Nº 4 - Dezembro de 2010 1 JORNAL PSICOSSOCIAL Estamos também em http://psicossocial-aquelabase-blogspot.com Curso Profissional de Técnico de Apoio Psicossocial Editorial Ensino profissional e educação para uma prática profissional eticamente investida. O ensino profissional na escola pública, e especialmente no curso de técnico de apoio psicossocial, enfrenta três desafios bási- cos aos quais tem de responder; o primeiro, refere-se à exigência do trabalho dos formadores com os formandos visar a educação para uma prática eticamente investida; o segundo refere-se à exigência de que as aprendizagens científicas e técnicas que sustentam a qualificação dos futuros trabalhadores sejam aprendidas com eficácia; o terceiro refere-se à exigência de que o percurso escolar dos alunos seja feito em colaboração com a comunidade local, nomeadamente com as suas instituições e empresas, não porque se conceba uma formação provinciana e presa ao local, mas porque é no local que há a possibilidade de desenvolvermos uma formação em contexto de trabalho. O primeiro desafio, e seguindo a óptima síntese de A. D. Carvalho e I. Baptista, investigadores do Projecto Europeu de Ética Social, pode ser concretizado se tivermos como princípios básicos do nosso trabalho pedagógico o reconhecimento e a valorização da perfectibilidade de todos os seres humanos, seja qual for a sua situação na vida (confiança antropológica), uma intenção pedagógica alicerçada na confiança antropológica e, como tal, crente na possibilidade de aperfeiçoamento e mudança positiva (crença na educabilidade). Partindo destes princípios, o trabalho formativo visa desenvolver nos formandos a capacidade para ser afectado pelo destino do outro, e para actuar escutando activamente aqueles para quem, e com quem, trabalha, uma atitude de acolhimento e aceitação do outro na sua condição de outro (sensibilidade relacio- nal); contudo, a sensibilidade relacional tem de ser acom- panhada pela competência reflexiva ou distanciamento analítico, necessária à avaliação racional das situações (distância críti- ca) e à consciência de que, aspirando embora a acção de técnico de apoio psicossocial ao máximo bem, nem todos os meios são legítimos para o conseguir. Por fim, e talvez este seja o primeiro no que se refere à criação de condições para o sucesso do nosso projecto educativo, os nosso formandos têm de desenvolver consciência de que as dificuldades não podem servir para justificar comportamentos de desistên- cia, demissão ou negligência profissional (perseverança profissional). Nesta perspectiva, a qualificação profissional não surge como uma simples prática de adestramento, que de resto não formaria profissionais capazes para uma socie- dade globalizada na qual a competência técnica, a adapta- bilidade e a capacidade de actuar critica- mente nas organizações é essencial, mas como uma prática reflexiva que permite formar profissionais com tais competências; com efeito, um gestor que, tendo um plano de acção e deseje que ele seja bem- sucedido, mais do que simplesmente cum- prido, procura ouvir os seus colaboradores, e não apenas os seus espelhos (isto é, as chefias por si nomeadas), pois pretende ideias alternativas, correcções baseadas na expe- riência do trabalhador ou simplesmente uma compreensão que capacite para a acção, de modo a que a sua decisão posterior seja compartilhada, e assumida como sua, pelos seus colaboradores. Ora só um trabalhador formado para uma prática reflexiva estará apto a desempenhar adequa- damente este papel; sabe-se como a falta de qualificação no nosso país no que se refere aos empreendedores, aos gestores e aos trabalhadores nos remete para práticas de gestão e de trabalho pouco produtivas, causadoras de insatisfação no trabalho e pouco concorrenciais no merca- do global (notar que tais práti- cas também afectam a orga- organização e a gestão escola- res). O segundo desa- fio pode, sobre- tudo no ensino profissional, parecer um combate quixo- tesco, um dese- jo piedoso, senão uma utopia cega; mas cabe aos formadores o trabalho de, definindo metas adequadas à qualificação pretendida e assumindo
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Nº 4 - Dezembro de 2010 1
JORNAL PSICOSSOCIAL Estamos também em http://psicossocial-aquelabase-blogspot.com
Curso Profissional AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE CONDEIXA-A-NOVA de Técnico de Apoio Psicossocial
Editorial
Ensino profissional e educação para uma
prática profissional eticamente investida. O ensino
profissional na escola pública, e especialmente no curso de
técnico de apoio psicossocial, enfrenta três desafios bási-
cos aos quais tem de responder; o primeiro, refere-se à
exigência do trabalho dos formadores com os formandos
visar a educação para uma prática eticamente investida; o
segundo refere-se à exigência de que as aprendizagens
científicas e técnicas que sustentam a qualificação dos
futuros trabalhadores sejam aprendidas com eficácia; o
terceiro refere-se à exigência de que o percurso escolar dos
alunos seja feito em colaboração com a comunidade local,
nomeadamente com as suas instituições e empresas, não
porque se conceba uma formação provinciana e presa ao
local, mas porque é no local que há a possibilidade de
desenvolvermos uma formação em contexto de trabalho.
O primeiro desafio, e seguindo a óptima síntese de
A. D. Carvalho e I. Baptista, investigadores do Projecto
Europeu de Ética Social, pode ser concretizado se tivermos
como princípios básicos do nosso trabalho pedagógico o
reconhecimento e a valorização da perfectibilidade de
todos os seres humanos, seja qual for a sua situação na
vida (confiança antropológica), uma intenção pedagógica
alicerçada na confiança antropológica e, como tal, crente
na possibilidade de aperfeiçoamento e mudança positiva
(crença na educabilidade). Partindo destes princípios, o
trabalho formativo visa desenvolver nos formandos a
capacidade para ser afectado pelo destino do outro, e para
actuar escutando activamente aqueles para quem, e com
quem, trabalha, uma atitude de acolhimento e aceitação
do outro na sua condição de outro (sensibilidade relacio-
nal); contudo, a sensibilidade relacional tem de ser acom-
panhada pela competência reflexiva ou distanciamento
analítico, necessária à
avaliação racional das
situações (distância críti-
ca) e à consciência de
que, aspirando embora a
acção de técnico de apoio
psicossocial ao máximo
bem, nem todos os meios
são legítimos para o conseguir. Por fim, e talvez este seja o
primeiro no que se refere à criação de condições para o
sucesso do nosso projecto educativo, os nosso formandos
têm de desenvolver consciência de que as dificuldades não
podem servir para justificar comportamentos de desistên-
cia, demissão ou negligência profissional (perseverança
profissional).
Nesta perspectiva, a qualificação profissional não surge como uma simples prática de adestramento, que de resto não formaria profissionais capazes para uma socie-dade globalizada na qual a competência técnica, a adapta-
bilidade e a capacidade de actuar critica-mente nas organizações é essencial, mas como uma prática reflexiva que permite formar profissionais com tais competências; com efeito, um gestor que, tendo um plano de acção e deseje que ele seja bem-sucedido, mais do que simplesmente cum-
prido, procura ouvir os seus colaboradores, e não apenas os seus espelhos (isto é, as chefias por si nomeadas), pois pretende ideias alternativas, correcções baseadas na expe-riência do trabalhador ou simplesmente uma compreensão que capacite para a acção, de modo a que a sua decisão posterior seja compartilhada, e assumida como sua, pelos seus colaboradores. Ora só um trabalhador formado para uma prática reflexiva estará apto a desempenhar adequa-damente este papel; sabe-se como a falta de qualificação no nosso país no que se refere aos empreendedores, aos gestores e aos trabalhadores nos remete para práticas de gestão e de trabalho pouco produtivas, causadoras de insatisfação no trabalho e pouco concorrenciais no merca-do global (notar que tais práti-cas também afectam a orga-organização e a gestão escola-res). O segundo desa-fio pode, sobre-tudo no ensino profissional, parecer um combate quixo-tesco, um dese-jo piedoso, senão uma utopia cega; mas cabe aos formadores o trabalho de, definindo metas adequadas à qualificação pretendida e assumindo
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padrões de trabalho exigentes, capacitar os formandos para um desempenho profissional eficaz. Certamente nem todos conseguirão alcançar um nível de desempenho óptimo, mas nenhum poderá alcançar o seu certificado profissional sem atingir o que está definido, em termos de aptidão e de desempenho, como suficiente; esse foi o compromisso que, no Contrato Profissional do Curso de Apoio de Técnico Psicossocial, assumimos em conjunto, formandos, formadores e encarregados de educação. A comunidade para quem trabalhamos, e com quem traba-lhamos, não exige certamente outra coisa. Em notícia recente sobre os testes PISA, o jornal Público informa que oito por cento dos alunos avaliados pelo PISA vieram dos Cursos Profissionais do Secundário; independentemente da relevância efectiva e do significado que estes testes têm, enquanto indício seguro da qualidade de um sistema de ensino (e há muita controvérsia sobre este ponto), é inte-ressante anotar as palavras de Maria do Rosário Lima, que foi coordenadora do PISA, em 2009, numa escola pública de Pombal, sobre os seus ex-alunos do 10.º ano que parti-ciparam nos testes; afirmou que «estes jovens, que há alguns anos acabariam por abandonar a escola depois de ficarem sucessivamente retidos, mudam de atitude, tor-nam-se mais confiantes e motivados». (Público, 18/12/2010). Bem entendido, não basta estar confiante em que se sabe para saber de facto, mas a confiança em si próprio, no sentido do desenvolvimento de expectativas de auto-eficácia, é uma condição necessária para aprender (os estudos do psicólogo Albert Bandura provam este ponto), ou seja, é um ponto de partida para uma melhor aprendi-zagem.
O terceiro desafio remete-nos para a formação em contexto de trabalho, ou seja, para a necessidade de con-cretizar uma ideia pedagógica muito simples: a de que se aprende observando e fazendo; sendo um princípio peda-gógico geral, é contudo muito relevante num curso profis-sional, pois os cursos deste tipo procuram justamente direccionar o saber acerca de um domínio para o desem-penho desse domínio num dado contexto. Neste sentido, procurámos que o nosso trabalho integrasse esta compo-nente prática da formação não apenas no âmbito das aprendizagens realizadas na escola, mas também no âmbi-to das instituições e empresas nas quais os formandos,
após a formação, podem desenvolver a sua actividade profissional; este objectivo, de que o nosso plano de activi-dades é uma concretização (consultável em http://psicossocial-aquelabse.blogspot.com), e que esta-mos já a desenvolver, tem tido, da parte das instituições e empresas locais, um apoio sem o qual não seria possível a sua realização. Neste primeiro período, esse apoio chegou-nos do Centro de Saúde de Condeixa (acção de formação sobre socorrismo), do Centro Educativo de Condeixa (acti-vidades «como cuidar de crianças na pré-escola, um dia de trabalho dos formandos no Jardim de Infância, actividade «à procura dos óculos tradutores»), da Escola Básica 2,3 de Condeixa (actividade «alunos com NEE nas escolas regula-res – o caso do autismo), da Autoridade para as Condições de Trabalho (actividade sobre higiene, segurança e saúde no trabalho), da Santa Casa da Misericórdia de Condeixa (actividade no dia internacional da terceira idade), do ATL da Cáritas na Escola Secundária Fernando Namora (guarda
roupa para a actividade «à procura dos óculos tradutores») e da Câmara Municipal de Condeixa e do Agrupamento de Escolas de Condeixa (acção de formação e projecto sobre empreendedorismo); a nível individual, e decorrendo em contexto de aula, os formadores Sérgio Nogueira (activida-de sobre jogos ópticos) e Rui Rato (actividade formativa sobre construção e utilização de diapositivos) acrescenta-ram, com a sua experiência e conhecimento técnico, uma perspectiva mais concreta ao currículo. Dado que introduz uma novidade em relação ao que foi feito no ano anterior, destacamos o conjunto de actividades planificadas sob a designação «Um dia de tra-balho em ... (Instituição ou Empresa); com estas activida-des pretende-se incorporar por uma dia os formandos numa dada instituição ou empresa de modo a tomarem contacto com a realidade laboral e a desempenharem algumas das funções que poderão assumir profissional-mente no fim da sua formação. A primeira experiência decorreu no Centro Educativo de Condeixa e permitiu dos formandos contactar com um tipo de actividade que per-tence à área de competência do curso; supervisionados pelas educadoras do Centro, e distribuídos em pequenos grupos pelas salas do Jardim de Infância, os formandos tiveram de acompanhar, e participar, nas actividades das crianças. Os formandos aderiram entusiasticamente à acti-vidade.