Do aspecto político e constitucional. No nosso Direito Penal temos uma mescla de políticas criminais que vai desde o princípio da intervenção mínima, em que limita ao cerceamento da liberdade do criminoso a crimes desprezíveis à sociedade, não deixando que sejam isolados aquele que podem produzir em favor da sociedade pagando ao mesmo tempo o crime cometido; até políticas criada em meio a alta carga emocional vivida pela sociedade de determinado momento como o caso da ideologia repressiva da Lei e Ordem. O movimento da “Lei e da Ordem” que surgiu nos EUA na década de 70 (setenta), como um reforço do Direito Penal Simbólico, tendo como um dos seus criadores o alemão Ralf Dahrendorf, representa o uso de uma resposta penal absurdamente severa como medida de eficácia preventiva e intimidatória à criminalidade violenta, se assentando na tentativa de empulhação: transformar em realidade a ficção de que leis e ações mais severas e em maior número são o caminho através do qual se alcança segurança e bem estar.
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Do aspecto político e constitucional.
No nosso Direito Penal temos uma mescla de políticas criminais que vai desde o
princípio da intervenção mínima, em que limita ao cerceamento da liberdade do criminoso a
crimes desprezíveis à sociedade, não deixando que sejam isolados aquele que podem produzir
em favor da sociedade pagando ao mesmo tempo o crime cometido; até políticas criada em
meio a alta carga emocional vivida pela sociedade de determinado momento como o caso da
ideologia repressiva da Lei e Ordem.
O movimento da “Lei e da Ordem” que surgiu nos EUA na década de 70
(setenta), como um reforço do Direito Penal Simbólico, tendo como um dos seus criadores o
alemão Ralf Dahrendorf, representa o uso de uma resposta penal absurdamente severa como
medida de eficácia preventiva e intimidatória à criminalidade violenta, se assentando na
tentativa de empulhação: transformar em realidade a ficção de que leis e ações mais severas e
em maior número são o caminho através do qual se alcança segurança e bem estar.
Segundo Damásio E. de Jesus, in Sistema Penal Brasileiro: execução das penas no
Brasil1, “Um dos princípios do "Movimento de Lei e Ordem" separa a sociedade em dois
grupos: o primeiro, composto de pessoas de bem, merecedoras de proteção legal; o segundo,
de homens maus, os delinquentes, aos quais se endereça toda a rudeza e severidade da lei
penal. Adotando essas regras, o Projeto Alternativo alemão de 1966 dizia que a pena criminal
era "uma amarga necessidade numa comunidade de seres imperfeitos".
É o que está acontecendo no Brasil. Cristalizou-se o pensamento de que o Direito
Penal pode resolver todos os males que afligem os homens bons, exigindo-se a definição de
novos delitos e o agravamento das penas cominadas aos já descritos, tendo como destinatários
os homens maus (criminosos). Para tanto, os meios de comunicação tiveram grande influência
(Raul Cervini, Incidencia de la "mass media" en la expansión del control penal en
Latinoamérica, Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, Editora Revista dos
Tribunais, 1994, 5: 36, dando enorme valor aos delitos de maior gravidade, como assaltos,
latrocínios, sequestros, homicídios, estupros, etc. A insistência do noticiário desses crimes
criou a síndrome da vitimização. A população passou a crer que a qualquer momento o
cidadão poderia ser vítima de um ataque criminoso, gerando a idéia da urgente necessidade da
agravação das penas e da definição de novos tipos penais, garantindo-lhe a tranquilidade”.1 http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7938#_ftn3, consultado em 07/02/2012, e também disponível em: http://campus.fortunecity.com/clemson/493/jus/m01-003.htm, consultado em 07/02/2012.
IV - extorsão mediante seqüestro e na forma qualificada (art. 159, caput e §§ 1º, 2º e 3º);
V - estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º);
VI – estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º, ambos, em combinação com
o art. 223, caput e parágrafo único);
VII - falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos
ou medicinais (art. 273, caput e § 1°, § 1°-A e § 1°-B, com a redação dada pela Lei n° 9.677,
de 2 de julho de 1998).
Parágrafo único - Considera-se também hediondo o crime de genocídio previsto nos arts. 1º,
2º e 3º da Lei nº 2.889, de 1º de outubro de 1956, tentado ou consumado.
O ministro Francisco de Assis Toledo, mencionado por Silva Franco,
considerando elogiável a adoção de tal critério, percebeu que uma conceituação genérica de
hediondez “ofereceria margem para debates intermináveis, sem previsão de uma solução
satisfatória, a curto ou médio prazo”.
Alberto Silva Franco, crítico ao sistema adotado, afirma que “o texto legal pecou,
desde logo, por sua indefinição a respeito da locução ‘crime hediondo’, contida na regra
constitucional. Em vez de fornecer uma noção, tanto quanto explícita, do que entendia ser a
hediondez do crime (o projeto de lei enviado ao Congresso sugeria uma definição a esse
respeito), o legislador preferiu adotar um sistema bem mais simples, ou seja, o de “etiquetar”
ou “colar (copiar-colar)”, com a expressão ‘hediondo’, tipos já descritos no Código Penal ou
em leis especiais. Desta forma não é ‘hediondo’ o delito que se mostre ‘repugnante,
asqueroso, sórdido, depravado, abjecto, horroroso, horrível’, por sua gravidade objetiva, ou
por seu modo ou meio de execução, ou pela finalidade que presidiu ou iluminou a ação
criminosa, ou pela adoção de qualquer outro critério válido, mas sim aquele crime que, por
um verdadeiro processo de colagem, foi rotulado como tal pelo legislador” .
Originalmente, a Lei 8.072/90 considerou oito tipos penais como hediondos, deu
prioridade à tutela patrimonial, dos costumes e à alguns delitos de perigo comum. Com a Lei
8.930/94, o homicídio foi acrescentado ao rol e desaparece a figura do art. 270 combinado
com o art. 285 do CP, envenenamento de água potável ou de substância alimentícia ou
medicinal, qualificado pela morte.
Pressionado pelo sensacionalismo tripudiado sobre alguns casos de crimes contra
a saúde pública (como se só agora estivessem ocorrendo...), o legislador, às pressas, dada a
proximidade das eleições, redigiu a Lei nº 9.695, de 20 de agosto de 1998, alterando o inciso
VII do art 1º. Sai do rol dos crimes hediondos o crime de epidemia com resultado morte, que
segundo Dyrceu Aguiar Dias Cintra Júnior, “há décadas fora do repertório e cujas
transferências conduzem apenas ao imaginário, à manipulação ideológica que justificou até
prisões arbitrárias em 1964”, e em seu lugar entra a falsificação, corrupção, adulteração ou
alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais , condutas tipificadas no art.
273, caput e §§, do CP, também modificados pela Lei. 9.677, de 2 de julho de 1998.
OS EFEITOS PENAIS E PROCESSUAIS PENAIS DA LEI 8.072/90
Sucintamente podemos destacar os efeitos principais penais e processuais da Lei 8.072, de 21
de junho de 1990:
1. Proibição dos benefícios da Anistia, Graça ou Indulto (art. 2º, I);
2. Impossibilidade da concessão de fiança (art. 2º, II). A liberdade provisória era
proibida, porém esta norma foi revogada pela lei 11.464/07, donde se conclui que
agora é admissível a liberdade provisória para os crimes hediondos;
3. Necessidade de cumprimento de 2/3 da pena para concessão de livramento
condicional; Vedação do benefício quando o apenado for reincidente específico em
crimes dessa natureza. (art. 5º e CP, art. 83, V);
4. Aumento das penas dos crimes de latrocínio (CP, art. 157, § 3º), extorsão mediante
seqüestro (CP, art. 159, caput e seus §§ 1º a 3º), estupro (CP, art. 213, caput), atentado
violento ao pudor (CP, art. 214, caput) e suas formas qualificadas (CP, art. 223),
epidemia (CP, art. 267) e envenenamento de água potável ou substância alimentícia
medicinal (CP, art. 270, caput);
5. Causa de aumento da pena, acrescendo de metade, nos crimes de latrocínio (CP, art.
157, § 3º), extorsão qualificada pela morte(CP, art. 158, § 2º), extorsão mediante
seqüestro (CP, art. 159, caput e seus §§ 1º a 3º), estupro (CP, art. 213, caput), atentado
violento ao pudor (CP, art. 214, caput) ) e suas formas qualificadas (CP, art. 223),
quando a vítima: não for maior de 14 anos; é alienada ou débil mental, e o agente
conhecia esta circunstância; não pode, por qualquer outra causa, oferecer resistência
(art. 9º e CP, art. 224);
6. Criação da “Delação Premiada” (art. 8º, p. único e CP, art. 159, § 7º);
7. Aumento da pena do crime de quadrilha ou bando (CP, art, 288) quando objetivarem a
prática de crimes hediondos, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins ou terrorismo (art. 8º); Com a atual lei de drogas as penas para a associação para
fins de tráfico a que aludo o art. 8º da Lei 8072/20 deixou de ter controvérsias,
passando a prevalecer a pena do art. 35 da Lei 11.343/06
8. Decretação de prisão temporária, com prazo de 30 dias prorrogáveis por igual período
em caso de extrema e comprovada necessidade (Lei 7.960/89, arts. 2º c/c Lei 8.072/90,
art. 2º, § 3º);
Em razão destas questões sucessivamente sendo levadas aos tribunais foi editada a
Súmula Vinculante nº. 26, do STF para fazer valer a amplitude dos efeitos de sua decisão
originária (HC 82.959-SP) e o Verbete de Súmula nº. 471 do STJ, bem como como fonte de
decisões esclarecedoras sobre o tema em casos concretos, temos o HC 83.799MS, do Superior
Tribunal de Justiça e Apelação Crime Nº 70044052942, disponível em: http://www.tjrs.jus.br, do
Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.
Com relação a súmula 471 do STJ, veio para afirmar entendimento de que a
norma sobre a progressão de regime não é processual e sim penal, ou como a doutrina
preleciona, trata-se de uma norma de natureza mista, ou seja, está no âmbito de dispositivo
legal (art. 2º da lei 8.072/90) que tem conteúdo de natureza processual e penal, como ocorre
no art. 366 do CPP.
Neste caso a súmula veio a firmar entendimento controvertido sobre a natureza
jurídica da norma que trata da progressão de regime, se de natureza processual ou penal, tendo
siso optado pelo entendimento de que o requisito objetivo para progressão de regime para os
condenados por crime hediondo e equiparado somente obedecerá o patamar de 2/5 para os
primários e 3/5 para os reincidentes se o fato foi praticado depois da vigência da Lei
11.464/07, do contrário, a regra a ser aplicada continua sendo a genérica prevista na Lei de
Execução Penal, qual seja que o réu tenha cumprido ao menos 1/6 da pena.
Isto significa dizer que a norma é de conteúdo penal e, portanto, não poderá
retroagir para prejudicar réu por fatos praticados antes da sua vigência. Em sentido oposto,
alguns doutrinadores entendem que se trata de norma de conteúdo processual e portanto
aplicar-se-ia a regra do art. 3º do CPP, ou seja, da imediatidade, ou seja, a regra atingiria aos
processo em curso.
No que tange a súmula vinculante nº 26 do STF, a redação aprovada reza:
Para efeito de progressão de regime de cumprimento de pena, por crime hediondo ou equiparado, praticado antes de 29 de março de 2007 , o juiz da execução, ante a inconstitucionalidade do artigo 2º, parágrafo 1º da Lei 8.072/90 , aplicará o artigo 112 da Lei de Execuções Penais , na redação original, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche ou não os requisitos objetivos e subjetivos do benefício podendo determinar para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.
Após serem feitas algumas retificações, a redação final da Súmula Vinculante, que
ganhou o número sequencial 26, ficou desta forma:
26. Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.
Em 29 de março de 2007 é a data em que a Lei 11.464/2007 entrou em vigor, ou
seja, pelos moldes do que foi explicado acima, quem cometeu crime depois dessa data, pode
progredir de regime, mas com os novos patamares de 2/5 e 3/5.
Antes dessa data, estava valendo o patamar de 1/6 do art. 112 da Lei de Execuções
Penais, regra geral que passou a abarcar também os hediondos com a declaração de
inconstitucionalidade da vedação à progressão de regime, prevista no artigo 2.º, 1.º da Lei
8.072/90.
Se algum magistrado inobservar a regra, compete ao causídico apresentar
Reclamação diretamente no Supremo Tribunal Federal para o restabelecimento da ordem
jurídico-constitucional. Desta forma, pacificou-se perante toda a Administração Pública a
questão.
A partir da edição da SV n. 26, consolidou-se o entendimento de o STF poder
afastar a regra geral constitucional da Resolução do Senado para as decisões tomadas pelo
Supremo em controle difuso de constitucionalidade. Essa questão de relevante interesse aos
constitucionalistas nacionais, diz respeito ao quórum da decisão de efeitos abstratos em
controle concreto de constitucionalidade no HC 82.959- 7: deu-se por maioria simples , em
votação apertada (6x5).
Concluindo, temos uma nova realidade constitucional consolidada no país e a
questão da quantidade de pena cumprida para progressão de regime de pena de crimes
hediondos e equiparados resolvida, para os delitos praticados entre 23 de fevereiro de 2006
(quando o STF, pelo sistema difuso de constitucionalidade analisou o Habeas Corpus 82959 e
reconheceu a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8.072/90) e 29 de março de 2007 (Lei
11464/07) a progressão de regime será com 1/ 6 da pena efetivamente cumprida.
Anistia, Graça e Indulto
A anistia, forma de extinção da punibilidade, exclui o crime, ex tunc, extinguindo
a punibilidade e demais conseqüências de natureza penal. Por sua vez, a graça, destina-se a
pessoa determinada e não a fato, como a anistia. O indulto, forma de graça coletiva, abrange
sempre um grupo de sentenciados. Tanto um como outro extinguem a punibilidade,
substituindo o crime, a condenação irrecorrível e seus efeitos secundários;
A Constituição Federal determinou que a lei considerará crimes inafiançáveis e
insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas
afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. A Lei 9.455/97, em seu art. 1º, § 6º,
superfluamente repetiu a ordem constitucional sobre a inafiançabilidade e insusceptibilidade
de graça ou anistia.
Neste aspecto a Lei 8.072/90 não caminhou bem. Na sua ânsia repressora,
mencionou também o indulto, fazendo surgir duas correntes:
1ª Corrente - A primeira, tomando a graça em sentido estrito, a menção é de
flagrante inconstitucionalidade, pois o legislador ordinário não poderia, indo além do disposto
na Constituição Federal, restringir a competência discricionária do Presidente da República de
conceder a indulgência coletiva. Enfileiram nesta corrente Alberto Silva Franco, Francisco de
Assis Toledo e Antônio Scarance Fernandes;
2ª Corrente - A segunda, considerando a graça em sentido amplo. Entende que
não há inconstitucionalidade no dispositivo, pois finalisticamente, se um indivíduo não pode
ser beneficiado, muito menos um grupo de pessoas o será. Para estes, a determinação
constitucional compreende tanto o indulto individual quanto o coletivo. É defendida por
Damásio, Vicente Cernicchiaro e Mirabete.
Fiança e Liberdade Provisória (Lei 8072/90 X 11.343/06)
Sobre a LIBERDADE PROVISÓRIA, convém salientar, não se confunde com fiança,
nem com crime afiançável. De acordo com o CPP, a liberdade provisória sem fiança pode ser
concedida a qualquer delito afiançável ou não, quando faltar os requisitos da prisão
provisória.
CPP, Art. 310 p. único Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação. (Redação dada ao artigo pela Lei nº 12.403, de 04.05.2011, DOU 05.05.2011)
A Constituição Federal também identifica esta diferença no art. 5º, inciso LXVI
[...] liberdade provisória, com ou sem fiança. A Lei 8.072/90 avançou o dispositivo
constitucional trazendo dúvidas e discussões, uma vez que a Constituição Federal não
menciona a vedação da liberdade provisória, apenas afirma a inafiançabilidade daqueles
crimes.
Antes da lei 11.464/07 o art. 2º da lei 8072/90 possuía no inciso II deste
dispositivo, vedação expressa à liberdade provisória e a fiança. Após 2007 há vedação
somente à fiança.
Tal alteração foi em razão do posicionamento do STF a despeito da possibilidade
da progressão de regime prisional como dito acima, e no mesmo plano da doutrina o
legislador considera inconstitucional a proibição da liberdade provisória.
Argumentam que além da Constituição Federal não mencionar este efeito, ela
consagra o direito à liberdade provisória, pois, de acordo com o art. 5º, inciso LXVI, ninguém
será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou
sem fiança, Odone Sanguiné aponta que a vedação da liberdade provisória “eqüivale à
privação de liberdade obrigatória infligida como pena antecipada, sem prévio e regular
processo e julgamento” (Inconstitucionalidade da Proibição da Liberdade Provisória, in
Fascículos de Ciências Penais, nº 4, pp. 20-21).
Luiz Flávio Gomes declara que “não pode o legislador, com critério abstrato,
substituir o juiz na tarefa de prender ou mandar soltar, que é eminentemente concreta. O
legislador não pode, a pretexto de atualizar a concretização dos direitos fundamentais, instituir
a legalização de tais direitos” (Crime Organizado, 2ª Ed., 1997, Ed. RT, p. 17).
Também seguem este entendimento Alberto Silva Franco, Rogério L. Tucci e
Magalhães Gomes Filho entre outros. Esses entendimentos sobre a inconstitucionalidade
sobre vedação à liberdade provisória era majoritária na doutrina porém na jurisprudência era
minoritário até 2006 e 2007 pelas razões acima aduzidas.
Outrossim, é o mesmo argumento doutrinário que hoje se sustenta em razão da
proibição da liberdade provisória na lei de drogas em seu art. 44:
Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.
A título de exemplo por apego ao estudo histórico do tema, trazemos a baila jurisprudência
que impedia a liberdade provisória, antes da lei 11.464/07
STF HABEAS CORPUS. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ALEGAÇÃO DE QUE A PRISÃO CAUTELAR FOI DECRETADA SEM FUNDAMENTAÇÃO - NÃO COMETEU QUALQUER ILEGALIDADE O ACÓRDÃO ORA ATACADO, QUANDO, POR TER PRONUNCIADO O ORA PACIENTE, "SUBMETENDO-O A JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI PELA PRÁTICA DOS CRIMES DE HOMICÍDIO E DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES", LHE IMPÔS QUE AGUARDE PRESO ESTE SEU JULGAMENTO NOS TERMOS DO QUE ESTABELECE A LEI 8.072/90 PARA OS CRIMES ENTRE OS QUAIS SE ENCONTRA UM DOS QUE LHE SÃO IMPUTADOS, E, POR ISSO, DETERMINOU A EXPEDIÇÃO CONTRA ELE DO COMPETENTE MANDADO DE PRISÃO. DE FEITO, AO ASSIM PROCEDER, CUMPRIU O DISPOSTO NA CITADA LEI QUE, COM BASE NO INCISO LXVI DO ARTIGO 5º DA CONSTITUIÇÃO, NÃO ADMITE A LIBERDADE PROVISÓRIA. HABEAS CORPUS INDEFERIDO. (HC-73657 / SP, Publicado no DJ de 16-05-97, p. 19950, 1ª Turma, Rel. Min. MOREIRA ALVES).
Jurisprudência: STJ PROCESSUAL PENAL. CRIME HEDIONDO. INCONSTITUCIONALIDADE. LIBERDADE PROVISORIA. REUS PRIMARIOS. I. OS PACIENTES, PRESOS EM FLAGRANTE, PELA PRATICA DE CRIME HEDIONDOS, NÃO TEM DIREITO A LIBERDADE PROVISORIA, EMBORA SEJAM PRIMARIOS. TRATA-SE DE BENEFICIO CUJA REGULAMENTAÇÃO OU ADMISSIBILIDADE ESTA RESERVADA AO LEGISLADOR ORDINARIO. (RHC 3969/SP, 94/0031260-1, publicado no DJ de 24/10/1994, Pg. 28769, Rel. Min. JESUS COSTA LIMA).
PROCESSUAL PENAL. CRIME HEDIONDO. TRAFICO DE ENTORPECENTES. LIBERDADE PROVISORIA. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME. A VEDAÇÃO CONTIDA NO INCISO II DO ART. 2. DA LEI 8.072/90, SOBRE CONCESSÃO DE FIANÇA E LIBERDADE PROVISORIA AOS DENUNCIADOS PELA PRATICA DE CRIMES HEDIONDOS, NÃO APRESENTA VICIO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR SE TRATAR DE BENEFICIO CUJA REGULAMENTAÇÃO OU ADMISSÃO E DEFERIDA PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL A LEI ORDINARIA (ART. 5., LXVI). (RHC 5180/SP, 95/0071175-3, publicado no DJ de 01/04/1996, p. 09921, Rel. Min. ASSIS TOLEDO).
Direito de Apelar em Liberdade (Lei 8072/90 X 11.343/06)
A Constituição Federal consagrou o princípio da presunção de inocência no art.
5º, inciso LXVI. Garantiu que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei
admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.
O Código de Processo Penal, no art. 594, determinava que: “o réu não poderá
apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons
antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se
livre solto”, no entanto este dispositivo foi revogado pela lei 12.403/11 dada sua
incompatibilidade com o princípio da presunção de inocência.
Na lei anterior a 11.343/06, a Lei 6.368/76, elevou a prisão provisória a requisito
necessário para o recebimento do recurso em seu art. 35: “O réu condenado por infração dos
art. 12 ou 13 desta lei não poderá apelar sem recolher-se à prisão”.
Na atual legislação, seu art. 59 assim dispõe: “Nos crimes previstos nos arts. 33,
caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei, o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, salvo se
for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória.
A doutrina a época, antes da revogação da lei 6.368/76 e do art. 594 do CPP, no
entanto, o art. 59 da lei 11.343/06 coloca restrições que o art. 2º, §3º da lei 8078/90, após a lei
11.464/07 não colocou o que mantém a pertinência do questionamento sobre a
constitucionalidade da vedação à liberdade provisória ante o princípio do estado de inocência.
Assim, uns entendiam que esses artigos tornaram-se inconstitucionais e, portanto,
revogados pelo mesmo motivo, v.g., Fernando da Costa Tourinho Filho e Alberto Silva
Franco que fundamentam o entendimento de que se o réu permaneceu livre durante toda a
instrução e julgamento em primeira instância, não haveria razão para ele necessitar de se
recolher à prisão para que a matéria seja apreciada em grau de recurso.
Outra corrente, mais (in)feliz, argumentando que o dispositivo constitucional não
alcançava a prisão provisória, fez-se vencedora e adotada pelo STJ culminou na Súmula 9, “a
exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção
de inocência”.
A Lei 8.072/90 despertou novas discussões, sendo muito criticado o § 3º do art.
2º. Determina que: “em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se
o réu se o réu poderá apelar em liberdade”.
A época, para fazer um confronto histórico entre as correntes doutrinárias, o art.
2º, §2º (atual §3º) da lei 8072/90, por contrariar o disposto no art. 35 da Lei 6.368/90. Surgem
três posições doutrinárias:
O art. 35 FOI REVOGADO pela Lei 8.072/90. É defendida por, entre outros
Mirabete . Alberto Silva Franco argumenta que o mencionado dispositivo já
havia sido revogado desde a Constituição Federal por ser incompatível com o
princípio da presunção da inocência;
Transmudando-se para o art. 59 da lei de drogas o STF vem entendendo que a lei
11434/06 é especial em ralação a lei de crimes hediondos.
O art. 35 NÃO FOI REVOGADO pela Lei 8.072/90, permanece intacto, como
exceção à regra do art. 2º, § 2º da Lei 8.072/90. Damásio E. de Jesus adotou esta
posição sobre os seguintes argumentos: Não seria admissível uma lei que vindo
punir mais severamente o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins pudesse
beneficiar o traficante; A Lei 8.072/90 acrescentou um parágrafo ao art. 35,
mantendo o caput intacto; A revogação do art. 35 da Lei 6.368/76 constitui uma
contradição jurídica, durante a formação da culpa permanece preso, reconhecida
pelo juiz monocrático, é colocado em liberdade provisória. Assim, se o réu,
incurso nos arts. 12 ou 13 da Lei 6.368/76, se estiver em liberdade, deverá
recolher-se a prisão para poder apelar, nas demais hipóteses, crimes hediondos,
tortura e terrorismo, aplica-se o art. 2º, § 2º da Lei 8.072/90;
Este é o raciocínio atual do STF a despeito da lei 11.343/06 por ser especial a lei 8072/90,
não sendo o réu primário e de bons antecedentes, se condenado deverá recolher-se a prisão
para apelar, criando uma pena antecipada e não dando o caráter cautelar da prisão,
analisando-o à luz dos requisitos da prisão preventiva.
POR FIM, TAMBÉM É INCONSTITUCIONAL A PROIBIÇÃO PEREMPTÓRIA DA
SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA E DO INDULTO, POIS NEM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL
O FEZ CONFORME ART. 5º, XLIII.
CUMPRIMENTO DA PENA EM REGIME INICIALMENTE FECHADO
Com o intuito de exemplificar sobre a natureza jurídica da norma contida no art.
2º, §1º da Lei 8.072/90 vale a pena voltarmos no tempo antes de 2006 para mencionarmos a
discussão sobre o tema.
Estabeleceu-se no § 1º, do art. 2º, antes de lei 11.464/07 que: A pena por crime
previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado. Questionou-se sobre
a retroatividade do dispositivo. Seria aplicável aos crimes abrangidos pela Lei 8.072/90,
praticados antes de sua vigência? Não se aplica. A matéria referente ao cumprimento é de
natureza penal, não retroagindo salvo se beneficiar o réu. A doutrina e a jurisprudência
são assentes neste entendimento.
Cabe mencionar a posição de J. F. Mirabete. Para ele, regime de cumprimento de
pena é assunto de direito processual, portanto de aplicação imediata e irrestrita (Crimes
Hediondos: Aplicação e Imperfeições da Lei, RT 663/268). Antônio Scarance Fernandes
também compartilha deste entendimento, para ele “as normas sobre progressão são próprias
de execução penal, e não interferem no quantum da pena a ser cumprida, não a reduzem, não
a alteram. Cuidam do local em que o preso cumprirá a pena imposta. Têm aplicação imediata,
resguardando-se situações já definidas, acobertadas pela coisa julgada”. Contudo, são
posições isoladas e não foram aceitas pelos tribunais.
Ademais às críticas feitas ao dispositivo, por romper com a finalidade
ressocializadora da pena e desestimular o condenado a possuir um bom comportamento em
nome de alguma benevolência, o § 1º do art. 2º, antes de 2006, vinha sendo criticado e
arguido de inconstitucionalidade por afronta ao princípio constitucional da individualização
da pena. Dois entendimentos dividam a questão:
1. § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 é INCONSTITUCIONAL por força do art. 5º,
XLVI. O dispositivo afronta o princípio da individualização da pena, posição
francamente majoritária na doutrina;
2. § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 é CONSTITUCIONAL. O dispositivo não
contradiz a Constituição Federal, devendo ser regularmente aplicado. Era o
entendimento do STF até 2006;
A individualização da pena compreende três fases distintas e seqüenciais:
cominação, aplicação e execução. A cominação é feita abstratamente pelo Legislador. Ao
Judiciário compete, em conformidade com os critérios legais, aplicar a pena ao caso concreto.
Segue-se a execução da pena.
Nesta última fase também cabe ao Judiciário aplicar a cada caso concreto as
disposições penais e processuais atinentes à execução, v.g., as disposições relativas ao regime
de cumprimento da pena.
A questão da constitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8072/90, por violação
do princípio da individualização da pena, foi provocada pelo fato do legislador atropelar a
fase de aplicação da pena e dispor sobre assunto, que por sua natureza, compete
exclusivamente ao Poder Judiciário. Conclui Luiz Flávio Gomes que “ao proibir a progressão,
destruiu o conteúdo essencial da individualização da pena na fase de execução. Nenhuma
norma regulamentadora de direitos fundamentais pode, a pretexto de regulamentá-la, eliminar
o conteúdo do direito”.
Desde a edição da lei dos crimes hediondos até fevereiro 2006, O STF vinha se
manifestando pela constitucionalidade do dispositivo, como por exemplo dos julgados
abaixo:.
Jurisprudência: STF "HABEAS-CORPUS". CRIME HEDIONDO. CONDENAÇÃO POR INFRAÇÃO DO ART. 12, PAR. 2. II, DA LEI N. 6.368/76. CARACTERIZAÇÃO. REGIME PRISIONAL. CRIMES HEDIONDOS. CUMPRIMENTO DA PENA EM REGIME FECHADO. ART. 2. PAR. 1., DA LEI 8.072/90. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5., XLVI,
DA CONSTITUIÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE NÃO CARACTERIZADA. INDIVIDUALIZACAO DA PENA. REGULAMENTAÇÃO DEFERIDA, PELA PRÓPRIA NORMA CONSTITUCIONAL, AO LEGISLADOR ORDINÁRIO. A LEI ORDINÁRIA COMPETE FIXAR OS PARÂMETROS DENTRO DOS QUAIS O JULGADOR PODERÁ EFETIVAR OU A CONCREÇÃO OU A INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA. SE O LEGISLADOR ORDINÁRIO DISPÔS, NO USO DA PRERROGATIVA QUE LHE FOI DEFERIDA PELA NORMA CONSTITUCIONAL, QUE NOS CRIME HEDIONDOS O CUMPRIMENTO DA PENA SERÁ NO REGIME FECHADO, SIGNIFICA QUE NÃO QUIS ELE DEIXAR, EM RELAÇÃO AOS CRIMES DESSA NATUREZA, QUALQUER DISCRICIONARIEDADE AO JUIZ NA FIXAÇÃO DO REGIME PRISIONAL. (HC-69603 / SP, Publicado no DJ de 23-04-93, p. 06922, TRIBUNAL PLENO, Rel. Min. PAULO BROSSARD).
Jurisprudência: STJ CONSTITUCIONAL E PENAL. CRIME HEDIONDO. TRAFICO DE ENTORPECENTES. PENA. REGIME FECHADO. 1 - A PENA PELO CRIME DE TRAFICO DE ENTORPECENTES (ART. 12, DA LEI 6.368/1976) DEVE SER CUMPRIDA INTEGRALMENTE EM REGIME FECHADO, A TEOR DO ART. 2., PAR. 1., DA LEI 8.072/1990, DECLARADO CONSTITUCIONAL PELO STF (PLENO), "UT" HC 69.603/SP (RISTJ 146/611) E HC 69.657/SP (DJU 18/06/1992). 2 - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (RESP 62105/SP, 95/0011771-1, publicado no DJ de 03/03/1997, p. 04715, Rel. Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO).
HC - CRIMES HEDIONDOS - DELITO PREVISTO NO ART. 12 DA LEI 6.368/76 - PENA CUMPRIDA EM REGIME FECHADO - APLICAÇÃO DA LEI 8.072/90. - DISPONDO O LEGISLADOR QUE NOS CRIMES HEDIONDOS O CUMPRIMENTO DA PENA SERA NO REGIME FECHADO, NÃO SE PERMITE AO JUIZ QUALQUER DISCRICIONARIEDADE NA SUA FIXAÇÃO, TAL QUAL ESTABELECER NA FORMA PROGRESSIVA DA EXECUÇÃO. - INEXISTE QUALQUER INCONSTITUCIONALIDADE DO RIGORISMO LEGAL EM APLICAR-SE O ART. 2., PARAGRAFO 1., DA LEI 8.072/90, ANTE O CARATER DE HEDIONDEZ PELA PRATICA DO DELITO PREVISTO NO ART. 12, DA LEI 6.368/76. - ORDEM DENEGADA. (HC 6659/SP 97/0090889-5, 5ª Turma, Rel. Min. CID FLAQUER SCARTEZZINI, publicado no DJ em 15/06/1998).
Em 23 de fevereiro de 2006, por seis votos a cinco (sendo vencidos os Ministros
Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Celso de Mello e Nelson Jobim), por maioria,
os ministros do STF, em meio a gama de princípios constitucionais achou no princípio da
individualização da pena o argumento ideal para decidir pela inconstitucionalidade do
parágrafo 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, que proibia a progressão de regime de cumprimento
de pena nos crimes hediondos. Em que, de acordo com o inciso XLVI, do artigo 5º, da
Constituição da República:
“A lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: privação ou
restrição de liberdade; perda de bens; multa; prestação social alternativa; suspensão ou
interdição de direitos”.
Apesar de a decisão do STF tenha sido proferida em controle difuso de
constitucionalidade, sem força vinculante, o entendimento predominante foi alterado.
O assunto foi analisado no Habeas Corpus 82959 impetrado por Oséas de
Campos, condenado a 12 anos e três meses de reclusão por molestar três crianças entre 6 e 8
anos de idade (atentado violento ao pudor).
Na prática, a decisão do Supremo, que deferiu o HC, se resume a afastar a
proibição da progressão do regime de cumprimento da pena aos réus condenados pela
prática de crimes hediondos. Caberá ao juiz da execução penal, segundo o Plenário, analisar
os pedidos de progressão considerando o comportamento de cada apenado – o que caracteriza
a individualização da pena.
É de bom alvitre mencionar que outros argumentos doutrinários sustentavam a
possibilidade da progressão da pena em razão das Leis 9.034/95 (Lei de combate ao crime
organizado) e 9.455/97 (Lei de Tortura), dispondo diversamente sobre progressão de pena,
assim redigidas:
Lei 9.034/95, art. 10 – “Os condenados por crimes decorrentes de organização
criminosa iniciarão o cumprimento da pena em regime fechado”.
A situação se resolve, segundo lição de Luiz Flávio Gomes, da seguinte maneira:
“se o crime organizado por extensão for de natureza hedionda, a lei nova é mais benéfica e,
portanto retroage; do contrário, a crimes não-hediondos a lei nova é prejudicial, porque fixa
peremptoriamente o regime inicial fechado; é, assim, irretroativa” .
O legislador pecou de maneira capital no dispositivo da Lei 9.034/95, que
pretenciona combater o crime organizado. Queria punir mais severamente a criminalidade
decorrente das organizações criminosas, mas só conseguiu beneficiar a criminalidade
hedionda decorrente destas organizações.
Nestes casos, como exceção à regra do art. 33 do Código Penal, os crimes
decorrentes de organização criminosa, sejam punidos com reclusão ou com detenção
obrigatoriamente tem o cumprimento da pena inicio no regime fechado. Eis a gafe do
legislador, esqueceu-se dos crimes hediondos. Criou-se uma situação no mínimo injusta: O
membro de organização criminosa, que metodicamente comete crimes hediondos ou
equiparados é beneficiado com a progressão de regime, enquanto o outro, criminoso solitário
e ocasional nas mesmas infrações, deve cumprir integralmente a pena em regime fechado.
Com a Lei 9.455/97, o legislador perdeu uma grande oportunidade para reparar os
erros da Lei. 8.072/90. Perdeu e criou mais injustiças. Abriu o benefício da progressão para os
indivíduos condenados por tortura, continuando a proibição para os condenados por crimes
hediondos, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e terrorismo, salvo se estes forem
praticados por organização criminosa que também tem direito ao benefício.
Lei 9.455/97, art. 1º, § 7º - O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a
hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado. Pergunta-se, foi
revogado o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, pelas leis mencionadas? Como resposta mais dois
entendimentos contrários:
§ 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 NÃO FOI REVOGADO - continua sendo a regra,
os crimes de tortura (art. 1º, § 7º da Lei 9.455/97) e decorrentes de organização
criminosa (art. 10 da Lei 9.034/95) a exceção. É a posição de J. F. Mirabete
(Tortura: Notas sobre a Lei 9.455/97, RT 746/476). Para o ilustre penalista os
dispositivos não foram revogados pela Lei 9.455/97. Neste mesmo sentido, para o
Supremo Tribunal Federal, a Lei de Tortura não revogou o dispositivo da Lei
8.072/90, este continua aplicável, salvo no caso da tortura, onde se aplica o art.
1º, § 7º., mas esse discussão perdeu o sentido em razão da inconstitucionalidade
declarada, pelo próprio STF em 23 de fevereiro de 2006 no HC 82959, bem
como com o advento da lei 11.464/07
§ 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 FOI REVOGADO pelo art. 1º, § 7º da Lei
9.455/97 - os delitos dos arts. 1º e 2º da Lei 8/072/90 são colocados no mesmo
nível, recebendo idêntico tratamento constitucional. Não cabe ao legislador
distingui-los. Em outras palavras, os crimes hediondos, a tortura, o terrorismo e o
tráfico ilícito de drogas foram equiparados pela Constituição Federal, não
podendo a legislação ordinária fazer distinção entre estes, a lei nova, sendo mais
benéfica, revogou tacitamente o § 1º do art 2º da Lei 8.072/90. É adotada pelo
STJ.
Para exemplificar a jurisprudência in verbis:
Jurisprudência: STF HC - INDEFERIDO PEDIDO DE HABEAS CORPUS EM QUE SE PRETENDIA A APLICAÇÃO DA LEI 9.455/97 — CUJO ART. 1º, § 7º, ASSEGURA AO CONDENADO POR CRIME DE TORTURA O INSTITUTO DA PROGRESSÃO DO REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA — A RÉU CONDENADO POR CRIME HEDIONDO (ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR). DE ACORDO COM A ORIENTAÇÃO ADOTADA PELO PLENÁRIO NO JULGAMENTO DO HC 76.371-SP (SESSÃO DE 25.3.98, V. INFORMATIVO 104), A TURMA AFIRMOU QUE O REFERIDO ART. 1º, § 7º, DA LEI 9.455/97, NÃO DERROGOU O ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90, QUE IMPÕE AOS CONDENADOS POR CRIME HEDIONDO O CUMPRIMENTO INTEGRAL DA PENA EM REGIME FECHADO. PRECEDENTE CITADO: HC 76.543-SC (DJU DE 17.4.98). HC 76.936-SP, rel. Min. Sydney Sanches, 2.6.98. (Informativo STF, nº 113, 1º a 5 de junho de 1998).
Jurisprudência: STJ HC - PENAL - CRIME HEDIONDO - PENA - EXECUÇÃO - REGIME INTEGRALMENTE FECHADO - RESP - CONSTITUCIONAL - PENAL - EXECUÇÃO DA PENA – CRIMES HEDIONDOS (LEI 8.072/90) - TORTURA (LEI 9.455/97) - EXECUÇÃO - REGIME FECHADO - A Constituição da República (art. 5º, XLIII) fixou regime comum, considerando-os inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. A Lei 8.072/90 conferiu-lhes a disciplina jurídica, dispondo: "a pena por crime previsto neste artigo será cumprida integralmente em regime fechado" (art. 2º, § 1º). A Lei 9.455/97 quanto ao crime de tortura registra no art. 1º - 7º: "O condenado por crime previsto nesta Lei, salvo a hipótese do § 2º, iniciará o cumprimento da pena em regime fechado. A Lei 9.455/97, quanto à execução da pena, é mais favorável do que a Lei 8.072/90. Afetou, portanto, no particular, a disciplina unitária determinada pela Carta Política. Aplica-se incondicionalmente. Assim, modificada, no particular a Lei dos Crimes Hediondos. Permitida, portanto, quanto a esses delitos, a progressão de regimes. Matéria solucionável no âmbito da legislação infraconstitucional. (HC 6809/DF 98/0001143-9, 6ª Turma, Rel. Min. LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, publicado no DJ em 17/08/1998).
A partir do julgamento do HC 82959, predominou o entendimento de que,
analisando o caso concreto, a progressão de regime é válida, para os crimes hediondos e
equiparados, nos termos do artigo 112 da Lei de Execuções Penais - Lei 7210/84.
Por derradeiro, após o movimento ocasionado pelo julgamento do Habeas Corpus
n°82959, foi promulgada, em 29 de março de 2007, a Lei n° 11.464/07, a qual alterou o artigo
2° da Lei n° 8.072/90, passando a vigorar a seguinte redação:
“Art. 2º (...)
II- fiança.
§ 1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado.
§ 2º A progressão de regime, no caso dos condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á
após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e de 3/5 (três
quintos), se reincidente.
§ 3º Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá
apelar em liberdade.
§ 4º A prisão temporária, sobre a qual dispõe a Lei no 7.960, de 21 de dezembro de 1989, nos
crimes previstos neste artigo, terá o prazo de 30 (trinta) dias, prorrogável por igual período em
caso de extrema e comprovada necessidade.” (NR)
Conforme nova redação, as penas dos crimes hediondos ou equiparados
deverão ser cumpridas em regime inicialmente fechado e será permitida a liberdade
provisória e a progressão de regime, mas não mais nos termos da lei de Execuções Penais, e
sim nos termos desta lei, ou seja, após o cumprimento de 2/5 da pena, se o réu for primário e
3/5 se for reincidente.
Com relação a aplicação da progressão de regimes, o entendimento que
predominante é o de que a lei 11.464/07 deve retroagir em sua parte benéfica, ou seja,
permitir a progressão aos delitos praticados antes de sua publicação.
Entretanto, a nova forma de progressão mostra-se prejudicial em comparação ao
regime estabelecido pela LEP, formando o entendimento de que caberá a progressão de
regime adotada no artigo 112 da Lei 7.210/84 aos delitos praticados antes da nova lei.
Aos delitos praticados a partir do primeiro segundo do dia 29 de março de 2007,
deve-se aplicar a progressão estabelecida na Lei n°11.464/07, inclusive para os crimes de
tortura, previstos na Lei n° 9.455/97.
Livramento Condicional: Reincidência Específica
A lei 8.072/90 alterou as regras do Código Penal sobre a concessão de livramento
condicional. Ampliou o prazo de cumprimento da pena para alcançar o benefício. Nos termos
do CP, com a nova redação, o juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado por
crime hediondo ou equiparado, desde que:
Possua comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom
desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria
subsistência mediante trabalho honesto;
Tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela
infração;
Cumpra mais de dois terços da pena, se não for reincidente específico em crimes
dessa natureza.
A atual lei de drogas não trouxe regramento sobre início de cumprimento de pena,
tendo sido omissa a esse respeito como também o foi a lei antiga. Portanto, o juiz deve agir da
mesma forma que o fazia com a lei anterior, ou seja, aplicando a regra de cumprimento de
pena da lei 8072/90 para os crimes hediondos e equiparados a hediondos, ou seja, regime
inicialmente fechado.
A Lei 8.072/90 ressuscitou a chamada “reincidência específica”, fórmula
abandonada há décadas. A redação desastrosa do dispositivo dá margem a outros conflitos
doutrinários. O que queria dizer o legislador com a expressão “reincidente específico em
crimes dessa natureza”. Duas posições sobre a abrangência da expressão fazem-se ouvir:
1. AMPLIATIVA – A expressão crimes dessa natureza engloba os crimes hediondos, e
aqueles previsto no art. 1º da Lei 8.072/90. Não é necessário que o condenado cometa
duas condutas típicas idênticas, v.g., dois homicídios qualificados ou dois estupros
para ser reincidente específico. Damásio defende este entendimento, no qual é seguido
por Antônio Scarance Fernandes e por J. F. Mirabete que arremata: “a referência à
reincidência específica realmente dificulta a interpretação, pois bastaria à lei fazer
menção ao ‘reincidente em crimes dessa natureza’”.
2. RESTRITIVA – Recorrem à noção clássica da reincidência específica. Para esta
corrente, escudada por Alberto Silva Franco , a reincidência específica deve resultar
ora da identidade absoluta, ora da identidade relativa das condutas, esta última
resultante da conjugação dos fatos constitutivos e dos motivos determinantes. Assim
será reincidente específico quem comete dois estupros ou um estupro e um atentado
violento ao pudor, mas não quem comete estupro e latrocínio.
Finalmente, como o dispositivo é mais gravoso e possui natureza penal, é
irretroativo, não se aplica aos mesmos crimes praticados antes da vigência da Lei 8.072/90.
A reincidência específica também não deve ser reconhecida valendo-se de crimes
praticados ou punidos antes da Lei 8.072/90, portanto, não se reconhece a reincidência
específica a quem foi condenado por ter cometido um estupro em 1980 e novamente
condenado pelo mesmo crime, praticado, desta vez, sob a égide da nova redação dada ao art.
83 do Código Penal.
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E QUADRILHA OU BANDO (ESTA DISCUSSÃO É MERAMENTE
HISTÓRICA. COM A PROMULGAÇÃO DA LEI 11.3434/06 DEIXOU DE TER SENTIDO DISCUTÍ-
LA)
A Lei 8.072/90, pródiga em disposições controvertidas, estabeleceu nova pena para o delito
de Quadrilha ou Bando , art. 288 do Código Penal, quando destinada à pratica de crimes
hediondos ou dos crimes de tortura, de tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e de
terrorismo. Eis a redação de seu art. 8º, caput:
Art. 8º - Será de 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão a pena prevista no art. 288 do Código
Penal, quando se tratar de crimes hediondos, prática da tortura, tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins ou terrorismo.
Acontece que não se aplica às condutas tipificadas nos arts. 12 e 13 da Lei 6.368/90 o art. 288
do CP, mas o art.14 da Lei de Tóxicos, mais gravosa e com elementos distintos da figura do
art. 288 do CP. Dispunha a Lei 6.368/76 que:
Art. 14 - Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente
ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 12 e 13 desta Lei:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360
(trezentos e sessenta) dias-multa.
Novamente a Lei 8.072/90, em sua afoiteza e estouvada repressividade, mais beneficia do que
agrava. Desejou endurecer com as quadrilhas ou bandos, e acabou beneficiando as
associações criminosas destinadas ao tráfico de tóxicos.
E agora? Revogou-se o art. 14? Às associações ou quadrilhas que praticam crimes de tráfico
ilícito de entorpecentes e drogas afins aplica-se o art. 14 da Lei 6.368/90 ou o art. 288 do CP?
A causa de aumento do P.U. do art. 288 (quadrilha ou bando armado) é aplicável a estes
crimes?
Respondemos. Como não poderia deixar de ser, surgiram interpretações antagônicas na
doutrina. Três em princípio:
1. Art. 14 NÃO FOI REVOGADO pelo art. 8º da Lei 8.072/90. O art. 14 foi mantido
íntegro, regulando as hipóteses da Lei 6.368/90. Aos demais casos aplica-se o art. 288
do CP.
2. Art. 14 FOI REVOGADO pelo art. 8º da Lei 8.072/90. É a posição de Alberto Silva
Franco. Para ele, “não bastará a associação de duas ou mais pessoas...,é mister, nos
termos do art. 288 do Código Penal, que a associação criminosa seja constituída, no
mínimo, de quatro pessoas, vinculadas à realização de um programa delinqüencial e
que a organização montada, para a prática de uma série indeterminada de crimes de
tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, apresente um certo grau de estabilidade”
.
3. Art. 14 foi PARCIALMENTE REVOGADO pelo art. 8º da Lei 8.072/90. É A posição
de Damásio, do STF e espelha o melhor entendimento. Mantém-se a figura típica do
art. 14 da Lei 6.368/76, dada sua distinção do art. 288 do CP. Para a associação bastam
duas pessoas, reunidas para a realização das condutas descritas nos art. 12 e 13 da
mesma lei, para o art. 288 do CP, são necessários, pelo menos, quatro delinqüentes,
associados para a prática de qualquer crime. Entretanto, não mais se aplica a pena de
reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e
sessenta) dias-multa cominada pela Lei 6.368/90. Como a Lei 8.072/90 é mais branda,
a pena aplicável é a do art. 8º da Lei 8.072/90: 3 (três) a 6 (seis) anos de reclusão.