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Scherer, A. L. F.; Souza, E. C. de. Período 1979-2009: ascensão e queda do capital financeiro. 1979-2009: ascensão e queda do capital financeiro André Luís Forti Scherer * Enéas Costa de Souza ** A economia mundial atravessou um período de grande renovação nos últimos 30 anos, transformando profundamente a sua base de crescimento e desenvolvimento. Construiu um período novo, inquietante e fantástico, armando a montagem de uma economia distinta da anterior. Deixou de ser uma hegemonia produtiva, de cunho fordista, do período pós Segunda Guerra Mundial, para tornar- -se uma economia centrada progressivamente na esfera financeira do capital. O “finance-led growth” integrou finança e produção, sob hegemonia da primeira . No vazio deixado pela queda da atividade econômica baseada monetariamente no padrão dólar, ocorreu a metamorfose global das estruturas da economia, da política e da sociedade. Tivemos, por consequência, a origem do atual padrão econômico, unido circulatoriamente por uma nova moeda, a moeda financeira, chamada também de moeda fiduciária, ou dólar livre. Essa moeda permitiu a expansão exacerbada do capital além do seu limite, entrando, porém, em crise, no ano de 2007. Os acontecimentos posteriores indicam uma desestruturação acentuada do padrão econômico iniciado no final dos anos 70, que foi marcado, sublinhemos definitivamente, por uma liderança, uma dominação e uma hegemonia das finanças sobre o Estado e toda a sociedade, período trepidante de alterações na distribuição da riqueza, concentrando-a fortemente no topo das esferas capitalistas. Ao mesmo tempo, financeirizou-se toda a realidade econômica, as remunerações dos trabalhadores e, assim, as relações sociais. Como resultado desse processo, ocorreram a mundialização e a globalização da economia, com grandes alterações geopolíticas e geoeconômicas, apoiadas em novas Economista da FEE. ** Economista da FEE. O ambiente regional. (Três décadas de economia gaúcha, v.1). 2010 227
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1979-2009: Ascensão e Queda do Capital Financeiro

Jun 25, 2015

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Artigo que retraça a trajetória da economia mundial entre 1979 e 2009.
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Scherer, A. L. F.; Souza, E. C. de. Período 1979-2009: ascensão e queda do capital financeiro.

1979-2009: ascensão e queda do capital financeiro

André Luís Forti Scherer∗

Enéas Costa de Souza**

A economia mundial atravessou um período de grande renovação

nos últimos 30 anos, transformando profundamente a sua base de

crescimento e desenvolvimento. Construiu um período novo, inquietante e

fantástico, armando a montagem de uma economia distinta da anterior.

Deixou de ser uma hegemonia produtiva, de cunho fordista, do período

pós Segunda Guerra Mundial, para tornar- -se uma economia centrada

progressivamente na esfera financeira do capital. O “finance-led growth”

integrou finança e produção, sob hegemonia da primeira. No vazio

deixado pela queda da atividade econômica baseada monetariamente no

padrão dólar, ocorreu a metamorfose global das estruturas da economia,

da política e da sociedade. Tivemos, por consequência, a origem do atual

padrão econômico, unido circulatoriamente por uma nova moeda, a

moeda financeira, chamada também de moeda fiduciária, ou dólar livre.

Essa moeda permitiu a expansão exacerbada do capital além do seu

limite, entrando, porém, em crise, no ano de 2007.

Os acontecimentos posteriores indicam uma desestruturação

acentuada do padrão econômico iniciado no final dos anos 70, que foi

marcado, sublinhemos definitivamente, por uma liderança, uma

dominação e uma hegemonia das finanças sobre o Estado e toda a

sociedade, período trepidante de alterações na distribuição da riqueza,

concentrando-a fortemente no topo das esferas capitalistas. Ao mesmo

tempo, financeirizou-se toda a realidade econômica, as remunerações dos

trabalhadores e, assim, as relações sociais. Como resultado desse

processo, ocorreram a mundialização e a globalização da economia, com

grandes alterações geopolíticas e geoeconômicas, apoiadas em novas

Economista da FEE.** Economista da FEE.

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tecnologias de comunicação e informação. A expansão, que implicou uma

forte desregulação do sistema financeiro, sustentada pelo poder público

em favor das finanças, terminou por gerar uma crise de vasta amplitude.

Crise tanto mais perturbadora, pois culmina numa crise da civilização,

envolvendo desde uma crise econômica até uma crise ecológica. É nesse

barco que a sociedade contemporânea está navegando. E, como diz o

poeta: navegar é preciso. Então, estamos num momento de transição,

cuja incerteza é o seu traço mais decisivo.

Para efeito do presente trabalho da FEE, cabe fazermos um

enquadramento desse período da economia financeira mundializada

(1979-2009). Com isso, há uma tentativa de definirmos a sua estrutura e

seus elementos por primeiro e os aspectos da dinâmica econômica em

seguida. A pergunta é imediata: qual a vantagem desse procedimento e

dessa abordagem? Visivelmente, a possibilidade de distinguirmos com

ênfase, e nitidamente, o pano de fundo de uma compreensão dos

acontecimentos da globalização — subterrâneo necessário para a leitura

da economia brasileira e da economia gaúcha. Cabe desenvolvermos,

neste texto, proposições, enunciados e efeitos que qualifiquem e

distingam a dupla situação onde se delineiam os movimentos significativos

dessa economia mundializada. De um lado, designamos as estruturas de

longo prazo; pois elas organizam as relações básicas e repetitivas, que,

num certo modo e por um determinado período, compõem a coesão de

uma totalidade histórica aberta e em movimento. São elas, essas

estruturas, que dão sentido ao econômico e à sociedade. No

desenvolvimento deste texto, elas estarão apresentadas como

proposições estruturais. E, de outro lado, como as estruturas se

transformam, o texto busca igualmente salientar o modo como os

elementos da estrutura se articulam à dinâmica do período. Surgem então

os enunciados dinâmicos. Ou seja, podemos entender a relação desses

marcos estruturais com os processos econômicos concretos. Nela, estão

incluídas, inclusive, aquelas evoluções que rompem com os aspectos

reiterativos e que provocam “revoluções” no interior do padrão

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contemporâneo, tecidas nas operações dos sistemas políticos,

econômicos, sociais, culturais, ambientais, etc. E, igualmente, os

processos que conduzem a uma forma de economia e sociedade, que,

depois de muitos anos de solavancos, mas, sobretudo, de êxitos (do ponto

de vista do capital), desembocam numa vasta crise. Aparecem incluídos aí

os efeitos mais profundos do movimento dessa sociedade capitalista com

hegemonia financeira. Todas as formas econômicas e sociais são assim,

desabrocham numa ascensão e culminam numa queda. Para termos um

panorama sintético desse período, discutiremos proposições estruturais,

avançaremos interpretações sob formas de enunciados dinâmicos, onde a

relação estrutura dinâmica/fatos empíricos será relevante, processos que

proporcionarão efeitos complexos, dos quais salientaremos os efeitos

geopolíticos e os efeitos civilizacionais. Dessa forma, configuraremos o

cenário, o panorama de onde decorrem as realidades de todos os países e

todos os lugares.

1 PROPOSIÇÕES ESTRUTURAIS DO CAPITALISMO SOB HEGEMONIA FINANCEIRA

Nesta parte do texto, importa desenvolvermos algumas proposições

gerais, que tratam de aspectos estruturais que foram extremamente

significativos no desenvolvimento do capitalismo após os anos 70. Em

função das necessidades explicativas e das limitações de espaço, mas,

teoricamente, por serem as peças fundamentais, daremos mais ênfase às

duas primeiras que às outras seis, que se encontram na segunda parte e

que serão desenvolvidas a partir dos enunciados explicativos. No entanto,

todas elas funcionam como um sistema e nos levam a compreender a

extensão da longevidade e a permanência do processo. Queira-se ver,

então, que essas proposições servem como moldura para o quadro

contemporâneo, cujos meandros, labirintos e diversificações serão

apresentados em um segundo momento deste artigo.

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1.1 Proposições estruturais que fundam a economia financeira

Proposição 1: a hegemonia financeira do capital transforma todos os

ativos em ativos financeiros. Instaura, assim, a partir dessa metamorfose,

uma tendência à especulação como a lei maior do atual sistema

econômico.

Foi, sem dúvida, Rudolf Hilferding quem primeiro tratou de uma

nova forma de capital, a qual chamou de capital financeiro. Este nada

mais é do que a possibilidade que um determinado montante de dinheiro

de uma empresa ou de um investidor tem de se valorizar por intermédio

de qualquer órbita econômica, seja ela produtiva, seja financeira, o que

nos faz pensar que o sistema econômico possa ter agora uma hegemonia

das finanças. Pois os produtos e serviços do sistema capitalista são, na

verdade, como diria Hyman Minsky posteriormente, ativos financeiros. Ou

seja, além desses ativos propriamente financeiros, os ativos reais e os

ativos monetários fazem parte do conjunto de valores econômicos que

tem a virtualidade de se valorizarem como se fossem títulos das finanças.

É uma mudança na economia do tipo da água para o vinho. Dessa forma,

um banco, uma fábrica, um shopping center, em face da nova situação,

podem funcionar como uma entidade financeira. Dito de outra forma: a

valorização dos seus ativos tende a ser regulada pela taxa de juros.

Percebemos, então, que a categoria hegemônica do “excedente

econômico” — como dizia Celso Furtado — é a da renda, mais do que a

dos lucros. Tudo porque — podemos afirmar, de uma terceira maneira —

esses ativos, aqui falados, são geridos na dinâmica cíclica pela função

monetária da especulação. Com essa característica, vislumbramos que a

economia contemporânea tende permanentemente para a explosão de

preços dos ativos financeiros. Nela, os preços não funcionam como nos

mercados normais de compra e venda, quando o aumento de preço retém

a oferta. Nos mercados de inspiração financeira, as elevações dos preços

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são, em verdade, estímulos convidativos para aumentar a demanda. Uma

ação, ou um título, quanto mais aumenta de valor, é tanto mais

procurada. E, de maneira fortemente devorante, já que, por uma razão ou

outra — desconfiança, descoberta de títulos fraudulentos, etc. —, há uma

ruptura dessa convenção altista, e o mercado desses ativos perde

subitamente sua dinâmica, entrando em colapso.

Dessa forma, constatamos que o regulador keynesiano, a relação da

taxa de juros com a eficiência marginal do capital, lentamente, ao longo

desses anos todos, sofreu um reparo, um acréscimo, um desvio, embora

essa relação continue a funcionar no limite. No curto prazo, no entanto,

em função da garantia, em última instância, da “mão visível do Estado”,

as aplicações financeiras — sejam ações, títulos securitizados ou

derivativos, petróleo ou commodities agrominerais — passam a ser o lado

fundamental da economia. E a especulação assume a figura que desperta

a elasticidade de valorização dos ativos e, claro, também o seu limite

incandescente. Logo, a tendência à especulação contém, no interior do

seu movimento, uma instabilidade que promove uma trajetória inclinada à

elevação dos resultados, mas também à sua iminente destruição.

Proposição 2: o capitalismo sob hegemonia financeira constrói a

montagem de um Estado financeiro e dá nascimento a uma moeda

igualmente financeira.

O processo de expansão do capital financeiro culmina certamente na

conquista do Estado. Porque o Estado tem dois pontos fundamentais: a

universalidade, que absorve e soluciona temporariamente os conflitos, e a

força oriunda dessa universalidade, que se chama de coerção, que é a

capacidade de fazer com que os grupos sociais cumpram as suas decisões.

E, obviamente, essa coerção termina, quando temos o lado externo de um

país, na sua atividade diplomática e militar, de produzir como efeito a

aceitação de sua liderança. Mas o Estado tem esse caráter de assumir a

unidade do poder e imperar sobre as forças, conduzindo os conflitos em

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favor do setor dominante. De tal maneira que o fato decisivo, na situação

atual, tem a ver com a extrema dificuldade, senão a impossibilidade, de

que qualquer partido político que assuma o poder possa interferir na

substância da economia política do capital financeiro. E o centro dessa

política, sabe-se, é a valorização de seus ativos, sustentada por uma

política econômica que privilegie uma política monetária, financeira e

fiscal. As demais políticas não importam. As políticas industrial, agrícola,

trabalhista, tecnológica, etc. serão sempre inexistentes ou subsidiárias das

primeiras. A política econômica carrega, no seu nervo ativo, o apoio quase

irrestrito às aplicações financeiras e à sua lógica.

Nessa fase da hegemonia do capitalismo financeiro, o mundo

presenciou, ainda nos anos 70, a desvinculação do papel-moeda da

mercadoria-dinheiro, o ouro. Com essa decisão dos Estados Unidos, ele, a

velha relíquia, deixou de ser a base da moeda. E, por esse fato político e

econômico, suspendeu-se a circulação do chamado dólar- -ouro;

começou, então, o período do nascimento da moeda financeira, que só

ocorreu, em sua plenitude, em 1979. Para que isso acontecesse, era

preciso que ela fosse, economicamente, construída e garantida pelo

Estado. O seu objetivo é o mais claro possível: proporcionar às finanças a

valorização básica das suas aplicações. Para resolver essa questão, tem-

se que atentar para os seguintes passos. Em primeiro lugar, só um Estado

líder do sistema mundial das potências poderia garantir uma moeda sem

base mercantil, ou seja, sem que uma mercadoria desse um suporte de

valor ao dinheiro. Primeiro, porque o fundamental de uma moeda, além

de atuar como meio de circulação e funcionar como medida de valores, é

exatamente cumprir a função “reserva de valor”. Para escapar do ouro, o

que vai permitir a existência da moeda financeira é a garantia de um

Estado hegemônico — política, econômica e militarmente —, para que,

amparado nessa amplitude de poderes, possa fixar a taxa de juros básica

da economia mundial. E quem fixa essa taxa é justamente o Banco

Central desse Estado.

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Essa é apenas a primeira parte da função reserva de valor, a

possibilidade de valorização. Mas há que se ter a garantia mínima da

valorização. E quem fornece é esse mesmo Estado, que, emitindo títulos

públicos por intermédio do seu Tesouro, determina a taxa básica do

sistema e assegura que a sua moeda possa ser, de fato, “reserva de

valor”. Isso significa que a moeda financeira não é apenas definida pela

taxa de juros, mas também pelos títulos públicos de um determinado

Estado. E, se essa é uma compreensão teórica da assunção do dólar como

moeda mundial, a evolução histórica da hegemonia do dinheiro dos

Estados Unidos seguiu uma cronologia específica, com fatos e lutas

monetárias marcadas pela hegemonia dos bancos norte-americanos, pela

constituição de um sistema financeiro cada vez mais complexo e

internacional, incluindo a constituição do shadow banking system,

expoente da crise financeira contemporânea.

Com essas apreciações, passamos a ter a consciência clara e

definitiva de que a hegemonia da órbita financeira do capital precisa, para

a sua dinâmica, de uma moeda abstrata, despregada de uma mercadoria-

dinheiro. Para que, assim se desmaterializando, a valorização do capital

possa ter uma elasticidade de valor de acordo com a potência especulativa

da capitalização requerida pelas finanças. Porém também fica nítido que

uma moeda com tais características não pode existir como pensava

Friedrich Hayek, garantida por capitais privados. Só o Estado, por estar

numa instância distinta dos capitais, sendo público, com dimensões

universais, pode, dado o seu poder, a sua riqueza e a sua política,

sustentar, pelo menos enquanto é a potência líder, uma moeda tão leve,

tão frágil, tão diáfana, tão sem valor mercantil, um simples papel, para

que todos os participantes da economia mundial possam aceitá-la. Assim,

a passagem do dólar-ouro para o dólar forte (ou dólar flexível, como

querem alguns) foi um elemento fundamental para que as finanças

pudessem organizar a dinâmica da economia capitalista de 1979 até

agora.

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Finalmente, pelo fato de o Estado ser financeiro e ter construído

uma moeda financeira, ele é o verdadeiro garantidor, em última instância,

das crises econômicas, principalmente financeiras, seja por seus recursos

orçamentários, seja por leis votadas pelo Congresso, seja pela própria

política monetária. Devemos salientar igualmente uma especificidade

marcante: o Estado usa o endividamento como a possibilidade, ocorrida

na atual crise, de utilizar a credibilidade pública em benefício do capital

financeiro, tanto através da sua dívida interna quanto da dívida externa. O

tão famoso discurso sobre a retirada do Estado da economia é apenas um

véu que cobre a posse do Estado pelas finanças e a garantia que ele

fornece, nos limites do seu endividamento, o caminho para o

desenvolvimento, a expansão e a sustentação de possíveis recuperações

das corporações financeiras em bancarrota.

1.2 Proposições estruturais que fazem funcionar o sistema

Pretendemos, nesta seção, delinear os traços estruturais quanto à

forma de funcionamento do capitalismo sob hegemonia financeira, bem

como desenvolvê-los explicativamente em enunciados dinâmicos, que

possibilitarão melhor divisarmos as articulações entre os diversos

elementos que compõem esse sistema.

Proposições

Proposição 1: o capitalismo atual produz uma estrutura financeira a

partir da desregulação da economia. Essa desregulação possibilita a

armação de uma “rede estrutural” que favorece uma dinâmica, cujo

funcionamento, em forma continuada, pode ser global, parcial ou pontual.

Proposição 2: a instabilidade característica do capitalismo sob

dominância financeira originou uma série de instituições e instrumentos,

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para permitir sua operação com grau de risco aceitável para os

operadores do mercado.

Proposição 3: há uma combinação circular entre as finanças e as

tecnologias de comunicação e informação para a crescente expansão e

hegemonia do capital financeiro. Processo que envolveu, direta e

indiretamente, também o capital bélico, para dar origem ao capitalismo

financeiro neoliberal de guerra.

Proposição 4: uma economia financeira estabelece uma nova inter-

-relação dos componentes da estrutura de demanda. Ao contrário da

demanda keynesiana, investimento-consumo, houve uma inversão, de

maneira que é o consumo quem puxa o investimento, a partir de um

processo constante de endividamento das famílias e das empresas.

Todavia, a partir dos anos 2000, esse sistema se enlaça profundamente

com a China, cuja dinâmica é desenvolvimentista, ou seja, o investimento,

sobretudo de origem estatal, está à frente do consumo.

Proposição 5: o capitalismo de hegemonia financeira leva à

financeirização tanto da estrutura produtiva como da remuneração dos

assalariados. O instrumento que opera decisivamente essa passagem

chama-se governança corporativa e é o elo que une capital financeiro e

capital produtivo em torno do objetivo comum de máxima extração de

renda.

Proposição 6: a crise do capitalismo financeiro foi uma crise de origem

financeira, onde a superacumulação de ativos se desdobrou numa crise de

superacumulação produtiva, evidenciando uma crise nas estruturas da

velha indústria, sobretudo automobilística.

Enunciados dinâmicos

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Os enunciados dinâmicos dispõem sobre os elementos que, ao

mudarem, dão forma concreta às transformações estruturais ocorridas,

sem terem, no entanto, capacidade de alterá-las por si próprios. Nem por

isso, devem ser considerados menos importantes, pois dão materialidade

às etapas de auge e de declínio da hegemonia financeira.

Enunciado 1: a desregulamentação do sistema financeiro norte-

-americano possibilitou a ascensão ao primeiro plano dos investidores

institucionais como atores dominantes do capitalismo financeiro

contemporâneo, promovendo gigantesca concentração de riqueza e de

poder.

Os chamados investidores institucionais — fundos de pensão, de

investimentos, hedge funds, private equity funds, fundos soberanos —

movimentaram imensas massas de capital financeiro em busca de

valorização ao redor do mundo, tendo papel fundamental na passagem da

predominância das finanças bancárias tradicionais às finanças de

mercado.1 Esse movimento foi tão avassalador que forçou a

reestruturação das atividades dos bancos tradicionais, que se

reconstituíram em holdings administradores de uma miríade de fundos,

próprios ou não, além de terem abarcado as atividades de bancos de

investimento, com a criação dos bancos múltiplos na década de 90. Em

um circuito poupança-investimento bancário tradicional, os recursos

depositados em bancos eram repassados aos investidores mediante

garantias reais. O circuito poupança-investimento contemporâneo implica

a captação de poupança conforme o objetivo dos aplicadores em fundos

de características específicas, os quais, seguindo estratégias predefinidas,

ou não, e sujeitos a formas diferenciadas de regulação e de controle,

buscam no mercado aplicações convenientes a partir de avaliações de

risco/retorno, que se encontram sintetizadas na nota atribuída pelas

1 Cabe destacarmos que os investidores institucionais, tratados genericamente neste momento, possuem estratégias bastante diferenciadas não apenas entre os diversos tipos de fundos, mas também dentro da mesma classe de fundos. Assim, os fundos de pensão não são apenas totalmente diferentes dos fundos hedge, como também apresentam diferenças marcantes entre si.

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agências de rating à aplicação. A presença, a notoriedade e a importância

que tomaram as agências de notação ou rating, enquanto instituições

privadas de regulação das relações entre o capital financeiro e as demais

frações do capital ou os Estados, foram fundamentais para a consolidação

de um sistema de incentivos e de punições pelo “mercado” do

comportamento e da adequação estratégica dos Estados e das empresas

não financeiras aos objetivos do capital financeiro, o qual aparece

explicitado sob a forma de notas. Mais uma vez, transparece que o

“mercado” e as instituições que governam seu funcionamento nada têm

de espontâneo e impessoal, como apregoado pela ideologia dominante.

Enunciado 2: a importância dos modernos mercados de capitais coloca

em concorrência os interessados na captação dos recursos, estabelecendo

uma verdadeira matriz de aplicações potenciais como opção aos

investidores institucionais.

Essa matriz de aplicações financeiras contempla as mais diversas

classes de ativos das diversas regiões geográficas mundiais, o que torna

imperativa e inescapável a aceitação das orientações estratégicas

financeiras, para fazer parte do portfólio desses investidores. É

interessante observarmos que o advento das finanças de mercado

possibilitou a obtenção de crédito em volume expressivo para algumas

empresas não financeiras que não possuíam um histórico ou garantias

suficientes que lhes permitissem um acesso facilitado ao crédito bancário,

o que foi importante, sobretudo, para a expansão das empresas dos

setores ligados às novas tecnologias de informação e de comunicação a

partir dos anos 80, passando pela bolha de ativos tecnológicos dos anos

90. Ao mesmo tempo, essa forma de acesso ao crédito traz em si a

necessidade de adaptação estratégica aos objetivos do capital financeiro,

contribuindo decisivamente para a financeirização das decisões

estratégicas, envolvendo toda e qualquer classe de ativos desejosa de

aceder aos recursos do mercado de capitais, o que inclui esferas de

atividades antes poupadas dos imperativos de valorização capitalista,

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como a saúde, a educação e a cultura, apenas para citarmos alguns

exemplos. Esse movimento foi estimulado pela extensão da ideologia

liberalizante às atividades antes de prestação prioritária do Estado,

abrindo novas fronteiras para a acumulação capitalista, o que auxiliou na

saída da crise do capitalismo dos anos 70.

Enunciado 3: os bancos de investimento foram os principais beneficiários

da ascensão das finanças de mercado, seja criando e vendendo títulos

públicos ou privados, seja intermediando a relação entre os diversos

agentes financeiros, ou mesmo criando e lançando novos produtos

financeiros (a chamada inovação ou engenharia financeira).

O papel dos bancos de investimento na proporção tomada pela

dominância financeira é central, na medida em que esses foram os

grandes provedores de recursos aos demais atores do sistema financeiro,

em especial os fundos hedge. Também têm atuação decisiva nos

processos de fusão e aquisição de empresas produtivas, atuando em

alavancagens de empresas dos fundos de private equity, características

dos anos 2000. Sua participação como elemento decisivo em episódios

marcantes das três últimas décadas, que resultaram em exacerbação

financeira e crise — tais como a criação do mercado de junk bonds nos

anos 80, a abertura de capitais para empresas nascentes no episódio da

bolha da internet e a securitização de títulos subprime no episódio da crise

financeira norte-americana de 2007 —, atesta sua importância como

elemento dinamizador do sistema financeiro. Seu papel enquanto

financiador das atividades dos fundos especulativos (hedge funds)

garantia liquidez e mercado para a consecução de suas estratégias de

estimular a alta na atividade de alguns segmentos do mercado. Sua

relação com os demais investidores institucionais, com as agências de

notação e com os mercados de capitais possibilitou a potencialização de

seus ganhos e a transferência de riscos aos demais segmentos do

mercado financeiro, transformando-os em um segmento de alta

lucratividade estrutural. Essa situação perdurou ao menos até a

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emergência da crise financeira de 2007, a qual levou a um

questionamento de seu papel de financiador do sistema bancário paralelo,

alavancado, materializado em instituições não bancárias que operam

como bancos sem o constrangimento regulatório dos mesmos (shadow

banking system), e de principal agente difusor das inovações financeiras.

Enunciado 4: a instabilidade intrínseca ao sistema financeiro tornou

imperativo que as inovações financeiras se direcionassem a reduzi-la, e,

paradoxalmente, esse se tornou o principal negócio em tamanho e

lucratividade do capitalismo sob dominância financeira.

Para tanto, foram criados dois grupos de produtos: a securitização

— transformação de dívidas em títulos negociáveis, inclusive em mercados

secundários — e os derivativos — a possibilidade de operação do futuro no

presente, a partir de operações cujo valor deriva do preço de outro ativo.

Essas duas classes de instrumentos financeiros possuem a mesma

finalidade: a redução dos riscos inerentes à necessidade de operação em

um ambiente caracterizado pela forte volatilidade e instabilidade. A

securitização permite a pulverização dos riscos de uma aplicação entre

uma grande quantidade de aplicadores, notadamente de investidores

institucionais. Ao mesmo tempo, força os captadores de poupança a

aceitarem as orientações estratégicas do capital financeiro. Por sua vez,

os derivativos constituem-se em instrumentos de dupla face por

excelência: ao mesmo tempo em que permitem uma redução do risco

para aqueles que necessitam comprar proteção contra a volatilidade

excessiva dos preços em um mercado liberalizado, permitem uma aposta

especulativa de parte dos vendedores de proteção em relação aos preços

dos ativos financeiros. A securitização e os derivativos corresponderam a

tal necessidade criada pela instabilidade intrínseca à finança e se

tornaram os principais instrumentos negociados globalmente. Entretanto,

ao mesmo tempo em que conferem proteção microeconômica aos atores,

interligam mercados, atores e maturidades, aumentando o risco do

sistema financeiro como um todo. Essa situação de maior risco sistêmico

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se ampliou ao longo do período analisado com a crescente sofisticação dos

instrumentos criados e vendidos pelos bancos de investimento e avaliados

pelas agências de notação.2 A título de exemplo, a criação do mercado de

Credit Default Swaps (CDS) ao final dos anos 90 e sua crescente

importância nos anos 2000 levou ao paroxismo a ideia de “proteção”

proporcionada pelos derivativos, bem como a cadeia de risco expandida

correlata. Nesse mercado, é vendida proteção contra a possibilidade de

default de dívidas de empresas, países e outros títulos, para os quais são

criados índices específicos. O interessante é que mesmo quem não possui

interesse direto nessa proteção pode comprá-la em uma aposta

especulativa quanto à saúde financeira de uma empresa ou de um setor

da economia. De outro lado, agentes que assumem a posição credora em

uma transação podem comprar proteção contra o não pagamento da

contraparte no negócio, até mesmo em valor maior do que o emprestado,

diminuindo (e, por vezes, eliminando) seu incentivo em negociar uma

solução que impeça a inadimplência e, até mesmo, incentivando-os a

acelerar cobranças, ao saberem da situação difícil da parte devedora.

Trata-se de um mercado imenso e de uma cadeia bastante complexa de

proteção, onde, ao invés do que ocorre em outros mercados de

derivativos, o valor nocional é normalmente uma fração do valor

realmente em jogo. Em 2010, trata-se de uma das maiores fontes

observadas de risco para o sistema financeiro como um todo, dada a

complexidade da cadeia de transações em posições compradas e vendidas

em contratos customizados de balcão. Até o momento, seu modo de

funcionamento — sem qualquer supervisão ou regulação — permanece

2 Satyajit Das, um dos principais conhecedores do mercado de derivativos e de seu desenvolvimento, afirmou recentemente, em uma crítica devastadora, que “[...] produtos cada vez mais complexos e opacos são usados para aumentarem o risco e a alavancagem bem como para ultrapassar restrições aos investimentos, às regras quanto ao capital bancário e a legislação quanto aos títulos e aos tributos. […] muito do que passa por inovação financeira é especificamente desenhado para esconder o risco ou a alavancagem, confundir os investidores e reduzir a transparência. Esse processo é inteiramente deliberado. Eficiência e transparência não são consistentes com as altas margens de lucro de Wall Street e da City“. Publicado em: <http://acemaxx-analytics-dispinar.blogspot.com/2009/12/interview-satyajit-das-risk-consultant.html>, em 22.12.2009.

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intocado, apesar dos sucessivos alertas quanto aos perigos que esse

mercado coloca ao sistema.

Enunciado 5: a emergência do regime de acumulação sob dominância

financeira aportou mudanças significativas nas características dos fluxos

internacionais de capital correspondentes à globalização produtiva —

comércio e investimento direto estrangeiro (IDE).

A expansão do comércio internacional foi intensa e estrategicamente

comandada pela expansão pelos investimentos diretos, ainda que

quantitativamente inferior àquela apresentada por estes. O comércio

internacional aprofundou tendências originadas com a disseminação das

empresas multinacionais industriais ainda nos anos 50: os fluxos de IDE

passaram a direcionar o comércio internacional (de forma estável,

aproximadamente dois terços do comércio mundial têm participação de

empresas multinacionais), comprovando o fracasso das teorias

neoclássicas, que opunham como excludentes fluxos de investimentos e

de comércio; os caráteres intrafirma e intraindústria do comércio

fortaleceram-se com a criação de redes mundiais de comércio, sob

liderança de multinacionais do setor industrial ou de serviços. Mudanças

correlatas, mas significativas, também ocorreram a partir dos anos 80: os

produtos de maior conteúdo tecnológico passaram a liderar a dinâmica

comercial; o aumento do comércio intrafirma refletiu em seu conteúdo a

maior participação do comércio de partes e de componentes no total

mundial, com a onda de investimentos em busca de racionalização

produtiva e de redução de custos das empresas multinacionais sendo

complementar à criação de áreas de livre comércio, o que originou a

formação de cadeias produtivas internacionais de montagem de produtos;

as novas tecnologias de informação e de comunicação possibilitaram a

expansão do comércio de serviços, praticamente nulo até então. Do ponto

de vista geográfico, houve um deslocamento progressivo dos fluxos

comerciais em direção aos países asiáticos, embora existam diferenças

significativas na composição dos fluxos comerciais asiáticos ao longo do

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Scherer, A. L. F.; Souza, E. C. de. Período 1979-2009: ascensão e queda do capital financeiro.

período. Entre os países desenvolvidos, Alemanha e Estados Unidos

mantiveram posição de destaque nos fluxos de exportação, tendo os

Estados Unidos se destacado enquanto principal polo dinâmico mundial no

que tange às importações.

Enunciado 6: o investimento direto estrangeiro subordinou-se ao

imperativo estratégico financeiro, o que levou a mudanças importantes

nas características dos fluxos de IDE, quando comparadas àquelas do

período pós Segunda Guerra Mundial.

Essas modificações levaram a um predomínio das fusões e das

aquisições nas estratégias de expansão das empresas multinacionais.

Essas foram promovidas pelos bancos de investimento e pela expansão do

mercado de capitais a partir da década de 80 e tiveram ao menos três

fases distintas: a criação do chamado market for corporate control nos

anos 80, com o predomínio das aquisições hostis financiadas por títulos

securitizados de dívida das empresas compradoras; as fusões “amigáveis”

dos anos 90, financiadas por emissões de ações das empresas

compradoras; e as compras para “fechamento do mercado” nos anos

2000, promovidas pelos fundos de private equity, a partir da emissão de

títulos pelos bancos de investimento, os quais eram repassados a outros

investidores, principalmente os hedge funds. Outra mudança importante

deu-se com a internacionalização do setor serviços, essencialmente a

partir da onda de privatizações nos anos 80 e 90. Essas duas

características fazem com que, embora a presença de funcionários das

empresas multinacionais tenha-se ampliado constantemente no mundo,

elas pouco tenham contribuído para a geração global de empregos, uma

vez que houve pouca expansão da capacidade instalada nesse período. O

investimento das multinacionais direcionou-se essencialmente para os

países desenvolvidos nos anos 80 e 90. O investimento direto destinado à

China foi exceção durante todo o período, ao receber prioritariamente

investimentos novos (ditos greenfield) no setor industrial. Esses

investimentos consolidaram, nos anos 2000, o País como principal centro

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manufatureiro mundial, com a integração das empresas do Japão, da

Coreia e de demais países asiáticos em desenvolvimento como

fornecedoras de partes e de equipamentos para a produção final das

empresas localizadas em território chinês. Este último período também

marcou a expansão sem precedentes das alianças estratégicas entre

empresas para o desenvolvimento de projetos específicos, sem que isso

representasse necessariamente mudanças societárias ou fluxos

internacionais de capital.

Enunciado 7: o domínio financeiro das empresas não financeiras

consolidou-se com a criação de um conjunto de regras informais sob o

nome amplo de governança corporativa, na tentativa de adequar as

práticas dos executivos às exigências dos acionistas proprietários.

Essas regras, que, pouco a pouco, foram institucionalizando-se a

partir da atuação das agências de controle de valores mobiliário em todo o

mundo, assimilam o interesse das empresas aos objetivos de lucratividade

de curto prazo dos acionistas. Em nome de princípios de validade

universal, como a transparência, a utilização eficiente do capital e, até

mesmo, a democracia (ao defenderem o interesse dos acionistas

minoritários frente à “ditadura” dos majoritários), alinham a estratégia

das empresas não financeiras aos objetivos de curto prazo de seus

principais acionistas, sobretudo os investidores institucionais, os quais,

atuando em conjunto, possuem grande força na definição da estratégia da

empresa. As regras orientadoras da governança corporativa passam pela

participação de representantes dos acionistas nos Conselhos de

Administração, pela exigência de prestação de contas trimestral aos

investidores e pela instituição da remuneração variável dos executivos e

principais gerentes da empresa (principalmente, a partir da distribuição de

participação nos resultados e de opções de ações da firma para a qual

trabalham em condições vantajosas), o que direciona a ação executiva

para a linha de lucratividade máxima no curto prazo desejada pelos

proprietários do capital. Uma “má governança corporativa”, do ponto de

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vista do capital financeiro, pode levar à destituição da diretoria executiva

da empresa ou, em caso de persistência dos maus resultados, à

debandada dos investidores institucionais do capital da firma, tornando-a

presa fácil para outras empresas concorrentes com acesso facilitado ao

crédito e aos aportes de novos capitais. Os principais problemas

decorrentes dessa forma de gestão transparecem na dificuldade das

firmas em convencer os investidores a financiarem projetos de longo

prazo com alto grau de incerteza, típico das atividades inovadoras3,

afetando o dinamismo de longo prazo da economia capitalista, e no fato

de que o perseguido alinhamento de objetivos entre executivos é, por

definição, uma miragem fadada ao fracasso. Assim, as fraudes contábeis

no sentido de mascarar o resultado efetivo das empresas sucederam-se

quando da crise das ações de empresas de alta tecnologia nos EUA, no

início dos anos 2000, e, apesar do reforço da legislação quanto à

responsabilidade dos executivos ocasionada por esse fracasso (Sarbanes-

Oxley Act, 2002), tornaram a repetir-se na crise imobiliária do final da

década. Neste último caso, foi posta em xeque a forma de remuneração

dos executivos das empresas financeiras, a qual estimulava a obtenção de

ganhos de curto prazo em empreendimentos que, em longo prazo, se

mostrariam desastrosos.

Enunciado 8: a captura dos principais países em desenvolvimento às

malhas do jogo financeiro internacional, a partir do final dos anos 80,

tornou a economia mundial ainda mais instável, resultando em seguidas

crises, que colocaram em dúvida a eficácia e a universalidade da

dominância financeira.

Para pertencerem ao círculo hierárquico-financeiro dos “mercados

emergentes” — transmutação semântica que os despiu de sua antiga 3 As atividades de inovação nos Estados Unidos têm-se concentrado em setores que possuem apoio estatal para projetos de longo prazo, caso da indústria farmacêutica e da rede de empresas fornecedoras do complexo militar norte-americano, como o eletrônico. Atualmente, a pesquisa intensifica-se no setor de energias alternativas ao petróleo, também com apoio estatal. Apesar de todo o esforço empreendido e de vários bilhões gastos, a biotecnologia, a nanotecnologia e os novos materiais ainda não respondem significativamente enquanto difusores de novos produtos comercialmente viáveis.

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condição de “país em busca de desenvolvimento” para confiná-los à

condição de plataforma de valorização do capital financeiro sob o

julgamento constante do “mercado” e das agências que os representam

—, países como México, Argentina, Brasil, Rússia, Malásia, Tailândia e

tantos outros foram obrigados, em maior ou menor grau, a aceitarem a

imposição da abertura aos fluxos de capital internacionais de curto prazo.

Com a expertise especulativa nos mercados cambiais dos fundos hedge,

testada com sucesso nos países desenvolvidos, nos anos 80 e início dos

90 (ver as crises europeias do início da década de 90, em especial na

Inglaterra), confrontando-se com a inexperiência e a cegueira ideológica

dos gestores de política monetária treinados nas universidades norte-

-americanas desses países, o resultado apenas poderia ser o de uma

lucrativa sucessão de crises cambiais nos “mercados emergentes” a partir

de 1995, como a crise mexicana. A esta se seguiram as crises asiática

(1997), russa (1998), brasileira (1999) e argentina (2001), causando

fortes quedas nas taxas de crescimento dos países e das regiões

envolvidas. Mais uma vez, ao mesmo tempo em que essas crises eram

erroneamente interpretadas como ocasionadas por “falta de adequação ao

quadro institucional liberalizante, tendo por modelo os EUA e a

Inglaterra”, a China seguia na contramão da tendência, adotando e

gerenciando rígidos controles de capital, que lhe permitiam controlar a

taxa de câmbio e impedir o contágio das crises internacionais.

Enunciado 9: a crise asiática ocupa um lugar de extrema importância na

compreensão das mutações do capitalismo financeiro nos anos 2000, bem

como na crise idológico-financeira que marcou o final da primeira década

do século XXI.

A crise asiática marcou o final o discurso unilateral triunfante do

capitalismo sob dominância financeira (o qual teve seu auge com a queda

do Muro de Berlim e a posterior dissolução da União Soviética) e marcou o

início de uma contestação ideológica que levou a uma compreensão

superior dos mecanismos e das instituições do sistema de dominação

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operante. Ocorrida em uma região que representava um símbolo do

crescimento da economia mundial (embora muito pouco das instituições

preconizadas pelo capitalismo financeiro tenha estado na origem desse

êxito), a crise asiática teve como principal característica econômica a

capacidade de contágio e transmissão de país para país da região. Iniciada

na Tailândia, logo atingiu a Malásia, a Indonésia e a Coreia do Sul, um

movimento “contagioso” que demonstrou a interligação financeira

existente entre os diversos mercados, ocasionada pelas cadeias de

aplicações/dívidas transfronteiras e pela “repartição do risco”, ocasionada

pelas características do mercado de derivativos cambiais. Paralelamente,

o colapso do fundo hedge alavancado Long-Term Capital Mangement

(LTCM) e a intervenção do Federal Reserve na coordenação de um resgate

internacional, em última instância, de suas dívidas para uma instituição

que não se encontrava sob sua supervisão apontaram os riscos que essas

instituições não bancárias colocavam ao sistema financeiro internacional,

sem que nenhuma providência ulterior tivesse sido tomada. Politicamente,

a crise asiática abriu espaço para diversas manifestações contra o

neoliberalismo ao redor do mundo, no final da década de 90 — a derrota

do Acordo Multilateral de Investimentos na OCDE e os protestos contra a

OMC em Seattle, seguidos de manifestações massivas em reuniões de

organismos multilaterais, na Europa, foram a linha de frente para a

organização do Fórum Social Mundial em Porto Alegre, em oposição ao

Fórum Econômico Mundial de Davos —, e teve consequências econômicas

que ultrapassaram muito a sua superação. O fato de a China ter mantido

o valor de sua moeda, não alimentando a continuidade das

desvalorizações competitivas autoalimentadas, que ameaçavam dar

continuidade ao processo de desvalorização dos ativos financeiros

regionais, colocou-a em posição confiável politicamente, frente à potência

norte-americana e às demais economias regionais. Ao mesmo tempo, a

superação da crise trouxe uma desconfiança fundamental dessas

economias em relação ao mercado de capitais internacional, reduzindo o

consumo interno e aumentando a poupança, a partir da implementação de

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uma política econômica e cambial voltada ao progressivo acúmulo de

reservas, de modo a reduzir o risco de novo colapso externo. Assim, já ao

final dos anos 90, ficou evidente a existência de sobras na produção de

bens duráveis oriundos da região, os quais apenas poderiam ser escoados

para os países desenvolvidos (no caso, os Estados Unidos). O estouro da

bolha tecnológica da NASDAQ e o atentado às Torres Gêmeas

desaceleraram o crescimento da economia norte-americana nos primeiros

anos do século XXI, forçando os países asiáticos a se atrelarem ao

dinamismo da economia chinesa enquanto fornecedores de insumos,

máquinas e equipamentos, ao mesmo tempo em que transferiam suas

plantas de bens finais para aquele país. A crise financeira asiática

transformou-se em uma crise produtiva, que modificou a geografia da

produção regional, com efeitos deflacionistas para o comércio mundial de

bens manufaturados, que caracterizaram a primeira década do século XXI.

Enunciado 10: as respostas asiática e norte-americana aos

acontecimentos do final da década de 90 exacerbaram os desequilíbrios

econômicos mundiais preexistentes, em nível tanto macroeconômico

quanto microeconômico, tornando crescente o risco de um colapso

financeiro sistêmico.

O sistema financeiro internacional, consolidado após 1980,

repousava sobre a capacidade de os Estados Unidos, ao deterem a moeda

mundial, poderem produzir recorrentes déficits em transações correntes.

Esses déficits proviam a necessária demanda que alimentava o aumento

dos investimentos produtivos e o deslocamento da produção industrial em

direção à Ásia. Os superávits daí resultantes eram reciclados no mercado

financeiro norte- -americano e tinham como contrapartida

microeconômica sua transformação em crédito para as famílias daquele

país, o que alimentava o consumo e a demanda por produtos externos.

Esse ciclo financeiro-produtivo, com suas crises passageiras — em

especial, na periferia do sistema, nos anos 90 —, se exacerba com o papel

central e disruptivo da ascensão da China a centro dinâmico da

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acumulação capitalista mundial. Ao contrário do Japão, a China não aceita

o jogo da livre flutuação de sua moeda, nem tem o grau de abertura

financeira dos demais países asiáticos. Do ponto de vista político, trata-se

de um país com maior capacidade de resistir às ameaças protecionistas

frequentemente lançadas pelos EUA, e esse poder avança com a

constituição de reservas em níveis espetaculares. Isso confere à China

uma capacidade de manter sua taxa de câmbio relativamente

desvalorizada, sem que as pressões norte-americanas tenham sucesso no

sentido de modificarem essa situação. De outro lado, a resposta norte-

americana à crise das ações das empresas de alta tecnologia passou por

uma redução continuada das taxas de juros, na tentativa de sustentar a

demanda abalada pela deterioração no nível de riqueza financeira das

famílias. Essa resposta criou as condições para que se formasse uma nova

bolha especulativa, dessa vez no setor imobiliário, com a elevação nos

preços dos imóveis alimentando a expansão do crédito e do consumo a

partir de 2003. Assim, os desequilíbrios que já existiam, tanto em nível

das relações entre os déficits norte-americanos e os superávits asiáticos

quanto em relação ao nível de endividamento das famílias nos Estados

Unidos, se tornaram explosivamente crescentes ao longo da década, até a

derrocada parcial do sistema a partir de 2007.

Enunciado 11: a expansão econômica, acelerada entre 2003 e 2007,

integrou o sistema produtivo mundial de forma global a partir da relação

China/EUA, trazendo um papel relevante para os países produtores de

commodities de regiões que, até então, eram perdedoras no processo de

globalização da economia.

Apesar de as promessas de uma economia mundial integrada e de a

metáfora do “mundo sem fronteiras” datarem ainda da década de 80, a

realidade da globalização foi rigidamente hierárquica. O centro esteve nos

Estados Unidos, com Wall Street (e, subsidiariamente, na City londrina),

com os demais países desenvolvidos em segundo plano. A esses se

seguiam os “mercados emergentes” e, em último plano, países como a

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Bolívia, o Paraguai, a Angola e tantos outros, os quais não apresentavam

potencial para serem nem mesmo plataforma de valorização financeira

para o capital. Do ponto de vista da inserção produtiva, as características

do IDE e do comércio mundial dificultavam sobremaneira uma inserção

virtuosa dos países produtores de commodities, dados o dinamismo

relativo do comércio de bens tecnologicamente mais sofisticados e sua

falta de inserção nas cadeias produtivas mundiais formadas pelas

empresas multinacionais. Ainda, a ideologia do livre comércio e a disputa

continuada (e estimulada pelas empresas) pela atração de investimentos

produtivos tornavam uma inserção virtuosa na economia mundial uma

batalha quase perdida, sobretudo para os países latino-americanos e

africanos. Os desdobramentos da crise asiática, com a emergência da

China enquanto centro organizador da produção mundial, bem como o

rápido crescimento da economia da Índia, alteraram de forma importante

esse quadro no período 2002-07. A continuidade de elevadas taxas de

crescimento na China e na Índia, países imensamente populosos, levou a

uma pressão crescente sobre os preços dos alimentos, das matérias-

primas agrícolas e, principalmente, das matérias-primas minerais,

pressionando rapidamente os preços desses mercados. O espectro da

escassez energética, com o esgotamento progressivo de fontes de energia

não renováveis, foi reavivado (o chamado peak-oil), o que fez com que o

preço do petróleo tivesse alta constante. Esse movimento chamou a

atenção dos bancos de investimento e dos fundos especulativos4, os quais

passaram, a partir de 2004, a alimentar especulativamente a tendência

altista dos preços das commodities. Confrontado esse aumento dos preços

das matérias-primas com as pressões deflacionistas pelas quais passavam

os preços dos produtos industrializados a partir da crise asiática, o

resultado foi a evolução dos termos de intercâmbio em favor dos países

produtores de commodities. Isso permitiu o fortalecimento das reservas

de países da América do Sul e da África e o crescimento dos fundos

4 Nos EUA, uma grande quantidade de recursos migrou para os fundos Exchange Traded Forward (ETFs), especializados em apostas alavancadas no mercado de commodities. Esses fundos tiveram muito sucesso na captação de recursos após 2004.

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soberanos dos países produtores de petróleo, uma situação cambial mais

estável (principalmente nos países com mecanismos eficientes de

intervenção cambial) e a atração de investimento diretos para os setores

agromineral e de infraestrutura. Essa maior estabilidade econômica,

proporcionada pelo aumento do valor das exportações, contribuiu para a

obtenção de taxas inéditas, nos últimos 30 anos, de crescimento dos

países dessas regiões, integrados à economia mundial como efeito

colateral do crescimento acelerado das economias da Índia e,

principalmente, da China, exacerbando ainda mais os desequilíbrios

econômicos mundiais.

Enunciado 12: a crise financeira iniciada em 2007 difere radicalmente

das demais crises da globalização financeira em sua amplitude e

abrangência, significando a impossibilidade de uma renovação virtuosa da

economia sob dominância financeira.

A crise econômica atingiu o centro do sistema financeiro e sua forma

de funcionamento e de encadeamento com a área produtiva da economia.

O ciclo econômico virtuoso comandado pela finança (finance-led growth)

funcionava a partir de uma expansão creditícia baseada no aumento do

preço dos ativos financeiros (no caso, do imobiliário), o qual possibilitava

a expansão do consumo e, posteriormente, do investimento, alavancando

o crescimento da economia e a geração de empregos, notadamente no

setor serviços. Dada a possibilidade de financiamento automático do seu

déficit corrente a partir da detenção da moeda de reserva mundial, esse

sistema apenas podia funcionar em sua plenitude nos Estados Unidos,

que, consequentemente, foi o País desenvolvido que atingiu maior

crescimento após 1980. Esse encadeamento foi atingido, em todos os

seus elos, pela crise que se iniciou em 2007. Os bancos de investimento, o

sistema bancário paralelo, as inovações financeiras, a desregulamentação

e a liberalização do sistema financeiro, a governança corporativa e as

agências de notação foram colocados sob severa suspeição após a

transmutação da crise imobiliária em crise financeira, em agosto de 2007,

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e, posteriormente, após a passagem desta a uma crise econômica mundial

em 2008. O crescente endividamento das instituições financeiras e dos

consumidores, que caracterizou o avanço do processo de dominância

financeira a partir da formação de sucessivas bolhas de ativos, que

aumentavam ficticiamente a riqueza financeira das empresas e das

famílias, deu lugar a um movimento de desalavancagem sistêmica, que se

expressa na exigência de uma maior taxa de poupança das famílias e das

empresas nos Estados Unidos. A quebra do banco Lehman Brothers, em

setembro de 2008, paralisou completamente o sistema financeiro e

desnudou o processo de interligação de mercados e de maturidades

promovido pela securitização e pelos derivativos, cada vez mais

complexos, em um movimento em cadeia que, até hoje, causa espanto

aos mais desavisados quanto às especificidades do sistema financeiro

montado nas últimas três décadas5. Subitamente, ficou evidenciada a

irresponsabilidade de operações em mercados e instituições, que, apesar

de proporcionarem elevado risco sistêmico, operavam sem qualquer

supervisão (quiçá regulamentação...) das autoridades monetárias e de

valores mobiliários. As perdas com a crise, inicialmente avaliadas em

centenas de milhões de dólares, atingiram, por esse processo sistêmico,

um montante que se estima superior aos US$ 4 trilhões, até o momento,

especialmente nos EUA e na Europa. O relaxamento da política monetária,

que tão bem havia dado conta dos efeitos recessivos ocasionados pelo

estouro de bolhas anteriores, dessa vez se mostrou insuficiente. O antes

execrado setor público foi chamado, com urgência urgentíssima, como

único ente capaz de paralisar, em última instância, a cadeia de quebras

que ameaçava o setor financeiro norte-americano (e, por extensão, o

mundial), transformando os maus negócios privados em dívida pública,

dado o risco de uma depressão econômica mundial. Com o espectro da

Grande Depressão rondando os espíritos mais avisados, pacotes de

5 A pergunta “Como pôde um mercado relativamente pequeno como o do imobiliário subprime causar um montante em perdas estimadas em mais de 50 vezes superior ao seu valor total?” é feita, até hoje, com frequência e mostra um desconhecimento quanto às características e à complexidade do sistema financeiro mundial.

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estímulo econômico foram lançados pelos Estados, na tentativa de

sustentar a atividade econômica e de impedir um avanço avassalador do

desemprego em todo o mundo. Assim, dada a ameaça concreta da

desintegração do sistema financeiro e da queda econômica, políticas que

vinham na contramão da não intervenção, pregada durante os primeiros

anos da década de 80, e que deram base à hegemonia financeira foram

saudadas corretamente como a única possibilidade de se evitar um

colapso econômico-financeiro mundial de proporções impossíveis de

serem previstas, caso não tivessem sido adotadas. Durante o ano de

2009, essa intervenção surtiu relativo efeito, especialmente após o mês

de março. O relaxamento de regras contábeis e a injeção de recursos

públicos a custo zero nas instituições bancárias dos EUA permitiram um

retorno à lucratividade contábil do sistema financeiro norte-americano,

possibilitando um novo avanço das atividades especulativas, nos

mercados tanto de commodities quanto de capitais dos países

desenvolvidos e, principalmente, dos países emergentes. Esse

desenvolvimento proporcionou uma aparência de normalidade às finanças

mundiais e à repetição insaciável do mantra “a crise acabou” pelos meios

de comunicação. Entretanto a intervenção estatal apenas proporcionou

que o sistema financeiro norte-americano ganhasse tempo, sem resolver

nenhuma das questões de fundo conjunturais ou estruturais que levaram

à eclosão da crise. A impossibilidade de recuperação dos níveis de crédito

às famílias continua tanto nos EUA quanto na Europa, mostrando a

fragilidade da incipiente recuperação — mais propriamente, uma

estabilização no fundo do poço — da atividade econômica e do emprego.

Assim, a recuperação financeira atual possui uma característica

fundamentalmente diferente daquela que marcou a saída de outras crises,

pois vem acoplada a um quadro de estagnação produtiva, com o setor

financeiro representando mais um peso do que um estímulo à sociedade.

Aqueles que ainda sonham com a volta ao sistema de dominância

financeira tal qual vigorou até 2007 terão de se confrontar com a

realidade, que mostra que é impossível beber água em um copo

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despedaçado, mesmo que a imensidão de pedaços tenha sido colada às

pressas. A cola da confiança, que soldava a expansão constante do crédito

a partir de um endividamento progressivo, derreteu com a crise

financeira. A História mostra que é impossível voltar atrás.

Enunciado 13: politicamente, o fortalecimento relativo do setor

financeiro em 2009, embora frágil, reforçou a posição dos setores sociais

que não desejam nenhuma mudança substantiva na regulação dos

mercados e das instituições financeiras, em que pese ao imenso prejuízo

assumido pela sociedade, podendo representar uma ameaça à

estabilidade financeira mundial.

Resolver o nó ocasionado pelo progressivo endividamento do setor

público dos países desenvolvidos, para manter intocado até o momento

um sistema financeiro não funcional do ponto de vista da acumulação

capitalista, traduz o imenso desafio que estes enfrentam, para possibilitar

uma retomada consistente da atividade econômica e afastar a ameaça,

cada vez mais presente, de estarem fadados à estagnação de longo prazo,

tal qual acometeu a economia japonesa após o fim da bolha imobiliária,

ainda em 1990. Não reformar radicalmente o modus operandi do sistema

financeiro mundial é correr o risco de ter de se confrontar, em momento

relativamente breve, com uma nova crise, necessariamente de proporções

mundiais (dado o avanço do capital especulativo nos mercados

emergentes), a qual rebateria sobre Estados ainda mais fragilizados

financeiramente do que na crise anterior e com um setor financeiro ainda

mais concentrado do que antes. A concentração de capital em um número

reduzido de instituições financeiras too big to fail não deixa dúvidas

quanto à necessidade de intervenção estatal para socorrê-las em caso de

perdas que ameacem a continuidade de suas atividades. Isso coloca seus

executivos na posição confortável de poderem arriscar o máximo em

apostas especulativas ao redor do mundo — e, em caso de acerto,

embolsarem grossas somas em generosos bônus por desempenho —,

tendo a certeza de que o Estado se obrigará a socorrê-los em caso

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contrário, restando apenas a dúvida quanto a capacidade financeira dos

Estados para tanto.

2 EFEITOS IDEOLÓGICOS, GEOPOLÍTICOS E CIVILIZACIONAIS DO CAPITALISMO FINANCEIRO

Após estabelecermos algumas proposições que definem em geral as

estruturas do capitalismo financeiro e desenvolvermos diversos

enunciados que trabalham a relação entre elementos da estrutura e a

dinâmica dos processos econômicos, chegando inclusive a tratar de fatos

dinâmicos empíricos, nesta seção, propomos a constatação de dois efeitos

profundos deste capitalismo financeiro. De um lado, fixamos as

transformações geopolíticas que ocorreram no período e, de outro, as

consequências que culminam numa sucessão de crises, que ultrapassam

as dimensões de uma vasta crise econômica.

Efeito 1: o capitalismo financeiro transforma a ideologia em indústria

midiática.

Para que seja dada a devida importância a tal mudança, devemos

levar em conta que a indústria midiática incorpora à antiga mídia

(imprensa, rádio, publicidade) as indústrias do divertimento (cinema e

televisão) e as novas mídias, como a internet, por exemplo. Observa-se a

ampliação exponencial daquilo que Guy Debord chamou de uma

“sociedade do espetáculo”, sociedade baseada tanto no poder da imagem

quanto na desqualificação da cultura. Trata-se da passagem de uma mídia

liberal, concorrencial e crítica, do tempo do comando do capital produtivo,

para uma mídia exclusiva do momento do pensamento único. Essa

passagem assegurou, durante 30 anos, o absoluto domínio ideológico do

capitalismo financeiro, através de uma mentalidade, de valores e de ideias

que promovem os vencedores e “o estilo norte-americano de habitar e

viver”. Vejamos a expansão das cidades asiáticas, como Xangai, Dubai,

Macao, Hong Kong, etc. Não se exclui a financeirização do esporte,

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canalizando para a cotidianidade diária e imediata o tema da veneração

aos vencedores, bem como a normalização da transformação dos

desportistas em portadores de marcas em ativos financeiros, para o caso

dos mais bem-sucedidos.

No final do período, transformações na tecnologia desvincularam

parte da sociedade dessa hegemonia ideológica, através do escape dos

cidadãos via internet, através de sites, celulares, blogs e twitter, na busca

de notícias mais consistentes e de opiniões, artigos mais substanciais,

com reflexos até mesmo em disputas políticas, como foi a vitória de

Zapatero — impulsionada, no último momento, por mensagens SMS sobre

o atentado de Atocha, que ultrapassaram a censura oficial — nas eleições

espanholas, já no século XXI.

Efeito 2: o processo político do capitalismo financeiro passou da Guerra

Fria para um neoliberalismo de guerra, culminando com uma articulação

econômica com a China.

Como consequência da Segunda Guerra, o mundo polarizou-se entre

os Estados Unidos e a União Soviética, num fenômeno conhecido como

Guerra Fria. O capitalismo industrial norte-americano, com expansão

bancária pelo mundo, transformou-se, após a queda da União Soviética,

definitivamente, num capitalismo de liderança, dominância e hegemonia

financeira, cada vez mais, desregulado. O resultado político-ideológico foi

a passagem do liberalismo político, econômico e existencial para um

neoliberalismo, onde predominou inicialmente o caráter econômico. Esse

neoliberalismo ultrapassou todos os limites, chegando ao nível político na

defesa do unilateralismo dos Estados Unidos. Esse processo culminou na

“guerra contra o terrorismo”, resultado do ataque sofrido pelos norte-

americanos em 11 de setembro de 2001, cujo desdobramento foi a Guerra

do Afeganistão e do Iraque.

O interessante é que o processo político-econômico foi duplo. De um

lado, no campo político, o neoliberalismo desdobrou-se num

neoliberalismo de guerra. “Os Estados Unidos são um povo guerreiro”,

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disse George Bush. De outro, no nível econômico, as necessidades

objetivas do capitalismo financeiro, centrado num vasto mercado de

títulos, centralizado nos Estados Unidos, obrigaram o deslocamento de

muitas de suas corporações para a Ásia, culminando na ascensão

fantástica da China, onde surgiu uma contradição consistente, através de

um capitalismo financeiro de Estado. A crise norte-americana exige fortes

reformulações no campo internacional. Estamos, neste momento, 2010,

atravessando a margem rumo a uma outra forma de capitalismo, ainda

em construção, a uma outra mundialização, onde, certamente, o

unilateralismo deixa o campo para a entrada de um novo multilateralismo,

de configuração ainda ignorada. O que sabemos é que a polaridade

principal será entre os Estados Unidos e a China. Mas, aqui, o futuro mal

começa a ser presente, e tudo são estratégias, conjeturas e perspectivas,

que vão sendo desenvolvidas no interior de um mundo cuja matemática

histórica é uma multiplicação de crises.

Efeito 3: o processo global do capitalismo financeiro e do neoliberalismo

culminou numa multiplicidade de crises, colocando em pauta o tema da

crise da civilização.

O processo social mundial que se viveu nos últimos 30 anos,

caracterizado pela dominância e pela hegemonia do capitalismo financeiro,

trouxe à cena uma multiplicidade de crises. Não bastasse a crise

econômica (com suas violentas quebras financeiras; com a crise das

velhas indústrias, do tipo automobilística; com a crise de crescimento das

tecnologias de comunicação e informação), outras crises emergiram no

panorama da mundialização: a crise política, a crise energética, a crise

ambiental, a crise cultural, a crise de valores e outras mais. Vejamos a

crise política. Vários são os temas que estão surgindo. As perguntas

eclodem com luminosidade. Como será a liderança norte-americana?

Como se dará a relação entre Estados Unidos e China? Qual será o papel

dos emergentes? Qual será o papel da emigração na constituição das

nações? Como será tratado o terrorismo? Como serão enfrentadas as

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máfias, cada vez mais presentes nos cenários econômicos? Haverá

governança internacional? Como serão tratados os países pobres? Etc.,

etc., etc...

Pois, a situação torna-se complexa, porque certamente temos o

surgimento, nas cenas econômica e, mesmo, ambiental, do tema da

energia. O que está em jogo, em primeiro lugar, é a base energética da

infraestrutura produtiva. Só que não se trata apenas da infraestrutura da

economia, está presente também o tema ambiental, que, obviamente, se

complica com tantos outros aspectos: o conteúdo agressivo diversificado

da pluralidade energética; a escassez desigual da água; a erosão e a

desertificação de várias regiões e vários países; a dificuldade de produção

de alimentos em inúmeras partes do mundo; dentre outras questões de

suma importância.

Todavia, não podemos reduzir as crises que o capitalismo financeiro

e o neoliberalismo aportaram apenas a elementos econômicos, políticos

ou ambientais. A crise espraiou-se por outros setores, como a cultura.

Nenhuma sociedade se renova, encontra fertilidade em ideias, em

perspectivas, se a cultura fica entravada. A transformação da cultura de

pensamento, da arte, das ideias e dos valores em mercadorias, que,

ademais, obedecem a uma lógica financeira de valorização, pode

alimentar o comércio dos consumidores, mas não provoca a metamorfose

criativa das sociedades.

E os desafios do momento são imensos, embora a indústria

midiática continue martelando que a crise iniciada em 2007 terminou, que

o mundo está brilhando como nunca. O que percebemos é exatamente o

contrário. E podemos até aventurar que, se olhamos de Nova Iorque a

Xangai, de Londres a Tóquio, de Paris a Teerã, de Roma a Cabul, de

Brasília a Bombaim, de Buenos Aires a Bagdá, de Porto Príncipe a

Joanesburgo, enfim, para todos os lugares do mundo — essa crise

financeira, com as suas desigualdades profundas; essa crise política,

incrustrada por uma crise demográfica; essa crise energética, com

incertezas demoradas; essa crise ambiental, da qual o documentário de Al

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Gore visualizou toda a dramaticidade; essa crise de valores, que explode

numa crise cultural —, o que percebemos é que estamos numa crise da

civilização.

Mas não ousemos dizer como certo cientista social que fala em

guerra de civilizações, isso seria esconder que, por trás dessa figura, está

presente a decomposição do capitalismo financeiro. Por isso, constatamos

que todas essas crises são atravessadas pela exacerbação do financeiro,

que introduziu o pensamento único, a sociedade de falsos vencedores, o

mundo da valorização pelo dinheiro, o momento histórico da

desqualificação da cultura, etc.

Ou seja, o saudável desta crise é que tudo pode encontrar novas

soluções e que essas serão encontradas a partir dos múltiplos conflitos em

concorrência. O problema fundamental será a capacidade do mundo de

definir regras para os confrontos. Porque, não há dúvida, os confrontos

estão apenas começando. Que se tenha bem claro: não foi a crise que

terminou, foi apenas o mundo dominado exclusivamente pelas finanças

que ruiu.

Começa, então, um outro mundo. Qual?

3 ECONOMIA BRASILEIRA: QUAL TRAJETÓRIA SOB A HEGEMONIA FINANCEIRA?

Neste artigo, buscamos traçar um quadro descritivo e explicativo de

um fenômeno complexo: a emergência de uma hegemonia do capital

financeiro, seu auge e sua crise e de como esse capitalismo,

hegemonizado pela finança, criou suas instituições e suas regras de

funcionamento, formando um sistema tão autoritário (pois não permitia

qualquer espaço para uma atuação dissidente) quanto flexível (baseado

em regras informais, convenções e na autorregulação).

Foi nesse ambiente que se desenvolveram as economias brasileira e

gaúcha, sob condições extremamente desiguais. A relação entre a

economia brasileira e o período da hegemonia financeira possui algumas

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especificidades bastante curiosas. Entre 1980 e 1993, o Brasil esteve sob

o peso de uma dívida externa que não mais podia ser refinanciada nas

condições anteriores. A primeira delas, que, em certo sentido, condicionou

as demais, trata-se do avanço da financeirização da economia brasileira

frente à sua inserção mais efetiva no processo da globalização

contemporânea. O avanço da inflação, nos anos 80, transformou o setor

financeiro nacional no setor líder da economia brasileira, em plena crise

inflacionária e estagnação econômica.

No Brasil, ao contrário do que ocorreu na Europa, não foi a

integração concorrencial ao sistema financeiro internacional que levou a

um relaxamento das regulações locais e a um avanço do setor financeiro

na luta intercapitalista. Aqui, o isolamento forçado do País, ocasionado

pela crise da dívida externa em 1982, e o decorrente surto inflacionário,

que se sucederam ao longo da década, tiveram como subproduto que um

setor não integrado à economia mundial se modernizasse

tecnologicamente — os ganhos com o floating intensificavam-se com a

inflação, ao mesmo tempo em que justificavam investimentos pesados em

tecnologia que permitissem ao setor financeiro maior agilidade e rapidez

no tratamento dos dados, ao contrário do que ocorria com os demais

setores da economia nacional — e se fortalecesse localmente, tornando-

se, pouco a pouco, o centro da acumulação capitalista no País.

Ao final dos anos 80, ganhou espaço o discurso neoliberal, sob

influência tanto dos fracassos na resolução do problema inflacionário

quanto de uma articulação conservadora, montada para a elaboração da

Constituição de 1988. Essa via, nas causas dos fracassos do combate à

inflação, um erro de diagnóstico. A abertura comercial e financeira, bem

como as privatizações e o ajuste fiscal pelo lado da despesa, foi

incorporada à agenda política nacional. A eleição de Fernando Collor, no

início dos anos 90, foi resultado desse novo ânimo conservador.

Entretanto o total improviso na elaboração do Plano Collor de combate à

inflação e sua abrupta condução, bem como a falha em seu diagnóstico,

que colocava o déficit público como causa primeira do desequilíbrio

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interno, levaram-no rapidamente ao fracasso e, com ele, o próprio

mandato presidencial. O grande passo para o controle inflacionário foi

dado, com êxito, na repactuação da dívida externa brasileira, nos moldes

do Plano Brady, entre 1992 e 1993. Essa renegociação recolocou, em

1993, o Brasil na órbita de interesse dos aplicadores internacionais e abriu

as portas para a transformação do País em “mercado emergente”. O

problema inflacionário que preexistia no Brasil tornou-se descontrolado

com a crise da dívida externa, que isolou o País dos fluxos de capitais

externos e o obrigou a um ajuste externo inflacionista, sendo equacionado

com a repactuação dessa dívida e a possibilidade de nova entrada de

divisas (retomada do endividamento externo). Esse foi o pré-requisito

fundamental para o sucesso do Plano Real, embora seja justo

reconhecermos a competência técnica de sua execução inicial, baseada

fundamentalmente nas mesmas premissas que deram origem ao

malfadado Plano Cruzado (derrotado essencialmente pela incapacidade do

Governo em promover uma importação massiva de bens de consumo,

dada a falta de divisas). O controle do processo inflacionário sob a égide

hegemônica neoliberal e a transformação do país em “mercado

emergente”, com a liberalização comercial e financeira, marcaram o fim

de uma etapa, em que o Brasil e o mundo desenvolvido estiveram

dissociados, dada a impossibilidade do País de receber capitais de curto

prazo, característicos do processo de integração financeira.

Uma segunda etapa iniciou com a estabilização da inflação e a

implementação do Plano Real, alicerçada por massiva entrada de recursos

do exterior, em 1994. Entretanto a condução do Plano Real, após seu

êxito inicial, não fez jus à engenhosidade de sua implantação. A crise

mexicana, ocorrida em dezembro de 1994, acrescentou um risco adicional

aos aportes de capitais aos “mercados emergentes”, fazendo com que os

aplicadores de recursos ao redor do mundo exigissem prêmios maiores

desses países. Foi nesse momento que a armadilha externa se fechou

novamente sobre o Brasil, com os juros elevados, originalmente com a

função de combater a ampliação descontrolada do crédito, sendo causa

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principal de novo descontrole externo, a partir da pressão para apreciação

cambial por eles exercida. Ou seja, houve uma exigência de manutenção

dos juros elevados, devido à deterioração da situação externa da

economia brasileira por eles provocada! A crise asiática e a crise russa

reforçaram a dificuldade de manutenção da política econômica baseada no

câmbio valorizado. A forte queda nas reservas e a fuga de capitais

levaram o Governo a recorrer ao Fundo Monetário Internacional em 1998

e a se comprometer com um programa de austeridade fiscal baseado na

privatização dos serviços públicos remanescentes (telecomunicações e

energia).

O período do primeiro Governo Fernando Henrique Cardoso (1994-

98) encerrou-se melancolicamente: a dívida interna havia aumentado

muito, tal qual a dívida externa, sem que isso tivesse contribuído para

uma expansão significativa da taxa de investimento. A elevação da dívida

interna e a remuneração obtida a partir das elevadas taxas reais de juros

consolidaram o sistema financeiro nacional em sua posição dominante,

tanto na economia como na máquina pública (em particular, no Ministério

da Fazenda e no Banco Central).

Em 1999, impôs-se uma mudança nos rumos da política econômica.

Sem conseguir estancar a fuga de capitais, o Governo implantou

novamente o regime de câmbio flutuante, dessa vez acompanhado do

comprometimento com a execução de um superávit primário nas contas

públicas e de um regime de metas preanunciadas para a taxa de inflação

do período. Tratava-se de uma combinação engenhosa, embora

insuficiente, para garantir a estabilidade inflacionária, mas que,

inevitavelmente, mantinha as taxas de juros elevadas6. O resultado foi um

período de estagnação econômica ainda mais contundente que o anterior,

com tímida e lenta melhora no equilíbrio fiscal e externo.7

6 A taxa de juros possui um papel crucial nessa política econômica: ela controla tanto o excesso de consumo e de crédito quanto a excessiva desvalorização cambial e seus efeitos sobre os preços. Esse duplo papel faz com que, em situação de restrição externa, sua queda seja praticamente impossível.7 É interessante relembrarmos que as questões afetas ao crescimento da economia e à geração de empregos eram tratadas, à época, como temas relacionados às reformas de cunho microeconômico, que dariam resultado em longo prazo. As privatizações

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Nesse contexto difícil, o Governo Lula começou timidamente seu

trabalho em 2003, dando continuidade ao tripé de política econômica

herdado do Governo anterior, a partir da nomeação de um ex-banqueiro,

Henrique Meirelles, para a Presidência do Banco Central. Os superávits

fiscais foram apertados, e a política monetária tornou-se ainda mais

ortodoxa, o que garantiu substancial continuidade no fluxo de renda

auferido pelos setores sociais rentistas. O ano de 2003 ainda foi marcado

pela estagnação e pela aceleração do ajuste externo, o qual se consolidou

a partir de 2004. A rápida melhoria da situação externa deu-se,

principalmente, pela reversão dos termos de intercâmbio em favor da

economia brasileira, a partir de 2003. Isso permitiu elevados saldos

comerciais e, a partir de 2005, saldos positivos em transações correntes.

Iniciava-se uma terceira etapa do relacionamento do Brasil com o

exterior, sob hegemonia financeira.

Essa mudança, ocorrida no cenário internacional, concedeu maior

liberdade de atuação ao Governo, o que possibilitou metamorfosear a

melhora da situação externa em aumento do consumo interno, a partir da

implantação de um simulacro de finance-led growth no País. As taxas de

juros nominais puderam ser relaxadas, pois a maior entrada de divisas

(sem endividamento dessa vez), combinada à estagnação dos preços

internacionais dos produtos manufaturados, deu conta das pressões

inflacionárias a partir da valorização da taxa de câmbio. Ora, no cenário

anterior, sem as mudanças externas, uma apreciação cambial teria

resultado em continuados déficits em transações correntes e aumento da

fragilidade externa e, posteriormente, fuga de capitais. Já no cenário

então presente, o efeito foi simétrico: dada a interpretação de uma

mudança estrutural na economia mundial pelos aplicadores internacionais,

modernizariam os serviços, rebaixando o mal alcunhado “Custo- -Brasil”; reformas no sistema previdenciário garantiriam as fontes de poupança privada; reformas trabalhistas introduziriam flexibilidade à economia; e, o mais importante, apenas uma melhoria substancial no sistema educacional traria o “crescimento sustentável”, expressão que foi repetida (e ainda é) ad nauseam, embora não faça nenhum sentido em uma economia capitalista e, portanto, intrinsecamente instável e desequilibrada.

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estes procuraram, com maior voracidade, o País, ainda que as taxas

nominais de juros estivessem cadentes.

Isso permitiu ao Governo promover ações que potencializaram o

efeito do ajuste externo involuntário. A criação e o sucesso instantâneo do

crédito consignado, a consolidação dos programas sociais com o Bolsa

Família, de valor crescente, e os aumentos reais para o salário mínimo

foram políticas que, embora viabilizadas pelo ajuste externo, dialogaram

com a menor fragilidade externa, criando um ciclo interno virtuoso.

A partir do final de seu primeiro mandato, em 2006, o Governo Lula

procurou tomar para si a condução e o fortalecimento do nexo entre

consumo e investimento, com a criação do Plano de Aceleração do

Crescimento (PAC). Tratou-se de importantíssima iniciativa em ano

eleitoral, pois, pela primeira vez após os anos 80, a simbologia do

crescimento e do desenvolvimento suplantava, em apelo, o ideário da

estabilização. A reafirmação desse imaginário político, em especial no

segundo turno da eleição de 2006, comprometeu o Governo com o ideário

do crescimento e da geração de empregos. Tratava-se do embrião de uma

estratégia neodesenvolvimentista, que ganhou fôlego com a descoberta de

grandes jazidas de petróleo na camada marítima do pré-sal, colocando a

Petrobrás no centro da estratégia de investimento projetada para o futuro.

A crise financeira mundial, embora tenha atingido fortemente o

Brasil no último trimestre de 2008, foi contra-arrestada com maior

velocidade do que nos países desenvolvidos, exatamente devido à menor

integração do sistema financeiro nacional com o exterior. Essa decorre

não apenas da origem da dominância financeira no País, mas também de

seu domínio sobre o Estado e de sua capacidade de auferir altíssimas

taxas de lucro, sem a necessidade de exposição excessiva ao risco

cambial e financeiro prevalente nos mercados globais8. A posição pró-ativa

do Estado brasileiro no episódio merece elogios pela efetividade do ataque

fiscal e da política de rendas frente à conjuntura recessiva. A política

8 O Unibanco, que se havia integrado à grande seguradora mundial American International Group (AIG), não resistiu e teve de ser vendido in extremis ao banco Itaú.

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monetária foi relaxada, em um contexto de pressões deflacionistas em

nível mundial, o que permitiu, conjuntamente com o aumento dos prazos

de pagamento, uma nova rodada de expansão creditícia e a manutenção

do consumo das famílias.

Entretanto desafios remanescem. O principal diz respeito ao retorno

dos déficits em transações correntes de grandes proporções, projetado

para 2010. Apesar do elevado nível das reservas em poder do País, a

História, pretérita e recente, mostra que a fragilidade externa e a

manutenção de uma taxa de câmbio irreal, dada a entrada de capitais de

curto prazo, sempre cobram altíssimo custo, quando, por qualquer

motivo, as expectativas de desvalorização cambial prevalecem e

precipitam a fuga de capitais. Em um contexto internacional

extremamente incerto e turbulento, onde existem inúmeros focos

potenciais de crise, com potencial de rápido alastramento, não atentarmos

para essa realidade chega às raias da irresponsabilidade.

Todavia, se olharmos para as perspectivas estruturais e

estratégicas, o Brasil está posicionado por causa do seu elenco de

oportunidades: petróleo, pré-sal, biocombustíveis, produtos alimentares e

até matérias-primas. A questão fundamental é como o futuro Governo e a

futura política econômica vão equacionar a presença ainda forte do capital

financeiro nos países emergentes — logo, no Brasil — e como o País vai

trabalhar a arquitetura de sua posição tanto na economia quanto na

política mundial. Cabe observarmos que não é tão fundamental o Brasil

ser a quinta ou a sexta economia do mundo (a Argentina foi, um dia, a

quarta), mas é decisivo internalizar os setores mais avançados da

atividade produtiva e procurar respostas adequadas na questão

tecnológica, para que se possa sustentar com alguma perspectiva nas

rupturas das etapas econômicas. O Brasil está na hora da razão e na de

pensar, estrategicamente, a sua inserção na nova divisão internacional do

trabalho, negociando habilmente com as finanças e as corporações

produtivas multinacionais.

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4 CONCLUSÃO

O trabalho sobre o capital financeiro, sua liderança, sua dominância

e sua hegemonia conduziu-nos a uma viagem ampla. Em primeiro lugar,

atravessamos o campo teórico, para caracterizarmos os fundamentos da

sua existência, da sua estrutura e da sua história. Isso equivale a

dizermos que, a partir de 1979, houve uma mutação histórica

absolutamente significativa, que envolveu uma nova concepção do Estado

e uma nova concepção da moeda, que deram as condições fundamentais

para o funcionamento do sistema econômico. Em segundo lugar,

descrevemos as condições operacionais dessa hegemonia financeira, seja

porque montou uma rede, uma máquina extremamente competente, seja

porque a tornou fascinante e voluptuosa. Em terceiro lugar, o grande

desenvolvimento dessa forma de capital trouxe uma vertiginosa

acumulação financeira da riqueza, de tal modo que originou uma

complexa construção de entidades das finanças e uma infindável criação

de instrumentos e títulos portadores de valorizações abstratas, de um

modo geral favorecedoras da especulação. Em quarto lugar, o capital

financeiro carregou uma série de inovações sociais, todas, porém,

caracterizadas pela mercantilização dos bens e dos serviços, uma vez que

o capital se aprontou para ocupar os mais diversos setores da sociedade:

educação, arte, cultura, saúde, segurança, previdência, etc. Enfim, os 30

anos foram marcados por uma ambição de domínio completo e total, uma

biografia de uma forma econômica de corpo inteiro e exclusivo, com

pretensões de ser única e insubstituível.

O movimento do período, onde o arco de influência do capital

financeiro avançou sobre todos os cantos do Planeta, integrando tudo —

Américas, Europa, Ásia, África, Austrália, Oceania —, caracterizou-se

igualmente pela capitalização do máximo possível. Em verdade, os

resultados foram brilhantes e enfeitiçadores em determinados momentos.

Contudo, no fim do período, o capitalismo financeiro, em suas formas

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política, militar e ideológica, atingiu modos desvirtuados e efeitos críticos

destruidores. No processo de análise, podemos constatar um decisivo

caminho de transformação da própria ideologia do capital financeiro em

indústria, de grande impacto e grande domínio das populações e que leva

o nome de indústria midiática, onde se situa a indústria cultural. Ela, além

de produzir imagens, ideias, mentalidades, afeições, valores, produtos,

etc., tem a função de veicular e canalizar desejos, aspirações,

sentimentos, no que, o principal, a crítica a qualquer aspecto do sistema,

está ausente. Mas, no fim do período, a vertiginosa subida das finanças

chegou ao seu reverso, ela se projetou numa pluralidade de crises,

vertendo problemas desde a área da economia até a crise energética e

ambiental. Muitos especialistas chegaram a falar em crise da civilização. E

tudo isso dentro de uma transformação imensa da geopolítica, que

certamente vai conduzir o mundo a novos problemas e a novas questões.

Claro, atravessou-se a polaridade entre Estados Unidos e União Soviética,

prosseguiu-se no unilateralismo norte-americano, para chegar a algo

novo, onde sobressai o G-2 — Estados Unidos e China — e põe-se no

palco dos protagonismos um conjunto de nações chamado G-20, onde

aparece igualmente o Brasil.

Num estudo sobre o Rio Grande do Sul, cabe vermos que existem

peculiaridades ao País e ao Estado, mas não podemos deixar de perceber

que existe uma moldura, um enquadramento, uma determinação de

leitura, que acompanha, pelo externo, as dimensões internas da sociedade

brasileira e da sociedade gaúcha. Esses dois lados da realidade desses 30

anos estão contemplados nestes vários volumes.

Porém o texto que aqui se encerra, um texto sobre o capital

financeiro, por mais limitado que seja, trabalha para dar conta do

movimento do capitalismo nos seus propósitos, nos seus enunciados e nos

seus efeitos. Ao mesmo tempo, tenta sublinhar as principais dimensões da

sua ascensão e as múltiplas facetas da sua queda. Por isso, este texto é

capaz de dialogar com os demais desta publicação, fazendo, nas suas

proporções e nos seus pensamentos, pontuações, referências e

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Scherer, A. L. F.; Souza, E. C. de. Período 1979-2009: ascensão e queda do capital financeiro.

indagações que só valorizam os demais trabalhos. Foi nesse sentido que

estas páginas foram escritas.

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