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p Raque Serve a Literatur A

Jun 04, 2018

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Vanessa Paiva
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    FICHA TCNICA:

    2013. Instituto Ecofuturo

    2 Edio.

    Concepo e Realizao: Instituto Ecofuturo

    Projeto Grfico: Carol S Jamault, Ganz Design

    Ilustraes gentilmente cedidas por Aline Abreu e autorizao da Pingo Letra.

    Produo Grfica: Laika Design

    ISBN: 978-85-60833-07-8

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    EQUIPE INSTITUTO ECOFUTURO:

    Daniel Feffer, Presidente

    Marcela de Macedo Porto Mello, Superintendente

    Christine Castilho Fontelles, Diretora de Educao e CulturaPaulo Groke, Diretor de Meio Ambiente

    Alessandra Avanzo Figueroa, Coordenadora de Comunicao

    Edmar Moraes Barros Junior, Coordenador Financeiro

    Guilherme Rocha Dias, Coordenador do Projeto Parque das Neblinas

    Rachel Barbosa Carneiro de Sousa, Coordenadora de Desenvolvimento

    Institucional

    Iran Oliveira Reis, Contador

    Crisangela Ayazian Martins, Analista de Desenvolvimento Institucional

    Daniele Juaaba, Analista do Programa Ler Preciso

    Julia de Lima Krahenbuhl, Analista de Projetos

    Marina Franciulli Santos, Analista de Comunicao

    Maurcio de Alcntara Marinho, Analista de Projetos

    Michele Cristina Martins, Analista de Projetos

    Palmira Petrocelli Nascimento, Analista do Programa Ler Preciso

    Regiane Basso, Analista ContbilRenato Guimares de Oliveira, Analista Administrativo Financeiro

    Vanessa de Jesus Espindola, Analista do Projeto Ler Preciso

    Alexandre Oliveira da Silva, Assistente de Manuteno

    Luciani Oliveira Santos, Assistente Administrativo

    Thais Moreno Soares, Assistente do Projeto Ler Preciso

    Clia Marcia Ribeiro de Arajo, Auxiliar Administrativo

    Marcos Jos Rodrigues do Prado, Auxiliar de Manuteno e Manejo

    FlorestalDavid de Almeida Santos, Guarda-Parque

    Marcelo Lemes de Siqueira, Guarda-Parque

    Marcelo Rogrio de Santana, Guarda-Parque

    Maurcio Rodrigues Prado, Guarda-Parque

    Ricardo Silva de Souza, Guarda-Parque

    Mariana Limeira, Estagiria do Programa Ler Preciso

    Mayra Iafelix Ferreira, Estagiria do Programa Ler Preciso

    CONSELHO DIRETOR:

    Daniel Feffer

    David Feffer

    Jorge Feffer

    Antonio dos Santos Maciel Neto

    Jacques Marcovitch

    Murilo Csar Lemos dos Santos PassosClaudio Thomaz Lobo Sonder

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    ndice

    Literatura desde o beroMaria Betnia Ferreira

    Traduzindo o MundoPaulo Bloise

    Leitura e liberdadeYves de La Taille

    Para alm do certo de ler:duas histrias de criana e leituraLuiz Percival Leme Britto

    Nem infncia sem livro nem dia sem ramo de flor

    Nilma Lacerda

    Arejando palavras: linguagem,literatura e leituraLucila Pastorello

    A formao de leitores pela falae pelas pginas impressasBetty Mindlin

    Festa da PalavraAna Maria Machado

    Experimente e nos conte depoisElizabeth DAngelo Serra

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    Pra que serve a leitura de literatura?

    D para imaginar que, por maiores e mais avanados que sejam os recursos contempo-rneos de transmisso da informao, uma educao de qualidade pode se dar ao luxode dispensar a leitura de literatura, ou de ter dvidas sobre a sua importncia, ou de ficardiscutindo em crculo sobre as diversas firulas que podem (ou no) caracterizar mtodosde se chegar l? Ou entendemos que no h educao sem leitura e nos alarmamoscom a situao brasileira, ou estamos perdidos (Balaio, de Ana Maria Machado,Editora Nova Fronteira, p.168)

    J faz alguns anos que propomos e implementamos iniciativas para reforar e facilitar aleitura por toda parte, a leitura compartilhada, o acesso leitura, a leitura em voz alta,a leitura com prazer, a leitura como direito, a escrita para virar leitura. Desta vez, nossofoco literatura desde o bero, e temos bons motivos para ter feito essa escolha.

    Da convidamos 9 educadores e pesquisadores para escrever o que descobriram e desen-volveram a partir de sua rea de estudo e atuao, e tambm em sua vida pessoal com

    relao a esta pergunta: Por que importante ler literatura desde a primeira infncia?.Boa Leitura!

    Christine Castilho FontellesDiretora de Educao e Cultura

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    Literatura desde o bero

    Um belo dia, ao preparar o banho do meu neto Tom, ento com dois anos e meio,recm-promovido ao posto de irmo mais velho com o nascimento da irm, me caia ficha do efeito da literatura desde o bero (que eu sempre sentira, mas nunca es-miuara). O pime olha muito srio e proferea seguinte frase, com todos os efes eerres: De agora em diante, certas coisas vo mudar em minha vida: haver o banhodo beb com a mame, claro, e depois o meu banho com... com a vov!. Algumtempo depois, o moleque desce a escada no momento em que acendo a luz da cozinha,

    e declara, com a nfase de um criador: E fez-se a luz.

    Voc adivinhou: frases de livros lidos em voz alta pelos adultos. No repetio purae simples, no: quando uma criana usa uma frase de livro num momento em que elacabe direitinho e faz alteraes para encaix-la em uma experincia real, est mos-trando que descobriu a magia de beber com os ouvidos e, mais tarde, com os olhos(ou com as mos) a memria da aventura humana contida no pote da literatura. Mais:descobriu que essa memria lhe pertence. Pertence-lhe, de pleno direito, a luz das

    palavras que se abrem em 130 milhes de livros j publicados.

    Nesses livros, h palavras e palavras. Umas apontam, explicam, informam, esclare-cem, orientam, classificam, enfileiram, convencem, formam. So palavras didticasque se destinam a conduzir o leitor a um ponto estabelecido pelo autor. Outras so

    Maria Betnia Ferreira

    Educadora, tradutora, leitora e

    escrevedora contumaz de textos e

    situaes. Para ela, Pingo Letra.

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    abre-te-ssamo: escapam do papel e danam, espalham poeira de estrelas, pirlim-pimpins, e l se vai o leitor, momentaneamente alforriadodo trem cotidiano. Essaspalavras danadas de boas so as palavras da literatura.

    o estado da arte da palavra escrita: os escritores entalham realidades com palavras,em infinitas dimenses, para entender-se com seus leitores. Clarice Lispector expli-cou: s vezes quero apenas tocar. Depois o que toco s vezes floresce e os outros po-dem pegar com as duas mos. (...) Eu escrevo sem esperana de que o que eu escrevoaltere qualquer coisa. No altera em nada... Porque no fundo a gente no est queren-do alterar as coisas. A gente est querendo desabrochar de um modo ou de outro....

    Tudo pode comear com uma voz querida que chega orelha no com instrues nem

    com explicaes, mas com cigarras que dialogam com formigas, bolsas amarelas queguardam coisas estranhas, meninos maluquinhos, meninas de nariz arrebitado que secasam com peixes, casas sem muros com segredos amarelos, coisas de arrepiar, panosvermelhos e bales que do a volta ao mundo. At que aprenda a ler por si mesma, pela voz de algum que l em voz alta que a criana vai usufruir do tesouro que lhecabe por direito.

    Cada pgina literria vai preenchendo dentro do pequeno leitor/ouvinte uma arca de

    ideias, paisagens, ardis, singelezas, bondades, encantamentos, sustos, indignaes,ternuras os ingredientes da aventura humana na Terra.

    Cada pgina literria um tributo inteligncia, sensibilidade e capacidade queas pessoas tm de entender a si e aos outros e de compartilhar. Quem l/escuta um

    Pi:Menino, no Rio Grande do

    Sul; pi a palavra da lngua

    Tupi para corao, estmago,

    entranhas . Tambm designandio jovem.

    Profere: Proferir dizer em voz

    e clara.

    Pertencer: No sentido de ser

    parte de, dizer respeito, ser

    devido ou merecido

    Abre-te ssamo: Palavras mgicas

    com que se abria a caverna do

    Ali Bab, no livro As mil e uma

    noites, certo mesmo seria em

    portugus Abre-te gergelim

    Pirlimpimpins:P Mgico. A

    palavra vem do francs pour le

    pinpin, que significa para algum

    muito crdulo.

    Alforriado:Liberto, livre.

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    texto tambm l/escuta a si mesmo, porque tem a oportunidade de descobrir-se ereconhecer-se nessa experincia que fusiona afeto, emoo, imaginao, memria,criatividade, lgica, razo e crtica.

    Quer argumentos educativos? L vo eles: pesquisas de Krashen (1993) e Cunnin-gham-Stanovich (1991) comprovaram uma relao significativa entre a quantidadede leitura livre fora da escola e o aumento do vocabulrio, a compreenso ao ler, afluncia verbal e o raciocnio crtico. Quem l independentemente se torna melhorleitor, tem notas melhores nas diversas matrias e retm mais contedos do que quemno tem o hbito de ler.

    Cada pgina literria pega o leitor pela mo e o leva a passear, sem nada impor, pelo

    campo florido das questes fundamentais da humanidade at mesmo dos erros, acoisa mais verdadeiramente humana dos humanos. A literatura enriquece pontos devista; instiga a ouvir, a levar em conta e a dar valor voz do outro; desperta a vontadede ultrapassar o prprio mundinho e alimentar-se de outras luzes. Um belo dia,quem sabe emerja uma percepo da vida menos burocrtica, mais amorosa...

    A voz da me ou do pai na cabeceira dos filhos capaz de fundar um exrcito de leitores.

    Esteban Quiroz Cisneros, educador peruano.

    Estado da arte:O nvel mais alto

    de desenvolvimento.

    Menos burocrtica, mais amorosa:

    Palavras de Christine Fontelles

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    Traduzindo o Mundo

    H poucos dias ocorreu-me um episdio que serve para expressar como a literaturainfantil consegue tocar a criana e auxili-la em seu processo de desenvolvimento.

    Passvamos de carro por uma zona triste da cidade. Usurios de drogas largados no cho,jovens equilibrando-se com dificuldade nas caladas. amos devagar, conversando. Mi-nha mulher dirigia distrada e contava um caso. Gabriel, meu filho de seis anos, quieto nobanco de trs. O farol fechou, figuras cinza como o entorno vieram em nossa direo. Nohavia carros nossa frente. Movido por uma sensao de vulnerabilidade que avanava

    pelas janelas, pedi para ela fechar o vidro. O tom saiu mais cortante do que devia. Ela con-tinuava despreocupada, fiquei tenso com sua displicncia e manifestei minha irritao.

    Gabriel protestou:

    Para, pai!

    Tentei justificar-me, mas ele foi preciso:

    Lembra do general falando do inferno? Voc agora est como ele!

    Que histria essa?, minha mulher perguntou.

    Enquanto minha animosidade baixava, resumi o conto infantil japons que eu e meufilho havamos lido juntos h uma semana.

    Paulo Bloise psiquiatra com resi-

    dncia e mestrado na Unifesp, onde

    fundou e coordenou o Ambulatrio

    de Crise Psiquitrica at 2007 e o

    Anthropos: Ncleo de Integrao

    Mente, Corpo e Espiritualidade.

    Analista membro da Sociedade

    Brasileira de Psicologia Analtica.

    Escritor autor de: O Tao e a

    Psicologia (Angra); De Olho na Rua

    (Dimenso); Sobre Humanos (Moder-

    na) e Surfando na Marquise (Cosac

    Naify) livro finalista do Prmio Jabuti

    de 2009. Organizador e coautor do

    livro Sade Integral: a Medicina do

    Corpo, da Mente e o Papel da Espiri-

    tualidade (Editora Senac, no prelo).

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    Leitura e liberdade

    No final do sculo XIX, vivia na Rssia um menino pobre chamado Alexey. Seu en-torno familiar e social era povoado de pessoas incultas, pragmticas e violentas. Osnicos interesses delas eram bens materiais, religio e sexo, e elas castigavam seve-ramente quem quisesse fugir desse estreito quadro de valores. Ora, o menino Alexeyera justamente uma das pessoas que sufocavam nesse meio. Escreveu ele mais tarde:Hoje ainda, quando evoco o passado, tenho dificuldade de crer que tudo foi realmen-te assim; h tanta coisa que eu gostaria de discutir e negar, pois a vida obscura de uma

    raa estpida demasiadamente frtil em crueldade.

    Se Alexey pde escrever e publicar um dia o trecho que acabo de transcrever foiporque, nesse mundo cruel e inculto, ele havia achado um refgio. Havia ele achadoalgum que o compreendesse a apoiasse? No. Seu refgio era a leitura! Seu refgioeram os livros e as brochuras que, quando o deixavam em paz, ele avidamente liaescondido. O que lia? Qualquer texto que lhe casse nas mos, qualquer livro queconseguisse emprestado.

    A leitura no foi somente um refgio para escapar da raa estpida qual ele se re-fere. A leitura foi tambm sua alforria em relao a esse mundo no qual livros eramvistos como inteis e at suspeitos. Foi por intermdio deles que Alexey descobriuque o mundo muito mais vasto que as estreitas fronteiras dentro das quais vivia.

    Yves de La Taille professor

    titular do Instituto de Psicologia da

    Universidade de So Paulo na ca-

    deira de Psicologia do Desenvol-

    vimento e Psicologia Moral. Entre

    vrias publicaes, destacam-se

    Moral e tica: Dimenses Inte-

    lectuais e Afetivas (Porto Alegre,

    Artmed, 2006) Prmio Jabuti

    2007 de Educao, Psicologia

    e Psicanlise e Formao tica:

    do Tdio ao Respeito de Si (Porto

    Alegre, Artmed, 2009).

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    Graas a eles, observou que as ideias criadas pelos homens vo muito mais alm daparca ideologia de seus pares. Com os livros, Alexey encontrou amigos, seja na fi-gura dos autores, seja na figura das personagens por eles criadas, amigos esses que

    dilataram sobremaneira o seu universo. E, um dia, um pouco mais velho, ele resolvesair de casa e andar por esse mundo anteriormente descoberto pela leitura. E se tor-naria ele mesmo escritor com o nome de Maxim Gorki.

    Com a leitura pode-se ir a pocas nas quais no sepode mais viver. Com a leitura pode-se ir a lugaresdistantes e inatingveis. Com a leitura entra-se

    em contato com pessoas que nuncasero conhecidas pessoalmente.E isso desde a mais tenra infncia.

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    Para alm do certo de ler:duas histrias de criana e leitura

    A HISTRIA DE LEON E ANA

    Ana uma me apaixonada por histrias e por seu filho, Leon. E vive com ele experi-ncias maravilhosas de ser e de ler. Uma recente foi com o stio de Lobato. Os dois pe-garam as Reinaes e comearam. Leon, fascinado, no encontrou pacincia de esperara noite para que ela lesse mais um pedacinho. Tratou de ler sozinho e logo passou afalar dos personagens o tempo todo, a contar a histria para as meninas que cuidam

    dele e para os amigos, e para a me, e para o pai. Todos os dias diz suas aventuraslobatianas. Apaixonado pelo stio, espera com ansiedade a chegada dos outros livrosde Pedrinho e sua turma, j encomendados. Outro dia, Leon lia durante o almoo.Ao ser repreendido por isso, explicou-se, inteiro e honesto: Mas que meu olho noresiste letra!.

    A HISTRIA DE ALICE E VAL

    Alice sempre sorri quando convidada para ler. Desde muito pequena, l todas asnoites com o pai. Uma vez, com oito anos, ouviu dele a explicao sobre ler com osolhos e ler com os ouvidos (quando outra pessoa enuncia em voz alta o texto paraa gente que ainda no sabe as letras). Noutro dia, o pai, ocupado com uma visita,disse-lhe que fosse para a cama e que, se quisesse, lesse um pouco antes. Tinham co-

    Luiz Percival Leme Britto

    linguista e educador, atuando

    principalmente no campo de

    educao e linguagem.

    Seus trabalhos enfatizam a necessi-dade de uma educao escolar que

    transcenda os limites do cotidiano e

    o senso comum; destacam tambm

    o valor da leitura literria como pro-

    cesso de conhecimento e de inda-

    gao da condio humana, o que

    faz com que no se possa perceb-

    la como simples entretenimento ou

    instrumento de prazer. Atualmente,

    professor da Universidade Federal

    do Oeste do Par.

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    meado na noite anterior De olho nas penas, uma histria da Ana Maria Machado,com que ela tinha se envolvido mais que normalmente. Ela vai, pega o livro, fical um tempo e, depois, volta e diz: Val, eu estou to cansada, me empresta seus

    olhos pra eu ler!Essas duas pequenas crnicas pem em evidncia uma das muitas possibilidades daleitura que vo alm de qualquer dimenso pragmtica ou objetiva. H nos gestosde Leon e de Alice a manifestao da leitura como mediadora das subjetividades ecriadora de espao de intimidade, de afeto, de interao. As crianas vivem, alm dashistrias dos textos, a incorporao do pai e da me em sua forma de ser. Ler, para elas,alm de descobertas, uma forma de fazer em sua vida a vida daqueles com quem seidentificam e querem.

    O desejo de Leon o desejo da me (cuja atitude leitora fazer das letras algo irresis-tvel para olhos da criana); o desejo de Alice o desejo do pai (que lhe empresta osolhos, que tambm no resistem s letras). Por isso, mais maravilhoso que o mundode Monteiro Lobato e o de Ana Maria Machado o mundo que, atravessado por essemaravilhoso, vivem Leon e Alice.

    A literatura grandiosa por ser isto: um lugar de transcendncia do imediato e do

    utilitrio, um lugar que permite que algum se esquea do que devia fazer e faa coisaserradas (como ler no almoo, o que pode prejudicar a viso e a digesto, ou no que-rer dormir e incomodar o pai ocupado com visitas) para indagar para alm do certo.

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    Nem infncia sem livronem dia sem ramo de flor

    Minha me me penteava. Cabelos ondulados. Devia doer. Meus cinco anos fulmi-naram com um tapa o pente na mo dela. Vermelha frente aos sogros, a autoridadeameaada, ela fez outro tapa esquentar a mo rebelde. Quando se avizinhava a tem-pestade, eu abrindo o berreiro, minha av correndo para proteger a neta, meu avinterveio: Deixa, a me est certa. de pequenino que se torce o pepino.

    Que frase mais repetida na crnica familiar. Eu sou um pepino? devo ter perguntado.

    Se no era, virei. E fui torcida desde pequena: cabelos penteados, mo comporta-da, corpo esguio, bem estaqueado para a planta produzir frutos mais bonitos, deaparncia homognea. To bem estaqueada fui, que me esparramei, alcancei outrosterrenos, no parei de frutificar, multiplico-me em cascas lisas ou ouriadas, de umverde feliz; por dentro, sementes e gua, sou de vidro e alimento, como disse ummenino a sua me.

    Tinha algum tempo que eu desconfiava, mas s recentemente encontrei a informao:pepino precisa de abelha por perto para crescer. Conhece a histria de que coco s dgua se estiver perto do mar? Pois pepino precisa de abelha para fazer a polinizaocruzada, uma vez que suas flores so s femininas ou s masculinas. Tem agricultorque paga dono de apirio para botar suas abelhas a fabricar a crosta delicada da vida.

    Nilma Lacerda autora, entre

    outras obras, de Manual de Tape-

    aria Prmio Rio de Literatura;

    Viver Feito Mo/Viver Risco

    em Vermelho; As Fatias do Mundo

    Prmio Jabuti e Prmio OrgenesLessa, da Fundao Nacional do

    Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), seo

    brasileira do International Board

    on Books for Young People (IBBY);

    Estrela de Rabo e Outras Histrias

    Doidas; Pena de Ganso; Brbara

    debaixo da Chuva; Sortes de Villa-

    mor e Cartas do So Francisco:

    Conversas com Rilke Beira do

    Rio, obra terica vencedora do

    Prmio Ceclia Meireles, da FNLIJ.

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    A mo que me torceu garantiu tambm as abelhas. Como a saber que me dava destinode buscar gua por via do sal, minha me reconheceu a menina beira do eu, a pontode dar salto para o mundo. Pensou no objeto mais precioso de todos para acompanhar

    essa travessia mais corajosa de todas. E, acreditando que inaugurava o mundo, no-meou: livro. Abenoou a palavra, considerou, em algum lugar, um parentesco entreele e as abelhas. Por causa de cera e mel, talvez.

    A lembrana dos primeiros livros em minha vida d-se a pelos sete anos, mas mem-ria coisa que tanto trai. O fato que no me lembro de tempo sem livro, na minhainfncia. Nem depois.

    Livro acompanhava cada inquietao, cada alegria, me oferecia personagens e casas,

    infinitos modos de viver e de perguntar o tempo de ontem e o de amanh. Para poderescrever bem as horas de hoje.

    Pepino bem torcido que fui, cresci frtil e recitei versos, engendrei narrativas paradesembaraar os cabelos de minhas filhas. Regozijada pela lio de av e me, de-cidi cultiv-las desde cedo, cuidando das estacas, adubando a terra, corrigindo aacidez do solo. As filhas ainda no ventre, trouxe as abelhas para dentro de casa. Efabricamos jardins.

    No nos lembramos, as quatro, de tempo sem livros ou de dias sem ramo de flor.

    Tradutora, ensasta, doutora em

    Letras Vernculas com ps-douto-

    rado em Histria Cultural e autora

    de inumerveis artigos cientficos, professora da Universidade

    Federal Fluminense. Desenvolve o

    projeto Dirio de Navegao da

    Palavra Escrita na Amrica Latina,

    premiado com a bolsa Virtuose,

    do Ministrio da Cultura.

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    Arejando palavras: linguagem,literatura e leitura

    A linguagem humaniza. Pela linguagem podemos acessar a cultura, interagir com osoutros, comunicar, educar e criar. Mas essa ferramenta poderosa tambm delicada.A linguagem no transparente, no exata: ela se renova conforme a usamos, pro-vocando sentidos diferentes. Apropriar-se da linguagem implica consider-la em suadelicadeza, percebendo usos e combinaes entre as palavras.

    Palavras podem ser usadas de muitas maneiras. Os

    fsforos s podem ser usados uma vez.Arnaldo Antunes

    Na linguagem cotidiana valorizamos a comunicao, mas no estamos livres de mal-enten-didos. Para ser bom entendedor, preciso estar atento: conhecer a instabilidade da palavra.

    Nutrimos os bebs com palavras, apresentando-lhes o mundo. Logo de sada um aler-ta: mama pode ser mame ou mamar; pap pode ser comida ou papai. E ento?Cantamos com as crianas, apresentamos adivinhas, parlendas, brincadeiras com aspalavras. Oferecemos nossa bagagem da tradio oral: o alerta no confunda vemde boca em boca, de pai para filho, durante os tempos. Essa prtica torna as crianasespertas, desconfiando sempre um pouco das palavras.

    Lucila Pastorello fonoaudiloga

    (Faculdade de Medicina da Uni-versidade de So Paulo), mestre

    em Semitica e Lingustica Geral

    (Faculdade de Filosofia, Letras e

    Cincias Humanas da Universi-

    dade de So Paulo ) e doutora

    em Educao (Faculdade de Edu-

    cao da Universidade de So

    Paulo). Atua como fonoaudiloga

    clnica e assessora de linguagem

    e leitura em escolas, editoras e

    organizaes de incentivo.

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    Os escritores verdadeiros devem ser, como meu pai talvez pensasse, seres mgicosnos quais mora uma espcie de fogo sagrado, porque fazem brotar o que no havia,mais real do que o que se considera que h. Mas os prazeres da leitura e da com-

    preenso, a viagem que conhecer, so tambm uma forma de escrever, aberta atodos, descortinando o que as lnguas podem proporcionar para quem souber trat-las com habilidade. Vale a pena comear desde o primeiro choro, quando as mesacalentam as crianas e lhes cantam baladas.

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    Festa da Palavra

    Histrias que me contaram, histrias que me encantaram, livros que me formaramTudo isso se mistura quando analiso de onde vim. Mas a memria conservou tudinho,nos menores detalhes. Lembro-me das histrias sem livros que minha av me contava,um tesouro de narrativas orais, do rico patrimnio de nossa literatura popular. Mastambm guardo intactas as lembranas dos livros que meus pais liam para mim.

    Bom, a bem da verdade, eu me lembro dos livros, das histrias e da voz deles a ler e

    mostrar as figuras. Mas com certeza a memria no guardou essas cenas da experinciainaugural, vivida quando eu era beb, e sim da cena repetida mais tarde, com meusirmos, pois sou a mais velha de uma ninhada de nove. Sempre vi meus pais contandohistrias para ns, at que comecei a ajud-los, compartilhando esse momento comos caulas. Depois segui o exemplo, dividindo livros, narrativas e figuras com meusfilhos, com meus sobrinhos, com meus netos. Desde muito cedo.

    Me lembro de meu neto Henrique antes de fazer um ano, no meu colo, na hora de ir

    para o bero, escolhendo pela lombada o livro que queria aquele dia e que ele conhe-cia, distinguindo entre os que tinha em sua estante.

    Me lembro de meu filho Pedro aos quatro ou cinco anos, a me pedir: Me, hojeestou meio triste. No quero histria, quero poesia. Ou de Rodrigo aos trs, ouvindo

    Ana Maria Machado

    Considerada uma das mais

    completas e versteis autoras

    brasileiras, a carioca Ana Maria

    Machado membro da Academia

    Brasileira de Letras. Pelo conjunto

    de sua obra como romancista,

    ensasta e autora de livros infanto-

    juvenis, ganhou o mais impor-

    tante prmio literrio nacional: o

    Machado de Assis.

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    Experimente e nos conte depois

    A criana, desde que nasce, ainda beb, demonstra sua alegria e satisfao quando oadulto lhe dedica ateno e afeto.

    Um simples toque das mos, um rpido olhar, a voz de algum se aproximando so,sempre, motivos para perninhas e braos se movimentarem em uma ao, ainda des-coordenada, da vontade de o beb se comunicar com o mundo ao qual acaba de chegare quer muito se integrar e conhecer.

    Quanto mais frequente for a proximidade do adulto com o beb, proporcionando-lhecarinho e amor, mais aumentaro as chances para a sua segurana emocional e a dis-ponibilidade positiva de se relacionar com o mundo.

    As descobertas, relativamente recentes, sobre essa fase da vida humana falam de suaenorme capacidade de recepo sobre experincias afetivas, sensoriais e motoras, nosensinando que, alm de alimentar, vestir e cuidar da sade e da segurana dessespequeninos, indefesos e curiosos seres, eles querem muito mais de ns, adultos, nos

    alertando para o fato de que o tempo que pudermos dedicar a eles ser pouco diantedo que precisam, merecem e tm direito.

    Nesse contexto, a troca de afetos com os pequerruchos ganhou um novo mediador,que, finalmente, vem chamando a ateno dos educadores brasileiros: os livros!

    Elizabeth DAngelo Serranasceu

    no Rio de Janeiro, tem 64 anos e

    formada em Pedagogia. Desde

    1987 trabalha na FundaoNacional do Livro Infantil e

    Juvenil FNLIJ, seo brasileira do

    International Board on Books for

    Young People/IBBY. Atualmente,

    coordena as atividades da insti-

    tuio em mbito nacional e inter-

    nacional. Do Programa Nacional

    de Incentivo Leitura/PROLER, foi

    coordenadora executiva de 1996

    a 2002 e, em 2006, membro de

    seu Conselho Consultivo.

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    Partilhar a leitura de livros de qualidade, com imagens grandes, que podem ser fotosou ilustraes de pessoas, bichos, objetos e coisas que fazem parte do entorno di-rio, em cores ou preto & branco, diverso na certa para o beb e tambm para oadulto, que, valorizando o momento e deixando-se levar pelas manifestaes do beb,recebe em troca a beleza da vida desabrochando e vibrando ao seu lado. Observar asreaes diante da nossa voz narrando uma histria (que diferente da fala coloquial),as mozinhas batendo nas pginas que vo sendo viradas e o girar da cabecinha nosentregando um olhar que nos diz Como bom estar aqui com voc pura alegriae prazer!

    E, para quem acredita na importncia dos livros para a vida e na necessidade de, des-de cedo, desenvolver a cultura escrita por meio deles, partilhar a leitura com bebssignifica criar momentos inesquecveis no relacionamento humano, cujas marcas nosdeixam mais esperanosos e confiantes na espcie humana.

    Por isso tudo e muito mais que voc vai descobrir , recomendamos a leitura com bebs.

    Experimente e nos conte depois!

    Desde 2009 presidente do

    Conselho Deliberativo do mesmo

    programa. Recebeu, em 2000,

    a Ordem do Mrito Cultural, do

    Ministrio da Cultura por servios

    relevantes prestados ao pas na

    rea de promoo da leitura

    e,em 2002, a Ordem Nacional

    do Mrito Educativo, do Minist-

    rio da Educao.

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    Um dos elementos que justificaram a criao do Instituto Ecofuturo, em 1999, est sedi-mentado na marca de um de seus mais ambiciosos programas: LER PRECISO.

    A leitura e o estmulo leitura passaram a ser, ento, uma de nossas principais frentesde ao, porque vemos nessa atividade um enorme poder transformador. Muitos pes-quisadores da educao afirmam que o hbito da leitura melhora as capacidades deraciocnio e de criatividade, imprescindveis no mundo em que vivemos e para o futuro,que chega cada vez mais rpido.

    Os pais tm papel fundamental na construo desse hbito, pois contar e ler histriasj a partir dos primeiros meses de vida de uma criana contribui decisivamente parao desenvolvimento da linguagem falada e para a aprendizagem da escrita, alm deestimular a curiosidade.

    Este o objetivo do Pra que serve a literatura?: demonstrar que a oferta de leitura lite-rria promove aproximao entre pais e filhos, educadores e educandos, entre a criana

    e o cidado planetrio que se tornar conectado, sensvel e hbil para atuar em favorde um mundo cuidadoso com todas as vidas.

    Daniel FefferPresidente

    Ler preciso

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    A crena de que esse o caminho

    Um caminho para difundir a leitura est sendo construdo pelo Instituto Ecofuturo. Seus objetivosso movidos pela persistncia e pela fora de uma boa ideia e por certo sero alcanados.

    Por partilhar da certeza de que a retomada da cultura de valorizao da leitura e daescrita constitui a pedra fundamental no alicerce da educao, com satisfao queassociamos o nome do Banco Safra aos projetos do Ecofuturo. Esperamos que nossaparticipao contribua para motivar o engajamento de pais, educadores, governos,empresrios enfim, de toda a sociedade. Nossa certeza a de que a construo do

    Brasil do futuro passa, necessariamente, pela aprendizagem e difuso do conhecimentopor meio da leitura, aliada disseminao de prticas sustentveis.

    Banco Safra

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    Pra que serve a biblioteca?

    Falamos de literatura. E aqui abrimos uma brechinha para falar de biblioteca, que a casados livros, mas tambm a casa do leitor, como bem nos anunciou a Casa del Lector, inau-gurada este ano em Madri, Espanha, onde possvel fazer emprstimos de acervo digital.

    Porque a biblioteca o lugar de emprstimos gratuitos de livros e atendimento hu-mano especializado para construir nossa trajetria como leitores, lanamos na pri-mavera de 2012 a campanha Eu Quero Minha Biblioteca, uma ao nacional de co-operao para contribuir para a efetividade da Lei 12.244/10. A lei determina que

    todas as instituies de ensino do Brasil, pblicas e privadas, tenham biblioteca at2020. A campanha uma iniciativa do Instituto Ecofuturo em cooperao com or-ganizaes no governamentais comprometidas com educao, leitura, biblioteca eliteratura: Academia Brasileira de Letras, Conselho Federal de Biblioteconomia,Fundao Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ), Instituto Ayrton Senna,

    Instituto C&A, Instituto de Co-Responsabilidade pela Educao (ICE), Movimen-

    to por um Brasil Literrio, Rede Marista de Solidariedade e Todos pela Educao.

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    Tambm conta com o apoio em divulgao da Associao Brasileira de Emissorasde Rdio e Televiso(ABERT), com a distribuio de entrevistas sobre a campanhapara 2.800 rdios e Associao Nacional de Jornais (ANJ), com envio peridico deinformaes para 49 jornais do programa Jornal e Educao.

    Informar a existncia da lei e como acessar recursos federais existentes para a educa-o que podem ser utilizados para a criao e manuteno de bibliotecas em escolaspblicas o eixo central da campanha. Est tudo disponvel para acesso gratuito no

    site http://www.euquerominhabiblioteca.org.br.

    Voc pode e deve fazer parte dessa rede nacional pela efetividade desse direito! Acesseo site da campanha e nos acompanhe em mdias sociais.

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    www.ecofuturo.org.br

    InstitutoEcofuturo

    @eco_futuro

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    EXECUO REALIZAOPATROCNIO

    PARCEIROS INSTITUCIONAIS