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CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS CASO MEMBROS DA ALDEIA CHICHUPAC E COMUNIDADES VIZINHAS DO MUNICÍPIO DE RABINAL VS. GUATEMALA SENTENÇA DE 30 DE NOVEMBRO DE 2016 (Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas) No caso Membros da Aldeia Chichupac e Comunidades Vizinhas do Município de Rabinal, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante a “Corte Interamericana”, a “Corte” ou o “Tribunal”), integrada pelos seguintes magistrados: Roberto F. Caldas, Presidente; Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot, Vice-presidente; Eduardo Vio Grossi, Juiz, Humberto Antonio Sierra Porto, Juiz; Elizabeth Odio Benito; Juíza; Eugenio Raúl Zaffaroni, Juiz, e L. Patricio Pazmiño Freire, Juiz; presentes também, Pablo Saavedra Alessandri, Secretário, e Emilia Segares Rodríguez, Secretária Adjunta, em conformidade com os artigos 62.3 e 63.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante “a Convenção Americana” ou “a Convenção”) e com os artigos 31, 32, 42, 65 e 67 do Regulamento da Corte (doravante “o Regulamento” ou “Regulamento da Corte”), dita a presente Sentença que se estrutura na seguinte ordem:
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Jul 16, 2020

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CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS

CASO MEMBROS DA ALDEIA CHICHUPAC E COMUNIDADES VIZINHAS DO MUNICÍPIODE RABINAL VS. GUATEMALA

SENTENÇA DE 30 DE NOVEMBRO DE 2016

(Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas)

No caso Membros da Aldeia Chichupac e Comunidades Vizinhas do Município de Rabinal,

a Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante a “Corte Interamericana”, a “Corte” ouo “Tribunal”), integrada pelos seguintes magistrados:

Roberto F. Caldas, Presidente;Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot, Vice-presidente;Eduardo Vio Grossi, Juiz,Humberto Antonio Sierra Porto, Juiz;Elizabeth Odio Benito; Juíza;Eugenio Raúl Zaffaroni, Juiz, eL. Patricio Pazmiño Freire, Juiz;

presentes também,

Pablo Saavedra Alessandri, Secretário, eEmilia Segares Rodríguez, Secretária Adjunta,

em conformidade com os artigos 62.3 e 63.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos(doravante “a Convenção Americana” ou “a Convenção”) e com os artigos 31, 32, 42, 65 e 67do Regulamento da Corte (doravante “o Regulamento” ou “Regulamento da Corte”), dita apresente Sentença que se estrutura na seguinte ordem:

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INDÍCE

IINTRODUÇÃO DA CAUSA E OBJETO DA CONTROVÉRSIA..............................................3IIPROCEDIMENTO PERANTE A CORTE............................................................................3IIICOMPETÊNCIA.............................................................................................................4IV................................................................................................................................4EXCEÇÕES PRELIMINARES..........................................................................................4

A. Exceções de falta de competência ratione temporis.....................................................4B. Exceção de falta de competência ratione materiae.......................................................4

B.1. Alegada falta de competência da Corte para conhecer supostas violações à CIDFP, àConvenção de Belém do Pará e à Convenção para a Prevenção e Punição do Delito deGenocídio...............................................................................................................4B.2. Alegada falta de competência para determinar o cometimento de delitos.................5B.3. Alegada falta de competência para declarar a invalidade da anistia..........................5

C. Exceção por não terem sido esgotados os recursos internos.........................................5C.2. Considerações da Corte.....................................................................................5

D. Exceção de carência de faculdade para apresentar outra demanda pelos mesmos fatos. . .6D.2. Considerações da Corte.....................................................................................6

VRECONHECIMENTO PARCIAL DE RESPONSABILIDADE................................................6

A.Reconhecimento parcial de responsabilidade do Estado e observações da Comissão e dos representantes...........................................................................................................6B. Considerações da Corte............................................................................................6

VICONSIDERAÇÃO PRÉVIA.............................................................................................6

A.Argumentos da Comissão e das partes........................................................................6B. Considerações da Corte............................................................................................6

VIIPROVA.........................................................................................................................7

A.Prova documental, testemunhal e pericial....................................................................7B. Admissão da prova..................................................................................................7C. Avaliação da prova..................................................................................................7

VIIIFATOS.........................................................................................................................7

A.Antecedentes do caso...............................................................................................7B. A aldeia Chichupac e as comunidades vizinhas do município de Rabinal..........................8

B.1. Execução Juan Alvarado Grave, Mateo Grave e Pedro Depaz Ciprián, edesaparecimento de Pedro Siana entre 23 e 24 de agosto de 1981................................8B.2. Execução de três membros da família Alvarado e três membros da família Reyes, em1o de janeiro de 1982..............................................................................................8B.3. Detenção de Ciriaco Galiego López e desaparecimento de Lorenzo Depaz Sipriandesde 08 de janeiro de 1982.....................................................................................8

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B.4. Massacre da Clínica da aldeia Chichupac em 08 de janeiro de 1982.........................8B.5. Estupro de Máxima Emiliana García Valey em 08 de janeiro de 1982.......................8B.6. Violência perpetrada na região, deslocamento dos habitantes, destruição dascomunidades e da aldeia modelo ou colônia em Chichupac............................................8B.7. Desaparecimento e identificação de Hugo García Depaz, Abraham Alvarado, Manuelde Jesús Alarcón Morente e Edmundo Alarcón Morente, desaparecimento de Adrián GarcíaManuel e Leonardo Cahuec González, e detenção de Miguel Chen Tahuico em 18 de janeirode 1982..................................................................................................................8B.8. Desaparecimento de Juan Mendoza Alvarado e José Cuz Mendoza Sucup desde 31 dejaneiro de 1982.......................................................................................................9B.9. Desaparecimento de María Concepción Chen Sic e Casimiro Siana desde 12 defevereiro de 1982....................................................................................................9B.10. Execução de Andrea Osorio Galeano em 19 de fevereiro de 1982..........................9B.11. Execução de Elías Milián González e Amelia Milián Morales em 23 de março e 20 deabril de 1982...........................................................................................................9B.12. Estupro e execução de Gregoria Valey Ixtecoc em 22 de novembro de 1982...........9B.13. Desaparecimento de Juan Pérez Sic, desde 15 de novembro de 1981....................9B.14. Desaparecimento de oito pessoas desde 26 de novembro de 1982 e detenção deNapoleón García De Paz nesse mesmo dia..................................................................9B.15. Execução de oito pessoas em 02 de março de 1983.............................................9B.16. Falecimento do menino Antonio Chen mendoza em março de 1983........................9B.17. Execução dos irmãos Eusebia e José León Grave García em 22 de outubro de 1983.9B.18. Situação de Juana García Depaz a partir de 22 de outubro de 1983 e trabalhosforçados.................................................................................................................9B.19. Execução de Medardo Juárez García em 31 de agosto de 1983 ou 1984...............10B.20. Desaparecimento de Marcelo Sic Chen desde dezembro de 1984.........................10B.21. Execução de Silvestre Sic e Raymunda Corazón em 20 de dezembro de 1984.......10B.22. Execução de Efraín García de Paz em 17 de agosto de 1986................................10

C. Investigações........................................................................................................10IX..............................................................................................................................10MÉRITO.....................................................................................................................10IX.I...........................................................................................................................10DIREITOS À LIBERDADE PESSOAL, INTEGRIDADE PESSOAL, VIDA ERECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE JURÍDICA DAS VÍTIMAS DEDESAPARECIMENTO FORÇADO, BEM COMO DIREITOS À INTEGRIDADE PESSOAL E ÀPROTEÇÃO À FAMÍLIA DOS SEUS FAMILIARES..........................................................10

A.Argumentos da Comissão e das partes......................................................................10B. Considerações da Corte..........................................................................................10

B.1. Determinação da ocorrência dos alegados desaparecimentos forçados e a suapermanência no tempo...........................................................................................11B.2. Violações aos artigos 7o, 5.1, 5.2, 4.1 e 3o da Convenção Americana....................12B.3. Direito à integridade pessoal e à proteção à família em prejuízo dos familiares dasvítimas de desaparecimento forçado.........................................................................12

IX.II..........................................................................................................................12DIREITO DE CIRCULAÇÃO E RESIDÊNCIA..................................................................12

A.Argumentos da Comissão e das partes......................................................................12B. Considerações da Corte..........................................................................................12

B.1. Impossibilidade de retorno dos membros da Aldeia Chichupac e ComunidadesVizinhas do Município de Rabinal..............................................................................13

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B.2. Ausência de medidas adotadas pelo Estado para reverter os efeitos do deslocamento...........................................................................................................................13B.3. Impactos do deslocamento e da omissão de garantir medidas de retorno para osmembros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas de Rabinal................................13B.4. Conclusões.....................................................................................................14

IX. III.......................................................................................................................14GARANTIAS E PROTEÇÃO JUDICIAIS DA CONVENÇÃO AMERICANA, e descumprimentodos ARTIGOS I.B DA CONVENÇÃO INTERAMERICANA SOBRE DESAPARIÇÃO FORÇADADE PESSOAS, 1o, 6 o E 8 o DA CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR ESANCIONAR A TORTURA, E 7.B DA CONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR,SANCIONAR E ERRADICAR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER...................................14

A.Alegações da Comissão e das partes.........................................................................14B. Considerações da Corte..........................................................................................14

B.1. Falta de devida diligência e obstaculização..........................................................15B.2. Falta de investigação de graves violações de direitos humanos..............................16B.3. Direito a conhecer a verdade e prazo razoável....................................................16B.4. Conclusões.....................................................................................................17

A. Parte Lesada.........................................................................................................17B. Programa Nacional de Ressarcimento.......................................................................17C. Obrigação de investigar os fatos e identificar, julgar e, segundo o caso, sancionar os responsáveis, bem como determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas, e recuperar e identificar as pessoas exumadas sepultadas em valas clandestinas..................................17D. Medidas de restituição, reabilitação, satisfação e garantias de não repetição.................18D.1. Medida de restituição: Garantir o retorno a seu lugar de origem das vítimas que ainda se encontram deslocadas...........................................................................................18D.2. Medidas de reabilitação: Atendimento médico, psicológico ou psiquiátrico às vítimas. .18D.3. Medidas de satisfação.........................................................................................19D.3.1. Ato público de reconhecimento de responsabilidade.............................................19D.3.2. Publicação da Sentença....................................................................................19D.4. Garantias de não repetição..................................................................................19D.4.1. Formação dos membros do Exército da Guatemala..............................................19D.4.2. Fortalecimento da capacidade do poder judiciário e do ministério público de investigaros fatos e sancionar os responsáveis............................................................................19D.4.3. Programa educativo em matéria de não discriminação..........................................19D.4.4. Fortalecimento dos mecanismos contra a discriminação racial e étnica...................19E. Indenização Compensatória: Dano material e imaterial..............................................20F. Custas e gastos.....................................................................................................20G. Modalidade de cumprimento dos pagamentos ordenados...........................................20

X...............................................................................................................................21PONTOS RESOLUTIVOS.............................................................................................21

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IINTRODUÇÃO DA CAUSA E OBJETO DA CONTROVÉRSIA

1. O caso submetido à Corte. - Em 05 de agosto de 2014, em conformidade com o dispostonos artigos 51 e 61 da Convenção Americana e do artigo 35 do Regulamento da Corte, aComissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante "a Comissão Interamericana" ou "aComissão") submeteu à jurisdição da Corte Interamericana o caso Membros da Aldeia deChichupac e Comunidades Vizinhas do Município de Rabinal contra o Estado da Guatemala(doravante "o Estado" ou "Guatemala"). O caso se refere a um suposto massacre na aldeiaChichupac em 08 de janeiro de 1982, bem como às alegadas execuções extrajudiciais,torturas, desaparecimentos forçados, violações sexuais, omissões de auxílio, detenções ilegais,deslocamentose trabalhos forçados "cometidos contra os indígenas maia-achi, da aldeiaChichupac e comunidades vizinhas [...] do município de Rabinal, através de uma série de atosentre 1981 e 1986." Segundo a Comissão, os fatos do caso estão "dentro de uma política deEstado fundamentada na Doutrina de Segurança Nacional e o conceito de Inimigo Interno, cujoobjetivo é eliminar a suposta base social de grupos insurgentes da época." Adicionalmente, ocaso trata de uma alegada falta de esclarecimento judicial dos fatos, punição de todos osresponsáveis e reparação às supostas vítimas, bem como sobre o suposto genocídio contra opovo indígena maia na Guatemala.

2. Trâmite perante a Comissão. - A tramitação perante a Comissão seguiu os seguintespassos:

a) Petição. - A petição inicial perante a Comissão foi apresentada em 13 de dezembro de2007 pela Associação Bufete Jurídico Popular.

b) Relatório de Admissibilidade. - Em 1o de novembro de 2010, a Comissão aprovou oRelatório de Admissibilidade No 144/10.1

c) Relatório de Mérito. - Em 02 de abril de 2014 a Comissão aprovou o Relatório de MéritoNo 6/142 conforme o artigo 50 da Convenção (doravante "o Relatório de Mérito"), no qualchegou a uma série de conclusões e elaborou várias recomendações para o Estado:

Conclusões. - A Comissão concluiu que o Estado era responsável pela violação dosdireitos estabelecidos nos artigos 3o, 4 o, 5 o, 7 o, 8 o, 11, 12, 16, 17, 19, 21, 22, 23, 24 e25 da Convenção Americana, em relação às obrigações estabelecidas no artigo 1.1 domesmo instrumento; do artigo I da Convenção Interamericana sobre DesaparecimentoForçado de Pessoas, e do artigo 7 o da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir eErradicar a Violência contra a Mulher, em prejuízo das supostas vítimas do presente caso.

Recomendações. - Consequentemente, a Comissão fez ao Estado as seguintesrecomendações:

1. Reparar adequadamente no âmbito individual e coletivo as violações dos direitos humanos declaradas nopresente Relatório no aspecto material, moral e cultural, incluindo uma justa compensação; o estabelecimento ea divulgação da verdade histórica dos fatos; a recuperação da memória das vítimas falecidas e desaparecidas; a

1 Cfr. Relatório de Admissibilidade N° 144/10, Caso Membros da Aldeia de Chichupac e Povoado Xeabaj doMunicípio de Rabinal Vs. Guatemala, de 1o de novembro de 2010 (Expediente de prova, folhas 3087 a 3105).2 Cfr. Relatório de Mérito No6/14, Caso Membros da Aldeia de Chichupac e Comunidades Vizinhas do Município deRabinal Vs. Guatemala, de 02 de abril de 2014 (Expediente de prova, folhas 06 a 88).

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implementação de um programa de atendimento psicossocial culturalmente adequado aos sobreviventes efamiliares das vítimas executadas e desaparecidas. As reparações de caráter coletivo deverão ser plenamenteaceitas pelos sobreviventes da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas, para restabelecer a sua vidacomunitária como parte do povo maia-achi, e, especialmente, o vínculo com a sua terra.

2. Estabelecer um mecanismo que permita, na maior medida possível, a identificação completa das vítimasexecutadas neste caso e fornecer o que seja necessário para dar continuidade à identificação e devolução dosrestos mortais dessas vítimas.

3. Estabelecer um mecanismo que permita a determinação das pessoas desaparecidas nos massacres, bem comoa respeito dos sobreviventes.

4. Localizar e entregar às famílias os restos mortais das vítimas desaparecidas.

5. Estabelecer um mecanismo que facilite a identificação completa dos familiares das vítimas executadas edesaparecidas, de forma que possam ser beneficiários das reparações.

6. Realizar, concluir e reabrir, conforme o caso, os procedimentos internos relacionados às violações e conduzir asinvestigações de forma imparcial, efetiva e dentro de um prazo razoável, a fim de esclarecer os fatoscompletamente, identificando os autores intelectuais e materiais e impor as punições correspondentes.

7. Fortalecer a capacidade do Poder Judiciário de pesquisar de forma adequada e eficiente os fatos e punir osresponsáveis, mesmo com os recursos materiais e técnicos necessários para garantir o correto desenvolvimentodos processos.

8. Contar com as medidas administrativas, disciplinares ou penais correspondentes para as ações ou omissões dosfuncionários públicos que contribuíram para a negação da justiça e impunidade na qual se encontram os fatosdo caso ou que participaram em medidas para dificultar os processos destinados a identificar e penalizar osresponsáveis.

9. Adotar as medidas necessárias para evitar que no futuro aconteçam fatos semelhantes, conforme o dever deprevenção e garantia dos direitos humanos reconhecidos na Convenção Americana. Especialmente, implementarprogramas permanentes de direitos humanos e direito internacional humanitário nas escolas de formação dasForças Armadas.

d) Notificação ao Estado. - O Relatório de Mérito foi notificado ao Estado em 05 de maio de2014, outorgando ao Estado um prazo de dois meses para informar sobre o cumprimentodas recomendações. A Guatemala apresentou um Relatório mediante o qual "indicou emtermos gerais a existência do Programa Nacional de Ressarcimento e o funcionamento doInstituto Nacional de Ciências Forenses, sem precisar os mecanismos concretosimplementados para a reparação das vítimas, sobreviventes e familiares deste caso, bemcomo para poder identificar os restos mortais. Indicou que as [investigações]continuariam e invocou a Lei de Reconciliação Nacional, precisando que o Estado nãopode ignorar o marco normativo interno. [Segundo a Comissão, o Estado não solicitouprorrogação para cumprir com as recomendações”.

e) Submissão à Corte. – Em 05 de agosto de 2014 a Comissão submeteu o caso à Corte“pela necessidade de obtenção de justiça […] perante a falta de cumprimento dasrecomendações”. Para tanto, nomeou como delegados o Comissionado James Cavallaro eo então Secretário Executivo, Emilio Álvarez Icaza L3, e como assessores legais aElizabeth Abi-Mershed, Secretária Executiva Adjunta, e a Silvia Serrano Guzmán e ErickAcuña Pereda, advogados da Secretaria Executiva.

3 Paulo Abrão é o atual Secretário Executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), cargoque assumiu em 16 de agosto de 2016.

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IIPROCEDIMENTO PERANTE A CORTE

3. Notificação ao Estado e aos representantes. - A submissão do caso foi notificado aoEstado em 17 de outubro de 2014 e aos representantes das supostas vítimas (doravantetambém “os representantes”)4 em 30 de outubro de 2014.

4. Escrito de solicitações, argumentos e provas. - Em 05 de janeiro de 2015, osrepresentantes apresentaram o seu escrito de solicitações, argumentos e provas (doravante“escrito de solicitações e argumentos”), conforme os artigos 25 e 40 do Regulamento da Corte.Nesse escrito, alegaram a violação aos artigos 3o, 4 o, 5 o, 6 o, 7 o, 8 o, 11, 12, 16, 19, 21, 22, 24e 25 da Convenção, com relação ao seu artigo 1.1, bem como do artigo I da ConvençãoInteramericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas e o artigo 7o da ConvençãoInteramericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. Tambémsolicitaram "a inclusão da lista de 97 famílias", que foi anexada.

5. Escrito de contestação. - Em 23 de abril de 2015, o Estado apresentou perante a Corte oseu escrito de exceções preliminares, contestação à submissão do caso por parte da Comissãoe de observações feitas no escrito de solicitações e argumentos (doravante "contestação").Nesse escrito, apresentou quatro exceções preliminares. Em 23 de outubro de 2015, o Estadodesignou como Agentes para este caso Rodrigo José Villagrán Sandoval e Steffany RebecaVásquez Barillas. Posteriormente, em 13 de abril de 2016 o Estado designou Carlos RafaelAsturias Ruiz e Steffany Rebeca Vásquez Barillas como Agentes.

6. Observações às exceções preliminares. - Em 25 de junho de 2015, os representantes e aComissão Interamericana apresentaram as suas observações às exceções preliminaresapresentadas pelo Estado.

7. Outros escritos apresentados pelas partes e pela Comissão. - Em 30 de julho de 2015, oEstado remeteu um escrito intitulado "Posição do Estado da Guatemala em relação à inclusãode novas vítimas no Caso [...]." Mediante nota da Secretaria, de 04 de agosto de 2015, foisolicitado aos representantes e à Comissão que apresentassem as observações queconsiderassem pertinentes ao referido escrito do Estado. Em 30 de agosto de 2015, osrepresentantes remeteram as observações solicitadas. Em 31 de agosto de 2015, a Comissãoremeteu as observações solicitadas junto à lista definitiva de declarantes oferecidas para aaudiência pública. Finalmente, em 19 de abril de 2016, os representantes enviaram 212certidões de nascimento, óbito e matrimônio das supostas vítimas que teriam sofridodeslocamento forçado, perseguição e desarraigamento.

8. Audiência pública. – Mediante Resolução do Presidente da Corte de 28 de março de2016,5 as partes e a Comissão foram convocadas para uma audiência pública que foi celebradaem 28 de abril de 2016, durante o 114º Período Ordinário de Sessões da Corte na sede doTribunal.6 Durante a audiência, foram coletadas as declarações das supostas vítimas JuanaGarcía Depaz e Napoleón García De Paz (ou Napoleón García Depaz ou Napoleón García de

4 A Associação Bufete Jurídico Popular representou as supostas vítimas durante a tramitação do caso perante Corte,inicialmente através do seu então representante legal, Conrado Aj Piox e a Advogada María Dolores Itzep Manuel.Mediante escrito de 20 de abril de 2016, a Associação informou que o senhor Aj Piox já não exercia o cargo derepresentante legal, e que esse tinha sido assumido pela senhora Paulina Ixpatá Alvarado de Osorio.

5 Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/asuntos/chichupac_28_03_16.pdf.

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Páz), e do perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza, propostos pelos representantes, bemcomo do perito Cristián Alejandro Correa Montt, proposto pela Comissão. Também foramrecebidas as observações e as alegações finais orais da Comissão, dos representantes e doEstado, respectivamente. Nesta Resolução também foi ordenado receber as declarações feitasperante agente dotado de fé pública (affidávit) de uma suposta vítima e de dois peritospropostos pelos representantes, um perito proposto pela Comissão e três peritos propostospelo Estado. Mediante comunicação datada de 11 de abril de 2016, o Estado desistiu daapresentação da prova testemunhal e pericial.

9. Amici curiae. – A Corte recebeu os amici curiae de: i) Alejandro Valencia Villa em 03 demaio de 2016, sobre a Lei de Reconciliação Nacional, as anistias e os delitos políticos naGuatemala; ii) Impunity Watch em 11 de maio de 2016, sobre a suposta competência da Cortepara se manifestar a respeito da alegada violação à Convenção para a Prevenção e Repressãodo Delito de Genocídio e outros tratados que protegem os direitos dos povos indígenas, aalegada carência de competência do Tribunal para declarar a invalidade da Lei de ReconciliaçãoNacional, bem como a reparação individual e coletiva no presente caso; iii) o Due Process ofLaw Foundation em 12 de maio de 2016, sobre a “especial gravidade” e “caráter prolongado”do deslocamento forçado; iv) Léa Réus em 12 de maio de 2016, sobre o eventual reparointegral no presente caso; v) Professores do Departamento de Estudos Sociopolíticos eJurídicos e da Coordenação Docente de Direito Constitucional e Direitos Humanos, bem comoestudantes de Bacharelado em Direito do Instituto Tecnológico e Estudos Superiores doOcidente (ITESO) em 13 de maio de 2016, sobre o eventual reparo integral no presente caso,

e vi) Santiago Medina Villarreal e a Corporação para a Defesa e Promoção dos DireitosHumanos REINICIAR em 13 de maio de 2016, sobre a suposta exceção preliminar rationetemporis interposta pelo Estado da Guatemala, a utilização de categorias penais paradeterminar violações dos direitos humanos e os alegados atos e práticas genocidas contra opovo maia-achi.

10. Alegações e observações finais escritas. – A Corte recebeu as alegações e as observaçõesfinais escritas dos representantes, do Estado e da Comissão, respectivamente, em 30 de maiode 2016. No seu escrito, o Estado remeteu uma "Proposta a um Acordo de Solução". Alémdisso, nos dias 31 de maio e 2 de junho de 2016, os representantes remeteram documentossolicitados como prova para melhor resolver, bem como uma lista geral de vítimas e decertificados que estabeleciam a sua identidade.

11. Observações dos representantes, o Estado e a Comissão. - Em 20 de junho de 2016, osrepresentantes remeteram dois escritos mediante os quais informaram que não tinhaminformações aos anexos remetidos pelo Estado junto às alegações finais escritas e que nãoaceitavam o acordo proposto. A Comissão apresentou as suas observações ao acordo propostoem 28 de junho de 2016, de forma extemporânea.

12. Deliberação do caso presente. - A Corte iniciou a deliberação da presente Sentença em25 de maio de 2016.

6 A esta audiência compareceram: por parte da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Enrique Gil Botero,Comissário, e Silvia Serrano Guzmán, Erick Acuña Pereda e Jorge Meza Flores, Advogados da Secretaria Executiva daComissão; pelos representantes das supostas vítimas, María Dolores Itzep Manuel, Advogada, Carlos Enrique De PazAlvarado, Abelina Osorio Sis, Advogada e Paulina Ixpatá Alvarado de Osorio, Presidente da Diretoria e RepresentanteLegal da Associação Bufete Jurídico Popular; e em representação do Estado da Guatemala, Víctor Hugo Godoy,Presidente da Comissão Presidencial Coordenadora da Política do Poder Executivo em matéria de Direitos Humanos(COPREDEH).

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IIICOMPETÊNCIA

13. A Corte Interamericana tem competência, nos termos do artigo 62.3 da CorteInteramericana, para conhecer este caso, uma vez que a Guatemala é Estado Parte daConvenção Americana desde 25 de maio de 1978 e reconheceu a competência contenciosa daCorte em 09 de março de 1987.7

IVEXCEÇÕES PRELIMINARES

14. O Estado apresentou no seu escrito de contestação as seguintes exceções preliminares:A) falta de competência ratione temporis; B) falta de competência ratione materiae; C) nãoforam esgotados os recursos internos, e D) “carência da faculdade para apresentar outrareclamação contra do Estado da Guatemala pelos mesmos fatos”.

A. Exceções de falta de competência ratione temporis

A.1. Argumentos da Comissão e das partes

15. O Estado interpôs a exceção de falta de competência ratione temporis. Argumentou queem 09 de março de 1987, "apresentou uma reserva por meio da qual limit[ou] a competênciada Corte [...ao conhecimento] de assuntos posteriores à data em que tal declaração [foi]apresentada". Afirmou que a Corte "não pode ampliar a sua competência temporal [...]alegando [uma] conduta continuada ou permanente [...], utilizando como base uma exceçãoao princípio de irretroatividade dos tratados". Explicou a diferença entre um delito continuadoe um permanente no seu ordenamento interno, e destacou que o desaparecimento forçado éum delito permanente, já que é de execução instantânea, mas os seus efeitos persistem aolongo do tempo. Por isso, "a Guatemala não aceita" que os fatos deste caso sejamconsiderados como desaparecimentos forçados, pois se estaria alterando "a tipificação dareferida conduta de forma retroativa [...]". Finalmente, o Estado alegou "que em momentoalgum pretende negar os fatos, nem pretende negar às vítimas as reparações às quaispudessem ter direito na condição de vítimas do conflito armado". Nesse sentido, declarou que"conhece as suas obrigações a respeito dos fatos acontecidos no conflito armado [e por issocriou o] Programa Nacional de Ressarcimento", o qual tem po finalidade prestar os reparos "asvítimas de violações dos direitos humanos cometidas pelo Estado [e] pela insurgência". Noentanto, isso não significa que esteja retirando "a sua reserva para que a Corte possa conhecertais fatos".

16. No seu escrito de submissão do caso, a Comissão assinalou que "submete à jurisdição daCorte as ações e omissões estatais acontecidas ou que continuaram acontecendo depois de 09

7 Em 09 de março de 1987 o Estado apresentou perante a Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos(OEA) o Acordo Governamental No123/87 de 20 de fevereiro de 1987, pelo qual reconheceu a competência da Cortecom a seguinte limitação: "(Artigo 2o) A aceitação da competência da Corte Interamericana de Direitos Humanosestende-se por prazo indeterminado, em caráter geral, sob condição de reciprocidade e com a reserva de que os casosem que se reconhece a competência limitam-se exclusivamente aos ocorridos posteriormente à apresentação destadeclaração ao Secretário-Geral da Organização dos Estados Americanos ". Convenção Americana sobre DireitosHumanos (Declarações, Reservas, Denúncias e Retiros). Disponível em: http://www.oas.org/dil/esp/tratados_B-32_Convencion_Americana_sobre_Derechos_Humanos_firmas.htm. Esse ponto será analisado infra, no Capítulo IVsobre Exceções Preliminares.

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de março de 1987, data de aceitação da competência contenciosa da Corte [...] por parte doEstado". O que antecede, "sem prejuízo de que [...] a Guatemala aceite a competência daCorte para conhecer a totalidade do presente caso, em conformidade com o estipulado noartigo 62.2 da Convenção". No entanto, no seu escrito de observações às exceçõespreliminares, a Comissão alegou que o reconhecimento de responsabilidade realizado peloEstado perante ela e reiterado na sua contestação perante a Corte implica uma renúncia àlimitação temporal de competência realizada pela Guatemala "outorgando, assim, o seuconsentimento para que o Tribunal examine os fatos acontecidos e se pronuncie sobre asviolações configuradas". Durante a audiência pública, a Comissão também destacou "violaçõesque tiveram início de execução antes da aceitação da competência da Corte [mas] continuaramacontecendo posteriormente àquela data". Afirmou também que as investigações internasforam iniciadas posteriormente ao reconhecimento de competência do Tribunal. Finalmente,manifestou que a interposição do Estado não foi uma "reserva".

17. No seu escrito de solicitações e argumentos, os representantes destacaram que "aCorte pode conhecer os atos ou fatos que ocorreram posteriormente [em 09 de março de1987...] e que tenham gerado violações [...] de execução instantânea e continuada oupermanente", e aquelas "de caráter continuado ou permanente, embora o primeiro ato deexecução tenha acontecido antes da data de reconhecimento". No entanto, no seu escrito deobservações às exceções preliminares, destacaram que o reconhecimento de responsabilidaderealizado pelo Estado perante a Comissão e reiterado na sua contestação perante a Corte,implica uma renúncia à limitação temporal de competência.

A.2. Considerações da Corte

18. O Tribunal observa que o Estado pretende que a Corte não conheça os fatos do caso quetenham ocorrido antes de 09 de março de 1987, data em que a Guatemala aceitou acompetência contenciosa do Tribunal, bem como aqueles fatos de caráter contínuo oupermanente cujo primeiro ato de execução tenha ocorrida antes daquela data. O que antecede,com base em que teria apresentado uma "reserva" por meio da qual limitou a competênciatemporal do Tribunal.

19. A fim de determinar se tem ou não competência para conhecer um caso ou um aspectodo caso, o Tribunal deve considerar a data de reconhecimento da competência por parte doEstado, os termos em que este ocorreu e o princípio de não irretroatividade, disposto no artigo28 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969.8 Neste caso, é claro que aCorte pode conhecer os atos ou os fatos que tenham ocorrido posteriormente à data doreferido reconhecimento.

20. Por outro lado, o Tribunal também tem competência para conhecer sobre violações aosdireitos humanos de caráter contínuo ou permanente, embora o primeiro ato de execuçãotenha ocorrido antes da data de reconhecimento de competência contenciosa da Corte, se taisviolações persistem posteriormente ao referido reconhecimento, uma vez que continuam sendopraticadas.9 Assim, ao Estado é lembrado que dentro do âmbito da sua jurisdição, cabe à Corte

8 Mesmo quando o Estado está obrigado a respeitar e a garantir os direitos protegidos na ConvençãoAmericana, a partir da data em que a ratificou, a competência da Corte para declarar uma violação das suas normas éregida pelo referido reconhecimento por parte do Estado.9 Cfr. Caso Blake Vs. Guatemala. Exceções Preliminares. Sentença de 22 de julho de 1996, Série C N° 27, pars.39 e 40, e Caso Argüelles e outros Vs. Argentina. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 20

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Interamericana avaliar as ações ou omissões de agentes do Estado nos casos apresentadosperante ela, conforme a prova apresentada pelas partes, e classificá-las em conformidade coma Convenção Americana e demais Tratados Interamericanos que lhe outorguem competência, afim de determinar se o Estado incorreu em responsabilidade internacional.

21. Finalmente, a Comissão e os representantes argumentaram que o Tribunal também teriacompetência para conhecer os fatos do caso de execução instantânea ocorridos antes da datade reconhecimento da competência contenciosa da Corte, com base em que o reconhecimentode responsabilidade no presente caso realizado pelo Estado perante a Comissão, e reiterado nasua contestação perante a Corte, implicaria uma renúncia à limitação temporal decompetência.

22. Neste caso, a Guatemala reconheceu a sua responsabilidade internacional dentro doprocesso perante a Comissão. No entanto, antes que a Comissão emitisse o seu Relatório deMérito, a Guatemala também declarou que "não reconhece a competência ratione temporis daCorte Interamericana [...] para conhecer o Caso [...]",10 Assim, ao submeter o caso perante oTribunal, a Comissão apenas colocou em seu conhecimento "as ações e omissões públicasacontecidas ou que continuaram acontecendo depois de 09 de março de 1987, data deaceitação da competência contenciosa da Corte Interamericana [...]", "sem prejuízo de que[...] Guatemala aceite a competência da Corte para conhecer a totalidade deste caso". Agoravejamos, na tramitação perante Corte, ou seja, na contestação, na audiência pública e nassuas alegações finais escritas, a Guatemala adotou uma posição consistente com oreconhecimento de responsabilidade realizado perante a Comissão, no sentido de não ternegado os fatos do caso. Da mesma forma, durante a audiência pública reconheceu a suaresponsabilidade internacional pelos artigos 8o e 25 da Convenção, em relação às investigaçõesiniciadas neste caso a partir de 1993 (infra par. 51). No entanto, a todo momento negouexpressamente o seu consentimento a que o Tribunal conhecesse os fatos acontecidos antesda data em que aceitou a sua competência.

23. A tal respeito, a Corte considera que um Estado pode renunciar a uma limitação temporalao exercício da sua competência de forma expressa ou tácita, como, por exemplo, através deum reconhecimento de responsabilidade internacional. No entanto, a vontade do Estado de serjulgado deve se depreender claramente da sua conduta processual.11 Nos casos anteriores em

de novembro de 2014, Série C No288, par. 25.10 Escritos apresentados em 11 de dezembro e em 17 de julho de 2013 (expediente de prova, folhas 3368 e3454).11 Ver, nesse sentido, Certain Questions of Mutual Assistance in Criminal Matters (Djibouti v. France), Judgment,I.C.J. Reports 2008, p. 177. Disponível em: http://www.icj-cij.org/docket/files/136/14550.pdf. “The consent allowingfor the Court to assume jurisdiction must be certain. […] As the Court has recently explained, whatever the basis ofconsent, the attitude of the respondent State must “be capable of being regarded as ‘an unequivocal indication’ of thedesire of that State to accept the Court’s jurisdiction in a ‘voluntary and indisputable’ manner” […]. For the Court toexercise jurisdiction on the basis of forum prorogatum, the element of consent must be either explicit or clearly to bededuced from the relevant conduct of a State”. Também, Anglo-Iranian Oil Co. (United Kingdom v. Iran), Judgement(Preliminary Objections), 22 July 1952, I.C.J. Reports 1952, p. 114. Disponível em: http://www.icj-cij.org/docket/files/16/1997.pdf. “The principle of forum prorogatum, if it could be applied to the present case, wouldhave to be based on some conduct or statement of the Government of Iran which involves an element of consentregarding the jurisdiction of the Court. But that Government has consistently denied the jurisdiction of the Court.Having filed a Preliminary Objection for the purpose of disputing the jurisdiction, it has throughout the proceedingsmaintained that Objection. It is true that it has submitted other Objections which have no direct bearing on thequestion of jurisdiction. But they are clearly designed as measures of defence which it would be necessary to examineonly if Iran's Objection to the jurisdiction were rejected. No element of consent can be deduced from such conduct onthe part of the Government of Iran. […] Accordingly, the Court has arrived at the conclusion that it has no jurisdiction

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que a Corte analisou a totalidade ou alguma parte dos fatos ocorridos anteriormente aoreconhecimento da sua competência e de ter se pronunciado sobre as violações que seconfiguraram a tal respeito, os Estados envolvidos outorgaram ao Tribunal, expressa outacitamente, o seu consentimento para tanto.12

24. Consequentemente, a Corte considera que neste caso não tem competência rationetemporis para declarar violações à Convenção Americana pelas prisões arbitrárias, torturas,execuções extrajudiciais, violações sexuais e outras formas de violência sexual, trabalhosforçados e destruição e roubos de propriedade supostamente cometidos entre os anos 1981 e1986 em prejuízo dos moradores indígenas maias-achí da aldeia Chichupac e comunidadesvizinhas, pelo qual o Estado tem razão. No entanto, não cabe razão ao Estado no que serefere às consequências contínuas ou permanentes desses fatos, trata-se de delitos contínuosou permanentes, conforme o direito penal interno. Qualquer que seja a classificação penalinterna, o que é contínuo é a violação à Convenção que permanece até hoje, uma vez que ainfração de conhecimento desta Corte é a do direito internacional atual, uma vez que não julgacriminalmente os funcionários, mas sim o Estado, por violações à Convenção.13 Nesse sentido,erra o Estado ao contestar a competência da Corte no suposto desaparecimento forçado e naalegada omissão, por parte do Estado, de implementar garantias de retorno ou umreassentamento voluntário em favor daquelas pessoas que permaneceram deslocadas depoisde 09 de março de 1987, data a partir da qual o Estado reconheceu a competência da Corte,bem como a respeito da sua alegada omissão de diligência de investigação perante gravesviolações aos direitos humanos, consequentemente, também a respeito da reparação dosfatos. Com vistas ao que antecede, este Tribunal acolhe parcialmente a exceção preliminar defalta de competência ratione temporis.

B. Exceção de falta de competência ratione materiae

25. O Estado opôs uma exceção de falta de competência ratione materiae com base emquatro argumentos: 1) a alegada falta de competência da Corte para conhecer supostasviolações à Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas (CIDFP) e àConvenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher(“Convenção de Belém do Pará”); 2) a alegada falta de competência do Tribunal paradeterminar o cometimento de delitos; 3) a alegada falta de competência da Corte em matériapenal para se pronunciar sobre se houve ou não genocídio, bem como para se pronunciarsobre uma violação à Convenção para a Prevenção e Punição do Delito de Genocídio; e 4) aalegada falta de competência do Tribunal para declarar a invalidade da anistia. A seguir, aCorte analisará as alegações apresentadas pelo Estado. O argumento 3) será analisado,conforme o caso, junto aos argumentos 1) e 2).

to deal with the case submitted to it […]”..12 Cfr. Caso Ticona Estrada e outros Vs. Bolívia. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentençade 27 de novembro de 2008 Série C No191, par. 30; Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña Vs. Bolívia. Mérito, Reparaçõese Custas. Sentença de 1 de setembro de 2010 Série C No217, par. 22; Caso Gudiel Álvarez e outros ("Diario Militar")Vs. Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 20 de novembro de 2012. Série C N o253, par. 32 e CasoGarcía e Familiares Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 29 de novembrode 2012 Série C No 258, par. 27. Ver também, Caso Massacres de El Mozote e lugares vizinhos Vs. El Salvador. Mérito,Reparações e Custas. Sentença de 25 de outubro de 2012 Série C No 252, par. 30, e Caso González Medina yfamiliares Vs. República Dominicana. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 27 de fevereirode 2012 Série C No240, par. 192.13 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito. Sentença de 29 de julho de 1988 Série C NNo4, par. 134,e Caso Garrido y Baigorria Vs. Argentina. Reparações e Custas. Sentença de 27 de agosto de 1998 Série C NNo 39, par.44.

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B.1. Alegada falta de competência da Corte para conhecer supostas violações àCIDFP, à Convenção de Belém do Pará e à Convenção para a Prevenção e Punição doDelito de Genocídio.

B.1.1. Argumentos da Comissão e das partes 26. O Estado aduziu que "a Corte carece de competência para conhecer supostas violações à[CIDFP], e a Convenção [de] Belém do Pará, uma vez que a Guatemala não reconheceu a suacompetência para conhecer as violações a tais convenções". Da mesma forma, argumentouque o desaparecimento forçado não estava tipificado como delito na Guatemala na época dosfatos do caso, e que deve aplicar a sua legislação nacional segundo os princípios de que, semlei não há delito, processo nem punição. Finalmente, afirmou que nem a Corte nem aComissão "podem se pronunciar sobre a violação à Convenção para a Prevenção e a Puniçãodo Delito de Genocídio".

27. A Comissão argumentou que em reiteradas oportunidades a Corte aplicou o artigo 7o daConvenção de Belém do Pará. Da mesma forma, afirmou que a Corte reiterou de formaconsistente que o artigo XIII da CIDFP, em relação ao artigo 62 da Convenção Americana, fixaa faculdade da Corte para conhecer dos assuntos relacionados ao cumprimento doscompromissos assumidos pelos Estados Partes naquele instrumento. Além disso, argumentouque a determinação da existência ou não de um desaparecimento forçado é uma questão deMérito, pelo qual não cabe se pronunciar de forma preliminar.

28. Os representantes argumentaram que a Corte tem competência para conhecer aviolação do artigo I da CIDFP, bem como do artigo 7o da Convenção de Belém do Pará, porquea Guatemala ratificou a primeira em 25 de fevereiro de 2000 e a segunda em 04 de abril de1995. Por outra parte, argumentaram que se deve interpretar que a proibição do genocídio éuma extensão do direito à vida, reconhecido na Convenção Americana, levando emconsideração "a norma de interpretação 29(c)" daquele tratado, bem como o fato de que aGuatemala ratificou a Convenção para a Prevenção e a Punição do Delito de Genocídio.

B.1.2. Considerações da Corte

29. Em primeiro lugar, a Guatemala depositou o seu instrumento de ratificação da ConvençãoInteramericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas (CIDFP) na Secretaria Geral daOEA em 25 de fevereiro de 2000, sem limitação à competência da Corte nem reservasvigentes.14 Esta Corte já estabeleceu reiteradamente15 que o artigo XIII da CIDFP16 fixa a

14 Cfr. Instrumento de ratificação da Convenção Americana por parte da Guatemala. Disponível em:http://www.oas.org/juridico/spanish/firmas/a-60.html.

15 Cfr. Caso Gómez Palomino Vs. Peru. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 22 de novembro de 2005 SérieC No 136, par. 110; Caso Radilla Pacheco Vs. México. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de23 de novembro de 2009 Série C NNo 209, par. 303; Caso Osorio Rivera y familiares Vs. Peru. Exceções Preliminares,Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 26 de novembro de 2013 Série C No 274, par. 29; Caso Rodríguez Vera eoutros (Desaparecidos do Palácio da Justiça) Vs. Colômbia. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 14 de novembro de 2014 Série C No 287, par. 43 e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru. ExceçõesPreliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 22 de junho de 2016 Série C No 314, par. 30.16 O artigo XIII estabelece: "Aos efeitos da presente Convenção, o trâmite das petições ou comunicaçõesapresentadas perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos na qual seja alegado o desaparecimentoforçado de pessoas estará sujeito aos procedimentos estabelecidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos,e no Estatuto e Regulamentos da Comissão e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos [...]".

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faculdade do Tribunal para conhecer os assuntos relacionados ao cumprimento doscompromissos assumidos pelos Estados Partes através do referido instrumento. Por outraparte, a avaliação sobre se determinados fatos constituíram desaparecimentos forçados emconformidade com a Convenção Americana e a CIDFP é uma questão de mérito, sobre a qualnão cabe se pronunciar de forma preliminar. Portanto, a Corte desconsidera a exceçãopreliminar de falta de competência da Corte para conhecer as alegadas violações da CIDFP.

30. Em segundo lugar, o Estado ratificou a Convenção de Belém do Pará em 04 de janeiro de1995, sem reservas ou limitações. Como foi dito, a Corte, nos casos González e outras("Campo Algodoeiro") Vs. México, Veliz Franco e outros Vs. Guatemala, Espinoza González Vs.Peru, e Claudina Velásquez Paiz e outros Vs. Guatemala, "o conteúdo literal do artigo 12 daConvenção de Belém do Pará concede competência à Corte, por não fazer quaisquer exceçõesà aplicação das normas e requisitos de procedimentos para as comunicações individuais".17

Cabe destacar que em outros casos contenciosos contra a Guatemala,18 a Corte declarou aresponsabilidade do Estado pela violação ao artigo 7o da Convenção de Belém do Pará e nãoencontra elementos que justifiquem se afastar da sua jurisprudência. Portanto, a Cortedesconsidera a exceção preliminar de falta de competência da Corte para conhecer o artigo 7o

da Convenção de Belém do Pará.

31. Em terceiro lugar, a Corte observa que nem a Comissão nem os representantessolicitaram ao Tribunal que declarasse violação à Convenção para a Prevenção e a Punição doDelito de Genocídio (CPSDG). Consequentemente, desconsidera-se a exceção preliminar defalta de competência da Corte para declarar violações da CPSDG, uma vez que carece deobjeto. Sem prejuízo disso, como em outros casos, mesmo contra a Guatemala, a Corteconsidera útil e adequado interpretar a Convenção Americana, tendo em conta outros tratados

17 O artigo 12 desse tratado aborda a possibilidade de apresentar "petições" perante a Comissão, referentes a"denúncias ou queixas de violação do [seu] artigo 7o", estabelecendo que "a Comissão as considerará emconformidade com as normas e os requisitos de procedimento para a apresentação e consideração de petiçõesprevistas na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e no Estatuto e o Regulamento da Comissão". A esserespeito, a Corte destacou que na elaboração do artigo 12 da Convenção de Belém do Pará "não é excluída qualquerdisposição da Convenção Americana, pelo qual se terá que concluir que a Comissão atuará nas petições sobre o artigo7o da Convenção de Belém do Pará 'em conformidade com o disposto nos artigos 44 a 51 da [Convenção Americana]',como dispõe o artigo 41 da mesma Convenção. O artigo 51 da Convenção [...] se refere [...] expressamente àsubmissão de casos perante a Corte”. Cfr. Caso González e outras (“Campo Algodoeiro”) Vs. México. ExceçõesPreliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 16 de novembro de 2009 Série C No 205, par. 41. No mesmosentido, ver Caso Veliz Franco e outros Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentençade 19 de maio de 2014 Série C N° 277, nota de rodapé 22; Caso Espinoza Gonzáles Vs. Peru. Exceções Preliminares,Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 20 de novembro de 2014 Série C No 289, nota de rodapé 5 e Velásquez Paize outros Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 19 de novembro de 2015Série C No307, par. 19.18 Cfr. Caso Massacres do Rio Negro Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 04 de setembro de 2012, Série C No250, par. 17; Caso Gudiel Álvarez e outros ("Diário Militar") Vs.Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 20 de novembro de 2012. Série C No253, par. 17; Caso VelizFranco e outros Vs. Guatemala, par. 36, e Caso Velásquez Paiz e outros Vs. Guatemala, par. 19.

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do direito internacional humanitário19 e o direito penal internacional20, considerando aespecificidade na matéria.21

B.2. Alegada falta de competência para determinar o cometimento de delitos

B.2.1. Argumentos da Comissão e das partes

32. O Estado declarou que nem "a Corte nem a Comissão podem indicar que foramcometidos delitos neste caso já que não são uma Corte Penal nem tem essa competência".Assim, solicitou à Corte que "não culpe o Estado pelo cometimento de delitos". A título deexemplo, disse que a Comissão se referiu de forma indevida a "homicídios, assassinatos,execuções extrajudiciais, crime de guerra, crime contra a humanidade, ou genocídio [...]".

33. A Comissão afirmou que "tanto a [Comissão] quanto a Corte foram consistentes emindicar que a sua competência não é de natureza penal, senão de natureza de supervisão documprimento com as obrigações livremente assumidos pelos Estados partes". Por outra parte,afirmou que o argumento do Estado não constitui uma exceção preliminar uma vez que nãopretende contestar a competência da Corte para conhecer o caso.

34. Os representantes afirmaram que "o desaparecimento forçado é uma violação aosdireitos humanos [...] que é de competência da Corte [...] por constituir uma violação múltiplae continuada de direitos reconhecidos na Convenção [...] e porque os atos constitutivos dedesaparecimento forçado têm caráter permanente enquanto não se conheça o paradeiro davítima ou os restos sejam encontrados". Da mesma forma, solicitaram à Corte que declarasseque a Guatemala aplicou uma política de genocídio contra o povo maia-achi, de Rabinal, e queexiste uma responsabilidade internacional agravada para o Estado que deve ser levada emconsideração no momento de fixar as reparações, uma vez que a "proibição de genocídio deveser uma extensão do direito à vida [...]".

B.2.2. Considerações da Corte

35. Este Tribunal já esclareceu que dentro do âmbito da sua jurisdição, cabe avaliar as açõesou omissões de agentes do Estado nos casos apresentados perante ela e classificá-las emconformidade com a Convenção Americana e demais tratados interamericanos que outorgamcompetência em seu favor. Para este exercício, também poderá levar em consideração outrosinstrumentos internacionais, considerando a sua especificidade na matéria. Além disso, nãocabe à Corte analisar nem determinar responsabilidades individuais, cuja definição competeaos tribunais penais internos e internacionais (supra par. 20). Desse modo, rejeita-se a

19 Ver, por exemplo, o Caso das Comunidades afrodescendentes deslocadas da Bacia do Rio Cacarica (OperaçãoGênese) Vs. Colômbia. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 20 de novembro de 2013Série C No 270, par. 221, e Massacre de Santo Domingo Vs. Colômbia. Exceções Preliminares, Mérito e Reparações.Sentença de 30 de novembro de 2012, Série C No 259, par. 187.20 Ver, Caso do Massacre das Duas Erres Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 24 de novembro de 2009 Série C No 211, par. 140; Caso Almonacid Arellano e outros Vs. Chile. ExceçõesPreliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 26 de setembro de 2006, Série C No154, par. 93 et seq.; CasoGelman Vs. Uruguai. Mérito e Reparações. Sentença de 24 de fevereiro de 2011, Série C No221, par. 99, nota derodapé 113, Caso Contreras e outros Vs. El Salvador. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 31 de agosto de 2011,Série C No 232, par. 82, nota de rodapé 102.21 Ver, artigo 64 da Convenção Americana.

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exceção preliminar apresentada pelo Estado a respeito da falta de competência da Corte parase pronunciar sobre delitos, uma vez que carece de fundamento.

B.3. Alegada falta de competência para declarar a invalidade da anistia

B.3.1. Argumentos da Comissão e das partes

36. O Estado afirmou que a Corte carece de "competência para declarar a invalidade daanistia", devido a que: i) ela foi declarada por meio da Lei de Reconciliação Nacional a fim deobter uma saída negociada ao enfrentamento armado interno; ii) a anistia foi negociada com aparticipação da maioria dos setores da sociedade guatemalteca, e foram levados emconsideração "os elementos da verdade", a criação de medidas de reparação às vítimas emedidas de não repetição, bem como as bases de incorporação dos grupos insurgentes à vidado país; e iii) a anistia na Guatemala não é uma "auto anistia" e não exclui os delitos maisgraves de transcendência internacional. Desse modo, a anistia promulgada no caso daGuatemala cumpriria com os requisitos exigidos pela Corte para a sua vigência.22

37. A Comissão destacou que “segundo os termos dos artigos 1o e 2o da ConvençãoAmericana, entre outros, é precisamente um componente indispensável da competência daCorte analisar até que ponto um Estado incorporou as garantias desse tratado na suanormativa, políticas e práticas”.

38. Os representantes afirmaram que "a aplicação das disposições de anistia da Lei deReconciliação Nacional contrariaria as obrigações decorrentes da Convenção Americana [...] eoutros instrumentos internacionais e impediriam a investigação e a punição aos responsáveispelas violações graves aos direitos humanos".

B.3.2. Considerações da Corte

39. A Corte lembra que as exceções preliminares são intervenções do Estado que buscam,de forma prévia, impedir uma análise do mérito de um caso. Consequentemente, se taisargumentos não podem sem considerados sem entrar na análise prévia do mérito do caso, nãopodem ser analisados mediante uma exceção preliminar. Assim sendo, a análise da validade deuma lei é uma questão de mérito. Além disso, nem a Comissão nem os representantessolicitaram ao Tribunal que declarasse a invalidade da Lei de Reconciliação Nacional em simesma, mas questionaram a sua aplicação neste caso. Por tais motivos, rejeita-se a exceçãopreliminar apresentada pelo Estado a respeito da alegada falta de competência da Corte parase pronunciar sobre a invalidade da Lei de Reconciliação Nacional.

C. Exceção por não terem sido esgotados os recursos internos

C.1. Argumentos da Comissão e das partes

40. O Estado apresentou uma exceção por não terem sido esgotados os recursos internos,argumentando que as supostas vítimas não apresentaram o recurso de habeas corpus ouapresentação pessoal em nenhum dos casos de desaparecimentos ou prisões ilegais, nemrecorreram ao PNR (Programa Nacional de Ressarcimento) como recurso administrativo criado

22 A tal respeito, citou o Caso Massacres de El Mozote e lugares vizinhos Vs. El Salvador e o Voto Concorrente doJuiz Diego García Sayán, no mesmo.

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para prestar ressarcimento individual e/ou coletivo às vítimas civis de violações dos direitoshumanos acontecidas durante o enfrentamento armado interno, que inclui o apoio material epsicológico às vítimas e aos seus familiares.

41. A Comissão argumentou que a presente exceção preliminar é extemporânea, uma vezque "na etapa de admissibilidade do Estado não alegou que ambos os recursos apresentadosem sua contestação escrita deviam ter sido esgotados [...]". Na etapa de admissibilidadeperante a Comissão, a Guatemala apenas alegou que "existiam processos penais pendentes", euma vez "na etapa de mérito o Estado alegou que um grupo de vítimas teriam recebido umaindenização por parte do PNR". Depois da emissão do Relatório de Mérito, a Guatemala "nãoprecisou [...] os montantes que os familiares das vítimas teriam recebido e a sua conexão comos fatos e as violações declaradas [...]". Consequentemente, afirmou que os argumentos doEstado a respeito deste ponto não configuram uma exceção preliminar e devem serconsiderados pela Corte no momento de determinar as reparações cabíveis". 42. Os representantes afirmaram que a exceção deve ser declarada "improcedente [...]porque a obrigação de investigar ex officio do Estado é independente da apresentação de umadenúncia [...]". Afirmaram que os familiares das supostas vítimas são aqueles que levaramadiante as investigações; no entanto, as autoridades não esclareceram os fatos nemdeterminaram o paradeiro dos desaparecidos. Além disso, afirmaram que a exceção por teremsido esgotados os recursos internos deve ser apresentada na etapa de admissibilidade perantea Comissão.

C.2. Considerações da Corte

43. O artigo 46.1.a) da Convenção Americana dispõe que para determinar a admissibilidade deuma petição ou comunicação apresentada perante a Comissão Interamericana, emconformidade com os artigos 44 ou 45 da Convenção, é necessário que tenham sidoapresentados e esgotados os recursos da jurisdição interna, conforme os princípios do DireitoInternacional geralmente reconhecidos. Nesse sentido, a Corte tem afirmado que uma objeçãoao exercício da sua jurisdição na suposta falta de esgotamento dos recursos internos deve serapresentada no momento processual oportuno, ou seja, durante o processo de admissibilidadeperante a Comissão. Ao alegar não terem sido esgotados os recursos internos, cabe ao Estadoespecificar quais ainda não foram esgotados, e demonstrar que estes estavam disponíveis eque eram adequados, idôneos e efetivos.23 Nesse sentido, o Tribunal declarou que não cabenem à Corte nem à Comissão, identificar ex officio quais são os recursos internos pendentes deesgotamento. Portanto, não compete aos órgãos internacionais corrigir a falta de precisão dasalegações do Estado.24

44. No seu escrito de contestação à demanda, o Estado apresentou perante a Corte aexceção preliminar de não esgotamento de recursos internos, com base em dois argumentos:i) a existência e não esgotamento do recurso de habeas corpus ou apresentação pessoal; e ii)

23 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Exceções Preliminares. Sentença de 26 de junho de 1987, SérieC No 1, par. 88, Caso Herrera Espinoza e outros Vs. Equador. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 1o de setembro de 2016, Série C No316, par. 25.24 Cfr. Caso Reverón Trujillo Vs. Venezuela. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 30de junho de 2009, Série C No 197, par. 23, e Caso Flor Freire Vs. Equador. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações eCustas. Sentença de 31 de agosto de 2016, Série C No 315, par. 24.

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a existência e não esgotamento do recurso administrativo denominado "PNR (ProgramaNacional de Ressarcimento".

45. A tal respeito, a Corte observa que a petição inicial perante a Comissão foi apresentadaem 13 de dezembro de 2007 e transferida ao Estado em 14 de julho de 2008. A resposta doEstado foi recebida em 10 de setembro de 2008. Nesse momento, o Estado declarou que nãoexistia "esgotamento dos recursos administrativos e judiciais disponíveis no ordenamentointerno [...]".25 Declarou que as investigações penais se encontravam na fase de investigação eque continuariam indagando sobre "as causas que ocasionaram o atraso na tramitação doprocesso antes identificado",26 e afirmou que existiam outros recursos administrativos, como oPNR, que também não tinham sido esgotados. Assim, a Corte destaca que o Estado nãomencionou a disponibilidade do recurso de habeas corpus ou apresentação pessoal no referidoescrito, nem em qualquer momento durante a etapa de admissibilidade perante a Comissão.Portanto, a presente alegação é extemporânea.

46. Enquanto ao segundo argumento, a Corte já estabeleceu no parágrafo anterior que elefoi apresentado no momento oportuno. No entanto, o Estado não informou ao Tribunal porquais motivos o Programa Nacional de Ressarcimento seria um recurso adequado, idôneo eefetivo para reparar as violações específicas alegadas no presente caso sobre as quais estaCorte tem competência (supra par. 24), além de assinalar que foi criado como recursoadministrativo "para oferecer ressarcimento individual e/ou coletivo às vítimas civis deviolações dos direitos humanos ocorridas durante o enfrentamento armado interno, que inclui oapoio material e psicológico aos familiares das vítimas falecidas e às vítimas sobreviventes".27

Em todo caso, o Tribunal considera que, em casos como o presente, em que são alegadasgraves violações aos direitos humanos, a apresentação da denúncia penal é suficiente parasatisfazer os requerimentos do artigo 46.1.a da Convenção.28

47. Com vistas no que antecede, a Corte indefere a exceção preliminar de não terem sidoesgotados os recursos internos.

D. Exceção de carência de faculdade para apresentar outra demanda pelos mesmos fatos

D.1. Argumentos da Comissão e das partes

48. O Estado solicitou à Corte que se abstivesse de conhecer o presente caso, "uma vez quea maioria das supostas vítimas já foram ressarcidas [através do Programa Nacional deRessarcimento] e dado que elas assinaram, naquela oportunidade, uma declaração na qual seobrigam a não apresentar no futuro qualquer outra demanda contra o Estado".

49. A Comissão não se referiu de forma específica a esse ponto. Os representantesargumentaram que "a Guatemala não fez uma reparação justa, digna e integral a respeito das

25 Escrito do Estado de 10 de setembro de 2008 (expediente de prova, folha 2954).26 Escrito do Estado de 10 de setembro de 2008 (expediente de prova, folha 2954).

27 Escrito de contestação do Estado. (Expediente de fundo, folha 1042), e Escrito do Estado de 28 de abril de2010 (expediente de prova, folhas 3220 e 3221).28 Ver, Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 194, e Caso Massacres de El Mozote e lugares vizinhosVs. El Salvador, pars. 242 a 244.

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consequências da totalidade das violações aos direitos humanos cometidas contra as supostasvítimas e sobreviventes [...] porque o PNR não responde aos parâmetros internacionais dereparação aceitas".

D.2. Considerações da Corte

50. Em virtude do princípio de complementaridade,29 uma vez que órgãos internos jácumpriram adequadamente com o dever de investigar e possibilitaram a reparação às supostasvítimas, pode não ser necessário que a Corte analise a violação aos direitos substantivos. Noentanto, tendo alegado o não cumprimento desses deveres, a Corte considera que, como emoutros casos,30 as alegações do Estado devem ser analisadas no Capítulo de Reparações infra.Portanto, o Tribunal rejeita esta exceção preliminar.

VRECONHECIMENTO PARCIAL DE RESPONSABILIDADE

A. Reconhecimento parcial de responsabilidade do Estado e observações da Comissão e dos representantes

51. Na audiência pública, o Estado propôs um acordo de solução amigável e declarou queisso "devia ser interpretado como um reconhecimento de responsabilidade do Estado por nãocumprir com os artigos 8o de garantias judiciais e 25, de proteção judicial da Convenção"."Considerando que a investigação dos fatos deste caso, até o momento, não apresentouresultados positivos, convocou as partes a criar uma comissão fiscalizadora e de avaliação dasintervenções pendentes [...]". Por outra parte, na sua resposta, a Guatemala afirmou que "emmomento algum pretendia negar que os fatos [aconteceram] ou negar que existeresponsabilidade do Estado se houve dolo, negligência ou culpa institucional ou de funcionáriosou empregados públicos; nem [...] que esteja evadindo a obrigação do Estado de ressarcir asvítimas". No entanto, solicitou que a Corte se abstivesse de se pronunciar a esse respeito, umavez que carece de competência para conhecer tais fatos.

52. Na audiência pública e nas alegações finais escritas, os representantes recusaram aproposta de solução amigável e solicitaram que se outorgasse efeitos jurídicos "à aceitação daresponsabilidade internacional de 29 de julho de 2011 do Estado"31 perante a Comissão e aoreconhecimento de responsabilidade internacional realizado na audiência pública. Manifestaram

29 Este Tribunal já afirmou que a responsabilidade do Estado sob a Convenção apenas pode ser exigida em nívelinternacional depois que o Estado tenha tido a oportunidade de declarar a violação e de reparar o dano causado pelosseus próprios meios. Isso, com base no princípio de complementaridade, que informa transversalmente o SistemaInteramericano de Direitos Humanos, que é, tal como expressa o Preâmbulo da própria Convenção, "coadjuvante oucomplementar da [proteção] que oferece o direito interno dos Estados americanos". Cfr. Caso Tarazona Arrieta.Exceção Preliminar, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 15 de outubro de 2014. Série C N° 286, par. 137.30 Cfr. Massacres do Rio Negro Vs. Guatemala, par. 296; Caso das Comunidades afrodescendentes deslocadasda Bacia do Rio Cacarica (Operação Gênese) Vs. Colômbia, pars. 469 a 476, e Caso Rodríguez Vera e outros(Desaparecidos do Palácio da Justiça) Vs. Colômbia, par. 548.31 Mediante escrito de 29 de julho de 2011, apresentado no trâmite perante a Comissão, a Guatemala declarou que"considerando que o Presidente da República [...] pediu perdão em nome do Estado aos familiares de algumas vítimaspelas angústias e pela dor causada durante o conflito armado interno, [...] neste caso, aceita a sua responsabilidadeinternacional pelas violações alegas e fundamentadas pelos peticionários, a partir da execução dos fatos até esta data,a respeito das vítimas plenamente identificadas, cuja violação de direitos se comprova mediante os expedientesabertos perante as instituições da justiça nacional, e a respeito das vítimas identificadas que se encontremdocumentadas no Relatório da Comissão para o Esclarecimento Histórico" (expediente de prova, folha 3159).

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que, "embora [...] não foi expressamente dito", pode-se interpretar que o Estado reconheceu asua responsabilidade internacional em relação às violações alegadas e fundamentadas pelospeticionários e que "o reconhecimento [...] abrangia todos os fatos deste caso". Da mesmaforma, solicitaram que se considerasse o texto da resposta do Estado.

53. A Comissão não se referiu de forma específica ao reconhecimento de responsabilidadedos artigos 8o e 25 da Convenção realizada pelo Estado na audiência pública. No entanto,referiu-se ao reconhecimento de responsabilidade realizada pelo Estado perante a Comissão eà suposta reiteração de tal reconhecimento na resposta, no âmbito da exceção preliminarratione temporis interposta pela Guatemala (supra par. 15).

B. Considerações da Corte

54. Em conformidade com os artigos 6232 e 6433 do Regulamento e no exercício das suasfaculdades de tutela judicial internacional de direitos humanos, questão de ordem públicainternacional que transcende a vontade das partes, incumbe ao Tribunal zelar porque os atosde conhecimento sejam aceitáveis para as finalidades que busca cumprir o sistemainteramericano. A tais efeitos, o Tribunal analisa a situação apresentada em cada casoconcreto.

55. Durante a audiência pública do caso, o Estado reconheceu a sua responsabilidade pelaviolação dos direitos às garantias judiciais e à proteção judicial, previstos nos artigos 8o e 25da Convenção, uma vez que "a investigação [...] até o momento não apresentou resultadospositivos". Porém, não especificou em prejuízo de quem reconhecia tal violação.

56. Conforme o anterior, o Tribunal resolve aceitar o reconhecimento parcial deresponsabilidade apresentado pelo Estado, no sentido de que violou os artigos 8o e 25 daConvenção Americana. Sem prejuízo disso, a Corte observa que persiste a controvérsia emquanto à abrangência das referidas violações, bem como sobre quem foram as pessoasprejudicadas por elas. Também permanece a controvérsia sobre as violações dos direitosestabelecidos nos artigos 3o, 4o, 5o, 6o, 7o, 11, 12, 16, 17, 19, 21, 22, 23, 24 e 24 daConvenção Americana, em relação às obrigações estabelecidas no artigo 1.1 do mesmoinstrumento; do artigo I da Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado dePessoas, e do artigo 7o da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar aViolência contra a Mulher, alegadas pela Comissão e/ou os representantes.

57. Por outro lado, a Corte considera que, perante a Comissão Interamericana, o Estadoreconheceu aqueles fatos comprovados "mediante os expedientes abertos perante asinstituições da Justiça nacional" e que se encontram documentados no Relatório da Comissãopara o Esclarecimento Histórico. Da mesma forma, na sua contestação, o Estado não negou osfatos deste caso, nem a sua obrigação de "ressarcir as vítimas", no entanto, opôs uma exceçãopreliminar ratione temporis, alegando que a Corte carece de competência para conhecê-los.

32 Artigo 62. Reconhecimento. "Caso o denunciado comunicar à Corte a sua aceitação dos fatos ou o seureconhecimento total ou parcial às pretensões que constam na submissão do caso ou no escrito das supostas vítimasou seus representantes, a Corte, ouvido o parecer dos demais intervenientes no processo, resolverá, no momentoprocessual oportuno, sobre a sua procedência e os seus efeitos jurídicos”.33 Artigo 64. Continuação da análise do caso. "A Corte, considerando as responsabilidades que lhe cabem deproteger os direitos humanos, poderá decidir pelo prosseguimento da análise do caso, mesmo na presença dos casosprevistos nos artigos precedentes”.

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58. Em conformidade com o artigo 41.3 do Regulamento,34 e em virtude do princípio deestoppel,35 a Corte considera aceitos os fatos do caso e os considerará como certos enquanto ocontrário não surja nos autos ou não resulte da convicção judicial (infra Capítulo VIII). Noentanto, analisará tais fatos em conformidade com o que estabelece o Capítulo IV destaSentença.

VICONSIDERAÇÃO PRÉVIA

A. Argumentos da Comissão e das partes

59. No seu escrito de solicitações e argumentos, os representantes invocaram o artigo 35.2do Regulamento a fim de solicitar a inclusão como supostas vítimas, além das pessoasmencionadas no Relatório de Mérito, a Juan Pérez Sic, quem estaria desaparecido, a 18familiares das supostas vítimas diretas do caso, bem como a 97 (sic) famílias apresentadas emuma lista anexada ao seu escrito. Nesse ponto, alegaram que os "efeitos negativos daperseguição, o deslocamento forçado, o temor prevalecente [e] o tempo transcorrido sãofatores que tornaram difícil poder apresentar perante a Comissão [...] a lista dos sobreviventesdos massacres".

60. No seu escrito de observações às exceções preliminares, remetido em 26 de junho de2015, os representantes solicitaram que todos os membros e as famílias da comunidade deChichupac e comunidades vizinhas do Rabinal sejam classificadas como vítimas. Anexaramuma nova lista de 39 famílias que solicitaram que sejam incluídas como supostas vítimas dedeslocamento forçado. Posteriormente, mediante escrito de 19 de abril de 2016, osrepresentantes enviaram 212 certidões de nascimento, óbito e matrimônio das supostasvítimas que teriam sofrido deslocamento forçado, perseguição e desarraigamento. Nas suasalegações finais escritas e junto com a prova para melhor resolver, remetida ao Tribunal, osrepresentantes apresentaram uma lista geral que "inclui a maior quantidade de" supostasvítimas e os seus familiares, bem como uma lista de supostas vítimas de deslocamento forçadoque teriam voltados às suas comunidades depois de 09 de março de 1987 ou que até apresente data permaneceriam em situação de deslocamento. Solicitaram também que se"deixe em aberto a possibilidade de identificações de futuras vítimas [...] e que seja criado ummecanismo efetivo de identificação de vítimas de deslocamento [...]".

61. Na audiência pública e nas suas alegações finais escritas, a Comissão destacou aimportância da aplicação do art. 35.2 do Regulamento da Corte, permitindo a inclusão de maisvítimas não identificadas expressamente no Relatório de Mérito.

62. Na sua resposta e alegações finais escritas, o Estado argumentou que o acréscimo devítimas por parte dos representantes é extemporânea e carece de fundamento, pelo qualsolicitou à Corte que não as admitisse.36

34 Artigo 41.3: "A Corte poderá considerar aceitos aqueles fatos que não tenham sido expressamente negados e aspretensões que não tenham sido expressamente contestadas”.35 Segundo a prática internacional, quando uma parte de um litígio adotou determinada atitude que implica prejuízopróprio ou em benefício da parte contrária, não pode, em virtude do princípio de estoppel, assumir outra conduta queseja contraditória à primeira. Cfr. Caso Huilca Tecse Vs. Peru. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 03 de marçode 2005. Série C N° 121, par. 56, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru. Exceções Preliminares,Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 1o de setembro de 2015. Série C N° 299, par. 27.

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B. Considerações da Corte

63. O artigo 35.1 do Regulamento dispõe que o caso será submetido à Corte mediante aapresentação do Relatório de Mérito da Comissão, o qual deverá conter "a identificação dassupostas vítimas". Em conformidade com essa norma, cabe à Comissão, e não a este Tribunal,identificar as supostas vítimas com precisão e no devido tempo processual em um casoapresentado perante a Corte. A segurança jurídica exige, como norma geral, que todas assupostas vítimas sejam devidamente identificadas no Relatório de Mérito, não sendo possívelacrescentar novas supostas vítimas depois da apresentação, exceto na circunstânciaexcepcional contemplada no artigo 35.2 do Regulamento da Corte.

64. Em conformidade com o mencionado artigo 35.2 do Regulamento, "quando se justificar aimpossibilidade de identificar alguma (s) vítima (s) dos fatos do caso por se tratar de casos deviolações massivas ou coletivas, o Tribunal resolverá dentro do seu prazo se considera asvítimas ou não". Na sua jurisprudência a esse respeito, a Corte avaliou a aplicação do artigo35.2 do Regulamento com base nas características particulares de cada caso,37 e destacou quenão é objetivo seu emperrar mediante formalismos o desenvolvimento do processo, mas, pelocontrário, aproximar a definição dada na Sentença à exigência de justiça. Assim, a Corteaplicou o artigo 35.2 nos casos massivos ou coletivos com dificuldades para identificar ou fazercontato com todas as supostas vítimas, por exemplo, devido à presença de um conflitoarmado, o deslocamento forçado ou a queima ou destruição dos corpos das supostas vítimas,ou em casos em que famílias inteiras desapareceram, pelo qual não haveria ninguém quepudesse falar em seu nome. Também levou em consideração a dificuldade de ter acesso à áreaonde se desenvolveram os fatos, a falta de registros a respeito dos habitantes do lugar e apassagem do tempo; bem como características particulares das supostas vítimas do caso, porexemplo, quando estas formaram clãs familiares com nomes e sobrenomes parecidos, ou porse tratar de migrantes. Da mesma forma, considerou-se a conduta do Estado, por exemplo,

36 Mediante escritos de 30 de julho e 14 de setembro de 2015, o Estado reiterou a sua recusa à inclusão denovas supostas vítimas. A apresentação, por parte do Estado, do escrito de 30 de julho de 2015, intitulado "Posição doEstado da Guatemala em relação à inclusão de novas vítimas no Caso [...]", não está prevista dentro do Regulamentoda Corte. Portanto, as alegações expostas através desse escrito são extemporâneas e não serão consideradas. Damesma forma, a fim de garantir a possibilidade de contraditório, mediante nota da Secretaria, de 04 de agosto de2015, foi solicitado aos representantes e à Comissão que apresentassem as observações que considerassempertinentes ao referido escrito do Estado. No entanto, uma vez que o referido escrito não é parte do processo, oTribunal também não considerará as observações dos representantes e da Comissão em relação a esse ponto,remetidas mediante escritos de 30 e 31 de agosto de 2015, respectivamente. Por outra parte, por meio do seu escritode observações às listas definitivas de declarantes da Comissão e dos representantes, apresentado em 14 de setembrode 2015, o Estado novamente expôs alegações referentes à inclusão de outras supostas vítimas. Tais alegaçõestambém não serão consideradas pelo Tribunal, uma vez que não era o momento processual oportuno.37 Cabe destacar que a Corte aplicou o artigo 35.2 do seu Regulamento nos seguintes casos: Caso Massacres doRio Negro Vs. Guatemala, pars. 48 a 51; Caso Nadege Dorzema e outros Vs. República Dominicana. Mérito,Reparações e Custas. Sentença de 24 de outubro de 2012. Série C No 251, pars. 29 a 37; Caso Massacres de ElMozote e lugares vizinhos Vs. El Salvador, pars. 49 a 57; Caso das Comunidades afrodescendentes deslocadas daBacia do Rio Cacarica (Operação Gênese) Vs. Colômbia, pars. 33 a 36, e Caso Comunidade Camponesa de SantaBárbara Vs. Peru, pars. 54 a 57. Da mesma forma, recusou a sua aplicação nos seguintes casos: Barbani Duarte eoutros Vs. Uruguai. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 13 de outubro de 2011. Série C N o 234, par. 43; CasoDefensor de Direitos Humanos e outros Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentençade 28 de agosto de 2014. Série C No 283, par. 47; Caso García e Familiares Vs. Guatemala. Mérito, Reparações eCustas. Sentença de 29 de novembro de 2012. Série C No 258, pars. 34 a 37; Caso Suárez Peralta Vs. Equador.Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 21 de maio de 2013. Série C No 261, pars. 26 a 28;Caso J. Vs. Peru. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 27 de novembro de 2013. Série CNo 275, par. 23 a 25; Caso Rochac Hernández e outros Vs. El Salvador. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 14de outubro de 2014. Série C No 285, par. 34, e Caso Argüelles e outros Vs. Argentina. Exceções Preliminares, Mérito,Reparações e Custas. Sentença de 20 de novembro de 2014. Série C No 288, par. 236.

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quando existem alegações de que a falta de investigação contribuiu para a identificaçãoincompleta das supostas vítimas.

65. Este caso é de caráter coletivo, está inserido no conflito armado guatemalteco e envolve,em princípio, aproximadamente 477 supostas vítimas listadas no "Anexo único" do Relatório deMérito. Além disso, neste caso teriam ocorridas supostas prisões arbitrárias, múltiplasexecuções extrajudiciais, desaparecimentos forçados, violações e outras formas de violênciasexual, tortura, queima de casas e bens, deslocamento e perseguição dos habitantes da aldeiaChichupac e comunidades vizinhas, bem como falta de acesso à justiça, tudo isso em umalegado contexto de graves e massivas violações aos direitos humanos, dentro do qual o povomaia teria sido especialmente afetado. Para algumas famílias, o deslocamento permanecia atéesta data. Aliado a isso, os fatos do presente caso aconteceram entre 28 e 33 anos antes daapresentação do Relatório de Mérito ao Tribunal, em 05 de agosto de 2014. Nesse contexto, oTribunal considera razoável que tenha sido uma tarefa complexa a identificação da totalidadedas supostas vítimas do caso. Por outra parte, o Estado não contestou em especial a condiçãode suposta vítima de nenhuma das pessoas identificadas pelos representantes no escrito desolicitações e argumentos, nem nos escritos de 26 de junho de 2015 e 30 de maio e 02 dejunho de 2016, alegando unicamente e de forma genérica, que a identificação dessas pessoasfoi extemporânea. Portanto, em aplicação do artigo 35.2 do Regulamento, esta Corteconsiderará como supostas vítimas aquelas pessoas identificadas e individualizadas pelaComissão no Relatório de Mérito, bem como pelos representantes a "Lista Geral de Vítimas" ena lista de "Pessoas individualizadas e deslocadas", remetidas em 02 de junho de 2016, umavez que, segundo eles, tais listas "mostram e envolvem a maior quantidade de vítimas docaso". O que antecede, sempre e quando o Tribunal conte com a prova necessária paraverificar a identidade de cada uma dessas pessoas. Essas pessoas estão identificadas nosAnexos I e II desta Sentença.

VIIPROVA

A. Prova documental, testemunhal e pericial

66. Este Tribunal recebeu diversos documentos apresentados como prova pela Comissão e aspartes, adjuntos aos seus escritos principais (supra pars. 1, 4 e 5). Da mesma forma, a Corterecebeu dos representantes documentos solicitados como prova para melhor resolver, emconformidade com o artigo 58 do Regulamento (supra par. 10). Além disso, a Corte recebeu asdeclarações prestadas perante agente dotado de fé pública (affidávit) pelos peritos AlejandroRodríguez Barillas38 e Ramón Cadena Rámila,39 e a suposta vítima Miguel Sic Osorio,40 todospropostos pelos representantes. Enquanto à aprova apresentada em audiência pública, a Cortetomou as declarações das supostas vítimas Napoleón García De Paz e Juana García Depaz,bem como do perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza, todos propostos pelosrepresentantes, bem como a perícia de Cristián Alejandro Correa Montt, proposta pela

38 Declaração perante agente dotado de fé pública de Alejandro Rodríguez Barillas (Expediente de prova, folhas11504 a 11591).39 Declaração perante agente dotado de fé pública de Ramón Cadena Rámila (Expediente de prova, folhas 11600 a11654).40 Declaração perante agente dotado de fé pública de Miguel Sic Osorio (Expediente de prova, folhas 11592 a11599).

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Comissão.41 Além disso, mediante escrito datado de 25 de junho de 2015, a Corte recebeu porparte dos representantes 62 documentos anexados consistentes em certidões de nascimento,casamento e óbito, emitidos pelo Registro Nacional das Pessoas, de supostas vítimas dacomunidade de Chichupac e outras, do município de Rabinal, Departamento de Baja Verapaz.Mediante escrito datado de 19 de abril de 2016, os representantes remeteram certidões denascimento, casamento e óbito emitidos pelo Registro Nacional das Pessoas da República daGuatemala, bem como 26 atas notariais de declaração pública das supostas vítimas da aldeiaChichupac e comunidades vizinhas do município de Rabinal, que supostamente sofreramperseguição, deslocamento forçado e desarraigamento das suas comunidades ancestrais.Finalmente, em 30 de maio de 2016, a Corte recebeu por parte dos representantes, um anexodenominado "pessoas individualizadas e deslocadas", bem como uma "lista Geral de Certidões"e "Lista Geral de vítimas", em 02 de junho de 2016.

B. Admissão da prova

B.1. Admissão da prova documental

67. O Tribunal admite os documentos apresentados na devida oportunidade processual pelaspartes e pela Comissão, e cuja admissibilidade não seja contestada nem objetada,42 bem comoos documentos procurados e incorporados de ofício pelo Tribunal.43 A respeito de algunsdocumentos destacados pelas partes e a Comissão por meio de links, este Tribunal estabeleceuque se uma parte proporciona ao menos o link direto do documento citado como prova e épossível acessá-lo, a segurança jurídica não se vê afetada, nem o equilíbrio processual,porque a Corte e as outras partes podem localizá-lo imediatamente.44

68. A respeito da oportunidade processual para a apresentação de prova documental, emconformidade com o artigo 57.2 do Regulamento, esta deve ser apresentada, em geral, junto

41 Mediante escrito de 04 de abril de 2016, a Comissão desistiu de apresentar a perícia de Antonio Delgado.Mediante comunicação recebida em 11 de abril de 2016, o Estado comunicou a desistência da apresentação, tanto poraffidávit quanto durante a audiência, dos três peritos e duas testemunhas convocadas mediante a Resolução de 28 demarço de 2016.42 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 140, e Caso Herrera Espinoza e outros Vs. Equador, par.44.

43 Os documentos procurados de ofício pelo tribunal como prova para melhor resolver são os seguintes: Guia no

10346061 de El Correo, de 20 de março de 2015 (expediente de prova, folha 11734); Ofício de 19 de março de 2015assinado por Jose Luis Linares Gutiérrez, Auxiliar Promotor I Ministério Público (expediente de prova, folhas 11735 a11745); Descrição de Álbum de fotografias da Unidade de Coleta de Evidências, Departamento de InvestigaçõesCriminalísticas Ministério Público. Relatório No ECA248-999-2015-118 Referência No MP248-2006-441 (expediente deprova, folha 11746); Fotografia No 1 e No 2, referência MP 248-2006-441 (expediente de prova, folha 11747);Fotografia No 3 e No 4, referência MP248-2006-441 (expediente de prova, folha 11748); Fotografia No 5 e No 6,referência MP248-2006-441 (expediente de prova, folha 11749); Fotografia No7 e No8, referência MP248-2006-441(expediente de prova, folha 11750); Fotografia No 9 e No 10, referência MP248-2006-441 (expediente de prova, folha11751); Fotografia No11 e No 12, referência MP248-2006-441 (expediente de prova, folha 11752); Informação doSubdepartamento de Controle Migratório, de 26 de março de 2015 (expediente de prova, folhas 11753 a 11756);Solicitação de urgência de adiantamento de prova de declaração testemunhal no expediente MP248-2006-441, de 16de julho de 2013 (expediente de prova, folhas 11757 a 11760); Perícia MP248-441-2006, aldeia Guachipilín, de 31 dejaneiro de 2008, expediente No MP248-2006-441 (expediente de prova, folhas 11761 a 11776 bis 14); Anexo MP247-2003-1142 Execução (expediente de prova, folhas 11777 a 11903), e Anexo resposta à comunicação datada de 12 demaio de 2016, e Anexo MP248/2010/263 Elías Milián González, Parte do expediente do Ministério Público no 248-2006-441 (expediente de prova, folhas 11904 a 11907).

44 Cfr. Caso Escué Zapata Vs. Colômbia. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 4 de julho de 2007. Série C No

165, par. 26, e Caso Herrera Espinoza e outros Vs. Equador, par. 45.

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com os escritos de submissão do caso, de solicitações e argumentos, ou de contestação,conforme o caso. Não é admissível a prova remetida fora das devidas oportunidadesprocessuais, exceto nas exeções previstas no referido artigo 57.2 do Regulamento, ou seja,por força maior, grave impedimento ou quando se trata de um fato ocorrido posteriormenteaos referidos momentos processuais.

69. A tal respeito, a Corte observa que os representantes aportam listas individualizadas desupostas vítimas, bem como certidões de nascimento, casamento e óbito destas e dos seusfamiliares mediante escritos de 25 de junho de 2015 e 19 de abril, 30 de maio e 02 de junhode 2016. O Tribunal constata que os referidos documentos foram remetidos a fim decomprovar a identidade das pessoas individualizadas como supostas vítimas do caso. NoCapítulo VI desta Sentença, a Corte já destacou que considerará como supostas vítimasaquelas pessoas identificadas e individualizadas pelos representantes, sempre e quando oTribunal conte com a prova necessária para verificar a identidade de cada uma dessas pessoas.Portanto, em aplicação do artigo 58.a do Regulamento,45 a Corte aceita os documentosmencionados por considerá-los úteis e necessários para a identificação das supostas vítimas dopresente caso.

B.2. Admissão da prova testemunhal e pericial

70. Da mesma forma, a Corte considera pertinente admitir as declarações das supostasvítimas e os laudos periciais apresentados na audiência pública e perante agente dotado de fépública; no que se ajustam ao objeto que foi definido pela Presidência na Resolução mediantea qual se ordenou recebê-los e ao objeto deste caso.

C. Avaliação da prova

71. Conforme estabelecido nos artigos 46, 47, 48, 50, 51, 57 e 58 do Regulamento, bemcomo na sua jurisprudência constante a respeito da prova e a sua apreciação, a Corte analisaráe avaliará os elementos probatórios documentais remetidos pelas partes e pela Comissão, asdeclarações, depoimentos e laudos periciais, bem como as provas para melhor resolver,solicitadas e anexadas por este Tribunal ao estabelecer os fatos do caso e se pronunciar sobreo mérito. Para tanto, sujeita-se aos princípios da sã crítica, dentro do marco normativocorrespondente, considerando o conjunto do acervo probatório e as alegações feitas nacausa.46 Da mesma forma, conforme a jurisprudência da Corte Interamericana, a declaraçãoapresentada pela suposta vítima não pode ser analisada de forma isolada, mas sim dentro doprocesso probatório do processo, na medida em que é possível oferecer mais informação sobreas supostas violações e as suas consequências.

72. Então, o Estado se opôs a que fosse utilizado o Relatório da Comissão de EsclarecimentoHistórico (CEH) como prova dentro do processo, uma vez que no Acordo sobre o seuEstabelecimento, ficou acertado que "os trabalhos, recomendações e relatório da Comissão nãoindividualizariam responsabilidades, nem teriam propósitos ou efeitos judiciais". Explicou queao longo do processo de negociação dos Presidentes Centro-americanos a respeito do Acordode Esquipulas, assinado em 1987, em negociação com os grupos insurgentes, e com o apoio

45 Nesse aspecto, o artigo 58.a do Regulamento estabelece: "Em qualquer estado da causa, a Corte poderá: a.Procurar de ofício toda prova que considerar útil e necessária [...]”.46 Cfr. Caso da “Panel Blanca” (Paniagua Morales e outros) Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 8 de março de 1998.Série C No 37, pars. 69 ao 76, e Caso Flor Freire Vs. Equador, par. 52.

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de países amigos e a mediação das Nações Unidas, dispôs que o referido documento não teriatais efeitos, pelo qual a Corte não pode anular esse Acordo.

73. A Corte lembra que em casos anteriores deu especial ênfase ao valor probatório dosrelatórios de Comissões da Verdade e de Esclarecimento Histórico como provas relevantes nadeterminação dos fatos e da responsabilidade internacional dos Estados.47 Nesse sentido,destacou que, conforme o objeto, procedimento, estrutura e fim do seu mandato, taiscomissões podem contribuir à construção e preservação da memória histórica, oesclarecimento de fatos e a determinação de responsabilidades institucionais, sociais e políticasem determinados períodos históricos da uma sociedade.48

74. O Relatório da Comissão de Esclarecimento Histórico (CEH) é uma referência importantena documentação do conflito armado interno e foi reiteradamente utilizado por este Tribunalcomo prova em, pelo menos, dez casos guatemaltecos a partir do ano 2000 e até o ano de2015, sem que o Estado tivesse se oposto.49 É recém neste caso que foi apresentada umaobjeção pela primeira vez. A tal respeito, esta Corte adverte que inclusive a própria Comissãode Esclarecimento Histórico ao estabelecer o seu funcionamento fez as seguintes duas posiçõesa respeito do uso do seu Relatório. Primeiro, entendeu "que a não individualização deresponsabilidades das violações de direitos humanos ou fatos de violência que estavaconvocada a esclarecer é uma característica que decorre da sua própria finalidade, que não éde caráter processual penal, mas de esclarecimento histórico". Segundo, que "por si mesmos,os [seus] trabalhos, recomendações e relatórios não têm caráter nem propósito judicial, já quea CEH não é um órgão judicial", nesse sentido, "se bem o Acordo diz que nem os trabalhosnem o Relatório têm efeitos judiciais, nada impede que a institucionalidade do Estado,especialmente as entidades do sistema de administração da justiça, podem se basear emelementos contidos no Relatório da CEH"50. Em virtude do que antecede, a Corte avaliará oRelatório da CEH junto com o restante do acervo probatório, em conformidade com as normasda sã crítica e com base na experiência, sem que se deva sujeitar a normas de prova taxada.

VIIIFATOS

75. A seguir, a Corte fará referência a: A) os antecedentes do caso; B) os fatos acontecidosna aldeia Chichupac e comunidades vizinhas, e C) os fatos relativos às investigações abertas. Atal respeito, o Tribunal aceitou os fatos que não foram expressamente negados pelo Estado,enquanto o contrário não apareceu no expediente (supra pars. 54 a 58, e 71 a 74), e assim

47 Por exemplo, a Corte se referiu a: o Relatório Final da Comissão de Esclarecimento Histórico da Guatemala; oRelatório Final da Comissão da Verdade e Reconciliação do Peru; o Relatório da Comissão da Verdade para El Salvador;o Relatório da Comissão Nacional da Verdade e Reconciliação; o Relatório sobre classificação de vítimas de violaçõesde direitos humanos e da violência política de Corporação Nacional de Reparação e Reconciliação; e o Relatório daComissão Nacional sobre prisão política e tortura, todos eles do Chile; e o Relatório da Comissão da Verdade sobre osfatos do Palácio da Justiça, na Colômbia. 48 Cfr. Caso Myrna Mack Chang Vs. Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 25 de novembro de 2003.Série C No 101, par. 131 a 134, e Caso Rodríguez Vera e outros (Desaparecidos do Palácio da Justiça) Vs. Colômbia,par. 88.49 Cfr. Casos Bámaca Velásquez, Myrna Mack Chang, Maritza Urrutia, Massacre Plan de Sánchez, Tiu Tojín, Massacredas Duas Erres, Chitay Nech e outros, Massacres de Río Negro, Gudiel Álvarez e outros, García e Familiares, VelizFranco e outros, Defensor de Direitos Humanos e outros, e Velásquez Paiz e outros.50 Cfr. Relatório da CEH “Guatemala, Memoria do Silêncio”, junho de 1999, Mandato e procedimento de trabalho,par. 68.

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sendo, expôs o relato dos fatos que é consistente com a prova que foi entregue pela Comissão,os representantes e o Estado, fazendo a citação correspondente. Da mesma forma, foi citada aprova que permite esclarecer ou precisar o indicado pelas partes e a Comissão.51 Da mesmaforma, quando foi pertinente, foram aceitos os casos em que este Tribunal se referiuanteriormente ao contexto político e histórico contemporâneo aos fatos. Cabe destacar que osfatos ocorridos antes da data de reconhecimento da competência do Tribunal por parte daGuatemala, ou seja, 09 de março de 1987, servem exclusivamente como antecedentes paracontextualizar os fatos e as alegadas violações dos direitos humanos que estão dentro da suacompetência temporal. A determinação da eventual responsabilidade internacional do Estadopela alegada violação dos direitos humanos será determinada no Capítulo IX da Sentença.

A. Antecedentes do caso

76. O Estado da Guatemala viveu um conflito armado interno entre os anos 1962 e 1996 queprovocou grandes custos humanos, materiais, institucionais e morais.52 No ano de 1990começou um processo de paz que encerrou, em dezembro de 1996, quando o Governo daRepública da Guatemala e a Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca (URNG), com aparticipação da sociedade civil, assinaram o Acordo de Paz Firme e Duradoura, com o objetivode encerrar o conflito armado. Esse Acordo outorga validade aos doze acordos que foramcelebrados durante negociações prévias, entre eles, um para o estabelecimento da Comissãopara o Esclarecimento Histórico (doravente "CEH") "das violações aos direitos humanos e osfatos de violência que causaram sofrimentos à população guatemalteca". Essa Comissão iniciouos seus trabalhos em 31 de julho de 1997 e publicou o seu Relatório “Guatemala, Memória doSilêncio” em 25 de fevereiro de 1999.53

77. No âmbito do conflito armado interno na Guatemala, o Estado aplicou o que denominoude "Doutrina de Segurança Nacional", com base na qual utilizou a noção de "inimigo interno",que inicialmente incluía as organizações guerrilheiras, mas foi se ampliando para incluir "todasaquelas pessoas que se identificavam com a ideologia comunista ou que pertenciam a umaorganização - sindical, social, religiosa, estudantil - ou a aqueles que, por qualquer motivo, nãoeram favoráveis ao regime estabelecido".54 Em aplicação dessa Doutrina, 91% das violaçõesregistradas ocorreram sob as ditaduras dos generais Romeo Lucas García (1978-1982) e JoséEfraín Ríos Montt (1982-1983).55 Com base nesta Doutrina, o exército da Guatemala

51 Foram utilizados como elementos probatórios neste Capítulo: a) o Relatório da CEH "Guatemala, Memória doSilêncio", elaborado no ano de 1999, Escritório de Serviços para Projetos das Nações Unidas; b) o Relatório do ProjetoInterdiocesano de Recuperação da Memória Histórica - Relatório REMHI - "Guatemala: Nunca Mais”, elaborado no anode 1998 pelo Escritório de Direitos Humanos do Arcebispado da Guatemala (ODHAG). Disponível em:http://www.fundacionpdh.org/lesahumanidad/informes/guatemala/informeREMHI-Tomo1.htm; c) o Relatório daProcuradoria de Direitos Humanos da Guatemala de 02 de setembro de 1996 (expediente de prova, folha 1869); d)alguns trechos dos expedientes penais abertos a partir das denúncias apresentadas a respeito aos fatos do caso, e e)as declarações de algumas das pessoas sobreviventes do caso.

52 Cfr. Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 29 de abril de 2004. Série C N° 105,par. 42.1, e Caso García e Familiares Vs. Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 29 de novembro de2012. Série C N° 258, par. 51.53 Cfr. Caso Myrna Mack Chang Vs. Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 25 de novembro de 2003.Série C N° 101, par. 134.9, e Caso García e Familiares Vs. Guatemala, par. 55.

54 Cfr. Caso Gudiel Álvarez e outros Vs. Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 20 de novembrode 2012. Série C N° 253, par. 54, e Caso García e Familiares Vs. Guatemala, par. 51.

55 Cfr. Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, pars. 42.3 e 42.4, e Caso Massacres de Río Negro Vs.Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 04 de setembro de 2012. Série C N°

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identificou os membros do povo indígena maia dentro da categoria de "inimigo interno", porconsiderar que constituíam ou podiam constituir a base social da guerrilha.56 Segundo a CEH,em termos étnicos, "83.3% das vítimas de violações dos direitos humanos e fatos de violênciaregistrados por essa comissão pertenciam a alguma etnia maia, 16.5% pertenciam ao grupoladino e 0.2% a outros grupos".57 A esse respeito, explicou que "na maioria dos casos, aidentificação entre as comunidades maias e a insurgência foi intencionalmente exagerada peloEstado que, apoiando-se em tradicionais preconceitos racistas, serviu-se dessa identificaçãopara eliminar as possibilidades presentes e futuras de que a população prestasse colaboraçãoou se incorporasse a qualquer projeto insurgente". Assim, "a incontestável realidade doracismo como doutrina de superioridade expressada permanentemente pelo Estado constituiuum fator fundamental para explicar a especial ira e indiscriminação com que foram realizadasas operações militares contra centenas de comunidades maias [...], especialmente entre 1981e 1983".58

78. Em abril de 1982, a Junta Militar do Governo, presidida por José Efraín Ríos Montt, ditouo "Plano Nacional de Segurança e Desenvolvimento", que estabelecia objetivos nacionais emtermos militares, administrativos, legais, sociais, econômicos e políticos. Esse Plano identificouas principais áreas do conflito em diferentes departamentos do país.59 A Junta Militar e o AltoComando também desenharam e ordenaram a implementação de um plano de campanhamilitar chamado "Vitória 82", no qual utilizaram novas definições estratégicas dentro do âmbitoda contra-insurgência e os objetivos do "Plano Nacional de Segurança e Desenvolvimento".60 ACEH afirmou que "esse programa impôs as operações de terra arrasada como forma deeliminar a base social do movimento insurgente".61 Tais massacres ou "operações de terraarrasada" se concentraram nas regiões de Quiché, Huehuetenango, Chimaltenango, Alta e BajaVerapaz, litoral sul e Cidade da Guatemala.62 Conforme a CEH, aproximadamente 626massacres atribuídos ao Exército da Guatemala e forças de segurança do Estado foramexecutados mediante atos de extrema crueldade destinados a eliminar as pessoas ou grupos

250, par. 57.

56 Cfr. Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, par. 42.7, e Caso Massacres de Río Negro Vs.Guatemala, par. 58.57 Cfr. Caso Tiu Tojín Vs. Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 26 de novembro de 2008. Série C N°190, par. 48, e Caso Chitay Nech e Outros Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 25 de maio de 2010. Série C N° 212, par.66.58 Cfr. Relatório da CEH "Guatemala, Memória do Silêncio", Capítulo IV, pars. 31 e 33.

59 Cfr. Caso Chitay Nech e Outros Vs. Guatemala, par. 65, e Caso Massacre Plan de Sánchez. Mérito, pars. 42.3 a42.4.60 Cfr. Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, pars. 42.4.61 Cfr. Relatório da CEH "Guatemala, Memória do Silêncio", Capítulo II, par. 2973.62 Cfr. Caso Massacres do Rio Negro Vs. Guatemala, par. 57, e Caso do Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala.Mérito, par. 42.5.

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de pessoas "definidos como inimigos" e a "aterrorizar a população".63 O terror provocado pelosmassacres e a devastação de aldeias inteiras, no período compreendido entre 1981 e 1983,desencadeou a fuga massiva de uma população diversa, cuja maioria estava constituída porcomunidades maias, mas que também incluía um importante número de famílias ladinas. ACEH considerou um número de deslocados que vai de 500 mil até um milhão e meio depessoas nesse período.64

79. Na época do conflito armado interno, o desaparecimento forçado de pessoas naGuatemala também constituiu uma prática do Estado promovido principalmente por agentesdas suas forças de segurança.65 A finalidade dessa prática era a desarticulação dosmovimentos ou organizações que o Estado identificava como propensos à "insurgência"ampliar o terror na população.66 Da mesma forma, a CEH concluiu que "o estupro foi umaprática generalizada e sistemática praticada por agentes do Estado no âmbito da estratégiacontra-insurgente", na qual a porcentagem de vítimas mulheres alcança 99% dos casosregistrados, e foi praticada como arma de guerra. Os casos de violações sexuais individuais ouseletivas aconteceram no contexto da prisão das vítimas e muitas vezes foram seguidas da suamorte ou desaparecimento.67 Por sua vez, durante e antes dos referidos massacres ou"operações de terra arrasada", membros das forças de segurança do Estado perpetraramviolações sexuais massivas ou indiscriminadas e públicas, acompanhadas em ocasiões damorte de mulheres e da indução de abortos. Essa prática estava orientada a destruir adignidade da mulher em nível cultural, social, familiar e individual.68 Por outra parte, duranteessa época, existiu um padrão de, depois dos massacres, separar meninos e meninas das suasfamílias e subtraí-los; tudo perpetrado pelas forças militares e grupos armados ilegais. Essaprática implicou, em muitos casos, na mudança de nomes e a negação da sua identidade.69 Aseparação de meninas e meninos das suas famílias, em alguns casos, levou à adoção ilegal ou

63 Cfr. Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, par. 42.6; Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala,par. 57, e Relatório “Guatemala, Memória do Silêncio”, Capítulo II, pars. 3077, 3086, 3105, 3128 e 3177. As forças desegurança do Estado incluíam o Exército, as patrulhas de autodefesa civil (doravante as "PAC"), os comissionadosmilitares, a guarda de fazenda, a polícia militar ambulante, a polícia nacional, a política judicial (conhecidos como"judiciais") e os "esquadrões da morte". Cfr. Caso Molina Theissen Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 04 de maio de2004. Série C N° 106, par. 40.3. As PAC surgiram no início dos anos 1980 como grupos de civis formadoscoercitivamente pela instituição armada. Em abril de 1983, o Acordo Governamental 222/83 as reconheceu legalmentemediante a criação da Sede Nacional de Coordenação e Controle da Autodefesa Civil. Os seus objetivos centrais foramorganizar a população civil contra os movimentos guerrilheiros e conseguir um controle sobre ela, para o qual tinhamuma relação institucional com o Exército, realizavam atividades de apoio às funções das forças armadas, recebiamrecursos, armamento, treinamento e ordens diretas do Exército e operavam sob a sua supervisão. Em suma, aspatrulhas civis atuavam como agentes do Estado durante a época do conflito armado. Essas patrulhas foram dissolvidaslegalmente no ano de 1996. Cfr. Caso Blake Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 24 de janeiro de 1998. Série C N° 36,par. 76, e Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, par. 42.28. Por sua parte, a polícia judicial era umbatalhão da Polícia Nacional "com as funções de investigação, perseguição e prisão dos delinquentes e prevenção dosdelitos". Os seus membros eram conhecidos popularmente como os "judiciais". Em meados da década de 1960,começou a se comentar sobre a intervenção e o controle do Exército sobre a Polícia. Cfr. Relatório da CEH "Guatemala,Memória do Silêncio", Capítulo II, pars. 1159 e 1164.

64 Cfr. Caso Chitay Nech e outros Vs. Guatemala, par. 123, e Relatório da CEH “Guatemala, Memória doSilêncio”, Capítulo IV, par. 66.

65 Cfr. Caso Bámaca Velásquez Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 25 de novembro de 2000. Série C N° 70,par. 132, e Caso García e Familiares Vs. Guatemala, par. 54.66 Cfr. Caso Molina Theissen Vs. Guatemala. Mérito, par. 40.1, e Caso García e Familiares Vs. Guatemala, par. 120.

67 Cfr. Relatório da CEH "Guatemala, Memória do Silêncio", Capítulo II, pars. 2351, 2352, 2376 e 2464.

68 Cfr. Caso do Massacre Plan de Sánchez Reparações e Custas. Sentença de 19 de novembro de 2004. Série CN° 116, par. 49.19, e Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 60.

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à venda dessas crianças, as quais também tiveram negado o seu direito de conhecer a suacultura.70 Em outros casos, as meninas e os meninos foram submetidos a condições deservidão por parte de agentes das forças de segurança do Estado.71

80. Todos estes fatos tiveram, e ainda têm, importantes efeitos culturais nos povoadosmaias. As violações aos direitos humanos que aconteceram durante o conflito armado internona Guatemala também siginificou a perda de valores e práticas culturais e religiosas dos povosmaias, bem como das suas instituições sociais, econômicas e políticas.72 Especialmente, osdesaparecimentos forçados, o uso da tortura e as execuções arbitrárias,73 entre outras ações,afetaram as estruturas de autoridade e liderança indígena, destruindo o tecido e as relaçõessociais tradicionais no interior das comunidades.74 A violência exercida contra os mais velhosteve especial importância, como autoridades ancestrais e "coluna vertebral da cultura dospovos maias", que foram os primeiros alvos de perseguição.75 Nesse sentido, a CEH indicouque com o desaparecimento das pessoas "se perdeu também o conhecimento técnico-modernoe tradicional-acumulado ao longo dos anos; bem como a possibilidade de transmiti-lo comnaturalidade às novas gerações [com o qual] pode começar a medir a magnitude do seuimpacto em longo prazo".76

81. A Corte não analisará os fatos alegados neste caso de forma isolada, mas simconsiderando a existência de um contexto sistemático de graves e massivas violações aosdireitos humanos na Guatemala, a fim de permitir uma compreensão da prova e adeterminação pontual dos fatos e dos seus efeitos jurídicos. Da mesma forma, esse contextoserá levado em consideração, se procedente, ao dispor medidas de reparação, especificamentesobre a obrigação de investigar e às garantias de não ocorrer novamente.

B. A aldeia Chichupac e as comunidades vizinhas do município de Rabinal

82. Durante o processo perante a Corte, foram argumentados fatos acontecidos em prejuízodos habitantes indígenas maia-achi da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas de Xeabaj,Chijom, Coyojá, El Tablón, Toloxcoc, Chirrum, El Chol e El Apazote, no município de Rabinal,Departamento de Baja Verapaz da Guatemala. Estes atos incluem, entre outros, alegadosmassacres, execuções extrajudiciais e desaparecimentos forçados; e se alega que um grandenúmero de supostas vítimas foi acusado de pertencer à guerrilha, foi torturado e depoisdesapareceu ou foi executado. É importante esclarecer que, conforme a prova apresentada,durante o período em que tais violações teriam ocorrido - nos lugares mencionados - também

69 Cfr. Caso do Massacre das Duas Erres Vs. Guatemala, pars. 177, 178, 170 e 199, e Caso Masacres de RíoNegro Vs. Guatemala, par. 60.

70 Cfr. Caso Massacres do Rio Negro Vs. Guatemala, par. 60.

71 Cfr. Caso do Massacre das Duas Erres Vs. Guatemala, par. 171, e Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala,par. 60.

72 Cfr. Caso do Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, par. 42.7, e Caso Massacres de Río Negro Vs.Guatemala, par. 61.

73 Cfr. Caso Chitay Nech e outros Vs. Guatemala, pars. 66 a 67, e 69, e Caso Masacres de Río Negro Vs.Guatemala, par. 61.

74 Cfr. Caso Massacres do Rio Negro Vs. Guatemala, par. 61.

75 Cfr. Caso Massacres do Rio Negro Vs. Guatemala, par. 61, e nota de rodapé da folha 57.76 Cfr. Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 61.

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ocorreram fatos adicionais atribuídos a agentes de segurança do Estado em prejuízo dediferentes pessoas, que não foram submetidas ao conhecimento deste Tribunal neste caso. ACorte procederá a estabelecer exclusivamente os fatos do caso que foram perante elasubmetidos a fim de determinar a sua compreensão pontual. Por outro lado, a Corte destacaque os dados das supostas vítimas que constam na prova variam, em alguns casos, a respeitodos seus nomes, idades e datas de óbito ou desaparecimento; pelo qual, procedeu a destacaraqueles dados que não concordam exatamente com a prova bem como na informaçãofornecida pelos representantes e a Comissão que não tenha sido contestada pelo Estado, semprejuízo da nova evidência que pudesse surgir a esse respeito.

83. O município de Rabinal é um dos oito municípios do Departamento de Baja Verapaz, queestá localizado na região central da Guatemala. Esse município está formado pela área urbana,por 14 aldeias e 60 povoados. No ano de 1981, a região estava habitada predominantementepor membros do povo indígena maia pertencente à comunidade linguística achí.77

84. Durante o conflito armado interno, foram registrados altos níveis de violência nomunicípio de Rabinal.78 A esse respeito, a CEH determinou que, apesar de que Rabinal não erauma área de combate, a região era utilizada como passagem para o abastecimento logístico,recrutamento de quadros ou retaguarda; e que devido à localização geográfica do município, oExército considerou toda a região como sendo estratégica, pelo qual "devia ser submetida apleno controle" e "identificou a população da região como sendo inimigo interno". Entre osanos 1981 e 1983, grupos militares ou paramilitares assassinaram pelo menos um 20% dapopulação do município, e 99.8% das vítimas registradas pela CEH eram membros do povomaia-achi, população civil não combatente.79

B.1. Execução Juan Alvarado Grave, Mateo Grave e Pedro Depaz Ciprián, edesaparecimento de Pedro Siana entre 23 e 24 de agosto de 1981

85. Em 23 de agosto de 1981, o senhor Juan Alvarado Grave foi executado por um grupo da"Polícia Judicial". Ao saber o ocorrido, o seu irmão, Mateo Grave e os senhores Pedro DepazCiprián (ou Pedro de Paz Cipriano ou Pedro de Paz Cipriáno) e Pedro Siana, da aldeia Xeabaj,se dirigiram ao Hospital de Salamá, em Baja Verapaz, como o objetivo de localizar o corpo dosenhor Juan Alvarado. No caminho, os três homens foram detidos por um grupo de dezagentes da Polícia Judicial, entre a cume de Rabinal e o município de San Migel Chicaj. Oscorpos sem vida de Mateo Grave e Pedro Depaz Ciprián foram trasladados ao Hospital deSalamá.80 Até esta data não se conhece o paradeiro do corpo do senhor Pedro Siana.

86. Conforme declaração da senhora Juana García Depaz, o seu esposo, Mateo Grave,faleceu em 24 de agosto de 1981 devido a “feridas por projétil de arma de fogo” e o seu corpofoi enterrado no cemitério de San Salamá, em Baja Verapaz, por ordens do Juiz de Paz domunicípio de San Miguel Chicaj. Nesse sentido, declarou que ao perceber a ausência do seu

77 Cfr. Caso do Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, par. 42.10, e Relatório da CEH “Guatemala,Memória do Silêncio”, Capítulo IV, par. 3362.78 Cfr. Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 64, e Caso do Massacre Plan de Sánchez. Mérito, par. 42.8.

79 Cfr. Relatório da CEH "Guatemala, Memória do Silêncio", Capítulo IV, pars. 3364 a 3368.

80 Cfr. Declarações prestadas perante agente dotado de fé pública (affidávit) por Juana García Depaz (esposa deMateo Grave) e Olivia Siana Ixtecoc de Bolaj (filha de Pedro Siana) nos dias 02 de novembro de 2009 e 18 dedezembro de 2014 (expediente de prova, folhas 1330, 1331 e 5841), e Declaração de Juana García Depaz naAudiência Pública celebrada em 28 de abril de 2016.

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esposo, compareceu perante o Juiz de Paz, a Polícia Nacional e o escritório dos Correios dalocalidade de Rabinal. Posteriormente, ao saber que o seu esposo estava no Hospital deSalamá, identificado como "XXX", foi a esse hospital e, ao chegar "foi ameaçada e perseguidapor três agentes da Polícia Judicial" que se encontravam em estado de embriaguez".

B.2. Execução de três membros da família Alvarado e três membros da família Reyes,em 1o de janeiro de 1982.

87. Em 1o de janeiro de 1982, membros do Exército e das patrulhas de autodefesa civil(doravante “as PAC”) na aldeia Xeabaj entraram na residência do senhor Víctor Alvarado Valey(ou Victor Alvarado Valey) e o assassinaram junto aos seus dois filhos, Ceferino (ou Seferino) eFidel, este de 17 anos de idade, ambos Alvarado Sucup (ou Sucúp). Nesse mesmo dia,membros do Exército Nacional e das PAC entraram na residência do senhor Domingo ReyesJuárez (ou Domingo Juárez Reyes) no povoado de Toloxcoc e o assassinaram junto aos seusfilhos, Andrés e Santiago este de 15 anos de idade, ambos Reyes Román. Os seus corposforam encontrados a 300 metros da sua casa, com feridas de armas de fogo na cabeça, "comos seus intestinos para fora" e "com as mãos amarradas atrás". Os corpos dos seis homensforam enterrados pelos seus familiares e outros moradores em uma fossa localizada namontanha de Cumatzá, na aldeia Xeabaj.81 No ano 2000, membros da Fundação deAntropologia Forense da Guatemala (doravante "a FAFG") identificaram essa fossa, a qualpertencia a um cemitério clandestino, e mediante reconhecimento judicial praticado em 2003,as ossadas foram reconhecidas pelas suas famílias.82

B.3. Detenção de Ciriaco Galiego López e desaparecimento de Lorenzo Depaz Sipriandesde 08 de janeiro de 1982

88. Em 08 de janeiro de 1982, aproximadamente à 01h da madrugada, o senhor CiriacoGaliego López e o seu genro, Lorenzo Depaz Siprian (ou Lorenzo Depaz Ciprian ou FlorencioDepaz Cipriano) saíram da sua residência localizada na aldeia Chichupac e se dirigiram aomunicípio de Rabinal, a fim de vender um touro. No caminho, foram interceptados pormembros do Exército Nacional e das PAC, os quais lhes retiraram o animal e os levaram aocárcere localizado na prefeitura. O senhor Ciriaco Galiego foi colocado em liberdade à noite,enquanto até esta data não se conhece o paradeiro do senhor Lorenzo Depaz.83

B.4. Massacre da Clínica da aldeia Chichupac em 08 de janeiro de 1982

81 Cfr. Declarações feitas perante o auxiliar fiscal por Rosario Román Tum (esposa de Domingo Reyes Juárez) eVíctor Cástulo Alvarado Sucup (filho de Víctor Alvarado Valey) nos dias 11 de agosto de 1995 e 09 de maio de 2000, eDeclarações feitas perante agente de fé público (affidávit) por Víctor Cástulo Alvarado Sucup (filho de Víctor AlvaradoValey) e Juana Reyes Román (filha de Domingo Reyes Juárez) nos dias 16, 18 e 31 de dezembro de 2014 (Expedientede prova, folhas 1883, 1885, 1890, 1888, 5831 e 5846), e Relatório de Investigação Antropológico Forense da FAFG de18 de dezembro de 2002 (Expediente de prova, folhas 1965, 1961, 1966, 1969 e 1971).

82 Cfr. Ata de exumação de corpos de 09 de abril de 2002 (relatório de prova, folhas 1938 a 1941); Relatório deInvestigação Antropológico Forense da FAFG de 24 de julho de 2002 (Expediente de prova, folha 2037) e Ata dereconhecimento judicial de ossadas humanas do Órgão Judicial da Guatemala, de 27 de fevereiro de 2003 (processode mérito, folhas 1952 a 1954).83 O Relatório da CEH diz que "em 09 de janeiro de 1982, na localidade de Rabinal, departamento de Baja Verapaz,Lorenzo de Paz Cipriano, quem era prefeito auxiliar de Chihom (sic) compareceu à prefeitura citado pela Polícia Judiciale paramilitares. Desde então, nada se sabe sobre a vítima". Cfr. Relatório da CEH "Guatemala, Memória do Silêncio",Capítulo IV, par. 163.

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89. Os habitantes da aldeia Chichupac e das comunidades vizinhas foram convocadas aparticipar de uma reunião em 08 de março de 1982 na clínica do povoado. Eles foraminformados que receberiam presentes. Nesse dia, membros do Exército da Guatemala, lotadosno destacamento de Rabinal, membros da polícia judicial e outros militares se reuniram nacomunidade. Os membros das PAC enfeitaram o caminho que leva à clínica e marimbastocavam para criar um ambiente festivo. Depois de entregar brinquedos para as meninas emeninos, os militares ordenaram às mulheres que fossem para as suas casas e levassem ascrianças.

90. Os militares chamaram 32 homens da aldeia, seguindo uma lista, e, uma vez separadosdo grupo, os trancaram dentro da clínica da aldeia. Posteriormente, os 32 moradores foramobrigados por membros do Exército a caminhar com as mãos amarradas até um morropróximo à clínica. Alguns morreram estrangulados e outros devido a ferimentos por armas defogo. Os corpos foram enterrados em fossas. No dia seguinte, homens membros dacomunidade, forçados a participar nas PAC, foram obrigados pelos militares a lavar a clínica,que estava suja de sangue e pedaços de carne, como orelhas, narizes e línguas84. Dias depois,familiares e moradores encontraram as fossas e, ao ver que não eram suficientementeprofundas, cavaram uma terceira fossa na qual os enterraram.85

91. No ano de 1993, a Equipe de Antropologia Forense da Guatemala (doravante "EAFG")identificou três fossas/sítios, de onde foram exumados restos de ossadas, roupas, artigospessoais e cápsulas de projéteis de armas de fogo. Segundo as análises forenses realizadas, foipossível estabelecer um número mínimo de 30 vítimas. Desses, o número mínimo deindivíduos enterrados nos sítios I e III foi de 20, e no sítio II foi possível encontrar 10 ossadascompletas. Por sua vez, foi possível identificar seis pessoas: Domingo Cahuec Sic, Víctor JuárezPangán, Cruz Sic Cuxum, Patrocinio Chen Galiego, Agustín Juárez Ixpancoc e Pedro GaliegoLópez. Nesse sentido, nas suas conclusões, a EAFG afirmou que: "[a]s análises de laboratórioindicam que as pessoas morreram de forma violenta, alguns deles com cordas no pescoço,mãos amarradas nas costas, tiros de misericórdia, fraturas em diferentes partes do corpo, etc.,que apresentam algumas ossadas", e que "[a] evidência sugere que o sítio II foi cavado váriosdias depois dos sítios I e III, e nele foram depositados cadáveres com sinais de terem estadoparcialmente expostos na superfície, por esse motivo, em alguns casos foi possível observarsinais causados por dentes de animais".86 Em suma, as descobertas da EAFG do ano 1993 sãoconsistentes com o relato dos fatos.

84 Cfr. Declarações de homens membros da comunidade que foram obrigados a limpar a clínica, recebidos nomarco da investigação penal pelo promotor auxiliar, coletados nos dias 27 de abril de 1999, 25 de outubro de 2000, 12e 27 de julho de 2005 e 16 de agosto de 2005, e feitas perante agente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 20, 22e 26 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 435, 448, 452, 611, 638, 735, 736, 758 a 759, 1009, 1212,1218, 5908, 5935 e 5964), e Declaração de Miguel Sic Osorio apresentada perante a Corte Interamericana peranteoficial de fé pública (affidávit) em 20 de abril de 2016.

85 Cfr. Declarações de membros da comunidade que fizeram as fossas para enterrar os corpos, bem como deoutras pessoas da comunidade que afirmaram conhecer os fatos, recebidas no marco da investigação penal peloauxiliar da promotoria nos dias 14 de abril de 1993, 27 de abril de 1999, 25 de outubro de 2000 e 12 e 27 de julho de2005, e recebidas perante agente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 19 e 30 de dezembro de 2014 (Expedientede prova, folhas 435, 472, 607, 611, 638, 719 a 720, 735 a 736, 759, 1009, 1205, 1212, 5896, 6125 e 5964), eDeclaração de Miguel Sic Osorio apresentada perante a Corte Interamericana perante agente dotado de fé pública(affidávit) em 20 de abril de 2016.86 Cfr. Ata de exumação de corpos, maio de 1993 (Expediente de prova, folhas 666 a 685); Relatório apresentadopela EAFG de julho de 1993 (Expediente de prova, folhas 511, 540 e 541), e Ofícios da Polícia Nacional de Salamá emBaja Verapaz de 15 e 19 de maio de 1993 (Expediente de prova, folhas 690 a 692, 940 e 941).

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92. As 32 supostas vítimas desse massacre foram os senhores:87 Víctor Juárez Pangán ouVíctor Juárez Pancán; Clemente Juárez lxpancoc; Cruz Sic Cuxum ou Cruz Sic Cuxún; Pedro SicJerónimo; Gregorio Garniga Valey ou Gregorio Valey; Timoteo Sic Cujá ou Mateo Sic Cujá;Roberto Galiego Chen; Antonio Alvarado González; Alfonso Cruz Juárez; Domingo Cahuec Sicou Domingo Cahuec Sic; Santiago Alvarado Xitumul; Agustín Juárez lxpancoc; TeodoroGonzález Xitumul; Eulogio Morales Alvarado; Luciano González ou Luciano González Sis;Apolinario Juárez Pérez; Alberto Juárez Pérez; Evaristo Depaz Siana ou Evaristo Siana; PedroTum ou Pedro Pérez Ampérez; Emigdio Siana lxtecoc ou Emilio Siana lxtecoc; Pedro GaliegoLópez; Demetrio Chen Alvarado; Pedro Galiego Mendoza; Camilo Juárez Valey; Julián Garnigaou Julián Garniga López; Benito Juárez lxpancoc; Francisco Depaz; Maximiliano Sis Valey ouMaximiliano Sis Valin; Vicente Sic Osorio; Patrocinio Galiego ou Patrocinio Chen Galiego ouPatrocinio Chen Coaliego; Félix Alvarado Xitumul, e Demetrio Cahuec ou Demetrio CahuecJerónimo ou José Demetrio Cahuec Jerónimo.

B.5. Estupro de Máxima Emiliana García Valey em 08 de janeiro de 1982

93. Em 08 de janeiro de 1982, enquanto acontecia a reunião na clínica da aldeia Chichupac,Máxima Emiliana García Valey, de 19 anos de idade, voltou para a sua casa para levar água ecomida para o seu esposo e a sua sogra. Quando chegou na sua casa, encontrou um grupo desoldados que a segurou violentamente e perguntou onde moravam umas pessoas cujos nomestinham escrito na mão, entre eles estava o nome do "[seu] padrasto[,] um filho do [seu]padrasto e um genro". Ela respondeu que não os conhecia porque "não era dali". Depois, umdos soldados a obrigou a tirar a roupa e em fila "muitos soldados" a estupraram, recebeutantos golpes que "não podia caminhar", porque sentia "dores no corpo todo". Quando voltou àclínica, não comentou nada porque estava muda, devido ao que tinha acontecido. No momentodos acontecimentos, Máxima García tinha entre seis e oito meses de gestação. Nos mesesseguintes nasceu o seu filho, quem padeceu de problemas de saúde e convulsões desde onascimento e morreu antes de completar quatro anos.88

B.6. Violência perpetrada na região, deslocamento dos habitantes, destruição dascomunidades e da aldeia modelo ou colônia em Chichupac

94. Em 08 de janeiro de 1982, quando aconteceu o massacre da clínica na aldeia Chichupac(supra pars. 89 a 92), membros do Exército também roubaram animais da comunidade.89

Além disso, devido ao temor gerado na população por tais acontecimentos, membros da aldeiaChichupac e comunidades vizinhas, especialmente homens, fugiram para as montanhas.Mesmo assim, os militares continuaram ido às aldeias e comunidades de Chichupac, Xeabaj,Chijom, Coyojá, El Chol, El Apazote, Chirrum, El Tablón e Toloxcoc para intimidar as pessoas

87 Em conformidade com a prova e os argumentos da Comissão e dos representantes não contestados peloEstado, Félix Alvarado, incluído no grupo de 32 homens, são suportou as torturas das quais foi vítima e morreu nocaminho. Cfr. Declarações de moradores da comunidade que informaram ter conhecimento dos fatos, e umadeclaração mais de uma pessoa que afirmou ter visto o senhor Félix Alvarado cair no chão, recebidas no marco dainvestigação penal pelo promotor auxiliar nos dias 27 de abril e 28 de junho de 1999, e 16 de agosto de 2005(Expediente de prova, folhas 638, 1024 e 1218).88 Cfr. Declarações de Máxima Emiliana García Valey recebidas no marco da investigação penal pelo auxiliar dapromotoria em 25 de outubro de 2000, 26 de julho de 2001 e 12 de julho de 2005, e feitas perante agente dotado defé pública (affidávit) em 12 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 463 a 469, 750 a 751, 796 e 5714).89 Cfr. Relatório da CEH "Guatemala, Memória do Silêncio", Capítulo Segundo, par. 3391, e nota de rodapé das folhas1090 e 1095.

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mediante disparos, procurar e matar os homens da comunidade, matar as mulheres quando jánão encontravam os homens e ameaçar de morte a população que continuava nascomunidades para forçá-las a abandonar os seus lares.90 No marco das expedições realizadasàs comunidades, os militares violaram mulheres, inclusive dentro dos seus próprios lares.91

95. Como consequência da violência impetrada na região, houve movimentos massivos demembros das aldeias e comunidades para se refugiarem sozinhos ou com as suas famílias nasmontanhas, em outros povoados, municípios, departamentos e cidades, inclusive fora do país.As pessoas que buscaram refúgio nas montanhas permaneceram escondidas por períodos queoscilaram entre alguns meses e até três anos, suportando fome, sede e frio. Devido àscondições de vida insalubre e precárias, algumas pessoas, especialmente crianças, adoeceramou morreram.92 Por sua vez, os militares continuaram perseguindo os moradores das aldeiasnas montanhas, bem como as pessoas que voltavam às comunidades, disparando contra eles,metralhando a mata, frequentemente lançando granadas e realizando buscas na região, peloqual os moradores se viram obrigados a entrar cada vez mais na montanha.93 Quando osmilitares encontravam as pessoas, estas eram presas, detidas, interrogadas, torturadas e/ouexecutadas; quando se tratava de mulheres, estas eram violadas sexualmente.94

96. A destruição das comunidades aconteceu paralelamente aos deslocamentos e posterior aeles. Dessa forma, membros do Exército Nacional e das PAC cometeram os seguintes atos: a)queima de moradias com todos os pertences; b) queima e destruição de plantações e colheitas(entre eles, milho, café, romã e cana); c) roubo e morte de gado, cavalos, galinhas, porcos eanimais domésticos; d) roubo de alimentos, grãos básicos e provisões; e) roubo de artigospessoais, roupa e objetos de valor; e f) roubo de utensílios domésticos e ferramentas.

90 Cfr. Declarações de membros da comunidade que padeceram a foram testemunhas da situação de violência eperseguição na região e de familiares, recebidas no marco da investigação penal nos dias 27 de abril de 1999, 25 deoutubro de 2000 e 12 e 27 de julho e 16 de agosto de 2005, e apresentadas perante agente dotado de fé pública(affidávit) nos dias 14, 18, 21 e 22 de agosto, 24 e 27 de novembro e 1o, 4, 8 a 20, 22, 23, e 26 a 31 de dezembro de2014 (Expediente de prova, folhas 445 a 6165), e Declaração de Juana García Depaz na audiência pública celebradaem 28 de abril de 2016.

91 Cfr. Declarações de mulheres que afirmaram terem sido estupradas e de pessoas que informaram que taisatos aconteceram contra os seus familiares, recebidas no marco da investigação penal nos dias 27 de abril de 1999, 25de outubro de 2000, 15 de novembro de 2002, 12 e 27 de julho e 16 de agosto de 2005 e feitas perante o auxiliar dapromotoria em 16 de agosto de 2005 e perante agente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 1o, 8, 9, 11, 13, 15,16, 22, 26, 28 e 30 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 428 a 6096), e Declaração perante agentedotado de fé pública (affidávit) de Miguel Sic Osorio apresentada à Corte Interamericana em 20 de abril de 2016.92 Cfr. Declarações de membros da comunidade que padeceram a foram testemunhas da situação de violência eperseguição na região e de familiares, recebidas no marco da investigação penal nos dias 25 de outubro de 2000, 12de julho e 16 de agosto de 2005, e apresentadas perante agente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 14, 18 e 21de agosto, 1o de setembro, 27 de outubro, 27 de novembro e 1o, 4, 9, 11, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 22, 23, e 26 a 31 dedezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 435 a 6155), e Declaração de Juana García Depaz na audiênciapública celebrada em 28 de abril de 2016.93 Cfr. Declarações de membros da comunidade que padeceram de perseguição militar e tiveram que se refugiar naregião, recebidas no marco da investigação penal nos dias 25 de outubro de 2000, 12 de julho e 16 de agosto de2005, e apresentadas perante agente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 14, 18 e 21 de agosto, 24 de novembroe 1o, 9, 11, 14, 15, 18, 19, 22, 23, 26, 28 e 31 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 445 a 6161).94 Cfr. Declarações de membros da comunidade que tinham fugido e que foram capturados pelos militares, recebidasno marco da investigação penal nos dias 25 de outubro de 2000, 12 e 27 de julho e 16 de agosto de 2005 e feitasperante agente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 1o de setembro, 27 de outubro e 9, 11, 13, 18, 19, 22, 23, 27a 31 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 456 a 6156).

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97. Aproximadamente no ano de 1983, membros do Exército Nacional construíram umaaldeia modelo ou colônia e, Chichupac, para ser habitada por pessoas capturadas durante aperseguição nas montanhas, por população civil que ingressou voluntariamente uma vez quese "ofereceu anistia" da perseguição e por pessoas obrigadas a voltar sob a ameaça de retiraros seus terrenos se não voltassem.95 Nessa colônia, as pessoas viveram em condiçõesprecárias com outras famílias, sob forte controle militar, tinham que pedir autorização paratrabalhar as suas terras e os soldados limitavam toda a sua liberdade. Mesmo assim, foramobrigadas a trabalhar para sustentar os militares, por exemplo, no cultivo de hortaliças.Especificamente, as mulheres foram obrigadas a preparar alimentos e lavar as roupas dosmilitares, e os homens, a patrulhar a região.96 Além disso, algumas mulheres sofreram abusossexuais. Entre 1986 e 1987, os membros do Exército Nacional abandonaram a colônia. Por suavez, o Centro de Integração Familiar (doravante "CIF"),97 por meio do Programa de Promoçãoe Desenvolvimento Humano Integral, proporcionou materiais aos moradores para areconstrução das suas moradias. Dessa forma, algumas pessoas conseguiram se reassentar naregião.98 Da mesma forma, o CIF implementó para essas famílias projetos de cultivo do café eforneceu alguns animais.99

98. No entanto, ainda no ano 1999, algumas pessoas afirmavam que a populaçãosobrevivente continuava vivendo com medo e recebendo ameaças, e que os responsáveis pelomassacre continuavam "roubando e violando as mulheres das comunidades".100 Nos diasatuais, pessoas afirmam que não conseguiram retornar às suas terras e se reencontrar com asua comunidade e a sua cultura em consequência do medo, da violência, do sofrimento eperseguição que viveram nas comunidades, a perda de todos os seus bens e o fato de nãoterem onde morar, pelo qual se veem forçadas a continuar em deslocamento. Além disso, umavez que os militares roubaram os seus documentos que comprovavam a propriedade das suasterras - os quais foram destruídos quando queimaram as suas casas - alguns moradoresdisseram que não puderam recuperar as suas terras porque outras pessoas moram nela e os

95 Cfr. Declarações de membros da comunidade que moraram na aldeia modelo de Chichupac, bem como de outraspessoas da comunidade que informaram saber que membros do Exército Nacional construíram essa colônia, recebidasno marco da investigação penal nos dias 25 de outubro de 2000, 2, 12 e 27 de julho e 16 de agosto de 2005 e feitasperante agente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 28 de outubro e 11, 12, 15 a 19, 22, 23, 26, 27 e 29 a 31 dedezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 439 a 6164).96 Cfr. Declarações de membros da comunidade que moraram na aldeia modelo Chichupac, recebidas no marco dainvestigação penal nos dias 27 de julho e 16 de agosto de 2005, e apresentadas perante agente dotado de fé pública(affidávit) nos dias 11, 16, 18, 19, 22, 23 e 26 a 31 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 1195 a 6151),e Declaração de Juana García Depaz na audiência pública celebrada em 28 de abril de 2016.97 Nesse momento, uma instituição de direito privado sem fins lucrativos, que não pertencia à administração públicanem era parte da estrutura pública.98 Cfr. Declarações de membros da comunidade que receberam a ajuda do CIF, apresentadas perante agente dotadode fé pública (affidávit) nos dias 27 e 29 a 31 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 6016, 6025, 6081,6126, 6136, 6141 e 6151) e Declaração apresentada perante agente dotado de fé pública por Miguel Chen Tahuico em30 de maio de 2016 (Expediente de prova, folhas 11905 a 11907).99 Cfr. Declaração de Miguel Chen Tahuico em 30 de maio de 2016 apresentada perante agente dotado de fé pública(affidávit) (Expediente de prova, folhas 11905 a 11907).100 Cfr. Declarações de membros da comunidade que afirmaram que as perseguições continuavam, recebidas nomarco da investigação penal pelo auxiliar de promotoria em 27 de abril de 1999 (Expediente de prova, folhas 608, 612e 614).

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seus proprietários originais não podem reclamá-las por não possuírem documentos e por nãocontarem com ajuda do Estado.101

B.7. Desaparecimento e identificação de Hugo García Depaz, Abraham Alvarado,Manuel de Jesús Alarcón Morente e Edmundo Alarcón Morente, desaparecimento deAdrián García Manuel e Leonardo Cahuec González, e detenção de Miguel ChenTahuico em 18 de janeiro de 1982

99. Depois de terem sido recrutados como membro das PAC, em 18 de janeiro de 1982,Adrián García Manuel, o seu filho Hugo García Depaz e o seu sobrinho Abraham Alvarado Tecú(ou Agapito Alvarado Depáz) saíram da sua casa na aldeia Chichupac a fim de realizar umpatrulhamento. No entanto, foram interceptados por membros do Exército Nacional, detidos eaprisionados na escola da aldeia Chirrum. Quando a senhora Juana García Depaz, filha deAdrián García, soube que os seus familiares estavam detidos na escola, enviou a sua filha comcomida. Os militares não permitiram que ela entregasse a comida, pois informaram que "iriamsoltá-los logo e em breve voltariam para casa". Posteriormente, os três homens foram levadospara o destacamento militar na aldeia Guachipelín, sem se que voltasse a ter notícias do seuparadeiro. Nesse mesmo dia, os irmãos Manuel de Jesús e Edmundo (o Raymundo), ambosAlarcón Morente, que também tinham sido recrutados como membros das PAC, foram vistospela última vez. Pela manhã, um grupo de soldados tinha chegado na casa da família AlarcónMorente, localizada entre as aldeiras Chirrum e Chuategá, e perguntaram pelos dois irmãos,sem que os familiares dessem notícias suas. Segundo o relato da família, Manuel de JesúsAlarcón Morente saiu para cortar cana e não voltou; e o seu irmão, Edmundo Alarcón Morentefoi visto pela última vez acompanhado por soldados que o levavam amarrado.102

100. Em 2006, e uma vez solicitado pela senhora Juana García Depaz, a FAFG realizoutrabalhos de escavação e exumação em um terreno localizado na aldeia Guachipilín, domunicípio de Rabinal.103 No ano de 2008, e mediante o relatório final da perícia antropológicaforense realizada pela FAFG, concluiu-se que em uma fossa foram exumadas quatro ossadas eque os restos pertenciam a Hugo García De Paz, Manuel de Jesús Alarcón Morente, EdmundoAlarcón Morente e Agapito Alvarado Depáz. Da mesma forma, esse relatório indicou que trêsdas quatro ossadas "tinham os braços para atrás e os punhos juntos, como se estivessemestado amarrados", e que "[n]o momento da inumação os corpos não foram colocados, massim atirados". Além disso, a partir das lesões traumáticas observadas nos restos da ossada quepertencia a Agapito Alvarado Depáz, concluiu-se que "a causa da morte é compatível com

101 Cfr. Declarações de membros da comunidade que não puderam voltar às suas terras, apresentada peranteagente dotado de fé pública (affidávit) nos dias 14, 21 e 22 de agosto, 1o de setembro, 24 de outubro, 24 denovembro e 8, 10, 19, 22, 23 e 30 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 5532 a 6130), e Declaraçãoperante agente dotado de fé pública (affidávit) de Miguel Sic Osorio, apresentada perante a Corte Interamericana em20 de abril de 2016.102 Cfr. Declarações apresentadas perante agente dotado de fé pública (affidávit) por Marcelina Alarcón Morente eClotilde Felipa Alarcón Morente (irmãs de Manuel de Jesús e Edmundo Alarcón Morente) em 13 de dezembro de 2014(Expediente de prova, folhas 5742 a 5744 e 5748). Cabe destacar que a Comissão explicou no seu Relatório de Méritoque "nas declarações, haveria divergências na data em que aconteceu a detenção e a morte de Raymundo Alarcón eManuel Alarcón”. Nesse sentido, a Corte procedeu a destacar o relato que é consistente com a prova, sem prejuízo danova evidência que pudesse surgir a esse respeito.103 Cfr. Ata do Auxiliar da Promotoria do Município de Rabinal, Baja Verapaz, de 09 de outubro de 2006(Expediente de prova, folhas 1414 a 1416); Ata do Auxiliar da Promotoria do Município de Rabinal, Baja Verapaz, de10 de outubro de 2006 (Expediente de prova, folhas 1417 a 1419), e Ofício do Subinspetor da P.N.C. Responsável pelaSubestação 52-21 da Polícia Nacional Civil de 19 de outubro de 2006 (Expediente de prova, folhas 1421 a 1422).

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degolamento".104 Segundo informado pelos representantes e não contestado, as quatroossadas foram entregues aos seus familiares e sepultadas por estes. Até hoje se desconhece oparadeiro do senhor Adrián García Manuel.

101. Também, em 18 de janeiro de 1982, e enquanto voltavam para as suas casas na aldeiaChichupac, depois de terem batizado uma das suas filhas em uma igreja católica de Rabinal, osenhor Leronardo Cahuec González e a sua esposa, Albertina Sic Cuxúm, foram interceptadospor um carro do qual desceram duas pessoas à paisana. Essas pessoas pediram que o senhorLeonardo Cahuec apresentasse os seus documentos de identidade, amarraram as suas mãos eo levaram a pé à cadeia do Centro do município de Rabinal. A senhora Albertina Sic se dirigiucom eles até a cadeia e dois homens que vigiavam a sua entrada lhe disseram que o seuesposo era guerrilheiro, que "todos os homens da aldeia Chichupac [...] era[m] guerrilheiros",que "o mandaram para o quartel para prestar serviço militar e que a qualquer momentovoltaria para a sua casa". Finalmente, ameaçaram bater nela se não fosse embora. Até estadata não se conhece o paradeiro do senhor Leonardo Cahuec.

102. Também em 18 de janeiro de 1982, 1983 ou 1984, o senhor Miguel Chen Tahuico, quemfugiu da aldeia Chichupac depois do massacre da clínica em 08 de janeiro de 1982 e serefugiou nas montanhas, foi detido por membros do Exército junto com um grupo de quatro aseis membros da sua família. Os militares o acusaram de pertencer à guerrilha, penduraram-no de uma árvore pelo pescoço, queimaram o seu peito com um cigarro, tentaram queimar asua língua com um ferro quente e, uma vez no solo, os soldados caminharam por cima dele,pisando o seu estômago. Depois, amarraram a sua cabeça, cintura, mãos e pés, deixando-o aorelento a noite toda, custodiado por soldados. No dia seguinte, foi levado à aldeia modelo ou acolônia em Chichupac, que estava sob controle militar. Nesse lugar, foi interrogado eameaçado, e posteriormente foi informado que viveria ali e sairia de patrulha com soldados,para os quais também tinha que cozinhar.105

B.8. Desaparecimento de Juan Mendoza Alvarado e José Cuz Mendoza Sucup desde31 de janeiro de 1982

103. Em 31 de janeiro de 1982, membros do Exército Nacional e das PAC se dirigiram à aldeiaEl Apazote, entraram na residência em que estavam Juan Mendoza Alvarado e o seu pai, JoséCruz Mendoza Sucup, retiraram os dois da casa, bateram neles e desde então nada se sabe doseu paradeiro.

B.9. Desaparecimento de María Concepción Chen Sic e Casimiro Siana desde 12 defevereiro de 1982

104. Em 12 de fevereiro de 1982, membros do Exército Nacional e das PAC ingressaram nacasa de María Concepción Chen Sic, na aldeia Chichupac, acusaram-na de preparrar alimentospara a guerrilha e exigiram que entregasse o seu esposo, Silvestre Sic Xitumul, quem estavafora da sua casa com dois filhos. Também nesse dia, o senhor Casimiro Siana, que era prefeitoauxiliar da comunidade, foi acusado de apoiar a guerrilha num momento em que se encontravaregando o seu plantio, próximo à sua casa. A senhora María Concepción Chen e o senhor

104 Cfr. Relatório da FAFG de 31 de janeiro de 2008 apresentado perante o Auxiliar da Promotoria Distrital doMinistério Público de Salamá (Expediente de prova, folhas 11776 idem 3, 11776 idem 13 e 11776 idem 14).105 Cfr. Declarações de Miguel Chen Tahuico perante o auxiliar da promotoria no dia 27 de julho de 2005 e outradeclaração sem data; e declaração feita perante agente dotado de fé pública (affidávit) em 13 de dezembro de 2014(Expediente de prova, folhas 459 a 462, 1196 e 5735).

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Casimiro Siana foram obrigados a caminhar junto a várias mulheres que tinham sidocapturadas, até chegar a um ponto em que ambos foram separados do grupo e levados emoutra direção. Até esta data nada se sabe do paradeiro de ambos.106

B.10. Execução de Andrea Osorio Galeano em 19 de fevereiro de 1982

105. Em 19 de fevereiro de 1982, um grupo de militares retiraram da sua moradia AndreaOsorio Galeano, na aldeia Chichupac. No dia seguinte, o seu filho encontrou o seu corpo semvida a aproximadamente um quilômetro da sua residência,107 a quem deram sepultura. Osrestos de Andrea Osorio foram exumados, analisados e identificados no ano de 1993 pelaEAFG, em uma quarta fossa localizada no lugar em que foram encontradas três fossas ondeforam exumados os restos dos homens executados em 08 de janeiro de 1982, (supra par. 91).Nos descobrimentos da EAFG foi documentada a existência de fraturas no corpo e em diversasvértebras.108

B.11. Execução de Elías Milián González e Amelia Milián Morales em 23 de março e 20de abril de 1982

106. Em 22 de março de 1982, o senhor Elías Milián González foi detido por um grupo demilitares enquanto se dirigia ao Centro do município de Rabinal. No dia seguinte foi levado àclínica de Xeabaj e enforcado na aldeia Chijom. O seu corpo foi localizado dias depois em umforno de barro pela sua família, que procedeu ao seu sepultamento. Em 27 de abril de 1982,um grupo de militares chegou à aldeia Toloxcoc e invadiu a casa de Amelia Milán Morales, filhade Elías Milián. Ela foi detida e levada. As suas irmãs encontraram o seu corpo naquele mesmodia, em um forno de doce, de barro, na mesma aldeia, e procederam a sepultá-lo.109

107. No ano de 2007, foram realizadas diligências de exumação em Toloxcoc a fim de localizar,entre outros, os restos de Amelia Milián Morales. Mediante perícia da FAFG, no ano de 2008,informou-se o achado da ossada, roupa e pertences pessoais de três indivíduos: "um femininoadulto, um masculino de faixa etária não determinada, bem como um indivíduo de sexo e faixaetária não determinados". No entanto, não foi possível fazer a identificação nem determinar acausa da morte, sem que isso signifique que, de acordo ao relatório forense, deva-se descartar"que os restos pertençam aos indivíduos procurados". As três ossadas foram entregues emdepósito para a custódia de Tarcila Milián Morales.110 Posteriormente, no ano 2010, foirealizada uma diligência de exumação de restos em Chijom, seguida de uma análise

106 Cfr. Declaração prestada perante agente dotado de fé pública (affidávit) por Margarita Siana Crúz (filha deCasimiro Siana) em 16 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 5821 a 5822).

107 Cfr. Declarações de Miguel Sic Osorio (filho de Andrea Osorio Galeano), Fabiana Chen Galiego e Teresa CacajCahuec (moradoras das comunidades) perante o auxiliar da promotoria em 27 de abril de 1999 e 16 de agosto de2005 (Expediente de prova, folhas 611 a 615, 636 e 641, 1214 e 1215), e Declaração de Miguel Sic Osorio,apresentada perante a Corte Interamericana perante agente dotado de fé pública (affidávit) em 20 de abril de 2016.

108 Cfr. Ata de exumação de corpos, maio de 1993 (Expediente de prova, folhas 666 a 685); Relatórioapresentado pela EAFG de julho de 1993 (Expediente de prova, folhas 511, 539 e 541), e Ofícios da Polícia Nacional deSalamá em Baja Verapaz de 15 e 19 de maio de 1993 (Expediente de prova, folhas 690 a 692, 940 e 941).

109 Cfr. Declarações de Tarcila Milián Morales (filha de Elías Milián González e irmã de Amelia Milián Morales)perante o auxiliar da promotoria em 22 de março de 1985, 27 de julho de 2011 e 24 de setembro de 2003; e peranteagente dotado de fé pública (affidávit) em 22 de dezembro de 214; bem como Declaração prestada por Angélica MaríaTorres Milián (familiar de Elías e de Amelia Milián) perante agente dotado de fé pública (affidávit) em 22 de dezembrode 2014 (Expediente de prova, folhas 799, 800, 1900, 1901, 5918, 5924 e 5925, 11783 e 11784), o Relatório da FAFGde 28 de junho de 2011 (Expediente de prova, folha 11915).

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antropológica forense. No relatório forense elaborado no ano 2011 pela FAFG foi possívelconcluir que aqueles restos pertenciam a Elías Milián González, e que o indivíduo "recebeu pelomenos um impacto contuso [na] mandíbula". Em 18 de abril de 2012, o auxiliar da promotoriamunicipal do Ministério Público de Rabinal entregou os restos do senhor Milián para a sua filha,Tarcila Milián.111

B.12. Estupro e execução de Gregoria Valey Ixtecoc em 22 de novembro de 1982

108. Na manhã do dia 22 de novembro de 1982, um grupo de militares e membros das PACchegou à aldeia Chichupac e invadiu a casa da senhora Gregoria Valey Ixtecoc, quem tinhaentre quatro e oito meses de gestação. Depois de perguntarem pelo seu esposo, quem não seencontrava, os militares foram embora. Aproximadamente ao meio-dia, o grupo voltou à casada senhora Valey, praticaram violações sexuais e posteriormente a penduraram do teto da suacasa com uma corda e a enforcaram. Depois, queimaram a casa. Naquele mesmo dia, os seusrestos foram enterrados pelos seus familiares nas proximidades desse lugar. No ano 2002,membros da FAFG identificaram essa fossa, que fazia parte de um cemitério clandestino,fizeram a exumação e identificaram os restos de Gregoria Valey, entre outros.112

B.13. Desaparecimento de Juan Pérez Sic, desde 15 de novembro de 1981

109. Em 15 de novembro de 1981, às 18h aproximadamente, um grupo de efetivos da políciajudicial entrou na casa de Manuela Toj Pérez e Juan Pérez Sic. Este último saiu para falar comeles, enquanto alguns homens entraram na residência para revistá-la e depois foram embora.Essa foi a última vez que Manuela Toj viu com vida a Juan Pérez, pois desde essa data sedesconhece o seu paradeiro.113

B.14. Desaparecimento de oito pessoas desde 26 de novembro de 1982 e detençãode Napoleón García De Paz nesse mesmo dia

110. Na tarde do dia 26 de novembro de 1982, um grupo de militares e das PAC chegou àsaldeias Xeabaj e Chijom, onde detiveram e retiraram, das suas casas às seguintes novepessoas: Gorgonio Gonzalez Gonzalez; Gabino Román Yvoy (ou Iboy ou Ivoy); Cruz PérezAmpérez; Eustaquio lxtecoc Gonzalez (ou Eustaquio Yxtecoc Gonzalez); Jorge Galeano Román;Rafael Depaz Tecú; Enrique Mendoza Sis; Dionisio Vachán (ou Bachan), e Napoleón García De

110 Cfr. Relatório da FAFG de 27 de fevereiro de 2008 apresentado perante o Auxiliar da Promotoria Distrital doMinistério Público de Salamá (Expediente de prova, folhas 11897 a 11899) e Ata do Ministério Público de 16 deoutubro de 2008 (Expediente de prova, folha 11845).111 Cfr. Relatório da FAFG de junho de 2011 (Expediente de prova, folha 11930), e Ata de entrega de ossada porparte do Auxiliar da Promotoria Municipal do Ministério Público de Rabinal (Expediente de prova, folhas 11949 e11950).

112 Cfr. Ata de exumação de cadáveres de 09 de abril de 2002 (Expediente de prova, folhas 1938 a 1941) eRelatório de Investigação Antropológica Forense da FAFG de 18 de dezembro de 2002 (Expediente de prova, folha2037).113 Cfr. Declarações de Manuela Toj Pérez (companheira de Juan Pérez Sic) perante agente dotado de fé pública(affidávit) em 29 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 6070 e 6071). A Comissão explicou, em nota derodapé de página do seu Relatório de Mérito, que nas suas primeiras comunicações, os peticionários informaram que osenhor Juan Pérez Sic tinha sido vítima dos desaparecimentos de 26 de novembro de 1982, e posteriormente,precisaram que tinha falecido no marco dos acontecimentos de violência de 1o de outubro de 1982. A Comissãoinformou que não contava com elementos suficientes para realizar uma determinação fática sobre as circunstâncias damorte dessa pessoa. No trâmite perante a Corte, os representantes informaram que essa pessoa é vítima dedesaparecimento desde 15 de novembro de 1981. A Corte procedeu a destacar o relato dos fatos e a data que sãoconsistentes com a prova, sem prejuízo da nova evidência que pudesse surgir a esse respeito.

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Paz (ou Napoleón García Depaz ou Napoleón García de Páz). Essas nove pessoas foramamarradas pelas mãos e levadas ao cemitério San Francisco na aldeia Xeabaj. O senhorNapoleón García De Paz relatou à Corte que nesse lugar, colocaram todos de bruços, com asmãos amarradas e que receberam golpes nas costas, das culatras de armas. Aproximadamenteà 01h a.m. conseguiu desamarrar as mãos e que foi o único que conseguiu fugir.114

111. No ano de 2004, membros da FAFG realizaram escavações no cemitério municipal deXeabaj, sem que fosse possível localizar os restos mortais buscados. No relatório elaborado, seexplicou que "a área de trabalho era muito reduzida, por estar em meio a nichos construídosno lugar; além disso, as testemunhas também não tinham uma localização exata de ondetinha sido o sepultamento, pelo qual não foi possível encontrar os restos mortaisprocurados".115 Da mesma forma, sabe-se que em 22 de dezembro de 2014, a FAFGapresentou perante o Ministério Público um Relatório Pericial da Investigação AntropológicaForense realizado no Cemitério San Francisco, aldeia Chuateguá, nos dias 07 de março de2012 e 20 de março de 2013, sem encontrar os restos buscados.116 Até esta data não seconhece o paradeiro dos oito homens.

B.15. Execução de oito pessoas em 02 de março de 1983

112. Em 02 de março de 1983, aproximadamente às 5:00 a.m., um grupo deaproximadamente 18 pessoas que tinha fugido para a montanha, buscando refúgio, devido aoconflito da região, foi surpreendido por membros do Exército Nacional enquanto dormiam emuma cabana que servia de refúgio. Ao vê-los, os militares procederam a disparar e algumaspessoas conseguiram fugir, entre elas o senhor Napoleón García De Paz, a sua esposa e filhos.Durante a fuga, o senhor Napoleón García recebeu dois disparos, em um dedo da mão e no pé.As seguintes oito pessoas da aldeia Xeabaj foram executadas a tiros e golpes de machadinha:cinco crianças, Rosa González Tecú de 10 anos, María Concepción Xitumul Xitumul (ou MariaIxtococ Chitimul) de 5 anos, Héctor Rolando Alvarado García de 4 anos, Adela FlorentinaAlvarado García (ou Delia Alvarado García) de 1 ano e uma menina de nome desconhecido, deentre 0 e 3 meses; duas mulheres, Enriqueta Tecú (ou Enriqueta Tecú Chiquito) e LucíaXitumul Ixpancoc (ou Luciana Xitumul Ixpancoc), e um homem, Luciano Alvarado Xitumul (ouLuciano Alvarado Chitimul). Os seus corpos foram enterrados em uma fossa clandestina naaldeia Xeabaj por vizinhos e familiares.117

113. No ano 2004, membros da FAFG realizaram a escavação de uma fossa coletiva eexumara, restos humanos, peças de roupas, artigos pessoais e vestígios balísticos. Uma vezrealizadas as análises correspondentes, concluiu-se que foram recuperados restos de seisossadas, que ao serem identificadas correspondem às seis pessoas antes mencionadas. Osrestos de Héctor Rolando Alvarado García e María Concepción Xitumul não foram

114 Cfr. Declaração de Napoleón García de Paz na audiência pública celebrada em 28 de abril de 2016.115 Cfr. Relatório de Investigação Antropológica Forense da FAFG de 06 de outubro de 2004 (Expediente deprova, folhas 1601 e 1606).116 Cfr. Relatório da FAFG de 05 de junho de 2014 (Expediente de prova, folhas 9247 a 9276).

117 Cfr. Declaração prestada por Daniel Xitumul Cuxúm (esposo de Lucía Xitumul Ixpancoc ou Luciana XitumulIxpancoc, e pai de María Concepción Xitumul Xitumul e da menina de nome desconhecido, com entre 0 e 3 meses deidade) perante agente dotado de fé pública (affidávit) em 1o de setembro de 2014 (Expediente de prova, folha 5563);Relatório da CEH “Guatemala, Memória do Silêncio”, Casos Apresentados, Anexo II, folha 156, e Declaração deNapoleón García de Paz na audiência pública celebrada em 28 de abril de 2016.

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identificados.118 O relatório forense destacou que algumas ossadas evidenciaram "traumacircun-mortem, como consequência da violência exercida sobre o indivíduo em um momentopróximo à morte, compatível com ferida de projétil de arma de fogo no crânio e lesõescontusas no tórax". Finalmente, "[o] padrão de enterramento apresentado na fossa permiti[u]inferir que foi realizado pelos familiares e/ou vizinhos, uma vez que o enterramentoapresento[u] oferendas associadas às ossadas e também foram cobertas com ponchos, paraproteção dos defuntos, colocando-os no fundo da fossa, e não jogando-os".119

B.16. Falecimento do menino Antonio Chen mendoza em março de 1983

114. O senhor Miguel Chen Tahuico e a sua esposa, Vicenta Mendoza Alvarado e os seusquatro filhos saíram da sua casa na aldeia Chichupac fugindo em direção à montanha, devido àperseguição por parte dos militares. Devido à exposição ao clima, um dos seus filhos, AntonioChen Mendoza, de 6 anos de idade "começou a sofrer diarreias, febre e teve o corpo afetadopor feridas, e em consequência do seu estado [...] faleceu". O seu corpo foi enterrado namontanha, sem haver certeza sobre a data de óbito, uma vez que, como foi dito pelo seu pai"na montanha não se tem controle do tempo".

B.17. Execução dos irmãos Eusebia e José León Grave García em 22 de outubro de1983

115. Em 22 de outubro de 1983, um grupo de militares e das PAC executaram os irmãosEusebia e José León Grave García (de 18 e 17 anos de idade), filhos de Juana García Depaz.Eusebia Grave estava em um riacho tomando banho e José León Grave estava tomando caféda manhã. Ele teve os seus órgãos genitais cortados, a orelha e o nariz, e "abriram o seucorpo" antes da sua morte. Os corpos foram enterrados pelos seus familiares e vizinhos emuma fossa localizada na montanha de Cumatzá, na aldeia Xeabaj. No ano 2002, membros daFAFG identificara, essa fossa, que fazia parte de um cemitério clandestino e no ano 2003 asossadas de Eusebia e José León Grave García foram identificadas pela sua mãe, mediante umreconhecimento judicial.120

B.18. Situação de Juana García Depaz a partir de 22 de outubro de 1983 e trabalhosforçados

116. Na manhã de 22 de outubro de 1983, um grupo de agentes da polícia judicial eaproximadamente duzentos militares detiveram a Juana García Depaz junto com um grupo demulheres e crianças, reuniram os vizinhos da região e queimaram a sua roupa e alimento.Posteriormente, levaram um grupo de pessoas, inclusive a Juana García, a um destacamentomilitar localizado no município de Rabinal, onde mantiveram essas pessoas "sem comida" e"sem água". À noite, o grupo foi encarcerado numa mesma peça e durante três noites asmulheres foram espancadas e violadas sexualmente por militares e agentes da polícia judicial.Durante esse tempo, Juana García foi ameaçada de morte, foi pendurada pelo pescoço com

118 Cfr. Relatório de Investigação Antropológica Forense da FAFG de 06 de outubro de 2004 (Expediente deprova, folhas 1601, 1606, 1609, 1640 e 1641).

119 Cfr. Relatório de Investigação Antropológica Forense da FAFG de 06 de outubro de 2004 (Expediente deprova, folhas 1601, 1606, 1609, 1640 e 1641).

120 Cfr. Ata de exumação de corpos de 09 de abril de 2002 (Expediente de prova, folhas 1938 a 1941); Relatóriode Investigação Antropológico Forense da FAFG de 18 de dezembro de 2002 (Expediente de prova, folhas 2037) e Atade reconhecimento judicial de ossadas humanas do Órgão Judicial da Guatemala, de 27 de fevereiro de 2003(Expediente de prova, folhas 1952 e 1954).

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uma corda e foi interrogada sobre a guerrilha. Depois de três dias e uma vez que os militareslevaram embora as crianças "ao sanatório das irmãs de caridade", o grupo foi levado à colôniade Pacux de Rabinal, onde ficou preso. Entre 31 de dezembro de 1983 e 1o de janeiro de 1984,um grupo formado por homens e mulheres, inclusive Juana García, foi levado por militares àaldeia Chichupac, onde viveram em cárcere. Nesse lugar, as mulheres passaram fome, foramobrigadas a cozinhar para trezentos ou quatrocentos soldados do destacamento e foramvítimas de violações sexuais. As violações sexuais perpetradas pelos militares em outubro de1982 e junho de 1985 contra Juana García resultaram em duas gestações, das quais nasceramos seus filhos Edgar e Sandra Maribel García.121

B.19. Execução de Medardo Juárez García em 31 de agosto de 1983 ou 1984

117. Em 31 de agosto de 1983 ou 1984, um grupo de militares e das PAC chegaram à aldeiaChichupac, entraram no pátio da casa de María Concepción García Depaz, do seu esposo e osseus cinco filhos e realizaram disparos. Nesse momento, o seu filho, Medardo Juárez García, deentre 14 e 16 anos de idade, assustado, saiu para a rua. Em resposta, um dos militaresdisparou e ele caiu morto. Nesse mesmo dia, os militares queimaram a moradia da família eroubaram os seus pertences, junto com os de outras casas da aldeia. Os familiares de MedardoJuárez sepultaram o seu corpo em uma fossa que cavaram próximo à sua residência.122 No ano2002, membros da FAFG identificaram essa fossa, que fazia parte de um cemitério clandestino,fizeram a exumação e identificaram os restos de Medardo Juárez, entre outros.123

B.20. Desaparecimento de Marcelo Sic Chen desde dezembro de 1984

118. O senhor Marcelo Sic Chen chegou entre 13 e 15 de dezembro de 1984 à colôniaChichupac a fim de "solicitar anistia e se entregar". Nesse lugar, foi recebido por umrepresentante militar, quem o entregou aos membros do Exército Nacional. Posteriormente foilevado ao destacamento de Rabinal e até esta data não se conhece o seu paradeiro.

B.21. Execução de Silvestre Sic e Raymunda Corazón em 20 de dezembro de 1984

119. Na manhã do dia 20 de dezembro de 1984, um grupo de militares e membros das PACentrou em uma residência na aldeia Chichupac onde estavam Silvestre Sic (ou Silvestre SicXutumul), pai de Marcelo Sic Chen (supra par. 118) e Raymunda Corazón (ou Raymunda SicalCorazón), os quais foram executados com arma de fogo. Os seus corpos, destroçados, foram

121 Cfr. Declarações de Juana García Depaz perante o auxiliar da promotoria em 26 de julho de 2001 eDeclaração de Juana García Depaz perante agente detentor de fé pública (affidávit) em 02 de novembro de 2009(Expediente de prova, folhas 790, 1333 a 1336), e Declaração de Juana García Depaz na audiência pública celebradaem 28 de abril de 2016.

122 Cfr. Denúncia penal de María García Depaz de 17 de janeiro de 1997 (expediente de prova, folha 1862);Declaração de María Concepción García Depaz perante o auxiliar da promotoria em 27 de julho de 2001 (Expediente deprova, folhas 801 e 1902), e Declaração de María Concepción García Depaz perante agente dotado de fé pública(affidávit) em 11 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 5694 e 5695).

123 Cfr. Ata de exumação de cadáveres de 09 de abril de 2002 (Expediente de prova, folhas 1938 a 1941) eRelatório de Investigação Antropológica Forense da FAFG de 18 de dezembro de 2002 (Expediente de prova, folha2037).

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encontrados no dia seguinte e os vizinhos os enterraram em um esgoto próximo à casa.124 Noano 2002, membros da FAFG identificaram essa fossa, que fazia parte de um cemitérioclandestino. Durante a diligência de exumação, uma das ossadas foi reconhecida como sendode Raymunda Corazón pelo senhor Francisco Sic Chen, no entanto, no relatório antropológicoforense consta que não foi identificada mediante a perícia realizada. Por sua vez, os restos deSilvestre Sic foram exumados e identificados mediante essa perícia.125

B.22. Execução de Efraín García de Paz em 17 de agosto de 1986

120. O senhor Efraín García de Paz, irmão de Juana García Depaz, esteve fora da região poraproximadamente três anos. Uma vez que voltou, em 17 de agosto de 1986, no caminho paraa sua casa, em Chichupac, no município de Rabinal, foi interceptado e executado. Segundoinforma a senhora Juana García Depaz, a pessoa que matou o seu irmão foi um patrulheirocivil, mas também informou que foi um "G2" do Exército. Por sua vez, a ComissãoInteramericana concluiu no seu Relatório de Mérito que o responsável foi um agente da políciajudicial. Segundo declaração de Juana García, ela e outros familiares recolheram o corpo deEfraín García e o enterraram no cemitério localizado em Rabinal.126

C. Investigações

121. Consta no acervo probatório que neste caso tramitaram dois processos relacionados àinvestigação dos fatos do massacre de 08 de janeiro de 1982: i) o Processo No 001-2005-95839 perante a Unidade de Casos Especiais e Violações aos Direitos Humanos do Ministério

124 Cfr. Declaração de Pedro Corazón Osorio (sobrinho de Raymunda Sical Corazón), quem se faz acompanharporFrancisco Sic Chen (filho de Silvestre Sic Xutumul), perante agente detentor de fé pública (affidávit) em 16 dedezembro de 2014 (Expediente de prova, folha 5814), e Declaração de Francisco Sic Chen perante o auxiliar dapromotoria em 26 de julho de 2001 (Expediente de prova, folha 792).

125 Cfr. Ata de exumação de cadáveres de 09 de abril de 2002 (Expediente de prova, folhas 1938 a 1941) eRelatório de Investigação Antropológica Forense da FAFG de 18 de dezembro de 2002 (Expediente de prova, folha2037).126 Cfr. Denúncia da senhora Juana García Depaz perante o Auxiliar Departamental do Procurador de DireitosHumanos em 09 de maio de 1995 (Expediente de prova, folhas 1290 e 1291), e Declaração de Juana García Depaz de28 de março de 2007 (Expediente de prova, folha 1423).

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Público,127 aberto a partir de uma denúncia apresentada em março de 1993128 e o qual estariaainda em fase de investigação; e ii) um processo perante o Procurador de Direitos Humanos daGuatemala, quem ditou uma resolução em 02 de setembro de 1996 relacionada aos cemitériosclandestinos localizados, entre outros lugares,129 na aldeia Chichupac.

122. Por outro lado, foram tramitados nove processos relacionados aos fatos do caso,cometidos antes e depois do massacre de 08 de janeiro de 1982: sete perante a PromotoriaDistrital do Ministério Público de Salamá e dois perante a Promotoria Municipal do MinistérioPúblico de Rabinal Nesses processos foram denunciados, entre os anos 1995 e 2010,desaparecimentos, execuções, deslocamentos forçados, violência e violações sexuais, atos detortura e trabalhos forçados, entre outros atos. Não se advertiram ações orientadas àdeterminação dos responsáveis em sete desses nove processos. Pelo contrário, as intervençõesdentro de cinco desses processos130 se limitaram à exumação e, em alguns casos, à entregade restos aos seus familiares, e em outros dois processos131 não se registra atividadeinvestigativa alguma. Por último, dentro dos Processos No 802-95-Of. 6to e M.P. 247-2006-441registram-se algumas intervenções orientadas a determinar responsabilidades, mas essasforam mínimas. O que antecede, apesar de que em todos os processos consta que foramidentificados membros do exército e/ou das PAC como sendo os responsáveis e em várias

127 Como explicaram os peticionários em um escrito apresentado durante o trâmite perante a Comissão, a partirde uma denúncia apresentada no ano de 1993 e até 2005, a investigação esteve sob a responsabilidade da PromotoriaDistrital do Ministério Público do Departamento de Baja Verapaz no Processo 1083/95 M.P. e Processo M.P.247/1999/492, com Causa N° 255/93 Of. Ato perante o Juiz de Primeira Instância Penal, Narcoatividade e DelitosContra o Meio Ambiente de Baja Verapaz. O Processo M.P. 247/1999/492 foi anexado à Causa N° 255/93 Of. Ato de 1 o

de setembro de 2005, segundo ofício do Auxiliar da Promotoria Distrital do Ministério Público de Baja Verapaz, dirigidoao Juiz de Primeira Instância Penal, Narcoatividade e Delitos Contra o Meio Ambiente de Baja Verapaz (processo deprova, folha 8772). O processo N° 001-2005-95839 aparentemente será tramitado perante a Unidade de CasosEspeciais e Violações aos Direitos Humanos do Ministério Público da cidade de Guatemala desde o ano 2005. Cfr.Escrito de 13 de dezembro de 2007 apresentado pelos representantes (antes peticionários) à Comissão (processo deprova, folhas 378 a 379). Não consta no processo N° 001-2005-95839 uma resolução na qual a Unidade de CasosEspeciais advogue conhecimentos da causa, nem mais intervenções desta causa. Portanto, não consta se tanto oProcesso 1083/95 M.P. como o Processo M.P. 247/1999/492 com Causa N° 255/93 Of. 4º perante o Juizado de PrimeiraInstância Penal, Narcoatividade e Delitos Contra o Meio Ambiente de Baja Verapaz passaram a formar parte doProcesso N° 001-2005-95839 perante a Unidade de Casos Especiais e Violações aos Direitos Humanos do MinistérioPúblico, mas se tem a convicção de que foi assim. A Comissão indicou que o Anexo 7 ao Relatório de Méritocorresponde ao processo N° 001-2005-95839. Isso não foi contestado pelo Estado. Dentro desse anexo, encontram-sedocumentos sem números de causa ou com números de causa diferentes, tais como as causas N° 916/97 Of. Ato, N°492/99 Of. 7º, N° 255-93 Of. 4º, e MP-36-00-7. A maioria do processo corresponde à causa N° 255-93 Of. 4º, a qualtambém se encontra no Anexo 9 ao Relatório de Mérito. No Anexo 9 há documentos que faltam no anexo 7 e vice-versa. 128 Cfr. Denúncia de Ana Calate Sic de 29 de março de 1993 (Expediente de prova, folhas 729 e 730).

129 Cfr. Resolução do Procurador dos Direitos Humanos de 02 de setembro de 1996 sobre os processosrelacionados com os cemitérios clandestinos localizados em Plan de Sánchez, Raxtuj, Chichupac e Río Negro, Rabinal,Baja Verapaz (Expediente de prova, folhas 1869 a 1879).130 Esses processos são: i) N° 87/97 perante a Promotoria Distrital do Ministério Público; ii) Causa N° 255/93 Of.4º (Processo 1083/95 M.P.) perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá; iii) Causa N° 247-2003-1142 perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá; iv) Causa N° 248-2010-263 perante a PromotoriaMunicipal do Ministério Público de Rabinal, e v) Processo N° M.P. 247-1997-1378 perante a Promotoria Distrital doMinistério Público de Salamá.131 Estes expedientes são: i) N° 81195 Of. 1º perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá e ii)N° 248-2006-169 perante a Promotoria Municipal do Ministério Público de Rabinal.

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ocasiões os denunciantes, inclusive, forneceram os nomes dessas pessoas e os lugares ondepoderiam ser localizadas,132 bem como os nomes de possíveis testemunhas.

123. Embora o Estado tenha afirmado que a partir do ano 2011 "diversos fatos ocorridos nestaregião" estão em etapa de investigação dentro do processo MP 001-2012-364, supostamentetramitado pela Unidade de Casos Especiais do Conflito Armado Interno da Promotoria da Seçãode Direitos Humanos, a Guatemala não proporcionou documentação que sustentasse essaalegação ou que permitisse ao Tribunal avaliar as intervenções dentro desse processo, apesarde ter sido uma solicitação da Corte.133

IX.MÉRITO

IX.IDIREITOS À LIBERDADE PESSOAL,134 INTEGRIDADE PESSOAL,135 VIDA136 E

RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE JURÍDICA137 DAS VÍTIMAS DEDESAPARECIMENTO FORÇADO, BEM COMO DIREITOS À INTEGRIDADE PESSOAL E À

PROTEÇÃO À FAMÍLIA138 DOS SEUS FAMILIARES

A. Argumentos da Comissão e das partes

132 Denúncia de Máxima Emiliana García Valey e Francisco Sic Chen, de 09 de maio de 1995 (Expediente deprova, folha 1577), e Declaração de Juana García Depaz de 08 de fevereiro de 2010 (Expediente de prova, folhas 9003a 9005).133 Durante a audiência pública, o Juiz Eduardo Ferrer solicitou ao Estado informar "quantos processos penaisestão abertos, quantos estão acumulados e em que etapa se encontram", e mediante nota da Secretaria de 12 demaio de 2016 foi solicitado que o Estado respondesse as perguntas realizadas pelos Juízes da Corte nessa audiência eapresentasse "a documentação de respaldo pertinente”.134 O artigo 7o da Convenção assinala: “1. Toda pessoa tem direito à liberdade e à segurança pessoais. 2.Ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelasconstituições políticas dos Estados Partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas. 3. Ninguém pode sersubmetido a detenção ou encarceramento arbitrários. 4. Toda pessoa detida ou retida deve ser informada das razõesda sua detenção e notificada, sem demora, da acusação ou acusações formuladas contra ela. 5. Toda pessoa detidaou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercerfunções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo deque prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento emjuízo. 6. Toda pessoa privada da liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que estedecida, sem demora, sobre a legalidade de sua prisão ou detenção e ordene sua soltura se a prisão ou a detençãoforem ilegais. Nos Estados Partes cujas leis preveem que toda pessoa que se ver ameaçada de ser privada de sualiberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente a fim de que este decida sobre a legalidade de talameaça, tal recurso não pode ser restringido nem abolido. O recurso pode ser interposto pela própria pessoa ou poroutra pessoa. 7. Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciáriacompetente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar”.135 O artigo 5o da Convenção, no que é pertinente, estabelece: “1. Toda pessoa tem o direito de que se respeitesua integridade física, psíquica e moral. 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis,desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidadeinerente ao ser humano”.136 O artigo 4.1 da Convenção diz: “1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deveser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vidaarbitrariamente”.137 O artigo 3o da Convenção expressa: "Toda pessoa tem direito ao reconhecimento de sua personalidadejurídica”.138 O artigo 17 da Convenção, no que é pertinente, estabelece: “1. A família é o elemento natural e fundamentalda sociedade e deve ser protegida pela sociedade e pelo Estado”.

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124. A Comissão estabeleceu, no seu Relatório de Mérito que oito pessoas foramdesaparecidas nos dias 24 de agosto de 1981; 08, 18 e 31 de janeiro e 12 de fevereiro de1982 e 13 de dezembro de 1984, e que todas essas pessoas foram vistas por última vez sob acustódia de agentes estatais e, até esta data, não se conhece o seu paradeiro. Os oitodesaparecimentos forçados estariam dentro do contexto de violência e perseguição contra opovo maia suspeito de estar vinculado à subversão. Consequentemente, concluiu a violaçãodos direitos dessas pessoas ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridadepessoal e à liberdade pessoal, previstos nos artigos 3o, 4o, 5o e 7o da Convenção Americana,em relação ao artigo 1.1 desse instrumento, bem como a violação ao artigo 1o da CIDFP. Nasusas alegações finais afirmou que alguns fatos que tinham sido classificados como execuçõesextrajudiciais na seu Relatório de Fundo poderiam ser melhor classificados comodesaparecimentos forçados e, consequentemente, a Corte tem competência temporal para sepronunciar sobre esses fatos. Nessa linha, assinalou que são vítimas de desaparecimentoforçado as pessoas que foram enterradas nas fossas clandestinas, que em 09 de março de1987 não tinham sido exumados, e que os seus restos não tinham sido identificados nementregues aos familiares. O que antecede, enquanto existiram ações do Estado para ocultar oacontecido e impedir a identificação dos restos. Nesse ponto, referiu-se às semelhanças destecaso com o Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. o Peru, no qual, a Corteclassificou os fatos como desaparecimento forçado apesar da existência de claros indícios damorte das vítimas.

125. Por outra parte, a Comissão afirmou que os familiares dos desaparecidos são, por suavez, vítimas de violação da sua integridade pessoal. Da mesma forma, estabeleceu que aperseguição, a violência extrema, a profunda situação de indefensa e as intenções dedestruição de bases familiares e sociais que motivaram a violência no contexto dos fatos,permite considerar uma violação autônoma do direito à proteção da família. Informou,também, que neste caso não foi feita uma investigação completa sobre os fatos, nem houveprocesso judicial efetivo. Consequentemente, concluiu que o Estado violou o direito àintegridade psíquica e moral e o direito à proteção da família, consagrados nos artigos 5.1 e 17da Convenção Americana, em relação ao dever de respeito estabelecido no artigo 1.1 dessetexto, em prejuízo dos familiares das vítimas deste caso.

126. Os representantes afirmaram no seu escrito de solicitações e argumentos que o Estadoé culpado pelo desaparecimento forçado de dezoito pessoas que moravam na aldeia Chichupace comunidades vizinhas a ela. Nas suas alegações finais, informaram, com base na Sentençado Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, é necessário alterar aclassificação jurídica do ocorrido às vítimas que foram apresentadas perante a Comissão comosendo execução extrajudicial, à figura de desaparecimento forçado, por não existir suficienteselementos para estabelecer a sua morte. Nesse sentido, solicitaram que fossem declaradascomo vítimas de desaparecimento forçado as oito pessoas identificadas pela Comissão no seuRelatório de Mérito, e solicitaram a mudança na classificação jurídica do ocorrido a uma lista de68 supostas vítimas fornecida na audiência pública e uma lista de 42 supostas vítimasfornecida nas alegações finais escritas, de execução extrajudicial para desaparecimentoforçado. Alegaram que até esta data, não se conhece o paradeiro de muitas das pessoas queconstam nessas listas, não foi determinada com certeza a sua identidade e os seus restos nãoforam encontrados ou entregues aos seus parentes para a sua exumação. Além disso, apesarde que em alguns casos já tenham sido realizadas as exumações, os restos não foramidentificados com provas ou análises que permitem comprovar a sua identidade, a forma ecausa da sua morte e a existência de possíveis lesões ou indícios de tortura.

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127. Por outra parte, os representantes afirmaram que um aspecto relevante em relação àprática sistemática do desaparecimento forçado é o impacto psicológico e moral das famíliasdas vítimas que decorre do profundo sofrimento por falta de localização dos restos mortais dosseus seres queridos, bem como pela nula investigação dos fatos sob os quais o crime ocorreu.Assim sendo, argumentaram a violação do artigo 5o da Convenção Americana, com relação aoartigo 1.1.

128. O Estado argumentou que não é possível atribuir responsabilidade pelosdesparecimentos ocorridos durante a época do conflito armado, já que o delito não estavatipificado no ordenamento penal interno nem existia no próprio âmbito interamericano. Alegouque nem a Corte nem a Comissão distinguem entre "delitos continuados" e "delitospermanentes" ao analisar a natureza jurídica do delito de desaparecimento forçado. Explicou adiferença entre tais delitos conforme o direito penal guatemalteco, e indicou que odesaparecimento forçado, que na Guatemala constitui um delito a partir de 22 de maio de1996, é um delito permanente porque se comete em um momento determinado e, emborapermaneçam os efeitos, não pode ser re-tipificado com base em fatos posteriores conforme oprincípio de legalidade e irretroatividade da lei. Consequentemente, os fatos ocorridos antes datipificação e entrada em vigência dos delitos de desaparecimento forçado e de tortura,poderiam ser enquadrados como delito de sequestro, detenção ilegal ou lesões graves.

129. O Estado acrescentou que apenas um juiz com jurisdição penal pode estabelecer aexistência de um desaparecimento forçado. Além disso, acrescentou "que não se pode atribuira qualquer tipo de provas fidedignas a responsabilidade do Estado de ter cometido taisdesaparecimentos". A tal respeito, afirmou que, para estabelecer um desaparecimento forçado,tanto a Comissão quanto a Corte apenas se baseiam no padrão sistemático da época doconflito armado interno. Também argumentou que quando há uma mudança de governo,embora se possa estender a responsabilidade do Estado pelos atos de funcionários degovernos anteriores, tais fatos não podem ser classificados como uma conduta continuada doEstado e, consequentemente, não se pode estender a competência da Corte a fatos anterioresà época em que o Estado reconheceu a sua competência. Da mesma forma, afirmou que aCIDFP não pode ser aplicada de forma retroativa a fatos que aconteceram antes da suaentrada em vigência para o Estado nem aqueles cujo início de execução aconteceu antes daratificação da Convenção em 25 de fevereiro de 2000.

130. Nesse mesmo sentido, o Estado argumentou que não pode incorrer nas violações dosdireitos à vida, à integridade pessoal, à liberdade e ao reconhecimento da personalidadejurídica, uma vez que a Corte não pode conhecer fatos anteriores à data em que a Guatemalareconheceu a sua competência. Por outro lado, citou o Caso Efraín Bámaca Velásquez paraargumentar que "a privação arbitrária da visa suprime à pessoa humana e, consequentemente,não procede, nessa circunstância, invocar a suposta violação ao direito à personalidade jurídicaou de outros direitos consagrados na Convenção". Finalmente, opôs-se a que fossemacrescentados novos nomes de pessoas que teriam sido "executados extrajudicialmente"segundo os Relatórios de Admissibilidade e Fundo da Comissão, à lista de pessoassupostamente desaparecimentos forçados.

B. Considerações da Corte

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131. Neste caso, o Estado foi enfático em assinalar que não pretende negar que aconteceramos fatos que causaram violações aos direitos humanos nem a sua responsabilidade se houvedolo, negligência ou culpa institucional ou de funcionários ou empregados públicos (supra pars.15 e 51). No entanto, transformou a análise que a Corte fez sobre o desaparecimento forçadoao longo da sua jurisprudência, e sobre esta base afirmou que não se pode atribuirresponsabilidade internacional pelos fatos do caso. A Corte procede a dar resposta aosargumentos do Estado.

132. Em primeiro lugar, o Estado alegou que não se pode atribuir responsabilidadeinternacional pelos desaparecimentos ocorridos durante a época do enfrentamento armadointerno, uma vez que o delito de desaparecimento forçado é um delito permanente que nãoestava tipificado no ordenamento penal interno nem existia no próprio âmbito interamericano enão pode ser retipificado conforme os princípios de legalidade e irretroatividade da lei. Em todocaso, o delito poderia se enquadrar, segundo o Estado, na figura delitiva de sequestro,detenção ilegal ou lesões graves.

133. Na sua jurisprudência constante iniciada desde 1988,139 a Corte estabeleceu que odesaparecimento forçado de pessoas é uma violação de direitos humanos constituída por trêselementos concorrentes: a) a privação da liberdade; b) a intervenção direta de agentesestatais ou o seu consentimento, e c) a negação em reconhecer a detenção e de revelar asorte ou o paradeiro da pessoa procurada. Nesse sentido, este Tribunal desenvolveu na suajurisprudência o caráter pluriofensivo do desaparecimento forçado, bem como a sua naturezapermanente ou continuada, na qual o desaparecimento e a sua execução se iniciam com aprivação da liberdade da pessoa e a subseguinte falta de informação sobre o seu destino, epermanece enquanto não se conheça o paradeiro da pessoa desaparecida ou sejam achados osseus restos de modo que se determine com certeza a sua identidade.140 Enquanto odesaparecimento perdurar, os Estados têm o dever correlativo de investigar e, eventualmente,punir os responsáveis conforme as obrigações decorrentes da Convenção Americana e,especialmente, da Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas(CIDFP).141

134. Este Tribunal tem competência para, eventualmente, classificar os fatos deste caso comosendo desaparecimento forçado devido ao caráter permanente ou continuado dos seus atosconstitutivos, e a ofensa plural aos direitos das pessoas reconhecidos na ConvençãoAmericana, enquanto não se conheça o paradeiro da vítima ou os seus restos sejamencontrados. A Corte lembra que um desaparecimento forçado se configura por umapluralidade de condutas que, juntas com uma única finalidade, vulneram de formapermanente, enquanto subsistam, diferentes bens jurídicos protegidos pela Convenção.142

Portanto, a análise de um possível desaparecimento forçado deve ser consequente com a

139 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito. Sentença de 29 de julho de 1988. Série C N° 4, par.155, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 22 dejunho de 2016. Série C N° 314, par. 141.140 Cfr. inter alia, Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, pars. 155 a 157, e Caso Herrera Espinoza eoutros Vs. Peru. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 26 de novembro de 2013. Série CN° 274, par. 31.141 Cfr. Caso Radilla Pacheco Vs. México. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 23 denovembro de 2009. Série C N° 209, par. 145, e Caso Osorio Rivera e Familiares Vs. Peru, par. 115.142 Cfr. Caso Radilla Pacheco Vs. México, par. 138, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru.Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 1o de setembro de 2015. Série C N° 299, par. 166.

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violação complexa de direitos humanos que este implica e não se deve focar isoladamente,dividida e fragmentadamente apenas na detenção, a possível tortura ou no risco de perder avida.143 Nesse sentido, a sua análise deve abranger a totalidade do conjunto dos fatosapresentados para a consideração do Tribunal. Apenas desse modo a análise dodesaparecimento forçado é consequente com a complexa violação aos direitos humanos queele representa.144

135. Essas considerações não infringem os princípios de legalidade e irretroatividade, poisdiferentem das execuções extrajudiciais, o desaparecimento forçado de pessoas se caracterizapor ser uma violação de caráter contínuo e permanente. Isso permite que a Corte possa sepronunciar sobre um suposto desaparecimento forçado, mesmo se este iniciou antes da dataem que o Estado reconhece a competência da Corte, sempre e quando tal violação permaneçaou continue com posterioridade a essa.145 Sem prejuízo disso, o Tribunal lembra que mesmoquando caiba analisar o alegado desaparecimento forçado desde uma perspectiva integral,pode declarar uma violação à Convenção Americana ou a outros tratados a partir da data dereconhecimento da competência por parte do Estado demandado,146 ou seja, 09 de março de1987.

136. Por último e a respeito dos argumentos que se referem à forma como se deve processarna esfera interna os fatos de desaparecimento forçado, a Corte adverte que na suajurisprudência conheceu casos em que devido à falta inicial da tipificação do delito autônomode desaparecimento forçado de pessoas no momento em que ocorreram os fatos e em quecomeçaram os processos penais em nível interno, não houve impedimentos para o seudesenvolvimento, no entanto, foi fundamental que a eventual aplicação das figuras penaissejam consequentes com a gravidade dos fatos e a violação complexa dos direitos humanosalegados. Assim, no Caso Ticona Estrada e outros Vs. Bolívia, o juiz da causa penal ditou umasentença em 08 de janeiro de 2008 mediante a qual condenou os ex membros do exército pordelitos de assassinato, privação da liberdade, ameaças e sequestro; bem como a dois exagentes públicos pelo delito de cumplicidade em assassinato. A Corte considerou que "nãoesta[va] demonstrado que a falta de tipificação do delito autônomo de desaparecimentoforçado de pessoas tive[sse] impedido o desenvolvimento efetivo deste caso penal".147 NoCaso Goiburú e outros Vs. Paraguai, em alguns casos, os acusados foram condenados sobfiguras penais como sequestro, privação ilegítima da liberdade, abuso de autoridade,associação ou conluio para delinquir, lesões, coação ou ameaças, e homicídio, previstos noCódigo Penal de 1914 e de 1998 quando este foi mais favorável ao acusado. A Cortereconheceu que "a detenção ilegal e arbitrária, a tortura e o desaparecimento forçado dasvítimas não ti[nha] ficado em total impunidade mediante a aplicação de outras figuraspenais".148 No Caso Castillo Páez Vs. Peru ocorreu algo diferente: embora os fatos inicialmente

143 Cfr. Caso Heliodoro Portugal Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 12 deagosto de 2008. Série C N° 186, par. 112, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 166.

144 Cfr. Caso Heliodoro Portugal Vs. Panamá, par. 112, e Caso Osorio Rivera e Familiares Vs. Peru, par. 116.

145 Essa tem sido a jurisprudência constante da Corte nos casos de desaparecimento forçado de pessoas. Cfr.Caso Heliodoro Portugal Vs. Panamá, par. 34; Caso Ticona Estrada e outros Vs. Bolívia. Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 27 de novembro de 2008. Série C N° 191, par. 28 e seguintes; Caso Radilla Pacheco Vs. México, par. 24;Caso González Medina e familiares Vs. República Dominicana. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas.Sentença de 27 de fevereiro de 2012. Série C N° 240, par. 48; Caso Tenorio Roca e Outros Vs. Peru, par. 31.146 Cfr. Caso González Medina e familiares Vs. República Dominicana, par. 53.147 Cfr. Caso Ticona Estrada e outros Vs. Bolívia, pars. 75, 76, 103 e 104.

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tenham sido processados pelo delito de sequestro, em 16 de março de 2006, quatro pessoasforam condenadas pelo delito de desaparecimento forçado. A Suprema Corte de Justiça doPeru confirmou essa posição em sentença de 18 de dezembro de 2007, estabelecendo que,"por se tratar de um delito permanente, entende-se como perpetrado sob a vigência do novoCódigo Penal e serão aplicadas as suas disposições". A Corte Interamericana considerou que asdecisões adotadas constituíram "importantes precedentes da justiça latino-americana emmatéria de direitos humanos”.149

137. Em segundo lugar, o Estado alegou que a determinação da existência de umdesaparecimento forçado apenas se faz por meio das instâncias jurisdicionais penais internas emediante a utilização das provas idôneas, e que este Tribunal não pode atribuir aresponsabilidade de cometimento de tais desaparecimentos sem provas incontestáveis.

138. A Corte lembra que a jurisdição internacional dos direitos humanos não deve serconfundida com a jurisprudência penal, uma vez que os Estados não comparecem perante aCorte como sujeitos de ação penal. O direito internacional dos direitos humanos não tem porobjeto impor penas a pessoas culpáveis das suas violações, senão amparar as vítimas e dispora reparação dos danos que os Estados responsáveis por essas ações tenham provocado.150

Para estabelecer que houve uma violação aos direitos consagrados na Convenção não énecessário comprovar a responsabilidade do Estado para além de qualquer dúvida razoávelnem que se identifique individualmente os agentes aos quais são atribuídos os fatos deviolência; é suficiente demonstrar que existiram ações ou omissões que tenham permito aperpetração dessas violações ou que exista uma obrigação do Estado que este não tenhacumprido.151 Para tanto, a Corte deve aplicar uma avaliação da prova que leve emconsideração a gravidade da atribuição de responsabilidade internacional a um Estado e que,sem prejuízo disso, seja capaz de criar a convicção da verdade dos fatos alegados.152 Porúltimo, este Tribunal pensa ser pertinente lembrar que para fundamentar uma sentença, aprova de indício ou presumível é especialmente importante quando se trata de denúncias sobredesaparecimento forçado, uma vez que essa forma de violação se caracteriza por procurar asupressão de todo elemento que permita comprovar a detenção, o paradeiro e o destino dasvítimas.153

B.1. Determinação da ocorrência dos alegados desaparecimentos forçados e a suapermanência no tempo

139. A seguir, a Corte analisará os desaparecimentos forçados alegados neste caso. Nessesentido, a Comissão identificou como vítimas de desaparecimento forçado 8 pessoas.Adicionalmente, os representantes identificaram como vítimas de desaparecimento forçado 10

148 Cfr. Caso Goiburú e outros Vs. Paraguai. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 22 de setembro de 2006.Série C N° 153, pars. 91 e 92.149 Cfr. Caso Castillo Páez Vs. Peru. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 03 de abril de2009. Supervisão de cumprimento de Sentença, considerandos 8 e 15.150 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Fundo, par. 134.

151 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, pars. 172 e 173 e Caso González Medina e familiares Vs.República Dominicana, par. 133.152 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 129, e Caso González Medina e familiares Vs.República Dominicana, par. 132.153 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 131 e Caso Rodríguez Vera e outros (Desaparecidosdo Palácio da Justiça) Vs. Colômbia, par. 230.

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pessoas no seu escrito de solicitações e argumentos, 68 pessoas durante a audiência pública e42 pessoas nas suas alegações finais escritas. A Corte realizou uma comparação de todas aslistas mencionadas e como resultado, adverte que existem nomes que se repetem em todas aslistas, outros nomes apenas constam em duas listas e alguns mais foram incorporados apenasem uma lista. Assim, uma vez realizado o cotejamento de todos os nomes, é possível concluirque um total de 81 pessoas154 foi classificado como vítimas de desaparecimento forçado pelaComissão e pelos representantes. Por sua vez, cabe destacar que os nomes dessas 81 pessoasconstam no Relatório de Mérito como supostas vítimas de desaparecimento forçado, deexecução extrajudicial e/ou de outras alegadas violações aos direitos humanos. Cabe a esteTribunal determinar, dentro do âmbito da sua jurisdição e em conformidade com a ConvençãoAmericana e demais Tratados Interamericanos que a ela outorgam competência, se as 81pessoas listadas foram vítimas de desaparecimento forçado.

140. Segundo a definição contida na CIDFP e a jurisprudência deste Tribunal, "uma dascaracterísticas do desaparecimento forçado, a diferença da execução extrajudicial, é que leva ànegação do Estado em reconhecer que a vítima está sob a sua custódia e de fornecerinformação a esse respeito, com o objetivo de gerar incerteza sobre o seu paradeiro, vida oumorte, de provocar intimidação e supressão de direitos".155 Este Tribunal reconheceu que odesaparecimento forçado incluiu com frequência a execução dos detidos, em segredo e semprocesso, seguido da ocultação de qualquer vestígio material do crime e procurar a impunidadedaqueles que o cometeram.156 Nesse sentido, a Corte conheceu casos em que a existência deindícios maiores ou menores sobre a morte das vítimas não mudou a classificação dedesaparecimento forçado.157 Foi justamente o que os agentes públicos fizeram depois de darmorte às vítimas, ou seja, a adoção de medidas orientadas a ocultar o que realmente tinhaacontecido ou apagar qualquer rastro dos corpos para evitar a sua identificação ou oestabelecimento do seu destino e paradeiro, o qual permitiu à Corte concluir pelodesaparecimento forçado das vítimas.158

154 As 81 pessoas são as seguintes: 1. Víctor Juárez Pangán; 2. Clemente Juárez Ixpancoc; 3. Cruz Sic Cuxum; 4.Pedro Sic Jerónimo; 5. Gregorio Valey; 6. Timoteo Sic Cujá; 7. Roberto Galiego Chen; 8. Antonio Alvarado González;9. Alfonso Cruz Juárez; 10. Domingo Cahuec Sic; 11. Santiago Alvarado Xitumul; 12. Agustín Juárez Ixpancoc; 13.Teodoro González; 14. Eulogio Morales Alvarado; 15. Luciano González; 16. Apolinario Juárez Pérez, 17. Alberto JuárezPérez; 18. Evaristo Siana; 19. Pedro Tum; 20. Egmidio Siana; 21. Pedro Galiego López; 22. Demetrio Chen Alvarado;23. Pedro Galiego Mendoza; 24. Camilo Juárez Valey; 25. Julián Garniga; 26. Benito Juárez Ixpancoc; 27. FranciscoDepaz; 28. Maximiliano Sis Valey; 29. Vicente Sic Osorio; 30. Patrocinio Galiego; 31. Félix Alvarado Xitumul; 32. JoséDemetrio Cahuec Jerónimo; 33. Andrea Osorio Galeano; 34. Silvestre Sic Xitumul; 35. Raymunda Sical Corazón; 36.Adrián García Manuel; 37. Hugo García Depaz; 38. Agapito Alvarado Depaz; 39. Edmundo Alarcón Morente; 40.Manuel de Jesús Alarcón Morente; 41. Juan Pérez Sic; 42. Gorgonio Gonzalez Gonzalez; 43. Gabino Román Ivoy; 44.Cruz Pérez Amperez; 45. Eustaquio Ixtecoc González; 46. Jorge Galeano Román; 47. Rafael Depaz Tecú; 48. EnriqueMendoza Sis; 49. Dionisio Bachán; 50. Elías Milián González, 51. Amelia Milián Morales; 52. Eusebia Grave García; 53.José León Grave García, 54. Mateo Grave; 55. Juan Alvarado Grave; 56. Pedro Depaz Ciprián; 57. Víctor AlvaradoValey; 58. Ceferino Alvarado Sucup; 59. Enriqueta Tecú Chiquito; 60. Rosa González Tecú; 61. Luciano AlvaradoXitumul; 62. Héctor Rolando Alvarado García; 63. Adela Florentina Alvarado García; 64. Luciana Xitumul Ixpancoc; 65.María Concepción Xitumul Xitumul; 66. criança de nome desconhecido; 67. Medardo Juárez García; 68. Efraín GarcíaDepaz; 69. Fidel Alvarado Sucup; 70. Domingo Reyes; 71. Andres Reyes; 72. Santiago Reyes; 73. Antonio ChenMendoza; 74. Pedro Siana; 75. Lorenzo Depaz Ciprián; 76. Leonardo Cahuec; 77. Juan Mendoza Sucup; 78. José CruzMendoza; 79. María Concepción Chen; 80. Casimiro Siana, e 81. Marcelo Sic Chen.155 Cfr. Caso Anzualdo Castro Vs. Peru. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 22 desetembro de 2009. Série C N° 202, par. 91, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 163.156 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 157, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru, par. 159.

157 Nesse sentido, Caso Gudiel Álvarez e outros ("Diário Militar") Vs. Guatemala, pars. 199, 206 e 214, e CasoMassacres de Río Negro Vs. Guatemala, pars. 123 e 125.

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141. É nessa ordem de ideias que, tal como foi antes destacado, os atos que constituemdesaparecimento forçado têm um caráter permanente enquanto não se conheça o paradeiro davítima ou os seus restos sejam encontrados (supra par.134). No entanto, especialmente comrelação a este último aspecto, de forma reiterada o Tribunal tem afirmado que não se tratasimplesmente do ato de encontrar os restos de uma determinada pessoa, senão que isso deveestar acompanhado da realização de testes e análises que permitam comprovar que,efetivamente, esses restos pertencem a essa pessoa.159 Enquanto os restos não sejamdevidamente localizados e identificados, o desaparecimento forçado continua sendoperpetrado.160 Nesse sentido, a Corte lembra que a investigação e judicialização penal não éincompatível com a adoção de diferentes mecanismos adequados e efetivos para localizar oparadeiro das pessoas desaparecidas ou localizar os seus restos de modo a determinar comclareza a sua identidade; pelo qual ambas as medidas podem se complementarmutuamente.161

142. Agora, vejamos, a Corte lembra que no Caso Comunidade Camponesa de Santa BárbaraVs. Peru, concluiu-se que o desaparecimento forçado de 15 pessoas que foram privadas da sualiberdade por agentes públicos e permaneceram sob a custódia do Estado enquanto foramtransferidas e levadas ao interior de uma mina onde foram baleadas com fuzis e quaseimediatamente foram queimadas mediante a detonação de cargas de dinamites. Nesse caso,foi comprovada a existência de indícios sobre atuações posteriores das autoridades e agentesdo Estado que "tiveram por objetivo eliminar as evidências do acontecido e ocultar o querealmente tinha ocorrido ou apagar qualquer vestígio dos corpos para evitar a sua identificaçãoou que o seu destino e paradeiro fosse estabelecido". Esses indícios consistiram em: a) anegativa das autoridades do Exército em reconhecer a detenção das vítimas durante osprimeiros dias do acontecimento dos fatos; b) o modus operandi utilizado na destruição deevidências durante os primeiros dias de acontecidos os fatos; c) a perda da evidência coletadaem 18 de julho de 1991; d) a inscrição das certidões de óbitos nos anos 1991 e 1992 comidades fraudadas; e e) que a investigação forense na procura, recuperação, análise e eventualidentificação dos restos humanos se caracterizou por uma clara falta de seriedade e devidadiligência, especialmente grave. Em definitivo, os indícios sobre as atuações posteriores de

158 Cfr. Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 164. Nesse sentido, o Grupo de Trabalhosobre os Desaparecimentos Forçados e Involuntários de Pessoas das Nações Unidas destacou que "uma detençãoseguida de uma execução extrajudicial constitui um desaparecimento forçado em sentido próprio, sempre que essadetenção ou privação da liberdade tenha sido cometida por agentes do governo, de qualquer setor ou nível; ou porgrupos organizados ou privados que atuem em nome ou com o apoio direto ou indireto do Governo ou com o seuconsentimento ou complacência e que, posteriormente à sua detenção, ou mesmo depois de ter cumprido a execução,estes se neguem a revelar o destino ou paradeiro dessas pessoas ou a reconhecer que o ato tenha sido cometido”.Desaparecimento forçado ou involuntário, Folheto Informativo N° 6/REV.3, Escritório do Alto Comissionado das NaçõesUnidas para os Direitos Humanos, 2009, página 14, e Grupo de Trabalho sobre os Desaparecimentos Forçados ouInvoluntários, Relatório do Grupo de Trabalho sobre os Desaparecimentos Forçados ou Involuntários, Comentário geralsobre a definição de desaparecimentos forçados, A/HRC/7/2, 10 de janeiro de 2008, folha 14, par. 10. O que antecede,"embora a detenção seja de curta duração”. Grupo de Trabalho sobre os Desaparecimentos Forçados ou Involuntários,Relatório do Grupo de Trabalho sobre os Desaparecimentos Forçados ou Involuntários, A/HRC/7/2, 10 de janeiro de2008, folha 95, par. 427.159 Cfr. Caso Ibsen Cárdenas e Ibsen Peña Vs. Bolívia. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 1o de setembro de2010. Série C N° 217, par. 82, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 165.160 Cfr. Caso La Cantuta Vs. Peru. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 29 de novembro de 2006. Série C N°162, par. 114, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 165.161 Nesse sentido, ver Caso Gómez Palomino Vs. Peru. Supervisão de Cumprimento de Sentença. Resolução daCorte Interamericana de Direitos Humanos de 05 de julho de 2011, considerando 15.

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agentes públicos que procuraram eliminar as evidências do acontecido e ocultar o querealmente ocorreu foram fundamentais para a conclusão do Tribunal.162

143. Neste caso, e considerando os argumentos das partes e da Comissão, a Corte realizará aanálise das intervenções realizadas pelas forças de segurança do Estado posteriormente àsuposta morte das supostas vítimas e, com base nisso, avaliará se procede classificar os fatoscomo desaparecimentos forçados. Da mesma forma, este Tribunal se pronunciará a respeitodas consequências de não iniciar, continuar e/ou concluir as investigações forensesrelacionadas à procura, recuperação, análise e eventual identificação de restos neste caso.

144. Em primeiro lugar, consta nos fatos que, das 81 pessoas identificadas como vítimas dedesaparecimentos forçados, um total de 21 dessas pessoas163 foram privadas da vida porforças de segurança do Estado e os seus corpos foram abandonados ao relento entre agosto de1981 e agosto de 1986. Os restos dessas pessoas foram encontrados por familiares e vizinhos,quem os enterraram em fossas clandestinas. Posteriormente, nos anos 1993, 2002, 2003 e2004 foram realizados estudos forenses nos quais se conseguiu exumar e identificar os restosósseos de, pelo menos 18 pessoas listadas, restos esses que eventualmente foram entreguesaos seus familiares (supra pars. 87, 105, 112, 113, 115, 117, 119 e 120). Ou seja, a partir dasua morte e em todo o tempo posterior, os familiares dessas 21 pessoas tiveram claroconhecimento de que essas vítimas tinham sido executadas, bem como o lugar onde elesmesmos tinham enterrado os seus restos. Em consequência, a Corte considera que não éprocedente concluir que as referidas 21 pessoas tenham sido vítimas de desaparecimentoforçado, uma vez que do relato dos fatos não se depreende que tenha existido tentativaalguma por parte dos agentes públicos de ocultar a sua morte e o que realmente ocorreu oumesmo de ocultar qualquer vestígio dos corpos para evitar a sua identificação, ou que o seudestino e paradeiro fosse estabelecido, nem de eliminar as evidências do ocorrido.

145. Em segundo lugar, consta que das 81 pessoas identificadas como supostas vítimas dedesaparecimentos forçados, 34 pessoas164 foram privadas da vida por membros das forças desegurança do Estado, que imediatamente procederam a realizar um enterramento dos corposque não chegou a ser completo, pelo qual os restos foram encontrados parcialmentedescobertos por familiares e vizinhos, e que foram estes que realizaram um enterramento maisprofundo desses corpos em fossas clandestinas. Nos anos 1993, 2007, 2008, 2010, 2011 e2012 foram realizados trabalhos forenses nos quais foram exumados restos ósseos e foipossível identificar 7 das pessoas mencionadas (supra pars. 91 e 107). Em suma, emboratenha existido uma primeira tentativa de ocultar os corpos sem vida dessas 34 pessoas - que

162 Cfr. Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, pars. 186 e 289.

163 As pessoas mencionadas são: 1. Víctor Alvarado Valey; 2. Ceferino Alvarado Sucup; 3. Fidel Alvarado Sucup;4. Santiago Reyes Román; 5. Andrés Reyes Román; 6. Domingo Reyes Juárez; 7. Andrea Osorio Galeano; 8. EusebiaGrave Garcia; 9. José León Grave García; 10. Medardo Juárez Garcia; 11. Silvestre Sic Xutumul; 12. RaymundaCorazón o Raymunda Sical Corazón; 13. Rosa González Tecu; 14. María Concepción Xitumul; 15. Héctor RolandoAlvarado García; 16. Adela Florentina Alvarado Garcia; 17. Enriqueta Tecu; 18. Luciana o Lucía Xitumul Ixpancoc; 19.Luciano Alvarado Xitumul; 20. Menina de nome desconhecido 0-3 meses e 21. Efraín García de Paz.164 As pessoas mencionadas são: 1. Elías Milián González; 2. Amelia Milián Morales; 3. Domingo Cahuec Sic; 4.Víctor Juárez Pangan; 5. Cruz Sic Cuxum; 6. Patrocinio Chen Galiego; 7. Agustín Juarez Ixpancoc; 8. Pedro GaliegoLópez; 9. Clemente Juárez Ixpancoc; 10. Pedro Sic Jerónimo; 11. Gregorio Valey; 12. Timoteo Sic Cujá; 13. RobertoGaliego Chén; 14. Antonio Alvarado González; 15. Alfonso Cruz Juárez; 16. Santiago Alvarado Xitumul; 17. TeodoroGonzález; 18. Eulogio Morales Alvarado; 19. Luciano González; 20. Apolinario Juárez Pérez; 21. Alberto Juárez Pérez;22. Evaristo Siana; 23. Pedro Tum; 24. Egmidio Siana; 25. Demetrio Chen Alvarado; 26. Pedro Galiego Mendoza; 27.Camilo Juárez Valey; 28. Julián Garniga; 29. Benito Juárez Ixpancoc; 30. Francisco Depaz; 31. Maximiliano Sis Valey;32. Vicente Sic Osorio; 33. Félix Alvarado Xitumul, e 34. José Demetrio Cahuéc Jerónimo.

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não foi completo - foram vizinhos e os próprios familiares quem posteriormente concluíram oenterramento dos corpos e, desde então, tiveram conhecimento do lugar em que estavamenterrados aqueles restos. Consequentemente, este Tribunal considera que não cabe concluirque essas 34 pessoas tenham sido vítimas de desaparecimento forçado.

146. Em terceiro lugar, consta que Antonio Chen Mendoza, de 6 anos de idade, também foiidentificado como vítima de desaparecimento forçado, no entanto, foi determinado nos fatosdeste caso que ele sempre permaneceu junto com a sua família nas montanhas, e que devidoà sua exposição a fatores climáticos, adoeceu e faleceu. O seu corpo foi enterrado namontanha pela sua própria família (supra par. 114). Além dele, Juan Alvarado Grave foiidentificado como vítima de desaparecimento forçado, no entanto, do relato dos fatos surgeque ele foi executado por um grupo de agentes judiciais e que o seu corpo estaria no Hospitalde Salamá, lugar ao qual o seu irmão Mateo Grave, acompanhado de outras duas pessoas, sedirigiu a fim de localizar e reconhecer o cadáver (supra par. 85). Por sua vez, Mateo Grave ePedro Depaz Ciprián foram identificados como vítimas de desaparecimento forçado, noentanto, foi apurado que foram executados por um grupo de agentes judiciais e que os seuscorpos também foram levados para o Hospital de Salamá. A respeito de Mateo Grave, constainclusive que o seu cadáver foi enterrado no cemitério de San Salamá, por ordens do Juiz dePaz de San Miguel Chicaj (supra pars. 85 e 86). Consequentemente, e uma vez que esteTribunal não conta com maiores informações nem elementos que permitam chegar a umaconclusão diferente, considera que não cabe concluir que as 4 pessoas mencionadas tenhamsido vítimas de desaparecimento forçado.

147. Em suma, a Corte considera que não cabe concluir o desaparecimento forçado de umtotal de 59 pessoas que foram alegadas como vítimas dessa violação (supra pars. 144 a 146).Sem prejuízo do que antecede, a Corte observa que devido à desinteressada investigação doEstado e conforme informação aportada por este Tribunal que não foi contestada, ainda não foipossível exumar e/ou identificar a totalidade dos restos de 31 pessoas165 enterradas porfamiliares e vizinhos em cemitérios clandestinos na época do conflito armado interno naGuatemala. De fato, em alguns casos se depreende que, embora se conheça o lugar deenterramento e/ou tenha sido feita a exumação e recuperação dos restos, não se sabe seforam completos os trabalhos forenses de procura, exumação, recuperação, análise e eventualidentificação dos restos. Essa situação será levada em consideração por este Tribunal naeventual análise sobre a alegada ausência de diligência e impunidade no caso, bem como nomomento de resolver sobre eventuais reparações, nos Capítulos IX.III e X desta Sentença.

148. Por outro lado, falta determinar o ocorrido a 22 pessoas que também foram identificadascomo vítimas de desaparecimento forçado e a respeito das quais se estabeleceu que:

a) Pedro Siana foi detido junto a duas pessoas no caminho de Rabinal por um grupo deagentes da polícia judicial e se desconhece o seu paradeiro desde 24 de agosto de 1981(supra pars. 85 e 86);

165 Não foram identificados os corpos de: 1. Héctor Rolando Alvarado García; 2. María Concepción Xitumul; 3.Raymunda Sical Corazón, y 4. Amelia Milián Morales. Também não foram identificados os corpos de: 5. ClementeJuárez Ixpancoc; 6. Pedro Sic Jerónimo; 7. Gregorio Valey; 8. Timoteo Sic Cujá; 9. Roberto Galiego Chén; 10. AntonioAlvarado González; 11. Alfonso Cruz Juárez; 12. Santiago Alvarado Xitumul; 13. Teodoro González; 14. EulogioMorales Alvarado; 15. Luciano González; 16. Apolinario Juárez Pérez; 17. Alberto Juárez Pérez; 18. Evaristo Siana; 19.Pedro Tum; 20. Egmidio Siana; 21. Demetrio Chen Alvarado; 22. Pedro Galiego Mendoza; 23. Camilo Juárez Valey; 24.Julián Garniga; 25. Benito Juárez Ixpancoc; 26. Francisco Depaz; 27. Maximiliano Sis Valey; 28. Vicente Sic Osorio;29. Félix Alvarado Xitumul; 30. José Demetrio Cahuec Jerónimo, e 31. Antonio Chen Mendoza

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b) Juan Pérez Sic , depois de ter saído para falar com um grupo de agentes da políciajudicial que foi até a sua casa e a revistou, foi visto pela última vez nesse lugar pela suacompanheira, Manuela Toj Pérez, em 15 de novembro de 1981, e até esta data sedesconhece o seu paradeiro (supra par. 109);

c) Lorenzo Depaz Siprian (ou Lorenzo Depaz Ciprian ou Florencio Depaz Cipriano) foidetido no caminho de Rabinal por membros do Exército Nacional e das PAC, conduzido àprisão localizada na prefeitura, visto pela última vez nesse lugar pelo seu sogro, osenhor Ciriaco Galiego López, e desde 08 de janeiro de 1982 se desconhece o seuparadeiro (supra par. 88);

d) Leonardo Cahuec Gonzales foi detido no caminho de Rabinal por agentes da políciajudicial, conduzido à prisão localizada na prefeitura de Rabinal, visto por última vez pelasua esposa, Abertina Sic Cuxúm, e desde el 18 de janeiro de 1982 se desconhece o seuparadeiro (supra par. 101);

e) Juan Mendoza Alvarado e o seu pai foram retirados da sua casa por membros doExército Nacional e das PAC, foram espancados, levados, e desde 31 de janeiro de 1982se desconhece o seu paradeiro (supra par. 103);

f) María Concepción Chen Sic foi retirada da sua casa e detida por membros do ExércitoNacional e das PAC, bem como Casimiro Siana, quem foi detido nas proximidades dasua casa por membros do Exército e das PAC. Ambos foram vistos pela última vez comvida em companhia de agentes das forças de segurança do Estado, os quais ossepararam do grupo de mulheres que também levavam detidas e os levaram em outradireção, desde 12 de fevereiro de 1982 se desconhece o seu paradeiro (supra par. 104);

g) Cruz Pérez Ampérez , Gorgonio Gonzalez Gonzalez, Jorge Galeano Román, Eustaquiolxtecoc Gonzalez (ou Eustaquio Yxtecoc Gonzalez), Rafael Depaz Tecú, Enrique MendozaSis, Gabino Román Yvoy (ou Iboy o Ivoy) e Dionicio ou Dionisio Vachan o Bachán, em26 de novembro de 1982 foram retirados das suas casas, detidos por membros doExército Nacional e das PAC e obrigados a caminhar com as mãos amarradas até ocemitério de San Francisco, na aldeia Xeabaj, lugar em que foram vistos pela última vezcom vida pelo senhor Napoleón García De Paz. Até esta data, o seu paradeiropermanece desconhecido e, a pesar do trabalho forense, os seus restos não foramlocalizados (supra pars. 110 e 111);

h) Marcelo Sic Chen, a respeito de quem, estando sob custódia militar na colôniaChichupac, o seu paradeiro é desconhecido desde dezembro de 1984 (supra par. 118).

i) Adrián García Manuel , o seu filho, Hugo García Depaz e o seu sobrinho, AbrahamAlvarado Tecú (ou Agapito Alvarado Depáz) foram detidos por membros do ExércitoNacional, transferidos para a escola da aldeia Chirrum e posteriormente para odestacamento militar da aldeia de Guachipelín. Os seus familiares foram informados queseriam liberados, no entanto, o seu paradeiro é desconhecido desde 18 de janeiro de1982 (supra pars. 99 e 100), e

j) Manuel de Jesús Alarcón Morente saiu para cortar cana e não voltou; e o seu irmão,Edmundo Alarcón Morente foi visto pela última vez acompanhado por soldados que olevavam amarrado. O seu paradeiro é desconhecido desde 18 de janeiro de 1982, diaem que um grupo de soldados tinha chegado na casa da família Alancón Morente e

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perguntado pelos irmãos (supra pars 99 e 100).

149. Mediante o relatório final de perícia antropológica realizado pela FAFG em 31 de janeirode 2008 concluiu-se que quatro ossadas exumadas no ano 2006 de uma fossa localizada emárea da aldeia Guachipilín do município de Rabinal correspondiam a Hugo García Depaz,Abraham Alvarado Tecú (ou Agapito Alvarado Depáz), Manuel de Jesús Alarcón Morente eEdmundo ou Raymundo Alarcón Morente. Esse relatório foi apresentado perante o auxiliar dapromotoria do Ministério Público de Rabinal e os restos foram entregues aos familiares (suprapar. 100). A partir da emissão desse relatório foi possível conhecer, definitivamente, oparadeiro das quatro pessoas antes mencionadas.

150. Em suma, a Corte considera comprovado que as 22 vítimas foram privadas de liberdadepor membros das forças de segurança do Estado, ou seja, militares, patrulheiros e agentes dapolícia judicial.166

151. Quase dez anos depois dos fatos e no âmbito das investigações realizadas em relação aeste caso, as autoridades negaram que a zona na qual aconteceram os fatos estivesse sobcontrole militar no ano 1982, que é a época em que ocorreu o maior número de privações deliberdade das 22 supostas vítimas. Assim, mediante um escrito datado de 09 de maio de 1993,o Comandante de Reservas Militares informou ao Juiz de Primeira Instância Penal de BajaVerapaz que "durante o ano 1982 não havia delegados militares n[a] aldeia [Chichupac], umavez que essa região era tida como zona de operações da delinquência terrorista, portantoninguém desempenhava o cargo de delegado militar, bem como não foi possível nomearqualquer comissão em 08 de janeiro de 1982".167 Nesse sentido, a presença e a participaçãode militares em operações na região foi negada. Isso revela que as autoridades do Exércitoocultaram informação sobre o acontecido às vítimas, o qual, sendo esse o caso, está de acordocom a negação de informação que forma parte de um desaparecimento forçado.

152. Também consta que os fatos ocorridos foram postos em conhecimento de autoridadespúblicas mediante diversas vias e em vários momentos. Primeiro, por meio de denúnciasapresentadas por familiares e vizinhos perante a Procuradoria de Direitos Humanos da

166 Como foi afirmado, esses pessoas foram detidas das seguintes formas: a) nas suas casas ou nas proximidadesdestas e permaneceram sob custódia pública enquanto foram transferidas a um lugar desconhecido; b) no caminhopara Rabinal e foram levadas a uma prisão da Prefeitura, onde permaneceram sob custódia pública nesse lugar foramvistas pela última vez com vida pelos seus familiares; c) no caminho para Rabinal e foram transferidas para a escola daaldeia Chirrum, onde permaneceram sob a custódia do Estado enquanto não foram levadas ao cemitério, lugar ondeforam vistas pela última vez com vida pelos seus familiares; d) nas suas casas e permaneceram sob custódia públicaenquanto não foram levadas a um cemitério, lugar em que foram vistas com vida pela última vez pela pessoa queconseguiu escapar; e) no caminho para Rabinal, sem que se tenha conhecimento dos seus paradeiros; e f) na colôniaChichupac, sem que se tenha notícia do seu paradeiro.

167 Cfr. Ofício do Comandante de Reservas Militares Departamental de 09 de maio de 1993 (Expediente de prova,folha711).

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Guatemala e o Ministério Público.168 Segundo, no Relatório da CEH publicado no ano de1999.169 Terceiro, mediante os relatórios que a FAFG apresentou perante o Ministério Públicono marco das investigações e perícias antropológicas forenses realizadas.170 Quarto, o caso foiapresentado perante a Comissão Interamericana em 13 de dezembro de 2007, e esta elaborouo seu Relatório de Mérito em 02 de abril de 2014,171 pelo qual, durante quase sete anos asautoridades públicas foram alertadas consecutivamente por esse órgão a respeito daocorrência dos fatos. Não obstante, as diligências realizadas para localizar o paradeiro dasvítimas foram quase nulas (infra pars. 220, 221, 227, 235, 237 e 238), o qual constitui umindício adicional do que aconteceu a elas.

153. Certamente, o desaparecimento das 22 supostas vítimas não constituiu um fato isolado,senão que se insere em uma prática de desaparecimento forçado de pessoas impetradaprincipalmente por agentes das forças de segurança do Estado durante a época do conflitoarmado interno (supra par. 79).

154. Em virtude do que antecede, a Corte conclui que as 22 supostas vítimas foram privadasda sua liberdade por membros das forças de segurança do Estado no marco do conflito interno,e a última informação que se teve delas é que estavam sob a custódia do Estado;posteriormente, o seu paradeiro é desconhecido. As intervenções posteriores das autoridades edos agentes públicos permitem a este Tribunal determinar que existiu uma negativa emreconhecer as referidas privações de liberdade, bem como de fornecer informação sobre o

168 Cfr. Denúncia de Máxima Emiliana García Valey e Francisco Sic Chen, de 20 de junho de 1995 sobre odesaparecimento forçado de Marcelo Sic Chen e María Concepción Sic (Expediente de prova, folhas 1576 a 1577). Damesma forma, em 25 de outubro de 2000, Aurelio Juárez López denunciou perante o Ministério Público de Rabinal,Departamento de Baja Verapaz, o desaparecimento de Pedro Siana (Expediente de prova, folhas 447 a 449). Alémdisso, mediante escrito de 12 de julho de 1995, o Auxiliar Departamental da Procuradoria de Direitos Humanos daGuatemala em Salamá pôs em conhecimento da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá, as denúnciasapresentadas pelo desaparecimento de Juan Mendoza Alvarado, José Cruz Mendoza, Leonardo Cahuec Gonzales eLorenzo Depaz Ciprián (Expediente de prova, folhas 1351 a 1353). Mediante escrito de 06 de agosto de 1997, aProcuradoria de Direitos Humanos da Guatemala pôs em conhecimento da Promotoria Distrital do Ministério Público deSalamá a denúncia apresentada por Francisca González Tecú sobre o desaparecimento do seu pai, Gorgonio GonzalezGonzalez. Em 8 de maio de 2003, Francisca González Tecú compareceu perante essa Promotoria e retirou os fatos dasua denúncia inicial. Cfr. Escrito de 06 de agosto de 1997, da Promotoria de Direitos Humanos da Guatemala(Expediente de prova, folha 9141), e Declaração de Francisca González Tecú e Clementina Bachan Cahuec de 08 demaio de 2003 perante o Auxiliar da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá (Expediente de prova, folhas9142 e 9143). Mediante uma declaração perante o Auxiliar da Promotoria Especial do Ministério Público na Cidade daGuatemala, Vicenta Alvarado Mendoza denunciou o desaparecimento do seu pai, José Cruz Mendoza Sucup e do seuirmão, Juan Mednoza Alvarado. Cfr. Declaração de Vicenta Mendoza Alvarado de 15 de novembro de 2002 (Expedientede prova, folhas 475 a 478). Em 09 de maio de 1995, Juana García Depaz denunciou perante a Promotoria de DireitosHumanos da Guatemala a detenção e desaparecimento de Adrián García Manuel, Hugo García Depaz e AbrahamAlvarado Depaz (Expediente de prova, folhas 1290 a 1291).169 Nesse relatório se fez a denúncia do desaparecimento de Lorenzo Depaz Cipriano e a execução de LeonardoCahuec González, Gorgonio Gonzalez Gonzalez e Eustaquio Ixtoc (sic). Cfr. Relatório da CEH "Guatemala, Memória doSilêncio", Casos Apresentados, Anexo II, folhas 155, 162, 163.170 Em 21 de outubro de 2004, a FAFG remeteu à Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá, BajaVerapaz, o Relatório Final da perícia antropológica forense realizada em Xeabaj. Também em 22 de dezembro de 2014,a FAFG apresentou perante o Ministério Público um Parecer Pericial da Investigação Antropológica Forense realizada noCemitério San Francisco, Aldeia Chuateguá. Entre as vítimas foram incluídos os nomes de Cruz Amperez Sis (sic),Gorgonio Gonzalez Gonzalez (sic), Gabino Román Iboy, Eustaquio Ixtecoc e Rafael Depaz. Cfr. Relatório deInvestigação Antropológica Forense da FAFG de 06 de outubro de 2004 (Expediente de prova, folhas 1601 a 1606), eRelatório da FAFG de 05 de junho de 2014 (Expediente de prova, folhas 9247 a 9276).171 Entre as vítimas apresentadas no Relatório de Mérito, foram incluídos os nomes de Juan Pérez Sic, CasimiroSiana, Jorge Galeano Román, Enrique Mendoza Sis, Manuel Alarcón Morente e Raymundo Alarcón Morente.

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destino ou o paradeiro dessas pessoas, com o objetivo de gerar incerteza a respeito da suavida ou morte. O contexto dos fatos do caso fundamenta tal conclusão.

155. Consequentemente, a Corte considera que o Estado é responsável pelo desaparecimentoforçado de: 1. Hugo García Depaz, 2. Abraham Alvarado Tecú (ou Agapito Alvarado Depáz), 3.Manuel de Jesús Alarcón Morente, e 4. Edmundo ou Raymundo Alarcón Morente. O seudesaparecimento se prolongou até o ano de 2008, quando foram identificados mediante umrelatório antropológico forense e a partir da emissão do relatório se conheceu, de formadefinitiva, o paradeiro das quatro pessoas (supra pars. 99 e 100). Nesse sentido, é possívelconcluir que o seu desaparecimento se prolongou por aproximadamente 26 anos.

156. Além disso, o Estado é responsável pelo desaparecimento forçado de: 5. Pedro Siana; 6.Juan Pérez Sic; 7. Lorenzo Depaz Siprian (ou Lorenzo Depaz Ciprian ou Florencio DepazCipriano); 8. Leonardo Cahuec Gonzalés; 9. Juan Mendoza Alvarado; 10. José Cruz MendozaSucup; 11. María Concepción Chen Sic; 12. Casimiro Siana; 13. Cruz Pérez Ampérez; 14.Gorgonio Gonzalez Gonzalez; 15. Jorge Galeano Román; 16. Eustaquio lxtecoc Gonzalez (ouEustaquio Yxtecoc Gonzalez); 17. Rafael Depaz Tecú; 18. Enrique Mendoza Sis; 19. GabinoRomán Yvoy (ou Iboy ou Ivoy); 20. Dionicio ou Dionisio Vachan ou Bachán; 21. Marcelo SicChen, e 22. Adrián García Manuel. Nesse sentido, não se conhece o paradeiro de todas essaspessoas até esta data, mais de 32 a 35 anos depois de iniciados os desaparecimentos, apesardas diversas denúncias colocadas em conhecimento do Estado em diferentes momentos.

157. Em virtude disso, a Corte conclui que neste caso, um total de 22 pessoas foram vítimasde desaparecimento forçado. No ano de 2008 foi possível estabelecer o paradeiro de 4 dessasvítimas, e nesta data ainda se desconhece o paradeiro de 18 vítimas. No entanto, não procedeconcluir o desaparecimento forçado de um total de 59 pessoas que foram identificadas comovítimas dessa violação e a respeito das quais ainda há trabalhos de exumação e identificação aserem concluídos nos restos de 31 pessoas (supra par. 147).

B.2. Violações aos artigos 7o, 5.1, 5.2, 4.1 e 3o da Convenção Americana

158. Neste caso, as 22 vítimas de desaparecimento forçado foram detidas ilegalmente poragentes públicos, sem que até este momento se tenha informação sobre o destino e paradeirode 18 dessas vítimas. Por sua vez, recém no ano 2008 foi possível estabelecer o paradeiro dequatro das vítimas (supra par. 100). Essa detenção inicial foi um passo prévio para o seudesaparecimento e foi contrária de todas formas ao direito à liberdade pessoal, em violação aoartigo 7o da Convenção Americana. O seu desaparecimento forçado está inserido no contextode uma prática de desaparecimento forçado de pessoas, o que permite concluir que essaprática colocou as vítimas em uma situação de especial vulnerabilidade e grave situação derisco de sofrer danos irreparáveis à sua integridade pessoal e à sua vida. A Corte estabeleceuque é evidente que as vítimas dessa prática têm a sua integridade pessoal violada em todas assuas dimensões,172 e que submeter presos a forças repressivas oficiais, agentes públicos ouparticulares que atuem com o seu consentimento ou tolerância, que impunemente pratiquem atortura e o assassinato, representa, por si só, uma infração ao dever de prevenção deviolações aos direitos à integridade pessoal e à vida, mesmo no caso em que os fatos detortura ou de privação da vida das pessoas não possam ser demonstrados neste caso em

172 Cfr. Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 166.

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concreto.173 Além disso, a Corte afirmou que o desaparecimento forçado é uma violação aodireito à integridade pessoal porque mesmo o isolamento prolongado e a incomunicaçãocoercitiva representam um tratamento cruel e desumano.174 O Tribunal também estabeleceuque o fato de que uma pessoa esteja desaparecida durante longo espaço de tempo e em umcontexto de violência é um indício suficiente para concluir que a pessoa foi privada da suavida.175 Tudo isso em contradição com os artigos 4.1, 5.1 e 5.2 da Convenção Americana.

159. Da mesma forma, a Corte lembra que desde o Caso Anzualdo Castro Vs. Peru, 22 desetembro de 2009, considera-se que a prática de desaparecimento forçado pode representaruma violação específica ao artigo 3o da Convenção Americana, uma vez que não apenas serefere a uma das formas mais graves de subtração de uma pessoa de todo o contexto deordenamento jurídico, mas também nega a sua própria existência e a deixa em uma forma delimbo ou situação de indeterminação jurídica perante a sociedade, o Estado e, inclusive, acomunidade internacional. Da mesma forma, "em casos de desaparecimento forçado depessoas a vítima fica em uma situação de indeterminação jurídica que impossibilita, impede ouanula a possibilidade da pessoa de ser titular ou de exercer de forma efetiva os seus direitosem geral, em uma das mais graves formas de incumprimento das obrigações dos Estado derespeitar e garantir os direitos humanos".176 A Corte já reiterou essa posição em sentençasposteriores.177 Neste caso, o Tribunal considera que as 22 vítimas identificadas foramcolocadas em uma situação de indeterminação jurídica que impediu a sua possibilidade deserem titulares ou de exercer de forma efetiva os seus direitos em geral, pelo qual, foi geradauma violação do seu direito ao reconhecimento da personalidade jurídica.

160. Em virtude do exposto, o Tribunal conclui que a Guatemala incorreu em responsabilidadeinternacional pelo desaparecimento forçado das 22 vítimas identificadas (supra pars. 155 e156), e que é responsável pela violação dos artigos 7o, 5.1 e 5.2, 4.1 e 3o da ConvençãoAmericana, em relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento e em relação ao disposto peloartigo I.a) da Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas,178 emprejuízo daquelas pessoas.

173 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 175; e Caso Anzualdo Castro Vs. Peru. ExceçõesPreliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 22 de setembro de 2009. Série C N° 202, par. 85.174 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, pars. 156 e 187; e Caso Anzualdo Castro Vs. Peru, par.85.175 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 188, e Caso Osorio Rivera e Familiares Vs. Peru,par. 160.176 Cfr. Caso Anzualdo Castro Vs. Peru, pars. 90 e 91. Nesse caso, a Corte reconheceu que até este momento namaioria dos casos de desaparecimento forçado de pessoas tinha avaliado que não cabia analisar a violação do artigo 3 o

da Convenção, por não haver fatos que assim o justificassem, citando entre outros o Caso Bámaca Velásquez Vs.Guatemala. Não obstante, dado o caráter múltiplo e complexo desta grave violação aos direitos humanos, o Tribunalreconsiderou a sua posição anterior e avaliou ser possível que, em casos dessa natureza, o desaparecimento forçadopudesse significar uma violação específica a esse direito.177 Cfr. Caso Radilla Pacheco Vs. México, Caso Chitay Nech e outros Vs. Guatemala, Caso Ibsen Cárdenas e IbsenPeña Vs. Bolívia, Caso Gomes Lund e outros Vs. Brasil, Caso Gelman Vs. Uruguai, Caso Torres Millacura e outros Vs.Argentina, Caso Contreras e outros Vs. El Salvador, Caso González Medina e familiares Vs. República Dominicana, CasoMassacres de Río Negro Vs. Guatemala, Caso Gudiel Álvarez e outros ("Diário Militar") Vs. Guatemala, Caso OsorioRivera e Familiares Vs. Peru, Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, e Caso Tenorio Roca e outrosVs. Peru.178 Nesse caso, o artigo I.a) da CIDFP diz que: "Os Estados Partes nesta Convenção se comprometem a: a) Nãopraticar, não permitir, nem tolerar o desaparecimento forçado de pessoas, nem em estado de emergência, exceção oususpensão de garantias individuais”.

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B.3. Direito à integridade pessoal e à proteção à família em prejuízo dos familiaresdas vítimas de desaparecimento forçado

161. A Corte vem afirmando em reiteradas oportunidades que os familiares das vítimas deviolações dos direitos humanos podem ser, por sua vez, vítimas. Da mesma forma, o Tribunalconsiderou que em casos que envolvem o desaparecimento forçado de pessoas, é possívelentender que a violação do direito à integridade psíquica e moral dos familiares da vítimas éuma consequência direta desse fenômeno, que lhes causa um severo sofrimento pelo fato emsi, acrescido, entre outros fatores, pela constante negação por parte das autoridades públicasde fornecer informação sobre o paradeiro da vítima ou de realizar uma investigação eficaz paraesclarecer os fatos. Essas afetações fazem presumir um dano à integridade psíquica e moraldos familiares em casos de desaparecimentos forçados. Nos casos anteriores, a Corteestabeleceu que tal presunção se estabelece iuris tantum a respeito de mães e pais, filhas efilhos, cônjuges, companheiros e companheiras permanentes, bem como irmãs e irmãos dasvítimas desaparecidas, exceto quando demonstrado o contrário pelas circunstâncias específicasdo caso.179

162. A Corte declarou a responsabilidade internacional da Guatemala pelo desaparecimentoforçado de 22 vítimas deste caso. O Estado, além dos argumentos expostos (supra pars. 128 a130), não aportou prova em contrário que desvirtue a presunção iuris tantum a respeito dosevero sofrimento dos familiares nas circunstâncias particulares deste caso, e também nãodesconsiderou a condição de familiares das vítimas desaparecidas. Portanto, a Corte considerasuficientemente fundamentada a presunção do dano à sua integridade psíquica e moral.

163. A Corte considera que os familiares das 22 pessoas que foram vítimas dedesaparecimento forçado são vítimas de violação à sua integridade pessoal devido aosofrimento provocado pela incerteza do ocorrido com os seus familiares; o luto não concluído,a negativa das autoridades públicas em fornecer informação sobre o destino ou o paradeirodessas pessoas que permitisse aos familiares determinar com certeza a sua vida ou morte e anegligência na investigação por parte das autoridades públicas para atender as denúncias einvestigar o ocorrido.

164. Pelo que antecede, o Tribunal conclui que o Estado violou o direito à integridade psíquicae moral, previsto no artigo 5.1 da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 dessemesmo instrumento, em prejuízo dos familiares das 22 vítimas de desaparecimento forçado.Os nomes das referidas pessoas se encontram no Anexo I desta Sentença.

165. Com relação à violação do direito de proteção à família, a Corte nota, primeiro, que nestecaso algumas vítimas de desaparecimento forçado mantinham entre elas relações familiaresestreitas, ou seja, pais, mães, filhos, irmãos e sobrinho, pelo qual as famílias dessas vítimastiveram que enfrentar a dor do desaparecimento forçado de vários dos seus membros,acrescentando com isso o impacto da sua vivência.180 Segundo, em uma grande maioria doscasos, os familiares presenciaram a detenção das vítimas nas suas próprias casas ou nas

179 Cfr. Caso Radilla Pacheco Vs. México, par. 161, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs.Peru, par. 274.180 Este é o caso de: José Cruz Mendoza Sucup e o seu filho Juan Mendoza Alvarado; María Concepción Chen Sice o seu filho Marcelo Sic Chen; Adrián García Manuel, o seu filho Hugo García Depaz e o seu sobrinho AbrahamAlvarado Tecú (ou Agapito Alvarado Depáz); e Manuel de Jesús Alarcón Morente e seu irmão Edmundo ou RaymundoAlarcón Morente.

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imediações, praticadas pelos agentes de segurança do Estado, e essa foi a última vez que osviram com vida. Consequentemente, o modo em que foram realizadas essas detenções causouuma clara percepção de desproteção nas famílias que persistiu no tempo.181 Terceiro, por faltade enterramento conforme as tradições da cultura maia-achí foram rompidas as relações dereciprocidade e harmonia entre mortos e vivos, afetando a união das famílias com os seusancestrais.182 Quarto, o desaparecimento forçado e o deslocamento causou a separação e/oudesintegração das famílias, tais como os analisados no seguinte Capítulo infra.

166. Pelo que antecede, o Tribunal considera que neste caso a Guatemala também violou oartigo 17.1 da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 desse mesmo instrumento, emprejuízo dos familiares das 22 vítimas de desaparecimento forçado.

IX.IIDIREITO DE CIRCULAÇÃO E RESIDÊNCIA183

A. Argumentos da Comissão e das partes

167. A Comissão alegou que os membros de Chichupac e comunidades vizinhas que se viramforçados a abandonar a sua aldeia, deixando destruídos ou abandonados os seus pertences, assuas casas e as suas terras, e a se deslocar em um princípio para comunidades vizinhas oupara as montanhas. Destacou que, nesse contexto de medo e de insegurança emconsequência da perseguição do Estado, essas pessoas viveram por vários meses e anoslutando para sobreviver às ameaças e perseguições, à fome e à falta de acesso a serviços desaúde e educação. Afirmou que a partir de 1983, os sobreviventes da aldeia Chichupac foramreassentados na aldeia modelo organizada pelo Exercito Nacional, em condições de vidaprecárias e sujeitos ao controle militar permanente. Além disso, observou que os fatos do casoestão contextualizados em uma situação generalizada de deslocamento forçado interno queafetou especialmente a população indígena e que foi causada por atos de terror aos quais foisubmetida no marco do conflito armado. Por tanto, concluiu que a Guatemala é responsávelpela violação ao artigo 22.1 da Convenção, em relação ao artigo 1.1 desse tratado, emprejuízo dos sobreviventes da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas.

168. Nas suas observações finais, a Comissão destacou que o deslocamento forçadoperdurou por anos e são fatos que têm uma natureza de caráter contínuo ou sucessivo.Argumentou que o deslocamento forçado, neste caso, ocorreu conjuntamente com outrasviolações conexas que continuaram e cujos efeitos foram se expandido no tempo devido àomissão prolongada do Estado de oferecer uma resposta adequada em matéria de reparação.

181 Este é o caso de: Juan Pérez Sic, Lorenzo Depaz Siprian, Leonardo Cahuec Gonzalés, Juan Mendoza Alvaradoe o seu pai José Cruz Mendoza Sucup, María Concepción Chen Sic, Casimiro Siana, Cruz Pérez Ampérez, GorgonioGonzalez Gonzalez, Jorge Galeano Román, Eustaquio lxtecoc Gonzalez, Rafael Depaz Tecú, Enrique Mendoza Sis,Gabino Román Yvoy, Dionicio Vachan.182 Nesse sentido, a psicóloga Nieves Gómez Dupuis explicou que "[n]a cultura maia-achí existe umaespecial relação entre vivos e mortos. Os vivos são responsáveis por zelar, dar uma sepultura digna aos mortos evisitá-los nos dias fixados para tanto. Os enterros foram feitos pela família e a comunidade, com rituais paraacompanhar a passagem entre a vida e a morte. Por sua vez, os defuntos e os ancestrais, em uma relação dereciprocidade, se responsabilizam por proteger os vivos, dando avisos e conselhos para a sua vida diária. As relaçõesde reciprocidade e de harmonia também estão presentes entre a natureza, os cosmos e os seres humanos”. Cfr.Relatório sobre o dano à saúde mental (moral) elaborado pela psicóloga Nieves Gómez Dupuis em 05 de maio de 2010e apresentado perante a Comissão Interamericana (Expediente de prova, folhas 1313 e 1321).183 No pertinente, o artigo 22.1 da Convenção estabelece: "Toda pessoa que esteja legalmente em território deum Estado tem direito a circular por ele e a residir com ele sujeito às disposições legais”.

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A tal respeito, destacou que a continuidade da destruição da estrutura social, odesvinculamento com os líderes comunitários e a perda das práticas culturais e tradicionais,bem como do idioma maia-achí, continuam destruindo e aniquilando a cultura maia, emprejuízo dos sobreviventes e as comunidades vizinhas. Sobre isso, alegou a vulnerabilidade daliberdade de consciência e religião e a liberdade de associação, estabelecidas nos artigos 12 e16 da Convenção.

169. Os representantes coincidiram com a Comissão na alegação de que o Estado violou osdireitos à circulação e residência das supostas vítimas, que sofreram com o deslocamentoforçado, massivo e coletivo, e a expulsão, devido às forças repressivas públicas e tiveram quefugir das suas comunidades e territórios ancestrais, refugiando-se em outros lugares.Destacaram que o Estado assegurou a impossibilidade de retorno dessas pessoas por meio dadestruição das suas moradias, bens, colheitas e animais. Assim, enfrentaram a perda das suasterras ancestrais, a falta de garantia de não repetição dos fatos e o medo. Finalmente,afirmaram que o Estado não forneceu as condições para o retorno de todos os membros dacomunidade, motivo pelo qual o impacto que representou o deslocamento forçado persiste aolongo do tempo e continua até esta data. Consequentemente, consideraram que a Guatemalavulnerou o artigo 22 da Convenção, bem como 1.1 desse mesmo instrumento, em prejuízo daspessoas que identificaram como vítimas e sobreviventes da aldeia Chichupac e comunidadesvizinhas do município de Rabinal que voltaram depois de 09 de março de 1987 e/ou que atéesta data estão em uma situação de deslocamento.

170. Nas suas alegações finais, os representantes afirmaram que o deslocamento das suasterras e a sua cultura ainda persiste para muitas famílias. Assinalaram também que as vítimassobreviventes, além do dano moral intenso causado pela política de terra arrasada e pelos atosde genocídio, sofreram um dano cultural, social e coletivo irreparável pela destruição da malhasocial dessas comunidades. Argumentaram que o deslocamento forçado significou uma brutalmudança no projeto de vida das famílias. Muitos passaram violentamente a viver em umcontexto urbano ou semiurbano, depois de viver toda a sua vida em áreas rurais do país, e deser agricultores trabalhando como peões, ajudantes, em plantações ou em outras atividades.Muitos deles vivem em áreas marginais da cidade da Guatemala, na área urbana de Rabinal,em outros departamentos do país ou mesmo fora da Guatemala.

171. O Estado informou que dentro da sua normativa interna, reconhece e garante o direitode moradia e de permanência no território nacional, bem como o direito de livre circulação. Porsua vez, opor-se a que a Corte conhecesse esses fatos, uma vez que eles teriam acontecidoantes da data em que a Corte tivesse competência.

B. Considerações da Corte

172. O artigo 22.1 da Convenção reconhece o direito de circulação e de moradia.184 A Cortejá estabeleceu em outros casos que este artigo também protege o direito a não ser deslocadoforçadamente dentro de um Estado Parte,185 e que os Princípios Reitores dos Deslocamentos

184 No que se refere ao artigo 22.1 da Convenção estabelece: "Toda pessoa que esteja legalmente em territóriode um Estado tem direito a circular por ele e a residir com ele sujeito às disposições legais”.185 Cfr. Caso dos Massacres de Ituango Vs. Colômbia. Sentença de 1o de julho de 2006. Série C N° 148, par. 207;Caso das Comunidades afrodescendentes desalojadas da Bacia do Rio Cacarica (Operação Gênese) Vs. Colômbia , par.219.

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Internos das Nações Unidas186 resultam particularmente relevantes para determinar o seuconteúdo e abrangência.187 Aqueles que definem que "se entende por deslocadas internas aspessoas ou grupos de pessoas que se viram forçadas ou obrigadas a escapar ou fugir do seular ou do seu lugar de moradia habitual, especialmente como resultado ou para evitar osefeitos de um conflito armado, de situações de violência generalizada, de violações dos direitoshumanos [...], e que não atravessaram fronteiras nacionais de forma reconhecida".188

173. Este Tribunal estabeleceu que em virtude da complexidade do fenômeno dodeslocamento interno e da ampla variedade de direitos humanos que afeta ou se colocam emrisco, e em atenção às circunstâncias de especial vulnerabilidade e desamparo em quegeralmente se encontram os deslocados, a sua situação pode ser compreendida como umacondição de fato de desproteção. Essa situação, conforme a Convenção Americana, obriga osEstados a adotar medidas de caráter positivo para reverter os efeitos da sua referida condiçãode debilidade, vulnerabilidade e desamparo, inclusive a respeito das atuações e práticas deterceiros particulares.189

174. Nesse sentido, este Tribunal destacou que o direito à circulação e de residência pode servulnerado por restrições de fato se o Estado não estabeleceu as condições nem previu osmeios que permitem exercê-lo, por exemplo quando uma pessoa é vítima de ameaças ouhostilidade e o Estado não fornece as garantias necessárias para que se possa transitar eresidir legalmente no território do qual de trate, inclusive quando as ameaças e hostilidadesproveem de atores não públicos. Da mesma forma, a Corte indicou que a falta de umainvestigação efetiva sobre fatos violentos pode proporcionar ou perpetrar um exílio oudeslocamento forçado.190

186 Cfr. Comissão de Direitos Humanos, Princípios Reitores dos Deslocamentos Internos das Nações Unidas,E/CN.4/1998/53/Add.2 de 11 de fevereiro de 1998, folha 05. Anexo. Introdução: abrangência e finalidade. No 2.Disponível em: http://www.hchr.org.co/documentoseinformes/documentos/html/informes/onu/resdi/E-CN-4-1998-53-ADD-2.html. Esses princípios foram reconhecidos pela comunidade internacional. Ver também: Nações Unidas,Assembleia Geral, Proteção e assistência para os deslocados internos, A/RES/64/162, de 17 de março de 2010,folha01. Disponível em: https://search.coe.int/cm/Pages/result_details.aspx?ObjectID=09000016805d8265; Councilof Europe, Committee of Ministers, Recommendation Rec (2006) to member states on internally displaced persons, 05April 2006. Disponível em:https://wcd.coe.int/ViewDoc.jsp?id=987573&BackColorInternet=9999CC&BackColorIntranet=FFBB55&BackColorLogged=FFAC75; African Union,Convention for the Protection and Assistance of Internally Displaced Persons in Africa (Kampala Convention), 23October 2009, article 1, K). Disponível em: h ttp://www.unhcr.org/4ae9bede9.html ; Conselho de Direitos Humanos,Relatório apresentado pelo representante do Secretário Geral sobre os direitos humanos dos deslocamentos internos,Walter Kalin. A/HRC/13/21/Add.3, folha 04. II.4. Disponível em:http://www.acnur.es/PDF/8151_20120416132838.pdf.

187 Cfr. Caso da Comunidade Moiwana Vs. Suriname. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 15 de junho de 2005. Série C N° 124, par. 111, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 173.

188 Cfr. Comissão de Direitos Humanos, Princípios Reitores dos Deslocamentos Internos das Nações Unidas,supra, par. 2. A esse respeito, a Assembleia Geral da OEA recomendou aos Estados utilizar os Princípios Reitores comobase para desenvolver as suas políticas e, inclusive, incluí-los nas suas legislações domésticas para promover a suaimplementação. Cfr. AG/RES. 2508 (XXXIX-O) "Deslocados Internos", aprovada na quarta Sessão Plenária, celebradaem 04 de junho de 2009, ponto resolutivo 2. Disponível em: www.oas.org/dil/esp/AG-RES_2508-2009.doc.

189 Cfr. Caso do "Massacre de Mapiripán" Vs. Colômbia. Sentença de 15 de setembro de 2005. Série C N° 134,par. 179; Caso das Comunidades afrodescendentes desalojadas da Bacia do Rio Cacarica (Operação Gênese) Vs.Colômbia, par. 315.190 Cfr. Caso da Comunidade Moiwana Vs. Suriname, pars. 119 e 120, e Caso Defensor de Direitos Humanos eoutros Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 28 de agosto de 2014. Série

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175. A Corte lembra também que a obrigação de garantir o direito à circulação e residênciatambém deve levar em consideração as ações praticadas pelo Estado para garantir que aspopulações deslocadas possam voltar aos seus locais de origem sem risco de que os seusdireitos sejam violados. Nesse sentido, este Tribunal reafirma que a obrigação dos Estados deproteger os direitos das pessoas deslocadas significa não apenas adotar medidas deprevenção, mas também fornecer as condições necessárias para um retorno digno e seguro aoseu lugar de moradia habitual ou o seu reassentamento voluntário em outra parte do Estado.Para tanto, deve-se garantir a sua plena participação no planejamento e gestão do seu retornoou reintegração.191

176. Por outra parte, conforme a sua jurisprudência constante em matéria indígena,mediante a qual reconheceu que a relação dos indígenas com o território é essencial paramanter as suas estruturas culturais e a sua sobrevivência étnica e material,192 o Tribunalconsiderou que o deslocamento forçado dos povos indígenas fora da sua comunidade ou dosseus membros pode colocá-los em uma situação de especial vulnerabilidade, que por suassequelas destrutivas sobre a malha étnica e cultural gera um claro risco de extinção cultural oufísico dos povos indígenas, pelo qual é indispensável que os Estados adotem medidasespecíficas de proteção, considerando as especificidades próprias dos povos indígenas, bemcomo o seu direito consuetudinário, valores, usos e costumes para prevenir e reverter osefeitos dessa situação.

177. Como estabelecido (supra pars. 94 a 98), os habitantes maia-achí da aldeia Chichupace das comunidades vizinhas de Rabinal se viram obrigados a fugir dos seus territórios a partirdo massacre de 08 de janeiro de 1982 e da violência que imperava na região, implementadapor agentes das forças de segurança pública, que incluiu massacres, execuções,desaparecimentos, violações sexuais e perseguições. Como consequência, existirammovimentos massivos dessas pessoas para se refugiarem nas montanhas, em outros lugaresda zona e, posteriormente, em outros municípios, departamentos, cidades e fora do Estado. Osmilitares continuaram com a perseguição nas montanhas, bem como com a perseguição daspessoas que retornavam às comunidades. Paralelamente, as forças de segurança públicaqueimaram casas, roubaram os seus pertences e provisões, destruíram as plantações ecolheitas e roubaram ou mataram os animais. Dessa forma, destruíram os meios de vidafazendo com que o deslocamento persistisse e impedisse o retorno. A partir do ano 1983,membros do Exército Nacional construíram a aldeia modelo, ou colônia, em Chichupac. Aspessoas que habitavam esse lugar viveram em condições precárias, sob um forte controlemilitar, sem que tivessem liberdade, e foram obrigadas a trabalhar para alimentar e sustentaros militares. Os homens foram obrigados a patrulhar novamente a zona e algumas mulheressofreram violência sexual. Finalmente, entre os anos 1986 e 1987 os militares abandonaram acolônia.

C N° 283, par. 166.191 Cfr. Caso Chitay Nech e outros Vs. Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentençade 25 de maio de 2010. Série C N° 212, par. 149; Caso das Comunidades afrodescendentes desalojadas da Bacia doRio Cacarica (Operação Gênese) Vs. Colômbia, par. 220.192 A Corte determinou que a cultura dos membros das comunidades indígenas corresponde a uma forma de vidaparticular de ser, ver e agir no mundo, constituída a partir da sua estreita relação com as suas terras tradicionais erecursos naturais; não apenas por serem estes o seu principal meio de subsistência, mas também porque constituemum elemento integrante da sua cosmovisão, religiosidade e, consequentemente, da sua identidade cultural. Cfr. CasoChitay Nech e outros Vs. Guatemala, par. 147, e Caso Pueblos Kaliña e Lokono Vs. Suriname. Mérito, Reparações eCustas. Sentença de 25 de novembro de 2015. Série C N° 309, par. 130.

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178. Consta na prova apresentada neste caso que houve comunidades que ficaramcompletamente vazias durante muito tempo e que essa situação perdurou até depois de 09 demarço de 1987, data em que a Guatemala reconheceu a competência deste Tribunal, e quemuitos dos membros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas do município de Rabinalpermanecem deslocadas até esta data.193 A seguir, a Corte estabelecerá se essas pessoas seviram impossibilitadas de retornar para as suas terras posteriormente a esta data. A seguir,como em ocasiões anteriores,194 a Corte analisará a alega omissão por parte do Estado deimplementar as medidas necessárias para garantir um retorno digno e seguro em favordaquelas pessoas que permaneceram deslocadas depois de 09 de março de 1987 ou paragarantir o seu reassentamento voluntário.

B.1. Impossibilidade de retorno dos membros da Aldeia Chichupac e ComunidadesVizinhas do Município de Rabinal

179. A Corte lembra que o processo de paz que encerrou o conflito armado interno naGuatemala iniciou em 1996, ou seja, quase 10 anos depois do reconhecimento da competênciacontenciosa da Corte. Nesse mesmo ano foram legalmente dissolvidas as patrulhas civis e foicriada da Comissão de Esclarecimento Histórico (CEH). Dados os antecedentes violentos quesubsistiram e o contexto de violência que permanecia vigente na Guatemala durante esses 10anos em que ainda se estendeu o conflito armado, os membros da aldeia Chichupac ecomunidades vizinhas se viram impossibilitadas de retornar aos seus territórios durante aqueleperíodo, devido ao temor justificado de serem objeto de violações aos seus direitos à vida eintegridade pessoal, entre outros.

180. Com relação ao período posterior ao conflito armado interno, depreende-se da provaque existe medo e sentimento de insegurança por parte da população sobrevivente emconsequência da atual presença dos responsáveis de atos de violência no entorno de Rabinal.Nesse sentido, o perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza explicou que, atualmente, aspessoas que têm vontade de retornar às terras que antes ocupavam ou onde moravam, e quetentaram retornar às comunidades, "viram frequentemente [no povoado] aqueles quecometeram os atos de crimes, os delatores, os torturadores, ex patrulheiros que colaboraramcom a repressão", "ou aqueles que entraram na aldeia para destruir colheitas". Além disso,"antigos delegados de polícia e os seus aliados locais exploram as suas terras", o que "produzinsegurança e medo". Assim, "o desejo de retornar [...] se vê afetado devido [...] à presençadas pessoas e das estruturas causantes do êxodo forçado e outras violações aos direitoshumanos".195 Da mesma forma, a psicóloga Nieves Gómez Dupuis no seu relatório de 05 de

193 Nesse sentido, a comunidade de Chijom, que contava com 50 casas de moradia, ficou vazia durante muitotempo e hoje está completamente povoada por sete famílias, aproximadamente. A comunidade Xeabaj, que nomomento prévio ao impacto do conflito armado interno contava com uma população distribuída em 80 ou 90 casas demoradia, nas quais habitavam famílias numerosas, hoje conta com apenas cinco ou seis casas habitadas. Cfr. Períciade Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza, apresentada perante a Corte Interamericana durante a audiência pública de28 de abril de 2016. Da mesma forma, as pessoas das comunidades de Xeabaj, Toloxcoc e Chirrum “já nãoconseguiram recuperar os seus líderes e projetos de produção". Cfr. Relatório sobre o dano à saúde mental (moral)elaborado pela psicóloga Nieves Gómez Dupuis em 05 de maio de 2010 (Expediente de prova, folhas 1323 e 1324).194 Cfr. Caso da Comunidade Moiwana Vs. Suriname, par. 108, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par.180.195 Cfr. Relatório escrito pelo perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza apresentado durante a audiência públicacelebrada em 28 de abril de 2016 (Expediente de prova, folhas 11674 a 11676), e perícia de Luis Raúl FranciscoSalvadó Cardoza apresentada perante a Corte Interamericana durante a audiência pública em 28 de abril de 2016.

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maio de 2010 indicou que "[a]s vítimas e familiares apontam como responsáveis determinadaspessoas do entorno municipal, no entanto não sentem confiança em esclarecer quem sãoaqueles que moram nas comunidades e que também participaram na delação e destruição dacomunidade. A identificação dessas pessoas está envolta em silêncio, no entanto, insiste-se emque estão obrigados [a] se encontrar com eles em espaços públicos coletivos".196

181. Por outra parte, a Corte observa que os lotes dos membros da aldeia Chichupac ecomunidades vizinhas foram ocupados sem a autorização dos seus antigos ocupantes eproprietários originais, ou que foram vendidos por necessidade. Além disso, em alguns casos,os documentos que comprovavam a posse das suas terras e os bens materiais foram roubadosou destruídos quando queimaram as suas casas, o que impede reclamar tais bens.197

182. Em virtude disso, a Corte considera que atualmente os membros das comunidades quedesejam retornar às suas terras encontram a impossibilidade material de fazê-lo, por isso seviram obrigadas a continuar em situação de deslocamento. Por isso, a liberdade de circulação ede residência dos membros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas do município deRabinal que foram deslocados, está limitada até esta data por elementos de facto.

B.2. Ausência de medidas adotadas pelo Estado para reverter os efeitos dodeslocamento

183. Em primeiro lugar, a Corte observa que nos dias 17 de janeiro de 1997, 25 de outubrode 2000, 15 de novembro de 2002, 12 e 27 de julho e 16 de agosto de 2005, e 07 de abril e06 de junho de 2006,198 foi denunciada perante o Ministério Público, entre outros fatos, aperseguição sofrida pelas comunidades e o deslocamento dos seus habitantes para asmontanhas e outro lugares da região a fim de salvar as suas vidas. Em algumas dessasdenúncias, foram informados nomes das pessoas que supostamente teriam colaborado com oExército Nacional na época, e se informou que ainda viviam nas comunidades vizinhas deRabinal (supra pars. 94 e 95 e infra pars. 222, 227, 228, 234 e 254). Além disso, em 27 deabril e 28 de junho de 1999, o Ministério Público foi informado que ex membros das forças desegurança pública que teriam participado nos fatos de 08 de janeiro de 1982, continuavamroupando, violando mulheres, matando pessoas da região e ameaçando a população da aldeiaChichupac, bem como foram informados os nomes dessas pessoas (infra par. 222). Noentanto, não consta que a Guatemala tenha implementado uma investigação efetiva sobre os

196 Cfr. Relatório sobre o dano à saúde mental (moral) elaborado pela psicóloga Nieves Gómez Dupuis em 05 demaio de 2010 e apresentado perante a Comissão Interamericana (Expediente de prova, folhas 1319 e 1322).197 Nesse sentido, o perito Salvadó Cardorza afirmou que "o lote que tinha antes foi ocupado por outras pessoasda mesma comunidade", inclusive por "pessoas que se aproveitaram de má-fé e que estão ocupando essas terras" ou"as suas terras de cultivo estão sendo utilizadas [...] parentes próximos". Assim, "muitos deles visitam ou visitaram aaldeia ou o povoado do qual foram obrigados a partir, mas não ocupam o seu antigo lote porque um parente próximo oestá ocupando e ele está de acordo com isso”. Da mesma forma, alguns "por necessidade de dinheiro venderam [...] aterra [...] que lhe[s] tinham oferecido”. Cfr. Relatório escrito pelo perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardozaapresentado durante a audiência pública celebrada em 28 de abril de 2016 (Expediente de prova, folhas 11674 a11676), e perícia de Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza apresentada perante a Corte Interamericana durante aaudiência pública em 28 de abril de 2016. Além disso, a perito Dupuis destacou que "[a]s mulheres se viram naobrigação de abandonar as suas terras ou vendê-las a preços muito baixos a fim de obter algum recurso econômicocom o qual levar adiante a sua família. Cfr. Relatório sobre o dano à saúde mental (moral) elaborado pela psicólogaNieves Gómez Dupuis em 05 de maio de 2010 e apresentado perante a Comissão Interamericana (Expediente deprova, folhas 1319 e 1322).198 Cfr. Denúncia de 06 de junho de 2006, apresentada por Miguel Chen Tahuico perante a Promotoria Municipalde Rabinal, Baja Verapaz. (Processo probatório, folhas 1564 e 1565).

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fatos violentos e deslocamentos sofridos pelos membros da aldeia Chichupac e comunidadesvizinhas, especialmente no que se refere à informação de que os responsáveis pela violênciacontinuavam morando nas comunidades vizinhas de Rabinal. Também foram investigadasdenúncias de que no ano 1999, alguns dos supostos responsáveis continuariam roubando,praticando abusos sexuais contra mulheres, matando pessoas da região e ameaçando apopulação da aldeia Chichupac (infra pars. 222 e 223).

184. Em segundo lugar, não consta que o Estado tenha estabelecido métodos para que osmembros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas que tenham perdido a documentaçãoque comprovava a posse das usas terras e bens - devido aos fatos deste caso - possamrecuperar esses documentos ou comprovar a sua propriedade de forma alternativa (supra par.98).

185. Em terceiro lugar, durante a audiência pública, os representantes informaram que até osúltimos dias de março de 2016 existia uma representação municipal em Rabinal do ProgramaNacional de Ressarcimento (PNR), que foi fechada. O Estado não contestou a veracidade dessainformação. No entanto, nas suas alegações finais, declarou que a fim de reverter a situaçãode deslocamento, no ano 2008 foi elaborado um diagnóstico sobre a Comunidade Chichupac,com o objetivo de arrecadar informação básica para que seja atendida pelo PNR. Esse trabalhodiagnóstico permitiu conhecer as condições econômicas, sociais e culturais da população, edessa forma, assentar as bases para a elaboração dos planos de ressarcimento realizados deforma integral. Além disso, informou que no ano 2008 foram construídas 80 casas de madeirae compensado com revestimento de alvenaria.

186. Nesse sentido, a psicóloga Nieves Gómez Dupuis, no seu relatório de 05 de maio de 2010afirmou que "[n]o ano de 2009, o [PNR] deu prioridad[e] à comunidade de Chichupac, a fim derealizar um processo de ressarcimento integral". Para tanto, em novembro de 2009, solicitou àEquipe de Estudos Comunitários e Ação Psicossocial (ECAP) que "realizasse um diagnóstico eproposta de reparação integral para essa comunidade". No entanto, "não se [obteve] umaresposta de consenso sobre o ressarcimento junto às vítimas, que seja clara e contundente, eque reúna todas as [suas] necessidades, [senão] que foram feitas ações isoladas como aconstrução de casas ou a entrega de indenizações financeiras, sem um acompanhamento demedidas de saúde, educação, justiça ou memória histórica". Nesse sentido, embora o PNRtenha atuado "no sentido de entregar casas[,] as pessoas não es[tiveram] de acordo com otipo de casa que lhes qu[eriam] entregar, e pela ausência de uma reparação integral". Alémdisso "[a]s pessoas que vivem atualmente deslocadas como consequência do massacre, nãosão levadas em consideração para as medidas de ressarcimento como, por exemplo, aconstrução de casas".199

187. A Corte não tem informação sobre se o PNR contemplaria medidas concretas sobre umpossível retorno ou um reassentamento voluntário e reintegração das pessoas que foramdeslocadas da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas do município de Rabinal, o qual incluaeventualmente a sua participação plena no planejamento e gestão. Também não conta cominformação sobre se, contemplando tais medidas, teriam sido eventualmente implementadas.Embora conste que no ano 2009 e por solicitação do PNR, a Equipe de Estudos Comunitários eAção Psicossocial (ECAP) elaborou um diagnóstico sobre a Comunidade Chichupac, não háinformação sobre o eventual acompanhamento desse diagnóstico. Mais ainda, o escritório

199 Cfr. Relatório sobre o dano à saúde mental (moral) elaborado pela psicóloga Nieves Gómez Dupuis em 05 demaio de 2010 e apresentado perante a Comissão Interamericana (Expediente de prova, folhas 1307 e 1321 a 1323).

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municipal do PNR em Rabinal foi fechado nos últimos dias de março de 2016, sem haverconhecimento sobre se esse fechamento foi temporário ou definitivo.

188. Agora, consta que o Estado construiu casas e entregou algumas indenizações financeiras,no entanto, este Tribunal não conta com informação clara e precisa sobre os critérios seguidospara a implementação dessas ações; se a sua entrega foi realizada aos proprietários originaisdas terras ou às pessoas que formam parte dos novos assentamentos, nem se respondem auma estratégia de retorno para reverter a situação de deslocamento dos membros dascomunidades; nem se estão orientadas a pessoas que vivem dentro das comunidades oupessoas que estão deslocadas delas.

189. Tudo o que antecede permite à Corte concluir que o Estado não adotou medidassuficientes e efetivas para garantir às pessoas deslocadas de Chichupac e comunidadesvizinhas um retorno digno e seguro aos seus lugares de residência habitual ou umreassentamento voluntário em outra parte do país ou, conforme o caso, uma indenizaçãoadequada. O Estado também não estabeleceu as condições nem forneceu os meiosindispensáveis para reparar ou minimizar os efeitos do deslocamento dos membros dascomunidades que foram reassentadas depois de 09 de março de 1987. Consequentemente, oEstado não garantiu a liberdade de circulação e de residência dos membros da aldeiaChichupac e comunidades vizinhas do município de Rabinal que foram deslocadas das suascomunidades, em violação ao artigo 22.1 da Convenção Americana, em relação ao seu artigo1.1.

B.3. Impactos do deslocamento e da omissão de garantir medidas de retorno para osmembros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas de Rabinal

190. Depreende-se da prova remetida ao Tribunal que o deslocamento e a omissão emgarantir medidas de retorno ou reassentamento tiveram graves efeitos no desenvolvimentodos projetos de vida e relações familiares dos membros da comunidade maia-achi da aldeiaChichupac e comunidades vizinhas. Nesse sentido, o perito Luis Raúl Francisco SalvadóCardoza e a psicóloga Nieves Gómez Dupuis afirmaram que, como efeito direto do processo dedeslocamento e no marco de estratégias de sobrevivência, ocorreram mudanças abruptas depapel e uma mudança "brutal" no projeto de vida das pessoas. Como exemplo disso, explicou:"[as] mulheres [...] ao se esconderem em diferentes cidades tiveram que 'lavar para fora',fazer tortilha ou tamal para vender de casa em casa, ou fazer serviço doméstico, etc.,enquanto na comunidade original eram donas de casa em unidades familiares rurais";"meninos [...] passar[am] a ser chefes de família [e se responsabilizar] por irmãos menoresdepois do assassinato dos seus pais, até encontrar os seus avós"; outros "passaram a serpequenos proprietários ou usufrutuários de lotes agrícolas" a se empregarem como "operáriosde máquinas", "pedreiros", "carregadores" em diferentes mercados municipais do país", "aincorporar-se como assalariados em propriedades localizadas em diferentes departamentos" etrabalhar em "tarefas domésticas".200

191. Da mesma forma, é evidente para a Corte que o deslocamento dos membros da aldeiaChichupac e comunidades vizinhas teve impacto grave na relação do povo maia-achi com o seu

200 Cfr. Relatório escrito do perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza apresentado durante a audiência públicacelebrada em 28 de abril de 2016 (Expediente de prova, folhas 11673 e 11676). Nesse mesmo sentido, Relatório sobreo dano à saúde mental (moral) elaborado pela psicóloga Nieves Gómez Dupuis em 05 de maio de 2010 e apresentadoperante a Comissão Interamericana (Expediente de prova, folhas 1316 e 1325).

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território, bem como nos vínculos comunitários, tradicionais, culturais e ancestrais do grupocomo tal. Nesse sentido, o perito Salvadó Cardoza informou que "[o] deslocamento rompeubrutalmente os vínculos históricos que a população afetada possuia com o seu território, com aterra e com as práticas sociais que regiam o dia a dia". Entre os efeitos comunitários,identificou "a desarticulação da malha comunitária", o que "levou a uma ruptura das relaçõessociais que tinham se dado em cada comunidade para organizar a convivência, a perdarepentina dos canais tradicionais de transmissão de conhecimentos [entre gerações], a lógicacultural das práticas produtivas [e] do uso da terra", bem como "os marcadores de identidadeforam se rompendo pouco a pouco". A "coesão comunitária se reduziu", "[f]oi gerada umadesconfiança entre as pessoas" e "isolamento das pessoas entre si", bem como "[a]sorganizações comunitárias se enfraqueceram profundamente ao desaparecer a liderança queexistia antes". Teve impacto nos aspectos culturais da população maia-achi, uma vez que as"novas estratégias de sobrevivência lateral, os marcadores de identidade se escondem". Porum lado, nas mulheres, as quais "durante a fuga t[iveram] que deixar para atrás os seus trajestradicionais, os trajes que usavam desde o seu nascimento [...] e trocá-lo [s] pelo que elaschamam de roupa de fábrica", "em um processo de mimetismo muito sofrido que tornapossível a sobrevivência no novo ambiente". Por outro lado, no uso do idioma achi empregadonas relações sociais, comunitárias e familiares, ao sair das comunidades, os seus membrostiveram de enfrentar o mundo da língua espanhola, que não é a sua primeira língua.201

192. Nesse mesmo sentido, a psicóloga Gómez Dupuis explicou que "[a] vida cotidiana, ascelebrações e os ritos giravam em torno da terra e os seus ciclos de produção, e daorganização social comunitária", e que "o deslocamento provocou uma ruptura das redes deapoio, a ruptura com a terra e a cultura ancestral". Destacou que "[a]s práticas culturais foramgravemente danificadas pela exclusão e estigmatização da população maia-achi".

193. A Corte considera que a declaração do senhor Napoleón García De Paz na audiênciapública é consistente com as perícias. O senhor García relatou à Corte que depois desobreviver aos fatos do dia 26 de novembro de 1982, em que oito pessoas foram vítimas dedesaparecimento, saiu da sua comunidade para se refugiar nas montanhas. Nesse lugar,sobreviveu com a sua esposa e filhos aos fatos ocorridos em 02 de março de 1983, nos quaisoito pessoas foram executadas (supra pars. 110 a 112). Explicou que posteriormente, foi paraa cidade de Guatemala e que atualmente vive em Rabinal, sem ter retornado à aldeia. Sobreos fatos vivenciados e o deslocamento, declarou que sente "uma dor [...] porque a gente énativo da aldeia de Xeabaj [...], então a gente sente, porque já não é igual chegar agora, naaldeia, nada de pessoas, nada de família, toda a minha família, os meus irmãos foram mortos,só eu fiquei [...], dói muito que a raça maia acabe, querem nos exterminar, os que estão noExército, porque nós, como índios, dizem que não valemos nada, porque não podemos nemfalar espanhol, o espanhol, é por isso que sofro com o que aconteceu nas nossas queridascomunidades [...]. [E] eu nem cheguei na minha aldeia porque [...] sinto medo, qualquer fogode artifício eu penso que o Exército vem para cima, mas não. Por quê? Porque a mente ficatraumatizada".

194. Junto a isso, a Corte constata que o deslocamento forçado também afetou a vidareligiosa dos membros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas. Segundo disse a psicólogaGómez Dupuis, “[d]urante esses anos, as pessoas deixaram de realizar as suas devoções pela

201 Cfr. Relatório escrito pelo perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza apresentado durante a audiência públicacelebrada em 28 de abril de 2016 (Expediente de prova, folhas 11676 a 11678), e perícia de Luis Raúl FranciscoSalvadó Cardoza apresentada perante a Corte Interamericana durante a audiência pública em 28 de abril de 2016.

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terra, pela chuva, pela colheita, pela saúde ou a morte, e a relação com os seus ancestrais.Com a passagem do tempo, as pessoas na comunidade foram recuperando as suas práticasculturais, e vários idosos da comunidade conseguiram sobreviver ao massacre perpetuando oconhecimento ancestral. No entanto, várias famílias se converteram a novas religiões, como acarismática e a evangélica. [...]. As práticas culturais também foram sendo perdidas entre aspessoas que foram deslocadas definitivamente para outros municípios e os jovens,especialmente, cresceram fora das suas terras ancestrais e assumindo novas identidades","longe da sua família, das suas tradições, do seu traje tradicional e o seu idioma".202

195. Nesse mesmo sentido, o perito Salvadó Cardoza se referiu "à dificuldade de realizaralgumas práticas culturais no novo contexto", bem como "às mudanças aparentemente súbitasna religiosidade tradicional, até as novas igrejas evangélicas apareceram procurando adeptos".Também se referiu ao impacto nas práticas religiosas, pois já não puderam ir aos locaissagrados tradicionais de Rabinal, o qual significou "um golpe muito duro para a comunidade eprovocou a ruptura da vida cotidiana".203

196. A Corte adverte que essa situação coincide com o acontecimento nos casos dosMassacres de Río Negro e Massacre Plan de Sánchez, nos quais as vítimas foram, na suamaioria, membros do povo maia-achi, entre eles meninas, meninos, mulheres e homens quemoravam em aldeias e comunidades do município de Rabinal, Departamento de Baja Verapaz,que se viram obrigadas a se deslocar para fora das suas comunidades e se refugiar nasmontanhas e em outros lugares, devido à perseguição, violência e destruição das suas casas ecomunidades no marco do conflito armado interno da Guatemala. Nesses casos, este Tribunalconstatou que, da mesma forma, as pessoas que sofreram o deslocamento forçado paralugares afastados da sua comunidade perderam a oportunidade de participar nas atividades,nos rituais, na espiritualidade e ciclo de aprendizagem, de falar o seu idioma e de usar os seustrajes, bem como de praticar as suas atividades tradicionais.204

197. Em suma, a Corte considera que a falta de garantias de retorno em favos dos membrosda aldeia Chichupac e comunidades vizinhas do município Rabinal depois de 09 de março de1987, afetou de forma especialmente grave as práticas comunitárias, culturais e religiosastradicionais, a estrutura familiar e social, os marcadores de identidade e o idioma do povomaia-achi dessa aldeia e comunidades. O que antecede, devido à ruptura da cultura ancestrale dos vínculos históricos com o território e com as práticas sociais, a desarticulação da malhacomunitária e a redução da coesão comunitária. Tudo isso significou uma perda de parte dacultura maia-achi, que ainda não foi totalmente avaliada. Nesse sentido, a Corte destaca oimpacto diferenciado que os fatos de violência e o deslocamento tiveram na identidade étnica ecultural dos membros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas do município de Rabinal, oqual os colocou em uma situação de especial vulnerabilidade.

202 Cfr. Relatório sobre o dano à saúde mental (moral) elaborado pela psicóloga Nieves Gómez Dupuis em 05 demaio de 2010 e apresentado perante a Comissão Interamericana (Expediente de prova, folhas 1313 a 1315, 1319 e1324).203 Cfr. Relatório escrito pelo perito Luis Raúl Francisco Salvadó Cardoza apresentado durante a audiência públicacelebrada em 28 de abril de 2016 (Expediente de prova, folhas 11676 a 11677), e perícia de Luis Raúl FranciscoSalvadó Cardoza apresentada perante a Corte Interamericana durante a audiência pública em 28 de abril de 2016.

204 Cfr. Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 58, nota de rodapé da folha 44, e Caso Massacre Plande Sánchez Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de quinta-feira, 29 de abril de 2004. Série C N° 105, par. 42.5.

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198. Por outra parte, a Corte destaca a existência de claros indícios relacionados ao impactodiferenciado que o deslocamento forçado e a omissão de garantir medidas de retorno oureassentamento teve nas mulheres da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas de Rabinal emnível cultural, social, familiar e individual. Elas tiveram que assumir a responsabilidade sobreas suas famílias e os filhos, e enfrentar a dor da violência à qual sobreviveram, o qual ascolocou em uma situação especial de risco de sofrer outras formas de violência. Esses indícios,indicados a seguir, dimensionam o horror vivido e a situação individual, familiar e coletiva dasmulheres deslocadas durante o conflito armado interno.

199. Primeiro, o perito Alejandro Rodríguez Barilla identificou que "[n]este caso, as denúnciaspermitem inferir que um número não inferior a 18 mulheres sofreram agressões sexuais efundamentalmente violações sexuais massivas por parte de membros do Exército e os seusgrupos paramilitares" e que alguma delas foram perpetradas contra mulheres deslocadas ereassentadas na "aldeia modelo" La Colônia. Por sua vez, pelo menos cinco mulheresidentificadas pelo perito foram vítimas de violações sexuais que resultaram em gestações enascimento dos seus filhos .205 Segundo, o Relatório da CEH reconheceu que "pelo seu modusoperandi, as violações sexuais originaram o êxodo de mulheres e a dispersão de comunidadesinteiras, romperam laços conjugais e sociais, geraram isolamento social e vergonhacomunitária, provocaram abortos e morte dos filhos, impediram matrimônios e nascimentosdentro do grupo". Da mesma forma, destacou que "[o] estigma que marca as mulheres maiasvítimas de estupro causa o horror à rejeição familiar ou da comunidade. Algumas dassobreviventes de agressões sexuais também se deslocaram para outra comunidade justamentepara não viver a vergonha de estar marcadas como 'mulher estuprada'. Essas mulherestiveram que sobreviver ao medo de 'serem descobertas' e ao pânico de que os demais asculpassem".206

200. Terceiro, a Corte nota a declaração de vida de Juana García Depaz, quem viveu a perdados homens do seu entorno familiar, ou seja, a morte dos seu esposo, irmão e filho, odesaparecimento do seu pai, irmão e sobrinho, bem como a morte da sua filha, entre agostode 1981 e agosto de 1986.207 Foi presa em 22 de outubro de 1983 pelas forças de segurançado Estado, levada ao destacamento militar do município de Rabinal, onde foi espancada,agredida sexualmente por militares, ameaçada de morte, pendurada pelo pescoço com umacorda e interrogada sobre a guerrilha. Posteriormente, foi levada para a colônia Pacux deRabinal, e depois para a colônia de Chichupac, onde viveu sob forte controle militar, obrigada atrabalhar para alimentar os militares e agredida sexualmente. As agressões sexuais praticadasem outubro de 1982 e junho de 1985 resultaram em duas gestações, das quais nasceram osseus filhos, Edgar e Sandra Maribel García (supra par. 116). Depois de 09 de março de 1987,Juana García viveu o deslocamento forçado junto à sua filha e filho, de aproximadamente 3 e 1anos de idade, que se estende até esta data. A esse respeito, durante a audiência públicaJuana García relatou a este Tribunal: "ficamos sem roupa, sem nada, sem casa, ficamos comopássaro voando [...]. Ficamos sem marido, sem esposos [...]. Eu perdi os meus filhos, não sóas duas mortes[,] [também] os mais velhos, esses se desintegrados, foram embora [...],durante nove anos perdi os meus filhos [...]. [V]i a morte dos meus filhos e todos os vizinhos.

205 Cfr. Perito Alejandro Rodríguez Barilla (processo processual, folhas 11568 e 11569).206 Cfr. Relatório da CEH“Guatemala, Memória do Silêncio”, Capítulo II, pars. 2353 e 2384.207 Os nomes dos familiares de Juana García Depaz são: Mateo Grave, Adrián García Manuel, Hugo García de Paz,Agapito Alvarado Depáz, Eusebia Grave García, José León Grave García e Efraín García de Paz (supra pars. 86, 99, 115e 148).

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Eu sofri muito, sofremos muito [...]. Ficamos fora peregrinando [...]. Até hoje estamosdesintegrados da família". No entanto e sob essas circunstâncias, Juana García iniciou aprocura pelos seus seres queridos que ficaram nos cemitérios clandestinos e os que foramvítimas de desaparecimento forçado, denunciou os fatos ocorridos aos seus familiares, esteveenvolvida nas investigações penais que se seguiram a essas denúncias, e participou nosprocedimentos de exumação e identificação dos seus familiares nos anos 2000, 2002 e 2006.Também relatou a esta Corte que ainda procura pelo seu pai, Adrián García Manuel e da suaneta, filha de Eusebia Grave García, a quem os militares levaram grávida de sete meses equem atualmente estaria na Suécia.208

201. Quarto, o Relatório REMHI destacou que “[m]ulheres de todas as idades e etnias, desdediversas condições sociais e diferentes pontos geográficos, […] [t]iveram que se dedicar abuscar os desaparecidos e preservar a vida daqueles que ficaram, além de garantir asobrevivência pessoal e familiar. E tudo isso junto com o desgaste emocional que significa oimpacto da violência e os seus efeitos nas mulheres, como a solidão, a sobrecarga e avalorização negativa de si mesma".209

202. Finalmente, a Corte entende que o deslocamento forçado incluiu uma grande parte decrianças, as quais, além do impacto de sobreviver aos fatos de violência, encontraram que oseu pai e a sua mãe ou um deles, que morreu, e se viram forçadas a viver em uma cultura quenão era a deles, o que lhes causou a perda de identidade e desenraizamento cultural, e emalguns casos passaram a se responsabilizar pelas suas irmãs e irmãos menores. A Cortedestaca o impacto diferenciado que os fatos de violência e o deslocamento tiveram naspessoas que eram crianças naquela época, o qual os colocou em uma situação especial devulnerabilidade. Da mesma forma, não foge al Tribunal as circunstâncias dos primeiros anos devida de crianças nascidas fruto das agressões sexuais sofridas pelas suas mães no marco doconflito armado interno e que, por sua vez, foram vítimas de violência naquela época; e queforam especialmente vulneráveis devido às possibilidades de enfrentar a estigmatização,discriminação, abandono, infanticídio ou outras formas de violência.210

B.4. Conclusões

203. Consequentemente, a Corte considera que o Estado da Guatemala é responsável pelaviolação aos direitos reconhecidos no artigo 22.1 da Convenção Americana, com relação ao seuartigo 1.1. Nesta Sentença, a Corte descreveu os problemas encontrados na identificaçãoefetiva de todas as supostas vítimas do caso, o qual, por sua vez, dificulta a determinação dequantas pessoas foram deslocadas. Em 02 de junho de 2016, os representantes apresentaramuma lista de "Pessoas individualizadas e deslocadas", indicando quais pessoas teriampermanecido em situação de deslocamento depois de 09 de março de 1987, sem que o Estadocontestasse a condição de vítimas deslocadas dessas pessoas (supra pars. 10, 65 e 69). Emaplicação do princípio de boa fé e lealdade processual das partes neste caso, a Corte entende

208 Cfr. Declaração de Juana García Depaz na audiência pública celebrada em 28 de abril de 2016.209 Cfr. Relatório REMHI “Guatemala: Nunca Mais”, Tomo I, Capítulo V, Título 5. A resistência das mulheres.

210 A respeito da violência sexual em conflitos armados, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha destacou que"[t]anto as crianças nascidas como consequência de violações quanto as mães, também são extremamentevulneráveis e podem enfrentar um risco de exclusão da comunidade. Essas crianças também podem ser vítimas deinfanticídio ou outras formas de violência”. Disponível em: https://www.icrc.org/spa/resources/documents/faq/sexual-violence-questions-and-answers.htm. Ver, também: Relatório REMHI “Guatemala: Nunca Mais”, Tomo I, Capítulo II,Títulos: 1. A violência contra a infância e 4. Os filhos da violência.

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que as pessoas que são vítimas de deslocamento estão identificadas no Anexo II destaSentença.

204. Por outro lado, este Tribunal considera que a alegada violação ao artigo 12 da ConvençãoAmericana já foi devidamente considerada na fundamentação deste Capítulo, sem que sejanecessário emitir um pronunciamento autônomo sobre esse ponto em especial.

205. Finalmente, a Corte observa que a Comissão também alegou que a Guatemala violou oartigo 16 da Convenção Americana. O artigo 16.1 da Convenção Americana estabelece queaqueles que estão sob a jurisdição dos Estados Partes têm o direito e a liberdade de seassociarem livremente com outras pessoas, sem a intervenção das autoridades públicas quelimitem ou impeçam o exercício desse direito. Trata-se, pois, do direito de se associar com afinalidade de buscar a realização comum de um fim lícito, sem pressões ou intromissões quepossam alterar ou desnaturalizar essa finalidade.211 Da mesma forma, o artigo 16.2 dessetratado estabelece que o exercício do direito de livre associação "apenas pode estar sujeito àslimitações previstas pela lei que sejam necessárias em uma sociedade democrática, em favordo interesse da segurança nacional, da segurança ou da ordem pública, ou para proteger asaúde ou a moral pública ou os direitos e liberdades dos demais". Neste caso e tal comoaconteceu no Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala,212 a Corte considera que a aldeiaChichupac e comunidades vizinhas de Rabinal não pode se assemelhar necessariamente a uma"associação", nos termos do artigo 16 da Convenção Americana. A esse respeito, a Cortedestaca que a Comissão não expressou as razões pelas quais essas comunidades, que têm umcaráter indígena, teriam direito reconhecido ao artigo 16 da Convenção. Portanto, o Tribunalconsidera que essa disposição não se aplica aos fatos deste caso.

211 Cfr. Caso Baena Ricardo e outros Vs. Panamá. Exceções Preliminares. Sentença de 18 de novembro de 1999.Série C N° 61, par. 156, e Caso García e familiares Vs. Guatemala, par. 116.212 Mutatis mutandi, Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala. Exceção Preliminar, Fundo, Reparações eCustas. Sentença de 04 de setembro de 2012. Série C N° 250, pars.167 a 168.

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IX. IIIGARANTIAS E PROTEÇÃO JUDICIAIS213 DA CONVENÇÃO AMERICANA, E

DESCUMPRIMENTO DOS ARTIGOS I.B DA CONVENÇÃO INTERAMERICANA SOBREDESAPARIÇÃO FORÇADA DE PESSOAS,214 1O, 6 O E 8 O DA CONVENÇÃO

INTERAMERICANA PARA PREVENIR E SANCIONAR A TORTURA,215 E 7.B DACONVENÇÃO INTERAMERICANA PARA PREVENIR, SANCIONAR E ERRADICAR A

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER216

A. Alegações da Comissão e das partes

206. A Comissão alegou que os fatos do caso formam parte de uma situação em queprevalece um alto índice de impunidade. Assinalou que transcorreram mais de 32 anos desdeos fatos e 21 anos de apresentada a denúncia; não obstante, estes seguem totalmenteimpunes. Sustentou que este lapso não é razoável, ressaltou diversas deficiências eobstaculizações na investigação, e argumentou que a Guatemala não levou a cabo umaientificação exaustiva dos restos exumados nem adotou medidas dirigidas a localizar oparadeiro das pessoas desaparecidas. Também assinalou que a falta de uma adequadaqualificação dos casos de desaparição forçada constitui um fator adicional de impunidade.Sobre este ponto, destacou que a aplicação do tipo penal de desaparição forçada não vulnera oprincípio de legalidade naqueles casos em que não se tenha determinado o paradeiro dapessoa desaparecida uma vez que o delito entrou em vigor. Pelo anterior, concluiu que oEstado violou os artigos 8.1 e 25 da Convenção Americana, em relação com o artigo 1.1 damesma, bem como o artigo I.b) da CIDP, em prejuízo das pessoas desaparecidas e dos

213 O artigo 8.1 da Convenção assinala: “Toda pessoa tem o direito de ser ouvida, com as devidas garantias edentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido comanterioridade pela lei, na substanciação de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para a determinação deseus direitos e obrigações de ordem civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outro caráter”. O artigo 25.1 da Convençãoexpressa: “Toda pessoa tem o direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo perante osjuízes ou tribunais competentes, que a ampare contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pelaConstituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação for cometida por pessoas que atuem emexercício de suas funções oficiais. ”

214 O artigo I.b da CIDFP estabelece: “Os Estados Partes nesta Convenção se comprometem a: […] b) Sancionarno âmbito de sua jurisdição os autores, cúmplices e encobridores do delito de desaparição forçada de pessoas, bemcomo a tentativa de comissão do mesmo”.215 O artigo 1o da CIPST estabelece: “Os Estados partes se obrigam a prevenir e a sancionar a tortura nos termosda presente Convenção”. O artigo 6o da CIPST estabelece: “De acordo com o disposto no artigo 1o, os Estados partestomarão medidas efetivas para prevenir e sancionar a tortura no âmbito de sua jurisdição. Os Estados partes seassegurarão de que todos os atos de tortura e as tentativas de cometer tais atos constituam delitos conforme seudireito penal, estabelecendo para castigá-los sanções severas que levem em conta sua gravidade. Igualmente, osEstados partes tomarão medidas efetivas para prevenir e sancionar, além disso, outros tratos ou penas cruéis,desumanas ou degradantes no âmbito de sua jurisdição”. O artigo 8o da CIPST estabelece: “Os Estados partesgarantirão a toda pessoa que denunciar ter sido submetida à tortura no âmbito de sua jurisdição o direito a que o casoseja examinado imparcialmente. Outrossim, quando existir denúncia ou razão fundamentada para acreditar que secometeu um ato de tortura no âmbito de sua jurisdição, os Estados partes garantirão que suas respectivas autoridadesprocederão de ofício e de imediato a realizar uma investigação sobre o caso e a iniciar, quando corresponder, orespectivo processo penal. Uma vez esgotado o ordenamento jurídico interno do respectivo Estado e os recursosprevistos por este, o caso poderá ser submetido a instâncias internacionais cuja competência tenha sido aceita poresse Estado”.

216 O artigo 7.b da Convenção de Belém do Pará estabelece: “Os Estados Partes condenam todas as formas deviolência contra a mulher e convêm em adotar, por todos os meios apropriados e sem dilações, políticas orientadas aprevenir, sancionar e erradicar dita violência e em levar a cabo o seguinte: […] b) agir com a devida diligência paraprevenir, investigar e sancionar a violência contra a mulher”.

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familiares das vítimas assinaladas no “Anexo único” ao Relatório de Fundo. Por outra parte, aComissão assinalou que os fatos do caso se incluem dentro da figura do genocídio e que “averificação do padrão de discriminação racial consistente em assinalar e perseguir os membrosdo povo indígena maia como simpatizantes da insurgência, exigiam da Guatemala umaespecial diligência na investigação e julgamento dos perpetradores”. Ao abster-se disso, osTribunais guatemaltecos vulneraram o artigo 24 da Convenção, em relação ao artigo 1.1 damesma, em prejuízo dos membros da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas.

207. Os representantes alegaram que em um marco de constante impunidade, múltiplasdenúncias foram apresentadas ao Ministério Público desde 1993. Entretanto, nenhum processopenal relacionado com os fatos superou a fase de investigação, apesar de existirem claraslinhas de investigação que poderiam determinar os culpados. Também assinalaram que o prazotranscorrido não é razoável. Destacaram diversos obstáculos na investigação, manifestaram queisto causa profunda dor e angústia na totalidade das vítimas e concluíram que a Guatemalaviolou os direitos às garantias judiciais e à proteção judicial relativas a elas. Outrossim,indicaram que o conhecimento do paradeiro das vítimas é parte do direito a conhecer a verdadeque assiste não apenas a seus familiares, mas a toda a população guatemalteca. Por outraparte, alegaram que existem elementos de contexto que evidenciam que os atos de membrosdo Estado foram cometidos “com a intenção de destruir total ou parcialmente” o grupo étnicoda comunidade maia da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas, e assinalaram que a falta deinvestigação dos fatos se relaciona direta e profundamente com o contexto atual dediscriminação racial que se vive na Guatemala.

208. Em sua contestação, o Estado sustentou que realizou o possível de acordo com suacapacidade potencial para cumprir com sua obrigação de investigar e que as autoridadesencarregadas foram sérias e diligentes. Informou sobre a abertura de diversos processos edetalhou as diligências realizadas dentro dos mesmos,217 entre elas, a identificação de 30vítimas. Em relação ao dever de investigar dentro de um prazo razoável, a Guatemala se referiuà complexidade dos fatos, à “notável inatividade” das vítimas na última década e a “diversas”diligências de investigação levadas a cabo. Por outra parte, alegou “a legalidade e procedênciada Anistia promulgada” através da Lei de Reconciliação Nacional (LRN). Em relação aos delitosaos quais, segundo o Estado, não é aplicável a anistia de acordo com a LRN, sustentou que nãoseria aplicável o delito de genocídio aos fatos do caso, dado que o enfrentamento guatemalteconão se originou como um conflito de caráter interétnico, e que os delitos de desaparição forçadae tortura só podem ser imputados em relação a fatos ocorridos posteriormente a sua tipificaçãoe entrada em vigência no ano de 1996. Em relação ao delito de desaparição forçada, reiterouque este é permanente, mas não continuado (supra pars. 15 e 128). Assim, indicou que“mesmo não sendo possível exercer a persecução penal relativa aos fatos ocorridos no marcodo enfrentamento armado interno […] o Estado da Guatemala aceita [a] responsabilidade e aobrigação de investigar a verdade histórica e reparar ou ressarcir as vítimas em nível interno”.Finalmente, referiu que o enfrentamento não foi uma forma de discriminação contra o povomaia, mas foi um conflito que se originou para derrubar o Governo, pelo que solicitou à Cortedeclarar que não violou o direito à igualdade.

209. Como já foi assinalado, na audiência pública o Estado reconheceu sua responsabilidadeinternacional pela violação dos artigos 8 e 25 da Convenção (supra pars. 51, 55 e 56).

217 Em particular, alegou que, a partir do ano de 2011, se investigam “diversos fatos ocorridos nessa região”dentro do processo MP001-2012-364, presumidamente tramitado pela Unidade de Casos Especiais do EnfrentamentoArmado Interno da Promotoria de Seção de Direitos Humanos.

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B. Considerações da Corte

210. O Estado manifestou seu reconhecimento de responsabilidade pela violação dos artigos 8 e 25da Convenção. Entretanto, como foi assinalado, o Estado não especificou os fatos que gerariamditas violações nem em prejuízo de quem se configurariam. Dado que este caso versa sobreuma pluralidade de violações graves de direitos humanos sucedidas no marco do conflitoarmado interno na Guatemala, a seguir a Corte se referirá a sua jurisprudência em torno aodever de investigar, julgar e, segundo o caso, sancionar os responsáveis por tais violaçõesquando são cometidas dentro de um contexto como o do presente caso, e detalhará os fatoresque configuraram um descumprimento do Estado dos referidos deveres.

211. A Corte lembra que, em virtude da proteção concedida pelos artigos 8 e 25 da Convenção, osEstados estão obrigados a fornecer recursos judiciais efetivos às vítimas de violações dosdireitos humanos, que devem ser substanciados de acordo com as regras do devido processolegal.218

212. Outrossim, este Tribunal assinalou que em uma sociedade democrática se deve conhecer averdade sobre os fatos de graves violações aos direitos humanos. Esta é uma justa expectativaque o Estado deve satisfazer,219 por um lado, mediante a obrigação de investigar de ofício e, poroutro, com a divulgação pública dos resultados dos processos penais e investigativos.220 Istoexige do Estado a determinação processual dos padrões de atuação conjunta e de todas aspessoas que, de diversas formas, participaram em ditas violações e suas correspondentesresponsabilidades221 e reparar as vítimas do caso. Por isso, em ocasiões anteriores, a Corteconsiderou que as autoridades encarregadas das investigações têm o dever de assegurar que,no curso das mesmas, se valorizem os padrões sistemáticos que permitiram a execução dasgraves violações dos direitos humanos, como as sucedidas no presente caso.222 Para garantirsua efetividade, a investigação deve ser conduzida considerando a complexidade deste tipo defato e da estrutura na qual se situam as pessoas provavelmente envolvidas nos mesmos, deacordo ao contexto em que ocorreram, particularmente em contextos de ataques massivos esistemáticos ou generalizados a algum setor da população,223 evitando assim omissões naobtenção de provas e no seguimento de linhas lógicas de investigação.224 Por isso, asautoridades estatais estão obrigadas a colaborar na obtenção das provas para alcançar os

218 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Exceções Preliminares. Sentença de 26 de junho de 1987. SérieC N° 1, par. 91, e Caso Maldonado Ordoñez Vs. Guatemala. Exceção Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentençade 03 de maio de 2016. Série C N° 311, par. 71.219 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Fundo, par. 181, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala,par. 194.

220 Cfr. Caso Anzualdo Castro Vs. Peru, par. 119, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 194.

221 Cfr. Caso do Massacre da Rochela Vs. Colômbia. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 11 de maio de2007. Série C N° 163, par. 195, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 194.222 Cfr. Caso do Massacre da Rochela Vs. Colômbia, par. 156, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par.194.223 Cfr. Caso Almonacid Arellano e outros Vs. Chile. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas.Sentença de 26 de setembro de 2006. Série C N° 154, pars. 94 a 96 e 98 a 99, e Caso Manuel Cepeda Vargas Vs.Colômbia. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 26 de maio de 2010. Série C N° 213, par.42.

224 Cfr. Caso das Irmãs Serrano Cruz Vs. El Salvador. Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 1o de março de2005. Série C N° 120, pars. 88 e 105, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru. Exceções Preliminares, Mérito,Reparações e Custas. Sentença de 22 de junho de 2016. Série C N° 314, par. 177.

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objetivos de uma investigação e abster-se de realizar atos que impliquem obstruções para oandamento do processo investigativo.225

213. Dada sua importância, a obrigação de investigar no presente caso não pode ser executada dequalquer maneira, mas deve realizar-se de acordo com os padrões estabelecidos pelas normase pela jurisprudência internacional que caracterizam as investigações de graves violações aosdireitos humanos, o que supõe, em primeiro lugar, gerar um marco normativo interno adequadoe/ou organizar o sistema de administração de justiça de forma tal que seu funcionamentoassegure a realização de investigações ex officio, sem dilações, sérias e efetivas.226

214. Da mesma forma, este dever impõe a remoção de todo obstáculo de jure e de facto queimpeça a investigação e julgamento dos fatos e, segundo o caso, a sanção de todos osresponsáveis pelas violações declaradas, bem como a busca pela verdade. Por esta razão, nopresente caso, que versa sobre graves violações de direitos humanos cometidas dentro de umcontexto de violações massivas e sistemáticas, a obrigação de investigar não pode serdesconsiderada ou condicionada por atos ou disposições normativas internas de nenhumaíndole.227

215. Além disso, a Corte considera pertinente assinalar que a obrigação de investigar, julgar e,segundo o caso, sancionar os responsáveis pelos atos de violação aos direitos humanos não sederiva somente da Convenção Americana. Em determinadas circunstâncias e dependendo danatureza dos fatos, esta obrigação também se depreende de outros instrumentosinteramericanos na matéria que estabelecem a obrigação a cargo dos Estados Partes deinvestigar as condutas proibidas por tais tratados.228 Ao respeito, este Tribunal nota que, nestecaso, a obrigação de investigar a cargo do Estado contraída a partir da ratificação da ConvençãoAmericana e que se mantém vigente na atualidade, foi reafirmada pela Guatemala com motivodo depósito do instrumento de ratificação da: i) Convenção Interamericana para Prevenir eSancionar a Tortura, de 29 de janeiro de 1987; ii) Convenção de Belém do Pará, de 04 de abrilde 1995, e iii) Convenção Interamericana sobre Desaparição Forçada de Pessoas (CIDFP), de 25de fevereiro de 2000, pelo que o Estado devia velar pelo seu cumprimento a partir dessesmomentos,229 mesmo quando estas não tinham sido adotadas pela Guatemala no momento dosfatos do caso.

216. Além disso, devido a que no presente caso algumas pessoas foram obrigadas a trabalharcontra sua vontade (supra pars. 97 e 116), a Corte lembra que a proteção contra a escravidão eservidão é uma obrigação internacional erga omnes, constitutiva de delito internacional e decaráter imprescritível, cuja proibição alcançou o status de jus cogens.230 Por estes motivos,quando os Estados tiverem conhecimento de um ato que possa ser constitutivo de escravidão

225 Cfr. Caso García Prieto e outros Vs. El Salvador. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 20 de novembro de 2007. Série C N° 168, par. 112, e Caso Comunidade Camponesa de Santa BárbaraVs. Peru, par. 237.226 Cfr. Caso Anzualdo Castro Vs. Peru, par. 65, e Caso Massacres de El Mozote e lugares vizinhos Vs. ElSalvador, par. 247.227 Cfr. Caso Contreras e outros Vs. El Salvador. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 31 de agosto de2011. Série C N° 232, par. 127, e Caso García Lucero e outras Vs. Chile. Exceção Preliminar, Mérito e Reparações.Sentença de 28 de agosto de 2013. Série C N° 267, par. 149.228 Cfr. Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 222.229 Cfr. Caso do Presídio Miguel Castro Castro Vs. Peru. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 25 denovembro de 2006. Série C N° 160, par. 377, e Caso Massacres de El Mozote e lugares vizinhos Vs. El Salvador, par.246.

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ou servidão, nos termos do disposto pelo artigo 6o da Convenção Americana, devem iniciar exofficio a investigação pertinente a efeitos de estabelecer as responsabilidades individuaiscorrespondentes.231

217. Como foi assinalado (supra pars. 121 e 122), consta no acervo probatório que, neste caso,foram abertas, por um lado, uma investigação na Unidade de Casos Especiais e Violações aosDireitos Humanos do Ministério Público e outra perante o Procurador de Direitos Humanos emrelação ao massacre de 08 de janeiro de 1982 e, por outro lado, nove processos relacionadosaos fatos do caso cometidos antes e depois do massacre. A seguir, o Tribunal constatará opertinente em torno à estas investigações, à luz dos padrões expostos.

230 Cfr. Caso Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde Vs. Brasil. Exceções Preliminares, Fundo, Reparações eCustas. Sentença de 20 de outubro de 2016. Série C N° 318, par. 454.231 Cfr. Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 225.

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B.1. Falta de devida diligência e obstaculização

B.1.1. Processo No 001-2005-95839, aberto em relação com o massacre de 08 dejaneiro de 1982

218. A partir de uma avaliação do Processo No 001-2005-95839 perante a Unidade de CasosEspeciais e Violações aos Direitos Humanos do Ministério Público, aberto no ano de 1993 apartir de uma denúncia interposta em relação ao massacre de 08 de janeiro de 1982,232 oTribunal constatou o seguinte.

B.1.1.1. Falta de atividade investigativa séria e oportuna

219. Apesar de constatada certa atividade investigativa das autoridades responsáveis, não seesgotaram todas as medidas que deviam realizar-se a fim de esclarecer os fatos e identificar ospossíveis autores dos mesmos, e várias das diligências realizadas se deveram ao impulsoprocessual dos familiares das vítimas. Outrossim, o Tribunal constatou que em diversasocasiões cessou a atividade investigativa durante longos períodos de tempo ou se registraramdemoras na realização das diligências.

220. Neste sentido, o Tribunal destaca, em primeiro lugar, que em 10 de agosto de 1993, o MédicoForense Departamental entregou à Vara de Primeira Instância Penal, Narcóticos e Delitos contrao Ambiente de Salamá, uma caixa com objetos associados aos restos ósseos exumados naqueleano.233 Entretanto, não se registra atividade alguma de seguimento até o dia 05 de fevereiro de1998, quando o Juiz de Primeira Instância solicitou ao Juiz de Paz de Rabinal, que tinha sidodesignado, para praticar a diligência de exumação, que informasse sobre as atuaçõesrealizadas.234 Após aproximadamente quatro anos e meio, esta última ação se realizou peloimpulso processual dos familiares das vítimas, que solicitaram, em dezembro de 1997, que secontinuasse a investigação235 e, em janeiro de 1998, que se solicitasse ao Juiz de Paz oprocesso no qual se praticou a exumação.236

221. Em segundo lugar, o Tribunal adverte que apenas foram identificadas sete pessoas de umnúmero mínimo de 31 indivíduos, cujos restos foram exumados em maio de 1993 (supra pars.91 e 105).237 Não se depreende do processo que tenha sido realizada alguma atividade posterior

232 Cfr. Denúncia de Ana Calate Sic apresentada em 29 de março de 1993 (Expediente de prova, folhas 729 e730) e Ratificação da denúncia de Ana Calate Sic apresentada em 19 de abril de 1993 (Expediente de prova, pága.718 a 721).233 Entre eles, três documentos de “inscrição militar”, uma “credencial de reservistas militares” e vários estojos“oxidados possivelmente de calibre 22 de pistola”. Cfr. Relatório do Médico Forense Departamental de 10 de agosto de1993 (processo de prova, folhas 655 a 658).234 Cfr. Ofício do Juiz de Primeira Instância ao Juiz de Paz de Rabinal (Expediente de prova, folha 628).

235 Cfr. Petição apresentada por Miguel Sic, Fabiana Chen e Teresa Cacaj em 05 de dezembro de 1997 paraconstituir-se como demandantes adesivos (Expediente de prova, folhas 636 a 645).236 Cfr. Petição de Miguel Sic, Fabiana Chen e Teresa Cacaj apresentada em 29 de janeiro de 1998 (Expediente deprova, folhas 632 e 633).

237 Cfr. Relatório de Investigações Antropológico Forenses, aldeia Chichupac, apresentado pelo EAFG em julho de1993 (Expediente de prova, folhas 511, 540 e 541); Atas de exumação de cadáveres do Juiz de Paz de Rabinal duranteo período de 06 a 09 de maio de 1993 (Expediente de prova, folhas 665 a 688); Ofício Número 830/jixt enviado peloDelegado de Polícia de Salamá em 17 de maio de 1993 (Expediente de prova, folhas 689 a 692), e Ofício Número

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dirigida a identificar as pessoas restantes. Em relação a este ponto, a Corte assinalou que, emcasos de graves violações de direitos humanos, como as deste caso, a exumação e identificaçãodas vítimas falecidas forma parte da obrigação de investigar a cargo do Estado. Portanto, trata-se de um dever que deve ser realizado ex officio, já que “dentro do dever de investigar subsisteo direito dos familiares da vítima de conhecer qual foi o destino dela e, de acordo com o caso,onde se encontram seus restos mortais”.238 Nessa medida, corresponde ao Estado satisfazeressas justas expectativas com os meios ao seu alcance.

222. Em terceiro lugar, em dezembro de 1997,239 assim como abril240 e junho de 1999241 aPromotoria Distrital do Ministério Público de Salamá recebeu, através das declarações de, pelomenos, três pessoas, os nomes de, pelo menos, 18 dos supostos responsáveis pelo massacre.Os declarantes solicitaram a apreensão dos mesmos em abril e junho de 1999, denunciaramque continuavam roubando, estuprando mulheres e ameaçando os moradores (supra pars. 98 e183), e também forneceram os endereços onde essas pessoas poderiam ser localizadas. Sebem em junho de 2000, ou seja, um ano depois, o Auxiliar da Promotoria solicitou ao Chefe doDepartamento de Cédulas de Vizinhança de Rabinal, as cédulas de 14 das pessoasassinaladas,242 apenas recebeu 13, pois um não foi localizado243 e não se registra nenhumaatuação posterior relativa a essas pessoas. Posteriormente, em julho244 e agosto245 de 2005 a“Promotoria Especial do Ministério Público” recebeu quinze declarações, nas quais se descrevemos fatos de 08 de janeiro de 1982, bem como outros fatos ocorridos antes e depois dessa data,entre os quais se destaca a morte de familiares, o deslocamento forçado, trabalhos forçados,violência sexual, necessidades e perseguição que sofreram, o incêndio de casas e plantações, e

856/jgc enviado pelo Delegado de Polícia de Salamá em 20 de maio de 1993 (Expediente de prova, folhas 663 a 664).238 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 181, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala,par. 217.239 Solicitaram, entre outros, que se ordenasse a apreensão dos indicados, sendo decretada prisão preventiva.Cfr. Petição apresentada por Miguel Sic, Fabiana Chen e Teresa Cacaj em 05 de dezembro de 1997 para constituir-secomo demandantes adesivos (Expediente de prova, folhas 636 a 645).240 Cfr. Declaração de Miguel Sic Osorio de 27 de abril de 1999 (Expediente de prova, folhas 610 a 612);Declaração de Fabiana Chen Galiego de 27 de abril de 1999 (Expediente de prova, folhas 613 a 615), e Declaração deTeresa Cacaj Cahuec de 27 de abril de 1999 (Expediente de prova, folhas 606 a 609).241 Cfr. Declaração de Miguel Sic Osorio e Teresa Cacaj Cahuec de 28 de junho de 1999 (Expediente de prova,folhas 1013 a 1015); Declaração de Susana Pancan de 28 de junho de 1999 (Expediente de prova, folhas 1016 a1017), e Declaração de Pedro Chen Sic de 28 de junho de 1999 (Expediente de prova, folhas 1022 e 1023).242 Cfr. Ofício do Auxiliar do Promotor da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá de 21 de junho de2000 (Expediente de prova, folhas 1099 e 8633).243 Cfr. Ofício do Encarregado do Registro de Vizinhança de Rabinal de 03 de julho de 2000 (Expediente de prova,folha 8628).244 Cfr. Declaração de Pedro Chen Sic de 12 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 733 a 740);Declaração de Máxima Emiliana García Valey de 12 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 748 a 754);Declaração de Miguel Chen Tahuico de 27 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8727 a 8731); Declaração deAna Calate Sic de 27 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8737 a 8740); Declaração de Domingo ChenTahuico de 27 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8741 a 8743); Declaração de Francisca Calate Sic de 27de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8743 a 8744); Declaração de Félix Valey Galiego de 27 de julho de2005 (Expediente de prova, folhas 8745 a 8747), e Declaração de Pedro Sic Gonzalez de 27 de julho de 2005(Expediente de prova, folhas 8748 a 8749).245 Cfr. Declaração de Miguel Sic Osorio de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8750 e 8751);Declaração de Pedro Chen Sic de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8754 e 8755); Declaração deSebastián Chen Tahuico de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8760 a 8762); Declaração de TeresaCacaj Cahuec de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8752 e 8753); Declaração de Susana Pancan de16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8756 e 8757); Declaração de Fabiana Chen Galiego de 16 deagosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8758 e 8759), e Declaração de María Teresa Sic Osorio de 16 de agostode 2005 (Expediente de prova, folhas 8763 e 8766).

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o roubo de animais, bem como foram identificados alguns dos supostos responsáveis.246

Entretanto, não consta nenhuma outra diligência dirigida a esclarecer sua responsabilidade pelomassacre. Não se registra, por exemplo, que alguma das pessoas mencionadas pelosdeclarantes tenha sido chamada a depor. Este ponto será abordado no item B.2 infra.

223. Em quarto lugar, não consta que se tenha realizado diligência alguma para investigar osroubos, estupros e ameaças que, segundo as mencionadas declarações de abril e junho de1999, continuariam cometendo os supostos responsáveis pelo massacre. Além disso, o Tribunalobserva que, em declarações de 14 de setembro de 2005 ao Auxiliar do Promotor da PromotoriaDistrital do Ministério Público de Salamá, tanto a senhora Máxima Emiliana García Valey247 comoa senhora Fabiana Chen Galiego248 se retrataram sobre a participação de pessoas que, emdeclarações anteriores tinham assinalado como responsáveis pelo massacre de 08 de janeiro de1982.

224. Sobre o particular, a Corte lembra que, para a garantia do devido processo, o Estado devefacilitar todos os meios necessários para proteger os operadores da justiça, investigadores,testemunhas e familiares das vítimas de hostilidades e ameaças que tenham como finalidadeperturbar o processo, evitar o esclarecimento dos fatos e encobrir os responsáveis pelosmesmos, pois caso contrário, isso teria um efeito amedrontador e intimidante sobre queminvestiga e sobre quem poderia testemunhar, afetando seriamente a efetividade dainvestigação. Em efeito, as ameaças e intimidações sofridas por testemunhas no processointerno não podem ser vistas isoladamente, mas que devem ser consideradas no marco dascomplicações da investigação do caso, já que tais fatos se convertem em outro meio paraperpetuar a impunidade e impedir que se conheça a verdade sobre o ocorrido.249

225. Em quinto lugar, nos dias 05 de dezembro de 1997, 21 de janeiro e 12 de maio de 2000,Miguel Sic Osorio, Fabiana Chen Galiego e Teresa Cacaj Cahuec solicitaram ao Juiz de PrimeiraInstância da Vara Criminal de Salamá e à Promotoria Distrital de Baja Verapaz,respectivamente, que ordenaram uma perícia sobre o material balístico encontrado em umcemitério clandestino durante a exumação de maio de 1993.250 O Auxiliar do Promotor daPromotoria Distrital enviou as evidências recolhidas para a Subdireção Técnico-Científica do

246 Duas destas pessoas também declararam em 12 de julho de 2005 na Unidade de Assuntos Internos adscrita àPromotoria de Delitos Administrativos. Cfr. Declaração de Miguel Sic Osorio de 12 de julho de 2005 (Expediente deprova, folhas 757 a 761), e Declaração de Domingo Chen Tahuico de 12 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas765 a 767). Não fica claro para o Tribunal por quê se procurou a Unidade de Assuntos Internos adscrita à Promotoriade Delitos Administrativos ou em que momento o processo passou para a Unidade de Casos Especiais e Violações aosDireitos Humanos do Ministério Público.247 A senhora Máxima Emiliana García Valey se apresentou ao Auxiliar do Promotor da Promotoria Distrital doMinistério Público de Salamá para ampliar sua declaração anterior, indicando que “por erro e confusão” tinhamencionado o nome de uma pessoa como suposta responsável pelo massacre na clínica, mas que “ele não esteve lá” eque o mencionou porque “dias antes da matança” esta pessoa tinha estuprado a sua mãe, a senhora Gregoria ValeyIxtecoc. Cfr. Declaração de Máxima Emiliana García Valey, de 14 de setembro de 2005 (Expediente de prova, folhas8773 e 8774).248 A senhora Fabiana Chen Galiego ampliou sua declaração de 27 de abril de 1999, indicando que tinhamencionado o nome de vários supostos responsáveis, mas que um deles tinha sido mencionado por “referência deoutras pessoas, mas que ele não teve nada a ver com o caso e com o massacre na clínica”. Cfr. Declaração de FabianaChen Galiego, de 14 de setembro de 2005 (Expediente de prova, folhas 8775 e 8776).249 Cfr. Caso do Massacre Dois Erres Vs. Guatemala, par. 145, e Caso Quispialaya Vilcapoma Vs. Peru. ExceçõesPreliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 23 de novembro de 2015. Série C N° 308, par. 195.250 Cfr. Petições apresentadas em 05 de dezembro de 1997, 21 de janeiro e 12 de maio de 2000 por Miguel Sic,Fabiana Chen e Teresa Cacaj para constituir-se como demandantes adesivos (Expediente de prova, folhas 589 a 590,595 a 596 e 636 a 645).

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Ministério Público para a perícia correspondente recém em 21 de junho de 2000,251 ou seja, seteanos depois de que foram encontrados ditos objetos e dois anos e meio após a petição inicialdos familiares mencionados. Junto a isto, não consta que se tenha realizado nenhuma diligênciade seguimento em relação com o relatório pericial elaborado pelo Técnico de InvestigaçõesCriminalísticas da Seção de Balística do Ministério Público e enviado para a Promotoria Distritalde Salamá em 05 de julho de 2000.252

226. Em sexto lugar, em junho de 1999, janeiro e maio de 2000 e dezembro de 2005, estaspessoas pediram à Promotoria Distrital de Baja Verapaz que solicitasse ao Ministério de DefesaNacional, um relatório sobre os nomes do Ministro de Defesa Nacional, Chefe do Estado MaiorGeral e demais autoridades militares designadas à zona de Baja Verapaz no ano de 1982;253

entretanto, não há registro de que se tenha dado resposta alguma a estas quatro solicitações,apresentadas durante o curso de seis anos.

227. Em sétimo lugar, o Tribunal nota que, em 09 de setembro de 2002, o Auxiliar do Promotor daPromotoria Especial do Ministério Público solicitou ao Registro Civil da Municipalidade deRabinal, as certificações dos atestados de óbito de 34 pessoas “cujas ossamentas foramencontradas em Chichupac [na] exumação de 06 de junho a 07 de julho de 1993 praticada pela[…FAFG]”.254 Ao respeito, a Corte nota que: i) a exumação iniciou em 06 de maio de 1993 e nãoem 06 de junho como indica a solicitação;255 ii) a lista de pessoas enviada pelo Auxiliar doPromotor ao Registro Civil contém os nomes de 34 pessoas, apesar de que na exumaçãomencionada apenas se recuperaram as ossamentas de 31 pessoas, das quais apenas foramidentificadas sete (supra pars. 91 e 105), e iii) alguns dos nomes que aparecem na lista enviadapelo Auxiliar do Promotor ao Registro Civil não aparecem nos depoimentos ouvidos dentro desteprocesso256 e não é claro para o Tribunal o motivo pelo qual foram incluídos. Outrossim, em 11de novembro de 2002 a Registradora Civil enviou as certificações dos Atestados de Óbitosolicitados, indicando que “a maioria não se encontraram nos livros respectivos”,257 entretanto,não consta nenhuma atuação posterior ao respeito. Tudo isso demonstra uma falta de rigor nainvestigação.

251 Cfr. Ofício do Auxiliar Fiscal da Promotoria Distrital de Salamá de 21 de junho de 2000 (Expediente de prova,folhas 1075 a 1079). Mediante ato de 15 de maio de 2000, o Juiz de Primeira Instância Penal ordenou enviar aevidência ao Ministério Público para a realização das perícias correspondentes (Expediente de prova, folha 582). Ditainformação foi enviada mediante o ofício N°C-255-93 of.40 (Expediente de prova, folhas 1076 a 1078).252 Cfr. Parecer N° BAL-00-0404-mxx do Técnico de Investigações Criminalísticas do Departamento TécnicoCientífico do Ministério Público de 05 de julho de 2000 (Expediente de prova, folhas 578 a 580).253 Cfr. Petições de Miguel Sic Osorio, Fabiana Chen Galiego e Teresa Cacaj Cahuec (Expediente de prova, folhas597 a 605 e 8797 a 8799).254 Cfr. Ofício do Auxiliar do Promotor da Promotoria Especial do Ministério Público de 09 de setembro de 2002(Expediente de prova, folha 506).

255 Cfr. Relatório de Investigações Antropológico Forenses (Expediente de prova, folhas 508 a 574).

256 Assim, por exemplo, não se encontra uma declaração na qual se mencione a morte de Andrea Sical, cujonome aparece na lista mencionada. 257 Cfr. Ofício da Registradora Civil da Prefeitura de Rabinal de 11 de novembro de 2002 (Expediente de prova,folha 479).

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228. Como ponto oitavo, nos meses de outubro de 2000,258 novembro de 2002,259 bem como julhoe agosto de 2005,260 pelo menos 18 pessoas declararam dentro do processo e denunciaram,entre outros, a morte e desaparição dos familiares, o deslocamento forçado, trabalhos forçados,violência e estupros, necessidades e perseguição sofrida, torturas, queima de casas eplantações, e roubo de animais. Não consta que se tenha realizado diligência investigativaalguma em relação aos fatos denunciados. Este ponto será abordado no ponto B.2 infra.

229. Por último, e como nono ponto, não consta atividade investigativa posteriormente a setembrode 2005,261 data em que se receberam diversos depoimentos e, até março de 2011, data apartir da qual se receberam diversos depoimentos em qualidade de antecipação probatória.262

Tampouco consta que se tenha dado seguimento algum à informação relevada em ditasoportunidades.

B.1.1.2. Descumprimento do dever de garantir a participação dos familiares

230. Por outro lado, este Tribunal lembra que, de acordo com o direito reconhecido no artigo 8.1 daConvenção Americana, em relação a seu artigo 1.1, os Estados têm a obrigação de garantir o

258 Cfr. Declaração de María Teresa Sic Osorio de 25 de outubro de 2000 (Expediente de prova, folhas 428 a431); Declaração de Miguel Sic Osorio de 25 de outubro de 2000 (Expediente de prova, folhas 432 a 436); Declaraçãode Pedro Chen Sic de 25 de outubro de 2000 (Expediente de prova, folhas 437 a 442); Declaração de Alberto JuarezBaley de 25 de outubro de 2000 (Expediente de prova, folhas 443 a 446); Declaração de Aurelio Juárez López de 25de outubro de 2000 (Expediente de prova, folhas 447 a 450); Declaração de Sebastián Chen Tahuico de 25 de outubrode 2000 (Expediente de prova, folhas 451 a 453); Declaração de Domingo Chen Tahuico de 25 de outubro de 2000(Expediente de prova, folhas 454 a 458); Declaração de Miguel Chen Tahuico de 25 de outubro de 2000 (Expedientede prova, folhas 459 a 462); Declaração de Máxima Emiliana García Valey de 25 de outubro de 2000 (Expediente deprova, folhas 463 a 469); Declaração de Máxima Sic González de 25 de outubro de 2000 (Expediente de prova, folhas471 a 474). Todos estes depoimentos se referem ao processo número MP-36-00-7 perante dois Auxiliares daPromotoria do Ministério Público na aldeia Chichupac, não assim ao processo N° 255-93-Of.; entretanto, encontram-sedentro da Certificação do Processo N° 001-2005-95839. Nos depoimentos de Domingo Chen Tahuico e Miguel ChenTahuico não há número de processo nem data, mas estão localizados entre os depoimentos de 25 de outubro de 2000.259 Cfr. Declaração de Vicenta Mendoza Alvarado de 15 de novembro de 2002 (Expediente de prova, folhas 475 a478).260 Cfr. Declaração de Pedro Chen Sic de 12 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 733 a 740);Declaração de Máxima Emiliana García Valey de 12 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 748 a 754);Declaração de Miguel Chen Tahuico de 27 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8727 a 8731); Declaração deAna Calate Sic de 27 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8737 a 8740); Declaração de Domingo ChenTahuico de 27 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8741 a 8742); Declaração de Francisca Calate Sic de 27de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 8743 a 8744); Declaração de Félix Valey Galiego de 27 de julho de2005 (Expediente de prova, folhas 8745 a 8747); Declaração de Pedro Sic Gonzalez de 27 de julho de 2005(Expediente de prova, folhas 8748 a 8749); Declaração de Miguel Sic Osorio de 16 de agosto de 2005 (Expediente deprova, folhas 8750 e 8751); Declaração de Pedro Chen Sic de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8754e 8755); Declaração de Sebastián Chen Tahuico de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8760 a 8762);Declaração de Teresa Cacaj Cahuec de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8752 e 8753); Declaraçãode Susana Pancan de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8756 e 8757); Declaração de Fabiana ChenGaliego de 16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8758 e 8759); Declaração de María Teresa Sic Osorio de16 de agosto de 2005 (Expediente de prova, folhas 8763 e 8766); Declaração de Miguel Sic Osorio de 12 de julho de2005 (Expediente de prova, folhas 757 a 761), e Declaração de Domingo Chen Tahuico de 12 de julho de 2005(Expediente de prova, folhas 757 a 761).261 Cfr. Declaração de Máxima Emiliana García Valey de 14 de setembro de 2005 (Expediente de prova, folhas8773 e 8774), e Declaração de Fabiana Chen Galiego de 14 de setembro de 2005 (Expediente de prova, folhas 8775 e8776).262 Cfr. Atas de depoimentos testemunhais de 10 de março, 24 de maio e 05 de agosto de 2011, de Pedro ChenSic, Félix Valey Galiego, Pedro Sic Gonzalez, María Teresa Sic Osorio e Susana Pangan (Expediente de prova, folhas9910 a 9918). Apesar de que nas mencionadas atas se manifeste que os depoimentos e os interrogatórios foram“devidamente registrad[os] em áudio”, não se anexaram as respectivas gravações.

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direito das vítimas ou seus familiares de participar em todas as etapas dos respectivosprocessos, de forma que possam prestar declarações, receber informações, produzir provas,formular alegações e, em síntese, fazer valer seus direitos. Dita participação deverá ter comofinalidade o acesso à justiça, o conhecimento da verdade sobre o acontecido e a concessão deuma justa reparação.263 Em relação a este ponto, a Corte constata que, nos dias 05 dedezembro de 1997264 e 29 de janeiro de 1998265 Miguel Sic Osorio, Fabiana Chen Galiego eTeresa Cacaj Cahuec solicitaram à Vara de Primeira Instância, participar do processo comodemandantes. Entretanto, foi apenas em março de 1999, ou seja, mais de um ano depois daprimeira solicitação, que esta foi resolvida, devido ao extravio do processo No 255/93, dentro doqual se realizou a diligência de exumação de 1993.266 Ao respeito, a Corte considera que ademora de mais de um ano em resolver a solicitação de participar do processo vulnerou odireito de participar no mesmo dos citados familiares. Por outro lado, esta Corte considera queo “extravio” do processo No 255/93 Of. 4º denota por si mesmo uma falta de devida diligênciana investigação.

B.1.1.3. Obstaculização

231. Por último, esta Corte assinalou que as autoridades estatais estão obrigadas a colaborar naobtenção da prova para alcançar os objetivos de uma investigação e abster-se de realizar atosque impliquem obstruções para o andamento do processo investigativo.267 Ao respeito, oTribunal constatou que, perante a solicitação do Juiz de Primeira Instância de 07 de maio de1993268 dos nomes das pessoas que se desempenhavam como representantes militares eajudantes de representantes no município de Rabinal em 1982, bem como informação sobre sefoi designada alguma comissão em 08 de janeiro desse ano, o Comandante de ReservasMilitares respondeu em 09 de maio de 1993, que “durante o ano de 1982 não existiamrepresentantes militares na aldeia, já que essa área era tomada como zona de operações dadelinquência terrorista[,…] assim […] não pode ser nomeada nenhuma comissão em 08 dejaneiro de 1982”.269 Como foi assinalado, segundo a CEH, o município de Rabinal foi consideradopelo Exército como uma área estratégica durante o conflito armado interno, e entre os anos1981 e 1983, grupos militares ou paramilitares assassinaram, pelo menos, 20% da populaçãodo município (supra par. 84). Além disso, foram membros do Exército da Guatemala designadosao destacamento de Rabinal, policiais judiciais e representantes militares, que realizaram omassacre na clínica da aldeia Chichupac em 08 de janeiro de 1982 (supra pars. 89 e 90).

263 Cfr. Caso Valle Jaramillo e outros Vs. Colômbia. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 27 de novembro de2008. Série C N° 192, par. 233, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru, par. 269.

264 Cfr. Petição apresentada em 05 de dezembro de 1997 por Miguel Sic, Fabiana Chen e Teresa Cacaj paraconstituir-se como demandante adesivo (Expediente de prova, folhas 636 a 645). A partir deste ponto, os documentosindicam que é a causa N° 916-97 Of. 4º, mas tudo está dentro da certificação processual N° 001-2005-95839. A partirde que aparece o processo 255-93 Of. 4º, volta-se a identificar a causa com este número.265 Cfr. Petição de Miguel Sic, Fabiana Chen e Teresa Cacaj de 29 de janeiro de 1998 (Expediente de prova, folhas632 e 633).266 Cfr. Resolução do Juiz de Primeira Instância Penal de Narcoatividade e Delitos contra o Ambiente de BajaVerapaz de 30 de março de 1999 e Certificação do Processo N° 001-2005-95839 (Expediente de prova, folhas 619 e620), e Ofício do Juiz de Primeira Instância de 18 de junho de 1998 (Expediente de prova, folha 627).267 Cfr. Caso García Prieto e outros Vs. El Salvador. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 20 de novembro de 2007. Série C N° 168, par. 112, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par.209.

268 Cfr. Ofício do Juiz de Primeira Instância de 07 de maio de 1993 (Expediente de prova, folha 712).

269 Cfr. Ofício do Comandante de Reservas Militares Departamental de 09 de maio de 1993 (Expediente de prova,folha 711).

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Assim, esta negação da existência de representantes miliares na zona no ano de 1982, e dapresença e participação de militares em operações, constituiu uma clara tentativa de ocultar osnomes das pessoas possivelmente responsáveis pelo massacre.

B.1.1.4. Conclusão relativa ao Processo No 001-2005-95839

232. Do anterior se depreende que, no marco da investigação do massacre de 08 de janeiro de1982, o Estado incorreu em uma série de faltas de devida diligência e, pelo menos, umaobstaculização que impediram a investigação efectiva, julgamento e eventual sanção dosresponsáveis.

B.1.2. Processos abertos em relação a fatos ocorridos antes e depois do massacre de08 de janeiro de 1982

233. A partir de uma avaliação dos nove processos abertos em relação aos fatos ocorridos antes edepois do massacre de 08 de janeiro de 1982, o Tribunal verificou o seguinte.

234. Em primeiro lugar, em sete processos não se advertem ações dirigidas à determinação dosresponsáveis pelos fatos. Em dois deles - processo No 811/95 Of. 1º perante a PromotoriaDistrital do Ministério Público de Salamá, no qual se denunciou a desaparição de familiares deMaría Teresa Sic Osorio, Albertina Sic Cuxum e Alejandra Galiego Mendoza,270 entre outros, e oprocesso No 248-2006-169 perante a Promotoria Municipal do Ministério Público de Rabinal, naqual se denunciou o deslocamento forçado da família do senhor Chen Tahuico e a morte de seufilho271 não se registra atividade investigativa alguma. Este Tribunal assinalou que a buscaefetiva da verdade corresponde ao Estado e não depende da iniciativa processual da vítima oude seus familiares, ou do fornecimento privado de elementos probatórios.272 Por isso, a Corteconsidera particularmente problemático que em 15 de agosto de 1995 o Promotor Distrital deSalamá ordenou el arcquivamento do processo No 811-95 Of. 1º devido a que “não aparec[ia]individualizado o imputado”.273 O caso foi arquivado apenas um mês depois da denúnciainterposta em 12 de julho de 1995, sem que se ordenasse uma investigação para determinar osresponsáveis nem localizar as pessoas desaparecidas, entre elas: Lorenzo Depaz Siprian,Leonardo Cahuec Gonzalez, Juan Mendoza Alvarado e José Cruz Mendoza Sucup. Por outraparte, em outros cinco processos,274 as atuações se limitaram à exumação e, em certos casos, à

270 Perante a Procuradoria de Direitos Humanos da Guatemala em Salamá, a senhora María Teresa Sic Osoriodenunciou a desaparição de seu marido, Juan Mendoza Alvarado, e de seu sogro, José Cruz Mendoza; a senhoraAlbertina Sic Cuxum denunciou a desaparição de seu marido, Leonardo Cahuec Gonzales, e a senhora AlejandraGaliego Mendoza denunciou a desaparição de seu marido, Lorenzo De Paz Ciprián. Em 12 de julho de 1995, a referidaProcuradoria levou ao conhecimento da Promotoria Distrital do Ministério Público Salamá as denúncias apresentadas.Cfr. Ampliação da denúncia do Auxiliar Departamental do Procurador de Direitos Humanos perante à PromotoriaDistrital do Ministério Público de Salamá de 12 de julho de 1995 (Expediente de prova, folhas 1351 a 1353).271 Foi aberto este processo a partir da denúncia de 07 de abril de 2006 do senhor Miguel Chen Tahuico perante aPromotoria Municipal do Ministério Público de Rabinal. Também denunciou a “necessidade de enterrar[seu filho] emterreno de [sua] propriedade, já que a perseguição do exército era constante, [e] não pud[eram] enterrá-lo em umcemitério legal”. Cfr. Denúncia de Miguel Chen Tahuico de 07 de abril de 2006 (Expediente de prova, folhas 1555 e1556).272 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito. Sentença de 29 de julho de 1988. Série C N° 4, par.177, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru, par. 176.273 Cfr. Resolução da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá de 15 de agosto de 1995 (Expedientede prova, folha 1398).274 Estes processos são: i) N° 87/97 perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá; ii) Causa N°255-93 Of. 4º (Processo 1083/95 M.P.) perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá; iii) Causa N°247-2003-1142 perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá; iv) Causa N° 248-2010-263 perante a

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entrega de restos a seus familiares, apesar de os familiares terem solicitado outras medidas deinvestigação.275 Não escapa à Corte que, entre os anos 1995 e 2010, foram denunciados nestescinco processos,276 execuções, torturas, estupros, deslocamento forçado, trabalhos forçados edesaparições. O Tribunal se referirá a este ponto no item B.2 infra.

235. Em segundo lugar, este Tribunal registrou demoras de cinco a dez anos na realização dasexumações em cemitérios clandestinos solicitadas pelos familiares das vítimas.277 O anterior,apesar de os familiares assinalarem os lugares onde se encontrariam enterradas as citadaspessoas. Outrossim, os restos do senhor Elías Milián Gonzalez foram entregues para sua filha, asenhora Tarcila Milián, pelo Auxiliar do Promotor da Promotoria Municipal do Ministério Público

Promotoria Municipal do Ministério Público de Rabinal, e v) Processo N° M.P. 247-1997-1378 perante a PromotoriaDistrital do Ministério Público de Salamá.

275 Em janeiro de 1997, a senhora María Concepción García Depaz solicitou ao Promotor Distrital do MinistérioPúblico que se “solicit[ará] ao Ministério de Defesa e/ou a base militar que corresponda [um] relatório sobre o nomedos soldados, oficiais e patrulheiros civis de [El] Chol”, Baja Verapaz. Cfr. Declaração de María García Depaz de 17 dejaneiro de 1997 (Expediente de prova, folhas 1862 e 1863). Não consta resposta nenhuma a esta solicitação.276 Cfr. Denúncia de Víctor Castulo Alvarado Sucup e Rosario Roman Tum de 27 de julho de 1995 (Expediente deprova, folhas 1881 e 1882); Declaração do senhor Víctor Castulo Alvarado Sucup de 11 de agosto de 1995 (Expedientede prova, folhas 1883 e 1884); Declaração da senhora Rosario Román Tum de 11 de agosto de 1995 (Expediente deprova, folhas 1885 e 1886); Declaração de María Concepción García Depaz de 17 de janeiro de 1997 (Expediente deprova, folhas 1862 e 1863); Declaração de Francisca González Tecú de 28 de julho de 1997 (Expediente de prova,folhas 9138 e 9139); Declaração de Juana García Depaz de 26 de julho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1893 a1895); Declaração de Francisco Sic Chen de 26 de julho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1896 e 1897);Declaração de Máxima Emiliana García Valey de 26 de julho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1898 e 1899);Declaração de Tarcila Milián Morales de 27 de julho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1900 e 1901); Declaração deMaría Concepción García Depaz de 27 de julho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1902 e 1903); Declaração deTarcila Milián Morales de 21 de maio de 2003 (Expediente de prova, folhas 11779 e 11780); Declaração de FranciscaGonzález Tecú e Clementina Bachan Cahuec de 8 de maio de 2003 perante o Auxiliar do Promotor da PromotoriaDistrital do Ministério Público de Salamá (Expediente de prova, folhas 9142 e 9143), e Declaração de Carlos ChenOsorio de 16 de abril de 2010 (Expediente de prova, folhas 11933 a 11935).277 Ao respeito, nos meses de maio e junho de 1995, Juana García Depaz, Máxima Emiliana García Valey eFrancisco Sic Chen procuraram o Auxiliar Departamental do Procurador de Direitos Humanos da Guatemala paradenunciar a existência de cemitérios clandestinos localizados na aldeia de Chichupac e solicitaram a exumação doscorpos. Além disso, o senhor Sic Chen mencionou o nome de um patrulheiro civil que assinalou como responsável poreste fato. Esta Procuradoria levou ao conhecimento da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá a denúnciasobre os cemitérios clandestinos. Cfr. Declaração do Auxiliar Departamental do Procurador de Direitos Humanos daGuatemala (Expediente de prova, folhas 1574 a 1577), e Declaração de Juana García Depaz de 9 de maio de 1995(Expediente de prova, folhas 1290 e 1291). Outrossim, em junho de 1995, Juana García Depaz denunciou àPromotoria Distrital do Ministério Público de Salamá a existência de cemitérios clandestinos, solicitou a exumação doscorpos e mencionou os nomes das pessoas que assinalou como responsáveis pelos fatos. Cfr. Declaração de JuanaGarcía Depaz de 9 de junho de 1995 (Expediente de prova, folhas 1263 e 1264).

Estes depoimentos foram reiterados seis anos depois perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá,em julho de 2001, quando novamente se solicitou a realização de exumações. Cfr. Declaração de Juana García Depazde 26 de julho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1893 a 1895); Declaração de Francisco Sic Chen de 26 de julhode 2001 (Expediente de prova, folhas 1896 e 1897), e Declaração de Máxima Emiliana García Valey de 26 de julho de2001 (Expediente de prova, folhas 1898 e 1899).

Do mesmo modo, em agosto de 1995, Víctor Castulo Alvarado Sucup e Rosario Román Tum solicitaram à PromotoriaDepartamental de Salamá, a exumação dos corpos enterrados em fosas clandestinas localizadas em Xeabaj. Cfr.Declaração de Víctor Castulo Alvarado Sucup de 11 de agosto de 1995 (Expediente de prova, folhas 1883 e 1884), eDeclaração de Rosario Román Tum de 11 de agosto de 1995 (Expediente de prova, folhas 1885 e 1886).

Entretanto, também tiveram que reiterar esta solicitação em maio de 2000 e fevereiro de 2002, ou seja, cinco e seteanos depois, perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá. Nesta última ocasião, também solicitaramà Promotoria nomear peritos para a análise dos corpos e oficiar a Polícia Nacional para oferecer segurança durante aexumação. Cfr. Declaração de Víctor Castulo Alvarado Sucup de 99 de maio de 2000 (Expediente de prova, folha

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de Rabinal em 18 de abril de 2012,278 10 meses depois que já tinham sido exumados eidentificados,279 sem que se depreenda do processo a razão da demora. Por outro lado, apesarde que, em abril de 2006, o senhor Miguel Chen Tahuico manifestou à Promotoria do MinistérioPúblico de Rabinal que não pode enterrar seu filho em um cemitério legal devido à “intensaperseguição” que sofreu, e que, além disso, assinalou onde o enterrou e solicitou suaexumação, não se registra que esta solicitação tenha sido atendida.280 De todo o anterior sedepreende que as exumações realizadas foram efetuadas a partir de solicitações e denúnciasfeitas por familiares das vítimas, e que a iniciativa do Estado para a busca e identificação devítimas foi mínima.

236. Ao respeito, a Corte lembra que a passagem do tempo guarda uma relação diretamenteproporcional com a limitação –e, em alguns casos, a impossibilidade- para obter as provas e/outestemunhos, dificultando e ainda tornando ilusória ou ineficaz, a prática de diligênciasprobatórias a fim de esclarecer os fatos materiais da investigação, identificar os possíveisautores e partícipes e determinar as eventuais responsabilidades penais. Apesar disso, asautoridades nacionais não estão eximidas de realizar todos os esforços necessários nocumprimento de sua obrigação de investigar.281

237. Em terceiro lugar, o Tribunal observa que, em fevereiro de 2003, foram entregues as treze282

ossamentas recuperadas na exumação de abril de 2002283 a Francisco Sic e Máxima Emiliana

1890); Declaração de Rosario Román Tum de 09 de maio de 2000 (Expediente de prova, folha 1888), e Petiçãoapresentada pelo senhor Víctor Castulo Alvarado Sucup e pela senhora Rosario Román Tum ao Agente do Promotor daPromotoria Distrital de Baja Verapaz em 14 de fevereiro de 2002 (Expediente de prova, folhas 1913 a 1915).

Em janeiro de 1997 e julho de 2001, a senhora María Concepción García Depaz solicitou a exumação de seu filho,assinalando o lugar onde ele se encontraria sepultado. Cfr. Declaração de María Concepción García Depaz de 17 dejaneiro de 1997 (Expediente de prova, folhas 1862 e 1863); Declaração de María Concepción García Depaz de 27 dejulho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1902 e 1903). Igualmente, em julho de 2001 e setembro de 2003 asenhora Tarcila Milián Morales identificou o lugar onde se encontrariam enterrados seu pai e sua irmã, e solicitou aexumação. Cfr. Declaração de Tarcila Milián Morales de 27 de julho de 2001 (Expediente de prova, folhas 1900 e1901), e Declaração da senhora Tarcila Milián Morales de 24 de setembro de 2003 (Expediente de prova, folhas 11783e 11784). Entretanto, não se ordenou uma exumação dirigida à busca dos familiares das senhoras María ConcepciónGarcía Depaz e Tarcila Milián Morales antes de fevereiro de 2007. Cfr. Resolução do Juiz de Primeira Instância Penal,Narcoatividade e Delitos Contra o Ambiente de Baja Verapaz de 22 de fevereiro de 2007 (Expediente de prova, folhas11827 e 11828). O pai da senhora Milián foi identificado no ano de 2011 (supra par. 107). Cfr. Relatório da FAFG de 27de junho de 2011 (Expediente de prova, folhas 11910 a 11931).Finalmente, foi constado que, em julho de 1997 e maio de 2003, a senhora Francisca González Tecú solicitou aexumação de seus familiares em um cemitério clandestino da aldeia Xeabaj; entretanto, esta exumação se realizouapenas em junho de 2004. Cfr. Declaração de Francisca González Tecú de 28 de julho de 1997 (Expediente de prova,folhas 9138 e 9139); Declaração de Francisca González Tecú e Clementina Bachan Cahuec de 8 de maio de 2003perante o Auxiliar do Promotor da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá (Expediente de prova, folhas9142 e 9143), e relatório da FAFG de 06 de outubro de 2004 (Expediente de prova, folhas 1594, 1640 e 1641).278 Cfr. Ata de entrega da ossada por parte do Auxiliar do Promotor da Promotoria Municipal do Ministério Públicode Rabinal (Expediente de prova, folhas 11949 e 11950).279 Cfr. Relatório da FAFG de 27 de junho de 2011 (Expediente de prova, folhas 11910 a 11931).280 Manifestou que, desde o dia 08 de janeiro de 1982, o Exército “deu início a uma intensa perseguição contra apopulação civil da comunidade de Chichupac”, pelo que teve que escapar da aldeia e ir para as montanhas “junto de[sua] esposa e [seus] quatro filhos menores”. Informou que, em março de 1983, “faleceu [seu] filho Antonio ChenMendoza devido a febres, diarreia e fome” e tiveram a “necessidade de enterrá-lo em terreno de [sua] propriedade, jáque a perseguição do [E]xército era constante, [e] não pud[eram] enterrá-lo em um cemitério legal”. Portanto,solicitou a investigação dos fatos e a exumação dos restos de seu filho. Cfr. Declaração de Miguel Chen Tahuico de 07de abril de 2006 (Expediente de prova, folhas 1555 a 1556).281 Cfr. Caso Anzualdo Castro Vs. Peru, par. 135, e Caso Contreras e outros Vs. El Salvador, par. 145.282 Cfr. Relatório de FAFG de 18 de dezembro de 2002 (Expediente de prova, folhas 2035 a 2037).

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García Valey, apesar de que unicamente duas delas correspondiam a seus familiares.284 A Corterecorda que receber o corpo de uma pessoa falecida é de suma importância para seusfamiliares, já que lhes permite sepultá-lo de acordo com suas crenças, bem como finalizar oprocesso de luto.285 Mesmo tendo Francisco Sic e Máxima Emiliana García Valey se“compromet[ido] a entregar aos outros familiares as ossamentas”,286 a Corte considera que estaera uma obrigação do Estado que não podia ser delegada a terceiros.287

238. Em quarto lugar, não consta no processo perante este Tribunal que se tenha realizado algumadiligência adicional dirigida a identificar as cinco pessoas cujas ossamentas foram exumadas emabril de 2002,288 maio de 2007289 e março de 2013,290 mas não identificadas nas referidasocasiões. Tampouco constam atuações posteriores a esta exumação de março de 2013,realizada no marco do processoNo M.P. 247-1997-1378 perante a Promotoria Distrital doMinistério Público de Salamá, dirigidas a encontrar a Gregorio (ou Gorgonio) Gonzales Gonzales,Gabino Román, Cruz Pérez Amperez, Eustaquio Ixtecoc e Rafael Depaz. E mais, no “ParecerPericial da Investigação Antropológica Forense realizada no Cemitério San Francisco, AldeaChuateguá”, apresentada pela FAFG ao Ministério Público em dezembro de 2014 dentro doreferido processo, não se menciona que se tenha procurado o senhor Dionicio Bachán nasexumações de março de 2012 ou março de 2013, apesar de sua desaparição também ter sidodenunciada em 08 de maio de 2003 no referido processo No M.P. 247-1997-1378.291 Por outro

283 Cfr. Ata de exumação de cadáveres em cemitérios clandestinos emitida pelo Juiz de Paz de Rabinal de 09 a 13de abril de 2002 (Expediente de prova, folhas 1938 a 1941).284 Cfr. Relatório de FAFG de junho de 2011 (Expediente de prova, folhas 2035 a 2037), e Resolução da Auxiliarda Promotoria do Ministério Público de Salamá de 27 de fevereiro de 2003 (Expediente de prova, folhas 1950 e 1951).285 Cfr. Caso Massacre Dos Erres Vs. Guatemala, par. 245, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru, par. 274.

286 Cfr. Resolução da Auxiliar da Promotoria do Ministério Público de Salamá de 27 de fevereiro de 2002(Expediente de prova, folhas 1950 e 1951).287 A Corte também constatou que três ossadas não identificadas foram entregues à senhora Tarcila MiliánMorales “em caráter de depósito”. Cfr. Resolução do Auxiliar do Promotor da Promotoria Distrital do Ministério Públicode Salamá de 16 de outubro de 2008 (Expediente de prova, folha 11845). Por outro lado, os restos de Adela FlorentinaAlvarado García e Luciano Alvarado Xitumul foram entregues à senhora Francisca González Tecú, e os restos de LuciaXitumul Ixpancoc e da recém-nascida de 0 a 3 meses de idade foram entregues ao senhor William Misael IxtecocXitumul. Cfr. Diligência de 22 de setembro de 2005 (Expediente de prova, folha 1583). O Tribunal não conta cominformação relativa a se as pessoas identificadas eram familiares das pessoas que receberam suas ossadas.288 Em 19 de dezembro de 2002, a FAFG apresentou seu relatório de perícia antropológica forense ao Auxiliar doPromotor do Ministério Público de Salamá. Neste relatório, a FAFG indicou que, de acordo com as declaraçõesconstantes no processo e as entrevistas realizadas, a exumação deveria dar conta de doze vítimas. Depois das análisescorrespondentes, a FAFG determinou que foram encontradas 13 ossadas incompletas, das quais identificou apenasquatro pessoas. Em 27 de fevereiro de 2003, foi realizado reconhecimento judicial de ossadas humanas perante o Juizde Paz de Rabinal através do reconhecimento de restos de vestuário e pertences das vítimas por parte dos familiares.Neste ato, foram reconhecidas as ossadas de mais oito pessoas. Apesar de o relatório da FAFG também mencionarRaymunda Sical Corazón como uma das vítimas procuradas, já que teria sido executada junto com Silvestre SicXitumul, ela não foi identificada nem pela FAFG nem por familiares. Cfr. Relatório da FAFG apresentado em 19 dedezembro de 2002 (Expediente de prova, folhas 1968 e 2035 a 2037), e Ata de Reconhecimento Judicial de OssadasHumanas perante o Juiz de Paz de Rabinal em 27 de fevereiro de 2003 (Expediente de prova, folhas 1952 a 1955).289 Cfr. Relatório da FAFG de 27 de fevereiro de 2008 (Expediente de prova, folhas 11861 a 11903), e Ofício daFAFG de 16 de outubro de 2008 (Expediente de prova, folha 11843).290 No Processo N° M.P. 247-1997-1378 perante a Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá constaque, em 22 de dezembro de 2014, o Ministério Público recebeu da FAFG, o “Parecer Pericial da InvestigaçãoAntropológica Forense realizada no Cemitério San Francisco, Aldeia Chuateguá”, indicando que “a investigação foirealizada em duas temporadas, a primeira […em] 07 de março de 2012 com resultado negativo e a segunda em 20 demarço de 2013 com resultado positivo”, já que se encontrou uma ossada humana que não foi identificada. Cfr.Relatório da FAFG de 05 de junho de 2014 (Expediente de prova, folhas 9247, 9250, 9252, 9270 e 9276).291 Cfr. Declaração de Clementina Bachan Cahuec de 08 de maio de 2003 (Expediente de prova, folhas 9142 e9143).

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lado, o Tribunal não conta com informação sobre as ações dirigidas a encontrar Pedro Siana,Casimiro Siana, Juan Pérez Sic, María Concepción Chen Sic, Marcelo Sic Chen, Jorge GaleanoRomán e Enrique Mendoza Sis, todos vítimas de desaparição forçada (supra pars. 148, 156 e160). O Tribunal considera que isso continua agravando a incerteza dos familiares sobre oparadeiro das vítimas, o que afeta seu direito de conhecer o que aconteceu com elas.

239. Em quinto lugar, as primeiras diligências dirigidas à determinação dos responsáveis dentro doprocesso No 802-95 Of. 6º perante a Promotora Distrital do Ministério Público de Salamátiveram lugar em fevereiro de 2010, ou seja, 15 anos depois de apresentadas as denúncias deexecuções, desaparições, detenção arbitrária, trabalhos forçados, bem como estupros, queconstam no mesmo.292 Outrossim, as dez pessoas investigadas pelo Ministério Público a partirdesta data pertenciam às PAC, e não consta que se tenha investigado algum membro doExército guatemalteco,293 apesar de que as denúncias apresentadas também assinalavam aparticipação dos mesmos.294 Por outro lado, apenas se tomou o depoimento de uma daspessoas investigadas,295 duas delas faleceram e não constam diligências adicionais dirigidas alocalizar as demais.296 Nos dias 17 de julho e 04 de outubro de 2013, o Auxiliar do Promotor daPromotoria Distrital informou à COPREDEH que os processos tramitados perante a mesma “seenc[ontravam] em fase de investigação”.297 Não consta na prova perante esta Corte algumaatuação posterior. Este ponto será abordado também no ítem B.2 infra.

240. Em sexto lugar, o Tribunal observa que, dentro do Processo M.P. 247-2006-441, no qual foidenunciada a desaparição de familiares de Juana García Depaz,298 em 18 de julho de 2013 oAuxiliar do Promotor I solicitou ao Juiz de Primeira Instância Penal que se tomasse o

292 Em 09 de maio de 1995, Juana García Depaz apresentou uma denúncia perante o Auxiliar Departamental doProcurador de Direitos Humanos relativa à existência de cemitérios clandestinos localizados na aldeia Chichupac. Em31 de maio de 1995, o Auxiliar Departamental do Procurador levou ao conhecimento da Promotoria Distrital doMinistério Público de Salamá a referida denúncia. Além disso, em 09 de junho de 1995, a senhora García prestoudepoimento na referida Promotoria Distrital. Por sua parte, em 20 de junho de 1995, Máxima Emiliana García Valey eFrancisco Sic Chen apresentaram uma nova denúncia ao Auxiliar Departamental do Procurador sobre a existência doscemitérios clandestinos na referida aldeia. Em 12 de julho de 1995, o Auxiliar Departamental levou ao conhecimentoda mencionada Promotoria Distrital a denúncia apresentada. Cfr. Denúncia de Juana García Depaz de 09 de maio de1995 (Expediente de prova, folhas 1290 e 1291); Declaração de Juana García Depaz de 09 de junho de 1995(Expediente de prova, folhas 1263 e 1264), e Denúncias sobre cemitérios clandestinos apresentadas pelo AuxiliarDepartamental do Procurador de Direitos Humanos de 31 de maio e 12 de julho de 1995 (Expediente de prova, folhas1574 a 1577, e 1259 a 1261).293 Em resposta a um pedido de 20 de janeiro de 2010, em 16 de fevereiro de 2010, o Auxiliar do Promotor daPromotoria Distrital do Ministério Público de Salamá enviou para a COPREDEH, um relatório sobre o conteúdo eavanços dos processos número 247/1995/802 (ou 802-95 Of. 6º), 247/1995/1995, e 247/1995/1085 tramitadosperante o mesmo. Nesse mesmo dia, o Auxiliar do Promotor solicitou ao Chefe da Polícia Nacional Civil que ordenasse“a investigadores sob seu comando [iniciar…] a investigação correspondente a efeitos de poder individualizar” dezsupostos membros das PAC que seriam responsáveis “por ter cometido atos violentos naquela época”. Cfr. Ofício daCOPREDEH de 21 de janeiro de 2010 (Expediente de prova, folha 9011), e Ofício do Auxiliar do Promotor daPromotoria Distrital do Ministério Público de Salamá de 16 de fevereiro de 2010 (Expediente de prova, folhas 8969 a8970 e 8981 a 8987).294 Cfr. Declaração de Juana García Depaz de 09 de maio de 1995 (Expediente de prova, folhas 1290 e 1291);Declaração de Máxima Emiliana García Valey e Francisco Sic Chen de 20 de junho de 1995 (Expediente de prova, folha1574 a 1577); Declaração de Juana García Depaz de 09 de junho de 1995 (Expediente de prova, folhas 1263 e 1264),e Declaração de Juana García Depaz de 8 de fevereiro de 2010 (Expediente de prova, folhas 9003 a 9005).295 Cfr. Declaração de 08 de março de 2010 (Expediente de prova, folhas 8988 a 8992).296 Cfr. Ofício do Subinspetor da PNC, Chefe da Equipe de Investigação da Delegacia 52 de Salamá de 22 dedezembro de 2014 (Expediente de prova, folhas 8976 a 8977).297 Cfr. Ofício do Auxiliar do Promotor da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá de 22 de dezembrode 2014 (Expediente de prova, folhas 9126 e 9127), e Ofício do Auxiliar Fiscal da Promotoria Distrital do MinistérioPúblico de Salamá de 22 de dezembro de 2014, (Expediente de prova, folhas 9132 a 9135).

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depoimento testemunhal daquela em caráter de antecipação de prova, e que esta seconsiderasse “como ato definitivo que, em seu momento, não se poderá reproduzir em debatedevido a idade avançada” da senhora García.299 Entretanto, não consta dentro do processo se oJuiz atendeu esta solicitação. Por outro lado, em março de 2015, ou seja, quase dois anosdepois, o Auxiliar do Promotor I enviou ofício ao Diretor dos Escritórios de Controle Migratório eà Direção Geral do Sistema Penitenciário, consultando se as pessoas: Adrián García Manuel,Hugo García Depaz e o menino Abraham (ou Agapito) Alvarado Depaz tinham saído do Estadoou tinham sido detidos entre os anos 1980 e 1990.300 Dado que no ano de 2008 foramidentificados os restos de Hugo García Depaz e Abraham Alvarado Depaz, não há clareza sobreas razões pelas quais se solicitou esta informação (supra pars. 100, 149 e 155). Por outro lado,não constam no processo atuações posteriores dirigidas a encontrar os restos do senhor AdriánGarcía Manuel nem determinar seu paradeiro.

241. Em sétimo lugar, no processo No M.P. 247-1997-1378 perante a Promotoria Distrital doMinistério Público de Salamá, constam lapsos de um a cinco anos sem atividade investigativaalguma.301 Além disso, não consta que se tenha investigado a denúncia por parte da senhoraFrancisca González Tecú de que, em janeiro de 2010, alguém lhe ofereceu dinheiro para retirarsua denúncia contra uma pessoa que tinha assinalado como responsável pela morte de seupai.302

242. Em relação a estes pontos, a Corte informou que não lhe compete substituir a jurisdiçãointerna, estabelecendo as modalidades específicas de investigação e julgamento em um casoconcreto para obter um melhor ou mais eficaz resultado, mas constatar se, nos passosefetivamente dados em nível interno, foram violados ou não obrigações internacionais do

298 Cfr. Declaração MP247/2006/648 de Juana García Depaz de 13 de junho de 2006, (Expediente de prova,folhas 1404 e 1405).299 Cfr. Petição do Auxiliar do Promotor Um da Promotoria Municipal do Ministério Público de Rabinal de 18 dejulho de 2013 (Expediente de prova, folhas 11757 a 11760).300 Cfr. Ofícios do Auxiliar do Promotor I do Ministério Público de Rabinal de 20 e 26 de março de 2015(Expediente de prova, folhas 11735 e 11737). A Subdireção de Controle Migratório da Direção Geral de Migração, em26 de março de 2015, indicou que nenhuma das 3 pessoas registram movimentos migratórios. Cfr. Ofício daSubdireção de Controle Migratório da Direção Geral de Migração dirigido a Auxiliar do Promotor I do Ministério Públicode Rabinal, Baja Verapaz de 26 de março de 2015 (Expediente de prova, folhas 11753 a 11756).301 Constam tais lapsos entre: i) setembro de 2005 e janeiro de 2010; ii) outubro de 2010 e outubro de 2011; iii)outubro de 2011 e dezembro de 2012, e iv) março de 2012 e março de 2013. Em 22 de setembro de 2005, a FAFGentregou ao Auxiliar do Promotor cinco recipientes contendo seis ossadas incompletas e, nesse mesmo dia, os restosforam entregues para a senhora Francisca González Tecú e para o senhor William Misael Ixtecoc Xitumul. Nos dias 11de janeiro, 14 de junho e 26 de outubro de 2010, a senhora González Tecú se apresentou ao Auxiliar do Promotor paradepor novamente. Em 08 de dezembro de 2012, o Juiz de Primeira Instância Penal autorizou a diligência de exumaçãodo cadáver do senhor Gorgonio Gonzalez, solicitada pelo Auxiliar do Promotor em 26 de outubro de 2011. Em 12 demarço de 2012, a senhora González Tecú manifestou ao Auxiliar do Promotor que, na exumação realizada em 07 demarço de 2012, “não se encontrou nada” e pediu que se solicitasse novamente ao Juiz respectivo à autorização paraescavar em três pontos que ela recordava dentro do mesmo lugar e, assim, encontrar o cadáver de seu pai. Em 22 dedezembro de 2014, o Ministério Público recebeu da FAFG, o “Parecer Pericial da Investigação Antropológica Forenserealizada no Cemitério San Francisco, Aldeia Chuateguá”. Cfr. Ofício da FAFG de 22 de setembro de 2005 (Expedientede prova, folha 1581); Declaração de Francisca González Tecú de 26 de outubro de 2010 (Expediente de prova, folha9232); Declaração de Francisca González Tecú de 11 de janeiro de 2010 (Expediente de prova, folhas 9243 e 9244);Declaração de Francisca González Tecú de 22 de dezembro de 2014 (Expediente de prova, folha 9245); Petição doAuxiliar do Promotor da Promotoria Distrital do Ministério Público de Salamá de 26 de outubro de 2012 (Expediente deprova, folhas 9130 e 9231); Declaração de Francisca González Tecú de 12 de março de 2012 (Expediente de prova,folha 9204), e Relatório de FAFG de 05 de junho de 2014 (Expediente de prova, folhas 9247, 9250, 9252, 9270 e9276).302 Cfr. Declaração de Francisca González Tecú de 11 de janeiro de 2010 (Expediente de prova, folhas 9243 e9244).

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Estado derivadas dos artigos 8o e 25 da Convenção Americana.303 Entretanto, no presente caso,do detalhado anteriormente se depreende que as atuações de investigação em relação aos fatosocorridos antes e depois do massacre de 08 de janeiro de 1982 foram tardias e incompletas,constituindo uma falta de devida diligência na investigação dos mesmos.

B.2. Falta de investigação de graves violações de direitos humanos

243. A Corte destaca que os fatos do presente caso se referem a desaparições forçadas edeslocamento forçado (supra pars. 160 e 203), bem como a denúncias sobre execuções, atosde tortura, violência e estupros, e trabalhos forçados, entre outros (supra pars. 222, 228, 234 e239), tudo isso dentro de um contexto de violações graves, massivas e sistemáticas dos direitoshumanos na Guatemala (supra pars. 76 a 81). Estes fatos foram colocados em conhecimentodo Estado em diversas oportunidades a partir do ano de 1993. Entretanto, como já assinalado,não foram investigados devidamente e, em alguns casos, inclusive, não se realizou investigaçãoalguma em torno aos mesmos (supra pars. 218 a 241).

244. O Tribunal estima que a falta de investigação das desaparições forçadas, execuçõesextrajudiciais, trabalhos forçados, torturas e violência sexual em conflitos armados e/ou dentrode padrões sistemáticos, como os ocorridos e denunciados no presente caso, constituem umdescumprimento das obrigações do Estado frente a graves violaçõesa direitos humanos, asquais contravêm normas inderogáveis e geram obrigações para os Estados304 como a deinvestigar e sancionar ditas práticas, de acordo com a Convenção Americana e, neste caso, àluz da CIDFP, a CIPST e a Convenção de Belém do Pará.

245. Neste mesmo sentido, a Corte lembra que a própria Lei Reconciliação Nacional (LRN) daGuatemala305 estabelece em seu artigo 8o que “a extinção da responsabilidade penal [pordeterminados delitos cometidos durante o conflito armado interno] a que se refere esta lei, nãoserá aplicável aos delitos de genocídio, tortura e desaparição forçada, asim como aquelesdelitos que sejam imprescritíveis ou que não admitam extinção daresponsabilidade penal, deconformidade com o direito interno ou os tratados internacionais ratificados pela Guatemala”.

246. Em relação a este ponto, não consta no acervo provatório que se tenha aplicado a LRN nosprocessos iniciados no presente caso. Não obstante, o Estado alegou que, na investigação ejulgamento dos fatos do caso, não seriam aplicáveis os tipos penais de desaparição forçada etortura, posto que ditos delitos não se encontravam tipificados em sua legislação para omomento em que ocorreram os fatos.

247. Ao respeito, de acordo com sua vasta e reiterada jurisprudência sobre a obrigação deinvestigar, julgar e, segundo o caso, sancionar, a Corte estabeleceu que são inadmissíveis asdisposições de anistia, as disposições de prescrição, bem como outras pretensas excludentes deresponsabilidade que na verdade sejam pretexto para impedir a investigação de violaçõesgraves dos direitos humanos.306

303 Cfr. Caso Nogueira de Carvalho e outro Vs. Brasil. Exceções Preliminares e Mérito. Sentença de 28 denovembro de 2006. Série C N° 161, par. 80, e Caso Velásquez Paiz e outros Vs. Guatemala. Exceções Preliminares,Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 19 de novembro de 2015. Série C N° 307, par. 169.304 Cfr. Caso Goiburú e outros Vs. Paraguai, par. 131.305 Disponível em: http://old.congreso.gob.gt/archivos/decretos/1996/gtdcx145-1996.pdf.

306 Cfr. 12 Casos Guatemaltecos. Supervisão de Cumprimento de Sentença. Resolução da CorteInteramericana de Direitos Humanos de 24 de novembro de 2015, considerando 145, e Caso Trabalhadores da

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248. Em particular, este Tribunal já assinalou que, em sua jurisprudência, conheceu casos em que afalta em um início da tipificação do delito autônomo de desaparição forçada de pessoas nãoobstaculizou o desenvolvimento de processos penais em nível interno, pelo que não resultouper se em uma violação das obrigações convencionais estatais (supra par. 136). O anterior nãoobsta que o Estado investigue com base no delito de desaparição forçada naqueles casos nosquais não se determinou o paradeiro da pessoa desaparecida ou não se identificaram seusrestos para a data em que entrou em vigor a tipificação do referido delito, em 1996. Nestescasos, a conduta delitiva continua e, portanto, o tipo penal resulta aplicável. A Corte jáestabeleceu que a aplicação do tipo penal de desaparição forçada sob os supostos assinaladosnão vulnera o princípcio de legalidade, nem implica uma aplicação retroativa da norma penal.307

249. Por outro lado, os representantes e a Comissão alegaram que os fatos do presente casoconstituem atos de genocídio, enquanto a Guatemala alegou que dito delito não seria aplicávelaos fatos do caso, “dado que o enfrentamento guatemalteco não se originou como conflito decaráter inter-étnico”.

250. Nesta Sentença já se estabeleceu que a Corte não tem competência temporal parapronunciar-se sobre uma grande parte dos fatos e as violações de direitos humanos alegadaspela Comisión e os representantes (supra par. 24). Por este motivo, o Tribunal não conta comos elementos para realizar uma qualificação como a solicitada pela Comissão e pelosrepresentantes, no caso de ser procedente.308 Mesmo assim, a Corte lembra que a Guatemalaratificou a Convenção para a Prevenção e a Sanção do Delito de Genocídio (CPSDG) em 13 dejaneiro de 1950, ou seja, anteriormente aos fatos do presente caso. O Artigo I do referidotratado obriga as Partes contratantes a sancionar este delito.309

251. Outrossim, neste caso já se estabeleceu que, sob a “Doutrina de Segurançad Nacional” (1978-1983), o Exército identificou, entre outros, os membros do povo indígena maia como “inimigointerno”, por considerar que constituíam ou podiam constituir a base social da guerrilha (suprapars. 77 e 84). Como já foi assinalado, em seu Relatório Final de junho 1999, a CEH explicouque a identificação entre as comunidades maias e a insurgência, e a violência e indiscriminaçãocom que se realizavam as “operações militares contra centenas de comunidades maias no oestee noroeste do país, particularmente entre 1981 e 1983”, apoiou-se em tradicionais preconceitosraciais. Junto a isto, considerando os massacres realizados nas aldeias de Plan de Sánchez, RíoNegro e Chichupac, entre outras, a CEH sustentou que:

“o conjunto de violações de direitos humanos perpetradas pelo Estado contra a população maia-achí duranteos anos de 1980-1983 permite concluir que se cometeram atos de genocídio inspirados por umadeterminação estratégica que também revistiu caráter genocida, por quanto o objetivo da campanha militarrealizada na área de Rabinal foi a destruição parcial do povo maia-achí, como requisito necessário para

Fazenda Brasil Verde Vs. Brasil, pars. 454 e 455.307 Cfr. Caso Chitay Nech e outros Vs. Guatemala. Supervisão de Cumprimento de Sentença. Resolução da CorteInteramericana de Direitos Humanos de 22 de agosto de 2013, considerando 11, e 12 Casos Guatemaltecos .Supervisão de Cumprimento de Sentença. Resolução da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 24 denovembro de 2015, considerando 149.308 Ao respeito, a Corte esclarece que, nos casos Massacre Plan de Sánchez e Massacres do Rio Negro, nãorejeitou per se a possibilidade de recorrer à qualificação jurídica de genocídio no marco de sua jurisdição contenciosapara declarar violações da Convenção Americana, mas limitou sua análise jurídica às circunstâncias concretas de cadacaso. Cfr. Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 29 de abril de 2004. Série C N° 105,par. 51, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 234.309 O Artigo I da CPSDG dispõe: “As Partes contratantes confirmam que o genocídio, tanto cometido em tempo depaz ou em tempo de guerra, é um delito de direito internacional que elas se comprometem a prevenir e sancionar”.

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manter absoluto controle sobre uma área militarmente estratégica e separar a guerrilha de sua suposta basesocial. […] Esta percepção de equivalência de identidade entre a população maia-achí de Rabinal e aguerrilha, conduziu, em um momento do enfrentamento, a uma campanha orientada à aniquilação parcial do

povo maia-achí de Rabinal, que se encontrava em total estado de desamparo”.310

252. A Corte lembra que os casos Massacre Plan de Sánchez e Massacres de Río Negro, ambosconhecidos por este Tribunal, também se referem a massacres, execuções, estupros e torturas,entre outros, que tiveram lugar na primeira metade da década de 1980 no marco do conflitoarmado interno guatemalteco, todos estes contra membros do povo maia-achi, entre eles,meninas, meninos, mulheres e homens que residiam em aldeias e comunidades do município deRabinal, e atribuídos a membros das forças de segurança do Estado. No caso do Massacre dePlan de Sánchez, se denunciou a comissão de diversos delitos, entre eles: genocídio, em junhode 1997.311

253. Neste contexto, consta que, em 02 de setembro de 1996, o Procurador de Direitos Humanosditou uma resolução relacionada com os cemitérios clandestinos localizados nas aldeias de Plande Sánchez, Río Negro e Chichupac, entre outras, na qual indicou que as matanças cometidasnos referidos lugares não eram isoladas e constituíam crimes contra a humanidade, assinalandocomo responsáveis “em forma direta as autoridades civis e militares que na data de execuçãodos atos, exercia[m] funções de jurisdição no lugar dos fatos”, assim como “os governos daRepública da data em que sucederam os fatos e aos Ministros da Defesa Nacional e de Governodessas administrações”. Também recomendou ao Promotor Geral da Nação “uma severa, rápidae continuada investigação e seguimento destes gravíssimos fatos, até a punição dosresponsáveis”.312

254. Por outro lado, nos dias 25 de outubro de 2000 e 12 de julho de 2005, o senhor Miguel SicOsorio foi até a Unidade de Assuntos Internos adscrita à Promotoria de DelitosAdministrativos313 e declarou que “os patrulheiros e representantes militares […] pordiscriminação queriam acabar conosco porque disseram que queriam acabar com os índios”.Também manifestou que “[a]té antes do massacre havia pessoas que praticavam a religião Maiae com o massacre mataram todos os sacerdotes Maias”.314 Além disso, a Corte destaca que em18 de julho de 2013 o Auxiliar do Promotor I da Promotoria Municipal do Ministério Público deRabinal assinalou ao Juiz de Primeira Instância Penal de Narcoatividade e Delitos contra o MeioAmbiente que os fatos denunciados pela senhora Juana García Depaz incluiam “delitos contra ahumanidade”.315 No mesmo sentido, dentro do processo M.P. 247/1999/492 com Causa 255-93

310 CEH, Memória do Silêncio, Capítulo XXI, folhas 375 e 376.311 Cfr. Caso Massacre Plan de Sánchez Vs. Guatemala. Mérito, par. 42.

312 Resolução do Procurador dos Direitos Humanos de 02 de setembro de 1996 (Expediente de prova, folhas 1869a 1879).313 Não fica claro para o Tribunal por quê se procurou a Unidade de Assuntos Internos adscrita à Promotoria deDelitos Administrativos ou em que momento o processo passou para a Unidade de Casos Especiais e Violações aosDireitos Humanos do Ministério Público.314 Declaração do senhor Miguel Sic Osorio perante a Unidade de Assuntos Internos adscrita à Promotoria deDelitos Administrativos em 12 de julho de 2005 (Expediente de prova, folhas 757 a 761), e Declaração de Miguel SicOsorio de 25 de outubro de 2000 (Expediente de prova, folhas 432 a 436).315 Cfr. Petição do Auxiliar do I Promotor da Promotoria Municipal do Ministério Público de Rabinal de 18 de julhode 2013 (Expediente de prova, folha 11758). Na referida petição se encontra a referência N° MP248-2006-441. Existeinconsistência em relação ao número deste processo. Consta no acervo probatório que se denunciou a desaparição defamiliares de Juana García Depaz dentro do Processo M.P. 247-2006-441, através da Denúncia MP247/2006/648 deJuana García Depaz de 13 de junho de 2006 (Expediente de prova, folhas 1404 e 1405). Na petição de solicitações eargumentos se assinala que o Processo do Ministério Público 648-2006/441 da Promotoria Municipal de Rabinal se

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Of. 4º, consta um ofício do Auxiliar do Promotor do Ministério Público de Baja Verapaz dirigido àPromotoria da Unidade de Casos Especiais e Violações de Direitos Humanos, de 14 de junho de2006, por meio do qual se envia o processo “que faz referência ao genocídio cometido na Aldeiade Chichupac [M]unicípio de Rabinal […]”.316

255. Do anterior, se depreende que, pelo menos desde o ano de 1996, o Estado tinhaconhecimento de que existiam possíveis crimes contra a humanidade no Município de Rabinal, epelo menos desde junho de 1999, data em que a CEH publicou seu Relatório Final, tinhaconhecimento de que os fatos cometidos neste caso possivelmente foram motivados porconceitos racistas e/ou constituíram atos de genocídio. Portanto, o Estado tinha a obrigação deinvestigar os fatos do caso considerando estas alegações, mas não consta da prova que istotenha sido feito, apesar de o Tribunal ter solicitado ao Estado esta informação. Deste modo, aGuatemala não pode alegar que “não seria aplicável o delito de genocídio aos fatos do caso”,sem constar que se tenha realizado uma investigação em relação a este aspecto a fim deesclarecer os fatos e determinar as responsabilidades correspondentes.

256. Finalmente, em relação à falta de investigação dos estupros cometidos por agentes desegurança do Estado no presente caso, a Corte considera que toda vez que existirem indícios deviolência sexual no marco de um conflito armado interno, esta não deve ser tratada como umdelito colateral, mas sua investigação deve fazer parte de cada etapa da estratégia global deinvestigação de possíveis torturas, crimes contra a humanidade, crimes de guerra ou atos degenocídio que possam ter sido cometidos.317 A investigação de violência sexual deverá serrealizada respeitando as características culturais das vítimas. Por outro lado, se deverãoinvestigar possíveis vínculos entre os responsáveis diretos da violência sexual e seus superioreshierárquicos, bem como a existência de componentes que demonstrariam uma intençãodiscriminatória e/ou a intenção de cometer genocídio.318

trata da “desaparição de Adrián Garcia Manuel, Hugo Garcia de Paz e Abraham Alvarado Tecú”. Entretanto, não seproporciona mais informação ao respeito. No relatório da FAFG se menciona que este caso está registrado sob oprocesso 247-2006-44 M.P.316 Cfr. Ofício do Auxiliar do Promotor do Ministério Público de Baja Verapaz de 14 de junho de 2006 (Expedientede prova, folha 8806).317 Este Tribunal assinalou reiteradamente que a violência sexual perpetrada por agentes do Estado podeconstituir tortura. Cfr. Caso Fernández Ortega e outros Vs. México. Exceção Preliminar, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 30 de agosto de 2010. Série C N° 215, par. 128, Caso Rosendo Cantú e outra Vs. México. ExceçãoPreliminar, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 31 de agosto de 2010. Série C N° 216, par. 118 e Caso EspinozaGonzáles Vs. Peru. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 20 de novembro de 2014. Série CN° 289, pars. 195 e 196. Por outro lado, a violência sexual pode, em determinadas circunstâncias, constituir crime deguerra, crime contra a humanidade ou constituir ato de genocídio. Cfr. Artigo 3o, comum aos quatro Convênios deGenebra, ratificados pela Guatemala em 14 de maio de 1952; artigo 4.2.e do Protocolo II adicional aos Convênios deGenebra de 1949 relativo à proteção das vítimas de conflitos armados sem caráter internacional, assinado pelaGuatemala em 12 de dezembro de 1977 e ratificado em 19 de outubro de 1987; artigo 7(1)(g) do Estatuto da CortePenal Internacional; artigo 5o do Estatuto do TPI; artigo 3 o do Estatuto do TPIR; ICTR, Trial Ch I. Prosecutor v.Akayesu, Jean-Paul. Judgment, Sep. 2, 1998. pars. 505-509 y 516; Trial Ch I. Prosecutor v. Musema, Alfred.Judgment, En. 27, 2000. pars. 908 y 933 (884-936); ICTY, Trial Ch. Prosecutor v. Radovan Karadžić y Ratko Mladić.Review of the indictments pursuant to rule 61 of the rules of procedures and evidence, Jul. 11, 1996. par. 93; ICTY,Trial Ch. Prosecutor v. Radislav Krstić. Judgment, Aug. 2, 2001. par. 509; Assembleia Geral das Nações Unidas,Resolução 50/192, Agressão e estupro de mulheres nas zonas de conflito armado da ex Iugoslávia . A/RES/50/192,22de dezembro de 1995, p. 3; Conselho de Segurança das Nações Unidas, Women and Peace and Security. UN DocS/PRST/2007/5, 7 de março de 2007, folha 02.; Relatório do Secretário Geral de acordo com a Resolução 1820 doConselho de Segurança de 15 de julho de 2009. par. 22., e ICRC, Rule 93.

318 Neste sentido, ver: Cfr. CPI, Situation in the Central African Republic in the case of the Prosecutor v. Jean-Pierre Bemba Gombo, 21 de março de 2016, Seção VI, (B) e (F), pars. 634 a 638 e 693 a 741; CPI Policy Paper onSexual and gender-based crimes, junho de 2014, págs . 17, 25, 26 e 43. Disponíveis em: https://www.icc-cpi.int/CourtRecords/CR2016_02238.PDF e https://www.icc-cpi.int/iccdocs/otp/OTP-Policy-Paper-on-Sexual-and-

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257. Pelo anterior, a Corte considera que o Estado descumpriu sua obrigação de investigar asgraves violações de direitos humanos ocorridas e/ou alegadas no presente caso, inclusive oalegado cometimento de violência e estupro, trabalhos forçados, torturas, crimes contra ahumanidade, crimes de guerra e atos de genocídio.

258. Ora, a Comissão alegou que o Estado violou o artigo 24 da Convenção Americana ao abster-sede investigar o padrão de discriminação racial que permitiu a perseguição do povo indígenamaia. Ao respeito, em casos anteriores, a Corte estabeleceu violações ao artigo 24 daConvenção quando se constatou uma vulneração ao acesso à justiça com base em critériosdiscriminatórios.319 Entretanto, neste caso, a Comissão não alegou fatos concretos dediscriminação no marco das investigações que constituíssem obstáculos para que os familiaresdas vítimas tivessem acesso à justiça por pertencerem ao povo indígena maia. Deste modo, aCorte não conta com elementos suficientes para pronunciar-se sobre esta alegada violação.

B.3. Direito a conhecer a verdade e prazo razoável

259. Em relação à celeridade do processo em geral, este Tribunal assinalou que o “prazo razoável”ao qual se refere o artigo 8.1 da Convenção deve ser apreciado em relação com a duração totaldo procedimento que se desenvolve até a prolatação da sentença definitiva. O direito de acessoà justiça implica que a solução da controvérsia se produza em tempo razoável, já que umademora prolongada pode chegar a constituir, por ela mesma, uma violação das garantiasjudiciais.320 Nesse sentido, a Corte usualmente considerou os seguintes elementos paradeterminar a razoabilidade do prazo: a) complexidade do assunto; b) atividade processual dointeressado; c) conduta das autoridades judiciais, e d) afetação gerada na situação jurídica dapessoa envolvida no processo. Entretanto, neste caso transcorreram, aproximadamente, 34anos desde que ocorreu o massacre da clínica da aldeia de Chichupac, entre 30 e 35 anosaproximadamente desde que ocorreram os demais fatos do caso e mais de duas décadas desdeque se receberam as primeiras denúncias, sem que nenhuma das investigações analisadasneste capítulo tenha superado a etapa investigativa. Ou seja, o caso se encontra em totalimpunidade e, portanto, a Corte considera evidente que a investigação não tenha ocorridodentro de um prazo razoável.

Gender-Based-Crimes--June-2014.pdf; ICTR, Prosecution of Sexual Violence. Lessons Learned from the Office of theProsecutor for the International Criminal Tribunal for Rwanda, 30 de janeiro de 2014, folhas 8 a 24, 28 a 32, 37.Disponível em: http://w.unictr.org/sites/unictr.org/files/legal-library/140130_prosecution_of_sexual_viole nce.pdf .

319 Por exemplo, nos casos Fernández Ortega e Rosendo Cantú, ambos contra o México, se concluiu que a faltade um intérprete que permitisse uma adequada participação das vítimas em seus próprios casos constituiudiscriminação no acesso à justiça. No caso Tiu Tojín Vs. Guatemala, a Corte considerou que, para garantir o acesso àjustiça das vítimas -membros do povo indígena maia- sem discriminação, o Estado devia assegurar que as referidasvítimas pudessem compreender e expressar-se nos procedimentos legais iniciados, facilitando a elas intérpretes ououtros meios eficazes para tal finalidade. Outrossim, nos casos Espinoza Gonzáles Vs. Peru, e Veliz Franco e outros, eVelásquez Paiz, contra a Guatemala, a Corte constatou que a falta de investigação da violência sofrida pelas vítimasdos referidos casos foi em decorrência da utilização, por parte dos operadores da justiça, de estereótiposdiscriminatórios. Cfr. Caso Fernández Ortega e outros Vs. México, par. 201; Caso Rosendo Cantú e outra Vs. México,par. 185; Caso Tiu Tojín Vs. Guatemala. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 26 de novembro de 2008. Série CN° 190, par. 100; Caso Espinoza Gonzáles Vs. Peru, pars. 272 e 278; Caso Veliz Franco e outros Vs. Guatemala.Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 19 de maio de 2014. Série C N° 277, par. 212 e 213,e Caso Velásquez Paiz e outros Vs. Guatemala, pars. 177, 183, 186 a 189.

320 Cfr. Caso Hilaire, Constantine e Benjamin e outros Vs. Trinidad e Tobago. Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 21 de junho de 2002. Série C N° 94, par. 145, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru, par. 237.

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260. Por outro lado, este Tribunal determinou que toda pessoa, inclusive os familiares das vítimasde graves violações aos direitos humanos, tem o direito de saber a verdade. Em consequência,os familiares das vítimas e a sociedade devem ser informados de todo o sucedido em relação àsreferidas violações.321 Apesar de o direito a saber a verdade ter sido embasadofundamentalmente no direito de acesso à justiça,322 ele tem uma natureza ampla e suavulneração pode afetar distintos direitos consagrados na Convenção Americana,323 dependendodo contexto e das circunstâncias particulares do caso.

261. A Corte considerou o conteúdo do direito a saber a verdade em sua jurisprudência,particularmente em casos de desaparição forçada, já que o direito a saber o paradeiro dasvítimas desaparecidas constitui um componente essencial do direito a saber a verdade.Entretanto, até hoje ainda se desconhece o paradeiro das pessoas desaparecidas e, como foiassinalado, existem restos recuperados durante as exumações que ainda não foramidentificados (supra par. 147). Em virtude das considerações anteriores, a Corte declara aviolação do direito a saber a verdade, em prejuízo dos familiares das vítimas de desapariçãoforçada. Neste caso, como em outros, a referida violação se baseia no direito de acesso àjustiça.

B.4. Conclusões

262. A Corte considera que, de acordo com a Convenção Americana, vigente ao momento dosmassacres, o Estado tinha a obrigação de investigar com a devida diligência todos os fatos dopresente caso, obrigação que se encontrava pendente ao momento do reconhecimento dacompetência contenciosa da Corte em 09 de março de 1987. A referida obrigação foi reafirmadapelo Estado com motivo do depósito do instrumento de ratificação da ConvençãoInteramericana para Prevenir e Sancionar a Tortura, a Convenção de Belém do Pará, aConvenção Interamericana sobre Desaparição Forçada de Pessoas e a Convenção para aPrevenção e a Sanção do Delito de Genocídio (supra pars. 215 e 250), pelo que o Estado deviavelar por seu cumprimento a partir do momento no qual as ratificou.

263. A mais de 30 anos de sucedidos os fatos e 23 anos das primeiras denúncias (supra par. 259),as investigações abertas em relação aos fatos deste caso permanecem em etapa deinvestigação, se constatam demoras prolongadas e omissões na reunião de provas e, namaioria dos processos examinados, não se observam ações dirigidas a determinar os

321 Cfr. Caso Trujillo Oroza Vs. Bolívia. Reparações e Custas. Sentença de 27 de fevereiro de 2002. Série C N° 92,par. 100, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru, par. 243.322 Cfr. Ver inter alia, Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 181; Caso Bámaca Velásquez Vs.Guatemala. Mérito. Sentença de 25 de novembro de 2000. Série C N° 70, par. 201; Caso Barrios Altos Vs. Peru.Mérito. Sentença de 14 de março de 2001. Série C N° 75, par. 48; Caso Almonacid Arellano e outros Vs. Chile, par.148; Caso La Cantuta Vs. Peru. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 29 de novembro de 2006. Série C N° 162,par. 222; Caso Heliodoro Portugal Vs. Panamá. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 12 deagosto de 2008. Série C N° 186, pars. 243 e 244, e Caso Kawas Fernández Vs. Honduras. Mérito, Reparações eCustas. Sentença de 3 de abril de 2009. Série C N° 196, par. 117.323 Nesse sentido, em seu estudo sobre o direito a saber a verdade, o Alto Comissariado das Nações Unidas paraos Direitos Humanos afirmou que distintas declarações e instrumentos internacionais reconheceram o direito a saber averdade vinculado ao direito a obter e solicitar informação, o direito à justiça, o dever de combater a impunidadefrente às violações aos direitos humanos, o direito a um recurso judicial efetivo e o direito à vida privada e familiar.Além disso, em relação com os familiares das vítimas, foi vinculado ao direito à integridade dos familiares da vítima(saúde mental), o direito de obter uma reparação em casos de graves violações aos direitos humanos, o direito a nãoser objeto de tortura nem maus tratos e, em certas circunstâncias, o direito das crianças de receber uma proteçãoespecial. Cfr. Relatório do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Estudo sobreo direito à verdade, U.N. Doc. E/CN.4/2006/91 de 09 de janeiro de 2006.

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responsáevis pelos fatos, ou melhor, apenas se realizaram indagações relativas aos membrosdas PAC, sem que se tenha investigado algum membro do exército guatemalteco. Isto apesarde, em reiteradas oportunidades, ter sido denunciada a participação destes últimos nos fatos ede os denunciantes fornecerem os nomes dos supostos responsáveis e os lugares ondepoderiam ser encontrados. Assim, o Tribunal estima que a investigação, perseguição, captura,julgamento e eventual sanção dos responsáveis pelos fatos do caso cometidos contra osmembros da aldeia de Chichupac e comunidades vizinhas do município de Rabinal, incluindo osautores materiais e intelectuais, não foi dirigida eficazmente, com a devida diligência e dentrode um prazo razoável de modo que se examinem de forma completa e exaustiva amultiplicidade de graves violações aos direitos humanos ocasionadas ou alegadas, dentro doparticular contexto no qual sucederam. Por outro lado, as investigações tampouco foramencaminhadas para a localização de todas as vítimas desaparecidas, nem foram devida eoportunamente identificados todos os restos encontrados nas diversas exumações realizadas;reitera-se, a partir do impulso procesual dos familiares das vítimas. Tudo isso vulnerou,particularmente, o direito à verdade dos familiares das vítimas desaparecidas.

264. Este Tribunal assinalou que a “Guatemala tem um problema grave em relação à impunidadeque impera no país, especificamente relativo a violações sistemáticas dos direitos humanosocorridas durante o conflito armado”.324 A Corte considera que a atuação do Estado nainvestigação dos fatos do presente caso demonstra uma clara vontade por parte dasautoridades de que os mesmos permaneçam na mais absoluta impunidade, o que resulta emuma responsabilidade agravada pelo descumprimento de seu dever de investigar gravesviolações aos direitos humanos.

265. Em relação às anteriores considerações, bem como o acervo probatório do presente caso e oreconhecimento parcial de responsabilidade internacional efetuado pelo Estado (supra pars. 55a 58), esta Corte entende que a Guatemala é responsável pela violação dos direitosreconhecidos nos artigos 8.1 e 25.1 da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 damesma, bem como pelo descumprimento das obrigações estabelecidas no artigo I.b) daConvenção Interamericana sobre Desaparição Forçada de Pessoas, o artigo 7.b da Convençãode Belém do Pará, e em aplicação do princípio iura novit curia, também em relação aos artigos1o, 6o e 8o da Convenção Interamericana para Prevenir e Sancionar a Tortura, em prejuízo dasvítimas do presente caso ou seus familiares, em suas respectivas circunstâncias. Os nomes detais pessoas estão identificados no Anexo I desta Sentença, no qual se incorporam, emaplicação do princípio da boa fé e lealdade processual, os nomes que aparecem no “Anexoúnico” ao Relatório de Mérito da Comissão e na “Lista Geral de Vítimas” enviada pelosrepresentantes em 02 de junho de 2016, conforme o que foi verificado.

XREPARAÇÕES

(Aplicação do artigo 63.1 da Convenção Americana)

266. Sobre a base do disposto no artigo 63.1 da Convenção Americana,325 a Corte indicou que todaviolação de uma obrigação internacional que tenha gerado dano comporta o dever de repará-lo

324 12 Casos Guatemaltecos. Supervisão de Cumprimento de Sentença. Resolução da Corte Interamericana deDireitos Humanos de 24 de novembro de 2015, considerando 125.325 O artigo 63.1 da Convenção estabelece: “Quando decidir que houve violação de um direito ou liberdadeprotegido nesta [a] Convenção, a Corte determinará que se assegure ao prejudicado o gozo de seu direito ou liberdadeviolados. Determinará também, se isso for procedente, que sejam reparadas as consequências da medida ou situaçãoque haja configurado a violação desses, bem como o pagamento de indenização justa à parte lesada”.

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adequadamente, e que essa disposição se trata de norma consuetudinária que constitui um dosprincípios fundamentais do Direito Internacional contemporâneo sobre responsabilidade de umEstado.326

267. A Corte determinou que as reparações devem ter um nexo causal com os fatos do caso, asviolações declaradas, os danos confirmados, assim como as medidas solicitadas para reparar osdanos respectivos.327

268. Em consideração às violações à Convenção declaradas nos capítulos anteriores, a Corteprocede a analisar as pretensões apresentadas pela Comissão e pelos representantes, bemcomo os argumentos do Estado, à luz dos critérios determinados em sua jurisprudência emrelação à natureza e alcance da obrigação de reparar, com o objetivo de dispor as medidasdirigidas a reparar os danos provocados às vítimas328.

269. A Corte considera pertinente reiterar que, com motivo da denegação de justiça emprejuízo das vítimas de graves violações aos direitos humanos, como as do presentecaso, se apresenta uma diversidade de afetações tanto na esfera individual quanto nacoletiva. Nesse sentido, resulta evidente que as vítimas de uma impunidade prolongadasofram diferentes afetações pela busca de justiça não apenas de caráter material, mastambém outros sofrimentos e danos de caráter psicológico, físico e em seu projeto devida, bem como outras possíveis alterações em suas relações sociais e na dinâmica desuas famílias e comunidades. Este Tribunal assinalou que estes danos se intensificampela falta de apoio das autoridades estatais na busca efetiva e identificação dos restos,e a impossibilidade de honrar apropriadamente seus seres queridos. Diante disto, aCorte considerou a necessidade de determinar diversas medidas de reparação, a fim deressarcir os danos de forma integral, pelo que, além das compensações pecuniárias, asmedidas de satisfação, restituição, reabilitação e garania de não repetição têm especialrelevância pela gravidade das afetações e pelo caráter coletivo dos danosprovocados.329

A. Parte Lesada

270. No presente caso, a Comissão solicitou à Corte que ordenasse ao Estado estabelecermecanismos que permitam: i) “a identificação completa das vítimas executadas”; ii) “adeterminação das pessoas desaparecidas nos massacres” e “as sobreviventes dos mesmos”, eiii) “a identificação completa dos familiares das vítimas executadas e desaparecidas, de formaque possam ser beneficiários das reparações”. Os representantes solicitaram a criação de “ummecanismo de identificação de todas as vítimas sobreviventes dos massacres[bem como deseus] familiares e que a Corte deixe aberta a possibilidade para que aquelas vítimassobreviventes [que] forem identificadas pelo Estado sejam incluídas como vítimas e, emconsequência, como beneficiárias das reparações”.

326 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Reparações e Custas. Sentença de 21 de julho de 1989. Série CN° 7, par. 25, e Caso Herrera Espinoza e outros Vs. Equador. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 1o de setembro de 2016. Série C N° 316, par. 210.327 Cfr. Caso Ticona Estrada e outros Vs. Bolívia. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 27 de novembro de2008. Série C N° 191, par. 110, e Caso Herrera Espinoza e outros Vs. Equador, par. 211.328 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Reparações e Custas, pars. 25 a 27, e Caso Herrera Espinoza eoutros Vs. Equador, par. 213.329 Cfr. Caso do Massacre das Duas Erres Vs. Guatemala, par. 226, e Caso Massacres De El Mozote e LugaresVizinhos Vs. El Salvador, par. 305.

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271. O Estado se referiu aos esforços que se encontraria realizando para localizar, exumar eidentificar os restos das vítimas no município de Rabinal (infra par. 291). Outrossim, se referiuaos critérios utilizados para estabelecer a qualificação de beneficiário do Programa Nacional deRessarcimento (PNR), a flexibilização de condições para o empadronamento da população nosregistros civis e a criação do Registro Nacional das Pessoas (RENAP), que tem como objetivoorganizar e manter o registro único de identificação das pessoas naturais. Assim, sustentou que“conta com um mecanismo que permite a identificação de pessoas para que possamposteriormente ser beneficiários de reparações”.

272. O Tribunal considera parte lesada, nos termos do artigo 63.1 da Convenção, quem foideclarado vítima da violação de algum direito reconhecido na mesma.330 Poranto, a Corteconsidera como “parte lesada” do caso aquelas pessoas referidas nos Anexos I e II destaSentença, quem em seu caráter de vítimas das violações declaradas de acordo com osparágrafos 155, 156, 160, 164, 203, 265, serão consideradas beneficiárias das reparaçõesordenadas pelo Tribunal. Em relação a estas pessoas, a Corte encontrou, dentro do acervoprobatório, a prova necessária para verificar sua identidade (supra par. 65).

273. Por outro lado, não foi possível encontrar dentro do acervo probatório, a documentaçãonecessária para verificar a identidade das pessoas que se encontram no Anexo III destaSentença. Outrossim, no Anexo IV da presente decisão se incluem os nomes de pessoassupostamente deslocadas, mas em relação a quem os representantes não especificaram sepermaneceram deslocadas com posterioridade a 09 de março de 1987, data na qual aGuatemala reconheceu a competência contenciosa deste Tribunal.

274. Graças a que a Corte já tenha estabelecido que no presente caso se justifica razoavelmente aaplicação da exceção prevista no artigo 35.2 do Regulamento, a Corte considera pertinente que,em um prazo de seis meses contados a partir da notificação desta Sentença, os representantesapresentem ao Tribunal, a documentação que confirme a identidade das pessoas que aparecemno Anexo III desta Sentença, assim como que especifiquem se as pessoas que figuram noAnexo IV permaneceram em situação de deslocamento com posterioridade a 09 de março de1987. O anterior, com o propósito de que estas pessoas possam ser consideradas vítimas dopresente caso assim que se identifiquem ou se comprove que permaneceram deslocadas após areferida data. Para tal efeito, o Tribunal avaliará o correspondente no exercício de suasfaculdades de supervisão da presente decisão.

275. O disposto nesta subseção não exclui o direito de aquelas pessoas membros da aldeiaChichupac ou comunidades vizinhas de Xeabaj, Chijom, Coyojá, El Tablón, Toloxcoc, Chirrum, ElChol e El Apazote que não foram apresentadas como vítimas pelos representantes ou pelaComissão, ou bem, que figuram nos Anexos III ou IV desta Sentença e não sejam incorporadascomo vítimas dentro do prazo de 06 meses estabelecido supra, de demandar, conforme o direitointerno, as medidas ressarcitórias correspondentes a seu favor.

B. Programa Nacional de Ressarcimento

276. O Estado assinalou em sua contestação que já conta com uma política pública deressarcimento, dirigida à reparação de vítimas de violações a direitos humanos sofridas no

330 Cfr. Caso do Massacre da Rochela Vs. Colômbia. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 11 de maio de 2007.Série C N° 163, par. 233, e Caso Herrera Espinoza e outros Vs. Equador, par. 212.

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enfrentamento armado interno, através do Programa Nacional de Ressarcimento (PNR). Indicouque esta política foi criada a partir das negociações de paz, e contempla medidas de reparaçãoindividual e coletiva, nos aspectos material, moral e cultural. Esclareceu que, na atualidade,este Programa foi suscetível de melhoras em relação aos procedimentos para ser beneficiários,assim como a determinação das formas e valores da reparação. Sustentou que o PNR outorgaas medidas de restituição material, indenização econômica, atendimento psicossocial,reabilitação e “medidas de dignificação das vítimas (ressarcimento moral e comunitário)”, econta com um escritório no município de Rabinal, bem como com pessoal apto para oatendimento das vítimas e seus familiares em idioma maia-achi. Questionou que a Corte “setransforme em uma instância paralela de reparação para algumas das vítimas do enfrentamentoarmado […], com procedimentos e reparações distintas para determinar os beneficiários e paradefinir as formas e valores de reparações que, além de exceder as capacidades financeiras doEstado, entorpecem o adequado funcionamento do Programa”. Além disso, sustentou que “amaioria” das vítimas já foram ressarcidas através do PNR e assinaram uma quitação na qual seobrigaram a não apresentar no futuro alguma outra reclamação contra o Estado pelos fatos docaso. Assim, apresentou uma lista das 67 pessoas que indica “já receberam seu ressarcimentopor parte do referido programa”.

277. Os representantes sustentaram que, do ponto de vista formal, o PNR “não é questionável”em relação a seus objetivos, entretanto, “a letra” difere “enorme[mente]” da realidade.Destacaram diversos problemas com a execução do programa,331 e sustentaram que os valoreseconômicos que o PNR outorga “não constituem um ressarcimento que compense justa edignamente o dano moral” causado realmente a suas comunidades. Em sua petição deobservações às exceções preliminares assinalaram que: i) “o programa determinou um valormáximo para ressarcir as vítimas, não importando o número de vítimas que uma família tenhaperdido e informado”, e ii) o programa “não ressarce todas as vítimas por cada uma dasviolações contempladas no artigo 3o do Acordo Governativo 43/2005. As violações comodeslocamento forçado e mortes por doenças, fome e condições sub-humanas ocorridas duranteo deslocamento forçado nas montanhas e em outros lugares, tampouco são ressarcidas”. Assim,solicitaram à Corte determinar que o PRN “não responde aos padrões internacionais dereparação aceitos”. Na audiência pública alegaram que o PNR “não foi efetivo nem reparou deforma integral, transformadora e satisfatoriamente as vítimas e as comunidades”. Além disso,assinalaram que, no fim de março de 2016, fechou o escritório do PRN no município de Rabinale não “sabe[m] por quê”.

278. A Comissão indicou que não contava com informação específica sobre a relação dasreparações outorgadas pelo PRN com a totalidade dos fatos e violações declaradas no presentecaso. Em suas alegações finais escritas, reconheceu e valorizou os programas administrativosde reparação que estabelecem os Estados por graves violações aos direitos humanos.Entretanto, alegou que os mesmos não podem substituir as reparações determinadas pela Corte

331 Indicaram que os valores das indenizações “não constituem um ressarcimento que compense justa edignamente o dano moral” causado realmente a suas comunidades; que o processo para o pagamento é lento; queexiste confusão familiar sobre quem recebe os recursos e quem não os recebe, o que gera conflito internamente entreos grupos familiares; que se excluem como beneficiários os filhos e filhas cujos pais ou mães sofreram as violaçõesque produziram moléstias, “feridas e divisionismo” nas comunidades afetadas o fato de que integrantes das PACtenham recebido pagamento por seus serviços –muitas vezes criminosos− antes de ter indenizado as vítimas; quevítimas de graves violações de seus direitos foram excluídas do programa por ter pertencido às PAC, apesar de quepertencer a elas, em muitos casos, era obrigatório; que as “moradias melhoradas” que se começaram a construir noano de 2010 não são culturalmente adequadas; que os materiais de construção foram entregues na estrada maispróxima das comunidades, gerando gastos de transporte, que algumas famílias contam com o material, já deteriorado,sem que tenham construído suas casas devido a que estão integradas por mulheres e pessoas de idade avançada.

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no marco de um caso individual, devido a que: i) as vítimas do caso passaram por processosjudiciais internos para chegar ao sistema interamericano e atualmente se encontram à esperade uma decisão, também judicial, na qual a Corte estabeça as violações cometidas em seuprejuízo e determine diretamente as reparações correspondentes, sem necessidade de realizarnovos procedimentos para confirmar sua qualidade de vítimas diante das autoridades estatais;ii) as reparações determinadas em âmbito internacional pela Corte têm conteúdo e alcanceespecíficos que são determinados pelo Tribunal, atendendo às circunstâncias próprias do caso;iii) em virtude do caráter independente que tem a reparação internacional, não corresponde aosorganismos do sistema interamericano sujeitar dita reparação para uma vítima de violação aseus direitos convencionais aos instrumentos de caráter interno do Estado, que podem conterdefeitos, imperfeições ou insuficiências, e iv) o PRN tem sérias deficiências em suaimplementação.

279. A Corte valoriza e reconhece as ações empreendidas pelo Estado através do ProgramaNacional de Ressarcimento (PNR) para reparar as violações aos direitos humanos perpetradasno marco do conflito armado interno na Guatemala. Entretanto, no presente caso, não sedepreende da prova fornecida pelo Estado que as pessoas ressarcidas através do PNR setenham “obriga[do] a não apresentar no futuro alguma outra reclamação contra o Estado” pelosfatos do caso, como alega a Guatemala. Pelo contrário, os convênios e quitações de “Pagamentode Ressarcimento Econômico” apresentados expressamente indicam que subsiste o direito daspessoas ressarcidas a beneficiar-se de outras medidas outorgadas pelo PNR “que completem oressarcimento integral”332 e/ou de “apresentar-se perante os orgãos jurisdicionais competentespara tramitar os processos legais que possam derivar-se da violação de direitos humanossofrida pela vítima antes identificada”.333

280. Por outra parte, da informação entregue pelo Estado, apenas se comprova o pagamento dealgumas indenizações334 a um universo parcial de vítimas por fatos que, na sua maioria, estãofora da competência temporária da Corte, tais como "massacres", execuções, torturas eviolência sexual.335 Portanto, não se depreende com clareza a relação de tais entregas com asviolações de direitos humanos estabelecidas nesta Sentença. Outrossim, nas mencionadasquitações não se indicam os critérios usados pela Comissão Nacional de Ressarcimento aomomento de estabelecer os valores e conceitos das indenizações a favor das vítimas.336 Emvista do anterior, a Corte considera que o Estado não comprovou que se tenha reparado asvítimas do presente caso de forma integral pelos danos derivados das violações de direitoshumanos estabelecidas nesta Sentença. Por outra parte, a Corte nota que o Estado nãocontestou a alegação dos representantes de que o PNR “determinou uma suma máxima para

332 Convênios e quitações de “Pagamento de Ressarcimento Econômico” (processo probatório folhas 10194 e10198, entre outros). Estas quitações indicam que as pessoas que recebem os pagamentos eximem de todaresponsabilidade o PNR e o Estado pelas demandas que possam apresentar outras pessoas com igual ou melhor direitode ser beneficiárias, o que não é equivalente a eximir o Estado de toda responsabilidade pelos fatos do caso.333 Convênios e quitações de “Pagamento de Ressarcimento Econômico” (processo probatório folhas 10224 e10588, entre outros).334 Com exceção da entrega de uma moradia a Juana García Depaz e a Rosa García de Paz, respectivamente,bem como o parecer favorável de seis moradias a favor dos beneficiários das seguintes pessoas: Clemente Juárezlxpancoc, Gregorio Valey, Eusebio Tahuico Timoteo Sic Cujá, Roberto Galileo Chén, Susana Valey Osorio e GabinoRomán (Expediente de prova, folhas 9903 a 9907, 10596 a 10605).

335 Cfr. Cópia das atas dos pagamentos realizados a membros da aldeia Chichupac por parte do ProgramaNacional de Ressarcimento (Expediente de prova, folhas 10193 a 10804).336 Ao respeito, a Corte adverte que o Manual de Critérios Básicos para a Aplicação das Medidas deRessarcimento outorgadas pelo PNR foi aprovado apenas em 07 janeiro de 2015, ou seja, posteriormente à data emque foram expedidas as quitações enviadas (Expediente de prova, folhas 9952 a 9954).

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ressarcir as vítimas, não importando o número de vítimas que uma família tenha perdido einformado”.337 Tampouco contestou o manifestado em audiência pelos representantes, relativoao fechamento do escritório do PNR correspondente ao município de Rabinal. Portanto, existeincerteza relativa à continuidade do Programa nesta área.

281. A Corte lembra que, de acordo com o artigo 63.1 da Convenção Americana, corresponde a elavelar para que se reparem as consequências das violações dos direitos humanos declaradasnesta Sentença, bem como dispor as reparações a que tiver lugar a parte lesada, de acordocom padrões internacionais e sua jurisprudência constante na matéria (supra pars. 266, 268 e272). Em consequência, o Tribunal disporá as medidas necessárias para este propósito. Semdesconsiderar este aspecto, as medidas de reparação que já foram entregues às vítimas dopresente caso em âmbito interno através do PNR pelas violações declaradas nesta Sentença,quando corresponder, devem ser reconhecidas como parte da reparação devida a estas e serãoconsideradas.

C. Obrigação de investigar os fatos e identificar, julgar e, segundo o caso, sancionar osresponsáveis, bem como determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas, e recuperar e identificar as pessoas exumadas sepultadas em valas clandestinas

C.1. Investigação completa, determinação, julgamento e eventual sanção dosresponsáveis materiais e intelectuais

282. A Comissão solicitou à Corte ordenar ao Estado a realizar, concluir e reabrir, casocorresponda, os procedimentos internos relacionados com as violações de direitos humanosdeclaradas no Relatório de Mérito e conduzir as investigações de forma imparcial, efetiva edentro de um prazo razoável com o objetivo de esclarecer fatos de forma completa, identificaros autores intelectuais e materiais e impor as sanções correspondentes. Outrossim, solicitouque o Estado disponha as medidas administrativas, disciplinares ou penais correspondentesfrente às ações ou omissões dos funcionários estatais que contribuíram para a denegação dejustiça e impunidade, na qual se encontram os fatos do caso ou que participaram em medidaspara obstaculizar os processos destinados a identificar e sancionar os responsáveis.

283. Os representantes solicitaram à Corte ordenar ao Estado realizar as averiguaçõesnecessárias e completas sobre os fatos examinados, baseando-se em linhas de investigaçãológicas e de acordo com os critérios estabelecidos na jurisprudência da Corte em relação comviolações graves de direitos humanos, incluindo desaparições forçadas, execuções extrajudiciaise torturas. Na audiência pública solicitaram, em particular, a “perseguição” da desapariçãoforçada e as alegadas torturas, estupros, genocídio, crimes contra a humanidade e crimes deguerra.

284. O Estado assinalou que em nenhum momento se negou a continuar com as investigações dosfatos. Manifestou que isto deve entender-se em observância a que o Exército e a guerrilhaacordaram que não haveria perseguição penal para nenhum dos dois grupos implicados, pelosfatos cometidos por cada um durante o enfrentamento armado interno, isto com o objetivo de

337 Neste sentido, no Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, este Tribunal observou que em um parecer doPNR relacionado a este caso se estabelecia “um valor máximo de ressarcimento econômico de quarenta e quatro milquetzales nos casos em que o núcleo familiar tenha mais de uma vítima fatal de execução extrajudicial, desapariçãoforçada ou morte em massacre; este valor também se outorgará às pessoas sobreviventes de torturas ou estuprosquando, além delas mesmas tenham outra ou outras vítimas fatais em um mesmo núcleo familiar”. Cfr. CasoMassacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 302.

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alcançar a assinatura da paz na Guatemala em 1996. Segundo o Estado, o Ministério Públicocontinua realizando a investigação dos fatos, mas se conseguir determinar que algum dos fatosse enquadra dentro dos presupostos contemplados na Lei de Reconciliação Nacional, não sepoderia perseguir penalmente os membros da guerrilha ou do Exército. Outrossim, valorizou asrecomendações realizadas, ressaltando que as mesmas podem orientar os juízes para ainterpretação e aplicação da lei, mas esclareceu que não deve ignorar a aplicação e vigência dasleis nacionais, que têm considerações relativas a garantias processuais e causas de extinção daresponsabilidade penal, cuja modificação ou revogação corresponde com exclusividade aoCongresso da República da Guatemala. Finalmente, o Estado afirmou que dispõe de medidasadministrativas, disciplinares e penais para a investigação e sanção de funcionários públicos nodesempenho de suas funções, entretanto, “não pode submeter nenhum funcionário a medidasdisciplinares sem que exista uma acusação direta e concreta”.

285. A Corte valora a disposição do Estado de promover as investigações penais do presente caso.Não obstante, considerando as conclusões assinaladas no Capítulo IX.III desta Sentença, oTribunal dispõe que o Estado deve remover todos os obstáculos, de facto e de jure, quemantêm a impunidade neste caso, e iniciar, continuar, impulsar e/ou reabrir as investigaçõesque forem necessárias para individualizar, julgar e, segundo o caso, sancionar os responsáveispelas violações de direitos humanos objeto do presente caso. O Estado deve impulsar, reabrir,dirigir, continuar e concluir as investigações e processos pertinentes, caso corresponda, em umprazo razoável, com o fim de estabelecer a verdade dos fatos, considerando que transcorreramentre 30 e 35 anos desde que sucederam. Em particular, o Estado deverá velar pela observânciados seguintes critérios:

a) Em consideração da gravidade dos fatos, não poderá aplicar leis de anistia nem disposições deprescrição, nem esgrimir pretensas excludentes de responsabilidade, que na verdade sejampretextos para impedir a investigação;

a) Deverá investigar de ofício e de forma efetiva os fatos do presente caso, considerando opadrão sistemático de violações graves e massivas de direitos humanos existente na épocaem que estas ocorreram. Em particular, deve investigar efetivamente as desapariçõesforçadas e deslocamentos forçados, as alegadas torturas, execuções extrajudiciais, estupros etrabalhos forçados, bem como as denúncias de que se cometeram crimes contra ahumanidade, crimes de guerra e/ou genocídio;

b) Deverá determinar a identidade dos supostos autores materiais e intelectuais dos fatos. Adevida diligência na investigação implica que todas as autoridades estatais estão obrigadas acolaborar na arrecadação da prova, pelo que deverão fornecer ao juiz da causa toda ainformação que requeira e abster-se de atos que impliquem a obstrução para o andamento doprocesso investigativo, e

c) Deverá assegurar que os diferentes orgãos do sistema de justiça envolvidos no caso contêmcom os recursos humanos, materiais, técnicos e científicos necessários para desempenharsuas tarefas de forma adequada, independente e imparcial, e que as pessoas que participemna investigação, entre elas as vítimas ou seus representantes, testemunhas e operadores dajustiça, contem com as devidas garantias de segurança.338

338 Cfr. Resolução de Supervisão de Cumprimento de 12 Casos Guatemaltecos, considerando 167; Caso doMassacre de Dos Erres Vs. Guatemala, par. 233; Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 257; Caso Gudiel

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286. Conforme sua jurisprudência,339 a Corte considera que o Estado deve assegurar o pleno acessoe capacidade de agir das vítimas ou seus familiares em todas as etapas da investigação e ojulgamento dos responsáveis, de acordo com a lei interna e as normas da ConvençãoAmericana. Adicionalmente, os resultados dos processos correspondentes deverão serpublicamente divulgados para que a sociedade guatemalteca conheça os fatos objeto dopresente caso, bem como seus responsáveis.

287. Assim como fez em outros casos,340 a Corte valoriza a publicação do relatório da CEH,Guatemala: Memória do Silêncio, que inclui uma parte dos fatos ocorridos no presente caso,como esforço que contribuiu para a busca e determinação da verdade de um período históricoda Guatemala. Sem desconhecer o anterior, a Corte considera pertinente precisar que oselementos de “verdade histórica” contidos neste relatório não completam ou substituem aobrigação do Estado de estabelecer a verdade e assegurar a determinação judicial deresponsabilidades individuais ou estatais através dos processos pertinentes.

288. A investigação dos fatos é um dever jurídico próprio do Estado, pelo que cada ato processualrealizado deve refletir o compromisso assumido pela Guatemala a fim de erradicar aimpunidade dos fatos, obrigação de garantia que se depreende do artigo 1.1 da ConvençãoAmericana. Para cumprir esta obrigação, o Estado tem que combater a impunidade por todos osmeios legais disponíveis, já que a impunidade “propicia a repetição crônica das violações dedireitos humanos e a total indefensão das vítimas e seus familiares”.341 Outrossim, o Estado temque “organizar todo o aparato governamental e, em geral, todas as estruturas através das quaisse manifesta o exercício do poder público, de forma tal que sejam capazes de assegurarjuridicamente o livre e pleno exercício dos direitos humanos”.342

289. Outrossim, quando um Estado é parte de tratados internacionais como a ConvençãoAmericana sobre Direitos Humanos, a Convenção Interamericana para Prevenir e Sancionar aTortura, a Convenção Interamericana sobre Desaparição Forçada de Pessoas e a ConvençãoInteramericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contra a Mulher, estes tratadosobrigam a todos seus órgãos, inclusive o poder judicial, cujos membros devem velar para queos efeitos das disposições de ditos tratados não se vejam reduzidas pela aplicação de normasou interpretações contrárias a seu objeto e fim. Os juízes e órgãos vinculados à administraçãode justiça em todos os níveis estão obrigados a exercer ex officio um “controle deconvencionalidade” entre as normas internas e os Tratados de Direitos Humanos dos quais éParte o Estado, evidentemente no marco de suas respectivas competências e das regulaçõesprocessuais correspondentes. Nesta tarefa, os juízes e órgãos vinculados à administração dajustiça, como o Ministerio Público, devem considerar não apenas a Convenção Americana e

Álvarez e outros ("Diário Militar") Vs. Guatemala, par. 327; Caso García e Familiares Vs. Guatemala, par. 196, e CasoDefensor de Direitos Humanos e outros Vs. Guatemala, par. 252.

339 Cfr. Caso do Caracazo Vs. Venezuela. Reparações e Custas. Sentença de 29 de agosto de 2002. Série C N°95, par. 118, e Caso Tenorio Roca e Outros Vs. Peru, par. 269.340 Cfr. Caso do Massacre Dois Erres Vs. Guatemala, par. 232, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala,par. 259.341 Cfr. Caso da “Panel Blanca” (Paniagua Morales e outros) Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 08 de março de1998. Série C N° 37, par. 173, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala, par. 261.342 Cfr. Caso Velásquez Rodríguez Vs. Honduras. Mérito, par. 166, e Caso Massacres de Rio Negro Vs. Guatemala,par. 261.

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demais instrumentos interamericanos, mas também a interpretação que destes realizou a CorteInteramericana.343

C.2. Determinação do paradeiro das vítimas desaparecidas, bem como recuperação eidentificação dos restos das vítimas desaparecidas e das pessoas sepultadas emvalas clandestinas

290. A Comissão solicitou à Corte que ordene ao Estado localizar e entregar às famílias os restosmortais das vítimas desaparecidas, bem como fornecer o necessário para dar continuidade àidentificação e devolução dos restos mortais das vítimas executadas. Os representantes nãose referiram a este ponto em sua petição de solicitações e argumentos.344

291. O Estado afirmou que, em 19 de julho de 2007, iniciou seu funcionamento o InstitutoNacional de Ciências Forenses da Guatemala (INACIF), uma instituição auxiliar da administraçãoda justiça cujo fim principal é prestar serviços de investigação científica de forma independentee emitir pareceres técnicos científicos que dotem a função jurisdicional, com meios de provaválidos e fidedignos nos processos judiciais. Assinalou que, em 11 de dezembro de 2012, foiassinado um Convênio de Colaboração entre o INACIF e a Fundação de Antropologia Forense daGuatemala (FAFG) por um prazo de cinco anos.345 Por outra parte, destacou que a iniciativa daLei 3.590, “Lei da Comissão de Busca de Pessoas Vítimas da Desaparição Forçada e outrasFormas de Desaparição”, tem como objetivo projetar, avaliar e executar planos de busca depessoas vítimas de desaparição, através do estudo, documentação, sistematização, análise,registro e seguimento dos casos de desaparição forçada e outras formas de desaparição.Segundo o Estado, esta iniciativa de lei se encontra em processo de aprovação no Congresso daRepública e conta com os pareceres favoráveis da Comissão de Finanças e Moeda e daComissão de Legislação e Pontos Constitucionais de 29 de agosto de 2007 e 22 de março de2011, respectivamente. Finalmente, destacou as dificuldades que enfrentou “no trabalho delocalização, identificação e entrega das vítimas”, particularmente, em relação às análises deDNA.

292. A Corte considera que é uma expectativa justa dos familiares das vítimas das desapariçõesforçadas que se identifique o paradeiro das mesmas ou se encontrem seus restos de modo adeterminar com certeza sua identidade, o que constitui uma medida de reparação e, portanto,gera o dever correlativo para o Estado de satisfazê-la.346 Por sua parte, isto permite aosfamiliares aliviar a angústia e o sofrimento causados por esta incerteza.347 É igualmente uma

343 Cfr. Caso Almonacid Arellano e outros Vs. Chile, par. 124, e Caso Masacres de Río Negro Vs. Guatemala, par.262.344 De forma extemporânea, na audiência pública solicitaram à Corte estabelecer a obrigação do Estadode buscar, identificar e determinar a forma de morte e entregar aos familiares das vítimas de desaparição forçada osrestos que sejam localizados e identificados. Em suas alegações finais escritas, solicitaram que se ordene ao Estadoconduzir uma investigação séria, encaminhada a determinar o paradeiro das vítimas desaparecidas e encontrar osrestos mortais das pessoas executadas, bem como proceder a sua adequada e certeira identificação e entrega a seusfamiliares. 345 Segundo o Estado, o convênio tem o objetivo de “estabelecer linhas gerais de cooperação entre ambas asinstituições; manter comunicação pelas diferentes vias para coordenar ações tendentes a otimizar a qualidade pericialmediante a complementariedade de conhecimentos, experiências e assessoria mútua em relação a novas tecnologias,métodos e padrões internacionais; bem como o desenvolvimento de projetos de interesse comum”.346 Cfr. Caso Neira Alegría e outros Vs. Peru. Reparações e Custas. Sentença de 19 de setembro de 1996. Série CN° 29, par. 69, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 295.347 Cfr. Caso Ticona Estrada e outros Vs. Bolívia, par. 155, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs.Peru, par. 295.

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expectativa justa dos familiares a recuperação e identificação dos restos das pessoas falecidas eque foram sepultadas em valas clandestinas a partir dos fatos do caso. Receber o corpo de umapessoa desaparecida forçadamente ou executada é de suma importância para seus familiares,já que lhes permite sepultá-las de acordo com suas crenças, bem como fechar o processo deluto. Adicionalmente, o Tribunal considera que os restos são uma prova do ocorrido e, junto aolugar no qual forem encontrados, podem proporcionar informação valiosa sobre os autores dasviolações ou a instituição à qual pertenciam.348

293. A Corte valoriza a vontade manifestada pelo Estado de empreender os trabalhos de busca,recuperação e entrega dos restos das pessoas desaparecidas ou executadas a seus familiares.Não obstante, a Corte constatou que, no caso concreto, as investigações iniciadas não foramencaminhadas para a localização de todas as vítimas desaparecidas, nem foram devida eoportunamente identificados todos os restos encontrados nas diversas exumações realizadaspelo impulso processual dos familiares (supra par. 263).

294. Em consequência, a Corte considera que o Estado deve realizar ou continuar, de formasistemática, rigorosa e com os recursos humanos e econômicos adequados, as açõesnecessárias tanto para determinar o paradeiro dos membros da aldeia de Chichupac ecomunidades vizinhas desaparecidos forçosamente, assim como localizar, exumar e identificaras pessoas falecidas e que foram sepultadas em valas clandestinas a partir dos fatos do caso.Para isso, o Estado deverá usar todos os meios técnicos e científicos necessários, considerandoas normas nacionais ou internacionais pertinentes na matéria349 e procurar concluir com o totaldas exumações que forem necessárias em um prazo de dois anos, contados a partir danotificação da presente Sentença.

295. No caso de identificar os restos, estes deverão ser entregues a seus familiares, com préviacomprovação genética de filiação ou reconhecimento pelos meios adequados e idôneos, deacordo com o caso, o mais breve possível e sem custos para os familiares. Além disso, o Estadodeverá cobrir os gastos fúnebres, de acordo com o caso, de comum acordo com os familiares.350

Neste caso, em relação aos problemas assinalados pelo Estado em realizar as análises de DNA(supra par. 291), a Corte lembra que os padrões internacionais exigem que a entrega de restosocorra quando a vítima estiver claramente identificada, ou seja, uma vez que se tenha obtidouma identificação positiva.351 Sobre este ponto, o Protocolo de Minnesota do ano de 1991estabelece que “o corpo deve ser identificado por testemunhas confiáveis e outros métodosobjetivos”.352 A Corte reconhece que, devido às circunstâncias específicas de um caso, é possívelque a identificação e entrega de restos mortais não possa estar respaldada por, pelo menos, ummétodo científico353 e a única opção prática nesses casos seja a identificação mediante o

348 Cfr. Caso Massacre Dos Erres Vs. Guatemala, par. 245, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs.Peru, par. 295.349 Tais como as estabelecidas no Manual das Nações Unidas sobre a Prevenção e Investigação Efetiva deExecuções Extrajudiciais, Arbitrárias e Sumárias.350 Cfr. Caso Anzualdo Castro Vs. Peru, par. 185, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par.297.351 Cfr. Caso González e outras (“Campo Algodonero”) Vs. México, par. 318, e Caso Comunidade Camponesa deSanta Bárbara Vs. Peru, par. 297.352 Manual sobre a Prevenção e Investigação Efetiva de Execuções Extrajudiciais, Arbitrárias e Sumárias dasNações Unidas (Protocolo de Minnesota). UN DOC E/ST/CSDHA/.12 (1991).353 O Comitê Internacional da Cruz Vermelha reconheceu como meios científicos: a) a comparação de radiografiasdentais post mortem e ante mortem; b) a comparação de impressões digitais post mortem e ante mortem; c) acomparação de amostras de DNA dos restos humanos com amostras de referência, e d) a comparação de outros

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reconhecimento dos restos efetuado por familiares ou conhecidos da pessoa desaparecida, bemcomo a comparação de dados entre o perfil biológico (sexo, idade, altura), suas característicasindividuais (lesões antigas, defeitos congênitos, tatuagens e características dentais), seusobjetos e documentos pessoas portados. Neste sentido, o Comitê Internacional da CruzVermelha considerou que os métodos visuais devem ser utilizados “como único meio deidentificação apenas quando os corpos não estiverem decompostos nem mutilados, e quando setiver uma ideia fundamentada da identidade da vítima, por exemplo: quando houvertestemunhsa que tenham presenciado o assassinato e o enterro de uma pessoa”.354

296. Para tornar efetiva e viável a eventual localização, exumação, identificação e entrega aseus familiares dos restos, este Tribunal dispõe que o Estado deverá estabelecer uma estratégiade comunicação com os familiares e acordar um marco de ação coordenada, para procurar suaparticipação, conhecimento e presença.

297. Por último, em relação à criação da referida “Comissão de Busca de Pessoas Vítimas deDesaparição Forçada e outras Formas de Desaparição”, a Corte registra e valoriza os avançosrealizados pelo Estado a respeito. Neste sentido, o Tribunal insta o Estado a continuar adotandotodas as medidas legislativas, administrativas ou de outra natureza que forem necessárias paraconcretizar a criação da referida Comissão. A Corte considera que uma entidade deste tipocoadjuvará favoravelmente na busca e identificação das vítimas do presente caso e, em geral,das vítimas de desaparição forçada na Guatemala.355

D. Medidas de restituição, reabilitação, satisfação e garantias de não repetição

D.1. Medida de restituição: Garantir o retorno a seu lugar de origem das vítimas que ainda se encontram deslocadas

298. A Comissão não precisou uma medida específica a respeito, mas, de forma geral, solicitoureparar adequadamente no âmbito individual e coletivo as violações de direitos humanos eprecisou que as reparações de caráter coletivo deverão ser plenamente consensuadas com ossobreviventes da aldeia Chichupac e comunidades vizinhas com a finalidade de reestabelecersua vida comunitária como parte do povo indígena maia-achi, e o particular vínculo com suasterras. Por sua parte, os representantes não solicitaram reparações tendentes a garantircondições dignas de retorno aos lugares de origem das vítimas no momento processualoportuno.356 Tendo isto presente, a Corte requer ao Estado implementar as medidas

identificadores únicos, como características físicas ou médicas, com inclusão de radiografias do esqueleto e da prótesecirúrgicas ou implantes numerados. Outrossim, indicou que cada um dos referidos meios “que integram o processo decoleta de dados ante mortem e post mortem, permite efetuar uma identificação com alto nível de certeza, a qual, namaioria dos contextos jurídicos, se consideraria uma identificação fora de toda dúvida razoável”. Cfr. CICR. Pessoasdesaparecidas, análise forense de DNA e identificação de restos humanos: Guia sobre práticas idôneas em caso deconflito armado e de outras situações de violência armada. (2ª Ed.), 2009, folha 12. Disponível em:http://www.icrc.org/spa/assets/files/other/icrc_003_4010.pdf.354 Cfr. Caso Gómez Palomino Vs. Peru. Supervisão de Cumprimento. Sentença de 13 de fevereiro de 2013,considerando 10, e Caso Comunidade Camponesa de Santa Bárbara Vs. Peru, par. 297. Citando: CICR. PessoasDesaparecidas, análise forense de DNA e identificação de restos humanos: Guia sobre práticas idôneas em caso deconflito armado e de outras situações de violência armada. (2ª Ed.), 2009, folha 10.355 Cfr. Caso Gudiel Álvarez e Outros (“Diário Militar”) Vs. Guatemala, par. 335, e Caso García e Familiares Vs.Guatemala, par. 221.356 Em suas alegações finais escritas, ou seja, de forma extemporânea, os representantes solicitaram, a favor dacomunidade de Chichupac e comunidades vizinhas, o fortalecimento da infraestrutura e implementação de serviçosbásicos e programas sociais. Também solicitaram projetos produtivos e, como projeto educativo, conceder bolsas deestudo para alunos do nível médio e universitário. Outrossim, solicitaram a construção de umas 250 moradias na

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necessárias para garantir, em coordenação com os representantes do presente caso, ascondições adequadas para que as pessoas que permanecem deslocadas possam retornar a suascomunidades de origem, se assim desejarem. Em particular, no que se refere às condições desegurança nas referidas aldeias. Em razão das particularidades deste caso, a Corte nãosupervisionará o cumprimento deste ponto.

D.2. Medidas de reabilitação: Atendimento médico, psicológico ou psiquiátrico às vítimas

299. A Comissão solicitou à Corte ordenar ao Estado “a implementação de um programa deatendimento psicossocial culturalmente adequado aos sobreviventes e familiares das vítimasexecutadas e desaparecidas”.

300. Os representantes solicitaram “a determinação de medidas que permitam a reabilitação dasvítimas das violações denunciadas no presente caso e de seus familiares”. Em suas alegaçõesfinais solicitaram, em particular, tratamento médico, psicológico e odontológico gratuito. Assim,solicitaram que a Corte ordene ao Estado fornecer “de forma imediata às vítimas que desejareme com prévio consentimento informado, tratamento médico e psicológico pelo tempo necessário,incluindo o fornecimento gratuito de medicamentos. O tratamento médico e psicológico deveser oferecido por pessoal e instituições estatais [, e…] este atendimento médico e psicológicopoderá realizar-se através dos curadores da comunidade maia-achi, de acordo com suaspróprias práticas de saúde e mediante o uso de medicina tradicional”.

301. O Estado informou que o PNR confere às vítimas sobreviventes e aos familiares das vítimas, amedida de reparação psicossocial, que consiste em fornecer atendimento profissional às vítimasde violações de direitos humanos durante o enfrentamento armado, tanto em nível individualcomo familiar e comunitário, com atendimento dirigido a mulheres, crianças e jovens e comabsoluto respeito à identidade étnica e cultural de cada um. Para implementar estas medidas, oPNR coordena ações com o Programa Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde Públicae Assistência Social. Este componente inclui capacitações com enfoque multicultural ecomunitário, dirigidas a profissionais. O Estado considerou “muito acertada a sugestão dosrepresentantes relativa a que o atendimento psicológico ofereciro às víctimas seja com seuprévio consentimento, isto devido a que em comunidades, como por exemplo a aldeia de Plande Sánchez e Concúl, do mesmo municipio de Rabinal, as vítimas não se apresentam parareceber a terapia psicológica, mas não podem ser obrigadas a recebê-la com o único fim decumprir uma obrigação internacional. Pelo qual o Estado está de acordo que as terapiaspsicológicas e médicas devem ser opcionais e não obrigatórias, além de emitir-se uma lista depessoas que deverão receber estes tratamentos”.

302. Nos Capítulos IX.I e IX.II desta Sentença, a Corte concluiu que a desaparição forçada de 22vítimas gerou em seus familiares uma violação a sua integridade psíquica e moral, e que aomissão de garantir medidas de retorno ou reassentamento nas vítimas deslocadas afetou eexerceu impacto de forma diferenciada em seus projetos de vida, relações e estrutura familiar,e em sua identidade étnica e cultural, bem como nas vítimas mulheres e crianças (supra pars.164, 190, 197, 198 e 202). Ao respeito, durante a audiência pública, o perito Luís Raúl SalvadóCardoza assinalou a importância da ajuda psicológica à população deslocada, ressaltando a

aldeia Chichupac e comunidades vizinhas, e que o Estado resolva os casos relacionados com a apropriação de terrasocorridas durante e depois do conflito armado interno das vítimas Gregoria Valey Yxtecoc, Demetrio Cahuec Jerónimo,Teodoro González Xitumul (marido da senhora Tomasa Alvarado Xitumul), bem como de outras vítimas, e queapresente soluções aos descendentes destas vítimas.

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necessidade de ações de “psicologia social”. Por outra parte, se bem o Acordo Governativo539/2013 do Presidente da República dispõe como medida de ressarcimento dentro do PRN, amedida de “Reparação Psicossocial e Reabilitação”,357 o Estado não demonstrou ter oferecido talmedida às vítimas do presente caso. Além disso, tal como foi assinalado, o Estado não negou ofechamento do escritório do PRN no município de Rabinal (supra par. 280).

303. Portanto, a Corte estima, como o fez em outros casos,358 que é preciso dispor uma medida dereparação que confira um atendimento adequado aos padecimentos psicológicos e físicossofridos pelas vítimas derivados das violações estabelecidas na presente Sentença. Com oobjetivo de contribuir com a reparação destes danos, o Tribunal dispõe a obrigação a cargo doEstado de oferecer gratuitamente, através de suas instituções de saúde especializadas, e deforma imediata, adequada, integral e efetiva, tratamento médico e psicológico ou psiquiátrico àsvítimas que assim solicitarem, prévio consentimento informado, incluindo o fornecimentogratuito dos medicamentos eventualmente requeridos, considerando os padecimentos de cadaum deles. O anterior implica que, ao serem vítimas de violações de direitos humanos, aquelasdeverão receber tratamento preferencial em relação ao trâmite e procedimento que devamrealizar para serem atendidos em instituições públicas. Outrossim, os tratamentos respectivosdeverão ser prestados, na medida do possível, nos centros mais próximos a seus locais deresidência pelo tempo que for necessário. Ao fornecer o tratamento psicológico ou psiquiátricodeve ser considerado, além disso, as circunstâncias e necessidades particulares de cada vítima,de forma a oferecer tratamentos coletivos, familiares e individuais, de acordo com o combinadocom cada uma delas e depois de uma avaliação individual. As vítimas que solicitem esta medidade reparação, ou seus representantes legais, dispõem de um prazo de seis meses, contado apartir da notificação da presente Sentença, para dar a conhecer a COPREDEH sua intenção dereceber atendimento médico, psicológicou ou psiquiátrico.

304. Em atenção ao solicitado pelos representantes (supra par. 300), este atendimento médico epsicológico poderá realizar-se através dos curadores da comunidade maia-achi, de acordo comsuas próprias práticas de saúde e mediante o uso de medicina tradicional,359 para o qual oEstado deverá, através da entidade estatal encarregada de fornecer atendimento de saúde aospovos indígenas da Guatemala, acordar com os representantes a forma como esta reparaçãoserá realizada.

D.3. Medidas de satisfação

D.3.1. Ato público de reconhecimento de responsabilidade

305. A Comissão solicitou a recuperação da memória das vítimas falecidas e desaparecidas. Osrepresentantes não se referiram a este ponto em sua petição de solicitações e argumentos.360

357 Artigo 2o idem, Acordo Governativo 539/2013 (Expediente de prova, folha 9927).358 Cfr. Caso Massacre Dos Erres Vs. Guatemala, par. 270, e Caso Tenorio Roca e outros Vs. Peru, par. 284.

359 Cfr. Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 289. Ver Declaração das Nações Unidas sobre osDireitos dos Povos Indígenas, artigo 24; Convênio sobre povos indígenas e tribais em países independentes, 1989 (n o.169) da OIT: artigo 25; Na publicação Convênio número 169 sobre povos indígenas e tribais: Um Manual (2003), folha60, a OIT estabeleceu diretrizes às quais devem adaptar-se os programas de saúde. Entre outros, ditos programasdeve: i) basear-se na comunidade; ii) ser complementares das práticas de cura tradicionais e compreendê-las; iii)contar com a participação ativa das comunidades; iv) formar pessoal local para trabalhas nos serviços sanitários, e v)os governos deverão proporcionar recursos em igualdade de condições com os outros cidadãos.360 Em suas alegações finais escritas, ou seja, de forma extemporânea, os representantes solicitaram ordenar aoEstado realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade.

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O Estado manifestou em sua contestação que o PNR conta com um escritório no município deRabinal, e executa “medidas de dignificação das vítimas (ressarcimento moral e comunitário)”.

306. Assim como já fez em outros casos contra a Guatemala,361 a Corte ordena ao Estado realizarum ato público de reconhecimento de responsabilidade no qual se faça referência aos fatos docaso, ao contexto de violações graves e massivas de direitos humanos perpetradas pelo Estado,e à responsabilidade internacional declarada nos termos desta Sentença. O ato deverá realizar-se na aldeia Chichupac, em idioma espanhol e na língua maia-achi, e transmitir-se através demeios de comunicação televisivos e/ou radiais, dentro do prazo de um ano contado a partir danotificação da presente Sentença. Da mesma forma, pelas características específicas dopresente caso, e para criar consciência sobre as consequências dos fatos do mesmo, no referidoevento de reconhecimento deverão estar presentes altos funcionários estatais. A realização eparticularidades da referida cerimônia pública deverá ser acordada com as vítimas e seusrepresentantes. Outrossim, o Estado deverá garantir e custear os gastos de transportenecessários para que as vítimas que se encontram na Guatemala possam assistir ao ato dereconhecimento.

D.3.2. Publicação da Sentença

307. A Comissão solicitou à Corte ordenar ao Estado o estabelecimento e a difusão da verdadehistórica dos fatos. Os representantes solicitaram à Corte ordenar ao Estado a publicação doresumo oficial da Sentença em um jornal de maior circulação e em um Boletim Oficial, bemcomo a versão da Sentença com os nomes das vítimas na íntegra, por um período de um ano,em um portal oficial da Guatemala na internet.

308. O Estado sustentou que os representantes “estavam se adiantando muito ao solicitar comomedida de reparação a publicação da Sentença, pois a Corte devia ainda analisar as exceçõespreliminares apresentadas […]. Motivo pelo qual o Estado não se pronunciou em relação a estasolicitação”. Em suas alegações finais escritas, o Estado solicitou à Corte que considerasse aspossibilidades econômicas do país no momento de realizar as publicações em um jornal demaior circulação e no Boletim Oficial.

309. Assim como fez em outros casos contra a Guatemala,362 a Corte dispõe que o Estado publiqueem um tamanho de letra legível e adequado, em idioma espanhol e maia-achi, e em um prazode seis meses, contado a partir da notificação da presente Sentença: a) o resumo oficial daSentença elaborado pela Corte, por uma única vez, no Boletim Oficial e em um jornal nacionalde ampia circulação, e b) a presente Sentença na íntegra, junto com seus anexos, disponívelpelo menos por um período de um ano, em um portal de Internet oficial do Estado. O Estadodeverá realizar a tradução do resumo oficial e das Sentenças, e estas deverão contar com oaval dos representantes antes de sua publicação.363 O Estado deverá informar de formaimediata a esta Corte uma vez que proceda a realizar cada uma das publicações dispostas,

361 O Estado cumpriu esta medida de reparação, por exemplo, no Caso Bámaca Velásquez Vs. Guatemala.Resolução de Supervisão de Cumprimento de Sentença de 10 de julho de 2007, considerando 7, e o Caso do MassacreDos Erres Vs. Guatemala. Resolução de Supervisão de Cumprimento de Sentença de 04 de setembro de 2012,considerando 16.362 O Estado cumpriu esta medida de reparação, por exemplo, no Caso do Massacre Dos Erres Vs. Guatemala.Resolução de Supervisão Cumprimento de Sentença de 06 de julho de 2011, ponto declarativo 1, e Caso Veliz Francoe outros Vs. Guatemala. Resolução de Supervisão de Cumprimento de Sentença de 03 de maio de 2016, pontoresolutivo 1.363 Cfr. Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par. 274.

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independentemente do prazo de um ano para apresentar seu primeiro relatório disposto noponto resolutivo 28 da Sentença.

D.4. Garantias de não repetição

D.4.1. Formação dos membros do Exército da Guatemala

310. A Comissão solicitou à Corte ordenar ao Estado implementar programas permanentes dedireitos humanos e direito internacional humanitário nas escolas de formação das ForçasArmadas. Os representantes não se referiram a este ponto em sua petição de solicitação eargumento.364

311. O Estado assinalou que o Ministério da Defesa Nacional da Guatemala é membro daConferência de Forças Armadas Centroamericanas (CFAC), criada em 1997 mediante um AcordoPresidencial dos Presidentes da Guatemala, El Salvador, Honduras e Nicarágua, como umorganismo internacional de caráter militar. A CFAC participa na Escola de Graduados em DireitosHumanos e Direito Internacional Humanitário (EGDHDIH), que é uma dependência daSecretaria de Estado das Forças Armadas da República Dominicana e ministra ensino nestamatéria e, por sua parte, o Ministério da Defesa Nacional da Guatemala, como membro daCFAC, participa nesta Escola. Também mencionou a participação de “integrantes do CursoSuperior de Guerra do Exército da Guatemala”, da Escola Politécnica do Exército da Guatemalae de oficiais superiores do Comando Superior de Educação do Exército, em cursos de direitoshumanos e direito humanitário. Outrossim, nas suas alegações finais escritas, destacou que"[p]essoal do Comitê da Cruz Vermelha, em coordenação com a Direção Geral de DireitosHumanos e Direito Internacional Humanitário do Ministério da Defesa Nacional", desenvolvemuma oficina orientada a oficiais que exercem o comando no Exército.

312. Neste caso, as graves violações dos direitos humanos determinadas pelo Tribunal foramperpetradas pelo Exército da Guatemala e outros membros das forças de segurança do Estado(supra pars. 148 e 160). Ao respeito, a Corte estima pertinente lembrar que a eficácia e oimpacto da implementação dos programas de educação em direitos no seio das forças desegurança são cruciaisl para gerar garantias de não repetição de fatos como os do presentecaso. Tais programas devem refletir em resultados de ação e prevenção que confirmem suaeficácia, além de que sua avaliação deva realizar-se através de indicadores adequados.365

313. No presente caso, o Estado informou sobre os cursos que estariam recebendo membros doExército da Guatemala; entretanto, não apresentou documentação que sustente o informado,que estabeleça a permanência dos cursos mencionados ou que indique quantos integrantes desuas forças recebem a referida capacitação. Portanto, a Corte ordena ao Estado incluir formaçãoem direitos humanos e direito internacional humanitário de forma permanente no currículo dosdiferentes centros de formação, profissionalização vocacional e capacitação de todas as áreasdo Exército da Guatemala. Esta capacitação deve ser implementada no prazo de um ano edirigida a todos os níveis hierárquicos do Exército da Guatemala e incorporar a necessidade deerradicar a discriminação racial e étnica, os estereótipos raciais e étnicos e a violência contra os

364 Em suas alegações finais escritas, os representantes solicitaram de forma extemporânea que a Corteordenasse ao Estado fortalecer suas capacidades institucionais mediante a capacitação das forças armadas.

365 Cfr. Caso Goiburú e outros Vs. Paraguai. Supervisão de Cumprimento de Sentença. Resolução da CorteInteramericana de Direitos Humanos de 19 de novembro de 2009, Considerando N° 49, e Caso Massacres de ElMozote e Lugares Vizinhos Vs. El Salvador, par. 368.

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povos indígenas, à luz da normativa internacional na matéria e a jurisprudência da Corte sobregraves violações aos direitos humanos, particularmente em casos guatemaltecos.

D.4.2. Fortalecimento da capacidade do poder judiciário e do ministério público de investigar os fatos e sancionar os responsáveis

314. A Comissão solicitou à Corte que ordene ao Estado fortalecer a capacidade do poderjudiciário de investigar de forma adequada e eficiente os fatos e sancionar os responsáveis,inclusive com os recursos materiais e técnicos necessários para assegurar o corretodesenvolvimento dos processos. Os representantes não se referiram a este ponto em suapetição de solicitações e argumentos.366

315. O Estado manifestou que conta com o Instituto Nacional de Administração Pública (INAP)para a formação, capacitação, adestramento e atualização dos servidores públicos. Para ofortalecimento de capacidades especificamente no sistema judiciário, o Estado indicou queconta com a Unidade de Capacitação do Ministério Público (UNICAP) e com a Escola de EstudosJudiciais. Detalhou os cursos ministrados pela UNICAP entre os anos 2010 e 2014,particularmente em matéria de discriminação racial, étnica e de gênero, bem como deestratégias de litígio em casos de enfrentamento armado interno e indução aos direitoshumanos, entre outros. Por outro lado, detalhou os níveis de formação dentro da Escola deEstudos Judiciais e mencionou que esta oferece diplomados em femicídio e outras formas deviolência contra a mulher.

316. No presente caso, a Corte estabeleceu diversas faltas de devida diligência e efetividade nainvestigação dos fatos que permitiram que estes continuem impunes, dentro de um contexto deimpunidade generalizada por graves violações de direitos humanos cometidos durante o conflitoarmado interno (supra pars. 262 a 265). O Tribunal valoriza as medidas assinaladas pelo Estadoa fim de capacitar membros do Ministério Público e do Poder Judiciário; entretanto, adverte queo Estado não proporcionou documentação que permita estabelecer o alcance, a idoneidade e apermanência dos cursos e programas de formação assinalados, a fim de fortalecer ainvestigação das graves violações de direitos humanos, particularmente aquelas cometidasdurante o conflicto armado.367 Em particular, a Corte nota que o Estado não mencionoucapacitações neste sentido dirigidas a membros de Organismo Judiciário.

317. Em sua Resolução de Supervisão de Cumprimento de Sentenças emitidas em 12 casosguatemaltecos, de 24 de novembro de 2015,368 a Corte observou que, mediante um Relatóriodo Ministério Público de maio de 2014, foi exposto que a Unidade de Casos Especiais do ConflitoArmado Interno “não conta com orçamento especial para a contratação de pessoal suficiente ououtros insumos para enfrentar o trabalho que […] representa os mais de 3.500 de suaresponsabilidades, os quais, além disso, incluem multiplicidade de vítimas e são particularmentecomplexos”. Outrossim, no referido Relatório o Ministério Público identificou diversas“problemáticas estruturais” no cumprimento da obrigação de investigar, julgar e, sendo o caso,sancionar os responsáveis pelas graves violações de direitos humanos ocorridas na Guatemala,

366 Em suas alegações finais escritas, os representantes solicitaram de forma extemporânea que a Corte ordeneao Estado fortalecer suas capacidades institucionais mediante a capacitação de juízes e promotores.367 A Corte nota que o link ao portal de Internet “capacitación.mp.gob.gt”, citado pelo Estado, não estáhabilitado. Por outra parte, o Estado não apresentou o documento “Memória de Trabalhos OJ 2012-2013” que tambémfoi citado.368 Resolução de Supervisão de Cumprimento de 12 Casos Guatemaltecos, considerandos 32, 168 e nota derodapé 183.

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em relação aos casos analisados nesta Resolução. Também assinalou que “propiciou capacitaçãoem matéria de direitos humanos a seus funcionários, cursos nos quais se incluiu o manejo dosinstrumentos internacionais na matéria, direito internacional humanitário, bem como o estudodas sentenças prolatadas pela Corte IDH, contra […] a Guatemala e muitas outras que seconsideraram importantes. Tudo isso foi incorporado ao currículo permanente de capacitação dacarreira”.

318. Neste caso, esta Corte já ordenou ao Estado garantir que os distintos órgãos do sistema dejustiça envolvidos no caso devem contar com os recursos humanos necessários paradesempenhar suas tarefas de forma adequada, independente e imparcial (supra par. 285.d).Portanto, à luz do exposto, o Tribunal considera necessário que as entidades de formação dosmembros do Organismo Judicial e do Ministério Público projetem e implementem, nos currículospermanentes dos cursos judiciais e da promotoria, respectivamente, programas de educaçãoem direitos humanos e direito internacional humanitário, caso não estejam contemplados. Osreferidos programas devem incorporar a necessidade de erradicar a discriminação racial eétnica, os estereótipos raciais e étnicos e a violência contra os povos indígenas, à luz danormativa internacional na matéria e a jurisprudência da Corte sobre graves violações aosdireitos humanos e o acesso à justiça das vítimas, particularmente em casos guatemaltecos, edevem ser implementados no prazo de um ano, contado a partir da notificação desta Sentença.

D.4.3. Programa educativo em matéria de não discriminação

319. A Comissão solicitou de forma geral à Corte adotar as medidas necessárias para evitar que,no futuro, se produzam fatos similares conforme o dever de prevenção e garantia dos direitoshumanos reconhecidos na Convenção Americana. A Corte considera necessário ordenar, comogarantia de não repetição, que, em um prazo razoável, o Estado incorpore ao currículo doSistema Educativo Nacional, em todos seus níveis, um programa de educação cujo conteúdoreflita a natureza pluricultural e multilingue da sociedade guatemalteca, promovendo o respeitoe o conhecimento das diversas culturas indígenas, incluindo suas cosmovisões, histórias,línguas, conhecimentos, valores, culturas, práticas e formas de vida. Este programa deveráenfatizar a necessidade de erradicar a discriminação racial e étnica, os estereótipos raciais eétnicos e a violência contra os povos indígenas, à luz da normativa internacional369 na matéria ea jurisprudência deste Tribunal.

D.4.4. Fortalecimento dos mecanismos contra a discriminação racial e étnica

369 Em 13 de setembro de 2007, a Assembleia Geral da ONU aprovou a Declaração das Nações Unidas sobre osDireitos dos Povos Indígenas, com voto favorável da Guatemala. Esta estabelece no artigo 15.2: “Os Estados adotarãomedidas eficazes, em consulta e cooperação com os povos indígenas interessados, para combater o preconceito eeliminar a discriminação, e para promover a tolerância, a compreensão e as boas relações entre os povos indígenas etodos os demais setores da sociedade”. Ademais, o Convênio N° 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais, ratificadopela Guatemala em 05 de junho de 1996, em seu artigo 31 estabelece: “Deverão ser adotadas medidas de carátereducativo em todos os setores da comunidade nacional, e especialmente naqueles que estejam em contato mais diretocom os povos interessados, com o objetivo de se eliminar os preconceitos que poderiam ter com relação a essespovos. Para esse fim, deverão ser realizados esforços para assegurar que os livros de História e demais materiaisdidáticos ofereçam uma descrição equitativa, exata e instrutiva das sociedades e culturas dos povos interessados”.Ademais, a Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada no 46º Período Ordinário deSessões da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos, celebrada de 13 a 15 de junho de 2016 naRepública Dominicana, estabelece em seu artigo XV.5: “Os Estados promoverão relações interculturais harmoniosas,assegurando nos sistemas educativos estatais currículos com conteúdos que reflitam a natureza multicultural emultilíngue de suas sociedades e que promovam o respeito e o conhecimento das diversas culturas indígenas. OsEstados, em conjunto com os povos indígenas, promoverão a educação intercultural que reflita as cosmovisões,histórias, línguas, conhecimentos, valores, culturas, práticas e formas de vida dos referidos povos”.

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320. A Comisisão solicitou à Corte adotar as medidas necessárias para evitar queno futuro se produzam fatos similares conforme o dever de prevenção egarantia dos direitos humanos reconhecidos na Convenção Americana. A Cortedispõe, como garantia de não repetição e dados os gravíssimos fatos contraindígenas maia-achi descritos na presente Sentença, e diante da possibilidadede que persistam na sociedade atitudes e sentimentos discriminatórios, que emum prazo razoável, o Estado aperfeiçoe e reforce a luta contra toda forma dediscriminação e, em particular, contra a discriminação racial e étnica,fortalecendo os organismos existentes ou os que serão criados com esseobjetivo. Esses organismos deverão contar com a participação direta de pessoasdos grupos vulneráveis e se ocuparão também de promover a revalorização dasculturas originárias, difundindo sua história e riqueza. O anterior, visando queas políticas públicas e ações orientadas a erradicar os atos de discriminaçãoracial sejam efetivas e se garantam, assim, a igualdade, o reconhecimento, orespeito e a promoção dos direitos dos povos indígenas, desincentivando, destaforma, as manifestações de discriminação racial e étnica na sociedadeguatemalteca.

E. Indenização Compensatória: Dano material e imaterial

321. A Comissão solicitou à Corte que ordene ao Estado reparar adequadamente as violações dedireitos humanos tanto no aspecto material quanto moral.

322. Os representantes solicitaram à Corte que ordene ao Estado pagar uma compensação pordanos materiais e imateriais, considerando a gravidade, intensidade e efeitos perduráveis dasviolações cometidas no presente caso, o sofrimento causado às vítimas, aos familiares e aossobreviventes pela falta de verdade, justiça e reparação integral, a impunidade a favor dosagressores, a perseguição, deslocamento massivo, os sofrimentos do deslocamento forçado,fome, sede, frio, calor, doenças, destruição do tecido social, desenraizamento de suas terras ede sua cultura que ainda persiste; destruição de suas moradias, roubo de seus animais,destruição de suas colheitas e plantações e bens materiais, danos causados à integridade física,psíquica, moral e cultural dessas pessoas a partir dos fatos denunciados. Em particular,solicitaram à Corte que ordene ao Estado pagar em equidade, em conceito de dano moral, osvalores de USD $5.845.000,00 a favor de “87 vítimas”, e de USD $3.360.000,00 a favor das“famílias das comunidades”. Em relação ao dano material, solicitaram à Corte que ordene aoEstado pagar, em conceito de lucro cesante, “dano patrimonial” e outros, os valores de USD$13.160.227,00 a favor de “87 vítimas”, e de USD $2.138.664,00 a favor das “famílias dascomunidades”. Os referidos valores, apresentados através de uma tabela, estão baseados norelatório atuarial do senhor Roberto A. Molina Cruz.

323. O Estado afirmou que, de acordo com a informação proporcionada pelo PNR, este programaefetuou pagamentos de reparação econômica a “pelo menos 59 vítimas das 84 apresentadas nopresente caso”. Em relação ao pagamento de reparações econômicas, considerou que “énecessário aplicar e respeitar o princípio de igualdade perante a lei e oferecer às vítimas deviolações aos direitos humanos durante o enfrentamento armado interno um tratamentoigualitário, o que ajudará também a melhorar o funcionamento do Programa Nacional deRessarcimento”. Outrossim, assinalou que “em nenhum momento nega as reparações que

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possam corresponder às vítimas de violações a seus direitos humanos ocorridas durante oenfrentamento armado interno; entretanto, se opõe a pagar os valores estabelecidos na tabelaproporcionada pelos representantes, toda vez que o [PNR] contempla os valores entregues atodas aquelas pessoas cujos direitos humanos foram violados durante o enfrentamento armadointerno, que se determinam de acordo com as possibilidades reais do Estado para cumprir suasobrigações derivadas dos Acordos de Paz”. Por outra parte, proporcionou uma lista de 67pessoas que já teriam sido ressarcidas através do PRN.

324. A Corte desenvolveu o conceito de dano material e imaterial e os supostos nos quaiscorresponde indenizar. Assim, estabeleceu que o dano material supõe a perda ou detrimento darenda das vítimas, gastos efetuados com motivo dos fatos e as consequências de caráterpecuniário que tenham um nexo causal com os fatos do caso.370 Por outra parte, o danoimaterial pode envolver tanto os sofrimentos e as aflições causados à vítima direta e pessoasmais próximas, o desrespeito a valores muito significativos para as pessoas, bem como asalterações, de caráter não pecuniário, nas condições de existência da vítima ou de suafamília.371 Outrossim, a Corte sustentou que é próprio da natureza humana que toda pessoa quepadece uma violação de seus direitos humanos experimente um sofrimento, motivo pelo qual odano imaterial resulta evidente.372

325. Ao respeito, a Corte observa, primeiramente, que os representantes enviaram como prova,um Relatório de “Avaliação atuarial de danos”373 elaborado pelo senhor Roberto A. Molina Cruzque determinou valores em compensação em conceito de lucro cessante, dano “patrimonial”,“outros” danos materiais e dano moral a favor de 87 pessoas que tinham sido alegados pelosrepresentantes como vítimas de execução extrajudicial ou de desaparição forçada, bem como afavor de 96 núcleos familiares em situação de deslocamento.374 Ao respeito, a Corte nota que orelatório contempla dentro de sua análise, danos materiais gerados por fatos que se encontrampor fora da competência do Tribunal, tais como lucro cessante das pessoas executadas, adestruição de moradias, animais, plantações e outros bens (supra par. 24). Portanto, estespontos não poderão ser considerados. Em relação aos valores por “dano moral” determinadosno relatório, que se gerariam a partir do sofrimento causado às vítimas pelas desapariçõesforçadas e o deslocamento forçado confirmados neste caso, entre outros, a Corte os valorizaráconsiderando os critérios estabelecidos em sua jurisprudência para a determinação do danoimaterial.

326. Em segundo lugar, a Corte observa que o Estado apresentou como prova, cópia das atas depagamentos realizados a favor de membros da aldeia Chichupac no marco do PNR.375 Assim, talcomo fez em outros casos contra a Guatemala,376 a Corte considera que os valores que já foramentregues a vítimas do presente caso em nível interno mediante o PNR pelas violações

370 Cfr. Caso Bámaca Velásquez Vs. Guatemala. Reparações e Custas. Sentença de 22 de fevereiro de 2002.Série C N° 91, par. 43, e Caso Flor Freire Vs. Equador. Exceção Preliminar, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de31 de agosto de 2016. Série C N° 315, par. 251.371 Cfr. Caso dos Meninos de Rua (Villagrán Morales e outros) Vs. Guatemala. Reparações e Custas. Sentença de26 de maio de 2001. Série C N° 77, par. 84, e Caso Flor Freire Vs. Equador, par. 256.372 Cfr. Caso Reverón Trujillo Vs. Venezuela. Exceção Preliminar, Fundo, Reparações e Custas. Sentença de 30 dejunho de 2009. Série C N° 197, par. 176, e Caso Maldonado Ordoñez Vs. Guatemala. Exceção Preliminar, Mérito,Reparações e Custas. Sentença de 03 de maio de 2016. Série C N° 311, par. 149.373 Relatório Atuarial de Danos (Expediente de prova, folhas 4305 a 4736).

374 O anterior, com a exceção de que não se calculou lucro cessante a favor das pessoas desaparecidas.

375 Cfr. Cópia das atas dos pagamentos realizados a membros da aldeia Chichupac pelo Programa Nacional deRessarcimento (Expediente de prova, folhas 10189 a 10804).

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estabelecidas nesta Sentença devem ser reconhecidos como parte da reparação devida a estase descontado das somas determinadas pelo Tribunal nesta Sentença em conceito de indenização(infra par. 327). Corresponde ao Estado, na etapa de supervisão do presente caso, comprovar aentrega efetiva dos valores dispostos mediante este Programa.

327. Atendendo aos critérios estabelecidos na jurisprudência constante deste Tribunal, ascircunstâncias do presente caso, a entidade, caráter e gravidade das violações cometidas, odano gerado pela impunidade, bem como os sofrimentos ocasionados às vítimas em sua esferafísica, moral e psicológica,377 a Corte estima pertinente determinar em equidade, as somasassinaladas a seguir, que deverão ser pagas no prazo que a Corte determinar para tal efeito(infra par. 335):

a) USD $55.000,00 (cinquenta e cinco mil dólares dos Estados Unidos da América) a cadauma das vítimas de desaparição forçada, assinaladas nos parágrafos 155 e 156 e no AnexoI desta Sentença, em conceito de danos materiais e imateriais;

b) USD $5.000,00 (cinco mil dólares dos Estados Unidos da América) a cada uma das vítimasde deslocamento forçado, assinaladas no Anexo II desta Sentença, em conceito de danoimaterial, e

c) USD $30.000,00 (trinta mil dólares dos Estados Unidos da América) a favor das mães, pais,filhas e filhos, cônjuges e companheiros e companheiras permanentes, e USD $10.000,00(dez mil dólares dos Estados Unidos da América) a favor das irmãs e irmãos das vítimas dedesaparição forçada, em conceito de dano imaterial, em relação às violações a seus direitosà integridade pessoal e familiar. Os nomes das referidas pessoas se encontram assinaladosno Anexo I desta Sentença.

328. Os valores dispostos a favor de pessoas desaparecidas forçadamente (supra par. 327.a)devem ser liquidados de acordo com os seguintes critérios:

a) Cinquenta por cento (50%) da indenização se dividirá, em partes iguais, entre os filhos davítima. Se um ou vários filhos da vítima já tiverem falecido, a parte que lhe ou lhecorresponder será entregue a seus filhos ou cônjuges, se existirem, ou se não existirem, aparte que lhe ou lhes corresponder será somada a dos demais filhos da mesma vítima;

b) Cinquenta por cento (50%) da indenização deverá ser entregue a quem for cônjuge,companheiro ou companheira permanente da vítima, no momento do início da desapariçãoforçada da última;

c) Caso não existiam familiares em alguma das categorias definidas anteriormente, o quetenha correspondido aos familiares compreendidos nessa categoria, será acrescido à partecorrespondente a outra categoria;

d) Caso a vítima não tenha filhos nem cônjuge nem companheira ou companheiropermanente, a indenização do dano material será entregue a seus pais, e

376 Cfr. Caso Gudiel Álvarez e outros ("Diario Militar") Vs. Guatemala, par. 389, e Caso Masscres de Río Negro Vs.Guatemala, par. 304.

377 Cfr. Caso Ticona Estrada e outros Vs. Bolívia, par. 109, e Caso Massacres de Río Negro Vs. Guatemala, par.309.

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e) Caso não existam familiares em alguma ou algumas das categorias definidasanteriormente, a indenização deverá ser paga aos herdeiros de acordo com o direitosucessório interno.

F. Custas e gastos

329. A Comissão não apresentou alegações específicas relativas a esta medida. Osrepresentantes solicitaram o pagamento de USD $ 218.322,00 a favor da Associação "BufeteJurídico Popular" em conceito de custas e gastos dos honorários profissionais causados pelasgestões perante instâncias nacionais e internacionais desde o ano de 2006, bem como os gastosrealizados na audiência pública do caso e os que eventualmente se realizem na supervisão decumprimento da sentença prolatada pela Corte. Assinalaram que estes valores se encontrambaseados no relatório atuarial elaborado pelo senhor Roberto A. Molina Cruz.

330. Em sua contestação, sob o título “VI. Custas e Gastos”, o Estado afirmou que osrepresentantes “deviam esgotar em primeira instância, os procedimentos internos disponíveisna jurisdição interna, antes de procurar um Tribunal Internacional”. Neste sentido, assinalouque “não têm direito de solicitar reparação no âmbito internacional […] porque nem mesmotentaram esgotar na via interna as referidas indenizações”.378

331. A Corte reitera que, conforme sua jurisprudência, as custas e gastos fazem parte do conceitode reparação, sempre que as atividades realizadas pelas vítimas com o objetivo de obterjustiça, tanto em nível nacional quanto internacional, implicam gastos que devem sercompensadas quando a responsabilidade internacional do Estado é declarada mediante umasentença condenatória. Em relação ao reembolso de gastos, corresponde à Corte apreciarprudentemente seu alcance, que compreende gastos gerados perante as autoridades dajurisdição interna, bem como os gerados no curso do processo perante o sistemainteramericano, considerando as circunstâncias do caso concreto e a natureza da jurisdiçãointernacional de proteção dos direitos humanos. Esta apreciação pode ser realizada com baseno princípio de equidade e considerando os gastos assinalados pelas partes, sempre que seuquantum for razoável.379 Como já assinalou em outras ocasiões, a Corte lembra que não ésuficiente o envio de documentos probatórios, mas se requere que as partes apresentem umaargumentação que relacione a prova com o fato que se considera representado, e que, ao setratar de alegados desembolsos econômicos, se estabeleça com clareza os segmentos ejustificativa dos mesmos.380

332. Os representantes remeteram como anexos ao seu escrito de solicitações e argumentos,diversa documentação relativa a supostas custas e despesas realizadas no ano 2007 até o ano2014, entre os quais se encontram notas fiscais de María Dolores Itzep Manuel, a título de

378 Em suas alegações finais escritas manifestou, em relação com a solicitação dos representantes do pagamentode custas e gastos, que estes teriam sido apresentados “de forma discricional, sempre que não se demonstraram deforma fidedigna com documentos comprováveis”. Igualmente, solicitou à Corte “considerar que em nenhum momentose ajusta à realidade o descrito de forma geral por parte dos representantes, e que, no momento de emitir umaresolução, também deve reconsiderar-se a situação econômica do país, e o não enriquecimento sem causa dassupostas vítimas”.379 Cfr. Caso Garrido e Baigorria Vs. Argentina. Reparações e Custas. Sentença de 27 de agosto de 1998. Série C N°39, pars. 79 e 82, e Caso Herrera Espinoza e outros, pars. 248 e 249.380 Cfr. Caso Chaparro Álvarez e Lapo Íñiguez. Vs. Equador. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas.Sentença de 21 de novembro de 2007. Série C N° 170, par. 275, e Caso Herrera Espinoza e outros, par. 248.

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serviços profissionais prestados à Associação Bufete Jurídico Popular; notas fiscais a título deserviços profissionais de Serviços Osorio e Sandra López; pagamentos a título de honorários aestagiários; comprovantes de pagamento de certidões de casamento, de nascimento, de óbito ebatismo de pessoas supostamente relacionadas ao caso; comprovantes de pagamentos porregistro de procurações judiciais e campainhas; notas fiscais por serviços de comidas etransporte; a locação de uma sala; o pagamento de combustível; pagamento de despesasrealizadas pela Associação Bufete Jurídico Popular, entre outros. Outrossim, os representantesapresentaram como prova de suas custas e gastos, uma “Avaliação atuarial de danos”causados, elaborada pelo senhor Roberto A. Molina Cruz em dezembro de 2014.381

333. A Corte constatou que se depreende de algumas das notas fiscais enviadas pelosrepresentantes, que estas representam gastos realizados com motivo do presente caso.382 Asreferidas notas fiscais chegam a uma soma de, aproximadamente, USD $2.422,00 (dois milquatrocentos e vinte e dois dólares dos Estados Unidos da América). Entretanto, outras notasfiscais e pagamentos de honorários não apresentam vínculos claros com o caso.383 Igualmente,o Tribunal nota que os representantes não apresentaram informação relativa aos gastosrealizados com motivo da audiência pública celebrada na sede do Tribunal. Não obstante, aCorte considera evidente que esta representação gerou, pelo menos, custos de transporte,hospedagem e alimentação. Por outra parte, a Corte considera que o relatório atuarialelaborado pelo senhor Roberto A. Molina Cruz (supra par. 332) carece de informação e respaldoprobatório que permita ao Tribunal entender qual é a base sobre a qual se estabeleceram osvalores das custas e gastos que teriam realizado os representantes e os que possam realizar notrâmite de supervisão de cumprimento de sentença.

334. Considerando o anteriormente dito, a Corte determina, em equidade, a soma de USD$50.000,00 (cinquenta mil dólares dos Estados Unidos da América) pelos gastos realizados natramitação do processo perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos. Esta somadeverá ser entregue dentro do prazo de um ano contado a partir da notificação da presentedecisão, à Associação "Bufete Jurídico Popular". Na etapa de supervisão de cumprimento dapresente Sentença, a Corte poderá dispor o reembolso por parte do Estado às vítimas ou seusrepresentantes de gastos posteriores, razoáveis e devidamente comprovados.

G. Modalidade de cumprimento dos pagamentos ordenados

335. O pagamento das indenizações por dano material e imaterial estabelecidas na presenteSentença será entregue diretamente às pessoas indicadas na mesma, em um prazo de doisanos contado a partir da notificação da presente Sentença. Cinquenta por cento do pagamentodeverá ser entregue durante o transcurso do primeiro ano a cada vítima, enquanto o valorrestante poderá ser entregue durante o segundo ano, considerando o indicado no parágrafo 327

381 Avaliação atuarial de danos (Expediente de prova, folhas 5397 a 5437).382 A prova documental enviada pelos representantes inclui pagamentos por: certificações emitidas pelaprefeitura de Rabinal; caixas mortuárias; locação de salão para conversa informativa; alimentação; transporte;fotocópias; combustível, e emolumentos notariais e fiscais, tudo em relação à tramitação do presente caso entre osanos 2007 e 2014. 383 Entre estes se encontram: o pagamento de honorários entre os anos 2007 e 2014 a María Dolores ItzepManuel; pagamentos a Sandra López e Reina Isabel Osorio Tecú por serviços técnicos de investigação prestados entreos anos 2007 e 2008; pagamentos a Abelina Osorio Sis em conceito de serviços técnicos como procuradora entre osanos 2007 e 2008, e os pagamentos a Carlos Enrique de Paz Alvarado em conceito de estágio entre os anos 2013 e2014. Da mesma forma, não se pôde constatar o vínculo com o presente caso de determinados pagamentos dealimentação, transporte, fotocópias, impressões e serviço de Internet, bem como o pagamento de registro de mandatojudicial, todos efetuados no ano de 2011.

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desta decisão. Em caso de falecimento das vítimas com anterioridade ao pagamento dasquantidades respectivas, bem como no caso das vítimas desaparecidas, os valores serãoentregues a seus beneficiários, conforme o estabelecido nos parágrafos 327 e 328 destaSentença.

336. O reembolso de custas e gastos estabelecido na presente Sentença será feito diretamente àspessoas indicadas na mesma, no prazo de um ano, contado a partir da notificação da presenteSentença, considerando o indicado no parágrafo 334 da mesma.

337. O Estado deverá cumprir as obrigações monetárias mediante o pagamento em dólares dosEstados Unidos da América ou seu equivalente em moeda nacional, utilizando para o cálculorespectivo o tipo de câmbio vigente na bolsa de Nova Iorque, Estados Unidos da América, nodia anterior ao pagamento.

338. Se por causas atribuíveis aos beneficiários das indenizações ou a seus sucessores não forpossível o pagamento das quantidades determinadas dentro dos prazos indicados, o Estadoconsignará o referido valor a seu favor em uma conta ou certificado de depósito em umainstituição financeira guatemalteca solvente, em dólares dos Estados Unidos da América e nascondições financeiras mais favoráveis que permitam a legislação e a prática bancária. Se apósdez anos o valor designado não for reclamado, as somas serão devolvidas ao Estado acrescidasde juros.

339. Os valores designados na presente Sentença sob os conceitos de dano material e imaterial edevolução de custos e gastos deverão ser entregues aos beneficiários de forma integral,conforme o estabelecido nesta Sentença, sem reduções derivadas de eventuais cargas fiscais.

340. Caso o Estado se constitua em mora, deverá pagar juro sobre a soma devida correspondenteao juro bancário moratório na Guatemala. Os juros moratórios começarão a computar-se após oprazo de dois anos a partir da notificação da presente Sentença.

XPONTOS RESOLUTIVOS

341. Portanto,

A CORTE

DECIDE,

Por unanimidade,

1. Acolher parcialmente a exceção preliminar de falta de competência ratione temporisinterposta pelo Estado, nos termos dos parágrafos 18 a 24 desta Sentença.

2. Afastar a exceção preliminar de falta de competência da Corte para conhecer sobrealegadas violações da Convenção Interamericana sobre Desaparição Forçada de Pessoas, nostermos do parágrafo 29 desta Sentença.

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3. Afastar a exceção preliminar de falta de competência da Corte para conhecer sobre oartigo 7o da Convenção Interamericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contraa Mulher, nos termos do parágrafo 30 desta Sentença.

4. Afastar a exceção preliminar de falta de competência da Corte para declarar violações daConvenção para a Prevenção e a Sanção do Delito de Genocídio, nos termos do parágrafo 31desta Sentença.

5. Afastar a exceção preliminar interposta pelo Estado em relação à falta de competência daCorte para pronunciar-se sobre delitos, nos termos do parágrafo 35 desta Sentença.

6. Afastar a exceção preliminar interposta pelo Estado em relação à alegada falta decompetência da Corte para pronunciar-se sobre a invalidade da anistia guatemalteca, nostermos do parágrafo 39 desta Sentença.

7. Afastar a exceção preliminar de falta de esgotamento dos recursos internos, nos termosdos parágrafos 43 a 47 desta Sentença.

8. Afastar a exceção preliminar de “carência de faculdade para apresentar outra reclamaçãopelos mesmos fatos”, nos termos do parágrafo 50 desta Sentença.

9. Aceitar o reconhecimento parcial de responsabilidade internacional efetuado pelo Estado,nos termos dos parágrafos 54 a 58 desta Sentença.

DECLARA,

Por unanimidade, que

10. O Estado é responsável pela violação dos direitos à liberdade pessoal, integridadepessoal, vida e ao reconhecimento da personalidade jurídica, reconhecidos nos artigos 7o, 5.1 e5.2, 4.1 e 3o da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 do mesmo instrumento e emrelação ao disposto no artigo I.a) da Convenção Interamericana sobre Desaparição Forçada dePessoas, em prejuízo das 22 vítimas de desaparição forçada que se identificam no Anexo Idesta Sentença, nos termos dos parágrafos 131 a 160 da mesma.

11. O Estado é responsável pela violação dos direitos à integridade psíquica e moral e àproteção à família, estabelecidos nos artigos 5.1 e 17.1 da Convenção Americana, em relaçãoao artigo 1.1 do mesmo instrumento, em prejuízo dos familiares das 22 vítimas de desapariçãoforçada, identificadas no Anexo I desta Sentença, nos termos dos parágrafos 161 a 166 damesma.

12. O Estado é responsável pela violação do direito à circulação e residência estabelecido noartigo 22.1 da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 da mesma, em prejuízo daspessoas listadas no Anexo II desta Sentença, nos termos dos parágrafos 172 a 203 destaSentença.

13. O Estado é responsável pela violação dos direitos às garantias e proteção judiciaisreconhecidos nos artigos 8.1 e 25.1 da Convenção Americana, em relação ao artigo 1.1 damesma, assim como pelo descumprimento das obrigações estabelecidas nos artigos 1o, 6o e 8o

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da Convenção Interamericana para Prevenir e Sancionar a Tortura, assim como o artigo I.b) daConvenção Interamericana sobre Desaparição Forçada de Pessoas e o artigo 7.b da ConvençãoInteramericana para Prevenir, Sancionar e Erradicar a Violência contra a Mulher a partir domomento em que estas entraram em vigor na Guatemala. Tudo isso em prejuízo das vítimasdo presente caso ou seus familiares, em suas respectivas circunstâncias, nos termos dosparágrafos 210 a 265 desta Sentença. Ademais, o Estado violou o direito dos familiares dasvítimas desaparecidas a saber a verdade, nos termos dos parágrafos 259 e 261 destaSentença.

14. O Estado não é responsável pela violação do artigo 12 da Convenção Americana, nostermos do parágrafo 204 desta Sentença.

15. O Estado não é responsável pela violação do artigo 16 da Convenção Americana, nostermos do parágrafo 205 desta Sentença.

16. O Estado não é responsável pela violação do artigo 24 da Convenção Americana, nostermos do parágrafo 258 desta Sentença.

E DISPÕE,

por unanimidade que:

17. Esta Sentença constitui per se uma forma de reparação.

18. O Estado deve remover todos os obstáculos, de facto e de jure, que mantêm aimpunidade neste caso, e iniciar, continuar, impulsar e reabrir as investigações necessáriaspara determinar e, segundo o caso, sancionar os responsáveis pelas violações dos direitoshumanos objeto do presente caso. Tudo isso em um prazo razoável, com o fim de estabelecera verdade dos fatos, nos termos dos parágrafos 285 a 289 desta Sentença.

19. O Estado deve realizar ou continuar, de forma sistemática, rigorosa e com os recursoshumanos e econômicos adequados, as ações necessárias tanto para determinar o paradeirodos membros da aldeia de Chichupac e comunidades vizinhas desaparecidos forçadamente,assim como localizar, exumar e identificar as pessoas falecidas, nos termos dos parágrafos 292a 297 desta Sentença.

20. O Estado deve oferecer tratamento médico, psicológico e/ou psiquiátrico às vítimas dopresente caso, nos termos dos parágrafos 302 a 304 desta Sentença.

21. O Estado deve realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidadeinternacional pelos fatos do presente caso, nos termos do parágrafo 306 desta Sentença.

22. O Estado deve realizar as publicações indicadas no parágrafo 309 da presente Sentença.

23. O Estado deve incluir formação em direitos humanos e direito internacional humanitáriode forma permanente no currículo dos diferentes centros de formação, profissionalizaçãovocacional e capacitação do Exército da Guatemala, nos termos dos parágrafos 312 e 313desta Sentença.

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24. O Estado deve projetar e implementar, nos currículos permanentes de formação dacarreira judicial e da promotoria, respectivamente, programas de educação em direitoshumanos e direito internacional humanitário, nos termos dos parágrafos 316 a 318 destaSentença.

25. O Estado deve incorporar ao currículo do Sistema Educativo Nacional, em todos seusníveis, um programa de educação cujo conteúdo reflita a natureza multicultural e multilingueda sociedade guatemalteca, promovendo o respeito e o conhecimento das diversas culturasindígenas, incluindo suas cosmovisões, histórias, línguas, conhecimentos, valores, culturas,práticas e formas de vida, nos termos do parágrafo 319 desta Sentença.

26. O Estado deve fortalecer os organismos existentes ou os criar com o fim de erradicar adiscriminação racial e étnica, nos termos do parágrafo 320 desta Sentença.

27. O Estado deve pagar as somas determinadas nos parágrafos 327 e 334 da presenteSentença, por conceito de indenizações pelo dano material e imaterial, e pelo reembolso decustas e gastos, nos termos dos referidos parágrafos e dos parágrafos 324 a 328, e 331 a 340desta decisão.

28. O Estado deve, dentro do prazo de um ano contado a partir da notificação destaSentença, enviar à Corte Interamericana de Direitos Humanos um relatório sobre as medidasadotadas para cumprir com a mesma.

29. A Corte supervisionará o cumprimento integral desta decisão, no exercício de suasatribuições e em cumprimento de seus deveres conforme a Convenção Americana, e dará porconcluído o presente caso uma vez que o Estado tenha dado total cumprimento ao disposto nomesmo.

Sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Caso Membros daAldeia Chichupac e Comunidades Vizinhas do Município de Rabinal Vs.Guatemala. Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas. Sentença de30 de novembro de 2016.

Roberto F. CaldasPresidente

Eduardo Ferrer Mac-Gregor Poisot Eduardo Vio Grossi

Humberto Antonio Sierra Porto Elizabeth Odio Benito

Eugenio Raúl Zaffaroni L. Patricio Pazmiño Freire

Pablo Saavedra AlessandriSecretário

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Comunique-se e execute-se,

Roberto F. CaldasPresidente

Pablo Saavedra AlessandriSecretário

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ANEXO I. LISTA GERAL DE VÍTIMAS

N°VÍTIMAS DE DESAPARIÇÃOFORÇADA N° NÚCLEO FAMILIAR

1 Hugo García Depaz1 Adrián García Manuel (Pai)2 Sabina de Paz Pérez (Mãe)

2Abraham Alvarado Tecú (ou AgapitoAlvarado Depaz)

3 Ángel Alvarado Tecú (Pai)

4 Victoria de Paz Pérez (Mãe)5 Lucas Alvarado Depaz (Irmão)6 Silveria Alvarado Depáz (Irmã)7 Paula Alvarado Depáz (Irmã)8 Margarito Alvarado Depáz (Irmão)

3 Manuel de Jesús Alarcón Morente

9 Juan Alarcón García (Pai)10 Graciela Morente (Mãe)11 Marcelina Alarcón Morente (Irmã)

12 Clotilde Felipa Alarcón Morente (Irmã)

13 Jesus Alarcón Morente (Irmão)14 Berta Alarcón Morente (Irmã)15 Victoria Alarcón Morente (Irmã)

4Edmundo ou Raymundo AlarcónMorente

16 Faustina Morales Morales (Esposa)17 Lupita Alarcón Morales (Filha)18 Plácido Alarcón Morales (Filho)

5 Pedro Siana

19 Margarita Ixtecoc González (Cônjuge)20 Juana Siana Ixtecoc (Filha)21 Olivia Siana Ixtecoc (Filha)22 Paula Siana Ixtecoc (Filha)

6 Juan Pérez Sic23 Manuela Toj Perez (Cônjuge)24 Ernesto Perez Toj (Filha)

7Lorenzo Depaz Siprian (ou FlorencioDepaz Cipriano)

25 Alejandra Galiego Mendoza (Filha)26 Ricardo Depaz Galiego (Filho)27 Apolonio de Paz Galiego (Filho)28 Odilia de Paz Galiego (Filha)29 Virgilio de Paz Galiego (Filho)

8 Leonardo Cahuec González

30 Albertina Sic Cuxúm (Esposa)31 Valentina Cahuec Sic (Filha)32 Rolando Cahuec (Filho)33 María Isabel Cahuec Sic (Filha)

9 Juan Mendoza Alvarado

34 Maria Teresa Sic Osorio (Esposa)35 Mario Mendoza Sic (Filho)36 María Asunción Mendoza Sic (Filha)37 Carmela Mendoza Sic (Filha)38 Emilia Mendoza Sic (Filha)39 Julian Mendoza (Filho)

10 José Cruz Mendoza Sucup

40 Fabustina Alvarado Manuel (Esposa)41 Vicenta Mendoza Alvarado (Filha)42 Tomasa Mendoza Alvarado (Filha)43 José Luis Mendoza Alvarado (Filho)44 Juan Mendoza Alvarado (Filho)

11 María Concepción Chen Sic

45 Rosalina Sic Chen (Filha)46 Reyna Margarita Sic Chen (Filha)47 Petronila Sic Chén (Filha)48 Francisco Sic Chén (Filho)49 Mario Sic Chén (Filho)

ANEXO I

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50 Marcelo Síc Chén (Filho)51 Pedro Síc Hernandez (Filho)

12 Casimiro Siana52 Dominga Sucup Cruz (Esposa)53 Margarita Siana Crúz (Filha)54 Oscar Siana Sucup (Filho)

13 Cruz Pérez Ampérez55 Pedrina Román Xitumul (Cônjuge)56 Maria Guadalupe Ampérez Román (Filha)

14 Gorgonio Gonzalez Gonzalez

57 Enriqueta Tecú (Esposa)58 Rosa Gonzalez Tecú (Filha)59 Pedro González Tecú (Filha)60 Francisca Gonzalez Tecú (Filha)

15 Jorge Galeano Román

61 Anastasia Xitumul Ixpancoc (Esposa)62 Carmela Galeano Xitumul (Filha)63 Patrocinia Galeano Xitumul (Filha)64 Cristina Galeano Xitumul(Filha)65 Candelaria Xitumul (Filha)

16 Eustaquio Ixtecoc

66 Isabel Reina Bolaj (Esposa)67 Victorino Ixtecoc Bolaj (Filho)68 Angel Augusto Ixtecoc Bolaj (Filho)69 Miguel Hector Ixtecóc Bolaj (Filho)

17 Rafael Depaz Tecú

70 Francisco Depaz (Pai)71 Matilde Tecú (Mãe)72 Balvino Depaz Tecú (Irmão)73 Juan Alfonzo Depaz Tecú (Irmão)

18 Enrique Mendoza Sis74 Leandra Sucup (Esposa)75 José Mendoza Sucup (Filho)

19 Gabino Román Yvoy (ou Iboy ou Ivoy)

76 Juana Xitumul López (Esposa)77 Pedrina Roman Xitumul (Filha)78 Cármen Román Xitumúl (Filha)79 José Manuel Román Xitumul (Filho)80 Enrique Román Xitumul (Filho)81 Francisco Román Xitumul (Filho)

20 Dionicio ou Dionisio Vachan ou Bachán

82 Simona Cahuec (Esposa)83 Clementina Bachán Cahuec (Filha)84 Tranquilina Bachan Cahuec (Filha)85 Catalina Vachán Depáz (Filha)86 Diego Bachan Cahuec (Filho)

21 Marcelo Sic Chen87 Fermina Hernández Mendoza (Esposa)88 Pedro Sic Hernández (Filho)89 Hermelinda Sic Hernández (Filha)

22 Adrián Garcia Manuel

90 Sabina de Paz Pérez (Esposa)91 Efraín García de Paz (Filho)92 Hugo Garcia de Paz (Filho)

93 Maria Concepción García Depaz (Filha)94 Juana Garcia Depaz (Filha)

ANEXO I

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OUTRAS VÍTIMAS DE VIOLAÇÃO DOS DIREITOS ÀS GARANTIAS E PROTEÇÃO JUDICIALDA CONVENÇÃO AMERICANA, E DESCUMPRIMENTO DOS ARTIGOS I.B DA CIDFP , 1, 6 E 8DA CIPST , E 7.B DA CONVENÇÃO DE BELÉM DO PARÁ, LISTADOS POR NÚCLEO FAMILIAR

23Víctor Juárez Pangan (ou Víctor JuárezPancan)

95 Iginia Chen96 Napoleón Juárez Chén97 Leonardo Juarez Chen98 Juan Juarez Chen99 Matilde Juárez Chén100 Candelaria Juárez Chen

24 Clemente Juárez Ixpancoc

101 Antonia Chén Valey102 Venancio Juárez Chen103 Urbano Juárez Chen104 Rosalina Juárez Chén

25 Cruz Sic Cuxum (ou Cruz Sic Cuxún),

105 Carmen Isabel Sic Cruz106 Victoria Sic Sic107 David Sic Sic108 Francisca Sic Sic109 Matilde Sic Sic110 Herlinda Sic Sic

26 Pedro Sic Jerónimo

111 Eligia Cruz112 Carlos Humberto Sic Cruz113 Carmen Isabel Sic Cruz114 Aminta Síc Crúz115 Juan Cruz (ou Juan Sic Crúz)116 Maria Lucrecia Sic Cruz117 Crisanto Sic Cruz

27 Gregorio Valey

118 Modesta Tahuíco119 Marcos Valey Tahuico120 Macario Valey Tahuico121 Abelina Valey Tahuíco

28 Timoteo Sic Cujá

122 Andrea Osorio Galeano123 Maria Teresa Sic Osorio124 Melesio Sic Osorio125 Miguel Sic Osorio126 Patricia Sic Osorio127 Juana Sic Osorio128 Paulina Sic Osorio129 Vicente Sic Osorio130 Dionicio Sic Osorio131 Mario Mendoza Sic132 María Asunción Mendoza Sic133 Carmela Mendoza Sic134 Lucía Sic Sic135 Florinda Sic Sic136 Pedro Sic Sic137 Ana Sic Sic138 Hilda Sic Sic139 Josefa Sic Sic140 Maximiliana Sic Cacaj141 Ramón Sic Cacaj142 Faustina Sic Cacaj

ANEXO I

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143 Ronaldo Sic Cacaj144 Ana Victoria Sic Cacaj145 Bernardo Sic Cacaj146 Liria Sic Cacaj

29 Roberto Galiego Chén147 Susana Valey Xitumúl148 Eulalia María Galiego Valey

30 Antonio Alvarado González

149 Francisca Juarez Pérez150 Sergio Lyonel Alvarado Juarez151 Cesar Augusto Alvarado Juarez152 Amelía Eugenia Alvarado Juarez153 Ana Marilú Alvarado Juárez154 Lesvia Nohemy Alvarado Juárez

31 Alfonzo Crúz Juárez

155 Lorenzo Sucup Crúz156 Rosa Juarez Yxpancoc157 Gregorio Crúz Juárez158 Marcelina Sucup Juarez159 Filomena Sucup Juarez160 Genaro Sucup Juárez

32 Domingo Cahuec Sic

161 Elena Valey162 Francisco Cahuec Valey163 Irrael Cahuéc Valey164 Elsira Cahuec Valey165 Maria Magdalena Cahuec Valey166 Rosalina Cahuec Valey167 Dora Alicia Cahuec Valey

33 Santíago Alvarado Xitumul168 Juana Garcia Manuel169 Matilde Alvarado García170 Martina Alvarado García

34 Agustín Juarez Ixpancoc

171 Miguelina Garcia Depáz172 Juán Juárez García173 Estefana Juarez García174 Roberto Juárez García175 Bernarda Garcia

35 Teodoro González Xitumul

176 Tomasa Alvarado Xitumul177 Hirma Yolanda Gonzalez Alvarado178 Blanca Esthela González Alvarado179 Marvin Giovany González Alvarado

36 Eulogio Morales Alvarado

180 Justina Sucup Mendoza181 Florentina Morales Sucup182 Miguel Ángel Morales Sucup183 Maura Morales Sucup184 Modesta Morales Sucup

37Luciano González (ou Luciano GonzalezSis ou Lucio Gonzalez Sis)

185 Ciriaco González Alvarado

186 Raymunda Sis Juarez

187 Pedro González Sis188 Benjamin González Román189 Catalina González Román190 Ofelia del Rosario González Román191 José Carlos Alberto Román

38 Apolinario Juárez Pérez

192 Alberta Cho Siana193 Matilde Juárez Chó194 María Estela Juárez Chó

ANEXO I

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195 Carlos René Juárez Chó

39 Alberto Juarez Perez

196 Bertha Martínez Izaguirre197 Edwin Eduardo Juarez Martínez198 Olga Marina Juarez Martinez199 Telma Hortencia Juarez Martinez200 Roselia Martínez

40Evaristo Depaz Siana (ou EvaristoSiana)

201 María Alvarado Román202 Magdaleno Cruz Siana Alvarado203 Vicente Siana Alvarado204 Benito Siana Alvarado205 Candelario Siana Alvarado206 Martina Siana Alvarado

41 Pedro Tum (ou Pedro Pérez Ampérez)

207 Mateo Pérez Cajbón208 Maria Ampérez209 Cruz Pérez Ampérez210 Maria Guadalupe Ampérez Román

42 Emigdio Siana Ixtecoc

211 Carmen Piox Alvarado212 Marta Cristina Siana Piox213 Amalia Margarita Siana Piox214 Odilia Yescenia Siana Piox215 Hugo Baldomero Siana Piox216 Aura Estela Siana Piox

43 Pedro Galiego López217 Bruna Chén Alvarado218 Juana Galiego Chén219 Roberto Galiego Chén

44 Demetrio Chen Alvarado

220 Maria Garcia de Paz221 Marcos Chen García222 Raymunda Chén Garcia223 Procopio Chen Garcia

45 Pedro Galiego Mendoza

224 Fabiana Chen Galiego

225 Marta Elena Galiego Chen

226 Francisca Galiego Chén227 Jorge Galiego Chén228 Antonia Galiego Chen229 Carmela Galiego Chén230 José Luis Galiégo Chen231 Victoria Chen Galiego

46 Camilo Juarez Valey

232 Maria Lucas Beltrán Gonzalez233 Mateo Juárez Beltran234 Juan de la Cruz Juarez Beltran235 Rosalina Juarez Beltran

47 Julián Garniga López236 Juliana Xitumul Ixpatá237 Juan Garniga Ixpatá238 Felipe Garniga Ixpatá

48 Benito Juárez Ixpancoc

239 Pedrina Pérez Iboy240 María del Rosario Juárez Pérez241 Ubalda Juarez Perez242 Sabina Juárez Pérez243 Hilario Juárez Pérez244 Enrique Alberto Juárez Pérez245 Emiliano Juárez Pérez246 Matilde Tecú247 Balvino Depaz Tecú

ANEXO I

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49 Francisco Depaz 248 Juan Alfonzo Depaz Tecú249 Rafael Depáz Tecú

50 Maximiliano Sis Valey

250 María Juárez López251 Cristina Sis Juárez252 Dora Marciana Sís Juarez253 Claudia Elvira Sis Juarez254 Wilmer (ou Wilmer Elisandro) Sic Sis255 José Obdulio Sic sis256 Lilian Cecilia Sic Sis

51 Vicente Sic Osorio

257 Teresa Cacaj Cahuec258 Maximiliana Síc Cacaj259 Ramón Sic Cacaj260 Faustina Sic Cacaj261 Liria Sic Cacaj262 Ronaldo Sic Cacaj263 Ana Victoria Sic Cacaj264 Bernardo Sic Cacaj

52 Patrocinio Galiego

265 Ana Calate Sic266 Sofia Galiego Calate267 Miguelina Galiego Calate268 Luisa Galiego Calate269 María Cruz Galiego Calate270 Edgar Galiego Calate271 Irma Galiego Calate272 Josefina Galiego Calate273 Olegario Galiego Calate

53 Félix Alvarado Xitumul

274 Maria Alvarado Cortez275 Alejandra Alvarado Alvarado276 Rosalio Alvarado Alvarado277 Gloria Luz Alvarado Alvarado278 Fidelia Eliza Alvarado Alvarado279 Edgar Alvarado y Alvarado280 Irlubia Magdalena Alvarado Alvarado281 Lorena Eugenia Alvarado

54 José Demetrio Cahuec Jerónimo

282 Estéfana Ixtecóc Gonzalez283 Pablo Cahuec Ixtecoc284 Miguelina Cahuec Ixtecoc285 Inocenta Cahuec Ixtecoc286 Lazaro Cahuec Ixtecóc

55 Gregoria Valey Ixtecoc (ou Yxtecoc)

287 Timoteo García Rojas (esposo)288 Tomás García Valey289 Timoteo García Rojas (filho)290 Máxima Emiliana García Valey291 Reginaldo García Valey

56 Silvestre Sic Xitumul

292 María Concepcion Chen Sic293 Rosalina Sic Chen294 Reyna Margarita Sic Chen295 Petronila Sic Chén296 Francisco Sic Chén297 Mario Sic Chén298 Marcelo Sic Chen299 Pedro Sic Hernandez

57 Raymunda Sical Corazón

300 Ramón Valey

301 Gregoria Corazón

ANEXO I

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302 Balbino Corazón303 Pedro Corazón Osorio

58Domingo Reyes Juárez (ou DomingoJuárez Reyes)

304 Rosario Román Túm305 Andrés Reyes Román306 Santiago Reyes Román307 Macario Reyes Román308 Juana Reyes Roman309 Toribia Reyes Román

59 Elías Milián González

310 Fidelia Morales311 Amelia Milián Morales (repetida)312 Tarcila Milián Morales313 Vitalina Milián Morales314 Maria Luisa Milian Garcia315 Elvia Yaneth Milian Garcia316 Edgar René Milian Garcia317 Angélica María Torres Milián (repetida)318 Vilma Torres Milián (repetida)319 Alonzo Torres Milián (repetido)

60 Amelia Milián Morales

320 Venancio Torres Gonzalez321 Angelica María Torres Milián322 Vilma Torres Milián323 Alonzo Torres Milián

61 Medardo Juárez García324 Alejandro Juarez Ixpancoc325 Maria Concepción García Depaz326 Olga Lili Juarez Garcia

62 Eusebia Grave García327 Juana Garcia Depaz328 Dominga Grave 2607

63 Juana García Depaz

329 Mateo Grave330 Eusebia Grave García331 José León Grave García332 Ermelinda Grave Garcia333 Marcelino Grave García334 Maria Antonia Grave García335 Victoriana Grave García336 Martín Grave García337 Edgar García Depaz338 Sandra Maribel García Depaz

64 Víctor Alvarado Valey

339 Dominga Sucup Cahuec340 Victor Cástulo Alvarado Sucup341 Micaela Alvarado Sucúp342 Antonia Alvarado Sucup343 Roberto Alvarado Sucup344 Ceferino Alvarado Sucup345 Fidel Alvarado Sucup

65 Juan Alvarado Grave

346 Natalia Siana347 Juan Nicolas Alvarado Siana348 Flora Alvarado Siana349 José Patricio Alvarado Siana350 Rosendo Alvarado Siana351 Rosalina Alvarado Siana

66 Efraín García (ou Efraín García de Paz)

352 Adrián Garcia Manuel353 Sabina de Paz Pérez354 Juana García Depaz355 Hugo Garcia de Paz

ANEXO I

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356 Maria Concepción García Depaz

67 Napoleón García De Paz357 Isabel Bolaj Ixtecoc García depaz358 Florinda García Bolaj359 Carmelina García Bolaj

68 Luciano Alvarado Xitumul

360 María García Manuel361 Adela Florentina Alvarado García362 Héctor Rolando Alvarado Garcia363 Tomasa Alvarado Xitumul364 Antonia Alvarado Xitumul

69 Luciana Xitumul Ixpancoc

365 Daniel Xitumul Cuxúm

366 María Concepción Xitumul Xitumul

70 Ciriaco Galiego Lopez

367 Dominga Mendoza368 Pedro Galiego Mendoza369 Macario Galiego Mendoza370 Julián Galiego Mendoza371 Leona Galiego Mendoza372 Manuel de Jesus Galiego Mendoza373 Alejandra Galiego Mendoza374 Marta Elena Chen Galiegp375 Francisca Chen Galiego376 Jorge Chen Galiego377 Antonia Chen Galiego378 Carmela Chen Galiego379 José Luis Chen Galiego380 Victoria Chen Galiego381 Abelina Mendoza Morán382 Telma Mendoza Morán383 Jacobo Mendoza Morán384 Mauricio Galiego Moran385 Eva Mendoza Morán386 Florencia Galiego Reyes387 Juana Galiego Reyes388 Paulina Galiego Reyes389 Rosa Galiego Reyes390 Feliza Galiego Reyes391 José Guillermo Galiego Reyes392 Santiago Galiego Reyes

71 Máxima Emiliana García Valey 393 Francisco Sic Chén

72 Miguel Chen Tahuico

394 Vicenta Mendoza Alvarado395 Antonio Chen Mendoza396 Demetrio Chen Mendoza397 Francisca Chen Mendoza398 Aníbal Chen Mendoza

73 Macario Galiego Mendoza

399 Lucila Morán

400 Mauricio Galiego Morán

401 Eva Mendoza Morán

402 Jacobo Galiego Morán

403 Telma Galiego Morán

ANEXO I

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404 Abelina Galiego Morán

74 Alberto Pangán Juarez

405 Marta Elena Galiego Chen406 Rosalina Pangán Galiego407 Francisco Pangán Galiego408 Juana Guadalupe Pangán Galiego409 Mercedes Pangán Galiego410 Gerónimo Pangán Galiego

75 Brigido Xitumul

411 Francisca Calate Sic412 Rosendo Xitumul Calate413 Eduardo Xitumul Calate414 René Apolinario Xitumul Calate415 Jorge Xitumul Calate416 Victor Manuel Xitumul Calate

76 Jesús Morales Garcia417 Jesús González Milián418 David Morales González

77 Pablo Xitumul

419 Pablo Xitumul420 Tomasa Sic Cuxúm421 Angélica Xitumul Síc422 Santos Xitumul Síc423 Gregorio Xitumul Sic424 Trancita Xitumul Síc425 José Ernesto Xitumul Sic426 Sergio Alfredo Xitumul Sic

78 Jesús Peréz Álvarez427 Juana Juárez García428 Cipriano Juárez429 Carlos Enrique Pérez Juárez

79 Jerónimo Ixpatá Xitumul

430 Jerónimo Ixpatá Xitumul431 Patricia Sic Osorio432 Fernando Ixpatá Sic433 Elvira Ixpatá Sic

80 Agustín Juarez López

434 Inocenta Ixtecóc Xitumúl435 Ana Maria Juarez Ixtecoc436 María Isabel Juárez Ixtecóc437 Sandra Lorena Juárez Ixtecoc438 César Agusto Juarez Ixtecoc

81 Sebastian Chen Tahuico

439 Vicenta Ixpatá Xitumul440 Josefina Chen Ixpatá441 Adela Chen Ixpatá442 Hector Chen Ixpatá443 Elsa Chén Ixpatá444 Silvestre Chen Ixpatá

82 Juan Chen Sic445 María de Jesús Tahuico Sacol446 Faustín Chen Tahuíco

83 José Lino Alquejay

447 María Rosario González Milián448 Julián Alquejay Gonzalez449 Candelaria Alquejay Gonzalez450 Thelmo Alquejay González451 Amilcar Alquejay González

84 José León Xitumul

452 Alejandra Yxpancoc González453 José Leon Xitumul Lopez454 Antonia Xitumul Ixpancóc455 Marcelina Xitumul Ixpancóc

85 Fidel Manuel Xitumul

456 Eustaquia Cuquej Galiego457 Guillermo Manuel Cuquej458 Pedrina Manuel Cuquej

ANEXO I

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459 Otilia Manuel Cuquej460 Leocadia Manuel Cuquej

86Marcelino Eugenio Morales Hernández(ou Marcelino Eugenio Morales)

461 Angela García Depáz462 Carmela Morales García463 Isaías Morales García

87 Juan García Depaz464 Máxima Sic Gonzalez465 Nazario García Sic466 Santiago García Sic

88 Gaspar Juarez467 Bernarda Pancán468 Juana Juarez Pangán

89 Maximiliano Sic469 Dominga Cuxúm Tecú470 Timotea Sic Cuxúm

90 Pío Chen Alvarado 471 Francisca Valey Galiego

91 Victor Garniga Pérez472 Paula Pérez473 Herlinda Garniga Pérez

92 Nicolas Izaguirre Beltran

474 Nicolas Izaguirre Beltran475 Antonia Garcia476 Pedro Izaguirre García477 Maria Lucrecía Izaguirre García

93 Ruperto Matías Martinez 478 Paula Siana Ixtecoc

94 Alberto Juárez Valey

479 Reyna Margarita Sic Chen480 Tomás Juárez Síc481 Marta Juárez Síc482 Enrique Juárez Síc483 Vicente Juárez Síc484 Eliria Juárez Síc485 Lucrecia Juárez Síc

95 Serapio Pérez Sic

486 Paulina Bachán487 Desideria Pérez Bachán488 Tráncito Pérez Bachán489 Clara Mercedes Pérez Bachan490 Buenaventura Pérez Bachán491 Agustín Pérez Bachán492 Rosa Pérez Bachán

96 Manuel Juarez Lopez

493 Maria Josefa Gonzalez Xitumul494 Manuel Juárez López495 Inocenta Juarez Gonzalez496 Josefina Juárez Gonzalez

97 Agustín Juárez Valey

497 Rigoberta Ixcopal López498 Paulina Juárez Ixcopal499 Ciriaca Juarez Ixcopal500 Zoila Juarez Ixcopal501 Clara Juarez Ixcopal502 Cristina Juárez Ixcopal

98 Victor Cuquej Morente

503 Toribia Galiego504 Victor Cuquej Morente505 Tomas Morente Galiego506 Maria Morente Galiego

99 Balbino Xitumul

507 Francisca Juárez508 Juán Xitumúl Juárez509 Eulogio Xitumul Juarez

510 Luis Manuel Xitumul Juárez

511 Emiliana López Juárez

ANEXO I

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100 Dionicio Juárez Valey 512 Juana Juárez López

101 Catarino Xitumul

513 Candelaria García Depaz514 Catarino Xitumul515 Ricardo Xitumul García516 María Elena Xitumul García517 José Ronaldo Xitumul García

102 Justo Manuel Ixpatá

518 Felipa Juárez López de Manuel519 Teresa Manuel Juárez520 Rosa Manuel Juárez521 Pedro Manuel Juárez522 Josefina Manuel Juárez

103 Tomas Valey González

523 Marta Mendoza Sis524 Tomas Valey González525 Anselma de la Cruz Valey Mendoza526 Fausto Eduardo Valey Mendoza

104 Luis Depaz Cipriano

527 Patrocinia Alvarado Camó528 Martín Depaz Alvarado

529 Telma Depaz Alvarado

530 José Mario Depaz Alvarado

105 Bernardino Alvarado Alvarado

531 Bernardino Alvarado Alvarado532 Felisa Matias Ojóm533 Alberto Alvarado Matías534 Rosa Alvarado Matías535 Juan de la Cruz Alvarado Matías536 Josefa Gabriela Alvarado Matías537 Mario Alvarado Matías538 José Alvarado Matías539 María Elena Alvarado Matías

106 Francisco Sic Cuxúm

540 Paulina Sic Osorio541 Josefa Síc Síc542 Ana Síc Síc543 Pedro Sic Sic544 Lucía Sic Sic545 Florinda Sic Sic

107 Félix Valey Galiego

546 Catalina Xitumul Juárez547 Felix Valey Galiego548 Maria Valey Xitumul549 Alfonso Valey Xitumul550 Santiago Valey Xitumul551 Miguel Ángel Valey Xitumul

108 Justo Izaguirre Veltrán 552 Dominga Chinchilla Paredes

109 Toribio Chen Gonzalez

553 Maria Jesús Matías Ojóm554 Maximiliano Chen Matías555 Herlinda Chen Matías556 Francisco Chen Matías

110 Miguel Sic Osorio

557 Antonia Valey Xitumúl558 Miguel Sic Osorio559 Imelda Sic Valey560 Amalia Sic Valey561 Dominga Galiego Rodríguez562 Piedad Valey Galiego563 Juana Valey Galiego

ANEXO I

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564 Agustina Valey Galiego111 Pedro Valey Galiego 565 Teresa Valey Galiego

566 Helcilia Valey Galiego567 Santos Valey Galiego568 Marcelino Valey Galiego569 Jesús Vley Galiego

112 Buenaventura Pérez Bachán

570 María Josefa Depaz Xitumul571 Buenaventura Pérez Bachán572 Ana Carmela Pérez Depaz573 Lucía Pérez Depaz

113 Margarito Alvarado Depaz574 Valeria Leonarda Herrera575 Margarito Alvarado Depaz576 Israel Donahí Alvarado Herrera

114 Secundino García Gonzalez577 Valentina Depaz Sarpec578 Mario García Depáz

115 Vicente Depaz Pérez

579 Matilde Herrera580 Florinda Depaz Herrera581 Isaias de Paz Herrera582 Moisésde Páz Herrera583 Mirian Olga de Paz Herrera

116 Juan Sic Cuxum584 Elena Chen Valey585 José Cruz Sic Chen

117 Emiliano Sis Valey586 Juana Juarez López587 Isabela Sis Juárez588 Enrique Sis Juárez

118 Manuel de Jesus Galiego Mendoza

589 Marcelina Garniga Pérez590 Blanca Estela Galiego Garniga591 René Antonio Galiego Garniga592 Héctor Vinicio Galiego Garniga

119 Tomás García Reyes593 Gregoria Manuel Xitumul594 Cristina García Manuel

120 Domingo Valey Sis 595 Paulina Valey García

121 Mariano Díaz Tolom596 Cayetana Sucup597 Francisco Díaz Sucup598 Porfiria Díaz Xitumul

122 Andrés Ixtecoc Xitumul

599 Hercilia Hernández Morales600 Benjamin Ixtecoc Hernández601 Elisa Ixtecoc Hernández602 María Rosario Ixtecoc Hernández603 Alfredo Ixtecoc Hernández

123 Zenón Us

604 Eligia Coloch Sucup605 Sabina Us Coloch606 Diego Us Coloch607 Francisca Us Coloch608 Narciza Us Coloch

124 Bernardo Roman Ivoy

609 Sebastiana Bachan610 Ignacia Román Bachán611 Juana Román Bachán612 José Luis Román Bachán613 Rigoberta Román Bachán614 Rosalia Román Bachán615 Rafaela Ciprian Coloch616 Marciala Depaz Ciprian De Gonzalez617 Antonio Depaz Ciprian618 Brígido Depaz Ciprián

ANEXO I

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125 Alberto Depaz Reyes 619 Juana Depaz Ciprián620 Jesús Depaz Ciprian621 Andrés Gilberto Depaz Ciprian622 Mario Depaz Ciprián

126 Silverio Chen Valey623 Marcela Juárez López624 Baudilio Chén Juárez625 Leandro Chen Juárez

127 Ramon Calat Sic626 Emilia Chén Valey627 Margarito Calat Chen

128 Juan Chen Galiego

628 Juan Chen Galiego629 Roberta Juárez López630 Buenaventura Chen Juarez631 Rosa Chén Juárez632 Juan Bautista Chen Juarez633 Gloria Chén Juárez634 Camilo Chen Juarez

129 Marcos Uscap Xitumul

635 Albina Chén Valey De Uscap636 Marcos Uscap Xitumul637 Josefina Uscap Chen

638 Augusto Uscap Chen

130 Nicolás Juarez ou Nicolás Juárez639 Ciriaca López Ixpatá640 Pedrina Juárez López

131 Leandro Xitumul

641 Catalina Garcia Manuel642 Leandro Xitumul643 Ernesto Xitumul García644 Santos Genaro Xitumul García645 Delmo Xitumul Garcia646 Amilcar Xitumul García

132 Guillermo González Román

647 Guillermo González Román648 Rosa García Depáz649 Elizabeth González García650 Oscar Ezequiel González García651 Mayra Judith González García

133 Bonifacio Calat652 Juana Sic Xitumul653 Marcelina Calat Sic654 Pedrina Calat Sic

134 Delfina Sucup Mendoza

655 Nicolas Mendoza Sis656 Delfina Sucup Mendoza657 Enma Mendoza Sucup658 Rolando Mendoza Sucup659 Edgar Mendoza Sucup660 Ruben Mendoza Sucup661 Flora Mendoza Sucup662 José Luis Mendoza Sucup

135 Santiago Pérez

663 Francisca Ivoy664 Fermina Pérez Iboy665 Dionisio Pérez Ibóy666 Vidal Pérez Iboy

136 Francisco Matías Cojom667 Valentina Pangán Juarez668 Felipa Pangán

137 Isabel Alvarado Rojas669 María Dolores Alvarado De Reyes

670 Efrain Reyes Rodríguez

ANEXO I

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671 Héctor Reyes Alvarado672 Floricelda Reyes Alvarado673 Irma Yolanda Reyes Alvarado674 Herlinda Reyes Alvarado675 Zoila Reyes Alvarado676 Norma Esperanza Reyes Alvarado677 Berta Cristina Reyes Alvarado678 Ana Hortencia Reyes Alvarado679 Santos Pascual Reyes Alvarado

138 Julián Galiego Mendoza

680 Lucía Reyes Cuxúm681 Florencia Galiego Reyes682 Juana Galiego Reyes683 Paula Galiego Reyes684 Rosenda Galiego Reyes685 Felisa Galiego Reyes686 Octavio Santiago Galiego Reyes687 José Guillermo Galiego Reyes

139 José Sic Cuxúm

688 Marciala Valey Morales689 Magdalena Sic Valey690 Susana Sic Valey691 Emilio Sic Valey692 Juana Sic Valey693 Jesús Sic Valey

140 Mariano Chen Valey

694 Cesilia Calat Sic695 Alejandro Chen Calat696 Clara Chen Calat697 Hilaría Chen Calat698 Agustín Chen Calat

141 Feliciano Sucup Cruz

699 Paula Morales700 Feliciano Cruz Sucup701 Marco Antonio Cruz Morales702 Eugenio Sucup Morales703 Fernando Cruz Morales704 Isabel Cruz Morales705 Luisa Cruz Morales706 Germán Cruz Morales707 Lucía Sucup Morales708 Sebastiana Sucup Morales

142 Pedro Pangán Cujá

709 Felisa Juárez710 Valentina Pangán Juarez711 Marcelo Pangán Juárez712 Florentina Pangán Juarez713 Alfredo Pangán Juarez714 Tomasa Pangán Juárez

143 Raymundo Juárez López715 Martina Ixpatá Xitumul716 Juan Juárez Ixpatá717 Fermina Juárez Ixpatá

144 Pedro Manuel Xitumul

718 Marcela Xitumul López719 Rosalínda Manuel Xitumul720 Raúl Manuel Xitumul721 Waldemar Manuel Xitumul722 Florinda Manuel Xitumul723 Rosario Manuel Xitumul

724 Carlos Manuel Xitumul

ANEXO I

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725 Clara Manuel Xitumul

145 Aurelio Juárez López

726 Timotea Rodríguez Morales727 Aurelio Juárez Lopez728 Juan Diego Juárez Rodríguez729 Ramona Juárez Rodríguez

146 Pedro Chen Sic

730 Susana Pancán Cujá731 Pedro Chen Sic732 Esteban Chen Pancan733 Florinda Chen Pancan

147 Felipe Sic Cuxúm

734 Tomasa Mendoza Alvarado735 Felipe Sic Cuxúm736 Alejandro Sic Mendoza737 Lucia Sic Mendoza738 Melecia Sic Mendoza739 Patrocinia Sic Mendoza

148 Florentin Toj

740 Lucía González

741 Florentin Toj

742 Simeón Gonzalez Gonzalez

743

Dolores Toj González

149 Domingo Chen Tahuico

744 Maximiliana Ixcopal López745 Domingo Chen Tahuico746 Carmen Chen Ixcopal747 Benedicto Chen Ixcopal748 Alberto Chen Ixcopal749 Santos Chen Ixcopal750 Eduviges Chen Ixcopal751 Jacinto Chen Ixcopal

150 Julián Pérez Vargas

752 María Roman Galeano753 Julián Pérez Vargas754 Isaias Pérez Galeano755 Bernarda Pérez Román756 Zacarías Pérez Román757 Samuel Pérez Román758 Fidelino Pérez Román759 Rosalina Pérez Román760 María Elena Pérez Román

151 Francisco Bolaj

761 Vicenta Siana Ixtecoc762 Pablo Bolaj Siana763 Vicente Bolaj Siana764 Juliana Bolaj Siana

152 Hilario Calate 765 Eugenia Sic

153 Doroteo Mendoza Rojas766 Juana Sis767 Ovidio Mendoza Sis

154 Agustin Valey (ou Baley)

768 Paula Pérez769 Agustin Valey (ou Baley)770 Florencia Valey Pérez771 Juan Valey Pérez772 Sabina Valey Pérez773 Santiago Valey Pérez774 Magdalena Valey Pérez

ANEXO I

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775 Medardo Valey Pérez776 Matilde Valey Pérez

155 Tomás Valey Pérez777 Teodora Jerónimo Cojóm778 Fernando Valey Jerónimo

156 Catarino Ixpatá Depaz779 Tomasa Xitumul780 Juana Ixpatá Xitumul

157 Pedro Sic González

781 Catalina Depáz Siana782 José Angel Síc Depaz783 Balvina Sic Depaz784 Victoria Sic Depaz785 Orlando Sic Depaz786 Armando Sic Depaz787 Mercedes Sic Depaz788 Paulina Sic Depaz

158 Miguel Xapot Martínez

789 Mercedes Guzmán Torres790 Carlos Xapot Guzmán791 Luz Elena Xapot Guzmán792 María Luisa Xapot Guzmán

159 Efraín Ac González

793 Herlinda Garniga Pérez794 Efrain Ac González795 Rosendo Ac Garníga796 Thelma Marina Ac Garniga

160 Venancio Depaz797 Antonia Xitumul Solomán798 Rodolfo Depaz Xitumul799 Adrián Depaz Xitumul

161 Juan Chen 800 Tránsito Juárez Uz

162 Daniel Galiego López

801 Ceferina Cachuec Jerónimo802 Hilario Galiego Cahcuec803 Leandra Galiego Cahuec804 Julián Galiego Cahuec

163 Santiago Sucup Pérez

805 Inocenta Mendoza Cahuec806 Juan Senón Sucup Mendoza807 Eulalio Sucup Mendoza808 Humberta Sucup Mendoza809 José Eleno Sucup Mendoza810 José Dolores Sucup Mendoza

164 Francisco Bolaj (ou Bolaj López)

811 Sebastiana Ixtecoc González812 Dominga Bolaj Ixtecoc

813 Felipe Bolaj Ixtecoc814 Jerónimo Bolaj Ixtecoc

165 Manuel Alquejay815 Juana Sic Osorio816 Juana Gregoria Alquejay Sic817 José Ángel Alquejay Sic

166 Lorenzo Alvarado Manuel818 Cornelia Alvarado Galeano819 Cruz Alvarado Alvarado

167 Matilde Juárez López

820 María Carmen Chen Gonzalez821 Denia Linday Juárez Chén822 Dolores Hermelinda Juárez Chen823 Lilian Rosmery Juárez Chén824 María Magdalena Juárez Chen

168 Alfonso Manuel Xitumúl825 Cecilia Chen Valey826 Irma Yolanda Manuel Chen

169 Teresa Xitumul López827 Paulina Xitumul

828 Rony Rocael Xitumul

ANEXO I

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170 "Menina sem nome"Filha de Luciana Xitumul Ixpancoc e Daniel Xitumul

Cuxum

171Pedro Depaz Ciprian (ou Pedro Depaz

Cipriano)

A CORTE NÃO TEM INFORMAÇÃO SOBRE SEUS FAMILIARES

172 Juan Chen Ixcopal173 Antonio Beltrán Izaguirre174 Juan Ixtecoc Xitumul175 Felipe González González176 Domingo González González

177 Patricio González Xitumul

178 Tomás Alvarado Pérez179 Ciriaco Gonzales Alvarado180 Domingo Depaz181 Juan Galeano182 José Alvarado Reyes183 Lorenzo Pérez Sic

ANEXO I

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ANEXO II

ANEXO II. PESSOAS DESLOCADAS1 Venancio Juarez Chen 56 Ubalda Juarez Perez2 Urbano Juárez Chen 57 Sabina Juárez Pérez3 Carmen Isabel Sic Cruz 58 Hilario Juárez Pérez4 Victoria Sic Sic 59 Enrique Alberto Juárez Pérez5 David Sic Sic 60 Emiliano Juárez Pérez6 Francisca Sic Sic 61 Matilde Tecú7 Matilde Sic Sic 62 Balvino Depaz Tecú8 Herlinda Sic Sic 63 Ana Calat Sic9 Carlos Humberto Sic Crúz 64 Sofía Galiego Calat10 Carmen Isabel Sic Cruz 65 Miguelina Galiego Calate11 Melesio Sic Osorio 66 Luisa Galiego Calate12 Susana Valey Xitumúl 67 María Cruz Galiego Calate13 Eulalia María Galiego Valey 68 Edgar Galiego Calate14 Tomasa Alvarado Xitumul 69 Irma Galiego Calate15 Hirma Yolanda Gonzalez Alvarado 70 Josefina Galiego Calate16 Blanca Esthela González Alvarado 71 Olegario Galiego Calate

17 Marvin Giovany González Alvarado 72 Maria Alvarado Cortez

18 Justina Sucup Mendoza 73 Alejandra Alvarado Alvarado19 Florentina Morales Sucup 74 Rosalio Alvarado Alvarado20 Miguel Angel Morales Sucup 75 Gloria Luz Alvarado Alvarado21 Maura Morales Sucup 76 Fidelia Eliza Alvarado Alvarado22 Modesta Morales Sucup 77 Edgar Avarado y Alvarado23 Alberta Cho Siana 78 Irlubia Magdalena Alvarado Alvarado24 Matilde Juárez Chó 79 Lorena Eugenia Alvarado25 María Estela Juárez Chó 80 Pablo Cahuec Ixtecoc26 Carlos René Juárez Chó 81 Miguelina Cahuec Ixtecoc27 Bertha Martínez Izaguirre 82 Inocenta Cahuec Ixtecoc28 Edwin Eduardo Juarez Martinez 83 Lazaro Cahuec Ixtecóc29 Olga Marina Juarez Martinez 84 Reginaldo García Valey30 Telma Hortencia Juarez Martinez 85 Francisco Sic Chén31 Roselia Martínez 86 Victor Cástulo Alvarado Sucup32 María Alvarado Román 87 Micaela Alvarado Sucúp33 Magdaleno Cruz Siana Alvarado 88 Antonia Alvarado Sucup34 Vicente Siana Alvarado 89 Roberto Alvarado Sucup35 Benito Siana Alvarado 90 Macario Reyes Román36 Candelario Siana Alvarado 91 Tarcila Milián Morales37 Martina Siana Alvarado 92 Vitalina Milián Morales38 Maria Guadalupe Ampérez Román 93 Maria Luisa Milian Garcia39 Carmen Piox Alvarado 94 Elvia Yaneth Milian Garcia40 Marta Cristina Siana Piox 95 Edgar René Milian Garcia41 Amalia Margarita Siana Piox 96 Angelica María Torres Milián42 Odilia Yescenia Siana Piox 97 Vilma Torres Milián43 Hugo Baldomero Siana Piox 98 Alonzo Torres Milián44 Aura Estela Siana Piox 99 Ermelinda Grave Garcia45 Fabiana Chen Galiego 100 Marcelino Grave García46 Francisca Galiego Chén 101 María Antonia Grave Garcia47 Jorge Galiego Chén 102 Victoriana Grave García48 Antonia Galiego Chen 103 Martín Grave García49 Carmela Galiego Chén 104 Edgar García Depaz50 José Luis Galiégo Chen 105 Sandra Maribel García Depaz51 Juan Garniga Ixpatá 106 Juana Siana Ixtecoc52 Pedrina Pérez Iboy 107 Olivia Siana Ixtecoc53 María del Rosario Juárez Pérez 108 Natalia Siana54 Juan Nicolas Alvarado Siana 109 Elvira Ixpatá Sic55 Flora Alvarado Siana 110 Eustaquia Cuquej Galiego

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ANEXO II

111 José Patricio Alvarado Siana 169 Guillermo Manuel Cuquej112 Rosendo Antonio Alvarado Siana 170 Pedrina Manuel Cuquej113 Rosalina Alvarado Siana 171 Otilia Manuel Cuquej114 Victoria Depaz Pérez 172 Leocadia Manuel Cuquej115 Lucas Alvarado Depaz 173 Angela García Depáz116 Silveria Alvarado Depaz 174 Carmela Morales García117 Paula Alvarado Depaz 175 Isaias Morales García118 Margarito Alvarado Depaz 176 Máxima Sic Gonzalez119 Marcelina Alarcón Morente 177 Nazario García Sic120 Jesús Alarcón Morente 178 Santiago García Sic121 Berta Alarcón Morente 179 Paulina Bachán122 Victoria Alarcón Morente 180 Decideria Pérez Bachán123 Pedro González Tecú 181 Tráncito Pérez Bachán124 Francisca González Tecú 182 Clara Mercedes Pérez Bachán125 Carmen Román Xitumúl 183 Rosa Pérez Bachán126 José Manuel Román Xitumul 184 Candelaria García De Paz127 Enrique Román Xitumul 185 Ricardo Xitumul García128 Francisco Román Xitumul 186 María Xitumul García129 Pedrina Román Xitumul de Piox 187 José Ronaldo Xitumul García130 Maria Guadalupe Ampérez Román 188 Rosario Xitumul López131 Victorino Ixtecoc Bolaj 189 Patrocinia Ixtecoc Xitumul132 Ángel Augusto Ixtecoc Bolaj 190 Gregorio Ixtecoc Xitumul133 Miguel Héctor Ixtecóc Bolaj 191 Justo Manuel Ixpatá134 Anastasia Xitumul Ixpancoc 192 Felipa Juárez López de Manuel135 Carmela Galeano Xitumul 193 Teresa Manuel Juárez136 Patrocinia Galeano Xitumul 194 Rosa Manuel Juárez137 Cristina Galeano Xitumul 195 Pedro Manuel Juárez138 Candelaria Xitumul 196 Josefina Manuel Juárez139 Leandra Sucup 197 Tomás Valey González140 José Mendoza Sucup 198 Marta Mendoza Sis141 Clementina Bachán Cahuec 199 Anselma de la Cruz Valey Mendoza142 Tranquilina Bachan Cahuec 200 Fausto Eduardo Valey Mendoza143 Catalina Bachán Depaz 201 Bernardinod Alvarado Alvarado144 Isabel Bolaj Ixtecoc de García 202 Felisa Matias Ojóm145 Florinda García Bolaj 203 Alberto Alvarado Matías146 Carmelina García Bolaj 204 Rosa Alvarado Matías147 Tomasa Alvarado Xitumul 205 Juan de la Cruz Alvarado Matías148 Antonia Alvarado Xitumul 206 Josefa Gabriela Alvarado Matías149 Daniel Xitumul Cuxúm 207 Mario Alvarado Matías150 Francisco Sic Chén 208 Josefa Síc Síc151 Manuela Toj Pérez 209 Ana Síc Síc152 Ernesto Pérez Toj 210 Pedro Sic Sic153 Lucila Morán 211 Lucía Sic Sic154 Mauricio Galiego Morán 212 Florinda Sic Sic155 Eva Mendoza Morán 213 Félix Valey Galiego156 Jacobo Galiego Morán 214 Maria Valey Xitumul157 Telma Galiego Morán 215 Alfonso Valey Xitumul158 Abelina Galiego Morán 216 Santiago Valey Xitumul159 Brigido Xitumul 217 Maximiliano Chen Matías160 Francisca Calate Sic 218 Herlinda Chen Matías161 Rosendo Xitumul Calate 219 Francisco Chen Matías162 Eduardo Xitumul Calate 220 María Josefa Depaz Xitumul163 René Apolinario Xitumul Calate 221 Ana Carmela Pérez Depaz164 Jorge Xitumul Calate 222 Lucía Pérez Depaz165 Patricia Sic Osorio 223 Valeria Leonarda Herrera García166 Fernando Ixpatá Sic 224 Israel Donahí Alvarado Herrera167 Mario García Depáz 225 Rosa García Depaz

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ANEXO II

168 Florinda Depaz Herrera 226 Elizabeth González García

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ANEXO II

227 Isaias de Paz Herrera 282 María Dolores Alvarado De Reyes228 Moisés Depaz Herrera 283 Efraín Reyes Rodríguez229 Mirian Olga de Paz Herrera 284 Lucia Reyes Cuxúm230 Juan Sic Cuxum 285 Florencia Galiego Reyes231 Elena Chen Valey 286 Juana Galiego Reyes232 Manuel de Jesus Galiego Mendoza 287 Paula Galiego Reyes

233 Marcelina Garniga Pérez de Galiego 288 Rosenda Galiego Reyes

234 Blanca Estela Galiego Garniga 289 Felisa Galiego Reyes235 René Antonio Galiego Garniga 290 Octavio Santiago Galiego Reyes236 Héctor Vinicio Galiego Garniga 291 José Guillermo Galiego Reyes237 Francisco Díaz Sucup 292 Cecilia Chen Valey238 Porfiria Díaz Xitumul 293 Irma Yolanda Manuel Chen239 Hercilia Hernández Morales 294 Paula Morales240 Benjamin Ixtecoc Hernández 295 Eugenio Cruz Morales241 Elisa Ixtecoc Hernández 296 Isabel Cruz Morales242 María Rosario Ixtecoc Hernández 297 Luisa Cruz Morales243 Alfredo Ixtecoc Hernández 298 Germán Cruz Morales244 Sabina Us Coloch 299 Mateo Cruz Morales245 Diego Us Coloch 300 Lucía Cruz Morales246 Francisca Us Coloch 301 Sebastiana Cruz Morales247 Narciza Us Coloch 302 Juan Juárez Ixpatá248 Sebastiana Bachan 303 Fermina Juárez Ixpatá249 Ignacia Roman Bachan 304 Felipe Sic Cuxúm250 Juana Román Bachán 305 Tomasa Mendoza Alvarado251 José Luis Román Bachán 306 Alejandro Sic Mendoza252 Rigoberta Román Bachán 307 Lucía Sic Mendoza

253 Marciala Depaz Ciprian De Gonzalez 308 Melesia Sic Mendoza

254 Brigido Depaz Ciprian 309 Patrocinia Sic Mendoza255 Juana Depaz Ciprian 310 Lucía González256 Jesusa Depaz Ciprian 311 Dolores Toj González257 Andrés Depaz Ciprian 312 Julián Pérez Vargas258 Silverio Chen Valey 313 María Roman Galeano De Pérez259 Marcela Juárez López 314 Isaias Pérez Galeano260 Baudilio Chén Juárez 315 Zacarías Pérez Román261 Leandro Chen Juárez 316 Samuel Pérez Román262 Emilia Chén Valey 317 Fidelino Pérez Román263 Margarito Calat Chen 318 Francisco Bolaj264 Roberta Juárez López 319 Pablo Bolaj Siana265 Buenaventura Chen Juarez 320 Vicente Bolaj Siana266 Rosa Chén Juárez 321 Juliana Bolaj Siana267 Juan Bautista Chen Juarez 322 Paula Pérez268 Gloria Chén Juárez 323 Juan Valey Pérez269 Camilo Chen Juarez 324 Sabina Valey Pérez270 Marcos Uscap Xitumul 325 Santiago Valey Pérez271 Albina Chén Valey De Uscap 326 Magdalena Valey Pérez272 Josefina Uscap Chen 327 Medardo Valey Pérez273 Augusto Uscap Chen 328 Matilde Valey Pérez274 Ciriaca López Ixpatá 329 Teodora Jerónimo Cojóm275 Pedrina Juárez López 330 Fernando Valey Jerónimo276 Catalina Garcia Manuel 331 Catalina Depaz Siana277 Ernesto Xitumul García 332 José Ángel Sic Depaz278 Santos Genaro Xitumul García 333 Balvina Sic Depaz279 Delmo Xitumul Garcia 334 Victoria Sic Depaz280 Oscar Ezequiel González García 335 María Luisa Chapot Guzmán281 Fermina Pérez Iboy 336 Tránsito Juarez Uz (ou Us)

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ANEXO II

337 Orlando Sic Depaz338 Armando Sic Depaz339 Mercedes Guzmán Torres340 Luz Elena Chapot Guzmán341 Hilario Galiego Cahcuec342 Leandra Galiego Cahuec343 Julián Galiego Cahuec344 Sebastiana Ixtecoc González345 Dominga Bolaj Ixtecoc346 Felipe Bolaj Ixtecoc347 Jerónimo Bolaj Ixtecoc348 Waldemar Manuel Xitumul349 Florinda Manuel Xitumul350 Rosario Manuel Xitumul351 Juana Juárez López352 Martín Depaz Alvarado353 Telma Depaz Alvarado354 José Mario Depaz Alvarado355 Tomas Morente Galiego356 Maria Morente Galiego357 Cristina García Manuel358 Teresa Xitumul López359 Paulina Xitumul360 Juana García Depaz361 Napoleón García De Paz

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ANEXO III

ANEXO III. PESSOAS NÃO IDENTIFICADAS EM PROCESSO (POSSÍVEIS VÍTIMAS)

1 María Verónica Alarcón Morales2 Raul Alarcón Morales3 Fermina Hernández Mendoza4 Hermelinda Sic Hernández5 Leonardo Alvarado García6 Marcos González Román7 Mauricio González Román8 Juan Capistrano Juárez Beltrán9 Camilo Juárez Beltrán10 Isaías Juárez Beltrán11 Ángel Alvarado Sucup12 Jaime Jesús García13 Mario Xitumul Xitumul14 Leonel Sic García15 Evaristo Sic García16 Rosa Estela Sic García17 José Bonifacio Sic García18 Cecilio Cruz Sic García19 Víctor Chen Mendoza20 Genaro Chen Mendoza21 Modesta Valey22 Hilario Calate23 Juana Calat Sic24 Silvia García Depaz25 Bruna Siana26 Eulalio Sucup Mendoza27 Pablo Canahuí28 Florencia Valey Pérez29 Antonio Sical30 Bernardino Corazón Raxcacó31 Mateo Cruz Morales32 Juana Reyes Roman33 Toribia Reyes Román

34Rosa Tahuico Depaz (suposta esposa de Pedro DepazCiprian)

35Elvira Depaz Tahuico (suposta filha de Pedro DepazCiprian)

ANEXO IV. OS REPRESENTANTES NÃOESPECIFICARAM SE ESTAS PESSOAS

PERMANECERAM DESLOCADAS APÓS O DIA 08DE MARÇO DE 1987

1 Antonia Chén Valey2 Rosalina Juárez Chén3 Eligia Cruz4 Aminta Síc Crúz5 Juan Síc Crúz6 Maria Lucrecia Sic Cruz7 Crisanto Sic Cruz8 Andrea Osorio Galeano9 Maria Teresa Sic Osorio10 Miguel Sic Osorio

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ANEXO III

11 Patricia Sic Osorio12 Juana Sic Osorio13 Paulina Sic Osorio14 Vicente Sic Osorio15 Dionicio Sic Osorio16 Mario Mendoza Sic17 María Mendoza Sic18 Carmela Mendoza Sic19 Lucía Sic Sic20 Florinda Sic21 Pedro Sic Sic22 Ana Sic sic23 Hilda Sic Sic24 Josefa Sic Sic25 Maximiliana Sic Cacoj/Cacaj26 Ramón Sic Cacoj27 Faustina Sic Cacoj28 Ronaldo Sic Cacoj29 Ana Victoria Sic Cacoj30 Bernardo Sic Cacoj31 Liria Sic Cacoj32 Mateo Pérez Cajbón33 Maria Ampérez34 Cruz Pérez Ampérez35 Marta Elena Galiego Chen36 Victoria Chen Galiego37 Juliana Xitumul Ixpatá38 Felipe Garniga Ixpatá39 Rafael Depáz Tecú40 Estéfana Ixtecóc Gonzalez41 Timoteo García Rojas42 Tomás García Valey43 Máxima Emiliana García Valey44 María Concepción Chen Sic45 Rosalina Sic Chen46 Reyna Margarita Sic Chen47 Petronila Sic Chén

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ANEXO IV

48 Mario Sic Chén49 Marcelo Síc Chén50 Pedro Síc Hernández51 Dominga Sucup Cahuec52 Ceferino Alvarado Sucup53 Fidel Alvarado Sucup54 Rosario Román Túm55 Andrés Reyes Román56 Santiago Reyes Román57 Fidelia Morales58 Amelia Milián Morales59 Angélica María, Vilma e Alonzo Torres Milián60 Venancio Torres Gonzalez61 Mateo Grave62 Eusebia Grave García63 José León Grave García64 Margarita Ixtecoc González65 Paula Siana Ixtecoc66 Ángel Alvarado Tecú67 Juan Alarcón García68 Graciela Morente69 Clotilde Felipa Alarcón Morente70 Enriqueta Tecú Chiquito71 Rosa González Tecú72 Juana Xitumul López73 Isabel Reina Bolaj74 Simona Cahuec75 María García Manuel76 Adela Florentina Alvarado García77 Héctor Rolando Alvarado García78 María Concepción Xitumul Xitumul79 Mario Xitumul Xitumul80 Plácido Alarcón Morales81 Buenaventura Pérez Bachán82 Agustín Pérez Bachán83 José Alvarado Matías84 María Elena Alvarado Matías85 Paulina Sic Osorio86 Catalina Xitumul Juárez87 Maria Jesús Matías Ojóm88 Valentina Depaz Sarpec89 Cayetana Sucup90 Zenón Us91 Eligia Coloch Sucup92 Rosalia Román Bachán93 Rafaela Ciprian Coloch94 Antonio Depaz Ciprian95 Mario Depaz Ciprián96 Guillermo González Román97 Mayra Judith González García98 Francisca Iboy99 Catarino Xitumul

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ANEXO IV

100 Dionicio Pérez Iboy101 Vidal Pérez Iboy102 Alfonso Manuel Xitumul (falecido)103 Marco Antonio Cruz Morales104 Fernando Cruz Morales105 Simeón Gonzalez Gonzalez106 Bernarda Pérez Román107 Rosalina Pérez Román108 María Elena Pérez Román109 Vicenta Siana Ixtecoc110 Mercedes Sic Depaz111 Carlos Chapot Guzmán112 Simeón Juárez Us113 Ceferina Cachuec Jerónimo114 Toribio Chen Gonzalez115 Maria Jesús Matías Ojóm116 Pedro Manuel Xitumul117 Marcela Xitumul López118 Rosalínda Manuel Xitumul119 Raúl Manuel Xitumul120 Carlos Manuel Xitumul121 Clara Manuel Xitumul122 Emiliana López Juárez123 Patrocinia Alvarado Camo124 Toribia Galiego125 Victor Cuquej Morente126 Gregoria Manuel Xitumul127 Macario Galiego Mendoza

128 Jerónimo Ixpatá Xitumul

129 Fidel Manuel Xitumul

130 Marcelino Eugenio Morales

131 Juan García Depaz

132 Serapio Pérez Sic

133 Celestino Ixtecoc

134 Ramon Calat Sic

135 Francisco Sic Cuxum

136 Alberto Depaz Reyes

137 Secundino García Gonzalez

138 Vicente Depaz Pérez

139 Mariano Díaz Tolom

140 Andrés Ixtecoc Xitumul

141 Bernardo Roman Ivoy

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ANEXO IV

142 Tomás García Reyes

143 Bernardino Alvarado Alvarado

144 Juan Chen Galiego

145 Nicolás Juárez

146 Leandro Xitumul

147 Santiago Pérez

148 Isabel Alvarado Rojas

149 Julián Galiego Mendoza

150 Feliciano Sucup Cruz

151 Martina Ixpatá Xitumul

152 Florentin Toj

153 Agustin Valey

154 Tomás Valey Pérez

155 Pedro Sic González

156 Miguel Xapot Martínez

157 Juan Chen

158 Daniel Galiego López

159 Dionicio Juárez Valey

160 Luis Depaz Cipriano

161 Francisco Bolaj López