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CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS1*
CASO RAMÍREZ ESCOBAR E OUTROS VS. GUATEMALA
SENTENÇA DE 9 DE MARÇO DE 2018
(Mérito, Reparações e Custas)
No caso Ramírez Escobar e outros,
a Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante "a Corte
Interamericana", "a Corte"ou "este Tribunal"), integrada pelos
seguintes Juízes:
Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot, Presidente;Humberto Antonio
Sierra Porto, Juiz;Elizabeth Odio Benito; Juíza; Eugenio Raúl
Zaffaroni, Juiz, eL. Patricio Pazmiño Freire, Juiz;
presentes também,
Pablo Saavedra Alessandri, Secretário, e Emilia Segares
Rodríguez, Secretária Adjunta,
em conformidade com os artigos 62.3 e 63.1 da Convenção
Americana sobre Direitos Humanos(doravante “a Convenção Americana”
ou “a Convenção”) e com os artigos 31, 32, 62, 65 e 67do
Regulamento da Corte (doravante “o Regulamento”), dita a presente
Sentença que seestrutura na seguinte ordem:
1* Os Juízes Eduardo Vio Grossi e Roberto F. Caldas não
participaram na deliberação e assinatura destaSentença por motivos
de força maior, o qual foi aceito pelo Pleno.
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TABELA DE CONTEÚDO
I 5
INTRODUÇÃO DA CAUSA E OBJETO DA CONTROVÉRSIA
5
II. 7
PROCESSO PERANTE A CORTE 7
III 9
COMPETÊNCIA 9
IV 9
RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO
9
A.
Reconhecimento do Estado e observações da Comissão e dos representantes
9
B. Considerações da Corte 13
B.1 Sobre os fatos 13
B.2 Sobre as pretensões de direito
14
B.3 Sobre as reparações15
B.4 Valorização do reconhecimento 15
V 16
CONSIDERAÇÃO PRÉVIA SOBRE A PARTICIPAÇÃO DE J.R.
16
A. Argumentos das partes e da Comissão
16
B. Considerações da Corte 17
VI. 19
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PROVA 19
A. Prova documental, testemunhal e pericial
19
B. Admissão da prova. 19
B.1 Admissão da prova documental 19
B.2 Admissão da prova testemunhal e pericial
21
C. Avaliação da prova. 21
VII. 22
FATOS 22
A.
Contexto de adoções irregulares na Guatemala na época dos fatos
22
B.
Marco normativo aplicável em nível interno na época dos fatos
27
B.1 Processo de declaração de abandono
27
B.2 Processo de adoção 28
C.
Os irmãos Osmín Ricardo Tobar Ramírez e J.R. E a sua família
30
C.1 Declaração de abandono dos irmãos Ramírez
31
C.2 Recurso de revisão contra a declaração de abandono
37
C.3 Processos de adoção dos irmãos Ramírez
41
C.4 Recursos interpostos depois da adoção dos meninos Ramírez
42
D.
Supostas ameaças, agressões e perseguição contra Gustavo Tobar Fajardo.
49
E. Situação atual da família Ramírez 49
VIII. 50
MÉRITO 50
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- 4 -
VIII‐1 51
DIREITO À VIDA FAMILIAR E À PROTEÇÃO DA FAMÍLIA, DIREITOS DA CRIANÇA, GARANTIAS JUDICIAIS E PROTEÇÃO JUDICIAL, EM RELAÇÃO À OBRIGAÇÃO DE RESPEITAR E GARANTIR OS DIREITOS SEM DISCRIMINAÇÃO E O DEVER DE ADOTAR DISPOSIÇÕES DE DIREITO INTERNO
51
A.
Considerações gerais sobre os direitos da criança
52
B. Declaração de abandono 54
B.1 Alegações da Comissão e das partes
54
B.2 Considerações da Corte 56
B.2.a Irregularidades no processo de declaração de abandono
58B.2.b Falta de motivação das decisões 63B.2.c Conclusão 65
C. Processos de adoção 66
C.1 Alegações da Comissão e das partes
66
C.2 Considerações da Corte 67
C.2.a Adotabilidade dos irmãos Ramírez 71C.2.b Avaliação do
melhor interesse da criança 72C.2.c Direito de ser ouvido 77C.2.d
Subsidiariedade da adoção internacional 78
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- 5 -
C.2.e Proibição de benefícios econômicos indevidos 79C.2.f
Conclusão sobre a adoção dos irmãos Ramírez 80
D.
Recursos apresentados contra a separação familiar
82
D.1 Alegações da Comissão e das partes
82
D.2 Considerações da Corte 82
D.2.a Efetividade dos recursos 83D.2.b Prazo Razoável e devida
diligência 85
E.
Proibição de discriminação em relação à obrigação de respeitar e garantir os direitos
87
E.1 Argumentos das partes e da Comissão
87
E.2 Considerações da Corte 87
E.2.a Considerações gerais sobre o direito à igualdade perante a
lei, a proibição de discriminação e a proteção especial das
crianças 88E.2.b Direito a não ser discriminado com base na posição
financeira
91
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- 6 -
E.2.c Direito a não ser discriminado com base em estereótipos de
gênero 95E.2.d Direito a não ser discriminado com base na
orientação sexual 97E.2.e Conclusão 98
VIII‐2 98
PROIBIÇÃO DO TRÁFICO DE PESSOAS, GARANTIAS JUDICIAIS E PROTEÇÃO JUDICIAL EM RELAÇÃO À OBRIGAÇÃO DE RESPEITAR E GARANTIR OS DIREITOS
98
A. Argumentos das partes e da Comissão
98
B. Considerações da Corte 99
B.1 Considerações gerais sobre o tráfico de pessoas com fins de adoção e venda de crianças no âmbito do artigo 6 da Convenção
100
B.2 Apreciação das circunstâncias específicas do presente caso
104
VIII‐3 107
DIREITO À LIBERDADE PESSOAL, EM RELAÇÃO À OBRIGAÇÃO DE RESPEITAR E GARANTIR OS DIREITOS E O DEVER DE ADOTAR DISPOSIÇÕES DE DIREITO INTERNO
107
A. Argumentos das partes e da Comissão
107
B. Considerações da Corte 108
B.1 Legalidade do acolhimento residencial
110
B.2 Finalidade e idoneidade do acolhimento residencial
112
B.3 Necessidade do acolhimento residencial
113
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- 7 -
B.4 Dever de regulamentar, fiscalizar e supervisionar
116
B.5 Conclusão 118
VIII‐4 118
DIREITO AO NOME DE OSMÍN TOBAR RAMÍREZ, EM RELAÇÃO À OBRIGAÇÃO DE RESPEITAR E GARANTIR OS DIREITOS
118
A. Argumentos das partes e da Comissão
118
B. Considerações da Corte 119
VIII‐5 121
DIREITO À INTEGRIDADE PESSOAL, EM RELAÇÃO À OBRIGAÇÃO DE RESPEITAR E GARANTIR OS DIREITOS121
A. Argumentos das partes e da Comissão
121
B. Considerações da Corte 121
IX. 123
REPARAÇÕES 123
A. Parte Lesionada124
B. Medidas de restituição: 124
B.1 Restituição dos vínculos familiares da família Ramírez
124
B.1.a Restituição do vínculo familiar entre Flor de María
Ramírez Escobar, Gustavo Tobar Fajardo e os seu filho Osmín Tobar
Ramírez
125
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- 8 -
B.1.b Vinculação de Flor de María Ramírez Escobar e Osmín Tobar
Ramírez com J.R. 126
B.2 Adotar medidas para a alteração da certidão de nascimento de Osmín Tobar Ramírez e a restituição dosvínculos legais familiares
127
C.
Obrigação de investigar os fatos deste caso
128
D.
Medidas de satisfação e garantias de não repetição
129
D.1 Realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional
129
D.2 Elaborar um documentário audiovisual
129
D.3 Publicação da Sentença 130
D.4 Fortalecimento da supervisão e controle da institucionalização de crianças
130
E. Outras medidas solicitadas 131
F. Indenizações compensatórias 133
F.1 Dano material 133
F.2 Dano imaterial 134
G. Custas e despesas 134
H.
Restituição das despesas ao Fundo de Assistência Legal de Vítimas
136
I.
Modalidade de cumprimento dos pagamentos ordenados
136
X PONTOS RESOLUTIVOS 137
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- 9 -
1I2INTRODUÇÃO DA CAUSA E OBJETO DA CONTROVÉRSIA
1. O caso submetido à Corte. - Em 12 de fevereiro de 2016, em
conformidade com odisposto nos artigos 51 e 61 da Convenção
Americana e o artigo 35 do Regulamento daCorte, a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (doravante "a
ComissãoInteramericana" ou "a Comissão") submeteu à jurisdição da
Corte Interamericana ocaso Irmãos Ramírez e família contra a
República da Guatemala (doravante "o Estado"ou "Guatemala"). De
acordo com a Comissão, o caso se relaciona a adoçãointernacional,
mediante trâmite extrajudicial, das crianças Osmín Ricardo
TobarRamírez e J.R.2, de sete e dois anos de idade respectivamente,
no mês de junho de1998, depois da institucionalização de ambos os
irmãos desde 9 de janeiro de 1997 e aposterior declaração de um
suposto estado de abandono. A Comissão determinou que,tanto a
decisão inicial de institucionalização quanto a declaração judicial
do estado deabandono, não cumpriram com as obrigações substantivas
e processuais mínimas parapoder ser considerados acordes com a
Convenção Americana. As supostas vítimasneste caso são Osmín
Ricardo Tobar Ramírez e os seus pais biológicos, Flor de
MaríaRamírez Escobar e Gustavo Tobar Fajardo. A condição de suposta
vítima de J.R. e a suaparticipação no presente caso é examinada e
determinada no capítulo V destaSentença.
2. Trâmite perante a Comissão. - A tramitação perante a Comissão
seguiu os seguintespassos:
a) Petição. – Em 1 de agosto de 2006, a Associação Casa Alianza,
o Movimento Socialpelos Direitos da Criança e o Centro pela Justiça
e Direito Internacional (CEJIL)(doravante “os representantes”)
apresentaram a petição inicial, em representação dassupostas
vítimas.
b) Relatório de Admissibilidade. - Em 19 de março de 2013, a
Comissão aprovou oRelatório de Admissibilidade No. 8/133.
2 Neste caso,a Corte, a Corte concedeu a reserva de identidade
solicitada pelos representantes em favor dosegundo filho de Flor de
María Ramírez Escobar e a sua família adotiva, pelo qual, serão
utilizadas as siglas “J.R.” parase referir ao segundo filho da
senhora Ramírez Escobar, “T.B.” para se referir ao seu pai adotivo,
“J.B.” para se referirà sua mãe adotiva, bem como “matrimônio B.”
ou “família B.” quando se fizer referência ao casal ou à família
adotivade J.R. De forma conjunta.
3 Cfr. CIDH, Relatório No. 8/13, Petição 793-06,
Admissibilidade, Irmãos Ramírez e família, Guatemala, 19de março de
2013.
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c) Relatório de Mérito. - Em 28 de outubro de 2015, a Comissão
aprovou o Relatório deMérito No. 72/15 no qual chegou a uma série
de conclusões e elaborou váriasrecomendações para o Estado:
● Conclusões. - A Comissão concluiu que o Estado da Guatemala
era responsável pelaviolação dos artigos 5, 7, 8, 11, 17, 18, 19 e
25 da Convenção Americana, comrelação aos artigos 1.1. e 2 do mesmo
instrumento, em prejuízo de Osmín RicardoTobar Ramírez, J.R., Flor
de María Ramírez Escobar e Gustavo Tobar Fajardo.
● Recomendações. - Consequentemente, a Comissão fez ao Estado
uma série derecomendações, com relação a:
1. Reparar integralmente as violações de direitos humanos
declaradas norelatório no aspecto material e moral.
2. Realizar, no prazo mais breve possível, uma pesquisa séria,
empenhandotodos os esforços, para determinar o paradeiro de
J.R.
3. Estabelecer de forma imediata um processo orientado à real
vinculaçãoentre a senhora Flor de María Ramírez Escobar e o senhor
GustavoTobar Fajardo com as crianças Ramírez, segundo os desejos
destesúltimos e considerando a sua opinião.
4. O Estado deve oferecer, de forma imediata, o tratamento
médico epsicológico ou psiquiátrico para as vítimas que assim o
solicitarem.
5. Dispor das medidas administrativas, disciplinares ou
penaiscorrespondentes às ações ou omissões dos funcionários
públicos queparticiparam dos presentes fatos.
6. Adotar as medidas de não repetição necessárias, incluindo
medidaslegislativas e de outro tipo para garantir que tanto na
suaregulamentação quanto na prática, as adoções na Guatemala
seajustem aos padrões internacionais estabelecidas no
relatório.
a) Notificação do Relatório de Mérito. - O Relatório de Mérito
foi notificado ao Estado em12 de novembro de 2015, outorgando ao
Estado um prazo de dois meses para informarsobre o cumprimento das
recomendações. Depois de uma prorrogação, o Estado daGuatemala
remeteu um escrito em 8 de fevereiro de 2016, mediante o qual
recusou asconclusões do Relatório de Mérito e indicou, entre outras
coisas, que não cabia outorgarqualquer tipo de reparação às
vítimas, uma vez que o Estado “[tinha] garanti[do] atodo o momento
os direitos humanos dos irmãos Ramírez, uma vez que procurou obem
supremo deles perante a necessidade de ser integrados a uma
família”.
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1. Submissão à Corte. – Em 12 de fevereiro de 2016 a Comissão
submeteu o presentecaso à Corte “pela necessidade de obtenção de
justiça para as vítimas do caso”. AComissão nomeou como delegados o
Comissionado Enrique Gil Botero e o SecretárioExecutivo Emilio
Álvarez Icaza, bem como as senhoras Elizabeth
Abi-Mershed,Secretária Executiva Adjunta e Silvia Serrano Guzmán
além do senhor Erick AcuñaPereda, como assessoras e assessor
legais.
2. Solicitações da Comissão Interamericana. - Com base no que
antecede, a ComissãoInteramericana solicitou a este Tribunal que se
concluísse e declarasse aresponsabilidade internacional do Estado
da Guatemala pelas violações previstas noRelatório de Mérito e que
se ordenasse ao Estado, como medidas de reparação, asrecomendações
incluídas no referido relatório (supra par. Trâmite perante a
Comissão.- A tramitação perante a Comissão seguiu os seguintes
passos:)
1II.2PROCESSO PERANTE A CORTE
1. Notificação ao Estado e aos representantes. - A submissão do
caso foi notificada aosrepresentantes das supostas vítimas e ao
Estado em 29 de março e 21 de abril de2016, respectivamente.
2. Escrito de petições, argumentos e provas. - Em 30 de maio de
2016, a Associação ElRefugio de la Niñez (Refúgio da Infância) na
Guatemala e o Centro pela Justiça e DireitoInternacional (CEJIL)
(doravante “os representantes”) apresentaram o seu escrito
depetições, argumentos e provas (doravante “escrito de petições e
argumentos”),conforme os artigos 25 e 40 do Regulamento da Corte.
Os representantes coincidiramsubstancialmente com as alegações da
Comissão e solicitaram à Corte que declarasse aresponsabilidade
internacional do Estado pela violação dos mesmos artigos
daConvenção Americana alegados pela Comissão. Adicionalmente,
alegaram a violação daproibição da escravidão e servidão (artigo 6
da Convenção) em prejuízo dos irmãosRamírez, bem como o direito de
igualdade perante a lei e a proibição da discriminação(artigos 1.1
e 24 da Convenção) em prejuízo de Flor de María Ramírez
Escobar,Gustavo Tobar Fajardo e os irmãos Ramírez. Finalmente,
solicitaram que se ordenasseao Estado adotar diversas medidas de
reparação e restituição de determinadas custas edespesas.
3. Fundo de Assistência Legal. - Mediante a Resolução de 14 de
outubro de 2016, oPresidente da Corte declarou procedente a
solicitação interposta pelas supostas vítimas,através dos seus
representantes, para se acolher ao Fundo de Assistência da
Corte4.
4 Cfr. Caso Ramírez Escobar e outros Vs. Guatemala. Fundo de
Assistência Legal de Vítimas. Resolução doPresidente da Corte de 14
de outubro de 2016. Disponível
em:http://www.corteidh.or.cr/docs/asuntos/Ramírezescobar_fv_16.pdf
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4. Escrito de contestação. - Em 23 de novembro de 2016, o Estado
apresentou perante aCorte o seu escrito de contestação à submissão
do caso por parte da Comissão e deobservações feitas no escrito de
petições e argumentos (doravante "escrito decontestação")5. Nesse
escrito, o Estado reconheceu algumas violações alegadas,contestou
outras e respondeu às solicitações de reparação.
5. Observações ao reconhecimento parcial de responsabilidade.-
Em 9 de janeiro de 2017a Comissão e os representantes apresentaram
as suas observações ao reconhecimentoparcial de responsabilidade
realizado pelo Estado.
6. Audiência pública. - Em 11 de abril de 2017, o Presidente
emitiu uma Resoluçãomediante a qual convocou o Estado, os
representantes e a Comissão Interamericanapara a celebração de uma
audiência pública, a respeito do mérito, reparações e custas,para
ouvir as alegações finais orais das partes e as observações finais
orais daComissão a respeito desses temas6. Da mesma forma, mediante
a referida Resolução,ordenou-se receber as declarações perante
agente dotado de fé pública (affidavit) deuma suposta vítima, uma
testemunha e nove peritos. Posteriormente, perante asolicitação do
Estado, também se ordenou receber a declaração de outra
testemunhamediante affidavit7 Os affidavit foram apresentados pelos
representantes nos dias 12 e16 de maio de 2017, e pela Comissão e o
Estado em 17 de maio de 2017.Adicionalmente, mediante a referida
Resolução, foram chamados a testemunhar naaudiência pública duas
supostas vítimas e um perito. A audiência pública foi celebradaem
22 de maio de 2017, durante o 118 Período Ordinário de Sessões da
Corte,
5 Em 21 de abril de 2016, o Estado nomeou como Agentes a Carlos
Rafael Asturias Ruiz, Steffany RebecaVásquez Barillas y Cesar
Javier Moreira Cabrera. Posteriormente, no seu escrito de
contestação de 23 de novembro de2016, informou que a Guatemala
seria representada neste caso pelo Presidente da Comissão
Presidencial,Coordenação da Política do Executivo em Matéria de
Direitos Humanos (COPREDEH), o senhor Victor Hugo Godoy, epela
Diretora Executiva do COPREDEH, a senhora María Ortiz Samayoa. Em
26 de setembro de 2017, a Guatemalainformou que nomeou um novo
presidente da COPREDEH, o senhor Jorge Luis Borrayo Reyes. Em 6 de
novembro de2017, informou que a nomeação do novo Diretor Executivo
da COPREDEH, o senhor Felipe Sánchez González.Portanto, a Corte
entende que, no momento da emissão desta Sentença, os Agentes do
Estado para o presente casosão Jorge Luis Borrayo Reyes, Presidente
da COPREDEH, e Felipe Sánchez González, Diretor Executivo da
COPREDEH.
6 Cfr. Caso Ramírez Escobar e outros Vs. Guatemala. Convocação
de audiência. Resolução do Presidente daCorte de 11 de abril de
2017. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/a
suntos/Ramírez_11_04_17.pdf .
7 A testemunha proposto pelo Estado, Erick Benjamín Patzán
Jiménez, foi convocada a declarar na audiênciapública na Resolução
do Presidente de 11 de abril de 2017. No entanto, em 9 de maio de
2017, o Estado informou que“não c[ontava] com os recursos
suficientes e necessários para arcar com as despesas de
deslocamento” de ErickBenjamín Patzán, pelo qual solicitou que a
sua declaração fosse apresentada mediante agente dotado de fé
pública.Em 12 de maio de 2017, mediante as notas da Secretaria, as
partes e a Comissão foram informadas que, perante aimpossibilidade
de comparecimento do senhor Erick Benjamín Patzán na audiência
pública convocada, o Presidentetinha disposto que a declaração da
testemunha Patzán fosse recebida mediante afidávit.
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realizado na sua sede8. No transcurso dessa audiência, os Juízes
da Corte solicitaramdeterminada informação e explicações às partes
e à Comissão.
7. Alegações fatos supervenientes.- Em 16 de maio de 2017 os
representantesapresentaram informação sobre alegados fatos
supervenientes. O Estado apresentou assuas observações sobre esses
fatos nas suas alegações finais escritas (infra par.Alegações e
observações finais escritas. - Em 22 de junho de 2017, os
representantes eo Estado apresentaram as suas alegações finais
escritas, bem como determinadosanexos, e a Comissão apresentou as
suas observações finais escritas.). A Comissão nãoapresentou
observações a tal respeito.
8. Amicus curiae. – O Tribunal recebeu um escrito na condição de
amicus curiae por parteda Clinic on Policy Advocacy in Latin
America de New York University9 sobre “as adoçõesinternacionais
ilegais que se desenvolveram na Guatemala depois do
conflito,explorando crianças e as suas famílias” e “os estereótipos
sobre a pobreza, gênero eorientação sexual usados para justificar a
intervenção do Estado na família”.
9. Alegações e observações finais escritas. - Em 22 de junho de
2017, os representantes eo Estado apresentaram as suas alegações
finais escritas, bem como determinadosanexos, e a Comissão
apresentou as suas observações finais escritas.
10.Distribuições em aplicação do Fundo de Assistência. - Em 12
de outubro de 2017 foitransmitido ao Estado o relatório sobre as
distribuições realizadas com crédito ao Fundode Assistência Legal
da Corte no presente caso e os seus anexos. O Estado nãoapresentou
observações a tal respeito.
11.Prova e informação para melhor resolver. - As partes
apresentaram a informação eprova para melhor resolver solicitada
pelos Juízes na audiência pública junto com assuas alegações finais
escritas. Adicionalmente, em 24 de novembro de 2017, oPresidente da
Corte solicitou ao Estado e aos representantes a apresentação
deinformação e a outra prova para melhor resolver. Os
representantes apresentaram essainformação em 1 e 20 de dezembro de
2017. O Estado apresentou parte dessainformação nos dias 1 e 20 de
dezembro de 2017.
12.Observações à informação e prova para melhor resolver e à
prova superveniente sobredespesas. – Em 27 de julho de 2017 os
representantes apresentaram as suas
8 Nessa audiência, compareceram: a) pela Comissão
Interamericana: as advogadas da Secretaria Executiva,Silvia Serrano
Guzmán e Selene Soto Rodríguez; b) pelos representantes das
supostas vítimas: de CEJIL, MarciaAguiluz, Gisela De León Esther
Beceiro, Carlos Luis Escoffié e de El Refugio de la Niñez, Monica
Mayorga e LeonelDubón, e c) pelo Estado da Guatemala: o embaixador
Juan Carlos Orellana Juárez, o Presidente da COPREDEH, VíctorHugo
Godoy e a Diretora de Acompanhamento de casos internacionais da
COPREDEH, Wendy Cuellar Arrecis.
9 O escrito foi assinado pelo Professor Eduardo A. Bertoni e a
Professora Florencia Saulino.
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observações à documentação apresentada pelo Estado com as suas
alegações finaisescritas. Na mesma data, a Comissão informou que
não tinha observações. O Estadonão apresentou observações aos
anexos apresentados pelos representantes com assuas alegações
finais escritas. Adicionalmente, nos dias 11 e 12 de dezembro de
2017,as partes e a Comissão apresentaram as suas observações à
documentaçãoapresentada em 1 de dezembro de 2017, bem como em 8 de
janeiro de 2018, osrepresentantes apresentaram as suas observações
à documentação apresentada peloEstado em 20 de dezembro de
2017.
13.Deliberação do caso presente. - A Corte iniciou a deliberação
da presente Sentença em9 de março de 2018.
1III2COMPETÊNCIA
1. A Corte é competente para conhecer o presente caso, nos
termos do artigo 62.3 daConvenção, uma vez que a Guatemala é Estado
Parte da Convenção Americana desde25 de maio de 1978, e reconheceu
a competência contenciosa da Corte em 9 de marçode 1987.
1IV2RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO
A. Reconhecimento do Estado e observações da Comissão e
dosrepresentantes
1. O Estado realizou um reconhecimento parcial de
responsabilidade, indicando que “alegislação vigente na matéria de
adoções na época em que aconteceram os fatos dopresente caso, não
se adequava ao corpus iuris internacional, violando, desse modo,
osdireitos humanos previstos na [Convenção Americana]”. De acordo
com a Guatemala,no entanto, “a legislação atual na matéria, sim
está adequada aos padrõesinternacionais para a proteção da infância
e as adoções como último mecanismo para arestituição de direitos da
criança e adolescência”. A Guatemala elaborou o seureconhecimento a
respeito das violações alegadas da seguinte forma:
a. A respeito das alegadas violações dos artigos 5, 7 e 11 da
Convenção, em relação aoartigo 1.1 do mesmo instrumento:
i.“no presente caso, as instituições do Estado separaram as
crianças da sua mãe,uma vez que ela não garantia adequadamente a
obrigação de cuidar e protegeros seus filhos. Uma denúncia levou a
Procuradoria Geral da Nação (PGN) aretirar as crianças da sua mãe
por se encontrarem em situação de risco (semcuidado de um adulto e
desprotegidos) e foram colocados em um abrigo,
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institucionalizados, a fim de protegê-los. Esses processos eram
previstos na Leivigente na época”.
ii.A “ação de determinadas instituições públicas refletidas no
relatório de méritodenota que poderia ter sido vulnerado o[s]
direito[s] garantido[s] nos [artigos]7 e 11 da [Convenção] dos
irmãos Ramírez, entre outros motivos, [por] teremsido internados em
uma instituição privada durante dezesseis meses e privá-losdo
contato com os seus familiares”. Além disso, considerou que “a
pesar dasações praticadas pelas instituições, lamenta que a
legislação vigente permitisseque uma declaração de abandono fosse
suficiente para que as criançaspudessem ser sujeitos de adoção,
violando, dessa forma, os seus direitos a umafamília”.
iii.“[C]onsiderando a conclusão da [Comissão], a jurisprudência
da Corte [...], aação de determinadas instâncias do Estado e a
legislação vigente na época, oEstado reconhece que, embora esses
aspectos já tenha sido harmonizados aosprincípios internacionais
vigentes, aquela situação poderia se enquadrar em umasuposta
violação ao direito à integridade pessoal (art.5) dos Irmãos
Ramírez eos seus familiares, bem como o direito à liberdade pessoal
(art. 7) e proteção àhonra e à dignidade (art. 11) dos irmãos
Ramírez”.
b. A respeito das alegadas violações dos artigos 17, 18 e 19 da
Convenção:i.“esta família foi separada devido a causas de
desproteção da mãe em relação àscrianças no seu entorno. No
entanto, a intenção do Estado era de poderrestaurar o direito a uma
família através da adoção. O Estado da Guatemalareconhece que essa
interpretação violava os direitos à família e que não seaplicavam
os preceitos que indicam que se deva dar prioridade ao entorno
ounúcleo familiar para o adequado desenvolvimento da infância e o
respeito aodireito a uma família”.
ii.“ao violar os seus direitos à integridade e família também
foi violado o seudireito ao [n]ome”. “O Estado reconhece que a
família, o nome, a nacionalidadee o vínculo familiar constituem
elementos constitutivos do direito à identidade”.
iii.“[o] Estado considera que neste caso, efetivamente, foram
violados os direitosdos irmãos Ramírez; pois nem a família nem o
Estado, na sua condição degarantia puderam garantir a sua proteção
e desenvolvimento”.
iv.“[a]tendendo às intervenções dos órgãos competentes que
separaram ascrianças da mãe biológica, tê-los internado em uma
instituição privada, e maisadiante, permitir a sua adoção
internacional e a sua residência fora do país,foram violados todos
os direitos previstos nos artigos 17, 18 e 19[,] em prejuízodos
irmãos Ramírez”.
c. A respeito das alegadas violações dos artigos 8 e 25 da
Convenção:i.“[o] Estado reconhece e lamenta que, embora houvesse na
legislação processosjudiciais previamente estabelecidos, e
existissem meios de contestaçãocorrespondentes, estes - ao ser
apresentados - foram mal tramitados por partedos juízes e não se
resolveu em conformidade com o direito.
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ii.“atendendo o compromisso internacional assumido de proteger e
garantir osdireitos previstos na [Convenção], o [E]stado lamenta
que nesse caso específicodos irmãos Ramírez, tenha sido viola[do] o
direito ao devido processo e,consequentemente, os direitos
reconhecidos nos artigos 8 e 25 [daConvenção]”.
1. A respeito das reparações, o Estado realizou considerações
individuais a respeito decada uma das medidas de reparação.
Solicitou à Corte que levasse em consideração ajurisprudência nessa
matéria, que o Estado implementou “reformas nos processos deadoções
através de leis vigentes que estão em harmonia com os Princípios e
Tratadosinternacionais de proteção da criança e em matéria de
adoções”, bem como que “acapacidade financeira do Estado da
Guatemala é muito limitada”. Da mesma forma,embora tenha
reconhecido violações em prejuízo de J.R., alegou que “no presente
casodevem ser considerados como titulares de direito à reparação
[…] Osmín RicardoAmilcar Tobar Ramírez, Flor de María Ramírez
Escobar e Gustavo Amilcar TobarFajardo”, na medida em que J.R. “Não
deseja[va] saber nada do presente processo”,pelo qual não deveria
ser considerado nas reparações propostas.
2. Na audiência pública reiterou as suas considerações em
relação às violações alegadas eprecisou, sobre os fatos, que:
o Estado da Guatemala reconheceu a responsabilidade
internacional pelos fatos que constamno Relatório de Mérito [...],
referente à falta de adequação de uma normativa deproteção à
criança e adolescência que cumpra com os padrões internacionais com
relaçãoao corpus juris internacional em matéria de proteção da
criança e adoções. Emconformidade com o afirmado no escrito de
contestação da ação, nos parágrafos de 14 a23, o Estado reconhece
que Osmín Ricardo e J.R. puderam ser objeto de uma violaçãodos
direitos humanos, no que se refere ao artigo 5.1 sobre integridade
pessoal, artigo 7sobre a liberdade pessoal, artigo 7 sobre a
liberdade pessoal e o artigo 11 sobre a honrae a dignidade
decorrente da separação dos seus pais, mesmo quando nos fatos do
casonão sejam demonstrados terem sido objeto de humilhações ou maus
tratos na instituiçãode abrigo.
3. Nas suas alegações finais escritas, o Estado informou que
“reitera os argumentosapresentados durante o processo
internacional, portanto, caberá à [...] Cortedeterminar as supostas
violações alegadas contra o Estado, conforme as
provasapresentadas”. Da mesma forma, informou que “as provas
apresentadas no processointernacional deverão determinar a
existência do dano causado, uma vez que asreparações (se ordenadas)
dependerão da gravidade dos fatos alegados como violaçõesao
Direitos Humanos”. Adicionalmente, esclareceu que não se podia
atribuirresponsabilidade internacional pela suposta violação à
proibição da escravidão eservidão, consagrada no artigo 6 da
Convenção, “por não se configurarem os elementospelos quais se
poderia considerar que se cometeu tráfico de pessoas ou alguma
outraforma contemporânea de escravidão ou servidão”.
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- 17 -
4. A Comissão “avaliou positivamente” o reconhecimento realizado
pelo Estado dconsiderou que “constitui um passo construtivo no
presente processo internacional”. Noentanto, considerou que “o
reconhecimento é sumamente limitado” e que o presentecaso é muito
mais amplo que a simples vigência de um marco normativo
incompatívelcom a Convenção em matéria de adoções, o qual parece
estar sendo limitado peloEstado. Destacou que o Estado reconheceu
as violações aos artigos 5, 7 e 11 daConvenção “em termos
condicionais”. Além disso, destacou que “a maioria dasviolações”
foi reconhecida em prejuízo dos irmãos Ramírez, mas não em prejuízo
dosdemais membros da família. De acordo com a Comissão, a única
violação que o Estadoestaria reconhecendo em prejuízo de Flor de
María Ramírez Escobar e Gustavo TobarFajardo é a violação da sua
integridade pessoal, pelo qual se manteria a controvérsia arespeito
da violação dos direitos consagrados nos artigos 8, 11, 17 e 25 em
seuprejuízo. Adicionalmente, observou que, embora o Estado tenha
reconhecidoexpressamente a violação do artigo 2 da Convenção,
destacou que a legislação vigenteem matéria de adoções na época em
que aconteceram os fatos do caso, não seadequava ao corpus iuris
internacional. De acordo com a Comissão, “[e]ssa formulaçãoparece
estar dirigida a reconhecer a violação do artigo 2 da Convenção”.
Por último, aComissão destacou que “a descrição fática que o Estado
realiza sobre as violaçõesreconhecidas, não incorpora a totalidade
dos fatos nos termos em que foram analisadosno Relatório de Mérito
à luz dos mesmos artigos”. Destacou que, embora o Estadotenha
invocado todos os direitos, ao indicar os motivos desse
reconhecimento, aGuatemala exclui múltiplos elementos de fato que
foram considerados pela Comissão eacrescenta algumas “afirmações
que são alheias” às determinações do Relatório deMérito. Em virtude
disso, a Comissão alegou que era necessário que a Corte
realizasseum estudo detalhado dos fatos e das violações à Convenção
Americana.
5. Os representantes alegaram que, “embora o reconhecimento
realizado pelo Estadofavoreça a solução do litígio e reflita uma
atitude positiva [...], não contribui realmenteao estabelecimento
da verdade e não esgota as questões apresentadas perante este[...]
Tribunal”. Indicaram que o reconhecimento de responsabilidade por
parte daGuatemala “é ambíguo, confuso e, ocasionalmente,
contraditório” e que a sua atitudeao longo desse processo “não
condiz com a existência de um reconhecimento deresponsabilidade e,
portanto, não contribui para a reparação do dano
causado”.Registraram que o Estado tinha reconhecido “diretamente” a
sua responsabilidadeinternacional a respeito da violação aos
artigos 8, 17, 18, 19 e 25 da ConvençãoAmericana, enquanto que
tinha negado, adotado uma posição ambígua ou omitido fazerqualquer
referência a respeito das demais violações. A respeito das
violações que aGuatemala reconhece, destacaram entender que com
isso o Estado “aceit[a] a suaresponsabilidade internacional a
respeito de todos os fatos implicaram a separaçãoarbitrária das
crianças Ramírez dos seus pais biológicos (tudo o relacionado com
oprocesso de institucionalização, o processo de declaração de
abandono, bem como oprocesso de adoção internacional), fatos que
igualmente violaram a proteção especial àqual estavam sujeitos, bem
como o direito ao nome”. Em virtude disso, conforme
osrepresentantes, “a aceitação de responsabilidade realizada pelo
Estado abrange asgraves negligências e irregularidades acontecidas
tanto no processo de declaração de
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- 18 -
abandono, na tramitação dos recursos interpostos contra essa
declaração, e noprocesso extrajudicial de adoção das crianças, bem
como a ausência de investigaçãodas mesmas”.
6. Da mesma forma, indicaram que, uma vez que o Estado omitiu se
pronunciar sobre asviolações alegadas dos artigos 6 e 24 da
Convenção, persiste a controvérsia a respeitodessas violações. Além
disso, alegaram que a Guatemala foi ambígua em reconhecer
asviolações aos artigos 5, 7 e 11 da Convenção Americana, uma vez
que “o Estado dizque tais violações poderiam ter se configurado,
mas não aceita com clareza a suaresponsabilidade a respeito das
mesmas”. Os representantes entendem que “daambiguidade expressada
pelo Estado não se pode depreender que exista uma aceitaçãoda
responsabilidade que lhe cabe perante as violações
configuradas,consequentemente, a controvérsia sobre elas persiste”.
Alegaram que, embora oEstado reconheça a senhora Ramírez Escobar e
o senhor Tobar Fajardo como vítimas dealgumas violações, “não
reconhece o seu direito a serem reparados e assume umaposição
revitimizante”. Alegaram que era contraditório que o Estado aceite
a suaresponsabilidade pelas violações aos artigos 8 e 25 da
Convenção e, ao mesmo tempo,continue afirmando que a mãe deixou de
proteger os seus filhos, justificando, assim,uma decisão que
claramente foi arbitrária e ignorando o impacto que teve sobre
afamília. Em virtude disso, consideraram que persiste a
controvérsia sobre os danossofridos por Flor de María Ramírez
Escobar e Gustavo Tobar Fajardo e as consequênciasreparações.
7. A respeito das medidas de reparação, indicaram que o Estado
não reconhece a maioriadas medidas de reparação propostas e que a
ambiguidade do seu reconhecimentotambém alcança às reparações.
Assinalaram que, “[e]mbora as autoridades declarem asua boa
vontade, isso não surge com clareza e a contundência necessária
paraconsiderar que o referido reconhecimento terá efeitos concretos
na vida das vítimas docaso nem para abordar o contexto que deu
origem às violações expostas”. Em suma,alegaram que persiste a
controvérsia com relação às reparações, uma vez que nospontos em
que o Estado declara aceitar o que é proposto, “o faz de forma
incompletae/ou ambígua, não dando certeza sobre a sua vontade de
reparar as vítimas de formaintegral”.
A. Considerações da Corte
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- 19 -
1. Em conformidade com os artigos 62 e 64 do Regulamento10, e no
exercício das suasfaculdades de tutela judicial internacional de
direitos humanos, questão de ordempública internacional que
transcende a vontade das partes, cabe ao Tribunal zelarporque os
atos de conhecimento sejam aceitáveis para as finalidades que busca
cumpriro sistema interamericano. Essa tarefa não se limita a
constatar, registrar ou tomar notado reconhecimento realizado, ou
as suas condições formais, mas que deve confrontá-los com a
natureza e a gravidade das violações alegadas, as exigências e o
interesse dajustiça, as circunstâncias particulares do caso
concreto, e a atitude e posição daspartes11, de forma tal que possa
precisar, assim que possível, e no exercício da suacompetência, a
verdade judicial do acontecido12. Nesse sentido, o reconhecimento
nãopode ter por consequência limitar, direta ou indiretamente, o
exercício das faculdadesda Corte de conhecer o caso que lhe foi
submetido13 e resolver se, nesse sentido, houveuma violação de um
direito ou liberdade protegidos na Convenção14. A tais efeitos,
esteTribunal analisa a situação apresentada em cada caso
concreto15.
10 Os artigos 62 e 64 do Regulamento da Corte estabelecem:
“Artigo 62. Reconhecimento. "Se o demandadocomunicar à Corte sua
aceitação dos fatos ou seu acatamento total ou parcial das
pretensões que constam nasubmissão do caso ou no escrito das
supostas vítimas ou seus representantes, a Corte, ouvido o parecer
dos demaisintervenientes no processo, resolverá, no momento
processual oportuno, sobre sua procedência e seus
efeitosjurídicos". “Artigo 64. Continuação da análise do caso. “A
Corte, considerando as responsabilidades que lhe cabem deproteger
os direitos humanos, poderá decidir pelo prosseguimento da análise
do caso, mesmo na presença dos casosprevistos nos artigos
precedentes".
11 Cfr. Caso Kimel Vs. Argentina. Mérito, Reparações e Custas.
Sentença de 2 de maio de 2008. Série C No. 177,par. 24, e Caso
Vereda La Esperanza Vs. Colômbia. Exceções Preliminares, Mérito,
Reparações e Custas. Sentença dequinta-feira, 31 de agosto de 2017
Série C No. 341, par. 21.
12 Cfr. Caso Manuel Cepeda Vargas Vs. Colômbia. Exceções
Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentençade 26 de maio de
2010. Série C No. 213, par. 17, e Caso Vereda La Esperanza Vs.
Colômbia, supra, par. 21.
13 O artigo 62.3 da Convenção estabelece: ”[A] Corte tem
competência para conhecer qualquer caso relacionadoà interpretação
e aplicação das disposições desta Convenção que seja a ela
submetido, sempre que os Estados Partesno caso tenha, reconhecido
ou reconheçam tal competência, ora por declaração especial, como se
indica nos incisosanteriores, ora por convenção especial.”
14 O artigo 63.1 da Convenção estabelece: “[q]uando decidir que
houve violação de um direito ou liberdadeprotegido nesta [a]
Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o
gozo de seu direito ouliberdade violados. Determinará também, se
isso for procedente, que sejam reparadas as consequências da medida
ousituação que haja configurado a violação desses, bem como o
pagamento de indenização justa à parte lesada”.
15 Cfr. Caso Myrna Mack Chang Vs. Guatemala. Sentença de 25 de
novembro de 2003 Série C No. 101, par. 105, eCaso Ortiz Hernández e
outros Vs. Venezuela. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 22
de agosto de 2017. SérieC No. 338, par. 22.
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1B.1 Sobre os fatos
1. Neste caso, o Estado apresentou o seu reconhecimento parcial
de responsabilidadesobre as violações à Convenção Americana
alegadas, sem admitir de forma clara eespecífica quais fatos
descritos no Relatório de Mérito da Comissão ou no escrito
depetições e argumentos dos representantes davam sustentação ao
referidoreconhecimento. Em outros casos16, este Tribunal considerou
que em casos como opresente, deve-se entender que o Estado aceitou
os fatos que, conforme o Relatório deMérito - marco fático desse
processo -, configuraram as violações reconhecidas nostermos em que
o caso foi submetido. No entanto, a Corte considera que neste
caso,embora o Estado não tenha sido claro nem detalhado, realizou
sim algumas declaraçõessobre os fatos que davam sustentação ao seu
reconhecimento. Algumas dessasafirmações não constituem um
reconhecimento de fatos senão uma versão diferente àalegada pela
Comissão e os representantes (especialmente tudo o que se refere
àsuposta “desproteção” dos seus filhos por parte da senhora Flor de
María RamírezEscobar) (supra par. O Estado realizou um
reconhecimento parcial de responsabilidade,indicando que “a
legislação vigente na matéria de adoções na época em queaconteceram
os fatos do presente caso, não se adequava ao corpus iuris
internacional,violando, desse modo, os direitos humanos previstos
na [Convenção Americana]”. Deacordo com a Guatemala, no entanto, “a
legislação atual na matéria, sim estáadequada aos padrões
internacionais para a proteção da infância e as adoções comoúltimo
mecanismo para a restituição de direitos da criança e
adolescência”. AGuatemala elaborou o seu reconhecimento a respeito
das violações alegadas daseguinte forma:.A respeito das alegadas
violações dos artigos 17, 18 e 19 daConvenção:). Na audiência
pública, o Estado tentou esclarecer que o reconhecimento sebaseava
nos fatos contidos no Relatório de Mérito, no entanto, novamente
limitou oreconhecimento a uma parte desses fatos, fazendo
referência às “possíveis” violaçõescometidas (supra par. Na
audiência pública reiterou as suas considerações em reralaçãoàs
violações alegadas e precisou, sobre os fatos, que:).
2. A Corte lembra que, para considerar um ato do Estado como um
reconhecimento deresponsabilidade, a sua intenção nesse sentido
deve ser clara17. Portanto, este Tribunalentende que o
reconhecimento do Estado compreende aqueles fatos, tal como
foramalegados pela Comissão e os representantes, que servem de
fundamento às violaçõesde direitos convencionais que o Estado
reconheceu sem reservas e de forma clara (infra
16 Cfr. Caso Zambrano Vélez e outros Vs. Equador. Mérito,
Reparações e Custas. Sentença de 4 de julho de 2007.Série C No. 16,
par. 17, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru.
Exceções Preliminares, Mérito,Reparações e Custas. Sentença de
terça-feira, 1 de setembro de 2015 Série C No. 299, par. 24.
17 Cfr. Caso Gelman Vs. Uruguai. Mérito e Reparações. Sentença
de 24 de fevereiro de 2011 Série C No.221,par. 28, e Caso Vásquez
Durand e outros Vs. Equador. Exceções Preliminares, Mérito,
Reparações e Custas. Sentençade 15 de fevereiro de 2017. Série C
No. 332, par. 47.
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- 21 -
par. Consequentemente, considerando as manifestações do Estado,
bem como asobservações dos representantes e da Comissão, a Corte
considera que a controvérsiacessou a respeito da violação do
direito à proteção da família (artigo 17), o direito aonome (artigo
18) e os direitos da criança (artigo 19), em prejuízo de Osmín
RicardoTobar Ramírez e o seu irmão, J.R., bem como das garantias
judiciais (artigo 8) e aproteção judicial (artigo 25), em prejuízo
de Osmín Ricardo Tobar Ramírez e J.R.),assim como aqueles fatos
referidos pelo próprio Estado na sua contestação de formaexpressa e
que coincidem com o alegado pela Comissão e os representantes (tais
comoa referência a não considerar outras opções exceto a adoção
internacional depois dadeclaração de abandono e a má condução dos
recursos) (supra par. O Estado realizouum reconhecimento parcial de
responsabilidade, indicando que “a legislação vigente namatéria de
adoções na época em que aconteceram os fatos do presente caso, não
seadequava ao corpus iuris internacional, violando, desse modo, os
direitos humanosprevistos na [Convenção Americana]”. De acordo com
a Guatemala, no entanto, “alegislação atual na matéria, sim está
adequada aos padrões internacionais para aproteção da infância e as
adoções como último mecanismo para a restituição de direitosda
criança e adolescência”. A Guatemala elaborou o seu reconhecimento
a respeito dasviolações alegadas da seguinte forma: e infra par.
Consequentemente, a Corte entendeque a Guatemala reconheceu os
fatos referentes à (i) legislação em matéria de adoçãovigente na
época dos fatos e a sua falta de adequação aos padrões
internacionaisvigentes para a Guatemala na época dos fatos; (ii) a
forma como foi realizada aseparação de Osmín Tobar Ramírez e J.R.
da sua mãe, Flor de María Ramírez Escobar,embora não os motivos
dessa separação; (iii) a institucionalização de Osmín TobarRamírez
e J.R. imediatamente depois da separação da sua mãe por um período
dedezessete meses, sem permitir-lhes qualquer tipo de contato com a
sua família, masnão as demais condições dessa institucionalização;
(iv) a concessão das adoçõesinternacionais uma vez declarado o
abandono das crianças; (v) a ausência deconsideração de outros
familiares como opções de cuidado antes das adoçõesinternacionais;
e (vi) as irregularidades cometidas pelas autoridades judiciais
naresolução dos recursos interpostos contra a declaração de
abandono e os processos deadoção. ).
3. Consequentemente, a Corte entende que a Guatemala reconheceu
os fatos referentes à(i) legislação em matéria de adoção vigente na
época dos fatos e a sua falta deadequação aos padrões
internacionais vigentes para a Guatemala na época dos fatos;(ii) a
forma como foi realizada a separação de Osmín Tobar Ramírez e J.R.
da sua mãe,Flor de María Ramírez Escobar, embora não os motivos
dessa separação; (iii) ainstitucionalização de Osmín Tobar Ramírez
e J.R. imediatamente depois da separaçãoda sua mãe por um período
de dezessete meses, sem permitir-lhes qualquer tipo decontato com a
sua família, mas não as demais condições dessa institucionalização;
(iv)a concessão das adoções internacionais uma vez declarado o
abandono das crianças;(v) a ausência de consideração de outros
familiares como opções de cuidado antes dasadoções internacionais;
e (vi) as irregularidades cometidas pelas autoridades judiciaisna
resolução dos recursos interpostos contra a declaração de abandono
e os processosde adoção.
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1B.2 Sobre as pretensões de direito
1. O Estado reconheceu determinadas violações de forma clara e
sem reservas, mastambém se referiu como “reconhecimentos” a
manifestações realizadas de formacondicional, ambígua e confusa.
Este Tribunal reitera as suas considerações a respeitoda clareza
necessária na manifestação de um reconhecimento (supra par. A
Cortelembra que, para considerar um ato do Estado como um
reconhecimento deresponsabilidade, a sua intenção nesse sentido
deve ser clara. Portanto, este Tribunalentende que o reconhecimento
do Estado compreende aqueles fatos, tal como foramalegados pela
Comissão e os representantes, que servem de fundamento às
violaçõesde direitos convencionais que o Estado reconheceu sem
reservas e de forma clara (infrapar. Consequentemente, considerando
as manifestações do Estado, bem como asobservações dos
representantes e da Comissão, a Corte considera que a
controvérsiacessou a respeito da violação do direito à proteção da
família (artigo 17), o direito aonome (artigo 18) e os direitos da
criança (artigo 19), em prejuízo de Osmín RicardoTobar Ramírez e o
seu irmão, J.R., bem como das garantias judiciais (artigo 8) e
aproteção judicial (artigo 25), em prejuízo de Osmín Ricardo Tobar
Ramírez e J.R.),assim como aqueles fatos referidos pelo próprio
Estado na sua contestação de formaexpressa e que coincidem com o
alegado pela Comissão e os representantes (tais comoa referência a
não considerar outras opções exceto a adoção internacional depois
dadeclaração de abandono e a má condução dos recursos) (supra par.
O Estado realizouum reconhecimento parcial de responsabilidade,
indicando que “a legislação vigente namatéria de adoções na época
em que aconteceram os fatos do presente caso, não seadequava ao
corpus iuris internacional, violando, desse modo, os direitos
humanosprevistos na [Convenção Americana]”. De acordo com a
Guatemala, no entanto, “alegislação atual na matéria, sim está
adequada aos padrões internacionais para aproteção da infância e as
adoções como último mecanismo para a restituição de direitosda
criança e adolescência”. A Guatemala elaborou o seu reconhecimento
a respeito dasviolações alegadas da seguinte forma: e infra par.
Consequentemente, a Corte entendeque a Guatemala reconheceu os
fatos referentes à (i) legislação em matéria de adoçãovigente na
época dos fatos e a sua falta de adequação aos padrões
internacionaisvigentes para a Guatemala na época dos fatos; (ii) a
forma como foi realizada aseparação de Osmín Tobar Ramírez e J.R.
da sua mãe, Flor de María Ramírez Escobar,embora não os motivos
dessa separação; (iii) a institucionalização de Osmín TobarRamírez
e J.R. imediatamente depois da separação da sua mãe por um período
dedezessete meses, sem permitir-lhes qualquer tipo de contato com a
sua família, masnão as demais condições dessa institucionalização;
(iv) a concessão das adoçõesinternacionais uma vez declarado o
abandono das crianças; (v) a ausência deconsideração de outros
familiares como opções de cuidado antes das adoçõesinternacionais;
e (vi) as irregularidades cometidas pelas autoridades judiciais
naresolução dos recursos interpostos contra a declaração de
abandono e os processos deadoção. ).). Consequentemente,
considerando as manifestações do Estado, bem comoas observações dos
representantes e da Comissão, a Corte considera que acontrovérsia
cessou a respeito da violação do direito à proteção da família
(artigo 17), o
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direito ao nome (artigo 18) e os direitos da criança (artigo
19), em prejuízo de OsmínRicardo Tobar Ramírez e o seu irmão, J.R.,
bem como das garantias judiciais (artigo 8)e a proteção judicial
(artigo 25), em prejuízo de Osmín Ricardo Tobar Ramírez e J.R.,Flor
de María Ramírez Escobar e Gustavo Amílcar Tobar Fajardo.
2. A Corte observa que o Estado não reconheceu a violação ao
artigo 17 da Convenção emprejuízo de Flor de María Ramírez Escobar
e Gustavo Amílcar Tobar Fajardo, pelo qual,entende que persiste a
controvérsia por essa violação em seu prejuízo. Da mesmaforma, a
respeito das declarações apresentadas pelo Estado como sendo
umreconhecimento com caráter condicional (supra par. O Estado
realizou umreconhecimento parcial de responsabilidade, indicando
que “a legislação vigente namatéria de adoções na época em que
aconteceram os fatos do presente caso, não seadequava ao corpus
iuris internacional, violando, desse modo, os direitos
humanosprevistos na [Convenção Americana]”. De acordo com a
Guatemala, no entanto, “alegislação atual na matéria, sim está
adequada aos padrões internacionais para aproteção da infância e as
adoções como último mecanismo para a restituição de direitosda
criança e adolescência”. A Guatemala elaborou o seu reconhecimento
a respeito dasviolações alegadas da seguinte forma:.A respeito das
alegadas violações dos artigos 5,7 e 11 da Convenção, em relação ao
artigo 1.1 do mesmo instrumento:), este Tribunalconsidera que não
se pode atribuir o caráter de reconhecimento. Essas
manifestaçõesconstituem, mas do que nada, pretensões do Estado para
que este Tribunal determineas violações à Convenção nas quais teria
incorrido, com base nas provas apresentadase nos fatos reconhecidos
(supra par. Nas suas alegações finais escritas, o Estadoinformou
que “reitera os argumentos apresentados durante o processo
internacional,portanto, caberá à [...] Corte determinar as supostas
violações alegadas contra oEstado, conforme as provas
apresentadas”. Da mesma forma, informou que “as provasapresentadas
no processo internacional deverão determinar a existência do
danocausado, uma vez que as reparações (se ordenadas) dependerão da
gravidade dosfatos alegados como violações ao Direitos Humanos”.
Adicionalmente, esclareceu quenão se podia atribuir
responsabilidade internacional pela suposta violação à proibição
daescravidão e servidão, consagrada no artigo 6 da Convenção, “por
não se configuraremos elementos pelos quais se poderia considerar
que se cometeu tráfico de pessoas oualguma outra forma
contemporânea de escravidão ou servidão”. ). Portanto,
tambémpersiste a controvérsia a respeito das alegadas violações
sobre as quais o Estado fezdeclarações condicionais, ou seja, as
violações a respeito dos direitos à integridadepessoal (artigo 5),
vida privada e familiar (artigo 11) e liberdade pessoal (artigo 7),
emprejuízo dos irmãos Ramírez, Flor de María Escobar e Gustavo
Tobar Fajardo,respectivamente, bem, como das violações alegadas à
proibição de discriminação e oprincípio de igualdade perante a lei
(artigos 1.1 e 24) e a proibição da escravidão eservidão (artigo
6), estas últimas todas negadas pelo Estado (supra par. Nas
suasalegações finais escritas, o Estado informou que “reitera os
argumentos apresentadosdurante o processo internacional, portanto,
caberá à [...] Corte determinar as supostasviolações alegadas
contra o Estado, conforme as provas apresentadas”. Da mesmaforma,
informou que “as provas apresentadas no processo internacional
deverãodeterminar a existência do dano causado, uma vez que as
reparações (se ordenadas)
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- 24 -
dependerão da gravidade dos fatos alegados como violações ao
Direitos Humanos”.Adicionalmente, esclareceu que não se podia
atribuir responsabilidade internacionalpela suposta violação à
proibição da escravidão e servidão, consagrada no artigo 6
daConvenção, “por não se configurarem os elementos pelos quais se
poderia considerarque se cometeu tráfico de pessoas ou alguma outra
forma contemporânea deescravidão ou servidão”. ).
1B.3 Sobre as reparações
1. O Estado se comprometeu a realizar ou a conceder algumas das
medidas de reparação,ofereceu realizar algumas “gestões” ou
“impulsionar” outras e se opôs a conceder asdemais. Adicionalmente,
solicitou ao Tribunal que determinasse as medidas dereparação
correspondentes, com base nas violações encontradas e o dano que
severifique no presente caso, considerando a sua jurisprudência em
matéria dereparações, bem como as limitações financeiras da
Guatemala (supra par. A respeitodas reparações, o Estado realizou
considerações individuais a respeito de cada uma dasmedidas de
reparação. Solicitou à Corte que levasse em consideração a
jurisprudêncianessa matéria, que o Estado implementou “reformas nos
processos de adoções atravésde leis vigentes que estão em harmonia
com os Princípios e Tratados internacionais deproteção da criança e
em matéria de adoções”, bem como que “a capacidade financeirado
Estado da Guatemala é muito limitada”. Da mesma forma, embora
tenhareconhecido violações em prejuízo de J.R., alegou que “no
presente caso devem serconsiderados como titulares de direito à
reparação […] Osmín Ricardo Amilcar TobarRamírez, Flor de María
Ramírez Escobar e Gustavo Amilcar Tobar Fajardo”, na medidaem que
J.R. “Não deseja[va] saber nada do presente processo”, pelo qual
não deveriaser considerado nas reparações propostas. e Nas suas
alegações finais escritas, oEstado informou que “reitera os
argumentos apresentados durante o processointernacional, portanto,
caberá à [...] Corte determinar as supostas violações
alegadascontra o Estado, conforme as provas apresentadas”. Da mesma
forma, informou que“as provas apresentadas no processo
internacional deverão determinar a existência dodano causado, uma
vez que as reparações (se ordenadas) dependerão da gravidadedos
fatos alegados como violações ao Direitos Humanos”. Adicionalmente,
esclareceuque não se podia atribuir responsabilidade internacional
pela suposta violação àproibição da escravidão e servidão,
consagrada no artigo 6 da Convenção, “por não seconfigurarem os
elementos pelos quais se poderia considerar que se cometeu tráfico
depessoas ou alguma outra forma contemporânea de escravidão ou
servidão”. ). Poroutra parte, embora o Estado tenha reconhecido
determinadas violações à ConvençãoAmericana em prejuízo de J.R.,
alegou que este não deveria ser beneficiário dasmedidas de
reparação, uma vez que não participou neste caso. Portanto, este
Tribunalverifica que a controvérsia permanece em relação à
determinação das eventuaisreparações, custas e despesas, pelo qual
determinará, no capítulo correspondente(infra Capítulo IX), as
medidas de reparação correspondentes, considerando assolicitações
da Comissão e dos representantes, a jurisprudência desta Corte
nessamatéria e as respectivas observações do Estado.
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1B.4 Valorização do reconhecimento
1. Este Tribunal valoriza o reconhecimento parcial de
responsabilidade internacionalrealizado pelo Estado. Também destaca
o compromisso declarado pelo Estadoreferente a algumas medidas de
reparação solicitadas pela Comissão e osrepresentantes, sob os
critérios que a Corte estabeleça.] Todas essas ações constituemuma
contribuição positiva ao desenvolvimento deste processo, à vigência
dos princípiosque inspiram a Convenção18 e, em parte, à satisfação
das necessidades de reparaçãodas vítimas de violações dos direitos
humanos19.
2. Como em outros casos20, a Corte considera que o
reconhecimento realizado pelo Estadoproduz plenos efeitos jurídicos
de acordo aos artigos 62 e 64 do Regulamento da Corteantes
mencionados e que tem um elevado valor simbólico em favor de que
fatossemelhantes não se repitam. Adicionalmente, a Corte adverte
que o reconhecimento defatos e violações pontuais e específicos
pode ter efeitos e consequências na análise queeste Tribunal venha
a fazer sobre os demais fatos e violações alegados, na medida emque
todos formam parte de um mesmo conjunto de circunstâncias21.
3. Em virtude do que antecede e das atribuições que lhe
correspondem como órgãointernacional de proteção dos direitos
humanos, a Corte considera necessário, atento àsespecificidades dos
fatos do presente caso y à ausência de uma investigação sobre
elesem nível interno, ditar uma sentença na qual sejam determinados
os fatos acontecidosde acordo com a prova reunida no processo deste
Tribunal, uma vez que isso contribuipara a reparação das vítimas,
para evitar que fatos semelhantes se repitam e parasatisfazer, em
suma, os fins da jurisdição interamericana sobre os direitos
humanos.
18 Cfr. Caso Benavides Cevallos Vs. Equador. Mérito, Reparações
e Custas. Sentença de 19 de junho de 1998.Série C No. 38, par. 57;
e Caso Gómez Murillo e outros Vs. Costa Rica. Sentença de 29 de
novembro de 2016. Série CNo. 326, par. 46.
19 Cfr. Caso Manuel Cepeda Vargas Vs. Colômbia, supra, par. 18,
e Caso Ruano Torres e outros Vs. El Salvador.Mérito, Reparações e
Custas. Sentença de 5 de outubro de 2015. Série C No. 303, par.
32.
20 Cfr. inter alia, Caso Torres Millacura e outros Vs.
Argentina. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 26 deagosto de
2011. Série C No. 229, par. 37, e Caso do Tribunal Constitucional
(Camba Campos e outros) Vs. Equador.Exceções Preliminares, Mérito,
Reparações e Custas. Sentença de 28 de agosto de 2013 Série C No.
268, par. 20, eCaso Rodríguez Vera e outros (Desaparecidos do
Palácio de Justiça) Vs. Colômbia. Exceções Preliminares,
Mérito,Reparações e Custas. Sentença de 14 de novembro de 2014
Série C No. 287, par. 32.
21 Cfr. Caso Rodríguez Vera e outros (Desaparecidos do Palácio
da Justiça) Vs. Colômbia, supra, par. 27, e CasoGonzales Lluy e
outros Vs. Equador. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e
Custas. Sentença de 1 de setembrode 2015 Série C No. 298, par.
49.
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- 26 -
4. Da mesma forma, e para favorecer uma melhor compreensão da
responsabilidadeinternacional pública no presente caso e do nexo
causal entre as violaçõesestabelecidas e as reparações que serão
ordenadas, a Corte considera pertinenteprecisar as violações aos
direitos humanos que aconteceram neste caso.
1V2CONSIDERAÇÃO PRÉVIA SOBRE A PARTICIPAÇÃO DE J.R.
1. Em conformidade com o artigo 35.1 do Regulamento da Corte, ao
submeter o presentecaso à Corte, a Comissão Interamericana
identificou como supostas vítimas a Flor deMaría Ramírez Escobar,
Gustavo Tobar Fajardo, Osmín Ricardo Tobar Ramírez e o seuirmão,
J.R. Tanto a Comissão quanto os representantes alegaram uma série
deviolações à Convenção Americana em prejuízo de ambos os irmãos
Ramírez. O Estadoreconheceu algumas dessas violações. No entanto,
como consta no processo, J.R. nãoparticipou em etapa alguma do
processo perante o sistema Interamericano nemmanifestou o seu
consentimento para fazer parte dele.
A. Argumentos das partes e da Comissão
1. A Comissão alegou que J.R. não deve ser excluído das
representações. De acordo coma Comissão, “a natureza dos fatos, a
duração dos efeitos de violações tão gravesquanto as do presente
caso e a complexidade dos processos que acompanham àsvítimas deste
tipo de violações”, torna razoável que a Corte estabeleça medidas
dereparação em favor de J.R., mantendo o sigilo sobre a sua
identidade e mantendo-a porum tempo razoável no caso de que este
resolva recebê-la no futuro.
2. Os representantes expressaram que “o fato de que J.R. tenha
manifestado não terinteresse neste momento do processo, não retira
dele, de forma alguma, a suacondição de vítima”. Expressaram que
ele deveria se considerar vítima qualquer pessoacujos direitos
tenham sido violados e que, ao longo do processo, o Estado
nãoapresentou qualquer elemento probatório que tornasse
controversos os fatos alegados.Alegaram que “é evidente” que assim
como o seu irmão Osmín Tobar Ramírez, os fatosdo presente caso
“afetaram gravemente os direitos de J.R., pelo qual, ele deve
serconsiderado vítima do caso. Afirmaram que “é justamente produto
dessas afetaçõesque J.[R.] resolveu não se envolver neste
processo”, pois faz apenas alguns anos queteria tido conhecimento
de que é adotado e das circunstâncias da sua adoção, peloqual, deve
ser concedido a ele um tempo prudente para processar o que
aconteceu. Emvirtude disso, solicitaram que J.R. fosse considerado
“vítima deste caso e beneficiáriodas reparações correspondentes,
guardando sigilo da sua identidade”, e fossemmantidas em suspenso
as reparações que o beneficiarem diretamente, “a fim de dar-lhe um
tempo prudente para que se pronuncie se deseja se beneficiar
delas”.
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- 27 -
3. O Estado indicou que entende que J.R. Renunciou a ser parte
deste caso. Porconseguinte, alegou que era necessário que a Corte
precisasse que não é vítima dopresente caso e, portanto, não lhe
cabia qualquer direito a reparação.
A. Considerações da Corte
1. Como mencionado anteriormente, J.R. não participou em etapa
alguma do processoperante o sistema Interamericano nem manifestou o
seu consentimento para fazerparte dele. Assim sendo, em 19 de
agosto de 2016, o Presidente da Corte remeteu umacarta a J.R.
Informando-lhe sobre a submissão do caso em seu nome,
explicando-lhealguns dados do processo perante a Corte,
solicitando-lhe que entrasse em contato como tribunal para
manifestar o seu consentimento para ser parte do processo e que,
casocontrário, seria entendido que não desejava participar nele22.
J.R. não respondeu àmensagem enviada, portanto, no fim de setembro
de 2016, o pleno da Corte resolveuque não o considerava parte deste
caso, sem prejuízo da possibilidade de quecomparecesse em alguma
etapa posterior do processo, em conformidade com o artigo29.2 do
Regulamento da Corte. Até esta data, J.R. não compareceu nem
manifestou oseu consentimento para participar no caso. No entanto,
tanto a Comissão quanto osrepresentantes tem insistido em que seja
considerado vítima das violaçõesdeterminadas no caso e beneficiário
das reparações que sejam ordenadas emconsequência. O Estado, pelo
contrário, declarou que J.R. não deveria ser beneficiáriodas
reparações que se ordenasse, apesar de reconhecer determinadas
violações contraele (supra par. O Estado realizou um reconhecimento
parcial de responsabilidade,indicando que “a legislação vigente na
matéria de adoções na época em queaconteceram os fatos do presente
caso, não se adequava ao corpus iuris internacional,violando, desse
modo, os direitos humanos previstos na [Convenção Americana]”.
Deacordo com a Guatemala, no entanto, “a legislação atual na
matéria, sim estáadequada aos padrões internacionais para a
proteção da infância e as adoções comoúltimo mecanismo para a
restituição de direitos da criança e adolescência”. AGuatemala
elaborou o seu reconhecimento a respeito das violações alegadas
daseguinte forma:.A respeito das alegadas violações dos artigos 17,
18 e 19 daConvenção:, O Estado realizou um reconhecimento parcial
de responsabilidade,indicando que “a legislação vigente na matéria
de adoções na época em queaconteceram os fatos do presente caso,
não se adequava ao corpus iuris internacional,violando, desse modo,
os direitos humanos previstos na [Convenção Americana]”. Deacordo
com a Guatemala, no entanto, “a legislação atual na matéria, sim
estáadequada aos padrões internacionais para a proteção da infância
e as adoções comoúltimo mecanismo para a restituição de direitos da
criança e adolescência”. AGuatemala elaborou o seu reconhecimento a
respeito das violações alegadas daseguinte forma:.A respeito das
alegadas violações dos artigos 8 e 25 da Convenção:
eConsequentemente, considerando as manifestações do Estado, bem
como asobservações dos representantes e da Comissão, a Corte
considera que a controvérsia
22 A comunicação foi enviada a um endereço eletrônico fornecido
pelos representantes.
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cessou a respeito da violação do direito à proteção da família
(artigo 17), o direito aonome (artigo 18) e os direitos da criança
(artigo 19), em prejuízo de Osmín RicardoTobar Ramírez e o seu
irmão, J.R., bem como das garantias judiciais (artigo 8) e
aproteção judicial (artigo 25), em prejuízo de Osmín Ricardo Tobar
Ramírez e J.R.).
2. A Corte entende a complexidade de um processo de revinculação
familiar pelo qual épossível que J.R., mesmo que até o momento não
tenha manifestado o seuconsentimento para ser parte deste caso,
poderia fazê-lo mais adiante. No entanto,lembra que se deve guardar
um justo equilíbrio entre a proteção dos direitos humanos,fim
último do sistema interamericano, e a segurança jurídica e equidade
processual quegarantem a estabilidade e a confiabilidade da tutela
internacional23. Se bem é verdadeque os processos no âmbito do
direito internacional dos direitos humanos não podemser de um
formalismo rígido, pois o seu principal e determinante cuidado é a
devida ecompleta proteção a esses direitos24, também é certo que
determinados aspectosprocessuais permitem preservar as condições
necessárias para que os direitosprocessuais das partes não sejam
diminuídos ou desequilibrados25. A segurançajurídica exige que as
supostas vítimas ou vítimas de um caso sejam definidas, a
maistardar, com o ato que põe fim à controvérsia, ou seja, a
Sentença.
3. O sistema interamericano de direitos humanos permite a
apresentação de petições porqualquer pessoa, bem como o início da
tramitação de uma petição de ofício por parteda Comissão, sem que
necessariamente as supostas vítimas26devam participar, emfavor da
proteção do interesse público. No entanto, à medida que avança o
processo deuma petição individual, é necessária cada vez mais a
participação das pessoas
23 Cfr. Caso Cayara Vs. Peru. Exceções Preliminares. Sentença de
3 de fevereiro de 1993 Série C No. 14, par.63, e Caso Valencia
Hinojosa e outra Vs. Equador. Exceções Preliminares, Mérito,
Reparações e Custas. Sentença de29 de novembro de 2016 Série C No.
327, par. 28.
24 Cfr. Caso Castillo Petruzzi e outros. Exceções Preliminares.
Sentença de 4 de setembro de 1998 Série C No.41, par. 77, y Caso
González e outras ("Campo de Algodão") Vs. México. Resolução da
Corte de 19 de janeiro de2009, considerando 45.
25 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez, Exceções Preliminares.
Sentença de 26 de junho de 1987 Série C No. 1, par. 33e 34, y Caso
González e outras ("Campo de Algodão") Vs. México. Resolução da
Corte de 19 de janeiro de 2009,considerando 45.
26 O artigo 44 da Convenção estabelece que: “Qualquer pessoa ou
grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente
reconhecida em um ou mais Estados membros da Organização, pode
apresentar àComissão petições que contenham denúncias ou queixas de
violação desta Convenção por um Estado Parte”. Ver, nomesmo
sentido, os artigos 23 e 24 do Regulamento da Comissão
Interamericana, aprovado pela Comissão no seu137° período ordinário
de sessões, celebrado de 28 de outubro a 13 de novembro de 2009; e
alterado em 2 desetembro de 2011 e no seu 147º período ordinário de
sessões, celebrado de 8 a 22 de março de 2013, para a suaentrada em
vigor em 1 de agosto de 2013.
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- 29 -
afetadas, por exemplo, para oferecer o seu consentimento para as
soluções amigáveisou a sua opinião a respeito de que o caso seja
submetido à Corte27. Uma vez que o casoé submetido à Corte, é
necessário o consentimento das supostas vítimas para ser partedo
processo28, sempre e quando seja possível, uma vez que a sua
participação por simesmas ou por intermédio dos seus representantes
é indispensável no processoperante este Tribunal.
4. As organizações representantes deste caso informaram que
“carecem de poder derepresentação expressa de J.R.”, com quem não
conseguiram estabelecer contato até apresente data. Assim sendo,
este Tribunal enviou uma mensagem a fim de fazercontato direto com
ele para lhe informar sobre a existência de um
processointernacional que diz respeito aos seus interesses e para
determinar se desejavaparticipar nele (supra par. Como mencionado
anteriormente, J.R. não participou emetapa alguma do processo
perante o sistema Interamericano nem manifestou o seuconsentimento
para fazer parte dele. Assim sendo, em 19 de agosto de 2016,
oPresidente da Corte remeteu uma carta a J.R. Informando-lhe sobre
a submissão docaso em seu nome, explicando-lhe alguns dados do
processo perante a Corte,solicitando-lhe que entrasse em contato
com o tribunal para manifestar o seuconsentimento para ser parte do
processo e que, caso contrário, seria entendido quenão desejava
participar nele. J.R. não respondeu à mensagem enviada, portanto,
nofim de setembro de 2016, o pleno da Corte resolveu que não o
considerava parte destecaso, sem prejuízo da possibilidade de que
comparecesse em alguma etapa posteriordo processo, em conformidade
com o artigo 29.2 do Regulamento da Corte. Até estadata, J.R. não
compareceu nem manifestou o seu consentimento para participar
nocaso. No entanto, tanto a Comissão quanto os representantes têm
insistido em que seja
27 O artigo 48.1.f da Convenção estabelece que “1. “A Comissão,
ao receber uma petição oucomunicação na qual se alegue violação de
qualquer dos direitos consagrados nesta Convenção, procederá da
seguintemaneira: [...] f) pôr-se-á à disposição das partes
interessadas, a fim de chegar a uma solução amistosa do
assunto,fundada no respeito aos direitos humanos reconhecidos nesta
Convenção”. Nesse sentido, o artigo 40.5 doRegulamento da Comissão
estabelece, na sua parte relevante, que “[a]ntes de aprovar [o]
relatório [de uma soluçãoamistosa], a Comissão verificará se a
vítima da presumida violação ou, se pertinente, seus beneficiários,
expressaramseu consentimento no acordo de solução amistosa”.
Também, o artigo 50.1 da Convenção Americana estabelece que,“[s]e
não se chegar a uma solução, e dentro do prazo que for fixado pelo
Estatuto da Comissão, esta redigirá umrelatório no qual exporá os
fatos e suas conclusões [...]”. Por sua vez, o artigo 44.3 do
Regulamento da Comissãoestabelece que “[a]pós deliberar e votar
quanto ao mérito do caso, a Comissão observará o seguinte processo:
[...]notificará ao peticionário sobre a adoção do relatório e sua
transmissão ao Estado. No caso dos Estados partes daConvenção
Americana que tenham aceitado a jurisdição contenciosa da Corte
Interamericana, a Comissão, ao notificaro peticionário, dar-lhe-á
oportunidade para apresentar, no prazo de um mês, sua posição a
respeito do envio do casoà Corte . O peticionário, se tiver
interesse em que o caso seja elevado à Corte, deverá fornecer os
seguinteselementos: a. a posição da vítima ou de seus familiares,
se diferentes do peticionário [...]”.
28 Nesse sentido, ver, Caso Vereda La Esperanza Vs. Colômbia,
supra, pars. 37 a 39, abem como os artigos 35,39 e 40 do
Regulamento da Corte que exigem que a Comissão informe os dados
“dos representantes das supostasvítimas devidamente comprovados” no
momento da submissão do caso; que se notifique sobre tal submissão
à“suposta vítima, os seus representantes ou o Defensor
Interamericano, se for o caso”, e que permita a apresentaçãode um
escrito de solicitações, argumentos e provas “à suposta vítima ou
aos seus representantes”.
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- 30 -
considerado vítima das violações determinadas no caso e
beneficiário das reparaçõesque sejam ordenadas em consequência. O
Estado, pelo contrário, declarou que J.R. nãodeveria ser
beneficiário das reparações que se ordenasse, apesar de
reconhecerdeterminadas violações contra ele (supra par. O Estado
realizou um reconhecimentoparcial de responsabilidade, indicando
que “a legislação vigente na matéria de adoçõesna época em que
aconteceram os fatos do presente caso, não se adequava ao
corpusiuris internacional, violando, desse modo, os direitos
humanos previstos na [ConvençãoAmericana]”. De acordo com a
Guatemala, no entanto, “a legislação atual na matéria,sim está
adequada aos padrões internacionais para a proteção da infância e
as adoçõescomo último mecanismo para a restituição de direitos da
criança e adolescência”. AGuatemala elaborou o seu reconhecimento a
respeito das violações alegadas daseguinte forma:.A respeito das
alegadas violações dos artigos 17, 18 e 19 daConvenção:, O Estado
realizou um reconhecimento parcial de responsabilidade,indicando
que “a legislação vigente na matéria de adoções na época em
queaconteceram os fatos do presente caso, não se adequava ao corpus
iuris internacional,violando, desse modo, os direitos humanos
previstos na [Convenção Americana]”. Deacordo com a Guatemala, no
entanto, “a legislação atual na matéria, sim estáadequada aos
padrões internacionais para a proteção da infância e as adoções
comoúltimo mecanismo para a restituição de direitos da criança e
adolescência”. AGuatemala elaborou o seu reconhecimento a respeito
das violações alegadas daseguinte forma:.A respeito das alegadas
violações dos artigos 8 e 25 da Convenção: eConsequentemente,
considerando as manifestações do Estado, bem como asobservações dos
representantes e da Comissão, a Corte considera que a
controvérsiacessou a respeito da violação do direito à proteção da
família (artigo 17), o direito aonome (artigo 18) e os direitos da
criança (artigo 19), em prejuízo de Osmín RicardoTobar Ramírez e o
seu irmão, J.R., bem como das garantias judiciais (artigo 8) e
aproteção judicial (artigo 25), em prejuízo de Osmín Ricardo Tobar
Ramírez e J.R.).). Noentanto, J.R. não respondeu a essa
comunicação29 e até o momento não existequalquer elemento de
informação que indique o seu interesse em participar no caso.Pelo
contrário, a pouca informação com a que conta este Tribunal,
transmitida pelo seuirmão, é que ele não deseja participar no
presente caso30.
5. A Corte adverte que o fato de J.R. não ser considerado
suposta vítima ou vítima nestaSentença, não significa que ele não
seja vítima das violações aos direitos humanospelos fatos
analisados nela. No entanto, como mencionado anteriormente, no
processo
29 Na comunicação enviada a J.R. informava-se que se não
respondesse à comunicação da Corte (fosse parasolicitar mais
informações, esclarecer dúvidas, solicitar uma prorrogação ou
manifestar o seu consentimento) seriaentendido que não desejava ser
parte do caso.
30 Os representantes explicaram que Osmín Tobar Ramírez tinha
entrado em contato com J.R. por Facebook,mas que este teria dito
que “não deseja[va] saber nada do presente processo”. Os
representantes afirmaram quedepois disso, enviaram uma comunicação
a J.R. para confirmar o que Osmín Tobar Ramírez tinha informado,
sem atéa data ter recebido resposta.
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perante esta Corte o consentimento das pessoas para serem
considerados para de umcaso, sempre e quando seja possível, é um
elemento fundamental para que a Corteadjudique responsabilidade
internacional ao Estado em seu prejuízo31. Se uma pessoanão quer
ser considerada suposta vítima ou vítima em um caso, a Corte deve
atender erespeitar essa manifestação de vontade.
6. Portanto, aos efeitos do presente caso, este Tribunal não
considerará a J.R. como partedele. Em virtude disso, não analisará
nem declarará violações em seu prejuízo, nemestabelecerá reparações
em seu favor. Isso, no entanto, não impede que a Corteanalise a
totalidade dos fatos do caso e estabeleça as violações cabíveis em
prejuízo dasua família, especialmente a sua mãe biológica, Flor de
María Ramírez Escobar e o seuirmão biológico, Osmín Tobar Ramírez.
Essa determinação também não deverá serinterpretada no sentido de
esvaziar o conteúdo ou deixar sem efeito o reconhecimentode
responsabilidade realizado pelo Estado em prejuízo de J.R. (supra
par. O Estadorealizou um reconhecimento parcial de
responsabilidade, indicando que “a legislaçãovigente na matéria de
adoções na época em que aconteceram os fatos do presentecaso, não
se adequava ao corpus iuris internacional, violando, desse modo, os
direitoshumanos previstos na [Convenção Americana]”. De acordo com
a Guatemala, noentanto, “a legislação atual na matéria, sim está
adequada aos padrões internacionaispara a proteção da infância e as
adoções como último mecanismo para a restituição dedireitos da
criança e adolescência”. A Guatemala elaborou o seu reconhecimento
arespeito das violações alegadas da seguinte forma: e O Estado
reconheceudeterminadas violações de forma clara e sem reservas, mas
também se referiu como“reconhecimentos” a manifestações realizadas
de forma condicional, ambígua econfusa. Este Tribunal reitera as
suas considerações a respeito da clareza necessária namanifestação
de um reconhecimento (supra par. A Corte lembra que, para
considerarum ato do Estado como um reconhecimento de
responsabilidade, a sua intenção nessesentido deve ser clara.
Portanto, este Tribunal entende que o reconhecimento doEstado
compreende aqueles fatos, tal como foram alegados pela Comissão e
osrepresentantes, que servem de fundamento às violações de direitos
convencionais queo Estado reconheceu sem reservas e de forma clara
(infra par. Consequentemente,considerando as manifestações do
Estado, bem como as observações dosrepresentantes e da Comissão, a
Corte considera que a controvérsia cessou a respeitoda violação do
direito à proteção da família (artigo 17), o direito ao nome
(artigo 18) eos direitos da criança (artigo 19), em prejuízo de
Osmín Ricardo Tobar Ramírez e o seuirmão, J.R., bem como das
garantias judiciais (artigo 8) e a proteção judicial (artigo25), em
prejuízo de Osmín Ricardo Tobar Ramírez e J.R.), assim como aqueles
fatosreferidos pelo próprio Estado na sua contestação de forma
expressa e que coincidemcom o alegado pela Comissão e os
representantes (tais como a referência a nãoconsiderar outras
opções exceto a adoção internacional depois da declaração
deabandono e a má condução dos recursos) (supra par. O Estado
realizou umreconhecimento parcial de responsabilidade, indicando
que “a legislação vigente na
31 Cfr. Caso Vereda La Esperanza Vs. Colômbia, supra, pars. 37 a
39.
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- 32 -
matéria de adoções na época em que aconteceram os fatos do
presente caso, não seadequava ao corpus iuris internacional,
violando, desse modo, os direitos humanosprevistos na [Convenção
Americana]”. De acordo com a Guatemala, no entanto, “alegislação
atual na matéria, sim está adequada aos padrões internacionais para
aproteção da infância e as adoções como último mecanismo para a
restituição de direitosda criança e adolescência”. A Guatemala
elaborou o seu reconhecimento a respeito dasviolações alegadas da
seguinte forma: e infra par. Consequentemente, a Corte entendeque a
Guatemala reconheceu os fatos referentes à (i) legislação em
matéria de adoçãovigente na época dos fatos e a sua falta de
adequação aos padrões internacionaisvigentes para a Guatemala na
época dos fatos; (ii) a forma como foi realizada aseparação de
Osmín Tobar Ramírez e J.R. da sua mãe, Flor de María Ramírez
Escobar,embora não os motivos dessa separação; (iii) a
institucionalização de Osmín TobarRamírez e J.R. imediatamente
depois da separação da sua mãe por um período dedezessete meses,
sem permitir-lhes qualquer tipo de contato com a sua família,
masnão as demais condições dessa institucionalização; (iv) a
concessão das adoçõesinternacionais uma vez declarado o abandono
das crianças; (v) a ausência deconsideração de outros familiares
como opções de cuidado antes das adoçõesinternacionais; e (vi) as
irregularidades cometidas pelas autoridades judiciais naresolução
dos recursos interpostos contra a declaração de abandono e os
processos deadoção. ).). Consequentemente, considerando as
manifestações do Estado, bem comoas observações dos representantes
e da Comissão, a Corte considera que acontrovérsia cessou a
respeito da violação do direito à proteção da família (artigo 17),
odireito ao nome (artigo 18) e os direitos da criança (artigo 19),
em prejuízo de OsmínRicardo Tobar Ramírez e o seu irmão, J.R., bem
como das garantias judiciais (artigo 8)e a proteção judicial
(artigo 25), em prejuízo de Osmín Ricardo Tobar Ramírez e J.R.,Flor
de María Ramírez Escobar e Gustavo Amílcar Tobar Fajardo.), nem as
reparaçõesque pudessem lhe caber, em nível interno, como
consequência.
7. Por último, a fim de proteger a privacidade de J.R. E da
família B., este Tribunal lembraque as partes deverão respeitar a
reserva de identidade ordenada neste caso em todosos seus escritos
e intervenções perante este Tribunal, bem como considera
importanteordenar que as partes e a Comissão adotem todas as
medidas necessárias para garantirque as partes pertinentes dos
documentos e atuações processuais que contenham asua identidade não
sejam expostas publicamente, exceto que ele mesmo ou o
seurepresentante legal assim o autorizem expressamente32.
1VI.2PROVA
A. Prova documental, testemunhal e pericial
32 Cfr. Caso Vereda La Esperanza Vs. Colômbia, supra, párr.
40.
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- 33 -
1. Este Tribunal recebeu diversos documentos apresentados como
prova pela Comissão eas partes, adjuntos aos seus escritos
principais (supra par.. O caso submetido à Corte.- Em 12 de
fevereiro de 2016, em conformidade com o disposto nos artigos 51 e
61 daConvenção Americana e o artigo 35 do Regulamento da Corte, a
ComissãoInteramericana de Direitos Humanos (doravante "a Comissão
Interamericana" ou "aComissão") submeteu à jurisdição da Corte
Interamericana o caso Irmãos Ramírez efamília contra a República da
Guatemala (doravante "o Estado" ou "Guatemala"). Deacordo com a
Comissão, o caso se relaciona a adoção internacional, mediante
trâmiteextrajudicial