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IET – INSTITUTO DE ENSINO TEOLÓGICO PÓLO: SANTA CRUZ CABRÁLIA - BA ROSEMERE PEREIRA SILVA OS CONTRASTES DOS EXÉRCITOS DA GUERRA DA INDEPENDÊNCIA DA BAHIA: Mercenários e Portugueses
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Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Dec 01, 2015

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Page 1: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

IET – INSTITUTO DE ENSINO TEOLÓGICOPÓLO: SANTA CRUZ CABRÁLIA - BA

ROSEMERE PEREIRA SILVA

OS CONTRASTES DOS EXÉRCITOS DA GUERRA DA

INDEPENDÊNCIA DA BAHIA: Mercenários e Portugueses

SANTA CRUZ CABRÁLIA – BA Dezembro 2012

Page 2: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

ROSEMERE PEREIRA SILVA

ALUNA DO CURSO DE HABILITAÇÃO EM HISTÓRIA – INSTITUTO DE ENSINO TEOLÓGICO - IET

OS CONTRASTES DOS EXÉRCITOS DA GUERRA DA

INDEPENDÊNCIA DA BAHIA: Mercenários e Portugueses

Monografia apresentada ao IET – Instituto de Ensino Teológico como requisito parcial para obtenção da Habilitação em História.

Orientação: Prof. MSC Stéfano Couto Monteiro

SANTA CRUZ CABRÁLIA – BADezembro 2012

Page 3: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

IET – INSTITUTO DE ENSINO TEOLÓGICOPÓLO: SANTA CRUZ CABRÁLIA - BA

DECLARAÇÃO DE AUTORIA

OS CONTRASTES DOS EXÉRCITOS DA GUERRA DA

INDEPENDÊNCIA DA BAHIA: Mercenários e Portugueses

“Declaro ser o único autor da presente

monografia, requisito parcial para a obtenção

da Habilitação em História e ressalto que não

recorri a qualquer forma de colaboração ou

auxílio de terceiros para realizá-lo a não ser

nos casos e para os fins autorizados pelo

professor orientador”.

________________________________

(Rosemere Pereira Silva)

Orientador: Prof. MSC Stéfano Couto Monteiro

SANTA CRUZ CABRÁLIA - BA2012

Page 4: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

ROSEMERE PEREIRA SILVA

ALUNA DO CURSO DE HABILITAÇÃO EM HISTÓRIA – INSTITUTO DE ENSINO TEOLÓGICO - IET

FOLHA DE APROVAÇÃO

OS CONTRASTES DOS EXÉRCITOS DA GUERRA DA

INDEPENDÊNCIA DA BAHIA: Mercenários e Portugueses

Aprovada em ____ de _______________ de ______________.

Grau atribuído à Monografia:_________________________

BANCA EXAMINADORA:

_________________________________________________Prof. MSC Stéfano Couto Monteiro - Orientador

Professor Examinador

_________________________________________________Prof. Raimundo MorenoProfessor Examinador

_________________________________________________Prof.

Professor Examinador

SANTA CRUZ CABRÁLIA - BA2012

Page 5: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

“As opiniões emitidas neste trabalho são

de inteira responsabilidade do Autor e não

exprimem, necessariamente, o ponto de vista o

Instituto de Ensino Teológico – IET.”

Page 6: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

AGRADECIMENTOS

Primeiramente agradeço a Deus.

A toda a minha família,

especialmente ao meu esposo.

Aos professores do IET, por sua

paciência, por seu carinho, atenção e

delicadeza dedicados a nós alunos

durante o período de aulas.

E a todos os meus colegas e

amigos pelos muitos incentivos.

Page 7: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho à minha

família.

Page 8: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

" Povos livres, lembrai-vos desta máxima: A liberdade pode ser conquistada, mas nunca recuperada.”

Jean Jacques Rousseau.

Page 9: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

RESUMO

O presente trabalho monográfico que ora se expõe trata do processo de independência da Bahia. Refletiremos a respeito das relações entre Portugal e Brasil e as mudanças advindas da transferência da corte ao Brasil na Capitania, sugerindo-se que não haveria o acúmulo de expectativas que visavam ao rompimento com o império português durante o período, a despeito do que se encontra assentado em certa historiografia. Falaremos sobre os fatores motivacionais e a consequência da guerra para a Bahia e Brasil, sobre as pessoas que mais influenciaram a independência e sobre as cidade que participaram desse processo. Para a realização deste trabalho foi feita uma pesquisa bibliográfica de cunho analítico e interpretativo.

Palavras-chave: Independência; Bahia; Brasil.

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INTRODUÇÃO

O dia 2 de julho é celebrado como o Dia da Independência da Bahia. A

data nasceu em 1823, dez meses após a independência do Brasil, quando o

país se livrou dos laços que o prendiam a Portugal. O curioso dessa história é

que, fora da Bahia, tanto a data quanto os acontecimentos que ela celebra são

praticamente desconhecidos. Segundo o historiador baiano Luís Henrique Dias

Tavares, isso se deve ao fato de que São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais

ganharam uma posição de destaque por causa da proclamação da República e

pelo desdobramento da chamada Revolução de 1930.

O processo de independência da Bahia foi marcado por vários episódios

importantes. Uma guerra teve início no estado e, de fevereiro de 1822 a julho

de 1823, foi pontuada por muita violência desenfreada, uma legião de feridos,

mortes, destruição de edificações, colapso dos serviços urbanos etc. Heróis

surgiram, em sua maioria, originários das camadas mais pobres da população.

Maria Quitéria, João das Botas e o Corneteiro Lopes são exemplos destes

nomes que, curiosamente, não são lembrados nos livros didáticos de História

do Brasil.

Quando Portugal nomeou Ignácio Luiz Madeira de Mello como novo

governador de Armas do Brasil, surgiu um movimento de resistência que

envolveu civis e militares. Tropas portuguesas começaram a invadir os

quartéis. Em Salvador, tomaram o Forte de São Pedro e o Convento da Lapa,

onde havia alguns soldados brasileiros. Neste episódio, a abadessa Sóror

Joana Angélica tentou impedir a invasão e acabou sendo morta.

Concluída a ocupação militar em Salvador, a cidade recebeu novas

tropas portuguesas e muitas famílias baianas fugiram para as cidades do

recôncavo. Na resistência, o coronel Joaquim Pires de Carvalho reuniu todo

seu armamento e tropas e entregou o comando ao general Pedro Labatut.

Pouco a pouco os territórios baianos foram sendo retomados.

Sob o comando do coronel José Joaquim de Lima e Silva o exército

realizou uma grande ofensiva contra os portugueses, resultando na rendição

das forças portuguesas. Com a vitória, o Exército Brasileiro entrou em Salvador

no dia dois de julho de 1823, consolidando a retomada da cidade e fim da

ocupação portuguesa no Brasil.

Page 11: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

A Bahia foi o último foco de todo o processo da Independência do Brasil.

O Dois de Julho deve ser entendido como a verdadeira independência do país.

A data merece ser resgatada e valorizada como um importante marco na

história, não só da Bahia, mas do Brasil.

Esse trabalho pretende analisar mais a fundo sobre todo esse processo

de Independência: a guerra, os fatores motivacionais e os principais

incentivadores.

CAPÍTULO I – COMO SE DEU O PROCESSO DE INDEPENDÊNCIA

DO BRASIL E DA BAHIA

A história da independência da Bahia esta vinculada a independência

do Brasil. Para compreender essa situação, precisamos vislumbrar a História

no período em que nosso país passava por uma transição, assim a

independência do Brasil é no dia 07 de setembro de 1822 e nós comemoramos

a independência aqui na Bahia, em 02 de julho de 1823, simplesmente porque

de acordo o professor Cid Teixeira:

o foco político vinculado a Lisboa, era um foco político ligado à metrópole portuguesa, era um foco político que tinha muito pouco a ver com o Brasil do nordeste que era o Brasil produtor, o Brasil que interessava ao fisco, o Brasil que interessava ao negociante de açúcar, o Brasil que interessava à produção e não o Brasil que interessava à política.

Portanto, uma coisa era o grito do Ipiranga e outra coisa era garantir o

domínio sobre o território nacional e foi isso que aconteceu na Bahia. A guerra

da Bahia, onde brilhou o heroísmo popular, além de lideranças como Labatut,

Lima e Silva, João das Botas, Maria Quitéria, entre tantos outros.

Em carta a José Bonifácio, Labatut registra: "Nenhum filho de dono de

engenho se alistou para lutar". A consciência da possibilidade de uma nação

surgiu de baixo.

Foram meses de luta, batalhas em diversos pontos do Recôncavo

Baiano, sendo a mais famosa a de Pirajá, onde segundo consta, o corneteiro

Lopes decidiu a vitória tocando 'avançar' quando havia sido instruído para fazer

o contrário. Vitória brasileira.

Page 12: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Em Santo Amaro e Cachoeira, as duas principais cidades do

Recôncavo, aconteceram importantes episódios históricos vinculados ao

processo da Independência da Bahia. Coube ao Senado da Câmara de Santo

Amaro, em 14 de junho de 1822, reunir-se e decidir que o Brasil deveria ter um

centro único de Poder Executivo, segundo regras de uma constituição liberal e

ter direito a exército e marinha sob a autoridade do Príncipe Regente. Também

a Câmara de Cachoeira, em 25 de junho 1822, proclamou o Príncipe Regente

“defensor e protetor deste Reino do Brasil”. Esses atos e manifestações

marcaram a adesão da Bahia ao movimento pela independência, que tomaram

impulso no sul do país.

No dia 18 de fevereiro, marinheiros portugueses cercaram e tomaram o

Forte de São Pedro e o quartel da Mouraria, onde se concentravam os militares

brasileiros. Sendo superiores em número e armamento, eles logo dominaram a

cidade e cometeram absurdos, culminando com o assassinato de Soror Joana

Angélica, no Convento da Lapa, onde também feriram o Padre Daniel da Silva

Lisboa, capelão do Convento.

Os baianos não aceitaram a perda da cidade. Militares brasileiros saíram

do Forte de São Pedro e armaram guerrilhas nas matas, desde Brotas até a

Fazenda Garcia. Militares, civis e famílias inteiras refugiaram-se no Recôncavo.

A Guerra da Independência da Bahia tornou-se uma oposição entre Salvador,

com os comerciantes portugueses ligados às cortes de Lisboa, e o Recôncavo,

centro de articulação das forças nacionais, com os senhores de engenho

radicados na terra e lutando por ela.

No Recôncavo baiano surgiram milícias e grupos de voluntários,

armados e mantidos pelos senhores de engenho.

No dia dois de julho, o Exército Libertador entrou triunfante na cidade do

Salvador, sob o comando do General Lima e Silva.

A libertação de Salvador do domínio de tropas portuguesas foi longa e

difícil. Na realidade, as lutas contra as forças portuguesas do brigadeiro

Madeira de Melo, a mais alta autoridade militar da província, começaram a

crescer desde 1820. Com a independência proclamada por dom Pedro, os

conflitos aumentaram.

Portugal desejava fazer de Salvador um foco de resistência à

independência da Colônia. No início de 1823, tropas portuguesas chegaram a

Page 13: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Salvador para reforçar os contingentes da Metrópole. As tropas brasileiras de

Manuel Pedro, que havia sido nomeado por dom Pedro para a mesma função

de Madeira de Melo, foram derrotadas. Diante da derrota, recuaram para o

Recôncavo Baiano, pois os habitantes dessa região eram os maiores

defensores da independência.

Nos primeiros meses de 1823, a situação de Salvador deteriorou muito.

Sem alimentos, as doenças matavam cada vez mais pessoas. Diante dessa

situação, o chefe português permite a saída dos moradores de Salvador e

cerca de 10 mil pessoas deixam a capital da província. Em fins de maio, uma

nova frota brasileira comandada pelo inglês lord Cochrane chega a Salvador.

Vendo que era inútil a resistência, as tropas portuguesas se rendem.

O mês de julho começa com o embarque dos portugueses. No dia 2, o Exército

brasileiro entra vitorioso em Salvador.

As guerras de independência, em especial a que se travou na Bahia,

revelam um aspecto importante no processo da emancipação política do Brasil,

muitas vezes pouco valorizado em nossos estudos históricos: a independência

enfrentou uma questão militar. E como o Brasil não tinha uma estrutura militar

adequada às necessidades de seu imenso território, precisou lançar mão de

tropas mercenárias, comandadas por oficiais estrangeiros.

1. 1 – Fatores que motivaram a luta pela independência da Bahia

A declaração de independência feita por Dom Pedro I, em sete de

setembro de 1822, deu início a uma série de conflitos entre governos e tropas

locais ainda fiéis ao governo português e as forças que apoiavam nosso novo

imperador. Na Bahia, o fim do domínio lusitano já se fez presente no ano de

1798, ano em que aconteceram as lutas da Conjuração Baiana.

No ano de 1821, as notícias da Revolução do Porto reavivaram as

esperanças autonomistas em Salvador. Os grupos favoráveis ao fim da

colonização enxergavam na transformação liberal lusitana um importante passo

para que o Brasil atingisse sua independência. No entanto, os liberais de

Portugal restringiam a onda mudancista ao Estado português, defendendo a

reafirmação dos laços coloniais.

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As relações entre portugueses e brasileiros começaram a se acirrar,

promovendo uma verdadeira cisão entre esses dois grupos presentes em

Salvador. Meses antes da independência, grupos políticos se articulavam pró e

contra essa mesma questão. No dia 11 de fevereiro de 1822, uma nova junta

de governo administrada pelo Brigadeiro Inácio Luís Madeira de Melo deu

vazão às disputas, já que o novo governador da cidade se declarava fiel a

Portugal.

Utilizando autoritariamente as tropas a seu dispor, Madeira de Melo

resolveu inspecionar as infantarias, de maioria brasileira, no intituito de

reafirmar sua autoridade. A atitude tomada deu início aos primeiros conflitos,

que se iniciaram no dia 19 de fevereiro de 1822, nas proximidades do Forte de

São Pedro. Em pouco tempo, as lutas se alastraram para as imediações da

cidade de Salvador. Mercês, Praça da Piedade e Campo da Pólvora se

tornaram os principais palcos da guerra.

Nessa primeira onda de confrontos, as tropas lusitanas não só

enfrentaram militares nativos, bem como invadiram casas e atacaram civis. O

mais marcante episódio de desmando ocorreu quando um grupo português

invadiu o Convento da Lapa e assassinou a abadessa Sóror Joana Angélica,

considerada a primeira mártir do levante baiano. Mesmo com a derrota

nativista, a oposição ao governo de Madeira de Melo aumentava.

Durante as festividades ocorridas na procissão de São José, de 21 de

março de 1822, grupos nativistas atiraram pedras contra os representantes do

poderio português. Além disso, um jornal chamado "Constitucional" pregava

oposição sistemática ao pacto colonial e defendia a total soberania política

local. Em contrapartida, novas forças subordinadas a Madeira de Melo

chegavam a Salvador, instigando a debandada de parte da população local.

Tomando outros centros urbanos do interior, o movimento separatista

ganhou força nas vilas de São Francisco e Cachoeira. Ciente destes outros

focos de resistência, Madeiro de Melo enviou tropas para Cachoeira. A

chegada das tropas incentivou os líderes políticos locais a mobilizarem a

população a favor do reconhecimento do príncipe regente Dom Pedro I. Tal

medida verificaria qual a postura dos populares em relação às autoridades

lusitanas recém-chegadas.

Page 15: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

O apoio popular a Dom Pedro I significou uma afronta à autoridade de

Madeira de Melo, que mais uma vez respondeu com armas ao desejo da

população local. Os brasileiros, inconformados com a violência do governador,

proclamaram a formação de uma Junta Conciliatória e de Defesa instituída com

o objetivo de lutar contra o poderio lusitano. Os conflitos se iniciaram em

Cachoeira, tomaram outras cidades do Recôncavo Baiano e também atingiram

a capital Salvador.

As ações dos revoltosos ganharam maior articulação com a criação de

um novo governo comandado por Miguel Calmon do Pin e Almeida. Enquanto

as forças pró-independência se organizavam pelo interior e na cidade de

Salvador, a Corte Portuguesa enviou cerca de 750 soldados sob a lideranaça

do general francês Pedro Labatut. As principais lutas se engendraram na

região de Pirajá, onde independentes e metropolitanos abriram fogo uns contra

os outros.

Devido à eficaz resitência organizada pelos defensores da

independência e o apoio das tropas lideradas pelo militar britânico Thomas

Cochrane, as tropas fiéis a Portugal acabaram sendo derrotadas em 2 de julho

de 1823. O episódio, além de marcar as lutas de independência do Brasil,

motivou a criação de um feriado onde se comemora a chamada Independência

da Bahia.

1. 2 - Movimento pela Independência do Recôncavo

Concluída a ocupação militar da cidade de Salvador. O Brigadeiro

Português Inácio Luiz Madeira de Mello e seus comandantes adotaram uma

linha de providências que visava duplamente justificar as decisões que

tomaram para posse do governo das armar e obter apoio político local para

manter a Bahia unida a Portugal. Madeira de Mello divulgou uma proclamação

na qual afirmava desejar “que a harmonia torne a estabelecer-se entre tantos

milhares de cidadãos de uma mesma nação súbditas de um mesmo rei, que só

deve considerar-se entre se como irmão”. Mas estava preparado para uma luta

demorada; e para as suas tropas portuguesas comandados pelo brigadeiro

Francisco Joaquim Caneti e que tinha sido expulsos do Rio de Janeiro por

ordem do Principio D.Pedro. Um número apreciável de famílias abandonaram a

Page 16: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

cidade. Iam para o Recôncavo: Santo Amaro, São Francisco do Conde,

Cachoeira, Maragogipe,...

Existiriam em abril várias conspirações contra o governo militar que

Madeira de Mello estabeleceria na cidade de Salvador; algumas tendiam para o

reconhecimento da autoridade do Príncipe Regente D.Pedro. Mas só se

definiram entre maio/junho. E nesse sentido influiu a carta-consulta de 22 de

março dos deputados baianos às Cortes, um documento preparado com o

espírito conciliador do parecer da Comissão Especial dos Negócios do Brasil,

mas que, ainda assim, uniu proprietários, oficiais militares e intelectuais liberais

nas mesmas posições de reconhecimento da regência no Rio de Janeiro e da

aceitação da autoridade do Príncipe D.Pedro. O jornal O Constitucional

esclarece: “Defendemos e havemos de defender a posição de ter o Brazil, hum

Centro de Poder Executivo”.

Tentou-se um primeiro pronunciamento na Câmara da cidade de

Salvador. Marcado para 12 de junho, nesse dia as tropas portuguesas

bloquearam as ruas da Misericórdia e a Direita do Palácio, a Praça da Câmara

e todas as vias de acesso; a reunião estava proibida. Dois dias depois (14 de

junho) reuniu-se a Câmara de Santo Amaro. E, com a participação do Ouvidor

da Comarca, Desembargador Antônio José Duarte d’Araújo Gordin, dos

vereadoras João Lourenço de Atayde Seixas, Antônio de Araújo Gomes Junior;

Raymundo Gonçalves Martins, do juiz-de-fora e presidente da Câmara Joaquim

José Pinheiro de Vasconcelos, do procurador da vila Joaquim José Ribeiro

Juimones; de oficiais da milícia, religiosos, advogados, políticos e professore;

decidiu: “ Que haja no Brazil, hum Centro único de Poder Executivo, que este

poder seja exercido por sua Alteza rela, o Príncipe Real” (D.Pedro). A partir da

aprovação dessa resposta a carta-consulta dos deputados baianos ás Cortes é

possível encontra uma seqüência de preparativos para a união da Bahia ao

Príncipe D.Pedro, já então aclamado no Rio de Janeiro Defensor Perpetuo e

Constitucional do Brasil.

A 21 de junho há uma reunião, proprietários, lavradores, militares, na

final inventariam armas e munição; em 24 de junho concentram-se soldados e

oficiais militares sob o comando dos grandes proprietários e coronéis da milícia

José Garcia de Moura Pinetu e Aragão e Rodrigo Antônio Falcão Brandão. No

sitio de Belém, povoado pouco acima da Vila de Cachoeira. a) O 25 de junho.

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Foram esses que oficiaram convocando uma reunião da Câmara. E reunida às

9 horas da manhã de 25 de junho de 1822, essa câmara indaga “do povo, e

tropa” (...) “se erão contentes que se aclamasse a S.A.R. o sr. D.Pedro de

Alcântara, por Regente Perpétuo Defensor e Protector do Reino Brazil.” Com a

resposta afirmativa, o procurador da vila, Manuel Teixeira de Freitas jogou o

estandarte da Câmara para o povo e a tropa reunida na praça aparentemente

significando que lhes entregava o símbolo do poder. Lavrou-se uma ata. E

estava celebrando Ti Deum na igreja de Nossa Senhora do Rosário quando a

escuna canhoneira pilotada por Madeira de Mello disparou o primeiro tiro

contra a vila; quase ao mesmo tempo, de suas casas alguns portugueses

atiraram nos que passavam. Mas foi somente no dia seguinte que se formou a

Junta Interina, Conciliadora e de Defesa, que se instalou no Hospital São João

de Deus e adotou as suas primeiras decisões de governo: enviar mensageiros

às vilas e povoados para informar-lhes a aclamação do príncipe e as

hostilidades portuguesas já declaradas para a escuna canhoneira; e organizar

forças para deter os tiros da canhoneira e dos portugueses isolados em suas

residências. Aproveitavam uma “velha peça de ferro” para improvisar a arma

com que responderam aos disparos da canhoneira. Também utilizaram vaívens

mandados. E embora fossem precárias, essas armas, serviram e no entardecer

de 28 apareceu uma bandeira branca na canhoneira, que foi tomada e de onde

vieram presos o capitão e 26 soldados.

Nesse junho de 1822, Francisco Carneiro de Campos e José Cardoso

Pereira de Mello abandonaram a Junta Provisória da Bahia, já então

virtualmente prisioneira das tropas portuguesa; foram para o Rio. Pouco antes

deles, Francisco Elesbão Pires de Carvalho e Albuquerque deixa a residência

dessa Junta e seguiria para Santo Amaro. b) Adesão das Vilas: A 26 de junho

ocorreu a reunião na Câmara da vila de Maragogipe que decidiu: “no Reino

Brazil deve residir hum único centro de poder executivo na pessoa do príncipe

real”.. No dia 29 chegou a Cachoeira, uma delegação das vilas de São

Francisco do Conde e de Santo Amaro, composta do tenente coronel Felisberto

Gomes Carneiro, do major-de-engenharia Antônio Mario da Silva Torres (um e

outro, conspiradores do 03 de novembro) e de Miguel Calmon Du Pim e

Albuquerque. Propuseram que a Junta ampliasse suas atribuições para

transformar em governo militar e civil legitimo em todas as vilas do Recôncavo.

Page 18: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Em 29 de junho, as vilas de São Francisco do Conde e de Santo Amaro

aclamaram o Príncipe D.Pedro, Regente Constitucional do Brasil. Por esses

dias, Joaquim Pires de Carvalho e Albuquerque de Ávila Pereira, chamado

Santinho, empolou o comando geral das tropas milicianas. Sucintas, mas

incisiva representação de São Francisco e Santo Amaro pediu em agosto “o

estabelecimento de um governo geral, não só para o recôncavo e comarca da

Bahia, mas também para toda a província”. Queriam um conselho, ao qual

“todas as autoridades civis e militares sem excepção alguma ficarão

subordinados”. Interino teve a seguinte composição:

Santo Amaro: Francisco Elisbão Pires de Carvalho e Albuquerque que

seria eleito Presidente do Conselho em 6 de setembro; Cachoeira: Francisco

Gomes Bedão Montizuma, que seria eleito secretario em 6 de setembro; São

Francisco do Conde: Desembargador Antônio José Duarte D’Araújo Gondin;

Jaguaribe: Capitão Manuel Gonçalves Maria Bittencourt; Maragogipe: Capitão-

mor Manuel Silva Souza Coimbra; Inhampube: Coronel Simão Gomes Ferreira

Vellozo; Pedra Branca: Cônega Manuel Dênde Bus; Abrantes: Miguel Calmon

du Pim e Almeida; Itapicuru: João Dantas dos Reis Portátil; Valença:

Reverendo Theodozio Rios de Castro; Água Fria: Vigário Francisco José de

Miranda Jacobina: Comendador Francisco Ayres de Almeida; Maraú: Manuel

dos Santos Silva; Rio de Contas: Capitão José Valentim de Souza; Camanu:

Reverendo Izidoro Manuel Mendes; Santarém: Capitão Pedro Jorge Vilimo;

Cairu: Pedro José de Melo Varjão. Esse conselho exerceu enérgica e

constante ação política, militar e administrativa desde a sua instalação e

procurou manter-se no governo ao longo da campanha militar. Nos seus

primeiros dias, dirigiu-se às Câmaras e exigiu votos de fidelidade e obediência;

organizou batalhões; reuniu e distribuiu armas e munição; e até que o coronel

Santinho entregasse o camando dessas forças ao general Pedro Labatut; o

Conselho interino suscitou as proposições de defesa estabelecidas na Ilha de

Itaparica e nos pontos do Funil, São Roque, Encarnação, Iguape, Saubara e

Ponta de Nossa Senhora.

1. 3 - Guerra pela Independência

Page 19: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Era a Guerra pela Independência do Brasil na Bahia. Ao longo do

decurso, há uma primeira fase, na qual as operações de guerra seguiram

iniciativas locais, embora sofra controle geral do Conselho Interino e comando

do Coronel miliciano Santinho, Joaquim pires de Carvalho e Albuquerque de

Ávila Pereira, que seria depois Visconde de Pirajá. E lha numa segunda fase,

essa sob o comando unificado do General Pedro Labatut. Na fase que vai de

junho a outubro de 1822, sugiram diversos Batalhões Patrióticos, alguns dos

quais se tornaram conhecidos: Campanha dos “Caçadores de Santo Amaro”,

que obedeceu ao comando do proprietário Capitão Antônio Bittencourt

Berenguer César; “Voluntários da Vila de Argolo; e os voluntários do Príncipe

D.Pedro”, denominado dos Periquitos (por causa da farda), sob comando do

Major Miliciano Castro. Esse batalhão foi posteriormente adestrado ao Exercito

e tornou-se Batalhão dos Caçadores, a ele pertenceu Maria Quitéria.

A esquadra que trouxe Labatut partiu do Rio a 1 de junho; transportava

38 oficiais e 260 soldados. Purigiu-se, porém para Alagoas e de Alagoas para

Pernambuco, onde Labatut incorporou 250 homens da tropa de linha, soldados

armados e “pagos por trez meses” e oficiais brasileiros, dos quais é o maior

exemplo, o coronel José de Barros Lacerda. Labatut alcançou a “Fera do

Capuame” em 28 de outubro. Nesse mesmo dia o coronel Santinho reuniu todo

o armamento e tropa para o Engenho Novo de Pirajá e entregou o comando.

Em seguida Labatut dedicou-se à organização e a disciplina do Exercito. E, em

tom sereno, apresentando-se como pacificador, intimou Madeira de Mello.

Todavia descrente de qualquer solução pacifica organizou o Exercito em duas

“Brigadas” colocando a primeira brigada na área de Cabrito – Campinas –

Pirajá e a segunda em Armação “avançando duas léguas de Itapoan”; o

Tenente Coronel José Falcão de Gomes Caldera. Tornou outras providências,

principalmente para municias a tropa e suprir o Tesouro geral do Exercito. Era

severo o distante, e inaugurou seu comando com a disciplina de guerra em que

fora educado na Europa. É nessa fase que a guerra pela Independência do

Brasil na Bahia vive alguns dos seus principais choques bólicos, o mais

importante dos quais foi a Batalha de Pirajá. a) A Batalha de Pirajá: Travou-se

na área de Cabrito – Campinas – Pirajá. Teria durado oito chovas. E

movimentou 4000 homens constituindo-se desde então na mais alta

demonstração da resistência Brasileira ao longo da cansativa, ingrata e merosa

Page 20: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

campanha militar pela Independência. Contudo, que sabemos dessas

batalhas? Em verdade, muito pouco: o comunicado de Labatut para o Conselho

Interino, data de 9 de novembro, no qual informe que as forças de Madeira de

Mello foram “obrigadas a ceder pelo valor, o de novo das bravas Tropas

Pernambucanas e do Rio de Janeiro, como também pelos soldados da Legião

da Bahia”; a corta ao Ministro José Bonifácio de Andrade e Silva; e as noticias

publicadas nos jornais “Seminário Cívico e Idade d’Ouro” . Pela escassez e

imprecisão dos informes, passou a dar grande credito à versão de Ladislau dos

Santos Titaro, o autor do poema “Paraguaçu” e a quem se respeita como

testemunha ocular da campanha militar pela Independência, pois exerceu o

encargo de registrar em linhas todas as correspondências do General Labatut.

Nas informações de Labatut, mas noticias dos jornais portugueses

aparecem à tenacidade dos oficiais e soldados brasileiros, regulares, milicianos

e voluntários, e o erro tático do Coronel Português Francisco José Pereira, que

atacou pela esquerda e abriu para Armação e Boca do Rio, assim

enfraquecendo o centro do ataque a Campinas – Pirajá, o que concedeu ao

Tenente Coronel Barros Falcão (Labatut nau participou da Batalha de Pirajá)

uma brecha para a ofensiva.

CAPÍTULO II – PESSOAS QUE SE ENGAJARAM NA LUTA PELA

INDEPENDÊNCIA DA BAHIA

A guerra de Independência da Bahia envolveu, principalmente, as

cidades do Recôncavo Baiano - região assim chamada porque arrodeia a "Baía

de Todos os Santos" - caracterizada pelo solo de massapé, propício ao cultivo

da cana-de-açúcar, para o qual os negros foram importados da África. Isso

justifica a predominância do crioulo na capital e adjacências, o que não é tão

frequente no interior baiano. Treze mil brasileiros se alistaram nas linhas

baianas, incluindo tropas vindas do Rio. A Legião de Caçadores, a Artilharia e o

1º Batalhão de Infantaria estavam sob o comando do General Pedro Labatut,

mercenário, que serviu o exército de Napoleão. Além do Brigadeiro José

Joaquim de Lima e Silva. Para a refrega, financiada por senhores de engenho,

foi recrutado um batalhão de negros forros.

Page 21: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Além disso, prometeu-se alforria aos escravos que participassem dos

embates. Do lado dos portugueses, lutaram os comerciantes lusitanos, o 12º

Batalhão de Infantaria, a Cavalaria e alguns marinheiros, todos liderados por

Madeira de Mello, general português.

Assim, no sítio da capital, aconteceram escaramuças nos bairros das

Mercês, Lapinha, Piedade e Liberdade, além das localidades de Cabrito e

Pirajá (fora da capital) e nas cidades de Cachoeira, São Félix, Santo Amaro e

Itaparica, além de outros locais. Como exemplo de fatos que vieram a

desencadear a insatisfação popular, pode-se citar a conspiração que ocorreu

em fevereiro de 1821. De cunho constitucionalista, o entrevero foi obra dos

portugueses, que queriam limitar o poder real e exigiram até o retorno de D.

Pedro a Portugal, pois incomodava a metrópole o status que tínhamos de

"reino unido". Diversas revoltas, principalmente de escravos, espocavam nos

primeiros anos do século 19. O aumento da população escrava, aliado a

diversas crises de abastecimento, foi um dos fatores contribuintes para a

eclosão da revolta.

2.1 – Um Processo Libertário

A luta pela libertação do jugo português - um processo que veio se

desenvolvendo havia muito tempo - caracterizou-se intrinsecamente como

movimentos libertários em que o elemento racial brasílico se rebelou contra o

domínio colonialista. Nesse sentido, pode-se considerar a luta como uma

oposição entre o branco português e os mestiços baianos, ainda que

predominasse a raça branca entre os senhores de engenho, que foram os

patrocinadores financeiros da revolta. Isso porque o grosso do efetivo, a massa

que se rebelou naqueles dias nas ruas da capital, localidades adjacentes e

outras cidades do Recôncavo, era de predominância étnica mestiça. A

participação negra nos conflitos foi muito significativa, embora houvesse

resistência a ela entre as elites libertárias.

O professor Dilton Oliveira de Araújo, docente da cadeira de História do

Brasil do departamento de História da Universidade Federal da Bahia explica:

"A participação de escravos foi posta, sobretudo, pelo

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comandante do Exército Libertador, o general Pierre Labatut, que convocou e incorporou escravos. Isso criou muita polêmica, porque os proprietários não aceitavam esse tipo de prática. Vários escravos chegaram a tentar a incorporação às forças baianas, mas não houve novas levas de recrutamento, o alvoroço, porém, foi significativo entre eles".

Uma evidência da participação popular, predominantemente mestiça

(reflexo da insatisfação que levou a anteriores revoltas), aconteceu a partir de

fevereiro de 1822, com a substituição do comandante das armas da província,

Manoel Pedro de Freitas Guimarães, pelo brigadeiro português Madeira de

Melo, nomeado pelas cortes portuguesas.

Ao chegar a Salvador, sofreu uma reação popular enorme, o que gerou

pelo menos cinco dias de conflitos na cidade. Foram dias em que a população

pobre e livre saiu às ruas para protestar contra o fato exposto, o que se

somava a outras insatisfações, a exemplo da ira contra o domínio português no

comércio da cidade. Dilton Oliveira explica:

"Nesse momento de descontrole social e político, grupos saíram às ruas, provocando medo na população abastada e branca, e nas autoridades. Esses eventos não se limitaram aos dias de fevereiro, estendendo-se pelos meses seguintes e foram importantes para a tomada de posição das elites agrárias baianas em apoio ao Príncipe Regente D. Pedro".

E ainda acrescenta: "Também índios foram recrutados, Era habitual o

uso de índios como elemento militar. O português fez isso desde o século 16 e

continuou a fazer ao longo do tempo." Assim, o índio foi, naturalmente,

incorporado aos efetivos que lutavam pela independência. "No momento da

guerra de independência -afirma o professor - essa prática foi mais uma vez

reiterada e arregimentaram-se grupos indígenas como soldados de regiões

próximas como o Recôncavo, mas também de regiões sertanejas, como o

sertão da Ressaca, onde hoje fica o município de Vitória da Conquista."

Entre as lideranças militares libertárias, predominava, porém, a raça

branca. Sempre houve, desde os tempos coloniais, enormes diferenças de

tratamento entre brancos e negros e isso ocorria também no âmbito militar, em

Page 23: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

cuja estrutura havia um número considerável e crescente de negros e

mestiços. Mas a participação efetiva popular mestiça reivindicatória foi

inconteste e já se desenhava havia muito tempo. Diz Dilton Oliveira:

"Aliás, essas questões já se fizeram presentes na Revolta dos Alfaiates de 1798, momento em que os pasquins sediciosos que foram afixados em vias públicas reivindicavam igualdade entre os grupos, independente da cor da pele",

2.2 – O recrutamento de escravos na época da guerra

Em meados de 1822, alguns meses depois da derrota das unidades do

exército brasileiro pelas forças portuguesas em Salvador, ocorrida em

fevereiro, senhores-de-engenho patriotas juraram fidelidade a Dom Pedro I,

que na época aos poucos construía um governo autônomo no Rio de Janeiro e

se preparava para a ruptura definitiva com Lisboa. Eles organizaram o assédio

a Salvador com um exército improvisado composto de milícias rurais, soldados

e oficiais da primeira linha de Salvador refugiados no Recôncavo, a milícia não-

branca da cidade, e uma grande quantidade de unidades patriotas organizadas

por voluntários. Em fins de outubro, chegou Pierre Labatut para comandar as

forças patriotas em nome de Pedro, além de um pequeno contingente de

tropas e milicianos do Rio de Janeiro, uma força maior de Pernambuco, e uma

grande quantidade de armas. Em Janeiro de 1823, o Batalhão do Imperador,

com 800 efetivos, chegou do Rio de Janeiro e juntou-se ao número crescente

das forças patriotas locais. Pelo fim do assédio, o Exército Pacificador, nome

dado às suas forças pelos patriotas, aproximava-se de um efetivo de 15.000

homens.

O recrutamento em larga escala empreendido em 1822 e 1823

inevitavelmente provocou mudanças na composição social da fileira, da qual

pretos e pardos eram oficialmente excluídos no final da época colonial (apesar

de que estes fossem às vezes admitidos se tivessem a pele clara). Algumas

fontes dispersas sugerem que a fileira patriota era notavelmente mais escura

do que a da época colonial. Uma testemunha ocular viu "brancos, pretos e

pardos" na guarnição de um forte no litoral, enquanto numa companhia de

tropas irregulares serviam trinta e um pardos, quatro brancos e dois cabras,

Page 24: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

contudo sob comando de três oficiais brancos. O recrutamento penetrou mais

fundo na população anteriormente isenta em meados de novembro de 1822,

quando Labatut solicitou que o Conselho fornecesse o maior número de

"pardos e pretos forros" que fosse possível para preencher o projetado

Batalhão de Libertos Constitucionais e Independentes do Imperador (que não

deve ser confundido com o Batalhão do Imperador do Rio de Janeiro). O

Conselho replicou que procuraria recrutar tais homens, mas sem coação, pois

qualquer recurso ao recrutamento forçado era "o rebate mais eficaz para

afugentar e dispersar pelos matos famílias inteiras em dano da Causa e da

agricultura". A essa altura, Labatut não tencionava recrutar escravos; apenas

solicitava que autoridades civis abandonassem sua relutância em recrutar

libertos, e especialmente libertos negros.

A questão dos escravos era bem diversa. Há indícios de que, já em

setembro de 1822 (antes da chegada de Labatut), patriotas pretendiam usá-los.

Maria Quitéria de Jesus contou depois a Maria Dundas Graham que patriotas

então queriam obrigar seu pai, um português, a contribuir com um escravo,

pois não tinha filhos para dar ao exército. A resposta dele "que interesse tem

um escravo para lutar pela independência do Brasil?" sem dúvida refletia

atitudes bem difundidas, e a julgar pela reação posterior às propostas para

recrutar escravos, é improvável que os patriotas intentassem alistar esse

escravo; é mais provável que ele fosse destinado a trabalho braçal em apoio à

mobilização. Seja como for, Graham não deixa claro se o pai de Maria Quitéria

se desfez de um escravo por essa época (ele acabou perdendo sua filha, o que

causou outros problemas para os comandantes patriotas quando foi descoberto

que ela se alistara).

Labatut era menos escrupuloso no que tocava ao recrutamento de

escravos, e em dezembro de 1822 o Conselho Interino queixou-se de que o

general francês empreendera a "horrorosa" medida de criar um "Batalhão de

negros cativos, crioulos e africanos," cujos soldados já estavam sendo

treinados. Aparentemente, o general confiscara e recrutara à força os escravos

de alguns senhores portugueses que estavam ausentes, principalmente a

família Teixeira Barbosa, e em decorrência disso corriam boatos que qualquer

escravo que se oferecesse voluntariamente seria liberto. Sem fim previsível

para a guerra e em face da falta de recrutas livres, Labatut propôs em abril de

Page 25: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

1823 que o Conselho organizasse uma contribuição voluntária de escravos

pelos senhores baianos. Aparentemente, ele discutira a proposta privadamente

com o juiz de fora de São Francisco e Santo Amaro em fins de fevereiro, e

apresentou-a como uma "patriótica proposição" do juiz. O general todavia

considerava-a mais do que uma sugestão, pois mandou dois oficiais do seu

quartel-general para Cachoeira afim de administrar essa leva. O Conselho

esquivou-se, apelando a Labatut para que ele agisse de forma mais prudente,

e sugerindo que as câmaras municipais fossem consultadas antes de qualquer

recrutamento. Uma semana mais tarde, os vereadores de Jaguaripe julgaram,

como era de esperar, que a proposta de Labatut era um grande erro. Além de

não haver muitos escravos disponíveis na vila, faltavam-lhes a honra e o

desinteresse de "um digno filho de Marte"; apenas a oportunidade de saquear a

propriedade alheia os motivaria a lutar. Mais importante, concluiu o Conselho, a

seleção de escravos para o serviço militar teria resultados funestos quando os

que não fossem libertos se juntariam aos escravos-soldados para se

levantarem. Essa proposta não foi adiante e a queda de Labatut em maio de

1823 pôs fim ao esforços para recrutar escravos.

Para o Conselho Interino, a iniciativa de Labatut era profundamente

preocupante, não só por causa da ameaça do recrutamento de escravos ao

direito de propriedade, mas também porque tocou a questão racial. "É verdade

já incontestável," escreveu o Conselho em meados de abril de 1823, "que as

classes de cor têm no Brasil o maior ciúme por não entrarem promiscuamente

nos empregos públicos". Enquanto os portugueses esperavam que um conflito

racial entre os brasileiros concorresse para a preservação do seu domínio

sobre o Brasil, não era "fácil, nem de modo algum político conceder já aquela

igualdade para aparecerem homens de cor nos primeiros empregos". Portanto,

"muito convém ter a maior política com a situação destas classes, desarmando-

as delicada e prudentemente". Labatut agira de forma imprudente, insistiu o

Conselho, resumindo os esforços do general para recrutar escravos e a sua

recusa em prestar atenção às advertências dele. Mais ominosamente, ele

colocara publicamente a questão do recrutamento escravo; em decorrência, "já

pelas ruas em outra coisa não falavam os pardos, cabras e crioulos". Ademais,

o capitão de milícias encarregado por Labatut do recrutamento era um liberto e,

conseqüentemente, interessado demais no êxito da medida: ele "não cessava

Page 26: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

de conversar com escravos, sendo até pelas ruas [da Cachoeira] cercado por

eles".

Essa exposição do debate sobre o alistamento de escravos em 1822 e

1823 sugere diversos pontos importantes. Em primeiro lugar, o recrutamento

de escravos foi um recurso improvisado: aparentemente, Labatut nunca emitiu

um decreto convidando escravos a se juntarem aos patriotas em troca de

liberdade. Que nenhum dos muitos inimigos dele o acusaram disso

posteriormente é um forte indício de que ele também não o fez informalmente.

Deveras, os escravos confiscados e recrutados foram alistados no Batalhão de

Libertos Constitucionais e Independentes do Imperador, mas esse alistamento

em si significava, no máximo, apenas uma promessa implícita de liberdade. Em

segundo lugar, Labatut respeitava sempre o direito de propriedade dos

senhores brasileiros. Ele consultava repetidamente o conselho; os escravos

alistados em fins de 1822 pertenciam a senhores portugueses ausentes que

aparentemente não tinham herdeiros brasileiros (quando havia tais herdeiros,

os bens eram administrados para eles). Dessa forma, o conflito entre Labatut e

o Conselho tratava da disposição de butim de guerra de grande valor. Em

terceiro lugar, por mais que Labatut e o Conselho discordassem sobre a

prudência do recrutamento de escravos, concordaram num ponto fundamental,

mas sempre implícito: soldado e escravo eram categorias distintas (e, portanto,

o alistamento deste implicava uma mudança da sua condição). Que o debate

sobre o recrutamento de escravos causou tanta agitação na Cachoeira

demonstra que os escravos também sabiam disso. Finalmente, a preocupação

do Conselho com o apoio de Labatut ao recrutamento de escravos passou

facilmente à ansiedade sobre as "classes de cor," aquele medo geral da parte

de uma elite branca numa sociedade com maioria esmagadora de não brancos,

tão comum na época posterior à revolução haitiana.

Em decorrência dos esforços de Labatut no sentido de alistar escravos e

da desarticulação social provocada pela guerra de 1822 e 1823, os escravos

baianos enfrentavam novas oportunidades. Havia poucos levantes nesses

anos; como João José Reis tem sustentado, a repressão brutal de duas

revoltas demonstrou a futilidade de rebeliões numa época em que a classe

senhorial, apesar de dividida, estava bem armada. Oportunidades para outras

formas de resistência, porém, multiplicavam-se: "Alexandre, pardinho, fugiu no

Page 27: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

tempo da guerra para o Recôncavo, e foi para Pernambuco com a tropa dali,

de onde o mandei vender," comentou posteriormente uma mulher. Outros

simplesmente desapareceram, como Maria Rita, uma crioula, que "fugiu

quando as tropas de Portugal se retiravam," e a Idade de Ouro do Brasil

atribuiu esse fenômeno preocupante ao mau exemplo dos senhores patriotas.

"Muitos escravos" se aglomeravam no acampamento principal brasileiro,

recordou o futuro visconde de Pirajá, onde foram empregados nos trabalhos de

fortificação, enquanto os oficiais escolheram alguns para servirem de criados.

Estes eram tantos que o sucessor de Labatut, José Joaquim de Lima e Silva,

emitiu ordens no sentido de restringir o número deles com direito à etapa.

Procurando minimizar o número de escravos alistados no exército, Pirajá

sustentou que a maioria deles foi mandada para trabalhar como sapadores ou

camaradas, empregos tradicionais para escravos de trabalho braçal e serviço

pessoal. Outros escravos encontravam-se a serviço da causa patriota sob

ordens dos seus senhores. O dono de duas armações de baleia mandou seus

sessenta escravos para a construção de fortificações e o carregamento de

víveres às linhas patriotas. Tanto a fuga de escravos do acampamento patriota

quanto a proximidade de escravos e soldados, sem falar dos boatos

provocados pelas iniciativas de Labatut no sentido de recrutar escravos,

aumentaram a probabilidade de que escravos foragidos fossem

inadvertidamente recrutados pelos patriotas. Nos últimos meses do assédio,

comandantes a cujas unidades faltavam soldados podiam ter fechado seus

olhos à condição escrava dos foragidos que se ofereciam voluntariamente para

servir, mas não há nenhuma evidência concludente de que isso acontecesse.

Dada a natureza irregular e com freqüência desordeira do recrutamento

para as forças patriotas, é impossível estabelecer o número de escravos

alistados. Em julho de 1823, o Batalhão de Libertos tinha um efetivo de 327,

incluindo oficiais e soldados, mas alguns e talvez muitos deles já eram libertos

antes da guerra, recrutados como livres mas segregados nessa unidade por

causa de sua anterior condição escrava. Essa cifra, é claro, não incluía os

escravos que, como dois pertencentes a Ana Joaquina do Livramento,

"pereceram na guerra". Além disso, como os processos de compensação

analisados abaixo deixam claro, alguns escravos serviam em outras unidades.

Onde fosse que servissem, tais homens ainda eram, de jure, escravos, pois

Page 28: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

nem Labatut nem o Conselho Interino lhes ofereceram a liberdade em troca de

serviço militar. Nem se haviam tomado medidas para liquidar o direito de

propriedade dos seu donos.

2.2.1 – As consequências do recrutamento de escravos

Depois da guerra, os vitoriosos senhores-de-engenho baianos

enfrentavam a difícil tarefa de restaurar sua autoridade sobre uma população

escrava que vira e ouvira muitas novidades, sobre um exército cuja fileira

continha um número apreciável de escravos (cuja condição ainda não fora

resolvida), e sobre "classes de cor" que ganharam nova consciência de sua

importância em conseqüência dos seus serviços na guerra. Restaurar a linha

divisora entre escravo e soldado foi um passo fundamental, efetuado pela

libertação dos escravos que serviram oficialmente como soldados, e pela

devolução do restante à condição de escravo. Posteriormente, as autoridades

removeram os ex-escravos (e também a maioria dos soldados negros) da

Bahia, dessa forma traçando mais explicitamente a linha divisora entre

escravos e soldados. O levante do Batalhão dos Periquitos (outubro a

novembro de 1824), percebido como uma revolta de soldados negros e ex-

escravos, urgiu essas medidas.

Uma vez de posse de Salvador, o governo baiano emitiu ordens às

autoridades locais para que escravos vadios fossem capturados e devolvidos

aos seus donos. O "grande número de cativos" alistados no Exército

Pacificador constituía um problema mais complicado, como explicou Lima e

Silva: "Conservei-os" na fileira "e sempre lhes observei provas de valor e

intrepidez, e um decidido entusiasmo pela causa da independência do Brasil."

Além disso, esses "irmãos de armas" ficaram sob disciplina durante a

ocupação de Salvador; portanto, "nada me parece mais duro" do que devolvê-

los à escravidão. O governo imperial aceitou essa lembrança e encarregou-se

de regularizar a nova condição deles, ordenando que o governo baiano

agenciasse a sua manumissão. Os interesses fiscais motivaram a esperança

de que senhores libertassem voluntariamente seus escravos; senão, o governo

ofereceria compensação, protegendo assim o direito de propriedade e (logo

que possível) o princípio de que a alforria era privilégio exclusivo dos senhores.

Page 29: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

A decisão do governo imperial de ratificar o alistamento de escravos e a

conclusão de que tais escravos eram oficialmente homens livres era

provavelmente no interesse dos senhores baianos. Afinal de contas, devolvê-

los à escravidão teria sido ainda mais imprudente do que recrutá-los. Muitos

senhores acabaram aceitando a compensação e abriram mão do seu direito de

propriedade, e "soldados libertos" às vezes aparecem em documentação

posterior, entre eles um nagô que depôs no processo contra os escravos

rebeldes de 1835. Outros senhores negaram-se a libertar seus escravos-

soldados, o que motivou requerimentos em que estes solicitaram liberdade ao

governo. Em pelo menos dois casos, ministros ordenaram que as autoridades

provinciais tentassem convencer os donos relutantes a aceitarem justa

recompensa e a libertarem seus escravos; um desses, Manoel Rufino Gomes,

era sargento em 1825.

Nem sempre era fácil obter compensação, ainda mais depois da

remoção da maioria dos escravos-soldados da Bahia em fins de 1824 (vide

abaixo). José Lino Coutinho aproveitou-se de uma visita ao Rio de Janeiro no

início de 1825 para provar seu domínio sobre os soldados Francisco Anastácio

e João Gualberto, irmãos que se declaravam alfabetizados, para os quais

aceitou 600$000, 160$000 menos do que o valor em que foram avaliados. José

Feliciano dos Santos gozava de menos sorte e ainda reivindicava a posse de

um certo Jacinto, em 1826. Dois casos arrastaram-se até 1829. Logo depois da

reocupação de Salvador, Geminiano Lázaro voltou à sua senhora, infelizmente

antes que chegasse a Salvador a notícia da libertação dos escravos-soldados.

De alguma maneira, acabou servindo no batalhão miliciano de negros em

1829, quando autoridades militares resolveram que ela fosse compensada. Um

companheiro miliciano de Geminiano, Antônio Ribeiro, tinha rabo-de-palha.

Tendo desertado do exército antes que sua condição escrava fosse liquidada,

voltou a Salvador onde foi alistado na milícia negra. Ali foi encontrado por seu

dono, e autoridades militares julgaram que perdera seu direito à liberdade por

causa da deserção, e o devolveram ao senhor.

Nem sempre era fácil resolver as reivindicações dos senhores, dos

escravos-soldados e do Estado. Um angolano foragido, Caetano Pereira,

alistou-se voluntariamente no dia 9 de junho de 1823 (mas não no Batalhão de

Libertos). Deu baixa no dia 7 de agosto e logo enfrentou um dono enfurecido

Page 30: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

que tentava vendê-lo para fora da província. Caetano, provavelmente sabendo

da decisão do governo imperial no sentido de libertar escravos-soldados,

procurou seu antigo comandante, que aceitou alistá-lo novamente no dia 6 de

outubro. O dono era cidadão português, o que provavelmente facilitou a

decisão do oficial de dar abrigo a Caetano. Todavia, e com muita razão, o dono

acusou o oficial de intencionalmente alistar um escravo foragido e

repetidamente exigia satisfação dele, talvez porque julgasse a burocracia

imperial insensível à sua reclamação. Inevitavelmente, alguns soldados e civis

descobriram jeitos de tirar vantagem do programa de compensação.

"Geralmente constava," segundo um oficial, que soldados e civis colaboravam

na feitura de requerimentos falsos, através dos quais os "escravos" e seus

"donos" repartiam o valor do "escravo". A preocupação com tais fraudes estava

por trás da exigência de comprovação de domínio e de identidade de escravos-

soldados, os quais, por seu lado, frustravam donos que nem sempre tinham tal

documentação à mão.

Nem todos os escravos que serviram à causa patriota conquistaram sua

liberdade, como já vimos no caso de Antônio Ribeiro. Da ilha de Itaparica, o

comerciante, senhor de engenho e governador militar da localidade, tenente-

coronel Antônio de Souza Lima, explicou em 1825:

Nenhum escravo prestou aqui serviço durante a campanha, com direito à liberdade, por que nunca para tal tive ordem, e nem entendi que esse indulto se estendia além do corpo, que com a denominação de 'Libertos' foi criado pelo General do Exército Pacificador (...). Alguns fizeram serviços; mas foram os que fugindo da cidade, ou os que aqui ficaram abandonados de seus senhores, andavam vagando pelos campos, fazendo roubos e desordens (...) foram entregues aos seus senhores, logo que requisitaram.

Ao minimizar os serviços prestados por esses escravos e ao negar sua

condição de soldados, os senhores que se opuseram ao recrutamento de

escravos continuavam a lutar em defesa da sua propriedade. Os escravos que

serviram na guerra, ao contrário, valeram-se dos seus serviços para reivindicar

respeito da parte das autoridades. Apesar de não ter sido liberto depois da

Page 31: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

guerra, o africano Domingos Sudré considerava-se veterano da independência.

Alforriado pelo seu dono em 1836, foi preso em 1862 por práticas de

candomblé em sua casa. Vestiu-se orgulhosamente com a farda dos veteranos

da independência na prisão, por muito desgosto do subdelegado, que lembrou

ao chefe de polícia que Sudré era escravo durante a guerra e que fora visto

posteriormente a serviço do engenho do seu senhor.

No decorrer da década de 1820, a burocracia imperial aos poucos

resolveu as pretensões dos escravos e dos senhores, demarcando o mais

claramente possível a linha divisória entre escravos e soldados, uma linha que,

segundo todos os envolvidos, devia existir e devia ser clara. De fato, o governo

imperial ressaltou esse princípio em 1824, ao decretar que homens de cor

provassem "sua condição livre" antes de se alistarem voluntariamente. O

pagamento de compensação aos donos cujos escravos se alistaram e lutaram

na campanha da independência baseava-se no princípio antigo do direito

romano que escravos que serviram ao Estado não deveriam continuar no

cativeiro, e a decisão de 1823 era, de vez em quando, citada como um

precedente para resolver casos de foragidos alistados há muito tempo cujos

donos pretendiam sua devolução, uma política bem estabelecida no exército

brasileiro já nos anos de 1840.

Libertar os escravos alistados casualmente em 1822 e 1823 resolveu

alguns problemas, mas deixou sem resolução a questão maior de como

administrar uma guarnição na qual, depois da independência, servia um grupo

significativo de ex-escravos e muito mais soldados não-brancos do que

antigamente. Oriundos de uma mobilização popular, os soldados da guarnição

de Salvador pós-guerra eram desordeiros. Em face dessa quebra de disciplina

militar, o governo brasileiro decretou em 1823 que soldados culpados de

primeira e segunda deserção simples recebessem sumariamente 30 e 50

chibatadas, respectivamente (em vez de passarem por complicados conselhos

de guerra), castigo dobrado em 1824 e aplicado em 1825 a qualquer forma de

desordem. A instituição de chibatadas como castigo para desertores era o

contraponto natural do recrutamento de escravos na guerra da independência.

Soldados libertos podiam ser controlados somente pela chibata, ou pelo menos

assim pensavam autoridades militares. Na Bahia, contudo, autoridades

provinciais ainda não estavam satisfeitas. O presidente exigiu "uma absoluta

Page 32: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

reforma" da tropa em maio de 1824, destacando que "de nenhuma maneira

podem convir os pretos de que se compõem os batalhões, que quase não têm

brancos, ou pardos que cheguem à décima parte". De forma mais pitoresca,

Felisberto Caldeira Brant Pontes, comandante da guarnição na década de 1810

(e futuro marquês de Barbacena), declarou durante uma visita a Salvador em

fevereiro de 1824, que "a não ser os uniformes poderiam bem considerar-se

aos soldados como armação da Costa da Mina". Para melhorar a guarnição,

Brant recomendou uma volta à prática colonial de recrutamento nenhum

soldado preto, inferiores somente brancos e, para "neutralizar a influência dos

pardos," 800 mercenários estrangeiros. Apesar de concordar com a

necessidade de mudanças, Pedro resolveu, com prudência, não estacionar

tropas estrangeiras em Salvador, mas Brant, como ministro em Londres, foi

instrumental na contratação dos mercenários alemães e irlandeses mandados

enfim para o Rio de Janeiro.

No calor da hora, tanto Brant quanto o presidente provavelmente

exageraram na proporção de negros na fileira. Outras fontes sugeriram que

havia um grau de segregação na guarnição de 1823 e 1824, quando muitos

dos ex-escravos acabaram servindo no Batalhão dos Periquitos, caraterizado

por um cronista como "composto pela maior parte de libertos e outras pessoas

de classes heterogêneas". O cônsul francês distinguia entre os batalhões

quando descreveu o levante dos Periquitos como um conflito entre tropa

branca e negra. Talvez essa segregação refletisse uma política oficial do

governo; pode também indicar uma relutância da parte dos livres de servirem

ao lado de ex-escravos, atitude evidente na Sabinada de 1837, quando

soldados rebeldes recusaram-se a servir com os escravos alistados pelo

efêmero governo republicano. Autoridades perceberam a grande inimizade

entre os Periquitos e os soldados dos outros batalhões.

Ordens para demitir o popular comandante do Batalhão dos Periquitos

em fins de 1824 e para transferir a unidade para fora de Salvador foram o

estopim do motim durante o qual o comandante da guarnição foi morto. O

levante perdeu as qualidades primitivas e virou um confronto entre tropas

rebeldes durante algum tempo em controle do governo provincial e os

autoproclamados legalistas que abandonaram a cidade. Depois de um mês

tenso, cheio de confrontos e negociações, a maioria dos Periquitos anuiu ao

Page 33: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

embarque para Pernambuco e os legalistas reocuparam a cidade. Em

conseqüência dessa revolta, os governos baiano e brasileiro expulsaram

soldados desordeiros da guarnição de Salvador e mostraram-se determinados

a manter a ordem, "custe o que custar". A repressão assumiu uma feição racial

com a remoção de soldados negros e ex-escravos da cidade. O embarque do

Batalhão dos Periquitos e a posterior dispersão dos seus soldados por outras

unidades desterrou os que eram então vistos como os mais perigosos. Na

hipótese de que escravos negros seriam menos perigosos no mar do que em

terra, a marinha foi o destino final de muitos. Mesmo antes do fim da revolta, o

governo provincial tentou transferir à marinha os soldados libertos que não

estavam designados para a expedição a Pernambuco, medida que o

governador das armas então julgou imprudente, porque serviria apenas para

provocar a deserção deles. Outros foram depois enviados a uma das unidades

negras do exército brasileiro, os Batalhões 10 e 11, estacionados na

seguramente remota e quase sempre assediada cidade de Montevidéu. A

legislação imperial sobre o recrutamento repetiu a exclusão colonial de pretos

do exército, uma exclusão a que o governador das armas deu atenção em

meados de 1825, quando recusou um recruta por causa de sua "cor preta", e

como já vimos, homens de cor (isto é, pardos) que queriam servir

voluntariamente foram obrigados em 1824 a comprovar "sua condição livre" (ou

liberta).

Tudo isso não foi nada menos do que uma purga racial maciça dos

remanescentes do Exército Pacificador. Foi também muito bem-sucedido:

numa lista de 366 desertores dos batalhões baianos durante 27 meses, de

1825 até o início de 1827, há apenas 15 pretos entre 275 pardos, 8 cabras, 4

caboclos e 64 brancos, muito longe da fileira 90 por cento negra de que

reclamara o presidente em 182446. Esses dados revelam o resultado de um

esforço intencional de remover negros e ex-escravos da guarnição. Negros

livres ou libertos podiam servir no exército, mas acabariam "gozando do frio de

Montevidéu," como ironizou um contemporâneo sobre o destino dos Periquitos.

2.3 – Mulheres que lutaram pela independência

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A participação de mulheres na luta pela Independência do Brasil na

Bahia, em 1823, deu destaque a três ícones femininos nas lutas para vencer as

tropas portuguesas.

"A gente destaca três, não esquecendo, obviamente, as outras que de

alguma forma lutaram. Mas essas três - Maria Quitéria, Joana Angélica e Maria

Felipa - se tornaram ícones importantes nos dias de hoje", ressalta o

historiador João Gualberto.

Maria Quitéria

Conhecida por lutar vestida de homem para ajudar o exército a expulsar

as tropas portuguesas da Bahia, Maria Quitéria é um dos destaques na história

de lutas. Ela conseguiu sair de casa escondida do pai viúvo e usando a farda

que pegou do cunhado. Por seu ato de bravura e ousadia, ficou conhecida

como “soldado Medeiros” e se tornou um dos ícones da Independência do

Brasil na Bahia.

Joana Angélica

Mártir na luta pela independência do Brasil na Bahia, Joana Angélica se

destacou pela bravura e coragem ao enfrentar tropas portuguesas dispostas a

invadir o Convento da Lapa, localizado no centro da cidade de Salvador.

Soteropolitana, Joana Angélica de Jesus nasceu em Salvador no ano de 1761.

Ao completar 21 anos, a jovem entra para o Convento da Lapa e em

1815 torna-se Abadessa, cargo religioso concedido à superiora de um mosteiro

de religiosas. Em 19 de fevereiro de 1822, meses antes do grito do Ipiranga

pela independência do Brasil, a tensão entre portugueses e baianos aumenta

após o ataque ao Forte de São Pedro, onde estavam alojados os combatentes

soteropolitanos.

Nessa mesma data, tropas portuguesas seguem em direção ao

Convento da Lapa em busca de combatentes baianos e encontram a

resistência de Joana Angélica, que se coloca à frente do Convento para tentar

impedir a invasão. Apesar do ato de bravura, a Abadessa é assassinada pelos

portugueses, que entram no templo religioso após o assassinato da religiosa.

Maria Felipa

Baiana, negra, natural da Ilha de Itaparica, Maria Felipa comandou cerca

de 40 mulheres na luta pela independência do Brasil na Bahia. Segundo relatos

Page 35: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

históricos, o grupo liderado por ela foi responsável por queimar 42

embarcações portuguesas.

Há também o episódio lendário da surra de cansanção que Maria Felipa

teria dado em homens portugueses. Pouco conhecida e reconhecida na história

oficial, Maria Felipa também é destaque nas lutas pela independência do Brasil

na Bahia.

CAPÍTULO III – MOVIMENTO PELA INDEPENDÊNCIA

O Brasil do início do século XVIII ainda era dominado por Portugal,

enquanto o Rio de Janeiro, Pernambuco, Minas Gerais e a Bahia continuavam

lutando pela independência. As províncias não suportavam mais a situação e,

percebendo os privilégios que o Rio de Janeiro estava recebendo por ser a

capital, Pernambuco e Bahia resolveram se rebelar.

Recife deu início a uma revolução anti-colonial em 6 de março de 1817.

Esta revolução tinha uma ligação com a Bahia, já que havia grupos

conspiradores compostos por militares, proprietários de engenhos,

trabalhadores liberais e comerciantes. Ao saber desta movimentação, o então

governador da Bahia, D. Marcos de Noronha e Brito advertiu alguns deles

pessoalmente.

O governo estava em cima dos conspiradores e, devido à violenta série

de assassinatos, muito baianos resolveram desistir. Com toda esta repressão,

a revolução de Recife acabou sendo derrotada. Os presos pernambucanos

foram trazidos para a Bahia, sendo muitos fuzilados no Campo da Pólvora ou

presos na prisão de Aljube, onde grande personagens baianos também

estavam presos.

Diante das insatisfações, começaram as guerras pela independência.

Os oficiais militares e civis baianos passaram a restringir a Junta Provisória do

Governo da Bahia, que ditava as ordens na época, e com esta atitude foi

formado um grupo conspirativo que realizou a manifestação de 3 de Novembro

de 1821.

Esta manifestação exigia o fim da Junta Provisória, mas foi impedida

pela “Legião Constitucional Lusitana”, ordenada pelo coronel Francisco de

Page 36: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Paula e Oliveira. Os dias se passaram e os conflitos continuavam intensos.

Muitos brasileiros morreram em combate

3. 1 – Força portuguesa

No dia 31 de Janeiro de 1822 a Junta Provisória foi modificada. E

depois de alguns dias, chegou de Portugal um decreto que nomeava o

brigadeiro português, Ignácio Luiz Madeira de Mello, o novo governador de

Armas.

Quando Portugal nomeou Ignácio Luiz Madeira de Mello como novo

governador de Armas do Brasil, surgiu um movimento de resistência que

envolveu civis e militares. Tropas portuguesas começaram a invadir os

quartéis.

Os oficias brasileiros não aceitavam esta imposição, pois este decreto

teria que passar primeiro pela Câmara Municipal. Houve, então, forte

resistência que envolveu muitos civis e militares. No dia 19 de fevereiro, os

portugueses começaram a invadir quartéis. Em Salvador, eles tomaram o Forte

de São Pedro e o Convento da Lapa, onde havia alguns soldados brasileiros.

Neste episódio, a abadessa Sóror Joana Angélica tentou impedir a invasão e

acabou sendo morta.

Concluída a ocupação militar portuguesa em Salvador, Madeira de

Mello fortaleceu as ligações entre a Bahia e Portugal. Assim a cidade recebeu

novas tropas portuguesas e muitas famílias baianas fugiram para as cidades do

recôncavo.

3. 2 – Contra-ataque brasileiro

No recôncavo, houve outras lutas para a independência das cidades e o

fortalecimento do exército brasileiro. O coronel Joaquim Pires de Carvalho

reuniu todo seu armamento e tropas e entregou o comando ao general Pedro

Labatut. Este, assim que assumiu, intimidou Madeira de Mello.

Labatut organizou todo seu exército em duas brigadas e iniciou uma

série de providências. Aos poucos o exército brasileiro veio conquistando

novos territórios até chegar próximo a cidade de Salvador.

Page 37: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

Madeira de Mello recebeu novas tropas de Portugal e pretendia fechar o

cerco pela ilha de Itaparica e Barra do Paraguaçu. Esta atitude preocupava os

brasileiros, mas os movimentos de defesa do território cresciam. E foi na

defesa da Barra do Paraguaçu que Maria Quitéria de Jesus Medeiros se

destacou, uma corajosa mulher que vestiu as fardas de soldado do batalhão de

“Voluntários do Príncipe” e lutou em defesa do Brasil.

Em maio de 1823, Labatut, em uma demonstração de autoridade,

ordenou prisões de oficiais brasileiros, mesmo sendo avisado do erro que

estava cometendo, e acabou sendo cassado do comando e preso. O coronel

José Joaquim de Lima e Silva assumiu o comando geral do Exército e no dia 3

de Junho ordenou uma grande ofensiva contra os portugueses. Com a força da

Marinha Brasileira, o coronel apertou o cerco contra a cidade de Salvador, que

estava sob domínio português, restringindo o abastecimento de materiais de

primeira necessidade. Diante destes fortes ataques e das necessidades que

estavam passando, Madeira de Mello enviou apelos e acabou se rendendo.

Com a vitória, o Exército Brasileiro entrou em Salvador consolidando a

retomada da cidade e fim da ocupação portuguesa no Brasil.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar da importância do 2 de julho, a data é desconhecida pela maioria

dos brasileiros, revelando uma grande falha de informação de nossa história

que precisa ser resgatada. Não se trata apenas da independência da Bahia

como muitos acreditam, mas do processo que consolidou a independência do

Brasil. Mesmo com a declaração da independência em 7 de setembro de 1822,

as tropas portuguesas ainda dominavam algumas províncias. Foram meses de

lutas e batalhas travadas em todo o Recôncavo Baiano que culminaram com a

expulsão das tropas portuguesas em 1823.

A guerra da Bahia contou com o heroísmo do seu povo que lutou ao lado

de lideranças como Maria Quitéria, Joana Angélica, João das Botas entre

outros, para assegurar o pleno domínio sobre o território nacional.

O processo de independência do Brasil na Bahia se realizou de

maneira cruel depois de um ano de guerra civil que resultou em ampla

mobilização dos habitantes da província.

Page 38: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

No entanto, a Independência mesmo, com guerra e sangue, a ferro e

fogo, aconteceu nas cidades da região que reuniam o grosso da economia no

país. Foi uma guerra vitoriosa.

Para o caso dos residentes na Bahia que vivenciaram novas

experiências de negociação e de acomodação, mas também possibilidades de

maturação política, os anos do constitucionalismo revelaram-se de grande

riqueza. Para as classes dirigentes, significou a busca pelo aprimoramento dos

mecanismos de dominação mediado pelos instrumentos de uma monarquia

constitucional; para as classes subalternas, o acúmulo de experiências no

longo processo de construção de um projeto político autônomo.

Resta acrescentar que se a busca pela compreensão do passado é

também uma tentativa de aprendermos a realidade presente na perspectiva de

construção de projetos de futuro, as experiências vivenciadas pelos homens

naqueles anos certamente tem muito a nos revelar sobre a crise de nossos

tempos.

Page 39: Monografia Rosemeire - Ind Da Bahia

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Livros

.TAVARES, Luís Henrique Dias. A independência do Brasil na Bahia,

Civilização Brasileira S.A, Rio de Janeiro, 1982

MARTINEZ, Socorro Targino. Dois de Julho - A festa e a história, Fundação

Gregório de Mattos, Salvador, 2000

AMARAL, Braz do. História da Independência na Bahia. Salvador:

Progresso, 1957.

TAVARES, Luís Henrique Dias. História da Bahia. 10. ed. São Paulo: UNESP;

Salvador: EDUFBa, 2001

SOUSA, Maria Aparecida Silva de. Bahia: de capitania a província, 1808-

1823. Tese (Doutorado em História Social) – Faculdade de Filosofia, Letras e

Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, 2008.

Sites

http://www.brasilescola.com/historiab/independencia-bahia.htm, acessado em

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http://www.ondacultural.ufba.br/index.php?

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http://www.culturabaiana.com.br/a-independencia-da-bahia-a-independencia-

so-foi-pacifica-na-regiao-sudeste-aqui-na-bahia-ela-foi-conquistada-com-

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http://www.bahia-turismo.com/independencia.htm, acessado em 26 de

novembro de 2012.

Dicionários

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988.