UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA RAQUEL DE ARAÚJO BOMFIM GARCIA Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de Alunos com Deficiência: contribuições da Psicologia Escolar a luz da Teoria Histórico-Cultural Maringá 2016
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CENTRO DE … · Semenovich Vygotsky. GARCIA. Raquel de Araújo Bomfim .Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de ... Cultural com ênfase
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
RAQUEL DE ARAÚJO BOMFIM GARCIA
Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de Alunos com
Deficiência: contribuições da Psicologia Escolar a luz da Teoria Histórico-Cultural
Maringá
2016
RAQUEL DE ARAÚJO BOMFIM GARCIA
Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de Alunos com
Deficiência: contribuições da Psicologia Escolar à luz da Teoria Histórico-Cultural
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Psicologia do Centro de Ciências
Humanas, Letras e Artes da Universidade Estadual de
Maringá, como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Psicologia.
Área de concentração: Constituição do Sujeito e
Historicidade.
Orientadora: Profª. Dra. Nilza Sanches Tessaro
Leonardo
Co-orientadora: Profª. Dra. Lúcia Pereira Leite
Maringá
2016
RAQUEL DE ARAÚJO BOMFIM GARCIA
Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de Alunos com Deficiência:
contribuições da Psicologia Escolar à luz da Teoria Histórico Cultural
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Centro de Ciências
Humanas, Letras e Artes da Universidade Estadual de Maringá, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em Psicologia.
BANCA EXAMINADORA
Profª Drª. Nilza Sanches Tessaro Leonardo
PPI/ Universidade Estadual de Maringá (Presidente)
Profª Drª Sonia Mari Shima Barroco
PPI/ Universidade Estadual de Maringá
Profª Drª Sandra Eli Sartoreto de Oliveira Martins
UNESP/Universidade Estadual de São Paulo –Bauru
Aprovada em:
Local de defesa:
AGRADECIMENTOS
Meus agradecimentos iniciais são dedicados a Deus, que me inspirou e confortou durante toda
a realização desta pesquisa, dando um sentido a tudo o que era realizado.
Aos meus pais, que sempre acreditaram no meu potencial e não mediram esforços para me
possibilitar oportunidades de crescimento tanto pessoal quanto profissional.
Ao meu anjo – Márcio Andwrey P. Garcia Burdin, companheiro de todas as horas, que esteve
sempre me apoiando, incentivando, elogiando, confiando nas minhas possibilidades de êxito e
principalmente me oferecendo o que tem de melhor, o seu amor.
Ao meu filho Miguel Bomfim Garcia, que com o seu sorriso me fazia esquecer os percalços
encontrados durante o caminho. Que em sua pouca idade entendeu a importância desta
formação na minha vida e aceitou muitas vezes a minha ausência.
A minha família como um todo que sempre estiveram torcendo por mim: irmã, tios, primos,
sogra, cunhados e sobrinhas; vocês são meu alicerce.
O reconhecimento especial a minha orientadora Prof.ª Dr.ª Nilza Sanches Tessaro Leonardo,
que compartilhou seus conhecimentos, me orientou com paciência e me apresentou o
verdadeiro sentido da mediação.
A Banca Examinadora formada pela Profª Drª Sonia Mari Shima Barroco e Profª Drª Sandra
Eli Sartoreto de Oliveira Martins, cujos apontamentos foram de grande relevância para o êxito
deste trabalho.
A Co-orientadora Profª Drª Lúcia Pereira Leite pelas contribuições vinculadas ao Programa
OBEDUC.
Ao Programa OBEDUC/CAPES, por oportunizar minha participação no Projeto de Pesquisa:
“ACESSIBILIDADE NO ENSINO SUPERIOR: da análise das políticas públicas educacionais
ao desenvolvimento de mídias instrumentais sobre deficiência e inclusão”, vinculado ao
Programa Observatório em Educação – OBEDUC/CAPES; oferecendo auxílio financeiro com
bolsa de mestrado acadêmico.
Aos professores do mestrado que com eficiência e dedicação dividiram conhecimentos e
compartilharam experiências fundamentais para minha formação.
Em especial a minha querida amiga Waléria Henrique dos Santos Leonel, que me impulsionou
nesta jornada, muitas vezes acreditando mais em mim, do que eu mesma. Seu afeto é
fundamental para mim.
Aos amigos conquistados durante este mestrado que passaram a fazer parte da minha história,
principalmente Luciana, Ana Paula , Tatiane e Letícia.
A direção e todos os funcionários da Associação Norte Paranaense de Reabilitação que sempre
acreditaram e me incentivaram nesta jornada, compreendendo meu afastamento e apoiando nos
momentos difíceis.
A todos os alunos especiais com os quais trabalhei e convivi durante esses anos de trabalho na
Educação Especial, que muito me ensinaram sobre superação e persistência.
Ao Magnífico Reitor da Universidade Estadual de Maringá, Júlio Santiago Prates Filho por
autorizar a realização desta pesquisa que muito contribuiu para o meu crescimento profissional.
Aos participantes desta pesquisa que prontamente se colocaram a disposição para estar expondo
sua realidade acadêmica nesta universidade.
À todos, não nomeados, que direta ou indiretamente contribuíram para a realização e conclusão
deste processo de crescimento profissional.
Provavelmente a humanidade vencerá, mais cedo ou
mais tarde, à cegueira, à surdez e a deficiência mental.
Mas vencerá muito mais cedo na esfera social e
pedagógica que na esfera médica e biológica. Lev
Semenovich Vygotsky.
GARCIA. Raquel de Araújo Bomfim .Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de
Alunos com Deficiência: contribuições da Psicologia Escolar à luz da Teoria Histórico-
Cultural.148 f. Dissertação (Mestrado em Psicologia) – Universidade Estadual de Maringá, PR.
RESUMO
O presente estudo faz parte de um projeto de pesquisa de maior abrangência, intitulado
“Acessibilidade no Ensino Superior: da análise das políticas públicas educacionais ao
desenvolvimento de mídias instrumentais sobre deficiência e inclusão”. Esse projeto foi
financiado pelo Programa Observatório da Educação (Edital/CAPES Nº49/2012) e foi
estruturado com vista a contribuir na compreensão de como estudantes com deficiência
conceituam as condições de acessibilidade na universidade. A abordagem teórica que
fundamentou este estudo foi a Psicologia Histórico-Cultural, que tem como seus principais
representantes os autores soviéticos Lev Semiónovich Vigotski (1896-1934), Alexander
Romanovich Luria (1902-1977) e Alexei Nicolaevich Leontiev (1903-1979). Essa teoria
enfatiza a importância do meio histórico-cultural na estruturação do comportamento e do
pensamento do homem, compreendendo-o como um ser ativo no seu processo de
desenvolvimento. Essa concepção não limita o desenvolvimento do homem ao aparato
biológico, mas possibilita que ele, a partir de suas relações sociais, consiga compensar suas
dificuldades. Para subsidiar a pesquisa, foi realizado um levantamento bibliográfico que buscou
resgatar a compreensão da pessoa com deficiência ao longo da história, sendo que a bibliografia
selecionada foi convalidada pelos documentos legais referentes à Educação Especial no Brasil.
De posse do conhecimento sobre as garantias asseguradas nas políticas públicas de
acessibilidade na Educação Básica, buscamos entender como esse processo vem acontecendo
no Ensino Superior. Na sequência, destacamos importantes concepções da Teoria Histórico-
Cultural com ênfase nos estudos da defectologia vygotskiana, que versa sobre o processo de
compensação da deficiência. A pesquisa empírica foi realizada na Universidade Estadual de
Maringá (UEM), localizada no Interior do Paraná, e teve como participantes cinco estudantes
com deficiência. As informações foram obtidas por meio de entrevista semiestruturada, sendo
que as respostas foram trabalhadas utilizando-se do método de análise de conteúdo. Os estudos
apontaram a dificuldade dos participantes em definir o conceito de acessibilidade, o qual estava
ainda restrito a impedimentos arquitetônicos. Na trajetória escolar dos participantes, da
Educação Básica até o Ensino Superior, o que se destacou foi a instrumentalização, ou seja, o
acesso aos suportes necessários para o seu desenvolvimento escolar, muito embora, vale
ressaltar, eles tenham sido disponibilizados por serviços de instituições de apoio. Ao discorrer
sobre as condições de acessibilidade da UEM, os participantes ressaltaram pontos positivos no
atendimento às suas solicitações no Concurso Vestibular e no apoio oferecido pelo Programa
Interdisciplinar de Pesquisa e Apoio à Excepcionalidade (PROPAE); em contrapartida,
narraram dificuldades relacionadas principalmente à acessibilidade arquitetônica,
comunicacional e instrumental, que interferem efetivamente na execução de suas atividades
acadêmicas. Outro aspecto evidenciado foi o despreparo do professor universitário para atender
à diversidade, mostrando-se algumas vezes impotente e, outras vezes, alegava não ter a
formação específica para atender tal demanda. Isso posto, compreendemos que a universidade
em questão tem procurado adequar-se ao que é proposto pelas políticas públicas de inclusão e
tem viabilizado o acesso de estudantes com deficiência ao Ensino Superior, entretanto, pouco
se tem avançado em relação às condições para que eles permaneçam nessa instituição, com um
ensino de qualidade que lhes possibilite a emancipação humana.
Esta pesquisa está vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade Estadual de Maringá (UEM), na área denominada “Constituição do Sujeito e
Historicidade”. A partir deste estudo, tivemos como objetivo compreender como os acadêmicos
com deficiência e/ou mobilidade reduzida conceituam as condições de acessibilidade da UEM.
Este trabalho faz parte de um projeto de pesquisa de maior abrangência, intitulado
“Acessibilidade no Ensino Superior: da análise das políticas públicas educacionais ao
desenvolvimento de mídias instrumentais sobre deficiência e inclusão”, o qual é financiado pelo
Programa Observatório da Educação (Edital/CAPES Nº49/2012).
A acessibilidade ganhou visibilidade nas políticas públicas brasileiras a partir da década
de 1990, estando vinculada principalmente às barreiras arquitetônicas; entretanto, mudanças
ocorridas na sociedade como um todo permitiram a participação de pessoas com deficiência em
todos os setores, como saúde, lazer, trabalho, educação, esporte, entre outros, e, com isso, o
termo acessibilidade torna-se mais complexo e exige uma compreensão mais ampla. Têm
avançado as discussões sobre esse tema nas etapas iniciais de escolarização, mas, no Ensino
Superior, os debates, decorrentes de políticas institucionais e de pesquisas direcionadas a essa
temática, surgem de modo embrionário.
Em nossa atuação como psicóloga na Educação Especial, acompanhando crianças e
adolescentes com deficiência, temos presenciado mudanças significativas em relação às
condições de acesso dessas crianças ao ensino comum, porém, ainda podemos perceber a
ausência de estratégias que visem à sua permanência com maior sucesso e êxito na Educação
Básica. Perante tal situação, muitos questionamentos surgem quanto às possibilidades de esses
estudantes alcançarem o auge do processo educativo, ou seja, o Ensino Superior.
Diante dessa inquietação, ao sermos convidados a participar do Programa do
Observatório de Educação (OBEDUC), despertou-se o interesse e a oportunidade de conhecer
um pouco a realidade educacional de estudantes nesse nível de ensino, permitindo a
aproximação aos seguintes temas: levantamento da percepção dos alunos com deficiência sobre
as condições de acessibilidade da universidade (quanto ao vestibular, campus, currículo, apoio
pedagógico, entre outros), ou seja, o ponto de vista deles sobre as barreiras e/ou a situação
favorável à sua permanência na instituição.
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Para melhor compreender esse processo e sistematizar as discussões, fizemos um
aprofundamento teórico na Psicologia Histórico-Cultural, cujos fundamentos na área da
defectologia muito têm contribuído para a compreensão do desenvolvimento de pessoas com
deficiência e sua humanização. Este conhecimento nos possibilitou oferecer uma importante
contribuição no tocante ao trabalho com pessoas com deficiência na área da Educação.
A realização do estudo permitiu o alcance dos objetivos propostos no início da pesquisa,
estando este trabalho organizado em quatro partes: Introdução; I - O Percurso da Educação
Especial no Brasil: de ações isoladas às políticas públicas; II – Políticas Públicas de
Acessibilidade e suas Implicações no Ensino Superior Brasileiro; III – O Desenvolvimento do
Humano sob a Perspectiva da Teoria Histórico-Cultural para Compreensão da Pessoa com
Deficiência; IV – Pesquisa Empírica: Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de
Estudantes com Deficiência; Considerações Finais; Referências Bibliográficas e Apêndices.
Na primeira seção fizemos um resgate de como a pessoa com deficiência tem sido
compreendida ao longo da história, correlacionando os dados com fatos relevantes da Educação
Especial no Brasil e as políticas públicas que legitimaram o atendimento educacional
especializado a essas pessoas.
Na segunda seção evidenciamos a compreensão sobre a Acessibilidade e sua aplicação
no Ensino Superior, destacando sua forma de organização no Brasil e sublinhando as políticas
públicas referentes à acessibilidade e à Educação Especial nesse nível de ensino.
Na terceira seção buscamos nos aprofundar na Psicologia Histórico-Cultural, mostrando
como se deu o processo de humanização do homem e a importância da educação na mediação
de bens materiais e culturais produzidos historicamente pela humanidade. Com essa
compreensão, referenciamos os estudos sobre defectologia realizados por Vigotski, segundo os
quais a criança com deficiência apresenta um desenvolvimento diferenciado, próprio, no qual
o meio cultural é determinante no processo de compensação da deficiência.
Na quarta seção procedemos ao desenvolvimento da pesquisa empírica, expondo os
procedimentos metodológicos pelos quais foram reunidas e organizadas as informações
colhidas na pesquisa. Nessa seção também caracterizamos a universidade estudada, destacando
suas resoluções referentes ao atendimento de pessoas com deficiência, especificando os
participantes e descrevendo os instrumentos adotados. Para sistematização das discussões,
organizamos as informações em quatro eixos temáticos, nos quais utilizamos excertos das falas
dos participantes correlacionando-os com a teoria estudada.
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Para concluir o estudo, foram elaboradas as considerações finais. Logo após, encontram-
se relacionadas as referências bibliográficas que possibilitaram o embasamento teórico desta
dissertação. Ao final, como desfecho, dispusemos os apêndices.
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1 O PERCURSO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL: de ações isoladas às
políticas públicas
Para melhor compreensão da acessibilidade de pessoas com deficiência ao Ensino
Superior, fez-se necessário recuperarmos a história da Educação Especial no Brasil, bem como
as políticas públicas que legitimaram a sua efetivação. O reconhecimento do longo percurso
pelo qual a educabilidade das pessoas com deficiência se estruturou nos possibilita conhecer as
bases educacionais que asseguraram a esses alunos o direito à educação em todos os níveis de
ensino.
Assim, esta sessão busca apresentar como a Educação Especial foi organizada, de
acordo com as necessidades da sociedade em cada momento histórico, sendo que estas também
influenciaram na forma de ver e pensar a educabilidade de pessoas com deficiência. Veremos
que a busca dessas pessoas por espaço no sistema educacional brasileiro ocorre desde o Império,
entretanto, no início, não havia intervenções contínuas nessa direção, apenas ações isoladas,
sendo que esse quadro só foi mudar quando políticas públicas começaram a ser estabelecidas.
Diante disso, desenvolveremos nesta sessão os temas: “A compreensão da educabilidade
de pessoas com deficiência no contexto brasileiro” e “Políticas públicas para educação especial
que legitimam o atendimento educacional”.
1.1 A compreensão da educabilidade de pessoas com deficiência no contexto brasileiro
A preocupação com a educabilidade de pessoas com deficiência no Brasil não é algo
recente, e suas primícias podem ser verificadas ainda no período do Império. No entanto, esse
esforço deu-se por meio de ações isoladas, advindas principalmente de instituições particulares,
filantrópicas e/ou organizações não governamentais, que, em sua maioria, tinham como
referência ideias provindas de outros países. Estas, por sua vez, foram de grande relevância para
o estabelecimento de políticas públicas de assistência e educação a pessoas com deficiência.
Entendendo que, segundo Souza (2006), as políticas públicas constituem-se em um
[...] campo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, “colocar o
governo em ação” e/ou analisar essa ação (variável independente) e, quando
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necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações (variável
dependente). A formulação de políticas públicas constitui-se no estágio em
que os governos democráticos traduzem seus propósitos e plataformas
eleitorais em programas e ações que produzirão resultados ou mudanças no
mundo real (Souza, 2006, p.26, grifo no original).
Constata-se assim, que o governo apresenta certa autonomia na implementação das
políticas públicas, embora diversos fatores, tanto internos quanto externos, influenciem na sua
formulação, sendo importante considerar o momento histórico pelo qual passa o país nessa
etapa (Souza, 2006).
À vista disso, pode-se compreender melhor o processo pelo qual a educação de pessoas
com deficiência vem se consolidando ao longo dos anos. De acordo com Aranha (2005),
Jannuzzi (2006) e Mazzotta 1(2005), a Educação Especial no Brasil, como já foi evidenciado,
sistematizou-se, em sua maioria, a partir de iniciativas privadas, tomadas por grupos isolados
influenciados por ideias originárias de outros países, cujas necessidades os impeliam a buscar
alternativas para promover a educação de pessoas com deficiência, persuadindo governantes a
legitimarem esses atendimentos. No entanto, Aranha (2001) ressalta que a trajetória até a
inclusão foi marcada por um
[...] longo e importante processo histórico que a produziu, configurado numa
luta constante de diferentes minorias, na busca de defesa e garantia de seus
direitos enquanto seres humanos e cidadãos. Ignorar tal processo implica na
perda de compreensão de seu sentido e significado” (p. 160).
Essa realidade pode ser certificada por meio dos fatos históricos apresentados a seguir,
os quais destacam eventos que foram relevantes para a educação de pessoas com deficiência.
Quadro 1 – Fatos históricos importantes para a educabilidade de pessoas com deficiência.
1 Esses autores não são da Teoria Histórico-Cultural, entretanto, muito contribuíram para a compreensão
histórica da educação especial no Brasil.
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ANO Fato Histórico
1854 Fundação do Imperial Instituto dos Meninos Cegos-RJ. Decreto Imperial nº
1.428. Em 1891, passou a chamar-se Instituto Benjamin Constant (IBC).
Decreto nº 1.320.
1857 Fundação do Imperial Instituto dos Surdos Mudos-RJ. Mudou o nome do
Imperial Instituto dos Surdos Mudos para Instituto Nacional de Educação de
Surdos (INES). Lei nº 3.198.
1883 Realização do 1º Congresso de Instrução Pública. Foi inclusa uma pauta sobre
sugestões de currículo e formação de professores cegos.
1874 Estabelecimento do Hospital Estadual de Salvador, que acolhia deficientes
mentais.
1892 Estabelecimento da Unidade Educacional Euclides da Cunha em Manaus-AM,
que ofericia atendimento a deficientes mentais e auditivos na rede de ensino
regular estadual.
1903 Estabelecimento do Hospital Nacional de Alienados - Pavilhão Bourneville: 1ª
Escola Especial para Alienados.
1909 Atendimento a deficientes mentais, auditivos e em comunicação em Escolas
Estaduais no Rio Grande do Sul: Escola Borges de Medeiros (Encruzilhada do
Sul) e o Grupo Escolar Delfine Dias de Ferraz (Montenegro).
1926 Criação do Instituto Pestalozzi (RS) para deficientes mentais.
1928 Fundação do Instituto dos Cegos Padre Chico (SP). Em 1930 o corpo docente
passou a ser mantido pelo Governo do Estado de São Paulo.
1929 Fundação do Instituto Santa Teresinha em Campinas para atendimento a
crianças surdas, que em 1933 mudou-se para São Paulo.
1931 Atendimento Educacional a deficientes físicos na Santa Casa de Misericórdia
de São Paulo.
1932 –
1948
Criação de três classes especiais na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo,
modalidade de ensino hospitalar.
1932 Fundação da Sociedade Pestalozzi de Minas Gerais.
1935 Criação do Instituto Pestalozzi (MG), que atendia crianças mentalmente
retardadas e com problemas de conduta. O Governo Estadual custeava os
professores; em 1940, a Granja Escola pela Sociedade Pestalozzi foi criada.
1942 Publicação, em braile, da Revista Brasileira de Cegos, pelo IBC.
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1943 Criação do Lar-Escola São Francisco (SP), para atendimento e reabilitação de
deficientes físicos. Convênio com a Secretaria de Educação do Estado.
Reconhecida como Utilidade Pública Estadual pela Lei nº 3.354/1956.
1946 Equiparação do Curso Ginasial do IBC com o Ensino Comum. Portaria
Ministerial nº 385.
1946 Criação da Fundação para o Livro do Cego no Brasil (FLCB), para produção e
distribuição de livros impressos em braile, também para a oferta de educação,
reabilitação e bem-estar de pessoas com cegueira e visão subnormal. Decreto
Federal nº 40.269/1957, Decreto Municipal nº 4.644/1960 e Decreto Estadual
nº 8.059/1967.
1948 Criação da Sociedade Pestalozzi do Brasil no Rio de Janeiro. Recebe subsídios
dos governos municipal, estadual e federal.
1949 IBC passa a oferecer gratuitamente livros a todos os cegos que realizassem a
solicitação. Portaria Ministerial nº504.
1950 Criação da primeira classe Braille formada por alunos do sistema escolar
comum, iniciativa do Instituto de Educação Caetano Campos/São Paulo.
1950 Fundação da Associação de Assistência a Criança Defeituosa (AACD).
1951 Instalação da Escola Municipal de Educação Infantil e de 1ºGrau para
deficientes auditivos Helen Keller – SP. Em 1988, foram criadas mais quatro
escolas municipais com a mesma proposta.
1952 Criação do I Núcleo Educacional para Crianças Surdas –SP.
1952 Fundação da Sociedade Pestalozzi de São Paulo e criação da 1º escola da
Sociedade Pestalozzi em São Paulo, como também da clínica psicológica e
escola de pais. Em 1956, a Fundação foi registrada na Secretaria de Estado da
Educação.
1954 Fundação do Instituto Educacional São Paulo (IESP), com ensino especializado
para crianças com deficiência auditiva. Registrado em 1958 na Secretaria de
Educação de São Paulo (nº 2.010).
1954 Criação da primeira Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE)
no Rio de Janeiro.
1957 Criação, pela AACD, das Classes Especiais para deficientes físicos em grupos
escolares. Convênio com a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo.
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1960 Realização da 1ª Campanha Nacional de Educação e Reabilitação de Deficientes
Mentais (CADEME), por iniciativa da Sociedade Pestalozzi e APAE (RJ);
instituída pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), por meio do Decreto
nº 48.961/1960.
1961 Criação da APAE de São Paulo, iniciada com o Centro Ocupacional Helena
Antipoff.
1967 Implantação do Centro de Treinamento Itaim (CTI), atendimento a adolescentes
com deficiência mental treinável.
1971 Autorização da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo para
funcionamento da Escola de Educação Especial da APAE de São Paulo.
1972 Criação dos Núcleos de Aprendizagem e Atividades Profissionais (NAAPs)
1979 Atendimentos, pela AACD, de suporte ou de suplementação à educação escolar.
Serviço De Educação Especial Da Coordenadoria De Estudos E Normas
Pedagógicas (CENEP).
1980 Organização da Federação das Sociedades Pestalozzi.
Fonte: Aranha (2005), Jannuzzi (2006) e Mazzotta (2005).
O período destacado no Quadro 1 possibilita visualizar o valor irrefutável de ações da
sociedade civil na promoção da educabilidade de pessoas com deficiência, o que evidencia que
a persuasão dessas ações induziu a mudanças por parte do governo em diferentes momentos
históricos. Nesse contexto, é relevante destacar que tais fatores foram desenvolvendo-se a partir
de mudanças na forma com que a sociedade relaciona-se com as pessoas com deficiência. De
acordo com Leite e Martins (2012, p.23),
[...] em diferentes tempos e lugares, as lesões corporais e as patologias
representaram o ser diferente, estranho, deficiente ou anormal. Ora a pessoa
com deficiência deveria ser marginalizada das relações sociais e até mesmo
do convívio da família, ora essa população deveria ser educada e capacitada
para pertencer à comunidade.
No período do Império, a pessoa com deficiência era segregada da sociedade, e as
iniciativas isoladas de atendimento educacional tinham influência de ideias advindas da Europa
e dos Estados Unidos, sendo fundamentadas em um liberalismo de elite que defendia ideias até
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certo ponto: até que não comprometessem os seus interesses. Tais ideias, por sua vez, refletiam
a realidade da educação geral no Brasil, a qual beneficiava apenas os membros de classes sociais
abastadas.
As instituições, nesse período, visavam ao tratamento e cuidado de pessoas com
deficiência visual e auditiva, a exemplo o IBC e INES (Jannuzzi, 2006). Entretanto, segundo
Aranha (2001), elas eram, na sua maioria ambientes isolados, cujo objetivo era retirar as
“pessoas com deficiência de suas comunidades de origem e pela manutenção delas em
instituições residenciais segregadas ou escolas especiais, frequentemente situadas em
localidades distantes de suas famílias” (p.165). A autora considera essa fase como o primeiro
paradigma formal assinalado na relação entre sociedade–deficiência, o qual ela denominou
como Paradigma da Institucionalização.
Mesmo com o advento da República, o que pode ser observado no Quadro1 é que, até a
década de 1960, a relação da sociedade brasileira com pessoas com deficiência ainda estava
encerrada na institucionalização, salvas algumas iniciativas isoladas, como a Unidade
Educacional Euclides da Cunha (Manaus/1892), sobre a qual há referências de atendimento a
deficientes mentais e auditivos no ensino comum, na rede estadual de ensino; também no Rio
Grande do Sul, havia escolas estaduais que atendiam deficientes mentais e de comunicação,
como a Escola Borges de Medeiros, em Encruzilhada do Sul, com atendimento a deficientes
mentais e em comunicação; além do Grupo Escolar Delfina Dias Ferraz, em Montenegro, que,
já em 1909, oferecia atendimento a crianças com deficiência mental, auditiva e de comunicação
(Jannuzzi, 2006).
De acordo com Leite e Martins (2012), deu-se início, a partir da década de 1960, um
movimento que visava à desinstitucionalização, o qual, em seu cerne, discutia sobre o cuidado
institucional e se este de fato promovia a recuperação dos indivíduos com deficiência; como
também almejava meios de introduzir essas pessoas na sociedade por intermédio de serviços
comunitários. O interesse nesse momento, segundo Aranha (2001, p.168, grifos no original) era
que
Ao se afastar do paradigma da institucionalização (não mais interessava
sustentar uma massa cada vez maior de pessoas, com ônus público em
ambientes segregados; interessava desenvolver meios para que estes
pudessem retornar ao sistema produtivo), criou-se o conceito da integração,
fundamentado na ideologia da normalização, a qual advogava o “direito” e a
necessidade das pessoas com deficiência serem “trabalhadas” a fim de que se
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assemelhassem o mais proximamente possível das características da
normalidade, estatística e funcional.
Destarte, o processo de integração visava a adequar o indivíduo com deficiência à
comunidade, ou seja, ela deveria oportunizar serviços e recursos que favorecessem à pessoa
com deficiência mudanças que a aproximasse do “normal” – ideologia da normalização. Porém,
é importante ressaltar que os países ocidentais foram os pioneiros no processo de
desinstitucionalização, isso porque
a luta pela defesa dos direitos humanos e civis das pessoas com deficiência
utilizou-se das brechas criadas pelas contradições do sistema sociopolítico-
econômico vigente (o qual defendia a diminuição das responsabilidades
sociais do Estado e buscava diminuir o ônus populacional) para avançar na
direção de sua integração na sociedade.(Aranha, 2001, p. 167)
Nessa época, várias das instituições, como a Sociedade Pestalozzi, APAE e AACD,
buscaram novas alternativas de atendimento às pessoas com deficiência. Segundo Aranha
(2001), essas instituições eram intituladas “organizações ou entidades de transição”, que
buscavam sair do enclausuramento da instituição total típica, mas ao mesmo tempo oferecer um
ambiente mais preservado do que a sociedade externa. Tais instituições ainda mantêm esses
serviços nos os dias de hoje, oferecendo salas com número reduzido de alunos, professor
especializado, trabalho individualizado e o auxílio da equipe multiprofissional, sendo influente
a visão de integração que permeia os projetos.
O princípio de integração fica evidente no texto da Lei n. 4.024/1961, que estabelecia
as Diretrizes e Bases para a Educação e na qual se encontra artigos dedicados à educação de
excepcionais2. No artigo 88, verifica-se que a “[...] educação de excepcionais, deve, no que for
possível, enquadrar-se no sistema geral de educação, a fim de integrá-los na comunidade.”
(Brasil, 1961). Para Mazzotta (2005), esse artigo suscitou algumas interpretações, dentre as
quais se destacam: 1- que a Educação Especial está à margem do sistema escolar, não
2 De acordo com Sassaki (2002), a forma correta de utilização de um termo está relacionada a valores e conceitos
da época bem como sociedade a qual está inserido; conforme os valores e conceitos mudam, vão sendo também
substituídos os termos. O termo excepcional foi muito utilizado até a década de 1970 para denominar pessoas com
deficiência intelectual. Após a década de 1980, passou a ser utilizado para denominar pessoas com altas
habilidades, com inteligências múltiplas acima da média; sendo que aqueles que apresentavam deficiência
intelectual eram chamados de deficientes mentais.
No transcorrer desta dissertação optamos por manter a terminologia utilizada pelos documentos e autores.
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pertencendo ao sistema geral de ensino; 2- que os mesmos serviços educacionais oferecidos
para a população em geral devem ser ofertados aos excepcionais; e 3- que estes só devem ser
encaminhados ao ensino especializado quando não for possível atendê-los no sistema geral de
ensino. Por sua vez, o artigo 89 prevê auxílio financeiro às instituições que, avaliadas pelos
conselhos estaduais, ofereçam educação a excepcionais (Brasil, 1961); porém, não ficam
explícitos nessa Lei os tipos de atendimento que serão oferecidos, se eles serão especializados
e se farão parte ou não do sistema geral de ensino, visto que a avaliação ficou a critério dos
conselhos estaduais (Mazzotta, 2005).
De acordo com Aranha (2001), o trabalho com pessoas com deficiência nesse período
foi organizado em três fases: avaliação, intervenção e encaminhamento ou re-encaminhamento.
Na avaliação, os profissionais visavam a verificar o que era preciso ser modificado no indivíduo
para que ele se aproximasse, dentro do possível, do que era esperado nos padrões de
normalidade. A partir dos objetivos estabelecidos na avaliação, iniciava-se o trabalho de
atendimento ao sujeito visando ao ensino, treinamento, capacitação, entre outros, de forma
sistematizada. Quando o indivíduo conseguia alcançar as metas estabelecidas e estava
preparado para vida em sociedade de forma independente, era feito o encaminhamento ou re-
encaminhamento para a comunidade. Verifica-se, entretanto, que a mudança estava focada no
indivíduo. É relevante ressaltar que o psicólogo teve um papel de destaque dentre os
profissionais que faziam parte desse processo. Nessa mesma época, a profissão de psicólogo
foi regulamentada no Brasil, por meio da Lei nº 4.119/1962, sendo reconhecida como profissão;
além dos cursos de formação, que também foram regularizados (Lisboa & Barbosa, 2009).
Importante ressaltar que, nessa época, a utilização de testes formais que mediam o Quociente
de Inteligência (QI) era comum entre os psicólogos, que muitas vezes limitavam sua avaliação
do sujeito aos resultados quantitativos apresentados nestes testes.
A forma de compreensão da pessoa com deficiência, baseada no princípio de
normalização, recebeu vários questionamentos, principalmente devido a dificuldades
específicas de alguns que não correspondiam às expectativas de assemelhar-se ao não
deficiente, como também pelo desrespeito pelas diferenças individuais, “[...] como se fosse
possível ao homem o ‘ser igual’ e como se ser diferente fosse razão para decretar a menor valia
enquanto ser humano e ser social”. (Aranha, 2001, p.169). Diante disso, segundo Leite e
Martins (2012), o que se pode verificar, na década de 1970, são ações por parte de estudiosos
visando à concretização de direitos e respeito à pessoa como ser humano, como a criação de
associações e órgãos representativos.
25
À vista disso, Aranha (2005) destaca a formação de um grupo específico responsável
pela sistematização do atendimento educacional aos excepcionais em todo o país, por meio da
Portaria n.º 86/MEC/1971. Mazzotta (2005) esclarece que a constituição do Grupo Tarefa de
Educação Especial possibilitou a elaboração do Projeto Prioritário n.º 35, incorporado ao Plano
Setorial de Educação e Cultura 1972/74. Dentre as atividades desenvolvidas pelo Grupo,
podemos destacar as contribuições para a criação do Centro Nacional de Educação Especial
(CENESP), anexo ao Ministério da Educação e Cultura, cujo objetivo era o atendimento aos
excepcionais do Brasil previsto no Decreto n.º 72.425/1973. O regimento interno do CENESP
foi aprovado no ano de 1975, por meio da Portaria n.º 550 do Ministério da Educação e Cultura
(Mazzotta, 2005). Os fundamentos dos trabalhos a serem desenvolvidos foram especificados
no artigo 2º do regulamento:
O CENESP tem por finalidade planejar, coordenar e promover o
desenvolvimento da Educação Especial no período pré-escolar, nos ensinos
de 1º e 2º graus, superior e supletivo, para deficientes da visão, da audição,
mentais, físicos, portadores de deficiências múltiplas, educandos com
problemas de conduta e os superdotados, visando à sua participação
progressiva na comunidade, obedecendo aos princípios doutrinários políticos
e científicos que orientam a Educação Especial (Mazzotta, 2005, p.56).
Ao mesmo tempo em que abre oportunidades para a educação de pessoas com
deficiência, o regulamento também deixa claro que esses indivíduos estão subordinados a
preceitos políticos e à maneira com que a ciência compreendia a deficiência.
O princípio de normalização também pode ser observado na Portaria Interministerial n.º
186/1978 (MEC/MPAS) que regulamentou a Portaria Ministerial n.º 477/1977 e com isso
delimitou os tipos de alunos que seriam atendidos pela Educação Especial, estabelecendo como
seria o diagnóstico, encaminhamento, supervisão e controle (Aranha, 2005). Mazzotta (2005)
destaca alguns objetivos dessa portaria, entre eles o de [...] ampliar oportunidades de
atendimento especializado, de natureza médico-psicossocial e educacional para excepcionais,
a fim de possibilitar sua integração social e propiciar continuidade de atendimento a
excepcionais, através de serviço especializado de reabilitação e educação” (p. 72).
O autor ressalta que as ideias propostas por essa portaria tinham um caráter
preventivo/corretivo, dando à Educação Especial uma conotação clínica e terapêutica, tanto que
26
até mesmo o encaminhamento de excepcionais para o sistema educacional geral dependeria de
uma avaliação diagnóstica, realizada por uma equipe interprofissional especializada. Um fato
relevante em relação à portaria é que nenhuma especialização era exigida aos professores de
classes especiais, mas apenas sugerida. Destaca-se ainda a importância dessas medidas naquele
momento, para delimitar um rumo para o atendimento educacional dos alunos; no entanto, o
documento evidencia a dificuldade em passar de um modelo clínico-terapêutico a um modelo
educacional, principalmente no que se refere à avaliação (Mazzotta, 2005).
Todavia, segundo Aranha (2001), ao abrir as discussões sobre as necessidades dos
indivíduos com deficiência, verificou-se que eles precisavam de mais do que apenas serviços
de avaliação e acompanhamento, desencadeando questionamentos sobre a forma como a
sociedade deveria ser organizada para garantir o acesso de todos, independentes de ter ou não
uma deficiência, e, com isso, garantir a acessibilidade a tudo o que é disponibilizado aos
cidadãos, sem nenhum tipo de diferenciação. Para isso, afirma Leite e Martins (2012),
tornaram-se imprescindíveis mudanças quanto à estruturação física, como também a ruptura
com as ideias normalizadoras que predominavam até este momento. No entanto, como veremos
no segundo capítulo desta dissertação, as legislações que sistematizaram a organização de
espaços físicos só aconteceram na década de 1990.
Tais ideias fundamentaram um novo modo de relação entre a sociedade e as pessoas
com deficiência, o qual Aranha (2001) denominou como Paradigma de Suporte. Esse paradigma
tem como princípio a diversidade e busca garantir o acesso dos cidadãos a todos os recursos
disponíveis na sociedade, oferecendo os instrumentos e suportes (social, econômico, físico ou
instrumental) necessários para que de fato se efetue a inclusão social; assim, a mudança aqui
não mais se centraliza no indivíduo. O fundamental nessa nova relação, segundo Omote (2008),
é a mudança indispensável na sociedade para o acolhimento do cidadão com deficiência,
possibilitando o acesso aos espaços e a convivência em comunidade; o que evidencia a
possibilidade de crescimento pessoal e social de todos os membros da sociedade.
Ao definir o processo de inclusão social, Aranha (2001, p.172) destaca que
[...] não é processo que diga respeito somente à pessoa com deficiência, mas
sim a todos os cidadãos. Não haverá inclusão da pessoa com deficiência
enquanto a sociedade não for inclusiva, ou seja, realmente democrática, onde
todos possam igualmente se manifestar nas diferentes instâncias do debate de
ideias e de tomada de decisões da sociedade, tendo disponível o suporte que
for necessário para viabilizar essa participação.
27
Diante disso, verifica-se que as pessoas com deficiência necessitam de mais do que
apenas serviços, precisam ter acesso ao desenvolvimento, e, para que isso aconteça, é
fundamental oferecer adaptações que possibilitem essa mudança. A disponibilização dos
suportes necessários é o que viabilizará a igualdade de oportunidades. A demanda desses
suportes deve ser viabilizada independentemente de sua natureza, podendo ser simples ou não,
precisar de maior ou menor tempo para sua efetivação etc., mas se a sociedade pretende ser
realmente democrática e justa, terá que fazer disso uma realidade (Aranha, 2001).
Algumas mudanças legislativas podem ser observadas a partir da década de 1980. Uma
delas foi a normatização dos critérios para prestação de apoio técnico e/ou financeiro à
Educação Especial, tanto pública quanto privada, estabelecida pela Portaria do MEC n.º
69/1986. Esta, de acordo com Mazzotta (2005), introduziu mudanças significativas, pois a
Educação Especial passou a integrar a Educação, com o objetivo de propiciar o
desenvolvimento das potencialidades do educando com necessidades especiais3. Verifica-se
aqui também uma mudança na nomenclatura: o aluno antes denominado excepcional passa a
ser chamado de educando com necessidades especiais. Nos artigos 6º e 9º, ficam estabelecidos
como serão os atendimentos educacionais especializados, destacando-se o desenvolvimento de
técnicas, métodos, recursos e procedimentos didáticos por equipe especializada, nas diferentes
modalidades de atendimento; sendo que a oferta desses atendimentos poderia acontecer tanto
por escolas públicas quanto particulares, pela rede regular de ensino ou por instituições
especializadas.
De acordo com Aranha (2005), outro fato relevante no contexto de transição e
implantação de suportes que possibilitassem o acesso de pessoas com deficiência foi a
Constituição Federal Brasileira de 1988, pois no Capítulo III, da Educação, da Cultura e do
Desporto, na Seção I, da Educação, destaca-se em seu artigo 208, Inciso III, do Capítulo III,
que “[...] o atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência4 deve ser,
preferencialmente, na rede regular de ensino” (BRASIL, 1988). Para Mazzotta (2005), essa
situação pode suscitar dois tipos de compreensão do portador de deficiência5 e da Educação
3Educando que durante o seu processo educacional apresenta: dificuldades acentuadas de aprendizagem ou
limitações no processo de desenvolvimento; dificuldades de comunicação e sinalização; e altas
habilidades/superdotação. (Brasil, 2001). 4 Segundo Sassaki (2002) este termo foi muito utilizado no Brasil entre a década de 1986 a 1996, entretanto entrou
em desuso diante das ponderações de pessoas com deficiência, esclarecendo que a deficiência não é algo que se
porta (como um documento, uma bolsa) que se pode deixar de portar. Por isso passou-se a usar o termo pessoa
com deficiência. 5 Foi mantida a denominação utilizada pelo autor.
28
Especial, na visão do legislador. Uma é o que o autor chama de visão dinâmica ou não linear,
em que é oferecida uma diversidade de opções de atendimento ao portador de deficiência; a
outra é a chamada visão estática ou por dicotomia, segundo a qual a Educação Especial é
necessariamente relacionada ao “portador” de deficiência, cuja educação deve ser regular e
igual à do educando normal. O autor destaca ainda o compromisso do Poder Público em
oferecer recursos financeiros a instituições particulares - que em sua maioria são assistenciais -
para manter os serviços especializados, o que pode significar menos investimento na qualidade
de ensino da escola pública. É reconhecido o trabalho especializado realizado por essas
instituições particulares, no entanto, também se faz necessário o investimento no atendimento
educacional desses educandos em serviços públicos.
Apesar dos esforços para mudanças na compreensão das necessidades educacionais de
pessoas com deficiência, no ano de 1994, quando foi elaborada a Política Nacional de Educação
Especial/MEC, ainda verificava-se uma visão de integração instrumental, segundo a qual
seriam inseridos no ensino comum aqueles alunos que conseguissem realizar as mesmas
atividades que os alunos considerados normais, seguindo o mesmo plano curricular, não
havendo revisão nas práticas educacionais, reafirmando a necessidade da Educação especial
(BRASIL, 2007b).
Perante essas colocações, Aranha (2001) evidencia que no Brasil as razões para a
segregação e exclusão ainda estão focadas na pessoa com deficiência; não transcedendo a visão
de integração, que busca a normalização destas pessoas; não possibilitando o desenvolvimento
de ações que disponibilizem os suportes necessários que assegurem a todos, com ou sem
deficiência, o acesso a todos os recursos disponíveis na comunidade.
O que se pode ponderar diante das considerações desta sessão é que o processo histórico
da organização e atendimento a pessoas com deficiência no Brasil estruturou-se em consonância
com as mudanças ocorridas na forma com que a pessoa com deficiência passou a ser
compreendida em cada momento histórico, o que foi bem delimitado por Aranha (2001). Foram
reveladas, assim, as circunstâncias em que a acessibilidade passou a ter relevância na
educabilidade dessas pessoas, independentemente do nível de escolaridade almejado. Em
continuidade ao tema, no próximo item, serão examinados documentos legais que buscaram
legitimar o acesso de pessoas com deficiência dentro de uma perspectiva inclusiva.
29
1.2 Políticas públicas para Educação Especial que legitimam o atendimento educacional
As mudanças ocorridas na legislação brasileira a partir dos anos de 1990 trouxeram grandes
avanços no que se refere à inclusão social, fomentando modificações no sistema educacional
que propiciassem uma Escola Inclusiva. Entendendo que
A inclusão subentende uma ação em prol dos direitos humanos e cívicos,
tende a modificar a essência e a estrutura da própria escola. A escola terá de
adaptar-se a todas as crianças, ou melhor, a variedade humana. Como
instituição social não poderá continuar a agir no sentido de escorraçar ou
segregar aqueles que não aprendem como os outros, sob pena de negar a si
própria. (Fonseca,1995, p.202).
Isso posto, muitas são as alterações necessárias no sistema educacional para possibilitar
o acesso e a permanência de pessoas com deficiência em todos os níveis de ensino. Nesse
sentido, retomam-se, neste item, legislações relevantes que subsidiaram até o momento a
acessibilidade de educandos com deficiência à educação.
Um marco referencial nesse processo aconteceu em 7 de abril de 1994, quando foi
realizada em Salamanca (Espanha) a Conferência Mundial de Educação Especial, na qual foi
elaborado um documento que até hoje tem grande relevância na criação de políticas públicas
referentes à inclusão. Participaram do evento representantes de 88 países e 25 organizações
internacionais. O Brasil, mesmo tendo sido convidado oficialmente, não enviou representante.
(Tessaro, 2011). Na Conferência foi proclamado que
• toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a
oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem, • toda
criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de
aprendizagem que são únicas, • sistemas educacionais deveriam ser
designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido
de se levar em conta a vasta diversidade de tais características e necessidades,
• aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola
regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na
criança, capaz de satisfazer a tais necessidades, • escolas regulares que
30
possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de
O que é importante destacar em relação a essa visão é que uma alteração no
desenvolvimento decorrente de um defeito exerce um papel duplo, ou seja, o defeito ao mesmo
tempo em que limita, debilita e altera o desenvolvimento, também impulsiona e estimula a sua
69
progressão. Nisso se baseia a lei central da defectologia atual, a de que o defeito possibilita
estímulos para estruturar a compensação (Vygotski, 1997).
Vygotsky & Luria (1996, p. 221) explicam:
No correr da experiência, a criança aprende a compensar suas deficiências
naturais; com base no comportamento defeituoso, técnicas e habilidades
culturais passam a existir, dissimulando e compensando o defeito. Elas
tornam possível enfrentar uma tarefa inviável pelo uso de caminhos novos e
diferentes. O comportamento cultural compensatório sobrepõe-se ao
comportamento natural defeituoso.
Assim, aquilo que a princípio limita e gera sofrimento, pode ser a força propulsora para
o desenvolvimento de novas capacidades, sendo que o contexto social será o fator
preponderante nessa evolução, oferecendo os recursos necessários para a compensação da
deficiência.
O mecanismo de compensação consiste na busca, pela criança, de caminhos indiretos
que a ajudem na operação psicológica, quando os caminhos diretos não estão ao seu alcance;
porém, os caminhos indiretos são desenvolvidos pela humanidade num processo histórico e
cultural e só são utilizados quando o caminho direto apresenta algum impedimento, numa
situação em que uma resposta primitiva não tenha conseguido corresponder de forma suficiente.
(Vigotski, 2011).
Ao explicar esse mecanismo de compensação em pessoas com algum comprometimento
físico e/ou mental, Barroco (2007) discorre sobre a importância de
[...] levar a pessoa sob tal condição a criar e/ou dominar via colaterais de
desenvolvimento; substituindo, sempre que necessário, meios de apreensão
do mundo externo e de externalização das suas elaborações internas. Pode-se
valer de esquemas que lhe são ensinados ou que são desenvolvidos por ela,
empregados ou não por demais pessoas em condições semelhantes. As vias
colaterais substituem os caminhos compartilhados pelos indivíduos comuns.
Ela pode desenvolver uma supercompensação, o que confirma que não há um
limite para o desenvolvimento humano (p. 374).
70
Assim, recuperando Vygotski (1997), verifica-se que a falta de uma função orgânica
impulsiona novas formações. Isso significa que a personalidade reage ao defeito, substituindo
e nivelando as funções psicológicas. É essa peculiaridade da criança deficiente que caracteriza
a compensação. Com isso, concebe-se um desenvolvimento diferenciado, inédito, particular, o
qual será determinado pelo meio social, que coloca os limites às particularidades orgânicas e
no qual ocorre o processo de desenvolvimento. Explica o autor russo:
O mais importante é que, junto com o defeito orgânico estão dadas as forças,
as tendências, as aspirações a superá-lo ou nivelá-lo. E essas tendências para
o desenvolvimento elevado são as que não advertiu a defectologia anterior.
Ainda que, precisamente, elas são as que outorgam peculiaridade ao
desenvolvimento da criança deficiente, são as que criam formas de
desenvolvimento criativas, infinitamente diversas, às vezes profundamente
raras, iguais ou semelhantes às que observamos no desenvolvimento típico de
uma criança normal (p.16).
Conforme Costa (2006), ao acreditar na capacidade do organismo de sobrepujar suas
limitações, Vygotsky deixa transparecer uma ideia de plasticidade relacionada à habilidade do
homem de construir meios adaptativos que lhe possibilitem transpor suas dificuldades. Isso só
acontecerá na relação entre fatores internos e externos que provocam o desenvolvimento, ou
seja, depende tanto do organismo quanto de fatores ambientais.
Na busca por meios alternativos, a pessoa com deficiência contará com recursos já
existentes desenvolvidos pela sociedade no decorrer da história e também criará seus próprios
mecanismos, incrementados pelas suas experiências pessoais e nas relações com os outros.
Vygotski (1997) admite que o processo de compensação não seja tão simples, os
obstáculos se intercalam com as vitórias e diante dessa interpolação é importante compreender
que no processo de desenvolvimento da criança com deficiência será necessário reorganizar as
funções adaptativas, buscando outros meios que substituam, equiparem e superem o que foi
produzido pelo defeito, traçando um novo trajeto para o desenvolvimento, um outro caminho.
Outro aspecto social relevante para o desenvolvimento da pessoa com deficiência está
associado à orientação social da compensação relacionada à adaptação e às condições do meio
social em que ela está inserida. Explica Vygotski (1997, p. 19):
71
Se o desenvolvimento de uma criança deficiente não vai representar
exigências sociais (objetivos), se esses processos forem entregues ao domínio
das leis biológicas, se a criança anormal não se vê diante da necessidade de
converter-se em uma unidade social determinada, em um tipo social de
personalidade, então seu desenvolvimento conduziria à criação de uma nova
espécie de homens.
De acordo com Vygotski (1997), um defeito não vai determinar a vida da criança
deficiente, mas irá gerar consequências sociais, e, assim, a compensação deverá atenuar as
dificuldades criadas por esse defeito. Dessa forma, são as consequências sociais da deficiência
que devem ser consideradas no desenvolvimento e educação da criança deficiente. Segundo
Barroco (2007), a deficiência altera as relações da criança com as pessoas e o mundo, e,
dependendo da época e da cultura em que ela esteja inserida, poderá haver mudanças no modo
de compreendê-la e de atendê-la. Assim, “[...] com Vigotski, fica explícito que o problema do
não desenvolvimento não se deve ao tipo de deficiência e ao grau de comprometimento
provocado; antes disto, ele se apresenta ante aos limites que as classes sociais delimitam aos
homens” (p. 371).
À vista disso, podemos encontrar crianças com mesmo diagnóstico clínico e com
desenvolvimento totalmente diferente, o que revela o quanto as relações que são estabelecidas
socialmente são determinantes nesse processo. A maneira como a deficiência é considerada
pelos que fazem parte de seu contexto social será fundamental na definição de suas
possibilidades.
Vygotski (1997) sublinha que a organização da cultura humana estruturou-se tendo
como referência o tipo biológico humano normal, e, assim, tudo o que se faz necessário para
sua adaptação, ferramentas e instituições, estão adequadas para esse tipo de homem. Com base
nesse pressuposto, presume-se que todos tenham o mesmo aparato biológico e que o acesso da
criança em uma sociedade vai depender do que dela é esperado em termos de desenvolvimento
orgânico gradual. Diante dessa configuração, a criança que apresente algum desvio do que é
esperado biologicamente e necessite de uma estruturação diferenciada de seu desenvolvimento,
também enfrentará dificuldades em inserir-se na cultura, pelo fato de esta não estar organizada
para tal defeito, e sua inserção não será direta e imediata. Não obstante, o autor ressalta que,
“[...] na medida em que o desenvolvimento orgânico realiza-se por meio do cultural, vai se
transformando em um processo biológico historicamente condicionado” (p.26).
72
De acordo com Vygotsky & Luria (1996), o indivíduo que se vê diante de um defeito
buscará criar uma estrutura psicológica para compensá-lo, e nesse contexto, a persistência, o
exercício e o uso cultural da função deficiente ou de outras funções substitutas serão uma
constância no processo de compensação. O que se destaca nisso é a reorganização mental, que
leva ao máximo da compensação, persistindo e exercitando tudo o que pode desenvolver o
defeito. Como expõe Vygotski (1997, p. 75),
O toque excepcional no cego e a visão no surdo explicam-se totalmente pelas
condições especiais em que estes órgãos são geralmente colocados. Em outras
palavras, as causas desta não são constitucionais ou orgânica, que consistem
na particularidade da estrutura de órgãos ou de suas vias nervosas, mas
funcional, apareceu como resultado do uso prolongado deste organismo para
outros fins que não os tipicamente as pessoas normais têm.
O fato de uma pessoa apresentar uma deficiência não significa que ela não seja eficiente,
pois o que vai determinar a sua condição será a compensação social do defeito, no desfecho da
formação de sua personalidade. Pelo processo de compensação das funções, o defeito pode
desenvolver novas capacidades, aspirações e talentos16 (Vygotski, 1997). Logo, o que se
observa é que determinada função, diante de um defeito congênito específico, acaba por
desenvolver um novo papel, criando novos recursos para compensar o que era visto como
incapacidade (Vygotsky & Luria, 1996).
Com base no exposto, entende-se que o desenvolvimento cultural da criança com
deficiência será definido a partir de alguns fatores essenciais, que estão relacionados à forma
com que ela fará uso de suas funções psicológicas, ao nível de primitivismo de sua psique e às
ferramentas psicoculturais com que ela se equipou. Assim, o paradoxo entre a estrutura
psicológica e a estrutura das formas culturais é que vai determinar o desenvolvimento cultural
da pessoa com deficiência (Vygotski, 1997). “O desenvolvimento cultural é a principal esfera
em que é possível compensar a deficiência. Onde não é possível avançar no desenvolvimento
orgânico, abre-se um caminho sem limites para o desenvolvimento cultural” (Vigotski, 2011,
p. 869).
A concepção de deficiência, conforme Rossato (2010), não pode estar desvinculada dos
recursos disponíveis para a sua compensação ou para a diminuição do seu efeito. A deficiência
16Aptidão natural ou adquirida; engenho, disposição, habilidade. (Ferreira, 2010).
73
não pode ser considerada estática, mas algo suscetível de transformação. Sendo assim, “[...] é
por meio das relações e mediações proporcionadas que o indivíduo constrói a sua singularidade,
forma e transforma seu psiquismo, o que lhe possibilita compreender a realidade em sua
complexidade e desenvolver-se” (p.203).
Dessa forma, no desenvolvimento das atividades escolares de pessoas com deficiência,
a mediação será equipada de recursos diferenciados que possibilitem o acesso ao conhecimento
científico, e, para isso, o professor deverá utilizar-se de recursos, métodos e técnicas específicas.
Nesse sentido, a educação tem um papel fundamental “[...] no desenvolvimento das
funções psicológicas superiores, haja vista que estas se desenvolvem na coletividade, na relação
com os outros homens, por meio da utilização de instrumentos e signos” (Facci, 2008, p.226).
A escola é responsável também por possibilitar à pessoa com ou sem deficiência o
conhecimento científico.
Destarte, a educação deve promover a todos a aprendizagem dos mesmos conteúdos
científicos, com o auxílio da mediação realizada por meio da linguagem (verbal, escrita e/ou
sinalizada) e da utilização de instrumentos (Braille, Soroban, entre outros) pertinentes à
sociedade em que essa pessoa esteja inserida. Barroco (2007) reafirma que vivências
qualitativas com conceitos científicos possibilitam à pessoa com deficiência o desenvolvimento
de
[...] formas psicológicas sofisticadas de interagir com o mundo; mais livre
pode se tornar da realidade objetiva imediata, permitindo-lhe realizar
análises, sínteses e generalizações, bem como governar conscientemente sua
conduta (p. 374).
Com isso, o acesso aos conhecimentos científicos podem ampliar a forma desses
estudantes de conhecer e interagir em seu contexto social e, consequentemente, provocar o
acesso ao desenvolvimento.
De acordo com Facci (2008), o processo educativo se dá pela mediação do professor,
que tem como função primordial promover a humanização do aluno por meio da apropriação
de conhecimentos científicos, produzidos historicamente; porém, esse conhecimento não pode
ser compreendido como finalizado, mas como passível de transformação, diante do fato de a
produção humana poder ser superada. Em síntese, na prática, o professor precisa acreditar nas
potencialidades do aluno, oferendo os recursos necessários para a promoção do seu
desenvolvimento.
74
Entretanto, para que o processo educativo de fato aconteça, de acordo com Pagni (2015,)
faz-se necessário uma mudança no olhar sobre esse outro “[...] para sua deficiência e para sua
diferença, no sentido de aceitá-la como é: uma diferença que se repete, mas não é igual em cada
ser que se manifesta” (p.99). Para isso, é preciso uma prática educativa que promova o
acolhimento e potencialize a singularização ética representada pela deficiência, favorecendo às
pessoas com deficiência a formação de seu modo de ser e de expressar-se diante do mundo,
possibilitando novos modos de existência, que possam transformá-lo.
Assim, é importante que não se veja a pessoa com deficiência apenas pela sua limitação,
mas que se tenha a compreensão de que ela tem uma vida psíquica normal além da enfermidade,
sabendo que, devido a condições sociais anormais, ela desenvolverá particularidades diferentes
das de crianças normais (Vygotski, 1997).
Essa forma de compreender a deficiência apresentada pela Teoria Histórico-Cultural é
bastante difundida entre os profissionais que trabalham com pessoas com deficiência, mas,
mesmo diante desse embasamento teórico, na prática, ainda encontramos posicionamentos
fundamentados na visão biológica. Isso fica evidente quando nos deparamos com profissionais
surpresos diante do desenvolvimento de uma criança cujo prognóstico clínico não era favorável.
Por outro lado, possibilita-nos reafirmar o quanto as mediações realizadas no contexto social
descerram amarras impostas pelo fator biológico.
O mecanismo de compensação da deficiência, associado às mediações realizadas
principalmente durante a sua trajetória escolar, tem conduzido estudantes com deficiência até
o Ensino Superior. O que, por sua vez, reforça o pressuposto de que não existem limites para o
desenvolvimento, desde que o contexto social ofereça aos estudantes as condições necessárias
para compensar o que lhe é posto pela deficiência.
A sociedade, ao longo da história, vem criando instrumentos e signos que possibilitam
cada vez mais atender à diversidade humana. Gradativamente, as pessoas com deficiência têm
apresentado suas necessidades e cobrado mudanças que possibilitem seu desenvolvimento.
Todavia, sabemos que a realidade ainda está muito distante do que seria ideal, a saber, que
todos, apresentando ou não uma deficiência, tivessem oportunidade de aprimorar aprendizagens
que possibilitem o desenvolvimento com fins de emancipação humana.
Por fim, as considerações teóricas discutidas até o momento estarão permeando as
discussões que serão realizadas na próxima seção, na qual serão apresentados os resultados da
Pesquisa Empírica: Acessibilidade no Ensino Superior na Perspectiva de Estudantes com
Deficiência.
75
4 PESQUISA EMPÍRICA: ACESSIBILIDADE NO ENSINO SUPERIOR NA
PERSPECTIVA DE ESTUDANTES COM DEFICIÊNCIA
Esta pesquisa empírica buscou delinear como acadêmicos com deficiência matriculados
na Universidade Estadual de Maringá compreendem a acessibilidade ao Ensino Superior, além
de suas percepções sobre como esse processo vem sendo implantado. As análises realizadas
tiveram como embasamento teórico a Psicologia Histórico-Cultural, cuja matriz se insere numa
concepção marxista: o método do Materialismo Histórico-Dialético.
O Materialismo Histórico-Dialético é um método de investigação dos fenômenos que
tem como referência a história da sociedade, pensando nas contradições da realidade e as
compreendendo como a base dos processos de mudanças (Stalin, 1945). Segundo o autor, esse
método apresenta alguns traços fundamentais. O primeiro é que, para se compreender qualquer
fenômeno da natureza, devem-se considerar as condições em que ele está envolvido, não
podendo ser tomado isoladamente; e o segundo é que os fenômenos estão em constantes
transformação e movimento, e que esse processo de desenvolvimento e renovação desencadeia
o desaparecimento de outros. Dentro do antigo já está a construção do novo, que em
determinado momento supera o primeiro (Stalin, 1945).
Segundo Stalin (1945), outro traço fundamental refere-se às mudanças qualitativas, que
“[...] são resultado da acumulação de mudanças quantitativas insensíveis e graduais” (p.18); ou
seja, as mudanças ocorrem lentamente, mas determinam grandes mudanças. O tempo todo estão
ocorrendo mudanças quantitativas, que em dado momento transformam-se em qualitativas.
Com isso, o método dialético compreende o desenvolvimento como um movimento progressivo
do quantitativo ao qualitativo, do simples ao complexo.
Pode-se então ver que a universidade faz parte desse processo de transformação da
sociedade, visto que seu objetivo principal, segundo Cury (2004), é transmitir, por meio do
76
ensino, o conhecimento acumulado pela humanidade, incorporando o que vem sendo revelado
de novo na pesquisa, e, assim, formar profissionais aptos para atuar na sociedade. A partir da
compreensão da acessibilidade nesse nível de ensino, podem-se desvelar mudanças ocorridas
na sociedade no que se refere à educação e à inclusão de pessoas com deficiência e/ou
mobilidade reduzida em todos os níveis de ensino. Chauí (2001, p.35) acrescenta que “[...] a
universidade é uma instituição social. Isso significa que ela realiza e exprime de modo
determinado a sociedade de que faz parte. Não é uma realidade separada e sim uma expressão
historicamente determinada de uma sociedade determinada”.
Paulo Netto (2011) explica que, para Marx, o “ser social” resulta do trabalho e que por
isso não se constitui de uma forma estática, mas a partir de movimentos ativados por
contradições internas e externas, num processo de mudança constante. A sociedade, para Marx
(citado por Paulo Netto, 2011), é “O produto da ação recíproca dos homens. [...] O simples fato
de cada geração posterior deparar-se com forças produtivas adquiridas pela geração precedente
[...] cria na história dos homens uma conexão, cria uma história da humanidade [...]. As suas
(dos homens) relações materiais formam a base de todas as suas relações” (p.33).
Esse princípio fundamental do método do Materialismo Histórico foi bastante enfatizado
nas obras de Vigotsky, nas quais o autor defende que a Psicologia deve compreender o
comportamento do homem como vinculado à sociedade na qual ele está inserido, destacando a
importância do meio histórico-cultural na construção do comportamento e pensamento do
homem. Também defende que as mudanças ocorridas na sociedade causam transformações nas
relações, rompendo, assim, com a ideia de que a natureza humana é passiva (Tuleski, 2008).
Por sua vez, Paulo Netto (2011) enfatiza que, para Marx, o objetivo do pesquisador é
buscar a essência do objeto, compreendendo sua estrutura e sua dinâmica; ou seja, o
pesquisador, utilizando-se de procedimentos analíticos e efetuando a síntese, reproduz, no plano
do pensamento, a essência do objeto, apreendendo-o como um processo. O autor ressalta, então,
que, na investigação, o sujeito “[...] tem de apoderar-se da matéria, em seus pormenores, de
analisar suas diferentes formas de desenvolvimento e de perquirir a conexão que há entre elas”
(Marx, citado por Paulo Netto, 2011, p.25). O estudioso ainda adverte que os instrumentos a
serem utilizados na pesquisa, como a observação, a entrevista e outros, são apenas recursos que
podem ser bem utilizados e devem ser bem compreendidos, mas que não se constituem em um
método.
O instrumento escolhido para agregar as informações referentes à acessibilidade de
pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida à Universidade Estadual de Maringá foi a
entrevista semiestruturada. Esta, segundo Trivinõs (1987), não só oferece condições de
77
descrição dos fenômenos sociais, mas também auxilia na compreensão e explicação da
totalidade desses fenômenos. De acordo com o autor, esse instrumento “[...] valoriza a presença
do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a
liberdade, e a espontaneidade necessária, enriquecendo a investigação” (p.146).
As informações alcançadas com entrevistas foram tratadas por meio de estratégias de
organização que podem ser contempladas no método de análise do conteúdo, que, segundo
Bardin (2011), consiste em “ [...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando
obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens,
indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às
condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (p.47).
Conforme Bardin (2011), tal técnica estrutura-se em três fases: pré-análise, exploração
do material e tratamento dos resultados (a inferência e interpretação). Na fase da pré-análise,
realizou-se a organização do material a ser analisado, sendo elaborandas as hipóteses que
nortearam as outras fases. Já na exploração do material, foram delimitados elementos de
codificação (codificação, classificação e categorização), e posteriormente procedeu-se ao
tratamento dos resultados, buscando-se transpor o conteúdo manifesto, com atenção ao que
estava latente. Para o autor, no momento da interpretação dos resultados é fundamental voltar-
se para a teoria que embasa o estudo, pois é ela que lhe dará significado.
Um aspecto fundamental na escolha de teoria foram os estudos realizados por Vigotski
sobre a defectologia, que contribuíram muito para a compreensão da pessoa com deficiência.
Muitas vezes, a deficiência é compreendida como uma dificuldade centrada no indivíduo, mas,
na perspectiva da Psicologia Histórico-Cultural, percebe-se que as aquisições do indivíduo se
dão num processo de apropriação e transformação do conhecimento na relação do homem com
outros homens. O desenvolvimento de conceitos científicos ocorre por meio de um processo
educacional, numa relação sistematizada entre o professor e o aluno, ou seja, numa relação
mediada (Vygotski, 2009).
4.1 Caracterização da instituição estudada
Para dar início às atividades referentes à pesquisa, realizou-se uma visita até a Reitoria
da Universidade Estadual de Maringá (UEM), com o intuito de solicitar ao Magnífico Reitor
78
autorização para realizar o estudo. Após a análise do projeto, o Senhor Reitor assinou um
documento de anuência (Apêndice A). O projeto foi, então, encaminhado para o Comitê
Permanente de Ética em Pesquisas envolvendo Seres Humanos/ UEM, do qual obteve parecer
favorável para a pesquisa.
Para maior compreensão de como essa Universidade vem se organizando ao longo dos
anos no quesito acessibilidade de pessoas com deficiência, foi feito um levantamento de
informações referentes ao tema em documentos oficiais e em outras pesquisas já ali realizadas.
A Universidade Estadual de Maringá iniciou suas atividades no ano de 1969, com a Lei
n.º 6.034, que autorizou seu funcionamento. Sua efetivação não foi diferente das demais
universidades criadas na época, ou seja, no ato de sua fundação foram associados três
estabelecimentos estaduais que já atendiam à demanda do Ensino Superior na cidade de
Maringá: a Faculdade Estadual de Ciências Econômicas (1.959), a Faculdade Estadual de
Direito (1.966) e a Fundação Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (1.966). Eis o histórico:
Pelo Decreto Estadual n.º 18.109 de 28/01/70 foi criada, sob a forma de
fundação de direito público, a Fundação Universidade Estadual de Maringá
(FUEM), sendo reconhecida em 11/05/76, pelo Governo Federal (Decreto n.º
77.583) e tornou-se autarquia pela Lei Estadual n.º 9.663 de 16/07/91,
mantendo a mesma denominação. A partir de 1999, foi implantada, em caráter
experimental, a autonomia da Universidade, conforme Termo de Autonomia,
assinado em 18 de março de 1999 (UEM, 2015b).
A UEM foi reconhecida pelo Governo Federal no ano de 1976, com o Decreto Federal
n.º 77.583. Nessa época, foi implantada uma nova organização dos cursos, que foram agregados
em departamentos coordenados por centros. Dessa forma, os departamentos passaram a ter
responsabilidades administrativas, e os colegiados dos cursos coordenavam questões didático-
pedagógicas. Os fomentos centrais dessa universidade, nesse momento, eram ensino, pesquisa,
extensão, cultura e as atividades administrativas (UEM, 2015b).
A expansão regional iniciou-se no ano de 1986, com a criação e implantação da
Extensão no município de Cianorte; em 1991, foi criado o Campus de Goioerê e, em seguida,
Campus nas cidades de Porto Rico, Cidade Gaúcha, Diamante do Norte e Umuarama. Hoje, a
instituição oferece, no total, 52 cursos de graduação, 93 de especialização, 43 de mestrado e 25
de doutorado (UEM, 2015b).
79
No tocante à acessibilidade, ao longo dos anos, essa universidade vem buscando
adequar-se ao que é requerido pelas políticas públicas de inclusão da pessoa com deficiência.
De acordo com Simionato (2012), desde 1994 a UEM possui um Programa Interdisciplinar de
Pesquisa e Apoio à Excepcionalidade (PROPAE), que tem como “[...] objetivos de diagnosticar,
avaliar e dar atendimento específico à excepcionalidade e desenvolver apoio pedagógico,
tecnologias e metodologias adequadas” (p.304). E, para cumprir esses propósitos, deverá:
I – pesquisar metodologias de diagnóstico, avaliação e atendimento
específicos às diversas formas de excepcionalidade; II – desenvolver
tecnologias e metodologias apropriadas ao atendimento do excepcional; III –
promover ações de prevenção de deficiências; IV – detectar precocemente as
excepcionalidades; V – atender à pessoa portadora de excepcionalidade e seus
familiares, num enfoque transdisciplinar; VI – apoiar as instituições que
realizam ações de habilitação e/ou reabilitação; VII – promover a capacitação
de docentes e técnicos da UEM, vinculados ao PROPAE, dentro da área de
atuação do Programa; VIII – capacitar recursos humanos para o
desenvolvimento de atividades específicas do Programa; IX – promover
cursos e eventos para capacitação de pessoal técnico especializado; X –
sensibilizar a comunidade sobre as questões da deficiência, prevenção e
integração social; XI – promover a integração dos diversos órgãos da UEM,
Prefeitura do Município de Maringá setores do Governo Estadual e/ou
instituições afins; XII – viabilizar, em conjunto com os órgãos competentes
da UEM, projetos visando à capacitação de recursos (UEM, 1994).
O trabalho do PROPAE é desenvolvido por participantes de diversas áreas, como
Direito, Educação, Educação Física, Física, Genética, Matemática e Psicologia. Esse Programa
também mantém intercâmbio com outras entidades que atendem pessoas com deficiência, tendo
sido instituído pela Portaria n.º 1.533/94-GRE (Apêndice B) vinculado ao Centro de Ciências
Humanas, Letras e Artes (CCH). No início, o propósito era agregar docentes, técnicos e
acadêmicos da UEM, além da comunidade externa, em projetos de pesquisa e extensão
referentes às deficiências (auditiva, visual, física e intelectual), e suas atividades eram
direcionadas a comunidade externa. Com o tempo e a necessidade, foi direcionando seu
trabalho principalmente para o apoio a acadêmicos com deficiência; como pode ser verificado
em seu regulamento (Apêndice C).
80
Entre as ações internas desenvolvidas pelo PROPAE, destaca-se sua influência na
elaboração da Resolução n.º 032-CEP (Conselho de Ensino e Pesquisa) de 16 de abril de 1997,
que legitimou as normas dos procedimentos de adaptação das provas do concurso vestibular da
UEM para pessoas com necessidades educativas especiais (PNEs). Essa resolução foi elaborada
a partir do Ofício-Circular n.º 277/96/MEC/GM e contemplou os vestibulandos portadores de
deficiência visual, física, auditiva e múltipla, aos quais foram asseguradas as seguintes
condições específicas: I. formas especiais de apresentação das questões conforme o tipo de
deficiência; II. ampliação do tempo determinado para realização das provas; III. salas especiais
e forma adequada de obtenção de respostas pelo vestibulando, de acordo com o tipo de
deficiência (UEM, 1997).
A Resolução também estabelece que os candidatos deverão apresentar laudos médicos
ou pareceres de profissionais especializados, os quais serão analisados por um profissional da
área da Educação Especial indicado pelo PROPAE. A solicitação para esses procedimentos
especiais deve ser feita até 15 dias após o término das inscrições. Assim, foram implantadas
tais mudanças para o Concurso Vestibular de 1998 (UEM, 1997).
Com essa Resolução, ficou garantido o acesso dos alunos com deficiência à UEM,
porém a sua permanência só foi definida pela Resolução n.º 015/2000-CEP. Esta, em seu artigo
1º, define como alunos com necessidades educativas especiais os que apresentam deficiências
físicas, visuais, auditivas e/ou múltiplas de natureza temporária ou permanente. Para atendê-
los, fica definido que “[...] a Universidade Estadual de Maringá deverá dispor de instalações,
equipamentos, materiais e profissionais que garantam a estes acadêmicos o acompanhamento
das atividades didático-pedagógicas dos seus respectivos cursos” (UEM, 2000).
Nessa resolução, o PROPAE passa a ter novamente uma participação importante, pois,
para atender às necessidades específicas desses estudantes, o programa terá que fazer a inter-
relação entre os colegiados dos cursos e profissionais da Educação Especial, visando encontrar
os recursos mais adequados para o desenvolvimento de suas atividades acadêmicas (UEM,
2000). Segundo o histórico do PROPAE, as atividades de apoio proporcionadas aos acadêmicos
são: digitalização de livros, apostilas e provas para serem impressas em Braille e
disponibilização de equipamentos.
Tais condições de apoio a esses acadêmicos foram implementadas ao longo dos anos
por meio das políticas públicas referentes à acessibilidade de pessoas com deficiências (Lei n.º
7.735/89; Decreto n.º 3298/1999; Portaria n.º 1.679/1999 – MEC). No ano de 2001, foi baixada
a Resolução n.º 098 do CAD (Conselho de Administração Competências · Conselheiros), que
celebrou o Termo de Compromisso entre a UEM e a Secretaria de Educação Superior
81
(SESu)/MEC. No documento, a UEM comprometeu-se a dar condições de mobilidade e a
oferecer os equipamentos e instalações necessários para acadêmicos com necessidades
educativas especiais, que são requisitos para avaliação, autorização, reconhecimento,
credenciamento e renovação de seus cursos (UEM, 2001).
Buscando adequar a UEM às condições descritas nesse termo, no ano de 2002, foram
destinadas cinco bolsas de monitoria especial para atender estudantes com deficiência, a partir
da Resolução n.º 632/2002 – CAD. Sendo que, no ano de 2003, o trabalho foi estruturado, por
meio da Resolução n.º 058 da CEP. Em seu artigo 1º, essa resolução estabelece que o Programa
de Monitoria Especial deverá atender às PNEs da Universidade Estadual de Maringá e que a
monitoria especial será realizada por outro acadêmico regularmente matriculado no mesmo
curso do acadêmico PNE, tendo como funções:
I - auxiliar o acadêmico PNE no processo ensino-aprendizagem dos
componentes curriculares cursados pelo mesmo; II - propiciar ao acadêmico
PNE condições para realização das verificações de aprendizagem, de acordo
com orientação do docente responsável por ministrar o componente
curricular; III - planejar e programar as atividades de monitoria, juntamente
com o acadêmico PNE e os docentes que ministram os respectivos
componentes curriculares; IV - efetuar o controle de atendimento e atividades
desenvolvidas, visando à obtenção de subsídios para a elaboração do relatório
final da monitoria especial (UEM, 2003).
Esse monitor conta com um docente orientador que o auxilia no planejamento das
atividades de acompanhamento do acadêmico PNE, na escolha da metodologia mais adequada
para o atendimento e na organização do cronograma de trabalho, como também orienta o
monitor quanto às necessidades e soluções para o desenvolvimento do processo ensino-
aprendizagem do acadêmico PNE dentro do curso no qual está inserido (UEM, 2003). Tal
trabalho é coordenado pelo PROPAE.
Segundo a Assessoria de Comunicação Social (ASC) da UEM, no ano de 2006, essa
IES inaugurou, em suas dependências, o primeiro Telecentro Paranavegar, para pessoas com
deficiência do interior do Estado do Paraná. Foi firmado um convênio com a Secretaria de
Estado de Assuntos Estratégicos do Paraná (SEEA) e a Companhia de Tecnologia da
Informação e Comunicação do Paraná (CELEPAR) - Informática. Esta forneceu computadores
com sintetizadores de voz para o uso de deficientes visuais, como também treinou profissionais
82
e acadêmicos da educação para utilizarem o Programa DOS-VOX. Esse trabalho está sendo
desenvolvido pelo PROPAE, e hoje tem característica de Telecentro Temático, em que são
atendidas pessoas com necessidades educativas especiais tanto da comunidade interna da UEM
quanto da externa, favorecendo sua inclusão digital.
No ano de 2008, as normas para o concurso vestibular estabelecidas na Resolução n.º
032/1997- CEP foram revogadas pela Resolução n.º 008 do CEP. A análise dos pedidos de
provas especiais continuou a ser feita pela Comissão do Vestibular Unificado (CVU) e pelo
PROPAE; no entanto, foram especificadas as formas de realização das provas de acordo com
cada deficiência, como segue:
I - Deficiência Visual: utilização de textos ampliados, lupas ou outros
recursos ópticos especiais para as pessoas com visão subnormal ou reduzida.
Utilização de recursos e equipamentos específicos para cegos: provas
gravadas e/ou em Braille, sorobã, máquina de datilografia comum ou
Perkins/Braille, gráficos e tabelas em relevo, microcomputador ou outras
formas especiais de apresentação das questões. Fiscal ledor. II - Deficiência
Física: adaptação de espaços físicos, mobiliários e equipamentos. Utilização
de provas gravadas e filmadas, computadores ou outros recursos. Fiscal
redator para transcrever as respostas para o candidato. III - Deficiência
Auditiva: Permissão para utilização de dicionário em Língua
Portuguesa e em Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Tradução das
instruções das provas (Língua Portuguesa para LIBRAS) por fiscais
intérpretes de LIBRAS. O intérprete terá a sua atuação filmada. IV
- Deficiência múltipla: combinação de procedimentos de acordo com as
deficiências associadas (UEM, 2008a).
Além disso, a CVU poderá conceder aos candidatos com deficiência tempo adicional de
até 50% do tempo normal das provas, de acordo com análise feita dos laudos médicos e
pareceres de profissionais especializados indicados pelo PROPAE. Outro aspecto considerado
é a avaliação diferenciada das provas de deficientes auditivos, principalmente quanto à
valorização do aspecto semântico nas estruturas frasais em detrimento da estruturação da
linguagem. Ficou, ainda, definido que o candidato deverá fazer a solicitação de adequações para
sua prova até 15 dias após o término das inscrições (UEM, 2008a).
83
Comparando informações da CVU e do Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA)
referentes ao ano de 2013, pode-se observar (Gráfico 1) uma diferença significativa entre o
número de candidatos com deficiência que realizam o vestibular e os que foram aprovados, ou
seja, dos vestibulandos que solicitaram o atendimento especial nesse ano, apenas 17,5% deles
foram aprovados. Isso revela que, mesmo sendo oferecidas as adaptações necessárias para a
realização das provas do vestibular, outro fator faz-se relevante nesse momento: a preparação
do candidato quanto aos conteúdos, ou seja, o embasamento advindo dos níveis de ensino que
antecedem o Ensino Superior.
Gráfico 1 – Comparativo entre o número de Candidatos que solicitaram o Atendimento Especial
no vestibular e o número de Aprovados
Fonte: CVU e DAA – UEM
Como pode ser observado no gráfico acima, o acesso de alunos com deficiência
intelectual nessa IES ainda não é uma realidade, visto que não houve procura para realização
do Concurso Vestibular por parte deles. A relevância desse fato pode ser verificada por meio
da Resolução n.º 008-CEP, 2008 – UEM, que discorre sobre as adaptações necessárias para
cada tipo de deficiência, na qual a deficiência intelectual nem é mencionada.
Novas mudanças no processo de acesso à Universidade Estadual de Maringá ocorreram
no ano de 2008, com a Resolução n.º 034/2008-CEP, que implantou o Processo de Avaliação
7
3
6
0
2
7
1
9
1
0
1
0 0
2
0
2
DeficiênciaAuditiva(Libras)
DeficiênciaAuditiva
(aparelhoauditivo)
DeficiênciaFísica
DeficiênciaIntelectual
DeficiênciaVisual(Total)
DeficiênciaVisual ( Sub-
normal)
Múltiplasdeficiências
Distúrbios(dislexia,
TDH)
Candidatos que solicitaram Atendimento Especial no Vestibular de Verão/2013 e os
que foram aprovados - UEM
Vestibulandos Aprovados
84
Seriada (PAS) como mais uma opção de ingresso. Esse processo de avaliação é destinado a
alunos do Ensino Médio de escolas públicas ou privadas. Para essa avaliação, os alunos
realizarão provas escritas ao final de cada série do Ensino Médio, e, conforme o resultado das
três provas, se dará a classificação, convocação e matrícula, de acordo com a classificação no
curso, turno e campus. No artigo n.º 12 da Resolução, encontram-se orientações para candidatos
com deficiência no sentido de que eles deverão esclarecer sua situação à CVU com até 60 dias
de antecedência. No Parágrafo único do artigo, fica explicitado que o atendimento especial
seguirá as exigências já regulamentadas, e que o candidato deverá preencher um requerimento
junto à CVU (UEM, 2008b).
Já no primeiro Manual do Processo de Avaliação Seriada - PAS-UEM/2009, verifica-se
um item especificamente dedicado a candidatos com deficiência. O atendimento especial é
descrito da seguinte forma:
Candidatos portadores de deficiência ou que necessitem de atendimento
especial para a realização das provas deverão apresentar pedido à Comissão
do Vestibular da UEM (CVU-UEM), indicando as respectivas necessidades.
O pedido é realizado por meio de requerimento (disponível em
www.pas.uem.br) que poderá ser entregue diretamente à CVU-UEM (bloco
28 do campus sede da UEM) ou encaminhado via Correios, no período de 28
de setembro a 16 de outubro de 2009, mediante a apresentação de laudo
médico. A análise do pedido será feita de acordo com as normas específicas
vigentes na UEM, sendo a decisão comunicada por escrito ao requerente.
Casos imprevistos (como acidentes e doenças), desde que solicitados até o dia
25 de novembro de 2009, terão os pedidos analisados e, após, avalia-se a
possibilidade de atendimento. A CVU-UEM comunicará ao requerente, via
telefone ou e-mail, o resultado da análise. (UEM, 2009, p.14).
Essas especificações são as mesmas exigidas pelo concurso vestibular da UEM,
descritas anteriormente. Nos anos seguintes, foram realizadas mudanças no regulamento do
PAS, porém, não houve nenhuma alteração quanto às orientações aos candidatos com
deficiência.
No ano de 2011, a UEM, por meio da Resolução n.º 70 – CAD, aprovou um Convênio
com a União, MEC e SESu (Convênio n.º 014/2010), no qual se comprometeu a adequar a
arquitetura do Campus Sede de forma a possibilitar a acessibilidade física, bem como a
85
proporcionar formação, sensibilização e capacitação de seus servidores sobre o tema
acessibilidade. (UEM, 2011).
Uma das resoluções mais recentes relacionadas às necessidade de alunos com
deficiência na UEM é a Resolução n.º 037/2014-CEP, que “Aprova Normas para Inscrição,
Seleção, Desenvolvimento e Avaliação do Programa de Monitoria Especial de Pós-Graduação
para a Universidade Estadual de Maringá” (UEM, 2014). A concessão de bolsas para essa
monitoria foi aprovada pela Resolução n.º 040/2015-CAD (UEM, 2015a).
Nesse contexto, verificamos que as políticas públicas referentes ao acesso e
permanência de acadêmicos com deficiência nessa IES vem ocorrendo em consonância com a
legislação federal pertinente, sendo estabelecidas algumas ações independentes dessa
legislação.
Diante dessa realidade, ressaltamos que o objetivo deste estudo é examinar como as
pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida matriculadas na UEM conceituam às
condições de acessibilidade dessa IES, e quais suas percepções sobre como esse processo vem
sendo implementado. Ou seja, se de fato o que tem sido organizado por meio dos documentos
oficiais está acontecendo na prática.
4.2 Participantes
A partir da aprovação do projeto de pesquisa pelo Comitê Permanente de Ética em
Pesquisa envolvendo Seres Humanos, foi solicitada ao Diretório de Assuntos Acadêmicos
(DAA) a lista dos alunos matriculados na UEM que no ato da matrícula declararam ter algum
tipo de deficiência e o especificaram.
O DAA atendeu prontamente a solicitação, enviando por e-mail uma lista contendo 321
acadêmicos da graduação com deficiência, dentre os quais 295 pertenciam ao Campus Sede e
26 aos demais Campi, no ano de 2014. Nessa lista, foi possível identificar cada acadêmico de
acordo com a deficiência e o curso que frequentavam. Para uma melhor visualização, reunimos
essas informações em quadros organizados por Centros Acadêmicos.
86
QUADRO 2 – Alunos com Deficiência matriculados no Centro de Ciências Sociais Aplicadas
- UEM
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
APLICADAS – UEM/2014
Cursos D. Visual
Parcial
D. Visual
Total
D.
Física
D.
Auditiv
a
Múltiplas
Deficiência
s
D.
Intelectu
al
Outras
Ciências Econômicas 7 2 2 2 0 0 2
Direito 15 0 2 0 0 0 1
Administração 11 2 5 2 0 0 3
Ciências Contábeis 10 0 3 1 0 0 1
Ciências Contábeis –
Cianorte
4 0 0 0 0 0 0
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) - UEM
QUADRO 3 – Alunos com deficiência matriculados no Centro de Ciências Exatas - UEM
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NO CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS –
UEM/2014
Cursos D. Visual
Parcial
D. Visual
Total
D.
Física
D.
Auditiv
a
Múltiplas
Deficiência
s
D.
Intelectu
al
Outras
Química 2 0 1 0 0 0 4
Matemática 3 0 0 0 0 0 1
Física 6 0 1 1 0 0 1
Estatística 1 0 1 0 0 0 1
Licenciatura Plena
em Ciências –
Goioerê
0 1 1 0 0 0 0
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) - UEM
QUADRO 4 – Alunos com deficiência matriculados no Centro de Ciências Humanas, Letras e
Artes – UEM
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NO CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES –
UEM/2014
87
Cursos D. Visual
Parcial
D. Visual
Total
D.
Física
D.
Auditiv
a
Múltiplas
Deficiência
s
D.
Intelectu
al
Outras
Letras 9 0 2 0 0 0 4
Geografia 4 1 0 1 0 0 4
História 3 1 2 0 1 0 1
Pedagogia 3 0 0 0 0 0 0
Psicologia 5 1 1 0 0 0 3
Ciências Sociais 2 0 0 0 0 0 1
Filosofia 3 0 0 0 0 0 1
Secretariado
Executivo Trilíngue
0 0 0 1 0 0 0
Música 3 0 0 0 0 0 0
Comunicação e
Multimeios
2 0 0 0 0 0 0
Artes Cênicas 4 0 1 0 0 0 0
Artes Visuais 1 0 0 0 0 0 0
Música PARFOR 0 0 0 0 1 0 0
História PARFOR 2 0 1 0 0 0 0
Pedagogia – Cianorte 1 0 0 1 0 0 0
História – Ivaiporã 2 0 0 0 0 0 1
Serviço Social –
Ivaiporã
0 0 1 0 0 0 0
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) - UEM
QUADRO 5 – Alunos com deficiência matriculados no Centro de Ciências da Saúde –UEM
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NO CENTRO DE CIÊNCIAS DE SAÚDE – UEM/2014
Cursos D. Visual
Parcial
D. Visual
Total
D.
Física
D.
Auditiv
a
Múltiplas
Deficiência
s
D.
Intelectu
al
Outras
Educação Física 4 0 3 0 0 0 2
Farmácia 2 0 1 0 0 0 0
Medicina 3 1 1 0 0 0 2
Odontologia 2 1 2 0 1 0 0
Enfermagem 3 0 0 0 0 0 0
Biomedicina 1 0 0 0 0 0 0
88
Educação Física –
Ivaiporã
2 0 0 1 0 0 0
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) - UEM
QUADRO 6 – Alunos com deficiência matriculados no Centro de Tecnologia – UEM
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NO CENTRO DE TECNOLOGIA – UEM/2014
Cursos D. Visual
Parcial
D. Visual
Total
D.
Física
D.
Auditiv
a
Múltiplas
Deficiência
s
D.
Intelectu
al
Outras
Engenharia Civil 6 2 3 0 0 0 1
Engenharia Química 6 0 3 2 0 0 1
Ciência da
Computação
1 1 0 0 0 0 0
Informática 4 1 2 0 0 0 1
Engenharia Mecânica 4 0 0 0 0 0 0
Engenharia de
Alimentos
2 0 0 0 0 0 0
Engenharia de
Produção
5 1 1 1 1 0 5
Arquitetura e
Urbanismo
1 0 3 0 0 0 4
Engenharia Elétrica 3 0 0 0 0 0 0
Design - Cianorte 1 0 1 0 1 0 2
Moda – Cianorte 0 0 0 0 0 0 1
Engenharia Têxtil –
Goioerê
2 0 1 0 0 0 0
Tecnologia em
Construção Civil –
Umuarama
2 0 0 0 0 0 1
Tecnologia em
Alimentos –
Umuarama
1 0 0 0 0 0 0
Engenharia Civil –
Umuarama
1 0 0 0 0 0 0
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) - UEM
89
QUADRO 7 – Alunos com deficiência matriculados no Centro de Ciências Biológicas –UEM
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NO CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS – UEM/2014
Cursos D. Visual
Parcial
D. Visual
Total
D.
Física
D.
Auditiv
a
Múltiplas
Deficiência
s
D.
Intelectu
al
Outras
Ciências Biológicas 2 0 2 1 0 0 0
Tecnologia em
Biotecnologia
0 0 0 1 0 0 1
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) - UEM
QUADRO 8 – Alunos com deficiência matriculados no Centro de Ciências Agrárias – UEM
ALUNOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NO CENTRO DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS – UEM/2014
Cursos D. Visual
Parcial
D. Visual
Total
D.
Física
D.
Auditiv
a
Múltiplas
Deficiência
s
D.
Intelectu
al
Outras
Zootecnia 1 0 0 1 0 0 2
Agronomia 3 0 2 1 0 0 1
Engenharia Agrícola –
Cidade Gaúcha
2 0 0 0 0 0 4
Agronomia –
Umuarama
1 1 0 1 0 0 0
Medicina Veterinária
– Umuarama
0 0 1 0 0 0 0
Engenharia
Ambiental –
Umuarama
2 0 0 1 0 0 0
Tecnologia em Meio
Ambiente –
Umuarama
2 0 0 0 0 0 0
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) - UEM
A partir dessas informações, identificou-se que 176 acadêmicos matriculados na UEM
têm deficiência visual parcial, 52 apresentam deficiência física, 16 têm deficiência visual total,
17 apresentam deficiência auditiva e 5 acadêmicos têm múltiplas deficiências. Os que
90
preencheram a matrícula no campo referente a outras (59), em sua maioria, apresentam
diagnóstico de distúrbios de aprendizagem e transtornos globais do desenvolvimento. Esses
dados podem ser visualizados no Gráfico 2.
Gráfico 2 - Acadêmicos que se autodeclararam como deficientes na UEM
Fonte: Diretório de Assuntos Acadêmicos (DAA) – UEM
Pôde-se observar, por meio desses dados, que o item deficiência visual parcial não fica
claro para o acadêmico, por não definir se esse item se refere àqueles que apresentam baixa
visão17, que é considerada uma deficiência visual, ou àqueles que apresentam ametropia18, que
não é considerada como deficiência.
Diante dessas informações, iniciamos o contato por e-mail com tais acadêmicos,
explicando os objetivos da pesquisa e solicitando que preenchessem uma ficha de identificação
(Apêndice D). Dos 321 e-mails enviados, sete alunos enviaram a ficha preenchida e quatro
retornaram o e-mail dizendo que não se encaixavam no público-alvo da pesquisa. Desses sete,
um apresentava ametropia, que não é foco deste estudo.
17“É a alteração da capacidade funcional da visão, decorrente de inúmeros fatores isolados ou associados, tais
como: baixa acuidade visual significativa, redução importante do campo visual, alterações corticais e/ou de
sensibilidade aos contrastes, que interferem ou que limitam o desempenho visual do indivíduo” (MEC, 2006). 18 Defeitos na visão decorrentes de focalização inadequada da luz que chega na retina, podendo ser corrigida pelo
uso de óculos.
6%
20%
66%
6%
2%
ACADÊMICOS COM DEFICIÊNCIA MATRICULADOS NA UEM EM 2014
DEFICIÊNCIA AUDITIVA
DEFICIÊNCIA FÍSICA
DEFICIÊNCIA VISUAL PARCIAL
DEFICIÊNCIA VISUAL TOTAL
MÚLTIPLAS DEFICIÊNCIAS
OUTRAS
91
A partir disso, retomamos o contato por e-mail com os acadêmicos que enviaram a ficha
de identificação convidando-os a participar de uma entrevista semiestruturada com o tema
acessibilidade. Para essa entrevista, foi elaborado um roteiro de doze perguntas relacionadas à
vida acadêmica do aluno e à acessibilidade na UEM (Apêndice E). Dos sete alunos, apenas três
retornaram concordando em participar.
As entrevistas foram marcadas e realizadas em local e horário escolhidos pelos
entrevistados, de acordo com sua disponibilidade. Cada participante recebeu na entrevista o
Termo de Consentimento Livre Esclarecido (Apêndice F), que foi lido e, depois de sanadas as
dúvidas, foi assinado pelo entrevistador e entrevistado. Para os alunos cegos, esse termo foi
enviado antecipadamente por e-mail para que, por meio do sistema operacional DOSVOX
(sistema de computação destinado a atender os deficientes visuais) pudessem cientificar-se do
conteúdo. No dia da entrevista, foi-lhes entregue o termo em Braille para ser assinado. Aqueles
que apresentavam baixa visão foram contatados antes para verificarem o tamanho da Fonte em
que deveria ser impresso o Termo. Não foi necessário intérprete de Libras, pois o acadêmico
surdo fazia uso de aparelho auditivo.
Com o consentimento dos entrevistados para a gravação da entrevista, iniciamos a
entrevista semiestruturada. Importante ressaltar que, sempre que necessário, foram esclarecidas
as dúvidas dos entrevistados acerca do conteúdo das perguntas. As entrevistas tiveram duração
média de 30 minutos, variando de acordo com o entrevistado. Essas gravações foram transcritas
e arquivadas em um computador para posterior análise.
Em razão do número reduzido de alunos que se apresentaram voluntariamente para
participar da pesquisa, entramos em contato com o PROPAE a fim de contatar aqueles que
participam desse programa na UEM. No contato, verificou-se que apenas oito alunos recebiam
algum tipo de atendimento e que apenas um deles já havia sido entrevistado. Ao entrarmos em
contato com esses alunos, dois se dispuseram a participar da pesquisa, sendo realizados os
mesmos procedimentos acima destacados.
A cooperação do PROPAE nessa etapa da pesquisa foi essencial, principalmente em
relação aos alunos cegos, pois foi feita a apresentação da pesquisadora, o que diminuiu a
insegurança deles diante de uma pessoa desconhecida. Também foi disponibilizado um espaço
especial para realização das entrevistas, o que facilitou a locomoção dos alunos, por ser um
local que eles já tinham o hábito de frequentar.
Diante disso, foram entrevistados cinco acadêmicos, aos quais daremos os nomes
fictícios de Pedro, Jonas, Carlos, Helena e Alice. Destes, dois são cegos, um é surdo, um tem
uma deficiência física e um tem baixa visão. A média de idade dos participantes é de 31,2 anos,
92
visto que o mais jovem tem 20 anos e o mais velho, 49 anos. As condições socioeconômicas
dos participantes variam de média à baixa renda. Quanto à formação escolar anterior, ou seja,
o Ensino Fundamental e Médio, apenas um dos participantes estudou em escola particular,
enquanto os demais frequentaram escolas públicas. Os cursos que frequentam na UEM são:
Educação Física, História, Ciências Contábeis, Ciências Econômicas e Administração. Três
dos entrevistados recebem apoio pedagógico no PROPAE.
4.3 Instrumentos utilizados
Na realização da pesquisa foram utilizados os seguintes instrumentos:
Documento de autorização do Magnífico Reitor da UEM, no qual ele permite a
realização da pesquisa nesta IES (Apêndice A).
Ficha de identificação dos alunos, enviada por e-mail a todos os alunos que no
ato da matrícula declararam-se com deficiência, na qual foram solicitadas
informações referentes aos seguintes dados: idade, sexo, curso, data de ingresso
na universidade, condições socioeconômicas, tipo de deficiência e eventual
recebimento de algum apoio pedagógico na UEM (Apêndice D).
Termo de consentimento livre e esclarecido, em que constam os objetivos da
pesquisa, esclarecimento sobre os procedimentos da entrevista e questões
referentes ao sigilo e confidencialidade das informações. O Termo foi entregue
impresso da maneira solicitada pelo participante (tamanho de fonte ou em
Braille) e assinado pelo acadêmico e pela pesquisadora em duas vias (Apêndice
F).
Roteiro de entrevista, que foi elaborado pela pesquisadora com o intuito de
alcançar os objetivos propostos pela pesquisa. Foram formuladas onze questões
abrangendo o tema acessibilidade (Apêndice E).
Gravador, utilizado durante as entrevistas com autorização do participante. O
conteúdo gravado foi transcrito e arquivado no computador.
93
4.4 Apresentação e discussão dos dados
Na sistematização dos conteúdos obtidos por meio das entrevistas realizadas com os
participantes, foi utilizado o método de análise do conteúdo que, segundo Bardin (2011),
consiste em uma técnica metodológica de análise das comunicações que compreende o que não
está aparente nos excertos das mensagens consideradas, para, dessa forma, ir além do que está
explicito, buscando significados e informações possíveis de serem verificadas. Ao utilizar essa
metodologia, primeiramente faz-se uma leitura flutuante do material, para em seguida delimitar
questões que poderão ser reunidas em temas ou categorias. Esses temas, por sua vez, serão
retirados “[...] do texto em unidades comparáveis de categorização para análise temática e de
modalidades de codificação para o registro de dados” (Bardin, 2011, p.100). Dessa maneira, a
categorização permite reunir elementos e conteúdos análogos, formando unidades de registro.
Nesse processo, o autor destaca que a análise deve sempre ser considerada em consonância com
a teoria que norteia o estudo, a qual é de fundamental importância para a interpretação dos
resultados da pesquisa.
Com o uso dessa metodologia, a pré-análise do material coletado por meio das
entrevistas – realizadas com acadêmicos com deficiência participantes deste estudo –
possibilitou classificar seu conteúdo em quatro eixos temáticos de discussão, a saber: Conceito
de Acessibilidade; Acessibilidade: da Educação Básica ao Ensino Superior; Condições de
Acessibilidade e Permanência na Universidade Estadual de Maringá; e Acessibilidade ao
Conhecimento Acadêmico. A escolha dos enunciados supracitados atende aos objetivos
propostos para esta pesquisa e foram organizados a partir do conjunto de informações
apresentadas pelos participantes, de acordo com a proximidade dos conteúdos expressos.
Todas as informações que serão discutidas e analisadas nos eixos temáticos terão como
subsídio interpretativo o embasamento teórico discutido nas seções 1, 2 e 3 desta dissertação.
Sendo esses eixos pautados nas questões propostas aos participantes, esclarecemos que serão
utilizados excertos das respostas que foram transcritas, respeitando-se o conteúdo e a forma
com que foram apresentadas. Ressalta-se que um mesmo trecho poderá aparecer em mais de
um eixo, dependendo da problemática analisada.
4.4.1 Conceito de Acessibilidade
94
Para desenvolver esse eixo temático, uma pergunta especifica permeou a discussão
sobre o conceito de acessibilidade. No transcorrer das entrevistas, os participantes não
apresentaram dificuldades em falar sobre a acessibilidade, mas diante da necessidade de
conceituar o termo, houve certa hesitação. Isso pode ser observado em trechos como:
“Acessibilidade? Vamos pensar um pouco” (Jonas). “Acho que é...” (Alice). “Acessibilidade
para mim?” (Carlos) - demonstrando dificuldades na conceituação de algo que faz parte do seu
cotidiano. As pessoas com deficiência convivem regularmente com situações que os remetem
a condições disponíveis ou não de acessibilidade; estas, por sua vez, despertam os mais
diferentes sentimentos, como raiva, indignação, reflexão, necessidade de pleitear mudanças,
entre outros. Dessarte, ao deparar-se com a necessidade de conceituar a acessibilidade, cada
participante resgata em sua história subsídios para definir o tema.
. Sobre esse aspecto, Facci (2004, p.212) contribui ao afirmar que “[...] os conceitos
envolvem um sistema de relações e generalizações contido nas palavras e determinado por um
processo histórico. O contexto cultural no qual o indivíduo se desenvolve vai fornecer-lhe os
significados das palavras do grupo em que está inserido. Todo conceito é uma generalização”.
Diante dessa consideração, pode-se entender que a dificuldade inicial desses participantes em
conceituar acessibilidade talvez esteja relacionada ao fato de eles conviverem com a deficiência
desde a adolescência e ainda estarem reorganizando sua forma de perceber o ambiente, e de
definir o significado que essa palavra assume no novo contexto em que está inserido. Essa
estranheza em relação ao significado da palavra pode estar relacionada ao fato de ela só
recentemente ter começado a efetivamente fazer parte de seu cotidiano, podendo-se considerar
que ainda se encontra numa fase de construção do conceito, que foi denominada por Vygotski
(2001, p.70) como pseudoconceito, em que “[...] um complexo já traz em si a semente em
germinação de um conceito”. Essa dificuldade de conceituação também pode estar relacionada
com a ausência da prática de definir e conceituar elementos na cotidianidade.
Dando continuidade à tentativa de definição, o que se pode observar é que alguns dos
participantes buscaram organizar a sua resposta partindo da utilização da palavra acesso de
forma vaga, o que é verificado nas falas: “Acessibilidade para mim é algo onde eu posso ter
acesso, né... é algo que onde eu posso conseguir acessar, né...” (Carlos), “Acho que é, ter ali,
acesso às coisas que outras pessoas têm também, né...” (Alice). O participante Jonas também
utilizou o termo, mas especificou o significado, que para ele, é “[...] dar oportunidade para
todas as pessoas é [...] que têm graus variados de dificuldades, terem assim acesso, terem as
mesmas oportunidades que as pessoas que não têm essas dificuldades”.
95
A partir da análise desses excertos, fica evidente a dificuldade desses participantes na
elaboração do conceito. Entretanto, é importante ressaltar que essa dificuldade é comum tanto
em pessoas com deficiência quanto naquelas sem deficiência, pois está relacionada a questões
que envolvem o nível cultural e a qualidade da formação educacional, seja na rede pública ou
privada. O que ficou evidente foram as tentativas de reunir elementos, principalmente de sua
vivência pessoal, partindo de uma palavra cujo conceito já está definido. De acordo com
Vygotski (2001), a elaboração de um conceito não se restringe à unificação de imagens,
palavras, vivências, “[...] é também necessário abstrair, isolar elementos e ver os elementos
abstraídos da totalidade da experiência concreta em que se encontram mergulhados. Na genuína
gênese dos conceitos é tão importante unificar como separar: a síntese tem que combinar-se
com a análise” (p.78). Assim, reafirmamos aqui que os participantes utilizaram-se de
pseudoconceitos – compreendendo esse processo como uma fase transitória do pensamento e
algo comum na infância, mas que também é utilizado com certa frequência pelo adulto. Explica
Vygotski (2001, p. 82):
[...] um conceito se forma não através do jogo mútuo das associações, mas
através de uma operação intelectual em que todas as funções mentais
elementares participam numa combinação específica. Esta operação é
orientada pela utilização das palavras como meios para centrar ativamente a
atenção, para abstrair certos traços, sintetizá-los e representá-los por meio de
símbolos.
Com isso, podemos compreender a dificuldade desses participantes (Carlos, Amanda e
Jonas) em conceituar o termo acessibilidade. O motivo pode estar relacionado ao fato de que a
perda sensorial deles é recente, sendo que estão em processo de reorganização de suas funções
psíquicas superiores por meio de caminhos indiretos. Os caminhos indiretos, de acordo com
Vigotski (2011), aparecem quando ocorre algum impedimento que a resposta primitiva não
consegue resolver.
Em alguns discursos, podemos observar que a conceituação ainda não superou a
concepção relacionada à acessibilidade arquitetônica, ou seja, às barreiras físicas; o que fica
evidente nas falas:
É aquilo que, que é feito para ajudar as pessoas que... deficientes, pessoas
que necessitam de, de algum auxílio, que não... não são capazes, talvez de,
96
por si só, ultrapassarem barreiras, passarem por locais. É, acho que é isso
acessibilidade, ter essa ajuda, as pessoas que não têm condições por si só de
chegarem a locais, de visitarem locais”. (Pedro)
...acessibilidade para eu chegar daqui até a minha casa, né...da minha casa
até aqui, né...num mercado, é numa farmácia né...enfim, né... Então eu vejo
acessibilidade é um objetivo, uma maneira de chegar em tal lugar, né... ali
onde está definido que eu deva ir. (Carlos).
Nos relatos acima, os entrevistados podem estar se referindo a posicionamentos
relacionados à adequação do espaço físico. Como vimos na segunda seção deste estudo, a
relação entre acessibilidade e barreiras arquitetônicas foi comum nas políticas públicas da
década de 1990. Nessas políticas, a preocupação estava em adaptar os espaços públicos, meios
de transportes e utensílios, visando adequá-los para o uso de todos. Não obstante, do ano 2000
até o momento, podemos observar, nas leis referentes à acessibilidade, apenas maiores
especificações dos aspectos acima citados. A alusão a esse tema nos remete à compreensão de
que, apesar das garantias legais, tais participantes ainda encontram no seu cotidiano
dificuldades relacionadas à adequação do espaço físico – ou seja, existem políticas públicas,
mas elas não estão sendo concretizadas.
Para Sassaki (2009, p.2), “[...] a acessibilidade é uma qualidade, uma facilidade que
desejamos ver e ter em todos os contextos e aspectos da atividade humana.” Ou seja, a
acessibilidade não se restringe ao meio físico, mas envolve a vida das pessoas como um todo.
O autor ainda destaca que a acessibilidade não serve apenas para aqueles que apresentam
alguma deficiência, mas beneficia a todos. Nas falas destacadas fica evidente apenas uma das
seis dimensões de acessibilidade destacadas por Sassaki (2009): a arquitetônica; no entanto,
percebe-se que os participantes compreendem sua aplicação nos diferentes campos da vida,
como o da educação, o do trabalho e o do lazer.
Outro enfoque examinado nas entrevistas foi a associação do conceito com questões
referentes a direitos: “[...] que todos têm ali acesso e não é por causa de uma dificuldade que
eu não posso ter esse acesso também, não posso ter essa mesma, esse mesmo direito, esse
mesmo... né?” (Alice); “Dar oportunidade para [...] todas as pessoas é... que têm graus
variados de dificuldades, terem assim acesso, terem as mesmas oportunidades que as pessoas
que não têm essas dificuldades, tem[...]” (Jonas); “[...] é estar nas mesmas condições que as
97
outras pessoas que não têm nenhuma necessidade física, visual, né? Porque os direito são para
todos, né?”.
Esses posicionamentos remetem às políticas públicas mais recentes, a partir do ano de
1997, nas quais se faz possível examinar incisos, artigos e até capítulos de leis, decretos ou
resoluções das mais diversas áreas, como educação, saúde, assistência social, tecnologia,
cultura entre outras, em que são endossados conteúdos alusivos às pessoas com deficiência,
garantindo assim seus direitos à aprendizagem e ao desenvolvimento. As falas dos participantes
revelam que eles entendem acessibilidade como o acesso deles a essas políticas públicas; no
entanto, para eles, o conceito ainda está relacionado a condições de acesso, não se referindo a
questões como permanência e aproveitamento de bens e serviços. (Paula &Bueno, 2006).
Duas das concepções se destacaram por evidenciarem princípios de normalização: “É,
aquilo que [...] que é feito para ajudar as pessoas que [...] deficientes, pessoas que necessitam
de [...] de algum auxílio, que não... não são capazes, talvez de, por si só, ultrapassarem
barreiras [...]” (Pedro). “[...] dar a essa pessoa então, uma certa facilidade, diminuir as
dificuldades que ela tem, né, as dificuldades que podem ser diminuídas, né” (Jonas). Nesses
excertos, a maneira de conceituar a deficiência enfatiza seu caráter incapacitante, a
acessibilidade é compreendida como uma forma de minimizar as dificuldades impostas pela
deficiência e não como um caminho para o desenvolvimento da pessoa que apresente essa
particularidade. O paradigma da normalização é evidenciado na necessidade de equiparar-se ao
esperado nos padrões de normalidade.
A ideologia da normalização, segundo Aranha (2001), tornou-se comum a partir da
década de 1960, e seu propósito foi definido pela American National Association of