UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE ENGENHARIA MECÂNICA ENGENHARIA DE CONTROLE E AUTOMAÇÃO Centrais Hidrelétricas de Pequeno Porte e o Programa Brasileiro de PCHs Bruno Wilmer Fontes Lima Orientador: Arsênio Oswaldo Sevá Filho Departamento de Energia Faculdade de Engenharia Mecânica - UNICAMP Campinas 2009
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
FACULDADE DE ENGENHARIA MECÂNICA
ENGENHARIA DE CONTROLE E AUTOMAÇÃO
Centrais Hidrelétricas de Pequeno Porte e o Programa Brasileiro
de PCHs
Bruno Wilmer Fontes Lima
Orientador: Arsênio Oswaldo Sevá Filho
Departamento de Energia
Faculdade de Engenharia Mecânica - UNICAMP
Campinas
2009
Agradecimentos
Primeiramente gostaria de agradecer a meus pais, Francisco e Beatriz, pela educação,
apoio e carinho que fizeram com que conseguisse chegar aonde cheguei. Gostaria também de
agradecer aos meus irmãos, Érico, Tatiana e Juliana; avós, Francisco, Lise, Haydée e Bruno
(que infelizmente não tive o prazer de conhecer) e demais familiares.
Gostaria também de agradecer a todos meus amigos: os de infância, os de adolescência,
aos da minha turma de Engenharia de Controle e Automação, aos colegas de república e a
todos os outros com quem tive o prazer de conviver ao longo de minha vida.
Ao professor Sevá, cuja orientação e criticas tornaram este trabalho possível, e também
aos ex-colegas de trabalho: Juliano, Antônio e Randal, que muito me ensinaram sobre
geradores e PCHs.
Por fim, gostaria de agradecer ao poder superior, que chamamos de Deus.
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Resumo
LIMA, Bruno Wilmer Fontes. Centrais Hidrelétricas de Pequeno Porte e o Programa
Brasileiro de PCHs. Campinas: Faculdade de Engenharia Mecânica, Universidade Estadual
de Campinas, 2009. 82 pág. Dissertação (Trabalho de Graduação).
Este trabalho de graduação faz uma análise das centrais hidrelétricas de pequeno porte, hoje
em dia denominadas Pequenas Centrais Hidrelétricas. Inicialmente, é apresentado um breve
histórico do setor elétrico brasileiro, e de como as centrais hidrelétricas, tanto as de pequeno
como as de grande porte, foram essenciais para o seu desenvolvimento no Brasil. Também é
mostrado como funciona o processo de implantação de uma PCH, a obra civil, o maquinário
eletro-mecânico e os arranjos utilizados nestas usinas. Para a realização deste trabalho,
também foram feitas visitas técnicas a duas centrais hidrelétricas de pequeno porte: PCH
Salto Grande, em Campinas-SP, e PCH Mogi Guaçu, em Mogi Guaçu-SP. No capítulo 2 é
feito o relatório dessas visitas. Em seguida, foi feita uma explicação do que é uma PCH,
segundo a definição da ANEEL, assim como dos conceitos de Geração Distribuída, e uma
breve análise do PROINFA, programa do Ministério de Minas e Energia que visa aumentar a
participação das fontes alternativas de energia na matriz brasileira, e como ele afetou a
construção de novas PCHs no país. Também são apresentados alguns casos onde a construção
de novas PCHs causou ou está causando problemas junto à sociedade ou o ambiente e o
impacto negativo que essas usinas estão trazendo a essas comunidades. Por fim é apresentado
um panorama da matriz elétrica brasileira atual, e as projeções de crescimento, feitas pela
Empresa de Pesquisa Energética, bem como o as estimativas da participação das PCHs na
Tabela 1 - Usinas Contratadas pelo PROINFA (fonte MME, 2009)
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A participação da energia do PROINFA (MWh) no atendimento à totalidade do
mercado consumidor brasileiro (SIN) representa 0,78%, em 2006, 1,33 % em 2007 e em
2009, 3,59 % (MME, 2009).
De acordo com a Lei n.º 11.943, de 28 de maio de 2009, o prazo para o início de
funcionamento desses empreendimentos encerra em 30 de dezembro de 2010.
O PROINFA trazia diversos benefícios para quem quisesse investir nas fontes
contempladas pelo programa, como a compra assegurada da energia produzida por 20 anos,
contados a partir da entrada em operação, pela Eletrobrás. Além disso, o PROINFA
estabeleceu um piso ao valor pago pela energia, variando conforme a fonte utilizada, baseados
na tarifa média nacional de fornecimento ao consumidor final (TMF), que foi fixada em R$
167,17/MWh em março de 2004, conforme tabela abaixo:
Fonte Porcentagem Piso (R$/MWh)
PCH 70% R$ 117,02
Biomassa 50% R$ 83,58
Eólica 90% R$ 150,45 Tabela 2 - Pisos correspondentes às fontes contempladas pelo PROINFA (Fonte: MME, 2004)
Esses valores terão como referência os 12 meses que antecederam a sanção da Lei do
PROINFA, e serão reajustados pelo Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M) nas datas de
assinatura dos contratos com a Eletrobrás.
Para que uma pequena usina pudesse ser selecionada para participar da 1ª fase do
PROINFA, o produtor teria que ser qualificado como Produtor Independente Autônomo ou
como Produtor Independente Não Autônomo. O decreto nº 5.025 de 30 de março de 2004
define:
VII - Produtor Independente Autônomo - PIA: um produtor independente de energia
elétrica é considerado autônomo quando sua sociedade, não sendo ela própria concessionária
de qualquer espécie, não é controlada ou coligada de concessionária de serviço público ou de
uso de bem público de geração, transmissão ou distribuição de energia elétrica, nem de seus
controladores ou de outra sociedade controlada ou coligada com o controlador comum,
conforme o § 1o do art. 3o da Lei no 10.438, de 2002; e
VIII - Produtor Independente de Energia Elétrica - PIE: a pessoa jurídica ou empresas
reunidas em consórcio que recebam concessão ou autorização do poder concedente, para
produzir energia elétrica destinada ao comércio de toda ou parte da energia produzida, por sua
conta e risco, conforme o art. 11 da Lei no 9.074, de 7 de julho de 1995.
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Além disso, um produtor pode ser considerado como Produtor Independente Não
Autônomo, caso não se enquadre na categoria de Produtor Independente Autônomo.
O processo de seleção de projetos a ser contemplados pelo PROINFA, no caso das
PCHs, é detalhado a seguir, retirado do Guia de Habilitação PCH (MME, 2004):
1. Com base nas cartas-resposta manifestando a intenção do empreendedor de participar
do PROINFA e analisando a documentação entregue, a ELETROBRÁS definirá uma lista de
empreendedores habilitados, ordenada pelo critério de antigüidade da LI (data de emissão da
primeira LI), começando pelo empreendimento que tem a LI mais antiga até aquele que teve a
LI emitida mais recentemente. Esta lista deverá contemplar apenas Produtores Independentes
Autônomos;
2. Neste momento é realizado o somatório das potências dos empreendimentos dos
produtores Autônomos habilitados, verificando se este é superior aos 1.100 MW destinados à
fonte. Caso este valor seja superior à meta do PROINFA (1.100 MW), não ocorrerá a
contratação de produtores Não-Autônomos. Caso ele venha a ser menor que os 1.100 MW
destinados à fonte, será elaborada uma segunda lista, ordenada também segundo o critério de
antiguidade de LI, para os empreendimentos de Não Autônomos;
3. Inicia-se a seleção dos projetos na ordem da lista de Autônomos, separando aqueles
selecionados em novas listas por estado, sendo que, no momento em que um estado atingir
165 MW, não mais serão selecionados projetos daquela unidade da federação, até que todos
os estados contemplados nesta lista sejam atendidos ou que se atinja a meta de 1.100 MW;
4. Os empreendimentos implantados na divisa de duas ou mais unidades da federação
ficarão alocados, para o processo de regionalização, no estado onde estiver implantado o
edifício de geração da central (casa de força);
5. Durante a seleção dos empreendimentos, considerado o limite de 165 MW por
estado, caso a contratação de um empreendimento supere este limite, será considerado, nesta
etapa, apenas o montante em “MW” que complete os 165 MW;
6. Após a seleção definida nos itens (1), (2), (3) e (4), existindo saldo remanescente
(diferença entre os 1.100 MW e o total da potência dos empreendimentos já selecionados),
verificar-se-á em quais estados ainda existem projetos com LI não selecionados e qual a
participação percentual de cada estado no montante total de potência dos projetos restantes.
Calculada a participação, esta é aplicada ao saldo remanescente de potência, encontrando-se o
montante adicional a ser contratado em cada estado;
7. Novamente se inicia a seleção, considerando os projetos não-contemplados em ordem
de LI mais antiga, até o limite do montante adicional definido no item (6), contemplando,
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obrigatoriamente, os empreendimentos que foram os últimos elegíveis no item (5) e tiveram
sua capacidade contratada apenas parcialmente;
8. Após as duas rodadas de seleção, podem existir empreendimentos que foram
selecionados para contratação parcial. Nesses casos, o empreendedor afetado será convocado
pela ELETROBRÁS para decidir se aceita ter seu empreendimento contratado parcialmente.
Caso o empreendedor não aceite, seu projeto será removido e substituído pelo imediatamente
seguinte, segundo a ordem de antiguidade de LI;
9. Não existindo mais projetos de Autônomos nem tendo sido contratados os 1.100
MW, adotar-se-á o mesmo procedimento definido nos itens (1), (2), (3), (4), (5), (6) e (7) para
a seleção de projetos de Não Autônomos, seguindo a ordem da segunda lista. Para este caso,
será respeitado o limite de contratação de 275 MW, destinado por lei a este tipo de
empreendedor;
10. Depois de definida a lista final de projetos selecionados, a ELETROBRÁS
divulgará o resultado, dando prazo legal para que os interessados selecionados apresentem a
documentação necessária à assinatura do CCVE.
Entretanto, diversas dificuldades foram encontradas durante a execução do PROINFA,
incluindo atrasos nas obras, falta de projetos inscritos, principalmente no caso das fontes
eólicas, fazendo com que ele o prazo para entrada em operação dos empreendimentos fosse
adiada de dezembro de 2006 para dezembro de 2010. Alguns destes pontos são listados no
trabalho do MME, 2009:
1.Aporte de capital próprio pelo pequeno empreendedor: alteração da titularidade ou de
estrutura acionária dos projetos
2.Concentração de projetos em poucos empreendedores
3.Necessidade de revisão de alguns projetos, pelo novo sócio, visando minimizar riscos
4.Prazo incompatível (2005-2006) com a capacidade de atendimento pelo parque
industrial, em especial para a eólica
5.Novas exigências na renovação das Licenças Ambientais
6.Greves em órgãos ou serviços públicos tais como órgãos ambientais, portos etc.
7.Dificuldades na Declaração de Utilidade Pública para PCHs e direito de dispor terra
para a eólica
8.Entraves na conexão à rede, em especial na região Centro Oeste e Nordeste
9.Indisponibilidade de atendimento da demanda de aerogeradores de grande porte, pelo
mercado nacional, face ao aquecimento do mercado mundial e ao cumprimento do índice de
nacionalização
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10.Insuficiência do Parque Industrial instalado que não expandiu, não podendo portanto
atender a demanda de equipamentos gerada pelo PROINFA, face ao aquecimento do mercado
mundial e ao cumprimento do índice de nacionalização
11.Dificuldade dos agentes financeiros devido ao insipiente conhecimento quanto à
complexidade do negócio relativo à energia eólica
12.Dificuldades de fornecimento de equipamentos para PCHs
13.Aditamento dos contratos com prorrogação de prazos para 2008 e 2009
Uma segunda etapa do PROINFA ainda prevê que, após a meta de 3.300MW gerados a
partir das fontes contempladas pelo programa, essas fontes passem a atender 10% do consumo
anual de energia elétrica do país em 20 anos.
3.3 Geração Distribuída
A expressão Geração Distribuída (GD) é utilizada para designar projetos de geração de
pequeno porte, conectados de forma dispersa a rede elétrica e normalmente localizada
próximo ao usuário. Atualmente, a GD representa 3,8% de nossa capacidade instalada
(ROMAGNOLI, 2005 apud BERMANN 2007, p.104).
A Geração Distribuída é definida pelo artigo 14º do decreto nº 5.163 de 30 de julho de
2004 como:
“Art. 14. Para os fins deste Decreto, considera-se geração distribuída a produção de
energia elétrica proveniente de empreendimentos de agentes concessionários, permissionários
ou autorizados, incluindo aqueles tratados pelo art. 8º da Lei nº 9.074, de 1995, conectados
diretamente no sistema elétrico de distribuição do comprador, exceto aquela proveniente de
empreendimento:
I - hidrelétrico com capacidade instalada superior a 30 MW; e
II - termelétrico, inclusive de cogeração, com eficiência energética inferior a setenta e
cinco por cento, conforme regulação da ANEEL, a ser estabelecida até dezembro de 2004.
Parágrafo único. Os empreendimentos termelétricos que utilizem biomassa ou resíduos
de processo como combustível não estarão limitados ao percentual de eficiência energética
prevista no inciso II do caput.”
Diversas tecnologias de geração e armazenamento podem ser utilizadas na GD, como:
• Energia Eólica
• Centrais Hidrelétricas de Pequeno Porte
• Geradores a Diesel
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• Turbinas a Gás com baixa inércia
• Sistemas a Biomassa
• Sistemas Fotovoltaicos
• Sistemas Termosolares
Podendo atuar no sentido de:
• Aumentar a confiabilidade e a qualidade do suprimento, como no caso de
indústrias energeticamente intensivas, como siderúrgicas, que utilizam usinas
hidrelétricas de pequeno porte e pequenas termoelétricas para assegurar um suprimento
confiável de energia elétrica.
• Atender a demanda de ponta, ou seja, proporcionar um suprimento confiável nos
horários de pico de consumo.
• Funcionar como reserva operativa, sendo utilizado para cobrir possíveis déficits
contratuais, provenientes de erros nas projeções de carga5, podendo o empreendimento
de GD ser de propriedade da empresa distribuidora ou de um produtor independente.
• Compor esquemas de cogeração, como no caso de usinas de cana de açúcar, onde
o bagaço da cana é utilizado para gerar eletricidade para a usina.
• Atender áreas remotas com baixa densidade de carga, onde os custos da
construção de linhas de transmissão tornam-se inviáveis devido à baixa demanda por
energia dessas regiões.
Podemos classificar a Geração Distribuída como:
3.3.1 Geração Distribuída Isolada
Refere-se à geração distribuída que será operada de forma isolada ao sistema elétrico,
como em consumidores de zonas rurais e locais afastados, onde linhas de transmissão ainda
não foram instaladas, ou para consumo próprio, como no caso de sistemas de cogeração.
3.3.2 Geração Distribuída Interconectada
Refere-se à geração distribuída que está conectada ao sistema elétrico, operando em
regime paralelo com ele, podendo ser subdividida em:
5 “(...) as empresas Distribuidoras precisam elaborar projeções de carga para os próximos 5 anos, havendo
pequenas tolerâncias para erros” (BERMANN, 2007, p.98).
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Geração distribuída de concessionária, que é possuída e operada por uma concessionária
de energia
Geração distribuída do consumidor, que é possuída pelo consumidor-investidor e
operada ou pelo consumidor investidor ou pela concessionária.
Quando a GD é interconectada, é necessário que ela esteja em sincronismo e
paralelismo com a rede da concessionária local. Normalmente empreendimentos de GD
geram em uma tensão de até 13,8kV, dependendo da potencia, enquanto que as tensões
básicas de distribuição podem ser de 13,8kV, 69kV ou 138kV6, dependendo de cada região.
Portanto, muitas vezes uma subestação elevadora é necessária para interconectar a GD à rede.
3.4 Outros Incentivos as PCHs
Além dos benefícios descritos no PROINFA, as PCHs também possuem outros
mecanismos de incentivo como: a isenção de pagamento de Uso de Bem Público – UBP; a
isenção da obrigação de aplicar, anualmente, o montante de, no mínimo, 1% (um por cento)
de sua receita operacional líquida em pesquisa e desenvolvimento do setor elétrico; a isenção
relativa à compensação financeira, paga aos Estados e Municípios, pela utilização de recursos
hídricos; a possibilidade de comercializar de imediato a energia elétrica produzida com
consumidores cuja carga seja maior ou igual a 500 kW (REN ANEEL 247/2006); a
possibilidade de sub-rogação da CCC (Conta de Consumo de Combustíveis Fósseis) para
empreendimentos instalados nos sistemas isolados (REN ANEEL 245/1999); e a redução de,
no mínimo, 50% no pagamento dos encargos por uso das redes de transmissão e distribuição
(REN ANEEL 77/2004). (EPE, 2008a, p. 20)
6 Maiores tensões mostram-se vantajosas na distribuição, por diminuírem as perdas ocasionadas pelo
efeito joule.
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4. Problemas Sociais e Conseqüências Ambientais
Apesar de serem consideravelmente menores que as usinas hidrelétricas de grande
porte, a construção de uma PCH pode trazer considerável impacto à comunidade local e ao
meio ambiente. A inundação da área do reservatório pode atingir um grande número de
famílias, que deverão deixar suas terras, além de muitas vezes destruir áreas de mata
protegida, afetando também a fauna ribeirinha, cachoeiras e rios, que muitas vezes são
essenciais à alimentação, economia e ao turismo da região. A seguir serão mostrados alguns
casos em que a construção de uma PCH está sendo motivo de controvérsia, e disputa entre os
moradores e empreiteiros.
4.1 PCH Aiuruoca - MG
O primeiro caso a ser mostrado será o de Aiuruoca - MG7, onde a Empresa de
Investimento em Energias Renováveis S.A. (Ersa) pretende construir uma usina de 16MW em
plena área de preservação ambiental. Mesmo com pareceres contrários do instituto Chico
Mendes e de diversos órgãos ambientais do estado de Minas Gerais, a ANEEL autorizou o
empreendimento, que iria desapropriar uma área de 70 hectares da Área de Preservação
Ambiental (APA) da Mantiqueira.
A construção da usina, que está orçada em R$ 85 milhões e conta com o BNDES como
um de seus financiadores, requer a inundação de 16,54 ha, composta principalmente por mata
ciliar com importante função de conectividade para a fauna local, além de afetar as
corredeiras do rio Aiuruoca, usadas para pratica de rafting e canoagem, o que traria grande
prejuízo ao turismo local (GESTA, 2009).
Apesar do aval do Conselho de Política Ambiental (Copam-MG) para o inicio das
obras, a Superintendência de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SUPRAM) Sul
de Minas publicou o parecer técnico número 88451/2009 recomendando o
INDEFERIMENTO da Licença de Instalação pelo não cumprimento da maior parte das
condicionantes pela ERSA S. A e em concordância com a posição dos órgãos ambientais
IBAMA e IEF, respectivamente gestores da APA Federal da Serra da Mantiqueira e do
7 O Globo. Obra de hidrelétrica em Aiuruoca em Minas Gerais não autorizada. O Globo, Rio de
Janeiro, 03/08/2009. Matéria disponível em <http://oglobo.globo.com/economia/mat/2009/08/03/obra-de-
hidreletrica-em-aiuruoca-em-minas-gerais-nao-autorizada-757093541.asp> acessado em 22/11/09.
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Parque Estadual do Papagaio, que consideram a área de fundamental importância para a
conservação da biodiversidade e negaram, por fim, as anuências ao empreendimento.
Em 3 de agosto de 2009, 12 conselheiros do Copam votaram a favor da concessão da LI
contra 7 conselheiros que votaram pela recomendação de indeferimento feita pela SUPRAM.
Como um dos principais argumentos da SUPRAM pelo indeferimento refere-se à Lei da Mata
Atlântica (Lei 11.428 de 2006), que o projeto violaria, o Secretário de Meio Ambiente do
Estado de Minas Gerais, José Carlos Carvalho, avocou a si o processo para avaliação sobre a
legalidade da decisão dos 12 conselheiros que votaram a favor da concessão da licença. Até o
momento, a decisão quanto à legalidade da decisão do Copam ainda não foi anunciada.
4.2 O Movimento Cachoeiras Vivas – MG/SP
A possibilidade da construção de cinco usinas hidrelétricas de pequeno porte nos
municípios mineiros de Bueno Brandão, Tocos de Mogi e Munhoz, e no município paulista de
Socorro, levou a criação do Movimento Cachoeiras Vivas, reunindo prefeitos, vereadores,
empresários, ambientalistas e cidadãos interessados evitar a construção dessas usinas, que em
muito afetariam as belezas naturais da região, muito importantes para o turismo ecológico e
de aventura, uma das principais fontes de renda destes municípios.
Segundo o blog do Movimento Cachoeiras Vivas8, “A intenção de se implantar CGHs
(mini hidrelétricas) na bacia do Rio Peixe causa grandes preocupações diante das possíveis
conseqüências ambientais e sócio-econômicas dos empreendimentos, principalmente com o
comprometimento do potencial turístico da região.”
O movimento vem conseguindo importantes vitorias. Prefeitos e empresários da região
compareceram à audiência pública na comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável na Câmara dos Deputados, no dia 20 de outubro de 2009, para discutir a
construção das usinas e o conseqüente impacto ao meio ambiente e turismo da região,
conseguindo o apoio de deputados federais, e agendando uma nova reunião com o diretor
geral da ANEEL, Nelson Hubner9.
8 Sitio Eletrônico do Movimento Cachoeiras Vivas. Disponível em
<http://cachoeirasvivas.blogspot.com/> acessado em 30/11/2009. 9 Movimento Cachoeiras Vivas. Autoridades, empresários e ambientalistas vão à Brasília para
defender as cachoeiras da região, 28/10/2009. Disponível em
<http://cachoeirasvivas.blogspot.com/2009/10/autoridades-empresarios-e.html> acessado em 30/11/2009.
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O movimento também conta com forte apoio da sociedade local, tendo recolhido mais
de 12 mil assinaturas contra a construção das usinas e em favor da preservação das
cachoeiras.
No dia 1º de dezembro, o movimento conseguiu, por intermédio de quatro conselheiros
do Conselho Estadual de Política Ambiental (COPAM-MG), a aprovação do pedido de vistas
ao processo que permitia a instalação da Central Geradora Hidrelétrica (CGH) no rio
Cachoeirinha no bairro do Limoeiro, em Bueno Brandão. MG, barrando o parecer favorável à
licença ambiental para o empreendimento, que havia sido liberada no dia 16 de novembro.
Agora, cabe aos quatro conselheiros elaborar uma análise profunda sobre o caso e levá-lo à
próxima reunião, prevista para fevereiro de 2010, com argumentos que possam impedir a
implantação da usina na cachoeira.
4.3 Bacia do Rio Juruena – MT
O problema com as PCHs que estão sendo construídas na bacia do rio Jurema, no Mato
Grosso foi retratado na edição nº 19 de fevereiro de 2009 da revista Retrato do Brasil. Abaixo
segue abaixo um resumo do conflito, que está envolvendo os consórcios que estão
construindo as usinas e as comunidades indígenas que estão sendo afetadas por elas.
O grupo Maggi, maior produtor e exportador de soja do País, interessado em aproveitar
uma nova oportunidade de negócios abriu um novo ramo do grupo, a Maggi Energia.
Individualmente ou em consórcio com outras empresas, o grupo Maggi está desenvolvendo
projetos de 10 PCHs e duas hidrelétricas maiores ao longo de 110 quilômetros do Alto
Juruena (a aproximadamente 700 quilômetros de Cuiabá), que somadas, devem gerar 276,7
MW. As empresas associadas no consórcio Juruena (que inclui o grupo Maggi) conseguiram,
em 2002, autorização para explorar este potencial energético.
As licenças foram solicitadas em outubro e concedidas com muita prontidão em
dezembro, num momento muito particular: Blairo Maggi (principal sócio do grupo e
governador do estado desde 2003) estava no auge de seu prestígio, acabara de ser eleito e o
governo FHC, do qual era aliado, estava nos seus últimos dias. Oito das licenças pedidas
foram concedidas.
Uma alteração na legislação ambiental do Mato Grosso auxiliou a Maggi na obtenção
dessas licenças. Até o ano 2000, a legislação ambiental do MT seguia a Resolução nº 1 do
Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), de 1986, que determina que, para obras
de usinas hidrelétricas acima de 10 MW, são necessários o Estudo de Impacto Ambiental
(EIA), o Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) e a realização de audiências públicas para
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consultar os vários setores da sociedade. Em 2000, um decreto do governador Dante de
Oliveira (PSDB) alterou a lei ambiental do estado, estabelecendo que somente seria necessária
a elaboração do EIA e do RIMA e a audiência pública para projetos de hidrelétricas com
capacidade a partir de 30 MW. Desde então, basta aos empreendedores interessados elaborar
um diagnóstico ambiental e apresentá-lo à Secretaria de Meio Ambiente (SEMA-MT).
Havendo essa aprovação ambiental, obtém-se a licença prévia, que será apresentada à ANEEL
com um estudo de viabilidade técnica. Sendo aprovado pela agência federal, o processo vai
para o Ministério de Minas e Energia, para aprovação final.
As licenças foram concedidas sem que a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) fosse
ouvida e sem que as inúmeras comunidades indígenas da região fossem informadas.
Surpreendidos com o início das obras, grupos indígenas, como os enáuenê-nauê, com medo
de ficarem sem peixe devido à construção das usinas, protestaram. Essa série de
empreendimentos fará com que, em 110 quilômetros de rio, o lago de uma usina praticamente
encoste-se ao da outra, transformando o rio com ambientes encachoeirados em uma série de
grandes lagos, ameaçando a existência das espécies de peixes que precisam subir a correnteza
para se reproduzir.
O Ministério Público Federal (MPF) de Mato Grosso foi então à Justiça, acusando o
empreendimento de ilegalidade. Em abril de 2008 o Tribunal Regional Federal (TRF) aceitou
o pedido do MPF e determinou que “os empreendedores se abstenham de promover a
construção das usinas até a realização do estudo de impacto ambiental e sua análise pelo
IBAMA”, referindo-se às cinco PCHs que já estavam em construção – Cidezal, Sapezal,
Parecis, Rondon e Telegráfica (todas elas obras beneficiadas pelo PROINFA). As obras
chegaram a ser paralisadas, mas a medida acabou cassada por liminar do ministro Gilmar
Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Em junho, as obras foram
retomadas.
No início de julho, representantes da FUNAI e da Empresa de Pesquisa Energética
(EPE) promoveram uma reunião com as comunidades dos índios ricbactas, menquis,
nhambiquaras, parecis e enáuenês-nauês, que apresentaram um documento conjunto em que
requeriam, entre outras reinvidicações, um trabalho de pesquisa mais aprofundado, que os
informasse sobre todas as conseqüências do impacto ambiental.
Em setembro, a FUNAI liberou um parecer apontando irregularidades nos estudos
apresentados. O parecer técnico da Coordenação de Patrimônio Indígena e Meio Ambiente
(CGPIMA) da fundação afirma que o principal estudo que permitiu o licenciamento do
complexo de usinas do rio Juruena (a Avaliação Ambiental Integrada, AAI, elaborado pelos
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próprios empreendedores) é contraditório, incompleto e não permite estimar os reais impactos
das obras no meio ambiente e sobre os índios. Por isso, recomenda que o processo seja
suspenso enquanto não forem feitos os estudos de impacto ambiental detalhado.
No início de outubro, houve outra reunião com os representantes das comunidades
indígenas interessadas, novamente sem sinais de um acordo definitivo. Poucos dias depois,
em 11 de outubro, os enáuenês-nauês, agiram, destruindo os equipamentos da PCH
Telegráfica, com prejuízos na ordem de 1 milhão de reais. “Na verdade, o que os deixou
indignados foi terem entrado numa reunião para discutir sobre cinco PCHs em construção e
assistirem a uma apresentação da EPE, informando que não são cinco, mas 11 as usinas
projetadas para o Alto Juruena. E mais: sobem a 83 os projetos de PCHs na bacia do rio.
Ficou evidente para eles que estavam sendo ludibriados.” (AZEVEDO, 2009)
Em 23 de outubro, em reunião com Mário Lúcio Avelar, procurador da República em
Mato Grosso, um grupo de lideranças dos enáuenês-nauês discutiu a proposta de uma
moratória para impedir o licenciamento de novos projetos de aproveitamento hidrelétrico,
exigindo a realização prévia de uma avaliação dos impactos que o conjunto de barragens pode
causar em toda a bacia do Juruena. Para que isso ocorresse, porém, seria necessária a
assinatura de um acordo entre Ministério Público, FUNAI, indígenas e SEMA-MT.
Esse acordo foi tentado em seguida. Os enáuenês-nauês foram convidados para uma
reunião em Brasília, que aconteceu no início de novembro. Nessa reunião, os índios
conseguiram a assinatura de vários membros do governo em um documento no qual os órgãos
públicos se comprometeram a negociar a paralisação das obras e a fazer novos estudos
ambientais antes que qualquer projeto seja executado. Firmaram o documento representantes
da ANEEL, da EPE, da SEMA-MT, do governo de Mato Grosso e da própria FUNAI.
Entretanto o acordo passou a ser desconsiderado, sob o argumento de que foi obtido
com intimidação pelos indígenas, que segundo relatos, compareceram armados às reuniões.
As obras não foram paralisadas, e o consórcio liderado pela Maggi anunciou que vai contratar
uma empresa de segurança para proteger suas instalações de novas ações dos indígenas.
4.4 Bacia do Rio Doce – MG
Rothman (2008) retrata em seu livro, Vidas Alagadas, o caso de cinco projetos usinas
hidrelétricas, sendo três de pequeno porte, que seriam construídas na bacia do Rio Doce, na
Zona da Mata Mineira, e os conflitos que ocorreram entre a população atingida por estas
barragens e os empreiteiros. Será mostrado a seguir o caso das três usinas de pequeno porte,
todas elas empreendimentos da Companhia Força e Luz Cataguazes Leopoldina.
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Projeto UHE Emboque
O projeto UHE Emboque, localizado no Rio Matipó, nos municípios de Raul Soares e
Abre Campo. O empreendimento, de 18MW, inundará uma área de 2,95km2, atingindo
diretamente 93 famílias.
Em 1995 a Cataguazes Leopoldina solicitou a Licença Prévia do empreendimento. A
comunidade atingida, mal informada e desorganizada, perdeu o prazo para solicitar uma
audiência pública. No final deste ano, líderes comunitários pediram assistência à Comissão
Pastoral da Terra de Minas Gerais (CPT-MG), que prestou assistência à organização de uma
associação dos atingidos pela barragem.
Entretanto, alguns dos maiores proprietários de terras que seriam atingidos preferiram
negociar individualmente o valor das indenizações com a empreiteira. Dessa forma, o
movimento perdeu força, e a Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) aprovou o
Estudo de Impacto Ambiental e outorgou as Licenças Prévias e de Instalação. Porém,
Rothman (2008) diz: “Segundo técnicos da FEAM e alguns Padres, vários problemas
humanos e ambientais relativos à barragem permaneciam pendentes no final de 2000”.
Hoje em dia, a usina está em operação, com 21,6MW outorgados, com o nome de Usina
João Camilo Penna10
Projeto UHE Cachoeira da Providencia
Localizada no Rio Casca, nos município Pedra do Anta, Canaã e Jequeri, possuiria uma
potencia de 12MW e seu reservatório, de 4,5km2, afetaria 140 famílias, em sua maioria de
pequenos produtores rurais.
Diferentemente do caso da UHE Emboque, desta vez a comunidade estava mais
organizada, e com a ajuda de professores da Universidade Federal de Viçosa e membros da
CPT-MG, solicitaram uma audiência pública, em maio de 1996, onde a população atingida foi
amplamente representada, e deficiências grosseiras no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e
Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) foram apontadas.
Em junho de 1997, mais de 50 pessoas que seriam atingidas viajaram à Belo Horizonte,
e conseguiram participar da reunião do Conselho de Política Ambiental (COPAM), onde