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Linfedema Mauro Andrade
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editores. Angiologia e cirurgia vascular: guia ilustrado.
Macei: UNCISAL/ECMAL & LAVA; 2003. Disponvel em: URL:
http://www.lava.med.br/livro
Linfedema
Mauro Figueiredo Carvalho de Andrade
Linfedema ou edema linftico so sinnimos de aumento de volume de
segmentos corpreos causado por distrbios do sistema linftico. Pelo
fato deste sistema possuir vrias funes importantes alm do controle
dos fluidos teciduais, o edema linftico possui caractersticas que o
diferem de edemas que acompanham doenas de outros rgos e sistemas.
Por este motivo, deve-se considerar o linfedema como sendo apenas
um dos sinais clnicos que acompanha m a insuficincia linftica,
sndrome complexa que tem etiologia variada e manifestaes clnicas
diversas e que, na sua forma crnica, causa profundas alteraes do
membro acometido, com graves repercusses funcionais, estticas e
psico-sociais para o paciente.
A alta prevalncia de distrbios linfticos torna importante o
conhecimento bsico dos diferentes aspectos ligados a estas doenas.
A filariose linftica atinge mais de 120 milhes de pessoas em 73
pases e mais de
20% da populao do planeta vive em reas endmicas1. Em nosso pas,
a rea metropolitana do Recife e a desembocadura do rio Amazonas so
as grandes reas de concentrao do problema (Figura 1).
Figura 1 - Distribuio geogrfica das reas endmicas de filariose,
segundo a Organizao Mundial de Sade.
As malformaes do sistema linftico, associadas ou no a outros
problemas de desenvolvimento, so uma causa importante de bitos
fetais. Todavia, distrbios congnitos e malformaes do sistema
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linftico so bem mais raros na prtica clnica. O linfedema
congnito familiar (Doena de Milroy) ocorre em 1 para cada 6.000
nascimentos (figura 2). Nos pases ocidentais, estima-se entre
600.000 e 2.000.000 o nmero de pessoas com linfedemas
congnitos.
Figura 2 - Linfedema congnito familiar (Doena de Milroy).
Exemplo de duas irms acometidas, apresentando insuficincia linftica
de membros inferiores em grau avanado.
H grande discusso quanto incidncia de linfedemas secundrios,
particularmente do linfedema ps-mastectomia. Nos ltimos anos, vem
ocorrendo um aumento da incidncia do cncer de mama. Nos anos 80,
havia 112.000 novos casos a cada ano, nmeros que cresceram para
180.000 no incio da dcada de 90. Com o diagnstico mais precoce e a
sobrevida mais longa destas pacientes, pode-se prever que haver um
nmero crescente de pacientes com linfedema de membro superior.
Dados estatsticos recentes2 demonstram que cerca de 25% das
mulheres submetidas ao tratamento do cncer de mama desenvolvero
linfedema secundrio do membro superior,
aps um perodo varivel de tempo e com gravidade tambm varivel
(figura 3).
Figura 3 - Linfedema de membro superior secundrio a tratamento
cirrgico e radioterpico de neoplasia de mama.
Se, a estes dados, acrescentarmos o enorme contingente de
pacientes com insuficincia venosa crnica (figura 4), onde a
participao da insuficincia linftica tem um papel reconhecidamente
importante, podemos chegar a uma prevalncia aproximada de
450.000.000 de pacientes com distrbios linfticos, ou seja, 15% da
populao mundial.
Figura 4 - Nos pacientes com hipertenso venosa crnica h grave
disfuno do sistema linftico superficial, com possvel implicao
fisiopatolgica nas repercusses cutneas da doena.
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Fisiopatologia O sistema linftico normal, assim como todos os
rgos, trabalha com uma reserva funcional bastante grande,
significando que a capacidade total de transporte linftico bem
superior s necessidades fisiolgicas. No estado de equilbrio, o
dbito linftico (volume de linfa transportado por unidade de tempo)
igual carga linftica, que a quantidade de lqidos e substncias de
transporte linftico presente nos tecidos (figura 5). Quando aumenta
a carga linftica, o dbito linftico cresce paralelamente at que seja
atingido o nvel mximo de transporte. A partir deste ponto, ocorre
edema (figura 5).
Figura 5 - Grfico demonstrando a relao entre carga linftica e
dbito linftico em situao fisiolgica. Aumentos de carga linftica se
acompanham de aumentos paralelos do dbito linftico, at o limite da
capacidade total de transporte do sistema. A partir deste ponto,
ocorre edema tecidual.
Desta maneira, podemos distinguir duas formas principais de
edema, de acordo com a participao do sistema linftico3:
Insuficincias linfticas dinmicas, onde, apesar da normalidade e
do aumento compensatrio da absoro e transporte linfticos, a carga
linftica ultrapassa a capacidade total de transporte, ocasionando o
aparecimento de edema (figura 5). So edemas tipicamente pobres em
protenas, que tm sua remoo do interstcio aumentada pelo aumento
compensatrio de trabalho dos vasos linfticos, sendo exemplos tpicos
o edema da insuficincia cardaca congestiva e os edemas venosos.
Tambm so conhecidos como edemas por insuficincia da vlvula de
segurana dos tecidos.
Insuficincias linfticas mecnicas (figura 6). Nesta situao h
perda da funo normal dos linfticos e, mesmo com cargas linfticas
fisiologicamente normais, h um acmulo tecidual de lqidos e
macromolculas. Caracteristicamente, so edemas de alto contedo
proteico e so os verdadeiros linfedemas.
Figura 6 - Reduo da capacidade de transporte linftico abaixo da
carga linftica fisiolgica, caracterizando insuficincia linftica
mecnica e linfedema. Observar que o tratamento pode restaurar parte
da capacidade de transporte sem, no entanto, normaliz-la.
No linfedema ocorre, basicamente, acmulo tecidual de
macromolculas. A quantidade associada de lqidos, ao menos na fase
inicial, deve-se ao poder osmtico destas molculas. Classicamente,
considera-se que a presena crnica de protenas no espao
extravascular produza um processo inflamatrio crnico e fibrose, que
vo ocasionar algumas das caractersticas clnicas da doena, como
veremos adiante. A repercusso tecidual desta fibrose pode ser
observada no corte tomogrfico demonstrado na figura 7.
Recentemente, demonstrou-se que o cido hialurnico, componente
essencial da matriz extracelular, apresenta acmulo marcante nos
tecidos afetados4, podendo ter significado importante na
fisiopatologia da doena.
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Figura 7 - Corte tomogrfico de membro inferior em paciente com
linfedema unilateral. Comparar o aumento de volume do membro
afetado, com preservao do compartimento subfascial. Observar o
espessamento da pele e o padro caracterstico (em favo de mel) do
tecido subcutneo.
O volume do membro com linfedema aumenta progressivamente se no
tratado, assim como aumenta a freqncia das complicaes relacionadas.
Para os linfedemas de aparecimento recente, usual observar-se
progresso espontnea nos cinco primeiros anos de seguimento,
ocorrendo relativa estabilizao aps este perodo. O linfedema
ps-mastectomia, curiosamente, apresenta uma taxa de crescimento
volumtrico cerca de trs vezes maior que os linfedemas dos membros
inferiores, para um dado perodo de tempo.5 O grande fator implicado
na progresso no espontnea do volume dos membros com linfedema a
ocorrncia de surtos de infeco, como erisipelas e celulites (figura
8). As infeces lesam adicionalmente o sistema linftico, reduzindo
ainda mais a capacidade de transporte.
Figura 8 - Surto agudo de erisipela em membro superior. Notar
que a hiperemia abrange toda a rea da drenagem linftica regional,
incluindo a mama.
Uma complicao temvel dos linfedemas sua malignizao. Linfedemas
de longa durao podem ser sede de linfangiossarcomas (figura 9) que,
se so infreqentes (menos de 1% dos casos), apresentam altssima taxa
de mortalidade independente do tratamento.
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Figura 9 - Linfangiossarcoma em linfedema de longa durao de
membro inferior. Leso vinhosa, pouco elevada, indolor.
Freqentemente apresenta leses menores, satlites.
Classificao Os linfedemas so classificados de acordo com o
distrbio causador da insuficincia linftica em primrios ou
secundrios.
Nos linfedemas primrios h alterao congnita do desenvolvimento de
vasos linfticos e linfonodos ou obstruo de linfticos de etiologia
desconhecida (linfedemas idiopticos).
Nos linfedemas secundrios, a disfuno anatmica ocorre em tecido
linftico previamente normal, sendo o linfedema ps-cirrgico ou
ps-radioterpico seu exemplo mais comum. De especial importncia o
linfedema secundrio por obstruo tumoral, nestes casos ocorre,
freqentemente, o que chamamos de linfedema rizomlico, cujo aumento
de volume predomina nas pores mais proximais do membro. imperativa
a pesquisa da causa primria previamente ao tratamento do linfedema
(figuras 10 e 11).
Figura 10 - Linfedema com predomnio nas regies mais proximais do
membro. Linfedema suspenso ou rizomlico. Quadro clnico
caracterstico de obstruo tumoral do sistema linftico.
Figura 11 - Tomografi a computadorizada de abdome demonstrando
massa tumoral no msculo lio-psoas.
Outras causas importantes de linfedema secundrio so a filariose,
os traumatismos (figura 12), erisipelas e celulites.
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Figura 12. Linfedema ps-traumtico; destruio do sistema linftico
superficial aps trauma extenso de membro inferior e enxertia livre
de pele.
Nos linfedemas primrios, a diviso entre congnito, precoce e
tardio feita de acordo com a idade do aparecimento do edema. Os
congnitos (figura 13) surgem antes do segundo ano de vida, podendo
estar associados a outras sndromes, ocorrer isoladamente (linfedema
congnito simples) ou apresentar transmisso hereditria e familiar
(doena de Milroy). Os linfedemas primrios precoces (figuras 14 e
15) tm incio mais comum em adolescentes do sexo feminino; se
apresentarem caracterstica familiar so denominados de sndrome de
Meige. Os linfedemas primrios tardios, por definio, acometem
pacientes aps os 35 anos de idade e so, usualmente, mais benignos
que os demais e tambm so mais freqentes no sexo feminino.
Figura 12 - Linfedema congnito associado sndrome de Turner.
Algumas sndromes e anomalias cromossmicas se apresentam com
malformaes do sistema linftico.
Figura 13 - Linfedema primrio precoce em mulher jovem. Quadro
clnico que se iniciou durante a adolescncia, complicado de vrios
surtos infecciosos. A maior parte destas pacientes apresenta
hipoplasia do sistema linftico.
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Figura 14 - Linfedema primrio precoce em paciente do sexo
masculino. Caractersticas clnicas semelhantes ao linfedema primrio
precoce observado em mulheres. Cerca de metade destes pacientes
apresenta coletores linfticos hiperplsicos.
DIAGNSTICO Diagnstico diferencial A avaliao clnica de um
paciente que se apresente com edema em extremidades deve incluir
inicialmente o diagnstico diferencial das vrias causas de edema
(Quadro 1) de membros inferiores, posto que os edemas de membro
superior dificilmente traro dificuldades diagnsticas.
Quadro 1. Diagnstico diferencial de linfedema de membro
inferior
Doenas sistmicas Insuficincia cardaca
Insuficincia renal Cirrose heptica Hipoproteinemia Edema cclico
idioptico Angioedema hereditrio Doenas venosas Miscelnea Malformaes
vasculares Lipedema Eritrocianose frgida Edema postural Quadros
psiquitricos
As causas mais comuns de edema so sistmicas. Dificilmente se
impem como problema diagnstico, visto que so vrios os sinais
clnicos e queixas caractersticas que acompanham estas doenas.
Ocasionalmente, exames laboratoriais simples podem confirmar o
diagnstico. Estes edemas so tipicamente bilaterais, simtricos e com
sinal de Godet pronunciado. O edema cclico idioptico, distrbio
renal do metabolismo do sdio, pode ser um diagnstico diferencial
difcil com linfedemas distais pequenos, mas seu aspecto cclico, e
sua associao com edema de face e mos em mulheres jovens podem
lembrar o diagnstico.
O angioedema hereditrio, doena autossmica dominante
caracterizada por deficincia no sistema do complemento, aparece em
surtos espontneos e reversveis, atingindo com freqncia o segmento
ceflico.
As doenas venosas respondem pela maioria dos casos onde o edema
unilateral. O diagnstico diferencial raramente problemtico, e suas
alteraes caractersticas sero discutidas em outro captulo.
Ocasionalmente, ocluses venosas ilacas podem levar a um quadro
clnico de edema de toda a extremidade, sem grandes alteraes
cutneas, necessitando-se de estudo ultrassonogrfico ou flebogrfico
para o diagnstico definitivo. Outra situao que permite dvida
diagnstica so os pequenos edemas distais com doena venosa
incipiente. Veremos mais adiante os sinais clnicos que permitem o
diagnstico diferencial.
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Nas malformaes vasculares no raro o acometimento do sistema
linftico, mas a distino com linfedema pode ser feita apenas pelo
exame clnico. Nestes pacientes, pode haver predomnio do edema
linftico sobre as alteraes dependentes dos outros componentes
vasculares, especialmente na sndrome de Klippel-Trenaunay (figura
16). De especial importncia no diagnstico diferencial entre as
malformaes e o linfedema o gigantismo do membro, especialmente em
recm-nascidos. O gigantismo pode apresentar graus variados de
hipertrofia do tecido subcutneo, mas a consistncia da pele sempre
normal. O linfedema congnito pode ser uni ou bilateral, mas o
gigantismo quase sempre unilateral. Adicionalmente, no gigantismo,
os dedos tm aparncia normal e o aumento de volume proporcionado,
enquanto que no linfedema congnito muito comum que o p apresente
aumento de volume comparativamente maior que o restante do
membro.
Figura 15 - Sndrome de Klippel-Trenaunay. Observa-se predomnio
do componente linftico associado a varicosidades superficiais e
nevus.
Uma das causas de aumento volumtrico dos membros inferiores que
comumente tem o diagnstico errneo de linfedema o lipedema. A
denominao lipedema imprpria. Os pacientes com esta condio no tm, na
realidade, edema e sim deposio excessiva de gordura nos membros
inferiores (figura 17). Este nome foi dado para salientar a
semelhana entre os quadros clnicos, sendo mais adequado o termo
lipodistrofia. Alm da predominncia feminina, h quase sempre
histrico familiar e o relato de que os tornozelos sempre tiveram
volume aumentado. Caracteristicamente, no h reduo do membro mesmo
com o repouso prolongado e no h histria de celulites ou erisipelas.
palpao, a consistncia tecidual elstica, no h o sinal de Godet e
comum dolorimento pr-tibial. Os ps so sempre preservados.
Figura 16 - Paciente do sexo feminino com deposio anormal de
gordura nos membros inferiores (lipodistrofia). Observar a simetria
do quadro e o aspecto normal dos ps.
A eritrocianose frgida condio relativamente comum em mulheres
jovens. A
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pele fria e apresenta reas alternadas de cianose e descolorao
devido lentificao da circulao cutnea. bilateral e o edema acomete
os tornozelos. Novamente, os ps so poupados.
O edema postural, assim como o edema de desuso, combina estase
venosa e linftica, associando caractersticas de ambas disfunes. O
diagnstico simples, feito pela histria clnica.
Quadros psiquitricos ou, eventualmente, tentativas de forjar
doenas para obteno de benefcios securitrios, podem levar o paciente
a garrotear o membro e provocar edema. O diagnstico diferencial
pode ser muito difcil. Histria clnica O tempo de evoluo dos
sintomas um dado importante da anamnese. Primeiramente, a idade do
paciente quando do aparecimento dos sintomas define a classificao
do linfedema primrio. Linfedemas recentes, sobretudo quando
predominam em regies proximais no membro, em pessoas de mais idade,
devem sempre alertar para a possibilidade de neoplasias
obstrutivas. A histria familiar importante nas doenas de Milroy e
Meige.
Embora o linfedema possa ter aparecimento espontneo, a maioria
dos pacientes consegue relacionar o aparecimento do edema com algum
fator desencadeante. Celulites, entorse de tornozelo, picada de
inseto, gravidez e viagem de avio so freqentemente referidos em
pacientes com linfedemas primrios. Perda de peso e diarria podem
tambm estar associados a linfedemas primrios, podendo sugerir
linfangiectasia intestinal e perda entrica crnica de protenas. A
etiologia dos linfedemas secundrios pode ser evidente aps
tratamentos cirrgicos e radioterpicos. Pacientes provenientes de
reas endmicas para filariose devem ser submetidos a pesquisa
adicional para comprovao diagnstica. A freqncia de ataques
inflamatrios/infecciosos deve ser anotada, pois trata-se de
importante fator prognstico
e permite, indiretamente, supor o grau de leso tecidual do
membro acometido.
Exame fsico O exame fsico geral permite o diagnstico do
linfedema primrio associado a outras condies clnicas, como na
sndrome de Turner. Deve-se pesquisar todos os segmentos corpreos
quanto presena de edema (face, tronco, ndegas, genitlia). A palpao
dos centros linfonodais parte fundamental na avaliao clnica dos
linfedemas secundrios, especialmente quando se suspeita da
ocorrncia de neoplasias. A presena de linfonodos regionais palpveis
em pacientes com linfedemas primrios dos membros inferiores pode
sugerir hipoplasia dos vasos coletores distais e de valor no
prognstico destes doentes.
O exame da extremidade afetada pode revelar a presena de nevus e
varizes da sndrome de Klippel-Trenaunay. A inspeo deve abranger o
membro na sua totalidade, procura de leses cutneas. Pacientes com
linfedemas de longa durao e com surtos infecciosos mltiplos
eventualmente apresentam leses verrucosas, denominadas de verrucose
linfosttica (figura 18), de difcil tratamento e que podem ser focos
crnicos de infeco. A presena de fistulizao em qualquer regio do
membro importante e, na observao da sada de fluido leitoso, faz-se
o diagnstico de refluxo quiloso (figura 19). Os espaos
interdigitais, sede freqente de dermatofitoses (figura 20), so
rigorosamente inspecionados.
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Figura 17 - Verrucose linfosttica. Leso avanada de pele em
paciente com linfedema primrio e surtos infecciosos mltiplos. As
fendas de pele se tornam focos permanentes de infeco.
Figura 18 - Paciente do sexo feminino com refluxo quiloso.
Presena de fistulizao com sada de fluido leitoso em leses
digitais.
Figura 19 - Leses fngicas no espao interdigital se constituem na
principal porta de entrada para infeces em pacientes com linfedema
de membro inferior.
A consistncia e textura da pele so facilmente observadas com a
palpao. Estas caractersticas podem variar amplamente, desde a pele
com aspecto prximo da normalidade at membros cuja palpao reflete
consistncia lenhosa, revelando extensa fibrose tecidual. Neste
aspecto, a pesquisa do sinal de Godet (figura 21) se reveste de
importncia prognstica. A depresso obtida com a digitopresso
correlaciona-se com a quantidade de lqido deslocado. Fica claro
que, para uma determinada regio, quanto maior o deslocamento lqido,
menor a fibrose, por dividirem o mesmo espao. Tambm, se conseguimos
deslocar lqido por simples presso digital, tambm o conseguimos
atravs de outras formas de tratamento. Por este raciocnio,
entende-se porque a presena deste sinal relaciona-se com melhor
prognstico destes pacientes.
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Figura 20 - Cacifo ou sinal de Godet em linfedema de membro
superior.
Um outro sinal clnico importante em pacientes com edema a
pesquisa do sinal de Stemmer (figura 22). Este sinal consiste no
espessamento cutneo da base do segundo artelho e obtido pelo
examinador quando se tenta realizar a preenso da pele desta regio6.
Em pacientes com linfedema, consegue-se perceber que existe uma
infiltrao dos tecidos, impedindo uma preenso adequada da pele. Este
sinal particularmente importante no diagnstico de linfedemas
primrios incipientes. Nestes casos, o edema se inicia distalmente
e, antes mesmo de haver aumento de volume da regio do tornozelo, o
sinal de Stemmer positivo, permitindo diferenciar dos edemas de
outras origens.
Figura 21 - Sinal de Stemmer. Espessamento da pele da base dos
artelhos dificultando a preenso digital pelo examinador.
Linfocintilografia Usualmente, o diagnstico clnico suficiente na
grande maioria dos pacientes com linfedema dos membros. Todavia, a
obteno de imagens permite melhor compreenso dos fenmenos
patolgicos, assim como possibilita o estabelecimento do diagnstico
em determinados casos.
Na linfocintilografia, captam-se as imagens dos vasos linfticos
e linfonodos com uma cmara de cintilao aps injeo subcutnea ou
intradrmica de pequenas quantidades (de 0,1 a 0,5 ml) de
macromolculas acopladas a material radioativo de meia vida curta,
usualmente o Tecncio (Tc 99m). Partculas
menores que 10 nm no devem ser utilizadas por atravessarem
livremente tanto os linfticos iniciais quanto os capilares
sangneos, no demonstrando, portanto, imagens especficas dos vasos
linfticos; partculas com dimetro acima de 100 nm apresentam
transporte muito lento, por ser este o tamanho mximo das junes
intercelulares dos linfticos iniciais, impedindo imagens de boa
qualidade dos vasos coletores. As macromolculas mais comumente
empregadas so os colides de trissulfeto de antimnio e o sulfrico, a
albumina humana e o dextran, este ltimo muito utilizado por autores
nacionais.
A linfocintilografia permite avaliao funcional dos sistema pois
as imagens obtidas dependero da absoro da macromolcula pelos
linfticos iniciais e do seu transporte ativo pelos vasos coletores,
ou seja, qualquer imagem obtida reflete a fisiopatologia do
sistema, ainda que a padronizao da metodologia empregada varie
bastante nos diversos servios que a realizam, dificultando a
comparao de resultados publicados na literatura. Na
linfocintilografia normal (Figura 23) observa-se o ponto de injeo
com o acmulo do radiofrmaco e a progresso simtrica nos dois
membros, contrastando os vasos coletores que acompanham a veia
safena magna. O acmulo na regio inguinal corresponde aos
linfonodos. Pode-se acompanhar o trajeto dos vasos linfticos da
cadeia iliolombar. No exame realizado em pacientes com linfedema de
membro inferior (figura 24) ocorre um retardo de absoro e/ou conduo
do radiofrmaco, refletindo a estase linftica do membro. comum o
aparecimento de fluxo drmico em imagens mais tardias (figura 25),
ou seja, transporte extravascular da macromolcula injetada,
denotando a destruio dos linfticos nesta rea. O estudo morfolgico
qualitativo pode ser complementado com estudos quantitativos ou
semiquantitativos da drenagem linftica,
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sensibilizando a avaliao da funo do sistema linftico nestes
pacientes.
Figura 22 - Exemplo de exame linfocintilogrfico normal. Aps a
injeo subcutnea de pequena quantidade de macromolculas marcadas com
Tc 99m em ambos os ps demonstra-se a ascenso simtrica e regular nos
dois membros, com a contrastao dos vasos coletores da veia safena
magna, linfonodos inguinais e coletores iliolombares.
Figura 23 - Estudo cintilogrfico em paciente com linfedema.
Ntida assimetria de fluxo no membro afetado, ainda que no se
demonstrem importantes alteraes anatmicas, evidenciando provvel
disfuno com predominncia de distrbio absortivo.
Figura 24 - Paciente com linfedema em fase avanada. Imagem
tardia, obtida cinco horas aps a injeo. No h
contrastao dos troncos coletores e se observa a difuso do
radiofrmaco pela derme.
TRATAMENTO Mesmo com os avanos na compreenso da doena e com a
padronizao da abordagem fisioterpica do linfedema, o tratamento
continua sendo difcil e dependente de uma abordagem
multidisciplinar. um tratamento custoso e que demanda tempo e
empenho tanto do paciente quanto da equipe responsvel pelo
tratamento. O objetivo da terapia diminuir o edema para manter ou
restaurar a funo e o aspecto do membro afetado. Um dos problemas
mais importantes quanto ao tratamento a dificuldade de se
estabelecer protocolos comparativos entre as diferentes formas de
tratamento, sendo que grande parte dos relatos da literatura se
referem a sries no controladas e no randomizadas.7
A forma de tratamento com os resultados mais consistentes para a
maior parte dos pacientes com linfedema dos membros a Terapia Fsica
Complexa (TFC) ou suas variantes.8 A TFC deve ser empregada em
conjunto com o tratamento das eventuais outras patologias
asssociadas e, eventualmente, sofre modificaes na sua forma de
aplicao dependendo do quadro clnico que apresenta o paciente. Os
resultados da TFC dependem, fundamentalmente, do estgio em que se
encontra a doena quando se inicia o tratamento, independendo do
fato do linfedema ser primrio ou secundrio9. Os pr-requisitos de um
tratamento bem sucedido dependem:10 (1) da presena de um mdico com
conhecimento de linfologia e da fisiopatologia das doenas ligadas
com os distrbios da microcirculao e que seja capaz de lidar com as
doenas associadas, (2) de um fisioterapeuta apto e treinado nas
tcnicas especficas para o tratamento destes pacientes,
supervisionado pelo mdico responsvel, (3) da disponibilidade de
material adequado para o enfaixamento e compresso elstica e (4) da
aderncia completa do paciente ao tratamento.
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A TFC uma ttrade composta por drenagem linftica manual, cuidados
de pele, compresso e exerccios miolinfocinticos.3,10 Estes quatro
componentes funcionam conjuntamente e qualquer destas formas de
tratamento aplicados isoladamente tendem a produzir resultados
decepcionantes.
A drenagem linftica manual feita com baixa presso em reas
normais prximais regio de linfostase (figura 26) com objetivo de
estimular a atividade motora dos linfngions; na regio afetada, os
movimentos so aplicados com maior presso para tratar os tecidos
fibrticos. A compresso por bandagens realizada com mltiplas
camadas, com objetivos distintos: proteo de pele, proteo das
salincias sseas, configurao de uma forma cilndrica do membro e
compresso propriamente dita (Figura 27).
Figura 25 - Drenagem linftica manual. Abordagem inicial das reas
sem edema clnico. Manipulao centrfuga atingindo reas mais distais
somente aps reabsoro do edema proximal.
Figura 26 - Enfaixamento. Realizado com faixas com baixa
elasticidade aps a drenagem linftica manual, objetivando manter
reduo volumtrica e servir de resistncia externa atividade fsica
especfica prescrita para estes pacientes.
A prescrio de exerccios miolinfocinticos visa ativao da
atividade muscular e recuperao da amplitude de movimento articular,
enquanto que os cuidados de pele servem para a preveno de infeces
bacterianas e micticas. A TFC um tratamento de duas fases. O
objetivo da primeira fase mobilizar edema e iniciar a regresso das
alteraes teciduais fibrosclerticas. Durante esta fase, o tratamento
aplicado diariamente e, na maior parte dos casos, realizado
ambulatorialmente.
Na segunda fase, mantm-se o membro sem edema e se obtm a
regresso do tecido cicatricial. Neste perodo, fundamental a
utilizao da conteno elstica adequada (figura 28) e o paciente
orientado quanto aos cuidados de pele e exerccios especficos. Nesta
fase, a drenagem linftica manual prescrita ocasionalmente.
Figura 27 - Meia elstica utilizada na fase de manuteno da TFC. A
conteno elstica s prescrita quando no h mais edema mobilizvel no
membro acometido.
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Linfedema Mauro Andrade
16/05/2003 Pgina 14 de 15 Pitta GBB, Castro AA, Burihan E,
editores. Angiologia e cirurgia vascular: guia ilustrado.
Macei: UNCISAL/ECMAL & LAVA; 2003. Disponvel em: URL:
http://www.lava.med.br/livro
A utilizao de bombas pneumticas seqenciais (Figura 29) ainda
bastante popular para o tratamento de linfedema dos membros em
determinados centros e uma grande variedade delas disponvel no
mercado. As bombas com vrias cmaras inflam a partir da extremidade
distal do membro, produzindo uma onda ascendente de presso.
Presume-se que seu funcionamento se baseia no transporte de fluido
para reas proximais onde haja vasos linfticos funcionais. Todavia,
no existem regras claras de sua utilizao quanto ao nmero e freqncia
de sesses, presso empregada e indicaes clnicas,7 Alguns autores
consideram o uso deste equipamento como sendo inefetivo e mesmo
perigoso.5,11
Figura 28 - Aparelho de pressoterapia com cmaras seqenciais.
A utilizao de medicamentos considerada como adjuvante ao
tratamento do linfedema. A cumarina e a diosmina tm sido empregada
nestes pacientes. Demontrou-se que as benzopironas estimulam a
protelise tecidual pelos macrfagos e aumentam seu nmero na
extremidade afetada12 e um estudo clnico confirmou seu efeito com
uso prolongado.13 Dois trabalhos recentes com a utilizao
destas drogas em linfedema ps-mastectomia demonstraram
resultados controversos.14,15 No h consenso quanto utilizao
profiltica de antibiticos, particularmente a penicilina benzatina,
mas a aplicao tpica de antifngicos na regio interdigital parece
justificada frente alta incidncia de dermatofitoses neste grupo de
pacientes.16
O tratamento cirrgico reservado a uma pequena parcela dos
pacientes e pode ser dividido em dois grandes grupos: as operaes de
resseco e as operaes de derivao. As resseces objetivam reduzir o
volume do membro, restaurando parcialmente sua funcionalidade. Como
exemplos temos a operao de Charles (remoo de todo o tecido afetado
e enxertia livre de pele) e todas suas variantes e as
dermolipectomias simples, que visam retirada de excessos de pele e
subcutneo, especialmente aps reduo volumtrica aps tratamento
fisioterpico. As operaes de derivao objetivam restaurar o fluxo
linftico, atravs de anastomoses microcirrgicas linfovenosas ou
linfolinfticas. Existem inmeras variantes. As indicaes do
tratamento cirrgico variam conforme os diversos centros que as
praticam, no existindo consenso quanto ao melhor protocolo a ser
aplicado neste grupo de pacientes.8
CONSIDERAES FINAIS Mesmo com os avanos na compreenso da doena e
com a padronizao da abordagem fisioterpica do linfedema, o
tratamento continua sendo difcil e dependente de uma abordagem
multidisciplinar.
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Linfedema Mauro Andrade
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Verso prvia publicada: Nenhuma
Conflito de interesse: Nenhum declarado.
Fontes de fomento: Nenhuma declarada.
Data da ltima modificao: 13 de outubro de 2002.
Como citar este captulo: Andrade MFC. Linfedema. In: Pitta
GBB,
Castro AA, Burihan E, editores. Angiologia e cirurgia vascular:
guia ilustrado. Macei: UNCISAL/ECMAL & LAVA; 2003.
Disponvel em: URL: http://www.lava.med.br/livro
Sobre o autor: Mauro Figueiredo Carvalho de Andrade
Doutor em Clnica Cirrgica pela Faculdade de Medicina da
Universidade de So Paulo, Responsvel pela Unidade de Linfedema da
Disciplina
de Cirurgia Vascular do Hospital das Clnicas da Faculdade de
Medicina da Universidade de So Paulo,
So Paulo, Brasil.
Endereo para correspondncia: Rua Teodoro Sampaio 312/134
05406-000 So Paulo, SP Fone+ 11 3068 8142