MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Núcleo de Combate à Corrupção – Força-Tarefa Lava Jato EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 7ª VARA FEDERAL CRIMINAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO Processo a ser distribuído por dependência aos autos nº 0204688-56.2017.4.02.5101 Demais referências: Autos nº 0504148-32.2017.4.02.5101 – Cautelar de afastamento do sigilo telefônico 0506980-72.2016.4.02.5101 - Cautelar de afastamento do sigilo telefônico 0504146-62.2017.4.02.5101 – Cautelar de afastamento do sigilo bancário e fiscal 0504147-47.2017.4.02.5101 – Cautelar de afastamento do sigilo telemático 0205067-94.2017.4.02.5101 – Cautelar de busca e apreensão 0205222-97.2017.4.02.5101 – Cautelar de sequestro e indisponibilidade 0204688-56.2017.4.02.5101 – Cautelar de prisão 0509567-67.2016.4.02.5101 – Cautelar de busca e apreensão - Calicute 0509565-97.2016.4.02.5101 - Cautelar de prisões – Calicute 0509503-57.2016.4.02.5101 – Ação penal – Calicute 0017513-21.2014.4.02.5101 – Ação penal – Crossover 0509154-20.2017.4.02.5101 – Cautelar de busca e apreensão (Sadala) O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelos Procuradores da República que ao final subscrevem 1 , no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, em especial a disposta no art. 129, I, da Constituição Federal, vem oferecer DENÚNCIA em desfavor de: 1) SÉRGIO DE OLIVEIRA CABRAL SANTOS FILHO (SÉRGIO CABRAL), CPF nº XXXXXXXXX, CI nº XXXXXXXXX (IFP/RJ), brasileiro, divorciado, jornalista, nascido no Rio de Janeiro, aos 27 de janeiro de 1963, filho de Sérgio Cabral Santos e Magaly de Oliveira Cabral Santos, com endereço na Rua XXXXXXXXX, atualmente custodiado na Cadeia Pública José Frederico Marques, em Benfica/RJ, em cumprimento de prisão preventiva; 1 Designados para atuar em auxílio ao Procurador natural neste feito e conexos pela Portaria PGR/MPF nº 1305 e n.º 1307, de 7 de dezembro de 2017. 1/60
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - poder360.com.br · 0504146-62.2017.4.02.5101 – Cautelar de afastamento do sigilo bancário e fiscal ... de outubro de 1959, ... Pelo menos entre janeiro
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MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALPROCURADORIA DA REPÚBLICA NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
Núcleo de Combate à Corrupção – Força-Tarefa Lava Jato
EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA 7ª VARA FEDERAL CRIMINAL DA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO DE JANEIRO
Processo a ser distribuído por dependência aos autos nº 0204688-56.2017.4.02.5101
Demais referências: Autos nº
0504148-32.2017.4.02.5101 – Cautelar de afastamento do sigilo telefônico
0506980-72.2016.4.02.5101 - Cautelar de afastamento do sigilo telefônico
0504146-62.2017.4.02.5101 – Cautelar de afastamento do sigilo bancário e fiscal
0504147-47.2017.4.02.5101 – Cautelar de afastamento do sigilo telemático
0205067-94.2017.4.02.5101 – Cautelar de busca e apreensão
0205222-97.2017.4.02.5101 – Cautelar de sequestro e indisponibilidade
0204688-56.2017.4.02.5101 – Cautelar de prisão
0509567-67.2016.4.02.5101 – Cautelar de busca e apreensão - Calicute
0509565-97.2016.4.02.5101 - Cautelar de prisões – Calicute
3. Anotações encontradas após medida de busca e apreensão
na residência de LUIZ CARLOS BEZERRA (DOCs n.º 03 e 04);
4. Relatório de Pesquisa nº 2936/2017 (DOC n.º 5);
5. Termo de declaração prestada por CARLOS MIRANDA (DOC
n.º 6);
6.Registros de ligações telefônicas entre REGIS FICHTNER,
HUDSON BRAGA, LUIZ CARLOS BEZERRA e SÉRGIO DE
CASTRO OLIVEIRA (DOC n.º 7);
7. Cautelar de afastamento do sigilo telemático de autos n.º
0504147-47.2017.4.02.5101;
8. Cautelar de afastamento do sigilo telefônico de autos n.º
0504148-32.2017.4.02.5101;
9. Cautelar de afastamento do sigilo bancário e fiscal de autos
n.º 0504146-62.2017.4.02.5101;
10. Informações extraídas do celular de RÉGIS FICHTNER
(cautelar de busca e apreensão de autos nº 0205067-
94.2017.4.02.5101);
11. Informações extraídas do celular de LUIZ CARLOS
BEZERRA (cautelar de busca e apreensão de autos nº 0509567-
67.2016.4.02.5101);
12. Cautelar de afastamento do sigilo telemático de autos n.º
0506602-19.2016.4.02.5101 (Calicute).
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3.1.1. Depoimento Prestado em sede de Interrogatório de Luiz Carlos Bezerra
LUIZ CARLOS BEZERRA, no interrogatório judicial prestado em
5 de maio de 2017, no bojo da ação penal de autos nº 0509503-57.2016.4.02.5101,
admitiu que as anotações feitas nas suas agendas apreendidas (cautelar de autos nº
0509567-67.2016.4.02.5101) registravam a contabilidade paralela da propina da
organização criminosa chefiada por SÉRGIO CABRAL.
Complementando este depoimento, em 11 de maio de 2017,
BEZERRA confirmou, perante o MPF, que os codinomes “ALEMÃO”, “GAÚCHO”,
“REGIS” dizem respeito a RÉGIS FICHTNER, ex-chefe da Casa Civil do Governo
Cabral, e que já entregou recursos em espécie a ele (DOC nº 01):
[…] Que o apelido utilizado para designar o ex-chefe da CasaCivil do Governo Cabral, REGIS FICHTNER, era “ALEMÃO”,“REGIS” ou “GAUCHO”; Que já entregou recursos em espéciepor cerca de quatro ou cinco vezes a REGIS FICHTNER; Que asentregas se deram entre meados de 2013 até abril de 2014, salvoengano; Que tais informações podem ser confirmadas pelasanotações já citadas; Que as entregas se deram dentro doPalácio Guanabara e também dentro do escritório de advocaciade REGIS FICHTNER, localizado no prédio do Jockey Clube, noCentro do Rio de Janeiro; Que acredita que o escritório ficavalocalizado no 3º andar; Que recebia as ordens de pagamento deCARLOS MIRANDA, bem como se comunicava com FICHTNERpor meio de telefone; Que os valores entregues eram de R$100.000,00 (cem mil reais); [...]
Por conseguinte, LUIZ CARLOS BEZERRA afirmou que sua
função na organização criminosa era recolher dinheiro em espécie e levar a locais
determinados por outros membros da organização, afirmando que REGIS FICHTNER, de
fato, recebia pagamentos mensais da organização criminosa chefiada por SÉRGIO
CABRAL.
3.1.2. Material Apreendido em Busca e Apreensão com o Operador Financeiro LUIZ
CARLOS BEZERRA
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Ao longo das várias denúncias decorrentes da Operação
Calicute3, foi demonstrado que CARLOS BEZERRA era o operador financeiro da
organização criminosa e responsável por buscar e levar valores em espécie referentes às
propinas recebidas e distribuídas4:
Em razão do cumprimento do mandado de busca e apreensão na
residência de CARLOS BEZERRA (cautelar de autos nº 0509567-67.2016.4.02.5101), foi
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Outro importante fato foi revelado por CARLOS MIRANDA, a
respeito do envolvimento de RÉGIS FICHTNER, ao lado de SÉRGIO CABRAL, com
outro braço da organização criminosa: a FETRANSPOR.
Segundo CARLOS MIRANDA:
[…] QUE sobre a FETRANSPOR, tem a dizer que desde que
SÉRGIO CABRAL assumiu a presidência da ALERJ, em 1995, a
FETRANSPOR pagava propina a CABRAL; QUE CABRAL ficava
com parte dos recursos e distribuía o restante entre os deputados
estaduais; QUE o colaborador participou dos ajustes entre
CABRAL e FETRANSPOR até 2002, quando CABRAL se
desligou da presidência da ALERJ, e assumiu o mandato de
senador da República, QUE em 2007, quando CABRAL assumiu
o governo do Estado do Rio de Janeiro, os pagamentos voltaram
a ser realizados; QUE CABRAL e WILSON CARLOS informaram
ao colaborador que tinham feito um ajuste com JOSÉ CARLOS
LAVOURAS de que o pagamento de propina seria no valor de R$
5.000.000,00 anuais para SÉRGIO CABRAL, dividido em onze
parcelas mensais de 420.000,00 e uma de R$ 380.000,00; QUE,
apesar desse ajuste, LAVOURAS acabou realizando doze
pagamentos de R$ 420.000,00; QUE tal ajuste perdurou de
janeiro de 2007 até março de 2014; QUE todo ano também havia
pagamento de prêmios pela FETRANSPOR a SÉRGIO CABRAL
em razão de negociações relacionadas a IPVA, reajuste de
tarifas, gratuidades etc; QUE no final de 2007 houve a primeira
dessas negociações relacionadas aos citados prêmios, tendo o
primeiro pagamento ocorrido ao longo de 2008; QUE somado ao
valor mensal de R$ 420.000,00, eram acrescidos os valores dos
prêmios, isto é, caso o prêmio ajustado fosse de R$
12.000.000,00, os pagamentos mensais seriam de R$
1.420.000,00; QUE o valor desses prêmios variou entre quinze e
vinte milhões de reais anuais, durante o período de 2008 a 2013,
sendo que em 2014 houve um ajuste de um prêmio bastante
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superior, que alcança a cifra de R$ 90.000.000,00; QUE o
valor desse prêmio se justifica em razão da negociação feita
em 2013/2014 para a prorrogação da concessão de linhas de
transporte público; QUE esse valor ainda não foi
integralmente pago; QUE o colaborador não participava da
negociação desses ajustes, mas apenas da coleta e
recebimento dos valores ilícitos; QUE em razão das
negociações com a FETRANSPOR, CABRAL também
repassava prêmios a membros da organização criminosa;
QUE em razão desse prêmio de noventa milhões, RÉGIS
FICHTNER foi agraciado com R$ 5.000.000,00; QUE em razão
da deflagração da Operação Lava Jato, em 2014, RÉGIS
FICHTNER abdicou do recebimento desse prêmio de cinco
milhões; […]
Com efeito, os atos de corrupção praticados pela organização
criminosa chefiada por SÉRGIO CABRAL em relação ao recebimento de vantagens
indevidas da FETRANSPOR foram demonstrados e denunciados no bojo das ações
penais de autos n.º 0505914-23.2017.4.02.5101 e n.º 0505915-08.2017.4.02.5101.
A denúncia da ação penal de autos n.º 0505914-
23.2017.4.02.5101 narra que:
No ano de 2014 o total pago de propina à ORCRIM de SÉRGIO
CABRAL foi de R$ 27.260.000,00, mas esse ano revelou outra
situação atípica, tendo em vista dois aportes de R$ 6.500.000,00
cada nos dias 14/01 (“referente a 26/12”) e 16/02 (“referente a
janeiro”), os quais indiciam um bônus vultoso de 13 milhões de
reais por ato de ofício no interesse das empresas, como de fato
ocorreu em janeiro de 2014, com a desoneração do ICMS e
desconto de 50% do IPVA para os ônibus, como será detalhado
em tópico próprio:
[…]
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Na sequência, em trocas de e-mails no início de janeiro de 2014,
os empresários JACOB BARATA FILHO, JOSÉ CARLOS
LAVOURAS e MARCELO TRAÇA, comemoram, junto com LELIS
TEIXEIRA a isenção do ICMS sobre o serviço de transporte
urbano ou metropolitano de passageiros promovida pela
Resolução da Secretaria de Fazenda – SEFAZ nº 706, de 27-12-
20136, publicada no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro,
em 03/01/2014:
6 Resolução SEFAZ Nº 706 DE 27/12/2013 - Publicado no DOE em 3 jan 2014 (Concede isenção do ICMS na prestaçãode serviços de transporte de passageiros com características de transporte urbano ou metropolitano, com fundamento noConvênio ICMS 37/89.) O Secretário de Estado de Fazenda, no uso de suas atribuições legais, tendo em vista o dispostono Convênio ICMS 133/2013, de 11 de outubro de 2013, que estendeu ao Estado do Rio de Janeiro as disposições doConvênio ICMS 37/1989, de 24 de abril de 1989, e o que consta no Processo nº E-04/058/40/2013,
Resolve :Art. 1 º Fica concedida isenção do ICMS na prestação dos serviços de transporte de passageiros com característicasde transporte urbano ou metropolitano.Art. 2 º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.Rio de Janeiro, 27 de dezembro de 2013RENATO VILLELASecretário de Estado de Fazenda
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A referida isenção tributária foi sacramentada pelo Decreto nº
44.550, de 02 de janeiro de 2014, expedido pelo Governador
SÉRGIO CABRAL:
Não bastasse, para completar o atendimento integral aos pleitos
dos empresários manifestados por LELIS TEIXEIRA em
novembro de 2013 e recusados pela Secretaria Estadual de
Fazenda, tendo em vista a necessidade de cumprimento das
metas fiscais junto à União, o então Governador SÉRGIO
CABRAL concedeu, por meio do decreto 44.568, de 17 de janeiro
de 2014, desconto de 50% no IPVA para as empresas de ônibus
do Estado do Rio de Janeiro, apenas um dia após o recebimento
do ofício com a solicitação encaminhado pelo Presidente
Executivo da FETRANSPOR, LÉLIS TEIXEIRA. O Decreto foi
assinado no dia 17/01/2014, sexta-feira, e publicado no dia
21/01/2014, terça-feira, tendo por base o processo administrativo
E-12/001/56/2017, que possui apenas 15 páginas e está anexado
na íntegra a esta denúncia. […]
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Tal ato, necessariamente, passou pela Casa Civil, sob comando
de RÉGIS FICHTNER, o qual fazia uso de seu conhecimento jurídico e suas relações
para viabilizar as necessidades das empresas de transporte público no Estado do Rio de
Janeiro.
Outro ato de ofício que atendeu aos interesses do grupo
criminoso no braço do transporte público, diz respeito ao desconto do IPVA incidente
sobre ônibus e micro-ônibus destinados à prestação de serviço de transporte público de
passageiros. Trata-se do Decreto 44.568/2014:
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Conforme consta do Processo n.º E-10/001/56/2014 (DOC n.º 8),
o pleito da FETRANSPOR por “isenção de IPVA”, datado de 16/01/2014, foi
encaminhado à CASA CIVIL – chefiada por RÉGIS FICHTNER – na mesma data, tendo
sido editado o decreto para conceder desconto de 50% sobre o valor do IPVA pago pelas
concessionárias e permissionárias de transporte público no dia 17/01/2014:
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Essa tramitação em tempo recorde bem como o conteúdo do
Decreto Estadual n.º 44.568/14, e em especial a rápida e “certeira” atuação de RÉGIS
FICHTNER junto à Casa Civil em prol dos interesses de empresários do setor de
transporte público, que pagavam vantagens indevidas a SÉRGIO CABRAL e outros
integrantes da organização criminosa, demonstra a benevolência do Governo CABRAL
para com esse setor.
Portanto, nem mesmo os grandes protestos populares de 2013 no
Rio de Janeiro foram capazes de conter a ganância do grupo criminoso. Em troca da
manutenção do status quo das empresas de transporte público que dominavam (e
continuam a dominar) a prestação desse serviço no Estado do Rio de Janeiro, foi
ajustado um prêmio milionário – diga-se, R$ 90.000.000,00 – destinado aos agentes
públicos.
Conforme narrado por CARLOS MIRANDA, a RÉGIS FICHTNER
coube a parcela de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), pelos “arranjos jurídicos”
que de praxe costuma fazer quando na chefia da Casa Civil para viabilizar os interesses
nada republicanos do “chefe” SÉRGIO CABRAL e demais integrantes da organização
criminosa.
Em razão do avanço das investigações da Operação Lava Jato,
RÉGIS FICHTNER optou por não assumir mais esse risco e abdicou da parcela que lhe
era devida.
Todos esses fatos estão a demonstrar que SÉRGIO CABRAL
autorizava, orientava e determinava a entrega de valores indevidos a RÉGIS FICHTNER,
como contraprestação aos serviços prestados à organização criminosa, dentro da área
que lhe incumbia – a Casa Civil.
Por tal razão, SÉRGIO CABRAL responde em coautoria pelos
atos de corrupção passiva praticados por RÉGIS FICHTNER, nos termos do art. 317, §
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1º c/c 327, § 2º, e art. 29, todos do Código Penal, na forma do artigo 71, do mesmo
diploma legal (20 crimes em continuidade).
3.1.4. A PROPINA E SUA POTENCIAL INFLUÊNCIA NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO
PÚBLICA: CONFIGURAÇÃO DOS CRIMES DE CORRUPÇÃO
A despeito da narrativa acusatória que os repasses de propina à
organização criminosa tinham como contraprestação a prática de atos de ofício do
Estado do Rio de Janeiro por meio de articulação de RÉGIS FICHTNER, direcionados a
favorecer empresas e outros agentes políticos, é certo que os crimes de corrupção são
de natureza formal e, portanto, a eventual prática, pelo funcionário público, do ato de
ofício viciado – assim como o retardamento ou omissão igualmente viciadas – não é
elementar típica dos crimes em tela, mas apenas de suas causas de aumento de pena (§
1º do art. 317 e parágrafo único do art. 333 do Código Penal).
Com efeito, a tipificação penal dos crimes de corrupção tutela a
Administração Pública, em especial nos aspectos de moralidade e probidade, ao
proscrever as condutas que visem sujeitar o exercício de uma função pública a
interesses privados. As condutas criminalizadas são, para o funcionário público
corrompido, solicitar, receber ou aceitar promessa de vantagem indevida; e, para o
terceiro corruptor, oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público.
Em ambos os casos há, ainda, a presença de elementos típicos
que traduzem a ideia de troca, transação ou comércio da função pública. As ações típicas
(solicitar, receber, aceitar, oferecer, prometer) recaem sobre um objeto – vantagem
indevida – que deve ser entendido pelos agentes como a contraprestação de uma
conduta do funcionário público praticada ou omitida em desconformidade, no mínimo,
com o princípio da impessoalidade. No tipo da corrupção passiva, a relação de troca está
expressa na presença da elementar subjetiva “em razão [da função pública]” e, na
corrupção ativa, há previsão do especial fim de agir “para determinar [o funcionário
público] a praticar, omitir ou retardar ato de ofício”.
Assim como não é necessária a prática/omissão do ato de ofício
viciado para a perfectibilização dos tipos penais de corrupção, tampouco é imprescindível
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para a configuração dos delitos em tela que os atos de ofício do funcionário público
sejam descritos de forma pormenorizada se o comércio da função pública possui, no
caso concreto, contornos genéricos, o que se apresenta especialmente na hipótese da
organização criminosa comandada por SÉRGIO CABRAL, na qual empresários
pagavam mesadas para terem benefícios variados durante a condução da máquina
pública e dos contratos administrativos.
Tais atos já foram demonstrados e denunciados em diversas
ações penais em trâmite perante a 7º Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio
de Janeiro, a exemplo dos processos de autos n.º 0504113-72.2017.4.02.5101 (Carioca
Engenharia); n.º 0504938-16.2017.4.02.5101 (Operação Ratatouille - Marco Antonio de
Luca); n.º 0503870-31.2017.4.02.5101 (Operação Fatura Exposta - Miguel Iskin e
Gustavo Estelita); n.º 0507524-26.2017.4.02.5101 (Operação Unfair Play – Arthur
Menezes Soares Filho); n.º 0505914-23.2017.4.02.5101 e n.º 0505915-
08.2017.4.02.5101 (Operação Ponto Final – Fetranspor).
O Supremo Tribunal Federal teve oportunidade de sedimentar
esse posicionamento no recente julgamento da Ação Penal 470 (CASO MENSALÃO), no
que toca à tese da prescindibilidade de individualização de atos de ofício nos crimes de
corrupção.
A Ministra Rosa Weber abordou o tema de forma breve mas com
indiscutível clareza:
A indicação do ato de ofício não integra o tipo legal da corrupçãopassiva. Basta que o agente público que recebe a vantagemindevida tenha o poder de praticar atos de ofício para que sepossa consumar o crime do artigo 317 do Código Penal. Seprovada a prática do ato, tipifica-se a hipótese de incidência do §2º do artigo 317, aumentando-se a pena. (fls. 1099 do acórdão –grifos no original)
Em seguida, o Ministro Luiz Fux, ao apreciar a questão, concluiu
que a mens legis da norma do art. 317 do Código Penal é a repressão à influência
indevida no exercício de função pública. A conduta tipificada na lei fica configurada
quando há vantagem indevida (solicitada, recebida ou meramente prometida), em
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contraprestação à influência no desempenho de função pública, ainda que tal influência
não esteja materializada, de início, em um ato de ofício concreto:
Isso serve para demonstrar que o crime de corrupção (passiva ouativa) independe da efetiva prática de ato de ofício. A lei penalbrasileira, tal como literalmente articulada, não exige tal elementopara fins de caracterização da corrupção. Em verdade, a efetivaprática de ato de ofício configura circunstância acidental namaterialização do referido ilícito, podendo até mesmocontribuir para sua apuração, mas irrelevante para suaconfiguração.
Um exame cuidadoso da legislação criminal brasileira revela queo ato de ofício representa, no tipo penal da corrupção, apenas omóvel daquele que oferece a peita, a finalidade que o anima. Emoutros termos, é a prática possível e eventual de ato de ofício queexplica a solicitação de vantagem indevida (por parte do agenteestatal) ou o seu oferecimento (por parte de terceiro).
E mais: não é necessário que o ato de ofício pretendido seja,desde logo, certo, preciso e determinado. O comportamentoreprimido pela norma penal é a pretensão de influênciaindevida no exercício das funções públicas, traduzida nodirecionamento do seu desempenho, comprometendo aisenção e imparcialidade que devem presidir o regimerepublicano.
Não por outro motivo a legislação, ao construir linguisticamenteos aludidos tipos de injusto, valeu-se da expressão 'em razãodela', no art. 317 do Código Penal, e da preposição 'para' no art.330 do Código Penal. Trata-se de construções linguísticas comcampo semântico bem delimitado, ligado às noções deexplicação, causa ou finalidade, de modo a revelar que o ato deofício, enquanto manifestação de potestade estatal, existe nacorrupção em estado potencial, i.e., como razão bastante parajustificar a vantagem indevida, mas sendo dispensável para aconsumação do crime.
(…)
Não se pode perder de mira que a corrupção passiva émodalidade de crime formal, assim compreendidos aquelesdelitos que prescindem de resultado naturalístico para suaconsumação, ainda que possam, eventualmente, provocarmodificação no mundo exterior, como mero exaurimento daconduta criminosa. O ato de ofício, no crime de corrupçãopassiva, é mero exaurimento do ilícito, cuja materializaçãoexsurge perfeita e acaba com a simples conduta descrita no tipode injusto.
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Em síntese: o crime de corrupção passiva configura-se com asimples solicitação ou o mero recebimento de vantagemindevida (ou de sua promessa), por agente público, em razãodas suas funções, ou seja, pela simples possibilidade de queo recebimento da propina venha a influir na prática de ato deofício. Já o crime de corrupção ativa caracteriza-se com osimples oferecimento de vantagem indevida (ou de suapromessa) a agente público com o intuito de que estepratique, omita ou retarde ato de ofício que deva realizar. Emnenhum caso a materialização do ato de ofício integra aestrutura do tipo de injusto.
(…)
Nesse cenário, quando a motivação da vantagem indevida é apotencialidade de influir no exercício da função pública, tem-se opreenchimento dos pressupostos necessários à configuração docrime de corrupção passiva. Como já exaustivamentedemonstrado, a prática de algum ato de ofício em razão davantagem recebida não é necessária para a caracterização dodelito. Basta que a causa da vantagem seja a titularidade defunção pública. Essa circunstância, per se, é capaz de vulnerar osmais básicos pilares do regime republicano, solidamenteassentado sobre a moralidade, a probidade e a impessoalidadeadministrativa.
De qualquer sorte, ainda que despiciendo seja o ato de ofício,as regras da experiência comum, que integram o iter doraciocínio jurídico discursivo, indicam que o “favor” serácobrado adiante, em forma de sujeição aos interessespolíticos dos que o concederam. Por isso, é mesmodispensável a indicação de um ato de ofício concretopraticado em contrapartida ao benefício auferido, bastando apotencialidade de interferência no exercício da funçãopública. A comprovação da prática, omissão ou retardamentodo ato de ofício é apenas uma majorante, prevista no § 2º doart. 317 do Código Penal. (fls. 1521/1529 do Acórdão – grifosnossos)
No mesmo sentido, o voto do Relator, Ministro Joaquim Barbosa,
admite que mesmo na hipótese em que a vantagem indevida tenha como
contraprestação atos de ofício genéricos – relacionados, por óbvio, às atribuições do
agente público corrompido – fica configurado o crime de corrupção passiva:
Quanto ao ato de ofício oferecido pelos parlamentares, cito,inicialmente, a doutrina de Juarez Cirino dos Santos,
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relativamente aos elementos normativos do tipo penal, comapoio em notável produção científica sobre a matéria (Jescheck,Wessels, Welzel, Roxin, Mezger, Maurach): 'A delimitação do objeto do conhecimento – portanto, do alcancedo dolo – requer alguns esclarecimentos: a) os elementosdescritivos do tipo legal (homem, coisa, etc.), existentes comorealidades concretas perceptíveis pelos sentidos, devem serrepresentados na forma de sua existência natural; b) oselementos normativos do tipo legal (coisa alheia, documento etc.),existentes como conceitos jurídicos empregados pelo legislador,devem ser representados conforme seu significado comum,segundo uma valoração paralela ao nível do leigo – e não nosentido da definição jurídica respectiva, porque, então, somentejuristas seriam capazes de dolo.'
Assim, como elemento normativo do tipo, o “ato de ofício” deveser representado no sentido comum, como o representam osleigos, e não em sentido técnico-jurídico.
No caso, é evidente que a prática de ato de ofício porparlamentares envolvia todas as suas atribuições na Câmara dosDeputados, no exercício da função parlamentar, em especial ovoto e a orientação de voto em prol do interesse dos acusadosde corrupção ativa. (fls. 3679/3680 do Acórdão – grifos nooriginal)
O voto do Ministro Ayres Britto segue a mesma linha de
entendimento e admite a corrupção passiva quando a vantagem indevida é relacionada
ao plexo de atribuições do agente público corrompido, e não necessariamente a um ato
de ofício previamente determinado:
À derradeira, quanto à elementar normativa do tipo penal decorrupção passiva, averbo que o ato de ofício visado pelacorrupção tanto pode ser lícito quanto ilícito. No caso, adenúncia enxergou no apoio político do PL ao GovernoFederal a contraprestação ao recebimento da vantagemindevida. Ou seja, o ato de ofício pretendido pela corrupçãose insere na atividade parlamentar cotidiana, integrando oplexo de atribuições inerentes à função exercida pelosparlamentares. Sendo certo que, conforme já consignadodiversas vezes, não se exige para a consumação do delito aefetiva realização de atos funcionais pelo agente corrompido. (fls.4529 do Acórdão – grifos nossos)
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Ao final, o próprio Revisor, Ministro Ricardo Lewandowski,
ressalvou seu posicionamento pessoal contrário, mas, analisando os votos dos demais
membros da Corte, curvou-se ao entendimento da maioria, concluindo:
O Plenário desta Corte, todavia, por sua douta maioria, aoapreciar a mesma matéria nesta AP 470, externou umentendimento mais abrangente, assentando ser suficiente, para aconfiguração do tipo previsto no art. 317 do Código Penal o merorecebimento de vantagem indevida, por funcionário público,dispensando-se a precisa identificação do ato de ofício. E mais:dispensou, também, a necessidade de indicação da relação entreo recebimento da vantagem por parte do servidor e a prática dedeterminado ato funcional.
Basta, pois, segundo entende a Corte, para a caracterização dodelito de corrupção passiva, que se demonstre o recebimento devantagem indevida, subentendendo-se a possibilidade ou aperspectiva da prática de um ato comissivo ou omissivo, nãoidentificado, presente ou futuro, atual ou potencial, desde queeste esteja na esfera de atribuições do funcionário público. (fls.3729 do Acórdão)
Como se vê, o denunciado RÉGIS FICHTNER, no exercício do
cargo de chefe da Casa Civil do Estado do Rio de Janeiro, sob anuência do então
governador, SÉRGIO CABRAL, solicitou e aceitou vantagem indevida para exercer o seu
cargo com especial atenção para os interesses privados de empresários do setor da
saúde, prestação de serviços de alimentação e limpeza, transporte público e construção
civil .
Assim, está plenamente configurado o crime de corrupção
passiva, já que resta claro que o conjunto de funções exercido pelo agente público em
questão está relacionado com os interesses privados dos principais fornecedores de
alimentação e serviços especializados no Estado do Rio de Janeiro, transporte público,
construção civil e saúde, isto é, pode-se aferir extreme de dúvidas a relação de
mercancia que tem por objeto a função pública exercida pela então maior autoridade do
Poder Executivo estadual junto ao Chefe da Casa Civil.
O comércio da função pública está caracterizado ainda que os
atos de ofício não estejam concretamente delimitados, pois a relação genérica entre a
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vantagem indevida e as atribuições do funcionário público não é óbice para a
configuração dos crimes de corrupção ativa e passiva.
No caso presente, além da configuração do crime de corrupção
passiva, conforme relatado acima, tem-se a prática de ato de ofício em infração a dever
funcional.
3.2. PERTENCIMENTO À ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – ramificação na CASA CIVIL
Pelo menos entre 01/01/20077 e 22/11/20178, RÉGIS FICHTNER,
além de outras pessoas (ou já denunciadas por integrarem a mesma organização
criminosa, ou ainda a serem processadas), de modo consciente, voluntário, estável e em
comunhão de vontades, promoveu, constituiu e integrou, pessoalmente, organização
criminosa que tinha por finalidade, entre outros delitos, a prática de crimes de corrupção
ativa e passiva, fraude às licitações e cartel em detrimento do ESTADO DO RIO DE
JANEIRO, bem como a lavagem dos recursos financeiros auferidos desses crimes.
Com efeito, agindo de forma estruturalmente ordenada,
caracterizada pela divisão formal de tarefas e com o objetivo de obter, direta e
indiretamente, vantagem indevida derivada dos crimes de corrupção ativa, corrupção
passiva e lavagem de dinheiro, o denunciado acima referido integrou organização
criminosa que estava estruturada da maneira a seguir sintetizada, tendo em
consideração as descrições fáticas até aqui realizadas.
A presente denúncia engloba, portanto, parte importante e
estratégica da atividade da organização criminosa liderada pelo ex-governador SÉRGIO
CABRAL, responsável pela prática de atos de corrupção envolvendo também as
contratações na área da alimentação e serviços especializados no Estado do Rio de
Janeiro.
Nos mesmos moldes existentes em relação às demais
organizações criminosas investigadas pela Operação Lava Jato, a sua estruturação e
7 Data da posse do denunciado SÉRGIO CABRAL no cargo de governador do Estado do Rio de Janeiro.8 Data da deflagração da C'est fini, com a prisão preventiva de Régis Fichtner.
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divisão de tarefas em quatro núcleos básicos: a) o núcleo econômico, formado por
executivos de empresas fornecedoras do Estado do Rio de Janeiro. b) o núcleo
administrativo, composto por gestores públicos do Governo do ESTADO DO RIO DE
JANEIRO, os quais solicitaram e administraram o recebimento das vantagens indevidas
pagas pelas empresas. Aqui encontra-se RÉGIS FICHTNER, como integrante tático e
estratégico da organização criminosa, responsável por operacionalizar e estruturar
administrativa e juridicamente os atos de governo que beneficiaram outros
membros da organização criminosa. c) o núcleo financeiro operacional, formado por
responsáveis pelo recebimento e repasse das vantagens indevidas, a exemplo do
denunciado CARLOS BEZERRA. d) o núcleo político, formado pelo líder da
organização criminosa, o ex-governador SÉRGIO CABRAL.
A narrativa é clara e demonstra que RÉGIS FICHTNER é figura
central do braço administrativo da organização criminosa. Como chefe da Casa Civil, era
o responsável por articular os atos de governo mais importantes, usando de sua
habilidade jurídica para buscar saídas minimamente defensáveis (aos olhos daqueles
que desconheciam os atos de corrupção e a verdadeira motivação do ato) para justificar,
por exemplo, alterações contratuais, editais de licitação, benefícios fiscais ou mesmo a
contratação de obras.
Nas declarações prestadas à Procuradoria da República no Rio
de Janeiro, CARLOS BEZERRA, indagado a respeito dos apelidos e codinomes
constantes das anotações de contabilidade que foram apreendidas residência, admitiu:
“Que o apelido utilizado para designar o ex-chefe da Casa Civil do Governo Cabral,
REGIS FICHTNER, era “ALEMÃO”, “REGIS” ou “GAUCHO”; Que já entregou recursos
em espécie por cerca de quatro ou cinco vezes a REGIS FICHTNER; Que as entregas
se deram entre meados de 2013 até abril de 2014, salvo engano; Que tais informações
podem ser confirmadas pelas anotações já citadas; Que as entregas se deram dentro do
Palácio Guanabara e também dentro do escritório de advocacia de REGIS FICHTNER,
localizado no prédio do Jockey Clube, no Centro do Rio de Janeiro; Que acredita que o
escritório ficava localizado no 3º andar; Que recebia as ordens de pagamento de
CARLOS MIRANDA, bem como se comunicava com FICHTNER por meio de telefone;
Que os valores entregues eram de R$ 100.000,00 (cem mil reais); [...]”
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E, de fato, o escritório de advocacia do qual RÉGIS FICHTNER foi
sócio localiza-se9 no mesmo prédio do Jockey Club Brasileiro10, na Av. Almirante Barroso,