Vestgios de um Deletrio Divagante I Anoitece, o espelho emudece.
A janela aberta. A luz do poste delineia nossos corpos, um vento
tpido misturado ao cheiro de tabaco extra- forte, recm aceso,
envolvido pelos odores tpicos da periferia, me deixam tonto...
Quando a olho, ela cobre o seio esquerdo discretamente e esboa um
sorriso calculado, exatamente, em todas as suas dzimas peridicas...
Ao amanhecer, no mago da cama, nossos corpos se roam, levemente
entrelaados pela noite dividida, noites de amores desconjurada,
para quem tm parmetros alheios. Ela faz um caf, eu fao um cigarro e
conto trinta e duas gotas de clonazepan na xcara, aps fico tonto
novamente. Beijo- a, afago- a e sinto seu toque, seu hlito, mas de
forma mecnica precisava sair. Saio sem rumo, procurando
distanciar-me dos lugares comuns que me assaltam de forma
sintomtica naquelas enfadonhas redondezas. Distrado, quase de um
jeito bobo tropeo na calada, e indiferente reparo no cachorro
atropelado com suas vsceras expostas em frente a uma igreja
protestante, provavelmente ningum ir recolher os restos do co.
Enfiei as mos nos bolsos para ver se tinha o do nibus. No ponto de
nibus, junto aos que sabem para onde esto indo, com suas certezas
axiomticas e desconcertantes, vi sentada em um enorme banco, uma
velha cheia de trapos... Suas ancas ocupavam deploravelmente o
martirizado banco. Ela se apoiava num carrinho de feira, cheio de
embalagens de produtos reciclveis, exalando uma profuso inspida.
Junto ela uma criana com os ps descalos e camisa da seleo
brasileira, uma criana com olhar lacrimoso, de quem sabe do
abandono prximo. frente da velha, prximo ao meio fio, um
homossexual com visual American style, lixava as unhas, pousando o
olhar sobre um operrio que passava de bicicleta, descosido. Todas
essas cenas aparentemente comuns eram as composies perturbadoras
dos descaminhos de quem carece de abismos para contemplar, lugares
inspitos para esquecer- se na exausto diria dos simulacros sociais.
Nos momentos mais arredios, indomveis e imprestveis tentamos julgar
a vida, supondo conden-la, vingar- se dela, sentindo- se de
dominado para dominante, mesmo que s vezes, com a conscincia
desanuviada, projetemos nossos simulacros sociais ou delirantes,
que nos tornam mais cativos, da esperana torpe de uma gloriosa
Causalidade conformista, que soa como um acalanto. De repente,
sentindo um pouco de nuseas, decidi seguir um descaminho dentro de
qualquer nibus, para qualquer lugar, um lugar de outro,
momentaneamente s meu, mesmo que insalubre, mas onde pudesse
esboroar minha cabea, onde poderia me perder sem preocupaes de
encontrar o que se havia desprezado, s vezes pela fragilidade de
nossas constituies sociais e fisiolgicas, intrnsecas aos humanos
que vivem confinados nas florestas concretadas. Dando uma olhadela
no interior do caixote de rodas, havia um assento vago, parecia
minha ltima acomodao, cinza, trepidante. Onde guardava memrias de
vrios glteos disformes se alternando aleatoriamente na lgica do
relgio incerto. Quando o motorista engatou a primeira, uma sbita
vontade de saltar, ou pular mesmo em movimento do caixote de rodas
rasgando minha carne contra o asfalto superfaturado, dilacerando
minhas desvontades, um torpor para minha conscincia ou iluso de
possu-la. Em um momento de divagao, inebriado por trinta e duas
gotas de clonazepan em uma xcara de caf, o meu destino era incerto,
j que eu no havia previamente me certificado qual seria o destino
do nibus. Passando por um posto de sade, olhando com olhos de
documentarista, agonizei em pensamentos com o juzo perdido. O posto
de sade no tratava de doenas infecciosas, pessoas atropeladas,
doenas tropicais ou qualquer outra enfermidade fsica ou mental, mas
sim, de uma enfermidade social disseminada cientificamente. Mais
frente pessoas vagavam errantes por lojas cheias de quinquilharias,
com vendedores sedentos por abonos miserveis em seus empregos
terceirizados, quase automatizados, para cumprir ordens e
satisfazer o patro, que sagaz por aumentar seus empreendimentos,
faz sonhos de plsticos e luzes, sonhos to intensamente sedutores e
formatadores e distantes e desnecessrios, que cabem num metro
quadrado, que fica parecendo um leito na ala de psiquiatria.
Trabalhar para manter o leito desumano nesse enorme campo de
concentrao, as vezes fica parecendo que estamos sempre preocupados
em aumentar o oramento da sade, parecendo um estmulo a economia,
parecendo que cavamos nossa prpria cova, o sortilgio da servido
moderna, da nossa farsa moderna... Para o mercado livre, que
significa livre para explorar, indiferente se o lucro advindo
atravs de doenas, sofrimentos... Na verdade maravilhoso haverem
doenas incurveis. Mas que o consumo cclico de medicamentos, possa
tornar um possvel morto, em um zumbi, uma morte lenta e muito bem
paga. E existindo doenas a descobrir, e descobrir um tratamento, e
vend-lo para quem puder pagar. Doenas fsicas e mentais, h muitos
clientes a satisfazer, a lgica mercadolgica, na tentativa, s vezes
de um ser humano profundamente depende de sistemas, seja l quais
forem eles, de desvencilhar- se das mais diversas situaes, sempre h
uma soluo extremamente lucrativa, para doenas ou para qualquer
outra bobagem... Imerso na fantasia de ter o olhar de
documentarista, parecia ter esquecido que possivelmente eu era a
pessoa mais enferma entre os transeuntes que circulavam
sistematicamente nos meus momentos divagantes e inebriados , eu
parecia isento da situao, o grande e previsvel Sei que Nada Sei .
Devaneando sempre o grande protagonista do momento, nunca era pego
desprevenido, simulava uma tosse mentirosa, continuava minha cnica
caminhada. Todo esse percurso do descaminho inconseqente que eu
decidira analisar, minhas presunes, meus achismos, meus empirismos
desleixados, tudo ao mesmo tempo vibrava como uma onda sonora
gutural, brutal, dilacerante que entrecortava vez em quando o meu
sistema, to desesperadamente simulado, to fragilmente repetitivo.
Seguia a esteira habilmente reparada e eficazmente aprisionadora.
Entre um farol e outro, e a cada ponto de passageiros, desciam
pessoas, como cargas sendo descarregadas, seguiam caminhos
distintos com olhares vagos, apticos e roupagem semelhante. II
Aportei prximo a uma praa onde eram preservadas rvores nativas, com
placas que detinham os nomes cientificamente catalogados das
espcies. Porm eram ilustrativas, representavam nossas mais
profundas ignorncias e ineficincias. Perto das rvores ilustrativas,
o lixo, as guimbas de cigarros se juntavam a garrafas de cervejas e
camisinhas, submergidas pela urina acumulada por instantes
incalculveis. Do outro lado da rua, vi um bar, me retive por uns
instantes para fazer um cigarro. Rumei para o bar, na pretenso de
encontrar algum para jogar conversa fora. No recinto havia vrias
mesas de sinucas e uma vasta variedade de bebidas altamente
confortantes para angstias e deleitveis para quimeras. No balco
ovos de codorna, imersos em um liquido misterioso, pareciam adornar
o recinto. No recinto as pessoas estavam dispersas fisicamente e em
pensamentos. Olhando de relance e de forma ligeiramente
desinteressada nas figuras que compunham o ambiente tosco, tentando
captar no instante em que se manteria de forma harmnica a relao
entre a plpebra e a ris, eu teria que ler as faces estranhas numa
piscadela, e a reao qumica ocasionada pela minha curiosidade
impertinente, muito possivelmente se traduziria em bbados
tabagistas reduzidos a uma aposentadoria nefasta, jovens
desempregados perdidos com sonhos comuns. Mulheres no havia, a no
ser a do dono do bar, parecia uma sanfona disforme e indecente para
olhos e ouvidos cautelosos. Ocupava-se em organizar e limpar
negligentemente o balco com um pano encardido, limpava poeira,
limpava qualquer coisa no cho e reclamava com sua voz estridente
sobre a caixa de gordura estar entupida novamente. De forma sbita
irrompeu em meus pensamentos brios, um desprezo profundo por tudo o
que compunha aquele cenrio. Cercado implacavelmente por fragmentos
de minhas desvontades, as palpitaes no meu peito tornaram- se
insuportveis, o suor frio, o olho aberto rigidamente e uma vontade
que j no era mais vontade, era a materializao das minhas
desvontades. Arrastei- me para fora do bar sob olhares abrasivos,
consegui chegar at a rua atrs do bar, encostei- me em uma rvore e
soltei o corpo aos poucos, depois de alguns minutos no conseguia
mais levantar. Mais ou menos uma hora e meia aps meu
desfalecimento, eu precisava urinar, meus braos estavam dormentes,
eu no tinha foras nem para abrir o zper da cala, que no tinha zper,
mas sim botes. Resolvi urinar confortavelmente na cala, ao tornar a
deciso um ato, um desconforto intestinal ocasionado provavelmente
pela ansiedade da situao no me deixou opes. Fiz todas as
necessidades fisiolgicas ali, cado, imperceptvel. Eu sabia que
depois de um tempo, decerto quando minhas fezes j estivessem secas,
algum iria me notar, fosse para me chutar como uma pedra obstante
ou para socorrer, tal qual se socorre qualquer um. Em uma tentativa
de gritar qualquer coisa, fiquei inconsciente... Aos poucos, ainda
muito sonolento, as plpebras resistiram, mas se moveram, a luz que
incidiu em meus olhos ofuscou a minha dbil tentativa de identificar
onde eu estava. Fechando os olhos novamente, tentando recordar- me
do que havia acontecido, lembrei de minhas fezes secando,
umidificadas pela minha urina que aquecia minhas pernas enquanto eu
perdia os sentidos. Alguns minutos depois ouvi uma voz feminina
horrivelmente masculinizada perguntando se eu estava me sentindo
bem, respondi letargicamente que mais ou menos, sem entender ainda
onde eu estava. Como a sonolncia ainda era forte, resolvi ceder
opulncia do esquecimento... Algum tempo depois, no saberia
especificar o quanto, a sonolncia havia passado por hora, mas ainda
com muitas dores no conseguia movimentar ambas as pernas,
assombrosamente uma sonda absorvia minha urina, que possua uma cor
muito viva, parecia densa, uma cor de cobre envelhecido, lia na
urina todas as minhas angstias, ela trazia os componentes qumicos
dos processos reativos ocasionados pelos mais diversos psicotrpicos
ingeridos por mim, nas tentativas de aplacar alguns desconfortos,
sim, parecia que eu estava num hospital. Ser toxicomanaco ou no, j
no significava nada, se me dissessem que eu poderia ficar com
seqelas irreversveis, limitaes fsicas, ou qualquer outro tipo de
limitao, j no importava. J havia algum tempo que eu vinha abusando
de alguns remdios, evitando ficar, cara a cara com alguns
desgostos, algumas memrias persistentes e demasiadamente inteis,
mas que ainda incomodavam por serem memrias do corpo, incomodavam
por que tinham vida prpria, e por assumirem uma postura ditatorial
em certas ocasies. Agora estava ansioso por saber o que havia
acontecido, pois uma sonda quer dizer alguma coisa. De repente ouvi
alguns passos, a porta ruidosamente e compassadamente foi sendo
aberta, uma equipe, todos com roupas brancas, adentrou rapidamente
ao quarto, ou enfermaria j que o lugar onde eu estava ainda me era
desconhecido. Um homem de meia idade que se dizia psiquiatra, um
sujeito raqutico com a barba por fazer e altura acima da mdia,
comeou a explicar o que me tinha acontecido, o mal que me
acometera. Comeou explicando que eu havia tido um desmaio por
conseqncia da presso baixa e fiquei inconsciente, em uma esquina
remota e fui acolhido por populares que acionaram as autoridades
competentes e ele dizia: Ns viemos lhe administrar um medicamento,
voc vai sentir um desconforto no inicio, mas vai ficar bem... Nesse
momento algum puxou meu brao e outro sujeito aplicou uma agulha
intravenosa com muita habilidade, mas bruscamente, em alguns
segundos tudo comeou a girar e uma voz bem longe comeou a
discursar: A Histria est errada, os Historiadores no compreendem as
verdadeiras razes do nosso amado Deus! Deus tem seus escolhidos, os
que perecem merecem esse destino, O Grande Plano divino agora tem
as suas bases para se consolidar. O Imprio Romano, Buda, Jesus,
Napoleo, Hitler, Stlin, Frana e Inglaterra, Vaticano e Estados
Unidos mesmo somados nada so diante de ti! Deus Amado, agora no h
Bandeiras Nacionais, Hinos Nacionais, particularidades e culturas,
somente Deus materializado em microchips, todos tero Deus, Amm...
As ltimas palavras que consegui escutar foram uma nova sociedade
emergiu, agora o mundo uma pirmide imutvel... Quando fiquei
consciente novamente, os meus olhos estavam bem, apenas o olho
esquerdo estava embaado, j conseguia lentamente firmar o corpo, com
um pouco mais de tempo acho que conseguiria andar, mas eu no estava
em um leito de hospital, era um quarto pequeno, com pouca moblia e
um desenho estranho, uma srie de nmeros aleatrios serviam de fundo
para um retngulo envolvido por um circulo onde estampava as
seguintes palavras Individualidade coletiva, Paz e Racionalidade...
Havia uma cadeira de cor negra. Ao lado da cadeira tinha um cabo,
notei que o cabo saia diretamente do assoalho e estava anexado
cadeira, possua na extremidade um modelo esquisito de pendrive, no
conseguia compreender a situao. Alguns minutos depois, ainda
tentando entender um pouco ouvi passos vindo na direo do quarto,
dava a impresso de ser uma multido, de repente um silncio... Aps
alguns segundos, a fechadura da porta comeou a se movimentar, bem
calmamente e a porta foi sendo aberta, trs homens e duas mulheres
penetraram abruptamente no quarto, todos estavam com uniformes
brancos, de crachs, mas nos seus crachs no havia nomes, somente
letras e nmeros, nos homens, do lado direito do trax figurava o
desenho que eu analisara no quarto momentos antes, nas mulheres o
desenho ficava na regio do ventre. O mais velho dentre eles iniciou
um discurso: Uma nova era nasceu para a humanidade, s amarras de um
Estado primitivo foram exterminadas, fronteiras, bandeiras
nacionais, ideais democrticos, guerras e outras organizaes j no
possuem significados. Vamos conect-lo, depois ele ir nos
agradecer.... Os outros dois homens vieram para cima de mim,
imobilizaram- me e fizeram com que eu me assentasse na maldita
cadeira, mas o que eles iriam fazer?! Conectar o pendrive no meu
rabo! No, eles ataram meus braos e minhas pernas estrutura da
cadeira, depois imobilizaram meu pescoo e comearam a raspar a parte
de trs do meu cabelo. De forma horripilante senti algo estranho
entre a minha nuca e a minha cabea, algo inorgnico, acoplado. Uma
mulher no seu crach constavam os nmeros e letras 000.002.009- XX,
ela pegou o cabo e o conectou a estrutura que estava acoplada na
minha cabea. Depois de conectar devidamente o cabo ela deu a ordem
para que o 000.001.009- XY apertasse a tecla enter. Quando ele
terminou eu desmaiei... III Acordei atnito, j levando a mo para
detrs da cabea, mas inesperadamente eu estava em casa, bem, com a
roupa que eu lembrava ter sado. Minha mulher estava preparando um
caf, e para despertar melhor preparei um cigarro, fiquei tonto por
alguns instantes. Aps tomar o caf, pedi a ela que se sentasse. Em
tom inquisitrio, mas inocente, perguntei o que estava acontecendo,
se alguma coisa estranha havia ocorrido, se ela saberia dizer para
onde eu havia ido quando sai pela manh no dia passado. Ela
respondeu que quando sai no havia avisado para onde eu ia, como de
costume, mas que cheguei por volta das trs e meia da manh, deitei-
me no sof, liguei a televiso e fiquei assistindo a um canal de
contedo religioso, parecia ser um pastor protestante ouvindo alguns
fiis desconsolados pelo telefone e pela internet, depois eu
adormeci. Eu no conseguia lembrar onde estive, o que acontecera
comigo, agora tudo continuava, numa suprema esteira de parada final
desconhecida, precisava me acalmar, peguei o frasco de clonazepan e
contei quarenta gotas em uma xcara de caf, fiz mais um cigarro e
fui para a varanda pensar um pouco, talvez minha sanidade, ou o
pouco que restava dela, estava se deteriorando quase, que
intencionalmente produzindo efeitos de alucinao... Em minha mente,
fragmentos de frases perturbavam minha sinttica calma, palavras
como Individualidade Coletiva, Paz e Racionalidade. De certa forma
soavam bem aos ouvidos desatentos, enquanto a maioria poderia
escutar belos discursos, ouvidos mais atentos se alarmavam com mais
uma ideologia desatinada. Estados com Poderes Centralizados,
Absolutos, jamais podero fazer nada por nada. Vozes coletivas
insensatas h aos milhares, clamam pelos desamparados, pedem
melhores salrios para os professores, tratando- os a pancadas,
Estados que so verdadeiras anomalias, atados por sistemas, modelos
econmicos que resultam em sociedades estratificadas, polticos
manipulados servindo a organismos internacionais. A palavra
coletividade, praticamente uma infmia para a maioria, com seus
microondas, laptops, tablets e tantas facilidades, sem dvida no
dimensionam o Estado contemporneo, o grau de interferncia na vida
de um sujeito, CPF! Ai est voc amigo, qual o seu CEP? Voc doador de
rgos? Qual igreja voc freqenta? Quais as suas marcas preferidas? Tm
balada , hoje est a fim? Vai ter doce... Eles devem saber de tudo,
ou quase tudo, pelo menos o que passa pelas mquinas. Onde voc
estiver tem algum disposto a lhe vender algo, qualquer coisa que no
tenha valor de mercado, algo que eles no ocupem mais, como seus
corpos amorfos. Parado em qualquer pontilho, voc pode contemplar os
carros, eles vem, eles vo, correm, e tem uma pressa alarmante. Os
nibus coletivos com suas cargas mveis e conformadas seguem ao lado
de carros que valem o triplo, monetariamente falando, e que se
exibem com seus designs sofisticados, nossas espaonaves de rodas.
Tambm carregam cargas com bpedes, que parecem seres selecionados,
como os louros guerreiros do terceiro reich, avanando mata adentro,
travando guerras de tolos, nas Florestas de concreto superfaturado.
Os olhares que saem do caixote de rodas, no condenam suas injustias
na mquina, no... Eles contemplam a mquina, se vem dirigindo a
mquina to sedutora, traria tantas coisas juntas, suas vaidades
seriam plenamente satisfeitas. A esperana num jogo de loteria, numa
possvel prece solitria, esperando desgraadamente, com as carcaas se
degenerando, uma virada no jogo, na vida, no futebol. Eu poderia at
sentir a mo divina tocando seus desgostosos, delicadamente mexendo
os pauzinhos, tirando um daqui outro acol, podando alguns galhos j
cansados do oficio de ser galho, fazendo um adianto e continuariam
uma prece cedo, outra tarde e muito brevemente a derradeira antes
de dormir, e se no der certo os desejos, a vontade divina, nada h
para lamentar. Amm... Entre avaliaes comuns transmutadas em idias
que negavam as prprias idias, na natureza urbana, vagando
aleatoriamente tentando equilibrar- me no meio fio, imaginando um
gro de areia, ou sua menor parte, na sua ilimitada
indivisibilidade, uma brisa ameniza a solido atmica. Mais adiante
uma nuvem escura d outro tom a minha pele plida, apesar de morena.
Pensamentos desintegram o que era palpvel. melhor ficar em estado
catatnico e esperar por ela, da minha forma grotesca e exasperada,
vou clamar a ela que me trate como um filho tal qual deve se tratar
um, confortando- o, acariciando- o, e talvez com uma cantiga bonita
para eu artificialmente saber como ... Solido Atmica, sei que no
alvio de um afago, na tentativa de no lembrar, sempre estar
esperando por mim. Solido atmica, exata, pontual e com memria de
elefante, serei deglutido, serei neblina de cigarros, nmeros de
clulas inexatas... IV Fiquei horas olhando literalmente para a
parede, Isabel no parava de me importunar para que fossemos ao
mercado comprar o necessrio para o fim de semana. Isabel, era
linda, vislumbrava qualquer homem, chegava a me incomodar sair ao
seu lado. Nossos pais j haviam falecido cinco anos. Para ela era
uma lembrana vaga, j se acostumara a sermos somente ns dois, irmos,
marido e mulher, a porcaria do filme A lagoa azul se configurara
para ns, simplesmente nada restara para ns, a no ser o irmo e a
irm, frgeis, imorais, sem misticismo barato, e tudo tinha que ficar
no anonimato. Seriamos chamados de bruxos, tal qual na idade mdia,
arderamos em fogo para dissipar o nosso amor deveras resignado.
Preciso resolver a nossa situao, estabelecer novas diretrizes para
ns, verificar no banco como transferir todos os bens que restaram
para Isabel, se j decidimos que no tentaremos ter filhos, quem sabe
futuramente poderia adotar uma menina, para Isabel se sentir menos
s. Meu trabalho, que apesar de ser um estorvo, era minha nica
renda, no somente para mim, mas tambm para Isabel. O laudo emitido
pelo Psiquiatra constatou um quadro de ansiedade, totalmente
controlvel com as dosagens certas dos medicamentos. Mas, no era o
suficiente, eu gostaria de me aposentar, dedicar- me mais aos
prazeres que no so comprados, mas conquistados. Qualquer tipo de
psicose, esse era o laudo que eu precisava, facilitaria o processo
de aposentadoria, por invalides, mas o laudo ter que fazer
referncia a origem da psicose, na rotina do trabalho, pilhas de
documentos para digitalizar, tendo que cursar o ensino superior e
trabalhar, cuidar da irm e mais a ansiedade crnica, deixaram-me em
estado debilitado. Algumas simulaes, alguns choros descontrolados,
poderiam at entregar minha tutela, para Isabel, eu seria louco para
os distantes, e a sanidade que incomoda para minha irm e amante
Isabel, doces so seus lbios, e a mama rosada... Todos podem bradar,
condenar ou lamentar por nossas pobres almas, eles dizem malditos,
eu digo no consigo escutar o que dizem ai de baixo, mas na maioria
das vezes permaneo calado. Nesse momento muito sutilmente Isabel
laou- me por trs com sua sada de banho, roou seus seios nas minhas
costas, e com lgrimas nos olhos, rogou para que a amasse para
sempre, no a deixasse, que agentaria outra mulher se fosse
necessrio. Fiquei perplexo com a situao, ela j era mulher, e se
entregando j sem foras, sem alguma nova perspectiva, ou outro rumo,
aquela relao incestuosa era sua dependncia. J estava anoitecendo e
eu queria sair, mas antes dei um calmante Isabel e esperei junto a
ela para que dormisse. Aps ela dormir, preparei um caf e um
cigarro, na xcara de caf contei quarenta gotas de clonazepan,
fumei, esperei o caf esfriar e sem saborear, engoli de uma vez. Fui
para o banheiro e com um anti-sptico bucal aliviei a amargura de
todos os componentes ingeridos. Fechei todas as janelas, voltei ao
quarto e a cobri, porm liguei o ventilador contra a parede, aps,
desliguei o gs, o telefone e todos os eletrnicos da casa. Tranquei
a porta e o porto, preparei mais um cigarro e segui rumo ao ponto
de nibus. Eram vinte e duas horas, e quase no havia ningum na rua,
a no ser viciados, mini-traficantes e travestis aberratrios. Toda
aquela redondeza maculada pela desigualdade social crnica era o
sinal de uma enfermidade social disseminada cientificamente, o
descaso humano tinha natureza na inverso e inveno das necessidades.
Eu vivia em dois mundos, um era a tranqilidade da pseudo-casa, com
um componente complicado, o outro era a cidade, o subrbio, o
centro, os grandes edifcios, manses, Bancos e outros componentes
complicados. Do hiato que h na vida, procuramos evitar certas
decises, pelo qual podem surtir efeitos diversos. Posso tentar
isolar- me junto Isabel, mas saberia que ela ficaria cansada dentro
de poucos meses, at o espelho poderia causar repudio. Isabel e o
resto, eu transitava entre dois mundos, um delicado e avassalador,
outro obscuro, porm sedutor. O que estaria ao meu alcance e, ao
aleatrio? A minha impotncia diante de tantos fatos, das minhas
fraquezas e conscincia da fraqueza, era desesperadamente uma forma
de punio inconsciente, autopunitiva. Tentar fazer qualquer coisa em
circunstncia nenhuma poderia resultar em mudanas significativas na
totalidade da sociedade. Mortes, guerrilhas, contravenes ou o que
seja contraveno de qualquer natureza poderia resultar em algo
significativo para as mudanas necessrias. O que fazer? Seguir o
curso do rio, na esperana que ele desge no mar, qualquer que seja,
por mais arredio que seja... No em minha mente parecia que eu tinha
o controle da situao, sempre fui calculista, ou pensava ser, j
levei tombo, mas depois de um tempo bambeando as pernas, tentava
novamente. Os remdios no me afetavam como os mdicos faziam
previses, nos ltimos dias, nas andanas aleatrias tive alguns piques
de confuso entre a realidade ou que eu achava que era realidade e
minhas divagaes inebriadas, eu posso ter ficado em transe mais
tempo do que poderia. Objetivamente traando as escolhas que no
teriam volta, percebi que a mais urgente era o caso de Isabel. Em
tudo que fosse fazer, teria que levar em considerao o bem estar de
Isabel. Minha pequena, parece to frgil, as mos to delicadas, um
mundo to horrivelmente monstruoso que no acolhia suas lgrimas
solitrias, por serem de origem inconfessvel. Apertava o peito dela
contra o meu e chorava descontroladamente, e eu sendo seu irmo e
marido a consolava invariavelmente. Morrer ficou mais angustiante
para mim. Embarquei num nibus que passaria pela avenida principal
da cidade e iria para o shopping principal dessa Necrpole. Decidi
ficar no maldito reduto de quinquilharias de marcas. Nada havia
para apreciar, a no ser as mulheres em geral, com seus corpos bem
delineados, roupas supostamente confortveis e atuais, e uma repulsa
no tratamento com os empregados e subservientes, maquilada em belos
sorrisos e gentilezas matemticas, causavam em mim estranhamente
aquela velha conhecida vontade de sumir como um relmpago,
estarrecido com mais composies impertinentes. A necessidade humana
do toque evidente, mas nessas andanas o desespero e a fraqueza e
conscincia da fraqueza do sujeito submisso a ignorncia disseminada,
as normas ditatoriais e formataes humanas, tudo controlvel pela
superestrutura tecnocrtica intocvel. Quem se torna smbolo da
superestrutura controla o Estado. Mas tambm devidamente controlado.
Desejo pela eternidade, quantos seres humanos no se debateram com
esse desejo? Perpetuar- se no poder, carrega esse sentimento de ter
a iluso de que permanecer no pice da estrutura poder lev-lo para
mais perto da eternidade, houve milhares de idiotas que de uma
maneira ou de outra acharam que poderiam ser o smbolo de uma nova
religio, de uma nova doutrina em uma outra vida, mais serena, mais
adequada a seus gostos nobres, imagine so centenas de milhares de
idiotas em delrio coletivo, e nem todos cabem nas covas... Meus
achismos polticos quando expostos sempre so ridicularizados, as
grandes curiosidades que pairam sobre a ao do individuo, quando
livre, tendo acesso aos meios mnimos de sobrevivncia, sem
classificaes de rico e pobre, o que parece impossvel. Abnegar uma
parte dos seus bens para uma ao mais coletiva sem que alguns
comecem a gritar: IDELOGO MARXISTA! Comunista! Hipcrita!- O que
essas palavras significam? O que elas tm a ver com a vida?
Democracias, livre mercados e bilhes de Escravos, simples no
preciso ir muito longe, Monoplios, Iluso de liberdade, o que a
maioria dos transeuntes que circulam sistematicamente nos centros
urbanos poderia declarar a respeito deste assunto? Ou a respeito
dos ismos. Bem, tenho uns desajustes mentais e mais alguns
problemas com psicotrpicos, provavelmente estou extremamente
desequilibrado. Muitos gostam de ouvir: Esse ai louco, tanta droga!
Chega a sair um excedente de saliva pela loucura demonstrada e
legitimada pelo doutor Psiquiatra. Li um autor escrevendo sobre o
prazer de estar certo. Na avaliao desse autor o prazer da verdade
ou prazer da verdade absoluta to intenso que inebria alguns homens,
os resultados das diversas cegueiras do homem, inebriados ou no
faria chorar o maldito capeta das velhinhas desenganadas. Vou ver
se esqueo esse assunto esgotado, mas j configurado. Vou voltar para
casa, para o meu simulacro principal, Isabel... V Quando cheguei em
casa, estava tudo devidamente certo, Isabel ainda estava dormindo,
desliguei o ventilador e a cobri novamente, ao levantar a cabea
para sair do quarto, fiquei com os olhos estticos. Fiquei
desnorteado olhando para o maldito desenho e as malditas palavras
que figuraram na minha real fantasia, nmeros aleatrios que serviam
de fundo para um retngulo envolvido por um circulo e as palavras
Individualidade coletiva, Paz e Racionalidade, na parede do quarto
de Isabel, uma fantasiosa realidade assumia moldes de uma percepo
permitida somente por ervas indgenas, que eu experimentara na
adolescncia, mas que se encontravam em esquinas das cidades, sendo
usadas como plantas ornamentais. Corri para a sala, tranquei a
porta, depois fechei as janelas, na cozinha peguei uma faca
qualquer, no havia muito tempo para pensar, Isabel estava dormindo,
eu no podia assust-la, com uma histria fantasiosa de conspiraes e
possveis conflitos. Parei por uns instantes para pensar no que
estava acontecendo, porque o maldito desenho estava no quarto dela,
seria alucinao, o que significaria todos esses eventos de
ocultismos e velhas ideologias parecendo peas de museus. Seria todo
produto de minha mente insana, eu poderia estar profundamente
doente, o louco no sabe que louco. Eu propriamente poderia ter
desenhado e depois esquecido, que desenhei, quem sabe o que
realmente acontece, com profundo domnio do que era antes e do que
era depois, tive um pico de ansiedade, mas passou, vou verificar a
casa e deitar- me junto Isabel... Havia muita confuso mental e uma
batalha homrica ocorria em minhas entranhas, o convencional, a
velha idia que plantada na mente do individuo doutrinando- os nas
escolas de que esse mundo sempre foi assim nos no podemos mudar a
maior parte de nossa vidas, ou est em deus ou no acidente csmico,
tudo foge e escapa e absorve atravs do buraco negro do tempo ou
aquilo que as pessoas acham que o tempo, dez, vinte, trinta anos
contados a partir de ponteiros que se tornaram junto com outros
elementos, a norma vigente, sentimo-nos sem motivao e como seres
desgraados numa terra errante que insisto nos escapa a todo
momento. Funciona e faz funcionar bilhes de seres humanos oprimidos
enganados por vrios dolos, terrestres ou no, de uma causalidade
nefasta, todo o controle parece estar fora de ns e ns acreditamos,
sedentos por uma explicao que no fuja do convencional, ou deus ou o
aleatrio, eis o nosso cativeiro mental. Observamos e avaliamos,
mesmo com uma cpula de abajur enfiada na cabea... Olhar ao meu
redor e seguir vivendo ignorando algumas suspeitas a respeito de
quem eu sou? Como cheguei a isso? E esses inconsolveis molestadores
mentais? Por que tudo quer nos escapar, quer nos conformar? Se
podemos funcionar como uma mquina programada, condicionada, algo
que nos supera detm esse conhecimento, numa linha imaginaria atravs
da historiografia convencional, poderia contemplar a mentira, como
uma mascara para no pensarmos em todas as injustias que j
vivenciamos, conosco e outros, nesses inmeros casos de
estranhamentos da vida. Por estranhamento quero ser mais
especifico, quando voc anda pela cidade e podemos generalizar, por
que o mundo esta cada vez mais uniforme parecendo uma grande
Corporao Monoltica e monopolizadora, as enfermidades disseminadas
cientificamente com total apoio psiquitrico, estranhamentos que
muitas vezes, quando nos afastamos desse modelo de sociedade e suas
regras totalitrias, sentimos o horror de que o que foi plantado
como fico em nossas vulnerveis mentes, comea emergir como uma Nova
Ordem, o que era oculto comea a tomar forma e ela no humana, dizem
que nem terrestre. H muita especulao a respeito de raas que possuem
uma descendncia gentica reptiliana e manipularam com engenharia
gentica o homo erectus que habitava nessa esfera csmica, criaram o
homo sapiens, que permitiu a essa nova raa, hibrida, servir-lhes
como escravos, h milhares de anos, servindo aos mestres
colonizadores espaciais. Eles colonizaram a terra e se diziam
deuses, parece absurdo, ou algum manipulado de outro jeito, tudo um
grande estranhamento. VI- Final Tudo martelava e esfolava a minha
cabea, j ouvi muitas historias de que o homem serve apenas como
escravo de uma raa superior, uma raa que reivindica esse planeta
como sua colnia, por serem de origem mais antiga, evoludas a partir
de rpteis, seiam como os nossos predadores. O homem, seria apenas o
veiculo para que o mundo material e a sustentao de poucos por
muitos se mantivesse intacta. Ainda h Estados Absolutistas
Totalitrios sob comando quem sabe, do Corporativismo Internacional
em reas que nos nem imaginamos, esse o mundo que me foi apresentado
e que ser at quando no puder agentar mais e de uma forma mutvel e
imperceptvel sairemos para uma forma mais assombrosa e estagnada,
uma forma cada vez mais profunda de escravido. Muitas informaes
podem paralisar um sistema e ele desliga para no morrer. O
desespero ao entender que nascemos num cativeiro como gados
confinados, o conceito de liberdade foi corrompido ou nunca
existiu, podemos at esquecer o que j falaram sobre liberdade, eu
mesmo no tinha a mnima idia de como funcionava fora do foco. Meus
pais que foram de forma irredutivelmente doutrinados atravs da
lobotomia medicamentosa, sonora e visual. Funcionavam como um
relgio ingls, pontualmente insosso. Percebi que j no conseguia
dormir, tudo girava... Porque eu no continuei na fila, quieto,
querendo ou no vo nos forar o matadouro e dizer que um mundo
melhor... Gostaria de ter uma viso mais ampla do que realmente
acontece ao meu redor, das conexes que nos escapam e controlam os
instantes irrecuperveis, afastando das possibilidades, que seriam
mil se no fosse a manipulao da nossa percepo, que possui espessura
de uma casca de ovo. Refletir e obter do cio algumas possveis
ilusrias respostas, algo que possa satisfazer as necessidades e
desejos de realidades, as reaes qumicas desejosas, tomos que vibram
em consonncia com os desejos mais exigentes, e que apesar de serem
apenas reaes qumicas ocasionadas por amores e medos, frutificam
freqncias diferentes e resultados infinitos. J no possvel manter a
neutralidade, j no possvel esquecer os vestgios do que foi
observado e do que foi subjetivamente vivido. Poderia viver o revs
de tudo que foi chamado verdade? Sem falsas nostalgias e pretenses
de melhorias da humanidade, por que de qualquer forma seria
melhoria ditada, com resultados sempre catastrficos e indecentes
para o bom senso, ou eu tomo as rdeas do meu desastre maquilado ou
continuo na fila, esperando, esperando... Quando me desfiz por
alguns momentos, da confuso que pairava sob os lugares mais
recnditos do ser humano, no caso nas minhas entranhas, lentamente
fui fechando os olhos e piscando cada vez menos, at adormecer. Devo
ter dormido algumas horas, ao tentar levantar da cama
espantosamente meu pulso esquerdo estava algemado a estrutura da
cama, agora em minha pseudo-casa, refm da minha mente, dominada por
foras exteriores. Fiquei exatamente como estava, agora no havia
perplexidades, nem absurdos. O que poderia me acontecer? Morrer. De
qualquer maneira eu haveria de morrer ora ou outra, o meu estado
miservel seria esperar a deciso de quem decidiria isso. Fiquei
alguns minutos sem nenhuma reao, de repente sem cerimnia alguma
Isabel estava minha frente com as pupilas extremamente dilatas. Ela
ficou alguns segundos em silncio, esperando que eu notasse a
gravidade da situao, e com sua voz aveludada disse: Suas observaes
a respeito de tudo que tens visto durante a vida trouxeram- lhe uma
resposta. Mas, acho que voc deve imaginar qual meu caro irmo.
Depois de terminar sua entrada, seguiu-se uma risadinha spera e
esperou uma reao minha. Mas que reao previsvel ela esperava? Eu
comeava a duvidar, suar, queria chorar e me debater no cho. Desejo
por realidade, uma realidade subjetiva que atenderia a vontade da
minha vontade, cega e repetitiva. Nada havia para discutir e
simplesmente disse ela: Se quiseres pode matar- me agora, o que
esperas? Uma ordem? Sem mover um msculo do rosto ela suavemente
disse: Acha que fcil assim, morrer? Pensas que tem o controle sobre
alguma coisa? Pensas que sou sua irm, depravado? Acha que uma relao
incestuosa poderia ser vestgios de estranhas civilizaes, obteve
respostas em livros? Estpido, no h livros livres da manipulao, como
no h informaes concretas para se chegar uma concluso exata das
possveis origens do que quer que seja, seu idiota! Ela conhecia
minhas angstias, de uma forma estranhamente ntima, como algum que
sabe segredos acessando diretamente meu hipocampo, algum alm do
passado. Ela apertava onde tinham feridas, feridas da ignorncia
alheia. Onde pairava o desconhecido, onde h uma dor comum para
todos, bem, na verdade uma dor de todos e de nenhum, por que
sente-se somente quando est chegando o fim, na verdade no sei se
onde realmente comea, um fim , um comeo. Quando Isabel terminou de
falar percebi que o meu lugar na esteira de parada final
desconhecida, j no era to desconhecida. Ento ela tirou uma seringa
j previamente preparada do bolso e disse: Bom felizmente para
continuarmos o processo, bem, voc est vendo a agulha, um pouco
maior, muitas outras viro, no vacile agora, seno teremos que
descart-lo sem experimentos, para voc simplesmente uma dose de
nanotecnologia auto-replicante, faa uma anlise de tudo agora. No
gosta de criticar tudo, no o grande pensador? Oh! Grande pensador!
E agora quer saber da sua verdade? Ou achas que o mundo um grande
relativismo, sempre uma nova perspectiva tua espera. Agora no tenho
mais tempo para perder contigo, quer ver o desenrolar da sua
supresso ou quer acordar no seu novo mundo? Lhe dou dois segundos
para escolher.... Ela estava muito segura a respeito do que dizia,
e eu no tinha opes a minha disposio. Ento olhei ao redor do quarto,
foi nesse momento que percebi que j no estava em casa, ou melhor em
minha pseudo-casa. Eu estava num leito hospitalar, poderia ser
qualquer lugar nesta cidade, poderia ser at um esgoto, pois no
fazia diferena. Respondi que gostaria de ver a minha supresso, ela
olhou fixamente nos olhos e completou: Idiota! Ainda acha que tem
escolha. No percebe que tal qual um verme quando pisado, voc
deveria se enrolar e esperar pacientemente a prxima ao do seu
dominador. Havia o meu descaminho, que eu tanto analisara, os meus
percalos, as minhas incertezas e agora minha supresso. Simplesmente
me tornei to importante quanto um verme. S no agi altura desta
magnfica criatura que nos degradam por dentro. No me enrolei como a
majestosa criatura vermiforme. Entender, s vezes queria compreender
de uma forma mais abrangente a totalidade dos fatos, das
interpretaes diversas . Buscando na superfcie das minhas lembranas
o que eu havia me tornado, sempre me escapava alguma coisa.
Compreendi que no havia entendimento, enxerguei que enquanto eu
contemplava o sorvete e tentava entend-lo ele derretia
imparcialmente. Se me querem ter apenas como um possvel resultado e
talvez descartar- me como smen depois de uma masturbao juvenil,
bem, j me masturbei e no tinha muito carinho pela minha poro
plasmtica. Ento com os dois segundos findados ela pediu para que
esticasse o brao e disse: Caro irmo depois de terminada a sua
supresso, simplesmente no ir lembrar absolutamente de nada, assim
como o resto dos idiotas que trilharam o caminho que no h retorno,
assim como a humanidade que no momento que est acordando, levada a
estaca zero por um longo sono pelos seus mestres... Havia outros
atormentados passando a mesma situao naquele momento? Estava
acontecendo em todo o mundo? A mentira que eu vivia era uma mentira
coletiva, crvel por que era respaldada por todos? A agulha estava a
alguns milmetros da minha veia e muitas imagens, imagens onde eu
podia me ver, andando, observando, agonizando, fazendo amor... A
ltima imagem que estacionou, tinha as feies de meus pais, eles
jogavam flores enquanto desciam meu corpo j deteriorado num buraco,
que no possua nem sete palmos de profundidade. Minha irm tambm
figurava na cena, ela segurava uma seringa e abraava nossos pais,
no final ela deu seu sorriso spero e ordenou: Ele j est conectado,
aperte Enter...Juan Hernandes