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APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA: UM CONCEITO SUBJACENTE1
A aprendizagem significativa como um conceito subjacente a
subsunores, esquemas de assimilao, internalizao de instrumentos e
signos, construtos pessoais e modelos mentais, significados
compartilhados e integrao construtiva de pensamentos, sentimentos e
aes
O conhecimento humano construdo; a aprendizagem significativa
subjaz essa construo. (J.D. Novak)
Introduo No contexto educativo, hoje quase no se fala mais em
estmulo, resposta, reforo positivo, objetivos operacionais, instruo
programada e tecnologia educacional. Estes conceitos fazem parte do
discurso usado em uma poca na qual a influncia comportamentalista
na educao estava no auge e transparecia explicitamente nas
estratgias de ensino e nos materiais educativos. Nessa poca, o
ensino e a aprendizagem eram enfocados em termos de estmulos,
respostas e reforos, no de significados. Atualmente as palavras de
ordem so aprendizagem significativa, mudana conceitual e
construtivismo. Um bom ensino deve ser construtivista, promover a
mudana conceitual e facilitar a aprendizagem significativa. provvel
que a prtica docente ainda tenha muito do behaviorismo, mas o
discurso cognitivista/construtivista/significativo. Quer dizer,
pode no ter havido, ainda, uma verdadeira mudana conceitual nesse
sentido, mas parece que se est caminhando em direo a ela. Em outros
trabalhos, discuti a questo dos significados errneos a respeito do
construtivismo (Moreira, 1993a) e fiz uma anlise crtica dos
principais modelos atuais de mudana conceitual (Moreira, 1994).
Neste, enfocarei apenas o conceito de aprendizagem significativa e
tentarei argumentar que este conceito, embora proposto
originalmente na teoria de aprendizagem de David Ausubel (1963,
1968), compatvel com outras teorias construtivistas e subjacente a
elas. Neste sentido, seria, hoje, um conceito supra-terico.
Contudo, argumentarei tambm que, do ponto de vista instrucional, o
conceito de aprendizagem significativa mais til na viso original de
Ausubel (1968) e, mais tarde, de Novak e Gowin (1984, 1988,
1996).
Aprendizagem significativa segundo Ausubel Aprendizagem
significativa o processo atravs do qual uma nova informao (um novo
conhecimento) se relaciona de maneira no arbitrria e substantiva
(no-literal) estrutura cognitiva do aprendiz. no curso da
aprendizagem significativa que o significado lgico do material de
aprendizagem se transforma em significado psicolgico para o
sujeito. Para Ausubel (1963, p. 58), a aprendizagem significativa o
mecanismo humano, por 1 Em Moreira, M.A., Caballero, M.C. e
Rodrguez, M.L. (orgs.) (1997). Actas del Encuentro Internacional
sobre el Aprendizaje Significativo. Burgos, Espaa. pp. 19-44.
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excelncia, para adquirir e armazenar a vasta quantidade de idias
e informaes representadas em qualquer campo de conhecimento.
No-arbitrariedade e substantividade so as caractersticas bsicas da
aprendizagem significativa. No-arbitrariedade quer dizer que o
material potencialmente significativo se relaciona de maneira
no-arbitrria com o conhecimento j existente na estrutura cognitiva
do aprendiz. Ou seja, o relacionamento no com qualquer aspecto da
estrutura cognitiva, mas sim com conhecimentos especificamente
relevantes, os quais Ausubel chama subsunores. O conhecimento prvio
serve de matriz ideacional e organizacional para a incorporao,
compreenso e fixao de novos conhecimentos quando estes se ancoram
em conhecimentos especificamente relevantes (subsunores)
preexistentes na estrutura cognitiva. Novas idias, conceitos,
proposies, podem ser aprendidos significativamente ( e retidos) na
medida em que outras idias, conceitos, proposies, especificamente
relevantes e inclusivos estejam adequadamente claros e disponveis
na estrutura cognitiva do sujeito e funcionem como pontos de
ancoragem aos primeiros. Substantividade significa que o que
incorporado estrutura cognitiva a substncia do novo conhecimento,
das novas idias, no as palavras precisas usadas para express- las.
O mesmo conceito ou a mesma proposio podem ser expressos de
diferentes maneiras, atravs de distintos signos ou grupos de
signos, equivalentes em termos de significados. Assim, uma
aprendizagem significativa no pode depender do uso exclusivo de
determinados signos em particular (op. cit. p. 41). A essncia do
processo da aprendizagem significativa est, portanto, no
relacionamento no-arbitrrio e substantivo de idias simbolicamente
expressas a algum aspecto relevante da estrutura de conhecimento do
sujeito, isto , a algum conceito ou proposio que j lhe
significativo e adequado para interagir com a nova informao. desta
interao que emergem, para o aprendiz, os significados dos materiais
potencialmente significativos (ou seja, suficientemente no
arbitrrios e relacionveis de maneira no-arbitrria e substantiva a
sua estrutura cognitiva). tambm nesta interao que o conhecimento
prvio se modifica pela aquisio de novos significados. Fica, ento,
claro que na perspectiva ausubeliana, o conhecimento prvio (a
estrutura cognitiva do aprendiz) a varivel crucial para a
aprendizagem significativa. Quando o materia l de aprendizagem
relacionvel estrutura cognitiva somente de maneira arbitrria e
literal que no resulta na aquisio de significados para o sujeito, a
aprendizagem dita mecnica ou automtica. A diferena bsica entre
aprendizagem significativa e aprendizagem mecnica est na
relacionabilidade estrutura cognitiva: no arbitrria e substantiva
versus arbitrria e literal (ibid.). No se trata, pois, de uma
dicotomia, mas de um contnuo no qual elas ocupam os extremos. O
tipo mais bsico de aprendizagem significativa a aprendizagem do
significado de smbolos individuais (tipicamente palavras) ou
aprendizagem do que eles representam. Ausubel denomina de
aprendizagem representacional este tipo de aprendizagem
significativa (op. cit. p. 42). A aprendizagem de conceitos, ou
aprendizagem conceitual, um caso especial, e muito importante, de
aprendizagem representacional, pois conceitos tambm so
representados por smbolos individuais. Porm, neste caso so
representaes
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genricas ou categoriais. preciso distinguir entre aprender o que
significa a palavra-conceito, ou seja, aprender qual conceito est
representado por uma dada palavra e aprender o significado do
conceito (op. cit. p. 44). A aprendizagem proposicional, por sua
vez, se refere aos significados de idias expressas por grupos de
palavras (geralmente representando conceitos) combinadas em
proposies ou sentenas. Segundo Ausubel, a estrutura cognitiva tende
a organizar-se hierarquicamente em termos de nvel de abstrao,
generalidade e inclusividade de seus contedos. Conseqentemente, a
emergncia de significados para os materiais de aprendizagem
tipicamente reflete uma relao de subordinao estrutura cognitiva.
Conceitos e proposies potencialmente significativos ficam
subordinados ou, na linguagem de Ausubel (op. cit. p. 52), so
subsumidos sob idias mais abstratas, gerais e inclusivas (os
subsunores). Este tipo de aprendizagem denominado aprendizagem
significativa subordinada. o tipo mais comum. Se o novo material
apenas corroborante ou diretamente derivvel de algum conceito ou
proposio j existente, com estabilidade e inclusividade, na
estrutura cognitiva, a aprendizagem subordinada dita derivativa.
Quando o novo material uma extenso, elaborao, modificao ou
quantificao de conceitos ou proposies previamente aprendidos
significativamente, a aprendizagem subordinada considerada
correlativa (ibid.). O novo material de aprendizagem guarda uma
relao de superordenao estrutura cognitiva quando o sujeito aprende
um novo conceito ou proposio mais abrangente que possa a
subordinar, ou subsumir, conceitos ou proposies j existentes na sua
estrutura de conhecimento. Este tipo de aprendizagem, bem menos
comum do que a subordinada, chamada de aprendizagem superordenada.
muito importante na formao de conceitos e na unificao e reconciliao
integradora de proposies aparentemente no relacionadas ou
conflitivas (op. cit. p. 53). Ausubel cita ainda o caso da
aprendizagem de conceitos ou proposies que no so subordinados nem
superordenados em relao a algum conceito ou proposio, em
particular, j existente na estrutura cognitiva. No so subordinveis
nem so capazes de subordinar algum conceito ou proposio j
estabelecido na estrutura cognitiva do aprendiz. A este tipo de
aprendizagem ele d o nome de aprendizagem significativa combinatria
(ibid.). Segundo ele, generalizaes inclusivas e amplamente
explanatrias tais como as relaes entre massa e energia, calor e
volume, estrutura gen tica e variabilidade, oferta e procura
requerem este tipo de aprendizagem. De maneira resumida, e
praticamente sem exemplos, tentei apresentar nesta seo os
significados originais atribudos por Ausubel ao conceito de
aprendizagem significativa. Este conceito hoje muito usado quando
se fala em ensino e aprendizagem, porm freqentemente sem saber-se
exatamente o que significa. Alm de procurar esclarecer isso, esta
seo tambm pretende fornecer subsdios para argumentar, nas sees
seguintes, que o conceito de aprendizagem significativa compatvel
com outras teorias construtivistas mas que seu maior potencial, na
perspectiva da instruo, est na teoria original Ausubel,
complementada por Novak e Gowin.
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A aprendizagem significativa em uma tica piagetiana Os
conceitos-chave da teoria de Piaget (1971, 1973, 1977) so
assimilao, acomodao, adaptao e equilibrao. A assimilao designa o
fato de que do sujeito a iniciativa na interao com o meio. Ele
constri esquemas mentais de assimilao para abordar a realidade.
Todo esquema de assimilao construdo e toda abordagem realidade supe
um esquema de assimilao. Quando o organismo (a mente) assimila,
incorpora a realidade a seus esquemas de ao impondo-se ao meio.
Quando os esquemas de assimilao no conseguem assimilar determinada
situao, o organismo (mente) desiste ou se modifica. No caso de
modificao, ocorre a acomodao, ou seja, uma reestruturao da
estrutura cognitiva (esquemas de assimilao existentes) que resulta
em novos esquemas de assimilao. atravs da acomodao que se d o
desenvolvimento cognitivo. Se o meio no apresenta problemas,
dificuldades, a atividade da mente apenas de assimilao; contudo,
frente a elas se reestrutura (acomoda) e se desenvolve. No h
acomodao sem assimilao, pois a acomodao uma reestruturao da
assimilao. O equilbrio entre assimilao e acomodao a adaptao.
Experincias acomodadas do origem a novos esquemas de assimilao,
alcanando-se um novo estado de equilbrio. A mente sendo uma
estrutura (cognitiva) tende a funcionar em equilbrio, aumentando,
permanentemente, seu grau de organizao interna e de adaptao ao
meio. Quando este equilbrio rompido por experincias no assimilveis,
o organismo (mente) se reestrutura (acomoda), a fim de construir
novos esquemas de assimilao e atingir novo equilbrio. Este processo
equilibrador que Piaget chama de equilibrao majorante o responsvel
pelo desenvolvimento cognitivo do sujeito. atravs da equilibrao
majorante que o conhecimento humano totalmente construdo em interao
com o meio fsico e scio-cultural. Piaget no enfatiza o conceito de
aprendizagem. Sua teoria de desenvolvimento cognitivo, no de
aprendizagem. Ele prefere falar em aumento de conhecimento. Nesta
perspectiva, s h aprendizagem (aumento de conhecimento) quando o
esquema de assimilao sofre acomodao. Teria, ento, sentido falar em
aprendizagem significativa em um enfoque piagetiano? Talvez sim, se
estabelecermos uma analogia entre esquema de assimilao e subsunor
(tanto um como outro so construtos tericos!): na aprendizagem
significativa subordinada derivativa o subsunor praticamente no se
modifica, a nova informao corroborante ou diretamente derivvel
dessa estrutura de conhecimento que Ausubel chama de subsunor.
Corresponderia assimilao piagetiana. Na aprendizagem significativa
superordenada um novo subsunor construdo e passa a subordinar
aqueles conceitos ou proposies que permitiram tal construo. Seria
um processo anlogo acomodao, na qual um novo esquema de assimilao
construdo. Claro, Ausubel diz que a aprendizagem superordenada um
processo relativamente pouco freqente, enquanto que a acomodao nem
tanto. Por outro lado, na aprendizagem significativa subordinada
correlativa o subsunor bastante modificado, enriquecido em termos
de significados. Esta modificao, ou enriquecimento, corresponderia
a uma acomodao no to acentuada como a da aprendizagem
superordenada. Na aprendizagem combinatria o significado vem da
interao da nova informao com a estrutura cognitiva como um todo. um
processo semelhante ao da aprendizagem subordinada com a diferena
que a nova informao ao invs de ancorar-se a
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um subsunor particular o faz em um conhecimento relevante de um
modo geral. Mas na tica piagetiana seria tambm uma acomodao. Quando
o material de aprendizagem no potencialmente significativo (no
relacionvel de maneira substantiva e no-arbitrria estrutura
cognitiva), no possvel a aprendizagem significativa. De maneira
anloga, quando o desequilbrio cognitivo gerado pela experincia no
assimilvel muito grande, no ocorre a acomodao. Tanto em um caso
como no outro a mente fica como estava; do ponto de vista
ausubeliano no foram modificados os subsunores existentes e do
piagetiano no foram construdos novos esquemas de assimilao.
possvel, portanto, interpretar a assimilao, a acomodao e a
equilibrao piagetianas em termos de aprendizagem significativa.
Assimilar e acomodar podem ser interpretados em termos de dar
significados por subordinao ou por superordenao. Naturalmente, isso
no quer dizer que os esquemas de Piaget e os subsunores de Ausubel
sejam a mesma coisa. Trata-se somente de uma analogia que permite
dar significado ao conceito de aprendizagem significativa em um
enfoque piagetiano.
A aprendizagem significativa em uma abordagem kellyana Para
George Kelly (1963), o progresso do ser humano ao longo dos sculos
no ocorreu em funo de necessidades bsicas, mas de sua permanente
tentativa de controlar o fluxo de eventos no qual est imerso. Assim
como um cientista, o homem-cientfico (uma metfora que se aplica raa
humana) busca prever e controlar eventos. Nessa tentativa, a pessoa
v o mundo atravs de moldes, ou gabaritos, transparentes que ela
constri e ento tenta ajustar a eles as realidades do mundo. O
ajuste nem sempre bom, mas sem estes moldes, padres, gabaritos --
que Kelly denomina de construtos pessoais -- a pessoa no consegue
dar sentido ao universo em que vive (op. cit. p. 9). Em geral, a
pessoa procura melhorar sua construo aumentando seu repertrio de
construtos e/ou alterando-os para aperfeioar o ajuste e/ou
subordinando-os a construtos superordenados ou sistemas de construo
(ibid.). O sistema de construo de uma pessoa um agrupamento
hierrquico de construtos. H construtos superordenados e construtos
subordinados. Em princpio, o sistema de construo de uma pessoa est
aberto mudana. nessa possvel mudana no sistema de construo que est
o conceito kellyano de aprendizagem. Sem os construtos pessoais, o
mundo pareceria uma homogeneidade indiferenciada a qual o ser
humano no conseguiria dar sentido. Naturalmente, todas as
interpretaes humanas sobre o universo esto sujeitas a reviso ou
substituio. Sempre existem construes alternativas. Mas este
alternativismo construtivo no significa indiferena construtiva, no
quer dizer que indiferente o sistema de construo que a pessoa
escolhe para interpretar o universo. Algumas construes alternativas
so melhores do que outras e algumas so definitivamente pobres.
Embora pessoais, h construtos ou sistemas de construo que podem ser
comunicados e compartilhados, inclusive em larga escala. Alguns
sistemas de construo compartilhados em larga escala, ou sistemas
pblicos, so elaborados para que determinados domnios, ou
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campos, a eles se ajustem. Por exemplo os construtos da Fsica
para fenmenos fsicos e os da Psicologia para fenmenos psicolgicos
(op. cit. p. 10). Apesar de que esta delimitao de domnios possa
ser, s vezes, artificial, na medida em que o mesmo construto se
aplique a distintos campos, importante reconhecer que existem
limites at onde conveniente aplicar certos construtos ou sistemas
de construo. Os construtos ou os sistemas de construo de uma pessoa
no s tm limites de convenincia como tambm focos de convenincia. Ou
seja, h regies dentro de um domnio de eventos nos quais eles
funcionam melhor. Geralmente so as regies que o construtor tinha em
mente quando edificou o construto (op. cit. p. 11). Nesta tica de
construtos pessoais, Kelly elabora uma teoria formal com um
postulado e onze corolrios. O postulado diz que a conduta de uma
pessoa no presente est determinada pela maneira em que ela antecipa
eventos. A antecipao de eventos implica construtos pessoais, pois a
pessoa antecipa eventos construindo rplicas deles (corolrio da
construo). As pessoas diferem umas das outras em suas construes, ou
seja, o sistema de construo de uma pessoa nico (corolrio da
individualidade ). O sistema de construo de uma pessoa muda medida
que ela constri rplicas de eventos e as confronta com as realidades
do universo, isto , a pessoa reconstri seus construtos para
melhorar suas antecipaes (corolrio da experincia). Estes so alguns
dos corolrios de Kelly. Dois outros que so importantes para tentar
interpretar a aprendizagem significativa luz da teoria de Kelly so
o corolrio da organizao e o corolrio da fragmentao. O primeiro diz
que o sistema de construo de uma pessoa est organizado
hierarquicamente, ou seja, h construtos subordinados e construtos
superordenados. O segundo afirma que as pessoas podem testar novos
construtos sem necessariamente descartar construtos anteriores,
inclusive quando so incompatveis; quer dizer, novos construtos no
so necessariamente derivaes ou casos especiais de construtos j
existentes. Nesta altura, seguramente o leitor j percebeu que h uma
certa analogia entre os construtos de Kelly e os subsunores de
Ausubel. A estrutura cognitiva para Ausubel uma organizao
hierrquica de subsunores enquanto o sistema de construo de Kelly
uma estrutura hierrquica de construtos. Nenhuma das duas esttica,
ambas esto abertas mudana, reconstruo e estas implicam
aprendizagem. Assim como h conceitos subsunores subordinados e
superordenados h, igualmente, construtos subordinados e
superordenados. Analogamente ao corolrio da fragmentao, novos
subsunores no so necessariamente derivaes ou casos especiais de
subsunores j existentes. O aprendiz pode construir novos subsunores
sem, obrigatoriamente, descartar (obliterar totalmente) novos
subsunores, inclusive quando so incompatveis. Assim como o sistema
de construo de uma pessoa pode abrigar construtos inconciliveis, a
estrutura cognitiva pode acolher subsunores incompatveis ou em um
mesmo subsunor podem co-existir significados contraditrios.
(Obviamente, em todos os casos a pessoa poder aprender a
discriminar entre tais construes incompatveis.) Como se
interpretaria, ento, a aprendizagem significativa em uma
perspectiva kellyana aprendizagem? Teria sentido isso? A partir da
analogia feita, entre construtos e subsunores e sistema de construo
e estrutura cognitiva, sim. Mas preciso levar em
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considerao que a teoria de Kelly , segundo ele mesmo, uma teoria
da personalidade, no uma teoria de aprendizagem. Como j foi dito, o
conceito kellyano de aprendizagem est na possvel mudana nos
construtos ou no sistema de construo. A aprendizagem significativa
estaria intimamente vinculada edificao de construtos. Na medida em
que os construtos pessoais do sujeito, ou seu sistema de construo,
fossem exitosos, no sentido de antecipar eventos atravs de suas
rplicas, estaramos diante da aprendizagem significativa subordinada
derivativa. Quer dizer, se os eventos ocorressem de modo a apenas
corroborar determinado construto pessoal, se o ajuste fosse bom,
poderamos falar em subordinao derivativa. Se fosse necessrio
melhorar o ajuste atravs de uma extenso, elaborao, modificao de um
certo construto estaramos frente a uma aprendizagem significativa
subordinada correlativa. Analogamente, se fosse necessrio
reformular o sistema de construo, reorganizando os construtos,
alterando a hierarquia de construtos, seria o caso de uma
aprendizagem superordenada. Finalmente, se a construo da rplica de
um evento envolvesse o sistema de construo como um todo, isso
corresponderia a uma aprendizagem significativa combinatria. Na
ausncia de subsunores apropriados, a aprendizagem no pode ser
significativa, o aprendiz no pode dar significados s novas
informaes. Em linguagem kellyana, a impossibilidade de aprendizagem
significativa corresponderia incapacidade de dar sentido a eventos
ou objetos por falta de construtos pessoais adequados. Portanto, a
partir de uma correspondncia entre construtos pessoais e
subsunores, e entre sistema de construo e estrutura cognitiva,
teria sentido falar em aprendizagem significativa em um contexto
kellyano. Naturalmente, isso no deve sugerir que construtos e
subsunores sejam a mesma coisa.
Aprendizagem significativa em um enfoque vygotskyano Para Lev
Vygotsky (1987, 1988), o desenvolvimento cognitivo no pode ser
entendido sem referncia ao contexto social, histrico e cultural em
que ocorre. Para ele, os processos mentais superiores (pensamento,
linguagem, comportamento voluntrio) tm sua origem em processos
sociais; o desenvolvimento cognitivo a converso de relaes sociais
em funes mentais. Nesse processo, toda relao/funo aparece duas
vezes, primeiro em nvel social e depois em nvel individual,
primeiro entre pessoas (interpessoal, interpsicolgica) e aps no
interior do sujeito (intrapessoal, intrapsicolgica). Mas a converso
de relaes sociais em processos mentais superiores no direta,
mediada por instrumentos e signos. Instrumento algo que pode ser
usado para fazer alguma coisa; signo algo que significa alguma
outra coisa. Existem trs tipos de signos: indicadores so aqueles
que tm uma relao de causa e efeito com aquilo que significam (fumaa
por exemplo significa fogo por que causada pelo fogo); icnicos so
os que so imagens ou desenhos daquilo que significam; simblicos so
os que tm uma relao abstrata com o que significam. As palavras, por
exemplo, so signos (simblicos) lingsticos; os nmeros so signos
(tambm simblicos) matemticos. A lngua, falada ou escrita, e a
matemtica so sistemas de signos. O uso de instrumentos na mediao
com o ambiente distingue, de maneira essencial, o homem de outros
animais. Mas as sociedades criam no somente instrumentos, mas
tambm
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sistemas de signos. Ambos, instrumentos e signos, so criados ao
longo da histria das sociedades e influem decisivamente em seu
desenvolvimento social e cultural. Para Vygotsky, atravs da
internalizao (reconstruo interna) de instrumentos e signos que se d
o desenvolvimento cognitivo. Quanto mais o sujeito vai utilizando
signos, tanto mais vo se modificando, fundamentalmente, as operaes
psicolgicas que ele capaz de fazer. Da mesma forma, quanto mais
instrumentos ele vai aprendendo a usar tanto mais se amplia, de
modo quase ilimitado, a gama de atividades nas quais pode aplicar
suas novas funes psicolgicas. Como instrumentos e signos so
construes scio-histricas e culturais, a apropriao destas construes
pelo aprendiz se d primordialmente via interao social. Ao invs de
focalizar o indivduo como unidade de anlise, Vygotsky enfoca a
interao social. ela o veculo fundamental para a transmisso dinmica
(de inter e intrapessoal) do conhecimento construdo social,
histrica e culturalmente. A interao social implica um mnimo de duas
pessoas intercambiando significados. Implica tambm um certo grau de
reciprocidade e bidirecionalidade, i.e., um envolvimento ativo, de
ambos os participantes. A aquisio de significados e a interao
social so inseparveis na perspectiva de Vygotsky, visto que os
significados dos signos so construdos socialmente. As palavras, por
exemplo, so signos lingsticos. Certos gestos tambm so signos. Mas
os significados das palavras e dos gestos so acordados socialmente,
de modo que a interao social indispensvel para que um aprendiz
adquira tais significados. Mesmo que os significados cheguem ao
aprendiz atravs de livros ou mquinas, por exemplo, ainda assim
atravs da interao social que ele/ela poder assegurar-se que os
significados que captou so os significados socialmente
compartilhados em determinado contexto. Para internalizar signos, o
ser humano tem que captar os significados j compartilhados
socialmente. Ou seja, tem que passar a compartilhar significados j
aceitos no contexto social em que se encontra. E atravs da interao
social que isso ocorre. s atravs dela que a pessoa pode captar
significados e confirmar que os que est captando so aqueles
compartilhados socialmente para os signos em questo. Naturalmente,
a linguagem (sistema de signos) extremamente importante em uma
perspectiva vygotskyana. Aprender a falar uma lngua, por exemplo,
libera a criana de vnculos contextuais imediatos e esta
descontextualizao importante para o desenvolvimento dos processos
mentais superiores. O manejo da lngua, por sua vez, importante para
a interao social, mas sendo a lngua um sistema de signos sua
aquisio tambm depende, fundamentalmente, da interao social.
Examinemos, ento, se teria sentido falar em aprendizagem
significativa em uma abordagem vygotskyana. Ao que parece sim! E
muito! A aprendizagem significativa, por definio, envolve
aquisio/construo de significados. no curso da aprendizagem
significativa que o significado lgico dos materiais de aprendizagem
se transforma em significado psicolgico para o aprendiz, diria
Ausubel (1963, p. 58). No seria essa transformao anloga
internalizao de instrumentos e signos de Vygotsky? Os materiais de
aprendizagem no seriam, essencialmente, instrumentos e signos no
contexto de uma certa matria de ensino? A Fsica, por exemplo, no
seria um
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sistema de signos e no teria seus instrumentos (procedimentos e
equipamentos)? Aprender Fsica de maneira significativa no seria
internalizar os significados aceitos (e construdos) para estes
instrumentos e signos no contexto da Fsica? Certamente sim, em
todos os casos! A atribuio de significados s novas informaes por
interao com significados claros, estveis e diferenciados j
existentes na estrutura cognitiva, que caracteriza a aprendizagem
significativa subordinada, ou emergncia de novos significados pela
unificao e reconciliao integradora de significados j existentes,
tpica da aprendizagem superordenada, em geral no acontecem de
imediato. Ao contrrio, so processos que requerem uma troca de
significados, uma negociao de significados, tipicamente
vygotskyana. Para Ausubel, o ser humano tem a grande capacidade de
aprender sem ter que descobrir. Exceto em crianas pequenas,
aprender por recepo o mecanismo humano por excelncia para aprender.
As novas informaes, ou os novos significados, podem ser dados
diretamente, em sua forma final, ao aprendiz. a existncia de uma
estrutura cognitiva prvia adequada (subsunores especificamente
relevantes) que vai permitir a aprendizagem significativa
(relacionamento no arbitrrio e substantivo ao conhecimento prvio).
Mas a aprendizagem por recepo no instantnea, requer intercmbio de
significados. Na tica vygotskyana, a internalizao de significados
depende da interao social, mas, assim como na viso ausubeliana,
eles podem ser apresentados ao aprendiz em sua forma final. O
indivduo no tem que descobrir o que significam os signos ou como so
usados os instrumentos. Ele se apropria (reconstri internamente)
dessas construes via interao social. Outro argumento em favor da
relevncia da interao social para a aprendizagem significativa a
importncia que Ausubel atribui linguagem ( lngua, rigorosamente
falando) na aprendizagem significativa.
Para todas as finalidades prticas, a aquisio de conhecimento na
matria de ensino depende da aprendizagem verbal e de outras formas
de aprendizagem simblica. De fato, em grande parte devido linguagem
e simbolizao que a maioria das formas complexas de funcionamento
cognitivo se torna possvel. (1968, p. 79)
Acrescente-se a isso que originalmente a teoria de Ausubel foi
chamada, por ele mesmo, de psicologia da aprendizagem verbal
significativa (1963). Tem, portanto, muito sentido falar em
aprendizagem significativa em um enfoque vygotskyano aprendizagem.
A tal ponto que se poderia inverter o argumento e dizer que tem
muito sentido falar em interao social vygotskyana em uma
perspectiva ausubeliana aprendizagem. Quer dizer, a aprendizagem
significativa depende de interao social, i.e., de intercmbio,
troca, de significados via interao social. Por outro lado, no se
deve pensar que a facilitao da aprendizagem significativa se reduz
a isto. Mais adiante este ponto ser retomado.
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Apre ndizagem significativa na perspectiva de Johnson-Laird
Particularmente nos anos noventa, cada vez mais as questes de
aprendizagem tm sido examinadas luz da moderna psicologia
cognitiva, de modo especial em termos de representaes mentais.
Representaes mentais, ou representaes internas, so maneiras de
re-presentar internamente o mundo externo. As pessoas no captam o
mundo exterior diretamente, elas constroem representaes mentais
(quer dizer, internas) dele. Pode-se distinguir entre representaes
mentais analgicas e proposicionais. As imagens visuais exemplificam
tipicamente as representaes analgicas, mas h outras como as
auditivas, as olfativas, as tcteis. As representaes proposicionais
so tipo- linguagem, mas trata-se de uma linguagem que no tem a ver
com a lngua que falamos nem com a modalidade de percepo, uma
linguagem prpria da mente que poderamos chamar de mentals. A questo
imagens vs. proposies polmica na Psicologia Cognitiva. H psiclogos
cognitivos para os quais a cognio deve ser analisada exclusivamente
em termos de representaes proposicionais, ou seja, no h necessidade
de supor que as imagens so um tipo especial de representao mental.
Para eles, os proposicionalistas, as imagens podem ser reduzidas a
representaes proposicionais; seriam tambm processadas no mentals.
Mas existem outros, os imagistas que no aceitam esta posio e
argumentam que as imagens tm identidade prpria, tanto que podem ser
rotadas, transladadas e esquadrinhadas mentalmente. Mas h uma
terceira via, uma sntese, uma terceira forma de construto
representacional, chamada modelos mentais, proposta por Philip
Johnson-Laird (1983). Para ele, proposies so representaes de
significados, totalmente abstradas, que so verbalmente expressveis.
O critrio de expressabilidade verbal distingue Johnson-Laird de
outros psiclogos cognitivos. Imagens so representaes bastante
especficas que retm muitos dos aspectos perceptivos de determinados
objetos ou eventos, vistos de um ngulo particular, com detalhes de
uma certa instncia do objeto ou evento. Modelos mentais so
representaes analgicas, um tanto quanto abstradas, de conceitos,
objetos ou eventos que so espacial e temporalmente anlogos a
impresses sensoriais, mas que podem ser vistos de qualquer ngulo (
e a temos imagens!) e que, em geral, no retm aspectos distintivos
de uma dada instncia de um objeto ou evento (Sternberg, 1996, p.
181). Ento, para Johnson-Laird (1983, p. 165) representaes
proposicionais so cadeias de smbolos que correspondem linguagem
natural, modelos mentais so anlogos estruturais do mundo e imagens
so modelos vistos de um determinado ponto de vista. A analogia pode
ser total ou parcial, isto , um modelo mental uma representao que
pode ser totalmente analgica ou parcialmente analgica e
parcialmente proposicional (Eisenck e Keane, 1994, p. 209). Um
modelo mental pode conter proposies, mas estas podem existir como
representao mental, no sentido de Johnson-Laird, sem fazer parte de
um modelo mental. Contudo, para ele, as representaes proposicionais
so interpretadas em relao a modelos mentais: uma proposio
verdadeira ou falsa em relao a um modelo mental de um estado de
coisas do mundo.
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Os modelos mentais e as imagens so, nessa tica, representaes de
alto nvel, essenciais para o entendimento da cognio humana (op.
cit. 210). Ainda que em seu nvel bsico o crebro humano possa
computar as imagens e os modelos mentais em algum cdigo
proposicional (o mentals), o uso destas representaes libera a
cognio humana da obrigao de operar proposicionalmente em cdigo de
mquina. Para Johnson-Laird, ao invs de uma lgica mental, as pessoas
usam modelos mentais para raciocinar. Modelos mentais so como
blocos de construo cognitivos que podem ser combinados e
recombinados conforme necessrio. Como quaisquer outros modelos,
eles representam o objeto ou a situao em si; sua estrutura capta a
essncia (se parece analogicamente) desta situao ou objeto. O
aspecto essencial do raciocnio atravs de modelos mentais no est s
na construo de modelos adequados para representar distintos estados
de coisas, mas tambm na habilidade de testar quaisquer concluses a
que se chegue usando tais modelos. A lgica, se que aparece em algum
lugar, no est na construo de modelos mentais e sim na testagem das
concluses pois esta implica que o sujeito saiba apreciar a
importncia lgica de falsear uma concluso, e no apenas buscar
evidncia positiva que a apie (Hampson e Morris, 1996, p. 243).
Contrariamente a modelos conceituais, que so representaes precisas,
consistentes e completas de eventos ou objetos e que so projetadas
como ferramentas para facilitar a compreenso ou o ensino, modelos
mentais podem ser deficientes em vrios aspectos, confusos,
instveis, incompletos, mas devem ser funcionais. Eles evoluem
naturalmente. Testando seu modelo mental, a pessoa continuamente o
modifica a fim de chegar a uma funcionalidade que lhe satisfaa.
claro que os modelos mentais de uma pessoa so limitados por fatores
tais como seu conhecimento e sua experincia prvia com estados de
coisas similares e pela prpria estrutura do sistema de
processamento humano (Norman, apud Gentner e Stevens, 1983, p. 7).
Os modelos mentais, portanto, podem ser revisados, reconstrudos
(reformulados) para atender o critrio (pessoal) da funcionalidade
(permitir ao seu construtor explicar e fazer previses sobre o
evento ou objeto analogicamente representado). nessa reformulao
(reconstruo, reviso) que poderia estar o significado de
aprendizagem na teoria de Johnson-Laird. Isso sugere que o conceito
de aprendizagem, com os significados usualmente aceitos, no
relevante nesta teoria. Cabe, ento, a mesma pergunta feita nas sees
anteriores: teria sentido falar em aprendizagem significativa no
cognitivismo de Johnson-Laird? Vejamos! Talvez se possa dizer que a
aprendizagem significativa quando o sujeito constri um modelo
mental da nova informao (conceito, proposio, idia, evento, objeto).
Por exemplo, quando uma pessoa capaz de explicar e fazer previses
sobre um sistema fsico porque, na linguagem de Johnson-Laird, ela
tem um modelo mental desse sistema, i.e., uma representao mental
anloga a ele em termos estruturais. Mas se a pessoa capaz de
explicar e fazer previses sobre tal sistema isso , sem dvida,
evidncia de aprendizagem significativa. Os modelos mentais
geralmente so modelos de trabalho, i.e., so construdos na hora para
representar determinada proposio, conceito, objeto ou evento e so
instveis, funcionam naquela situao e so descartados. Mas se pode
tambm falar em modelos mentais estveis, modelos que por sua
funcionalidade em muitas situaes adquirem uma
-
certa estabilidade, no sentido de que ficariam armazenados na
memria de longo prazo. Por outro lado, os modelos de trabalho no so
construdos a partir do zero. Ao contrrio, eles so construdos a
partir de entidades mentais j existentes, as quais, a rigor seriam
tambm modelos mentais (quer dizer, h modelos mentais dentro de
modelos mentais). Levando em considerao estas caractersticas dos
modelos mentais, poder-se- ia imaginar que para gerar modelos de
trabalho o sujeito tem que ter o que Ausubel chama de conceitos
subsunores, mas os prprios conceitos subsunores j estariam
representados mentalmente por modelos mentais mais estveis (segundo
Johnson-Laird conceitos so representados por modelos mentais).
Neste caso, seria possvel, por exemplo, interpretar a aprendizagem
significativa subordinada derivativa como um caso em que o aprendiz
facilmente construsse modelos de trabalho para dar significado as
novas informaes. Porm no caso de uma aprendizagem significativa
subordinada correlativa a construo de um modelo mental no seria
trivial, e muito menos em uma aprendizagem significativa
superordenada. Alis, a no construo de modelos mentais pode estar
muito relacionada anttese da aprendizagem significativa, i.e.,
aprendizagem mecnica: Em um estudo que fizemos (Moreira e Greca,
1996; Greca e Moreira, 1997a e b) com estudantes de Fsica Geral na
rea de Eletromagnetismo, acreditamos ter conseguido distinguir
entre alunos que trabalhavam e no trabalhavam com modelos mentais,
segundo Johnson-Laird, enquanto se desempenhavam em tarefas
instrucionais. No segundo caso, os estudantes usavam proposies
soltas, no articuladas em um modelo, e pareciam no utilizar
imagens. As proposies que faziam uso eram definies e frmulas
manipuladas mecanicamente para resolver problemas ou questes
conceituais. Tipicamente aprendizagem mecnica! Por outro lado, se
considerarmos que aprendizagem significativa e aprendizagem mecnica
ocupam os extremos de um contnuo, ao invs de constituir uma
dicotomia, os alunos que usavam modelos mentais deram evidncias de
uma aprendizagem prxima do extremo da aprendizagem significativa.
Nos pareceu nesta pesquisa que a aprendizagem do aluno seria tanto
mais significativa quanto fosse sua capacidade de construir modelos
mentais de trabalho para os contedos da matria de ensino. Parece
ser perfeitamente possvel ento falar em aprendizagem significativa
tambm na perspectiva dos modelos mentais, tal como definidos por
Johnson-Laird.
Aprendizagem significativa em uma viso humanista: a teoria de
Novak At aqui a aprendizagem significativa foi focalizada de um
ponto de vista basicamente cognitivo. Obviamente, todos sabemos que
o ser humano no s cognio. A pessoa conhece, sente e age! Como fica
ento a aprendizagem significativa em uma perspectiva humanista?
-
O prprio Ausubel, ao explicitar as condies para a aprendizagem
significativa (1968, pp. 37 e 38), de certa forma leva em
considerao o lado afetivo da questo: a aprendizagem significativa
requer no s que o material de aprendizagem seja potencialmente
significativo (i.e., relacionvel estrutura cognitiva de maneira
no-arbitrria e no- literal), mas tambm que o aprendiz manifeste uma
disposio para relacionar o novo material de modo substantivo e
no-arbitrrio a sua estrutura de conhecimento. Ou seja, para
aprender de maneira significativa o aprendiz deve querer relacionar
o novo contedo de maneira no- literal e no-arbitrria ao seu
conhecimento prvio. Independente de quo potencialmente
significativa a nova informao (um conceito ou uma proposio, por
exemplo), se a inteno do sujeito for apenas a de memoriz- la de
maneira arbitrria e literal, a aprendizagem s poder ser mecnica.
Nessa disposio para aprender pode-se perceber a importncia do
domnio afetivo na aprendizagem significativa j na formulao original
de Ausubel. Mas foi Joseph D. Novak (1977, 1981) quem deu um toque
humanista aprendizagem significativa. Novak co-autor da segunda
edio da obra Educational psychology: a cognitive view (1978, 1980,
1983) e durante muito tempo trabalhou no refinamento, testagem e
divulgao da teoria da aprendizagem significativa, a tal ponto que
esta teoria deveria ser, hoje, a teoria de Ausubel e Novak. Porm
Novak tem o que ele chama de sua teoria de educao (ibid.): A
aprendizagem significativa subjaz integrao construtiva entre
pensamento, sentimento e ao que conduz ao engrandecimento
(empowerment) humano. Para Novak, uma teoria de educao deve
considerar que seres humanos pensam, sentem e agem e deve ajudar a
explicar com se pode melhorar as maneiras atravs das quais as
pessoas fazem isso. Qualquer evento educativo , de acordo com
Novak, uma ao para trocar significados (pensar) e sentimentos entre
aprendiz e professor. A questo da troca de significados j apareceu
quando se falou em Vygotsky e ser retomada mais adiante na teoria
de ensino de Gowin (1981). Aqui, basta considerar que o objetivo
dessa troca a aprendizagem significativa de um novo conhecimento
contextualmente aceito. Mas Novak se refere tambm a uma troca de
sentimentos. Um evento educativo, segundo ele, tambm acompanhado de
uma experincia afetiva. A predisposio para aprender, colocada por
Ausubel como uma das condies para a aprendizagem significativa,
est, para Novak, intimamente relacionada com a experincia afetiva
que o aprendiz tem no evento educativo. Sua hiptese que a
experincia afetiva positiva e intelectualmente construtiva quando o
aprendiz tem ganhos em compreenso; reciprocidade, a sensao afetiva
negativa e gera sentimentos de inadequao quando o aprendiz no sente
que est aprendendo o novo conhecimento. Predisposio para aprender e
aprendizagem significativa guardam entre si uma relao praticamente
circular: a aprendizagem significativa requer predisposio para
aprender e, ao mesmo tempo, gera este tipo de experincia afetiva.
Atitudes e sentimentos positivos em relao experincia educativa tm
suas razes na aprendizagem significativa e, por sua vez, a
facilitam. Novak, como foi dito no comeo desta seo, adotou a teoria
de Ausubel e, conseqentemente, o conceito de aprendizagem
significativa. No entanto, ele deu novos significados a este
conceito, ou estendeu seu mbito de aplicao: em sua teoria humanista
de
-
educao, a aprendizagem significativa subjaz a construo do
conhecimento humano e o faz integrando positivamente pensamentos,
sentimentos e aes, conduzindo ao engrandecimento pessoal.
Aprendizagem significativa: um conceito subjacente Nas sees
anteriores tentei mostrar que se pode falar em aprendizagem
significativa em distintos referenciais tericos construtivistas.
Podemos imaginar a construo cognitiva em termos dos subsunores de
Ausubel, dos esquemas de (ao) assimilao de Piaget, da internalizao
de instrumentos e signos de Vygotsky, dos construtos pessoais de
Kelly ou dos modelos mentais de Johnson-Laird. Creio que em
qualquer destas teorias tem sentido falar em aprendizagem
significativa. No vejo problema em pensar que o resultado da
equilibrao majorante uma aprendizagem significativa ou que a
converso de relaes pessoais em processos mentais, mediada por
instrumentos e signos e via interao social, resulte em aprendizagem
significativa. Tambm no vejo dificuldade em interpretar como aprend
izagem significativa a construo de modelos mentais ou de construtos
pessoais; tanto uns como outros implicam dar significados a eventos
ou objetos. Todas estas teorias so construtivistas e a aprendizagem
significativa subjaz construo humana. Este o ponto! Novak vai alm e
diz, em sua teoria de educao, que a aprendizagem significativa
subjaz tambm a integrao construtiva de pensamentos, sentimentos e
aes. Tudo isso leva a considerar a aprendizagem significativa como
um conceito subjacente, subentendido, nas teorias construtivistas,
sejam elas cognitivistas ou humanistas. Seria um conceito
supra-terico. claro que isso pode conduzir tambm a uma trivializao
do conceito de aprendizagem significativa. Alis, este conceito to
usado hoje que parece estar a caminho da trivializao. Mas isso
provavelmente tem muito mais a ver com uma incorporao superficial
do conceito ao discurso sobre ensino e aprendizagem do que com
teorizaes a respeito do assunto. Tendo em vista o perigo da
trivializao da aprendizagem significativa, daqui para frente
enfocarei a questo da facilitao da aprendizagem significativa em
sala de aula procurando mostrar que no tem nada de trivial.
Buscarei tambm evidenciar que da perspectiva instrucional os
significados que Ausubel e Novak do ao conceito de aprendizagem
significativa so os de maior potencial para o professor.
A facilitao da aprendizagem significativa em sala de aula Se
aprendizagem significativa um conceito subjacente s teorias
construtivistas de aprendizagem2, cada uma delas deve nos sugerir
algo sobre como facilit- la em uma situao de ensino. Vejamos! 2
Este termo est sendo usado aqui sem nenhum rigor. A teoria de
Piaget, por exemplo, uma teoria de desenvolvimento cognitivo, no de
aprendizagem propriamente dita. A teoria de Kelly tambm no o ;
trata-se
-
Em uma tica piagetiana, ensinar seria provocar desequilbrio
cognitivo no aprendiz para que ele/ela procurando o reequilbrio
(equilibrao majorante) se reestruturasse cognitivamente e
aprendesse (significativamente). O mecanismo de aprender de uma
pessoa sua capacidade de reestruturar-se mentalmente buscando novo
equilbrio (novos esquemas de assimilao para adaptar-se nova
situao). O ensino deve ativar este mecanismo. Contudo, esta ativao
deve ser compatvel com o nvel (perodo) de desenvolvimento cognitivo
do aluno e o desequilbrio cognitivo por ela provocado no deve ser
to grande que leve o estudante a abandonar a tarefa de aprendizagem
ao invs de acomodar. Em uma linha kellyana, o ensino teria por
objetivo mudanas nos construtos ou no sistema de construo do
aprendiz. Mas preciso considerar que os construtos so pessoais e
que o sistema de construo pode abrigar construtos incompatveis (por
exemplo, concepes alternativas e concepes cientficas). necessrio
levar em conta tambm que o que se ensina igualmente um sistema de
construo. As teorias, os princpios, os conceitos, so construes
humanas e, portanto, sujeitos a mudanas, reconstruo, reorganizao.
Em uma situao de ensino, so trs os construtos envolvidos: os
construtos pessoais do aprendiz, os construtos da matria de ensino
(que so construes humanas) e os construtos do professor. Nenhum
deles definitivo. No tem sentido ensinar qualquer matria como se
fosse conhecimento definitivo. Mas preciso cuidar, claro, para no
cair no relativismo, pois sempre h construes melhores do que outras
e algumas so decididamente pobres. Interpretando o ensino luz da
teoria dos modelos mentais de Johnson-Laird, a situao semelhante.
So trs os modelos participantes: os modelos mentais do aprendiz, os
modelos conceituais da matria de ensino e os modelos mentais do
professor. Modelos mentais so modelos que as pessoas constroem para
representar internamente eventos e objetos. Estes modelos so
anlogos estruturais do mundo e tm apenas que ser funcionais. Por
outro lado, estas mesmas pessoas constroem modelos que so precisos,
consistentes, robustos, completos e projetados para facilitar o
entendimento e o ensino de estados de coisas do mundo. Estes so os
modelos conceituais que o professor ensina para estudantes que
constroem modelos mentais daquilo que lhes ensinado. D para
perceber que o problema complicado! Para Vygotsky, o nico bom
ensino aquele que est frente do desenvolvimento cognitivo e o
dirige. Analogamente, a nica boa aprendizagem aquela que est
avanada em relao ao desenvolvimento. A interao social que leva
aprendizagem deve ocorrer dentro daquilo que ele chama de zona de
desenvolvimento proximal, i.e., a distncia entre o nvel de
desenvolvimento cognitivo real do indivduo, tal como poderia ser
medido por sua capacidade de resolver problemas sozinho e seu nvel
de desenvolvimento potencial, tal como seria medido por sua
capacidade de resolver problemas sob orientao ou em colaborao com
companheiros mais capazes. O ensino, portanto, deve acontecer na
zona de desenvolvimento proximal e, de certa forma, determinar o
limite superior desta zona. Na interao social que deve caracterizar
este ensino, o professor o participante que j internalizou
significados socialmente compartilhados para os materiais
educativos do currculo e procura fazer com que o aprendiz tambm
venha a compartilh- los. O processo de troca de significados a
implcito est muito claro no modelo de ensino de Gowin, descrito a
seguir.
de uma teoria psicolgica.
-
Aprendizagem significativa segundo Gowin D. B. Gowin um autor
muito conhecido por um instrumento heurstico que desenvolveu para
analisar a estrutura do processo de produo do conhecimento ou para
desempacotar conhecimentos documentados (por exemplo, em artigos de
pesquisa), o chamado V de Gowin ou V epistemolgico (Novak e Gowin,
1984, 1988, 1996; Moreira, 1993b). Mas sua teoria de educao,
apresentada na obra Educating (Gowin, 1981), muito mais do que o V.
Desta teoria, h uma parte que poderia ser chamada de modelo de
ensino de Gowin e que se assemelha muito a uma abordagem
vygostkyana. Gowin v uma relao tridica entre professor, materiais
educativos e aprendiz. Para ele, um episdio de ensino-aprendizagem
se caracteriza pelo compartilhar significados entre aluno e
professor, a respeito de conhecimentos veiculados por materiais
educativos do currculo. Usando materiais educativos do currculo,
aluno e professor buscam congruncia de significados. Em uma situao
de ensino, o professor atua de maneira intencional para mudar
significados da experincia do aluno, utilizando materia is
educativos do currculo. Se o aluno manifesta uma disposio para
aprender, ele/ela tambm atua intencionalmente para captar o
significado dos materiais educativos. O objetivo compartilhar
significados. O professor apresenta ao aluno os significados j
compartilhados pela comunidade a respeito dos materiais educativos
do currculo. O aluno, por sua vez, deve devolver ao professor os
significados que captou. Se o compartilhar significados no
alcanado, o professor deve, outra vez, apresentar, de outro modo,
os significados aceitos no contexto da matria de ensino. O aluno,
que alguma maneira, deve externalizar novamente os significados que
captou. O processo continua at que os significados dos materiais
educativos do currculo que o aluno capta so aqueles que o professor
pretende que eles tenham para o aluno. A, segundo Gowin, se consuma
um episdio de ensino. Neste processo, professor e aluno tm
responsabilidades distintas. O professor responsvel por verificar
se os significados que o aluno capta so aqueles compartilhados pela
comunidade de usurios da matria de ensino. O aluno responsvel por
verificar se os significados que captou so aqueles que o professor
pretendia que ele captasse, i.e., os significados compartilhados no
contexto da matria de ensino. Se alcanado o compartilhar
significados, o aluno est pronto para decidir se quer aprender
significativamente ou no. O ensino requer reciprocidade de
responsabilidades, porm aprender de maneira significativa uma
responsabilidade do aluno que no poder ser compartilhada pelo
professor. Para aprender significativamente, o aluno tem que
manifestar uma disposio para relacionar, de maneira no-arbitrria e
no-literal (substantiva), sua estrutura cognitiva, os significados
que capta a respeito dos materiais educativos, potencialmente
significativos, do currculo.
-
Observe-se que o modelo de Gowin introduz a idia de captar o
significado como um passo anterior aprendizagem significativa.
Note-se tambm que na ltima etapa do modelo esto as condies
originais de Ausubel para a aprendizagem significativa. Nesta seo
objetivei deixar claro que a facilitao da aprendizagem
significativa em sala de aula est longe de ser trivial. Em cada
referencial terico que consideramos, surgem implicaes didticas
importantes e difceis. Como promover a equilibrao majorante? Como
compatibilizar o ensino com o nvel de desenvolvimento do aluno,
evitando o desequilbrio cognitivo que no conduz acomodao? Como
levar em conta os modelos mentais e os construtos pessoais do
aluno? Como por em prtica a interao pessoal que leve ao
compartilhar significados? So questes complexas que devem estar
atormentando a conscincia de professores que querem ser realmente
construtivistas e promover a aprendizagem significativa. difcil ser
construtivista na sala de aula. difcil facilitar a aprendizagem
significativa. E as teorias construtivistas no ajudam muito porque
no se propem a isso. No so teorias de ensino. So de aprendizagem,
se no formos muito rigorosos com o termo. Acredito, no entanto, que
a teoria original de Ausubel, enriquecida por Novak, apesar de
tambm ser uma teoria de aprendizagem, a que mais oferece,
explicitamente, diretrizes instrucionais, princpios e estratgias
que se pode vislumbrar mais facilmente como por em prtica , que
esto mais perto da sala de aula. Isto porque, distintamente das
demais teorias referidas neste trabalho, nas quais a idia de
aprendizagem significativa est subjacente, a teoria de Ausubel uma
teoria de aprendizagem em sala de aula.
A facilitao da aprendizagem significativa segundo Ausubel A
manipulao deliberada de atributos relevantes da estrutura cognitiva
para fins pedaggicos levada a efeito de duas formas (Ausubel, 1968,
p. 147; Moreira e Masini, 1982, pp. 41 e 42):
1. Substantivamente, com propsitos organizacionais e
integrativos, usando os conceitos e proposies unificadores do
contedo da matria de ensino que tm maior poder explanatrio,
inclusividade, generalidade e relacionabilidade nesse contedo.
2. Programaticamente, empregando princpios programticos para
ordenar
seqencialmente a matria de ensino, respeitando sua organizao e
lgica internas e planejando a realizao de atividades prticas.
Em termos substantivos, o que Ausubel est dizendo que para
facilitar a aprendizagem significativa preciso dar ateno ao contedo
e estrutura cognitiva, procurando manipular os dois. necessrio
fazer uma anlise conceitual do contedo para identificar conceitos,
idias, procedimentos bsicos e concentrar neles o esforo
instrucional. importante no sobrecarregar o aluno de informaes
desnecessrias, dificultando a organizao cognitiva. preciso buscar a
melhor maneira de relacionar, explicitamente, os aspectos mais
importantes do contedo da matria de ensino aos aspectos
especificamente relevantes de estrutura cognitiva do aprendiz. Este
relacionamento imprescindvel para a aprendizagem significativa.
-
Em resumo, indispensvel uma anlise prvia daquilo que se vai
ensinar. Nem tudo que est nos programas e nos livros e outros
materiais educativos do currculo importante. Alm disso, a ordem em
que os principais conceitos e idias da matria de ensino aparecem
nos materiais educativos e nos programas muitas vezes no a mais
adequada para facilitar a interao com o conhecimento prvio do
aluno. A anlise crtica da matria de ensino deve ser feita pensando
no aprendiz. De nada adianta o contedo ter boa organizao lgica,
cronolgica ou epistemolgica, e no ser psicologicamente aprendvel.
No que se refere estrutura cognitiva do aluno, claro que a condio
sine qua non para a aprendizagem significativa a disponibilidade de
subsunores -- conceitos ou proposies claros, estveis,
diferenciados, especificamente relevantes -- na estrutura
cognitiva. No caso de no existirem os subsunores ou de estarem
obliterados, a principal estratgia advogada por Ausubel (1968, p.
148) para deliberadamente manipular a estrutura cognitiva a dos
organizadores prvios (Moreira e Sousa, 1996). So materiais
introdutrios apresentados antes do material de aprendizagem em si,
em um nvel mais alto de abstrao, generalidade e inclusividade. Sua
principal funo a de servir de ponte entre o que o aprendiz j sabe e
o que ele deve saber a fim de que o novo material possa ser
aprendido de maneira significativa (ibid.). Seriam uma espcie de
ancoradouro provisrio. Organizadores prvios podem ser usados tambm
para reativar significados obliterados (isso perfeitamente possvel
se a aprendizagem foi significativa), para buscar na estrutura
cognitiva do aluno significados que existem mas que no esto sendo
usados a algum tempo no contexto da matria de ensino. E
principalmente para estabelecer relaes entre idias, proposies e
conceitos j existentes na estrutura cognitiva e aqueles contidos no
material de aprendizagem. Inmeras pesquisas j foram feitas em torno
do efeito facilitador dos organizadores quase sempre focalizando
sua funo ponte. Uma meta-anlise de muitas dessas pesquisas (Luiten,
Ames e Ackerson, 1980) levou concluso de que os organizadores
prvios, de fato, tm um efeito na aprendizagem e na reteno, mas
pequeno. Quer dizer, como pontes cognitivas os organizadores prvios
no tm muito valor instrucional, no so capazes de suprir a
deficincia de subsunores. Provavelmente, o maior potencial didtico
dos organizadores est na sua funo de estabelecer, em um nvel mais
alto de generalidade, inclusividade e abstrao, relaes explcitas
entre o novo conhecimento e o conhecimento prvio do aluno j
adequado para dar significado aos novos materiais de aprendizagem.
Isto porque mesmo tendo os subsunores adequados muitas vezes o
aprendiz no percebe sua relacionabilidade com o novo conhecimento.
No que se refere facilitao programtica da aprendizagem
significativa, Ausubel (op. cit. p. 152) propes quatro princpios
programticos do contedo: diferenciao progressiva, reconciliao
integrativa, organizao seqencial e consolidao. A diferenciao
progressiva o princpio segundo o qual as idias e conceitos mais
gerais e inclusivos do contedo da matria de ensino devem ser
apresentados no incio da instruo e, progressivamente, diferenciados
em termos de detalhe e especificidade.
-
Ausubel prope este princpio programtico do contedo baseado em
duas hipteses (1978, p. 190): 1) menos difcil para o ser humano
captar aspectos diferenciados de um todo mais inclusivo previamente
aprendido do que chegar ao todo a partir de suas partes
diferenciadas previamente aprendidas; 2) a organizao do contedo de
um corpo de conhecimento na mente de um indivduo uma estrutura
hierrquica na qual as idias mais inclusivas esto no topo da
estrutura e, progressivamente, incorporam proposies, conceitos e
fatos menos inclusivos e mais diferenciados. Portanto, uma vez que
a estrutura cognitiva , por hiptese, organizada hierarquicamente e
a aquisio do conhecimento menos difcil se ocorrer de acordo com a
diferenciao progressiva, nada mais natural do que deliberadamente
programar a apresentao do contedo de maneira anloga, a fim de
facilitar a aprendizagem significativa. Por outro lado, a programao
do contedo deve no s proporcionar a diferenciao progressiva, mas
tambm explorar, explicitamente, relaes entre conceitos e proposies,
chamar ateno para diferenas e similaridades relevantes e
reconciliar inconsistncias reais ou aparentes. Isso deve ser feito
para se atingir o que Ausubel chama de reconciliao integrativa. A
reconciliao integrativa , ento, o princpio programtico segundo o
qual a instruo deve tambm explorar relaes entre idias, apontar
similaridades e diferenas importantes e reconciliar discrepncias
reais ou aparentes. A diferenciao progressiva e a reconciliao
integrativa so processos da dinmica da estrutura cognitiva, mas
aqui esto sendo tratados como princpios programticos instrucionais
potencialmente facilitadores da aprendizagem significativa. A
organizao seqencial, como princpio a ser observado na programao do
contedo para fins instrucionais, consiste em seqenciar os tpicos,
ou unidades de estudo, de maneira to coerente quanto possvel
(observados os princpios da diferenciao progressiva e da
reconciliao integrativa) com as relaes de dependncia naturalmente
existentes na matria de ensino. O princpio da consolidao, por sua
vez, aquele segundo o qual insistindo-se no domnio (ou mestria) do
que est sendo estudado, antes que novos materiais sejam
introduzidos, assegura-se contnua prontido na matria de ensino e
alta probabilidade de xito na aprendizagem seqencialmente
organizada. O fato de Ausubel chamar ateno para a consolidao
coerente com sua premissa bsica de que o fator isolado mais
importante influenciando a aprendizagem o que o aprendiz j sabe. A
teoria de Ausubel oferece, portanto, diretrizes, princpios e uma
estratgia que ele cr serem facilitadores da aprendizagem
significativa. Como p-los em prtica com os alunos foge
completamente ao esprito deste texto, mas no possvel deixar de
mencionar um instrumento desenvolvido por Novak, baseado
principalmente na diferenciao progressiva, muito exitoso na sala de
aula, os mapas conceituais. Tampouco se pode deixar de citar aqui o
V epistemolgico de Gowin.
-
Os mapas conceituais A estratgia do mapeamento conceitual foi
desenvolvida por Novak (1991, 1997) e colaboradores, na
Universidade de Cornell, a partir de 1972. Trata-se de uma tcnica
que, como sugere o prprio nome, enfatiza conceitos e relaes entre
conceitos luz dos princpios da diferenciao progressiva e
reconciliao integrativa. Os mapas conceituais podem ser usados como
recurso didtico, de avaliao e de anlise de currculo (Moreira,
1993c; Moreira e Buchweitz, 1993). Podem tambm servir como
instrumento de metacognio, i.e., de aprender a aprender (Novak e
Gowin, 1984, 1988, 1996). O V epistemolgico Embora no desenvolvido
diretamente a partir da teoria da aprendizagem significativa, o
chamado V de Gowin ou V epistemolgico (Gowin, 1981; Novak e Gowin,
1984, 1988, 1996; Moreira, 1993b; Moreira e Buchweitz, 1993) hoje
considerado tambm uma estratgia facilitadora da aprendizagem
significativa. Trata-se de um instrumento heurstico que tem a forma
de um V, da ser tambm denominado de diagrama-V, projetado para
analisar a estrutura do processo de produo do conhecimento. Na
medida em que um instrumento de metaconhecimento, tambm uma
ferramenta para facilitar a aprendizagem significativa em sala de
aula.
Uma viso integradora final - um mapa conceitual Escrevi este
trabalho com a inteno de mostrar que o conceito de aprendizagem
significativa, hoje to utilizado no contexto educativo, embora
proposto, inicialmente, por Ausubel (1963, 1968) compatvel com
outras teorias construtivistas contemporneas. Mas objetivei tambm
resgatar os significados originais deste conceito para mostrar que
no so triviais e argumentar que neles que os professores encontraro
mais apoio para facilitar a aprendizagem significativa em sala de
aula. Os mapas conceituais de Novak, por exemplo, decorrem
diretamente da teoria original de Ausubel e tm se mostrado muito
teis, na prtica, para facilitar a aprendizagem significativa tanto
do ponto de vista substantivo como do programtico. Trata-se de um
artigo de natureza terica. Por isto mesmo no tive muita preocupao
com exemplos ou aplicaes prticas. Abrirei, no entanto, uma exceo
para os mapas conceituais, apresentando, a ttulo de concluso, um no
qual tento dar uma viso integradora final de todo o trabalho, uma
espcie de reconciliao integrativa. Este mapa est na Figura 1.
Diferentemente de textos e outros materiais educativos, os mapas
conceituais no so auto-explicativos. Eles no foram projetados com
esta finalidade. Requerem explicao de parte de que os faz: Nos
retngulos esto os conceitos mais relevantes para a argumentao
desenvolvida ao longo de todo o texto. Aprendizagem significativa
aparece, intencionalmente, com destaque por ser o conceito-chave do
artigo. As linhas simbolizam as relaes entre os conceitos. As
palavras escritas sobre as linhas, os chamados conectivos,
juntamente com os conceitos unidos pelas linhas, devem dar a idia
de proposies que expressam as relaes entre os conceitos.
Naturalmente, nem todas as possveis relaes aparecem no mapa para
que ele no fique muito denso e para que as relaes mais importantes
no fiquem perdidas em meio a relaes secundrias. Flechas foram
utilizadas parcimoniosamente, apenas quando
-
necessrias para direcionar certas relaes. O uso acentuado de
flechas nos mapas conceituais deixa-os muito semelhantes a
diagramas de fluxo e, assim, os distorce. Aparentemente, o mapa da
Figura 1 no segue o modelo hierrquico de Novak que, por sua vez est
baseado na idia de que a estrutura cognitiva est hierarquicamente
organizada e no princpio da diferenciao progressiva. Mas se
elevarmos o conceito de aprendizagem significativa em relao ao
plano do mapa, a hierarquia aparece claramente. O mapa comea com a
idia de que o conhecimento humano construdo e que nessa construo
pensamentos, sentidos e aes esto integrados. Teorizando sobre como
se d a construo do conhecimento humano, diferentes autores propem
distintos construtos tericos, como os subsunores de Ausubel, os
esquemas de assimilao de Piaget, os construtos pessoais de Kelly e
os modelos mentais de Johnson-Laird. Vygotsky destaca os signos e
instrumentos como construes sociais, mas a internalizao destas
construes uma reconstruo mental do aprendiz. Para ele, a interao
social vital no processo de internalizao (reconstruo). Kelly tambm
destaca a interao social (pessoal) em sua teoria, tanto que um dos
corolrios o da sociabilidade. A interao social igualmente
importante para Ausubel, a tal ponto que originalmente sua teoria
chamava-se teoria da aprendizagem verbal significativa. Alis como
bem destaca Gowin, o compartilhar significados, via interao social
entre professor e aprendiz, condio para que se consume um episdio
de ensino. A seguir, o mapa destaca a semelhana entre a estrutura
hierrquica de subsunores que Ausubel chama de estrutura cognitiva e
a estrutura hierrquica de construtos pessoais que Kelly denomina de
sistema de construo. Talvez se possa encontrar algum construto
anlogo em Piaget e Johnson-Laird, mas isso no foi explorado no
texto. O grande destaque, no entanto, fica com o conceito de
aprendizagem significativa que subjacente no s integrao construtiva
de pensamento, sentimentos e aes preconizada por Novak, mas tambm
aos construtos dos demais autores e internalizao de instrumentos e
signos de Vygotsky. A segunda parte do mapa se refere aos conceitos
envolvidos na facilitao da aprendizagem significativa. A aparecem
os princpios programticos facilitadores (diferenciao progressiva,
reconciliao integrativa, organizao seqencial e consolidao) e as
estratgias de facilitao substantiva, atravs da manipulao deliberada
do contedo (anlise conceitual) e da estrutura cognitiva
(organizadores prvios), para fins instrucionais. Finalmente,
aparece o conceito de mapas conceituais representando o instrumento
que muito bem ilustra a viabilidade prtica de implementao de tais
princpios e estratgias. O V epistemolgico no foi includo no mapa
por no ter uma relao direta coma teoria original da aprendizagem
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