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A b b l i a e a I N E R R N C I A U ^ b X)N ? r /
Amin A. Rociar*
A controvrsia sobre a extenso da inerrncia bblica continua viva
entre os evanglicos na arena do debate teolgico atual e, como
afirma Colerhan,:'' . assunto "no quer morrer."1 A questo, que
considerada por alguns to importante quanto os debates cristolgicos
do terceiro e quarto sculos, ou como as disputas soteriolgicas do
sculo XVI, tornou-se uma fonte de crescente angstia e diviso na
coalizo evanglica. Para os herdeiros da teoria de Warfield de uma
Bblia perfeita e inerrante, uma linha deve ser traada entre aqueles
que aceitam uma viso plena das Escrituras, e aqueles que no
aceitam.2 Assim, a inerrncia se tornou uma insgnia evanglica, sob o
conceito de que " melhor estar dividido pela verdade do que unido
pelo erro."3
Ao identificar inspirao com inerrncia, os proponentes desta
doutrina interpretam a incerteza acerca desta com o declnio na
crena sobre aquela e com o declnio do respeito pela prpria Bblia,
ento, uma ameaa sobre a autoridade bblica e a certeza
religiosa.
Argumentando que "toda a Bblia , como Deus, sem qualquer
defeito,"4 os inerrantistas reduzem tudo no registro bblico a; um
nico nvel de inerrncia absoluta, e ento alegam que sem uma slida
plataforma de inerrncia, impossvel manter uma viso elevada da
Escritura', e que para os cristos s h uma alternativa, "ns cremos
em Cristo e na inerrncia bblica, em ambas - ou em nenhuma. ' 0 .
'
P rops i to deste estudo: Uma vez que os defensores da inerrncia
nos detalhes alegam que esta crena a maneira exclusiva de honrar a
Escritura com uma viso elevada de sua autoridade, este artigo tem o
propsito bsico de investigar a validade desta insistncia e
determinar se uma viso da inspirao pode ou no ser elevada sem o
apelo inerrncia.
Organ izao do art igo: Este estudo est dividido em trs partes:
(1) a primeira parte ser uma breve pesquisa sobre as razes
histricas da doutrina da inerrncia, uma vez que uma clara
compreenso de seu pano de fundo crucial para nossa avaliao. (2) A
segunda e terceira partes sero uma investigao dos
Amin A. Rodar, Th.D. Andrews University. EUA. Ex-Professor do S
A L T - I A E N E , a tua lmen te . Pastor da Igreja Adventis ta
Luso-Brasileira em Toronto, Canad.
^ R- J- Coleman, "Biblical Inerrancy: Are We Going Anywhere?"
Theology Today 31 (1975) : 281. | ; P . Sehef fe r , "Form and
Freedom in the Church , " Lei lhe Earlli Hear His Vaice 153 (1974)
, 364-
J65. fe ^ Edward J. Carnel l , et'., Chrixiiaiiiiy Today
(February 24, 1978), 36.
s C. C. Ryrie, Wliai Vou Slioitld Know aboui Inerrancy (Chicago:
M o o d y Press, 1981), 41 . R. L Harris, " T h e Basis for Our
Belief in Inerrancy", Bulletin
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2 Revista Teolgica do SALT- IAENE
quatro argumentos - bblico, histrico, epistemolgico e argumento
domin - os quais, de acordo com os proponentes da inerrncia bblica,
so os maiores obstculos para uma viso elevada das Escrituras fora
da inerrncia. (3) A quarta parte tratar do conceito da viso elevada
da Escritura luz dos fenmenos bblicos. (4) Finalmente, na quinta
parte, o sumrio e a concluso. '
Def in io de termos: ( 1 ) 0 termo inerrncia ser usado
geralmente neste estudo em um sentido teolgico, segundo o qual a
Bblia "no contm erro de qualquer tipo"6 em cada detalhe particular
em todos os assuntos que ela toca. (2) A expresso viso elevada da
Escr i tu ra ser usada intercambiavemente com expresses como viso
elevada da Autor idade , viso elevada da Inspirao, viso p lena ...
viso for te ..., no mesmo sentido, para descrever alta considerao
pela Bblia como a confivel palavra de Deus.
Pano de Fundo da Dou t r ina da Ine r r nc ia
Por quase dezoito sculos de Histria do Cristianismo, a Bblia
havia sido geralmente considerada como sendo, do comeo ao fim, a
inspirada Palavra de Deus.
Contudo, na metade do sculo dezessete, quando a "Idade da F"
rpida e inesperadamente veio a ser substituda pela "Idade da Razo,"
o quadro logo comeou a mudar. A pesquisa nas razes histricas nos
levaria a uma grande variedade de nomes, atitudes e abordagens,7 os
quais progressivamente, atravs de diferentes dialticas "comearam a
insistir que no havia nenhuma diferena essencial entre a Bblia e
qualquer outra produo literria."8
Uma abordagem racionalista das Escrituras estava se
desenvolvendo, especialmente na Alemanha com uma grande suspeita
quanto ao conceito da inspirao bblica. Tanto o Antigo como o Novo
Testamento eram objeto de crtica baseada nas pressuposies e
categorias do movimento filosfico contemporneo.9 O pinculo desta
abordagem foi a publicao, por Julius Welhausen, de Prolegomena to
The History of Israel (1878). Aplicando princpios evolucionistas
apreendidos tanto de Charles Darwin como de G. W. F. Hegel,
Welhausen "reestruturou radicalmente o Antigo Testamento ao tentar
demonstrar o desenvolvimento naturalista da f de Israel."10
h H. L i n d s e l , The Battlefor lhe Bihlc (Grand Rapids, MI:
Zondervan, ) , 35. 7 H a v i a a n e g a o de Kant (1804) de que as
realidades teolgicas podem ser apreendidas pela mente e q u e ta is
d o u t r i n a s desf ru tam val idade universal . Havia a insis
tncia de Sch le ie rmacher (1834) sobre a i m a n n c i a de Deus,
quase cr iando u m a religio baseada nos sent imentos pessoais .
Havia a n f a s e de K i e r k e g a a r d na d i s juno radical
ent re o finito e o infini to, um virtual dua l i smo metaf s ico
que to rnou imposs ve l a revelao d iv ina objet iva. x R. D e d e
r e n , "Revelat ion, Inspirat ion, and. Hermeneut ics , " A
Syniposiion on Bihlical Hermeneutics ( W a s h i n g t o n , D.C. :
The Rev icw and Herald Publishing Assoeia t ion , 1974), 9 .
A Bblia e a Iner rnc ia
Progressivamente, por diferentes caminhos, a alta crtica alem
comec ser introduzida na Amrica," desafiando a Ortodoxia
Protestante a respeito sua atitude quanto inspirao e autoridade da
Escritura. As novas idia respeito da Bblia se tornaram o tema
dominante nas igrejas no final da dcade 1870.
Diante de to formidveis incurses do liberalismo, as fileiras da
ortode I ^
comearam a ceder. ~ Compreensivelmente, ameaados por estes
assaltos, evanglicos americanos buscaram conter a eroso da confiana
na Bblia, definir, mais precisamente do que os Reformadores, a
natureza da inspira autoridade."13 Como D. Hubbard assinala, como
era de se esperar, eles voltaram, em busca de ajuda, para
Turrentin,14 o qual havia desenvolvido u defesa da divindade da
Escritura baseado nos argumentos racionais acerca natureza da
inspirao e suas implicaes. E ningum fez isto com rr persistncia e
eficcia do que os baluartes de Princeton, Charles Hodge e B
Warfield.
Deve ser notado que a obra lnstitutio theologiae elenticae, de
Turren onde o conceito de inerrncia defendido com preciso
sistemtica, fo
Word Books , 1977). 155. " Theodore Parker introduziu a alta crt
ica alem j em 1843 c o m sua t raduo de De Wet Criticai and
Histrica! Introduclion lo ilie Old Testament, mas o movimento no
inf luem realmente a teologia amer icana ate cerca de 1880 (ver
Counts , A Stuely of Benjamim B. Warfie Vicw of llie Doctrin of
Inspiration [Tese apresentada faculdade do Dallas Theo log ica l
Semir 1959], 5). 12 O Congregac iona l i smo se rendeu primeiro.
Henry Ward Beecher tornou-se o pr imeiro cli p roeminente a abraar
a evoluo em 1880, e no poucos seguiram seu exemplo (ver Counts ,
op. < 5). Em 1881 c inco professores do Andover Theological
Seminary foram subme t idos a ju lgame por heresia. U m a das
acusaes era que a Bblia para eles era "falvel e no c o n f i v e l
mesmo alguns de seus ens inos rel igiosos" (ver H. S. Coff in ,
Reli^ion Yesterckiy and Today [New Y( Books for Libraries Press.
1968], 68). Os presbiterianos sucumbi ram mais l en tamen te . Em
1881 erudi to C. A. Briggs publicou seu Bible Sludy, lis
Principies. Methods, and History ( N e w York: Scribners Sons ,
1894), que estabeleceu as posies liberais; a lguns anos mais t a r
d e Briggs processado e suspenso da igreja por heresia. Em apoio a
Briggs, O Union S e m i n a r y desassocioi da Igreja Presbi ter
iana e se tornou uma cidadela para os liberais. 13 Hubbard . 155.
14 Francis Turrent in (1623-1687) no Escolast icismo Ps-Reforma,
escreveu lnstitutio Theoloa Elencticae, com uma doutr ina da Escri
tura baseada no mtodo Aris to t l ico-Tomis ta de pr a ra antes da
f. Porque as provas racionais devem preceder a f, Turrent in sent
iu s e r necess harmonizar cada aparente inconsistncia no texto
bblico. Ele se recusou a admi t i r q u e os escritc sagrados poder
iam escorregar na memria ou errar em questes mn imas . Ele espec i
f icou ' profetas no cometeram erros nem mesmo nos mnimos
particulares. Dizer isto ser ia tornar duvid> toda a Escr i tu
ra . " Ele proclamou que "A Bblia inerrante em todas as ques tes .
" S o b a influn de Tur ren t in , em 1675, foi publ icada a Frmula
de Consenso Helvtica, e sobre a inspirao Antigo Tes tamento , ela
declarou que esta inspirao era encontrada no "apenas em s u a s
consoam mas em suas vogais - ou nos prprios pontos voclicos, ou
pelo m e n o s no poder dos pontos. ' ' Bblia foi inspirada "no
apenas em sua substncia m.-iv em une nnlnvmc " :i c n n f i s s o
declaroi
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4 Revista Teolgica do SALT- IAENE
principal livrq-texto de teologia sistemtica no Seminrio de
Princeton por sessenta anos,15 e considerado como "um dos mais
perspicazes livros jamais escrito."1 6 A maioria dos ministros, e
atravs deles membros, da Igreja Presbiteriana haviam sido treinados
por dcadas a igualar Turrentin com a G.onfisso Westminster e os
Reformadores. Ento, a influncia da teologia escolstica de Turrentin
sobre a vida do evangelicalismo americano, atravs de Princeton,
estava alm de avaliao, e emergiu claramente na obra de
Hodge-Warfield.
Na forte reao contra o liberalismo, Hodge e Warfield refinaram e
reinterpretaram a doutrina da inerrncia, mantendo suas razes em
Turrentin. No clssico artigo "Inspirao" publicado no peridico
Pre.sbite.rian Review em 1881, o qual proveu uma estratgia de
combate contra o liberalismo e alta crtica, Hodge-Warfield
afirmaram: (1) A Escritura Sagrada plenria e totalmente inspirada,
(2) A Escritura Sagrada verbalmente inspirada, (3) a Escritura
Sagrada inerrante em todos os assuntos nos quais ela toca e (4)
nenhum erro pode ser atribudo ao texto original.
Evidentemente, Hodge-Warfield no estavam simplesmente
estabelecendo a viso bblica da inspirao; antes, sua obra era
reacionria, isto , desenvolvida para refutar ataques contra a Bblia
com o especial propsito de conter as correntes de infidelidade. Por
conseguinte, eles assumiram uma posio radical, a qual encontrada em
algumas declaraes do famoso artigo "Inspirao," a respeito da
Escritura: "absolutamente infalvel" (226); "absolutamente
inerrante" (227); "sem erro de fato ou doutrinas" (228); "expresso
inerrante" (231); "um registro inerrante" (232); "infalvel em sua
expresso verbal" (234); "infalibilidade inerrante das palavras"
(240); e "absoluta liberdade de erro em suas declaraes" (234).
Estas declaraes mostram como tentativas ortodoxas de reagir contra
a heresia ou descrena, por necessrias que fossem, produziram
ultra-reao.
Nos longos sculos de histria da Igreja, um extremo freqentemente
tem provocado outro, e a histria da teologia est repleta com
exemplos de "supercrena," credos alm dos que foram estabelecidos
pela Escritura. Ento, aqui, a histria se havia repetido. Com a
inteno de proteger a Palavra de Deus, os telogos de Princeton.
enquanto viam os perigos da esquerda, esqueceram os iguais ou
maiores perigos da direita.
As tenses sobre o assunto da inerrncia da Escritura cresceram
durante as prximas dcadas, e o conceito de inerrncia Ibi submetido
a um processo de endurecimento de um telogo para outro com a
passagem dos anos. Alguns
Em seu conf l i to com Warfield sobre a compreenso da Escritura.
Briggs havia a legado q u e a hisriiiiiid de Francis Turrent in se
lornara em livro texto de Princeton e q u e "a Westmins ter Divine
e r a m i g n o r a d o s " (J. Rogers, Srripturc i ,/lc
Westminster Cmifcssioii [Grand Rapids , Ml: Eerdmans 1967], 29 . )
.
A Bblia e a Iner rnc ia 5
argumentaram que a doutrina da inerrncia era essencial e
necessria,17 e um crescente nmero de ministros igualava o postulado
da inerrncia com a autoridade bblica, e considerava ambas como
sendo inseparveis. Por conseguinte, eles interpretavam a incerteza
a respeito da inerrncia com um declinante respeito para com a
Bblia.
Um sculo aps a publicao do famoso artigo por Hodge-Warfield, o
debate sobre a inerrncia e as exatas implicaes da inspirao da
Escritura tem continuado vivo entre os modernos telogos evanglicos.
Como R.K. Johnston assinala, "a discusso dentro do evangelicalismo,
concernente a inspirao da Escritura, tem costumeiramente focalizado
neste ponto: se a Escritura ou no inerrante."18 De acordo com
alguns eruditos, como j indicado anteriormente, a controvrsia "to
importante quanto as controvrsias cristolgicas do quarto sculo e a
controvrsia soteriolgica do sculo dezesseis,"19 ou de acordo com H.
Lindsell, "o Cristianismo evanglico est engajado na maior batalha
de sua histria."20
A crescente lista de artigos, ensaios e livros com farta
bibliografia em apndice, indica a tremenda nfase que tem sido posta
no assunto. A palavra chave inerrncia apareceu em uma posio de
grande proeminncia e tem sido usada como um instrumento de cisma e
diviso no corpo evanglico, a ponto de desejar excluir das fileiras
evanglicas aqueles que no se submetem a este conceito.
Entre os evanglicos, o compromisso com a inspirao da Escritura,
um corolrio de sua crena na autoridade bblica, tem levado arautos,
tais como F. Schaeffer-, Lindsel, C.C. Ryrie a considerarem uma
formulao particular da doutrina da inspirao - uma crena na
inerrncia da Escritura nos detalhes -como sinnima de uma viso
elevada da autoridade bblica. "Conflitando autoridade bblica,
inspirao, e inerrncia, eles tm tornado a "inerrncia" a marca d'gua
dogmtica do evangelicalismo."21 Segundo Schaeffer, o
"evangelicalismo no ^consistentemente evanglico, a menos que seja
traada uma linha entre os que tm uma viso plena da Escritura, e
aqueles que no a possuem."22 C. C. Ryrie,23 na mesma linha,
assinala que inspirao e inerrncia esto inseparavelmente vinculadas
e ningum pode manter uma viso elevada da
17 No final do sculo, quando o professor Henry P. Smith foi
processado e acusado de heres ia , e le diz do comi t que instaurou
o processo: "A mais perplexa declarao q u e eles f izeram foi de q
u e apenas uma Escri tura inerrante pode ter poder para realizar na
alma humana a obra para a qual a revelao foi dada , isto , a obra
de converso e regenerao." H. S. Cof f in , Religitm Yesterday and
Today (New York : Books for Libraries Press, 1968). 73. Ix R. K.
Johnston, Evan^elicals al cm Impasse (Atlanta: John Knox Press,
1979). 15. I y Esta n fase a s sumida pelos eruditos evangl icos
reunidos em Chicago , 1977, no ass im c h a m a d o Conc l io
Internacional sobre Inerrncia Bblica; ver Eternity (November 1977),
10. 211 H. Lindsel l . The Ballle for tlie Bible, 141, 200. 2 l
Johns ton , 5.
-
6 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
inspirao a menos que inclua a inerrncia. Nossa preocupao bsica a
seguir investigar a validade da alegao dos
defensores da inerrncia e verificar, como Pinnock24 diz, que
direito tm os inerranlistas em argumentar que uma viso da inspirao
no pode ser elevada e forte a menos que a inerrncia esteja
implcita.
Bblia, Or todoxia Cris t , e Ine r rnc ia
Em quase cada delesa da inerrncia bblica, assumido que a noo
escriturstica, isto , um conceito ensinado pela prpria Bblia. Os
defensores da inerrncia, com freqncia, e abertamente alegam que "a
Bblia ensina sua prpria inerrncia."2''^
C. C. Ryrie, em sua forte nfase na importncia da inerrncia,
refere-se a ela como uma doutrina bblica e conclui que "Cristo
ensinou a inerrncia assim como tambm o apstolo Paulo."26 Na mesma
linha, H. Lindsell afirma que o conceito de inerrncia aceito, no
por fazer com que seus defensores se sintam confortveis, mas
"porque ensinado na Escritura, exatamente como a divindade de
Cristo, o nascimento virginal de Cristo e a ressurreio corporal de
nosso Senhor dentre os mortos so ensinados na Escritura."27
De acordo com Ryrie, h trs classes de referncias bblicas que
testificam da inerrncia. A p r ime i ra a classe de versculos que
afirmam a confiabilidade de Deus. A segunda envolve versos que
enfatizam o carter permanente das Escrituras completas. Em apoio a
esta alegao, Ryrie usa textos tais como Mateus 5:17-18, e envida
considervel esforo para provar que o iota e o til, embora os
menores sinais do alfabeto hebraico, desempenham um grande papel
nele. Ele ento conclui que as promessas do Antigo Testamento so
"proferidas com preciso e assim com preciso cumpridas."28
Adicionalmente, citando Joo 10:33-36, onde Jesus afirma que a
Escritura no pode ser quebrada, ele alega que "isto s possvel
porque a Escritura verdadeira em cada particularidade e em todas as
suas partes." A terceira parte de evidncia, segundo Ryrie, so
aqueles versculos nos quais o argumento empregado fundamentado em
uma palavra ou na forma de uma palavra. Por exemplo: Mateus 22:32
(tempo presente do verbo ser); Mateus 22:43-45 (a palavra Senhor);
Glatas 3:15, 16 (a forma singular da palavra "semente" em contraste
com o plural). Ento ele conclui: "naturalmente,
C. C. P innock "Three Views of lhe Bible in Con lempora ry
Theology ," Diblical Revehuion ( C h i c a g o : M o o d y Press),
66. " Cf . S. T. Davis , The Debate aboui ilie Bible (Phi
ladelphia: The Westmins ter Press, 1977). 51.
C. C. Ryrie . Wlial Yan Shoiild Know uboui hierrancy (Chicago:
Moody Press. 1981), 25. Ver t a m b m seu art igo. "The Imporiance
of Inerranee," Bibliothem Sacra. 120: 4 7 8 (April 1963),
139-144.
27 L indse l l , The Batlle for lhe Bible, 162. n I I / , . . .
/ o , .
A Bblia e a Iner rncia 7
se a Bblia no inerrante tais argumentos deixam de ter qualquer
peso."29
Contudo, apesar destas alegaes, qual o testemunho da Escritura
com referncia ao seu prprio carter? a inerrncia realmente um
conceito escriturstico ou simplesmente uma inferncia traada por
mentes piedosas? Ou, exige a inspirao o conceito da inerrncia? Em
primeiro lugar, aqueles textos utilizados para sustentar a idia da
inerrncia apenas testificam da confiabilidade e inspirao da Bblia,
mas no h reivindicao de inerrncia ilimitada, como uma doutrina.
Ademais, o argumento Ryrie baseado "em uma palavra ou na forma de
uma palavra," no uma verdade universal, uma vez que no tem aplicao
geral, e certamente pode ser usado para provar exatamente o oposto.
Desta forma os evangelhos so o maior obstculo para a doutrina da
inerrncia.30
Podemos concordar inteiramente com S. T. Davis, de que algum
procuraria em vo por um nico texto bblico que ensine que a Bblia
inerrante, que ela no contm erro em nenhum lugar ou sobre qualquer
assunto; ele diz, "A Bblia no ensina a inerrncia, nem a inerrncia
parece estar pressuposta ou implcita pelo que ela faz."31
Adicionalmente, A. F. Harrison, como muitos outros eruditos,32
observa que " preciso conceder que a prpria Bblia, ao desenvolver
sua prpria reivindicao de inspirao, no diz nada preciso sobre sua
inerrncia. Esta permanece como concluso a que mentes devotas
chegaram por causa do carter divino da Escritura."33 L. Morris diz,
"a Bblia no parece jamais reivindicar inerrncia para si mesma, pelo
menos em termos estabelecidos."'
De fato. a inerrncia no uma reivindicao formalmente declarada
pelas Escrituras em benefcio delas prprias, ao contrrio uma
inferncia do conceito Bblico de inspirao. Uma deduo lgica da
afirmao bblica da perfeio de Deus , portanto, a concluso do
silogismo:
Premissa A - Tudo o que Deus faz perfeito. Premissa B - Deus
inspirou as Escrituras.
"J Ibid., 143. w Apenas um exemplo esclarecer o ponto: a ordem
de Jesus para "bat izar" aparece a p e n a s em Mateus 28:19, mas
no nas narrativas paralelas de Lucas 24:47 ou Marcos 16:15-16. A f
o r m a verbal de Mateus no aparece de forma a lguma nos paralelos.
31 Davis, 61.
A posio de muitos nomes da erudio evangl ica contempornea est em
opos i o a reivindicao de que a inerrncia um concei to Bblico; H.
Ridderbos, Studies in Scripture and lis Aiilhorily (Grand Rapids:
Eerdmans , 1978), 21; R. H. Mounce , "Clues to Unders tanding
Biblical Accuracy," Eleniiiy (June 1966), 16-18; R. K. Johnston,
Evangelicals ai cm Impasse (At lan ta : John Knox Press, 1979). 5;
D. M. Beegle, Scripture, Tradition anel Infallibilily (Grand Rap
ids , MI:
; Eerdmans , 1973), 19. E. F. Harrison, "The Phenomena of Scr ip
ture" in Revelation and lhe Bible (Grand Rap ids : Baker
Book House. 19SX1 - m
-
8 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
Concluso - Portanto as Escrituras so perfeitas.3'1
Para alguns defensores mais sofisticados da inerrncia, a idia
tambm a concluso da analogia entre a no pecaminosidade de Cristo e
os fenmenos da Escritura. C. Pinnock e C. C. Ryrie, quase nas
mesmas palavras, argumentam que o erro no mais condio para a
humanidade do que o pecado o para a natureza humana de Cristo.
"Cristo foi verdadeiramente humano e livre de erro."" '
Evidentemente, a analogia do Cristo divino-humano, como D. M.
Beegle a chama, uma "analogia remota,"37 especialmente porque em
termos exatos os dois elementos nao so paralelos, e possvel manter
uma crena na no pecaminosidade de Cristo e ainda aceitar a
Escritura como sendo errante em detalhes perifricos.
Quanto a questo exigir-se inerrncia da inspirao, os
inerrantistas argumentam que impossvel separ-las e ainda sustentar
a autoridade da Bblia. W. R. Cook observa que, "aquelas doutrinas
(inspirao e inerrncia) ficam de p ou caem juntas."38 J. Warwick
Montgomery declara: "notem cuidadosamente que eu no disse meramente
que inspirao e inerrncia no deveriam ser separadas, mas de
preferncia que a inspirao escriturstica e a inerrncia no existem
separadas uma da outra (i.e. que separ-las resulta no apenas em
erro, mas pura e simplesmente em falta de sentido)."39
Este argumento seria razovel, se baseado numa teoria de inspirao
de ditado mecnico, no qual os escritores bblicos passivamente
copiaram exatamente o que Deus sussurrava aos seus ouvidos.
Todavia, a Bblia no reivindica este modelo de inspirao, nem os
fenmenos o apoiam. Alm disso, como afirma S. T. Davis,40 nenhum
inerrantista hoje admitiria sustentar tal viso da inspirao.
Aqueles que vinculam inspirao com inerrncia, e tornam a primeira
dependente da segunda, do a impresso de que uma Bblia inerrante
solucionaria todos os problemas da inspirao. Mas isto improvvel,
uma vez que um documento inerrante no necessariamente um documento
divinamente inspirado. E possvel escrever um texto de matemtica ou
geometria que no contenha nenhum erro. Mas isto no torna estes
livros divinamente inspirados.
Mounce , ' 17. P innock , 94; ver t a m b m Ryrie. The
Iniporiance of Inerrancy, 144. in teressante notar q u e da
m e s m a analogia G. C. Be rkouwer tira d i ferentes concluses
, Holy Scripture (Grand Rapids , MI: E e r d m a n s , 1975), 200.
37 D. M. Beegle, Scripture, Tradition and lifallibility, 290. A
analogia pode ser usada cor re tamente se a h u m a n i d a d e da
Bblia for paralela c o m as l imitaes humanas da encarnao de Jesus;
ver Eilen Whi t e , Grande Conflito (Santo Andr: Casa Publ icadora
Brasileira, 1981), vi. 3S Rober t Cook , "Bibl ical Inerrancy and
Intelectual Honesty," Bibliolheca Sacra 125:498 (April 1968), 158.
1y J. W. Montgomery , "Inspirat ion and inerrancy," Bullelin of
tlie Evanglica! Theolot-ical Society, 8 : 4 5 (1965) , 48. 411
Davis, fv?
A Bblia e a Iner rncia 9
Uma Escritura inerrante apenas diria que a Escritura no poderia
ser acusada de erro, mas isto em si no prova que a Escritura
Sagrada seja divinamente inspirada. Para isto outras categorias e
outros tipos de evidncias so necessrias. Ento a concluso que a
inerrncia no indispensvel para uma viso elevada das Escrituras uma
vez que a mesma no implica automaticamente em crena na
inspirao.
Por outro lado, os inerrantistas tenazmente argumentam que a
inerrncia total tem sido a posio normativa da igreja atravs de sua
histria, assim, ela no uma nova teoria desenvolvida em tempos
modernos. Lindsell afirma que da perspectiva histrica pode ser dito
que por dois mil anos a igreja crist tem concordado que a Bblia
completamente inerrante.41 R. Lovelace42 tambm vindica a inerrncia
como viso histrica normativa da igreja. A mesma posio defendida por
Francis Schaeffer4 3 e outros proponentes da inerrncia total. Para
eles a posio Hodge-Warfield no uma inovao; sua essncia germinal
encontrada nos grandes telogos da igreja crist, do segundo ao dcimo
oitavo sculo. A lgica do argumento que aqueles que negam a teoria
da inerrncia nos detalhes esto em coliso com a admitida viso plena
da Bblia, assumida atravs de quase dois mil anos de histria da
igreja.
Contudo, pelo menos dois pontos permanecem em oposio a esta
nfase: primeiro, de uma pesquisa histrica sobre a noo de inerrncia,
pode-se tirar diferentes concluses. As Evidncias favorecem que a
"moderna teologia herdou o problema da inerrncia bblica do
escolasticismo ortodoxo do sculo dezessete, tanto luterano quanto
reformado."44 Ademais, J. Rogers, de seu exaustivo estudo
. sbre as razes histricas da doutrina da inerrncia, conclui que
historicamente irresponsvel alegar que por dois mil anos os cristo
tm crido que a autoridade da Bblia acarreta um moderno conceito de
inerrncia em detalhes cientficos e histricos.4"1 A igreja
corporativamente tem sido cautelosa e fazer a reivindicao de
"inerrncia" normativa para a vida crist, usando em vez disto
palavras como "autoridade," "suficincia" e "infalibilidade" ao
pronunciar seus credos. Igualar estes termos com "inerrncia"
novamente uma inferncia dedutiva dos inerrantistas.
O segundo aspecto a ser notado que, contrariamente as alegaes
dos inerrantistas, o pano de fundo histrico para a doutrina da
inspirao
Lindsell, 19; ver tambm o artigo de Lindsell , "Bibl ical
Infallibility: The Reformat ion and Beyond Journal of the
Evanglica! Tlieolo^ical Society 1-9 (Winter 1976), 25-37.
Cf. Roger R. Nicole and J. Ramsey Machae l s (eds.), Inerrncy
and Coinnwn Sense (Grand Rapids: Baker Book Housc, 1980),
20-25.
F. Schaeffer , No Pinai Conflict: The Bible Without Error Is Ali
That ll Affmvs (Downers Grove , IL: Inter-Varsity Press. 1975), 8.
45 -46 ; ver t a m b m P innock , Biblical Revelalion. lhe
Foundation of Christian Theology (Chicago: Moody Press, 1971),
147-174.
Otto W. Heick, "Biblical Inerrancy and the Hebrew M o d e of
Speech," Tlie Luleran Quarlerly 20 (1968) . 7.
-
1 0 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
extremamente complexo. Um conceito moderno de inerrncia
envolvendo linguagem cientificamente precisa era, naturalmente,
desconhecido antes do surgimento da cincia moderna. Assim, mesmo
quando os Pais da igreja reivindicam que a Bblia no tem erro,
podemos estar quase certos de que "erro" no significa para eles o
que significa para ns hoje. Como J. I. Packer diz, no podemos ler
em Calvino nossas prprias preocupaes, e esperar que ele responda
perguntas que so nossas, no dele.46
Em suma: por acreditarem que tanto a Bblia como a.tradio
ortodoxa da igreja sustentam a inerrncia, os defensores da
inerrncia sentem-se justificados em negar o termo "evanglicos"
queles que rejeitam esta doutrina. Nesta base eles concluem que uma
viso elevada da Escritura impossvel sem a inerrncia. Contudo, como
foi salientado, a Bblia no reivindica inerrncia para si prpria, nem
o resultado'final da inspirao apoia isto. Portanto, no h uma viso
"mais elevada" da Escritura do que aquela que a Bblia reivindica
para si prpria, e no h maneira de aperfeioar o que Deus fez. Por
outro lado. recorrer aos Pais da Igreja e aos Reformadores em apoio
a uma teoria.moderna de inerrncia "dar pouco valor a preocupao
deles de que a Bblia nossa nica autoridade sobre salvao e prtica
para a vida crist."47
Os Argumen tos Epistemolgico e Domin
Para os que vindicam a teoria da inerrncia nos detalhes, o
compromisso com esta crena sinnimo de uma viso elevada da
autoridade bblica, e a nica maneira-.de honrar a Escritura. De
fato, em muitos arraiais, a opinio popular assume que at mesmo a f
crist impossvel sem a crena na inerrncia da Escritura, a qual,
segundo seus defensores, um teste de autenticidade evanglica. De
acordo com C. C. Ryrie, "uma viso plena e elevada da inspirao exige
a inerrncia como seu elemento natural e necessrio."48 R. L. Harris,
outro proponente' da inerrncia, mais enftico. Ele argumenta, "se
temos alguma considerao por consistncia, ns cremos em Cristo e na
inerrncia, em ambas ou em nenhuma. Para o cristo a escolha
simples."49
Deveria ser notado que, basicamente, por detrs deste dilema
proposto pelos inerrantistas, h duas razes principais que levam
seus proponentes concluso de que a crena na perfeita ausncia de
erro da Bblia maneira
4' J a m e s Packer, "Ca lv in ' s Vievv of Scr ip tu re" in
John Warwiek Montgomery (ed.). Gad'.v Inerrant Word; an
Syinpaxiiini on lhe Tnisiworilumess of Serip lure (Minneapol is :
Bethany Fel lowship , 1974), 97.
4 7 Rogers , 45 ; Bernard R a m m nota que "Deve ser sal ientado
que his tor icamente a inerrncia da Escr i tura no o lipo de perfe
io da Escr i tura que os Reformadores e os telogos or todoxos ps-r
e f o r m a d o s ens inaram;" "Rela l ionship of Sc ience ...."
JASA, 21-22 (1969): 97. 4X Ryrie, "The Importance of Incrrancy."
Biblialheca Sacra 120:478 (April 1963). 141. 4
-
12 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
declnio. '0 4
Ademais, certamente difcil compreender, porque Deus, se Ele
considerava a ausncia de erro epistemologicamente to crucial, no
tomou mais cuidado em preservar um texto sem erros, e como explicar
a Bblia errante que os cristos sempre possuram para us-la to
efetivamente por milnios. claro que Jesus, Paulo, e os escritores
do Novo Testamento possuam manuscritos no inerrantes em suas mos, e
foram capazes de us-los como confiveis e autoritativos, e parece
improvvel que aqueles manuscritos imperfeitos tenham interferido em
sua religio pessoal, teologia ou "viso elevada" do Antigo
Testamento. Podemos dizer que o que era suficientemente bom para
Jesus suficientemente bom para ns.
Bernard Ramin sugere:
Eu creio q u e menos do q u e 1 % do co rpo de crentes
evanglicos renunciar ia sua f se isto fosse comprovado c o m o um
erro (a respeito da discrepncia entre I Cornt ios 10:8 e Nmeros
25:24) ou se qua lque r outro erro desle tipo fosse most rado na
Escr i tura Sagrada . A razo para m i m bas tante bvia. Os Crislos
no se apegam f crist por causa da inerrncia da Escr i tura , mas
por causa de sua experincia com Cris to e o Esp r i to San to e do
con tedo espir i tual da Escri tura Sagrada que to e fe t ivamente
tem fa lado aos seus coraes.'1"1
Certamente que a Bblia pode "errar" em alguns lugares, e
provavelmente falhar no teste rgido da inerrncia nos detalhes, mas
ainda podemos confiar nela. Como Beegle salienta, "A soberania de
Deus, a honra de Jesus Cristo, e a confiabilidade da doutrina
bblica no esto em risco ao aceitar-se uma doutrina da inspirao que
rejeita a qualificao da inerrncia."56 Ento, obviamente, o argumento
baseado na epistemologia , por si prprio, muito duvidoso.
Por outro lado, de acordo com a "teoria do domin, '0 7 tambm
chamada de "argumento do escorregador,"5" quem quer que negue a
inerrncia acabar negando outras doutrinas evanglicas. C. C. Ryrie
argumenta que se todas as doutrinas da Bblia podem ser comparadas
com domins enfileirados, ento a crena na total exatido da Bblia
encabea a fila, "se o primeiro domin permanecer de p ou cair
inevitavelmente afetar alguns, a maioria ou at mesmo todos os
outros. '0 9
A questo a ser formulada a seguinte: a rejeio da inerrncia
perfeita
5 4 P i n n o c k , 66. s s Bernard Ramin, " T h e Relal ionship
of Sc ience . Factual Sta tements and lhe Doctr ine of Biblical Ine
r rancy , " Journal of lhe American Scicnlifii: Affilialion 21-22
(1969-1970) : 103. 5 " Beeg l e . 290. ",7 Ver Ryrie, no cap tulo .
"The D o m i n o e s are Fall ing." Wliai Yan SliouUI Know ahoul
Inerrancy, 9-II.
K Dav i s . 83-93.
A Bblia e a Iner rncia 13
um declive que leva inevitavelmente heresia, sendo assim
incompatvel com uma viso elevada da Escritura? Naturalmente, se a
inspirao houvesse sido identificada com a inerrncia, o argumento
teria lido mais validade; contudo, igualar inerrncia nas mincias
com o conceito de inspirao uma inverso equivocada e longe da
verdade.
Podemos questionar o conceito de Francis Schaeffer de que a
rejeio da inerrncia bblica total o mais importante fator doutrinrio
controlador por detrs do moderno declnio espiritual e teolgico/'
Por ironia, Charles Hodge, embora um ardoroso defensor da doutrina
da inerrncia, pode argumentar vagamente que mesmo que houvesse o
que parecem ser erros tatuais na Escritura, eles so to
insignificantes como as manchas no Partenon.' Podemos tambm dizer
que mesmo uma doutrina gravemente inadequada da Escritura no
invalida .a habilidade de um indivduo para apreender a ortodoxia
bblica em muitos pontos, como no caso de Karl Bar th/'2 Estas
simples evidncias so suficientes para levantar algumas reservas a
respeito do teorema do ' domin."
Em concluso a isto, assumimos que negar a opo de uma viso
elevada das Escrituras queles que rejeitam a posio do inerrantismo
radical com um apelo ao argumento epistemolgico ou "domin," no pode
ser considerada uma objeo sria. Como diz Pinnock, "os evanglicos no
rejeitaram um papado para aceitar outro."w
A inerrncia no o teste real para uma viso plena da autoridade
bblica. De fato, nos enganaremos se basearmos a autoridade e a
verdade da Escritura na inerrncia dos registros bblicos e ento
tentarmos demonstr-la segundo o racionalismo. Em uma perspicaz
monografia intitulada "The Inerrancy Debate among the
Evangelicals," C. Pinnock adverte que homens como Francis Schaeffer
e Harold Lindsell tendem a confundir a viso elevada da Escritura
com a interpretao que eles fazem dela, de modo que a menos que a
pessoa concorde com a leitura que eles fazem do texto, ela poder
ser chamada de evanglica imperfeita, ou absolutamente no
evanglica/"1 Certamente, o abandono da inerrncia no fora algum a
abraar o liberalismo e/ou a apostasia.
" "Schae f f e r , Dealli in ilie City (Chicago: lnter-Varsity
Press, 1969). C. Hodge. Systemaiic Tlieoloj-y (New York: Charles
Scr ibner 's Sons, 1871), | .170; cf . Lovelace ,
Inerrancy and Cominou Senxe, 28. h 2 Como Klass Runia indica, a
viso de Barth da Escri tura est consideravelmente aba ixo da
inerrncia l imitada, u m a vez que admite que a capac idade de erro
da Bblia "tambm se e s t ende ao seu con tedo religioso e
teolgico;" Karl Bartli's Doctrine of Holy Scripiure (Grand Rapids ,
MI : Eerdmans , 1962), 60 . 63 P innock, "The Inerrancy Debate
among the Evangel ieal ," Tlieolany News and Notes (Pasadena , CA:
Fuller Theolosrical Seminnrv 19761 13
-
1 4 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
Viso Elevada da Inspirao e os Fenmenos da Bblia
Em seu clssico ensaio, The Phenornena of Scripture. F. Harrison
observa que "nenhuma viso da Escritura pode ser indefinidamente
sustentada se correr contra os fatos. Que a Bblia reivindica
inspirao evidente. O problema definir a natureza da inspirao luz
dos fenmenos."6""1 Evidentemente, podemos ter nossas idias prprias
sobre como Deus deveria ter inspirad'o a Palavra, mas mais
produtivo aprender como Ele de fato a inspi rou/ Is to significa
que precisamos aprender a ouvir a Palavra de Deus, no insti;i-la, e
aqui onde o conceito de inerrncia literal fracassa, porque em sua
tentativa de
proteger" a Escritura, a defesa baseada no racionalismo criou um
modelo irreal de inspirao que abafa o prprio fenmeno.
a suposio da inerrncia um componente essencial dos fenmenos da
Escritura? Considervel esforo tem sido feito pelos inerrantistas
para vindicar uma resposta positiva a esta questo. Para sustentar
que a Bblia completamente inerrante em seus mnimos detalhes e
preservada de "erro fatual, histrico, cientfico, ou outro,"66 eles
estabeleceram uma srie de qualificaes, uma quantidade de obstculos
que um suposto "erro" tem de transpor antes que seja qualificado
como um "erro."
S. T. Davis diz que " impossvel ver como algum suposto erro
poderia passar todos os testes."67 Ele deve pertencer aos autgrafos
inexistentes, algo que no pode ser realmente provado. Deve ser
indubitavelmente falso. Deve ser provado alm de"qualquer dvida,
etc. Todo este esforo gasto para provar que a Bblia "no contm erro
de qualquer tipo,"68- basicamente o resultado de um enganoso
conceito de inspirao. Ademais, agindo dentro de um processo de
deduo, os inerrantistas, como vimos antes, argumentam que porque
Deus perfeito e a Bblia a Palavra de Deus, a Bblia deve ser
perfeita; ou porque Deus no pode "mentir" e porque a Bblia
"inspirada por Deus" ela deve ser inerrante, no pode conter
qualquer erro - nenhum, em histria, geografia, botnica, astronomia,
sociologia, psiquiatria, economia, lgica, matemtica, ou qualquer
rea que seja.
Antes de considerarmos que a crena em uma Bblia perfeita e
inerrante no condio necessria para uma viso elevada da Escritura,
faamos uma
f , s E. -F. Harr ison, "The Phenornena of Scr ipture" in Carl
F. Henry (ed.) Revelation and the Bihle, (Grand Rapids , MI: Baker
Book House, 1958), 239. M ' H. Lindsel l , The Batlle for llw Bihle
(Grand Rapids, MI: Zondervan , 1976), 30-31.
T. S. Davis menciona c inco condies usadas pelos inerrantistas
que so uma fortaleza i n e x p u g n v e l e descar tam qualquer
possvel discrepncia bblica. Ele diz. "... Erros histricos e g e o g
r f i c o s podem ser excludos na condio 3; inconsistncias internas
em dois ou mais textos b b l icos podem ser excludas na condio 4; e
cer tamente , qua lquer pretenso erro imaginvel pode ser exc lu do
nas condies 2 ou 5; The Debate abam lhe Bihle (Philadelphia: T h e
Westmins ter Press , 1977), 28.
A Bblia e a Ine r rnc ia 1 5
reflexo sobre o conceito de "erro," o que certamente esclarecer
nosso caso. C. C. Ryrie, como um bom representante dos defensores
da inerrncia,
assume que "a Bblia inerrante ao expressar a verdade, e ela o
faz sem erro em todas as partes e com todas as suas palavras."69
Certamente, no h nada de errado com a proposio "sem erro" em si
mesma, contudo o ponto crucial : o que significa "erro," e que
padres podem ser usados para julgar o erro?
Parece que a chave para uma viso apropriada dos fenmenos da
Escritura, em relao ao debate moderno, repousa no significado da
palavra "erro." E um falso conceito de erro, que impe a necessidade
de um autgrafo perfeito, ou que requer harmonizao acrobtica das
discrepncias bblicas tal como afirmar que o galo cantou seis vez
para extrair sentido inerrante da histria da negao de Pedro,70 ou
que a Bblia preserva o valor matemtico do "pi" nas dimenses do mar
de fundio71 ( lRs 7:23), ou ainda para explicar a contradio entre 1
Corntios 10:8 (o relato de Paulo de que 23.000 caram em um nico
dia), e Nmeros 25:9 (o Antigo Testamento registra 24.000),
sugerindo que outras mil baixas ocorreram durante a noite,72 ou, de
acordo com a explicao de Ryrie, "Paulo limita sua cifra de 23.000
queles mortos em um dia. O relato em Nmeros 25 ... inclui mortes
adicionais que ocorreram nos dias seguintes."73
Os inerrantistas confundem "erro" no sentido de preciso tcnica
com a noo Bblica de erro como engano intencional, ento, para
garantir a confiabilidade da Escritura eles acabam exigindo da
Bblia estrita preciso cientfica.74 Os resultados so lamentveis,
porque este processo finalmente exige algo mais objetivo do que o
testemunho interior e pessoal do Esprito Santo atravs do prprio
texto, e acaba aferindo a verdade da Bblia por um padro
extrabblico.
Como foi salientado antes, seremos induzidos ao erro se
basearmos a autoridade da Escritura na total inerrncia dos escritos
e ento tentarmos demonstrar isto de acordo com os cnones da
racionalidade cientfica, e por outro lado o ensino da suficincia da
Bblia rompido quando reivindicamos sua inerrncia na base de
detalhes mnimos de cronologia, geografia, histria, ou cosmologia.
"A inerrncia nas mincias pode ser um item central para o guia
telefnico mas no para Salmos, Provrbios, literatura apocalptica e
parbola." 3
Como Johnston diz, "Aqui est a ironia: tentamos assegurar a
autoridade da Bblia ao reivindicar que ela inerrante; mas para
mostrar que ela inerrante ns aplicamos uma norma externa Bblia qual
a Bblia deve se conformar se ela
Ryrie, Wlial You S I K U I I I I Know cibout Inerrancy, 32. 7,1
Lindsell , 174-176. 71 Ibid., 165-167. 7" Mounce , 18. 7 3 Ryrie,
86. 14 Ver Lindsell . The Barile for the Bihle, 18, 19, 27, para
tais alegaes.
-
1 6 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
deve ser considerada como verdadeira."76 Ao buscar manter uma
viso elevada da inspirao, os proponentes da inerrncia tm se
debatido com o fato de que revelao de Deus foi declarada nos termos
da linguagem, lgica, e localizao das pessoas s quais ela foi
escrita originalmente, ou como Harrison77 diz, embora a alma da
Escritura seja universal e eterna, seu corpo permanece oriental, e
certamente qualquer considerao verdadeira dos fenmenos no deveria
esquecer isto.
Parece que G. R. Osborne tem razo quando diz que "tanto liberais
como evanglicos so culpados de uma aceitao fcil demais de certos
fatos como erros."7 8 um falso conceito de erro que tem levado os
defensores da inerrncia a denominar de "viso elevada" das
Escrituras Sagradas, uma precipitada harmonizao mecnica de situaes
bblicas, que no reivindicam nenhuma harmonizao. Esta atitude , de
fato, uma desconsiderao do propsito real de nossas Escrituras, e um
desafio noo de que os escritores bblicos eram homens do seu tempo
com conhecimento limitado ou mesmo deficiente de tpicos seculares,
e em nenhum momento Deus os removeu de seu ambiente, ou "os
transformou em algum que eles no fossem - cidados de tempo e lugar
antigos."7 9 Ento, se certos eventos bblicos exigem harmonizao, ela
no deve ser buscada mecanicamente, de modo que obscurea os prprios
fenmenos, e seu conceito de inspirao.
Como L. Morris escreveu: "no devemos impor uma inerrncia ou
nossa prpria construo sobre a Bblia, mas antes aceitar o tipo de
inerrncia que ela oferece. E esta uma inerrncia compatvel com os
variados relatos das palavras usadas em dada ocasio."811 O processo
humano pelo qual Deus escolheu tornar Sua Palavra conhecida em
lnguas terrenas to crucial para nosso conhecimento daquilo que Ele
est dizendo na Escritura, quanto o nosso reconhecimento da plena
inspirao da Escritura. O Deus que escolheu falar-nos atravs de
escritores que viveram em contexto histrico, social, cultural e
lingstico especf icos determinou, por esse mtodo de falar, como Sua
palavra deve ser compreendida.
H erros na Bblia? Mentira e falsidade o que a Escritura associa
com erro, e a Escritura certamente no identificada com engano neste
sentido. Assim, em relao a Deus e Sua verdade a Bblia nunca conduz
a erro e neste sentido ela inerrante. Contudo, a honestidade exige
que reconheamos que h discrepncias e dificuldades no texlo bblico.
Neg-las seria ir contra os fatos e
7
-
18 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
teolgicos por detrs das variaes, outros so dificuldades reais.
luz destas dificuldades, emerge a questo: possvel considerar a
Bblia como um livro imperfeito e limitado em muitos aspectos e
ainda sustentar uma elevada viso de sua autoridade?
Eilen White, em sua abordagem pessoal s Escrituras Sagradas,
sugere uma resposta segura. Ela disse: "Tomo a Bblia tal como ela ,
como Palavra Inspirada. Creio nas declaraes de uma Bblia
inteira."86 Para ter uma viso forte e plena da autoridade da
Escritura, no necessitamos de engenhosos instrumentos para
sustent-la. A viso singular que honra os fenmenos da Escritura a
que aceita a Bblia como ela realmente : a Palavra de Deus em
palavras humanas. Como pode ser isto? No h necessidade de
solucionarmos este mistrio; nossa grande necessidade reconhec-lo e
aceit-lo.
A melhor maneira de reverenciar a Palavra Viva sustentar um
conceito saudvel de sua revelao e inspirao, ento as dificuldades e
variaes dos fenmenos no nos perturbaro porque concordamos que a
inspirao age no homem em uma situao concreta. Deus inspirou
pessoas, usando suas mentes, coraes, formao, vocabulrio,
experincias, personalidades, treino educacional, cosmoviso,
contextos culturais, e sensibilidades espirituais. Deve ser notado
que este conceito de inspirao que permite considervel liberdade ao
agente humano, no significa permisso descontrolada. Ebionismo e
Docetismo ainda so extremos a serem evitados.
A Bblia a Palavra de Deus, acomodada, revestida e transmitida em
linguagem humana. Ento, como Pinnock87 observa, a Bblia pode conter
"erros" mas no ensina nenhum. Isto significa que a Bblia infalvel
em seus temas ao invs de nos seus termos, nos seus ensinos ao invs
de nos componentes utilizados em sua formulao. Contudo, deve ser
notado que errncia no a opo para inerrncia. A opo para inerrncia
total infalibilidade da Bblia em assuntos pertencentes a sua
inteno. Como B. Mickelsen salienta,
Jesus na c idade, aps o que Eic saiu para passar a noi te em
Betnia (21:10-12, 17). Marcos , con tudo , d iz-nos que a pur i f
icao ocorreu no dia segu in te noite passada em Betnia (11 :11-12 ,
15). De acordo com Marcos Jesus amaldioou a f igueira quando estava
a caminho para a c idade, aps a noi te passada em Betnia e antes da
pur i f icao (11:12-14, 10); de acordo com Mateus a maldio, o
secamento , e as l ies da decorrentes ocor reram jun tos na manh
aps a pur i f i cao (21:18ss) . Mui to mais mareawte a divergncia
entre Joo e os Evangelhos Sint icos sobre a da ta da pur i f i cao
do templo. Aqui toda a extenso do minis tr io de Jesus separa as
duas datas . No Evange lho de Lucas o c h a m a d o dos discpulos
(5:7-1 1); a cura do leproso (4:12-13); o Sermo do M o n t e
(6:17-38); o episdio com os discpulos de Joo Batista (7:20); a
festa na casa de S i m o (7 :36ss) : e a lguns milagres esto comple
t amen te fora de ordem em relao aos out ros Evangelhos . Para u m
a slida sugesto a respeito dos mot ivos teolgicos por detrs das d
iscrepncias da c ronologia lucana. ver Robert B. S loan. Jr.. The
Feiyorablc Yeitr of lhe Lure! (Aust in: Schola Press. 1997).
x" Eilen G. White . Mensagens Escolhidas (Santo Andr, SP: Casa
Publieadora Brasileira, 1985), 1:17.
Pinnock "The hwmincv VI-I.-III rimmn l-x/mnir-lii-il "
77ii//."> Wu.i"' /III/ M . I I (1TA\ l i
A Bblia e a Iner rnc ia 19
Ao invs de discut i rmos o que a Bblia no faz (i.e. "ter a lgum
erro") , nec i s i t amos nos concent rar na nota positiva. A Bblia
ensina a verdade. Ela ens ina a verdade nos modos e manei ras de
expressar a verdade nos tempos antigos. Porque Deus energ izou seus
servos, a ve rdade ensinada de muitas formas diferentes magn i f i
camen te e f i caz . Agradeamos a Deus pelas Escrituras assim como
elas so. Sua forma e estilo an t igo es to ent re as grandes provas
de sua autenticidade.*15
Voltando a nossa questo bsica, nosso compromisso com uma viso
elevada da Escritura exige inerrncia? Vamos responder a questo.
Deve ser salientado tambm que a teoria da inerrncia tem pouca
sensibilidade para com os fenmenos da Escritura, ou seja, a
variedade, de palavras e declaraes, encontrada no prprio texto.
Ademais, a doutrina da inerrncia no contribui para uma viso elevada
da inspirao ou para uma posio slida quanto a autoridade da
Escritura, e pensar que tudo est seguro apenas em "provar" que a
Bblia perfeitamente inerrante um sonho ingnuo. Finalmente, deve ser
afirmado tambm que uma viso elevada da Escritura no est de qualquer
modo comprometida com a inerrncia bblica nos detalhes. Antes, seu
compromisso com a Inspirao da Palavra Viva de Deus. Como Johnston
diz, "de fato, pode-se defender uma viso elevada da Escritura sem
recorrer ao termo inerrncia."
Sumrio
Evidentemente que o debate sobre a inerrncia da Bblia no permite
uma soluo fcil uma vez que no um assunto em preto e branco.
Contudo, observando a questo de uma perspectiva diferente, o ponto
crucial no se a Escritura totalmente inerrante ou no, mas a
natureza e a finalidade dos registros bblicos. Em outras palavras
nossa necessidade bsica compreender a
a * 90
autoridade e confiabilidade das Escrituras em termos de inteno e
proposito. O apstolo Paulo, no contexto da bem conhecida frase
"toda a Escritura
inspirada" (theopneustos), to significante para a doutrina da
inspirao, apresenta o propsito essencial para o qual a Escritura
foi dada: ela capaz de tornar "sbio para a salvao pela f em Cristo
Jesus," e "til para o ensino, para a correo, para a educao na
justia, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente
habilitado para toda boa obra" (ITm 3:15-17 ARA).
A Escritura do Antigo e Novo Testamentos no um livro sem
propsito. Seu propsito primrio, do incio ao fim, libertar o homem
do pecado e finalmente lev-lo a comunho com Deus. Seu contedo a
maior mina de verdade essencial, mesmo que no seja verdade
absoluta. Ento, a Bblia foi dada por Deus com finalidade
soteriolgica, e a mais elevada prova deste ptopsito
,SI Berkeley Mickelsen. " T h e Bible ' s Own Approach to
Authori ly ," in Biblical Auiliority (Waco, Texas : 1967), 87.
Johnston, Op. cil.. 22. , Wl , n ^ , ' i v . . , . 7 V . / / / I
V Tl (1975). 295.
-
20 Revista Teolgica do S A L T - I A E N E
encontrada no fato de que Deus em pessoa fala nela. Onde a Bblia
funciona como a espada do Esprito na vida de homens ali est o
manejo da indisputvel autoridade divina em todas as reas
pertencentes a sua finalidade bsica.
Ao declarar o propsito da Bblia, Eilen White disse: "em Sua
Palavra Deus conferiu aos homens o conhecimento necessrio
salvao."91 De fato, algum que estuda a Bblia com o mais ardoroso
desejo de obter salvao ser infalivelmente guiado a Jesus Cristo, e
saber por si mesmo que a Palavra de Deus verdadeira e
suficiente.
Conseqentemente, uma viso correta da Bblia deve pr a nfase onde
a prpria Bblia a pe - em sua mensagem de salvao e sua instruo para
a vida, no em seus detalhes de geografia ou cincia, porque como
temos visto e L. Morris observa, o propsito da Bblia no dar
informao sobre assuntos cientficos. Tais verdades so suscetveis de
descoberta por nossos prprios esforos e Deus as deixou para serem
descobertas deste modo. Elas no so o objeto prprio da revelao.92
Assim, lutar por detalhes minuciosos em nome de uma "viso correta"
da Bblia tem somente o efeito negativo de desviar a ateno da
mensagem de salvao e da educao na justia que so os temas-chave da
Bblia, e frequentemente dar a impresso de que no se pode crer e
confiar em nenhuma parte da Escritura, a menos que se prove que
todas as suas partes sejam in errantes.
O propsito bsico de Deus no frustrado por existirem contradies e
tenses no texto bblico em matrias tatuais, e aceitar estas
dificuldades como parte dos fenmenos da Escritura no diminui uma
alta considerao por ela. Contudo, em conteno contra a doutrina da
inerrncia, ns no temos sido dominados pelo sdico desejo de
encontrar discrepncias nos registros bblicos, nem almejamos provar
sua errncia.
Ademais, no podemos endossar qualquer teoria de distino entre
matria revelacional e no revelacional nas Escrituras,93 e dizer que
a revelao foi limitada apenas queles ensinos que so essenciais para
nossa salvao. O Esprito de Deus engolfou a totalidade da Escritura
de tal maneira que discusso sobre graus ou nveis de inspirao est
completamente equivocada. A genealogia de Gnesis 5 no menos
inspirada do que o Evangelho de Joo, mas provavelmente eles foram
inspirados de modos diferentes, e talvez as diferentes formas pelas
quais operou a inspirao seja a chave adequada para entendermos
algumas dificuldades dos registros bblicos.
Eilen G. Whi te . O Grande Cuiflilu. 8. 1,2 Leon Morris . /
Believe in Revelalioii (Grand Rapids, Ml : Eerdmans . 1976),
133.
Os defensores da inerrncia l imitada d iscr iminam entre a f i
rmaes revolucionais e no revelaeionais na Escri tura na base de uma
metodologia indutiva. Ento eles concluem que a Bblia
A Bblia e a Inerrncia 2 1
Concluses
Ao final deste artigo, alguns pontos parecem emergir de nossas
consideraes e exigem uma reflexo final.
Em primeiro lugar, o conceito da inerrncia nos detalhes estranho
a Bblia. E uma imposio humana; como diz Pinnock, "a lgica do caso
pela inerrncia tem sido confundida com uma piedade equivocada, e a
inerrncia da Bblia tem sido defendida no tanto por convico de que
ela seja inerrante mas por uma crena de que ela deve ser."94
Ademais, a doutrina da inerrncia mostra desconsiderao para com os
fenmenos da Escritura, exigindo o que Deus no intencionou: um
superlivro, um registro perfeito e inerrante em cada detalhe
particular. Evidentemente isto s pode ter efeitos perniciosos.
Temos que dizer, tambm, que historicamente, inerrncia no
qualificada da Bblia no c o tipo de perfeio da Escritura que a
Ortodoxia Crist ensinou no transcurso da Histria do Cristianismo,
at o sculo dezessete quando o Escolasticismo declarou que "nenhum
erro, mesmo em assuntos insignificantes, nenhuma falha de memria,
para no dizer inverdade, pode ter lugar em toda a Escri tura
Sagrada."9:i
Em segundo lugar, como defendido por alguns de seus proponentes,
o conceito de inerrncia d a impresso de que no h meio termo entre
inerrncia por um lado, c atitudes neo-ortodoxas, liberais ou mesmo
atestas para com a Bblia por outro lado. Contudo, at onde podemos
ver, a inerrncia no uma doutrina crucial para o cristianismo
Evanglico, e o perigo de renunciar as pressuposies da inerrncia
largamente imaginrio. De fato, o abandono da inerrncia no pe em
risco a teologia e no fora ningum a abraar a apostasia ou o
liberalismo. Ento, os argumentos espistemolgico e domin so uma
crena exagerada.
Em terceiro lugar, a Bblia a Palavra de Deus autoritativa e
confivel, atravs da qual Ele fala e opera. A Inspirao assegura que
a Bblia representa o ponto de vista de Deus e no do homem (2Tm
3:14-17; 2Pe 1:19-21); ento, "a Bblia representa o que Deus tinha
em mente."96 No existe desvio do que Deus procurou comunicar para a
salvao dos homens. Contudo, a inspirao no garante um registro
inerrante em tudo o que a Escritura toca, e qualquer esforo para
remover os traos da dimenso humana nas Escrituras resultar somente
em "rebaixamento" da viso de inspirao.
Pinnock. "Three Views of the Bible in Contemporary Theo logy , "
Biblical Authority, 64 . Heinrich Schmid . The Doctrina! Theology
of Evanglica! Lullieran Church (Phi ladelphia :
Lutheran Publicalion Society, 1876). 49 ; Otto W. Heiek,
"Biblical Inerrancy and Hebrew M o d e of
-
22 Revista Teolgica do SALT- IAENE
Certamente, as verdades essenciais da Bblia no so alteradas pelo
reconhecimento de que algumas de suas declaraes so imprecisas,
assim como uma viso elevada de sua autoridade no obliterada por
este reconhecimento. O poder auto-autenticador da Palavra de Deus
no depende da inerrncia. R. H. Mounce observa:
quan to mais es tudamos a Bblia mais al ta se torna nossa viso
de sua inspirao ... e m b o r a o homem tenha escrito as palavras,
a mensagem de Deus. H uma qua l idade auto-autent icadora a
respeito da Palavra de Deus. Ns saberamos que ela inspirada m e s m
o que ela no ensinasse sua prpria inspirao. '"
Certamente que dificuldades tcnicas e "erros" no destruiro a
confiana das pessoas na Bblia se elas encontraram a Cristo em suas
pginas e ouviram sua voz a lhes falar.
Em quarto lugar, parece que a nica viso que honra a Palavra de
Deus aquela que mostra elevada considerao pelos fenmenos da
Escritura, e os aceita como Deus no-los deu. Essa viso, com igual
fora, mantm a humanidade e a divindade da Palavra da Escritura.
Ademais, a viso mais adequada da Escritura no pode ser mais elevada
do que aquela sustentada pelo prprio .Tesus que, at onde sabemos,
no apelou para autgrafos perfeitos para tornar o Antigo Testamento
autorizado. Como perguntamos antes, est algum justificado em
reivindicar mais do que a Escritura reivindica? Ou pode haver na
verdade uma viso mais elevada da Escritura do que a viso
bblica?
Finalmente, fazer da inerrncia o sinal da autenticidade
evanglica98 uma infeliz discriminao baseada na intolerncia. O
resultado, como vimos, inevitvel desgosto e desiluso, que ameaa a
unidade evanglica, forando uma desnecessria brecha entre os cristos
em um tempo em que o testemunho unido para um mundo incrdulo
dolorosamente necessrio. De fato, a controvrsia atual sobre a
doutrina da inerrncia, para defender uma "viso elevada da
autoridade Bblica" uma batalha que no necessita ser ferida porque,
como B. Mickelsen observa, "a mais elevada viso de autoridade na
Bblia a obedincia circundada por amor."99
1)7 R. H. M o u n c e , "Clues to Understanding Biblical
Accuracy," Elerniiy ( June 1966), 17. y x Harold Lindsell diz: "Eu
no concedo sequer por um momento, contudo , que em um sentido
tcnico algum possa reivindicar a insgnia de evanglico uma vez q u e
tenha a b a n d o n a d o a iner rnc ia" (The Batlle for llie
Bihle. 210). '''' B. Mickelsen , " T h e Bible ' s Own Approach lo
Author i ty" in Biblical Aiilhority, 93.