A oralidade e a escrita prof roberta scheibe1
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A ORALIDADE, A
ESCRITA, A
ALFABETIZAÇÃO E O
LETRAMENTO
PROF. MSC. Roberta Scheibe
Nunca o conhecimento e a aprendizagem
foram tão valorizados como atualmente. Isso
indica que já vivemos na sociedade do
conhecimento, em que fatores tradicionais de
produção, como a matéria-prima, o trabalho e
o capital, terão um papel secundário,
conforme apontam diversos pesquisadores.
O conhecimento e, portanto, seus processos
de aquisição assumiram papel de destaque,
de primeiro plano, exigindo o repensar dos
processos educacionais. À medida que a
sociedade torna-se cada vez mais
dependente do conhecimento, é necessário
questionar e mudar certos pressupostos que
fundamentam a educação atual. A
aprendizagem é uma atividade contínua,
iniciando nos primeiros minutos de vida e
estendendo-se ao longo dela, o que significa
expandir o conceito de aprendizagem.
Convém ressaltar que o conhecimento
vai se costurando como uma produção
de muitas mãos. Assim sendo, ocorre a
tessitura da teia de saberes que implica
uma leitura de mundo não-linear, na qual
cada tema, cada conceito, remete para
conexões com outros saberes, outros
sentidos.
Segundo Freire (1996), a leitura de
mundo revela, evidentemente, a
inteligência do
mundo que vem cultural e socialmente
se constituindo. Revela também o
trabalho individual de cada sujeito no
próprio processo de assimilação da
inteligência do mundo (1996, p. 139).
Portanto, aprendemos muito ao longo da vida, vivendo, fazendo
coisas e interagindo com as pessoas, não somente sendo
ensinados por meio de aulas formais. Além disso, as pessoas
também têm capacidade de ensinar, transmitindo valores que a
sociedade tem acumulado.
Embora um indivíduo possa aprender bastante ao interagir com
o objeto e com as pessoas, a complexidade do mundo acaba
demandando que ele procure ajuda para formalizar aquilo que
faz intuitivamente.
OS CONCEITOS E AS RELAÇÕES
ENTRE LETRAMENTOS E
ALFABETIZAÇÃO
ALFABETIZAÇÃO
ALFABETIZAR
ALFABETIZADO
ANALFABETISMO
ANALFABETO
LETRAMENTOLETRAMENTO ILETRADO
ALFABETISMO
ANALFABETISMO-estado ou condição de
analfabeto
ANALFABETO – que não conhece o
alfabeto, que não sabe ler e escrever.
ALFABETIZAR – tornar o individuo capaz
de ler e escrever
ALFABETIZAÇÃO – é a ação de
alfabetizar, de tornar “alfabeto”.
LETRAMENTOLETRADO= Versado em letras, erudito.
ILETRADO= Que não tem conhecimentos literários
DEFINIÇÃO DA PALAVRA LETRAMENTO
LETRA + MENTO
LETRAMENTO – Resultado da ação de ensinar e
aprender
as práticas sociais da leitura e escrita;
-O estado ou condição que adquire;-um grupo social
ou um
individuo;
-como conseqüência de deter-se apropriado da escrita
e de suas
práticas sociais.
Indivíduo Alfabetizado –
indivíduo que sabe ler e escrever
Indivíduo LetradoNão só sabe ler e escrever, mas usa socialmente
a leitura e a escrita, e as pratica e responde às
demandas
Sociais de leitura e de escrita.
Diferença entre alfabetização e
letramento
ALFABETIZAÇÃO = ação de ensinar/aprender a ler e a escrever
LETRAMENTO = estado ou condição de quem não sabe ler e
escrever, mas cultiva e exerce as práticas Sociais
que usam a escrita.
ALFABETIZAR LETRANDO = ensinar a ler e a escrever no
contexto das práticas sociais e da escrita
CONCEITO DE LETRAMENTO:
O conceito de letramento foi desenvolvido em
campo teórico para qual contribuíram
diversas disciplinas das ciências humanas, a
saber: a Sociologia, a História, a
Antropologia, a
Psicologia, a Lingüística e os Estudos
Literários. Mas recentemente, no
Brasil, também vem
sendo apropriado pelo campo pedagógico, no
qual ganha novas conotações, passando a ser
referência principalmente para reflexão sobre
práticas de alfabetização e de ensino da
língua.
Baseados em estudos mais
rigorosos, diversos autores passaram a argumentar que
não é o domínio da linguagem escrita em
si que provoca transformações nas pessoas, mas sim os
usos que as pessoas fazem dessas
habilidades em diversos contextos.
Segundo Marcuschi (2001):
Uma vez adotada a posição de que lidamos com práticas de
letramento e oralidade, será
fundamental considerar que as línguas se fundam em usos e
não o contrário. Assim não
serão primeiramente as regras da língua nem a morfologia
os merecedores da nossa
atenção, mas os usos da língua, pois o que determina toda a
variação lingüística em todas
as suas manifestações são os usos que fazemos dela.
(2001, p.16)
Soares (2005) distingue basicamente duas
dimensões de letramento: a individual e a social.
Para ela, a dimensão individual diz respeito à
posse individual de capacidades relacionadas à
escrita e à leitura, que inclui não só a habilidade de
decodificação de palavras, mas também um amplo
conjunto de habilidades de compreensão e
interpretação, por exemplo:
estabelecer relações entre idéias; fazer inferência;
reconhecer a linguagem figurada; combinar a
informação textual com a informação extratextual etc.
Tais habilidades podem, ainda, ser aplicadas a uma
ampla gama de textos.
Por outro lado, a dimensão social do letramento
diz respeito às práticas sociais que
envolvem a escrita e a leitura em contextos
determinados. O que está em jogo, nesse âmbito,
são
os objetivos práticos de quem utiliza a leitura e a
escrita, as interações que se estabelecem entre
os participantes da situação discursiva, as
demandas que os contextos sociais colocam, as
representações e os valores associados à leitura
e à escrita que um determinado grupo cultural
assume e dissemina.
Tradicionalmente, a educação escolar
concentrou-se no desenvolvimento de um
conjunto delimitado de habilidades de leitura e
escrita na alfabetização inicial, o foco eram os
mecanismos de codificação e decodificação de
letras, sílabas e palavras. O professor de
português seguia com o treino de ortografia, a
fluência da leitura em voz alta e, finalmente, a
compreensão e a interpretação de
textos, sobretudo narrativos e literários.
Os professores das demais disciplinas,
por sua vez, apesar de fazerem uso intenso de
textos didáticos para ensinar e avaliar os
conteúdos, não focalizavam os processos de
leitura propriamente ditos.
Esse tipo de prática escolar não produziu os
resultados esperados, junto a um grande
número de alunos, visto que eles não adquiriram o
gosto pela leitura e não se tornavam leitores e
escritores autônomos. Também não conseguiam
utilizar com eficiência a leitura como meio de
aprender os demais conteúdos escolares, nem
tampouco a escrita para demonstrar as
aprendizagens realizadas.
Ao evidenciar que não é a
aprendizagem da língua
escrita em si que transforma
as
pessoas, mas sim os usos que
elas fazem desse
instrumento, os estudos sobre
o letramento abrem
novas perspectivas para uma
reflexão sobre o papel da
escola e também para o
desenvolvimento de práticas
pedagógicas que respondam
com mais eficiência às
demandas sociais relativas ao
letramento.
Esses estudos convidam a escola a refletir sobre
os gêneros textuais que circulam no meio
social, sobre os diversos usos sociais da leitura e
da escrita e também sobre as habilidades
cognitivas, as atitudes e os valores neles
implicados. Convidam, ainda, a uma análise das
inter-relações entre a oralidade, o letramento e
outras esferas da cultura.
Com relação à diversidade de usos
sociais da escrita, às habilidades
cognitivas e aos conteúdos
culturais a eles associados, há um
campo enorme de pesquisa e
experimentação a ser explorado
pelos educadores.
OS CONCEITOS E AS RELAÇÕES
ENTRE ORALIDADE E ESCRITA
Hoje em dia, é impossível investigar oralidade
e letramento, sem uma referência direta ao
papel dessas duas práticas na sociedade
contemporânea. De igual modo, já não se pode
observar satisfatoriamente as semelhanças e
diferenças entre fala e escrita ou seja, o
contraponto formal das duas práticas acima
nomeadas, sem considerar a distribuição de
seus usos na vida cotidiana. Assim fica
difícil, senão impossível, o tratamento das
relações entre elas, centrando-se
exclusivamente na questão do código. Mais do
que uma
simples mudança de perspectiva, isto
representa a construção de um novo objeto de
análise, e uma nova concepção de língua e de
texto, agora vistos como um conjunto de
práticas sociais.
A mudança de visão operou-se a partir dos anos 80,
em reação aos estudos de três décadas anteriores
em que se examinava a oralidade e a escrita, como
opostas, predominando a noção de supremacia
cognitiva da escrita dentro do que Street (1984)
chamou de paradigma da autonomia.
Neste modelo conceitual, considerava-se a relação
oralidade e letramento como Dicotômicas,
atribuindo-se à escrita,
valores cognitivos intrínsecos ao uso da língua, não
se vendo nelas, portanto, duas práticas sociais
articuladas. Hoje, predomina a posição de que se
pode perfeitamente conceber oralidade e
letramento como atividades interativas e
complementares no contexto das práticas sociais e
culturais.
O letramento (literacy), enquanto prática social
formalmente ligada ao uso da escrita, tem uma história
rica e multifacetada (não-linear e cheia de
contradições), ainda por ser esclarecida, como bem
lembra Graff (1995). Numa sociedade como a nossa, a
escrita, como manifestação formal dos diversos tipos
de letramento é mais que uma simples tecnologia. Ela
se tornou um bem social indispensável para enfrentar
o dia a dia, seja nos centros urbanos, ou nas zonas
rurais.
Por isso, que ela se tornou indispensável, ou seja, sua
prática e avaliação social
a elevaram a um status mais alto, chegando a
simbolizar educação desenvolvimento e poder.
Se é bem verdade que todos os povos, indistintamente
têm ou tiveram uma tradição oral, mas relativamente
poucos têm ou tiveram uma tradição escrita, isso não
torna a oralidade mais importante ou mais prestigiosa
que a escrita. Trata-se apenas de perceber que a
oralidade tem uma primazia cronológica indiscutível
sobre a escrita (cf. STUBBS, 1980).
Os usos da escrita, no entanto, quando arraigados
numa certa sociedade, impõem-se com uma violência
inusitada, e adquirem um valor até maior do que a
oralidade.
A fala (enquanto manifestação da prática oral) é adquirida
naturalmente no contexto social do dia a dia, e nas relações
sociais e dialógicas que se instauram desde o momento em
que a mãe dá seu primeiro sorriso ao bebê.
Mais do que a decorrência de uma disposição biogenética, o
aprendizado e o uso de uma língua natural é uma forma de
inserção cultural, e de socialização. Por outro lado, a escrita
(enquanto
manifestação formal do letramento), em sua faceta
institucional é adquirida em certos contextos formais: na
escola, por exemplo. Daí, também, seu caráter mais
prestigioso como bem cultural desejável. E
daí, também, o fato de uma certa identificação entre
alfabetização e escolarização, o que não passa de um mero
equívoco (cf. GRAFF, 1995; FRAGO, 1993), pois houve
situações históricas, tal como o caso da
Suécia, em que a alfabetização se deu desvinculada da
escolarização.
Segundo Marcuschi (2001), a
oralidade seria uma prática
social interativa para fins
comunicativos que se apresenta
sob várias formas ou gêneros
textuais fundados na realidade
sonora: ela vai desde uma
realização mais informal a mais
formal nos vários contextos de uso
(2001, p. 21).
É fundamental ouvir leituras de
diversos gêneros textuais e em
variados suportes,
dialogando com o aprendiz, mas
sempre respeitando o que ele
pensa. Ao mesmo tempo, elaborar
questões que possam ajudá-lo a
avançar na organização do
pensamento.
Chartier (1996) enfatiza que é
importante multiplicar no período
da aula as oportunidades para que
os alunos falem sobre situações da
vida, o bairro, a família, as relações
de vizinhança, o calendário, os atos
da vida cotidiana, que constituem o
pano de fundo de muitos escritos
escolares (1996, p.115).
Ao concebermos a escrita como modo
de representação, somos obrigados a
admitir que o simples domínio de sistema
não torna o sujeito um escritor
competente, porque, além disso, é preciso
que ele amplie a sua experiência e seus
conhecimentos a ponto de reconhecer a
escrita na sua especificidade (vinculada à
oralidade, mas não dependente
dela), compreender seus modos de
representação (que extrapolam a relação
biunívoca letra-som) e, finalmente, ampliar a
sua experiência sobre as práticas sociais de
produção e compreensão/interpretação.
Portanto:
A oralidade seria uma prática social interativa
para fins comunicativos que se apresenta sob
variadas formas de gêneros textuais fundados na
realidade sonora. Ela vai desde uma realização
informal à mais formal passando pelos mais
variados contextos de uso. Uma sociedade pode
ser totalmente oral, ou de oralidade
secundária, como se expressou Ong (1982), ao
caracterizar a distinção entre povos com, e sem
escrita. Considerando-se essa posição, nós
brasileiros, por exemplo, seríamos hoje um povo de
oralidade secundária, tendo em vista o uso intenso
da escrita neste país.
O letramento, por sua vez, envolve as mais
variadas técnicas de escrita, nas suas variadas
formas existentes na sociedade, e pode ir desde
uma apropriação mínima da escrita, tal como o
indivíduo que é analfabeto, mas letrado porque
identifica o valor do dinheiro, consegue identificar
o ônibus que deve tomar, sabe fazer cálculos
complexos, e sabe distinguir as mercadorias pelas
mascas etc, mas não escreve cartas e nem lê o
jornal regularmente, até uma apropriação profunda,
como o indivíduo que desenvolve tratados de
Filosofia e Matemática, ou escreve romances.
Portanto, letrado é o indivíduo que participa de
forma significativa de eventos do letramento, e não
apenas aquele que faz um uso formal da escrita.
Já a fala seria uma forma de produção
textual-discursiva para fins comunicativos
na modalidade oral. Situa-se, portanto, no
plano da
oralidade, ou seja, não há a necessidade de
uma tecnologia além do aparato disponível
pelo próprio ser humano. Caracteriza-
se, também,
pelo uso da língua na sua forma de sons
sistematicamente articulados e
significativos, bem como aspectos
prosódicos, envolvendo, ainda, uma série de
recursos expressivos de uma outra
ordem, tal como a gestualidade, os
movimentos do corpo e a mímica.
Por último, a escrita seria um modo de
produção textual-discursiva para fins
comunicativos com certas especificidades
materiais, e se caracteriza por sua
constituição gráfica, embora envolva,
também, recursos de ordem pictórica dentre
outros. Situa-se, portanto, no plano dos
letramentos. Pode manifestar-se, do ponto de
vista da tecnologia, por unidades alfabéticas
(escrita alfabética), ideogramas
(escrita ideográfica), ou unidades
iconográficas, sendo que no geral, não
temos uma dessas escritas puras. Trata-se
de uma unidade de uso da língua
complementar à fala.
“Tudo no mundo está
dando respostas, o que
demora é o tempo
das perguntas”
Saramago, escritor português
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BEZZERRA, FRANCISCA A. M.; FARIA, FRANCISCA E.
M.; MACHADO, JOSÉ A. F. ORALIDADE E ESCRITA -
INSTRUMENTOS NA CONSTRUÇÃO DO SABER
AO LONGO DA VIDA . ARTIGO. S/D
CITELLI, ADILSON. LINGUAGEM E PERSUASÃO. SÃO
PAULO: ÁTICA, 1991.
PEREIRA, GIL CARLOS. A PALAVRA: EXPRESSÃO E
CRIATIVIDADES. SÃO PAULO:
MODERNA, 1997.
SOARES, MAGDA, “LETRAMENTO, UM TEMA EM TRÊS
GÊNEROS”. BELO HORIZONTE : AUTÊNTICA, 1998.
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