PEDRO MANOEL SANSANA CONTRATAÇÃO DIRETA DAS ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR Trabalho de Conclusão de Especialização apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Licitações e Contratos Administrativos, 2ª Turma, das Faculdades Integradas do Brasil – Unibrasil. Orientador: Prof. Tarso Cabral Violin CURITIBA 2011
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PEDRO MANOEL SANSANA
CONTRATAÇÃO DIRETA DAS ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR
Trabalho de Conclusão de Especialização apresentado como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Licitações e Contratos Administrativos, 2ª Turma, das Faculdades Integradas do Brasil – Unibrasil.
Orientador: Prof. Tarso Cabral Violin
CURITIBA 2011
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à minha esposa, Sara, pelo amor, carinho, dedicação, incentivo
e compreensão, não só durante nossa convivência até o momento, como
especificamente durante a realização do curso.
Este trabalho é dedicado, também, ao meu filho Pedro Gabriel Sansana, bem mais
precioso de minha vida e com o qual aprendo a cada dia e, assim, passo a ser uma
pessoa melhor.
Ainda no âmbito familiar, dedico o presente trabalho de conclusão de
especialização a meus pais, Sélio e Idete, pela estrutura familiar disponibilizada e
educação que me proporcionaram; dedico, de igual forma, a meus irmãos, Paulo e
Vinícius, por serem, antes de tudo, meus melhores amigos.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço a DEUS, inicialmente, origem de tudo e guia de nossas vidas.
Agradeço ao corpo docente do curso, em especial aos professores Tarso Cabral
Violin e Julieta Mendes Lopes Vareschini, por terem contribuído intelectualmente com
a realização deste trabalho, e à professora Nádia Maria Guariza, sem a qual não seria
possível adaptar a formatação do texto às normas técnicas exigidas.
Não posso deixar de agradecer, também, aos meus colegas de curso, que direta ou
indiretamente contribuíram para meu aprendizado durante as discussões e debates
práticos efetuados no decorrer das aulas.
Agradeço, por fim, ao Ministério Público do Estado do Paraná, em especial à
Promotora de Justiça Cibele Cristina Freitas de Resende, aos Promotores de Justiça da
Comarca de Ponta Grossa e aos que atuam no Centro de Apoio Operacional das
Promotorias das Fundações e Terceiro Setor.
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RESUMO
O presente Trabalho de Conclusão de Especialização tem por objetivos discorrer, com base na legislação federal e estadual de licitações, bem como na doutrina e na jurisprudência, sobre as hipóteses legais que permitem a contratação direta pela Administração Pública, via dispensa de licitação, das pessoas jurídicas sem fins lucrativos integrantes do Terceiro Setor (que serão também caracterizadas) para execução de determinados serviços.
Palavras-chave: Direito Administrativo. Licitação. Contratação direta. Dispensa de licitação. Entidades sem fins lucrativos. Terceiro Setor.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................... 6 1 TERCEIRO SETOR ............................................................................... 9 1.1 CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS ................................................................ 9 1.2 NATUREZA JURÍDICA DOS ENTES DO TERCEIRO SETOR............ 13 1.2.1 Associações de direito privado .................................................................. 13 1.2.2 Fundações de direito privado ..................................................................... 15 1.3 DENOMINAÇÕES E QUALIFICAÇÕES DAS ENTIDADES ............... 19 1.3.1 Organizações não-governamentais ............................................................ 20 1.3.2 Entidades sem fins lucrativos .................................................................... 21 1.3.3 Entidades filantrópicas ............................................................................... 22 1.3.4 Entidades de interesse ou de assistência social .......................................... 23 1.3.5 Entidades beneficentes de assistência social ............................................. 25 1.3.6 Entidades de educação ............................................................................... 26 1.3.7 Organizações da sociedade civil de interesse público ............................... 27 1.3.8 Institutos .................................................................................................... 29 1.3.9 Organizações sociais .................................................................................. 29 2 LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO DIRETA........................................ 30 2.1 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE LICITAÇÕES............................. 30 2.2 CONTRATAÇÃO DIRETA ..................................................................... 33 2.2.1 Inexigibilidade de licitação ........................................................................ 35 2.2.2 Dispensa de licitação ................................................................................. 37 3 CONTRATAÇÃO DIRETA DAS ENTIDADES DO TERCEIRO
A Administração Pública, assim como qualquer outra pessoa jurídica de direito
privado, necessita celebrar contratos das mais diversas espécies, tais como de obra ou
serviço de engenharia, compras, prestação de serviços, tudo para possibilitar seu
funcionamento interno e, principalmente, o atendimento às necessidades do cidadão.
Para pôr em prática sua atuação interior, o Poder Público necessita, por exemplo,
adquirir veículos, computadores, móveis e utensílios, máquinas e equipamentos,
material de expediente, produtos de higiene e limpeza. Tudo isso para, através de seus
servidores públicos, colocar a máquina estatal em funcionamento.
A outra ponta da atuação da Administração Pública consiste no atendimento das
necessidades constitucionais e legais do cidadão (interesses públicos), tendo o
Município um papel de suma importância, na medida em que, nos comentários de
Jund, “é nele que vive o cidadão”.1
Assim, por exemplo, o art. 23 da Constituição Federal determina ser competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios “cuidar da saúde
e assistência pública” e “proporcionar os meios de acesso à cultura, è educação e à
ciência” ou, ainda, “promover programas de construção de moradias e a melhoria das
condições habitacionais e de saneamento básico”, bem como “proteger o meio
ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas”.
Além de contar com seu quadro de servidores, as pessoas jurídicas de direito
público, muitas vezes, precisam que determinadas tarefas sejam executadas por
terceiros, pessoas físicas ou jurídicas, essas com ou sem fins lucrativos. É, segundo
Gasparini, a chamada “execução descentralizada dos serviços públicos”: A prestação dos serviços públicos é descentralizada na medida em que a atividade administrativa (titularidade e execução) ou a sua mera execução é atribuída a outra entidade, distinta da Administração Pública, para que a realize. Descola-se a atividade, ou tão só o seu exercício, da Administração Pública central para outra pessoa jurídica, esta privada, pública ou governamental.2
1 JUND, Sérgio. Administração, orçamento e contabilidade pública: teoria e questões. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006, p. 289. 2 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 15 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 366.
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Para tanto, realizam o procedimento administrativo denominado “licitação” ou, nas
situações previstas em lei, contratam diretamente via dispensa ou inexigibilidade de
licitação.
Em todos os casos, firmam o chamado “contrato administrativo”, definido pelo art.
2º, parágrafo único da Lei Federal nº 8.666/93 como “todo e qualquer ajuste entre
órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo
de vontades para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja
qual for a denominação utilizada.
Dentro das situações legais de contratação direta via dispensa de licitação, estão
previstas hipóteses que envolvem os contratos administrativos passíveis de ser
firmados com entidades integrantes do Terceiro Setor, cujos requisitos e características
serão expostas no presente trabalho.
Assim, no primeiro capítulo, será tratado do tema Terceiro Setor propriamente dito,
onde serão apresentados conceitos doutrinários desse grupo, histórico sobre seu
surgimento, áreas onde as entidades que o integram atuam (não só em complemento,
mas, às vezes até mesmo em substituição ao Estado), quais pessoas jurídicas que dele
fazem parte e suas principais características, denominações e qualificações jurídicas
dadas a essas entidades que em nada alteram suas essências e naturezas.
O segundo capítulo conterá exposições sobre os institutos jurídicos da licitação e da
contratação direta, suas previsões constitucionais e infralegais, os princípios a que
estão subordinados os gestores públicos nos procedimentos licitatórios, comentários e
diferenças entre as espécies de contratações diretas e definições de contratos
administrativos.
O capítulo número três entrará definitivamente no ponto central deste trabalho, ou
seja, nele serão comentadas as hipóteses legais de contratação direta das entidades do
Terceiro Setor, especialmente as situações previstas na legislação federal e estadual,
especificação da motivação do legislador para tanto, evolução legislativa,
entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca dos principais requisitos legais e,
ainda, das formalidades do procedimento administrativo de contratação direta.
O tema escolhido será tratado com base nas principais fontes de direito, ou seja, lei,
doutrina e jurisprudência, especialmente, essa última, originada do Tribunal de Contas
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da União, referência em julgamentos sobre a matéria, bem como exemplificado por
casos concretos resultantes do trabalho de auditoria desempenhado pelo autor junto ao
Ministério Público do Estado do Paraná, com o devido sigilo.
1 TERCEIRO SETOR
1.1 CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS
Normalmente, participam de relações jurídicas, sociais e comerciais das mais
diversas espécies o Estado e a iniciativa privada, representantes, respectivamente, do
primeiro e do segundo setores.
A Constituição Federal de 1988 arrola como direitos sociais, em seu art. 6º, a
educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a
previdência social, a proteção à maternidade e à infância e a assistência aos
desamparados. São apenas algumas das inúmeras competências outorgadas pelo
legislador constitucional à Administração Pública, no âmbito da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios.
Em razão desse elevado número de tarefas lhe conferidas pela Constituição Federal
e pela legislação infraconstitucional, o Estado, em sua acepção ampla, passou a se
tornar ineficiente e com pouca estrutura na missão de prestá-las ou colocá-las à
disposição da população. Por essa razão, passou a ter suas atividades suplementadas e,
até mesmo, em alguns casos, substituídas pelas entidades da iniciativa privada.
Assim, passou a existir um crescimento relevante da participação do particular em
setores e áreas nos quais, até então, se verificava somente a figura soberana estatal.
Exemplos disso não faltam: educação, saúde, previdência e segurança, todas hoje, em
larga escala, prestados (com qualidade) pelo particular, com ou sem fins lucrativos.
É de se observar que o próprio Poder Público reconhece sua ineficiência na
prestação dos serviços públicos mais essenciais (educação e saúde, por exemplo), na
medida em que possibilita à pessoa física deduzir do Imposto de Renda, que deveria
ser investido nas mesmas áreas, os valores pagos pela utilização dos serviços
disponibilizados pelos particulares.1
As pessoas jurídicas de direito privado de fins lucrativos, ante a previsão
constitucional da possibilidade de atuarem em algumas dessas áreas e da livre
1 Particularmente, entendo que outras despesas, tais como de seguros e aluguéis, também deveriam ser computadas como deduções. Sobre essa última, existem projetos de lei em andamento.
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iniciativa, viram nessa precariedade da prestação dos serviços públicos pelo Estado
mais um potencial mercado carente de exploração.
Contudo, nem todos os potenciais usuários possuem acesso aos serviços prestados
pela iniciativa privada, ficando os mesmos restritos apenas à parte da população:
àqueles que possuem condições de pagar por eles.2
Inicialmente por sentimentos pessoais e pelo “dever” de caridade, particulares
disponibilizaram aos demais integrantes da coletividade, indivíduos que integram as
camadas menos favorecidas de nossa sociedade, os mesmos serviços prestados tanto
pelo Estado como pela iniciativa privada de fins econômicos.
Para tanto, ante a grandeza e estrutura necessária, passaram a fazê-lo por
intermédio de pessoas jurídicas, na maioria das vezes constituídas sob a modalidade de
associação ou fundação.
São as chamadas pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou, na
denominação mais recente, entidades integrantes do Terceiro Setor, que possuem, ao
mesmo tempo, características tanto do primeiro (prestação de serviços públicos, por
exemplo) como do segundo setores (atendimento a obrigações tributárias acessórias e
obediência à Consolidação das Leis do Trabalho quanto aos vínculos empregatícios).
Para fomentar a atuação dessas entidades, o próprio Poder Público passou a
conceder benefícios e privilégios que não se estendem ao empresário que busca o
lucro, como o caso das isenções e imunidades de tributos e contribuições sociais e as
possibilidades de serem diretamente contratadas para prestarem determinados serviços,
desde que atendidas as exigências legais.
Jacoby Fernandes, ao comentar o art. 24, XIII, da Lei Federal nº 8.666/93, que será
também objeto do presente trabalho, explica que essa hipótese legal constitui relevante
fonte de recursos para as instituições contratadas, ao dizer que “a oportunidade
oferecida pela Lei de Licitações deve ser aproveitada como uma solução concreta e
eficaz à sobrevivência das instituições que desenvolvem trabalhos de relevante
importância ao progresso do País [...]”.3
2 É bom lembrar que as pessoas menos favorecidas passaram a ter acesso ao ensino particular através dos programas de financiamento do Governo. 3 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Contratação direta sem licitação. 8 ed. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 431.
11
Violin, a respeito da expressão Terceiro Setor, tece os seguintes comentários: O “terceiro setor” é uma expressão polêmica, muito abrangente, que surgiu com o fortalecimento do ideário gerencial-neoliberal, que engloba as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos de benefício público e as de benefício mútuo, as pessoas físicas voluntárias e as que trabalham profissionalmente nestas entidades, e o movimentos sociais. Ou seja, tudo o que não faz parte nem do mercado nem do Estado em sentido estrito. Assim, voluntários, associações que atuam endogenamente ou de forma exógena, fundações privadas, institutos, movimentos sociais ou qualquer agrupamento sem personalidade jurídica, sindicatos, cooperativas, fazem parte do “terceiro setor”.4
Justen Filho assim discorre sobre o Terceiro Setor, ao tempo em que batiza seus
atores de “entidades não estatais”:
Tem sido utilizada a expressão “terceiro setor” para indicar esse segmento, de modo a diferenciá-lo do Estado propriamente dito (primeiro setor) e da iniciativa privada voltada à exploração econômica lucrativa (segundo setor). O Terceiro Setor é integrado por sujeitos e organizações privadas que se comprometem com a realização de interesses coletivos e a proteção de valores supra-individuais.5
As entidades integrantes do Terceiro Setor atuam em diversas áreas, tanto na
complementação ou suplementação estatal como na defesa e construção de direitos em
grupos específicos, tais como assistência social, moral e à saúde, incentivo à cultura,
defesa dos direitos humanos e da cidadania, proteção do meio ambiente, educação,
direitos da mulher, direitos indígenas, direitos do idoso, direitos do consumidor,
direitos da criança e do adolescente, ensinamento de doutrinas religiosas, auxílio ao
produtor e trabalhador rural, amparo ao menor abandonado, atividades esportivas,
previdência privada, dentre outras.
Quanto ao histórico do nascimento do Terceiro Setor e das entidades que o
integram, Violin explica que:
É impreciso o momento do aparecimento da sociedade civil. Também é questionável quando surgiram as organizações representativas da sociedade civil. Apenas nos séculos XV a XIX foram formadas as instituições de beneficência, caridade e filantropia, quando no Brasil surgiram as Santas Casas de Misericórdia e a Cruz Vermelha. [...] O termo “terceiro setor” surgiu na década de 70 do século XX nos Estados Unidos da América [...]. [...] mas apenas no final da década de 70 e início da de 80, surgiu o termo “terceiro setor” e consequentemente as entidades que o compõem, que tomou força com o discurso de que o Estado social não tinha mais condições de executar diretamente determinados serviços à
4 VIOLIN, Tarso Cabral. Terceiro setor e as parcerias com a Administração Pública. 2. Ed. rev. Ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 278. 5 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 130.
12
população. No Brasil, a utilização do “terceiro setor” como prestador de serviços antes executados diretamente pelo Estado ocorreu apenas na década de 90 [...].6
Paes, membro do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, explica que a
religião exerceu grande influência no nascedouro do Terceiro Setor:
Através dos séculos, o dever do católico caridoso e cumpridor de suas obrigações sempre foi o de ajudar a Igreja e suas obras assistenciais; ela centralizava as funções de socorro social, cuidando dos pobres e dos incapacitados.[...] com a ascensão da burguesia e o surgimento do capitalismo na Europa, surgiu também o Protestantismo, rebelando-se contra o monopólio religioso da Igreja e estabelecendo um canal direto de comunicação entre Deus e o indivíduo [...].7
Segundo o mesmo autor, a origem do Terceiro Setor no Brasil possui íntima relação
com o período da Ditadura Militar (1964-1985), época de afirmação da sociedade civil
e de valorização da democracia, cuja mobilização decorreu visando combater o
autoritarismo e o arbítrio então existentes. Para o doutrinador, naquele cenário:
[...] surgiram várias organizações e movimentos sociais em conseqüência de um novo ímpeto – introduzido inicialmente por setores cristãos progressistas e depois abraçado por outros setores comprometidos com a democracia e a “mudança social” – de organização da sociedade pela base” e, no campo da cidadania, “a partir da década de 70, houve uma expansão significativa de associações civis, movimentos sociais, sindicatos, grupos ambientalistas e de defesa de minorias – foi quando surgiu pela primeira vez, no cenário brasileiro, grande número de ONGs.8
Mânica, Procurador do Estado do Paraná, em sua dissertação para obtenção do grau
de Mestre em Direito do Estado perante a Universidade Federal do Paraná apresenta
dois motivos pelos quais as entidades do Terceiro Setor teriam crescido: a) a reforma
do aparelho de Estado brasileiro, e o conseqüente incentivo para atuação da sociedade
civil na consecução dos chamados serviços públicos sociais; b) a conscientização da
sociedade civil de sua responsabilidade social em relação ao alcance dos objetivos
traçados pela Constituição Federal.9
Na visão do doutrinador, o Terceiro Setor é o “conjunto de pessoas jurídicas de
direito privado, de caráter voluntário e sem fins lucrativos, que (i) desenvolvam
6 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 126/133. 7 PAES, José Eduardo Sabo. Fundações e entidades de interesse social. 4 ed. rev. atual. amp. Brasília: Brasília Jurídica, 2003, p. 91. 8 Ibidem, p. 94. 9 MÂNICA, Fernando Borges. Terceiro setor e imunidade tributária: teoria e prática. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 18.
13
atividades de defesa e promoção dos direitos fundamentais ou (ii) prestem serviços de
interesse público”.10
Destarte, de acordo com Paes, o Terceiro Setor:
É aquele que não é público e nem privado, no sentido convencional desses termos; porém, guarda uma relação simbiótica com ambos, na medida em que ele deriva sua própria identidade da conjugação entre a metodologia deste com as finalidades daquele. [...] é composto por organizações de natureza ‘privada’ (sem o objetivo de lucro) dedicadas à consecução de objetivos sociais ou públicos, embora não seja integrante do governo (Administração Estatal).11
1.2 NATUREZA JURÍDICA DOS ENTES DO TERCEIRO SETOR
O Código Civil Brasileiro, no Livro I, Capítulo II, trata das pessoas jurídicas e, nos
artigos 40, 41, 42 e 44, dispõe que elas podem ser de direito público, interno (União,
Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, autarquias, associações públicas e
demais entidades de caráter público criadas por lei) ou externo (Estados estrangeiros e
todas as pessoas regidas pelo direito internacional público), e de direito privado
(associações, sociedades, fundações, organizações religiosas e os partidos políticos).
Dentre as pessoas jurídicas de direito privado arroladas pela legislação nacional,
por se tratarem das mais conhecidas entidades ocupantes do Terceiro Setor,
interessarão de forma mais prioritária ao presente trabalho as associações e as
fundações, até porque é com essas entidades que são assinados a maioria dos contratos
decorrentes das hipóteses de dispensabilidade de licitação.
1.2.1 Associações de direito privado
10 MÂNICA, Fernando Borges. Panorama histórico-legislativo do terceiro setor no Brasil: do conceito de terceiro setor à lei das Oscip. In: DE OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino (Coord.). Direito do terceiro setor: atualidade e perspectivas. Coleção comissões. Curitiba: Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Paraná, 2006, p. 17. 11 PAES, José Eduardo Sabo. Op. Cit., p. 88.
14
Na redação do art. 53 do Código Civil Brasileiro, constituem-se as associações pela
união de pessoas que se organizem para fins não econômicos. Assim, já no conceito
legal dessa pessoa jurídica de direito privado aparece a característica que a insere no
Terceiro Setor (finalidade não-lucrativa), bem como a que a diferencia das fundações
de direito privado (agrupamento humano).
Paes conceitua a associação como uma “modalidade de agrupamento dotado de
personalidade jurídica, sendo pessoa jurídica de direito privado voltada à realização de
interesses de seus associados ou de uma finalidade de interesse social [...]”.12
Ao incluir as associações na categoria das entidades que buscam fins não
lucrativos, Lisboa as conceitua como “pessoa jurídica sem fins econômicos,
constituída pela união formal de sujeitos para determinado objetivo, diverso da
circulação de riquezas, conforme consta do seu estatuto associativo submetido a
registro perante o cartório próprio”.13
Sob pena de nulidade, o estatuto de uma associação conterá: (I) a denominação, os
fins e a sede; (II) os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados,
bem como os respectivos direitos e deveres; (III) as fontes de recursos para sua
manutenção; (IV) o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos
deliberativos; (V) as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a
dissolução; (VI) a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas
contas.
Muito embora a Constituição Federal garanta liberdade para abertura de uma
associação, uma interpretação sistemática do ordenamento jurídico brasileiro permite
aferir que nem para todos os fins é que uma associação pode ser constituída, mas
apenas para os lícitos, nos termos do art. 5º, XVII, do próprio texto constitucional, que
estabelece ser plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter
paramilitar.
A respeito, o art. 115 da Lei de Registros Públicos (Lei Federal nº 6.015/73) prevê
expressamente que “não poderão ser registrados os atos constitutivos de pessoas
jurídicas, quando o seu objeto ou circunstâncias relevantes indiquem destino ou 12 Ibidem, p. 43. 13 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil. Volume I 3 ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 348/375.
15
atividades ilícitos ou contrários, nocivos ou perigosos ao bem público, à segurança do
Estado e da coletividade, à ordem pública ou social, à moral e aos bons costumes”.
Diniz, M. explica que o instituto jurídico da associação configura-se “[...] quando
não há um fim lucrativo ou intenção de dividir o resultado, embora tenha patrimônio,
formado por contribuição de seus membros para a obtenção de fins culturais,
A principal característica de uma associação, que serve, também, para distingui-la
das demais entidades de direito privado, é a sua formação predominante através do
elemento humano, ou, como prefere a doutrina, por uma “universalidade de pessoas”
(universitas personarum), que se reúnem objetivando o alcance de finalidades comuns
a todo o grupo (servidores públicos, proteção aos animais, pais e amigos dos
excepcionais, por exemplo). O patrimônio é importante, mas não essencial para a
constituição desse tipo de entidade.
A esse respeito, Violin comenta que “quando o motivo de principal da criação de
uma entidade sem fins lucrativos for a união de esforços, o associativismo, a união de
indivíduos e grupos para a realização de um objetivo comum, em geral a entidade
toma a forma de uma associação [...]”.15
Observo que a pessoa jurídica constituída na modalidade em análise está incluída
nas quatro hipóteses legais de contratação direta que serão comentadas neste trabalho,
em uma delas de forma explícita (associação de portadores de deficiência física), daí
porque a relevância de serem conhecidas suas principais características.
1.2.2 Fundações de direito privado
Ao contrário das associações, predomina nas fundações de direito privado o
elemento patrimonial (universalidade de bens), constante já do dispositivo que
14 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 2 vol: teoria geral do direito civil. 18 ed. rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2003. 15 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 188.
16
estabelece as formas pelas quais ocorrerá a dotação de bens livres para a criação desse
tipo de entidade (escritura pública ou testamento - art. 62 do Código Civil).
Em síntese, ao constituir uma fundação, os bens dotados pelo instituidor passam a
fazer parte da coletividade e são administrados por pessoas designadas por ele para
cumprir a finalidade fixada na escritura pública ou no testamento de instituição.
Essa destinação patrimonial é muito bem comentada por Justen Filho, ao dizer que
“as fundações refletem, historicamente, a primeira manifestação da consciência de que
o patrimônio privado também pode contribuir para a satisfação de necessidades supra-
individuais”.16
Segundo Diniz, M., as fundações caracterizam-se por uma “[...] universalidade de
bens, personalizadas pela ordem jurídica, em consideração a um fim estipulado pelo
fundador, sendo este objetivo imutável e seus órgãos servientes, pois todas as
resoluções estão delimitadas pelo instituidor”17. Para a autora, o principal diferencial
dessas entidades em relação às demais pessoas jurídicas é “[...] a disposição de certos
bens em vista de determinados fins especiais”.18
Portanto, o fundamental na constituição de uma fundação é o patrimônio, que tem
que ser compatível com as finalidades almejadas. Além disso, uma só ou mais pessoas
poderão instituí-la.
Quanto às finalidades, explica o parágrafo único do art. 62 do Código Civil que a
fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de
assistência. Esse leque, no entanto, é desdobrado em várias áreas, conforme bem
concluiu a Doutora Cibele Cristina Freitas de Resende, Promotora de Justiça do
Ministério Público do Estado do Paraná no artigo “As Fundações e o novo Código
Civil”19 escrito em junho de 2003 (com destaques no original):
3. Segundo as fontes positivas de interpretação, os fins assistenciais compreendem: a assistência à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade, à infância e à adolescência; a assistência aos desamparados, à promoção da integração ao mercado de trabalho; à habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.
16 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso ...., p. 131. 17 DINIZ, Maria Helena. Op. Cit., p. 228. 18 Ibidem, p. 229. 19 Disponível em “http://www.fundacoes.caop.mp.pr.gov.br/arquivos/File/fundcodciv.pdf”
17
4. Como fins culturais, além do apoio, valorização e a difusão de manifestações culturais, propriamente ditas, podem inserir-se a educação ambiental para a preservação do meio ambiente. 5. A viabilidade, sob a ótica da essência do instituto fundacional, da interpretação extensiva da norma, admitindo-se como fins de assistência: a colaboração, o apoio, o amparo, a prestação de assistência direta a questões coletivas em qualquer das áreas de interesse coletivo: como o meio ambiente, a pesquisa científica, a preservação do patrimônio cultural, a valorização e a difusão de manifestações culturais, o desenvolvimento intelectual, os esportes, etc., desde quem sem fins econômicos.
Aproveitando a menção que foi dada acima sobre as áreas de atuação das fundações
de direito privado, importa destacar o crescimento das chamadas “fundações de
apoio”, que prestam serviços diretamente às universidades e são assim caracterizadas
por Gasparini:
As Fundações de Apoio são pessoas jurídicas de Direito Privado, regidas pelo disposto a respeito no Código Civil (arts. 62 a 69) [...]. Não fazem parte da Administração Pública direta ou indireta. São entidades civis sem fins lucrativos, e os membros de sua diretoria e dos conselhos não podem ser remunerados pelo exercício dessas atividades.20
O art. 1º da Lei Federal nº 8.958/94, que dispõe sobre as relações entre as
instituições federais de ensino superior (IFES) e de pesquisa científica e tecnológica e
as fundações de apoio, com a redação alterada pela Lei Federal nº 12.349/2010,
autoriza que as instituições de ensino e as demais Instituições Científicas e
Tecnológicas – ICTs celebrem convênios e contratos por prazo determinado, nos
termos do inciso XIII do art. 24 da Lei no 8.666/93, objeto do presente trabalho, com
fundações instituídas com a finalidade de dar apoio a projetos de ensino, pesquisa e
extensão e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico, inclusive na
gestão administrativa e financeira estritamente necessária à execução desses projetos.
Outra característica que diferencia essas entidades das demais está expressamente
prevista no art. 66 do Código Civil, que estabelece o dever legal de velar pelas
fundações conferido ao Ministério Público do Estado onde situadas21. Se funcionarem
no Distrito Federal, ou em Território, caberá o encargo ao Ministério Público Federal;
se estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles,
ao respectivo Ministério Público.
20 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 523. 21 As associações também poderão ser objeto de investigações pelo Ministério Público, desde que recebam recursos públicos.
18
A respeito, a Lei Complementar Estadual nº 85/99 (estabelece a Lei Orgânica e
Estatuto do Ministério Público do Estado do Paraná) atribui aos Promotores de Justiça
a tarefa de fiscalizar as fundações (art. 67, II) e, de forma mais específica:
Art. 68. São atribuições do Promotor de Justiça: XII - em matéria de Fundações: 1. fiscalizar e inspecionar as fundações; 2. requerer: a) que os bens doados, quando insuficientes para constituir a fundação, sejam convertidos em títulos de dívida pública, se de outro modo não tiver disposto o instituidor; b) a remoção dos administradores das fundações nos casos de negligência ou prevaricação, e a nomeação de quem os substitua, salvo o disposto nos respectivos estatutos ou atos constitutivos; 3. notificar quaisquer responsáveis por fundações que recebam legados, subvenções ou outros benefícios para prestarem contas de sua administração e, em caso de desatendimento, promover a ação própria; 4. promover o sequestro dos bens das fundações ilegalmente alienados e as ações necessárias à anulação dos atos praticados sem observância das prescrições legais ou estatutárias; 5. examinar as contas das fundações e promover a verificação de que trata o art. 30, parágrafo único, do Código Civil22; 6. elaborar os estatutos das fundações, se não o fizerem aqueles a quem o instituidor acometeu o encargo; 7. velar pelas fundações e oficiar nos processos que lhes digam respeito; 8. dar ciência ao Procurador-Geral de Justiça das medidas que tiver tomado no interesse das fundações, remetendo as respectivas peças de informação; 9. exercer outras atribuições que lhe sejam conferidas em lei ou regulamento.
Vale mencionar que no âmbito do Estado do Paraná, vigora, desde janeiro de 2003,
a Resolução nº 2.434/2002, da Procuradoria-Geral de Justiça, a qual disciplina a
atuação das Promotorias das Fundações e estabelece normas que vão desde a análise
dos atos constitutivos dessas entidades, inclusive estatuto e estudo de viabilidade
econômica, passam pelo exame anual e de ofício das prestações de contas, bem como
das alterações estatutárias (Art. 67, III, do Código Civil), e terminam com a
possibilidade de extinção da fundação (administrativa ou judicial).
A importância de que as principais características dessas entidades sejam tratadas
reside no fato de que elas, implicitamente, constam das situações legais de
dispensabilidade de licitação envolvendo os entes do terceiro setor que serão
comentadas neste trabalho.
Observo que o ordenamento jurídico apresenta, também, a figura das “fundações
públicas”, cujas características legais foram assim arroladas pelo art. 2º do Decreto-Lei
22 Artigo 69 do novo Código Civil.
19
nº 900/69: a) dotação específica de patrimônio, gerido pelos órgãos de direção da
fundação segundo os objetivos estabelecidos na respectiva lei de criação; b)
participação de recursos privados no patrimônio e nos dispêndios correntes da
fundação, equivalentes a, no mínimo, um terço do total; c) objetivos não lucrativos e
que, por sua natureza, não possam ser satisfatoriamente executados por órgão da
Administração Federal, direta ou indireta; d) demais requisitos estabelecidos na
legislação pertinente a fundações.
Essas fundações distinguem-se das particulares, de acordo com Araújo, pelos
principais motivos a seguir delineados:
a) precisam ser criadas por lei; b) prestam contas ao competente Tribunal de Contas; c) seus contratos e atos são administrativos; d) precisam de licitação para contratar23; e) regem-se pelo direito público; f) seus atos são passíveis de mandado de segurança; g) o Estado responsabiliza-se subsidiariamente pelos atos; h) gozam de imunidade; i) seus bens são impenhoráveis; j) gozam de privilégio de prazo em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar; k) adotam os princípios gerais da contabilidade pública; l) seus bens não são passíveis de usucapião; m) seus empregados são servidores públicos (agentes públicos), concursados, que gozam dos benefícios previstos nos artigos 38 a 41 da CF/88.24
Ainda nessa parte, Gasparini observa que “assim como a Administração Pública
pode criar uma fundação pública, pode instituir uma fundação privada”. Assim,
embora as fundações de direito privado não se confundam com as fundações públicas,
é possível que o próprio órgão estatal constitua uma fundação de direito privado.25
1.3 DENOMINAÇÕES E QUALIFICAÇÕES DAS ENTIDADES
Existem no ordenamento jurídico brasileiro inúmeras denominações e qualificações
dadas pelo Poder Público às entidades integrantes do Terceiro Setor, que em nenhum
23 Entendo que também as fundações privadas e demais entidades sem fins lucrativos devam realizar licitações para aplicar recursos oriundos do Poder Público (convênios, por exemplo). 24 ARAÚJO, Geraldo Bonnevialle Braga. A responsabilidade social da empresa e as fundações privadas. In: DE OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino (Coord.). Direito do terceiro setor: atualidade e perspectivas. Coleção comissões. Curitiba: Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Paraná, 2006, p. 79 25 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 512.
20
momento descaracterizam suas verdadeiras naturezas jurídicas, ou seja, não deixam de
ser associações ou fundações quando as recebem.
Segundo Violin, os títulos concedidos a pessoas jurídicas de direito privado
“permitem a concessão de benefícios às entidades qualificadas, via subvenções,
auxílios, convênios, contratos de gestão, termos de parceria, etc”. 26
A seguir, as principais qualificações e denominações concedidas às entidades do
Terceiro Setor.
1.3.1 Organizações não-governamentais
É comum verificarmos nos meios de comunicação a utilização da sigla “ONG”
(Organização Não-Governamental) para identificar uma pessoa jurídica que atue de
forma complementar e até mesmo em substituição ao Estado.
No entanto, não existe a figura jurídica “ONG” no rol legal das pessoas jurídicas de
religiosas e partidos políticos. Podemos dizer que todas essas entidades, se tiverem por
objetivo uma finalidade pública, podem ser chamadas de Organizações Não-
Governamentais.
O surgimento das Organizações Não-Governamentais (ONG`s), segundo Coelho,
decorreu tanto da ineficácia estatal na prestação de direitos básicos da população como
da vontade dos particulares em proporcionar esse atendimento:
As ONGs se consideram, em outras palavras, entidades organizadas por particulares para atendimento de interesse público. Já que o estado não demonstra mais capacidade ou disposição para prover saúde, educação, assistência e previdência social nos moldes esperados pelos usuários desses serviços, grupos de cidadãos voluntários podem organizar-se com a intenção de atender parcialmente a expectativa.27
Segundo Violin, “não são todas as pessoas jurídicas de direito privado sem fins
lucrativos que são chamadas de ONGs, mas apenas as mais politizadas, mais atuantes
26 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 196. 27 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito civil. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2003.
21
na defesa e construção de direitos, e na luta por uma melhor qualidade de vida da
população”.28
Há consenso de que essas organizações sejam constituídas na modalidade de
associação ou fundação, especialmente em razão da ausência de finalidade lucrativa,
conforme explica Coelho:
Do ponto de vista jurídico, a ONG deve constituir-se como associação ou fundação. Não se admite que uma sociedade seja a forma da ONG, tendo em vista a finalidade econômica inerente a essa espécie de pessoa jurídica. Na constituição e funcionamento da ONG, observam-se as normas aplicáveis a qualquer outra pessoa jurídica da mesma espécie.29
A natureza jurídica dessas organizações é reforçada pelo Conselho Federal de
Contabilidade: “o termo ONG se prolifera no Brasil aplicando-se às organizações da
sociedade civil, que atuam paralelamente ao Governo em busca do bem-estar da
coletividade, constituídas sob a forma de: associações, centros, grupos, fundações,
institutos, etc”.30
1.3.2 Entidades sem fins lucrativos
Para ser conhecida como uma entidade sem fins lucrativos, é preciso que a
associação ou a fundação não tenha resultado positivo (lucro ou superávit) em suas
operações, não é mesmo? Por mais entranho que possa parecer, a resposta é negativa.
O conceito de entidade sem fins lucrativos é verificado em diversos diplomas
legislativos e normativos, dentre eles, apenas para mencionar, a Lei Federal 9.532/97 e
a Resolução 2434/2002 do Ministério Público do Estado do Paraná, já mencionada.
A esse respeito, o art. 12, § 3º da Lei 9532/97 considera como entidade sem fim
lucrativo aquela que não apresente superávit em suas contas ou, caso o alcance em
determinado exercício, destine referido resultado, integralmente, à manutenção e ao
desenvolvimento dos seus objetivos sociais. 28 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 279. 29 COELHO, Fábio Ulhoa. Op. Cit., p. 259. 30 CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE. Manual de procedimentos contábeis e prestação de contas das entidades de interesse social. 2. Ed. Brasília: CFC, 2004.
22
Já a Resolução do Ministério Público considera sem fim lucrativo a fundação que
não distribui, entre os seus conselheiros, diretores, empregados ou doadores, eventuais
excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, bonificações, participações ou
parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercício de suas atividades, e que os
aplica integralmente na consecução do respectivo objeto social.
Em síntese, as definições esclarecem que essas entidades, independentemente da
forma de constituição, até podem e devem obter resultado positivo ao final de
determinado exercício, mas lhes é vedado, e aí reside a relevância do conceito, dividi-
los ou distribuí-los entre seus dirigentes. Podem, apenas, custear suas despesas
operacionais e aplicar o excedente exclusivamente no desenvolvimento de suas
atividades e no aperfeiçoamento de seus objetivos estatutários.
A respeito do resultado positivo em suas operações, Violin observa que “ o que é
proibido é que estas entidades distribuam estes excedentes entre seus diretores,
associados, conselheiros, etc, como ocorre com as empresas com finalidade lucrativa.31
Cabe mencionar, também, que o fato de não ter fim lucrativo não quer dizer que a
entidade não possa cobrar de seus usuários pela utilização dos serviços que
proporciona, desde que, é claro, reinvista essa renda em suas finalidades estatutárias.
Outra consideração acerca do tema reside na remuneração que os contratos
administrativos firmados por essas entidades e o Poder Público proporcionam aos
entes sem fins lucrativos. Para Justen Filho, essa renda não descaracteriza a exigência
de ausência de fim lucrativo, pois “não se confunde o fim lucrativo da entidade com a
garantia de remuneração digna aos prestadores de serviço”.32
1.3.3 Entidades filantrópicas
De acordo com Leite, o termo “filantropia”, de origem grega, significa “amor ao
homem, ao ser humano, especialmente no sentido de solidariedade, de prática do bem” 31 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 187. 32 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 10 ed. São Paulo: Dialética, 2004.
23
e seu conceito é “voltado em geral para ações de maior porte e por vezes de efeitos
menos objetivos e menos diretos, destinadas inclusive a pessoas que desfrutam de
satisfatórias condições de vida”.33
O mesmo autor traça um paralelo entre os serviços úteis e valiosos, prestados pelas
entidades filantrópicas, mas nem sempre essenciais: [...] uma entidade que oferece, por exemplo, programas culturais gratuitos de alto nível dá a pessoas que não dispõem de recursos para pagar por eles uma oportunidade valiosa que não deixa de ter algum sentido filantrópico. Entretanto, isso não corresponde a uma necessidade básica, vital, dessas pessoas, que decerto apreciam programas culturais requintados mas podem viver sem eles. Ainda por outras palavras: trata-se de algo mais e não de um mínimo; e em última análise é essa a principal diferença entre filantropia e assistência social.34
Para o doutrinador “filantropia é gênero e assistência social uma das suas espécies,
donde resulta que toda entidade de assistência social é filantrópica, mas nem toda
entidade filantrópica é de assistência social”.35
Como característica principal dessas entidades pode ser citada a realização de
serviços e atividades importantes, porém, não essenciais (o chamado “algo a mais)”.
Serve de exemplo o atendimento a um número discriminado e determinado de
usuários, como uma creche ou escola para os filhos apenas dos empregados de uma
empresa específica.
Entidade filantrópica, portanto, é aquela que atua em diversas áreas, inclusive
assistência social, e alcança um número determinado ou até mesmo indeterminado de
pessoas, realizando atividades de cunho solidário com ou sem cobrança pelas mesmas.
1.3.4 Entidades de interesse ou de assistência social
O art. 203 da Constituição Federal dispõe que os objetivos da assistência social
direcionam-se à (I) proteção à família, à maternidade, à adolescência e à velhice; (II)
amparo às crianças e adolescentes carentes; (III) promoção da integração ao mercado
33 LEITE, Celso Barroso. Filantropia e contribuição social. São Paulo: LTr, 1998. 34 Ibidem, p. 76. 35 Ibidem, p. 31.
24
de trabalho; (IV) habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a
promoção de sua integração à vida comunitária.
A assistência social, nas lições de Tavares, consiste em:
[...] um plano de prestações sociais mínimas e gratuitas a cargo do Estado para prover pessoas necessitadas de condições dignas de vida. É um direito social fundamental e, para o Estado, um dever a ser realizado através de ações diversas que visem atender às necessidades básicas do indivíduo, em situações críticas da existência humana, tais como a maternidade, infância, adolescência, velhice e para pessoas portadoras de limitações físicas.36
A definição legal do que sejam entidades e organizações de assistência social é
assim dada pelo art. 3º da Lei Federal 8.742/93: “consideram-se entidades e
organizações de assistência social aquelas que prestam, sem fins lucrativos,
atendimento e assessoramento aos beneficiários abrangidos por esta lei, bem como as
que atuam na defesa e garantia de seus direitos”.
Como bem observa Paes, entidades de interesse social “são todas aquelas
associações e sociedades sem fins lucrativos, que apresentam em suas finalidades
estatutárias objetivos de natureza social e assistencial”.37
Ibrahim, a seu turno, restringe um pouco os beneficiários das atividades dessas
pessoas jurídicas, ao dizer que “as entidades de assistência social, não beneficentes,
são restritas a determinadas classes ou grupos, visando ao auxílio mútuo – buscam
garantir um padrão mínimo de vida dos associados, sem atender pessoa estranhas ao
grupo”.38
Diniz, G., explica que há reconhecimento público por parte do ente estatal (União,
Estados, Distrito Federal e Municípios) em relação aos serviços prestados por essas
entidades:
Às entidades de interesse social o Estado reconhece publicamente os serviços por ela prestados, concedendo-lhes, direta ou indiretamente, favores especiais, em virtude dos fins humanitários e sociais a que elas visam. No âmbito do ordenamento jurídico brasileiro, são duas as manifestações nesse sentido. A primeira denomina-se de título de utilidade pública e advém da Lei nº 91, de 29 de agosto de 1935, que dispôs que as associações civis, as sociedades e as fundações constituídas no Brasil, que sirvam desinteressadamente à
36 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito Previdenciário. 5. ed. rev. amp. atual. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2003, p. 11. 37 PAES, José Eduardo Sabo. Op. Cit., p. 58. 38 IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 8. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2006, p. 365.
25
coletividade, poderão ser declaradas de utilidade pública, desde que tenham personalidade jurídica, estejam em efetivo funcionamento e sirvam desinteressadamente à coletividade e não sejam remunerados os cargos de sua diretoria.39
Possuem essas entidades características de prestarem o mínimo vital para os mais
necessitados e de forma generalizada, ou seja, para qualquer pessoa que necessite.
E aqui se insere a principal diferença entre as entidades filantrópicas e as
assistenciais: enquanto as primeiras proporcionam um “algo mais”, ou seja, algum
serviço importante, mas não imprescindível, dispensável, portanto, as segundas dão
um mínimo àqueles desprovidos de recursos que dele são carecedores (proteção aos
idosos, por exemplo).
Em resumo, portanto, são chamadas de entidades de assistência ou de interesse
social todas as pessoas jurídicas sem fins lucrativos que, mediante remuneração ou não
de seus serviços, auxiliem o Estado na realização das finalidades e dos atendimentos
previstos nos artigos 6º e 203 da Constituição Federal e ainda na Lei 8.742/93.
1.3.5 Entidades beneficentes de assistência social
Juntando as definições das palavras “beneficente”, “beneficiador” e “benefícios”
contidas no dicionário da língua portuguesa “Aurélio Buarque de Holanda Ferreira”,
conclui-se que a beneficência consiste num serviço ou bem que se faz de forma
gratuita.40
A assistência social beneficente é explicada por Tavares como sendo “a prestação
gratuita de benefícios e serviços a quem deste necessitar, considerando-se pessoa
carente a que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem tê-la
provida por sua família [...]”.41
39 DINIZ, Gustavo Saad. Direito das Fundações Privadas: teoria geral e exercício de atividades econômicas. Porto Alegre: Síntese, 2000. 40 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 2 ed. ver.aum. 36 imp. Nova Fronteira: Rio de Janeiro, 1997, p. 248. 41 TAVARES, Marcelo Leonardo. Op. Cit., p. 303.
26
Assim, as entidades beneficentes possuem um plus em relação às demais, uma vez
que, além de proporcionarem serviços de extrema relevância (assistência social,
educação ou saúde), os fazem de forma totalmente gratuita às pessoas carentes que
deles precisarem.
Ibrahim ressalta que uma entidade de assistência social (conceituada no item
anterior) também pode ser beneficente “desde que abra seus serviços à sociedade,
atendendo a todos que se enquadrem como necessitados”.42
Violin registra que, entre outras exigências, “apenas serão certificadas como
entidades beneficentes de assistência social as que não remunerarem seus dirigentes,
estiverem registradas no CNAS, sejam declaradas de utilidade pública federal,
estiverem em efetivo funcionamento por três anos”.43
1.3.6 Entidades de educação
A educação, como um dos direitos sociais e dever do Estado, nos termos do art. 205
da Constituição Federal, será promovida e incentivada com a colaboração da
sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício
da cidadania e sai qualificação para o trabalho.
Desde que atendidos os requisitos do cumprimento das normas gerais da educação
nacional, bem como da autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público,
permite a Constituição Federal, no artigo 209, que a iniciativa privada atue nessa área.
Paes conceitua da seguinte forma as entidades de educação:
[...] são todas aquelas pessoas jurídicas de direito privado, sociedades civis, associações civis, fundações ou serviços sociais ou, ainda, as escolas comunitárias ou confessionais dedicadas ao aprendizado, ao ensino e à pesquisa, tanto no ensino fundamental como no ensino médio ou no ensino superior e universitário, ministrado com base nos princípios estabelecidos no art. 206 da CF e atendidas pela iniciativa privada, como condições básicas para o cumprimento das normas gerais da educação nacional, estabelecida pela Lei de
42 IBRAHIM, Fábio Zambitte. Op. Cit., p. 365. 43 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 199.
27
Diretrizes e Bases e mediante autorização e avaliação de qualidade pelo poder público (art. 209, I e II da CF).44
A Pontifícia Universidade Católica (PUC) é exemplo de entidade sem fins
lucrativos que atua na área educacional.
1.3.7 Organizações da sociedade civil de interesse público
A ausência de uma legislação única fez com que, no Brasil, a Lei Federal nº
9.790/99 que, dentre outras providências, dispõe sobre a qualificação de pessoas
jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade
Civil de Interesse Público (OSCIP), seja conhecida como o “marco legal do Terceiro
Setor”.
Justen Filho, em poucas palavras, apresenta as principais características de uma
OSCIP:
[...] a organização civil de interesse público é uma pessoa jurídica de direito privado sem fim lucrativo. Portanto, trata-se de fundação ou associação civil, tal como se passa com a organização social. Surge a organização de interesse público por meio de qualificação outorgada pelo Ministério da Justiça em favor de uma associação civil ou fundação que preencha requisitos legais.45
De acordo com seu art. 1º, podem qualificar-se como Organizações da Sociedade
Civil de Interesse Público as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos,
cujos respectivos objetivos sociais e normas estatutárias atendam aos requisitos
instituídos pela legislação.
Para obtenção da qualificação, os objetivos sociais dessas entidades deverão ser
destinados à promoção, dentre outras, de uma das seguintes finalidades: assistência
social; cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; educação;
saúde; defesa, preservação e conservação do meio ambiente; combate à pobreza;
experimentação de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de
44 PAES, José Eduardo Sabo. Op. Cit., p. 433. 45 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso ..., p. 135.
28
produção, comércio, emprego e crédito; assessoria jurídica gratuita de interesse
suplementar; cidadania, direitos humanos e democracia; estudos e pesquisas,
desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e
conhecimentos técnicos e científicos que digam respeito às atividades antes
mencionadas.
O aspecto mais importante trazido pela lei diz respeito à possibilidade das entidades
qualificadas como OSCIP celebrarem o chamado “Termo de Parceria” com o Poder
Público, destinado à formação de vínculo de cooperação para o fomento e execução
das atividades de interesse público previstas na Lei 9.790/99.
É de se ressaltar que a própria lei define as entidades que não podem almejar a
qualificação como OSCIP. São exemplos as sociedades comerciais, os sindicatos, as
instituições religiosas, as organizações partidárias, as entidades de benefício mútuo
destinadas a proporcionar bens ou serviços a um círculo restrito de associados ou
sócios; as instituições hospitalares e escolas privadas não gratuitas e suas
mantenedoras; as organizações sociais; as cooperativas; fundações públicas e as
fundações, sociedades civis ou associações de direito privado criadas por órgão
público ou por fundações públicas.
Violin observa que “a outorga da qualificação é ato vinculado, ou seja, a entidade
atendendo os requisitos legais, o Ministério da Justiça é obrigado a conceder o título,
não sendo assim, um ato discricionário, dependente de uma decisão conforme a
conveniência e oportunidade do administrador público [...]”.46
Bandeira de Mello menciona as seguintes características que distinguem as OSCIPs
das Organizações Sociais (qualificação que será comentada no presente trabalho, ante
a existência de dispositivo específico na lei de licitações quanto a suas contratações
por dispensa de licitação):
a) a atribuição do qualificativo não é, como naquelas, discricionária, mas vinculada e aberta a qualquer sujeito que preencha os requisitos indicados; não prevê o trespasse de servidores públicos para nelas prestar serviço; b) não celebram “contratos de gestão” com o Poder Público, mas “termos de parceria”, conquanto, tal como neles, seja especificado um programa a cumprir, com metas e prazos fiscalizados, além da obrigação de um relatório final, o que os faz mais distintos, entre si, pelo nome que pelo regime; c) os vínculos em questão não são condicionantes para a qualificação da entidade como tal, ao contrário do que
46 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 213.
29
ocorre com as “organizações sociais”; d) o Poder Público não participa de seus quadros diretivos, ao contrário do que ocorre naquelas; e e) o objeto da atividade delas é muito mais amplo, compreendendo, inclusive, finalidades de benemerência social, ao passo que as “organizações sociais” prosseguem apenas atividades de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.47
Jund observa que as OSCIP’s não consistem “em nova categoria de pessoa jurídica,
e sim numa qualificação especial, desde que atendidos certos requisitos legais”.48
1.3.8 Institutos
Muitas pessoas jurídicas, constituídas sob a natureza jurídica de associação ou
fundação, possuem a palavra “instituto” em suas razões sociais.
Conforme bem observado por Violin, também não consiste o instituto em espécie
de pessoa jurídica quanto à natureza legal:
Algumas entidades, estatais ou privadas, utilizam a expressão “instituto” em suas razões sociais, sob forma de fundação ou associação, mas usualmente o termo é associado às entidades dedicadas à educação, pesquisa ou à produção científica. É claro que por não ser um termo jurídico, entidades com fins lucrativos também podem utilizá-lo, mas não é o mais comum.49
1.3.9 Organizações sociais
Algumas características das Organizações Sociais, bem como a legislação
pertinente, serão objeto de comentários em tópico específico que tratará de uma das
possibilidades de dispensa de licitação envolvendo as entidades assim qualificadas.
47 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de direito administrativo. 25 ed. rev. atual. Malheiros Editores: São Paulo, 2008. 48 JUND, Sérgio. Op. Cit., p. 43. 49 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 188.
2 LICITAÇÃO E CONTRATAÇÃO DIRETA
2.1 BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE LICITAÇÕES
Via de regra, o Poder Público não tem liberdade para escolher aquele que irá lhe
fornecer um bem, prestar um serviço ou executar uma obra de engenharia, uma vez
que, nos termos do art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988, “obedecerá aos
princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência” e
buscará com isonomia a proposta que lhe seja mais vantajosa.
Gasparini distingue de que forma a iniciativa privada e a Administração Pública
tratam da busca pela proposta mais vantajosa:
A procura da melhor proposta para certo negócio é procedimento utilizado por todas as pessoas. Essa busca é, para umas, facultativa, e, para outras, obrigatória. Para as pessoas particulares é facultativa. Para, por exemplo, as públicas (União, Estado-Membro, Distrito Federal, Município, autarquia) e governamentais (empresa pública, sociedade de economia mista, fundação), é, quase sempre, obrigatória, já que essas entidades algumas vezes estão dispensadas de licitar e em outras tantas a licitação é para elas inexigível ou mesmo vedada [...].1
De forma mais específica, nos termos do art. 37, XXI, da Constituição Federal, com
redação idêntica na Constituição do Estado do Paraná (art. 27, inciso XX), ressalvados
os casos especificados na legislação, as obras, serviços e compras serão contratadas
mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os
concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as
condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as
exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações.
Das próprias Constituições, Federal e Estadual, portanto, é que originou a
obrigatoriedade da Administração Pública, no atendimento de suas e das necessidades
da coletividade, em realizar processo de licitação pública para a contratação de obras,
serviços e compras, que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes,
ressalvados os casos de contratação direta previstos em lei.
1 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 526.
31
No âmbito federal, a Lei nº 8.666/93 estabelece, aos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios, normas gerais sobre licitações e contratos
administrativos pertinentes a obras, serviços, compras, alienações e locações,
subordinando-se a seu regime, além dos órgãos da administração direta, os fundos
especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de
economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União,
Estados, Distrito Federal e Municípios.
No Estado do Paraná, a Lei nº 15.608/07 estabelece normas sobre licitações,
contratos administrativos e convênios no âmbito dos Poderes respectivos, observando
as normas gerais sobre a matéria expedidas pela União em razão de sua competência
privativa.
Nos termos do art. 1º, §1º da lei estadual supra, subordinam-se as suas normas (I)
os órgãos da administração direta, (II) as autarquias, inclusive as em regime especial e
as fundações públicas, (III) os fundos especiais, não personificados, pelo seu gestor e
(IV) as sociedades de economia mista, empresas públicas e demais entidades de direito
privado, controladas direta ou indiretamente pelo Estado do Paraná, prestadoras de
serviço público, nas quais também se incluem os Poderes Judiciário e Legislativo, o
Ministério Público e o Tribunal de Contas do Estado do Paraná.
A respeito da licitação, Bandeira de Mello explica que “ao contrário dos
particulares, que dispõem de ampla liberdade quando pretendem adquirir, alienar,
locar bens, contratar a execução de obras ou serviços, o Poder Público, para fazê-lo,
necessita adotar um procedimento preliminar rigorosamente determinado e
preestabelecido na conformidade da lei”.2
Para o doutrinador, licitação “é um certame que as entidades governamentais
devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar
determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais
vantajosa às conveniências públicas” e que visa a alcançar duplo objetivo:
“proporcionar às entidades governamentais possibilidades de realizarem o negócio
mais vantajoso (pois a instauração de competição entre ofertantes preordena-se a isto)
2 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Op. Cit., p. 514.
32
e assegurar aos administrados ensejo de disputarem a participação nos negócios que as
pessoas governamentais pretendam realizar com os particulares”.3
Meirelles define a licitação como o procedimento administrativo “mediante o qual a
Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu
interesse”4 e, Gasparini, como “através do qual a pessoa a isso juridicamente obrigada
seleciona, em razão de critérios objetivos previamente estabelecidos, de interessados
que tenham atendido à sua convocação, a proposta mais vantajosa para o contrato ou
ato de seu interesse”.5
Justen Filho assim discorre sobre a obrigatoriedade da licitação:
A Constituição acolheu a presunção (absoluta) de que prévia licitação produz a melhor contratação – entendida como aquela que assegura a maior vantagem possível à Administração Pública, com observância do princípio da isonomia. Mas a própria Constituição se encarregou de limitar tal presunção absoluta, facultando contratação direta nos casos previstos em lei.6
Ao lado dos princípios acima indicados, caminham outros espalhados na própria
Carta Magna, como aqueles previstos no art. 5º, caput e incisos, com destaque para o
princípio da igualdade, elevado à classe de fundamental. Niebuhr assim discorre sobre
a “isonomia”:
[...] é dos valores mais prestigiados pelas sociedades ocidentais, especialmente após o advento da modernidade. Ela é expressão concreta da idéia de justiça, pois o tratamento discriminatório retrata uma das formas mais odiosas de arbitrariedade. Sobremodo, a igualdade é um dos baluartes do ordenamento jurídico nacional, tendo sido encartada no altiplano dos direitos fundamentais prestigiados na Constituição Federal (caput do artigo 5º). Assim sendo, se do contrato advém benefício econômico, todos os interessados hábeis em usufruir dele devem ser tratados com igualdade. Para trata-los com igualdade, torna-se imperativo que a celebração do contrato seja precedida de certas formalidades.7
Para Bandeira de Mello, “o princípio da isonomia ou igualdade dos administrados
em face da Administração firma a tese de que esta não pode desenvolver qualquer
espécie de favoritismo ou desvalia em proveito ou detrimento de alguém”.8
3 Idem. 4 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 28. Ed. atual. Malheiros: São Paulo, 2003. 5 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 527. 6 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários ..., p. 229. 7 NIEBUHR, Joel de Menezes. Dispensa e inexigibilidade de licitação pública. São Paulo: Dialética, 2003. 8 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Op. Cit., p. 83.
33
E o princípio da isonomia é aplicado aos casos de contratação direta, assunto objeto
da presente monografia? Justen Filho responde essa indagação:
É óbvio que o princípio da isonomia, por sua supremacia constitucional, não poderá deixar de ser aplicado. Logo, a contratação direta não é modalidade de atividade administrativa imune à incidência do princípio da isonomia. Passa-se, tão somente, que o princípio da isonomia tem de ter compatibilizado com as peculiaridades da contratação direta. A contratação direta não autoriza atuação arbitrária da Administração. No que toca com o princípio da isonomia, isso significa que todos os particulares deverão ser considerados em plano de igualdade. Ao escolher um sujeito específico e com ele contratar, a decisão administrativa deverá ser razoável e fundar-se em critérios compatíveis com a isonomia.9
Ao lado da isonomia e demais princípios básicos (legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade, probidade administrativa, vinculação ao instrumento
convocatório e julgamento objetivo) outro alvo da licitação, nos termos do art. 3º da
Lei Federal nº 8.666/93, é a seleção da proposta mais vantajosa para a Administração
Pública contratante.
2.2 CONTRATAÇÃO DIRETA
Em que pese o fato da realização de procedimento licitatório ser regra nos negócios
jurídicos realizados pelo Poder Público, Pereira Júnior explica a existência de quatro
grupos de situações que constituem exceções ao dever geral constitucional de licitar:
Há situações em que a Administração recebe da lei o comando para a contratação direta; há outras em que a Administração recebe da lei autorização para deixar de licitar, se assim entender conveniente ao interesse do serviço; hipóteses há em que a Administração defronta-se com inviabilidade fática de licitar, anuindo a lei em que é inexigível fazê-lo; e há um caso em que à Administração é defeso licitar, por expressa vedação da lei.10
9 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários ...., p. 231. 10 PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei de licitações e contratações da administração pública. 6 ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.
34
Segundo Medauar, as hipóteses legais são chamadas de contratação direta porque a
“Lei 8.666/93 arrola os casos em que não se realiza procedimento licitatório antes da
contratação, havendo, conforme o caso, um procedimento interno”. 11
Observando a existência também do instituto jurídico da licitação “dispensada”,
que não integra o objetivo do presente trabalho (art. 17 da Lei Federal nº 8.666/93, por
exemplo), as situações legais que autorizam que o bem ou serviço almejado pelo Poder
Público sejam contratados sem a realização de procedimento licitatório (diretamente,
portanto) denominam-se “dispensa” e “inexigibilidade” de licitação, diferenciados por
Bandeira de Mello da seguinte maneira:
Em tese, a dispensa contempla hipóteses em que a licitação seria possível; entretanto, razões de tomo justificam que de deixe de efetuá-la em nome de outros interesses públicos que merecem acolhida. Já, a inexigibilidade resultaria de inviabilidade da competição, dada a singularidade do objeto ou do ofertante, ou mesmo – deve-se acrescentar – por falta dos pressupostos jurídicos ou fáticos da licitação não tomados em conta no arrolamento dos casos de licitação dispensável.12
Di Pietro também discorre sobre as diferenças entre dispensa e inexigibilidade de
licitação (com destaques no original):
A diferença básica entre as duas hipóteses está no fato de que, na dispensa, há possibilidade de competição que justifique a licitação; de modo que a lei faculta a dispensa, que fica inserida na competência discricionária da Administração. Nos casos de inexigibilidade, não há possibilidade de competição, porque só existe um objeto ou uma pessoa que atenda às necessidades da Administração; a licitação é, portanto, inviável.13
Niebuhr diferencia os institutos também sob as óticas da exaustividade e
taxatividade das hipóteses previstas na legislação:
A inexigibilidade depende de hipótese fática, de ter ocorrido efetivamente situação que inviabiliza a competição. Quer-se dizer que pouco importam as prescrições legislativas, pois, diante de inviabilidade de competição, está-se, queira ou não, diante da inexigibilidade. Já a dispensa depende de hipótese fática e da respectiva autorização legislativa. Melhor explicando: ao agente administrativo só é lícito dispensar a licitação diante de expressa autorização legal [...].14
11 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 7. Ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. 12 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Op. Cit., p. 532. 13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2005. 14 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 42.
35
Moreira Neto substitui a expressão “contratação direta” por “afastamento de
licitação” e assim diferencia as duas formas de materialização desse instituto (original
com destaques):
A licitação é dispensável quando existam razões, legalmente previstas, que recomendem ou reconheçam a desnecessidade da competição. A licitação é inexigível quando, por quaisquer motivos, fáticos ou jurídicos, possa caracterizar-se a inviabilidade de competição.15
Do procedimento licitatório, ou dos casos de contratações diretas, é que surgem, os
“contratos administrativos”, definidos por Justen Filho como “o acordo de vontades
destinado a criar, modificar ou extinguir direitos e obrigações, tal como facultado
legislativamente e em que pelo menos uma das partes atua no exercício da função
administrativa”.16
Segundo Violin, os contratos administrativos podem ser assinados tanto com as
entidades do ‘terceiros setor’ como com qualquer pessoa jurídica com fins lucrativos.
Ressalva o doutrinador:
Independentemente do contratado, a celebração deste termo exige a realização de licitação prévia, a não ser nos casos de dispensa ou inexigibilidade, quando será possível a contratação direta por meio de procedimento simplificado de escolha. Lembramos que a Lei nº 8.666/93 define alguns casos de dispensa de licitação especificamente para determinadas entidades do “terceiro setor”.17
2.2.1 Inexigibilidade de licitação
Segundo o art. 25 da Lei Federal nº 8.666/93 e 33 da Lei Estadual nº 15.608/07, é
inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;
15 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo. 14 ed. rev. ampl. E atual. Forense: Rio de Janeiro, 2006. 16 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso ..., p. 277. 17 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 283.
36
II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação; III - para contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.
As leis acima, respectivamente nos artigos 13 e 21, especificam o que pode ser
considerado como serviços técnicos profissionais mencionados no inciso II: (I) estudos
técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos; (II) pareceres, perícias e
avaliações em geral; (III) assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras
ou tributárias; (IV) fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;
(V) patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas; (VI) treinamento e
aperfeiçoamento de pessoal e (VII) restauração de obras de arte e bens de valor
histórico.
A legislação enumera algumas situações onde o Administrador Público pode deixar
de realizar procedimento licitatório e contratar diretamente através de inexigibilidade,
dentre elas a aquisição de equipamentos que só possam ser fornecidos por empresa
comercial exclusiva e para contratação de profissional de qualquer setor artístico
consagrado pela crítica especializada.
Tais situações, contudo, são exemplificativas pois, conforme explica Niebuhr, “a
licitação pública é inexigível sempre que se estiver diante de inviabilidade de
competição” e, por essa razão, “mesmo se a Administração Pública quisesse realiza-la,
tal empreendimento estaria fadado ao insucesso”.18
O “credenciamento” pode ser um exemplo de inexigibilidade de licitação não
prevista na Lei 8.666/93, tratada, no entanto, de forma expressa pela Lei Estadual nº
15.608/07.
Tal procedimento é muito comum na área de saúde, onde um Município pode
chamar médicos a se credenciarem visando atender os servidores públicos respectivos.
Nessa situação, a inexistência de competitividade se dá em sentido inverso do
tradicional, pois inúmeros profissionais poderão atender os requisitos legais e assim se
credenciarem.
18 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 40.
37
A respeito, o art. 24 da Lei Estadual nº 15.608/07 o define expressamente como o
“ato administrativo de chamamento público, processado por edital, destinado à
contratação de serviços junto àqueles que satisfaçam os requisitos definidos pela
Administração, observado o prazo de publicidade de no mínimo 15 (quinze) dias úteis
e no máximo de 30 (trinta) dias úteis”.
2.2.2 Dispensa de licitação
Niebuhr explica a adoção da expressão “dispensável” pelo legislador nos
dispositivos legais que tratam da matéria:
Percebe-se que só é pertinente aludir à dispensa de algo que poderia ser realizado. Só se dispensa aquilo de que se dispõe, não o que está fora do alcance. Assim sendo, dispensa de licitação pública ocorre só quando seria possível a competição, porém, se dessa maneira se procedesse, impedir-se-ia à satisfação do interesse público. A dispensa de licitação pública pressupõe invariavelmente a possibilidade de realizá-la, mesmo que isso impusesse sacrifício ao interesse público. Ela é, em última análise, o mecanismo de que se vale o legislador para salvaguardar o interesse público, sopesando os valores que o circundam, evitando que a realização de licitação pública erga barreiras à plena consecução dele.19
Para Justen Filho, “a dispensa de licitação verifica-se em situações em que, embora
viável competição entre particulares, a licitação afigura-se objetivamente
inconveniente ao interesse público”.20
Jund, a respeito da não obrigatoriedade de se escolher pela dispensa de licitação,
entende que “por possibilitar a competição entre os proponentes e oferecer todas as
condições para que seja realizado o certame, a dispensa de licitação não é obrigatória,
e sim, uma faculdade que a Administração Pública possui para fundamentar a
contratação de produtos e serviços quando tiver condições de caracterizar tal situação
como sendo a proposta mais vantajosa”.21
Bacellar Filho assim trata da dispensa de licitação:
19 Ibidem, p. 44. 20 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários ..., p. 234. 21 JUND, Sérgio. Op. Cit., p. 390.
38
É um ato discricionário, facultando-se à Administração Pública, diante do caso concreto, realizar a licitação ou deixar de realiza-la, mediante avaliação dos critérios de conveniência e oportunidade – o que importa considerar que a licitação, em algumas situações especialíssimas, constantes do taxativo rol elencado pelo art. 24 da Lei n. 8.666/93, é dispensável.22
O chamado pela doutrina “rol taxativo” das situações de dispensa de licitação, isto
é, onde pode ocorrer a contratação direta por essa forma apenas nos casos previstos em
lei, é assim explicado por Pereira Júnior:
As hipóteses de dispensabilidade do art. 24 constituem rol taxativo, isto é, a Administração somente poderá dispensar-se de realizar a competição se ocorrente uma das situações previstas na lei federal. Lei estadual, municipal ou distrital, bem assim regulamento interno de entidade vinculada, não poderá criar hipótese de dispensabilidade.23
Pela característica do elenco das situações de dispensa de licitação, Gasparini
observa que “por se tratar de exceção à obrigatoriedade de licitar, é taxativo, não
podendo, portanto, as entidades que devem observância a esse princípio aumentá-lo no
momento da execução da lei”.24
E por competir a União legislar sobre normais gerais de licitação, nas quais estão
incluídas as hipóteses de dispensa, o mesmo autor registra que “não cabe ao Estado-
Membro ou ao Distrito Federal, nem ao Município, por ocasião da feitura de suas
respectivas leis de licitação e contrato administrativo, criar novas hipóteses de
dispensabilidade”.25
O momento é oportuno para tratar de um caso concreto enfrentado pelo Tribunal de
Contas da União (Acórdão 421/2004 - Plenário26) a respeito de uma consulta que lhe
foi apresentada pela Câmara dos Deputados, envolvendo uma das hipóteses de
dispensa de licitação comentada no presente trabalho.
A entidade integrante do Congresso Nacional submeteu ao TCU consulta sobre a
possibilidade de contratação de bens ou serviços das entidades dos serviços sociais
22 BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Direito administrativo. 2 ed. rev. e atual. Saraiva: São Paulo, 2005. 23 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Op. Cit., p. 259. 24 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 571. 25 Idem. 26 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 019.027/2003-3. Consulta. Contratação de Serviços Sociais Autônomos por dispensa de licitação fundada no art. 24, inciso XXIV, da Lei n° 8.666/93. Brasília, DF. DOU. 29/04/04. Disponível em <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/ServletTcuProxy>. Acesso em: 17 mai 2011.
39
autônomos (Sesi, Sesc, Senai) com dispensa de licitação fundamentada no art. 24,
XXIV, da Lei Federal nº 8.666/93. Visada a Câmara dos Deputados, assim, estender a
essas entidades a prerrogativa dada às Organizações Sociais para serem diretamente
contratadas.
Caso fosse possível efetivar-se na prática a intenção do órgão consulente,
estaríamos diante de uma nova hipótese de dispensa de licitação, não prevista no
ordenamento jurídico, que possui, como já dito, rol exaustivo.
O relatório técnico elaborado pelo Tribunal de Contas da União entendeu não ser
razoável “estender tal previsão a outras entidades, mesmo de natureza semelhante,
nem a outros serviços que não os contemplados em contratos de gestão realizados com
Organizações Sociais”. O trecho abaixo reproduzido melhor explica a fundamentação
adotada:
[...] Tendo em vista, portanto, a posição majoritária da doutrina, bem como a jurisprudência desta Corte, no sentido de que os casos de licitação dispensável previstos no art. 24 da Lei nº 8.666/93 estão expressos taxativamente naquela Lei - numerus clausus - não podendo ser interpretados extensiva ou analogicamente, entendemos que não há amparo legal em contratações, por parte da Administração Pública Direta, do fornecimento de bens ou serviços das entidades dos Serviços Sociais Autônomos com dispensa de licitação baseadas no art. 24, inciso XXIV, da Lei nº 8.666/93.
No mesmo julgamento, outro argumento utilizado pelo TCU foi o de que a
enumeração constante do art. 24 da Lei 8.666/93 não admite interpretação extensiva ou
analogia.
Para elucidar ainda mais o tema, Jacoby Fernandes explica:
Para que a situação possa implicar dispensa de licitação, deve o fato concreto enquadrar-se no dispositivo legal, preenchendo todos os requisitos. Não é permitido qualquer exercício de criatividade ao Administrador, encontrando-se as hipóteses de licitação dispensável previstas expressamente na lei, numerus clausus, no jargão jurídico, querendo significar que são apenas aquelas hipóteses que o legislador expressamente indicou que comportam dispensa de licitação.27
27 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 301.
3 CONTRATAÇÃO DIRETA DAS ENTIDADES DO TERCEIRO SETOR
3.1 COMENTÁRIOS INICIAIS
Não há dúvidas de que as entidades do Terceiro Setor, a cada dia, com mais
frequência participam de assuntos relacionados ao bem-estar da coletividade e que
tenham imediata relação com o interesse público.
Niebuhr assim explica o motivo do legislador em ter optado por proporcionar que
em alguns casos os integrantes do Terceiro Setor sejam diretamente contratados pelo
Poder Público:
Como tais entidades desenvolvem atividades pertinentes ao interesse público, o legislador reputou dever-se, em alguns casos, estreitar as relações delas com a Administração Pública, possibilitando a contratação direta, por dispensa de licitação pública. Nessas hipóteses, a dispensa de licitação pública é um modo concebido para que a Administração fomente as atividades de tais entidades; logo, representa uma espécie de incentivo. Em vez de realizar licitação pública, tratando com igualdade todos os possíveis interessados em contratos administrativos, o legislador resolveu distinguir ditas entidades, oferecendo-lhes tratamento privilegiado, permitindo que a Administração não processa ao certame, contratando-as diretamente, por meio de dispensa. [...] a dispensa justifica-se na conveniência ou necessidade de fomentar certas atividades vinculadas ao interesse público, mesmo que levadas a cabo por entidades privadas. A idéia é de contratar ditas entidades especialmente qualificadas, que, mesmo indiretamente, propiciam retorno ao interesse público, em vez de contratar qualquer outra entidade, cujo retorno, consubstanciado em lucro, é compartilhado apenas entre seus sócios.1
Di Pietro denomina os casos de dispensa de licitação onde estão envolvidas as
pessoas sem fins lucrativos como “hipóteses de dispensa em razão da pessoa”.2
Justen Filho, por outro lado, observa que, em havendo possibilidade de competição,
isto é, existindo mais de uma entidade que tenha interesse em celebrar o contrato, não
poderá o gestor público dispensar a licitação:
O dispositivo abrange contratações que não se orientam diretamente pelo princípio da vantajosidade. Mas a contratação não poderá ofender o princípio da isonomia. Existindo diversas instituições em situação semelhante, caberá a licitação para selecionar aquela que apresente a melhor proposta – ainda que essa proposta deva ser avaliada segundo critérios diversos do “menor preço”.3
3.2 EVOLUÇÃO LEGISLATIVA
1 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 312. 2 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. Cit., p. 323. 3 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários ..., p. 255.
41
De acordo com Schier, o Decreto-Lei nº 200/67 “consolidou a criação da
Administração Pública indireta no país, trazendo para o nosso ordenamento jurídico
conceitos como planejamento, coordenação, descentralização, dentre outros”.4
Para Justen Filho, referido decreto “disciplinou a estrutura da Administração
Pública, introduziu uma reforma administrativa e promoveu a sistematização quanto às
pessoas dela integrantes”.5
Em seu art. 126, §2º, o comando legal supra estabelecia ser dispensável a licitação:
(a) nos casos de guerra, grave perturbação da ordem ou calamidade pública; (b) quando sua realização comprometer a segurança nacional a juízo do Presidente da República; (c) quando não acudirem interessados à licitação anterior, mantidas neste caso, as condições preestabelecidas; (d) na aquisição de materiais, equipamentos ou gêneros que só podem ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivos bem como na contratação de serviços com profissionais ou firmas de notória especialização; (e) na aquisição de obras de arte e objetos históricos; (f) quando a operação envolver concessionário de serviço público ou, exclusivamente, pessoas de direito público interno ou entidades sujeitas ao seu controle (sic) majoritário; (g) na aquisição ou arrendamento de imóveis destinados ao Serviço Público; (h) nos casos de emergência, caracterizada a urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízos ou comprometer a segurança de pessoas, obras, bens ou equipamentos; (i) nas compras ou execução de obras e serviços de pequeno vulto, entendidos como tal os que envolverem importância inferior a cinco vêzes, no caso de compras, e serviços, e a cinqüenta vezes (sic), no caso de obras, o valor do maior salário-mínimo mensal.
Tais situações legais de dispensa, nas quais estavam incluídas o que hoje são
tratadas pela legislação como situações de inexigibilidade (letra “d”, acima) e nada
falava sobre entidades sem fins lucrativos, vigoraram até a edição do Decreto-Lei nº
2.300/86.
Observo que o art. 1º da Lei Federal nº 5.456, de 20 de junho de 1968, aplicou aos
Estados e Municípios das normas relativas às licitações para as compras, obras,
serviços e alienações previstas nos artigos do Decreto-lei nº 200/67; já para o Distrito
Federal, o mesmo conteúdo foi imposto pela Lei Federal nº 5.721/1971.
No dia 25 de novembro de 1986, entrou em vigor o Decreto-Lei nº 2.300/86 que
passou a dispor sobre licitações e contratos da Administração Federal, bem como
normais gerais aos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios.
4 SCHIER, Adriana da Costa Ricardo. Administração Pública: apontamentos sobre os modelos de gestão e tendências atuais. In: GUIMARÃES, Edgar (Coord.). Cenários do direito administrativo: estudos em homenagem ao professor Romeu Felipe Bacellar Filho. Belo Horizonte: Fórum, 2004. 5 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso...., p. 99.
42
Referida norma, em seu artigo 22, (I) manteve os casos de dispensa em razão do
valor, adaptada para a moeda da época, bem como as situações das letras “a”, “c”, “d”
(apenas serviços técnicos com profissionais de notória especialização), “e”, “f”, “g”,
“h”, todas do art. 126, §2º, do Decreto-Lei nº 200/67; (II) retirou a hipótese antes
tratada pela letra “b”, do mesmo dispositivo; (III) acrescentou as seguintes situações
de dispensa de licitação, onde mais uma vez nada foi dito quanto às entidades sem fins
lucrativos:
V - quando houver comprovada conveniência administrativa na contratação direta, para complementação de obra, serviço ou fornecimento anterior; IX - para a contratação de profissional de qualquer setor artístico, diretamente ou através de empresário, desde que consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública; XII - quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado, ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos estatais incumbidos do controle oficial de preços casos em que se admitirá a contratação direta dos bens e serviços, por valor não superior ao constante do registro de preços. XIII - quando a União tiver que intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento. IX - quando as propostas apresentadas consignarem preços manifestamente superiores aos praticados no mercado ou forem incompatíveis com os fixados pelos órgãos estatais incumbidos do controle oficial de preços, casos em que, observado o parágrafo único do art. 38, será admitida a adjudicação direta dos bens ou serviços, por valor não superior ao constante do registro de preços; X - quando a operação envolver exclusivamente pessoas jurídicas de direito público interno, ou entidades paraestatais ou, ainda, aquelas sujeitas ao seu controle majoritário, exceto se houver empresas privadas que possam prestar ou fornecer os mesmos bens ou serviços, hipótese em que todas ficarão sujeitas a licitação; XI - para a aquisição de materiais, equipamentos ou gêneros padronizados ou uniformizados, por órgão oficial, quando não for possível estabelecer critério objetivo para o julgamento das propostas.
Com a revogação do Decreto-Lei nº 2.300/86 pela Lei Federal nº 8.666/93,
atualmente a licitação é dispensável em 31 hipóteses taxativas, das quais apenas as dos
incisos III (guerra e perturbação da ordem), IV (emergência ou calamidade pública), V
(licitação anterior deserta), VI (intervenção da União no domínio econômico), VII
(propostas com preços manifestamente superiores ao de mercado), IX
(comprometimento da segurança nacional), XI (contratação de remanescente), XIII
(instituição nacional sem fins lucrativos, cuja redação foi alterada posteriormente) e
XV (obras de arte e objetos históricos), constam desde o início de sua vigência.
43
Com exceção da entidade de pesquisa, ensino ou de desenvolvimento institucional,
que teve sua redação original alterada pela Lei Federal nº 8.883/946, as demais
possibilidades legais de contratação de entidades do Terceiro Setor foram incluídas por
leis ordinárias na vigência da Lei Federal nº 8.666/93.
Os casos hoje definidos nos incisos XIII e XX do art. 24 da lei federal passaram a
vigorar através da Lei Federal nº 8.883/94 (originada de Medida Provisória); a
hipótese do inciso XXIV foi incluída pela Lei 9.648/98; a dispensa prevista no atual
inciso XXX do mesmo artigo e lei foi acrescentada recentemente, por intermédio da
Lei Federal nº 12.188/2010.7
A lei estadual, por sua vez, em seu art. 34, apresente vinte e uma situações onde a
licitação pode ser dispensável, a maioria em repetição à lei federal.
Existem hipóteses legais de dispensa de licitação onde tanto o particular da
iniciativa privada como as entidades sem fins lucrativos podem ser diretamente
contratadas pela Administração Pública, como nos casos estabelecidos no art. 24, II
(em razão do valor) e V (licitação anterior deserta), da Lei Federal 8.666/93, e no art.
34, iguais incisos, da Lei Estadual 15.608/07.
A legislação, federal e estadual, autoriza, também, que diretamente o Poder Público
celebre contratos com entidades do terceiro setor em casos onde apenas esses entes
possuem legitimidade para tanto, isto é, para ser contratada, a pessoa jurídica tem que
obrigatoriamente não possuir fins lucrativos.
São algumas das hipóteses previstas no art. 24 da Lei Federal nº 8.666/93 e,
repetidas, com modificações, pelo art. 34 da Lei Estadual 15.608/07 (com exceção dos
serviços de assistência técnica e extensão rural).
Assim, de acordo com o art. 24 da Lei Federal nº 8.666/93, é dispensável a
licitação:
- na contratação de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à
6 As modificações foram as seguintes: a) substituição da expressão “instituição nacional” por “instituição brasileira”; b) exclusão dos objetivos “desenvolvimento científico ou tecnológico"; c) inclusão de entidade com atuação na recuperação social do preso; d) inclusão do requisito quanto à contratada não ter fins lucrativos. 7 Por essa razão, a doutrina específica quase nada escreve sobre o tema.
44
recuperação social do preso, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos (inciso XIII); - na contratação de associação de portadores de deficiência física, sem fins lucrativos e de comprovada idoneidade, por órgãos ou entidades da Administração Pública, para a prestação de serviços ou fornecimento de mão-de-obra, desde que o preço contratado seja compatível com o praticado no mercado (Inciso XX); - para a celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão (Inciso XXIV); - na contratação de instituição ou organização, pública ou privada, com ou sem fins lucrativos, para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural no âmbito do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária, instituído por lei federal (Inciso XXX).
A Lei Estadual nº 15.608/07 repetiu integralmente a possibilidade de dispensa de
licitação na contratação de associação de portadores de deficiência física e para a
celebração de contratos de prestação de serviços com as organizações sociais.
Além disso, prevê, também, a contratação de instituição de pesquisa, ensino ou
desenvolvimento institucional, ou de entidade dedicada à recuperação social do preso,
acrescentando ao final do dispositivo a vedação de transpasse da execução do objeto
contratual a terceiros. Não trata, contudo, da última situação acima elencada.
Essas situações legais são sistematizadas por Justen Filho, do ponto de vista do
ângulo de manifestação de desequilíbrio na relação custo/benefício, sob o modo
“destinação da contratação”, isto é, “quando a contratação não for norteada pelo
critério da vantagem econômica, porque o Estado busca realizar outros fins”8 e
chamada por Niebuhr como “dispensa em razão de atributos pessoais do contratado”.9
3.3 CONTRATAÇÃO DE INSTITUIÇÃO BRASILEIRA INCUMBIDA
REGIMENTAL OU ESTATUTARIAMENTE DA PESQUISA, DO ENSINO OU DO
DESENVOLVIMENTO INSTITUCIONAL, OU DE INSTITUIÇÃO DEDICADA À
RECUPERAÇÃO SOCIAL DO PRESO
Pereira Júnior entende que essa hipótese de dispensa atende o comando do art. 218
da Constituição Federal:
8 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários...., p. 235. 9 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 312.
45
A lei licitatória cumpre, neste inciso, a ordem do art. 218 da Constituição Federal, que incumbe o Estado de promover e incentivar “o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas”. A determinação do §4º do preceito constitucional nitidamente inspira esta hipótese de dispensabilidade, ao cometer à lei, imperativamente, o dever de apoiar e estimular “as empresas que invistam em pesquisa, criação de tecnologia adequada ao País, formação e aperfeiçoamento de recursos humanos ...”.10
No mesmo sentido é a manifestação de Guimarães:
Tudo leva a crer que a intenção do legislador, ao criar esta hipótese de dispensa de licitação, foi a de dar cumprimento, ainda que de forma indireta, aos ditames previstos no artigo 218 da Constituição Federal de 1988, incentivando e favorecendo a manutenção das instituições ali mencionadas a executarem os nobres objetivos sociais a que dispõem. Em outras palavras, beneficiar a contratação de entidades em cujos estatutos estejam presentes finalidades voltadas ao desenvolvimento de atividades sócio-políticas que, em última análise, são de interesse público.11
Jacoby Fernandes também se manifesta de forma semelhante quanto à intenção do
legislador a estabelecer essa situação de contratação direta:
[...] uma das formas mais eficazes de incentivar o desenvolvimento é por meio da valorização do trabalho. A lei estabelece uma desigualdade jurídica no universo dos licitantes visando, sobretudo, resguardar outros valores, também tutelados pelo Direito. No aparente conflito, deve o legislador estabelecer, com sabedoria, a prevalência do bem jurídico fundamental, no caso.12
Quatro são os requisitos legais da contratada para que o Poder Público concretize
contratações diretas via dispensa de licitação com fundamento nesse dispositivo: (I)
tem que ser instituição brasileira e incumbida da pesquisa, ensino, desenvolvimento
institucional ou recuperação social do preso; (II) tem que deter inquestionável
reputação ético-profissional; (III) não pode ter fins lucrativos; (IV) não pode
transpassar a execução do objeto contratual a terceiros (exigência apenas da legislação
estadual).
Ao mesmo tempo e como primeiro requisito, a legislação exige que a contratada
seja “instituição brasileira”.
10 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Op. Cit., p. 281. 11 GUIMARÃES, Edgar. Contratação direta – comentários às hipóteses de licitação dispensável e inexigível – coleção 10 anos de pregão. Editora Negócios Públicos do Brasil: Curitiba, 2008. 12 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 422.
46
O emprego do primeiro vocábulo retro, de acordo com Guimarães descarta
“qualquer possibilidade de contratação de pessoa física, pois a idéia que se tem é de
uma estrutura organizacional típica de uma pessoa jurídica”.13
Para o mesmo autor, “instituição brasileira pode ser conceituada como sendo aquela
que tenha sido criada de acordo com as leis brasileiras e que possua sede e
administração no País”. 14
Essa definição, também adotado por Jacoby Fernandes, constava expressamente do
art. 171, I, da Constituição Federal, revogado pela Emenda Constitucional nº 06/95.
No entanto, mesmo com a revogação, esse autor entende que o conceito continua
válido:
[...] pois o fato de revogação implica o caso em lacuna, suprível pela norma inferior, que continua válida. Se pretendesse o constituinte extirpar qualquer desigualdade, tê-lo-ia feito expressamente. Com a revogação do art. 171, deixou de haver desigualdade, em favor da empresa brasileira, permanente e absoluta, ficando, ao prudente arbítrio do legislador ordinário, estabelecer em cada caso, se, e como haverá diferença.15
Citadini critica a razão desse benefício apenas para instituições brasileiras pois,
segundo ele, “nada justifica afastar um número considerável de boas instituições
estrangeiras que poderiam estar à disposição da Administração Pública nacional. 16
Em sentido oposto, Guimarães entende ser possível que as entidades estrangeiras
celebrem contratos com a Administração com supedâneo no dispositivo em exame.
Segundo o doutrinador, a assertiva de que essas instituições alienígenas não poderiam
ser contratadas “cai por terra em razão de que a Emenda Constitucional 6/1995,
revogou o §2º do artigo 171 da Constituição Federal, que determinada tratamento
preferencial à empresa brasileira na aquisição de bens e serviços pelo Poder
Público”.17
13 GUIMARÃES, Edgar. Op. Cit., p. 38. 14 Idem. 15 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 424. 16 CITADINI, Antonio Roque. Comentários e jurisprudência sobre a lei de licitações públicas. 3. Ed. rev. e atual. Max Limonad: São Paulo, 1999. 17 GUIMARÃES, Edgar. Op. Cit., p. 39.
47
Outra exigência da legislação refere-se à atuação da futura contratada nas áreas da
pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional. Jacoby Fernandes18 alerta sobre a
abrangência dessas três expressões: Objetos vagos, para os fins da Lei nº 8.666/93, como, por exemplo, pesquisar a cura da AIDS, são ilegais, dispondo o Estado de outros meios para realizar tais atividades, inclusive mediante subvenção. Aqui, busca-se o serviço ou o bem absolutamente definido e mensurável, com programação de etapas perfeitamente claras. A atividade poderá, inclusive, nem ser a pesquisa, embora firmada com uma entidade dedicada à pesquisa, havendo compatibilidade com o objeto.19
A respeito da falta de conceito preciso do “desenvolvimento institucional”, Niebuhr
observa: Nada obstante isso, o intérprete deve tratar os casos que lhe são apresentados com olhos na parte inicial do inciso XXI do artigo 37 da Constituição, cuja dicção ordena interpretar restritivamente a dispensa e, pois, formular conceito restritivo e não ampliativo. Ora, se fosse possível formular conceito amplo de desenvolvimento institucional, todas as entidades sem fins lucrativos seriam beneficiadas pela dispensa prevista no inciso em comento, porque todas têm algum propósito “institucional”.20
Ainda sobre a abrangência da expressão, Jacoby Fernandes explica que “cuidam do
desenvolvimento institucional tanto uma empresa que possui um centro de controle de
qualidade, como uma faculdade, sindicato ou associação de moradores, qualquer
‘instituição’, portanto, que de dedique a um fim”.21
A questão de que a contratada atue na área do “desenvolvimento institucional”,
embora não encontre definição nas legislações que tratam especificamente da licitação,
é assim definida pelo Decreto Federal nº 7.423/2010, que atualmente regulamente a
Lei nº 8.958/94, que trata das relações entre as instituições federais de ensino superior
e de pesquisa científica e tecnológica e as fundações de apoio:
Art. 2o Para os fins deste Decreto, entende-se por desenvolvimento institucional os programas, projetos, atividades e operações especiais, inclusive de natureza infraestrutural, material e laboratorial, que levem à melhoria mensurável das condições das IFES e demais ICTs, para o cumprimento eficiente e eficaz de sua missão, conforme descrita no Plano de
18 Idem. 19 Exemplo apresentado pelo autor: contrato de treinamento do pessoal acerca de agressões de cobras e aracnídeos e de fornecimento de vacinas com a Fundação Osvaldo Cruz. 20 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 315. 21 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 428.
48
Desenvolvimento Institucional, vedada, em qualquer caso, a contratação de objetos genéricos, desvinculados de projetos específicos.
No julgamento que originou o Acórdão nº 730/2010 – 2ª Câmara, de 02 de março
de 2010, o Tribunal de Contas da União, a respeito do alcance da expressão
“desenvolvimento institucional” prevista no dispositivo, determinou à Universidade
Federal situada em Estado do Nordeste do país: [...] exija que as contratações relativas a projetos classificados como de desenvolvimento institucional impliquem produtos que resultem em melhorias mensuráveis da eficácia e eficiência no desempenho da universidade, com impacto evidente em sistemas de avaliação institucional do Ministério da Educação e em políticas públicas plurianuais de ensino superior com metas definidas, evitando enquadrar nesse conceito atividades tais como manutenção predial ou infraestrutural, conservação, limpeza, vigilância, reparos, aquisições e serviços na área de informática, expansões vegetativas ou de atividades de secretariado, serviços gráficos e reprográficos, telefonia, tarefas técnico-administrativas de rotina, como a realização de concursos vestibulares, e que, adicionalmente, não estejam objetivamente definidas no Plano de Desenvolvimento Institucional da universidade [...]. [...] não transfira, para as fundações de apoio, recursos destinados à execução de obras ou serviços de engenharia, tendo em vista o não enquadramento desta atividade no conceito de desenvolvimento institucional, nos termos da jurisprudência firmada por este tribunal de contas.22
Pouco comentado pela doutrina pesquisada, a contratação de instituição dedicada à
recuperação social do preso mereceu as seguintes considerações de Jacoby Fernandes,
descrevendo algumas características dessa relação com o Poder Público:
[...] a aquisição funda-se num contrato com uma instituição que pode até ser, por exemplo, da Prefeitura com o Estado que mantém um presídio. A condição do agente e a finalidade a que se dedica são fatores que motivam a contratação; [...] a dispensa de licitação, agora, poderá ocorrer para qualquer das modalidades, com exceção do leilão, que é próprio para a alienação de bens da Administração e, no caso, está pretendendo adquirir bens ou serviços para a Administração.23
O requisito da impossibilidade de finalidade lucrativa por parte da instituição
contratada é de fácil explicação e compreensão, conforme já mencionado em tópico
anterior.
22 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 017.537/1996-7. Denúncia contra o Instituto Nacional de Desenvolvimento do Desporto e contra a Confederação Brasileira de Triathlon. Irregularidades em contratos celebrados com dispensa de licitação entre o referido Instituto e a Fundação Educativa de Rádio e Televisão de Ouro Preto, ligada à Universidade Federal de Ouro Preto. Irregularidades em convênio quanto à Confederação. Brasília, DF. DOU 26/12/97. Disponível em < http://contas.tcu.gov.br/pt/MostraDocumento?qn=2>. Acesso em: 17 mai 2011. 23 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 428.
49
Para atender essa exigência legal, a entidade não pode distribuir entre seus
administradores e dirigentes qualquer excedente de seus resultados, sendo até
desejável que obtenha superávit no desenvolvimento de suas atividades. Esse resultado
positivo, contudo, deverá ser reinvestido nas próprias atividades da instituição.
E se algum dirigente ocupar algum cargo da estrutura administrativa da entidade
que requeira dedicação exclusiva?
É comum que nas entidades do Terceiro Setor de grande porte exista a figura de um
Diretor Executivo, que dedique tempo integral para as tarefas de interesse da
instituição. Nessa situação, nada mais justo que receba remuneração, pois se trata de
um funcionário, como outro qualquer, ocupante da estrutura administrativa da
entidade.
O que tem que ficar bem claro é que os cargos de direção, execução e fiscalização
(Conselho de Curadores, Diretoria Executiva e Conselho Fiscal, por exemplo), não
podem, em nenhuma hipótese e sob qualquer pretexto, serem remunerados ou
receberem excedentes dos resultados positivos alcançados pela entidade em
determinado exercício.
O ideal é que o órgão público contratante não se resuma a verificar se no estatuto
da associação ou fundação exista a expressão “sem fins lucrativos”.
Principalmente quando a contratação envolver uma fundação de direito privado,
basta uma consulta ao Ministério Público do Estado, órgão responsável pelo velamento
dessas entidades, o que inclui análise da prestação de contas anual, para saber se existe
algum tipo de remuneração ou distribuição de rendas a seus dirigentes.
Essa mesma consulta poderá suprir a verificação do requisito da “inquestionável
reputação ético-profissional”, na medida em que o velamento das contas pelo órgão do
Ministério Público abrange a correlação entre as atividades desenvolvidas pelas
fundações e as previsões estatutárias.
Em casos de desaprovação das contas pela Promotoria de Justiça das Fundações, é
possível que o órgão público interessado na contratação verifique se tal decisão
decorreu de situações onde a reputação ética-profissional da entidade possa ser
colocada em dúvida (desvio de finalidade, ingerência administrativa, má-utilização de
50
recursos públicos recebidos através de convênios, descumprimento de outros contratos
anteriores também celebrados com o Poder Público, etc).
E o que vem a ser “inquestionável reputação ético profissional? Segundo Pereira
Júnior, consiste “vale dizer, em termos licitatórios, idoneidade assemelhada, mutatis
mutandis, àquela resultante da habilitação prevista no art. 27 e à notória especialização
definida no art. 25, §1º”.24
Jacoby Fernandes explica, para atendimento dessa exigência legal, ser “insuficiente
a ausência de comentários negativos ou a existência simultânea de fatores positivos e
depreciativos, com prevalência do primeiro; mas é suficiente que a instituição só seja
conhecida no âmbito restrito dos que atuam naquele segmento do mercado [...]”25. Para
o autor, também não pode haver confusão entre “os conceitos das pessoas físicas que
criaram a entidade com esta própria” e “não há que se associar ‘inquestionável
reputação ético-profissional’ com notória especialização” (tratada nos casos de
inexigibilidade de licitação).26
Segundo Guimarães, a obediência dessa exigência legal por parte da contratada
“pode ser analisada e constatada mediante a apresentação de declarações ou certidões
expedidas por pessoas jurídicas de direito público ou privado que, de alguma forma,
comprovem essa condição”.27
O Tribunal de Contas da União, no julgamento que originou a “Decisão nº
881/1997 – Plenário”, entendeu que determinada entidade não atendia no caso
concreto o requisito relacionado à inquestionável reputação ético-profissional
considerando (I) o fato de a contratada ter sido recentemente instituída e (II) a
utilização por parte dela de recursos de terceiros (Universidade Federal, no caso), para
o alcance dos seus objetivos, demonstrando falta de autonomia e incapacidade de
assumir e executar, com seus próprios meios, as obrigações contratadas.28
24 PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Op. Cit., p. 281. 25 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 428. 26 Idem. 27 GUIMARÃES, Edgar. Op. Cit., p. 39. 28 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 020.225/2007. PRESTAÇÃO DE CONTAS. UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ. EXERCÍCIO DE 2006. Brasília, DF. DOU 02/03/10. Disponível em <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/ServletTcuProxy>. Acesso em: 17 mai 2011.
51
Além dos requisitos expressamente previstos nos dispositivos, há outros, implícitos,
que têm sido objeto de recentes comentários da doutrina e de posicionamentos
jurisprudenciais: (I) o preço da contratação e (II) o nexo entre a natureza da instituição
e o objeto do contrato.
Quanto ao primeiro, Gasparini explica que “qualquer dessas contratações, ainda
que esse inciso não mencione, há de ser por preços compatíveis com os praticados no
mercado”.29
A respeito do segundo, Niebuhr assevera e exemplifica:
Em primeiro lugar, se a dispensa é para entidades dedicadas à pesquisa, ao ensino, ao desenvolvimento institucional ou à recuperação social do preso, evidentemente que o contrato a ser celebrado precisa guardar pertinência a tais finalidades. Ou seja, o contrato deve ter por objeto a pesquisa, o ensino ou algo prestante ao desenvolvimento institucional ou à recuperação social do preso. Em segundo lugar, a instituição precisa dedicar-se à área objeto do contrato, que deve se relacionar com um dos objetivos enunciados no dispositivo supracitado e revelar experiência nela. É irrazoável contratar instituição ambiental para realizar curso de marketing, ou instituição de engenharia para realizar curso de administração. A razoabilidade impõe que uma instituição dedicada à engenharia seja contratada para prestar serviços na área de engenharia. Quem é apto para prestar serviços em administração, venhamos e convenhamos, é uma instituição pertinente à Ciência da Administração; em hipótese alguma, uma instituição voltada à engenharia.30
O Tribunal de Contas da União, através do Acórdão nº 2.053/2007 – Plenário31, de
03 de outubro de 2007, reiterou julgamentos anteriores e afirmou que “a contratação
com dispensa de licitação de instituição sem fins lucrativos, com fulcro no art. 24,
inciso XIII, da Lei 8.666/93, somente é admitida nas hipóteses em que houver nexo
entre o mencionado dispositivo, a natureza da instituição e o objeto a ser contratado”.
Tal conclusão decorreu da análise dos serviços prestados pela pessoa jurídica
contratada, onde se verificou que a natureza dos trabalhos (consultoria jurídica e
projetos para fiscalização de empresas) não se amolda aos casos de dispensa de 29 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 588. 30 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 315. 31 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 011.595/1999-0. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO DE 1997. RECURSO DE REVISÃO. CONHECIMENTO. EXCLUSÃO DE ALGUNS RESPONSÁVEIS. PROVIMENTO PARCIAL. CONTAS IRREGULARES. DÉBITO. MULTA. Brasília, DF. DOU 05/10/07. Disponível em < http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/MostraDocumento?qn=4&doc=3&dpp=20&p=0>. Acesso em: 17 mai 2011. No mesmo sentido: Decisões Plenárias 657/1997; 881/1997; 612/1998; 830/1998, 346/1999; 908/1999; 30/2000; 150/2000; 1.067/2001; 1.101/2002 e Acórdãos 409/2001 e 7459/2010 (Segunda Câmara), 511/2003 (Primeira Câmara) e 551/2010 (Plenário).
52
licitação previstos no art. 24, XIII, da Lei 8.666/93, porquanto consistem em mera
prestação de serviços para os quais a licitação seria essencial.
Assim, o entendimento do Tribunal de Contas da União é no sentido de que, para
que haja a dispensa da licitação nos termos do art. 24, XIII, da Lei Federal nº 8.666/93,
torna-se necessário que o objeto contratado esteja em consonância com as atividades
de ensino, pesquisa ou desenvolvimento institucional.
A situação está pacificada ao ponto do TCU já ter editado súmula a respeito (nº
250), estabelecendo que “a contratação de instituição sem fins lucrativos, com
dispensa de licitação, com fulcro no art. 24, XIII, da Lei nº 8.666-93, somente é
admitida nas hipóteses em que houver nexo efetivo entre o mencionado dispositivo, a
natureza da instituição e o objeto contratado, além de comprovada a compatibilidade
com os preços de mercado”.
Assim, serviços de consultoria jurídica e projetos para fiscalização de empresas, por
exemplo, não se encaixam ao caso de dispensa aqui analisado, pois consistem em mera
prestação de serviços para os quais a licitação seria essencial.
Esses entendimentos jurisprudenciais do TCU se encaixam perfeitamente em caso
concreto por nós enfrentado em auditoria realizada em contratação direta de fundação
de direito privado, com fundamento no art. 24, XIII, da Lei 8.666/93, realizada por
órgão Municipal, para a execução de serviços na área da saúde.
Nessa auditoria, constatou-se que, além da ausência de experiência anterior por
parte da contratada, não havia nexo direto entre suas finalidades estatutárias e o objeto
almejado pela Municipalidade.
Na prática, a contratação serviu apenas para terceirizar atividade-fim do Município
(serviços na área da saúde), prática vedada pelo ordenamento jurídico, o que afasta,
inclusive, a realização de procedimento licitatório para a contratação.
Segundo Gasparini, atendem as condições do dispositivo em exame “as
Universidades federais (Universidade Federal do Pará) e estaduais (Universidade de
São Pulo) e os Institutos de Pesquisas (Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São
Paulo)”.32
32 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 587.
53
Aplicável às contratações no Estado do Paraná, a Lei 15.608/07 possui hipótese de
dispensa idêntica, com praticamente os mesmos requisitos, adicionado a esses a
vedação de transpasse da execução do objeto contratual a terceiros.
Com isso, a lei estadual quer dizer que a execução do objeto não pode ser
transmitida a terceiros.
Embora a lei federal não trate da questão da subcontratação de forma explícita,
coube à Advocacia-Geral da União regular parcialmente essa matéria, envolvendo os
contratos celebrados com as fundações de apoio.
Em 07 de abril de 2009, entrou em vigor a “Orientação Normativa nº 14” editada
pela AGU, estabelecendo que “os contratos firmados com as fundações de apoio com
base na dispensa de licitação prevista no inc. XIII do art. 24 da Lei nº 8.666, de 1993,
devem estar diretamente vinculados a projetos com definição clara do objeto e com
prazo determinado, sendo vedadas a subcontratação; a contratação de serviços
contínuos ou de manutenção; e a contratação de serviços destinados a atender as
necessidades permanentes da instituição”.
Em sua fundamentação, a AGU entendeu que a dispensa de licitação com base no
dispositivo em exame “só encontra amparo legal quando o objeto do ajuste tiver prazo
certo, não sendo admitida para serviços continuados, e também se mostrar diretamente
relacionado com pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional, consoante fins
estatutários ou regimentais da instituição que deve, ainda, evidenciar inquestionável
reputação ético-profissional, além da efetiva demonstração de que não tem fins
lucrativos”.33
Quanto à impossibilidade de subcontratação, Jacoby Fernandes lembra que os
requisitos legais “são verdadeiramente intuito personae, obrigando o contratado à
execução direta dos serviços, visto que está subjacente um objetivo maior, que é o de
prestigiar a finalidade da instituição por meio do trabalho desta”.34
Segundo o doutrinador “também as subcontratações devem ser precedidas de
licitação”, porque, para ele, “não pode ser subcontratado, terceirizado ou transferido
para outro a parte essencial do objeto – a “alma do objeto” – não definível por 33http://www.agu.gov.br/sistemas/site/PaginasInternas/NormasInternas/ListarAtos.aspx?TIPO_FILTRO=Orientacao 34 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 432.
54
quantidade, preço ou qualidade – ou permitir-se que o órgão público, no caso, funcione
como mero intermediário do negócio”.35
Em outra auditoria realizada, envolvendo a contratação direta de renomada
fundação do Estado de São Paulo, apuramos que essa entidade subcontratou mais de
oitenta por cento dos serviços a outra pessoa jurídica, de finalidade lucrativa. Assim,
na prática, a subcontratada prestou os serviços à Municipalidade sem ter participado de
certame licitatório.
Tema polêmico e interessante diz respeito à necessidade ou não de realizar
procedimento licitatório caso exista mais de uma instituição apta a ser contratada nos
moldes desse dispositivo.
Entendendo com base no art. 25 da Lei 8.666/93 que “a inviabilidade de
competição só é requisito para a contratação direta por inexigibilidade”, Jacoby
Fernandes entende que não há obrigatoriedade em se licitar: [...] mesmo existindo várias instituições com igualdade de condições – se forem exatamente iguais, o que é pouco provável – a escolha pode ser feita por uma pesquisa de preços, por exemplo. Mais adequado seria que a justificativa da escolha do contratado tivesse relação com a capacidade da instituição e o objeto do contrato, e não só com o preço. 36
Em sentido oposto, o Tribunal de Contas da União, no Acórdão 1.257/04 –
Plenário37, entendeu pela necessidade de comprovação, pelo gestor público, da
ausência de outras entidades em condições de prestar os serviços a serem contratados
com supedâneo no dispositivo em análise. Caso contrário, em obediência ao princípio
constitucional da isonomia, deve ser feita licitação entre as entidades existentes para
escolha da melhor proposta técnica.
35 Ibidem, p. 685. 36 Ibidem, p. 441. 37 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 009.051/2003-5. Relatório de Auditoria. Bens e serviços de informática. Contratação de mão-de-obra terceirizada para a execução de atividade-fim do órgão. Contratação irregular de instituições sem fins lucrativos, mediante dispensa de licitação, para prestação de serviços de consultoria e de informática. Audiência dos responsáveis. Razões de justificativa insuficientes para elisão da totalidade dos pontos questionados. Brasília, DF. DOU 03/09/04. Disponível em <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/ServletTcuProxy>. Acesso em: 17 mai 2011.
55
Em outro julgado com conclusão semelhante e baseada no mesmo princípio
(Acórdão nº 1.731/03 – Primeira Câmara)38, o TCU decidiu não ser aplicável as
previsões do artigo em análise a contratações em áreas onde operam exclusivamente
entidades sem fins lucrativos.
Citadini tece uma crítica ao dizer que o dispositivo em tela cria uma reserva de
mercado para algumas instituições, que deveriam participar de licitação:
Deve-se observar, por outro lado, que a dispensa de licitação aplicável só a entidades sem fins lucrativos elimina também a competição e eventual prestação de ótimos serviços por empresas que, comumente, perseguem os mesmos objetivos destas instituições (pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional), mas que, por terem finalidades lucrativas, só por isso estão impedidas de ser contratadas. A rigor, este dispositivo permite a contratação direta de instituições universitárias, levando na prática, membros de Universidades a constituírem entidades dessa espécie, ou serem por elas contratados, e que, por suas relações privilegiadas com os órgãos públicos, venham a prestar seus serviços indiretamente, e assim, sem qualquer constrangimento legal, fazer pesquisas, realizar estudos, propor programas de reorganizações administrativas ou gerenciais, etc.39
3.4 CONTRATAÇÃO DE ASSOCIAÇÃO DE PORTADORES DE DEFICIÊNCIA
FÍSICA
Pereira Júnior entende que “a contratação direta de associação que presta serviços
ou forneça mão-de-obra de portadores de deficiência físicas contribui, a toda
evidência, para a promoção da integração socioeconômica destes”.40
Isso porque, de acordo com o art. 203, IV, da Constituição Federal, “a assistência
social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à
38 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 015.284/2001-6. Auditoria. Secretaria de Estado do Trabalho e Ação Social do Espírito Santo - Setas. Verificação da regularidade da aplicação dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador - FAT. Contratação direta de serviços. Superfaturamento de preços. Realização de pagamento sem a regular liquidação da despesa. Celebração de termo de responsabilidade e aprovação do respectivo plano de trabalho sem a descrição adequada do seu objeto. Brasília, DF. DOU 13/08/03. Disponível em <http://contas.tcu.gov.br/portaltextual/MostraDocumento?qn=3&doc=2&dpp=20&p=0>. Acesso em: 17 mai 2011. 39 CITADINI, Antonio Roque. Op. Cit., p. 202. 40 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Op. Cit., p. 294.
56
seguridade social e tem por objetivos [...] a habilitação e a reabilitação das pessoas
portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária”.
Ainda de acordo com o texto constitucional, é de competência comum da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Município “cuidar da saúde e assistência
pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência”.
Jacoby Fernandes explica que o propósito do dispositivo é o “de buscar a
integração pelo trabalho”, pois, para o doutrinador, “um dos sinais significativos da
evolução de uma sociedade é a eliminação de grandes círculos de preconceitos e a
redução da parcela ociosa da sociedade, pelo engajamento ao trabalho, como meio
mais eficaz de integração social e redução da carga tributária sobre a população
economicamente ativa”. 41
Para Niebuhr, transpareceu “a intenção do legislador de integrar no mercado de
trabalho os portadores de deficiência física” e, por consequência, “o contrato deve ser
executado por portadores de deficiência física e não por terceiros”.42
Justen Filho apresenta outra motivação: incentivar a atuação de entes que tenham
objetivos estatutários relacionados à satisfação de interesse público:
[...] Os recursos públicos são aplicados de modo a produzir efeitos indiretos relevantes. O objetivo imediato reside na satisfação de uma necessidade pública, objeto da contratação. No entanto e conjuntamente, há outro intento. Trata-se de incentivar a atividade de certas entidades privadas, não integrantes da Administração Pública, mas cuja atuação relaciona-se com o bem comum. Produz-se uma espécie de “função social do contrato administrativo”, no sentido de que a contratação é instrumento de realização de outros valores sociais. 43
Preliminarmente, merece registro a crítica da doutrina quanto ao fornecimento de
mão-de-obra previsto no dispositivo. Di Pietro assim se manifesta:
É bastante estranhável a inclusão, no dispositivo, de contratos de fornecimento de mão-de-obra, pois estes, além de não estarem previstos na Lei nº 8.666/93, não encontram fundamento no nosso sistema constitucional, uma vez que toda a contratação de mão-de-obra, na Administração Direta ou Indireta, está sujeita a concurso público, nos termos do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal, ressalvada a hipótese de contratação temporária prevista no inciso IX do mesmo dispositivo.44
41 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 490. 42 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 316. 43 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários..., p. 259. 44 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanela. Op. Cit., p. 330.
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Via de regra, segundo Violin, “a mão-de-obra a ser utilizada pela Administração
deve ser contratada mediante a realização de concurso público”.45
O comentário acima teve como fundamento o art. 37, II, da Constituição Federal de
1988, que estabelece que a investidura em cargo ou emprego público depende de
aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com
a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei,
ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação
e exoneração.
Feitas essas breves observações, nessa outra hipótese de dispensa de licitação, o
próprio dispositivo já apresenta os requisitos que a fundamentam, que envolvem
características da contratada (ser associação de portadores de deficiência física, não
possuir finalidade lucrativa, prestar serviços ou fornecer mão-de-obra e ter, por órgãos
ou entidades da Administração Pública, comprovação de idoneidade) e do preço do
contrato (tem que ser compatível com o praticado no mercado).
No caso concreto, Jacoby Fernandes explica que a contratada funcionará como
intermediária da mão-de-obra dos deficientes sob duas formas:
Na primeira, como prestadora de serviço. A associação poderá ser a empregadora, regendo-se, em relação aos seus associados, pela Consolidação das Leis do Trabalho [...]. A associação pode, ainda, fornecer a mão de obra, não havendo subordinação entre o deficiente e a associação, mas com o tomador do serviço.46
Quanto a entidades que atuem em auxílio a portadores de outras deficiências, que
não somente físicas, Justen Filho esclarece, com fundamento no art. 203, IV, da
Constituição Federal47, que:
A contratação direta poderá fazer-se em prol de associação de portadores de deficiência. A Lei alude apenas à deficiência física, mas é evidente que toda e qualquer associação que congregue portadores de alguma deficiência poderá ser contratada diretamente. Portanto, podem ser contratadas diretamente entidades que congreguem portadores de Síndrome de Down, por exemplo. Não se contraponha que a natureza do instituto da dispensa de licitação impediria interpretações “extensivas” [...]. Não há qualquer discriminação cabível entre as diferentes modalidades de deficiência. Portanto, a regra que realiza a vontade constitucional
45 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 228. 46 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 492. 47 Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: [...] IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.
58
de promover a integração dos portadores de deficiência, tem necessariamente de abranger todas as hipóteses possíveis [...].48
Há, no entanto, entendimentos contrários a respeito do tema.
Gasparini observa que “são prestigiadas por esse dispositivo as associações de
portadores de deficiência física; excluem-se, portanto, os portadores de deficiências
psíquicas”.49
No mesmo rumo, Violin entende que “outra infelicidade é a fixação apenas dos
deficientes físicos, o que excluiria, numa interpretação literal, entidades que trabalham
com deficientes mentais, como por exemplo as Associações de Pais e Amigos dos
Excepcionais”.50
Outra consideração interessante diz respeito à natureza jurídica da entidade
contratada, vez que o artigo prevê expressamente que seja associação. Poderá pessoa
jurídica de outra natureza ser contratada com fundamento no dispositivo em exame?
Justen Filho entende que “não há impedimento em contratar-se fundação, por
exemplo”, pois, para o autor, parece “inquestionável que também pode fazer-se a
contratação com outras entidades que desempenham idêntica função, ainda que sob
forma jurídica diversa”.51
Em sentido oposto, Jacoby Fernandes afirma que “a forma jurídica do contratado
deverá ser associação civil congregadora dos portadores de deficiência física ou de
seus responsáveis”. Para o autor, outras entidades não estão abrangidas, possivelmente
porque nas associações “o interesse dos deficientes seria representado pelos próprios
interessados”.52
A respeito da ausência de finalidade lucrativa, já tratamos do assunto na análise dos
requisitos do tópico anterior. Reitera-se que essa vedação restringe-se à distribuição de
quaisquer valores aos dirigentes, permitindo-se o alcance de resultado positivo pela
entidade ao final de um determinado exercício financeiro.
48 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários ..., p. 260. 49 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 592. 50 VIOLIN, Tarso Cabral. Peculiaridades dos convênios administrativos firmados com as entidades do terceiro setor. In: GUIMARÃES, Edgar (Coord.). Cenários do direito administrativo: estudos em homenagem ao professor Romeu Felipe Bacellar Filho. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 498. 51 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários..., p. 260. 52 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 491.
59
Sobre o requisito da comprovada idoneidade, Jacoby Fernandes registra que “para
provar que alguém não tem comprovada idoneidade, deve-se demonstrar que há
máculas de ordem moral que afetam substancialmente o conceito que a sociedade
detém da instituição”.53
Finalmente, quando ao requisito do preço de mercado, Justen Filho explica que “a
Administração somente poderá aplicar o disposto no inc. XX quando o valor do
contrato equivaler aos montantes que seriam desembolsados caso houvesse
licitação”.54
A respeito, Jacoby Fernandes observa que “a lei não exige que o preço contratado
seja o menor, mas que seja compatível com o de mercado e, do processo de dispensa
de licitação, conste a justificativa”.55 Para esse autor, a confrontação poderá ser feita
com base em preços de outras empresas do mesmo ramo.
Vemos aqui, concretamente, a importância do atendimento da legislação de
licitações no que pertine à elaboração de orçamentos detalhados em planilhas, que
expressem a composição integral dos custos dos serviços objetos da contratação.
A respeito da necessidade ou não de licitação na eventualidade de existir mais de
uma entidade apta a executar os serviços, remeto às considerações lançadas no tópico
anterior.
Também em auditoria realizada à Promotoria de Justiça de Proteção ao Patrimônio
Público, do Ministério Público do Estado do Paraná, tivemos oportunidade de apreciar
um contrato celebrado por Município juntamente com associação de portadores de
deficiência.
Sem entrar no mérito quanto à finalidade do ato da contratação, bem como no fato
da mesma ter sido realizada em ano eleitoral, previamente ao pleito, consistiram os
serviços na execução, por portadores de deficiências físicas associados à entidade
contratada, do denominado call center, só que no sentido inverso do que vemos
tradicionalmente, pois, nesse exemplo prático, as (os) telefonistas é quem efetuavam
ligações aos cidadãos visando a discussão de temas de interesse público e voltados ao
bem-estar da coletividade, e não o contrário. 53 Ibidem, p. 492. 54 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários..., p. 259. 55 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit., p. 500.
60
3.5 ORGANIZAÇÕES SOCIAIS, QUALIFICADAS NO ÂMBITO DAS
RESPECTIVAS ESFERAS DE GOVERNO, PARA ATIVIDADES
CONTEMPLADAS NO CONTRATO DE GESTÃO
De acordo com o art. 1º da Lei Federal 9.637/98, o Poder Executivo poderá
qualificar como organizações sociais pessoas jurídicas de direito privado, sem fins
lucrativos, cujas atividades se relacionem ao ensino, à pesquisa científica, ao
desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à
saúde.
Gasparini explica o interesse do Estado em qualificar as entidades como
organização social: Sabendo da existência de associações civis e de fundações constituídas, organizadas e dirigidas por particulares segundo as regras do Direito Privado que, sem fins lucrativos, estão voltadas ao desempenho de atividades de interesse público, como são as de saúde e educação, o Estado dispôs-se a aproveitá-las visando diminuir sua atuação nesse setor em que não age com exclusividade e, com isso, melhorar a prestação desses serviços [...].56
Em livro escrito pouco depois da vigência da lei acima, Citadini assim expôs a
motivação governamental na implantação do projeto “Organizações Sociais”:
De acordo com o Ministério da Administração, o projeto Organizações Sociais faz parte de um programa nacional que tem como escopo a otimização de serviços públicos pelo Estado, no caso, os chamados “não exclusivos”. A idéia é de que algumas atividades, hoje desempenhadas pelo Estado e paralelamente por instituições de caráter privado, são passíveis de publicização, ou seja, de serem realizadas pela sociedade, de forma não lucrativa, com melhor qualidade e menor utilização de recursos, mediante parceria, através de um ente não estatal, criado na própria sociedade civil.57
O mesmo autor explica de que forma ocorrerá a parceria do Estado com a entidade
qualificada como organização social:
[...] dar-se-á mediante contrato de gestão que fomentará as atividades publicizadas, fazendo-o com utilização de recursos financeiros e bens do Estado e tendo gerenciamento feito pelas OS´s. Importa ressaltar que as OS´s gozarão de autonomia administrativa, o que implica no entendimento de terem total liberdade para a realização de compras e para a contratação de obras e serviços, bem como para a admissão e demissão de pessoal. Esse entendimento
56 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 516. 57 CITADINI, Antonio Roque. Op. Cit., p. 211.
61
desobriga as Organizações Sociais de cumprirem, as regras impostas à Administração Pública, fugindo, portanto, da lei de licitações58 e também do concurso ou processo seletivo para a contratação de pessoal.59
Para tanto, deverá a interessada comprovar que sua natureza social corresponde à
respectiva área de atuação, bem como a ausência de finalidade lucrativa, com a
obrigatoriedade de investimento de seus excedentes financeiros no desenvolvimento
das próprias atividades. Por outro lado, está proibida de distribuir bens ou de parcela
do patrimônio líquido em qualquer hipótese.
Justen Filho observa que “organização social não é uma nova espécie de sujeito de
direito” mas, sim, “ou associações civis sem fim lucrativo ou fundações que
preencham certos requisitos legais”60. No mesmo sentido posiciona-se Gasparini:
Não são, como se vê, entidades da Administração Pública direta; também não integram a Administração Pública indireta. São entidades privadas que se valem do contrato de gestão para prestar atividades públicas, com apoio das pessoas políticas que as aceitam como parceiras. São entidades de colaboração.61
O principal benefício destinado a uma entidade qualificada como organização
social consiste na possibilidade de firmar com o Poder Público o chamado “contrato de
gestão”, visando o fomento e execução de atividades relacionadas ao ensino, à
pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio
ambiente, à cultura e à saúde.
Entende-se por contrato de gestão, nos termos do art. 5º da Lei Federal nº 9.637/98,
o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como
organização social, com vistas à formação de parcerias entre as partes para fomento e
execução de atividades de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico,
proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde.
A respeito da natureza jurídica desse tipo de contrato, Justen Filho explica:
58 Recentemente, através do Acórdão 352/2011 (Tribunal Pleno), o Tribunal de Contas do Estado do Paraná decidiu que as Organizações Sociais (OS) estão dispensadas de realizar licitação na contratação de serviços, mesmo recebendo recursos de entidades públicas por meio de transferências voluntárias. No entanto, elas são obrigadas a fazer escrituração contábil destacando a fonte dos recursos, observar os princípios da Lei 15.608/07 quando fizerem aquisições e contratações e submeter-se ao controle do Tribunal de Contas do Estado do Paraná. 59 Ibidem, p. 212. 60 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso..., p. 132. 61 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 516.
62
É problemático definir, examinando a questão em tese, a natureza jurídica de um contrato de gestão. Até se poderia reconhecer figura similar ao “convênio”. É que as partes, no contrato de gestão, não têm interesses contrapostos. Não se trata de submeter parcialmente o interesse próprio a um sacrifício para obter benefícios egoísticos ou vantagens consistentes na redução do patrimônio alheio. Trata-se, muito mais, de contratos organizacionais ou associativos, pelos quais diversos sujeitos estruturam deveres e direitos em face de interesses comuns. Mas, no caso concreto, a expressão “contrato de gestão” pode comportar inúmeras figuras jurídicas, da mais diversa natureza. Caberá examinar a situação concreta para atingir uma conclusão. O regime jurídico aplicável dependerá da identificação do substrato da relação jurídica pactuada.62
Segundo o art. 24, XXIV da Lei Federal nº 8.666/93 (redação também da lei
estadual de licitações – art. 34, XXI, é dispensável a licitação para a celebração de
contratos de prestação de serviços com as organizações sociais, qualificadas no âmbito
das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de
gestão.
De acordo com Meirelles, “o Poder Público pode efetuar com essas entidades
contratos de prestação de serviços, sem licitação, para o desenvolvimento de
atividades que estejam previstas no contrato de gestão, dentro do espírito de formação
de parcerias entre o setor público e o privado, visando a realização das finalidades das
organizações sociais”.63
Para Fogiato, essa hipótese legal consiste em dispensa de licitação “em razão da
pessoa” e a mesma concretiza-se “para execução de políticas públicas”.64
A mesma autora constata a fixação de duas condições para aplicação do dispositivo
no caso concreto: “primeiro, que se trate de uma entidade qualificada como
Organização Social; e segundo, que a prestação de serviço esteja contemplada no
Contrato de Gestão”. E explica:
Não se trata de mera coincidência a Lei de Licitações referir-se conjuntamente a duas figuras jurídicas disciplinadas pelo mesmo diploma legal. O legislador assim procedeu para salientar que a dispensa restringe-se ao conteúdo do Contrato de Gestão, que por sua vez é firmado
62 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso ...., p. 134. 63 MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contratos Administrativos. 15. Ed. Malheiros: São Paulo, 2010, p. 154. 64 FOGIATO, Alessandra Deslandes. Os acordos administrativos e a Lei nº 8.666/93. In: DE OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justino (Coord.). Direito do terceiro setor: atualidade e perspectivas. Coleção comissões. Curitiba: Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Paraná, 2006, p. 45.
63
exclusivamente por Organizações Sociais tituladas conforme os ditames da Lei nº 9.637/1998.65
Para melhor compreensão sobre o contido no dispositivo, reproduzo o exemplo
apresentado por Violin: O dispositivo permite que as organizações sociais qualificadas e que tenham firmado contrato de gestão sejam contratadas diretamente pelo próprio ente qualificador. Assim, exemplificativamente, uma organização social qualificada pela União, e que tenha firmado contrato de gestão com a Administração Pública federal, pode ser contratada por dispensa de licitação pelo art. 24, inc. XXIV, apenas pela própria União. Assim como uma organização social municipal não pode ser contratada, conforme o dispositivo em tela, por algum Estado da Federação.66
O posicionamento acima é reforçado por Gasparini, ao dizer que “será ilegal a
contratação direta pela União de uma OS assim qualificada por certo Município”.67
Ainda segundo esse autor, “o preceptivo em comento exige que as atividades, cuja
execução por parte dessas organizações sociais seja do interesse da Administração
Pública, estejam, pois, contempladas no contrato de gestão”.68
Esse ponto, do objeto da contratação estar contemplado no contrato de gestão, é
melhor esclarecido por Citadini:
Tal condição implica em que a Organização Social contratada possa ter capacidade de vir a prestar um serviço para algum órgão governamental – diverso daquele com quem mantenha o contrato de gestão – mas que seja um serviço que faça parte das atividades referidas no próprio contrato. Parece só poder ser assim, pois, com o próprio órgão com o qual celebrou o contrato de gestão pressupõe-se que os serviços contidos no referido contrato não venham a ser objeto de nova contratação.69
Jacoby Fernandes entende, também, ser “imprescindível que a organização social
integre a mesma esfera de governo que a entidade contratante, em face da literalidade
inafastável do inciso em comento”.70
De forma contrária às esferas que qualifiquem e celebrem contratos, Citadini
concorda que uma Organização Social qualificada no âmbito federal, seja considerada,
por extensão, como qualificada também no âmbito estadual ou Municipal: 65 Idem. 66 VIOLIN, Tarso Cabral. Op. Cit., p. 229/250. 67 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 594. 68 Idem. 69 CITADINI, Antonio Roque. Op. Cit., p. 215. 70 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit. p, 521.
64
Quanto à esfera de Governo, é oportuno relembrar que a Lei Federal nº 9.637/98, permite a reciprocidade de tratamento às organizações sociais qualificadas como tal por Estados e Municípios, desde que estes assegurem igual tratamento às do âmbito federal.71
Guimarães aponta que “uma vez firmado o contrato de gestão, todas as posteriores
contratações com a organização social que se referirem à execução das atividades nele
arroladas, poderão ser realizadas por dispensa de licitação”.72
O autor, no entanto, adverte que “a contratação direta a que se refere esse inciso
não diz respeito à celebração de um contrato de gestão”, pois “o dispositivo pressupõe
a qualificação da entidade como organização social e, consequentemente, a pré-
existência de um contrato de gestão”.73
A primeira parte do posicionamento acima é defendida também por Jacoby
Fernandes quando diz que “o objeto não é o contrato de gestão, mas um serviço, uma
atividade, um trabalho”.74
O Tribunal de Contas da União já firmou entendimento de que a contratação direta
fundamentada no art. 24, XXIV, da Lei 8.666/93 (com redação idêntica trazida pela
Lei Estadual nº 15.608/07) submete-se à estrita e simultânea observância de dois
requisitos (Acórdão 421/04 – Plenário): [...] a pessoa jurídica contratada deve ser qualificada como Organização Social, nos termos da Lei n° 9.637/98, por ato formal da esfera de governo à qual pertence o órgão ou entidade contratante; [...] o objeto da contratação deve ser necessariamente a prestação de serviços, tomados na acepção do art. 6°, inciso II, da Lei n° 8.666/93, devendo tais serviços estarem inseridos no âmbito das atividades fins, previstas no seu estatuto e constantes do contrato de gestão firmado entre a Organização Social e o Poder Público, na forma dos arts. 5° a 7° da Lei n° 9.637/98.75
Merece registro a informação de que tramita no Supremo Tribunal Federal “Ação
Direta de Inconstitucionalidade” (ADin nº 1.923-6) na qual o “Partido dos
Trabalhadores” – PT e o “Partido Democrático Trabalhista” - PDT questionam, entre
outros pontos, a constitucionalidade da possibilidade de contratação direta das
Organizações Sociais prevista no dispositivo em exame.
71 CITADINI, Antonio Roque. Op. Cit. p, 215. 72 GUIMARÃES, Edgar. Op. Cit. p, 50. 73 Idem. 74 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Op. Cit. p, 522. 75 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 019.027/2003-3 [...]
65
Não houve concessão de medida cautelar e, no dia 31 de março deste ano, o Relator
da ação, Ministro Ayres Britto, julgou parcialmente procedente o pedido. Na mesma
sessão, houve pedido de vista por parte do Ministro Luiz Fux; na seqüência, em
19/05/2011, foi a vez do Ministro Marco Aurélio pedir vista dos autos.76
Em que pese a existência da ADIN supra citada, a legalidade do dispositivo em
exame é defendida por Niebuhr, ao comentar que “o inciso não diz respeito à dispensa
para a celebração de contrato de gestão; antes pressupõe que a entidade já o tenha
celebrado, já tenha sido qualificada como organização social, para então ser contratada
diretamente pelo Poder Público a fim de lhe prestar serviços”.77
3.6 INSTITUIÇÃO OU ORGANIZAÇÃO PRIVADA SEM FINS LUCRATIVOS,
PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E
EXTENSÃO RURAL
Essa situação de dispensa de licitação, não contemplada pela legislação do Estado
do Paraná, foi incluída no art. 24 (inciso XXX) da legislação federal pelo art. 27 da Lei
Federal 12.188/2010 (regulamentada pelo Decreto nº 7.215/2010), que instituiu a
Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural para a Agricultura Familiar
e Reforma Agrária (PNATER) e o Programa Nacional de Assistência Técnica e
Extensão Rural na Agricultura Familiar e na Reforma Agrária (PRONATER).
Entende-se como “assistência técnica e extensão rural” o serviço de educação não
formal, de caráter continuado, no meio rural, que promove processos de gestão,
produção, beneficiamento e comercialização das atividades e dos serviços
agropecuários e não agropecuários, inclusive das atividades agroextrativistas, florestais
e artesanais (art. 2º, I, da Lei Federal 12.188/2010).
O art. 3º da supra mencionada lei define como princípios da “Política Nacional de
Assistência Técnica e Extensão Rural para a Agricultura Familiar e Reforma Agrária”
76 http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1739668 77 NIEBUHR, Joel de Menezes. Op. Cit., p. 317.
66
o (I) desenvolvimento rural sustentável, compatível com a utilização adequada dos
recursos naturais e com a preservação do meio ambiente, (II) a gratuidade, qualidade e
acessibilidade aos serviços de assistência técnica e extensão rural, (III) a adoção de
metodologia participativa, com enfoque multidisciplinar, interdisciplinar e
intercultural, buscando a construção da cidadania e a democratização da gestão da
política pública, (IV) a adoção dos princípios da agricultura de base ecológica como
enfoque preferencial para o desenvolvimento de sistemas de produção sustentáveis,
(V) equidade nas relações de gênero, geração, raça e etnia, e (VI) a contribuição para a
segurança e soberania alimentar e nutricional.
Já os objetivos do PNATER, de acordo com o art. 4º da mesma lei, dentre outros,
consistem na promoção do desenvolvimento rural sustentável, apoio a iniciativas
econômicas que promovam as potencialidades e vocações regionais e locais, aumento
da produção, qualidade e produtividade das atividades e serviços agropecuários e não
agropecuários, inclusive agroextrativistas, florestais e artesanais, promoção da
melhoria da qualidade de vida dos beneficiários (assentados da reforma agrária, povos
indígenas, remanescentes de quilombos, etc), aumento da renda do público
beneficiário e agregar valor a sua produção.
São entidades executoras do chamado “PRONATER” as instituições ou
organizações públicas ou privadas, com ou sem fins lucrativos, previamente
credenciadas nos Conselhos Estaduais de Desenvolvimento Sustentável e da
Agricultura Familiar (ou órgãos similares).
Para o credenciamento, essas pessoas jurídicas devem preencher os seguintes
requisitos: (I) contemplar em seu objeto social a execução de serviços de assistência
técnica e extensão rural; (II) estar legalmente constituída há mais de 5 (cinco) anos,
exceto de for entidade pública; (III) possuir base geográfica de atuação no Estado em
que solicitar o credenciamento; (IV) contar com corpo técnico multidisciplinar,
abrangendo as áreas de especialidade exigidas para a atividade; (V) dispor de
profissionais registrados em suas respectivas entidades profissionais competentes,
quando for o caso.
Além disso, com fundamento no art. 3º do Decreto Federal nº 7.215/2010, deverão
também demonstrar que possuem (I) infraestrutura e capacidade operacional, (II)
67
conhecimento técnico e científico na área de atuação e (III) experiência na execução
de serviços na área de atuação, por mais de dois anos.
A lei em exame, como já dito, acrescentou hipótese de contratação, por dispensa de
licitação, de entidade executora dos serviços de assistência técnica e extensão rural por
intermédio de “chamada pública”, destinada a classificar propostas técnicas
apresentadas e que conterá, pelo menos, (I) o objeto a ser contratado, descrito de forma
clara, precisa e sucinta; (II) a qualificação e a quantificação do público beneficiário;
(III) a área geográfica e os valores da prestação dos serviços; (IV) o prazo de execução
dos serviços; (V) a qualificação técnica exigida dos profissionais, dentro das áreas de
especialidade em que serão prestados os serviços; (VI) a exigência de especificação
pela entidade que atender à chamada pública do número de profissionais que
executarão os serviços, com suas respectivas qualificações técnico-profissionais; (VII)
os critérios objetivos para a seleção da Entidade Executora.
Referida chamada pública terá que ter publicidade mínima de trinta dias, por meio
de divulgação na página inicial do órgão contratante na internet e no Diário Oficial da
União, bem como, quando julgado necessário, por outros meios.
3.7 FORMALIDADES LEGAIS NAS CONTRATAÇÕES DIRETAS
Não é porque a lei autoriza a contratação direta, via dispensa ou inexigibilidade,
que a Administração Pública poderá celebrá-la sem que obedeça à determinadas
exigências formais e procedimentais legais.
As contratações diretas não dispensam a abertura de processo administrativo,
devidamente autuado, protocolado e numerado, contendo a autorização respectiva, a
indicação sucinta de seu objeto e do recurso próprio para a despesa, nos termos do art.
38 da Lei Federal nº 8.666/93. A esse respeito, ensina Justen Filho: A contratação direta se submete a um procedimento administrativo, como regra. Ou seja, ausência de licitação não equivale a contratação informal, realizada com quem a Administração bem entender, sem cautelas nem documentação. Ao contrário, a contratação direta exige um procedimento prévio, em que a observância de etapas e formalidades é imprescindível. Somente em hipóteses-limite é que a Administração estaria autorizada a
68
contratar sem o cumprimento dessas formalidades. Seriam aqueles casos de emergência tão grave que a demora, embora mínima, pusesse em risco a satisfação do interesse público.78
O doutrinador entende que o procedimento formal prévio das contratações diretas
destina-se a dois objetivos principais:
Por um lado, trata-se de apurar e comprovar o preenchimento dos requisitos para contratação direta (dispensa ou inexigibilidade). Por outro, busca-se selecionar a melhor proposta possível, com observância (na medida do possível) do princípio da isonomia. Se a Administração pode escolher o particular, isso não significa autorizar escolhas meramente subjetivas. Deverá evidenciar que, nas circunstâncias, a contratação foi a melhor possível. Logo, deverão existir dados concretos acerca das condições de mercado, da capacitação do particular escolhido etc.79
Assim, num primeiro momento, deverá o órgão responsável pela contratação
instaurar processo administrativo, devidamente autuado, protocolado e numerado,
contendo a autorização respectiva, a indicação sucinta de seu objeto e do recurso
próprio para a despesa, nos termos do art. 38 da Lei Federal nº 8.666/93.
Ao respectivo processo serão juntados, nos termos do parágrafo único do art. 26 e
incisos do art. 38, ambos da lei federal de licitações, documentos relativos às razões da
escolha do fornecedor ou executante, justificativa do preço, original das propostas,
pareceres técnicos ou jurídicos emitidos sobre a dispensa, termo de contrato ou
instrumento equivalente, comprovantes de publicações e demais documentos relativos
à licitação (certidões negativas de débito, por exemplo).
A lei estadual de licitações, no art. 35, §4º, exige, especificamente nos processos de
dispensa, que o mesmo seja instruído, dentre outros elementos, com a numeração
seqüencial, autorização do ordenador de despesa, indicação do dispositivo legal
aplicável, indicação dos recursos orçamentários próprios para a despesa, razões da
escolha do contratado, consulta prévia da relação das empresas suspensas ou
impedidas de licitar ou contratar com a Administração Pública do Estado do Paraná,
justificativa do preço, inclusive com apresentação de orçamentos ou da consulta aos
preços de mercado, pareceres jurídicos e, conforme o caso, técnicos, emitidos.
78 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários ..., p. 229. 79 Ibidem, p. 230.
69
Dentre a documentação acima, destaque para o parecer jurídico, momento no qual
poderão ser apontadas possíveis ilegalidades ou ausência de atendimento de dado
requisito na contratação direta analisada pela assessoria.
A respeito, o Tribunal de Contas da União vem entendendo pela responsabilização
do parecerista jurídico nos casos em que essa manifestação não se apresente
suficientemente fundamentada, tanto na doutrina como na jurisprudência, de modo a
sustentar a respectiva conclusão.
No Acórdão 2.567/2010, a 1ª Câmara do TCU examinou concretamente um parecer
exarado a respeito da contratação direta prevista no art. 24, XIII, da Lei 8.666/93
(examinado no presente trabalho), no qual o subscritor limitou-se a informar a
legalidade da contratação “sem discorrer sobre doutrina ou jurisprudência pertinente,
tampouco aprofundar o exame acerca da subsunção da contratação direta pretendida
aos requisitos do dispositivo legal mencionado”.80
Outra formalidade, prevista no art. 7º, §2º da mesma lei, por força do §9º do mesmo
dispositivo, consiste na elaboração de projeto básico, aprovado pela autoridade
competente e disponível para exame dos interessados; existência de orçamento
detalhado em planilhas que expressem a composição dos custos unitários da
contratação; previsão de recursos orçamentários que assegurem o pagamento das
obrigações decorrentes da contratação. A esses requisitos, a lei estadual complementa
a existência de “plano de gerenciamento da execução do objeto” (art. 12, IV).
A respeito da última exigência acima, Meirelles explica que “qualquer despesa da
Administração deve ter recursos financeiros para seu atendimento, ou seja, dotação
80 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Processo nº 009.680/2001-3. PRESTAÇÃO DE CONTAS DA FUNDAÇÃO CULTURAL PALMARES, REFERENTE AO EXERCÍCIO DE 2000. INSPEÇÃO. AUDIÊNCIAS E CITAÇÕES. FALHAS RELACIONADAS À CONTRATAÇÃO DE BENS E SERVIÇOS, BEM COMO À CELEBRAÇÃO E EXECUÇÃO DE CONVÊNIO. CONTRATAÇÃO DIRETA, SEM PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS DO ART. 23, INCISO XIII, DA LEI N. 8.666/1993. AUSÊNCIA DE PROJETO BÁSICO E ORÇAMENTO DETALHADO. CONTABILIZAÇÃO DE BENS SEM A RESPECTIVA EXISTÊNCIA FÍSICA. PARECER JURÍDICO INSUFICIENTE PARA SUSTENTAR A LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO. APROVAÇÃO INDEVIDA DE PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CONVÊNIO, CUJO OBJETO FORA EXCUTADO PARCIALMENTE. INFRAÇÃO ÀS NORMAS DE NATUREZA CONTÁBIL, PATRIMONIAL E ORÇAMENTÁRIA. ATO ANTIECONÔMICO. Brasília, DF. DOU 21/05/10. Disponível em: http://contas.tcu.gov.br/pt/MostraDocumento?qn=4. Acesso em: 24/05/2011.
70
orçamentária ou crédito adicional (especial, suplementar ou extraordinário) aprovado
regularmente”.81
Conforme determina o art. 26 da lei federal de licitações, todas as situações de
dispensas originárias de contratação de entidades do Terceiro Setor, conforme
discorrido no presente trabalho, deverão ser comunicadas, dentro de três dias, à
autoridade superior, para ratificação e publicação na imprensa oficial, no prazo de
cinco dias, como condição para a eficácia dos atos. Essa obrigatoriedade consta
também da lei estadual (art. 35, §2º).
Na parte concernente à habilitação, nas modalidades tradicionais de licitação, tanto
a lei federal como a estadual exigem dos interessados, via de regra e exclusivamente,
documentação relativa à habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação
econômico-financeira e regularidade fiscal.
Nas dispensas de licitação, não é porque a contratação se efetivará diretamente que
o responsável deixará de exigir da contratada determinados documentos de
regularidade.
O Tribunal de Contas da União, através do Acórdão 260/02, decidiu que, nas
licitações públicas, mesmo no caso de dispensa ou inexigibilidade, é obrigatória a
comprovação por parte da empresa contratada de “Certidão Negativa de Débito (INSS
- art. 47, inciso I, alínea a, da Lei nº 8.212, de 1991); Certidão Negativa de Débitos de
Tributos e Contribuições Federais (SRF-IN nº 80, de 1997) e Certificado de
Regularidade do FGTS - CEF (art. 27 da Lei nº 8.036, de 1990)”.82
Com efeito, o art. 47, I, “a” da Lei 8.212/91, estabelece ser exigida CND da
empresa quando contratar com o Poder Público. O art. 195, §3º da Constituição
Federal dispõe que a pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social não
poderá contratar com o Poder Publico.
Da mesma forma, o art. 27 da Lei Federal 8.036/90 define como obrigatória a
apresentação do Certificado de Regularidade do FGTS, fornecido pela Caixa
Econômica Federal, para habilitação e licitação promovida por órgão da
Administração Federal, Estadual e Municipal. 81 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal ..., p. 400. 82 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos: orientações básicas. 3. ed, rev. atual. e ampl. Brasília: TCU, Secretaria de Controle Interno, 2006, p. 236.
71
A propósito, está pacificado no Tribunal de Contas da União o entendimento de que
a “regularidade com a seguridade social é condição obrigatória para a habilitação em
licitação, para a dispensa e a inexigibilidade, cumprindo à Administração exigir e
fiscalizar a manutenção dessa regularidade durante toda a vigência do contrato”.
Nessas situações, a Lei Estadual nº 15.608/07 exige prova de regularidade para com
as fazendas Federal, Estadual e Municipal do domicílio ou sede da empresa, bem
como de regularidade para com a Fazenda do Estado do Paraná, bem como prova de
regularidade relativa à Seguridade Social (INSS), mediante a apresentação da Certidão
Negativa de Débitos/CND e ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS),
mediante a apresentação do Certificado de Regularidade de Situação (art. 35, §4º).
Vale observar, por força do art. 55, XIII da Lei Federal nº 8.666/93, que determina
a inserção de cláusula obrigatória no contrato administrativo da obrigação do
contratado em manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com
as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação
exigidas na licitação, que a cada pagamento referente aos serviços executados deverá
ser exigida da contratada a comprovação das regularidades acima indicadas.
Nas dispensas cujos preços estejam compreendidos nos limites das modalidades
“tomada de preços” (R$ 650.000,00) e “concorrência” (acima de R$ 650.000,00), por
força do art. 62 da Lei Federal nº 8.666/93, o instrumento de contrato é obrigatório,
ressaltando que ele deve mencionar os nomes das partes e os de seus representantes, a
finalidade, o ato que autorizou a sua lavratura, o número do processo da dispensa, a
sujeição dos contratantes às normas legais e às cláusulas contratuais.
A lei estadual de licitações, a seu turno, estabelece que a formalização do contrato
será feita por meio de (I) instrumento de contrato ou (II) carta-contrato, nota de
empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.
O primeiro será obrigatório nos casos precedidos de contratação direta em que
exista obrigação futura do contratado, não garantida por cláusula de assistência técnica
ou certificado de garantia do fabricante; o objeto seja manutenção de equipamentos,
bens ou instalações da Administração Pública; o objeto seja bens e serviços de
informática não comuns; o objeto seja concessão ou permissão de uso de bens; tenha
72
vigência superior a 12 (doze) meses; exista cláusula de reversão de doação ou de bens;
ou em qualquer caso, quando exigida garantia. Os segundos, nos demais casos.
E a publicação do contrato administrativo, exigida pelo art. 61, parágrafo único da
Lei 8.666/93, é também obrigatória nos casos de dispensa de licitação? Justen Filho
entende que não, justamente pela redação do art. 26 da Lei 8.666/93, citado
anteriormente:
Mas a exigência não se aplica nos casos previstos no art. 26 da Lei n. 8.666/93, que subordina as contratações diretas por inexigibilidade ou por dispensa (excluídas as situações indicadas no próprio art. 26) a uma publicação prévia na imprensa. Logo, não teria sentido realizar suas publicações (uma no ato que autoriza a contratação direta e outra do extrato do contrato). Basta uma única.83
De acordo com Gasparini “o atendimento de tais exigências é indispensável para a
eficácia dos atos”, isto é, segundo o doutrinador, “somente será possível a contratação
depois de observado esse procedimento, que termina com a publicação na imprensa
oficial do ato de ratificação da dispensa de licitação, acompanhado de sua
justificativa”.84
É importante registrar, também, que a própria lei federal de licitações, em seu art.
89, tipifica como crime, punido com detenção de três a cinco anos, o ato de dispensar
licitação fora das hipóteses previstas em lei ou de deixar de observar as formalidades
pertinentes, incorrendo na mesma pena aquele que, tendo comprovadamente
concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ilegal para
celebrar contrato com o Poder Público.
83 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários ..., p. 358. 84 GASPARINI, Diógenes. Op. Cit., p. 573.
CONCLUSÃO
Historicamente, no âmbito federal, apenas uma das situações de contratação direta
envolvendo entidades do Terceiro Setor (instituição de ensino, pesquisa ou
desenvolvimento institucional) nasceu juntamente com a Lei Federal 8.666/93.
As demais foram inseridas pelo legislador ao final da década de 90, período que
coincide com o crescimento das associações e fundações sem fins lucrativos, tanto em
número como em participação nos temas de interesses sociais.
As principais intenções do legislador ao prever essas hipóteses de contratação direta
podem ser resumidas na: (I) promoção, incentivo, manutenção e valorização do
trabalho nas áreas das finalidades das entidades, relacionadas com os núcleos dos
dispositivos; (II) reabilitação e integração profissional, social e econômica dos
destinatários das finalidades das associações e fundações; (III) aproveitamento do
trabalho das entidades que tenham como funções atividades de interesse público e
consequente redução da atuação do Poder Público.
Em relação ao Estado do Paraná, tais hipóteses de dispensa de licitação surgiram no
ano de 2007, através da lei nº 15.608.
Dentre as quatro hipóteses de contratação direta via dispensa de licitação
examinadas, duas possuem previsão idêntica tanto na legislação federal como na
estadual de licitações (associação de portadores de deficiência e organizações sociais);
uma delas (instituição de pesquisa, ensino ou desenvolvimento institucional) também
possui praticamente os mesmos requisitos nas Leis 8.666/93 (Federal) e 15.608/07
(Estadual), trazendo essa última uma exigência a mais (vedação de subcontratação); a
outra situação consta apenas da legislação federal (serviços de assistência técnica e
extensão rural).
Todas as possibilidades legais apresentam um requisito comum, embora em uma
delas conste de forma implícita (organizações sociais): a exigência de ausência de
finalidade lucrativa da entidade cuja contratação se pretende realizar.
É considerada sem fins lucrativos a fundação ou associação que não distribui, sob
qualquer forma, parcelas de seu patrimônio ou resultado aos membros que a integram.
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É até desejável que obtenham superávit no desenvolvimento de suas finalidades
estatutárias, o qual deverá ser reinvestido em suas próprias atividades.
A contratação de entidade que atue nas áreas da pesquisa, do ensino ou do
desenvolvimento institucional, ou, ainda, na recuperação social do preso, requer que a
contratada seja pessoa jurídica sem fim lucrativo, detenha inquestionáveis reputações
éticas e profissionais, que a contratação ocorra a preços de mercado e, principalmente,
que exista nexo entre a natureza da instituição e o objeto do contrato.
Tema polêmico do dispositivo diz respeito à possibilidade ou não do Poder Público
Entendo que a inclusão das empresas estrangeiras no elenco estaria criando nova
possibilidade de dispensa cujo rol legal é taxativo.
Além disso, o art. 3º, §2º da Lei Federal nº 8.666/93 aplica-se apenas aos casos de
licitação, considerando-se o local de inclusão desse dispositivo no corpo da lei. Deve
ser considerado, ainda, o fato da hipótese de contratação direta exigir expressamente
que a instituição seja brasileira.
A respeito da subcontratação dos serviços contratados com base nessa hipótese de
dispensa de licitação, há vedação expressa na Lei Estadual de Licitações e orientação
normativa no mesmo sentido pela Advocacia-Geral da União no âmbito federal.
A respeito das associações de portadores de deficiência física, se for considerada a
intenção do legislador em promover, habilitar e proteger as pessoas portadoras de
deficiência, de uma maneira geral, deve a hipótese de contratação direta estender-se à
entidades que amparem portadores de deficiências outras que não apenas física.
Da mesma forma, uma fundação que tenha em seus objetivos estatutários garantir
os direitos dos portadores de deficiência também poderá ser contratada, pois o que
muda, aqui, é apenas a natureza jurídica da entidade, permanecendo intacta a
finalidade de amparar, promover e auxiliar essas pessoas.
Aqui, ao contrário da situação anterior quanto à instituição estrangeira (incumbida
do ensino, da pesquisa, do desenvolvimento institucional e da recuperação social do
preso), não há inclusão de nova hipótese de dispensa, pois existe diferença apenas na
75
natureza jurídica das entidades envolvidas, ambas criadas nos termos da legislação
nacional.
Outros requisitos legais exigidos para essa hipótese de dispensa de licitação
relacionam-se também com a comprovação de idoneidade por parte da contratada,
compatibilidade do preço com o praticado no mercado e que o objeto do contrato
corresponda à prestação de serviços ou fornecimento de mão-de-obra.
Na parte afeta ao preço, as duas leis de licitações examinadas estabelecem que em
qualquer caso de dispensa de licitação, se comprovado superfaturamento, respondem
solidariamente pelo dano causado à Fazenda Pública o prestador de serviços e o agente
público responsável.
Grande parte da doutrina critica essa última parte, pois entende, com base na
Constituição Federal, a existência de afronta ao ingresso através de concurso público.
Tal situação, no entanto, pode ser considerada uma das formas de imposição do
conceito realista de igualdade, ou seja, de tratamento desigual aos desiguais, até
porque a intenção legislativa foi a de facilitar a inserção dessas pessoas ao mercado de
trabalho (registra-se a existência de leis determinando que a iniciativa privada também
contrate pessoas portadoras de deficiência).
A respeito da dispensa prevista no art. 24, XXIV da Lei Federal nº 8.666/93 e no
art. 34, XXI da Lei Estadual nº 15.608/07, primeiramente deverá a associação ou
fundação ser qualificada como Organização Social (situação que não desnatura as
respectivas naturezas jurídicas), nos termos da Lei Federal nº 9.637/98, pelo próprio
ente da federação que futuramente a contratará com fulcro nesses dispositivos legais.
Uma vez qualificada como organização social, a entidade estará apta a firmar
contrato de gestão com o Poder Público qualificador, visando a formação de parceria
para fomento e execução de atividades nas áreas de ensino, pesquisa científica,
desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e
saúde.
Somente num terceiro momento, portanto, é que ocorre a aplicação do dispositivo
da contratação direta, isto é, após ser qualificada como Organização Social e firmar o
contrato de gestão, poderá a associação ou fundação ser, via dispensa de licitação,
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contratada pelo Poder Público para prestar os serviços integrantes do instrumento retro
mencionado e com objetos nas áreas também nele previstas.
A última hipótese de contratação direta via dispensa de licitação possui previsão
apenas na Lei Federal nº 8.666/93.
Segundo o art. 24, XXX, da lei federal de licitações, é dispensável a licitação na
contratação de instituição ou organização, pública ou privada, com ou sem fins
lucrativos, para a prestação de serviços de assistência técnica e extensão rural no
âmbito do Programa Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural na Agricultura
Familiar e na Reforma Agrária.
Essa situação foi incluída recentemente pela Lei Federal nº 12.188/2010, que
passou a vigorar em fevereiro de 2010; contudo, considerando a redação de seu artigo
29, que determinou observância ao art. 167, I, da Constituição Federal, que veda o
início de programas ou projetos não incluídos na lei orçamentária anual, tais
contratações somente seriam possíveis a partir de janeiro de 2011, o que justifica a
carência de material doutrinário e jurisprudencial a respeito.
Vale observar que o dispositivo autoriza que, além dos entes sem fins lucrativos,
também entidades privadas com fins lucrativos sejam contratadas para prestar os
respectivos serviços. Segundo a legislação, ambas deverão ser previamente
credenciadas nos Conselhos de Desenvolvimento Sustentável e da Agricultura
Familiar dos respectivos Estados.
Mesmo não havendo obrigatoriedade na realização de certame licitatório, a não ser
nos casos onde exista mais de uma entidade legitimada para tanto, a contratação direta
de entidade sem fins lucrativos não desobriga o Administrador Público de cumprir as
formalidades procedimentais legais para tanto, como, por exemplo, a abertura do
procedimento administrativo, a juntada de certidões negativas de débito, a elaboração
de pareceres jurídicos, a inserção de cláusulas obrigatórias nos contratos
administrativos, podendo, inclusive, o gestor público responder criminalmente se
deixar de observar as formalidades pertinentes na dispensa de licitação ou realiza-la
fora das hipóteses legais.
A necessidade de que o rol taxativo da legislação seja atendido pelo administrador
público, bem como os requisitos exigidos em cada um dos dispositivos, ganham
77
especial importância na medida em que, de acordo com a Secretaria de Prevenção da
Corrupção e Informações Estratégicas, unidade de Controladoria-Geral da União,
contratações diretas indevidas das entidades sem fins lucrativos configuram uma das
principais fraudes em licitações e contratos administrativos.1
1 SPINELLI, Mário Vinícius Claussen. Fraudes em licitações e em contratos administrativos. Palestra proferida na Fundação Escola do Ministério Público do Estado do Paraná – Fempar. Curitiba, 2009.
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