UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E DA COMUNICAÇÃO DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – PUBLICIDADE E PROPAGANDA YES WE CAN: UM NOVO PARADIGMA EM CAMPANHAS ELEITORAIS JEAN MICHEL BAÚ CAXIAS DO SUL 2010
UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E DA COMUNICAÇÃO
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – PUBLICIDADE E PROPAGANDA
YES WE CAN: UM NOVO PARADIGMA EM CAMPANHAS ELEITORAIS
JEAN MICHEL BAÚ
CAXIAS DO SUL
2010
JEAN MICHEL BAÚ
YES WE CAN: UM NOVO PARADIGMA EM CAMPANHAS ELEITORAIS
Monografia de conclusão do Curso de
Comunicação Social, habilitação em
Publicidade e Propaganda da Universidade
de Caxias do Sul, apresentada como
requisito parcial para a obtenção do título
de Bacharel.
Orientadora:
Profª Ms. Ivana Almeida
CAXIAS DO SUL
2010
AGRADECIMENTO
A trajetória acadêmica de qualquer aluno
reflete a união de esforços de seus
familiares, professores e amigos. Comigo
não foi diferente. Agradeço especialmente à
minha mãe, Maria Angélica dos Santos, por
sua força, amor e por seu exemplo de
coragem. À minha orientadora, Ms. Ivana
Almeida com meus votos de sucesso em
seu doutorado. Agradeço ainda aos amigos
que me apóiam em minha caminhada.
Mudança no espírito do país, maníaco e
egocêntrico. A mudança não virá do topo,
eu dizia. A mudança virá das raízes, das
bases mobilizadas.
BARACK OBAMA
RESUMO
Este estudo analisa a campanha eleitoral de Barack Obama à presidência dos Estados Unidos
em 2008. Seu objetivo é compreender como o candidato alcançou o engajamento voluntário
de seus eleitores, entendendo as facetas do contexto histórico e dos esforços de comunicação
envolvidos no pleito. Para isso utilizou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica, o
estudo de caso e estudos exploratórios. Através das relações entre a campanha, a história dos
Estados Unidos, teorias da motivação humana e do marketing político traçaram-se as
possíveis causas para o forte apoio do eleitorado à Obama. Este estudo conclui que dentre
diversos fatores a utilização de técnicas motivacionais como o empowerment foram
responsáveis pelo envolvimento dos eleitores.
Palavras-chave: Barack Obama, eleições, Estados Unidos, marketing político, motivação,
propaganda, voluntariado, yes we can.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Edifício em Kansas City .............................................................................. 76
Figura 2: Discurso de Obama em Columbus, Ohio, em 02 de novembro de 2008 ..... 78
Figura 3: Discurso de Obama em Reno, Nevada, em 25 de outubro de 2008 ............ 78
Figura 4: Change, we can believe in ........................................................................... 79
Figura 5: Assinatura visual da campanha de Obama .................................................. 80
Figura 6: Assinaturas visuais políticas nas disputas presidenciais
norte-americanas ........................................................................................................... 81
Figura 7: Adaptações da assinatura visual de Obama ................................................. 82
Figura 8: Estados por Obama ...................................................................................... 83
Figura 9: www.barackobama.com .............................................................................. 85
Figura 10: Extratos sociais no site da campanha ........................................................ 86
Figura 11: Latinos for Obama ..................................................................................... 86
Figura 12: Yes we can songs ....................................................................................... 87
Figura 13: Obama Mobile ........................................................................................... 87
Figura 14: Downloads ................................................................................................. 88
Figura 15: Obama Store .............................................................................................. 88
Figura 16: Página de cadastro da comunidade
mybarackobama.com: simplicidade para o usuário ...................................................... 89
Figura 17: Página de Obama no YouTube .................................................................. 90
Figura 18: Página de Obama no Facebook.................................................................. 91
Figura 19: Página de Obama no Flickr........................................................................ 91
Figura 20: E-mail recebido através do cadastro no site de Obama ............................. 92
Figura 21: Cenas do clip “Best of Obama Girl: Crush On Obama” ........................... 93
Figura 22: Cena do comercial de 30” intitulado “90 per cent” ................................... 94
Figura 23: Três cenas do comercial de 30” intitulado “book tv” ................................. 95
Figura 24: Quatro cenas do comercial de 30” intitulado “still” .................................. 96
Figura 25: Quatro cenas do comercial de 30” intitulado “Obama Superbowl” .......... 97
Figura 26: Quatro cenas do clip musical intitulado “Yes we can” .............................. 102
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 9
2 PERSUASÃO, MOTIVAÇÃO E PROPAGANDA .............................................. 12
2.1 Persuasão ............................................................................................................... 12
2.2 Motivação .............................................................................................................. 16
2.3 Propaganda ........................................................................................................... 23
3 MARKETING POLÍTICO ..................................................................................... 28
3.1 Marketing político e eleitoral: definições ........................................................... 33
3.2 Processo persuasivo do marketing político: uma construção
norte-americana .......................................................................................................... 35
4 ESTADOS UNIDOS: VÉSPERA DE UMA ELEIÇÃO
HISTÓRICA ............................................................................................................... 45
4.1 História dos Estados Unidos: breve retrospecto no estudo da
formação do norte-americano contemporâneo ........................................................ 45
4.2 Vésperas de uma eleição histórica: contexto histórico e
características do eleitorado ...................................................................................... 52
4.2.1 Fatos relevantes em 2006 ................................................................................... 53
4.2.1.1 O levantamento do Census ............................................................................... 53
4.2.2 Fatos relevantes em 2007 ................................................................................... 54
4.2.2.1 Março e maio: pesquisas importantes .............................................................. 55
4.2.2.2 Os jovens .......................................................................................................... 55
4.2.2.3 Recordes em arrecadação ................................................................................ 56
4.2.2.4 Avaliação do governo ....................................................................................... 57
4.2.2.5 Eleições dominam noticiário, mas medo do terror é relevante ........................ 58
4.2.2.6 Hillary perde força ........................................................................................... 58
4.2.2.7 A internet em 2007/2008: a força das redes sociais ........................................ 59
4.3 A engrenagem eleitoral americana ..................................................................... 59
5 A CORRIDA PELO ENGAJAMENTO: CAMPANHA DE
BARACK OBAMA EM 2008 .................................................................................... 63
5.1 Barack Obama: uma nova liderança .................................................................. 63
5.2 As primárias: retratos da pré-eleição presidencial ........................................... 65
5.2.1 Hillary Clinton: a primeira desafiante .............................................................. 67
5.2.2 John McCain: O adversário republicano .......................................................... 68
5.3 Kennedy e Luther King: conexões possíveis na cabeça
do eleitorado ............................................................................................................... 70
5.3.1 John Kennedy e Obama ..................................................................................... 70
5.3.2 Martin Luther King e Obama ............................................................................ 72
5.4 Uma campanha motivadora: estratégias para envolver o
eleitorado ..................................................................................................................... 74
5.4.1 Yes we can: o discurso da campanha ................................................................ 74
5.4.1.1 Os slogans ........................................................................................................ 75
5.4.1.2 A assinatura visual ........................................................................................... 79
5.4.1.3 A internet .......................................................................................................... 84
5.4.1.4 Televisão ........................................................................................................... 93
5.5 A militância: voluntariado e celebridades .......................................................... 97
5.6 Obamania: o retrato da vitória ........................................................................... 102
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 106
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 108
ANEXOS ..................................................................................................................... 112
9
1 INTRODUÇÃO
Conforme a democracia se consolida no mundo inteiro como o sistema de governo
mais popular, cresce a importância da propaganda aplicada às campanhas eleitorais. Nesse
contexto a propaganda é uma eficiente ferramenta de conquista ou manutenção do poder
social. As eleições se configuram como um momento de expressão patriótica, no qual o
eleitorado tem a sensação de possuir o poder para melhorar a sociedade. Portanto mesmo as
análises lógicas são carregadas de emoção em qualquer processo eleitoral. Através da
propaganda, as agremiações políticas utilizam a emoção como um artifício de comunicação na
busca de votos, imprimindo sentimentos em cada proposta de seus candidatos.
A guerra por votos não se desenrola no cenário político apenas, mas perpassa todos
os sentimentos e julgamentos de valor do eleitor. Uma eleição não é estritamente um debate
ideológico, de busca de soluções às demandas sociais, mas uma disputa mercadológica, na
qual a moeda de troca é o voto. Nessa disputa a comunicação é responsável por persuadir o
eleitorado a votar em determinada proposta política.
A campanha de Barack Obama à presidência dos Estados Unidos em 2008 parece
apresentar uma nova forma de entender a comunicação aplicada às campanhas políticas. A
segmentação da propaganda do candidato, o uso inovador da internet e o forte engajamento
dos eleitores transformaram sua campanha em uma espécie de movimento social, quebrando
paradigmas tradicionais. Este estudo analisa essas características e suas relações com o
marketing político, com a persuasão e com algumas teorias da motivação humana.
Na campanha de Obama observou-se como o uso persuasivo das ferramentas de
comunicação pode eleger um candidato inicialmente insignificante. Porém sabe-se que uma
boa assessoria de comunicação não é suficiente para alcançar uma vitória eleitoral. Portanto o
fenômeno Obama deve ser analisado também através de fatores subjetivos como os ideais que
ele representava, e objetivos como o momento histórico e social em que se desenrolou o
pleito.
A importância dessa campanha transcende o campo da comunicação e o da política.
Em um tempo onde as instituições políticas mostram suas deficiências e as pessoas parecem
estar cada vez mais isoladas em sua individualidade, conquistar seu engajamento é um fato de
ordem psicológica. Portanto seu estudo é relevante para a compreensão das motivações das
pessoas em causas coletivas em um contexto amplo. Através da análise das estratégias de
motivação utilizadas na campanha, pode-se entender como a comunicação promove o
10
relacionamento entre pessoas e marcas, políticas ou não. O estudo da trajetória de Barack
Obama à Casa Branca é justificado como forma de colaborar científico-teoricamente com o
estudo da Comunicação Social no campo político.
Analisar a campanha de Obama sob o prisma da motivação é fundamental para sua
exata compreensão. Através das estratégias discursivas adotadas e dos esforços de
comunicação a campanha permitiu, por exemplo, que os eleitores motivados replicassem em
progressão geométrica as mensagens criadas pelo comitê central através de eventos, internet e
ações de guerrilha.
Portanto a questão central deste estudo é: como a campanha de Obama conquistou o
engajamento de seus eleitores? Para resolvê-la adotou-se como metodologia: estudos
exploratórios, pesquisa bibliográfica e estudo de caso.
Os estudos exploratórios compõem o conjunto de procedimentos para identificar,
selecionar, localizar e obter documentos de interesse à pesquisa, permeando todo o trabalho.
A pesquisa bibliográfica será realizada a partir de obras relacionadas à figura de Barack
Obama e sua campanha à presidência, literatura sobre marketing político e textos que tragam
as principais teorias de motivação humana. A distância geográfica deste estudo em relação ao
palco dos acontecimentos analisados justifica a utilização de fontes secundárias de
informação: matérias jornalísticas nacionais e internacionais, publicações traduzidas, artigos
científicos e livros. O estudo de caso tem o intuito de analisar aprofundadamente a campanha
de Obama. Ele possibilita a obtenção de informações de pesquisa que inicialmente não foram
previstas, ampliando o conhecimento acerca do tema estudado.
Barack Obama pode estabelecer um novo paradigma em campanha eleitoral, baseado
em ouvir e dar poder aos eleitores. Seria o uso inteligente de ferramentas digitais o fator
responsável por permitir a multiplicação de eleitores cativados pela mensagem de Obama?
Ou tão importante quanto o suporte virtual foram as metas auto-estabelecidas para a grande
legião de colaboradores em que se transformaram seus eleitores? Que estratégia suportou a
eleição de um negro em um país divido por raças, dono de um nome muçulmano que tanto
lembrava os terroristas que ameaçam seu país?
Através da resolução dessas questões pode-se entender em que a campanha de
Barack Obama se tornou enquanto fenômeno de comunicação, e como ela conquistou a
lealdade de seus eleitores.
11
12
2 PERSUASÃO, MOTIVAÇÃO E PROPAGANDA
A sociedade contemporânea configura-se como uma grande aldeia global1
mergulhada em um intrincado jogo de poder. Forças políticas utilizam o fluxo de
comunicação cada vez maior entre os indivíduos, buscando alcançar controle sobre a
sociedade, das mais diferentes formas. E com o surgimento do conceito de cibercultura2 o
entendimento dessas relações de poder ficou ainda mais complexo, uma vez que podemos
estudar suas implicações na dimensão das trocas individuais de informação. As modificações
que a internet vem provocando nos relacionamentos entre as pessoas estão criando novas
formas de perceber as tentativas de impor a vontade de um pequeno grupo sobre grandes
parcelas das populações.
E na busca pelo poder, seja ele político, cultural ou comercial, é fundamental o uso
da persuasão. Para agir conforme a vontade expressa das forças comunicadoras, os receptores
de suas mensagens precisam ter sua intenção referendada por sua própria emoção e razão.
2.1 Persuasão
A palavra “persuasão” origina-se do latim “per” (que significa “por meio de”) e
“Suada” (deusa romana da persuasão). Assim “persuasão” seu significado aproxima de “fazer
algo por meio do auxílio divino”. O dicionário define “persuadir” como “levar a crer ou a
aceitar; decidir (a fazer alguma coisa); aconselhar; induzir; convencer” (GLOBO, 1996,
p.325). De acordo com essa definição fica claro que a persuasão está diretamente conectada
com a ação. Assim, persuadir significa incitar diretamente o indivíduo a adotar determinado
comportamento.
1 Termo cunhado por Marshall McLuhan, referindo-se à grande rede eletrônica que distribui informação
mundialmente, tornando seu acesso facilitado para qualquer indivíduo.
2 Conceito que aborda as implicações culturais do desenvolvimento das tecnologias digitais de informação e
comunicação.
13
Segundo Abreu (2006) persuadir é falar para a emoção do outro. O autor estabelece
uma diferenciação entre persuadir e convencer, afirmando que o convencimento é uma
construção no campo das ideias, enquanto que a persuasão é estabelecida no terreno das
emoções, sensibilizando para a ação. Assim o convencimento está relacionado a fatores
racionais. Já a persuasão não necessariamente precisa estar atrelada a alguma explicação
lógica, contanto que alcance os sentimentos do indivíduo persuadido. Ou seja, o
convencimento lógico por si só não motiva o sujeito à ação, daí a necessidade da carga
emocional na mensagem.
A persuasão pode ser analisada sob o prisma da individualidade. Segundo Fowler
(2000), a persuasão é uma combinação de diversas características, que compreendem desde a
análise dos objetivos do emissor de mensagens persuasivas sob o ponto de vista de seu
receptor até a percepção da linguagem corporal daquele a ser persuadido. Considerando as
características atuais da comunicação global, que se direciona para um modelo baseado na
interação e compartilhamento de informações e opiniões, preocupar-se com o ponto de vista
dos outros é fundamental para o sucesso persuasivo. O autor ainda considera importante
investigar e questionar as opiniões das pessoas durante o diálogo. Ou seja, aí está colocada a
importância das pesquisas de mercado como ferramenta de previsibilidade dos índices de
força dos argumentos persuasivos.
Camorcardi (2003) divide a persuasão em duas categorias:
Há dois tipos de persuasão: a persuasão válida e a não-válida. A persuasão válida é
aquela em que expomos com clareza os motivos que fundamentam nossa posição. O
interlocutor é capaz de perceber claramente e questionar cada passo de nosso
raciocínio. Já a persuasão não-válida é aquela em que o interlocutor não tem
consciência de que está sendo persuadido nem pode perceber e questionar os
elementos do processo de persuasão. Tomemos como exemplo de persuasão não-
válida as apelações e chantagens emocionais, as jogadas com a inflexão da voz, os
apelos subliminares às necessidades conscientes (CAMORCARDI, 2003, p.33).
Percebe-se que a persuasão é um meio retórico de alcançar a adesão de indivíduos a
uma ideia. Logo, conforme Perelman (1997), o processo cognitivo de persuasão é composto
por uma gama de procedimentos de prova que não se reduzem nem aos meios utilizados pela
lógica formal nem à simples sugestão. O autor vai mais fundo na diferença entre persuasão e
convencimento (definição próxima a persuasão não-válida de Camorcardi), “os critérios pelos
quais se julga poder separar convicção e persuasão são sempre fundamentados numa decisão
que pretende isolar de um conjunto – conjunto de procedimentos, conjunto de faculdades –
certos elementos considerados racionais” (PERELMAN, 1993, p.32).
14
Para que alguém seja realmente persuadido a exercer algum tipo de comportamento,
o processo de persuasão leva em conta diversas características psicológicas do sujeito, como
sua bagagem cultural, seus valores e o ambiente social no qual está inserido. O conjunto
dessas características, aliado a força da mensagem persuasiva e a forma como ela é
transmitida é o que baliza a eficácia da persuasão. Dias (1985) afirma que a persuasão é um
processo que envolve a interação de muitos fatores que agem sobre o indivíduo.
Porém podemos considerar que todo esforço comunicativo é um esforço persuasivo.
Independentemente do conteúdo da mensagem, aquele que fala pretende que seu interlocutor
acredite na verdade da informação falada. O meio se transforma na mensagem3. A forma
como a mensagem é transmitida, o ambiente no qual se dá essa transmissão bem como os
canais por onde essa mensagem transita também se configuram como elementos persuasivos.
Souza (2000) afirma que a persuasão é inerente a argumentação:
A persuasão é, portanto, indeclinável em qualquer forma de argumentação, e a
legitimidade do seu exercício, embora sempre subordinada ao limites éticos da
discutibilidade, vai, nas justas proporções, da procura do verdadeiro até à do
meramente plausível, razoável, preferível (SOUZA, 2000, p.8).
O autor ainda destaca a importância do interlocutor no processo persuasivo, uma vez
que retoricamente um argumento só pode ser considerado válido após passar pela reação do
auditório. O conteúdo da mensagem não necessariamente precisa ser verdadeiro, contanto que
alcance seus fins retóricos. Dessa forma percebemos que a persuasão não se dá efetivamente
no discurso, mas reside na mente de quem se deixa persuadir. São as conexões entre as
sensações e pensamentos que permitem que qualquer tentativa de persuasão tenha êxito ou
não. O que determina se a mensagem persuasiva não se trata de uma simples informação
vazia de significado é a compreensão feita dela por seu receptor.
Souza (2000) comenta que a dificuldade de contra-argumentação faz parte do
processo de persuasão. Uma das regras para a eficácia persuasiva citada pelo autor é a união
de múltiplos argumentos; de modo a não permitir sua desconstrução pelo interlocutor.
Quando o indivíduo percebe um esforço deliberado em persuadi-lo, sua reação natural é
afastar-se e criar uma série de defesas psicológicas contra o domínio externo de sua vontade.
Porém a persuasão eficiente evita esse tipo de barreiras, uma vez que o sujeito não percebe
consciente o esforço persuasivo como algo prejudicial ao seu livre-arbítrio.
Conforme Niremberg (1980):
3 Termo cunhado por Marshall McLuhan referindo-se a influência do meio na mensagem emitida.
15
Um motivo muito comum pelo qual as tentativas de persuadir falham é o de se
considerara persuasão como uma submissão forçada à vontade do outro. Esta
concepção leva a medidas violentas, tais como o empenho da força através de
argumentos violentos, da ênfase na voz e da não tolerância de pontos de vista
contrários.
Tais métodos não funcionam simplesmente porque as ideias não podem ser
absorvidas socando-as de fora para dentro. Elas são apreendidas se vierem de dentro
(NIREMBERG, 1980, p. 180).
Existem três teorias sobre o processo persuasivo relacionado com a comunicação de
massa: a teoria psicodinâmica, teoria sociocultural e a teoria da construção de significados.
Cada um desses estudos entende o processo persuasivo focado em grandes grupos de
populações, porém ficam claros os vieses individuais.
DeFleur (1993) explica a teoria psicodinâmica:
Embora as emoções representem uma base óbvia de estratégias persuasivas, só
podem ser utilizadas num número limitado de situações. Um plano de jogada bem
mais freqüente na concepção de campanhas de persuasão tem sido o de tentar
manipular fatores cognitivos. As suposições que apóiam esse são assaz lógicas. Já
que a maioria dos fatores cognitivos são adquiridos em um processo de socialização,
eles são um alvo prioritário para campanhas que tentem promover nova
aprendizagem de sorte a modificá-lo da maneira desejada pelo comunicador.
A segunda suposição é de que fatores cognitivos são influências relevantes no
comportamento humano. Por conseguinte, se fatores cognitivos puderem ser
mudados, então com certeza o comportamento poderá ser mudado (DEFLEUR,
1993, p.293).
A teoria psicodinâmica apresenta grande relação com o conceito de “convencimento”
de Abreu (2006). Segundo essa corrente de pensamento, o indivíduo somente pode ser
persuadido a modificar seu comportamento se compreender perfeitamente o que essa
mudança significa, e quais suas implicações.
Já a teoria sociocultural concorda que os fatores cognitivos são adquiridos através de
um processo de socialização, porém, é exatamente através desses padrões sociais que os
indivíduos são persuadidos a adotar determinados comportamentos. DeFleur (1993) acredita
que a chave das mensagens persuasivas segundo essa teoria é a ideia de consenso, pois é
importante que o indivíduo compreenda que adotar determinado comportamento é exigido por
um grupo social que ele considera relevante.
Aqui a pressão do grupo social é vital no processo de persuasão. E isso não significa
necessariamente que o indivíduo precise estar inserido em determinado grupo. O que
realmente importa é qual o grupo no qual deseja estar; e como esse grupo se comporta. Uma
estratégia sociocultural pode basear-se em reafirmar determinados conceitos sociais, ou tentar
16
redefinir as exigências sociais que formam determinados comportamentos. A ideia de status
social é inerente a essa teoria.
A terceira teoria é a construção de significados. Seus pressupostos são, sem dúvida,
os mais utilizados na propaganda. Construir significados significa criar novas formas de
perceber as coisas, conforme a vontade do comunicador. Aqui a ideia de duplo-sentido é
recorrente, trazendo elementos subjetivos para a realidade objetiva.
DeFleur (1993) explica:
A utilização de duplo sentido em campanhas, propaganda e outras tentativas para
persuadir prossegue com todo o vigor. Nestes últimos anos vimos uma velha indagar
“Cadê o peru?”, para se referir a determinado sanduíche. Aviões agora voam em
céus “camaradinhas”. Certos laxativos e antiácidos produzem “alívio da poupança”.
Candidatos políticos procuram expressões breves, tipo slogans, capazes de ligar
significados positivos a suas imagens na comunicação de massa (Nova Jogada,
Mãos Limpas, Grande Sociedade, Novo Começo, Pai dos Pobres, e assim por
diante) (DEFLEUR, 1993, p. 311).
A teoria da construção de significado é amplamente utilizada na propaganda, uma
vez que visa criar uma relação cognitiva entre consumidor e produto. Ao estabelecer uma
conexão na mente do consumidor, a propaganda aumenta a lembrança do produto ou ideia
anunciada na memória do indivíduo, aumentando suas chances de aceitação.
2.2 Motivação
A motivação humana está intimamente conectada com a persuasão, uma vez que
ambas tratam das razões pelas quais as pessoas adotam determinados comportamentos. A
persuasão só pode existir através da motivação, enquanto que a motivação também pode se
dar através da persuasão. Em determinados momentos seus conceitos se confundem, uma vez
que ambos consideram variáveis como ambiente, sensações, emoções e reações cognitivas a
determinados estímulos. A diferença fundamental entre a persuasão e a motivação parece
estar na forma: a persuasão é um esforço externo ao indivíduo, enquanto que a motivação
advém de uma vontade interna. Mesmo assim podem ocorrer esforços externos que visem a
motivação do indivíduo.
O dicionário define “motivar” como “dar motivo a, causar, ocasionar, expor os
motivos, as razões de” (GLOBO, 1996, p. 289). Através dessa definição podemos perceber a
estreita relação da motivação com a ação, uma vez que ela ocupa a função de causa.
17
Existem diversas teorias sobre a motivação humana, e as causas pelas quais os
indivíduos podem promover o desenvolvimento de determinadas intenções e ações. Algumas
dessas teorias são extremamente relevantes para o estudo proposto, devido as suas relações
com propaganda, persuasão e com a dinâmica do jogo eleitoral. Uma das correntes mais
conhecidas de estudos sobre a motivação trata das necessidades humanas. Segundo Lopes
(1980):
Em regra, há consenso de que todo comportamento é motivado e de que as pessoas
têm razões para agir da maneira pela qual o fazem ou para se comportarem deste ou
daquele modo, isto é, todo comportamento humano visa a alcançar certos objetivos
ou propósitos. Tal comportamento dirigido para objetivos ou propósitos gira em
torno de um desejo de satisfazer necessidades.
Uma necessidade insatisfeita constitui o ponto de partida no processo da motivação.
Significa uma deficiência dentro do indivíduo e provoca a chispa que deslancha a
cadeia de eventos conduzindo ao comportamento. A necessidade insatisfeita causa
tensão física ou psicológica dentro do indivíduo, forçando-o a engajar-se em alguma
espécie de comportamento (quer dizer, a busca de um meio) para satisfazer a
necessidade e, por conseguinte, reduzir a tensão (LOPES, 1980, p.31).
Maslow é um dos estudiosos mais famosos a respeito da teoria das necessidades. Ele
entende o conjunto de necessidades humanas dividas em grandes categorias, e as ordenou de
forma ascendente em cinco níveis. Para ele qualquer necessidade só pode ser satisfeita se as
carências do nível imediatamente inferior estiverem satisfeitas (LOPES, 1980).
A hierarquia de necessidades de Maslow é descrita em ordem ascendente, segundo
Lopes (1980):
1. Fisiológicas – Este é o mais básico nível da hierarquia das necessidades. Em
geral, corresponde aos motivos primários não-aprendidos ou naturais [...]. As mais
importantes são aquelas indispensáveis à sobrevivência. Exemplos destas
necessidades são: fome, sede, sono e relações sexuais.
2. Segurança – Grosso modo, este nível equivale ao motivo de igual nome referido
na introdução desse livro. Refere-se à necessidade de segurança contra perigos,
ameaças, privações, doenças, instabilidade no emprego, inadequada retribuição
salarial, etc.
3. Sociais – [...] refere-se aos sentimentos de associação com outras pessoas e
grupos. Nasce da natureza gregária do homem.
4. Estima – Diz respeito à necessidade de estimar-se a si próprio, de estimar e
respeitar outras pessoas e fazer-se respeitar e estimar por outras pessoas. Exemplos
de necessidades deste nível são: prestígio, poder, autoconfiança, contemplação e
status.
5. Auto realização – Representa a culminação das necessidades humanas de todos os
níveis. Significa a motivação de um indivíduo para transformar sua percepção de si
próprio em realidades. Em suma, pleno desenvolvimento de todas as potencialidades
de uma pessoa, inclusive da oportunidade de usar o pensamento criativo (LOPES,
1980, p.35).
18
Essa teoria considera que os esforços motivacionais (e, por extensão, persuasivos)
devem orientar-se para a satisfação de alguma necessidade. Nota-se a importância do
direcionamento do conteúdo da mensagem e de suas características à realidade de cada
indivíduo, que pode ser compartilhada por grandes grupos. A batalha pela adoção de
determinado comportamento sugerido é travada dentro das percepções de valor da cada
sujeito. Mesmo que dividam o mesmo ambiente e as mesmas possibilidades sociais, ainda
assim o esforço motivacional será percebido de forma diferente por cada indivíduo, devido a
suas idiossincrasias.
Lopes (1980) coloca essa questão sobre o prisma da personalidade. Afirmando que a
personalidade é o resultado da soma geral de características de um indivíduo, ele a coloca
como a principal causa de mudanças comportamentais; além de ser a diferença crucial entre
os padrões motivacionais.
Uma alternativa para a teoria de Maslow foi desenvolvida por C. Alderfer (apud
LOPES, 1980), que substituiu as cinco categorias de necessidades de Maslow por três:
existência, relacionamento e crescimento. A hierarquização se mantém, porém para o autor a
satisfação de necessidades de nível inferior não impede a satisfação de necessidades de nível
superior.
Herzberg também desenvolve uma teoria muito parecida com os estudos de Maslow,
porém a simplificação é ainda maior: para ele os fatores motivacionais se dividem em
higiênicos e motivacionais (LOPES, 1980). Partindo de conceitos diferentes (motivação para
Maslow e satisfação para Herzberg) ambos buscam a satisfação das necessidades. Lopes
(1980) explica os pressupostos da teoria de Herzberg:
Os fatores higiênicos funcionam como agentes de insatisfação porque representam o
ambiente ao qual o aspecto animal do homem está constantemente tentando adaptar-
se. De outra parte, os fatores motivadores afetam a motivação numa direção positiva
porque a substância de uma tarefa é que estimula metas de crescimento, isto é, uma
tarefa potencialmente criativa e indispensável ao fomento da inovação (LOPES,
1980, p. 42).
Outra teoria bastante popular é a da expectativa. Para Lopes (1980) essa teoria se
baseia na ideia de uma recompensa futura por um comportamento presente. Ou seja, o
raciocínio é construído da seguinte forma: se eu adotar essa ação, certamente poderei
aproveitar daquele benefício.
Essa teoria pode facilmente ser relacionada com qualquer corrida eleitoral. O eleitor
tem uma expectativa em relação ao candidato e as suas proposições, o que o motiva a votar no
19
presente esperando sua recompensa futura. Nota-se também que nesse caso o voto pode não
ter nenhum tipo de relação com uma preocupação por um futuro coletivo, mas apenas com o
desejo de satisfação de uma expectativa individual.
A expectativa envolvida na motivação não precisa ser necessariamente positiva. O
indivíduo pode adotar um comportamento presente para evitar uma reação futura. É o caso
das ações motivadas pela coerção. Um exemplo prático é a criança que evita comportar-se
mal para não ser castigada.
É claro que, dentro do contexto eleitoral, objeto deste estudo, a motivação pela
liderança deve ser analisada de forma especial. A liderança como força motivadora e
persuasiva é uma das principais características do jogo eleitoral.
Lopes (1980) traz a classificação de liderança proposta por Max Weber:
1. Líder tradicional, consequente de uma ordem social sagrada e eterna, baseada no
direito divino, na tradição cultural, na herança e na distância social. Apresenta traços
patriarcais e patrimonialistas. A natureza da sociedade é o clã e a tribo.
2. Líder carismático, inicialmente rejeitando a tradição e rebelando-se contra a
ordem social vigente, concentra-se depois na aceitação de uma nova ordem,
encarnada em uma única pessoa. Apresenta traços místicos, arbitrários e
personalistas. A natureza da sociedade é a dominada por partidos políticos ou grupos
revolucionários.
3. Líder legal, fundamenta-se me normas sociais a que todos devem obedecer,
constituindo dogma básico da democracia, ou seja, governo de leis e não de homens.
Apresenta traços impessoais, racionais e técnicos. A natureza da sociedade é a
burocrática, onde predominam as empresas, as forças armadas e a administração
pública (LOPES, 1980, p. 62).
Os tipos de liderança propostos por Weber (apud LOPES, 1980) precisam ser
entendidos de forma um pouco diferente dentro do contexto histórico atual. A liderança
carismática também pode apresentar traços paternalistas e não ser, necessariamente, contra a
ordem de poder vigente. Observa-se nos diversos cenários políticos atuais a preponderância
de líderes carismáticos; verdadeiros messias que constroem sua imagem em torno de traços de
suas personalidades.
A liderança é uma das mais importantes fontes de persuasão e motivação. O
indivíduo é persuadido para aceitar a liderança. E isso independe das razões motivacionais
envolvidas. O que não significa que o sujeito adotará um comportamento de acordo com o
desejo de seu líder em todas as situações. A grande questão é o entendimento de que alguém
possui uma posição de liderança em relação aos demais. Logo, seu poder está estabelecido na
mente dos seguidores, portanto suas possibilidades de emitir mensagens persuasivas eficazes
são exponencialmente maiores.
20
Ainda existem as possibilidades de estudo da motivação sobrepondo o indivíduo a
tarefa que deve realizar. Essa análise é importante para o estudo eleitoral proposto, uma vez
que o movimento interno dos comitês é um fator causal das reações do eleitorado.
Para Lopes (1980) a motivação em relação a tarefas a serem realizadas depende
essencialmente de três principais fatores:
a) O indivíduo deve receber feedback significativo sobre seu desempenho. As
implicações desta necessidade são as seguintes: o próprio indivíduo deve avaliar seu
desempenho e deve definir a espécie de feedback que lhe deverá ser fornecido; e
deve participar da elaboração de um produto completo ou pelo menos de uma parte
substancial do mesmo;
b) O indivíduo deve perceber sua tarefa como requerendo o uso de capacidades que
têm valor para ele. Somente quando o indivíduo sente que suas capacidades
significativas estão sendo testadas pela tarefa é que sentimentos de realização e
crescimento provavelmente resultarão do bom desempenho;
c) O indivíduo deve sentir que tem alto grau de autocontrole sobre a fixação de seus
próprios objetivos e sobre a definição dos caminhos para alcançá-los. De acordo
com Chris Argyris, somente quando essa condição existe é que as pessoas
experimentam satisfação psicológica como resultado do bom desempenho (LOPES,
1980, p. 90).
Esses pressupostos têm relação com a teoria Y, de Douglas McGregor (apud LOPES,
1980); que sugere que os seres humanos não são inerentemente passivos, mas desenvolvem
sua motivação e sua capacidade em assumir responsabilidades de acordo com as
possibilidades do meio. Percebemos que dentro dessa premissa a liderança utiliza da
persuasão e das técnicas de motivação apenas como um meio para que o próprio sujeito
persuadido perceba suas qualidades. Novamente vemos que a motivação se desenvolve dentro
da mente do indivíduo motivado, muitas vezes a revelia dos esforços persuasivos.
Existe uma corrente de pensamento que desacredita os pressupostos da teoria Y, e
propõe a teoria X. De acordo com essa teoria o homem “trabalhará sempre o mínimo possível,
preferindo ser conduzido em vez de assumir responsabilidades, e deseja, acima de tudo,
sentir-se seguro” (LOPES, 1980, p.64). Esse comodismo natural facilitaria a eficiência das
mensagens que visassem a persuasão.
Para os adeptos da teoria X as pessoas devem ser controladas, e seu desempenho
medido. Interessante notar que esse pensamento ignora a vontade do sujeito persuadido,
considerando que as pessoas são mais facilmente manipuláveis através da coerção. Um
modelo como esse não se sustenta na grande aldeia global em que se tornou a sociedade.
Embora existam tentativas de controle pouco explícitas e uma série de indicadores de
21
desempenho utilizados em campanhas de comunicação4, o uso desses artifícios está mais
facilmente relacionado com a teoria da motivação sobre tarefas. Os indicadores de controle se
transformam em ferramentas de feedback se fizermos uma inter-relação simples entre as duas
teorias. Sua função não é coagir o comportamento, mas permitir que o próprio sujeito analise
suas atitudes e se motive para alcançar determinados níveis de desempenho.
No campo da administração de empresas (fonte de inúmeros estudos sobre
motivação), o empowerment é uma das técnicas mais enaltecidas atualmente. Ela consiste em
dar poder e delegar responsabilidades às pessoas, ou seja, compartilhar a autoridade de
gerenciamento das situações. Segundo esse pensamento, para o líder tornar sua organização
eficaz deve distribuir tarefas entre seus subordinados, permitindo que sua execução seja
efetuada com liberdade.
De acordo com essa corrente de pensamento quanto maior for a participação das
pessoas no processo de decisão que afetam sua vida no trabalho, maior sua motivação para
cumpri-las. Existe, portanto uma relação entre essa teoria e o entendimento de que o homem é
naturalmente pró-ativo.
Tracy (1994) explica o empowerment:
Um administrador confere empowerment aos outros dando-lhes autoridade igual à
responsabilidade que lhes é designada. As pessoas só têm condições de desempenhar
as responsabilidades inerentes às suas funções até o limite da autoridade que lhes for
conferida. Um administrador possui mais poder para alcançar os seus próprios
objetivos quando as pessoas que trabalham para ele desfrutam de autoridade para
desempenhar suas responsabilidades (TRACY, 1994, p. 19).
Para a autora, o empowerment é uma filosofia aplicada aos relacionamentos
organizacionais. Desse modo, dar poder às pessoas significa conferir-lhes liberdade de ação e
de decisão. Portanto a autoridade sobre as decisões é inerente ao processo de tomada de
responsabilidades. Sem autoridade o indivíduo é incapaz de executar de forma satisfatória a
tarefa que lhe foi delegada, uma vez que não possui controle efetivo sobre ela.
Outra faceta importante sobre o empowerment é o conhecimento. O poder conferido
deve estar acompanhado das informações necessárias para o exercício desse poder. Segundo
essa teoria um indivíduo somente poderá motivar-se a assumir a responsabilidade sobre algo
se possuir todas as informações relevantes ao panorama no qual sua atividade se desenrolará.
Tracy (1994) destaca a importância do conhecimento no processo de empowerment:
4 Segundo Lupetti (2000) configuram-se como um conjunto de estratégias e ações de comunicação
harmoniosamente definidas.
22
Um administrador confere empowerment aos outros fornecendo-lhes o
conhecimento e as informações de que necessitam para tomar decisões boas e
sensatas. As pessoas precisam ter a capacidade de tornar decisões sensatas se
quiserem alcançar o sucesso. Um administrador tem mais poder para alcançar os
seus próprios objetivos quando as pessoas que trabalham para ele são capazes de
tomar boas decisões (TRACY, 1994, p. 73).
A confiança é outro valor fundamental na delegação de poder. Mais do que delegar
tarefas, os líderes devem deixar claro que delegam confiança aos liderados. Essa atitude
valoriza o indivíduo que assume responsabilidades, uma vez que percebe o voto de confiança
nele depositado. Ao perceber-se digno de confiança, o indivíduo passa a acreditar mais em si
mesmo.
Uma liderança participativa, portanto têm na confiança um de seus valores centrais.
Destaca-se ainda que a distribuição de responsabilidades somente pode alcançar êxito através
da clara percepção do que se espera de quem as assume e da confiança depositada em sua
capacidade de julgamento. Ao entender a expectativa que lhe cerca, o sujeito responsável
poderá melhorar sua percepção sobre suas ações, seus objetivos e sobre sua própria
capacidade, além de sentir-se valorizado pela confiança a ele destinada.
Tracy (1994) destaca que as possibilidades de sucesso na realização de qualquer
tarefa aumentam quando os indivíduos envolvidos com ela acreditam em si:
Um administrador confere empowerment aos outros confiando neles, o que os ajuda
a acreditar mais em si mesmos. Quanto mais pessoas acreditam em si, mais poder
têm para alcançar o sucesso. Um administrador tem mais poder para alcançar os seus
próprios objetivos quando as pessoas que trabalham para ele acreditam em si
mesmas (TRACY, 1994, p.119).
Acreditar na própria capacidade é fundamental para a motivação. Crer em si mesmo
é um pressuposto motivador, uma vez que diminui a importância de qualquer dificuldade
encontrada pelo indivíduo.
23
2.3 Propaganda
O termo “propaganda” encontra sua origem na expressão latina Congregatio de
Propaganda Fide5, entidade criada pelo Papa Clemente VIII, 1602, cuja atribuição era
propagar a fé católica. Atualmente a propaganda é estudada como uma ciência da área da
comunicação social.
Segundo Sandmann (2005):
Quanto ao significado da palavra propaganda, hoje definitivamente um substantivo,
há diferenças de compreensão em algumas línguas. No inglês, por exemplo,
propaganda é usado exclusivamente para propagação de ideias, especialmente
políticas, tendo muitas vezes uma conotação depreciativa, sendo que a propaganda
comercial ou de serviços se usa do termo advertising (SANDMANN, 2005, p.10).
O autor ainda esclarece que, no Brasil, o termo propaganda difere de publicidade.
Aqui propaganda se relaciona com a propagação de ideias, enquanto que publicidade é
utilizada para a venda de produtos e serviços, sem carga ideológica. Calazans (2001) traz a
origem da palavra propaganda, que deriva do latim pangere, plantar. Desse modo os esforços
de comunicação por meio da propaganda visam plantar uma proposição no receptor da
mensagem.
A respeito da sobreposição entre os termos “propaganda” e “publicidade” Domenach
(2002) escreve:
A propaganda confunde-se com a publicidade nisto: procura criar, transformar certas
opiniões, empregando, em parte, meios que lhe pede emprestados; distingue-se dela,
contudo, por não visar objetos comerciais e, sim, políticos: a publicidade suscita
necessidades ou preferências visando a determinado produto particular, enquanto a
propaganda sugere ou impõe crenças e reflexos que, amiúde, modificam o
comportamento, o psiquismo e mesmo as convicções religiosas ou filosóficas. Por
conseguinte, a propaganda influencia a atitude fundamental do ser humano. Sob esse
aspecto, aproxima-se da educação; todavia, as técnicas por ela empregadas
habitualmente, e, sobretudo o desígnio de convencer e de subjugar sem amoldar,
fazem dela a antítese (DOMENACH, 2002, p.4).
O dicionário define “propaganda” como “ato de propagar ideias, princípios ou
teorias” e “publicidade” como “qualidade do que é público, divulgação” (GLOBO, 1996, p.
403).
5 Congregação da fé que deve ser propagada.
24
Sob o prisma da administração de empresas, a propaganda e a publicidade são
ferramentas do marketing6. Alguns autores como Odgen (2000) sugerem que a publicidade é
uma subfunção das Relações Públicas7, de modo que precisa estar integrada a toda
comunicação empresarial em uma campanha de comunicação integrada de marketing.
Dias (1985) explica que existem duas correntes teóricas que propõem modelos
referentes ao processo persuasivo da propaganda. A primeira supõe que a propaganda provoca
no consumidor a propensão de compra através da atitude. Ou seja, a propaganda estimula a
atitude, e essa se converte em compra. Dias (1985) desdobra o conceito de atitude em três
dimensões:
A dimensão cognitiva, que diz respeito a conhecimentos, crenças, convicções,
informações, opiniões, enfim, todo um conjunto de elementos conscientes que um
indivíduo adquire, através do aprendizado, sobre determinado objeto.
A dimensão afetiva, que se relaciona com toda a sorte de sentimentos que esse
determinado objeto desperta no indivíduo.
A dimensão conativa, que está ligada à predisposição que o indivíduo tem para agir
em relação a este objeto. Por necessidade, ou condicionamento, o ser humano pode
estar predisposto a se comportar de certa forma em relação a um objeto, de maneira
mais ou menos independente do que sabe ou sente em relação a ele (DIAS, 1985, p.
59).
Outra corrente teórica pressupõe que a propaganda alcança maior influência sobre o
comportamento; gerando antes a ação de compra e depois as atitudes em relação à compra.
Assim o sujeito não percebe que seu comportamento é afetado pela propaganda, uma vez que
os estímulos persuasivos não precisam ser necessariamente conscientes. Dias (1885) ainda
afirma que ambas as correntes teóricas exageram o poder persuasivo da propaganda, ao
mesmo tempo em que não são suficientes para explicar todo o tipo de caso concreto de
persuasão.
Kotler (2003) afirma a propaganda deve informar, persuadir, lembrar ou reforçar
uma informação. O autor traça um paralelo entre as diferentes possibilidades mercadológicas
de um produto com as funções da propaganda. Assim para um produto novo no mercado, a
propaganda deve informar e persuadir. Para um produto já consolidado a propaganda deve
reforçar a posição da marca e lembrar o consumidor. Kotler (2003) ressalta que o propósito da
6 De acordo com Kotler (2003) marketing é a arte e a ciência de conquista e retenção de clientes por meio da
criação de valor.
7 Ciência da Comunicação Social que estuda a comunicação aplicada aos públicos relacionados com as
organizações.
25
propaganda não é descrever fatos sobre o que se pretende vender, mas persuadir o consumidor
com soluções e sonhos.
A propaganda é uma ferramenta de persuasão por excelência. Através das técnicas de
comunicação social ela busca persuadir as pessoas e motivá-las a alguma ação, seja ela
comprar algum produto ou simplesmente repensar seus conceitos sobre determinado assunto.
Sem persuasão a propaganda não pode existir, pois essa é apenas um desdobramento, uma
maneira de alcançar a primeira. Percebemos também que a propaganda trata diretamente da
motivação, pois se orienta para a busca de uma ação efetiva de quem foi impactado por ela.
A propaganda se utiliza de recursos retóricos, persuasivos e motivacionais para
alcançar os objetivos de comunicação a que se propõe. Embora as combinações entre essas
ferramentas sejam infinitas, o que torna a propaganda realmente fascinante é o fato de que ela
invariavelmente busca falar com a razão e com os sentimentos das pessoas. As pessoas
conservam um conjunto de características psicológicas inatas, que pouco variam. As
oscilações dentro dessas características de personalidade estão mais intimamente ligadas ao
ambiente sociocultural em que as pessoas estão inseridas do que propriamente relacionadas a
diferenças individuais simples.
Portanto, dadas as relações entre motivação e persuasão e se aceitarmos que ambas
somente ocorrem na mente daquele a ser persuadido, a propaganda atua como criadora de um
ambiente propício. Através de artifícios semióticos8 e semânticos
9 a propaganda enfraquece as
barreiras psicológicas que resistem a persuasão.
Alguns estudiosos afirmam que a propaganda venha perdendo sua força, em função
de sua baixa credibilidade quando comparada a ação jornalística ou mesmo à indicação
pessoal direta. Para Ries (2002), a propaganda e a publicidade são vistas como tentativas de
imposição ao consumidor. Assim quanto mais insistente, forte e incisivo for o apelo de venda
maior será a resistência por parte do possível comprador. A propaganda é vista por autores
como Al Ries como uma intromissão: o comercial interrompe o programa de rádio, atrapalha
a novela na televisão e o anúncio de jornal toma o lugar de informações relevantes.
Nesse sentido os estudiosos de comunicação estão buscando alternativas tecnológicas
para tornar a publicidade e a propaganda menos agressivas. Especialmente através das mídias
digitais e do desenvolvimento de novos formatos de publicidade, as empresas de propaganda
buscam torná-la mais atrativa e interessante, além de inseri-la no contexto em que é veiculada.
8 Pierce (apud SANTAELLA, 2008, p.14) define semiótica como “teoria geral das representações”.
9 Couto (2007, p.135) define semântica como “o estudo do significado linguístico”.
26
Não apenas a credibilidade da propaganda é atacada, como sua perenidade. Ries
(2002) chega a afirmar que um anúncio de ontem é totalmente inútil. Desse modo a
propaganda é vista como incapaz de gerar relacionamentos de longo prazo entre anunciantes e
consumidores.
Porém existem diferenciações práticas entre propaganda e promoções de vendas10
,
que muitas vezes não são consideradas pelos críticos mais ferrenhos. A propaganda trata de
persuasão, de ideias. E não é possível propor uma ideia com seriedade através de um canal
sem credibilidade, logo, devemos analisar com cuidado as proposições levianas de alguns
críticos. E cada anúncio, cada esforço de propaganda, faz parte da construção da imagem de
determinada organização; sendo assim, mesmo que o anúncio tenha sido veiculado ontem, a
ideia por trás dele permanece dentro do imaginário a respeito daquele anunciante.
10
Kotler (2003) define promoção de vendas como uma ferramenta de comunicação de curto prazo para aumento
de vendas.
27
28
3 CAPÍTULO – MARKETING POLÍTICO
O marketing político vem ganhando grande projeção e ares de “ciência”, através da
cobertura (muitas vezes exagerada da mídia). Em campanhas eleitorais, especialmente nos
grandes centros urbanos, é comum a figura do “marqueteiro”; do mago da pesquisas e dos
grandes slogans11
capazes de eleger mesmo o mais inapto candidato. A estrutura eleitoral em
si, e todo o grande jogo de poder contido nela exigem um elevado profissionalismo de todos
os setores envolvidos. Porém não existem magos; o que efetivamente possibilita a ascensão de
determinado candidato a qualquer cargo eletivo é o estudo, o planejamento e a execução de
todas as facetas de sua campanha.
Utilizado pelos partidos políticos, agremiações estabelecidas em torno de ideologias,
o marketing político é a principal ferramenta para a busca de poder político e,
consequentemente, de poder social. O marketing é a primeira ferramenta que deve ser usada
pelos partidos políticos, não apenas em momentos eleitorais.
Em geral os autores firmam consenso em relação ao conceito de marketing. Torquato
(2002) define marketing como um conjunto de ações destinadas a promover relações de troca
entre um emissor e um receptor, por meio de canais adequados, e mensagens apropriadas. O
autor estabelece um paralelo entre os 4 P’s do marketing comercial (produto, preço, praça e
promoção) citando seu conceito de 4 C’s do marketing político (candidato, comunicação,
cenário e custos). A abordagem dos 4 C’s se apresenta como uma relação interessante com o
marketing comercial, e dá conta de um universo de possibilidades e características próprias do
universo político.
O autor ainda desenha seis vetores principais do marketing político: delineamento do
mercado, motivações do voto, emoção e razão, ajustamento, planejamento da comunicação e
distribuição. O delineamento de mercado é a definição dos segmentos-alvo. Começa com um
corte populacional baseado em classes sociais, e prossegue com o direcionamento de
mensagens a determinados setores profissionais, determinadas parcelas de público
organizadas por idade ou ainda por área geográfica. É através dessas divisões que os
especialistas de marketing podem traçar os perfis comportamentais.
11
Conceito aprofundado no capítulo 5.
29
As motivações do voto devem ser identificadas através de pesquisas. São as razões
pelas quais o eleitorado vota em determinado candidato em detrimento de outro. As pesquisas
visam descobrir quais os fatores cognitivos estão ligados a decisão do voto. Torquato (2002)
também fala sobre o equilíbrio entre a emoção e a razão no processo de persuasão eleitoral.
Para ele, a emoção e a razão são as duas bases psicológicas por trás da motivação do voto. As
classes populares tendem a escolher seus candidatos baseados na emoção, enquanto que os
argumentos racionais encontram maior impacto nas classes com maior grau de instrução.
O ajustamento consiste no alinhamento entre o conjunto de ideias e proposições do
candidato com os desejos dos eleitores. Deve estar presente não apenas no programa de gestão
do candidato expresso por suas propostas, mas também na adequação da mensagem as
características regionais. Os canais para a transmissão das mensagens devem ser escolhidos
conforme a disponibilidade do público.
O planejamento de comunicação é a quinta fase do trabalho de marketing político
para Torquato (2002). Aqui devem ser respondidas todas as questões a respeito de forma e
conteúdo da mensagem: o que dizer, como dizer, quando dizer, para quem dizer, de que
maneira dizer, através de quais tipos de canais. É importante facilitar ao máximo a
compreensão de todas as mensagens ao eleitor.
A distribuição diz respeito a logística dos materiais produzidos para a campanha.
Panfletos, adesivos, bandeiras, insígnias e demais artigos devem chegar às mãos do eleitor
sem dificuldades. Distribuir os materiais com inteligência se configura como um grande
diferencial competitivo, pois favorece a expansão da mensagem do candidato.
Para o autor também é importante realizar cruzamentos entre as estratégias do
candidato com as de seus adversários. Desse modo é possível elaborar projeções através da
perspectiva do eleitorado, auxiliando no processo de identificação de ameaças eleitorais. Essa
análise é útil inclusive para minimizar a capacidade de retaliação do adversário. Porém,
nenhum candidato deve distrair-se com questões menores. Manter o foco em seu objetivo é
crucial para a vitória eleitoral.
O voto é o principal objetivo dos esforços de marketing político. Ele é a moeda de
troca que permite a expressão do eleitor nos sistemas democráticos. Mesmo que os países
adotem diferentes metodologias de coleta e de valoração dos votos, ele continua sendo a
máxima expressão da democracia.
Diversas teorias versam sobre o objetivo e as razões do voto. Uma delas é a teoria
racional, citada por Figueiredo (2000):
30
A decisão do voto é concebida como produto de uma ação racional individual,
orientada por cálculos de interesse e utilidade pessoal, tendo em vista o objetivo de
maximizar os ganhos. O eleitor decide se irá votar ou não considerando a relação
entre os custos relativos à tomada de decisão e os benefícios que podem ser obtidos
no caso de vitória do candidato desejado. E o eleitor decide racionalmente a direção
de seu voto. De acordo com seu auto-interesse, seleciona partidos e candidatos em
ordem de preferência e opta por aquela alternativa que avalia possibilitar a obtenção
de maiores ganhos.
Para prever como os eleitores irão se comportar em um processo eleitoral é preciso,
de acordo com essa teoria, conhecer os interesses e pontos de vista dos votantes,
uma vez que a mecânica da decisão, orientada pela lógica racional, já é conhecida. O
comportamento do eleitor pode ser deduzido dos seus interesses e pontos de vista
(FIGUEIREDO, 2000, p. 117).
A teoria racional está diretamente relacionada com o conceito de convencimento
lógico. Figueiredo (2000) ainda aponta outras teorias que colocam o convencimento como
fator central da decisão do voto; como a tese do voto retrospectivo, na qual o eleitor define
seu voto de acordo com sua avaliação do governo vigente. A mesma lógica se apresenta na
teoria do voto econômico, segundo a qual o eleitor vota de acordo com a situação da
economia.
Outras teorias admitem a importância de fatores como sentimentos, emoções, e
valores sociais na decisão do voto. Essas correntes afirmam que o ato de votar é repleto de
emoção, uma vez que carrega as esperanças do eleitor. Assim, o apelo lógico não é suficiente
para a vitória eleitoral: é necessário falar diretamente com os sentimentos, com o coração do
eleitor. Mesmo as emoções do eleitor podem ser entendidas como fatores lógicos, pois
auxiliam o indivíduo a concretizar seu desejo, impulsionado por suas razões particulares.
Mendonça (2001) afirma que, quando o candidato usa a emoção como linguagem
básica, adotando uma postura convidativa junto ao eleitorado “as suas propostas são mais
facilmente memorizadas, chegam mais rápido ao coração do eleitor, mesmo que o seu
adversário venha com um discurso mais enfático e preciso” (MENDONÇA, 2001, p.55). A
utilização da emoção dentro do contexto eleitoral é recorrente pelos profissionais em
campanhas; muitas vezes a escolha pelo apelo emocional se dá em função da falta de razões
objetivas para a escolha de votar em determinado candidato.
Usualmente existem definições que buscam simplificar o marketing político,
aproximando-o do tradicional marketing de produtos e serviços. Porém, essa sobreposição
precisa considerar algumas variáveis. Segundo Figueiredo (2000):
31
Tendo em vista essas interpretações, seria útil uma definição mínima de marketing
político. Alguns autores fazem um paralelismo com o marketing de produtos. Gary
Mauser aponta três similaridades. Primeira, em ambos os casos existe um conjunto
de organizações (empresas e partidos políticos) competindo entre si pelos
consumidores ou eleitores entre as alternativas dadas, sejam produtos ou candidatos.
Segunda, tanto os consumidores quanto os eleitores têm o mesmo papel nos dois
domínios: são tomadores de decisão. Terceira: os canais de comunicação e
persuasão disponíveis para os candidatos nas democracias modernas são
basicamente os mesmos: contato pessoal e comunicação de massa (cada vez mais a
mídia eletrônica).
As semelhanças convivem com diferenças acentuadas. A principal delas é que o
“produto” no marketing político pensa, fala e tem história de vida. Os produtos,
geralmente, são colocados à disposição de uma parcela dos consumidores:
automóveis podem ser comprados apenas por quem tem um determinado padrão de
renda, tênis são a paixão dos mais jovens, seguro de vida só a partir de determinada
idade, papinha para bebês e assim por diante. Já numa eleição o candidato deve se
vender para a maior parcela possível do eleitorado, embora possa lançar mão de
alguns artifícios para trabalhar de forma segmentada (FIGUEIREDO, 2000, p.14).
Embora a diferença mercadológica entre um produto inanimado e um ser vivo pareça
óbvia, existem correntes simplistas. Figueiredo (2000) esclarece as diferenças principais entre
o marketing convencional e aquele voltado ao processo político afirmando que o público-alvo
de um candidato é muito maior do que qualquer produto pode almejar dentro das fronteiras
nacionais. Mesmo as marcas de produtos massivos não estão ao alcance de todos, enquanto
que o voto é universal. A ideologia e a importância política relacionada com todas as esferas
sociais se caracterizam em outro diferencial, além da espontânea cobertura midiática.
Também é imprescindível entendermos o conceito geral de política. O dicionário
define política como “ciência do governo dos povos, arte de governar um Estado e regular
suas relações com outros, princípios políticos, maneira hábil de agir a fim de obter o que se
deseja” (GLOBO, 1996, p.512). Nesse contexto a persuasão é inerente ao conceito de política.
Existem diversas maneiras de entender a política, que o digam pensadores como
Jean-Jacques Rosseau, Michel Foucault, Max Weber, entre outros. O presente estudo
considera a definição de Lftwich (apud GOMES, 2007):
[...] compreende todas as atividades de cooperação e de conflito dentro e entre as
sociedades, mediante a qual os cidadãos se organizam, durante a produção e
reprodução de sua vida social e biológica, o uso, a produção e distribuição de
recursos humanos, naturais e outros, tais atividades não estão isoladas dos outros
elementos, públicos ou privados, da vida social. Assim sendo, é certo que influem e
refletem a distribuição de poder e as formas de decisão na estrutura da organização
social (inclusive, mas não somente, nas eleições), os sistemas de cultura e de
ideologia na sociedade ou nos seus grupos (GOMES, 2007, p.3).
32
Convém percebermos que a estrutura filosófica da política permanece inalterada
desde o nascimento da democracia. O que realmente se modifica é o contexto histórico no
qual a democracia acontece, e as relações de poder estabelecidas entre o Estado, a população
comum e Estados estrangeiros.
A lógica eleitoral, em si, é bastante simplificada. O procedimento para que algum
candidato ascenda ao poder está calcado em alguns passos simples. Primeiro ele precisa
perceber a realidade da mesma forma como o eleitorado a percebe. Assim ele pode
desconstruir o modelo social atual ou apoiá-lo, de acordo com seu interesse pessoal. Se o
eleitorado perceber a relação entre o presente percebido (pelo candidato) e o futuro prometido
por ele como verdadeira, suas possibilidades de vitória são acentuadas. Aí se configura a
balança entre a aceitação e a rejeição de determinado candidato; uma vez que o eleitor precisa
perceber que o candidato é capaz de realizar o que promete. Nessa estrutura aparentemente
simples de funcionamento residem todas as interfaces das disputas eleitorais e das
configurações de manutenção e conquista do poder nas sociedades democráticas. Figueiredo
(2000) apresenta uma descrição do funcionamento retórico da competição eleitoral:
1. Descrever um mundo atual, dentre os possíveis, que melhor represente as
condições sociais em que as pessoas vivem; aqui o objetivo é persuadir a todos
de que “o copo com água está quase vazio ou quase cheio”;
2. Descrever um mundo futuro, dentre os possíveis, desejável para a maioria do
eleitorado; aqui o objetivo é persuadir as pessoas de que, no mínimo, “o copo
com água não ficará quase vazio”, isto é, a situação melhorará;
3. A melhor maneira de construir o mundo futuro desejável é fazer “x”;
4. A única garantia de que “x” será feito é através do candidato, do grupo
político ou do partido ao qual está ligado; esses atores se tornam os garantidores
da realização do mundo futuro desejável (FIGUEIREDO, 2000, p.153).
A disputa eleitoral se dá, portanto, no campo simbólico. O eleitor constrói
internamente seu retrato do momento vivido, através da percepção das ações do governo e da
oposição. Todos os esforços semânticos e semióticos de cada um dos lados da disputa ajudam
a compor esse imaginário do eleitor. Os símbolos visuais criados nas campanhas, a linha
retórica adotada pelos candidatos, os conflitos de ideias e o modo como os outros encaram a
corrida eleitoral também fazem parte das concepções do eleitor. O indivíduo une essas
percepções com seus valores individuais, seus desejos, suas crenças, e suas análises pessoais
do quadro social presente.
A retórica do debate eleitoral é ficcional, baseada em uma ideia de futuro. Cada
candidato combina a situação presente com algumas projeções futuras, de acordo com sua
33
plataforma de governo. A grande questão reside em persuadir ou convencer os eleitores de
que essa projeção é possível. Existem duas possibilidades retóricas: “o mundo atual está ruim,
mas ficará bom” ou “o mundo atual está bom e ficará ainda melhor” (FIGUEIREDO, 2000, p.
152).
A construção do discurso político passa também pela metáfora, utilizada para
desenhar as relações entre o presente (já visto como passado) e o futuro imaginado. Torquato
(2002) afirma que, para que o discurso político seja eficaz, o candidato deverá embutir nele
expressões que provoquem uma reação emotiva, se possível, que esteja relacionado com os
mecanismos de preservação da espécie. Entretanto, para isso o discurso deve despertar
atenção. A intensidade da atenção dependerá do teor das mensagens, do interesse efetivo que
a ela provoca no ouvinte e em seus estados físico e psicológico.
3.1 Marketing político e eleitoral: definições
É comum o tratamento midiático não apontar diferenças entre o marketing político e
o marketing eleitoral. Porém alguns autores indicam que existem diferenças substanciais entre
os dois termos. O marketing político é entendido como o conjunto de análises e ações em
comunicação durante toda a vida do partido; enquanto que o marketing eleitoral apenas existe
no momento em que eleições se desenrolam.
Gomes (2007) aborda essa diferenciação em um de seus artigos sobre o tema:
O marketing político é mais abrangente, inclusive englobando ações de marketing
eleitoral, usadas em oportunidades sazonais. Pode ser entendido como uma
estratégia permanente de aproximação do emissor/político com o receptor/cidadão.
Deve ser sistemático e organizado em função de um período maior do que aquele
regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral e dedicado às campanhas eleitorais.
Fazer marketing político inclui a formação de futuros eleitores, em uma estratégia de
aproximação com o cidadão, envolvendo diferentes tipos de públicos, já que ser
cidadão não significa, necessariamente, ser eleitor.
Já como marketing eleitoral entendemos os esforços estratégicos voltados para
aproximar sua relação com o eleitor, com o objetivo de fazer o partido ou o
candidato vencer uma determinada eleição ou conseguir um número favorável de
votos para que possa ocupar um cargo eletivo (GOMES, 2007, p.1).
34
É verdade que o marketing eleitoral nada mais é do que uma parcela do marketing
político. Assim se adotarmos uma visão sistêmica sobre o tema, percebemos que a eleição é
apenas um fragmento do ciclo de movimentação das forças políticas; logo a denominação
“marketing político” além de mais abrangente, retrata melhor as possibilidades de ação e as
atribuições dessa atividade.
Gomes (2007) sugere que a definição de marketing político é reducionista, uma vez
que a relação entre a comunicação e a política compreende inúmeras outras facetas, passíveis
de aprofundadas análises. A estudiosa afirma que a comunicação política engloba a
propaganda, a publicidade, o jornalismo, as relações públicas além da tradicional abordagem
do marketing. Desse modo a opinião pública, a formulação da agenda da campanha, a escolha
dos formatos para as mensagens emitidas e até mesmo as relações de poder são fatores que
influenciam a configuração da disputa eleitoral.
Com relação a essa diferenciação conceitual, é importante não confundirmos a
complexidade das atribuições do marketing político com as atribuições exclusivas da
propaganda; confusão geralmente estabelecida pela mídia de massa. Mendonça (2001)
apresenta as diferenças entre os dois campos de atuação:
O que quero dizer é o seguinte: o marketing é o conteúdo – é o que, a partir das
ideias e dos projetos do candidato, define o quê é preciso dizer. E a propaganda é a
forma – define o como dizer.
O marketing determina, por exemplo, o caráter da mensagem que a propaganda vai
ter e o público a ser atingido. Mas cabe à propaganda dar forma à mensagem, com
habilidade e talento, para que ela seja capaz de chamar a atenção do eleitor de
maneira clara e objetiva. Nunca é demais repetir que comunicação não é o que você
diz – mas, sim, o que os outros entendem (MENDONÇA, 2001, p.49).
A propaganda eleitoral é apenas uma das diversas ferramentas do marketing. Ela
busca persuadir os eleitores para que mudem ou mantenham suas percepções sobre
determinado candidato ou partido. Persuadir dentro da ideia de marketing eleitoral é uma de
suas atribuições; uma vez que ele deve relacionar um amplo conjunto de fatores cognitivos
com a realidade do eleitor, e ainda incitá-lo a persuadir outras pessoas a seguirem seu ponto
de vista.
Na diferenciação entre marketing político e eleitoral reside uma das grandes
diferenças desse tipo de marketing com sua versão comercial: o tempo. Como as eleições têm
um tempo determinado, e a escolha do voto culmina em uma determinada data, toda a
estrutura do marketing é modelada de forma especial. Comercialmente, o que há de mais
próximo com o marketing eleitoral é o marketing de eventos, por sua característica temporal.
35
Porém, apenas o marketing eleitoral busca vender uma projeção intangível de futuro, ao invés
de um produto ou serviço.
Torquato (2002) sugere que os políticos de modo geral não sabem utilizar todo o
potencial do marketing político, pois pode ser utilizado tanto para viabilizar candidaturas
proporcionais e majoritárias quanto para estabelecer e preservar a imagem das administrações
públicas. A confusão estabelecida entre marketing político e eleitoral, considerando o
primeiro apenas como uma ferramenta eleitoral inutiliza o imenso potencial dessa ferramenta.
3.2 Processo persuasivo do marketing político: uma construção norte-americana
O marketing político e eleitoral, bem como todo o processo de comunicação eleitoral
como conhecemos hoje encontra precedência nos Estados Unidos. O desenvolvimento das
técnicas relacionadas ao marketing político, de forma organizada e sistematizada encontra
suas raízes em 1952, quando o Partido Republicano contratou a agência de propaganda
BBDO para comandar a campanha do general Eisenhower. Figueiredo (2000) indica as
origens do marketing político-eleitoral nos Estados Unidos:
Naquele ano já surgiam as primeiras regras da comunicação política, como a ideia
USP (Unique Selling Proposition), significando que, em cada peça publicitária do
candidato, deveria ser vendida apenas uma ideia, uma proposição. Depois, apareceu
a publicidade negativa – o ataque aos adversários, que os eleitores brasileiros
conhecem bem. Em 1960, pela primeira vez surge o debate de televisão. Um deles
foi decisivo para selar a vitória de John Kennedy sobre Richard Nixon, onde ficou
clara a importância da aparência do candidato.
Quatro anos depois, aparece todo o potencial da comunicação política no famoso
Daisy Spot, de Tony Schwartz, onde uma menina desfolha uma margarida contando
de um a nove. Quando chega a dez, faz um gesto de surpresa, a câmera faz um plano
largo sobre seus olhos e uma vos forte e deformada começa a contar de nove até um.
Quando chega ao fim, há o barulho de uma explosão atômica e a imagem se reflete
no olho da menina. Em seguida, a voz do candidato Lyndon Johnson: “Existe uma
escolha: fazer um mundo onde todas as crianças de Deus podem viver ou perseguir a
obscuridade total. Nós devemos nos amar uns aos outros ou morrer.” Tratava-se de
uma crítica contundente ao seu adversário ultraconservador, Barry Goldwater, que
criticava a política externa conciliatória dos Estados Unidos. O marketing político se
incorporava definitivamente nas eleições americanas (FIGUEIREDO, 2000, p.17).
Dentre os pilares da comunicação eleitoral figura um comercial de televisão, que
precursoramente, dá uma dimensão nunca antes imaginada à emoção da disputa eleitoral.
Vemos o uso da teoria da construção de significado (DEFLEUR, 1993), o que prova que sua
36
utilização é bastante antiga; mesmo que seu estudo seja recente. Não podemos, porém, ignorar
que algumas técnicas de marketing político remontam à séculos passados, caracterizados
pelas disputas internas de poder em grande impérios, como o Romano, por exemplo. Naquele
tempo já havia a construção de significado nos grandes festivais, a publicidade negativa já
fazia parte do cotidiano dos senadores, bem como os debates. Isso demonstra que embora as
evoluções tecnológicas e sociais tragam mudanças nos cenários eleitorais, o cerne ideológico,
emocional e mesmo cognitivo pouco sofreu alterações.
Considerando a comunicação eleitoral moderna, a maior parte dos estudos acerca do
tema deriva da experiência americana. Isso se deve, em parte, a rapidez dos avanços
tecnológicos nesse país, especialmente no século XX, onde a pujança desse povo ficou
evidente devido a seu poder de reconstrução pós-crises. Justamente para acelerar esses
processos de reconstrução a sociedade acaba encontrando novos argumentos persuasivos, e
nesse contexto reside o marketing político.
Diversos autores apresentam modelos de atuação em marketing eleitoral. Porém,
todos concordam que são diversos os fatores que devem ser considerados na busca de votos.
A análise situacional, por exemplo, figura como uma das variáveis mais importantes na
disputa eleitoral. Almeida (2008) sugere seis pontos fundamentais que interferem no
julgamento do eleitor: a avaliação do governo; a identidade dos candidatos; o nível de
lembrança (recall) dos candidatos; o currículo dos candidatos e se eles utilizam-no para
mostrar ao eleitor que podem resolver o principal problema que aflige o eleitorado; o
potencial de crescimento dos candidatos (que combina a rejeição de cada um deles com seu
respectivo nível de conhecimento pelo eleitorado) e o fato de não ser possível contar com
apoios políticos, ou seja, popularidade e simpatia não se transferem.
Almeida (2008) afirma que o fator essencial para uma vitória eleitoral é o quadro
político presente. Ou seja, se o governo goza de bons índices de aceitação, é natural que o
candidato governista tenha uma considerável vantagem. Entretanto, quando o governo está em
crise ou desacreditado, a eleição do candidato oposicionista é muito favorecida. O autor chega
a sugerir que se avaliação popular do governo for péssima, a eleição do candidato
oposicionista é praticamente impossível.
E mais: toda a configuração eleitoral depende da situação do governo. Para Almeida
(2008):
37
A avaliação do governo condiciona a estratégia de campanha de todos os candidatos.
Uma avaliação muito positiva torna o candidato governista favorito e dá a ele a
chance de se descolar um pouco do governo, criticando aquilo que a população
considera ser o principal ponto fraco do governo. Por outro lado, nessa situação o
candidato da oposição terá poucas chances de vitória. Ele terá de escolher entre fazer
uma campanha claramente oposicionista, plantando para eleições futuras,
principalmente se o governo passar a ser mal avaliado, quando ele teria a imagem
clara de oposicionista (ALMEIDA, 2008, p. 45).
As constatações do autor sugerem inclusive que, em pesquisas, quando a soma de
avaliações positivas “ótima” e “bom” for superior de 45%, a eleição é governista; e quando
essa soma for inferior a 40% a eleição é oposicionista. Quanto pior for a avaliação do governo
presente melhor será a situação da oposição. E a comunicação segue esses pressupostos.
A avaliação do governo depende de suas ações, e da forma como essas ações são
encaradas pela mídia. A comunicação eleitoral não pode mudar as realizações do governo,
nem modificar diretamente a forma como a população vê determinado governante quando sua
gestão está em vias de acabar. Almeida (2008) acredita que o marketing eleitoral não pode
mudar substancialmente o panorama imagético do governo, assim, existem eleições possíveis,
eleições facílimas e pleitos impossíveis de serem vencidos.
É natural que o eleitor, quando percebe que o governo realiza ações acertadas, vote
favoravelmente à continuidade do bom período vivido. Desse modo o resultado das eleições
depende do juízo de valor do eleitor em relação às atitudes governamentais. Todavia, quando
a situação percebida pelo eleitor é desfavorável, a mudança é a via procurada pelo desejo do
indivíduo.
A emissão eficaz de informações relevantes também são especialmente importantes
para qualquer campanha eleitoral. Mendonça (2001) afirma que o primeiro passo da persuasão
nas campanhas políticas é manter a base eleitoral bem informada:
Assim minha primeira meta é transformar cada eleitor meu num cabo eleitoral. Ele
tem que estar afiado e afinado. Ter respostas e propostas prontas, na ponta da língua.
Tem que saber dizer, com segurança e clareza, sem titubear um só instante, por que
o seu candidato é o bom. Tem que saber responder à indiferença, à rejeição, à
intriga, à crítica, ao medo. Tem que ter argumentos para tudo, tem que estar
vacinado contra tudo. Ao fortalecer esse eleitor “cativo”, não só vou consolidando o
eleitorado que vota no meu candidato, como começo, aos poucos, a sensibilizar os
indecisos, os eleitores “conquistáveis” que, ouvindo essas conversas aqui e ali, vão
absorvendo gradualmente os nossos argumentos. Ainda não estou falando
diretamente para estes, mas a verdade é que o trabalho de conquista já começou
(MENDONÇA, 2001, p. 59).
Munir a base eleitoral com informações faz parte da intenção de motivar
individualmente cada pessoa. Quando motivado, e tendo a sua disposição um leque de
38
informações que o ajude a defender seu ponto de vista o eleitor se sente a vontade para
persuadir outras pessoas. De acordo com esse pensamento, o indivíduo se transforma em parte
importante da engrenagem eleitoral, uma vez que ele transmite sua credibilidade ao replicar a
mensagem do candidato ao seu círculo social.
Uma das informações que são usualmente utilizadas como arma psicológica pelos
cabos eleitorais são os resultados das pesquisas. Existe, no meio do marketing político, uma
ampla discussão sobre a influência dos resultados de pesquisas nos eleitores.
Não há uma conclusão sobre o impacto que a pesquisa têm na mente do eleitor.
Estatisticamente sabe-se que, se a pesquisa for conduzida de acordo com uma metodologia
profissional, é bastante provável que os números projetados sejam semelhantes aos reais. A
importância da pesquisa reside na atenção que os atores da disputa eleitoral lhes concedem.
Invariavelmente o lado perdedor utiliza subterfúgios para desqualificar os resultados da
pesquisa enquanto que o lado em melhor posição utiliza a pesquisa como um forte argumento
de persuasão.
Para que a pesquisa influencie realmente o voto, é necessário, segundo Almeida
(2008), que o eleitor, além de confiar na credibilidade dos resultados, entenda e memorize que
está ganhando e quem está perdendo. Quando houver alguma divergência entre institutos de
pesquisa ele precisa escolher a fonte na qual irá confiar. Entretanto, para que a pesquisa tenha
algum peso direto no voto, o eleitor precisa valorizar mais os resultados das pesquisas do que
outras informações e percepções, como, por exemplo, a avaliação do governo.
Mendonça (2001) alerta para as rápidas mudanças nos quadros eleitorais, que por
vezes fogem ao alcance das pesquisas:
Pesquisas são números e dados coletados de forma fria, sem emoção – e servem para
aumentar o nosso conhecimento sobre determinado assunto ou tema, nos ajudando a
conhecer o perfil das pessoas com as quais pretendemos nos comunicar. É uma
ajuda e tanto. Mas não podemos nos esquecer de que quando alguém responde a
uma pesquisa, responde somente com a cabeça. Quando vota, vota também com o
coração. É exatamente por isso que numa eleição, de vez em quando, ocorrem
modificações aparentemente inexplicáveis. De uma hora para outra. E nem sempre
detectadas pelos institutos de pesquisa. É que, com frequência, costumamos não
prestar atenção a uma frase importante, muito repetida pelos pesquisadores. A
pesquisa é o retrato de um momento. A fotografia de um agora. Que pode se alterar
com o surgimento de um fato novo. Ou seja: uma fato gera uma emoção – e uma
emoção tem o poder de mudar, de repente, a opinião das pessoas (MENDONÇA,
2001, p. 41).
As pesquisas são o termômetro do momento eleitoral. Servem especialmente para
motivar a base eleitoral dos vencedores do momento. Torquato (2002) sugere que é
39
importante que os profissionais de marketing eleitoral trabalhem com dois tipos de pesquisa: a
interna, que serve para monitorar o cotidiano da campanha, e a externa, que pode ser
divulgada na mídia. Embora não se possa mensurar a importância da pesquisa para a
composição das razões que compõem a decisão do voto, ela certamente tem o poder de trazer
novidade ao cenário eleitoral, de movimentá-lo. Como exemplos citam-se candidatos que
embora em desvantagem nas primeiras pesquisas, diminuem a diferença até ultrapassar os
primeiros colocados. Todos aqueles que fazem parte dessa campanha sentem seu crescimento,
fator extremamente motivador e persuasivo. O eleitor se sente mais à vontade para rebater
eventuais críticas, alicerçado no crescimento percebido nas pesquisas.
Através de fatores como os resultados das pesquisas, ou a demonstração de força de
determinado lado da disputa eleitoral, pode ocorrer uma movimentação silenciosa das
intenções de voto. Surgem os chamados “formadores de opinião horizontal”, conforme afirma
a teoria da “espiral do silêncio”, de Elisabeth Noelle-Neumann, citada por Figueiredo (2000).
Essa teoria consiste na percepção do “clima de opinião”; ou seja, qual a opinião das pessoas
sobre qual candidato irá vencer. Quando o eleitor acredita que determinado candidato irá
vencer, ele poderá votar nesse candidato, de modo a unir-se a opinião da maioria. O voto,
nesse caso, é definido pelo sentido de tendência percebido pelo indivíduo. Para isso, é de
especial relevância a movimentação das bases eleitorais. O lado que demonstrar maior poder,
através de seus signos, do engajamento e da convicção de seus membros, terá maior
possibilidade de criar uma tendência favorável na mente dos eleitores. Por isso é importante o
trabalho dos comitês e cabos eleitorais, uma vez que eles ajudam a compor o “clima de
opinião”. Logo, o lado que demonstrar maior vontade em tornar pública sua ideologia
eleitoral começa a se sobrepor ao lado contrário, cujos membros são absorvidos por uma
“espiral de silêncio”, conduzindo seu candidato à derrota.
A figura do candidato é o centro no qual gravitam todas as variáveis da disputa
eleitoral. Ele é o defensor da vontade e das opiniões de determinada parcela da população na
disputa pelo poder. Em si, o candidato carrega as esperanças e os sonhos de seus partidários,
enfrentando adversários à sua visão de futuro. A imagem do candidato é altamente
motivadora e persuasiva, uma vez que ele é a principal ferramenta popular para que os anseios
e reivindicações do eleitorado sejam devidamente supridos. O comportamento do candidato e
suas ideologias, aliado ao momento histórico vivido no momento do pleito são os fatores que,
de fato, determinam o resultado das eleições. E, se o candidato demonstrar carisma e gerar
empática com o eleitorado, sua escalada ao poder é facilitada.
40
Mas não é crível que um candidato, sozinho, consiga modificar o pensamento das
pessoas a ponto de ser considerado um herói ou mártir. Figueiredo (2000) comenta que o
eleitor está mais maduro e dificilmente confere ao candidato características simbólicas que
vão além de seu próprio carisma:
O eleitor não estabelece uma relação de adoração e veneração ao líder. Embora
acredite no mito do “bom governante”, desconfia dos políticos reais, de modo geral,
vistos negativamente. Não percebe o político real como um “deus vivo”. A imagem
do político ideal é utilizada como referência simbólica na associação instintiva feita
a partir das imagens dos políticos reais percebidas. Não é estabelecida uma relação
de dependência, de entrega de si mesmo. O novo eleitor não-racional identifica-se
pontualmente, em certas circunstâncias, com determinados candidatos, e em outra
situação se identifica com outros. Ele julga em função de seu gosto, por meio de sua
intuição e sensibilidade. Presta atenção nas expressões faciais, nos olhares, nos
gestos e nas ações simbólicas desenvolvidas pelos candidatos nas campanhas
eleitorais, escolhendo aqueles percebidos pelo seu olhar intuitivo como os melhores
e mais autênticos (FIGUEIREDO, 2000, p. 122).
Podemos perceber que o eleitor conserva sua liberdade individual, ou seja, uma vez
que não acredita cegamente em determinado candidato, pode resolver apoiar seu adversário,
se os argumentos deste forem mais relevantes. Aqui se estabelece um paralelo entre a
persuasão e a motivação. O eleitor precisa se motivar a seguir a ideologia de determinado
candidato, uma vez que a persuasão pode não conquistá-lo por tempo suficiente. O esforço
persuasivo embora relativamente mais simples, precisa ser extremamente ostensivo; enquanto
que, uma vez estabelecida a motivação individual, as chances da manutenção dessa motivação
são muito maiores.
O eleitor moderno desempenha, portanto, um papel ativo no processo eleitoral. Ele
reage as mensagens a ele direcionadas, com aceitação ou repulsa, e espalha sua posição
ideológica aos demais integrantes de seu grupo social. Mesmo que o indivíduo perceba no
candidato características que ele julga excepcionais, não perde sua identidade individual para
defendê-lo. Em sociedades economicamente e socialmente estáveis, onde o acesso a
informação é cada vez mais irrestrito, será exponencialmente menor o espaço para o
fanatismo e o radicalismo. Vivemos o momento em que o eleitor muda a ideologia do
candidato, e não mais o candidato comanda o pensamento do eleitor; independentemente de
seu carisma.
O marketing eleitoral busca construir a imagem do candidato de acordo com os
desejos da maioria do eleitorado. Assim suas características negativas são minimizadas e seus
aspectos positivos são exibidos com orgulho em sua comunicação. É necessário que entender
que o processo de construção da imagem do candidato pode começar muito antes do período
41
eleitoral. O candidato acaba apresentando um ciclo de desenvolvimento pessoal, pois seu
comportamento pode ser mais ou menos enfático dependendo do momento; sem nunca
desviar seu foco da simpatia e do apoio do eleitorado.
Um candidato deve possuir uma identidade, isto é, um conjunto de características
que o diferenciem dos outros atores da disputa. Torquato (2002) afirma que a identidade é
composta pela história do candidato, seus compromissos e seu pensamento. Ele deve ser
claramente oposicionista ou assumidamente governista. O candidato precisa demonstrar maior
preocupação ou com indicadores administrativos ou com o social. Acima de tudo ele deve
possuir uma causa, uma razão de ser na disputa. Para Almeida (2008) nada pode ser pior para
um candidato do que a falta de clareza em sua imagem.
O candidato deve formar ao seu redor uma “marca política”. Tal qual uma marca
comercial, ela deve estabelecer rápida diferenciação em relação aos adversários. E a marca
não significa apenas o desenho gráfico ostentado pelas peças de propaganda da campanha,
mas todo o conjunto de ideias concentradas no candidato. Figueiredo (2000) apresenta
algumas das principais características das marcas políticas:
As marcas políticas, porém, têm períodos específicos, nas campanhas eleitorais ou
durante polêmicas/crises políticas, em que tomam o lugar de centro das atenções da
sociedade e tendem a ocupar importante espaço nos meios de comunicação, assim
como são disseminadas através de discussões entre eleitores.
Uma vez conhecida, uma marca de sucesso deve construir na mente das pessoas
ligações imediatas e rápidas com ideias, imagens, sentimentos de teor positivo e que
gerem envolvimento. É nesse momento que entra a estratégia de posicionamento, ou
seja, conseguir que o indivíduo perceba uma diferença importante daquela marca em
relação às outras (FIGUEIREDO, 2000, p.99).
É interessante observar que ao contrário da propaganda comercial, as marcas
políticas não precisam estar ligadas à originalidade. Mendonça (2001) afirma que é um
criador do óbvio em suas campanhas. Desse modo a criatividade não é um fator decisivo na
comunicação eleitoral; o importante são os resultados, e nem sempre o caminho da inovação é
o melhor.
Para as marcas políticas, o público-alvo primário são as chamadas “bases eleitorais”;
o grupo de partidários que tem como missão alavancar a campanha. A ampliação da base
eleitoral visa a conquista de novos aliados, o que, na visão comercial, corresponderia a
conquista de novos mercados. Quanto mais grupos sociais estiverem engajados na campanha,
maiores suas possibilidades de angariar votos.
As marcas políticas devem transmitir todos os valores da campanha, estando
intrinsecamente relacionadas com o marketing eleitoral e suas estratégias. As marcas
42
(enquanto conjunto semiótico e semântico das ideologias do candidato) servem para diminuir
o esforço cognitivo do eleitor, e aumentar a presença do candidato em sua mente. A unidade
na comunicação é importante não apenas para estabelecer o padrão estético e facilitar a
compreensão do eleitor, mas para manter a credibilidade das informações políticas debaixo da
marca. Essa unidade é expressa de várias maneiras: pelo logotipo da campanha, pelo slogan
do candidato, pelas cores utilizadas na comunicação visual, pelos sons e vozes de sua
comunicação radiofônica, etc.
A marca precisa ser lembrada pelos eleitores, portanto sua visibilidade é
fundamental. É importante que o partido facilite o processo de expansão de sua marca, tanto
ampliando o número de suportes para ela quanto aumentando seu alcance geográfico. A
marca política é um dos fatores fundamentais na vitória eleitoral, especialmente se
considerarmos a teoria da “espiral do silêncio”.
A mídia também desempenha um papel fundamental na construção do marketing
político. As mídias de massa são bastante importantes no processo eleitoral, pois levam a
mensagem do candidato à população. Quanto maior for a audiência do meio, maior será a
atenção reservada a ele pelos profissionais do marketing eleitoral na criação do formato e do
conteúdo de suas mensagens.
Mendonça (2001) comenta a importância da televisão para a comunicação eleitoral:
Se você me perguntar quais são as dez coisas que considero mais importantes numa
campanha política, não vou precisar nem pensar para responder. As seis primeiras,
pelo menos, sei de cor e salteado. A primeira, sem dúvida, é o contexto, o momento
político em que as eleições se realizam. Essa conjuntura pode ser favorável ou
prejudicial a este ou àquele candidato, aumentando ou diminuindo as suas chances
de vitória. A segunda, sem dúvida, é o candidato. Um candidato-mala é dose para
carregar. A terceira é o horário de TV. A quarta, o horário de TV. A quinta e a sexta,
o horário de TV. Depois disso vem o rádio. Quanto ao resto, confesso, eu precisaria
pensar um pouco. Vai depender da campanha, vai depender do lugar (MENDONÇA,
2001, p.111).
Embora a televisão ainda retenha os maiores índices de audiência ao redor do
mundo, o advento da internet está mudando esse panorama. Ela é a única mídia que permite
acesso mesmo enquanto as pessoas trabalham. A internet também possibilita a interatividade
das pessoas com a campanha, além de se tornar um importante canal de ouvidoria.
Um fenômeno que ganha cada vez mais força ao redor do mundo é o
enfraquecimento dos partidos políticos. É comum que o voto seja mais direcionado ao
candidato enquanto indivíduo do que a sua legenda partidária. Isso se deve aos constantes
escândalos que assolam a esfera política ao redor do mundo. É fácil ao eleitor perceber a
43
guerra de interesses pessoais entre os atores do cenário político, em desfavor do debate
ideológico e da busca pelo bem-comum. Torquato (2002) afirma que pesquisas comprovam
que o candidato será mais benquisto e aceito se trabalhar com assuntos próximos à população.
As pessoas buscam vantagens e realizações tangíveis.
Isso também se deve ao eleitor, cada vez mais individualista e imediatista.
Figueiredo (2000) faz uma análise desse movimento de carência ideológica:
Através dessas análises históricas feitas por Bobbio e por Giddens, percebe-se
claramente que estamos assistindo à transição de um contexto partidário construído
em torno de ideologias para um novo contexto em que a prática política torna-se
cada vez mais ligada ao dia-a-dia dos eleitores, relacionando cada voto com um
benefício concreto e imediato, na vida do eleitor e de sua família, dos moradores de
seu bairro, da sua cidade, do seu estado ou do seu país.
O papel dos meios de comunicação de massa nesse processo de “desideologização”
da política tem sido bastante estudado por cientistas políticos e de comunicação,
conforme descreve Antônio Lavareda, em seu livro recentemente editado. Diversos
estudos de comportamento eleitoral cotados por esse autor procuraram demonstrar
como “a comunicação eletrônica exponencializa a importância da personalidade e
das questões específicas, deixando em segundo plano a influência dos vínculos de
lealdade partidária”.
Assim, na política atual torna-se cada vez mais difícil assistir a uma disputa no plano
das ideias abstratas, valores gerais ou projetos amplos para a sociedade e até para a
humanidade. As batalhas políticas têm ocorrido no nível do dia-a-dia, do pocket-
oriented, do pragmatismo, e isso não é, conforme demonstram os textos citados
acima, um privilégio da política brasileira (FIGUEIREDO, 2000, p. 92).
A crescente falta de identificação com os partidos políticos, que são as instituições
responsáveis pela distribuição do poder político, abre espaço às lideranças populistas. O apelo
popular imediatista, demonstrando uma total despreocupação com um projeto de gestão de
longo prazo é recorrente nas campanhas modernas. Esse movimento nasce do pressuposto de
que pessoas votam em pessoas, e não em ideias intangíveis. Porém esse tipo de
comportamento eleitoral é extremamente nocivo às sociedades democráticas, pois favorece as
ditaduras personalistas.
Os valores próprios da disputa eleitoral como a busca pelo bem comum são
substituídos pela retórica do candidato. De certo modo a figura do candidato encarna uma
série de ideais, que não resistem sem a sua existência. Esse fato não é uma construção social
recente, basta que nos lembremos de Getúlio Vargas ou de John Kennedy. O voto direcionado
ao candidato e não ao partido é uma realidade no panorama político atual.
44
45
4 ESTADOS UNIDOS: VÉSPERA DE UMA ELEIÇÃO HISTÓRICA
As eleições presidenciais de 2008 nos Estados Unidos acabariam por tomar um
lugar de extrema importância na história: uma estratégia eleitoral inovadora seria utilizada
para eleger um candidato inicialmente insignificante. Porém, devemos analisar esse momento
eleitoral como fruto de uma construção histórica. As influências dessa construção se refletem
no comportamento do povo, dos candidatos e no próprio desenho do sistema eleitoral dos
Estados Unidos.
Para a análise das eleições de 2008, é necessária a compreensão do pensamento
social americano, da forma como o povo se relaciona com a política e qual a importância que
atribui ao tema. Assim estudaremos brevemente alguns momentos da história dos Estados
Unidos; que contribuíram para sua política e cultural.
Fatos relevantes ocorridos nos dois anos anteriores ao pleito também serão
estudados, pois eles nos ajudam a entender o cenário no qual as eleições se desenrolaram.
4.1 História dos Estados Unidos: breve retrospecto no estudo da formação do
norte-americano contemporâneo
Para a compreensão o comportamento de determinado povo em qualquer momento
da história, é necessário o conhecimento dos fatores que influenciaram esse comportamento
ao longo dos anos. Assim, para que possamos compreender a formação do pensamento
cultural, social e político do povo norte-americano, é necessário que estudemos os principais
momentos de sua história. Embora nosso objetivo principal não seja analisar a cultura
americana em pormenores, cientes de que esse breve estudo não seria suficiente para discorrer
sobre a formação sociológica dos Estados Unidos, é pertinente traçarmos um retrospecto
histórico. Através da análise desses momentos será possível entender quais as principais
características dos norte-americanos, e estabelecer relações entre sua cultura e seus valores
com seu posicionamento político em 2008.
46
É interessante notar que a colonização dos Estados Unidos se deu posteriormente a
colonização na América Latina. Apesar disso, sua nação se desenvolveu de forma
excepcional, até se tornar a maior potência militar e econômica do mundo. Alguns
historiadores atribuem esse desenvolvimento as características implícitas de sua colonização,
feita majoritariamente por ingleses.
No início de sua formação, os Estados Unidos foram construídos por ingleses que
trabalhavam para companhias de colonização, em um regime quase escravocrata. Porém,
Sellers (1990) traz uma característica importante do povo americano do início da colonização,
afirmando que não havia o qualquer estigma social ligado a uma família que tivesse
começado sua vida na América dentro desse regime de quase escravidão. Todas as colônias
tiveram líderes que haviam sido trabalhadores contratados. Ou seja, o trabalho era
considerado um valor mais importante do que a descendência familiar.
Outro fator importante na construção da identidade americana foi o protestantismo.
Grande parte dos colonizadores dos Estados Unidos pertenciam a uma dissidência da Igreja
Católica. De acordo com Sellers (1990):
Os protestantes mais convictos nunca haviam se sentido satisfeitos com a Reforma
moderada institucionalizada pela Igreja da Inglaterra. Dando a si mesmos o nome de
puritanos, queriam livrar a Igreja inglesa de práticas católicas romanas e “purificá-
la” mediante a eliminação da hierarquia de bispos e da simplificação do ritual
(SELLERS, P. 24, 1990).
Foi através desse pensamento que a sociedade americana foi concebida. Havia,
portanto, um sentimento de formação de uma sociedade sagrada. Mesmo atualmente, a
importância de Deus está explícita na vida americana; desse modo a cédula de dólar contém a
inscrição “In God we trust”12
, e podemos perceber, em praticamente todos os discursos
presidenciais a frase “God bless America”13
.
Acreditar que seu país é fruto de uma sociedade escolhida por Deus é uma das
características mais fortes da história dos Estados Unidos, e empresta ao seu povo um
sentimento de liderança em relação às outras nações do mundo. Sellers (1990) escreve sobre a
lógica por trás do pensamento puritano:
12
Em Deus nós confiamos.
13 Deus abençoe a América.
47
Por mais estranhos que os ideais puritanos possam parecer a gerações mais novas, a
iniciativa de fundar uma sociedade sagrada constitui sem dúvida alguma um dos
sonhos mais nobres da humanidade. Se aceitarmos as premissas puritanas de que
Deus é soberano, que o dever fundamental de cada homem é cumprir Sua vontade e
que a grande questão na vida é se o homem recebe ou não a graça, ou salvação, de
Deus, é difícil resistir à conclusão de que a sociedade deve ser construída segundo
um plano divino para a redenção humana (SELLERS, P.25, 1990).
A democracia é outro valor inerente ao puritanismo. A ideia de governo civil se
baseava na noção de pacto: um acordo entre as pessoas e Deus e entre si mesmas. Os
puritanos acreditavam que seus magistrados deveriam possuir qualidades especiais, que lhes
permitissem interpretar a vontade divina. Segundo Sellers (1990) o sistema de escolha de
representação social detinha traços democráticos:
Cabia aos membros da Igreja escolher como ministro, ou pastor, um homem
especialmente qualificado por caráter e educação para interpretar a vontade divina.
(As mulheres, claro, de modo geral não tinham acesso à educação nem eram
elegíveis ao clero). Essa teoria continha um elemento de democracia, no sentido em
que todos os membros participavam do pacto sagrado, da escolha de um pastor, e da
admissão de novos membros, e um elemento de aristocracia no sentido em que o
ministro, uma vez escolhido, devi ter sua autoridade respeitada devido às suas
qualificações especiais para interpretar a vontade de Deus, e, finalmente, um
elemento de monarquia no sentido em que a vontade de Deus era soberana
(SELLERS, P.25, 1990).
Através dessas observações conclui-se que a democracia é especialmente importante
na formação da cultura social do povo americano. O sistema democrático em si depende da
premissa na qual o líder detém a confiança do povo, na maioria das vezes expressa pelo voto.
No caso dos Estados Unidos colonial, essa confiança se dava não apenas pela escolha comum,
mas pela percepção de características de caráter ligadas ao divino. A liderança americana,
através desse olhar, não é apenas fruto da democracia, mas de uma escolha divina,
transformada em realidade pelo voto dos cidadãos; os indivíduos são considerados simples
ferramentas de Deus para a concretização de Sua vontade.
A independência dos Estados Unidos, portanto, era apenas uma questão de tempo.
Um povo escolhido por Deus não pode ser submisso a nenhuma outra nação. Porém não d
entender a independência americana apenas sob o viés religioso, uma vez que razões
econômicas foram muito mais fortes nesse contexto. A exploração e os abusos da Coroa
inglesa, em dado momento, não seriam mais tolerados pelos americanos, que já possuíam uma
estrutura social mínima para a formação de um Estado soberano. Segundo Sellers (1990):
48
A Declaração de Independência significou algo muito mais importante e de muito
maior alcance do que uma simples notícia pública de separação. As suas ideias
inspiraram um fervor da massa pela causa americana, pois instilava no homem
comum um sentimento de sua importância, inspirava-o para a luta pela liberdade
individual, pelo autogoverno e um lugar digno na sociedade (SELLER, P.40, 1990).
A liberdade torna-se outro valor americano. O país apresenta ao mundo o conceito de
que todo homem nasce livre e igual, embora a escravidão deixasse claro que essa premissa era
válida apenas para a população branca.
O sistema de governo dos Estados Unidos foi forjado sobre o valor da liberdade.
Após o estabelecimento da constituição federal, foi a vez de cada estado criar sua carta
magna. Os estados, através de suas constituições, preocuparam-se especialmente em conferir
liberdade ao cidadão, como uma forma de diminuir seu poder sobre as pessoas. Sellers (1990)
apresenta o panorama das constituições estaduais:
Como quer que fossem adotadas todas elas invariavelmente refletiram a
desconfiança no poder do governo – “sempre inquieto, ganancioso e ambicioso”
poder executivo ou governatorial – nascida do liberalismo do Iluminismo e da
experiência dos colonos com a autoridade britânica. A fim de impedir a violação da
liberdade pelo poder, a maioria dos estados copiou a constituição da Virgínia,
incluindo uma carta de direitos, especificando em detalhes os direitos dos cidadãos
(liberdade de expressão, de imprensa, julgamento por júri, e coisas semelhantes) que
nenhum governo poderia legalmente limitar (SELLERS, P. 72, 1990).
A valorização da educação, especialmente do ensino superior, já enraizados no
pensamento puritano ganharam importância ainda maior com o advento do Iluminismo14
na
Europa. Na década de 1770 nove faculdades foram fundadas nos Estados Unidos. Jornais,
bibliotecas públicas e bibliotecas por assinantes se multiplicaram pelo território. A
preocupação do americano com a educação é facilmente percebida hoje, basta citarmos os
centros de tecnologia como o Vale do Silício e universidades como a de Harvard para
entendermos a relevância do sistema educacional na formação do Estado americano. Nota-se
mais uma vez a força da democracia americana: seu primeiro presidente, George Washington,
foi eleito em 1789; desde então os Estados Unidos jamais foram governados por um sistema
ditatorial.
14
Movimento intelectual do século XVII que defendia o domínio da razão sobre a visão teocêntrica.
49
Sellers (1990) tece uma relação interessante entre o estereótipo do homem norte-
americano típico com a autobiografia de Benjamin Franklin, um dos constituintes mais
célebres da história dos Estados Unidos:
Sábio, humanitário e prático, Franklin refletia o espírito de um povo que preferia a
mobilidade à nobreza, e que, para citar o próprio Franklin, caracteristicamente
perguntava a um estranho não “Quem é ele?” mas “O que ele pode fazer?”.
Franklin era a quintessência do norte-americano simples, vigoroso, independente,
não corrompido pela suposta decadência do Velho Mundo (SELLERS, P. 54, 1990).
Outro aspecto interessante da cultura americana é o sistema bipartidário. A estrutura
política do país, mesmo que seu território fosse o terceiro maior do mundo, e que existissem
diferenças culturais entre os estados, conseguiu se adaptar a apenas dois grandes partidos
nacionais. Sellers (1990) afirma que o sistema bipartidário teve sua origem em 1800, mas foi
em 1830 que se popularizou pelo país.
A estrutura democrática, no entanto, se adaptou ao sistema de dois partidos políticos
porque suas raízes foram concebidas com inteligência. Diversas esferas de poder e de decisão
ajudavam a compor cada partido, assim as diferenças entre os estados eram minimizadas na
busca do bem comum. Residia aí uma das ferramentas políticas de adaptação dos partidos às
políticas estaduais através de seu conceito de federação. Sellers (1990) comenta:
Sistemas competitivos de comissões (diretórios) partidárias aos níveis de condado,
estado e nação distribuíram um jorro constante de cartazes e panfletos, organizavam
paradas e comícios e providenciavam para que ninguém ficasse em casa no dia da
eleição. Essa atividade política incessante não só trouxe, em grandes levas, os
eleitores às urnas, mas transformou a política em uma forma importante de recreação
norte-americana, ao mesmo tempo que submetia a população à maciça educação
política (SELLERS, P.148, 1990).
Cada estado constituía uma realidade política única, forçando os políticos a encontrar
ferramentas retóricas para a construção de coalizões. Os democratas constituíram sua base
eleitoral entre os pequenos agricultores e a classe operária, enquanto que os liberais
alcançavam fatias maiores de apoio entre os grandes empresários e industriais abastados.
Nota-se que a estrutura política também faz parte da cultura americana,
influenciando o modo como os cidadãos dos Estados Unidos agem, pensam e votam. A
característica bipartidária tende a polarizar opiniões, além de dividir com clareza o espectro
50
político, simplificando o entendimento da trama política e das relações de poder, facilitando
inclusive o debate das grandes questões nacionais.
A formação dos Estados Unidos, embora tenha se dado em sua maioria por
imigrantes ingleses, contou também com pessoas vindas de diversas outras nações. Para
povoar um país de dimensões continentais, apenas imigrantes ingleses não seriam suficientes.
Logo a imensidão do território americano já não mais necessitaria de desbravadores. Nesse
momento, aproximadamente na década de 1920, é perceptível a inteligência e o oportunismo
do povo americano. Segundo Sellers (1990):
A restrição à imigração durante os anos 20 marcou uma transformação significativa
na política norte-americana. Durante os primeiros 15 anos do século XX, mais de 13
milhões de pessoas haviam chegado aos Estados Unidos. Já desde algum tempo
vinha crescendo um sentimento contrário à imigração sem restrições. Os Estados
Unidos já não mais se consideravam como tendo um imenso império interno para
colonizar, e já não se mostravam dispostos a aceitar hordas de imigrantes. Esse
sentimento extravasou na Lei da Quota de Imigração em 1924 e uma outra em 1929,
que limitavam o número anual de imigrantes em 150.000, número esse que seria
distribuído entre os povos de várias nacionalidades na proporção dos números de
seus compatriotas que já estivessem nos Estados Unidos (SELLERS, P. 138, 1990).
Foi justamente na década de 1920, antes da imensa depressão iniciada com a queda
da bolsa em 1929, que apareciam os primeiros traços da sociedade americana como a
conhecemos, e do famoso “American way of life”15
. De acordo com Sellers (1990):
Hábitos mutáveis de consumo, estimulados pela nova indústria de publicidade
maciça. Auxiliados por crédito fácil e compras a prestação pareciam tornar obsoletos
as virtudes puritanas de trabalho duro, auto sacrifício e poupança. Tornando-se cada
vez mais comuns para os operários industriais a semana de cinco dias e meio de
trabalho, o lazer e a busca de divertimentos ficaram possíveis para maior número de
pessoas. Com tempo extra nas mãos e dinheiro de sobra nos bolsos, o público voltou
a atenção para um novo panteom: estrelas de cinema, atletas e heróis como Charles
Lindbergh, a Águia Solitária, cujo vôo solo através do Atlântico em 1927
transformou-o no mais conhecido dos norte-americanos (SELLERS, P. 317, 1990).
Porém, na década de 1930, os Estados Unidos entrariam em uma imensa recessão
econômica, que forçou o governo a tomar medidas intervencionistas. Os altos índices de
desemprego proporcionaram o surgimento de uma nuvem de dúvida sobre o estilo liberal de
governo americano. A crença na auto-regulação do mercado foi abalada, embora a noção de
15
Estilo de vida americano.
51
liberdade das pessoas e dos empreendimentos não seria facilmente esquecida, uma vez que
está já estava arraigada no espírito do povo desde a fundação de seu país.
O ímpeto consumista já manifesta na década de 1920, retornou com força no período
de pós-guerra em 1945. Sellers (1990) traz as principais mudanças ocorridas na cultura
americana nessa época:
A população e o mercado de habitações em expansão fizeram-se acompanhar de um
crescimento sem precedente no mercado de bens de consumo. Praticamente
insaciável em seu apetite, a sociedade de consumo do pós-guerra foi sustentada por
salários em elevação constante, crédito fácil e publicidade maciça. Confiantes em
que as rendas futuras mais altas tornariam possível o pagamento de prestações, se
não indolor, os norte-americanos tornariam empréstimos como nunca. Entre 1945 e
1952, o crédito direto ao consumidor aumentou 800%. O orçamento de publicidade
da nação subiu extraordinariamente de US$ 3 bilhões em 1945 para US$ 12 bilhões
em 1960 (SELLERS, P.387, 1990).
O automóvel se tornou símbolo de status, a televisão passou a reinar onipresente nos
Estados Unidos, e o mercado adolescente, antes incipiente, se tornou um negócio de muitos
milhões de dólares. Sellers (1990) afirma que para a maioria dos cidadãos a cultura de
consumo era considerada o êxito supremo da economia mais vigorosa do mundo. Ou seja, o
povo escolhido por Deus manifestava seus ideais de liberdade usufruindo de tudo aquilo que o
mundo pudesse lhe oferecer. O consumo se tornou um importante fator na composição da
identidade americana.
A segregação racial é o último tópico relevante abordado nesse breve retrospecto. As
diferenças entre negros e brancos chegou a produzir uma das mais sangrentas guerras em
território americano, dividindo a nação. Na guerra civil o norte libertário venceu o sul
escravista e separatista. Nesse contexto o presidente Abraham Lincoln foi reconhecido como
uma espécie de herói trágico: como líder do norte, foi um dos aríetes na luta pelos direitos
iguais entre raças, porém quando seu assassino gritou “O Sul está vingado” foi adicionada a
sua magnanimidade uma aura de martírio. De acordo com Sellers (1990) Lincoln libertou os
escravos entrando para a história como o “grande libertário” (embora sua vontade pessoal
fosse dissonante de sua ação).
Porém, apenas muitos anos depois da guerra civil é que os avanços sociais
envolvendo os negros se deram de forma substancial. Foi na década de 1950 que se iniciaram
os movimentos contra a segregação que obtiveram resultados mais universais. E o progresso
social dos afro-americanos não foi produto de um esforço governamental, mas de iniciativas
52
da população negra e da organização ativista junto ao judiciário. Sellers (1990) comenta os
avanços sociais da década de 1960:
Ao enfrentar o pior problema social do país, o tratamento desigual dado aos negros,
Kennedy teve seus esforços seriamente limitados pela coalizão congressional de
democratas sulista e republicanos em geral conservadores. Derrotado em várias
batalhas legislativas e temeroso de ver toda sua ação interna e externa naufragar em
um mar de obstrucionismo legislativo, o governo passou a depender principalmente
de ação executiva. Negros foram nomeados cada vez mais para cargos no governo,
aplicou-se pressão contra a discriminação através da política de compra de órgãos
públicos e, após alguma hesitação, o presidente proibiu a discriminação em projetos
habitacionais financiados pelo governo federal (SELLERS, P. 397, 1990).
Percebe-se que a melhoria nas condições de vida dos negros norte-americanos foi
sempre condicionada a movimentos sociais. O governo cedeu às pressões desses movimentos
não pela visão social de seus líderes, mas por uma necessidade de assegurar sua legitimidade.
A sociedade evoluiu para a igualdade racial apenas através dos esforços das minorias.
4.2 Vésperas de uma eleição histórica: contexto histórico e características do
eleitorado
Para este estudo analisaremos alguns fatos relevantes acontecidos de 2006 a 2008. O
período estudado compunha o contexto histórico em que as eleições se desenrolariam, e seus
acontecimentos orientariam os esforços de campanha. Como fonte de informações para essa
parte do estudo utilizaremos o portal de notícias G116
. Notícias e pesquisas desse período,
explicações acerca do funcionamento das eleições norte-americanas bem como informações
biográficas sobre Barack Obama, Hillary Clinton e Joseph Biden foram extraídas do portal.
A escolha desse portal da internet deveu-se a sua reconhecida credibilidade
jornalística. O portal conta com notícias de agências internacionais de informação, fato que
contribui para a ampla gama de matérias disponíveis aos seus usuários.
16
www.g1.com
53
4.2.1 Fatos relevantes em 2006
Em novembro de 2006 o Partido Democrata assume o controle do Senado norte-
americano, com 51 das 100 vagas disponíveis. Os Democratas então passaram a comandar as
duas casas do Congresso dos Estados Unidos pela primeira vez em 12 anos. Essa derrota do
governo Bush (republicano) já demonstrava uma certa animosidade da população em relação
ao partido do presidente.
O impacto do resultado da eleição foi tão relevante que o Secretário de Defesa norte-
americano, Donald Rumsfeld, renunciou ao cargo. Ele foi um dos principais defensores da
invasão dos Estados Unidos ao Iraque, um dos temas mais importantes da disputa eleitoral de
2008 e trunfo do Partido Democrata.
Em dezembro a conjuntura política do país força o presidente George W. Bush a
falar, pela primeira vez, na retirada das tropas americanas no Iraque. Bush prometeu a retirada
das tropas até 2008, além de enfatizando a necessidade de flexibilidade para determinar o
número de soldados que permaneceriam no país. A principal motivação para o
pronunciamento do presidente foi a divulgação de um relatório, que sugeriu mudanças na
atuação dos Estados Unidos no Iraque.
4.2.1.1 O levantamento do Census
Em dezembro de 2006 o governo federal americano, através do Census Bureau,
lançou o Resumo Estatístico dos Estados Unidos: um apanhado de informações que traçou o
perfil geral da sociedade americana daquele momento.
Em 2006 os norte-americanos passaram cerca de oito horas e meia por dia (recorde
histórico) assistindo à televisão, usando computadores, ouvindo rádio, indo ao cinema ou
lendo.
Entre os adultos, no ano de 2005, 97 milhões de pessoas procuraram notícias on-line,
92 milhões compraram produtos, 91 milhões fizeram reservas de viagem, 16 milhões usaram
um site para fazer "network" social ou profissional e 13 milhões criaram blogs. Porém a
televisão e o rádio ainda lideravam os índices de audiência em 2006.
54
O tempo gasto em cada categoria variou, com menos sendo gasto com televisão
aberta (desceu de 793 horas em 2000 para 679 em 2005) e em leitura de modo geral, com
mais uso da internet (até 183 horas de 104 horas) e com TV a cabo e por satélite.
De 2000 a 2005, o número de empregos na indústria caiu 18%. Quase todas as
categorias registradas decaíram, menos a indústria farmacêutica. Emprego na indústria têxtil
caiu 42%. Os empregos com maior previsão de crescimento para 2014 estão na área de
enfermagem domiciliar
Mais da metade dos lares norte-americanos possuía ações e fundos mútuos em 2005.
Os 91 milhões de indivíduos nessas residências tinham uma idade média de 51 anos e uma
renda média de US$ 65.000 por ano (cerca de R$ 11 mil por mês).
Em 2005, 75% dos estudantes universitários afirmaram que seu objetivo principal era
ficar bem financeiramente. Entre os que se formaram, 27% tinham pelo menos um dos pais
nascido no exterior. O número de alunos estrangeiros nascidos na Índia aumentou para 80.000
em 2005 em relação aos 10.000 de 1976. Em 1970, 33 mil homens e 2 mil mulheres
ganharam diplomas superiores, em 2004, os números foram 42 mil homens e 41 mil
mulheres.
4.2.2 Fatos relevantes em 2007
No dia 16 de janeiro o senador Barack Obama anunciou sua candidatura nas
primárias democratas que definiriam o candidato presidencial para as eleições de 2008.
Naquele momento os pré-candidatos de oposição que lideravam a preferência pública eram
ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani e o senador John McCain. Porém, Obama já
mostrava sinais de que conseguiria uma grande movimentação partidária em sua campanha.
Pela primeira vez em 80 anos nenhum presidente ou vice-presidente americano
participaria do pleito. De certo modo isso já demonstrava silenciosamente a propensão à
mudança. Dentre os pré-candidatos dos dois partidos haviam representantes de diversas
etnias: negro, mulher, hispânico. Todos buscando se aproveitar da baixa popularidade do
governo Bush. Alguns dias depois, em 20 de janeiro, foi a vez de Hillary Clinton anunciar sua
candidatura.
55
4.2.2.1 Março e maio: pesquisas importantes
Em março de 2007 a rede CNN divulgou os resultados de uma pesquisa de opinião
realizada nos Estados Unidos. Os números apontavam que praticamente sessenta por cento
dos americanos queriam que suas tropas se retirassem do Iraque em no máximo um ano. Já
39% afirmaram que o exército americano deveria permanecer no Iraque até a situação no país
estivesse estável.
Entre os eleitores do Partido Republicano, o sentimento era o de divisão partidária, e
de insatisfação com a escolha dos candidatos para as eleições de 2008, afirmava pesquisa
New York Times/CBS News. Segundo a pesquisa 40% dos eleitores republicanos disseram
acreditar em uma vitória democrata nas eleições presidenciais, enquanto que 46%
acreditavam em uma vitória de seu partido.
Em 17 de maio de 2007 o Census Bureau divulgou um relatório mostrando que as
minorias étnicas nos Estados Unidos já somavam mais de 100 milhões de pessoas. Esse
número foi impulsionado em grande parte pelo aumento da população hispânica. Em 2006 os
hispânicos (maior grupo minoritário) já representava 14,8% da população total.
Os afro-americanos somavam 40,2 milhões de pessoas, ocupando a segunda posição. Os
quase 15 milhões de asiáticos colocavam sua etnia como a terceira maior dos Estados Unidos.
4.2.2.2 Os jovens
O New York Times e as redes de televisão CBS News e MTV promoveram, em
junho de 2007, uma grande pesquisa com jovens de 17 a 29 anos. O objetivo da pesquisa era
prever o comportamento eleitoral dessa parcela da população, bem como mapear sua opinião
sobre alguns temas polêmicos.
Cerca de 54% dos jovens entrevistados declararam ter intenção de votar em um
democrata para presidente em 2008. O estudo ainda mostrou havia uma desaprovação geral ao
governo Bush: apenas cerca de 40% apoiavam o presidente.
56
Os jovens pareciam estar mais inclinados a apoiar o Partido Democrata: 28%
descreveram a si mesmos como liberais, comparados com 20% da nação em geral. E 27% se
descreveram como conservadores, comparados com 32% do público em geral.
A maioria dos jovens acredita que a nação está pronta para eleger uma mulher, um
negro ou alguém que admitisse já ter usado maconha como presidente. 18% citaram Obama,
de Illinois, e 17% citaram Clinton, de Nova York como candidatos de sua preferência. O
republicano Rudolph W. Giuliani foi citado por 4% dos entrevistados. 44% dos jovens
disseram que casais gays poderiam ter permissão para casar, comparados a 28% da população
geral.
O aborto dividia opiniões: 24% afirmavam que ele deveria continuar proibido,
enquanto 38% diziam que ele poderia ser legalizado, mas com restrições. Para 37% o aborto
deveria ser legalizado.
Quando o tema era saúde, 62% dos jovens disseram que apoiariam um programa
nacional de seguro de saúde; enquanto que 47% da população geral concordava com essa
opinião. Em relação a imigração, 30% dos jovens disseram que os americanos deveriam
aceitar novos imigrantes sem restrições.
Historicamente os jovens americanos tendem a apoiar as ações do governo em
tempos de guerra, fato que confirmado pela pesquisa: cerca de 50% acreditavam que os
Estados Unidos tiveram ou viriam a ter sucesso no Iraque.
4.2.2.3 Recordes em arrecadação
Em junho de 2007 os democratas já assumem a liderança na arrecadação de fundos
via internet. Naquele momento os democratas haviam arrecadado 50% a mais do que os
republicanos, US$ 144,3 milhões comparados com US$ 101,7 milhões. Até aquele instante,
90% de toda a arrecadação da campanha de Obama haviam sido garimpados via internet17
.
17
Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL69070-5602,00-DEMOCRATAS+LIDERAM+
ARRECADACOES+ONLINE+PARA+CAMPANHA+ELEITORAL.html; acesso em 13 de junho de 2007.
57
Alguns especialistas apontavam a diferença geral em termos de entusiasmo entre os
membros dos dois partidos, motivada pela guerra no Iraque e pelo caráter incerto do campo
republicano. Outros argumentavam que os democratas possuíam inovações on-line, fato que
causaria o risco aos republicanos de ficarem bastante defasados em um mundo cuja mídia se
altera rapidamente.
Enquanto o Partido Democrata comemorava os recordes de arrecadação, os
republicanos temiam por sua campanha. O líder do partido em todas as pesquisas, Rudolph
Giuliani, tinha até o momento o pior desempenho virtual entre os pré-candidatos: havia
arrecadado apenas US$ 1,3 milhão.
4.2.2.4 Avaliação do governo
Em agosto foi divulgado o resultado de uma pesquisa de opinião, que ouviu 1.020
possíveis eleitores, sobre sua avaliação do governo de George W. Bush. O índice de
avaliações regular/ruim alcançou os 67%, enquanto que somente 32% dos entrevistados
consideravam o governo bom ou excelente. Porém a avaliação americana de seu Congresso
(comandado pelos democratas) também não era animadora. Para apenas 15%dos entrevistados
a atuação da Câmara e do Senado era boa ou excelente.
O descontentamento alcançava ainda a política econômica: 64% se mostraram
descontentes com a política econômica e 74% não estavam satisfeitos com a política externa.
Apenas 24% dos entrevistados acreditavam que o país estava trilhando um bom caminho
político.
Os números em relação ao emprego eram alarmantes: cerca de 25% responderam
possuir ao menos um pouco de medo do desemprego. Sobre segurança nacional, 51% se
sentiam “razoavelmente” seguros, e 27% se sentiam muito seguros.
58
4.2.2.5 Eleições dominam noticiário, mas medo do terror é relevante
O Centro para a Excelência em Jornalismo Estados Unidos divulgou em agosto de
2007 um relatório, que apontava qual o tamanho da parcela de atenção que os veículos de
comunicação dedicaram às eleições de 2008. Segundo o estudo a corrida pela Casa Branca
ocupou 9% de todo o espaço midiático. A cobertura de eventos no Iraque, com 7% ocupava o
segundo lugar. O debate sobre as políticas do governo federal sobre a situação no Iraque
ocuparam outros 7% do noticiário. Porém o interesse pelo Iraque vinha caindo
sistematicamente, em parte devido a falta de ações concretas do governo.
Em setembro o instituto Zogby publicou os resultados de uma pesquisa realizada em
solo americano, em que 91% dos norte-americanos acreditavam que os Estados Unidos
voltariam a sofrer atentados terroristas no futuro. Somente 4% dos entrevistados acreditavam
que o país estava livre de novos ataques. A guerra no Iraque já perdia sua associação com o
combate ao terror: apenas 41% dos entrevistados disseram haver ligação entre a guerra no
Iraque e o combate ao terrorismo.
Outra pesquisa, promovida pela rede NBC e pelo Wall Street Journal, apontava que
30% dos americanos aprovavam o desempenho do presidente Bush a frente da guerra no
Iraque. Apesar disso, o índice de aprovação do governo federal continuava sendo baixo:
apenas 36% aprovavam a gestão Bush.
4.2.2.6 Hillary perde força
Em novembro a principal candidata democrata à presidência dos Estados Unidos,
Hillary Clinton, já dava mostras de perda de prestígio junto a sua base eleitoral. Uma pesquisa
da Opinion Research para a rede de televisão CNN afirmava que, embora a senadora ainda
fosse a primeira opção de voto dos democratas, sua preferência havia caído de 51% para 44%.
Além disso, caso a eleição naquele mês de 2007, Hillary venceria o ex-prefeito de
Nova York, Rudolph Giuliani, principal candidato republicano, por 51% a 45% dos votos.
Nesse momento, o senador Barack Obama contava com 25% da preferência democrata, e o
ex-senador John Edwards (14%). Entretanto, em outubro, uma enquete apontava Hillary na
frente de Obama por uma diferença de 30 pontos percentuais.
59
4.2.2.7 A internet em 2007/2008: a força das redes sociais
No último mês de 2007 o Google apresentou um relatório que mostrava quais os sites
mais buscados no ano. Sete em cada dez buscas estiveram ligadas às redes de relacionamento,
como YouTube, Facebook ou Hi5. O mundo virtual oferecido pelo Second Life também
figurava entre os dez sites mais buscados. O número de usuários do Facebook duplicou em
2005, até chegar a cerca de 55 milhões, enquanto o líder neste setor, MySpace, cresceu 30%,
alcançando 110 milhões de membros18
.
4.3 A engrenagem eleitoral americana
Cada novo presidente norte-americano é eleito por meio de um colégio eleitoral.
Considerando que os Estados Unidos da América são uma união de estados federados, existe
uma eleição em cada estado. São nos estados que entram em cena os delegados: as pessoas
que têm direito a voto no colégio eleitoral.
O número total de delegados de cada estado oscila conforme a soma do número de
senadores e de membros na Câmara dos Representantes; quantidade proporcional a
população. Dessa forma os Estados mais populosos elegem mais delegados. Geralmente, o
candidato que ganha o maior número de votos populares leva todos os delegados desse
Estado. Um candidato necessita dos votos de 270 dos 538 delegados para ser eleito.
Após as eleições gerais, os delegados de cada Estado se encontram nas capitais
estaduais para votar para presidente e vice-presidente. Os votos são enviados ao Senado, que
os contam e anuncia o vencedor, com todo o Congresso presente. Esse sistema eleitoral
permite que o candidato com menor número de votos dos cidadãos se eleja presidente da
nação. Isso porque a eleição não é direta. A população elege delegados, que se comprometem
a apoiar algum candidato.
Outra característica importante das eleições norte-americanas é a liberdade do voto.
Todo cidadão maior de 18 anos, que não esteja cumprindo penas nas penitenciárias tem o
18
Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL239630-5602,00-GOOGLE+SITES+MAIS+
PROCURADOS+SAO+DE+REDES+DE+RELACIONAMENTO.html; acesso em 26 de dezembro de 2007.
60
direito a voto, porém não é obrigado a votar. Alguns Estados permitem o voto a partir dos 16
anos, assim como de americanos não-residentes nos Estados Unidos. Mas essa liberdade
impõe seu preço à sociedade: os índices de participação popular em eleições é um dos
menores entre os países industrializados. Cerca de apenas 50% da população apta a votar
exerce seu direito.
Nos Estados Unidos existem apenas dois partidos de expressão nacional: o
Democrata e o Republicano. Para escolherem seus candidatos à presidência, ambos os
partidos passam pelo processo de primárias e cáucus. Uma primária segue o sistema de uma
eleição geral, onde os eleitores votam em um candidato presidencial ou em delegados que
representarão esse candidato na convenção nacional. As eleições primárias permitem a todos
os eleitores registrados no Estado a votação direta em seu candidato preferido.
As primárias são dividas em três tipos: fechadas, abertas e mistas. Nas primárias
fechadas os eleitores só podem participar da escolha do candidato do partido em que forem
registrados. Já nas primárias abertas o eleitor pode escolher em qual partido deseja votar, mas
só pode votar em um deles. Nas primárias mistas os eleitores podem votar nos candidatos dos
dois partidos.
O cáucus é uma reunião de membros locais do partido, que servem para debate de
temas, avaliação dos candidatos e escolha de delegado. Os membros da reunião escolherão os
delegados de seu Condado, depois de seu Distrito, e, por fim, do ao Estado. São os delegados
estaduais votam na convenção nacional do partido e escolhem seu candidato definitivo. O
cáucus é utilizado em onze dos cinquenta estados norte-americanos. Tanto nos cáucus como
nas primárias são eleitos delegados, em número proporcional à população dos estados.
Os estados mais populosos, portanto, são os mais importantes na disputa eleitoral,
pois elegem um maior número de delegados. O candidato a presidente escolhido pelos
delegados na convenção nacional geralmente escolhe algum dos candidatos derrotados nas
primárias para ser o vice em sua chapa.
Existem ainda os “superdelegados”, que são delegados que possuem votos
independentes; ou seja, que não necessariamente precisam seguir a decisão da primária ou
cáucus de seu estado. Ex-governadores, governadores e senadores, líderes partidários,
representantes do Congresso, ex-presidentes e ex-candidatos compõem o grupo dos
“superdelegados”.
Nos Estados Unidos qualquer cidadão pode candidatar-se a presidência, mesmo que
não seja filiado a nenhum partido. O candidato precisa apenas reunir um número determinado
61
de assinaturas para endossar sua inscrição. Porém, desde 1852 os presidentes americanos são
de uma das duas legendas do país: democratas ou republicanos.
Quanto ao financiamento das campanhas, existem dois tipos: o público e o privado.
No financiamento público, o governo oferece ao candidato soma semelhante à que ele tenha
obtido em doações. Esse sistema é pouco adotado, pois restringe a arrecadação total da
campanha. O cidadão americano opta por contribuir para os fundos públicos, doando US$ 3,
embutidos em seus impostos. Apenas 7% dos contribuintes optam por doar dinheiro para esse
fundo.
O financiamento privado é a maior fonte de renda das campanhas. O máximo que um
cidadão pode doar para uma campanha são US$ 2,3 mil, na etapa das primárias e o mesmo
valor nas eleições gerais. O financiamento privado é mais popular entre os candidatos, pois,
além de sua arrecadação ser irrestrita, não existe espaço midiático gratuito para propaganda
eleitoral.
62
63
5 A CORRIDA PELO ENGAJAMENTO: CAMPANHA DE BARACK
OBAMA EM 2008
A campanha de Barack Obama notabilizou-se por alcançar o verdadeiro
envolvimento voluntário do eleitorado. A força de sua imagem e a utilização de técnicas de
motivação foram determinantes para alcançar o engajamento dos eleitores. Celebridades
uniram-se aos voluntários anônimos para apoiar o candidato democrata, multiplicando as
mensagens da campanha.
Neste capítulo analisaremos os principais acontecimentos do ano em que se
desenrolaram as eleições, as possíveis relações entre Obama e outros líderes norte-americanos
e as estratégias do Partido Democrata para motivar seus eleitores.
5.1 Barack Obama: uma nova liderança
Barack Obama saltou de candidato insignificante à celebridade em poucos meses, se
tornando o quadragésimo quarto presidente dos Estados Unidos da América. Em sua trajetória
derrotou adversários famosos e experientes no jogo político. Considerando que ele era um
candidato negro, com nome islâmico, filho de pai africano e mãe americana, em um país
profundamente dividido por raças, sua vitória é ainda mais interessante. Barack Obama
conseguiu realizar uma campanha praticamente impecável, alcançar um lugar de destaque na
história mundial e se tornar o maior case em marketing político da atualidade.
Barack Hussein Obama II nasceu em 4 de agosto de 1961, em Honolulu, capital do
Estado do Hawaii. Filho de uma americana e de um queniano, Obama desde cedo se
acostumou com a vida sem a presença do pai. Quando tinha apenas dois anos de idade seus
pais se separaram. Barack Hussein Obama, seu pai, escolheu abandonar a família para estudar
na Universidade de Harvard.
Quando criança residiu alguns anos na Indonésia, devido ao casamento de sua mãe,
Ann Dunhan, com um estudante indonésio chamado Lolo, que conhecera na Universidade do
Hawaii. Foi nesse país que teve início a efetiva a formação cultural de Obama, extremamente
incentivada e conduzida por sua mãe. Segundo Obama (2008):
64
Cinco dias por semana, ela me acordava às 4 horas, forçava-me a tomar o café-da-
manhã e me dava aulas de inglês durante três horas antes de eu ir para a escola e ela,
para o trabalho. Tive grande resistência a esse regime, mas em resposta a cada nova
desculpa minha, fosse ela nada convincente (“Meu estômago está doendo”), fosse
incontestavelmente verdadeira (“meus olhos pesados insistiam em fechar a cada
minuto), ela repetia com toda a paciência o seu argumento mais poderoso: “Isto não
é nenhum piquenique para mim também, espertinho” (OBAMA, 2008, p.66).
Três anos se passaram desde que a família de Obama viajou para a Indonésia, e mais
uma vez ele viu sua mãe separar-se. Assim, com 10 anos de idade, voltou com ela ao Hawaii,
para morar com os avôs maternos. Após concluir a High School (espécie de ensino médio),
Barack foi estudar na Occidental College em Los Angeles. Em 1983 foi transferido para a
Universidade de Columbia, em New York. Nesse ponto se encontram os fatos mais relevantes
para este estudo.
Barack decide ser líder comunitário. De acordo com Obama (2008):
Não sabia nada sobre o que era, de fato, trabalhar na área social e não conhecia
ninguém que ganhasse a vida fazendo isso. Quando colegas da faculdade
perguntavam-me o que um líder comunitário fazia, não conseguia responder-lhes ao
certo. Mas tentava falar sobre a necessidade de mudanças. Mudanças na Casa
Branca, onde o presidente Reagan e seus protegidos conduziam seus atos sujos.
Mudança no Congresso, complacente e corrupto. Mudança no espírito do país,
maníaco e egocêntrico. A mudança não virá do topo, eu dizia. A mudança virá das
raízes, das bases mobilizadas (OBAMA, 2008, p. 151).
Após trabalhar como divulgador de algumas iniciativas de organizações não
governamentais com jovens de New York, Obama conhece Marty Kaufman. Marty havia
iniciado um movimento de organização social em Chicago, e precisava de um treinee. Assim,
no ano de 1985, o futuro presidente dos Estados Unidos da América se muda para a capital do
estado do Illinois.
Em 1988 Obama ingressa na Universidade de Direito de Harvard (Harvard Law
School). Aos trinta e cinco anos de idade se elege deputado para a Assembleia Legislativa de
Illinois. No ano 2000 concorre ao Senado e é derrotado por um candidato democrata que
buscava a reeleição. Em 2004 é eleito Senador pelo estado do Illinois. Quatro anos mais tarde
concorreria à presidência dos Estados Unidos da América.
65
5.2 As primárias: retratos da pré-eleição presidencial
Em dezembro de 2007 pesquisas já apontavam Obama e Hillary Clinton como os
principais favoritos do Partido Democrata na disputa pela candidatura à presidência dos
Estados Unidos. Entre os republicanos, Mitt Romney liderava as pesquisas, seguido por
Rudolph Giuliani.
A maior e mais cara campanha presidencial na história dos Estados Unidos teve seu
real início na quinta-feira dia 3 de janeiro de 2008, no estado Iowa. Porém o eleitorado estava
tão oscilante que parece impossível chegar a um prognóstico confiável. Em 30 de janeiro
Rudolph Giuliani abandona a disputa e anuncia seu apoio à John McCain.
A primeira prévia eleitoral norte-americana ocorreu no dia 3 de janeiro de 2008, no
estado de Iowa. O democrata Barack Obama e o republicano Mike Huckabee venceram por
seus partidos. No dia seguinte dois pré-candidatos democratas abandonaram as primárias: Joe
Biden e Chris Dodd. Embora Iowa seja um pequeno estado, sem grande força no cenário
nacional, as vitórias nas suas primárias foram importantes por seu simbolismo, e para
alavancar a imagem dos candidatos.
A resposta da senadora e ex-primeira-dama Hillary Clinton à vitória de Obama foi
rápida. Ela atacou seu adversário em um debate, três dias antes das importantes eleições
primárias do Estado de New Hampshire. Naquele momento Obama e Hillary figuravam nas
pesquisas de opinião disputando equilibradamente a preferência do eleitorado. Entre os
republicanos o principal favorito era o senador John McCain.
No dia 5 de fevereiro de 2008 aconteceu a “super-terça”. Nesse dia os democratas
realizaram primárias em 22 estados, e os republicanos em 21. Os delegados democratas que
estavam em jogo eram 2.084; sendo que para conseguir a candidatura oficial do partido, é
preciso obter o apoio de 2.025 delegados. Ou seja, eram precisos mais do que a metade mais
um dos 4.049 que participariam da Convenção Democrata em Denver, no final de agosto de
2008. Para os republicanos, a “super-terça” elegeria 1.081 delegados, dos 1.191 necessários
para conseguir a candidatura presidencial.
Os resultados da “super-terça” demonstraram qual seria o candidato republicano, mas
mantiveram a disputa acirrada no Partido Democrata. Hillary Clinton conquistou 900
delegados e 213 “superdelegados”, enquanto que Barack Obama conseguiu 824 delegados e
127 “superdelegados”. O republicano John McCain conquistou 604 delegados, número muito
superior a Mitt Romney com seus 244 delegados. A partir daquele momento o Partido
Republicano e a mídia concentraram sua atenção em McCain. Teoricamente ele teria uma
66
vantagem sobre seu rival democrata, qualquer que fosse, uma vez que sua candidatura estava
praticamente definida com muita antecedência.
Em 21 de fevereiro de 2008 Obama vencia as prévias democratas entre os norte-
americanos que não residiam nos Estados Unidos. Os eleitores que residiam no exterior
puderam votar pela internet. A vitória foi conseguida com ampla vantagem sobre Hillary
Clinton: 65% contra 32%. Já no final de fevereiro Obama possuía 1.319 delegados, enquanto
Hillary somava 1.250 representantes.
Ainda naquele mês o senador de Connecticut, Chris Dodd, anunciou seu apoio a
Obama. Ao mesmo tempo uma pesquisa do jornal New York Times em parceria com a rede de
televisão CBS afirmava, pela primeira vez, que Obama possuía mais possibilidade de vencer
McCain nas eleições do que Hillary Clinton. Naquele momento 60% dos entrevistados
apontavam Obama como o candidato mais forte do Partido Democrata. O New York Times
publicou um artigo em seu site, indicando que após 40 prévias e 11 vitórias consecutivas,
Obama havia conquistado grandes avanços entre os principais grupos do partido, incluindo
homens, mulheres, progressistas e moderados, assim como entre os eleitores de renda média e
superior. A mesma pesquisa afirmava que quase nove entre cada dez entrevistados diziam que
McCain estava preparado para chegar à Casa Branca; e mais de oito de cada dez indicaram
confiar em sua capacidade para enfrentar uma crise internacional.
Em maio uma pesquisa realizada pelo jornal Los Angeles Times e pela agência
Bloomberg apontava que tanto Hillary Clinton quanto Barack Obama venceriam McCain nas
eleições presidenciais. Segundo o levantamento Obama ganharia 46% dos votos se enfrentasse
McCain, que receberia 40%. A vantagem de Hillary seria um pouco maior: ela obteria 47%
dos votos, contra 38% de McCain. Quando perguntados sobre quem dirigira melhor a
economia do país, John McCain recebeu a pior nota entre os três principais aspirantes.
A disputa democrata só teve fim em junho. Na noite do dia 3 daquele mês Hillary
reconheceu, em New York, que seu adversário já obtivera o número suficiente de delegados
para ser aclamado candidato a presidência pelo Partido Democrata. No mesmo dia os
republicanos divulgaram uma nota de três páginas, afirmando que Obama herdaria um partido
divido, e que o número de votos emitidos contra Obama em 2008 superava o número total de
votos emitidos nas primárias democratas das quatro eleições presidenciais precedentes.
Pesquisa realizada pelo Yahoo! News e pela AP em 27 de junho afirmava que quase
de 53% dos eleitores que apoiaram a senadora Clinton nas prévias já apoiavam Obama. Cerca
23% dos consultados disseram preferir o republicano John McCain, mostra sondagem.
67
No dia 23 de agosto de 2008, já extra-oficialmente candidato pelo Partido Democrata,
Barack Obama anunciou o nome do vice de sua chapa: Joseph Biden. O anúncio foi feito para
mais de 35.00 pessoas em Springfield, Illinois. Neste mesmo local, sede do Congresso de
Illinois onde legislou Abraham Lincoln, Obama havia anunciado em 2007 que se lançaria à
disputa pela candidatura presidencial.
Quatro dias após lançar Joe Biden como seu vice, Obama foi oficialmente nomeado
como candidato a presidência dos Estados Unidos da América pelo Partido Democrata.
Durante a convenção nacional do Partido Democrata em Denver, no Colorado, Hillary Clinton
interrompeu a votação orientando seus eleitores a elegerem Obama por aclamação. Barack
Obama aceitou a nomeação com um discurso emocionado. O dia da nomeação de Obama foi
especialmente escolhido, pois era o aniversário de 45 anos do famoso discurso “I have a
dream”19
, de Martin Luther King.
Dia 29 de agosto foi a vez da chapa republicana movimentar o noticiário. John
McCain anunciava o nome da vice de sua chapa: Sarah Palin. Aos 44 anos, a governadora do
Estado do Alaska poderia se tornar a primeira mulher vice-presidente da nação mais poderosa
do mundo. A escolha surpreendeu os meios políticos norte-americanos, que apostavam em
nomes como os do ex-governador de Massachusetts Mitt Romney e do atual governador de
Minnesota, Tim Pawlenty.
5.2.1 Hillary Clinton: a primeira desafiante
Hillary Rodham Clinton, ex-primeira-dama dos Estados Unidos ostentava, em 2008,
a imagem de ícone do Partido Democrata. Na história do país ela era a primeira mulher com
reais chances de alcançar a presidência. Além de reunir a experiência de sua vida em
Washington tinham seu nome altamente reconhecido pelo eleitorado americano.
Hillary foi presidente dos Jovens Republicanos quando estava na universidade de
direito de Yale, além de presidir o governo estudantil e representar assim sua academia no
Senado. Entretanto sua discordância com alguns líderes partidários a aproximaram do Partido
Democrata.
19
Eu tenho um sonho.
68
Em 1975, residindo em Little Rock, Arkansas, casa-se com Bill Clinton. Bill havia
sido eleito procurador-geral do estado, já carregando uma campanha perdida pelo Congresso.
Quatro anos mais tarde seu marido seria eleito governador do Arkansas. Em 1993 ele
alcançaria a presidência dos Estados Unidos.
Nesse período Hillary enfrentou ao lado do marido dois escândalos políticos. O
primeiro relacionado com acusações ao casal sobre um suposto envolvimento com atividades
ilegais quando Bill Clinton governava o Arkansas. Nada foi provado contra Hillary ou Bill. O
segundo foi o famoso caso Mônica Lewinsky; assessora do presidente que o acusou de
assédio sexual. Hillary manteve sua boa imagem apesar da infidelidade do marido.
No ano 2000 Hillary mudou-se para o estado de New York, elegendo-se Senadora.
Seu primeiro mandato no Senado foi marcado por dois fatos: seu esforço em conquistar
recursos federais para seus Estado após os ataques terroristas de 11 de setembro, e seu voto,
em 2002, para autorizando o uso da força militar norte-americana no Iraque.
Sempre houve uma característica meio holográfica em Hillary Clinton. Quando
observada de um ângulo, ela pode parecer uma líder inovadora e durona, que já passou por
milhares de tempestades. Por outro lado, ela pode ser a personificação da ambição fria e
calculada20
.
Disputando a nomeação democrata à presidência dos Estados Unidos mostrou-se
favorável ao direito ao aborto e contrária a proibição do casamento gay. Sobre a saúde
declarou que faria esforços para oferecer ao povo uma cobertura pública universal. Como
senadora votou pelo banimento de armas de fogo e favoravelmente a legalidade dos
imigrantes ilegais.
5.2.2 John McCain: O adversário republicano
John McCain foi indicado como candidato à presidência dos Estados Unidos pelo
Partido Republicano meses antes que Obama e Clinton tivessem terminado sua disputa nas
20
Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Mundo/0,,MUL240919-5602,00-HILLARY+CLINTON+
A+DEMOCRATA+FAMILIAR+E+AINDA+DESCONHECIDA+DOS+AMERICANOS.html; acesso em 02 de
janeiro de 2008.
69
primárias democratas. Veterano de guerra elogiado mesmo por seus adversários, o senador
pelo Estado do Arizona foi o escolhido para defender o governo Bush nas eleições de 2008.
John McCain nasceu na região do canal do Panamá freqüentando mais de 20 escolas
antes mudar-se para Annapolis, onde se formou 1958 com um dos piores desempenhos entre
seus colegas. Em 1967, já casado e pai, viajou como soldado norte-americano para a guerra
do Vietnã. Em uma missão seu avião caiu ao mar; quando alcançou a costa após o acidente foi
aprisionado pelos vietnamitas. Durante cinco anos McCain resistiu a espancamentos,
desnutrição, tortura e a solitária. Tentava resistir ao encarceramento com bom-humor, fazendo
encenações cômicas aos seus companheiros de cela. Alcançou a liberdade através dos
Acordos de Paz de Paris em 1973, regressando para casa de muletas.
Os ferimentos de torturas e guerra deixaram marcas em seu corpo: McCain passou a
mancar levemente e a não conseguir erguer nenhum dos braços acima da altura de seu
pescoço. Foi diagnosticado três vezes com câncer de pele, fato que lhe conferiu uma cicatriz
no rosto.
John McCain estudou o trabalho dos congressistas em Washington como contato da
Marinha no Senado até 1981. Um mês após divorciar-se de sua primeira esposa, casou-se com
Cindy Hensley, mudando-se para o Arizona. Rapidamente ingressou na política, elegendo-se
para a Câmara em 1982. Dois mandados depois conquistou uma cadeira no Senado.
A fama de McCain de manter um controle rígido do dinheiro dos contribuintes
aumentou. Órgãos de controle lhe encheram de recompensas por combater o desperdício.
Empreiteiros da defesa não gostaram de sua intensa vigilância, legisladores viram
procedimentos estabelecidos há tanto tempo para ganhar o pão de cada dia serem desafiados
ou eliminados, e muitos viram um temperamento desmoralizador que, segundo McCain,
mostra o que há de melhor nele. McCain foi além da questão do desperdício e atacou o
sistema de financiamento de campanhas, questão que o aproximou de democratas que
compartilhavam sua opinião e o afastou dos líderes republicanos21
.
Em 2000 disputou as primárias republicanas buscando sua indicação à presidência,
mas foi derrotado por George W. Bush. McCain foi um crítico feroz a conduta de Bush em
relação à guerra no Iraque. Porém, tornou-se um aliado do então presidente americano através
da responsabilidade de dar continuidade ao governo republicano.
21
Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/0,,MUL741604-15525,00-JOHN+MCCAIN
+O+REPUBLICANO+DO+SONHO+DOS+DEMOCRATAS.html; acesso em 29 de agosto de 2008.
70
John McCain entrou na disputa presidencial em 2008 com 70 anos de idade. Em sua
campanha manifestou posição contrária ao direito ao aborto, além de ser contra a proibição do
casamento gay e da proibição do uso de armas de fogo. Quando Senador votou favorável a
construção de uma cerca na fronteira dos Estados Unidos com o México.
5.3 Kennedy e Luther King: conexões possíveis na cabeça do eleitorado
Diversas conexões cognitivas podem aproximar Obama à outros líderes norte-
americanos. Assemelha-se com Luther King em seu raça e suas frases de ordem. Parece-se
com Kennedy em sua idade e intelecto. Essa relações possíveis podem ter aumentado a
importância de Obama no contexto eleitoral, auxiliando-o na conquista de votos.
5.3.1 John Kennedy e Obama
John Fitzgerald Kennedy foi o trigésimo-quinto presidente dos Estados Unidos da
América. Um dos mais jovens presidentes norte-americanos, Kennedy carregava em torno de
si a possibilidade de um novo tempo, de uma nova política para os Estados Unidos.
Descendente de irlandeses, o ex-presidente norte-americano nasceu em Boston, no ano de
1917.
Kennedy pertencia a uma família milionária que sempre nutriu apreço pela política.
Foi acostumado desde cedo a viajar pelo mundo: Londres, Paris, Berlim e Moscou foram
alguns de seus destinos na adolescência. Cursou a universidade de Harvard e publicou em
1940 um livro sobre a fraqueza militar da Grã-Bretanha às vésperas da Segunda Guerra
Mundial.
Não fugiu ao serviço militar, ao contrário, alistou-se para servir ao seu país na
Segunda Guerra. Conforme Bothwell (1965), Kennedy (apelidado de Jack) sofreu para
ingressar no serviço militar, onde já estava seu irmão Joseph (Joe):
71
Jack Kennedy, compreendendo que a guerra era iminente, fez uma viajem para a
América do Sul, que sempre desejara conhecer, e ao regressar decidiu alistar-se no
exército. Mas, para seu tormento, o Exército recusou-o, por causa de sua lesão na
espinha dorsal, resultante de um acidente esportivo quando estava na Universidade.
Essa lesão haveria de torturá-lo para o resto da vida. Qualquer outro jovem rico teria
posto nessa ocasião um ponto final em seu dever para com a pátria. Mas Jack
Kennedy, porém, não agiu assim. Submeteu-se a uma série de tratamentos e
exercícios rigorosos para fortalecer o dorso e, quando se sentiu mais seguro de si
mesmo, fisicamente, apresentou-se novamente, desta feita na Marinha. Ter-lhe-ia
agradado ingressar na Força Aérea, com Joe, mas percebeu que sua lesão não
permitiria que fosse aceito. Finalmente a Marinha acolheu-o e lhe deu um posto
burocrático, junto ao serviço de inteligência em Washington (BOTHWELL, 1965,
p.39).
Porém Kennedy queria servir ao seu país no campo de batalha, e utilizou seu
prestígio familiar para ser enviado ao combate. Por bravura, John Kennedy recebeu a Medalha
do Coração Púrpura e a Medalha da Marinha e dos Fuzileiros Navais. Acometido pela
malária, Kennedy, ainda em batalha, recebeu a notícia da morte heróica de seu irmão Joe, pela
explosão do avião que pilotava.
Tão logo voltou da guerra iniciou sua carreira política, elegendo-se deputado federal.
Após alguns anos na Câmara, em 1952 elegeu-se Senador. Bothwell (1965) ressalta a vitória
expressiva de Kennedy: “Ao encerrar-se a apuração, Jack Kennedy havia ganhado sua cadeira
no Senado com uma vantagem de mais de 70.000 votos [...]” (BOTHWELL, 1965, p.58).
John Kennedy escreveu seu mais popular livro Profiles in Courage22
em 1955. Logo
após a publicação o livro recebeu o cobiçado Prêmio Pulitzer de literatura. O livro tratava-se
de “um conjunto de ensaios histórico-políticos, sendo também uma página de alto valor
literário” (BOTHWELL, 1965, p.72).
No dia 8 de novembro de 1960 o democrata John Fitzgerald Kennedy foi eleito
presidente dos Estados Unidos, após uma campanha marcante contra o republicano Richard
Nixon. Assim Kennedy impediu o continuísmo republicano no governo americano, na época
comandado pelo presidente Eisenhower. O presidente Kennedy foi assassinado em 22 de
novembro de 1963, com um tiro certeiro em seu cérebro, em Dallas, enquanto participava de
uma passeata em sua limusine conversível.
Podem-se notar diversas conexões cognitivas entre Obama e Kennedy. Ambos
jovens, disputando uma eleição opondo-se ao governo. Kennedy viaja pelo mundo através das
posses de sua família. Obama viaja pelo mundo também por uma série de fatores familiares.
O presidente da década de 1960 foi um herói de guerra; buscando nisso exercitar seu
ideal de patriotismo. Obama expressa esse patriotismo através de seu intelecto e de sua
22
Política e Coragem.
72
retórica. Ambos publicam livros de sua autoria, estabelecendo entre si um laço de liderança
intelectual. Kennedy encontra seu país em guerra no Vietnã, enquanto que Obama vive o
período da guerra dos Estados Unidos no Iraque.
Os dois ilustres representantes do Partido Democrata em disputas presidenciais
compartilham, sobretudo o ideal da mudança. Tanto Obama quanto Kennedy inserem em seus
discursos mensagens positivas, quase poéticas, de valorização ao povo americano. Ambos
fazem promessas ideológicas para o futuro, incitando a população à ação. A responsabilidade
do povo no processo de mudança social fica claro no discurso de posso de Kennedy “meus
compatriotas, não pergunteis o que nosso país pode fazer por nós, mas sim o que nós podemos
fazer por nosso país” (BOTHWELL, 1987), e no próprio slogan de Obama “yes we can”23
.
5.3.2 Martin Luther King e Obama
Martin Luther King Jr. foi um dos ícones do movimento negro nos Estados Unidos.
Em 28 de agosto de 1963, o reverendo King, então com 34 anos de idade proferiu o discurso
que o colocaria para sempre na história. Mais de 200 mil pessoas assistiam a manifestação
que acontecia em frente a imponente estátua de Abraham Lincoln na capital americana,
quando o homem negro de bigode fino disse emocionado à multidão sua mais célebre frase: “I
have a dream”.
Tamanho o impacto de seu discurso, que King foi recebido naquele mesmo dia pelo
então presidente John Kennedy. Kennedy afirmou que as propostas de King para uma nova
legislação a respeito da segregação racial tinham seu apoio. Na década de 1960, o tratamento
social destinado aos negros do sul dos Estados Unidos tinha suas raízes no colonialismo.
Segundo Shuker (1987):
Se uma família negra sulista resolvesse fazer uma viagem de carro para outra cidade,
tinha de planejar cuidadosamente seus roteiros, a fim de que suas paradas
coincidissem com os lugares onde tivesse amigos ou parentes, pois nenhum hotel, ou
motel, em todo o Sul dos Estados Unidos, aceitava negros (SHUKER, 1987, p.15).
O fato que projetou King nacionalmente foi o boicote aos ônibus em Montgomery.
Os brancos tinham prioridade para sentar-se nos bancos de ônibus naquela cidade. Porém
23
Sim nós podemos.
73
Rosa Parks, uma negra ativa do movimento anti-segregação recusou-se a ceder seu acento à
um homem branco que havia tomado o ônibus pouco depois dela. A Srª Parks foi presa por
desafiar a lei segregacionista dos transportes públicos. Martin Luther King foi um dos
organizadores de um boicote, que levou os negros a não utilizarem ônibus durante um dia
inteiro.
A ação teve resultados expressivos. De acordo com Shuker (1987):
Duas coisas haviam acontecido naquela segunda-feira de dezembro, em
Montgomery, coisas que mudariam o Sul para sempre. Um juiz tomara uma decisão
que levaria ao fim quase sessenta anos de leis segregacionistas e 50.000 cidadãos
negros haviam descoberto um novo sentimento de auto-estima (SHUKER, 1987,
p.40).
Alguns anos depois, o livro de King A caminho da Liberdade: a História da vitória
de Montgomery foi publicado nacionalmente. O líder negro sofreu alguns atentados contra sua
vida, que não abalaram em absoluto sua luta contra a segregação. Martin Luther King Jr. foi
assassinado com um disparo de arma de fogo em 4 de abril de 1968.
Muitos paralelos podem ser traçados entre King e Obama. Ambos negros, líderes que
começaram seu trabalho em pequenas comunidades, dispostos a deixar sua marca na história.
As imagens das duas lideranças se aproximam ainda mais quando consideramos os momentos
históricos em que encontraram sua maior popularidade: o auge do segregacionismo americano
e uma das maiores crises econômicas da história. Em ambas as situações a população
enfrentava uma situação histórica adversa, que exigia ação imediata.
Outro fator que aproxima os dois ícones americanos foram suas frases de ordem. O
“I have a dream” e o “yes we can” possuem estruturam semânticas parecidas, porém diferem
em seu conteúdo. Um fala no “eu”, outro no “nós”. Um fala no futuro enquanto que outro traz
sua narrativa para o presente. Mas ambos falam de superação, de ideais, de uma luta em torno
de uma causa comum. Possivelmente o slogan de Obama tenha sido concebido para
assemelhar-se a célebre frase de Martin Luther King Jr. e, assim, maximizar as relações entre
os dois.
O eleitorado pode ter traçado conexões entre Obama e o líder negro da década de
1960, modificando ou confirmando suas intenções de voto. Como já considerado neste
estudo, a adoração a um líder é um fato gerador de motivação. Transferir à Obama atributos
de Martin Luther King Jr., portanto maximiza a importância de sua liderança aumentando seu
poder persuasivo e sua capacidade de incitar a motivação no eleitorado.
74
O sentimento de mudança social, tão expressivamente evocado na campanha de
Obama também estava presente nos anos 60. O eleitorado de 2008 pode, através da ligação
cognitiva entre os dois líderes, ter acreditado se encontrar em um momento histórico
semelhante ao da luta contra a segregação. Sem dúvida esse sentimento aumentaria os índices
de voto nas eleições, e impulsionaria o engajamento dos envolvidos com a causa do Partido
Democrata. O próprio Obama buscava criar essa atmosfera em seus discursos, com frases
como “at this defining moment”24
ou “this is our moment25
”.
5.4 Uma campanha motivadora: estratégias para envolver o eleitorado
A campanha de Barack Obama transcendeu o uso da simples persuasão, alcançando a
verdadeira motivação dos envolvidos na campanha. O eleitorado entendeu que a campanha
não apenas falava sobre política, mas sim sobre o futuro de um país, de uma série de valores e
situações inerentes a um povo. Este estudo propõe a análise das causas que levaram uma
campanha eleitoral a se transformar em uma espécie de movimento nacional. Considera-se
que por trás da motivação dos eleitores houve inteligentes comandantes de propaganda, que
identificaram os desejos e necessidades desse eleitorado, suprindo essas carências com
informações relevantes e construídas de acordo com uma diretriz partidária.
5.4.1 Yes we can: o discurso da campanha
A linha discursiva da campanha foi cuidadosamente conduzida, de forma que todas
as faces da campanha pudessem transmitir uma unidade de pensamento. A figura do
candidato, o conteúdo e a forma de suas mensagens estavam sempre conectadas ao todo. A
24
Neste momento decisivo.
25 Este é o nosso momento.
75
ideia de mudança, esperança e renovação sempre estavam inseridas no discurso político do
Partido Democrata nas eleições de 2008.
5.4.1.1 Os slogans
O slogan é um dos elementos mais comuns em campanhas políticas. É utilizado para
reunir em uma única frase os principais valores do candidato e resumir o momento da disputa.
Ele “mobiliza no seu receptor uma ânsia pelo futuro, sua natureza projetiva” (LASBECK,
2002, p.12).
Lasbeck (2002) traz a origem etimológica do slogan, que remonta a expressão
escocesa “sluagh-ghairm”, que significa “grito de guerra de um clã”. Nota-se que o slogan
nasceu ligado a fatores políticos. Essa conexão é relevante para este estudo, uma vez que, na
campanha de Obama, os slogans são de fundamental importância no discurso do candidato.
De certa forma, a força de seu slogan o aproxima dos grandes líderes mundiais da história.
Segundo Lasbeck (2002):
Grandes líderes e estadistas políticos, coincidentemente ou não, foram
estigmatizados e lembrados pela história não só pelos seus feitos, mas também (e, às
vezes, principalmente) pelos brilhantes slogans que utilizaram em suas campanhas
políticas ou em discursos para multidões, sejam em praças públicas, sejam através
do rádio, do cinema ou da televisão (LASBECK, 2002, p. 50).
O slogan da campanha ilustra perfeitamente o que a equipe de Obama queria
transmitir ao eleitorado em relação à situação do país: “yes we can”. Consideremos que
Obama começou sua campanha como um candidato menor na disputa: sim, nós podemos
derrotar os candidatos mais populares. Ou ainda que o candidato pudesse ser julgado por sua
raça: sim, nós podemos eleger o primeiro presidente negro dos Estados Unidos da América. E
quando pensamos que a maior potência econômica mundial estava mergulhando em uma crise
financeira26
: sim, nós podemos recuperar nossa economia.
O “yes we can” foi, sem dúvida alguma um slogan muito poderoso. Por sua
construção simples lembrava a famosa fala de Martin Luther King “I have a dream”. Nota-se,
26
Crise financeira global gerada pela falência de alguns bancos norte-americanos devido ao não pagamento de
empréstimos por seus credores.
76
porém, a adequação do discurso: do “eu” de Luther King ao “nós” de Obama. O slogan de
campanha de Obama foi o centro discursivo de sua trajetória na busca pela presidência.
Figura 1: Edifício em Kansas City
Fonte: www.flickr.com/photos/barackobamadotcom/2955890187; acesso em 4 de dezembro de 2008.
O “sim, nós podemos” é importante uma vez que Obama busca derrubar o partido
que está no poder, impedindo sua continuidade a frente do país. Desse modo a frase assume
um sentido revolucionário, de mudança política. Basta perceber que as pesquisas apontavam a
baixa popularidade de Bush para imaginar o poder das palavras que buscavam a mudança.
Podemos imaginar a força de uma mensagem de esperança que afirmava que sim, as pessoas
podiam mudar a situação em que seu país se encontrava. O espírito liberal americano, calcado
na livre iniciativa, é evocado de forma extremamente eficaz pelo slogan de Obama.
Inúmeras relações são possíveis entre o slogan de Obama e outras frases de efeito
utilizadas em outras épocas. Na Califórnia, por exemplo, na década de 1970 houve um
movimento social chamado “La Causa”, que se utilizou de um grito de guerra muito parecido
com o “yes we can”. De acordo com Ramos (2008): “Yes, we can” es el eco de otro slogan
77
famoso en su día, el del movimiento de los braceros hispanos en California, de significado
muy parecido: “Juntos, podemos” (RAMOS, 2008, p.109)”.
Percebe-se facilmente a carga conceitual que o slogan de Obama carrega, quando
relacionado a esse fato da história americana. Sem dúvida essa conexão histórica, dentre as
milhares possíveis, aumenta sua importância, conferindo-lhe um caráter atemporal.
Por outro lado, o slogan utilizado pelo Partido Republicano “Country First”27
era
pouco expressivo na disputa eleitoral. O país não se encontrava em nenhuma disputa
internacional, apenas havia sofrido recentemente alguns escândalos de imigração ilegal
(OBAMA, 2007, p.160). Porém esse slogan revelava certo conservadorismo americano: em
plena era da internet, com as fronteiras nacionais cada vez mais tênues, assuntos como
imigração tendem a ocupar menos espaço na cabeça do eleitorado. Não se pode considerar
que esse seja um tema irrelevante na disputa presidencial. Porém, certamente não era o
principal, uma vez que o país atravessava uma crise econômica. Obama (2007) previa qual
seria a base da campanha republicana, anunciando seu argumento para combatê-la.
Segundo Obama (2007):
Com o escândalo recente em torno da imigração ilegal, por exemplo, o slogan
conservador de Pat Buchana “America First” (Os Estados Unidos em primeiro
lugar) pode vir a ser ressuscitado pelo partido e apresentar um desafio a
administração Bush e sua política de livre comércio (OBAMA, 2007, p.160).
O slogan foi exaustivamente repetido nos discursos do candidato. Geralmente usada
várias vezes seguidas, a frase “yes we can” fazia a plateia delirar, gritando com Obama suas
palavras de ordem. “We can change this country”28
; “yes we can argue and debate our
positions passionately”29
e “we can do this”30
foram algumas das sentenças faladas inúmeras
vezes pelo candidato. Em cada discurso de campanha, os redatores de Obama inseriam sua
frase de ordem. A palavra “can”31
tomou conta dos discursos do candidato.
27
O país em primeiro lugar.
28 Nós podemos mudar esse país.
29 Sim, nós podemos discutir e debater as nossas posições apaixonadamente.
30 Nós podemos fazer isso.
31 Verbo “poder” em inglês.
78
Figura 2: Discurso de Obama em Columbus, Ohio, em 02 de novembro de 2008
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 4 de novembro de 2008.
Figura 3: Discurso de Obama em Reno, Nevada, em 25 de outubro de 2008
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
O segundo slogan da campanha, tão utilizado quanto o primeiro, foi um
chamamento direto à mudança: “change, we can believe in32
”. Novamente o “nós” dá o
sentido de união, de coro. O “acreditar” está conectado com a esperança, valor expresso pela
campanha, também relacionado com a mudança, nesse caso, a mudança de governo.
“Mudança” é a palavra-chave da campanha, englobando desde a luta pelo governo até a luta
de cada cidadão contra a crise econômica. Essa palavra de forte carga emocional é
fundamental no discurso do candidato, uma vez que está ligada também as baixas taxas de
aprovação ao governo Bush nas pesquisas.
32
Mudança, nós podemos acreditar nela.
79
Figura 4: Change, we can believe in
Fonte: http://barnardcolumbiaiso.files.wordpress.com; acesso em 22 de maio de 2010.
A mudança foi o cerne da campanha de Obama. Quando afirma que o povo pode
acreditar na mudança, a campanha também tenta imprimir verossimilhança ao seu discurso.
Através de seu slogan a campanha diz ao eleitor que seu discurso não é vazio, que suas
proposições irão se realizar. Ou seja, se eleito, Obama realmente conduziria o país à mudança
desejada pelo eleitorado.
5.4.1.2 A assinatura visual
Como já citado neste estudo, as marcas políticas tem fundamental importância na
disputa eleitoral. Enquanto conjunto semiótico e semântico de valores e ideologias do
candidato, as marcas políticas têm como principal função transmitir esses valores ao
eleitorado. Na esfera semiótica essa função se expressa através da assinatura visual.
A assinatura visual de Obama trouxe uma nova proposta gráfica às campanhas
eleitorais americanas. Ao contrário das tradicionais faixas e estrelas, utilizadas
majoritariamente em cartazes retangulares, o Partido Democrata apresenta seu círculo: o sol.
Na assinatura visual de Obama, o sol nasce no horizonte dos Estados Unidos da América. As
faixas vermelhas e brancas, e o azul do contorno superior na marca fazem a conexão com a
80
bandeira americana. O vazio que se forma no centro da assinatura, além de lembrar a letra
“o”, inicial do nome do candidato, apresenta o sol que se ergue no horizonte.
A fonte serifada transmite a seriedade do candidato, uma vez que são mais indicadas
para documentos formais (MENDONÇA, 1992). O desenho da assinatura visual traz traços
marcantes e precisos, sem falhas ou distorções, mostrando a preocupação da equipe de design
com os detalhes gráficos da campanha.
A tentativa de fazer com que a assinatura traduzisse algum ideal culminou no
desenho do sol. Utilizado como símbolo de energia por diversas civilizações, o sol seria o
responsável por anunciar a mudança de Obama. O sol carregaria os valores da campanha.
A assinatura visual expressa graficamente a mensagem de esperança da campanha,
através do sol que nasce novo todos os dias, anunciando um novo tempo. A simbologia em
torno do sol é utilizada por Obama criando diversos significados: dar energia para as bases
eleitorais, fornecer luz para iluminar a política do país e simbolizar a mudança, proposta pelo
nascer do sol, que rompe as trevas trazendo seus raios de esperança.
De acordo com Rosa (2009) em seu Dicionário de Símbolos, o sol é um dos mais
importantes símbolos da história. Presente em diversas civilizações o sol representava o poder
divino, a justiça e a inteligência: “[...] pelas civilizações antigas é chamado de Luz, símbolo
da inteligência, do calor, do fogo primordial. Seu nascimento e ocaso diários simbolizam a
ressurreição. Símbolo da justiça (ROSA, 2009, p.106)”. Rosa (2009) ainda afirma que para os
cristãos, a figura de Jesus Cristo também é relacionada com o sol. Sua ligação com a
espiritualidade também é ressaltada pela autora “[...] simboliza a glória, espiritualidade,
iluminação (ROSA, 2009, p.107)”.
Figura 5: Assinatura visual da campanha de Obama
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
81
Figura 6: Assinaturas visuais políticas nas disputas presidenciais norte-americanas
Fonte: www.porcupinesfloat.com; acesso em 22 de maio de 2010.
É notável a diferença gráfica entre a assinatura visual de Obama e o padrão gráfico
utilizado em campanhas eleitorais nos Estados Unidos. A assinatura visual do candidato
democrata foge das linhas retas e dos retângulos, embora mantenha as tradicionais cores
vermelha e azul. Sol Sender, o criador da assinatura visual de Obama, em um vídeo de sua
82
empresa no YouTube, afirma que a composição da assinatura foi proposital, pois utilizar
formatos mais arrojados traria a ideia de mudança que o candidato desejava, mas manter as
cores da bandeira americana era importante para transmitir uma mensagem de patriotismo33
.
O sol de Obama permitiu, através de sua versatilidade gráfica, uma ampla utilização.
Agregando mais significado as peças gráficas, cada segmento da população importante para a
campanha ganhou um símbolo próprio, desenhado sobre os traços da marca de Obama.
Assim, a assinatura visual de Obama foi adaptada para representar diversos extratos da
população: crianças, latino-americanos, veteranos de guerra, mulheres, ambientalistas, etc.
Essa adaptabilidade é um dos principais vetores das atividades de marketing político, já
citadas neste estudo por Torquato (2002) como “ajustamento”. A versatilidade da marca
também se relaciona com os valores de homogeneidade e união propostos pela campanha.
Com a divisão da mensagem partidária em parcelas menores, direcionadas, cada segmento do
eleitorado foi valorizado.
Figura 7: Adaptações da assinatura visual de Obama
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
33
Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=etEP1Bhgui0; acesso em 10 de janeiro de 2009.
83
O uso do “for Obama”34
expressa o sentimento de união. Desse modo o candidato se
apropria desses grupos, colocando-os na linha de frente de sua campanha. Mais do que isso,
ele propicia que pessoas do mesmo círculo social, mulheres, por exemplo, ao utilizar um
grafismo próprio, possam se auto-organizar em núcleos independentes, o que de fato
aconteceu. Mais uma vez o espírito de liderança comunitária, dividindo a massa populacional
em partes menores, é utilizado na campanha.
Os estados norte-americanos também foram transformados graficamente em
defensores da causa democrata. As assinaturas visuais com os nomes de cada estado
buscavam a imagem da unidade estadual em torno do candidato, direcionando a mensagem
não mais à massa americana, mas ao povo de cada membro da federação. A ideia de respeitar
as diferenças, portanto, também é representada através das assinaturas visuais estaduais. Um
endereço diferente no site do candidato para eleitores de cada estado reforça esse
posicionamento.
Figura 8: Estados por Obama
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
Valorizar as pessoas seja individualmente ou através de seus grupos é fundamental
no processo de motivação. A valorização é um dos fatores que atendem a necessidade humana
34
Por Obama.
84
de estima, segundo a hierarquia concebida por Maslow, já citada neste estudo (LOPES, 1980).
Entendendo-se motivação como um processo cognitivo individual, a simples orientação dos
esforços de comunicação para segmentos menores do público total que se pretende alcançar
pode maximizar sua eficiência, pois se dirigem a um ambiente mais próximo do indivíduo (se
essa divisão for construída de acordo com as características desse público, sejam elas
demográficas ou comportamentais).
5.4.1.3 A internet
Um dos fatores centrais da campanha de Obama foi a utilização do empowerment. A
crença de que dar poder às pessoas, partilhando responsabilidades, poderia conduzir o
candidato democrata à vitória foi decisiva no resultado das eleições. É importante salientar
que, segundo Lopes (1980), um dos fatores motivadores é o sentimento individual de
autonomia. Ben Self (2009), estrategista da campanha digital de Obama, afirmou que a luta
pela presidência dos Estados Unidos da América “não foi uma campanha, foi uma
mobilização cívica digital” (SELF apud MARCONDES, 2009, p. 30).
Construir um movimento social de base, começando pelos cidadãos comuns até
chegar as mais altas esferas políticas sempre foi uma das ambições de Obama, desde seus
tempos de organizador comunitário. E a principal ferramenta escolhida para isso foi a
Internet.
O estrategista digital de Obama, em sua entrevista à Marcondes (2009) destacou a
importância do empowerment: “O que a campanha digital fez foi dar poder às comunidades,
para que elas desempenhassem seu papel de cidadania interativa e participativa” (SELF apud
MARCONDES, 2009, p. 31). Permitir que as pessoas construíssem a campanha junto com o
candidato foi um dos principais fatores diferenciais da campanha de 2008. Porém precisamos
entender que, as decisões estratégicas sempre eram tomadas pelos comitês oficiais
organizados pelo candidato.
O uso inovador do meio de comunicação mais dinâmico que existe foi um imenso
diferencial da campanha. Lembremos que apenas o número de usuários do Facebook havia
alcançado os 110 milhões. Afinal a internet permite o uso de áudio, vídeo, texto e imagem,
com atualizações em tempo real. E ainda permite a interação entre quem emite e quem remete
a mensagem. A internet é então a fala e o ouvido, o remédio e o termômetro. Self (2009)
85
ressaltou a importância do planejamento: “Não se trata de uma campanha política, mas de um
programa planejado de engajamento e relacionamento digital” (SELF apud MARCONDES,
2009, p. 30).
A ferramenta central da estratégia online de Obama foi seu site:
www.barackobama.com. Porém, ao contrário do objetivo tradicional das organizações (gerar
o maior número de acessos ao seu site) a equipe do Partido Democrata buscava a
disseminação das informações pela web. Ben Self (2009) afirma que:
Ali o internauta encontrava todas as ferramentas que precisava para criar sua própria
comunidade, organizar eventos, promover debates etc. Nosso objetivo primário
nunca foi gerar tráfego para o site. Ao contrário, era fazer com que as pessoas, uma
vez dotadas de nossas ferramentas digitais, nunca mais voltassem lá. Vital era que,
na internet ou em sua comunidade na vida física, real, elas replicassem nossa
mensagem, a mensagem de Obama. Foi assim que, a partir de um portal na web,
chegamos aonde todos os eleitores norte americanos, de fato, estavam (SELF apud
MARCONDES, 2009, p. 32).
O site foi concebido tendo como valor central a simplicidade. Bem construído
graficamente, os links disponíveis no site apresentavam fácil acesso ao internauta. Um link
denominado “please donate35
” encontrava destaque na página, lembrando um dos principais
objetivos do site: obter fundos para a campanha democrata através de doações de seus
eleitores.
Figura 9: www.barackobama.com
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
35
Doe por favor.
86
No site, além de acessar vídeos e textos da campanha, o usuário encontrava
conteúdos exclusivos de seu estado, ou grupo étnico. Nessas páginas da web se concretizava a
tática da campanha de valorizar a população através da estratificação. Produzir conteúdos
relevantes a pequenos grupos é de fundamental importância quando considera-se a
composição social americana segundo Sellers (1990). Para o autor o próprio sistema de
governo americano foi desenvolvido considerando as particularidades de cada estado da
federação, suas características, seus direitos e interesses.
Figura 10: Extratos sociais no site da campanha
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
Figura 11: Latinos for Obama
Fonte: www.barackobama.com/latinos; acesso em 26 de outubro de 2008.
87
O site de Obama dispunha dos mais variados tipos de conteúdo para o eleitorado. Um
álbum musical denominado “Yes we can songs”36
foi disponibilizado aos usuários do site.
Conteúdos exclusivos para utilização em aparelhos de telefone celular também eram
encontrados no site.
Figura 12: Yes we can songs
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
Figura 13: Obama Mobile
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
Para munir os usuários do site com conteúdo, diversos arquivos foram
disponibilizados para download. Cartazes, vídeos, fotos, imagens, e todas as versões da
36
Músicas sim nós podemos.
88
assinatura visual de Obama podiam ser acessadas facilmente. Os materiais poderiam ser
utilizados tanto dentro quanto fora da internet, o que transformava o site em uma poderosa
ferramenta de campanha, suprindo as bases com conteúdo relevante.
Figura 14: Downloads
Fonte: www.barackobama.com/downloads; acesso em 26 de outubro de 2008.
Em nenhum momento pode-se esquecer que uma das finalidades de um site de
campanha eleitoral nos Estados Unidos é a obtenção de fundos. Assim, além da área exclusiva
para doações, no site era possível encontrar uma loja de souvenires online. Bonés, canecas,
bottons, camisetas entre outros itens podiam ser adquiridos, e sua renda revertida na
campanha.
Figura 15: Obama Store
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
89
A ação mais inovadora da estratégia de internet da campanha foi a criação da
comunidade mybarackobama.com. No endereço virtual os usuários cadastrados tinham acesso
a ferramentas para utilização em outros sites de relacionamento, como Facebook e MySpace.
Na página além de suas informações pessoais, os usuários podiam interagir com outras
pessoas, estabelecendo uma rede de contatos. Essa interação era facilitada pelas comunidades
(agrupamentos de usuários) disponíveis. Desse modo formavam-se grandes grupos, fossem
eles baseados na localização geográfica, etnia ou comportamento. De acordo com Ben Self
(2009): “ali o internauta encontrava todas as ferramentas para criar a própria comunidade,
organizar eventos, promover debates, etc.” (SELF apud MARCONDES, 2009, p. 32). O
intuito era aproximar os eleitores, e facilitar sua organização voluntária para a campanha. Ben
Self (2009) afirma que o mais importante no mybarackobama.com era construir um
relacionamento entre Obama e seus eleitores:
Aos poucos você ganhará a confiança de seus eleitores. Entenda que, como em um
relacionamento amoroso, você não se casa no primeiro encontro. Um
relacionamento se constrói aos poucos. Assim como você não deixa de falar com sua
mulher no dia seguinte ao casamento. Não há interrupção no diálogo (SELF apud
MARCONDES, 2009, p. 32).
Figura 16: Página de cadastro da comunidade mybarackobama.com: simplicidade para o usuário
Fonte: www.barackobama.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
A presença do candidato se estendeu pelos sites americanos de relacionamento. Sites
de compartilhamento de imagens como o Flickr, de compartilhamento de vídeos como o
90
YouTube e de relacionamento pessoal como o Facebook contaram com páginas
personalizadas da campanha. Esses sites foram utilizados para disseminar as informações da
campanha ao maior número possível de internautas, através de atualizações constantes.
Faulk (2009) comenta algumas das ações utilizadas nos sites de relacionamento que
foram transferidas também para o portal oficial do candidato:
À la Facebook e outros sites de redes sociais, os membros do MyBo criaram as
próprias páginas e ingressaram em grupos afins, fornecendo as costumeiras
informações e fotos pessoais. Mas, além de compartilhar informações, esperava-se
que os membros do MyBo se comprometessem com as atividades de campanha com
seu grupo, como ligar para uma lista de pessoas fornecida pelo site. Também se
esperava que gerassem um “índice de atividade” em sua página, e relatassem os
resultados de seus esforços até o momento, além de criar uma página pessoal para
arrecadar fundos, que incluía sua meta monetária individual e uma mensagem a ser
enviada a amigos e familiares. A página de cada pessoa incluía um termômetro para
mostrar seu progresso em relação a essa meta e os visitantes da página também
podiam ver os resultados – uma forma nada sutil de pressão aos colegas (FAULK,
2009, p.64).
Figura 17: Página de Obama no YouTube
Fonte: www.youtube.com/obamachannel; acesso em 26 de outubro de 2008.
91
Figura 18: Página de Obama no Facebook
Fonte: www.facebook.com/obamaprofile; acesso em 26 de outubro de 2008.
Figura 19: Página de Obama no Flickr
Fonte: www.flickr.com; acesso em 26 de outubro de 2008.
Para o estrategista digital de Obama, Ben Self, o mais importante pilar da campanha
online foi o uso inteligente do e-mail. As mensagens geralmente carregavam o nome do
destinatário, e eram assinados pelo próprio candidato Barack Obama. O texto era escrito
quase que informalmente, para dar ao destinatário a sensação de individualidade. Assim o e-
mail não era mais uma mensagem inapropriada recebida diariamente, mas algo que dava a
impressão de ter sido escrito diretamente para o indivíduo que o recebia (SELF apud
MARCONDES, 2009).
92
Marcondes (2009) explica a diferença entre o envio tradicional de e-mails e a forma
utilizada pela campanha democrata em 2008:
Só que (e sempre há um “só que”) enquanto todos fazem e-mail marketing de forma
quase descuidada e burocrática, acreditando apenas nas ferramentas e sistemas de
gestão tecnológica, em programas prontos de disparos e análise de resultados, a BSD
elevou essa técnica a um estágio mais elevados de análise inteligente de
performance. Isso transformou pó em ouro (MARCONDES, 2009, p. 30).
Figura 20: E-mail recebido através do cadastro no site de Obama
Fonte: E-mail pessoal, acesso em 02 de setembro de 2009.
Um fato inusitado que colocou à prova a estratégia de internet da campanha foi o
surgimento da Obama Girl37
. Uma jovem veiculou na internet um clip musical38
onde se dizia
“apaixonada por Obama”. As imagens sugeriam uma sátira, porém a mensagem era
claramente de apoio à Obama. O vídeo e suas variações foram vistos na internet mais de 60
milhões de vezes.
37
Garota Obama.
38 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=wKsoXHYICqU; acesso em 15 de maio de 2009.
93
Mas a campanha não interferiu. Não houveram pedidos para que o vídeo fosse
retirado do ar; ao contrário, a situação foi conduzida com bom humor pela maioria da equipe
de campanha. Oficialmente não houve manifestação sobre o vídeo, o que prova a coerência da
campanha ao permitir que as pessoas a conduzissem como quisessem.
Faulk (2008) comenta o pensamento estratégico da equipe de Obama:
Obama ficou feliz com toda essa manipulação? Provavelmente, não. Mas estava
ocorrendo em espaço público, não em seu site, e ele entendeu o primeiro princípio
do marketing do mundo da rede social: se quiser que fama o trabalho para você, tem
de aceitar que eles estão no comando. Você está operando no espaço deles, e ele
decidem, a cada momento, se sua missão será um sucesso ou um fracasso. Para
maximizar as chances de um resultado positivo, Obama tentou criar um
relacionamento forte e constante com as comunidades on-line. Após ter conquistado
sua confiança, seriam mais propensos a dar boas vindas a ele e à sua mensagem
(FAULK, 2008, p.88).
Figura 21: Cenas do clip “Best of Obama Girl: Crush On Obama”
Fonte: http://www.youtube.com/watch?v=wKsoXHYICqU&feature=related, acesso em 02 de
setembro de 2009.
5.4.1.4 Televisão
Para a televisão o discurso da campanha adota uma maior agressividade. O esforço
persuasivo se baseia no combate direto ao governo. Os esforços são direcionados ao ataque à
94
McCain, construindo relações entre ele e o presidente George W. Bush. A imagem do senador
Obama é sempre exibida em contraste com a de John McCain.
Na televisão surge outro slogan de campanha: “The middle class first”39
. Em clara
oposição ao “Country First” republicano, a construção semântica democrata traz a classe
média (importante parcela da população, afetada pela crise econômica) ao debate eleitoral.
Obama se apropria da “defesa” da classe média, enquanto seu adversário trata pouco desse
assunto em seus pronunciamentos.
“More of the same”40
foi outra frase utilizada na comunicação televisiva de Obama
para referir-se a McCain. A intenção da equipe de Obama em aproximar McCain do
presidente Bush é evidente. A frase ganha força especial considerando a crise econômica e os
baixos índices de aprovação do governo dos Estados Unidos. A crise econômica é um dos
mais importantes temas da eleição, uma vez que, conforme já citado neste estudo, mais da
metade dos lares norte-americanos possuíam ações em bolsas de valores. Nesse sentido,
mostrar que John McCain apoiava a administração Bush durante 90% das votações no senado
foi outro poderoso argumento de Obama.
Figura 22: Cena do comercial de 30” intitulado “90 per cent”
Fonte: www.youtube.com; acesso em 22 de maio de 2010
39
A classe média em primeiro lugar.
40 Mais do mesmo.
95
A economia é tema de diversos comerciais da campanha de Obama. Os altos preços
dos combustíveis nos Estados Unidos, a crise econômica e o volume de recursos destinados a
financiar a guerra no Iraque eram responsabilidade de McCain e Bush nos comerciais de
televisão de Obama. Vale destacar que uma pesquisa já citada neste estudo afirmava que,
entre Hillary, Obama e McCain, o republicano era apontado como o candidato menos apto
para dirigir a economia. No vídeo intitulado “book tv” McCain é satirizado na capa de um
livro, simbolizando seu plano econômico. As páginas do livro mostram fotos e manchetes que
valorizam o grande tema da eleição presidencial de 2008. Nota-se que, ao buscar demonstrar
que McCain não pode combater a crise mundial, Obama tenta sugerir (no âmbito da
motivação) que o republicano não pode suprir as necessidades de segurança do eleitorado,
citadas neste estudo por Lopes (1980).
Figura 23: Três cenas do comercial de 30” intitulado “book tv”
Fonte: www.youtube.com; acesso em 22 de maio de 2010
96
Se Obama representava o novo e o moderno para o país, McCain deveria simbolizar
o velho e o ultrapassado. A campanha democrata então elaborou um comercial televisivo
mostrando que McCain chegara à Washington como congressista em 1982, e que muitas
coisas mudaram desde então. O comercial afirma que para McCain essas mudanças foram
irrelevantes, uma vez que ele não sabia usar um computador, tampouco mandar e-mails. As
citações exibidas no vídeo traziam suas fontes e datas, o que conferia maior credibilidade aos
ataques de Obama.
Figura 24: Quatro cenas do comercial de 30” intitulado “still”
Fonte: www.youtube.com; acesso em 22 de maio de 2010.
Quando Obama aparece em seus comerciais o discurso conciliador reaparece.
Quando não fala diretamente à população, os vídeos o exibem em contato com o eleitorado, e
seus discursos acompanhados de uma trilha sonora compõem o áudio. No comercial “Obama
Superbowl” o candidato aparece cumprimentando eleitores e discursando. Frases como “we
can end a war”41
e “we can change the world”42
efetuam a intersecção entre as cenas. Nota-se
aqui o esforço persuasivo em torno da liderança de Obama.
A promessa da campanha em torno da liderança do candidato democrata é tão forte
que utiliza argumentos supondo que os eleitores poderão mudar o mundo. Essas afirmações
41
Nós podemos acabar com a guerra.
42 Nós podemos mudar o mundo.
97
têm extrema relação com a teoria Y de Douglas McGregor, citada neste estudo por Lopes
(1980). Essa teoria diz que o líder deve estimular o liderado a reconhecer sua própria
capacidade e assumir responsabilidades. No caso desse comercial o indivíduo pode perceber
sua capacidade para mudar o mundo, e assumir junto ao candidato esse compromisso,
motivando-se ao voto.
Figura 25: Quatro cenas do comercial de 30” intitulado “Obama Superbowl”
Fonte: www.youtube.com; acesso em 22 de maio de 2010.
5.5 A militância: voluntariado e celebridades
A campanha de Barack Obama mobilizou milhões de voluntários durante o período
eleitoral em 2008. Cidadãos espalhados pelos Estados Unidos uniram-se pela causa
democrata, trabalhando com afinco pela mudança e pela esperança prometidas por Obama. A
campanha não apenas persuadiu o eleitorado, mas trouxe argumentos suficientemente fortes
para criar uma verdadeira força motivadora em cada indivíduo.
Obama trouxe em seu discurso diversos valores típicos do povo norte-americano, já
analisadas neste estudo: livre iniciativa, democracia, liberdade e uma liderança paternal
heróica, quase que divina. Os elementos constitutivos da comunicação do candidato
98
democrata possuíam uma unidade discursiva; praticamente todos os materiais da campanha,
impressos ou digitais traziam uma mensagem de mudança e de poder popular.
Para Cezar Busatto (2008) o candidato democrata além de conquistar vitórias em
estados tradicionalmente republicanos, notabilizou-se pela arrecadação de fundos:
[...] Obama conseguiu tecer uma imensa rede social de 35 mil grupos de apoiadores
voluntários; consolidou a vitória eleitoral em estados tradicionalmente democratas;
viabilizou a vitória em vários estados até então dominados pelos adversários
republicanos; levou para a campanha milhões de novos eleitores que normalmente
não compareciam às urnas; e possibilitou inaugurar uma forma inédita, altamente
eficaz e transparente de financiamento da política, através de pequenas contribuições
voluntárias, capaz de gerar um volume de recursos duas vezes maior do que as
campanhas presidenciais feitas até hoje nos Estados Unidos (BUSATTO, 2008,
p.13).
O engajamento do voluntariado foi talvez a maior novidade do processo eleitoral
norte-americano em 2008. Considerando que apenas 5% dos americanos desempenham
alguma atividade voluntária (BUSATTO, 2008), é interessante a percepção da força do
movimento em torno de Obama. Os Estados Unidos viveram uma campanha sem precedentes
em sua história, onde um sentimento de mudança social e de avanço nacional dominou a
disputa, aliado a temas práticos como a economia. A necessidade de prover a motivação da
base eleitoral já citada neste estudo por Mendonça (2001) não é algo novo no cenário político.
Porém a forma como foi alcançada na campanha de Obama (através da auto-organização
voluntária) e a proporção que tomou foram fatos inéditos na história das campanhas eleitorais.
O comitê central da campanha de Obama permitiu que o voluntariado se auto-
organizasse, apenas disponibilizando informações e ferramentas para facilitar seu trabalho. E
não poderia ser diferente, levando em consideração a trajetória comunitária do candidato.
Grupos como equipes de vizinhos e comunidades formadas pelo site oficial de Obama
compunham a base do voluntariado. Os eleitores foram estimulados a formar suas próprias
equipes de voluntariado. Para isso as pessoas recrutavam os vizinhos de sua rua, de seu bairro.
Desse modo a mensagem da campanha poderia ser disseminada em progressão geométrica.
Busatto (2008) conta como a vizinhança era organizada a partir de sites criados por
grupos de voluntários e coordenadores da campanha:
99
Um site, no caso da região do Vale do Silício onde morei, foi o
http://www.sv4obama.com/, que fornecia a relação dos vizinhos e um conjunto de
orientações para o trabalho com a vizinhança. Banco de telefones Para essa atividade
de fazer ligações telefônicas para vizinhos, amigos e outras pessoas, além do roteiro
de chamada (call script), era sugerido consultar o site http:// www.votebuilder.com/
e algumas páginas mais importantes do site principal da campanha
http://www.barackobama.com/, como foi o caso dos temas (issues), que
apresentavam as posições do candidato e a resposta às acusações (fight the smears)
(BUSATTO, 2008, p.59).
Cada estado representava um cenário único na disputa eleitoral. Estados
tradicionalmente republicanos como Nevada e Colorado requeriam atenção especial da equipe
democrata. Para fortalecer as bases eleitorais nesses estados, voluntários eram especialmente
deslocados de estados vizinhos. “No caso da Califórnia, as pessoas eram principalmente
deslocadas para ajudar no estado de Nevada” (BUSATTO, 2008, p. 59). Os voluntários eram
preparados para essas situações pelo programa de treinamento da campanha, denominado
Camp Obama43
.
Outra forma comum de organização do voluntariado era a participação em eventos.
O site oficial de Obama continha uma página denominada “find an event”44
, onde o internauta
podia encontrar eventos de campanha na região onde se encontrava (BUSATTO, 2008, p.60).
Muitas vezes os eventos eram organizados pelo corpo de voluntariado da campanha, sem a
coordenação do comitê central de campanha.
Faulk (2009) comenta que os eventos também eram divulgados através de mensagens
de texto de telefonia celular:
Em eventos de campanha públicos, muito antes de o candidato aparecer, os
assessores apelavam à multidão para usar seus celulares e smatphones e ligar ou
mandar uma mensagem de texto para todos os seus conhecidos para que viessem. Os
simpatizantes de Obama recebiam um fluxo contínuo de texto e correio de voz da
campanha, de press releases à divulgação de eventos e campanhas locais. A maior
promoção de mensagem de texto da campanha foi a oferta de Obama de contar para
as pessoas que compartilharam o número de seu celular sobre a opção de vice-
presidente antes de informá-la à mídia. Isso acrescentou substancialmente à lista
crescente de contatos de celulares que a campanha estava reunindo desde o
princípio, usando chamarizes como adesivos e ringtones grátis (FAULK, 2009,
p.92)
Os eventos ainda cumpriam outra função na campanha: arrecadação de fundos.
Nessas ocasiões os voluntários montavam barracas para vender os produtos oficias da
43
Acampamento Obama.
44 Encontre um evento.
100
campanha. De camisetas e bottons a livros e adesivos a máquina eleitoral de Obama se
esforçava para arrecadar o maior número possível de dólares. Nota-se a relação desse fato
com a teoria da “espiral do silêncio”45
.
Os voluntários recebiam um grande suporte de campanha para realizar com eficácia
o trabalho de divulgação das mensagens da campanha. Além das ferramentas virtuais
disponíveis, os comitês estaduais organizavam forças-tarefa de auxílio e treinamento aos
voluntários. Assim além de valorizar as pessoas que trabalhavam espontaneamente pela causa,
a campanha monitorava o envolvimento e a metodologia adotada pelos voluntários na busca
de votos para Obama.
De acordo com Busatto (2008) o suporte recebido pelos voluntários se estendia por
diversas áreas da campanha:
Entre elas incluíam-se equipe de tecnologia, que recebia colaboração de peritos em
tecnologia da informação; finanças, que buscava colaboradores para ajudar a
levantar recursos para a campanha; facilidades e materiais, que recebiam
contribuições para equipar os comitês, material de propaganda, meios de transporte,
etc.; e escritório, que buscava colaboradores para o atendimento voluntário nos
comitês de campanha (BUSATTO, 2008, p.60).
O sentimento de mudança foi a mola propulsora do eleitorado. Mas mais do que isso,
a valorização das pessoas através das atividades de apoio ao voluntariado, o feedback
recebido por eles por parte da organização da campanha e a situação econômica do país
foram, também, fatores determinantes para o forte engajamento do eleitorado pela causa de
Obama. O feedback, já citado neste estudo por Lopes (1980) é vital no processo de motivação.
Nesse contexto destaca-se também o treinamento concedido aos voluntários.
Segundo Busatto (2008) organizações não-governamentais como a MoveOn estavam
totalmente envolvidas na campanha. Essa ONG organizou um movimento voluntário
denominado Yes we Can. A organização treinava seus voluntários orientando-os a como
conduzir suas conversas com vizinhos e como iniciar abordagens telefônicas na busca de
votos por Obama. Nos Estados Unidos a prática da visita porta a porta é largamente utilizada,
bem como as ligações telefônicas aos eleitores, pedindo donativos ou apenas divulgando as
propostas de determinado candidato. Cerca de 4 milhões de pessoas espalhadas pelo território
norte-americano participaram do movimento Yes we can.
Busatto (2008) explica o trabalho de organizações como a MoveOn:
45
Ver capítulo 3.
101
[...] as pessoas passaram a ser treinadas em como dar um telefonema efetivo para
pessoas previamente identificadas em listas, convidando-as para engajar-se nas
atividades da campanha em suas comunidades. O contato pessoa a pessoa por
telefone, ou em visitas porta a porta, vizinho a vizinho, é considerado a forma mais
efetiva de envolvimento. Uma das principais páginas da campanha pela internet –
http://www.mybarackobama.com/ – lançou uma mobilização nacional vizinho a
vizinho, fornecendo para a pessoa interessada a relação dos vizinhos na sua própria
comunidade para fazer o contato, seja por telefone ou em visitas porta a porta
(BUSATTO, 2008, p. 68).
Essas ONGs eram responsáveis pelo monitoramento constante das atividades de
voluntariado. O fluxo de informações era controlado para que os envolvidos na campanha não
abordassem, acidentalmente, duas vezes a mesma pessoa ou família. Além de minimizar as
perdas de tempo, essa ação evitava aborrecimentos por parte dos eleitores.
Outro fator importante na eleição americana é a liberdade do voto. Por não haver a
obrigatoriedade do voto, as campanhas devem convencer o eleitor da eficiência das propostas
de seu candidato e persuadi-lo a dirigir-se a uma seção eleitoral para votar. Isso aumenta a
importância do voluntariado, pois ele foi um dos grandes responsáveis em reforçar o trabalho
de divulgação da campanha nos dias próximos a eleição, de modo a garantir a presença do
eleitorado. Busatto (2008) traz a fala de um voluntário democrata dias antes da eleição:
Durante46
este período visitávamos as casas já identificadas como possíveis
votantes de Obama para que comparecessem a votar com antecedência. Cada noite
levávamos nossa informação e uma equipe de voluntários com laptops atualizavam
as listas com os dados recebidos do escritório de votação e eliminavam os que já
haviam votado. Para o dia da votação, já mais de 50% de nossa base de dados
havia votado. Para o último dia, minha companheira e eu tínhamos uma lista de 50
pessoas, fizemos um primeiro roteiro às seis da manhã para deixar notícias na porta
das casas que pudessem lembrar as pessoas antes de ir trabalhar. Fizemos outra
passada às dez da manhã, a lista se atualizou às duas da tarde. Às quatro da tarde
fizemos mais uma passada, e quando terminamos, às seis, restaram cinco eleitores
que ainda não haviam se apresentado para votar. A eleição terminou às oito da
noite (BUSATTO, 2008, p.84).
O corpo de voluntários de Obama não foi constituído apenas por cidadãos norte-
americanos anônimos. Diversas celebridades uniram-se a causa democrata. Para aumentar sua
fama ou mostrar uma preocupação com a situação social e econômica do país (fosse essa
preocupação verdadeira ou não) diversos cantores, atrizes e personalidades uniram-se ao
voluntariado. Suas contribuições baseavam-se em apresentações beneficentes, depoimentos
para as mídias ou doação de materiais artísticos.
46
Em itálico no original.
102
Vídeos, músicas, fotos e textos foram doados ao Partido Democrata por celebridades
nas eleições de 2008. Na internet essas doações se multiplicavam pelas mãos dos voluntários
anônimos, que replicavam o conteúdo geometricamente. Os sites de compartilhamento de
conteúdo, como o YouTube, eram constantemente abastecidos com novos conteúdos da
campanha.
Uma das contribuições mais famosas da campanha foi o clip musical Yes we can. A
música, baseada em um dos discursos de Obama, era cantada no vídeo por diversos astros da
música dos Estados Unidos. Entre eles Will.i.am do grupo Black Eyed Peas e Nicole
Scherzinger do grupo Pussycat Dolls.
Figura 26: Quatro cenas do clip musical intitulado “Yes we can”
Fonte: www.youtube.com/watch?v=SsV2O4fCgjk; acesso em 22 de maio de 2010.
5.6 Obamania: o retrato da vitória
A campanha de Obama alcançou a vitória, tornando-o o 44º presidente dos Estados
Unidos da América com recorde histórico de votos. Primeiro negro a assumir o comando do
governo da maior potência econômica mundial, Barack Obama alcançou a admiração de
milhões de pessoas. Através de uma estrutura de campanha extremamente eficaz, Obama
103
conseguiu deixar a posição de candidato desconhecido em 2007 para se tornar um fenômeno
midiático em 2008.
Os resultados da campanha impressionam. Busatto (2008) apresenta alguns números
divulgados pelo jornal The Washington Post:
• a lista de emails de Barack Obama é formada por mais de 13 milhões de endereços
– e mais 5 milhões de apoiadores se reuniram em diversas redes de relacionamento;
• a assessoria do candidato enviou mais de sete mil diferentes mensagens ao longo
da campanha;
• o número de emails encaminhados superou a 1 bilhão;
• o número de pessoas que se inscreveram para receber mensagens de texto por
telefone chegou a 1 milhão;
• no dia da eleição, pelo menos 3 mensagens de texto foram enviadas a cada eleitor
inscrito no programa;
• os apoiadores de Obama receberam, em média, entre 5 e 20 mensagens por mês,
dependendo de onde viviam;
• no site http://www.mybarackobama.com/ ou no http://www.mybo.com/, a própria
rede de Obama, 2 milhões de perfis foram criados;
• foram escritas cerca de 400 mil postagens de blog;
• aproximadamente 3 milhões de chamadas telefônicas foram feitas apenas nos
últimos 4 dias de campanha, usando uma única plataforma de banco de telefones;
• mais de 5,4 milhões de usuários “clicaram” o botão “Eu votei”, no dia da eleição,
para avisar seus amigos do Facebook que eles haviam comparecido às urnas
(BUSATTO, 2008, p.8).
Está claro que, através das teorias de marketing político, a vitória de Obama seria
facilitada. A péssima aprovação do governo vigente mostrava uma eleição propícia à oposição
(ALMEIDA, 2008). A figura jovem e carismática de Obama em oposição ao experiente John
McCain conseguia estabelecer uma melhor relação de liderança com o eleitorado. A clareza
oposicionista de sua imagem também favorecia seu discurso, sempre coerente, a fixar-se com
mais força na mente do eleitorado (TORQUATO, 2002).
Obama conseguiu mais do que uma vitória política: conseguiu incutir no eleitorado o
sentimento genuíno de mudança social. A campanha não falou para o eleitorado, mas com o
eleitorado. As pessoas podiam assumir responsabilidades na campanha, tanto individualmente
quanto através de grupos ou organizações não-governamentais.
Uma das regras mais importantes do jogo da motivação esteve sempre presente: a
autonomia das pessoas foi respeitada. Elas podiam abastecer a internet com o conteúdo que
quisessem, abordar as pessoas e divulgar a campanha da forma que entendessem ser
conveniente. Nesse sentido o treinamento dedicado ao voluntariado foi importante, porém as
pessoas mantinham sua liberdade. Não apenas porque as pessoas são de fato livres para
tomarem as ações que julgarem corretas, mas porque a campanha de Obama entendeu de fato
que a liberdade é um valor arraigado na história americana.
104
Fundamental para a motivação, essa liberdade permitiu que as pessoas se
organizassem em torno da causa de Obama. Imbuídas de espírito patriótico, os cidadãos
comuns dos Estados Unidos conduziram a campanha nas ruas.
A campanha buscava constantemente o diálogo direto com o eleitor. Na tentativa de
diminuir a importância da mídia enquanto mediadora (talvez por algum tipo de receio de que
ela se inclinasse para outros candidatos) a campanha de Obama utilizou ações em mídias
interativas: sites na internet, mensagens de texto de telefonia celular e até mesmo patrocínio a
games online. Essas ações foram fundamentais para envolver o eleitorado, em especial o
público jovem, tradicionalmente com menor participação nas votações.
De acordo com Faulk (2009) a utilização de mídias interativas como mensagens de
texto foi fundamental para o sucesso da campanha:
Obama começou a usar mensagens de texto de forma substancial nas primárias. A
técnica fora usada nas eleições de 2006 com bons resultados. Um estudo creditava a
ela o aumento de 4% do comparecimento entre os jovens. O custo por voto era de
US$ 1,56, uma pechincha em comparação aos US$ 10 ou US$ 20 por voto de
abordagens tradicionais como caça aos votos de porta em porta e centrais
telefônicas. No dia da primária de New Hampshire, sua campanha enviou três
mensagens de texto para os simpatizantes, instigando-os a convencer seus amigos e
familiares a votar. Sua margem de vitória entre os eleitores de 18 a 24 anos foram
inéditos 40 pontos. Uma mensagem de texto típica em um estado no qual a votação
ocorreu cedo: “Registre-se para votar; faltam duas semanas e só leva 5 minutos”
(FAULK, 2009, p.91).
Esse diálogo direto foi uma das mais claras demonstrações da estratégia de Obama.
Conversar com o eleitor, permitindo que ele também falasse e adotasse ações com
independência foi desde cedo um dos mais importantes pilares da campanha. Através de
pesquisas e de seus voluntários a campanha ouvia o eleitorado. Os voluntários podiam
conversar entre si utilizando as ferramentas digitais disponíveis. Essas trocas de experiências
foram fundamentais para manter o voluntariado engajado na disputa eleitoral. E quem fazia
isso era o próprio eleitorado.
Certamente essa mobilização do voluntariado aumentou o raio de ação do candidato
Obama exponencialmente. Manifestou-se a teoria já citada da “espiral do silêncio”47
. Ao
perceber que Obama reúne em sua campanha pessoas motivadas que disseminavam suas
propostas, o eleitorado comum passa a acreditar em sua vitória contribuindo para ela. A não-
47
Ver capítulo 3.
105
obrigatoriedade do voto nos Estados Unidos obriga os partidos a mobilizarem suas bases de
forma muito eficaz, especialmente para alcançar os eleitores indecisos.
Obama estabelece assim um novo paradigma em campanhas eleitorais: engajar as
pessoas através da liberdade e da responsabilidade. Embora esses sejam dois valores inerentes
a cultura norte-americana, são também duas características humanas. Obama acreditou na
população na mesma medida em que a população acreditou nele. E isso fez toda a diferença.
106
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em 2008 os Estados Unidos presenciaram uma eleição incomum. O primeiro
presidente negro de sua história foi eleito através de uma campanha que transcendeu a disputa
eleitoral transformando-a em uma espécie de movimento social. A vitória eleitoral de Barack
Obama foi notável especialmente pelo engajamento que os eleitores dedicaram à sua
campanha.
De acordo com os teóricos do marketing político a eleição para Obama era facilitada
devido aos baixos índices de aprovação popular à administração Bush. Com o momento de
crise econômica vivido nos Estados Unidos, uma tentativa oposicionista de ascensão ao
governo detinha uma predisposição natural à vitória. Porém, Obama não teria conquistado o
engajamento de seus eleitores se não conduzisse sua campanha para isso.
Nesse sentido ele estabeleceu um novo paradigma eleitoral: motivar as pessoas
dando-lhes responsabilidades e liberdade de ação (utilizando-se da teoria do empowerment),
além de proporcionar o diálogo com o eleitorado dividindo-o em segmentos. Embora esses
pressupostos não sejam novos para o estudo do marketing, sua prática eficiente aplicada à
política inicia-se com Barack Obama. Aliado às práticas tradicionais de marketing político, as
duas grandes forças inovadoras de Obama alavancam o estudo da comunicação política.
A campanha de Obama foi construída verticalmente em sentido duplo. A cúpula
organizada da campanha emitia as mensagens ao eleitorado e orientava os esforços da
campanha. O eleitorado executava voluntariamente as diretrizes da cúpula e emitia o feedback
das atividades de campo, o que permitia a readequação da campanha, se necessário. Essa
construção dupla é fundamental dentro das campanhas eleitorais, pois por possuírem uma data
de término exigem rápida resposta dos comitês às mais diversas situações.
Através desse estudo notou-se a estreita relação entre o empowerment aplicado na
campanha de Obama e sua trajetória como líder comunitário. É provável que as ações
tomadas para compartilhar a campanha com o eleitorado apenas tiveram êxito porque
encontraram eco na figura do candidato.
A imagem de Obama agia como fator motivacional. Encarnando o líder carismático
de Weber, ele rebelava-se contra a ordem vigente oferecendo um novo caminho: a mudança.
Embora intangível, a proposição de “mudança” conquistou o coração do eleitorado.
Lembrando o líder patriarcal puritano, Obama aproximava-se do eleitorado através de suas
características pessoais únicas.
107
Já a compreensão da importância de cada segmento social expressa na campanha
inverte o pensamento massificado vigente na comunicação política. Desse modo a ideia
tradicional de mensagens direcionadas a toda população da nação é substituída pelo diálogo
com parcelas menores do eleitorado. Além de valorizar os segmentos de público a campanha
pode responder aos anseios de grupos sociais, dialogando diretamente com o eleitorado.
Percebe-se que no Brasil ainda vigora a comunicação aplicada às massas como
metodologia de campanha eleitoral, o que denota uma defasagem em nosso modelo. Uma vez
que a internet agora está se popularizando em nosso país, se os partidos políticos não
modernizarem sua comunicação certamente encontrarão dificuldades em se comunicar com os
eleitores, especialmente com os mais jovens.
A internet aparece pela primeira vez com força em uma campanha eleitoral. Utilizada
para prover esse diálogo direto entre o candidato e o eleitor, dispensa a mídia tradicional
como intermediária das mensagens entre partidos e eleitores. Dessa forma a internet
revolucionou a prática da comunicação política.
O principal meio para alcançar a motivação das bases eleitorais foi a internet. O uso
inteligente do e-mail, a disponibilidade de ferramentas digitais de divulgação e a possibilidade
das pessoas estabelecerem relacionamentos online foram fatores essenciais para o sucesso da
campanha de Obama. Em 2008 assistiu-se a primeira campanha que entendeu o
comportamento das pessoas na web, sinalizado por pesquisas desde 2006. Destaque para a
inteligência da campanha em não interferir nos acontecimentos na internet, como no caso
Obama Girl.
Porém a internet foi apenas um meio, uma ferramenta na busca da vitória eleitoral. O
fato realmente importante na vitória de Obama foi a motivação do eleitorado para se auto-
organizar através da internet. Essa motivação se deveu a diversos fatores, como a situação
econômica e social do país e os esforços de comunicação do candidato. Porém esses esforços
apenas alcançaram êxito porque compreenderam a composição cultural do povo norte-
americano, valorizando sua liberdade e livre iniciativa.
Assim a campanha presidencial do Partido Democrata em 2008 apresentou a
motivação como valor central. Permitir que as pessoas participassem da campanha com
liberdade impulsionou o alcance de suas propostas. Reservadas as proporções, com este
estudo notou-se que população possui um interesse por temas políticos, ao contrário do que se
imagina tradicionalmente. A abertura dos partidos à contribuição popular pode alavancar o
progresso social de uma nação. De certo modo, era isso que o yes we can queria dizer ao
eleitorado.
108
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ANEXOS