PROJETO DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
Relações solo-relevo em área sob vegetação de restinga na Ilha
Cardoso (SP).
ALUNO: BRUNO GHERARDI ORIENTADOR: PABLO VIDAL TORRADO
PIRACICABA, SP. SETEMBRO DE 2002
RESUMO
O Projeto será desenvolvido na Estação Ecológica da Ilha do Cardoso, onde
se encontra uma Restinga, que faz parte das quatro principais formações florestais
do Estado de São Paulo. Nessa área está sendo feito um mapeamento
ultradetalhado de solos, com amostragem em cada uma das 256 sub-parcelas
permanentes em uma parcela de 10,24ha, que tem a forma de um quadrado. Essa
forma, dividida em 256 sub-parcelas iguais, dá origem a uma malha de 16
transeções longitudinais e 16 transversais, sendo que apenas uma de cada direção
será estudada neste projeto. Este método foi escolhido pelo fato de se ter verificado
uma possível relação entre as variações de microrelevo e os solos da restinga, após
as observações que as tradagens feitas até um metro de profundidade
proporcionaram. Observou-se Espodossolos, Gleissolos e Neossolos Quartzarênicos
em complexa associação na restinga da Ilha do Cardoso, se diferenciando
significativamente devido à sua posição no relevo. Em conseqüência disso, as
transeções escolhidas serão aquelas com a maior diversidade de formas de relevo,
procurando verificar as variações ocorridas no solo da região em função do
microrelevo. Serão obtidas amostras de forma sistemática, de 20 em 20m, por meio
de tradagens de dois metros de profundidade, com eventuais tradagens até o fim do
pacote arenoso (quatro a seis metros de profundidade) nas transeções estudadas.
Essas amostras serão conduzidas para o laboratório, onde serão feitas as análises
química e granulométrica. A configuração lateral e vertical dos horizontes do solo ao
longo das duas transeções será determinada pelo método da análise estrutural.
Relações solo-relevo em área sob vegetação de restinga na Ilha Cardoso (SP).
INTRODUÇÃO
A restinga é a principal formação geomorfológica litorânea encontrada na
costa brasileira. O termo restinga é utilizado aqui no sentido amplo que engloba o
conjunto de comunidades vegetais encontradas nas planícies arenosas quaternárias
de origem marinha. A Biologia tem empregado o termo para expressar um tipo de
comunidade vegetal litorânea determinada por condições edáficas arenosas e pela
influência marinha. A Geologia usa o termo para designar formações sedimentares
arenosas costeiras, de origem recente (alguns milhares de anos) e com variados
aspectos: planícies, esporões, barras, etc. Ecologicamente, as restingas são
ecossistemas costeiros, físicamente determinados pelas condições edáficas (solo
arenoso) e pela influência marinha, possuindo origem sedimentar recente (início no
período Quaternário), sendo que as espécies que aí vivem (flora e fauna) possuem
mecanismos para suportar os fatores físicos dominantes como: a salinidade,
extremos de temperatura, forte presença de ventos, escassez de água, solo instável,
insolação forte e direta, etc.
A principal dificuldade de adaptação vegetal a esse sistema, se deve às
características do solo que dificultam a propagação de plantas dependentes de
maior concentração de nutrientes no solo. A maioria dos solos presentes nessa área
são Podzóis Hidromórficos (Espodossolos) ou não e Areias Quatzosas Marinhas
(Neossolos Quartzarênicos), que são solos essencialmente arenosos e, portanto, de
baixa capacidade de trocas catiônicas, além de aparecer alguns solos com sérias
restrições de acidez e salinidade.
Podzóis ou Espodossolos (EMBRAPA, 1999) compreendem solos minerais
hidromórficos ou não, normalmente de textura arenosa, com horizonte espódico
precedido de horizonte E álbico ou outros horizontes eluviais (OLIVEIRA et al.,
1992). O horizonte espódico é um horizonte subsuperficial, no qual materiais
amorfos ativos, compostos de matéria orgânica e alumínio, com ou sem ferro,
tenham precipitado. Ocorrem normalmente sob um horizonte eluvial que tenha cor
de quartzo lavado, geralmente cinza a cinza claro (EMBRAPA, 1999; ESTADOS
UNIDOS, 1999).
Areias Quartzosas ou Neossolos Quartzarênicos (EMBRAPA, 1999) são solos
minerais, fracamente desenvolvidos, hidromórficos ou não, geralmente profundos,
essencialmente quartzosos, com textura areia ou areia franca ao longo de pelo
menos uma profundidade de dois metros da superfície (sem horizonte diagnóstico
subsuperficial) apresentando perfil AC (OLIVEIRA et al., 1992).
Um fato comum é de solos classificados como Areias Quartzosas Marinhas
de ambientes de restinga apresentarem a grandes profundidades um horizonte
espódico, fora de posição diagnóstica. A determinação da variação lateral desse
horizonte é importante, pois uma das hipóteses deste estudo seria a de que a
acumulação de matéria orgânica em diferentes profundidades promove interações
diferentes com a planta, sendo, portanto, fator limitante na seleção de espécies
adaptadas às condições impostas pelo tipo de solo. Segundo Bremen & Buurman
(1998), existem três teorias para explicar o processo de iluviação da matéria
orgânica para horizontes sub-superficiais. Nelas, a mineralogia e as formas de ferro
e alumínio do solo estão relacionados com o processo de podzolização e este pode
estar condicionado pelas variações do relevo. Sendo assim, o estudo detalhado das
relações entre as variações do microrelevo e os atributos e horizontes do solo
permitirá um maior entendimento dos processos pedogenéticos locais e levantar
hipóteses sobre as relações solo-relevo-vegetação.
OBJETIVOS
Com a observação detalhada das relações entre as variações topográficas e
os atributos do solo, pretende-se discorrer sobre os processos de formação dos
solos presentes na parcela e contribuir para o entendimento da variabilidade dos
solos e sua relação com a vegetação de restinga na Ilha do Cardoso.
MATERIAL E MÉTODOS
A Ilha do Cardoso situa-se no extremo sul do litoral do Estado de São Paulo
no município de Cananéia, entre os paralelos 25003’05”- 25018’18” e os meridianos
47053’48”-48005’42”. Faz parte do complexo estuarino lagunar de Iguape-Cananéia-
Paranaguá, considerado o terceiro do mundo em termos de produtividade pela
União Internacional de Conservação da Natureza (IUCN).
A Ilha possui uma área de aproximadamente 22.500ha, dados climáticos
coletados em baixa altitude (<200m) para o período de dois anos (1990-1991)
revelam que a média das temperaturas mínimas está em torno de 190C. a média das
máximas em torno de 270 C e a precipitação anual entre 1800-2000 mm (Melo &
Mantovani 1994).
A topografia é predominantemente montanhosa, sendo a região central da
ilha ocupada por um maciço que atinge mais de 800m de altura. Os solos das
planícies são resultado de sedimentação marinha recente e são espodossolos,
hidromórfico ou não, caracterizado pelo alto teor de areia, baixos teores de argila e
silte e baixa fertilidade (Giulietti et al., 1983). Nas meias encostas e morros isolados
predominam o Latossolo Vermelho-Amarelo, e nas encostas mais acidentadas o
Podzólico Vermelho-Amarelo com transição para Latossolo Vermelho-Amarelo.
Estes solos, geralmente profundos e bem drenados, são formados a partir de rochas
granito-gnaisse e apresentam alto teor de argila, baixo pH, coloração alaranjada, e
baixa fertilidade (Pfeifer 1989).
Descrição, coleta e amostragem dos solos
Do delineamento original, que consta de uma malha regular de 20X20m,
foram escolhidas duas transeções perpendiculares entre si (a e b, Figura 1), que
varrem a maior parte dos solos e de formas de relevo. Nessas transeções serão
feitas amostragens de dois metros de profundidade a cada 20 metros, sendo
acrescentados alguns pontos em que essa distância contenha variações bruscas de
relevo. Com isso, pode-se precisar de amostragens mais profundas para determinar
com precisão a variação de horizontes, sendo utilizadas nesses casos tradagens de
quatro a seis metros de profundidade chegando até o fim do pacote arenoso. Serão
coletadas amostras para análise das profundidades mais relevantes para a
determinação dos solos. Na Figura 3. que está em anexo, é mostrado o esquema de
amostragem sistemática com malha regular de 20X20m de espesssamento entre
pontos. Esta amostragem está sendo empregada no levantamento ultra detalhado
de solos (PROJETO PARCELAS PERMANENTES, ESALQ USP, 2002).
Será feito neste trabalho um estudo bidimensional da configuração lateral dos
horizontes sub-superficiais, segundo os procedimentos propostos por Boulet et al.
(1982) e, em seguida, serão selecionados os locais para abertura das trincheiras.
Uma maneira interessante de representar essas variações laterais de atributos
relacionados com a podzolizção (como M.O. e % de argila, p.e.) é a utilização das
curvas de isovalores. As curvas de isovalores são representadas pelas Figura 1. e
Figura 2. em anexo (Boulet, 1988).
Análises granulométricas - As análises granulométricas das amostras
coletadas em trincheiras e tradagens serão feitas nos laboratórios do Departamento
de Solos e Nutrição de Plantas da ESALQ/USP. Após agitação horizontal por 16
horas, será feita a separação das frações granulométricas da TFSA (terra fina seca
ao ar) pelo método do densímetro, utilizando-se como dispersante solução contendo
hidróxido de sódio e hexametafosfato de sódio (CAMARGO et al., 1986).
Fração > 2mm (cascalhos e calhaus) e < 2mm (terra fina) – secagem da
amostra total, destorroamento com rolo de madeira, tamisação em peneira de furos
circulares de 2mm; percentagem por volume obtida por medição volumétrica
(imersão) das frações maiores e menores que 2mm; percentagem por peso por
determinação gravimétrica.
Análises químicas de rotina – Essas determinações seguirão as
metodologias recomendadas por RAIJ et al. (1987).
Para determinação da reação do solo serão medidos em H20, em KCl 1M e
CaCl2 0,01M. A matéria orgânica será determinada após oxidação com dicromato de
potássio e titulação com sulfato ferroso amoniacal. Para a determinação do alumínio
trocável, se utilizará KCl 1M como solução extratora. A acidez potencial (H + Al) será
obtida após extração com acetato de cálcio 1M a pH 7,0. Cálcio, magnésio e
potássio trocáveis e fósforo serão determinados pelo método da resina de troca
iônica..
JUSTIFICATIVAS
No projeto das parcelas permanentes, a variabilidade espacial dos atributos
mais relevantes do solo será utilizada para o estudo das relações solo-vegetação.
Embora o mapa de solos ultra detalhado, que está sendo elaborado, forneça a
maioria das informações necessárias à esse fim, o estudo mais detalhado das duas
transeções e das relações solo-microrelevo poderá melhorar o entendimento das
transições entre os diferentes solos e seu respectivo funcionamento, assim como
aumentará a precisão da informação daquele mapa.
FORMA DE ANÁLISES DE RESULTADOS
As observações de campo, tais como: microrrelevo e profundidade do lençol
freático, ocorrência ou não de horizonte espódico, a profundidade em que este
ocorre, grau de cimentação e coloração, serão úteis para a determinação de fatores
que possibilitam a formação deste horizonte.
BIBLIOGRAFIA
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EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA.. Centro Nacional de Pesquisa de Solos (Rio de Janeiro, RJ). Sistema brasileiro de classificação de Solos. Brasília:Embrapa. Produção de informação, Rio de Janeiro:Embrapa Solos, 1999. 412p. ESTADOS UNIDOS. Department of Agriculture. Soil Conservation Service Soil Survey Laboratory Staff. Soil survey laboratory methods manual. 3 ed. Washington, DC. 1996.(Soil Survey Investigation Report 42)
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RAIJ, B. Van; QUAGGIO, J.A.; CANTARELLA, H.; FERREIRA, M.E.; LOPES, A.S. & BATAGLIA, O.A. Análise de solos para fins de fertilidade. Campinas, Fundação Cargill, 1987. 165p.
PFEIFFER, R. M., NOFFS, M. S. & SILVA, D. A. 1989. Correlação de características
do meio biofísico do Parque Estadual da Ilha do Cardoso. Revista do Instituto
Florestal 1: 39-49.
MELO, M.R.F. & MANTOVANI, W. 1994. Composição florística e estrutura
fitossociológica da mata atlântica de encosta na Ilha do Cardoso (Cananéia, Brasil).
Boletim do Instituto de Botânica 9:107-158.
BOULET, R.; CHAUVEL, A. HUMBEL, F.X. & LUCA, Y. Analyse structurale et cartographie en pédologie. Cah. ORSTOM Ser. Pédol., 19:309-351, 1982.
BREEMEN, N.V.; BUURMAN, P. Soil Formation. Dordrecht:Kluwer, 1998. 245p.
CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO
2002 2003Etapas Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set
1 X X 2 X X3 X4 X X X X X X5 X X X X X6 X X X X X X
LEGENDA (Etapas):
1. Reconhecimento dos diferentes tipos de solos existentes. 2. Tradagens sistemáticas (campo) e coleta de amostras. 3. Descrição de perfis completos. 4. Análise estrutural (campo). 5. Análises química e física no laboratório da ESALQ. 6. Confecção de relatórios e publicação.
B Figura 1. representação bidimensional de experimentação sobre uma barra pré-litorânea.
Figura 2. Representação de isovalores de argila do corte A-B (Figura 1).
Figura 3. Prováveis transeções a serem estudadas na Ilha do Cardoso.