Universidade Presbiteriana Mackenzie 1 INTERAÇÕES NUCLEARES NOS RAIOS CÓSMICOS Samuel Mendes Sanches Junior (IC) e Fernanda Monti Steffens (Orientadora) Apoio: PIBIC Mackenzie Resumo Os raios cósmicos foram descobertos no início do século 20 por Victor Hess, que para isto utilizou balões a 5 km de altitude e assim verificou que quanto maior a altitude, maior a ionização. Esses raios são compostos basicamente de prótons, que provem de diversas partes do universo. Sua origem, que está intimamente interligada com sua aceleração inicial, ainda é um tema muito debatido na comunidade científica atual. Podem ser essencialmente divididos em raios cósmicos primários, sendo as partículas originais da fonte que ainda não sofreram nenhum tipo de interação, e raios cósmicos secundários, sendo as partículas produzidas por interações das partículas primárias com os núcleos presentes na atmosfera. Ao entrarem na atmosfera pode-se ter dois eventos, cascata atmosférica, se as partículas não atingirem o solo, ou chuveiro atmosférico, se atingirem o solo. Este trabalho tem como objetivo estudar as interações que acontecem nos raios cósmicos ao se chocarem com os núcleos presentes na atmosfera. Para isto foi feito um detalhado levantamento bibliográfico das grandezas utilizadas no estudo dos raios cósmicos para então verificar uma possível conexão com a seção de choque próton-próton, que é de extrema importância na física nuclear. Como resultado, foi deduzido uma expressão que retorna os valores do fluxo de prótons a partir da energia inicial no sistema de laboratório, desde o nível do mar a até altitudes elevadas. Palavras-chave: raios cósmicos; altas energias; seção de choque Abstract The cosmic rays were discovered in the earlier 20 th century by Victor Hess, which uses balloons at 5 km altitude and verify that the higher altitude, higher the ionization. These rays are composed basically by protons, coming from several parts of the universe. Their origin, which is closely linked with their initial acceleration, is still debated in the current scientific community. They may be essentially divided into primary cosmic rays, being the original particles of the source which still did not suffer any kind of interaction, and secondary cosmic rays, being the particles produced due to the primary particles' interactions with the nuclei of atmosphere. When enter in the atmosphere, could have two events, atmospheric cascade, if the particles not reaching the ground, or air shower, if reaching the ground. This work aims study the interactions that occur when cosmic rays collide with the nuclei in the atmosphere. To do this was made a detailed bibliography of quantities used in the study of cosmic rays and then verify a possible connection with the proton-proton cross section, which is of extreme importance in nuclear physics. As result, was deducted an expression that calculates the values of the proton flux from the initial energy in the laboratory system, since sea level up to high altitudes. Key-words: cosmic rays; high energy; cross section
This document is posted to help you gain knowledge. Please leave a comment to let me know what you think about it! Share it to your friends and learn new things together.
Transcript
Universidade Presbiteriana Mackenzie
1
INTERAÇÕES NUCLEARES NOS RAIOS CÓSMICOS
Samuel Mendes Sanches Junior (IC) e Fernanda Monti Steffens (Orientadora)
Apoio: PIBIC Mackenzie
Resumo
Os raios cósmicos foram descobertos no início do século 20 por Victor Hess, que para isto utilizou balões a 5 km de altitude e assim verificou que quanto maior a altitude, maior a ionização. Esses raios são compostos basicamente de prótons, que provem de diversas partes do universo. Sua origem, que está intimamente interligada com sua aceleração inicial, ainda é um tema muito debatido na comunidade científica atual. Podem ser essencialmente divididos em raios cósmicos primários, sendo as partículas originais da fonte que ainda não sofreram nenhum tipo de interação, e raios cósmicos secundários, sendo as partículas produzidas por interações das partículas primárias com os núcleos presentes na atmosfera. Ao entrarem na atmosfera pode-se ter dois eventos, cascata atmosférica, se as partículas não atingirem o solo, ou chuveiro atmosférico, se atingirem o solo. Este trabalho tem como objetivo estudar as interações que acontecem nos raios cósmicos ao se chocarem com os núcleos presentes na atmosfera. Para isto foi feito um detalhado levantamento bibliográfico das grandezas utilizadas no estudo dos raios cósmicos para então verificar uma possível conexão com a seção de choque próton-próton, que é de extrema importância na física nuclear. Como resultado, foi deduzido uma expressão que retorna os valores do fluxo de prótons a partir da energia inicial no sistema de laboratório, desde o nível do mar a até altitudes elevadas.
Palavras-chave: raios cósmicos; altas energias; seção de choque
Abstract
The cosmic rays were discovered in the earlier 20th century by Victor Hess, which uses balloons at 5 km altitude and verify that the higher altitude, higher the ionization. These rays are composed basically by protons, coming from several parts of the universe. Their origin, which is closely linked with their initial acceleration, is still debated in the current scientific community. They may be essentially divided into primary cosmic rays, being the original particles of the source which still did not suffer any kind of interaction, and secondary cosmic rays, being the particles produced due to the primary particles' interactions with the nuclei of atmosphere. When enter in the atmosphere, could have two events, atmospheric cascade, if the particles not reaching the ground, or air shower, if reaching the ground. This work aims study the interactions that occur when cosmic rays collide with the nuclei in the atmosphere. To do this was made a detailed bibliography of quantities used in the study of cosmic rays and then verify a possible connection with the proton-proton cross section, which is of extreme importance in nuclear physics. As result, was deducted an expression that calculates the values of the proton flux from the initial energy in the laboratory system, since sea level up to high altitudes.
Key-words: cosmic rays; high energy; cross section
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011
2
INTRODUÇÃO
O estudo dos raios cósmicos é relativamente recente, tendo seu início por volta de 1900
como resultado da observação da ionização de gases contidos em recipientes fechados.
Posteriormente, foram realizados experimentos com balões para verificar qual seria a
participação da Terra nesta ionização. A descoberta dos raios cósmicos é atribuída a Victor
Hess, que em 1912 utilizou balões em grandes altitudes. Em 1950 já eram conhecidas as
principais características dos raios cósmicos primários (aqueles que não sofreram
interações desde sua fonte até a Terra), porém as informações obtidas da composição e do
espectro não ajudavam em quase nada para o conhecimento de sua origem e fonte. Sendo
sua origem uma das questões centrais da astrofísica dos raios cósmicos de hoje em dia.
Os detalhes dos movimentos dos raios cósmicos ainda não são totalmente compreendidos
(sabe-se que o campo magnético galáctico representa um papel fundamental neste
movimento). Como não se tem uma teoria definitiva que explique a natureza da propagação
dos raios cósmicos baseada na interação de partículas relativísticas com o meio interestelar,
pode-se utilizar modelos semi-empíricos.
Este trabalho tem como intuito estudar as interações que acontecem nos raios cósmicos ao
se chocarem com os núcleos presentes na atmosfera, já que a energia envolvida neste
processo é muito superior a que se tem nos laboratórios hoje em dia na Terra.
REFERÊNCIAL TEÓRICO
A origem dos raios cósmicos ainda é um dos problemas não resolvidos em astrofísica. Para
entender como são originados é preciso, em um contexto amplo, conhecer os efeitos físicos
de como a sua aceleração e propagação através do espaço podem ocorrer. Sendo a sua
composição basicamente prótons e outras partículas carregadas, tem-se interação com
campos eletromagnéticos, que são aleatórios (em direção e sentido) e abundantes no
universo.
De acordo com C. Grupen (2005) os raios cósmicos podem ser produzidos e acelerados
por:
� Explosões de supernova.
� Estrelas de nêutrons em rotação e altamente magnetizadas (pulsares).
� Discos de acreção de buracos negros.
� Centros de galáxias com núcleo ativo.
Também se pode ter uma aceleração através do meio interestelar ou intergaláctico devido à
interação com extensas nuvens de gás (estas nuvens são criadas devido a irregularidades
Universidade Presbiteriana Mackenzie
3
de campos magnéticos implicando que partículas carregadas podem ganhar energia
enquanto são espalhadas pelas constituintes dessas nuvens magnéticas) (GRUPEN, 2005).
As radiações cósmicas produzidas na fonte são comumente chamadas de raios cósmicos
primordiais. As partículas com origens galácticas costumam atravessar uma coluna de
densidade de aproximadamente 6 g/cm² antes de atingirem o topo da atmosfera terrestre,
este topo corresponde a uma altitude de aproximadamente 40 km. Os raios cósmicos que
chegam até a atmosfera terrestre sem sofrerem perturbações consideráveis, como a
produção de outras partículas, são chamados de raios cósmicos primários (GRUPEN,
2005).
Normalmente as partículas aceleradas são prótons e elétrons, porém todos os elementos da
tabela periódica são produzidos nas fontes, como os núcleos de hélio e lítio. Os raios
cósmicos apresentam certas similaridades com as abundâncias encontradas no sistema
solar. Além de partículas carregadas, pode-se ter também a produção de outras partículas
que emergem das fontes, como neutrinos, do canal �� → �� + ��, e fótons, do canal
�� → (GRUPEN, 2005).
Os elementos presentes nos raios cósmicos são, aproximadamente, 85 % são prótons, 12
% partículas � e elementos com Z ≥ 3 representam somente 3 %. Ao analisar a composição
química dos raios cósmicos e do sistema solar, vê-se que as duas distribuições tem picos no
carbono, nitrogênio, oxigênio e no grupo do ferro. Isto pode ser explicado pelo fato de que
os raios cósmicos foram acelerados de fontes que possuem a mesma composição química
que o sistema solar. Porém os raios cósmicos possuem alguns elementos em excesso,
como o lítio, berílio, boro e elementos com um número atômico um pouco menor que o do
ferro (sub-Fe). O excesso dos elementos Li, Be e B podem ser explicados pela
fragmentação de núcleos de carbono e oxigênio e os elementos sub-Fe podem ser
explicados pela fragmentação ou espalação (que é a fissão nuclear de um átomo
desintegrado que sofre um impacto de uma partícula com alta energia, que pode ser um
próton) do ferro (GAISSER & STANEV, 2006).
O espectro das energias para os raios cósmicos primários com energia maior que 2
GeV/nucleon está mostrado no Gráfico 1.
As partículas que possuem baixa energia são modificadas pelos campos magnéticos do Sol
e da Terra. O ciclo de 11 anos de manchas solares modula a intensidade dos raios
cósmicos primários com energias menores que 1 GeV/nucleon. Quando o Sol está ativo a
intensidade dos raios cósmicos é reduzida, devido à criação de intensos campos
magnéticos, que impede partículas galácticas carregadas de atingirem a Terra (NAKAMURA
et al., 2010).
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011
4
GRÁFICO 1: Componentes dos raios cósmicos primários
Fonte: Adaptado de Nakamura et al., 2010 O espectro de todas as partículas com carga está mostrado no Gráfico 2, com suas
respectivas estruturas. Acredita-se que os raios cósmicos com energias de até 1015 eV são
produzidos na nossa Galáxia. Logo após da região denominada de “joelho” o espectro se
torna mais íngreme e decresce, na região denominada de “tornozelo” (energias da ordem de
1018 eV) o espectro se achata (NAKAMURA et al., 2010).
GRÁFICO 2: Espectro de todas as partículas, a parte cinza significa o intervalo de medidas dos raios cósmicos
Fonte: Adaptado de Nakamura et al., 2010 Em 1966 Greisen, Zatsepin e Kuzmin, logo após a descoberta da radiação cósmica de
fundo, realizaram um cálculo que indica que prótons com energias maiores que 6x1019 eV
sofreriam interações com estes fótons que permeiam o espaço e assim perderiam energia.
Estas interações são dadas através da ressonância ∆ pelos canais (LAMPARD, CLAY &
DAWSON, 1997):
Energia cinética por partícula ou núcleo (GeV)
dN/d
E (
de n
úcle
os)
[1/(
m²
Sr
s G
eV)]
Joelho
Tornozelo
Universidade Presbiteriana Mackenzie
5
+ � → �′ + ��
+ � → + �� (1)
Esta energia máxima é chamada de limite GZK, e leva os prótons a terem um livre caminho
médio pequeno, da ordem de 10 Mpc, surgindo então o mistério das fontes que podem
acelerar as partículas a esta alta energia, pois com essas distâncias próximas (em escala
astronômica) não se tem conhecimento de que objeto do universo poderia fornecer tamanha
energia para uma partícula. No Gráfico 3 pode-se verificar o livre caminho médio para
interações de um próton com a radiação cósmica de fundo em função da energia do raio
cósmico. Claramente verifica-se que partículas com energias da ordem de 1020 eV são
bastante atenuadas, tendo um livre caminho médio de aproximadamente apenas 30 Mpc e
no Gráfico 4 verifica-se para uma dada energia inicial do próton qual será a energia após
ter-se percorrido alguns Mpc (LAMPARD, CLAY & DAWSON, 1997).
GRÁFICO 3: Livre caminho médio para interações de um próton com a radiação cósmica de fundo
Fonte: Adaptado de Lampard; Clay; Dawson, 1997
GRÁFICO 4: Energia média em função da distância, de uma amostra de 1000 prótons, com a energia inicial
indicada Fonte: Adaptado de Lampard; Clay; Dawson, 1997
Os raios cósmicos primários ao encontrarem a atmosfera terrestre, interagem com os
átomos que a constitui, produzindo novas partículas, que são comumente chamadas de
raios cósmicos secundários.
Dis
tânc
ia (
Mpc
)
Distância (Mpc)
log � (eV)
log� (e
V)
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011
6
Para ter-se um melhor conhecimento das interações que se dão na atmosfera, deve-se ter
um conhecimento de sua estrutura e composição. Na Figura 1 pode-se ver como a
atmosfera está divida.
As partículas secundárias produzidas na atmosfera estão intimamente conectadas com a
espessura de matéria atravessada (ou profundidade atmosférica dado em g/cm²), no
Gráfico 5 pode-se verificar como a profundidade atmosférica varia com a altitude. A
profundidade atmosférica está relacionada com a densidade da atmosfera de acordo com a
equação (2) (GAISSER, 1990):
��ℎ� = � ��ℎ′��ℎ′�
� (2)
FIGURA 16: Camadas da atmosfera até o espaço
Fonte: Adaptado de Putze, 2006
GRÁFICO 5: Variação da profundidade atmosférica em função da altitude
Fonte: Adaptado de Putze, 2006 Através do Gráfico 5 verifica-se que no nível do mar a profundidade atmosférica equivale a
1000 g/cm², enquanto que experimentos realizados com balões (~ 40 km) a profundidade é
de 5 g/cm². Em termos de produção de partículas secundárias isto representa uma grande
diferença, devido ao processo de fragmentação com os núcleos da atmosfera (PUTZE,
2006).
Como as partículas primárias possuem energias relativísticas, quando entram na atmosfera,
interagem com os núcleos ali presentes e produzem muitas outras partículas secundárias,
Monte Everest Balõe s Meteorológicos Meteoros Auroras Ônibus Espacial