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Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n.º 19/2003 de 20 de Junho A) Financiamento dos Partidos Políticos 1. Muito embora a Lei n.º 19/2003 esteja concebida para entidades colectivas que sejam Partidos políticos regularmente constituídos, deve aplicar-se também, pelo menos, aos grupos de cidadãos eleitores (ver, por exemplo, os artigos 15º, n.º 4, 16º, n.º1, alínea c) ou 17º, n.º3 da mesma Lei), ainda que com as necessárias adaptações. Os grupos de cidadãos eleitores (GCE’s), não sendo entes jurídicos, podem ser configurados como associações sem personalidade nos termos dos artigos 195º a 198º do Código Civil, ainda que com uma particularidade natural: o fim transitório. Surgem, igualmente, especialidades no regime de responsabilidade a que se sujeitam os GCE’s que se justificam, também, pela sua falta de personalidade jurídica. Por exemplo, o primeiro proponente de cada grupo de cidadãos eleitores candidato a qualquer acto eleitoral é subsidiariamente responsável com o respectivo mandatário
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Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Jan 28, 2023

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Page 1: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas

Eleitorais

Lei n.º 19/2003 de 20 de Junho

A) Financiamento dos Partidos Políticos

1. Muito embora a Lei n.º 19/2003 esteja concebida

para entidades colectivas que sejam Partidos políticos

regularmente constituídos, deve aplicar-se também, pelo

menos, aos grupos de cidadãos eleitores (ver, por exemplo,

os artigos 15º, n.º 4, 16º, n.º1, alínea c) ou 17º, n.º3 da

mesma Lei), ainda que com as necessárias adaptações.

Os grupos de cidadãos eleitores (GCE’s), não sendo

entes jurídicos, podem ser configurados como associações

sem personalidade nos termos dos artigos 195º a 198º do

Código Civil, ainda que com uma particularidade natural: o

fim transitório.

Surgem, igualmente, especialidades no regime de

responsabilidade a que se sujeitam os GCE’s que se

justificam, também, pela sua falta de personalidade

jurídica. Por exemplo, o primeiro proponente de cada grupo

de cidadãos eleitores candidato a qualquer acto eleitoral é

subsidiariamente responsável com o respectivo mandatário

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financeiro pela apresentação das contas da campanha (artigo

22º, n.º2, desta Lei).

Porém, apesar de não serem dotados de personalidade

colectiva, os grupos de cidadãos eleitores representam uma

individualidade distinta relativamente aos respectivos

proponentes como se prova, em especial, pelo facto de terem

direito, enquanto grupo, a uma subvenção estatal (artigo

17º da presente Lei).

2. “As fontes de financiamento da actividade dos Partidos políticos

compreendem as suas receitas próprias e outras provenientes de

financiamento privado e de subvenções públicas” (artigo 2º da Lei n.º

19/2003).

A partir desta disposição há um aspecto que convém

desde já sublinhar: para além das receitas que o Partido

consiga angariar, o restante financiamento admissível nem é

exclusivamente público nem é exclusivamente privado. O

meio-termo justifica-se pela necessidade de evitar que o

Partido seja apenas um instrumento ao serviço dos poderes

públicos instituídos ou, ao invés, que se erga como um

veículo destinado a proporcionar o favorecimento de

interesses particulares.

3. Assim, são receitas próprias dos Partidos políticos

(artigo 3º):

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3.1. As quotas e outras contribuições dos seus filiados: No que

toca a esta alínea o que se quer dizer é que qualquer

contribuição de um associado, ou seja, de um filiado, é

receita do Partido. Por contribuição deve entender-se

qualquer tributo imposto ao filiado pelo simples facto de

ser membro do Partido (quota ou qualquer outra forma de

financiamento a que o filiado esteja vinculado nos termos

estatutários).

Relativamente a este aspecto, no Acórdão n.º 70/2009,

o Tribunal Constitucional decidiu que “de acordo com o disposto

no n.º 1 do artigo 8º da Lei n.º 19/2003, “os partidos políticos não podem

receber donativos anónimos nem receber donativos [...] de natureza pecuniária

ou em espécie de pessoas colectivas nacionais ou estrangeiras”. Por outro lado,

o artigo 7º, n.º 1 do mesmo diploma estatui que, “os donativos de natureza

pecuniária feitos por pessoas singulares identificadas estão sujeitos ao limite

anual de 25 salários mínimos [alterado para «25 vezes o valor do IAS» pela Lei

64-A/2008, todavia não aplicável ao caso] por doador e são obrigatoriamente

titulados por cheque ou transferência bancária. Finalmente, há que ter em

atenção que constituem receitas próprias dos partidos políticos as quotas e

outras contribuições dos seus filiados, bem como as contribuições dos

representantes eleitos em listas apresentadas por cada Partido ou por este

apoiadas. Daqui decorre que, sendo certo que as receitas provenientes de

quotas e de outras contribuições de eleitos e filiados dos partidos não podem

deixar de ser “obrigatoriamente tituladas por meio de cheque ou por outro

meio bancário que permita a identificação do montante e da sua origem” e

estando os diferentes tipos de receitas próprias dos partidos submetidos a

regimes jurídicos diversos, os partidos políticos têm de estar em condições de

identificar a origem das receitas que auferem, nomeadamente quem foi o

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autor da contribuição e o respectivo montante, de modo a que se possa

verificar que as mesmas não constituem receitas proibidas, conservando os

elementos necessários para tal identificação. Além disso, embora as listas dos

filiados dos partidos não sejam elementos de suporte indispensáveis para a

inscrição das receitas, os partidos políticos têm o ónus de disponibilizar os

meios que permitam identificar a origem dos fundos e dissipar quaisquer

dúvidas que se possam colocar sobre a qualidade de filiado de quem

efectivamente contribuiu com as verbas que forem inscritas na rubrica das

respectivas contas anuais relativa a “quotas” e a “outras contribuições de

filiados”.

3.2. As contribuições de representantes eleitos em listas apresentadas

por cada partido ou por este apoiadas: O que está aqui em causa são

as contribuições realizadas por quem, não sendo militante,

também não é propriamente um terceiro no sentido exacto do

termo. “Os cidadãos eleitos em listas de partidos políticos

exercem livremente o seu mandato, nas condições definidas

no estatuto dos titulares e no regime de funcionamento e de

exercício de competências do respectivo órgão electivo”

(artigo 23º, Lei Orgânica n.º 2/2003, de 14 de Maio) – o

que importa, pois, é que sejam cidadãos com capacidade

eleitoral, independentemente de serem filiados no Partido

que propôs ou suporta a respectiva candidatura. Porém, as

contribuições dos filiados cabem nas hipóteses da alínea

anterior; pelo que aqui apenas podem estar em causa os

chamados “candidatos independentes”.

3.3. As subvenções públicas: Está em consideração agora o

chamado financiamento público previsto nos artigos 4º e 5º

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desta Lei. Os Partidos políticos, para não ficarem

inteiramente na dependência de interesses privados, têm

direito a que o Estado os sustente (parcialmente) na medida

em que concorrem para a formação da vontade democrática e

promovem a participação dos cidadãos na vida política da

Nação (artigo 51º, n.º 1, Constituição da República

Portuguesa). Nos termos dos artigos 5º e 17º da presente

lei os Partidos regularmente constituídos têm direito a

receber subsídios concedidos pelo próprio Estado dentro das

condições e dos limites ali estabelecidos. Assim se dá

execução ao disposto no n.º 6 do artigo 51º da

Constituição.

Se os Partidos políticos devem, por definição, ser

independentes do Estado (artigos 46º, n.º 1, 51º, n.º 1 e

n.º 4 da Constituição) a possibilidade de se financiarem

nestes moldes torna-se, no entanto, muito discutível.

Prevaleceu, como já se disse, a orientação segundo a qual

os Partidos políticos não devem ficar inteiramente

dependentes do financiamento privado.

Sublinham-se, todavia, três aspectos:

- só os Partidos que obtiveram representação

parlamentar ou aqueles que, pelo menos, obtiveram

50.000 votos poderão obter a subvenção em causa;

- desde que, em todo o caso, a requeiram ao

Presidente da Assembleia da República;

- as regras de cálculo da subvenção são imperativas

na relação entre o Partido e o Estado, mas, havendo

coligação eleitoral, a distribuição interna dos

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montantes da subvenção pode ser objecto de

convenção entre os Partidos coligados sendo o

conteúdo desta oponível ao Estado financiador.

3.4. O produto de actividades de angariação de fundos por eles

desenvolvidas: A angariação de fundos pressupõe uma conduta activa

por parte do Partido dirigida à obtenção de financiamento

(alínea b) do n.º 7 do artigo 12º da presente Lei); ao

invés, no caso dos donativos (alínea h) do artigo ora em

análise), a conduta do Partido é passiva, limitando-se a

aceitar contribuições de terceiros que tomaram a iniciativa

de o financiar. A angariação de fundos não pode exceder

anualmente os limites fixados pelo artigo 6º – este limite

funciona obviamente por Partido, mesmo quando integrado em

coligação, uma vez que esta não constitui uma entidade

jurídica distinta dos Partidos que a compõem (artigo 11º,

n.º 3 e artigo 23º, Lei Orgânica n.º 2/2003 de 14 de Maio).

A distinção entre angariação de fundos e donativos torna-se

especialmente importante por uma razão: é que os limites de

financiamento obtidos por uma via ou por outra são

distintos (artigos 6º e 7º, n,º 1, da presente Lei,

respectivamente).

Dando sequência à ideia de que os Partidos (também)

não devem ficar inteiramente dependentes do financiamento

privado, estabeleceram-se limites à obtenção de

financiamento através do recurso à angariação de fundos.

Com o estabelecimento destes limites pretende-se,

claramente, impedir o surgimento de “accionistas de

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referência” bem como, ainda, obstar a que o Partido se

torne, na sua actuação política, prisioneiro dos interesses

particulares dos seus financiadores.

Para que o Tribunal Constitucional possa proceder à

fiscalização das Contas, torna-se indispensável que o

Partido identifique documentalmente a acção de campanha que

lhe permitiu obter a receita proveniente de angariação de

fundos em causa.

3.5. Os rendimentos provenientes do seu património: Os Partidos

políticos podem, naturalmente, ter um património (como

qualquer pessoa colectiva). Na medida em que o mesmo

produza frutos, ou seja, rendimentos, estes constituem fonte

de financiamento. Mas, e sublinha-se este aspecto porque,

apesar de ser geral, tem neste campo particular incidência,

“a proveniência e a utilização dos fundos dos Partidos”

devem ser “publicitadas nos termos estabelecidos na lei do

financiamento dos Partidos políticos e das campanhas

eleitorais” (artigo 6º, n.º 4, Lei Orgânica n.º 2/2003, de

14 de Maio e artigo 23º, n.º 2 da presente Lei) pelo que

deve constar de listas próprias discriminadas e anexas à contabilidade dos

Partidos o património imobiliário dos Partidos [artigo 12º, n.º 7,

alínea c), Lei n.º 19/2003].

3.6. O produto de empréstimos: Abrangem-se tanto os

concedidos por terceiros como, eventualmente, os concedidos

pelos próprios filiados uma vez que, sem distinções, devem

obedecer “às regras gerais da actividade dos mercados

financeiros”. Porém, abarca-se só a cessão (temporária) de

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moeda (mútuo, em rigor) uma vez que a cessão (temporária)

de bens infungíveis (comodato, em rigor) se integra na

categoria dos donativos. Em geral, o empréstimo só pode ser

contraído junto de pessoa singular, a menos que seja obtido

junto de instituição de crédito ou sociedade financeira

(artigo 8º, n.º 1, a contrario, e n.º 3, da presente Lei).

3.7. O produto de heranças ou legados: São obviamente uma

outra fonte de financiamento dos Partidos uma vez que as

pessoas colectivas, em geral, têm capacidade sucessória

passiva na sucessão testamentária [artigo 2033º, n.º 2,

alínea b), Código Civil].

3.8. Os donativos de pessoas singulares: São, ao invés dos

empréstimos, cedências de bens, em dinheiro ou em espécie, que

se caracterizam, por natureza, pelo chamado animus donandi (ou

“espírito de liberalidade” – artigo 940º, Código Civil).

Incluem tanto a cessão de bens a título definitivo (doação

em sentido próprio) como a cessão de bens a título

temporário ou transitório (comodato, em rigor, uma vez que

este se presume gratuito). A expressão donativo emprega-se,

portanto, no sentido de liberalidade e não no sentido estrito

de doação.

Distinguem-se duas espécies de donativos – pecuniários e

em espécie (ou não pecuniários).

Os donativos pecuniários (n.º 1 e n.º 2):

- estão sujeitos a um limite máximo anual por doador;

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- devem ser titulados por cheque ou transferência

bancária (para que seja possível identificar a sua

origem);

- devem ser depositados em conta bancária

exclusivamente aberta para esse fim;

- e nesta conta apenas se podem depositar tais

donativos.

O preço pago por terceiro que haja adquirido bens ao

partido por montante manifestamente superior ao seu valor de

troca considera-se donativo e, portanto, submete-se ao

regime que fica descrito para os donativos em geral. Apesar

de a Lei o não dizer, esta solução só faz sentido para o

excesso de preço em relação ao valor normal de mercado; só

a este se deve dar o carácter de donativo, pois o resto é

preço.

Em relação aos donativos em espécie torna-se

necessário distinguir consoante sejam prestados por

militantes ou por terceiros. E, no primeiro caso (n.º 3 do

presente artigo), consoante sejam “próprios da actividade

militante” (v.g. colagem de cartazes, participação em

caravanas com automóveis próprios, montagem de palcos ou de

quaisquer outras instalações) ou não. Se o forem, não devem

ser contabilizados. Se o não forem equiparam-se a donativos

(em espécie) efectuados por terceiros, razão pela qual:

- devem ser contabilizados pelo valor actual de

mercado;

- estão submetidos ao limite anual máximo por doador;

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- e deverão ser discriminados como uma receita nos

termos do artigo 12º da presente Lei.

4. As receitas que ficam enumeradas, sempre que

realizadas em numerário, devem permitir estabelecer, fixar,

o chamado “fluxo financeiro”, ou seja ainda, devem:

– permitir identificar o seu montante e a sua origem,

e

– devem ser depositadas em contas bancárias

exclusivamente destinadas ao efeito.

Trata-se de uma aplicação do princípio da

transparência (artigo 51º, n.º 5, Constituição da República

Portuguesa). Exceptuam-se apenas os montantes que estiverem

contidos dentro dos limites do n.º 3 deste artigo 3º.

Parece que a conta bancária a que se refere o n.º 2 do

artigo 7º da presente Lei é diferente daquela a que reporta

o n.º 2 do artigo 3º (não obstante a letra da lei não ser

minimamente decisiva, dado que naquele se repetiu, embora

particularizando, o conteúdo deste último: “contas bancárias

exclusivamente destinadas a esse efeito e nas quais só podem ser efectuados

depósitos que tenham esta origem”). É este, ao menos, o

entendimento da Entidade das Contas e Financiamentos

Políticos. Pelo que, a ser assim, dever-se-á abrir uma

conta para as receitas em geral e outra (só) para os

donativos em particular.

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5. Qualquer bem obtido em espécie (ou seja, bem que

não consista em numerário) deve ser contabilizado em função

do seu valor corrente de mercado (isto é, em função do seu

valor de troca actual). Justamente para poder ser avaliado

para efeitos do disposto nos artigos 6º e 7º desta Lei.

Como é óbvio, a necessidade de tal avaliação não se coloca

para heranças e legados dado que já não se corre o risco de

a realização da liberalidade poder induzir alguma

contrapartida.

6. Por comparação com a Lei n.º 56/98 de 18/08 (que

anteriormente regulava o financiamento dos Partidos

políticos e das campanhas eleitorais), há duas grandes

diferenças a assinalar no que toca à obtenção de

financiamento pelos Partidos políticos:

– Agora apenas se admitem donativos de pessoas

singulares, ao passo que no âmbito da anterior Lei eram

lícitos os donativos atribuídos por pessoas colectivas

[alínea a) do n.º 1 do artigo 3º] com excepção daquelas que

apareciam enumeradas no n.º 1 do seu artigo 5º;

– Também agora se admitem os empréstimos apenas nas

condições supra referenciadas, ao passo que na vigência da

Lei precedente estes não sofriam quaisquer restrições

(podendo ser concedidos assim por qualquer pessoa).

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7.1. Para preservar as regras da transparência e da

publicidade – e para poder, portanto, identificar os “fluxos

financeiros” – a que se devem subordinar as contas dos

Partidos, há certo tipo de financiamentos que se proíbe

(artigo 8º).

Assim, os Partidos não podem receber donativos

anónimos. O mesmo se diga para os donativos em “dinheiro

vivo” dado que, no fundo, também são anónimos.

Pela mesma razão não podem, como regra, receber

donativos ou empréstimos de pessoas colectivas, nacionais

ou estrangeiras: atrás da “máscara” da pessoa colectiva

poderia encobrir-se verdadeiramente uma ou várias pessoas

singulares (que, caso tal donativo ou empréstimo fosse

admitido, camuflar-se-iam assim sob a capa por ela

proporcionada). Através desta proibição esquiva-se o

recurso, sempre árduo e difícil, à figura da

desconsideração da personalidade colectiva.

Excepcionalmente, admite-se que os Partidos obtenham

empréstimos (nunca donativos, porém) mas de harmonia com o

regime geral que rege os mercados financeiros (n.º 2), pois

em tal caso a suspeição de favorecimento associada ao

anonimato desaparece.

Todavia, através do Acórdão n.º 146/2007, o Tribunal

Constitucional já declarou que “a propósito de algumas

informações solicitadas pela ECFP ao BE relativamente a empréstimos

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contraídos junto de militantes, veio este partido afirmar, reportando-se a uma

passagem do relatório de auditoria da PWC, que os Partidos políticos não estão

impedidos por lei de contrair empréstimos junto de militantes, sendo que a

proibição prevista no artigo 5º, nº 1, da Lei nº 56/98 apenas se refere às

pessoas colectivas nacionais ou estrangeiras. De salientar que a ECFP, na sua

avaliação às contas do PH, afirmou de forma explícita que a obtenção de

empréstimos junto de militantes «é um procedimento que não está em

conformidade com a lei actualmente em vigor» (…). A interpretação do texto

legal feita pelo BE deve reputar-se correcta quanto à inexistência de uma

proibição legal de empréstimos feitos pelos militantes. Cumpre, porém, advertir

que os Partidos deverão fornecer todas as informações necessárias

respeitantes a tais empréstimos (v.g, a identidade dos respectivos titulares, as

suas condições de reembolso e juros e o respectivo suporte documental), sob

pena de a ECFP não poder controlar se se trata de verdadeiros empréstimos

onerosos, ou, afinal de contas, de donativos de natureza pecuniária

encapotados — assim se contornando os limites legais a eles respeitantes”.

É verdade que a letra da lei anterior permitia uma

interpretação por exclusão de partes mais maleável do que

aquela que é autorizada pela actual, mas é perfeitamente

concebível proceder à integração dos empréstimos

concedidos por militantes justamente nos “actos e contributos

pessoais próprios da actividade militante” (artigo 7º, n.º 3, da

presente Lei).

7.2. Para evitar financiamentos alcançados por

donativos encobertos sob outros mantos, está especialmente

impedido aos Partidos:

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- adquirir bens ou serviços a preços inferiores aos

praticados no mercado;

- o inverso, ou seja, serem remunerados por bens ou

serviços por si prestados a preços manifestamente

superiores aos valores normais de mercado;

- receber donativos que se traduzam no pagamento por

terceiros de despesas que aproveitam ao Partido.

Está aqui em causa a proibição do chamado donativo

indirecto: aquele que não assume a forma mas tem a substância

de donativo. É que, a não se ter em consideração esta

espécie de financiamento e não a proibindo, poderiam os

Partidos ludibriar facilmente a proibição constante do n.º

1 do artigo 7º (ou seja, a proibição de os donativos de

pessoas singulares ultrapassarem o limite anual de 25

salários mínimos mensais nacionais por doador). Confira-se,

a este propósito, o disposto no n.º 4 do artigo 5º da Lei

n.º 56/98, na redacção dada pela Lei n.º 23/2000 (anterior

Lei do Financiamento dos Partidos Políticos), bem como o

Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 86/2008 (apesar de

naquele dispositivo legal se formular um conceito bastante

mais restrito de donativo indirecto).

Convirá ainda sublinhar, em relação ao disposto neste

n.º 3, dois aspectos:

Por um lado, que a proibição constante da alínea a)

deve também estar dependente de os preços serem

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manifestamente inferiores aos de mercado, pois, caso

contrário, dificilmente será sindicável;

Por outro lado, que o donativo somente será claramente

indirecto para efeitos da alínea c) se a despesa que

aproveita ao Partido for paga por terceiro, não por um

militante.

O Tribunal Constitucional já se pronunciou igualmente

no sentido de considerar “que os donativos indirectos são também

proibidos nas campanhas eleitorais” (“desde logo por força de um princípio

de transparência que rege todo o financiamento dessas campanhas. Por outro

lado, pela própria interpretação da alínea c) do n.º 1 do artigo 16º da Lei n.º

19/2003, que se refere aos donativos de pessoas singulares, conjugada com o

n.º 3 do artigo 15º do mesmo diploma, uma vez que a exigência de fazer

depositar na conta bancária da campanha todas as receitas obtidas em

numerário se afigura incompatível com a admissibilidade de donativos

indirectos” – Acórdão n.º 19/2008).

Porém, a distinção entre apoiantes de candidaturas ou

de grupos de cidadãos eleitores (artigo 16º, n.º 1, c), da

presente Lei) e terceiros não se afigura simples. Haverá

decerto um remédio radical: considerar que os referidos

apoiantes são sempre equiparados a terceiros e, portanto,

que nunca se admitem pagamentos que aproveitem à

candidatura que não sejam efectuados pela própria

candidatura, dado que por natureza inexiste, nesta

situação, o vínculo formal da militância (da pertença à

associação). A ser assim, apenas se consideram feitos pela

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própria candidatura os pagamentos efectuados a partir da sua conta

bancária.

8. No que tocas às despesas dos Partidos políticos rege

o disposto no artigo 9º.

O conteúdo deste artigo tem uma motivação simples a

qual justifica igualmente a forma como algumas receitas

devem estar documentadas (artigo 3º, n.º 2, da presente

Lei): para que os chamados “fluxos financeiros” sejam

susceptíveis de reconhecimento e seguimento, é necessário

que se possa identificar o montante do pagamento e o seu

destinatário. Por isso estão proibidas as despesas pagas em

numerário. Pretende-se prevenir, naturalmente, que o

Partido possa servir, por exemplo, para alguma espécie de

branqueamento de capitais ou actos similares.

Exceptuam-se desta regra as despesas de montantes em

numerário de valor relativamente reduzido (segundo os

critérios do n.º 2 do artigo 9º) pois, em tal caso, aquele

perigo inexiste ou é comparativamente muito diminuto.

9. 1. Do disposto no artigo 12º da Lei n.º 19/2003

resulta uma exigência básica, que decorre, por seu turno,

do que se estabelece no n.º 5 e no n.º 6 do artigo 51º da

Constituição: a organização contabilística dos Partidos é

regida pelos princípios decorrentes do Plano Oficial de

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Contas. Destina-se esta necessidade, fundamentalmente, a

permitir a apreciação da sua situação financeira e

patrimonial.

Não sendo as Contas elaboradas de harmonia com os

requisitos impostos por esta estatuição legal considera-se,

para todos os efeitos, que o Partido não forneceu ao

Tribunal Constitucional “os elementos necessários que lhe permitiriam

proceder à auditoria das mesmas” e, portanto, não prestou contas

(Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 146/07 e artigo

32º, n.º 2 da Lei Orgânica n.º2/2005 de 10 de Janeiro).

O dever de possuir contabilidade organizada é “um dever genérico,

mas nem por isso menos importante que os outros, pois a falta de uma

contabilidade organizada torna menos transparentes as contas dos partidos, e

vai dificultar o apuramento de outras eventuais infracções por eles cometidas.

Em suma, trata-se de um dever genérico mas básico, na medida em que o seu

incumprimento ou cumprimento defeituoso prejudica a actividade de auditoria

das contas” (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 146/07).

Do dever de organizar as Contas de harmonia com os

princípios aplicáveis ao Plano Oficial de Contas resulta a

necessidade de apresentar “suporte documental das despesas e

receitas realizadas” (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º

146/07).

Particularmente para efeitos do que se estabelece na

alínea b), do n.º 7 da presente disposição, a ECFP “procede

à elaboração de uma base de dados informatizada de que

constam as acções de propaganda política dos partidos e as

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acções de campanha eleitoral, bem como os meios nelas

utilizados” (Artigo 19º, n.º 1, Lei Orgânica n.º 2/2005 de

10 de Janeiro). Para isso as candidaturas eleitorais estão

obrigadas a comunicar à Entidade as acções de campanha eleitoral

ou as demais acções de propaganda política que realizem, bem como os meios

nelas utilizados, que envolvam um custo superior a um salário mínimo

(artigo 16º, n.º 1 e n.º 2, daquela Lei).

9.2. De acordo com a doutrina fixada pelo Acórdão n.º

70/2009 do Tribunal Constitucional, “os montantes que são

entregues como contrapartida directa de um serviço prestado não devem ser

considerados «receita própria proveniente de actividade de angariação de

fundos», pois “apenas o «resultado líquido» da actividade e não a sua «receita

bruta» deve ser considerado como angariação. Assim sendo, uma vez que só

esse montante líquido estaria submetido ao regime dos números 2 e 3 do

artigo 3º da Lei n.º 19/2003 – e não os concretos actos individuais que se

traduzam na aquisição de bens ou serviços –, não tem aqui cabimento a

exigência de que os pagamentos dos “cafés, os refrigerantes, as lembranças, os

livros ou discos, as refeições” sejam efectuados através de cheque ou

transferência bancária. É, porém, exigível, indubitavelmente, uma organização

contabilística (…) que, claramente, identifique e decomponha cada uma das

parcelas das receitas e das correspondentes despesas, de tal modo que se

possa saber quais os montantes que correspondem ao mero pagamento de

serviços e quais os que correspondem a efectiva contribuição de fundos para o

Partido, ou seja, qual é o efectivo “produto da actividade de angariação de

fundos”. Não tendo sido apresentados nem constando dos autos os dados

contabilísticos necessários para uma tal verificação, o Tribunal considera que,

existe aqui uma violação do dever de organização contabilística genericamente

estatuído no artigo 12º, n.º 1, dessa mesma Lei”.

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10. Tratando-se de uma estrutura organizada (por isso

está dotada de personalidade jurídica), deve o acto

constitutivo de cada Partido político regular e prever

“órgãos de fiscalização e controlo interno das contas da

sua actividade” (artigo 13º).

Esta exigência afigura-se de natureza semelhante

àquelas que decorrem do disposto no n.º 1 do artigo 160º do

Código Civil. Pelo que a sua inobservância deve determinar

a nulidade do referido acto constitutivo nos termos gerais

do artigo 294º do mesmo Código, caso em que o Partido

inexistirá enquanto pessoa colectiva e, portanto, enquanto

Partido político.

Também como qualquer entidade colectiva ou equiparada,

no final de cada exercício anual devem os partidos

políticos prestar Contas.

Dada, porém, a importância institucional que umas e

outras traduzem, tais Contas devem ser apresentadas ao

Tribunal Constitucional, o qual as deve apreciar sob o

ponto de vista da sua regularidade e legalidade (artigo 23º,

n.º 1, da presente Lei). Para o efeito, existe junto deste

Tribunal uma chamada Entidade das Contas e Financiamentos

Políticos (ECFP – Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro)

que tem como função básica auxiliá-lo tecnicamente.

Page 20: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

B) Financiamento das Campanhas Eleitorais

1. Qualquer que seja a espécie de campanha eleitoral

(isto é, seja para que efeito for), cada candidatura tem o

dever de elaborar uma Conta própria dessa campanha com os

requisitos e as discriminações impostas pelo artigo 12º da

presente Lei.

Nas eleições autárquicas, a Conta deve ter base

municipal. Mas isso não invalida:

1º - que deva ser elaborada uma Conta central relativa,

justamente, “às despesas comuns e centrais”;

2º - que a Conta deva ser elaborada por freguesia,

sempre que se trate de candidaturas exclusivamente

dirigidas à mesma (que é o que mais vulgarmente sucede com

as candidaturas de grupos de cidadãos eleitores, ainda que,

por vezes, também aconteça com candidaturas de partidos

políticos).

A qualquer Conta de campanha devem corresponder contas

bancárias especificamente constituídas para o efeito, onde

são depositadas as respectivas receitas e movimentadas

todas as despesas relativas à campanha (artigo 15º, Lei n.º

19/2003). De acordo com o que resulta do Acórdão do

Tribunal Constitucional n.º 19/2008: “sendo absolutamente

indispensável que a conta da campanha eleitoral esteja encerrada no momento

em que é apresentada (…) e que a conta bancária, especificamente constituída

para o efeito (artigo 15º, n.º 3, da Lei n.º 19/2003), corresponde exclusivamente

Page 21: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

à movimentação da conta da campanha, deve a conta bancária estar

encerrada no momento do encerramento da conta de campanha”.

2. Tal como para os Partidos políticos, a lei

identificou as fontes de financiamento admissíveis para as

campanhas eleitorais (seja de que espécie forem). No seu

conjunto, são de natureza muito parecida àquelas que

constituem fontes de financiamento dos Partidos políticos,

pelo que no essencial se pode remeter para as notas que

subjazem ao artigo 3º da presente Lei. Aqui, no entanto, ao

contrário do que sucede para efeitos do disposto no

referido artigo 3º (onde o elemento literal não é tão

incisivo), o elenco das fontes de financiamento das

campanhas eleitorais tem carácter marcadamente taxativo

(“só podem” – artigo 16º, n.º 1).

Assim, as actividades da campanha eleitoral poderão

ser financiadas apenas por:

2.1. A primeira das fontes de financiamento das

campanhas eleitorais é a subvenção estatal, a qual nos termos

do artigo seguinte, é concedida em moldes similares àqueles

que se utilizam para a subvenção pública aos partidos

políticos (artigo 5º da presente Lei).

2.2. Surgem depois as contribuições dos próprios Partidos

políticos que apresentem ou que sustentem candidaturas,

conforme o caso, à Assembleia da República, para o

Parlamento Europeu, para as Assembleias Legislativas

Page 22: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Regionais, para as Autarquias Locais ou para Presidente da

República. A contrario, de imediato se pode concluir que as

contribuições efectuadas por entidade que não seja Partido

político e que tão-pouco se integrem na hipótese da alínea

seguinte, são ilegítimas. Exige-se, nos termos do n.º 2 do

presente artigo, que estas contribuições sejam atestadas

através de documentos emitidos pelo órgão competente do

próprio Partido para que, evidentemente, se possa comprovar

a fidedignidade da origem.

2.3. Também se admitem os donativos como modo de

financiamento das campanhas eleitorais. Mas apenas desde

que:

1º - Sejam realizados por pessoa singular;

2º - Para custear:

a) a eleição de candidatos à Presidência da República;

ou,

b) para pagar a eleição de grupo de cidadãos eleitores

para Autarquia Local; ou ainda,

c) para suportar a campanha de Partidos políticos,

pois se estes se podem financiar por via de donativos

(artigo 3º, n.º 1, alínea h), da presente Lei) não se vê a

razão pela qual não hão-de poder custear as respectivas

campanhas pela mesma via (o que se significa que a alínea

c) da presente disposição tem natureza meramente

interpretativa: esclarece que os candidatos à Presidência

Page 23: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

da República e os grupos de cidadãos eleitores também

podem recorrer aos donativos para custear as respectivas

campanhas).

Efectivamente, a Lei n.º 19/2003 é fruto da conjugação

de três projectos de lei apresentados na Assembleia da

República pelo PS (222/IX), PCP (225/IX) e BE (266/IX). Os

correspondentes a estes dois últimos Partidos formulavam

alterações pontuais à lei então vigente (Lei n.º 56/98); só

o projecto do PS era o de uma Lei completa. A actual Lei

n.º 19/2003 baseia-se, fundamentalmente, neste dito

projecto; aliás há até uma correspondência quase total na

numeração e no conteúdo do seu articulado.

Ora, sucede, no que concerne à questão do

financiamento das campanhas através de donativos de pessoas

singulares, que se dispunha no seu artigo 18º, sob a

epígrafe “Contribuições singulares para a subvenção das campanhas”, o

seguinte:

1 - As pessoas singulares, devidamente identificadas, podem efectuar

depósitos, mediante cheque ou transferência bancárias, em conta bancária,

titulada pela Assembleia da República, especificamente aberta para o efeito,

com a finalidade de contribuir para a subvenção estatal das campanhas

eleitorais.

2 - Os depósitos efectuados nos termos do número anterior não estão

sujeitas aos limites fixados e, quando efectuados por quem não tenha dívidas à

administração fiscal ou à segurança social pendentes de execução, serão

Page 24: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

considerados para efeitos fiscais, nos termos do disposto no Estatuto do

Mecenato.

3 - Os valores dos donativos referidos no número anterior são deduzidos

na subvenção estatal para as campanhas eleitorais.

E no n.º 5 do artigo 17º estabelecia-se que:

A subvenção é solicitada ao Presidente da Assembleia da República, que

a mandará depositar, mediante transferência bancária, no prazo de 5 dias

posteriores à entrega da declaração emitida pelo banco respectivo

comprovativa do efectivo depósito das contribuições ou dos donativos

efectuados na conta a que se refere o artigo 15.º.

A alínea c) do n.º 1 do artigo 16º actual

correspondia, tal qual, à mesma alínea, número e artigo do

Projecto de Lei.

Como resultava da respectiva Exposição de Motivos, com

este articulado pretendia-se permitir a formação de uma

“conta de apoio ao exercício democrático: as pessoas singulares, devidamente

identificadas, podem efectuar depósitos, nos termos gerais, em conta bancária,

titulada pela Assembleia da República, especificamente aberta para o efeito,

com a finalidade de contribuir para a subvenção estatal das campanhas

eleitorais”.

Muito simplesmente a alínea d) do n.º 1 do artigo 16º

da actual Lei não existia e no seu n.º 2 dizia-se

aproximadamente o que agora surge no n.º 3: ou seja,

essencialmente, que os donativos de pessoas singulares

podiam ser obtidos mediante angariação de fundos.

Page 25: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Do conjunto, pode deduzir-se que os donativos de

pessoas singulares para financiamento da campanha não

estavam excluídos de modo algum, independentemente de se

destinarem a candidatos à Presidência, a grupos de cidadãos

eleitores ou a Partidos políticos.

Da conjugação entre os três Projectos de Lei

apresentados e das discussões havidas resultou um texto de

substituição apresentado para votação em Plenário pela

Comissão Eventual para a Reforma do Sistema Político, o

qual, na parte que interessa, acrescentava a actual alínea

d) do n.º 1 do artigo 16º e silenciou qualquer referência à

forma pela qual os donativos de pessoas singulares poderiam

ser realizados.

O que importa concluir, todavia, é que não se retira

da história do articulado em causa qualquer impedimento à

obtenção de donativos de pessoas singulares para

financiamento das campanhas eleitorais, quer a favor de

candidatos à Presidência da República ou grupos de cidadãos

eleitores, quer a favor de Partidos políticos. Muito pelo

contrário, o que se pretendia era justamente que tal fosse

possível. E, quer do articulado apresentado ao Plenário

pela mencionada Comissão, quer, sobretudo, da discussão na

especialidade (DAR I Série n.º 113/IX/1 2003.04.06 – págs.

4787-4795), nada resultou que infirmasse esta constatação.

Sublinha-se, de todo o modo, o aspecto mais marcante:

que estão proibidos os donativos de pessoas colectivas.

Page 26: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Estão aqui em causa, outra vez, tanto os donativos

pecuniários como aqueles em espécie. Para estes deverá

funcionar, por analogia, a regra contida no n.º 4 do artigo

3º, para efeitos do disposto no artigo 20º da presente lei.

O conceito de donativo é o mesmo que ficou referido para

efeitos do artigo 3º. Como os donativos podem surgir em

qualquer momento da campanha, inclusive no último dia, o

Tribunal Constitucional já determinou (no Acórdão n.º

563/2006) que “as receitas da campanha destinam-se a promover uma

candidatura, devendo, em princípio, ser percebidas até ao acto eleitoral. O

princípio enunciado admite excepções, em situações específicas e devidamente

justificadas (...). É o que sucede com (...) os donativos ou contribuições que

tenham sido efectuados antes do acto eleitoral mas que por qualquer razão só

tenham sido percebidos pela candidatura em data posterior (em virtude, por

exemplo, do tempo que medeia entre o depósito de um cheque e o respectivo

crédito em conta ou entre a expedição de um donativo pelo correio e a sua

recepção pela candidatura). A percepção de donativos e contribuições

posteriormente ao acto eleitoral só excepcionalmente se pode considerar

justificada. Quando assim não suceda, tal prática deve qualificar-se como

irregular, pois não permite confirmar se há uma correspondência efectiva entre

os montantes entregues à candidatura com o intuito de financiar a campanha

eleitoral e as receitas declaradas nas contas da campanha, nem permite

determinar com segurança se foi cumprido o princípio contabilístico da

especialização (ponto 4 do POC), que impõe uma separação clara entre as

receitas da campanha e as receitas dos partidos, com integração em contas

distintas”.

2.4. Por fim admite-se ainda, como fonte de

financiamento, o produto da angariação de fundos especialmente

Page 27: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

destinado à campanha eleitoral. O significado é o mesmo que

se deu para efeitos do disposto no artigo 3º.

Como resulta do n.º 3 deste artigo 16º, os donativos

tanto podem ser da iniciativa dos seus autores como podem

ser obtidos mediante angariação de fundos (ou seja, através

da iniciativa do candidato à Presidência da República, do

grupo de cidadãos eleitores ou do Partido político). Na

primeira hipótese, o produto dos donativos obtidos no

âmbito de uma angariação de fundos não abate ao montante da

subvenção estatal (artigo 18º, n.º 4, desta Lei). Ao invés,

o “montante contabilizado como proveniente de acções de angariação de

fundos” propriamente dita deduz à referida subvenção. É a

solução que se impõe para evitar tratar desigualmente os

candidatos à Presidência da República e os grupos de

cidadãos eleitores, por um lado, e os partidos políticos,

por outro. Deve reconhecer-se, no entanto, que impor a

dedução à subvenção estatal do produto daquela angariação

premeia o laxismo.

Tanto o produto da angariação de fundos como o dos

donativos estão sujeitos ao limite máximo fixado pelo n.º 3

do artigo 16º e devem também ser documentados de modo a que

o estabelecimento do respectivo fluxo financeiro fique

assegurado.

3. As despesas em campanha eleitoral não podem

ultrapassar os limites estabelecidos pelo artigo 20º. Tais

Page 28: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

tectos máximos de despesa são (como qualquer limite legal

fixado com minúcia) mais ou menos arbitrários. Sublinha-se

apenas que o momento a que se deve atender para definir o

número de eleitores do município é aquele em que, através

de Diário da República, se torna público o Mapa contendo o

número de eleitores inscritos no recenseamento eleitoral,

obtido através da base de dados central do recenseamento

eleitoral e apurados de acordo com as circunscrições de

recenseamento do território nacional definidas no artigo

8.º da Lei n.º 13/99, de 22 de Março (Lei do Recenseamento

Eleitoral).

Por outro lado, de harmonia com o Acórdão do Tribunal

Constitucional n.º 563/206, “a inclusão nas contas da campanha de

despesas realizadas após o acto eleitoral constitui uma prática irregular,

quando não seja devidamente justificada. Em princípio, a facturação de

despesas da campanha deve ocorrer antes do acto eleitoral, visto que tais

despesas respeitam à aquisição de bens e contratação de serviços para

promoção de uma candidatura, cessando esta actividade com a realização das

eleições. Essa regra não só constitui uma decorrência do princípio da

especialização (ponto 4 do POC) como também tem consagração legal expressa

no n.º 1 do artigo 19.º da Lei n.º 19/2003: “consideram-se despesas de

campanha eleitoral as efectuadas pelas candidaturas, com intuito ou benefício

eleitoral, dentro dos seis meses imediatamente anteriores à data do acto

eleitoral respectivo”. Após o acto eleitoral, só se consideram

devidamente justificadas quando, por exemplo, digam ”respeito

a telecomunicações, água, gás e electricidade, cuja facturação normalmente

ocorre um ou dois meses após a prestação dos serviços e fornecimento dos

bens” (Acórdão cit.).

Page 29: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Está implícito, pois, no que fica dito que o pagamento

de despesas efectuado após a realização do acto eleitoral

se admite desde que:

– primeiro, esteja relacionado com a campanha eleitoral

e,

– segundo, diga respeito a despesas realizadas antes

desse acto mas facturadas (apenas) depois.

4. Para a campanha eleitoral, deve existir um

mandatário financeiro para representar (organicamente) o

Partido político. O mesmo se diga em relação aos grupos de

cidadãos eleitores e às candidaturas à Presidência da

República, embora na medida do analogicamente possível

(dado que nestes casos inexiste uma pessoa colectiva que o

mandatário esteja a representar).

O mandatário é responsável pela conta de campanha em

todas as suas vertentes: controlo e fiscalização de

receitas e despesas; autorização para a realização destas

últimas; e, finalmente, elaboração e apresentação quer do

Orçamento da campanha (artigo 17º, Lei Orgânica n.º 2/2005

de 10 de Janeiro) quer, muito especialmente, da própria

Conta final de campanha, nos termos impostos pelos artigos

12 e 18º da presente Lei.

Dada a importância das funções que o mandatário

financeiro desempenha, convém que a sua existência e, acima

Page 30: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

de tudo, a sua identidade seja publicamente conhecida. Daí

a razão para que o Partido, a coligação, o grupo de

cidadãos eleitores ou o candidato a Presidente da República

devam promover a publicação em dois jornais de circulação

nacional das respectivas identidades.

Embora se exija, para as eleições autárquicas, que tal

publicação se faça em jornais de dimensão local, é evidente

que este requisito está cumprido se a mesma ocorrer em

jornais de dimensão nacional.

5. Estabelece-se por isso no artigo 22º da Lei n.º

19/2003 que o mandatário financeiro responde para diversos

fins (incluindo alguns contra-ordenacionais – veja-se, por

exemplo, o disposto no artigo 32º da presente Lei), pela

preparação da correspectiva Conta de campanha.

O mandatário financeiro, tendo o dever, não tem,

porém, um interesse próprio na realização da Conta –

justamente, ele é apenas um mandatário. Por isso, ainda que

subsidiariamente, também respondem pela elaboração e

apresentação da Conta, consoante o caso, “os candidatos a

Presidentes da República, os partidos políticos ou

coligações, (e) os primeiros candidatos de cada lista”.

Sendo estes que se propõem ao eleitorado e que têm

interesse na respectiva eleição, é razoável que respondam

(também) pelo cumprimento das regras de financiamento da

Page 31: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

campanha que se consubstanciam na respectiva Conta (artigo

18º, n.º 3, Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro).

No que toca aos grupos de cidadãos eleitores, é

subsidiariamente responsável pela Conta o seu “primeiro

proponente”. Para além da óbvia dificuldade na determinação

de quem seja esse “primeiro” (por exemplo: é o primeiro a

assinar?; e, havendo várias “folhas de assinaturas” a

circular, a ordem das mesmas será qual?), fica a dúvida

sobre própria a razão de ser da imputação desta

responsabilidade uma vez que pode resultar de factores

absolutamente casuais.

C) Apreciação e fiscalização das Contas

1. As contas anuais dos partidos políticos e as contas das campanhas

eleitorais são apreciadas pelo Tribunal Constitucional, que se pronuncia sobre

a sua regularidade e legalidade (artigo 23º, n.º 1).

Sobre a distinção entre legalidade e regularidade das

Contas o Tribunal Constitucional já se pronunciou (Acórdão

n.º 146/07): ”A apreciação do Tribunal não recai, segundo critérios de

natureza económico-financeira, sobre a gestão, em geral, dos partidos

políticos, mas tão-só sobre o cumprimento, pelos mesmos, das exigências que a

lei, directamente ("legalidade" em sentido estrito) ou devolvendo para regras e

princípios contabilísticos ("regularidade"), lhes faz nessa área”. E ainda mais

explicitamente no Acórdão n.º 563/06: irregularidades são “situações que não

violam nenhuma norma específica de financiamento e organização

contabilística mas que atentam contra o dever genérico de organização

Page 32: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

contabilística previsto no artigo 12.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003 (aplicável às

contas das campanhas eleitorais ex vi do artigo 15.º, n.º 1, do mesmo diploma),

impossibilitando que se conheça plenamente a situação financeira das

candidaturas e que se verifique o cumprimento das obrigações previstas na

lei”.

Apesar de, nos termos do artigo 24º, o Tribunal

Constitucional ser coadjuvado no desempenho desta

competência por um órgão independente que funciona junto de

si (a ECFP), é normal que aquele recorra, nos termos do n.º

3 da presente disposição, aos “serviços de empresas de auditoria ou

a revisores oficiais de contas para a realização de peritagens ou auditorias”.

Para além do que se dispõe nesta Lei, o estatuto da

ECFP consta actualmente, no essencial, da Lei Orgânica n.º

2/2005 de 10 de Janeiro.

No artigo 24º da Lei n.º 19/2003, explicitam-se as

diversas competências (essenciais) atribuídas à ECFP.

Sublinham-se algumas:

– À semelhança, por exemplo, do Provedor de Justiça

(artigo 23º da Constituição da República), a ECFP tem o

direito de exigir a cooperação de quaisquer entidades

públicas ou privadas para o desempenho da sua função

(artigo 15º, Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro);

– Tem igualmente poder inspectivo sobre as contas dos

Partidos e das Campanhas para quaisquer eleições, o qual

pode ser exercido oficiosamente ou mediante solicitação do

Tribunal Constitucional;

Page 33: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

– Deve preparar ainda a chamada “lista indicativa do

valor dos principais meios de campanha” destinada a

estabelecer preços ou valores de referência para as

principais despesas eleitorais de modo a (tentar) evitar a

respectiva subvalorização (atento o disposto no artigo 20º

da presente Lei). Esta “lista” deve ser publicada em Diário

da República nos termos do artigo 21º da Lei Orgânica n.º

2/2005 de 10 de Janeiro.

A ECFP pode, no exercício das suas competências,

elaborar regulamentos e recomendações de harmonia com o que se

dispõe nos artigos 10º e 11º da Lei Orgânica n.º 2/2005 de

10 de Janeiro. Uns e outras são habitualmente

disponibilizados através do sítio da internet do Tribunal

Constitucional (www.tribunalconstitucional.pt). Os primeiros

devem igualmente ser publicados no Diário da República

(artigo 10º, n.º 2, Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de

Janeiro).

A ECFP, sendo um órgão independente, funciona todavia

dentro do Tribunal Constitucional. Por isso, é a este que

cumpre designar os respectivos membros (“em Plenário,

devendo recolher uma maioria de oito votos” – artigo 6º,

n.º 1, Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro).

Os membros da ECFP “são designados por um período de

quatro anos, renovável uma vez por igual período, e cessam

funções com a tomada de posse do membro designado para

ocupar o respectivo lugar” (artigo 5º, n.º 3, da referida

Lei).

Page 34: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Nos termos do artigo 19º da Lei Orgânica n.º 2/2005 de

10 de Janeiro, os Partidos políticos e os mandatários

financeiros das campanhas são os primeiros responsáveis

pela apresentação das Contas, respectivamente, dos próprios

partidos e das campanhas.

As Contas anuais dos Partidos devem ser entregues até

ao mês de Maio do ano seguinte àquele a que respeitam

(artigo 26º). O Tribunal Constitucional só deve pronunciar-

se sobre as mesmas, no entanto, até ao termo do sexto mês

após a recepção das mesmas. Este prazo interrompe-se, todavia,

caso o Tribunal entenda ser necessário exigir qualquer

esclarecimento ao Partido em causa até que este seja

efectivamente obtido. Supondo que se utilizou a linguagem

técnica adequada (e é isso que se deve presumir – artigo

9º, n.º 3, Código Civil), tal “interrupção inutiliza (…)

todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr

novo prazo a partir do acto interruptivo” (artigo 326º, n.º

1, Código Civil).

“Após a recepção das contas dos partidos políticos, o

Tribunal Constitucional remete-as à Entidade para instrução

do processo e apreciação” (artigo 26º, Lei Orgânica n.º

2/2005 de 10 de Janeiro).

“A ECFP realiza auditoria à contabilidade dos partidos

políticos, circunscrita, no seu âmbito, objectivos e

métodos, aos aspectos relevantes para o exercício da

competência deferida à Entidade e ao Tribunal

Constitucional” (artigo 27º, da citada Lei).

Page 35: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

“Face aos resultados da auditoria (…) e considerada a

documentação entregue pelos partidos políticos, a Entidade

elabora um relatório do qual constam as questões naquela

suscitadas relativamente a cada partido político”. Este

relatório deve ser feito “no prazo máximo de seis meses a

contar da data da recepção das contas” (artigo 30º, n.º 4

da Lei em causa). Razão pela qual se pode concluir que o

prazo de seis meses de que o Tribunal Constitucional dispõe

para se pronunciar sobre as Contas dos partidos é,

verdadeiramente, um prazo para a ECFP executar o relatório

em causa. De facto, até que o Tribunal Constitucional

efectivamente se pronuncie sobre a legalidade e a

regularidade das Contas dos partidos:

A ECFP ainda “notifica os partidos políticos para se

pronunciarem, querendo, no prazo de 30 dias, sobre a

matéria constante” desse relatório, “na parte que ao mesmo

respeite, e prestar sobre ela os esclarecimentos que tiver

por convenientes” (artigo 30º, n.º1 e n.º 5, Lei Orgânica

n.º 2/2005 de 10 de Janeiro).

E depois, decorrido este prazo, aquela Entidade,

“tendo em conta as respostas dos partidos políticos,

elabora, no prazo de 20 dias, parecer sobre a prestação de

contas, identificando as irregularidades verificadas”

(artigo 31º, daquela Lei).

Somente “após receber o parecer da Entidade referido

no artigo anterior, o Tribunal Constitucional decide, em

Page 36: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

plenário, relativamente a cada Partido político, num dos

seguintes sentidos:

a) Contas não prestadas;

b) Contas prestadas;

c) Contas prestadas com irregularidades” (artigo 32º,

n.º1, Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro).

3. No que toca às Contas das Campanhas Eleitorais, o

prazo para a respectiva apresentação ao Tribunal

Constitucional é de noventa dias a partir da proclamação

oficial dos resultados.

O Tribunal dispõe igualmente de noventa dias após a

recepção das mesmas para se pronunciar. E, por analogia com

o disposto a propósito das contas partidárias, tem o poder

de exigir quaisquer esclarecimentos que considere

indispensáveis. Novamente deve considerar-se que aquele

prazo se interrompe caso tal suceda até que o

esclarecimento seja prestado. Em acréscimo, porém, se o

Tribunal verificar qualquer irregularidade nas contas, deverá

notificar a candidatura para as aperfeiçoar no prazo de

quinze dias. Ao invés, as ilegalidades eventualmente

existentes dão lugar à aplicação das sanções estabelecidas

nos artigos seguintes.

Page 37: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Parece existir uma incongruência entre o que se dispõe

no n.º 5 deste artigo e no n.º 2 do artigo 15º da presente

Lei. Ela é esclarecida, no entanto, pelo disposto no n.º 1

do artigo 37º da Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro:

“tratando-se de eleições autárquicas, a Entidade notifica

as candidaturas para apresentarem conta de âmbito local,

sempre que considere que tal elemento é necessário para a

apreciação das respectivas contas da campanha”. Caso se

proceda a tal notificação, “o prazo para o Tribunal

Constitucional se pronunciar sobre a regularidade e a

legalidade das contas da campanha suspende-se até à recepção

da conta de âmbito local” (artigo 37º, n.º3 da citada Lei).

“Após a recepção das contas das campanhas eleitorais,

o Tribunal Constitucional remete-as à Entidade para

instrução do processo e apreciação” (artigo 36º da Lei

Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro).

A ECFP “inicia os procedimentos de auditoria às contas

das campanhas eleitorais, no prazo de cinco dias após a sua

recepção” devendo esta ficar “concluída no prazo de 35

dias” (artigo 38º da mesma Lei).

“Face aos resultados da auditoria (…) a Entidade

elabora um relatório do qual constam as questões naquela

suscitadas relativamente a cada candidatura” e que deve ser

notificado às “candidaturas para, no prazo de 10 dias, se

pronunciarem, querendo, sobre a matéria constante do

relatório referido no n.º 1, na parte que à mesma respeite,

Page 38: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

e prestar sobre ela os esclarecimentos que tiver por

convenientes” (artigo 41º daquela Lei).

Após isto, a ECFP “elabora um parecer, tendo em conta

os resultados da auditoria e as respostas das candidaturas,

apreciando todas as questões relevantes para que o Tribunal

Constitucional possa decidir da existência ou não de

irregularidades nas contas apresentadas” no prazo máximo de

setenta dias a partir do fim do prazo de apresentação das

contas da campanha eleitoral (artigo 42º, n.º 1 e n.º 3 da

Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro). O que significa

que dispõe de vinte dias para o realizar!!! Parece que o

prazo de dez dias concedido às candidaturas para responder

ao relatório é peremptório, razão pela qual não sendo ele

respeitado não deve ser considerado na elaboração do

parecer.

Recebido o parecer da ECFP, “o Tribunal Constitucional

decide, em plenário, do cumprimento da obrigação de

prestação de contas das campanhas eleitorais e da

existência ou não de irregularidades nas mesmas” (artigo

43º, n.º 1 da citada Lei). O Acórdão deve ser tirado no

prazo máximo de noventa dias “a partir do fim do prazo de

apresentação das contas da campanha eleitoral” (n.º 2).

Pelo que, por conseguinte, ao Tribunal são outorgados

outros vinte dias para se pronunciar sobre as Contas da

Campanha!!!

Page 39: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

4. O Tribunal Constitucional notifica os Partidos

políticos das promoções do Ministério Público previstas no

n.º 2 do artigo 29.º e no n.º 4 do artigo 32º da Lei

Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro (artigo 33º, n.º 1, da

mesma). Findo o prazo concedido aos Partidos para se

pronunciarem para o efeito (vinte dias – art. 33º, n.º 2),

“o Tribunal Constitucional decide, em plenário, do

sancionamento ou não dos partidos políticos, bem como das

coimas a aplicar” (artigo 34º da citada Lei). O mesmo

mutatis mutandis para as contas das campanhas eleitorais

(artigos 44º e 45º da Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de

Janeiro)

O Tribunal Constitucional é competente para aplicar as

sanções previstas nesta Lei “com ressalva das sanções

penais” (artigo 46º, n.º 1, Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10

de Janeiro).

A prescrição do procedimento pelas contra-ordenações

previstas na presente Lei e na Lei Orgânica n.º 2/2005 de

10 de Janeiro suspende-se, para além de outros casos

legalmente previstos, até à emissão do parecer a que se

referem, consoante os casos, os artigos 28º, 31º, 39º e 42º

(artigo 22º, Lei Orgânica n.º 2/2005 de 10 de Janeiro).

D) Projectos de alteração à Lei do Financiamento

1. Os Partidos políticos são pessoas colectivas de

tipo associativo. Submetem-se, por isso, ao regime geral

Page 40: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

estabelecido para as associações entre os artigos 157º a

184º do Código Civil. Mas é indesmentível que são também

associações com características muito particulares; de tal

modo que à própria Constituição da República não bastou a

referência geral à liberdade de associação constante do seu

artigo 46º, pois ainda foi necessário estabelecer o

travejamento básico do regime jurídico dos Partidos

políticos através do que se dispõe no artigo 51º.

Além disso, o desenvolvimento legislativo

infraconstitucional ainda exige, para esta matéria, uma

categoria especial de lei da Assembleia da República: a Lei

Orgânica [artigos 164º, alínea h) e 166º, n.º 2], com o que

isso implica por arrastamento (v.g. artigo 168º, n.º 4 e n.º

5). Indiscutivelmente esta forma legislativa é

indispensável para regular a constituição, organização,

funcionamento e extinção dos Partidos políticos (Lei

Orgânica n.º 2/2003, de 22 de Agosto). Já mais

duvidosamente para o que diz respeito à própria lei que

regula o seu financiamento. A verdade é que, até hoje,

nunca as leis sobre financiamento partidário assumiram tal

forma.

2. Neste tema, a discussão sobre a origem do

financiamento partidário será sempre básica, por um lado, e

polémica, por outro.

Page 41: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

Básica, na medida em que tudo o resto gira à sua

volta: admissibilidade de donativos de pessoas colectivas

ou de donativos indirectos; limites de angariação de fundos

ou de donativos; identificação dos fluxos financeiros, seja

na vertente das receitas seja na das despesas;

identificação dos doadores, filiados ou apoiantes, etc.

Polémica, uma vez que, para além da polarização entre

a legitimidade do financiamento privado e a necessidade do

financiamento público, é do interesse dos Partidos, por

óbvias razões de sobrevivência, aumentar e maximizar as

suas fontes de financiamento.

3. Fundamentalmente por isto se trata de matéria tão

instável do ponto de vista legislativo.

As últimas alterações propostas pela Assembleia da

República (Decreto n.º 285/X) resumem-se, muito

sucintamente, ao seguinte:

Através da introdução da alínea j) no artigo 3º, n.º

1, pretende-se admitir como lícita toda a receita de

angariação de fundos que a lei não proibir e pela nova

letra conferida à alínea e) especificam-se os rendimentos

patrimoniais que podem constituir receita dos Partidos.

Esclareceu-se, pela nova redacção do n.º 2 do artigo

3º, que cada uma das receitas enumeradas no seu n.º 1 deve

ser depositada em conta bancária própria para o tipo

Page 42: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

correspondente mas, através do renovado n.º 3 do artigo 3º,

aceitando-se a referida proposta, actividades como, por

exemplo, a Festa do Avante deixam de estar submetidas à

regra daquele n.º 2. Além disso, os tectos máximos globais

para o produto, quer das contribuições dos filiados, quer

das angariações de fundos, sobem exponencialmente (são

agora de 3.000 IAS).

No artigo 5º, n.º 4, acrescenta-se que, além da

subvenção pública a que os Partidos já podem recorrer, os

respectivos Grupos Parlamentares passam a ter igualmente

direito a subvenção do mesmo género para encargos de

assessoria. Quem fiscaliza a sua utilização é o Tribunal

Constitucional (n.º 8 deste artigo).

O artigo 6º consagra inteiramente doutrina já firmada

pelo Tribunal Constitucional, especialmente no seu n.º 1:

“Consideram-se angariações de fundos todas as iniciativas e

eventos, incluindo as realizações que, complementarmente,

envolvam a oferta de bens e serviços, por parte do partido

organizador, ou outras acções que, não lhes sendo vedadas

por lei, tenham como finalidade a recolha de fundos para o

partido ou para uma sua actividade específica”. O tecto

máximo para o produto da angariação de fundos sobe (de

igual modo) para 3.000 IAS.

A eliminação do n.º 4 do artigo 7º significará os

Partidos não podem receber pagamentos por preços

manifestamente superiores aos valores de mercado; não

obstante, se tal suceder, isso não constitui donativo na

Page 43: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

parte excedente, uma vez que o negócio em causa será

totalmente nulo (art. 8º, n.º 4, na sua nova redacção). (Ao

que parece, tal negócio será, inclusivamente, insusceptível

de redução nos termos gerais do artigo 292º do Código

Civil).

Por via da nova composição dada à alínea c) do n.º 3

do artigo 12º, os encargos com as coimas do art. 29º passam

a entrar na conta de despesas e, de acordo com o seu n.º 8,

os Partidos com movimento financeiro anual inferior a €

30.000,00 podem optar por contabilidade simplificada.

Por intermédio do novo n.º 3 do art. 15º consagra-se a

orientação do Tribunal Constitucional segundo a qual as

despesas de campanha cessam com o encerramento desta, mas

estabelecendo-se agora um período fixo (15 dias) para que a

despesa se considere como tal (“exceptuadas as despesas

directamente relacionadas com o encerramento e prestação de contas”).

Por outro lado, através da inserção de um n.º 7, alarga-se

de um para, pelo menos, três dias, o prazo para o Tribunal

disponibilizar na internet os diversos orçamentos de

campanha.

No artigo 16º produzem-se alterações de monta:

– pelo n.º 1, alínea c), os donativos de pessoas

singulares passam a ser receitas de campanha qualquer que

seja a espécie de candidatura (à Presidência da República,

de Partido a qualquer eleição, de Grupo de Cidadãos

Eleitores);

Page 44: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

– pelo n.º 3 elevam-se os limites máximos, quer para

os donativos, quer para o produto da angariação de fundos:

“60 IAS por doador”;

– através do novo n.º 4, recolhe-se doutrina do

Tribunal Constitucional mas estabelecendo um prazo fixo

(três dias) para se fazer o depósito das receitas de

donativos ou do produto da angariação de fundos quando

obtidas no último dia de campanha;

– e, por fim, também pelo renovado n.º 5 estabelece-se

que a utilização de bens do Partido ou o recurso à

colaboração dos seus militantes, simpatizantes e apoiantes

não constitui receita nem despesa de campanha.

No artigo 17º, nº 7 e seguintes, estatui-se que também

há lugar a subvenção pública em caso de eleição intercalar

municipal.

Numa inovação (no mínimo) extraordinariamente

controversa, pelo n.º 5 do artigo propõe-se que “o eventual

excedente proveniente de acções de angariação de fundos,

relativamente às despesas realizadas, reverte para o Estado

no caso de candidaturas individuais e independentes, sendo,

nos restantes casos, depositado em conta própria do

respectivo partido, para tal destinada, a fim de ser

afectado à campanha eleitoral subsequente e nela

devidamente contabilizado”. Daqui resulta ser concebível

que os Partidos tenham lucro com a sua actividade (o que,

reconheça-se, não é contrário à sua caracterização como

Page 45: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

pessoa colectiva de tipo associativo, pois pelo artigo 157º

do Código Civil apenas se consideram inadmissíveis aquelas

associações que tenham em vista a obtenção de lucros para a

sua posterior repartição entre os associados, o que não é o

caso).

Pelo artigo 19º, n.º 1, esclarece-se que se consideram

igualmente como despesas de campanha as “efectuadas para

estas” (ou seja, por terceiros) desde que com o

consentimento da candidatura.

Através do artigo 21º, n.º 1, expõe-se que cabe ao

mandatário financeiro responder pelo cumprimento das

recomendações emanadas do Tribunal Constitucional e pelo

n.º 4 que a lista completa dos mandatários financeiros deve

ser publicada num único jornal de circulação nacional.

Segundo o artigo 22º, n.º 2, são subsidiariamente

responsáveis pela apresentação das Contas ”os candidatos a

Presidente da República, os partidos políticos ou

coligações, o primeiro candidato de cada lista ou o

primeiro proponente de cada grupo de cidadãos candidatos a

qualquer acto eleitoral, consoante se trate de eleições

para o Presidente da República, para a Assembleia da

República, para o Parlamento Europeu ou para as Assembleias

Legislativas das regiões autónomas, ou para as autarquias

locais, são subsidiariamente responsáveis com os

mandatários financeiros”.

Page 46: Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais Lei n

De acordo com o n.º 9 do artigo 24º, dos regulamentos

da ECFP cabe impugnação para o Tribunal Constitucional e

por força o n.º 3 do artigo 26º, verificada qualquer

irregularidade nas Contas susceptível de ser suprida, deve o

Tribunal Constitucional notificar a candidatura em causa

para que faça a correspondente regularização.

O prazo para apresentar as Contas passa a ser de 60

dias, salvo no caso das autárquicas, onde permanecem os 90;

mas o começo da contagem deixa de ser o da proclamação

oficial dos resultados e passa a ser o do pagamento

integral da subvenção pública (artigo 27º, n.º 1).

De harmonia com o conteúdo do artigo 3º do Decreto

Preambular, as referências ao salário mínimo nacional

somente se consideram transferidas para o IAS (indexante de

apoios sociais – Lei n.º 53-B/2006, de 29 de Dezembro) a

partir do ano em que o montante deste atinja o valor da

retribuição mínima mensal garantida fixada para 2008.

Por último, no que toca à aplicação de coimas

derivadas de infracções às regras sobre financiamentos

partidários ou de campanhas, estabelece o n.º 2 do artigo

33º que “sem prejuízo da consideração dos princípios gerais

de graduação das sanções, na aplicação das coimas deve ser

tido em conta o montante da subvenção pública atribuída e,

relativamente aos partidos políticos a que se refere o n.º

8, do artigo 12.º, os limites mínimo e máximo daquelas são

reduzidos a metade”.

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Lisboa, 3 de Junho de 2009

José A. R. L. González

Professor Associado da Faculdade de Direito da

Universidade Lusíada de Lisboa

Professor Auxiliar do ISCPSI

Assessor do Conselheiro Vice-Presidente do Tribunal

Constitucional