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SANCHES, Maria Angelica

Oct 05, 2015

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SANCHES, Maria Angelica
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  • CENTRO REICHIANO DE PSICOLOGIA CORPORAL

    MARIA ANGELICA SANCHES

    O RESGATE DA AUTO-REGULAO POR MEIO DA PSICOLOGIA CORPORAL E DO YOGA

    CURITIBA

    2009

  • ii

    MARIA ANGLICA SANCHES

    O RESGATE DA AUTO-REGULAO POR MEIO DA PSICOLOGIA CORPORAL E DO YOGA

    Monografia apresentada como requisito parcial ao Programa de Especializao em Psicologia Corporal, ministrado pelo Centro Reichiano.

    Orientador: Prof. Dr. Jos Henrique Volpi

    CURITIBA 2009

  • iii

    Sanches, Maria Anglica O Resgate da auto-regulao por meio da Psicologia Corporal e do Yoga / Maria Anglica Sanches Curitiba: Centro Reichiano, 2009.

    Orientador: Prof. Dr. Jos Henrique Volpi

    Monografia do Curso de Especializao em Psicologia Corporal, Centro Reichiano de Psicoterapia Corporal.

    1. Autoconhecimento. 2. Auto-regulao. 3. Carter. 4. Conflito. 5. Energia vital.

  • iv

  • v

    Dedico a todos os indivduos

    cujos corpos perderam a

    habilidade de se auto-regular

    e com ela a possibilidade de

    vivenciar a conexo com a

    essncia divina, adaptando-se

    vida com plenitude.

  • vi

    .

    Agradeo ao Jos Henrique Volpi e a Sandra Volpi pelos ensinamentos

    na rea da Psicologia Corporal e por todo apoio e incentivo durante o curso de

    formao.

    A todos os professores que contriburam para o meu aprendizado tanto

    terico quanto prtico, desenvolvendo em mim qualidades como ser, humano.

    Aos meus pais pelos infinitos apoios e por acreditarem em mim e nas

    minhas buscas.

    A minha filha Jade Slter por me dar a oportunidade de compreender as

    fases do desenvolvimento da criana.

    A minha me Odil Sanches pelo seu tempo despendido na leitura dos

    termos deste estudo com seus teis alertas epistemolgicos.

    Aos amigos pelas gentis pacincias e apoios no percurso dos meus

    estudos e descobertas.

  • vii

    Como a vida pode ser mais fcil e

    cheia de prazer quando a pessoa no

    tem que tomar decises porque o desejo

    est to claro e forte que no h mais

    escolhas de comportamento.

    Alexander Lowen

  • viii

    RESUMO

    O RESGATE DA AUTO-REGULAO POR MEIO DA PSICOLOGIA

    CORPORAL E DO YOGA

    Este estudo tem como objetivo explorar os contedos da Psicologia Corporal para mostrar como os conflitos ocorridos nas etapas do desenvolvimento tm uma qualidade corporal, emocional e mental que afetam o indivduo em sua personalidade, na construo do seu carter e no fluxo da energia vital. Neste contexto, o funcionamento do carter torna-se neurtico com base em contedos recalcados no inconsciente. Esta a origem das couraas que impedem o indivduo de vivenciar a sua natureza genuna, capaz de manter a vida auto-regulada. A filosofia do Yoga anloga Psicologia Corporal, pois define que o ser humano necessita tomar conscincia de unidade por meio do autoconhecimento para vencer as vontades da personalidade egica. A prtica do Yoga um conjunto de tcnicas com objetivo de transformar a conscincia e assim restaurar a paz mental libertando o indivduo dos sofrimentos do ego. A integrao dos vrios aspectos do homem capaz de destruir as reaes inconscientes e lev-lo a um estado de conscincia plena e autorealizada. Palavras-chave: Autoconhecimento. Auto-regulao. Carter. Conflito. Energia vital.

  • ix

    SUMRIO

    RESUMO vii 1 INTRODUO 10 2 A PSICOLOGIA CORPORAL 13 2.1 ESTRUTURAS DE CARTER 22 2.1.1 Estrutura de Carter Esquizide 23 2.1.2 Estrutura de Carter Oral 25 2.1.3 Estrutura de Carter Psicoptica 27 2.1.4 Estrutura de Carter Masoquista 28 2.1.5 Estrutura de Carter Rgida 30 2.2 A PERDA DA AUTO-REGULAO 33 2.3 O RESGATE DA AUTO-REGULAO 36 3 YOGA 41 3.1 LITERATURA VDICA 44 3.2 DHARSHANAS, ESCOLAS ORTODOXAS 45 3.3 YOGA-SUTRA 46 3.4 ASTHANGA YOGA 51 3.4.1 Yamas 52 3.4.2 Nyamas 53 3.4.3 Asana 53 3.4.4 Pranayama 55 3.4.5 Pratyahara 56 3.4.6 Dharana 57 3.4.7 Dhyana 57 3.4.8 Samadhi 58 3.5 AS PRINCIPAIS VIAS DO YOGA 59 3.6 YOGATERAPIA 60 4 CONCLUSO 64 REFERNCIAS 69

  • 10

    INTRODUO

    O presente estudo tem por objetivo mostrar como o indivduo perde a

    auto-regulao e como poder resgat-la por meio da Psicologia Corporal e do

    Yoga. Este estudo colocou em enfoque o indivduo que perde sua auto-

    percepo, auto-expresso e auto-possesso devido construo de couraas

    psquicas e musculares provenientes de conflitos no decorrer do seu

    desenvolvimento. O segundo captulo aborda as idias de Wilhelm Reich e de

    outros autores que se basearam em suas descobertas para explicar como as

    desordens internas se refletem na integridade do ser humano. O interesse em buscar como o indivduo perde sua auto-regulao aconteceu devido aos

    estudos sobre os traos de carter que definem padres de comportamentos e

    acabam por limitar a pulso vital.

    A energia est presente no corpo desde a vida embrionria e constitui as

    razes dos processos vitais. Neste captulo explicado como o beb pode

    perder a sua pulsao natural no nascimento e nas fases do desenvolvimento

    que seguem at por volta dos sete anos, chegando vida adulta com conflitos

    decorrentes de estresses prematuros. Sendo assim, o indivduo adulto cria

    padres de funcionamento para defender sua sade fsica e mental. Restringe

    a mobilidade do corpo, diminui a respirao e bloqueia a expressividade. Isso

    gera um conflito no indivduo desde a fase infantil, onde ceder ou no as suas

    necessidades uma angstia. A criana passa a limitar o impulso da energia

    vital para preservar-se do meio e com isso impossibilita o desenvolvimento

    saudvel da percepo, da sensao, do pensamento e da ao. O intuito foi

    investigar os reflexos dessas limitaes sobre o corpo e a mente do indivduo

    adulto.

    Todas as descobertas e registros de Reich apiam-se em um princpio

    bsico que sustenta o seu trabalho, citado por Volpi e Volpi (2003b): mente e

    corpo so indissolveis e se influenciam mutuamente. Com base neste

    princpio, pode-se fazer uma possvel ligao da viso de Reich com a filosofia

    do Yoga. Por esta razo sero aproximadas essas duas abordagens de

    transformao no funcionamento do ser humano. O Yoga uma filosofia de

    vida, sendo apontada como um dos mais antigos sistemas holsticos que

    possibilita colocar em harmonia o corpo, a mente e as emoes do ser

  • 11

    humano, para gerar uma ao mais coerente com os pensamentos e os

    sentimentos.

    O indivduo precisa perceber e identificar como chegou ao ponto

    limitante da sua vida para que possa romper as barreiras para alcanar a auto-

    expresso e a auto-possesso. Isto o levar a vivenciar o potencial do seu ser

    para garantir uma sade mais vibrante, com criatividade e honestidade,

    respeitando a si prprio e ao ambiente.

    Tanto a Psicologia Corporal quanto o Yoga acreditam que o indivduo

    possui um fluxo energtico que garante os processos de funcionamento do

    corpo, desde as funes mais sutis como as sinapses entre clulas nervosas

    at as funes mais externadas como caminhar, falar, etc. A quantidade e

    qualidade de energia no corpo definem a capacidade de se movimentar, sentir

    e se expressar no ambiente, refletindo a personalidade e a atitude do indivduo

    em relao vida. Um corpo com maior fluxo energtico ter mais condies

    de vida, enquanto um corpo com menos fluxo estar com sua vivacidade

    reduzida.

    O terceiro captulo traz a filosofia e a prtica do Yoga. Segundo

    Desikachar (2007) esta escola tem suas razes no pensamento indiano, mas

    seu contedo universal, porque trata dos meios pelos quais o indivduo pode

    realizar as mudanas necessrias em sua vida. Neste captulo apontado

    como a prtica do Yoga que est contida em sua filosofia - destaca em seus

    ensinamentos a atitude de estar atento s prprias aes de tal modo a

    desenvolver uma observao mais cuidadosa que possibilitar a descoberta de

    si e dos prprios limites.

    Iyengar (2006) descreve que o Yoga busca resgatar a paz mental,

    gerando mais estabilidade e tranqilidade para enfrentar as situaes

    estressantes da vida. O Yoga ensina o caminho para auto-realizao, atuando

    sobre os obstculos impostos pelo ego, indisposies fsicas e mentais que

    impedem a perfeita harmonia entre corpo e mente. As tenses acumuladas

    perturbam a mente, estressam o corpo e causam enfermidades orgnicas. Ter

    sade no estar livre de doenas, mas ter condies de retornar ao estado

    de equilbrio e harmonia. O Yoga um grande colaborador deste processo.

    Iyengar (2006, p. 20) diz que: O Yoga no uma cura milagrosa, capaz de

    liberar a pessoa de todo o estresse, mas pode ajudar a minimiz-lo. Os

    estresses roubam as reservas de bioenergia, porque recorrem aos estoques de

  • 12

    energia vital armazenado nas clulas nervosas, esgotando as reservas

    energticas e levando o indivduo a um colapso fsico e mental. O Yoga fornece

    ao indivduo a oportunidade de entrar em contato consigo mesmo e melhor

    entender-se, contribuindo para o amadurecimento e integrao entre corpo,

    mente, intelecto e alma.

    Relacionei a Psicologia Corporal com o Yoga com intuito de mostrar

    como se complementam em suas teorias e prticas e podem contribuir uma

    com a outra para o resgate da auto-regulao do corpo. Ambas fornecem a

    oportunidade ao indivduo de se autoconhecer e possibilitam a harmonia

    interna para motivar buscas mais condizentes com as verdadeiras

    necessidades.

  • 13

    PSICOLOGIA CORPORAL

    Segundo Volpi e Volpi (2003a) Reich foi discpulo e dissidente de Freud.

    Aps alguns anos atuando como psicanalista, se sentiu insatisfeito com os

    resultados subsequentes das tcnicas utilizadas pela psicanlise, percebeu

    que no havia mudana efetiva no paciente e acabou por criar sua prpria

    escola denominando-a inicialmente de Economia Sexual e finalmente de

    Orgonomia. Com isso afrontou as idias da prtica psicanaltica proposta por

    Freud e foi expulso das Sociedades Psicanalticas Nacional e Internacional.

    Devido a este fato mudou-se para os Estados Unidos. L enfrentou o governo

    americano por desacato autoridade devido a suas idias e trabalho com a

    energia orgonio, onde condenado a dois anos de priso. Antes mesmo de

    completar um ano na priso faleceu vtima de um ataque cardaco.

    Reich aps abandonar a psicanlise em 1928, trabalhando com a

    Economia Sexual, desenvolveu a tcnica da Anlise do Carter, que mais tarde

    foi incorporada aos estudos do sistema neurovegetativo e passou a se chamar

    Vegetoterapia Caracteroanaltica, at que com a descoberta da energia

    orgonio, passou a ser chamada de Orgonoterapia. A Anlise do Carter

    conforme Volpi e Volpi (2003b) consiste em analisar as atitudes da pessoa a

    fim de alcanar o inconsciente, pois a idia de que a incapacidade de

    descarga da energia libidinal quando retida no corpo gera a couraa psquica e

    seu correspondente somtico, a couraa muscular. Conforme o prprio Reich

    (1998), em suas pesquisas, constatou que as couraas surgem a partir de uma

    resistncia de carter introduzida na estrutura psquica que est enraizada no

    inconsciente, devido s tenses crnicas de experincias traumticas ao longo

    da vida.

    Nas couraas esto presentes contedos recalcados inconscientes.

    Reich (1998) define que as resistncias decorrentes destes contedos se

    manifestam no comportamento do indivduo de diversas maneiras como,

    censuras, distores, projees, racionalizaes, condensaes etc., e acaba

    por afastar o indivduo da realidade. Este indivduo passa a criar um modo

    especifico de existir que determina o seu trao de carter. Reich percebeu que

    no s as reaes procedentes da couraa psquica eram neurticas, mas que

    o indivduo apresentava um carter neurtico, e para soluo da neurose seria

  • 14

    necessrio regular a energia orgnica dissolvendo as couraas que atuam

    como mecanismo de defesa.

    A partir destes esclarecimentos Reich passou a ver a neurose no

    aspecto econmico-energtico. Reich (1998) afirma que a couraa serve tanto

    para proteo dos estmulos externos quanto para o controle da energia

    libidinal. O indivduo estabelece certo equilbrio de funcionamento e mesmo

    que neurtico, este representa o resultado de seu desenvolvimento total. Por

    meio da anlise do carter possvel perceber os comportamentos de defesa

    motivados pelas couraas, que definem o funcionamento do indivduo e

    expressa todo o seu passado. Para restabelecer a energia libidinal Reich

    levantou a necessidade de descobrir onde ela fica retida e como afeta o

    organismo humano. Na analise do carter passa a prevalecer os mecanismos

    de defesa e no mais somente os aspectos do inconsciente reprimido.

    A dinmica da economia energtica levou Reich a observar o corpo,

    onde percebeu a existncia de um movimento energtico em direo a

    superfcie do corpo, promovendo a expanso, a descarga. Em compensao,

    surge um movimento em direo ao centro que ocasiona a sobrecarga do

    sistema, gerando a contrao. Firma-se assim o conceito de anttese centro-

    periferia relacionada com carga-descarga. Sobre este aspecto Reich passa a

    estudar o sistema neurovegetativo do corpo humano e a ligao entre os

    processos de expanso provenientes do sistema nervoso autnomo

    parassimptico e os processos de contrao oriundos do sistema nervoso

    autnomo simptico. Surge ento a Vegetoterapia Caracteroanaltica. Volpi e

    Volpi (2003 b, p. 9) expem a definio: Essa terapia recebeu o nome de

    Vegetoterapia porque uma terapia que trabalha sobre o sistema

    neurovegetativo; e caractero-analtica porque no decurso da terapia possvel

    fazer a analise de carter da pessoa.

    Volpi e Volpi (2003 b) comentam ainda que Reich seduzido por suas

    descobertas a respeito dos movimentos reflexos do corpo humano iniciou uma

    srie de investigaes, entrando na rea da biofsica. Encontrou a existncia

    de uma energia dentro e fora do organismo, a qual chamou de orgone. Com a

    descoberta desta energia csmica, Reich d origem teoria da pulsao

    orgstica do plasma. Seu trabalho ento passou a se chamar Orgonomia, cuja

    funo estudar a energia dentro e fora do organismo.

  • 15

    A orgonomia uma abordagem humana que busca compreender todo o ser vivo como uma unidade de energia que contem em si dois processos paralelos: o psiquismo (mente) e o soma (corpo). Tem por objetivo reencontrar a capacidade do ser humano de regular sua prpria energia, e, por consequncia, seus pensamentos e emoes, podendo alcanar uma vida mais saudvel (VOLPI e VOLPI, 2003 b, p. 11).

    O indivduo utiliza-se de dois nveis de funcionamento para interagir com

    a natureza: o psquico (mente) e o somtico (corpo). Estes dois nveis

    determinam uma unidade funcional que constituem as caractersticas desta

    interao. Lowen (1982) cita que para Reich todos os processos biolgicos so

    caracterizados pela anttese e pela unidade. De acordo com Reich (1998, p.

    324): A relao antittica clara: o comportamento fisiolgico determina o

    comportamento psquico, e vice-versa. Sendo assim, se um dos nveis est

    em conflito refletir no sistema orgnico como um todo e perturbar a unidade

    de funcionamento. Neste contexto, vale ressaltar que a relao entre os dois

    nveis dialtica e estabelecem uma identidade de funcionamento. Reich fez

    algumas descobertas atravs de dados clnicos - por meio da orgonomia - ao

    verificar esta relao e chegou a formulaes fundamentais para o avano do

    entendimento da relao psicofsica, delineou-as em:

    1) a funo bsica da psique de natureza econmico-social; 2) a excitao sexual e as sensaes de angstia so, ao mesmo

    tempo, idnticas e antitticas (isto , derivam da mesma fonte do organismo biopsquico, mas correm em direes opostas) e representam a anttese bsica irredutvel do funcionamento vegetativo;

    3) a formao do carter resultado de uma ligao da energia vegetativa;

    4) a couraa de carter e a couraa muscular so funcionalmente idnticas;

    5) a energia vegetativa pode ser liberada, isto , reativada, a partir da couraa do carter e da couraa muscular, com o auxilio de uma tcnica definida [...] (REICH, 1998, p. 325).

    O ponto de partida da orgonomia explicado por Reich (2003) est em

    funes observveis e mensurveis produzidas pela energia orgone csmica

    sobre os seres vivos de uma forma organizada. O fio condutor do estudo da

    motilidade, sendo este, a capacidade do organismo vivo de se mover

    espontaneamente, ou ainda de manifestar seu processo vital, foi encontrado na

    funo do orgasmo. Reich (2003, p. 196) descobriu que a convulso orgstica

  • 16

    governa todo o reino animal nas prprias razes de sua existncia

    bioenergtica.

    Calegari ((2001) define que Reich determinou a frmula do orgasmo a

    partir da observao de quatro momentos do material plasmtico: a tenso e a

    carga determinam a absoro da energia do ambiente, elevando de forma

    progressiva o potencial energtico do cerne, onde h um aumento da tenso

    mecnica e da carga energtica do metabolismo vital; em consequncia do

    acmulo de tenso o sistema vivo produz a descarga e o relaxamento, onde h

    o alvio do metabolismo vital e a liberao do excesso de energia plasmtica.

    Todo este processo produz o que Reich havia constatado ao examinar o

    sistema neurovegetativo: todo organismo possui uma srie repetitiva de

    expanses e contraes por onde carrega e descarrega o material plasmtico e

    a energia. Este funcionamento permeia toda escala biolgica. Calegari (2001,

    p. 29) esclarece esta afirmao mostrando que esses movimentos ocasionam

    sempre o mesmo resultado: a pulsao entre um perodo de fechamento e

    acmulo de matria e energia e um perodo de abertura e descarga de matria

    e energia.

    Volpi (2003 a) comenta que segundo os estudos de Reich,

    particularmente sobre o Sistema Nervoso Autnomo, a anttese simptico-

    parassimptico foi quem trouxe a compreenso da motilidade do organismo. O

    sistema simptico sinnimo de contrao, de angstia e retraimento,

    enquanto o parassimptico sinnimo de expanso, de prazer e abertura.

    Estas duas funes, contrao e expanso geram onda e pulso, impulsionando

    a energia por todo sistema vivo e promovendo a pulsao plasmtica. Esta

    pulsao o reflexo do estado interno do corpo e o meio pela qual a matria

    viva se percebe. Calegari (2001) interpreta que os movimentos de onda e pulso

    conduzem percepo das sensaes, emoes, sentimentos e pensamentos.

    A vida corporal percebida devido aos movimentos internos provocados pela

    pulsao plasmtica, enquanto a percepo desenvolve a existncia psquica.

    A percepo acrescenta Lowen (1997), um fenmeno de superfcie,

    tendo em vista que, um sentimento ocorre s quando o impulso atinge a

    superfcie do corpo, o que abrange os msculos voluntrios. A fora e a

    intensidade da pulsao plasmtica dentro do organismo o que traz os

    estmulos e sensaes superfcie e impulsionam o ser vivo a interagir com o

    meio ambiente e se perceber como identidade funcional: eu sou isso,

  • 17

    aumentado assim a vivncia corporal e psquica. A partir das percepes e

    sensaes corporais a mente nomeia e explica as emoes e sentimentos

    como respostas lgicas frente ao mundo externo. O ser passa a se perceber

    como uma organizao fsica que percebe o seu ambiente e a si mesmo

    atravs das sensaes.

    Ainda segundo as pesquisas de Reich apud Calegari (2001), os

    msculos estriados esqueltico fazem parte da periferia do organismo,

    enquanto os msculos lisos exerce domnio nos vasos sanguneos e nas

    vsceras, ou seja, no cerne do corpo. A pulsao acontece do cerne para a

    periferia e vice-versa. Quando o corpo est interagindo com o meio a pulsao

    desloca a energia do cerne para periferia, fornecendo tenso e carga; o cerne

    se expande expulsando a carga energtica para fora. Quando a energia retorna

    ao cerne acontece a descarga e o relaxamento da periferia; ela entra em

    expanso abrindo-se para o exterior. Neste momento, o cerne se contrai devido

    ao retorno da carga energtica e em seguida, novamente se expande e

    expulsa a carga para periferia. Esta a dinmica do funcionamento do sistema

    vital, cuja vida pulsa entre o perodo de individualizao, ou seja, de retorno

    para dentro, e entre o perodo de interao, de abertura para fora.

    Essa troca de energia pela carga e descarga, expanso e contrao no

    corpo est ligada aos movimentos internos e aos nveis de conscincia,

    fornecendo ao corpo a vivncia do EU. O EU sente e responde a este

    sentimento com algum movimento, seja em nvel de percepo, de

    pensamento, de comunicao ou de ao. Segundo Calegari (2001) o

    movimento plasmtico que parte do cerne em direo a periferia o que pode

    se chamar de emoo. O autor citado acima (2001, p. 43) descreve que: As

    emoes primrias so o prazer, a raiva e a expresso da dor (choro). Reich

    nomeou de remoo o recuo da energia para o cerne, e relacionou duas

    remoes primrias: a angstia e o medo. Portanto, o corpo expressa o que

    sente, e sente o que expressa, dando caractersticas personalidade. No

    entanto, o corpo o EU (o indivduo), e o EU o corpo.

    O corpo est constantemente em movimento, pulsando e gerando ondas

    que dinamizam as emoes e movimentam o corpo em busca da satisfao

    das necessidades e anseios internos. Neste momento a pulsao natural

    decorrente das vsceras e a periferia do corpo se move diante a esta condio,

    confiante que o ambiente acolher seu impulso. Caso isso no ocorra, o corpo

  • 18

    paralisa a excitao interna e experimenta o recuo da energia, gerando uma

    contrao muscular e respiratria, de tal modo a diminuir a vitalidade corporal.

    Para Navarro (1995) todo comportamento demanda de algum esforo muscular

    para expressar-se. Se a necessidade de expresso for reprimida, o empenho

    gerado ficar ancorado nos msculos que entraram em ao para cumprir a

    necessidade da expresso. Navarro (1995, p. 18) diz: Para mim, tudo o que

    diz respeito memria emotiva est ligada aos msculos e tudo o que diz

    respeito memria intelectiva est ligado clula nervosa.

    O recuo da energia foi o que Reich denominou de couraa muscular. O

    fluxo energtico expressa a onda emocional e a paralisia do impulso retm a

    vivencia da emoo por meio da contrao muscular, impedindo o processo

    natural e limitando a pulsao vital. Este mecanismo passa a ter funes de

    defesas inconscientes de proteo vida, com intuito de preservar a identidade

    funcional do individuo. Quando a energia liberada pela via reprimida, os atos

    serviro para sustentar as dificuldades e a baixa energia de expresso,

    fazendo surgir a imagem do ego. Calegari (2001) expe que Reich chega a

    afirmar que todos os conflitos existentes dentro da vida decorrem desse conflito

    inicial entre energia e a matria dentro do sistema vital.

    De acordo com Lowen (1982) o que ocorre da conteno que, a

    musculatura da qual foi retirada a energia, entra em contrao crnica ou

    espasticidade, permitindo a no-expresso dos sentimentos inibidos e com isto

    o distanciamento do desejo inibido. O indivduo constri um modo tpico de

    reagir para evitar o contato com as foras pulsionais que o impulsiona para

    satisfao de seu desejo. Reich (1998) esclarece que a psicanlise provou que

    este funcionamento estabelece o encouraamento do ego contra as ameaas

    do mundo exterior e as exigncias pulsionais. Cria-se um mecanismo

    automtico independente da vontade consciente, que determina a formao do

    carter.

    Reich (1998, p. 151) cita: O carter consiste numa mudana crnica do

    ego que se poderia descrever como um enrijecimento. Este enrijecimento a

    base para incapacidade de descarga e interrupo no fluxo de expanso e

    contrao, responsvel pelas reaes crnicas; o propsito deste mecanismo

    resguardar o ego dos perigos internos e externos. Reich definiu esta forma de

    funcionamento como encouraamento, pois definem comportamentos de

    carter do indivduo com padres inconscientes, que restringe a mobilidade

  • 19

    psquica da personalidade como um todo. Estas restries so dificuldades de

    vivenciar o mundo interno e externo de forma a entregar-se s emoes

    bsicas da vida e realidade das sensaes.

    Exatamente como todas as emoes e reaes na vida brotam de sensaes de rgos e movimentos expressivos e correspondem a eles; exatamente como o organismo vivo forma idias do mundo que o cerca a partir das impresses que deriva das expresses do mundo sua volta; do mesmo modo todas as emoes, reaes e idias do organismo encouraado esto condicionadas pelo seu prprio estado de mobilidade e expresso (REICH, 2003, p. 59).

    Nestas circunstncias a condio corporal cria mecanismos para moldar

    os pensamentos e construir uma auto-imagem de acordo com as limitaes

    geradas pela pessoa. Essas manobras so realizadas pelo ego de acordo com

    o princpio do prazer e do desprazer, e tambm para evitar que as sensaes

    de conflitos inconscientes se tornem conscientes. Desta forma o indivduo est

    protegido dos seus impulsos. Em situaes de desprazer a couraa se contrai,

    fazendo com que a pessoa perca o contato com as sensaes internas e com a

    realidade externa; em situaes de prazer, ela se expande, aproximando a

    pessoa tanto de sua realidade interna quanto da externa. O que sustenta o

    trao de carter e diferencia o grau de flexibilidade deste, segundo Reich

    (1998) a capacidade do indivduo de se abrir e se fechar para o mundo

    externo. Dependendo da circunstncia, sua estrutura pode ser guiada para a

    realidade ou manter-se em uma estrutura de carter neurtico.

    Reich (1998, p. 152) afirma que: A couraa de carter forma-se como

    resultado crnico de choque entre exigncias pulsionais e um mundo externo

    que frustra essas exigncias. Como a construo do carter tambm acontece

    diante dos conflitos da existncia e da defesa da prpria integridade, ele passa

    a ser uma expresso de natureza secundria - a manifestao do ego - e assim

    deixa-se a natureza genuna a manifestao do self encoberta pelos

    comportamentos e buscas inadequadas. O ego estabelece a comunicao

    entre os mbitos interno e externo do indivduo. Se o mundo interno esta

    limitado por crenas, as relaes externas acontecem com objetivo de

    sustentar essas crenas, portanto, desconectadas da verdade sincera do

    indivduo. Neste processo perde-se a expresso espontnea e passa-se a ter

    um carter neurtico, ancorado em crenas e defesas com o intuito de manter

    a harmonia com o ambiente externo.

  • 20

    A caracterstica bsica do carter est na sintonia que existe entre a identidade mental e o como nos percebemos. Acreditamos que somos de determinada forma, percebemo-nos e nos explicamos como sendo exatamente dessa forma (CALEGARI 2001, p. 7).

    A citao acima a base da neurose, pois o indivduo muitas vezes

    desiste da sua verdadeira natureza e passa a desempenhar um papel que foi

    organizado atravs de conflitos internos. Isto limita a sua vida e seu ser.

    Segundo Lowen (1986, p. 75): A mscara ou disfarce tornou-se parte do nosso

    ser. O papel passou a ser uma segunda natureza para ns, e nos esquecemos

    de como era nossa natureza original. No entanto, o ego se fortalece e mantm

    os contedos recalcados mais presentes na vida do indivduo, pois, o ego tem

    que se enrijecer e assumir um carter produtivo e automtico, j que

    enfraquecer seu papel tornou-se uma ameaa fsica e psquica. Lowen (1977,

    p. 118) comenta: O carter a expresso do funcionamento do indivduo tanto

    no mbito psquico quanto no somtico [...]., sendo assim, ele a maneira

    habitual com a qual o indivduo confronta a vida.

    Reich observou que o organismo humano apresenta sete segmentos ou

    anis circulares ao longo do corpo sem uma delimitao anatmica definida.

    So representaes das reas funcionais do sistema nervoso autnomo, onde

    cada um exibe uma capacidade de pulsao independente. Sobre esta

    descoberta Reich traou um mapeamento emocional do corpo humano e

    denotou que cada anel tem sua pulsao elevada de acordo com a fase de

    desenvolvimento que o ser atravessa e as buscas relacionadas a ela. Colocar

    em risco a pulsao plasmtica das partes anatmicas envolvidas em um anel,

    devido ao comprometimento energtico resultante das constantes frustraes,

    demarca a couraa e a regio onde houve a fragmentao do fluxo energtico.

    Os segmentos descobertos por Reich so: ocular, oral, cervical, torcico,

    diafragmtico, abdominal e plvico. No h uma relao anatmica entre eles,

    mas emocionalmente eles esto interligados. Reich estudou as etapas do

    desenvolvimento emocional do indivduo, desde a gestao at a maturidade,

    com o intuito de entender o desenvolvimento energtico de cada segmento, a

    que etapa correspondia e os possveis bloqueios da pulsao energtica. Os

    bloqueios gerados em uma determinada etapa determinam o carter do

    indivduo adulto e sua fixao na fase correspondente ao conflito. Estes

    mecanismos inconscientes limitadores da pulsao vital foi o que Reich

  • 21

    determinou de couraas. Pierrakos (1990, p. 89) completa esta idia afirmando

    que: Essa negao do fluxo de energia o denominador comum de toda a

    disfuno humana, [...], moldam as caractersticas especificas de cada

    pessoa.

    Devemos fazer uma distino entre os mecanismos protetores inconscientes e conscientes. Os primeiros constituem as couraas; elas esto fora da conscincia e do controle voluntrio, so automticas. Alm das couraas, o ego necessita de mecanismos de proteo para estar no mundo, porm devem ser conscientes e, portanto, flexveis, podendo ser usado ou no (CALEGARI, 2001, p. 65, 66).

    Com base nos estudos de Reich, Calegari (2001) descreve que o

    encouraamento pode acontecer em quatro nveis diferentes. Cada um produz

    uma couraa especfica: 1) Couraa vegetativa do cerne restringe a pulsao

    energtica; 2) Couraa muscular reprime a vivncia corporal muscular, ou

    seja, as limitaes dos movimentos deliberam a forma de sentir e agir de

    acordo com as defesas do carter; 3) Couraa caracterolgica limita a vivncia

    psquica, est conectada a organizao da couraa muscular, pois por meio

    dos comportamentos estrutura-se a percepo e o pensamento, gerando

    conceitos, imagens, interpretaes e racionalizaes de si e do meio; 4)

    Couraa vegetativa visual afeta organizao da conscincia, ela incide da

    unio entre as vivncias corporais e psquicas e responsvel por estabelecer

    a autopercepo. Nesta conjuntura, Calegari (2001, p. 68) argumenta: Na

    realidade, sempre que houver uma parte do corpo encouraado, ocorrero

    diminuio da autopercepo e racionalizaes ou crenas errneas a respeito

    dela e de suas funes.

    Ainda sobre a reflexo de Calegari (2001), a relao entre as formas de

    couraa, seja pela diminuio da vitalidade, limitao dos movimentos,

    estruturao da percepo e do pensamento resulta em uma nica questo:

    limita-se conscincia para preservar a identidade egica. Lowen (1977) alega

    que Reich formulou a funo econmica do carter afirmando que a resistncia

    do carter surge como meio de evitar o desprazer e de absorver energias

    reprimidas. A formao do carter procede de experincias infantis que

    produzem no indivduo adulto a resistncia do carter atravs de

    comportamentos defensivos e transfernciais. Sobre este contexto, Lowen

  • 22

    ainda enfatiza que o carter para ter acepo necessita estar relacionado

    estrutura do ego.

    [...] deve-se salientar uma vez mais que a formao do carter depende no apenas do fato de a pulso e a frustrao chocarem-se uma contra a outra, mas tambm da maneira como isso aconteceu, da fase de desenvolvimento durante a qual os conflitos que formam o carter ocorreram e das pulses envolvidas (REICH, 1998, p. 155).

    Reich (1998) acrescenta que carter no so apenas os

    comportamentos, e sim a totalidade de tudo o que o ego constri como padres

    de reao, ou ainda, caractersticas de reaes de uma personalidade

    especfica. Os mecanismos protetores do carter atuam quando a angstia

    sentida no interior do corpo, pode ser de natureza interna pulsional ou por um

    estimulo externo pertinente ao aparelho pulsional, todavia, em qualquer uma

    das situaes o carter tende a controlar a angstia presente. O que

    caracteriza cada carter no sua resistncia, mas as foras pulsionais

    utilizadas para isto. As couraas concebem os limites em que o ego pode

    funcionar sem angstia, portanto, o indivduo percebe, pensa e age dentro dos

    limites do seu carter.

    Pierrakos (1990) fala que essas caractersticas de funcionamento

    tendem a seguir padres, porque os seres humanos tem modos similares de

    estabelecer defesas contra a dor, a ansiedade e o sofrimento. Essas

    caractersticas de padres de defesa tiveram seu inicio catalogado por Freud

    de acordo com a origem da histria psicolgica da pessoa. Aps Reich

    analisou-as atravs das atitudes e as determinou como estruturas de carter.

    A caracterologia analtica proposta por Reich e formulada na funo econmica

    do carter levou Lowen (1982) atravs da bioenergtica a classificar os

    diversos traos de carter em cinco tipos bsicos de estrutura: esquizide, oral,

    psicoptica, masoquista e rgida. Cada um deles tem um padro comum de

    defesa tanto a nvel em psicolgico, energtico e em nvel muscular, sendo isto

    que os diferenciam. Nenhum indivduo um tipo puro de carter e o que o

    define de acordo com Pierrakos (1990) so trs formas de negao: vontade

    prpria, orgulho e medo. So formas que se combinam na pessoa e que

    influenciam na sua vitalidade, nos seus impulsos e nas suas defesas

    manifestadas com objetivo de controlar o meio e aliviar a angstia.

    2.1 ESTRUTURAS DE CARTER

  • 23

    Antes de relatar as caractersticas dos cinco tipos de carter vale

    salientar a distino entre neurose de carter e neurose sintomtica, pois sero

    aspectos citados nas descries a seguir. A primeira j foi esclarecida

    anteriormente, mas Calegari (2001) enfatiza como sendo um conjunto de

    crenas que surgem como soluo aos comprometimentos infantis, quando h

    discordncia entre as crenas e o funcionamento ou entre o indivduo e o

    ambiente, surgindo s racionalizaes e negaes. A neurose de carter

    egossintnica, demarca a forma do indivduo funcionar no mundo. A neurose

    sintomtica desvenda um momento de desequilbrio da economia energtica,

    quando o equilbrio entre as couraas caracteriolgica e muscular rompem.

    Neste momento a estase energtica aumenta e sobrecarrega os rgos e as

    funes fisiolgicas, ocasionando sofrimentos, sintomas corporais e

    dificuldades de relao com o ambiente. Acontece uma incapacidade do

    carter em solucionar a tenso interna.

    Na sequncia, resumidamente, apresenta-se os cinco tipos de carter

    segundo a escola da Anlise Bioenergtica de Alexander Lowen:

    2.1.1 Estrutura de Carter Esquizide

    A constituio deste carter est vinculada ao segmento visual, ou etapa

    ocular. A experincia emocional que interrompe o desenvolvimento saudvel

    acontece no tero materno e/ou nos primeiros vnculos afetivos, por meio da

    rejeio por parte da me. A me mostra-se fria nessa fase, mesmo que

    inconscientemente e afeta o contato do beb com o mundo. Este sente sua

    vida ameaada e percebe o mundo de forma hostil e no-acolhedora, por isso

    retrai sua energia para dentro do corpo como meio de evitar sua relao com a

    realidade, pois o mundo no o sustenta. Quando se concretiza esta ao os

    sentimentos do prprio corpo so negados, a identidade desenvolve-se

    baseada em uma imagem projetada pelos pais - j que a estruturao da

    identidade necessita do corpo - enfraquecendo o ego da criana. Acontece

    assim uma ciso entre ego e corpo.

    O indivduo que apresenta trao de carter esquizide tem a tendncia a

    dissociar-se dos sentimentos e de se retrair da realidade externa. Costuma

    valorizar a razo e desvalorizar as emoes, nega o seu corpo e suas

  • 24

    sensaes. Segundo Volpi e Volpi (2003 c, p. 64): O esquizide, por sua vez,

    sabe que tem corpo, orienta-se no tempo e no espao, mas no se identifica

    com seu corpo, no se sente vivo, desliga-se de si mesmo, do mundo e das

    pessoas. Lowen (1979) expe que este indivduo utiliza-se de

    intelectualizaes para sustentar o contato com a realidade, j que este lhe

    desperta sentimentos como a rejeio e a hostilidade, alm de sobrecarreg-lo

    de medo. H um medo de contato severo, pois a alienao e o isolamento

    caracterstico do esquizide enfraquecem o ego e o seu senso de identidade. O

    contato com o mundo representa uma tentativa de auto-afirmao para

    qualquer indivduo, mas para um indivduo com este trao de carter ele

    obtido como uma possvel aniquilao do ego.

    Calegari (2001) afirma que a fora energtica est nos olhos, ativando o

    primeiro movimento do ego de ir para o mundo. A fase visual aonde o beb

    inicia a vivncia do ego perceptivo. O movimento saudvel do ego seria

    ostentar o prazer de ir para mundo, perceb-lo visualmente e sentir-se

    pertencente a ele. O movimento dos olhos principia a separao da me, e a

    percepo entre o EU e o TU. Assim sendo, desenvolve-se a percepo

    objetiva da realidade (funo do ego) e o centramento da identidade

    energtica (funes do EU).

    Na estrutura de carter esquizide a carga de energia costuma enrijecer-

    se no centro do corpo, devido as fortes contraes musculares utilizadas para

    manter os impulsos naturais sobre controle como forma de proteo. Lowen

    (1982) afirma que a energia da pessoa com este trao esta retida e no flui do

    centro para os rgos que fazem contato com o mundo: rosto, mos, genitais e

    ps. H uma desconexo com a superfcie do corpo, a musculatura prxima

    superfcie est contrada, o que diminui os impulsos e dificulta a motilidade do

    organismo, mantendo o corpo com uma baixa carga energtica. Quando h

    rupturas graves no fluxo energtico esta estrutura se aproxima da psicose.

    Pierrakos (1990, p. 93) apresenta as trs formas de negao desta estrutura no

    seguinte trecho:

    A Essncia est cercada por negaes primais no-integradas, e a principal emoo protetora transmitida periferia o medo. Isso produz extrema desconfiana, que chega parania, nos vrios eus da mscara. O orgulho na estrutura esquizide, muitas vezes to intenso quanto o medo e, dada a desorganizao sistmica da pessoa, expressa-se numa atitude de controle. A vontade prpria flutua, mudando com os diferentes eus perifricos; no h coeso geral.

  • 25

    O Lowen (1982) complementa que h tenses crnicas localizadas na

    base da cabea, nos ombros, nas articulaes do quadril e ao redor do

    diafragma. Aparece tambm uma ciso energtica no corpo na altura da

    cintura, separando o corpo em superior e inferior, dificultando a integrao

    entre as duas partes. Os Braos parecem no pertencer ao corpo e os ps

    apresentam-se rgidos e frios, com descarga de peso sobre as bordas

    externas.

    As funes do segmento visual segundo Calegari (2001) so: viso,

    audio, olfato, percepo energtica, funo mental, ateno, auto-percepo,

    coordenao das funes corporais e conscincia. Os principais sintomas

    conseqentes do bloqueio ocular so: ciso (estado psictico), confuso

    mental, desorganizao, sensao de estar distante ou disperso, dificuldade de

    ateno, estados dissociativos, insnia, medo, pnico, desconfiana etc. Os

    sintomas fsicos so: miopia, hipermetropia, conjuntivite, glaucoma, labirintite,

    cefalia, enxaqueca etc.

    2.1.2 Estrutura de Carter Oral

    O desenvolvimento do carter oral esta associado fase de

    amamentao. Conforme explica Calegari (2001) essa etapa est atrelada ao

    primeiro ano de vida do beb. Este busca na me a satisfao de suas

    necessidades biolgicas, de amor e cuidados. Quando a busca satisfatria o

    beb estabelecer a vivncia de que o mundo adequado, que fornece amor e

    o recebe bem. Isso resultar em um alto nvel de carga energtica em busca do

    prazer, pois sua relao com o mundo boa e deve ser incorporada. Caso

    contrrio desenvolver a sensao de abandono, de no receber o apoio para

    suas necessidades bsicas. A me nessa situao no oferece segurana

    emocional por agir de forma superprotetora ou com atitudes de abandono. De

    ambas as formas a me no fornece ao beb a possibilidade de encontrar sua

    prpria fora, a autoconfiana no pode ser construda e com isso se fixa a

    dependncia emocional.

    No indivduo com carter oral existem muitos traos da infncia como:

    fraqueza, dependncia, baixa agressividade e necessidade de ser apoiado e

    cuidado. Sua maior caracterstica a carncia afetiva, enquanto no esquizide

    a rejeio. Calegari (2001) comenta que o beb procura na me de modo

  • 26

    incondicional suprir suas necessidades de alimento, contato, calor, proteo e

    amor. Quando h frustrao em algum dos aspectos citados acima ocasionar

    uma descrena na relao e no amor, e uma postura de no necessitar do

    outro. A criana perder a confiana bsica na sua ao, desenvolvendo uma

    ao com falta de auto-sustentao, um ego frgil que o manter dependente

    do ambiente. Pierrakos (1990) afirma que a distoro bsica do oral o

    orgulho. Todas as suas aes so comparadas com a dos outros devido

    autoconscincia e autodireo serem fracas. A vontade prpria se impe sobre

    os outros e o medo altera o instinto de autopreservao, mantendo a

    concentrao e defesa contra a prpria fora vital.

    Lowen (1982) diz que esta estrutura de carter tem baixa carga

    energtica. A energia no esta fixada no centro como no carter esquizide,

    mais chega at a periferia do corpo de forma precria. Existe uma fraqueza em

    todo sistema muscular, o que reduz a fora do impulso. A baixa energia mais

    acentuada na parte inferior do corpo, eliminando o vigor do indivduo e

    transmitindo a sensao de falta de sustentao, ou seja, um indivduo com o

    trao de carter oral no consegue manter-se sobre os prprios ps. Deste

    modo necessita ser amparado por outras pessoas a fim de receber calor e

    apoio, constantemente tem uma sensao de vazio. Logo, o baixo nvel de

    energia leva o indivduo de trao oral inconstncia de humor, variando entre a

    depresso e a euforia.

    Calegari (2001, p. 106) acrescenta: A fixao na fase oral pode ter duas

    direes distintas: a oralidade repressiva e a oralidade insatisfeita. Na primeira

    o segmento oral encontra-se contrado, com baixa carga e excitao. Os

    sintomas mais comuns so: crtica mordaz, ironia, anorexia e depresso.

    Navarro (1995) cita que o oral repressivo - para ele oral reprimido obteve o

    desmame de forma brusca e no experimentou a funo do prazer, por isso,

    apresenta um alto nvel de raiva contida. Este indivduo no tem conscincia de

    sua depresso, assim sendo, se defende dela por meio de uma atitude reativa

    raivosa. Exibe tambm racionalidade, determinao com baixa agressividade

    eficaz e baixa receptividade. A musculatura do corpo apresenta-se hipertnica.

    O oral insatisfeito adquiriu uma ligao de dependncia com o ato de

    sugar, persistentemente buscando amor, prazer, proteo e alimentos. Os

    principais sintomas de acordo com Calegari (2001) so: voracidade, obesidade,

    drogadio, alcoolismo e quadros de hipomania e mania.

  • 27

    O oral insatisfeito uma pessoa que no fundo sempre esconde a situao depressiva, mas como plenamente consciente dela, procura compens-la com alimento, lcool, fumo ou qualquer substituto que possa dar-lhe pelo menos um mnimo de satisfao no nvel oral (NAVARRO, 1995, p. 59).

    Ainda sobre o trao oral insatisfeito, sua auto-imagem engrandecida,

    costuma ter grande inteligncia no nvel mental, mas com baixa capacidade de

    realizao. Seus comportamentos so de exigir e absorver o outro. Sua

    musculatura hipotnica, as articulaes so soltas e os ps sem arco,

    transparecendo a falta de base e de segurana no corpo. Para ambos os

    aspectos do trao oral os sintomas fsicos so: bruxismo, problemas de ATM,

    baixo tnus muscular e fragilidade corporal.

    2.1.3 Estrutura de Carter Psicoptica

    Esta estrutura est associada fase anal do desenvolvimento. Reich

    define dois traos de carteres presentes nesta fase: compulsivo e masoquista.

    Lowen os nomeia de psicopata e masoquista. Aqui ser tratado pelo nome

    determinado pela bioenergtica de Lowen, no entanto, as abordagens sero

    sobre os conceitos de outros autores que independente da denominao fazem

    menes equivalentes s questes fundamentais dessa etapa. A fase anal cita

    Calegari (2001), de conquista da autonomia interna e se estende at por volta

    dos dois anos e meio de idade. A criana nesse perodo volta-se para si prprio

    e para o seu funcionamento. Suas exigncias de amor e cuidados externos

    diminuem, sua dependncia comea a dar espao para o nascimento da

    prpria identidade.

    A criana quando permeia a sua autonomia busca nos pais aprovao.

    Para concretizao do trao de carter psicoptico a criana encontrou

    seduo, invaso e negao do direito de ser independente por parte dos

    genitores. Volpi e Volpi (2003 c) afirmam: O psicopata a criana possuda,

    usada. Os autores ainda comentam que para suportar o medo de perder o

    controle e o amor, compensa se auto-afirmando exageradamente e negando os

    prprios sentimentos, o que d origem supervalorizao da imagem e ao

    comportamento narcisista. Lowen (1982) descreve que prevalece o controle, o

  • 28

    poder, a manipulao, o domnio sobre os outros por meio da opresso ou da

    seduo e o desprezo pelos prprios sentimentos e alheios.

    No indivduo com este trao de carter existe um excesso de carga

    energtica na cabea, ocasionando uma hiperexcitao na mente que resulta

    numa forte tendncia a controlar as situaes. A necessidade de controle por

    que no mago desse indivduo encontra-se uma auto-estima que vacila entre

    se sentir superior e inferior, entre controlar e ser controlado, pois h um grande

    medo de ser usado e de fracassar. Lowen (1982) sobrepe que o indivduo

    fortalece o seu ego e nega o seu corpo e seus sentimentos, principalmente os

    de origem sexual. A sexualidade utilizada num jogo de poder, o desempenho

    e a conquista so mais importantes do que prazer na relao.

    A energia corporal desequilibrada, alta na parte superior do corpo e

    baixa na parte inferior. Entretanto, o aspecto fsico desproporcional, com

    aparncia inflada, forte na parte de cima (peito) e fraco na parte de baixo (pelve

    e pernas), caractersticas relacionadas ao tipo tirnico; no tipo sedutor a

    aparncia mais regular. H uma compresso no diafragma que impossibilita a

    descida do fluxo energtico e dos sentimentos para partes inferiores do corpo.

    Volpi e Volpi (2003 c) mencionam que a energia projetada para fora com

    intuito de controlar o ambiente e distanciar-se do self. Esse trao de carter

    esta relacionado aos segmentos: cervical, peitoral e diafragmtico. Portanto, os

    sintomas fsicos apresentam-se com tenso na regio do pescoo e dos

    ombros, com atitude inspiratria no peito e contrao no diafragma. Os olhos e

    a cabea costumam transparecer sobrecarregados e atentos.

    2.1.4 Estrutura de Carter Masoquista

    Esta estrutura como a anterior demarcada pela fase anal. Foram

    mencionadas acima as caractersticas desta fase, mas o que diferencia no

    trao de carter masoquista que a criana conviveu com atitudes de uma

    me controladora ao ponto se sufoc-la e com um pai passivo e submisso a

    esta me. Ambos humilham a criana e cobram dela obedincia, transmitem a

    mensagem de que ela no capaz de nada sozinha. A criana passa a se

    sentir inferiorizada, humilhada, culpada e envergonhada em relao as suas

    necessidades. Calegari (2001, p. 112) expe que: A partir da a ambivalncia,

    a dvida e a culpa estaro sempre implcitas no comportamento anal.

  • 29

    Controlar ou liberar as funes excretoras para criana passa a ser sinnimo

    de represso severa. Qualquer atitude que a criana tente declarar faz com

    que sua culpa aumente, pois sua luta interna entre liberdade e medo da no

    aprovao eleva consideravelmente o seu nvel de tenso.

    O indivduo adulto com este trao de carter conforme Lowen (1977) tem

    a idia de que faz o maior esforo, mas que no valorizado e no tm

    sucesso. Ele tem sensao de sofrimento e infelicidade que se expressa em

    lamentaes. O sofrimento verdadeiro devido ao seu sentimento de

    inadequao e desvalorizao, as queixas so sempre relevadas em atitudes

    autodepreciativas. Como tem a necessidade de ser aprovado se empenha para

    agradar sendo servil e submisso, com a esperana de receber amor. O alto

    nvel de tenso interna ocasionado por esta situao leva a sentimentos

    antagnicos de negatividade, de hostilidade e superioridade. A conteno to

    grande para evitar a expresso das verdadeiras emoes, devido ao medo de

    punio, que mantm o indivduo em um estado de medo de explodir. Assim

    sendo, sua musculatura encontra-se tensa e contrada no apenas para

    restringir os movimentos, mas para supresso da agressividade.

    O masoquista segundo Reich (1998) cultiva dentro de si um rancor

    infantil que alimenta a negatividade dos seus sentimentos. Isto faz com que

    suas exigncias de amor sempre tenham um tom provocativo, com a finalidade

    de demonstrar o seu despontamento com os objetos que interage. Essa

    caracterstica de desapontamento a dinmica desse carter, impedindo a

    verdadeira satisfao em qualquer situao, pois, o alicerce de sua excessiva

    exigncia de amor est estabelecido em uma angstia prematura de decepo

    com o objeto amado e o medo de ser abandonado. Portanto, h uma

    demasiada necessidade de amor e aceitao devido a infncia repressora.

    Esse indivduo convive com uma sensao de luta interna, uma autocrtica

    brutal sobre todas suas produes e com dvidas torturantes, o que evidencia

    uma forte intolerncia a tenses psquicas e um alto nvel de energia presa no

    organismo. Sua agressividade e auto-afirmao so consideravelmente

    reduzidas.

    As expresses predominantes so a hesitao e o medo, relacionadas com a recusa da pessoa ao movimento. Aqui tambm o medo desloca o instinto de autopreservao. Gera um estado de preocupao e ansiedade no especificadas que , por assim dizer, um truque para evitar que a pessoa permita o fluxo de energia. A

  • 30

    vontade exterior acompanha o medo, tomando forma de teimosia e resistncia, desdm e desafio. A distoro do orgulho tem dois gumes uma atitude superficial de humildade e afabilidade que esconde uma atitude de superioridade e uma tendncia a caluniar os outros (PIERRAKOS, 1990, p. 92).

    De acordo com Lowen (1982) a conteno da energia severa e impede

    a descarga e por consequncia as aes expressivas so muito limitadas e o

    nvel de ansiedade alto. A atitude provocativa do masoquista funciona como um

    meio de liberar o excesso de carga energtica interna, j que esta no se

    mantm sedimentada. O corpo apresenta bloqueios na cintura e no pescoo,

    denso, entroncado e sobrecarregado. Os principais sintomas fsicos dos

    desajustes da bioenergia so: tenso no pescoo (curto e grosso), ombros e

    assoalho plvico, abdmen contrado, dificuldades nas expresses vocais,

    peito estufado e contido, msculos flexores tensos e com pouca flexibilidade,

    alm de um bloqueio acentuado da energia na regio do diafragma.

    2.1.5 Estrutura de Carter Rgida

    A ltima estrutura de carter apresentada por Lowen (1982) a rgida,

    onde o orgulho predomina como atitude de defesa. A etapa flica acontece

    entre quatro e seis anos de idade, no perodo edipiano e est conectada ao

    segmento plvico. Nesta fase a criana busca aprovao de sua identidade

    sexual no genitor do sexo oposto. No caso da sexualidade ser reprimida,

    frustrada, a criana torna-se agressiva para se auto-afirmar, procura identificar-

    se com o genitor do mesmo sexo e competir com ele. Se este ltimo genitor

    consente a expresso da agressividade, se desenvolvero carteres mais

    ativos, com a angstia de castrao; se subjuga a expresso passaro a existir

    carteres mais passivos, com a angstia incestuosa. De qualquer forma a

    criana cria um sentimento de dio pelos dois genitores, pois um a rejeita

    enquanto o outro compete com ela. Sendo assim, a criana no se sente

    amada em sua sexualidade e ento surge a mgoa, o ressentimento e os

    desejos de vingana.

    A criana no diferencia a rejeio da sexualidade e do amor, para ela

    ambos foram rejeitados nessa fase. Calegari (2001, p. 119) alega que: Com

    frequencia os pais no suportam o contato fsico com os filhos quando estes

    comeam a mostrar interesse sexual. Devido a esse fato ela reprime a

  • 31

    expresso sexual de seu amor. Na adolescncia o conflito reaparece em forma

    de vingana e continua separado do amor. Quando adulto esse indivduo se

    defende dos impulsos que buscam o prazer, tm medo de ceder, de ser usado

    e enganado e de perder a liberdade, constri assim uma postura determinada

    com atitude rejeitadora e orgulhosa.

    Lowen (1982) coloca que existe grande carga de energia principalmente

    na periferia do corpo, o que favorece experimentar a realidade e at mesmo

    control-la antes de agir. A conteno dos impulsos paralisa na periferia do

    corpo, portanto, sua expresso limitada. O corpo geralmente apresenta

    harmonia entre as partes, mais assegura- se de uma forte rigidez para que o

    ego suporte o controle dos comportamentos. As principais reas de tenso so

    os msculos longos do corpo, principalmente das costas e das pernas, para

    agentar a postura ereta e orgulhosa. Quando a rigidez mais branda o corpo

    demonstra mais vivacidade nos olhos brilhantes, na cor da pele e na leveza

    dos gestos e movimentos; em contrapartida, mais rigidez, menos vivacidade.

    Existem dois traos de carteres rgidos mais passivos. Volpi e Volpi

    (2003 c) explicam que o carter histrico tem origem nas ligaes incestuosas.

    A menina v o pai como objeto genital, o seduz como expresso de seu amor e

    sua necessidade de afirmar sua sexualidade, o pai ansioso passa a rejeit-la,

    alia-se me contra a filha, que ento a rejeita tambm. Edifica-se assim um

    comportamento na mulher onde as necessidades sexuais so odiadas, ela

    seduz atravs da sexualidade para poder rejeitar depois como fator de

    vingana ao sexo masculino. Lowen (1982) comenta que h uma ciso entre

    sentimentos amorosos e genitalidade. No corpo h presena do pescoo rgido,

    queixo duro e enrijecimento das costas desde a base do crnio at o sacro.

    O outro trao passivo o carter passivo-feminino, designado ao sexo

    masculino por apresentar uma supresso da agressividade. Conforme Volpi e

    Volpi (2003 c) o menino conviveu com um pai submisso e fraco que encoberta

    estas caractersticas com atitudes hostis e omissas, gerando medo na criana.

    O pai no estimula a agressividade no filho e to pouco objeto de

    identificao para este. A me forte e sua relao com filho em alguns

    momentos de frieza e outros de seduo. A criana chega fase genital com

    questes de privao oral devido aos comportamentos da me, instala-se

    assim, o seu conflito interno: identifica-se com a me por ser mais forte que o

    pai, mas precisa ser o bom menino para manter o amor dela e com isso

  • 32

    reprime sua sexualidade; sente dio pelo pai que no o protege da seduo da

    me, e culpado por isto acaba por inibir sua agressividade e impulsividade.

    Entretanto, o passivo-feminino de acordo com Lowen (1977) no se sente

    fracassado como o masoquista, ele apenas mantm uma baixa carga para

    atitudes agressivas e decisivas. Corporalmente apresenta musculatura interna

    tensa, enquanto a superficial mais mole, sua expresso facial suave e

    plstica.

    Os traos rgidos mais ativos so: o carter flico-narcisista e o carter

    agressivo-masculina. O primeiro relacionado rigidez masculina. Volpi e

    Volpi (2003 c) asseguram que os homens com este trao de carter

    apresentam um bom desempenho profissional e social, so sexualmente

    atraentes s mulheres e se mostram bastante adaptados ao meio. Demonstram

    um alto nvel de agressividade e determinao em suas aes na busca pelo

    poder, objetivando sempre vencer. Sua preocupao no exatamente com o

    sucesso, mas sim com o medo de fracassar. Contudo, a determinao que faz

    com que tenha sucesso tambm a causa de sua neurose. Na infncia o

    menino se relaciona com um pai forte que instiga sua agressividade de

    competio em relao me. Ele v o pai como vencedor do amor da me,

    pois a me rejeita sua sexualidade e se junta ao pai contra o ele. Crescer com

    a idia de reconquistar a me perdida e provar sua virilidade ao odiado pai. Por

    conseguinte, a oposio ao pai pode voltar-se contra as mulheres, recordando

    a me que negou sua sexualidade. O adulto ento, conforme Lowen (1977, p.

    264): [...] no encontra satisfao profunda em nenhum nvel de atividade e

    v-se forado a prosseguir com a perseguio e a conquista. Sua funo

    mental e muscular mais utilizada do que a funo visceral, portanto, seu

    organismo tanto psicolgica como somaticamente pouco flexvel.

    J o segundo, o carter agressivo-masculina citado por Volpi e Volpi

    (2003 c) direcionado menina e retrata a histria do pai que rejeita a

    sexualidade da filha, mas a incentiva intelectualmente e agressivamente. A

    me nessa situao se mostra fraca e permite a hostilidade da filha. A

    femilidade da menina negada pelo pai e a me submissa tolera a

    agressividade da criana e se une a ela contra o pai. A criana sente atrao

    pelo pai e desprezo pela figura feminina devido imagem de fraqueza e

    ausncia da me. O conflito na mulher passa a ser entre manter a

    agressividade e a competio, comandadas pelo ego, ou dar vazo s

  • 33

    necessidades sexuais receptivas. Forma-se assim, a luta interna entre ego e

    sexualidade, a qual o ego acaba por vencer. Os comportamentos em relao

    aos homens so de competio, dominao e castrao. Corporalmente essa

    mulher apresenta solidez e inflexibilidade.

    2.2 A PERDA DA AUTO-REGULAO

    As descries acima servem para demonstrar como os conflitos

    prejudicam a vida saudvel, motivam os padres de comportamentos, a

    constituio fsica e energtica do indivduo. Lowen (1977, p. 255) refere que:

    Os tipos de carter so psicologicamente diferenciados por suas estruturas de

    ego, ou seja, por suas atitudes frente realidade. O autor acrescenta dizendo

    que quando h uma determinada represso, o desempenho contra ela um

    processo autonmico involuntrio, do qual o indivduo no tem cincia. Neste

    contexto, a neurose pode ser vista como uma limitao do comportamento com

    padres reativos. As buscas esto sempre fundamentadas na necessidade de

    amar, na procura de intimidade e de prazer, mas elas acontecem na maioria

    dos indivduos de forma neurtica.

    Resumidamente Lowen (1982) expe que o carter esquizide evita a

    busca de intimidade, amor e prazer, pois so fatores ameaadores sua

    existncia. J o carter oral exibe sentimentos de dependncia devido o vazio

    interior, pois necessita em excesso de calor humano e apoio. O carter

    psicoptico sustenta uma relao enquanto o outro depender dele, sua posio

    sempre de controle. O carter masoquista se relaciona de forma submissa

    para acobertar sua sensao de fracasso, em compensao expe uma atitude

    provocativa ao outro, mas no se liberta da relao. O oral e o masoquista so

    considerados pr-genitais, com o ego deficiente, impulsivo e ansioso,

    apresentam atitudes infantis frente realidade e so destitudos de armadura.

    Em contrapartida, os carteres rgidos estabelecem relaes razoavelmente

    ntimas, mas apresentam uma armadura emocional e muscular que mantm o

    ego em alerta e sem ceder ao amor e ao prazer. Esto mais ancorados na

    realidade, mas ao mesmo tempo so submetidos ela e com dificuldades de

    se adaptar.

    Toda estrutura de carter apresenta um conflito inerente porque h, em sua personalidade, ao mesmo tempo, a necessidade de

  • 34

    intimidade, de aproximao, de auto-expresso e o medo de que estas necessidades sejam mutuamente exclusivas. A estrutura de carter o melhor arranjo que a pessoa teve condies de propor-se no inicio de sua situao existencial. Infelizmente a pessoa fica acorrentada a essa situao, apesar de o meio ter-se modificado, quando j na fase adulta (LOWEN, 1982, p. 150).

    Os padres de comportamento do carter se enrazam na

    personalidade da pessoa, suas expresses atravs do corpo e do pensamento

    so determinantes e acabam por estabelecer o seu destino. A defesa

    construda para proteger uma condio especfica alimenta esta mesma

    condio. Levantar barreiras psicolgicas e musculares para proteo contra

    possveis desprazeres uma atitude neurtica e que resguarda o indivduo no

    seu prprio conflito. Conforme Lowen (1986, p. 43): Percebi que a luta para

    evitar um destino temido, mas que o prprio esforo por ela despendido

    assegura o destino de que est procurando escapar. A negao de um conflito

    garante sua manuteno, pois o recalque das sensaes no faz o conflito

    desaparecer, mas sim, garante um efeito somtico sobre o corpo e a mente.

    O ser humano uma espcie de hbitos e memria, seu corpo e seus

    comportamentos so estruturados mediante as situaes e entanto, quando h

    novas circunstncias a adaptao torna-se muitas vezes difcil e resguardada

    s mudanas.

    Se uma emoo um conjunto das alteraes no estado do corpo associadas a certas imagens mentais que ativaram o sistema cerebral especfico, a essncia do sentir de uma emoo a experincia dessas alteraes em justaposio com as imagens mentais que iniciaram o ciclo (DAMSIO, 1996, p. 175).

    Pode-se dizer ento que o sentimento depende do corpo e de uma

    imagem fora dele transmitido pela cognio. Em suma, a experincia absorvida

    pelo organismo caracteriza-se por meio do funcionamento dos circuitos

    cerebrais, e esta se mantm presente na memria do indivduo. Assim sendo,

    fica claro que os diversos desequilbrios humanos tm suas bases nas

    disfunes das sinapses cerebrais, as quais geram processos de

    memorizao, permitindo a repetio no modo de funcionamento e

    influenciando o comportamento do indivduo em um ciclo vicioso.

    Logo, as resistncias que sustentam as reaes egico-mentais

    (neurose) lutam contra as modificaes. Algo novo pode ser sempre um o

    conflito para o ego, visto que a conscincia est limitada pelos conflitos que

    causaram os bloqueios, tanto ao nvel da auto-percepo quanto da auto-

  • 35

    expresso devido ao fluxo energtico fragmentado e a mente reativa e

    acabam por afetar o futuro. Lowen (1986, p. 49) enfatiza a seguinte questo: A

    mudana faz parte da ordem natural. A vida no esttica; est

    constantemente evoluindo ou involuindo. [...] O crescimento acontece natural e

    espontaneamente quando a energia est disponvel.

    A cristalizao das represses numa estrutura de carter pode resultar

    em ameaa real s necessidades bsicas da vida. O resultado da continua

    represso o modo habitual de agir e atitudes corporais inconscientes que

    levam ao amortecimento de funes do organismo. A sade somtica (corpo) e

    psquica (mente) dependem da dinmica energtica do corpo, como j

    mencionada, a relao entre ambas antittica. Portanto, corpo e mente so

    uma unidade e expressa no mundo a condio desta relao. Conforme Lowen

    (1982, p. 53): Ns somos seres sensveis, o que significa que temos o poder

    de sentir ou perceber e de experimentar sensaes e sentimentos. A

    percepo uma funo da mente que, por sua vez, aspecto do corpo. Ter

    conscincia do corpo a nica maneira de descobrir quem se , e o que a

    mente, para ento modificar a dinmica da identidade de funcionamento. A

    mente funciona como rgo reflexivo e perceptivo, sentindo e definindo o que

    se passa pelo corpo.

    A omisso das sensaes cria tenso na musculatura e diminui o

    movimento da energia corporal, alm de influenciar na capacidade de evoluo

    da mente consciente. Lowen (1997) revela que manter a represso do

    sentimento uma questo de insensibilizao, uma tentativa de suprimir uma

    possvel frustrao, mas que enfraquece a pulsao interna do corpo, a

    vitalidade e o estado de excitao. Sendo assim, a mente se firma na

    necessidade de controle e passa a no permitir os sentimentos; mas reprimir

    um sentimento reprimir outros tambm. Quando no h movimento interno,

    no h sentimentos e nem relaes de forma satisfatria com o meio. Lowen

    (1970, p. 49) expe: Todas as sensaes so percepes corporais. Se o

    corpo de uma pessoa no reage ao ambiente, ela no sente nada.

    Toda tenso crnica significa uma limitao na capacidade do indivduo

    de sentir e de expressar. Quando o indivduo perde a capacidade de sentir,

    acontece a paralisao da energia vital; pode-se dizer que o corpo entrou em

    estado de depresso. Segundo Lowen (1983, p. 65): A depresso uma

    forma de morte emocional e psicolgica. O grau deste estado marcado pela

  • 36

    perda da vitalidade, sua variao medida pelo nvel do organismo

    descarregado e pela condio do indivduo de manter a sua mente em

    circunstncias negativas e/ou ilusrias. Este o ponto onde o indivduo perde

    sua auto-regulao, pois sua capacidade de perceber a realidade e de se

    adaptar a ela est gravemente prejudicada.

    As iluses so as defesas do ego contra a realidade, e embora possam poupar a pessoa da dor de uma realidade assustadora, tornam-nos prisioneiros da irrealidade. Sade emocional a capacidade de aceitar a realidade e de no fugir dela. Nossa realidade bsica nosso corpo (LOWEN, 1997, p. 29).

    Lowen (1982) cita que num indivduo de personalidade saudvel, os

    aspectos fsico e mental de funcionamento esto em equilbrio e buscam

    promover o bem-estar. Na pessoa em conflito no h colaborao desses dois

    aspectos, sentimento e comportamento esto em desequilbrio de

    funcionamento e acabam por bloquear a livre manifestao de impulsos e de

    sensaes. A segunda forma de funcionamento infelizmente pode se tornar um

    estilo de vida e fazer com que a pessoa supervalorize o seu ego, alcanando

    satisfao apenas pela manipulao do ambiente. As necessidades do corpo

    sero negadas enquanto a pessoa mantiver o seu conflito emocional protegido

    pelas couraas. Para quebrar as barreiras impostas pela estrutura de carter

    e ter uma vida fluida necessrio que o indivduo resgate sua auto-regulao,

    com capacidade de se auto-perceber, se auto-expressar e se auto-possuir. Um

    corpo livre e uma mente consciente o que vai possibilitar uma nova atitude

    perante a vida e permitir o fluxo da energia em seu potencial para uma sade

    vibrante.

    2.3 O RESGATE DA AUTO-REGULAO

    A renovao dos comportamentos existir se a pessoa compreender

    que o passado determinou seu presente. Ela precisa descobrir como chegou a

    tal ponto, no ignor-lo, mas tambm no permanecer nele, sustentando-o. A

    fixao no passado determina o nvel da neurose de uma pessoa. Tal fixao

    se romper por meio das trs capacidades citadas anteriormente: a auto-

    percepo direcionar o indivduo compreenso de sua personalidade no

    decorrer da percepo das sensaes corporais e da correta interpretao da

  • 37

    mente, o ato de perceber a relao entre o pensar e sentir; a auto-expresso

    permitir o fluir das sensaes e da energia vital, manifestar a criatividade do

    indivduo enquanto mantm a mente distante de agitao e de dvida, ela o

    reflexo da auto-percepo; a auto-possesso trar coeso entre o sentir,

    pensar e agir, prover a integridade do indivduo e o habilitar para responder

    adequadamente s situaes da vida.

    O fluir da energia engloba todos os movimentos do indivduo, os

    internos e externos. Para que este fluir ocorra tem que haver entrega total

    experincia presente por parte da pessoa. Isso exige ausncia de

    perturbaes, confuses, dvidas sobre si mesmo, interpretaes, julgamentos

    e expectativas. A entrega de si em uma experincia no determina que ela seja

    agradvel ou desagradvel; a entrega permitir ao indivduo vivenciar a

    experincia tal como ela , a ter clareza interior e refletir essa clareza no

    ambiente de forma espontnea. Esse o caminho para o esclarecimento de si

    e a possibilidade de se entregar para vida honestamente. Sem erro isso levar

    o indivduo integrao, ao reconhecimento de seus comportamentos de

    carter, ao respeito e sabedoria pelo que construiu em seu corpo e a paz de

    estar presente com a diversidade de sensaes que o ser humano capaz de

    sentir e expressar.

    Quando a vida do corpo forte e vibrante, o sentimento, assim como o tempo, varivel. Podemos estar sentindo raiva num momento, depois afeto, e chorar a seguir. Assim como o sol pode aparecer depois da chuva, a tristeza pode transformar-se em prazer. Essa mudana de humor, assim como uma mudana de tempo, no compromete o equilbrio bsico da pessoa. As mudanas acontecem na superfcie e no perturbam as pulsaes profundas que proporcionam uma sensao de bem-estar pessoa (LOWEN, 1997, p. 20).

    Conforme Reich (2003, p. 60): O ser desencouraado percebe a si

    mesmo e ao mundo circundante de uma maneira essencialmente diferente do

    organismo encouraado. As couraas limitam a percepo, o sentir e as

    formas de expresso. uma forma de estar no mundo separado dele, pois a

    energia que circula no corpo humano a mesma encontrada na natureza. a

    energia que est presente em todo universo, que d origem vida e permeia

    todos os organismos vivos. A limitao do fluxo natural dessa energia

    fragmenta o homem, separando-o de sua essncia e desconectando-o da

    energia universal, o que acaba por gerar estresse, alm de sensaes como

    frustrao, angstia e raiva tanto no nvel corporal quanto mental. Portanto,

  • 38

    sentir o corpo levar a conscincia prpria identidade. se perceber como

    um organismo vivo, pulsante, gerando ondas que se movimentam para relao

    com o meio ambiente.

    Um organismo pulsante est constantemente dinamizando a excitao

    em direo ao prazer. Neste sentido, Lowen (1970) afirma que o fluxo dos

    sentimentos deliberado pela vontade do contato com o prazer, mas a

    diferena que na pessoa desencouraada o corpo reage livremente, o prazer

    o impulso como tambm o resultado deste processo, pois uma pessoa com

    esta caracterstica entrega-se e deixa os movimentos flurem; j a pessoa

    bloqueada est sobre o comando de suas represses inconscientes e por isso

    seu fluxo de sensaes deficiente e muitas vezes ilusrio, reduzindo a

    mobilidade natural do corpo, sendo assim, a busca passa a ser uma

    necessidade do ego e no do corpo pelo prazer. Sem a condio natural do

    corpo o prazer no pode ser vivenciado e nem to pouco expressado.

    Lowen (1997) relata que a alegria diz respeito s sensaes corporais

    e no s propriedades da mente. No uma simples deciso estar alegre. Ela

    parte das sensaes corporais positivas, ou seja, consideradas boas. So

    elas que iro permear o corpo e trazer a excitao prazerosa que dar

    pessoa o estado de alegria. Ao contrrio, as sensaes negativas ou ms

    levam o organismo conteno dos sentimentos. Esta conteno elimina o

    sentimento de liberdade e afirma os sentimentos de angstia e de culpa; as

    sensaes so de no fazer o que quer e de no estar como quer. Afinal, a

    sensao de no estar a vontade no prprio corpo o que assegura a

    continuidade dos maus sentimentos. Segundo Lowen (1986), as aes de

    uma pessoa saudvel demonstram harmonia e equilbrio entre ser e fazer,

    entre sentir e pensar, entre espontaneidade e determinao. Existe completa

    harmonia entre ego e self, independente do sentimento experienciado pelo

    indivduo, seja ele bom ou mau a pulsao no interior do corpo capaz de

    sustentar sua integridade.

    Perceber o funcionamento do carter e possibilitar uma mudana a ele

    assustador para qualquer indivduo; supostamente o carter sustenta a sua

    sobrevivncia. No entanto, a nica maneira que o indivduo tem para

    readquirir a motilidade e a vitalidade do corpo. Aproximar-se do self, ou seja, de

    sua natureza genuna resgatar a auto-regulao proveniente da relao

    inerente com o meio. No basta falar a respeito de sensaes, elas precisam

  • 39

    ser experimentadas e expressas para que o corpo liberte-se das constries e

    das aes fundamentadas no carter neurtico. No transcorrer da flexibilizao

    das couraas, as iluses geradas na infncia e seus mecanismos sero

    conectados s limitaes corporais e psquicas que progressivamente iro

    tornando-se conscientes. O contato com os padres de funcionamento

    muscular, respiratrio e mental iro diluir o encouraamento proveniente de

    bloqueios emocionais onde houve a paralisao ou recuo da energia vital. Para

    isso, o ser humano necessita restabelecer a total capacidade de pulsao do

    organismo, para recuperar o seu corpo, e com ele, conforme Lowen (1997, p.

    24) [...] sua alma e seu self.

    Lowen (1997) afirma que: Nosso self no uma imagem em nosso

    crebro, mas um organismo real, vivo e pulsante. Para nos conhecermos,

    temos que sentir o nosso corpo. A perda da sensibilidade em qualquer parte do

    corpo a perda de parte do self. O homem moderno inseguro com seu

    corpo, porque perdeu a ligao com seu self, com o ambiente e logo se

    distanciou da relao com o universo. A religao do indivduo com os

    aspectos perdidos possvel por meio do abandono dos controles egicos, da

    entrega do corpo as sensaes e liberao das vontades do ego. Esclarecer

    o conceito de ego neste ponto importante para compreenso de que ele no

    apenas um aspecto negativo do indivduo. Vale lembrar que o ego o agente

    entre o mbito interno e externo do indivduo, a questo torn-lo integrado

    com a conscincia, fazer dele o servo e no o soberano, para que no perca a

    sua eficincia, tornando-se negativo.

    Como j dito, o ego abrange o pensamento volitivo da pessoa

    pensamento autoconsciente e vontade exterior consciente. Tem capacidade para discriminar e selecionar, mas no cria. O ego pode apenas juntar conhecimento, memorizar, repetir, copiar, classificar, induzir, deduzir e fazer escolhas. O ego apenas uma partcula da conscincia, muito mais vasta, que a pessoa tem do universo (PIERRAKOS, 1990, p. 126).

    A base da cura do indivduo adulto o resgate do contato com sua

    essncia, ou seja, com a fonte da fora vital que nutre a vida de modo

    afirmativo e receptivo. Pierrakos (1990) afirma que a energia da essncia o

    promotor das escolhas conscientes e que sua ruptura a causa das distores

    das percepes e das decises. A essncia a habilidade total do ser humano,

    pois lutar constantemente para restituir os processos de sade. Lowen (1977)

    explica que a sade deve ser anloga ausncia de padres de

  • 40

    comportamento, um estado fluido, ao contrrio da neurose que tem uma

    natureza estruturada. Seus atributos so a espontaneidade e a adaptabilidade

    s exigncias de qualquer ocasio.

    O resgate da essncia movimentar o corpo para relao com o

    mundo, fornecer sade, criatividade, espontaneidade, realizaes, sensao

    de alegria, prazer e a expanso da mente consciente. Alis, ela a nica fora

    do ser humano capaz de dissolver os conflitos emocionais e transcender as

    atitudes egicas. A condio de ser consciente e de se auto-regular esto

    vinculadas aos processos energticos do corpo, o fluxo de energia que o corpo

    apresenta e evidencia o alcance de liberdade que a pessoa est hbil a viver.

    Calegari (2001, p. 141) pronuncia: A verdadeira felicidade reside na plena

    ativao da conscincia e no desenvolvimento de seus reais potenciais! A

    sabedoria da vida perceber que ela uma jornada e o mais importante

    percorr-la com a plenitude da essncia; assim sendo, o princpio vital do

    universo ser integrado ao corpo e prover as virtudes genunas do ser

    humano e sua relao saudvel com o ambiente.

  • 41

    YOGA

    A origem do Yoga est registrada em documentos muito antigos da

    ndia. Historicamente esta regio possui uma tradio espiritual milenar e muito

    profunda. A filosofia indiana possui uma diviso em escolas ortodoxas e no-

    ortodoxas. Estas escolas so chamadas de Darshanas, que quer dizer ponto

    de vista. Os Darshanas ortodoxos tm em comum o fato de aceitarem os

    Vedas como autoridade, o que no ocorre nos Darshanas no-ortodoxos. O

    Yoga como uma escola ortodoxa tem sua base de estudo nos textos clssicos

    vdicos, conhecidos como escrituras sagradas, os Vedas.

    Determinar a cronologia do Yoga no uma tarefa fcil, pois no h

    registros com datas especficas, mas Feuerstein (2006) cita o surgimento do

    Yoga na era Pr-Clssica (1000 100 a.C.). Sendo sistematizado por Patanjali

    durante o perodo da Era-Clssica (100 a.C. 500 d.C.) no Yoga-Sutras,

    principal obra onde foram compilados todos os conhecimentos em prticas

    yguicas. Cada escola do hinduismo produziu o seu prprio sutra, que significa

    fio condutor das idias importantes que caracterizam o pensamento da

    escola. um estilo conciso de se escrever.

    Feuerstein (2006) comenta que muito antes da palavra Yoga obter o

    sentido de espiritualidade, os sbios da ndia j haviam organizado um

    conjunto de mtodos com objetivo de transformar a conscincia ordinria. Este

    conjunto constituiu-se em modificaes significativas que depois foi chamado

    de Yoga. Neste contexto o Yoga pode ser definido como uma doutrina moral

    internalizada. Segundo o autor a definio de Patanjali ao Yoga a restrio

    dos turbilhes da mente (citta-vrtti-nirodhah), ou seja, um estado de

    conscincia que surge quando a mente se aquieta. A palavra Yoga no

    usada apenas para mencionar um estado de conscincia, mas tambm se

    refere s prticas que facilitam a parada dos turbilhes da mente e a tudo o

    que isso resulta. Para amenizar os turbilhes da mente Patanjali descreveu oito

    passos a serem seguidos, que so conhecidos como Asthanga Yoga.

    Para Iyengar (1995), Desikachar (2007), Taimni (2006), Feuerstein

    (2006), etimologicamente a palavra Yoga tem origem snscrita, deriva da raiz

    verbal yuj, que significa unir, juntar, integrar. Para Gharote (2005)

    significa a integrao do ser em todos os aspectos: fsico, mental, social,

    intelectual, emocional e espiritual. Ainda para Feuerstein (2006, p. 36) o termo

  • 42

    Yoga interpretado como: a unio do eu individual (jiva-atman) com o

    supremo Si Mesmo (parama-atman). Definio esta baseada no Vedanta, que

    traz que o eu individual est separado de sua essncia transcendente.

    O Yoga uma forma de psicotecnologia com intuito primordial de

    atingir a mente ou psique humana, conforme descreve Feuerstein (2006, p.

    299): [...] segundo os yogues visionrios, nosso mundo interior espelha a

    estrutura do prprio cosmos. Sendo assim, os passos propostos por Patanjali,

    ainda na idia de Feuerstein (2006, p. 299): so psicocosmogramas,

    esquemas tanto do universo interior quanto do exterior. O objetivo desses

    esquemas mostrar o que esta alm dos nveis da psique e do cosmos, pois

    se acredita que a natureza essencial do ser humano, o Si Mesmo ou Esprito,

    ilimitadamente transcendente.

    Para o Yoga necessrio a tomada de conscincia de unidade, contato

    este que resultar de um trabalho intenso sobre si mesmo. Isso significa que

    Yoga a concentrao do corpo inteiro, no qual todo o ser da pessoa se

    aquieta e se manifesta em percepo e movimento para unir-se ao objeto que

    est sendo contemplado. por meio da ao que o Yoga conduz ao

    crescimento psicoespiritual e a transcendncia da vontade, que uma reao

    da personalidade egica.

    Feuerstein (2006) no Katha Upanishad descreve o Yoga afirmando que

    quando os sentidos esto imobilizados e a mente est em repouso, no h

    oscilao do intelecto, assim possvel atingir o estado mais elevado do ser.

    Este controle inaltervel dos sentidos e da mente foi definido como Yoga.

    Aquele que o atinge est livre de iluso. Este estado de Ser alm da mente o

    Yoga. Este caminho leva mansido da mente, fornecendo um reservatrio de

    paz. quando a mente se aquieta e entra em contato com o vazio do seu

    silncio, livre de contedos, de julgamentos e condicionamentos. uma

    dimenso do Ser que embora ocultada, sempre esteve presente.

    Para chegar ao Yoga preciso antes transpor ao ego. Iyengar (2006)

    denota que o objetivo fundamental do Yoga restaurar a paz mental,

    libertando-a dos sofrimentos do ego. Conforme Feuerstein (2006, p. 38): Yoga

    , portanto, o nome genrico de vrios caminhos indianos de

    autotranscendncia esttica, ou de transmutao metdica da conscincia at

    que esta se liberte do feitio da personalidade egica. Essa idia foi expressa

    no Yoga-Sutra de Patanjali como sendo a habilidade de direcionar a mente

  • 43

    sem distrao ou interrupo. No se pode negar que esta habilidade traz

    benefcios a todas as pessoas que pretendem ter uma vida centrada e

    produtiva.

    Outro conceito importante presente no Yoga-Sutra como o indivduo

    percebe as coisas, ele explica por que as pessoas entram constantemente em

    dificuldades, e diz que, se souberem como essas dificuldades foram criadas,

    sabero tambm como sair delas, livrando-se dos sofrimentos. Iyengar (2006)

    comenta que o sbio Patanjali refletiu sobre a natureza do homem e as normas

    da sociedade em sua poca e sistematizou suas observaes comeando em

    cdigos de conduta e terminando com objetivo final, a emancipao e a

    liberdade.

    citado no Yoga-Sutra que as pessoas experimentam alternadamente

    ondas de clareza e de obscuridade quando comeam a praticar Yoga. Quanto

    mais progridem, mais ficam conscientes de sua natureza holstica. H muitas

    maneiras de praticar Yoga, e gradualmente o interesse num caminho vai

    conduzindo a outro. A verdadeira prtica, realizada conscientemente, seguindo

    o caminho descrito nas escrituras, leva cada pessoa direo da realizao de

    seu ser. um caminho completamente pessoal. Assim se aprende a

    desenvolver uma observao mais cuidadosa que possibilitar a descoberta de

    si e dos prprios limites. Conforme Desikachar (2007), quando se est

    consciente dos prprios atos deixa-se de ser prisioneiro deles, o que permite

    examinar as aes de forma nova e assim evitar as repeties inconscientes.

    As mudanas atravs da realizao do Yoga devem ser originadas de

    dentro para fora e acontecem como resultado da prtica, mas nunca ser

    verdadeiro se estas mudanas forem impostas, de fora para dentro. preciso

    incorporar todos os aspectos apresentados pelo Yoga, suas diferentes tcnicas

    e caminhos para que no fique apenas uma agitao interna e desordenada. O

    fato das coisas serem melhores ou piores depende consideravelmente das

    prprias aes. Quando a mente est plena no absorvida pelos fatores

    externos, sim capaz de ponderar esses fatores. O Yoga treina a mente para

    senso de realidade e torna a pessoa capaz de discernir sua prpria verdade.

    Para Patanjali apud Feuerstein (2006) existe uma correlao entre a

    natureza e o Si Mesmo, e o vnculo que os liga no tem incio, portanto, isso

    o que gera a iluso de que o ser humano corpo e mente individual, um

    complexo da personalidade e no o Si Mesmo transcendente. Esta a causa

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    de todo sofrimento humano, ou seja, a ignorncia espiritual (avidya) ou

    conscincia ordinria que determina o nvel de identificao com o corpo e a

    mente egica. Esta identificao a fonte dos desejos e averses, causas de

    sofrimento segundo o Yoga. A psicotecnologia do Yoga tem como objetivo

    fornecer a oportunidade de autoconhecimento para atenuar a ignorncia

    (avidya) e por fim a transcendncia. Yoga algo muito alm das definies.

    Yoga para vivenciar, sentir, ter disposio mental e uma ao que envolve

    atitude ativa do sujeito no processo de conscincia.

    3.1 LITERATURA VDICA

    A palavra Veda significa conhecimento. Vem do termo snscrito vid

    que significa sabedoria, conhecer a Sabedoria Divina, por isto os Vedas so

    traduzidos como Sabedoria Divina ou Suprema. Os Vedas so as escrituras

    sagradas mais antigas