UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO Utilização da biomassa: avaliação dos resíduos e utilização de pellets em caldeiras domésticas João Jorge Mestre Dias (Licenciado) Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Mecânica Orientador: Doutor João Luís Toste de Azevedo Júri: Presidente: Doutor Mário Nery Rodrigues Nina Professor Associado do Instituto Superior Técnico, Universidade Técnica de Lisboa Vogais: Doutor Manuel Arlindo Amador de Matos Professor Auxiliar da Universidade de Aveiro Doutor João Luis Toste de Azevedo Professor Auxiliar do Instituto Superior Técnico, Universidade Técnica de Lisboa DEZEMBRO DE 2002
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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA INSTITUTO …enersilva.navegantes.info/areasubir/articulos/Tesis Mestrado Joao... · Palavras chave: resíduos de biomassa, pellets , emissões, eficiência
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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA
INSTITUTO SUPERIOR TÉCNICO
Utilização da biomassa: avaliação dos resíduos e utilização
de pellets em caldeiras domésticas
João Jorge Mestre Dias
(Licenciado)
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Engenharia Mecânica
Em primeiro lugar agradeço ao meu orientador Professor Dr. João Luís Toste de Azevedo
pelo incansável apoio prestado ao longo do trabalho
Ao Professor Dr. Mário Costa pelo apoio prestado na orientação de parte do trabalho
desenvolvido e na preparação de um artigo sobre os ensaios na caldeira
Ao Sr. Luís Mascarenhas da firma TEPAL pelo fornecimento da caldeira e combustível,
essencial para este estudo
Ao Eng. Pedro Figueiral (ADENE) e Eng.ª Susana Sobral (ARECBA) pelo apoio e
aconselhamento
Ao Professor Doutor Raul Bruno de Sousa pela grande ajuda e apoio
Aos colegas da Área Departamental de Ciência e Tecnologia dos Alimentos da Escola
Superior Agrária de Beja, em especial ao Professor Dr. João Canada, Dr.ª Silvina Ferro
Palma, Dr. Bartolomeu Alvarenga e Eng.ª Maria João Alves
Ao Eng. Nunes Ribeiro, à Dr.ª Helena Monteiro e à Lena pelo apoio na realização de análises
e disponibilização das instalações
À Caetana, Maria, Manuela, Fernanda e Célia pela sua colaboração
Aos colegas do mestrado Ronne Toledo, Pedro Grosmann, João Cunha e Luis Silva
Aos colegas do LASIQ, em especial ao Eng. Ulisses Fernandes e ao técnico Manuel Pratas
À minha família por todo o apoio e compreensão
ÍNDICE DE CONTEÚDOS
Página
Resumo........................................................................................................................................ i Abstract ...................................................................................................................................... ii Agradecimentos.........................................................................................................................iii
1 – Introdução ............................................................................................................................ 1 1.1 – Motivação do trabalho................................................................................................... 1 1.2 – Avaliação dos resíduos de biomassa em Portugal continental ...................................... 4 1.3 – Características da biomassa densificada ....................................................................... 9 1.4 – Testes em caldeiras...................................................................................................... 12 1.5 – Combustão da madeira ................................................................................................ 15
1.6 - Estrutura da tese........................................................................................................... 26 2 – Avaliação dos resíduos de biomassa em Portugal continental.......................................... 28
2.1 - Avaliação dos resíduos florestais................................................................................. 28 2.2 – Avaliação dos resíduos da indústria de transformação da madeira e cortiça .............. 33
2.2.1 - Estimativa dos resíduos florestais a partir do consumo de madeira ..................... 37 2.3 – Avaliação dos resíduos da agricultura......................................................................... 40 2.4 – Avaliação dos resíduos da agro-indústria.................................................................... 45 2.5 – Avaliação dos resíduos com possibilidade de queima ................................................ 49
3 – Metodologia dos ensaios na caldeira................................................................................. 53 3.1 - Descrição da caldeira utilizada .................................................................................... 53 3.2 – Descrição da instrumentação utilizada........................................................................ 55 3.3 – Metodologia dos ensaios ............................................................................................. 59 3.4 – Pellets utilizadas.......................................................................................................... 64 3.5 – Transferência de energia na caldeira........................................................................... 67
4 – Resultados obtidos na caldeira .......................................................................................... 72 4.1 – Ensaios em regime estacionário .................................................................................. 72
4.1.1 – Rendimento térmico da caldeira........................................................................... 72 4.1.2 – Perdas na caldeira................................................................................................. 74 4.1.3 – Emissões da caldeira ............................................................................................ 77 4.1.4 – Análise da transferência de calor na caldeira ....................................................... 80
4.2 – Ensaios de arranque da caldeira .................................................................................. 82 4.2.1 - Propagação da combustão no leito........................................................................ 82 4.2.2 – Evolução da temperatura dos gases de exaustão.................................................. 85 4.2.3 – Evolução das espécies químicas........................................................................... 88
Figura 1: Distribuição das principais espécies florestais em Portugal continental. ................... 5 Figura 2: Destino dos resíduos da indústria da madeira............................................................. 7 Figura 3: Evolução da massa duma partícula de biomassa durante a combustão .................... 19 Figura 4: Processo de pirólise da biomassa.............................................................................. 21 Figura 5: Secção de uma partícula em combustão ................................................................... 21 Figura 6: Disponibilidade dos resíduos de biomassa ao longo do ano..................................... 51 Figura 7: Caldeira ECOAGUA ................................................................................................ 53 Figura 8: Pellets utilizadas ....................................................................................................... 54 Figura 9: Tegão de abastecimento............................................................................................ 54 Figura 10: Esquema da caldeira ECOAGUA........................................................................... 54 Figura 11: Representação esquemática da instalação .............................................................. 56 Figura 12: Analisador dos gases de exaustão........................................................................... 58 Figura 13: Computador e data logger ...................................................................................... 58 Figura 14: Esquema simplificado da caldeira .......................................................................... 67 Figura 15: Representação das trocas radiativas entre as superfícies da caldeira ..................... 68 Figura 16: Correlação entre o circuito da caldeira e o da água de refrigeração....................... 72 Figura 17: Potência térmica da caldeira ................................................................................... 73 Figura 18: Temperatura dos gases em função da potência fornecida ...................................... 74 Figura 19: Perda de energia nos gases de exaustão.................................................................. 75 Figura 20: Concentração de O2 nos gases de exaustão ............................................................ 77 Figura 21: Emissões normalizadas de CO em função do oxigénio.......................................... 78 Figura 22: Emissões normalizadas de NOX em função do oxigénio........................................ 78 Figura 23: Temperatura da extremidade direita do leito de combustão, durante o arranque ... 83 Figura 24: Temperatura da extremidade esquerda do leito de combustão, durante o arranque83 Figura 25: Temperatura dos gases no lado esquerdo da câmara, durante o arranque .............. 86 Figura 26: Temperatura dos gases no centro da câmara, durante o arranque .......................... 86 Figura 27: Temperatura dos gases no lado direito da câmara, durante o arranque .................. 86 Figura 28: Concentração de CO, durante o arranque ............................................................... 88 Figura 29: Concentração de O2, durante o arranque ................................................................ 89 Figura 30: Concentração de NOX, durante o arranque............................................................. 89
ÍNDICE DE TABELAS
Página
Tabela 1: Superfície dos povoamentos puros e mistos dominantes ........................................... 5 Tabela 2: Estimativa de Barreto (1980) para os resíduos florestais ........................................... 6 Tabela 3: Resíduos florestais estimados para Portugal .............................................................. 8 Tabela 4: Expressões utilizadas em estudos de avaliação de resíduos de biomassa .................. 8 Tabela 5: Comparação entre as pellets e as briquetes .............................................................. 11 Tabela 6: Valores limite de alguns parâmetros do fabrico de pellets e briquetes .................... 12 Tabela 7: Emissões de diferentes sistemas domésticos de aquecimento ................................. 13 Tabela 8: Normas da avaliação do desempenho de pequenas caldeiras de biomassa.............. 14 Tabela 9: Estimativas do poder calorífico da biomassa ........................................................... 17 Tabela 10: Principais fontes de emissões poluentes da combustão da biomassa..................... 24 Tabela 11: Densidade e estimativa de resíduos por área e ano ................................................ 31 Tabela 12: Resíduos anuais estimados, por espécie................................................................. 32 Tabela 13: Consumo de matéria-prima na indústria transformadora da madeira .................... 34 Tabela 14: Consumo de matéria-prima na indústria da pasta do papel.................................... 35 Tabela 15: Origem da matéria-prima adquirida pela indústria da pasta do papel.................... 35 Tabela 16: Consumo de cortiça pela indústria transformadora................................................ 36 Tabela 17: Resíduos da indústria de transformação da madeira e cortiça ............................... 36 Tabela 18: Estimativa dos resíduos florestais segundo diferentes métodos............................. 39 Tabela 19: Características dos principais resíduos agrícolas herbáceos .................................. 41 Tabela 20: Resíduos das culturas temporárias ......................................................................... 42 Tabela 21: Características das podas das culturas permanentes .............................................. 43 Tabela 22: Resíduos das culturas permanentes ........................................................................ 44 Tabela 23: Resíduos da agro-indústria ..................................................................................... 48 Tabela 24: Disponibilidade de resíduos de biomassa para combustão .................................... 50 Tabela 25: Identificação dos termopares.................................................................................. 57 Tabela 26: Análise numérica das grandezas medidas .............................................................. 61 Tabela 27: Valores médios e incertezas das potências calculadas ........................................... 64 Tabela 28: Características das pellets....................................................................................... 66 Tabela 29: Propriedades das diferentes superfícies da caldeira ............................................... 68 Tabela 30: Factores de forma ................................................................................................... 69 Tabela 31: Desvio padrão e estimativa da incerteza ................................................................ 73 Tabela 32: Dados referentes à combustão incompleta ............................................................. 75 Tabela 33: Conversão do azoto em NOX.................................................................................. 79 Tabela 34: Temperatura dos produtos de combustão no interior da caldeira........................... 80 Tabela 35: Transferência de energia na caldeira...................................................................... 81 Tabela 36: Temperatura no leito de combustão, durante o arranque ....................................... 84 Tabela 37: Temperatura no interior da câmara de combustão, durante o arranque ................. 87
NOMENCLATURA
A Área, m2
At Altura total, m C Carbono cp Calor específico a pressão constante, kJ/(kg.K) DAP Diâmetro à altura do peito medido 1.30m acima do solo, cm E Erro da variável Cd Cádmio CF Carbono fixo Cl Cloro Cr Crómio Cu Cobre G Radiação incidente, W/m2 J Radiosidade, W/m2
h Entalpia específica, kJ/kg H Hidrogénio HC Hidrocarbonetos Hg Mercúrio k Condutividade térmica, W/(m.K) m& Caudal mássico, kg/s ou kg/h N Azoto Nu Número de Nusselt Nm3 Metro cúbico normal O Oxigénio Pb Chumbo PCI Poder Calorífico Inferior, kJ/kg ou MJ/kg PCS Poder Calorífico Superior, kJ/kg ou MJ/kg Pr Número de Prandtl R Constante universal dos gases ideais, kJ/(kmol.K) Re Número de Reynolds S Enxofre T Temperatura, ºC ou K t Tempo, s tep Tonelada equivalente de petróleo ton. Tonelada X Fracção mássica Zn Zinco Letras gregas α Difusividade térmica, m2/s ε Emissividade εVH Coeficiente de variação volumétrica da madeira, com humidade H, % ρ Massa específica, kg/m3 ρΗ Massa específica da madeira em base húmida com humidade H, kg/m3 σ Constante de Stefan-Boltzmann, W/(m2.K4)
Índices ar Base húmida (do inglês as received) daf Matéria seca, isenta de cinzas (do inglês dry ash free) db Base seca (do inglês dry basis) e Eléctrico th Térmico
SIGLAS UTILIZADAS
ASTM American Society of Testing and Materials CBE Centro da Biomassa para a Energia DGE Direcção-Geral de Energia DGF Direcção-Geral das Florestas DIN Deutsches Institut für Normung EN European Standard IFN Inventário Florestal Nacional ÖNORM Österreichisches Normungsinstitut SS Swedish Standard TAPPI Technical Association of the Pulp and Paper Industry
1
1 – Introdução
Neste capítulo será feita uma apresentação do tema a ser estudado na presente tese incluindo,
na secção 1.1, a motivação e a sua importância no contexto actual. Este capítulo contém na
secção 1.2 uma revisão bibliográfica relativa à produção e aproveitamento da biomassa em
Portugal, com destaque para o maior recurso disponível, a floresta. Na secção 1.3 apresentam-
se as propriedades típicas e normas associadas à preparação de biomassa densificada. A
secção 1.4 inclui uma revisão bibliográfica sobre alguns estudos realizados relativos ao
desempenho de caldeiras domésticas alimentadas a biomassa, incluindo um resumo sobre
algumas normas europeias. A secção 1.5 inclui um trabalho de revisão bibliográfica relativo
ao processo de combustão da biomassa, de modo a providenciar bases para o
desenvolvimento do trabalho e também analisar problemas associados à combustão de
biomassa. Finalmente na secção 1.6 apresenta-se a estrutura de apresentação dos capítulos
seguintes.
1.1 – Motivação do trabalho
A utilização de fontes renováveis para a produção de energia foi incentivada e fortemente
divulgada na Europa e nos Estados Unidos da América a partir dos finais dos anos setenta.
Neste contexto, a produção de energia a partir de biomassa vegetal constitui uma componente
importante, inicialmente valorizando os resíduos agrícolas, florestais e agro-industriais já
existentes, e posteriormente dando cada vez mais importância à produção de biomassa com
fins energéticos (Pereira, 2001). No que diz respeito à sua classificação, segundo a definição
de Biomassa constante na Directiva 2001/77/EC de 27 de Setembro de 2001, é “a fracção
biodegradável de produtos e resíduos da agricultura (incluindo substâncias vegetais e
animais), da floresta e das indústrias conexas, bem como a fracção biodegradável dos resíduos
industriais e urbanos” (ADENE/INETI, 2001). No entanto, na presente tese foi apenas
realizada a estimativa da produção de resíduos de biomassa na floresta, agricultura, agro-
indústria produtora de resíduos lenhosos e indústrias transformadoras da madeira e cortiça.
O aproveitamento deste recurso deverá constituir uma das prioridades de uma política
energética, sobretudo em sociedades que não dispõem de combustíveis fósseis. Esta opção
fará ainda maior sentido em situações onde o combustível aparece como subproduto dos
2
processos de fabrico (Companhia de Celulose do Caima, 2001), como é o caso de algumas
matérias lenhosas.
Actualmente, em todo o Mundo, milhões de pessoas utilizam a biomassa como fonte de
energia, principalmente nos países em vias de desenvolvimento (Bhattacharya, 2002), no
entanto uma grande parte é utilizada em processos simples, poluidores e ineficazes em termos
energéticos. Dentro da União Europeia, a utilização da biomassa no ano 2000 correspondia a
3% das necessidades energéticas, ou seja, cerca de 45 Mtep. No entanto, tal como firmado no
documento ‘White paper: Energy for the Future: Renewable Sources of Energy’, COM (97)
599, um dos objectivos prioritários é o aumento da utilização desta fonte de energia em mais
90Mtep até 2010 e se tal objectivo for cumprido, a biomassa irá contribuir com cerca de 50%
das fontes de energia renováveis (EC, 2000). Para cumprir esta meta será necessária a
utilização dos resíduos da agricultura, floresta, indústria transformadora da madeira e outros
resíduos, assim como a utilização de culturas energéticas (EC, 1997). Na Europa, a ideia da
utilização da biomassa para fins energéticos teve um grande desenvolvimento, dado que se
conjugava com aspectos então também em discussão acerca da utilização da terra para
produções agrícolas não alimentares e da utilização dos produtos agrícolas excedentários para
fins industriais não alimentares, no quadro de uma política europeia de subsídios à
agricultura. Rapidamente os aspectos relacionados com o ambiente ganharam importância e
muitos estudos iniciaram-se, relacionando o impacto da utilização da biomassa como fonte
combustível no ambiente, quer a nível da produção quer da utilização (Pereira, 2001).
Em Portugal, verificam-se alguns avanços na utilização desta fonte de energia, principalmente
no aquecimento doméstico, apesar de ser utilizada com uma baixa eficiência energética. Em
paralelo continua a ser uma fonte de energia marginal na utilização em larga escala, como em
centrais térmicas e termoeléctricas. Em outros países europeus como a Suécia, Áustria e
Alemanha, a biomassa tem vindo a consolidar-se como alternativa fiável às fontes energéticas
convencionais, sendo já bastante largo o número de aplicações em grandes centrais. Entre as
causas que contribuem para a fraca penetração no nosso mercado encontram-se a sua
imaturidade no mercado da energia, o facto de utilizar tecnologias relativamente novas ou
introduzir problemas de operação nas instalações onde é utilizado em co-combustão (Barroso,
2001).
3
A realização da presente tese, nos dias de hoje, justifica-se pelo facto de actualmente se estar
a despertar para algumas situações que há poucos anos se julgava improvável, como é o
aquecimento global. Este facto levou à realização de conferências a nível global para
discussão do problema, como foi Rio de Janeiro 1992, Quioto 1997 e Joanesburgo 2002.
Simultaneamente, a sociedade tem vindo a ganhar uma maior consciência dos impactos dos
seus actos quotidianos no equilíbrio do ecossistema, verificando-se cada vez mais a opção por
soluções ecológicas. O mercado dos combustíveis não é excepção e em Portugal o ramo dos
sistemas de aquecimento doméstico, individual e colectivo, alimentados a biomassa tem vindo
a ganhar terreno relativamente a outros sistemas. Com a necessidade de modernizar os
sistemas de queima tradicionais alimentados a biomassa, surgiram os combustíveis de
biomassa densificada, como as briquetes/pellets, com a vantagem de permitir o
funcionamento automático do sistema de aquecimento, tal como ocorre com muitos sistemas
alimentados a gasóleo e butano.
Este cenário pode mostrar-se bastante favorável para a economia Portuguesa, uma vez que a
disponibilidade de uma grande quantidade de biomassa, com viabilidade técnica e económica
pode criar oportunidades para a criação de novas indústrias, capazes de explorar e rentabilizar
convenientemente este recurso, como poderia ser o caso do fabrico de combustíveis de
biomassa densificada.
A presente tese tem por objectivo dar um contributo para o desenvolvimento do conhecimento
científico relativo à utilização dos resíduos de biomassa como fonte de energia,
nomeadamente no que diz respeito à avaliação do potencial disponível em Portugal e ao
desempenho energético e ambiental da biomassa densificada durante a combustão em
sistemas domésticos. Relativamente ao primeiro objectivo, é do conhecimento geral que
Portugal é deficitário em combustíveis fósseis, pelo que se torna inevitável a sua importação,
levando a uma dependência externa. No entanto, a situação é inversa nas fontes de energia
renovável, como é o caso da energia solar, eólica e também da produção de biomassa. Na
primeira parte da tese serão apresentados os resultados de um estudo realizado sobre a
produção anual de resíduos de biomassa nos principais sectores da economia, com viabilidade
técnica e económica em combustão, como é o caso de alguns resíduos da floresta, indústria
transformadora da madeira e cortiça, agricultura e agro-indústria.
4
Relativamente ao segundo objectivo, tem-se verificado que a aplicação mais simples e
comum da biomassa como fonte energética é a sua combustão ou co-combustão com
combustíveis fósseis, implementada actualmente com o objectivo de reduzir a emissão de
gases de estufa, já que no caso da biomassa o CO2 emitido não é contabilizado. Na segunda
parte da tese serão apresentados os resultados obtidos no desempenho energético e na emissão
de gases poluentes em ensaios realizados numa caldeira doméstica alimentada a biomassa
densificada (pellets), operando em regime estacionário e durante a fase de arranque. Nestes
ensaios serão testados lotes de pellets de diferentes características, com o objectivo de avaliar
a influência da composição da biomassa no desempenho da combustão.
1.2 – Avaliação dos resíduos de biomassa em Portugal continental
A fileira da biomassa deve ser encarada como uma área estratégica de interesse nacional que
merece um planeamento global integrado, de forma a garantir o seu devido escoamento,
incluindo os usos para fins energéticos, numa posição de são equilíbrio entre a oferta e a
procura deste tipo de resíduos (ADENE/INETI, 2001).
Em Portugal, a principal fonte de biomassa é, sem dúvida, a floresta a qual representa um
terço da área total do País, constituindo desta forma um importante recurso que deverá ser
avaliado no sentido de se obter um conveniente aproveitamento dos resíduos aí produzidos.
De acordo com a terceira revisão do Inventário Florestal Nacional (DGF, 2001), a área
ocupada por povoamentos florestais em Portugal continental corresponde a cerca de 3202 mil
hectares (tabela 1), onde o pinheiro bravo e pinheiro manso apresentam-se como as espécies
mais abundantes (1054 mil ha), seguidos do sobreiro (713 mil ha), do eucalipto (672 mil ha) e
da azinheira (462 mil ha). Geograficamente, a região com maior área florestada é o Alentejo
(1136 mil ha), seguido da região Centro (948 mil ha), Norte (604 mil ha), Lisboa e Vale do
Tejo (416 mil ha) e Algarve (98 mil ha).
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Tabela 1: Superfície dos povoamentos puros e mistos dominantes (em mil ha)
Pinheiro1 Eucalipto Sobreiro Azinheira Outras folhosas
Outras resinosas
TOTAL
Norte 246 143 21 20 152 21 604
Centro 571 227 28 32 86 4 948
Lisboa e Vale do Tejo
110 143 140 3 19 1 416
Alentejo 112 131 484 398 11 0.3 1136
Algarve 15 29 40 9 6 0 98
TOTAL 1054 672 713 462 274 27 3202
Fonte: DGF (2001) 1 Inclui pinheiro bravo e pinheiro manso
Figura 1: Distribuição das principais espécies florestais em Portugal continental
Fonte: DGF (2001)
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A figura 1 apresenta a distribuição das principais espécies em Portugal continental, onde é
possível observar mais claramente a distribuição dos povoamentos florestais, verificando-se
que a grande mancha de pinheiro encontra-se na região central do País, enquanto que a região
a sul do Tejo é essencialmente povoada por azinheiras e sobreiros. Os dados disponíveis sobre
a floresta nas regiões autónomas são bastante incompletos e apenas estão disponíveis valores
das áreas totais, correspondendo a 9200 ha nos Açores e 1700 ha na Madeira (INE, 2001b),
que correspondem a pequenas fracções de ocupação do solo.
Um estudo realizado em 1980 (Barreto, 1980) estima em 2094 mil toneladas a disponibilidade
anual de resíduos florestais, prevendo-se na altura um crescimento gradual para os anos
subsequentes, tal como se pode verificar na tabela 2.
Tabela 2: Estimativa de Barreto (1980) para os resíduos florestais
Ano 1980 1985* 1990* Pinheiro
Resíduos (mil ton./ano) 1560 1617 1732
Ano 1978 1979 – 83* 1984 – 89* Eucalipto
Resíduos (mil ton./ano) 534 854 1190
Fonte: Barreto (1980), * valor previsto
O uso de resíduos florestais como fonte energética apresenta-se não só como um importante
meio para cumprir as metas delineadas em Quioto (EC, 1997), como também para o
ordenamento e gestão da floresta portuguesa, essencial para a diminuição dos incêndios
florestais. De facto, na última década (DGF, 2002) os incêndios consumiram cerca de 107 mil
ha/ano, representando 3% da área florestal total, ou seja, o correspondente a uma perda de 400
mil toneladas de biomassa por ano. Os incêndios têm afectado principalmente os pinhais, os
quais viram a sua área reduzida de 1250 para 1053 mil ha entre 1982 e 1995, enquanto que a
área de eucalipto aumentou de 386 para 673 mil ha no mesmo período (Morais, 2002). Em
1995 apenas 80 mil ha de pinhal tinham menos de 8 anos, enquanto que a área de eucaliptal
com menos de 7 anos era de 367 mil ha. No nosso País, estas duas espécies florestais
adquirem uma grande importância, uma vez que o eucalipto é a principal matéria-prima da
indústria da pasta do papel, apresentando um crescimento mais rápido, enquanto que o
pinheiro bravo é a principal espécie florestal consumida pela indústria da serração e do
mobiliário (INE, 1998 a 2001b).
7
De acordo com Arthur D. Little (1985), em 1985 foram produzidas 2462 mil toneladas verdes
de resíduos na indústria da madeira, as quais tiveram a utilização sintetizada na figura 2.
Figura 2: Destino dos resíduos da indústria da madeira
Fonte: Arthur D. Little (1985)
Relativamente à aplicação dos resíduos como fonte de energia, tradicionalmente são
utilizados por pequenas industrias locais, tais como a da cerâmica e a panificação, no entanto
recentemente têm sido desenvolvidas tecnologias no sentido de os utilizar em processos em
média escala. Como exemplo, em Portugal encontra-se uma instalação equipada com um
gaseificador de leito fluidizado, com capacidade útil de 10.4 MWth, utilizando a casca de
pinheiro resultante do processo de fabrico de pasta de papel (Antunes, 1998). Por outro lado,
algumas indústrias da cortiça estão a utilizar o pó de cortiça resultante do processo de fabrico
na produção de energia.
Em outras indústrias da madeira, de menor dimensão, tais como as serrações e as carpintarias,
a recolha de informação relativa ao consumo de biomassa é mais difícil, devido ao grande
número de empresas envolvidas (mais de mil empresas). Em 1999, com base nos 557
estabelecimentos industriais da CAE 20 - Indústrias da madeira e da cortiça e suas obras
(excepto mobiliário), que remeteram os mapas de resíduos ao Instituto dos Resíduos, foram
declaradas cerca 1086 mil toneladas de resíduos, das quais 15% não eram valorizadas
(ADENE/INETI, 2001).
O estudo realizado pela Arthur D. Little (1985) para a Direcção Geral de Energia teve como
objectivo projectar a instalação de uma central de resíduos de biomassa em Portugal, sendo
esta informação actualizada posteriormente pelo Centro da Biomassa para a Energia (CBE,
Produção de resíduos: 2462 mil ton./ano
Utilizadas como fonte de calor: 1340 mil ton./ano Ex: indústria da cerâmica, panificação
Utilizados como matéria-prima: 900 mil ton./ano Ex: fabrico de prensados
Sem aproveitamento: 222 mil ton./ano
8
1993), com os resultados sintetizados na tabela 3, onde é claramente visível que o maior
contributo provém dos resíduos de pinheiro, de eucalipto e de sobreiro. Os resíduos de outras
espécies foram estimados em cerca de 200 mil ton. secas/ano.
Tabela 3: Resíduos florestais estimados para Portugal (mil ton./ano)
Espécies Fonte Ano Base húmida Base seca
AD Little1 1985 1217 513 Pinheiro
CBE2 1993 1400 594
AD Little1 1985 908 403 Eucalipto
CBE2 1993 1543 645
Sobreiro AD Little1 1985 896 650
Outros AD Little1 1985 297 197 1 Fonte: Arthur D. Little (1985) 2 Fonte: CBE (1993)
A tabela 4 resume as expressões que estiveram na base das estimativas dos resíduos florestais
realizadas pela Arthur D. Little (1985) e pelo CBE (1993), tendo neste último sido utilizadas
as correlações obtidas por Silva et al. (1991):
Tabela 4: Expressões utilizadas em estudos de avaliação de resíduos de biomassa
Espécies Peso verde total dos topos e ramos (kg/árvore)
Humidade (%)
Referências
Pinheiro bravo
Todo o País: 0.656DAP2.364AT-0.977 57.9 Arthur D. Little (1985)
Todo o País: 0.463DAP1.604 57.6 Silva et al. (1991)
Eucalipto Todo o País: 0.1785DAP1.756 52.6 Silva et al. (1991)
Nota: onde DAP é o diâmetro à altura do peito e AT é a altura total média
Os trabalhos de campo realizados por Arthur D. Little (1985) mostraram que a idade média
dos povoamentos de pinheiro bravo era 39 anos, com uma altura total média de 14.30m e
DAP médio de 21.4cm. Com base neste modelo, os resíduos por árvore estimados para o caso
9
do pinheiro é de 67.7 kg verdes/árvore, produzindo assim 67.7kg verdes/39 anos = 1.7 kg
verdes/árvore/ano. Para o eucalipto, os resultados do trabalho de campo mostraram que o
DAP médio era 13.4cm ao fim de 10 anos. Os valores estimados para a zona Norte - Centro e
para a zona Sul são diferentes, correspondendo a 1.7 e 2.6 kg verdes/árvore/ano,
respectivamente. Com base nas correlações de Silva et al. (1991) os valores dos resíduos
correspondem para o pinheiro e eucalipto a 1.6 e 2.4 kg verdes/árvore/ano, respectivamente.
Tendo em conta as áreas florestais disponíveis na altura da realização de cada um dos
trabalhos verificou-se a produção média de resíduos de pinheiro bravo apresentou valores
entre 0.4 e 0.6 ton. secas/ha/ano. Por outro lado, a estimativa dos resíduos de eucalipto
apresentou valores entre 1.5 e 2.0 ton. secas/ano/ha. Em ambos os casos, são superiores os
valores obtidos na estimativa realizada pelo CBE (1993).
Uma das consequências destes estudos foi a selecção do local para a instalação da central
termoeléctrica de Mortágua em 1999, alimentada apenas a biomassa e com uma capacidade
instalada de 9MWe. A sua eficiência é cerca de 26.5%, usando uma caldeira de circulação
natural com barrilete de vapor. A fornalha foi desenhada tendo em consideração a combustão
de resíduos florestais, estando dotada de grelha vibratória arrefecida a água (Patrão, 1998).
Recentemente, foi necessário proceder a algumas modificações, nomeadamente na
alimentação de biomassa e no sistema de remoção de cinzas. Esta central, pioneira em
Portugal no aproveitamento energético de resíduos florestais, apresenta um consumo de
biomassa em plena carga de 12.2 ton./h e está dimensionada para laborar 7800 horas/ano
(Barroso, 2001).
1.3 – Características da biomassa densificada
Os resíduos de biomassa são produzidos localmente e têm geralmente baixa densidade, a
título de exemplo, a palha apresenta uma densidade aparente de 50-120 kg/m3 e a casca de
arroz cerca de 122 kg/m3, valores muito inferiores aos do carvão, onde variam desde 560
kg/m3 a 900 kg/m3 (Werther et al., 2000). Devido aos elevados custos de transporte é, na
generalidade dos casos, pouco económico a sua utilização como principal fonte de energia em
grandes centrais termoeléctricas. Por outro lado, a sua utilização em pequenas centrais locais
tem a desvantagem dos elevados custos de investimento, uma quantidade elevada de mão-de-
obra especializada e baixa eficiência, quando comparado com as grandes centrais.
10
Uma das formas de melhorar a qualidade da biomassa na combustão é a densificação
(Werther et al., 2000), o que irá melhorar a sua homogeneidade, tornando-se mais fácil e
económico o seu transporte (Kanury, 1994). Com o objectivo de minimizar os custos de
transporte, opta-se por utilizar biomassa densificada ou, em alguns casos, misturando a
biomassa com um combustível fóssil como por exemplo turfa, sob a forma de pellets ou
briquetes.
Embora a combustão do material lenhoso seja vastamente estudada, o processo de combustão
de material densificado é um processo novo e a sua caracterização como combustível ainda
não está completamente desenvolvida (Tabarés et al., 2000). Algumas das principais
vantagens da biomassa densificada são (Werther et al., 2000):
� Taxa de combustão comparável à do carvão
� Combustão mais uniforme
� Redução da emissão de partículas
� Melhoria das condições de armazenamento, transporte e alimentação
As técnicas de densificação geralmente utilizadas são a produção de briquetes e pellets, uma
vez que a produção de fardos é uma técnica simples destinada, essencialmente, à preparação
da biomassa para alimentação de animais. As briquetes ou pellets requerem um processo mais
avançado e caro, sendo apenas aplicável em situações economicamente rentáveis. O objectivo
destas técnicas é elevar a massa específica aparente da biomassa em muitos casos, 5 a 10
vezes superior ao material de origem (Werther et al., 2000). Quando comparado com as
briquetes, as pellets apresentam algumas vantagens (tabela 5), incluindo maior compactação e
aceitação de material com maior gama de humidade.
Verifica-se que a utilização de biomassa densificada sob a forma de briquetes está mais
difundida nos países em desenvolvimento, substituindo em alguns casos a lenha no fabrico do
carvão vegetal. Por outro lado, a utilização de pellets está mais difundida nos países
desenvolvidos, mais indicado para equipamentos com alimentação automática (Bhattacharya,
2002).
11
Tabela 5: Comparação entre as pellets e as briquetes
Combustível Pellets Briquetes
Humidade da biomassa de origem
10 a 20% 10 a 15%
Capacidade máxima de produção
4 a 6 ton./h 1 – 1.5 ton./h
Consumo energético (corte e prensagem)
80 a 90 kWh/ton. 40 a 50 kWh/ton.
Preparação da biomassa Trituração em pequenas partículas
Trituração em partículas maiores
Dimensões do produto final
Diâmetro 6-12mm Comprimento10-30mm
Largura 20-100mm Comprimento 30-300mm2
Sistemas de combustão Automatizados Podem ser usadas em instalações para toros
Matéria-prima Serradura, desperdícios de madeira e resíduos
agrícolas1
Serradura, desperdícios de madeira e resíduos
agrícolas1
Fonte: Werther et al. (2000) 1 Especialmente nos países em desenvolvimento (Bhattacharya, 2002) 2 Fonte: Baldini (1987)
Na utilização de biomassa densificada em sistemas domésticos automáticos é necessário obter
altos padrões de qualidade, pelo que em alguns países europeus já se encontra em vigor a
aplicação de algumas normas que regulamentam a produção deste tipo de combustível,
enquanto que noutros ainda se encontram em preparação. No entanto, considerou-se que estes
altos padrões de qualidade a exigir na utilização em pequenos equipamentos não são
aplicáveis para os equipamentos industriais, uma vez que estes se encontram equipados com
sistemas mais sofisticados para o controlo da combustão, tratamento dos gases e controlo do
processo (Obernberger and Thek, 2002).
Actualmente em alguns países europeus, onde a utilização de biomassa densificada em
aplicações domésticas está mais divulgada, já estão em vigor normas que regulamentam os
critérios de qualidade a exigir ao combustível. A tabela 6 apresenta o resumo das
especificações físico-químicas a cumprir pelas pellets e briquetes de biomassa,
regulamentadas pelas normais vigentes mais relevantes, nomeadamente a ÖNORM M 7135
(Áustria), DIN 51731 (Alemanha), SN 166000 (Suiça), SS 18 71 20 (Suécia) e normas da
Austrian Pellets Association.
12
Tabela 6: Valores limite de alguns parâmetros do fabrico de pellets e briquetes
Parâmetro Unidade Pellets de madeira
Briquetes de madeira
Pellets de palha e briquetes de casca4
Diâmetro (D) mm 4 – 101 40 – 1201 -
Comprimento mm < 5 x D1,4 < 4001 < 4001
Densidade aparente kg/dm3 > 6003 - -
Densidade da partícula
kg/dm3 > 1.121 > 1.01 > 1.101
Humidade % (ar) < 101, 3, 4 < 101 < 181
Cinzas % (db) < 0.51, 4 < 0.51 < 6.01
PCI MJ/kg (db) > 18.01, 4 > 18.01 > 18.01
N % (db) < 0.31, 2 < 0.31, 2 < 0.61
S mg/kg (db) < 4001, 4 < 4001 < 8001
Cl mg/kg (db) < 2001, 4 < 2001 < 4001
Abrasividade % (ar) < 2.31, 4 - -
Cd mg/kg (db) < 0.52, 4 < 0.52 < 0.52
Pb mg/kg (db) < 102, 4 < 102 < 102
Zn mg/kg (db) < 1002, 4 < 1002 < 1002
Cr mg/kg (db) < 82, 4 < 82 < 82
Cu mg/kg (db) < 52, 4 < 52 < 52
Fonte: Obernberger and Thek (2002) Nota: ar - as received (base húmida), db – dry base (base seca)
1 de acordo com a norma ÖNORM M 7135; 2 de acordo com a norma DIN 51731 e SN 166000 (não é válida para casca, apenas para comparação); 3 de acordo com a norma SS 18 71 20; 4 de acordo com as normas da Austrian Pellets Association
1.4 – Testes em caldeiras
A eficiência da combustão, a par das emissões gasosas, é um dos principais parâmetros para
descrever o desempenho das caldeiras alimentadas a biomassa. Num estudo realizado sobre a
utilização de sistemas domésticos de queima alimentados a biomassa, numa região da
Alemanha (Strehler, 1998), verificou-se que os mais comuns eram os recuperadores de calor
(88%), caldeiras alimentadas a troncos de madeira (11%) e fornalhas alimentadas a estilha de
madeira (1%), tendo sido comercializadas mais de 197000 unidades em 1994. Verificou-se
que os valores mais elevados nas emissões de CO foram observados nos sistemas tradicionais
(recuperadores de calor e lareiras), com valores entre 2 e 5 g CO/Nm3 @ 13% O2, enquanto
13
que os valores mais baixos foram observados nos recuperadores de calor alimentados a pellets
com valores próximos de 0.07 g CO/Nm3 @ 13% O2.
Olsson and Kjallstrand (2002) realizaram alguns ensaios nas emissões de várias caldeiras e
recuperadores de calor, durante a combustão de alguns tipos de pellets, concluindo que os
principais hidrocarbonetos não queimados libertados consistiam no 2-metoxifenol e no
benzeno. Enquanto que o primeiro composto é libertado durante a fase de combustão com
chama, apresentando efeitos antioxidantes e com benefício para a saúde, o segundo é libertado
durante a combustão incandescente do resíduo carbonoso, apresentando efeitos cancerígenos.
Num estudo comparativo, realizado na Suécia, verificou-se que os sistemas individuais de
combustão de biomassa apresentam alguns inconvenientes relativamente às centrais
colectivas, apresentando maiores emissões poluentes. Entre estas emissões, encontram-se os
compostos voláteis orgânicos (VOC), os compostos aromáticos policíclicos (PAH) e as
partículas (tabela 7). Verificou-se que as caldeiras tradicionais alimentadas a madeira emitem
uma maior quantidade de hidrocarbonetos e outros poluentes do que outros sistemas de
queima. No entanto, em caldeiras modernas estas emissões decresceram em mais de 90%, o
que é uma melhoria considerável. Verificou-se ainda que a introdução de sistemas
alimentados a pellets apresenta a vantagem de reduzir ainda mais estas emissões (Gustavsson
et al., 2000).
Tabela 7: Emissões de diferentes sistemas domésticos de aquecimento
Sistemas Alcatrões (mg/kWh)
VOC (mg/kWh)
NOX (mg/kWh)1
Partículas (mg/kWh) 2
Alimentados a gás - - 200 -
Alimentados a óleo - 80 200 120
Caldeiras tradicionais alimentadas a madeira
2500 10000 350 1800
Caldeiras modernas alimentadas a madeira
30 300 520 80
Recuperadores de calor modernos alimentados a madeira
50 700 Não realizado
80
Caldeiras alimentadas a pellets 20 160 > 270 1,2 160
Recuperadores de calor alimentados a pellets
20 120 > 270 1,2 160
Fonte: Gustavsson et al. (2000) 1 As emissões de NOX dependem do teor de azoto no combustível 2 Poucos dados disponíveis
14
As emissões de NOX dependem da concentração de azoto na madeira, sendo esse valor
normalmente baixo. Num estudo realizado em combustão de pellets (Eskilsson et al., 2002)
verificou-se que para o teor mais baixo de azoto no combustível obteve-se uma emissão de
NOX correspondente a uma conversão quase completa do azoto do combustível, verificando-
se nesse caso que a contribuição da componente térmica foi cerca de 10%. Ao aumentar a
fracção de azoto nas pellets, verificou-se que a fracção de conversão do azoto da biomassa em
NOX diminuiu.
A nível europeu, verifica-se que os países mais evoluídos em termos de investigação e
controlo ambiental da combustão de biomassa são a Suécia, Alemanha e Áustria, onde
existem actualmente algumas normas em vigor e outras em estudo, relativas ao desempenho
energético e ambiental de instalações alimentadas a biomassa (Kroplin, 1998). Na tabela 8 são
apresentadas algumas das normas propostas e das normas já em vigor:
Tabela 8: Normas da avaliação do desempenho de pequenas caldeiras de biomassa
Nº. Norma Equipamento ηηηη (%)
CO (g/m3)
1 European Standard EN 303/5 (rascunho)
Caldeiras com capacidade 10-300 kW
73 - 82 1 - 4
Caldeiras alimentadas a madeira de 5-50kW
65 - 77 7.5 - 10 2 European Standard TC 295 (em estudo)
Aquecedores com/sem água < 50kW
50 - 70 3.8 – 12.5
3 German Standard DIN 18892 (rascunho)
Aquecedores locais 75 2.5
4 Regensburger model Aplicações individuais < 15kW
- 1.5
5 ZVSHK / AdK1 Equipamentos < 15kW 75 - 85 1.6
Nota: normas 1 a 4 avaliadas à temperatura normal de funcionamento, norma 5 referente a arranque a frio 1 Central Association for Sanitary, Heating and Air-conditioning Technology
Verifica-se que em nenhum caso são aprovados equipamentos com eficiência inferior a 50%,
sendo o valor mais comum 70-80%. Existe igualmente uma grande atenção sobre a emissão
de CO, estando em estudo uma norma europeia, a EN 303/5, que tolera a emissão deste
poluente até um máximo de 4 gCO/Nm3. Todas as normas referidas apresentam valores
limites de emissões para funcionamento em regime estável de carga máxima. Recentemente, a
15
SP Swedish National Testing and Research Institute, definiu um teste mais realista
abrangendo diversos regimes de funcionamento das caldeiras domésticas no período de um
dia completo.
1.5 – Combustão da madeira
1.5.1 – Características da biomassa
Os componentes da biomassa incluem a celulose, hemi-celuloses, lenhina, lípidos, proteínas,
açucares simples, amido, água, hidrocarbonetos, cinzas e outros compostos. A concentração
de cada classe depende da espécie, tipo de tecido, estado de crescimento e condições de
crescimento. A celulose é um hidrato de carbono de cadeia longa não ramificada constituída
por unidades β-D-glucose, celobiose e com ligações glicosídicas 1-4 (Jenkins et al., 1996),
com composição elementar C6H10O5. Tem-se verificado que diferentes tipos de celuloses,
provenientes de diferentes materiais e processos têm praticamente a mesma composição,
sendo em todos os casos muito semelhantes à celulose pura, o que implica que a sua variação
estrutural é desprezável (Sheng and Azevedo, 2001).
As hemi-celuloses são polissacáridos de composição variável, incluindo monossacáridos de 5
e 6 átomos de carbono. A sua estrutura é muito semelhante à da celulose, no entanto, é mais
curta e apresenta mais ramificações (Sheng and Azevedo, 2001). A lenhina é um polímero
irregular, ramificado, de unidades de fenilpropano unidas por ligações carbono-carbono e
ligações éter (Jenkins et al., 1996).
Devido ao facto de ser essencialmente constituída por hidratos de carbono, a biomassa tem
muito mais oxigénio que os combustíveis fósseis convencionais, incluindo o carvão,
correspondendo a cerca de 30 a 45% da matéria seca. Por este motivo, teoricamente, a
combustão da biomassa necessita de menor quantidade de ar (Tabarés et al., 2000). No
entanto, tal como nos combustíveis fósseis, o principal constituinte é o carbono, cerca de 30 a
60% da matéria seca, seguido do oxigénio. O hidrogénio é o terceiro maior componente, com
cerca de 5 a 6% da matéria seca. O azoto, enxofre e cloro encontram-se em quantidades
normalmente inferiores a 1% da matéria seca, sendo no entanto responsáveis pela formação
de emissões poluentes. Um exemplo é o caso do azoto, constituinte da fracção proteica das
plantas e elemento indispensável para o seu crescimento, no entanto é responsável pela
emissão NO e NO2 (Jenkins et al., 1996). Verifica-se que o teor proteico da matéria lenhosa
16
apresenta grandes variações entre espécies diferentes, observando-se a ocorrência de valores
desde 3% (base seca), como é o caso dos cereais, até cerca de 21% (base seca), como é o caso
do bagaço de girassol (McDonald et al., 1981). Em alguns resíduos de biomassa provenientes
da agricultura, como é o caso da palha dos cereais e a casca de arroz, a sílica é o terceiro
maior componente, atingindo teores até 10-15% da matéria seca (Jenkins et al., 1996).
As características que afectam a combustão da biomassa podem dividir-se em dois tipos
principais (Kanury, 1994):
� Termoquímicas: entre as características mais importantes encontram-se a entalpia da
reacção de combustão, a temperatura de combustão, a energia de activação (Tabarés et
al., 2000) e o teor em cinzas. Estas características são influenciadas pelas propriedades
dos combustíveis (análise próxima, teor de humidade, minerais, etc.) e da instalação
de queima;
� Taxa de combustão: este factor afecta tanto o processo de combustão no interior da
partícula como à sua superfície. Certas propriedades, tais como o tamanho da
partícula, condutividade térmica, densidade, calor específico e porosidade são
propriedades físicas que afectam os processos internos. Por outro lado, as
propriedades que afectam os processos à superfície estão essencialmente relacionadas
com a transferência de calor desde o ambiente exterior para a partícula, com a
circulação do ar e com a transferência de massa entre os voláteis e o ar.
De facto, algumas das características que fazem da biomassa um bom combustível são a
facilidade de secagem, elevado poder calorífico, baixa temperatura de ignição, elevado teor
em voláteis (Werther et al., 2000), elevada taxa de combustão (Kanury, 1994) e baixa energia
de activação (Tabarés et al., 2000). Estas propriedades são influenciadas tanto pelas
características do combustível como pelas características da fornalha (Kanury, 1994). Por
outro lado, certas características como a humidade, granulometria, densidade e
heterogeneidade dos materiais lenhosos irão limitar a eficiência da sua combustão (Kanury,
1994). Outro aspecto importante é o facto de ser praticamente impossível obter uma mistura
completamente homogénea entre o combustível e o comburente, sobretudo quanto se entra em
conta com o curto espaço de tempo em que ocorre a mistura (Tabarés et al., 2000). De uma
forma simples, a reacção global de combustão da biomassa com o ar pode ser representada
pela seguinte expressão:
17
298726252423
2222154321 21
791
SOnNOnCOnNnOnOHnCOn
)NO)(e(nOHnSNOHC xxxxx
++++++=
=++++
onde a composição da biomassa é simplificada, sendo representada como um composto
formado por apenas C, H, O, N, S e H2O. Nesta expressão o ar atmosférico é igualmente
simplificado, sendo representado por uma mistura binária de N2 e O2 (na proporção N2/O2 =
3.76), desprezando a participação do CO2, vapor de água e gases raros da atmosfera. Nos
produtos formados na combustão, foi considerada apenas a formação de CO2, H2O (resultante
da evaporação da água e reacção do hidrogénio do combustível), N2, CO, NO e SO2.
A medida padrão do teor energético de um combustível é o seu poder calorífico, o qual
depende da sua composição química, incluindo o teor de humidade, factor limitante da
combustão devido à sua entalpia de evaporação (Jenkins et al., 1996). Alguns dos trabalhos
mais relevantes são apresentados na tabela 9.
Tabela 9: Estimativas do poder calorífico da biomassa
Energia (MJ/kg) Observações
PCIar = 19.2 – 21.64XHum Fonte: Johansson (2001) XHum – Fracção mássica de humidade, em base ar
PCSar = 20.5 - 31.3XHum Fonte: Jiménez and González (1991) XHum – Fracção mássica de humidade, em base ar
PCSdb = 14.119 + 0.196XCF Fonte: Demirbas (1997) XCF - Fracção mássica de carbono fixo, em base db
TOTAL 2628 1 corresponde à produção anual de resíduos, seguindo o método 2, excepto os resíduos com valor
comercial e os resíduos consumidos pela Central Termoeléctrica de Mortágua 2 no caso do olival considerou-se apenas a fracção dos ramos sem valor comercial, ou seja, cerca de
metade do total obtido
Verificou-se que existe uma grande produção de resíduos com possibilidade de utilização em
sistemas simples de produção de energia, como é a combustão, com disponibilidades anuais
de cerca de 2628 mil toneladas secas/ano.
Tal como se pode observar pela figura 6, verificou-se que a disponibilidade anual dos
resíduos de biomassa apresenta grandes variações ao longo do ano, devido essencialmente ao
carácter sazonal de certos ramos de actividade. Durante os meses de Abril a Junho a
disponibilidade de resíduos é cerca de 284 mil toneladas secas, provenientes essencialmente
das operações florestais e das indústrias da madeira e cortiça, desenvolvidas equitativamente
ao longo do ano. Durante os meses de Julho a Setembro, a disponibilidade é cerca de 1112
mil toneladas secas, provenientes das indústrias florestais e colheita das culturas temporárias,
nomeadamente girassol e milho. Durante os meses Outubro a Dezembro a disponibilidade é
cerca de 918 mil toneladas, provenientes das indústrias florestais e das podas das culturas
permanentes, nomeadamente da vinha, árvores de fruto e do olival. No caso do olival, devido
à grande procura dos ramos de maior diâmetro para utilização em lareiras domésticas, apenas
51
foi contabilizada a biomassa correspondente aos ramos de menor dimensão e sem valor
comercial, ou seja, cerca de metade da massa total obtida após a poda. Finalmente, durante os
meses Janeiro a Março a disponibilidade é cerca de 314 mil toneladas, provenientes das
indústrias florestais, podas e do bagaço de azeitona.
Figura 6: Disponibilidade dos resíduos de biomassa ao longo do ano
0
200
400
600
800
1000
1200
Janeiro -Março
Abril -Junho
Julho -Setembro
Outubro -Dezembro
Período
mil
ton.
sec
as
Face aos valores obtidos na avaliação da disponibilidade dos resíduos (tabela 24) e a sua
distribuição ao longo do tempo (figura 6), verificou-se que esta apresenta algumas oscilações
ao longo do ano, relacionadas essencialmente com o ciclo das operações agrícolas. É, no
entanto, possível concluir que apesar destas variações, a oferta é extremamente abundante,
existindo condições técnicas suficientes para a instalação de indústrias capazes de aproveitar
estes resíduos de forma útil. Obviamente, para tirar conclusões mais alargadas será necessária
a realização de estudos de viabilidade económica, os quais não foram contemplados na
presente tese.
Tendo em conta as diferenças na composição dos resíduos obtidos nos diferentes sectores e a
irregularidade na oferta ao longo do ano, a densificação do material poderá ser um importante
meio de homogeneização do combustível para subsequente utilização. Esta homogeneização é
indispensável quando se fala do aproveitamento destes resíduos para combustão, uma vez que
estão em causa combustíveis de natureza diferentes e com composições químicas diferentes
(ex. teor em cinzas), que poderá levar ao funcionamento irregular da instalação térmica.
52
De facto, actualmente estão a ser desenvolvidos grandes esforços no Alentejo para a
implementação de uma unidade de produção de briquetes/pellets a partir do bagaço de
azeitona, podas de oliveira e sarmentos de vinha, com uma capacidade inicial de 9000
toneladas/ano de briquetes/pellets (Sobral, 2000). A concretização deste projecto, iria
contribuir para a criação de postos de trabalho numa região altamente deficitária de
oportunidades de emprego e, por outro lado, seria um importante contributo para o
aproveitamento energético eficaz de resíduos com valor comercial praticamente inexistente,
que todos os anos são queimados no terreno, como é o caso dos ramos das podas. A
possibilidade da instalação de uma linha de produção de pellets foi uma das motivações para a
realização de ensaios numa caldeira doméstica, apresentados nos próximos dois capítulos.
53
3 – Metodologia dos ensaios na caldeira
Tal como referido no capítulo anterior, a utilização da biomassa densificada apresenta-se
como um combustível de grande interesse, com algumas melhorias relativamente à madeira.
As pellets de biomassa são utilizadas desde os anos 1970 nos Estados Unidos, tendo-se
tornado mais importantes na Europa a partir dos anos 90, devido à introdução do imposto
sobre as emissões de dióxido de carbono. Verificou-se que existe pouca informação
disponível na literatura aberta, podendo ser devido ao facto da biomassa apresentar um lugar
secundário relativamente a outras fontes de energia e ao facto de ser um tema novo, pelo qual
a sua investigação ainda não se encontra muito divulgada.
Neste capítulo será realizada uma pequena descrição da caldeira doméstica utilizada na
presente tese, assim como a metodologia adoptada e a instrumentação utilizada na avaliação
do seu desempenho energético e ambiental, utilizando diferentes tipos de pellets como
combustível.
3.1 - Descrição da caldeira utilizada
A caldeira utilizada, da marca ECOFOREST modelo ECOAGUA, foi gentilmente cedida pela
empresa TEPAL e apresenta as seguintes características: 895mm de altura, 660mm de largura,
630mm de comprimento, 160kg de peso e capacidade para 60kg de pellets (figura 7).
Figura 7: Caldeira ECOAGUA
54
O abastecimento de pellets (figura 8) é feito manualmente através da colocação do
combustível no tegão de abastecimento, localizado na parte superior da caldeira (figura 9).
Figura 8: Pellets utilizadas Figura 9: Tegão de abastecimento
Fonte: ECOFOREST (2001)
Por sua vez, o transporte de pellets para a câmara de combustão é feito através de um parafuso
sem-fim accionado por impulsos, com velocidade regulada através dum pequeno comando
colocado na face direita na caldeira e de acordo com 9 posições pré-definidas, nomeadamente
de 1 a 9 (HI) (ECOFOREST, 2001).
A figura 10 apresenta um esquema da caldeira, identificando a localização do cesto, porta-
cesto, gaveta de remoção de cinzas, ignitor, entrada de ar e painel de comandos.
Figura 10: Esquema da caldeira ECOAGUA
Fonte: ECOFOREST (2001)
As pellets transportadas, ao entrar na câmara de combustão caem por gravidade, através duma
pequena abertura, num pequeno cesto colocado centralmente na parte inferior da câmara de
combustão (figura 10).
Cesto
Porta-cesto
Gaveta de remoção de cinzas
Painel de comandos
Entrada de ar
Ignitor
55
A ignição das pellets é realizada através de uma resistência eléctrica colocada no lado direito
do cesto referido anteriormente, a qual aumenta a sua temperatura até ficar incandescente. Por
sua vez o aquecimento das pellets dá-se por radiação e convecção de ar, originando a ignição
e a consequente propagação da chama à totalidade das pellets presentes no cesto.
As cinzas produzidas durante a combustão caem por gravidade numa pequena gaveta
colocada na parte inferior da caldeira, tendo estas sido retiradas no final de cada dia de
ensaios (figura 10). A extracção dos gases de dentro da caldeira é realizada através de um
extractor centrífugo colocado junto da entrada da tubagem de exaustão, o qual pode ser
controlado pelo comando referido anteriormente. A velocidade do extractor pode variar de
acordo com 19 posições pré-definidas, numa escala de -9 a 9 (ECOFOREST, 2001). Para
além da regulação referida, a velocidade do extractor é controlada automaticamente, como é o
caso do arranque da combustão e o ajuste automático de acordo com a carga da caldeira
(ECOFOREST, 2001).
3.2 – Descrição da instrumentação utilizada
A caldeira foi colocada num ambiente com temperatura constante (aproximadamente 23-
25ºC), com a parte posterior a cerca de 50 cm da parede e a face direita a cerca de 1m da
parede, de modo a permitir os ajustes necessários à realização dos ensaios. Para o transporte
dos gases de exaustão, foi colocada uma tubagem em alumínio com 10cm de diâmetro na
saída dos gases da caldeira e com ligação ao sistema de exaustão do Laboratório de Análise
de Sistemas Industriais de Queima (LASIQ), no Instituto Superior Técnico.
A instalação de teste da caldeira é apresentada na figura 11, onde se identifica a caldeira assim
como o permutador de calor utilizado para dissipar o calor produzido e para a realização do
balanço térmico. Este permutador recebia a água quente produzida no interior da caldeira,
arrefecendo-a através da utilização da água da rede (aproximadamente a 21-23ºC). Após
arrefecimento, a água era reenviada para a caldeira.
Para a avaliação de comportamento da caldeira foram realizadas medições de temperatura,
composição dos gases de exaustão e de consumo de combustível, pelo que foi necessário
proceder a algumas alterações para a colocação dos respectivos sensores. A caldeira foi
56
instalada sobre uma pequena báscula com uma resolução de 0.02kg, com o objectivo de
avaliar a taxa de consumo de pellets (WI1 na figura 11).
Figura 11: Representação esquemática da instalação
A válvula V1 da figura 11 representa uma válvula manual de globo, utilizada para o ajuste da
pressão da água no interior da caldeira no início do seu funcionamento, permanecendo
fechada durante os testes. As válvulas V2 e V3 representam válvulas manuais de globo,
utilizadas para regulação do caudal da água da caldeira e do circuito da água de refrigeração,
respectivamente. Os caudais de ambos os circuitos foram medidos através de dois rotâmetros,
tendo sido registados os valores de 1112 litros/h e 874 litros/h para o circuito da água da
caldeira e para o circuito da água de refrigeração, respectivamente (FI1 e FI2 na figura 11).
No circuito da caldeira, a temperatura de entrada e a de saída do permutador de placas foram
registadas através de dois termopares do tipo K com 2mm de diâmetro, designados por TI3 e
TI4 na figura 11. A medição da temperatura do circuito de água externa, foi realizada através
de dois termopares do tipo K com 2 mm de diâmetro, designados na figura 11 por TI1,
colocado na entrada de água, e TI2, colocado na saída da água.
Em determinados testes, estas temperaturas foram igualmente medidas com termopares do
tipo E com 0.5mm de diâmetro, com o objectivo de avaliar o rigor das leituras obtidas. Com
estes termopares confirmaram-se os valores médios obtidos, verificando-se como esperado
57
que os termopares de maior diâmetro produziam valores com menor variação, tendo estes sido
escolhidos. Um termopar do tipo E (TI5 na figura 11), com 1.5mm de diâmetro foi
permanentemente instalado na tubagem de exaustão dos gases de combustão. Os valores
analógicos obtidos foram transmitidos através de um conversor A/D para um computador, em
cada 10 segundos, tendo sido registados valores médios em cada 5 minutos, durante a
realização dos ensaios. A tabela 25 apresenta um resumo das características dos termopares
utilizados na instalação.
Tabela 25: Identificação dos termopares
Código Tipo Diâmetro Localização
TI1 K 2mm Entrada de água de arrefecimento no permutador
TI2 K 2mm Saída de água de arrefecimento do permutador
TI3 K 2mm Entrada de água da caldeira no permutador
TI4 K 2mm Saída de água da caldeira do permutador
TI5 E 1.5mm Temperatura dos gases de exaustão
TI6 E 0.5mm Temperatura dos gases de exaustão da zona esquerda da câmara de combustão
TI7 E 0.5mm Temperatura dos gases de exaustão da zona centro da câmara de combustão
TI8 E 0.5mm Temperatura dos gases de exaustão da zona direita da câmara de combustão
TI9 E 0.5mm Temperatura da zona esquerda do leito de combustão
TI10 E 0.5mm Temperatura da zona direita do leito de combustão
Para a medição da temperatura dos gases de exaustão dentro da caldeira, foram colocados
termopares no lado esquerdo, centro e no lado direito da câmara de combustão a uma altura
aproximada de 30 cm acima do leito de combustão (TI6, TI7 e TI8 da tabela 25,
respectivamente). Para medição da temperatura do leito de combustão, foram ainda colocados
dois termopares, um no lado esquerdo e outro no lado direito junto ao fundo do cesto das
pellets (TI9 e TI10 da tabela 25, respectivamente). Nos termopares utilizados nos ensaios não
foi feita a compensação das perdas por energia radiante, pelo que se prevê que as
temperaturas reais sejam ligeiramente superiores.
58
A composição dos gases de exaustão foi continuamente avaliada durante os ensaios através da
colocação de uma sonda na conduta para a recolha dos gases de exaustão. A amostra de gás
era retirada utilizando o sistema de amostragem do analisador, o qual analisa a composição
dos gases após condensação do vapor de água. A instrumentação analítica incluí um
analisador magnético de pressão para as medições de O2, analisadores infravermelhos não
dispersivos de gás para as medições de CO2 e CO e um analisador de quimioluminiscência
para as medidas de NOX (figura 12). Foram realizadas calibrações do zero e da escala, com
misturas standard antes e após cada sessão de medidas. O valor máximo dos desvios durante
a calibração encontrou-se dentro do intervalo ± 2% da escala máxima.
Figura 12: Analisador dos gases de exaustão Figura 13: Computador e data logger
Tal como na recolha de valores da temperatura, a saída analógica dos analisadores foi
transmitida, através de conversores A/D, para um computador onde os sinais foram
processados e realizadas médias em cada 30 segundos de amostragem (figura 13).
Foram desenvolvidos esforços no sentido de eliminar pontos de fuga de gases enquanto a
caldeira estivesse em funcionamento, através da selagem de todas as juntas e da janela de
visita.
No início dos testes, foram realizadas algumas tentativas para a instalação de uma placa de
orifício calibrado na conduta de admissão de ar. No entanto, a perda de carga induzida foi
significativa, pelo que o caudal de admissão de ar foi influenciado, conforme foi possível
observar pelos valores da concentração de oxigénio nos gases. Por este motivo, a taxa de
consumo de ar teve de ser estimada, com base na taxa de consumo de pellets, na sua
59
composição e na composição dos gases de exaustão. Consequentemente, o caudal de gases de
exaustão é daqui em diante calculado, através da equação 14:
1
2
2
.).(
+=+
=F
A
M
X
M
X
M
X
m
m
CO
CO
CO
CO
C
raC
Pellets
Gas
&
& (14)
desprezando a perda de carbono através dos inqueimados. Nesta expressão XCO e XCO2 são as
fracções mássicas nos produtos de combustão em base húmida. A fracção volumétrica de
água foi estimada com base nas fracções volumétricas medidas (YCO, YCO2)db e na relação
molar entre o carbono e o hidrogénio (C/H2) nas pellets (húmidas) através da equação 15:
( )
1
2 12
2
−
++
=dbCOCO
OH YY
H
C
Y (15)
assumindo a conversão completa do hidrogénio da biomassa e desprezando a humidade do ar.
3.3 – Metodologia dos ensaios
Os ensaios realizados com a caldeira tiveram por objectivo, não só avaliar o seu desempenho
em condições estacionárias de funcionamento, mas também durante a fase de arranque da
combustão, utilizando os diferentes tipos de pellets disponíveis em ambas as situações.
Nos ensaios em condições estacionárias foi avaliado o desempenho da caldeira mantendo
constante a temperatura do circuito de água, abaixo de 40ºC. Em condições reais a capacidade
de dissipação do sistema de aquecimento alimentado pela caldeira pode ser menor que a
capacidade da caldeira, funcionando então esta em períodos interrompidos, regulados através
de um termostato presente no circuito de água da caldeira. Em condições reais, a temperatura
da água na saída da caldeira é, em sistemas de aquecimento central, cerca de 75ºC, sendo um
resultado do sistema de dissipação de calor. Num estudo similar, Granada et al. (2002)
concluíram que a temperatura da água na caldeira tinha uma influência pequena na eficiência,
apesar de esta ser observável.
60
Os caudais seleccionados conduziram a uma temperatura baixa da água no circuito de água da
caldeira, com o efeito de maximizar a eficiência da caldeira e de possivelmente aumentar as
emissões de CO. Outra motivação para utilizar a temperatura seleccionada foi a
uniformização de valores, de uma forma simples, independentemente da carga. Desta forma
foram realizados ensaios alterando os seguintes parâmetros: i) variação do caudal de
abastecimento de pellets, ii) variação do ventilador da câmara de combustão e iii) variação
do ventilador com o abastecimento de pellets em regime máximo. Nos ensaios em regime
estacionário foram tomadas providências para que os resultados obtidos não sofressem
influência das variações de condições, pelo que foi atribuída uma margem de tempo nunca
inferior a 30 minutos para que a caldeira apresentasse oscilações mínimas. Em cada regime de
funcionamento foram registados valores em cada 5 minutos e, no mínimo, foram realizados
cinco registos para cada condição de funcionamento. Na análise dos resultados apresentam-se
estimativas dos erros máximos que podem surgir devido à instrumentação, sendo estes valores
comparados com as variações observadas durante os ensaios.
Os ensaios referentes à fase de arranque, tal como os ensaios realizados em regime
estacionário, foram realizados para cada um dos lotes de pellets disponíveis, com o objectivo
de avaliar a evolução da combustão numa fase extremamente crítica como é a do arranque.
Nos ensaios de arranque, procedeu-se à ignição através do isqueiro eléctrico da caldeira e
foram registados valores até apresentar variações desprezáveis ao longo do tempo. Durante
este intervalo de tempo foram realizadas medições, com intervalos de 30 segundos, das
temperaturas de gases em diferentes pontos, temperatura no leito da combustão e
concentrações gasosas nos gases de exaustão.
Para além da aquisição dos dados das espécies e temperaturas, foram ainda determinados
valores médios em sequências de ensaios com o mesmo tipo de pellets para a quantidade de
finos que permaneciam no tegão de abastecimento de pellets e a quantidade de inqueimados
acumulados no cinzeiro da caldeira. Estas últimas amostras, recolhidas no final de uma
sequência de ensaios, foram posteriormente analisadas para determinar a fracção de
inqueimados. Deve ser referido que não foram realizadas medições relativas à quantidade de
partículas presentes nos gases de exaustão. Foi avaliada regularmente a repetibilidade dos
parâmetros da caldeira para todas as condições de funcionamento. Para os ensaios em regime
61
estacionário efectuou-se pelo menos uma repetição das mesmas condições de operação em
dias diferentes e para os ensaios de arranque efectuaram-se três ensaios, excepto para uma das
pellets. Para todos os valores medidos, apresenta-se na tabela 26 a incerteza dos resultados
associada à resolução da escala, enquanto no caso dos termopares optou-se por indicar o valor
do desvio padrão médio, conduzindo a uma incerteza de 0.13-0.65ºC para as temperaturas da
água e cerca de 9ºC para a temperatura do gás.
Tabela 26: Análise numérica das grandezas medidas
Grandeza Estimativa de erro
TI1 0.13 ºC1
TI2 0.51 ºC1
TI3 0.40 ºC1
TI4 0.65 ºC1
Termopares
TI5 8.66 ºC1
PCI (base húmida) 566 kJ/kg1
Consumo de pellets 0.02 kg2
Rotâmetro do circuito da água da caldeira
12.5 kg/h3
Rotâmetro do circuito da água de refrigeração
4.37 kg/h3
Tempo 0.01 minutos
1 corresponde ao desvio padrão das observações realizadas 2 segundo dados do fabricante 3 corresponde a 0.5% da escala máxima do rotâmetro, segundo dados do fabricante
Para todas as grandezas calculadas a partir dos valores medidos, estimou-se a sua incerteza
através de análise numérica, utilizando os valores obtidos experimentalmente que maximizam
o erro e os valores da tabela 26 como valores de erro máximo para cada variável.
O caudal de pellets foi calculado com base na variação de massa dividida pelo intervalo de
tempo entre as medições (equação 16):
t
mm pellets
pellets ∆∆
=& [em kg/h] (16)
62
onde pelletsm∆ é a variação da massa de pellets (em kg) e t∆ é a variação do tempo (em h). A
incerteza associada ao caudal foi estimada pela equação 17:
2t
m*tE
t
mEmE pelletspellets
pellets ∆∆
∆+∆
∆=& [em kg/h] (17)
tal como todas as outras grandezas, apresenta-se na tabela 27 um valor típico das incertezas
estimadas.
O cálculo da potência fornecida à caldeira foi realizado de acordo com a equação 18:
3600basehúmida pellets,pellets
input
xPCImQ
&
= [em kW] (18)
onde pelletsm& é o caudal de consumo de pellets (em kg/h), humida base pellets,CIP representa o poder
calorífico inferior das pellets, na base húmida (em kJ/kg). O cálculo da incerteza da potência
fornecida (EQinput) foi realizado através da equação 19:
Para as pellets D, como a combustão diminuiu de intensidade após os 12 minutos (figura 23)
torna-se mais difícil a sua caracterização. Os valores máximos de temperatura atingidos em
ambos os lados são comparáveis aos obtidos para outros testes realizados em pellets
(Palchonok et al., 2002), durante a combustão heterogénea. A evolução verificada para a
Eliminado: ¶¶Para as pellets D, como a combustão diminuiu de intensidade após os 12 minutos (figura 23) torna-se mais difícil a sua caracterização. Os valores máximos de temperatura atingidos em ambos os lados são comparáveis aos obtidos para outros testes realizados em pellets (Palchonok et al., 2002), durante a combustão heterogénea.
Eliminado: ¶
84
extremidade esquerda do leito das pellets encontra-se representada na figura 24, verificando-
se um atraso de cerca de 4 minutos relativamente ao lado direito (figura 23).
O cálculo da velocidade de propagação da combustão foi realizado com base na distância
entre os dois sensores de temperatura colocados nas extremidades do leito (240mm) e no
tempo mediante entre o aparecimento do pico de temperatura no lado direito e no lado
esquerdo (tabela 36). Assim, verificou-se que as pellets C apresentaram o valor mais elevado
da velocidade de propagação da frente de combustão (0.080cm/s), seguido das pellets D e B
(com cerca de 0.065cm/s). As pellets A apresentaram a velocidade de propagação de
combustão mais baixa, com uma velocidade de 0.034cm/s (tabela 36).
Tabela 36: Temperatura no leito de combustão, durante o arranque
Pellets A B C D
Lado direito do leito de combustão
Temperatura máxima (ºC) 968.4 944.3 928.5 873.9
Taxa de aquecimento até 600ºC (ºC/s) 1.61 1.44 2.13 2.46
Tempo para atingir 600ºC (mm:ss) 06:53 07:26 04:50 04:06
Lado esquerdo do leito de combustão
Temperatura máxima (ºC) 999.5 994.4 709.6 940.9
Taxa de aquecimento até 600ºC (ºC/s) 0.71 0.90 0.96 0.87
Tempo para atingir 600ºC (mm:ss) 15:25 12:16 10:47 10:13
Velocidade de propagação da chama (cm/s) 0.034 0.065 0.080 0.065
Relativamente às taxas de aquecimento no lado direito do leito, as pellets D apresentaram o
maior valor (2.46ºC/s), seguido das pellets C (2.13ºC/s), das pellets A (1.61ºC/s) e das pellets
B (1.44ºC/s). No que diz respeito à taxa de aquecimento no lado esquerdo as taxas de
aquecimento não apresentaram diferenças tão evidentes, com valores entre 0.71ºC/s e
0.96ºC/s. Devido ao facto da colocação dos termopares no cesto das pellets ter sido realizada
num local abaixo do ponto de combustão, os valores reais da temperatura na zona principal de
combustão poderão ser superiores aos observados.
85
4.2.2 – Evolução da temperatura dos gases de exaustão
As figuras 25 a 27 mostram a evolução da temperatura dos gases em três regiões distintas da
câmara de combustão da caldeira, na parte superior da câmara, próximo dos tubos e cerca de
30 cm acima do leito de combustão, nomeadamente: a região central, a região direita e a
região esquerda da câmara. Os resultados referentes às pellets A a C correspondem à média de
três ensaios de arranque, mas no caso das pellets D, devido à limitada quantidade disponível,
apenas foi possível realizar um ensaio de arranque.
Verificou-se, para todas as pellets e para as diferentes regiões da câmara, que a temperatura
atingiu um pico máximo aos 10-12 minutos, estabilizando em seguida até cerca dos 30
minutos, tempo ao fim do qual se considerou que a caldeira entrou em regime estacionário de
funcionamento, sendo interrompida a recolha de dados e considerada a fase de arranque
concluída. Os perfis de temperatura durante o arranque mostram que para todas as posições
existe um pico de temperatura seguido de uma pequena redução, sendo este efeito mais
pronunciado no centro. Este comportamento é atribuído à maior intensidade de combustão
logo após a ignição, quando a quantidade de pellets no leito é superior à do regime
estacionário.
Os valores mais elevados de temperatura ocorreram na região central de câmara, com valores
médios cerca de 300-400ºC utilizando as pellets A, B e C, mas apenas 174ºC utilizando as
pellets D (tabela 37). A taxa de aquecimento dos gases nesta região variou entre 0.67ºC/s
(pellets A) e 1.22ºC/s (pellets B). A diferença verificada entre as pellets B e as restantes,
poderá estar relacionada com o facto destas apresentarem um teor de voláteis superior (cerca
de 78.1% da massa, base ar), o que leva a que inicialmente haja uma maior disponibilidade de
voláteis para combustão (tabela 28). É visível que as pellets D apresentaram uma temperatura
média menor que as restantes, apesar de na fase de ignição e propagação da combustão no
leito ter um comportamento semelhante. Tal como referido anteriormente, apenas se efectuou
um ensaio de arranque para estas pellets e verificaram-se instabilidades na alimentação
associado ao facto de apresentar um diâmetro superior, o que provocou um transporte não-
uniforme desde o tegão até ao leito de combustão, originando o arrefecimento dos gases.
86
Figura 25: Temperatura dos gases no lado esquerdo da câmara, durante o arranque
0
100
200
300
400
0:00 0:05 0:10 0:15 0:20 0:25 0:30
Tempo (h:mm)
Tem
pera
tura
(ºC
)
TIPO A
TIPO B
TIPO C
Figura 26: Temperatura dos gases no centro da câmara, durante o arranque
0
100
200
300
400
500
600
0:00 0:05 0:10 0:15 0:20 0:25 0:30
Tempo (h:mm)
Tem
pera
tura
(ºC
)
TIPO A TIPO BTIPO C TIPO D
Figura 27: Temperatura dos gases no lado direito da câmara, durante o arranque
0
100
200
300
400
500
0:00 0:05 0:10 0:15 0:20 0:25 0:30
Tempo (h:mm)
Tem
pera
tura
(ºC
)
TIPO A
TIPO B
TIPO C
87
Os valores médios observados no lado direito da caldeira foram ligeiramente inferiores aos
observados da região central, cerca de 230 e 370ºC, com um comportamento semelhante entre
pellets. A taxa de aquecimento foi inferior ao verificado na região central, com valores entre
0.46ºC/s (pellets C) e 0.58ºC/s (pellets B). Finalmente, no lado esquerdo, as temperaturas
médias foram ligeiramente inferiores, próximos de 250-290ºC, com uma taxa de aquecimento
não superior a 0.44ºC/s (pellets B).
Tabela 37: Temperatura no interior da câmara de combustão, durante o arranque
Pellets A B C D
Lado esquerdo da caldeira
Temperatura máxima (ºC) 307 344 277 -
Tempo do pico de temperatura (mm:ss) 15:14 13:00 12:16 -
Taxa de aquecimento (ºC/s) 0.34 0.44 0.38 -
Temperatura média (ºC) 288 267 242 -
Parte central da caldeira
Temperatura máxima (ºC) 509 559 488 372
Tempo do pico de temperatura (mm:ss) 12:38 07:37 10:24 08:22
Taxa de aquecimento (ºC/s) 0.67 1.22 0.78 0.74
Temperatura média (ºC) 361 388 306 174
Lado direito da caldeira
Temperatura máxima (ºC) 380 438 293 -
Tempo do pico de temperatura (mm:ss) 13:12 12:38 10:36 -
Taxa de aquecimento (ºC/s) 0.48 0.58 0.46 -
Temperatura média (ºC) 299 370 225 -
Os resultados obtidos para as temperaturas da câmara de combustão são inferiores a
resultados obtidos na combustão de pellets de turfa, utilizada como combustível no norte da
Europa, para ensaios realizados nas mesmas condições. Uma das causas para esta diferença
poderá residir no maior poder calorífico da turfa, cerca de 30% superior ao das pellets
(Heiskanen et al., 1985).
88
4.2.3 – Evolução das espécies químicas
Relativamente à composição dos produtos de combustão, verificou-se em todos os lotes de
pellets uma grande concentração de CO, com valores a exceder os 1.5% (base seca) no caso
das pellets A e B, estabilizando posteriormente em valores mais baixos e inferiores a 0.13%
(base seca), tal como se pode observar na figura 28.
Figura 28: Concentração de CO, durante o arranque
0
0.5
1
1.5
2
0:00 0:04 0:08 0:12 0:17 0:21 0:25 0:30
Tempo (h:mm)
CO
med
ido
(%
base
sec
a) TIPO A TIPO B
TIPO C TIPO D
Resultados comparáveis foram observados no arranque da combustão de pequenos
fragmentos de madeira completamente seca, tendo-se verificado valores entre 1.30% e 1.85%
de CO cerca de 4 minutos após o arranque da combustão (Oren et al., 1987). O facto de neste
trabalho se registar este pico alguns minutos mais tarde poderá estar relacionado com o tempo
necessário à perda da humidade presente nas pellets utilizadas e a diferenças entre as duas
instalações.
A figura 29 mostra a variação do oxigénio medido durante a fase de arranque, onde se
verificou que durante os primeiros minutos a concentração de O2 diminui rapidamente até
atingir o valor mínimo, regressando depois a um valor normal. A diminuição do O2 está
relacionada com o facto de haver, na altura da ignição, uma grande quantidade de pellets no
leito de combustão consequência do seu abastecimento quase em contínuo, levando à sua
acumulação enquanto não é iniciada a combustão. Esta diminuição foi menor para o caso das
pellets D, devido ao facto da sua ignição ser mais rápida, levando a que não houvesse uma
acumulação muito elevada de pellets antes da ignição. Para as pellets C observou-se também
89
um valor mínimo menos acentuado que as restantes, dando origem a um pico menor na
emissão de CO (figura 28).
Figura 29: Concentração de O2, durante o arranque
11
13
15
17
19
21
0:00 0:04 0:08 0:12 0:17 0:21 0:25 0:30
Tempo (h:mm)
O2
med
ido(
% b
ase
seca
)
TIPO A TIPO B
TIPO C TIPO D
Num ensaio realizado em fragmentos de madeira completamente seca registaram-se valores
na concentração de O2 ligeiramente inferiores, aproximadamente 8-9%, cerca de 4-5 minutos
após o arranque (Oren et al., 1987), verificando que após a estabilização o seu valor foi cerca
de 18%. Esta diferença poderá ser devida aos diferentes caudais utilizados e no tipo de
instalação testada.
Figura 30: Concentração de NOX, durante o arranque
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
0:00 0:04 0:08 0:12 0:17 0:21 0:25 0:30
Tempo (h:mm)
NO
x m
edid
o (m
g/N
m3 @
13%
O2 ) TIPO A TIPO B
TIPO C TIPO D
90
Relativamente à emissão de NOX, destacam-se desde logo os elevados valores apresentados
pelas pellets A, onde se verificou uma emissão crescente desta espécie ao longo de todo o
arranque, ao contrário do comportamento dos restantes lotes, onde a concentração de NOX
estabilizou abaixo dos 500mg/Nm3. Para o único arranque com as pellets D, verificou-se uma
diminuição da taxa de combustão cerca de 11 minutos após a ignição, devido a
irregularidades no abastecimento de combustível, quando seria de esperar uma estabilização
perto de 1000mg/Nm3 (figura 30). Este fenómeno é justificado pela concentração de azoto
presente no combustível que constitui este lote de pellets e que já havia sido verificado nos
resultados da sua análise elementar, superior à das pellets B e C (tabela 28).
91
5 – Conclusões
Os objectivos do presente trabalho consistiam no estudo de avaliação da produção de
biomassa lenhosa em Portugal e no estudo do desempenho de uma caldeira comercial
utilizando diferentes tipos de pellets como combustível, operando em diferentes regimes.
Estes objectivos foram cumpridos através dos seguintes resultados:
� Foi realizado em estudo de avaliação dos resíduos de biomassa lenhosa a partir dos
dados presentes na estatística e da bibliografia disponível, completado em alguns
casos com trabalhos de campo
� Foram realizados diferentes ensaios numa caldeira alimentada a pellets, através da
variação do caudal de combustível e da variação da velocidade do ventilador, tendo
sido realizadas diversas medições para a avaliação do seu desempenho energético e
ambiental
Na avaliação da biomassa lenhosa em Portugal, foram realizadas estimativas para a produção
de resíduos na floresta, agricultura, agro-indústria e indústrias transformadoras da madeira e
da cortiça, a partir de diversos dados disponíveis. Relativamente à floresta, verificou-se que
em Portugal as principais espécies são o eucalipto e o pinheiro, seguidos da azinheira e do
sobreiro, embora em número muito mais reduzido. Concluiu-se que a produção de resíduos
através das operações florestais é de 1173 mil toneladas secas/ano, das quais apenas os
resíduos de azinheira e sobreiro têm aproveitamento energético significativo.
Relativamente à agricultura, foram tidas em conta tanto os resíduos produzidos na culturas
temporárias como nas permanentes. Nas culturas temporárias, os resíduos produzidos foram
estimados em 1324 mil toneladas secas/ano, onde praticamente apenas os resíduos produzidos
na cultura dos cereais têm aplicação, sendo o restante queimado no local sem qualquer
aproveitamento energético. Para as culturas permanentes, foram avaliados os resíduos
produzidos nas operações de poda das principais culturas, nomeadamente o olival, vinha e
principais árvores de fruto, tendo-se estimado a sua produção anual em 677 mil toneladas
secas/ano. Os resíduos resultantes das podas actualmente têm um aproveitamento muito
reduzido, de facto apenas os ramos de olival de maiores dimensões têm aplicação, sendo o
restante queimado no local. Verificou-se, portanto que a produção de resíduos na agricultura é
92
muito significativa, cerca de 2001 mil toneladas secas/ano, das quais apenas uma pequena
parcela tem aplicação.
Na avaliação dos resíduos produzidos na agro-indústria foram tidas em conta apenas as
indústrias do ramo vegetal, ou seja, as produtoras de material lenhoso, tendo-se verificado que
na maioria dos casos o teor em humidade e de proteína são muito elevados, o que deixa
antever alguma dificuldade na sua combustão directa. Os resultados obtidos permitem
concluir que a produção de resíduos nesta indústria é 872 mil toneladas secas/ano, no entanto,
em muitos casos os resíduos têm um mercado, como é o caso do fabrico de rações para
animais, o que significa que têm um preço elevado.
Finalmente, no caso das indústrias transformadora da madeira, foram avaliados os resíduos
produzidos nas serrações, na indústria da pasta do papel, assim como na indústria
transformadora da cortiça. Os resultados obtidos permitem concluir que a produção de
resíduos neste sector é 1584 mil toneladas secas/ano, no entanto, uma grande parte já é
utilizada como combustível, ao contrário dos restantes sectores.
Tendo em conta os resíduos produzidos nestes sectores, estimou-se que a quantidade total de
resíduos de biomassa produzidos em Portugal ascendem a 5630 mil toneladas secas/ano, das
quais 2628 mil toneladas secas/ano estão disponíveis para produção de energia térmica
através da combustão.
Na segunda parte do presente trabalho, foi avaliado o desempenho de uma caldeira comercial,
sob diferentes regimes de funcionamento e utilizando diferentes tipos de pellets. A análise
realizada aos quatro tipos de pellets utilizados permitiu concluir que são muito semelhantes.
De facto, na análise elementar, todos os lotes de pellets apresentaram valores idênticos de
carbono, hidrogénio e enxofre, tendo-se verificado diferenças apenas no teor de azoto, com
uma concentração muito mais elevada nas pellets A. Estas diferenças traduziram-se na
emissão de concentrações de NOX muito superiores às dos restantes lotes em todos os ensaios
realizados. Relativamente ao poder calorífico, os diferentes lotes também não apresentaram
diferenças significativas, com valores do poder calorífico inferior cerca de 16 MJ/kg, em base
húmida.
93
Nos ensaios em regime estacionário, a caldeira apresentou uma potência térmica entre 7 e
17kWth com as pellets A a C, enquanto que com as pellets D (com maior diâmetro) atingiu
apenas uma potência média de 5kWth. Verificou-se que o rendimento médio da caldeira na
carga máxima é cerca de 77%, com perdas de calor sensível nos gases de exaustão cerca de
16% e perdas praticamente insignificantes nos finos e nos inqueimados (cerca de 0.5%).
Verificou-se que as emissões gasosas de CO encontram-se geralmente abaixo dos
1500mg/Nm3 @ 13% O2, apresentando os valores mais baixos quando a concentração de O2
nos gases de exaustão é 13%. As emissões de NOX estão correlacionadas com o excesso de ar
e com a fracção de azoto na composição das pellets, sendo apenas significativas num tipo de
pellets.
Foram igualmente realizados ensaios ao arranque da caldeira, tendo sido analisado o seu
comportamento em termos de emissões e de temperaturas em diferentes pontos da câmara de
combustão e do leito. Verificou-se que, durante esta fase, é atingido um pico na concentração
de CO da ordem de 1.5%, devido à maior quantidade de biomassa presente no leito de
combustão. A análise de temperaturas ao longo do arranque permitiu concluir que a
temperatura dos gases na câmara atinge valores cerca de 300 a 560ºC, dependendo da região
considerada, e que a temperatura do leito de combustão é cerca de 600-800ºC, atingida 10
minutos após o arranque, com picos de temperatura de 900-1000ºC.
O cálculo da estimativa da transferência de energia por radiação e por convecção apresentou
resultados com alguma aproximação relativamente aos resultados dos ensaios experimentais,
tendo-se observado que a estimativa da transferência de energia por convecção é semelhante
ao balanço de energia dos gases de exaustão na passagem pelos tubos. No entanto, a soma dos
valores estimados para a energia transferida por convecção e por radiação é inferior ao valor
experimental obtido no balanço térmico da caldeira. Esta diferença de valores poderá ser
devida às simplificações realizadas na modelação da transferência de energia dentro da
caldeira.
94
6 – Trabalhos futuros
Com esta tese foram realizados alguns avanços, no entanto, tal como a maioria da
investigação, representa um trabalho em curso e não uma meta alcançada. Durante a sua
realização houve alguns aspectos que não ficaram totalmente esclarecidos, pelo que deverão
ser objecto de estudo mais aprofundado.
No cálculo da disponibilidade de biomassa em Portugal apenas foi possível contactar um
número muito reduzido de empresas intervenientes nas fileiras de produção de resíduos, pelo
que se recomenda uma investigação mais exaustiva, tentando contactar um número
estatisticamente significativo de empresas dentro de cada sector. A análise da floresta poderá
ser mais aprofundada, utilizando mais dados do inventário florestal nacional e estabelecendo
comparações com edições anteriores.
Concluiu-se que grande parte dos resíduos não tem aplicação prática, apesar de apresentar
boas propriedades para a combustão. A preparação de pellets com os resíduos identificados,
seguido de testes em laboratório constitui um estudo importante a ser realizado antes da sua
produção.
Para a caracterização química dos resíduos lenhosos foi necessário recorrer, em certos casos, à
bibliografia disponível. Seria interessante realizar um estudo mais completo e detalhado sobre
os resíduos produzidos nos diversos sectores de actividade, nomeadamente através da
determinação do poder calorífico, matéria volátil, humidade, teor de cinzas e sua composição
química, etc. Este trabalho, no entanto, é muito extenso e encontrava-se fora do âmbito desta
tese de mestrado.
Na presente tese não foram contemplados certos parâmetros que irão influenciar o cálculo do
rendimento da caldeira, como é o caso das perdas de calor através das paredes da caldeira e
perda de energia radiante através da janela. Para avaliar mais correctamente o rendimento real
da caldeira, estas perdas deverão ser incluídas, uma vez que poderão representar uma parcela
energética significativa no desempenho da caldeira. Os ensaios realizados não consideraram
como parâmetro independente a temperatura da água no circuito que requer uma instalação
para poder controlar o valor de modo a ser mais representativo de uma instalação de
95
aquecimento central. Outra parcela importante e que deverá ser incluída em trabalhos futuros
é a emissão de partículas, a qual resulta numa importante fonte de poluição.
96
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