IBMR - LAUREATE INTERNATIONAL UNIVERSITIES
CAMPUS BOTAFOGO
CURSO: PSICOLOGIA
KARINA SANTA MARINHA LIMA PEREIRA DE ARAJO
A RELAO DO SUJEITO COM ESTTICA DO SEU CORPO E A PREVALNCIA DE
SINTOMAS DE BULIMIA NERVOSA EM FREQUENTADORES DE ACADEMIAS DE
GINSTICA DE
COPACABANA
RIO DE JANEIRO,
2014
KARINA SANTA MARINHA LIMA PEREIRA DE ARAJO
A RELAO DO SUJEITO COM ESTTICA DO SEU CORPO E A PREVALNCIA DE
SINTOMAS DE BULIMIA NERVOSA EM FREQUENTADORES DE ACADEMIAS DE
GINSTICA DE
COPACABANA
Monografia apresentada ao curso de Psicologia do IBMR- Laureate
International Universities como requisito parcial das exigncias
para a concluso do curso de graduao em Psicologia.
Orientadora: Prof. Luciana Castaneda Ribeiro
RIO DE JANEIRO,
2014
KARINA SANTA MARINHA LIMA PEREIRA DE ARAJO
A RELAO DO SUJEITO COM ESTTICA DO SEU CORPO E A PREVALNCIA DE
SINTOMAS DE BULIMIA NERVOSA EM FREQUENTADORES DE ACADEMIAS DE
GINSTICA DE
COPACABANA
Monografia apresentada ao curso de Psicologia do IBMR- Laureate
International Universities como requisito parcial das exigncias
para a concluso do curso de graduao em Psicologia sob a orientao da
professora Luciana Castaneda Ribeiro.
Aprovada em de de 2014.
EXAMINADORES
____________________________________
____________________________________
____________________________________
Dedico este trabalho aos meus pais Cristina
Santa Marinha e Paulo Henrique Lima Pereira de
Arajo, e a minha av Da Brum da Soledade
Lima, por sempre estarem ao meu lado, dando-
me incentivo e sabedoria para que eu possa
completar com sucesso mais essa etapa da
minha vida.
AGRADECIMENTOS
Agradeo minha me Cristina Santa Marinha por todo o incentivado
nas
horas difceis, de desnimo cansao.
minha irm Vitria Santa Marinha Flumignan por sempre estar
disposta a
me ouvir, sendo minha parceira em todos os momentos.
Aos meus irmos Pietro Novello Santa Marinha Flumignan e Yuri
Novello
Santa Marinha de Hiroki Flumignan por sempre alegrarem o meu
dia, me
ajudando a esquecer dos problemas.
A Guilherme Malluta Vervloet por sempre ter estado ao meu lado
quando
precisei, me fazendo feliz e tornando essa jornada mais
fcil.
Ao meu padrasto, Izidoro de Hiroki Flumignan, por ter me
auxiliado e
norteado com seus conhecimentos.
Ao professor Sergio Aguiar de Medeiros que me conduziu, estando
sempre
disposto quando precisei de sua ajuda.
professora Luciana Castaneda Ribeiro pelo suporte no pouco tempo
que
lhe coube, pelas suas correes e incentivos.
professora Claudia Aparecida Capito pelos seus ensinamentos e
por ter
sido uma excelente supervisora de estgio sempre preocupada com
seus alunos.
E a todos que direta ou indiretamente fizeram parte da minha
formao, os
meus mais sinceros agradecimentos.
Admito que inata em ns a estima pelo prprio corpo, admito que
temos o dever de cuidar dele.
No nego que devamos dar-lhe ateno, mas nego que devamos ser seus
escravos. Ser
escravo de muitos quem for escravo do prprio corpo, quem temer
por ele em demasia, quem
tudo fizer em funo dele. Devemos proceder no como quem vive no
interesse do corpo, mas
simplesmente como quem no pode viver sem ele. Um excessivo
interesse pelo corpo inquieta-
nos com temores, carrega-nos de apreenses, expe-nos aos
insultos; o bem moral torna-se
desprezvel para aqueles que amam em excesso o corpo."
(Sneca)
RESUMO
A magreza exagerada tem sido muito valorizada na sociedade atual
e na mdia. Desta forma est deixando-se de lado a subjetividade e a
singularidade, e como consequncia desse padro de beleza ocorre um
grande desequilbrio na percepo da autoimagem, surgindo assim
patologias como os transtornos alimentares. De acordo com a grande
importncia epidemiolgica da bulimia nervosa, esta pesquisa
objetivou investigar a relao do sujeito com a esttica do seu corpo
e a prevalncia de sintomas de bulimia nervosa e seu perfil em
frequentadores de academias de ginstica do bairro Copacabana no Rio
de Janeiro. Participaram do estudo 60 pessoas de ambos os sexos,
com mdia de idade de 32,05 anos. Foi utilizado na pesquisa o Teste
de Investigao Bulmica de Edinburgh (BITE) e um questionrio scio
demogrfico para rastrear os sintomas de bulimia nervosa e analisar
o perfil dos participantes. Na anlise dos dados foi observada uma
prevalncia de sintomas de bulimia nervosa de 3,33% e uma prevalncia
de 11,67% de traos bulmicos. Dos sete (11,67%) indivduos que
apresentaram traos bulmicos a maioria foi classificada com eutrofia
(no peso ideal) de acordo com o IMC. Pde-se observar tambm uma
ocorrncia maior no sexo feminino, onde seis (85,71%) indivduos
confessaram j terem utilizado ou utilizarem dos exerccios fsicos
como forma compensatria de um episdio exagerado de ingesto de
alimento, e cinco (71,43%) indivduos consideraram-se felizes e
satisfeitos sexualmente. Os resultados apresentados nesta pesquisa
mostram a importncia de alertar profissionais da sade sobre a
existncia de bulmicos em academias de ginstica que utilizando dos
exerccios fsicos em excesso como forma compensatria de episdios
exagerados de alimentao, podem sofrer consequncias indesejveis
sobre sua sade. Palavras chave: transtornos alimentares; bulimia
nervosa; BITE; academias de ginstica; exerccios fsicos.
ABSTRACT
The exaggerated slimness has got much value in current society
and media. This way subjectiveness and singularity are being left
aside, and as a consequence of this new standard of beauty it
creates a great imbalance in the perception of self-image, leaving
new pathologies like eating disorders. According to the great
epidemiological importance of the bulimia nervosa, this research's
objective was to investigate the relation between the subject and
the aesthetics of his body, and the prevalence of bulimia nervosa
symptoms as its profile on health club goers on the neighborhood of
Copacabana, Rio de Janeiro. 60 people of both genders participated
in this research, with a mean of 32.05 years old. The Bulimic
Investigatory Test of Edinburgh (BITE) and a socio-demographic
questionnaire were used to track the symptoms of bulimia nervosa
and to analyze its profile on participants. In the data analysis it
was observed a prevalence of bulimic symptoms of 3.33% and a
prevalence of 11.67% of bulimic traces. Of the seven (11.67%)
individuals that presented bulimic traces, the majority was
classified eutrophics (ideal weight) according to BMI. Also it
could be observed a bigger occurrence in females, where six
(85.71%) individuals confessed they already used or still use
physical exercises as a form to compensate an exaggerated food
intake episode, and five (71.43%) individuals considered themselves
sexually happy and satisfied. The results presented in this
research show the importance of alerting health professionals about
the existence of bulimics in health clubs that by using physical
exercises to compensate exaggerated food intake episodes, may
suffer undesired consequences on their health. Key words: eating
disorders; bulimia nervosa; BITE; health clubs; physical
exercises.
LISTA DE ILUSTRAES
FIGURA 1. Quadro comparativo dos Transtornos Alimentares 18
FIGURA 2. Quadro das caractersticas em comum da Anorexia e da
Vigorexia 28
FIGURA 3. Quadro com os sinais da Ortorexia Nervosa 35
FIGURA 4. Quadro da escala dos sintomas do BITE com pontuao
e
classificao 56
FIGURA 5. Quadro demonstrativo do clculo do IMC segundo a OMS
57
FIGURA 6. Tabela das variveis Scio Demogrficas 59
FIGURA 7. Tabela de Classificao do Estado Nutricional de Acordo
com o IMC
60
FIGURA 8. Tabela com a Classificao do Teste de Investigao
Bulmica de
Edinburgh BITE 61
FIGURA 9. Grfico com a classificao do BITE entre homens e
mulheres 61
SUMRIO
1. INTRODUO 09 2. A ESTTICA E O SUJEITO 12 2.1 A relao do
sujeito com a esttica do seu corpo 12
2.2 Transtornos Alimentares: Tipos e sua Definio 16
2.2.1 Anorexia Nervosa 18
2.2.2 Vigorexia 27
2.2.3 Ortorexia Nervosa 32
2.2.4 Transtorno da Compulso Alimentar Peridica 37
2.3 A Bulimia Nervosa, sua histria e aspectos psicolgicos 41
3. INDO A CAMPO 54 3.1 Desenho do Estudo 54
3.2 Populao Estudada 54
3.3 Instrumentos de Coleta 54
3.4 Anlise Estatstica 57
3.5 Aspectos ticos 58 4. RESULTADOS E DISCUSSO DOS DADOS 59 5.
CONCLUSO 65 6. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 66 7. ANEXOS 72 7.1 ANEXO
1: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 72
7.2 ANEXO 2: Questionrio Scio Demogrfico 74
7.3 ANEXO 3: Teste de Investigao Bulmica de Edinburgh - BITE
76
1. INTRODUO
A preocupao exagerada pelo corpo est atingindo a populao em
nvel
mundial. Para compreender melhor esse culto imagem de perfeio, o
captulo
dois intitulado A Esttica e o Sujeito, ir abordar em seu
primeiro tpico 2.1, a
relao do sujeito com a esttica do seu corpo, como a magreza
exagerada est
cada vez mais sendo valorizado pela sociedade, que est deixando
de lado a
subjetividade e a singularidade, e como consequncia desse padro
de beleza
ocorre um grande desequilbrio na percepo da autoimagem.
Essa epidemia de culto ao corpo afeta uma populao
patologicamente
preocupada com a esttica corporal e que possui alteraes
psquicas
relacionadas ao esquema corporal. Desta forma surgem os
distrbios alimentares
como reflexos de um sofrimento psquico, que sero abordados no
trabalho no
tpico 2.2. Os transtornos alimentares so patologias e possuem
descries nos
critrios diagnsticos atuais, o DSM-IV classifica esses distrbios
como severas
perturbaes do comportamento alimentar.
Esses distrbios so formas de demonstrar dores subjetivas de
vrias
ordens, podem comprometer seriamente a sade levando a
prejuzos
biopsicossociais com elevada morbidade e mortalidade, e so
divididos em duas
categorias: anorexia nervosa e bulimia nervosa. Essas patologias
apresentam
uma grave perturbao da percepo da forma e do peso corporal,
afetam na
maioria dos casos adolescentes e mulheres jovens, apresentando
importantes
prevalncias na populao em geral. De acordo com a American
Psychiatric
Association a prevalncia de anorexia nervosa varia cerca de 0,3
a 3,7% e a
prevalncia da bulimia nervosa varia entre 1 a 4%. Os homens
tambm so
acometidos por estes distrbios, porm em propores menores.
Tambm sero abordados no trabalho, outros tipos de
transtornos
alimentares que podem ser encontrados, apesar de no estarem
includos no
DSM-IV com suas prprias categorias e necessitarem de maiores
estudos para
uma melhor caracterizao, como a Vigorexia (caracterizada pela
prtica
excessiva de exerccios fsicos, obsessiva preocupao com o corpo e
adoo de
prticas alimentares no convencionais), a Ortorexia Nervosa
(caracterizada pela
fixao por sade alimentar, com uma obsesso doentia pelo
alimento
biologicamente puro, que resulta na criao de rituais e adoo de
uma dieta
10 restritiva, com consequente isolamento social) e o Transtorno
da Compulso
Alimentar Peridica TCAP (sndrome definida por episdios
recorrentes de
compulso alimentar, sem a presena de comportamentos
compensatrios
extremos para a perda de peso como vmito e laxantes).
No subcaptulo 2.3, ser explicado as principais caractersticas, a
histria e
aspectos psicolgicos da bulimia nervosa, que caracterizada
segundo o DSMIV
por episdios repetidos de compulses alimentares seguidas de
comportamentos
compensatrios inadequados, como vmitos auto induzidos,
diurticos, mal uso
de laxantes, dentre outros medicamentos, jejuns ou exerccios
excessivos.
A bulimia nervosa uma patologia que apareceu na literatura desde
o
sculo XVI, se situa no cruzamento de diversos eixos
psicopatolgicos, como o
neurtico, psictico, perverso e psicossomtico.
Portadores de bulimia nervosa apresentam peso normal ou
sobrepeso,
desta forma mais difcil de ser diagnosticada.
A gravidade das condutas purgativas varia muito de um caso para
outro,
porm, o uso de laxantes, diurticos, drogas e exerccios fsicos
intensivos podem
provocar o aparecimento de problemas orgnicos diversos que, nas
formas
graves, podem ser fatais.
Mesmo que tenhamos conhecimento de casos desde a antiguidade,
hoje
em dia esse transtorno tem notoriedade pela morte de jovens
sempre comentadas
pela mdia, desta forma foi feita uma pesquisa de campo para
ampliar os estudos,
onde foi utilizado o questionrio autoaplicvel j validado e com
verso em
portugus teste de investigao bulmica de Edinburgh BITE, que um
dos
instrumentos mais utilizados para o rastreamento de sintomas de
bulimia nervosa
em diversos pases, apresentando propriedades psicomtricas
adequadas e bons
resultados nos estudos anteriores, contm 33 questes de
autopreenchimento,
desta forma, possui uma facilidade de administrao, eficincia e
economia nas
pesquisas para investigar a presena de comportamentos bulmicos
na
populao.
A escolha deste tema foi pensada diante da importncia
epidemiolgica, da
gravidade e das diversas complicaes da bulimia nervosa, sendo a
prtica de
exerccios fsicos excessivos um dos comportamentos
compensatrios
inadequados utilizados aps episdios repetidos de compulso
alimentar.
11
Desta forma o presente trabalho possui como objetivo geral
investigar a
relao do sujeito com a esttica do seu corpo e a prevalncia de
sintomas de
bulimia nervosa e seu perfil em frequentadores de academias de
ginstica de
Copacabana de ambos os sexos e matriculados em exerccios
aerbicos e
anaerbicos, a fim de informar os profissionais da rea da sade,
em especial os
psiclogos, nutricionistas, professores de educao fsica e mdicos,
sobre a
presena de bulmicos em academias e as possveis consequncias
indesejveis
sobre a sade pelo excesso de exerccios fsicos.
12 2. A ESTTICA E O SUJEITO
2.1 A relao do sujeito com a esttica do seu corpo
No de hoje que o ser humano tem uma preocupao com seu prprio
corpo, mas a forma como pensamos na esttica, vem sofrendo
diversas
modificaes ao longo das geraes.
A relao entre a autoestima e a imagem do corpo magro na
atualidade
tem sido muito valorizada na sociedade e nos meios de
comunicao,
repercutindo de forma considervel na vida das pessoas. O
contingente feminino
o mais acometido por essas patologias, pois sofre maior presso
no que se
refere valorizao corporal, tendendo assim, a dar maior ateno ao
seu corpo.
J o contingente masculino, a cobrana esttica no se restringe
simples
reduo do peso ou do manequim do vesturio, mas tambm troca da
gordura
excessiva por msculos bem destacados, que podem gerar outras
patologias que
ainda no foram classificadas pelos manuais, como a
vigorexia.
Segundo Bucaretchi (2003), a imagem corporal est relacionada com
a
autoestima, que significa amor prprio, satisfao pessoal e,
principalmente, estar
bem consigo mesmo. Qualquer insatisfao se refletir na
autoimagem. A
primeira manifestao da perda da autoconfiana percebida quando o
corpo
que se tem no est de acordo com o esteretipo idealizado pela
sociedade.
Estamos vivendo uma poca na qual a beleza um fator de grande
importncia, acabamos no valorizando a subjetividade e a
singularidade. H uma
exigncia da nossa sociedade pelo corpo perfeito e magro, e essas
influncias
externas acabam gerando um grande peso no desequilbrio da
percepo da
autoimagem corporal.
Alguns autores associam o aparecimento das doenas da beleza
(Medeiros, S. A. Esttica, Angstia e Desejo - Uma Abordagem
Psicanaltica Sobre as
Doenas da Beleza., 2012), como aspectos socioculturais, C.M.
Morgan e A.M.
Claudino de Azevedo (1998), destacam que: [...] a presso
cultural para
emagrecer considerada um elemento fundamental da etiologia dos
transtornos
alimentares, que interage com fatores biolgicos, psicolgicos e
familiares para
gerar a preocupao excessiva com o corpo e o pavor doentio de
engordar,
caractersticos da bulimia e anorexia nervosa. (p.1).
13
Porm atualmente vem sendo enfatizado que os transtornos
alimentares
no esto restritos s sociedades ocidentais, desta forma no podem
ser
compreendidos como sndromes ligadas apenas a cultura.
Podemos obervar que outras culturas tambm podem apresentar
esses
transtornos, de uma forma que no necessariamente aparea o medo
de
engordar, como as anorxicas descritas na Idade Mdia, onde o
transtorno estava
ligado ao parar de comer como uma forma de purificao, e no por
medo de
engordar.
Estudando a histria da arte podemos analisar que a magreza nem
sempre
foi o ideal de beleza almejado pelas mulheres, e tambm que as
mesmas sempre
recorreram aos seus corpos para expressarem sua subjetividade e
a
singularidade de seus sofrimentos. Na Grcia, por exemplo, a
harmonia de
propores do corpo era a sntese da beleza ideal, como podemos
observar na
esttua de Vnus de Milo, que era um smbolo do padro grego. Na
Idade Mdia,
o corpo ideal de maternidade passou a ser valorizado, neste
perodo a mulher era
considerada a fonte do pecado e o corpo passou a ser negado e
reflexo da beleza
divina. A imagem da prpria Virgem Maria personifica esse ideal.
No perodo
renascentista o padro de beleza se relacionava a riqueza, como
as ricam tinham
acesso a uma boa alimentao, as mulheres com os corpos mais
fartos, quadris
grandes e abdomens avantajados, eram as mais admiradas. No sculo
XX houve
uma transformao nos padres de beleza. Na dcada de 20 com o incio
do
movimento de libertao da mulher, voltou exigncia da magreza, a
silhueta
feminina ficou mais fina. Nas dcadas de 40 e 50 as estrelas de
Hollywood, como
a Marilyn Monroe, encarnavam o modelo das mulheres de seios
fartos e corpos
com curvas. Na dcada de 60 e 70 com o movimento hippie, a
exigncia da
magreza se intensificou e a imagem do corpo ideal passou a ser
centrado no
corpo adolescente, magro, sem curvas e seios pequenos, desta
forma a
problemtica dos transtornos alimentares passou a ocupar um lugar
de destaque
na psicopatologia da poca. Em 80 surgiu o corpo feminino
musculoso, talvez
pela liberdade feminina e a competio com os homens, a cantora
Madonna
representa bem esse ideal de beleza.
Atualmente no sculo XXI, temos dois esteritipos de beleza, a
magreza
exagerada das passarelas e os msculos enaltecidos que estampam
as
14 propagandas das academias. Esses padres de beleza vm
influnciando o
aumento assustador da incidencia dos transtornos
alimentares.
A sociedade contempornea aponta o culto ao corpo como uma
ditadura
da beleza, disfarada em uma falsa promessa de felicidade. A
esttica, sobretudo
o corpo, teria se tornado um produto de consumo e uma estratgia
de
acumulao para o Capital, podemos observar com o advento da
modernidade, o
permanente convite ao consumo, com os diversos e carssimos
produtos estticos
e as cirurgias plsticas, o que s confirmam o quanto a magreza e
a aparncia
so maciamente investidos.
Os padres de beleza impostos por nossa sociedade geram uma
obsesso pela perfeio do corpo. Na realidade, trata-se de uma
"epidemia de
culto ao corpo" que se multiplica em uma populao patologicamente
preocupada
com a esttica corporal e afetada por alteraes psquicas
relacionadas ao
esquema corporal. Na obra de Freud O Mal Estar na Civilizao
(1930), o autor
situa a fruio da beleza como uma estratgia de busca da
felicidade. Freud
tambm se interroga sobre o sentido da atitude de reverncia a
beleza ainda
que no oferecesse proteo ao desamparo.
Talvez a anorexia e a bulimia estejam to presentes na nossa
atualidade
por denunciarem o desconforto e a falta numa sociedade
consumista onde
imperam o conforto e a abundncia, denunciando o mal-estar na
nossa sociedade.
Desta forma podemos observar o quanto cultura est relacionada
aos
transtornos alimentares, apesar dos aspectos socioculturais no
serem os nicos
causadores do aparecimento desses transtornos, eles tem uma
importncia
fundamental como favorecedores do seu desenvolvimento. Parece
haver tambm,
um consenso de que os aspectos socioculturais desempenham um
papel mais
significativo no aparecimento da bulimia do que na anorexia.
Esse mal-estar decorre dos processos de homogeneizao da
cultura,
onde encontra no corpo uma forma de expresso privilegiada atravs
da
valorizao da magreza, da boa forma e da sade perfeita. Mas mais
importante
do que a tentativa de atribuir os transtornos alimentares a uma
causalidade social
a constatao da incidncia desses transtornos no mundo todo, o que
coloca
em discusso os efeitos da modernizao e da globalizao.
15
H uma relao entre os distrbios alimentares e sintomas ligadas ao
ato
de comer com a parte emocional do ser humano. Esses distrbios so
formas de
demonstrar dores subjetivas de vrias ordens.
Os distrbios de imagem corporal e a baixa autoestima tambm
podem
contribuir para a alterao da satisfao sexual. A sexualidade
feminina, por
exemplo, configurada atravs de diferentes fatores como as
influncias
histrico-sexuais de nossa civilizao, questes de gnero, aspectos
familiares,
religiosos, entre outros. E esses diferentes fatores podem se
relacionar com uma
srie de comprometimentos emocionais, tais como autoimagem
diminuda, baixa
autoestima, ansiedade e depresso. As mulheres que so acometidas
pelos
transtornos alimentares associam seu sentimento sexual com o
peso corporal,
gravidez, amamentao e o estado de seus relacionamentos.
A psicloga Mrcia Atik considera que o significado do corpo
na
sexualidade vai muito alm de sua beleza, e est relacionado
possibilidade
desse corpo ser a matriz da sexualidade, a ponte entre o desejo
e sua expresso
e gozo.
A valorizao do corpo perfeito, como vemos na atualidade os
sentimentos de desvalia, invade a mente e, como um raio, a
ultrapassa em alguns momentos, quando o ideal seria a entrega total
ao outro e s sensaes. Sem dvida, as presses do mundo externo acabam
trazendo para a sexualidade feminina uma nova forma de represso, no
a social como em outros tempos, mas, pior que isso, a represso que
a prpria mulher se impe por fora de uma autocrtica centrada em
parmetros muitas vezes idealizados. (ATIK, M. Descontente com o
corpo x sexualidade, So Paulo, 2010)
Estamos vivendo em tempos onde a sociedade est marcada por
um
exacerbado narcisismo e esses distrbios so reflexos de um
sofrimento psquico,
o ideal de beleza to intenso que interfere na sexualidade.
Entre outras coisas, o que nos diferencia de qualquer outra
espcie animal a subjetividade das emoes, e esse sentir que
ultrapassa o corpo fsico e sexual uma disponibilidade interna de
entrega, de troca, de valorizao de si e de seu desejo.
(Op.cit.)
16 Uma pessoa sexualmente sadia, valoriza seu prprio corpo,
estabelece e
mantm relaes significativas, enquanto as pessoas que sofrem com
esta
patologia apresentam um distrbio da autoimagem, acarretando
numa
insatisfao com seu corpo, afetando dentre outras coisas, sua
atividade sexual.
A essncia da beleza est na felicidade e em estar saudvel,
sem
presses, preconceitos ou modelos. O mais bonito do ser humano
sua
singularidade.
Estamos diante de um grande problema, seja o sofrimento psquico
do
sujeito em relao esttica de seu corpo ou o comportamento de
indivduos em
relao aos alimentos (os transtornos alimentares), ou ainda ao
culto
contemporneo imagem de perfeio.
Por reviravolta completa, o corpo transforma-se em objeto
ameaador que preciso vigiar, reduzir, mortificar para fins
estticos, com os olhos fixos nos modelos emagrecidos da Vogue, onde
possvel decifrar toda a agressividade inversa de uma sociedade da
abundncia em relao ao prprio corpo e toda a recusa veemente dos
prprios princpios. (Baudrillard, J. A sociedade de consumo, So
Paulo, 1970, p.175)
2.2 Transtornos alimentares: Tipos e sua Definio
Os transtornos alimentares so considerados patologias e
descritos no
DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders
IV), onde so
caracterizados por severas perturbaes do comportamento
alimentar.
Esses transtornos esto aumentando consideravelmente nos ltimos
anos
atingindo entre 1 e 4% da populao (Szmukler, G. I., 1985) e
afetam
aproximadamente 90% dos casos mulheres jovens, apesar de
recentemente estar
havendo um aumento no nmero de transtornos em homens e em
adultos de
ambos os sexos (Abott DW, Ackerman SH, Agras WS, Banzhaf D,
Barber J,
Bartlett JC, et al.1993).
Os transtornos alimentares podem levar a grandes prejuzos
biopsicossociais com elevada morbidade e mortalidade, so
frequentemente
considerados quadros clnicos ligados modernidade, na medida em
que o
avano da mdia nas ltimas dcadas tem incentivado um padro de
beleza
quase impossvel de ser alcanado.
17
Segundo o DSM-IV esse quadro inclui dois diagnsticos especficos,
a
Anorexia Nervosa que caracterizada por uma recusa a manter o
peso corporal
em uma faixa normal mnima, e a Bulimia Nervosa que caracterizada
por
episdios repetidos de compulses alimentares seguidas de
comportamentos
compensatrios inadequados, como vmitos auto induzidos,
diurticos, mal uso
de laxantes, dentre outros medicamentos, jejuns ou exerccios
excessivos.
Tanto a Anorexia Nervosa quanto a Bulimia Nervosa apresentam
uma
grave perturbao da percepo da forma e do peso corporal. Um
paciente
bulmico pode apresentar episdios anorxicos e vice-versa e uma
pessoa pode
desenvolver as duas doenas simultaneamente.
A obesidade tambm um quadro que possui uma ampla problemtica
na
adolescncia e na vida adulta, e vem atingindo um nmero cada vez
maior de
pessoas em todo o mundo, mas que no aparece no DSM-IV, porque no
foi
estabelecida uma associao consistente com uma sndrome psicolgica
ou
comportamental, mas includa na Classificao Internacional de
Doenas (CID)
como uma condio mdica geral.
A obesidade se constitui como um problema grave de sade pblica
e
epidemiologicamente significativo, pela taxa de mortalidade ser
maior em
indivduos que apresentam a obesidade, essa taxa maior devido
ao
aparecimento de vrias doenas desencadeadas pelo sobrepeso. As
primeiras
doenas que costumam afetar o obeso so as do corao, pois o corao
de uma
pessoa acima do peso tem que trabalhar mais. Porm a obesidade
pode
desencadear diversas outras doenas, como: hipertenso arterial,
trombose,
apnia, esteatose heptica, depresso, asma, infertilidade e
gravidez de risco,
colesterol alto, diabetes do tipo dois, entre outros.
Podemos observar no DSMI-IV uma categoria para transtornos
alimentares
sem outra especificao, onde so encontrados transtornos que no
satisfazem
os critrios para um transtorno alimentar especfico. A presena de
outros
transtornos de alimentao vistos pela primeira vez na infncia
(exemplo: PICA,
Transtorno de Ruminao e Transtorno de Alimentao na infncia) so
includos
na seo Transtornos de Alimentao da Primeira Infncia.
Outros tipos de transtornos alimentares podem ser encontrados,
apesar de
no estarem includos no DSM-IV com suas prprias categorias e
necessitarem
18 de maiores estudos para uma melhor caracterizao, como a
Vigorexia, a
Ortorexia Nervosa e o Transtorno da Compulso Alimentar Peridica
(TCAP).
No quadro a baixo pode ser observado as principais
caractersticas e
diferenas dos transtornos alimentares que sero abordados neste
trabalho:
FIGURA 1: Quadro comparativo dos Transtornos Alimentares.
2.2.1 Anorexia Nervosa
A Anorexia Nervosa foi o primeiro transtorno alimentar a ser
descrito, ainda no sculo XIX, apresentou sua classificao e teve
seus critrios
reconhecidos na dcada de 1970. O termo anorexia significa falta
de apetite,
deriva do grego an-, deficincia ou ausncia de, e orexis,
apetite, porm na
anorexia no ocorre uma perda real do apetite, ao menos nos
estgios iniciais da
doena, os pacientes com essa doena costumam sentir fome, porm h
uma
negao do apetite e um controle obsessivo do corpo. Esta
patologia se
caracteriza por perda de peso intensa e intencional atravs de
uma recusa
Quadro comparativo dos Transtornos Alimentares
Anorexia Nervosa Bulimia Nervosa Vigorexia
Ortorexia Nervosa
Transtorno da Compulso Alimentar Peridica
Pessoa muito magra que se v acima do peso. Autoimagem de Obeso.
No se alimenta o suficiente e pode ou no ter sintomas purgativos.
Pode ter perodos de compulso. Frequentemente inicia-se na
adolescncia. Mais comum no sexo feminino.
Pessoa com peso normal ou acima, alimenta-se aparentemente
normal, apresentando perodos frequntes de compulso com sintomas
purgativos ou compensatrios, como automedicao com laxantes e
diurticos. Frequentemente inicia-se na adolescncia. Mais comum no
sexo feminino.
Pessoa com peso normal e musculatura hipertrofiada. Autoimagem
de fraco. Alimenta-se visando o aumento da fora muscular.
Pensamento obsessivo na aparncia fsica. Frequente uso de
anabolizantes. Comumente inicia-se na adolescncia. Afeta mais o
sexo masculino.
Pessoa com peso normal ou abaixo. Obstinado pela alimentao que
ele julga saudvel. Pensamento obsessivo na sade. Obsesso doentia
com o alimento biologicamente puro, acarretando restries
alimentares significativas e isolamento social.
Com sobrepeso ou obesidade, sem sintomas purgativos ou
compensatrios. Inicia-se frequntemente na infncia. Autocrtica
depreciativa com sintomas depressivos e ansiosos. Estima-se 5 a 30%
do TCAP em obesos que buscam servios especializados para tratamento
da obesidade. Fracassos das dietas.
19 alimentar consciente pelo paciente que utiliza de dietas
extremamente rgidas,
almejando obsessivamente manter seu peso abaixo da faixa normal
mnima,
associado a um intenso temor de engordar, apresentando uma
imagem corporal
extremamente distorcida.
Esse transtorno pode ser encontrado desde a Idade Mdia, onde
estava
relacionado a jejuns religiosos que se transformavam em
comportamentos
obsessivos. Um dos primeiros casos sugestivos de anorexia
nervosa descrito
por Habermas (1986), sobre uma jovem chamada Friderada que viveu
no ano de
895. Almejando diminuir seu apetite, buscou refgio em um
convento, onde foi
restringindo sua dieta ate passar a efetuar longos jejuns, desta
forma rapidamente
seu quadro foi se deteriorando at a sua morte, por
desnutrio.
Em um estudo sobre a evoluo da histria da anorexia, C.
Weinberg
(2004), comenta:
As santas e as beatas da Idade Mdia, com seus jejuns auto
impostos, no perseguiam um ideal de magreza, mas um ideal de ascese
e de comunho com Deus. Ou ainda, faziam de recusa em alimentar-se
uma forma de conservarem a virgindade e opor-se aos casamentos
arranjados. (p.6)
No sculo XIII houve uma grande expanso dos casos de anorexia
santa,
essas condutas eram interpretadas inicialmente como um meio de
alcanar a
elevao espiritual e, no pice da Inquisio, comearam a serem
vistas como
possesso demonaca. Entre os anos de 1200 e 1600, existem muitas
descries
de mulheres que praticavam jejuns prolongados como uma forma de
se aproximar
espiritualmente de Deus, sendo consideradas santas ou milagrosas
por
conseguirem sobreviver apesar do estado de inanio em que se
encontravam
aps os jejuns prolongados.
Segundo Weinberg e Cords (2006), com surgimento da Reforma,
obteve-
se um declnio dos casos de anorexia santa:
Mulheres como Clara de Assis e Catarina de Siena podiam, por
meio do jejum, afirmar sua prpria personalidade em reao ao mundo
que tentava domin-las. Entretanto, com o advento da Reforma, a
autonomia religiosa das mulheres passou a ser encarada como uma
heresia ou obra do diabo, levando ao declnio do comportamento.
(p.18-19)
20
As jovens tambm se utilizavam do jejum como meio de
responder
estrutura social patriarcal a qual estavam submetidas, como, por
exemplo, os
casamentos impostos e arranjados. Um caso bem conhecido o da
Santa
Catarina de Siena, que ao ter uma viso de Jesus aos seis anos de
idade, decide,
um ano depois, dedicar sua virgindade Virgem Maria. Porm, seus
pais
pretendem cas-la com o marido de sua irm, recentemente falecida
no parto.
Catarina recusou o plano de casamento imposto por seus pais e
durante trs
anos ela castigada, levando uma vida de trabalho, recluso e
oraes at que
seu pai, convencido de sua santidade, a libera do castigo e
determina que a
deixem viver conforme seu desejo. Desta forma Catarina entrou
para o convento,
onde se alimentava de po e alguns vegetais, autoflagelava-se, e
eventualmente
provocava vmitos atravs de ervas e galhos na garganta. A mesma
veio a
falecer de desnutrio aos 32 anos.
Podemos observar aspectos em comum na anorexia santa e na
anorexia
nervosa, ambas descrevem excesso de atividades, perfeccionismo,
constante
vigilncia, insatisfao consigo prpria e distores cognitivas.
No ano de 1694, Richard Morton o autor do primeiro relato mdico
de
anorexia nervosa, descreveu u m quadro clnico que denominou de
consumpo
de origem nervosa, que apresentava como sintomas principais a
perda do
apetite, amenorreia, averso comida, obstipao, hiperatividade
e
emagrecimento extremo. O autor relatou dois casos, um deles
sobre uma jovem
com recusa em alimentar-se e ausncia de ciclos menstruais, que
rejeitou
qualquer ajuda oferecida e morreu de inanio. Morton se mostrou
intrigado pela
indiferena caracterstica que essas pacientes demonstravam em
relao a seu
estado crtico de desnutrio e pela preservao de suas faculdades
mentais
bsicas.
No sculo XIX surgem, quase simultaneamente, descries clnicas
feitas
pelo mdico ingls William Gull em 1868 e pelo neurologista francs
Charles
Lasgue em 1873.
Em 1868, William Gull, durante um encontro da British
Medical
Association, em Oxford, descreveu trs pacientes com um quadro
anorxico
restritivo, que inclua emagrecimento, amenorreia, perda de
apetite, bradicardia,
baixa temperatura corporal, edema nos membros inferiores,
obstipao e cianose
perifrica. O mdico denominou este quadro clnico inicialmente de
apepsia
21 histrica, passando mais tarde, em 1874, a empregar o termo
anorexia nervosa,
que a descreveu como uma forma peculiar de doena que afeta
principalmente
mulheres jovens e caracteriza-se por emagrecimento extremo, cuja
falta de
apetite decorrente de um estado mental mrbido e no a qualquer
disfuno
gstrica. Gull rejeitou a possibilidade que uma enfermidade
orgnica justificasse a
anorexia.
Em 1873, Charles Lasgue descreveu a anorexie histrique,
produzindo
uma descrio deste quadro clnico, que permanece vlida at os dias
atuais,
qualificando-a de inanio histrica e considerando-a, da mesma
forma que Gull,
uma doena psicognica. Ressaltando tambm a origem psquica dessa
doena,
focalizando a fenomenologia distinta da anorexia histrica na
crena mrbida de
que o alimento lesivo e deve ser evitado.
Em continuidade a Lasgue, Charcot e Djerine caracterizam a
anorexia
mental pela recusa alimentar e a colocam em oposio melancolia e
aos delrios
de perseguio, em que tal recusa fruto das ideias delirantes.
Em 1903, Pierre Janet relata o caso de Nadia, uma moa de 22 anos
que manifestava vergonha e averso ao seu corpo com constante desejo
de
emagrecer, quadro que coloca em evidncia o medo de engordar e
que
denominou de anorexia mental. Janet salienta a vergonha que a
jovem sentia de
seu corpo a fazendo se vestir como um menino. O autor relacionou
a busca
intensa da magreza tentativa de adiar a maturidade sexual e
sugeriu dois
subtipos psicopatolgicos, o obsessivo, na qual a fome estava
mantida, e o
histrico, na qual as pacientes a perdiam. Contudo, Janet (1908)
salienta que isso
no significava uma inverso sexual, mas sim o desejo de erradicar
o sexo e de
no ter corpo algum. (p.37)
A anorexia era compreendida como uma espcie de perverso
mental,
sendo tratada com mtodos de isolamento e, posteriormente, j em
1914, ocorreu
uma mudana marcante na compreenso desta patologia, que passou a
ser
considerada uma doena endcrina, quando Simmonds, um patologista
alemo,
descreveu uma paciente extremamente magra, a quem, ao fazer-lhe
autopsia
encontrou uma destruio pituitria e durante os 30 anos seguintes,
reinou a
confuso entre insuficincia pituitria (doena de Simonds) e
anorexia nervosa. A
partir dos anos 30, a anorexia passa a ser estudada
principalmente sobre o ponto
22 de vista psicolgico, deixando no esquecimento as antigas
discusses sobre a
origem endcrina ou psicolgica do transtorno.
A partir de 1960, o aumento de casos de pacientes com anorexia
nervosa
parece ter colaborado para seu reconhecimento como sndrome
psiquitrica
especfica, com aspectos caractersticos que a distinguem de
outros transtornos.
O professor e psiquiatra britnico Gerald Russell em 1970 tenta
mostrar a
relao entre as teorias biolgicas da origem da doena com as
psicolgicas e
sociolgicas, sugerindo critrios padronizados para o diagnstico
da anorexia
nervosa com base nos distrbios psicobiolgicos e
psicopatolgicos,
desenvolvidos para atender tanto as necessidades clnicas como as
de pesquisa.
Russell definiu que este transtorno psquico provoca a preocupao
mrbida com
o risco de engordar, a diminuio da ingesto de alimentos e a
perda considervel
de peso, esta por sua vez, seria a causa do transtorno endcrino,
a desnutrio
agravaria o transtorno psquico, que tambm poderia piorar de
maneira direta a
funo hipotalmica e produzir disfunes endcrinas, como a
amenorreia, o
transtorno hipotalmico poderia alterar as funes psquicas,
gerando atitudes
anmalas frente ao alimento, imagem corporal e sexualidade. Os
aspectos
propostos por Russell so concebidos como diagnsticos de anorexia
nervosa
pelos atuais sistemas classificatrios.
O DSM-IV classifica a anorexia nervosa como um transtorno mental
e da
conduta alimentar que se caracteriza por: recusa em manter o
peso corporal
dentro ou acima do mnimo normal adequado idade e altura, por
exemplo,
perda de peso levando manuteno do peso corporal abaixo de 85%
do
esperado, ou fracasso em ter o ganho de peso esperado durante o
perodo de
crescimento, levando a um peso corporal menor que 85% do
esperado; medo
intenso de ganhar peso ou de se tornar gordo, mesmo com peso
inferior;
perturbao no modo de vivenciar o peso, tamanho ou forma
corporais, influncia
indevida do peso ou da forma do corpo sobre a autoavaliao, negao
da
gravidade do baixo peso corporal atual; e especificamente nas
mulheres, ocorre a
amenorreia, que a ausncia de pelo menos trs ciclos menstruais
consecutivos,
quando esperado ocorrer o contrrio (considera-se que uma mulher
tem
amenorreia se os seus perodos menstruais ocorrem apenas aps
a
administrao de hormnio, por exemplo, estrgeno).
23
O critrio diagnstico do DSM-IV tambm distingue a anorexia
nervosa em
dois tipos: o tipo restritivo, onde no h episdios recorrentes de
excessos
alimentares e/ou prticas purgativas (exemplo: vmitos auto
induzidos, uso de
laxantes, diurticos, enemas, etc.). Neste tipo de anorexia h uma
restrio da
alimentao at jejum completo visando o emagrecimento rpido; e o
tipo
bulmico ou purgativo, onde h episdios recorrentes de excessos
alimentares
(binge-eating) e/ou prticas purgativas. Alguns estudos
consideram que pacientes
que utilizam de prticas purgativas so mais impulsivas,
perfeccionistas e
obsessivas do que pacientes que usam apenas prticas
restritivas.
A anorexia nervosa um grande sintoma dos males que afligem o
sculo
XXI, o estilo de corpo extremamente magro imposto pela cultura
atual acaba
gerando dificuldades para a aceitao da autoimagem, essa
patologia revela algo
sobre toda coletividade qual pertence o sujeito que a manifesta.
Assim como as
histricas diziam algo a respeito do inconsciente do final do
sculo XIX a anorexia
nervosa tem muito a dizer sobre o sculo XXI. A prevalncia de
anorexia nervosa varia cerca de 0,3 a 3,7% segundo a
American Psychiatric Association. Estudos mostram que essa doena
afeta mais
pessoas do sexo feminino, da raa branca e tem incio na
adolescncia.
Est havendo um aumento crescente de casos de anorexia, em
especial no
grupo de modelos e bailarinas e h uma tendncia ao aumento da
prevalncia
desta doena nos prximos anos.
Atualmente, podemos encontrar na Internet sites e comunidades
pr-ana e
pr-mia que significam simultaneamente, pr-anorexia e pr-bulimia.
Nestes sites
os adolescentes trocam dicas e experincias sobre como enaltecer
seus ossos,
divulgando fotos de famosos anorxicos, msicas pr-anorexia,
dentre outros
mtodos para incentivar a perda de peso.
Uma reviso de 12 estudos de incidncia cumulativa realizada por
Pawluck
& Gorey (1998), relatou uma incidncia de anorexia nervosa
mdia anual na
populao em geral de 18,5 por 100.000 (DP=21,01) entre mulheres e
de 2,25 por
100.000 (DP=2,63) por ano entre homens. H evidncias limitadas de
alteraes
na incidncia geral da anorexia nervosa no decorrer do tempo.
Nos Estados Unidos, calcula-se que 1 em cada 100 meninas
seja
anorxica, no Brasil, a proporo de 1 para 250, e na Argentina, so
10 em
cada 100 meninas.
24
A anorexia nervosa apresenta a maior taxa de mortalidade entre
os
distrbios psiquitricos, segundo Erbert (2005), entre 6% a 20%
dos portadores
diagnosticados com esta patologia e no tratados morrem
prematuramente,
devido desnutrio extrema, arritmias malignas, insuficincia
cardaca, suicdio
e infeces graves.
Existem alguns instrumentos que podem indicar a presena de
sintomas de
anorexia nervosa, como o Eating Attitudes Test EAT, que indica a
presena de
padres alimentares anormais, pode ser usado tambm para o
rastreamento de
Bulimia Nervosa e fornece um ndice de gravidade de preocupaes
tpicas de
pacientes com transtorno alimentar, particularmente, inteno de
emagrecer e
medo de ganhar peso. Este instrumento apresenta duas verses, uma
com 40
itens, e outra menor, com 26 itens, sendo que esta ltima foi
traduzida para o
portugus e est em processo de validao Teste de Atitudes
Alimentares.
Outro instrumento o Eating Disorder Inventory EDI, que
possui
propriedades psicomtricas bem estabelecidas em estudos de
confiabilidade e
validade. Apresenta 64 itens que avaliam as caractersticas
psicolgicas e
comportamentais comuns anorexia nervosa e bulimia nervosa.
Consiste em
oito subescalas, trs para avaliar os aspectos psicopatolgicos
especficos do
transtorno alimentar (mpeto para a magreza, insatisfao corporal
e bulimia), e
cinco para avaliar os aspectos psicopatolgicos gerais observados
em pacientes
com transtorno alimentar. Apresenta uma verso revisada EDI-2 que
contm mais
trs subescalas (asceticismo, regulao do impulso e insegurana
social). H
uma verso do EDI para crianas (KEDS).
O Eating Disorder Examination verso questionrio - EDE-Q, tambm
pode
ser utilizado para avaliar sintomas de anorexia nervosa, foi
desenvolvido como
uma verso autoaplicvel do Eating Disorder Examination em formato
de
entrevista. Possui 41 itens e constitudo pelas mesmas quatro
subescalas
presentes no EDE (restrio alimentar, preocupao com a comida,
preocupao
com a forma corporal e preocupao com o peso). Possui uma verso
em
portugus chamado Questionrio de Investigao de Transtornos
Alimentares.
Tanto o EDE-Q e EDE, possuem sua validade e confiabilidade
bem
documentadas.
importante ressaltar algumas caractersticas dos pacientes com
anorexia
nervosa, como a baixa autoestima, sentimento de desesperana,
25 desenvolvimento insatisfatrio da identidade, tendncia a
buscar aprovao
externa, extrema sensibilidade a crticas e conflitos entre
autonomia e a
dependncia. Pessoas acometidas por este distrbio se sentem acima
do peso,
independente da imagem refletida no espelho, apresentam uma
percepo
distorcida quanto ao seu prprio corpo. Alguns se sentem
totalmente gordos,
outros percebem que so magros, mas preocupam-se com partes do
corpo,
principalmente abdmen, coxas e ndegas. Apesar das pessoas em
volta
notarem que o paciente est abaixo do peso, o mesmo insiste em
negar, em
querer emagrecer e perder mais peso. O funcionamento mental de
uma forma
geral est preservado, exceto quanto imagem que tem de si mesmo e
o
comportamento irracional de emagrecimento.
Esse transtorno no melhora com o emagrecimento, pois esses
pacientes
permanecem insatisfeitos com sua aparncia apesar da perda de
peso, podendo
utilizar mtodos de controle de peso cada vez mais extremos.
Alguns dos
mtodos pouco usuais para emagrecer utilizado por pessoas com
anorexia so:
auto induo de vmito, excesso de atividade fsica, ingesto de
diurticos, uso
de laxantes e jejuns.
Portadores de anorexia apresentam uma recusa inconsciente de
crescer,
tentando conservar as formas da infncia, apresentam grandes
comprometimentos no relacionamento patolgico com a me,
frequentemente se
dizem auto suficientes mas so dependentes, so carentes de afeto,
com
obsessiva tendncia para o perfeccionismo, a maternidade e
gravidez so
considerados absurdos, h uma recusa da feminilidade, visando o
corpo reto sem
formas arredondadas nem seios, surgindo assim uma tentativa de
controlar o
prprio corpo.
Frequentemente se inicia com o desejo de perder alguns quilos,
porm h
ocasies em que o comeo da doena se deve por um fato
significativo da vida,
como a diminuio da ingesto de alimentos devido a um problema
vivencial
(termino de relacionamento, demisso, etc.). As dietas passam a
ter um objetivo
especial para essas pessoas, dar uma sensao de poder e controle
sobre seu
comportamento alimentar, o que no experimenta em outras reas da
sua vida.
A perda de peso decorrente deste distrbio conseguida atravs
da
seleo dos alimentos, ocorrendo uma preocupao exagerada com o
contedo
calrico e teor de gordura dos mesmos, depois esses pacientes
podem ficar
26 longos perodos sem comer, chegando ao jejum total onde no
ingerido nem
gua. Pesam-se incessantemente em diferentes balanas e utilizam
de tcnicas
para enganar os familiares, escondendo ou jogando fora os
alimentos e usando
roupas cada vez mais folgadas, para que permitam disfarar a
magreza. Pode ser observado como parte desse quadro sintomas
depressivos,
isolamento social, irritabilidade e insnia. A amenorreia sempre
est presente na
anorexia, alm desta, inmeros comprometimentos fsicos e orgnicos
so
consequentes desnutrio e s alteraes neuroendcrinas, como a perda
de
interesse sexual, pele seca e amarelada, unhas e cabelos
quebradios, sede
excessiva, tonteira, cefaleia, letargia, edema de membros,
anemia, distrbios de
coagulao e alteraes metablicas, cardiovasculares e
gastrintestinais. Nos
casos em que ocorre induo de vmitos pode-se observar desgaste do
esmalte
dentrio provocado pelo suco gstrico dos vmitos, que leva
descalcificao
dos dentes e aumenta o desenvolvimento de cries, podendo levar
at a perda de
dentes e o Sinal de Russell (leses cicatriciais no dorso das
mos, causadas pela
introduo da mo na boca para estimular o reflexo do vmito, que
pode variar de
calosidade ulcerao). No entanto, o distrbio mais srio,
responsvel pela
maioria dos casos de morte, o distrbio hidroeletroltico, cuja
consequncia
maior a manifestao de arritmias por vezes fatais.
Por envolver fatores biolgicos, psicolgicos e socioculturais, o
tratamento
da anorexia nervosa deve abranger uma abordagem individual e
familiar com uma
equipe multidisciplinar composta por psiclogo, mdico (clnico
ou
endocrinologista), psiquiatra e nutricionista.
Pacientes anorxicos apresentam muita resistncia a qualquer tipo
de
interveno externa, o que colabora para um dos maiores ndices de
recusa e
desistncia do tratamento. Estes desenvolvem atitudes negativas
em relao
alimentao durante longos perodos, e isso interfere no processo
de
recuperao. Pessoas com essa patologia apresentam um aumento
da
autoestima a cada quilo perdido, e os objetivos do tratamento
envolvem o ganho
de peso, colocando-os de frente com o que mais temem.
Os objetivos do tratamento da anorexia nervosa so: promover uma
auto
regulao do peso corporal, permitindo recuperar a menstruao,
restabelecimento dos padres saudveis de alimentao, tratar as
complicaes
fsicas decorrentes da doena, tratar os pensamentos, sentimentos
e crenas
27 inapropriadas, melhorar o relacionamento social, obter apoio
familiar ao
tratamento e prevenir as recadas.
Podemos observar a gravidade desta doena e a necessidade de
profissionais da sade se ajustarem aos novos instrumentos de
avaliao, para
melhor localizarem os diversos nveis da psicopatologia da
alimentao. Tambm
importante ressaltar que uma ampla educao, a nvel escolar,
talvez possa
diminuir os dados alarmantes deste grave problema, visto que a
faixa etria mais
afetada est entre adolescentes.
2.2.2 Vigorexia
A Vigorexia uma das mais recentes patologias emocionais
estimuladas pela cultura. Por tratar-se de um transtorno tornado
frequente mais recentemente,
ainda no foi catalogada como doena especfica pelos manuais de
classificao
internacionais (CID-10 e DSM-IV). Caracteriza-se pela prtica
excessiva de
exerccios fsicos, obsessiva preocupao com o corpo e adoo de
prticas
alimentares no convencionais Indivduos acometidos por esse
transtorno se
descrevem como fracos e pequenos, quando apresentam
musculatura
desenvolvida em nveis acima da mdia.
tambm conhecida como Dismorfia Muscular e Anorexia Nervosa
Reversa, foi descrita como uma subdiviso de um quadro mais
abrangente
chamado de Transtorno Dismrfico Corporal, definido como uma
preocupao obsessiva com algum defeito imaginrio na aparncia fsica
numa pessoa com
aparncia normal, essa preocupao causa sofrimento clinicamente
significativo
ou prejuzo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras
reas
importantes da vida do indivduo. Os quadros mais comuns no
Transtorno
Dismrfico Corporal envolvem preocupaes com defeitos faciais ou
outras partes do corpo, cheiro corporal e aspectos da aparncia.
A Dismorfia Muscular uma patologia psquica que envolve uma
preocupao de no ser suficientemente forte ou musculoso em todas
as partes
do corpo, uma alterao na percepo do esquema corporal
especificamente
referente esttica muscular do corpo, onde as pessoas que sofrem
deste
transtorno esto continuadamente em obsessiva busca da perfeio
esttica, se
diferencia do Transtorno Dismrfico Corporal, o qual se
caracteriza por um
28 sofrimento e uma obsesso com alguma parte especfica do corpo
que impea a
pessoa que sofre do transtorno de ter uma vida normal.
O DSM IV diz que a caracterstica essencial do Transtorno
Dismrfico
Corporal (historicamente conhecido como Dismorfofobia) uma
preocupao com
um defeito na aparncia, sendo este defeito imaginado ou, se uma
ligeira
anomalia fsica est realmente presente, a preocupao do
indivduo
acentuadamente excessiva e desproporcional.
A Dismorfia uma palavra grega que significa feira. A primeira
referncia
aparece na histria de Herodutus, no mito da garota feia de
Esparta, que era
levada por sua enfermeira, todos os dias, ao templo para se
livrar da sua falta de
beleza e atrativos.
O termo Dismorfia Corporal foi proposto em 1886 pelo
italiano Morselli. Alguns autores escreveram sobre a Dismorfia
Corporal de formas
diferentes, Kraeplin, em 1909, a descrevia como uma neurose
compulsiva, Janet,
em 1903, como uma obsesso com a vergonha do corpo, Jahrreiss, em
1930,
como hipocondria da beleza, e Stekel, 1949, escreveu sobre um
grupo peculiar de
ideias obsessivas que as pessoas apresentam a respeito de seu
prprio corpo.
O termo Vigorexia foi primeiramente descrito em 1993, pelo
psiquiatra americano Harrisom G. Pope, da Faculdade de Medicina de
Harvard,
Massachusetts, que a chamou inicialmente de Anorexia Reversa. Em
seus
ltimos trabalhos Pope utilizou o termo Sndrome de Adnis,
caracterizando
como uma espcie de culto ao corpo perfeito, reconhecendo que os
homens eram os principais acometidos e, mais raramente, algumas
mulheres. Pope observou
existirem muitos elementos em comum entre a Anorexia e a
Vigorexia, considerando-os como doenas ligadas perda de controle de
impulsos
narcisistas. Apontou algumas das caractersticas em comum:
Caractersticas comuns da Anorexia e da Vigorexia 1. Preocupao
exagerada com o prprio corpo 2. Baixa autoestima 3. Distoro da
Imagem Corporal 4. Personalidade Introvertida 5. Tendncia
automedicao 6. Fatores socioculturais comuns 7. Idade de
aparecimento igual (adolescncia) 8. Modificaes da dieta
FIGURA 2: Quadro das caractersticas em comum da Anorexia e da
Vigorexia.
29
Segundo Grieve (2007), citado por Camargo et al. (2008),
classificou nove
variveis identificadas na literatura da dismorfia muscular:
massa corporal,
influncia da mdia, internalizao do ideal de forma corporal,
baixa autoestima,
insatisfao pelo corpo, falta de controle da prpria sade, efeito
negativo,
perfeccionismo e distoro corporal.
O aumento da incidncia de Transtornos Dismrficos, sejam os
corporais
(associados Anorexia e Bulimia) ou musculares (Vigorexia) est
associado aos
padres rigorosos de beleza atuais.
A Vigorexia deve ser considerada um transtorno da linhagem
obsessivo-
compulsiva, tanto pela obsesso em musculatura, pela compulso aos
exerccios
e ingesto de substncias que aumentam a massa muscular, quanto
pela
fragrante distoro do esquema corporal. Uma das observaes
psicolgicas
desses pacientes que tem vergonha do prprio corpo, por isso
evitam exposio
de seus corpos em pblico, uma preocupao anormal com sua massa
muscular,
recorrendo assim aos exerccios excessivos de levantamento de
peso, prtica de
dietas hiperproticas, hiperglicdicas e hipolipdicas, e uso
indiscriminado de
suplementos proticos, alm do consumo de esterides anabolizantes
como
frmula mgica para acelerar o fortalecimento. Esse transtorno
evolui para um
quadro onde as pessoas acometidas por essa doena se sentem
fracassadas,
abandonam suas atividades e se isolam em academias dia e
noite.
O problema mais encontrado no incio da adolescncia, por ser
um
perodo onde as pessoas tendem a ser insatisfeitas com o prprio
corpo e se
submetem exageradamente aos ditames da cultura. A importncia
da
identificao da Vigorexia precocemente no sentido de evitar que
os
adolescentes faam uso de drogas para obter os resultados
desejados (ou
fantasiados).
A prevalncia da Vigorexia afeta com maior frequncia homens entre
18 e
35 anos, mas pode tambm ser observada em mulheres, sendo
expressa por
fatores socioeconmicos, emocionais, fisiolgicos, cognitivos e
comportamentais.
O nvel socioeconmico destes pacientes variado, mas geralmente
mais
frequente na classe mdia baixa. Em alguns casos, a obsesso com o
prprio
corpo se assemelha com o mesmo fenmeno observado na anorexia
nervosa.
A prtica de atividade fsica contnua caracterstica desta desordem
pode
ser comparada a um fanatismo religioso, colocando prova
constantemente a
30 forma fsica do indivduo, que no se importa com as
consequncias que podem
ocorrer em seu organismo. Alm disto, em relao aos exerccios
fsicos,
observa-se que indivduos com Vigorexia no praticam atividades
aerbicas, pois
temem perder massa muscular.
Falhas nos corpos destes indivduos que, normalmente,
passariam
despercebidas para outros, so reais para estes pacientes,
conduzindo os
mesmos depresso ou ansiedade, problemas no trabalho e relaes
sociais.
Como resultado, podem perder o emprego e apresentar problemas
de
relacionamento.
Segundo Baptista (2005), frequentadores assduos de academia
que
realizam exerccio fsico em excesso na busca de um corpo
perfeito, fazem parte
do grupo de pessoas que sofrem de Vigorexia. Este transtorno
pode ser agravado
pela busca inconstante da beleza fsica, acompanhadas de
ansiedade,
depresso, fobias, atitudes compulsivas e repetitivas (como
olhadas seguidas no
espelho).
Podemos observar que a esttica supervalorizada em alguns
esportes e
serve mesmo como critrio para a obteno de resultados
satisfatrios nas
competies, explicando a maior prevalncia de transtornos
alimentares em
atletas do que no atletas. Os treinadores normalmente expressam
preocupaes
sobre alguns de seus atletas, principalmente em relao queles que
necessitam
de baixo peso corporal como corredoras, ginastas, lutadores e
atletas do peso
leve.
O fisiculturismo um dos esportes que mais comumente se relaciona
com
este tipo de transtorno. No fisiculturismo as categorias so
divididas por peso
corporal, levando estes atletas a utilizarem diversos recursos
para a manuteno
ou reduo de seu peso. Outro ponto importante que participantes
desta
modalidade esportiva so julgados por sua aparncia e no por sua
performance.
Um estudo realizado por Lantz, Rhea e Cornelius (2002), com
100
fisiculturistas e 68 levantadores de peso, sendo todos atletas
de elite
competitivos, mostrou que os pertencentes ao primeiro grupo
apresentaram
maiores porcentagens de indicadores de Vigorexia, como preocupao
com
tamanho do corpo e simetria, proteo psquica, comportamento
alimentar tpico e
uso de medicamentos, do que levantadores de peso. Isto indica
que fisiculturistas
podem ser um grupo de risco para a desordem.
31
Outro estudo realizado na frica do Sul por Hitzeroth, Wessels,
Zungu-
Dirwayi, Oosthuizen e Stein (2001), com 28 fisiculturistas
competitivos amadores
encontrou a prevalncia de 53,6% de Vigorexia. Foi tambm descrito
neste
estudo que 33% dos atletas com Vigorexia tinham maior tendncia a
apresentar
desordem dismrfica corporal relacionada a outros aspectos que no
a
musculatura.
E uma pesquisa realizada por Hildebrand, Schlundt, Langenbucher
e
Chung (2006), com 237 levantadores de peso do sexo masculino
mostrou que
indivduos que apresentam Dismorfia Muscular apresentam altos
ndices de
distrbios de imagem corporal, de sintomas relacionados a
psicopatologias
associadas, de uso de esteroides anabolizantes e comportamento
controlador em
relao aparncia.
As complicaes da vigorexia ou overtraining so vrias, como as
consequncias pelo excesso de treinamento, em que o nosso corpo
demonstra
reaes corporais que so semelhantes ao estresse, como por
exemplo, a
insnia, falta de apetite, irritabilidade, desinteresse sexual,
cansao constante,
dificuldade de concentrao entre outras, problemas fsicos e
estticos tambm
podem ser encontrados, como a desproporo displsica, tambm entre
o corpo e
cabea, problemas sseos e articulares devido ao peso excessivo,
falta de
agilidade e encurtamento de msculos e tendes.
Com o consumo de esteroides anabolizantes, a situao se
agrava,
ocorrendo um aumento do risco de doenas cardiovasculares, leses
hepticas,
disfunes sexuais, diminuio do tamanho dos testculos e maior
propenso ao
cncer da prstata.
Normalmente pode ser encontrado algum grau significativo de
comprometimento social e/ou ocupacional nos pacientes portadores
de Vigorexia,
e sua qualidade de vida pode ser agravada ainda por
procedimentos
potencialmente iatrognicos e onerosos, como tratamentos
cirrgicos e
dermatolgicos desnecessrios.
No h uma descrio para o tratamento da Vigorexia at o
momento.
Indivduos com Vigorexia dificilmente procuram tratamento, pois
atravs dos
mtodos propostos geralmente acarretaro perda da massa muscular.
Caso o
indivduo faa uso de esteroides anabolizantes, sua interrupo deve
ser sugerida
imediatamente.
32
No campo psicolgico, o tratamento envolve a identificao de
padres
distorcidos de percepo da imagem corporal, identificao de
aspectos positivos
da aparncia fsica, deve-se abordar e encorajar atitudes mais
sadias, e enfrentar
a averso de expor o corpo.
No existem muitos estudos para caracterizar adequadamente as
alteraes do consumo alimentar de indivduos com Vigorexia, o que
dificulta no
tratamento que deve ser multidisciplinar, com nutricionistas,
psiclogos, mdicos
e que deve ser feito com os treinadores tambm para o sucesso do
tratamento e
para uma menos incidncia da Vigorexia, j que treinadores podem
ajudar no
desenvolvimento de problemas em relao sade fsica e psicolgica de
atletas
e desportistas.
Com a modernizao, a mdia ganhou uma grande importncia na vida
das
pessoas, mostrando um mundo onde s existem corpos perfeitos que
so
mostrados como sinnimos de beleza e sucesso, o que atinge homens
e
mulheres que acabam ficando propcios a desenvolverem
transtornos
alimentares. Sendo assim, o que passa a ser desejvel que o ser
humano
esteja moderadamente preocupado com seu corpo, sem que essa
preocupao
se converta numa obsesso. O ideal desejvel e sadio no o padro
imposto
pelas revistas de beleza e pelos modelos publicitrios, mas sim
estar satisfeito
consigo mesmo e aceitar-se como .
2.2.3 Ortorexia Nervosa
A Ortorexia Nervosa um quadro recente, no qual o indivduo se
preocupa excessivamente com a pureza dos alimentos consumidos, de
forma, a
saber, o contedo nutricional de tudo que ingere e acaba deixando
de comer
alimentos importantes, como carne, carboidratos e gorduras, sem
a correta
substituio dos mesmos. O termo Ortorexia vem do grego, onde
orthos significa
"correto" e "verdadeiro", e orexis quer dizer apetite, foi
criado em 1997 por
Steven Bratman, um mdico americano, para designar um quadro
obsessivo
caracterizado por fixao pela sade alimentar, com uma obsesso
doentia pelo
alimento biologicamente puro, que resulta na criao de rituais e
adoo de uma
dieta restritiva, com consequente isolamento social. Aps
observar constantes
33 episdios de pessoas com o problema, Bratman lanou, em 2001, o
livro Health
food junkies (Viciados em comida saudvel, em traduo livre).
Segundo Bratman (2002), citado por Martins et al. (2011, p.348),
em certa
fase de sua vida apresentava-se excessivamente preocupado com
certos
aspectos alimentares. De acordo com seu testemunho pessoal:
Era um vegetariano, comia legumes frescos e de qualidade
plantados por mim, mastigava cada colherada mais de 50 vezes, comia
sempre sozinho, em local sossegado, e deixava o meu estmago
parcialmente vazio, no final de cada refeio. Tornei-me um presunoso
que desdenhava qualquer fruto colhido da rvore h mais de quinze
minutos. Durante um ano fiz esta dieta, senti-me forte e saudvel.
Observava com desprezo queles que comiam batatas fritas e
chocolates como meros animais reduzidos satisfao dos seus desejos.
Mas no estava satisfeito com a minha virtude e sentia-me sozinho e
obcecado. Evitava a prtica social das refeies e obrigava-me a
esclarecer familiares e amigos acerca dos alimentos.
Essa doena ainda no foi reconhecida oficialmente como um
transtorno,
portanto este um quadro no validado pelo DSM IV e nem pelo CID
10, e ainda
existem poucas publicaes sobre o tema na literatura cientfica.
considerado
pelos autores de modo geral como variante sintomtico dos
Transtornos
Alimentares, principalmente da Anorexia ou do Transtorno
Dismrfico Corporal,
ambos situados dentro do aspecto obsessivo compulsivo. Pessoas
acometidas
por esta doena se assemelham com anorxicos por serem de uma
forma geral
meticulosas, perfeccionistas, organizadas, e com uma necessidade
exagerada de
autocuidado e proteo. Alm de que ambos parecem ser impulsionados
por
presses sociais, sendo a anorexia afetada pelos padres estticos
de beleza e
pelo culto ao corpo, enquanto a ortorexia influenciada pela
nfase no viver
saudvel, em seu foco biolgico. Porm, diferente da anorexia
nervosa, cuja
ideologia focada na perda de peso, a ortorexia busca alcanar a
dieta saudvel
perfeita. Nesse sentido, o comportamento ortorxico traz a criao
de regras
rgidas e a sensao de superioridade e desprezo em relao s pessoas
que
no adotam as mesmas normas em sua alimentao e estilo de
vida.
A Ortorexia Nervosa acomete tanto os homens, quanto mulheres.
As
caractersticas observadas em pessoas com comportamento ortorxico
incluem a
preocupao exagerada com hbitos alimentares saudveis e a dedicao
de
34 grande parte do tempo a planejar, comprar, preparar e fazer
refeies (conhecido
como a espiritualidade da cozinha). A alimentao desses indivduos
deve ser
livre de agrotxicos, conservantes, herbicidas, pesticidas,
corantes, ingredientes
geneticamente modificados e excesso de gorduras saturadas, sal e
acar. O
modo de preparo dos alimentos tambm pode fazer parte do ritual
obsessivo,
como cortar hortalias apenas de uma determinada forma, os
utenslios utilizados
(ex: somente madeira, metal, etc) e a origem dos alimentos, como
foram
plantados, colhidos ou criados, alm dos processos at a chegada
aos
supermercados. Neste contexto, a alimentao passa a ser a
preocupao central
do dia a dia, para a qual o indivduo se dedica cada vez mais,
com objetivo de
ingerir alimentos que contribuam para o bom funcionamento do
organismo e
libertem o corpo e a mente de impurezas a fim de alcanarem um
corpo saudvel
e maior qualidade de vida. A diferena entre Ortorexia e a
Sndrome do Gourmet,
que na Sndrome de Gourmet no h nenhuma preocupao com os
alimentos
politicamente corretos e saudveis.
Os comportamentos nutricionais cada vez mais restritivos
originam num
prejuzo da prpria sade dos ortorxicos, por deixarem de comer
alimentos
importantes para nosso organismo, podendo gerar grande perda de
peso,
carncias nutricionais e/ou um de distrbio da conduta alimentar.
Em um prazo
longo de tempo a falta de vitaminas e minerais, como o ferro e o
clcio, pode
provocar o desenvolvimento de anemia e osteoporose pela
acentuada perda de
peso. Tambm pode ser observado um isolamento social, devido ao
fascnio da
dieta saudvel acabar tomando conta da vida do ortorxico, que
passa a
apresentar um desprezo pelos que no seguem os mesmos padres
elevados
de alimentao, evitar a prtica social das refeies, insatisfao com
a prpria
condio e a autoimposio para tentar esclarecer outros acerca dos
alimentos
saudveis. Desta forma deixam de sair com os amigos e familiares,
causando
conflitos e dificuldades de relacionamento. Esses pacientes no
procuram
tratamento por acreditarem que esto fazendo as escolhas
certas.
De acordo com a Associao Brasileira de Nutrologia, os principais
sinais
de Ortorexia Nervosa so:
35
Ortorexia Nervosa
Sinais: Busca obsessiva por normas de alimentao saudvel;
Checagem de composio de alimentos antes da refeio; Preocupao
excessiva com a forma de preparo dos pratos, incluindo os
utenslios utilizados; Evitar se alimentar fora de casa,
distanciando-se, assim, de eventos sociais; Queda de cabelo e unhas
quebradias em decorrncia da falta de nutrientes; Transtornos
psiquitricos, como depresso e ansiedade.
FIGURA 3: Quadro com os sinais da Ortorexia Nervosa.
Na Ortorexia Nervosa como na Vigorexia pode-se observar uma
inclinao
obsessiva nos pacientes, uma preocupao exagerada e tirnica com a
perfeio
e uma rigidez s normas e regras. Na Ortorexia o paciente preza
por uma
alimentao considerada politicamente correta e pretensamente
saudvel,
apresentando uma exclusividade no consumo de frutas, folhas e
legumes.
Foram desenvolvidos dois testes importantes para o diagnstico
de
Ortorexia Nervosa ao longo do tempo, o primeiro foi criado por
Bratman,
envolvendo atitudes em relao aos alimentos (BOT ou Bratmans
orthorexia
test), com dez afirmativas que permitem respostas dicotmicas:
sim ou no, e
o segundo foi institudo por um grupo de pesquisadores italianos,
que criou e
validou um instrumento intitulado ORTO-15, que j tem
disponibilidade online em
verso em portugus. Este contm 15 questes de mltipla escolha
(sempre,
frequentemente, s vezes e nunca) que inclui alguns dos itens do
BOT e agrega
outros criados, abordando atitudes obsessivas relacionadas
escolha, aquisio,
preparo e consumo de alimentos considerados saudveis. Apesar de
o teste ter
apresentado boa capacidade preditiva, os prprios autores
ressaltam que o teste
no identifica comportamentos obsessivo-compulsivos e recomendam
que novas
questes devam ser acrescentadas e novas avaliaes do instrumento
realizadas.
Ainda no h uma prevalncia da Ortorexia Nervosa, mas atravs
destes
instrumentos citados acima, estudos e artigos internacionais
sugerem que
estudantes de medicina, mdicos, nutricionistas, atletas que se
dedicam a
esportes como fisiculturismo e atletismo, adeptos de modismos
alimentares e de
hbitos alimentares alternativos, como vegetarianos e dieta
macrobitica, pessoas
com sintomas de ansiedade, e que supervalorizam o corpo perfeito
constituem
grupos suscetveis ao desenvolvimento desse transtorno.
36
No Brasil, foi feito uma investigao do comportamento ortorxico
em uma
amostra de 392 nutricionistas por Alvarenga et al. (2012), onde
foi utilizado o teste
ORTO-15 online, em sua verso em portugus. Atravs desta pesquisa
foi
observada uma tendncia ao comportamento ortorxico, em aspectos
como a
escolha de alimentos relacionada qualidade nutricional ao invs
do sabor, a
crena de que alimentos saudveis podem melhorar a aparncia fsica
e a
rejeio de escolhas alimentares consideradas como transgresses.
Porm, so
necessrias novas investigaes para confirmar a validade e
confiabilidade do
instrumento traduzido para uso em nossa populao, a fim de
conhecer a
prevalncia da ortorexia.
Segundo Martins et al. (2011), a alimentao saudvel deve ser
pensada
alm do biolgico, j que o ser humano no tem necessidades apenas
biolgicas.
O comportamento alimentar est inserido na atitude alimentar,
entendido como
um processo que constitui um conjunto de aes realizadas com
relao ao
alimento, que tm incio no momento da deciso e envolvem a
disponibilidade, o
modo de preparar, os utenslios usados, as caractersticas, os
horrios e a diviso
da alimentao nas refeies do dia, as preferncias e averses
alimentares e
finalmente encerra com o alimento sendo ingerido.
Alguns autores definiram a atitude alimentar como crenas,
pensamentos,
comportamentos, sentimentos e relacionamento para com os
alimentos. Esta
viso engloba, portanto, as cognies e os conhecimentos que o
indivduo tem
sobre alimentao e a carga afetiva em relao aos alimentos. Estes
fatores
predispem a determinadas aes que marcam o relacionamento de uma
pessoa
com sua alimentao.
Beumont et al. (1990), citado por Martins et al. (2011, p 354)
ressaltam que
o comer adequadamente no est relacionado apenas com a manuteno
da
sade, mas tambm com um comportamento socialmente aceitvel,
flexibilidade e
satisfao.
O tratamento da Ortorexia Nervosa envolve a compreenso do
paciente de
que a alimentao saudvel no se restringir a certos grupos de
alimentos, deve
ser balanceada e ter os nutrientes necessrios para a sade, o
tratamento requer
a participao de equipe multidisciplinar, composta por mdicos,
psiclogos,
psiquiatras, psicoterapeutas e nutricionistas especializados.
importante ressaltar
que para um bom resultado do tratamento, alm da psicoterapia, e
de
37 suplementos alimentares necessrio tambm uma reeducao
alimentar. Esse
transtorno deve ser discutido para alertar os profissionais da
rea da sade sobre
a existncia desse comportamento inadequado e suas possveis
consequncias
no s para a sade fsica e emocional, mas tambm para a viso de
alimentao
saudvel.
2.2.4 Transtorno da Compulso Alimentar Peridica
A obesidade um importante problema de sade pblica, tendo em
vista
sua alta prevalncia, que continua crescendo, a dificuldade no
controle e o
elevado ndice de reincidir. Apesar de uma boa parte dos
profissionais da sade
concordarem que a obesidade compreendida como uma manifestao
somtica
de um conflito psicolgico que, em determinados indivduos com
formao egica
inadequada, seria solucionado atravs de uma alimentao excessiva,
essa
postura no tem sido bem aceita, pelo menos quando se fala de
obesos da
populao geral e os manuais no aceitam a obesidade como um
transtorno
psiquitrico. A obesidade pode surgir ao longo da vida do
indivduo por influncia
gentica (a pessoa apresenta distrbios no seu metabolismo que so
inerentes sua carga gentica herdada de seus pais), nutricional (a
obesidade se deve
ingesto de alimentos sem valor nutricional adequado, podendo
estar exagerando
ingerindo nutrientes muito calricos), comportamental (onde
predomina os erros de comportamentos como um estilo de vida
sedentrio, hbitos inadequados na
maneira de alimentar-se, como comer depressa, sem mastigar
direito, comer em
p ou andando por causa do pouco tempo), e psicolgica (as pessoas
que esto
passando uma situao de depresso, ansiedade, estresse, solido,
rejeio, e
muitas outras, podero comer demais, na tentativa de compensar o
problema,
ocorrendo uma perda do controle alimentar).
Uma subcategoria da obesidade pode ser constituda por obesos
comedores compulsivos, que se caracterizam por apresentarem o
incio da
obesidade mais cedo que os no compulsivos, nveis maiores de
psicopatologias,
especialmente a depresso, tendncia a engordar comparados aos que
no
possuem este transtorno, maior prevalncia da flutuao de peso,
incio mais
cedo de preocupaes com o peso e dietas e consequentemente um
prejuzo
maior no funcionamento ocupacional e social.
38
O comportamento de compulso alimentar, em ingls denominada BE,
foi
inicialmente reconhecida como um padro distinto de alimentao
dentre
indivduos obesos. O transtorno da compulso alimentar peridica
(TCAP) foi descrito pela primeira vez em 1950 por Stunkard (1959).
Porm apenas em 1994
foi includo no apndice B do DSM-IV, como um transtorno que
necessita de
maiores estudos para melhor caracterizao. Trata-se de uma
sndrome definida
por episdios recorrentes de compulso alimentar, sem a presena
de
comportamentos compensatrios extremos para a perda de peso como
vmito e
laxantes, j que nesse caso se classificaria como bulimia.
Caracteriza-se pela
ingesto de grande quantidade de comida em at duas horas,
acompanhada da
sensao de perda de controle sobre o que ou o quanto se come, que
devem
ocorrer, pelo menos dois dias por semana nos ltimos seis
meses.
Estima-se uma frequncia de 5 a 30% do TCAP em obesos que
buscam
servios especializados para tratamento da obesidade. Pacientes
obesos com
compulso alimentar apresentam maior resistncia com os
tratamentos, pela
incapacidade de controlar a ingesto de alimentos, e apresentam
uma tendncia
a engordar se comparados a pessoas sem este transtorno.
Alguns autores asseguram que uma pessoa com TCAP abrange
principalmente dois elementos: o subjetivo (atravs da sensao de
perda de
controle) e o objetivo (atravs da quantidade de alimentos
ingeridos). Pacientes
com o TCAP apresentam baixa autoestima, ansiedade, culpa,
vergonha,
dificuldade em controlar seus impulsos e uma ambiguidade de
sentimentos.
Tm sido encontrados elevados ndices de depresso, de transtornos
de
ansiedade (como agorafobia, fobia simples e transtorno de
estresse ps-
traumtico), bulimia, tabagismo e transtorno de personalidade
boderline em
obesos comedores-compulsivos que procuram tratamento.
Existem dois questionrios especficos para a identificao do TCAP:
o
Binge Eating Scale BES, que um instrumento largamente utilizado,
que foi
desenvolvido para avaliar a gravidade da compulso alimentar
peridica em
indivduos obesos, de uma forma a possibilitar a elaborao de
estratgias
teraputicas mais adequadas e a avaliao sequencial do tratamento
nesse
subgrupo de pacientes obesos. Essa escala possui 16 itens que
avaliam as
manifestaes comportamentais, sentimentos e cognies envolvidos
num
episdio de compulso alimentar peridica e apresenta uma verso
validada em
39 portugus, a Escala de Compulso Alimentar Peridica ECAP, com
adequadas propriedades psicomtricas que indicam sua utilizao para o
descobrimento do
TCAP em indivduos obesos que procuram tratamento para emagrecer,
e que
dever apresentar uma confirmao por uma entrevista clnica; o
outro
instrumento o Questionnaire on Eating and Weight Patterns QEWP,
que foi
desenvolvido especificamente para fornecer o diagnstico de TCAP
de acordo
com os critrios do DSM-IV e foi posteriormente revisado para
atender as
propostas estabelecidas no manual, passando a ser chamado de
QEWP-R.
Possui 28 questes sobre episdios de compulso alimentar
peridica,
indicadores de perda de controle no comer, mtodos compensatrios
de controle
do peso, histria de peso e dieta, grau de preocupao com o peso e
o corpo e
dados demogrficos bsicos. indicado para o rastreamento do TCAP
na
populao geral e para distinguir Bulimia Nervosa purgativa e
Bulimia Nervosa
no purgativa. H uma verso revisada em portugus, que se chama
Questionrio sobre Padres de Alimentao e Peso, que possui um
estudo de
validao.
O TCAP geralmente tem inicio na infncia ou na adolescncia, se
difere da
hipergafia por no estar associado a um evento traumtico, e se
diferencia da
bulimia por no apresentar comportamentos compensatrios extremos
para a
perda de peso como vmito e laxantes e apresenta um ndice de
massa corprea
superior aos portadores de Bulimia Nervosa. Apesar de o TCAP e a
Bulimia
Nervosa estarem fortemente relacionados, j que ambos apresentam
uma
insatisfao com seus corpos e so influenciados pela mdia, que
possui um
padro de magreza exagerado, acabam se envolvendo em prticas
alimentares e
comportamentos disfuncionais em busca desse ideal de beleza.
Nesses dois
transtornos o contato com o prximo e ntimo evitado, as relaes
apresentam
uma tendncia a serem mais superficiais, desta forma o sintoma se
perpetua.
A maioria dos acometidos por este transtorno apresenta um longo
histrico
de tentativas de fazer dietas e um sentimento de desespero pela
dificuldade em
controlar a ingesto de alimentos.
Segundo Castillo (1990), quando o alimento usado de forma
inadequada,
como para suprir diferentes estados emocionais, fica difcil
diferenciar estados
emocionais de sinais fisiolgicos, como a fome. Dessa forma, o
alimento torna-se
40 um aspecto central de extrema importncia na vida do indivduo
e, independente
da fonte e da natureza da inquietao, usado
indiscriminadamente.
O estresse, que esta cada vez mais presente na sociedade, tem
sido
evidenciado como um fator que pode ajudar no aumento da
ocorrncia de
compulses alimentares, pelo fato de que em situaes estressantes,
o cortisol
liberado estimulando a ingesto de alimentos e o aumento do peso.
Estudos
demonstram que pessoas obesas apresentam uma capacidade gstrica
maior do
que em pessoas com peso normal, o que facilita a ingesto de
grande quantidade
de alimentos. Porm, segundo Geliebter (2002), desconhece-se a
existncia de
um transtorno alimentar que tenha sido predisposto por uma
grande capacidade
gstrica.
Segundo Stunkard (2003), estima-se a prevalncia em TCAP numa
dimenso variada, em parte devido variao das definies de
compulso. No
Brasil, foi encontrada uma prevalncia entre 15% e 22% em
pacientes que
procuravam tratamento para emagrecer, segundo algumas pesquisas
e entre os
pacientes que realizaram a cirurgia baritrica, esta prevalncia
maior e pode
variar de 27% a 47%. Aproximadamente 20% das pessoas que se
identificam
como possuidoras de compulso alimentar possuem diagnstico de
TCAP.
Borges (1998) encontrou uma frequncia de 16% de TCAP em
mulheres
obesas de um programa de vigilantes do peso.
Uma pesquisa realizada por Petribu et al. (2006), entrevistou 67
de 400
pacientes obesos mrbidos inscritos no programa de cirurgia da
obesidade do
Hospital Universitrio Oswaldo Cruz (HUOC) no Recife, e foi
observado o TCAP
em 56,7% dos pacientes, e os mesmos apresentaram os piores
escores em todos
os domnios de qualidade de vida segundo os testes aplicados.
Sendo assim foi
constatada elevada prevalncia de TCAP. Outras diferenas
estatisticamente
relevantes foram que o grupo com TCAP realizou mais tratamentos
com objetivo
de perder peso e apresentou mais depresso do que o grupo sem
TCAP.
A procura pela cirurgia da obesidade, que vem sendo realizada
com
sucesso, est aumentando significativamente por causa da
dificuldade nos
tratamentos de reduo de peso. Sabendo que os portadores de
TCAP
apresentam vasta psicopatologia, deve-se aprimorar a deteco
desses distrbios
a fim de proporcionar-lhes o tratamento adequado, desta forma de
suma
importncia uma avaliao psiquitrica pr-operatria, mesmo que por
meio de
41 escalas de avaliao validadas, pois o tratamento prvio do
transtorno psiquitrico
associado obesidade pode ser essencial para o sucesso do
procedimento
cirrgico. importante ressaltar que podem acabar surgindo
complicaes ps-
operatrias que possam comprometer o resultado da cirurgia, por
causa das
alteraes do comportamento alimentar.
Como no h um consenso na literatura sobre os critrios para
avaliao
psiquitrica nos candidatos s operaes baritricas, cada equipe
multidisciplinar
parece usar seus prprios critrios. Transtornos psiquitricos,
especialmente do
humor, ansiosos e psicticos so frequentemente considerados
contraindicaes
para o procedimento. Contudo no h dados precisos nem fatores
preditivos de
bom ou mau prognstico adequadamente estudado e/ou
comprovados.
A recuperao da cirurgia tambm um processo muito complexo e
que
exige ateno, pois depende da disposio que os pacientes tm para
a
mudana, como auto aceitao, disciplina, juntamente com a ajuda
profissional.
Apesar do transtorno da compulso alimentar peridica apresentar
uma
elevada prevalncia na populao geral, pouco se sabe a respeito
das
correlaes psicossociais e comportamentais deste distrbio em
amostras no
clnicas. Este transtorno uma sndrome do comportamento alimentar
com
caractersticas ainda incertas e s vezes conflitantes. Diferentes
estudos j
demonstram alguns sinais e critrios sugestivos de um diagnstico
sindrmico,
contudo faltam diretrizes mais apuradas para organizar um grupo
razoavelmente
homogneo e caracteriz-lo como categoria diagnstica.
2.3 Bulimia Nervosa sua histria e aspectos psicolgicos
O termo bulimia vem da palavra grega boulimia, que significa
fome
devorante. Provm do adjetivo boulimos, que j era usado sculos
antes de
Cristo, onde bou significa boi e limos significa fome,
significando literalmente
fome de boi, designando assim um apetite to grande que seria
possvel a um
homem comer um boi, ou quase. Hipcrates o empregava para
designar uma
fome doentia, diferente da fome fisiolgica. A Bulimia Nervosa
caracterizada pela ingesto impulsiva e voraz de grande quantidade
de alimentos de uma
maneira muito rpida e com a sensao de perda de controle, os
chamados
episdios bulmicos. Os episdios de hiperfagia normalmente so
acompanhados
42 de mtodos compensatrios inadequados para evitar o ganho de
peso, como
vmitos auto induzidos (que o mtodo compensatrio mais comum
entre
bulmicos), uso de medicamentos (diurticos, laxantes e inibidores
de apetite),
dietas, exerccios fsicos, abuso de cafena ou uso de cocana.
A bulimia nervosa apareceu desde o sculo XVI como oposto da
anorexia,
na antiguidade grega era chamada de cinorexia, que hoje
considerada uma
palavra sinnimo de voracidade ou de bulimia. Analisando a
histria, podemos
observar o uso de purgantes e a auto induo de vmitos. No antigo
Egito, os
egpcios vomitavam e usavam purgativos com frequncia, pois
acreditavam que
todas as doenas dos homens eram vindas da comida. Na Grcia,
Hipcrates
recomendava a induo de vmitos por dois dias consecutivos todo ms
como
uma forma de prevenir diferentes doenas. Em Roma, foi criado o
vomitorium,
que permitia aos romanos comerem em excesso durante os
banquetes, e
posteriormente vomitarem em um local reservado para esta
finalidade, s vezes
era necessrio usar uma pena de ave para estimular o vmito. As
primeiras
referncias de bulimia nervosa datam do incio do sculo XVIII,
onde em 1743, o
mdico ingls R. James descreveu um quadro clinico que denominou
de "True
Boulimus" (verdadeira bulimia, em uma traduo livre),