- Cumprimento defeituoso de contrato de empreitada · 2016. 8. 30. · - Cumprimento defeituoso de contrato de empreitada * RELATÓRIO A, empresa de construção Intenta ação declarativa
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- Cumprimento defeituoso de contrato de empreitada
*
RELATÓRIO
A, empresa de construção
Intenta ação declarativa de condenação com processo ordinário contra
B, serviços industriais
Peticionando a condenação da Ré no pagamento de € 121.854.76, quantia essa
alegadamente correspondente aos prejuízos causados à Autora com o cumprimento
defeituoso de contrato de empreitada consistente na limpeza química de equipamento
industrial.
A Ré excecionou a litispendência e reconviu, peticionando o pagamento de €
147.747.97 por trabalhos efetuados e não pagos, sendo € 76.134.96 respeitantes à
empreitada que sustenta o pedido da autora.
A exceção da litispendência foi julgada improcedente.
O objeto do litígio consiste, assim, no cumprimento defeituoso de contrato de
empreitada, suas consequências, bem como no apuramento dos contra créditos da
empreiteira.
A instância mantém-se válida e regular, nada obstando ao conhecimento de
mérito.
Nestes termos, as questões a decidir são as seguintes:
a) Determinar se ocorreu incumprimento ou cumprimento defeituoso do
contrato de empreitada celebrado entre autora e ré;
b) Na afirmativa, apurar os prejuízos que a autora suportou em
decorrência de tal situação;
c) Liquidar o eventual crédito da Ré perante a Autora decorrente de
trabalhos efetuados e não pagos.
*
FACTOS PROVADOS
Estão provados os seguintes factos:
1- A Autora tem por objeto o exercício de atividades industriais e comerciais
relacionadas com construções metalo-mecânicas, assistência e manutenção a
unidades fabris.
2- A Autora de 07/05/2012 a 31/05/2012 realizou trabalhos, como empreiteira, para
a sociedade C, na (…) da mesma, situada na sua refinaria de (…).
3- No âmbito da referida empreitada, a Autora subcontratou a Ré para “Limpeza,
lavagem inseridos nos trabalhos da paragem da C - Área 1” (documento de fls.
12 cujo teor se dá por reproduzido).
4- A atividade da Autora na obra consistia pois nas atividades padrão de mecânica
e manutenção, tais como válvulas de segurança, permutadores, depósitos,
colunas, filtros e bombas.
5- A Autora na execução da sua atividade necessitava que a Ré executasse todos os
trabalhos de lavagens químicas e de limpeza de alta pressão, estando as tarefas
da Ré planeadas, de acordo com o planeamento da obra e do conhecimento da
mesma.
6- Em 27.6.2012, foi realizada uma reunião entre a Autora e a Ré.
7- O planeamento da obra e do conhecimento da Ré sofreu alterações, sendo a
primeira versão a de fls. 13 a 15, cujo teor se dá por reproduzido, e a segunda
versão a de fls. 140-156, cujo teor se dá por reproduzido.
8- A 11 de Maio de 2012, três dias após o início da Paragem, já o Cliente (C)
alertava a Autora para os atrasos da Ré nos Equipamentos E2101/A/B/C/D.
9- A Ré tinha dado o total de 15 horas para fazer o trabalho em cada um dos
equipamentos acima referidos (com inicio na Quarta Feira dia 9 e conclusão a
Segunda Feira dia 14).
10- O atraso e a não aprovação pelo Cliente do trabalho executado pela Ré deveu-se
ao facto de não terem equipamentos adequados nem pessoal qualificado para os
trabalhos que lhes tinham sido adjudicados.
11- Quanto aos Caudalimetros, a C teve de intervir e facultou o produto adequado à
lavagem bem como ensinou os colaboradores da Ré a lavarem-nos de modo a
não os danificar.
12- A Inspeção da C só aprovou os seguintes equipamentos depois de sucessivas
reprovações:
- E 8401 – aprovado à segunda vez.
- D2101 – aprovado à terceira vez.
- D2701 – aprovado à quarta vez.
- D8601 – aprovado à segunda vez.
- T2001 – após 6 dias de lavagem, o trabalho da B foi reprovado e a lavagem foi
entregue à D.
- E2102 – aprovado à terceira vez.
13- Em 14.5.2012, a Autora tinha entregue ao Cliente os caudalimetros.
14- Em 13.5.2012, por insistência do Cliente (C) foi contratada uma outra empresa –
a D - para realizar trabalhos de Alta Pressão, a fim de se recuperar os atrasos
provocados pela incapacidade técnica da Ré.
15- Nesta altura, os equipamentos reprovados pela inspeção tinham sido todos
lavados com máquinas de pouca capacidade, que não conseguiam satisfazer os
requisitos impostos pelo cliente (C), nem os prazos acordados.
16- Na última semana de Maio, a Ré foi afastada da Paragem Geral e até essa data
foram sendo progressivamente retirados à Ré equipamentos, sem prejuízo do
referido em 12.
17- A reunião de 27.6.2012 decorre do referido em 8 a 16.
18- Os equipamentos foram sucessivamente reprovados pela Inspeção do Cliente por
não cumprimento dos requisitos de qualidade exigíveis neste tipo de trabalho.
19- Sempre que os equipamentos eram reprovados, havia necessidade de se voltar a
repetir a Lavagem de Alta Pressão e, consequentemente, adiando-se a data de
entrega dos equipamentos.
20- Da reunião realizada (em 27/6) ficou assente entre a Autora e a Ré que:
- Os trabalhos executados pela Ré nos E 2101/A/B/C/D/, E 2102, E8401,
D2101, D2701, D8601, T2001 foram sucessivamente reprovados devido à
inexperiência dos operadores de lavagem, desconhecimento total dos
equipamentos que iriam intervencionar bem como à utilização de máquinas
inadequados para este tipo de intervenção (Alta Pressão);
- A execução dos trabalhos pela Ré foi deficiente logo desde o segundo dia de
trabalho da Ré;
- A C (cliente final) sempre contestou a capacidade técnica e de resposta da B;
- Face à situação a Autora teve de recorrer aos serviços de outro fornecedor.
21- A inexperiência da Ré manifestou-se no desconhecimento dos operadores, da
Chefia da Ré, bem como da sociedade E - empresa subcontratada pela Ré para
as Lavagens de Alta Pressão na Área 1 - no tipo de equipamentos a serem
intervencionados.
22- As máquinas de Alta Pressão utilizadas pela Ré não tinham pressão adequada
para os trabalhos a serem executados.
23- A Paragem em causa consistiu no Isolamento Processual acompanhado pela C,
montagem de andaimes, retirada de isolamentos térmicos, abertura de
equipamentos, Limpezas Industriais a Alta Pressão, Lavagens Químicas, END´s
(testes hidráulicos), aprovações pela Inspeção do Cliente, fecho dos
equipamentos, montagens de instrumentação, montagens de isolamentos
térmicos e desmontagem de andaimes.
24- As paragens são intervenções complexas com trabalhos e tarefas planeados
exaustiva e cuidadosamente para que todos os intervenientes executem os seus
trabalhos atempadamente.
25- A conduta da ré obrigou a Autora a contratar outra empresa – a D - para poder
executar parte dos trabalhos da sua responsabilidade perante a C.
26- As reprovações e atrasos derivados da conduta da Ré (consoante factos provados
supra sob 8, 10 a 12, 15, 16, 18 a 20 e 22) causaram imobilização de mão-de-
obra que custou à Autora € 22.189,20 (1804 horas a € 12,30 por hora). Houve
catorze equipamentos cuja limpeza foi realizada, total ou parcialmente, pela D,
passando-se a discriminar – quanto a tais equipamentos- os valores orçados,
acordados e pagos:
Equipamento Proposta média da F
e da G (em euros)
Orçamento acordado
entre
Valor cujo
pagamento foi
Valor pago
pela Autora
Autora e Ré,
adjudicado (em
euros)
acordado na reunião
de 12.7.2012, a pagar
pela Autora
à Ré (em euros)
à D (em euros) pelo
trabalho realizado
26D8801 4065 919.08 0 7157.96
26D8802 5835 1378.62 0 6146.45
26D8806 2175 919.08 0 7438.10
26T2001 24495 11028.96 5514.48 57219.75
26T2101 23735 11028.96 0 18627.37
26T2701 19730 13786.20 3446.55 15511.34
26E2101A 6855 5517.22 2311.66 4974.75
26E2101B 6880 5517.22 2311.66 4974.75
26E2101C 6870 5517.22 2311.66 4974.75
26E2101D 6880 5517.22 2311.66 4974.75
26E2102 33265 11825 10346.88 8558.55
26E8601 3820 1054.12 1054.12 950
26E8602 3310 11.825 0 1100
26E8801 2985 6324.72 6324.72 275
TOTAL € 150.900 € 92.158.62 € 35.933.39 € 137.863.55
A coluna 26T2001 foi reprovada após seis dias de lavagem pela Ré quando se
estava a dois dias do fim do prazo para conclusão de toda a limpeza. Nesse
circunstancialismo, a D foi encarregue de a limpar o que fez no limite do prazo.
Aproveitando-se desse facto, a D cobrou à Autora a quantia de € 57.219.75 quando
o valor médio das propostas para limpar a coluna 26T2001 era de € 24.495 e o valor
acordado com a Ré para tal efeito foi de € 11.028.96.
No primeiro domingo que foram trabalhar (facto 33), os trabalhadores da D foram
impedidos de o fazer por pessoal da Ré, sendo o custo da mão-de-obra imobilizada
correspondente de € 5.292.
27- As horas de imobilização de mão-de-obra foram calculadas partindo do princípio
que as intervenções nos equipamentos teriam de cumprir com o Planeamento
(numero de horas para serem intervencionados – dadas pela Ré), a Autora tinha
equipas de Mão-de-obra (MO) prontas para darem continuidade as suas
atividades de manutenção, logo que concluída as Lavagens de Alta Pressão.
28- A Autora emitiu a fatura nº 11892, em 20/7/2012, a reclamar da Ré o pagamento
da quantia de € 149.881.35.
29- Aquando do início da empreitada, os trabalhos entregues à Ré são os
correspondentes ao Planeamento cuja cópia consta de fls. 155-156.
30- Não foram entregues atempadamente pela Autora à Ré pelo menos três
equipamentos, um dos quais foi o 26E2702, para que a Ré efetuasse os trabalhos
de empreitada adjudicados.
31- O referido em 30 implicou a conclusão dos trabalhos de limpeza desses
equipamentos em data posterior à inicialmente acordada.
32- Encontravam-se também à data em execução outros equipamentos extra que não
se encontravam incluídos no planeamento inicialmente acordado: Túnel do
Quenche, Filtros, Válvulas e Troços de Tubagem.
33- Aquando da chegada da Ré à obra, em 13.05.2012 (domingo), para realizar os
trabalhos devidos, nomeadamente limpeza de equipamentos, os funcionários da
D preparavam-se para iniciar o seu trabalho em equipamento anteriormente
adjudicado à ré.
34- Os equipamentos vieram a ser aprovados e aceites pela cliente final (C).
35- De forma a colmatar a reclamação da Autora, a Ré mobilizou duas máquinas de
alta pressão (uma de 1.200 bar e outra de 2.500 bar) e mais operadores de
limpeza industrial.
36- Ocorreu uma reunião, em 27.6.2012, entre Autora e ré.
37- As partes reuniram-se novamente em 12.07.2012, a fim de fechar as contas
relativas à Área 1 da C – Paragem 2012.
38- Nesta reunião, as partes discutiram e aprovaram pontos respeitantes aos
trabalhos prestados.
39- Tendo ficado acordado nessa reunião que o valor final a debitar à Autora,
relativamente aos trabalhos efetuados para a C, seria de € 73.476,79, resultante
da soma da Fatura n.º 19/2012, no montante de € 11.578,45, e da Fatura n.º
52/2012, no montante de 61.898,34, a que acresce o respetivo IVA.
40- Em resultado, quer das encomendas, quer dos trabalhos realizados pela Ré, a Ré
emitiu e remeteu à Autora as respetivas faturas, a saber:
- Fatura n.º 19/2012, datada de 29.03.2012 e vencida a 28.05.2012, no valor de
€14.241,49 (catorze mil, duzentos e quarenta e um euros e quarenta e nove
cêntimos);
- Fatura n.º 20/2012, datada de 30.03.2012 e vencida a 29.05.2012, no valor de
€44.288,10 (quarenta e quatro mil, duzentos e oitenta e oito euros e dez
cêntimos);
- Fatura n.º 52/2012, datada de 20.07.2012 e vencida a 18.09.2012, no valor de €
76.134,96 (setenta e seis mil, cento e trinta e quatro euros e noventa e seis
cêntimos).
41- A Fatura n.º 19/2012 foi emitida em cumprimento da Nota de Encomenda n.º
239, datada de 29.03.2012 , isto é, liquidação de “10% com a encomenda, a 60
dias da receção da fatura”.
42- Tal Nota de Encomenda respeita a serviços de limpeza e lavagem adjudicados à
Ré para realizar na Paragem da C – Área 1.
43- Pelo que, o seu valor de €11.578.45 corresponde a 10% do valor total da
empreitada com a encomenda inicial.
44- A respetiva fatura foi emitida e remetida à Autora em 29.03.2012, uma vez foi
nessa data que a encomenda foi rececionada pela Ré.
45- No que concerne à Fatura n.º 20/2012, a mesma respeita à realização de
trabalhos pela Ré para a empresa H, nomeadamente limpeza química dos spools
em aço-carbono e aço-inox e armazenagem, transporte e tratamento dos
efluentes de limpeza.
46- De acordo com a Nota de Encomenda n.º 917, datada de 25.10.2011, as
condições de pagamento são “100% com o final dos trabalhos, a 60 dias da
data da fatura”.
47- Tendo os trabalhos terminado a 30.03.2012, a Ré emitiu e remeteu à Autora a
respetiva Fatura na mesma data, no total de € 44.288,61 (quarenta e quatro mil,
duzentos e oitenta e oito euros e dez cêntimos).
48- Correspondendo tal valor ao montante constante da nota de encomenda (€
36.007,00), acrescido do respetivo IVA.
49- Sendo que, também quanto a esta não procedeu a Autora à sua devolução ou a
qualquer reclamação, considerando-se, portanto, a mesma aceite e sendo por isso
o valor nela aposto totalmente devido.
50- A fatura nº 52 foi remetida pela Ré à Autora em 20.7.2012.
*
FACTUALIDADE NÃO PROVADA
Não se provaram os seguintes factos: Artigos 8º, 35º, 37º, 38º, 41º a 43º dos
Temas da Prova.
Artigo 4º dos Temas da Prova: provado apenas o que consta da resposta ao
artigo 7º dos mesmos Temas.
Artigo 12º: provado apenas o que consta da resposta ao artigo 7º dos Temas da
Prova;
Artigos 25º: provado o que consta das respostas aos artigos 23º e 24º dos Temas
da Prova;
Artigo 26º: provado o que consta da resposta ao artigo 23º dos Temas da Prova;
Artigos 29º a 31º dos Temas da Prova: provado apenas o que consta da resposta
ao artigo 32º dos Temas da Prova;
Artigos 48º dos Temas da Prova: provado o que consta da resposta aos artigos
23º e 47º dos Temas da Prova;
Artigo 49º: provado o que consta da resposta ao artigo 47º;
Artigos 60º e 61º: provado o que consta da resposta aos artigos 46º e 47º dos
Temas da Prova.
*
FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
A convicção do Tribunal quanto às respostas de teor afirmativo estribou-se na
apreciação crítica e conjugada:
a) Das declarações de parte de I, engenheiro, presidente do conselho de
administração da ré desde 1999. Esteve presente nas duas reuniões. Descreveu o
âmbito dos trabalhos contratos e os trabalhos extra e o trabalho atinente à fatura
referida em 45. Empolou a percentagem de trabalho efetivamente realizado pela
Ré. Mostrou-se agastado com a posição da autora. Mostrou espanto-
parcialmente fundado - perante os valores reclamados pela autora de € 2.112 de
imobilização de mão-de-obra por cada válvula.
As declarações relevaram para a prova dos factos 32,36, 37, 38, 39, 40 a 50.
b) Das declarações de parte de J, o qual é um dos administradores da autora desde
2007. Foi ouvida por iniciativa do tribunal. Explicou as relações da autora com a
D. Reconheceu que o preço cobrado pela D pelo último equipamento pode ser
um abuso por saberem que é o último equipamento. De forma absolutamente
espontânea, precisou que a Autora tem um custo de € 12,30 por hora com a mão
– de-obra que intervinha a seguir à lavagem e que esteve imobilizada.
As declarações relevaram para a prova dos factos 14, 25, 26, 27.
c) Do depoimento das testemunhas:
- K, o qual foi diretor geral da autora entre junho de 2010 e abril de 2013.
Acompanhou a obra em supervisão, sendo que as pessoas que estiveram mais
assiduamente no terreno por parte da Autora foram o Eng. L e a Eng. M. Relatou o
conhecimento que teve da prestação da Ré, seus defeitos e modo como a autora tentou
superá-los.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 9, 10, 11, 13, 14, 15, 16, 17,
19, 21, 22, 26, 28.
- L, engenheiro mecânico, o qual à data dos factos desempenhava as funções de
chefe de departamento de manutenção e logística da autora. No âmbito da empreitada
dos autos, preparou recurso para a paragem, esteve envolvido na contratação de
subempreiteiros. Era a pessoa a quem a engenheira M reportava. Tinha uma presença
assídua na obra. Foi chamado pela C logo de início para ser informado que a prestação
da Ré não correspondia ao necessário. Relatou a evolução subsequente. Esteve presente
na reunião de 12.7.2012.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 8, 9, 12, 14, 15, 16, 17, 19,
22, 26, 37, 39.
- M, engenheira eletromecânica, a qual trabalhou para a autora entre 2003 e
finais de 2012, exercendo as funções de coordenadora de manutenção. Foi a
coordenadora da manutenção da paragem. Tinha presença diária na obra, sendo a pessoa
da autora que mais estava no terreno. Fez uma descrição muito detalhada das
vicissitudes da obra. Esclareceu que preveniu a Ré da intervenção da D. Na altura, foi
encarregue e fez um levantamento do número de horas da mão-de-obra imobilizada em
virtude dos atrasos causados pela Ré. Esteve presente nas duas reuniões. Precisou que a
Ré esteve seis dias para lavar a coluna, sendo a lavagem reprovada a dois dias do termo
da empreitada, sendo a D que salvou a situação.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 7, 8, 10, 11, 12, 14, 15, 16,
17, 18, 19, 20, 21, 22, 25, 26, 27, 28, 37 e 39.
- N, o qual trabalha para a Ré há dez anos, exercendo as funções de diretor de
limpezas químicas da Ré. Exercia por parte da Ré as funções de coordenado da paragem
da C. A informação atinente à execução da empreitada passava, em regra, por ele.
Reconheceu que a Ré teve atrasos que procurou superar com mais máquinas e pessoal.
Relatou o conteúdo das reuniões de 27.6. e de 12.7, embora quanto à primeira tenha
evidenciado uma memória “seletiva” na medida em que não se recordou das partes da
ata da reunião que eram favoráveis à autora. Esclareceu que a partir de determinada
altura, a Ré e a D estavam a trabalhar na empreitada, sendo que – apesar de a autora
retirar equipamentos que entregava à D - a Ré continuava a trabalhar na empreitada.
Reconheceu que houve problemas com a coluna T2001 da responsabilidade da ré.
Particularmente significativo o segmento do seu depoimento em que afirma que a Ré
não trabalhou mais com o subempreiteiro E.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 12, 18, 19, 21, 22, 25, 26,
29, 30, 31, 32, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 45, 46, 47.
- O, trabalhador da Ré há mais de vinte anos, com a categoria de operador de
limpeza química. Trabalhou na obra quase desde o início mais com funções de chefia de
pessoal. Relatou atrasos na entrega de equipamento pela autora. Esteve presente no
agitado domingo em que os trabalhadores da Ré se cruzaram, pela primeira vez, com os
trabalhadores da D.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 30, 31, 33, 35, 45.
- P, o qual trabalha para a Ré há nove anos, tendo a categoria de operador de
limpezas químicas. Foi uma das pessoas que foi colocado pela ré para reforçar a equipa
face aos atrasos e problemas.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 30, 31, 33, 35, 45.
- Q, o qual desempenhou na empreitada geral da C as funções de inspetor de
equipamentos. Esta testemunha foi ouvida por iniciativa do tribunal. A aprovação das
limpezas passava por si, acabando esta testemunha por supervisionar o trabalho da
autora, feito pela própria autor ou através da ré/subempreiteira. Estava todos os dias na
obra. Esclareceu que o trabalho mais complexo foi a coluna.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 10, 12, 18, 19, 25, 26, 34.
- R, engenheiro mecânico, o qual trabalha para a C desde 1979, exercendo as
funções de chefe de manutenção de equipamento estativo. Esta testemunha também foi
ouvida por iniciativa do tribunal. Exerceu as funções de responsável pela coordenação
da paragem da área 1 por parte da C. Foi a testemunha que se revelou mais isenta e com
uma visão mais estrutural dos acontecimentos. Esclareceu que pressionou a autora para
recorrer à F e não à Ré, o que inicialmente mereceu acolhimento da autora mas acabou
por não se concretizar porque, entretanto, a F se comprometeu a trabalhar noutra zona
durante a paragem. Explicou que o valor cobrado pela D à autora pela coluna 26T2001 é
um exagero porquanto a Ré já lá tinha andado a lavar vários dias. Nas suas próprias
palavras, “as empresas [D] valem-se da situação de quem está com a corda na garganta
[autora] ”. Via o pessoal da autora imobilizado à espera que fossem concluídas as
lavagens.
O seu depoimento relevou para a resposta aos factos 10, 14, 18, 19, 21, 22, 25,
26, 27, 33.
No caso em apreço, o núcleo do litígio centrou-se na discussão dos encargos
(máxime factos 26 e 27) que a autora teve de suportar em decorrência do cumprimento
defeituoso da Ré. Quanto ao cumprimento defeituoso, as testemunhas confluíram na sua
ocorrência, incluindo testemunhas da Ré (v.g. N).
Resulta de depoimentos confluentes e do próprio facto provado sob 26 (a Ré
apresentou um orçamento de € 92.158,62 para trabalhos que a média da concorrência
pedia € 150.900) que a Ré não tinha experiência neste trabalho e que se socorreu de um
parceiro (E) também inexperiente. Perante a situação daí resultante, a autora teve que
suportar encargos, inflacionando alguns sem justificação. No que tange à imobilização
da mão-de-obra, o tribunal atendeu às horas apontadas pela testemunha M, sendo a
imobilização confirmada pela testemunha mais imparcial R, conjugado com o valor
hora de € 12,30, assumido espontaneamente por J como sendo o custo que a autora
suporta com tal mão-de-obra. Tivemos também a preocupação de discriminar todos os
valores, equipamento a equipamento, para ter uma imagem mais fidedigna dos
acontecimentos.
No que tange aos trabalhos cujo pagamento é reclamado pela Ré, em termos
efetivos, os mesmos não foram questionados pelas próprias testemunhas da Autora,
tanto mais que ocorreu um acordo de pagamento na reunião de 12.7.2012, sendo ainda
certo que nada foi contraditado quanto aos trabalhos referidos nos factos provados sob
45 a 47.
As testemunhas depuseram com conhecimento direto de parte dos factos sobre
que foram inquiridas, de modo idóneo e de molde a convencer o Tribunal quanto à
ocorrência dos factos que foram dados como provados.
É de relembrar que "os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode
ser medido apenas pelo tom em foram proferidos. Todos sabemos que a palavra é só um
meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e
todo o aspeto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no
crédito a prestar-lhe." – EURICO LOPES CARDOSO, BMJ nº80, pp. 220/221.
Assim na valoração do depoimento testemunhal, aquilatou-se nomeadamente: na
intervenção pessoal nos factos em causa; na decisão e consistência das respostas; na
transparência do conhecimento direto dos factos; na serenidade da postura; nas reações
dos depoentes, no tom de voz, modo de dizer e outras circunstâncias similares que
modificam o sentido das palavras; na isenção e imparcialidade denotadas versus
eventuais interesses na causa e/ou eventual ligação às partes.
De modo ainda mais concretizado, entendemos que na valoração dos
depoimentos testemunhais sobrelevam os seguintes critérios:
A coerência do relato efetuado, devendo o mesmo ter uma boa estruturação do
ponto de vista lógico;
A contextualização do relato (contexto cognitivo) de molde que o relato que
oferece detalhes de uma circunstância ou ambiente vital, espacial ou temporal
em que se desenrolam os factos descritos, fazendo-o de forma plausível e
espontânea, constitui índice da veracidade do depoimento;
As corroborações periféricas no sentido de averiguar se o relato da testemunha é
confirmado por outros dado que, indiretamente, demonstram a veracidade da
declaração. Essa corroboração pode advir da coincidência das diferentes
declarações sobre um facto, abrangendo também a prova circunstancial ou
derivada de presunções;
A (in) existência de detalhes oportunistas a favor da parte no processo. Trata-se
de averiguar se a testemunha faz referências a dados, normalmente
desnecessários, que pretendem beneficiar uma das opções que se estão a debater
no processo, por exemplo, manifestações sobre o carácter ou intencionalidade de
uma das partes ou mesmo de justificação das atuações das partes, que
extravasam o que se perguntou à testemunha. A testemunha, ao atuar assim
pretende que os factos sobre que depõe se interpretem a favor de quem deseja
beneficiar.
No caso de testemunhas com algum interesse na causa (v. g. as pessoas indicadas no
Artigo 497º do Código de Processo Civil ou trabalhadores e outros dependentes
economicamente das partes), são expectáveis a coerência do depoimento e a existência
de detalhes oportunistas pelo que a respetiva ocorrência deve ser secundarizada ou ser
simplesmente utilizada como elemento justificador do não merecimento de
credibilidade. Para a avaliação deste tipo de testemunhas deve valorar-se
fundamentalmente a contextualização dos relatos e, a posteriori, a existência de
corroborações – cf. JORDI NIEVA FENOLL, La Valoración de la Prueba, Marcial Pons,
2010, p. 284.
O ato de valorar depoimentos não se basta com o somatório dos mesmos, sendo
certo que responder à matéria dos Artigos não é transpor para essas respostas as
palavras das testemunhas. Uma coisa é o que a testemunha diz e outra, muito diferente,
é o valor daquilo que diz. Os depoimentos pesam-se caso a caso, no contexto em que se
inserem, tendo em conta a razão de ciência invocada, a sua razoabilidade face à lógica, à
razão, às máximas da experiência e aos conhecimentos científicos, relevando ainda na
valoração do depoimento os aspetos comportamentais e reacionais acima já
mencionados.
Conforme refere LEBRE DE FREITAS, Introdução ao Processo Civil, Conceito e
Princípios Gerais à Luz do Novo Código, Coimbra Editora, 2013, p. 200, “No âmbito
do princípio da livre apreciação da prova, não é exigível que a convicção do Julgador
sobre a validade dos factos alegados pelas partes equivalha a uma certeza absoluta,
raramente atingível pelo conhecimento humano. Basta-lhe assentar num juízo de
suficiente probabilidade ou verosimilhança, que o necessário recurso às presunções
judiciais (…) por natureza implica (...) ”. O convencimento do julgador deve fundar-se
numa certeza relativa, histórico-empírica, dotada de um grau de probabilidade adequado
às exigências práticas da vida, tendo em vista lograr a paz social, o que não se
compadece com indagações intermináveis e de natureza puramente epistemológica. Ou
seja, as provas não têm que criar no espírito do julgador uma certeza para além de todas
as dúvidas, mas tão só a probabilidade bastante da existência do facto, tendo em
consideração as regras de experiência comum. Necessário é que o juiz aprecie as provas
segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto [Artigo 607º, nº5 do Código de
Processo Civil], exigindo-se que o julgador proceda com bom senso e sentido de
responsabilidade, sendo a livre apreciação lógica e motivada em obediência a critérios
legais.
Acerca do nosso entendimento sobre o significado precípuo de dar como
provado um facto, sobre o sentido da apreciação da prova segundo a probabilidade
lógica prevalecente e standard de prova conexo, cf. LUÍS FILIPE PIRES DE SOUSA, Prova
por Presunção no Direito Civil, Almedina, 2013, 2ª ed., pp. 143-157.
c) Dos documentos oportunamente juntos aos autos os quais foram valorados em
conjugação com a prova testemunhal.
FACTOS DOCUMENTOS DE FLS:
7 13-15, 140-156
8 18
9 149-149 v
12 18
16 260-262 v
18 18
20 16
26 19, 259-263, 317, 317 v, 337-349
28 20
29 150-156
36 16
39 19, 68, 69
40 16, 68, 68 v, 69
41 68
42 68
43 68
45 68
46 102 v
48 102 v
50 69
Note-se que os documentos particulares escritos ou assinados por terceiros, que
não as partes, são apreciados livremente pelo Tribunal – cfr. Artigos 376º e 366º do
Código Civil; Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 24.5.2005, Lopes Pinto, de
31.5.2005, Ferreira Girão, de 29.1.2008, Santos Bernardino, acessíveis em
www.dgsi.jstj/pt. “Os documentos particulares que, em resultado de terem sido
impugnados, carecem da força probatória estabelecida no artigo 376º do Código Civil
podem, não obstante, contribuir para a livre convicção do juiz sobre os factos
quesitados, com base na sua maior ou menor credibilidade” – Acórdão do Supremo
Tribunal de Justiça de 15.4.2004, Quirino Soares, 04B795. Em sentido equivalente, cfr.
o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30.4.2012, Augusto de Carvalho,
169/1993, segundo o qual “O facto de se impugnar um documento não significa que
deixe de ter valor probatório. Uma coisa é a força probatória de um documento e outra
bem diversa é a convicção do julgador formada, após a análise crítica das provas,
incluindo a dos documentos.”
Os factos provados sob 23 e 24 resultam de acordo das partes ( cf. ata de fls.
220).
As respostas negativas aos artigos derivam designadamente:
- Da prova produzida em sentido oposto ou incompatível:
Artigo 8º versus planeamento de fls. 140-145, 147v. e 149, o qual não confirma
as datas indicadas;
Artigos 37º e 38º dos Temas da Prova versus depoimento da testemunha M;
- Da insipiência e insuficiência da prova produzida:
Artigos 35º, 41º a 43º dos Temas da Prova : as testemunhas não se pronunciaram
assertivamente e de forma concretizada sobre esta factualidade, inexistindo prova
documental suficiente.
Note-se que, conforme foi o caso, os meios de prova podem servir à formação de
convicção judicial sobre factos diversos daqueles para os quais foram especificadamente
indicados, designadamente, no que tange à prova testemunhal.
[ Cfr. Artigo 607º, nº5, do Código de Processo Civil; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de
2.11.79, Martins da Fonseca, BMJ nº 296, p. 323, Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9.4.87,
Aragão Seia, CJ 1987- II, p. 234, Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 11.5.95, Matos Canas,
BMJ nº 447, p. 599, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 7.3.95, Pereira Cardigos, acessível em
www.dgsi.jstj, de 13.1.2000, Sumários, 37º - 33, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de
31.10.2006, Isaías Pádua, acessível em www.dgsi.pt/jtrc.]
*
O DIREITO
Assentes os factos, cumpre aplicar-lhes o direito.
Do cumprimento defeituoso da subempreitada
Resulta da matéria de facto assente que a Autora e a Ré celebraram um contrato
de subempreitada tendo por objeto a realização de trabalhos de lavagens químicas e de
limpeza de alta pressão, nas instalações da C, em (…). A Autora assumiu a posição de
dona da obra perante a Ré e de empreiteira perante a C, dona da obra da empreitada
geral. Por sua vez, a Ré assumiu a posição de empreiteira perante a autora.
Subempreitada é o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o
empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela –
Artigo 1213º, nº1 do Código Civil.
A realização existente entre a subempreitada e a empreitada é a de uma união de
contratos unilateral, funcional e necessária. Os dois contratos prosseguem a mesma
finalidade, visando ambos a realização do interesse do dono da obra.
A subempreitada é um contrato de tipo idêntico ao da empreitada, ao qual se
aplicam as mesmas regras. Todavia, por vontade das partes, ela pode ficar sujeita a
cláusula diferentes do contrato base – cf. PEDRO ROMANO MARTINEZ, Contrato de
Empreitada, 1994, Almedina, p. 124; Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de
13.1.2004, Rosário Morgado, acessível em www.dgsi.pt/jtrl.
Com o contrato de subempreitada cria-se uma relação obrigacional que está
condicionada à existência do contrato de empreitada, em que o empreiteiro
(denominado intermediário) assume posições jurídicas diferentes nos dois contratos em
que é parte. Com base na posição jurídica que lhe advém do contrato de empreitada, o
empreiteiro (intermediário) celebra um segundo contrato no qual vai ocupar a posição
de contraparte no primeiro contrato, ou seja, torna-se dono da obra em relação ao
subempreiteiro e este torna-se empreiteiro em relação àquele – cf. Acórdãos do
Supremo Tribunal de Justiça de 11.6.2002, Miranda Gusmão, CJ 2002 – II, p. 100 e de
24.10.2002, Afonso Melo, CJ 2002 – III, p. 116.
No que tange aos prazos de denúncia dos defeitos e respetivo regime de
responsabilidade, aplicam-se ao contrato de subempreitadas as mesas regras que ao
contrato de empreitada – cf. PEDRO DE ALBUQUERQUE e MIGUEL ASSIS RAIMUNDO,
Direito das Obrigações, Contratos em Especial, Contrato de Empreitada, Almedina,
2012, II Volume, pp. 333-334; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.2.2008,
Salvador da Costa, 08B192.
Ora, a prestação da Ré foi defeituosa conforme ressalta à exaustão da matéria de
facto provada sob 8, 10, 11, 12, 15, 18, 19, 21, 22, 25. Em resumo, a ré não tinha
experiência neste tipo de trabalho, recorreu a um parceiro (E) que também não tinha
experiência nem equipamento adequado para a realização dos trabalhos. Tudo isto
implicou sucessivas reprovações dos trabalhos por incumprimento de requisitos de
qualidade, subsequentes atrasos no planeamento dos trabalhos e na empreitada a cargo
da Autora.
Tendo em consideração que o prazo para a realização da empreitada era curto
(três semanas) e pressionada pelo dono da empreitada geral (C), a autora optou por
recorrer à prestação de serviços de outra empresa para realizar trabalhos que a Ré não
lograva concluir e retirou-lhe, ab initio, outros trabalhos, encarregando a terceira
sociedade de os fazer.
Aqui chegados, a questão que se coloca é a de saber se a autora podia recorrer
aos serviços de terceiro nos termos em que o fez, vindo peticionar depois o seu
ressarcimento perante a Ré.
Vejamos.
Ocorre cumprimento defeituoso sempre que o devedor realiza a prestação a que
estava adstrito em violação do princípio da pontualidade, ocorrendo um
desconformidade entre a prestação devida e a prestação realizada que não permite a
satisfação adequada do interesse do credor – cf. Artigos 799º, nº1, 913º e ss., 1218º e ss.
do Código Civil. O cumprimento inexato advém de uma violação do contrato que, as
mais das vezes, tem por base uma perturbação na equivalência das prestações.
O cumprimento defeituoso depende do preenchimento de quatro condições:
1ª - Ter o devedor realizado a prestação violando o princípio da pontualidade. As
situações de cumprimento inexato podem ser agrupadas nomeadamente nas
seguintes classes:
- A prestação é realizada de modo distinto do estabelecido no acordo;
- A prestação é realizada em tempo distinto do acordado;
- A prestação é de quantidade distinta da devida;
- A prestação não é realizada no local aonde era devida;
- É entregue coisa diferente da acordada,
- A prestação é de qualidade diversa da devida quer quanto à conduta quer
quanto ao objeto;
- A prestação padece de um defeito de direito, v.g., coisa alheia ou gravada com
ónus não declarado;
- Quando, para ser realizada a prestação principal, foram violados deveres
acessórios;
- Situações de realização defeituosa da prestação expressamente estabelecidas na
lei para alguns contratos em especial.
2ª - Haver o credor procedido à sua aceitação por desconhecer a
desconformidade ou, conhecendo-a, apondo uma reserva;
3ª - Mostrar-se o defeito relevante;
4ª - Sobrevirem danos típicos. Estes podem consistir em danos subsequentes
com a correlativa obrigação de indemnizar, bem como em prejuízos (em sentido amplo)
que geram deveres de eliminar os defeitos ou de reduzir a contraprestação. Trata-se de
danos distintos daqueles que o credor poderia sofrer em caso de não cumprimento
definitivo ou de mora - cf. PEDRO ROMANO MARTINEZ, Cumprimento defeituoso,
Em especial na compra e venda e na empreitada, Almedina, 1994, pp. 143-152;
CARNEIRO DA FRADA, Contrato e deveres de proteção, Coimbra, 1994, p. 29, Nota
40.
A responsabilidade do devedor baseia-se na culpa (imputação da conduta
violadora do dever de cumprimento ao obrigado, num juízo de censura), havendo uma
presunção de culpa do devedor que também abrange as situações de cumprimento
defeituoso - Art. 799º, nº1 do Código Civil; cf. LUÍS MENEZES LEITÃO, Direito das
Obrigações, III Vol., 2002, Almedina, p. 267. O estabelecimento desta presunção
resulta do facto de, sendo a culpa - segundo as regras da experiência - normalmente
inerente ao incumprimento contratual, deve competir ao devedor provar a verificação da
situação anormal de ausência de culpa. Acresce que, sendo o devedor quem controla e
dirige a execução da prestação tem maior facilidade de conhecer e demonstrar as causas
de verificação do incumprimento – cf. JOÃO CURA MARIANO, Responsabilidade
contratual do empreiteiro pelos defeitos da obra, Almedina, 2004, p. 58.
Numa situação de cumprimento defeituoso não se verifica a liberação do
devedor, podendo ocorrer as seguintes situações: ou o devedor se constitui em mora
(Artigo 804º do Código Civil) ou se verifica o incumprimento definitivo da obrigação
(Artigo 808º do Código Civil). Ocorrendo mora, o credor conserva interesse na
prestação, pelo que caberá ao devedor reparar o defeito, ou substituir a prestação
defeituosa por outra em condições.
Refere JOSÉ CARLOS BRANDÃO PROENÇA, Lições de Cumprimento e Não
Cumprimento das Obrigações, Coimbra Editora, 2011, p. 359,
“ (…) o credor não poderá avançar para tutelas mais radicais sem antes dar ao
devedor a possibilidade de cumprir corretamente o seu dever. O pedido de
novo cumprimento (por eliminação dos vícios, expurgação dos ónus, substituição
da prestação) pressupõe, por um lado, que o cumprimento defeituoso não
provocou uma perda de interesse do credor e que este está disposto a esperar
pela correção/substituição a efetuar dentro de um prazo razoável, mas pode
ser paralisado, por outro lado, pela invocação (pelo devedor) da sua
desproporcionalidade (equação custos-benefício e relação correção-
indemnização). Não sendo material ou juridicamente viável a correção do
cumprimento (…) ou tenha sido recusada, na oportunidade concedida pelo credor,
este poderá exigir uma redução da sua contraprestação ou resolver o contrato,
estando, contudo, ciente de que a “escassa importância” do defeito pode precludir
a utilização deste último remédio.”
Em sede de cumprimento defeituoso, as normas especiais sobre a compra e
venda de coisas defeituosas, sobre o cumprimento defeituoso do contrato de locação e
sobre o cumprimento defeituoso do contrato de empreitadas constituem afloramentos,
concretizações ou explicitações de uma norma geral – cf. NUNO MANUEL PINTO
OLIVEIRA, Princípios de Direito dos Contratos, Coimbra Editora, 2011, p. 411.
No que tange ao concurso entre os direitos à retificação e à substituição da
prestação defeituosa, NUNO OLIVEIRA, Op. Cit., p. 501, entende que assiste ao credor a
faculdade de escolher entre a retificação e a substituição da prestação. E prossegue:
” O credor (p. ex., o comprador ou o dono da obra) terá a faculdade de escolher
entre o direito subjetivo propriamente dito à reparação e o direito subjetivo
propriamente dito à substituição da prestação defeituosa, imperfeita ou inexata.
O devedor (p. ex., o vendedor ou o empreiteiro) poderá opor-se à escolha do
credor da prestação defeituosa, alegando e provando uma de três coisas:
1º que a substituição da prestação defeituosa é desnecessária, porque a
retificação satisfaz o interesse do credor – art. 914º do Código Civil - ; 2º que a
reparação ou a substituição é impossível – art. 1221º , nº1 , do Código Civil -;
e/ou – 3º que a reparação ou substituição é inexigível – art. 1222º, nº2 , do Código
Civil “.
O direito do credor a exigir a redução do preço ou a resolver o contrato são
subsidiários em relação aos direitos primários de reparação ou substituição da prestação.
Com efeito, e recorrendo ao regime do contrato de empreitada (que constitui
afloramento de um princípio geral, como vimos), provada a existência de defeitos que
tornam a obra inadequada para os fins pretendidos pelo seu dono, cabe ao dono da obra
a obrigação de notificar o empreiteiro para que este, dentro de um prazo razoável, os
elimine (Artigos 777º, 804º, 805º e 808º do Código Civil). Se nesse prazo razoável os
defeitos não forem eliminados ou não tiver sido construída nova obra, é que então o
dono da obra poderá exigir a redução do preço ou a resolução do contrato se os defeitos
tornarem inadequada a obra ao fim a que se destina e, ao mesmo tempo, poderá pedir a
intervenção de terceiros para eliminar os defeitos. Só em caso de manifesta e provada
urgência é que ele pode diretamente, e sem intervenção do tribunal, proceder à
eliminação dos defeitos, exigindo depois o pagamento das respetivas despesas por parte
do empreiteiro – cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 30.10.97, 98B900,
Ferreira de Almeida, de 8.6.2006, 06A1338, Fernandes Magalhães, de 2.11.2006,
06B3822, Custódio Montes, de 16.3.2010, 6817/06, Urbano Dias, Acórdão do Tribunal
da Relação do Porto de 28.3.2011, Soares de Oliveira, 444/08, todos acessíveis em
www.dgsi.pt/jstj.
Esta é a posição que vem sendo adotada maioritariamente pela jurisprudência.
Todavia, não cremos que seja a mais ajustada e pertinente ao caso em apreço,
não devendo ser adotada de modo absoluto.
Em primeiro lugar, a exceção da urgência das obras deve admitir-se se o recurso
a terceiro for necessário para evitar prejuízos ulteriores, podendo então o dono da obra
recorrer a um terceiro a expensas do empreiteiro. Conforme se referiu no Acórdão do
Tribunal da Relação de Lisboa de 22.6.2006, Neto Neves, 176006,
www.colectaneadejurisprudencia.com, “O recurso à eliminação de defeitos por terceiro
só é admitido em casos de comprovada urgência e para evitar maiores prejuízos.
Verifica-se essa situação se o empreiteiro estava sujeito a prazos de cumprimento
perante o dono da obra. Pela lógica da autodefesa poderá, neste caso, o empreiteiro
reclamar do subempreiteiro o pagamento do que despendeu na correção do defeito.”
Referem a este propósito PEDRO DE ALBUQUERQUE e MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Direito
das Obrigações, Contratos em Especial, II Vol., Almedina, 2012, pp. 431-432, que:
«A solução dada por este segmente da Doutrina às situações de urgência
deve ser admitida até por encontrar um paralelo significativo, no sistema do
cumprimento defeituoso dos contratos em especial: o regime das obras urgentes
no contrato de locação, na hipótese de o locador as não realizar (art. 1036º). Na
verdade, encontra-se aí a previsão de dois níveis diversos de urgência. Um
primeiro nível, previsto no artigo 1036º/1, harmonizável com a colocação do
senhorio em mora, mas não com as 2delongas do procedimento judicial”.
Depois, um segundo nível, definido no artigo 1036º/2, além de inconciliável com
as delongas do processo, nem sequer permite alguma dilação. Na primeira
hipótese, o locatário, após ter deixado o locador em mora, pode recorrer a
terceiros, suportando o locador o custo das obras. Na segunda, perante a
urgência, obviamente, o apelo a terceiros fica imediatamente aberto ao locatário,
mesmo se, neste caso, deve simultaneamente avisar o locado, tal como resulta do
artigo 1036º/2 e derivaria dos deveres de boa ré.»
Em terceiro lugar, o incumprimento definitivo por parte do empreiteiro pode
decorrer de uma ou várias tentativas frustradas de cumprir, “que obviamente colocam o
dono da obra numa situação de falta justificada de confiança na prestação do
empreiteiro (perda de interesse objetivo na prestação por aquele empreiteiro) ” - PEDRO
DE ALBUQUERQUE e MIGUEL ASSIS RAIMUNDO, Op. Cit., p. 432. Nesta ótica, o custo do
recurso a um terceiro apresenta-se como mais um dano indemnizável decorrente do
cumprimento defeituoso, convertido em definitivo.
Em quarto lugar, citando-se novamente PEDRO DE ALBUQUERQUE e MIGUEL
ASSIS RAIMUNDO, Op. Cit., p. 433,
«Repare-se ser a alternativa a esta posição a de exigir ao dono da obra a
passagem pelo “calvário” processual de ter de condenar o empreiteiro no
cumprimento de um dever, por este já definitivamente violado, para, depois,
dispor de título para peticionar ao tribunal a determinação do cumprimento por
terceiro a expensas do empreiteiro. Durante todo esse tempo processual
(suscetível de mostrar muito longo), o dono da obra não é admitido a conformar
a obra ao seu interesse, exceto se existirem motivos de urgência, numa solução
totalmente desrazoável.»
Assim, tendo em consideração o curtíssimo prazo para a realização da
empreitada geral (três semanas), as multas a que a Autora estava sujeita em caso de
desrespeito do prazo, bem como a prestação defeituosa da Ré que deu azo a sucessivas
reprovações do trabalho feito e a atrasos, temos como admissível a conduta da Autora
que recorreu a um terceiro para completar alguns trabalhos e realizar outros de raiz. A
autora tinha fundamentos objetivos suficientes para não ter confiança na prestação da
Ré.
Note-se que esta posição é que melhor tutela o próprio subempreiteiro. Na
verdade, se a autora fosse observar o calvário processual aludido, o montante dos
prejuízos a ressarcir pela ré seria sempre superior com as multas e custos adicionais que
a autora teria de suportar.
No que tange ao cômputo dos danos, a autora acordo com a ré a realização dos
trabalhos enumerados sob 26 pelo preço total de € 92.158.62. Todavia, para que tais
trabalhos fossem concluídos dentro do prazo, a Autora teve de pagar € 35.933.39 à Ré,
acrescendo o pagamento de € 137.863.55 à D. Ou seja, a Autora foi obrigada a
despender € 173.796.39 em vez dos acordados € 92.158.62 pelo que o prejuízo, a este
título, foi de € 81.638.32.
Um segundo prejuízo advém da quantia de € 22.189.20 que teve de pagar a mão-
de-obra que esteve imobilizada por causa dos atrasos da Ré.
Finalmente, um terceiro prejuízo decorre do facto ilícito do pessoal da Ré ter
impedido os trabalhadores da D trabalharem no primeiro domingo em que o foram
fazer, no valor de € 5.292 (Artigos 483º e 800º do Código Civil).
Tudo somando € 109.119.52.
A compensação
Na petição, a autora efetua a declaração de compensação com a quantia que
reconhece dever à Ré de € 73.476.79. Este valor em dívida está provado consoante
resulta do facto 39.
Nos termos do artigo 847º do Código Civil
1. Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode
livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor,
verificados os seguintes requisitos:
a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele exceção,
perentória ou dilatória, de direito material;
b) Terem as duas obrigações por objeto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade.
2. Se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na
parte correspondente.
3. A iliquidez da dívida não impede a compensação.
E, nos termos do Artigo 848º do Código Civil
1. A compensação torna-se efetiva mediante declaração de uma das partes à outra.
2. A declaração é ineficaz, se for feita sob condição ou a termo.
Temos, assim, como requisitos da compensação os seguintes:
a) A existência de dois créditos recíprocos;
b) A validade e exigibilidade judicial do crédito do autor da compensação (crédito
ativo);
c) A fungibilidade ou homogeneidade das prestações, sendo que os créditos
pecuniários são, por definição, homogéneos, sendo irrelevante a sua fonte (cf.
ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Da Compensação, no direito civil e no
direito bancário, Almedina, 2003, p. 117);
d) A não exclusão da compensação por lei;
e) A declaração da vontade de compensar, de carácter recetício (art. 224º do C.
Civil), configuradora de um direito potestativo a exercitar, quer por via judicial
quer por via extrajudicial.
A compensação traduz-se na extinção de duas obrigações, sendo o credor de uma
delas, devedor na outra, e o credor desta última, devedor na primeira.
O crédito com o qual o declarante pretende livrar-se da sua dívida é o chamado crédito
ativo ou principal. Chama-se crédito passivo àquele contra o qual a compensação opera.
Como refere ALMEIDA COSTA, Noções de Direito Civil, 3ª Ed., p. 319, a
compensação representa um encontro de contas, que se justifica pela conveniência de
evitar pagamentos recíprocos. A compensação funda-se ainda em se julgar equitativo
que se não obrigue a cumprir aquele que é, ao mesmo tempo, credor do seu credor, visto
que o seu crédito ficaria sujeito ao risco de não ser integralmente satisfeito, se entretanto
se desse a insolvência da outra parte – cf. Vaz Serra, “A Compensação”, BMJ n.º 31,
pp. 14/15.
Em juízo, a compensação pode ser invocada em ação de simples apreciação, por
exceção perentória ou por reconvenção, revestindo a configuração de um direito
potestativo – cf. PIRES DE LIMA E ANTUNE VARELA, Código Civil Anotado, Vol.
II, p. 95.
Quanto ao que seja um crédito judicialmente exigível, não tem sido uniforme o
entendimento da jurisprudência.
Assim, arestos tem havido nos quais se defende que só podem ser compensados
os créditos em relação aos quais o declarante esteja em condições de obter a realização
coativa da prestação - isto é, de os executar, querendo, pois a execução é precisamente o
meio comum de obter coercivamente a satisfação do direito do credor. Assim, para
operar a compensação não basta invocar-se um crédito hipotético e controvertido, antes
se impondo, para que aquela possa ser eficaz, que a existência do (s) crédito(s) esteja
reconhecida no momento em que a compensação é invocada, pois só assim se pode
afirmar ser o crédito do compensante ‘exigível judicialmente.
Neste sentido, cf. o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 6.7.2005, António
Valente, acessível em www.dgsi.pt/jtrl.
Todavia, esta interpretação restritiva não é de subscrever.
ANTUNES VARELA, Direito das Obrigações, Vol. II, pág. 194, considera que
é judicialmente exigível a obrigação que, não sendo voluntariamente cumprida, dá
direito à ação de cumprimento e à execução do património do devedor, nos termos do
art. 817º do Código Civil. No mesmo sentido se afirmava já no § 2º do art. 765º do
Código Civil de 1867 ao referir-se que a dívida exigível é aquela “cujo pagamento pode
ser exigida em juízo”. Esse requisito da exigibilidade judicial da obrigação afasta, por
exemplo, a possibilidade de se utilizar para fins de compensação um crédito nascido do
jogo, porque este só pode saldar-se mediante pagamento voluntário – cf. Artigos 402º e
1245º do Código Civil, Vaz Serra, Op Cit., p. 55 e PIRES DE LIMA E ANTUNES
VARELA, Op. Cit, pg. 93.
Este mesmo entendimento é partilhado por LUÍS MENEZES LEITÃO, Direito
das Obrigações, II Vol., Almedina, 2002, pg. 196, ALMEIDA COSTA, Direito das
Obrigações, 5ª Ed., pg. 942, e por MENEZES CORDEIRO, Op. Cit., pg. 113 que faz
ressaltar que a exigibilidade judicial implica que o crédito ativo esteja vencido,
afastando a exigibilidade judicial a compensação quando o crédito ativo integre uma
obrigação natural.
Conforme se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9.5.2007,
Henrique Araújo, acessível em www.dgsi.pt/jtrp, “ (...) o crédito é exigível
judicialmente quando o declarante da compensação se arroga titular de um direito de
crédito suscetível de ser reconhecido em ação de cumprimento.
Claro está que, havendo impugnação do crédito ativo (nos articulados de resposta ou
réplica), a compensação desse crédito só opera se o mesmo for reconhecido por
sentença. Nesta mesma linha de raciocínio, cf. o Acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça de 14.2.2008, Pereira da Silva, acessível em www.dgsi.pt/jstj; Acórdãos do
Tribunal da Relação do Porto de 10.3.2008, Fernandes do Vale, CJ 2008 – II, pp. 173-
176, de 11.9.2008, Teles de Menezes, CJ 2008 – IV, pp. 171-173.
Do exposto, importa clarificar que a exigibilidade judicial do crédito ativo
(imposta pelo art. 847º, n.º 1) e o reconhecimento judicial do mesmo, para efeitos do
funcionamento do mecanismo da compensação, são realidades distintas: a primeira é
requisito da declaração de compensação; a segunda é condição da sua eficácia.
Constituiria verdadeiro paradoxo aceitar-se o exercício, pelo credor passivo, do seu
direito de crédito, através da competente ação de cumprimento, e exigir-se ao declarante
da compensação na mesma ação (réu) que a invocação em juízo do seu crédito carecesse
de reconhecimento judicial prévio.”.
Flui do breve excurso que antecede que pode a Autora operar a compensação
entre os seus créditos e os créditos da Ré, operando tal compensação pela declaração
emitida no próprio processo.
Assim, o crédito da Autora fica reduzido a € 35.642.73 (€ 109.119.52 - €
73.476.79).
A reconvenção
O crédito provado da ré de € 73.476.79 (que abrange as faturas nos. 19 e 52, sem
IVA) já foi relevado e considerando na compensação que antecede. Todavia, a Ré é
sujeita passiva do IVA sobre tais faturas (cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
de 13.10.2011, Vaz Gomes, 724/08) pelo que deve a autora pagar o valor do IVA em
falta que é de € 2.663,04 (desde 29.5.2012) e € 14.236,62 (desde 20.9.2012), tudo
somando € 16.899.66.
Além desse, a Ré é credora pelo valor de trabalhos prestados à autora no valor
de € 44.288.61 (incluindo IVA, factos 40, 45, 47), valor vencido desde 29.5.2012.
O crédito de capital da Ré sobre a autora é de € 61.188.27.
Nos termos do Art. 102º do Código Comercial,
Artigo 102.º
Obrigação de juros 1
Há lugar ao decurso e contagem de juros em todos os atos comerciais em que for de convenção ou
direito vencerem-se e nos mais casos especiais fixados no presente Código.
§ 1.º A taxa de juros comerciais só pode ser fixada por escrito.
§ 2.º Aplica-se aos juros comerciais o disposto nos artigos 559.º-A e 1146.º do Código Civil.
§ 3.º Os juros moratórios legais e os estabelecidos sem determinação de taxa ou quantitativo,
relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou coletivas, são os
fixados em portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça.
§ 4.º A taxa de juro referida no parágrafo anterior não poderá ser inferior ao valor da taxa de juro
aplicada pelo Banco Central Europeu à sua mais recente operação principal de refinanciamento
efetuada antes do 1.º dia de Janeiro ou Julho, consoante se esteja, respetivamente, no 1.º ou no 2.º
semestre do ano civil, acrescida de sete pontos percentuais, sem prejuízo do parágrafo seguinte.
§5º No caso de transações comerciais sujeitas ao Decreto-lei nº 62/2013, de 10 de maio, a taxa de juro
referida no parágrafo terceiro não poderá ser inferior ao valor da taxa de juto aplicada pelo Banco
Central Europeu à sua mais recente operação principal de refinanciamento efetuada antes do 1º dia
de janeiro ou julho, consoante se esteja, no 1º ou no 2º semestre do ano civil, acrescida de oito pontos
percentuais.
Decorre deste preceito que a taxa de juros comerciais tem de ser estipulada por
escrito quer quando seja superior quer quando seja inferior à legal, independentemente
de estarem ou não sujeitos a forma escrita os atos jurídicos a que respeita - neste
sentido, cf. Ac. da Tribunal da Relação de Lisboa de 17.3.94, Silva Paixão, CJ 1994 -II,
pg. 90. E, de acordo com o Art. 559º, nº2 do Código Civil, a estipulação de juros
superiores à taxa legal deve ser feita por escrito sob pena de serem apenas devidos os
juros legais.
1 Redação do Decreto-lei nº 62/2013, de 10 de maio.
Como no caso em apreço não foram fixados juros por escrito, haverá apenas que
atender aos juros legais de créditos de que são titulares empresas comerciais (Artigo
102º § 3º).
Tais juros foram de 8% no primeiro e segundo semestres de 2012 (Avisos nº
692/2012 e 9944/2012), 7,75% no primeiro semestre de 2013 (Aviso 594/2013, DR,
nº8, II Série, de 11.1.2013), 8.5% no segundo semestre de 2013 (Aviso nº 11617/2013,
de 27.8), 7,25% no primeiro semestre de 2014 (Aviso nº 1019/2014, DR, II Série, Nº
17, 24.1.2014) até integral pagamento, sem prejuízo de subsequentes alterações da taxa
de juro.
Da litigância de má fé
Argui a Ré que a autora litiga de má fé porquanto só apresenta a ação como uma
manobra para se esquivar ao pagamento dos montantes devidos à Ré. A Autora sabe que
jamais se poderá eximir ao pagamento das faturas nos. 19 e 20, sendo que esta último
reporta-se a trabalhos que não foram sequer realizados para a C ( fls. 35).
Os comportamentos que a lei tipifica como integrando má fé são: a) dedução de
pretensão ou oposição cuja fatal de fundamento , de facto ou de direito, a parte não
devia ignorar, ou seja, a parte deve ponderar a razoabilidade da pretensão, evitando-a se
não houver fundamento sério para a mesma; b) alteração da verdade dos factos ou
omissão de factos relevantes para a decisão da causa, v.g., mentira da parte, negação de
factos pessoais que se provam, apresentação de versão de acidente que a parte sabia ser
falsa; c) omissão grave do dever de cooperação; d) instrumentalização manifestamente
reprovável do processo ou dos meios processuais com vista a impedir a descoberta da
verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar , sem fundamento sério, o trânsito em
julgado da decisão – cf. Artigo 542º, nº2, do Código de Processo Civil .
Do facto de terem sido negativas as respostas aos quesitos respeitantes a factos
pessoais alegados por uma das partes não pode extrair-se a conclusão de que esses
factos eram falsos – cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 23.5.95,
Francisco Lourenço, BMJ nº 447, p. 586, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de
16.3.2000, Sumários, 39º, 30. Com efeito e como é pacífico, da resposta negativa a um
quesito apenas resulta que não se provaram os factos quesitados, mas não que se
demonstrasse o contrário, tudo se passando como se aqueles factos não tivessem sido
articulados.
Consoante se refere no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13.3.2008,
Fernando Baptista, acessível em www.dgsi.pt/jtrp , a simples falta de prova de factos
alegados, ainda que de natureza pessoal, com a consequente improcedência da ação, não
permitem concluir pela litigância de má fé por banda da parte que os alegara e sobre
quem impendia o respetivo ónus probandi, sob pena de se estar a coartar o legítimo
direito de as partes discutirem e interpretarem livremente os factos e o regime jurídico
que os enquadra, por mais minoritárias ( em termos jurisprudenciais) ou pouco
consistentes que se apresentem as teses defendidas.
Flui do exposto que não basta a improcedência de pretensão deduzida por falta
de prova dos factos adrede alegados para se concluir, sem mais, pela existência de
litigância de má fé.
Cremos que é essa a situação em apreço. A versão da autora improcedeu em
parte, mas daí não deriva automaticamente que a autora esteja a litigar de má fé, atenta a
dificuldade de apuramento dos factos em causa, evidenciada em julgamento.
Por outro lado, num contexto litigioso em que as partes são credores e devedoras
recíprocas, não se afigura desproporcionado e ilegítimo que a autora suste o pagamento
da fatura nº 20/2012 até que sejam definidos os créditos e débitos recíprocos, ficando
onerada com o pagamento de juros sobre a mesma.
Termos em que concluímos pela inexistência de litigância de má fé.
*
DECISÃO
Pelo exposto, julgo:
a) a ação procedente parcialmente procedente por provada e, em consequência,
condeno a Ré a pagar à Autora a quantia de 35.642.73, acrescida de juros
desde a citação (24.2.2013) às taxas de 7,75% no primeiro semestre de
2013, 8.5% no segundo semestre de 2013, 7,25% no primeiro semestre de
2014 até integral pagamento, sem prejuízo de subsequentes alterações da
taxa de juro;
b) a reconvenção parcialmente procedente por provada, condenando a Autora a
pagar à Ré as quantias de € 2.663,04, € 14.236,62 e € 44.288.61, acrescidas
de juros desde 29.5.2012, 20.9.2012 e 29.5.2012, respetivamente, às taxas
de 8% no primeiro e segundo semestres de 2012 , 7,75% no primeiro
semestre de 2013, 8.5% no segundo semestre de 2013, 7,25% no primeiro
semestre de 2014 até integral pagamento, sem prejuízo de subsequentes
alterações da taxa de juro;
c) improcedente o pedido de condenação da autora como litigante de má fé.
Custas pelas partes na proporção do decaimento.
Registe e notifique.
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