UNIVERSIDADE DE LISBOA INSTITUTO DE GEOGRAFIA E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO Educação, Diversidade e Território O caso da Área Metropolitana de Lisboa Maria João de Oliveira Antunes Barroso Hortas Tese orientada por: Professora Doutora Maria Lucinda Fonseca DOUTORAMENTO EM GEOGRAFIA GEOGRAFIA HUMANA 2013
559
Embed
UNIVERSIDADE DE LISBOArepositorio.ul.pt/bitstream/10451/9663/1/ulsd066888_td... · 2017. 12. 18. · PARTE II – DIVERSIDADE E INTEGRAÇÃO: UMA ANÁLISE DAS POLÍTICAS DE ACOLHIMENTO
This document is posted to help you gain knowledge. Please leave a comment to let me know what you think about it! Share it to your friends and learn new things together.
Transcript
UNIVERSIDADE DE LISBOA
INSTITUTO DE GEOGRAFIA E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO
Educação, Diversidade e Território
O caso da Área Metropolitana de Lisboa
Maria João de Oliveira Antunes Barroso Hortas
Tese orientada por:
Professora Doutora Maria Lucinda Fonseca
DOUTORAMENTO EM GEOGRAFIA GEOGRAFIA HUMANA
2013
ii
iii
SUMÁRIO
Educação, Diversidade e Território surge na sequência da intensificação e
diversificação dos fluxos migratórios com destino a Portugal, em particular para a Área
Metropolitana de Lisboa (AML), na transição do século XX para o século XXI.
A chegada de população de origens diversas à cidade revê-se, não só nos territórios
em que esta se fixa pela multiplicidade de usos, práticas e formas de apropriação dos
espaços, mas também pelas dinâmicas que se desencadeiam entre os recém-
chegados, as populações locais e as instituições que as servem.
Nas escolas, inseridas nos bairros que acolhem esta diversidade de populações, os
públicos alteraram-se e a integração da diversidade sociocultural é hoje um dos
principais desafios que é colocado à comunidade educativa.
Definindo integração como um processo interactivo e multidimensional que decorre a
diferentes níveis e se desenvolve na interacção entre dois pilares fundamentais –
imigrantes e sociedade de acolhimento –, a pesquisa empírica que sustenta a
investigação tem como objectos de estudo alunos, escola e famílias. O envolvimento
que é esperado entre estes três agentes chave permitirá reconhecer os processos de
interacção que promovem ou inibem a inclusão dos alunos de origem imigrante no
sistema educativo nacional e afectam o seu desempenho escolar.
Assumindo que o essencial da integração se vive à escala local, que os territórios são
diversos nas suas estruturas socioeconómicas e culturais, colocamos como hipótese
de estudo que os contextos sócio-espaciais influenciam os processos de incorporação
dos alunos imigrantes nas escolas.
As escolas do ensino básico, objecto de estudo, localizam-se em dois territórios da
AML, o centro histórico de Lisboa e uma área suburbana do concelho de Sintra. A
leitura das dinâmicas de integração, desencadeadas pelos três agentes envolvidos em
cada território, revela ter algumas características que as distinguem. Associamos as
diferentes dinâmicas i) à composição socio-étnica dos territórios; ii) às diferenças
registadas nos níveis socioeconómicos das famílias; iii) às diversas expectativas das
famílias e ao capital cultural que transferem para os filhos e, iv) às escolas com os
seus posicionamentos distintos relativamente à incorporação de alunos de diferentes
origens geográficas e socioculturais.
Palavras-chave: Diversidade, Território, Integração, Aluno Imigrante, Comunidade
Educativa.
iv
ABSTRACT
Education, Diversity and Territory arises from the intensification and diversification of
migratory flows to Portugal, in particular to the Metropolitan Area of Lisbon, in the
transition from the 20th century to the 21st century.
The arrival of people from diverse origins to the city is visible in the territories of
settlement not only in the multitude of uses, practices and forms of appropriation of
space, but also in the dynamics unfolded among the recently arrived citizens, the local
population and the existing community institutions.
The schools of the neighbourhoods hosting this diversity of residents have registered
remarkable changes in their students and the integration of socio-cultural diversity is
today one of the main challenges faced by the educational community.
Defining integration as an interactive and multidimensional process taking place at
different levels and being developed in the interaction of two fundamental pillars –
immigrants and hosting society – the empirical research supporting this work has
students, schools and families as subjects of study. The involvement that is expected
among these three key agents will allow the recognition of the processes of interaction
that promote or inhabit the inclusion of students of migrant descent in the national
educational system and which affect their school performance.
Assuming that integration is an issue essentially lived at the local level and that
territories show immensely diverse socioeconomic and cultural structures, the research
hypothesis of this dissertation is that the social and spatial contexts influence the
processes of incorporation of migrant students in the schools.
The basic level schools, the case studies of this work, are located in two territories of
the Metropolitan Area of Lisbon: in the historical centre of Lisbon and in a suburban
area of the municipality of Sintra. The reading of the dynamics of integration triggered
by the three agents involved in each territory reveals some distinguishing features. The
different dynamics are associated to i) the social and ethnic composition of the
territories; ii) the differences seen at the social and economic levels of the families; iii)
the diverse expectations of the families and the cultural capital they transfer to the
children and, iv) the schools and to their distinct positioning concerning the
incorporation of students of different geographical, social and cultural origins.
Instituto Politécnico de Lisboa e Fundação para a Ciência e a Tecnologia: bolsa PROTEC
Centro de Estudos Geográficos, Núcleo Migrare: apoio logístico e financeiro
viii
ix
ABREVIATURAS
ACIDI – Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural
AL – Agrupamentos de escolas de Lisboa
AML – Área Metropolitana de Lisboa
AS – Agrupamentos de Escolas de Sintra
CEB – Ciclo do Ensino Básico
EB – Ensino Básico
ER – Ensino Regular
GEPE – Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação
INE – Instituto Nacional de Estatística
LP – Língua Portuguesa
ME – Ministério da Educação
PE – Projeto Educativo
SEF – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras
x
xi
ÍNDICE
INTRODUÇÃO 1
PARTE I – TEMA, MODELO DE ANÁLISE E FINALIDADES 11
1. Apresentação do tema 15
2. Problemática e modelo de análise 25
2.1. Definição da problemática e dimensões de análise 27
2.2. Os conceitos: diversidade cultural e integração 32
2.2.1. Diversidade cultural 33
2.2.2. Integração 40
2.3. Modos de incorporação 46
3. Os estudos sobre a integração de descendentes de imigrantes 65
3.1. Os estudos internacionais 65
3.2. Os estudos nacionais 68
4. Finalidades, fontes e linhas metodológicas 73
4.1. Finalidades 73
4.2. Fontes e linhas metodológicas 77
PARTE II – DIVERSIDADE E INTEGRAÇÃO: UMA ANÁLISE DAS POLÍTICAS DE ACOLHIMENTO
95
1. Políticas de integração na Europa – abordagens teóricas 101
2. O acesso dos filhos dos imigrantes à educação 109
2.1. Quadro legal internacional e europeu do acesso à educação de populações imigrantes
109
2.2. O acolhimento de imigrantes: contexto político nacional 121
2.3. Quadro legal nacional de acesso dos alunos imigrantes à educação
125
3. Imigração e educação – a reconstrução das políticas 139
PARTE III – ALUNOS IMIGRANTES NAS ESCOLAS EM PORTUGAL 143
1. Espaços e tempos da presença de alunos de origem imigrante no sistema educativo português
147
2. Escola e Imigração em Portugal – diversidades no final da primeira década do século XXI
157
3. A Área Metropolitana de Lisboa: escola e diversidades 173
3.1. Origens e distribuição geográfica no território metropolitano 175
3.2. Distribuição por ciclo, no Ensino Básico, e desempenho escolar
182
3.3. Tendências sócio-espaciais do desempenho escolar no território metropolitano
185
xii
3.4. Padrões territoriais do insucesso escolar 196
4. Perfis da imigração no sistema de ensino português – do país à AML
203
PARTE IV – AS ESCOLAS E OS TERRITÓRIOS: ACOLHIMENTO E INTEGRAÇÃO
211
1. Área Metropolitana de Lisboa: imigração e território 215
2. Os territórios em estudo 219
2.1. A área central da cidade – Mouraria/ Martim Moniz, Graça e Bairro Alto
220
2.1.1. Génese e breve evolução histórica 221
2.1.2. Perfil sociodemográfico 226
2.1.3 – Perfil socioeconómico da população residente e condições de habitabilidade
231
2.2. Os bairros da coroa suburbana – Monte Abraão e Agualva-Cacém
234
2.2.1. Génese e breve evolução histórica 235
2.2.2. Perfil sociodemográfico 238
2.2.3. Perfil socioeconómico da população residente e condições de habitabilidade
242
3. Os agrupamentos de escolas: características da população escolar e orientações da política de integração de alunos imigrantes
245
3.1. A diversidade da população escolar 246
3.2. Perfis de desempenho da população escolar 254
3.3. Orientações na política de integração de alunos imigrantes 264
3.3.1. Centro Histórico de Lisboa 264
3.3.2. Concelho de Sintra 278
4. Escolas, alunos e famílias: imagens e percursos de integração 291
4.1. Os questionários aos alunos 291
4.1.1. Perfil geral dos alunos inquiridos 292
4.1.2. Perfil dos alunos inquiridos em cada território 297
4.1.3. Composição familiar e Perfil Socioeconómico 306
4.2. Perfil socioeconómico e cultural das famílias inquiridas 316
4.3. Dimensão relacional – percepções, vivências e sociabilidades construídas na escola
332
4.3.1. Porquê ir á escola 333
4.3.2. Percepções construídas sobre a escola 336
4.3.3. Interacção e relação 347
4.3.4. Da escola ao bairro: construção de relações interétnicas
354
xiii
4.3.5. Da escola ao bairro: os espaços de convívio 368
4.3.6. Escola e percursos escolares: os intervenientes 376
4.3.7. O envolvimento das famílias na escola 397
5. Escola, diversidade e integração: reflexões a partir do território 407
SÍNTESE CONCLUSIVA 417
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 431
ANEXOS 457
xiv
xv
ÍNDICE-FIGURAS
Fig. I.1 – Modelo de análise 32
Fig. II.1 – Educação e integração: dimensões, políticas, actores e agentes 120
Fig. III.1 – Treze principais países de origem dos alunos imigrantes em Portugal, 2009-10 153
Fig. III.2 – Origem dos alunos, do ensino básico e secundário, inscritos nas escolas portuguesas, por NUTII, 2009-10 157
Fig. III.3 – Alunos nativos e estrangeiros em Portugal, por NUT II, 2009-10. 158
Fig. III. 4 – Índice Territorial de Imigração dos estudantes do ensino básico e secundário, 2009-10 159
Fig. III.5 – Níveis de ensino frequentados pelos alunos inscritos nas escolas portuguesas, segundo a origem, por NUTII (2009-10) 161
Fig. III.6 – Origem dos alunos, do ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos, 2009-10 164
Fig. III.7 – Principais nacionalidades por NUT, 2009-10 166
Fig. III.8 – Percentagem de alunos (5 a 18 anos), com idade superior à esperada, por ciclo de ensino, segundo a origem, 2009-10 168
Fig. III.9 – Origem dos alunos, com idade até 18 anos, inscritos no ensino regular na AML, 2008-09 177
Fig. III.10 – Principais nacionalidades dos alunos estrangeiros, nas escolas do ensino básico e secundário, da AML (5 a 18 anos), 2008-09 179
Fig. III.11 – Dezoito principais nacionalidades da população estrangeira documentada a residir na AML, 2010 180
Fig. III.12 – Origem dos alunos com idades entre 5 a 18 anos, por concelho da AML, em relação ao total, 2008-09 181
Fig.III.13 – Distribuição dos alunos estrangeiros, com idades entre 5 e 18 anos, segundo as origens nos concelhos da AML, 2008-09 182
Fig. III.14 – Percentagem de alunos (5 a 18 anos), com idade superior à esperada, por ciclo de ensino, segundo a origem, 2008-09 183
Fig. III.15 – % de Retenções/Desistências entre os alunos portugueses, que frequentam o ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09 197
Fig. III.16 – % de Retenções/Desistências entre os alunos estrangeiros, que frequentam o ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09 198
Fig. III.17 – % de Retenções/Desistências entre os alunos africanos, que frequentam o ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09 199
Fig. III.18 – % de Retenções/Desistências entre os alunos sul-americanos, que frequentam o ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09 200
xvi
Fig. III.19 – Taxa de desemprego, 2011 201
Fig. III.20 – % de analfabetos com mais de 10 anos, 2011 202
Fig. IV.1 – Territórios de estudo 220
Fig. IV.2 – Município de Lisboa – Área de Estudo 226
Fig. IV.3 – Residentes estrangeiros, segundo os principais grupos de origem, na cidade de Lisboa e no território em estudo, 2011 229
Fig. IV.4 – Dez principais nacionalidades da população estrangeira residente nas freguesias do centro de Lisboa, 2011 230
Fig. IV.5 – População estrangeira nas freguesias do centro de Lisboa, 2011 231
Fig. IV.6 – Município de Sintra – Localização da Área de Estudo 238
Fig. IV.7 – Residentes estrangeiros, segundo os principais grupos de origem, no concelho de Sintra e no território em estudo, 2011 241
Fig. IV.8 – Dez principais nacionalidades da população estrangeira residente nas freguesias de Monte Abraão e Agualva-Cacém, 2011 241
Fig. IV.9 – População estrangeira nas freguesias de Monte Abraão e Agualva-Cacém, 2011 242
Fig. IV.10 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos no EB nos agrupamentos em estudo no concelho de Lisboa, 2009-10 248
Fig. IV.11 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos no EB nos agrupamentos em estudo no concelho de Sintra, 2009-10 249
Fig. IV.12 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos em escolas do EB no concelho de Lisboa, 2009-10 250
Fig. IV.13 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos em escolas do EB no concelho de Sintra, 2009-10 250
Fig. IV.14 – Índice de diversidade dos estudantes no concelho de Lisboa e Sintra, 2009-10 251
Fig.IV.15 – Perfil do sucesso escolar nos concelhos de Lisboa e de Sintra, por ciclo do ensino básico, 2009-10 256
Fig.IV.16 – Perfil do sucesso escolar dos alunos do ensino básico, segundo as regiões origem, 2009-10 257
Fig. IV.17 – Perfil do sucesso escolar nos agrupamentos de escolas de Sintra e no concelho de Sintra, por ciclo do ensino básico, 2009-10 260
Fig. IV.18 – Perfil do sucesso escolar nos agrupamentos de escolas de Lisboa e no concelho de Lisboa, por ciclo do ensino básico, 2009-10 262
Fig. IV.19A – Localização dos agrupamentos em estudo, Lisboa 265
Fig. IV.19B – Localização dos agrupamentos em estudo, cidade de Lisboa 266
Fig. IV.20 – Regiões de origem dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas L1, 2009- 268
xvii
2010
Fig. IV.21 – Oito principais nacionalidades dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas L1, 2009-2010 268
Fig. IV.22 – Regiões de origem dos alunos (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas L2, 2009-2010 271
Fig. IV.23 – Oito principais nacionalidades dos alunos (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas L2, 2009-2010 272
Fig. IV.24 – Regiões de origem dos alunos (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas L3, 2009-2010 275
Fig. IV.25 – Oito principais nacionalidades dos alunos (5-18 anos) a
frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas L3, 2009-
2010 275
Fig. IV.26A – Localização dos agrupamentos em estudo, concelho de Sintra 278
Fig. IV.26B – Localização dos agrupamentos em estudo, concelho de Sintra 279
Fig. IV.27 – Regiões de origem dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico regular no agrupamento de escolas S1, 2009-2010 281
Fig. IV.28 – Oito principais nacionalidades dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico regular no agrupamento de escolas S1, 2009-2010 281
Fig. IV. 29 – Regiões de origem dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas S2, 2009-2010 285
Fig. IV.30 – Oito principais nacionalidades dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico regular no agrupamento de escolas S2, 2009-2010 285
Fig. IV.31 – Principais países de origem do total de famílias imigrantes inquiridas 320
Fig. IV.32 – Principais países de origem das famílias imigrantes (Sintra) 320
Fig. IV.33 – Principais países de origem das famílias imigrantes (Lisboa) 321
Fig. IV.34 – Relações interétnicas, familiares dos alunos das escolas de Lisboa 364
Fig. IV.35 – Relações interétnicas, familiares dos alunos das escolas de Sintra 365
Fig. IV.36 – Percepções das famílias sobre a diversidade na escola 367
xviii
xix
ÍNDICE-QUADROS
Quadro I.1 – Estrutura da entrevista realizada aos directores de agrupamento 85
Quadro I.2 – Estrutura do questionário aplicado aos alunos 88
Quadro I.3 – Estrutura do questionário aplicado às famílias 89
Quadro I.4 – Estrutura do questionário aplicado aos docentes 91
Quadro II.1 – Seis opções para as políticas de incorporação 104
Quadro II.2 – Tipologia das políticas para a imigração/minorias étnicas 105
Quadro II.3 – Integração e pertença étnica 107
Quadro II.4 – Políticas e medidas para a integração de alunos de origem imigrante em contexto educativo 132
Quadro III.1 – Alunos imigrantes e total de alunos inscritos no ensino básico e secundário regular (continente) 150
Quadro III. 2 – Alunos imigrantes inscritos no ensino básico e secundário (regular) por país e região de origem (continente) 151
Quadro III.3 – Alunos de origem imigrante, no ensino regular, por NUT II 154
Quadro III. 4 – Taxas de diplomação por ciclo do Ensino Básico e origem dos alunos (continente) 155
Quadro III.5 – Origem dos alunos, do ensino básico e secundário, inscritos nas escolas portuguesas, segundo os níveis e modalidades de ensino, 2009-10 160
Quadro III.6 – Origem dos alunos estrangeiros, do ensino básico e secundário, por NUT II (em % do total de estrangeiros por NUT II), (2009-10) 162
Quadro III.7 – Alunos do ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos, por ciclo de ensino e origem, 2009-10 (%) 163
Quadro III.8 – Origem dos alunos do ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos, por NUT II (2009-10) 163
Quadro III.9 – Principais nacionalidades dos alunos do ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos, 2009-10 165
Quadro III.10 – Média de Idades dos alunos, por ciclo, no ensino básico regular (dos 5 aos 18 anos), segundo a origem (2009-10) 167
Quadro III.11 – Transição/Conclusão e Retenção/Desistência no ensino básico regular (dos 5 aos 18 anos), segundo a origem, (2009-10) 169
Quadro III.12 – Origem dos alunos que frequentam as escolas do ensino básico e secundário da AML, 2008-09 176
Quadro III.13 – Principais nacionalidades dos alunos na AML, inscritos no ensino regular (dos 5 aos 18 anos) 178
Quadro III. 14 – Origem dos alunos na AML por ciclo no ensino regular (dos 5 aos 18 anos) 183
xx
Quadro III.15 – Aprovação vs retenção/desistência para alunos estrangeiros e nacionais (2008-09) 184
Quadro III.16 – Variáveis que apresentam uma correlação muito significativa 188
Quadro III.17 – Variáveis independentes utilizadas na análise de regressão múltipla 190
Quadro III.18 – Modelo de Regressão Múltipla (variável independente % retenções/desistências dos alunos estrangeiros do Ensino Básico regular, 2008-09) 192
Quadro III.19 – Modelo de Regressão Múltipla (variável independente % retenções/desistências dos alunos portugueses do Ensino Básico regular, 2008-09) 193
Quadro III.20 – Modelo de Regressão Múltipla (variável independente % retenções/desistências do total de alunos do ensino básico regular, 2008-09) 194
Quadro IV.1 – Percentagem de estrangeiros residentes na Área Metropolitana de Lisboa e taxa de variação (2001/2011) 216
Quadro IV. 2 – Taxa de variação da população estrangeira, residente na Área Metropolitana de Lisboa (NUT III), por continente de origem, 2001/2011 217
Quadro IV.3 – Alunos inscritos no ensino básico, segundo a origem e modalidade de ensino (2009-2010) 252
Quadro IV.4 – Alunos portugueses e estrangeiros por ciclos de ensino (Lisboa, 2009-2010) 253
Quadro IV.5 – Alunos portugueses e estrangeiros por ciclos de ensino (Sintra, 2009-2010) 253
Quadro IV.6 – Origem dos alunos a frequentar o agrupamento de escolas L1, ano lectivo 2009-2010 267
Quadro IV.7 – Origem dos alunos no Ensino Básico e média de idades (5-18 anos) no agrupamento de escolas L1, 2009-2010 267
Quadro IV.8 – Origem dos alunos a frequentar o agrupamento de escolas L2 no ano lectivo 2009-2010 271
Quadro IV.9 – Origem dos alunos no Ensino Básico e média de idades (5-18 anos) no agrupamento de escolas L2, 2009-2010 271
Quadro IV.10 – Origem dos alunos a frequentar o agrupamento de escolas L3 no ano lectivo 2009-2010 274
Quadro IV.11 – Origem dos alunos no Ensino Básico e média de idades (5-18 anos) no agrupamento de escolas L3, 2009-2010 274
Quadro IV.12 – Origem dos alunos a frequentar o agrupamento de escolas S1, ano lectivo 2009-2010 280
Quadro IV. 13 – Origem dos alunos no Ensino Básico e média de idades (5-18 anos) no agrupamento de escolas S1, 2009-2010 280
Quadro IV.14 – Origem dos alunos a frequentar o agrupamento de escolas S2 no ano lectivo 2009-2010 284
xxi
Quadro IV.15 – Origem dos alunos (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas S2, 2009-2010 284
Quadro IV.16 – Origem dos alunos inquiridos, 1ª e 2ª geração 293
Quadro IV.17 – 1ª e 2ª geração de imigrantes, por ano de escolaridade e território 294
Quadro IV. 18 – Idade dos alunos inquiridos, por ano de escolaridade 295
Quadro IV.19 – Idade dos alunos, por ano de escolaridade, segundo a origem 296
Quadro IV.20 – Alunos inquiridos por ano e por território 298
Quadro IV.21 – Distribuição da 1ª e 2ª gerações de alunos imigrantes, segundo as regiões de origem, por território 299
Quadro IV.22 – Idades dos alunos, por ano de escolaridade e território 302
Quadro IV.23 – Região de origem (naturalidade) dos pais em que um dos cônjuges é nativo 306
Quadro IV.24 – Distribuição das idades dos pais, por género e por território 307
Quadro IV.25 – Situação dos pais perante a profissão 309
Quadro IV.26 – Nível de ensino dos pais, por género e território 314
Quadro IV. 27 – Origens das famílias inquiridas em cada território 318
Quadro IV. 28 – Regiões de origem das famílias inquiridas em cada território 319
Quadro IV. 29 – Idade média dos elementos do agregado familiar em cada território 323
Quadro IV.30 – Número médio de anos de escolaridade das famílias inquiridas 324
Quadro IV.31 – Nível de ensino dos pais, por género e território 325
Quadro IV.32 – Rendimento mensal das famílias inquiridas, segundo a origem (%) 330
Quadro IV.33 – Distribuição dos alunos em função do limite de idade esperado em cada ano de escolaridade (%) 377
Quadro IV. 34 – Aprendizagem da língua portuguesa, % em relação ao total de referências para cada item 389
Quadro IV.35 – Elementos da família que apoiam o aluno nas tarefas escolares, % em relação ao total de referências para cada item 390
Quadro IV.36 – Ocupação dos tempos livres dos alunos, em Lisboa e em Sintra, segundo a origem (% de respostas em cada item) 391
Quadro IV.37 – Actividades escolares em que a família se envolve (% de respostas em cada item) 399
Quadro IV.38 – Actividades escolares em que a família se envolve (% de respostas as cada item) 402
Quadro IV.39 – Actividades promovidas pela escola (% de respostas a cada item) 404
xxii
xxiii
INDICE-ANEXOS
Anexo 1 – Guião de entrevista aos directores de agrupamento 459
Anexo 2 – Questionário aos alunos 1º/2º CEB 471
Anexo 3 – Questionário aos alunos 3º CEB 481
Anexo 4a – Questionário às famílias (português) 491
Anexo 4b – Questionário às famílias (inglês) 501
Anexo 4c – Questionário às famílias (mandarim) 511
Anexo 5 – Questionários aos professores titular de turma/director de turma 523
Anexo 6 – Quadro I – Estrangeiros residentes, segundo a região de origem, nas freguesias do centro de Lisboa, 2011 529
Anexo 7 – Quadro II – Estrangeiros residentes, segundo a região de origem, nas freguesias de Monte Abraão e Agualva-Cacém, 2011 533
xxiv
1
INTRODUÇÃO
A diversidade e a criatividade convivem de mãos dadas com a cidade.
Desde sempre, a cidade assumiu-se como acolhedora da expressão
mais poderosa do pluralismo humano.
(Roberto Carneiro, Fundamentos da Educação e da Aprendizagem, 2001, p. 256)
2
3
Quase 11 horas de uma quarta-feira de Maio de 2010…
Numa rua de um dos bairros com mais história para contar na cidade de
Lisboa, procuro a escola onde me vou encontrar com a professora, para definir a
turma onde poderei aplicar os questionários aos alunos.
Encontrar o número da porta nesta rua é quase uma aventura, que já me
obrigou a voltar atrás mais que uma vez e a questionar-me sobre as minhas
competências de orientação…
Finalmente! A algazarra que vem das janelas não deixa dúvidas sobre a
presença de crianças num edifício cuja fachada e a sua grande porta de madeira nos
informam, num primeiro olhar, da existência de uma longa história. Fiquei a saber,
mais tarde, que a construção é pombalina e que, em tempos, lhe foi destinada a
função de escola, que ainda hoje mantém.
Confirmo a morada e concluo que estou, finalmente, em frente do número 51.
De repente, a algazarra termina, sinal que as crianças estarão a voltar para a sala de
aula para recomeçar as suas tarefas.
A porta está fechada, após o toque na campainha, foi possível entrar para um
hall, frio, meio lusco-fusco, silencioso, revestido de antigos azulejos azuis e brancos e,
ao fundo, uma escadaria que os azulejos acompanham na subida para o piso superior.
Num primeiro impacto, interrogo-me se haveria de facto uma escola ali! Não
fossem os sinais das crianças e creio que me sentiria equivocada! A subida até ao
primeiro andar permitiu descobrir um outro espaço onde, finalmente, se abre uma
porta de acesso a diferentes salas, ou melhor, à escola!
Duas das professoras recebem-me e fazem as “honras da casa”. Reparo nos
espaços das salas e percebo o quanto são reduzidos para acolher todos os materiais
e as crianças. Sorte, o grupo de crianças não parecer ser muito grande!
Fiquei então a saber que o barulho que ouvia na rua vinha exactamente
daquele espaço onde me encontrava. A escola não tem qualquer pátio exterior para
recreio e as crianças brincam nos corredores que fazem a ligação entre as salas.
A conversa com as duas professoras permitiu esclarecer os motivos da minha
presença, tendo sido definidas no momento as diferentes possibilidades de aplicação
do questionário. Uma turma do 3º/4º ano seria o grupo ideal, sugeria a professora.
Mas, atendendo a que tinha definido na metodologia de trabalho que os questionários
seriam aplicados a alunos em final de ciclo, propus organizar o grupo de alunos
inscritos no 4º ano, explicar os objectivos do questionário e enviar os pedidos de
autorização para os pais.
4
… Passada uma semana, de regresso à escola, a professora titular de turma,
também ela descendente de imigrantes, provavelmente indianos oriundos de
Moçambique, recebeu-me e conduziu-me à sala de aula onde o grupo que iria
responder ao questionário iria ficar.
Enquanto decorria o intervalo aproveitou para apresentar o grupo de alunos
com quem trabalha, um grupo de pequena dimensão, mas imenso em diversidade,
motivo pelo qual se reportou ao mesmo dizendo que “tenho quase o mundo dentro da
sala de aula”. Devido à presença de crianças de diferentes origens, chegadas em
momentos distintos, a professora refere que tem na sala muitos terceiros e quartos
anos, de idades diversas, entre os 10 e os 13 anos. Metade do grupo é português,
mas existem duas crianças oriundas do Brasil, uma romena, uma ucraniana, uma
bangladeshiana e dois paquistaneses. O entusiasmo com que falava do seu grupo só
foi interrompido pelo desabafo da dificuldade em gerir um grupo tão diverso. Pensei,
de imediato, tratar-se do grupo ideal para o trabalho que pretendia desenvolver.
Assim que termina o intervalo, o grupo de alunos que vai preencher o
questionário dirige-se para a sala e senta-se em torno de uma mesa já organizada
para o efeito. A professora apresentou rapidamente cada um e despediu-se para ir
continuar as suas actividades com os alunos que frequentam o 3º ano.
Em torno da mesa ouvia falar diferentes línguas. De modo a tentar chegar a
todo o grupo, fazendo entender o que se pretendia com o questionário e quais as
regras para o seu preenchimento, tentei falar pausadamente. Após o início da tarefa
algumas questões foram surgindo mas, prontamente, o grupo foi tentando colaborar
no sentido de explicar as palavras mais difíceis aos restantes colegas. O momento foi
de intensa partilha e, entre gestos e tentativas de tradução, que se prolongaram por
cerca de uma hora, todos foram, à sua maneira e com os seus saberes, preenchendo
o questionário.
Ocupei o que restava da manhã de aulas da professora e imaginei, durante
aquele precioso momento de interacção, as diferentes estratégias que a professora
teria que encontrar nas suas práticas diárias para responder a todos e conseguir
conduzir na aprendizagem um grupo com aquelas características. Provavelmente, o
tempo nunca seria suficiente para aquela sala de aula!
As línguas faladas são pelo menos cinco, não querendo alargar-me aos
possíveis dialectos que desconheço. Porém, foi visível, pela pequena mas rica
experiência que vivi, perceber que entre si se inventam formas de comunicar, de
partilhar e de ajudar os outros a aprender.
5
Terminado o tempo destinado à nossa tarefa, até porque se aproximava a
hora do almoço, a professora voltou e o grupo despediu-se para se dirigir ao refeitório.
Perguntaram quando voltaria, até porque tinham gostado da tarefa!
Comentei com a professora as características do grupo e a forma como
partilharam o momento, respeitando-se e ajudando-se. Ao que a mesma respondeu,
com o entusiasmo que anteriormente já tinha manifestado, que têm uma relação muito
positiva, de entreajuda, e que todos têm aprendido muito naquele contexto.
Finalizado o meu tempo, de interrupção do árduo trabalho que se desenvolve
naquela sala de aula, despedi-me com uma enorme necessidade de voltar!
O grupo deixou-me uma grande curiosidade para aprender mais e,
principalmente, para perceber como se mantêm tão unidos e interagem tão facilmente
no meio de uma diversidade de expressões que, à partida, parece que ninguém
entende, mas que no fim, nos deixa uma enorme vontade de poder partilhar.
A experiência vivida nesta escola ilustra as mudanças sociais que ocorreram
em Portugal, na transição do século XX para o século XXI, como resultado da sua
nova posição nas dinâmicas migratórias internacionais. A maior abertura do país, por
via da sua pertença à União Europeia, uma conjuntura favorável da economia e a
projecção internacional são alguns dos factores que aceleraram a chegada, a um país
tradicional de emigração, de quantitativos significativos de migrantes oriundos de
todos os continentes.
À medida que se intensificam os fluxos migratórios com destino a Portugal,
diversificam-se as origens dos recém-chegados configurando-se, nos territórios
urbanos, novas paisagens étnicas e culturais. A cidade de Lisboa e a sua área
metropolitana, espaços por excelência de destino da imigração, nos anos de transição
entre séculos, assistem a importantes transformações, resultado das formas diversas
com que os imigrantes se apropriam destes espaços.
Áreas em declínio demográfico no centro da cidade que, por via do
envelhecimento das populações e da debilidade das habitações, foram sendo
progressivamente abandonadas, confrontaram-se com um novo papel no contexto
urbano, resultado da ocupação recente por gentes diversas nas suas origens, nos
modos de estar e de viver no “novo” território. Em alguns destes espaços centrais,
menos apetecíveis por parte de uma população mais jovem que tem migrado para a
periferia, multiplicam-se os estabelecimentos de comércio étnico, improvisam-se
espaços de culto e vive-se, nas ruas e praças, entre um corrupio de gentes muito
diversas nas formas de vestir, de se relacionar, de viver a cidade. Por seu turno, nas
áreas periféricas, onde se vinha fixando e consolidando um grupo importante de
6
população oriunda de países africanos, maioritariamente descendentes da grande
vaga migratória que entrou no país após a descolonização, a diversidade viu-se
ampliada com a chegada destes novos habitantes, provenientes de países do leste
europeu, do Brasil e do continente asiático.
Este cenário, que caracteriza de um modo muito geral o percurso recente
realizado pela Área Metropolitana de Lisboa no acolhimento de populações migrantes,
foi acompanhado de perto pelas escolas que nele se localizam, e onde se vivem e
reflectem as realidades socioculturais das comunidades em que se inserem. Espaços
de encontro e relação diária de crianças e jovens, são também o palco onde se
constroem importantes redes de relações e laços que, transportados para os espaços
exteriores e para o bairro, constituem o capital social com que estas populações
podem avançar degraus importantes no percurso de integração.
Os desafios que se lhes colocam na busca de respostas que melhor se
adequem à diversidade de públicos que servem, transcendem o tradicional domínio
das aprendizagens curriculares realizadas dentro dos muros da escola, ou melhor,
dentro da sala de aula, dispersando-se por áreas do domínio relacional e dos
comportamentos. O desenvolvimento de capacidades ou sensibilidades que permitam
à escola em geral, e ao corpo docente em particular, identificar, analisar e resolver
problemas a partir de múltiplas perspectivas e perante um público diversificado, será
certamente um dos maiores desafios que se colocam hoje à escola.
Olhando agora para a educação, por via do contributo na integração de
crianças e jovens, é inquestionável o papel que desempenha nos percursos de
descendentes de migrantes, quer estes tenham já nascido em território nacional, quer
se encontrem na transição para a nova sociedade. O contributo que se reclama da
escola para o século XXI, é que compreenda um ideário educativo assente numa
trilogia de valores – aprender a viver juntos, aprender a aprender juntos e aprender a
crescer juntos. Num momento em que a diversidade e o pluralismo humano convivem
de mãos dadas nos palcos da educação, preconiza-se uma visão educativa partilhada,
assente num paradigma que associe diversidade a criatividade, culturas a
oportunidades. Desafio que se coloca a todas as comunidades escolares que se
disponibilizam para sustentar a sua acção educativa na construção de culturas abertas
à descoberta do outro, estruturantes de percursos de integração que se constituam
como motores da coesão social.
Este estudo, centrado na diversidade sociocultural que hoje caracteriza as
escolas da AML, tem na sua origem a intenção de desenvolver uma leitura da
integração de crianças e jovens descendentes de migrantes, em contextos escolares
localizados em territórios distintos deste espaço metropolitano. As grandes linhas que
7
o orientam mobilizam, em diferentes escalas de análise, dois conceitos-chave,
diversidade e integração, os quais permitem conduzir na interpretação da informação
empírica e, assim, na compreensão dos modos e percursos que se estruturam na
relação dialéctica aluno-escola, no sentido da integração.
Apresentado genericamente o estudo a que nos propomos, cabe agora
descortinar as motivações que o sustentam. De imediato, a relação entre geografia e
migrações, que nos conduz na interpretação das novas dinâmicas de ocupação e
organização dos espaços. Decorrente desta primeira premissa, a associação dos
espaços de acolhimento dos migrantes ao território urbano, onde se materializam as
interacções com as populações e com as instituições, suscita a análise das dinâmicas
que se vivem à escala local. Por fim, as interacções que se vivem nos contextos locais,
no caso particular as escolas, que, em conjunto com os recém-chegados, procuram
respostas no sentido da integração, assumem-se como o núcleo central deste estudo.
Para além destes aspectos, que mais directamente se relacionam com o
itinerário que fomos construindo para chegar ao cerne da presente investigação e que
o justificam do ponto de vista da Geografia, existem outros que decorrem de um
percurso construído desde que terminei a minha licenciatura nesta área científica. Em
primeiro lugar, a proximidade com as questões urbanas para as quais desde cedo
direccionei a investigação que fui desenvolvendo, privilegiando na exploração da
cidade os agentes que sobre ela actuam e as transformações de que são alvo as
áreas centrais. Em segundo lugar, a opção profissional pelo ensino da Geografia que,
depois de um percurso no ensino básico e secundário, me levou à Escola Superior de
Educação de Lisboa. Aqui, continuando alguns trabalhos de investigação no campo da
Geografia Urbana e da Didáctica da Geografia iniciei, por via das funções docentes
que me foram atribuídas, um trabalho mais próximo das escolas do primeiro e do
segundo ciclo, localizadas na AML. Neste território, fui progressivamente contactando
com crianças de diferentes origens e preocupações diversas, quer por parte dos
professores, quer dos aprendizes de professores sobre as melhores estratégias para
atender a todos. Anteriormente, enquanto professora do ensino básico e secundário,
tinha trabalhado com turmas diversas em termos socioculturais, tinha vivido algumas
dificuldades na integração daqueles jovens na sala de aula, mas a realidade que
conhecida não era exactamente aquela com que me confrontava mais recentemente.
A diversidade é muito maior, os percursos escolares anteriores mais diversos, os
ritmos muito diferentes e as expectativas multiplicam-se! Em terceiro lugar, embora
não menos importante no peso que teve na opção pelo tema da investigação, contou a
minha participação, enquanto investigadora do Centro de Estudos Geográficos, no
núcleo de estudo das migrações (MIGRARE). O desafio de reunir ao mesmo tempo
8
estas três pertenças ou áreas de interesse, conduziu-me na procura do ponto de
encontro possível destes três percursos que, necessariamente, tinha que ser
sustentado pela Geografia – migrações, educação e cidade.
Encontrada a justificação para o percurso a seguir – a relação entre cidade e
migrações materializa-se nas escolas enquanto espaços de acolhimento e vivência
diária da pluralidade de culturas que em cada território se fixa – ficou definida a
proposta de tema que apresentei para investigação.
Após as primeiras leituras e definição das linhas de investigação e
metodologia de recolha de informação, foi-me possível avançar para o trabalho de
campo, no centro da cidade e nos bairros de um concelho da periferia de Lisboa.
Procurei junto dos cinco agrupamentos de escolas que previamente tinha identificado
para desenvolver a minha pesquisa, em particular junto dos órgãos directivos, o apoio
para iniciar a tarefa a que me propus. Apesar das renitências iniciais, em muito
devidas aos momentos conturbados que viviam, a abertura que posteriormente
manifestaram merece que lhes dedique as primeiras palavras de agradecimento.
Também, a todas as crianças, famílias e professores que prontamente se
disponibilizaram para colaborar nesta tarefa, dirijo os meus primeiros agradecimentos.
Sem a vossa colaboração não teria, com toda a certeza, percorrido este caminho!
Dirijo um profundo agradecimento à minha orientadora, Professora Maria
Lucinda Fonseca que, ao acolher este projecto, se disponibilizou mais uma vez para
acompanhar a minha formação enquanto investigadora. Pela forma como desde o
primeiro momento aceitou orientar esta investigação e se dedicou ao seu
acompanhamento, esclarecendo as minhas dúvidas, lendo atentamente os meus
textos e reflectindo comigo sobre o percurso a seguir, merece que lhe seja dirigida
uma palavra de reconhecimento muito especial. Não faltaram as palavras de incentivo
e de confiança que, entre o rigor que deposita na sua forma de fazer investigação, me
permitiram ultrapassar os momentos de hesitação e chegar a bom porto.
Regresso agora a todos os amigos e colegas que, de uma forma mais
próxima, acompanharam ou viveram comigo este percurso, tão fascinante quanto
longo, para lhes agradecer o enorme contributo pelas palavras de incentivo, os
conselhos, as ajudas e os apoios que me dispensaram.
Ao meu colega e amigo Alfredo Dias, agradeço a disponibilidade que desde o
início desta investigação manteve para comigo reflectir, construir e desconstruir
percursos de abordagem possíveis de seguir num trabalho desta natureza. A leitura
que fez das minhas páginas, complementada pelas sugestões de quem já foi actor em
9
contextos escolares diversos e de diversidade, permitiu ir mais além dos primeiros
resultados que os dados empíricos transmitem.
Às minhas colegas e amigas Célia Martins e Cristina Cruz devo a ajuda
preciosa na construção e revisão das intermináveis bases de dados que reúnem a
informação estatística que sustenta este estudo. Agradeço, igualmente, a
disponibilidade demonstrada pela Alina Esteves, a quem devo o companheirismo e a
ajuda preciosa nas sugestões de análise quantitativa de alguns dados estatísticos, na
revisão das traduções e no estabelecimento de contactos para obtenção de
informação estatística junto do Gabinete de Estatística e Planeamento do Ministério da
Educação. Ao Joaquim Seixas gostaria de deixar uma palavra de apreço pelo cuidado
que depositou na realização dos mapas que acompanham este trabalho. Um
reconhecimento sincero deixo também aos bolseiros do núcleo MIGRARE, Patrícia e
Tiago, que introduziram a informação dos questionários na base de dados
Ainda a nível individual, importa agradecer a três colegas da Escola onde
desempenho as minhas funções docentes: à Cristina Loureiro, que me ajudou a abrir
as portas das escolas do centro de Lisboa que participaram neste estudo; ao João
Rosa, pela sua disponibilidade para partilhar comigo o seu saber sobre a análise
estatística a partir do SPSS e, à Joana Campos, pelo apoio às minhas incursões nos
domínios da Sociologia.
A um nível institucional, foi fundamental o apoio dos técnicos do Gabinete de
Estatística e Planeamento do Ministério da Educação, em particular do Sr. Nuno
Cunha, na disponibilização da informação estatística que permite conhecer os
quantitativos de alunos nas escolas portuguesas. Na divisão de Educação da Câmara
Municipal de Sintra, o Dr. Frederico Eça e Dra. Marina Barros, mostraram uma total
abertura para me fornecerem a informação estatística que possuíam e reflectir, com
base na experiência e conhecimento que têm do terreno, sobre os territórios que iriam
integrar o estudo. Posteriormente, os contactos que estabeleceram com os
agrupamentos de escolas abriram as portas para o trabalho que viria a desenvolver.
Ao Alto Comissariado para a Imigração e o Diálogo Intercultural especialmente à
Senhora Alta Comissária, Dr.ª Rosário Farmhouse, ao Coordenador do Observatório
da Imigração, Eng.º Roberto Carneiro e à Coordenadora da Unidade de Estudos e
Relações Internacionais, Dr.ª Catarina Oliveira, agradeço o interesse e apoio à
realização de um estudo exploratório, sobre a mesma temática, que desenvolvi para o
Observatório da Imigração. No Programa Escolhas, desejo expressar o meu
reconhecimento ao Dr. Pedro Calado que me facilitou o estabelecimento dos contactos
com os coordenadores locais dos projectos que decorriam nos territórios servidos
pelas escolas.
10
As últimas palavras vão para a família, que viveu e acompanhou bem de
perto este percurso e que, em muitos momentos, me foi lembrando que continuava à
minha espera… Ao Hortas, ao João e à Joana, um obrigada pela ajuda que vos foi
possível proporcionar. Ao João, mais do que o agradecimento pela compreensão das
ausências em momentos que eram mesmo muito importantes, devo o reconhecimento
pela paciência e cuidado que depositou na construção de cada gráfico e de cada
esquema que compõem este trabalho, aqui ficam registados todos os “créditos” que,
enquanto autor, mereces! À Joana, companheira das grandes maratonas de trabalho,
agradeço a disponibilidade com que sempre respondeu às solicitações que em
diferentes momentos lhe fui fazendo. A ajuda na organização das bases de dados
“que nunca mais terminavam” e nas traduções de alguns parágrafos mais rebuscados
do inglês merecem, certamente, muito mais do que um simples agradecimento!
Deixo as últimas palavras desta lista longa de agradecimentos aos meus pais,
a quem dedico este trabalho. Para eles, tendo dificuldade em encontrar palavras
adequadas, uma única parece preencher todas as condições que imponho: Obrigada!
11
PARTE I – TEMA, MODELO DE ANÁLISE E FINALIDADES
1. Apresentação do tema
2. Problemática e modelo de análise
2.1. Definição da problemática e dimensões de análise
2.2. Os conceitos: diversidade cultural e integração
2.2.1. Diversidade cultural
2.2.2. Integração
2.3. Modos de incorporação
3. Os estudos sobre a integração de descendentes de imigrantes
3.1. Os estudos internacionais
3.2. Os estudos nacionais
4. Finalidades, fontes e linhas metodológicas
4.1. Finalidades
4.2. Fontes e linhas metodológicas
A passagem da cultura à multicultura desencadeia
fenómenos novos na cidade.
(Roberto Carneiro, Fundamentos da Educação e da Aprendizagem, 2001, p. 262)
12
13
A imigração tem sido o grande motor do crescimento urbano e das
transformações económicas, sociais e espaciais nas cidades (Fonseca, 2006). Apesar
de, desde sempre, acompanharem a história da humanidade, as migrações assumem-
se, no mundo contemporâneo, como um dos fenómenos com maior significado à
escala global, pelo número de indivíduos que mobilizam, pela diversidade de países
envolvidos e pelas transformações que desencadeiam nos territórios envolvidos. São
diversos os factores que estão na origem dos fluxos migratórios, assim como as
modalidades que os diversos grupos sociais escolhem para os seus trajectos. As
migrações de carácter temporário, movidas pelas necessidades de mão-de-obra em
alguns países ocidentais foram, durante muito tempo, assumidas como a tipologia
dominante na mobilidade. Contudo, a evolução que o fenómeno registou e a dimensão
que assumiu em alguns países, conduziram a um reconhecimento do seu carácter
definitivo, desencadeando novas abordagens na teoria das migrações e nos processos
de incorporação nas sociedades de acolhimento.
A gestão e acolhimento da diversidade de populações imigrantes colocam
hoje desafios em níveis diversos das estruturas políticas, económicas e sociais. As
respostas a estes desafios implicam uma revisão do quadro conceptual associado ao
fenómeno, dos modelos de análise e das metodologias que melhor se adequam à
compreensão das dinâmicas e percursos migratórios do nosso tempo.
Apesar de se tratar de um fenómeno global, o grande impacto das migrações
é vivido à escala local, da cidade, dos bairros e das instituições onde diariamente as
populações convivem e com os quais estabelecem relações de proximidade. Os
estudos desenvolvidos pela Escola de Chicago nos anos 20 do século XX apresentam
os primeiros paradigmas explicativos para a análise do lugar do imigrante nos espaços
urbanos. Defendendo uma perspectiva assimilacionista da integração, estes estudos
dominaram as concepções teóricas até meados do século.
Segundo o paradigma definido, os imigrantes recém-chegados deveriam
assimilar-se progressivamente à sociedade de acolhimento abandonando, para tal, a
sua cultura de origem se ambicionavam ser entendidos como cidadãos do novo
território. Contudo, a diversidade de dinâmicas migratórias, de trajectos, e de formas
de incorporação dos imigrantes e de territórios de acolhimento colocou,
progressivamente, novas questões a este paradigma.
O entendimento de que a integração se desenrola em dimensões diversas,
constituindo-se como um processo heterogéneo e partilhado, porque envolve a
sociedade de acolhimento e o imigrante, tem implícita a valorização do local na sua
análise. Para tal devem ser mobilizadas as instituições locais, os imigrantes e a
restante comunidade local. É nesta perspectiva de análise que situamos a escola,
14
instituição local que serve o território em que se insere e que funciona diariamente
como espaço de encontro da população imigrante com a população nativa. Para a
maioria dos recém-chegados, é na escola que ouvem pela primeira vez a língua do
país de acolhimento e que se confrontam com os primeiros desafios da sua integração.
Em Portugal, a população de origem imigrante que frequenta o sistema de
ensino tem aumentado, sendo no final da primeira década do séc. XXI cerca de 5% as
crianças e jovens que se encontram matriculados nas escolas portuguesas,
concentrando-se maioritariamente na Área Metropolitana de Lisboa. Ao incremento no
número de estudantes estrangeiros associa-se a diversificação das origens,
desafiando as escolas na procura de estratégias para a sua gestão, em simultâneo
com a construção de respostas que garantam o ensino e aprendizagem de todos.
A escolarização das crianças imigrantes tem colocado muitas interrogações e
conduzido a respostas diversificadas à escala europeia, nacional e local. As diferenças
que se encontram nas formas e processos de integração relacionam-se, em linhas
gerais, com os contextos nacionais e locais, quer do ponto de vista das orientações da
política nacional, quer da política local, mas também com as características do
território e da população escolar.
O estudo de caso concreto, da integração de crianças e jovens em escolas
da AML, implica a mobilização de um quadro teórico que permita a análise dos
modelos e políticas de integração da diversidade vividos em diferentes escalas,
ajustando-se à problemática definida, às metodologias adoptadas e tendo em linha de
conta as fontes a que foi possível aceder.
15
1. Apresentação do tema
Num mundo cada vez mais globalizado, onde a intensificação das trocas e
dos contactos à escala planetária assumem contornos sem precedentes, partilhamos o
território, à escala local, no quotidiano das grandes urbes, com populações oriundas
de nacionalidades e culturas diversas. Calcula-se que em 2009 eram 214 milhões os
migrantes à escala mundial, dos quais 32 milhões residiam em países europeus (UE
27).1 Desde “há muito locais de contacto, justaposição, cooperação e conflito entre
diferentes culturas (…) as cidades têm permitido a coexistência de comunidades
culturalmente diversas” (Gaspar & Fonseca, 2008, p. 93) ainda que as formas de viver
essa diversidade tenham assumido contornos diferentes ao longo do tempo.
Movida pela rápida difusão das inovações nos transportes e pela maior
facilidade nas deslocações “entre mundos” distantes, a população mundial intensificou
a sua mobilidade e diversificou os territórios de destino. À tradicional circulação entre
antigas colónias e respectivas metrópoles, 2 consequência dos processos de
descolonização e do despoletar das guerras civis em muitos territórios coloniais,
juntou-se, no último quartel do séc. XX, a abertura económica da China promovida por
Deng Xiao-ping, sob o princípio “um país, dois sistemas”; a desagregação do Bloco de
Leste e a queda dos regimes comunistas, na Europa; e, já no séc. XXI, a designada
“primavera árabe” nos países do norte de África e do Médio Oriente, que ainda vivem
sob a alçada de regimes ditatoriais. Neste quadro de mudanças geopolíticas e de
reorganização interna dos estados, caracterizadas pela transição para novos regimes
políticos, pela integração de novos espaços económicos regionais e pelo novo
posicionamento nas redes globais, intensificam-se as mobilidades e, em particular nas
cidades, emergem comunidades “mais complexas tanto ao nível social como cultural”
(Gaspar & Fonseca, 2008, p. 93). A globalização, tecnológica e económica, que se
intensificou desde finais do séc. XX, é hoje vivida numa dimensão cultural (Malheiros,
2001), com importantes reflexos à escala local. A cidade concentra a diversidade, os
seus espaços inscrevem-se numa cultura corporativa dominante (Sassen, 1994), mas
integrando uma multiplicidade de culturas e identidades diferentes decorrentes, em
particular, da imigração (Ribas-Mateos, 2004). Assim, a imigração surge como uma
localização do global nas cidades, um processo de importância particular através do
qual se constitui uma nova economia política e transnacional, e um conjunto de
1 OIM (2011). Etat de la Migration dans le Monde. Genéve.
2 (…) apesar do fim da era colonial, as relações ex-metrópole /ex-colónia continuaram a ser uma das
lógicas em que assentaram as migrações que se mantiveram entre os territórios nacionais. (Dias, 2012, p. 6)
com impacto a diferentes escalas, exige uma abordagem que deve ultrapassar as
fronteiras nacionais, enquadrando-se num contexto regional, numa perspectiva
sincrónica de articulação entre o global e o local.4
Este desafio, não obstante adivinharmos as dificuldades que constitui, merece
ser assumido tendo em conta o potencial imenso para explorar, questionar, descobrir.
No final, certamente nos indicará a possibilidade de reconhecer outros percursos
possíveis, de desencadear outras análises e de mobilizar outras informações,
modificando o olhar de partida e reconstruindo as interpretações iniciais. Deste modo
esperamos ser possível dar um contributo para a compreensão local de um fenómeno
que é também global.
O estudo que pretendemos desenvolver resultará da análise de contextos
locais e, como tal, não é nossa intenção entrar em generalizações, mas sim mobilizar
os seus possíveis contributos para a compreensão das teorias que sustentam esta
temática de investigação. Neste sentido, o estudo da integração de crianças de origem
imigrante na escola, a partir dos contextos territoriais que as acolhem, será orientado
numa perspectiva que assume a integração como um processo interactivo entre dois
4 De acordo com Sayd, falar da dimensão sincrónica da imigração significa analisá-la do ponto de vista
das estruturas presentes na sociedade e do seu funcionamento (Ribas-Mateos, 2004).
20
pilares, o imigrante e a sociedade de acolhimento. No equilíbrio da estrutura de
suporte a esta ponte, que se constrói no diálogo quotidiano entre os dois pilares, os
agentes e os actores locais que actuam no território assumem um papel decisivo.
A presença de alunos de origem imigrante nas escolas portuguesas
acompanhou o processo de descolonização e a chegada da população africana que
residia nas ex-colónias. Contudo, os primeiros dados quantitativos5 de que dispomos
sobre estes alunos remontam ao ano lectivo de 1994-95 e davam-nos conta de um
total de 53 120 indivíduos (3,7% do total de alunos). Este valor inicial apresentou
oscilações nos anos seguintes, aumentando até 1997-98, ano em que o peso relativo
deste grupo atingiu 4,6%. Até 2003-04 os dados indicam que o valor percentual não
ultrapassou 4,9%. No entanto, o processo de recolha de informação sofreu alterações
a partir de 2000-01, não se socorrendo sempre dos mesmos critérios, pelo que não é
aconselhável a sua utilização numa análise evolutiva do fenómeno, ou esta deve ser
feita com reservas.
A imigração em Portugal foi assumindo contornos diversos, desde finais dos
anos 90, dispersando-se as origens, diversificando-se as características dos
imigrantes, em particular, os níveis de formação/qualificação e as actividades
profissionais. Desde então, o acréscimo de população imigrante foi significativo e, em
2011, Portugal tem, entre a sua população, 436 822 6 cidadãos estrangeiros
documentados, frequentando o sistema de ensino português 45 4677 crianças e jovens
estrangeiros, com idades compreendidas entre os 5 e 18 anos, correspondendo a
5,1% do total de estudantes. À população de origem africana vieram juntar-se os
asiáticos, os europeus de leste e os brasileiros, estes últimos constituindo o grupo
(nacionalidade) de maior dimensão e que mais tem crescido. A par destes movimentos
migratórios surgem também alguns movimentos de retorno, em particular de
emigrantes portugueses ou seus descendentes a residir em França, Bélgica, Suíça e
Alemanha.
A dinâmica migratória que caracteriza Portugal na primeira década do séc.
XXI, marcada pela diversificação de origens e trajectos individuais, trouxe para a
escola novas diversidades que suscitaram no poder político a necessidade de alterar e
adequar alguns dos normativos legais orientadores da integração no sistema
educativo dos novos públicos.
5 Os primeiros dados publicados sobre os alunos descendentes de imigrantes em Portugal são da
responsabilidade do Secretariado Entreculturas e reportam-se aos anos lectivos de 1994-95 a 1997-98 e abrangem apenas o ensino público. A partir de 1999-2000 estes dados passaram a ser produzidos pelo GIASE/ME e reportam-se ao ensino público e privado. 6 Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.http://sefstat.sef.pt/distritos.aspx (acedido em Dezembro, 2012).
7 Departamento de Estatística e Planeamento da Educação (GEPE). Ministério da Educação. (2009-10).
Waters & Holdaway, 2008) mas também, pelos contributos que oferece para uma
sociedade mais coesa, assumimos ser esta uma temática que não se pode descurar
na análise do processo de integração. Dito de outro modo, consideramos de toda a
pertinência um estudo que permita compreender (i) o modo como os descendentes de
imigrantes que residem na cidade e na Área Metropolitana de Lisboa são acolhidos na
escola; (ii) as relações que estabelecem com esta, com os seus pares e com os
adultos; (iii) os percursos escolares que constroem em conjunto com a família; (iv) a
forma como transportam para a comunidade e o território em que se inserem as
vivências da escola.
Associada a esta temática emergem então quatro tópicos que orientam a
investigação: a relação entre imigração e educação, a relação entre escola e território,
as respostas da escola às populações imigrantes e as atitudes das populações
imigrantes perante a escola. Se, por um lado, as estruturas políticas nacionais definem
o sistema de gestão da imigração nas instituições públicas, por outro, é em cada
território e em cada escola que se definem e implementam as estratégias de
integração. Aprofundar esta análise significa conhecer as políticas nacionais que, em
matéria de política educativa, orientam as escolas no acolhimento das populações
imigrantes. Mas, significa também, caracterizar os territórios de acolhimento e as suas
dinâmicas de inserção da população imigrante e, num momento seguinte, caracterizar
as populações migrantes que, na AML, são o centro do estudo que se pretende fazer
da integração em meio escolar.
24
25
2. Problemática e modelo de análise
Em 2011, a Área Metropolitana de Lisboa contava, segundo o SEF, com
219 491 residentes estrangeiros, um pouco mais de metade da população estrangeira
documentada residente em Portugal (436 822).8 Na segunda metade da década de 90,
assistimos à intensificação e diversificação dos fluxos migratórios com destino a
Portugal. Na viragem do século, o número de cidadãos estrangeiros a residir no país
cresceu significativamente (+175,3%), assim como a diversidade do seu perfil nacional
e profissional. Assistimos à chegada de um grupo numeroso de europeus de leste,
com relevância para os indivíduos oriundos da Ucrânia, ao crescimento de 279,2% de
população brasileira (em 10 anos), e ao aumento dos quantitativos de população
asiática, com origem na China, India, Paquistão e Bangladesh (com um crescimento
de +228,4%). A composição étnica da população portuguesa e, em particular, a da
Área Metropolitana de Lisboa, alterou-se significativamente num período de 10 anos:
em 2001, 4,9% dos residentes eram estrangeiros e, em 2009, este valor aumentou
para 8,2% (Fonseca & McGarrigle, 2012).
Desde meados dos anos 80 que os movimentos migratórios com destino a
Portugal apresentaram um crescimento contínuo, atenuado pelo contexto de crise
económica que o país atravessa no final da primeira década do século XXI. Estes
novos fluxos de imigrantes, dirigindo-se preferencialmente para a AML, são visíveis
pelas marcas que deixam na paisagem urbana, pelos modos de viver e usufruir do
território, e pelas dinâmicas que desencadeiam nas instituições com as quais se
relacionam no seu processo de inserção económica e social. É ao nível das
instituições que situamos a escola pública: frequentada pela maioria dos descendentes
de imigrantes, é o local por excelência do encontro diário de diferentes culturas. Para
muitas crianças e jovens recém-chegados, a escola é o espaço privilegiado para o
convívio com a sociedade de acolhimento, pois é nela que passam a maior parte do
dia, e é nela que se jogam os primeiros contactos com os novos estilos de vida, com
diferentes formas de brincar e conviver, com as novas regras sociais. Para uns, um
mundo até então desconhecido que se cruza com o desafio do sucesso escolar e
aprendizagem de uma nova língua, frequentemente estranha e por vezes difícil de
descodificar. Para outros, os já nascidos no país de acolhimento, em princípio melhor
posicionados no contexto social e territorial em que se movimentam, a escola surge
também como um importante espaço de relação e interacção entre elementos
8 É importante referir que além do número de estrangeiros registados nas estatísticas oficiais, existe um
número significativo de imigrantes e descendenets de imigrantes que residem no país em situação ilegal e que é difícil quantificar (Fonseca, 2008a).
26
próximos e distantes da sua cultura de origem. Por um lado, facilita uma convivência
com colegas com a mesma origem permitindo uma aproximação a alguns traços
identitários que lhes são próximos dos contextos familiares por outro, pela interacção
com traços comuns da sociedade em que estão a crescer através dos contactos com
os colegas nativos.
Os alunos estrangeiros são confrontados com um duplo desafio: relacionar-se
com os novos colegas, e ter sucesso num país e numa língua que até então lhes era
distante. Contudo, o sucesso da sua inserção nas escolas que frequentam, não
depende apenas dos recursos individuais e/ou familiares. Neste domínio, a política e
os meios disponíveis na escola são fundamentais no acolhimento de alunos migrantes.
Acresce ainda que as escolas têm características diversas na sua dinâmica interna e
que o público que as frequenta transporta consigo as particularidades dos territórios
em que se insere. É neste sentido que as especificidades dos territórios, em termos da
sua estrutura urbana (habitação e espaços públicos), e das suas características
socioeconómicas interagem com a escola, devendo ser tidas em conta na definição
das suas linhas de intervenção. A estes factores podemos associar a experiência do
território e da escola no acolhimento de populações migrantes e, segundo Portes
(1999), também a dimensão e as características do grupo têm um papel importante
nos percursos escolares dos descendentes de imigrantes.
As estratégias de incorporação de imigrantes nas sociedades de acolhimento
têm suscitado, ao longo da história da imigração, a construção de diversos modelos de
análise que, em diferentes momentos, têm avançado com interpretações que, ao
entrarem em ruptura com as anteriores ou incorporarem novos elementos, permitem
ampliar o leque de formas de pensar o acolhimento de estrangeiros. Desde as
explicações assimilacionistas da Escola de Chicago,9 ao desenvolvimento do conceito
de “assimilação segmentada” de Portes e dos investigadores que o acompanham (Min
Zhou, Rubén Rumbaut, Robert Bach), os modos de incorporação foram evoluindo em
função dos paradigmas socioculturais e económicos, mas também como resultado das
características dos fluxos migratórios e da diversidade de trajectórias realizadas pelas
populações em mobilidade nos territórios de acolhimento.
À evolução registada nos modelos de incorporação não é alheia a própria
evolução dos conceitos de cultura e de diversidade cultural. A história recente do
pensamento científico sobre estes conceitos articula-se com os paradigmas que, em
cada momento, sustentaram o fenómeno social da incorporação de populações em
mobilidade nas sociedades de acolhimento.
9 Por escola de Chicago entendemos a comunidade científica que trabalha na referida cidade nos anos 20
e da qual Robert Park e Ernest Burguess foram os percursores principais. (Ribas-Mateos, 2004).
27
2.1. Definição da problemática e dimensões de análise
No caso de estudo da integração de descendentes de imigrantes nos
sistemas de ensino dos países de destino, e em particular nas escolas, consideramos
que se trata de um processo que é condicionado por três factores: o primeiro reporta-
se às teorias e princípios que orientam a política de acolhimento no país e que
regulam, à partida, o percurso que é possível um imigrante realizar, na medida em que
o modelo ou modo de incorporação adoptado é o resultado dos contextos políticos; o
segundo refere-se à forma como a escola coloca em prática as orientações de política
nacional, em articulação com os territórios em que se insere, e define as estratégias
de integração; o terceiro resulta das características socioculturais da população
imigrante, da disponibilidade para se integrar na sociedade de acolhimento e dos
processos que desenvolve nesse percurso, na relação com o território e, em particular,
com a instituição de ensino.
Assim, as particularidades do processo de integração desencadeado na
escola emergem do contexto político-social vivido no país, dos contextos locais de
acolhimento e do modelo de inclusão definido pela escola, e das características
socioculturais da população imigrante. É com base nestes pressupostos que definimos
a seguinte problemática: o processo de integração que decorre na escola, que
acolhe descendentes de imigrantes, resulta da mobilização das políticas
nacionais, das especificidades socioeconómicas e urbanas dos territórios (de
acolhimento) em que se insere e das características socioculturais dos grupos
migrantes. Desta problemática resultam três dimensões de análise que permitem
compreender a integração no caso de estudo que nos propomos realizar: (i)
orientações de política europeia e nacional em particular, no domínio da educação, no
sentido do acolhimento das populações migrantes, as quais definem o nível de análise
macro; (ii) o território local e a escola, enquanto espaços sociais de integração de
imigrantes e descendentes de imigrantes e materialização da política educativa, que
nesta investigação definem o nível meso, no qual se integram os casos de estudo que
permitem situar a materialização das políticas nacionais à escala local; (iii) os
imigrantes, actores fundamentais de todo o processo, que transportam as expectativas
e as opções de integração na sociedade de acolhimento, e que definem o nível micro
da análise. Partindo destes três eixos orientadores da investigação, os dois primeiros
com ênfase nos territórios nacional e local, em particular nas políticas e modos de
incorporação, e o terceiro, centrado na população imigrante, nas atitudes e
expectativas perante a integração no novo território, pensamos ter delineado o
percurso que nos conduzirá na compreensão das características e dos processos
28
desencadeados pelos actores e agentes envolvidos na inserção de alunos de origem
imigrante na escola.
A opção por estes níveis de análise é corroborada por diferentes autores que
têm vindo a estudar e reflectir sobre o processo de operacionalização do conceito de
integração. Considerámos nesta investigação a proposta de Ribas-Mateos (2004),
bem como os contributos de Barth (1994), Alba e Nee (2003), e Lindo (2005). Assim,
Alba e Nee (2003) apresentam duas categorias de análise: a proximidade, associada
aos níveis micro e meso – onde os imigrantes desenvolvem as acções objectivas no
sentido da sua adaptação à sociedade e se integram nas redes sociais, com o capital
social assumindo diferentes formas; a distância, nível macro, onde se situam os
mecanismos institucionais que regulam o contexto de proximidade. Numa perspectiva
semelhante, Barth (1994) identifica os níveis micro, médio e macro na análise do
processo de integração e que correspondem, respectivamente, à formação da
identidade e interacção interpessoal, ao processo de criação de colectividades e
mobilização de grupos; às políticas nacionais, procedimentos legais, ideias e discursos
globais. Ainda nesta linha de pensamento, Lindo (2005) propõe: i) o nível micro, dos
comportamentos individuais – em particular a interacção entre indivíduos, as atitudes
para com os outros e para com as instituições, a dinâmica interna dos grupos e as
relações com o meio social; ii) o nível médio, dos comportamentos colectivos entre
grupos formais e informais, incluindo as instituições – engloba o desenvolvimento de
instituições no seio dos grupos ou subgrupos, as relações institucionais entre grupos,
as interdependências entre grupos de recém-chegados e habitantes nativos, a
diversidade de iniciativas levadas a cabo pelos actores para contrariar ou potencializar
as oportunidades apresentadas pelo exterior; iii) o nível macro, a „mão invisível‟ do
envolvimento institucional – inclui os processos externos, as decisões políticas, as
políticas nacionais, mudanças institucionais e legislativas definidas ao nível nacional e
internacional.
A definição destes três níveis de análise no processo de integração não exclui
a existência de uma interdependência entre os mesmos e, consequentemente, a
necessidade de combinar e definir conceitos de um modo transversal. É nesta
perspectiva que são definidas as linhas orientadoras desta investigação, valorizando
uma análise da integração a diferentes escalas, mas não descurando a existência de
uma dinâmica de interacção entre as mesmas. As respostas de integração das
escolas resultam da diversidade do público que as frequenta, das características dos
territórios que servem e das orientações políticas nacionais, e estes elementos não
podem ser analisados de forma isolada em função do posicionamento que assumem
no modelo de análise (macro, meso ou micro).
29
Retomando as dimensões de análise definidas anteriormente, centremo-nos
na primeira, as orientações de política europeia e nacional no sentido do acolhimento
das populações migrantes. Nesta dimensão emerge, no contexto das orientações
políticas, o papel da educação na integração e na garantia de mobilidade social dos
imigrantes. Um papel que se assume como fundamental, não apenas na
aprendizagem da língua para facilitar a entrada no mercado de trabalho e/ou o acesso
à nacionalidade,10 mas também na necessidade em assegurar aos descendentes dos
imigrantes a possibilidade de ingressarem nos sistemas de ensino nacionais e
realizarem os seus percursos académicos a par das populações autóctones. Perante
estes desafios, a União Europeia, em particular o Parlamento Europeu, tem tido,
desde finais dos anos 90, um papel relevante na área da educação de imigrantes,
minorias e crianças marginalizadas. Neste âmbito, a Comissão Europeia e os estados
membros têm contribuído para o desenvolvimento de uma política sólida, recorrendo a
diversos instrumentos políticos, incluindo aspectos legais (regulamentos, directivas e
decisões), recomendações políticas (comunicações, green papers, white papers,
resoluções, opiniões, recomendações, conclusões), assim como programas de
financiamento (Huttova et al., 2010). Uma política centrada na valorização da
diversidade cultural e na definição de directivas que podem tornar-se linhas
orientadoras das políticas nacionais.
A escola é confrontada a partir do espaço europeu, com “um processo de
internacionalização que promove a heterogeneização e a diversidade no seu interior,
sendo ambas identificadas com a construção europeia” (Cortesão & Stoer, 2001, p.
372). Reforce-se a este respeito o princípio de autonomia de cada estado membro em
matéria de política educativa. Contudo, a pertença a um território europeu comum tem
orientado, em alguns contextos nacionais, as opções de política no âmbito da
educação. Os próprios estudos comparados das políticas europeias nacionais, ao
recorrerem a critérios comuns na recolha de informação e interpretação de
documentos legais, 11 permitem identificar as tendências de aproximação e/ou
afastamento entre países e reflectir sobre os percursos que em cada estado membro
têm sido desenvolvidos em matéria de política educativa. Em Portugal, a revisão e
produção de documentos legais no âmbito da educação, em particular no sentido da
integração de descendentes de imigrantes, têm-se revelado de um grande dinamismo
10
Nos termos do novo regime jurídico, o Governo concede a nacionalidade portuguesa, por naturalização, aos estrangeiros que, entre outros requisitos, demonstrem conhecer suficientemente a língua portuguesa. (Portaria 1403 – A/2006, de 15 de Dezembro). 11
Citamos como exemplo o Índex de Políticas de Integração de Migrantes – MIPEX (2011) e o relatório Eurydice (2004), Integrating Immigrant Children in to Schools in Europe - Portugal, Country Reports. Directorate-General for Education and Culture: European Commission.
30
na primeira década do séc. XXI, fruto das novas realidades migratórias, da
intensificação da diversidade em contexto escolar e da necessidade de responder às
novas demandas de uma população que tem, por direito, acesso à escola em
condições de igualdade com a população nativa. Deixamos assim em evidência que
as alterações que têm ocorrido na política educativa nacional em matéria de imigração
são fruto, por um lado, da intensificação dos movimentos migratórios e, por outro, da
necessidade de acompanhar novos modos de incorporação que valorizam a formação
dos alunos de origem imigrante. Em última análise, pretende-se proporcionar o acesso
à educação aos filhos dos imigrantes em condições idênticas às dos nacionais,
facilitando a sua presença nas escolas e turmas dos nativos.
A segunda dimensão de análise parte do território local e da escola, enquanto
espaços sociais de integração de descendentes de imigrantes e materialização da
política educativa. Neste âmbito é privilegiado o estudo do local, de territórios de
acolhimento de populações migrantes, em particular dos que se localizam na Área
Metropolitana de Lisboa e que definimos para o estudo de caso que apresentamos.
Estes, geograficamente localizados em áreas distintas do território metropolitano, têm
histórias particulares no acolhimento de populações imigrantes. Histórias que são
distintas pelo momento em que a recepção teve início, mas que também se
individualizam pelas suas características urbanas, pelas suas funções, pelos espaços
de sociabilidade que proporcionam, pelas dinâmicas socioeconómicas e também
demográficas dos seus residentes. As escolas que se localizam nestes territórios, e
que acolhem uma população maioritariamente residente no meio em que se inserem,
são também um resultado dos modos de vida, vivências e diversidade cultural que
caracterizam a sua envolvente. Os projectos educativos que definem os modos de
implementação da política de escola e, em particular, os modelos de inclusão na
mesma devem responder às características do público e dos territórios que servem, e
estas respostas constroem-se na articulação entre as orientações nacionais e as
questões emergentes da especificidade do local. Os desafios despoletados por cada
contexto decorrem (i) da diversidade étnica e cultural; (ii) das particularidades do
espaço urbano construído; (iii) das características socioeconómicas da população
residente; (iv) das instituições públicas e privadas existentes; (v) das singularidades
que marcam as vivências locais.
Para a terceira dimensão de análise mobilizamos os alunos imigrantes e as
suas famílias, actores fundamentais de todo o processo, que assumem neste estudo
um papel central. A informação empírica de que dispomos para a sua caracterização
foi recolhida a partir de estatísticas oficiais e de questionários. Assim, todos os
aspectos que permitem retratar a imagem das comunidades imigrantes relativamente
31
à integração que é vivida na escola são resultado da recolha de informação em cada
escola localizada nos territórios que individualizámos para a investigação. A ausência
de estudos específicos, em Portugal, sobre a temática que propomos abordar, relação
entre imigrantes, escola e território, direccionou a pesquisa para outros casos de
estudo que ilustram os processos de inserção em países europeus e norte americanos,
com uma experiência muito mais prolongada nesta matéria. Entre nós, os trabalhos
desenvolvidos permitem-nos mobilizar algumas reflexões sobre a inclusão na escola
de grupos de nacionalidades ou etnias específicas e de particularidades do seu
processo de inserção como a aprendizagem da língua, a relação escola-família e os
percursos escolares. As informações de que dispomos, principalmente os dados
empíricos, permitirão apresentar a dimensão, as características e os modos de
inserção dos descendentes de imigrantes em meio escolar. Tratando-se de um estudo
de caso que envolve diversas nacionalidades e territórios distintos no contexto urbano,
esperamos poder compreender as especificidades dos processos de inserção
desenvolvidos pelos imigrantes e as respostas que cada agrupamento12 de escolas
constrói para responder à diversidade de públicos que as frequenta.
Por sua vez, as dinâmicas de inserção desenvolvidas pela escola, a relação
estabelecida com as populações migrantes e as características dos processos de
acolhimento vividos no território são analisadas a partir de dois conceitos
estruturantes: diversidade cultural e integração. Estes conceitos, transversais às
dimensões de análise (macro, meso e micro), permitem explicitar a interacção entre as
estruturas e os agentes que participam na articulação escola-imigrante-território, no
sentido da integração da diversidade cultural. A compreensão de cada um dos níveis e
dos processos de interdependência que entre eles se estabelecem contribuirá,
certamente, para a identificação dos diferentes sentidos do processo de integração
desenvolvido à escala da escola.
12
Entende-se por Agrupamento de Escolas a “unidade organizacional, dotada de órgãos próprios de administração e gestão, podendo integrar estabelecimentos de educação pré-escolar e de um ou mais ciclos de escolaridade do Ensino Básico, a partir de um projecto comum” (ponto 1, do artigo 5º, do Decreto-Lei nº 115 / 98, de 4 de Maio). Carta Educativa de Lisboa (2008).
32
Fig. I.1 – Modelo de análise
O quadro conceptual de suporte (Fig. I.1), que permite explicitar os modos de
incorporação subjacentes em cada nível de análise, é estruturado a partir dos dois
conceitos chave: diversidade cultural e integração. Contudo, no estudo de cada
dimensão, outros conceitos poderão surgir, decorrentes das especificidades de cada
escala de análise que definimos e das diferentes dimensões em que se joga o
processo de inclusão de imigrantes em contexto escolar.
2.2. Os conceitos: diversidade cultural e integração
Uma abordagem à diversidade cultural em contexto urbano, resultado da
intensificação dos movimentos migratórios, conduz a uma reflexão que se constrói em
torno de dois grandes pólos: a sociedade receptora e os grupos de imigrantes. No
primeiro, situamos as dinâmicas económicas e sociais, e os mecanismos
desencadeados pelos territórios no acolhimento dos novos públicos; no segundo, as
características e os processos que os recém-chegados desenvolvem no sentido da
sua integração e aceitação no novo contexto.
Resultado da complexidade associada aos movimentos migratórios, as
cidades são hoje cada vez mais multiétnicas (White, 2008) e a heterogeneidade é a
regra nas grandes urbes (Penninx, 2008), características que desafiam os territórios
no encontro de respostas para a gestão das migrações, da diversidade cultural e dos
fenómenos sociais a estas associadas. Natália Ribas-Mateos (2004) identifica esta
complexidade urbana como um dos grandes desafios da sociedade contemporânea e
Penninx (2008) resume-a na questão crucial que se coloca às grandes cidades – como
acomodar a nova diversidade?
33
Os desafios postos pela diversidade cultural requerem, das ciências sociais,
uma abordagem multidisciplinar, pela multiplicidade de situações e de contextos em
que o fenómeno é vivido (geografia, economia, identidade, política, cultura, relações
sociais, demografia…) e, pela complexidade das respostas de integração dos
imigrantes na sociedade de acolhimento (instituições e comunidades). Nos anos 90, os
fluxos migratórios globais apresentavam já dinâmicas e composições distintas das
observadas até ao início dos anos 70. Resultado destas novas dinâmicas migratórias,
os espaços urbanos foram sucessivamente ocupados por vagas diversas de imigração,
que se caracterizam pela sua composição étnica, perfis sociais e profissionais,
padrões de integração económica e urbana, e, ainda, pelas atitudes que os imigrantes
revelam ter com a sociedade de origem e de acolhimento (Gaspar & Fonseca, 2008).
A reflexão que apresentamos em torno do fenómeno migratório e dos
processos sociais por este desencadeados, é sustentada pela convicção de que
existem múltiplos factores que explicam as migrações e as suas implicações nos
territórios envolvidos assim como, podemos assistir a uma pluralidade de situações no
processo de integração. Tratando-se de um fenómeno social, este é moldado por uma
multiplicidade de factores (Modood, 2007), o que nos permite defender que o estudo
das migrações deve procurar nas análises interdisciplinares o contributo de diferentes
olhares em torno de um fenómeno social que se deve assumir, na esteira de Marcel
Mauss (1965), como um facto social total.
Para a compreensão das respostas actuais de integração dos imigrantes nas
sociedades receptoras mobilizamos os estudos que, desde a primeira década do
século XX, investigadores americanos e europeus desenvolveram, e sobre os quais
existe literatura diversa. O uso do termo integração associa-se ao de diversidade
cultural, o qual, enquanto conceito utilizado nas ciências sociais e nas respectivas
políticas de imigração, é relativamente recente. Contudo é longa a história dos
conceitos de assimilação, aculturação e acomodação (Asselin, Dureau, Fonseca,
Giroud, Hamadi, Kohlbacher, Lindo, Malheiros, Marcadet & Reeger, 2006). A
compreensão do significado e da pertinência do seu uso, que surgem para dar
resposta a sociedades diversas do ponto de vista étnico e cultural, remete-nos, num
primeiro momento, para a definição do conceito de diversidade cultural, dando relevo
ao seu significado no âmbito desta investigação.
2.2.1. Diversidade cultural
Etimologicamente, diversidade cultural, provém da palavra latina “divers” que
significa oposto e da sua derivada “diversitas” que pode ter dois significados:
heterogeneidade, variedade ou dispersão; ou algo que é diverso ou plural (Arnesen,
34
Hadzhitheodoulou-Loizidou, Birzéa & Allan, 2009). Diversidade sociocultural está
associada a diferenças humanas de origem social ou cultural, mas o seu entendimento
deve ir além da presença de culturas e perspectivas distintas: deve ser potenciadora
de um clima de diálogo mútuo no sentido de se complementarem, expandirem os
horizontes e contribuírem para a realização humana. Significa conviver com diferentes
talentos, competências, pontos de vista, formas de organização social, características
psicológicas e morais diversas, constituindo-se cada uma destas como um recurso de
que é possível usufruir em diferentes áreas da vida, na escola, no desporto, nos
negócios, nas artes, na gestão e na governança dos lugares. Neste sentido, a
diversidade cultural é desejável, não apenas porque é importante preservar
determinadas formas ou valores que caracterizam cada cultura, mas numa perspectiva
de interacção e diálogo mútuo (Parekh, 2006). Utilizado por uma larga comunidade de
investigadores, académicos e políticos, também eles de origens sociais e culturais
diversas, este conceito está conotado com pluralismo social e é considerado, em
documentos oficiais, um atributo fundamental para uma sociedade mais humana e
inclusiva.13 A diversidade cultural assume-se como uma característica das sociedades
contemporâneas. Integrados num contexto complexo de globalização, tecnologias,
pessoas, ideias e capitais cruzam fronteiras e territórios, desencadeando processos de
múltiplas interacções e influenciando novas formas de viver e de pensar que, em
muitas situações, recriam ou coexistem com os traços culturais anteriores.
Designamos frequentemente as sociedades marcadas pela diversidade de
formas de vida e de culturas, de multiculturais, por oposição às sociedades
monoculturais ou à homogeneização cultural que durante séculos foi assumida como
um dos paradigmas das teorias clássicas do estado-nação. Todavia, a presença de
culturas diversas num território geograficamente definido não é um fenómeno recente
e, como tal, as sociedades contemporâneas multiculturais não são historicamente
únicas (Parekh, 2006).
“O tecido europeu conserva os sedimentos das sucessivas migrações
intracontinentais, da redefinição das fronteiras, do colonialismo e dos impérios
multinacionais” (Conselho da Europa, 2008, p. 16). Contudo, “nas últimas décadas, a
diversificação cultural acelerou-se. A Europa atraiu migrantes e requerentes de asilo
do mundo inteiro que procuram uma vida melhor” (Conselho da Europa, 2008, p. 16).
A diversidade dos fluxos migratórios produziu uma grande variedade de paisagens
étnicas, por vezes envolvendo padrões complexos de interacção e inter-relação entre
diferentes grupos (Fonseca, Malheiros, Esteves & Caldeira, 2002). As paisagens
13
22nd Session of the Council of Europe Conference of Ministers of Education; Istambul, 4-5 May 2007.
35
urbanas recrearam-se, pela pluralidade cultural que hoje as atravessa, integrando nas
suas vivências diárias a oportunidade de uma multiplicidade de contactos sem
precedentes na história urbana europeia.
Os antecedentes históricos que conduziram à evolução para a sociedade em
que hoje nos situamos permitiram, segundo Parekh (2006), a acumulação de vivências
com impactos sociais diversos, e que o autor organiza em quatro dimensões: os
contextos culturais e políticos de subordinação das minorias e a restrição da sua
presença ou mobilidade a espaços sociais e geográficos restritos; o colonialismo, a
repressão e subordinação de determinados povos; a globalização económica e cultural,
resultado do desenvolvimento tecnológico e da redução das distâncias; e a
homogeneização cultural em que muitos estados viveram durante séculos. Na
perspectiva deste autor, as aprendizagens realizadas pela vivência dos contextos
apresentados estão na génese do dinamismo cultural das sociedades
contemporâneas, caracterizando-se: (i) pela abertura e o estabelecimento de
interacções complexas entre si e entre a sociedade em geral; (ii) pela adopção de
princípios liberais de igualdade de direitos políticos e liberdade de participação na vida
social e cultural da sociedade; (iii) pelo reconhecimento e respeito pelas diferentes
culturas e pela cultura individual como parte integrante dos princípios de cidadania; (iv)
pela redução da valorização da cultura nacional e a maior abertura das sociedades de
acolhimento a diferentes culturas; (v) pelo reconhecimento dos indivíduos como
portadores de direitos, dando-lhes a oportunidade de conviver num espaço organizado
e estruturado segundo determinados princípios políticos.
Em anos recentes, autores de diferentes formações (filósofos, antropólogos,
sociólogos, psicólogos) têm desenvolvido teorias sobre a diversidade cultural no
sentido de desmistificar alguns dos princípios que caracterizavam as teorias clássicas
e que pouco valorizavam as potencialidades de uma sociedade culturalmente diversa.
Para Bhikhu Parekh (2006), Rawls, Raz e Kymlicka são os três autores de referência
na abordagem aos diferentes tipos de diversidade, e é a partir de uma breve reflexão
sobre os estudos por eles desenvolvidos que iremos construir o conceito de
diversidade cultural que orientará a presente investigação.
Rawls (1971) assenta o seu paradigma em princípios liberais e desenvolve
uma teoria centrada na diversidade moral. 14 Segundo ele, uma sociedade liberal
caracteriza-se por uma certa homogeneidade política, a educação é utilizada como
uma ferramenta cultural e os cidadãos são autónomos para conduzir os seus
percursos de vida. Contudo, nesta sociedade, o espaço deixado para a diversidade
14
A sua obra intitula-se A Theory of Justice (1971).
36
cultural é relativamente restrito e, deste modo, as pessoas que não comungam dos
princípios e valores gerais são rejeitadas, “Rawl‟s society is inhospitable to diversity…”
(Parekh, 2006, p. 89). A teoria que nos apresenta centra-se fundamentalmente na
diversidade moral, dando pouco ênfase à pluralidade cultural resultante da diversidade
étnica, à importância da cultura e às aspirações das diferentes comunidades, nas
quais se situam os imigrantes.
Com uma maior sensibilidade para estas questões, Raz (1986)15 defende uma
sociedade baseada no princípio da autonomia pessoal, ou seja, cada indivíduo é co-
autor do seu percurso e as suas escolhas são o resultado das alternativas que lhe são
colocadas pelas diferentes sociedades. A cultura é o resultado do treino e estruturação
dos desejos individuais (Parekh, 2006). No entanto, o autor questiona-se sobre as
capacidades de uma sociedade liberal, como a ocidental, acolher a diversidade não
liberal. Neste sentido, avança um pouco mais que Rawls, ao assumir que diferentes
sociedades proporcionam oportunidades diversas e que cada sociedade contém uma
diversidade de culturas às quais é importante dar resposta no respeito pelos seus
costumes e práticas. Entende que a cultura permite criar uma identidade que facilita as
relações sociais, os laços entre gerações e o acesso ao mundo das relações pessoais,
factores que contribuem para o bem-estar. Contudo, na perspectiva de Parehk (2006)
as duas características de cultura apresentadas não têm que ser necessariamente
coincidentes, pois a cultura pode promover o bem-estar mas não a autonomia. O autor
acrescenta ainda que Raz estabelece o valor de uma cultura mas não da diversidade
cultural, evidenciando algumas dificuldades em justificar porque é que determinadas
culturas conseguem afirmar-se, e outras não, e assumir que a coexistência não é
pacífica. No conceito de sociedade multicultural que apresenta, defende que para as
culturas que estão em minoria não deve haver diferenças de tratamento,
responsabilizando o grupo dominante pela aceitação das diferenças, pela criação de
espaços de mobilidade para os outros, por evitar a exclusão, por disponibilizar
recursos, por respeitar os direitos. Defende ainda que as crianças podem ser
educadas na língua e na cultura das suas comunidades, desde que os pais assim o
definam.
Partindo de alguns pressupostos anteriores Kymlicka16 retoma, em meados
dos anos 80, os conceitos de autonomia e de cultura numa tentativa de lhes atribuir
novas funções e significados. Na sua perspectiva, a cultura é essencial para capacitar
os seres humanos e, neste sentido, constitui as bases fundamentais para a autonomia
15
Na obra intitulada The Morality of Freedom (1986). 16
As suas obras de referência são Liberalism, Community and Culture (1989) e Multicultural Citizenship: A Liberal Theory of Minority Rights (1995).
37
e, por outro lado, torna-se essencial para o bem-estar humano e a criação de
comunidades estáveis. Perante os seus argumentos, as minorias têm direito à sua
cultura, e os grupos maioritários e minoritários devem ter direitos culturais iguais. O
autor critica a assimilação forçada pelas consequências negativas que daí advêm mas,
ao mesmo tempo, identifica grupos diversos de minorias que se individualizam pelas
características únicas que possuem, referindo-se aos imigrantes como um grupo que
abandonou voluntariamente o seu país de origem e que, por isso, escolheu viver
segundo a cultura do país de destino. Esta convicção leva-o a afirmar que, quando os
imigrantes reclamam pelos direitos étnicos, como o direito à não discriminação e à
manutenção da língua de origem, estão claramente a desafiar os direitos nacionais e a
entrar em conflito com as normas do território que os acolheu.
Na perspectiva de Parekh (2006), a teoria multicultural de Kymlicka segue a
mesma estrutura da apresentada por Raz. Defende as capacidades e valores
inerentes a uma sociedade liberal e o papel fundamental da cultura na construção da
autonomia, mas apresenta um conceito de comunidade cultural idêntico ao de
comunidade nacional e, por isso, divide os grupos culturais em nacionais, não-
nacionais ou grupos étnicos, aos quais atribui competências e direitos diferentes.
Centra-se fundamentalmente nas minorias nacionais, valoriza os refugiados por não
terem visto respeitados os seus direitos, razão pela qual lhes deve ser dada a
oportunidade de recriar a sua cultura, e revela pouca tolerância perante os imigrantes.
Os três teóricos apresentados avançam com importantes contributos para o
entendimento do conceito de cultura, retirando-lhe a visão estática e imprimindo-lhe o
dinamismo necessário às características das sociedades liberais: maior abertura à
pluralidade moral e cultural (Parekh, 2006). Contudo, nem sempre é evidente a
possibilidade de construção de uma sociedade heterogénea do ponto de vista cultural
pela concretização de princípios que hoje associamos à diversidade cultural, e que
desenvolveremos mais adiante. É identificada a possibilidade de coexistirem diferentes
culturas mas não é explicitado o modo como as mesmas podem interagir no sentido
de se potencializarem crenças e práticas de cada uma, ou antes, a interacção de
dinâmicas culturais diversas. Na perspectiva de Parekh (2006), as concepções de
cultura e diversidade cultural que os autores apresentam nem sempre se aproximam
de uma visão mais inclusiva da sociedade. Contudo, consideramos que, para esta
investigação, o contributo destes autores, no entendimento dos conceitos de cultura e
de diversidade cultural que vamos adoptar, se revela fundamental.
A globalização da sociedade e a emergência de novas formas de vida em
contextos sociais e culturais cada vez mais plurais trouxeram novas preocupações em
matéria de direitos humanos, justiça social e aceitação das diferenças. Gradualmente,
38
o reconhecimento do valor da diversidade revelou-se uma preocupação e um pilar
importante na definição das orientações de política para diferentes domínios da
sociedade. No início dos anos 90, a UNESCO publicou a Declaração Mundial sobre a
“Educação para Todos”17 e, no final dessa década, o Conselho da Europa introduziu
nas políticas educativas o princípio da valorização da diversidade. Em 2001, na
primeira reunião da Conferência Geral da UNESCO, logo após os acontecimentos de
11 de Setembro, é aprovada a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural que
reconhece a diversidade cultural como “um património comum da humanidade”
(UNESCO, 2002, p. 3). Detendo-nos nos três artigos que constituem um dos seus
princípios, Identidade, Diversidade e Pluralismo, o conceito de cultura é entendido
como uma estrutura dinâmica e que pode adquirir “formas diversas através do tempo e
do espaço” (artigo 1); por sua vez, numa perspectiva de interacção harmoniosa entre
pessoas e grupos com identidades culturais plurais, “o pluralismo cultural constitui uma
resposta política à realidade da diversidade cultural” (artigo 2); a diversidade cultural
enquanto factor de desenvolvimento, “amplia as possibilidades de escolha que se
oferecem a todos” (artigo 3).18 A conferência dos Ministros da Educação Europeus
realizada em Atenas em 200319 assumiu, na condução dos seus trabalhos e nas
conclusões apresentadas, a diversidade como um valor acrescido, quer para as
comunidades locais, quer para a sociedade.
No Livro Branco do Diálogo Intercultural, publicado em 2008, o Conselho de
Ministros da União Europeia apresenta a diversidade cultural como “a existência
empírica de diferentes culturas e a sua capacidade de interagirem num determinado
espaço e no seio de uma determinada organização social” (pp. 13-14). A abordagem à
diversidade cultural, pela União Europeia, é baseada na compreensão mútua, no
respeito pelas diferentes culturas, na capacidade de entender o outro, a sua história,
língua, valores e os benefícios da convivência com uma população diversificada
(Lamers, 2008).
A perspectiva que defendemos, de valorização da interacção e diálogo mútuo
numa sociedade plural não subvaloriza a importância do desenvolvimento do sentido
de comunidade (solidariedade, lealdade e consensos morais e políticos), preconiza
antes, a criatividade e inovação20 na gestão das potencialidades da diversidade e das
17
Declaração Universal da Diversidade Cultural (disponível em: http://www.unesco.pt/cgi-bin/educacao/programas/edu_programas.php). 18
Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. UNESCO (2002): p..3. (disponível em: http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160por.pdf). 19
Conferência de Atenas (disponível em: http://www.see-educoop.net/education_in/pdf/declarat-eur-minist-educ-intercult-educ-oth-enl-t02.pdf) . 20
O conceito de inovação é entendido aqui na perspectiva definida por Alter (2000), como um movimento permanente que mobiliza o conjunto dos actores, dependendo fundamentalmente da forma como estes e
tensões geradas pelo diálogo entre culturas e, ao mesmo tempo, o respeito pelos
grupos de indivíduos que decidem viver segundo a sua cultura tradicional. Tal significa
que, por um lado, uma sociedade diversa pode alcançar em algumas dimensões um
balanço positivo dos atributos desejáveis ao bem-estar mas que, por outro lado, em
diferentes momentos esta sociedade, pode ser confrontada com necessidades,
experiências e aspirações diversas, e que as culturas devem adaptar-se ou recrear-se
em função destas mudanças se pretendem contribuir para o desenvolvimento humano.
A pertença a uma comunidade cultural significa, nas sociedades
contemporâneas, a existência de laços comuns e de relações de solidariedade,
dificilmente significa homogeneidade nos comportamentos, mas antes o entendimento
de que cada cultura é um produto de diferentes influências, contém vertentes diversas
de pensamento e é aberta a várias interpretações (Parekh, 2006). Na perspectiva de
Bauman (cit. em Moddod, 2007) cultura não é uma „coisa‟ real, mas uma noção
abstracta e plural que deve ser entendida na dinâmica da sociedade e não de modo
isolado. Modood (2007) explicita o dinamismo do conceito de cultura por comparação
com o percurso de um indivíduo, referindo que no final da vida a sua forma de pensar
reflecte as mudanças na sua personalidade, resultantes da passagem do tempo e das
experiências vividas, “as with a person, so with a culture. A culture is made through
change, is not defined by an essence which exists apart from change, a noumenon
hidden behind the altering configurations of phenomen” (Modood, 2007, p. 93).
Abordámos até aqui o conceito de diversidade cultural numa perspectiva
diacrónica e sincrónica de compreensão do mesmo sem o dissociar do conceito de
cultura e aplicando-o de uma forma geral às relações sociais. Não esgotamos a
discussão em torno destes conceitos, nem foi essa a nossa intenção. A sua
complexidade é evidente, mobilizando perspectivas diversas, e, além do mais, os seus
territórios estão em constante expansão (Wieviorka, 2002). Reforçamos com esta
análise que, para as ciências sociais, a diversidade cultural é um traço comum das
sociedades contemporâneas, tal como a cultura surge como o “tema central de
interrogações que as inquietações de ordem geopolítica renovam” (Wieviorka, 2002, p.
26). Fazendo uso da perspectiva de Giddens (1992), a diversidade constitui-se como
um desafio para aqueles que pretendem reflectir sobre as dinâmicas das sociedades
mais avançadas da modernidade tardia e, neste sentido, o seu estudo implica
reorientar a investigação para o que é interno e não externo à sociedade.
Consideramos a diversidade cultural como uma característica da sociedade
contemporânea, resultado da mobilidade e da facilidade de contactos que a
os agentes se mobilizam e dão uso ao capital social, “l‟innovation est le résultat d‟une constelation d‟accions ordinaires.” (Alter, 2002, p. 20).
40
caracterizam, e que se revê nas cidades pela multiplicidade de formas de ser e estar,
de interagir e de utilizar o território. Esta perspectiva pressupõe assumir a cultura e a
sociedade como estruturas dinâmicas, abertas à mudança e, como tal, resultando de
“uma elaboração constante, participada por comunidades de diversas origens em que
são cada vez mais relevantes os seus contributos para novas reconfigurações
culturais” (Cardoso, 2005, p. 19).
Pensar a diversidade na escola, significa olhar para o palco onde diariamente
decorrem encontros e interacções entre grupos de alunos de diferentes origens
socioculturais, se revêem práticas familiares diversas e se materializam práticas
pedagógicas não menos diversas. Uma amálgama de difícil compreensão, porque se
acentua entre estabelecimentos de ensino e tem tomado proporções maiores com a
explosão e diversificação dos movimentos migratórios (Perrenoud, 2001). Partindo de
um olhar centrado nas dinâmicas que se vivem internamente na escola é possível
construir uma imagem da sociedade diversa que esta serve e que se constrói
diariamente na relação dialéctica com o território e os grupos.
Se nos centramos só nos alunos, enquanto seres sociais, falar de diversidade
cultural significa elencar uma lista de conhecimentos e crenças, de arte e moral, de
costumes e capacidades adquiridas (Cuche, 2006). As crianças e jovens que hoje
chegam à escola são o reflexo da diversidade que caracteriza a sociedade e
transportam consigo um capital cultural, social e linguístico muito variável, a que
qualquer sistema de ensino deve estar atento. Se tomarmos a educação como uma
das mais importantes ferramentas no desenvolvimento de competências que facilitam
a integração nas estruturas sociais, percebemos quão relevante é o seu papel na
integração. Acresce ainda a sua importante função como elemento de coesão social,
que pela sua essência conduz à construção de um projecto comum (Santibáñez, et al.,
2005).
2.2.2. Integração
O conceito de integração social pode ser definido como um processo
complexo e interactivo, com múltiplas facetas, que envolve o desenvolvimento de
interdependências entre uma diversidade de actores, agentes e territórios. Trata-se de
um conceito fundamental na análise das respostas às desigualdades existentes na
estrutura social, embora a sua definição nem sempre seja assumida pelos cientistas
sociais como uma tarefa fácil, resultado das particularidades dos contextos sociais e
das ideologias políticas dominantes em cada momento.
No contexto europeu, assiste-se ao regresso do conceito de assimilação,
associado à necessidade de assegurar a integração dos imigrantes e seus
41
descendentes no sentido de garantir a coesão social. Porém, conotar a assimilação
como um conceito unilateral, sustentado no princípio de que os recém-chegados
mudam no tempo, independentemente dos percursos que realizam, é colocar em
causa os desenvolvimentos teóricos mais recentes sobre o conceito e ignorar as
alterações significativas – sociais, culturais e económicas – que a maioria dos
imigrantes que se instalou na Europa provocou nos territórios que os acolheram
(Papademetriou, 2008). Ainda assim, é frequente a conotação do termo assimilação
com integração e, neste sentido, importa esclarecer o entendimento que é feito dos
dois conceitos, ou seja: referem-se apenas à forma como os indivíduos se devem
adaptar às sociedades receptoras, adquirindo as características destas e
abandonando as suas origens; ou, debruçam-se sobre a multiplicidade de interacções
entre os recém-chegados e a sociedade de acolhimento, assumindo diversas formas
de incorporação que não implicam necessariamente a renúncia às origens.
A evolução do conceito de integração acompanhou a evolução das teorias
sobre a diversidade cultural e a cultura, assim como a sua construção tem revelado,
em diferentes momentos, as atitudes e conflitos resultantes do convívio em
sociedades multiculturais. Mais recentemente, este conceito surge associado ou é
substituído pelo de interculturalidade, como se este fosse um espaço social resultante
da integração social (Ribas-Mateos, 2004), o que segundo a autora se explica pelo
facto da utilização do termo interculturalidade dar ênfase aos processos de
interconexão e de inter-relação. Por outro lado, se nos anos 80, falar de integração
social significava assumir que o imigrante deveria seguir um percurso que o conduziria
à sua incorporação na sociedade e que esse percurso culminava com a integração,
hoje a diversidade de percursos que empiricamente se identificam desde a chegada
do imigrante a um novo território, no sentido da sua inserção na sociedade que o
acolheu, atropelam as visões demasiado normativas do conceito e podem conduzir à
formação de grupos minoritários entre os imigrantes, reforçando a estratificação étnica,
aspecto que sustenta as posições e políticas relativas ao pluralismo cultural e
multiculturalismo (Heckmann, 2003, 2004).
A concepção durkheimiana de integração, 21 como uma propriedade da
sociedade que se revê na complementaridade funcional entre pessoas e grupos ou, a
integração parsoniana, 22 definida como um requisito prévio para o equilíbrio do
21
Segundo Durkeim (1895, 1903, 1912), “através da educação, cada sociedade transmite aos indivíduos que a compõem o conjunto das normas sociais e culturais que asseguram a solidariedade entre todos os membros dessa mesma sociedade e que são mais ou menos obrigados a fazer suas.” (Cuche, 2006, p. 77) 22
Para Parson (1955), “quanto mais cedo a conformidade com as normas e os valores da sociedade intervém na existência do indivíduo, mais tenderá a levar a uma adaptação adequada ao «sistema social».” (Cuche, 2006, p. 77).
42
sistema social e garantia da coesão social, ao postularem que a socialização é o
resultado de uma “coerção que a sociedade exerce sobre o individuo” (Cuche, 2006, p.
78), são hoje insuficientes no quadro multidimensional em que se desenrola a
integração.
O acolhimento de imigrantes na sociedade mobiliza diversas dimensões: legal
e económica, cultural e educativa, religiosa, etc., valorizando a autonomia individual e
a garantia do respeito pelos direitos humanos evitando a entrada em processos de
segregação (Ribas-Mateos, 2004). É neste sentido que surgem diferentes abordagens
do conceito, que resultam da sua associação apenas a uma das dimensões: quando
se reporta à integração racial, no sentido da igualdade de direitos para todos os
cidadãos de um país independentemente da raça, aparece conotado com assimilação;
quando surgem referências à boa integração na população autóctone, associada ao
desempenho de uma actividade profissional, aproxima-se também do termo
assimilação; em contexto escolar, a boa integração associa-se frequentemente a uma
convivência interétnica saudável, por fusão ou assimilação dos valores dominantes.
A este respeito, Solé (cit. em Ribas-Mateos, 2004) elabora um modelo
analítico do conceito de integração, aplicado à sociedade catalã, estruturado em
quatro subprocessos: integração ocupacional (mobilidade e necessidade de saber ou
não o catalão no local de trabalho); integração urbana (habitação e espaço urbano);
integração política (identificação sindical, tendências e partidos políticos,
comportamento eleitoral) e integração sociocultural (conhecimento do catalão, atitude
perante a língua e cultura catalãs, atitude perante os símbolos e instituições da
Catalunha, atitude perante a “catalinização”). A sua visão de integração surge como o
culminar da passagem por estes subprocessos em que o imigrante abandona as
origens e a possibilidade de retorno.
Uma outra perspectiva do processo de inserção dos imigrantes na sociedade
de acolhimento é apresentada por Esser. Segundo o autor, a integração passa por
diferentes fases de construção, concretizando-se por etapas que se articulam entre si.
Na sua perspectiva, a integração social define-se como a inclusão dos actores
individuais nos sistemas sociais existentes e contempla quatro dimensões:
“aculturação, posicionamento, interacção e identificação” que, em termos espaciais e
nos diferentes níveis de análise, têm impactos e intensidades diferentes. Aculturação
refere-se ao processo de aceitação e apropriação das práticas de uma determinada
cultura/sociedade e à sua implicação na mobilidade social dos indivíduos.
Posicionamento é o processo de ocupação de diferentes posições na sociedade e a
atitude dos indivíduos perante o acesso aos recursos (conquistar, manter, defender),
relevante para a posição de um indivíduo ou um grupo em especial no domínio da
43
educação, rendimento, habitação, saúde. As probabilidades dos actores terem êxito no
acesso aos recursos relacionam-se com o domínio de conhecimentos, competências
de comunicação, identificação, representação e poder, mas também com as
interdependências entre os indivíduos e os grupos de pessoas. Interacção articula-se
com as duas dimensões anteriores e relaciona-se com as interacções entre diferentes
grupos sociais e étnicos no acesso aos recursos, podendo assumir diferentes tipos em
função da intensidade de contactos, do tipo de comunicação, do contexto institucional
e do ambiente social. Identificação dá a dimensão do desenvolvimento de
interdependências dos indivíduos/grupos com um determinado ambiente social (Lindo,
2005).
Esta perspectiva acrescenta uma visão mais dinâmica do processo de
integração, afastando-se da atitude normativa anterior que tem implícita uma visão
ideal de um sistema, retratado pela sociedade de acolhimento. Mobilizando a proposta
de Esser, é possível distinguir diversos momentos do processo, que podem ser
conseguidos de forma diferente, em função das características dos grupos envolvidos,
e assumir diferentes tipos, resultado da natureza e intensidade dos contactos
estabelecidos. Tentar quantificar o conceito de integração como resultado de uma
combinação de números não é uma tarefa simples (Baubock, 1994; Ribas-Mateos,
2004), importa antes conseguir distinguir posições, estruturas, condições, interacções
em momentos específicos do processo sem, contudo, esperar que o resultado seja
homogéneo mas sim diverso, pela complexidade das dinâmicas que se geram e pelas
distintas formas que pode assumir. Nesta perspectiva, que se inspira em autores
diversos (Portes, 1999; Entzinger, 2005; Modood, 2007), consideramos que a
realidade pode ser construída a partir de múltiplas percepções, de grupos, de classes
sociais, de etnias, de estatutos económicos e culturais. Nem todos tiram o mesmo
partido de um instrumento comum, pois a combinação de influências de natureza
social é diversa (Halbwachs, cit. em Wieviorka, 2002).
Definir a integração como um processo significa valorizar, por um lado, o
reforço das relações dentro do sistema social e, por outro, o estabelecimento de
relações com novos actores e grupos, inserindo-os no sistema social já existente e nas
instituições a este associadas (Heckmann, 2004). Deste modo, as pessoas e as suas
actividades intervêm directamente na vida social e criam interdependências mútuas de
relações, tratando-se portanto de um processo multinível (vivido a diferentes escalas)
e multidimensional (envolve diversas dimensões da sociedade: estrutural, associada
ao contexto socioeconómico; jurídico-legal e super estrutural, relativa ao universo
cultural). Neste sentido, o conceito de integração poderá ser entendido como um
processo que envolve o desenvolvimento de interdependências entre indivíduos num
44
determinado território, neste caso particular, entre imigrantes e população autóctone,
através do qual se partilham valores e crenças que não anulam as identidades de
cada grupo. Pode ser percebido como um processo resultante da interacção entre
factores estruturais na sociedade de acolhimento (oportunidades e processos de
partilha) e comportamentos dos imigrantes (características culturais, capacidade de
iniciativa e expectativas face à sociedade de acolhimento). Caracteriza-se por ser
dinâmico, dado que decorre da interacção entre o imigrante e a sociedade de
acolhimento, e heterogéneo, pela diversidade dos grupos envolvidos e dos percursos
que estes realizam no sentido da sua inserção no novo território.
Consideramos a integração na perspectiva apresentada por Fonseca e
Malheiros (2005), como um processo complexo que abarca uma dimensão relacional e
uma dimensão espacial, resultante da interacção entre imigrantes e seus
descendentes, mas também entre indivíduos, grupos e instituições, num determinado
território de acolhimento. Um percurso que requer reajustamentos contínuos, a
diferentes níveis, que se prolongam por mais que uma geração (Papademetriou, 2008)
e no qual é possível identificar diferentes níveis/escalas de análise em que as relações
entre imigrantes e sociedade de acolhimento acontecem (Lindo, 2005). Neste sentido,
o estudo da inclusão de comunidades imigrantes em meio escolar exige, para além do
conhecimento dos grupos de imigrantes e das interacções que estabelecem com a
população nativa, a compreensão das dinâmicas de acolhimento geradas ao nível da
escola, das características socioeconómicas e urbanas dos territórios em que estas se
inserem e das orientações da política educativa nacional para as populações
estrangeiras. A análise de cada um destes níveis e a compreensão das dinâmicas de
interdependência que entre eles se estabelecem contribuirão, certamente, para a
identificação das diferentes dimensões do processo de integração dos alunos
estrangeiros nas escolas portuguesas.
Pretende-se ainda, através do estudo das diferentes dimensões da integração
compreender qual o modelo que está subjacente aos níveis de análise propostos:
assimilacionista ou pluralista e/ou se cada nível se encontra em momentos diferentes
do processo de integração. A análise combina, por um lado, a interdependência entre
os níveis definidos por Barth (1994), Alba e Nee (2003) e Lindo (2005), micro, meso e
macro e, por outro, numa perspectiva transversal, as dimensões do processo de
integração propostas por Esser, aculturação, posicionamento, interacção e
identificação (Lindo, 2005). É nossa intenção ensaiar, por um lado, uma combinação
entre o domínio relacional e o domínio espacial no sentido do conceito de integração já
apresentado e, por outro, identificar para cada um dos níveis de análise o modelo de
incorporação que emerge das políticas e práticas implementadas.
45
Na perspectiva assimilacionista clássica defende-se uma sociedade
homogénea internamente e, neste sentido, os recém-chegados devem adaptar-se às
instituições públicas da sociedade de acolhimento sendo os únicos responsáveis pela
sua inclusão ou exclusão, adoptando para tal as práticas da sociedade receptora. Este
modelo toma como referência a cultura e história nacionais, e os valores da classe
dominante, assumindo a diversidade cultural como uma ameaça à identidade nacional.
Parte do pressuposto que as minorias e os marginalizados não têm competências nem
conhecimentos para a sua inserção na sociedade em geral e, assim, terão de se
submeter aos valores da cultura dominante numa atitude de respeito pelo outro, de
modo a não interferir/afectar a cultura dominante.
Na perspectiva pluralista, podem surgir duas situações. A primeira resulta do
reconhecimento do pluralismo cultural e da adopção de uma postura de tolerância pela
diversidade cultural, maior liberdade de expressão, promoção das culturas das
minorias étnicas e das relações interétnicas positivas, características de um modelo
multicultural. Segundo este paradigma, os imigrantes não têm que ser iguais aos
cidadãos nacionais, podendo conviver na mesma sociedade indivíduos e grupos com
origens diversas que mantêm as suas referências e práticas culturais. O estado e a
sociedade devem ter uma atitude de aceitação, dando-lhes o direito à diferença
cultural e, neste sentido, as instituições e regras sociais devem ser revistas e
adaptadas. Uma das principais críticas que foi feita a este modelo, refere-se ao risco
de potenciar a fragmentação social por fomentar a coexistência de diferentes grupos
sem promover a convivência entre os mesmos. A segunda, defende a promoção e
interacção dos domínios público e privado, da vida dos grupos étnicos,
proporcionando-lhes: a aquisição de conhecimentos e competências necessárias para
participar na cultura cívica nacional e para aderir aos ideais democráticos da igualdade,
da justiça e da liberdade; a garantia da manutenção e afirmação, com liberdade plena,
das características identificadoras da cultura do indivíduo. “Esta interacção gera novos
valores, normas, usos e costumes comuns que devem ser integrados num discurso
estruturalmente inclusivo de todos os grupos culturais, desenvolvido em bases
racionais num contexto de plena liberdade.” (Lynch, cit. em Cardoso, 1996, p. 14),
numa perspectiva intercultural.
Segundo Cardoso (1996), a partir da crescente diversidade cultural das
sociedades modernas é possível construir um modelo de integração considerando
princípios e elementos comuns que garantam o respeito por uma cultura democrática,
realista e aberta. Esta perspectiva corrobora com a concepção dinâmica de cultura,
anteriormente apresentada, vulnerável à mudança e resultando das interacções
próprias num mundo cada vez mais globalizado e, por isso, cada vez mais plural. A
46
integração é assumida como um processo participado pelas duas partes envolvidas: a
população imigrante que deve fazer esforços no sentido de introduzir mudanças, ao
mesmo tempo que a sociedade receptora também desenvolve os seus processos de
mudança para se adaptar e potencializar a diversidade cultural que a caracteriza.
As trajectórias de integração dos imigrantes nas sociedades de acolhimento
constituem-se como processos de adaptação criativa às condições locais de habitação
e à (re)construção cooperativa e colaborativa dos territórios em que residem,
envolvendo aprendizagens mútuas resultantes da cooperação, conflito, diálogo e
partilha de saberes, experiências e práticas culturais entre indivíduos, grupos sociais e
comunidades étnicas que convivem na mesma área geográfica (Fonseca & Malheiros,
2005).
2.3. Modos de Incorporação – abordagens analíticas
“No apogeu do “Estado-nação” na Europa, entre cerca de 1870 e 1945,
predominava a ideia de que todos os indivíduos que viviam no interior das fronteiras
de um Estado se deviam assimilar ao modelo de vida dominante, o qual servia de
base à socialização das gerações seguintes, nomeadamente através de rituais
nacionais e, por vezes, nacionalistas” (Conselho da Europa, 2008, p. 23).
Na Europa, os estudos sociológicos das migrações sofreram grande
influência dos trabalhos desenvolvidos na sociedade norte-americana, onde a temática
se confunde com a história do país (Ribas-Mateos, 2004; Crul, Schneider & Lelie,
2012). Os trabalhos apresentados pela Escola de Chicago, a partir dos anos 20 do
século passado e que tiveram como cenário a própria cidade, laboratório social, e os
intensos processos migratórios nela vividos (migração transatlântica e movimentos de
imigração negra provenientes do sul), inspiraram as visões clássicas da teoria da
assimilação. Park e Burgess são dois autores de referência na concepção desta teoria,
tendo apresentado um primeiro conceito de assimilação a partir da análise das
relações raciais em espaços urbanos.23 Estes autores e os seus discípulos foram os
primeiros a valorizarem a importância do fenómeno das migrações nas relações
sociais nas cidades industriais norte-americanas (Ribas-Mateos, 2004). Os estudos
que posteriormente se desenvolveram, de reflexão, de contestação e de reformulação
das suas propostas de incorporação dos imigrantes nas sociedades de acolhimento,
conduziram ao surgimento de novos paradigmas na interpretação deste fenómeno
23
Por relações de raças entendem-se aquelas que “existem entre povos com origens raciais distintas, particularmente quando tais referências raciais penetram na consciência dos individuos e dos grupos assim identificados, determinando desse modo a concepção que cada individuo tem de si mesmo e do seu estatuto dentro da comunidade.” (Park, cit. em Wieviorka, 1992, p.52)
47
social. Propondo modelos que pretendem integrar a pluralidade cultural da sociedade
contemporânea, sem ter por ambição a sua homogeneidade, mas sim aceitando a
convivência em territórios marcados pela diferença, os paradigmas da integração
foram-se aproximando de uma visão mais dinâmica do conceito de cultura e das
potencialidades da diversidade cultural na construção das sociedades actuais.
Progressivamente, as interpretações sobre os modelos assimilacionistas clássicos
reconstroem-se, resultado do acentuar da diversidade cultural e das múltiplas formas
que pode assumir a integração dos imigrantes nos territórios de acolhimento. “Em vez
de um padrão relativamente uniforme cujos valores e normas determinam um percurso
homogéneo de integração, é possível distinguir hoje em dia diversos trajectos
alternativos.” (Portes, 1999, p. 101).
Partindo dos pressupostos que acabamos de apresentar, optámos por
estruturar a abordagem analítica sobre os modos de incorporação assente em dois
paradigmas: o assimilacionista (unidireccional) e o pluralista (multidimensional).
A abordagem assimilacionista
O paradigma assimilacionista, utilizado na interpretação do processo de
integração dos imigrantes nas sociedades de acolhimento, dominou as investigações
desenvolvidas na primeira metade do século XX. Segundo este paradigma, o estado
nação é assumido como ideal e, como tal, nenhuma política pode ser estável e coesa
se os seus membros não partilharem uma cultura nacional comum, incluindo valores,
ideais, crenças morais e práticas sociais. Deste modo, os grupos minoritários que
quiserem fazer parte da sociedade e terem tratamento igual aos restantes membros
devem ser assimilados. A opção por outra solução pode ser vista como uma
provocação e reverter-se contra os mesmos por via da discriminação (Parekh, 2006).
Enfatizando o papel do meio social, como peça chave na organização e
formas de vida dos actores, os defensores deste paradigma procuram analisar as
formas de integração urbana. Para tal, definem as dinâmicas da relação entre grupos
étnicos em quatro etapas: competição, conflito, acomodação e por fim, a assimilação.
O primeiro momento ocorre com a chegada do imigrante e a sua inserção social
através do trabalho onde se confronta/concorre com a restante população; de seguida
faz-se a aproximação a outros grupos, com base nos interesses sociais inerentes ao
estatuto de trabalhador, situação que reforça a sua integração mas que normalmente é
vivida com algum conflito; num terceiro momento ocorre a adaptação às regras de
funcionamento da sociedade; e, por fim, a assimilação dos valores gerais e da cultura
da sociedade de acolhimento (Wieviorka, 2002). Para Park, Burguess e seus
seguidores, a assimilação é um processo duplo, resultante da troca de experiências e
48
de histórias de vida ao longo do tempo, construído na sequência de categorias que
caracterizam a ecologia urbana, que permite incorporar pessoas de diferentes origens
na vida comunitária e, deste modo, construir, na perspectiva de Park, uma
solidariedade cultural que permita apoiar uma existência nacional (Asselin et al., 2006).
Nesta perspectiva, a assimilação surge como um processo de interpenetração e fusão,
através do qual pessoas e grupos adquirem referências, sentimentos e atitudes de
outros grupos que, modelados pela sua experiência e história, incorporam numa vida
cultural comum (Alba & Nee, 1997). Para Burguess, a assimilação pode ser entendida
como um processo social através do qual os imigrantes, em interacção recíproca com
a sociedade de acolhimento, vão interiorizando um conjunto diverso de referências,
sentimentos e opiniões de outros indivíduos e grupos, no sentido da sua incorporação
num novo território. Trata-se, portanto, de um processo que não se afasta muito da
visão clássica de socialização definida por Durkheim, no qual, através da
aprendizagem das normas e expectativas do grande grupo, se vão interiorizando
progressivamente os valores que compõem a cultura de uma sociedade (Wieviorka,
2002).
A mudança de paradigma, que chega com a Escola de Chicago, marca uma
viragem metodológica na análise das relações e mobilidade espacial dos diversos
grupos étnicos, pela introdução de três novas concepções: (i) uma abordagem
dinâmica do conceito de cultura, ao assumir que as culturas se transformam
permanentemente e são recreadas pelos indivíduos à medida que estes procuram
adaptar-se a um novo meio; (ii) o entendimento do grupo étnico numa perspectiva
dinâmica, como uma variável que intervém num contínuo processo de negociação
entre vários grupos; (iii) a valorização dos aspectos subjectivos e simbólicos na
construção de uma visão alternativa das relações interétnicas (Ribas-Mateos, 2004).
As ideias centrais que caracterizam este paradigma acompanharam, até aos
anos 60, os estudos sociológicos desenvolvidos sobre a integração dos imigrantes na
sociedade americana. Valorizando as relações interétnicas e o meio social em que
estas se materializavam, a integração assumia-se como um processo evolutivo,
iniciado pelo contacto entre os grupos e finalizado com a assimilação em diferentes
dimensões da vida económica e social. Na teoria de Park, o imigrante vive um
processo duplo: por um lado, está simultaneamente a ser atraído pela sociedade
receptora e, por outro, a ser despojado da sua cultura. Neste processo, que se
assume necessariamente como sequencial e cíclico, o imigrante é entendido à partida
como um indivíduo que ocupa um lugar social marginal, posição esta que se deve
alterar quando a assimilação ocorre. Contudo, é necessário que o próprio tenha
capacidade de inovação, de adaptação e mudança perante o novo contexto. Assim,
49
segundo Park, o produto resultante da colisão, conflito e fusão de pessoas e culturas,
envolvidas no processo migratório, designa-se de assimilação (Heisler, 2007).
As concepções de Park sobre a assimilação revolucionaram as teorias
funcionalistas anteriores e relançaram uma nova dinâmica nos estudos sobre a
relação entre imigrantes e sociedade de acolhimento, em particular na sociedade
norte-americana. Contudo, a rigidez da organização sequencial dos diferentes
momentos do processo até à assimilação e a persistência de desigualdades raciais e
conflitos suscitaram algumas das críticas ao modelo (Heisler, 2007). Por outro lado, a
convicção de que o final da linha percorrida pelos imigrantes, em particular os seus
filhos, culmina com a mobilidade social e o abandono das referências culturais por
interiorização da cultura dominante, deixou muitas interrogações aos investigadores
que continuaram o estudo dos modelos de incorporação nas sociedades de
acolhimento.24
Na sequência das críticas que foram sendo apresentadas ao modelo
desenvolvido por Park, surgem novas perspectivas que, apesar de incorporarem
alguns dos princípios anteriores, tentam ultrapassar as limitações identificadas,
introduzindo variantes no processo de assimilação. No conceito de “straight-line
assimilation”, que Warner e Srole definem no seu trabalho Social Systems of American
Ethnic Groups (1945), defende-se que a adaptação de diferentes grupos na sociedade
americana tenderia a evoluir no sentido único da assimilação de uma mesma cultura
universal de referência: the American way of life (Asselin et al., 2006, p. 134). Contudo,
os mesmos autores reconhecem a existência de diferenças significativas nos ritmos de
assimilação decorrentes da distância cultural e das categorias raciais. Em meados do
séc. XX, no apogeu da metáfora do “melting pot”, assimilação é o pivot em torno do
qual as investigações sociais sobre etnicidade e raça se desenvolvem. Milton Gordon
(1964), no seu estudo Assimilation in American Life, apresenta um conceito de
assimilação multidimensional que se organiza numa sequência temporal de
acontecimentos e que culmina com a incorporação em grupos de classe média ou na
core culture: a aculturação, pelo domínio da língua inglesa, é a dimensão que surge
em primeiro lugar e antecede a adopção de alguns comportamentos, valores e
expectativas da sociedade receptora (Heisler, 2007). Entre os recursos que os
imigrantes podem mobilizar, o autor identifica factores intrínsecos e extrínsecos. Os
primeiros resultam da herança cultural dos grupos, os segundos constroem-se nos
contactos com a sociedade de acolhimento, no processo de acomodação à nova
24
Reeves Kennedy (1944, 1952), Herberg (1956), Glazer and Moynihan (1963), são alguns dos autores que contestaram a perspetiva optimista apresentada nos estudos da Escola de Chicago em relação ao modo de incorporação dos imigrantes na sociedade de acolhimento (Heisler, 2007).
50
sociedade. Na perspectiva de Gordon, a aculturação não é uma condição suficiente
para uma melhor integração socioeconómica. Considera assim que a assimilação, nos
diferentes domínios da vida, ocorre quando os imigrantes e respectivos descendentes
são aceites e estão dispostos a aceitar os grupos primários numa sociedade (Price, cit.
em Asselin et al., 2006). Na sua hipótese de partida, a assimilação estrutural
(integração nos grupos primários) surge associada ou estimula os outros tipos de
assimilação. O preconceito e a discriminação vão-se atenuando à medida que os
imigrantes se vão “misturando” na sociedade de acolhimento ou afastando das
referências étnicas de origem (Alba & Nee, 2003). Neste sentido, a assimilação
estrutural resulta da entrada nos circuitos socioeconómicos e da posterior
internalização dos aspectos intrínsecos. Ainda assim, Gordon não descura a
possibilidade destes grupos primários poderem funcionar como uma barreira ao
próprio processo de assimilação (Heisler, 2007).
As críticas que são feitas a este modelo, pelos autores que mobilizamos,
centram-se na pouca clareza na definição de alguns conceitos que são utilizados
(distinção entre factores intrínsecos e extrínsecos, e grupos primários), assim como na
sequência unidireccional dos diferentes momentos do processo de assimilação até à
emergência de uma nova cultura. Também o facto de não se explicitar de que forma
as grandes estruturas institucionais (mercado de trabalho, instituições políticas e de
educação) podem funcionar como uma barreira ao processo, é uma das falhas
identificadas no modelo. Por outro lado, o assumir que a aculturação envolve
mudanças por parte de um grupo étnico e o não questionamento das alterações
resultantes do contacto entre culturas na população nativa surgem entre as
incoerências apontadas na explicação do conceito de assimilação estrutural. Para Alba
e Nee (2003), numa sociedade como a americana, resultado de diversas influências
culturais, a aculturação não pode ser vista apenas na perspectiva do recém-chegado,
o impacto das culturas minoritárias é notório, em particular nos estilos de vida urbana.
Seguindo a perspectiva apresentada por Warner e Srole em 1945, Gordon
(1964) define o conceito de melting pot, como resultado final do processo de
assimilação (Heisler, 2007). Aplicando-o aos grupos religiosos que existem na
sociedade americana, o autor refere ser possível pensar uma sociedade organizada
em diferentes “potes” ou subsociedades, cada uma delas definida por um grupo
religioso, que se encontra num processo de fusão com a comunidade autóctone que a
acolhe. Se os grupos em presença forem suficientemente fortes, no final do percurso
irá emergir uma nova cultura, resultado da fusão de elementos culturais diversos,
eventualmente com um grupo dominante. Mas, na opinião dos autores anteriormente
referidos, mais uma vez, o conceito de assimilação cultural não é claro, centra-se em
51
elementos particulares de uma cultura e constrói-se numa perspectiva unidireccional,
deixando pouco explícita a sua definição.
Do assimilacionismo às abordagens pluralistas
O multiculturalismo contemporâneo, sustentado na ideia de que a sociedade
pode tornar-se mais diversa culturalmente com a presença de diferentes grupos
étnicos, deve uma primeira abordagem no terceiro modelo de integração apresentado
por Gordon (Alba & Nee, 2003). Contudo, nesta aproximação, a aculturação
(assimilação cultural) é ainda assumida como um fim inevitável, tal como a assimilação
estrutural ou integração social, esta última resultado da entrada nas instituições da
sociedade dominante. O foco da análise da integração continua direccionado para os
imigrantes, deixando a sociedade de acolhimento inalterada perante a sua presença.
Porém não é tornada evidente a forma como a assimilação dos indivíduos e grupos
étnicos é promovida ou dificultada, pois o autor não avança com uma teoria da
assimilação (Alba & Nee, 2003). Todavia, é notório nos modelos desenvolvidos por
Gordon uma preocupação em identificar as diversas dimensões que caracterizam o
processo: cultural, estrutural, familiar, identitária, atitudinal, comportamental, cívica, e
que permitem compor um índice de assimilação multidimensional (Zhou, 1997).
As teorias da assimilação linear e melting pot foram muito criticadas nos
trabalhos desenvolvidos pelos autores pós assimilacionistas. Em concreto, os estudos
empíricos de Glazer e Moynihan sobre grupos imigrantes de origem africana nos
Estados Unidos, revelaram que para alguns grupos é importante ser americano em
determinados aspectos mas noutros, como os hábitos alimentares ou de convívio,
prevalecem os traços da cultura de origem (Asselin et al., 2006). Estes autores
acrescentam ainda a existência de diversos ritmos de mobilidade entre grupos de
diferentes origens, aspecto a que Gordon não deu grande ênfase, por se centrar na
mobilidade individual e não estudar o grupo no seu todo (Heisler, 2007). No contexto
socioeconómico e político da cidade de Nova Iorque, onde desenvolveram o seu
estudo, os autores concluíram que todos os grupos pretendem preservar alguns traços
da sua identidade étnica ao mesmo tempo que aspiram tornar-se americanos. É
sustentado nesta evidência que Heisler (2008) defende que a etnicidade e identidade
étnica não desaparecem, passam antes por períodos de recriação.
Os estudos de Gans (1979, 1996) assumem orientações um pouco diferentes
das que apresentamos até aqui, ao introduzirem na análise a dimensão geracional e
temporal (Asselini et al., 2006). O paradigma que sustenta a bumpy line theory coloca
em causa as concepções que assumem uma relação positiva entre aculturação e
mobilidade social: cada geração representa um novo estádio de ajustamento à
52
sociedade de acolhimento, que não tem que ser necessariamente de avanço
sentido, é possível que entre os elementos da segunda geração o abandono das
referências culturais de origem desencadeie um recuo face ao percurso social
conseguido pelos seus progenitores, assim como é provável que a terceira geração,
que se identifica com outra cultura, necessite de mobilizar alguns traços das suas
origens (Portes, 1999). Seguindo este princípio, os recursos proporcionados pelas
comunidades de origem podem tornar-se um apoio fundamental na integração e,
apesar da assimilação, cada indivíduo continua a ser portador de diferenças que o
individualizam face ao resto da população.
Na sequência da viragem de paradigma e da intensificação do fenómeno
migratório para os EUA e para algumas economias industrializadas da Europa durante
os anos 80, a investigação sobre a teoria das migrações ganha novo impulso, surgindo
novos modelos que, em alguns casos, vêm entrar em ruptura com os anteriores. Até
então, “a fixação numa cultura dominante, a tónica na construção de consenso e a
suposição de uma sequência básica e padronizada de adaptação constituem os
elementos centrais da teoria da assimilação” (Portes, 1999, p. 41). Os estudos de
Portes e de outros autores que com ele investigaram (Robert Bach; Rubén Rumbaut;
Min Zhou) são referência fundamental na literatura que caracteriza esta viragem.
A conotação negativa que o conceito de assimilação foi assumindo entre a
comunidade de investigadores conduziu ao seu quase abandono entre os anos 70 e
inícios dos anos 90. Portes e Zhou retomam-no, em 1993, dando-lhe um sentido de
maior abertura à diversidade de modos de incorporação que é possível encontrar na
sociedade americana. O novo paradigma, que designam de assimilação segmentada,
assenta no reconhecimento de que os imigrantes são incorporados em diferentes
níveis da sociedade de acolhimento. Quer estes, quer os seus descendentes, podem
integrar outras estruturas sociais por um processo de ascensão, que pode decorrer ao
longo de gerações. Direccionando a sua análise para as crianças descendentes de
imigrantes, constatam que os percursos seguidos por estes assumem contornos
diversos. Resultado do estatuto social das famílias, as crianças assimilam diferentes
segmentos da estrutura social existente. Assim, entre aqueles que são oriundos de
uma classe média as oportunidades oferecidas pela sociedade americana (na
educação e posteriores oportunidades de mobilidade social) permitem-lhes uma
assimilação na classe média. Já entre as crianças imigrantes, provenientes de famílias
com estatuto social mais baixo, as oportunidades são diferentes, tal como o percurso
que têm oportunidade de realizar. Confrontados com situações de discriminação na
escola, por vezes associadas ao contacto com uma subcultura que rejeita a educação
53
e as condições económicas dos pais, estas crianças correm o risco de integrar os
grupos mais desfavorecidos da sociedade. 25 A oportunidade ou a opção pela
residência num bairro vizinho em substituição do enclave residencial em que vivem os
seus co-étnicos, pode ser uma oportunidade para as crianças contactarem com outros
contextos sociais, conviverem com outros pares, frequentarem outras escolas,
reduzindo as possibilidades de crescer em contextos conotados com a desvantagem
social. Outros grupos imigrantes optam por manter os seus contextos sociais
desfavorecidos, convivendo no seio do mesmo grupo étnico, mas desenvolvendo
mecanismos internos que lhes permitam ascender na sociedade de acolhimento.
Através do estabelecimento de redes próprias, desenvolvendo os seus nichos
económicos, conseguem tirar partido das comunidades em que se inserem,
construindo o seu percurso na nova sociedade e contrariando a tendência para o
isolamento que a convivência em situações de desvantagem social lhes poderia
causar.
Se mobilizarmos, como exemplo, o percurso desenvolvido pelos jovens
oriundos do Sri-Lanka e os jovens de origem magrebina que migraram para Paris,26
identificamos resultados diferentes no processo de integração. Para os primeiros, o
confronto com a escola e em seguida com o mercado de trabalho é difícil, mas os
resultados obtidos são melhores que entre os segundos (que moram no mesmo bairro
e frequentam a mesma escola). Apesar de conviverem mais frequentemente com
situações de marginalização, quer pelo sistema escolar, quer pelos seus pares norte-
africanos, podendo ser alvo de situações de racismo e xenofobia, abandonando cedo
a escola para entrar no mundo do trabalho, no qual são integrados a partir de redes
étnicas, os jovens oriundos do Sri-Lanka desempenham tarefas pesadas e mal
remuneradas, mas não se sentem desvalorizados ou desprezados pela situação,
aspecto que também os distingue dos imigrantes magrebinos, para quem as
referências comunitárias são escassas e distantes, pela adesão a uma nova cultura
mais globalizada.
Portes (1999), no estudo sobre a comunidade haitiana a residir em Miami,
conclui que a primeira geração está muito mais orientada para a preservação de uma
identidade nacional, associada à solidariedade comunitária e redes sociais que
garantem o sucesso individual. No entanto, os seus filhos têm dificuldade em gerir esta
pertença nacional com as vivências escolares. As escolas que frequentam, localizadas
na principal zona residencial negra do centro de Miami (inner city), têm uma população
25
São exemplo destes grupos, os Afro Americanos e Portoricanhos (Portes & Rumbaut, 2001). 26
Comunidades analisadas por Claire Schiff no estudo Situation migratoire et condition minoritaire. Une comparaison entre les adolescents primi-arrivants et les jeunes de la deuxieme géneration vivant en milieu urbain défavorisé, Paris, these, EHESS, 2000.
54
maioritariamente haitiana que convive com outros jovens nascidos nos EUA oriundos
de minorias étnicas. Estes jovens construíram uma imagem dos seus pares haitianos,
como “dóceis e subservientes para com os brancos, e troçam do francês, do crioulo e
do sotaque dos haitianos” (Portes, 1999, p. 98). Entre o desafio de continuar haitiano e
enfrentar as ameaças vividas na escola, ou tornar-se americano e abandonar os
valores e princípios dos seus progenitores e grupo étnico de pertença, estas crianças
convivem numa situação de permanente conflito. O estudo conclui que a opção
tomada tem resultados distintos no sucesso dos estudantes: os melhores alunos
haitianos-americanos “preservam a sua identidade étnica sob a aparência de formas
culturais dos negros americanos” outros, “optaram pelo caminho mais fácil e
assimilaram-se aos valores e normas da inner city” (Portes, 1999, p. 99).
A investigação realizada por Gibson sobre os jovens Sihk, oriundos do
Penjabe (1980-82), residentes numa cidade do norte da Califórnia onde a actividade
agrícola, fonte de rendimento principal, se encontrava a cargo de imigrantes de origem
indiana, revela que o processo de assimilação dos estudantes de segunda geração é
muito difícil devido à hostilidade dos estudantes brancos. Contudo, apesar de
constituírem apenas 11% da comunidade estudantil, e serem alvo de ataque
permanente pelos seus pares “brancos”, estes jovens obtiveram melhores resultados
no final da educação secundária aspirando, os rapazes, à frequência da educação
superior na área da engenharia e matemática (Portes, 1999).
As experiências apresentadas, sobre os percursos de jovens descendentes
de imigrantes, introduzem algumas variantes aos modelos clássicos que defendem um
processo linear de assimilação destas comunidades, resultado da incorporação
progressiva num modelo cultural dominante. É neste sentido, assumindo trajectos
alternativos no percurso da assimilação, que Portes (1999) se refere ao conceito de
assimilação segmentada.
Os estudos pós assimilacionistas sobre a incorporação dos imigrantes nas
sociedades de acolhimento sugerem a existência de influências múltiplas no processo,
estádios e modos de incorporação e, deste modo, associam às questões religiosas e
culturais, as actividades económicas, o mercado de trabalho e a posição
socioeconómica. Assumindo a etnicidade como um recurso fundamental, estes
modelos valorizam a actividade socioeconómica do grupo étnico e as formas de
organização deste numa sociedade em constante mudança. A nova literatura
“identifies the ethnic community not as a station on the way to eventual assimilation,
but as a distinct mode of immigrant incorporation” (Heisler, 2007, p. 86).
Entendendo a etnicidade como um recurso, e enfatizando o papel central das
redes, a tipologia dos modos de incorporação apresentada por Portes, é ilustrativa da
55
importância da valorização da diversidade de experiências vividas pelos migrantes na
sociedade receptora. Entre os níveis macro e micro da estrutura social, a tipologia
identifica três níveis de acolhimento que, combinados, constituem o modelo geral de
incorporação de um determinado grupo de imigrantes na sociedade: o político, a
sociedade civil e opinião pública, e a comunidade imigrante. Ao nível político, da
política governamental, são identificadas três possíveis respostas: receptiva,
indiferente e hostil; no segundo nível, da sociedade civil, cada uma das três categorias
anteriores pode dividir-se entre acolhimento com preconceito e sem preconceito; no
terceiro nível, a comunidade imigrante pode classificar-se como forte ou fraca – a
primeira associada à concentração geográfica e estruturas de emprego diversificadas,
a segunda, a comunidades de menor dimensão ou compostas por trabalhadores com
poucas qualificações (Portes & Rumbaut, 1990; Portes, 1999). Este modelo foi
aplicado nos EUA, em doze contextos de acolhimento, com imigrantes de diferentes
origens e permitiu identificar que a localização de um grupo de imigrantes num
contexto específico influencia as possibilidades individuais e do grupo durante o
processo de incorporação. Apesar da tipologia não apresentar de forma assumida a
assimilação como um modo de incorporação, duas das categorias identificadas pelo
autor, aproximam-se do conceito, na perspectiva de Heisler (2008). Portes e Zhou
(1993) relançam a discussão em torno do conceito de assimilação, quer na América,
quer na Europa. A longa experiência de imigração nos Estados Unidos, marcada pela
diversidade de discursos, políticas e práticas de integração, levou a um progressivo
encurtar das diferenças sociais relevantes entre grupos, que legitimam a investigação
e análise do processo de assimilação.
Alba e Nee (1997, 2003) retomam a análise das causas que ajudam a
compreender o processo de assimilação e detêm-se sobre as atitudes individuais e do
grupo. Identificam as escolhas feitas pelos agentes como resultado das
especificidades dos seus esquemas mentais e referências culturais (personalidade,
normas sociais, leis, ideologia e religião) o que, na sua perspectiva, molda as
percepções e os interesses próprios. São os mecanismos de actuação aos níveis
individual, de grupo e institucional que permitem explicar as trajectórias de adaptação
dos imigrantes e seus descendentes na sociedade receptora. Estes mecanismos
organizam-se, segundo os autores, em dois grandes grupos: causas próximas, que
operam ao nível das redes individuais e sociais (grupos primários e comunidade) e
que são determinadas pelas formas de capital que os indivíduos e grupos possuem; e
as causas distantes, por vezes com implicações mais profundas, que resultam das
grandes estruturas, como as organizações institucionais do estado, das empresas, do
mercado de trabalho (Alba & Nee, 2003). Neste sentido não é um conjunto de
56
mecanismos e acções isoladas que determinam a adaptação do individuo à sociedade
de acolhimento, há uma variedade de intervenientes que operam a diferentes níveis e
que são acolhidos e mobilizados pelos grupos e, dentro do mesmo grupo étnico, de
formas diversas. Estes mecanismos são classificados pelos autores como acções
intencionais, processos sociais e formas de capital, e os mecanismos institucionais.
Na perspectiva apresentada por Alba e Nee (2003), o processo de
assimilação não se pode definir como o resultado de uma trajectória linear, que é
vivida por todos os imigrantes da mesma forma, desde que chegam ao território de
acolhimento até à sua integração na classe média, é antes o resultado de um percurso
de confronto, de reflexão, de escolhas, construído diariamente no decurso das acções
dos indivíduos e das consequências dos seus comportamentos e decisões. As acções
intencionais (purposive actions) podem ser condicionadas pelo capital humano,
financeiro e social de que os mesmos são detentores. Quando estas formas de capital
se apresentam fracas, os indivíduos podem confrontar-se com constrangimentos na
escolha da área de residência, no acesso ao mercado de trabalho, à saúde e à
educação, e no estabelecimento de redes de relações sociais. Para os restantes, as
escolhas podem combinar estratégias mistas, individuais e colectivas, facilitadoras da
sua integração e da mobilidade social das gerações seguintes, através da entrada no
mercado de trabalho fora das redes étnicas, do aumento dos níveis de formação e do
maior leque de oportunidades. O investimento que a primeira geração pode fazer nos
seus descendentes, ao nível da aprendizagem da língua do país de acolhimento e do
desenvolvimento de competências bilinguísticas, pode revelar-se um impulso
fundamental para o sucesso escolar e a garantia de uma carreira profissional mais
qualificada. O investimento em capital humano na segunda geração, por parte de
alguns indivíduos e grupos de imigrantes, pode tornar-se uma mais-valia importante,
no alargamento do leque de oportunidades de entrada na sociedade de acolhimento: o
desenvolvimento de competências culturais e sociais pode ter efeitos multiplicadores
noutros domínios, garantindo desta forma a redução da distância social.
Os processos sociais (network mecanism), que orientam e fazem cumprir
normas entre grupos minoritários muito fechados (Alba & Nee, 2003), revelam-se
fundamentais para garantir a continuidade do grupo, a sua identidade e o seu sucesso
na transição para outra sociedade. As estratégias colectivas que mobilizam são
imprescindíveis para ultrapassar as barreiras, e as redes construídas são uma forma
de capital social, ou seja, o conjunto de laços que foram acumulados durante a
experiência migratória, iniciados com maior intensidade na família e amigos mais
próximos e alargados, de uma forma mais ténue, para outras convivências.
57
As formas de capital que os imigrantes transportam são diferentes entre
grupos étnicos e no seio da mesma corrente migratória. O capital humano,27 adquirido
através da educação e experiência profissional, assume um papel determinante no
acesso ao mercado de trabalho e na mobilidade social. Contudo, na perspectiva de
Bourdieu (1980),28 também o capital cultural adquirido na família, educação e cultura,
é um factor condicionante do sucesso da adaptação dos imigrantes na sociedade de
acolhimento. A assimilação é, nesta perspectiva, afectada não apenas pela
diversidade de formas de capital de que cada família é portadora, mas também pelo
uso que é feito desse capital dentro ou fora da rede de relações étnicas e das
instituições. A educação surge, simultaneamente, como uma componente do capital
humano e do capital cultural dificultando, por vezes, a utilização isolada das duas
formas. A opção pela sua integração num único conceito, capital humano-cultural
(Alba & Nee, 2003, p. 48), parece-nos ser uma proposta a adoptar. Para algumas
famílias de imigrantes, a transferência de capital humano-cultural entre a primeira e a
segunda geração é uma das estratégias essenciais do investimento na mobilidade
social e que procuram atingir, através do acesso à habitação em contextos sócio
territoriais menos desfavorecidos, facilitadores do acesso a escolas que garantam, por
um lado, uma educação de qualidade às suas crianças e, por outro, as vivências em
contextos sociais onde o público dominante não se limite ao grupo étnico de referência.
Contudo, este perfil não é extensível a todas as famílias. O contexto migratório, as
vivências anteriores, as referências identitárias e as redes que os imigrantes mantêm
com os co-étnicos na sociedade receptora, são alguns dos factores que os estudos
sobre a mobilidade social da segunda geração têm identificado como condicionantes
do processo (Portes & Zhou, 1993; Portes & Macleod, 1996; Portes & Hao, 1998;
Portes, 1999; Portes & Rumbaut, 2001). Neste sentido, sai reforçada a tese de que as
escolhas dos percursos de vida na sociedade de acolhimento resultam, em parte, das
características do capital humano-cultural que os imigrantes transportam e que
marcam de forma acentuada o sucesso da sua integração.
Os mecanismos institucionais surgem com implicações mais profundas no
decorrer do processo, na medida em que determinam os mecanismos de proximidade
(as acções intencionais e os mecanismos de rede), os processos de segregação ou
27
“Chiswick foi pioneiro na aplicação do conceito de capital humano ao estudo da realização económica dos imigrantes” (Portes, 1999, p. 28). 28
No texto publicado nas Actes de la Recherche en Sciences Sociales, Bordieu (1980) define o conceito de capital social como o conjunto dos recursos actuais ou potenciais gerados pela pertença a um determinado grupo onde os elementos se mantêm unidos por redes de relações duráveis de interconhecimento e inter-reconhecimento. Segundo Portes (2000), através do capital social os agentes podem ter acesso aos recursos económicos e aumentar o capital cultural, através da rede de contactos pessoais que mantenham com instituições e pessoas.
58
interacção. Constituem-se como o pano de fundo da articulação entre os níveis micro
(próximo) e macro (distante) da integração dos imigrantes na sociedade receptora. As
respostas que são dadas a nível local podem ser adaptadas ao contexto migratório,
contudo as orientações gerais são da responsabilidade das instituições do Estado, o
agente responsável pela definição do quadro legal de referência que orienta a vida em
sociedade e órgão máximo para a garantia da coesão territorial.
Os modelos de incorporação que temos vindo a apresentar não se reportam
de forma explícita ao papel da cidadania ou, dito de outro modo, às desvantagens
políticas e aos bloqueios no acesso e exercício da cidadania por parte das populações
imigrantes. Apesar do exercício da cidadania poder ser entendido como o resultado de
uma construção que é transversal a uma sociedade pluralista e que, por inerência do
convívio intercultural, se constrói ao longo do tempo, esta não é uma
reflexão/abordagem explícita nos modelos que anteriormente apresentámos.
Tomamos como referência para justificar a importância da definição de um
modelo de integração/incorporação assente nas relações sociais e na cidadania o
estudo desenvolvido por Pires (2009), sobre os percursos escolares da segunda
geração de imigrantes de origem cabo-verdiana e hindu-indiana em Portugal. Na
revisão que faz dos conceitos e abordagens analíticas da integração, a autora avança
para a proposta de um Modelo da Cidadania sustentado teoricamente nas análises de
um conjunto de autores (Heisler, Favell, Turner, Castles, Vermeulen, Brubaker e
Soysal) que se têm debruçado sobre a forma como os estados-nação têm resolvido a
questão do acesso à cidadania (Pires, 2009). A reflexão apresentada pretende ir além
do processo de regulação da entrada das populações imigrantes e das regras de
acesso à cidadania, avançando para a importância da compreensão dos direitos e
deveres que regem a pertença a uma comunidade e que, na perspectiva de Castles,
constituem a cidadania substancial (Pires, 2009, p. 24).
Segundo a autora, a produção teórica que fundamenta este modelo apoia-se
em duas teses antagónicas: (i) a primeira, centrada na análise das novas formas de
pertença e de direitos, encontra suporte nos princípios internacionais dos direitos
humanos e é defendida por Yasemin Soysal, 29 tomando como exemplo o espaço
europeu, como espaço de plena aceitação das diferenças no seio dos estados-nação;
(ii) a segunda apoia-se nos argumentos dos autores que reconhecem que, apesar dos
princípios mais humanistas e liberais em que assenta o controlo da imigração e da
aquisição de alguns direitos sociais e cívicos pelos não nacionais, no exercício efectivo
da cidadania a abertura social desejada ainda não foi conseguida. O que na
29
Estes argumentos surgem na obra intitulada Limits of Citizenship – Migrants and Postnational Membership in Europe (1994).
59
perspectiva de Brubaker tem uma evolução diferente consoante os Estados (Pires,
2009).
O papel dos contextos políticos e sociais de acolhimento na participação
social e cultural e no desenvolvimento de sentimentos de pertença é fundamental no
acolhimento e integração de populações migrantes (Crul & Schneider, 2012), numa
perspectiva de diversidade cultural. A possibilidade que é dada a estas populações de
se envolverem e de participarem na vida social do território que as acolhe é, por um
lado, uma dimensão importante da integração e, por outro, uma manifestação
fundamental do seu contributo enquanto cidadãos. Para os autores anteriormente
referidos, o entendimento da participação nas instituições chave em diferentes cidades
europeias requer uma análise feita a partir de duas perspectivas: (i) ao nível da
sociedade, compreendendo as dinâmicas institucionais locais que facilitam a
participação no sentido de conhecer o seu papel na redução ou reprodução das
desigualdades; (ii) a partir dos agentes, indivíduos ou grupos que fazem as suas
escolhas desafiando as oportunidades e as estruturas.
Na linha de raciocínio que temos vindo a defender, a abordagem aos modos
de incorporação implica, por um lado, uma análise sobre as condições de acesso à
cidadania (regimes e políticas) e sobre o conjunto de direitos e deveres pelos quais se
rege a pertença a uma comunidade (Brubaker, 1990) e, por outro, na perspectiva de
Móran (2003), o reconhecimento da diversidade como um dos grandes desafios da
construção da cidadania. A convivência em sociedades marcadas pela pluralidade
cultural coloca desafios no entendimento do conceito de cidadania que ultrapassam a
visão redutora de aceitação numa comunidade, por pertença política ou por aquisição
de um estatuto legal, e se centram numa perspectiva de integração, de acesso a bens
e serviços, de intercâmbio cultural, de participação democrática, de respeito pelos
direitos humanos. É nesta óptica, de valorização da diversidade, que o conceito de
cidadania deve ser revisto e integrado nos paradigmas de incorporação de imigrantes
nas sociedades de acolhimento.
Se, nas sociedades contemporâneas, a diversidade se assume como uma
das principais características da população que reside em contextos urbanos, e que se
traduz, em muitas cidades europeias, por um convívio em ambientes cada vez mais
multi-étnicos e “super diversos” (Vertovec, 2006), a integração deve também ser
pensada no sentido da construção de laços e sentimentos de pertença através da
mobilização de todos em projectos comuns. Estes sentimentos reportam-se à
possibilidade da existência de múltiplas e diversas formas de pertença que podem
ocorrer em diferentes contextos e tempos. Crul e Schneider (2012) referem que a
pertença implica dois níveis: o individual, que resulta do desafio de encontrar um lugar
60
na sociedade; e, o institucional, que se situa ao nível da interacção social, traduzindo-
se pela capacidade de desenvolver relações sociais “fortes” e “fracas” em diferentes
contextos.
Quando centramos a investigação sobre integração das crianças e jovens
descendentes de imigrantes, a abordagem à cidadania deve potencializar e implicar
este público no sentido da mudança social, fomentando o seu sentimento de pertença
e o desenvolvimento sócio pessoal através da convivência e da participação na
comunidade (Maiztegui-Oñate & Fonseca-Peso, 2013). Ainda segundo as autoras,
num modelo de incorporação assente na perspectiva da cidadania um dos grandes
desafios é colocado ao nível da educação. O contributo da educação é assumido
como fundamental na integração destas populações pela importante mais-valia na
formação das crianças e jovens no sentido da construção dos percursos de cidadania
(Suarez Orozco & Suarez Orozco, 2001; Banks, 2004, 2011, 2012). A escola
localizada numa sociedade culturalmente plural deve mobilizar-se para promover uma
educação sustentada na convivência, na partilha, na interacção, no intercâmbio e no
respeito (Council of Europe, 2002; UNESCO, 2005) e, desta forma, contribuir para o
aprender a ser, o aprender a fazer, o aprender a conhecer e o aprender a viver juntos
(UNESCO, 2005). Defende-se, nesta perspectiva, uma escola que forme cidadãos
conscientes das normas, leis e regras, que sejam ao mesmo tempo competentes para
as mobilizar, reconhecendo os contextos de diversidade em que se movimentam.
Assim, as crianças e jovens imigrantes são formados no sentido de poderem fazer
escolhas e manter os laços/identificação com as suas referências culturais ao mesmo
tempo que participam na cultura nacional. Estas duas dimensões perspectivam-se
numa relação interactiva, dinâmica e de interdependência, permitindo a compreensão
das múltiplas influências que decorrem do convívio em comunidades culturalmente
diversas, reconhecendo que a sua comunidade de origem tem um papel fundamental
sobre a comunidade nacional e/ ou global (Banks, 2011). Para este autor, as escolas
necessitam de garantir a afirmação da identidade dos estudantes oriundos de
diferentes grupos, se pretendem que estes defendam os valores nacionais, se tornem
cosmopolitas,30 interiorizem os direitos humanos e trabalhem no sentido de colocar a
sua comunidade, nação, região e mundo mais justos e humanos. Nesta linha de
pensamento, a concepção de identidade 31 deve assumir-se numa perspectiva
dinâmica, resultado de processos múltiplos, em mudança e contextuais.
30
Cosmopolitanismo é aqui apresentado na perspectiva de Niessen como o conhecimento de valores que transcendem as fronteiras nacionais e que permitem aos cidadãos tornarem-se cidadãos do mundo (Banks, 2011). 31
Na perspectiva de Cuche (2006), no campo das ciências sociais, o conceito de identidade caracteriza-se pela sua “polissemia” e “fluidez”, a sua definição deve ter em conta a heterogeneidade de qualquer
61
Em síntese, podemos afirmar que a integração, enquanto processo, envolve
o desenvolvimento de interdependências entre indivíduos, grupos e instituições num
determinado território, o qual ocorre num espaço mais ou menos definido, permitindo-
nos a identificação de diferentes níveis/escalas de análise em que essas relações
acontecem (Lindo, 2005). Definindo a integração como um processo dinâmico e
heterogéneo, que abarca uma dimensão relacional, uma dimensão temporal e uma
dimensão espacial, o estudo das respostas de inclusão de comunidades imigrantes
em meio escolar exige, para além do conhecimento da população imigrante e da sua
relação com a população nativa, a compreensão das dinâmicas das escolas, das
características dos territórios em que estas se inserem e das orientações da política
educativa nacional no domínio da imigração. A compreensão de cada um destes
níveis (macro, meso e micro) e a análise das interacções e interdependências que
entre eles se estabelecem contribuirão, certamente, para a identificação das diferentes
dimensões e percursos do processo de integração desenvolvido à escala da escola.
A diversidade de modelos que, desde o final da II Guerra Mundial, surgiu para
explicar a relação que os imigrantes e seus descendentes desenvolvem com os
territórios de acolhimento, no sentido da sua incorporação, alerta-nos para a
multiplicidade de formas que este processo pode assumir e que, como tal, é
susceptível de induzir em interpretações diversas, consoante o foco de análise
(cultural, social, económico) e as variáveis mobilizadas em cada paradigma.
A escola de Chicago apresentou-nos um primeiro conceito para entender e
interpretar a adaptação dos imigrantes e seus descendentes – Parks race relations
cycle of contact, competition, accomodation and eventual assimilation, o qual
representa um primeiro esforço para analisar, em larga escala, as migrações no séc.
XIX e início do séc. XX, fundado numa dimensão cultural. Vários autores que
mobilizamos na análise anterior, apesar de reconhecerem as limitações da teoria
clássica da assimilação, têm recorrido ao conceito introduzindo-lhe reformulações que
lhe confiram maior pertinência teórica e analítica, e tornem exequível a sua aplicação
na investigação sobre as migrações actuais e a convivência em sociedades
multiculturais. Destes estudos, resultam abordagens múltiplas dos modos de
incorporação, assim como são identificados diversos factores, próximos e distantes,
individuais e de grupo, que influenciam o percurso que os imigrantes realizam desde a
sua chegada ao “novo” território. Estes trajectos, iniciados na primeira geração,
prolongam-se pelas seguintes, tendo desfechos diversos em função dos contextos
sociais, económicos, culturais e políticos em que decorrem, mas também como
grupo social. “Na medida em que resulta de uma construção social, participa da complexidade do social.” (p. 133).
62
resultado das acções individuais e das diferentes formas de capital que é possível
mobilizar, pelo individuo ou pelo grupo que procura integrar-se na “nova” sociedade.
A abordagem teórica que acabámos de fazer à integração tomou por
referência alguns dos modelos que foram experimentados pela sociedade americana.
Por se tratar de uma sociedade onde a imigração acompanhou a história do próprio
país, são diversos os estudos que têm sido desenvolvidos no sentido de compreender
as múltiplas formas de integração dos imigrantes. Porém, a transferência das teorias
desenvolvidas noutros contextos para o contexto europeu e mesmo para o nacional
requer alguma atenção. Para Crul e Shneider (2012), a realidade das cidades
europeias é de super diversidade, sendo difícil a vivência de processos de assimilação
segmentada. Sustentados nestes pressupostos, os autores assumem que as
diferentes posições que podem surgir no decorrer da integração são devidas
fundamentalmente aos contextos e às circunstâncias. Assim, um dos grandes
contributos para o debate teórico sobre a integração é a valorização dos contextos
nacionais como factor crucial de todo o processo e, reportando-se ao território europeu,
os autores reforçam a ideia da existência de mecanismos e instituições muito
diferentes dos descritos na teoria da assimilação segmentada de Portes e Zhou. É
partindo desta constatação que situam os investigadores europeus perante o desafio
de formularem um quadro teórico que reflicta o continente, as instituições que nele
existem, as realidades e os seus grupos. Uma teoria que tenha, em consideração,
prioritariamente, a importância dos contextos nacionais e/ou locais de integração.
À escala da Europa, a diversidade de políticas de integração em países com
contextos multiculturais é grande e não nos reportamos de modo indiferente à
integração vivida nos países da Escandinávia, na França, na Alemanha e na Holanda.
Os contextos históricos, culturais, sociais e políticos são distintos e os discursos
nacionais influenciam claramente as concepções de integração que se definem em
cada Estado. Por outro lado, ao nível da cidade as orientações são particulares,
existindo também particularidades nos processos das agências e instituições sociais
nas respostas às necessidades específicas dos imigrantes e seus descendentes,
assim como da diversidade cultural da população que nela habita, incluindo os nativos
(Crul & Shneider, 2012).
No âmbito da educação e das instituições de educação, as diferenças que se
encontram nas formas e processos de integração devem-se, em linhas gerais, aos
contextos nacionais e locais em que estas se inserem quer do ponto de vista das
orientações da política nacional, quer da política local, mas também das
características do território e do público que servem. Tal como para o mercado de
trabalho, a habitação e a saúde, os contextos de integração escolar são diversos nas
63
cidades europeias, mas também o são nos territórios nacionais e mesmo à escala da
cidade ou da região as diferenças podem existir. Nesta perspectiva, os sistemas
educativos oferecem diferentes “janelas” de oportunidades, mobilizam de formas
diversas as famílias e desenvolvem uma multiplicidade de estratégias no acolhimento
da diversidade. Por seu turno, a comunidade ou os grupos, não são estáticos ou fixos
(Alba & Nee, 2003), criam estratégias diversas de integração, estão predispostos para
a interacção de diferentes formas, constroem múltiplos sentimentos de pertença
individuais e institucionais, transportam perspectivas diversas face aos percursos no
território de acolhimento.
O modelo que orienta a análise da integração, de crianças e jovens
imigrantes, em contexto escolar combina, na lógica definida por Gimenez Romero
(2010) e Crul & Shneider (2012), a importância dos contextos de acolhimento, com o
papel fundamental da articulação entre comunidades, estrutura de oportunidades e
atitudes individuais propostas por Portes (1999) e Zhou (2005). Estes diferentes níveis,
institucional, colectivo e individual, apresentam-se de forma articulada, como propõem
Penninx e Martiniello (2010).
64
65
3. Os estudos sobre a integração de descendentes de imigrantes
Dedicamos este ponto à apresentação de alguns projectos de investigação
realizados no âmbito da temática da educação e integração de descendentes de
imigrantes. Num primeiro momento centramo-nos nos estudos internacionais e, em
particular, nos projectos desenvolvidos nos EUA e na Europa; num segundo momento,
expomos estudos realizados a nível nacional, procurando fazer o estado da arte
relativo à produção científica que desde os anos 90, mobiliza a temática da educação
e integração de descendentes de imigrantes.
A análise destes estudos permite i) situar a investigação que nos
encontramos a desenvolver; ii) analisar a evolução da investigação realizada, do ponto
de vista conceptual; iii) conhecer metodologias de abordagem à temática e de
organização e recolha de informação e, iv) identificar as teorias e práticas dominantes
noutros países, sobre a integração de crianças e jovens descendentes de imigrantes
em contexto escolar.
3.1. Os estudos internacionais
O ponto de partida centra-se num estudo recente organizado por Crul e
Mollenkopf (2012) que compara os percursos da segunda geração de imigrantes nos
EUA e na Europa. Este estudo apresenta sucintamente os principais projectos sobre a
temática da integração de descendentes de imigrantes realizados nos dois lados do
Atlântico. De modo a complementar a informação que nos é disponibilizada neste
trabalho pesquisámos outros projectos realizados na Europa sobre imigração e
educação.
Os primeiros estudos internacionais realizados sobre os descendentes de
imigrantes desenvolvem-se nos EUA. A constatação da entrada precoce no mercado
de trabalho por parte de uma geração (segunda geração) que frequentemente não
terminava a sua escolarização desafiou as primeiras investigações levadas a cabo por
Alexandro Portes e Rubén Rumbaut. Estes investigadores realizaram o primeiro
estudo em larga escala sobre os filhos dos imigrantes e as relações com o sucesso
escolar. Intitulado Children of Immigrants Longitudinal Study (CILS), este trabalho foi
desenvolvido na cidade de Nova Iorque com estudantes com quinze e mais anos
nascidos nos EUA ou chegados ainda nas primeiras idades, até à adolescência.
Através do trabalho de campo realizado, com a aplicação de questionários aos
estudantes, foi possível construir uma base de dados longitudinal, abarcando um
66
conjunto diverso de variáveis. Esta investigação deu origem a vários livros e números
especiais de revistas.32
Na sequência deste estudo desenvolve-se posteriormente um segundo
trabalho que pretende comparar os resultados escolares das crianças imigrantes com
as nativas. Dirigido por uma equipa de quatro investigadores (Philip Kasinitz, John
Mollenkopf, Mary Waters e Jennifer Holdaway), o estudo centra-se na segunda
geração,33 mas alarga-se também à geração 1.534 e aos grupos nativos que residem
na área metropolitana de Nova Iorque em 1999. Intitulado ISGMNY, este projecto
mobilizou jovens oriundos de grupos diversos (dominicanos, afro-caribenhos, chineses,
colombianos, equatorianos, peruanos e judeus com origem na Rússia ou outros
territórios da União Soviética) e três grupos de comparação (brancos, afro americanos
e porto-riquenhos descendentes de pais nativos). Além dos 3 415 questionários
realizados telefonicamente, a equipa de investigadores utilizou informação adicional
recolhida em institutos nacionais, entrevistas em profundidade a 330 respondentes dos
questionários e estudos etnográficos em sítios chave de interacção entre jovens da
segunda geração e nativos. Os resultados da investigação foram publicados em
alguns livros, artigos de revista e em comunicações a congressos.35
Os resultados alcançados impulsionam uma segunda investigação em Los
Angeles, o IIMMLA. A equipa da universidade da Califórnia, responsável pelo desenho
do questionário, baseia-se no modelo anterior introduzindo algumas modificações,
alargando a idade dos respondentes e incluindo a primeira geração de imigrantes
mexicanos e a terceira e gerações seguintes dos indivíduos com origem mexicana. O
questionário abrange os grupos mais representativos com origem em El Salvador,
Guatemala, China, Coreia, Vietname, Filipinas, incluindo outros grupos imigrantes, e
comparando os resultados com os questionários realizados aos brancos e afro-
americanos com pais nativos. O questionário foi aplicado em 2004 e os resultados
foram já publicados em alguns artigos.
Os resultados destes dois projectos foram fundamentais pelo debate que
desencadearam sobre as trajectórias da segunda geração nos EUA.
Na Europa, em simultâneo com os dois trabalhos anteriores, inicia-se o
estudo da segunda geração europeia. Tribalat (1995) em França, Crul (1994) na
32
Referimos a título de exemplo a publicação Legacies: the Story of the Immigrant Second Generation. (2001). 33
A Segunda Geração é definida como as crianças nascidas da primeira geração de imigrantes nos países para onde estes se deslocaram, atendendo à nacionalidade dessas crianças (Crul & Mollenkopf, 2012). 34
A Geração 1.5 é constituída pelas crianças da primeira geração que imigraram para o país de acolhimento com os pais, ainda com pouca idade e que aí cresceram (Crul & Mollenkopf, 2012). 35
Referimos a título de exemplo a publicação Inheriting the Cty: The Children of Immigrants Come of Age. (2008)
67
Holanda, Vennman (1996) e Lesthaeghe (1996) na Bélgica são os autores de
referência desta fase de início da investigação sobre os descendentes de imigrantes.
O primeiro projecto europeu que compara as estratégias nacionais para a integração
da segunda geração intitula-se Effectiveness of National Integration Strategies toward
Second Generation Migrant Youth in Comparative European Perspective (EFFNATIS).
Este projecto, iniciado por Friedrich Heckmann, compara a segunda geração de
grupos em França, Alemanha e Reino Unido, avançando com algumas reflexões para
a Espanha, Holanda, Suécia e Finlândia. 36 A este projecto seguiu-se o estudo
coordenado por Maurice Crul e Jans Schneider, o TIES Project, The Integration of the
European Second Generation, iniciado em 2005 e que compara a segunda geração de
jovens adultos com idades entre 18 e 35 anos e a população nativa em quinze cidades
europeias 37 localizadas em oito países. Este projecto recorre aos modelos de
questionário e às experiências dos projectos americanos. Foram inquiridos cerca de
10 000 indivíduos. Os grupos de imigrantes que integram a amostra são provenientes
de três países, Turquia, ex-Jugoslávia e Marrocos, tendo todos nascidos na Europa. A
principal finalidade é comparar os percursos de jovens com a mesma origem étnica
em cidades e países diferentes. Para tal, um dos primeiros objectivos era analisar as
especificidades e contextos das cidades e dos países na promoção da integração da
segunda geração. Num segundo momento, a pesquisa orientou-se para as instituições
locais, escolas, mercado de trabalho, políticas de cidadania e anti-discriminação. Os
resultados da comparação internacional foram publicados em 2012 num volume
intitulado The European Second Generation Compared: Does the Integration Context
Matter?, mas existe também um conjunto de separatas nacionais, artigos e papers
disponíveis no sítio do TIES.
Num momento posterior, os investigadores envolvidos nos estudos ISGMNY,
IIMMLA e TIES desenvolveram um estudo comparativo transatlântico que publicam na
recente obra The Changing Face of World Cities (2012). Para este estudo os autores
mobilizam os grupos mais representativos em cada cidade, não apenas por serem os
que detêm maiores quantitativos, mas também pelas características que apresentam,
pelas semelhanças na origem e motivações para a emigração, pelo grau de instrução
de que são portadores e condições de habitação no destino. Os grupos envolvidos são
os dominicanos (Nova Iorque), os mexicanos (Los Angeles) e os turcos (Europa).
36
O relatório final deste projecto intitulado Effectiveness of Nacional Integration Sstrategies Towards Second Generation Migrant Youth in a European Comparative Perspective, encontra-se publicado por Heckman, Lederer e Worbs (2001). 37
As cidades envolvidas são Paris e Estrasburgo em França, Berlim e Frankfurt na Alemanha, Madrid e Barcelona em Espanha, Viena e Linz na Áustria, Amesterdão e Roterdão na Holanda, Bruxelas e Antuérpia na Bélgica, Zurique e Basel na Suiça e Estocolmo na Suécia.
68
Ainda integrado nos projectos europeus, o projecto Ethnic Differences in
Education and Diverging Propspects for Urban Youth in na Enlarged Europe
(EDUMIGROM), iniciado em 2008, explora num conjunto de nove países (República
Checa, Dinamarca, Alemanha, França, Hungria, Roménia, Eslováquia, Suécia e Reino
Unido), de que forma os sistemas educativos, políticas educativas, práticas e
experiências em regimes políticos diferentes contribuem para o processo de
“minorização”. Pretende-se saber de que forma as práticas na educação obrigatória
levam à redução, manutenção ou desaparecimento das desigualdades nas
oportunidades dos jovens no acesso ao mercado de trabalho, nos contactos sociais,
nas relações interétnicas e estratégias de formação da identidade entre adolescentes
com origens diversas. O estudo, focado na forma como as escolas moldam as
posições e perspectivas de adolescentes da segunda geração e de jovens de origem
cigana, define como metodologia de recolha de informação a aplicação de
questionários (5 086) em turmas de escolaridade obrigatória, com idade entre 14 e 17
anos. Estes questionários, aplicados a vinte e cinco grupos étnicos, são
complementados pela recolha de informação através de entrevistas qualitativas com
diferentes actores e intervenientes, focus-grupo com estudantes, pais e professores,
observação de aulas, estudo etnográfico nas escolas e fora delas e estudos de caso
com organizações civis. Alguns resultados deste estudo foram já publicados em
papers disponíveis no sítio do projecto38 e que permitiram sintetizar, em linhas gerais,
as principais intenções e orientações que apresentamos (Szalai, 2011a; Szalai, 2011b).
Os projectos que acabamos de expor, por se centrarem em aspectos da
integração que consideramos centrais para o presente trabalho, servir-nos-ão de
suporte à análise dos questionários aplicados às crianças e jovens imigrantes e
nativas e respectivas famílias em escolas da AML.
3.2. Os estudos nacionais
Em Portugal, é com o pós 25 de Abril de 1974 que chegam à escola crianças
oriundas de culturas diversas. É num intervalo temporal relativamente curto que ocorre
a descolonização, a abertura do país à Europa e a sua posterior integração nos
circuitos migratórios internacionais, ao mesmo tempo que se vivem os primeiros
passos na democratização do ensino. Após a chegada das populações com origem
nos PALOP, na sequência da descolonização, assistimos, ainda na década de 80, à
entrada dos primeiros brasileiros. A estes imigrantes vêm juntar-se, a partir de meados
38
Ethnic Differences in Education and Diverging Prospects for Urban Youth in an Enlarged Europe. http://www.edumigrom.eu/ .
dos anos 90, os europeus de leste e uma nova corrente migratória brasileira que
atinge o seu auge nos primeiros anos do séc. XXI, quando também se intensifica a
presença de populações asiáticas com origens diversas.
Num estudo que elaborámos recentemente sobre a integração das crianças e
jovens descendentes de imigrantes em escolas localizadas no centro histórico de
Lisboa,39 tivemos oportunidade de proceder a uma revisão dos estudos e trabalhos
produzidos no âmbito da temática e que mobilizamos agora para uma breve
apresentação do estado da arte em Portugal sobre a integração de imigrantes em
contexto escolar. Apesar de não existir um estudo que abarque as dimensões da
integração que pretendemos analisar, optámos por orientar este levantamento para os
diversos trabalhos que têm implícita a intenção de estudar a relação entre populações
imigrantes e escola.
Os primeiros estudos sobre a educação de populações migrantes nas escolas
portuguesas surgiram na década de 90 associados, fundamentalmente, às
dificuldades decorrentes da integração em meio escolar de alunos originários dos
PALOP. São referência desta fase inicial de investigação os trabalhos de: Cardoso
(1997), sobre a imagem dos professores relativamente à escolarização das crianças
de origem africana; Cortesão e Stoer (1995a, 1995b, 1996, 2000) e Stoer e Cortesão
(1999a, 1999b) centrados na educação inter/multicultural; Vieira (1995, 1999a, 1999b)
em torno da formação de professores e interculturalidade; Villas-Boas (1999) sobre a
relação família escola entre as minorias étnicas imigrantes e Seabra (1994, 1999,
2000), incidindo sobre etnicidade, família e socialização das crianças imigrantes na
escola, em particular de origem africana.
Nos últimos anos, o número de estudos tem aumentado e têm-se
diversificado as áreas de investigação sobre a temática da educação e imigração,
facto que associamos à intensificação e diversificação dos fluxos migratórios com
destino ao País e, em particular, à Área Metropolitana de Lisboa. O aumento do
número de alunos de diferentes origens geográficas, nas escolas portuguesas, tem
colocado interrogações, em particular junto do corpo docente e dos órgãos de gestão,
relacionadas maioritariamente com as estratégias a adoptar para incorporar os recém-
chegados nos novos contextos. As questões que emergem mais frequentemente
centram-se nas relações interétnicas em meio escolar, na relação entre famílias
imigrantes e escola, na exclusão social em meio escolar, no desempenho escolar dos
alunos imigrantes, no ensino e aprendizagem de conteúdos disciplinares específicos.
39
O estudo intitula-se Educação e Imigração: A Integração dos Alunos Imigrantes nas Escolas do Ensino Básico do Centro Histórico de Lisboa. (Hortas, 2012).
70
A escassa divulgação de informação estatística sobre os quantitativos de
alunos estrangeiros nas escolas portuguesas, sobre o seu desempenho escolar e os
percursos que realizam tem conduzido, por vezes, a generalizações e construções
estereotipadas em relação ao seu perfil, associadas a situações de insucesso e
violência escolar, divulgadas frequentemente pelos órgãos de comunicação social.
A informação estatística que se encontra disponível no sítio do Gabinete de
Estatística e Planeamento da Educação (GEPE)40 está neste momento desactualizada
face à dimensão e diversidade da população estrangeira nas escolas portuguesas. Só
o contacto directo com GEPE permite obter os dados recentes (anos lectivos de 2008-
2009 e 2009-2010) para uma análise da dimensão e dispersão actual dos alunos
estrangeiros nas escolas portuguesas, aspecto a que já nos referimos anteriormente.
Neste sentido, é ainda muito incipiente o conhecimento dos quantitativos e diversidade
dos alunos estrangeiros que frequentam o sistema de ensino português, assim como é
escassa, ou quase inexistentes, a investigação desenvolvida com base neste suporte
estatístico.
A nível europeu e mundial, é possível ter acesso a diversos estudos que
integram informação sobre Portugal, em particular os que comparam desempenhos
escolares entre alunos imigrantes e nativos (PISA, 2009; Relatório de
Desenvolvimento Humano, 2009) e os que medem o investimento dos países em
políticas e medidas educativas para a integração de populações migrantes (Relatório
Eurydice, 2004; Relatório de Desenvolvimento Humano, 2009; Relatório do MIPEX III,
2011). A informação disponibilizada por estes estudos permite um melhor
conhecimento sobre a realidade portuguesa, comparativamente a outros países, e a
desconstrução de algumas imagens menos positivas associadas ao desempenho dos
alunos estrangeiros.
O investimento na publicação de estudos sobre a educação de populações
migrantes, levado a cabo pelo Observatório da Imigração, revela uma preocupação
com esta temática, nomeadamente no que diz respeito à necessidade de conhecer
melhor e divulgar as características deste público escolar, os principais problemas
vividos na escola e as práticas desenvolvidas no sentido da sua integração. Citamos
como exemplo os estudos de Seabra, Mateus, Rodrigues e Nico (2011); Silva e
Gonçalves (2011); Marques e Martins (2005) e a publicação de teses de mestrado e
doutoramento concluídas nos últimos anos no âmbito desta temática (Casimiro, 2008;
Mirotshnik, 2008; Araújo, 2008; Martins, 2008 e Pires, 2009).
40
Gabinete do Ministério da Educação, criado pelo decreto regulamentar nº 25/2007, de 29 de Março. http://www.gepe.min-edu.pt/np4/estatisticas.
Para além da investigação realizada no âmbito da formação avançada,
encontram-se também em curso projectos de investigação que procuram dar
continuidade a algumas das linhas de investigação anteriormente apresentadas e
avançar com novas temáticas de pesquisa. A maioria destes projectos está a ser
desenvolvida em centros de investigação das universidades localizadas em Lisboa.
Desses centros podemos referir, a título de exemplo, o Centro de Investigação e
Estudos de Sociologia, do Instituto Superior das Ciências do Trabalho e Empresas; o
Grupo de Investigação em Currículo e Formação de Professores, do Instituto de
Educação; o Centro de Estudos de Sociologia, da Universidade Nova de Lisboa; o
núcleo de Investigação MIGRARE – Migrações, Espaços e Sociedades, do Centro de
Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa; e, também, o Centro de Estudos das
Migrações e Relações Interculturais, da Universidade Aberta.
72
73
4. Finalidades, fontes e linhas metodológicas
No último ponto da Parte I deste estudo pretende-se explicitar as finalidades e
os objectivos gerais a que nos propomos chegar no decorrer da investigação,
identificar as fontes de informação e apresentar as principais opções metodológicas
orientadoras da pesquisa.
A partir do tema da investigação, Educação, Diversidade e Território, e do
modelo de análise anteriormente apresentado (sustentado nos conceitos-chave
integração e diversidade), são definidas três grandes finalidades que se subdividem
em objectivos gerais e que norteiam a investigação.
O percurso até à definição dos objectivos implicou a realização de algumas
leituras centradas na temática da integração social e, em particular, na integração em
contextos de diversidade. Estas leituras permitiram a identificação de outros conceitos
a mobilizar em dimensões específicas da análise, a identificação das escalas de
análise (macro, meso e micro) em que a integração deve ser estudada e que, numa
investigação de cariz geográfico são fundamentais para a compreensão da
interrelação entre os diferentes níveis em que o fenómeno é vivido (Brettell & Hollifield,
2008).
Definido um primeiro esquema de análise é importante, num momento
seguinte, proceder à pesquisa sobre as fontes de informação e à identificação das
técnicas de recolha que melhor se adequam às finalidades e objectivos do estudo.
Esta pesquisa teve como pano de fundo o esquema de análise, as finalidades e os
objectivos, procurando assegurar que a informação recolhida fosse coerente com as
linhas orientadoras e permitisse conduzir a investigação no sentido definido.
A encerrar este percurso definem-se as linhas metodológicas que,
sustentadas na problemática e mobilizando os dados quantitativos e a informação
qualitativa que foi possível recolher, viabilizam o percurso da investigação.
4.1. Finalidades
A macro-análise que pretendemos realizar incide na procura de informação
que nos permita (i) compreender o lugar da educação de populações imigrantes nas
orientações da política europeia de integração; (ii) situar Portugal no contexto das
políticas de integração europeias, enfatizando o acesso à educação de populações
imigrantes. A primeira grande finalidade deste estudo sobre educação e integração de
crianças e jovens imigrantes, pode definir-se do seguinte modo: contextualizar, no
tempo, as mudanças na definição da política europeia e nacional de integração
74
de populações imigrantes, especificamente no que diz respeito à valorização da
educação, na sequência da intensificação e diversificação dos fluxos migratórios com
destino à Europa, em particular aos países da União Europeia mais desenvolvidos.
Esta finalidade decorre da problemática definida, mais concretamente da
abordagem transversal da integração em três níveis de análise e que considera no
primeiro nível as respostas políticas à integração. Centramo-nos, em primeiro lugar, no
nível europeu, pelo reconhecimento do esforço iniciado nos anos 90, pela Comissão
Europeia e pelos estados membros, no sentido da valorização da educação na
definição da sua política de integração de populações imigrantes. Sendo cada estado
membro autónomo na definição da sua política educativa, importa compreender de
que forma a sua pertença a um território comum tem orientado as opções políticas de
educação, em particular no que às populações imigrantes diz respeito.
Reconhecendo que a reorientação da política de integração europeia tem tido
um impacto significativo na definição de linhas orientadoras das políticas nacionais, no
sentido da valorização da diversidade cultural, e que a política de integração
portuguesa se encontra bem posicionada nos estudos internacionais, importa
compreender as dinâmicas que têm sido desencadeadas pelo país no sentido de, por
um lado, acompanhar os desafios colocados pela Europa e, por outro, acolher a
diversidade de populações que reflecte um momento particular da história nacional
nos fluxos migratórios internacionais.
Ao nível da macro-análise, definimos para esta primeira finalidade três
objectivos que concorrem para a sua compreensão. Em primeiro lugar pretende-se
identificar a valorização que é feita da educação na política de integração europeia,
dando ênfase às mudanças que ocorreram desde os anos 90, período de referência
na intensificação dos movimentos migratórios com destino à Europa. Com este
objectivo propomo-nos fazer uma abordagem às orientações que são feitas pela União
Europeia no âmbito da valorização da educação de populações migrantes nos países
de acolhimento e ao tratamento que esta temática tem tido nos documentos oficiais
divulgados a partir desta instituição. Definidas as orientações europeias propomo-nos,
num momento seguinte, identificar as mudanças que têm ocorrido na política
educativa nacional, no sentido da integração em contexto escolar de crianças e jovens
descendentes de imigrantes. Tendo em conta que, em Portugal, as alterações na
política educativa que visam a integração de populações migrantes são recentes e têm
acompanhado a história da imigração portuguesa, este capítulo termina
contextualizando o país no quadro mais alargado da União Europeia no sentido de
posicionar a política portuguesa de integração de populações imigrantes em contexto
75
escolar relativamente a outros países europeus, e que definimos como o terceiro
objectivo da primeira finalidade do presente estudo.
Contextualizada a temática da investigação no quadro das políticas de
integração (macro-análise), e reconhecida a importância das orientações europeias na
definição da política nacional, posicionando Portugal no quadro europeu em matéria
de acolhimento de alunos imigrantes no sistema educativo, conduzimos agora o
estudo na caracterização da população de origem imigrante que frequenta as escolas
em Portugal e na Área Metropolitana de Lisboa, região onde se localizam os territórios
que mobilizamos para este trabalho. Esboçado o nível meso de análise, importa então
definir a grande finalidade que orienta esta parte da investigação: caracterizar a
população imigrante que frequenta o sistema de ensino português, a sua
distribuição no território (continental) e na Área Metropolitana de Lisboa,
identificando as suas dinâmicas económicas e socioculturais.
A resposta a esta finalidade alicerça-se na necessidade de dar a conhecer os
protagonistas da imigração em contexto escolar e avançar com alguns factores
estruturais que permitem caracterizar as dinâmicas subjacentes aos percursos
escolares por estes realizados no sentido da sua integração.
O reconhecimento da dimensão da imigração, da diversidade de origens e da
territorialização da imigração à escala nacional e regional possibilita (i) a
contextualização dos territórios em estudo, antecipando possíveis dinâmicas que
caracterizam a população imigrante num contexto local específico; (ii) a análise das
dinâmicas económicas e socioculturais associadas à região metropolitana; (iii) uma
visão alargada desta área geográfica e o posicionamento dos territórios em estudo no
contexto mais vasto em que se inserem.
Assim, esta finalidade passa pela concretização de três objectivos gerais que
permitem uma caracterização do país e da Área Metropolitana de Lisboa como
territórios de acolhimento de populações imigrantes e, em particular, da diversidade
cultural que é vivida nas escolas. O primeiro objectivo, consiste em identificar a
dimensão, origens e distribuição dos estudantes imigrantes em Portugal e na Área
Metropolitana de Lisboa, traçando um primeiro perfil da diversidade cultural que
frequenta as escolas em diferentes regiões (NUT II) e posicionando as escolas da
Área Metropolitana de Lisboa face à dinâmica nacional. O segundo objectivo decorre
de uma primeira análise muito restrita da integração a partir dos resultados do sucesso
escolar dos alunos inscritos nas escolas da AML, identificando, ainda que apenas
sustentadas em dados de natureza quantitativa, a relação destes estudantes com o
sistema de ensino nacional. Pretende-se assim caracterizar a relação dos alunos
imigrantes no ensino básico com o sistema de ensino nacional com base nos
76
resultados do sucesso escolar. A completar esta caracterização, é nossa intenção
encontrar alguns factores explicativos do sucesso escolar com recurso a variáveis de
cariz social, cultural e económico. Na resposta a este desafio, que possibilita a análise
de algumas dimensões estruturais da integração desenha-se o terceiro objectivo,
identificar os factores que asseguram ou inibem o sucesso escolar dos estudantes
imigrantes e dos nativos no território metropolitano.
Caracterizada a população imigrante que frequenta o sistema de ensino
português e, em particular as escolas da AML, e identificados alguns dos factores
explicativos da dimensão sucesso escolar para os estudantes deste território,
propomo-nos prosseguir com uma análise que permita, com recurso a um maior leque
de variáveis e centrada em contextos locais, compreender as dinâmicas de
integração dos estudantes imigrantes do ensino básico em escolas localizadas
em diferentes territórios da AML. Definimos assim a terceira grande finalidade deste
estudo, para a qual é esperado que seja possível identificar as dimensões da
integração em contexto escolar que ultrapassem a debilidade da análise circunscrita
ao sucesso escolar. Para tal centramo-nos em três territórios da AML que, pelas
características sociais, económicas e urbanas que os identificam e, pela sua história
no acolhimento de populações imigrantes, reúnem as condições definidas para
integrar o caso de estudo que permitirá, à escala micro, reconhecer os percursos de
integração de crianças e jovens imigrantes em contexto escolar, e identificar os
factores explicativos destes percursos na óptica dos três principais intervenientes no
processo: a escola, os alunos e as famílias. O primeiro objectivo consiste em
caracterizar a população imigrante que frequenta as escolas dos dois concelhos da
AML, contextualizando os territórios em estudo, identificando assim as particularidades
da população escolar em cada um dos territórios concelhios. Apresentados os
territórios e contextualizados os casos de estudo, importa concretizar a política de
escola seguida no sentido de uma actuação pedagógica que contemple, entre outros
aspectos, a integração social de crianças e jovens imigrantes, garantindo-lhes o
desenvolvimento de competências que assegurem a sua convivência na sociedade de
destino e facilitando, ao mesmo tempo, a mobilização do capital social de que são
portadores. Deste último aspecto surge a formulação de um segundo objectivo, a
saber, caracterizar as políticas de escola no sentido da integração de alunos
imigrantes. Contudo, na definição do conceito de integração que norteia este estudo,
os alunos imigrantes e as suas famílias têm um papel activo em todo o processo,
interagindo com a escola e com o meio. Assim, deseja-se que na escola as crianças e
jovens realizem as aprendizagens que lhes asseguram o exercício de uma cidadania
activa que ultrapasse a sala de aula e o contexto escolar. Porém, neste processo que
77
em parte se constrói diariamente na escola, é esperado o envolvimento da família não
apenas pelo importante papel no acompanhamento dos percursos escolares das
crianças e jovens, mas no sentido de uma intervenção activa em articulação com o
contexto escolar. As melhores expectativas que se podem depositar na escola saem
certamente defraudadas se as acções para a sua concretização não envolverem todos
os actores do processo educativo. É nesta perspectiva que surge o terceiro objectivo
desta grande finalidade, que se traduz na intenção de reconhecer os processos de
interacção entre escola, alunos e famílias que promovem ou inibem a integração.
A encerrar a abordagem à terceira grande finalidade definida, pretende-se
mobilizar a análise que decorre dos processos de integração desencadeados pela
escola, pelos alunos e pelas famílias para, através destes, identificar os factores que
asseguram a integração dos alunos em contexto escolar.
Em síntese, são três as grandes finalidades que orientam a presente
investigação: (i) contextualizar, no tempo, as mudanças na definição da política
europeia e nacional de integração de populações imigrantes e, especificamente no
que diz respeito à valorização da educação; (ii) caracterizar a população imigrante que
frequenta o sistema de ensino português, a sua distribuição no território (continental) e
na Área Metropolitana de Lisboa, identificando as suas dinâmicas económicas e
socioculturais e, (iii) compreender as dinâmicas de integração dos estudantes
imigrantes do ensino básico em escolas localizadas em diferentes territórios da AML.
Relacionadas com estas finalidades estruturamos este trabalho em três partes: A
Educação nos Percursos da Integração; Imigração e População Escolar; e, Percursos
de Integração de Crianças e Jovens Imigrantes.
4.2. Fontes e linhas metodológicas
A definição das linhas metodológicas a seguir é resultado da articulação entre
finalidades e objectivos gerais anteriormente elencados, mas também das
condicionantes associadas à temática, em particular nos aspectos que se reportam à
disponibilização de informação coerente com os espaços e tempos do universo em
análise.
A resposta à primeira finalidade definida desenvolve-se, na sua essência, a
partir da análise da bibliografia produzida sobre as políticas de integração europeia,
incluindo relatórios de projectos europeus realizados no âmbito das temáticas da
multiculturalidade e interculturalidade. Estas leituras são complementadas pela
exploração de diversos instrumentos de política da Comissão Europeia que incluem
aspectos legais (regulamentos, directivas e decisões), medidas políticas e leis “ligeiras”
78
(comunicações, green papers, white papers, resoluções, opiniões, recomendações,
conclusões).
Para o caso português, as leituras orientadas para as políticas de integração
são complementadas pela consulta dos normativos legais publicados em Diário da
Republica sobre políticas educativas e acolhimento de populações imigrantes. A
consulta destes documentos não dispensa: (i) o recurso à documentação diversa
disponível no sítio do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural
(ACIDI) sobre educação, multiculturalidade e diversidade cultural (estudos, programas,
legislação, relatórios, teses); (ii) a consulta dos documentos disponibilizados pela
Direcção Geral de Educação – DGE (projectos, legislação, relatórios).
A análise da posição de Portugal relativamente a outros países europeus, em
matéria de política educativa direccionada para a integração de crianças e jovens
imigrantes em contexto escolar, resulta da consulta de relatórios de avaliação
publicados no âmbito das Nações Unidas – Relatório de Desenvolvimento Humano
(2009); da Comissão Europeia – Relatórios Eurydice (2003/04, 2009) e do Migration
Policy Group e British Council – Migrant Integration Policy Índex (MIPEX III, 2011).
Para a segunda finalidade, de cariz mais quantitativo, recorremos aos dados
estatísticos publicados pelo Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação
(GEPE) para os anos lectivos de 2008-09 e 2009-10. Esta informação, não publicada,
começou por ser solicitada ao gabinete no início do estudo contudo, nesse momento,
os dados estatísticos disponíveis estavam desactualizados em termos temporais. O
facto de Portugal ter assistido, durante a primeira década deste século, ao maior
número de entradas de imigrantes da sua história, em termos quantitativos e da
diversidade de origens, dificultou a disponibilização de informação permanente e
actualizada. Para o ano de 2008-09, o gabinete disponibilizou a informação por NUT II,
freguesia, nacionalidade, ano de escolaridade, modalidade de ensino e situação de
retenção/desistência – transição/conclusão, para todas as escolas de ensino público e
privado. Para o ano de 2009-10, os dados estatísticos encontram-se organizados por
NUT II, escola, freguesia, nacionalidade, ano de escolaridade, modalidade de ensino e
situação de retenção/desistência – transição/conclusão, para as escolas de ensino
público.
Importa salientar as limitações que ao longo da investigação se foram
colocando na recolha da informação estatística actualizada sobre os alunos imigrantes
a frequentar o sistema de ensino português. Os dados a que anteriormente nos
referimos só muito recentemente ficaram acessíveis em suporte informático não tendo
sido alvo de qualquer tratamento estatístico e, como tal foi necessário proceder ao seu
79
tratamento e organização numa base de dados, com recurso ao SPSS, para tornar
possível o seu manuseamento e dar cumprimento aos objectivos definidos.
Um outro aspecto que limitou a análise que nos propusemos desenvolver
reporta-se à ausência de informação quantitativa que permita traçar um quadro
evolutivo da presença de alunos imigrantes nas escolas portuguesas. Os dados
anteriormente referidos pecam por não se reportarem ao mesmo universo de sistemas
de ensino, público e privado. Porém, desde 2003-04 que não era possível ter acesso a
informação estatística que permitisse um conhecimento efectivo dos quantitativos de
imigrantes e das suas origens no sistema de ensino português, com um nível de
desagregação tão elevado.
A primeira publicação de informação sobre os quantitativos e origens de
alunos não nacionais surgiu, em meados dos anos 90, pelo Secretariado Coordenador
dos Programas de Educação Multicultural (Entreculturas),41 actualmente integrado no
ACIDI. Nesta data foram publicados os dados estatísticos, para as escolas públicas
portuguesas, com base no critério “grupo cultural”.42 A transferência desta tarefa, no
final dos anos 90, para o Departamento de Avaliação Prospectiva e Planeamento, sob
alçada do Ministério da Educação – DAPP, depois para o Gabinete de Informação e
Avaliação do Sistema Educativo do Ministério da Educação – GIASE, actualmente
com a designação de Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação – GEPE,
foi introduzindo alterações sucessivas nos critérios de recolha de informação, nas
designações para aluno imigrante e nos universos mobilizados. Nesta última fase, as
estatísticas passaram a abarcar as escolas públicas e/ou as privadas utilizando a
designação de aluno estrangeiro.43 A não coincidência nos critérios de recolha de
informação, pelos motivos que acabamos de expor, condiciona uma análise evolutiva
da população escolar de origem imigrante em Portugal ainda assim, de modo a não
ocultar completamente alguma informação que tornasse possível um olhar diacrónico
sobre o fenómeno optamos por apresentar alguns números, recorrendo a estudos e
estatísticas disponíveis.
Ainda para responder a esta segunda finalidade, em particular ao objectivo
que se reporta à identificação dos factores económicos e socioculturais que inibem ou
asseguram o sucesso escolar dos estudantes no território metropolitano, recorremos
aos dados estatísticos publicados pelo INE no Recenseamento Geral da População
41
O Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural de âmbito exclusivamente educativo surgiu em 1991, foi posteriormente substituído pelo Secretariado Entreculturas, pelo Despacho Normativo 5/2001 de 1 de Fevereiro, ficando na dependência do Ministro da Presidência e do Ministro da Educação. 42
“o aluno é considerado no grupo cultural a que pertencem os ascendentes, mesmo que tenha nacionalidade portuguesa (interessa essencialmente conhcer a sua origem étnico-cultural)”. (Secretariado Entreculturas. Mod. EC nº1/98). 43
Aluno com nacionalidade num país estrangeiro.
80
(2001 e 2011), desagregados ao nível de freguesia, e à informação disponibilizada
pelo GEPE sobre as origens dos estudantes e as situações de retenção/desistência e
transição/conclusão (2008-09).
O estudo, previamente realizado, com recurso à informação estatística
relativa a 2001, para os indicadores económicos e socioculturais, e 2008-09, para os
alunos inscritos nas escolas, permite traçar uma primeira tendência sobre os factores
estruturais que explicam o comportamento da variável sucesso escolar dos estudantes.
Ensaiamos, para tal, vários modelos de regressão linear múltipla passo a passo
(stepwise). A opção pela aplicação da técnica de regressão linear múltipla justifica-se
por esta permitir a análise da relação entre uma variável dependente (y) e um conjunto
de variáveis independentes (x1, x2, x3, … xn). Contudo, num primeiro ensaio realizado,
a distância temporal entre a informação estatística utilizada – pelo facto dos dados
relativos aos estudantes se reportarem a 2008-09 e os dados de caracterização da
população e do território metropolitano a 2001 – colocou alguns problemas na análise
dos resultados finais da regressão múltipla. Esta situação foi posteriormente
ultrapassada com o recurso aos dados estatísticos dos Censos de 2011, recentemente
publicados.
Convém ainda referir que para a análise realizada à escala da AML
recorremos aos dados estatísticos do GEPE para 2008-09 e não para 2009-10 pelo
facto de ser esta a informação que foi possível organizar com maior nível de
desagregação para todas as freguesias deste território. Esta opção resulta da
dificuldade em proceder, em tempo útil, à construção de uma base de dados para
2009-10 com um nível de desagregação semelhante. O momento em que foi
disponibilizada a informação pelo GEPE para o ano lectivo de 2009-10 não permitiu,
no tempo de que ainda dispúnhamos, a construção de uma base de dados
desagregada para todas as freguesias da AML. Contudo, foi possível constatar que
entre os dois momentos temporais, as diferenças em termos de quantitativos de
alunos e das tendências registadas no sucesso escolar para este território não têm
uma expressão relevante. Deixamos apenas a ressalva relativa ao facto de em 2008-
09 os dados estatísticos do GEPE se reportarem ao universo das escolas públicas e
privadas.
A resposta à terceira grande finalidade implica a mobilização de fontes e
técnicas de recolha de informação diversa. A sua concretização implica o
conhecimento: (i) dos territórios que definimos no caso de estudo, no que se refere à
população residente e às características urbanas dos espaços; (ii) dos agrupamentos
de escolas, no que se reporta à composição dos estudantes, e aos aspectos
81
organizacionais e de gestão da diversidade sociocultural e, (iii) dos alunos e das
famílias nos domínios de relação e inserção em contexto escolar.
Considerando os objectivos da terceira finalidade da investigação, centrados
nos casos de estudo definidos, importa clarificar em primeiro lugar os princípios que
orientaram a definição dos territórios no contexto da Área Metropolitana de Lisboa e
proceder à sua identificação. A escolha dos territórios de estudo teve em conta a
ponderação de um conjunto de factores: a presença de populações imigrantes; a
diversidade cultural e étnica; a história como territórios de acolhimento de imigrantes; a
localização geográfica no contexto da área Metropolitana de Lisboa; e as
características urbanas e socioeconómicas. Assim, os territórios visados apresentam
importantes diferenças que se podem definir em três grupos:
a) uma comunidade suburbana já consolidada e com fortes sentimentos
identitários, marcada pelo forte enraizamento de populações africanas,
mas confrontada na actualidade com a chegada de novas populações
quer de origem africana quer de outras nacionalidades, aumentando a
diversidade cultural e o aparecimento de novas tensões interétnicas e
pelo uso do espaço (Agualva/Cacém);
b) um território suburbano de elevada densidade populacional, com um
peso significativo de população de etnia africana ainda em crescimento e
que, pela sua morfologia geográfica e social, sofre múltiplos efeitos de
exclusão social (Monte Abraão);
c) uma área do centro histórico da cidade, “porta de entrada para muitos
imigrantes”, com uma população autóctone envelhecida, na qual residem
diversos grupos culturais e étnicos em constante mobilidade, que revelam
carências a vários níveis e problemas de desintegração social (Mouraria-
Graça e Baixa-Chiado).
Nestes territórios escolhemos para casos de estudo cinco agrupamentos de
escolas do Ensino Básico: na cidade de Lisboa, o Agrupamento L1 serve os bairros
Coração de Jesus, Sacramento, Madalena, São José e Encarnação; os Agrupamentos
L2 e L3 servem os bairros da Mouraria, Anjos, Graça e Sé; no concelho de Sintra, os
agrupamentos de escolas S1 (Monte Abraão) e S2 (Agualva/Cacém).
A escassez de informação estatística actualizada pelo gabinete de estatística
do ME, que garantisse o conhecimento dos quantitativos de alunos imigrantes nas
escolas, impediu que esta variável fosse tida em conta no momento da definição dos
82
territórios para o estudo. Socorremo-nos, apenas, dos quantitativos de população
estrangeira nos concelhos e freguesias da AML.
Posteriormente, foi solicitada às autarquias locais, em particular às
divisões/secções responsáveis pela educação,44 a possibilidade de realização de uma
entrevista de modo a recolher a informação estatística que poderia assegurar que os
agrupamentos de escolas seleccionados acolhiam um número significativo de alunos
não nativos. Foram contactadas as divisões de educação de Sintra e de Lisboa,
realizadas entrevistas não estruturadas aos técnicos responsáveis onde se pretendia,
no essencial, conhecer: (i) a presença de alunos imigrantes nas escolas dos
respectivos concelhos; (ii) os projectos desenvolvidos em parceria com a autarquia no
acolhimento dessas crianças e jovens e, (iii) a existência de instituições locais que, em
articulação com a escola, colaborassem na integração destas populações. Este
primeiro contacto, ao mesmo tempo que se revelou de grande importância no
conhecimento da realidade em estudo, confrontou-nos com a dificuldade da tarefa a
que nos propúnhamos, pela não existência de orientações comuns aos dois
municípios na recolha de informação, mas também pela escassez da mesma. No
concelho de Lisboa os registos de alunos em função da sua origem apenas se
reportavam à educação pré-escolar e ao 1º CEB; o critério utilizado na recolha de
informação é o de “minoria étnica”, 45 surgindo nas tabelas disponibilizadas os
quantitativos de alunos segundo os países de origem e a referência à etnia cigana;
também não se registou uma periodicidade anual na recolha da informação. No
concelho de Sintra, a informação estatística disponibilizada, segundo as origens dos
estudantes, encontrava-se organizada para os três ciclos do EB e do ensino
secundário, para cada escola; o critério utilizado na recolha de informação é o de etnia,
sendo apresentados nas tabelas finais os quantitativos de alunos por país de origem,
acrescidos da etnia cigana; a periodicidade na recolha de informação é anual. Em
nenhum dos territórios, na fase de recolha da informação, eram conhecidos os
quantitativos referentes aos alunos descendentes de imigrantes já nascidos em
território nacional e que se incluem na segunda geração. Neste momento, a autarquia
de Sintra já disponibiliza regularmente online a informação relativa aos quantitativos de
alunos, para todos os níveis de ensino segundo a nacionalidade, assim como a
nacionalidade dos encarregados de educação.46
44
Divisão de Educação de Lisboa – http://www.cm-lisboa.pt/viver/educacao; Divisão de Educação de Sintra - http://cmsintra.malha.eu/moodle/index.php 45
O conceito de minoria étnica e etnia nem sempre foi explícito para os técnicos das escolas responsáveis pelo preenchimento das tabelas de recolha de informação. 46
Esta informação pode ser consultada em: http://cmsintra.malha.eu/moodle/course/view.php?id=40
Definidos os territórios, avançou-se para a recolha de um conjunto de
variáveis que permitisse a sua caracterização socioeconómica e demográfica. Para tal
recorremos, num primeiro momento, aos dados do Recenseamento de 2001. Contudo,
a publicação pelo INE do Recenseamento de 2011 permitiu uma actualização posterior
da informação e a construção de um perfil mais realista dos territórios em estudo. Esta
actualização revelou-se de grande pertinência pelo facto de nos encontrarmos a
trabalhar em espaços que no período intercensitário viveram alterações demográficas
significativas, resultado da chegada de importantes quantitativos de população
imigrante.
Para contextualizar os agrupamentos de escolas definidos para o caso de
estudo nos concelhos em que estes se inserem mobilizámos a informação estatística
disponibilizada pelo GEPE para o ano lectivo de 2009-10. Estes dados quantitativos
foram organizados ao nível de escola e freguesia, nas variáveis que se reportam ao
número de alunos, nacionalidades, ano de escolaridade e modalidade de ensino e
situação de retenção/desistência ou transição/conclusão. A base de dados construída
em SPSS permitiu, através de uma série de cálculos estatísticos, com recurso à
análise de variância ANOVA, e da realização de testes de significância, comparar os
diferentes universos entre si e apresentar uma primeira síntese da posição de cada
agrupamento face ao concelho e da posição dos agrupamentos entre si relativamente
à diversidade de origens dos estudantes e ao sucesso escolar.
A informação estatística a que nos reportamos acima foi também a utilizada
para caracterizar cada agrupamento de escolas. Na impossibilidade de reunir os
dados referentes aos alunos para o mesmo momento temporal e obedecendo aos
mesmos critérios de recolha, junto dos agrupamentos, a opção por esta fonte de
informação apresentou-se-nos como a mais correcta.
Definidos os agrupamentos de escolas, optámos por realizar num primeiro
momento a recolha de informação por observação directa dos territórios em que estes
se inserem, em articulação com os objectivos definidos para a terceira finalidade do
estudo. A observação permitiu reunir um conjunto de informações relativas às
características socioeconómicas dos residentes, à tipologia das habitações, às
dinâmicas sociais de bairro e relações de vizinhança, às instituições públicas e
privadas ao serviço das populações locais, às actividades económicas, assim como
aos usos dos espaços públicos. A opção pelo contacto directo com o território facilitou
o diagnóstico de alguns elementos sócio-espaciais que poderão revelar-se
fundamentais na compreensão dos factores explicativos da fixação da população
84
imigrante e dos laços que esta mantém com o território em que se inserem, o bonding
capital.47
A pertinência deste momento de observação directa justifica-se também pela
importância que o meio local (cultural, social, político, económico) assume. Para além
de espaço de residência dos imigrantes, é também o lugar onde estes mantêm
frequentemente as suas práticas sociais. As oportunidades que estes encontram no
local onde vivem e as relações que nele estabelecem podem proporcionar-lhes novas
formas de mobilidade geográfica, económica e social (Hortas, 2010). Nesta
perspectiva, a composição socioeconómica e cultural dos habitantes na área de
residência, a acessibilidade a bens e serviços, assim como as características da
estrutura urbana do bairro são factores condicionantes do processo de integração dos
imigrantes. O desenvolvimento de instituições no seio dos grupos ou subgrupos, as
relações institucionais entre eles, as interdependências entre recém-chegados e a
população nativa, assim como as respostas dos actores sociais face às oportunidades
que surgem do exterior são, em muitas situações, influenciadas pelas condições de
acolhimento.
O contacto com o território, de cariz exploratório, foi enriquecido pela
oportunidade de realização de entrevistas não estruturadas em algumas instituições
locais que têm como missão, entre outros aspectos, a inclusão de populações
imigrantes. Foram entrevistados três coordenadores de projectos desenvolvidos no
âmbito do Programa Escolhas (dois em Lisboa e um em Sintra) que acolhem crianças
e jovens que frequentam as escolas, um técnico de uma instituição da Sta Casa da
Misericórdia (em Lisboa) que trabalha em articulação com as famílias e as escolas, um
técnico dos serviços de Acção Social da Câmara Municipal de Sintra pelo
conhecimento dos projectos de inclusão existentes no território e da articulação
existente entre escolas e outras instituições. Estas entrevistas permitiram: (i) a
reconstrução da imagem dos territórios; (ii) a identificação de situações de exclusão
neles vividas; (iii) o contacto com as dinâmicas sociais de bairro; (iv) a identificação
das parcerias institucionais existentes no território; (v) o conhecimento da relação das
instituições locais com os órgãos de poder local e com a escola; (vi) o contacto com as
respostas das instituições/projectos entrevistados na integração de crianças e jovens e
respectivas famílias em articulação com a escola. Esta fase do trabalho de campo, um
recurso fundamental na investigação em Geografia, justifica-se neste estudo pelo
47
Ao conceito de capital social associam-se as noções de rede, norma e confiança necessários para a circulação do capital no grupo no sentido da concretização dos objectivos individuais (Field, 2003). Através do bonding capital é possivel reforçar os laços internos entre os indivíduos, desencadeando
mecanismos de trocas e de solidariedade essenciais na sua integração no território de acolhimento; para o grupo, significa garantir e reforçar a coesão social, criando mecanismos de defesa face a adversidades exteriores ( Putman, 1999; Pontieux, 2006).
85
impacto que as dinâmicas geradas pela população imigrante têm ao nível local, no
mercado de habitação, no mercado de trabalho, nos serviços sociais e no sistema de
educação pública, sendo necessária a coordenação de políticas e estratégias que
criem condições para a integração dos recém-chegados (Papademetriou, 2008).
Para a recolha directa de informação, junto das escolas, organizaram-se
quatro instrumentos: guião de entrevista semi-estruturada aos directores de
agrupamento, questionário aos alunos, questionário às famílias e questionário aos
professores titulares de turma no 1º ciclo, e aos directores de turma no 2º e 3º ciclos.
A primeira fase da recolha de informação por observação directa iniciou-se
com a realização de entrevistas semi-estruturadas aos representantes dos cinco
agrupamentos de escolas (Anexo 1), em Outubro de 2008. Esta fase, que se
prolongou até Abril de 2009, facilitou a recolha de um conjunto de elementos
fundamentais sobre o agrupamento e as escolas que o constituem, e possibilitou o
estabelecimento de contactos nas diferentes escolas de cada agrupamento. Estes
revelaram-se fundamentais para a preparação da fase seguinte de aplicação de
questionários a alunos, famílias e docentes das turmas incluídas na amostra,
previamente definida em função do número de alunos e de turmas de cada escola. As
entrevistas organizaram-se a partir de um guião (Quadro I.1), onde se indicam os
objectivos e as variáveis que estiveram subjacentes à construção das questões.
Quadro I.1 – Estrutura da entrevista realizada aos directores de agrupamento
Objectivos Variáveis Questões
Identificar o agrupamento de escolas
Localização
Contactos
Nome das Escolas
Caracterização Agrupamento e do Entrevistado
Caracterizar o entrevistado Nome
Cargo que desempenha no agrupamento
Idade
Género
Anos de permanência na Escola
Anos de permanência no cargo
Anos de docência
Caracterizar as escolas do agrupamento
Localização
Estrutura do edifício
Idade do edifício
Recursos Físicos
Recursos Humanos: pessoal docente e não docente
Nº turmas
Nº alunos por turma
Capacidade/Lotação
Parte I; II
Caracterizar a tendência de Nacionalidade dos alunos Parte III, 1, 2, 3
86
evolução no tempo da chegada dos alunos estrangeiros ao agrupamento (entre 1970 e 2000)
Década de chegada de maiores quantitativos de alunos em função da origem
Caracterizar o perfil sócio económico dos alunos
Nível socioeconómico, atendendo ao grau de instrução, profissão e rendimento das famílias
Carências identificadas nos alunos pelo agrupamento
Parte III, 4,5
Identificar as medidas implementadas pelo agrupamento para combater as carências dos alunos
Medidas implementadas pelo agrupamento no combate às situações de pobreza e carências sociais
Frequência de implementação das medidas implementadas
Parte III, 6,6.1
Caracterizar o envolvimento do agrupamento com a comunidade local
Natureza dos projectos em que o agrupamento se encontra envolvido
Tema dos projectos
Objectivos dos projectos
Parceiros envolvidos
Resultados da participação nos projectos
Parte III, 7, 7.1, 7.2, 7.3, 7.4
Caracterizar a política de integração dos alunos estrangeiros desenvolvida pelo agrupamento
Critérios para a inscrição dos alunos nas escolas
Critérios para a organização das turmas.
Principais preocupações com a integração dos alunos
Referências à integração dos alunos: no Projecto Educativo de Escola, no Projecto Curricular de Escola, nos Projectos Curriculares de Turma, no Plano Anual de Actividades
Critérios para colocação dos recém-chegados nos anos de escolaridade
Critérios de aplicação das directrizes do Ministério da Educação em relação à colocação dos alunos no ano/ciclo de escolaridade correspondente ao percurso anterior
Parte IV, 8, 9, 10, 11, 12.1, 12.2, 12.3, 12.4, 13.1,
Identificar a percepção da direcção do agrupamento, dos alunos e dos funcionários docentes e não docentes relativamente aos alunos estrangeiros.
Fragilidades/Potencialidades identificadas pelo agrupamento
Características dos alunos estrangeiros identificadas pelos pares, pelos docentes e pelo pessoal não docente
Parte IV, 14, 14.1, 20
Caracterizar as medidas pedagógico-didácticas para a inclusão dos alunos estrangeiros.
Tipo de medidas pedagógico-didácticas
Natureza dos projectos em curso
Tipo e modalidades dos apoios institucionais
Estratégias de ensino da língua não materna. Avaliação das estratégias de intervenção: aspectos positivos, aspectos negativos
Parte IV, 15, 15.1, 15.2, 15.3, 16, 17, 17.1, 18, 19, 19.1
Caracterizar o desempenho escolar dos alunos que frequentam as escolas do agrupamento
Taxa de insucesso
Anos de escolaridade com maior taxa de insucesso
Causas do insucesso
Nº alunos que abandonam a escola
% de retenções dos alunos segundo a origem
Factores que justificam o insucesso
Parte IV, 21, 22.1, 22.2, 23, 23.1, 24, 24.2, 24.2
Identificar as medidas para contrariar o insucesso escolar dos alunos.
Tipo de estratégias para reduzir o abandono/ insucesso
Parte IV, 25
Caracterizar o envolvimento das famílias na escola.
Modalidades de envolvimento das famílias nas actividades da escola
26, 27,28, 28.1,
Identificar as Tipo de actividades desenvolvidas pela escola que Parte VI, 29,
87
medidas/estratégias de envolvimento das famílias no agrupamento
mobilizem as famílias 30, 30.1,
Caracterizar as expectativas dos encarregados de educação face à diversidade cultural existente no agrupamento
Tipo de expectativas dos encarregados de educação, oriundos de diferentes culturas, face à escola
Parte VI, 31, 31.1, 32, 33
Caracterizar a política de formação de professores desenvolvida pelo agrupamento
Tipo de acções de formação desenvolvidas a partir da escola
Nº de professores com formação na área da educação multicultural
Tipo de necessidades de formação identificadas pelo agrupamento no âmbito da educação multicultural
Nº de acções dinamizadas no âmbito da educação multicultural
Parte VII, 34, 35, 35.1, 36, 37, 38, 38.1
Identificar os desafios, para o agrupamento, da presença de diversidade cultural no agrupamento
Tipo de desafios colocados ao agrupamento pela presença de alunos de origens diversas.
Estratégias de resolução dos desafios colocados ao agrupamento
Parte VII, 39, 39.1
No momento seguinte à realização da entrevista foram analisados os
projectos educativos de agrupamento, através dos quais foi possível recolher
informação que completasse algumas lacunas da entrevista, em particular a que se
reporta aos princípios orientadores e estratégias de intervenção no sentido da inclusão
social. É de referir que ao longo do percurso desta investigação, os projectos
educativos de agrupamento foram reformulados, tendo sido actualizados os dados
inicialmente recolhidos.
A segunda fase da recolha de informação por observação directa concretiza-
se com a aplicação dos questionários aos alunos, às famílias e aos docentes. Esta
fase do trabalho de campo desenrolou-se em dois momentos distintos, por um lado,
pela dimensão da amostra, por outro, pela dificuldade de contacto com algumas
escolas a que se associou, por vezes, alguma renitência por parte de alguns directores
em colaborar no estudo. Assim, uma primeira fase decorreu entre Abril e Junho de
2009 e, uma segunda fase, entre Abril e Junho de 2010. Foi nossa intenção inquirir os
estudantes na fase final de um ano de escolaridade, tentando garantir que já tivessem
realizado um percurso escolar naquela escola e turma, que lhes permitisse um melhor
conhecimento das mesmas e assegurasse maior consistência nas respostas ao
questionário.
O questionário elaborado para os alunos (Quadro I.2) foi definido a partir de
um conjunto de objectivos e das variáveis que o estruturam (Anexos 2 e 3). Os
questionários aplicados aos alunos foram testados, num primeiro estudo exploratório,48
48
Hortas, M. (2008). Territories of integration: the children of immigrants in the schools of the Metropolitan Area of Lisbon. Intercultural Education. London: Routledge, 19(5), pp. 421- 433.
88
realizado em escolas do 1º ciclo. A sua análise e tratamento estatístico permitiram
levar a cabo as reformulações necessárias e construir a versão final utilizada no
presente estudo.
Quadro I.2 – Estrutura do questionário aplicado aos alunos
Objectivos Variáveis Questões
Identificar a escola Nome
Turma
Ano de escolaridade
Identificação Escola
Caracterizar a família do aluno
Idade pai/mãe
Profissão pai/mãe
Anos de Escolaridade pai/mãe
Naturalidade pai/mãe
Nacionalidade pai/mãe
Parte I, 1, 2,
Caracterizar o aluno e o percurso escolar anterior
Idade
Género
Bairro de residência
Naturalidade
Nacionalidade
Nº de anos em Portugal (imigrante)
Nome escola frequentada anteriormente
Situação de retenção/desistência (ano de escolaridade)
Tipo de dificuldades à entrada para a escola em Portugal (imigrante)
Parte II, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 6.1, 7, 7.1, 8
Identificar as representações que o aluno tem da escola que frequenta.
Conceito de escola
Aspectos positivos da escola
Aspectos negativos da escola
Motivos da frequência da escola
Parte III, 9, 10, 11, 12
Caracterizar a relação com os pares.
Motivos da zanga com colegas
Estratégias de resolução dos conflitos. Colegas com quem o aluno se relaciona.
Parte III, 13, 13.1, 14, 15
Caracterizar as práticas desenvolvidas pelo aluno com a família.
Língua falada em casa (imigrante)
Modalidade de aprendizagem da língua portuguesa (imigrante)
Frequência de aulas da língua do país de origem (imigrante)
Língua falada com colegas (imigrante)
Apoio da família ao estudo
Local de estudo
Parte IV, 16, 17, 17.1, 17.2, 17.3, 17.4, 18, 19, 19.1
Identificar o tipo de actividades desenvolvidas pelo aluno nos tempos extra lectivos.
Actividades de ocupação dos tempos livres Parte IV, 20, 21, 21.1
Caracterizar a relação com colegas de diferentes origens em contextos extra escolares.
Origens/nacionalidade dos colegas/amigos com quem se relaciona fora da escola
Tipo de práticas de sociabilidade com colegas de escola em espaço extra-escolar
Formas de contacto com colegas/amigos
Parte IV, 22, 23.1, 24, 25
Identificar os espaços de convívio com amigos.
Locais frequentados no bairro.
Locais frequentados fora do bairro.
Parte IV, 24.1
89
Identificar os espaços de sociabilidade frequentados com a família.
Locais frequentados no bairro.
Locais frequentados fora do bairro.
Parte IV, 26, 26.1
Os questionários foram aplicados no 1º ciclo do Ensino Básico aos alunos das
turmas do 4º ano; no 2º ciclo aos alunos das turmas de 6º ano e, no 3º ciclo, aos
alunos das turmas de 9º ano. Foram validados 1 360 questionários aplicados a alunos
a frequentar o Ensino Básico. Destes, 497 foram preenchidos por estudantes a
frequentar o 4º ano, 627 o 6º ano e 236 o 9º ano. Nos agrupamentos de Sintra foram
preenchidos 637 questionários, nos agrupamentos de Lisboa 723 questionários.
Em simultâneo com a aplicação dos questionários aos alunos, foram
aplicados questionários às famílias dos respondentes, que permitissem recolher
informação complementar à dos estudantes e que facultassem a obtenção de outros
registos relativos às expectativas e percepção das famílias em relação à escola, à
presença de alunos de origens diversas e ao acolhimento que nesta é feito da
diversidade sociocultural. O questionário elaborado para as famílias concretizou-se a
partir dos objectivos e das variáveis que o estruturam (Quadro I.3).
Quadro I.3 – Estrutura do questionário aplicado às famílias
Objectivos Variáveis Questões
Caracterizar o agregado familiar.
Bairro/freguesia/concelho de residência
Número de elementos do agregado familiar
Grau de parentesco
Idade, cada elemento do agregado familiar (eaf)
Género (eaf)
Nacionalidade (eaf)
Naturalidade (eaf)
Grau de instrução (eaf)
Estado Civil (eaf)
Situação Perante o Trabalho (eaf)
Situação na profissão (eaf)
Profissão (eaf)
Local de trabalho/estudo (eaf)
Meio de transporte utilizado (eaf)
Meios de subsistência da família
Rendimento familiar
Região/país de origem dos pais (imigrante)
Número de anos em Portugal dos pais (imigrantes)
Número de anos em Portugal do respondente (imigrante)
Parte I, 1, 2, 3, 11.1, 11.2, 11.3, 11.4, 11.5, 11.6, 11.7, 11.8, 11.9, 11.10, 11.11, 11.12, 14, 14.1, 14.2
Identificar as percepções sobre o bairro.
Número de anos de residência no bairro
Aspectos que caracterizam o bairro
Aspectos da identificação com o bairro
Relações de vizinhança
Parte I, 4, 5,5.1
Parte III, 2
90
Caracterizar as condições de habitação.
Tipo de habitação
Número de assoalhadas
Tipo de infra-estruturas
Tipo de equipamentos
Parte I, 6, 7, 8, 9, 10
Identificar as trajectórias migratórias
Locais de residência em Portugal (bairro/concelho)
Número de anos de residência em cada local
Número de anos na residência actual
Parte I, 14.5, 14.6
Identificar as relações com o país de origem (imigrante)
Número de visitas ao país de origem
Motivos das visitas
Perspectiva de regresso
Motivos de regresso
Parte I, 14.3, 14.4
Caracterizar a relação da família com a escola
Tipo de actividades em que a família se envolve na escola
Motivações para o envolvimento em actividades dinamizadas pela escola
Tipo de expectativas face à escola
Opinião relativamente à escola frequentada pelo educando
Parte II, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7
Caracterizar as estratégias familiares na construção da relação aluno/escola
Tipo de problemas vividos pelo educando na escola
Estratégias de resolução dos problemas
Aspectos mais valorizados na escola pelo educando
Parte II, 8, 9, 10,
Caracterizar a percepção das famílias face à diversidade cultural vivida na escola
Opinião sobre a presença de crianças/jovens de origens diversas na escola
Parte II, 11, 15
Caracterizar as práticas de sociabilidade na família
Tipo de actividades de ocupação dos tempos livres
Tipo de práticas realizadas com o educando nos tempos livres.
Parte III, 1, 1.1, 1.2
Identificar a existência de práticas de sociabilidade com amigos de origens diversas.
Local de residência dos amigos: no bairro, fora do bairro.
Origem/nacionalidade dos amigos.
Parte III, 2, 3
É de referir que este questionário foi traduzido em inglês e mandarim, de
modo a ultrapassar as barreiras linguísticas que, junto das famílias, poderiam conduzir
ao não preenchimento do mesmo (Anexo 4a, 4b e 4c).
No conjunto das famílias dos alunos inquiridos, 653 responderam ao
questionário, mas só foram validos 619. Deste total, 261 questionários correspondem
a famílias dos alunos que frequentam as escolas de Lisboa e 358 dizem respeito a
famílias de alunos das escolas de Sintra.
A concluir a fase de recolha de informação junto das escolas, procedeu-se à
aplicação de questionários junto dos professores titulares de turma e/ou dos directores
de turma. O questionário construído pretendeu conduzir numa reflexão posterior sobre:
(i) as experiências e percepções dos docentes que trabalham em contexto de
91
diversidade sociocultural e, (ii) os desafios vividos na construção da relação
pedagógica e na condução do processo de ensino e aprendizagem.
A organização deste questionário (Anexo 5) obedece à estrutura (Quadro I.4)
que a seguir se apresenta.
Quadro I.4 – Estrutura do questionário aplicado aos docentes
Objectivos Variáveis Questões
Caracterizar o entrevistado e o seu percurso profissional
Nome do agrupamento
Nome da escola
Ano de escolaridade em que lecciona
Disciplina leccionada
Idade
Género
Habilitações Literárias
Anos de docência
Anos de permanência na Escola
Ano(s) de escolaridade em que lecciona
Cargo que desempenha na escola/ agrupamento
Formação no âmbito da Educação Multicultural
Caracterização do Entrevistado
Parte III, 16, 17.1
Caracterizar os alunos da turma Idades
Género
Naturalidade/Nacionalidade dos alunos
Características socioculturais
Parte I, 1, 2
Parte II, 10.1
Caracterizar as percepções sobre a diversidade sociocultural na turma
Características socioeconómicas e relacionais dos alunos imigrantes recém- chegados, dos alunos descendentes de imigrantes naturais de Portugal e dos alunos descendentes de portugueses
Tipo de influências da diversidade sociocultural nos alunos
Parte II, 3, 4.1, 4.2, 5, 6, 12
Identificar os aspectos que interferem com as práticas escolares dos alunos
Tipo de Influência dos contextos e modos de vida familiares nas práticas dos alunos na escola
Parte II, 7.1, 7.2
Compreender a influência da diversidade étnica e sociocultural em contexto de sala de aula.
Componentes do processo de ensino aprendizagem influenciados pela presença de uma população diversa na sala de aula
Parte II, 8.1, 8.2, 8.3
Identificar as estratégias desenvolvidas em contexto de sala de aula para ultrapassar os desafios colocados por uma turma diversa
Estratégias de resposta, em contexto de sala de aula, à diversidade sociocultural
Referências à diversidade sociocultural surgem contempladas no PCT
Estratégias definidas no PCT para responder à diversidade sociocultural
Estratégias para o ensino da língua portuguesa como língua não materna
Parte II, 8.4, 9.1, 9.2, 9.3, 11.1, 11.2
Identificar os processos de recolha de informação sobre os alunos
Instrumentos de recolha de informação sobre os alunos da turma
Natureza da informação recolhida
Parte II, 10.1, 10.2, 10.3,
92
Caracterizar a atitude dos pais perante a diversidade sociocultural
Atitudes dos pais portugueses e imigrantes sobre uma turma diversa
Parte II, 13
Identificar as estratégias de envolvimento das famílias nas actividades da turma e da escola
Estratégias de envolvimento da família nas actividades dos educandos
Parte II, 14,
Reflectir sobre a legislação existente em Portugal para a inclusão dos alunos imigrantes em contexto escolar
Aspectos em que a legislação se revela adequada/não adequada
Parte II, 15.1, 15.2, 15.3, 15.4
Identificar as necessidades de formação profissional no âmbito do desenvolvimento de competências interculturais
Temáticas de formação no âmbito do desenvolvimento de competências interculturais
Competências interculturais da profissão docente
Parte III, 17.1, 17.1, 17.3, 17.4
O número de questionários preenchidos pelos docentes foi muito reduzido:
apenas foram recolhidos 12 questionários no universo das escolas envolvidas no
estudo. Pela fraca representatividade que consideramos ter a amostra optámos por
utilizar a informação apenas com recurso a uma análise qualitativa que permitisse
complementar os resultados obtidos através dos questionários aos alunos e famílias e
das entrevistas aos directores de agrupamento.
Finalizando este ponto, importa sublinhar que a problemática definida e as
linhas de investigação que orientam o estudo conduzem-nos a abordagens que
ultrapassam o âmbito da Geografia. A complexidade associada à temática das
migrações, como qualquer fenómeno social, convoca necessariamente para a sua
análise um conjunto de factores que, em combinações diversas, mobilizam de
diferentes âmbitos disciplinares, conceitos e métodos que confluem na compreensão
do fenómeno na sua totalidade. O estudo da integração de crianças e jovens
imigrantes em contextos escolares encerra em si uma multiplicidade de intervenientes
que, em diferentes níveis de análise, se combinam e conduzem o processo e percurso
educativo que um indivíduo ou grupo de indivíduos realiza. Como já discutimos
anteriormente o percurso de integração de um indivíduo ou grupo de indivíduos na
sociedade de acolhimento não é linear. Na perspectiva de Moddod (2007) a integração
é, como a mobilidade social, um processo heterogéneo, plural, que pode assumir
múltiplas formas. Porque se trata de um percurso construído por um individuo ou
grupo de indivíduos que são na sua essência diferentes, não só pelos laços de
pertença a uma comunidade ou família com níveis de organização distintos ou porque
são detentores de um background económico, social e cultural que os aproxima ou
afasta dos restantes, mas porque têm diferentes atitudes no seio do seu grupo ou
família, se relacionam entre si e com as instituições locais de formas diversas e
também têm diferentes prioridades e repostas nas suas escolhas.
93
As linhas metodológicas que anteriormente apresentámos, que irão conduzir
o estudo no sentido de uma abordagem da integração a diferentes níveis e
mobilizando actores diversos, procuram seguir as linhas definidas para a investigação
num eixo fundamental. Este emerge, de imediato, da abordagem geográfica que
estrutura este trabalho, privilegiando três escalas de análise, macro, meso e micro
através das quais se procura compreender o papel dos agentes e actores
intervenientes da integração. A nível da macro-análise procura-se explicitar as
relações entre as orientações de política europeia e nacional no domínio da integração
de crianças e jovens imigrantes em contexto escolar. Na meso-análise situamos o
estudo dos contextos de acolhimento, em particular a espacialização do fenómeno no
território nacional e na Área Metropolitana de Lisboa, no sentido de conhecer as suas
dimensões e características. Na micro-análise integramos o estudo na escala local, do
bairro, da escola, dos alunos, das famílias procurando factores que permitam explicitar
os percursos de integração que se constroem em tempos e espaços distintos.
A organização do estudo em diferentes níveis de análise pressupõe que entre
estes se desencadeiem processos de interacção e dinâmicas no sentido da integração.
Nesta abordagem, que entende os diferentes territórios de análise numa dimensão de
interacção social entre instituições, indivíduos e espaços, são mobilizadas fontes e
métodos de recolha de informação que permitem construir uma investigação na
interacção e complementaridade entre dados quantitativos e qualitativos.
94
95
PARTE II – DIVERSIDADE E INTEGRAÇÃO: UMA ANÁLISE DAS POLÍTICAS DE
ACOLHIMENTO
1. Políticas de integração na Europa – abordagens teóricas
2. O acesso dos filhos dos imigrantes à educação
2.1. Quadro legal internacional e europeu do acesso à educação de
populações imigrantes
2.2. O acolhimento de imigrantes: contexto político nacional
2.3. Quadro legal nacional de acesso dos alunos imigrantes à educação
3. Imigração e educação – a reconstrução das políticas
As culturas podem passar a coexistir sem diferenciação de estatuto e assim
dialogar em pé de igualdade abrindo-se ao enriquecimento recíproco.
(Roberto Carneiro, Fundamentos da Educação e da Aprendizagem, 2001, p. 267)
96
97
O reconhecimento da diversidade cultural europeia e da necessidade de
promover a sua integração tem sustentado um conjunto de reflexões em torno dos
modelos de incorporação e das orientações políticas comunitárias. O percurso que a
história recente da Europa iniciou, em finais dos anos 80, suscitou novas questões e a
relevância de definir novos caminhos na política multicultural europeia, ou melhor, na
abordagem e tratamento da diversidade no espaço europeu. À diversidade cultural que
já caracterizava a história da Europa, junta-se agora uma mobilidade entre o leste e o
ocidente europeus que até à data não tinha sido vivida. A par desta, surge também a
abertura à imigração de um conjunto de países europeus, nomeadamente do Sul, que
até então se tinham mantido, fundamentalmente, no papel de emissores de população.
Para Castles e Miller (2003), Foner e Lucassen (2012), estudar a imigração
na actualidade implica mobilizar as experiências do velho continente em matéria de
imigração. Nesta perspectiva, os autores referem-se à multiculturalidade na Europa
como fazendo parte da sua história, razão pela qual os conceitos, tal como os métodos
para estudar este fenómeno na actualidade têm necessariamente que ter uma relação
com o passado. Os padrões de incorporação que caracterizam hoje as opções na
integração de crianças e jovens imigrantes são o resultado de um passado de
escravatura, segregação e movimentos pelos direitos civis (Foner & Lucassen, 2012).
Muitos países da Europa que hoje acolhem população imigrante de origens diversas
viveram no passado o papel de colonizadores e confrontaram-se, no pós-guerra, com
movimentos migratórios com origem nessas colónias, na sequência dos processos de
descolonização. O percurso recente da história europeia tornou claro, para muitas das
antigas metrópoles, a importância da definição de políticas e estratégias de
acolhimento de populações oriundas de outros países, mesmo que estas tivessem
como ponto de partida uma antiga colónia. Assumir os recém-chegados como parte
integrante da comunidade nacional, portanto cidadãos nacionais, colocou muitos
Estados numa situação de alheamento face às necessidades efectivas de integração
desta população (Foner & Lucassen, 2012). Porém, para os returnees na Holanda, os
repatriates na Alemanha, os retornados em Portugal ou os pieds noirs em França, a
integração numa sociedade que no seu modo de funcionamento, organização e
atitudes perante o recém-chegado se afastava dos contextos de origem, implicava
ultrapassar obstáculos nem sempre fáceis de transpor. A ideia de que estas
populações transportavam consigo uma cultura de origem idêntica à da metrópole e,
como tal, facilmente iriam fazer parte integrante da nova sociedade, rapidamente
deixou de ser um apanágio. As dificuldades que entretanto se foram evidenciando no
percurso desta geração e no das crianças que dela nasceram foram alertando os
98
políticos, governantes e também os investigadores para a urgência de pensar
respostas no sentido da sua integração.
Aos imigrantes oriundos das ex colónias vieram juntar-se as populações que
se deslocavam por motivos económicos e todas aquelas que, num processo de
reunificação familiar, se moviam entre países da Europa ou chegavam de territórios
exteriores a esta. A constatação de que a presença de imigrantes no Velho Continente
era uma realidade que se consolidava e não apenas um momento particular da sua
história e dos indivíduos envolvidos no processo, acentuou a necessidade de pensar a
integração numa perspectiva que não se restringisse apenas ao mercado de trabalho,
mas que englobasse outras dimensões da vida social.
A experiência no acolhimento de populações imigrantes vivida em França, na
Alemanha, no Reino Unido e na Holanda denota, no final dos anos 80, a debilidade de
algumas políticas de integração experimentadas por estes países. A recessão dos
anos 70 veio acentuar e acelerar alguns dos problemas que já se faziam sentir entre
as populações imigrantes, tornando evidente a situação de fragilidade social em que
estas populações se encontravam e alertando para a necessidade de repensar as
políticas de integração. O desemprego, a criminalidade, a segregação residencial, e
também as taxas de abandono e reprovação escolar entre os jovens são sinais que
surgem, na perspectiva de Wacquant, de forma mais acentuada nos centros das
cidades e em algumas áreas dos subúrbios das grandes metrópoles, de que são
exemplo Paris e Londres (Foner & Lucassen, 2012).
Diversos autores (Castles, 1995; Hollifield, 1997; Favell, 1998; Entzinger,
Lucassen, 2012) que se têm debruçado sobre a análise dos modelos de integração
adoptados pelos diversos países europeus revelam existirem diferenças nas
experiências migratórias vividas, assim como nas atitudes perante a imigração.
Tomando como exemplo, numa breve abordagem, os critérios adoptados na atribuição
da cidadania a populações oriundas da imigração por dois países, com longos
percursos no acolhimento de imigrantes, França e Alemanha, é perceptível a diferença
de concepções e políticas dos Estados perante o fenómeno. Em França, um Estado
laico e republicano que defende os ideais de igualdade, uma criança descendente de
imigrantes que tenha nascido em território nacional é considerada como estrangeira
até aos 18 anos. Na Alemanha, é a nacionalidade dos pais que determina a dos filhos,
e desde 2000, momento em que se tornou possível a obtenção da cidadania alemã
por parte dos trabalhadores migrantes, que este título assume um carácter provisório
até à idade de 23 anos, para as crianças nascidas em território nacional.
99
Se atendermos às atitudes relativas ao acesso à cidadania e identidade
nacional, nos países com tradição no acolhimento de imigrantes, a literatura identifica
três modelos de integração ou gestão da diversidade cultural: o modelo anglo-
saxónico ou multicultural, o modelo francês assimilacionista e o modelo alemão, de jus
sanguinis. Estes modelos, defendidos pelos países que os adoptam, são estruturantes
interferindo na definição das políticas de integração desenvolvidas por cada um dos
Estados. Em França, a ideia de uma ameaça ao equilíbrio étnico e cultural, em
particular por parte da imigração muçulmana, conduz o governo a importantes
medidas restritivas quer à entrada, quer à aquisição da nacionalidade. As noções de
tolerância cultural e religiosa, assim como as relações inter-raciais são muito
questionadas e a sua aceitação é posta em causa perante a possibilidade de se
tornarem hostis à cultura e ao Estado. Por seu turno, no Reino Unido, a ênfase
colocada nas relações interétnicas, minorias étnicas e tolerância cultural, num sistema
mais liberal, é determinante na definição da política de integração.
Perante os dois modelos apresentados, não é unânime a opinião sobre o
sucesso de cada um e, em particular, os próprios países são muito críticos face às
políticas implementadas pelos territórios vizinhos. Recorrendo ao exemplo dos
modelos britânico e francês, Favell (2008) refere-se ao olhar crítico que a França lança
ao modelo multicultural britânico de integração, considerando que este contribui para a
manutenção das desigualdades e das situações de racismo, dificultando também a
construção de uma identidade nacional e não impondo obrigações aos recém-
chegados. Por sua vez, o Reino Unido critica a excessiva carga assimilacionista do
modelo francês, classificando-o de intolerante e propiciador de situações de exclusão.
100
101
1. Políticas de integração na Europa – abordagens teóricas
Os modelos de incorporação apresentados na parte I deste estudo,
desenham-nos algumas pistas que permitem orientar uma análise empírica dos
percursos realizados pelos diversos actores e agentes no sentido da integração de
populações imigrantes. Na perspectiva de Alba, Reitz e Simon (2012), estes modelos
centram-se em três questões fundamentais: (i) como é que os imigrantes e seus
descendentes entendem o seu estatuto como outsiders e se tornam reconhecidos
como insiders? (ii) Qual o lugar que podem assumir na sociedade a que pertencem?
(iii) Como é que as sociedades gerem a diversidade e o que é que determina o seu
sucesso no acolhimento dos grupos numa sociedade mais integrada?
O quadro teórico que anteriormente discutimos, permite constatar que
existem percursos diversos na incorporação de população imigrante, diferentes
contextos de acolhimento, actores e agentes envolvidos, que muito provavelmente se
revêem na mobilização de uma heterogeneidade de critérios para a definição das
políticas de integração. Sendo nossa intenção, nesta segunda parte do estudo, a
compreensão das mudanças que têm ocorrido na evolução da política europeia de
integração de populações imigrantes, em particular no âmbito da educação, importa-
nos agora explorar a relação entre os modelos de incorporação e as tipologias de
política que destes emanam, assim como identificar o percurso das orientações de
política internacional e europeia.
O estudo desenvolvido sobre as políticas de integração na Europa, por Hans
Entzinger (2005), explora o papel dos poderes públicos no processo de integração
detendo-se mais especificamente sobre os objectivos de uma política de integração,
alertando para o facto de frequentemente estas políticas não terem em conta a
pluridimensionalidade e complexidade do processo. Na tipologia de análise das
políticas de integração que propõe, o autor considera existirem três elementos
fundamentais para a sua definição: político-jurídico (estado), cultural (nação) e
socioeconómico (mercado). Também Penninx (2008), na tipologia de políticas que
apresenta, centrada no conceito de cidadania, define três dimensões que se
aproximam das anteriores: (i) político/legal; (ii) socioeconómica; (iii) cultural e religiosa.
Segundo Entzinger (2005), é possível identificar na Europa uma grande
diversidade de tipologias e modelos que explicam os processos de integração e as
relações entre maiorias e minorias. Contudo, o autor reforça que, de uma forma quase
constante, a complexidade da integração se perde em muitas das políticas que analisa,
por estas se centrarem apenas numa das dimensões do processo. Numa tentativa de
resumir as tipologias encontradas, apresenta uma classificação que organiza em três
102
grupos: (i) trabalhadores migrantes e imigrantes permanentes; (ii) jus soli e jus
sanguinis; (iii) minorias e assimilação. Estas três tipologias reflectem, na sua
perspectiva, os principais dilemas da imigração e integração na Europa. É com base
nas características que são apresentadas para cada uma que elaboramos de seguida
uma breve síntese, no sentido de identificar as principais preocupações subjacentes à
formulação das políticas de integração na Europa.
Para a primeira tipologia, trabalhadores migrantes e imigrantes permanentes,
são identificados dois modelos. No modelo dos trabalhadores migrantes o grande
impulsionador da migração é o mercado de trabalho e a necessidade de mão-de-obra
que, entendida como uma situação temporária, conduzia também ao assumir da
imigração como um fenómeno temporário. Esta concepção da população imigrante,
como residente temporária, rapidamente foi tida como pouco adequada, pela
constatação de que a sua permanência no país de acolhimento se prolongava além do
tempo inicialmente previsto, como aconteceu em países como a Suíça, a Alemanha, a
Áustria, a Bélgica e a Holanda onde muitas vezes, pela precariedade e vulnerabilidade
da situação legal, os trabalhadores migrantes passaram a ser incorporados nos
sectores informais, menos qualificados. O modelo dos imigrantes permanentes,
advogando princípios contrários ao anterior, encontra fundamentos em países como
os EUA, Canadá e Austrália, territórios com história no acolhimento destes
trabalhadores e que entendem esta população como motor de expansão económica e
de desenvolvimento do país. Na perspectiva do autor, a rigidez destes modelos advém
do facto de nem sempre a imigração temporária se tornar permanente e o percurso
contrário também ser uma possibilidade. Por este motivo, e pelo facto de se tratar de
uma tipologia que se centra em determinantes de cariz essencialmente económico, a
compreensão da multidimensionalidade dos processos de integração fica
condicionada.
A segunda tipologia definida, jus soli e jus sanguinis, debruça-se sobre o
estatuto político e jurídico que os países de acolhimento definem para a integração
dos recém-chegados. No modelo jus soli, todos os residentes num mesmo território
têm os mesmos direitos, independentemente da sua origem e duração da sua
permanência. Para a população imigrante pode ser definido um período de transição.
No sistema jus sanguinis, a cidadania e os direitos são transmitidos de uma geração
para outra, segundo os laços de sangue, o que significa que nem todos os residentes
usufruem dos mesmos direitos de cidadania. Esta situação traduz-se, para os
imigrantes e descendentes, na impossibilidade de usufruir dos mesmos direitos e
deveres dos nativos. Segundo Entzinger (2005), os dois modelos são válidos e
fundamentais no entendimento da integração, na medida em que definem os meios
103
pelos quais os recém-chegados se podem tornar membros de um Estado. Porém, a
realidade que se encontra é, frequentemente, o resultado de uma mistura dos dois
modelos, com algumas diferenças entre países. Citando alguns exemplos: no Reino
Unido vigora o sistema jus soli; na Alemanha e na Bélgica assistiu-se recentemente à
introdução de elementos do jus soli no sistema jus sanguinis até então em vigor; em
França oscila-se entre os dois sistemas. Tal como para a tipologia anteriormente
apresentada, as críticas do autor recaem sobre as limitações de uma política que
apenas valoriza uma dimensão da integração.
A terceira tipologia, minorias e assimilação, é fundada sobre a dimensão
cultural e identificam-se nesta dois modelos: o modelo das minorias étnicas e o
modelo da assimilação. No primeiro modelo, a imigração é entendida como um
fenómeno permanente e não temporário, sendo os imigrantes reconhecidos como
elementos da sociedade de acolhimento que mantém as suas origens nacionais ou
étnicas. Em resposta a esta situação, as medidas de política devem assegurar a
preservação e continuação da identidade cultural, assumindo-se o carácter
pluricultural da sociedade. Este modelo surge associado ao Reino Unido, embora
possam surgir outros países da Europa que o adoptem, como é o caso da Holanda e
alguns países nórdicos. No modelo de assimilação, conceptualmente antagónico do
anterior, a França surge como o protótipo, assume-se que os imigrantes devem
adoptar as características culturais da sociedade de acolhimento. O autor identifica um
conjunto de potencialidades no primeiro modelo, coexistência de diferentes culturas e
de abordagens individuais e de grupo no processo de integração, perspectiva de
construção de uma sociedade diversa e plural. Porém, considera que este continua a
não atender à multidimensionalidade do processo de integração. Outros modelos
recorrem frequentemente a comparações entre países para representar as dinâmicas
de integração na Europa. São exemplo destas abordagens os modelos apresentados
por Hollifield e Castles em meados dos anos 90 (Entzinger, 2005). Hollifield distingue
três tipos de modelos: i) o modelo de imigração temporária, que associa à Alemanha;
ii) o modelo de assimilação, de que a França é o protótipo e que considera a imigração
como permanente, mas valoriza muito mais o indivíduo do que as comunidades ou os
grupos; iii) o modelo das minorias étnicas, do qual o Reino Unido é representante e
que considera a imigração como permanente, valorizando a coexistência de
comunidades diversas. Castles, desenvolve outra tipologia, identificando três modelos:
i) o modelo de exclusão diferencial, de que são exemplo a Alemanha e Europa do Sul;
ii) o modelo assimilacionista, ilustrado pela Grã-Bretanha e Países Baixos; iii) o
modelo pluralista, típico de países que recorrem à imigração no seu processo de
desenvolvimento e que, segundo o autor, é difícil encontrar na Europa. Os dois
104
modelos procuram criar tipologias de integração sustentadas nas experiências vividas
por alguns países. Contudo, fazem-no recorrendo a pressupostos diferentes e,
segundo Favell, tentando rotular os países com um determinado modelo de
incorporação, em vez de procurar compreender o conteúdo das políticas de integração
(Entzinger, 2005). Acrescentamos ainda que estas classificações se situam
temporalmente em meados dos anos 90 e que desde então as políticas relativas à
integração de imigrantes na Europa têm sofrido alterações, resultado de novas
dinâmicas migratórias, da constatação da inadequação de algumas políticas, das
características dos novos imigrantes e dos territórios de acolhimento e, também, da
intensificação da investigação sobre a temática.
Segundo Entzinger, a análise das políticas de integração deve ser sustentada
numa perspectiva dinâmica, de cruzamento das dimensões legais e políticas, culturais
e socioeconómicas (Arnaud & Sala Pala, 2005). Nesta linha de pensamento propõe
um modelo que assente em duas dimensões que considera fundamentais: i) a
integração entendida como um processo pluridimensional e, como tal, manifestando-
se em diferentes domínios da sociedade – jurídico e político, social e económico, e
cultural; ii) a valorização dos níveis individual e colectivo/grupo. A partir destas duas
dimensões são apresentadas as várias possibilidades de um modelo de análise das
políticas de integração (Quadro II.1). Neste estão previstas seis possibilidades de
combinação das duas dimensões que reflectem seis objectivos diferentes de uma
política de integração.
Quadro II.1 – Seis opções para as políticas de incorporação
Dimensões
Jurídico-político Cultural Socioeconómico
Indivíduo igualdade de direitos pluralismo liberal igualdade de
oportunidades
Grupo direitos de grupo pluriculturalismo igualdade
Adaptado de: Entzinger, 2005, p. 35.
A complementar a análise que é possível realizar a partir do modelo, é
importante encontrar os factores explicativos para a escolha de uma das seis opções
ou seja, é fundamental contextualizar as escolhas de orientação política da integração,
na situação económica do país, na sua maturidade em relação ao processo de
imigração, nas possibilidades de intervenção do Estado para influenciar a integração
em domínios específicos e na ideologia política, mais intervencionista ou mais liberal
(Entzinger, 2005).
105
Na linha de análise que Entzinger advoga, privilegiando a natureza
multidimensional das políticas de integração, Penninx (2008) propõe um modelo
analítico centrado no conceito de cidadania a partir de três dimensões: i) político/legal;
ii) socioeconómica; iii) religiosa e cultural. Na construção do modelo são estabelecidas
duas condições i) cada uma das dimensões de análise pode ser classificada como
positiva (sustenta a política na dimensão considerada) ou negativa (não sustenta a
política) e ii) atendendo ao tempo de duração do movimento migratório, permanente
ou temporário, a política pode ser inclusiva ou de exclusão. Os imigrantes podem
assim ser entendidos como parte integrante da comunidade, do país ou da cidade e
neste sentido as políticas serem inclusivas ou, como um grupo de passagem não
sendo desencadeadas medidas no sentido da sua inclusão. O modelo desenvolve-se
na análise do contributo de cada dimensão para a construção da cidadania em
situações de inclusão ou de exclusão, identificando-se seis tipos de política (Quadro
II.2).
Quadro II.2 – Tipologia das políticas para a imigração/minorias étnicas
Inclusão Exclusão
tipo 1 2 3 4 5 6
dimensão político-legal
+ + + - - -
dimensão socioeconómica
+ + - + - -
dimensão cultural/religiosa
+ - - + + -
Adaptado de: Penninx, 2008, p. 230
Na perspectiva do autor, as políticas de inclusão mais frequentes nas
sociedades europeias ocidentais são as de tipo 1 ou 2, por considerar que em
democracias liberais as situações de desigualdade no acesso aos direitos, previstas
no tipo 3, não têm lugar para cidadãos que pertencem a uma mesma comunidade
política (Penninx, 2008). As políticas de tipo 1 pressupõem inclusão política e
igualdade no domínio socioeconómico, mas também igualdade religiosa e cultural,
apoiando-se em pressupostos multiculturais. Para os imigrantes significa manter as
suas características culturais; para o Estado e sociedade de acolhimento significa
aceitar os recém-chegados como indivíduos e grupos com direito às diferenças
culturais, impondo-se para tal uma revisão das regras de acolhimento da diversidade.
As políticas de tipo 2 têm uma conotação muito vincada com os modelos
assimilacionistas, definindo a integração dos recém-chegados como um processo que
106
decorre fundamentalmente da sua capacidade de adaptação às instituições públicas
da sociedade (Penninx, 2008).
O modelo apresentado, tal como o anterior, idealiza diferentes tipologias de
política, ignorando em parte os contextos em que estas se implementam. Também a
própria concepção de partida que estabelece a distinção entre dimensões positivas e
negativas encerra em si algum vazio de conteúdo, como o próprio autor assume. Por
outro lado, não é comum encontrar nas políticas europeias multiculturais uma
convergência entre as três dimensões como sugere a tipologia 1. Se a possibilidade
de convergência ao nível socioeconómico é uma realidade, provavelmente é mais
débil ao nível político-legal e mais difícil de concretizar ao nível cultural e religioso.
Estas questões, podendo não ter um impacto significativo quando analisadas a uma
escala nacional, revestem-se de grande significado numa análise da integração à
escala local, onde as diferentes dimensões de análise têm grande impacto.
Atendendo a que os imigrantes são diversos nas suas origens, estilos de vida
e culturas, a sua integração na cidade não pode assumir-se como um processo natural.
As situações de segregação social, exclusão e marginalização podem despoletar-se
para alguns grupos, durante o percurso que decorre ao nível dos territórios em que se
fixam (Malheiros, 2002; Penninx, 2008; White, 2008). Tal significa, que a valorização
da componente local na análise das políticas de integração é necessária, pois é a esta
escala que se vivem os principais desafios e se joga a coesão social. É nesta
perspectiva que Penninx (2008) reforça i) a necessidade de mobilização dos
imigrantes e de ponderação das diferentes dimensões de análise das políticas; ii) a
articulação entre diferentes níveis de integração (instituições públicas e específicas
dos imigrantes, organizações e indivíduos); iii) a interacção entre estratégias top-down
e bottom-up de envolvimento e mobilização dos imigrantes.
À semelhança do modelo anteriormente explorado, também nesta proposta, a
utilização das tipologias definidas para a análise das políticas de integração não
escusa a mobilização de outros factores que emergem dos contextos locais, dos
indivíduos e dos grupos.
Alba, Reitz e Simon (2012), mais recentemente, referem-se à integração
como um dos grandes desafios políticos da União Europeia (27) e um dos conceitos
sociológicos mais frequentemente utilizados no discurso político europeu, adoptando
para tal os Princípios Básicos Comuns de integração. Os autores reforçam a
fragilidade dos princípios que orientam uma política de cariz assimilacionista, na
Europa do século XXI, e que ainda incorporam algumas das tipologias ultimamente
colocadas em causa por países que rejeitam a assimilação (Foner & Lucassen, 2012).
Preterido o conceito de assimilação para definir o processo de incorporação dos
107
imigrantes no território de acolhimento, coloca-se a tónica na integração, quer no
discurso político, quer entre os cientistas sociais. Esta mudança, na perspectiva de
abordagem dos percursos dos imigrantes na nova sociedade, surge ainda num
contexto de rejeição do paradigma multicultural em países como o Reino Unido, a
Holanda e a Alemanha, deixando evidente a necessidade de desenvolver esforços no
sentido da integração (Alba, Reitz & Simon, 2012).
A passagem de um enfoque centrado na redução das diferenças étnicas
(assimilação) para uma abordagem que mobiliza os conceitos de integração,
incorporação e adaptação, orientando-se especificamente para a relação entre os
imigrantes e as instituições da sociedade de acolhimento, abre caminho para uma
análise das trajectórias realizadas pelos imigrantes em sectores diversos da
sociedade: mercado de trabalho, mercado de habitação, escola, política, relações
sociais informais nas comunidades locais. Nesta concepção pluralista de integração,
que já vinha sendo defendida anteriormente por Entzinger, os valores
socioeconómicos e de pertença étnica encontram-se, podendo variar de forma
independente e resultar em combinações finais diversas (Quadro II.3). Na óptica dos
autores referidos no parágrafo anterior, a integração considera as características
culturais dos imigrantes, a sua identidade, as relações sociais, étnicas e culturais na
comunidade, a sua religião e a sua pertença a uma cultura étnica como tópicos
distintos da integração estrutural ou seja, alerta para a possibilidade de que a
manutenção das características étnicas possa ser independente da integração
socioeconómica (Alba, Reitz & Simon, 2012).
Quadro II.3 – Integração e pertença étnica
Pertença Étnica
Integração Alta Baixa
Alta pluralismo assimilação
Baixa enclave étnico marginalidade
Adaptado de: Alba, Reitz & Simon, 2012, p. 53.
As dimensões, pertença étnica e integração, têm implicações teóricas directas
na agenda política europeia. Nesta perspectiva de abordagem, a pertença étnica não é
necessariamente condicionante da integração social, antes pelo contrário, pode ter
impactos positivos em vários grupos de incorporação em contextos plurais. Assim,
complexifica-se a análise das políticas e do grau de integração dos imigrantes nas
instituições, pois além dos factores anteriormente referidos no modelo apresentado por
108
Entzinger, considerar a pertença étnica implica ter em conta: (i) os vários níveis de
desenvolvimento institucional de cada comunidade e dos elementos que podem
contribuir para a ligação com a comunidade étnica; (ii) a identificação das relações
entre os subgrupos dentro da comunidade que afectam o desenvolvimento global da
mesma e das relações da comunidade étnica com a sociedade de acolhimento.
Em síntese, os três modelos apresentados avançam com algumas tipologias
de análise das políticas de integração que podem nortear a exploração do quadro legal,
internacional e europeu, que orienta a definição de políticas para a integração de
crianças descendentes de imigrantes em contexto escolar. Das propostas avançadas
pelos autores salientamos alguns aspectos que consideramos serem mais pertinentes:
a fragilidade de políticas sustentadas num modelo assimilacionista (Alba,
Reitz & Simon, 2012);
o entendimento da integração como um processo multidimensional com
impacto em diferentes domínios da sociedade (Entzinger, 2005);
a análise das políticas deve ser sustentada numa dinâmica de
cruzamento de três dimensões (político-legal, socioeconómica, cultural
e religiosa), (Arnaud & Sala Pala, 2005; Entzinger, 2005; Penninx,
2008);
a valorização dos níveis individual e colectivo/grupo na análise das
políticas (Entzinger, 2005);
a mobilização dos agentes e instituições que actuam à escala local, mas
também dos imigrantes na definição das políticas (Penninx, 2008);
a importância de considerar uma política de integração que incorpore a
relação entre imigrantes e instituições na sociedade de acolhimento ou
seja, que perspective a articulação entre mercado de trabalho, escola,
habitação, política e relações sociais por um lado e, por outro, as
características culturais, identidade, relações no grupo étnico/cultural e
religião dos imigrantes (Alba, Reitz & Simon, 2012);
a mobilização dos factores contextuais que se relacionam com a
situação do país, a sua maturidade no acolhimento de imigrantes e o
papel do Estado (Entzinger, 2005);
a análise das políticas a um nível micro ou seja, nos territórios onde se
vive e materializa a integração (Penninx, 2008);
a importância de articulação entre estratégias top-down e bottom-up na
operacionalização das políticas (Penninx, 2008).
109
2. O acesso dos filhos dos imigrantes à educação
A abordagem, que temos vindo a desenvolver, às possíveis tipologias de
política de integração dos imigrantes e seus descendentes alerta para as várias
dimensões e factores intervenientes no percurso destas populações para se tornarem
parte de uma sociedade. Numa Europa caracterizada pela pluralidade cultural, a
resolução das questões associadas à presença de populações de origens diversas
tem desencadeado a produção de um conjunto de orientações legais que procuram
articular diversidade, imigração, integração e coesão social.
Os anos 90 são marcados pela necessidade de desenhar políticas e
orientações comunitárias consentâneas com as novas realidades europeias. Desde
então a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa tem vindo a adoptar um
vasto leque de recomendações e resoluções, a par da realização de audições e
debates sobre diferentes aspectos da diversidade cultural, do diálogo intercultural e
inter-religioso, da imigração e coesão social. São várias as convenções e declarações
que enfatizam o respeito pela diversidade; o papel da educação na compreensão entre
povos e culturas; a necessidade de respeitar e responder à diversidade sociocultural
que existe nas escolas; a importância da educação para os direitos humanos e da
educação multicultural numa Europa de culturas diversas.
As conclusões do relatório Eurydice, publicado em 2004, sobre a integração
na escola dos alunos imigrantes, sublinham a importância do acolhimento e
escolarização das crianças e jovens descendentes de imigrantes. Duas grandes
preocupações que, conjuntamente com a gestão da diversidade em contexto
educativo, têm ocupado uma parte significativa da agenda política europeia actual.
2.1. Quadro legal internacional e europeu do acesso à educação de populações
imigrantes
A Declaração Universal dos Direitos do Homem define no seu Artigo 26º que
toda a pessoa tem direito à educação, devendo esta assegurar a plena expansão da
personalidade humana nas suas diferentes dimensões: direitos, liberdades,
compreensão, tolerância e amizade, pertencendo aos pais a decisão relativa ao
género de educação a dar aos filhos.49 Esta intenção surge claramente reforçada no
Artigo 13º do Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais.
49 Declaraçao Universal dos Direitos do Homem (disponível em: http://www.un.org/fr/documents/udhr/index.shtml).
110
Em ambos os documentos, a educação deve habilitar para a convivência entre nações
e grupos raciais, étnicos e religiosos.50
Os mesmos direitos sobre o acesso à educação surgem fortalecidos no Artigo
2º e no Artigo 28º da Convenção dos Direitos da Criança,51 definindo que “todos os
direitos se aplicam a todas as crianças sem excepção” (p.6) e que “os Estados Partes
reconhecem o direito da criança à educação e tendo, nomeadamente, em vista
assegurar progressivamente o exercício desse direito na base da igualdade de
oportunidades” (p.20). “A educação deve destinar-se a promover o desenvolvimento
da personalidade da criança, dos seus dons e aptidões mentais e físicas, na medida
das suas potencialidades.” (Artigo nº 29; p.21), cabendo aos pais ou seus
representantes legais “a responsabilidade de educar a criança e de assegurar o seu
desenvolvimento.” (Artigo nº 18; p.13). A mesma Convenção define no Artigo 29º que
“nos Estados em que existam minorias étnicas, religiosas ou linguísticas ou pessoas
de origem indígena, nenhuma criança indígena ou que pertença a uma dessas
minorias poderá ser privada do direito de, conjuntamente com membros do seu grupo,
ter a sua própria vida cultural, professar e praticar a sua própria religião ou utilizar a
sua própria língua.” (p. 21).
A Declaração Mundial sobre a Educação para Todos, resultado da
Conferência de Jomtien na Tailândia em 1990,52 retoma a importância de garantir o
acesso de todos à educação, em particular aos grupos excluídos, às populações das
periferias urbanas e zonas rurais, aos nómadas e aos trabalhadores migrantes, aos
povos indígenas, às minorias étnicas, raciais e linguísticas: refugiados, deslocados
pela guerra e os povos submetidos a um regime de ocupação (Artigo nº.3). Defende
ainda, esta declaração, uma educação que promova a tolerância para com a
diversidade de sistemas sociais, políticos e religiosos assegurando o respeito pelos
valores humanistas e direitos humanos (Artigo nº.1).
A Declaração de Dakar (2000)53 vem reforçar a orientação da Declaração de
Jomtien, conotando a educação com a chave para o desenvolvimento sustentável.
Assim, as comunidades locais e internacionais, ao assegurarem a toda a criança,
jovem e adulto o direito humano de beneficiar de uma educação que satisfaça as suas
necessidades básicas de aprendizagem, no respeito pelos talentos e capacidades de
50 Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais. (disponível em:
http://www.fd.uc.pt/hrc/enciclopedia/onu/textos_onu/pidesc.pdf). 51 A Convenção sobre os Direitos da Criança. (disponível em: http://www.unicef.pt/docs/pdf_publicacoes/convencao_direitos_crianca2004.pdf). 52 Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de aprendizagem. (disponível em: http://unesdoc.unesco.org/images/0008/000862/086291por.pdf). 53 Educação para todos: o compromisso de Dakar. (disponível em: http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001211/121147f.pdf).
cada um, estão a garantir o desenvolvimento de competências que permitam uma
participação efectiva destes cidadãos nas sociedades e economias do nosso século.
A Convenção Internacional sobre a Protecção dos Trabalhadores Migrantes e
Membros das suas Famílias,54 instrumento fundamental para a garantia e salvaguarda
dos direitos dos imigrantes, prevê no Artigo 30º a aplicação do direito à educação aos
trabalhadores migrantes em situação irregular, em condições de igualdade com os
cidadãos do Estado de acolhimento. A Convenção é especialmente clara quanto à
consagração do direito à educação dos filhos dos trabalhadores migrantes,
independentemente da legalidade da presença do trabalhador migrante ou da criança.
O Artigo nº 2 do Protocolo da Convenção para a Protecção dos Direitos Humanos
(1952) (ETS nº.9) garante que a ninguém pode ver negado o direito à educação,
salvaguardando que a implementação desse direito deve respeitar as convicções
religiosas e filosóficas dos pais.55
A Convenção Cultural Europeia (1954) (ETS nº. 18) defende uma política que
valorize e promova o desenvolvimento de uma cultura europeia comum num contexto
de diversidade cultural. Para tal, a resolução defende o estudo das línguas, da história
e civilização dos outros e da civilização que é comum a todos.56
A Carta Social Europeia, publicada em 1961 e revista em 1996, complementa
a Convenção Cultural Europeia em matéria de direitos económicos e sociais ao definir
um conjunto de situações em que as crianças gozam do direito à educação:
descendentes de minorias étnicas; refugiadas ou em situação de asilo; internadas em
unidades de saúde; jovens grávidas, mães jovens e crianças/jovens em regime de
internato em instituições a cumprir penas. No âmbito da educação, destacamos os
Artigos 17º e 19º onde se definem os direitos das crianças e dos jovens à protecção
social, legal e económica, garantido o livre acesso à educação primária e secundária,
e se atribui uma relevância particular aos trabalhadores migrantes, definindo o direito
destes e das suas famílias à aprendizagem da língua de origem e da língua do país de
acolhimento.57 Acrescentamos ainda as orientações no domínio da protecção face à
pobreza e exclusão social de grupos em situação de vulnerabilidade (Artigo nº 30)
ocupando a educação um lugar fundamental.
54
Convenção Internacional sobre a Protecção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias. Adoptada pela Resolução n.º 45/158 da Assembleia-Geral das Nações Unidas, a 18 de Dezembro de 1990, entrou em vigor em 1 de Julho de 2003 (disponível em: http://gfph.dpieurope.org/droit%20homme/ConventionInfo/Manual_PT/AD8POR.pdf). 55
Protocolo Adicional à Convenção de Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais. (Modificado nos termos das disposições do Protocolo nº11). Conselho da Europa (disponível em: http://conventions.coe.int/Treaty/En/Treaties/html/009.htm). 56
Na Conferência de Viena, em 1993, o Conselho da Europa colocou no centro
da sua política para a diversidade cultural e educação a protecção das minorias
nacionais enfatizando o desenvolvimento de uma educação para os direitos humanos
e respeito pela diversidade cultural (Arnesen, Hadzhitheodoulou-Loizidou, Birzéa &
Allan, 2009). A diversidade cultural é novamente valorizada, no âmbito da educação
para a cidadania, na 2ª Cimeira do Conselho da Europa realizada em Estrasburgo, em
1997.58
Em 2000, o Conselho da Europa (Directiva 2000/43) volta a colocar o acento
tónico no princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de
origem racial ou étnica (Artigo 2º), justificando que as situações de discriminação
comprometem a realização dos objectivos definidos em tratados anteriores,
nomeadamente nos aspectos que se relacionam com a coesão social para a qual a
educação dá um contributo importante (Artigo 3º).59
A Declaração da Diversidade Cultural, adoptada em 2000, reconhece que o
respeito pela diversidade cultural é uma condição essencial da vida das sociedades
humanas e do processo de construção europeia. 60 Na conferência, realizada em
Varsóvia em 2005, é evocada a importância da diversidade como fonte de
enriquecimento mútuo, favorecendo o diálogo político, intercultural e inter-religioso,
fundamental para edificar sociedades solidárias e garantir um acesso igual aos direitos
sociais, protegendo os grupos vulneráveis e reforçando a coesão das sociedades nas
suas dimensões social, educativa, cultural e de saúde.61
As conferências de ministros europeus de educação têm-se orientado pelos
princípios contidos nas declarações anteriormente referidas. Destacamos neste
domínio as sessões de Kristiansand (1997), Cracóvia (2000), Atenas (2003) e Istambul
(2007). Os documentos e recomendações que emergiram destas conferências são
importantes referências para as políticas nacionais de educação.
A conferência de 1997 acentuou a importância da abordagem à diversidade
de identidades nacionais europeias na formação inicial e contínua de professores e
enfatizou a pertinência do desenvolvimento de estratégias de comunicação
58
Nesta cimeira é lançado o projecto Educação para a Cidadania Democrática e para os Direitos Humanos, inscrito na missão fundadora do Conselho da Europa, a de "reforçar a democracia pluralista, o respeito pelos Direitos do Homem e a primazia do direito" (disponível em: http://www.gepe.min-edu.pt/np4/148.html). 59
Directiva 2000/43/CE do Conselho, de 29 de Junho de 2000, aplica o princípio da igualdade de tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica. Jornal Oficial nº L 180 de 19/07/2000 p. 0022 – 0026 (disponível em: http://eurlex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2000:180:0022:0026:PT:DF). 60
Déclaration sur la diversité culturelle. (disponível em: https://wcd.coe.int/ViewDoc.jsp?Ref=Decl-07.12.2000&Language=lanFrench&Ver=original&Site=CM&BackColorInternet=9999CC&BackColorIntranet=FFBB55&BackColorLogged=FFAC75). 61
Déclaration de Varsovie (disponível em: http://www.coe.int/t/dcr/summit/20050517_decl_varsovie_FR.asp?).
113
interpessoal, promoção da interdisciplinaridade e do trabalho em equipa sustentados
na noção de escola como “comunidade educativa”. Em 2000, na Conferência de
Cracóvia, os Ministros da Educação voltam a retomar as questões da formação,
acrescentando a importância do ensino da História e de uma educação para a
cidadania democrática (Arnesen et al. 2009).
Na Conferência de Atenas (2003), os ministros da educação reconheceram o
papel da educação intercultural e o empenho do Conselho da Europa em desenvolver
e manter a unidade e diversidade das sociedades europeias. Intitulada “Intercultural
education: managing diversity, strengthening democracy”,62 a conferência reforça a
importância da resposta aos desafios colocados pela diversidade das sociedades na
melhoria da qualidade da educação. A Declaração, resultante desta Conferência,
solicita ao Conselho da Europa que potencialize a riqueza de experiências
acumuladas nas áreas de gestão da diversidade, educação intercultural e educação
de qualidade, para dar um novo impulso na construção de um plano de acção
coerente, viável e integrado. Assim, deve: i) relançar a investigação conceptual sobre
a educação intercultural; ii) contribuir para a dimensão europeia da educação no
contexto da globalização, valorizando a diversidade e abertura a outras culturas e
religiões; iii) incentivar os Estados membros a reconhecer que a gestão da diversidade
não é um problema que as escolas devam viver sozinhas, mas diz respeito a toda a
sociedade, especialmente no que toca às políticas implementadas na vida social,
familiar e no domínio das migrações. Na perspectiva de Dietz (2012), as opções
avançadas por esta declaração desenvolvem-se fundamentalmente a partir das
necessidades das sociedades receptoras perante a heterogeneidade do público
escolar.
Na Declaração de Roclaw (2004),63 a diversidade cultural surge novamente
como um dos pilares base da coesão social e do desenvolvimento sustentável. À
educação formal e não-formal cabe o papel de assegurar o diálogo intercultural e inter-
religioso como meio de sensibilização e compreensão do outro, de prevenção de
conflitos e contribuição para a coesão social. Em 2005, na Declaração de Faro,64 os
ministros da cultura comprometeram-se em contribuir para a construção de uma
sociedade solidária que reforce a coesão social nas dimensões educativa e cultural,
através da implementação de estratégias de gestão e promoção da diversidade
62
Declaration by the European Ministers of Education on intercultural education in the new European Context. (disponível em: http://www.coe.int/t/e/cultural_cooperation/education/standing_conferences/e.21stsessionathens2003.ap). 63
Wroclaw declaration on fifty years of European Cultural Cooperation. (disponível em:
Faro Declaration on the Council of Europe‟s Strategy for Developing Intercultural Dialogue. (disponível em:http://www.coe.int/t/dg4/CulturalConvention/Source/FARO_DECLARATION_Definitive_Version_EN.pt).
114
cultural numa perspectiva que assegure o desenvolvimento futuro da sociedade. De
modo a operacionalizar estas intenções, definem as seguintes linhas de acção: i) o
respeito pelos direitos culturais e o direito à educação para lutar contra a exclusão em
particular dos grupos vulneráveis; ii) a implementação de políticas públicas
intersectoriais que favoreçam a diversidade cultural e o diálogo intercultural, assim
como a aprendizagem das línguas e o acesso às tecnologias de informação
facilitadores das trocas à escala global; iii) o desenvolvimento da consciência da
história das culturas, das artes e das religiões numa perspectiva de valorização de
elementos ilustrativos das influências históricas e contemporâneas entre culturas e
civilizações, assim como de fenómenos de mestiçagem cultural.
Em 2008, na Conferência de Istambul, são retomadas as questões da
educação numa perspectiva de inclusão social, “Building a more human and inclusive
Europe: role of education policies”.65As recomendações da Declaração de Istambul
apelam ao diálogo intercultural e inter-religioso nas instituições de educação; ao
envolvimento das organizações governamentais e não-governamentais; à participação
das organizações internacionais, nacionais e locais, enfatizando o importante papel
destas últimas e da sociedade civil, na promoção da tolerância, compreensão e
participação, criando e ajustando ambientes multiculturais que permitam beneficiar das
vivências em sociedades diversas. Para responder a estes desafios é sugerido aos
governos nacionais e instituições não-governamentais um trabalho multidisciplinar,
facilitador de uma abordagem crítica a partir de diferentes perspectivas, que conduza a
uma promoção da diversidade nos programas e sistemas de ensino formais e não
formais e à definição de políticas escolares mais inclusivas, promotoras de laços, do
diálogo, do conhecimento e descoberta sobre a diversidade. Para tal impõe-se, ao
nível da escola, um currículo aberto, que facilite uma abordagem de diversos pontos
de vista, representativos dos vários grupos, etnias e religiões.
O envolvimento das instituições locais é uma das recomendações que surge
com alguma ênfase na Declaração, nomeadamente pela importância que assume o
local nas vivências diárias de comunidades diversas. Assim, os desafios que se
colocam a este nível implicam o desenvolvimento de políticas de suporte às
manifestações interculturais e inter-religiosas; o encorajamento ao desenvolvimento de
estruturas representativas de diferentes religiões e comunidades culturais promotoras
de programas e actividades ao nível local; a definição, suporte e divulgação de
medidas que sustentem a participação de todos os grupos (baseadas no género, etnia,
65
Standing Conference of European Ministers of Education; Final Declaration – Building a more humane and inclusive Europe: role of education policies. (disponível em: http://www.coe.int/t/dg4/highereducation/news/istanbul_final%20declaration_en.doc.pdf).
115
religião, idade, estatuto sócio económico, orientação sexual, competências físicas e
mentais, etc.) nas decisões locais, princípio fundamental de uma sociedade
democrática.
Na sequência desta Declaração e do desenvolvimento dos trabalhos no
âmbito do diálogo intercultural, o Conselho da Europa publicou, em Maio de 2008, o
Livro Branco Sobre o Diálogo Intercultural. 66 Nele é defendida uma abordagem
intercultural que proporcione um modelo de gestão da diversidade aberto às evoluções
futuras, sendo que, para tal “será necessário adaptar várias vertentes da governação
democrática da diversidade cultural; a cidadania e a participação democrática devem
ser reforçadas; as competências interculturais devem ser ensinadas e desenvolvidas:
os espaços reservados ao diálogo intercultural devem ser criados ou ampliados; o
diálogo intercultural deve ter uma dimensão internacional” (COE. 2008, p. 7). Acresce
ainda que a construção de uma identidade europeia deve sustentar-se no “respeito
pelo património comum, pela diversidade cultural e pela dignidade de cada indivíduo.”
(COE. 2008, p. 6), valorizando o diálogo intercultural, a diversidade e a coesão social.
As sucessivas conferências do Conselho da Europa dos ministros
responsáveis pelas questões das migrações 67 têm também redigido algumas
recomendações que valorizam a educação nomeadamente: i) na sensibilização aos
alunos para as diferenças culturais, promovendo o conhecimento e compreensão
mútuos; ii) na promoção das relações intracomunitárias; iii) na manutenção do bem-
estar social nas sociedades pluriculturais contemporâneas; iv) na luta contra o racismo
e xenofobia.
Na conferência de Kiev (2008)68 propõe-se, entre as medidas específicas de
intervenção, a necessidade de eliminar os obstáculos dos migrantes e suas famílias à
educação e o estabelecimento de programas educativos que visem ajudar os
migrantes a aprender a língua do país de acolhimento e a conhecer melhor a sua
cultura. Acredita-se que estas medidas contribuirão, em conjunto com outras, para a
promoção do diálogo entre migrantes e a sociedade de acolhimento (nomeadamente
ao nível local), e proporcionarão os meios para uma participação activa no processo
de integração, quer dos migrantes recém-chegados, quer daqueles que já residem no
país há alguns anos.
66
Livro Branco sobre o Diálogo Intercultural. “Viver Juntos em Igual Dignidade” (disponível em: http://www.coe.int/T/dg4/intercultural/Source/Pub_White_Paper/WhitePaper_ID_PortugueseVersion2.pdf). 67
Declaração de Kiev da Conferência Internacional Desafios Actuais aos Direitos Humanos e Liberdades. (disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/pfdc/informacao-e-comunicacao/informativos-pfdc/edicoes-de-2008/docs-abril/Anexo2_inf_26_2008).
116
Relativamente à promoção da integração das crianças imigrantes ou
descendentes de imigrantes, o Comité de Ministros dos Estados Membros adoptou,
em Fevereiro de 2008, uma Recomendação (CM/Rec (2008) 4)69 para a integração
nas políticas e práticas nacionais de dispositivos para a melhoria da integração das
crianças recém-chegadas no sistema escolar: dar a estas crianças competências
linguísticas ao nível pré-escolar; preparar as crianças migrantes ou descendentes de
migrantes, no final da sua escolaridade, para fazer a transição da escola para o
mercado de trabalho e ultrapassar as dificuldades com que são confrontadas as
crianças que vivem em zonas segregadas ou bairros desfavorecidos. 70 Esta
recomendação pretende responder a um conjunto de considerações que o referido
Comité apresenta e das quais salientamos algumas: i) a relação entre a integração
dos imigrantes e a coesão social; ii) a necessidade de reforçar a integração na escola
e na sociedade de acolhimento das crianças imigrantes ou descendentes de
imigrantes; iii) as limitações que o fraco domínio da língua de ensino e as diferentes
experiências educativas anteriores podem ter no percurso escolar das crianças
imigrantes; iv) o facto de em muitos estados membros serem as crianças imigrantes
ou descendentes as que mais frequentemente abandonam precocemente a escola; v)
a importância das competências interculturais dos professores e outros responsáveis
pela educação na gestão da diversidade e da integração das crianças imigrantes na
escola; vi) a importância de envolver/implicar os pais na educação escolar dos filhos
fornecendo-lhes as informações necessárias para fazer o referido acompanhamento;
vii) a necessidade de encorajar o envolvimento da sociedade civil e das associações
de migrantes na integração das crianças.
Em síntese, desde a revisão da Carta Social Europeia, em 1996, que as
instituições europeias têm produzido um conjunto de declarações e recomendações
políticas que procuram valorizar os desafios colocados pela diversidade cultural,
colocando a tónica no contributo desta na melhoria da qualidade da educação.
Progressivamente, a diversidade cultural surge associada à coesão social, e as
comunidades escolares revelam-se “os estaleiros ideais para a prática da tolerância e
para a formação de espíritos abertos à descoberta do outro” (Carneiro, 2001, p. 78).
Educar cidadãos para a convivência numa “nação de nações” coloca a escola perante
dois grandes desafios: i) acolher expressões culturais diversas e, ii) assumir a
construção da identidade como um processo que combina multireferências culturais
69
Recomendações CM/Rec (2008) 4 do Comité de Ministros sobre a promoção da integração de crianças migrantes e de origem imigrante. (disponivel em: http://www.coe.int/t/dg3/children/news/guidelines/A4%20Recommendation%20CM% 0protection%20of%20children%20_POR_BD.pdf). 70
Esta Recomendação vem na sequência de outras no mesmo domínio, como por exemplo: Rec786 (1976), R (84) 9 de 1984, Rec1089 (1988) e Rec 1093 (1989).
Crianças em Mundo Urbano. Situação Mundial da Infância, 2012. (disponível em: http://www.unicef.pt/18/Relatorio_SituacaoInfancia2012.pdf).
118
O quadro estratégico para a educação e formação na União Europeia,
integrado na estratégia definida para 2020, identifica quatro objectivos chave para o
desenvolvimento das políticas de educação e formação que integram as premissas
anteriormente apresentadas: i) tornar a aprendizagem ao longo da vida e a mobilidade,
uma realidade; ii) melhorar a qualidade e eficiência da educação e formação; iii)
promover a igualdade, a coesão social e a cidadania activa; iv) melhorar a criatividade
e inovação, incluindo empreendedorismo, nos diferentes níveis de educação e
formação (ENAR,74 2011).
Apesar de, na perspectiva da integração da população imigrante, a
concretização de todos os objectivos definidos ser fundamental, o objectivo promover
a igualdade, a coesão social e a cidadania activa é aquele cuja concretização pode ter
maior relevância na educação e formação de populações imigrantes. A justificação
para a sua pertinência encontra-se no facto deste objectivo prever que a educação e
políticas de formação devem: (a) envolver todos os cidadãos tendo em conta a sua
situação individual, social e económica, garantindo assim o desenvolvimento de
competências para a vida activa; (b) incentivar os cidadãos a aprender ao longo da
vida; (c) desenvolver um diálogo intercultural e uma cidadania activa. Na concretização
deste objectivo são definidas quatro prioridades de acção: i) combate ao abandono
escolar precoce; ii) promoção da educação pré-primária; iii) educação/formação das
populações migrantes; iv) educação/formação dos indivíduos com necessidades
educativas especiais (ENAR, 2011). Defende-se ainda que as desvantagens na
educação devem ser combatidas através de programas específicos de apoio e de uma
educação que se deve iniciar desde cedo.75 A promoção da educação inclusiva é uma
variável muito importante neste objectivo e, como tal, a União Europeia argumenta que
a educação e formação devem assegurar a todos – pessoas com necessidades
educativas especiais, pessoas em desvantagem social e migrantes – a possibilidade
de concluírem o seu percurso escolar, mesmo que para tal seja necessário garantir
uma segunda oportunidade e prestar um apoio educativo mais individualizado (ENAR,
2011). Deste modo, pela via da educação e formação deve ser possível promover o
desenvolvimento de competências interculturais, valores de democracia e respeito
pelos direitos fundamentais, bem como o combate a todas as formas de discriminação,
formando cidadãos capazes de interagir com a diversidade de forma positiva,
independentemente do seu background.
74
ENAR – European Network Against Racism 75
A Aprendizagem ao Longo da Vida abrange todos os níveis educativos, desde a infância, à educação superior, à formação vocacional e formação de adultos (ENAR, 2011).
119
Os objectivos definidos para a política educativa europeia orientam-se
fundamentalmente por princípios de igualdade, respeito pelos direitos humanos,
participação democrática e promoção do diálogo intercultural. Estas premissas
reúnem-se nas principais intenções da educação intercultural definidas pelo Conselho
da Europa em 2003: educação para os valores; competências de cidadania; prática da
democracia (Neuner, 2012). Cada uma das dimensões do modelo é analisada pelo
autor, com base nos documentos produzidos pelo Conselho da Europa:
1. Educação para os valores. No caso da educação intercultural são
identificados como fundamentais três valores: os direitos humanos, a
democracia pluralista e o papel da lei na definição das condições de acesso à
cidadania;
2. Competências de cidadania. Entendidas como parte integrante da
cultura cívica de cada pessoa, são adquiridas ao longo da vida em processos
de aprendizagem em contextos educativos diversos, sendo fundamentais
para consolidar e promover a aprendizagem da cidadania;
3. Prática directa da democracia. Construída na experiência quotidiana, a
aprendizagem da democracia não resulta de políticas top-down, mas sim do
envolvimento directo dos alunos em experiências de aprendizagem que
envolvam a participação activa, a negociação colectiva, a comunicação, a
resolução de problemas e o envolvimento na comunidade.
As três dimensões do modelo de educação intercultural têm implícitas,
segundo Neuner (2012), o entendimento do conceito “intercultural” como dimensão
activa da diversidade, pressupondo a interacção entre os indivíduos, grupos e
comunidades no sentido do desenvolvimento de projectos comuns, de partilha de
responsabilidades e de criação de identidades comuns. Estas dimensões encontram
também suporte numa política de educação assente nos quatro pilares definidos pela
UNESCO (2005) para a educação no século XXI: “aprender a ser” que se liga aos
valores, “aprender a conhecer” que implica uma visão ampla e dinâmica de cultura,
“aprender a fazer” e “aprender a viver juntos” que mobilizam a abertura ao diálogo, à
solidariedade, à cooperação, à interacção e ao conhecimento dos outros.
Retomando os modelos teóricos de análise das políticas de integração
anteriormente discutidos, podemos identificar nas políticas que se centram na
educação um conjunto de dimensões e elementos que os autores consideram ser
fundamentais na sua construção. Referimo-nos às três dimensões (político-legal,
socioeconómica, cultural e religiosa) que conferem um carácter multidimensional, à
120
articulação entre os níveis local, nacional e regional, e à implicação de diferentes
actores e agentes, entre os quais se situam as populações imigrantes. O esquema da
Fig. II.1 procura apresentar (i) as diferentes áreas de intervenção contempladas nas
orientações europeias para a política educativa, identificadas a partir de uma análise
de conteúdo das diversas orientações anteriormente referidas; (ii) os actores e
agentes envolvidos; (iii) o tipo de políticas que os documentos europeus e
internacionais privilegiam neste domínio e, (iv) os efeitos multiplicadores que se prevê
que possam ser desencadeados, quer nas populações directamente envolvidas, quer
na sociedade em geral.
O esquema organiza-se em quatro círculos concêntricos: áreas de
intervenção da educação, actores e agentes, políticas e efeitos, que se prevê que se
articulem entre si através das dinâmicas transversais que emergem das diferentes
áreas de intervenção da educação que se situam no núcleo central. Tal como para os
modelos anteriormente apresentados, se na educação apenas se valorizar uma das
áreas de intervenção todo o percurso no sentido da integração pode ficar condicionado,
por comprometer a lógica multidimensional das políticas.
Fig. II.1 – Educação e integração: dimensões, políticas, actores e agentes
Fonte: Construção própria.
121
A análise evolutiva das orientações europeias no domínio da educação de
crianças e jovens imigrantes e o conhecimento das suas intencionalidades são um
importante suporte para a compreensão e contextualização das orientações da política
educativa nacional. Apesar das competências da União Europeia, no campo da
educação, se resumirem ao suporte e monitorização das actividades dos estados
membros e não à imposição de uma legislação comum (ENAR, 2011), as orientações
definidas são um importante suporte para os diversos estados membros. É tendo
como cenário de fundo as grandes intenções dos normativos europeus no campo da
educação e integração de populações imigrantes que analisamos, no ponto seguinte a
política educativa nacional.
2.2. O acolhimento de imigrantes: contexto político nacional
Os princípios fundamentais definidos nos artigos nº 13 (Princípio da
igualdade)76 e nº 15 (Estrangeiros, apátridas, cidadãos europeus) da Constituição da
República Portuguesa reconhecem a igualdade perante a lei a todos os cidadãos e a
garantia aos nacionais de países estrangeiros, que residem legalmente no território
português, de todos os direitos de cidadania – direitos cívicos, sociais e económicos,
com excepção dos direitos políticos.77 No âmbito pessoal e individual, o artigo 26.º
especifica, entre outros, os direitos à identidade pessoal e à protecção legal contra
quaisquer formas de discriminação. A Lei nº 134/99, de 28 Agosto, proíbe as
discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na raça, cor,
nacionalidade ou origem étnica.
Portugal tem registado, nos últimos anos, uma evolução positiva na política
de imigração, orientando as suas medidas e estratégias para um enquadramento legal
integrado, favorável ao acolhimento e integração de imigrantes em todas as
dimensões da sociedade portuguesa. As medidas adoptadas no país com vista à
integração dos imigrantes têm tido referências muito positivas ao nível internacional,
conforme comprova o relatório apresentado pelo MIPEX – Índex de Políticas de
76
Constituição da República Portuguesa, Parte I – Direitos e Deveres Fundamentais, Título I – Princípios
Gerais. Artigo 13º, ponto 2. “Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.” (disponível em: http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx#art13). 77
Constituição da República Portuguesa, Parte I – Direitos e Deveres Fundamentais, Título I – Princípios Gerais. Artigo 15º, ponto 1. “Os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português”; ponto 2. “Exceptuam-se do disposto no número anterior os direitos políticos, o exercício das funções públicas que não tenham carácter predominantemente técnico e os direitos e deveres reservados pela Constituição e pela lei exclusivamente aos cidadãos portugueses” (disponível em: http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx#art13).
122
Integração de Migrantes (2007).78 Mais recentemente, o relatório de 2011,79 que inclui
a dimensão educação entre os indicadores analisados, classifica Portugal no segundo
lugar num conjunto de 31 países da Europa e América do Norte, e o Relatório de
Desenvolvimento Humano das Nações Unidas (2009) posiciona Portugal no primeiro
lugar em políticas de integração dos imigrantes. Este reconhecimento internacional
resulta de uma comparação realizada com base nos pareceres técnicos de peritos de
42 países. São exemplos destas mudanças qualitativas os desenvolvimentos no
domínio da legislação aplicável na área da imigração: a nova Lei da Nacionalidade (Lei
Orgânica n.º2/2006, de 17 de Abril)80 que reconhece um estatuto de cidadania a quem
tem fortes laços com Portugal; a nova lei de entrada, permanência, saída e
afastamento de cidadãos estrangeiros do território nacional (Lei n.º 23/2007, de 4 de
Julho),81 a qual procedeu à transposição de diversas Directivas Comunitárias neste
domínio; o Decreto-Lei n.º 368/2007, de 5 de Novembro, que instituiu um regime
especial de concessão de autorização de residência a vítimas do crime de tráfico de
pessoas; os objectivos e prioridades da política criminal na sua vertente imigratória,
constantes da Lei n.º 51/2007, de 31 de Agosto.
No âmbito dos planos governamentais na área da imigração e integração,
destacam-se os planos (I e II) para a integração dos imigrantes (Plano I – Resolução
do Conselho de Ministros n.º 63-A/2007, Diário da República n.º 85, SÉRIE I, de 3 de
Maio 82 e Plano II - Resolução do Conselho de Ministros n.º 74/2010, de 17 de
Setembro) 83 , constituídos por um conjunto de medidas que, concretizando
compromissos sectoriais do Estado, continuam a assumir como grande finalidade a
plena integração dos imigrantes. Do Plano II constam 90 medidas distribuídas por 17
áreas de intervenção das quais destacamos a cultura e a língua, o emprego e a
formação profissional, a educação, os descendentes de imigrantes, e a promoção da
diversidade e interculturalidade. De salientar ainda o reforço do apoio aos imigrantes
78
O MIPEX II é composto por 140 indicadores, distribuídos por cinco áreas prioritárias para a integração dos imigrantes: acesso ao mercado de trabalho, reagrupamento familiar, participação política, acesso à nacionalidade e medidas de combate ao racismo e descriminação. 79
O MIPEX III é composto por 148 indicadores de políticas, distribuídos por sete áreas: educação de alunos migrantes, acesso ao mercado de trabalho, reagrupamento familiar, participação política, residência de longa duração, aquisição de nacionalidade e antidiscriminação. 80
”pela nova lei é atribuída a nacionalidade portuguesa de origem aos nascidos no território português, filhos de estrangeiros, se pelo menos um dos progenitores também aqui tiver nascido e aqui tiver residência, independentemente de título, ao tempo do nascimento do filho, bem como aos nascidos no território português, filhos de estrangeiros que se não encontrem ao serviço do respectivo Estado, se declararem que querem ser portugueses, desde que, no momento do nascimento, um dos progenitores aqui resida legalmente há, pelo menos, cinco anos.” (Lei Orgânica n.º 2/2006, de 17 de Abril). 81
A Lei de Estrangeiros foi ainda regulamentada através do Decreto Regulamentar n.º 84/2007, de 5 de Novembro, e complementada pelas Portarias n.ºs 727/2007, de 6 de Setembro, 1079/2007, de 16 de Novembro, 1563/2007, de 11 de Dezembro, 287/2007, de 16 de Março. 82
Plano para a Integração dos Imigrantes (2007-10) (disponível em: http://www.dgeep.mtss.gov.pt/planeamento/pimigrantes.php) (acedido Novembro, 2009). 83
Plano para a Integração dos Imigrantes (2010-2013) (disponível em: http://www.governo.gov.pt/pt/GC18/Documentos/PCM/II-PII.pdf) (acedido em Março, 2011).
através do Alto Comissariado para a Imigração e o Diálogo Intercultural – ACIDI
(criado através do Decreto-Lei n.º 251/2002, de 22 de Novembro) e dos seus centros
locais e nacionais de apoio ao imigrante – CLAI e CNAI; da Comissão para a
Igualdade e Contra a Discriminação Racial – CICDR (Lei n.º 134/99, de 28 de Agosto);
da Comissão da Liberdade Religiosa – CLR (Lei n.º 16/2001, de 22 de Junho).
Estes instrumentos legais visam uma abordagem global, equilibrada e atenta
à complexidade dos processos migratórios actuais, estruturando-se “em torno de
quatro grandes eixos: regulação dos fluxos migratórios, promoção da imigração legal,
luta contra a imigração clandestina e integração dos imigrantes.” (SEF, 2007, p. 5).
Quer a lei da nacionalidade quer a “lei da imigração” abrem novas portas no
domínio do acolhimento e integração de imigrantes na sociedade portuguesa face à
legislação anterior. Contudo, são condições para a aquisição da nacionalidade a
existência de alguns conhecimentos no domínio da Língua Portuguesa (Portaria n.º
1403 – A/2006, de 15 de Dezembro)84 e que os requerentes não tenham sido julgados
e condenados a pena igual ou superior a três anos, segundo a Lei Portuguesa. A
aquisição da nacionalidade portuguesa não implica a perda da nacionalidade de
origem, desde que a lei do país de origem assim o permita.
É também evidente a melhoria significativa das condições legais de
acolhimento na sociedade portuguesa, nomeadamente com a simplificação de
requisitos necessários para o reagrupamento familiar, a obtenção de autorizações de
residência,85 a imigração de natureza temporária, a admissão de cientistas, docentes
universitários e estrangeiros altamente qualificados (Fonseca, McGarrigle, Esteves &
Malheiros, 2009).
Portugal foi um dos países europeus que registou mudanças mais
significativas no período dos três anos (2007-2010) que mediaram a avaliação das
políticas de acolhimento de imigrantes pelo MIPEX. Em 2010, na apreciação global, o
país posicionou-se em segundo lugar, logo a seguir à Suécia. Para este
posicionamento foram fundamentais os esforços realizados em diversos campos da
política, em particular nos domínios do direito à residência de longa duração, da
situação laboral, do reagrupamento familiar e das leis antidiscriminação.
O exercício do direito à residência de longa duração, resultante da aprovação
da Lei da Imigração de 2007, permitiu aos imigrantes que há mais tempo residiam em
84
Nos termos do novo regime jurídico, o Governo concede a nacionalidade portuguesa, por naturalização, aos estrangeiros que, entre outros requisitos, demonstrem conhecer suficientemente a língua portuguesa. (Portaria n.º 1403-A/2006, de 15 de Dezembro. Diário da República, 1ª Série, n.º 240, pp. 8468(2)-8468(5)). 85
Assistiu-se, assim, à introdução de um novo conceito de residência legal em território português, entendendo-se que residem legalmente em Portugal não apenas os titulares de autorização de residência mas, igualmente, os detentores de qualquer título válido. (Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho. Diário da República, 1ª Série, n.º 127, pp. 4290-4330).
124
território nacional usufruírem de uma maior segurança de estatuto sendo-lhes
possibilitado o direito de fixarem residência enquanto, para os recém-chegados,
significou poder beneficiar de requisitos de elegibilidade mais favoráveis e de melhores
condições e direitos (MIPEX III, 2010). Em termos laborais, os trabalhadores
imigrantes e respectivas famílias, independentemente da nacionalidade, têm
legalmente as mesmas oportunidades de mudar de emprego e realizar um percurso
profissional, quer no sector público, quer como trabalhadores por conta própria. Os
seus direitos perante o emprego são idênticos aos dos nativos, podendo usufruir do
apoio do gabinete jurídico dos Centros Nacionais de Apoio ao Imigrante (CNAI). O
Plano Nacional de Integração dos Imigrantes define que as oportunidades no acesso
ao mercado de trabalho devem ser idênticas às dos nacionais, evitando assim
situações de discriminação. Para os trabalhadores com formação superior realizada
num país estrangeiro, a oportunidade de solicitarem o reconhecimento da sua
qualificação pode facilitar o acesso a uma carreira profissional mais ajustada às
habilitações de que são portadores.
Um outro aspecto, que valoriza as políticas portuguesas de integração na
avaliação internacional, reporta-se à componente familiar, por assumir nas suas
políticas uma definição mais inclusiva de família. A aposta do país em assegurar a
permanência da família, mesmo em situação de crise económica, tem sido uma
medida fundamental na garantia da coesão social.
A lei da nacionalidade, baseada na reforma de 2006, tem sido muito eficaz do
ponto de vista da imigração, sendo avaliada como a que melhor promove a edificação
de uma cidadania comum entre os 31 países avaliados pelo MIPEX III. O acesso à
cidadania por parte de todos os residentes portadores de conhecimentos básicos de
língua, confere aos imigrantes um estatuto semelhante ao dos portugueses. Esta lei,
surge também como referência para as mudanças necessárias ao nível da
participação política, uma área em que é recomendado um maior investimento, no
sentido de alargar as oportunidades de participação a todos os cidadãos (MIPEX III,
2010).
Ainda no campo da antidiscriminação, a solidez das leis surge bastante
valorizada no quadro internacional. Contudo, a complexidade dos procedimentos e a
morosidade dos processos suscitam a necessidade de reorganização dos
mecanismos e instituições que actuam neste campo.
Apesar das fragilidades ainda sentidas em alguns domínios dos direitos dos
imigrantes, de que são exemplo os direitos políticos (Fonseca & Goracci, 2007), têm
sido significativos os esforços do Estado português para articular as políticas de
imigração e integração dos imigrantes com as directivas comunitárias e com a política
125
social nacional, numa lógica de coesão social e de garantia da igualdade de
oportunidades.
2.3. Quadro legal nacional de acesso dos alunos imigrantes à educação
No quadro da política educativa, existe uma grande diversidade nas medidas
postas em prática nos diferentes sistemas educativos europeus para incluir as
crianças imigrantes, sendo da responsabilidade de cada estado membro a definição
das políticas neste domínio (Eurydice, 2004).
A Constituição da República Portuguesa (CRP) define, que “Todos têm direito
ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito
escolar.” (artigo n.º 74.1) e que, na realização da política de ensino, incumbe ao
Estado “Assegurar aos filhos dos imigrantes apoio adequado para efectivação do
direito ao ensino.” (artigo n.º 74.2, alínea j). Assim, todas as crianças e jovens
imigrantes ou descendentes de imigrantes que se encontrem a residir em Portugal, em
situação legal ou ilegal86 têm, perante a lei, direito ao ensino.
O aluno imigrante é assumido na lei como um cidadão com direitos e
estatutos iguais aos cidadãos nacionais, motivo pelo qual não encontramos na
legislação referente ao acesso ao sistema de ensino português, assim como nos
documentos produzidos pelo Ministério da Educação, uma definição de “aluno
imigrante”. Os documentos legais referem-se a filhos de imigrantes, alunos cuja língua
materna não é a Língua Portuguesa e alunos estrangeiros.
A Lei de Bases do Sistema Educativo (1986) retoma os princípios
constitucionais. Desde o lançamento da reforma educativa que “os documentos e a
legislação que enquadram e fundamentam o sistema educativo têm vindo a evoluir no
sentido de uma maior e melhor consideração pela diversidade dos alunos no seu
contexto.” (Cardoso, 2005, p. 27). A necessidade de responder aos desafios da
crescente diversidade vivida no sistema educativo e de promover uma educação de
maior qualidade, numa Europa culturalmente heterogénea, sustentou a revisão
curricular do Ensino Básico de 2001. 87 Esta revisão prevê uma organização do
currículo centrada em cinco princípios fundamentais: (i) existência de áreas
disciplinares; (ii) integração da educação para a cidadania com carácter transversal às
86
É garantido a todos os cidadãos estrangeiros menores em situação ilegal, o acesso à educação tal como acedem os menores em situação regular no território nacional. (Decreto-Lei n.º 67/2004, de 25 de Março, Diário da República, 1ª Série, n.º 72, p. 1798). 87
O Decreto-Lei 6/2001, de 18 de Janeiro, define o conjunto de competências essenciais e estragtégias de implementação do currículo nacional para cada ciclo do Ensino Básico, assim como o perfil de competências a desenvolver ao longo de cada ciclo e o tipo de experiências de aprendizagem para os estudantes. (Diário da República, 1ª Série, n.º 15, pp. 258-265).
126
restantes áreas/disciplinas; (iii) reconhecimento da autonomia das escolas, com a
possibilidade de construção de um projecto curricular de escola integrado no
respectivo projecto educativo; (iv) valorização de metodologias e estratégias de
aprendizagem diversas; (v) aposta na diversidade de ofertas educativas, de acordo
com as necessidades dos estudantes.88 A revisão curricular do Ensino Básico é um
marco importante na reorientação da política educativa e no início da produção
gradual de um conjunto de documentos legais de suporte e incentivo à integração dos
filhos de imigrantes no sistema de ensino português.
Os documentos legais definem que todas as crianças em idade pré-escolar
ou escolar devem frequentar a escola da sua área de residência89 e serem integradas
em grupos ou turmas de acordo com a heterogeneidade do público escolar.90 Para os
alunos que já haviam iniciado o seu percurso escolar no país de origem está previsto
um sistema de atribuição de equivalência de habilitações ou a colocação no nível de
ensino adequado à idade, no caso do aluno não se fazer acompanhar de um
certificado. Cabe aos estabelecimentos de ensino grande parte da responsabilidade na
condução destes processos.91
Ao nível governamental, o Departamento do Ensino Básico reconhece a
necessidade de promoção da Educação Intercultural como resposta à crescente
diversidade de alunos de origem estrangeira. O ensino do português como Língua Não
Materna surge pela primeira vez nos documentos oficiais em 2001 (artigo 8º, Decreto-
Lei n.º 6/2001). Às escolas é atribuída autonomia na organização de currículos
específicos para aprendizagem da língua portuguesa como segunda língua, para os
estudantes que não têm a língua portuguesa como língua materna. Actualmente, os
alunos estrangeiros podem beneficiar de apoio pedagógico adequado às
competências de língua de que são portadores, enquadrado no projecto educativo do
estabelecimento de ensino. Este apoio deve centrar-se na superação das dificuldades
sentidas pelo aluno, designadamente no domínio da língua portuguesa (LP).92 O apoio
na aprendizagem da língua portuguesa é a única situação em que são sugeridos
grupos específicos de trabalho e os alunos imigrantes podem surgir isolados dos
restantes colegas de turma. A legislação refere-se ainda à necessidade de promover,
“o reconhecimento e o respeito pelas necessidades individuais de todos os alunos e,
88
Em 2011, o Ministério da Educação e Ciência revogou o Currículo Nacional do EB. Competências Essenciais pelo Despacho n.º 17169/2011, de 23 de Dezembro de 2011 (Diário da República, 2ª Série, n.º
245, p. 50080). Contudo, o seu enquadramento legal (Decreto-Lei 6/2001) manteve-se em vigor. 89
Despacho n.º 13170/2009, de 4 de Junho, Diário da República, 2ª Série, n.º 108, pp. 22467-22473. 90
Anexo 1, ponto 5.10 do Despacho n.º 13170/2009, de 4 de Junho, Diário da República, 2ª Série, n.º 108, pp. 22467-22473). 91
Capítulo IV, Artigo n.º 11º do Decreto-Lei nº 227/2005 de 28 de Dezembro, Diário da República, 2ª Série, n.º 248, pp. 7255-7259). 92
Decreto-Lei nº 227/2005 de 28 de Dezembro.
127
em particular, pelas necessidades específicas dos alunos recém-chegados ao sistema
educativo nacional”93 e aos desafios colocados às escolas perante a possibilidade de
mobilizar a riqueza da diversidade linguística e heterogeneidade sociocultural como
factores de coesão e integração. 94 Neste sentido, também “os programas e os
projectos mais específicos, promovidos pelo poder político, têm visado consolidar
formas de lidar curricularmente com a diversidade de alunos. São disso exemplo os
projectos de flexibilização curricular, currículos alternativos, educação intercultural,
educação inclusiva, educação para a cidadania, etc.” (Cardoso, 2005, p. 30).
O documento orientador do ensino do português como Língua Não Materna
(2005) prevê também o apoio a programas de aprendizagem da Língua Materna e da
cultura de origem e, neste sentido, as “escolas com alunos oriundos de outros países
poderão apresentar programas de aprendizagem da língua materna e da cultura de
origem dos alunos, que integrarão o seu projecto educativo”.95
Apesar de algumas limitações que ainda podemos encontrar na Lei de Bases
do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86), a educação foi o sector pioneiro em iniciativas
políticas formais relativamente à diversidade étnica e cultural (Cardoso, 2005). A Lei
n.º 46/86 estabelece o quadro geral e organização do sistema educativo (Pré-primário,
Educação Básica, Educação Secundária e Educação Superior) e prevê o direito à
educação e cultura para todos os portugueses. Neste quadro legal, o Estado é o
responsável pela democratização da educação, assegurando igualdade de
oportunidades em educação, acesso e sucesso. A criação do Secretariado
Coordenador dos Programas de Educação Multicultural (Entreculturas) em 1991,
posteriormente integrado no ACIDI (2004), foi a primeira medida política concreta
neste domínio, permanecendo hoje como um importante programa de promoção do
conhecimento da diversidade cultural.96 A equipa deste projecto foi criada numa lógica
interministerial e transversal, com uma articulação permanente com outros
departamentos ministeriais, sendo responsável por implementar actividades numa
perspectiva integradora.
O estudo realizado por Calado e Batista (2010), no âmbito do projecto
europeu Moving Societies Towards Integration,97 apresenta uma síntese do trabalho
desenvolvido pelo Secretariado Entreculturas no campo da educação multicultural.
93
Despacho Normativo n.º 7/2006, de 6 de Fevereiro, Diário da República, 1ª Série, n.º 26, pp. 903-905. 94
Despacho Normativo n.º 30/2007, de 10 de Agosto, Diário da República, 2ª Série, n.º 154, pp. 22853-22854. 95
DGIDC, Português Língua não Materna no Currículo Nacional. Documento Orientador. Programa para integração dos alunos que não têm português como língua materna. DGIDC, Ministério da Educação. (disponível em: http://www.dgidc.min-edu.pt/linguaportuguesa/Documents/PLNMDoc_orientador.pdf) 96
Sobre as funções do Secretariado Enterculturas veja-se http://www.entreculturas.pt/. 97
O Relatório encontra-se disponível em: http://www.programaescolhas.pt/conteudos/noticias/ver-noticia/4cbc861626a97/moving-societies-towards-integration----relatorio-final-faz-o-retrato-do-grau-de-abertura-intercultural-no-sistema-de-ensino-em-portugal.
128
Com base neste estudo, construímos uma breve apresentação da contribuição deste
núcleo impulsionador da educação multicultural em Portugal como ferramenta para a
integração de alunos imigrantes. Entre 1991 e 1993, o Secretariado desencadeou um
trabalho importante de sensibilização nas escolas e outros intervenientes para as
questões da educação multicultural como veículo para a integração de populações
imigrantes na escola. Ainda no âmbito da sua estratégia de actuação, o Secretariado
dinamizou e participou em conferências nacionais e internacionais que permitiram: (i) a
mobilização de redes de parceiros e investigadores na construção de um conjunto de
documentos para serem utilizados nas escolas e, (ii) o envolvimento de escolas e
organizações não-governamentais em projectos de educação multicultural. Entre 1993
e 1997, foi implementado em 50 escolas portuguesas, envolvendo 200 professores, o
Projecto de Educação Intercultural (PEI)98 que permitiu realizar algumas experiências
educativas para interagir com a diversidade social, cultural e étnica, e promover a
inclusão. Os objectivos do PEI eram: fomentar a qualidade na educação; incentivar a
educação multicultural a partir de projectos; promover a igualdade de oportunidades
através da escola e a integração de estudantes das minorias; fomentar as relações
entre escola, família e a comunidade. O PEI surge num contexto marcado pelo
aumento do número de alunos de origem africana nas escolas portuguesas, em
particular nos distritos de Lisboa e Setúbal, sustentando a sua pertinência no facto de
nas sociedades modernas tenderem a “agravar-se problemas de convivência
intercultural, manifestações de intolerância e de violência física e psicológica exercidas
sobre minorias étnicas” e das “dificuldades acrescidas de convivência e integração”
por parte destas populações (Despacho n.º 170/ME/93). Para facilitar a
implementação deste projecto nas escolas foi desenvolvido um programa de formação
para professores.
Em 1997, o Entreculturas orienta também a sua acção para produção de
materiais de apoio à educação intercultural nas escolas e nas instituições que se
dediquem à educação de crianças e jovens imigrantes, mobilizando e procurando
colocar em prática alguns resultados e reflexões decorrentes do PEI. No ano seguinte
o âmbito da intervenção é alargado ao campo social e as actividades do Secretariado
direccionam-se para a produção e disseminação de materiais e participação em
98
O PEI foi “lançado no âmbito do Secretariado Coordenador dos Programas de Educação Multicultural (Despacho Normativo nº 63/91, de 13 de Março) a quem compete coordenar, incentivar e promover, no âmbito do sistema educativo, os programas e acções que visem a educação para os valores da convivência, da tolerância, do diálogo e da solidariedade entre diferentes povos, etnias e culturas. O Projecto Educação Intercultural desenvolve-se em escolas do ensino básico situadas em zonas de residência de populações pertencentes a minorias étnicas e com elevada percentagem de insucesso escolar” (disponível em: http://www4.seg-social.pt/documents/10152/13326/Criancas_jovens_risco).
129
projectos europeus (Sócrates, Coménius, Arion) e outros projectos transnacionais,
como o Youthstart, e EQUAL (Calado & Batista, 2010).
A intensificação e diversificação das correntes migratórias para Portugal e a
sucessiva publicação de legislação no domínio da imigração incentivaram a criação do
Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME). Actualmente
designado de Alto Comissariado para a Integração e Diálogo Intercultural (ACIDI), é
uma instituição pública que funciona em parceria com o Ministério da Educação no
sentido da integração dos imigrantes e seus descendentes. A integração do
Secretariado Entreculturas no ACIDI inicia uma nova fase no seu âmbito de actuação
e responsabilidades. A criação do gabinete de Educação e Formação, alarga o campo
de intervenção e define novas áreas de actuação no âmbito da educação.
O ACIDI tem como missão principal a cooperação no estabelecimento,
execução e avaliação de políticas públicas, transversais e sectoriais, relativas à
integração de imigrantes e minorias étnicas, assim como promoção do diálogo entre
culturas diversas, etnias e religiões. Os sete princípios básicos que orientam a
intervenção do Alto Comissariado são: igualdade, no reconhecimento e garantia dos
direitos e oportunidades; diálogo, na promoção da comunicação; cidadania, pela
participação activa e exercício dos direitos e deveres; hospitalidade, no
reconhecimento da diversidade; interculturalidade, resultado do enriquecimento no
encontro com a diferença; proximidade, pelo encurtar das distâncias de modo a
conhecer e melhor responder e, iniciativa, que se traduz pela capacidade de
antecipação (Calado & Batista, 2010).
O ACIDI é actualmente uma referência na coordenação de um importante
programa nacional dinamizado no âmbito da inclusão escolar e educação não formal.
O Programa Escolhas99 é um programa de âmbito nacional, tutelado pela Presidência
do Conselho de Ministros e fundido no Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo
Intercultural, IP, que visa promover a inclusão social de crianças e jovens provenientes
de contextos socioeconómicos mais vulneráveis, particularmente dos descendentes de
imigrantes e minorias étnicas, tendo como objectivos principais a igualdade de
oportunidades e o reforço da coesão social. 100 O programa, envolvendo crianças,
jovens e respectivas famílias, está a ser implementado no território nacional,
99
O Programa Escolhas foi criado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 4/2001, de 9 de Janeiro (Diário da República, 1ª Série-B, n.º 7, pp. 68-72). Posteriormente, foi renovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 60/2004, de 30 de Abril (Diário da República, 1.ª Série-B, n.º 102, pp. 2689-2691); pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 80/2006, de 26 de Junho (Diário da República, 1.ª Série-B, n.º 121, pp. 4518-4520); e pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 63/2009, de 23 de Julho. 100
Programa Escolhas (disponível em: http://www.programaescolhas.pt).
130
encontrando-se já na sua quinta geração (2013-2015) 101 com 110 projectos que
mobilizam, como parceiros, os agrupamentos de escolas. 102 O percurso que o
programa seguiu, desde a primeira geração em 2001, tem-no aproximado
progressivamente das escolas, num primeiro momento, pelo estabelecimento de
algumas parcerias através dos projectos locais, posteriormente pela definição das
escolas e agrupamentos de escolas como parceiros prioritários dos projectos.
Têm sido diversos os programas e projectos em curso nas escolas que visam,
na sua essência, dar resposta às preocupações sentidas com a integração dos filhos
dos imigrantes na sociedade de acolhimento. Outros programas, como o Urban e o
EQUAL, têm promovido projectos com o objectivo da integração da população
imigrante nas escolas.
O II Plano para a Integração dos Imigrantes (2010-2013) prevê, para as áreas
da cultura e da língua, o reforço das medidas de intervenção das quais destacamos:
formação para a interculturalidade na formação contínua de professores; definição e
implementação de recomendações para a constituição de turmas equilibradas e
adequação das estratégias das escolas no acolhimento dos alunos estrangeiros e
descendentes de imigrantes; diversificação das ofertas educativas e formativas;
integração de agentes de mediação intercultural em contexto escolar no âmbito do
Programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP); 103 acesso de
estudantes estrangeiros aos apoios da acção social escolar, em todos os graus de
ensino; divulgação dos recursos pedagógicos interculturais junto das escolas; apoio ao
acolhimento e integração de estudantes estrangeiros e descendentes de imigrantes; e
o projecto «SEF vai à Escola» 104 no âmbito da regularização documental dos
imigrantes menores que frequentam os estabelecimentos de ensino em Portugal.
A preocupação com a integração dos imigrantes no sistema educativo
português tem sido evidente desde finais dos anos 80. Hoje, Portugal vai mais longe
do que outros novos países de imigração na promoção da integração social a partir da
101
Actualmente o programa encontra-se na 5ª geração (2013-2015), aprovada pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 68/2012, de 9 de Agosto, Diário da República, 1.ª série, n.º 154, pp. 4279-4281). 102
O Despacho Normativo n.º 17/2012, de 16 de Agosto, que enquadra o Regulamento do Programa Escolhas, define no capítulo III, artigo 6º, ponto 1, as escolas e agrupamentos de escolas como instituições elegíveis com carácter prioritário nas candidaturas ao programa (Diário da República, 2ª Série, n.º 158, pp. 29006-29014). 103
Criado pelo Despacho n.º 147-B/ME/96, de 1 de Agosto (Diário da República, 2ª Série, n.º 177, pp. 10719-10720), os TEIP visam a promoção da igualdade no acesso e no sucesso educativos da população escolar em idade de frequência do ensino básico, em particular das crianças e dos jovens em situação de risco de exclusão (social e escolar). Em 2008, o programa é relançado, pelo Despacho Normativo n.º 55/2008, de 23 de Outubro (Diário da República, 2ª Série, n.º 206, pp. 43128-43130). Em 2012, é lançado o terceiro programa TEIP pelo Despacho Normativo n.º 20/2012, de 3 de Outubro de 2012 (Diário da República, 2ª Série, n.º 192, pp. 33344-33346). 104
O projecto “SEF vai à Escola” tem como objectivo atribuir ou renovar títulos de residência em território nacional a a lunos que frequentam estabelecimentos de ensino em Portugal (disponivel em: http://www.imigrante.pt/campanha_SEF_escola.htm).
131
educação: todos os alunos, independentemente do seu estatuto, têm acesso à escola
e a um apoio direccionado para as famílias mais vulneráveis, aprendendo ainda a
conviver num ambiente marcado pela diversidade (MIPEX III, 2011).
De acordo com estudos realizados, apesar das intenções, das medidas e dos
planos para a redução das situações de exclusão social através da integração no
sistema educativo, nem sempre o sucesso desejado à escala da escola, tal como o
sucesso na melhoria das condições sociais a partir da educação, tem sido fácil de
alcançar (Abrantes, 2003; Seabra, 2008; Sebastião, 2009; Carvalho, 2010). Muitas
crianças continuam hoje a aceder à escola em situações desiguais, sem as condições
mínimas para competir e realizar um percurso escolar com sucesso. É preciso que as
crianças e os jovens, sobretudo aqueles que vêm de meios desfavorecidos,
reencontrem um sentido para a escola, pois só assim conseguiremos que “todos os
alunos tenham verdadeiramente sucesso” (Nóvoa, 2009, p. 14). Nas escolas são
significativas, entre outros aspectos, as diferenças quantitativas e qualitativas ao nível
dos recursos humanos e materiais, dos aspectos organizacionais e metodológicos,
das condições económicas e sociais dos territórios e das famílias que servem
(Cardoso, 2006). De acordo com este autor e corroborando os resultados do último
relatório do MIPEX, apesar da abertura da política educativa nacional e do
reconhecimento pelas instituições de educação da necessidade de uma atenção
particular à integração dos alunos imigrantes, os esforços desenvolvidos limitam-se,
por vezes, à reprodução das desigualdades esquecendo: i) a necessidade de criar
oportunidades de sucesso educativo para todos, independentemente das suas origens
sociais, étnicas e religiosas; ii) a importância da valorização das diferentes culturas
através da sua integração no currículo; iii) a necessidade de afastar/eliminar as
atitudes e procedimentos de racismo pessoal e institucional; iv) o papel fundamental
do envolvimento dos pais imigrantes na educação dos seus filhos; v) a necessidade de
formação dos professores no âmbito da educação e diversidade e, vi) a abertura da
escola à comunidade. Entre os factores responsáveis pelo insucesso das medidas e
planos implementados podemos salientar: a falta de recursos, a falta de formação dos
professores, a resistência das famílias, o desconhecimento das causas do insucesso e
abandono escolar por parte de alguns sectores da população, entre os quais se
encontra a população económica e socialmente desfavorecida e a de origem
estrangeira com baixo nível socioeconómico. Apesar das diversas iniciativas
legislativas a que temos assistido em Portugal, programas, projectos, investigações e
intenções, nem sempre é visível uma continuidade e coerência dos mesmos. O próprio
documento final da revisão curricular de 2001 não integra explicitamente, nas dez
competências que define para o Ensino Básico, a diversidade cultural. Apesar de
132
tomar como referentes os pressupostos da Lei de Bases do Sistema Educativo,
sustentando-se em valores e princípios de “respeito e valorização da diversidade dos
indivíduos e grupos quanto às suas pertenças e opções” e na “valorização das
dimensões relacionais da aprendizagem e dos princípios éticos que regulam o
relacionamento com o saber e com os outros”,105 a referência à diversidade cultural
surge de forma explícita apenas no âmbito de algumas disciplinas e/ou áreas
curriculares (Cardoso, 2005).
Portugal afirma-se politicamente como um país que acolhe imigrantes e
descendentes seguindo um modelo intercultural. Este modelo assume a sociedade
portuguesa como culturalmente diversa, preconizando o reforço do sentimento de
pertença, a construção participada de uma comunidade inclusiva, o respeito mútuo
pela diversidade e sua valorização (Calado & Batista, 2010). A diversidade cultural é
assumida como uma componente positiva da sociedade que se vive na articulação
entre pluralismo cultural e coesão social. Nesta perspectiva, o modelo segue as
premissas que anteriormente discutimos para o conceito de integração, construindo-se
numa lógica de articulação interactiva e relacional, implicando o acolhimento e
transformação das duas partes envolvidas no sentido da inclusão.
O Quadro III.4 apresenta uma breve síntese cronológica das principais
medidas e políticas que têm dado forma a um modelo de educação intercultural. No
que se reporta às alterações na política educativa, a leitura do quadro deixa claro que
a primeira década do séc. XXI assinala uma viragem no paradigma que passa a
sustentar o acolhimento da diversidade de alunos nas escolas. As principais
orientações legais que tornam exequíveis os princípios da valorização da diversidade
e da construção da cidadania, emanados na Lei de Bases do Sistema Educativo, são
produzidas e entram em vigor já neste século.
Quadro II.4 – Políticas e medidas para a integração de alunos de origem imigrante em contexto
educativo
Ano Instituições, Projectos e Planos Política Educativa
1991 Criação do Secretariado para a Educação Multicultural.
1993-94
Implementação do Projecto Educação Intercultural (PEI).
1993 Fundação da Associação de Professores para a Educação
105
Currículo Nacional do Ensino Básico. (2001). DEB, Ministério da Educação, p. 15 (disponível em: http://www.dgidc.min-edu.pt/ensinobasico/index.php?s=directorio&pid=2).
Formação de mediadores Culturais para o Ensino Básico, em escolas com populações ciganas (DEB/ME).
1995 Criação do ACIME
1996 1º Programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP).
1998 Implementação do Projecto “For Minorities”, integrado no programa Cidades Digitais, pelo ACIME e MCT.
1999 Decreto Regulamentar nº 10 de 99
Figura do Professor Tutor para acompanhamento individual do processo educativo de um grupo de alunos.
2001 1ª Geração do Programa Escolhas (PE)
Decreto-Lei n.º 6/2001
Revisão Curricular do Ensino Básico:
- ensino da Língua Portuguesa como segunda língua;
- educação para a cidadania transversal aos currículo;
- projectos curriculares de escola contextualizados no local.
Lei nº 105/2001
Figura do Mediador Sociocultural que pode exercer funções em diversos organismos públicos e privados incluindo a escola.
2004 Integração do Secretariado Entreculturas no ACIME.
Delegação de competências em educação intercultural ao ACIME/Entreculturas, pelo ME.
Integração do PE no ACIME.
segunda Geração do PE.
Decreto-Lei n.º 67/2004
Garante o direito à saúde educação para as minorias em situação irregular.
2005 Decreto-Lei n.º 227/2005
Disponibilização de apoio pedagógico em LP para os alunos estrangeiros.
2006 3ª Geração do PE. Despacho n.º 7/2006
Reconhecimento e respeito pelas necessidades individuais de todos os alunos, em particular dos imigrantes recém-chegados.
2007
O ACIME passa a ACIDI.
Criação e implementação do 1º Plano Nacional para a Integração dos Imigrantes (2007-10).
Despacho n.º 30/2007
Delegação de competências à escola para mobilizar a diversidade linguística e heterogeneidade sociocultural como factores de integração e coesão social.
2008 2º Programa TEIP
2009 4ª Geração do PE.
Projecto “SEF vai à Escola”
Despacho n.º 13170/2009
As crianças e jovens em idade pré-escolar ou escolar devem frequentar a escola na área de residência e ser integradas em turmas heterogéneas.
2010 Criação e implementação do 2º Plano Nacional para a Integração dos Imigrantes (2010-13).
2012 5ª Geração do PE. 3º Programa TEIP
134
Em síntese, identificam-se três grandes tipos de medidas no modelo
intercultural definido para a inclusão dos estudantes imigrantes nas escolas: (i) de
acolhimento; (ii) de apoio na aprendizagem da LP como língua não materna e, (iii) de
flexibilização curricular.
Nas medidas de acolhimento identificam-se os seguintes domínios de
intervenção:
organização dos processos escolares individuais dos alunos;
organização de turmas heterogéneas;
constituição de uma equipa multidisciplinar e multilinguística;
avaliação dos conhecimentos em LP através de um teste diagnóstico;
instituição da figura do mediador sociocultural, que permite estabelecer
a articulação entre escolas, famílias e outras instituições públicas e
privadas da comunidade;
instituição da figura do professor tutor que, em articulação com os
restantes professores, pode fazer o acompanhamento individual do
processo educativo de um grupo de alunos.
Nas medidas de apoio à aprendizagem da LP como língua não materna
destacam-se a:
dinamização de actividades curriculares específicas para a
aprendizagem da LP como segunda língua para estudantes cuja língua
materna não é o português;
implementação de áreas curriculares disciplinares e projectos em LP
que permitem uma abordagem transversal da LP;
construção e implementação de planos de recuperação que integrem
actividades de ensino de LP como segunda língua.
Nas medidas de flexibilização curricular situam-se diversas áreas em que a
escola tem autonomia de gestão do currículo, das quais evidenciamos:
gestão de 45 minutos lectivos em actividades de desenvolvimento e
aprendizagem da LP;
definição do projecto curricular de escola, integrado no projecto
educativo, adaptando-o e ajustando-o às diferentes necessidades e
contextos escolares;
135
gestão da abordagem intercultural do currículo;106
implementação de projectos em áreas diversas do conhecimento e/ou
transversais às diferentes áreas do saber.
Na apreciação internacional, Portugal surge numa posição favorável em
termos de política educativa para a integração de populações imigrantes, sendo-lhe
reconhecido o trabalho desenvolvido no sentido da definição de políticas para a
inclusão social na educação. Segundo os resultados do MIPEX III, o país ocupa a
primeira posição na facilidade de acesso à educação (a par dos EUA) e o quinto lugar
em termos de educação internacional (depois do Reino Unido, Holanda, Noruega e
Suécia). Os principais factores que contribuem para uma avaliação positiva do país
reportam-se i) ao acesso à escola por parte de todas as crianças e jovens; ii) à
possibilidade de aprender desde cedo a conviver num ambiente que se caracteriza
pela diversidade; iii) ao acesso ao ensino da língua portuguesa com algum apoio extra;
iv) ao apoio escolar disponibilizado pelo Estado, para as famílias mais vulneráveis,
assegurando uma parte das despesas com a educação dos filhos; v) ao apoio
institucional do ACIDI e aos projectos que este desenvolve no sentido da integração
social e inclusão escolar, com destaque para o Programa Escolhas.
Nas fragilidades reconhecidas pela avaliação internacional das políticas de
ensino são identificados, i) o envolvimento dos pais e encarregados de educação,
desde a educação pré-escolar; ii) a regulação das aprendizagens anteriores dos
alunos recém-chegados com vista a uma melhor colocação dos mesmos nos anos e
ciclos de ensino; iii) o aproveitamento das novas oportunidades, decorrentes da
presença de comunidades imigrantes, em particular a promoção do ensino da língua e
cultura; iv) a formação de professores para dar resposta a necessidades específicas
dos imigrantes; v) as respostas a necessidades específicas dos imigrantes em
ambiente escolar, em particular no ensino da língua portuguesa e apoios extra; vi) a
diversificação das escolas e do pessoal docente.
As fragilidades identificadas devem ser interpretadas como um importante
ponto de partida para a melhoria na definição das políticas de educação,
perspectivando um melhor desempenho do país neste domínio. Apesar da entrada de
populações estrangeiras ter vindo a diminuir nos últimos anos, a educação das
crianças e jovens descendentes de imigrantes continuará a ser uma realidade nas
escolas portuguesas. Entre esta população identificam-se (i) os descendentes de
106
Sobre a abordagem intercultural do currículo veja-se a publicação Gestão Intercultural do Currículo, elaborada para o 1º CEB e outros estudos desenvolvidos no âmbito do Entreculturas e ME (Cardoso, 1998).
136
imigrantes que permanecem no país e que acompanharam os pais no movimento
migratório; (ii) as crianças que já nasceram em território nacional cujos pais são
imigrantes e/ou contraíram matrimónio, ou vivem em união de facto com nativos; e,
também, (iii) os descendentes de emigrantes portugueses que regressaram a Portugal
e que já frequentam o sistema de ensino e/ou todos aqueles que numa conjuntura
económica mais favorável poderão regressar dentro de alguns anos. A integração da
segunda geração deverá continuar a fazer parte das orientações políticas do país no
campo da imigração.
Um outro instrumento que é possível mobilizar, e que permite também fazer
um balanço do impacto da política educativa nacional, é o relatório PISA divulgado em
2009. 107 Neste documento é feita uma comparação do desempenho escolar dos
alunos imigrantes relativamente aos nativos em diferentes países europeus. Segundo
este relatório, persiste nos países da OCDE uma diferença equivalente a um ano
escolar entre os alunos imigrantes e os nativos, distância que se mantém mesmo
depois de controlada a variável de nível socioeconómico. Portugal registou em 2009
melhorias em todos os domínios avaliados pelo PISA (leitura, matemática e ciências),
facto que o próprio relatório relaciona, em parte, com a existência de políticas
favoráveis. Contudo, mantêm-se diferenças entre os domínios avaliados, encontrando-
se também as características sociodemográficas como o sexo, a origem imigrante e o
estatuto socioeconómico e cultural associados a resultados desiguais.
O estudo desenvolvido por Carvalho, Ávila, Nico e Pacheco (2011), com base
nos indicadores do relatório PISA (2009) conclui que “ser do sexo masculino e de
origem imigrante de primeira geração é uma combinação que interfere negativamente
no desempenho da literacia, em qualquer dos domínios considerados do PISA.” (p. 81).
Todavia, os mesmos autores afirmam que, relativamente ao conjunto dos países da
União Europeia, a associação negativa entre as variáveis origem imigrante e
desempenho escolar é menos acentuada para Portugal. Entre os factores que
avançam para a justificação da evolução global registada nos níveis de literacia das
crianças e jovens do país, onde se incluem também os alunos de origem imigrante,
são valorizadas as políticas, os projectos e programas desenvolvidos a nível nacional
e/ou regional, como o Plano Nacional de Leitura,108 o Programa Ciência Viva,109 o
107
O relatório PISA disponibiliza indicadores, representativos e comparativos, do desempenho escolar dos alunos de 15 anos em áreas chave ou consideradas fundamentais das sociedades contemporâneas. Os resultados para Portugal estão disponíveis em: http://www.gave.min-edu.pt/np3content/?newsId=346&fileName=Apres_Gulb_Final.pdf. 108
Sobre o Plano Nacional de Leitura veja-se em: http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt/index1.php. 109
A informação sobre o programa encontra-se disponível em: http://www.cienciaviva.pt/cienciaviva/
137
Plano de Acção da Matemática,110 o Programa Nacional de Ensino do Português111 e o
Programa de Formação em Ensino Experimental das Ciências112.
A concluir a caracterização da política nacional relativa à integração dos
alunos imigrantes no sistema educativo e à posição do país perante um conjunto
alargado de países de acolhimento de imigrantes mobilizamos a apreciação global
feita no relatório MIPEX III e que ilustra, de forma clara, a situação actual. “São poucos
os sistemas educativos na Europa que se estão a adaptar à realidade da imigração.
Os mais diligentes encontram-se na América do Norte, nos países nórdicos e no
Benelux. De entre os novos países de imigração Portugal é aquele que possui as
melhores práticas, tal como a República Checa na Europa Central e a Estónia no
Báltico. Os restantes ficam abaixo da média, alguns deles com resultados bastante
inferiores (França, Irlanda, Letónia, Bulgária, Hungria)” (MIPEX, Índex III, Portugal,
2010, p. 16).
110
Sobre o Plano de Acção da Matemática a informação está disponível em: http://www.dgidc.min-edu.pt/outrosprojetos/index.php?s=directorio&pid=29 111
Sobre o Plano Nacional de Ensino do Português veja-se: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:qHF9ewz_3ZMJ:http://www.dgidc.minedu.pt/outrosprojetos/index.php%3Fs%3Ddirectorio%26pid%3D188%2BPNEP&rls=com.microsoft%3Apt%3AIE-SearchBox&oe=UTF-8&rlz=1I7ADBR_enPT238&hl=pt&ct=clnk. 112
A consulta de informação sobre este programa pode ser feita em: http://www.dgidc.min-edu.pt/outrosprojetos/index.php?s=directorio&pid=93#i.
138
139
3. Imigração e educação – a reconstrução das políticas
A intensificação dos movimentos migratórios com destino à Europa
desencadeou, no século XXI, alterações importantes nas políticas de acolhimento. A
convicção de uma imigração de cariz temporário foi progressivamente abandonada
pelo reconhecimento da fixação nos territórios de destino de grupos alargados de
imigrantes. A fragilidade de um modelo de integração, construído apenas a partir do
mercado de trabalho, numa lógica de assimilação cultural, foi deixando de fazer
sentido numa sociedade marcada pela pluralidade de culturas. O entendimento da
integração como um processo multidimensional e dinâmico, com impacto em
diferentes domínios da sociedade complexifica a sua concretização, implicando na
formulação das políticas dimensões diversas de intervenção no campo social. A
procura de soluções para a integração da diversidade de populações imigrantes tem
marcado as agendas políticas europeias e desencadeado investigações diversas no
âmbito das ciências sociais.
Ao carácter multidimensional e dinâmico que deve sustentar a formulação das
políticas de integração, articulando as dimensões político-legal, socioeconómica,
cultural e religiosa, deve associar-se a incorporação da relação entre imigrantes e
instituições na sociedade de acolhimento, valorizando os níveis individual e
colectivo/grupo. Neste sentido, deve perspectivar-se, por um lado, a articulação entre
as estruturas da sociedade e as relações sociais e, por outro, as características
culturais, identidade, relações no grupo étnico/cultural e religião dos imigrantes.
A uma escala europeia, as principais orientações de política para a educação
insistem no importante papel da escola enquanto agente de inclusão e promotor da
coesão social, orientando os objectivos da política educativa por princípios de
igualdade, respeito pelos direitos humanos, participação democrática e promoção do
diálogo intercultural. Estas premissas reúnem-se nas principais intenções da educação
intercultural definidas pelo Conselho da Europa em 2003: educação para os valores;
competências de cidadania; prática da democracia (Neuner, 2012), dimensões que
encontram correspondência nos quatro pilares definidos pela UNESCO para a
educação no século XXI. 113 Deste modo, pela via da educação e formação, apela-se à
promoção e desenvolvimento de competências interculturais, reconhecimento dos
valores de democracia e respeito pelos direitos fundamentais, combate a todas as
formas de discriminação, formando cidadãos capazes de interagir com a diversidade
de forma positiva.
113
Estas dimensões encontram-se explicitadas no Relatório para a UNESCO, da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, coordenado por Jacques Delors (Delors, 2005).
140
A um nível micro, nos territórios onde se vive e concretiza a integração a
partir das orientações nacionais, os principais intervenientes no processo de formação
são a escola, os professores, os alunos e as famílias, mas também a comunidade, as
instituições públicas e a sociedade civil e as Organizações Não Governamentais
(ONG). Pretende-se, desta forma, uma abordagem multidisciplinar à educação e a
articulação entre estratégias top-down e bottom-up na operacionalização das políticas.
Neste novo paradigma de resposta a uma sociedade plural, a educação passa a
relacionar-se e a desempenhar um importante papel em dimensões diversas da vida
em sociedade que decorrem “fora dos muros da escola” mas que com esta interferem
directamente. Entendida nesta óptica, a educação surge como a ferramenta para a
promoção da diversidade cultural, para a participação democrática, para a prevenção
da pobreza e exclusão social, abrindo o caminho para a inclusão e coesão social.
Como vimos anteriormente, Portugal afirma-se politicamente como um país
que acolhe imigrantes e seus descendentes seguindo um modelo intercultural,
assumindo a sociedade portuguesa como culturalmente diversa, reforçando o
sentimento de pertença, a construção participada de uma comunidade inclusiva, o
respeito mútuo pela diversidade e a sua valorização (Calado & Batista, 2010). As
orientações de política nacional no acolhimento de populações imigrantes registaram
uma grande evolução, em particular nos domínios do direito à residência de longa
duração, da situação laboral, reagrupamento familiar e leis anti-discriminação. O país
encontra-se, assim, melhor posicionado do que muitos países europeus com
prolongadas experiências no acolhimento de populações imigrantes.
A área da educação pode ser considerada como a pioneira na definição de
estratégias de intervenção no sentido da promoção da interculturalidade, iniciada com
a criação do Secretariado Entreculturas (1991). Portugal encontra-se mais próximo de
países norte-americanos, de alguns países nórdicos e do Benelux. Não obstante esta
posição vantajosa, a educação é a área que requer maior investimento no futuro, em
particular no aproveitamento das potencialidades decorrentes da diversidade cultural,
na formação de professores para a interculturalidade e na construção de respostas em
contexto escolar que melhor se adeqúem às necessidades específicas da imigração.
São evidentes as mudanças registadas desde o início do século XXI na
política educativa portuguesa. A atestar estas mudanças está o conjunto de
documentos legais produzidos para responder à intensificação e diversidade de
populações de origem imigrante no sistema educativo, assim como o aparecimento de
instituições e projectos que, em articulação com a escola, concorrem para uma melhor
integração das crianças e jovens oriundas da imigração. Embora no âmbito das
políticas o país não consiga ainda responder à globalidade das orientações europeias,
141
são evidentes os esforços no sentido de alargar os intervenientes na educação,
aproximar as escolas da comunidade, flexibilizar os currículos, garantir a
aprendizagem da língua portuguesa para os recém-chegados e atribuir um importante
papel à educação como motor da inclusão e coesão social. Destacam-se, entre os
principais aspectos positivos, a garantia do acesso à escola por parte de todas as
crianças e jovens; a possibilidade de aprender desde cedo a conviver num ambiente
caracterizado pela diversidade; a integração no currículo da língua portuguesa como
língua não materna; o acesso ao ensino da língua portuguesa com algum apoio extra;
o apoio escolar disponibilizado pelo Estado, para as famílias mais vulneráveis,
assegurando uma parte das despesas com a educação dos filhos; o apoio institucional
do ACIDI e dos projectos que este organismo desenvolve no sentido da integração
social e inclusão escolar, com destaque para os projectos do Programa Escolhas.
A corroborar os indicadores anteriores, o estudo de análise dos resultados do
PISA (2009) realizado por uma equipa de investigadores portugueses (Carvalho, Ávila,
Nico & Pacheco (2011) revela que no país são menos acentuados os efeitos da
associação negativa entre origem imigrante e desempenho escolar quando
comparados com os resultados divulgados para o conjunto da União Europeia (os
quais são relativamente mais baixos quando comparados com o efeito estatuto
socioeconómico e cultural). A esta avaliação positiva junta-se também o maior
sucesso identificado entre a segunda geração de imigrantes no relatório PISA (2009).
Para os autores do estudo, a evolução registada no desempenho escolar em
Portugal, quer entre imigrantes, quer entre nativos, deve-se, globalmente, às escolas e
seus protagonistas; às famílias e decisores políticos; às políticas e projectos nacionais
e regionais que mobilizam todos os agentes ou, a projectos e dinâmicas de menor
amplitude, só captáveis a uma escala micro.
142
143
PARTE III – ALUNOS IMIGRANTES NAS ESCOLAS EM PORTUGAL
1. Espaços e tempos da presença de alunos de origem imigrante no sistema
educativo português
2. Escola e Imigração em Portugal – diversidades no final da primeira década do
século XXI
3. A Área Metropolitana de Lisboa: escola e diversidades
3.1. Origens e distribuição geográfica no território metropolitano
3.2. Distribuição por ciclo, no Ensino Básico, e desempenho escolar
3.3. Tendências sócio-espaciais do desempenho escolar no território
metropolitano
3.4. Padrões territoriais do insucesso escolar
4. Perfis da imigração no sistema de ensino português – do país à AML
A cidade é crescentemente plural e complexa.
(Roberto Carneiro, Fundamentos da Educação e da Aprendizagem, 2001, p. 266)
144
145
Depois de definido o esquema de análise que nos propomos mobilizar,
desenvolvido a partir dos conceitos de diversidade cultural e integração, o qual
sustentou a análise dos normativos legais que têm orientado a integração dos
descendentes de imigrantes no sistema educativo, quer na União Europeia, quer em
Portugal, centramo-nos de seguida na caracterização da população imigrante que
frequenta as escolas públicas portuguesas.
A chegada às escolas públicas de grupos de crianças e jovens naturais de
outros países pode situar-se temporalmente no período pós-descolonização, que se
inicia com o 25 de Abril de 1974. Nos nossos dias, a presença de crianças e jovens de
origens diversas é a realidade de muitas escolas, em particular das que se localizam
em meio urbano, com destaque para a AML. Com os alunos originários dos PALOP,
convivem hoje crianças e jovens oriundas de diferentes regiões do globo, com
destaque para os brasileiros, europeus de leste e asiáticos.
Apesar do acolhimento de crianças não nativas, em contexto escolar, ter uma
história que se prolonga por cerca de trinta anos, só em meados dos anos 90 se fazem
os primeiros investimentos no sentido de pôr em prática um conjunto de dispositivos
dirigidos especificamente a estas populações.
Na Parte III da presente investigação, propomo-nos desenvolver três eixos de
análise que permitem fazer uma aproximação progressiva ao caso de estudo da
integração de crianças e jovens descendentes de imigrantes em agrupamentos de
escolas da AML. Pretende-se avançar com alguns factores que a nível meso
contribuem para a compreensão dos processos e percursos de integração que
decorrem em contextos territoriais específicos.
O primeiro eixo reporta-se à caracterização do percurso realizado pelo país
no acolhimento de populações imigrantes no sistema educativo, tentando analisar, por
um lado, os quantitativos, as origens étnicas e a geografia dos alunos que integraram
o sistema em diferentes momentos e, por outro lado, a posição que estes foram
ocupando em função dos resultados escolares, tendo por finalidade a compreensão do
grupo no contexto escolar mais amplo em que se insere, pela sua estrutura e pelo
desempenho escolar.
O segundo estrutura-se na análise das características mais recentes do grupo
de imigrantes que frequenta o sistema educativo nacional, resultado da intensificação
dos fluxos migratórios com destino a Portugal e da diversificação das origens e
características da população envolvida. Desta análise pretende-se reconhecer a
diversidade de perfis que se podem identificar nos alunos não nativos e evidenciar
alguns aspectos que os caracterizam e que podem ser referências importantes no
prosseguimento da investigação.
146
Por fim, o terceiro eixo reporta-se ao estudo dos alunos descendentes de
imigrantes no território da AML, tendo por referência os dados estatísticos do Gabinete
de Estatística e Planeamento da Educação – Ministério da Educação, desagregados
ao nível da freguesia, e as características socioeconómicas dos territórios no sentido
de situar, por um lado, os alunos imigrantes no grande grupo do território
metropolitano, atendendo à sua dimensão e origens étnicas e, por outro lado,
compreender os factores estruturais que podem justificar, numa escala meso, o
sucesso escolar.
147
1. Espaços e tempos da presença de alunos de origem imigrante no sistema
educativo português
Na segunda parte deste estudo ensaiámos uma análise da evolução da
produção legislativa em Portugal sobre as políticas de acolhimento de crianças e
jovens em contexto escolar.
Antes de nos debruçarmos sobre os territórios específicos que constituem os
casos de estudo desta investigação, impõe-se que se trace, em linhas gerais, o quadro,
também ele evolutivo, da presença de alunos de origem imigrante no sistema de
ensino português, no que diz respeito, em primeiro lugar, aos quantitativos nacionais e
referentes à AML e, em segundo lugar, aos indicadores disponíveis sobre os níveis de
sucesso escolar entre as crianças migrantes.
As principais fontes de informação utilizadas, a que já fizemos referência na
Parte I deste trabalho, são os dados estatísticos publicados pelo Secretariado
Coordenador dos Programas de Educação Multicultural (Entreculturas), para o período
1994-95 a 1997-98; pelo Gabinete de Informação e Avaliação do Sistema Educativo
do Ministério da Educação – GIASE, para os anos lectivos de 1999-2000 e 2003-04 e,
para os anos lectivos mais recentes (2008-09 e 2009-10), as bases de dados
disponibilizadas pelo Gabinete de Estatística e Planeamento da Educação (GEPE). O
facto da informação ter sido recolhida por diferentes organismos foi introduzindo
alterações sucessivas nos critérios utilizados na sua recolha. Também, a própria
evolução dos conceitos associados à temática, por se tratar de uma área de
intervenção recente para o país e, para a qual não havia até então um trabalho
desenvolvido ao nível da recolha e organização de informação estatística,
prolongaram as dificuldades na designação das terminologias a adoptar e na definição
dos critérios de recolha de informação. Na utilização da informação disponibilizada, a
partir das fontes acima referidas, um dos primeiros obstáculos com que nos
deparamos é o leque de definições utilizado para aluno imigrante. Entre as várias
designações para população escolar não nativa encontra-se a referência a “grupos
culturais”, “grupo cultural/nacionalidade”, “minoria étnica”, “descendente de imigrante”
e “estrangeiro”. Estas designações, por vezes de alguma complexidade, nem sempre
reuniram o consenso dos responsáveis locais (nas escolas) pela recolha de
informação, conduzindo a diferentes olhares e interpretações na identificação da
população-alvo e a diversas opções na organização dos dados estatísticos. Acresce
também a esta fragilidade, da informação disponível, a natureza dos universos
mobilizados, pois nem sempre a separação entre ensino público e privado foi um
critério na recolha de informação.
148
Em meados da década de 90 assistimos à primeira publicação, pelo
Secretariado Entreculturas, dos dados estatísticos referentes aos “grupos culturais”
que frequentavam as escolas públicas portuguesas. O “grupo cultural” do aluno está
associado ao grupo cultural de pertença dos seus ascendentes, o fundamental é
conhecer a sua origem étnico-cultural, independentemente da sua nacionalidade. No
final dos anos 90 a responsabilidade pela recolha desta informação foi transferida para
o DAPP, depois para o GIASE, sob a alçada do Ministério da Educação, passando as
estatísticas a abarcar as escolas públicas e privadas com base num novo conceito de
aluno imigrante. O aluno é considerado em função da sua nacionalidade, estrangeira
ou portuguesa, “cujos ascendentes pertençam a um dos grupos
culturais/nacionalidade indicadas” (Seabra, 2010, p. 118). A alteração fundamental
reside em centrar a variável origem, no aluno ou na família: na primeira classificação é
a origem da família que é tida como referência, na segunda é a nacionalidade do aluno,
sem contudo eliminar o grupo de pertença da família. Em qualquer dos casos, não
deixa de existir uma certa ambiguidade nos conceitos apresentados, principalmente na
sua operacionalização pelos técnicos que nas escolas são responsáveis pela recolha
de informação. Nas estatísticas organizadas mais recentemente pelo GEPE (2008-09
e 2009-10) é utilizada a nacionalidade do aluno, classificando-o em estrangeiro ou
português.
A classificação simplificada entre portugueses e estrangeiros, utilizada hoje
na recolha dos dados estatísticos referentes aos alunos que frequentam o sistema
educativo português, contribui para que se mantenha “escondida” uma parte
significativa da segunda geração de alunos imigrantes, por já terem nascido em
Portugal e serem integrados nas estatísticas como nacionais. Este facto assume maior
relevo por este grupo apresentar já uma expressão importante no país e, por lhe
serem reconhecidos percursos de integração na escola com particularidades distintas
dos realizados pela primeira geração e que, como tal, carecem de uma análise
individualizada.114
Apesar de todas as limitações apontadas aos processos de recolha de
informação, reconhecemos que o esforço que tem sido levado a cabo pelo Ministério
da Educação, na melhoria dos dispositivos e dos processos, tem facilitado a
disponibilização de dados mais actuais e com um grau de desagregação que permite
114
Referimo-nos aos resultados divulgados no relatório PISA (2009) que distinguem a primeira e segunda geração de imigrantes quanto ao desempenho escolar. Também os estudos desenvolvidos para a segunda geração de imigrantes, que têm sido nossa referência ao longo desta investigação, alertam para a existência de diferenças nos percursos escolares dos dois grupos, independentemente das suas origens.
149
construir uma fotografia muito real dos quantitativos e origens de alunos estrangeiros
que frequentam as escolas da rede pública e privada em Portugal.
Sendo nossa intenção fazer uma análise diacrónica e sincrónica do fenómeno,
a não coincidência nos critérios de recolha de informação impõe-nos algumas reservas
na mobilização dos dados estatísticos disponíveis. Na análise diacrónica, por ser
necessário mobilizar informação estatística para um intervalo de tempo alargado, que
situamos entre 1994 e 2010, dificilmente conseguimos traçar um retrato fidedigno da
evolução do quantitativo de alunos imigrantes. As limitações impostas pela pluralidade
de terminologias utilizadas, nos diferentes momentos de recolha, e pela instabilidade
dos universos estatísticos de referência, apenas permitem uma menção aos
quantitativos de alunos nos diferentes momentos temporais, condicionando a
configuração de um padrão evolutivo dos mesmos, no espaço e no tempo e em função
das suas origens. Optámos, contudo, por analisar a informação de que dispúnhamos
tentando não generalizar um perfil tipo da evolução do fenómeno, mas indicar apenas
algumas tendências que se evidenciam para o momento temporal de referência. Nesta
análise recorremos aos dados estatísticos para o país (continente), relativos aos
quantitativos de alunos por NUT II, por ciclo de ensino e pelos principais países de
origem.
Apresentadas as limitações encontradas na construção deste exercício, e que
se justificam por três ordens de factores: (i) os diferentes processos e técnicas
mobilizados para a recolha da informação estatística; (ii) a mudança nos organismos
responsáveis pela produção estatística e, (iii) as diferentes concepções sobre os
grupos-alvo de caracterização, partimos para a uma abordagem, ainda que em traços
gerais, dos quantitativos e diversidade de origens dos alunos descendentes de
imigrantes que, desde 1994 frequentam o sistema de ensino português. Recorremos
também para esta análise a alguns estudos já desenvolvidos a partir dos dados
estatísticos resultantes da primeira década de implementação dos dispositivos de
recolha de informação sobre os alunos imigrantes, de que é exemplo o estudo
elaborado por Seabra (2010). A análise do Quadro III.1 permite constatar que, em
termos globais, o número de alunos de origem imigrante cresceu cerca de 18% no
decénio 1994-2004. No mesmo período, o número total de alunos matriculados nas
escolas nacionais apresentou uma diminuição de 8,6%. Num contexto que se
apresenta de redução da população escolar, os alunos imigrantes têm dado um
contributo importante na atenuação dessa diminuição.
150
Quadro III.1 – Alunos imigrantes e total de alunos inscritos no ensino básico e secundário regular (continente)
Nota: os dados de 2009-10 dizem respeito a todas as modalidades de ensino (regular e não regular).
Fontes: Base de Dados Entreculturas (1994-95 a 1997-98); GIASE/ME (2000-01 a 2003-04); GEPE/ME (2009-10).
Quadro adaptado de: Seabra (2010).
152
É no Ensino Básico, em particular no 1º ciclo, que se encontram os maiores
quantitativos de alunos imigrantes, sendo também neste ciclo, do Ensino Básico, que
se regista o maior crescimento do número de alunos não nativos na década em
análise (28,8%). No Ensino Secundário, este grupo é mais reduzido, contudo, o
crescimento registado é superior ao dos restantes ciclos de ensino (35,1%).
A comparação dos quantitativos de alunos imigrantes no ano lectivo
2003/2004 com os registados para o ano de 2009/2010, evidencia um ligeiro aumento
deste grupo de estudantes contudo, este não ocorre da mesma forma em todos os
ciclos de ensino. No 1º ciclo é notória a diminuição do peso de alunos imigrantes no
total de alunos inscritos neste ciclo, tendência que já se vinha a registar desde
2003/04 e que pode estar associada a uma redução do número de entradas de
imigrantes que se começa a desenhar em meados da primeira década do século,
tendo um impacto imediato neste ciclo de ensino. No 2º ciclo ocorre, entre os dois
momentos, um aumento significativo do número alunos imigrantes, o valor duplica
relativamente ao ano de 2003/04, ascendendo o peso de alunos imigrantes, no total de
alunos do 2º ciclo, para 10,1%. Também no 3º ciclo, embora com uma variação menor
relativamente ao ano de 2003/04, se verifica um aumento do número de alunos, com
um peso no total de estudantes deste ciclo de 6,1%, valor que fica muito aquém do
registado para o 2º ciclo. No ensino secundário o quantitativo de alunos imigrantes
reduziu-se relativamente ao ano em comparação porém, o peso relativo que o grupo
ocupa no conjunto dos alunos deste nível de ensino aumentou.115
Entre os países de origem dos alunos imigrantes, apresentados no Quadro
III.2, destacamos as ex-colónias africanas (Angola e Cabo Verde em particular) e, no
cômputo geral para o período 1994-2004, entre 50 a 60% dos estudantes não nativos
são oriundos dos PALOP, registando-se um aumento dos provenientes de São Tomé
e Príncipe e da Guiné-Bissau e uma redução dos oriundos de Moçambique (Seabra,
2010). Nas restantes origens destaca-se a U.E. (9 182 alunos em 2003-04), cerca de
15% do total de estrangeiros e o Brasil que se apresenta em crescimento contínuo
desde 1994-95, tendo quase triplicado o número de estudantes em dez anos (de 3 325
para 8 052 alunos) e os países do leste Europeu (4 688 alunos em 2003-04).
Na comparação dos quantitativos de alunos entre 2003-04 e 2009-10,
manifesta-se uma diminuição significativa do número de alunos com origem nos
PALOP, reduzindo o seu peso no cômputo geral para 33,9%. Os alunos de origem
brasileira e de países da Europa de Leste (Moldávia, Roménia, Rússia e Ucrânia),
115
Nos dois momentos em análise, 2003-04 e 2009-10, a designação de aluno imigrante sofreu alterações. A análise comparativa que tentamos fazer deve ser lida com as reservas impostas pela natureza diversa dos procedimentos na recolha da informação estística.
153
0 2500 5000 7500 10000 12500 15000 17500 20000
Espanha
Reino UnidoChina
AlemanhaFrança
Moldávia
São ToméRoménia
Guiné-BissauUcrânia
AngolaC. Verde
Brasil
número de alunos
registam uma evolução em sentido contrário aos anteriores, abrangendo os primeiros
27,9% do total de estrangeiros e, os segundos, 16,4%. É de salientar que o Brasil, em
2009-10, apresentava um quantitativo de alunos muito próximo do conjunto dos
PALOP, 18 038 face a 21 915 indivíduos. Esta constatação permite aferir que são
estes dois territórios, Brasil e Europa de Leste, os principais países/regiões
responsáveis pelo aumento do número de estudantes não nativos.
Os resultados da análise da desagregação dos países de origem do total de
alunos que frequentam as escolas básicas e secundárias em Portugal (Fig. III.1), em
2009-10, corroboram a afirmação que acabamos de fazer. O Brasil surge em primeiro
lugar, a uma distância significativa da segunda e terceira posições, ocupadas por
Cabo Verde e Angola. O primeiro país da Europa de Leste posiciona-se na quarta
posição (Ucrânia), com um total de alunos muito próximo da Guiné-Bissau, surgindo a
Roménia e a Moldávia na sexta e oitava posições respectivamente, com quantitativos
semelhantes aos de São Tomé e Príncipe (sétimo lugar). Moçambique, que em 1994-
95 surgia como o terceiro país de origem dos alunos provenientes dos PALOP não se
encontra, em 2009-10 entre os treze principais países de origem.116
Fig. III.1 – Treze principais países de origem dos alunos imigrantes em Portugal, 2009-10
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
116
Estes treze países de origem dos alunos não nativos detém pelo menos 1% do total de alunos estrangeiros.
154
A análise da distribuição dos alunos no território nacional, entre 2000-01 e
2003-04 permite constatar que a maioria do grupo se concentra na região de Lisboa,
68% em 2003-04 e, a uma distância maior surgem a região Norte (12,4%) e Centro
(9,4%) (Quadro III.3).
Apesar dos quantitativos mais elevados do Norte e Centro, comparativamente
à região do Algarve, é nesta última que se regista, no período de dez anos, o segundo
maior aumento do número de estudantes de origem imigrante (30,1%); na primeira
posição situa-se o Alentejo (42,9%). As alterações na distribuição territorial dos
imigrantes que se acentuam para 2009-10, com a redução significativa do peso de
Lisboa e o aumento da percentagem de estudantes no Algarve, no Alentejo e no Norte,
são reveladoras das diferentes direcções dos fluxos migratórios no território
continental, facto que se associa à composição étnica dos mesmos e às escolhas que
os imigrantes de diferentes origens revelam ter na sua fixação no novo país. A
dispersão territorial é uma das características das novas vagas de imigrantes que
entraram em Portugal (Fonseca, 2004).
Quadro III.3 – Alunos de origem imigrante, no ensino regular, por NUT II
Total Imig. 87,5 86,1 83,3 83,0 72,1 72,7 72,1 75,1
(a) ensino público
(b) ensino público e privado
Fontes: Base de Dados Entreculturas (1994-95 a 1997-98); GIASE/ME (2000-01 a 2003-04).
Quadro adaptado de: Seabra (2010).
A identificação destes factores fará parte de uma análise posterior,
desenvolvida a uma escala micro, com recurso à informação recolhida a partir dos
questionários aplicados a alunos, e respectivas famílias, em contextos escolares e
territoriais marcados pela presença de comunidades migrantes.
156
157
2. Escola e imigração em Portugal – diversidades no final da primeira década do
século XXI
A informação estatística que suporta a presente análise, foi disponibilizada
pelo GEPE e refere-se aos quantitativos de alunos que frequentaram as escolas
públicas portuguesas, organizados por idades, por ciclo e modalidade de ensino, por
região e país de origem, situação de retenção/desistência ou transição/conclusão, no
ano lectivo de 2009-10, por NUT II. Estes dados, não publicados, foram cedidos pelo
gabinete numa base de dados em formato Excel, sem qualquer tratamento prévio,
tendo sido necessário proceder à sua organização numa nova base com um nível de
desagregação adequado aos objectivos definidos para esta parte do estudo. A partir
da nova base de dados foram então calculados os indicadores que apresentamos nos
gráficos, tabelas e mapas que suportam a caracterização mais recente do contexto
nacional relativo à presença de alunos imigrantes no sistema de ensino português.
Com base nesta informação avançamos para (i) a definição do padrão
espacial dos alunos estrangeiros em Portugal; (ii) a construção de um quadro da
diversidade dos estudantes estrangeiros nas regiões portuguesas; (iii) a análise da
distribuição dos quantitativos de alunos nas diferentes modalidades de ensino em
função da sua origem; (iv) a caracterização da estrutura etária dos estudantes,
segundo a origem e, (v) a análise do sucesso escolar.
No ano lectivo de 2009-10, estavam inscritos no sistema educativo nacional
1356 686 estudantes, de 162 nacionalidades, com idades compreendidas entre os 5 e
os 76 anos. Os alunos estrangeiros correspondem a 4,8% do total da população
escolar, concentrando-se maioritariamente no Algarve e na região de Lisboa (Fig. III.2).
Fig. III.2 – Origem dos alunos, do ensino básico e secundário, inscritos nas escolas portuguesas, por NUTII, 2009-10
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Algarve
Alentejo
Lisboa
Centro
Norte
Portugal
Alunos
Estrangeiros
Portugueses
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
158
A geografia dos alunos estrangeiros em Portugal (NUT II) caracteriza-se por
uma forte polarização da região de Lisboa e do Algarve, particularmente da segunda.
Em 2009-10 estas regiões concentravam 70,1% do stock de alunos estrangeiros em
Portugal. No Alentejo, a presença destes estudantes é relativamente reduzida no
conjunto da população escolar e, no Centro e Norte, os quantitativos apresentam-se,
na mesma proporção, ligeiramente superiores aos do Alentejo (Fig. III.3). Nestas
regiões, o peso relativo dos estudantes estrangeiros aproxima-se da percentagem
obtida para esta população no território nacional, de 12%.
Fig. III.3 – Alunos nativos e estrangeiros em Portugal, por NUT II, 2009-10.
Para analisar o impacto regional dos estudantes não nativos importa
combinar o padrão de distribuição geográfica dos alunos imigrantes com o seu
significado no total de estudantes em cada região (Fonseca, 2008). A relação assim
estabelecida é expressa pelo Índice Territorial de Imigração (relação entre o peso de
um território no volume nacional de estudantes imigrantes e o peso demográfico do
mesmo espaço no total de estudantes do país).117 Os valores resultantes do cálculo do
índice, inferiores à unidade, indicam que a relevância dos alunos imigrantes na região
é inferior à média nacional. Por oposição, os valores superiores à unidade indicam que
117
O cálculo e análise do Índice Territorial de Imigração tem por base o estudo de Fonseca (2008) para a população imigrante em Portugal, que apresenta e analisa os padrões territoriais da imigração em território nacional.
0
100
200
300
400
500
600
Norte Centro Lisboa Alentejo Algarve
Milh
are
s
alunos estrangeiros
alunos portugueses
alunos total
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
159
a região tem uma capacidade atractiva de alunos imigrantes superior à nacional (Reis
et al., citado em Fonseca, 2008).
O cálculo do Índice Territorial de Imigração coloca em evidência a relevância
da imigração na região do Algarve e em Lisboa, com valores de 2,6 e 2,1
respectivamente (Fig. III.4). As restantes regiões apresentam índices inferiores à
unidade, sendo a região Norte a que detém valores menos expressivos (0,3). As
regiões do Alentejo e Centro atingem valores entre 0,8 e 0,6, facto que se explica
segundo Fonseca (2008) pela atracção de vagas migratórias mais recentes, originárias
do Brasil e de países europeus de leste.
Fig. III. 4 – Índice Territorial de Imigração dos estudantes do ensino básico e secundário, 2009-10
O padrão de distribuição dos alunos imigrantes acompanha o padrão de
dispersão da população imigrante em geral. Apesar de estarem contabilizados todos
os estudantes, independentemente da sua idade e modalidade de ensino em que se
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
160
encontram inscritos, a maioria frequenta o ensino básico, acompanhando os
progenitores no seu trajecto migratório em Portugal.
Os alunos matriculados nas escolas públicas portuguesas, no ano lectivo de
2009-10, frequentam, maioritariamente, o ensino básico regular (65,5%). A presença
noutros cursos do ensino básico é relativamente reduzida (8,8%), assim como no
ensino secundário regular (12,9%) e outros cursos deste nível de ensino (12,9%)
(Quadro III.5).
Quadro III.5 – Origem dos alunos, do ensino básico e secundário, inscritos nas escolas portuguesas, segundo os níveis e
modalidades de ensino, 2009-10
Ensino Básico Ensino Secundário
Total Regular Out.Cursos Regular Out.Cursos
% % % % %
Estrangeiros 5,1 3,5 4,3 4,2 4,8
Portugueses 94,9 96,5 95,7 95,8 95,2
Total 65,5 8,8 12,9 12,9 100,0
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
Retomando a análise, agora desagregada por NUTII, a tendência
anteriormente descrita, sobre a distribuição dos alunos pelos níveis de ensino, em
função da origem, evidencia que entre os estrangeiros há uma maior concentração no
ensino básico regular (70,4%) seguida, a uma distância significativa, do ensino
secundário regular (11,7%), de outros cursos do ensino secundário (11,4%) e, na
última posição, dos outros cursos do ensino básico (6,4%). Entre os estudantes
portugueses mantém-se a concentração no ensino básico regular (65,2%), na segunda
posição surgem os alunos de outros cursos do ensino secundário (19%), seguidos dos
inscritos no ensino secundário regular (12,9%) e nos outros cursos do ensino básico
(8,9%). Contudo, entre os alunos de nacionalidade portuguesa, a distribuição pelos
vários níveis de ensino, nem sempre segue o mesmo comportamento nas diversas
NUT, no Norte e Algarve o peso percentual dos alunos que frequentam outros cursos
do ensino secundário é superior ao registado para os inscritos em cursos do ensino
secundário regular (Fig. III.5).
A esta escala de análise não é possível evidenciar uma maior tendência para
a frequência de cursos de ensino não regular por parte dos estudantes estrangeiros: a
distribuição pelas modalidades de ensino consideradas apresenta um comportamento
próximo para os dois grupos (estrangeiros e nacionais).
161
Fig. III.5 – Níveis de ensino frequentados pelos alunos inscritos nas escolas portuguesas, segundo a origem, por NUTII (2009-10)
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
Ainda assim, é de salientar que entre o grupo de nacionalidade portuguesa se
encontram muitos descendentes de imigrantes que, por terem já nascido em Portugal
e/ou já se encontrarem no país por um período de tempo relativamente alargado, são
cidadãos nacionais. Esta constatação inviabiliza uma análise mais fina sobre a
distribuição dos estudantes com background imigrante nas escolas portuguesas, por
ciclos e modalidade de ensino. A informação estatística disponível reduz a análise à
população imigrante de primeira geração e, neste sentido, todas as conclusões
apresentadas neste ponto se circunscrevem a este grupo de estudantes.
Os países de origem dos alunos estrangeiros podem agrupar-se em quatro
conjuntos principais que representam 91,1% do total de estudantes não nacionais:
África (em particular os PALOP), América do Sul, com destaque para o Brasil, Europa
de Leste e Rússia e países da U.E.(15) (Quadro III.6). O grupo mais numeroso é
oriundo dos países africanos (35,4% do total); cerca de um quarto são originários do
continente sul-americano; 10,1% provêm de países da U.E.(15) e 16,5% são
provenientes da Europa de Leste.
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Portugueses
Estrangeiros
Portugueses
Estrangeiros
Portugueses
Estrangeiros
Portugueses
Estrangeiros
Portugueses
Estrangeiros
Alg
arve
Ale
ntej
oLi
sboa
Cent
roN
orte
Ens ino bás ico regular
Ens ino bás ico - outroscursos
Ens ino secundárioregular
Ens ino secundário -outros cursos
162
Quadro III.6 – Origem dos alunos estrangeiros, do ensino básico e secundário, por NUT II (em % do total de estrangeiros por NUT II), (2009-10)
Total 398248 44,9 209915 23,6 279458 31,5 887621 100,0
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
No que diz respeito às origens, entre os estudantes estrangeiros, incluídos
nos grupos de idades de 5 a 18 anos, 31,7% têm origem sul-americana, 31,1%
africana, 18,4% são nacionais de países europeus de leste, 10,5% de países da
Europa dos quinze e 4,5% de países asiáticos (Quadro III.8).
Quadro III.8 – Origem dos alunos do ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos, por NUT II (2009-10)
Alentejo Algarve Centro Lisboa Norte Total
Portugal 95,9 85,9 97,1 89,3 98,5 94,9
África 4,6 12,2 9,0 47,7 8,0 31,1
América Sul 36,1 30,9 31,7 31,5 31,5 31,7
América Norte 0,6 0,5 2,7 0,3 2,1 0,9
Ásia 4,3 3,4 5,9 4,1 6,4 4,5
UE 15 17,2 17,6 20,2 3,2 24,5 10,5
Europa Leste+Rússia 32,7 34,6 23,8 12,1 16,9 18,4
Outros Países U.E. 4,2 0,6 6,1 0,8 10,2 2,7
Outras Regiões 0,3 0,2 0,5 0,2 0,3 0,2
Total Estrangeira 2684 6097 5603 25837 5246 45467
Total 65542 43244 190371 240356 348055 887568
% de Estrangeira/Total 4,1 14,1 2,9 10,7 1,5 5,1
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
164
A distribuição pelas regiões portuguesas, deste grupo de estudantes, segue a
tendência apresentada anteriormente para o conjunto dos alunos estrangeiros (Fig.
III.6), uma maior concentração no Algarve (14,1%) e em Lisboa (10,7%).
Fig. III.6 – Origem dos alunos, do ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos, 2009-10
No Quadro III.9 estão representados os principais países de origem dos
alunos, com idades compreendidas entre os 5 e 18 anos que frequentam o ensino
básico regular. Neste grupo concentram-se 65,4% dos estudantes inscritos em todos
os cursos do ensino básico, dos quais 5,1% são estrangeiros. Num total de 45 467
indivíduos, estes alunos constituem 70,3% do total de estudantes estrangeiros que, no
ano lectivo de 2009-2010, se matricularam nas escolas públicas portuguesas. A
análise das dezanove nacionalidades mais representativas indica que, em primeiro
lugar surgem os nacionais do Brasil (30,7%), seguidos dos de Cabo Verde (12,1%),
Angola (7,4%), Ucrânia (6,9%), Guiné-Bissau (5,8%) e Roménia (5,1%). Os
estudantes com origem nos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP)
continuam a constituir um grupo significativo no conjunto dos estrangeiros (29,5% do
total) mas que, nas idades consideradas, já é ultrapassado pelo grupo oriundo do
Brasil (30,7%). A intensificação da imigração brasileira e de países europeus de leste,
nos últimos anos do século XX e na primeira década do século XXI, tem conduzido a
uma diversificação das origens dos alunos nas escolas portuguesas. Como se verifica,
o número de crianças e jovens de nacionalidade brasileira (13 970), ucraniana (3 125)
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
0% 20% 40% 60% 80% 100%
Algarve
Alentejo
Lisboa
Centro
Norte
Portugal
Alunos
Estrangeiros
Portugueses
165
e romena (2 310) já ultrapassa o número das que chegam de alguns países africanos,
até então o grupo de estrangeiros mais frequente nas escolas portuguesas.
Quadro III.9 – Principais nacionalidades dos alunos do ensino básico regular, com idades entre
5 e 18 anos, 2009-10
nº
% no total estrang.
Portugueses 842101
Estrangeiros 45467
ÁFRICA 14119 31,1
Cabo Verde 5518 12,1
Angola 3350 7,4
Guiné-Bissau 2654 5,8
São Tomé e Príncipe 1613 3,5
Moçambique 298 0,7
AMÉRICA 14818 32,6
Brasil 13970 30,7
UE 15 4780 10,5
França 1428 3,1
Alemanha 969 2,1
Reino Unido 872 1,9
Espanha 537 1,2
EUROP. LESTE+ RÚSSIA 8346 18,4
Ucrânia 3125 6,9
Roménia 2310 5,1
Moldávia 1888 4,2
Bulgária 435 1,0
Rússia 435 1,0
OUTROS PAÍSES EUROP. 1242 2,7
Suíça 1061 2,3
ÁSIA 2059 4,5
China 988 2,2
Índia 316 0,7
Paquistão 262 0,6
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
Numa análise do mapa das doze principais nacionalidades dos alunos do
ensino básico regular em cada NUT II, é notória a diversidade do perfil das origens
entre as regiões. Apesar dos alunos oriundos do Brasil ocuparem sempre a primeira
posição, as restantes nacionalidades organizam-se em combinações diversas em
cada NUT (Fig. III.7). No Norte e Centro surgem com uma presença significativa os
estudantes nacionais de países europeus de destino da emigração portuguesa
(França, Suíça e Alemanha), facto que associamos ao retorno de parte desta
população.
166
Fig. III.7 – Principais nacionalidades (nº de alunos) por NUT, 2009-10
A
B
C D
E
Norte
0 250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000
Luxemburgo
Rússia
Venezuela
Cabo Verde
Angola
China
Espanha
Roménia
Alemanha
Ucrânia
Suíça
França
Brasil
Lisboa
0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000 8000 9000
Moçambique
Paquistão
Índia
China
Moldávia
Ucrânia
Roménia
São Tomé e Príncipe
Guiné-Bissau
Angola
Cabo Verde
Brasil
Alentejo
0 250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000
Bulgária
Holanda
França
Reino Unido
Espanha
Suíça
China
Alemanha
Moldávia
Ucrânia
Roménia
Brasil
Algarve
0 250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000
Bulgária
China
Holanda
França
Guiné-Bissau
Alemanha
Cabo Verde
Reino Unido
Roménia
Moldávia
Ucrânia
Brasil
Centro
0 250 500 750 1000 1250 1500 1750 2000
Rússia
Cabo Verde
Angola
Roménia
China
Reino Unido
Moldávia
Alemanha
Suíça
França
Ucrânia
Brasil
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
167
Para estas crianças e jovens, cujos progenitores viveram entre duas culturas
diferentes, porque acompanharam os seus pais no processo migratório e/ou já
nasceram no estrangeiro, a integração na escola em Portugal continua a ser um
desafio que é importante não descurar. Em simultâneo vivem, como as restantes
crianças estrangeiras, o confronto com duas culturas acrescido, em alguns casos, das
fragilidades no domínio da língua portuguesa por parte dos progenitores. Os efeitos
decorrentes da imigração e do confronto entre culturas prolongam-se entre as
gerações seguintes (Fonseca, 2005). Em Lisboa é notória a presença de nacionais
dos PALOP, de asiáticos e europeus de leste, não sendo relevante a população
oriunda dos restantes países europeus. No Alentejo e Algarve são os europeus de
leste e de outras nacionalidades europeias os grupos mais frequentes nas escolas
públicas e, nestas regiões, só na segunda é notada a presença de alunos oriundos
dos PALOP, em particular de Cabo Verde e Guiné-Bissau (Fig. III.7).
A análise que realizamos, com recurso aos dados quantitativos
disponibilizados pelo GEPE, é condicionada pela ausência de informação
desagregada para os descendentes de imigrantes que têm nacionalidade portuguesa.
Por conseguinte, os estudantes de origem africana estão subavaliados, na medida em
que um elevado número já nasceu em território nacional e tem nacionalidade
portuguesa.
A caracterização do perfil etário do grupo de estudantes, do ensino básico
regular, mobilizado para esta análise (5-18 anos) em função da sua origem, aponta
para uma tendência comum a todos os ciclos: a média de idades entre os alunos
estrangeiros é superior à dos nativos (Quadro III.10). Este comportamento torna-se
ainda mais evidente quando se desagrega a informação por idade e por ciclo de
ensino, verificando-se que os alunos estrangeiros, comparativamente aos nacionais,
apresentam sempre maior peso percentual nos escalões etários mais elevados de
cada ciclo.
Quadro III.10 – Média de Idades dos alunos, por ciclo, no ensino básico regular (dos 5 aos 18 anos),
segundo a origem (2009-10)
1º Ciclo 2º Ciclo 3º Ciclo
(5-10 anos) (11-12 anos) (13-15 anos)
Portugueses 7,7 10,9 13,4
Estrangeiros 8,4 11,7 14,1
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
168
Considerando o limite de idade esperado para cada ciclo do Ensino Básico e
analisado o peso relativo dos alunos que frequentam um ciclo inferior àquele em que
deveriam estar matriculados, atendendo à sua idade, as afirmações que fizemos
anteriormente assumem uma maior relevância. É entre os estrangeiros que
encontramos a maior proporção dos alunos inscritos num ciclo de ensino para o qual
já ultrapassaram o limite de idade previsto (Fig. III.8). Essa desvantagem ocorre em
todos os ciclos, mas é no segundo ciclo que a distância entre os nativos e os
estrangeiros é maior (15,7%).
Fig. III.8 – Percentagem de alunos (5 a 18 anos), com idade superior à esperada, por ciclo de ensino, segundo a origem, 2009-10
A justificação para os resultados apresentados anteriormente pode ser
sustentada por causas diversas: uma entrada mais tardia dos alunos imigrantes no
sistema de ensino português dificultada, muitas vezes, pelo desconhecimento do
sistema por parte dos seus familiares; o receio, perante situações de irregularidade
dos progenitores e/ou dos próprios, em contactar as instituições de ensino; a falta de
documentação sobre o percurso escolar anterior das crianças e jovens, que coloca
dificuldades na atribuição de uma equivalência no sistema de ensino português; um
maior número de retenções/desistências entre os alunos oriundos de outros países.118
118
Estes factores são corroborados por Collicelli (2001) no relatório realizado pelo Child Immigration Group, quando apresenta as dificuldades relacionadas com a integração escolar de crianças de origem imigrante a partir de estudos realizados na Bélgica, França, Grécia, Israel, Suécia e Reino Unido.
0,0
5,0
10,0
15,0
20,0
25,0
1º CEB 2º CEB 3º CEB
+10 anos +13 anos +15 anos
%Portug.
Estrang.
Total
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
169
Os dados de que dispomos revelam que os alunos não nacionais apresentam
taxas de retenção/desistência, no Ensino Básico, superiores às dos nativos: 16,7% e
7,9%, respectivamente para os estrangeiros e para os portugueses (Quadro III.11). Ou
seja, a taxa de retenção/desistência é mais do dobro da dos nacionais e também cerca
de duas vezes superior à taxa global (8,3%). A desagregação desta informação por
ciclo, no Ensino Básico, evidencia que, para os alunos estrangeiros o peso das
retenções é sempre superior ao dos nativos. Em ambos os grupos a tendência é para
a duplicação do peso das retenções na transição de ciclo para ciclo. Contudo, é
sempre entre os estrangeiros que o insucesso é maior. Só na transição do 2º para o 3º
ciclo é que se atenua um pouco o aumento das retenções/desistências entre os
estrangeiros (de 15,9% para 25,8%). Estes resultados, analisados à escala nacional,
são concordantes com as conclusões apresentadas pelo relatório do programa PISA
(2009) para os alunos de origem imigrante e em particular para a primeira geração,
que os posicionam num patamar de desempenho inferior ao dos autóctones.119
É possível, com os dados de que dispomos, avançar ainda para uma análise
da retenção/desistência desagregada em função das origens dos estudantes no
sentido de compreender se a posição de desvantagem que os estrangeiros
apresentam é comum a todos os grupos independentemente da sua origem, ou se
existem grupos que apresentam padrões de sucesso escolar mais próximos dos
registados para os portugueses. Neste sentido, o cálculo da percentagem de
estudantes que são contabilizados no grupo da retenção/desistência para cada origem
119
Os resultados do PISA para Portugal, relativos aos níveis de proficiência linguística indicam que: i) para os estudantes de origem imigrante com nível igual ou superior a 3, a diferença percentual entre a primeira e a segunda geração é de 1 a 2% mas, face aos autóctones a diferença é de 18%; ii) nos estudantes com nível inferior 2 não se observam diferenças entre a segunda geração e os nativos (19 e 18% respectivamente) mas há uma diferença significativa para a primeira geraçao (31%). (PISA 2009 Results: Overcoming Social Background – volume II. Disponível em http://www.oecd.org/document/24/0,3746,en_32252351_46584327_46609752_1_1_1_1,00.html) (acedido em Abril, 2011).
Quadro III.11 – Transição/Conclusão e Retenção/Desistência no ensino básico regular (dos 5 aos 18 anos), segundo a origem, (2009-10)
Quadro III.15. Globalmente, a percentagem de alunos que transita de ano de
escolaridade, em 2008-09, é superior entre os nativos e inferior, em aproximadamente
10 pontos percentuais, nos estrangeiros. Relativamente à percentagem da
transição/conclusão que caracteriza o território nacional, os estudantes estrangeiros
situam-se aquém deste valor em cerca de 9 pontos percentuais.
Uma análise desagregada por ciclo de escolaridade, evidencia taxas de
aprovação menores no grupo de estrangeiros, logo no 1º ciclo (91% contra 96% do
grupo nativo), aumentando o fosso no 2º ciclo (90% contra 82%). Entre os diferentes
ciclos do Ensino Básico, é no 3º Ciclo que se registam as menores taxas de aprovação
para os dois grupos, acentuando-se ainda mais a descida para o grupo estrangeiro,
que não ultrapassa a taxa de 72% quando a dos nativos se situa em 85%.
Quadro III.15 – Aprovação vs retenção/desistência para alunos estrangeiros e nacionais (2008-09)
Nacionalidade Trans/Conc Ret/Desist Total
Portugal 297 865 33 899 331 764
% 89,8 10,2 100,0
Estrangeiro 29 599 7 619 37218
% 79,5 20,5 100,0
Total 327 464 41 518 368 982
% 88,7 11,3 100,0
Fonte: GEPE, 2008-09. Cálculos da autora.
A situação de desvantagem no sistema educativo dos alunos estrangeiros,
relativamente aos portugueses, é evidenciada pelas diferenças existentes nas taxas
de sucesso que apresentam. Os indicadores e monitorização desenvolvidos pelo
Programa Internacional para a Avaliação dos Alunos (Programme for International
Student Assessment – PISA)122 alertam para diferenças no desempenho escolar dos
122
O PISA tem sido levado a cabo, desde 1997, por um conjunto de países membros da OCDE e um grupo de países parceiros (mais de 30). Em 2009 participaram 65 países. Destina-se a avaliar a preparação dos alunos, com mais de 15 anos de idade para os desafios da vida futura: para a aprendizagem ao longo da vida e para o desempenho como cidadãos com um papel activo e interventivo na sociedade. É um programa desenhado e coordenado pela OCDE que, desde a década de 80, disponibiliza indicadores sobre a educação que permitam fazer comparações válidas entre países. Os resultados desta investigação têm sido publicados em relatórios diversos, destacando-se o relatório Education at a Glance, com uma publicação regular desde 1991 e cuja última publicação é de 2012 (www.uis.unesco.org/Education/Documents/oecd-eag-2012-en.pdf). O principal objectivo do PISA é “medir competências, conhecimentos e atitudes em áreas consideradas chave ou fundamentais, atendendo às mudanças em curso nas sociedades actuais” (…) “ o modelo proposto é orientado para a avaliação de competências e conhecimentos reconhecidos como sendo de importância transversal aos vários contextos nacionais e internacionalmente comparaveis” (Carvalho, Ávila, Nico & Pacheco, 2011, p.9). A informação é recolhida em ciclos trienais, sobre os conhecimentos e as competências dos alunos em trâ áreas fundamentais: leitura, matemática e ciências. Em cada um dos ciclos é eleita uma área principal: em 2009 a área eleita foi literacia em leitura (Carvalho, Ávila, Nico & Pacheco, 2011)
185
imigrantes relativamente à população nativa e também entre a primeira e segunda
geração, a residir em Portugal (PISA, 2009), atribuindo à última níveis de literacia
superiores à primeira, mas ainda aquém dos conseguidos pela população nativa. Os
dados quantitativos de que dispomos para o país comprovam a persistência desse
desnível no desempenho escolar dos alunos estrangeiros e dos nativos,
tendencialmente desfavorável aos primeiros. Ainda assim, nem sempre a distância
entre uns e outros é muito significativa, registando-se, isso sim, comportamentos
diversos entre os diferentes grupos de imigrantes e entre as diferentes regiões do país
(NUTII).
Retomando o estudo realizado pelo grupo de investigadores do CIES 123
(Carvalho, Ávila, Nico & Pacheco, 2011) a partir dos dados disponíveis nas bases de
dados do site oficial do PISA/OCDE124 e de outras informações específicas sobre a
implementação do PISA em Portugal disponibilizadas pelo GAVE, 125 é possivel
avançar com algumas informações que podem complementar a informação estatística
de que dispomos, sobre o desempenho escolar dos alunos de origem imigrante, e
mesmo, contribuir para a sua interpretação.
Com base na correlação entre um conjunto de variáveis (sexo, origem
imigrante, estatuto socioeconómico e cultural e desempenho nos três domínios
avaliados), os autores traçam um perfil dos alunos imigrantes que sistematizam no
parágrafo seguinte: “ser descendente de imigrante em Portugal está associado
negativamente ao desempenho escolar em todos os domínios (apesar de ser uma
associação muito baixa, é estatisticamente significativa). “ (Carvalho, Ávila, Nico &
Pacheco, 2011, p. 89). Na análise que desenvolvem, os autores reforçam que no
território nacional os efeitos nos resultados dos alunos da variável origem imigrante,
são menos acentuados que os observados no conjunto dos países da U.E. onde se
evidencia uma associação mais negativa entre origem imigrante e desempenho
escolar. Assim, concluem que em Portugal o efeito do estatuto socioeconómico e
cultural é mais relevante que a variável origem imigrante.
3.3. Tendências socio-espaciais do desempenho escolar no território
metropolitano
Os indicadores que sustentam a análise do desempenho escolar dos alunos
do ensino básico regular na AML, foram construídos a partir da base de dados do
123
Centro Interdisciplinar de Estudos Sociais, Instituto Universitário de Lisboa. 124
(www.pisa.oecd.org/) 125
Gabinete de Avaliação Educacional, Ministério da Educação. (www.gave.min-edu.pt/)
186
GEPE (2008-09). A base de dados resultante da organização da base de origem,
construída com recurso ao SPSS, é constituída por um universo de 197 freguesias. O
número de freguesias incluídas na análise resultou da verificação de duas condições
em simultâneo: a existência de escolas do ensino básico sedeadas no seu território e
a presença de alunos estrangeiros entre os matriculados nessas escolas. Dado que
nem todas as freguesias reúnem as duas condições definidas, não foi possível
considerar o universo de 211 freguesias que compõem a AML.
Os indicadores do âmbito da educação permitem identificar três dimensões
fundamentais para a análise que nos propomos: (i) o peso dos alunos estrangeiros e
dos alunos nativos face ao universo de estudantes; (ii) a percentagem de alunos
nativos e estrangeiros de diferentes origens por ciclo do ensino básico; (iii) a relação
entre a retenção/desistência por ciclo de escolaridade para os alunos nativos e para os
estrangeiros por regiões de origem.
Para responder à segunda finalidade, que orienta este ponto da investigação,
em particular ao objectivo que se reporta à identificação dos factores económicos e
socioculturais que inibem ou asseguram o sucesso escolar dos estudantes no território
metropolitano, recorremos aos dados estatísticos publicados pelo INE no
Recenseamento Geral da População (2011), desagregados ao nível de freguesia, e
que permitiram construir dez indicadores que caracterizam cada unidade territorial nas
educação e formação e condições de habitação (Quadro III.15). A base de dados que
mobilizamos para a análise estatística é constituída por dezoito indicadores relativos
aos estudantes que frequentam o ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos,
construídos a partir dos dados do GEPE (2008-09) e pelos indicadores respeitantes
aos factores estruturais (económicos, socioculturais, demográficos) construídos com
base no recenseamento da população (2011).
Na tentativa de identificar possíveis factores estruturais que caracterizem
algumas das tendências sócio-espaciais do desempenho escolar dos alunos, com
idades compreendidas entre os 5 e 18 anos que frequentam o ensino básico regular
na Área Metropolitana de Lisboa, recorremos ao cálculo do coeficiente de correlação
de Pearson 126 e à análise de regressão múltipla a partir da base de dados
anteriormente referida.
126
“O coeficiente de correlação é uma estatística que permite avaliar a magnitude e a direcção da associação ou correlação existente entre duas variáveis.” (Maroco & Bispo, 2005, p. 259). ” O coeficiente de correlação de Pearson pode variar entre -1≤R≤1. Um R>0 significa que o aumento de magnitude de uma das variáveis tem associado um aumento linear da outra variável, enquanto para R<0 o aumento de valor de uma das variáveis tem associada uma redução linear do valor da outra variável. Para R=0 não existe associação linear entre as duas variáveis, isto é, variações em magnitude de uma variável não
187
A escolha das variáveis a utilizar no cálculo do coeficiente de correlação e na
análise de regressão múltipla foi efectuada com base nos resultados de estudos que
investigam a influência de factores socioeconómicos no desempenho escolar e na
inclusão de alunos de origem imigrante nas escolas. Citamos, entre os diversos
trabalhos consultados, os estudos desenvolvidos em escolas portuguesas por Seabra
(2008) e Abrantes (2008); a análise dos resultados do PISA 2009 para Portugal
realizada por Carvalho, Ávila, Nico e Pacheco (2011); a investigação desenvolvida por
Portes e Rumbaut (2001), para a segunda geração de imigrantes latino-americanos
nos EUA; o estudo publicado por Kasinitz, Mollenkopf, Waters e Holdaway (2009) que
mobilizou jovens oriundos de grupos diversos (dominicanos, anglo-afro-caribenhos,
chineses, colombianos, equatorianos, peruanos e judeus com origem na Rússia ou
outros territórios da União Soviética) e três grupos de comparação (brancos, afro
americanos e porto-riquenhos descendentes de pais nativos) na área metropolitana de
Nova Iorque; os trabalhos de Burguess, Johnston e Wilson (2003, 2006), Cobb-Clark,
Sinninge e Stillman (2011) e Dustmann, Frattini e Lanzara (2011) sobre alguns grupos
de imigrantes que frequentam escolas do Reino Unido; o estudo coordenado por Crul,
Schneider e Lelie127 (2012) sobre as trajectórias escolares da segunda geração de
marroquinos, turcos e ex-jugoslavos em 15 cidades europeias e o trabalho de Crul e
Mollenkopf (2012) que compara a trajectória no sistema educativo dos mexicanos de
segunda geração residentes em Los Angeles com a segunda geração de turcos em
cidades da Europa ocidental.
Ensaiamos num primeiro momento a análise de correlação e, num momento
seguinte, vários modelos de regressão linear múltipla passo a passo (stepwise). A
aplicação da técnica de regressão linear múltipla permite a análise da relação entre
uma variável dependente (y) e um conjunto de variáveis independentes (x1, x2, x3, …
xn).
A análise de correlação permitiu identificar, as principais associações entre as
variáveis de natureza estrutural e as variáveis do desempenho escolar dos alunos que
frequentam as escolas do ensino básico regular, com idades entre 5 e 18 anos. No
Quadro III.16 estão representadas as variáveis que têm entre si uma correlação muito
significativa (nível de significância <0,005). Apenas as variáveis taxa de desemprego
e % de alojamentos sobrelotados apresentam uma correlação muito significativa com
as variáveis relativas à retenção dos alunos nos três grupos considerados (nativos,
imigrantes e totalidade do grupo). A variável relativa à população licenciada e à
estão associadas a variações lineares de magnitude da outra variável.” (Maroco & Bispo, 2005, p. 260-261). 127
Este estudo reúne um conjunto de artigos produzidos por investigadores que integraram a equipa do projecto TIES.
188
estrutura familiar correlacionam-se de forma significativa com a % de alunos
portugueses retidos ou em situação de desistência.
Quadro III.16 – Variáveis que apresentam uma correlação muito significativa
% de reprovação/ desistência entre alunos estrangeiros
% de reprovação/ desistência entre alunos portugueses
% de reprovação/ desistência entre alunos portugueses
e estrangeiros
Taxa de Desemprego + + +
% de famílias com um elemento feminino com idade superior a 15 anos e um menor com idade inferior a 15 anos
+
% de licenciados com idade superior a 25 anos +
% de alojamentos sobrelotados + + +
+ significância da correlação < 0,005
Fonte: Matriz de correlação. Construção própria.
Apesar da significância da correlação entre as variáveis que acabamos de
referir, as correlações são de um modo geral fracas, sendo a percentagem de
explicação reduzida. A associação entre a taxa de desemprego e a % de
retenções/desistências para cada grupo de alunos considerado revela ser a que se
apresenta com correlações mais elevadas e, como tal, com maiores percentagens de
explicação. Assim, a variável taxa de desemprego explica: 19% (0,434 2) da variação
da % de retenção/desistência entre os alunos nativos; 14% (0,380 2) da variação da %
de retenção/desistência do total do grupo e, 9,5% (0,309 2) da variação da % de
retenção/desistência de alunos estrangeiros. A variável % de alojamentos
sobrelotados tem percentagens de explicação muito baixas com as variáveis relativas
ao desempenho escolar dos alunos estrangeiros e da totalidade do grupo (5,7% e 7%
respectivamente) e uma percentagem de explicação de 14,7% para a variável % de
retenção/desistência entre os alunos portugueses. Quer a variável relativa à população
licenciada, quer a relativa às famílias monoparentais, com correlações muito
significativas com a % de retenção/desistência entre alunos portugueses, revelam ter
percentagens de explicação muito baixas (5% e 6% respectivamente). É importante
salientar que a explicação da variação da retenção/desistência entre os alunos
estrangeiros pelas variáveis taxa de desemprego e % de alojamentos sobrelotados é
189
mais reduzida quando comparada com a obtida para os nativos e para a totalidade do
grupo.
Na tentativa de encontrar factores explicativos para o desempenho escolar
dos alunos estrangeiros com diferentes origens incluímos na análise a % de
retenção/desistência por grupo de origem. Os resultados obtidos não são reveladores
da existência de correlações significativas entre cada uma das variáveis estruturais
definidas, excepção para os alunos oriundos de países europeus, U.E. (15), e para os
alunos de origem africana. Para os primeiros é a variável % de população licenciada
com mais de 25 anos que revela ter uma correlação significativa (nível de significância
= 0,004), para o segundo grupo é no peso das famílias monoparentais que o nível de
significância da correlação é importante (0,003). Ainda assim, o valor da correlação é
relativamente baixo em cada uma das situações, significado de uma percentagem de
explicação das variáveis reduzida.
Os resultados da análise de correlação indicam que, entre as variáveis
seleccionadas, as que melhor se associam com o insucesso escolar nos diferentes
grupos considerados, são fundamentalmente de natureza económica, em particular a
existência ou não de rendimento a partir do trabalho, situação que tem implicações
nas condições de habitabilidade, de onde emerge a segunda variável com correlação
significativa com todos os grupos de alunos considerados. Contudo, apesar da
significância da correlação, as reduzidas percentagens de explicação denunciam a
existência de outros factores, que não terão sido considerados na análise, com maior
capacidade de explicação sobre a variação do desempenho escolar, quer entre
nativos, quer entre estrangeiros. Esta evidência acentua-se para os alunos
estrangeiros, como se constata pelos valores mais baixos de correlação obtidos. A
influência dos factores económicos no desempenho escolar dos estudantes é uma
constatação recorrente noutros estudos sobre a temática. Porém, os autores também
são unânimes em afirmar que não se trata de uma situação de “determinismo social”
pois existem claramente outras variáveis, do foro individual, familiar e cultural e ao
nível do sistema educativo e das políticas escolares que podem diminuir os efeitos das
origens de classe e contrariar as expectativas “sociais” (Carvalho, Ávila, Nico &
Pacheco, 2011).
Identificadas as variáveis que melhor se associam com o desempenho
escolar dos estudantes do ensino básico regular na AML, avançámos para a
construção dos modelos de regressão começando por testar a relevância das
variáveis anteriormente identificadas (variáveis independentes) na explicação do
insucesso escolar (variável dependente), representado pela percentagem de
estudantes, nativos e imigrantes, de diversas nacionalidades, que não transitaram de
190
ano ou que desistiram (y) face ao total de alunos matriculados em cada grupo no ano
de referência. No Quadro III.17 apresenta-se uma lista de variáveis independentes (x)
agrupadas em cinco conjuntos de domínios.
Quadro III.17 – Variáveis independentes utilizadas na análise de regressão múltipla
Indicadores utilizados
Estr
utu
ra
De
mo
grá
fica
Estr
utu
ra f
am
ilia
r
Estr
utu
ra
so
cio
pro
fissio
nal
Ed
ucaçã
o e
Fo
rmaçã
o
Co
nd
içõ
es d
e
ha
bita
ção
Variáveis independentes
Taxa de Desemprego X
% de activos nos grupos profissionais (7, 8 e 9) X
% de famílias com um elemento feminino com idade superior a 15 anos e um menor com idade inferior a 15 anos
X X
% de população residente com idade até 14 anos X
% de população residente com idade igual ou superior a 65 anos
X
% de analfabetos com idade superior a 10 anos X
% de licenciados com idade superior a 25 anos X
% de alojamentos sobrelotados X
% de indivíduos a viver em alojamentos não clássicos X
% de famílias em alojamento próprio X
Com recurso ao programa SPSS, corremos o modelo para três variáveis
dependentes diferentes: 1) percentagem de retenções/desistências entre os alunos
inscritos no ensino regular com idades compreendidas entre os 5 e os 18 anos; 2)
percentagem de retenções/desistências entre os alunos portugueses inscritos no
ensino regular com idades compreendidas entre os 5 e os 18 anos e, 3) percentagem
de retenções/desistências entre os alunos estrangeiros inscritos no ensino básico
regular com idades compreendidas entre os 5 e os 18 anos.
Começando por introduzir, passo a passo, as 10 variáveis independentes
indicadas no Quadro III.17, para testar a contribuição de cada uma para a explicação
da variável dependente. Após estes testes, seleccionámos apenas modelos em que
considerámos três das variáveis independentes iniciais: taxa de desemprego,
percentagem de alojamentos sobrelotados e a percentagem de analfabetos. Apesar do
191
coeficiente de determinação múltipla (R2), apresentar valores crescentes com a
introdução de mais variáveis, para além destas três, as capacidades preditivas do
modelo não aumentam significativamente, ou seja, a proporção da variância total de y
que é explicada pelo modelo de regressão ajustado não se altera significativamente
quando o número de variáveis aumenta, devido à forte colinearidade128 observada
entre as restantes variáveis. Os modelos obtidos para os alunos estrangeiros, para os
nativos e para o total de alunos apresentam algumas diferenças que importa registar a
partir de análise individualizada para cada grupo.
Alunos estrangeiros
A variação registada no comportamento do insucesso escolar dos alunos
estrangeiros inscritos no ensino regular, com idades compreendidas entre os 5 e os 18
anos, é explicada, no modelo de regressão, pela taxa de desemprego da população
residente e pela percentagem de população analfabeta com mais de 10 anos. No
conjunto das variáveis independentes utilizadas, estas duas caracterizam a estrutura
socioprofissional e a educação e formação.
Na construção do modelo, introduziu-se em primeiro lugar (modelo 1), a
variável com maior capacidade explicativa sobre o desempenho escolar (taxa de
desemprego da população residente), a qual explica 9,5% (R 2). A segunda variável
introduzida na equação foi a percentagem de população analfabeta com mais de 10
anos (modelo 2), que acrescenta 2,2% à explicação anterior. As duas variáveis em
conjunto explicam 11,7% da variação registada na percentagem de
retenções/desistências dos estudantes estrangeiros (Quadro III.18). Segundo o
modelo, o insucesso registado entre os alunos estrangeiros é, em parte explicado por
factores de ordem económica e cultural.
O modelo ajustado129 ao número de variáveis independentes e de unidades
de análise apresenta uma percentagem de explicação da variação observada de
10,2%, um valor relativamente baixo, apesar do modelo ser significativo (para a
variável taxa de desemprego F= 16,471, com a entrada da segunda variável F= 11,992,
em ambas as situações a probabilidade de significância é inferior a 0,001 ou seja, a
probabilidade dos resultados obtidos serem devidos ao acaso é inferior a 1%).
128
“Variáveis colineares são variáveis fortemente correlacionadas entre si.” (Maroco, 2005, p. 302) 129
Utilizamos o coeficiente R quadrado ajustado por ser o mais adequado quando os modelos possuem mais do que uma variável independente.
192
Quadro III.18 – Modelo de Regressão Múltipla (variável independente % retenções/desistências dos alunos estrangeiros do Ensino Básico regular, 2008-09)
Sumário do Modelo de Regressão
Modelo R R2 R
2 ajustado
erro padrão da estimativa
1 ,280a ,079 ,074 10,7561
2 ,333b ,111 ,102 10,5927
a. preditores: (constant), TxDesemprego; b.preditores: (constant), Tx Desemprego, % Analfabetismo.
ANOVAc
Modelo soma dos quadrados
graus de liberdade
média dos quadrados
F nível de
significância
1
Regressão 1905,630 1 1905,630 16,471 ,000a
Resíduo 22328,679 193 115,693
Total 24234,308 194
2
Regressão 2691,092 2 1345,546 11,992 ,000b
Resíduo 21543,216 192 112,204
Total 24234,308 194
a. preditores: (constante), Tx Desemprego; b. preditores: (constante), Tx Desemprego, % Analfabetismo; c. variável dependente: % Retenções/Desistências alunos estrangeiros.
Alunos portugueses
A aplicação do modelo para a variável dependente percentagem de
retenções/desistências entre os alunos portugueses inscritos no ensino regular, com
idades compreendidas entre os 5 e os 18 anos, apresenta agora uma percentagem de
explicação relativamente superior à anterior (18,9%).
A variável independente, taxa de desemprego, possui um efeito significativo
na explicação da variação observada no desempenho escolar entre os alunos
portugueses. O coeficiente de determinação da regressão é de 18,9% (Quadro III.19).
A percentagem de explicação do modelo ajustado (18,4%) é ligeiramente superior à
anterior e continuamos na presença de um modelo significativo (o valor de F é de
32,477 e a probabilidade de significância inferior a 0,001). Os resultados obtidos para
a explicação do insucesso escolar entre os alunos portugueses alertam para a
importância do nível económico das famílias, medido neste caso pela taxa de
desemprego.
193
Quadro III.19 – Modelo de Regressão Múltipla (variável independente % retenções/desistências dos alunos portugueses do
Ensino Básico regular, 2008-09)
Sumário do Modelo de Regressão
Modelo R R2 R
2 ajustado
erro padrão da estimativa
1 ,434a ,189 ,184 4,20098
a. preditores: (constante), Taxa Desemprego
ANOVAa
Modelo soma dos quadrados
graus de liberdade
média dos quadrados
F nível de
significância
1
Regressão 791,750 1 791,750 44,863 ,000b
Resíduo 3406,102 193 17,648
Total 4197,851 194
a. variável dependente: % Retenções/Desistências alunos portugueses
preditores: (constante), Taxa Desemprego
Alunos estrangeiros e portugueses
O modelo estimado para a variável dependente percentagem de
retidos/desistências entre os alunos (estrangeiros e portugueses) inscritos no ensino
regular com idades compreendidas entre os 5 e os 18 anos, é também significativo,
como os anteriores (F=32,477 o que corresponde a uma probabilidade de significância
inferior a 0,001), explicando 14,4% da variabilidade observada (R2). A percentagem de
explicação do modelo ajustado é de 14,0%, um pouco inferior à registada para o
modelo construído para explicar a variação do insucesso entre os alunos portugueses.
Tal como se verificou neste modelo, apenas a variável taxa de desemprego possui um
efeito explicativo sobre a variável dependente % de retenções/desistências (Quadro
III.20). Os resultados obtidos indicam ser a taxa de desemprego, ou seja a não
existência de um meio de subsistência por via do emprego, a variável, entre as
diversas que foram utilizadas, que melhor explica a variação no desempenho escolar
das crianças e jovens do ensino básico regular.
194
Quadro III.20 – Modelo de Regressão Múltipla (variável independente % retenções/desistências do total de alunos do ensino básico regular, 2008-09)
Sumário do Modelo de Regressão
Modelo R R2 R
2 ajustado
erro padrão da estimativa
1 ,380a ,144 ,140 6,07960
a. preditores: (constante), Taxa Desemprego
ANOVAa
Modelo soma dos quadrados
graus de liberdade
média dos quadrados
F nível de
significância
1
Regressão 1200,383 1 1200,383 32,477 ,000b
Resíduo 7133,575 193 36,962
Total 8333,958 194
a. variável dependente: % Retenções/Desistências do total de alunos
b. preditores: (constante), Taxa Desemprego
É interessante notar que, quer para a totalidade de alunos, quer para os
portugueses, a taxa de desemprego surge como a variável explicativa da variação
observada no desempenho escolar dos alunos. Embora com uma percentagem de
explicação pouco elevada, a taxa de desemprego surge associada à percentagem de
analfabetos no modelo ajustado para a variável dependente referente aos alunos
estrangeiros, e surge isolada no modelo do desempenho escolar para os alunos
portugueses. Aferimos também, que a taxa de desemprego possui um efeito
explicativo significativo, embora com uma percentagem menos elevada que a
registada para o modelo referente aos alunos nativos, sobre a variação observada no
desempenho escolar da totalidade dos alunos (5 a 18 anos) que frequentam o ensino
básico regular.
Os resultados obtidos nos modelos de regressão múltipla atrás apresentados,
indicam que as características socioeconómicas do meio em que os alunos
residem/estudam, não são os únicos determinantes do desempenho escolar dos
estudantes do ensino básico, quer para os alunos portugueses, quer para os
imigrantes.
195
Apesar das variáveis independentes que utilizámos para a construção dos
modelos serem estatisticamente significativas, a percentagem de explicação é
reduzida. Este facto reforça a ideia que diversos autores têm defendido sobre a
explicação do desempenho escolar, da população imigrante e nativa. Este resulta de
uma combinação de várias ordens de factores que incluem o contexto socioeconómico
e político, as características das escolas e aspectos, do foro familiar e individual
Ao nível familiar, sublinhamos os efeitos do estatuto socioeconómico, os
percursos de vida, as suas expectativas face à escola e a integração no mercado de
trabalho. No caso das famílias imigrantes, a estes factores junta-se ainda o tempo de
permanência no país de acolhimento e a língua falada em casa (Portes & Rumbaut,
2001; Portes & Hao, 2005; Portes, 2006). Em relação às características individuais do
aluno, referimos a predisposição para aprender, as competências construídas no
percurso escolar anterior, a abertura para a interacção com os outros, a capacidade
para utilizar a língua do país de acolhimento e as expectativas que revela ter face à
escola (Crul, 2007b; Suárez-Orozco, Darbes, Dias & Sutin, 2011). Acrescentamos
ainda, a estes dois grupos de factores, a influência da escola e dos quadros de vida
nos territórios onde esta se localiza sobre os percursos escolares dos estudantes e
sobre os comportamentos que estes revelam ter (Carvalho, 2010). Por outro lado, a
capacidade da escola para se abrir à diversidade é determinante na promoção das
relações interétnicas e da convivência em espaços multiculturais (Wessendorf, 2011),
fundamentais para assegurar a inclusão e promover o sucesso escolar. Neste sentido,
as respostas de inclusão das escolas diferem em função das características dos
territórios em que se inserem (Portes & Rumbaut, 2001; Portes, 2006; Hortas, 2008).
Aos aspectos anteriormente identificados, vêm juntar-se as especificidades de
cada grupo de imigrantes ou, como referem Portes e MacLeod (1996, 1999), os efeitos
da etnicidade no desempenho escolar. A este respeito são diversos os estudos e
autores que é possível citar: o trabalho de Suárez-Orozco (1991) para os mexicanos,
porto-riquenhos e cubanos em escolas americanas; os trabalhos de Portes e MacLeod
(1996, 1999), Portes e Rumbaut (2001), Portes e Hao (2005), sobre as minorias
hispânicas nos EUA (mexicanos, colombianos, cubanos entre outros da América
Central e do Sul); a investigação desenvolvida no âmbito do projecto TIES (Crul &
Heering, 2007; Crul 2000, 2004, 2007; Crul & Schneider, 2010, 2012) sobre as
trajectórias escolares da segunda geração de imigrantes turcos, com idade superior a
15 anos, em cinco países europeus (Alemanha, Áustria, Bélgica, França e Holanda); o
196
estudo de Aparício (2007) realizado em escolas de Barcelona e Madrid, sobre os
percursos dos jovens imigrantes de origem marroquina, peruana e dominicana e a
investigação de Seabra (2008, 2010) para os alunos de origem indiana e cabo-
verdiana a frequentar escolas na área Metropolitana de Lisboa.
Perante a diversidade e complexidade de intervenientes na inserção dos
alunos imigrantes em contexto escolar, defendemos que só uma análise sustentada
num quadro de causalidades cruzadas, umas de cariz microssocial, outras inerentes
ao contexto territorial e social das escolas, nos permitirá encontrar factores
explicativos para os percursos escolares diferenciados (Sebastião, 2009, p. 283).
3.4. Padrões territoriais do insucesso escolar
O padrão de distribuição territorial da percentagem de retenções/desistências
dos alunos portugueses (Fig. III.15) revela diversidades no interior de cada concelho
permitindo identificar alguns eixos/áreas de maior intensidade do fenómeno: (i) núcleo
central da cidade e a sua periferia imediata (freguesias de Mártires, Mercês, Anjos, S.
Vicente, S. João e Beato) e algumas freguesias da periferia urbana (Sta Maria dos
Olivais, Charneca, Benfica); (ii) áreas peri-urbanas mais recentes e com alguma
presença industrial de que são exemplo o eixo de Vila Franca de Xira na margem
norte do Tejo e o arco ribeirinho do Montijo a Almada, na margem sul; (iii) núcleos com
elevadas densidades populacionais dos eixos Amadora-Sintra e Odivelas-Loures, na
margem norte e, na margem sul, as freguesias do Pragal e Laranjeiro, Caparica e
Costa da Caparica (Almada), Amora e Arrentela (Seixal), a área urbana do Barreiro
(Lavradio, Alto de Seixalinho, Sto André, Sto António), Quinta do Conde (Seixal), Vale
da Amoreira (Moita), e a cidade de Setúbal (freguesia de S. Sebastião); (iv) áreas peri-
urbanas, mais afastadas da capital, onde ainda persiste alguma actividade agrícola
como é o caso de algumas freguesias do concelho de Mafra (Sto Isidoro, Malveira e
Venda do Pinheiro), do concelho de Sintra (Montelavar e Terrugem) e de Loures
(Unhos), localizadas na margem norte e, dos concelhos de Palmela (Poceirão),
Montijo (Pegões e Sto Isidro de Pegões), na margem sul.
197
Fig. III.15 – % de Retenções/Desistências entre os alunos portugueses, que frequentam o ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09
O padrão de distribuição do insucesso dos alunos portugueses quando
comparado com o dos alunos estrangeiros revela ter muitos traços comuns (Fig. III.16).
Porém, há uma intensificação do fenómeno no eixo de Odivelas-Loures e Amadora-
Sintra, e um atenuar do mesmo no concelho de Palmela.
A distribuição geográfica do insucesso, entre os alunos estrangeiros evidencia
que: (i) o comportamento destes segue o dos alunos portugueses; (ii) em algumas
áreas urbanas, onde os nativos apresentam maior número de
reprovações/desistências, os estrangeiros detém valores ainda maiores, em alguns
territórios três a quatro vezes superiores.
Fonte: GEPE, 2008-09. Construção própria.
198
Fig. III.16 – % de Retenções/Desistências entre os alunos estrangeiros, que frequentam o
ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09
Os estudantes de origem africana estão representados em grande proporção
na maioria das freguesias onde o insucesso/desistência dos estrangeiros assume
valores relativos mais elevados no conjunto Área Metropolitana de Lisboa (Fig. III.17):
(i) núcleo central da cidade e a periferia imediata (freguesias do Beato, Castelo,
Mercês, S. Miguel, S. Vicente de Fora) e algumas freguesias da periferia urbana (Sta
Maria dos Olivais, Benfica e S. Domingos de Benfica); (ii) nos eixos Amadora-Sintra
(Brandoa, Damaia, Falagueira, Venteira, Queluz, Monte Abraão, Rio de Mouro,
Algueirão-Mem Martins, Casal de Cambra) e Odivelas-Loures (Pontinha, Póvoa de Sto
Adrião, Odivelas, Apelação, Bobadela, Camarate, Sacavém, Sta Iria da Azóia, São
João da Talha); (iii) na margem sul, nas freguesias do Pragal e Laranjeiro, Caparica e
Costa da Caparica e Almada (Almada), Amora e Arrentela (Seixal), a área urbana do
Fonte: GEPE, 2008-09. Construção própria.
Fonte: GEPE, 2008-09. Construção própria.
199
Barreiro (Lavradio, Alto de Seixalinho, Sto António), Vale da Amoreira e Baixa da
Banheira (Moita), e na cidade de Setúbal (freguesia de N. Senhora da Anunciada, S.
Sebastião e S. Julião).
Fig. III.17 – % de Retenções/Desistências entre os alunos africanos, que frequentam o ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09
Para complementar a análise que acabámos de fazer, cartografámos também
a percentagem de reprovações/desistências dos alunos de origem sul-americana,
maioritariamente de nacionalidade brasileira (a comunidade que tem maiores
quantitativos e com maior crescimento na actualidade em Portugal). Tratando-se de
um grupo que apresenta padrões de distribuição mais dispersos e uma maior
heterogeneidade na forma de ocupação do território metropolitano, manifestando
preferência pelas freguesias próximas do litoral (Fonseca, 2008), a análise da sua
Fonte: GEPE, 2008-09. Construção própria.
200
distribuição poderá permitir acrescentar alguma explicação na distribuição espacial do
insucesso registada na Fig. III.16 entre os alunos estrangeiros. Assim, o maior peso
relativo nas retenções/desistências identificado para estes alunos nas freguesias que
delimitam a AML, onde a população africana apresenta menores índices de
concentração, pode ser em parte explicado pelos valores do insucesso entre os alunos
brasileiros (Fig. III.18). Neste grupo incluem-se algumas freguesias dos concelhos de
Cascais (Estoril e Cascais), Oeiras (Algés e Paço de Arcos), Sintra (Colares e
Montelavar) e Mafra (Ericeira, Mafra e Malveira), na margem norte do Tejo; Almada
(Caparica e Trafaria), Seixal (Corroios e Arrentela), Sesimbra (Castelo e Santiago) e
Setúbal (S. Julião e S. Sebastião) na Península de Setúbal.
Fig. III.18 – % de Retenções/Desistências entre os alunos sul-americanos, que frequentam o ensino regular, com idade entre os 5 aos 18 anos, 2008-09
A comparação dos padrões espaciais do insucesso escolar dos distintos
grupos atrás analisados, com a taxa de desemprego e percentagem de analfabetismo
entre a população com mais de 10 anos (ambos utilizados nos modelos de regressão
Fonte: GEPE, 2008-09. Construção própria.
201
múltipla), coloca em evidência algumas tendências comuns nos padrões do insucesso
escolar e nas características socioeconómicas e culturais da população. A taxa de
desemprego (Fig. III.19) apresenta uma distribuição geográfica muito próxima da
registada nas taxas de retenção/desistência dos alunos nativos e estrangeiros,
constatação que nos permite inferir sobre a relação existente entre o nível
socioeconómico das populações e a capacidade de investimento pessoal na educação.
Importa salientar que no eixo Odivelas-Loures e Amadora-Sintra, onde anteriormente
identificámos níveis de insucesso elevados, quer entre os nativos, quer entre os
estrangeiros, a taxa de desemprego surge também com valores elevados.
Fig. III.19 – Taxa de desemprego, 2011
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
202
Todavia, a percentagem de analfabetos (Fig. III.20) não segue a mesma
tendência, em particular nos concelhos da margem norte do Tejo, correspondendo
nestes territórios a maior percentagem de analfabetos às áreas demograficamente
mais envelhecidas Incluem-se neste grupo as freguesias do núcleo central da cidade
de Lisboa e da frente ribeirinha oriental, freguesias rurais dos concelhos de Loures,
Sintra, Mafra e Vila Franca de Xira.
Fig. III.20 – % de analfabetos com mais de 10 anos, 2011
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
203
4. Perfis da imigração no sistema de ensino português – do país à AML
Desde finais da década de 70, com a chegada de um contingente significativo
de população de origem africana, que começou ainda antes do processo de
descolonização, passou a ser visível a presença de crianças e jovens não nativas no
sistema de ensino português. Com um padrão de distribuição territorial muito
concentrado nos distritos de Lisboa e Setúbal, esta “nova” população escolar integrou
um sistema de ensino que se encontrava em transição, por inerência das mudanças
políticas decorrentes do final de um regime ditatorial e de início da construção de uma
sociedade democrática. Uma transição que era ainda vivida numa fase embrionária,
de procura de mecanismos para a integração da diversidade socioeconómica num
sistema de ensino até então orientado para uma certa homogeneidade do seu público
escolar, mas ainda alheado dos desafios com que hoje se depara no sentido da
integração da diversidade cultural. É neste contexto de mudança, de uma escola
frequentada por um grupo restrito para uma escola aberta a todos, que as crianças e
jovens não nativos, maioritariamente de origem africana, dão os primeiros passos no
sentido da sua integração no novo território.
Em finais dos anos 70 e durante os anos 80, a integração de alunos
estrangeiros decorreu sem que fossem equacionados mecanismos particulares que a
suportassem. No caso particular das populações oriundas das ex-colónias, a
integração na nova sociedade não foi equacionada como um processo com
implicações na formulação de políticas nacionais específicas. Estas populações, pela
ligação que até então tinham mantido com a metrópole, eram entendidas como
cidadãos nacionais que, por inerência do contexto político, tinham sido “obrigadas” a
mudar de território de residência. Para o país, com pouca experiência no acolhimento
de populações não nativas, o desafio de pensar a integração surge mais tarde, quando
se intensificam os fluxos migratórios e se diversificam as origens dos novos migrantes.
Na segunda metade dos anos 90, o Secretariado Entreculturas divulga os
primeiros números referentes à população não nativa que frequenta as instituições de
ensino básico e secundário em Portugal. No ano lectivo de 1994-95 contavam-se 53
120 estudantes, 41% a frequentar o 1º ciclo. Em 1997-98, este valor já perfazia um
total de 60 975 alunos, 36% no 1º ciclo, 19% no 2º ciclo e 25% no 3º ciclo do ensino
básico. Estes quantitativos alteraram-se significativamente na viragem do século, ao
mesmo tempo que se diversificaram as origens dos estudantes. Em 2003-04 o grupo
ascendia a 62 491 alunos, 4,8% do total de estudantes inscritos nas escolas em
Portugal. Nesta data surgem os primeiros registos oficiais sobre os quantitativos de
estudantes com origem na China e nos países europeus de leste, estes últimos
204
perfazendo já 5% da população não nativa. Até ao ano lectivo de 2009-10, o padrão
de distribuição das origens dos alunos imigrantes vai sofrendo alterações: embora
mantendo-se a posição maioritária ocupada pelos alunos de origem africana, é o Brasil
que passa a ser o principal país de origem dos estrangeiros a frequentar as escolas do
ensino público em Portugal. Também neste período assistimos ao engrossar do grupo
de crianças oriundas de países do leste europeu, em particular da Ucrânia, Roménia,
Moldávia e Rússia, 16,4% do total de estrangeiros no ano lectivo de 2009-10.
Em 2009-10, o grupo de estudantes estrangeiros a frequentar o sistema de
ensino público regular contabilizou o total de 62 471 indivíduos, oriundos de cerca de
160 nacionalidades, constituindo aproximadamente 6% do total de alunos do país.
Este grupo apresenta agora uma maior dispersão pelos diversos ciclos de ensino,
relativamente ao padrão anteriormente registado, 25,7% no 1º ciclo, 35,3% no 2º ciclo,
27% no 3º ciclo e 12% no ensino secundário.
A distribuição no país dos quantitativos de alunos estrangeiros revelava,
desde o início do século, uma concentração na região de Lisboa. No final da primeira
década assistimos ao delinear de uma tendência para a atenuação da excessiva
metropolização que caracterizava os momentos anteriores, resultado de uma maior
dispersão pelo território nacional das novas vagas migratórias associada à
composição étnica das mesmas e às escolhas que os imigrantes de diferentes origens
revelam ter na sua fixação no novo país. O aumento da percentagem de estudantes
no Algarve, no Alentejo e no Norte, é revelador das diferentes direcções dos fluxos
migratórios no território continental. A cartografia do Índice Territorial de Imigração
coloca em evidência a relevância da imigração na região do Algarve nesta primeira
década do séc. XXI.
Em Portugal, a maioria dos alunos frequenta o ensino básico regular (65,5%).
A presença noutros cursos do ensino básico é relativamente reduzida, assim como no
ensino secundário regular e noutros cursos deste nível de ensino. Entre os alunos
estrangeiros acentua-se a concentração no ensino básico regular (70,4%), a uma
distância significativa do ensino secundário regular (11,7%) e de outros cursos do
ensino básico e secundário (6,4% e 11,4% respectivamente).
O grupo de alunos que frequenta o ensino básico regular, com idades entre 5
e 18 anos, corresponde a 65,4% do total de estudantes do país e dele faz parte uma
população de 94,9% de portugueses e 5,1% de estrangeiros. Os quantitativos de
alunos deste grupo (5-18 anos) distribuem-se pelos três ciclos de ensino na seguinte
ordem: 1º ciclo, 3º ciclo e 2º ciclo. Entre os alunos imigrantes, o grupo maioritário
frequenta o 3º ciclo (37,1%), em segundo lugar posiciona-se o 1º ciclo (35,5%) e, por
último, o 2º ciclo (27,4%). Relativamente às origens deste grupo, 31,7% é oriundo da
205
América do Sul, em particular do Brasil, 31,1% do continente africano, nomeadamente
dos PALOP, 18,4% de países do leste europeu (Ucrânia, Roménia, Moldávia e Rússia),
10,5% tem origem em países da U.E. (15) e 4,5% na Ásia (Índia, China, Paquistão).
Os seis principais países de origem dos estudantes estrangeiros da faixa etária 5-18
anos, são o Brasil (30,7%), Cabo Verde (12,1%), Angola (7,4%), Ucrânia (6,9%),
Guiné-Bissau (5,8%) e Roménia (5,1%).
O padrão de distribuição dos alunos do ensino básico regular pelas regiões
portuguesas (NUTII) revela que as crianças oriundas do Brasil ocupam sempre a
primeira posição, organizando-se as restantes nacionalidades em combinações
diversas em cada NUT. É de referir, no Norte e Centro, a presença significativa de
estudantes nacionais de países europeus de destino da emigração portuguesa
(França, Alemanha, Suíça), provavelmente associados a movimentos de retorno desta
população.
As taxas de diplomação dos alunos não nativos situaram-se desde sempre
em níveis inferiores às dos estudantes autóctones. Contudo, desde o início do século
que se tem registado uma tendência para a diminuição das taxas de diplomação entre
os alunos estrangeiros comparativamente aos nacionais. A análise da média de idades
dos alunos estrangeiros e nativos, por ciclo de ensino básico, evidencia o maior peso
daqueles que já ultrapassaram o limite de idade previsto para o ciclo de ensino que
frequentam. Este desnível não se distancia muito do já avançado pelo relatório PISA
(2009), que identificava que pelo menos um ano separava os alunos imigrantes dos
nativos no nível de ensino frequentado.
Os dados de que dispomos permitem identificar que, entre os alunos
estrangeiros inscritos no ensino básico regular, as taxas de retenção/desistência são
cerca do dobro das obtidas pelos nacionais. A tendência registada para o país é de
aumento do número de retenções à medida que se avança do 1º para o 3º ciclo.
Porém, entre os estrangeiros, os quantitativos são sempre superiores. Este
comportamento não é uniforme para todos os grupos de origem, identificando-se à
escala nacional as maiores taxas de retenção entre os estudantes oriundos de países
africanos (22,3%), asiáticos (20,5%) e sul-americanos (17,4%). São os alunos
descendentes de cidadãos europeus (U.E.15) e de europeus de leste, com taxas de
reprovação/desistência de 12,4% e 13,6%, os que mais se aproximam das taxas de
retenção dos nativos (7,9%).
São diversos os factores (políticos, familiares e individuais) que se podem
elencar para justificar os desníveis encontrados no sucesso escolar entre alunos
estrangeiros e nativos, assim como entre os vários grupos de origem. Entre os
primeiros situam-se as políticas nacionais de acolhimento no sistema educativo e as
206
políticas de escola. Os factores de ordem familiar, integram os níveis socioeconómicos,
o domínio da língua do país de acolhimento e os níveis de instrução dos progenitores,
assim como a valorização que fazem da escola e da educação. O nível individual
reporta-se à expectativa dos alunos face à escola, ao domínio da língua e ao percurso
escolar anterior, às relações que estabelecem com os colegas e com os adultos em
contexto escolar e aos laços que criam com as instituições que os acolhem.
A Área Metropolitana de Lisboa acolhe 27% do total de alunos inscritos nas
escolas em Portugal. Neste território, concentram-se 56,4% dos estudantes
estrangeiros matriculados nas escolas portuguesas. A população não nativa perfaz
10% do total de alunos da região metropolitana, encontrando-se inscritos nas escolas
do ensino básico e secundário 46 090 alunos (2008-09). As principais regiões de
origem destes estudantes são o continente africano (54,1%) e a América do Sul
(24,4%). Na terceira e quarta posições surgem os europeus de leste (9%) e os alunos
provenientes de países da União Europeia (15) (7,4%).
O grupo de alunos com idades compreendidas entre 5 e 18 anos, que se
encontra a frequentar escolas do ensino básico, totaliza 368 982 indivíduos, dos quais
aproximadamente 10% são estrangeiros (37 218). As regiões de origem mantêm o
padrão anterior, contudo, reduz-se o peso relativo dos alunos oriundos de África. Entre
as principais nacionalidades destaca-se o Brasil (26,5% dos estrangeiros), Cabo Verde
(19%), Angola (12,6%), Guiné-Bissau (8,5%), S. Tomé e Príncipe (5,5%), Ucrânia
(3,4%), Roménia (3,0%) e Moldávia (2,6%).
O concelho de Sintra e Lisboa concentram 33% dos estudantes estrangeiros
a residir na AML. Os concelhos de Cascais, Amadora e Loures surgem na 3ª, 4ª e 5ª
posições em termos de quantitativos de alunos imigrantes. No conjunto, os cinco
municípios referidos contabilizam 69% dos estudantes estrangeiros inscritos em
escolas da AML. Porém, a análise do peso relativo da população escolar não nativa
em cada concelho da AML posiciona a Amadora, Cascais, Sintra e Loures nos
primeiros quatro lugares, com mais de 10% de alunos de origem imigrante. Lisboa
altera a sua posição para o 13º lugar no conjunto da região metropolitana.
A análise das regiões de origem dos estudantes evidencia uma tendência
para a concentração da população escolar oriunda de países africanos nos eixos
Amadora-Sintra e Odivelas-Loures, na margem norte do Tejo; e, Seixal, Moita e
Barreiro na margem sul. Nestes territórios mais de metade da população escolar não
nativa é de origem africana. Os estudantes com origem na América do Sul,
maioritariamente de nacionalidade brasileira, dispersam-se por todo o território
metropolitano, apresentando maior peso relativamente ao total de estrangeiros nos
concelhos de Mafra, Cascais, Sesimbra, Alcochete e Setúbal. Também com uma
207
dispersão na AML, e menor concentração na cidade de Lisboa, surgem os alunos
oriundos de países do leste europeu que frequentam na sua maioria escolas
localizadas nos concelhos do Montijo, Sesimbra e Alcochete, na margem sul. Os
estudantes de origem asiática concentram-se maioritariamente nos concelhos de
Lisboa e Palmela.
Globalmente, os maiores quantitativos de alunos da AML frequentam o
primeiro ciclo (39%), seguindo-se o terceiro (25%), e só depois o segundo ciclo (20%).
Os estudantes estrangeiros acompanham este padrão de distribuição. Todavia,
enquanto quase 40% dos alunos portugueses frequentam o 1º ciclo, apenas 32% dos
alunos estrangeiros se encontram neste ciclo de ensino.
Tal como observamos para o território nacional, regista-se uma tendência
para os alunos estrangeiros apresentarem uma média de idades mais elevada que os
seus colegas portugueses que frequentam o mesmo ciclo de ensino. A maior
percentagem de alunos não nativos que já ultrapassou a idade prevista para o ciclo de
escolaridade em que se encontra inscrito é evidente em todos os ciclos do ensino
básico. O valor médio de retenção/desistência para o conjunto dos três ciclos passa de
10% entre os nativos para o dobro nos estrangeiros. Deste modo, é evidente um
menor sucesso escolar entre os alunos não nativos por comparação com os padrões
nacionais. Uma tendência que se desenha logo desde o 1º ciclo.
A reflexão feita, a uma escala nacional e regional, do comportamento
registado no desempenho escolar dos alunos estrangeiros evidencia alguns resultados
da integração que é vivida na escola. Porém, apenas nos oferece uma vertente desse
processo (sucesso ou insucesso escolar), não permitindo avançar com explicações
sustentadas para os padrões registados. Ainda assim, tentámos encontrar alguns
factores explicativos dos resultados observados, recorrendo à análise de correlação e
de regressão múltipla. Partindo de uma análise centrada no desempenho escolar dos
estudantes estrangeiros e nativos, quantificada pelas variáveis % de
retenção/desistência entre os alunos estrangeiros e % de retenção/desistência entre
os alunos nativos, nas freguesias da AML, e de um conjunto de variáveis
representativas da estrutura familiar, estrutura socioprofissional, educação e formação,
e condições de habitação, procuramos encontrar alguns factores explicativos dos
padrões do insucesso registados entre os alunos estrangeiros e alunos nativos. Do
conjunto de variáveis utilizadas, a taxa de desemprego surge como aquela que
apresenta maior percentagem de explicação sobre o insucesso escolar, quer para os
estudantes estrangeiros, quer para os nativos. Existem outras variáveis que também
apresentam uma correlação significativa com a percentagem de retenção/desistência
registada entre os alunos nativos, contudo, o coeficiente de correlação é relativamente
208
reduzido. Referimo-nos à variável % de alojamentos sobrelotados. As variáveis % de
licenciados com idade superior a 25 anos e % de famílias monoparentais constituídas
por um elemento feminino e um menor de 15 anos têm também uma correlação
significativa com o insucesso escolar identificado entre a população nativa no entanto,
a percentagem de explicação desse insucesso é reduzida.
Os resultados obtidos a partir da análise de correlação confirmam a existência
de outros factores explicativos do insucesso escolar dos alunos em geral, que vão
para além das variáveis socioeconómicas, contrariando as visões demasiado
deterministas que associam insucesso escolar a níveis socioeconómicos baixos.
Quando nos reportamos à população estrangeira acentua-se a necessidade de
encontrar outros factores explicativos do insucesso escolar que não são possíveis de
identificar a partir de variáveis de natureza quantitativa. Reportamo-nos a aspectos
que se relacionam com a política de acolhimento em contexto escolar, com a
aprendizagem da língua, com as atitudes das famílias e dos estudantes face à escola,
com os percursos que os alunos já realizaram anteriormente, com o caminho que
constroem na sua inserção social na escola e que se materializa pelas relações que
estabelecem com os adultos e com os pares. Causalidades que só são passíveis de
serem exploradas numa análise à escala micro, centrada nos territórios de
acolhimento, nas escolas, nos alunos e nas famílias. Tarefa a que nos propomos na
parte IV deste estudo.
O recurso à construção de modelos de regressão múltipla para explicar o
comportamento das variáveis relativas ao insucesso escolar registado entre os alunos
estrangeiros e os alunos nativos (variáveis dependentes), utilizando um conjunto de
variáveis independentes (estrutura familiar, estrutura socioprofissional, educação e
formação, e condições de habitação), apresenta resultados que se aproximam dos
anteriores. Confirma-se a relevância da variável taxa de desemprego na explicação do
comportamento das variáveis dependentes em todos os modelos. Porém, no caso da
variável dependente, % de retenção/desistência dos alunos estrangeiros, a variável
independente % de analfabetismo surge também com alguma capacidade explicativa
do comportamento registado. Ainda assim, é importante referir, que apesar da taxa de
desemprego surgir como uma variável estatisticamente muito significativa na
explicação do insucesso escolar, a percentagem de explicação é reduzida. Assim,
confirma-se que os factores que permitem explicar o desempenho escolar, quer entre
nativos, quer entre estrangeiros, não são resultado apenas de variáveis estruturais, de
natureza económica e social. A complexidade de intervenientes no processo de
inserção dos alunos em contexto escolar pode transpor-se também aos factores que
interferem no seu desempenho e, neste sentido, só uma análise das diversas
209
causalidades poderá permitir compreender a diversidade de percursos escolares que
os diferentes grupos realizam.
No território metropolitano, o padrão do insucesso dos alunos nativos e
estrangeiros revela ter alguns traços comuns. Em algumas áreas onde os nativos
apresentam maior número de reprovações/desistências, os estrangeiros detém valores
ainda menores, por vezes três a quatro vezes superiores. Os estudantes de origem
africana estão representados em grande proporção na maioria das freguesias onde o
insucesso/desistência dos estrangeiros assume valores mais elevados na AML: i)
núcleo central da cidade e periferia imediata; ii) eixos Amadora-Sintra e Odivelas-
Loures e, iii) algumas freguesias da margem sul, localizadas no concelho de Almada,
Seixal e Moita, e das áreas urbanas do Barreiro e da cidade de Setúbal.
A análise que desenvolvemos até aqui, relativa ao desempenho escolar dos
alunos imigrantes e nativos permite reter dois aspectos fundamentais: i) são diversos
os factores que interferem no desempenho escolar, quer dos alunos estrangeiros quer
dos nativos; apesar das variáveis socioeconómicas poderem explicar uma parte deste
insucesso, a percentagem de explicação é reduzida; ii) os padrões territoriais do
desempenho escolar na AML evidenciam que o insucesso registado entre os alunos
estrangeiros, em particular entre os oriundos dos PALOP e do Brasil, acompanha,
embora com quantitativos superiores, os padrões do insucesso escolar entre os
nativos.
Importa agora, avançar para uma análise da integração dos alunos
estrangeiros em territórios educativos mais restritos, que permita encontrar factores
que, a uma escala micro, possam ajudar a clarificar as diferentes dimensões que a
escala de análise nacional e regional permitiu delinear como fundamentais na análise
deste processo de natureza complexa e multidimensional.
210
211
PARTE IV – AS ESCOLAS E OS TERRITÓRIOS: ACOLHIMENTO E INTEGRAÇÃO
1. Área Metropolitana de Lisboa: imigração e território
2. Os territórios em estudo
2.1. A área central da cidade – Mouraria/ Martim Moniz, Graça e Bairro Alto
2.1.1. Génese e breve evolução histórica
2.1.2. Perfil sociodemográfico
2.1.3 – Perfil socioeconómico da população residente e condições de
habitabilidade
2.2. Os bairros da coroa suburbana – Monte Abraão e Agualva-Cacém
2.2.1. Génese e breve evolução histórica
2.2.2. Perfil sociodemográfico
2.2.3. Perfil socioeconómico da população residente e condições de
habitabilidade
3. Os agrupamentos de escolas: características da população escolar e
orientações da política de integração de alunos imigrantes
3.1. A diversidade da população escolar
3.2. Perfis de desempenho da população escolar
3.3. Orientações na política de integração de alunos imigrantes
3.3.1. Centro Histórico de Lisboa
3.3.2. Concelho de Sintra
4. Escolas, alunos e famílias: imagens e percursos de integração
4.1. Os questionários aos alunos
4.1.1. Perfil geral dos alunos inquiridos
4.1.2. Perfil dos alunos inquiridos em cada território
4.1.3. Composição familiar e Perfil Socioeconómico
4.2. Perfil socioeconómico e cultural das famílias inquiridas
4.3. Dimensão relacional – percepções, vivências e sociabilidades
construídas na escola
4.3.1. Porquê ir á escola
4.3.2. Percepções construídas sobre a escola
212
4.3.3. Interacção e relação
4.3.4. Da escola ao bairro: construção de relações interétnicas
4.3.5. Da Escola ao bairro: os espaços de convívio
4.3.6. Escola e Percursos Escolares: os intervenientes
4.3.7. O envolvimento das famílias na escola
5. Escola, diversidade e integração: reflexões a partir do território
A governância da nova cidade pressupõe então um contrato social de aprendizagem
permanente onde todos aprendem uns com os outros.
(Roberto Carneiro, Fundamentos da Educação e da Aprendizagem, 2001, p. 299)
213
No início deste trabalho de investigação propusemo-nos analisar a integração
de descendentes de imigrantes em três níveis distintos mas que se complementam. A
contextualização das orientações de política europeia e nacional para a integração de
imigrantes e, em particular, de crianças e jovens descendentes de imigrantes no
sistema educativo definem a escala macro da presente análise. A caracterização do
impacto da imigração no sistema educativo nacional e, em particular na AML, a partir
dos seus quantitativos, origens e desempenho escolar, permitiram conhecer a
evolução e a situação actual da presença de alunos não nativos no sistema educativo
português, definindo o nível meso de análise.
Propomo-nos agora, desenvolver a micro análise que nos conduzirá na
compreensão das especificidades dos percursos de integração desenvolvidos em
contexto escolar, por crianças e jovens descendentes de imigrantes. Para levar a cabo
a intenção definida, que mobiliza necessariamente informação relativa aos alunos e
territórios socorremo-nos dos dados estatísticos disponíveis em diferentes fontes e/ou
da recolha dos mesmos com recurso a questionários ou entrevistas.
Os agrupamentos de escolas em estudo localizam-se e servem freguesias
dos concelhos de Lisboa e de Sintra. Para a caracterização dos territórios os
recenseamentos da população de 2001 e 2011 disponibilizam dados estatísticos que
permitem conhecer as características demográficas, económicas e as condições de
habitação ao nível de cada freguesia. A informação disponibilizada pelo GEPE, relativa
ao ano lectivo 2009-10, para as escolas localizadas no concelho de Lisboa e de Sintra
permite traçar, numa primeira abordagem, o mapa dos quantitativos, origens e
percursos escolares dos alunos (nativos e estrangeiros) nos territórios em que se
localizam os agrupamentos em estudo. Na análise da política educativa do
agrupamento são mobilizados os respectivos projectos educativos, a partir dos quais
tentaremos identificar as orientações e estratégias de operacionalização da integração
de alunos estrangeiros. A análise dos percursos de integração dos alunos nos
agrupamentos em estudo é sustentada na informação recolhida através dos
questionários e entrevistas aplicados junto dos mesmos, das respectivas famílias, dos
professores e directores de agrupamento.
A exploração da informação recolhida mobiliza os conceitos de diversidade
cultural e integração, procurando ensaiar um estudo que articule, numa perspectiva
dinâmica, as diversas dimensões em que se vive a integração, espacial, temporal e
relacional. O estudo dos percursos de integração que decorrem em cada território
educativo pressupõe uma análise que se reparte por quatro dimensões: a primeira,
reporta-se às características do espaço social e urbano em que se inserem as escolas
e que interage com as opções de política educativa das mesmas; a segunda, ao
214
espaço institucional, e que permitirá compreender a escola enquanto território de
acolhimento; a terceira, o espaço dos alunos, conduzirá na compreensão dos modos
como estes se apropriam da escola, como mobilizam o capital cultural nas interacções
diárias e como estabelecem a partir desta as pontes para as relações que mantêm no
bairro; a quarta, o espaço da famílias, ou seja aquele que se constrói das interacções
que se geram entre família, escola e alunos a partir de formas múltiplas de relações e
participação que podem inscrever-se numa lógica bottom-up ou top-down.
A articulação entre as diversas dimensões de análise, a um nível micro,
conduzirá na compreensão da integração que é vivida por alunos de diferentes origens
na escola e no território em que se movimentam. Um processo que envolve
necessariamente a família e desempenha um papel fundamental nos percursos de
integração dos descendentes, com impacto na escola e nos usos do território.
A presença de crianças de origens diversas nas escolas do Ensino Básico da
AML tem desencadeado importantes desafios na gestão dos contextos de
aprendizagem. Desde meados dos anos 90, que o aumento do quantitativo de
crianças e jovens, de diferentes origens, no sistema educativo tem desencadeado
múltiplas questões que se prendem com os processos de ensino e aprendizagem, mas
também com as relações de sociabilidade e com as dinâmicas de interacção escola-
aluno-família. Referimo-nos, à questão central deste estudo, as dinâmicas de
integração desencadeadas pela presença de comunidades imigrantes nas escolas do
ensino básico, incluindo alunos, famílias, professores, escolas e territórios em que
estas se inserem. As respostas aos desafios que emergem deste processo situam-se,
numa primeira instância, no plano político nacional mas são implementadas a uma
escala local. Importa, assim, compreender de que forma se têm materializado em
contextos locais, ao nível da escola e dos territórios de acolhimento, as orientações de
política nacional.
A entrada destes novos públicos nos espaços de educação formal veio
romper com as lógicas anteriormente dominantes ou, com a tradição de práticas
escolares pensadas para um público que era assumido com um perfil de certa
homogeneidade. Às crianças e jovens de origem africana, juntam-se hoje, em grande
número, os brasileiros e os europeus de leste, os grupos principais entre muitas outras
origens com que nos cruzamos nas escolas do território metropolitano.
215
1. Área Metropolitana de Lisboa: imigração e território
Em 2011, a Área Metropolitana de Lisboa contava com uma população de
cerca de 2,8 milhões, 130 correspondendo a 26,7% da população portuguesa, que
contabiliza nesta data 10 562 178. Na AML, três quartos da população concentra-se
nos nove concelhos da margem norte do Tejo, distribuindo-se nestes de uma forma
desigual.
Nos períodos intercensitários (1991-2001 e 2001-2011), o crescimento da
população na AML foi sempre superior ao do país. No último momento (2001-2011) o
crescimento demográfico do território nacional foi de aproximadamente 2% enquanto o
da AML se situou em 6%. A capacidade atractiva que esta região continua a exercer
no contexto nacional é evidente, pelo dinamismo demográfico que a caracteriza. São
os concelhos localizados na Península de Setúbal aqueles que apresentam neste
período intercensitário o maior crescimento de população, com uma taxa de variação
de 9%, enquanto a da margem norte não ultrapassa 5%. A este dinamismo pode
associar-se a intensa urbanização que se inicia nos anos 90 em alguns municípios da
península de Setúbal (Fonseca & McGarrigle, 2012).
Os estrangeiros que chegam ao território nacional e, em particular à região
metropolitana, fixam-se preferencialmente na margem norte do Tejo, concentrando-se
neste território maiores quantitativos de população não nativa (7,2%) relativamente ao
restante território metropolitano (5,2%). Na cidade de Lisboa, 5,8% da população tem
nacionalidade estrangeira. Contudo, comparando o comportamento demográfico no
período intercensitário, é na margem sul que se regista um maior crescimento de
população estrangeira (55,2%), superior também ao registado para o conjunto da AML
(Quadro IV.1).
A cidade de Lisboa regista, entre 2001 e 2011, um crescimento significativo
da população estrangeira (70%), valor que contraria a tendência geral de redução da
população que se vem registando há alguns anos neste território urbano e que neste
período de tempo foi de -3%. A tendência para a fixação na cidade de população
oriunda das últimas vagas migratórias, com origem no Brasil, em alguns países do
leste europeu e do continente asiático, tem atenuado a propensão para a
desertificação de áreas centrais da capital, onde as condições de habitação são
menos atractivas para os nacionais mas os valores das rendas são mais adequados
ao perfil económico dos trabalhadores migrantes. Os bairros históricos em redor do
centro da cidade, comportam-se como uma porta de entrada no país. À presença
130
Recenseamento da população, 2011 (disponível em: www. ine.pt).
216
destas novas populações associam-se também outras dinâmicas sociais, económicas
e de reurbanização/revitalização urbana.
Quadro IV.1 – Percentagem de estrangeiros residentes na Área Metropolitana de Lisboa e taxa de variação (2001/2011)
% no total da população residente
tx variação (%)
2001 2011 2001/11
Margem Norte Grande Lisboa (NUT III) 5,1 7,2 48,8
Lisboa 3,3 5,8 69,9
Margem Sul Península Setúbal 3,7 5,2 55,2
Área Metropolitana de Lisboa 4,7 6,7 50,2
Portugal 2,2 3,4 58,8
Fonte: Recenseamento da População, 2001, 2011 (www. ine. pt). Cálculos da autora.
O investimento que foi feito na rede rodoviária, ferroviária e fluvial que liga a
cidade de Lisboa à sua área periurbana mais distante, com efeitos multiplicadores na
intensificação da urbanização, resultou numa maior procura destes concelhos para a
fixação de algumas comunidades migrantes, destacamos os municípios de Mafra,
Alcochete, Sesimbra e Palmela (Fonseca & McGarrigle, 2012). Como já referimos
anteriormente, as vagas migratórias mais recentes, nomeadamente de população
brasileira e do leste europeu, apresentam um padrão mais disperso de fixação no
território, procurando concelhos mais distantes da cidade centro onde por vezes ainda
coexistem algumas marcas da ruralidade e um mercado de habitação mais acessível.
A intensificação dos movimentos migratórios com destino à capital está
também associada a uma maior diversidade das origens desenhando-se, desde
meados dos anos 90, novos perfis étnicos, sociais e económicos da população
estrangeira. 131 Em 2011, 52% dos estrangeiros em Portugal residiam na AML,
tornando esta região a mais diversa em termos de nacionalidades no contexto
nacional. Enquanto a população das primeiras vagas migratórias, com origem em
territórios africanos, revela ter, entre 2001 e 2011, uma tendência para a redução do
número de residentes no conjunto da Área Metropolitana, crescendo sim o peso da
segunda e terceira gerações, são significativos os aumentos da população oriunda do
continente americano (+218,3), com particular relevo para o Brasil, e do asiático
131
Estas novas vagas migratórias associam-se, segundo Fonseca (1999) a factores diversos, entre os quais se destacam a reestruturação económica do país, com um incremento do sector dos serviços; a internacionalização da economia, na sequência da entrada na U.E., com um aumento do investimento directo estrangeiro; o investimento em grandes projectos de obras públicas nas maiores áreas urbanas, financiados por fundos europeus e pelo governo português.
217
(+151,8), com destaque para os chineses, indianos, paquistaneses e bangladechianos.
Os cidadãos provenientes do continente europeu surgem com a terceira taxa de
crescimento mais elevada (+108,3), salientando-se entre os principais países de
origem os territórios do leste, anteriormente sob a alçada de regimes comunistas. Para
qualquer um destes continentes de origem, o crescimento dos quantitativos de
imigrantes, entre 2001 e 2011, é três a quatro vezes superior à média da AML (Quadro
IV.2).
Quadro IV. 2 – Taxa de variação da população estrangeira, residente na Área
Metropolitana de Lisboa (NUT III), por continente de origem, 2001/2011
NUT III Grande Lisboa Península de Setúbal Área Metropolitana de
Lisboa
2001 2011 Tx var. 2001 2011 Tx var. 2001 2011 Tx var.
Continente nº nº % nº nº % nº nº %
Europa 16723 32510 94,4 3176 8936 181,4 19899 41446 108,3
sector terciário: comércio e restauração, serviços pessoais e domésticos (Malheiros
(org.), 2007). Entre os cidadãos com origem neste país de língua portuguesa existem
diferenças nos níveis de qualificação de que são detentores, revelando o grupo que
mais recentemente se instalou no país ter menores qualificações académicas que
aquele que chegou no final dos anos 80. Os estrangeiros com origem no continente
asiático, com um crescimento considerável na AML, concentram a sua actividade
profissional no comércio ou na construção civil, sendo empresários ou trabalhando
com co-étnicos.
219
2. Os territórios em estudo
A escolha dos territórios em estudo obedeceu a um conjunto de critérios que
permitiu comparar os concelhos da Área Metropolitana de Lisboa em quatro
dimensões: percentagem de imigrantes relativamente à média da AML; localização no
território metropolitano (centro da cidade, área suburbana); história do local no
acolhimento de imigrantes (área de recepção recente, área em transição, área
tradicional de imigração); estrutura sociodemográfica e económica do território
(número de habitantes, estrutura etária e perfil socioeconómico da população) e a
estrutura urbana (características da habitação e da ocupação urbana do território).
Tratando-se de um estudo que mobiliza as escolas que em cada concelho
servem os bairros em análise, recorremos também na definição dos territórios, à
exploração da informação estatística disponível sobre os alunos estrangeiros a
frequentar os agrupamentos de escolas. Esta variável, à data de definição das áreas
de estudo, não se encontrava ainda disponível com o nível de desagregação
necessário nas estatísticas do Ministério da Educação. Foi possível recolher alguma
informação, sobre os quantitativos de alunos não nativos, junto das divisões de
educação de Câmaras Municipais da AML porém, a inexistência de dados e/ou a
diversidade de critérios utilizados na recolha dos mesmos dificultaram uma
comparação inter-concelhia que se apresentasse fiável, tendo sido esta informação
estatística utilizada apenas com carácter indicativo.
Definidos os concelhos onde se localizam os territórios de estudo, Lisboa e
Sintra, partimos, num momento seguinte, para a realização de entrevistas não
estruturadas nas respectivas divisões de educação com o objectivo de mobilizar o
conhecimento que os técnicos locais têm do território, para a identificação dos
agrupamentos de escolas que melhor assegurem as respostas às finalidades traçadas
para a investigação: i) a presença de um número significativo de alunos de origem
imigrante; ii) a existência de alguma diversidade de origens no perfil dos alunos; iii) os
percursos realizados pelas escolas no acolhimento de alunos não nativos
(tradição/transição/recepção recente). A partir das informações disponibilizadas e das
cartas educativas de cada concelho, foram definidos os territórios de estudo e que
correspondem, i) na área central da cidade de Lisboa, às freguesias que englobam os
bairros da Mouraria/ Martim Moniz, Graça e Bairro Alto e, ii) no concelho de Sintra, às
freguesias de Agualva-Cacém e Monte Abraão (Fig. IV.1). Em termos da estrutura
demográfica da população, composição étnica, perfil socioeconómico e estrutura
urbana, estes territórios apresentam algumas diferenças importantes. Por outro lado,
como era nossa intenção, localizam-se em áreas distintas da AML, no centro da
220
cidade e em áreas suburbanas caracterizando-se, enquanto territórios de acolhimento,
pela realização de percursos diferentes na recepção de população imigrante. Parece-
nos que à partida estarão garantidas as condições definidas para a selecção dos
territórios que constituem os nossos casos de estudo, assegurando exemplos de
distintas trajectórias de mobilidade da população de origem imigrante no território
metropolitano.
Fig. IV.1 – Territórios de estudo
2.1. A área central da cidade – Mouraria/ Martim Moniz, Graça e Bairro Alto
Localizados no centro histórico da cidade de Lisboa, estes bairros têm a sua
génese em momentos diferentes da história da urbe. Contudo, são hoje territórios que
vivem novas dinâmicas urbanas devidas, em parte, ao seu novo papel no acolhimento
da diversidade de populações estrangeiras oriundas dos novos territórios de
imigração: Brasil, China e península do Indostão (Índia, Paquistão e Bangladesh) e
países europeus de leste.
221
2.1.1. Génese e breve evolução histórica
Mouraria/Martim Moniz
A Mouraria é um bairro histórico localizado na periferia imediata do centro
tradicional da cidade de Lisboa, remontando as suas origens ao século XII. Após a
reconquista da cidade aos mouros, a encosta oeste da colina do castelo serviu de
acolhimento a esta população, “o bairro desenvolvia-se até ao sopé da colina e
entrava pelo leito quase seco da antiga Ribeira, a marca de um limite a não transpor
(passa no centro da actual Praça da Figueira).” (Couto, 2003). Segundo a autora, a
Mouraria era então fechada por três portas e a mesquita localizava-se ao cimo da
actual rua do Capelão. O seu nome está relacionado com a história do local e o bairro
mantém ainda hoje um traçado urbano medieval, com ruas estreitas, pouco iluminadas
e habitações que ocupam áreas reduzidas e se elevam por um ou dois pisos. Desde
1940, na sequência das intervenções modernistas na cidade, de abertura de ruas mais
largas e redução dos problemas de insalubridade de alguns lugares, que se iniciou no
bairro uma importante intervenção urbana prolongada por cerca de cinquenta anos. Os
sucessivos planos de reconstrução, aprovados para o local, e a falta de consenso
sobre o tipo de intervenção mais adequada para o bairro, foram adiando a renovação
deste território e deixando ao abandono alguns edifícios e espaços inicialmente
demolidos para a abertura de novas ruas e praças. Este processo foi conferindo ao
local uma imagem negativa no contexto urbano, associada à degradação, exclusão
social, delinquência e criminalidade, tráfico de droga e prostituição (Fonseca &
McGarrigle, 2012). Com uma história longa no acolhimento de comunidades diversas
que chegavam à cidade de Lisboa e marcado na sua génese como território dos
mouros, o bairro acolhe mais tarde populações oriundas do interior do país e
imigrantes provenientes da Galiza (nos séculos XVIII e XIX) mantendo-se até aos dias
de hoje, como um território de referência no acolhimento de populações de origens
diversas.
Apesar da imagem negativa com que é conotado, muitos imigrantes
procuram-no como porta de entrada na cidade e/ou para aí iniciar as suas actividades,
associadas no local a uma forte presença do comércio étnico. As débeis condições de
habitabilidade e a imagem negativa do território conferem ao espaço baixos valores
das rendas e, apesar das contrariedades identificadas, as condições do mercado
habitacional e a sua localização no contexto urbano tornam-se um atractivo para a
população imigrante que chega à cidade.
No conjunto da área central da cidade onde decorre este estudo, a Mouraria
individualiza-se pela maior concentração de população imigrante e por um dinamismo
222
comercial que lhe está associado. Estendendo-se pelas freguesias de Santa Justa,
Socorro e São Cristóvão e São Lourenço, este território tem sido, nos últimos anos,
alvo de uma importante intervenção de requalificação urbana que pretende, entre
outras finalidades, valorizar a presença da diversidade cultural.
A presença do comércio étnico situa-se temporalmente nos anos 70, com a
chegada dos imigrantes indianos oriundos de Moçambique, na sequência da
descolonização (Malheiros, 1996). Nos últimos anos a actividade comercial com uma
forte componente étnica é uma marca fundamental do bairro (Malheiros, 2008),
ismaelitas (mobiliário), hindus e muçulmanos (material electrónico, brinquedos e
joalharia), africanos (cabeleireiros, cafés e comércio grossista), chineses (roupas e
produtos alimentares de origem asiática), bangladechianos e paquistaneses
(grossistas e proprietários da restaurantes) (Fonseca & McGarrigle, 2012). Estes
comerciantes concentram-se nos grandes espaços de comércio do bairro,
dispersando-se também segundo algumas lógicas de organização que parecem ser
definidas em função das suas origens. O bairro afirma-se no contexto urbano pela
marca da diversidade multi-étnica, ou se nos quisermos apropriar do conceito de
Vertovec (2006), por uma superdiversidade.
Em 2010 regressaram ao bairro os programas e projectos de intervenção
urbana e social. O Programa de Desenvolvimento Comunitário da Mouraria e o Plano
de Acção da Mouraria sustentam duas das grandes intervenções actuais132 e marcam
o esforço da Câmara Municipal e das instituições locais para promover a imagem de
uma Mouraria culturalmente diversa, onde se continua a ouvir cantar o fado, mas ao
mesmo tempo se contacta com uma diversidade enorme de estabelecimentos
comerciais e de pessoas que têm neste território uma presença com características
únicas na cidade. A intervenção urbana e social pretende dar uma nova visibilidade ao
bairro no conjunto da cidade, tornando-o mais atractivo para a população local, mas
também para a fixação de novos residentes, estrangeiros e gentrifiers (jovens artistas,
132
O Programa de Desenvolvimento Comunitário da Mouraria, um plano social integrado para este território, teve início no final de 2010. Trata-se de um plano de desenvolvimento social, em complementaridade com o PA Mouraria, de modo a que a intervenção de reabilitação urbana de que esta zona de Lisboa será objecto tenha também uma forte incidência positiva sobre a vida dos seus habitantes e comunidades. Este plano envolve um consórcio muito alargado de parceiros a actuar no território. O Plano de Acção da Mouraria (PA), iniciado no último trimestre de 2011, tem como finalidades a intervenção urbana no bairro e a sua revitalização social, desenvolvendo-se em quatro eixos estruturantes: Requalificação do espaço público e do ambiente urbano (CML); Refuncionalização e reabilitação de algumas áreas /quarteirões; Valoração das Artes e dos Ofícios; Valorização Sócio - Cultural e Turística. Sobre este programa e plano veja-se o sítio da Câmara Municipal de Lisboa. http://www.aimouraria.cm-lisboa.pt/pdcm.html.
designers e investigadores)133 (Fonseca & McGarrigle, 2012; Malheiros, Carvalho &
Mendes, 2012) e para os turistas que o utilizam nos seus percursos.
Graça
O bairro da Graça é também um dos mais antigos da capital, ocupando a
área que se inclui na freguesia de S. Vicente de Fora e da Graça e estendendo-se em
direcção à Penha de França. Aquando da formação da nacionalidade a colina vizinha
do castelo, onde mais tarde se edificou o bairro abrigava um extenso olival e, junto de
uma das portas da Mouraria o Almocávar, cemitério mouro. Após a reconquista,
fundaram-se dois conventos de grandes dimensões, o de S. Vicente e o dos
Agostinhos (Convento da Graça), este último localizado no Largo da Graça e com um
papel importante na urbanização do bairro. Em 1834, na sequência das revoluções
liberais e desestruturação da igreja do Antigo Regime com a abolição das ordens
religiosas, o convento da Graça entra na posse do estado tendo sido os seus bens
nacionalizados. O convento passa a ser utilizado como quartel e os terrenos
expropriados e vendidos a particulares (Couto, 2003).
Na sequência do terramoto de 1755, e da destruição de uma parte
significativa do património edificado da Graça, intensifica-se a construção no bairro
com diversas tipologias de habitação, desde residências de pequenas dimensões
ocupadas por classes populares a casas apalaçadas pertencentes a alguns burgueses.
Nos finais do séc. XIX e primeiros anos do séc. XX constroem-se no bairro alguns
pátios e vilas operárias. Apresentando duas grandes tipologias, uma em banda,
disposição em corredor, com casas de um piso ou de dois e, outra, em grandes
conjuntos urbanos. Estas últimas, de maiores dimensões, podem assumir duas
variantes, a vila-bairro, de um ou dois pisos como é o caso da Estrela de Ouro, ou a
vila construída com base num prédio que pode ter mais de três andares, ocupando um
quarteirão com acesso central, como é o caso da Vila Sousa. As vilas maiores, género
bairro, podiam integrar alguns equipamentos, escola, posto de polícia, lavadouro,
sanitários, pequenas lojas ou oficinas. Estas vilas alojavam população empregada nos
estabelecimentos comerciais do centro da cidade e populações que trabalhavam nas
fábricas instaladas no Beato e em Xabregas (Barata Salgueiro, 1992).
Actualmente no bairro predomina a função residencial, mantendo-se uma
tipologia de habitações heterogénea, coexistindo prédios mais antigos de pequenas
dimensões, por vezes em estado de degradação, habitados por populações de níveis
133
Os gentrifiers “são na sua maioria urbanitas, tratando-se desta forma, não de uma migração de fora para dentro da cidade, mas sim de movimentos operados no seio do espaço urbano-metropolitano e dentro deste com maior incidência nos bairros centrais.” (Mendes, 2006, p.63).
224
socioeconómicos mais baixos, com construções mais recentes habitadas por uma
classe de maiores posses económicas. Os pátios e vilas operárias, testemunhos do
passado do bairro, continuam a marcar a sua geografia, sendo também um atractivo
cultural e turístico, a Vila Berta, a Vila Sousa, o bairro Estrela d‟Ouro e a Vila Maria. Na
sequência da saída de população do bairro para as áreas suburbanas, alguns edifícios
foram reabilitados tendo-se vindo a assistir a um processo de gentrificação urbana,
associado à entrada de um perfil de residentes detentores de níveis económicos e de
qualificação mais elevados. Em paralelo com a entrada destes novos residentes, tem-
se assistido à chegada de população imigrante, com origens diversas, num processo
idêntico ao registado noutros bairros históricos do centro da cidade.
Associado à função residencial do território, encontra-se o pequeno comércio
tradicional, diversificado e na sua maioria de bens de consumo diário. Alguns destes
estabelecimentos comerciais são propriedade de população imigrante noutros, é
frequente encontrar entre os profissionais, trabalhadores estrangeiros. O bairro faz
fronteira com os bairros da Mouraria, do Castelo e de Alfama, onde também é comum
a presença de população estrangeira.
Bairro Alto
A génese urbana do território que corresponde hoje ao Bairro Alto surge da
necessidade de abertura de novas frentes de urbanização, na sequência do
desenvolvimento de Lisboa, propiciado pelo incremento do comércio marítimo (Barata
Salgueiro, 1992). Os terrenos pertenciam, no início do séc. XVI, a particulares,
iniciando-se o loteamento do bairro nessa época com a designação de Vila Nova de
Andrade, apelido do promotor. As primeiras casas são habitadas essencialmente por
gente ligada à faina marítima: capitães, mesteirais, calafates e operários navais.
Segundo Barata Salgueiro (1992), o Bairro Alto terá sido “o primeiro loteamento
moderno em cidade portuguesa” (p.171), rompendo com a tradição urbanística
medieval, seguindo um plano de traçado ortogonal, com ruas mais arejadas e mais
largas que as da restante cidade. A sua expansão decorreu de um modo rápido,
devido à grande carência de alojamento na cidade, à destruição provocada pelo
terramoto de 1531 e insalubridade de algumas áreas mais antigas.
O nascimento do bairro aparece ligado à presença de jesuítas que iniciam,
em meados do século XVI, a construção de um novo templo em S. Roque e mais tarde
o noviciado no edifício que é hoje ocupado pelos Museus de Ciência e de História
Natural da Universidade de Lisboa, atraindo para o bairro população de estratos
sociais mais elevados, aristocratas e burgueses endinheirados. O território resultante
da expansão e progressiva junção dos dois bairros, São Roque e Vila Nova de
225
Andrade, surge com a designação de Bairro Alto, a partir de finais do séc. XVI. Até
finais do séc. XVII a área edificada continua a crescer situando-se o início do seu
declínio no período pós terramoto, com a expulsão dos jesuítas pelo Marquês de
Pombal. Na reconstrução pós terramoto dá-se o crescimento em altura dos edifícios (4
ou 5 pisos) e urbanização de algumas áreas adjacentes que passaram a acolher
antigos moradores com mais posses económicas. Com excepção do Largo Camões, o
bairro apresenta hoje uma configuração que herdou da época da sua grande
expansão (Barata Salgueiro, 1992), estendendo-se por quatro freguesias, Encarnação,
Santa Catarina, Mercês e Mártires.
À história do Bairro Alto associa-se a presença da indústria, que desde o séc.
XIX aí se instala em unidades de pequena dimensão, as tipografias, o fabrico de
artigos metálicos, de mobiliário e actividades conexas da edição. Os espaços de
tertúlia e de boémia, as casas de fado, as tascas e a imprensa são símbolos da
história do bairro. As tabernas e as tascas eram o ponto de encontro dos boémios e
também os locais frequentados por aqueles que trabalhavam nas redacções dos
jornais. 134 Ainda hoje proliferam pelas diferentes ruas do bairro as tascas, os
restaurantes, os bares e as casas de fado que atraem públicos muito heterogéneos e
coexistem com os espaços residenciais. Da imprensa, apenas o jornal a Bola resiste,
mas a toponímia não deixa que entrem no esquecimento os diversos jornais que
desde finais do séc. XIX se instalaram no bairro e lhe conferiram durante mais de um
século uma vida constante. Passaram pelo bairro as sedes de diversos jornais, Diário
de Notícias, o Século, o Correio da Manhã, o Diário Popular, o Record, o Mundo, a
Capital e o Diário de Lisboa. A reconversão dos espaços deixados vazios pela saída
das redacções dos jornais trouxe para este território novos usos, espaços de serviços
públicos, galerias de arte, teatros, bares e lojas vanguardistas que se misturam com as
velhas associações e os clubes que mantém as tradições bairristas, as pequenas
mercearias, os antigos barbeiros e as costureiras. Quer para os nativos, quer para os
turistas estrangeiros o bairro é um importante espaço de diversão nocturna.
À semelhança dos bairros anteriores, também no Bairro Alto se assiste, nos
últimos anos, a alterações do seu tecido social com a chegada de novos moradores,
com padrões de consumo e estilos de vida particulares, produzindo novas e
134
A publicação de diários e revistas é uma indústria que se encontra mais estreitamente ligada a uma localização central. ” No caso da edição de jornais e revistas, a frequência de produção é muito rápida, pois há que imprimir um número novo todos os dias ou todas as semanas. As tarefas de redacção e correcção são bastante mais intensas na produção de cada número “(…) “implicando uma localização que facilite o mais possivel o contacto com os autores, ilustradores, fotógrafos, agentes de moda e outros profissionais. Também é no centro que se podem estabelecer relações mais rápidas com as agências de publicidade que constituem a principal fonte de rendimento deste tipo de publicações. Assim, devido às suas características, os jornais e publicações periódicas tendem a manter uma localização central”. (Barata Salgueiro, 1992, p. 283).
226
diversificadas procuras culturais (Mendes, 2006), os gentrifiers a que já anteriormente
nos referimos para a Mouraria/Martim Moniz e Graça. Ao mesmo tempo, multiplicam-
se as pertenças étnicas com a chegada de populações de origem imigrante, brasileiros
e asiáticos, que se vêm juntar a algumas comunidades de origem africana que já se
haviam inserido no bairro em momentos anteriores. A população é globalmente
heterogénea, o que se reflecte numa crescente diferenciação e diversificação de
práticas sociais e culturais.
2.1.2. Perfil sociodemográfico
A área de influência dos três agrupamentos de escolas que constituem o caso
de estudo no centro da cidade, estende-se pelas freguesias de Anjos, Castelo,
Coração de Jesus, Encarnação, Graça, Madalena, Mártires, Mercês, Pena, Penha de
França, Sacramento, Santa Catarina, Santa Engrácia, Santa Isabel, Santa Justa,
Santiago, Santo Estêvão, Santos-o-Velho, São Cristóvão e São Lourenço, São João,
São Jorge de Arroios, São José, São Mamede, São Miguel, São Nicolau, são Paulo,
São Vicente de Fora, Sé e Socorro (Fig. IV. 2).
Fig. IV.2 – Município de Lisboa – Área de Estudo
227
Nesta área da cidade residia, à data dos Censos de 2011, uma população de
123 556 indivíduos, 22,6% dos habitantes da cidade de Lisboa. No período
intercensitário (2001-2011) a população deste território registou um decréscimo (-
9,2%). Entre os indivíduos com residência neste conjunto de freguesias, 13 301 são
naturais de um país estrangeiro, quantitativo que em 2001 perfazia apenas 6 490
indivíduos. Em 2001, 4,8% da população residente no território tinha nacionalidade
estrangeira, em 2011 este valor sobe para 10,8%. No conjunto da cidade, esta área
acolhe 41,8% dos estrangeiros residentes. Destaca-se ainda a presença de um
quantitativo significativo de população com dupla nacionalidade (portuguesa e outra),
que no conjunto dos residentes no território tem um peso de 25,5%.
Desde finais dos anos 70 que assistimos, em alguns bairros deste território
central da cidade de Lisboa, à ocupação dos espaços residenciais e comerciais por
estrangeiros. Bairro Alto, Alfama, Mouraria, Martim Moniz, Graça, Anjos e o eixo
Avenida Almirante Reis até à Praça do Chile, acolhem hoje uma população diversa
que marca o quotidiano dos espaços públicos, contrariando a tendência para a
desertificação demográfica do centro da cidade. No período intercensitário 2001/2011
a população estrangeira cresceu 105% neste território, enquanto a população
portuguesa continuou a diminuir (-14,9%).
O comércio, com um marcado cariz étnico, começou a instalar-se na área do
Martim Moniz, quando chegaram os primeiros comerciantes indianos, vindos de
Moçambique, na sequência do processo de descolonização. Com a intensificação dos
movimentos migratórios para Lisboa, na segunda metade dos anos 90 e na primeira
década deste século, este núcleo central da cidade, com tradição no acolhimento de
migrantes, em declínio demográfico, com um parque habitacional degradado e um
mercado de arrendamento a preços mais acessíveis, exerceu uma grande atracção
sobre a população recém-chegada, de origens diversas e de parcos recursos
socioeconómicos. Hoje, a par dos comerciantes indianos, coexistem os paquistaneses,
bangladechianos, chineses e africanos e nas ruas misturam-se diferentes
línguas/dialectos. Também os brasileiros e europeus de leste procuram neste território
a sua primeira habitação.
Os 123 556 indivíduos que em 2011 residem nesta área distribuem-se de
forma muito desequilibrada pelos diferentes escalões etários. O peso da população
com idade compreendida entre os 0 e 24 anos é de 19,6%, valor inferior ao dos idosos
(25,5%), sendo que o grupo dos activos (15-64 anos) é composto por 63,7% da
população. As crianças, com idade até catorze anos totalizam 10,8% da população
residente. Entre as freguesias com maior índice de juventude, igual ou superior a 50%,
destacam-se Madalena (77,3%), Sacramento (57,8%), São Mamede (56,3%), Santos-
228
o-Velho 52,7%), Santa Justa (52,2%), Socorro (51,7%) e Mártires (50,0%). 135 O índice
de envelhecimento no território é de 237%, valor superior ao obtido para a cidade de
Lisboa (185,8%) sendo, em algumas freguesias, superior a 300%. Incluem-se neste
grupo as freguesias de Santiago (597,2%), Santo Estêvão (400,9%), Castelo (392,3%),
São Cristóvão e São Lourenço (334,3%) e São Miguel (328,8%). A tendência registada
para o declínio demográfico é acentuada pelos valores obtidos no cálculo do índice de
dependência de idosos, pois o índice é superior ao da cidade (40,1% face a 37,8%) e,
em cerca de 12 das 29 freguesias, existem mais de 40 idosos por cada 100 pessoas
em idade activa.
No período intercensitário (2001/2011), sete freguesias viram aumentada a
sua população, Santa Justa (27,3%), Socorro (14,6%), Mártires (9,1%), São Jorge de
Arroios (5,8%), São Nicolau (4,8%), Madalena (3,4%) e Santos-o-Velho (0,2%). Para
algumas destas freguesias, o crescimento positivo registado nesta década significou
uma inversão no comportamento demográfico que se vinha a desenhar na década
anterior, destacando-se neste grupo as freguesias de Santa Justa e do Socorro que
coincidem também com os territórios onde o peso da população estrangeira é superior,
33% e 28% respectivamente. As freguesias envolventes à área do Martim Moniz
(Socorro, Madalena, Mártires, Santa Justa e São Nicolau) são as que no conjunto
registam um crescimento demográfico mais acentuado entre 2001 e 2011.
Ao desequilíbrio registado na estrutura etária, acrescentamos um sex ratio
também um pouco desajustado. A população feminina representa 54% no total do
grupo, com valores superiores a 50% em 25 freguesias. As freguesias onde se regista
um sex ratio inferior a 50% coincidem com aquelas onde o peso relativo da população
estrangeira é superior (Socorro, Santa Justa e São Nicolau), comportamento que
provavelmente se pode associar à persistência de alguma migração masculina no
território.
Quando comparada com o conjunto da cidade de Lisboa a percentagem da
população estrangeira neste território é duas vezes superior. O total de estrangeiros a
residir na cidade é de 31 833 indivíduos (5,8% da população), residindo na área em
estudo 13 301 (10,8%) ou seja, 41,8% dos estrangeiros em Lisboa. Esta população
tem contribuído para uma revitalização demográfica do território central da cidade,
contrariando a tendência que há algumas décadas se vinha a desenhar em algumas
freguesias. As vivências do local evidenciam a forte implantação do comércio étnico,
uma multiplicidade de culturas que diariamente se cruzam na via pública e, nas
escolas, é notória a diversidade de alunos que constituem cada turma (em particular
135 O Indíce de Juventude para a cidade de Lisboa é de 53,8% e para o território em estudo 42,2%.
229
no 1º CEB). Neste território multicultural, actuam diversos projectos e instituições que
desenvolvem um trabalho no sentido do acolhimento e integração da população
imigrante. Destacamos os projectos dinamizados no âmbito do Programa Escolhas e
de instituições como a Santa Casa da Misericórdia, as Juntas de Freguesia e as
Associações de Imigrantes.
No conjunto dos 13 301 estrangeiros residentes no território, o grupo mais
representativo é proveniente do Brasil (33,7%), em segundo lugar posicionam-se os
imigrantes asiáticos (22,3%), em terceiro lugar os cidadãos oriundos de países da
União Europeia (15) (15%), seguidos dos provenientes dos PALOP (12%) e dos
países europeus de leste (6,3%). Porém, como se pode visualizar na Fig. IV.3. o
padrão de distribuição das diversas nacionalidades neste território central não é
idêntico ao que caracteriza a cidade. A população de origem africana encontra-se sub
representada face a outros grupos, que aqui se impõem com maior peso relativo,
brasileiros, europeus (15) e asiáticos. Nestas freguesias do centro residem 60% dos
cerca de 5 000 cidadãos de origem asiática na cidade de Lisboa, sendo na sua maioria
de origem chinesa, indiana e paquistanesa. Entre as cinco principais nacionalidades
posiciona-se a brasileira, seguida da chinesa, da cabo-verdiana, da angolana e da
ucraniana (Fig. IV.4).
Fig. IV.3 – Residentes estrangeiros, segundo os principais grupos de origem, na cidade de Lisboa e no território em estudo, 2011
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
0% 20% 40% 60% 80% 100%
área em estudo
concelho de
LisboaU.E. (15)
Outros países europeus
Europa de leste+Rússia
PALOP
Brasil
Ásia
230
Fig. IV.4 – Dez principais nacionalidades da população estrangeira residente nas freguesias do centro de Lisboa, 2011
A distribuição da população imigrante no território central não segue um
padrão uniforme, sendo nas freguesias de Santa Justa, Socorro, São Nicolau, São
Paulo, São Cristóvão e São Lourenço e Pena que a população estrangeira tem um
peso relativo igual ou superior a 15% no total da população. Porém, são as freguesias
de São Jorge de Arroios, Anjos, Penha de França, São João, Socorro e Pena que
acolhem o maior grupo de estrangeiros (56,5%) que se estabelecem neste território
(Fig. IV.5). A análise desagregada da distribuição das diferentes origens da população
estrangeira nas diversas freguesias da cidade permite identificar padrões distintos
neste território: os cidadãos provenientes de países da União Europeia (15) fixam-se
preferencialmente no Castelo, Madalena e São Mamede; os brasileiros preferem as
freguesias de São João, São José, Coração de Jesus e São Vicente de Fora; a
população com origem nos PALOP escolhe as freguesias da Graça, Santa Catarina e
Santos-o-Velho; os europeus de leste procuram as freguesias de Santiago, São Miguel
e São Vicente de Fora e, a população asiática concentra-se preferencialmente nas
freguesias de Santa Justa, Socorro e Madalena (Anexo 6).
0 2000 4000 6000 8000 10000 12000 14000 16000
Paquistão
São Tomé e Príncipe
Índia
Guiné-Bissau
Roménia
Ucrânia
Angola
Cabo Verde
China
Brasil
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
231
Fig. IV.5 – População estrangeira nas freguesias do centro de Lisboa, 2011
A análise da informação empírica que acabamos de apresentar permite
confirmar a imagem de um território multicultural que nos foi transmitida pelas
primeiras observações realizadas no local e que conduziram à sua escolha como caso
de estudo desta investigação. Aproveitando o esvaziamento demográfico,
consequência do envelhecimento dos nativos e da degradação do parque habitacional,
a população estrangeira que já em 2001 apresentava uma expressão significativa
entre os habitantes deste espaço urbano (4,8%), intensifica-se em 2011 (10,8%). Com
um padrão residencial disperso, associado a diferentes momentos de chegada, perfis
socioeconómicos distintos e percursos migratórios particulares (Fonseca & Silva,
2010), estes imigrantes, retratados nos processos de apropriação e ocupação do
espaço urbano conferem hoje, ao núcleo central da cidade e à sua envolvente
imediata, dinâmicas próprias que dificilmente se encontram no restante território
urbano.
2.1.3 – Perfil socioeconómico da população residente e condições de
habitabilidade
Ao perfil demográfico traçado para a população residente associam-se
características socioeconómicas que conferem a esta área da cidade uma imagem
frequentemente conotada com situações de fragilidade económica e social. A
informação estatística publicada no Recenseamento da população permite traçar um
breve perfil destes residentes e das freguesias que constituem a área de estudo, com
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%A
njo
s
Ca
ste
lo
Co
raçã
o d
e
En
ca
rna
çã
o
Gra
ça
Ma
da
len
a
Má
rtir
es
Me
rcê
s
Pe
na
Pe
nh
a d
e
Sa
cra
me
nto
Sa
nta
Sa
nta
Sa
nta
Sa
nta
Ju
sta
Sa
ntia
go
Sa
nto
Sa
nto
s-o
-
S. C
ristó
vã
o
Sã
o J
oã
o
Sã
o J
org
e
Sã
o J
osé
Sã
o
Sã
o M
igu
el
Sã
o N
ico
lau
Sã
o P
au
lo
Sã
o V
ice
nte
Sé
So
co
rro
% pop. estrangeira
residente na
freguesia
%
estrangeiros/total
estrangeiros
residentes na área
232
base na análise de indicadores relativos à educação, actividades económicas,
desemprego e condições de habitabilidade.
A população que reside neste território apresenta valores de analfabetismo
ainda relativamente elevados (entre 2,0% e 8,3%), quando comparados com a média
registada para a cidade (3,2%). Esta incidência pode ser explicada pelo maior peso
dos idosos entre os residentes nesta área mas, também, pelos percursos de vida
decorrentes de contextos socioeconómicos mais desfavorecidos. É nas freguesias de
São Miguel (8,3%), Socorro (7,4%), Santo Estêvão (5,1%), Santa Justa (4,8%) e
Madalena (4,6%) que este fenómeno assume maior expressão. Contudo, a evolução
positiva registada para esta variável, entre os dois momentos de recenseamento,
136 leva-nos a avançar com a hipótese do decréscimo percentual da população
analfabeta poder estar relacionado com a chegada de população imigrante com níveis
de escolaridade mais elevados que os anteriores residentes, uma hipótese que
poderemos confirmar, posteriormente, a partir da informação recolhida nos
questionários aplicados aos alunos e às respectivas famílias.
No conjunto do território, 36,6% da população com mais de 25 anos possui
um curso superior, valor um pouco inferior ao obtido para o concelho de Lisboa
(41,9%) contudo, algumas freguesias situam-se relativamente a esta variável numa
posição bastante vantajosa, com mais de 45% de licenciados. Neste grupo encontram-
se as freguesias de São Mamede (61,8%), Mártires (61,4%), Madalena (53,3%), Santa
Isabel (52,4%), São Jorge de Arroios (46,1%), Sacramento (48,7%). É nas freguesias
de Socorro e Santa Justa que se regista a menor percentagem de licenciados entre a
população com mais de 25 anos (aproximadamente 15%), assim como os valores
mais elevados de analfabetismo. De modo a tentar compreender estas fragilidades,
dado ocorrerem em freguesias mais jovens e que se encontram em crescimento
demográfico devido à imigração, procurámos analisar a origem da população
estrangeira que aí se tem fixado, evidenciando-se um peso superior a 60% dos
cidadãos de origem asiática. Este facto leva-nos a equacionar a existência de baixos
níveis de instrução entre a população asiática que poderão contribuir para a posição
ocupada por estas freguesias no conjunto da área em estudo. Também as actividades
económicas desempenhadas pelos residentes poderão reflectir o perfil de
escolarização que acabamos de traçar. Contudo, entre a população imigrante, nem
sempre a actividade profissional desempenhada corresponde aos níveis de
136
Relativamente a 2001 ocorre um decréscimo da percentagem de população analfabeta na totalidade da área em estudo e da cidade de Lisboa. A cidade tinha nessa data uma taxa de analfabetismo de 5,7% e para quase todas as freguesias da área em estudo as taxas eram superiores às actuais. Citamos como exemplo as freguesias de São Miguel (11,3%), Socorro (9,9%), Santo Estevão (9,4%) e Santa Justa (8,6%) (Hortas, 2012, no prelo).
233
escolarização de que esta é portadora, ainda assim parece-nos importante tentar
compreender se existe alguma relação entre estas variáveis.
A percentagem de activos nos grupos 7, 8 e 9, 137 a exercer uma profissão
menos exigente em termos de habilitações académicas tem, na área central, uma
expressão idêntica à da cidade (aproximadamente 16% da população que se encontra
a exercer uma actividade profissional). Nas freguesias do Socorro e Santa Justa este
valor ascende a 27% e 24% respectivamente, os maiores quantitativos no território em
estudo. Só em mais sete freguesias se regista um valor superior a 20% de activos nos
grupos profissionais 7, 8 e 9 (São Miguel, Santa Engrácia, São Vicente, São João, São
Cristóvão, Santo Estêvão e Graça). Perante os resultados identificados poderemos
avançar com um perfil socioeconómico para as freguesias do Socorro e de Santa
Justa, que se afasta do conjunto do grupo e que se define pela concentração de
população com menores habilitações literárias e que desenvolve uma actividade
profissional nos sectores menos qualificados.
Neste território central da cidade, a taxa de desemprego, em 2011, é de
12,7%. Um valor que ultrapassa o obtido para a cidade de Lisboa (11,8%), com
algumas freguesias a registar uma taxa superior a 17%, Castelo (20,0%), Socorro
(17,5%) e São Cristovão e São Lourenço (17,0%). Na posição oposta, com uma taxa
de desemprego inferior a 10% surgem as freguesias de Coração de Jesus (9,7%),
Santa Isabel (9,1%), São Mamede (9,1%), São Nicolau (8,1%) e Mártires (6,5%). A
análise da população jovem (15-24 anos) que usufrui do Rendimento Social de
Inserção revela que neste território é relativamente reduzida a percentagem daqueles
que se encontram nessa situação. Apenas cerca de 0,8% da população recebe este
subsídio, quando na cidade de Lisboa o valor é de 1,5%. Contudo, nas freguesias de
Socorro (4,1%), São Vicente de Fora (2,9%), São João (1,9%) e São Miguel (1,8%)
este valor é superior ao registado para a cidade. Em relação aos restantes tipos de
subsídios e apoios sociais é importante mencionar que neste território a percentagem
de população jovem que usufrui dos mesmos é inferior à da cidade de Lisboa. Com
excepção de um número reduzido de freguesias, a percentagem de população com
idade entre 15 e 24 anos que recebe subsídios ou apoios sociais é relativamente baixa.
Numa breve caracterização das condições de habitabilidade neste território
permite completar o perfil socioeconómico da população residente. A percentagem de
pessoas a residir em alojamentos não clássicos não tem expressão nesta área da
cidade contudo, nem sempre se mantêm as condições mínimas de habitabilidade
137
Grupo 7 – Operários, Artífices e Trabalhadores Similares; Grupo 8 – Operadores de Instalações e Máquinas e Trabalhadores de Montagem; Grupo 9 – Trabalhadores Não-Qualificados. Segundo a Classificação Nacional de Profissões. Disponível em: http://www.iefp.pt/formacao/CNP/Paginas/CNP.aspx
(electricidade, retrete, água, aquecimento e banho). Para 78% dos residentes estas
condições estão asseguradas, ainda assim o valor é ligeiramente inferior ao registado
para a cidade (84%). Em dezasseis freguesias, a percentagem de habitantes que não
tem acesso às condições referidas é ainda inferior a 78%, no Socorro e em Santa
Justa, são cerca de 50% os residentes que não têm garantidas as condições mínimas
de habitabilidade. Acresce ainda, que 12,4% dos alojamentos com menos de três
divisões se encontram sobrelotados 138 e, em 59% das freguesias este valor é
superado, destacando-se com o maior peso relativo de alojamentos sobrelotados as
freguesias de São Miguel, Santa Justa, Socorro e Santo Estevão (cerca de 20% dos
alojamentos com menos de três divisões encontram-se sobrelotados).
A caracterização do perfil socioeconómico dos residentes no território central
da cidade e das suas condições de habitabilidade, deixa transparecer que se trata de
uma área onde existe uma grande heterogeneidade entre as freguesias, confrontando-
se uma parte significativa da população com fragilidades nos diferentes domínios
analisados. Assim, no âmbito das qualificações, é ainda reduzido o número de
licenciados entre a população maior de 25 anos, persistindo em algumas freguesias
valores de analfabetismo significativos. No domínio do emprego e actividades
profissionais, é significativa a percentagem de residentes a exercer uma profissão em
sectores de actividade menos qualificados e pior remunerados, mantendo-se uma taxa
de desemprego com valores elevados em algumas freguesias. No que diz respeito às
condições de habitabilidade, ainda se registam algumas lacunas, permanecendo em
algumas freguesias, uma significativa percentagem de alojamentos sobrelotados.
Tratando-se de uma análise que incide sobre o total de população residente,
arriscamos a avançar com a hipótese, de em algumas situações, as dificuldades que
os imigrantes enfrentam no seu quotidiano serem partilhadas pelos autóctones. Porém,
é importante reforçar que as freguesias do Socorro e Santa Justa são as que
apresentam maiores fragilidades em todas as variáveis analisadas.
2.2. Os bairros da coroa suburbana – Monte Abraão e Agualva-Cacém
Localizados no concelho de Sintra, estes territórios cresceram
fundamentalmente em função da cidade de Lisboa. Pelo acolhimento de populações
que se deslocavam de outras regiões do país e, desde meados dos anos 70, pela
chegada de grupos oriundos de países africanos de expressão portuguesa. Na sua
história e na sua génese não seguiram processos muito distintos: de espaços
138
Na cidade de Lisboa 11,4% dos alojamentos com menos de três divisões estão sobrelotados.
235
ocupados por quintas agrícolas no último quartel do séc. XX, transformaram-se em
territórios densamente urbanizados onde se movimentam diariamente populações de
origens sociais, económicas e culturais diversas.
2.2.1. Génese e breve evolução histórica
Monte Abraão
Monte Abraão surge como freguesia em 1997, e constitui com Queluz e
Massamá a cidade de Queluz. É uma das mais antigas localidades do concelho de
Sintra; a sua existência remonta à antiguidade, como testemunham os diversos
monumentos megalíticos existentes na região.
O bairro tem como limite sul a linha de caminho-de-ferro Sintra /Lisboa, a
norte a freguesia de Belas, a nascente o rio Jamor e a linha férrea e a poente a
CREL.139
Até aos anos 60, os terrenos onde se localiza actualmente a freguesia tinham
um uso fundamentalmente agrícola. O início da urbanização do bairro remonta aos
anos 60, a partir da linha de caminho-de-ferro. Contudo, foi nas últimas duas décadas
do século XX que decorreu o grande boom de construção (cerca de 85% da
construção existente actualmente) (Fonseca & McGarrigle, 2012). O crescimento da
freguesia insere-se no processo de expansão suburbana que se intensificou a partir
dos anos 80 na parte norte de Lisboa, em particular na Linha de Sintra, seguindo a
linha de caminho-de-ferro e difundindo-se a partir desta em todas as direcções como
uma mancha de óleo (Barata Salgueiro, 1992). Desde então ocorreram mudanças
significativas neste território, com elevados índices de construção e com o acolhimento
de uma população essencialmente jovem oriunda de outras regiões do país, das
antigas colónias africanas, mas também do interior da cidade de Lisboa onde os mais
jovens não conseguem responder ao elevado aumento do custo da habitação.
Em Monte Abraão reside uma população de origens diversas, com particular
ênfase para as comunidades oriundas de países africanos de língua portuguesa
(Guiné-Bissau e Angola). Os brasileiros e cidadãos do leste europeu estão também
presentes, mas em número mais reduzido. A população de origem imigrante encontra-
se dispersa pelo bairro, sendo possível identificar duas áreas de maior concentração.
Uma das áreas localiza-se na parte norte do bairro e a outra, a oeste, junto do bairro
da “Caixa”, um bairro de habitação social.
A freguesia é uma das mais populosas do concelho de Sintra, contando com
20 809 habitantes, 5,5% da população do concelho. O território tem uma função
139
Circular Regional Exterior de Lisboa, inaugurada em 1995, constitui um anel de dispersão do tráfego para o exterior da cidade, ligando a A1 e a A5.
236
essencialmente residencial, disponibilizando alguns serviços e comércio de bairro que
se instalam no rés-do-chão dos prédios. A área é densamente ocupada com edifícios
de habitação, frequentemente com cinco ou mais pisos. O número de habitações por
edifício é elevado na encosta leste, em direcção à ribeira do Jamor, e na parte norte
do bairro (Fonseca & McGarrigle, 2012). Os espaços verdes, assim como os espaços
infantis não são em número suficiente, se atendermos à densidade de ocupação da
freguesia.
Agualva-Cacém
Agualva-Cacém, localizada a sudeste do concelho de Sintra, foi elevada à
categoria de cidade em 2001, passando então o seu território a organizar-se em
quatro freguesias: Agualva, Cacém, Mira Sintra e S. Marcos. O acesso à cidade de
Lisboa é assegurado por dois grandes eixos viários, a linha de caminho-de-ferro e o
Itinerário Complementar (IC 19).
A história de Agualva-Cacém está muito relacionada com a ribeira que a
atravessa e que divide a cidade. A Ribeira das Jardas, com um importante papel na
organização do território edificado funcionou como limite administrativo desde o século
XII, e actualmente como fronteira das duas freguesias, Agualva e Cacém, localizadas
em margens opostas da ribeira. Só com a construção do caminho-de-ferro, no século
XIX, se redefiniu o limite da actual cidade.
Tal como em Monte Abraão a presença do património arqueológico, pré-
histórico, atesta a antiguidade do lugar. Pensa-se que o território também terá tido
uma ocupação mourisca ou moçárabe no séc. XII. Nos séculos XIV e XV, regista-se
uma expansão do povoamento, proliferando casais e herdades propriedade das
ordens religiosas que aí se instalaram. A exploração agrícola do local, feita nas
margens da ribeira onde se localizavam as quintas, das quais ainda hoje existem
alguns vestígios (Quinta da Fidalga, Quinta da Bela Vista e Quinta da Barroca)
dinamizou muito a povoação que rapidamente viu aumentada a sua população. A
geografia do lugar e a existência de características climáticas favoráveis levaram à
instalação de numerosos moinhos, associados à produção de cereal. O dinamismo
económico resultante da produção agrícola, está também na génese de um importante
mercado, a feira de Agualva, que aí passa a realizar-se. A agricultura permanece no
local como uma importante actividade económica, os moinhos são substituídos mais
tarde por fábricas de moagem, e a actividade agrícola é complementada com o
aparecimento de outras unidades industriais.
Uma das unidades industriais que se instalou na margem direita da ribeira,
logo no séc. XVI, foi a fábrica de papel, aproveitando a água como fonte de energia.
237
Anos mais tarde a sucessora desta fábrica será uma das principais responsáveis pela
destruição da ribeira. Em finais do séc. XIX, com a construção da linha de caminho-de-
ferro, a população do lugar volta a aumentar, mas é o intenso crescimento
demográfico que ocorre a partir dos anos 60 que vai alterar as dinâmicas até então
vividas no território, conferindo-lhe uma nova configuração urbana. A indústria
assume-se como uma actividade importante no local140 e a ocupação dos anteriores
territórios agrícolas com a construção de edifícios de vários pisos transformam a
paisagem tradicional.
Inserido no processo de expansão dos subúrbios que dominou o eixo Lisboa-
Sintra, desde meados do séc. XX, o forte crescimento demográfico de Agualva-Cacém
começa a provocar desequilíbrios de vária ordem decorrentes da falta de qualidade
urbanística e do crescimento desordenado, das grandes densidades populacionais, da
degradação e destruição de antigos núcleos habitacionais, do desaparecimento
progressivo de espaços verdes, da degradação ambiental e da poluição da ribeira.
Relacionado com o crescimento demográfico da cidade está a chegada de população
estrangeira, oriunda em particular de países africanos de língua portuguesa (Cabo
Verde, Angola e Guiné-Bissau) mas, mais recentemente, também dos novos países de
imigração, com destaque para o Brasil e para os países do leste europeu. Com uma
história já longa no acolhimento de população de origem africana, iniciada em meados
dos anos 70, é hoje frequente a presença da segunda e terceira gerações de
descendentes dos primeiros imigrantes que se instalaram no território.
Desde que foi elevada a cidade, Agualva-Cacém tem passado por vários
projectos de intervenção no território, destacando-se pelo impacto que tem tido nas
condições urbanísticas e na requalificação urbana, o Programa Polis,141 dinamizado a
partir de 2005. No âmbito deste programa foram levadas a cabo várias intervenções:
criação de espaços verdes, requalificação urbana da área envolvente da estação do
caminho-de-ferro e da Ribeira das Jardas, melhoramento das acessibilidades, da
ligação ao IC 19, e da utilização dos comboios do nó ferroviário das linhas de Sintra e
do Oeste. Por outro lado, a intensificação do comércio e serviços tem facilitado a
fixação da população residente, diminuindo a sua dependência relativamente a Lisboa,
quer em termos de trabalho, quer em termos de acesso a bens e serviços. Contudo,
140
As indústrias localizam-se numa posição periférica há cidade, dispondo de uma reibeira e benificiando da instalação de linhas férreas e de transportes urbanos (Barata Salgueiro, 1992). 141
“O Programa Polis – Programa de Requalificação Urbana e Valorização Ambiental da Cidade – é um projecto do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente que, em parceria com as Autarquias Locais, tem como objectivo principal melhorar a qualidade de vida das cidades através de intervenções nas vertentes urbanística e ambiental, potenciando a atractividade e competitividade dos pólos urbanos. Como tal, a cidade de Agualva-Cacém será alvo de uma profunda reestruturação.” (http://www.cm-sintra.pt/Artigo.aspx?ID=2441)
238
face às elevadas densidades populacionais da cidade, os serviços e instituições de
apoio à população não conseguem ainda proporcionar uma resposta eficaz.
2.2.2. Perfil sociodemográfico
A área de influência dos três agrupamentos de escolas que constituem o caso
de estudo no concelho de Sintra, estende-se por três freguesias; Monte Abraão,
Agualva e Cacém (Fig. IV.6).
Fig. IV.6 – Município de Sintra – Localização da Área de Estudo
Residia nestas freguesias, à data dos Censos de 2011, uma população de 77
922 indivíduos, 20,6% dos habitantes do concelho. No período intercensitário (2001-
2011) a população deste território registou um decréscimo de -3%.142 Do conjunto de
residentes nas três freguesias 8 850 são naturais de um país estrangeiro,
correspondendo a 11,4% da população total e 27% da população estrangeira do
concelho.
142
O cálculo da taxa de variação para as freguesias de Agualva-Cacém está condicionado pela alteração que se registou em 2001 com a criação de novas feguesias que surgem agora individualizadas no recenseamento de 2011. De modo a percepcionar se no seu conjunto o território viu aumentada ou reduzida a população optámos por calcular a taxa de variação no período intercensitário utilizando as divisões administrativas que constam no recenseamento de 2001.
239
O concelho de Sintra acolhe população de origem imigrante desde meados
dos anos 70, na sequência do processo de descolonização. No período intercensitário
2001-2011 a população estrangeira cresceu +39,4% neste território enquanto a
população total apenas aumentou 3,9%. Na freguesia de Monte Abraão a população
diminuiu cerca de 6% entre os dois recenseamentos contudo, a população estrangeira
apresentou um crescimento de 19,9%. Na cidade de Agualva-Cacém (abrange as
quatro freguesias) o crescimento populacional registado entre os dois momentos foi
negativo (-2,5%), enquanto a população estrangeira cresceu cerca de 40%, um valor
muito próximo do registado para o concelho.
Os 77 922 indivíduos que em 2011 residem nas três freguesias distribuem-se
de forma desequilibrada pelos diferentes escalões etários. O peso da população com
idade compreendida entre os 0 e 24 anos é de 28,9%, valor superior ao dos idosos
(13,5%), sendo o grupo dos activos (15-64 anos) composto por 70% dos residentes. A
percentagem de crianças, com idade até catorze anos, é de 16,5%, valor que também
é superior ao da população idosa. Os residentes no concelho de Sintra apresentam,
ainda, um índice de juventude relativamente elevado quando comparados com o
concelho de Lisboa (129% e 53,8% respectivamente). No território em estudo este
índice é de 122%, a freguesia mais jovem é a de Agualva (133,5%), seguindo-se
Monte Abraão (125,2%) e Cacém (120,8%). O índice de envelhecimento no conjunto
das três freguesias é de 82%, valor superior ao obtido para o município (77,5%),
registando a freguesia de Agualva um índice de 88%, Monte Abraão de 79,9% e o
Cacém de 74,9%. A tendência para uma maior juventude deste território, relativamente
à cidade de Lisboa, pode ainda ser confirmada pelos valores obtidos no cálculo do
índice de dependência de idosos, o índice aproxima-se de 19% em todas as
freguesias, um valor ligeiramente inferior ao do Concelho (19,9%). O cálculo do sex
ratio permite constatar que apesar da tendência para um maior peso da população
feminina (o valor situa-se entre os 52 a 53% em todas as freguesias), mantém-se um
equilíbrio na distribuição entre os dois sexos.
A percentagem de população estrangeira na área em estudo é um pouco
superior à média do concelho. O total de estrangeiros no concelho é de 32 709
indivíduos (8,7% da população), residindo na área em estudo 8 850 (11,4%) ou seja,
27,1% dos estrangeiros no concelho de Sintra. No conjunto da população residente
neste território identifica-se ainda uma percentagem de 26% de indivíduos com dupla
nacionalidade (portuguesa e outra). Esta população tem contribuído para uma
densificação do território, atenuando a tendência que se desenha no último período
intercensitário para o decréscimo do número de habitantes. Note-se que em Monte
Abraão apesar do aumento de estrangeiros, a população total diminuiu na freguesia (-
240
5,6%). As vivências do local evidenciam a presença, entre os estrangeiros, de uma
maioria de origem africana, coexistindo também a população oriunda do Brasil e de
países europeus de leste, embora com menor peso no cômputo geral. A diversidade
cultural provavelmente não é tão acentuada como a registada anteriormente para o
centro da cidade de Lisboa, mas a sua presença é notória nas escolas que servem o
território. Neste, tal como na área central de Lisboa existem diversos projectos e
instituições que desenvolvem um trabalho no sentido do acolhimento e integração da
população imigrante. Destacam-se também os projectos dinamizados no âmbito do
Programa Escolhas e de instituições como a Santa Casa da Misericórdia, as Juntas de
Freguesia e as Associações de Imigrantes.
No conjunto dos 9 164 estrangeiros residentes no território, o grupo mais
representativo é proveniente dos PALOP (62,7%), em segundo lugar posicionam-se os
cidadãos oriundos do Brasil (18,7%), na terceira posição a população com origem em
outros países europeus (5,3%) que não pertencem à União Europeia (15) e em quarto
lugar a população oriunda de países do leste europeu (4,7%) e (Fig. IV.7). A
população proveniente de países asiáticos e de países da U.E. (15) tem pouca
expressão no território. As quatro principais nacionalidades presentes são a cabo-
verdiana, brasileira, angolana e guineense (Fig. IV.8). O padrão de distribuição das
diversas regiões de origem da população estrangeira residente neste território segue o
registado para o concelho. Ainda assim, a população de origem africana encontra-se
com maior peso relativo no território em estudo relativamente ao que apresenta no
concelho (53,9%). Nestas freguesias concentram-se 32,6% dos cerca de 17 600
cidadãos com origem nos PALOP, residentes no concelho, 25% em Agualva-Cacém e
8,6% em Monte Abraão. Esta população é maioritariamente originária de Cabo Verde
(40%), Angola (25,8%) e Guiné-Bissau (25,6%), apresentando um padrão de
distribuição diferente em Monte Abraão e em Agualva-Cacém. Em Monte Abraão a
principal nacionalidade de origem é guineense (37,3%), seguindo-se a população
angolana (29,2%) e a cabo-verdiana (27,7%). Em Agualva-Cacém o grupo maioritário
é originário de Cabo Verde (44,6%), seguindo-se os nacionais de Angola (24,6%) e,
em terceiro lugar os nacionais da Guiné-Bissau (21,2%).
241
Fig. IV.7 – Residentes estrangeiros, segundo os principais grupos de origem, no concelho de Sintra e no território em estudo, 2011
Fig. IV.8 – Dez principais nacionalidades da população estrangeira residente nas freguesias de Monte Abraão e Agualva-Cacém, 2011
0% 20% 40% 60% 80% 100%
área em estudo
concelho de
SintraU.E. (15)
Outros países europeus
Europa de leste+Rússia
PALOP
Brasil
Ásia
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
0 500 1000 1500 2000 2500
Moçambique
China
Moldávia
Ucrânia
Roménia
São Tomé e Príncipe
Guiné-Bissau
Angola
Brasil
Cabo Verde
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
242
A distribuição da população estrangeira no território em estudo não segue um
padrão uniforme: na freguesia de Agualva concentra-se 45,8% desta população, em
segundo lugar posiciona-se Monte Abraão (27,5%), seguindo-se o Cacém (26,7%) (Fig.
IV.9).
Fig. IV.9 – População estrangeira nas freguesias de Monte Abraão e Agualva-Cacém, 2011
A caracterização das três freguesias do concelho de Sintra, que constituem a
área de estudo, permite confirmar a importância da população de origem estrangeira
neste território, em particular da proveniente dos PALOP (Anexo 7), e que conduziu à
sua escolha como caso de estudo desta investigação. Em contextos de recomposição
demográfica e contrariando a tendência para o envelhecimento que também se regista
em alguns territórios suburbanos, a presença de população estrangeira revela ter uma
expressão significativa entre os habitantes destes espaços urbanos (11,4% da
população total). Com uma maior concentração na freguesia de Agualva, estes
imigrantes continuaram a chegar ao território durante a primeira década do séc. XXI,
juntando-se a outros grupos com a mesma origem que aí se vêm fixando desde
meados dos anos 70. Visível nos processos de apropriação e ocupação do espaço
urbano, estes residentes conferem as áreas em que se movimentam, dinâmicas
próprias que por vezes entram em conflito com as práticas existentes.
2.2.3. Perfil socioeconómico da população residente e condições de
habitabilidade
Ao perfil demográfico traçado para a população residente associam-se
características socioeconómicas que conferem a esta área da cidade uma imagem
frequentemente conotada com situações de fragilidade económica e social. A
informação estatística publicada no Recenseamento da população permite traçar um
Fonte: INE, Recenseamento da População, 2011. Construção própria.
0%
10%
20%
30%
40%
50%
Ag
ua
lva
Ca
cé
m
Mo
nte
Ab
raã
o
% pop.
estrangeira
residente na
freguesia
%
estrangeiros/total
estrangeiros
residentes na
área
243
breve perfil destes residentes e das freguesias que constituem a área de estudo, com
base na análise de indicadores relativos à educação, actividades económicas,
desemprego e condições de habitabilidade.
A população que reside neste território apresenta uma taxa média de
analfabetismo de 1,2% valor relativamente baixo quando comparado com o do
concelho (4,3%). A taxa de analfabetismo oscila entre 0,3% e 3,3%, sendo a freguesia
do Cacém a que detém um maior peso relativo de população analfabeta (3,3%). No
conjunto do território, 19% da população com mais de 25 anos possui um curso
superior, valor um pouco inferior ao obtido para o concelho (21,9%) contudo, na
freguesia de Monte Abraão a percentagem de licenciados situa-se acima do valor
concelhio (24,2%) e em Agualva-Cacém 17% da população com mais de 25 anos tem
um curso superior. De um modo geral os níveis de qualificação não são muito
elevados, como atesta a percentagem de licenciados.
A partir da análise dos quantitativos de activos que exercem uma profissão
nos grupos 7, 8 e 9 é possível constatar que é relativamente elevado o peso dos
profissionais nestes grupos no conjunto do território, pois totalizam 31% do total da
população a exercer uma profissão. O valor não se afasta muito da tendência
concelhia (29% de profissionais nos grupos 7, 8 e 9) contudo, em Agualva-Cacém o
peso relativo destes profissionais é superior (32,4%). Monte Abraão afasta-se um
pouco da tendência geral, com 27,7% de activos em profissões menos qualificadas. A
este facto não é alheia a informação anterior sobre a percentagem de licenciados que,
nesta freguesia é superior ao restante território e mesmo à média do concelho.
A taxa de desemprego apresenta, no conjunto das três freguesias um valor de
14,2%, ligeiramente superior à média concelhia (13,5%). É na freguesia de Agualva
que a percentagem de desemprego apresenta o valor mais elevado (15%),
posicionando-se Monte Abraão e Cacém em torno dos 14%. Apesar das elevadas
taxas de desemprego, a percentagem de população jovem (15-24 anos) que usufrui do
Rendimento Mínimo Garantido é relativamente reduzida no território em estudo.
Apenas 0,3% da população recebe este subsídio, quando na cidade de Lisboa o valor
é de 0,5%. Contudo, é de referir que na freguesia de Monte Abraão este valor atinge
0,6% dos jovens. Em relação aos restantes tipos de subsídios e apoios sociais é
importante mencionar que neste território a percentagem de população que usufrui dos
mesmos não é muito elevada, sendo ligeiramente superior à do concelho, 1,6% do
grupo com idade entre 15 e 24 anos.
Uma breve caracterização das condições de habitabilidade neste território
permite completar o perfil socioeconómico da população residente. A percentagem de
pessoas a residir em alojamentos não clássicos não tem expressão, tal como no
244
concelho de Sintra (0,1%). Também é significativa a percentagem de população que
reside em habitações com as condições mínimas de habitabilidade (electricidade,
retrete, água, aquecimento e banho). Para 81,3% dos residentes estas condições
estão asseguradas, ainda assim o valor é ligeiramente inferior ao registado para o
concelho (84,6%). Contudo, a percentagem de residentes em alojamentos
sobrelotados tem alguma expressão quando comparada com o total concelhio. Nas
três freguesias em estudo 18,6% da população vive em alojamentos com menos de
três divisões que se encontram sobrelotados. Quer em Monte Abraão quer em
Agualva-Cacém, os valores oscilam entre 18% e 19% quando no concelho é de 15,7%.
A caracterização do perfil socioeconómico dos residentes neste território do
município de Sintra deixa evidente que se trata de uma área onde existe uma certa
homogeneidade entre as freguesias. Apenas no âmbito das qualificações se identifica
uma distância entre Monte Abraão e Agualva-Cacém, registando a primeira um maior
peso da população licenciada. No domínio do emprego e actividades profissionais, é
significativa a percentagem de residentes em sectores de actividade menos
qualificados e pior remunerados, persistindo também uma taxa de desemprego com
valores elevados. No que diz respeito às condições de habitabilidade, a principal
fragilidade advém da percentagem de alojamentos sobrelotados.
Traçado o perfil dos concelhos e territórios onde se inserem as escolas que
constituem o caso de estudo, importa agora proceder à caracterização dos respectivos
agrupamentos, contextualizando-os nos territórios que servem. De modo a dar
cumprimento a esta intenção, estruturamos a análise da informação disponível para
cada agrupamento em duas linhas que consideramos fundamentais: i) a dimensão,
população escolar, equipamentos e orientações da política educativa e, ii) a posição
relativamente aos concelhos em que se inserem, no que se reporta às características
da população estrangeira que os frequenta e aos níveis de desempenho escolar do
conjunto dos alunos que se encontram inscritos no ensino básico.
245
3. Os agrupamentos de escolas: características da população escolar e
orientações da política de integração de alunos imigrantes
A identificação das principais características da política de integração de
alunos imigrantes no sistema educativo nacional, assim como o conhecimento dos
seus quantitativos, diversidade de origens e percursos escolares no território nacional
e na AML, constituem o quadro de fundo da análise que agora se inicia. Desta primeira
aproximação, retemos as grandes linhas de orientação da política de integração que
pretendemos de seguida analisar, a uma escala micro, seguindo as finalidades
definidas para o estudo localizado em territórios da AML.
Dos capítulos II e III retirámos algumas conclusões que necessitamos agora
de ver confirmadas através do estudo dos percursos de integração realizados pelas
comunidades de imigrantes em contexto escolar, referimo-nos i) à abertura do país na
dimensão político-legal (direitos de residência e de acesso à cidadania); ii) à mudança
na orientação da política educativa portuguesa que posiciona o país no grupo de
países que oferece um quadro político de acolhimento mais favorável; iii) à existência
de maior diversidade étnica e cultural nas escolas da região de Lisboa, em particular
nas do ensino básico e, iii) aos maiores quantitativos de reprovação/desistência entre
crianças e jovens de origem imigrante que frequentam o ensino básico regular.
A articulação entre escalas de análise, que tem orientado este estudo,
completa-se agora com a abordagem à escala micro. A compreensão dos processos
de integração vividos a este nível implica, necessariamente, a mobilização de todas as
análises anteriormente desenvolvidas. Para Penninx (2009), a análise do processo de
integração vivido nas cidades implica, necessariamente, a articulação entre três níveis
básicos de governança – local, nacional e europeu. Na perspectiva do autor, a
integração vive-se fundamentalmente a nível local, ainda que alguns mecanismos que
a orientam dependam de regras institucionais definidas a níveis mais elevados. Assim,
a integração assumida como um processo que envolve duas partes, o imigrante ou
grupos de imigrantes e a sociedade de acolhimento, decorre em contextos muito
concretos: nas ruas, nos bairros, nas escolas, nos locais de trabalho, nos espaços
públicos e nas organizações locais (Penninx, 2009). Neste sentido, o autor defende
que uma análise das políticas e práticas de integração implementadas a nível local
implica a mobilização de um conjunto de factores e circunstâncias específicas i) o
território urbano, enquanto espaço físico de acolhimento; ii) a história/experiências
locais no acolhimento da imigração e diversidade e, iii) os instrumentos concretos e os
recursos disponibilizados aos actores políticos locais para a condução do processo em
domínios vitais, como a habitação, o mercado de trabalho, a educação e a saúde.
246
Reconhecendo que, certamente, não conseguiremos reunir toda a informação
necessária para justificar algumas das evidências que iremos encontrar na análise do
processo de integração que decorre a nível local (escola e bairro), parece-nos que os
dados que recolhemos, com base num contacto mais próximo com a comunidade
escolar e com os territórios, permitirão avançar, numa lógica próxima da apresentada
por Rinus Penninx (2009), com uma análise mais consistente sobre a vivência e
resultados do processo. Propomo-nos, agora, proceder à micro análise que conduzirá
na exploração das especificidades dos percursos de integração dos alunos em
contextos escolares localizados em territórios distintos da Área Metropolitana de
Lisboa.
Para o estudo das especificidades de um território educativo consideramos
ser fundamental proceder, num primeiro momento, à sua contextualização num âmbito
mais alargado o que, no caso particular do estudo da integração dos descendentes de
imigrantes em alguns agrupamentos de escolas, significa posicionar estes
agrupamentos no âmbito dos concelhos em que se inserem (Lisboa e Sintra). Para tal,
propomo-nos (i) analisar os quantitativos de alunos estrangeiros; (ii) identificar as suas
origens e, (iii) caracterizar os seus percursos escolares. Pretende-se, com este
exercício, situar os territórios em estudo face ao contexto mais alargado em que se
inscrevem, identificando as especificidades que os aproximam ou afastam do conjunto
da rede concelhia.
3.1. A diversidade da população escolar
A análise que se desenvolve de seguida situa os agrupamentos de escolas
que em cada território são objecto de estudo, área central da cidade de Lisboa, Monte
Abraão e Agualva-Cacém, face ao concelho de Lisboa e ao concelho de Sintra
respectivamente, avançando com algumas comparações relativas ao perfil dos alunos
nos dois concelhos a partir de um conjunto de variáveis (número de alunos por ciclo do
ensino básico, origem, situação de retenção/desistência, transição/conclusão). É ainda
nosso objectivo explorar um conjunto de indicadores que permitem caracterizar os
territórios educativos em estudo, traçando um primeiro perfil dos estudantes que
acolhem, com base nos quantitativos e diversidade de origens da população
estrangeira e, também, no sucesso escolar destes alunos relativamente aos nativos.
Ensaiamos, deste modo, uma aproximação progressiva aos contextos e públicos
sobre os quais se irá debruçar o percurso seguinte desta investigação.
Para levar a cabo esta intenção, socorremo-nos dos dados estatísticos do
GEPE, para as escolas da rede pública em 2009-10, em particular os quantitativos de
alunos por escola segundo a nacionalidade, ciclo e modalidade de ensino e o número
247
de alunos em situação de retenção/desistência e transição/conclusão por ciclo e
modalidade de ensino.
A população que frequenta as escolas do ensino básico e secundário no
concelho de Lisboa totaliza 58 400 indivíduos distribuídos por diferentes ciclos de
escolaridade e modalidades de ensino. No concelho de Sintra, este grupo reduz-se
para 48 502 indivíduos. As idades dos estudantes que se encontram inscritos nas
escolas dos dois concelhos distribuem-se entre os 6 e os 82 anos. No concelho de
Sintra a percentagem de alunos estrangeiros (15,4%) é superior à registada nas
escolas do concelho de Lisboa (9,6%), porém, é maior a diversidade de origens do
grupo que compõe a população estrangeira neste último concelho.
No que diz respeito ao número de alunos nativos nos territórios dos
agrupamentos que são alvo do nosso estudo encontramos inscritos 7 908 alunos a
frequentar o Ensino Básico, com idades compreendidas entre os 5 e os 18 anos.
Neste grupo, 3 694 estudantes frequentam as escolas de Lisboa e 4 214 as escolas de
Sintra correspondendo, no caso de Lisboa a 10,4% dos alunos do concelho e, no caso
de Sintra, a 12,6% do total de estudantes do referido grupo etário. Se atendermos às
origens destes alunos, o grupo maioritário é constituído por nativos, 2 969 nas escolas
do centro da cidade de Lisboa e 3 453 nas escolas de Sintra.
Os alunos estrangeiros são em número mais reduzido que os nativos nestes
territórios, perfazendo um total de 725 (19,6% do total de alunos) nos agrupamentos
de Lisboa, e 761 (18,1% do total de alunos) nos de Sintra. Nas escolas em estudo
concentram-se, respectivamente, 24,4% e 18,6% do total dos estudantes que, nos
respectivos concelhos (Lisboa e Sintra), não têm nacionalidade portuguesa. Nos
agrupamentos de Sintra, o peso relativo dos alunos estrangeiros no conjunto da
população escolar é ligeiramente inferior ao registado para Lisboa, 18,1% face a
19,6%. Assim, enquanto em Lisboa, os territórios dos agrupamentos concentram uma
percentagem de alunos estrangeiros significativamente superior à média concelhia, em
Sintra esta diferença é pouco significativa (0,5%).
A análise das nacionalidades da população estrangeira inscrita nos
agrupamentos de escolas dos territórios em estudo revela a existência de diferenças
associadas às origens deste grupo. Assim, nos agrupamentos do centro de Lisboa, os
alunos são oriundos de regiões diversas, com maior peso para os naturais de países
da América do Sul (42,6%), em particular do Brasil (41,7%). Na segunda posição
surgem os estudantes com origem no continente africano (23%), em particular de
Cabo Verde (6,5%), da Guiné-Bissau (6,5%) e de Angola (5,9%). Ocupando o terceiro
lugar encontram-se os alunos asiáticos (19,7%), com destaque para os provenientes
da China (5,9%), da Índia (4,8%) e do Bangladesh (4,7%). Na quarta posição surgem
248
os europeus de leste (10,5%) entre os quais se destacam os alunos com
nacionalidade romena (4,6%) e ucraniana (2,9%) (Fig. IV.10).
Fig. IV.10 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos no EB nos agrupamentos em estudo no concelho de Lisboa, 2009-10
Nos agrupamentos de Sintra (Monte Abraão e Agualva-Cacém) cerca de
72,3% dos estudantes são oriundos de países africanos, em particular de Cabo Verde
(24,4%), Angola (22,3%) e Guiné-Bissau (18,1%). Os quantitativos de alunos com
origem na América do Sul (16,6%), concretamente no Brasil, são menores
comparativamente a Lisboa, assim como o peso daqueles que são provenientes de
países do leste europeu (8,5%), nomeadamente de nacionalidade ucraniana (4,3%),
moldava (2,2%) e romena (1,7%). Já a população de origem asiática, com uma
representação muito significativa no concelho de Lisboa, vê agora a sua presença
reduzida a 1,4% no conjunto dos alunos estrangeiros que frequentam os dois
agrupamentos do concelho (Fig. IV.11).
A distribuição que acabamos de apresentar, para as origens dos estudantes
estrangeiros que em Sintra frequentam as escolas dos territórios em estudo, revela
algumas diferenças quando comparada com o registado para o concelho. O grupo
proveniente de Cabo Verde ocupa a primeira posição e, em segundo lugar, surge o
grupo oriundo do Brasil, que nas escolas do estudo se posiciona em quarto lugar. Esta
constatação deixa antever que a probabilidade de incluir na amostra estudantes com
origem no Brasil é relativamente reduzida nos territórios escolhidos, pois do total de
indivíduos deste grupo apenas 12,8% se encontra inscrito nestas escolas.
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45
São Tomé e Príncipe
Ucrânia
Roménia
Bangladesh
Índia
Angola
China
Cabo Verde
Guiné-Bissau
Brasil
%
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
249
Fig. IV.11 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos no EB nos agrupamentos em estudo no concelho de Sintra, 2009-10
Nas escolas do concelho de Lisboa, o padrão de distribuição dos alunos, em
função das origens, revela ter algumas características que se afastam das
identificadas para as escolas do centro da cidade, diferença justificada pela sobre-
representação dos estudantes com origem em países asiáticos, em particular na China,
Índia e Bangladesh, quando comparados com os quantitativos do concelho. Os
estrangeiros de origem asiática “têm uma forte implantação no centro e nos bairros
históricos da cidade, em áreas de forte densidade comercial. Este padrão geográfico
está fortemente relacionado com o desenvolvimento de um empreendedorismo
comercial de base étnica, criado por estas comunidades, com grande visibilidade no
eixo do Martim Moniz/Av. Almirante Reis e áreas adjacentes do centro cidade”
(Fonseca, 2008a, p. 81). O grupo proveniente da Índia corresponde a 39,8% do total
de indianos existente no concelho, o grupo oriundo da China perfaz 24,3% do seu total
e os alunos de nacionalidade bangladeshiana atingem os 55,8%. Estes grupos
destacam-se, nesta área da cidade, pela sua maior concentração relativamente a
outros que se apresentam com maiores quantitativos neste território, como é o caso
dos brasileiros (22,8% do total do grupo inscrito nas escolas do concelho) (Fig. IV.10).
0 5 10 15 20 25 30
China
Senegal
Roménia
Moldávia
Ucrânia
São Tomé e Príncipe
Brasil
Guiné-Bissau
Angola
Cabo Verde
%
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
250
Fig. IV.12 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos em escolas do EB no concelho de Lisboa, 2009-10
No que diz respeito ao concelho de Sintra, os estudantes que têm origem em
Cabo Verde (25,8%), tal como acontece nos agrupamentos, são o grupo de maior
expressão. Contudo, os provenientes do Brasil surgem agora em segundo lugar
(20,4%), seguidos dos de Angola (19%), Guiné-Bissau (14,3%) e São Tomé e Príncipe
(4,4%). São os nacionais da Ucrânia (3,8%), Roménia (2,9%) e Moldávia (2,5%) que
ocupam as posições seguintes, mas em número muito reduzido. A população de
origem asiática tem pouca expressão neste território (Fig. IV.13).
Fig. IV.13 – Dez principais nacionalidades dos alunos estrangeiros inscritos em escolas do EB no concelho de Sintra, 2009-10
A diversidade de origens é significativamente maior nas escolas do concelho
de Lisboa, onde se contam 73 nacionalidades diferentes e, destas, 42 (57,5%)
frequentam as escolas do estudo. No município de Sintra, são 65 as nacionalidades
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45
Moldávia
Índia
Roménia
Guiné-Bissau
Ucrânia
China
São Tomé e Príncipe
Angola
Cabo Verde
Brasil
%
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
0 5 10 15 20 25 30
Guiné-Conacri
China
Moldávia
Roménia
Ucrânia
São Tomé e Príncipe
Guiné-Bissau
Angola
Brasil
Cabo Verde
%
251
dos estudantes e, deste conjunto, 24 (36,9%) encontram-se representadas nas
escolas da amostra.
O cálculo do índice de diversidade,143 em função das regiões de origem dos
estudantes, para as freguesias dos concelhos de Lisboa e Sintra comprova as
diferenças anteriormente referidas. Este índice apresenta valores superiores no
concelho de Lisboa (0,71) relativamente ao de Sintra (0,51) e, quando comparados os
resultados das freguesias onde se localizam os agrupamentos em estudo evidenciam-
se tendencialmente menores valores do índice em Sintra que em Lisboa. A cartografia
da diversidade dos alunos estrangeiros para os dois concelhos transmite um padrão
de distribuição territorial com maior concentração da diversidade de origens nas
freguesias de Lisboa, particularmente relevante na área central da cidade (Fig. IV.14).
Fig. IV.14 – Índice de diversidade dos estudantes no concelho de Lisboa e Sintra, 2009-10
Em poucas palavras, estamos perante territórios cuja população tem uma
forte marca de diversidade no que diz respeito às suas origens. Veremos, no decorrer
143
n
Índice de Diversidade - D = 1 - ∑ p2
i i=1
(p = proporção de pessoas de cada nacionalidade; n = número de nacionalidades)
Fonte: GEPE, 2009-10. Construção própria.
252
desta análise como ela influencia, ou não, as formas de que se reveste a sua
integração.
Centremos, por agora a nossa atenção em dois domínios que nos permitem
aproximar da realidade que constitui a presença dos alunos não nativos nas escolas
dos concelhos de Lisboa e Sintra, isto é, a sua distribuição por modalidades de ensino
(regular e não regular) e por ciclos de ensino, ao nível da escolaridade básica.
A análise da distribuição dos estudantes por modalidades de ensino, regular e
não regular, revela que para o Ensino Básico regular a percentagem de alunos é de
96,6% no concelho de Lisboa e de 98,1% no de Sintra (Quadro IV.3). No reverso
destes números encontramos a percentagem de 3,4% de alunos a frequentar o ensino
não regular em Lisboa, enquanto no concelho de Sintra esta percentagem fica-se
pelos 1,9%.
A questão que importa equacionar é a de reconhecer as possíveis influências
que exercem sobre estes números as características da população não nativa que vive
nestes concelhos e cujos filhos frequentam as suas escolas.
Quando centramos a nossa atenção nos agrupamentos, observamos uma
redução muito acentuada das percentagens de alunos oriundos de um país
estrangeiro que optam pelo ensino não regular: no caso de Lisboa, a percentagem
concelhia de 7,5% reduz-se para 2,1% e, no caso de Sintra, passa de 4,1% para 1,4%
(Quadro IV.3).
Quadro IV.3 – Alunos inscritos no ensino básico, segundo a origem e modalidade de ensino (2009-2010)
Territórios Origem Regular Não Regular* Total
nº % nº % nº %
Concelho Lisboa
Estrangeiro 2749 92,5 222 7,5 2971 8,3
Portugal 31625 96,9 1000 3,1 32625 91,7
total 34374 96,6 1222 3,4 35596 100,0
Agrupamentos Lisboa
Estrangeiro 710 97,9 15 2,1 725 19,6
Portugal 2936 98,9 33 1,1 2969 80,4
total 3649 98,7 48 1,3 3694 100,0
Concelho Sintra
Estrangeiro 3917 95,9 167 4,1 4084 12,2
Portugal 29032 98,5 457 1,5 29489 87,8
total 32949 98,1 624 1,9 33573 100,0
Agrupamentos Sintra
Estrangeiro 750 98,6 11 1,4 761 18,1
Portugal 3437 99,5 16 0,5 3453 81,9
total 4187 99,4 27 0,6 4214 100,0
*CEF - Cursos de Educação e Formação; EFA - Educação e Formação de Adultos; RVCC - Sistema de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências.
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
253
Apesar destes resultados, não podemos deixar de sublinhar que esta redução
é comum aos dois grupos (estrangeiros e nativos) e que a percentagem de alunos
estrangeiros a frequentar o ensino não regular é sempre superior à dos nativos. Por
ouro lado, podemos equacionar a hipótese da adesão a este tipo de ensino estar
dependente das ofertas das escolas no âmbito do ensino não regular.
O segundo domínio que nos propomos analisar refere-se à distribuição dos
alunos dos concelhos de Lisboa e de Sintra, assim como dos agrupamentos em
estudo, pelos diferentes ciclos do Ensino Básico (Quadros IV.4 e IV.5).
Quadro IV.4 – Alunos portugueses e estrangeiros por ciclos de ensino (Lisboa, 2009-2010)
Portugueses Estrangeiros
Concelho Agrupamento Concelho Agrupamento
nº % nº % nº % nº %
1º CEB 14529 40,8 1436 48,4 1135 30,7 328 45,2
2º CEB 8595 24,1 756 25,5 949 25,7 185 25,5
3º CEB 12470 35,0 777 26,2 1612 43,6 212 29,2
Total 35594 100,0 2969 100,0 3696 100,0 725 100,0
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
Quadro IV.5 – Alunos portugueses e estrangeiros por ciclos de ensino (Sintra, 2009-2010)
Portugueses Estrangeiros
Concelho Agrupamento Concelho Agrupamento
nº % nº % nº % nº %
1º CEB 14697 44,6 1592 46,1 1545 31,9 260 34,2
2º CEB 7754 23,5 1176 34,1 1302 26,9 301 39,6
3º CEB 10491 31,8 685 19,8 1998 41,2 200 26,3
Total 32942 100,0 3453 100,0 4845 100,0 761 100,0
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora.
No que diz respeito aos alunos nativos, a nível concelhio, podemos identificar
um padrão que se repete nos dois territórios, com variações pouco significativas. Nas
escolas dos agrupamentos regista-se uma quebra acentuada nas percentagens
relativas ao 3º CEB que, a nível concelhio, aumentam em relação ao 2º CEB, mas que
se reduzem nestes territórios específicos, em especial no concelho de Sintra, ficando-
se pelos 19,8%.
254
Centrando a nossa atenção nos alunos estrangeiros, podemos identificar
algumas diferenças que são dignas de registo, quanto à sua distribuição pelos três
ciclos do Ensino Básico. Em primeiro lugar, as percentagens menos elevadas, na área
de todo o concelho encontram-se no 3º CEB e não no 1º CEB. Em segundo lugar, nas
escolas dos agrupamentos, tal como acontece entre os portugueses, regista-se uma
diminuição nas percentagens do 3º CEB mas, quer em Lisboa, quer em Sintra, estas
percentagens são superiores entre os alunos estrangeiros, quando comparadas com
as dos nativos: 29,2% e 26,3%, respectivamente.
Quanto aos significados que possamos atribuir a estas diferenças, algumas
hipóteses podem ser equacionadas. Por um lado, sabemos que muitas das crianças
provenientes de um país estrangeiro que chegam aos territórios e iniciam a sua vida
escolar, já portadores de habilitações adquiridas nos territórios de partida, inserem-se
no sistema educativo em Portugal já no 2º ou 3º ciclos. Mas, as elevadas
percentagens a nível concelhio entre os estrangeiros que frequentam o 3º CEB (43,6%
em Lisboa e 41,2% em Sintra) não se explicam sem se colocar a possibilidade de
estarmos perante uma realidade que indicia a existência de sucesso no percurso
escolar dos alunos oriundos de um país estrangeiro. Apesar destes valores não serem
acompanhados pelos territórios dos agrupamentos, todavia, continuam superiores às
percentagens que se registam entre os alunos nativos, principalmente em Sintra.
Veremos, no ponto seguinte, com mais pormenor, se estas hipóteses são confirmadas
pela análise dos resultados escolares.
3.2. Perfis de desempenho da população escolar
A caracterização do sucesso escolar dos alunos que frequentam o ER nos
agrupamentos de escolas em estudo é medida pelo número de alunos retidos e em
situação de desistência por ciclo de escolaridade. Uma análise global da distribuição
do peso da retenção/desistência para cada território em estudo, permite traçar um
primeiro perfil que evidencia diferenças nos percursos escolares realizados pelos
estudantes em cada contexto e para cada ciclo de ensino. Assim, é entre os alunos
que frequentam as escolas de Lisboa que o insucesso é mais elevado (12,7%)
comparativamente ao registado para os colegas que frequentam as escolas de Sintra
(8,3%). Estes resultados acompanham a tendência registada para os dois concelhos,
com Lisboa a apresentar 13,1% de retenções e Sintra 9,5%. É entre os alunos
inscritos no 3º ciclo que se identifica a percentagem mais elevada de
retenção/desistência. O resultado da aplicação do T-teste 144 para amostras
144
O T-teste para amostras independentes “avalia, com base na probabilidade associada ao resultado do teste, se a diferença de médias encontrada se deve ao acaso ( o que acontece quando o resultado não é
255
independentes, confirma existirem diferenças significativas no sucesso escolar entre
os dois territórios. Para o concelho de Lisboa, a média145 do insucesso é superior à de
Sintra (média de Lisboa = 0,87; média de Sintra = 0,90), (t(67138) = -14,568, p = 0,000).
Dando continuidade à análise global do sucesso escolar dos estudantes nos
dois concelhos, e de modo a verificar as disparidades que podem existir entre os três
ciclos do Ensino Básico, aplicou-se uma análise de variância ANOVA unifactorial.146
Os resultados obtidos indicam um valor de F = 1391,1 com 2,74970 graus de liberdade
e uma significância associada de p = 0,000. Perante este valor de probabilidade (p =
0,000, estatisticamente significativo), conclui-se que existem diferenças de médias
significativas no sucesso escolar entre os três ciclos em comparação: o ciclo que
apresenta maiores níveis de insucesso é o 3º, seguido do 2º e, por fim do 1º ciclo
(Fig.IV.13).
Além das disparidades existentes no sucesso escolar entre os dois concelhos
e entre ciclos de ensino, também ocorrem diferenças significativas entre os alunos
estrangeiros e os nacionais: o valor médio situa-se em 0,90 para os portugueses e
0,81 para os estrangeiros. Recorrendo a um T-teste para amostras independentes, os
resultados revelam que o facto de ser estrangeiro ou nacional tem uma diferença
estatisticamente significativa no sucesso escolar (t(74971) = 24,38, p = 0,000).
A análise das médias comparadas dos quantitativos da retenção/desistência e
transição/conclusão para a totalidade dos alunos em função das regiões de origem
evidencia que existem diferenças no desempenho escolar para os diversos grupos de
estudantes. A aplicação da análise de variância ANOVA unifactorial para comparar o
sucesso dos seis principais grupos de estudantes do estudo em função das suas
origens, apresenta-nos um valor de F de 138,424 com 5,748 graus de liberdade e uma
significância associada de 0,000. Este valor de probabilidade (p = 0,000) é indicativo
que estamos perante diferenças de médias, que são significativas entre os grupos em
comparação.
significativo) ou se se deverá a diferenças que existem, de facto na população de onde foram recrutados os dois grupos que estão a ser comparados.” (Martins, 2011, p. 135) 145
O valor médio varia entre 0 (retenção/desistência) e 1 (transição/conclusão), sendo que quanto mais próximo de 0 for o resultado obtido, maiores são as ocorrências de retenção. 146
A Análise de Variância (ANOVA) Unifactorial permite “comparar três ou mais grupos independentes ao nível de uma variável dependente intervalar.” (Martins, 2011, p. 150)
256
Fig.IV.15 – Perfil do sucesso escolar nos concelhos de Lisboa e de Sintra, por ciclo do ensino básico, 2009-10.
Constatamos, através do cálculo da ANOVA, que as diferenças de sucesso
escolar entre os grupos de origem são comprovadas estatisticamente e é possível
quantificar através das médias de cada grupo as respectivas distâncias. Importa agora
identificar, recorrendo aos testes Post-Hoc,147 quais são essas diferenças e quais os
grupos entre os quais estas se registam. Assim, a interpretação da tabela resultante
da aplicação do teste, clarifica o posicionamento dos diferentes grupos de origem.
Identificam-se quatro grupos, o que mais se afasta dos restantes e surge numa
situação mais desvantajosa é composto por estudantes asiáticos, o grupo seguinte é
constituído pelos alunos de origem africana e os grupos de estudantes provenientes
da América do Sul. Num outro grupo surgem os estudantes oriundos de países
europeus U.E.(15) e, por fim, num quarto grupo, os estudantes com origem nos países
europeus de leste acompanhados dos portugueses (Fig. IV.16).
147
Os testes Post-Hoc realizados no âmbito da análise de variância, permitem “comparar os grupos dois a dois, identificando entre que grupos existem diferenças significativas” (Martins, 2011, p. 155).
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora, resultantes da análise de variância ANOVA unifactorial.
257
Fig.IV.16 – Perfil do sucesso escolar dos alunos do ensino básico, segundo as regiões
origem, 2009-10
Os factores que associamos ao posicionamento dos diferentes grupos
relativamente ao sucesso escolar podem ser diversos, ainda assim parece delinear-se
uma tendência para a importância que o domínio/conhecimento da língua portuguesa
pode ter nos percursos escolares dos alunos não nativos. Segundo Soares (1999), um
deficiente conhecimento da língua de ensino148 conduz ao insucesso escolar não só
em língua, mas também noutras disciplinas desencadeando, entre outros aspectos, a
desmotivação perante as aprendizagens e/ou mesmo o abandono escolar, com efeitos
cumulativos noutras áreas da vida social. A posição que os asiáticos ocupam no
conjunto do grupo, deixa evidente esta relação, a que também pode associar-se o
tempo de permanência no país, as opções de integração na sociedade de acolhimento,
a existência de uma comunidade étnica forte, pois trata-se de um grupo que
frequentemente se integra a partir das redes co-étnicas (Oliveira, 2005; Fonseca &
Malheiros, 2004). Os alunos de origem africana e os provenientes de países da
América do Sul, com destaque para o Brasil, apesar de, por motivos diferentes149 não
148
A escola, segundo Braun tem “uma língua específica que coexiste a par com a língua da comunidade: a língua de ensino” (Silva & Gonçalves, 2011, p. 41). 149
O estudo desenvolvido por Silva e Gonçalves (2011) identifica cinco grupos de alunos em função dos niveis de proficiência linguística. Em relação aos alunos imigrantes de países de língua oficial portuguesa as autoras identificam: (i) alunos “que desconhecem a língua portuguesa ou pensam conhecê-la, mas num registo completamente diferente e desadequado ao protuguês falado em Portugal, concretamente nas escolas portuguesas”; (ii) “alunos imigrantes do Brasil, falantes de língua portuguesa mas com um uso próprio da mesma, a nível de estrutura sintática e de domínio vocabular”; (iii) alunos portugueses com
Asia Africa
AMSul Europa 15 Europa Leste
Portugal
0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
0 1 2 3 4 5grupos
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora, resultantes da aplicação do teste Post-Hoc.
258
possuírem o domínio completo do português falado e escrito, têm uma exposição
maior à língua, contactando mais próximo com esta, e este pode ser um aspecto a
considerar no seu desempenho relativamente ao grupo dos colegas asiáticos. O grupo
proveniente de países da U.E.(15) é constituído quer por alunos cujos pais são
estrangeiros, mas provavelmente também por descendentes de emigrantes
portugueses, nascidos no estrangeiro, associados a movimentos de retorno, este
último aspecto pode justificar, em parte, a sua proximidade ao grupo nativo e aos
descendentes de europeus de leste, afastando-se de grupos anteriores. A proximidade
entre os estudantes chegados do leste europeu e os nativos, registando maior
sucesso escolar quando comparados com os grupos anteriores, pode encontrar
justificação, no caso dos europeus de leste, nos percursos de formação anteriores
quer dos próprios estudantes quer dos familiares, marcados pelo importante papel da
escola e exigência/dedicação nas tarefas escolares (Martins, 2008, 2005; Mendes,
2010; Linares, 2011), que lhes permitem ultrapassar facilmente o “extensíssimo
continuum de distância linguística em relação ao português” (Silva & Gonçalves, 2011,
p. 168).
Retomando a análise do sucesso escolar, desagregado agora para cada
concelho, pretende-se compreender a posição dos agrupamentos de escolas em
estudo no território concelhio e, assim, delinear algumas características que os
aproximam ou afastam dos comportamentos que caracterizam a rede mais vasta em
que se inserem e que consideramos serem fundamentais para a continuação da fase
seguinte da investigação.
Para os alunos estrangeiros que frequentam as escolas do concelho de Sintra,
o peso relativo da retenção/desistência é globalmente o dobro do registado entre os
alunos nacionais (18,7% face a 8,1%). É no 3º ciclo que a percentagem de retenção
revela ser superior, quer entre alunos estrangeiros, quer entre nativos. Estas
diferenças são comprovadas pela disparidade existente nas médias do sucesso de
cada grupo (0,90 para os portugueses e 0,81 para os estrangeiros), valores
estatisticamente confirmados pelo T-teste (t(32947) = 22,668, p = 0,000). Nos
agrupamentos de Sintra (AS), a distância entre o sucesso escolar de estrangeiros e
nativos mantém-se; contudo, reduz-se ligeiramente face à registada para o território
concelhio. As médias entre os dois grupos são de 0,93 para os portugueses e 0,86
para os estrangeiros, diferenças estatisticamente significativas (t(4185) = 6,26, p =
0,000).
ascendência próxima ou relativamente próxima de países de língua oficial portuguesa, assumindo o português como a sua língua mãe, mas com erros a vários níveis” (pp. 170-171).
259
É para o 1º ciclo, que o afastamento negativo relativamente à tendência
registada para o concelho é mais notório, numa proporção semelhante para
estrangeiros e nativos. Para o 2º ciclo, o desvio registado é positivo, ou seja, o peso
das retenções é menor quer entre estrangeiros, quer entre nativos, acentuando-se a
distância entre os estrangeiros que frequentam as escolas (AS) e o conjunto que
frequenta as escolas do concelho em 4,5 pontos percentuais. No 3º ciclo volta a ser
mais reduzida a percentagem de retenções nos agrupamentos (AS) relativamente ao
concelho. A aplicação da análise de variância ANOVA unifactorial para cada ciclo de
ensino, para a totalidade do grupo e para os dois grupos de origem, desagregada para
o concelho e para os agrupamentos AS, permite identificar as diferenças no sucesso
escolar ocorrido nos três ciclos de ensino entre alunos estrangeiros e nativos
relativamente ao total do grupo. Importa agora, recorrendo aos testes Post-Hoc,
identificar essas diferenças assim como os grupos e ciclos entre os quais estas se
registam.
A representação dos resultados no gráfico da figura IV.17 facilita uma leitura
conjunta, comparando as médias de sucesso obtidas em cada ciclo, em função da
origem do grupo e do território em análise (concelho/agrupamentos AS). As distâncias
referidas no parágrafo anterior são agora possíveis de visualizar comparando as
médias para cada grupo e em cada território. Os valores de probabilidade obtidos em
todos os cálculos são indicativos de que estamos perante diferenças de médias, que
são significativas entre os grupos em comparação (p = 0,000). Os estrangeiros
posicionam-se num nível de sucesso inferior em todos os ciclos, no concelho e nos
agrupamentos (AS). Quando comparada a sua posição no concelho com a registada
para as escolas (AS) verifica-se que, com excepção do 1ºCEB em que a média é
muito próxima entre os dois grupos, nos vários ciclos a posição deste grupo surge
favorecida nas escolas dos agrupamentos (AS) relativamente ao concelho. No gráfico
é ainda evidente que os agrupamentos (AS) revelam ter uma posição mais vantajosa
ou idêntica à do concelho relativamente ao sucesso escolar e que, entre os
estrangeiros que frequentam o 2º e 3º CEB as médias do sucesso afastam-se
positivamente das registadas para o concelho.
260
Fig. IV.17 – Perfil do sucesso escolar nos agrupamentos de escolas de Sintra e no concelho de Sintra, por ciclo do ensino básico, 2009-10
Tentando traçar um perfil dos estudantes que frequentam as escolas do
território em estudo no concelho de Sintra (AS), relativamente ao perfil geral do
concelho, podemos referir que estes apresentam três traços principais:
o desempenho escolar vai diminuindo do 1º para o 3º CEB, sendo um
comportamento comum quer nos territórios em estudo, quer no
concelho e, quer entre nacionais quer entre estrangeiros;
a tendência para a existência de maiores taxas de retenção entre os
estudantes de nacionalidade estrangeira (duas vezes superior à
registada para os nacionais) é comprovada estatisticamente para todos
os ciclos de ensino;
o sucesso escolar dos alunos estrangeiros nas escolas (AS) é superior
ao registado por este grupo no concelho.
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora, resultantes da análise de variância ANOVA unifactorial.
261
Para o concelho de Lisboa, o valor médio do insucesso dos estrangeiros
quando comparado com o dos nacionais apresenta uma diferença significativa (média
para nacionais = 0,87; média para estrangeiros = 0,79), resultados que são
comprovados estatisticamente pelo T-teste (t(34189) = 12,385, p = 0,000). No concelho
de Lisboa, a distância entre o peso relativo das retenções dos estudantes estrangeiros
face aos nacionais é ligeiramente inferior ao registado anteriormente para Sintra
(12,4% para os nacionais face a 20,4% para os estrangeiros). Contudo, é superior o
peso das retenções, quer entre alunos nativos, quer entre estrangeiros. É no grupo de
estudantes que frequenta o 3º ciclo que ocorrem as taxas de retenção mais elevadas e,
este valor é particularmente significativo para os estrangeiros (30,7%). A tendência
registada até aqui, para a existência de maiores níveis de insucesso entre os alunos
estrangeiros, mantém-se nos agrupamentos do centro de Lisboa. Apesar da média do
insucesso ter valores mais elevados que a globalidade do concelho, entre portugueses
e estrangeiros mantém-se a distância nas médias relativas ao sucesso escolar. Estas
diferenças são comprovadas pela disparidade entre as médias do sucesso de cada
grupo (0,89 para os portugueses e 0,82 para os estrangeiros), valores estatisticamente
confirmados pelo T-teste (t(3644) = 5,176, p = 0,000).
Para os agrupamentos de escolas de Lisboa (AL), as percentagens de
retenção por ciclo não se afastam muito das registadas para a totalidade do concelho.
As ligeiras diferenças que ocorrem no 1º e 2º ciclos são pouco significativas e apenas
no 3º ciclo o afastamento em relação à tendência geral é ligeiramente superior em 2,4
pontos percentuais. A aplicação da análise de variância ANOVA unifactorial para
comparar o sucesso entre as escolas do concelho e as do caso de estudo, permite
identificar que a média no sucesso escolar se mantém (0,87) para os dois grupos.
A análise comparativa do percurso realizado por estrangeiros e nativos, em
cada ciclo de ensino, indica que o afastamento entre os dois grupos relativamente ao
insucesso é muito menor que o registado nas escolas em estudo no concelho de
Sintra. A excepção ocorre no 3º ciclo, onde a taxa de retenção/desistência entre os
estrangeiros é muito mais elevada que a dos nacionais (34,0% face a 18,5%).
Recorrendo à análise de variância ANOVA unifactorial para cada ciclo de ensino, para
a totalidade do grupo e para os dois grupos de origem, desagregada para o concelho e
para os agrupamentos (AL), permite identificar as diferenças no sucesso escolar
ocorrido nos três ciclos de ensino para alunos estrangeiros e nacionais relativamente
ao total do grupo. Importa agora identificar, recorrendo aos testes Post-Hoc, quais são
essas diferenças e quais os grupos e ciclos entre os quais estas se registam.
262
A representação dos resultados na figura IV.18 facilita uma leitura cruzada,
comparando as médias de sucesso obtidas em cada ciclo, em função da origem do
grupo e do território em análise – concelho/agrupamentos (AL). As distâncias referidas
no parágrafo anterior são agora possíveis de visualizar confrontando as médias para
cada grupo e em cada território. Os valores de probabilidade obtidos nos cálculos da
ANOVA são indicativos de que estamos perante diferenças de médias, que são
significativas entre os grupos em comparação (p=0,000). Os estudantes estrangeiros
posicionam-se sempre num nível de sucesso inferior ao dos portugueses e à
tendência geral do grupo, quer no concelho, quer nas escolas (AL). Analisando os
comportamentos registados para os diferentes ciclos de ensino, identificam-se: (i) para
o 1ºCEB médias de sucesso muito próximas entre estrangeiros e portugueses, quer no
concelho, quer nos agrupamentos (AL); (ii) para o 2º CEB os valores médios reduzem-
se, acentuando-se negativamente a diferença no sucesso para os estrangeiros no
concelho de Lisboa mas mantendo-se mais próxima nos agrupamentos (AL); (iii) no 3º
ciclo os valores médios reduzem-se novamente, agora com um afastamento negativo
maior para os estrangeiros e mais acentuado nas escolas dos agrupamentos (AL).
Fig. IV.18 – Perfil do sucesso escolar nos agrupamentos de escolas de Lisboa e no concelho de Lisboa, por ciclo do ensino básico, 2009-10
Traçando um perfil dos estudantes que frequentam as escolas do território de
Lisboa (AL), relativamente às tendências registadas para o concelho, podem apontar-
se três características fundamentais:
Fonte: GEPE, 2009-10. Cálculos da autora, resultantes da análise de variância ANOVA unifactorial.
263
o desempenho escolar vai diminuindo do 1º para o 3º CEB nos dois
territórios, com maiores taxas de retenção entre os estudantes que
frequentam o 3º ciclo, significativamente mais elevadas entre os
estrangeiros;
as percentagens da retenção por ciclo acompanham a tendência
registada para o concelho, com excepção para a população estrangeira
que frequenta o 3º ciclo, onde o afastamento negativo relativamente ao
concelho é superior, diferença comprovada estatisticamente;
o sucesso escolar dos alunos estrangeiros nas escolas (AL) é
tendencialmente inferior ao registado por este grupo no concelho.
Para completar a análise anterior e apresentar uma síntese dos
comportamentos relativamente à variável retenção/conclusão entre concelhos, entre
concelhos e agrupamentos em estudo e entre agrupamentos, socorremo-nos de uma
análise de variância (ANOVA) unifactorial que nos indica existirem diferenças
estatisticamente significativas ao nível do sucesso escolar entre os territórios em
análise, F (3,74969) = 86,5, p = 0,000. O pedido do teste Post-Hoc de Gabriel150 gerou
uma tabela de comparações múltiplas que permite averiguar se existem diferenças
estatisticamente significativas entre cada grupo, concelho ou agrupamento. O grupo
de escolas do concelho de Lisboa apresenta diferenças significativas,151 no sucesso
escolar dos alunos, relativamente ao concelho de Sintra e aos agrupamentos (AS) já
que os valores de significância são de p = 0,015. Entre o concelho de Lisboa e os
agrupamentos (AL) não há diferenças significativas dado que o valor de significância é
de p = 0,880. Repetindo o processo, agora contrastando as escolas do concelho de
Sintra com os agrupamentos (AS) verificamos que a diferença é estatisticamente
significativa, o valor de significância é de p = 0,047. Resumindo, a aplicação do teste
revela que as diferenças estatisticamente significativas ocorrem entre o concelho de
Lisboa e o concelho de Sintra e, entre o Concelho de Lisboa e os agrupamentos (AS).
Já entre os territórios (AL) e o concelho de Lisboa as diferenças não são
estatisticamente significativas, mas entre os agrupamentos (AS) e o concelho de
Sintra registam-se diferenças significativas.
Globalmente, nos territórios em estudo, a percentagem de
retenção/desistência entre os alunos estrangeiros é superior à dos nativos.
150
O teste Post-Hoc de Gabriel adequa-se à comparação entre grupos quando estes não têm o mesmo número de participantes (Martins, 2011, p. 157). 151
As médias das diferenças são significativas para um p inferior a 0,05” (Martins, 2011, p. 158).
264
Comparando os dois concelhos no que se refere ao insucesso escolar, concluímos
que:
os territórios em estudo revelam acompanhar a tendência registada
para os concelhos em que se inserem mantendo, entre a população não
nativa, níveis de insucesso superiores;
em Sintra, são menores as taxas de retenção/desistência relativamente
às registadas para o concelho de Lisboa;
em Lisboa, apesar do registo de maiores taxas de retenção/desistência,
relativamente a Sintra, é menor a distância que separa os estrangeiros
dos nacionais;
as escolas dos agrupamentos de Lisboa (AL) não se distanciam muito,
relativamente ao sucesso escolar, das escolas do concelho;
as escolas dos agrupamentos de Sintra (AS) apresentam diferenças
significativas, no que diz respeito ao sucesso escolar, relativamente ao
conjunto do concelho.
3.3. Orientações na política de integração de alunos imigrantes
Traçado o perfil da população estrangeira que frequenta o conjunto das
escolas dos dois territórios em estudo, importa agora caracterizar cada agrupamento e
as orientações de política que define no sentido do acolhimento da diversidade
sociocultural de alunos e da sua integração. Para desenvolver esta análise socorremo-
nos de dois instrumentos fundamentais, (i) os projectos educativos de agrupamento e,
(ii) os dados estatísticos disponibilizados pelo GEPE para o ano lectivo de 2009-2010.
A identificação das principais características de cada agrupamento em
estudo organiza-se segundo os dois territórios em análise, a saber: Centro Histórico de
Lisboa e a área suburbana de Agualva-Cacém.
3.3.1. Centro Histórico de Lisboa
Os três agrupamentos de escolas localizados no centro de Lisboa (L1, L2 e
L3), incluídos no grupo Centro Litoral, acolhem entre 5,7% e 16,3% de alunos
estrangeiros na sua população escolar (Fig. IV.17A e 17B). Contudo, se apenas
contabilizarmos os alunos que frequentam o Ensino Básico, estes valores assumem
uma dimensão diferente nos agrupamentos que também integram o ensino secundário.
265
No agrupamento L1, 21% dos alunos são de origem estrangeira e, no agrupamento L3,
este valor é de 20,6%.
O Agrupamento L1 tem uma área de influência que se estende por 14
freguesias na área central da cidade e é constituído por cinco edifícios, sendo que
quatro não foram construídos para as funções que hoje desempenham. Com oferta
educativa desde a educação Pré-Escolar ao Ensino Secundário, incluindo um Curso
de Educação e Formação (EFA), três cursos profissionais (nível III); cursos de
Reconhecimento e Validação de Competências (RVCC) e cursos de Educação Extra-
Escolar em horário pós-laboral: “Português para Todos” e “Alfabetização de Adultos”.
Fig. IV.19A – Localização dos agrupamentos em estudo, Lisboa
Fonte: Município de Lisboa. Carta educativa. (Disponível em: http://www.cm-lisboa.pt/fileadmin/VIVER/Educacao/Actividades/Documentos/Carta_educativa/Carta_Educativa_v3.pdf)
266
Fig. IV.19B – Localização dos agrupamentos em estudo, cidade de Lisboa
No quadro IV.6 encontra-se representada a distribuição dos alunos segundo a
origem e os níveis de ensino. Os 1 519 alunos distribuem-se com pesos relativos
diferentes entre os diversos graus de ensino: 85,6% frequenta o ensino básico, 10,5%
o ensino secundário e 3,9% outros cursos do ensino não regular.
Base cartográfica dos edifícios extraída de IGeoE, Carta Militar nº 431, 1:25000. Fonte: Município de Lisboa. Carta educativa. (Disponível em: http://www.cm-lisboa.pt/fileadmin/VIVER/Educacao/Actividades/Documentos/Carta_educativa/Carta_Educativa_v3.pdf).
267
Quadro IV.6 – Origem dos alunos a frequentar o agrupamento de escolas L1,
ano lectivo 2009-2010
Portugueses Estrangeiros Total
nº % nº % Nº %
Ensino Básico 1027 83,5 273 94,5 1300 85,6
Ensino Secundário 150 12,2 10 3,5 160 10,5
Outros Cursos 53 4,3 6 2,1 59 3,9
Total 1230 100,0 289 100,0 1519 100,0
% no total 81,0 19,0 100,0
Fonte: GEPE, 2009-2010. Cálculos da autora.
Os 289 alunos estrangeiros têm um peso relativo de 19% no total da
população escolar e são oriundos de 29 países. A maioria, encontra-se a frequentar o
ensino básico (94,5%) e, neste grupo, as principais regiões de origem são a América
do Sul (49, 3%), em segundo lugar os PALOP (25,2%) e em terceiro lugar países
asiáticos (13,3%), (Fig. IV.20). Os cinco principais países de origem são o Brasil, Cabo
Verde, China, Angola e Ucrânia (Fig. IV.21). O grupo que frequenta o ensino básico
está inscrito maioritariamente no 1º e 3º ciclos, apresentando tendencialmente os
alunos estrangeiros uma média de idades superior à dos alunos nativos, mas que não
chega a um ano de diferença (Quadro IV.7).
Quadro IV.7 – Origem dos alunos no Ensino Básico e média de idades (5-18 anos) no agrupamento de escolas L1, 2009-2010
Os alunos de nacionalidade estrangeira (oriundos de 29 países diferentes)
constituem, aproximadamente, 16% do total (256 alunos), sendo maioritariamente
275
provenientes do Brasil, de países asiáticos e dos PALOP. O ensino básico é
frequentado por 223 dos 256 alunos de origem estrangeira, estes encontram-se em
maior número no 1º e 3º ciclos, 46,6% e 33,6% respectivamente. Entre as diversas
regiões de origem destacam-se a América do Sul (31,4%), a Ásia (25,9%) e África
(25%), em particular os PALOP (Fig. IV.24). Nestas regiões, os principais países de
origem são o Brasil, Bangladesh, Índia, Roménia, Angola e Guiné-Bissau (Fig. IV.25).
Fig. IV.24 – Regiões de origem dos alunos (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas L3, 2009-2010
Fig. IV.25 – Oito principais nacionalidades dos alunos (5-18 anos) a frequentar o Ensino
Básico no agrupamento de escolas L3, 2009-2010
0 5 10 15 20 25 30 35
China
São Tomé e Príncipe
Angola
Guiné-Bissau
Roménia
Índia
Bangladesh
Brasil
%
Fonte: GEPE, 2009-2010. Construção própria.
4,1%
25,0%
31,4%
12,7%
25,9%
0,9%
Europa
Africa
America Sul
Europa Leste+Russia
Asia
America Norte
Fonte: GEPE, 2009-2010. Construção própria.
276
Neste agrupamento de escolas, a composição da população estrangeira, em
função da origem geográfica, assume um padrão diferente dos anteriores: os
quantitativos de alunos oriundos do continente asiático são superiores aos da
população africana, e as crianças e jovens com origem no leste europeu registam um
peso percentual de 12,7%, no conjunto da população imigrante.
Globalmente, os índices de sucesso escolar são baixos no ensino básico,
19,7% dos alunos ficam retidos ou abandonam a escola. Para os alunos portugueses
os valores situam-se em 17,3% e para os estrangeiros em 29,4% (GEPE, 2009-10).
As famílias têm um baixo nível de escolaridade, mais de metade não tem
habilitações superiores ao 3º ciclo (65%) e cerca de 37% não completou o ensino
básico. Em termos profissionais, a maioria das famílias desempenha actividades
pouco qualificadas, existindo situações de desemprego e de alguma precariedade.
Estas situações reflectem-se nas escolas, sendo visíveis pelo número de alunos
subsidiados pelas Acção Social Escolar, 52% dos alunos que frequentam o 2º e 3º
ciclos, percentagem que sobe para aproximadamente 60% ou 65% no pré-escolar e
1.º ciclo. Dos alunos subsidiados, a maioria está abrangida pelo escalão mais elevado,
o que denota as grandes fragilidades económicas do agregado familiar (PE, 2010-
2013).
No projecto educativo do agrupamento são definidas como grandes
finalidades, (i) o acolhimento de todas as crianças e jovens; (ii) a promoção de um
ensino de qualidade; (iii) a garantia de boas condições de trabalho, estudo e convívio e,
(iv) a articulação com a comunidade envolvente. A integração dos alunos estrangeiros
surge como uma das prioridades da primeira grande finalidade definindo-se, para tal,
um conjunto de objectivos centrados em quatro eixos de intervenção: a aprendizagem
da língua portuguesa; a divulgação de hábitos tradições e culturas; o
acompanhamento tutorial feito pelos pares e com recurso a instituições exteriores e a
articulação escola-família.
Tal como nos agrupamentos anteriores, é evidente a preocupação em
encontrar respostas adequadas às características da comunidade escolar, combater o
absentismo e insucesso e reduzir as situações de exclusão social que podem ser
agravadas a partir da escola. Contudo, no documento do PE não se definem as
estratégias de operacionalização dos objectivos anteriormente definidos não nos
sendo possível analisar os procedimentos inerentes à implementação das intenções
definidas.
Em síntese, os agrupamentos da área central de Lisboa acolhem entre a
população escolar que frequenta o ensino básico regular cerca de 20% de alunos
estrangeiros de origens diversas, brasileiros, africanos, asiáticos e europeus de leste,
277
convivem diariamente nas salas de aula com a população nativa. Estes alunos,
distribuem-se de forma diferente entre os três agrupamentos, sendo maioritariamente
de origem brasileira. Em algumas escolas, os alunos de origem asiática têm um peso
significativo relativamente às restantes origens, um traço particular das escolas
localizadas neste território central da cidade. A análise da média de idades destes
estudantes revela que tendencialmente são mais velhos que os colegas autóctones
ainda assim, esta diferença é mais acentuada no 2º e 3º ciclos.
Localizados em territórios com evidentes fragilidades sociais e económicas,
associados a uma população com baixo grau de instrução que desenvolve actividades
profissionais pouco qualificadas e com baixos salários, estes agrupamentos de
escolas caracterizam-se por um conjunto de aspectos comuns: (i) taxas de insucesso
e abandono escolar elevadas; (ii) reduzidas expectativas relativamente à escola por
parte de algumas famílias; (iii) escassa interacção escola-família e, (iv) articulação
entre a escola e a comunidade envolvente ainda incipiente. As situações de exclusão
social são comuns a todos os diagnósticos apresentados nos projectos educativos.
Nos projectos educativos é valorizada a intenção de acolhimento de todos os
alunos, comprometendo-se a escola com a sua integração e garantia de sucesso
escolar. É evidente, em alguns PE, o assumir dos alunos estrangeiros como parte
integrante da comunidade escolar, deste modo, as questões relativas à sua integração
surgem contempladas nos princípios que orientam a política geral de agrupamento e,
tal como as restantes preocupações com a inclusão da comunidade escolar em geral,
são evidentes nas estratégias de intervenção que definem. Para outros projectos, a
aposta na integração dos alunos estrangeiros surge associada à gestão do processo
de ensino e aprendizagem, operacionalizando-se através da disponibilização de
actividades complementares de aprendizagem da língua portuguesa e de apoio em
algumas áreas disciplinares/disciplinas.
A valorização das diferentes culturas e a sua mobilização numa
aprendizagem conjunta da diversidade, promotora de laços sociais e de uma cidadania
plural, na perspectiva defendida por Banks (2004, 2011, 2012) é ainda um percurso
pouco evidente nas estratégias que asseguram a operacionalização da política
educativa nos agrupamentos referidos. Estas surgem muito centradas na
aprendizagem efectiva dos conteúdos programáticos e, no que diz respeito aos alunos
estrangeiros, na garantia de um apoio na aprendizagem da língua portuguesa que lhes
assegure a construção do conhecimento em outras áreas do saber.
278
3.3.2. Concelho de Sintra
No concelho de Sintra, as escolas incluídas no estudo organizam-se em dois
agrupamentos localizados nas freguesias de Monte Abraão (S1), Agualva e Cacém
(S2) (Fig. IV.26A e B). A população estrangeira que frequenta estes agrupamentos de
escolas tem, no conjunto dos estudantes, um peso de 18,4% em Monte Abraão e de
21,9% em Agualva-Cacém. Comparando com os agrupamentos do centro de Lisboa, o
peso relativo dos alunos estrangeiros no total da população escolar é semelhante.
Fig. IV.26A – Localização dos agrupamentos em estudo, concelho de Sintra
Fonte: Município de Sintra. Carta educativa. (Disponível em: https://docs.google.com/folder/d/0B9tWQWfnmmAVM2RlYzJmMzMtZDYxNS00MDU1LTk3NjgtNTM1Y2VjMDBmZmZj/edit?usp=drive_web&pli=1&hl=pt_PT#)
279
Fig. IV.26B – Localização dos agrupamentos em estudo, concelho de Sintra
O Agrupamento S1 tem uma área de influência que se estende
fundamentalmente pela freguesia de Monte Abraão, é constituído por três escolas,
duas que acolhem o Pré-escolar e o 1º ciclo e a terceira, escola sede, que acolhe o 2º
e 3º ciclos. O agrupamento é parceiro num projecto do Programa Escolhas, da
responsabilidade da Junta de Freguesia. A Fundação Aga Khan, através do programa
K‟CIDADE (programa de desenvolvimento comunitário urbano) assegura também
alguns espaços de ATL numa das escolas de 1º ciclo.
A oferta educativa do agrupamento inclui a educação Pré-Escolar e o Ensino
Básico, Cursos de Educação e Formação (EFA) e cursos de Educação Extra-Escolar
em horário pós-laboral: “Português para Todos” e “Alfabetização de Adultos”.
No quadro IV.12 encontra-se representada a distribuição dos alunos segundo
a origem e os níveis de ensino. Os 1 730 alunos distribuem-se com pesos relativos
Base cartográfica dos edifícios extraída de IGeoE, Carta Militar nº 431, 1:25000 Fonte: Município de Sintra. Carta educativa. (Disponível em: https://docs.google.com/folder/d/0B9tWQWfnmmAVM2RlYzJmMzMtZDYxNS00MDU1LTk3NjgtNTM1Y2VjMDBmZmZj/edit?usp=drive_web&pli=1&hl=pt_PT#)
280
muito diferentes nas diversas modalidades de ensino: 96,0% frequenta o ensino
básico regular e 4,0% outros cursos do ensino não regular.
Quadro IV.12 – Origem dos alunos a frequentar o agrupamento de escolas S1, ano lectivo 2009-2010
Portugueses Estrangeiros Total
nº % nº % Nº %
Ensino Básico 1384 83,4 276 16,6 1660 96,0
Outros Cursos 27 38,6 43 61,4 70 4,0
Total 1411 319 1730
% no total 81,6 18,4 100,0
Fonte: GEPE, 2009-2010. Cálculos da autora.
Os 285 alunos estrangeiros, com idades entre 5 e 18 anos, constituem 17%
do total da população escolar inscrita no ensino básico regular, sendo oriundos de 18
países. A população estrangeira é proveniente de países africanos (75,5%), em
particular dos PALOP, da América do Sul (17,3%), nomeadamente do Brasil. Na
terceira posição surgem os alunos com origem em países do leste europeu (3,9%),
seguidos dos provenientes do continente asiático (2%), (Fig. IV.27). As cinco principais
nacionalidades dos alunos estrangeiros são a Guiné-Bissau, Angola, Brasil, Cabo
Verde e S. Tomé e Príncipe (Fig. IV.28). O grupo de alunos que frequenta o ensino
básico regular está inscrito maioritariamente no 1º ciclo, seguindo-se o 2º e 3º ciclos.
Os alunos estrangeiros distribuem-se pelos três ciclos segundo o mesmo padrão dos
alunos nativos, mantendo-se a diferença no que respeita à média de idades entre os
dois grupos (Quadro IV.13).
Quadro IV. 13 – Origem dos alunos no Ensino Básico e média de idades (5-18 anos) no agrupamento de escolas S1, 2009-2010
Fig. IV.27 – Regiões de origem dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico regular no agrupamento de escolas S1, 2009-2010
Fig. IV.28 – Oito principais nacionalidades dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico regular no agrupamento de escolas S1, 2009-2010
As habilitações académicas dos encarregados de educação oscilam entre o
2º e 3º ciclos, cerca de 2/3 têm apenas a escolaridade obrigatória. As profissões que
desempenham situam-se maioritariamente nos grupos dos profissionais de comércio e
serviços e dos operários. Coexistem, entre as famílias, muitas situações de
precariedade no emprego que têm repercussões, segundo o projecto do agrupamento,
no acompanhamento que fazem dos seus educandos quer no que se reporta às
75,5%
17,3%
3,9%
0,0%
1,3%2,0%
Europa
Africa
America Sul
Europa Leste+Russia
Asia
America Norte
Fonte: GEPE, 2009-2010. Construção própria.
0 5 10 15 20 25 30
Guiné-Conacri
Paquistão
Senegal
Ucrânia
São Tomé e Príncipe
Cabo Verde
Brasil
Angola
Guiné-Bissau
%
Fonte: GEPE, 2009-2010. Construção própria.
282
actividades escolares, quer nas suas actividades extra lectivas (PE, 2010-13).155 Pelas
características do território e da população escolar que serve, o agrupamento
candidatou-se ao programa Territórios Educativos de Intervenção Prioritária 2
(TEIP2),156 integrando este programa desde 2009-10.
As taxas de insucesso e abandono escolar situam-se, no ano lectivo de 2009-
10 em 9,5% no ensino básico regular (GEPE, 2009-10), revelando um número
significativo de alunos, pouco interesse em relação à escola e às aprendizagens e
problemas de indisciplina em contexto de sala de aula, situações agravadas por
alguma ausência das famílias neste processo. Para os alunos imigrantes os valores do
insucesso e abandono escolar atingem 12%, 4 pontos percentuais acima dos obtidos
pelos alunos autóctones.
O agrupamento reconhece, no diagnóstico que faz da comunidade, uma
grande heterogeneidade social e cultural. Com base neste diagnóstico, assumindo a
importância de uma escola que tenha na sua missão acolher todos, o agrupamento
privilegia a sua intervenção no sentido de contribuir para o desenvolvimento do espírito
crítico e criativo, valorizando “as diferentes ideias e vivências, a livre troca de opiniões,
formando jovens capazes de viverem bem integrados socialmente e que, ao mesmo
tempo, possam empenhar-se na sua transformação progressiva.” (PE, 2010-2013, p.7).
Na fundamentação legal das suas opções de política o agrupamento mobiliza o artigo
2º da Lei de Bases do Sistema Educativo que define, para o país, um sistema
educativo que responda “às necessidades resultantes da realidade social, contribuindo
para o desenvolvimento pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos,
incentivando a formação de cidadãos livres, responsáveis, autónomos e solidários e
valorizando a dimensão humana do trabalho.” (Lei de Bases do Sistema Educativo,
artigo 2.º, ponto 4.º), promotor de um modelo educativo que sustente “o
desenvolvimento do espírito democrático e pluralista respeitador dos outros e das suas
ideias, aberto ao diálogo e à livre troca de opiniões, formando cidadãos capazes de
julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de se
empenharem na sua transformação progressiva. “ (Lei de Bases do Sistema Educativo,
artigo 2.º, ponto 5.º).
Para ir ao encontro dos princípios defendidos, são propostas como principais
áreas de intervenção i) o abandono e insucesso escolares; ii) o envolvimento da
comunidade educativa na vida escolar e, iii) a garantia de condições de segurança e
requalificação dos espaços escolares. Transversal a estes eixos orientadores é a
valorização da diversidade cultural que caracteriza a comunidade educativa. Neste
Aproximadamente 21% dos alunos, com idades entre os 5 e 18 anos que
frequentam o ensino básico regular, são estrangeiros com 19 nacionalidades
diferentes: a maioria é oriunda de países africanos (71,8%); com quantitativos mais
reduzidos surgem, em segundo lugar, os alunos oriundos da América do Sul (15,5%),
exclusivamente do Brasil, o terceiro grupo mais numeroso é proveniente da Europa de
285
Leste (10,6%), (Fig IV.29). As principais cinco nacionalidades são: Cabo Verde,
Angola, Brasil, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe (Fig. IV.30).
Fig. IV. 29 – Regiões de origem dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico no agrupamento de escolas S2, 2009-2010
Fig. IV.30 – Oito principais nacionalidades dos alunos estrangeiros (5-18 anos) a frequentar o Ensino Básico regular no agrupamento de escolas S2, 2009-2010
Entre a população escolar que frequenta o ensino básico, as taxas de
insucesso/desistência são de 9,5%. Este valor é um pouco mais reduzido para os
alunos portugueses (7,7%), mas muito mais elevado entre os alunos estrangeiros
(16,1%), (GEPE, 2009-10).
71,8%
15,5%
10,6%1,3%
0,6%
0,2%
Europa
Africa
America Sul
Europa Leste+Russia
Asia
America Norte
Fonte: GEPE, 2009-2010. Construção própria.
0 5 10 15 20 25 30 35
Roménia
Moldávia
Ucrânia
São Tomé e Príncipe
Guiné-Bissau
Brasil
Angola
Cabo Verde
%
Fonte: GEPE, 2009-2010. Construção própria.
286
As famílias dos alunos que frequentam o agrupamento revelam grande
heterogeneidade em termos culturais e sociais. Segundo o Projecto Educativo157 as
origens são diversas, apenas 62% dos pais têm nacionalidade portuguesa,
distribuindo-se os principais grupos de estrangeiros por três nacionalidades: cabo-
verdiana, angolana e guineense. As habilitações escolares da maioria dos pais não
ultrapassam o ensino básico, com um percurso profissional em sectores pouco
qualificados. As situações de desemprego e de contratos precários são frequentes
entre as famílias (PE, 2010-2013).
O agrupamento define no seu PE a aposta na construção de uma Escola
Para Todos, neste sentido tem vindo a “alargar o âmbito da acção da escola,
mobilizando e interagindo com os recursos disponíveis e a disponibilizar, exigindo uma
dinâmica em que todos os professores, técnicos da comunidade escolar local e pais se
envolvam, mobilizados e responsabilizados. ” (PE, 2010-2013, p. 28). Os princípios
que orientam a sua acção pautam-se por (i) respeitar a crescente interdependência e
solidariedade entre todos os povos do mundo; (ii) contribuir para a realização
individual através do desenvolvimento da personalidade, da formação do carácter e da
cidadania, preparando-o para uma reflexão consciente sobre os valores espirituais,
estéticos, morais e cívicos e proporcionando-lhe um equilibrado desenvolvimento
físico; (iii) assegurar o direito à diferença, respeitando as personalidades e os
projectos de vida, bem como a consideração e valorização dos diferentes saberes e
culturas e, (iv) contribuir para a realização pessoal e comunitária dos indivíduos,
fomentando a autonomia na aprendizagem e a ocupação dos tempos livres.
As concepções apresentadas de escola e de aluno, sustentam as orientações
que caracterizam a política de acção deste agrupamento. A escola é entendida como
uma “Instituição complexa, sujeita a constantes e significativas mudanças, que
interage com factores sociais como a pobreza, a exclusão social e a intolerância.
Sistema social e dinâmico onde as variedades linguísticas e culturais são marcas das
alterações da sociedade portuguesa actual. Espaço de referência de toda a
comunidade, acolhe afectivamente as suas diferenças, ensinando a respeitar as
assimetrias que inevitavelmente coexistem.” (PE, 2010-2013, p. 31). O aluno é
definido “como uma criança ou jovem com potencialidades e características próprias,
cuja realidade e experiência são valorizadas como campos de conhecimento a alargar
progressivamente. Emerge de contextos sociais, culturais e económicos diferenciados,
com um percurso singular de vida, com um ritmo próprio da aprendizagem, com
diferentes interesses, expectativas e necessidades.” (PE, 2010-2013, p. 32).
157
Projecto Educativo de Agrupamento disponível em: http://www.agrupamentoantoniosergio.pt/docs/docs_oficiais_10_11/pe/pe_2010_2011.pdf
287
O respeito pela diversidade e valorização da inclusão são transversais a
todas as dimensões do PE, assim como a importância da articulação com a
comunidade e com a família. As linhas orientadoras da acção do agrupamento
privilegiam a promoção da qualidade do sucesso educativo e a formação cívica. Para
tal surgem reforçados os objectivos que têm norteado a política de escola e que se
têm centrado (i) na valorização das manifestações diversas de cultura no espaço
escolar; (ii) no desenvolvimento de actividades abertas ao meio, mobilizando-o como
recurso educativo e aumentando os níveis de participação da comunidade na vida da
escola e, (iii) no envolvimento em projectos nacionais e internacionais centrados na
temática da inclusão e multiculturalidade. No sentido da construção de uma escola
inclusiva, atendendo à diversidade sociocultural, são propostas como acções de
melhoria das práticas e de operacionalização do PE, a construção/reforço dos laços de
pertença, a prevenção de comportamentos de risco e exclusão social e o
desenvolvimento de projectos de educação intercultural.
Em síntese, os agrupamentos que constituem o caso de estudo no concelho
de Sintra acolhem entre a população escolar que frequenta o ensino básico regular
cerca de 19% de alunos estrangeiros de origens diversas, em particular, africanos,
brasileiros, e europeus de leste. A população com origem nos PALOP tem um peso
muito importante no conjunto da população estrangeira, sobretudo as nacionalidades
cabo-verdiana, guineense e angolana.
As principais fragilidades identificadas entre os alunos situam-se ao nível do
insucesso e abandono escolar e das situações de exclusão social em que se
encontram muitas crianças, jovens e respectivas famílias. Estas famílias possuem, na
generalidade, níveis de instrução muito baixos, a maioria não vai além do ensino
básico, desenvolvendo actividades profissionais pouco qualificadas e por vezes em
situações de alguma precariedade contratual.
Os PE dos agrupamentos, orientam a sua política de modo a atenuar/reduzir
as barreiras que condicionam a participação e aprendizagem de todos os alunos,
independentemente das suas origens socioculturais. Apesar de seguirem orientações
diferentes, porque as prioridades de intervenção que identificam não se situam ao
mesmo nível, a diversidade que caracteriza os contextos territoriais em que se inserem
é assumida, nas propostas que elaboram. O agrupamento S1, confrontado com um
conjunto de problemas associados ao abandono e insucesso escolar e a questões de
segurança em meio escolar, define as suas estratégias de intervenção centradas
nestes problemas, que são comuns à comunidade educativa em geral,
independentemente das suas origens. No agrupamento S2, onde alguns dos
problemas anteriores já foram sendo atenuados, as orientações definidas no PE
288
perspectivam um investimento na diversidade cultural, na valorização das culturas, na
abertura da escola ao meio e na colaboração em projectos de educação intercultural.
Neste sentido é também privilegiada a formação do corpo docente para responder à
diversidade de alunos, através da participação em encontros nacionais e
internacionais. Tal como nos PE analisados para os agrupamentos do centro de
Lisboa, identificamos nestes projectos diferentes níveis de abordagem à diversidade,
resultado das problemáticas que se vivem diariamente na escola, mas também das
concepções sobre os modos de operacionalização da inclusão em contextos
educativos.
A comparação dos agrupamentos localizados nos dois territórios em estudo,
Lisboa e Sintra, relativamente às orientações da respectiva política de integração não
nos permite identificar um perfil que os individualize. As particularidades que
identificamos resultam antes das especificidades dos contextos territoriais em que
cada agrupamento se insere e das opções de política dos órgãos de governo que os
constituem. Na construção dos projectos analisados foram utilizadas diferentes lógicas
de abordagem à integração da população imigrante, que poderemos sintetizar em três
perspectivas, i) os alunos estrangeiros são entendidos como parte integrante de uma
comunidade que se caracteriza pela diversidade cultural e, desta forma, os objectivos
e estratégias definidos não individualizam especificidades no seu processo de
integração, diluem-se no conjunto da intervenção definida para a comunidade escolar;
ii) os alunos estrangeiros são entendidos como um grupo com características
particulares, definindo-se um conjunto de objectivos específicos de resposta à sua
integração, transmitindo a ideia de que se trata de um processo que funciona à parte
do restante processo de ensino e aprendizagem e, iii) os alunos estrangeiros são
assumidos como parte integrante da comunidade, que é diversa em termos culturais e
sociais, desenvolvendo-se todo o projecto em torno de linhas orientadoras que se
sustentam nesta diversidade.
As orientações de política nacional para a integração de alunos estrangeiros
são comuns a todos os projectos, principalmente ao nível da operacionalização de
alguns objectivos que definem. Situam-se neste nível, as estratégias de aprendizagem
da língua portuguesa e o desenvolvimento de actividades de complemento curricular.
Contudo, são pouco frequentes ou quase inexistentes, as estratégias de valorização
da diversidade cultural e mobilização da mesma em contexto de aprendizagem,
sustentadas numa lógica de flexibilização curricular que é preconizada nos
documentos oficiais. Um outro aspecto que resulta da análise dos projectos educativos,
é a tomada de consciência da necessidade de maior abertura da escola à comunidade
289
escolar, de maior envolvimento dos pais na escola e de estabelecimento de parcerias
com instituições locais. Também a articulação entre o sistema de educação formal e
os projectos de educação não formal, no sentido da inclusão da população escolar,
surge contemplado nas orientações definidas, sendo uma prática em três dos
agrupamentos, em particular através das parcerias estabelecidas com os projectos do
Programa Escolhas.
Pensar a escola hoje, abrindo-a a todos, implica necessariamente a tomada
de decisões em contextos de diversidade, assegurando a convivência entre diferentes
culturas e a construção de uma cidadania plural perspectivada na transição da cultura
para a multicultura (Carneiro, 2001). Para as crianças e jovens oriundos de diferentes
culturas, a escola é, por excelência, o palco onde diariamente se cruza a pluralidade
de saberes, princípios, valores e atitudes que é importante saber valorizar no convívio
entre diferentes. É, portanto, na construção deste tecido social plural e complexo que
se joga um dos papéis fundamentais da escola: a formação integral dos indivíduos,
assegurando-lhes a possibilidade de se inserirem na sociedade e dela fazerem parte
como cidadãos ativos e interventivos (Perrenoud, 2001). Pensar a educação, num
palco de diversidades, significa ajudar os estudantes a construir o seu conhecimento,
a desenvolver a sua identificação com os grupos culturais de pertença, garantindo, ao
memo tempo, a sua formação no âmbito de uma cidadania global integradora de uma
complexa teia de relações vividas à escala nacional, regional e local ou, na óptica de
Kymlicka formar cidadãos portadores de uma “cidadania multicultural” (Banks, 2011, p.
244). As sucessivas conferências do Conselho da Europa, realizadas no âmbito da
temática das migrações e integração, têm-nos confrontado com recomendações que
valorizam o papel da escola na inclusão social das populações migrantes
nomeadamente: i) na sensibilização dos alunos para as diferenças culturais; ii) na
promoção das relações intracomunitárias; iii) na manutenção do bem-estar social nas
sociedades pluriculturais contemporâneas e, iv) na luta contra o racismo e xenofobia.
A consciencialização de que a escola se deve abrir à comunidade e o
investimento revelado no desenvolvimento de estratégias nesse sentido, poderão
desencadear, nas escolas dos agrupamentos em estudo, um importante salto
qualitativo no sentido do acolhimento dos seus estudantes. “O conhecimento das
realidades locais, das relações institucionais entre os grupos ou subgrupos da
comunidade, das interdependências entre recém-chegados e habitantes locais, assim
como da diversidade de iniciativas levadas a cabo pelos actores para contrariar ou
potencializar as oportunidades apresentadas pelo exterior, revelam-se fundamentais
na construção de uma cidade multicultural” (Hortas, 2010, p. 2).
290
Temos vindo a defender que é ao nível local que a escola pública é
confrontada com a imigração e desafiada para a construção e coordenação de
políticas e estratégias promotoras da integração dos recém-chegados. A valorização
da abertura ao exterior numa óptica ampla das relações locais, incluindo outras
instituições na concepção e implementação de projectos educativos é, cada vez mais,
uma condição de sucesso da missão a que a escola se propõe. A este respeito, a
União Europeia tem sugerido aos governos locais e instituições não-governamentais
um trabalho multidisciplinar, sustentado numa abordagem crítica a partir de diferentes
paradigmas, que inclua a diversidade nos programas e sistemas de ensino formais e
não formais, na definição de políticas escolares mais inclusivas, promotoras de laços,
de diálogo, de conhecimento e de descoberta da diversidade. Estas medidas,
desencadeadas a partir da escola em conjunto com outras instituições, permitirão dar
um passo mais à frente na condução e promoção do diálogo entre migrantes e
sociedade de acolhimento (nomeadamente ao nível local), proporcionando os meios
para uma participação activa no processo de integração, quer dos recém-chegados,
quer dos que já residem no território há alguns anos. Reforçando a base comunitária e
as redes de proximidade, através do estabelecimento de parcerias com órgãos das
autarquias e organizações locais, a escola pode assumir-se como uma instituição
estruturante na concepção e implementação de políticas locais intersectoriais, em
particular as que sustentam a integração da população imigrante.
A Declaração de Istambul (2008), a que nos referimos na parte II deste
estudo, reforça os pressupostos anteriores, ao sublinhar a importância do
envolvimento das escolas e restantes instituições locais no processo de integração
dos imigrantes, mobilizando a participação de todos os grupos nas tomadas de
decisão. Instituições públicas, privadas e da sociedade civil que, ao nível local, actuam
na construção dos quadros de vida das populações devem organizar-se de forma
concertada para uma actuação local nos domínios da educação e formação, na
construção de políticas que valorizem a importância estratégica da educação na
construção da integração.
291
4. Escolas, alunos e famílias: imagens e percursos de integração
Retomamos, para a análise que pretendemos elaborar à escala micro, o
conceito de integração anteriormente definido, aplicado agora na exploração das
dinâmicas vividas na escola no sentido da inclusão dos alunos imigrantes. Um
processo dinâmico e heterogéneo que se constrói na interacção entre os imigrantes e
as instituições da sociedade de acolhimento e se desenvolve em três dimensões
articuladas entre si, que temos vindo a desenvolver: relacional, temporal e espacial.
Sustentada na definição apresentada, a análise da informação empírica
estrutura-se em torno dos dois pilares da integração: um deles, constituído por alunos
e respectivas famílias; um outro, formado pela escola (política de escola) e
professores. O papel desempenhado por cada um dos actores, no sentido da
integração, é analisado a partir de um conjunto de variáveis recolhidas nos
questionários aplicados aos alunos, famílias, directores de agrupamento e professores.
Num primeiro momento caracterizamos as amostras de inquiridos (alunos e
famílias); num segundo momento, apresentamos uma análise exploratória dos
resultados obtidos, para os alunos e respectivas famílias, escola e professores, no
sentido de caracterizar o processo de integração nas três dimensões em que este se
desenrola. A informação empírica, de natureza quantitativa e qualitativa, recolhida a
partir de quatro instrumentos diferentes, será analisada de forma articulada no sentido
de compreender o fenómeno na sua totalidade, a partir daqueles que definimos serem
os principais intervenientes.
4.1. Os questionários aos alunos
Na primeira parte deste estudo foi apresentada a estrutura do questionário
aplicado aos alunos e especificados os objectivos que sustentaram a sua construção.
Subjacente à definição das questões que o compõem esteve o conceito de integração
e as três dimensões já identificadas.
Iniciamos este ponto com a caracterização geral dos alunos inquiridos,
imigrantes e nativos, nos aspectos relativos à origem geográfica (naturalidade e
nacionalidade), idade, género e tempo de permanência no país. Associada à
apresentação dos alunos surge a composição étnica das famílias, estrutura familiar e
perfil socioeconómico, caracterizados a partir da informação relativa às origens
geográficas (naturalidade e nacionalidade), estrutura etária, número de agregados
familiares em que só está presente um adulto, situação perante o trabalho, grupos
profissionais e nível de instrução.
292
A partir do cruzamento das origens geográficas dos progenitores com a
naturalidade dos descendentes é possível identificar, no grupo de inquiridos, os
descendentes de primeira e segunda geração.
Dos questionários aplicados aos alunos, foram validados 1 360. Destes, 497
foram preenchidos por alunos a frequentar o 4º ano, 627 por alunos do 6º ano e 236
por alunos do 9º ano. O ano de escolaridade com maior número de representantes é o
6º ano (46,1%), seguido do 4º ano (36,6%) e do 9º ano (17,3%).
4.1.1. Perfil geral dos alunos inquiridos
O maior grupo de alunos inquirido é natural de Portugal (81,7%), sendo os
restantes 18,3% oriundos de diversos países, num total de 256. As principais regiões
de origem dos estudantes não nativos são África, América do Sul e Europa de Leste e
Rússia, de onde são naturais respectivamente 46,5%, 28,5% e 13,7% dos estudantes
que frequentam as escolas dos agrupamentos em estudo. O Brasil é o país de origem
do grupo de estrangeiros mais numeroso (68 alunos); o segundo grupo, é oriundo de
Cabo Verde (44 alunos) e o terceiro de Angola (34 alunos). Na quarta posição surgem
os naturais da Guiné-Bissau (30 alunos) e, em quinto e sexto lugares, mas com um
número de indivíduos já muito reduzido relativamente aos anteriores, posicionam-se
os grupos provenientes da Ucrânia e da Roménia (12 e 9 elementos respectivamente).
Nestes seis países concentram-se cerca de 80 % dos alunos nascidos no estrangeiro.
A organização do grupo de alunos em função da naturalidade dos pais
permite identificar aqueles que, apesar de terem nascido em Portugal e estarem
referenciados como cidadãos nacionais na amostra, são descendentes de imigrantes
(324 indivíduos). Este grupo constitui a segunda geração de imigrantes, que integra o
presente estudo, que no conjunto da amostra estão representados em número
significativo, em particular nos territórios que acolhem populações imigrantes há mais
tempo. Para este grupo, as principais regiões de origem mantêm-se na sequência
anterior, surgindo muito reforçado o peso dos países africanos, em particular dos
PALOP. Assim, constituem a 2ª geração, 81,8% de alunos de origem africana, 7,7%
oriundos da U.E.(15), 7,4% vindos da América do Sul. As regiões que mais
recentemente incorporaram os fluxos migratórios com destino a Portugal – Ásia e
Europa de Leste e Rússia – vêem reduzido o seu peso relativo neste grupo por ainda
ser diminuto o número de descendentes que já nasceram em território nacional
(Quadro IV.16).
293
Angola, Cabo Verde, Brasil, Guiné-Bissau e Moçambique situam-se agora
entre os cinco principais países de origem dos alunos imigrantes, com 438 dos 580
alunos com naturalidade num país estrangeiro. As comunidades oriundas de África
têm uma presença mais prolongada em território nacional facto que justifica o elevado
número de descendentes; por outro lado, a posição do Brasil é justificada pela entrada,
em território nacional, desde finais dos anos 90, da segunda vaga de cidadãos
oriundos deste país. O número de alunos imigrantes (primeira e segunda geração)
totaliza 580.
Assim, no conjunto da amostra, estes 580 imigrantes (primeira e a segunda
geração) representam 42,6% do total de alunos, mas a sua presença nos dois
territórios tem um peso diferente: 43,4% frequentam as escolas de Lisboa e os
restantes (56,6%) frequentam as escolas de Sintra.
É também relevante assinalar a percentagem de alunos imigrantes de
segunda geração. Face ao total de alunos (580), estes representam 58%, mas em
relação ao seu peso relativo em cada território também existe uma pequena variação,
na medida em que, em Sintra, num total de 328 alunos imigrantes, cerca de 59% são
de segunda geração, enquanto em Lisboa, num total de 252 alunos, a percentagem
situa-se nos 52%.
No que se refere à distribuição das duas gerações de alunos imigrantes pelos
ciclos de ensino em cada território, observa-se o seguinte: em Lisboa, ao equilíbrio
entre o número de alunos de primeira (121) e segunda geração (131) corresponde
uma distribuição similar pelos ciclos de ensino; em Sintra, as diferenças a assinalar
centram-se no 4º e 6º anos de escolaridade, pelo maior número de alunos de 2ª
geração, respectivamente 79 e 90 crianças. Todavia, este aumento traduz-se num
maior equilíbrio entre estes dois anos de escolaridade, nos alunos de segunda
geração, que se traduz nas percentagens de 40,9% no 4º ano e 46,6% no 6º ano
(Quadro IV.17). O maior peso dos alunos imigrantes de segunda geração em Sintra
Quadro IV.16 – Origem dos alunos inquiridos, 1ª e 2ª geração
Regiões Total %
1ªG 2ªG 1ªG 2ªG
África 119 265 46,5 81,8
América Sul 73 24 28,5 7,4
EU leste+Rússia 35 2 13,7 0,6
U.E. (15) 14 25 5,5 7,7
Ásia 13 7 5,1 2,2
América Norte 2 1 0,8 0,3
TOTAL 256 324 100,0 100,0
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
294
pode ser reflexo de uma imigração mais prolongada no tempo, o que é frequente entre
os imigrantes oriundos dos PALOP, que são maioritários neste território.
Entre as famílias dos alunos imigrantes, em 29,3% dos casos ambos os pais
são naturais de países estrangeiros, em 7,2% o pai nasceu num país estrangeiro e a
mãe é portuguesa e em 6,1% dos agregados familiares o pai é natural de Portugal e a
mãe de um país estrangeiro. As famílias mistas são mais frequentes entre
portugueses e africanos ou brasileiros, ou entre africanos com diferentes naturalidades.
A análise cruzada das nacionalidades e naturalidades evidencia que há um
grupo de sessenta e cinco alunos que, apesar de ter nascido no estrangeiro, tem
nacionalidade portuguesa. Tal facto regista-se fundamentalmente entre os
provenientes de Angola, Cabo Verde e Brasil (39 alunos no total). O número de
crianças e jovens com dupla nacionalidade é muito reduzido neste conjunto, apenas
doze do total de inquiridos.
No grupo de alunos imigrantes que não nasceu em Portugal (44,1%), 11,8%
chegou há menos de um ano (tendo por referência o ano de 2009), 47,1% reside em
Portugal desde 2004, 32,8% chegou ao país há um período entre 5 a 10 anos e 8,4%
é residente há mais de dez anos em território nacional. Entre os alunos que se
encontram há menos de um ano no país, cerca de 43% são de origem brasileira e
21,4% são oriundos de Cabo Verde. Esta tendência mantém-se para aqueles que
chegaram há 2/3 anos e 3/5 anos. A análise desagregada pelos seis principais países
de origem dos alunos (Brasil, Cabo Verde, Angola, Guiné-Bissau, Ucrânia e Roménia)
evidencia, com excepção para os que são oriundos de Angola, que cerca de 60%
destes estudantes se encontra em Portugal há menos de cinco anos.
Os alunos inquiridos têm idades compreendidas entre os 9 e os 18 anos: os
que frequentam o 4º ano situam-se, maioritariamente, entre os 9 e os 10 anos (91,3%),
Quadro IV.17 – 1ª e 2ª geração de imigrantes, por ano de escolaridade e território
Geração Lisboa Sintra
nº % nº %
1ª
4º ano 55 45,5 44 32,6
6º ano 56 46,3 74 54,8
9º ano 10 8,3 17 12,6
sub-total 121 100,0 135 100,0
2ª
4º ano 53 40,5 79 40,9
6º ano 63 48,1 90 46,6
9º ano 15 11,5 24 12,4
sub-total 131 100,0 193 100,0
TOTAL 252 328
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
295
os que se encontram no 6º ano têm entre 11 e 12 anos (72,2%) e, entre os que
frequentam o 9º ano, 74,1% têm entre 13 e 14 anos de idade, (Quadro IV. 18).
Quadro IV. 18 – Idade dos alunos inquiridos, por ano de escolaridade
idades 4º ano 6º ano 9º ano Total
nº % nº % nº % nº %
9 219 44,4 219 16,2
10 231 46,9 2 0,3 233 17,3
11 27 5,5 205 32,8 232 17,2
12 9 1,8 246 39,4 1 0,4 256 19,0
13 5 1,0 93 14,9 1 0,4 99 7,3
14 1 0,2 54 8,6 74 31,9 129 9,6
15 1 0,2 17 2,7 97 41,8 115 8,5
16 6 1,0 39 16,8 45 3,3
17 2 0,3 18 7,8 20 1,5
18 2 0,9 2 0,1
Total 493 100,0 625 100,0 232 100,0 1350 100,0
n.r. 4 2 4
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
A análise desagregada, em função das regiões de naturalidade dos alunos,
revela que tendencialmente os não nativos são mais velhos, sendo superior o peso
relativo dos estudantes que já ultrapassaram o limite de idade esperada no final de
cada ciclo: mais de 10 anos no 4º ano, mais de 12 anos no 6º ano e mais de 15 anos
no 9º ano. Nos grupos com maior número de alunos, africanos e brasileiros, é evidente
o peso relativo daqueles que já ultrapassaram a idade esperada para a conclusão do
ciclo de ensino que se encontram a frequentar: entre os alunos oriundos de países
africanos este valor é superior a 50% no 6º e 9º anos e, no 4º ano ultrapassa os 40%;
para os alunos provenientes da América do Sul, em particular do Brasil, este valor é
igual ou superior a 40% no 6º e 9º anos. A análise deste comportamento para os
restantes grupos não se revela significativa, dado o reduzido número de alunos
quando comparado com os dois grupos analisados (Quadro IV.19). Todavia, importa
assinalar que entre os imigrantes asiáticos a percentagem de alunos com idade
superior à esperada no 4º e 6º ano, é de 37,5% e 50%, respectivamente.
296
Quadro IV.19 – Idade dos alunos, por ano de escolaridade, segundo a origem
América Sul 83,9 16,1 0,0 100 58,8 38,2 2,9 100 60,0 40,0 100
Europa Leste+Rússia
100,0 0,0 0,0 0 68,8 31,3 0,0 100 0,0 100,0 100
Ásia 62,5 12,5 25,0 100 50,0 50,0 0,0 100
América Norte 100,0 0,0 0,0 0
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
4º ano – Qui-Quadrado = 109,100, df = 54, p = 0,000
6º ano – Qui-Quadrado = 152,092, df = 36, p = 0,000
9º ano – Qui-Quadrado = 31,318, df = 24, p= 0,145
Na análise dos países de origem dos alunos africanos, a frequentar o 4º ano,
é entre os naturais de Cabo Verde e de Angola que se identifica a maior percentagem
de indivíduos com idade superior a 10 anos, 38,5% e 30% respectivamente; em
terceiro lugar surgem os guineenses (25%).158 Para os alunos oriundos do Brasil, o
peso dos que já ultrapassaram a idade esperada para o 4º ano é de 16%. No grupo
que frequenta o 6º ano, a tendência anterior mantém-se, acentuando-se o peso
daqueles que já não se encontram na faixa etária prevista para a frequência do 2º ciclo
(12 anos), em particular os naturais da Guiné-Bissau (89,5%) e de Cabo Verde
(77,3%). Relativamente aos naturais do Brasil, este valor é de 45,5%, uma posição
que ultrapassa agora a dos alunos nascidos em Angola (36,9%).159 Para os estudantes
que se encontram a frequentar o 9º ano, é entre os guineenses (26,3%) que se regista
o maior peso relativo daqueles que já deveriam estar a frequentar o nível de ensino
seguinte. 160 Esta constatação acompanha a tendência já registada para o país,
relativamente às idades dos alunos estrangeiros, e deixa algumas pistas para uma
análise posterior que permita compreender através de outras variáveis, a imagem que
os alunos têm da escola, relações que nela estabelecem, relação da família com a
escola e expectativas que a mesma revela ter desta, as diferenças registadas no
desempenho escolar.
A comparação das médias de idades dos dois grupos de alunos (imigrantes e
nativos) com recurso à análise de variância ANOVA indica que para a totalidade do
grupo, a diferença de idades não é significativa,161 apenas se registam diferenças
158 4º ano – Qui-Quadrado = 347,927; df = 108; p =0,000 159 6º ano – Qui-Quadrado = 286,055, df= 147, p=0,000 160 9º ano – Qui-Quadrado = 286,055, df= 147, p=0,000 161
O valor de F é de 2,151, com 1,1348 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,143.
297
significativas na variável idade quando comparadas a primeira e segunda gerações. 162
Contudo, entre anos de escolaridade e territórios o comportamento não é idêntico. No
4º ano a distância registada na média de idades entre alunos nativos e imigrantes é
muito significativa 163 porém, enquanto em Lisboa esta tendência é comprovada
estatisticamente quando comparados os alunos nativos e imigrantes,164 em Sintra só
entre a primeira e a segunda geração é que a discrepância de idades tem significado
estatístico. 165 No grupo de alunos que frequenta o 6º ano, esta diferença só é
significativa entre os estudantes imigrantes de primeira e segunda geração, quer em
Lisboa 166 quer em Sintra. 167 No 9º ano, voltamos a registar diferenças de idades
significativas entre a primeira e a segunda geração de alunos imigrantes que
frequentam as escolas do centro de Lisboa.168 Analisada a média de idades dos alunos
que frequentam o 4º ano, nas escolas do centro de Lisboa, em função da sua origem,
identificamos que as principais diferenças, entre grupos e entre estes e a população
nativa ocorrem para os alunos de origem asiática e africana.
Na composição por género encontramos, para todos os anos de escolaridade,
uma sobre-representação (entre os 3,5% e os 10,2%) da população feminina. Esta
surge, no total da amostra, com um peso de 53,1% e a população masculina com um
peso de 46,9%.
4.1.2. Perfil dos alunos inquiridos em cada território
Neste ponto pretendemos continuar a caracterização dos alunos inquiridos,
desagregando a informação para cada território em estudo, nos aspectos relativos à
origem geográfica (naturalidade e nacionalidade), idade, género e tempo de
permanência no país.
O total de alunos inquiridos (1 360) apresenta-se numa proporção semelhante
nos dois territórios, 53% em Lisboa e 47% em Sintra e distribui-se, por ano de
escolaridade/ciclo, com um peso relativo semelhante (Quadro IV.20). O ano com maior
número de alunos inquiridos é o 6º ano, em segundo lugar surge o 4º ano e, com
menor número de questionários preenchidos, o 9º ano.
162
O valor de F é de 17,652, com 1,571 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,000. 163
O valor de F é de 18,589, com 1,492 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,000. 164
O valor de F é de 19,777, com 1, 281 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,000. 165
O valor de F é de 9,685, com 1, 121 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,002. 166
O valor de F é de 21,875, com 1, 116 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,000. 167
O valor de F é de 26, 475, com 1, 161 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,000. 168
Em Lisboa os resultados do cálculo da análise de variância ANOVA para os dois grupos indicam o resultado do valor de F de 9,596, com 1, 21 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,005. Em Sintra os resultados da análise indicam um valor de F de 7,423, com 1, 38 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,010.
298
Quadro IV.20 – Alunos inquiridos por ano e por território
ano escolaridade
Lisboa Sintra Total
nº % nº % nº %
4º 286 39,6 211 33,1 497 36,5
6º 312 43,2 315 49,5 627 46,1
9º 125 17,3 111 17,4 236 17,4
Total 723 100,0 637 100,0 1360 100,0
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
As origens
Comparando, a variável naturalidade dos alunos, nos dois territórios
evidencia-se um menor peso relativo dos nativos em Sintra (79,4%) que em Lisboa
(83,8%) e, entre os estrangeiros, os três grupos mais importantes são naturais de
países africanos, da América do Sul e da Europa de Leste. Estes grupos apresentam
um padrão de distribuição diferente nos dois territórios, em Lisboa, onde se regista
uma maior dispersão de origens, em primeiro lugar posicionam-se os alunos oriundos
da América do Sul (6,4%), na segunda posição os provenientes de África (3,8%) e, na
terceira os europeus de leste (3,1%). Em Sintra, onde o padrão surge mais
concentrado, o grupo mais numeroso é oriundo de países africanos (14,2%), na
segunda posição os naturais de países sul-americanos (3,8%), seguindo-se os
provenientes do leste europeu (1,9%).
Nos três anos de escolaridade, a distribuição das principais origens dos
estudantes também evidencia características diferentes. Os alunos oriundos de países
africanos encontram-se mais dispersos por todos os anos comparativamente aos seus
pares provenientes da América do Sul e da Europa de Leste, que no 9º ano são em
menor número. Este comportamento pode associar-se à chegada mais recente destes
dois grupos ao país e a uma maior juventude desta população. Os alunos de origem
asiática apresentam-se em menor número e, como tal, com um peso relativo muito
mais baixo que os anteriores no conjunto dos não nativos (4,9%). Encontram-se
presentes apenas no centro de Lisboa, na amostra que estamos a utilizar, no 4º e 6º
anos, com uma percentagem de 2,8% e 1,3% no grupo natural de um país estrangeiro.
Tal como os dois grupos anteriores estes alunos têm uma presença relativamente
recente nas escolas portuguesas.
A análise que acabamos de apresentar aborda as origens dos alunos em
função da respectiva naturalidade, o que apenas permite quantificar o número de
299
crianças e jovens de origem imigrante que não nasceu em Portugal. Contudo, na
compreensão da integração dos alunos imigrantes em contexto escolar, entre a
diversidade de factores de origem social, económica e cultural, também o vector
temporal assume um papel fundamental. Neste sentido, a análise das origens dos
alunos não pode reduzir-se à sua naturalidade, é importante recuar à naturalidade dos
pais, e identificar entre as crianças e jovens que já nasceram em Portugal as que
descendem de progenitores estrangeiros e/ou de casamentos ou uniões de facto
mistas. Este grupo constitui a segunda geração de imigrantes.
Assim, traçando agora o perfil do grupo de alunos em função das origens dos
pais, de imediato se evidencia que a segunda geração de imigrantes apresenta
quantitativos significativos que introduzem uma dimensão mais alargada da
diversidade sociocultural existente nos agrupamentos de escolas e nos territórios em
estudo (Quadro IV.21). Este facto relaciona-se com as idades do grupo com o qual
estamos a trabalhar – crianças e jovens com idades compreendidas entre 9 e 18 anos
– que, é no caso de já terem nascido em Portugal mas descenderem de dois ou de
apenas um progenitor não nativo é importante serem identificadas com as suas
origens. Globalmente, o peso relativo dos alunos imigrantes passa de 18,3% para
42,5%. As regiões que mais contribuem para este aumento são África e E.U.(15).
Quadro IV.21 – Distribuição da 1ª e 2ª gerações de alunos imigrantes, segundo as regiões de origem, por território
Regiões
Lisboa Sintra
1ª G 2ªG 1ª G 2ªG
nº % nº % nº % nº %
África 28 23,1 91 69,5 91 67,4 174 90,2
América Sul 48 39,7 16 12,2 25 18,5 8 4,1
América Norte 2 1,7 1 0,8 0 0,0 0 0,0
U.E. (15) 8 6,6 14 10,7 6 4,4 11 5,7
Europa Leste+Rússia 22 18,2 2 1,5 13 9,6 0 0,0
Ásia 13 10,7 7 5,3 0 0,0 0 0,0
Total 121 100 131 100,0 135 100,0 193 100,0
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
No que respeita ao grupo descendente de população oriunda de África
verifica-se um crescimento de 47,8% para 67%, facto que podemos relacionar com o
maior número de anos de permanência no país. De seguida surgem os alunos
oriundos de famílias provenientes de países da U.E.(15), que associamos ao retorno
de alguns emigrantes portugueses que residiam em França e na Alemanha, os quais
registam um crescimento de 4% para 6,1%. No entanto, importa ainda referir o
contributo, ainda que diluindo-se no total de alunos de segunda geração, dos
300
imigrantes oriundos da América do Sul (71 na primeira geração e 96 na segunda) e da
Ásia (aos 12 da primeira geração somam-se 20 da segunda).
Deste modo, assumindo que os alunos imigrantes incluem os que já
nasceram em Portugal (segunda geração) mas com, pelo menos, um progenitor não
nativo a amostra recolhida com um total de 1 360 crianças atinge um conjunto de 256
alunos de primeira geração e 324 de segunda geração, o que nos oferece um total
global de 580 alunos com um background imigrante (42,6%). Contudo, ao analisarmos
as regiões de origem e a distribuição por gerações desta amostra global, identificamos
alterações nos dois territórios em estudo: i) em Lisboa a segunda geração representa
52% dos alunos imigrantes enquanto que em Sintra esta percentagem é de 58,8%; ii)
em Sintra o grupo de descendentes de imigrantes apresenta um quantitativo superior
ao grupo de nativos (51,4%); iii) em Lisboa, os descendentes de africanos mais do que
duplicam o seu número entre a primeira e a segunda geração; iv) em Sintra é o grupo
de descendentes de europeus, de países da U.E. (15), e o grupo de origem africana
que se apresentam com uma maior variação no número de indivíduos entre gerações
(200% e 91,2% respectivamente); v) em Lisboa são os alunos de origem africana que
ocupam o primeiro lugar entre a segunda geração (69,5%), seguidos dos alunos
oriundos da América do Sul (12,2%); vi) em Sintra são os descendentes de africanos
(90,2%) que mantêm o primeiro lugar no quantitativo de alunos de origem imigrante,
seguindo-se os oriundos da U.E. (15) (5,7%) e, em terceiro lugar os provenientes da
América do Sul (4,1%); vii) o padrão de distribuição dos estudantes em função da sua
origem apresenta-se mais concentrado em Sintra, devido ao grande número de alunos
de origem africana (265 entre os 328 descendentes de imigrantes).
A análise desagregada segundo os países de origem dos alunos imigrantes
coloca, entre os cinco primeiros países, Angola (22,7%), Cabo Verde (17,8%), Brasil
(15,4%), Guiné-Bissau (12,8%) e Moçambique (7,3%). Estas cinco principais origens
mantêm-se entre os dois territórios, distribuindo-se em padrões diferentes: em Lisboa
posiciona-se em primeiro lugar o Brasil (22,7%) e, nas três posições seguintes, Angola
(16,7%), Cabo Verde (11,6%), Moçambique (7,2%) e Guiné-Bissau (6,0%); em Sintra
surge em primeiro lugar Angola (27,2%), seguindo-se Cabo Verde (22,6%), Guiné-
Bissau (18,0%), Brasil (9,8%) e Moçambique (7,3%). Nos agrupamentos de escolas de
Lisboa, a diversidade também é marcada pela presença de alunos oriundos de países
do leste europeu (9,2%) e do continente asiático (8,0%), enquanto nas escolas de
Sintra, o número de alunos com origem em países europeus de leste (4,0%) é
reduzido, não integrando o grupo alunos proveniente de países asiáticos. A
diversidade a que nos referimos no centro de Lisboa é evidente, na amostra, pela
301
presença de alunos oriundos de 37 países, relativamente aos 21 que registamos em
Sintra.
A comparação entre o padrão da distribuição dos países de naturalidade da
mãe e do pai revela grandes semelhanças. A diferença que podemos registar reporta-
se ao número de pais nascidos em Portugal (63,5%) relativamente ao número de
mães (56,3%), relacionando-se com a maior propensão para os homens nascidos em
território nacional escolherem como parceira uma mulher estrangeira. A análise
desagregada dos países de naturalidade dos pais, nos dois territórios em estudo,
confirma a tendência anterior, porém, surgem diferenças entre os principais países de
origem, assim como na diversidade de regiões envolvidas.
No centro de Lisboa contam-se pelo menos vinte e dois países de origem
(incluindo Portugal), enquanto nos bairros de Sintra apenas identificamos catorze. Os
países de naturalidade dos pais coincidem com a naturalidade dos filhos na maioria
das situações. A principal diferença regista-se em Sintra onde apenas se identificam
oito países de origem para as crianças e jovens imigrantes enquanto em Lisboa este
valor mantém-se em dezassete. É em Sintra que o número de alunos nascidos em
Portugal, descendentes de imigrantes, é significativamente superior (aproximadamente
60%), resultado de uma presença mais antiga de imigrantes nestes territórios oriundos,
em particular, dos PALOP como verificado anteriormente. Na área central de Lisboa,
caracterizada por ser tradicionalmente, uma área de recepção de imigrantes, a
diversidade de origens é maior, sendo menor o peso relativo dos alunos descendentes
de imigrantes nascidos em Portugal (cerca de 50%).
Em Lisboa, o principal país de origem das famílias não nativas é o Brasil
(24,2%), nas três posições seguintes surgem os naturais dos PALOP, Angola (15,6%),
Cabo Verde (12,0%) e Moçambique (6,9%). Em Sintra, os três principais países de
origem dos familiares dos alunos não nativos são, Angola (26,9%), Cabo Verde
(23,4%) e Guiné-Bissau (18,8%), e na quarta posição surgem os naturais do Brasil
(9,9%). Como anteriormente referimos, no núcleo central de Lisboa concentra-se uma
maior diversidade de origens da população imigrante, evidenciada também pelo peso
relativo dos cidadãos oriundos do leste europeu (9,3% dos imigrantes) e dos asiáticos
(8,4%), dos quais os mais representativos são os chineses, indianos, paquistaneses e
bangladechianos. Nos agrupamentos de Sintra, a presença de famílias oriundas de
países do leste europeu é mais reduzido (4,3% do total de imigrantes), não havendo
alunos de origem asiática na amostra. Acrescentamos ainda que a diversidade de
origens dos alunos vai diminuindo em função do aumento do ano de escolaridade que
frequentam: é no 4º e 6º anos que se evidencia a maior diversidade, sendo esta é
mais reduzida no 9º ano.
302
As idades e o género
As idades dos alunos inquiridos situam-se entre os 9 e os 18 anos. O grupo
que frequenta o 4º ano tem, maioritariamente, idades compreendidas entre os 9 e 10
anos (91,3%); os alunos que se encontram no 6º ano concentram as suas idades entre
os 10 e 12 anos (72,5%); e, para os inscritos no 9º ano, as idades situam-se entre os
12 e 15 anos (74,6%). A distribuição das idades dos alunos, pelos três anos em estudo,
revela algumas diferenças nos territórios em análise. A média de idades é
tendencialmente mais elevada entre os alunos com background imigrante e, com
excepção para o 4º ano, é sempre ligeiramente superior no território de Sintra.
Também, neste território, a média de idades dos nativos se apresenta para todos os
anos com valores ligeiramente superiores, excepto para o 9º ano (Quadro IV.22).
Em Lisboa, 92,9% dos alunos que frequentam o 4º ano têm entre 9 e 10 anos;
em Sintra este grupo tem um peso relativo inferior (89%), havendo portanto maiores
quantitativos dos alunos que já ultrapassaram a idade limite para o 4º ano (10 anos)
em Sintra relativamente a Lisboa. Dos estudantes que frequentam o 6º ano em Lisboa,
76,8% concentram as suas idades entre os 10 e 12 anos, valor que desce para 68,2%
em Sintra, onde mais uma vez os quantitativos dos que já ultrapassaram o limite de
idade esperado para o 6º ano (12 anos) é superior. Para os alunos que se encontram
no 9º ano as diferenças registadas entre os dois territórios não são tão acentuadas,
73,2% dos estudantes inscritos em Lisboa têm entre 12 e 15 anos e em Sintra são
76,1%, aqueles que se encontram dentro deste grupo. No 9º ano, o peso dos alunos
que já ultrapassou a idade limite prevista (15 anos) é ligeiramente superior em Lisboa
relativamente a Sintra, apesar de ser reduzida a diferença.
Quadro IV.22 – Idades dos alunos, por ano de escolaridade e território
Idades 4º ano 6º ano 9º ano
9_10 mais 10 tot 10_12 mais 12 tot 12_15 mais 15 tot
Lisboa nº 263 20 283 239 72 311 90 33 123
% 92,9 7,1 100,0 76,8 23,2 100,0 73,2 26,8 100,0
Sintra nº 187 23 210 214 100 314 83 26 109
% 89,0 11,0 100,0 68,2 31,8 100,0 76,1 23,9 100,0
Total nº 450 43 493 453 172 625 173 59 232
% 91,3 8,7 100,0 72,5 27,5 100,0 74,6 25,4 100,0
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
Lisboa – Qui Quadrado= 1147,006; df= 18; p=0,000
Sintra – Qui Quadrado= 921,047; df= 16; p=0,000
Desagregando as idades, para cada território, em função das origens mais
significativas para os vários anos de escolaridade, registamos algumas diferenças que
nos apraz assinalar. Nas escolas do centro da cidade, é entre o grupo de alunos
303
oriundos do continente africano e os de origem asiática que registamos o maior
número daqueles que já ultrapassaram a idade limite para frequentar o 4º ano, 18%
dos alunos de origem africana e 40% dos alunos asiáticos. Em Sintra, para o mesmo
ano de escolaridade, é entre o grupo descendente de africanos (16,3%) e o grupo
proveniente do Brasil (20,0%) que se regista o maior número de alunos com idade
superior a 10 anos. A mesma análise para os alunos que frequentam o 6º ano indica-
nos que se diversificam as origens entre aqueles que já ultrapassaram os 12 anos de
idade e que frequentam este nível de ensino: em Lisboa o grupo é constituído por
38,7% de brasileiros, 30% de alunos com origem no leste europeu, 22,2 % para o
grupo dos alunos africanos e o dos asiáticos e, finalmente, de 21,1% para os
portugueses; em Sintra são os alunos oriundos de países africanos que surgem em
maior número (40,3%), em segundo lugar os brasileiros (31,3%), em terceiro lugar os
europeus de leste (28,6%) e, na quarta posição, os portugueses (24,5%). Para o 9º
ano, a menor diversidade de origens não permite estabelecer diferenças significativas
entre os grupos. Contudo, em Sintra continua a evidenciar-se a tendência para um
peso maior dos alunos com idade superior a 15 anos a frequentar este ano de ensino.
As diferenças encontradas na média de idades dos alunos inquiridos
comparando os dois territórios não são estatisticamente significativas (p> 0,005).169
Também para Sintra, as diferenças registadas na média de idades dos alunos que
frequentam cada ano de escolaridade, em função da sua região de origem, não têm
significado estatístico. Só no grupo de alunos que frequenta o 4º ano, nas escolas do
centro de Lisboa, estas diferenças são estatisticamente significativas,170 posicionando-
se os alunos africanos e asiáticos com os valores médios de idade mais elevados (10
e 10,5 anos respectivamente).
Apesar de não se registarem diferenças estatisticamente significativas na
média de idades dos alunos entre os territórios em estudo e, de um modo geral, entre
os grupos de origem que frequentam os três anos de escolaridade, as diferenças de
idades entre as duas gerações de imigrantes são estatisticamente significativas para
Sintra e para Lisboa, como atestam os cálculos da análise de variância ANOVA. Assim,
nas escolas de Sintra as diferenças mais significativas ocorrem entre as médias de
idades dos alunos que frequentam o 4º ano e dos alunos do 6º ano, apresentando a
segunda geração uma média de idade inferior à primeira. 171 Em Lisboa, estas
169
O valor de F = 3,963, com 1,1349 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,047. 170
O output da análise de variância ANOVA apresenta o valor de F = 4,996, com 6,276 graus de liberdade
e com uma significância associada de 0,000. 171
Para os alunos imigrantes que frequentam o 4º ano nas escolas de Sintra a média de idades da 1ª geração é de 10,1 anos e da 2ª geração 9,6 anos. No grupo de alunos imigrantes que frequentam o 6º ano, a primeira geração tem uma média de idade de 12,9 anos e a 2ª geração de 12 anos. Os resultadaos da comparação da média de idades entre a 1ª e a 2ª geração que frequenta o 4º ano, com recurso à
304
diferenças registam-se para os alunos que frequentam o 6º ano e o 9º ano, integrando
a primeira geração os alunos mais velhos. Nas escolas de Lisboa os alunos imigrantes
da primeira geração que frequentam o 6º ano têm uma média de idades de 12,7 anos
e os da segunda geração de 11,7 anos. A média de idades para os alunos imigrantes
de primeira geração que frequentam o 9º ano é de 15,8 anos e para os da segunda
geração de 14,6 anos.172
Em termos da estrutura de género, a distribuição é relativamente equilibrada
para os diferentes anos de escolaridade e para os dois territórios. Evidencia-se uma
tendência para um maior peso relativo dos alunos do sexo feminino, em todos os anos
de escolaridade quer em Lisboa (53,6%) quer em Sintra (52,5%). Em Lisboa, a média
de idades dos alunos, calculada por sexo, para cada ano de escolaridade, revela que
no 4º e 6º anos existe uma grande proximidade nas idades do grupo. Tendencialmente,
os rapazes são um pouco mais velhos, mas no 9º ano é entre estes que se regista a
média de idades mais baixa. Em Sintra, no 4º ano os alunos do sexo masculino são
um pouco mais novos, enquanto no 6º e 9º anos são os elementos femininos que têm
uma média de idades inferior. Todavia, as diferenças registadas quer em Lisboa, quer
em Sintra, na média de idades entre sexos, são muito baixas e sem significado
estatístico. O estudo da distribuição dos alunos por género em função da origem não
apresenta grandes disparidades entre os mesmos, quer para os três anos de
escolaridade, quer entre os territórios em estudo. Também a distribuição por género
dos nativos e imigrantes não evidencia diferenças relevantes.
Número de anos em Portugal
Os alunos de origem imigrante que não nasceram em território nacional
chegaram ao país em momentos distintos: 11,7% há menos de um ano; 25,4% há dois
ou três anos; 21,7%, entre três a cinco anos; 32,5%, entre cinco a dez anos; e, 8,8%
residem em Portugal há mais de dez anos.
Em cada território em análise identificam-se diferenças significativas no que
se refere ao tempo de permanência em Portugal dos alunos de origem imigrante. Em
Sintra, 49% destes alunos chegou há menos de cinco anos ao país, já em Lisboa este
grupo tem um peso de 69% entre o total de descendentes não nativos. Os dois
territórios em estudo têm percursos diferentes enquanto receptores de populações
ANOVA, indicam um valor de F = 9,685, com 1,121 graus de liberdade e uma significância associada de p = 0,002; para os alunos do 6º ano, os output da ANOVA indica um valor de F = 26,475, com 1,161 graus de liberdade e uma significância associada de 0,000. 172
Os resultados da comparação da média de idades entre os alunos de 1ª e 2ª geração que frequentam o 6º ano, através da análise de variância ANOVA, indicam um valor de F = 21,875, com 1,116 graus de liberdade e uma significância associada de p = 0,000; para o 9º ano a comparação da média de idades apresenta um valor de F = 9,596, com 1,21 graus de liberdade e uma significância associada de p = 0,005.
305
migrantes: o centro da cidade acolhe frequentemente uma população recém-chegada
à AML e que encontra nesta área um mercado de arrendamento mais acessível,
ocupando alojamentos com poucas condições de habitabilidade e/ou partilhando o
mesmo fogo com outros imigrantes; por outro lado, estas populações usufruem da
proximidade de co-étnicos e das redes de contactos facilitadoras da sua inserção na
cidade, nomeadamente no que se refere aos grupos oriundos da Ásia, do Brasil e da
Europa de Leste; em Sintra, uma parte significativa da população residente de origem
imigrante já se encontra há mais tempo em Portugal, presença visível pelo peso da
segunda geração neste território, e algumas famílias já realizaram um percurso de
mobilidade residencial na AML, tendo-se instalado na periferia da cidade, onde
encontram oportunidade de obter casa própria e/ou melhores condições de habitação.
A desagregação segundo os tempos de chegada ao país em função das
regiões de origem dos alunos de origem imigrante permite reforçar as afirmações
anteriores. As famílias dos estudantes que frequentam as escolas de Sintra
encontram-se há mais tempo em território nacional. Ainda assim continua a ser
significativo o fluxo migratório com origem nestes países (entre os 69 alunos que
chegaram há menos de 10 anos, 68,9% residem em Portugal há menos de cinco
anos). Os grupos que mais recentemente se instalaram na AML (tendo como
referência os 5 anos anteriores à data de aplicação do questionário) não encontram
expressão significativa neste território, pois para um total de 61 alunos, apenas 16,4%
são oriundos do Brasil e 11,5% do leste europeu. Nas freguesias do centro de Lisboa,
o grupo de alunos que se instalou nos últimos cinco anos no território é mais
numeroso e diverso, correspondendo o maior peso aos naturais do Brasil (46,2%), em
segundo lugar aos europeus de leste (20,5%), seguidos dos africanos (16,7%) e dos
asiáticos (14,1%).
Os resultados que apresentamos na caracterização dos territórios e dos
grupos de alunos que frequentam as escolas que neles se localizam, alertam-nos para
algumas diferenças em termos das origens, do peso da segunda geração, das médias
de idades e do tempo de permanência no país. Estes aspectos ser-nos-ão
fundamentais na análise que pretendemos desenvolver sobre a integração dos alunos
em escolas localizadas em contextos territoriais distintos da AML, com diferentes
vivências no acolhimento de populações migrantes. A compreensão dos percursos de
integração dos descendentes de imigrantes poderá encontrar alguma sustentação na
experiência das instituições no acolhimento destes públicos, mas também nas
dinâmicas relacionais decorrentes da diversidade de origens que se cruza em cada um
destes espaços.
306
4.1.3. Composição familiar e Perfil Socioeconómico
Estrutura familiar e etária do grupo de alunos inquiridos
No universo das famílias caracterizadas pelos alunos (1325), identificamos
casamentos/uniões de facto com composições diferentes no que diz respeito às
origens dos respectivos cônjuges. Assim, o número de famílias em que ambos os
membros são nativos, é de 760 (57,4%), e o total daquelas em que ambos os
cônjuges nasceram no estrangeiro é de 388 (29,3%). Os agregados familiares em que
um dos membros é imigrante perfazem um total de 177. Destes, o elemento migrante
pode ser a mãe (45,8%) ou o pai (54,2%) (Quadro IV.23).
Quadro IV.23 – Região de origem (naturalidade) dos pais em que um dos cônjuges é nativo
Regiões Pai Mãe
nº % %
Europa 27 7,9 7,3
África 119 29,9 37,3
América Sul 24 6,8 6,8
Europa Leste+Rússia 3 0,6 1,1
Ásia 3 0,6 1,1
América Norte 1 0,0 0,6
total 177 45,8 54,2
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
Para as famílias em que se registam casamentos/uniões de facto mistos,
entre nativos e naturais de outras regiões, as situações mais frequentes registam-se
entre nativos e africanos (67,2%), em 37,3% das 177 uniões identificadas com estas
características a mulher é nativa e em 29,9% dos casos é o homem que é natural de
Portugal. Também se registam algumas uniões, embora em menor número, entre
nativos e brasileiros, em 6,8% dos casos a mulher é natural de Portugal e, com a
mesma percentagem, surgem os agregados familiares em que o elemento masculino
nasceu em Portugal. As uniões entre nativos e europeus de leste ou asiáticos também
se registam mas têm pouca expressão, totalizam apenas 2,2% das famílias mistas.
Os agregados familiares em que ambos os cônjuges nasceram num país
estrangeiro são maioritariamente oriundos do continente africano (68,8%),
nomeadamente dos PALOP, e da América Latina (18,3%), em particular do Brasil. Em
menor número surgem os naturais de países da Europa de Leste e Rússia (7,7%) e do
continente asiático (4,4%), onde a China e a Índia são os principais países de origem.
É entre as famílias africanas que ocorre o maior número de casamentos ou uniões de
307
facto que envolvem cônjuges de diferentes origens, quer naturais de outros países
africanos (13,4% das famílias), quer de outros continentes (3,8% das famílias).
O número de famílias monoparentais é, entre os pares onde pelo menos um
dos elementos não é nativo, de aproximadamente 18% e entre os cônjuges autóctones
de cerca de 11%. Nas famílias de origem imigrante, as situações de
monoparentalidade são mais frequentes entre as que são oriundas do continente
africano (cerca de 20%): nestas é comum apenas a presença da mãe, a quem é
atribuída a responsabilidade pela educação dos filhos.
Os escalões etários mais frequentes entre os pais dos alunos situam-se entre
os 35 e os 49 anos de idade, com valores sempre superiores a 64%. Dentro deste
grupo etário as idades dos elementos masculinos concentram-se entre os 35 e os 49
anos, com maior frequência no escalão dos 40-49 anos (27,6%). Na maioria das
mulheres, as idades oscilam entre os 35 e os 44 anos, com maior peso da classe dos
35-39 anos (29,5%). Quando comparamos as idades mais frequentes dos pais
naturais de um país estrangeiro com as dos pais nativos, o comportamento de ambos
obedece à tendência geral apresentada. Porém é notório um menor peso relativo nos
grupos de idades até 35 anos entre os nativos e um maior peso relativo destes nos
grupos etários seguintes. Quer as mães, quer os pais nativos têm também um menor
peso nos grupos etários mais jovens quando comparados com os de origem imigrante
(Quadro IV.24). Recorrendo à análise de variância (ANOVA) unifactorial, constatamos
que as diferenças de médias de idades entre nativos e imigrantes são estatisticamente
significativas.173
No centro da cidade de Lisboa regista-se uma tendência para uma maior
juventude das famílias, quer nativas quer de origem imigrante, notória pelos maiores
173
O valor de F é de 8,59, com 6,1241 graus de liberdade e com uma significância associada de 0,000. Perante este valor de probabilidade (p=0,000, estatisticamente significativo), conclui-se que as diferenças na média de idades são significativas entre os grupos em análise.
Quadro IV.24 – Distribuição das idades dos pais, por género e por território
Grupos idade
Lisboa Sintra
Imigrante Nativo Imigrante Nativo
Mãe Pai Mãe Pai Mãe Pai Mãe Pai
até 35 33,1 18,3 20,7 13,5 26,6 13,3 19,7 9,1
35-49 64,6 68,6 71,5 69,2 69,8 77,0 73,1 79,8
50-64 2,2 11,8 7,9 15,5 3,6 9,7 7,2 10,1
65+ 0,0 1,2 0,0 1,8 0,0 0,0 0,0 0,9
Total abs. 178 169 484 445 252 226 335 317
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
308
valores percentuais no grupo de idades mais jovem. É entre as famílias originárias de
países da América do Sul que, em ambos os territórios, mais de metade dos seus
membros tem até 39 anos de idade. Também os pais originários de países europeus
de leste revelam esta tendência. Já para as famílias oriundas do continente africano,
há mais tempo em Portugal, a juventude dos progenitores é relativamente mais
reduzida em Lisboa, embora ainda se registe um peso elevado dos agregados
familiares até aos 39 anos, particularmente entre as mães residentes em Sintra (cerca
de 62%).
A média de idades entre os pais nativos é mais elevada em ambos os
territórios. Registamos para as mães uma média de idades de 40 anos em Lisboa
(37,6 anos para as mães oriundas de outro país) e de 39,8 anos em Sintra (38 anos
para as de origem imigrante). Para os pais (elementos masculinos) nascidos em
Portugal, a média de idades é de 42,9 anos em Lisboa (41,3 anos para os não nativos)
e de 42,2 anos em Sintra (41,8 anos para os que nasceram noutro país). A
comparação entre médias de idades dos dois grupos, com recurso à análise de
variância ANOVA, confirma que as diferenças são estatisticamente significativas, quer
entre os elementos masculinos quer entre os femininos residentes no centro de
Lisboa.174 Todavia, em Sintra só se registam diferenças estatisticamente significativas
para as mães.175
Estrutura profissional
Nas famílias dos alunos inquiridos, 87,2% dos elementos exercem uma
actividade profissional (93,5% dos homens e 81,3% das mulheres). Dos 291 indivíduos
que não desenvolvem qualquer actividade remunerada, 46% encontram-se
desempregados e 56,4% constitui o grupo das domésticas (Quadro IV.25). Quer entre
os imigrantes, quer entre os nativos, é na população feminina que se regista o menor
peso relativo no exercício de uma actividade profissional (apenas 74,2% das mulheres
imigrantes e 84,9% das nativas têm um emprego remunerado). Acresce a este
aspecto, o facto de ser entre a população imigrante que se registam os maiores
quantitativos de desemprego: 88,9% para os homens e 28,4% para as mulheres. Entre
os imigrantes, 92,9% dos homens e 74,2% das mulheres desempenham uma
174
O output da análise de variância ANOVA, resultante da comparação da média de idades das mães
indica que para F = 5,596, com 6,654 graus de liberdade, a significância associada é de 0,000; a comparação da média de idades dos pais indica que para F = 3,533, com 6,607 graus de liberdade, a significância associada é de 0,002. 175
Comparando a média de idades, segundo a região de origem das mães, com recurso à análise de
variância ANOVA, os resultados indicam um valor de F = 4,509, com 4,582 graus de liberdade, e uma significância associada de p = 0,001. Para os pais, os resultados da comparação da média de idades não são estatisticamente significativos, pois para F = 1,864, com 4,538 graus de liberdade a significância associada é de 0,115.
309
actividade profissional. Para aqueles que não desempenham qualquer actividade
remunerada, acresce ainda referir que 64,7% das mulheres são domésticas. Para os
nativos o peso relativo dos que se encontram a exercer uma profissão é de 93,8%
para os homens e de 84,9% para as mulheres encontrando-se entre os
desempregados 81 indivíduos dos quais 77,3% são homens e 39,8% são mulheres.
Entre as mulheres nativas a percentagem de domésticas ascende a 49,2%.
Quadro IV.25 – Situação dos pais perante a profissão
Total Imigrantes Nativos
HM H M HM H M HM H M
nº % % nº % % nº % %
A exercer actividade 1981 93,5 81,3 647 92,9 74,2 1334 93,8 84,9
A análise da estrutura do emprego, tendo por base a classificação nacional de
profissões,176 entre as famílias nativas e as imigrantes evidencia uma concentração de
75,5% dos activos com profissão nos grupos 3, 5 e 7. A desagregação por género dá-
nos conta que, para os homens, as actividades profissionais mais frequentes se
desenvolvem nos grupos 5, 7 e 3, com 43,9%, 33,2% e 9,6% dos empregados,
enquanto para as mulheres, o padrão segue uma sequência diferente, estruturando-se
entre os grupos 5, 9 e 4, com 50,8%, 16,6% e 14% do emprego respectivamente.
Assim, os serviços e comércio asseguram a maioria dos locais de trabalho para os
dois sexos, seguidos da construção civil e das profissões técnicas de nível intermédio
para os homens, e dos trabalhos não qualificados e das actividades administrativas
176
1. Quadros Superiores da Administração Pública, Dirigentes e Quadros Superiores de Empresas; 2. Especialistas das Profissões Intelectuais e Científicas; 3. Técnicos e Profissionais de Nível Intermédio; 4. Pessoal Administrativo e Similares; 5. Pessoal dos Serviços e Vendedores; 6.Agricultores e Trabalhadores Qualificados da Agricultura e Pescas; 7. Operários, Artífices e Trabalhadores Similares; 8. Operadores de Instalações e Máquinas e Trabalhadores da Montagem; 9. Trabalhadores não Qualificados; 0. Membros das Forças Armadas.
310
para as mulheres. A desagregação dentro do grupo profissional 7 evidencia a
tendência para o desenvolvimento de actividades de construção civil entre a
população masculina e, no grupo 9, a ocupação com os serviços de limpeza e serviços
domésticos entre a população do género feminino.
Entre as famílias nativas, é nos grupos profissionais 3, 4, 5, e 7 que se
concentram 86,6% dos activos com profissão. Em particular, o grupo 5 que inclui o
pessoal dos serviços e vendedores, reúne cerca de 50% do emprego deste conjunto
de famílias. O perfil profissional apresenta algumas diferenças por género, em
particular entre os grupos 4 e 7: no primeiro existe uma percentagem maior das
mulheres (16,5% face a 4,3%) e, no segundo, uma percentagem maior de homens
(25% face a 3,0%). Estes resultados explicam-se pela maior frequência das mulheres
nos sectores da administração, em particular nos serviços de secretariado e um maior
número de homens nos trabalhos relacionados com a construção civil.
As famílias de origem imigrante apresentam uma estrutura do emprego, por
grupos profissionais, com algumas diferenças relativamente às nativas. É nos grupos 5,
7 e 9 que se concentra 81,5% da população a exercer uma actividade, predominando
então os serviços e comércio, os operários e artífices e, finalmente, os trabalhadores
não qualificados. Para as mulheres (56,3%), os grupos 4, 5 e 9 surgem nas três
primeiras posições e, para 88,6% dos homens são os grupos 3, 5 e 7 que os acolhem.
Os padrões de inserção no mercado de trabalho apresentam características
distintas em função da origem de alguns grupos de imigrantes. Os cidadãos
provenientes de países europeus, apesar de revelarem uma concentração no grupo 5,
são também os que se encontram com algum peso relativo nas profissões liberais,
intelectuais e científicas (19,2%), entre os técnicos e profissionais de nível intermédio
(11,5%) e os administrativos (15,4%). Ainda assim, entre este grupo, há um conjunto
de indivíduos (cerca de 14%) que exerce a sua actividade nos grupos profissionais
menos qualificados (7 e 9). É provável que entre os cidadãos oriundos da Europa, e
em particular da França e da Alemanha, se encontrem descendentes de emigrantes
portugueses que regressaram a Portugal e que continuam a desenvolver actividades
relacionadas com a construção civil, no caso dos homens, enquanto que as mulheres
são empregadas de limpeza e domésticas.
Os cidadãos provenientes de países africanos e, em particular dos PALOP
têm perfis profissionais semelhantes aos imigrantes do leste europeu, apesar dos
diferentes níveis de escolaridade que se registam entre os dois e dos quais falaremos
no ponto seguinte. O elemento que os distingue advém exactamente dos níveis de
instrução que possuem e que facilita, aos segundos (15,2% do grupo), o
desenvolvimento de actividades no grupo 2, em particular nas profissões intelectuais e
311
científicas, onde se destaca o envolvimento de 22,7% da população feminina. Os dois
grupos de imigrantes estão maioritariamente representados nos grupos profissionais 5,
7 e 9, (83,8% dos africanos e 78,2% dos europeus de leste). A desagregação por
género revela-se, para estes, importante para explicar a distribuição do emprego.
Assim, entre os elementos femininos persistem os trabalhos pouco qualificados, em
particular as empregadas domésticas e de limpeza (32,1% das mulheres africanas e
45,5% das mulheres oriundas do leste), enquanto os homens trabalham na sua
maioria na construção civil, em empregos mal remunerados (52,5% dos africanos e
62,5% dos europeus de leste). As actividades que estes dois grupos desenvolvem no
grupo profissional dos serviços e comércio, relacionam-se fundamentalmente com a
restauração e serviços de hotelaria, serviços pessoais, empregados de balcão e
cabeleireiros.
A desagregação dos trabalhadores pelos principais países de origem, em
África e na Europa de Leste, evidencia que nos países africanos são as mulheres
naturais de Cabo Verde as que mais frequentemente exercem a sua actividade no
grupo 9 (56,4%), enquanto as que são oriundas de Angola e da Guiné-Bissau são em
menor número neste grupo profissional (23% e 27% respectivamente), exercendo a
sua actividade preferencialmente no grupo 5 (53,8% e 55,9% respectivamente). Para
os elementos masculinos, oriundos de Angola, Cabo Verde e da Guiné-Bissau, a
construção civil é a actividade em que a maioria se concentra, sendo os cidadãos
cabo-verdianos os que têm o maior peso relativo neste grupo profissional (67,2%). A
população oriunda de Moçambique distribui-se pelos diversos grupos profissionais de
forma distinta dos anteriores, concentrando-se maioritariamente nos serviços e
comércio (65,0% dos homens e 52,9% das mulheres) e, em segundo lugar, no grupo 3
(15,0% dos homens e 23,5% das mulheres). Os grupos profissionais 7 e 9, surgem
apenas na terceira posição. Deve ainda sublinhar-se que, entre a população angolana,
guineense e moçambicana encontramos alguns indivíduos a exercer actividade
profissional de âmbito intelectual e científico, facto que se relaciona com a existência
de maiores níveis de instrução entre estes imigrantes, apesar de ainda em reduzido
número quando comparados com os europeus de leste.
A população com origem em países da América do Sul, em particular no
Brasil, apresenta-se mais dispersa pelos grupos profissionais, 43,0% no grupo 5,
24,6% no grupo 7 e 11,4% no grupo 9. A população masculina tem um maior peso
relativo no grupo 7 (45,2%), enquanto metade da população feminina trabalha no
grupo 5. Entre esta população regista-se também o desenvolvimento de algumas
actividades nos grupos 2 (7,0%) e 3 (8,8%), facto que se relaciona com a presença de
uma vaga de imigração brasileira mais qualificada.
312
Os asiáticos não surgem representados nos grupos 8 e 9, e no grupo 7
apenas 12,5% dos cidadãos (fundamentalmente do género masculino) apresentam
actividade. Este grupo está sobre representado no comércio e nos serviços (79,2%),
em particular na indústria da restauração e no comércio. As mulheres, distribuem-se
entre o comércio e serviços (87,5%) e as actividades administrativas (12,5%). A
integração no mercado de trabalho destes imigrantes, com uma concentração singular
na restauração e nas actividades comerciais, denuncia a importância do emprego
étnico na sua incorporação (Fonseca & McGarrigle, 2012).
A análise, que acabamos de fazer, sobre a integração das famílias imigrantes
no mercado de trabalho revela a tendência para uma estrutura polarizada, com
características muito próximas das registadas para a Área Metropolitana de Lisboa, tal
como já nos foi apresentado por outros estudos que se reportam às questões do
acesso ao mercado de trabalho de populações estrangeiras (Fonseca & McGarrigle,
2012). Em particular, para o estudo que se pretende desenvolver, o perfil profissional
das famílias dos alunos, quer nativos quer descendentes de imigrantes, revela que a
maioria (64,0%) ocupa postos de trabalho nos grupos profissionais relacionados com
pessoal de serviços e vendedores, operários e artífices e trabalhadores não
qualificados, para os quais os níveis de instrução necessários são pouco elevados,
sendo reduzido o peso relativo dos especialistas das profissões intelectuais (5,4%) e
dos técnicos e profissionais de nível intermédio (9,8%), que exigem habilitações
literárias superiores. Acrescentamos ainda que, desagregando a informação relativa
aos grupos profissionais em função da origem da população para cada território,
conclui-se que é em Sintra que se encontra a maior proporção dos imigrantes activos
nos grupos profissionais 7 e 9, em detrimento dos restantes grupos em que a
presença destas comunidades é mais reduzida.
A taxa de desemprego apresenta valores mais elevados para a população
imigrante relativamente à população nativa. Para o conjunto da amostra, a taxa de
desemprego177 é de 5,7% entre os nativos e de 7,6% para a população de origem
imigrante. Entre os dois territórios estes valores assumem proporções diferentes: em
Lisboa a taxa de desemprego é de 6,6% para os imigrantes e de 5,2% para os nativos,
e em Sintra situa-se em 5,6% para os nativos e em 8,2% para os imigrantes. Numa
leitura linear, este indicador aponta para a possibilidade de os imigrantes serem os
primeiros atingidos pelo fenómeno do desemprego, o que constitui um obstáculo à sua
integração social.
177
Tx de Desemprego = N desempregados/ (N população economicamente activa+N desempregados) *100
313
A informação relativa às características profissionais e à estrutura das
famílias dos alunos, conduz-nos a uma reflexão sobre a relação destes aspectos com
o percurso dos descendentes de imigrantes na sua integração em contexto escolar.
Retomando o estudo de Portes e Rumbaut (2001), para a maioria dos pais, as
expectativas que constroem em torno do futuro dos filhos leva-os a um grande
investimento dos recursos de que são detentores na formação dos jovens e, em
particular, para as famílias imigrantes, este investimento reveste-se de um esforço
acrescido, por vezes pela multiplicação das horas de trabalho. Contudo, nem todas as
famílias são detentoras dos mesmos recursos e auferem das mesmas oportunidades
para oferecer aos seus filhos condições para alcançarem um maior sucesso educativo.
Segundo os autores, os recursos necessários são de dois tipos: o acesso ao mercado
de trabalho e a disponibilidade de bens económicos. Assim, os pais com níveis de
capital humano superiores situam-se numa posição mais favorável para suportar a
adaptação dos filhos, não só porque possuem mais informação sobre o contexto de
acolhimento, mas também porque conseguem auferir de melhores rendimentos para
proporcionar aos seus descendentes o acesso a uma maior diversidade de bens. A
estes aspectos, os autores acrescentam a influência que as características ou a
composição da família podem ter nos comportamentos dos descendentes. Nesta
perspectiva, para as crianças e jovens que convivem diariamente com os dois pais
biológicos, a possibilidade de auferirem maiores níveis de atenção é superior (Portes &
Rumbaut, 2001). Este aspecto torna-se particularmente importante entre os imigrantes,
em particular entre aqueles que revelam ter maiores fragilidades económicas e níveis
de integração menores.
Constatámos, anteriormente, que é entre as famílias oriundas dos PALOP
que se regista a maior propensão para a monoparentalidade, sendo frequentemente
delegada às mães a educação dos filhos, realidade que pode ser herdada de um
quadro cultural importado dos territórios de origem. São também estas famílias, em
particular as oriundas de Angola, Cabo Verde e Guiné-Bissau que ocupam mais
frequentemente os grupos profissionais menos qualificados e como tal pior
remunerados, para os quais a integração no mercado de trabalho revela maiores
fragilidades. Deste modo, se a combinação destes dois factores é um requisito
importante no sucesso da integração dos descendentes de imigrantes, a associação
entre baixos níveis de capital humano e maior instabilidade familiar têm, segundo
Portes e Rumbaut (2001), efeitos negativos na integração de crianças e jovens na
sociedade de acolhimento. Importa ainda, na perspectiva que defendemos, analisar os
graus de instrução das famílias, pois nem sempre as actividades profissionais
desenvolvidas nos territórios de chegada têm uma correspondência com os níveis de
314
formação que os imigrantes transportam dos seus países de origem. Referimo-nos,
em particular, às famílias oriundas de países do leste europeu e do Brasil, detentoras
de níveis de escolaridade mais elevados e que profissionalmente se integram,
frequentemente, nos grupos dos operários e artífices, dos trabalhadores não
qualificados, e/ou, também, no grupo profissional do pessoal dos serviços e
vendedores, em actividades associadas ao comércio e serviços pessoais pouco
qualificados.
Educação e habilitações académicas
As famílias dos alunos inquiridos apresentam níveis de escolaridade
tendencialmente muito baixos. O número de pais que não completou qualquer nível de
ensino ou que apenas concluiu o 1º nível do ensino básico é ainda relativamente
elevado e, quer no centro da cidade de Lisboa, quer no território de Sintra, apresenta
um peso relativo mais elevado que os níveis de ensino pós secundário, oscilando
entre 15,8% e 28,7% (Quadro IV.26).
Quadro IV.26 – Nível de ensino dos pais, por género e território
É entre as famílias residentes no centro da cidade que registamos a maior
frequência dos pais que apenas concluíram os primeiros quatro anos de escolaridade.
Este valor é mais elevado para os nativos do sexo masculino (28,7%) e entre as
mulheres de origem imigrante (23,0%). Por outro lado, é também neste território que
se encontram os progenitores com os níveis mais elevados de ensino (pós-secundário
e superior), quer entre os nativos, quer entre os imigrantes. É importante evidenciar
que é para a população não nativa que o peso percentual dos indivíduos que são
detentores de uma licenciatura ou de outro curso pós licenciatura é superior (16,3%
das mães e 17,3% dos pais). Neste território, a diversidade de origens entre o grupo
não nativo, em particular, devido à presença de brasileiros e europeus de leste, tem
315
uma influência positiva nos níveis de escolaridade revelados por esta população. Por
outro lado, a presença de população nativa, com fracos recursos socioeconómicos,
reflecte-se nos níveis de escolaridade mais baixos que se registam.
Em Sintra, é menos frequente o número de pais que apenas concluiu os
primeiros anos de escolaridade, com percentagens mais elevadas entre os que
terminaram o ensino básico (aproximadamente 50%) e o ensino secundário (24,0%).
Contudo, para os níveis pós secundário os quantitativos são menores do que os
registados para Lisboa. Apenas entre as mães nativas, o peso relativo ultrapassa
ligeiramente os 10% e é entre as mães de origem imigrante que registamos a menor
frequência daquelas que conseguiram completar este nível de ensino (6,0%). Entre os
progenitores do sexo masculino, 8% concluiu um nível de ensino superior e, entre os
nativos, apenas 7,2% realizou um curso deste nível.
No conjunto dos dois territórios, a heterogeneidade na formação das famílias
é grande. As maiores discrepâncias evidenciam-se entre os residentes no centro da
cidade, facto que também associamos às disparidades que se registam entre a
população residente na área do Bairro Alto e Martim Moniz/Mouraria, esta última com
níveis muito baixos de escolaridade entre a população nativa (Fonseca & McGarrigle,
2012) e aos residentes nos bairros da Graça e Penha de França. Estas diferenças
também correspondem a alguma fragmentação social e urbana existente neste
território, em particular os bairros do eixo Intendente/Martim-Moniz/Mouraria e no
Bairro Alto onde reside uma população de fracos recursos socioeconómicos, em
habitações de pequena dimensão frequentemente com fracas condições de
habitabilidade, e os bairros da Graça e Penha de França com uma população de um
nível socioeconómico um pouco mais elevado e condições de habitabilidade um pouco
superiores. A comparação do número médio de anos de escolaridade entre os
diferentes grupos, para a população feminina e para a masculina, com recurso à
análise da variância ANOVA, confirma as diferenças a que nos referimos.178 O valor de
probabilidade (p=0,000) é muito significativo, quer para os elementos femininos, quer
para os masculinos. A aplicação do teste Post-Hoc permitiu identificar as principais
diferenças entre os grupos de origem considerados, que se apresentam em dois
grandes conjuntos: o primeiro constituído por europeus, U.E.(15), e europeus de leste
e, o segundo, pelas restantes origens (portugueses, asiáticos, africanos e brasileiros).
Entre as mães, o número médio de anos de escolaridade do grupo constituído por
europeus, U.E.(15), e europeus de leste oscila entre 11 e 13 anos, situando-se as
178
O valor de probabilidade é muito significativo quer para os elementos femininos quer para os masculinos. Para as mães a comparação do número médio de anos de escolaridade com recurso à ANOVA indica que para F = 4,551, com 6,523 graus de liberdade, a significância é de 0,000; para os pais o resultado é de F= 5,163, com 5,480 graus de liberdade e uma significância de 0,000.
316
mães nativas no grupo de menores qualificações (média de anos de escolaridade
entre 7,8 e 10 anos), com um valor médio de 9,4 anos de escolaridade. Para os pais,
os grupos anteriormente desenhados mantêm-se, não se registando alterações nas
médias do grupo com maior número de anos de escolarização e aumentando o valor
mínimo de anos de escolaridade para o segundo grupo. Contudo, se entre a
população feminina são as mães asiáticas as detentoras de uma média de anos de
escolaridade mais baixa (7,8), entre os elementos masculinos, são os pais
portugueses os que pior se posicionam, com um valor médio de 8,7 anos de
escolaridade.
Em Sintra, o número de famílias com níveis de formação mais elevados é
superior, mas entre a população de origem imigrante não são frequentes níveis de
formação pós secundária. Este facto pode ser em parte explicado pela presença de
população de origem africana, em particular oriunda de Cabo Verde, que apresenta no
conjunto da amostra níveis de escolaridade mais baixos. No entanto, esta análise é
apenas indicativa, na medida em que a comparação das médias de anos de
escolaridade com recurso à ANOVA apresenta valores de probabilidade que não são
estatisticamente significativos, quer para os elementos masculinos, quer para os
femininos.179 Neste território, com menores quantitativos de população europeia, quer
oriunda da U.E. (15), quer da Europa de Leste, evidencia-se uma maior
homogeneidade no comportamento da variável anos de escolaridade. Os pais
oriundos do leste europeu continuam a apresentar os valores médios de anos de
escolaridade mais elevados (12 anos), posicionando-se os portugueses entre os que
detêm menor número médio de anos de escolaridade no grupo masculino (8,6 anos) e
as mães africanas (8,5 anos) no grupo feminino.
4.2. Perfil socioeconómico e cultural das famílias inquiridas
A apresentação da estrutura do questionário aplicado às famílias consta da
primeira parte deste estudo, onde são definidos os objectivos subjacentes à sua
construção e identificadas as questões que o estruturam. A grande finalidade da
aplicação deste questionário é identificar a imagem das famílias relativamente à
formação dos seus educandos em contextos escolares de diversidade sociocultural, as
179
Os resultados da análise de variância ANOVA aplicada na comparação do número médio de anos de escolaridade das mães em função da origem, indicam que para F = 2,688, com 4,465 graus de liberdade, a significância associada é de p = 0,031; na comparação do número médio de anos de escolaridade dos pais os resultados obtidos também indicam que entre as diferentes origens as diferenças não são estatisticamente significativas, F = 2,728, com 4,415 graus de liberdade e uma significância de p = 0,029.
317
expectativas que constroem perante a escola e a avaliação do papel da instituição
enquanto espaço de integração.
Num primeiro momento, é apresentada a amostra de inquiridos, nos aspectos
relativos à origem geográfica (naturalidade) e idade. De seguida, surge a estrutura e
dimensão do agregado familiar e o perfil socioeconómico, este último caracterizado a
partir do grau de instrução, da situação perante o trabalho, do grupo profissional,
natureza e escalão dos rendimentos auferidos. Pretende-se com esta caracterização
da amostra de famílias inquiridas situar o grupo de respondentes relativamente ao
perfil geral apresentado anteriormente pelos alunos.
Responderam ao questionário 653 famílias mas apenas foram validados 633
questionários: nos restantes não se identificavam elementos indispensáveis para o
presente estudo, como a referência à naturalidade e/ou nacionalidade dos
progenitores e a identificação do aluno; por vezes, também, existiam muitas lacunas
de informação. Assim, o universo de famílias objecto de estudo corresponde a 46,9%
dos alunos inquiridos. A análise das origens, feita com base na naturalidade180 dos
progenitores indica que estes são maioritariamente nativos (646 indivíduos)
registando-se, 357 elementos não nativos. Os respondentes do questionário foram, na
maioria dos casos as mães dos alunos (70%), quer no centro de Lisboa, quer em
Sintra.
O número de mulheres é superior ao de homens, quer entre os nativos quer
entre os imigrantes, permitindo identificar, no conjunto das famílias, uma percentagem
de 12,3% de mulheres que assumem sozinhas o agregado familiar.
Origens geográficas, idade e estrutura familiar
A composição da globalidade das famílias, atendendo às origens de cada
elemento do agregado, resulta maioritariamente da união de dois elementos nativos
(57,4%). Os núcleos familiares em que ambos os pais são de origem imigrante
totalizam 124 (27,5%) e, aqueles em que a composição é mista são 68 (15,1%). Em
Lisboa, os agregados familiares são maioritariamente constituídos por nativos (64,2%):
as famílias em que ambos os elementos são de origem imigrante (23,5%) e aquelas
em que se verifica apenas a presença de um imigrante (12,3%) são em número mais
reduzido que a tendência geral da amostra. Em Sintra, 52,9% dos núcleos familiares
são compostos por nativos, 30,1% são constituídos por imigrantes e, 16,9% reúnem
um elemento nativo e um não nativo. O peso das famílias em que pelo menos um dos
cônjuges é imigrante é, neste território, superior à globalidade da amostra.
180
O número total de elementos da família, segundo a naturalidade, não coincide com o total da amostra, pois alguns elementos apenas fizeram referência à nacionalidade.
318
Entre os elementos dos agregados familiares, com naturalidade no território
nacional, fora da AML, encontramos 31,9% dos progenitores. Destes 49,3% dos pais e
39,7% das mães são oriundos das regiões do centro e norte interior de Portugal. As
famílias nativas são, na sua maioria, naturais de concelhos da AML (68,1%),
destacando-se o concelho de Lisboa (90,5% dos naturais da AML). Este padrão geral
apresenta algumas variações nos dois territórios (Quadro IV.27). Entre as famílias dos
alunos do centro de Lisboa, o grupo maioritário (69%) é nativo e neste, 72,1% dos
elementos são naturais da AML e 27,9% de outros distritos do país. Entre os naturais
da AML aproximadamente 95% nasceram em Lisboa. Em Sintra, reduz-se o peso dos
portugueses (61,3%) no conjunto das famílias, relativamente a Lisboa e ao conjunto da
amostra, registando-se também maiores quantitativos de familiares com origem em
territórios exteriores à AML (35%). Ainda assim, cerca de 85% dos indivíduos naturais
da AML nasceram em Lisboa facto que, apesar de não se poder generalizar, indicia a
migração para este território de populações que anteriormente possam ter vivido na
cidade, movimentos associados à maior facilidade no acesso à habitação por parte de
populações mais jovens. Os portugueses oriundos de outros distritos do país são em
número superior ao registado nas famílias de Lisboa, diversificando-se também as
suas origens. Porém, a tendência do conjunto da amostra, para uma importante
presença de familiares do centro e norte interiores mantém-se neste território (41%
dos homens e 34,7% das mulheres).
Quadro IV. 27 – Origens das famílias inquiridas em cada território
Pai Mãe Total
nº % nº % nº %
Total 440 43,9 563 56,1 1003
Portugal 277 63,0 369 65,5 646 64,4
AML 187 67,5 253 68,6 440 68,1
outros distritos 90 32,5 116 31,4 206 31,9
Estrangeiro 163 37,0 194 34,5 357 35,6
Lisboa 176 43,3 230 56,7 406
Portugal 119 67,6 161 70,0 280 69,0
AML 85 71,4 117 72,7 202 72,1
outros distritos 34 28,6 44 27,3 78 27,9
Estrangeiro 57 32,4 69 30,0 126 31,0
Sintra 264 44,2 333 7,4 597
Portugal 158 59,8 208 62,5 366 61,3
AML 102 64,6 136 65,4 238 65,0
outros distritos 56 35,4 72 34,6 128 35,0
Estrangeiro 106 40,2 125 37,5 231 38,7
Fonte: Questionários às famílias 2009/2010. Cálculos da autora.
319
A análise das regiões de origem (Quadro IV.28) da totalidade dos familiares
não nativos (35,6%), evidencia a maior presença dos naturais de países africanos
(23,7%), em segundo lugar surgem os naturais de países da América do Sul,
fundamentalmente do Brasil (5,8%), na terceira posição os familiares oriundos de
países europeus de leste (3,2%), seguidos dos asiáticos (2%).
Quadro IV. 28 – Regiões de origem das famílias inquiridas em cada território
Pai Mãe Total
nº % nº % nº %
Total
Portugal 277 63,0 369 65,5 646 64,4
África 108 24,5 130 23,1 238 23,7
América do Sul 27 6,1 31 5,5 58 5,8
U.E. (15) 3 0,7 6 1,1 9 0,9
Europa Leste 14 3,2 18 3,2 32 3,2
Ásia 11 2,5 9 1,6 20 2,0
total 440 100,0 563 100,0 1003 100,0
Lisboa
Portugal 119 67,6 161 70,0 280 69,0
África 34 19,3 32 13,9 66 16,3
América do Sul 8 4,5 16 7,0 24 5,9
U.E. (15) 1 0,6 5 2,2 6 1,5
Europa Leste 5 2,8 7 3,0 12 3,0
Ásia 9 5,1 9 3,9 18 4,4
total 176 100,0 230 100,0 406 100,0
Sintra
Portugal 158 59,8 208 62,7 366 61,4
África 74 28,0 98 29,5 172 28,9
América do Sul 19 7,2 15 4,5 34 5,7
U.E. (15) 2 0,8 0 0,0 2 0,3
Europa Leste 9 3,4 11 3,3 20 3,4
Ásia 2 0,8 0 0,0 2 0,3
total 264 100,0 332 100,0 596 100,0
Fonte: Questionários às famílias 2009/2010. Cálculos da autora.
Desagregando as origens por país identificam-se entre as três principais
naturalidades dos familiares dos alunos os seguintes países: Angola, Cabo Verde e
Brasil (Fig. IV.31). Todavia, deste padrão geral, apenas se aproximam as famílias dos
alunos que frequentam as escolas de Sintra, com 28,9% de imigrantes oriundos de
África, 5,7% do Brasil e 3,4% da Europa de Leste. Os principais países de origem
voltam a surgir na sequência apresentada para o conjunto do grupo (Fig. IV.32). Entre
os familiares dos alunos do centro de Lisboa apenas um grupo de 66 indivíduos é
oriundo de países africanos (16,3%), 5,9% do Brasil, 3% da Europa de Leste e 4,4%
do continente asiático. Os quatro principais países de origem deste grupo são agora
320
Angola e Brasil (com os mesmos quantitativos), Cabo Verde e Moçambique (Fig.
IV.33). A maior diversidade de origens e a presença de quantitativos significativos de
população asiática no centro da cidade, já referidos em momentos anteriores, é
também um traço comum da amostra dos familiares que responderam ao questionário.
Estas diferenças, que reforçam as particularidades de cada território relativamente às
origens das famílias dos alunos, devem ser tidas em conta na análise das imagens
construídas sobre a escola e no olhar sobre o acolhimento que é feito no sentido da
integração das crianças e jovens.
Questionadas sobre o tempo de permanência no país, 50% das famílias
imigrantes referem ter chegado a Portugal há menos de 10 anos e 60% há menos de
15 anos. Quando analisadas as origens destas famílias constata-se que são
maioritariamente as naturais de países asiáticos, Brasil e leste europeu, as que se
encontram no país há menos de 10 anos. Comportamento que já tínhamos antes
constatado para os alunos de origem imigrante e que acompanha as mudanças que
caracterizam os movimentos migratórios com destino a Portugal.
Fig. IV.31 – Principais países de origem do total de famílias imigrantes inquiridas
Fonte: Questionários às famílias 2009/2010. Cálculos da autora.
Fig. IV.32 – Principais países de origem das famílias imigrantes (Sintra)
Fonte: Questionários às famílias 2009/2010. Cálculos da autora.
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Ucrânia
China
Roménia
S. Tomé Príncipe
Moçambique
Guiné Bissau
Brasil
Cabo Verde
Angola
número
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Rússia
S. Tomé Príncipe
Ucrânia
Roménia
Moçambique
Guiné Bissau
Brasil
Cabo Verde
Angola
número
321
Fig. IV.33 – Principais países de origem das famílias imigrantes (Lisboa)
Fonte: Questionários às famílias 2009/2010. Cálculos da autora.
Uma outra característica associada às famílias imigrantes que responderam
ao nosso inquérito, é a mobilidade residencial que apresentam, quer na cidade de
Lisboa, quer entre concelhos da AML, visível pelas referências à mudança de local de
residência que indicam no questionário. Para 51,1% das famílias residentes no centro
de Lisboa, à data do questionário, registou-se pelo menos uma alteração no local de
residência desde a chegada ao país. Entre as residentes em Sintra, 35,4% também
indicam ter mudado de local de residência, pelo menos uma vez desde a sua chegada.
Explorando os percursos realizados pelas famílias em cada um dos territórios
evidencia-se, na cidade de Lisboa, uma mobilidade entre freguesias vizinhas, sem
contudo se registar uma correspondência entre o perfil do itinerário realizado e as
origens familiares. Em Sintra, as trajectórias residenciais alargam-se à AML,
envolvendo preferencialmente freguesias da margem norte do Tejo, incluindo a cidade
de Lisboa. Na cidade de Lisboa estes percursos podem associar-se às oscilações
registadas no mercado de arrendamento, às situações de precariedade vividas no
mercado de trabalho e à instabilidade que caracteriza os primeiros anos de chegada
ao país. Em Sintra, a estes factores também se associa uma maior atractividade do
território para a aquisição de habitação, em particular entre as populações de origem
africana que se encontram há mais tempo na AML, detentoras de uma maior
estabilidade profissional e económica. Relembramos os níveis de escolaridade e os
percursos académicos anteriormente referidos por alguns dos familiares de origem
africana a residir neste território. A análise do tipo de habitação a que as famílias, em
cada território, referem ter acesso reforça as afirmações que acabamos de fazer: i) as
famílias de Lisboa recorrem com maior frequência ao mercado de arrendamento, 71%
das famílias imigrantes e 51% das famílias nativas, sendo que entre as primeiras é
0 5 10 15 20 25 30
Ucrânia
Roménia
Índia
S. Tomé Príncipe
China
Moçambique
Cabo Verde
Angola
Brasil
número
322
mais frequente o recurso ao mercado de habitação social (43,5%); em Sintra, apesar
das famílias imigrantes continuarem a recorrer ao mercado de habitação social para
arrendamento (24,2%), é significativa a percentagem de famílias imigrantes (62,5%) e
de famílias nativas (81,2%) que referem ter uma habitação própria.
A constatação da tendência registada, entre a população imigrante, para a
mobilidade entre locais de residência leva-nos a questionar sobre as consequências
deste processo nos percursos de integração dos próprios nos contextos sociais e
territoriais por onde se movimentam, mas também, entrando no cerne desta
investigação, na integração dos descendentes em contextos escolares. A instabilidade
associada à mudança de escola tem evidentes impactos na esfera relacional e
individual, pois abandonam-se os amigos e as referências construídas para se
recomeçar noutro local, até então desconhecido, mas onde se impõe a construção de
novas amizades e o convívio com novas regras e desafios na escola, entre colegas e
no bairro. Para esta população jovem, frequentemente com poucas referências sobre
os territórios onde se inserem quando chegam ao país, a instabilidade associada à
mudança de local de residência pode ser um factor que acrescenta maior grau de
dificuldade à sua integração.
Continuando a caracterização das famílias inquiridas centremo-nos agora na
análise da estrutura etária das mesmas. A média de idades dos progenitores que
compõem o núcleo familiar dos alunos inquiridos é, para os elementos masculinos, de
42,1 anos e, para os elementos femininos, de 39,2 anos. Entre os dois grupos de
origem, nativo e imigrante, registam-se médias de idades diferentes, quer para os
progenitores do sexo masculino, quer para os do sexo feminino, diferenças que são
estatisticamente significativas.181 Confirmamos assim que, tendencialmente, os pais
portugueses são mais velhos que os pais imigrantes (Quadro IV.29). Em Lisboa, o
padrão geral mantém-se: a média de idades dos pais e mães nativos é superior à dos
pais estrangeiros. Porém, as diferenças registadas não têm significado estatístico.182
Para as famílias dos alunos de Sintra, a diferença identificada na média de idades
181
Na comparação da média de idades entre os dois grupos recorreu-se à análise de variância ANOVA unifactorial tendo-se chegado ao resultado seguinte: Elementos masculinos – F = 5,92, com 2,444 graus de liberdade, com uma significância de p = 0,003. Elementos femininos – F = 6,55, com 2,556 graus de liberdade, com uma significância associada de p = 0,002. 182
Na comparação da média de idades entre os dois grupos, do centro de Lisboa, recorreu-se à análise de variância ANOVA unifactorial tendo-se chegado ao resultado seguinte: Elementos masculinos – F = 2,35, com 2,178 graus de liberdade, com uma significância de p = 0,098. Elementos femininos – F = 2,34, com 2,228 graus de liberdade, com uma significância associada de p = 0,098.
323
entre os pais nativos e os imigrantes é estatisticamente significativa apenas para os
elementos femininos.183
Quadro IV. 29 – Idade média dos elementos do agregado familiar
em cada território
Pai Mãe
Total 42,1 39,2
nativos 42,8 39,8
imigrantes 40,6 37,8
Lisboa 41,9 39,1
nativos 42,7 39,7
imigrantes 40,4 37,7
Sintra 42,0 39,1
nativos 42,9 39,9
imigrantes 40,7 37,9
Fonte: Questionários às famílias 2009/2010. Cálculos da autora.
A maioria das famílias da amostra é casada (72,3% dos elementos
masculinos e 57,8% dos elementos femininos). O peso dos núcleos familiares
constituídos apenas por um elemento feminino é de 30%. Entre as famílias de Sintra
identifica-se uma percentagem ligeiramente superior de cônjuges que contraíram
matrimónio (75,6% dos homens e 60,3% das mulheres). Ainda assim, é neste território
que se reconhece um maior peso relativo de mães a viverem sós (39,7%). No grupo
nativo, o peso das mulheres que vivem sós é de 32% e, no grupo de mães de origem
africana, o segundo mais numeroso, a percentagem ascende a 36,2%.
Atendendo à dimensão média das famílias, para o conjunto do grupo o valor
situa-se em 3,9 elementos, sendo nos núcleos autóctones de 3,8 e nas de origem
imigrante de 4,1. Contudo, a diferença na dimensão média dos agregados familiares
entre os dois grupos, apesar de ser visível não é estatisticamente significativa, pois o
valor de p é superior a 0,005. 184 Desagregando esta análise para cada território
identificam-se duas situações distintas: i) em Lisboa, a dimensão média das famílias é
de 3,8 indivíduos, mantendo-se este valor para os nativos e situando-se para os
183
Na comparação da média de idades entre os dois grupos, de Sintra, recorreu-se à análise de variância ANOVA unifactorial tendo-se chegado ao resultado seguinte: Elementos masculinos – F = 7,23, com 1,264 graus de liberdade, com uma significância de p = 0,008. Elementos femininos – F = 8,69, com 1,326 graus de liberdade, com uma significância associada de p =
0,003. 184
Os resultados da análise de variância ANOVA unifactorial revelam que o valor de F = 4,67, com 2,570 graus de liberdade e uma significância de p = 0,010.
324
agregados não nativos em 3,9; 185 em Sintra, a dimensão média das famílias é
ligeiramente superior à do conjunto do grupo (4 elementos), acentuando-se a distância
entre as famílias nativas e imigrantes, 3,9 indivíduos para o primeiro grupo e 4,3 para
o segundo, diferença comprovada estatisticamente pelos resultados da análise de
variância ANOVA.186
Perfil Socioeconómico
As famílias inquiridas têm um número médio de anos de escolaridade que
oscila entre 9,3 anos para os elementos do género masculino e 9,6 anos para os
elementos femininos. Desenham-se ligeiras diferenças em função da origem dos
progenitores residentes em cada território, mas sem significado estatístico. Todavia,
podemos assinalar as disparidades mais evidentes que ocorrem ao nível do género e
entre os dois contextos territoriais. O quadro IV.30 permite fazer a leitura destas
distâncias, apresentando-se as mães dos alunos residentes em Sintra no grupo
detentor de um número médio de anos de escolaridade superior (9,8 anos). Por outro
lado, os elementos masculinos, residentes neste território, têm menor número médio
de anos de escolaridade. Em Lisboa, as diferenças não são relevantes para os pais,
mas é de referir que é entre as mães imigrantes que se identifica o menor número
médio de anos de escolaridade no conjunto da amostra. Importa agora tentar
compreender quais são as principais diferenças entre os grupos de origem, em função
da sua naturalidade, de modo a traçar um perfil mais individualizado ao nível dos
grupos, que não é possível definir a partir desta análise.
Quadro IV.30 – Número médio de anos de escolaridade das famílias inquiridas
Lisboa Sintra Total
Pai nativo 9,4 9,2 9,3
imigrante 9,4 9,5 9,5
total 9,3 9,3 9,3
Mãe nativo 9,5 9,8 9,7
imigrante 9,0 9,8 9,5
total 9,3 9,8 9,6
Fonte: Questionários às famílias 2009/10. Cálculos da autora.
185
Os resultados da análise de variância ANOVA unifactorial revelam que o valor de F = 0,36, com 2,238 graus de liberdade e uma significância de p = 0,697. 186
Os resultados da análise de variância ANOVA unifactorial revelam que o valor de F = 11,51, com 1,330 graus de liberdade e uma significância de p = 0,001.
325
De modo a complementar a análise anterior, socorremo-nos do quadro IV.31
para fazer uma exploração dos graus de instrução, segundo a origem dos
progenitores. Desta análise identificam-se alguns aspectos que nos apraz sublinhar: i)
o ensino básico é o nível de escolaridade dominante em todo o grupo, correspondendo
a 50% dos elementos dos agregados familiares; ii) entre as mães imigrantes,
residentes em Lisboa, regista-se a maior percentagem, no conjunto dos elementos
femininos das famílias, de portadores de um curso pós secundário, quase
exclusivamente de nível superior (15,4%); iii) para as mães e pais imigrantes
residentes em Sintra, evidencia-se um peso relativo de licenciados superior ao dos
nativos (14,3% e 17,6%, respectivamente), que, no caso dos elementos masculinos, é
a percentagem mais elevada do conjunto do grupo.
Quadro IV.31 – Nível de ensino dos pais, por género e território
Desagregando a informação em função da naturalidade dos imigrantes,
constatamos que são as mães oriundas de países do leste europeu as que mais
contribuem para o peso do grupo feminino de imigrantes licenciadas no centro de
Lisboa (50% do total de mulheres licenciadas de origem imigrante). Porém, em Sintra,
também se evidencia um grupo significativo entre os elementos femininos oriundos de
África com habilitações de nível superior (50% do total de mulheres licenciadas de
origem imigrante). Os resultados obtidos para os elementos masculinos das famílias
residentes em Sintra associam-se também à população de origem africana (50% dos
pais imigrantes com um curso pós secundário) e brasileira (23,5% dos pais imigrantes
com um curso pós secundário). Do ponto de vista da integração importa compreender
se o facto de ser detentor de um grau de instrução superior significa uma mudança de
atitude perante a escola e as expectativas de integração. Será que estas famílias têm
326
um envolvimento diferente na escola e nas actividades a ela associadas? Será que
valorizam mais que as restantes a convivência em contextos de diversidade na
formação dos seus educandos? ou, simplesmente, adoptam a postura da maioria, não
sendo o grau de instrução uma variável com impacto significativo nas atitudes que
revelam ter?
Avançamos agora na caracterização das famílias relativamente a aspectos
que se prendem com a situação perante a profissão e com o acesso ao mercado de
trabalho. A análise da situação profissional da totalidade do grupo revela que é entre
os elementos masculinos que se regista o maior peso de indivíduos a exercer uma
profissão (84,6%), enquanto para a população feminina apenas ¾ se encontra nesta
situação. É para os familiares dos alunos do concelho de Sintra que estes resultados
são relativamente inferiores à tendência geral, com um maior peso de domésticas
(11,5% da população feminina) e de mulheres desempregadas (14,4% do total). Em
Lisboa a percentagem de mães que se encontram em situação de desemprego é de
11,9%, valor inferior ao registado para os pais e, também mais reduzido que o obtido
para o conjunto do grupo do sexo masculino (13,4%).
A maioria do grupo, a exercer uma profissão, encontra-se numa situação de
assalariado (77,5% dos homens e 83,3% das mulheres). Nos dois territórios a
tendência é semelhante, uma maior percentagem de mulheres assalariadas (83% para
77,5% dos homens) assim como de homens que trabalham por conta própria (17%
para 9% das mulheres).
Os grupos profissionais em que os inquiridos desempenham a sua actividade
apresentam um padrão um pouco diferente entre os dois sexos. Quase 50% dos
homens exercem uma profissão no grupo de pessoal dos serviços e vendedores,
seguindo-se o grupo de operários e artífices (24%), com uma distância significativa
dos dois principais grupos posicionam-se os activos das profissões intelectuais e
científicas (8,8%). A população feminina concentra-se também no grupo dos
profissionais de serviços e vendedores (44,8%), em segundo lugar no grupo do
pessoal administrativo (13,9%) e, na terceira posição no grupo de trabalhadores não
qualificados (7,4%), incluindo neste último as empregadas domésticas.187 Entre o sexo
feminino é significativo o conjunto que se identifica como doméstica (11,4%), sendo
este mais numeroso entre as famílias de Sintra (14,2%). Neste território reduz-se,
comparativamente à totalidade do grupo, a percentagem de homens que exercem a
187
No output das tabelas de contingência que cruzam as duas variáveis, grupo profissional e origem do
elemento do agregado familiar, o valor do teste do Qui-Quadrado, para os elementos do sexo masculino, com 22 graus de liberdade (df) é de 56, 773 (Value) com uma probabilidade associada de p = 0,000; para os elementos do sexo feminino, o valor do teste do Qui-Quadrado com 22 graus de liberdade (df) é de 66,716 (Value) com uma probabilidade associada de p = 0,000.
327
sua actividade no comércio e serviços (34,7%) e aumenta o peso dos operários
(33,1%), em particular dos trabalhadores da construção civil. As mães dos alunos das
escolas de Sintra têm um menor peso relativo no grupo profissional 9,188 pois são
apenas 3,9% as que desenvolvem tarefas não qualificadas, resultado inferior ao da
globalidade do grupo e ao dos elementos femininos das famílias de Lisboa, onde
12,6% ocupa postos de trabalho neste grupo profissional. Os elementos masculinos
dos agregados familiares dos alunos de Lisboa concentram-se no grupo profissional 5,
pessoal dos serviços e vendedores (40,7%), um peso superior ao registado para Sintra,
mas que resulta da localização do território em análise no contexto da cidade, uma
área predominantemente comercial, com uma grande presença do comércio étnico.
Neste território, reduz-se para 29,3% a percentagem de trabalhadores no grupo 7, que
engloba os operários da construção civil.
Em Lisboa, é maior o peso relativo dos familiares que desenvolvem
actividades nos grupos mais qualificados quando comparado com Sintra. Apesar de
globalmente a percentagem destes profissionais ser reduzida (8,8% dos homens e
5,1% das mulheres), em Sintra este valor é inferior (5,4% para os homens e 3,5% para
as mulheres) relativamente a Lisboa (6,8% para os homens e 7,4% para as mulheres).
Uma análise desagregada dos grupos profissionais, segundo a origem,
permite identificar diferenças importantes no padrão de distribuição, quer dos
elementos masculinos quer dos femininos. O factor “ser imigrante” tem resultados
muito significativos, nas tabelas de contingência do teste de Qui-Quadrado, excepção
apenas para os familiares do sexo masculino na cidade de Lisboa.189 Ainda que a
formação académica seja de nível superior, esta não tem uma correspondência directa
com a actividade profissional que a população imigrante se encontra a desenvolver no
país. Tal facto é uma evidência entre a população feminina de origem imigrante
residente em Lisboa, portadora de qualificações académicas de nível superior, mas
188
Grupos profissionais: 1. Quadros Superiores da Administração Pública, Dirigentes e Quadros Superiores de Empresas; 2. Especialistas das Profissões Intelectuais e Científicas; 3. Técnicos e Profissionais de Nível Intermédio; 4. Pessoal Administrativo e Similares; 5. Pessoal dos Serviços e Vendedores; 6.Agricultores e Trabalhadores Qualificados da Agricultura e Pescas; 7. Operários, Artífices e Trabalhadores Similares; 8. Operadores de Instalações e Máquinas e Trabalhadores da Montagem; 9. Trabalhadores não Qualificados; 0. Membros das Forças Armadas. 189
Lisboa – no output das tabelas de contingência que cruzam as duas variáveis, grupo profissional e origem do elemento do agregado familiar, o valor do teste do Qui-Quadrado, para os elementos do sexo masculino, com 22 graus de liberdade (df) é de 24,984 (Value) com uma probabilidade associada de p =
0,298; para os elementos do sexo feminino, o valor do teste do Qui-Quadrado com 18 graus de liberdade (df) é de 47,735 (Value) com uma probabilidade associada de p = 0,000. Sintra – no output das tabelas de contingência que cruzam as duas variáveis, grupo profissional e origem do elemento do agregado familiar, o valor do teste do Qui-Quadrado, para os elementos do sexo masculino, com 9 graus de liberdade (df) é de 36,400 (Value) com uma probabilidade associada de p = 0,000; para os elementos do sexo feminino, o valor do teste do Qui-Quadrado com 10 graus de liberdade (df) é de 436,965 (Value) com uma probabilidade associada de p = 0,000.
328
que exerce a sua actividade fundamentalmente nos grupos do pessoal dos serviços e
vendedores, e dos trabalhadores não qualificados.
Os elementos masculinos, de origem imigrante, exercem a sua profissão
maioritariamente no grupo dos operários e artífices: 44,7% em Lisboa e 53,4% em
Sintra. Esta situação não se verifica para a população nativa, empregada
preferencialmente no grupo do pessoal dos serviços e vendedores. Na terceira
posição, para os nativos e para os imigrantes, surgem os profissionais do grupo 2
(profissões intelectuais e científicas), sendo entre as famílias de Lisboa maior o peso
relativo de indivíduos no exercício destas funções (9,2% dos nativos e 8,5% dos
imigrantes). Um aspecto importante a reter é o que se reporta ao peso do desemprego
entre a população masculina de origem imigrante das famílias de Sintra (10,2%).
Os elementos femininos desempenham a sua actividade profissional
maioritariamente no grupo 5: em Lisboa o peso relativo é de 48,7% entre as mães
nativas e 40,7% entre as mães imigrantes; em Sintra metade das mães nativas e
32,8% das que têm origem imigrante. Uma importante diferença a registar refere-se à
posição que ocupam as mães nativas relativamente às imigrantes no grupo 4 (pessoal
administrativo e similares). Entre a população nativa, 16% em Sintra e 18% em Lisboa,
desenvolve a sua actividade neste grupo profissional e, entre a população imigrante, a
percentagem reduz-se para 10,9% em Sintra e 3,4% em Lisboa.
A composição, segundo as origens, dos activos no grupo profissional 2,
revela ligeiras diferenças entre as famílias de Lisboa e as de Sintra. Em Lisboa,
repete-se no registo identificado para os elementos masculinos dos agregados
familiares, maior percentagem no grupo nativo (7,9%) por comparação com o grupo
imigrante (5,1%). Em Sintra, a situação inverte-se, ainda que com diferenças muito
ligeiras, o maior peso de activos no grupo profissional 2 regista-se entre as mães
imigrantes (4,2%) relativamente às mães nativas (3,1%).
Em relação aos quantitativos de desempregados entre a população feminina
identifica-se, tal como para a população masculina, maiores percentagens entre as
mulheres imigrantes residentes em Sintra (18,5%) comparativamente a Lisboa (3,4%),
sendo também mais elevada a percentagem de domésticas (23,5%) entre as famílias
imigrantes residentes neste território por comparação com as do centro da cidade
(16,9%). É ainda de salientar, nesta caracterização dos grupos profissionais, a
distância entre a percentagem de mulheres de origem imigrante que exerce uma
actividade profissional não qualificada em Lisboa (28,8%) relativamente ao grupo de
Sintra (5,9%).
A maioria das famílias inquiridas tem no salário a principal fonte de
subsistência, porém, registam-se diferenças entre os dois territórios que é importante
329
referir. Em Lisboa, a percentagem de famílias que recorre ao subsídio de desemprego
e rendimento social de inserção é de 5,9%. Em Sintra, esta percentagem reduz-se
para 4,9%. Ainda assim, neste território, tem algum significado o contributo das ajudas
de amigos/familiares no rendimento do agregado familiar.
A análise da natureza do rendimento familiar em função da origem das
famílias revela algumas diferenças entre os dois grupos. No caso dos familiares dos
alunos das escolas do centro da cidade as diferenças registadas são estatisticamente
significativas190 e evidenciam, entre a população nativa, a importância do recurso ao
subsídio de desemprego e ao rendimento social de inserção. Entre as famílias de
Sintra ocorrem também algumas disparidades, nas fontes de rendimento, entre nativos
e imigrantes, contudo, estas não têm significado estatístico.191 No grupo de famílias
imigrantes é maior o peso das que têm rendimentos próprios e recorrem à ajuda de
amigos e familiares, assim como é um pouco mais elevada, comparativamente às
famílias nativas o peso das que usufruem do rendimento social de inserção e do
subsídio de desemprego. Apesar de não se registarem grandes disparidades,
relativamente à natureza dos rendimentos das famílias atendendo às suas origens,
quando recorremos à análise dos escalões de rendimento, acentua-se a distância
entre as famílias nativas e as de origem imigrante. Em Sintra, a análise global dos
rendimentos dos familiares dos alunos indica que 186 famílias auferem de um
rendimento até 1000 € mensais, o que representa 57,4%; se a estes acrescentarmos
os 92 núcleos familiares que se situam no escalão entre os 1000€ e 2000€ esta
percentagem atinge o valor de 85,8%. Para as famílias imigrantes acentua-se o peso
relativo nos escalões mais baixos de rendimento (73,6% têm rendimentos mensais
inferiores a 1000€), comparativamente à percentagem de famílias nativas (47,8%). Em
Lisboa, a distribuição dos rendimentos familiares mantém um padrão semelhante ao
de Sintra: 61,7% aufere de um rendimento mensal até 1000 € e 85,5% até 2000 €. A
percentagem de famílias que vive com um rendimento inferior a 450€ é idêntica nos
dois territórios (aproximadamente 13%). Nos agregados familiares residentes no
centro de Lisboa registam-se, tal como em Sintra, diferenças estatísticas significativas
na distribuição dos rendimentos entre nativos e imigrantes. São as famílias nativas que
auferem de rendimentos superiores a 1000€ mensais: em Lisboa, este grupo atinge a
percentagem de 47,2% e, em Sintra, chega aos 52,2% (Quadro IV.32).
Quadro IV.32 – Rendimento mensal das famílias inquiridas, segundo a origem (%)
Escalões de Rendimento Mensal (€)
menos 450 450-1000 1000-2000 2000-3000 3000-5000 total
Lisboa
Autóctone 6,3 46,5 28,3 10,1 8,8 100,0
Imigrante 29,2 52,3 13,8 4,6 0,0 100,0
total 30 110 54 19 14 227
Sintra
Autóctone 6,9 40,9 35,0 11,8 5,4 100,0
Imigrante 19,8 53,7 17,4 6,6 2,5 100,0
total 38 148 92 32 14 324
Fonte: Questionários às famílias 2009/10. Cálculos da autora.
Lisboa - Qui -Quadrado = 112,712, df = 10, p = 0,000
Sintra - Qui -Quadrado = 25,442, df = 4, p = 0,000
Comparando globalmente os dois territórios, a partir das diversas variáveis
que caracterizam as famílias dos alunos, é possível identificar um conjunto de
aspectos que consideramos relevantes para as análises posteriores:
a composição dos agregados familiares, atendendo às origens dos
elementos que os constituem, diferem nos dois territórios – em Lisboa,
a maioria das famílias é constituída por dois elementos nativos,
enquanto em Sintra, só em cerca de 50% das famílias os dois
elementos são nativos;
em Sintra, entre as regiões de origem das famílias de origem
imigrante, evidencia-se um peso significativo dos elementos oriundos
de países africanos (cerca de 30%), surgindo, com percentagens
menores, os agregados familiares com naturalidade no Brasil e em
países da Europa de Leste;
em Lisboa, apesar do grupo mais significativo de respondentes
imigrantes também ter origem em países africanos (16%), este é mais
reduzido quando comparado com Sintra, surgindo com algum
significado, o grupo de famílias oriundas do continente asiático, que
na amostra é superior aos cidadãos do leste europeu;
a dimensão média das famílias não apresenta grandes disparidades
entre nativos e imigrantes no centro de Lisboa (3,8 e 3,9 elementos
respectivamente), revela-se em Sintra com uma dimensão superior,
em particular entre as famílias imigrantes (4,3 elementos);
é frequente que os pais e mães nativos se situem em escalões etários
superiores relativamente aos imigrantes, contudo, não são
significativas as diferenças encontradas na média de idades entre os
dois territórios;
331
as diferenças encontradas nos graus de instrução, em função das
origens das famílias, evidenciam a tendência para o peso de
licenciados ser superior entre as de origem imigrante – são as mães
oriundas dos países do leste europeu que em Lisboa se situam nesta
posição e, em Sintra, os mais graduados são os pais de origem
africana;
quando se compara a situação na profissão para cada grupo (nativo e
imigrante) constata-se, entre as mães imigrantes residentes em Sintra,
um maior número de desempregadas e de domésticas;
os grupos profissionais em que as famílias exercem as suas
actividades não seguem a mesma sequência nos dois territórios – a
grande diferença identifica-se no maior peso dos profissionais dos
serviços e vendedores no centro de Lisboa e, em Sintra, nos maiores
quantitativos de operários entre os elementos masculinos, em
particular na construção civil;
associado à actividade profissional que desempenham está o
rendimento familiar e, neste domínio, é entre as famílias imigrantes
que se contabiliza o maior número de agregados familiares que
auferem de um rendimento mensal inferior a 1000 €, 81,5% das
famílias residentes no centro de Lisboa e 73,6% das residentes em
Sintra;
as famílias de imigrantes residentes no centro da cidade revelam ter
maior mobilidade em termos de local de residência, quando
comparadas com as residentes em Sintra, mobilidade que se realiza
fundamentalmente entre freguesias vizinhas.
Sobre o perfil das famílias que responderam ao questionário, quando
comparado com o perfil traçado a partir dos questionários realizados aos alunos,
concluímos que as principais diferenças se situam: i) quanto ao total de respondentes,
no menor número de respostas das famílias dos alunos de Lisboa; ii) quanto às
origens, no maior peso relativo de respostas entre as famílias nativas, em Lisboa e em
Sintra; iii) quanto aos países de origem, no número reduzido de famílias asiáticas que
responderam ao questionário em Lisboa, situação que em Sintra se regista entre as
famílias de origem guineense; iv) quanto aos níveis de escolaridade, o peso
significativos de famílias imigrantes, com níveis de formação pós secundária ou
superior que responderam ao questionário em Sintra.
332
4.3. Dimensão relacional – percepções, vivências e sociabilidades construídas
na escola
As características da população inquirida nas escolas dos agrupamentos em
estudo, complementadas pela anterior caracterização dos territórios onde estas se
localizam, contextualizam a análise que se desenvolve de seguida. Pretende-se
compreender, a partir de quatro actores fundamentais, alunos e famílias, directores de
escola e professores, as dinâmicas de integração dos estudantes imigrantes do ensino
básico em escolas localizadas em dois territórios da AML.
As transformações estruturais de que têm sido alvo estes territórios,
traduzindo-se pela desagregação de alguns quadros tradicionais ou, na perspectiva de
Giddens (2000) pela destradicionalização, resultante do aumento da diversidade
sociocultural, têm desencadeado processos sociais e culturais complexos com impacto
no quotidiano das escolas, “já que interferem sobre os seus processos internos e se
traduzem inevitavelmente por novos quadros de relações entre o sistema educativo e
os contextos sociais e políticos com que este se relaciona.” (Sebastião, Alves &
Campos, 2010, p.15).
Nos territórios em estudo, a diversidade sociocultural é uma característica da
comunidade escolar. Porém, esta apresenta traços distintos quando comparamos o
centro da cidade com a área suburbana. Na perspectiva da população imigrante, a
diversidade de origens não se anuncia da mesma forma: o peso da primeira e da
segunda geração é diferente e os tempos de permanência no país também não são
iguais; do lado da escola, os percursos realizados no acolhimento de imigrantes têm
tempos e ritmos diferentes e os territórios que servem apresentam características
urbanas e socioculturais particulares. Os aspectos que acabamos de elencar têm
impactos nas dinâmicas internas das estruturas educativas, nas orientações de política,
nas relações que se constroem, nos percursos escolares e, consequentemente, nos
percursos de integração. É na compreensão dessas dinâmicas de interacção,
desencadeadas pelas escolas e pelos diversos actores envolvidos no processo, que
se constrói a trajectória seguinte da presente investigação, identificando traços
comuns e aqueles que distanciam as estratégias de integração que se desenvolvem
nos dois territórios.
Construímos o estudo do processo de integração assente nos dois pilares
que temos vindo a definir, mobilizando para a análise da dimensão relacional um
conjunto de questões que se organizam em três grandes estruturas: i) a escola,
enquanto espaço de acolhimento, envolvendo uma dimensão de relação física e
humana e, neste sentido, as variáveis de análise emergem, a partir dos alunos, do
333
conjunto de questões construídas em torno dos motivos para a frequência da escola,
da definição de escola, dos aspectos positivos e negativos identificados a partir das
vivências neste espaço; ii) os grupos de pares, actores e agentes das relações de
sociabilidade construídas na escola e, iii) a comunidade extra-escolar, onde as
relações sociais podem prolongar as relações de amizade construídas na escola. De
modo a compreender o papel dos vários intervenientes no processo, a análise das
respostas apresentadas pelos alunos é cruzada com a análise das respostas das
famílias.
4.3.1. Porquê ir à escola
No sentido de delinear uma primeira abordagem às motivações inerentes à
frequência da escola, desafiámos os alunos a ordenar, entre um conjunto de factores,
três motivos prioritários para a sua presença na instituição. Os resultados indicam que
para os diferentes anos de escolaridade, e nos dois territórios, os alunos não hesitam
em colocar o factor aprendizagem como o motivo prioritário para a frequência da
escola. Tendencialmente, na segunda posição, surge o factor “conviver com os
colegas” para os diferentes grupos e anos de escolaridade, excepção feita por alguns
grupos de alunos, que posicionam o factor “poder continuar a estudar no futuro” como
segunda prioridade. Neste grupo, apenas se incluem os estudantes de origem
imigrante que frequentam o 6º ano nas escolas do centro de Lisboa e os alunos
nativos, do 6º ano, que frequentam as escolas de Sintra. Curiosamente, o convívio
com os colegas volta a surgir com maior frequência entre os factores que os alunos
colocam na terceira posição, independentemente das suas origens e ano de
escolaridade em que se encontrem nas escolas de Lisboa. Para os alunos de Sintra,
as opiniões sobre o terceiro motivo que justifica a frequência da escola distribuem-se
entre a “obrigação de estudar”, opção apontada pelos alunos imigrantes de 4º ano e, o
“poder continuar a estudar no futuro”, referência dos descendentes de imigrantes do 6º
e 9º anos, partilhada pelos colegas nativos do 9º ano.
Embora seja difícil avançar com padrões particulares de respostas,
relativamente às motivações para frequentar a escola, decorrentes da origem dos
alunos, evidencia-se uma tendência geral para a conotação da instituição como
espaço de realização de aprendizagens e de convívio com os colegas. Os dois
factores que os alunos mais frequentemente colocam na primeira e segunda posições.
A preocupação com as possibilidades que a escola abre para a construção do futuro,
surge apenas entre as motivações identificadas pelos estudantes de Sintra, em
particular entre os imigrantes. Sobre esta postura, tentaremos indagar, a partir dos
questionários realizados às famílias, se é resultado das expectativas que estas
334
depositam nos seus jovens e da preocupação que revelam ter quanto ao futuro dos
seus descendentes, transferindo para estes uma imagem da escola enquanto espaço
que prepara para o futuro e que lhes garante as condições de mobilidade social a que
os pais não tiveram acesso. Já, anteriormente, nos reportámos à importância que as
famílias imigrantes depositam na educação dos seus filhos, como forma de garantir a
sua integração na sociedade de acolhimento e de proporcionar, através do
desenvolvimento de uma profissão mais qualificada, oportunidades de mobilidade
social no país onde se fixaram. Investigaremos, de seguida, se este sentimento a que
Portes e Rumbaut (2001) se reportam nos seus estudos sobre os descendentes de
imigrantes nos EUA, emerge a partir da análise dos questionários realizados às
famílias destes estudantes.
Nas expectativas que revelam ter sobre a função da escola, os familiares dos
alunos reportam-se, com maior frequência, à realização de aprendizagens curriculares
(do domínio do saber) e, associado a estas, valorizam o papel da escola no
desenvolvimento de competências sociais (relacionar-se com os outros e com a
sociedade). Neste sentido, as famílias colocam na terceira posição as expectativas
relativamente à “competência”, à “exigência”, à “organização” e à “responsabilidade”
da escola, referências feitas, em particular, pelas famílias de origem imigrante. De um
modo geral, à escola, é ainda atribuída a importante função de preparar as crianças e
jovens para o futuro, atitude revelada quer pelas famílias nativas, quer pelas de origem
imigrante. Sobre as expectativas que são depositadas na escola pelos familiares dos
alunos, é difícil, tal como anteriormente, identificar posturas diferentes entre os pais de
origem imigrante e os pais nativos, assim como não são evidentes tendências que
permitam distinguir os dois territórios. Porém, a confiança revelada anteriormente
pelos jovens sobre o contributo da escola no seu futuro, parece ser uma construção
feita no núcleo familiar. Esta atitude é assumida de forma particular pelos jovens
nativos e de origem imigrante que frequentam as escolas de Sintra.
A confirmar-se a proximidade de expectativas dos alunos e das famílias face
à escola, ela pode traduzir-se numa disponibilidade, à partida, nas crianças imigrantes
para se integrarem na dinâmica educativa das escolas. Se assim for, recai sobre estas
e sobre as competências que os jovens trazem de início a explicação para os seus
níveis de desempenho. Todavia, parece desenhar-se uma contradição entre os dois
pólos, famílias e escola. Se, por um lado, constatamos que as expectativas que as
famílias depositam na escola permitem criar importantes níveis de confiança nos
alunos, por outro lado, confrontamo-nos com a imagem negativa que os
representantes das escolas transmitem sobre as expectativas das famílias
relativamente à instituição.
335
Para os representantes dos órgãos directivos dos agrupamentos, 192 as
expectativas que as famílias depositam na escola ficam aquém do desejado, ainda
que reconheçam que são diversas. Apesar de, na generalidade, não conseguirem
estabelecer diferenças significativas entre famílias nativas e imigrantes, facilmente nos
desenham, para as últimas, imagens que associam a questões culturais e a origens
diversas, como atestam os relatos seguintes:
“ Os africanos esperam que a escola os substitua, faça o seu papel, substitua
a casa. A escola é um espaço onde podem ter os filhos, sabem onde eles estão… Os
brasileiros têm outras expectativas, esperam que os descendentes atinjam outro
patamar e envolvem-se. Os europeus de leste fazem todos os sacrifícios, são muito
responsáveis, mais que os portugueses. Brasileiros, europeus de leste e portugueses
olham para a escola mais como um local de aprendizagem.” (DS1);
“O ponto de partida é diferente… os africanos, são os que revelam ter menos
expectativas, assim como os brasileiros que vêm de situações de exclusão. Os
europeus de leste, depositam muitas expectativas na escola – dever, disciplina – são
famílias participativas.” (DS2)
“Algumas famílias vêem a escola como uma obrigatoriedade, uma forma de
receberem os subsídios e das crianças terem alimentação.” (DL2)
“Algumas crianças asiáticas vêm à escola porque é obrigatório.” (DL2)
Na assertividade revelada nas respostas dos responsáveis pelos
agrupamentos de escolas sobre as fracas expectativas das famílias em relação à
instituição, identificam-se diferenças de postura que são dignas de registo, na
continuação da análise. Neste sentido, é importante compreender se as imagens
construídas se associam a estereótipos ou, são uma evidência na postura revelada
por alunos e familiares. A relação família escola é um dos elementos fundamentais na
integração das crianças e jovens (López, 2001; Turkey & Kao, 2009; Maiztegui &
Ibarrola (s.d.)). Uma atitude distante relativamente à escola e ao papel da instituição,
por parte das famílias, pode ter um efeito idêntico nos alunos, na valorização que
fazem da instituição e na postura que, de um modo geral, revelam ter sobre os seus
percursos escolares.
192
Os excertos das entrevistas que são mobilizados para o estudo estão identificados com a letra D (direcção da escola) e o código do agrupamento a que se reportam, anteriormente definido. As siglas utilizadas combinam as letras D e L ou D e S e o número atribuído ao agrupamento.
336
4.3.2. Percepções construídas sobre a escola
Colocar os alunos perante a tarefa de definir a escola que frequentam, com
recurso a três palavras, permite avançar com as dimensões que caracterizam o olhar
sobre a instituição por parte dos seus protagonistas. Este olhar, resultado das
vivências quotidianas e das relações diárias construídas por cada aluno com o espaço
físico em que se movimenta, com os adultos e com os seus pares, conduz-nos à
identificação do papel atribuído à instituição, às vivências com os restantes elementos
da comunidade e aos laços que a partir destas se constroem no sentido da
socialização e da integração.
Para os alunos inquiridos, a escola é definida, fundamentalmente, por um
conjunto de aspectos positivos (71,6% dos termos utilizados na definição de escola). A
diversidade de palavras utilizadas na construção do conceito obrigou-nos ao seu
agrupamento, em primeiro lugar entre aspectos positivos e aspectos negativos e, de
seguida, em cinco categorias que pretendem ilustrar as dimensões utilizadas na
definição de escola: recursos físicos, aspectos humanos, ludicidade, função educativa
e higiene dos espaços. As três categorias que surgem mais valorizadas, segundo a
importância que lhes é atribuída são: os aspectos físicos, directamente relacionados
com os espaços disponibilizados e o estado de conservação dos mesmos “a escola é
grande”, “a escola tem recreio”, “a sala de aula tem mesas e cadeiras”, “a escola é
bonita”; as relações com os adultos, “gosto muito da professora”, “as auxiliares
ajudam…” e, a uma distância maior em número de referências, a função educativa que
se traduz na utilização de palavras como “aprender”, “ler”, “educar”.
Numa análise global, das opiniões de todos os alunos inquiridos não se
identificam atitudes muito díspares entre nativos e imigrantes, assim como também
não se evidenciam atitudes particulares entre os vários grupos de imigrantes em
estudo. De um modo geral, há uma imagem positiva da escola e, mesmo quando a
relação com o espaço físico não é das melhores, porque o edifício não oferece as
condições esperadas, o campo relacional aparece valorizado pelas relações
construídas com os adultos. Quer para a primeira, quer para a segunda geração é
muito importante “o professor ser amigo”, “ajudar” e “ser compreensivo”, e também os
assistentes operacionais estabelecerem uma boa relação com os alunos.
As alusões negativas utilizadas na definição de escola colocam, mais uma
vez, em primeiro lugar, a dimensão física, em segundo lugar, os aspectos relacionados
com a higiene dos espaços e, em terceiro lugar, a função educativa. As referências à
insegurança são mais comuns entre os alunos que frequentam o 6º e 9º anos. Neste
campo, os mais pequenos gozam de uma maior protecção nas escolas que
frequentam e, em particular, nas escolas do centro de Lisboa, pelo facto de muitas
337
serem de reduzida dimensão. Têm um professor titular de turma, com quem passam a
maior parte do seu tempo, têm uma sala de aula de referência, o contexto em que se
movimentam é mais restrito e, no geral, a combinação destes factores garante um
ambiente mais seguro.
Se, globalmente, entre os alunos nativos e imigrantes não se registam
grandes disparidades na concepção que apresentam de escola, quando
desagregamos a informação de que dispomos, por ciclo e para cada território em
estudo, evidenciam-se algumas diferenças nas suas representações.
A maior valorização que é feita dos aspectos positivos entre os alunos que
frequentam os agrupamentos de Lisboa (81,1% das referências), relativamente aos
seus pares que frequentam as escolas de Sintra (62,1% de referências), surge como
um primeiro elemento distintivo. É também nas escolas deste território que se regista
uma maior distância entre os alunos autóctones e os imigrantes na frequência com
que recorrem à utilização de referências positivas para definir escola: entre os
primeiros, apenas 56,3% dos termos mobilizados tem uma conotação positiva na
construção do conceito, enquanto para os colegas não nativos 67,9% das referências
utilizadas avalia positivamente a escola. Relativamente a esta posição, podemos
questionar se o maior desagrado registado pelos estudantes nativos em Sintra está
relacionado com o facto de conviverem em escolas onde o peso da população não
nativa faz com que se sintam em minoria. Não sendo possível, desde já, assumir esta
hipótese como confirmada, é importante que seja tida em conta na continuação da
exploração de outras variáveis de que dispomos.
Por seu lado, os alunos que frequentam as escolas de Lisboa revelam alguma
uniformidade na utilização de referências positivas nas suas respostas, quer entre
ciclos diferentes, quer para as diversas origens em análise. Os aspectos mais
valorizados no 4º ano reportam-se às características físicas da escola
(aproximadamente 50% das referências), aos aspectos de relação com os
adultos/relações humanas (30,0% das referências positivas) e, em terceiro lugar, à
função educativa da instituição (11,7% das referências). Parecendo contrariar estas
opiniões, os directores dos agrupamentos do centro de Lisboa revelaram, nas
entrevistas que concederam, uma grande apreensão com os espaços onde estão
instaladas algumas escolas, pelo facto de não terem sido pensados para as funções
que hoje desempenham, não terem recreios e serem desadequados na sua dimensão.
Este é um exemplo que nos ajuda a ilustrar de que modo os diferentes agentes,
encontrando-se em pontos de observação distintos, fazem, por isso, uma apreensão
diferente da realidade. No 6º ano a tendência anterior mantém-se; no entanto, coloca-
se uma maior distância na valorização dos aspectos físicos (56,1%) relativamente à
338
dimensão humana (17,1%). É entre este grupo de alunos que se regista uma ligeira
distância entre os imigrantes e os nativos na valorização que fazem dos aspectos
humanos nas suas respostas: para os primeiros, este é um elemento com maior
relevância na definição de escola, surgindo com 20% das referências, facto que
reflecte a tónica que é colocada na escola como espaço privilegiado de relação. É
entre o grupo que frequenta o 9º ano que se assinala um olhar diferente dos anteriores
relativamente à escola, definindo-a fundamentalmente pelas características humanas
(46,5% das referências), relegando para segundo plano as características físicas
(35,4%). Esta diferença pode ser explicada se tivermos em linha de conta a tendência
para os jovens adolescentes sobrevalorizarem as relações humanas, em particular
entre os pares. Este tópico será retomado mais adiante.
Entre os alunos de Lisboa, as referências negativas seguem a tendência
geral apresentada. Os aspectos físicos, que se relacionam com a degradação de
alguns edifícios, e a escassez de espaços de recreio e de prática desportiva surgem
entre as expressões mais utilizadas (75,0% dos termos mobilizados pelos alunos do 4º
ano, 32,3% dos utilizados pelo 6º ano e 37,6% pelo 9º ano). As questões associadas à
higiene estão entre os aspectos que os alunos mobilizam com alguma frequência nos
diferentes anos (entre 13,1% e 16,7% das referências). Nas posições seguintes
surgem referências às relações humanas com os adultos, o não gostar dos
professores ou das atitudes dos assistentes operacionais, a confusão e o barulho
existente no espaço da escola. Todavia, entre os alunos que frequentam o 9º ano e,
em particular, entre os de origem imigrante, a associação da escola à insegurança é
frequente entre os aspectos negativos mencionados (22,2% das referências), mais
importante que as questões relacionadas com a higiene dos espaços valorizadas
pelos colegas mais novos. Um sentimento que pode estar associado a uma menor
identificação com o espaço, por desconhecimento do mesmo, e a uma ausência de
protecção ou isolamento num grupo em que se encontra em minoria.
Se, entre os alunos que frequentam as escolas do centro da cidade, é
evidente o peso dos aspectos positivos na imagem que revelam ter da escola, também
é notório que à medida que a sua idade aumenta a exigência em relação à instituição
vai sendo maior. Como tal, os alunos enumeram um leque mais diversificado de
aspectos e a frequência das referências negativas (43,1%) aproxima-se das positivas
(56,9%).
No que diz respeito aos alunos de Sintra, começando a análise pelos que
frequentam o 4º ano de escolaridade, regista-se um padrão nas referências utilizadas
na definição de escola idêntico ao que descrevemos para Lisboa, acrescido de uma
maior frequência de referências positivas (92,1% dos termos utilizados). Contudo, nos
339
ciclos seguintes, a imagem que os estudantes transmitem da escola afasta-se da dos
seus colegas do centro da cidade: os aspectos negativos surgem entre os mais
utilizados na construção do conceito, acentuando-se a sua utilização entre os
estudantes do 9º ano.
Assim, para o conjunto dos alunos do 6º ano, mais de metade das referências
recaem sobre os recursos físicos da instituição, seguidas das referências sobre a
higiene das instalações. A principal diferença situa-se então quando, em terceira
posição, os imigrantes valorizam as relações com os adultos, enquanto os autóctones
salientam os aspectos relacionados com a segurança.
Por seu lado, os estudantes do 9º ano indicam, em mais de metade das suas
referências, os aspectos físicos mas, os nativos definem a escola também pela
insegurança (20,2% das referências utilizadas) e pela fragilidade das relações com os
adultos (11,9% das referências); os alunos com background imigrante revelam ter uma
imagem mais segura da escola (apenas 12,8% das referências se direccionam para
este problema), mas acentuam, de forma negativa, as relações com os adultos (em
23,4% dos vocábulos utilizados).
Em síntese, entre as imagens que os alunos transmitem da escola revela-se
uma maior conotação da mesma como um espaço inseguro entre os estudantes mais
velhos, quer para os alunos de origem imigrante, no centro de Lisboa, quer entre os
alunos nativos que frequentam as escolas de Sintra. Os contextos em que se inserem
têm características diferentes em termos de quantitativos de população imigrante. Se,
para Lisboa, a menor presença e a maior diversidade de alunos imigrantes pode
conduzir a sentimentos de insegurança por parte destes, por conviverem num
ambiente escolar em que claramente estão em minoria, em Sintra, a situação inverte-
se, nas escolas em estudo, isto é, os alunos imigrantes são a maioria podendo ser
este o factor desencadeador do sentimento de insegurança a que se reportam os
alunos nativos.
Desta primeira abordagem sobre os olhares que nos transmitem sobre o
conceito que têm de escola, através das respostas aos questionários, emerge um
conjunto de considerações que, na perspectiva da integração, é importante sublinhar:
a imagem construída sobre a escola é, na generalidade, positiva – as
diferenças registadas evidenciam-se entre ciclos de estudo e
territórios;
entre os alunos que frequentam o 4º ano, nos dois territórios, não se
registam diferenças significativas na concepção que revelam ter de
escola – os recursos físicos em primeiro lugar no conjunto de opções
340
e as relações com os adultos, em segundo, destacam-se entre os
principais atributos da escola;
os alunos que frequentam as escolas do centro de Lisboa revelam ter
uma imagem mais positiva das mesmas;
em Sintra, o olhar revelado por nativos e imigrantes recorre com
maior frequência a elementos negativos, em particular no que diz
respeito aos alunos nativos que frequentam o 6º e 9º anos;
em Lisboa regista-se uma maior uniformidade no olhar sobre a escola
por parte dos dois grupos de alunos, evidenciando-se uma maior
exigência perante a instituição e uma menor valorização dos aspectos
positivos por parte dos estudantes de 9º ano;
em Lisboa, os alunos do 6º e 9º anos valorizam muito, na imagem que
transmitem da escola, as relações humanas com os adultos,
destacando-se os alunos de origem imigrante que frequentam o 6º
ano;
em Lisboa, os alunos de 9º ano, imigrantes e descendentes de
imigrantes, colocam a (in)segurança entre os indicadores que utilizam
para transmitir a imagem negativa da escola;
em Sintra, a fragilidade nas relações com os adultos e a
(in)segurança são elementos que constituem a imagem negativa dos
alunos nativos do 9º ano;
os alunos com background imigrante das escolas de Sintra revelam
um olhar sobre a escola como um local seguro, mas com fragilidades
nas relações que constroem com os adultos.
Reflectindo sobre este primeiro olhar em torno da escola, à luz do conceito de
integração, constatamos que a imagem geral positiva que todo o grupo revela ter é por
vezes contrariada. Quando desagregamos a informação por ano de escolaridade e por
território, as concepções gerais anunciam algumas mudanças que nos levam a
questionar sobre o sentido da integração em contextos e grupos particulares.
Evidenciam-se dois aspectos, relações com os adultos e insegurança associada ao
espaço da escola, que podem interferir de modo menos positivo no sentido da
integração. Estas referências ocorrem nos dois territórios ainda que nem sempre
associadas aos aspectos negativos que os alunos de origem imigrante identificaram
sobre a escola.
341
A este respeito, questionamo-nos sobre as associações que é possível
estabelecer com os contextos territoriais: um, marcado pela diversidade e com
menores quantitativos de população imigrante; outro, caracterizado por uma forte
presença de estudantes de origem imigrante, de primeira e de segunda geração,
provenientes, na sua maioria, de países africanos. Encontramo-nos, portanto, perante
contextos territoriais que diferem pela composição da população imigrante que
acolhem e pela sua história na recepção desta população. Estes factores parecem
interferir nas imagens que os alunos nos transmitem da escola, em particular nos
aspectos que se reportam às relações humanas: os sentimentos de insegurança e as
relações construídas com os adultos, dois elementos fundamentais no processo de
integração, emergem dos dois pilares que a sustentam, a população imigrante e as
instituições na sociedade de acolhimento. Assim, o processo de integração implica
mobilizar, por um lado, a responsabilidade dos profissionais de educação no sentido
de garantir uma escola segura e promover elos de relação e confiança dentro dos
estabelecimentos de ensino e, por outro lado, implicar os estudantes e as respectivas
famílias na construção de um ambiente acolhedor, no qual todos são responsáveis.
Este olhar cruzado, para quem acolhe e para quem pretende ser acolhido, é
fundamental na análise da dinâmica do processo de integração.
Se na primeira questão, os alunos eram solicitados a definir a escola,
podendo mobilizar, para isso, as representações que possuem sobre a instituição, na
segunda questão tentámos garantir que os alunos nos indicassem, objectivamente,
quais eram os aspectos positivos e os aspectos negativos que nela identificam. Pelos
resultados obtidos na primeira questão, é clara a aproximação entre as respostas às
duas questões. De qualquer modo, como veremos um pouco mais à frente, existem
diferenças que importa registar.
Assim, os resultados para a segunda questão apresentam, no geral, um
padrão semelhante. Quanto aos aspectos positivos, as condições físicas voltam a
ser colocadas em primeiro lugar, para todos os anos de escolaridade, com 37% a 47%
das respostas nas escolas de Sintra e, entre 47% e 54%, nas escolas de Lisboa.
Quanto aos aspectos humanos em geral, as relações com os adultos e com os pares
posicionam-se no segundo e terceiro lugares para os diferentes anos de escolaridade,
sendo as primeiras um pouco mais valorizadas nas escolas do centro da cidade, onde
ocupam sempre a segunda posição entre as respostas dos estudantes (entre 12% e
23%).
Se, no que diz respeito aos aspectos físicos, nada mais há a acrescentar se
tivermos presente as respostas já dadas na primeira questão, no que diz respeito às
relações humanas importa aprofundar um pouco a nossa análise.
342
São os alunos com origem em países de língua portuguesa que no 4º ano
mais elogiam a relação com os adultos, enquanto os seus colegas oriundos da Europa
de Leste e da Ásia atribuem maior destaque às relações com os pares, uma
valorização que provavelmente advém de um maior desconhecimento da língua da
sociedade de acolhimento por parte destes imigrantes recém-chegados, sendo este
um obstáculo facilmente ultrapassado nos ambientes de relação inter-pares. Contudo,
com o avançar dos anos, regista-se uma mudança de atitude, passando estes a
valorizar a relação com os adultos tal como os restantes colegas logo no 6º ano.
Continuando esta análise desagregada por anos de escolaridade,
reconhecemos que é para os imigrantes que frequentam o 9º ano, em ambos os
territórios, que se regista o maior peso relativo das respostas que enaltecem o papel
do adulto, em particular a relação com o professor e com os assistentes operacionais
(21,6% das respostas em Sintra e 29,3% das respostas em Lisboa). Porém, em Sintra,
a relação de pares, pouco valorizada pelos alunos imigrantes no 4º ano (8,1% das
respostas), assume-se como fundamental para os alunos do 6º e 9º anos (17,8% e
21,6% das respostas, respectivamente).
Nas respostas dos alunos de Lisboa, a relação inter-pares é um atributo
fundamental da escola, reforçando-se as referências, entre os mais velhos, com
recurso a expressões como “estar”, “conversar”, “encontrar-se com os amigos”,
confirmando também as afirmações feitas anteriormente sobre a valorização da
relação com o outro. A este respeito, Sebastião (2009) e Abrantes (2003) reportam-se
ao papel fundamental dos processos de socialização, resultantes da integração no
grupo de pares, na construção de uma importante dimensão da socialização em
contexto escolar, a par da dimensão socialização institucional. Na sua perspectiva, as
relações sociais que o aluno vai construindo, ao longo do processo de
desenvolvimento e aprendizagem com o seu grupo de pares, vão evoluindo de forma
dinâmica, assumindo formatos diversos e deixando marcas significativas. O grupo de
pares com que cada indivíduo diariamente se relaciona e desenvolve mecanismos de
filiação pode funcionar como “um céu protector”, tanto mais protector quanto mais
deslocado da cultura escolar o aluno se sentir (Morgado, 1999, p. 34).
Como que a confirmar as respostas dos seus educandos, as famílias dos
agrupamentos de Lisboa também consideram que o convívio com os colegas, mais
que o convívio com os professores, é um factor que os seus educandos valorizam
bastante na escola, reunindo 33,7% das referências por parte do grupo autóctone e
28,4% por parte do grupo de familiares de origem imigrante.
343
Para além destas duas componentes que são valorizadas pelos alunos –
aspectos físicos e humanos – surge uma terceira que deve ser também destacada, a
saber, a função educativa da escola.
Nas escolas de Lisboa, em particular entre os alunos do 4º e 6º anos, esta
função é tida como um atributo fundamental, a par das relações de pares ou
sobrepondo-se a estas na quantificação das respostas, como é visível no 4º ano. A
apreciação feita pelos alunos é corroborada pelas famílias, quando confrontadas com
a questão que nos transmite a percepção que os seus educandos têm da escola. Na
sua perspectiva, os filhos valorizam a escola como local de aprendizagem, mas
também de convívio, atribuindo a cada um destes factores um peso de 32,4% do total
das suas respostas (num conjunto de quatro hipóteses). Assim, “aprender” e “conviver
com os colegas” reúnem 62,8% do total de referências dos familiares dos alunos,
ainda que entre as famílias de origem imigrante surja reforçada a função da escola
como local de aprendizagem (38,3% das respostas).
Finalmente, o ultimo aspecto que se registou a partir das respostas dos
alunos refere-se à atribuição de uma função de ludicidade à escola. Em particular nas
escolas de Sintra, esta associação da escola como espaço de encontro, é colocada
como um dos seus principais atributos, surgindo para os três anos de escolaridade
entre a terceira e quarta posições, reforçando-se a importância da relação de pares e
relegando para último plano a função educativa. Já nas escolas do centro da cidade,
as referências à ludicidade são escassas, entre os aspectos mais valorizados; só para
o 4º ano surge na quinta posição (9,4% das respostas) entre as oito possibilidades de
classificação referidas e, para os restantes anos, posiciona-se nos últimos lugares.
Podemos desde já sublinhar que a escola é então valorizada positivamente
pelos alunos, no essencial, pelas condições físicas que disponibiliza e pelas relações
humanas que se constroem, quer com os adultos, quer entre pares. Apesar de
reconhecerem a escola como espaço de aprendizagem, como já tivemos ocasião de
sublinhar anteriormente, quando pensam na escola como espaço de integração social
que é complementar à família, os alunos privilegiam as relações humanas, quer com
os adultos, quer com os pares. Esta atitude surge particularmente reforçada pelos
alunos de Sintra, onde a escola é entendida como um local de encontro, de
brincadeiras, de estabelecimento de relações com os colegas, conotando-a como um
espaço mais associado à ludicidade que ao ensino e aprendizagem.
A este respeito, as famílias dos alunos que frequentam as escolas deste
território revelam ter uma imagem sobre a valorização do papel da escola enquanto
local de convívio consentânea com a dos seus educandos. Ao pronunciarem-se sobre
os aspectos que consideram ser mais valorizados na escola, pelos seus filhos,
344
colocam em primeiro lugar “o convívio com os colegas” (34,8% das respostas) e só na
segunda posição a função aprendizagem (29% das respostas), quer entre nativos,
quer entre imigrantes, não se identificam disparidades significativas. Neste território, o
convívio com os professores surge relegado para último plano, ainda que com maior
reconhecimento por parte das famílias imigrantes (18,5% das referências
relativamente a 16,7% por parte das famílias nativas).
Também em Sintra, as famílias consideram que os seus educandos valorizam
mais as relações construídas com os espaços da escola, quer associados ao convívio
com os colegas, quer ao desenvolvimento de actividades extra curriculares
(actividades desportivas, utilização da biblioteca e da sala de informática) que o
convívio/relação com o professor. Já anteriormente constatámos, a partir das
respostas obtidas nas entrevistas aos órgãos directivos, que para as famílias dos
alunos residentes em Sintra, em particular para as de origem africana, a escola
assume um importante papel no acolhimento diário das crianças e jovens, que nela
podem usufruir de um conjunto de espaços e recursos materiais a que não conseguem
aceder no bairro ou em casa. Por outro lado, tratando-se de um território suburbano,
onde reside uma percentagem significativa de famílias que diariamente se deslocam
para a cidade de Lisboa ou para outros concelhos limítrofes para trabalhar (58% das
mães e 76% dos pais que responderam ao questionário), permanecendo muitas horas
fora de casa, a escola funciona para muitos dos alunos que acolhe, quase como a
primeira casa, se atendermos ao número de horas que nela passam diariamente.
Assim, confirma-se, que o olhar relativo à integração no processo de ensino e
aprendizagem é subalternizado, privilegiando o processo de socialização nos grupos
de pares através do convívio diário que a escola proporciona. Porém, estas dinâmicas
revelam-se fundamentais, principalmente para as crianças e jovens que residem em
contextos mais desfavorecidos, sendo as redes de sociabilidade que conferem sentido
às experiências e aos percursos escolares (Abrantes, 2003).
Ainda sobre a valorização das aprendizagens por parte das famílias, alguns
professores193 estabelecem, nas respostas aos questionários, uma conotação entre
estas e a atitude das famílias, que justificam pela forma como se valoriza a escola no
seio familiar: “há famílias que vêem a escola como um local onde as crianças passam
o dia e “não chateiam” e, há famílias, que vêem a escola como um meio de alcançar
objectivos, de definir um percurso de vida” (P2); “a expectativa e a ambição que os
encarregados de educação demonstram em relação ao futuro dos seus educandos,
193
Os questionários aplicados aos professores são mobilizados apenas para ilustrar algumas
constatações que decorrem da análise dos questionários dos alunos e famílias, encontrando-se identificadas as afirmações que fazem com a letra P e o respectivo número de ordem.
345
também é um factor extremamente importante, pois é este tipo de agregado familiar
que dá apoio aos alunos nos seus estudos quer seja com o auxílio nos TPC, quer seja
com o esclarecimento de dúvidas e imposição de regras de conduta social” (P1).
Quando solicitados a pronunciar-se sobre os aspectos negativos da escola,
estes alunos centram-se, mais uma vez, em primeiro lugar, nos aspectos físicos (entre
34% e 49% das respostas). Entre as principias críticas surge a referência à ausência
ou degradação dos espaços de recreio, de convívio e de campos de jogos, que no
centro de Lisboa se associam a escolas que funcionam maioritariamente em antigos
edifícios que não foram construídos para a função que desempenham. Já nas escolas
de Sintra, as referências dos alunos relacionam-se com a degradação dos espaços
e/ou a inexistência dos mesmos em alguns estabelecimentos de 1º ciclo. A maior
dispersão nas alusões aos restantes aspectos negativos identificados na escola, entre
os alunos dos três anos de escolaridade e diferentes origens, não permite estabelecer
um padrão na distribuição das respostas, por isso, consideramos ser preferível
analisar os resultados, discriminando os dois territórios.
Nas escolas de Lisboa é evidente a preocupação com as questões
relacionadas com a alimentação, surgindo no conjunto das referências na segunda
posição para o 4º e 6º anos, aspecto que é muito pouco valorizado nas escolas de
Sintra. As questões da higiene são colocadas em terceiro ou quarto lugar nos dois
territórios e são nitidamente uma preocupação de todos os alunos,
independentemente do ano de escolaridade em que se encontram.
As relações humanas com adultos ocupam, nas escolas de Lisboa, a quarta e
quinta posições, entre os aspectos menos positivos, logo seguidas das referências aos
comportamentos menos adequados de alguns colegas. As associações feitas aos
elementos menos positivos da escola situam-se, para este grupo de alunos,
maioritariamente nas condições físicas e materiais, já anteriormente identificados entre
as referências negativas utilizadas na definição de escola. Contudo, em Sintra, os
estudantes do 6º e 9º anos reportam-se às relações com os adultos como uma
característica muito negativa da escola, posicionando-as no segundo e terceiro lugar,
facto a que não são alheias as famílias. Entre os diversos comentários proferidos na
resposta à questão surge frequentemente a má relação com os professores e com os
assistentes operacionais. Sobre este assunto, importa acrescentar que vários estudos
realizados sobre a eficácia da acção educativa têm vindo a identificar como factor
elementar na garantia dessa eficácia, a existência de representações e expectativas
positivas por parte dos docentes sobre a totalidade dos seus alunos. Por outro lado, na
relação professor-aluno é fundamental que este último sinta um clima favorável ao
sucesso e, para tal, o professor deve ser capaz de lhe transmitir “confiança nas suas
346
capacidades e expectativa positiva face aos seus esforços de aprendizagem”
(Morgado, 1999, p. 38). Estanqueiro (2012) reforça as ideias anteriores, atribuindo ao
educador o importante papel na construção de “um clima favorável” que contribua
“decisivamente para a eficácia da acção educativa” (p.29), com reflexos importantes
na formação social e pessoal das crianças e jovens. A este respeito, também Abrantes
(2003) se reporta à importância que têm as redes de sociabilidade que incluam os
professores e outros actores da escola, na integração das crianças e jovens em
contexto escolar.
A referência aos comportamentos menos adequados de alguns colegas é
uma preocupação que surge fundamentalmente entre os alunos do 4º ano, em ambos
os territórios. É também nestas idades que mais frequentemente se registam motivos
de insatisfação na relação de pares, quer entre nativos, quer entre descendentes de
imigrantes, que associamos às características próprias da idade e aos conflitos
resultantes de algum egocentrismo que a caracteriza. Contudo, no conjunto dos
aspectos negativos que identificam na escola, são pouco significativos.
É fundamental reforçar a posição que as questões relacionadas com a
segurança em meio escolar ocupam nas referências negativas feitas pelos estudantes
de Sintra: generalizadas agora a todos os anos de escolaridade, embora com maior
ênfase no 6º e 9º anos. É entre os alunos imigrantes que se regista um maior número
de menções às questões associadas à segurança neste território (na segunda posição
entre doze categorias) contrariando a anterior tendência para a concentração desta
preocupação apenas entre os alunos nativos. Sobre este aspecto, nas escolas do
centro de Lisboa, não surge com a mesma ênfase a preocupação dos estudantes,
quer nativos, quer imigrantes. Porém, são também os jovens que frequentam o 9º ano
aqueles que se manifestam de forma mais insistente sobre o mesmo, como já tinha
sido registado anteriormente.
Tentar explicar o sentimento de insegurança vivido na escola, implica
mobilizar o ambiente social e cultural que caracteriza o território onde esta se insere,
mas também as vivências das crianças e familiares nos seus quadros de vida
(Carvalho, 2010). As situações vividas em contexto escolar resultam certamente da
agregação de diversos factores, sendo múltiplas as variáveis que, num momento e
contexto específicos, definem cada situação. O espaço da escola é um campo de
relações e interacções diárias e constantes, onde se confrontam públicos diversos,
opiniões e modos de vida, naturalmente geradores de tensões e conflitos. Numa
perspectiva de integração, à escola cabe o importante papel de descodificar as
diversas formas de expressão da insegurança vivida pelas crianças e jovens abrindo-
lhes novos percursos nas formas de actuação, assentes numa atitude relacional e
347
crítica por parte dos actores, no sentido de orientarem a sua intervenção para o
combate e prevenção dos comportamentos geradores de situações de insegurança.
Nesta perspectiva é fundamental que as escolas desenvolvam “a capacidade de
leitura da realidade social da qual participam” (Carvalho, 2010, p. 91).
Ensaiando uma síntese da análise que temos vindo a efectuar, relativamente
à valorização que é feita dos aspectos físicos/condições materiais, quer pela positiva,
quer pela negativa, esta pode ser justificada de duas formas complementares. No
processo de socialização dos alunos, a escola ocupa um lugar fundamental, enquanto
espaço de acolhimento onde são vividas muitas horas do dia, devendo proporcionar
condições de conforto, bem-estar e segurança, pelo que, esta vertente é
particularmente sensível na observação das crianças e jovens. Tendo por referência
as idades dos alunos, quando confrontados com a sua ideia de escola, esta é de
imediato associada ao aspecto físico do edifício, das salas de aula, dos materiais
disponíveis, e dos espaços de brincadeira e convívio, porque são facilmente
observados num primeiro olhar, isto é, são percepcionados por estes como a imagem
de marca da escola e avaliados como um requisito fundamental da mesma. São estes
espaços físicos e materiais que potenciam as construções sociais e individuais dos
estudantes, e que estes transportam para o exterior como um dos símbolos máximos
da identidade da escola.
A par das características físicas dos edifícios e recursos materiais, as
relações humanas são o segundo atributo da escola. Quer reportando-se aos adultos,
quer aos colegas, as relações construídas na escola são parte integrante da imagem
edificada a partir das experiências escolares, transmitindo paralelamente ao
desenvolvimento do trabalho escolar, outras dimensões fundamentais do percurso de
socialização (Sebastião, 2009). A sua importância suscita uma atenção particular
quando surgem percepcionadas negativamente por um colectivo de alunos. Se estas
relações não se constroem num ambiente de confiança mútua, e são afectadas pela
desvalorização que os adultos fazem da criança e do jovem, não estão criadas as
condições para inclusão destes em contexto escolar, podendo a instituição tornar-se
pouco atractiva para os mais jovens. Se, por um lado, da adesão dos alunos à escola
depende uma parte significativa do seu percurso escolar, por outro lado, o não
estabelecimento de vínculos entre as crianças/jovens e escola pode colocar em causa
os objectivos definidos para a sua formação e socialização (Sebastião, 2009).
4.3.3. Interacção e relação
Nas brincadeiras e momentos de convívio na escola, os alunos inquiridos
dizem relacionar-se fundamentalmente com os colegas da turma (96%) e com os
348
colegas de outras turmas (4%), não se registando diferenças nos comportamentos em
função da origem dos inquiridos nem entre os dois territórios. As relações com os
vizinhos e ou familiares que também frequentam o mesmo estabelecimento de ensino
revelam-se com pouco significado em contexto escolar. Estas atitudes corroboram a
valorização anteriormente manifestada sobre a importância do convívio com os pares
no contexto escolar. Para os estudantes de origem imigrante, este é um aspecto de
particular importância, na medida em que a escola é claramente o espaço onde se
confrontam diariamente com a população autóctone e com outras comunidades
imigrantes e, na sua integração na sociedade de acolhimento, as relações que
constroem na escola podem, eventualmente, constituir-se como um importante capital
social194 que, mais tarde, podem mobilizar noutros contextos institucionais e territoriais.
Enquanto espaço de educação, a escola deve ser facilitadora do diálogo com os
outros e com comunidades com diferentes experiências, valores e perspectivas (Osler,
2008) e, neste sentido, a educação pode tornar-se numa oportunidade para a
compreensão dos outros e para a construção dos alicerces de uma sociedade mais
aberta ao diálogo e ao acolhimento de comunidades de origens diversas.
As situações de conflito que emergem na gestão quotidiana das relações com
os colegas da turma devem-se fundamentalmente a provocações/insultos (28,9% das
referências), discussões ou desacatos (27,7%) em momentos de brincadeira. As
referências a situações de rivalidade/rejeição entre pares surgem na quarta posição, a
uma distância significativa das anteriores.
A identificação de situações de racismo ou discriminação não é comum nas
respostas dos alunos (com excepção de 5 ou 6 casos). Contudo, algumas destas
atitudes poderão estar incluídas nas provocações/insultos que os mesmos referem ser
a causa principal dos conflitos vividos, mas que não valorizam como tal. Quer para os
alunos autóctones, quer para os de origem imigrante, as respostas seguem a mesma
tendência, não sendo possível identificar um padrão de comportamento específico da
população imigrante que a coloque perante situações de maior discriminação quando
comparada com a população escolar portuguesa. A excepção surge apenas no peso
relativo das referências feitas ao confronto físico por alunos nativos e por imigrantes
nos dois territórios em análise. Em Sintra, os alunos com background imigrante
referem-se mais frequentemente ao confronto físico como um motivo de desacato,
194
Para Bourdieu, o capital social define-se como o conjunto dos recursos actuais ou potenciais que estão ligados à posse de uma rede de relações, de interconhecimento e de inter-reconhecimento, mais ou menos duradoura (Bourdieu, 1980). O capital social contribui para a acção colectiva, fortalecendo as relações de reciprocidade e facilitando os fluxos de informação e as relações de confiança (Putnam, 1993). A ideia fundamental centra-se na importância do valor criado a partir das redes sociais e dos contactos entre os indivíduos, e nos efeitos multiplicadores deste para o desenvolvimento económico, social, político e cultural das sociedades.
349
sendo o número de referências para 4º e 6º anos duas vezes superior às dos nativos,
enquanto em Lisboa, as situações invertem-se, pois é entre os nativos que os
desacatos devidos ao confronto físico são mais vezes referidos. Poderemos explorar
se, entre os diferentes grupos de origem dos alunos imigrantes, os factores
explicativos das situações de conflito vividas na escola e as respostas que
desencadeiam revelam diferenças que devem ser realçadas. Esta análise,
desagregada em função das respostas aos questionários por parte dos alunos
imigrantes, para Lisboa e Sintra, apenas permite identificar que, neste último território,
as referências à diferença de comportamento em função das origens associam os
conflitos ao grupo oriundo de países africanos.
Na perspectiva da direcção das escolas de Sintra, “a escola é um espaço com
alguma violência, existe uma enorme diversidade de idades, de culturas, de educação
e princípios, por vezes há um certo espírito de grupo, no sentido de gang, que só
consegue ser controlado quando têm elementos castigados”; “os encarregados de
educação têm uma grande preocupação com a violência, com a diferença etária entre
os estudantes na mesma turma”; “entre a população africana existem poucas regras,
os alunos fazem o que querem, há uma grande dicotomia entre nós e eles” (DS1).
Apesar dos responsáveis tentarem generalizar as causas da insegurança a
todos os grupos e às características dos contextos sociais em que se inserem as
escolas, o acento tónico acaba por recair sobre factores inerentes à presença de
população africana, a quem atribuem menores expectativas face à escola, “a
divergência de interesses é mais difícil de tratar que a origem étnica, a ausência de
regras, a falta de expectativas escolares, aspectos mais evidentes entre a população
africana mais carenciada”; “também se tem sentido um ambiente social mais difícil,
com maior número de situações de mar (DS2).
Não obstante estas opiniões expressas pelos adultos responsáveis pela
escola, perante as situações de conflito que acabamos de identificar, importa salientar
que os alunos afirmam que recorrem frequentemente a formas apaziguadoras para a
sua resolução: nas escolas de Sintra 47,7% das referências recaem sobre o diálogo e
30,4% nas de Lisboa; 17,5% das referências, em Sintra, indicam o recurso aos adultos
(professores, assistentes operacionais, elementos da direcção da escola) e 13,2% em
Lisboa; outros deixam que o alheamento face à situação e o passar do tempo
permitam ultrapassar o problema (39,7% das referências dos alunos de Sintra e 27,7%
de Lisboa). Ainda assim, o recurso a comportamentos agressivos, em particular entre
os alunos que frequentam as escolas de Sintra, surge com 22,5% das referências, o
dobro das situações indicadas em Lisboa, e as decisões que implicam o corte de
relações com os colegas têm um peso de aproximadamente 15% em cada território.
350
Portanto, quer os nativos, quer os imigrantes, adoptam maioritariamente uma situação
de compromisso e de diálogo na resolução dos conflitos, facto que nos parece ser
digno de registo, na medida em que contraria as imagens que frequentemente nos são
transmitidas pelos órgãos de comunicação social e que são mobilizadas para justificar
a existência de alguma indisciplina nas escolas ou de situações geradoras de violência.
Contudo, os comportamentos identificados pelos alunos têm características diferentes
nos dois territórios em estudo, revelando-se um pouco mais agressivos nas escolas do
território de Sintra.
Ao compararmos as decisões evocadas pelos alunos autóctones com aquelas
que os alunos de origem imigrante enunciam, registamos algumas atitudes que
consideramos poder distinguir os dois grupos: o recurso a comportamentos agressivos
na resolução de conflitos assume um peso maior nas decisões tomadas pelos alunos
autóctones quando comparamos com os colegas imigrantes nas escolas de Lisboa,
mas a situação inverte-se em Sintra. Desagregando a informação em função das
origens dos alunos, é no grupo de alunos oriundos de países africanos que
frequentam as escolas de Lisboa que mais frequentemente encontramos referências a
este tipo de comportamento para resolver as situações de conflito. A mesma análise,
agora para as escolas de Sintra, permite avançar com uma conclusão semelhante: o
recurso a comportamentos agressivos na resolução de conflitos com os colegas é
mais usual entre os descendentes de africanos (as referências feitas têm um peso
duas vezes superior às dos nativos). Contudo, em ambos os territórios, são também
os alunos não nativos que referem, mais frequentemente, recorrer à ajuda dos adultos
na resolução dos conflitos com os colegas. A sensibilidade desta problemática
autoriza-nos a que nos debrucemos sobre ela de uma forma mais cuidada. Será
importante perceber, para não generalizar a constatação que fizemos sem outros
argumentos, a partir dos questionários aos alunos e das entrevistas aos responsáveis
das escolas, quais as representações que nos foram transmitidas pelos pais sobre
esta mesma situação, o que faremos mais adiante.
Uma análise das estratégias de resolução de conflitos utilizadas pelos alunos,
em função da sua idade (tendo como referência o ano de escolaridade), evidencia
ainda que há uma substituição clara do recurso ao adulto pelo diálogo com o par entre
os alunos mais velhos (em Lisboa de 12,6% das referências feitas pelos alunos do 4º
ano, surge apenas com 8,5% das referências pelos alunos do 9º ano, enquanto o
recurso ao diálogo aumenta de 25,3% entre as referências feitas no 4º ano para 47,7%
no 9º ano). Estes resultados atestam a autonomia que as crianças e jovens vão
criando em relação aos adultos, resultado do seu processo de desenvolvimento
pessoal e social, mas também é reveladora das atitudes de cooperação e partilha no
351
encontro de soluções que satisfaçam ambas as partes. Por outro lado, na óptica da
integração, o recurso à comunicação na gestão de conflitos, é fundamental como base
de relacionamento entre partes, de compreensão dos valores dos outros e de respeito
pela diferença. Contudo, nas escolas de Sintra, o recurso aos adultos, que também vê
reduzida a sua expressão do 4º para o 9º ano, não é substituído pelo diálogo, opção
que mantém o seu peso relativo nos vários anos, mas sim por um maior recurso à
violência física (de 10% das referências no 4º ano, sobe para 18,9% no 6º ano e atinge
os 15,7% no 9º ano).
Não obstante podermos considerar relevante a percentagem das crianças e
jovens que recorrem a comportamentos agressivos, é de sublinhar que
maioritariamente optam por soluções socialmente adequadas face ao que são as
exigências da escola. O diálogo e o recurso aos adultos, assumidos como estratégias
de resolução de conflitos, permitem descortinar a influência do capital cultural 195
acumulado na família no contexto escolar, comprovar o peso dado pelos alunos às
relações pessoais e confirmar a sua disponibilidade para se adaptarem às regras
sociais que a escola exige. Mas, mais importante, revela um elevado nível de
confiança que a criança deposita nos seus pares, nos adultos e na escola enquanto
instituição, quando recorre ao seu corpo docente e não docente e aos órgãos
pedagógicos (Dias & Hortas, 2009, 2011).
Complementarmente, na perspectiva das famílias, as situações de conflito
vividas na escola, por parte dos seus educandos, assumem uma posição relevante no
conjunto das situações problemáticas que enumeram. Sem que existam diferenças
evidentes, na postura dos pais de origem imigrante e dos pais nativos relativamente ao
problema, a referência às situações de conflito entre colegas é colocada entre os três
primeiros factores que consideram menos positivos na relação dos seus educandos
com a escola. Porém, existem outros problemas vividos pelas crianças e jovens na
escola aos quais as famílias atribuem maior ênfase ou que colocam no mesmo
patamar das situações conflituosas vividas com os colegas. Quer em Lisboa, quer em
Sintra, a principal preocupação das famílias é colocada sobre os processos escolares
de aprendizagem, em particular entre as famílias imigrantes. Os familiares dos alunos
de Sintra reforçam ainda a sua apreensão sobre os percursos escolares dos seus
educandos, atribuindo um peso significativo ao insucesso escolar entre os problemas
por estes vividos. Também surgem, por parte destes familiares, as referências a
195
Portes, inspirado em Bourdieu e Coleman, afirma que “o apoio familiar ao desenvolvimento da criança é uma fonte de capital cultural.” (Portes 2000, p.143). A reprodução da estrutura da distribuição do capital cultural opera-se na relação entre as estratégias das famílias e a lógica específica da instituição escolar. Esta proporciona o capital escolar que credencia o capital cultural que a família possui e é transmitido de forma explícita ou difusa durante a infância (Bourdieu, 2010, p. 95).
352
situações de conflito vividas entre alunos e professores, confirmando as referências
antes feitas pelos estudantes. São ainda preocupação, entre as famílias imigrantes,
residentes em Lisboa e em Sintra, as situações de absentismo por parte dos seus
descendentes. Facto que também é apresentado entre os motivos de apreensão
enunciados pelos representantes da direcção das escolas de Sintra, reportando-se,
em particular, aos alunos de origem africana, apesar de não excluírem a ocorrência do
fenómeno entre os alunos nativos, como vimos nos excertos das entrevistas já por nós
transcritos anteriormente.
No centro da cidade, as características dos espaços escolares associadas à
sua reduzida dimensão e ao estado de conservação em que os mesmos se encontram,
sobrepõem-se a outras preocupações do foro dos processos formativos. É entre as
famílias nativas residentes neste território, que as condições físicas dos edifícios são
entendidas como o principal problema com que as suas crianças se confrontam na
escola. Questão que os alunos também enfatizam quando se reportam aos aspectos
negativos da escola, e que é claramente identificada pelos responsáveis dos
agrupamentos deste território urbano, associando-se a edifícios antigos, com áreas
reduzidas, adaptados para salas de aula, sem espaços de recreio, ginásios,
bibliotecas e mesmo refeitórios.
Em síntese, sobre o processo de acolhimento que é feito nas escolas, na
perspectiva dos alunos das famílias e dos representantes dos agrupamentos,
destacamos um conjunto de elementos que consideramos constituírem o fundamental
das imagens que nos são transmitidas pela análise empírica:
os alunos transmitem uma imagem da escola muito positiva,
resultando as diferentes posturas da idade dos alunos e das
características socioculturais dos contextos territoriais em que se
inserem;
os alunos que frequentam as escolas do centro de Lisboa recorrem
mais frequentemente a referências positivas na percepção que
revelam ter relativamente à escola, quando comparados com os
colegas de Sintra;
no conjunto de elementos positivos que mobilizam na construção do
seu conceito de escola, os alunos valorizam, de um modo geral, as
características físicas dos espaços e as relações com os adultos, em
particular o acolhimento feito pelos professores;
são os estudantes mais velhos aqueles que revelam ter maior
exigência no acolhimento feito pela escola, sendo, nas escolas de
Sintra, maior a frequência no recurso a elementos negativos na
353
apreciação que fazem da escola, quer os alunos nativos, quer os
imigrantes;
entre os elementos negativos surge como uma das fragilidades
vividas, a relação com os adultos, professores e assistentes
operacionais, em particular nas escolas de Sintra;
um outro aspecto valorizado negativamente no espaço da escola
reporta-se à insegurança, situação identificada por todos os
inquiridos/entrevistados, destacando-se os representantes das
escolas de Sintra, as famílias e os alunos mais velhos de origem
imigrante que frequentam as escolas do centro da cidade e os alunos
nativos e de origem imigrante que frequentam as escolas de Sintra;
para os momentos de convívio vividos na escola, são privilegiados os
colegas de turma, assim como é valorizada a relação de pares e o
convívio nas relações construídas na escola e que se constituem
como um dos grandes atributos da vivência da escola;
na resolução das situações de conflito vividas entre colegas de escola,
os alunos recorrem frequentemente a situações apaziguadoras,
através do diálogo e do recurso aos adultos;
entre os estudantes que frequentam as escolas de Sintra é mais usual
a indicação que se recorre a comportamentos agressivos como
estratégia de resolução dos conflitos vividos, um comportamento que
é identificado pelos alunos de origem africana e colocado entre o
leque de preocupações enunciadas pelas escolas;
as famílias posicionam os processos escolares de aprendizagem e o
insucesso entre as principais preocupações – este último aspecto
emerge com maior ênfase entre as famílias imigrantes residentes em
Sintra;
na perspectiva das famílias, as situações conflituosas vividas entre
colegas na escola, são também um dos principais problemas da
interacção vivida nestes espaços, associando-se, na óptica da
direcção das escolas de Sintra, à diversidade de idades dos alunos
nas turmas, às diversas formas de educar no seio familiar, à maior
carência afectiva vivida por crianças e jovens que passam a maior
parte do tempo sozinhos;
354
os familiares dos alunos de Sintra colocam também algumas reservas
relativamente às situações de conflito vividas pelos seus educandos
com o corpo docente.
4.3.4. Da escola ao bairro: construção de relações interétnicas
Para os alunos que frequentam os diferentes anos de escolaridade, as
relações de amizade construídas na escola continuam a prevalecer fora desta. Quer
entre os autóctones, quer entre os imigrantes, são cerca de 63,9% (Lisboa) e 66,3%
(Sintra) os alunos que referem que os seus colegas de escola continuam a fazer parte
do grupo de amigos que mantêm no bairro onde residem ou mesmo nas deslocações
para espaços exteriores a este. Neste grupo de amigos incluem-se indivíduos de
diferentes origens, tal como é frequente encontrar nos espaços de recreio da escola.
Entre os colegas com quem prolongam as suas vivências quotidianas, a maioria dos
inquiridos (aproximadamente 85%) inclui amigos de diversas origens. Esta tendência é
válida para os alunos autóctones (78,5%) e para os imigrantes (84,6%). Nas escolas
de Sintra e nas de Lisboa, é para os alunos mais velhos (9º ano) que o número de
referências à inclusão de amigos de outras origens no grupo de contactos mais
próximo é menor. A este facto não é alheia a concepção de amizade, entendida como
“as relações pessoais próximas nas quais existe uma apreciação e valorização mútuas”
(Sprinthall & Collins, 1994, p. 365), que separa os dois grupos: na infância, a amizade
situa-se fundamentalmente ao nível das actividades que se desenvolvem em conjunto;
na adolescência, os amigos são entendidos como “pessoas com as quais
compartilham sentimentos e pensamentos comuns” (Sprinthall & Collins, 1994, p. 366).
Nas escolas de Sintra, independentemente de serem imigrantes ou nativos,
os alunos referem que escolhem, com menos frequência, amigos com outras origens
(de 79,1% dos alunos do 4º ano e 87,5% dos alunos do 6º ano, a percentagem diminui
para 65,3% no 9º ano) mas, nas escolas de Lisboa, é de assinalar que entre os
descendentes de imigrantes se mantém o padrão de respostas do 4º ao 9º ano (83% a
88% afirma ter amigos de outras origens), enquanto para os nativos decrescem de
forma acentuada as respostas afirmativas à existência de amigos de outras origens
(de 87,7% no 4º ano e 84,5% no 6º ano, para 52,1% no 9º ano). A esta atitude não é
alheia a visão mais auto-avaliativa por parte dos mais velhos, materializando-se numa
maior selectividade relativamente aos outros que têm perspectivas diferentes das suas
(Sprinthall & Collins, 1994).
As origens geográficas mais presentes no grupo de amigos, quer para os
portugueses, quer para os estrangeiros que frequentam as escolas de Sintra são,
355
segundo a frequência das referências feitas, os PALOP, o Brasil, a Europa de Leste e
a Rússia. Nestas escolas, a maioria dos alunos é descendente de famílias oriundas de
países africanos, sendo também esta a origem mais frequente entre os amigos
referidos (com um peso percentual superior a 40% para cada ano), posicionando-se os
outros grupos a uma distância significativa em termos quantitativos. Nas escolas do
centro de Lisboa, a diversidade de origens dos estudantes é maior, assim como a
diversidade de amigos da rede de contactos. As referências às origens são mais
dispersas e incluem, além dos grupos já mencionados para Sintra, os asiáticos que
nesta área da cidade se encontram sobre representados. O grupo que é mais vezes
eleito entre os amigos é oriundo do Brasil e, em segundo lugar, o de descendentes de
africanos, situação que só é invertida no 9º ano.
A génese das relações sociais pode ser explicada por diversos elementos,
com diferentes graus de importância, e requer um conhecimento e compreensão dos
indivíduos que vai além do estudo empírico que nos propomos desenvolver. Acresce
também que, para este estudo, estamos a recorrer a uma amostra de alunos de
diferentes idades que certamente não têm a mesma interpretação do conceito “amigo”.
Na construção das amizades é fundamental a existência de interesses comuns e a
partilha. A concepção sobre estas duas dimensões difere quando nos reportamos a
crianças ou a adolescentes: na infância partilhar significa realizar actividades em
comum; para os adolescentes as amizades são importantes no estabelecimento de
relações mais íntimas, que envolvem a compreensão do eu e do outro e a preparação
para relações de partilha ao longo da vida, há uma maior exigência sobre o tipo de
relacionamento (Sprinthall & Collins, 1994), tal como já foi aflorado anteriormente.
Os grupos são constituídos por múltiplas formas de estar ligado, pelo todo e
no todo, por “relações e interacção social”, definidas como sociabilidades espontâneas
(Silva & Schiltz, 2007). Estas sociabilidades dependem das actividades, das
motivações defendidas e das estruturas hierárquicas internas aos próprios grupos em
interacção, podendo o grau de participação e intensidade das relações assumir
diferentes formas. Assim, as práticas de sociabilidade que as crianças mais pequenas
experienciam e identificam com os amigos, ou grupos de amigos, podem estar
associadas fundamentalmente às brincadeiras, constituindo relações mais
espontâneas e provavelmente de menor durabilidade. Já para os jovens e
adolescentes, a representação que têm do amigo, ou do seu grupo de amigos, é o
resultado de um processo mais complexo que implica um certo grau de identificação e
semelhança com a ideologia dos pares dentro do grupo de pertença, e uma
diferenciação e heterogeneidade face a outros indivíduos e grupos. Para estes, as
relações assumem uma maior intensidade e exigem uma maior confiança, tornando-se
356
também mais selectivas. A sua visão, mais auto avaliativa, conduz à construção de
juízos de valor mais elaborados e diferenciados acerca das implicações de “ser
diferente” (Sprinthall & Collins, 1994).
Os pressupostos anteriormente enunciados, não dispensam uma análise
sobre as relações que os diversos grupos de alunos estabelecem com os seus pares
numa tentativa de compreender a sua atitude perante os contextos de diversidade com
que diariamente convivem nas escolas que frequentam.
A análise das respostas aos itens referentes à receptividade dos alunos
portugueses em relação aos imigrantes e a sua inclusão no grupo de amigos que
mantêm fora do espaço escolar revelam que, de um modo geral, as crianças e jovens
portugueses estabelecem laços de amizade com pares de diferentes origens
geográficas. Dos 743 alunos nativos que responderam à questão, aproximadamente
78,5% refere relacionar-se com amigos imigrantes nas brincadeiras e no convívio fora
da escola. Cerca de 37,8% destes alunos afirma ter amigos imigrantes com duas
origens diferentes (por exemplo: asiáticos e africanos; europeus de leste e brasileiros,
entre outras combinações referidas), 44,2% reporta-se apenas a uma origem, e 18,0%
elege três ou quatro origens (ex: africano, brasileiro, europeu de leste e asiático).
Contudo, estas relações que as crianças e jovens portugueses estabelecem fora da
escola e que poderão ser um prolongamento dos contactos estabelecidos em meio
escolar apresentam intensidade diferente em função da origem das crianças
imigrantes: os alunos oriundos de África e do Brasil são os mais referidos pelos seus
pares portugueses como fazendo parte do grupo de amigos que mantêm fora da
escola.
A facilidade com que as crianças e jovens nativos se relacionam com
imigrantes brasileiros pode justificar-se pela maior proximidade linguística, pela maior
abertura desta comunidade ao contacto com o outro e, em particular, com os
portugueses (Lages & Policarpo, 2002), e até mesmo pela imagem que os
portugueses têm deste grupo de imigrantes, “mais semelhantes aos portugueses do
que quaisquer outros” (Lages et al. 2006, p. 273). Já as relações de amizade
estabelecidas com as crianças de origem africana surgem, no nosso levantamento, em
segundo lugar nas escolas de Lisboa e, em primeiro, nas de Sintra, facto que nos leva
a questionar até que ponto o maior tempo de permanência no país, a dimensão do
grupo e a proximidade linguística não se revêem aqui como factores facilitadores dos
contactos. Há claramente outros aspectos que, na informação recolhida, não se
evidenciam mas que, certamente, condicionam os laços de amizade entre estes dois
grupos. Referimo-nos ao facto de poderem existir maiores preconceitos entre estes
grupos, que condicionam as relações de amizade que podem ser estabelecidas. Os
357
estudos de Lages e Policarpo chamam a atenção para a existência de um maior
preconceito dos portugueses em relação aos africanos e aos imigrantes de leste que
em relação aos brasileiros (Lages et al. 2006) e, por outro lado, a menor percentagem
de africanos que refere ter amigos portugueses quando comparado com os brasileiros.
As referências aos contactos estabelecidos com asiáticos e europeus de leste
revelam-se em número inferior àquelas que são feitas aos grupos anteriores, facto que
pode encontrar explicação imediata num menor domínio da língua portuguesa,
associado a um menor tempo de permanência no país. Acrescem também a estes,
aspectos particulares relacionados com a forma como as crianças são educadas e, por
outro lado, a uma maior reserva manifestada por estas comunidades, em particular as
asiáticas ao contacto com os outros. Nesta análise não poderá estar ausente o papel
desempenhado pela família na educação dos filhos, pautada por uma diversidade de
estilos parentais, de ambientes familiares e de interacções vividas na família, e que se
revêem no capital cultural que as crianças e jovens transportam para a escola. Nas
escolas de Sintra, a presença de alunos oriundos destes territórios é mais reduzida,
não havendo um número significativo de inquiridos na amostra utilizada, ao que
associamos a reduzida frequência de alunos que referem ter no seu grupo amigos
oriundos da Ásia.
A leitura que fazemos dos dados obtidos nos questionários confirma algumas
das observações que tivemos oportunidade de realizar em situação de sala de aula,
no pátio das escolas onde recolhemos a informação, em particular, nas escolas de 1º
ciclo. A abertura manifestada, por parte das crianças portuguesas, aos diferentes
grupos de colegas imigrantes é visível, quer em situações de aprendizagem quando
recorrem ao trabalho a pares ou em pequeno grupo como estratégia, quer nas
brincadeiras e nos pequenos grupos com quem convivem no recreio. De um modo
geral, as crianças desta faixa etária (6-10 anos) não fazem grande distinção entre os
seus pares, concentram a sua atenção nas actividades em que participam, nas
experiências e percepções sobre o que é observável, e estabelecem laços
sustentados nas actividades que desenvolvem em grupo (Sprinthall & Collins, 1994).
Regista-se, por vezes, uma tendência para o isolamento entre aqueles que
chegaram há menos tempo à escola e que procuram nos pares com a mesma origem
o refúgio para as suas brincadeiras e conversas, facto que é evidente pela valorização
que fazem de colegas oriundos da mesma região no grupo de amigos. Na perspectiva
dos responsáveis pelos agrupamentos de escolas, as atitudes perante a diversidade
de alunos são, de um modo geral, de aceitação, quer por parte dos estudantes, quer
das famílias. Porém, para alguns familiares, a diversidade é olhada com apreensão
quando surgem problemas e, mesmo entre o pessoal docente e não docente, sente-se
358
alguma “incompetência” perante a necessidade de gerir a diversidade de públicos
(DL1). Nas escolas de Sintra, há mais tempo confrontadas com a presença de alunos
oriundos do continente africano, a diversidade “faz parte da escola” (DS2), recaindo
sobre a gestão da dimensão das turmas e o excessivo número de alunos as principais
dificuldades enunciadas (DS1). As escolas que há mais tempo convivem com a
diversidade dos seus públicos têm experimentado estratégias facilitadoras de
interacção e de gestão das relações sociais, resultando na acumulação de uma
experiência que mobilizam, actualmente, na sua prática quotidiana. Esta traduz-se, por
exemplo, na construção de diversas formas de organização das turmas, de resolução
de situações de conflito que emergem das relações entre alunos, entre professores e
alunos, e no apoio aos recém-chegados, no sentido da sua inclusão: “hoje, as turmas
são organizadas com grupos diversos e faz-se uma tutoria aluno-aluno, que significa
que um aluno fica responsável pela integração do colega recém-chegado” (DS2).
Entre os mecanismos referidos, é-nos apontada a heterogeneidade das turmas, a
integração dos recém-chegados em turmas onde exista pelo menos um colega com a
mesma origem e a dinamização de projectos centrados nas artes e nas actividades
desportivas, envolvendo todos (DS1, DS2, DL2).
Estas estratégias, encontradas pela escola no acolhimento da diversidade de
públicos, se analisadas do ponto de vista da integração, revelam-se como um
contributo importante no sentido i) da participação dos estudantes; ii) do
reconhecimento da diversidade e da complexidade que a esta se associa e, iii) da
mobilização dos espaços de educação como fins e meios da educação para a
cidadania no sentido da inclusão (Banks, 2004; Gutman, 2004). Questionamo-nos, em
que medida o trabalho desenvolvido na escola permite aos alunos a acumulação de
um capital social que transportem para fora desta, e mobilizem nas relações que
prolongam e constroem no bairro onde residem. Provavelmente, na continuação da
análise da informação empírica de que dispomos, encontraremos fundamentação que
sustente a reposta à questão que agora se nos coloca.
Retomando a análise, ressalta que a maioria dos alunos portugueses revela
ter atitudes de aceitação e de acolhimento dos imigrantes, quer na sala de aula, quer
nas brincadeiras em que se envolve, quer ainda nas relações de amizade que mantém
fora do espaço escolar. A estas atitudes não será certamente alheia a educação que
recebem na família, nem, tão pouco, o convívio que diariamente mantêm na escola
com colegas de diferentes origens (Rodrigues, 2006), sendo esta a primeira fonte de
capital social endo-escolar que pode influenciar a sua inclusão (Sotomayor, 2012). Dito
de outro modo, referimo-nos ao jogo entre o capital cultural adquirido junto da família e
359
o capital escolar a que Bourdieu se reporta na sua análise do contributo da escola
enquanto espaço social (Bourdieu, 2010).
Contudo, convém ressalvar o facto da análise que nos encontramos a
desenvolver ser condicionada pela proximidade dos locais de residência, em particular
para os alunos do 4º e 6º anos que, provavelmente, têm uma mobilidade reduzida e
que, nos bairros onde habitam, podem estar mais próximos geograficamente de uns
grupos relativamente a outros. Já entre os alunos do 9º ano, são mais frequentes as
referências à ausência de amigos de outras origens nas suas vivências quotidianas no
espaço exterior à escola. A tendência registada indica que, à medida que a idade
aumenta, os jovens tornam-se mais selectivos face às relações que estabelecem e,
quer nas escolas de Lisboa, quer nas de Sintra, estes alunos revelam uma menor
receptividade à inclusão, no seu leque de amigos, de jovens de outras origens (36,5%
dos alunos do 9ºano de Sintra e 47,9% dos que frequentam as escolas de Lisboa).
Atitude, a que não é alheia a valorização que fazem das características pessoais do
outro nas relações sociais que constroem e que vai para além dos jogos na infância
(Sprinthall & Collins, 1994).
Os alunos de origem imigrante revelam ter uma grande abertura à inclusão de
amigos oriundos de diversas regiões entre os seus pares. O peso das respostas
afirmativas relativamente à questão “tem amigos de outras origens/nacionalidades” é,
para estes, de 84,6%, um valor ligeiramente superior ao registado entre os nativos. Os
amigos que incluem nas suas vivências diárias têm origens diversas e, tal como os
alunos nativos, que frequentam as escolas de Lisboa, revelam ter preferência pelos
amigos de ascendência brasileira e, nas escolas de Sintra, pelos colegas
descendentes de africanos, facto que também se explica pela composição da
população imigrante que frequenta as escolas em cada um dos territórios. Porém, no
centro da cidade, os alunos de origem asiática posicionam os amigos africanos em
primeiro lugar. E, para os europeus de leste, há uma preferência pelos amigos de
origem asiática, colocando-os na segunda posição, relativamente aos outros grupos
de origem. Entre os brasileiros, o maior número de referências recai sobre os colegas
africanos e, em segundo lugar sobre os portugueses. Se entre os nativos é frequente a
referência a terem amigos de origem imigrante, o mesmo não se passa em sentido
inverso, isso é, as crianças imigrantes fazem poucas referências a amigos
portugueses. A análise que tentamos esboçar, sobre as relações de amizade que os
alunos de origem imigrante constroem na escola e transportam para fora desta, deixa-
nos algumas dúvidas, nomeadamente nos aspectos que explicam a reduzida
frequência com que são referidos os amigos autóctones. Parece-nos que há
claramente uma tendência, entre os nativos, para o estabelecimento de relações de
360
amizade com crianças e jovens de origem brasileira e que, entre os asiáticos e
europeus de leste, se cria alguma empatia que não é tão comum entre os outros
grupos; mas temos dificuldade em explicar a posição em que os portugueses surgem
nas redes de amizade que os imigrantes constroem.
Na tentativa de compreender os resultados obtidos retomamos a questão
colocada aos alunos onde se pedia para indicar entre “Africanos, Asiáticos, Europeus
de Leste, Brasileiros e Outros”, a origem dos amigos. Parece-nos que a formulação da
questão poderá ter induzido algumas das respostas, pois não especifica os
Portugueses entre as hipóteses colocadas, deixando apenas espaço para a sua
referência nos Outros. Por outro lado, a primeira parte da questão solicitava a
indicação da existência de amigos de outras origens/nacionalidades o que, para os
descendentes de imigrantes que já nasceram em Portugal e se sentem portugueses,
pode levar há exclusão imediata dos portugueses, por terem a mesma nacionalidade.
Apesar do possível enviesamento dos resultados obtidos nesta questão,
devido à forma como foi colocada, é legitimo concluir que as tendências observadas
são concordantes com as de outros estudos sobre as imagens recíprocas de
portugueses e imigrantes (Lages & Policarpo, 2002; Lages, 2006). Assim, a imagem
que existe na sociedade portuguesa da abertura dos brasileiros, da facilidade com que
estabelecem relações de amizade e da sua simpatia, quase genética ou, como refere
Beatriz Padilha (2007) “uma simpatia que se torna étnica”, revê-se nas respostas dos
alunos autóctones, em particular em Lisboa, onde a comunidade tem uma presença
maior e é reforçada pelos colegas de origem imigrante. Ter, entre os amigos, um
brasileiro é quase uma característica comum, referida por aproximadamente 80% dos
alunos que afirmam ter amigos de outras origens. Se, para os portugueses e africanos,
podemos associar a destreza no relacionamento com os brasileiros à proximidade
linguística, factor facilitador da interacção e inserção em alguns sectores da sociedade,
para os europeus de leste, que também os elegem entre os amigos, a justificação
poderá assumir outros contornos.
Os brasileiros constituem um grupo de imigração distinto dos restantes,
evidenciando grandes relações de proximidade com os portugueses. Esta capacidade
surge mencionada em estudos diversos que se debruçam sobre as relações
interétnicas construídas entre comunidades migrantes residentes em Portugal. No
estudo realizado por Silva e Schiltz (2007), sobre hábitos culturais e valores sociais
das comunidades imigrantes, são evidentes as proximidades entre brasileiros e
portugueses no que se refere à educação dos filhos, e aos usos e costumes.
Tentaremos confirmar mais adiante se estes aspectos, que encontramos expressos
nas relações de amizade e vizinhança que registámos entre os alunos, também têm
361
origem nas famílias. As mesmas autoras adiantam ainda que existem maiores
diferenças entre os portugueses e os africanos que entre estes e os brasileiros,
afirmando que os usos e costumes dos imigrantes de Leste também são pouco
diferentes dos nacionais, estando as três comunidades muito próximas neste aspecto.
Num estudo recente, publicado no âmbito do projecto GEITONIES 196
(Fonseca & McGarrigle, 2012), confirmam-se as tendências que acabamos de registar
na construção das relações interétnicas entre as diferentes comunidades imigrantes e
a população portuguesa. Ao analisar a génese e características das relações
estabelecidas entre populações de origem imigrante e nativos em três territórios da
Área Metropolitana de Lisboa (onde se incluem a Mouraria e Monte Abraão), os
autores afirmam existir um Brazilian effect nos bairros onde esta comunidade se
encontra representada. Definem este efeito pelos elevados níveis de interacção nos
contactos de proximidade, quer com a população nativa, quer com imigrantes, que
distinguem a população de ascendência brasileira, em particular das populações com
origem nos PALOP, que valorizam nos seus contactos a rede de relações
estabelecidas na família.
Às justificações que acabamos de apresentar para as relações de
proximidade entre os diversos grupos que compõem a nossa amostra acrescentamos
uma outra dimensão que, apesar de não ter surgido nos estudos consultados, parece
ajudar a compreender a abertura e a simpatia “genética” ou “étnica” que todos os
grupos manifestam em relação aos brasileiros. Necessitamos de, para tal, mobilizar
para esta análise o conceito de hibridismo cultural e aplicá-lo à comunidade brasileira.
Uma comunidade que cresceu no encontro e interacção entre a população nativa, os
invasores europeus e os escravos africanos que chegaram com os europeus (Burke,
2010). Os brasileiros da actualidade transportam consigo um capital cultural que é o
resultado desta “mistura de culturas” e que lhes confere estas particularidades de uma
maior capacidade de abertura ao outro e uma maior plasticidade para se adaptar a
novos contextos e neles reconstruir os seus laços, as suas vizinhanças, as suas
relações de confiança.
Os alunos que frequentam as escolas de Sintra revelam ter maior número de
amigos de origem africana do que brasileira, asiática ou do leste europeu. Esta
constatação explica-se pela composição étnica dos grupos que habitam o bairro onde
a maioria dos indivíduos de origem imigrante é proveniente de países africanos e,
como tal, nas escolas são também as crianças e jovens de origem africana as que se
encontram em maioria. Ainda assim, são evidentes as referências aos amigos de
196
Projecto desenvolvido e coordenado pelo Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa.
362
origem brasileira que surgem sempre na segunda posição, nos diferentes anos e entre
os diferentes grupos de imigrantes, e, também aos asiáticos e europeus de leste,
apesar de serem uma minoria nestas escolas.
Retendo alguns aspectos que parecem ser relevantes para a análise da
inserção dos alunos imigrantes em contexto escolar apraz-nos sublinhar (i) a
predisposição do grupo de alunos da sociedade de acolhimento para se relacionar
com todos os outros e, (ii) a abertura dos grupos de imigrantes ao estabelecimento de
relações de amizade, quer com os portugueses, quer com outros grupos de imigrantes.
Neste momento, as explicações que podemos avançar para a natureza das relações
que cada grupo revela ter com o outro serão, certamente, condicionadas, por um lado,
pelo contexto escola e pela composição dos grupos de alunos que a frequentam e, por
outro, pelas concepções sobre a convivência em espaços multiculturais que as
famílias revelam ter e transmitem aos seus descendentes. Os resultados obtidos para
os dois territórios são reveladores da influência da convivência em contextos de
diversidade e alertam-nos para a maior heterogeneidade na composição da rede de
relações quando coabitam no mesmo território, escola ou bairro, grupos de origens
muito diversas. Reconhecemos que existem diferenças entre cada grupo étnico e,
também no seio de cada grupo, a receptividade ao outro assume contornos diversos.
Em todo o caso, é legítimo afirmar que os resultados obtidos corroboram a observação
que fizemos em situação de sala de aula e nas brincadeiras das crianças no recreio da
escola, reforçando o importante papel desta instituição na promoção de mecanismos
de integração social que se podem rever no plano das relações sociais quotidianas
que se estabelecem fora desta, no bairro e na sociedade de acolhimento (Hortas,
2008).
Poderemos questionar em que medida as relações de amizade construídas
em meio escolar, entre crianças de origens diversas e transportadas para fora da
escola, são apoiadas pelas famílias e têm efeitos multiplicadores na construção de
novas relações de amizade na comunidade e bairro onde residem. Esta é uma
questão sobre a qual nos iremos centrar mais adiante, quando analisarmos a imagem
da família sobre o papel da escola e sobre a convivência dos seus educandos em
contextos de diversidade. Porém, a análise da questão colocada às famílias sobre se
incluem no seu grupo de amigos indivíduos oriundos de outras culturas/etnias, permite
antever a existência de uma predisposição para o convívio em grupos multiculturais.
No conjunto das famílias, 65,5% revela ter no seu grupo de amigos indivíduos
oriundos de outras culturas. No centro da cidade de Lisboa, é semelhante a
percentagem de famílias autóctones e de imigrantes que afirmam ter amigos com uma
origem diferente da sua, 63% e 60,6% respectivamente. Em Sintra, 56,6% das famílias
363
nativas e 82% das famílias imigrantes referem-se à existência de amigos oriundos de
outras culturas no seu grupo de relações mais próximas.
A análise da rede de amigos, organizada segundo a origem dos elementos do
agregado familiar, revela uma tendência para a valorização das relações com a
população africana e com a população oriunda da América do Sul, em particular do
Brasil. Entre as famílias dos alunos do centro da cidade regista-se uma maior
dispersão da rede de contactos, assim como uma maior frequência da referência à
presença dos portugueses nessa rede. A população nativa valoriza os contactos com
a população africana, a população oriunda da América do Sul, exclusivamente do
Brasil, e a população asiática; os europeus (U.E.15), referem-se aos contactos com
cidadãos provenientes de outros países europeus e aos brasileiros; as famílias de
origem africana relacionam-se preferencialmente com população oriunda de outros
países africanos e do Brasil; os familiares com origem em países da América do Sul
situam, entre os amigos, a população africana e os portugueses; os agregados
familiares oriundos do leste europeu e do continente asiático, em menor número,
valorizam mais as relações com a população portuguesa (Fig. IV.34). Porém, para
estes dois últimos grupos é significativo o peso das referências à ausência de
indivíduos de outras origens no seu núcleo de amigos: 50% das famílias do leste
europeu e 75% das famílias asiáticas. A este facto não serão alheios, o número de
anos da sua presença em Portugal; o domínio da língua, em particular entre as
famílias asiáticas; o maior fechamento de algumas comunidades; o número de horas
de trabalho e o pouco tempo disponível para o convívio, assim como a existência de
redes co-étnicas nas quais algumas comunidades se movimentam e mantém os seus
amigos.
364
Fig. IV.34 – Relações interétnicas, familiares dos alunos das escolas de Lisboa
Fonte: Questionários às famílias 2009/10. Construção própria.
Em Sintra, o grupo de famílias inquiridas é maioritariamente nativo e de
origem africana. Por outro lado, a população imigrante residente no território em
estudo, não se apresenta tão diversa como no centro de Lisboa. As famílias,
independentemente da origem, incluem a população africana no grupo de amigos que
identificam. Entre as famílias com origem em países africanos (Cabo Verde, Angola,
Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Moçambique), é frequente a alusão a amigos
oriundos de outros países africanos, justificando-se assim a percentagem de 62,3%
obtida nas referências feitas pela população africana. Porém, este grupo atribui pouca
relevância às relações de amizade com a população portuguesa, valorizando no seu
grupo de amigos os brasileiros. As famílias nativas elegem entre os amigos de origem
imigrante, a população africana e, em segundo lugar, os naturais de países da
América do Sul, exclusivamente do Brasil. Também, os agregados familiares oriundos
do Brasil mencionam, com maior frequência (50% das referências), a população
africana entre o grupo de amigos, posicionando a população nativa em segundo lugar.
Para as famílias oriundas do leste europeu, residentes no território, o grupo de amigos
encontra-se preferencialmente entre indivíduos com origem em países desta região,
365
seguindo-se as alusões à população africana e, por fim, à população portuguesa (Fig.
IV.35). A população asiática, pela fraca representação que tem nesta amostra, não
será alvo de análise nesta dimensão.
Fig. IV.35 – Relações interétnicas, familiares dos alunos das escolas de Sintra
Fonte: Questionários às famílias 2009/10. Construção própria.
Em síntese, podemos afirmar que, para a maioria dos familiares dos alunos,
se evidencia uma abertura ao convívio com amigos de origens diversas. Em Lisboa, a
maior resistência aos contactos com população oriunda de outras origens/culturas
regista-se entre as famílias provenientes do continente asiático e do leste europeu.
Entre as referências feitas, recai sobre a população africana a maior frequência, logo
seguida da população brasileira. A alusão a indivíduos nativos entre o grupo de
amigos das famílias de origem imigrante surge com 14,9% das referências feitas pelos
familiares residentes em Lisboa e, com 12% no conjunto das referências feitas pelos
familiares residentes em Sintra. Por parte das famílias portuguesas, regista-se uma
atitude com contornos diferentes em Lisboa e em Sintra: a maior resistência à inclusão
no grupo de amigos de indivíduos com uma origem diferente regista-se entre os
familiares de Sintra, contrariando a maior abertura manifestada pelas famílias de
366
Lisboa. Acrescentamos também a este facto que é entre a população africana que se
evidenciam maiores reservas à inclusão de indivíduos nativos no seu grupo de amigos.
Os resultados a que chegamos aproximam-se da análise anteriormente
realizada para os alunos, assim como dos resultados apresentados nos estudos sobre
as relações interétnicas entre as comunidades migrantes residentes no país e, em
particular, em bairros da AML (Fonseca & McGarrigle, 2012; Silva & Schiltz, 2007;
Lages et al. 2006). A maior distância entre a população oriunda dos PALOP e a
população portuguesa continua a fazer-se sentir entre os familiares dos alunos,
revelando-se uma maior abertura nos contactos de proximidade com a população
brasileira. Contudo, para as famílias de origem africana, de ambos os territórios, são
os amigos oriundos de outros países africanos que prevalecem na sua rede de
contactos mais próximos.
A análise cruzada das relações de amizade construídas pelos familiares e
pelos alunos, permite confirmar que, as atitudes e comportamentos das crianças e
jovens face aos seus colegas de outras origens são resultado, em parte, das vivências
proporcionadas pelas famílias e do capital cultural que destas herdaram.
Transportando este capital cultural para a escola onde diariamente convivem em
contextos de grande diversidade, as crianças e jovens vêem a construção da sua
relação com o outro num ambiente de maior abertura e aceitação, fazendo escolhas
que em muito se aproximam das registadas para as suas famílias.
A respeito da diversidade que caracteriza as escolas, as famílias foram
levadas a pronunciar-se, no questionário que preencheram, sobre alguns aspectos
que nos permitem inferir relativamente às percepções construídas. Constatamos,
apesar de algumas diferenças pontuais, que é possível registar entre as famílias que
residem nos dois territórios, uma visão muito positiva/construtiva da diversidade
cultural. Uma percentagem significativa de respostas (96% a 98%) valoriza muito o
convívio em escolas multiculturais, não só pelas aprendizagens realizadas no sentido
da construção de uma cidadania plural mas, também, pelas mais-valias decorrentes
do conhecimento de culturas diversas (86% a 89% das respostas). Em relação ao
processo de ensino – aprendizagem, as famílias não reconhecem que o mesmo seja
prejudicado devido à presença de uma população diversa culturalmente: entre 66% a
75% das respostas apresentadas referem discordar desta relação. Porém, são as
famílias de Lisboa que mais frequentemente colocam reservas relativamente a este
item (19,1% das respostas). Relativamente à maior propensão para a ocorrência de
comportamentos menos adequados e situações de violência, decorrentes da
convivência em contextos de diversidade cultural, um número significativo de
respostas vai no sentido da discordância desta relação. Porém, não se registam
367
atitudes idênticas entre as famílias dos dois territórios, pela maior apreensão revelada
pelos familiares dos alunos de Sintra, espelhada no gráfico da Fig. IV.36. Um
comportamento que já se tinha constatado anteriormente, quer por parte das famílias,
quer dos alunos, quando se reportaram às relações de pares e às estratégias de
resolução de conflitos.
Fig. IV.36 – Percepções das famílias sobre a diversidade na escola
Fonte: Questionários às famílias 2009/2010. Construção própria.
Partindo dos principais traços que caracterizam as relações entre população
nativa e população imigrante e, o olhar sobre a diversidade nas escolas dos territórios
em estudo, apresentamos de seguida os aspectos mais significativos que, na óptica da
integração, nos apraz sublinhar:
entre os alunos regista-se uma predisposição para a relação com
pares de diferentes origens, aspecto que se destaca entre os alunos
mais novos;
os alunos mais velhos são os que revelam uma maior selectividade na
escolha dos amigos com quem se relacionam fora da escola;
os jovens de origem imigrante, que frequentam as escolas do centro
de Lisboa, apresentam uma maior abertura às relações de
proximidade com amigos de diferentes origens, relativamente aos
seus colegas das escolas de Sintra;
os alunos nativos referem, com maior frequência, a inclusão de
amigos oriundos do Brasil no seu grupo de contacto mais próximo
368
fora da escola, reduzindo as referências aos amigos de origem
africana;
os alunos descendentes de população asiática e de europeus de leste,
a frequentar as escolas de Lisboa, evidenciam ter menor número de
interacções nas relações de proximidade com colegas de outras
origens;
as famílias dos alunos revelam ter, em geral, uma importante abertura
para a inclusão na sua rede de amigos, de indivíduos de outras
origens;
entre as famílias nativas dos alunos de Sintra regista-se uma menor
interacção, nos contactos de proximidade, com a população
imigrante;
os familiares dos alunos de origem africana, residentes em Sintra,
revelam menor abertura à interacção com a população nativa,
aspecto também evidente entre os alunos, neste território;
as famílias revelam ter, perante a diversidade cultural que caracteriza
as escolas que os seus educandos frequentam uma atitude muito
positiva/construtiva.
Reconhecendo a importância que as relações familiares exercem no
desenvolvimento social, intelectual e emocional das crianças e jovens, questionamo-
nos em que medida as atitudes que revelam ter na escola, com os adultos e com os
pares, e no grupo de amigos mais próximos, são o resultado de um processo iniciado
na família e que transportam depois para a sala de aula e para o bairro. Neste sentido,
para os percursos de integração que vivenciam na escola e no bairro, as crianças e
jovens transportam o capital cultural acumulado na família e, no que se reporta às
relações de amizade que constroem, parece exercer uma importante influência. Ainda
a este respeito, é relevante reflectir em que medida as situações de conflito vividas na
escola com os professores, a que se reportam em particular alunos e familiares de
origem africana, não encontram a sua génese, ainda que parcialmente, na maior
resistência que revelam ter na interacção com a população nativa, onde se inclui a
maioria dos professores.
4.3.5. Da escola ao bairro: os espaços de convívio
Assumimos anteriormente que a escola pública é o espaço de excelência
para o estabelecimento de contactos e de laços entre os alunos, independentemente
das suas origens étnicas e socioculturais. Educação e escola são inevitavelmente
369
conotados como um espaço de encontro entre pessoas (Soler, 2009). As escolas que
integram este estudo são espaços onde diariamente se cruzam comunidades diversas
e, como tal, desempenham perante o bairro e em articulação com este197 um papel
fundamental na disponibilização de oportunidades que influenciam a inclusão,
integração e bem-estar do seu público. Defendendo que uma escola enraizada no
bairro onde se localiza projecta a sua actividade no território (Rodríguez, 2009) e que a
sua acção educativa não se pode entender como um compartimento fechado a este
(Soler, 2009), importa perceber se as oportunidades identificadas pelos alunos na
construção de relações de amizade nos espaços da escola (i) se projectam para fora
desta e (ii) se materializam nas redes de relações que se prolongam no bairro ou
externamente a este. Dito de outro modo, pretende-se compreender qual o contributo
das diversas formas de participação e relação, construídas na escola, no incremento
do capital social do bairro (Sotomayor, 2012).
As crianças e jovens que anteriormente caracterizámos atribuem à escola um
papel importante como espaço de relação com os seus pares, quer no contexto de
sala de aula, quer nos espaços de recreio, onde interagem preferencialmente com os
colegas de turma (57,4% das referências dos alunos de Lisboa e 59,5% dos alunos de
Sintra) e com colegas de outras turmas (37,7% das referências dos alunos de Lisboa e
35,0% dos alunos de Sintra).
Quando questionados sobre a permanência das amizades construídas na
escola em espaços exteriores a esta, em locais de brincadeira ou de encontro, mais
de metade dos alunos responde afirmativamente (60,7%). Para os três anos de
escolaridade, o peso das respostas afirmativas aumenta com a idade dos alunos, facto
que associamos a maiores graus de autonomia e de mobilidade por parte dos jovens,
assim como às características da adolescência de que já falámos anteriormente.
Contudo, identificam-se algumas diferenças quando comparamos os grupos nativos e
os imigrantes, pois é entre os segundos que se regista o maior número de respostas
positivas. Isto corresponde a afirmar que é para os alunos não nativos que são mais
frequentes os encontros com amigos da escola em espaços exteriores a esta,
deixando transparecer o papel instrumental que a instituição pode assumir na
promoção dos contactos entre pares e na facilitação das vivências com grupos
diversos. Já anteriormente foi possível constatar que estes estudantes têm facilidade
em estabelecer laços com colegas de diferentes origens, que a diversidade de
197
O paradigma que defende a articulação da escola com a comunidade local emergiu em Portugal nos
anos 80 correspondendo, i) do ponto de vista pedagógico, a uma valorização da diversidade de experiências e saberes dos alunos, construídos em contextos formais, não formais e informais de educação e, ii) do ponto de vista organizacional, a uma abordagem articulada e interactiva, territorialmente integrada, que mobiliza de forma concertada diferentes parceiros (Canário, 2005).
370
contactos que têm oportunidade de realizar na escola tem efeitos nas interacções
sociais que mantêm nos espaços exteriores e que, em escolas multiétnicas, a rede de
contactos se dispersa facilmente por diferentes grupos, contrariamente ao que
acontece quando a diversidade se confina à presença de um ou dois grupos da
mesma origem. Esta última constatação resulta da análise anterior sobre as
características da rede de contactos dos alunos com colegas de outras origens e que
revelou uma maior dispersão da mesma nos bairros do centro da cidade,
caracterizados pela diversidade de grupos étnicos. Na perspectiva de Bronfenbrenner
(1987), é notória a evolução positiva dos efeitos da participação e convívio dos
estudantes em contextos múltiplos, aumentando quando estes meios são
culturalmente diversos, em termos étnicos, sociais e religiosos.
Um outro aspecto que consideramos importante analisar é a frequência de
respostas dos alunos que referem encontrar-se com os colegas fora da escola.
Neste particular registam-se diferenças mínimas entre as respostas dos alunos de
Sintra (62%) e as dos alunos de Lisboa (59,4%). Estes dados, confirmam a tendência
já antes identificada dos alunos prolongarem para o bairro as vivências que constroem.
Esta constatação poderá ser explicada por factores inerentes ao grupo, mas
também pelas características urbanas do território onde residem e onde frequentam a
escola. Para o primeiro factor destacamos: (i) a valorização do papel da rua como local
de brincadeira e/ou encontro, que caracteriza as famílias africanas, sendo comum um
prolongamento diário da presença na rua entre os mais novos; (ii) o número de horas
que as crianças e jovens que residem em territórios da periferia da cidade passam sós,
devido aos horários de trabalho dos pais, mas também à distância que separa o local
de residência e de trabalho. Em relação ao segundo factor, evidenciam-se as
características urbanas dos territórios que habitam, onde domina a construção em
altura, típica de “bairros dormitório”, com alguns espaços livres entre os prédios,
pequenas pracetas ou espaços ajardinados que podem ser utilizados pelas crianças e
jovens como local de encontro e/ou brincadeira. A análise que de seguida
desenvolvemos poderá permitir encontrar a resposta para esta tendência, através da
identificação dos espaços que são frequentados por estes jovens. A estes factores
poderá associar-se um outro, de carácter mais geral que contextualiza as redes de
relações de amizade construídas pelos alunos nos contextos sociodemográficos e
culturais de cada território.
O papel dos lugares, em particular do bairro, é importante no
desenvolvimento de relações interétnicas (Fonseca & McGarrigle, 2012). A análise das
escolhas feitas sobre os locais frequentados no bairro, indica-nos a forma como as
relações sociais são vividas nos espaços de proximidade que, neste ponto do estudo,
371
incidem sobre os locais seleccionados para ocupação dos tempos livres e que para as
crianças e jovens do estudo se materializam no espaço privado da habitação, na rua,
nos jardins e parques, nos centros comerciais. A inclusão do espaço da casa no
conceito de bairro relaciona-se com as múltiplas concepções e escalas possíveis, a
que a literatura se reporta,198 para a sua definição e, também, por considerarmos a
possibilidade das relações sociais entre os mais novos ser necessariamente vivida em
espaços de maior proximidade à habitação, que garantam a sua segurança. Os
resultados da análise do questionário revelam que, para os alunos mais novos (4º e 6º
anos), os espaços eleitos para as suas brincadeiras conjuntas oscilam entre a casa e
a rua. Em Sintra é visível a utilização do espaço da rua em detrimento da casa, quer
por nativos, quer por imigrantes, facto que associamos a uma menor proximidade
entre as famílias, a uma menor intensidade das relações de vizinhança e,
provavelmente, a uma menor facilidade de interacção na esfera privada, destacando-
se neste grupo os descendentes de imigrantes. Em Lisboa registamos um maior
recurso ao espaço da casa para as brincadeiras dos mais novos, apesar de não se
distanciar de modo significativo da frequência na utilização da rua, facto que poderá
indiciar maiores níveis de interacção entre as famílias e um maior conhecimento mútuo
facilitador dos contactos entre os mais novos na esfera privada.
Quando questionados apenas sobre os espaços de encontro que utilizam
com os seus colegas, constatamos que existem diferenças entre os alunos que
residem nos dois territórios: em Lisboa, as respostas denotam uma tendência para a
utilização mais frequente de espaços exteriores ao bairro (53,0% dos alunos),
enquanto em Sintra, 54,7% dos estudantes revela preferir os espaços do bairro para
os seus encontros com os colegas.
É para os imigrantes que frequentam as escolas de Lisboa que se destaca
uma maior valorização dos espaços exteriores ao bairro (57,8% dos alunos). Nesta
área da cidade, a dimensão reduzida dos bairros e a proximidade entre os mesmos
facilita a mobilidade e cria mais oportunidades de interacção entre os residentes. Para
os mais jovens, com menor mobilidade, são os espaços de proximidade, localizados
no bairro, os mais utilizados para as brincadeiras e convívio. Entre estes elegem os
jardins e parques, os espaços desportivos, os centros comerciais e os cinemas para
os momentos de encontro: a escolha recai, preferencialmente, sobre os espaços ao ar
livre (jardins e parques), com 42,4% das referências feitas pelos autóctones, e 37,7%
pelos imigrantes; e sobre os espaços desportivos, 27,9% das referências para os
imigrantes e 23,4% para os nativos. A existência destes pequenos espaços públicos,
198
Sobre este assunto, o estudo de Fonseca & McGarrigle (2012) apresenta uma breve discussão.
372
na área de residência, revela-se fundamental para assegurar as relações de
vizinhança, promover momentos de socialização e encontro entre os moradores e,
neste caso em particular, entre as crianças e jovens. A frequência de espaços
desportivos no bairro surge muitas vezes associada à prática desta actividade nas
colectividades locais e em campos de jogos e/ou ginásios geridos pelas juntas de
freguesia. São frequentemente espaços de reduzida dimensão, dirigidos
fundamentalmente aos residentes mas que, segundo as respostas ao questionário,
são importantes locais de encontro para o público mais jovem aí residente (com 24,8%
das referências). Os centros comerciais, indicados em terceiro lugar nos espaços de
convívio utilizados no bairro (com 15,5% das referências), surgem por vezes
associados aos espaços de trabalho dos pais que, devido aos prolongados horários de
trabalho, os filhos acabam por adoptar como espaços de brincadeira e convívio. Em
particular, nos centros comerciais da Mouraria e Martim Moniz é frequente encontrar
os mais pequenos nas suas brincadeiras durante o horário de trabalho dos pais. Esta
é uma situação que também se repete nas ruas destes bairros, durante o fim-de-
semana ou nas férias escolares. Quer entre a população imigrante, quer entre os
autóctones, os espaços da rua são importantes locais de encontro. Este é um aspecto
que se evidencia com particular relevo nas escolhas feitas pelos mais velhos (a
frequentar o 9º ano), independentemente da sua origem.
Neste contexto, o bairro funciona como um espaço facilitador da interacção,
potencializador das primeiras relações entre a população imigrante e a nativa, onde se
sobem degraus importantes no percurso de integração. As características da malha
urbana, as condições de habitação, a tipologia dos edifícios e a valorização que é feita
do bairro conferem aos espaços públicos, parques e praças, desta área central da
cidade uma importância particular como lugares de encontro. E, se para a população
nativa o bairro é fundamental no incremento das relações diárias, para a população
imigrante é indiscutivelmente importante na determinação das oportunidades e
constrangimentos que influenciam a inclusão, integração e qualidade de vida. Nesta
área da cidade e, em particular na Mouraria, o bairro é um local importante para os
contactos entre os residentes de diferentes idades e origens (Fonseca & McGarrigle,
2012) e, tal como a escola, é nele que se joga diariamente a integração.
Também as famílias foram inquiridas sobre estas mesmas questões,
relacionadas com os usos dos espaços do bairro e as vivências que neles constroem.
As respostas das famílias de Lisboa, quando confrontadas com a questão “gosta de
viver no bairro”, mostram uma unanimidade afirmativa: 91,4% das respostas são
positivas e, entre a população não nativa, esta percentagem sobe, ainda, para 92%.
No leque de motivos que atestam a valorização que os residentes fazem do bairro
373
onde residem enumeramos os mais frequentes: o sentimento de segurança, as
relações de vizinhança, a localização e acessibilidade, os serviços que disponibiliza,
ser um espaço acolhedor, as condições de higiene e a existência de espaços verdes.
Os aspectos negativos, menos valorizados no conjunto das respostas, reportam-se à
insegurança, à degradação e condições de higiene de alguns espaços, à ausência de
espaços verdes e à diversidade cultural.
A valorização que é feita do bairro, pelas famílias em geral, revê-se também
nas relações de amizade que aí mantêm. Para aproximadamente 50% das famílias,
nativas e das imigrantes, os amigos habitam no bairro e, entre aquelas que referem ter
amigos noutros bairros do concelho de Lisboa, 50% identifica as freguesias
envolventes à sua. Estes resultados vêm reforçar a análise anterior sobre a
importância que é atribuída pelas crianças e jovens aos espaços do bairro para os
seus encontros e brincadeiras. A imagem positiva que os pais revelam ter dos
territórios onde residem, associada à presença de uma rede de amigos com os quais
se relacionam mais frequentemente, pode revelar-se securizante para os filhos,
permitindo-lhes maiores níveis de confiança nas relações de amizade que constroem e,
também, na interacção com o território onde residem. Pensando nas crianças e jovens
de origem imigrante, estes níveis de confiança que podem ser transmitidos pelos pais
revelam-se estruturantes na sua relação com a escola, com os colegas e com os
adultos e, também, com os espaços em que diariamente se movimentam.
As formas de uso dos espaços do bairro referidas pelas crianças e jovens das
escolas de Sintra apresentam um perfil semelhante ao já traçado para Lisboa,
identificando-se algumas diferenças relativamente às práticas dos colegas residentes
no centro da cidade. Tal como em Lisboa, são os parques e jardins e os espaços
desportivos aqueles que surgem com maior número de referências, 31% e 26,4%
respectivamente, embora se registe uma maior dispersão das respostas pelos
diferentes equipamentos. São os mais novos, aqueles que mais frequentemente se
referem ao uso dos parques e jardins (48% das referências), facto que se associa à
própria tipologia urbana, onde dominam pracetas ajardinadas e com alguns
equipamentos infantis para uso dos residentes. Para os alunos de origem africana que
frequentam o 4º ano evidencia-se uma maior propensão para o uso dos parques e
jardins relativamente aos espaços desportivos. A análise para o 6º ano revela que as
preferências recaem sobre os espaços desportivos, com uma menor valorização dos
jardins e parques. Porém, a grande mudança, na escolha dos espaços de encontro
com amigos no bairro, ocorre no 9º ano onde a rua surge como o principal local de
(con)vivência no conjunto das referências feitas pelos alunos (43,4%),
independentemente da sua origem. Tal como referimos anteriormente, neste território
374
a rua assume um papel muito importante como local de encontro entre crianças e
jovens, preferindo-a à casa e valorizando-a relativamente aos restantes espaços
públicos de encontro. É importante, tentar perceber se para as famílias destes alunos
se mantém a mesma atitude nos usos dos espaços do bairro e se as opiniões
manifestadas pelos descendentes são resultado das práticas sociais que se constroem
na família, ou resultam da interacção entre pares, construída na escola e transportada
para os territórios onde convivem diariamente.
A desagregação da informação, em função dos países de origem, dos alunos
revela que as tendências anteriormente descritas se mantêm e que as práticas na
utilização dos espaços públicos não se alteram se atendermos à diversidade das suas
origens. A principal condicionante das escolhas dos locais de convívio no bairro é a
idade e, associada a esta, a autonomia e capacidade de mobilidade. Todavia, entre as
famílias inquiridas, regista-se alguma divergência, entre nativos e imigrantes, na
imagem que transmitem sobre o bairro onde residem. Para as primeiras, são menos
frequentes as referências positivas ao bairro (apenas 84,5% das famílias se
manifestam satisfeitas com o local de residência) enquanto que para as segundas, a
opinião positiva mobiliza 90,6% das famílias. Entre os aspectos referidos
negativamente destacamos, a insegurança, a ausência de serviços, a limpeza do
bairro, a localização e a densidade populacional. Nas referências positivas enumeram-
se: a segurança, os serviços disponíveis, a vizinhança, a higiene, a existência de
espaços verdes e o facto de se tratar de um bairro acolhedor. A estes aspectos não é
alheia a atitude manifestada por nativos e imigrantes relativamente à rede de
amizades construída no bairro: para 64% das famílias imigrantes é mais frequente o
estabelecimento de relações de amizade no bairro onde residem, enquanto que entre
as famílias nativas, apenas 51% afirma ter amigos no bairro. Destes dados, o que
importa valorizar é a percentagem significativa de referências que as famílias
imigrantes de Sintra fazem em relação às amizades que mantêm no bairro, o que pode
ser considerado como um reflexo destas famílias terem, na sua maioria, as mesmas
origens culturais.
Quando solicitados a identificar os espaços de encontro procurados fora do
bairro, os alunos que frequentam as escolas de Lisboa e de Sintra fazem recair as
suas escolhas sobre os centros comerciais e as salas de cinema, que muitas vezes se
localizam nos mesmos espaços, (aproximadamente 53% das referências dos nativos e
66,1% das dos imigrantes em Lisboa; 67,4% das referências dos alunos nativos e
62,6% dos descendentes de imigrantes em Sintra). Sem grandes diferenças na ordem
de preferência entre os imigrantes e os nativos, parece-nos que estas opções
espelham um pouco a tendência que observamos entre a população que reside na
375
cidade de Lisboa e nos restantes concelhos da Área Metropolitana e que não deixa de
estar associada ao processo de expansão urbana e implantação dos centros
comerciais a que assistimos desde início dos anos 90.199 Para as famílias residentes
no centro da cidade de Lisboa, a localização dos grandes centros comerciais nas
freguesias periféricas e mesmo nos concelhos contíguos, assim como a saída das
grandes salas de cinema dos espaços centrais da cidade e a expansão da rede de
metropolitano, são factores de atracção para territórios exteriores ao bairro. Entre os
grandes espaços comerciais referidos, destacamos o centro comercial Vasco da
Gama (localizado no Parque das Nações) e o centro comercial Colombo (localizado na
freguesia de Benfica), ambos de grande acessibilidade em relação ao centro da cidade.
E, apesar de nas áreas centrais da cidade ainda registarmos uma vida de relação no
bairro relativamente intensa, os centros comerciais exercem um forte poder atractivo
enquanto espaços de comércio, mas também como importantes lugares de lazer e
convívio entre diferentes grupos etários e sociais (Barata Salgueiro, 2001). Para os
residentes nos territórios de Sintra, a reduzida frequência de equipamentos de lazer
que se regista em alguns bairros, associada à intensa ocupação do território com
construção para habitação, tem também um efeito no uso dos grandes centros
comerciais, localizados externamente ao bairro, como espaços de lazer e de convívio.
São frequentes, entre os inquiridos, as referências às deslocações ao centro comercial
Colombo, localizado numa freguesia da cidade de Lisboa que faz fronteira com o
concelho da Amadora e Odivelas.
Numa apreciação global, retendo alguns dos aspectos que acabamos de
analisar, consideramos importante sublinhar que: i) as crianças e jovens que
inquirimos assinalam a existência de importantes laços com o bairro onde residem; ii)
os espaços de recreio e lazer do bairro são importantes locais de referência para as
suas brincadeiras e convívio, onde incluem as amizades que constroem na escola; iii)
as preferências pelos espaços que frequentam fora do bairro recaem sobre os centros
comerciais e cinemas; iv) entre as crianças e jovens, imigrantes e nativas, não se
identificam diferenças significativas nas escolhas dos espaços de convívio, valorizando
de igual forma as relações no bairro.
Retomando os princípios teóricos inicialmente discutidos, arriscamos a
sublinhar que as crianças e jovens que nos encontramos a analisar mobilizam, para o
espaço exterior à escola, as relações de amizade que aí constroem, materializando
nos espaços do bairro essa convivência e prolongando os contextos de diversidade
diariamente vivenciados em meio escolar. Assim, é legítimo concluir que a escola,
199
Segundo Barata Salgueiro (2001), o início dos anos 90 corresponde à 3ª fase do processo de
implantação dos centros comerciais na região de Lisboa.
376
enquanto espaço de socialização e de promoção das relações interculturais, está a
prestar um importante contributo para a inclusão desta faixa etária da população
imigrante nos seus territórios de acolhimento. O capital social endo-escolar, resultado
das relações sociais vividas na escola, revela-se fundamental no incremento do capital
social de bairro (Sotomayor, 2012). Mesmo nos contextos em que as famílias
valorizam as relações de amizade fora do bairro, as crianças e jovens continuam a
reportar-se à convivência com os colegas de escola “fora dos muros desta”.
Se nos apropriarmos do conceito de capital social desenvolvida por Putnam
(1993), poderemos afirmar que o capital social que estas crianças e jovens vão
construindo na escola é um importante recurso para a sua acção colectiva,
fortalecendo as relações de reciprocidade e facilitando as relações de confiança. Os
contactos entre colegas revelam ter efeitos multiplicadores nas relações sociais e no
desenvolvimento humano. Neste sentido, o capital cultural torna-se um pré-requisito
importante para a coesão social e participação activa de todos; as redes de contactos
e laços de confiança que ligam os indivíduos dão forma ao capital social. Assim, as
relações que estas crianças estabelecem na escola, a forma como resolvem os
conflitos com os colegas com quem diariamente convivem e as amizades que
prolongam para fora do espaço escolar e que mantém no meio onde residem
permitem compreender a mobilização que fazem do capital cultural na esfera social
em que se relacionam e identificar a extensão da rede de ligações que efectuam. As
escolas, localizadas nestes contextos, revelam-se importantes lugares de troca de
experiências e de interacção cultural e social, requisitos fundamentais para aprender a
viver juntos, na perspectiva que nos é apresentada por Roberto Carneiro (2001). São
também os lugares onde a população de origem imigrante estabelece as relações de
amizade mais importantes e, neste sentido, a qualidade das escolas é fundamental
para a promoção da integração das crianças e jovens e para o seu desenvolvimento
pessoal e social (Fonseca et al, 2010). As aprendizagens, realizadas nestes espaços
promotores da interacção cultural, tornam a diversidade uma realidade que não é
estranha aos alunos, permitindo transpor para a gestão das relações sociais no
espaço extra-escolar as competências desenvolvidas na escola (Perrenoud, 2001).
4.3.6. Escola e percursos escolares: os intervenientes
Para construir um indicador que permita comparar, utilizando o mesmo critério,
o percurso escolar dos alunos inquiridos optamos pela relação entre a idade esperada
no final de cada ano de escolaridade considerado e a idade do aluno no momento em
que responde ao questionário. Apesar do indicador calculado não espelhar
exactamente o número de situações de retenção, ele é indicativo do número de alunos
377
que já ultrapassaram o limite de idade esperado para o ano de escolaridade e/ou ciclo
que frequentam. Esta informação permite traçar um perfil de desempenho para os
alunos, tendo em conta a sua origem (nativos ou imigrantes) e, no caso dos alunos de
origem imigrante, em função da geração a que pertencem. Assim, esperamos que a
comparação dos resultados globais calculados para cada grupo de origem, por ano de
escolaridade e para cada território, permita delinear as particularidades no percurso
escolar dos estudantes.
No universo dos 273 alunos que já ultrapassaram o limite de idade esperado
para o ano de escolaridade/ciclo que frequentam, 53,5% são de origem imigrante.
Entre o grupo de alunos com background imigrante, 25,5% encontram-se além deste
limite de idade enquanto entre os nativos este peso é de 16,4% (Quadro IV.33). No
total dos 146 estudantes não nativos que integram o grupo a que nos reportámos
anteriormente, 69,9% constitui a primeira geração e tem um perfil que se distancia
muito do da população nativa (40,6% dos alunos já ultrapassaram o limite de idade
esperado para o ano que frequentam). Mas, na segunda geração, a percentagem dos
alunos aproxima-se mais da dos nativos, revelando ser para o grupo de imigrantes
ligeiramente mais reduzido o peso daqueles que se encontram além do limite de idade
esperado (13,7%).200
Quadro IV.33 – Distribuição dos alunos em função do limite de idade esperado em cada ano de escolaridade (%)
Sup. Igual Inf. Total
Nativos 16,4 43,3 40,3 100,0
Total abs. 127 336 313 776
Imigrantes Geração* 1ª 40,6 39,4 19,9 100,0
2ª 13,7 43,2 43,1 100,0
Total (%) 25,5 41,5 33,0 100,0
Total abs. 146 238 189 573
Total 273 574 502 1349
Fonte: Questionários aos alunos, 2009-10. Construção própria. Qui-Quadrado = 67,537; df = 7; p = 0,000
Repetindo a análise anterior com a informação desagregada em função das
regiões de origem dos alunos não nativos, é entre os grupos oriundos da Ásia, da
América do Sul e de África que registamos o maior peso dos estudantes que
frequentam um ano de escolaridade para o qual já ultrapassaram o limite de idade.
Para os alunos provenientes da Ásia e da América do Sul, o número de anos em
200
As características que registamos para a 1ª e 2ª gerações, e que nos permitem identificar dois padrões diferentes relativamente ao perfil de desempenho dos alunos, são corroboradas pelos resultados divulgados pelo Programa PISA 2009. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1787/9789264091504-en
atraso alarga-se até um máximo de 3, tal como para a maioria dos nativos, mas para
os alunos oriundos do continente africano este número chega a alcançar 5 anos.201 A
desagregação por anos de escolaridade revela que globalmente é no 6º e 9º anos que
o peso dos alunos que já ultrapassou o limite de idades é mais significativo (27,4% e
25,4% respectivamente), sendo que, entre os alunos de origem imigrante, os valores
são ligeiramente superiores (33,1% para o 6º ano e 30,2% para o 9º ano). Para o 4º
ano, a relação entre as origens dos alunos e o limite de idade é muito significativo,202
sendo o afastamento do comportamento dos nativos face ao dos imigrantes bastante
relevante: 3,4% dos nativos já ultrapassou o limite de idade esperado, mas para os
não nativos este valor ascende a 14,8%. É para os grupos oriundos do continente
asiático, de países africanos e da América do Sul que se regista o maior peso relativo
de elementos mais velhos em cada ciclo, constatação que corrobora, a uma escala
micro, a análise anteriormente realizada com base nos dados estatísticos
disponibilizados pelo GEPE.
Tal como já constatamos anteriormente, entre as duas gerações de alunos
com background imigrante evidenciam-se perfis diferentes relativamente aos
quantitativos de estudantes que se encontram além da idade limite para o ano que
frequentam. Esta constatação, verificada para a globalidade dos alunos, é também um
traço comum em cada ano de escolaridade. A relação entre as duas variáveis,
geração a que pertence o aluno imigrante e idade do aluno no ano que frequenta, é
muito significativa em cada ano de escolaridade;203 é para a segunda geração que o
perfil de idades dos descendentes de imigrantes se aproxima muito do perfil de idades
dos alunos nativos. Na primeira geração, o peso dos alunos que se encontra além do
limite de idade em cada ano é consideravelmente superior ao da segunda geração,204
sendo no 9º ano cerca de quatro vezes superior.
A análise que acabamos de fazer permite-nos traçar, ainda que com algumas
reservas, pela natureza da informação de que dispomos, o perfil de desempenho dos
alunos imigrantes relativamente aos nativos, o qual tende a caracterizar-se por um
201
A comparação da média de idades dos diferentes grupos de origem, com recurso à análise de variância ANOVA, indica que a diferença de idades é estatisticamente significativa (F=6,134, com 6,1336 graus de liberdade, p=0,000). Os alunos mais velhos são de origem africana (média=12,8 anos), seguindo-se os nativos (média= 11,7 anos), muito próximos dos brasileiros, dos europeus (U.E.15), dos asiáticos, sendo o grupo mais jovem orundo dos países do leste europeu (média=11,1 anos). 202
Qui-Quadrado = 90,979; df = 36; p = 0,000 203
4º ano – Qui-Quadrado = 15,054; df = 6; p = 0,020; 6º ano – Qui-Quadrado = 50,894; df = 7; p= 0,000; 9º ano – Qui-Quadrado = 15,523; df = 5; p = 0,008. 204
A comparação da média de idades da 1ª e 2ª geração de alunos descendentes de imigrantes, com recurso à análise de variância ANOVA, atesta os resultados anteriores, revelando ser muito significativa a diferença de idades entre estes dois grupos (F=17,652, com 1,571 graus de liberdade, p=0,000).
379
maior insucesso entre os alunos de origem imigrante devido, em particular, ao
comportamento registado pela primeira geração.
Esta constatação, da maior propensão para o insucesso entre os alunos de
primeira geração é confirmada na análise dos dados estatísticos apresentados pelo
Ministério da Educação, segundo a nacionalidade do aluno, e sobre os quais já
reflectimos oportunamente. Concluímos, que a tendência identificada para o País, para
a AML e para os agrupamentos de escolas se mantém quando apenas nos
reportamos à nacionalidade do aluno, pois salvo algumas excepções, registadas para
os alunos oriundos de países europeus de leste, os estrangeiros têm taxas de
retenção superiores às dos nacionais entre 8 e 10 pontos percentuais.
Na caracterização feita anteriormente, sobre o sucesso escolar dos alunos
portugueses e estrangeiros, para o país, para a Área Metropolitana de Lisboa e para
cada agrupamento de escolas, identificámos que os segundos apresentavam,
tendencialmente, valores relativos inferiores para este indicador. Todavia, os
resultados que agora analisamos revelam que, ao desagregarmos o grupo de alunos
imigrantes em primeira e segunda geração, a tendência registada previamente se
altera para alguns agrupamentos de escolas, pela aproximação dos resultados obtidos
para os nativos e imigrantes. Assim, a procura de uma explicação para o sucesso
escolar, deverá dar particular atenção ao tempo de permanência do aluno ou da
respectiva família no país, aos percursos escolares anteriores dos estudantes, às
expectativas que têm face à escola, assim como às origens, percursos escolares e
envolvimento dos progenitores, variáveis que surgem nas referências feitas pelos
professores que responderam ao questionário, quer em relação aos alunos nativos,
quer aos imigrantes, e que transcrevemos: “o papel que a família atribui à escola e as
expectativas face ao futuro dos educandos” (P1, P2, P4, P5, P9, P8); “há aspectos
comuns a todos, independentemente das origens: a adequação do ano de
escolaridade frequentado à idade e ao percurso anterior, as expectativas face à escola
por parte das famílias e o nível socioeconómico das famílias” (P5); “há diferenças de
atitudes entre grupos, assim como na adequação do percurso escolar anterior ao da
escola portuguesa” (P10); “é fundamental o apoio dos encarregados de educação e as
expectativas face ao futuro dos educandos, quer no apoio nas tarefas extra escolares,
quer na construção de regras de conduta social” (P1).
Consideramos existirem ainda outros factores que permitem explicar estes
resultados e que pretendemos explorar após a análise desagregada do perfil do
sucesso escolar dos alunos em cada território. Referimo-nos à exploração dos modos
de participação dos diversos intervenientes no percurso escolar dos alunos e às
características dos contextos territoriais em que estes se inserem, pois é nestes que
380
se manifestam as especificidades sociais que poderão ajudar a explicar a maior
proximidade no desempenho escolar dos estudantes imigrantes de segunda geração e
dos nativos.
Esta análise deve, posteriormente, ser complementada por outra que coloque
em interacção um conjunto de factores que consideramos fundamentais, e que se
podem agrupar em três dimensões: (i) de ordem individual (hábitos de trabalho escolar,
conhecimento da língua e expectativas face à escola); (ii) de ordem familiar e
comunitária (as características do bairro de residência, o estatuto socioeconómico das
famílias, o desenvolvimento de competências biculturais, a relação entre pais e filhos,
as expectativas que depositam na escola e o envolvimento na mesma) e, (iii) de ordem
contextual (a gestão da diversidade social e étnica na escola, a relação do aluno com
os adultos e com os pares, as práticas pedagógicas).205
Retomando a análise do indicador anteriormente discutido, agora para cada
território, procuramos encontrar pontos de convergência e divergência face às
tendências gerais apresentadas para o grupo e que permitirão, num momento seguinte,
avançar para a exploração dos possíveis factores que interferem sobre o
comportamento deste. Para os alunos que frequentam as escolas do centro de Lisboa,
o peso relativo daqueles que se encontram inscritos num ano de escolaridade para o
qual já ultrapassaram o limite de idade, é de 17,4%. Neste grupo inserem-se 50
estudantes imigrantes (40% do total) e 75 nativos, uma distribuição que contraria, em
parte, a tendência geral apresentada. Entre os alunos de origem imigrante, o peso
daqueles que se encontram além do limite de idade esperado para o ano que
frequentam é de 20,2%, cerca de três pontos percentuais acima do valor registado
para o grupo de estudantes do centro da cidade. Para os 247 estudantes com
background imigrante, é no grupo que constitui a primeira geração que se encontram
31,4% dos alunos que já ultrapassaram o limite de idade previsto, enquanto no grupo
que integra a segunda geração este peso é inferior ao registado para os nativos
(16%).206 Nesta área da cidade, é para os alunos oriundos de países asiáticos, da
América do Sul e de África que registamos os maiores quantitativos daqueles que já
205 Não esgotamos aqui os múltiplos factores que podem influenciar o percurso e desempenho escolar
das crianças e jovens. Socorremo-nos para a sua enumeração dos vários estudos que têm sido desenvolvidos sobre o desempenho escolar dos alunos imigrantes, alguns deles já anteriormente apresentados, e deles retiramos os aspectos que consideramos poderem ser abordados na presente investigação. Destacamos os estudos de Portes & Mac-Leod (1996, 1999); Portes, (1999); Seabra (2000, 2007, 2008, 2010); Portes & Rumbaut (2001); Suarez-Orozco & Suárez-Orozco (2001); Crul (2004, 2007a); Portes & Hao (2005). 206
Esta relação entre as idades da 1ª e 2ª geração de imigrantes face ao ano de escolaridade em que se
encontram inscritos é estatisticamente muito significativa, como atestam os resultados obtidos no cálculo do qui quadrado (Qui-Quadrado =24,920; df =6; p =0,000).
381
ultrapassaram o limite de idade esperado e em que o peso relativo dos alunos que se
encontram nesta situação é superior ao dos nativos.
A análise desagregada por anos de escolaridade evidencia que o
comportamento geral traçado anteriormente não se mantém. No 4º e 6º anos, em que
se assinalam os maiores quantitativos de alunos de origem imigrante, é evidente a
maior distância a que se encontram estes alunos do comportamento geral do grupo e
dos colegas nativos. No 4º ano, 14,2% dos imigrantes têm idade superior à esperada,
o dobro da registada para o grupo que frequenta este ano de escolaridade, enquanto
entre os nativos não é excedido o peso de 3% para aqueles que se encontram além
do limite de idade. No 6º ano, estas disparidades são mais atenuadas pois, no
cômputo geral, 23,2% dos alunos apresenta idade superior à esperada, mas entre os
nativos o valor é de 21,2% e entre os imigrantes de 26,3%. O grupo não nativo que
frequenta o 9º ano é muito reduzido na amostra que se encontra em análise, e a
tendência anteriormente descrita altera-se, pois para este apenas 17,4% dos alunos
excede o limite de idade enquanto para a totalidade do grupo este valor é de 26,8% e
para os nativos de 29%.
Numa tentativa de perceber se em cada ano de escolaridade existem
diferenças no perfil da primeira e da segunda geração, é possível inferir pelos
resultados obtidos que os comportamentos não são homogéneos. Para os alunos que
se encontram a frequentar o 4º ano, o comportamento dos imigrantes da primeira e da
segunda geração não revela grande diferença de idades, entre si e do conjunto dos
imigrantes, as diferenças na média de idades também não são estatisticamente
significativas.207 Porém, o peso dos nativos que já excederam o limite de idades é de
2,8%, o grupo de imigrantes totaliza 14,2%. No 6º ano volta a registar-se a tendência
geral, os quantitativos de imigrantes com idade superior à esperada apenas
ultrapassam em 5 pontos percentuais o peso dos nativos, mas a primeira geração
distancia-se em cerca de 35 pontos percentuais da segunda.208 Esta última, numa
posição muito vantajosa relativamente à tendência geral e à população nativa, pois
são apenas 3,7% os imigrantes de segunda geração que têm uma idade desadequada,
por excesso, para o ano de escolaridade que frequentam, enquanto os nativos
perfazem 21,2%.
207
A comparação da média de idades dos dois grupos de alunos descendentes de imigrantes (1ª e 2ª
geração), com recurso à ANOVA, confirma que são significativas as diferenças nas médias de idades (F=1,015, com 1,104 graus de liberdade, p=0,000). Para os alunos de primeira geração a média de idades é de 10 anos, para os da 2ª geração de 9,9 anos. 208
Os resultados da ANOVA para a 1ª e 2ª gerações de alunos imigrantes a frequentar o 6º ano indicam que é significativa a diferença de média de idades entre os dois grupos (12,7 anos para a primeira e 11,7 anos para a segunda). Para F=21,875, com 1,116 graus de liberdade, p=0,000.
382
Numa tentativa de perceber o comportamento deste indicador entre os
diversos grupos de origem dos imigrantes e os diferentes anos de escolaridade,
optámos por proceder, mais uma vez, à análise desagregada dos dados disponíveis.
Os resultados obtidos indicam que não há um comportamento homogéneo entre os
diversos grupos de origem para os três anos em análise, só entre os alunos de origem
africana se mantém, em cada ano de escolaridade, um peso relativo de cerca de 20%
dos que já alcançaram a idade limite. Para os alunos asiáticos, a presença neste
grupo é acentuada no 4º e 6º anos, e para os alunos de origem sul-americana, em
particular brasileiros, é no 6º ano que a sua presença se destaca (38,7% no conjunto
do grupo com a mesma origem). Esta constatação leva-nos a avançar com a hipótese
de que são múltiplos os factores que interferem no percurso escolar dos alunos, que
estes se podem alterar ou ter repercussões diversas ao longo do tempo e que a
pertença a um determinado grupo étnico não pode ser considerada como a única
condicionante do percurso escolar, pois em anos de escolaridade diferentes o perfil
dos alunos, pertencentes a um mesmo grupo étnico, também aparenta ter
características distintas. A estes factores juntamos ainda o número de anos de
residência em Portugal e a pertença à primeira ou segunda geração, dimensões que
constatamos terem um peso significativo, em particular para os alunos de origem
africana e asiática que residem no centro da cidade de Lisboa.
Importa agora compreender se para os alunos que frequentam as escolas
localizadas em Sintra também se registam percursos idênticos aos que acabamos de
apresentar, ou seja, se é evidente a distância entre a primeira e segunda gerações
relativamente ao número de alunos que já ultrapassou o limite de idade para a
frequência do ano de escolaridade em que se encontra inscrito, se se mantém a
heterogeneidade de comportamentos entre grupos de diferentes origens e para os três
anos de escolaridade.
Uma análise global dos resultados obtidos para Sintra evidencia um peso
maior dos estudantes que já se encontram além da idade limite para o ano de
escolaridade que frequentam comparativamente com Lisboa. No total são 148 alunos,
dos quais 96 (64,9%) são imigrantes ou descendentes de imigrantes. Esta distribuição
segue a tendência geral apresentada para o país e AML, onde se registam maiores
quantitativos de alunos estrangeiros em situação de insucesso escolar, mas contraria
a distribuição que anteriormente apresentámos para o centro de Lisboa. Contudo, não
podemos esquecer que o peso relativo dos alunos imigrantes que frequentam as
escolas deste território é inferior ao registado para Sintra, onde 48,4% dos alunos são
nativos e 51,6% têm um background imigrante. Assim, nos agrupamentos de escolas
localizados neste território, a percentagem de alunos que já ultrapassou o limite de
383
idade para o ano que frequenta é de 23,4% e, entre os de origem imigrante, este valor
é de 29,4%. A análise discriminada para a primeira e segunda geração denota que
entre os 133 alunos que constituem a primeira geração, a percentagem daqueles que
já se encontra além do limite de idade esperado, é superior (48,9% na primeira
geração e 16,1% na segunda geração).209 Esta relação, entre a posição dos alunos em
função da idade limite em cada ano de escolaridade e a geração de pertença, é
estatisticamente muito significativa.210 Entre os alunos nativos, 17% apresentam idade
superior à esperada para o ciclo que frequentam, um valor muito próximo do que
registamos entre a segunda geração de imigrantes (16,1%). É para os alunos de
ascendência africana e brasileira que se identificam os maiores quantitativos daqueles
que já ultrapassaram o limite de idade previsto para o ano de escolaridade
frequentado (cerca de 30% dos alunos em cada grupo).
A análise para o 4º ano evidencia que o peso de alunos imigrantes com idade
superior à esperada é de 15,4%, apenas de quatro pontos percentuais acima da média
do grupo, mas cerca de quatro vezes superior ao registado para os nativos (4,6%).
Este resultado é devido, fundamentalmente, ao comportamento dos alunos de primeira
geração, dado que os de segunda se aproximam significativamente dos nativos.211
No 6º ano, a distância entre os imigrantes e os nativos é significativa: 38,2%
dos imigrantes têm idade superior a 12 anos, enquanto entre os alunos nativos este
valor situa-se em 24,7%. A primeira geração volta a ser a que regista um peso maior
dos alunos (57,5%) que se encontram além da idade prevista para o ano que
seguem.212 Os alunos que frequentam o 9º ano mantêm o comportamento registado
anteriormente, acentuando-se o peso dos imigrantes de primeira geração que se
encontram com idade superior à esperada para este ano de escolaridade.213
A desagregação da informação em função das origens mais frequentes entre
os alunos de origem imigrante permite identificar, pelo número de anos de
permanência em Portugal e pela idade relativamente ao limite de referência para cada
ano de escolaridade, a tendência já anteriormente apresentada para Lisboa. É a
209
Os resultados da ANOVA para a comparação da média de idades dos dois grupos (1ª e 2ª gerações)
revelam que as difrenças são estatisticamente significativas (F=18,363, com 1,362 graus de liberdade, p=0,000). 210
Qui-Quadrado=46,167; df=7; p=0,000 211
A comparação da média de idades dos dois grupos de descendentes de imigrantes (1ª e 2ª gerações),
com recurso à ANOVA, indica serem estatisticamente significativas as diferenças encontradas (F=9,685, com 1,212 graus de liberdade, p=0,002). Para a 1ª geração a média de idades é de 10,1 anos enquanto para a 2ª se situa em 9,6 anos. 212
No 6º ano a média de idades da primeira geração é de 12,9 anos e a da segunda é de 11,9 anos. Esta diferença é estatisticamente significativa, como atesta a análise de variância ANOVA (F=26,475, com 1,161 graus de liberdade, p=0,000). 213
Para os estudantes descendentes de imigrantes a frequentar o 9º ano, as diferenças registadas na comparação da média de idades não são estatisticamente significativas (F=7,423, com 1,38 graus de liberdade, p=0,010). Contudo para o grupo da primeira geração a média de idades é de 15,8 anos e, para o grupo de 2ª geração é de 14,9 anos.
384
primeira geração de alunos oriundos do continente africano que revela ter
ultrapassado em maior número de anos (até 5 anos) os limites de idade para o ano de
escolaridade frequentado e, é entre os grupos que se encontram no país por um
período mais prolongado de tempo que esta tendência é maior (cerca de 59% dos
alunos estão além da idade limite para o ano em que estão inscritos e, destes, 72,7%
já se encontram em Portugal por um período superior a três anos). Para o grupo
oriundo da América do Sul, composto por estudantes que já residem no país há mais
de 5 anos, a tendência anterior não se repete: os alunos que já excederam o limite de
idade não vão além de dois anos. Estes resultados alertam para a diversidade de
percursos realizados pelos alunos descendentes de imigrantes, que em parte
percebemos que podem ser inerentes à própria diversidade de origens étnicas, sem
contudo esgotar nas mesmas as causas que pensamos interferirem neste processo.
Uma outra variável que se nos evidencia de alguma importância é o factor tempo, em
particular o tempo de permanência no país, emergindo como uma das variáveis que
no decorrer da análise se tem manifestado com um peso significativo nos perfis dos
percursos escolares que fomos traçando. As conclusões que se nos vão desenhando
alertam para a importância de continuar a exploração da informação cruzando
variáveis diversas na compreensão dos percursos de integração dos alunos em
contexto escolar, quer estes se centrem no domínio relacional, quer na inserção nas
dinâmicas inerentes ao processo de ensino e aprendizagem.
Não esgotando todos os factores que nos permitem traçar hipóteses
explicativas para os resultados obtidos e, em particular, para a proximidade registada
no sucesso escolar dos alunos imigrantes de segunda geração e autóctones, parece-
nos evidente que as especificidades de ordem familiar e comunitária, associadas ao
factor tempo, têm aqui um papel determinante. Gillborn refere que o processo
educacional é complexo, tendo as atitudes das escolas e professores uma grande
influência sobre os resultados dos alunos (Seabra, 2010). Nesta perspectiva, os
resultados escolares resultam da confluência de factores favoráveis inscritos na esfera
familiar/comunitária, tal como na escolar/societária. Todavia, importa ir mais longe,
relacionando estes resultados com o grupo de origem e com o tempo de permanência
no país.
Estes resultados, que assumimos terem expressões diferentes para cada
grupo de origem dos imigrantes incluídos na análise e para cada ano de escolaridade
considerado, julgamos que também podem contribuir para a explicação que
procuramos. No caso dos descendentes de segunda geração, em que um dos
membros da família não é migrante, o domínio que este tem da língua, os
conhecimentos que possui do sistema educativo que provavelmente também
385
frequentou e, em algumas situações, da própria escola, poderão constituir-se como
uma mais-valia na integração do educando, no seu envolvimento enquanto
encarregado de educação e na sua disponibilidade para colaborar nas tarefas
escolares. Nesta perspectiva, a continuidade cultural entre o meio familiar e escolar
pode revelar-se como um factor de êxito dos alunos (Seabra, 2010; Rodriguez, 2012;
Sotomayor, 2012).
Se mobilizarmos a informação apresentada no início da exploração dos
resultados dos questionários, identificamos que as expectativas que os alunos
imigrantes revelam ter perante a escola, classificando-a de uma forma muito positiva e
valorizando o papel do adulto nas relações de sociabilidade, mas também na sua
função de educador, são indiciadoras de uma predisposição para aprender. Por outro
lado, a frequência de escolas que acolhem múltiplas referências culturais,
confrontando-se diariamente com a mobilidade da população imigrante, proporciona a
estes alunos momentos e espaços de interacção com a diversidade e o convívio com
diferentes ritmos de aprendizagem, que exigem dos professores a procura de
estratégias diferenciadas de resposta. Na opinião dos professores inquiridos, o
trabalho desenvolvido em contextos de diversidade sociocultural tem impacto i) no
desenvolvimento de competências sociais e de cidadania, ii) nas aprendizagens
realizadas pelas crianças e jovens e, iii) nas estratégias de organização e gestão da
sala de aula e das aprendizagens. Relativamente aos dois primeiros aspectos, a
análise das afirmações feitas pelos professores nas respostas aos questionários ilustra
a perspectiva que revelam ter sobre as potencialidades decorrentes do convívio em
escolas multiculturais. Numa perspectiva muito próxima da defendida por Gutman
(2004), alguns professores valorizam as interacções vividas nestes contextos
escolares como geradoras de um interdinanismo cultural como atestam os seguintes
excertos: “as crianças tomam conhecimento da cultura de outros países e estes alunos
trabalham de forma diferenciada” (P5); “permite que haja intercâmbios de hábitos e
costumes, que ajuda todos a ampliarem os seus horizontes” (P13); “maior abertura e
desenvolvimento de competências interculturais nos alunos, geradoras de uma
dinâmica de crescimento a nivel socioafectivo e cognitivo de relação com o meio
envolvente” (P3); “aproveitar a diversidade para enriquecer os conhecimentos dos
alunos” (P2). Nesta perspectiva, alunos e professores são colocados como agentes
criativos que têm ao seu dispor um conjunto de recursos culturais que podem mobilizar
em contexto de sala de aula, mas que têm, certamente, mais-valias importantes nas
suas práticas de cidadania em domínios diversos da sociedade. Segundo Gutman
(2004), num sistema educativo democrático a presença de diferentes grupos culturais
386
deve ser reconhecida, não apenas numa perspectiva de tolerância das diferenças,
mas de reconhecimento dos contributos culturais de cada um.
Ainda sobre a convivência em contextos de diversidade, os professores
reportam-se à facilidade com que os alunos nativos aceitam e integram os imigrantes
e adoptam, em alguns casos, elementos de outras culturas nas suas práticas. A título
ilustrativo transcrevemos alguns dos excertos das respostas aos questionários “os
alunos portugueses aceitam bem a diversidade, até aceitam bem demais, uma vez
que muitas vezes são aculturados pelos alunos estrangeiros e não o contrário:
adoptam os ritmos musicais dos alunos africanos, as expressões que utilizam na
linguagem e, negativamente, comportamentos desrespeitadores que observam nos
outros ( na forma como estão na aula, como abordam os professores, na falta de
assiduidade, pontualidade)” (P10); “os alunos portugueses são muito influenciados
pela diversidade, pela cultura e música africanas e até mesmo no modo de falar e
estar” (P9).
No que se refere à influência da diversidade cultural na organização e gestão
das práticas em contexto de sala de aula, os professores reconhecem o esforço
acrescido que é necessário para gerir competências e ritmos de aprendizagem
diversos, com diferentes níveis de proficiência linguística, comportamentos e atitudes
construídos em contextos familiares distintos. Entre os principais desafios identificados,
os professores reportam-se à necessidade de “mais tempo para responder a todos,
necessidade de mais materiais e uma pedagogia diferenciada, tarefa difícil em turmas
de 30 alunos” (P12); “organização e planificação de acordo com as especificidades ou
características dos alunos e organização da sala de aula para responder à exigências
sentidas” (P5); “dinamização de actividades de grupo e parceria entre alunos para
facilitar o processo ensino-aprendizagem” (P7); “gestão dos conflitos que possam
surgir pelo encontro de culturas diversas, preparando o grupo para a troca/partilha de
vivências culturais” (P2); “maior flexibilidade e adequação do currículo às
necessidades dos alunos, como também um diálogo mais alargado face às
potencialidades dos alunos” (P3); “programação de actividades de forma a que posam
ser realizadas por todos, adaptando o grau de dificuldade às especificidades de cada
um” (P10); “o ritmo nas aulas terá que ser mais lento para permitir um
acompanhamento mais individualizado” (P10); “é necessário ter em conta as várias
sensibilidades e susceptibilidades” (P8); “necessidade de maior investimento na
gestão de conflitos, por vezes os conflitos entre pares não são fáceis de resolver!” (P8).
Se atentarmos nos territórios onde se inserem as escolas, estes
caracterizam-se, em termos socioeconómicos, por uma população com baixos níveis
de instrução, que desempenha actividades profissionais em sectores com fraca
387
remuneração e que revela ter taxas de desemprego elevadas. Nestes contextos, quer
para a população nativa, quer para a imigrante não se identificam padrões
socioprofissionais muito distantes. Contudo, a análise das habilitações académicas
coloca as famílias imigrantes numa posição vantajosa, em particular no centro de
Lisboa, e chama a atenção para a necessidade de uma reflexão que coloque em
evidência a relação entre habilitações académicas dos progenitores e percurso escolar
dos seus descendentes. Se os contextos de baixo nível socioeconómico nos alertam
para níveis mais débeis de capital social (Letki, 2008), em que medida esta relação
pode ser contrariada quando os progenitores apresentam níveis de literacia superiores
à média do território onde se inserem? Assim, importa identificar, a partir dos
questionários aplicados às famílias, alguns indicadores que, incidindo em
características particulares dos grupos migrantes, podem ajudar a explicar os
percursos escolares desenvolvidos pelas suas crianças. Referimo-nos, em particular,
às variáveis relativas ao domínio da língua portuguesa, ao envolvimento da família nas
actividades escolares, aos hábitos de leitura e interesses dos estudantes.
Segundo alguns autores, o fraco domínio da língua do país de acolhimento
pode ter efeitos sobre os percursos escolares que as crianças e jovens realizam (Sim-
Sim, 1998; Solla, 1999) e, em contextos de grande diversidade linguística, pode
mesmo sentir-se um impacto significativo na comunicação e capacidade de construção
de laços (Leigh, 2006). Para as crianças e jovens inquiridos, que descendem de
imigrantes, é significativo o número das que pertencem à primeira geração e utilizam o
português com a família (42,5% dos alunos das escolas de Lisboa recorrem ao
português nas conversas com a família e 27% destes utilizam também outra língua;
em Sintra, 71,7% dos alunos de origem imigrante utilizam o português e destes, 7,2%
utilizam outra língua). Em Sintra, é notório o recurso aos crioulos, em particular entre
os descendentes de guineense e cabo-verdiana; quanto a Lisboa, além da utilização
dos crioulos surgem as línguas/dialectos asiáticos e alguns idiomas do leste europeu.
A segunda geração de imigrantes revela ter um perfil um pouco diferente do que
acabamos de apresentar para a primeira, pois é menos significativo o recurso a outras
línguas na esfera familiar (em Lisboa 92% dos alunos referem-se à utilização do
português e, é entre os descendentes de africanos que surgem as principais
referências à utilização de outra língua/dialecto, em particular o crioulo; em Sintra,
95% dos alunos recorre ao português e os restantes utilizam fundamentalmente
crioulos africanos).
A aprendizagem da Língua Portuguesa por parte dos alunos de origem
imigrante decorre em três contextos diferentes (família, amigos e escola), mas que
podem ser complementares. Este é também um dos domínios de intervenção que as
388
escolas consideram fundamental na integração dos alunos imigrantes, elencando nas
entrevistas realizadas, a explicitação de diferentes estratégias desenvolvidas na
construção de respostas adequadas à aprendizagem da língua portuguesa: horas de
apoio em pequeno grupo, de acordo com as orientações definidas pelo ME (DS1, DS2,
DL1, DL2, DL3); organização das actividades lectivas na disciplina de LP (2º/3º ciclos)
em par pedagógico (DS2); tutoria por parte de alunos com a mesma origem (DS2);
cursos de LP para crianças, jovens e adultos (DS1, DL3); projectos de língua
“Português como Língua Não Materna” (DL2).
Apesar do esforço desenvolvido pelas escolas e pelos professores na
disponibilização de estratégias de ensino da LP a alunos não nativos, é manifestada
de forma unânime a necessidade de encontrar outros mecanismos que permitam
facilitar a estes alunos uma aprendizagem mais intensiva da LP. Entre as propostas
apresentadas, quer por parte dos representantes das escolas, quer por parte dos
professores, surge valorizada a frequência de um curso intensivo de aprendizagem da
língua antes da integração dos alunos nas turmas. Um modelo que é adoptado por
alguns países europeus (Áustria, Bélgica, França, Finlândia, Holanda, Suécia),214 mas
que contraria o modelo definido em Portugal e que privilegia uma aprendizagem da
língua em simultâneo com a integração numa turma, facilitando ao recém-chegado o
contacto diário com colegas de outras origens e, desde cedo, a construção de laços
facilitadores da sua integração na escola e nos espaços exteriores a esta.
Para a primeira geração é notório o papel da escola no contacto e
aprendizagem da língua: quer nas escolas de Sintra, quer nas de Lisboa, as
referências destacam a instituição como lugar de encontro e aprendizagem do
português e, em particular, em Sintra, quase 50% das referências feitas por este grupo
de alunos recaem sobre o papel fundamental da instituição neste processo (Quadro
IV.34). Em segundo lugar, os alunos destes territórios colocam a responsabilidade da
aprendizagem da língua no grupo de amigos e, na última posição, reportam-se à
família (cerca de 30% das referências). É ainda de referir que apesar da diversidade
de origens que registamos no centro de Lisboa, o papel que é atribuído à escola como
local de aprendizagem da língua não é tão evidente como aquele que se identifica
para as escolas de Sintra. Associamos esta atitude à dimensão da comunidade
oriunda do Brasil e também à presença de cidadãos vindos do leste europeu. Para a
primeira, a proximidade linguística é o principal factor explicativo; para a segunda, o
214
O relatrório Eurydice (2004) identifica nas medidas de integração dos alunos imigrantes nos sistemas
educativos europeus dois modelos, “integrated model” e “separate model” (p.41). Os países referidos situam-se entre os que adoptam o “separate model”, significando que os alunos recém-chegados são organizados em grupos, separados dos restantes colegas de escola, para aprendizaegm da lingua do país de acolhimento.
389
esforço que os progenitores desenvolvem na aprendizagem e uso do português com
os seus descendentes em contexto familiar, surge reconhecido na valorização do seu
papel neste item. Acresce ainda que é para estes dois grupos de origem que se
contam os níveis de qualificação académica mais elevados, com destaque para os
cidadãos do leste europeu (36,8% dos pais imigrantes com formação superior e 37%
das mães imigrantes com esta formação são oriundos de países de leste),
competências que revertem favoravelmente para os filhos.
Quadro IV. 34 – Aprendizagem da língua portuguesa, % em relação ao total de referências para cada item
com
família com
amigos JI/escola
total ref.
Lisboa 1ª geração 30,0 31,0 39,0 100
2ª geração 37,5 31,3 31,2 16
Sintra 1ª geração 25,0 27,2 47,8 92
2ª geração 47,6 23,8 28,6 21
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
Na segunda geração, estes papéis invertem-se e é à família que se
reconhece o maior contributo na aprendizagem da língua, referência que se destaca
entre os estudantes residentes em Sintra. Este grupo coloca ainda na segunda
posição a escola, como responsável pelas aprendizagens da língua do país de
acolhimento.
A imagem transmitida pelos alunos, sobre o envolvimento das suas famílias
nas actividades escolares, revela existir uma grande proximidade entre famílias
imigrantes e famílias nativas. Tendencialmente, depositam na escola a confiança na
educação e formação dos seus filhos, numa perspectiva de interacção cultural. Nos
dois territórios em estudo, o envolvimento dos pais nas tarefas escolares não difere
muito entre a primeira e segunda gerações de alunos imigrantes (Quadro IV.35), mas
distancia-se um pouco da atitude que caracteriza as famílias nativas. Apesar de, para
a segunda geração, o apoio familiar se aproximar mais dos registos da população
nativa, estes ainda ficam um pouco aquém dos comportamentos que identificamos
para os nativos e, entre os dois territórios, é em Sintra que a distância parece ser
maior. Esta ajuda que as crianças e jovens nem sempre encontram entre os
progenitores é, nos alunos que frequentam as escolas do centro da cidade, substituída
pelos amigos. Note-se o peso das referências que são feitas a este grupo e que
ultrapassa o peso relativo das referências feitas aos pais e irmãos. Em Sintra, é aos
irmãos que, a seguir aos pais, é atribuído este importante papel no apoio nas tarefas
escolares entre os alunos de origem imigrante. Esta situação não é alheia ao menor
390
número de horas que estas famílias passam com os seus filhos devido aos
prolongados horários de trabalho e maior distância entre casa – trabalho (referidos nos
questionários das famílias) e, em algumas situações, decorre também dos baixos
níveis de literacia registados entre alguns imigrantes. No ponto seguinte retomaremos
este assunto.
Quadro IV.35 – Elementos da família que apoiam o aluno nas tarefas escolares, % em relação ao total de referências para cada item
sozinho pai/mãe irmãos amigos outros
familiares total ref.
Lisboa
nativos 48,4 26,1 8,8 10,0 6,7 670
imigrantes 1ª geração 50,6 20,1 6,5 22,1 0,5 154
2ª geração 48,2 23,9 12,2 14,7 1,0 197
Sintra
nativos 50,4 30,8 7,3 11,5 0,0 383
imigrantes 1ª geração 54,4 20,0 17,5 8,1 0,0 160
2ª geração 52,6 22,5 14,6 9,9 0,4 253
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
Numa tentativa de compreender em que medida algumas actividades
desenvolvidas pelos estudantes nos tempos extra escolares podem revelar-se mais-
valias importantes para os percursos de aprendizagem que realizam na escola, foi
formulada, no questionário, uma questão em que se pedia aos alunos para
identificarem, entre quatro possibilidades (ver TV, ler, jogar computador/playstation e
brincar) aquelas que realizam nos seus tempos livres. A partir das respostas à questão
colocada e das referências ao tipo de programas televisivos e de leituras que preferem
realizar, considerámos pertinente analisar a informação em três itens i) atividades
desenvolvidas; ii) existência de hábitos de leitura e tipo de livros e revistas lidos e, iii)
natureza dos programas de televisão. As percentagens obtidas correspondem ao
número de escolhas para cada um dos itens em função do número de respondentes.
Assim, na informação relativa às actividades desenvolvidas pelos alunos nos tempos
livres não se identificam diferenças significativas quando se comparam as referências
feitas pelas crianças e jovens de origem imigrante e pelas nativas (Quadro IV.36).
Apenas nos é possível identificar ligeiras diferenças entre os dois territórios que
sintetizamos de seguida: em primeiro lugar, os inquiridos posicionam o visionamento
de programas de televisão, actividade identificada por mais de 90% dos elementos;
em segundo lugar, as brincadeiras ou o encontro com amigos, referidas por cerca de
88% dos inquiridos; para os alunos de origem imigrante em Lisboa, é valorizada a
leitura de livros (86,1%), enquanto os nativos preferem os jogos de
391
computador/playstation (88,1%), revelando estes últimos, ter um comportamento
semelhante ao do conjunto dos alunos de Sintra (86,9% dos imigrantes e 83,8% dos
nativos colocam os jogos de computador ou playstation na segunda preferência); na
terceira posição, os alunos de Sintra colocam a leitura de livros, numa percentagem
idêntica entre imigrantes e nativos, atitude próxima à dos alunos nativos em Lisboa;
em último lugar, são colocadas as referências à leitura de revistas, referidas por 73% a
79% dos estudantes.
Quadro IV.36 – Ocupação dos tempos livres dos alunos, em Lisboa e em Sintra, segundo a origem (% de respostas em cada item)
Lisboa Sintra
imigrantes nativos imigrantes nativos
ver televisão 90,9 95,3 94,8 94,2
brincar/conviver 87,3 89,4 90,9 86,4
ler livros 86,1 84,5 81,1 80,6
jogar computador/playstation
81,7 88,1 86,9 83,8
ler de revistas 72,6 79,2 73,8 73,5
total respondentes 229 449 311 291
Fonte: Questionários aos alunos 2009/10. Cálculos da autora.
Entre o tipo de leituras que fazem, as crianças e jovens organizam as suas
preferências em livros de aventuras, banda desenhada, acção e histórias infantis. A
desagregação da informação obtida, em função da origem das crianças e dos
territórios, não revelou existirem diferenças nas preferências elencadas, apenas se
vão alterando os gostos em função da idade. Também, entre as revistas que elegem
para leitura, se regista alguma uniformidade nas escolhas que apresentam e que
oscilam entre as revistas infantis, juvenis, desportivas e de música. Os alunos
inquiridos revelam ter, a este respeito, uma grande proximidade nas preferências que
apresentam, sendo difícil estabelecer diferenças significativas de comportamento entre
nativos e imigrantes, e mesmo entre os territórios em estudo. A respeito dos
programas televisivos que elegem, a maioria também se situa entre filmes, desenhos
animados, telenovelas e programas musicais. Parece-nos que as principais mudanças
que se identificam, sobre as escolhas dos alunos inquiridos, decorrem
fundamentalmente da idade, deixando assim de parte a possibilidade de poderem ser
um resultado associado à diversidade cultural e aos contextos territoriais em que se
movimentam. Estes resultados indiciam, ao nível das opções que as crianças e jovens
fazem para a ocupação dos tempos livres, uma convergência de gostos e um
entrosamento entre nativos e imigrantes facilitadores de níveis importantes de
integração no grupo de pares.
392
A percentagem de referências feitas pelos alunos à leitura ultrapassou as
expectativas que tínhamos sobre os resultados que seria possível obter a partir da
questão colocada e, também, a imagem que habitualmente nos é transmitida sobre os
níveis de literacia das crianças e jovens em Portugal.215 Mesmo entre a primeira e a
segunda geração de imigrantes, a diferença registada nas referências à leitura como
uma prática, entre outras, que identificam na ocupação dos seus tempos livres, não se
apresentam com expressão (as diferenças não ultrapassam os 3 pontos percentuais).
Trata-se de resultados que, ao mesmo tempo que nos deixam algumas reservas, pelo
elevado número de alunos que afirma ler nos tempos livres, nos colocam algumas
expectativas sobre o impacto que os recentes programas de apoio à leitura,
desenvolvidos pelo Ministério da Educação, 216 podem ter vindo a desencadear a partir
das escolas. No âmbito destes programas, o investimento feito na leitura, com o
equipamento de bibliotecas escolares e o incentivo à sua prática a partir da sala de
aula, pelo professor, tem-se revelado um esforço importante no sentido da construção
e aumento dos níveis de literacia junto dos mais novos. Nas salas de aula, em
particular nas de 1º ciclo, a mudança de atitude dos professores no sentido de
encontrar estratégias de promoção da leitura, entre as crianças e os mais jovens,
parece ter surtido efeitos nos comportamentos e predisposição que os mesmos vão
demonstrando ter.217 Para muitas crianças, requisitar um livro na biblioteca da escola e
poder lê-lo em casa começa a ser uma prática para a qual revelam ter maior
disponibilidade. Por outro lado, em contextos familiares de menores recursos
económicos, a possibilidade das crianças poderem ler desde cedo, porque têm maior
facilidade de acesso aos livros, pode surtir efeitos multiplicadores no futuro.
De modo a tentar compreender se os hábitos de leitura que as crianças
revelam ter, podem também ser desencadeados a partir de casa, pelas famílias,
analisamos a questão referente aos hábitos de leitura dos pais, a partir dos
questionários aplicados às famílias. Para tal, utilizamos como elemento de referência
da família para a análise da informação a mãe.218 Os resultados obtidos indicam que,
apesar de algumas diferenças entre nativos e imigrantes e, entre territórios, a
215
No estudo realizado sobre alunos imigrantes em algumas escolas da AML, Seabra, Mateus, Rodrigues
e Nico identificam que “os tempos livres dos alunos descendentes de imigrantes e dos alunos autóctones são muito semelhantes, destacando-se entre as actividades mais frequentes ver televisão e ouvir música. Mais raras são as práticas de leitura e as idas ao cinema (2011, p.77). 216
A este respeito, o Plano Nacional de Leitura, tem sido uma referência fundamental, nacional e internacional, pelo trabalho desenvolvido no âmbito da promoção da leitura. Disponível em: http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt/index1.php. 217
Esta afirmação resulta das observações das práticas docentes que foi possivel desenvolver no âmbito deste estudo, mas também das decorrentes da atividade profissional que desenvolvo e que implica o aompanhamento dos estágios de futuros professores, em contextos de 1º ciclo e de 2º ciclo. 218
A opção por analisar a resposta a esta questão partindo do elemento feminino do agregado familiar justifica-se pela maior frequência deste elemento como respondente do questionário (em 70,2% dos questionários).
393
tendência geral é reveladora da existência de hábitos de leitura: em Lisboa, 79,3% dos
elementos femininos das famílias nativas revela ler livros e, entre as famílias
imigrantes, a percentagem é de 63,8%; em Sintra, 80,2% das famílias nativas refere
ter hábitos de leitura, percentagem que entre as famílias de origem imigrante é de
73,5%. Embora estes resultados contrariem a percepção comum sobre os níveis de
literacia destas populações, quer nativas, quer imigrantes, não deixa de ser importante
sublinhar que parece existir alguma relação entre as práticas de leitura registadas para
os alunos e aquelas são reveladas pelas famílias. Sem querer generalizar estes
resultados, é importante equacionar a influência que a família e a escola podem estar
a desenvolver na construção de hábitos de leitura junto dos mais jovens. A confirmar-
se este pressuposto, é provável que ele possa estar a desencadear alguns efeitos
positivos sobre os percursos de aprendizagem realizados pelas crianças.
Perante os resultados da análise desenvolvida em torno dos indicadores que
definimos para a compreensão dos percursos escolares dos alunos, mobilizados a
partir da informação empírica recolhida, importa sublinhar um conjunto de
características que aproximam ou afastam, em cada território, os comportamentos dos
estudantes. Identificamos como principais indicadores, i) a relação ciclo/idade do aluno
e a pertença à primeira ou à segunda geração; ii) a participação das famílias; iii) o
capital cultural das famílias; iv) as estratégias de escola e de sala de aula e, v) as
actividades de ocupação dos tempos livres pelos alunos.
Sobre a relação ciclo/idade do aluno e a pertença à primeira ou à segunda
geração, é importante sublinhar,
o maior peso dos estudantes de origem imigrante que já
ultrapassaram o limite de idade esperado para o ano de
escolaridade/ciclo que frequentam;
a proximidade, na idade, da segunda geração e da população nativa;
o maior peso relativo dos estudantes oriundos do continente asiático,
do africano e do Brasil entre os estudantes mais velhos em cada ciclo;
a maior frequência de alunos que já ultrapassaram o limite de idade
encontra-se no 6º e 9º anos de escolaridade, sendo maior o peso dos
estudantes de origem imigrante;
no centro de Lisboa, a proximidade registada na idade dos alunos de
segunda geração e dos nativos é muito grande, revelando-se em
algumas situações a vantagem para os imigrantes;
394
o domínio da língua portuguesa é reconhecido, por professores e
responsáveis das escolas, como um atributo fundamental para a
realização de aprendizagens escolares;
para os professores o sucesso escolar dos alunos recém-chegados
depende da adequação do ano de escolaridade ao percurso realizado
anteriormente;
o comportamento relativo aos percursos escolares não é homogéneo,
variando entre diversos grupos de origem e anos de escolaridade;
os percursos escolares são diversos, assim como os factores que
sobre eles interferem ao longo do tempo, não podendo ser a pertença
étnica a única variável explicativa.
Sobre a participação das famílias nas actividades escolares dos educandos,
evidencia-se uma proximidade entre o acompanhamento que os
alunos, de origem imigrante e nativos, referem ter nas tarefas
escolares por parte das suas famílias;
em Lisboa, onde a diversidade linguística é maior, o recurso aos
amigos revela-se um apoio fundamental na concretização das
aprendizagens escolares dos alunos de origem imigrante;
nas escolas de Sintra, os descendentes de imigrantes encontram nos
irmãos um apoio importante nas suas tarefas escolares;
é em Sintra que se regista um maior afastamento no comportamento
da população imigrante, face aos registos obtidos para a população
nativa;
para os professores, o sucesso escolar dos alunos depende das
expectativas e do envolvimento das famílias nas tarefas escolares, e
do seu nível socioeconómico.
Sobre o capital cultural das famílias,
em contextos territoriais onde dominam baixos níveis de instrução, a
população imigrante, portadora de maiores habilitações académicas
consegue que as suas crianças e jovens realizem percursos
escolares com maior sucesso que os alunos nativos, como se verifica
no centro de Lisboa;
395
a valorização que é feita pelas famílias de origem imigrante
relativamente à aprendizagem da língua portuguesa, é visível na
língua em que comunicam em casa com os seus descendentes;
os níveis de literacia revelados pelas famílias indiciam a existência de
um importante capital cultural que pode ser transferido para as
crianças e jovens;
a presença de diferentes culturas na escola é entendida, por parte de
alguns docentes, como uma mais-valia na construção de
aprendizagens e na formação pessoal e social dos alunos;
o acolhimento feito pelos alunos nativos é valorizado pelos docentes
como uma prática facilitadora da integração dos colegas não nativos.
Sobre as estratégias de escola e de sala de aula,
evidencia-se uma preocupação, por parte da escola, em encontrar
estratégias diversificadas para o ensino da língua portuguesa como
língua não materna;
os professores reconhecem a necessidade de alterar as suas práticas
de modo a responder às necessidades diferenciadas do grupo de
alunos;
é identificado, por parte dos docentes, um conjunto de práticas que
visa contribuir para o sucesso escolar de todos os alunos;
a aprendizagem da língua portuguesa é valorizada por todos como
uma condição fundamental para a integração na turma e ano de
escolaridade.
Sobre as actividades de ocupação dos tempos livres pelos alunos,
as escolhas revelam uma grande proximidade e convergência de
interesses entre nativos e imigrantes;
os gostos e preferências em termos de programas televisivos, género
de livros e revistas são coincidentes para um grupo significativo;
a convergência de interesses, reconhecida nos alunos nativos e nos
imigrantes, constitui-se como um importante potencial para a inclusão
no grupo de pares.
Em síntese, tendo presente seis dos indicadores que contribuem para a
compreensão dos percursos de integração dos alunos imigrantes em contexto escolar
396
e, retomando o conceito de integração, como um processo que se constrói na relação
dialéctica entre os indivíduos e a escola, da qual não podemos dissociar os contextos
sociais, políticos e institucionais, situados ao nível macro da sociedade receptora e,
também os contextos territoriais em que se fixam os imigrantes (Fonseca & Malheiros,
2005), pensamos reunir um conjunto de elementos que nos autorizam, neste momento
do estudo, a avançar com algumas conclusões sobre o processo de integração que se
vive na escola. Neste processo, são envolvidos dois protagonistas, o imigrante, ao
qual se associa a família e as instituições da sociedade de acolhimento (Penninx,
2008).
Ao nível individual, os percursos escolares realizados pelos alunos imigrantes
ou descendentes de imigrantes revelam ser diversificados, concorrendo para a sua
caracterização o momento de chegada ao território de acolhimento; o ano/ciclo de
ensino em que os alunos são incluídos; o domínio da língua portuguesa; as
expectativas que as famílias têm face à escola e o envolvimento que têm na mesma; e,
ainda, os contextos territoriais de acolhimento, em particular as características
socioeconómicas e sociodemográficas. Para a sua inclusão no grupo de pares
revelam-se facilitadoras as práticas que caracterizam a forma como ocupam os
tempos livres, reveladoras da convergência ao nível dos gostos entre as crianças
nativas e imigrantes, pelas preferências que mantém nos hábitos de leitura e nos
programas de televisão, na medida em que permitem uma maior aproximação entre
crianças e jovens, independentemente das suas origens. As atitudes positivas entre
estudantes reforçam as relações de pares, importante suporte emocional para os
alunos imigrantes no seu percurso de integração (Kasinitz, Mollenkop, Waters &
Holdaway, 2008).
Na óptica do capital cultural, o contributo das famílias revela ser fundamental
no sucesso do percurso de integração dos seus descendentes, concretizando-se, na
esfera familiar, pelo apoio prestado nas tarefas escolares e pelo investimento que é
feito na aprendizagem da língua portuguesa e, na esfera social, pelos níveis de capital
cultural que os seus descendentes transportam para a escola e mobilizam nas
relações com os outros e nas aprendizagens realizadas. Globalmente, apesar dos
resultados obtidos poderem espelhar algum distanciamento das famílias imigrantes
relativamente às tarefas escolares dos seus educandos, consideramos que não se
afastam muito dos comportamentos que registamos para as famílias nativas. Mesmo
residindo em territórios marcados por características socioeconómicas desvantajosas,
os alunos imigrantes rentabilizam o capital cultural disponível nas famílias, que se
distingue em função das suas origens, reflectindo-se no seu sucesso escolar.
397
No envolvimento das escolas em geral e, dos professores, em particular, nos
percursos de integração das crianças e jovens, denota-se uma preocupação em
atender a todos, valorizando os respectivos recursos culturais. Para tal, procuram-se
estratégias e actividades que facilitem o acolhimento da diversidade, respondendo aos
diferentes ritmos de aprendizagem e tomando como referência as competências
anteriormente desenvolvidas. Entre as estratégias identificadas, são valorizadas pelos
professores as diferentes formas de organização da sala de aula, a diferenciação
pedagógica e o desenvolvimento de actividades cooperativas, potencializadoras de
diferentes momentos de interacção e partilha e do desenvolvimento de competências
sociais e de cidadania. Sobre a integração dos alunos imigrantes, as escolas e os
professores são unânimes em afirmar a importância da aprendizagem da língua,
cumprindo para tal os normativos legais e procurando estratégias inovadoras de
organização do trabalho na turma e na escola. Numa reflexão crítica sobre o trabalho
que tem sido desenvolvido pelo ME para a colocação dos alunos recém-chegados no
respectivo ano/ciclo, as escolas e os professores defendem um modelo que atenda de
forma mais clara à diversidade de competências desenvolvidas anteriormente e
privilegie a aprendizagem da língua portuguesa como um requisito prévio à integração
dos alunos no ano de escolaridade respectivo.
4.3.7. O envolvimento das famílias na escola
A complexidade da relação família-escola nos aspectos que se reportam à
participação tem sido amplamente debatida. Como se define participação? Como
devemos colocar em articulação famílias, docentes, alunos e órgãos de gestão da
escola? Quais os limites que se impõem à participação das famílias? Quais as
finalidades e conteúdos da participação?
Definimos participação como um processo aberto, neste caso específico, um
direito e um dever das famílias, que implica disponibilidade e motivação ou seja,
querer participar, saber participar e aprender a participar para “tomar parte”, “ser parte”
e “ter parte” num processo educativo. Por outro lado, também pelo lado da escola é
importante existir disponibilidade para acolher a participação e capacidade de iniciativa
para a promover e incentivar.
Os estudos sobre a relação família-escola revelam existir diversos níveis,
áreas e modalidades de participação/cooperação entre estas duas instituições (Turkey
& Kao, 2009; Rodriguez, 2012). Frequentemente, a participação reduz-se ao nível
individual (reuniões de avaliação, entrega de notas, comunicação de situações de
indisciplina), centrada no percurso e atitudes do aluno(filho), e/ou na reflexão sobre o
modo de resolução dos conflitos por este vividos. A este nível, serão reduzidos os
398
contributos para inovar o processo educativo. Segundo Rodriguez (2012), os níveis de
participação devem assumir duas modalidades: o individual e o colectivo. Para a
concretização do segundo, importa que ocorra colaboração, comprometimento,
cooperação, comunicação e implicação. São seis as grandes áreas de cooperação
das famílias nas escolas/agrupamentos: i) a escola como fonte de ajuda às famílias,
proporcionando-lhes os meios para que possam levar a cabo as suas obrigações
educativas; ii) a família como fonte de ajuda à escola, para que esta consiga uma
intervenção educativa mais eficaz; iii) a colaboração das famílias na escola para
desenvolver actividades complementares de apoio; iv) a implicação das famílias nas
actividades escolares/de aprendizagem, através do apoio em casa; v) a intervenção
das famílias na gestão, através dos diferentes órgãos de gestão; vi) a interacção das
famílias do agrupamento, com outras instituições sociais e comunidades educativas
(Rodriguez, 2012).
A partir dos questionários preenchidos pelos alunos e pelas famílias é
possível identificar as formas de cooperação das famílias nas escolas que as crianças
e jovens frequentam. Sobre os resultados obtidos nos primeiros, ou melhor, sobre a
imagem que os alunos nos transmitem do acompanhamento feito pelos pais na
realização das suas tarefas extralectivas, já nos debruçámos anteriormente. Importa
agora analisar as percepções das famílias sobre as modalidades de participação que
consideram ter na vida escolar dos seus educandos e sobre os motivos que
apresentam para justificar os comportamentos que assumem nesta matéria.
Uma análise global da apreciação feita pelas famílias da amostra indica que a
maioria refere envolver-se nas actividades dos seus educandos (63,1% dos inquiridos
responde afirmativamente à questão “costuma envolver-se nas actividades que o seu
filho/educando desenvolve na escola?”). Desagregando o grupo em função da origem
do elemento feminino da família,219 em imigrante e nativo, concluímos que não é
significativa a diferença no comportamento das mães imigrantes e das mães nativas
relativamente à atitude que manifestam ter no acompanhamento das actividades
lectivas dos seus educandos: 63,5% das mães nativas e 65,9 % das mães de origem
imigrante. A este respeito, as entrevistas realizadas aos representantes dos
agrupamentos corroboram os resultados que obtivemos com a aplicação do
questionário. Entre os motivos mais frequentemente referidos para justificar a não
participação nas actividades dos educandos, as famílias evocam fundamentalmente, a
“falta de tempo”, referida por 60,6% das famílias autóctones e por 71,1% das famílias
219
A opção por analisar a resposta a esta questão partindo do elemento feminino do agregado familiar
justifica-se pela maior frequência deste elemento como respondente do questionário (em 70,2% dos questionários) e, também, pela maior presença das mães no acompanhamento das actividades escolares dos educandos.
399
de origem imigrante. Registe-se que, no grupo de famílias de origem imigrante,
apenas uma se reporta ao facto de não dominar a língua portuguesa como motivo
para a não participação nas actividades escolares.
Sobre a tipologia de actividades em que referem participar e que caracterizam
o seu envolvimento na escola, as famílias situam, em primeiro lugar, o
acompanhamento das tarefas escolares em casa (28% das respostas), na segunda
posição a participação em reuniões com o professor titular de turma e/ou o director de
turma (17,6%). Na terceira e na quarta posição, é colocada a participação em
festas/comemorações (14,5%) e em actividades desenvolvidas no âmbito das artes e
do desporto (12,8%). Comparando o padrão de respostas das famílias nativas e das
de origem imigrante, concluímos que não se registam diferenças significativas, apenas
salientamos uma maior valorização das actividades de cariz artístico e desportivo por
parte das segundas (Quadro. IV.37).
Em relação à predisposição que revelam ter para se deslocar à escola,
analisada a partir da situação que despoleta essa mesma deslocação, por iniciativa
própria ou apenas quando solicitadas, constatamos que aproximadamente 50% refere
fazê-lo por iniciativa própria. Apesar do comportamento das famílias imigrantes não se
afastar muito do registado para as famílias nativas, para as primeiras é mais frequente
a referência à obrigação de se deslocar à escola para responder a uma solicitação
feita pela mesma, que entre as segundas (44,3% para 38,5%, respectivamente).
Quando levadas a enumerar as actividades que a escola desenvolve para
envolver a comunidade, as famílias reportam-se com maior frequência às reuniões de
pais (52,4% das respostas), colocando na segunda posição as festas/comemorações
(21,6%). Às restantes actividades especificadas no questionário: espectáculos,
Quadro IV.37 – Actividades escolares em que a família se envolve (% de respostas em cada item)
nativo imigrante total
acompanham. tarefas escolares em casa 31,3 21,3 28,0
Agrupamento: ______________________________________________________________________ Sede de Agrupamento: _______________________________________________________________ Morada: ___________________________________________________________________________ Contactos: Email: ____________________________ Telf.: _____________ Fax: ________________
Entrevistado: ________________________________________________________________________ Cargo que desempenha: _______________________________________________________________ Idade: _______ anos Género: F ___ M ___ Anos de permanência na Escola: _______E no cargo: _______ Anos de docência: ________
I. CARACTERIZAÇÃO DO AGRUPAMENTO
Escolas
Local
Estrutura
Idade
Recursos Físicos
Recursos Humanos
Docente
Não Docente
Nº turmas/alunos
Capacidade
Área Geográfica
462
II. NÚMERO TURMAS/ALUNOS NAS ESCOLAS DO AGRUPAMENTO
III. CARACTERÍSTICAS/PERFIL DOS ALUNOS 1. Grupo étnico/cultural de origem dos alunos.
Grupo
Escola
Portu-
guês
Africano Asiático Europeu de Leste Brasi-
leiro U.E. Outros*
Ang. CV Moç. STP China Índia Paq. Ucra. Rom. Mold.
Nota: Quando o aluno é descendente de pais com origem diferente opta-se pela origem do pai. *Quais?______________________________________________________________________________ 2. Quais as tendências de evolução da chegada dos alunos imigrantes/descendentes às escolas do Agrupamento?
463
Anos
Grupo
1970
1980
1990
2000
Afr
ican
o
Angola
Cab. Verde
Moçamb.
STP
Guiné
Asi
áti
co
China
Índia
Paquistão
Eu
rop
eu
Lest
e
Ucrania
Roménia
Moldávia
Brasil
U.E.
Outros
( – ; + ; ++ ) os que existiam e os que estão a crescer 3. Quais as origens geográficas dos alunos que frequentam as escolas do Agrupamento? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 4. Qual o perfil socioeconómico dos alunos que frequentam as escolas do Agrupamento?
Perfil Socioeconómico %
Baixo
Médio Baixo
Médio
Médio Alto
Alto
Atendendo ao grau de instrução, tipos de profissão e
rendimento.
464
5. Quais as principais carências sentidas pelo agrupamento relativamente aos seus alunos?
Carências %
Económicas
Alimentares
Afectivas
Empenho nas actividades
Motivação
Cooperação
6. Que medidas o Agrupamento tem implementado para suprir as carências sentidas?
Medidas % (+/-)
Solicitação ajuda económica
Refeições
Acompanhamento psicológico
Dinamização actividades extra curriculares
(projectos/clubes/…)
Envolvimento famílias
Outras
6.1. Quais aquelas a que recorre com maior frequência? _____________________________________________________________________________________ 7. Quais os projectos em que o Agrupamento se encontra envolvido?
Projectos %
Agrupamento
Escola
Associações Locais
Autarquia
Nacionais
Europeus
7.1.Quais os temas dominantes dos projectos? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 7.2. Quais os objectivos gerais destes projectos? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 7.3. Qual a importância, para o Agrupamento, do envolvimento em projectos desta natureza? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 7.4. Quais os resultados da participação nesses projectos? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
465
IV – A INTEGRAÇÃO DOS ALUNOS 8. Quais as orientações definidas pelo Agrupamento para a frequência das suas escolas/aceitação da matrícula nas suas escolas? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 9. Quais as orientações do Agrupamento para a organização dos alunos nas turmas? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 10. Quais são as principais preocupações do Agrupamento relativamente à integração dos seus alunos? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 11. Quais as principais dificuldades que têm surgido relativamente à integração dos alunos nas escolas do Agrupamento? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12. De que forma as preocupações com a integração dos alunos nas escolas do Agrupamento é tida em conta nos seus documentos orientadores: 12.1. No Projecto Educativo? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12.2. No Projecto Curricular de escola? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12.3. Nos Projectos Curriculares de Turma? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12.4. No Plano Anual de Actividades? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
466
13. Quais os critérios utilizados para a colocação dos alunos imigrantes (recém chegados) nos ciclos/anos de escolaridade? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13.1. Qual a posição do Agrupamento relativamente à política do Ministério da Educação para a colocação dos alunos imigrantes nos ciclos de ensino/anos de escolaridade? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 14. Quais as principais fragilidades que as escolas do Agrupamento encontram nos alunos imigrantes/descendentes de imigrantes? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 14.1. Quais as potencialidades mais frequentemente identificadas nesses alunos? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ 15. O Agrupamento sentiu necessidade de definir medidas pedagógico-didácticas específicas para os alunos imigrantes/ descendentes de imigrantes? Sim___ Não___ 15.1. Se Sim, quais? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 15.2. Existem projectos em curso específicos para estes alunos? Quais? Porquê? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 15.3. Quais os resultados? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 16. Quais os apoios a que o Agrupamento recorre para facilitar a integração dos alunos imigrantes/ descendentes de imigrantes? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 17.Considera importante um envolvimento dos órgãos de administração local/autarquia/associações locais no apoio à integração dos alunos imigrantes/ descendentes de imigrantes? Sim___ Não___ 17.1. Se sim, de que forma? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
467
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 18. Como é ensinada a Língua Portuguesa aos alunos que chegam à escola com outra língua materna? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 19. Globalmente, qual o balanço que faz do trabalho desenvolvido para a integração dos alunos imigrantes/ descendentes de imigrantes? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________ 19.1. Quais as principais dificuldades que tem encontrado e quais os aspectos mais positivos? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________
20. Como é vista a presença dos alunos imigrantes e descendentes de imigrantes nas escolas do Agrupamento pelos outros alunos, pelo pessoal docente e não docente? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ V – DESEMPENHO ESCOLAR 21. Como caracteriza, em termos gerais, o desempenho escolar dos alunos que frequentam as escolas do Agrupamento? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 22. Qual a taxa de insucesso que o Agrupamento apresenta? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 22.1. Quais os anos de escolaridade em que se registam taxas mais elevadas de insucesso? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 22.2. Quais os motivos que apresenta para essas taxas de insucesso? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 23. Qual a taxa de abandono/ nº de alunos que abandonam a escola? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 23.1. Em que anos se registam os maiores valores de abandono escolar? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
468
24. Existe um maior número de retenções/abandono escolar entre os alunos imigrantes? Sim___ Não___ 24.1. Quais os grupos? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 24.2. Quais os factores que o justificam? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 25. Quais as medidas que o Agrupamento tem desenvolvido para atenuar esses níveis de abandono/retenção? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ VI – AS FAMILIAS E A ESCOLA 26. As famílias dos alunos que frequentam as escolas do agrupamento envolvem-se nas actividades dos seus educandos? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 27. De que forma é mais frequente essa participação? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 28. Existem diferenças na forma e frequência de participação entre as famílias dos alunos imigrantes/descendentes e as outras? Sim___ Não___ 28.1. Se SIM quais? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 29. Que tipo de encontros/actividades o Agrupamento desenvolve com os encarregados de educação? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 30. Existem algumas medidas específicas para envolver os encarregados de educação dos alunos imigrantes? Sim____ Não____ 30.1. Se SIM quais? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 31.Qual a sua imagem relativamente às expectativas que os encarregados de educação, oriundos de outras culturas, têm face à Escola? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
469
31.1. Existem diferenças associadas ao grupo cultural a que pertencem? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 32. Qual a percepção que tem dos encarregados de educação face à diversidade cultural que encontram nas escolas do Agrupamento? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 33. Qual a imagem que as famílias dos alunos imigrantes/ descendentes de imigrantes têm da escola que os seus educandos frequentam? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ VII – A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES 34. Qual a política de formação do Agrupamento? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 35. Existem professores a procurar formação no domínio da multiculturalidade? Sim___ Não___ 35.1. Se SIM qual? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 36. Quais as principais necessidades sentidas pelos professores do agrupamento no âmbito da formação multicultural? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 37. Quais as resposta do Agrupamento no domínio da formação de professores? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 38. Há professores a leccionar no agrupamento com formação específica no domínio da multiculturalidade e/ou educação para a diversidade? Sim___ Não___ 38.1. Se SIM, qual? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 39. Quais os grandes problemas e desafios que se colocam hoje à escola que trabalha com comunidades multiculturais? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
470
__________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 39.1. Como têm tentado resolver os problemas que surgem? _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 40. Outras informações que considere pertinentes:
471
Anexo 2
472
473
INSTITUTO DE GEOGRAFIA E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO CENTRO DE ESTUDOS GEOGRÁFICOS UNIVERSIDADE DE LISBOA
Estudo sobre Educação, Diversidade e Território
Questionário aos Alunos – 1º e 2º Ciclos do Ensino Básico
A tua colaboração é imprescindível para o estudo que me encontro a desenvolver. É importante que as tuas repostas sejam sinceras. Todos os dados serão tratados de forma anónima e confidencial.
Nome da Escola: ____________________________________________ Turma __________ Data: ___/___/___ Ano de escolaridade: ___º
II – CARACTERIZAÇÃO DO ALUNO 1. Idade: 2. Género: F___ M ___ 3. Bairro onde resides: _____________________________________________________________________________________ 4.
Naturalidade (país onde
nasceu)
Nacionalidade
Europeu
Portugal
Espanha
França
R. Unido
Outro*
Africano
Angola
Cabo Verde
Moçambique
São Tomé e Príncipe
Outro*
Sul Americano
Brasil
Venezuela
Argentina
Outro*
Europeu de Leste
Moldávia
Roménia
Rússia
Ucrânia
Outro*
Asiático
China
Índia
Paquistão
Bangladesh
Timor
Outro*
* Qual?_______________________________________________________ 5. Se NÃO nasceste em Portugal há quantos anos vieste para cá? (assinala com uma cruz X)
Menos de 1 ano
2/3 anos
3/5 anos
5/10 anos
Mais de 10 anos
6. Sempre frequentaste esta Escola? Sim ___ Não ___ 6.1. Se NÂO qual a outra? (indicar o nome ou o local) _____________________________________________________________________________________ 7. Já alguma vez tiveste que repetir um ano? Sim___ Não ___ 7.1. Se SIM, qual? _____________________________________________________________________________________
475
8. Se frequentaste a escola no teu país de origem indica as dificuldades que sentiste quando começaste a frequentar a escola em Portugal. (assinala com uma cruz X)
Língua
Conteúdos das áreas disciplinares/disciplinas
Diálogo com os professores
Convívio com os colegas
Comportamentos/indisciplina na turma
Organização do sistema de ensino (regime de faltas/número de disciplinas/número de professores/número de horas de aulas por dia)
Outra. Qual?
III – REPRESENTAÇÃO DA ESCOLA 9. Define, em três palavras a tua Escola: ______________________________ ______________________________ ______________________________ 10. Indica três aspectos que mais gostes na tua Escola: ______________________________ ______________________________ ______________________________ 11. Indica três aspectos que não gostes na tua Escola: ______________________________ ______________________________ ______________________________ 12. Indica três motivos que te fazem vir à escola: (classifica-os na escala de 1 a 3. Para o mais importante atribui o número 1 e para o menos importante o número 3).
Aprender
Conviver com os colegas
Obrigação de estudar (escolaridade obrigatória)
Imposição da família
Poder continuar a estudar no futuro
13. Alguma vez te zangaste com os teus colegas de Escola? Sim___ Não ___ 13.1. Se SIM, porquê? (assinala com uma cruz X)
Provocações/Insultos Desprezo
Rivalidades Lutas
Brincadeiras Outro motivo*
Discussões
* Qual?_______________________________________________________ 14. Como resolveste a situação? (assinala com uma cruz X)
15. Com quem costumas brincar no recreio? (escolhe apenas duas hipóteses)
Com os colegas da turma
Com colegas de outras turmas
Com vizinhos
Com familiares
Outro. Qual?
IV – IDENTIDADE E PRÁTICAS IDENTITÁRIAS 17. Que língua(s) falas em casa com a família? ______________________________________________ 18. Para os alunos que não falam em casa o português e/ou que chegaram recentemente a Portugal. Os restantes alunos passam para a questão 19. 18.1. Como aprendeste o português? (assinala com uma cruz X)
Em casa com a família
Com os amigos
No jardim-de-infância/ama
Na escola com o professor
Outra. Qual?
18.2. Frequentas aulas de Língua Portuguesa para alunos imigrantes na tua escola? Sim ___ Não ___ Quantas vezes por semana? ___ 18.3. Frequentas alguma escola onde estejas a aprender a língua do país de origem dos teus pais? Sim ___ Não ___ Qual?____________________________________________________________ 18.4. Falas outra língua com os teus colegas na escola que não seja o português? Sim___ Não ___Qual? ________________________________________________________________ 19. Com quem costumas estudar? (assinala com uma cruz X)
Sozinho
Com o pai ou a mãe
Com irmãos
Com amigos
Outros. Quais?
20. Onde costumas estudar / fazer os TPC? (assinala com uma cruz X)
Casa
Escola
ATL
Casa de amigos
Outros. Quais?
20.1. Se estudas em casa, qual a divisão da casa que usas? (assinala com uma cruz X)
Sala
Quarto
Cozinha
Outros. Quais?
477
21.Como ocupas os teus tempos livres?
A ver TV___ Indica os três programas que mais vês e os três canais que preferes.
Programas Canais de TV
Telenovelas RTP1
Desenhos animados RTP2
Comédia TVI
Filmes SIC
Concursos MTV
Música Odisseia
Desporto Canal História
Programas de Luta Disney Channel
Telejornal Sport TV
Documentários
Outros. Quais? Outros. Quais?
A ler ___ Indica até três tipos de livros e três tipos de revistas que tenhas lido ultimamente.
Livros Revistas
Aventuras Infantis (Visão Júnior …)
Acção Juvenis (Bravo/SuperPop/100%Jovem/ Super interessante/…)
Histórias Infantis/Juvenis Desportivas
Romances Música
Banda Desenhada Programação TV (TV 7 dias/TV Guia/…)
Poesia Informática (Play Station/PC Guia/…)
Viagens “Cor de Rosa” (Gente/LUX/Caras/Flash…)
Generalistas (Sábado/Visão/…)
Outros. Quais?
Outras. Quais?
A jogar no computador ou na play station ___ Indica até três tipos de jogos.
Tipo de jogos
Acção
Luta
Educativos (Ciências/Matemática/História/…)
Desportivos
De Pistas
Outro. Qual?
A brincar com os amigos ___ Indica até três locais onde costumas brincar.
Locais de brincadeira
Casa
Rua
Jardim/Parque Infantil
Campo Desportivo
Outro. Qual?
478
22. Costumas brincar com os teus colegas da Escola? Sim ___ Não ___ 22.1. Se SIM, onde brincam? (assinala com uma cruz X)
Casa Rua Jardim/Parque Infantil
Campo Desportivo
Outro. Qual?
23. Os amigos com quem sais/convives fora da Escola têm outras origens étnicas/nacionalidades? Sim ___ Não ___
Africanos Asiáticos Europeus Leste Brasileiros Outros. Quais?
24. Costumas sair com colegas da Escola quando não tens aulas e/ou aos fins-de-semana? Sim___ Não ___ 24.1. Se SIM, onde costumas ir? Indica os três locais que mais frequentas: 25. Como costumas contactar com os teus amigos/colegas? (assinala com uma cruz X)
Formas de contacto
Telefone
Telemóvel
Email
MSN/HI5
Ir a casa
Outro. Qual?
Locais frequentados com colegas de Escola
no bairro fora do bairro (indicar o local)
Jardim/Parque Infantil
Espaços Desportivos
C. Comercial
Cinema
Outro. Qual? Onde se localiza?
479
26. Costumas sair com a tua família em tempo de aulas e/ou aos fins-de-semana? Sim ___Não ___ 26.1. Se SIM, onde costumas ir? Indica os três locais que mais frequentas.
Muito Obrigada pela tua colaboração!
_______________________________
(Maria João Barroso Hortas)
Locais frequentados com a Família
no bairro fora do bairro (indicar o local)
Jardim/Parque Infantil
Espaços Desportivos
C. Comercial
Supermercado/Hipermercado
Restaurantes
Cinema
Centros Culturais
Museus
Locais de culto (igreja, mesquita, templo…)
Visitar família
Visitar Amigos
Outro. Qual? Onde se localiza?
480
481
Anexo 3
482
483
INSTITUTO DE GEOGRAFIA E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO CENTRO DE ESTUDOS GEOGRÁFICOS UNIVERSIDADE DE LISBOA
Estudo sobre Educação, Diversidade e Território
Questionário aos Alunos – 3º Ciclo do Ensino Básico A tua colaboração é imprescindível para o estudo que me encontro a desenvolver. É importante que as tuas repostas sejam sinceras. Todos os dados serão tratados de forma anónima e confidencial.
Nome da Escola: ____________________________________________ Turma __________ Data: ___/___/ Ano de escolaridade: ___º
II – CARACTERIZAÇÃO DO ALUNO 1. Idade: _____________ 2. Género: F ___ M ___ 3. Bairro/Freguesia onde resides: __________________________________________________________________ 4.
Naturalidade (país onde
nasceu)
Nacionalidade
Europeu
Portugal
Espanha
França
R. Unido
Outro*
Africano
Angola
Cabo Verde
Moçambique
São Tomé e Príncipe
Outro*
Sul Americano
Brasil
Venezuela
Argentina
Outro*
Europeu de Leste
Moldávia
Roménia
Rússia
Ucrânia
Outro*
Asiático
China
Índia
Paquistão
Bangladesh
Timor
Outro*
* Qual?_______________________________________________________ 5. Se NÃO nasceste em Portugal, há quantos anos vieste para cá? (assinala com uma cruz X)
Menos de 1 ano
2/3 anos
3/5 anos
5/10 anos
Mais de 10 anos
6. Indica a escola que frequentaste nos ciclos/anos anteriores:
1º ciclo 2º ciclo 3º ciclo
7. Já alguma vez tiveste que repetir um ano? Sim ___ Não ___ 7.1. Se SIM, qual? ________________________________________________________________________
485
8. Se frequentaste a escola no teu país de origem indica as dificuldades que sentiste quando começaste a frequentar a escola em Portugal. (assinala com uma cruz X)
Língua
Conteúdos das disciplinas
Diálogo com os professores
Convívio com os colegas
Comportamentos/indisciplina na turma
Organização do sistema de ensino (regime de faltas/número de disciplinas/número de professores/número de horas de aulas por dia)
Outra. Qual?
III – REPRESENTAÇÃO DA ESCOLA 9. Define, em três palavras a tua Escola:
12. Indica três motivos que te fazem vir à escola: (classifica-os na escala de 1 a 3. Para o mais importante atribui o número 1 e para o menos importante o número 3).
Aprender
Conviver com os colegas
Obrigação de estudar (escolaridade obrigatória)
Imposição da família
Poder continuar a estudar no futuro
13. Alguma vez te zangaste com os teus colegas de Escola? Sim ___ Não ___ 13.1. Se SIM, porquê? (assinala com uma cruz X)
Provocações/Insultos Desprezo
Rivalidades Lutas
Brincadeiras Outro motivo*
Discussões
* Qual?_______________________________________________________ 14. Como resolveste a situação? (assinala com uma cruz X)
15. Com quem costumas conviver no recreio/intervalos das aulas? (escolhe apenas duas hipóteses)
Com os colegas da turma
Com colegas de outras turmas
Com vizinhos
Com familiares
Outro. Qual?
IV – IDENTIDADE E PRÁTICAS IDENTITÁRIAS 17. Que língua(s) falas em casa com a família? ______________________________________________ 18. Para os alunos que não falam em casa o português e/ou que chegaram recentemente a Portugal. Os restantes alunos passam para a questão 19. 18.1. Como aprendeste o português? (assinala com uma cruz X)
Em casa com a família
Com os amigos
No jardim-de-infância/ama
Na escola com o professor
Outra. Qual?
18.2. Frequentas aulas de Língua Portuguesa para alunos imigrantes na tua escola? Sim ___ Não ___ Quantas vezes por semana?_________ 18.3. Frequentas alguma escola onde estejas a aprender a língua do país de origem dos teus pais? Sim ___ Não ___ Qual?____________________________________________________________ 18.4 Falas outra língua com os teus colegas na escola que não seja o português? Sim ___ Não ___ Qual?________________________________________________________________ 19. Com quem costumas estudar? (assinala com uma cruz X)
Sozinho
Com o pai ou a mãe
Com irmãos
Com amigos
Outros. Quais?
19.1. Se estudas em casa, qual a divisão da casa que usas? (assinala com uma cruz X)
Sala
Quarto
Cozinha
Outros. Quais?
487
20.Como ocupas os teus tempos livres?
A ver TV ___ Indica os três programas que mais vês e os três canais que preferes.
Programas Canais de TV
Telenovelas RTP1
Desenhos animados RTP2
Comédia TVI
Filmes SIC
Concursos MTV
Música Odisseia
Desporto Canal História
Programas de Luta Disney Channel
Telejornal Sport TV
Documentários
Outros. Quais?
Outros. Quais?
A ler ___ Indica até três tipos de livros e três tipos de revistas que tenhas lido ultimamente.
Livros Revistas
Aventuras Juvenis (Bravo/SuperPop/100%Jovem/ Super interessante/…)
Acção Desportivas
Histórias Infantis/Juvenis Música
Romances Programação TV (TV 7 dias/TV Guia/…)
Banda Desenhada Informática (Play Station/PC Guia/…)
Poesia “Cor de Rosa” (Gente/LUX/Caras/Flash…)
Viagens Generalistas (Sábado/Visão/…)
Outros. Quais?
Outras. Quais?
A jogar no computador ou na play station ___ Indica até três tipos de jogos.
Tipo de jogos
Acção
Luta
Educativos (Ciências/Matemática/História/…)
Desportivos
De Pistas
Outro. Qual?
A conviver com os amigos ___ Indica até três locais de convívio com os teus amigos.
Locais de convívio
Casa
Rua
Jardim/Parque
Campo Desportivo
Centro Comercial
Café
Discoteca/Bar
Outro. Qual?
488
Ir ao cinema ___ Indica até três tipos de filmes que tenhas visto este ano.
Tipo de filmes
Acção
Aventura
Comédia
Romance
Suspense
Animação
Terror
Outro. Qual?
20.1. Outra ocupação ___ Qual? ____________________________________________________________________ 21. Costumas sair com colegas da Escola quando não tens aulas e/ou aos fins-de-semana? Sim ___ Não ___ 21.1. Se SIM, onde costumas ir? Indica os três locais que mais frequentas. 22. Os amigos com quem sais/convives fora da Escola têm outras origens étnicas/nacionalidades? Sim ___ Não ___ 22.1. Se respondeste Sim, indica a origem étnico/cultural dos teus três melhores amigos.
Africanos Asiáticos Europeus Leste Brasileiros Outros. Quais?
23. Como costumas contactar com os teus amigos/colegas? (assinala com uma cruz X)
Formas de contacto
Telefone
Telemóvel
Email
MSN/HI5
Ir a casa
Outro. Qual?
Locais frequentados com colegas de Escola
no bairro fora do bairro (indicar o local)
Rua
Jardim/Parque
Espaços Desportivos
C. Comercial
Cinema
Discoteca/Bar
Outro. Qual? Onde se localiza?
489
24. Costumas sair com a tua família? Sim ___ Não ___ 24.1. Se SIM, onde costumas ir? Indica os três locais que mais frequentas.
Muito Obrigada pela tua colaboração!
_______________________________ (Maria João Barroso Hortas)
Locais frequentados com a Família
no bairro fora do bairro (indicar o local)
Jardim/Parque
Espaços Desportivos
C. Comercial
Supermercado/Hipermercado
Restaurantes
Cinema
Centros Culturais
Museus
Locais de culto (igreja, mesquita, templo…)
Visitar Família
Visitar Amigos
Outro. Qual? Onde se localiza?
490
491
Anexo 4a
492
493
I - CARACTERIZAÇÃO DO AGREGADO FAMILIAR E DA HABITAÇÃO 1. Número de elementos do agregado familiar: _____ 2. Qual o seu grau de parentesco para com o aluno? (colocar uma X)
PAI MÃE AVÔ AVÓ IRMÃO/IRMÃ OUTRO.
Qual?________
3. Residência: Bairro_______________________ Freguesia ________________________ Concelho ________________ 4. Há quantos anos reside no bairro? __________
5. Gosta de viver no bairro? SIM ____ NÃO ____ 5.1. Indique três aspectos que caracterizam o seu bairro. _______________________________ _______________________________ _______________________________
6. Qual o tipo de habitação onde reside actualmente? (colocar uma X)
7. Quantas assoalhadas tem a sua casa? (quartos + salas) ________________________
8. Indique as infra-estruturas que a sua habitação tem: (colocar uma X)
9. Indique as telecomunicações e electrodomésticos que a sua habitação tem: (colocar uma X)
SIM NÃO
Telefone
Computador
Computador com Internet
Televisão
TV por cabo
Máquina de lavar loiça
Máquina de lavar roupa
10. Está satisfeito com a actual habitação? SIM ____ Porquê?___________________________ __________________________________________ NÃO ____ Porquê?__________________________ __________________________________________
SIM NÃO
Electricidade
Água da rede pública
Esgotos ligados à rede pública
Casa de banho com duche e sanita
INSTITUTO DE GEOGRAFIA E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO CENTRO DE ESTUDOS GEOGRÁFICOS UNIVERSIDADE DE LISBOA
Estudo sobre Educação, Diversidade e Território
Questionário às Famílias
A sua colaboração é imprescindível para o estudo que me encontro a desenvolver. É importante que as suas repostas sejam sinceras. Todos os dados serão tratados de forma anónima e confidencial.
494
11. Caracterização de cada elemento do agregado familiar que reside na habitação.
11.1 Elementos da Família (em cada coluna coloque um elemento da família)
1 PAI
2 MÃE
3 ____
4 _____
5 _____
6 ____
_____
11.2 Sexo (M/F) 11.3 Idade 11.4 Nacionalidades (se tiver mais que uma nacionalidade deve indicar)
11.5 Naturalidade (concelho onde nasceu ou país se for no estrangeiro)
11.6 Grau de instrução que possui (indicar o número) 1) Não sabe ler nem escrever; 2) ensino primário incompleto; 3) ensino primário; 4) 6º ano; 5) 9º ano; 6) secundário; 7) licenciatura; 9) mestrado
11.7 Estado civil (indicar o número) 1) Solteiro; 2) Casado; 3) Vive junto; 4) Viúvo; 5) Divorc./ Separado.
11.8 Situação perante o trabalho (indicar o número) 1) Activo com profissão; 2) Doméstica; 3) Estudante; 4)Reformado; 5) Serviço militar; 6)Desempregado.
11.9 Situação na profissão (indicar o número) 1) Assalariado; 2) Traba. por conta própria; 3) Traba. familiar ñ remunerado; 4) Patrão; 5) Outra (qual?)
11.10 Profissão
11.11 Local de trabalho/Estudo (localidade, concelho)
11.12 Meio de transporte utilizado para o trabalho/escola (indicar o número) 1) Carro próprio; 2) Carro amigo; 3) Carrinha do patrão; 4) Transporte público; 5) A pé; 6) Carro próprio e transporte público 7) Outro (qual?)
495
12. Refira os meios de subsistência de que depende a família actualmente. (colocar uma X)
Salário Pensão/Reforma Rendimentos próprios Subsídio de Desemprego Rendimento Social de Inserção Outros Apoios Sociais Ajuda de familiares/amigos Outro. Qual?______________________
13. Rendimento familiar total por mês (sem impostos e descontos). (colocar uma X)
Menos de 450 € De 450 a 1000 € De 1000 a 2000 € De 2000 a 3000 € De 3000 a 5000 € Mais de 5000 €
Se não nasceu em Portugal ou se é descendente de pais imigrantes responda às questões seguintes. Se nasceu em Portugal e é descendente de pais portugueses passe para o grupo II – AS FAMÍLIAS E A ESCOLA
14. País onde nasceram os seus pais. (colocar uma X)
Região/País de Origem Naturalidade (país onde nasceu)
PAI MÃE
Europa
Portugal
Espanha
França
R. Unido
Outro*
África
Angola
Cabo Verde
Moçambique
São Tomé e Príncipe
Outro*
América do Sul
Brasil
Venezuela
Argentina
Outro*
Europa de Leste
Moldávia
Roménia
Rússia
Ucrânia
Outro*
Ásia
China
Índia
Paquistão
Bangladesh
Timor
Outro*
* Outro. Qual?_____________________________________________________ 14.1 Há quantos anos os seus pais vieram para Portugal? ____________________________________________________________ 14.2 Há quantos anos veio para Portugal? _____________________________________________________________
496
14.3 Costuma visitar o seu país de origem ou o país de origem dos seus pais? Sim_____ Quantas vezes já lá foi? ___________ Porquê? _______________________________________ _____________________________________________________________________________________ Não _____ Porquê? ____________________________________________________________________ 14.4 Pensa em voltar um dia para o seu país de origem ou para o dos seus pais? Sim _____ Porquê?_____________________________________________________________________ Não _____ Porquê? ____________________________________________________________________ 14.5 Viveu sempre no mesmo bairro desde a sua chegada a Portugal? Sim ____ Não ____ 14.6 Se NÃO indique os lugares onde viveu: (colocar uma X)
Localidade (bairro) Quantos anos aí viveu?
Concelho
Quando Chegou
II – AS FAMÍLIAS E A ESCOLA 1. Qual o ano de escolaridade que o seu filho/educando frequenta? (colocar uma X)
4º
6º
9º
2. Costuma envolver-se nas actividades que o seu filho/educando desenvolve na escola? SIM ____ Quais?______________________________________________________________________ NÃO ____ Porquê? ____________________________________________________________________ 3. Que tipo de actividades a escola desenvolve para os encarregados de educação? (colocar uma X)
Encontros temáticos/Sessões de esclarecimento (alimentação, saúde, indisciplina, juventude …)
4. Costuma ir à escola: (colocar uma X) Por iniciativa própria _______ Só quando convocado pelo Director de Turma/Conselho Executivo _______ 5. O que espera da Escola que o seu filho/educando frequenta? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
497
6. Qual a opinião que tem da escola que o seu filho/educando frequenta? (coloque uma X no número correspondente) 1 – Insuficiente; 2 – Satisfatório, 3 - Bom
1 2 3
Procura responder às dificuldades de aprendizagem dos alunos
Promove o respeito e a tolerância entre os alunos e entre estes e os professores
Resolve os problemas de indisciplina de forma justa
Desenvolve hábitos de trabalho e estudo nos alunos
Disponibiliza actividades extra curriculares para os alunos (clubes, projectos, …)
Acolhe os alunos de forma afectuosa ajudando-os a resolver os seus problemas
Disponibiliza-se para ouvir os alunos
Facilita os contactos entre professores/director de turma e encarregados de educação
Acolhe todos de forma igual
Está sempre disponível para ouvir os encarregados de educação
Informa sobre as actividades que desenvolve
Promove um ensino que corresponde às suas expectativas
7. A escola que o seu filho/educando frequenta disponibiliza os seguintes serviços: (colocar uma X)
Orientação Profissional
Apoio psicológico
Refeitório
Biblioteca
Sala de Informática
Ginásio
Outro. Qual? _________________________
8. Quais os principais problemas que o seu filho/educando tem vivido na escola: (colocar uma X)
Se é imigrante ou descendente de imigrantes responda às seguintes questões. Se não passe para o grupo III – LAZER E TEMPOS LIVRES
12. A escola que o seu filho/educando frequenta desenvolve algumas medidas específicas para envolver os encarregados de educação dos alunos imigrantes? SIM____ NÃO____ 14.1SeSIMquais? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13. Qual a imagem que tem dos outros encarregados de educação face à diversidade cultural que encontram hoje na escola que o seu filho/educando frequenta? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ III – LAZER E TEMPOS LIVRES 1. Como ocupa o seu tempo livre? A ver TV ___ Indique os três programas que mais vê e os três canais que prefere.
Programas Canais de TV
Telejornal RTP1
Telenovelas RTP2
Comédia TVI
Filmes SIC
Concursos MTV
Música Odisseia
Desporto Canal História
Documentários AXN
Hollywood
Sport TV
Outros. Quais? Outros. Quais?
499
A ler ___ Indique até três tipos de livros e três tipos de revistas que tenha lido ultimamente.
Livros Revistas
Aventuras Programação TV (TV 7 dias/TV Guia/…)
Acção “Cor de Rosa” (Gente/LUX/Caras/Flash…)
Romances Desportivas
Banda Desenhada Música
Poesia Generalistas (Sábado/Visão/…)
Viagens Informática (Play Station/PC Guia/…)
Outros. Quais? Outras. Quais?
A conviver com os amigos/familiares ___ Indique até três locais de convívio.
Ir ao cinema ___ Indique até três tipos de filmes que tenha visto este ano.
Tipo de filmes
Acção
Aventura
Comédia
Romance
Suspense
Animação
Terror
Outro. Qual?
1.1 Outra ocupação ___ Qual? __________________________________________________________ 1.2 Qual ou quais das actividades que anteriormente indicou costuma realizar com o seu filho/educando?
2. Os seus amigos residem no seu bairro? SIM ____ NÃO____ Onde residem (freguesia/concelho) ________________________________________
3. Tem amigos de outras culturas/etnias? SIM____ Qual a sua origem? _________________________________________ NÃO ____
500
501
Anexo 4b
502
503
I – CHARACTERIZATION OF THE FAMILY AND RESIDENCE 1. Number of elements in the family: _____ 2. What is your relationship with the student? (place an X)
FATHER MOTHER GRANDFATHER GRANDMOTHER BROTHER/SISTER OTHER.
Specify_______
3. Residence: Neighbourhood_______________ Parish ________________________ Municipality________________ 4. How long have you been living in the neighbourhood? __________
5. Do you enjoy living in the neighbourhood? YES ____ NO ____ 5.1. Mention three aspects that characterize your neighbourhood. _______________________________ _______________________________ _______________________________
6. In what type of residence do you currently live? (place an X)
7. How many rooms does your dwelling have? (bedrooms + living) ________________________
8. Indicate the amenities your house has: (place an X)
9. Indicate the telecommunications and electrical appliances your house has: (place an X)
YES NO
Telephone
Computer
Computer with Internet
Television
Cable TV
Dishwasher
Clothes washing machine
10. Are you happy with your current dwelling? YES ____ Why?___________________________ __________________________________________ NO ____ Why?__________________________ __________________________________________
YES NO
Electricity
Piped water
Sewage connected to the public sewage disposal system
Bathroom with shower and toilet
INSTITUTO DE GEOGRAFIA E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO CENTRO DE ESTUDOS GEOGRÁFICOS
Estudo sobre Educação, Diversidade e Território
School __________________________________ Family Questionnaire
our cooperation is essential for the study I am carrying out. It is important that your answers are sincere. All data will be treated in an anonymous and confidential manner.
504
11. Characterization of each element of the family residing in the house.
11.1 Elements of the family (one element of the family in each column)
1 FATHER
2 MOTHER
3 ____
4 _____
5 _____
6 ____
_____
11.2 Sex (M/F) 11.3 Age 11.4 Nationality (if there is more than one, please specify)
11.7 Marital status (indicate number) 1) Single; 2) Married; 3) Living together; 4) Widow(er); 5) Divorc./ Separated.
11.8 Work situation (indicate number) 1) Active with a job; 2) Domestic (stay at home); 3) Student; 4)Retired; 5) Doing Military service; 6)Unemployed
11.9 Professional situation (indicate number) 1) Employee; 2) Own account worker; 3) N/paid family worker; 4) Employer: 5) Other (which?)
11.10 Profession
11.11 Place of work/study (parish, municipality)
11.12 Transportation to go to work/school (indicate number) 1) Private car; 2) Friend’s car; 3) Employer’s car; 4) Public transportation; 5) On foot; 6) Private car and public transportation 7) Other (which?)
505
12. Family income (place an X)
Monthly salary
Pension/Retirement pension Personal income Unemployment subsidy
Social Insertion Income Other social support Help of family/friends Other. Which?______________________
13. Total family income per month (no taxes and contributions). (place an X)
Less than 450 € From 450 to 1000 € From 1000 to 2000 € From 2000 to 3000 € From 3000 to 5000 € More than 5000 €
If you weren’t born in Portugal or if you are descendent from immigrant parents answer the following questions. If you were born in Portugal and are descendent from Portuguese citizenship go to Group II – FAMILIES AND SCHOOL. 14. Parents’ country of birth. (place an X)
Region/Country of origin Origin (country of birth)
FATHER MOTHER
Europe
Portugal
Spain
France
United Kingdom
Other*
Africa
Angola
Cape Verde
Mozambique
São Tomé and Príncipe
Other*
South America
Brazil
Venezuela
Argentina
Other*
Eastern Europe
Moldavia
Romania
Russia
Ukraine
Other*
Asia
China
India
Pakistan
Bangladesh
Timor
Other*
* Other. Specify?_____________________________________________________ 14.1 How many years ago did your parents come to Portugal? ____________________________________________________________ 14.2 How many years ago did you come to Portugal? _____________________________________________________________
506
14.3 Do you usually visit your country of origin or your parents’ country of origin? Yes_____ How many times have you been there? _______________ Why? _______________________ ________________________________________________________________________________ No _____ Why? ____________________________________________________________________ 14.4 Do you plan on returning some day to your or your parents’ country of origin? Yes _____ Why?_____________________________________________________________________ No _____ Why? ____________________________________________________________________ 14.5 Have you always lived in the same neighbourhood since arriving in Portugal? Yes ____ No ____ 14.6 If NOT indicate the places where you lived: (place an X)
Place (neighbourhood)
How long did you live there?
Municipality
When you arrived (first housing)
September 2003
September 2007
II – FAMILIES AND SCHOOL 1. What school year does your child attend? (place an X)
4th
6th
9th
2. Do you usually get involved in the activities your child carries out at school? YES ____ Which?_____________________________________________________________________ NO ____ Why? ____________________________________________________________________ 3. What type of activities does the school carry out for parents/guardians? (place an X)
4. Do you usually go to the school: (place an X) Out of personal initiative _______ Only when called by the Director de Turma/Executive Board _______ 5. What do you expect from the School your child attends? _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
507
6. What is your opinion of the school your child attends? (place an X on the corresponding number) 1 – Insufficient; 2 – Satisfactory, 3 - Good
1 2 3
Attempts to address students’ learning difficulties
Promotes respect and tolerance between students, and between students and staff
Solves indiscipline problems fairly
Develops work and study habits among the students
Makes extracurricular activities (clubs, projects) available
Welcomes students warmly and helps them to solve their problems
Is available and willing to listen to students
Makes contact between teachers/director de turma and parents/guardians easy
Equally accepts all students
Is always available to listen to parents/guardians
Provides information on the activities carried out
Promotes teaching that lives up to your expectations
7. The school your child attends has the following services available: (place an X)
Professional Orientation
Psychological Support
Canteen
Library
Computer (IT) room
Gymnasium (sports facilities)
Other. Which? _________________________
8. What are the main problems your child has experienced at school: (place an X)
If you are an immigrant or descendent of immigrants answer the following questions. If not, go to Group III – LEISURE AND FREE TIME.
12. Does the school your child attends develop specific measures to integrate the guardians (parents)of immigrant students? YES____ NO____ 12.1 If YES which? __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13. What’s your perception of other parents/guardians towards the cultural diversity that you find in your child’s school? ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
509
III – LEISURE AND FREE TIME
1. How do you occupy your free time?
Watching TV ___ Indicate the three programmes you watch most and the three channels you prefer.
1.1 Other occupation ___ Which? _____________________________________________ 1.2 Which of the activities mentioned above do you usually carry out with your child?
2. Do your friends live in your neighbourhood? YES ____ NO____ Where do they live? (parish/municipality) ________________________________________
3. Do you have friends of other cultures/ethnic groups? YES____ What is their origin? _________________________________________ NO ____
INSTITUTO DE GEOGRAFIA E ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO CENTRO DE ESTUDOS GEOGRÁFICOS
Estudo sobre Educação, Diversidade e Território Questionário aos Directores de Turma/Professor Titular de Turma
A sua colaboração é imprescindível para o estudo que me encontro a desenvolver. Todos os dados serão
tratados de forma anónima e confidencial.
Nome da Escola: __________________________________________________ Turma __________ Ano de escolaridade: ___º Disciplina que lecciona (2º/3º ciclos) _____________________________ Data: ___/___/___
I – CARACTERIZAÇÃO DOS ALUNOS DA TURMA. 1.
Idades (indicar o número de alunos para cada nível etário)
Género (indicar o número de alunos do género feminino e do género
II – A DIVERSIDADE NA ESCOLA 3. Na sua opinião quais os aspectos que influenciam o processo de integração dos alunos imigrantes (recém chegados) na escola onde lecciona. Identifique-os, utilizando a seguinte escala:
MR – muito relevante; R – relevante; PR – pouco relevante; NR – não relevante.
Domínio da Língua Portuguesa
Diálogo com o professor
Convívio com os colegas
Respeito pelas regras de comportamento
Adequação do ano de escolaridade que o aluno frequenta à idade e ao percurso anterior
Conhecimento da organização do sistema de ensino português (regime de faltas/número de disciplinas/número de professores/número de horas de aulas por dia)
As expectativas face à escola por parte dos familiares
O nível socioeconómico da família
O bairro onde residem
Outra. Qual?
4. Os aspectos anteriormente identificados mantêm-se para os alunos que já nasceram em Portugal e são descendentes de imigrantes? Sim ____ Não ____ Quais as alterações que identifica? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 5. Os aspectos que identificou na questão 3 são comuns a todos os grupos de imigrantes ou existem especificidades? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
527
6. Dos aspectos anteriormente identificados quais os que considera que são comuns aos alunos de nacionalidade portuguesa que não são descendentes de imigrantes? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 7. Em que medida o meio (área geográfica) onde a escola se localiza influencia as práticas dos alunos que a frequentam? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 8. De que modo a diversidade cultural/étnica e geográfica existente na sala de aula influencia a organização e gestão do seu processo de ensino e aprendizagem? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 9. Quais os impactos da diversidade existente na sala de aula nos alunos portugueses? ___________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
528
10. Qual a reacção dos pais dos alunos não imigrantes perante a diversidade que existe na escola? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 11. Que actividades dinamiza para envolver as famílias dos seus alunos na escola? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 12. Considera que a legislação existente em Portugal para atribuição de equivalência aos alunos imigrantes é adequada? Justifique. ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 13. Identifique algumas alterações, que considere importantes, ao processo de colocação dos alunos imigrantes no sistema de ensino português? _________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ III – CARACTERIZAÇÃO DO DOCENTE 14.
Idade
Género
Habilitações Literárias
Nº anos de docência
Nº anos na escola
Ano(s) de escolaridade que lecciona (2008/09)
Cargo(s) que desempenha na escola (2008/09)
Muito Obrigada pela sua colaboração! Maria João Barroso Hortas
529
Anexo 6
530
531
Quadro I – Estrangeiros residentes, segundo a região de origem, nas freguesias do centro de Lisboa, 2011
freguesias Países Europeus
PALOP Brasil Ásia outros
territórios Total
U.E. (15) Outros Leste+Rússia
Anjos 120 125 65 175 423 415 60 1383
Castelo 6 0 0 2 2 0,00 3 13
Coração de Jesus 86 18 16 52 160 54 10 396
Encarnação 72 6 5 14 71 22 4 194
Graça 106 31 29 99 188 49 22 524
Madalena 22 2 2 1 5 16 0 48
Mártires 12 1 0 4 14 8 0 39
Mercês 110 11 8 53 153 12 12 359
Pena 81 22 43 89 188 190 60 673
Penha de França 108 99 106 133 570 209 35 1260
Sacramento 25 3 3 2 29 6 3 71
Santa Catarina 113 16 14 69 106 37 21 376
Santa Engrácia 73 54 34 45 178 40 25 449
Santa Isabel 135 34 10 52 134 22 22 409
Santa Justa 10 6 16 15 49 187 14 297
Santiago 8 3 9 6 13 2 0 40
Santo Estêvão 37 3 8 7 21 17 5 98
Santos-o-Velho 74 15 6 62 99 66 13 335
S. Cristóvão e S. Lourenço
26 10 3 27 20 109 16 211
São João 65 121 108 150 543 60 45 1092
São Jorge de Arroios
224 173 179 232 808 504 128 2248
São José 74 13 15 38 155 57 8 360
São Mamede 149 8 11 41 108 23 17 357
São Miguel 46 6 19 6 19 43 3 142
São Nicolau 24 1 4 17 50 145 7 248
São Paulo 75 18 15 67 176 73 12 436
São Vicente de Fora 58 11 32 38 104 31 22 296
Sé 19 5 1 13 26 17 8 89
Socorro 32 16 72 86 73 552 27 858
Total 1990 831 833 1595 4485 2966 601 13301
área em estudo 15,0 6,2 6,3 12,0 33,7 22,3 4,5 100,0