UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ARTES GUILHERME ARAUJO FREIRE AUTONOMIA E DISTINÇÃO NA INDÚSTRIA FONOGRÁFICA BRASILEIRA DOS ANOS 1950 E 1960: O CASO DAS GRAVADORAS FESTA, ELENCO E FORMA CAMPINAS 2019
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE ARTES
GUILHERME ARAUJO FREIRE
AUTONOMIA E DISTINÇÃO NA INDÚSTRIA FONOGRÁFICA BRASILEIRA DOS ANOS 1950 E 1960: O CASO DAS GRAVADORAS FESTA, ELENCO E FORMA
CAMPINAS 2019
GUILHERME ARAUJO FREIRE
AUTONOMIA E DISTINÇÃO NA INDÚSTRIA FONOGRÁFICA BRASILEIRA DOS ANOS 1950 E 1960: O CASO DAS GRAVADORAS FESTA, ELENCO E FORMA
Tese apresentada ao Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutor em Música, na área de Música: Teoria, Criação e Prática.
ORIENTADOR: JOSÉ ROBERTO ZAN
ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA POR GUILHERME ARAUJO FREIRE, E ORIENTADA POR PROF. DR. JOSÉ ROBERTO ZAN.
CAMPINAS 2019
Ficha catalográfica Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Artes Silvia Regina Shiroma - CRB 8/8180
Freire, Guilherme Araujo, 1987- F883a r Autonomia e distinção na indústria fonográfica brasileira dos anos 1950 e 1960 : O caso das gravadoras Festa, Elenco e Forma / Guilherme Araujo Freire. – Campinas, SP : [s.n.], 2019. Orientador: José Roberto Zan. Fre Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Artes. Fre 1. Indústria musical. 2. Registros sonoros - Indústria. 3. Registros sonoros - Executivos e produtores. 4. Gravadoras (Registros sonoros). I. Zan, José Roberto, 1948-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes. III. Título. Informações para Biblioteca Digital Título em outro idioma: Autonomy and distinction in the Brazilian phonographic industry of the 1950's and 1960's : The case of the record labels Festa, Elenco and Forma Palavras-chave em inglês: Music trade Sound recording industry Sound recording executives and producers Record labels (Sound recordings) Área de concentração: Música: Teoria, Criação e Prática Titulação: Doutor em Música Banca examinadora: José Roberto Zan [Orientador] Rita de Cássia Lahoz Morelli Márcia Regina Tosta Dias Eduardo Vicente Michel Nicolau Netto Data de defesa: 25-02-2019 Programa de Pós-Graduação: Música Identificação e informações acadêmicas do(a) aluno(a) - ORCID do autor: http://orcid.org/0000-0003-1913-4706 - Currículo Lattes do autor: http://lattes.cnpq.br/8992314615019141
BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO
GUILHERME ARAUJO FREIRE
ORIENTADOR: JOSÉ ROBERTO ZAN MEMBROS: 1. PROF. DR. JOSÉ ROBERTO ZAN
2. PROFA. DRA. RITA DE CÁSSIA LAHOZ MORELLI
3. PROFA. DRA. MÁRCIA REGINA TOSTA DIAS
4. PROF. DR. EDUARDO VICENTE
5. PROF. DR. MICHEL NICOLAU NETTO
Programa de Pós-graduação em Música do Instituto de Artes da Universidade
Estadual de Campinas.
A ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros da Comissão
Examinadora encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na
Secretaria do Programa da Unidade.
DATA DA DEFESA: 25.02.2019
Aos meus pais e familiares, pelo apoio incondicional
Aos amigos e parceiros músicos, pelo companheirismo em todas as fases
Ao Tomé Braga, pela conversa instigante sobre long-plays
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São
Paulo pela concessão de bolsa de doutorado (FAPESP - Processo n° 2015/10878-9), que
garantiu as condições materiais adequadas para a dedicação integral à pesquisa durante
aproximadamente dois anos. No mesmo sentido, gostaria de agradecer também ao
Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD) pela concessão de bolsa (Processo
n° 57381333) para participação no programa de Doutorado Sanduíche na Universidade
de Música Franz Liszt (Hochschule für Musik Franz Liszt, Weimar, Alemanha) e
informar que o presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de
Financiamento 001.
Sou enormemente grato aos meus pais, Valder Nogueira e Rosaneiva Marcia,
por continuarem apoiando minha formação e as minhas pesquisas acadêmicas desde o
início do curso de graduação, em 2009, e por garantirem que fossem mantidas as
melhores condições possíveis para o meu desenvolvimento pessoal e profissional.
Notadamente, agradeço ao Prof. Dr. José Roberto Zan pela decisiva contribuição
na minha formação no que se refere aos conceitos e autores relacionados à Sociologia
da Cultura/Música, bem como os problemas de método envolvidos na atividade de
pesquisa acadêmica desde as disciplinas do curso de Graduação em Música na
UNICAMP. Também pela insistência no rigor científico, pela generosidade de seguir
orientando minhas pesquisas acadêmicas e pelas valiosas contribuições.
Gostaria de apresentar meus agradecimentos também ao Prof. Dr. Tiago de
Oliveira Pinto, professor e diretor da cátedra de Estudos Transculturais de Música
(Transcultural Music Studies) na Universidade de Música Franz Liszt (Hochschule für
Musik Franz Liszt), pela orientação durante o estágio da pesquisa de doze meses na
Alemanha e pelas atenciosas contribuições realizadas no que se refere à análise do
mercado fonográfico das décadas de 1950 e 1960.
Aos Profs. Drs. Fábio Akcelrud Durão, Michel Nicolau Netto, Glauco Barsalini
e Carlos Gonçalves Machado Neto agradeço pela prontidão em atenderem o convite
para participação das bancas de Monografia e Exame de Qualificação, assim como pela
leitura crítica e principalmente pela grande contribuição feita na avaliação dos
resultados iniciais da pesquisa e nos apontamentos pertinentes feitos sobre as possíveis
perspectivas a serem exploradas nas etapas seguintes da pesquisa.
Agradeço da mesma forma a todos os colegas pesquisadores e integrantes do
grupo de pesquisa “Música Popular: História, Produção e Linguagem” (CNPq) pelas
valiosas discussões, leituras e releituras de textos e autores da literatura: Sheyla Castro
Diniz, Rafael dos Santos, Adelcio Camilo Machado, Ismael de Oliveira, Beatriz Cyrino,
Almir Côrtes, Mateus Berger, Gabriel Sampaio Rezende, Leandro Barsalini, Sheila
Zagury, Thaís Nicodemo, Rodrigo Vicente, Daniela Vieira, Luã Ferreira, entre outros.
Agradeço também aos integrantes do grupo de pesquisa alemão GfPM
(Gesellschaft für Popularmusikforschung) – Melanie Ptatscheck, Nicolas Ruth, Maria
Behrendt, Alan van Keeken, Martin Kreuzer, Svenja Reiner, pela convivência
enriquecedora em eventos acadêmicos na Alemanha e também pelas discussões
instigantes sobre métodos de pesquisa e sobre os problemas envolvidos em sua
aplicação na abordagem dos objetos de estudo.
Devo agradecer também aos funcionários do Instituto Brasileiro de Estatística
(IBGE), dos acervos dos jornais Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, O Globo,
da Revista VEJA, da Hemeroteca Digital Brasileira, da Biblioteca do Instituto de Artes
da UNICAMP, do Arquivo Edgard Leuenroth, da Biblioteca da ECA-USP e do Instituto
Moreira Sales (IMS), que ajudaram e facilitaram o trabalho de coleta de material
primário e de informações estatísticas relacionadas à produção industrial de uma
maneira geral e ao mercado fonográfico brasileiro nas décadas de 1950 e 1960.
Em especial, gostaria de apresentar meus agradecimentos a Fernando Krieger,
funcionário do Instituto Moreira Salles (IMS) do Rio de Janeiro, pelo atendimento
atencioso e pelo cuidado na busca, identificação e digitalização de todo o material
relacionado às gravadoras Festa, Elenco e Forma e seus respectivos produtores nas
diversas coleções que integram o acervo da instituição. Material este que permitiu a
identificação e o acesso a um número considerável de discos lançados pelas gravadoras
e que revelou uma quantidade de informações considerável.
Aos funcionários do Programa de Pós-graduação em Música do Instituto de
Artes da UNICAMP e, em especial, à funcionária Andréia Oliveira vinculada ao
DPROD, pelo atendimento cuidadoso e pela ajuda nos processos institucionais e pelo
preparo minucioso de documentos para serem submetidos à FAPESP.
Presto agradecimentos também a Gracita Garcia Bueno, sobrinha de Irineu
Garcia (produtor/proprietário da gravadora Festa), pela entrevista concedida, pelas
informações biográficas da família compartilhadas, pela disponibilização de quinze
discos relevantes re-editados pela sua iniciativa e também pelo acesso concedido ao seu
acervo pessoal de materiais gráficos e numerosas matérias de periódicos relacionados ao
seu tio e à gravadora Festa.
Aos amigos, companheiros músicos e diletantes da Bateria Alcalina pela
confiança, pela amizade enriquecedora e pelo incentivo na manutenção e
desenvolvimento da prática musical e da produção artística. Aos amigos queridos no
Brasil – Kássio Moreira, Talita Guimarães, Tamiris Duarte, Kora Prince, Gabriela
Salomé, Daniel Carezzato, Francisco Santana, Alberto Luiz, Renan Barjud, Nina Neder
Petrini, entre muitos outros, e também no exterior – Sina Mylluks, Antonia Siegert,
Antonia K. e Juan Paez, Elisabeth Dietrich, Kamai Freire, Åshild Svensson, Katharina
Oswald, pela paciência, pelo companheirismo, conversas, discussões e pela convivência
estimulante.
RESUMO
No contexto das transformações sociais e políticas associadas à modernização do país em curso nas décadas de 1950 e 1960, os diferentes setores do mercado cultural passavam por processos de reconfiguração estrutural. Ao estabelecermos como foco da pesquisa as trajetórias das gravadoras Festa, Elenco e Forma e dos seus respectivos proprietários e produtores, Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e Roberto Quartin, buscamos compreender de que modo os processos de produção dessas três empresas refletiam transformações que ocorriam no âmbito mais amplo das indústrias culturais do período associado tanto ao desenvolvimento da base técnica como ao recrudescimento da segmentação do mercado de bens culturais em curso. A partir de documentos da época e de dados estatísticos, demonstramos de que maneira o estágio incipiente de desenvolvimento do mercado engendrou condições favoráveis para a atividade de pequenas empresas nacionais geridas por empresários e produtores que buscavam autonomia administrativa, motivados por aspirações sobretudo pessoais e dedicados a projetos musicais muitas vezes orientados por parâmetros culturais e estéticos, em detrimento do interesse puramente econômico. No entanto, avaliamos que tal autonomia disposta pelos seus produtores se mostrava relativa, pois ainda que dispusessem de liberdade de decisão em relação às grandes gravadoras, atuavam em um contexto de mercado e tinham de produzir sob as limitações dos recursos materiais que dispunham e dentro da lógica de funcionamento do sistema. Por meio da análise dos catálogos das gravadoras e das representações formadas em discursos proferidos pela crítica especializada em periódicos, avaliamos o papel desempenhado pelas três gravadoras no processo de segmentação do mercado. Por fim, o estudo buscou verificar de que modo o desenvolvimento da indústria cultural, acompanhado pelo aprofundamento da racionalização da produção no final da década de 1960, atuou no sentido de restringir os espaços de atuação e minar as bases de manutenção das três gravadoras.
Palavras-chave: Indústria fonográfica. Produção musical independente. Gravadora Festa. Gravadora Elenco. Gravadora Forma.
ABSTRACT
In the context of the social and political transformations associated with the modernization of Brazil during the 1950s and 1960s, the different sectors of the cultural market underwent processes of structural reconfiguration. By analyzing the trajectories of the recording companies Festa, Elenco e Forma and its respective owners and producers, Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira and Roberto Quartin, we sought to understand in which way the processes of production of those three companies reflected the transformations that took place on the widest extent of the culture industries of the period, which were associated either with the development of the technologies, as with the intensification of the segmentation of the market of symbolic goods. Based on historical documents and statistical data, we demonstrate in which manner the incipient stage of development of the market engendered favorable conditions for the activity of small Brazilian companies managed by entrepreneurs and producers that aspired administrative autonomy, were guided by above all personal ambitions and dedicated to musical projects, many times oriented by cultural and aesthetic parameters, to the detriment of the purely economical interest. However, the study indicates that the degree of autonomy disposed by the producers was relative, since even if they had freedom of decision in relation to the major labels, they still acted in a context of commercial market and had to produce under the limitations of the material resources that they disposed and within the operation logic of the system. Through the analysis of the catalogs of the recording companies and of the representations formed in discourses uttered by the specialized critic in periodicals, we evaluated the role played by the three recording companies in the process of segmentation of the market. Finally, the study sought to verify how the development of the cultural industry, accompanied by the intensification of the production rationalization in the late 1960’s, contributed to limit the market participation und undermine the bases of maintenance of the three labels.
Keywords: Phonographic Industry. Indepedent music production. Festa Label. Elenco Label. Forma Label.
ABSTRACT
Im Kontext der sozialen und politischen Umwälzungen getrieben durch den Industrialisierungs- und Modernisierungsprozess in Brasilien während der 1950er- und 1960er-Jahre, durchliefen die verschiedenen Sektoren des kulturellen Marktes strukturelle Rekonfigurationsprozesse. Durch das Analysieren der Verläufe der Schallplattenfirmen Festa, Elenco und Forma und ihrer jeweiligen Eigentümer und Produzenten, Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira und Roberto Quartin, versuchten wir besser zu verstehen, in welcher Art und Weise die Produktionsprozesse dieser drei Unternehmen die Umwandlungen widerspiegeln, die entweder mit der Entwicklung der technologischen Basis oder mit der Intensivierung der Segmentierung des Marktes symbolischer Güter assoziiert waren. Anhand historischer Dokumente und statistischer Angaben legen wir dar, inwiefern das anfängliche Entwicklungsstadium des Marktes günstige Zustände für den Betrieb kleiner brasilianischer Unternehmen schuf, die nach Verwaltungsautonomie strebten, von persönlichen Ambitionen gesteuert wurden und für musikalischen Projekt engagiert waren, die sich oft, zum Nachteil des rein ökonomischen Interesses, an kulturellen und ästhetischen Parametern orientierten. Durch die Analyse der Kataloge der Schallplattenfirmen und der in den Diskursen geformten Repräsentationen der Fachkritiker in Zeitschriften wurde die Rolle der drei Firmen im Prozess der Marktsegmentierung bewertet. Schließlich sollte in der Studie überprüft werden, wie die Entwicklung der Kulturindustrie und die Vertiefung der Rationalisierung der Produktionsprozesse in den 1960er-Jahren dazu beigetragen haben, die Marktteilnahme zu begrenzen und die Grundlagen zur Aufrechterhaltung der drei Labels zu untergraben. Stichworte: Schallplattenindustrie. Unabhängige Musikproduktion. Festa Label. Elenco Label. Forma Label.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 14
Capítulo 1: Indústria fonográfica: Preâmbulo teórico e análise prévia do
mercado cultural dos anos 1940 e 1950 ................................................................ 22
1.1. Desenvolvimento da indústria fonográfica nos anos 1940 ............................................... 22
1.2. Panorama do mercado cultural da década de 1950 ..................................................................... 35
1.3. A música e os meios de comunicação: rádio, televisão, disco e revistas ..................... 49
1.4. Independência administrativa e dependência estrutural em gravadoras: a questão da
autonomia no setor fonográfico ........................................................................................................... 57
Capítulo 2: As gravadoras Festa, Elenco e Forma: fundação, modo de atuação, perfis
de produção e catálogos ............................................................................................................ 64
2.1. Populismo, funcionalismo público e modernismo ............................................................... 64
2.2. Intelectuais modernistas e a fundação da gravadora Festa .............................................. 70
2.3. A série de música erudita e “a construção da identidade nacional”: Convergência de
interesses entre agentes públicos, políticos e a iniciativa de Irineu Garcia ....................... 82
2.4. Atuação do Estado como instância de consagração: prêmios, certames e a repercussão
dos Discos Festa .......................................................................................................................................... 93
2.5. Aloísio de Oliveira e a gravadora Elenco: Bossa Nova e o projeto de uma “moderna
música popular brasileira” ....................................................................................................................... 98
2.6. Aspiração ao avanço da “moderna música popular” e a ideia de etiqueta de autor na
gravadora Forma de Roberto Quartin ................................................................................................. 113
Capítulo 3: O “bom gosto” em disputa: conflitos simbólicos e representações de
“bom gosto” nas trajetórias das gravadoras Festa, Forma e Elenco e na crítica
especializada ................................................................................................................................. 124
3.1. Especificidades na formação do campo artístico no Brasil e suas implicações na
formação de representações de “bom gosto” e hierarquias ..................................................... 124
3.2. Pares de oposição que balizam as disputas dos agentes no campo .............................. 129
3.2.1. Massivo X Circulação restrita (“Artístico”) ................................................................... 129
3.2.2. Popular X Erudito .................................................................................................................... 144
3.2.3. Nacional X Estrangeiro .......................................................................................................... 156
Capítulo 4: Declínio e encerramento das atividades das gravadoras Festa, Elenco e
Forma no contexto de reconfiguração do mercado cultural em fins de 1960 ....... 168
4.1. Regime militar, tecnocracia e o campo da produção cultural .......................................... 168
4.2. Segmentação e especialização do mercado musical ............................................................ 177
4.3. Expansão/internacionalização do mercado e término das atividades das gravadoras
Festa, Elenco e Forma ............................................................................................................................... 186
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................... 201
REFERÊNCIAS ................................................................................................................................ 206
APÊNDICES ..................................................................................................................................... 217
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INTRODUÇÃO
O estudo da produção cultural realizada no Brasil na década de 1950 e 1960
interpõe uma série de problemas e desafios ao pesquisador. Apesar de constituir um
período de grande efervescência, de marcada produtividade cultural de grande
importância na história da cultura brasileira, uma análise da historiografia sobre a
indústria fonográfica permite constatar uma evidente escassez de análises aprofundadas
relativas a este recorte temporal. Os principais autores que se debruçaram sobre o tema,
Othon Jambeiro (1975), Rita Morelli (1991), Enor Paiano (1994), Márcia Tosta Dias
(2000) e Eduardo Vicente (2002), elencaram como objeto de estudo principalmente os
anos 1970 e as décadas subsequentes e, assim, acabou se formando um hiato na
bibliografia relacionada. Ao se debruçar sobre esta lacuna histórica e refletir sobre os
temas relacionados à área obteve-se norte na delimitação dos objetos e no
desenvolvimento do projeto de pesquisa: realizar um estudo sobre a trajetória das
gravadoras Festa, Elenco e Forma e as condições materiais sócio-históricas de produção
no contexto dos anos 1950 e 1960.
O objetivo deste trabalho é retomar o debate sobre cultura brasileira,
desenvolvimento da indústria fonográfica, formação e segmentação do mercado de bens
simbólicos, a partir dos casos das gravadoras Festa (1955 – 1967), Elenco (1963 –
1968) e Forma (1964 – 1969)1. Para além da relevância histórica que ganhou parte dos
discos lançados - como, por exemplo, as séries de poesia recitada e de música erudita
brasileira da gravadora Festa; o LP Canção do amor demais (Festa/1959) de Elizete
Cardoso, um dos primeiros trabalhos em parceria de Tom Jobim e Vinicius de Morais
que prenunciaram a Bossa Nova; o aclamado Os Afrosambas (Forma/1965) de Baden
Powell e Vinicius de Moraes; uma série de álbuns centrais da Bossa Nova, como
Vinicius e Caymmi no Zum Zum (Elenco/1966); o primeiro disco de Nara Leão, Nara
(Elenco/1964); o rigor composicional de Moacir Santos em Coisas (Forma/1965), entre
outros-, alguns aspectos comuns identificados nos discos gravados, nos processos de
produção das gravadoras e nos perfis de atuação dos seus proprietários/produtores
1 Consideramos neste trabalho, como marco inicial da atividade das gravadoras, o ano de fundação de cada empresa e, como encerramento de suas trajetórias, o ano específico em que cada produtor decidiu interromper as atividades, vender o respectivo catálogo para a multinacional Philips e migrar para o exterior. Vale observar, no entanto, que as atividades das três gravadoras continuaram pelos 2-3 anos seguintes enquanto selos subsidiados sob administração da Philips e que, por isso, foram lançados discos que não tiveram nenhum envolvimento ou participação dos três produtores e que apresentam um perfil estético sensivelmente distinto da orientação inicial seguida desde a fundação.
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levantaram temáticas e questões que não deixam se desvincular da dinâmica de
funcionamento do mercado cultural do período.
Na medida em que foram se aprofundando as informações sobre as gravadoras e
o modus operandi de seus produtores ao longo do contato com os documentos e discos
na pesquisa, tornava-se evidente a relevância de inserir os objetos de estudo em
determinados debates dos campos da musicologia e das ciências sociais. Sabendo que
constituíram empresas de pequeno porte, fundadas e administradas pelos produtores
Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e Roberto Quartin em função da busca pela
autonomia administrativa em relação às grandes gravadoras e com o intuito de realizar
uma produção cultural que não se alinhava às tendências de maior circulação do
mercado do período, o caso das gravadoras se apresentou como uma circunstância
oportuna para abordar temas como produção fonográfica independente, cultura
brasileira, identidade nacional, desenvolvimento da indústria fonográfica, formação do
mercado cultural, segmentação do mercado fonográfico e consolidação do campo
artístico.
Uma vez que as três gravadoras produziram especialmente em segmentos de
circulação restrita do mercado, como literatura recitada, música erudita, Bossa Nova,
música instrumental e conquistaram uma repercussão favorável nos meios de
comunicação, sendo recebidas como símbolo de “bom gosto”, da intelectualidade, vistas
sob o signo da distinção e regularmente aclamadas por realizar uma produção
considerada essencialmente “artística”, tornou-se pertinente ao estudo avaliar quais
fatores estruturais do mercado tornou viável essa produção, e refletir sobre as relações
entre as lutas simbólicas ocorridas em torno das gravadoras e o recrudescimento da
segmentação do mercado nas décadas de 1950 e 1960. Processo este que culmina
posteriormente na consolidação de um segmento que passa a ser reconhecido como de
“bom gosto”, “legítimo”, e designado como “moderna música popular brasileira”. É
evidente que as gravadoras Festa, Elenco e Forma não foram as únicas empresas que
tomaram parte nesse processo histórico, no entanto a pesquisa se dedicou a aprofundar
as informações sobre o caso específico destas iniciativas.
No que se refere à metodologia, partimos de algumas premissas teóricas
elementares para a realização do estudo. Em primeiro lugar, foi adotada foi a ideia de
sociedade administrada, noção empregada por Adorno e Horkheimer para destacar o
fenômeno da absorção da cultura pela assim denominada racionalidade administrativa.
Partindo de princípios teóricos weberianos e marxistas, os sociólogos da assim
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designada Escola de Frankfurt escolheram trabalhar com a noção histórica de sociedade
capitalista monopolista e conceitualizar o termo indústria cultural para a análise da
incursão dos bens culturais no campo das mercadorias através da aplicação de um
processo industrial e capitalista de produção. A partir da investigação das músicas que
tocavam nas rádios dos Estados Unidos na primeira metade do século XX, Adorno
chega à tese de que com o avanço da razão técnica no capitalismo tardio a produção
cultural cada vez mais perde seu traço artesanal e seu potencial crítico para assumir
feições padronizadas de mercadoria e funções de consumo per si, criando demandas de
consumo e condicionando gostos. Com base nesses princípios é que se pretende avaliar
a mudança do padrão de tratamento dado à produção cultural e da configuração da
indústria fonográfica com o desenvolvimento do sistema capitalista brasileiro ocorrido
no período aqui estudado.
Para as análises dos catálogos e dos perfis de atuação das gravadoras Festa,
Elenco e Forma, foi adotada como ferramenta analítica a apreciação musical dos LP’s
enquanto documento histórico, com a qual se buscou incorporar o estudo do contexto
histórico e social que envolve o objeto de estudo, sem negligenciar os aspectos
especificamente musicais e suas questões intrínsecas. Nesse sentido, tentamos evitar
aqui o uso exclusivo tanto de uma determinada vertente analítica, que confere ênfase
exclusivamente a aspectos específicos da linguagem musical, mas negligencia suas
implicações políticas e sociais; como também de uma segunda vertente, cultivada por
historiadores, antropólogos, sociólogos e críticos literários, que prioriza a compreensão
da realidade social a partir de uma determinada produção musical, deixando de lado,
contudo, a música em seus aspectos inerentes (cf. BESSA, 2005b). Assim, a apreciação
dos discos procurou combinar as duas vertentes em uma relação complementar, de
modo que as relações intrínsecas do objeto do estudo fossem contempladas tanto em sua
dimensão musical como no seu aspecto histórico e social.
Para a reflexão sobre classificação no campo artístico e análise das
representações associadas à produção das gravadoras e das disputas pela legitimação no
mercado foram adotados como referência os conceitos de habitus e de campo
formulados por Pierre Bourdieu (2011). O autor define habitus como as condutas do
indivíduo marcadas pela introjeção das regras do campo, ainda que de maneira
inconsciente, no qual os agentes assumem posições conforme reagem às ações de
outrem em um processo similar ao andamento de um jogo – um sentido de jogo social
propriamente que se adquire desde a infância. Neste, as ações dos agentes têm um
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caráter estratégico, mas não podem ser reconhecidas como práticas inconscientes e
totalmente determinadas pela estrutura, nem como ações resultantes apenas de um
cálculo racional. O contexto social e os espaços de relações objetivas em que os agentes
atuam recebe a designação de campo e se configuram como espaços, estruturados por
posições determinadas ou postos, no qual se embatem as relações de força entre os
agentes em luta pela distribuição de tipos específicos de capital simbólico. Segundo o
autor, “para que um campo funcione, é preciso que haja objetos de disputas e pessoas
prontas para disputar o jogo, dotadas de habitus que impliquem no conhecimento e no
reconhecimento das leis imanentes do jogo, dos objetos de disputas” (BOURDIEU,
1983: 89). Nesse sentido, para Bourdieu a produção cultural e artística acontece em
campos específicos de produção e circulação de bens simbólicos, que se formaram com
o advento da produção em larga escala e subsequente autonomização da vida intelectual
e artística em relação às instâncias tradicionais de legitimação.
Em decorrência da falta de publicações acadêmicas relacionadas às três
gravadoras e da inexistência de pesquisas de mercado realizadas até a década de 1950 e
consequente escassez de bases de dados estatísticos confiáveis relativos ao mercado
fonográfico, a busca por novas fontes informativas e dados estatísticos constituiu um
dos maiores desafios da pesquisa. Para obter as informações necessárias às análises e
assegurar um grau suficiente de teor empírico, fez-se necessário realizar uma pesquisa
extensa e paciente de material primário nos acervos do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), Arquivo Edgard Leuenroth (AEL/UNICAMP), Instituto Moreira
Salles (IMS/RJ), Biblioteca da Escola de Comunicação e Artes (ECA/USP),
Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional (RJ), assim como no acervo digital de
periódicos como Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Jornal do Brasil, Correio
da Manhã, Tribuna da Imprensa, O Globo, O Jornal, Revista do Rádio, Revista
Intervalo, Revista Long Playing, Cash Box Magazine, visando a catalogação de
matérias, reportagens, entrevistas e dados estatísticos relacionados aos problemas
centrais da pesquisa. Como resultado, foram coletados cerca de 360 recortes de
periódicos, em grande maioria diretamente relacionados com as três gravadoras, seus
respectivos produtores ou com o mercado fonográfico das décadas de 1950 e 19602.
Através de consulta realizada ao acervo musical de gravações em compacto
simples, EP’s e LP’s do Instituto Moreira Salles (RJ) – mais especificamente as
2 Uma lista com a maior parte das matérias catalogadas durante a pesquisa pode ser consultada na seção “Apêndices” deste trabalho.
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coleções de Aloysio de Alencar Pinto, Antônio D’Auria, João Salles Ferreira Alves,
Jorge Zahar, Robespierre, José Ramos Tinhorão, Vânia Chalfun-, foram encontrados
cerca de 50 LP’s lançados pela gravadora Festa e obtido acesso às capas respectivas
digitalizadas. Através da descoberta destes discos e de consultas aos catálogos de discos
de música brasileira disponíveis no Instituto Memória Musical Brasileira (IMMuB), foi
realizada uma estimativa dos catálogos produzidos pelas gravadoras3, os quais
auxiliaram diretamente nas análises dos seus perfis de produção. Considerando que os
discos constituem documentos históricos relevantes, uma vez que trazem discursos e
informações pertinentes em seu material gráfico (capa, contracapa e rótulo) sobre as
condições de produção e as escolhas dos produtores, a descoberta dos discos contribuiu
consideravelmente para a obtenção de informações detalhadas sobre os lançamentos das
três gravadoras, os músicos e profissionais envolvidos em sua produção, os locais de
gravação e o seu modo de operação. Foi realizada também entrevista com Gracita
Garcia Bueno, sobrinha do fundador da gravadora Festa, e atual proprietária do catálogo
da Festa Discos e das fitas magnéticas originais (DAT), que contêm o material sonoro
bruto das gravações realizadas pela gravadora. Devido à natureza familiar da relação de
Gracita com Irineu Garcia, a entrevista possibilitou a obtenção de informações
biográficas detalhadas sobre o produtor, bem como possibilitou o acesso a uma série de
matérias de periódicos publicadas sobre a gravadora Festa que integram o seu acervo
pessoal.
Os textos que serão apresentados a seguir constituem os resultados de um
processo de quatro anos de pesquisa, leitura crítica do material primário coletado e
subsequente confronto com a bibliografia especializada. Algumas indagações surgiram
ao longo do aprofundamento do conhecimento sobre os objetos e motivaram a
realização do estudo: como foi possível para as três gravadoras manter os custos de
produção atuando em segmentos de menor circulação no mercado? Quais aspectos da
configuração do mercado tornaram esta produção viável? Qual foi o papel
desempenhado pelo Estado na dinâmica do mercado cultural? Quais relações podem ser
estabelecidas entre a busca pela autonomia de Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e
Roberto Quartin e a segmentação de perfis de público em um mercado ainda marcado
pela incipiência?
3 Estimativas dos catálogos de discos lançados pelas gravadoras Festa, Elenco e Forma podem ser consultadas na seção “Apêndices” deste trabalho.
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No primeiro capítulo, realizamos uma análise do mercado fonográfico das
décadas de 1950 e 1960 no contexto do surto de desenvolvimento industrial ocorrido em
função das políticas de investimento que integraram o “Plano Nacional de Re-
aparelhamento Econômico” do governo de Getúlio Vargas (1951-1954) e o “Plano de
Metas” de Juscelino Kubitschek (1956-1961). A partir de uma revisão bibliográfica de
trabalhos das áreas de história, antropologia, sociologia e musicologia, apresentamos
uma breve retrospectiva do período de instalação e desenvolvimento inicial da indústria
fonográfica até a década de 1940 e, com base em novos dados estatísticos e fontes
informativas encontrados nos acervos do IBGE e em periódicos, realizamos uma análise
abrangente do mercado nas décadas de 1950 e 1960, tentando aprofundar em detalhes as
informações disponíveis e reavaliar as teses formuladas nas principais obras da
historiografia. Para tal, as análises foram empreendidas visando dimensionar o grau de
crescimento do setor, avaliar quais eram as gravadoras estrangeiras e nacionais mais
representativas em atividade, quais gravadoras lideravam o mercado, quais eram os
gêneros musicais lançados, as tendências de consumo, quais foram os aprimoramentos
técnicos implementados, assim como verificar o que mudou na dinâmica de produção e
recepção com a proliferação de gravadoras nacionais e o aumento da concorrência no
mercado na década de 1950.
Por meio da análise das relações entre os meios de comunicação de massa e a
produção cultural do período colocamos em questão o nível de articulação entre os
diversos setores do mercado cultural e, com referência em pesquisas e estudos recentes,
tentamos realizar um primeiro mapeamento dos indícios da segmentação de perfis de
público ou de consumo e dos investimentos simbólicos na programação de rádio,
televisão e nos conteúdos vinculados em periódicos. Considerando que as três
gravadoras Festa, Elenco e Forma foram fundadas em função da busca pela autonomia
de seus produtores e compartilharam de um modo de produção similar,
problematizamos os conceitos de autonomia e de independência no contexto da
produção fonográfica.
No segundo capítulo, tratamos das trajetórias das gravadoras Festa, Elenco e
Forma, o modo de produção empregado pelos seus produtores, os seus perfis de
produção, os gêneros musicais que predominaram e apontamos alguns discos
representativos dos seus catálogos. Contudo, com o intuito de conferir maior
profundidade à argumentação e abordar questões centrais que tangem os objetos de
estudo, dissertamos antes sobre as relações entre servidores públicos, seus projetos
20
políticos nacionalistas e iniciativas do setor privado, com enfoque no caso específico da
gravadora Festa de Irineu Garcia. A partir dos trabalhos de Miceli (2001), Ianni (1996) e
Ortiz (1994), avaliamos de que maneira a conjuntura política e estrutural resultante do
modelo de governo de Vargas engendrou as condições de produção dispostas por
determinados grupos de agentes sociais (literatos, músicos, jornalistas, produtores, entre
outros) no mercado cultural, incluindo a iniciativa de Irineu Garcia e sua gravadora
Festa. A partir de matérias de periódicos, analisamos detalhadamente o perfil da
gravadora e o modo de produção empregado desde a sua fundação, colocando em
evidência a proximidade de Garcia com os burocratas/intelectuais modernistas e o
alinhamento da produção da gravadora com o projeto modernista-nacionalista de cultura
erudita.
Dada a orientação de Irineu Garcia de produzir para segmentos de menor
rentabilidade no mercado, como o de música erudita nacional e de poesia recitada,
avaliamos o papel desempenhado por determinados servidores públicos e políticos na
manutenção das atividades da gravadora Festa, assim como no investimento em
políticas culturais que promovessem a integração do país e consolidassem a identidade
nacional. Considerando esse aspecto e a fraca autonomização de setores do mercado
cultural no período (p. ex. literatura e música erudita nacional), verificamos de que
modo a política cultural do Estado incidiu como instância de legitimação, ao criar
concursos e prêmios com o intuito de fomentar a produção de obras artísticas e produtos
de orientação nacionalista, contemplando produções culturais preteridas no setor
privado e, ao mesmo tempo, conferindo distinção simbólica e certo grau de autonomia
às práticas artísticas em relação aos imperativos do mercado. Os dois últimos tópicos se
destinam a abordar as trajetórias das gravadoras Elenco e Forma, analisando
detalhadamente quais foram os discos de destaque lançados, seus perfis de produção, o
modo de produção empregado, as similaridades e diferenças entre si.
O terceiro capítulo se dedica à reflexão sobre classificação no campo artístico,
notadamente, ao estudo dos conflitos simbólicos em torno da noção de “bom gosto” que
tangenciaram as trajetórias das gravadoras Festa, Elenco e Forma, e dos elementos de
tensão que marcaram o mercado cultural do período. Dado que o cenário artístico no
qual se inserem as três gravadoras é marcado pela ocorrência de disputas entre
intelectuais ligados aos diferentes segmentos do mercado, colocamos em questão uma
série de códigos, parâmetros, juízos e valores nem sempre homogêneos, que eram
atribuídos a temas e noções comuns como, por exemplo, à “tradição”, à “modernidade”,
21
ao elemento “nacional”, ao “estrangeiro”, ao “comercial”, etc., e que orientavam os
modos dos agentes pensarem e atuarem no campo. Como estratégia de apresentação dos
resultados das análises, os subcapítulos foram organizados pelos seguintes pares de
oposição: mercado de massa X produção “artística”, popular X erudito, nacional X
estrangeiro. A partir de cada par, avaliamos de que modo as disputas simbólicas
balizadas pelas noções citadas marcaram a trajetória de cada uma das três gravadoras e
problematizamos as relações entre as lutas de classificação e o recrudescimento da
segmentação do mercado nas décadas de 1950 e 1960.
No último capítulo, nos concentramos na análise das transformações
engendradas pelas medidas político-econômicas implementadas nos governos de
Juscelino Kubitschek, de João Goulart, assim como no projeto tecnocrático da ditadura
militar. Com base na bibliografia especializada, procurou-se avaliar de que maneira a
expansão, reorganização e modernização dos diferentes setores do mercado de bens
simbólicos ocorridas na década de 1960 interferiram nas atividades das três gravadoras
e no padrão de tratamento dado à produção cultural de um modo geral. Mais
precisamente, buscamos avaliar em que medida as transformações, ocorridas na
intensificação do processo da industrialização e na consolidação da indústria cultural,
atuaram no sentido de minar as bases de manutenção de suas produções e levar ao
encerramento de suas atividades, assim como à subsequente aquisição dos seus
catálogos por parte da empresa multinacional Philips-Phonogram.
22
CAPÍTULO 1 – INDÚSTRIA FONOGRÁFICA:
PREÂMBULO TEÓRICO E ANÁLISE PRÉVIA DO MERCADO CULTURAL
DOS ANOS 1940 E 1950
1. 1. Desenvolvimento da indústria fonográfica nos anos 1940
O contexto sócio-histórico em que se inserem as produções das gravadoras
Festa, Elenco e Forma revela uma efervescência cultural significativa e uma dinâmica
de funcionamento peculiar dos diferentes setores do mercado cultural brasileiro. As
particularidades que marcam as disposições dos diversos agentes sociais, produtores,
jornalistas, críticos especializados, músicos, escritores, empresários e servidores
públicos envolvidos, assim como as representações formadas e os conflitos simbólicos
ocorridos nesse período expressam uma relação dialética com as condições técnicas e
estruturais associadas ao nível de desenvolvimento do país. A análise em perspectiva da
configuração do mercado cultural, problematizando quais as gravadoras em atividade,
quais os segmentos existentes, quais as estratégias de atuação, e as implicações que tais
circunstâncias tiveram na dinâmica de produção, recepção e segmentação do mercado,
constitui uma etapa fundamental na compreensão do contexto amplo do período e das
condições de atuação dispostas pelas três gravadoras e seus respectivos produtores.
Na década de 1940, diferentes setores de produção e difusão de produtos em
massa, tais como o rádio, as gravadoras de discos, o cinema e o mercado editorial, se
modernizavam e começavam a articular suas atividades. Tal processo pode ser
observado, por exemplo, na fundação de emissoras de radiodifusão por parte de jornais
que tinham o objetivo de expandir seu campo de atuação e complementar as tarefas
informativas dos seus periódicos. A própria Rádio Nacional, fundada em 1936 por
iniciativa do jornal A Noite, compartilhou o mesmo prédio com a empresa para sediar
suas atividades e realizar suas transmissões. De maneira similar, outras emissoras de
rádio foram fundadas e vinculadas a editoras de periódicos, como a Rádio Jornal do
Brasil (1935), vinculada ao jornal de mesmo nome; a Rádio Tupi (1934), fundada por
empresários da Diários Associados, cadeia de jornais de propriedade de Assis
Chateaubriand, e a Rádio Globo (1944), ligada ao grupo de comunicação O Globo4.
4 Informações obtidas através de consultas ao endereço http://cpdoc.fgv.br/, realizadas em 15/12/2016, em busca por verbetes presentes no banco de dados do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas.
23
O cinema começava a ampliar o seu público com a presença predominante de
filmes norte-americanos e, paralelamente, a tentativa da criação de um circuito de filmes
nacionais. Nesta última, a empresa Cinédia se dedicava, desde os anos 1930, a produzir
dramas populares e comédias musicais, conhecidos como chanchadas. Outras iniciativas
atuavam no mesmo nicho criativo do circuito, como a produtora Atlântida fundada em
1941, que começou a produzir uma média de três chanchadas por ano, e a Vera Cruz,
criada com grandes investimentos em 1949. Entre 1951 e 1955, estas empresas junto de
outras produtoras menores, como a Maristela, Cinedistri e Multifilmes, chegavam a
lançar no mercado uma média de vinte e sete filmes por ano. No entanto, conforme
aponta Ortiz (1994), devido às condições estruturais ainda precárias do país, as
empresas tiveram dificuldades em lidar com sérios problemas de distribuição e de
operação nas salas de exibição dos filmes, o que levou a falência de grande parte delas
no final da década de 1950.
Durante o seu período de atividade, produtoras de filmes nacionais mantiveram
vínculos com o setor fonográfico não apenas pela necessidade de contratar compositores
e instrumentistas para produzir trilhas sonoras, mas também para buscar artistas célebres
para encenar nos filmes e usufruir da popularidade que já desfrutavam em relação ao
grande público. Não raro, integravam o elenco destas produções célebres cantores das
principais emissoras de rádio, como Carmem Miranda, Sílvio Caldas, Nelson
Gonçalves, Marlene, Emilinha Borba, Linda Batista, Ângela Maria, Jorge Goulart, Nora
Ney, entre outros, os quais desempenhavam papéis e cantavam canções em musicais
produzidos nos moldes de filmes de Hollywood, como, por exemplo, A Voz do
Carnaval (1933), O Ébrio (1946), Este mundo é um pandeiro (1947), Carnaval no fogo
(1949), Tudo Azul (1951) e Rio Fantasia (1957).
No setor editorial também se verifica uma expansão significativa do número de
jornais, revistas e livros, das tiragens realizadas e do volume de importação de papel.
Segundo Ortiz (1994: 43), no período situado entre 1936 e 1944, verifica-se no setor de
livros uma taxa de crescimento de 46,6% e, entre 1944 e 1948, de 31%. O número de
livros editados cresce 300% entre 1938 e 1950 e observa-se também a elevação do
número de editoras, que praticamente dobra no mesmo período. Também neste setor
alguns periódicos se vincularam com segmentos da indústria fonográfica e
cinematográfica e orientaram sua linha editorial a temáticas relacionadas a estes
universos, como a Revista de Cinema, Cinearte, Cine Revista, Cinegrama, Revista do
Rádio e Revista de Música Popular.
24
Deste modo, começava a se constituir, principalmente do final dos anos 1940
para frente, aquilo que foi designado por Krausche posteriormente como “complexo
fonográfico-cultural” (cf. KRAUSCHE, 1994). Período que ficou marcado pelo
aparecimento de um corpo de profissionais especializados nos diversos setores da
produção de bens simbólicos, como músicos, compositores, arranjadores, radialistas,
diretores, produtores de filmes, empresários do show business, jornalistas e críticos,
bem como pela ampliação do público consumidor de discos e filmes.
A indústria fonográfica, que operava desde a sua implantação pelo
empreendedor tcheco Frederico Figner no fim do século XIX e a instalação da primeira
fábrica da Odeon em 1912, já havia avançado algumas etapas de desenvolvimento com
a introdução do sistema elétrico de captação em 1927, o qual proporcionou uma
expressiva melhora de qualidade na reprodução dos discos e contribuiu
significativamente para a expansão do mercado. Nesse período, a vigência das patentes
que regulavam o acesso à tecnologia de reprodução sonora expirou (VICENTE & DE
MARCHI, 2014: 12) e algumas gravadoras internacionais puderam se instalar no Brasil,
atuar no mercado latino-americano e recuperar suas finanças, as quais haviam sido
afetadas pela crise econômica de 1929. Assim, entre 1927 e 1932 quatro gravadoras
estrangeiras e três nacionais iniciaram suas atividades no país, porém os
empreendimentos locais não subsistiram, restando apenas três empresas estrangeiras,
que ficaram responsáveis pela produção brasileira de discos 78rpm até praticamente o
final da Segunda Guerra Mundial: Odeon, Victor e Columbia (GONÇALVES, 2006:
30-59).
25
Gravadoras em atividade no Brasil (1902 – 1943)
Empresas
estrangeiras
Gravação mecânica Gravação elétrica
1902-1908 1908-1920 1921-1927 1928-1932 1932-1943
Internacional
Zon-0-phone
Odeon
Columbia
Phonograph
Victor Record
Faulhaber/Favorite
Odeon
Discos Phoenix
Odeon
Popular/Jurity
Columbia
Victor
Odeon
Parlophon
Brunswick
Columbia-CBS
RCA-Victor
EMI-Odeon
Empresas
nacionais
Gran Record Brasil
Discos Gaúcho
Disco Popular
Imperador
Imperador
Arte-fone
Brazilphone
Ouvidor
Tab. 1 – Estimativa de gravadoras que atuaram no Brasil entre 1902 e 1943 (apud GONÇALVES, 2006: 38)
Antes da chegada das gravadoras estrangeiras, entre 1927 e 1928, estimava-se
que eram produzidas um pouco mais de 600 matrizes pela Odeon (cf. DISCOGRAFIA,
1982), única grande gravadora em atividade, cuja fábrica dispunha da capacidade de
produzir 125 mil discos mensalmente (cf. LAUS, 2005). Com a chegada das quatro
novas empresas no país em 1929, avalia-se que a produção de matrizes quase triplicou,
conforme aponta levantamento feito pelos pesquisadores Gracio Barbalho, Nirez, Jairo
Severiano e Alcino Santos no catálogo de discos produzidos entre 1902 e 1964,
intitulado Discografia Brasileira 78 rpm. Apesar dos autores não estarem isentos de
equívocos na avaliação estatística da produção do período, não seria nada absurdo
reconhecer que ocorreu no período um salto qualitativo e quantitativo no mercado com
a chegada do sistema elétrico de reprodução/gravação, a instalação de novas fábricas e
estúdios no país e o barateamento dos aparelhos reprodutores.
Integravam os catálogos das cinco empresas discos de música brasileira e de
música estrangeira, sendo estes últimos prensados no Brasil a partir de matrizes
estrangeiras. Nos primeiros anos da fonografia (início do século XX), o repertório
26
gravado consistia em sua maior parte de modinhas e lundus acompanhados ao violão e
uma menor parte de músicas instrumentais executadas por bandas e artistas atuantes no
ramo do entretenimento dos teatros de revista, cinemas, music-halls, varietés, cabarés,
café-cantantes e circos (BESSA, 2005a: 24-5). Entre as músicas instrumentais, notava-
se invariavelmente a presença de gêneros dançantes derivados das danças de salão
européias (valsas, polcas, schottisches, mazurcas e quadrilhas), as quais já começavam a
ser adaptadas em sua execução rítmica com a sincopa brasileira e receber a designação
de tango brasileiro ou maxixe. Após o final da primeira Guerra, repercute no país os
modismos associados ao consumo de gêneros que se popularizavam nos Estados
Unidos, como o ragtime, o cakewalk, o charleston, o one-step, o two-step e, sobretudo,
o fox-trot, cujos discos já eram importados e também prensados localmente desde os
primeiros anos da fonografia5. Conforme aponta Gomes (2004: 81-5) em sua pesquisa
sobre o teatro de revista desse período, tais gêneros figuravam entre os mais executados,
por exemplo, nas peças da companhia de teatro Paschoal Segreto, uma das mais
lucrativas da capital carioca.
Apesar de já haver a prática de batucada em redutos de ex-escravos e mestiços
nos subúrbios do Rio de Janeiro e de já haverem sido lançados discos e partituras no
mercado com a referência ao gênero samba, sua popularidade começaria a se tornar
dominante no mercado somente após a repercussão causada pela canção “Pelo
Telefone” de Ernesto dos Santos (Donga) e Mauro Almeida. Segundo Severiano e
Mello (1999: 49), depois do sucesso da canção no carnaval de 1917, os músicos
começaram a compor sambas e marchas carnavalescas especialmente para o evento e,
assim se iniciou os ciclos anuais de canções carnavalescas. A partir da década de 1930,
com a difusão massiva do rádio e a proteção, censura e o incentivo do Estado Novo, o
samba carioca passa a dominar maior parte do mercado e a cena musical ganha
perenidade nos meios de comunicação de massa. Nas próximas duas décadas, o samba
torna-se símbolo de autenticidade, brasilidade e mantém sua posição de destaque no
mercado fonográfico, suplantando os ritmos estrangeiros e os outros gêneros brasileiros
em popularidade (p. ex. modinha, toada, cateretê, embolada, maxixe, chula, e o choro).
Ainda na década de 1930, as festas juninas passam a movimentar um
significativo mercado de produção e consumo de canções temáticas, em geral, marchas
5 O primeiro cakewalk registrado no Brasil foi gravado pela Banda do Corpo de Bombeiros, entre 1904 e 1907, e foi intitulado At a Georgia campmeeting, de Kerry Mills. Disco Odeon 40.115. (cf. DISCOGRAFIA, 1982).
27
dançadas em quadrilhas e músicas de feições regionais (BESSA, 2005a: 29-30).
Fenômeno este que acabou por formar um segmento de “músicas de meio de ano” e,
junto com as músicas de carnaval, constituíram por décadas os dois eventos mais
importantes que balizavam as disputas entre as gravadoras pela obtenção de contratos
com os cantores mais célebres e a conquista de uma maior parcela do mercado.
Se em sua fase inicial as transmissoras de rádio eram vistas como possíveis
concorrentes pelas companhias fonográficas instaladas no país, com a instalação das
empresas Columbia e Victor, as relações entre a fonografia e o rádio tornariam a se
aproximar. Com base em sua experiência nos países-sede, os diretores destas empresas
tinham para si que enquanto o rádio não se firmasse enquanto difusor da música
popular, o mercado fonográfico teria dificuldades para expandir ainda mais. Com o
tempo, as empresas passaram a negociar os lucros da publicidade dos programas
musicais com as empresas radiofônicas e a repensar a própria concepção do aparelho
leitor (GONÇALVES, 2006: 91-2). Assim, a indústria fonográfica se desenvolveu,
mantendo vínculos próximos e contratos com as transmissoras de rádio, e se valeu desse
meio de comunicação para divulgar seus lançamentos mais recentes e manter o mercado
musical minimamente unificado, ainda que a nível local. Em São Paulo, por exemplo, a
Sociedade Rádio Educadora Paulista foi fundada em 1923, obteve ajuda da RCA-
Victor, a partir de 1927, para construir sede própria; a Rádio Cruzeiro do Sul, fundada
em 1927, foi comprada anos depois pela família Byington, que era representante da
Columbia no Brasil e a Rádio Sociedade Record foi fundada por Álvaro Liberto de
Macedo, que também era proprietário de uma casa de discos na capital paulista
(MORAES, 2000: 60-62).
Na década de 1940, a ocorrência de três eventos aponta o início de uma mudança
estrutural na configuração do mercado fonográfico brasileiro, o qual estivera sob
domínio das gravadoras estrangeiras por aproximadamente dez anos. A empresa norte-
americana Columbia (CBS) era representada no país pelo empresário Alberto Byington,
desde 1929, através do selo Columbia do Brasil. Após a decisão de instalarem fábrica e
filial próprias no país e não renovarem o contrato de representação em 1943, Byington
resolveu criar a própria gravadora, aproveitando o maquinário, a rede de contatos e o
esquema de distribuição que havia desenvolvido. Nesse momento, o selo Continental é
fundado, adotado pela empresa Gravações Elétricas S.A. de Byington, e se torna a
primeira empresa brasileira de grande porte do mercado fonográfico (VICENTE, 2002:
54-5).
28
Em 1945, apenas dois anos depois, outra gravadora brasileira é fundada pelo
empresário Paulo Serrano, a Sociedade Interamericana de Representações (Sinter). Sua
estrutura física foi instalada em um prédio projetado por Oscar Niemeyer no Alto da
Boa Vista (RJ) e passou a competir no mercado investindo no repertório nacional e, ao
mesmo tempo, atuando como subsidiária da empresa norte-americana Capitol (LAUS,
2005: 124). Em 1948, através da iniciativa dos irmãos Vitale, proprietários de uma das
maiores editoras de partituras do país, mais uma significativa gravadora brasileira foi
fundada no Rio de Janeiro, a Copacabana. Assim como a gravadora Continental,
também dispôs de fábrica, gráfica e setor administrativo próprios e, por isso, teve
condições para realizar quase todas as etapas envolvidas na confecção dos discos.
Inicialmente estabeleceu sede no Rio de Janeiro, porém anos depois, foi transferida para
a cidade de São Bernardo do Campo, no estado de São Paulo.
29
Gravadoras mais representativas em atividade no Brasil (1943 – 1972)
78 rpm e
Compactos
simples
78rpm, Compactos simples
e Long-plays
Empresas
estrangeiras
1943 – 1951 1952 – 1957 1958 – 1964 1965 – 1968 1969 – 1972
Columbia-CBS
RCA-Victor
EMI-Odeon
Columbia-CBS
RCA-Victor
EMI-Odeon
CBS
RCA-Victor
EMI-Odeon
Philips-Phonogram
CBS
RCA-Victor
EMI-Odeon
Philips-Phonogram
CBS
RCA
EMI-Odeon
Philips-Phonogram
Empresas
nacionais
Continental
Sinter
Copacabana
Todamérica
Continental
Sinter/CBD
Copacabana
Mocambo/Rozenblit
RGE
Fermata
Rádio
Chantecler
Musidisc
Todamérica
Festa
Continental
Sinter/CBD
Copacabana
Mocambo/Rozenblit
RGE
Fermata
Rádio
Chantecler
Musidisc
Todamérica
Festa
Elenco
Continental
Copacabana
Mocambo/Rozenblit
Fermata/RGE
Chantecler
Musidisc
Festa
Elenco
Forma
Equipe
Continental
Copacabana
Mocambo/Rozenblit
Fermata/RGE
Chantecler
Musidisc
Equipe
Tab. 2 – Estimativa de gravadoras mais representativas que atuaram no Brasil entre 1943 e 1972. Fonte: Catálogos da Revista Long Playing e outras diversas6.
Até esse momento, devido à condição de subdesenvolvimento, em relação ao
capitalismo mundial, e à fraca segmentação do mercado de bens simbólicos, as
gravadoras lançavam indistintamente os gêneros e estilos que circulavam. Não havia a
necessidade de conceituar um selo diferente para cada tipo de produção ou de evitar
misturas incoerentes de estilos musicais nos dois lados dos discos. Conforme aponta
Laus (2005: 122-3), até o ano de 1946 as capas de discos confeccionadas seguiam um
6 Além dos catálogos de discos lançados no mercado fonográfico, publicados pela Revista Long Playing
entre 1956 e 1971, serviram como base na elaboração da tabela as informações presentes no conjunto de matérias de periódicos coletadas (ver relação completa na seção ‘Apêndices’ deste trabalho), assim como no acervo de fonogramas do Instituto Memória Musical Brasileira (IMMuB) e em livros/trabalhos acadêmicos de pesquisadores da área - VICENTE, 2014; VICENTE, 2010; VICENTE, 2002: 307-331; PAIVA, 2010; TARIK apud BERNARDO, 2004: 124; ASSEF & MELO, 2017.
30
mesmo padrão (não-personalizadas) de baixo custo: um envelope simples com um
buraco no meio e textos tipográficos, sem ilustrações. Dado que o formato do compacto
simples apenas compatibilizava uma música de cada lado do disco, julgava-se suficiente
o próprio selo fixado ao centro, uma vez que já continha todas as informações
consideradas relevantes. A partir de meados dos anos 1940 começaram a ser
empregadas fotografias para ilustrar os envelopes, geralmente acima de uma lista do
repertório dos artistas no catálogo da gravadora. Somente a partir dos anos 1950 capas
personalizadas passam a ser confeccionadas a partir de uma concepção gráfica,
incluindo fotos, desenhos, nome do intérprete/grupo, título do disco, logo da gravadora,
e eventualmente dados técnicos relacionados à gravação (idem). Segundo Vicente
(2014: 73), a gravadora Sinter foi pioneira no design das capas dos discos por ter
contratado cartunistas e desenhistas conceituados como Lan (Lanfranco Cortelline
Rossi), Nássara (Antonio Gabriel Nássara) e Miécio Caffé, entre outros, para ilustrar as
capas dos seus lançamentos.
A divisão de setores de produção e a especialização de funções eram pouco
incidentes e as pesquisas de perfil de consumidor de discos não eram empregadas,
apesar da existência de institutos como o IBOPE em São Paulo, fundado em 1942.
Desde os anos 1930, radialistas e produtores de gravadoras tinham de orientar-se por
critérios empíricos, como a simples observação “do calor do auditório”, a quantidade
das cartas recebidas pela redação e a reação do público na programação radiofônica,
para elaborar suas próximas estratégias de atuação no mercado. As primeiras pesquisas
de hábitos de consumo de TV foram encomendadas por transmissoras de televisão, em
1958, e se delimitaram às cidades de Rio de Janeiro e São Paulo (ORTIZ, 1994: 63). No
que se refere à indústria fonográfica, as primeiras pesquisas de vendas de discos surgem
apenas em 1959 e continuam nos primeiros anos da década de 1960 (GHEZZI, 2011:
75-7). Até esse período, os produtores e diretores artísticos das gravadoras tiveram de
empregar seus próprios métodos artesanais para avaliar as tendências do mercado, sem
dispor de informações e avaliações tipificadas sobre os consumidores.
Apesar de não haver pesquisas sobre a quantidade de discos vendidos por gênero
ou segmento, o levantamento realizado pelos pesquisadores Jairo Severiano e Zuza
Homem de Mello e os registros de obras, realizados na escola Nacional de Música,
fornecem indícios representativos para se identificar os segmentos do mercado e
analisar as tendências de produção e consumo durante as décadas de 1930 e 1940.
Segundo Severiano e Mello (1997: 86), no período situado entre 1931 e 1940 foram
31
gravadas 6706 composições, dentre elas 2176 foram sambas (32,45% do total) e 1225,
marchinhas (18,26%). Deste modo, pode-se dizer que mais da metade de toda a
produção fonográfica do país constituía de sambas e marchinhas, com a predominância
clara do samba.
Registro de obras na Escola Nacional de Música por gênero musical (1940-1949)
1940 1941 1942 1943 1944 1945 1946 1947 1948 1949 Total Batucada - 2 2 23 6 5 6 6 - - 50
Canção 7 9 13 128 10 6 18 26 11 5 233
Folclore - 12 1 2 - 5 1 5 - - 26 Foxtrote - 4 8 57 2 5 14 5 3 12 110
Foxtrote-canção 1 5 1 36 2 2 - 2 1 - 50
Marcha 41 36 17 521 25 19 53 28 21 38 799
Samba 44 42 228 644 96 47 119 42 32 48 1342 Samba-canção 1 - 4 30 6 2 - 8 7 - 58
Tango 1 - 6 57 2 4 8 4 1 4 87 Valsa 17 8 13 325 25 17 36 21 10 28 500
Valsa-canção 3 4 7 72 2 3 - 1 2 - 94
Outros/sem-esp. 27 56 115 147 31 25 20 59 38 52 570
Total 142 178 415 2042 207 140 275 207 126 187 3919
Tab. 3 – Registro de obras na Escola Nacional de Música por gênero musical (1940-1949). Fonte: Anuário Estatístico do Brasil (1940-1949) apud GHEZZI, 2011.
Conforme pode-se observar na tabela apresentada por Ghezzi (2011: 61),
verifica-se que além de ter sido o gênero mais gravado na década de 1930, também foi
aquele que teve mais obras registradas na Escola Nacional de Música do Rio de Janeiro,
seguido pela marcha de carnaval. Outros registros apontam a mesma tendência no
mercado, conforme podemos verificar a seguir no levantamento de discos de 78rpm
lançados divididos por gênero musical entre 1930 e 1960 feito com base em dados da
Fonoteca da Fundação Joaquim Nabuco, a qual teve como referência o catálogo de
discos presente na Discografia Brasileira 78rpm de Nirez, Barbalho, Santos e
Severiano.
32
Estimativa de lançamentos em 78rpm por gênero musical (1930-1960)
Samba Marcha Canção Samba-
canção
Valsa Baião Outros Total
1930 77 59 93 - 36 - 181 446 1931 87 31 40 - 21 - 117 296 1932 135 34 40 - 37 - 123 385 1933 138 77 75 - 49 - 119 458 1934 110 105 36 3 57 - 157 468 1935 115 127 52 1 64 - 137 496 1936 152 144 50 2 46 - 124 518 1937 162 107 54 2 77 - 157 559 1938 105 97 58 3 74 - 169 506 1939 211 149 60 3 75 - 220 718 1940 176 120 74 2 62 - 207 641 1941 210 131 36 0 82 - 264 723 1942 237 64 19 1 60 - 151 532 1943 214 76 38 1 65 - 154 548 1944 178 69 29 0 55 - 212 543 1945 236 60 52 1 82 - 284 715 1946 241 65 38 2 55 2 233 636 1947 152 68 40 4 46 2 158 470 1948 131 45 27 1 40 2 226 472 1949 104 46 22 5 23 9 167 376 1950 177 66 34 7 36 45 316 681 1951 227 77 71 13 62 112 361 923 1952 282 108 121 36 78 114 369 1108 1953 264 69 144 46 89 159 421 1192 1954 204 62 109 23 104 109 430 1041 1955 214 70 110 19 55 65 498 1031 1956 219 88 115 11 62 65 560 1120 1957 178 70 96 18 50 32 315 759 1958 178 49 110 43 23 21 235 659 1959 164 62 117 24 44 27 567 1005 1960 149 53 84 26 34 23 464 833
Tab. 4 – Estimativa de lançamentos em 78rpm por gênero musical (1930-1960). Fonte: Base de dados “Disco” da Fonoteca da Fundação Joaquim Nabuco (apud GHEZZI, 2011: 66)
Fica evidente na tabela o predomínio do samba entre os gêneros lançados no
mercado até a década de 1960, porém observa-se também que a partir de 1951 as
diferenças de proporção entre os gêneros começam a ficar mais equilibradas e a
distância do samba em relação aos demais gêneros torna a ficar menor. Os dados
apontam também a ascensão e queda da popularidade do baião, impulsionado por Luiz
Gonzaga e intérpretes afins, assim como a difusão de gêneros estrangeiros caribenhos
33
(rumba, calipso, chá-chá-chá, tango, guarânia, entre outros) e norte-americanos (jazz,
rock, twist, hully-gully), que passou a ocorrer de maneira mais intensa no país por
consequência de medidas implementadas, associadas à política de Boa Vizinhança dos
Estados Unidos (TOTA, 2000: 129-44), e a subsequente difusão de novos padrões de
consumo no país.
Ainda no que se refere aos setores do mercado, sabe-se que desde os primeiros
anos do mercado fonográfico houve o predomínio da música popular e que ao longo do
seu percurso de desenvolvimento a circulação de discos de música erudita apresentou
continuamente números modestos de vendas. Estimativas apontavam que a circulação
de discos deste segmento correspondia a aproximadamente 20% do volume total do
mercado (cf. QUÁDRIO, 1957c), porém, dado que não eram realizadas pesquisas de
mercado no período, considera-se tal cifra questionável e que poderia constituir uma
porcentagem menor. Posto que apresentava perspectivas modestas de lucros e vendas,
sua manutenção dependia de investimentos do Estado ou de sociedades ou agremiações
de aficionados, em grande maioria pertencentes às elites das cidades. Segundo Vicente e
Sergl (2007: 2), no século XIX entidades como o Club Mozart (1867), o Club
Beethoven (1882) e a Sociedade de Concertos Clássicos (1883) no Rio de Janeiro, e o
Club Haydn (1883), em São Paulo, se utilizavam dos meios disponíveis para ampliar o
repertório executado e trazer instrumentistas virtuoses para suas cidades, chegando
inclusive a organizar uma montagem e apresentação da ópera Tannhäuser de Richard
Wagner em 1883.
Assim, a presença da cultura européia no país, manifesta pelo hábito da
realização de serenatas e de saraus importados da Europa pelos filhos e outros membros
da família que iam a países europeus realizar seus estudos superiores, conservou certa
demanda por concertos, transmissões de música erudita na programação do rádio e o
consumo de discos com obras clássicas de compositores europeus, designados como
discos “de classe” ou música “fina”. Predominou neste setor a utilização de matrizes
importadas e produzidas pelas sedes das gravadoras estrangeiras para o lançamento de
obras clássicas dos compositores europeus de maior relevância histórica. No entanto, as
gravadoras não organizavam estratégias de atuação no segmento, seleção de repertório e
sequer dispunham de um departamento internacional exclusivo para cuidar da
encomenda das matrizes estrangeiras. Como consequência das sucessivas edições do
mesmo conjunto de obras pelas mesmas gravadoras estrangeiras, críticos especializados
34
apontavam o desinteresse do público pela falta de variedade no repertório (cf.
QUÁDRIO, 1957a).
Mesmo em programas de rádio o segmento de música erudita apresentava
dificuldades na formação de público. A título de exemplo, pode-se considerar o caso da
estréia do célebre Programa Casé, que começou a ser transmitido, em 1932, pela Rádio
Philips do Rio de Janeiro e que foi dividida em duas partes de duras horas, uma
dedicada à música erudita e outra à música popular. Conforme relata Cabral (1990: 94),
o próprio radialista Casé afirmava que acreditava, tal como Roquette Pinto, que o rádio
deveria ser educativo, porém o problema, segundo Casé, foi que ele apenas recebeu
chamadas de ouvintes, pedidos de música e congratulações entre oito e dez horas, trecho
do programa destinado à música popular. Nas duas horas seguintes não houve qualquer
contato. Tal reação fez com que ele optasse por reformular o formato do programa e
retirar a parte dedicada à música erudita (FENERICK, 2005: 169) 7.
Outra problemática que interferia não apenas no segmento dos discos clássicos e
no mercado de bens culturais, mas no sistema capitalista como um todo, foi a
insuficiente integração nacional. Constituía uma grande dificuldade para as empresas
organizar um sistema de distribuição que alcançasse consumidores nas regiões mais
longínquas do país, uma vez que a malha de ferrovias e estradas construída era bastante
reduzida e que o sistema operava sob déficit. Além disso, conforme aponta Ortiz (1994:
54), o próprio sistema radiofônico não se desenvolveu em forma de rede devido à
impossibilidade material de realização. A área de irradiação do rádio era bastante
reduzida em relação ao território nacional ocupado e, por isso, uma parcela considerável
da população era excluída (idem: 47). Tal condição restritiva favoreceu o
desenvolvimento da radiofonia local, em que as transmissoras irradiavam seus
programas direcionados a um público da região próxima, sem que se constituísse um
centro integrador da diversidade nacional. A própria emissora líder de audiência, a
Rádio Nacional, praticamente não era ouvida na cidade de São Paulo, uma vez que a
Rádio Record e a Difusora operavam na mesma frequência e bloqueavam a difusão
daquela. Por esse motivo, determinados roteiros de rádio-novela e outros programas de
sucesso apresentados no Rio de Janeiro fossem reapresentados com outro elenco por
outra emissora em São Paulo. Portanto, apesar de haver indícios da concretização de
7 Um depoimento do próprio autor do programa confirma o episódio: “Mesmo sendo só o primeiro programa, senti que deveria fazer uma opção. O programa tinha fins lucrativos e eu precisava de audiência. Decidi tirar, a contragosto, a parte erudita, dedicando quatro horas à música popular.”. Fonte: CASÉ, Rafael. Programa Casé: O rádio começou aqui. Rio de Janeiro, Mauad, 1995, p. 44.
35
uma sociedade de consumo no país, o funcionamento comercial dos meios de
comunicação e dos setores culturais se dava principalmente a nível local.
1.2. Panorama do mercado cultural da década de 1950
Durante a década de 1950, com a intensificação do crescimento industrial, a
expansão do setor terciário e o rápido crescimento dos centros urbanos (Rio de Janeiro,
São Paulo, Porto Alegre, Recife, Belo Horizonte, Salvador, entre outros), a
configuração do mercado de bens simbólicos começa a se transformar. Nesse período,
como consequência das políticas de investimento que integravam o Plano Nacional de
Re-aparelhamento Econômico no governo de Getúlio Vargas (1951-1954), foi
impulsionado o desenvolvimento das indústrias de base, transporte, energia, frigoríficos
e modernização da agricultura. Com a realização de investimentos estrategicamente
direcionados foram dinamizados os diferentes setores produtivos ligados à borracha, ao
cimento, à siderúrgica, à química e à farmacêutica. A expansão significativa dos bens de
produção e de consumo acarretou a necessidade da ampliação de parques industriais e
intensificou o processo de urbanização, ocasionando grandes movimentos migratórios
das cidades do interior e de outras regiões do país para as capitais da região sudeste. Ao
mesmo tempo, intensificava-se o processo de internacionalização do mercado brasileiro,
através da abertura da economia para investimentos de capital estrangeiro em diferentes
setores produtivos, o qual assumia uma participação cada vez maior na economia
(IANNI, 1996: 119-147).
36
Fig. 1 – Dados estatísticos sobre a produção industrial brasileira coletados pela Fundação Getúlio Vargas. Fonte: IBGE, AEB - Anuário Estatístico do Brasil 1960, ano XXI, p. 67.
Conforme indicam os dados da tabela, se observa uma expansão sutil, porém
contínua, nos diferentes setores produtivos desde meados da década de 1940. Uma
consulta aos anuários de dados estatísticos coletados e organizados pelo IBGE relativos
à produção industrial nacional da década de 1950 aponta que o movimento expansivo
acontece mais rapidamente e em maior proporção nas diversas áreas produtivas do
mercado brasileiro. Entre 1956 e 1958, o valor de produção, estimado em cruzeiros em
setores-chave, como o de material de construção e transporte, quadruplicou; por sua
vez, os setores de indústrias extrativas, produtos minerais, indústria de transformação,
metalúrgica, material elétrico/material de comunicações, triplicaram e outros, como de
produção de papel/papelão, borracha, química e farmacêutica, vestuário e tecidos e
editorial/gráfica tiveram sua cifra duplicada8.
Considerando esse cenário, é plausível assumir que as transformações trazidas
pela intensificação do desenvolvimento industrial no país também impactaram na esfera
cultural, uma vez que paralelamente ao crescimento do parque industrial e do mercado
interno de bens materiais, especialmente nas capitais urbanas, se expandiam, em certo
8 Fonte: Produção Industrial Brasileira 1958, Dados Retrospectivos IBGE – Conselho Nacional de Estatística. Seção de Aspectos Gerais, p. 5-6.
37
grau, determinados setores ligados ao mercado de bens culturais. No que se refere à
indústria fonográfica em específico, apesar de ainda apresentar feições locais e dispor
de um sistema de distribuição limitado, na década de 1950 seu volume de produção
também experiencia um acréscimo considerável em relação às décadas anteriores.
Contribuía para este fenômeno não apenas os investimentos volumosos do Estado na
expansão industrial através dos planos econômicos de Vargas (“PNRE” – Plano
Nacional de Re-aparelhamento Econômico) e Kubitschek (“Programa de Metas”), mas
também a instalação de novas fábricas de discos e filiais de gravadoras em território
nacional.
Conforme resultados de um censo realizado em 1950, operavam no país seis
fábricas de discos, a maior parte localizada em São Paulo, cuja produção anual era
estimada aproximadamente na marca de cinco milhões de unidades de discos, todos no
formato de 78rpm (cf. OS DISCOS, 1956). Nesse período, se concentravam perto de
70% do número de funcionários ocupados e de 50% do valor da produção nacional
apenas em São Paulo. Estatísticas feitas a partir dos dados presentes no “Registro
Industrial” do IBGE, referentes ao ano de 1956, apenas seis anos depois, apontaram que
a produção brasileira alcançara a cifra de 15.932.639 unidades de discos, produzidos no
conjunto de nove fábricas em atividade no país (cf. OSDISCOS, 1956; QUÁDRIO,
1957c), seja produção relativa à própria gravadora proprietária da fábrica, fabricação de
remessa de discos encomendada ou produções de selos subsidiários. Assim, a partir
desses dados pode-se inferir que, durante a década de 1950, a capacidade de produção
aumentou com a instalação de três novas fábricas no país, fator este que parece ter
contribuído para um crescimento considerável do volume de produção de discos.
Uma análise em perspectiva do desenvolvimento do mercado fonográfico deste
período permite identificar duas fases em sua configuração interna. Entre 1930 e
meados da década de 1940, verifica-se uma primeira fase de expansão e concentração
do mercado nacional nas mãos das três gravadoras estrangeiras que também lideravam o
mercado no panorama internacional (FLICHY, 1982: 23) - RCA-Victor, Colúmbia
(CBS) e EMI-Odeon. Orientadas pela mesma estratégia aplicada em outros países, essas
gravadoras focaram suas produções no repertório nacional, trabalharam com os
intérpretes locais mais notáveis e, assim, se estabeleceram mantendo o domínio do
mercado brasileiro através do controle das fábricas em atividade, dos esquemas de
distribuição e de canais de divulgação (vínculos com emissoras de rádio, revistas
especializadas e anúncios em jornais).
38
A partir de 1945 se inicia uma segunda fase de expansão e aumento da
concorrência no mercado através do ingresso de uma série de gravadoras nacionais no
mercado (ver Tab. 2), tanto por meio de gravações e produções próprias como também
enquanto subsidiárias de outros selos estrangeiros; algumas delas chegaram a instalar
estrutura física própria (fábrica, estúdio, tipografia, refeitório, etc.). Além das
gravadoras já citadas anteriormente (Continental, Sinter, e Copacabana), começaram a
lançar discos e competir no mercado a gravadora Todamérica (1950), de quatro sócios
vinculados à UBC (União Brasileira de Compositores) - Alberto Byington (também
dono da gravadora Continental), Sávio da Silveira, Carlos Alberto de Ferreira Braga e o
americano Wallace Downey (BERNARDO, 2004: 124); a Musidisc (1953) do
compositor Nilo Sérgio (VICENTE, 2014: 61); a Rozenblit (1954), da família recifense
de empresários Rozenblit (ACONTECIMENTO, 1954: 9); a RGE (1954) do empresário
e publicitário José Scatena (PAIVA, 2010: 13); Fermata (1954) do empreendedor
polonês recém-imigrado Enrique Lebendiger (cf. ASSEF & MELO, 2017); Rádio
(1951) fundada por Ovídio Grottera (VICENTE, 2014: 121); a gravadora Festa (1955)
de Irineu Garcia (cf. MURILO, 1955) e a Chantecler (1956), fundada pelo grupo Cássio
Muniz (VICENTE, 2010: 82-3). Não consideramos implausível assumir esta
proliferação de empresas nacionais como uma consequência dos investimentos estatais e
o surto de expansão, desenvolvimento industrial e urbanização ocorrido ao longo na
década de 1950, o qual parece ter afetado similarmente a dinâmica do setor fonográfico.
Até meados da década de 1960, o mesmo cenário de acréscimo da concorrência se
mantém com a instalação da gravadora Philips-Phonogram no país, em 1958, a
fundação da gravadora Elenco de Aloísio de Oliveira, em 1963 (cf. ECO, 1963), da
gravadora Equipe de Oswaldo Cadaxo, em 1964, entre outras. No entanto, ao contrário
do que se poderia supor, o aumento da concorrência no mercado não parece ter afetado
significativamente a posição de liderança destacada das gravadoras estrangeiras, ao
menos até os últimos anos de 1950.
Apesar de não terem sido realizadas pesquisas sobre o percentual de participação
das gravadoras no mercado fonográfico nas décadas de 1950 e 1960, uma análise das
listagens dos discos mais vendidos, que foram publicadas semanalmente pela Revista do
Rádio entre 1950 e 1959, aponta um notável predomínio das grandes gravadoras
estrangeiras Columbia, RCA-Victor e Odeon, juntamente com a gravadora brasileira
Continental (MACHADO, 2016: 241-301). Os dados da tabela a seguir, montada com
base nestas listagens, que eram elaboradas pelo periódico através de consultas feitas a
39
lojas de discos da cidade do Rio de Janeiro e São Paulo, apontam claramente a liderança
destas gravadoras no mercado durante a década de 1950 em relação aos demais selos
concorrentes (Sinter, Copacabana, Todamérica, etc.).
Participação das gravadoras nas listagens de discos mais vendidos (RR) 9
1950 1951 1952 1953 1954 1955 1956 1957 1958 1959
RCA-Victor 54 25 17 19 14 17 10 23 20 25
Odeon 43 21 17 6 12 20 14 19 16 23
Columbia 6 - - - 7 32 31 23 27 26
Continental 26 29 26 9 9 12 20 8 - 8
Sinter 7 20 8 8 6 8 10 - 5 3
Copacabana - 4 - 12 21 21 17 11 10 11
Todamérica - 24 12 10 - - 1 - 1 1
Outras10 15 2 2 3 9 18 16 37 31 27
Tab. 5 – Participação das gravadoras nas listagens de discos mais vendidos realizadas pela Revista do Rádio entre 1950 e 1959.
Como podemos perceber, o predomínio de quatro gravadoras permanece
constante e é afetado sutilmente pela concorrência das novas gravadoras nacionais
apenas nos últimos anos da década. Uma consulta das músicas presentes nas listagens
desse período indica a existência de uma demanda insatisfeita por canções de filmes de
selos estrangeiros representados por gravadoras nacionais, seguidas de canções de
bolero, samba-canção e gêneros regionais não contemplados pelas grandes gravadoras,
como a música sertaneja e o frevo. Apesar de não terem emplacado muitos discos nas
listagens de discos mais vendidos elaboradas pela Revista do Rádio, as novas
gravadoras nacionais atuaram na expansão do volume de produção do mercado e na
diversificação da oferta de produtos, uma vez que produziam para segmentos e artistas
preteridos pelas grandes gravadoras que lideravam o mercado.
9 Os números vinculados a cada gravadora não correspondem ao número total de discos, a cada ano, presentes nas listas publicadas pelo periódico, mas sim à quantidade de aparições dos lançamentos de cada gravadora nas listas. Não era raro que um mesmo título permanecesse entre os mais vendidos por mais de uma semana e se repetisse nas listagens. 10 Dentre os outros selos presentes nas listagens publicadas pela Revista do Rádio constam: Star, Polydor, Musidisc, Decca, Repertório, RGE, Rozenblit/Mocambo/Mercury/Seeco, Fonit e Chantecler. A participação de gravadoras sem sede no Brasil nas listagens foi vinculada às gravadoras que as subsidiavam, conforme consta: MGM e London – Odeon; Capitol – Sinter (cf. QUÁDRIO, 1957a).
40
Um caso representativo desse fenômeno foi o conjunto de eventos que levaram à
fundação da gravadora Rozenblit e a construção de sua fábrica própria. Conforme
aponta Sobrinho (1993: 49-53), José Rozenblit fazia parte de uma família bem-sucedida
de proprietários de lojas que vendiam móveis, decoração, toca-discos e discos em
Recife, e considerava uma situação problemática que a produção musical local de
maracatus, frevos de bloco, frevos-canção dependesse da estrutura de produção e
distribuição das gravadoras estrangeiras que lideravam no mercado. Até então os
lançamentos de discos destes gêneros realizados se faziam seguindo uma espécie de
seleção organizada por um representante da RCA-Victor: a orquestra da Polícia Militar
executava algumas composições carnavalescas e, aquelas que obtivessem mais votos
favoráveis pelo comitê avaliador, composto por lojistas da região, seriam gravadas.
Descontente com a situação, José Rozenblit resolveu tomar a iniciativa e conquistar
maior autonomia para a produção local, e, para isso, realiza uma experiência gravando
um disco, em Recife, com as faixas “Come e dorme” (frevo-de-rua, composto pelo
maestro Nelson Ferreira) e “Boneca” (frevo-canção de José Menezes e Aldemar Paiva,
interpretado por Claudionor Germano), e consegue um acordo com a gravadora Sinter
para a confecção de duas mil cópias em fábrica situada no Rio de Janeiro. O sucesso
comercial gerado pela primeira prensagem levou a uma segunda prensagem, que por sua
vez fez com que membros da família Rozenblit decidissem formar sociedade e fundar
uma gravadora própria em Recife.
Em 18 de dezembro de 1954 foi inaugurada a primeira fábrica de discos fora do
eixo sudeste/sul, a Fábrica de Discos Rozenblit, situada na Estrada dos Remédios, n°
885, bairro dos Alagados, com a estrutura necessária para a realização de todas as etapas
de produção (estúdio, máquinas de prensa modernas, tipografia, refeitório e enfermaria
para os funcionários). A empresa se manteve em atividade entre 1954 e 1984, dispunha
de filiais em Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, prensava discos com o selo
próprio Mocambo e atuava também como subsidiária dos selos estrangeiros Mercury e
Seeco. As prensagens iniciais eram modestas, e permeavam a cifra de 2.500 cópias e,
em caso de maior sucesso comercial de algum disco, eram prensados entre três e quinze
mil cópias de discos 78rpm. No entanto, a produção de alguns dos seus maiores
sucessos, como o frevo-canção “Evocação n°1”, composição de Nelson Ferreira e
interpretada pelo Bloco Batutas de São José, chegou a alcançar a cifra de duzentos e
vinte mil cópias (idem), números estes que corroboram a tese de que houve um aumento
expressivo do volume de produção no mercado nacional.
41
A fábrica Rozenblit foi beneficiada por amparo estatal através do decreto n°
44.359, assinado pelo governador de Pernambuco, em 1959, o qual concedia isenção de
impostos de Venda e Consignações por um período de seis anos (cf. QUÁDRIO, 1959).
Além da produção de discos dos selos estrangeiros que representava, estima-se ter sido
realizada uma produção de 560 discos 78rpm para o selo Mocambo11, dentre os quais
61% de músicas brasileiras e 39% de música estrangeira. Do número correspondente a
esta porcentagem de repertório nacional, 40% das gravações consistiam de frevos e
música regional; de modo que se pode estimar que cerca de dois terços dos discos de
música brasileira produzidos pela Rozenblit incluíram repertório nordestino e
pernambucano (SOBRINHO, 1993: 102-4). Deste modo, fica evidente que a atuação da
gravadora Mocambo contribuiu de maneira expressiva no escoamento da produção de
música local/regional de Recife e regiões próximas, assim como atuou na diversificação
da oferta de produtos no mercado, mesmo nas regiões sul e sudeste, uma vez que
distribuía seus produtos por meio de suas filiais instaladas nas capitais do Rio de
Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul.
Outro caso representativo foi a atuação da gravadora Chantecler, fundada em
1956 pelo grupo Cássio Muniz. Conforme se verifica na análise de Vicente sobre a
produção da gravadora (2010: 82-5), desde o início a empresa atuou na faixa de
mercado considerada “popular” e desempenhou um papel fundamental na formação de
segmentos como o sertanejo, a música romântica tradicional e a música regional
(guarânias, rasqueados, etc.). Após um ano de parceria firmada com a empresa
internacional RCA, a empresa encerrou o vínculo e passou a empregar um sistema de
distribuição próprio.
A Chantecler conquistou considerável sucesso comercial com o lançamento de
músicas como o tango “Cinzas do Passado” interpretado por Cláudio de Barros, a valsa
“Perdão para Dois” de Leila Silva, o bolero “Faz-me Rir” de Edith Veiga, “Tu Sabes”
de Marta Mendonça, o baião “Baiano burro nasce morto” interpretado por Luiz
Wanderley, o tango “Somente Tu” de José Orlando, o bolero “Longe de Ti” de Wilson
Miranda e obras do harpista paraguaio Luis Bordon. O seu maior sucesso comercial foi
provavelmente o disco de “Coração de luto” de Teixeirinha, o qual teria vendido cerca
de seiscentas mil cópias, conforme relato do produtor Biaggio Baccarin (idem). Outra
11 A relação detalhada dos lançamentos com o repertório gravado, intérprete e autores das obras pode ser conferida em SOBRINHO, Antônio Alves. Desenvolvimento em 78 Rotações: A Indústria fonográfica Rozenblit (1953-1964). Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco, 1993, p. 62-101.
42
contribuição notável da empresa durante sua atividade foi a realização da primeira
gravação íntegra da ópera O Guarani, em 1959, do compositor Carlos Gomes da
América Latina, a qual fora lançada em edição de álbum composto com três discos e
esgotou-se rapidamente (idem). Estima-se que ao longo do seu período de atividade a
empresa tenha produzido cerca de 1.840 títulos nos diferentes formatos (78rpm,
compactos simples, LP e CD). Assim, percebemos que, através de suas atuações, a
gravadora Chantecler e as demais gravadoras nacionais em atividade atuavam na
expansão e diversificação do mercado com o lançamento de novos repertórios, artistas e
segmentos não levados em consideração pelas majors.
Conforme já apontamos anteriormente, na visão do crítico especialista em
música erudita, Maurício Quádrio (1957a), um dos problemas centrais do segmento de
música designada como “fina”, “de classe” consistia na falta de variedade do repertório
lançado, uma vez que um mesmo conjunto de obras clássicas era lançado pelas mesmas
gravadoras estrangeiras. Nesse sentido, a atuação de gravadoras nacionais, na década de
1950, contribuiu para suprimir a deficiência desta área: a gravadora Sinter, por exemplo,
representava selos internacionais que desfrutavam de sucesso no mercado exterior
(Decca, Urânia, Westminster, Vox, Nixa e Montilla) e trabalhou um repertório que
abrangeu diversos gêneros e épocas, com destaque para o repertório de Mozart e as
coleções da Vox dos concertos de Vivaldi e de Brandenburgo de J. S. Bach e também a
série de concertos e peças de piano interpretados por Guiomar Novaes. Além da Sinter,
a produção das gravadoras Copacabana e Rozenblit também eram enaltecidas pela suas
contribuições no lançamento de um repertório ainda não disponível para aquisição
(QUÁDRIO, 1957b).
43
Gravadora Selos que representaram nos anos 1960
Odeon London, Angel, Capitol, Warner Bros, Imperial e Orion
RCA Victor RCA Camden, Liberty e Elenco
Sinter/CBD Philips, Polydor, Decca, Westminster, Fonit, ABC Paramount, Vanguard,
Mercury, Elenco e Forma
Rozenblit Mocambo, Kapp, Seeco, Barclay, United Artists, Gurtler, Blue Hell,
Time, Jay-Gee, Vogue, Sidet, Meazzi, Surf, Supraphon, Italdisc e
Italmusic Continental Kapp, Col-Pix, W&G’s, Caboclo, Sertanejo, Ducretet-Thomson, Durium,
Telefunken, Disquinho e Discão
RGE Dot, Everest, Orfeon, 20th Fox, CGD, GC, Onix, Antar e Barclay
Fermata Young, Cameo, A&M, Hispa-Vox, Jupiter, Premier, Ateo, Durium,
Parkway e Tamla/Motown
Copacabana Palette, Hi-Fi Record, Montilla, Audiomex, MGM/Verve, Hi-Fi Record,
Montilla e Audiomex
Chantecler Sertanejo, Ricordi, Roulette, Marfer, Fuentes, Peerless, Sica Peruana,
Disk Luckey, S.R.L. e Edward Radio
Musidisc Masterpiece, Audio Laboratory, MGM, Vox, Hi-Fi Jazz, Nilser, United
Artists, Command, Audiola, Grand Award e Junior
Tab. 6 – Relação de gravadoras e os respectivos selos que representaram no Brasil na década de 1960. Fonte: Cashbox Magazine12.
Vale destacar que a possibilidade de representar selos estrangeiros no país
constituía para as gravadoras nacionais um meio lucrativo de atuar no mercado, uma vez
que recebiam as matrizes prontas do exterior e por isso não precisavam arcar com as
despesas de gravação ou realizar investimentos em publicidade/promoção, dado que já
eram produções divulgadas internacionalmente. Compôs uma atividade atrativa na
12 Edição de 5 de agosto de 1961, p. 64 e edição de 9 de julho de 1966, p. 11. O Cashbox Magazine foi um periódico norte-americano que tratava da indústria fonográfica e teve periodicidade semanal entre julho de 1942 a novembro de 1996. A partir da década de 1960, incluiu uma seção internacional, na qual eram apresentadas notícias e análises do mercado fonográfico de outros países (Alemanha, Inglaterra, França, México, Brasil, Argentina, Japão, entre outros). Constituiu um dos diversos periódicos que publicavam listas dos discos mais vendidos nos Estados Unidos, ao lado de concorrentes como o Billboard e Record World. Informações obtidas através de consulta ao link https://www.americanradiohistory.com/Cash-Box-Magazine.htm, realizada em 20/11/2018. Coleção de edições do periódico disponível para consulta no acervo da fundação Internet Archive - https://archive.org/.
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medida em que enquanto subsidiárias obtinham um retorno financeiro considerável e
mantinham uma determinada parcela de participação no mercado com a grande
repercussão de canções internacionais, seja de artistas de sucesso efêmero ou de trilhas
sonoras de filmes de grande repercussão comercial13. Conforme aponta Morelli (1991:
67), esse cenário se mantém até a década de 1970, pois com a instalação de filais
próprias de algumas empresas estrangeiras no país (p. ex. WEA e Capitol) destinadas a
trabalhar especialmente o repertório internacional, a atividade se tornaria menos atrativa
e as empresas nacionais tornariam a perder participação no mercado.
Já afirmamos anteriormente que, durante a década de 1960, o cenário de
expansão e aumento da concorrência no mercado se mantém com a instalação da
gravadora Philips no país, em 1958 e a fundação de outras gravadoras, como a Elenco,
Equipe, Sideral, Top-tape, Tapecar, entre outras. Através da análise das listagens dos
discos mais vendidos publicadas pela Revista do Rádio e das listagens elaboradas pelo
empresa de pesquisa de mercado NOPEM14 pode-se perceber que, apesar do
prevalecente domínio das grandes gravadoras estrangeiras, persiste ainda assim um
cenário de competitividade no mercado no período, no qual as gravadoras nacionais
movimentam certa parcela considerável do mercado. Vejamos os dados nas duas tabelas
a seguir:
13 A título de exemplo de compactos simples com canções estrangeiras de sucesso efêmero, pode-se citar Love letters de Victor Young (Decca/1950), Ballerina de Bing Crosby (Decca/1950), Limelight, versão de Frank Chacksfiel (Decca/1953), El ermitaño de Sonora Matancera (Seeco/1955), Love is many splendored thing de David Rose (MGM/1956), When de The Kalin Twins (Decca/1958), Smoke gets in your eyes de The Platters (Mercury/1959), Put your head on my shoulder de Paul Anka (Polydor/1960), Personality de Don Taylor (RGE/1960), Come september de Billy Vaughn (RGE/1962), Let’s twist again de Chubby Checker (Fermata/1962), Ya ya de Joey Dee (Fermata/1962), Una lacrima sul viso de Bobby Solo (Chantecler/ 1964), My Boy Lollipop de Millie Small (Fermata/1965), The more I see you de Cris Montez (Fermata/1966), Love me, please love me de Michel Pilnarefe (Mocambo/1967), You’ve got troubles de Jack Jones (Chantecler/1969), My Pledge of love de The Joe Jofrey (Top-Tape/1970), entre outros. Fonte: Listagens de discos mais vendidos elaboradas pelo NOPEM e pela Revista do Rádio; estas últimas consultadas em MACHADO, 2016, p. 241-301, e em levantamento próprio disponível na seção ‘Apêndices’ deste trabalho. 14 Conforme aponta Vicente (2008: 100), o NOPEM (Nelson Oliveira Pesquisas de Mercado) foi criado, em 1965, com o objetivo de atender exclusivamente à indústria fonográfica. Nelson Oliveira, seu fundador, trabalhara anteriormente no IBOPE e organizou sua pesquisa própria de vendas de discos a partir de consultas à lojistas das cidades de São Paulo e Rio de Janeiro.
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Participação das gravadoras nas listagens de discos mais vendidos (RR)
1960 1961 1962 1963 1964
RCA-Victor 23 28 35 25 21
Odeon 37 25 14 27 14
Columbia/CBS 15 11 9 12 15
Philips 1 4 8 21 6
Continental 8 11 10 3 2
Copacabana 12 9 15 10 15
Chantecler 10 8 13 2 12
Outras15 12 21 15 12 10
Tab. 7 – Participação das gravadoras nas listagens de discos mais vendidos realizadas pela Revista do Rádio entre 1960 e 1964.
Participação das gravadoras nas listagens dos 50 discos mais vendidos (NOPEM) 16
1965 1966 1967 1968 1969 1970 1971
RCA-Victor 7 4 2 7 5 8 2
Odeon 11 10 14 11 9 9 8
CBS 8 8 6 11 9 9 6
Philips 6 5 5 8 8 7 8
Continental 1 2 5 1 0 1 2
Copacabana 4 3 6 3 5 1 3
RGE 3 3 2 3 3 1 2
Outras17 10 15 10 6 11 14 18
Tab. 8 – Participação das gravadoras nas listagens dos 50 discos mais vendidos no eixo Rio-São Paulo elaboradas pelo NOPEM entre 1965 e 1971.
Deste modo, considerando tais bases de dados como referência para análise da
configuração do mercado fonográfico, nota-se como uma consequência da proliferação
de gravadoras nacionais e iniciativas autônomas na década de 1950 um aumento
15 Dentre os outros selos, presentes nas listagens publicadas pela Revista do Rádio, constam: Polydor, Todamérica, Rozenblit/Mocambo, Fermata, Musidisc, Drink, Sideral, Chantecler, Otiger, Liberty e Albatroz. 16 Nesta tabela, os números vinculados a cada gravadora correspondem ao número total de discos, a cada ano, presentes nas listas elaboradas pelo NOPEM. 17 Dentre os outros selos, presentes nas listagens elaboradas pelo NOPEM, constam: Rozenblit/Mocambo, Equipe, Polydor, Fermata, Musidisc, GNI, Reprise, HI-FI, Chantecler, Top-tape, Tapecar, Caravelle, Savoia, Castelinho, Epic, Ebrau, Som Maior, Apple, Young, Beverly e Liberty.
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representativo da competitividade no mercado, que fez com que as gravadoras
estrangeiras perdessem determinadas fatias do mercado e do público consumidor para as
empresas concorrentes. Tal relação disposta entre gravadoras nacionais e estrangeiras na
configuração de mercado parece se prolongar até a década de 1970, período em que
uma série de outros fatores começam a interferir e contribuir para ocorrer novamente
uma concentração do mercado. No entanto, para manter a linha argumentativa
desenvolvida neste trabalho, tais fatores somente serão problematizados no último
capítulo.
Além das transformações apontadas, a indústria fonográfica passa também por
uma série de aprimoramentos técnicos implementados pelas gravadoras no período,
como a introdução da stereofonia e também da tecnologia Hi-Fi (abreviação de High-
Fidelity – Alta fidelidade) pelos técnicos da Columbia, que aprimorou o processo de
produção e a qualidade sonora dos discos; e do micro-sulco, em 1948, tecnologia
desenvolvida pelos técnicos da CBS (VICENTE, 1996: 18), que além de eliminar
impurezas no processo de gravação e reprodução, expandiu o tempo possível de duração
do disco de quatro para mais de vinte minutos, o que abria um novo campo de
possibilidades para compositores e arranjadores. Conforme destaca Vicente (idem),
inicialmente ocorreu uma disputa pela a imposição de um novo formato padrão entre a
RCA e a CBS, porém a questão foi resolvida através de um acordo em promover uma
divisão no mercado, no qual os discos de 33 1/3rpm foram destinados ao repertório de
música erudita e os discos de 45rpm ao segmento de música popular, através dos então
designados singles ou compactos. No entanto, ao longo dos anos o segundo padrão não
emplacou e prevaleceu o formato de Long Play (LP), iniciando-se assim a era do Long-
Play, inicialmente ainda coexistindo com o dominante formato de 78rpm18.
Assim, o impulso de expansão e modernização da indústria nacional impelia
também a produção fonográfica, que inicia a produção nacional de LP’s por iniciativa
da gravadora Sinter, em 1951, com o lançamento do disco Capitol – Carnaval em long
playing. Durante a década de 1950, três empresas nacionais concentraram a produção de
LP’s do Rio de Janeiro, a Sinter de Paulo Serrano, a gravadora Rádio de Ovídio
Grottera e a Musidisc do empresário Nilo Sérgio. Devido à menor velocidade de rotação
necessária para a reprodução, a modernização do formato demandou o desenvolvimento
18 Segundo dados da ABPD (Associação Brasileira de Produtores de Disco), o formato de 78rpm prevalece ainda enquanto suporte predominante na circulação de discos por muitos anos e somente é suplantado pelo Long-Play em 1975. Apenas no início da década de 1990 o formato sairia de circulação do mercado (apud DIAS, 2001: 56).
47
de aparelhos igualmente modernos, os quais foram desenvolvidos pelas indústrias do
setor e passaram a dispor de agulhas mais sensíveis e velocidade de rotação cambiável.
Os custos adicionais gerados pelos aprimoramentos técnicos nos aparelhos reprodutores
somados aos maiores custos de confecção das capas, que começaram a ser
personalizadas e incluir ilustrações coloridas e fotos acabaram causando o
encarecimento dos preços dos produtos no mercado e dividindo os consumidores
potenciais dos produtos conforme seu poder de compra (cf. LAUS, 2005; BRAZIL,
1961).
Esse conjunto de transformações que ocorriam no mercado cultural constitui um
indício do avanço da racionalização e de um processo de modernização do mercado em
curso, impulsionado pelo intenso desenvolvimento industrial, e que, no entanto,
encontrava no caminho uma série de deficiências estruturais que refreavam o seu
avanço, fazendo com que o dinamismo ocorresse com limites bem delimitados.
Conforme aponta Ortiz (1994: 45), tal fenômeno é designado pelos economistas como
“industrialização restringida”, ou seja, o surto de desenvolvimento capitalista se realiza
somente em determinados setores e não se estende para todos os setores da sociedade.
Em termos amplos, pode-se afirmar que o processo de desenvolvimento do mercado de
bens culturais é atenuado pela impossibilidade de um desenvolvimento econômico
generalizado do país. Deste modo, apesar do fenômeno de expansão e diversificação do
setor fonográfico, as dinâmicas de produção e recepção do mercado cultural ainda assim
vão se caracterizar mais pela sua incipiência do que pela sua amplitude.
Apesar dos aprimoramentos técnicos implementados no setor fonográfico do
período, ainda havia uma grande defasagem de conhecimento tecnológico e de
equipamento dos estúdios em relação aos países desenvolvidos. Segundo Paiva (2010:
16), o recurso da câmara de eco, que possibilitava criar uma sensação de profundidade
sonora, constituía uma novidade no país, ao passo que já era largamente utilizada desde
muito antes no exterior; os sistemas de gravação multipistas de oito canais,
desenvolvidos pela empresa Ampex, em 1955, já se encontravam em curso de
implementação nos Estados Unidos. Em 1958, a gravadora norte-americana Atlantic foi
a primeira a dispor de um estúdio com o equipamento, enquanto que, no Brasil, muitas
das grandes gravadoras líderes no mercado somente adquiriram e empregaram tais
novas tecnologias nos anos 1970.
Conforme aponta Ortiz (1994: 45-6), o mercado de livros no Brasil constituía
ainda um setor deficiente, uma vez que o alto índice de analfabetismo do país impedia
48
que se formasse um público consumidor expressivo e fazia com que a penetração das
publicações no contingente populacional fosse pequena. Nesse sentido, não havia
condições para o escritor custear sua produção literária apenas com a venda dos seus
livros e, consequentemente, torná-lo um profissional dedicado apenas à literatura.
Índices apontam que a modesta produção de livros entre 1946 e 1956 se mantém no
mesmo patamar de aproximadamente seis milhões de exemplares e, entre 1948 e 1953,
o número de editoras reduz de 280 para 144, atingindo uma quantidade inferior à do ano
de 1936. Alguns fatores contribuíam para esta configuração: a falta de subsídios estatais
para a importação de papel para a produção de livros, a incidência de impostos
alfandegários e a tarifa de câmbio do dólar faziam com que fosse mais barato importar
livros do que papel para produzi-los, problemática esta que contribuía para que o
mercado permanecesse estagnado (idem).
Integrava esse quadro também o sistema televisivo, que tinha um circuito
predominantemente local, restringido praticamente às capitais de Rio de Janeiro e São
Paulo, operava com sérias restrições técnicas e uma estrutura pouco compatível com a
lógica comercial. Além de o experimentalismo constituir uma prática frequente no
período inicial, não havia um sistema de redes e o sistema de videotape apenas começa
a ser empregado posteriormente, na produção de telenovelas realizada na década de
1960. Além disso, os aparelhos de televisão eram importados, uma vez que ainda não
havia produção local suficiente de televisores, e, devido ao baixo poder aquisitivo da
maior parte população, apenas uma pequena parte da população tinha acesso. Em sua
análise sobre o setor, Ortiz (idem) apresenta a evolução do número de aparelhos no
período: 1951 – 3.500; 1955 – 141.000; 1959 – 434.000. Devido ao baixo poder de
penetração em relação à totalidade da população, as agências de publicidade davam
prioridade aos meios de comunicação de massa mais difundidos (rádio e jornal), o que
fazia com que a televisão atraísse menos investimentos em publicidade.
Levando-se em consideração as deficiências estruturais do país e o consequente
funcionamento precário dos diversos setores que integravam o mercado cultural,
considera-se problemática a aplicação do conceito de indústria cultural, tal qual
formulado por Adorno e Horkheimer (1986), no contexto brasileiro das décadas de 1950
e 1960. Conforme já apontaram diversos sociólogos, a saber, Ortiz (1994: 48), Morelli
(1991), Zan (1997) e Dias (2000), faltava ainda o caráter integrador característico, que
torna a suprimir os espaços individualizados e subjetivos das manifestações culturais e
integra-os a um mesmo sistema central através da racionalidade dos modos de
49
produção. Neste sistema, os diferentes setores que o compõem estabeleceriam uma
relação de interdependência, visando o aprimoramento do controle e da eficácia dos
mecanismos de produção e atuação no mercado. As condições necessárias para dar
origem a esta configuração de mercado são alcançadas apenas posteriormente, na
década de 1970.
1.3. A música e os meios de comunicação: rádio, televisão, disco e revistas
Na medida em que a divisão social do trabalho na sociedade incidia e as
diferentes classes sociais se tornavam mais distinguíveis com a expansão da classe
média, os padrões de consumo e de demanda por bens materiais e simbólicos também
começaram a se diferenciar. Tomemos como referência a então capital federal, Rio de
Janeiro, que, ao longo das décadas de 1940 e 1950, sofreu transformações que
modificaram profundamente a dinâmica da vida sociocultural das classes médias e altas.
Um dos fatores determinantes foi a proibição dos jogos de azar e o consequente
fechamento dos cassinos, implementado no governo de Eurico Dutra em 1946. Os
cassinos se destacavam na cidade não somente devido às apresentações nacionais e
internacionais de artistas, big bands norte-americanas e orquestras latino americanas
que dinamizavam a vida artística noturna carioca, mas também por constituir um
incentivo relevante ao turismo nacional e internacional, como ponto de visita em rotas
internacionais de viagens prestigiadas de entretenimento de setores de elite
(O’DONNELL, 2013: 185-194). O fechamento destes espaços obrigou artistas e
empresários a deslocarem suas atividades para outras regiões da cidade, como a Praça
Tiradentes na região central, reativando o Teatro de Revista.
Outro fator que desempenhou um papel determinante na reorganização espacial
do mercado musical e artístico da cidade foi o fechamento dos prostíbulos em 1942 e o
subsequente processo de decadência do bairro da Lapa ocorrido em fins dos anos 1940,
que constituía até então o principal ponto de encontro de intérpretes e compositores
boêmios da música popular (ZAN, 1997: 96). Esta medida integrou uma série de outras
reformas urbanas levada a cabo pelo então prefeito Henrique Dodsworth, como, entre
outras, a desapropriação de centenas de prédios e a abertura da Avenida Presidente
Vargas, que resultou em uma nova remoção forçada da população de baixa renda do
centro da capital federal e na destruição da célebre Praça Onze, marco histórico do
carnaval carioca. Gradualmente, a atividade de prostituição se transferiu para outros
bairros, como o Catete, o Mangue e a Cinelândia, fazendo com que a Lapa se tornasse
50
cada vez mais em um bairro associado à violência urbana e que intelectuais e artistas a
buscassem outros espaços para frequentar.
Ao mesmo tempo acontecia no bairro de Copacabana, no período situado entre
as décadas de 1940 e 1960, um vertiginoso crescimento físico e populacional
relacionado em grande parte com a migração acentuada de habitantes de outros bairros e
também de outras cidades e estados, o que fez com que alcançasse um ritmo de
crescimento superior em sete vezes ao da própria cidade do Rio de Janeiro (VELHO,
1975: 21-24). Segundo Gilberto Velho (idem), o elevado contingente de migração era
motivado pela crença no “prestígio social” e no “status” associado à condição de
morador da região, que habitava o imaginário de frações da classe média e alta carioca.
Também incidia nesse fenômeno um processo de revitalização da Zona Sul, na qual
passaram a se destacar os recém-construídos edifícios de apartamentos, hotéis luxuosos
e boates frequentadas cada vez mais por turistas estrangeiros, fatores que contribuíam
para que se criasse uma imagem de “glamour” sobre a região. Estas transformações
fizeram com que Copacabana e os bairros atlânticos se tornassem no lugar privilegiado
das relações socioculturais de classes sociais abastadas e em uma referência de hábitos e
costumes de civilidade e “bom gosto” (O’DONNELL, 2013: 190-199).
Associados às representações de modernidade e a uma imagem de “glamour”, os
bares, restaurantes e boates de Copacabana reuniam artistas, intelectuais e um público
de classes médias e altas e demanda compatível com suas predileções. O pequeno
espaço disponível nestes estabelecimentos não comportava os tradicionais espetáculos
musicais realizados em cassinos, que incluíam usualmente grandes orquestras e um
corpo de bailarinas e intérpretes. Nesse sentido, formou-se nesses ambientes um tipo de
produção de música popular camerística, um segmento que desenvolveu um tipo de
tratamento musical distinto do samba exaltação e do samba-canção, pautado por
sofisticações poéticas, harmônicas e orquestrais, que mantinham afinidade com o
cotidiano da boemia dos bairros da Zona Sul do Rio de Janeiro, o intimismo das boates
e um público de classe média e alta (cf. ZAN, 1997).
Além da atividade das casas noturnas, programas de rádio como o “Em tempos
de Jazz” de Paulo Santos, “Festival de Jazz” de Myrso Barroso e o “Disc-Jockey” – este
último irradiado pela Rádio Globo em horário nobre e idealizado pelo radialista Luís
Serrano em 1948-, destinavam toda sua programação à apresentação de artistas e
repertório de jazz e pop norte-americano através dos discos importados, e incentivava os
ouvintes à formação de fã-clubes com o intuito de facilitar o intercâmbio entre as
51
agremiações e a difusão dos LP’s importados (CASTRO, 1989: 36-45). Seguindo a
sugestão de Luís Serrano, jovens de classe média criaram agremiações, como o “Glenn
Miller Fan Club”, “Stan Kenton Progressive Club” e “Sinatra-Farney Fã Club”, para
realizar escutas coletivas semanais dos discos dos seus ídolos, shows, jam-sessions e
sessões cinematográficas. Fenômenos como estes contribuíam na valorização simbólica
da música popular norte-americana ao reconhecer e disseminar um conjunto de artistas e
determinadas práticas musicais presentes nesse repertório como símbolos de
modernidade e de cosmopolitismo.
Por outro lado, nos meios de comunicação de massa desfrutava de grande
popularidade uma linha de música popular reconhecida como “comercial”, que se
alinhava com o caráter efusivo de programas de auditório das transmissoras de rádio.
Tal segmento reuniu desde gêneros musicais regionais como o baião, o xote e a moda-
de-viola, até gêneros estrangeiros, como o bolero, a rumba, o calipso, o chá-chá-chá, o
tango, a guarânia, entre outros (cf. ZAN, 1997). Deste modo, em paralelo às
transformações correntes na estrutura física do país e na configuração das classes sociais
nas capitais urbanas revela-se nesse período o início de uma definição mais clara da
segmentação do mercado, tanto no que se refere à esfera de produção por parte dos
agentes músicos e gravadoras, como por parte do público, cujas demandas começam a
se diferenciar conforme se pluralizavam as preferências e perfis sociais dos
consumidores. É possível identificar indícios desse processo na produção simbólica
difundida nos meios de comunicação.
Na programação do rádio, as principais emissoras, Tupi, Mayrink e Rádio
Nacional, irradiavam as atrações de maior audiência no “horário nobre” e, dentre elas,
tinham maior destaque as radionovelas, os programas de radialistas (disquejóqueis)
famosos, programas humorísticos e de auditório. No horário de fim de noite, se
apresentavam os programas voltados à música instrumental (VICENTE, 2014: 52),
como, por exemplo, o programa “Ritmos do Copacabana”, transmitido diretamente do
luxuoso hotel e “Quando os maestros se encontram”, transmitido pela Rádio Nacional e
que contava com arranjos elaborados pelos arranjadores contratados da emissora
(Radamés Gnattali, Leo Peracchi, Lyrio Panicali e Romeu Ghipsman). Segundo
levantamento realizado por Gilberto de Andrade, em 1945, a programação semanal da
Rádio Nacional se distribuía na seguinte proporção: Música variada 26,9%, Música
popular brasileira 11%, Radio-novela e teatro 14,3%, Variedades 14,1%,
52
Noticiários/informativos 11%, Cultura física 9%, Programas de auditório, música
clássica, Programas educativos 4% cada (SAROLDI & MOREIRA, 1988: 54).
Desde a década de 1930 já se destacavam os primeiros ídolos de massa do rádio
- Francisco Alves, Carmem Miranda, Orlando Silva e Vicente Celestino-, porém foi
durante as décadas de 1940 e 1950 que o rádio alcançou o seu apogeu, período em que
se consagraram os “reis” e “rainhas” do rádio em concursos promovidos por associações
de rádio, revistas e jornais: Silvio Caldas, Ciro Monteiro, Nelson Gonçalves, Cauby
Peixoto, Jorge Goulart, Emilinha Borba, Marlene, Dalva de Oliveira, Ângela Maria,
Dircinha Batista, Linda Batista, Vera Lúcia, Dóris Monteiro, entre outros (MACHADO,
2016: 41-3). Através de entrevistas e matérias publicadas nos periódicos, promovia-se o
cultivo de sua imagem pública, da biografia, de eventos cotidianos da esfera íntima e do
repertório cantado, estabelecia-se um mecanismo de identificação entre os artistas e o
seu público. Ainda que os programas de auditório e de radionovelas tivessem grande
sucesso e altos índices de audiência, foram os intérpretes de música popular que
ganhavam maior destaque nos meios de comunicação e desfrutavam de grande
prestígio, se tornando verdadeiros ídolos de massa; fenômeno este que indicava a
formação de um star-system no país (NAPOLITANO, 2010: 65).
Contudo, vale lembrar que havia também emissoras menores que mantinham
outro padrão de programação no rádio, como as estatais Rádio Ministério da Educação
(MEC) e Rádio Roquette Pinto, e a privada Rádio Gazeta de São Paulo (cf.
MASSARANI, 1954). Estas conservavam a orientação inicial da “radiofonia
educadora” defendida por intelectuais como Roquette Pinto, que consistia em irradiar
música erudita e uma programação educativa com o intuito de contribuir com o
aprimoramento do gosto artístico e com a civilização do povo brasileiro, ou em outras
palavras, moldar as “massas amorfas” e conduzir a classe política para assegurar o
desenvolvimento nacional19. Além destas, as emissoras comerciais Jornal do Brasil e
Rádio Eldorado mantinham também a mesma orientação e voltavam sua programação
de maneira bastante incisiva para a música erudita (idem).
Na medida em que o rádio expandia sua difusão territorial e a música popular
conquistava um espaço mais expressivo e ampliava significativamente o seu público,
crescia ao mesmo tempo sua inserção no setor de revistas, que crescia e se diversificava
19 Para obter informações mais pormenorizadas sobre o assunto, ver a tese GILIOLI, Renato de Sousa Porto. Educação e cultura no rádio brasileiro: concepções de radioescola em Roquette-Pinto. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade de São Paulo, São Paulo, São Paulo, 2008.
53
no período de acordo as temáticas e os perfis de comportamento e consumo (ORTIZ,
1994: 42-3). Desde as décadas anteriores, os intérpretes e os acontecimentos
relacionados ao metier da música popular ingressavam a esfera pública por meio das
colunas publicadas em periódicos, como o Jornal do Brasil, Correio da Manhã, Diário
Carioca ou Última Hora. Contudo, com o surgimento de novos periódicos específicos o
cenário artístico e radiofônico passou a ser abordado com matérias mais extensas por
revistas especializadas. Como indício desta diferenciação de perfis de público pode-se
citar as diferenças nítidas observadas entre as linhas editoriais de dois periódicos
relevantes que circularam no período, a Revista do Rádio e a Revista da Música
Popular.
A primeira começou a ser publicada em 1948, manteve periodicidade semanal e
era destinada principalmente ao público fiel do rádio, dos programas de auditório e aos
fã-clubes. Seus principais responsáveis eram o editor Anselmo Domingues e o chefe de
redação Borelli Filho e o seu foco principal era tratar da esfera íntima e pessoal dos
intérpretes de destaque do rádio, estampando, em suas matérias curtas, páginas inteiras
de fotos combinadas e manchetes com relatos da vida pessoal, não raramente de teor
polêmico, e da carreira artística (MACHADO, 2016: 45-6). Considerando que a
televisão somente era acessível para um percentual bastante restrito da população
durante as décadas de 1940 e 1950, as imagens publicadas pelos periódicos constituíam,
para muitos, um dos poucos meios de conhecer o aspecto físico das celebridades do
rádio (ZAN, 1997: 92). Através da exposição da imagem e de aspectos da vida íntima
dos artistas através de textos e seções de teor sensacionalista (“Buraco da Fechadura”,
“Ficha completa”, “24h na vida de um artista”, entre outras), pode-se dizer que o
periódico atuava significativamente na construção de uma imagem pública do artista.
A Revista da Música Popular, por sua vez, era dirigida a um público mais
restrito, intelectualizado, de aficcionados pela música popular e manteve uma linha
editorial compromissada com a pesquisa e cultivo de um repertório específico da música
popular, o qual se julgava ter uma importância histórica de destaque, atuando a favor da
valorização e perpetuação daquilo que se acreditava ser uma “autêntica” música popular
brasileira (GARCIA, 2010: 13). Teve um período curto de circulação (entre 1954 e
1956), e, ao invés de tratar dos últimos sucessos do rádio e dos eventos contemporâneos
mais relevantes, o editor Lúcio Rangel e o diretor-gerente Pérsio de Moraes buscavam
através dos artigos publicados estabelecer os critérios e referenciais para se diferenciar a
54
música popular de “qualidade” daquela considerada massiva e predominante nos canais
de divulgação dos meios de comunicação de massa.
Integravam o corpo de colaboradores jornalistas, músicos e intelectuais, como
Fernando Lobo, Manuel Bandeira, Paulo Mendes Campos, Rubem Braga, Vinicius de
Moraes, Ary Vasconcelos, Silvio Túlio Cardoso, muitos dos quais assumiam como
necessário conservar a riqueza do patrimônio cultural brasileiro - representada pela
produção de artistas da assim considerada “Era de Ouro” da música brasileira, como
Sinhô, Donga, João da Baiana, Pixinguinha, Noel Rosa, Mario Reis, Francisco Alves,
Aracy de Almeida entre outros-, e fazer frente à presença considerada excessiva de
gêneros estrangeiros nos meios de comunicação de massa e no cenário artístico em
geral.
No que se refere à televisão, apesar de ter um circuito predominantemente local,
restringido praticamente às capitais de Rio de Janeiro e São Paulo, e um público
bastante restrito20, a música também manteve um espaço de destaque na grade da
programação. Em sua análise sobre a televisão em sua fase inicial de implantação, Ortiz
(1994: 73-6) identifica uma peculiaridade, dado que pelo seu estágio ainda inicial,
realizavam uma série de improvisações e experiências na busca de uma estrutura
definitiva da programação. No ano de 1954, por exemplo, houve uma mudança de
orientação das telenovelas, de um modelo inspirado nas radio novelas (com roteiro
escrito ainda pelos agentes do rádio), para adaptações de livros de escritores
consagrados, como Victor Hugo, Mark Twain e Kipling. Para Ortiz, tal mudança teria
feito com que a lógica de legitimidade cultural, determinada na área da cultura “erudita”
penetrasse o universo da produção em massa, que, por sua vez, teria levado a ser
considerada por críticos como uma televisão elitista no período. Contudo, ao mesmo
tempo a programação da TV Tupi não deixava de apresentar resquícios da radiofonia,
vinculando também um tipo de programação consagrado como popular, a saber, os
shows de auditório, música popular e programas humorísticos. Assim, o autor conclui
que, “numa sociedade de massa incipiente, a televisão opera, portanto, com duas
lógicas, uma cultural, outra de mercado”, porém, como esta última ainda não havia se
consagrado como prevalecente, coube ao universo da alta cultura desempenhar um
papel importante na definição de critérios de distinção social (idem).
20 Ver estatísticas do número de aparelhos televisores vendidos no Brasil no tópico anterior.
55
A análise de Rita Morelli (2011) sobre a programação musical da televisão de
São Paulo das décadas de 1950 e 1960, por sua vez, indica que se observa, nos anos
iniciais de operação da pioneira TV Tupi, uma frequência maior de gêneros musicais
estrangeiros sobre os nacionais, algo que reflete a hegemonia dos ritmos sul-americanos
e caribenhos na programação das emissoras de rádio da época ou do repertório de jazz
executado nas boates paulistanas. Além desse aspecto, a autora aponta também a
tentativa de distinção empreitada pela emissora ao incluir no seu programa óperas, pelo
seu elenco especializado em música lírica, pela apresentação de operetas completas
esporadicamente e também pelo programa “Grandes Momentos Líricos”, apresentado às
terças-feiras à noite, cujas atrações incluíram as principais árias do repertório
consagrado de óperas e apresentações de balé (idem: 4). Esta orientação da emissora
indica ter tido um perfil alinhado com a lógica cultural da programação destacada por
Ortiz.
O perfil de programação da TV Record, por outro lado, se distinguia
fundamentalmente, uma vez que predominavam claramente atrações com música
popular nacional. Das 26 referências a programas encontrados por Morelli, apenas uma
se referia a música erudita, três se referiam a música instrumental, duas se referiam a
música popular estrangeira e quatorze tratavam de música popular brasileira. Programas
como “Viva São João”, apresentado por Alvarenga e Ranchinho, “Gente do Sereno”,
coordenado por Paulo Vanzolini e com a participação de artistas representativos, como
Inezita Barroso, Ary Barroso, Dorival Caymmi, Elizeth Cardoso, Jackson do Pandeiro,
Jacob do Bandolim, Delora Bueno, Nestor Amaral, Ataulfo Alves; e também “Grandes
Espetáculos”, “Café Caboclo e União”, “Astros e Estrelas”, “TV Visita seu Bairro”,
“TeleTeste” e “Risos e Melodias”, atestavam a orientação nacionalista da emissora ao
priorizar a música brasileira na maior parte de sua programação. Além destas
referências, Morelli cita também a primeira e segunda “Noite dos Choristas”,
organizadas por Jacob do Bandolim, em 1955 e 1956, o “Concerto de Música Popular
Brasileira” com a participação dos maestros Radamés Gnatalli, Paulo Tapajós e Gabriel
Migliori e de cantores como Jorge Goulart e Nora Ney; “Retrato Musical do Brasil” e
“Feitiço da Vila” com Sílvio Caldas e Elizeth Cardoso interpretando melodias nacionais
populares (idem: 10-1).
Apesar da prioridade dada à música brasileira, a emissora não deixou de
apresentar também programas com atrações musicais norte-americanas, as quais, a
partir de 1958, passam a receber investimentos massivos da emissora. Com a
56
contratação de apresentações de um grande número de artistas norte-americanos de
destaque, entre 1958 e 1963, como Bill Halley e seus Cometas, Roy Hamilton, Nat King
Cole, The Cotton Club Revue de Cab Calloway, The Jubilee Singers, Sarah Vaughan,
Ella Fitzgerald, Paul Anka, Tony Bennet, Frank Avalon, Dizzy Gillespie e Brenda Lee,
Neil Sedaka, Dean Reed, Chubby Checker, entre outros (idem: 13), a TV Record se
distinguia das outras emissoras pelo investimento na internacionalização da
programação, de valor muito superior se comparado com o das concorrentes. Outro
fator que contribuiu para distinguir a programação da emissora foi a apresentação de
ídolos de Rock’n Roll, como Bill Halley e os Cometas, Chubby Checker, e também ter
sido pioneira em manter programas e investimentos destinados ao gênero em sua grade,
como o “Noites de Rock’n Roll”, “Celly em Hi-Fi” com os ídolos da juventude, Celly e
Tony Campello.
A seguir em sua análise, Morelli destaca ainda que, a partir do início da década
de 1960, a clivagem etária passa a ser predominante na programação musical das
emissoras de São Paulo. Não apenas devido ao surgimento de programas de rock’n roll
afins nas outras emissoras, como “Jovem Guarda” e “Alô Brotos” da TV Tupi, “Nossos
Brotos”, “Crush em Hi-Fi” ou o “Ritmos para a Juventude” da TV Paulista, mas
também devido à inclusão de atrações com artistas da Bossa Nova, como “Hora da
Bossa” na TV Tupi, II e III Festivais da Bossa Nova, “Bossa Nova em Hi-Fi”, “Nós e
Geraldo Cunha” e “Hully Bossa”, na TV Record e “Bossa Nova at Carnegie Hall” e
“Bossa Nova”, na TV Excelsior, as quais também eram identificadas como “música
jovem” e direcionadas a esse público. Esse cenário de segmentação de mercado e
diferenciação estatutária assume contornos ainda mais claros com o início dos ciclos de
festivais de canção da TV Excelsior e principalmente da TV Record, em 1965, e do
processo de politização e polarização do campo artístico, manifestada entre artistas e
intelectuais engajados na realização de uma canção de orientação nacional-popular e
entusiastas da Jovem Guarda.
É nessa configuração de mercado, marcada pela vigência de um processo de
desenvolvimento industrial, expansão da produção fonográfica, proliferação de
gravadoras nacionais e início da segmentação de mercado das décadas de 1950 e 1960
que se inserem as atividades das gravadoras Festa, Elenco e Forma. Dentro dos
propósitos deste estudo, cabe avaliar a seguir quais foram as condições de produção
dispostas pelos seus produtores (Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e Roberto Quartin)
nesta configuração e como as trajetórias das gravadoras refletem as transformações
57
trazidas por esse desenvolvimento nas dinâmicas de produção e consumo. Contudo,
considerando que os três produtores empregaram processos de produção autônomos
para realizar seus lançamentos, consideramos pertinente realizar antes uma reflexão
introdutória e problematizar os conceitos de autonomia e de independência no contexto
da produção fonográfica.
1.4. Independência administrativa e dependência estrutural em gravadoras: a
questão da autonomia no setor fonográfico
Ao longo do percurso histórico da indústria fonográfica no século XX ganharam
relevância histórica em diferentes períodos casos de lançamentos realizados por
gravadoras de pequeno porte, os quais contribuíram muitas vezes para a criação ou o
prospecto de novas tendências de consumo até então desconsideradas pelas grandes
gravadoras. Apesar de dispor de recursos limitados e não ter condições estruturais para
realizar todas as etapas envolvidas na produção de um disco (concepção inicial,
preparação do artista e direção artística, gravação em estúdio, mixagem, preparo das
matrizes, prensagem, distribuição, divulgação e confecção das capas), certas empresas
fonográficas designadas como “gravadoras independentes” ganharam notoriedade por
adotar uma orientação distinta em suas atividades, muitas vezes evitando as tendências
comerciais prezadas pelas majors e adotando uma orientação estética alheia às
tendências comerciais em alta no mercado.
Para mencionar alguns casos, basta considerar as primeiras gravações de
músicos de jazz que desenvolveram o estilo Bebop, como Charlie Parker, Dizzy
Gillespie, Thelonius Monk, os quais encontraram espaço inicialmente apenas em
gravadoras de pequeno porte especializadas em jazz e fundadas em fins da década de
1940 ou antes, como a Apollo, Guild, Manor, Dial, Duke, Savoy e Prestige
(PETERSON & BERGER, 1975: 164). Outro caso não menos representativo e
frequentemente citado na literatura é a busca por autonomia de bandas do movimento
punk dos Estados Unidos e do Reino Unido no final da década de 1970, que por não
terem encontrado espaço nas majors ou simplesmente pela busca da garantia da
autonomia artística, procuraram meios alternativos para gravar e causaram repercussão
considerável na cena cultural. Os quatro primeiros LP’s da banda punk pioneira
Ramones, por exemplo, foram lançados pela gravadora Sire, que fechava contratos com
a major Polydor Records para realizar a distribuição dos seus discos (O’CONNOR,
2008: 1-3).
58
O fenômeno das gravadoras independentes e a relação estabelecida com as
majors constituíram objeto de estudo em pesquisa conduzida por Peterson e Berger
(1975), os quais destacam que, no período de grande crescimento do setor fonográfico
norte-americano, situado entre 1948 e 1955, as quatro maiores companhias do país
(RCA Victor, Columbia, Decca e Capitol) controlavam 75% do mercado através de
uma integração vertical, na qual as grandes gravadoras garantiam a manutenção do
oligopólio pelo controle total sobre as diferentes etapas de fabricação do disco, desde o
tratamento do material primário bruto até as etapas de distribuição e venda no atacado, e
não pela oferta dos produtos que os consumidores desejavam. No entanto, com a
atuação bem-sucedida de selos independentes (como a Atlantic, Chess, Dot, Imperial,
Monument e Sun Records) em segmentos desprezados pelas majors, como o Jazz, Soul,
Gospel, Rythm & Blues e Country & Western, tal oligopólio se torna ameaçado pela
conquista de uma fatia maior de mercado por estas pequenas gravadoras, que
alcançaram posições de destaque no cenário musical com artistas como Little Richards,
Fats Domino, Chuck Berry, Bo Diddley, entre outros (idem: 164). Além da repercussão
destes trabalhos, Peterson e Berger atribuem o sucesso das gravadoras independentes ao
surgimento da televisão e à entrada das empresas cinematográficas no campo da
produção fonográfica, que acabou diminuindo o monopólio sobre os canais centrais de
divulgação. Os pesquisadores concluem que tais fatores indicam que o sistema de
“integração vertical” adotado pelas majors se mostrou uma estratégia ineficiente para
um mercado musical em segmentação, no qual o surgimento de demandas insatisfeitas
criou condições para o surgimento e consolidação de novas empresas no cenário
artístico (PETERSON & BERGER, 1975: 161-4).
Na década de 1960, a estratégia adotada pelas grandes gravadoras para assumir
novamente o controle sobre a maior parte do mercado se concentrou na contratação de
artistas que haviam conquistado reconhecimento através de gravadoras independentes e
também na aquisição e incorporação destas próprias gravadoras enquanto selos
subsidiários com o intuito de ampliar o seu espectro de produção aos diversos
segmentos que surgiam e que viriam a surgir no futuro. Conforme apontam Peterson e
Berger (idem: 169), ao adotarem uma gama mais ampla de artistas e segmentos em sua
atuação, as majors conseguiram lidar com cada mudança de gostos e diversificação das
demandas do mercado, mantendo o seu predomínio a partir de uma organização
estrutural mais flexível. Deste modo, ao invés de uma “integração vertical” impetrada
por um sistema fechado de produção, as grandes empresas fonográficas desenvolvem
59
um ‘sistema aberto’, através do qual incorporam/distribuem a produção de empresas
pequenas ou estabelecem contratos com produtores de discos independentes (LOPES,
1992: 57). Esta estratégia permitiu assegurar o monopólio tanto sobre as etapas finais de
produção (fabricação, confecção das capas e distribuição) dos lançamentos como
possibilitou atender novas tendências de consumo e lidar com a imprevisibilidade do
mercado através da incorporação dos novos artistas e novos gêneros em seu espectro de
atuação.
No que se refere à indústria fonográfica brasileira dentro do seu percurso
histórico, algumas iniciativas foram reconhecidas pela busca de autonomia e o intuito de
viabilizar a produção de projetos musicais que se distinguissem das tendências
comerciais consolidadas no mercado e prezadas pelas grandes gravadoras. Por trabalhar
com a parte excedente da produção musical que não é admitida nas grandes empresas,
além de fornecer espaço para novos artistas e novas sonoridades, as gravadoras
“independentes” acabam desempenhando um papel importante de documentação de
uma parte da produção cultural, diversificação da oferta dos produtos e prospecção de
novas tendências no mercado. Conforme já apontou Camargo Costa (1984: 11), até
então não foi empreendido um estudo histórico sobre as iniciativas de produção
independente no país e as informações sobre o tema se encontram difusas em diversos
trabalhos acadêmicos e publicações de jornalistas, faltando ainda pesquisas a serem
realizadas sobre o tema. Devido a este estado da arte, observa-se certa confusão entre os
autores sobre quem teriam sido os pioneiros, além de narrativas de teor nostálgico e
uma omissão/imprecisão de critérios (p. ex. porte da empresa, número de funcionários,
capital próprio ou estrangeiro?, disposição de fábrica própria, realização de todas as
etapas da produção ou somente de algumas?, etc.) que definam claramente que tipo de
empresa pode ser caracterizada como uma gravadora independente na literatura.
Verifica-se na bibliografia especializada, no entanto, certo consenso entre os
autores de que existiram gravadoras de menor porte e de capital próprio desde as
primeiras décadas da produção de fonogramas no Brasil, mesmo antes da nomenclatura
“gravadora/selo independente” ser empregada e reconhecida correntemente enquanto tal
nos meios de comunicação na década de 1960. Trabalhando com alcance local/regional
e parcelas pequenas do mercado em relação ao domínio das grandes empresas, tais
iniciativas constituíram uma alternativa para artistas em início de carreira e algumas
produções musicais desconhecidas do grande público, e conferiram um maior grau de
autonomia nas decisões de determinados agentes no mercado.
60
Considerando a imprecisão de critérios no que se refere à definição de que tipos
de empresas existem no mercado fonográfico e quais podem ser consideradas
“independentes” na literatura, uma pesquisa realizada por uma equipe liderada por
Damiano Cozzella e publicada no livro intitulado Disco em São Paulo (1980) oferece
alguns parâmetros que contribuem para marcar algumas diferenças substanciais.
Baseado em um estudo sistemático e programático realizado, em 1976, sobre os
diversos setores e etapas que envolvem a produção de um disco, os autores propõem
três categorias de empresas de acordo com a dimensão do seu patrimônio, organização
estrutural e divisão interna de funções: a grande, média e pequena empresa. Nesses
termos, para ser considerada completa a estrutura de uma empresa fonográfica deve
possuir, além do setor administrativo, uma direção artística, elenco de artistas, estúdio,
fábrica, gráfica, departamento de divulgação e dispositivos de comercialização (IDART,
1980: 19). As grandes empresas (majors) têm capital e disponibilidade para dar conta de
todos os processos envolvidos e estabelecer funções bastante divididas entre diferentes
setores e seus respectivos diretores. Resguardadas as especificidades de cada uma, sua
estrutura mais recorrente pode ser assim representada:
Fig. 2 – Representação da estrutura de uma grande empresa fonográfica elaborada pelo IDART (1980).
Percebe-se que sua organização interna apresenta dispõe de diferentes setores,
nos quais trabalham uma equipe de profissionais e que desempenham funções
especializadas e interdependentes entre si. Um dos aspectos que diferencia
substancialmente as grandes empresas fonográficas das demais consiste na posse de
fábrica, dado que devido ao alto investimento necessário para a construção, aquisição
das máquinas e manutenção envolvido apenas aquelas com maior patrimônio, capital de
investimento e elevada demanda de produção de discos conseguem compensar tais
61
custos. De modo que, no ano em que a pesquisa foi realizada (1976), apenas sete
empresas dispunham de fábricas (RCA, Continental, Crazy, Copacabana, Odeon,
Tapecar e CBS), o que faz com que as demais empresas de menor porte dependam das
grandes gravadoras para realizar as etapas de corte, prensagem e distribuição dos seus
discos21.
A empresa pequena, por sua vez, tem como característica principal o acúmulo de
quase todas as funções em um grupo reduzido de pessoas e a terceirização de várias
etapas de produção dos discos. O patrimônio envolvido é consideravelmente pequeno e
usualmente não tem um esquema próprio de distribuição em território abrangente, o que
leva a comercializar seus produtos em escala reduzida, por vezes com distribuição e
divulgação feitas pelo próprio artista. Sua estrutura interna pode ser assim representada
(IDART, 1980: 23):
Fig. 3 – Representação da estrutura de uma pequena empresa fonográfica elaborada pelo
IDART (1980).
Percebemos que o número de setores envolvidos no processo de produção é
expressivamente menor e são geralmente administrados e conduzidos pelo próprio
proprietário ou por um grupo reduzido de pessoas. Uma vez que não dispõe de estúdio,
fábrica ou gráfica, a pequena empresa é obrigada a terceirizar etapas importantes da
produção e depender de contratos com grandes empresas e da sua própria dinâmica e
agenda. No entanto, levando em consideração as trajetórias de algumas empresas que
atuaram no percurso histórico da indústria fonográfica pode-se perceber que não era
apenas o fator estrutural que levava uma empresa a ser reconhecida e designada como
21 Segundo relato dos engenheiros da RCA Toshio Icizuca e Bruno Rafaell, em média quarenta por cento da prensagem é destinada a demanda de terceiros e sessenta por cento por demanda da própria RCA. Em outras épocas do ano esta proporção pode chegar até mesmo a cinquenta por cento de cada parte (IDART, 1980: 19).
62
“gravadora independente”. Gravadoras como a RGE, Musidisc, Fermata, Transamérica
operavam como empresas de pequeno porte – dispunham apenas de estúdio e
terceirizavam as demais etapas de produção (confecção das capas, prensagem e
distribuição dos discos) -, e nem por isso foram consideradas empresas
“independentes”, ainda que dispusessem de autonomia administrativa plena.
Nesse sentido, no campo simbólico formado em torno da noção de “gravadora
independente”, parece constituir um fator mais determinante a pré-disposição ou linha
de discurso mantida pelo proprietário/produtor pautada na realização de uma produção
desvinculada das tendências comerciais e imperativos do mercado. Em certos casos tal
posicionamento acaba se tornando um critério de distinção através da atuação da crítica
especializada, cujos discursos baseiam-se em representações de conotação positiva
associadas à ideia de autonomia de seus agentes, a uma determinada forma de produção
cultural dissociada do circuito central das grandes gravadoras, expressando muitas vezes
sua negação22.
Para a pesquisadora Márcia Tosta Dias (2000: 134), as gravadoras independentes
ganham importância apenas no início da década de 1980, fenômeno impulsionado pelo
acelerado desenvolvimento tecnológico e consequente barateamento dos equipamentos
de estúdio (VICENTE, 1996: 66-9). Alguns casos tiveram destaque, como o lançamento
do disco Feito em casa (1977) do pianista compositor Antônio Adolfo, que realizou
todas as etapas de produção, inclusive a de distribuição; a experiência do conjunto Boca
Livre, que realizou uma produção independente e alcançou a expressiva cifra de 80 mil
cópias vendidas e exposição na mídia, frequentando programas de auditório de grande
audiência na televisão; os discos de música instrumental lançados através da iniciativa
da gravadora Som da Gente do casal de compositores Walter Santos e Tereza Souza; a
produção experimental de compositores, desenvolvida em São Paulo, que se
convencionou chamar de Vanguarda Paulista, entre outras (cf. MULLER, 2005).
22 Além da imprecisão de critérios que caracterizem a condição de “gravadora independente”, outra confusão conceitual pode ser observada no emprego, muitas vezes sem distinção, dos termos “selo” e “gravadora”. O termo “selo” pode tanto fazer referência ao “rótulo” fixado no disco, que traz o logotipo e as informações relacionadas à empresa que o produziu, estabelecendo aí uma relação entre o rótulo/selo e a empresa; como também à designação de selo subsidiário – departamentos internos de alguma grande gravadora, criados para seguir uma orientação temática e se especializarem em um segmento específico do mercado (p. ex. os selos Verve e Prestige, este último dedicado ao lançamento de discos de jazz e subordinado atualmente à Universal Music Group). Apesar de disporem normalmente de um maior grau de autonomia, ainda permanecem sob a administração, da agenda e dos interesses da grande empresa associada.
63
A abordagem das trajetórias das gravadoras Festa, Elenco e Forma, a ser
realizada nos próximos capítulos, constitui uma circunstância favorável para retomar a
discussão sobre tais formulações e representações simbólicas formadas sobre as noções
de “independência” e autonomia artística no setor fonográfico. Uma vez que seus
lançamentos também tiveram destaque em matérias de críticos devido à sua condição
“independente” empregando uma argumentação similar já em 1965 (CARDOSO, 1965),
convém aqui colocar a compreensão histórica da noção de “gravadora independente”
em reavaliação sob luz desta lacuna histórica. Vale frisar que não se trata de querer
invalidar o “pioneirismo” atribuído por vários autores à iniciativa de Antônio Adolfo ou
à gravadora Disco Popular de João Gonzaga e Severio Leonetti, ou à gravadora Gaúcho
associada a Gustavo Figner (DIAS, 2001: 131-2), mas sim de trazer para o debate
novamente a historicidade destas classificações.
Com o intuito de evitar as representações associadas à ideia de independência,
que se mostram incoerentes se considerarmos uma relação, na verdade, de dependência
destas empresas com as grandes gravadoras - principalmente nas etapas de prensagem,
corte e distribuição-, optamos aqui por trabalhar com a especificidade de cada pequena
empresa fonográfica, desenvolvendo a noção de iniciativas autônomas. Compreendemos
a noção de autonomia associado à produção fonográfica de pequenas empresas neste
trabalho não como uma ação estritamente diletante de produtores, com o intuito de
garantir a liberdade artística integral aos seus artistas e desinteressada comercialmente,
mas sim como iniciativas que buscam prosperar financeiramente - ainda que obtendo
retorno modesto dos seus investimentos-, e que optaram por garantir sua autonomia
administrativa e suas convicções estéticas, evitando influência de terceiros
(empresários, investidores, sócios, etc.), seja por alteridade em seus valores políticos ou
culturais em relação aos padrões hegemônicos ou pelo interesse exclusivo de disputar
por um espaço no mercado fonográfico. No entanto, avaliamos que tal autonomia
disposta por estas empresas se mostra ser relativa, pois ainda que desfrutem de liberdade
de decisão em relação às grandes gravadoras, atuam em um contexto de mercado e têm
de produzir sob as limitações dos recursos materiais que dispõem e dentro da lógica de
funcionamento do sistema. É partir desta concepção de autonomia relativa ao setor
fonográfico que analisaremos a seguir as trajetórias das gravadoras Festa, Elenco e
Forma.
64
CAPÍTULO 2 – AS GRAVADORAS FESTA, ELENCO E FORMA:
FUNDAÇÃO, MODO DE ATUAÇÃO, PERFIS DE PRODUÇÃO E CATÁLOGOS
2. 1. Populismo, funcionalismo público e modernismo
Dentro da perspectiva de reflexão proposta neste trabalho sobre as relações entre
as atividades das três gravadoras e as condições materiais sócio-históricas de produção
no contexto das décadas de 1950 e 1960, neste capítulo tratamos das trajetórias das
gravadoras Festa, Elenco e Forma, os perfis dos seus produtores, os procedimentos de
produção adotados, os gêneros musicais que predominaram em suas produções e a
caracterização dos discos mais representativos dos seus catálogos. No entanto, com o
intuito de tentar conferir maior profundidade à nossa tese principal e abordar questões
centrais que tangem os nossos objetos de estudo, como o papel desempenhado pelo
Estado e seus agentes na dinâmica do mercado de bens simbólicos, suas relações com o
setor privado, a construção da identidade nacional, o modernismo e a presença do
funcionalismo público no campo cultural, reconhecemos como necessário antes
percorrer algumas transformações promovidas pelo modelo de governo do período
vigente situado entre os anos de 1930 e 1945, caracterizado na sociologia como governo
populista.
Nos quadros da estrutura social e econômica do Brasil, uma série de
transformações políticas e institucionais, ocorridas a partir de 1930, impulsionavam um
processo de transição de uma base social de caráter agro-exportador para o modelo
urbano-industrial. A progressiva perda da base de poder pelas oligarquias rurais e sua
paulatina derrota política para as classes sociais urbanas, vinculadas a então nascente
indústria nacional, ficaram marcadas historicamente pelo episódio conhecido como
“Revolução de 1930”. Desde esse período os desenvolvimentos das políticas estatais
tenderam a favorecer os conteúdos burgueses em detrimento dos elementos culturais e
políticos de tipo oligárquico vigentes nas décadas anteriores (cf. IANNI, 1996). Nesse
sentido, nos primeiros anos o governo provisório de Vargas, apoiado por uma nova
coalisão de classes procurou, por um lado, reformular, redimensionar e integrar órgãos
governamentais pré-existentes e criar novos com o intuito de combater a recessão
econômica vinculada ao setor exportador cafeeiro e à crise internacional de 1929 e, por
outro lado, solapar as bases políticas da oligarquia tradicional.
Uma vez que chegou ao poder em decorrência da crise do poder das oligarquias
associadas à Velha República, o governo Vargas não possuía uma base social vinculada
65
à colisão de uma classe hegemônica. Embora tenha recebido apoio de segmentos da
burguesia industrial nascente, oligarquias dissidentes que produziam para o mercado
interno e certas alas do tenentismo (MICELI, 2001: 100), o governo assumiu ainda
como necessário para garantir a ordem social conquistar legitimidade junto às massas
urbanas, que se ampliavam desde a abolição da escravidão com o crescimento do setor
terciário e da própria urbanização. Segundo Weffort (1989: 50), “o poder conquistado
pelos revolucionários nos quadros de um compromisso, só encontraria condições de
persistência na medida em que se tornasse receptivo às aspirações populares”. Assim, os
decretos, dispositivos constitucionais e a legislação trabalhista implementados pelo
governo tiveram o intuito de atender às diversas reivindicações das massas urbanas e, ao
mesmo tempo, desarticular e esvaziar o conteúdo político dos movimentos e lutas
operárias (IANNI, 1996: 44-51). Esse tipo de política caracteriza um governo populista,
pois se por um lado se mostra receptivo aos anseios das massas urbanas, por outro lado
busca manipular e esvaziar o sentido político das lutas de classes, constituindo o motivo
de sua insatisfação e pressão. Comentando à respeito, destaca Ianni (1968: 61-4):
[...] graças à política de massas, foi possível efetivar determinadas etapas do desenvolvimento industrial. Por meio das técnicas políticas e jurídicas inerentes ao populismo, manteve-se em nível adequado ao progresso industrial a relação entre custo de vida e salário real. Em âmbito mais largo, foi a política populista que propiciou a conciliação de interesses [econômicos] em benefício da industrialização e em nome do desenvolvimento nacionalista.23
Para Octavio Ianni (1996), no percurso de desenvolvimento do sistema político-
econômico brasileiro do período Vargas convergiram duas tendências importantes de
impacto representativo na estrutura social e na esfera cultural do país: a crescente
participação estatal na economia e a política econômica planificada. As sucessivas
crises ocorridas na economia primária exportadora (açúcar, café, borracha, etc.) e os
efeitos das crises do capitalismo mundial (Depressão de 1929, Primeira e Segunda
Guerra Mundial) tornaram evidentes as limitações da dependência econômica em
relação ao capital estrangeiro e acentuavam a necessidade de transformações políticas
profundas. A interferência estatal na economia e a adoção de medidas estratégicas
planejadas impunham-se no governo de Vargas como essenciais para superar as
deficiências estruturais do país e os diversos impasses interpostos no desenvolvimento
23 Colchetes nossos. Grifos do próprio autor.
66
da indústria nacional, frente à omissão de iniciativas privadas. Nesse sentido, conforme
Ianni destaca (1996: 51-64), o poder público passa cada vez mais a adotar diretrizes
intervencionistas, nacionalistas e a prática de medidas planificadas no âmbito
econômico. Este aspecto fica evidente no conteúdo das Constituições brasileiras de
1934 e 1937 e na criação de diversos órgãos públicos como o Conselho Federal do
Comércio Exterior; o Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial; a
Coordenação de Mobilização Econômica; entre outros, destinados a expandir e
implementar a eficiência do sistema produtivo, da logística e dos mecanismos
financeiros de diversos setores (mineração, agricultura, pecuária, etc.) por meio de
estudos técnico-científicos com coleta de dados e consequente sistematização, análise e
avaliação de medidas sobre os problemas identificados (idem).
Além da implementação de uma política nacional-desenvolvimentista de perfil
intervencionista e emancipacionista, o período do governo Vargas caracterizou-se
também pela associação de um modelo de governo populista com o surgimento de uma
cultura de massa. Para Zan (1997: 34), a massificação ocorrida no Brasil adquiriu
características específicas, se comparada com a dos países desenvolvidos, uma vez que
ela promoveu certo enfraquecimento das formas de solidariedade internas e de
consciência da classe trabalhadora em formação desde o início da República Velha
(1889-1930). Dado que a industrialização consistia ainda em um fenômeno nascente na
sociedade brasileira, a massificação não ocorreu a partir de uma estrutura de classes
bem delineada como nos países industrializados e contribuiu para a dissolução de
formas tradicionais de sociabilidade vigentes, especialmente nas zonas rurais. Além
disso, a constituição do massivo no país se difere também pela ausência de uma
indústria cultural. As empresas ligadas à comunicação de massa no Brasil tinham suas
atividades limitadas pelos entraves e dificuldades presentes no estágio de
desenvolvimento do sistema capitalista e, por isso, faltava o caráter integrador de
diversos setores, característico em sociedades urbanizadas e industrializadas (ORTIZ,
1994: 48).
Segundo Martín-Barbero (2009: 228-31), a cultura massiva iniciou a partir de
1930 nos países latino-americanos em um processo no qual os meios de comunicação
desempenharam um papel fundamental até os anos 1950 como um dos principais
elementos mediadores das relações entre o Estado e as massas. Conforme aponta o autor
(idem), a eficácia e o sentido social dos meios estão mais relacionados ao modo como
foram apropriados e o reconhecimento que as massas populares fizeram deles e de si
67
próprias do que com a sua organização industrial e seus conteúdos ideológicos. Barbero
ainda complementa:
“não porque o econômico e o ideológico não fossem desde então dimensões-chaves no funcionamento dos meios, mas porque o sentido de sua estrutura econômica e da ideologia que eles difundem remete para além de si mesmas, para o conflito que nesse momento histórico informa e dinamiza os movimentos sociais: o conflito entre massa e Estado, e sua solução de ‘compromisso’, sob a forma do populismo nacionalista e dos nacionalismos populistas” (idem).
Além disso, a ideologia nacionalista foi um dos componentes importantes do
imaginário de governos populistas dos países latino-americanos, uma vez que ao
manipularem os meios massivos, atuaram “no sentido de converter as massas em povo e
o povo em Nação”. No entanto, para Barbero a interpelação do Estado frente às massas
somente surtiu efeito no momento em que as massas reconheceram nos bens culturais
veiculados pelos meios de comunicação algumas de suas expectativas, demandas e suas
próprias formas de expressão. Deste modo, pode-se dizer que através desse modelo
populista de constituição do massivo foi realizada nos países da América Latina a
gestão da crise de hegemonia, o parto da nacionalidade e a entrada na modernidade
(idem).
No processo de centralização autoritária, ocorrido no governo Vargas entre 1930
e 1945, a ampliação do aparato burocrático prestou uma contribuição efetiva na
manutenção de uma base social de apoio ao poder público. Conforme aponta Miceli
(2001: 195-237), a abertura de ministérios, uma série de departamentos e órgãos
vinculados diretamente ao Presidente da República, e de uma rede de autarquias,
conselhos e comissões especiais teve função não apenas administrativa direta, mas
também de atingir espaços emergentes de negociação entre o Estado e os diversos
setores econômicos e operavam como frentes de legitimação da crescente intervenção
do Estado em setores até então sob o domínio de outras frações da classe dominante.
Tal processo de formação de uma grande rede de aparelhos estatais propiciou as
condições necessárias para a expansão e a cristalização da categoria social dos
funcionários públicos.
Nesse contexto, cresceu constantemente o número de postos e cargos destinados
a intelectuais que também estavam envolvidos na produção cultural e simbólica. Estes
68
assumiram as diversas tarefas políticas e ideológicas associadas à crescente intervenção
do Estado nos diferentes setores de sua atividade. Segundo Miceli (2001: 197),
Durante o período populista (1945-1964), verifica-se uma ampliação das carreiras reservadas aos intelectuais ao mesmo tempo que se intensifica o recrutamento de novas categorias de especialistas (economistas, sociólogos, técnicos em planejamento e administração etc.); muitos deles se alçaram aos postos-chaves da administração central, dos quais foram sendo excluídos outros grupos de intelectuais e especialistas que resistiram à implantação das diretrizes e dos programas adotados pela nova coalizão dominante nos últimos quinze anos em que os militares se apoderaram do controle do Estado.
Dentre os intelectuais convocados, uma quantidade expressiva de escritores e
poetas modernistas ocuparam cargos públicos e trabalharam em função das diretrizes e
demandas do Estado nacional, a saber, Manuel Bandeira, Mário de Andrade, Oswald de
Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Menotti Del Picchia, Guilherme de Almeida,
Lima Barreto, Cassiano Ricardo, Jorge Amado, José Lins do Rego, Graciliano Ramos,
Vinicius de Moraes, João Cabral de Melo Neto, Murilo Mendes, Cecília Meireles, entre
outros24. Conforme aponta Miceli (2001: 208), estes e outros intelectuais tenderam a se
efetivar em cargos com que dispunham de padrões de rendimento elevados e de uma
série de regalias e vantagens na hierarquia burocrática. Eram convocados ora para
atuarem como funcionários em tempo parcial, para prestação de serviços de consultoria
e trabalhos afins, para o desempenho de cargos de confiança em posições elevadas da
hierarquia, para assumirem direções de órgãos governamentais ou para ocuparem
posições que se abriam nas novas carreiras em demanda pelas políticas de intervenção
do Estado. O ingresso dos intelectuais no estamento burocrático atingiu uma extensão
considerável e passou a constituir uma condição favorável e indispensável para a
legitimação nos diversos domínios do campo intelectual, inclusive aqueles da esfera
privada que não dependiam necessariamente de favores e concessões do poder público
para garantir sua subsistência.
Nesse sentido, na medida em que seus vínculos institucionais garantiam os
subsídios necessários para a própria manutenção, os escritores modernistas e demais
intelectuais dispunham de relativa autonomia em relação ao poder político para realizar
sua produção literária, prestar colaborações para a imprensa e atuar em um mercado
24 Informações sobre as carreiras profissionais dos escritores retiradas de capítulos e de tabelas apresentadas em MICELI, 2001: 18-19, 108-109, 164-165.
69
editorial em vias de expansão. Condição esta contrastante à da geração de escritores
associada à República Velha, os quais dependiam diretamente das instituições e grupos
das classes dominantes e não raro “viam-se forçados a ajustar-se a gêneros havia pouco
importados da imprensa francesa: a reportagem, a entrevista, o inquérito literário e, a
crônica” (MICELI, 2001: 17). Assim, segundo Miceli (2001: 79), pode-se afirmar que
os grupos sociais de classe média em expansão nos grandes centros industriais e
administrativos do país (os funcionários públicos, profissionais do setor terciário, etc.),
cujo apoio constituiu uma base social de sustentação do regime, favoreceram a
constituição de um mercado de bens culturais dotado de maior autonomia, tanto em
relação aos antigos grupos dirigentes e aos seus mecenas privados, como às instâncias
políticas e religiosas (o Estado, a Igreja, a grande imprensa etc.) interessadas em impor
suas diretrizes à produção cultural.
Ao mesmo tempo em que compunham o corpo de agentes do Estado e
ocupavam-se em função das diretrizes e medidas intervencionistas de propósitos
nacionalistas do governo na esfera institucional, os escritores modernistas integravam
também a linha de frente das lutas literárias contra o academicismo e o formalismo da
poesia parnasiana e a favor da construção de uma “identidade nacional” na esfera
simbólica. Diferentemente de como ocorreu nos países industrializados, os integrantes
do Modernismo no Brasil fizeram coincidir a busca pelo moderno, inspirada nos
princípios e modelos estéticos das vanguardas européias (futurismo, cubismo,
surrealismo), com um projeto nacionalista, representada pela busca de temáticas e
símbolos das origens país. Deste modo, buscavam romper com os elementos culturais
associados à ordem política oligárquica vigente nas décadas anteriores e assegurar uma
“consciência criadora nacional” (ANDRADE, 1978: 242), com o emprego de signos
locais para a decantação de uma arte moderna.
Dentro dos propósitos deste trabalho, convém avaliar a seguir de que maneira a
conjuntura política e estrutural resultante do modelo de governo populista engendrou as
condições de produção dispostas pelos agentes sociais (literatos, músicos, jornalistas,
produtores, etc.) no mercado de bens simbólicos, e, mais especificamente, na produção
da gravadora Festa. Além disso, interessa aqui refletir sobre a associação do Estado
nacional com o setor privado na implementação de políticas e de fomento às produções
culturais que contribuíssem para a integração nacional e “consolidassem” a identidade
nacional.
70
2. 2. Intelectuais modernistas e a fundação da gravadora Festa
Segundo Ortiz (1994: 25), uma das diferenças marcantes manifestadas até a
década de 1960 entre o mercado cultural brasileiro e o europeu/norte-americano se
evidencia na ausência de uma diferenciação clara entre pólo de produção restrita
(cultura erudita ou alta cultura) e de produção ampliada (cultura massiva ou de massa).
Devido ao estágio precário de desenvolvimento do capitalismo no país e às
complicações daí decorrentes - como a fraca divisão do trabalho intelectual e a confusão
de fronteiras entre as diversas áreas culturais-, tornava-se difícil se desenvolver uma
expressão plena do mercado de bens simbólicos (idem). Entre os impasses para a
autonomização do campo artístico literário figurava, por exemplo, a dificuldade de se
formar um público de consumidores. Para isso contribuía ainda em grau expressivo os
índices de analfabetismo (em 1920, 75%; em 1940, 57%; em 1950, 50,6%) e de baixa
escolaridade da população (idem: 28). Entre os pesquisadores da área, há um consenso
de que, até a década de 1930, a produção e o comércio de livros eram praticamente
inexistentes em termos de mercado. Uma vez que não havia possibilidade de obter
rendimentos suficientes com a produção artística, o intelectual era condicionado a
exercer funções no magistério e cargos públicos e a adequar sua agenda com suas
atividades artísticas. Cenário este que tomou proporções consideráveis com as políticas
do governo Vargas, conforme apontamos no tópico anterior.
Nesse panorama, a imprensa desempenhou um papel distinto como mediador
entre os intelectuais e o seu público enquanto esfera de produção de massa. Para o
escritor, prestar colaborações para jornais representava uma oportunidade de obter renda
e prestígio social, dado que consistia um dos únicos meios do escritor tornar os seus
textos acessíveis ao público e em um dos principais canais de influência política nos
quais se envolviam as disputas oligárquicas. Conforme aponta Miceli (2001: 54), no
início do século XX, o jornalismo consistia em um ofício compatível com o status de
escritor e em uma possibilidade de atividade regular de rendimento suplementar
indispensável para os intelectuais. A expansão do setor editorial e da imprensa ocorrida
a partir da década de 1930, fez com que se rompesse o monopólio dos produtores sobre
os instrumentos de produção e modificasse também a estrutura das instâncias de
consagração. A consagração no campo deixa de ser concedida às “obras
notáveis/destacadas” de compositores individuais para se destinada a grupos de
escritores associados a empreendimentos intelectuais coletivos (jornais, etc.), que
tendem a se tornar as principais instâncias de consagração no campo literário (idem: 57).
71
Assim, devido à insuficiente institucionalização da esfera literária, um órgão voltado
para a comunicação de massa se transforma em uma instância consagradora de
legitimidade da obra literária.
Na década de 1950, as redações da imprensa consistiam ainda em um espaço de
prestígio intelectual e integravam respeitados escritores, poetas, ensaístas, críticos
literários e de arte do país. Dada a dificuldade de acesso ao ensino superior, consistia
algo incomum entre os jornalistas ter uma formação com curso universitário na área e
muitos não concluíam o curso secundário. Normalmente sua formação profissional se
dava nos próprios jornais ou em cursos de Direito e dividiam suas atribuições na
imprensa com cargos públicos (cf. O MODERNO, 2008).
É neste panorama da configuração do mercado de bens culturais e das condições
de atuação dispostas pelos intelectuais e escritores modernistas que pretendemos situar a
atuação de Irineu Garcia, os círculos sociais por ele frequentados e a sua iniciativa no
mercado fonográfico junto à gravadora Festa. Oriundo de uma família residente na
pequena cidade de Cajuru, do interior de São Paulo, Irineu José Garcia nasceu em 1920
e, já no começo da sua adolescência, deixou a casa dos pais, a princípio para trabalhar
em um dos principais jornais da cidade de Ribeirão Preto. Pouco depois, mudou-se para
a cidade do Rio de Janeiro e começou a atuar em diferentes tipos de trabalhos até ser
contratado pelo periódico Jornal do Brasil. Neste, assumiu o ofício de crítico literário
desde a década de 1950 e conviveu no meio artístico do Rio de Janeiro, mantendo
vínculos próximos com produtores culturais, editores de jornais e livros, e escritores de
prestígio da esfera literária25.
Apesar de não pertencer a uma das famílias que integravam as classes dirigentes
e dispor de rendimento modesto, Irineu Garcia habitou círculos sociais de intelectuais
influentes de escritores modernistas, compositores, agentes públicos e compartilhou de
hábitos de consumo, vestuário e comportamento semelhantes, o que consistia um entre
os frequentes casos de importação dos padrões de gosto das classes abastadas.
Conforme aponta Miceli (2001: 97), as viagens à Europa, o aprendizado de modelos
estéticos e éticos das vanguardas européias, as formas requintadas do consumo,
impregnavam as obras de autores modernistas financiadas pelos mecenas. Tais práticas
consistiam uma referência de distinção simbólica e orientavam outras práticas no campo
simbólico não apenas de Irineu Garcia, mas também de outros agentes. Vejamos trechos
25 Informações obtidas por meio de entrevista com Gracita Garcia, sobrinha de Irineu Garcia, realizada pelo autor deste trabalho no dia 05/08/2016.
72
de publicações que apresentam relatos descritivos com indícios representativos para se
compreender os hábitos de Garcia:
A elegância do jornalista Irineu Garcia era facilmente perceptível pelos trajes que vestia e pelo trato com as palavras. Sempre de terno alinhado, independente das altas temperaturas do Rio de Janeiro, era incapaz de pronunciar um palavrão sequer. Do alto de seus 1,90 m, apresentava traços firmes em seu semblante - familiar pelo bigode sempre bem aparado e pelo início de uma calvície que denotava respeito e experiência, marcas que lhe caracterizavam como um homem sábio e seguro. Calmo e reservado, Irineu gabava-se de não frequentar as praias cariocas, era amante da literatura latino-americana, apreciador de música erudita e, acima de tudo, um defensor implacável da cultura. Cronista do Jornal do Brasil e conhecido da grande parcela da intelectualidade do país nos anos 50, Irineu teve sua melhor ideia após ouvir gravações francesas de Paul Eluard declamando seu famoso poema Liberté e de André Gide comentando uma aula de piano. [...] Carlito Maia conheceu o jornalista Irineu Garcia no Rio de Janeiro, e afirmou que apesar do clima, ele jamais foi visto na cidade sem paletó e gravata: “E ainda vangloriava-se de nunca ter ido à praia. Era um homem muito cerimonioso. Um cavalheiro, um príncipe”. (IRINEU, 1984: 1)
Fica evidente nas duas descrições símbolos e representações de um
comportamento típico de segmentos sociais médios e altos, observados pelo uso de
argumentos que enfatizam a elegância dos seus trajes, o uso de um vocabulário
adequado (sem palavrões), temperamento calmo, domínio de línguas estrangeiras, o
gosto pela literatura de diferentes países e pela música erudita. Tais hábitos e tipos de
comportamento traduziam a busca - não apenas de Irineu Garcia, mas de uma camada
social média em ascensão-, por distinção simbólica dentro dos círculos sociais que
ocupavam naquele período. A escolha de vestimentas, os gestos pelos quais alguns
grupos se identificavam, o gosto e a preferência por um tipo específico de obra artística,
a crença ou descrença em valores religiosos, ou seja, a forma como se comportavam no
cotidiano constituía em um pressuposto básico para ser aceito e frequentar determinados
grupos sociais.
Em meados da década de 1950, Irineu Garcia manteve o hábito de frequentar a
mercearia chamada Vilarino, que constituiu um ponto de encontro de um grupo
influente de intelectuais: escritores, radialistas, músicos, diplomatas, poetas e jornalistas
atuantes em repartições públicas e nos diferentes setores do mercado cultural, não
somente na indústria fonográfica, mas também no editorial e radiofônico. A título de
73
exemplo, pode-se citar como frequentantes do estabelecimento: Rubem Braga, Darcy
Ribeiro, Paulo Mendes Campos, Ari Barroso, Haroldo Barbosa, Luiz Jatobá, Lúcio
Rangel, Sérgio Porto, Di Cavalcanti, Antonio Bandeira, Fernando Lobo, Aracy de
Almeida, Tom Jobim, Vinicius de Moraes, entre outros (cf. CASTRO, 1997).
Neste período, Irineu Garcia recebia por encomenda discos de poemas da França
e, dentre eles, estavam dois discos com crônicas dos escritores franceses Paul Éluard e
André Gide recitados pelos próprios autores (cf. CASTRO, 1997). A partir desta
referência teria surgido a ideia de fundar uma gravadora, com o intuito inicial de
documentar as vozes de poetas e literatos consagrados do país em disco e lançar no
mercado fonográfico. Para concretizar o projeto, Garcia contou com Arnaldo Pedro
Santos para formar sociedade e entrar com parte do capital inicial e, em parceria com o
editor de livros Carlos Ribeiro, fundou a Festa Discos Ltda, em 1955 (cf. MURILO,
1955), empresa pela qual se começa a dedicar de maneira intensa nos anos seguintes.
No que se refere ao nome da gravadora, o produtor inspirou-se em uma das
revistas literárias que lançaram os textos que disseminaram as ideias revolucionárias do
movimento cultural do Modernismo de 22, a Revista Festa (1927-9) (cf. FILHO, 1984) 26. Ao lado de outras revistas como a Revista Klaxon (1922-3), Árvore Nova (1922),
Revista de Antropofagia (1928-9), a Revista Festa reuniu textos de escritores como
Andrade Muricy, Tasso da Silveira, Henrique Abílio e Barreto Filho, que integraram a
primeira geração do movimento.
A decisão pelo nome com base em uma revista do movimento modernista não
constitui um mero acaso, uma vez que a grande maioria dos escritores que gravaram os
primeiros discos da gravadora escreveu segundo princípios estéticos praticados nas
diferentes fases do modernismo brasileiro do século XX. Alguns deles integraram a
primeira etapa do movimento (1922 – 1930), como Mário de Andrade, Manoel
Bandeira, Guilherme de Almeida, Sérgio Milliet, Menotti del Picchia e Cassiano
Ricardo. Outros constituíram os seus sucessores e foram reconhecidos posteriormente
como a segunda geração do modernismo (1930 – 1945), tais como Jorge Amado,
Vinicius de Moraes, Augusto Frederico Schmidt, Murilo Mendes, Érico Veríssimo,
Cecília Meireles, Emílio Moura, Abgar Renault, Adalgisa Nery e Augusto Frederico
Schmidt.
26 Para maiores informações sobre a Revista Festa e o papel desempenhado no movimento cultural do Modernismo de 22, consultar a dissertação de mestrado: RUCKER, Joseane de Mello. A Revista Festa e a modernidade universalista na arte. Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.
74
Para os primeiros lançamentos da gravadora, foram convidados a participarem,
além dos autores modernistas já citados, João Cabral de Melo Neto, Paulo Mendes
Campos, Onestaldo de Pennafort, Olegário Mariano, Álvaro Moreira, Ascenso Ferreira,
Vargas Neto, Rosalina Coelho Lisboa e Gilberto Amado. Durante os três anos iniciais
de atividade foi lançada uma série de discos de poesia brasileira recitada por seus
próprios autores ou por um declamador(a) convidado. O primeiro conjunto de
lançamentos contabilizou 13 títulos, além das coletâneas de obras selecionadas,
intituladas Moderna poesia brasileira – Jograis de São Paulo (1956), Poesia de sempre
– Antologia (1956), Recital de Margarida Lopes de Almeida (1956), O pequeno
príncipe – Antoine Saint-Exupéry (1958), Poemas de Amor – Pablo Neruda (s/d), entre
outros.
Assim, desde o princípio a produção realizada por Irineu Garcia através da
gravadora Festa foi articulada dentro de círculos sociais de escritores modernistas,
jornalistas e profissionais com relações próximas à fração intelectual e política da classe
dominante e vinculada em sua grande maioria ao aparelho burocrático do Estado. Além
da proximidade com o nicho social das classes intelectuais e dirigentes, o perfil de
atividade da gravadora manteve uma afinidade evidente com o projeto modernista, tanto
no que se refere à importação de preceitos estéticos das vanguardas européias, como à
perspectiva nacionalista. O próprio intuito inicial de fundação da gravadora de
documentar as vozes de poetas representativos da cultura brasileira, por exemplo,
evidencia esse aspecto, posto que traduz a intenção de Garcia de registrar e preservar
fenômenos culturais representativos da cultura brasileira e de fomentar a consolidação
de uma “identidade nacional”.
75
Fig. 4 e 5 – Capa e contracapa do primeiro LP lançado pela gravadora Festa, Poesias Vol. I – Carlos Drummond e Manuel Bandeira (1955). Fonte: Instituto Moreira Salles, Coleção Jorge
Zahar.
76
Vejamos o texto escrito pelo escritor modernista Paulo Mendes Campos para
compor a contracapa do primeiro LP da gravadora, que constitui um indício bastante
representativo da convergência de convicções nacionalistas:
Neste disco se gravou para sempre a voz de dois escritores que ficarão para sempre na história da literatura brasileira como pontos altos de nossa evolução literária. Há muito tempo a Europa e os Estados Unidos têm esse bom costume de gravar os seus melhores poetas e de oferecê-los ao público. Só agora começamos. Dou meus parabéns a Irineu Garcia e Carlos Ribeiro, oportunos idealizadores da valiosa coleção que aqui se inicia. Antes tarde do que nunca. (POESIAS, 1955) 27
A relação próxima de Garcia com os modernistas e o seu universo simbólico na
década de 1950 fica notável também no projeto gráfico desenvolvido para as capas dos
lançamentos da gravadora. Ao convidar artistas plásticos, desenhistas, gravuristas
consagrados no país - como Lygia Clark, Emiliano Di Cavalcanti, Darcy Penteado,
Fernando Lemos, Poty Lazarotto, Oswaldo Goeldi, artistas sensíveis aos movimentos
das vanguardas artísticas européias e às práticas disseminadas pela arte moderna-, para
ilustrar as capas dos discos, o produtor buscava distinguir a produção da gravadora
Festa associando a marca da empresa ao tipo de técnica e de ilustração empregada pelos
artistas, bem como ao valor simbólico que as obras de tais artistas já haviam adquirido
na cena artística.
27 Grifos nossos.
Fig. 6 – Capa do LP Poesias Vol. XIII pelo artista plástico Fernando Lemos. Fonte: Instituto Moreira Salles, Coleção
Fig. 7 – Capa do LP Jograis de São PauloPenteado. Fonte:
Como estratégia de divulgação dos lançamentos da Festa Discos
organizadas seções de autógrafos com os escritores em livrarias
lançamento. Nestes eventos
produção dos discos, além d
Poesias Vol. XIII – Sergio Milliet e Manoel Bandeira (1958)
pelo artista plástico Fernando Lemos. Fonte: Instituto Moreira Salles, Coleção
Jograis de São Paulo (1956), realizada pelo artista plástico Darcy
Penteado. Fonte: Instituto Moreira Salles, Coleção Jorge Zahar.
Como estratégia de divulgação dos lançamentos da Festa Discos
seções de autógrafos com os escritores em livrarias ou
eventos convidavam-se aqueles envolvidos no processo de
além de artistas e profissionais do setor editorial e da indústria
77
(1958), realizada pelo artista plástico Fernando Lemos. Fonte: Instituto Moreira Salles, Coleção Robespierre.
, realizada pelo artista plástico Darcy Instituto Moreira Salles, Coleção Jorge Zahar.
Como estratégia de divulgação dos lançamentos da Festa Discos eram
ou coquetéis de
no processo de
artistas e profissionais do setor editorial e da indústria
fonográfica. A título de exemplo, pode
Almeida, Paulo Autran e Glória Cometh
que recebiam cópias dos discos e
Claribalte Passos (Correio da Manhã), Zito Batista Filho (O Globo), Silvio Túlio
Cardoso (O Globo), Ruth Silver (Jornal do Brasil), Ary V
de Andrade (O Jornal) e Lúcio Rangel (diversos) (cf. MURILO, 1955; O PEQUENO,
1957). Além dos eventos organizados e das resenhas, Irineu Garcia investia também na
publicidade através da publicação de anúncios sobre os últimos l
gravadora em periódicos especializad
Revista do Rádio.
Fig. 8 – Rótulo utilizado nos primeiros lançamentos da gravadora Festa. Acima, o LP Poesia Brasileira – Jograis de São Paulo
A ideia de Irineu Garcia em lançar discos de literatura declamada no país não era
exatamente inédita, pois já havia nos Estados Unidos
segmentos com este tipo de produção no mercado fonográfico, e, além disso,
28 Palavra apropriada da língua francesa e empregada, na década de 1950, para designar artistas que se especializavam no ato de recitar textos da dramaturgia ou da literatura (poesia, conto, crônica, etc.) em performances expressivas. Não tinham necessariamecênicas. Segundo Manuel BandeiraMarianne Moore e Elisabeth Bishop eram reconhecidos pela sua habilidade em declamar suas próprias poesias, fenômeno considerado incomum no Brasil.
A título de exemplo, pode-se citar os diseurs28 Margarida Lopes de
Almeida, Paulo Autran e Glória Cometh, os poetas, assim como jornalistas e críticos
que recebiam cópias dos discos e posteriormente publicavam resenhas em periódicos
Claribalte Passos (Correio da Manhã), Zito Batista Filho (O Globo), Silvio Túlio
Cardoso (O Globo), Ruth Silver (Jornal do Brasil), Ary Vasconcelos (O Jornal), Ayres
de Andrade (O Jornal) e Lúcio Rangel (diversos) (cf. MURILO, 1955; O PEQUENO,
1957). Além dos eventos organizados e das resenhas, Irineu Garcia investia também na
publicidade através da publicação de anúncios sobre os últimos l
especializados da área, como a Revista Long Playing
Rótulo utilizado nos primeiros lançamentos da gravadora Festa. Acima, o LP Jograis de São Paulo (Festa/ 1956). Fonte: Instituto Moreira Salles,
Coleção Jorge Zahar.
A ideia de Irineu Garcia em lançar discos de literatura declamada no país não era
exatamente inédita, pois já havia nos Estados Unidos, na França
segmentos com este tipo de produção no mercado fonográfico, e, além disso,
Palavra apropriada da língua francesa e empregada, na década de 1950, para designar artistas que se especializavam no ato de recitar textos da dramaturgia ou da literatura (poesia, conto, crônica, etc.) em
expressivas. Não tinham necessariamente formação e/ou experiência na área de artes cênicas. Segundo Manuel Bandeira (1958: 3), poetas da língua inglesa, como T. S. Elliot, Dylan Thomas, Marianne Moore e Elisabeth Bishop eram reconhecidos pela sua habilidade em declamar suas próprias
fenômeno considerado incomum no Brasil.
78
Margarida Lopes de
assim como jornalistas e críticos
publicavam resenhas em periódicos –
Claribalte Passos (Correio da Manhã), Zito Batista Filho (O Globo), Silvio Túlio
asconcelos (O Jornal), Ayres
de Andrade (O Jornal) e Lúcio Rangel (diversos) (cf. MURILO, 1955; O PEQUENO,
1957). Além dos eventos organizados e das resenhas, Irineu Garcia investia também na
publicidade através da publicação de anúncios sobre os últimos lançamentos da
Revista Long Playing e a
Rótulo utilizado nos primeiros lançamentos da gravadora Festa. Acima, o LP Moderna 1956). Fonte: Instituto Moreira Salles,
A ideia de Irineu Garcia em lançar discos de literatura declamada no país não era
na França e na Alemanha
segmentos com este tipo de produção no mercado fonográfico, e, além disso, outros
Palavra apropriada da língua francesa e empregada, na década de 1950, para designar artistas que se especializavam no ato de recitar textos da dramaturgia ou da literatura (poesia, conto, crônica, etc.) em
nte formação e/ou experiência na área de artes , poetas da língua inglesa, como T. S. Elliot, Dylan Thomas,
Marianne Moore e Elisabeth Bishop eram reconhecidos pela sua habilidade em declamar suas próprias
79
selos e gravadoras no Brasil, como a Continental, a Musidisc, Odeon e RGE, também
lançavam discos com recitais. Contudo, nenhuma outra empresa especializou tanto seu
catálogo nessa área como a Festa. Em apenas três anos de atividade, já haviam sido
gravados 32 LP’s de literatura recitada (cf. SILVER, 1957), uma quantidade expressiva
para o segmento no período. Posteriormente, o acervo de discos deixado pela gravadora
acabou constituindo um arquivo histórico importante com registros das vozes de
diversos poetas consagrados do Brasil e de alguns do Chile e da Espanha.
Fig. 9 - Foto realizada na ocasião da festa de lançamento do LP O pequeno príncipe
(Festa/1957). Da esquerda para a direita: Lúcio Rangel, Vinicius de Moraes, Tom Jobim e Irineu Garcia. Fonte: Revista Long Playing
Durante o período de 13 anos de atividade, as dependências do selo resumiram-
se a duas salas, localizadas inicialmente na Rua São José, próximo à mercearia
Villarino, que foram transferidas posteriormente para a Av. Franklin Roosevelt. A
empresa atuava de maneira autônoma e empregava um modo de produção praticamente
artesanal: todas as principais funções e os diferentes setores envolvidos no processo de
produção dos discos eram acumulados por Irineu Garcia, com eventuais colaborações de
amigos e profissionais de sua rede de contatos. Dado que não dispunha de fábrica ou
estúdio próprio, o selo dependia de contratos com as grandes gravadoras para prensar as
suas modestas tiragens de mil cópias de cada lançamento (cf. IRINEU, 1984) e para
realizar a etapa de distribuição, que no período ainda encontrava sérias limitações
devido às condições precárias de transporte entre as cidades. A grande empresa
encarregada da distribuição dos discos foi a Companhia Brasileira de Discos (CBD) e, a
80
título de exemplo, dentre as fábricas que prensaram discos para a Festa Discos, pode-se
citar a Fábrica “Rádio Petrópolis”, Fábrica da RCA Victor Rádio, fábrica da Companhia
Industrial de Discos (CID) e a também a Fábrica ODEON S.A., localizada no estado de
São Paulo.
Nos primeiros três anos da gravadora (1955-1958), os discos foram prensados no
suporte técnico do LP com os tamanhos de 7 e principalmente de 10 polegadas de
diâmetro, que dispunha de 7 minutos e meio de tempo de reprodução em cada lado.
Segundo Egel Laus (2005: 124), no período inicial da produção de LP’s no mercado, o
disco de 10 polegadas era utilizado exclusivamente para o segmento de música popular
e se manteve em circulação até o ano de 1958. Nos anos seguintes, o tamanho dos
discos de vinil predominante na Festa Discos, assim como no mercado de uma maneira
geral, tornou-se o de 12 polegadas, que tinha a capacidade de reprodução de 22 minutos
em cada lado e possibilitava a gravação completa de obras de maior extensão, além da
criação de discos conceituais e coletâneas. Parte dos discos produzidos pelo selo era
lançada no mercado com a marca de “Alta Fidelidade” (Hi-Fi), signo de modernidade
em evidência no período, associado aos aprimoramentos realizados nas tecnologias de
reprodução no período, que contribuíam também para distinguir determinados produtos
no mercado.
Considerando que suporte do LP ainda consistia em uma novidade no mercado e
que a quantidade de consumidores que possuíam vitrolas adaptadas para reproduzi-lo
consistia ainda em uma parcela mínima e de elite em relação ao grande mercado ainda
predominado pelo suporte de 78rpm, pode-se inferir que os lançamentos realizados pela
Festa e por outras gravadoras que adotaram este suporte na década de 1950, como a
Sinter e a Musidisc, tinham um público potencial reduzido, em grande parte pertencente
a segmentos sociais médios e altos.
Para angariar recursos para produzir suas séries de LP’s e lidar com a incerteza
do retorno financeiro dos seus investimentos, Irineu Garcia procurava obter apoio de
diversos órgãos públicos, como o Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) e o
Ministério da Educação e Cultura (MEC). Era motivado em grande parte devido às
dificuldades envolvidas no próprio setor e à falta de recursos associada ao modesto
patrimônio do selo. Para lançar a coleção de 300 minutos de música erudita, intitulada
“Do Barroco a Villa Lobos”, por exemplo, Irineu Garcia argumentou, em matéria
publicada no jornal Correio da Manhã, que
81
[...] o álbum, dividido em oito discos de tipo “long-play”, contou com a ajuda e o incentivo do Conselho Nacional de Cultura, dirigido por Paschoal Carlos Magno; o Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, dirigido por Otacílio Braga; o Museu Vila Lobos, dirigido por Arminda Neves Villa Lobos; a Escola Nacional de Música, dirigida por Joanídia Sodré; a Rádio Ministério da Educação, dirigida por Murilo Miranda; o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, dirigida por Rodrigo Mello; o Serviço de Documentação, dirigido por José Simeão Leal; além do incentivo sempre presente do diretor da Divisão de Educação Extra-escolar, prof. José Salvador Julianelli. (DO BARROCO, 1962)
A procura de Irineu Garcia por apoio em instituições públicas reflete as
dificuldades que tinha por atuar de maneira autônoma com recursos limitados e também
a tentativa de angariar meios para continuar produzindo em setores de demanda
reduzida do mercado. Alguns de seus contatos próximos, como os poetas-diplomatas
Vinicius de Moraes e João Cabral de Melo Neto exerciam cargos de influência no
Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) e ordenavam a compra de parte da
produção da gravadora para enviar aos consulados no exterior como forma de apoio (cf.
QUÁDRIO, 1956; ANDRADE, 1997). Assim, ao que tudo indica, a iniciativa particular
de Irineu Garcia manteve uma relação de colaboração mútua com agentes públicos e
políticos, seja pelo intuito compartilhado de fomentar produções culturais
representativas da cultura brasileira no próprio país, ou para disseminar a música
brasileira no exterior e promover as relações do Brasil com outros países.
Para garantir a realização das diferentes etapas de produção dos discos
gravadora, Garcia recorria a vínculos pessoais com servidores públicos para conseguir
apoio, seja na forma subsídio feito através da compra de discos da gravadora, seja na
concessão do uso de espaços para ensaio/gravação ou pela participação de orquestras e
grupos de artistas subvencionados pelo Estado. A convergência de interesses entre a
iniciativa de Irineu Garcia e servidores do estamento burocrático configura, deste modo,
uma associação entre agentes políticos influentes e o setor privado para a
implementação de políticas de fomento às produções culturais que promovessem a
integração nacional e “consolidassem” a identidade nacional.
Vale observar também que a fundação, a articulação da produção e a divulgação
da gravadora junto aos artistas, escritores, jornalistas, atores, etc., foram facilitadas
consideravelmente pelo prestígio social associado ao posto de Irineu Garcia na imprensa
e se relacionam estreitamente com o estado pouco desenvolvido do mercado de bens
simbólicos. A proximidade de Garcia, um jornalista, com os escritores modernistas, por
82
exemplo, é representativa da estreita ligação que havia entre a imprensa o campo
literário, potencializada pela fraca autonomização deste (ORTIZ, 1994: 28-9). Por sua
vez, o fenômeno da ampliação do aparato burocrático, ocorrida nos governos de Vargas
(1930 – 1946; 1951- 1954) e o subsequente ingresso de intelectuais e escritores
modernistas no estamento burocrático também constituíram fatores propícios para a
convivência de Garcia com agentes públicos influentes e para a garantia de subsídios e
apoio funcional de diversos órgãos públicos na manutenção das atividades de sua
gravadora.
2. 3. A série de música erudita e “a construção da identidade nacional”:
Convergência de interesses entre agentes políticos e a iniciativa de Irineu Garcia
Após a repercussão positiva gerada pelo lançamento da série de discos de
literatura recitada, especialmente por parte da crítica especializada, Irineu Garcia
resolveu expandir sua atuação e começou a produzir para outros segmentos. Em
dezembro de 1957, o disco Valsas de esquina do compositor Francisco Mignone é
lançado (cf. FILHO, 1957) e inicia uma série de discos de música erudita nacional
editada pela gravadora Festa, com o seguinte texto impresso em sua contracapa assinado
pelo editor de livros Ênio Silveira:
Iniciando com êste disco um novo setor de suas atividades, a gravadora de Irineu Garcia enriquece consideravelmente seu já valioso ativo de realizações e presta inestimável serviço à cultura nacional. Dedicada até então ao lançamento de literatura gravada - poesia, conto e teatro - FESTA, DISCOS se volta agora também para a música brasileira, contribuindo para divulgá-la em todo o mundo e, o que é ainda mais importante, aqui mesmo. De fato, a triste verdade é que não conhecemos bem a obra de nossos compositores, com exceção de Villa Lobos, que as gravadoras nacionais vêm lançando não como decorrência de seus inegáveis méritos, mas como reflexo do sucesso obtido quando lançadas em disco nos Estados Unidos ou na Europa pelas suas casas matrizes. (VALSAS, 1957)
A despeito das intenções de Silveira de promover o disco, o texto traz indícios
das condições em que o segmento de música erudita se encontrava na configuração do
mercado fonográfico da década de 1950. Desde os princípios da fonografia no país as
gravações haviam focado no repertório de música popular e, até aquele momento, não
havia uma indústria de música erudita brasileira consolidada, apenas lançamentos
esparsos de compositores brasileiros contemporâneos. Predominava no mercado o
83
lançamento de obras representativas de compositores europeus renomados, pertencentes
a diversos estilos e períodos históricos, com gravações realizadas por orquestras
filarmônicas e grupos consagrados da Europa e dos Estados Unidos. Maurício Quádrio,
especialista no setor e crítico do Jornal do Brasil, destacava que somente as gravadoras
Angel, Sinter e Odeon haviam tomado a iniciativa de lançar alguns discos no país de
compositores brasileiros ainda em atividade naquele período, como Villa-Lobos,
Camargo Guarnieri, Cláudio Santoro e Francisco Mignone. Contudo, para Quádrio e
outros agentes da crítica especializada faltava o escopo histórico, o registro de obras
antigas, que possibilitassem acessar a música erudita nacional com perspectiva (cf.
QUÁDRIO, 1958a).
Alguns fatores de ordem econômica eram determinantes para que o investimento
no repertório nacional não fosse atrativo no mercado. Primeiramente, os “discos
clássicos” (como eram designados naquele período), custavam no mercado, em média,
15% a mais do que o disco de música popular, fato que restringia o poder de consumo
do público, especialmente aquele oriundo de classes mais baixas, e contribuía na
redução das vendagens e consequentemente das tiragens. Em segundo lugar, o disco
lançado a partir de matriz importada acarretava como custo, grosso modo, quase que
exclusivamente a fabricação industrial das cópias e confecção das capas em qualquer
setor de lançamento, seja o de música popular ou erudita. Em contraposição, para lançar
um disco com matriz produzida no país os custos envolvidos aumentavam
desproporcionalmente, especialmente se a produção fosse feita com orquestra sinfônica
e, portanto, com pagamento de um grande grupo de músicos especializados. Além de
envolver custos altos de produção, o lançamento de música erudita nacional seria
direcionado em grande parte para consumo interno, que por sua vez apresentava
historicamente números modestos de vendas e isto contribuía para aumentar os riscos.
Como consequência das dificuldades envolvidas no setor, a grande maioria dos
investimentos realizados na área de música erudita pelas majors era destinada aos
lançamentos de obras de compositores europeus consagrados, realizados a partir de
gravações de orquestras da Europa ou dos Estados Unidos e contando com matrizes
importadas29.
29 Para averiguar estas informações, foram consultados os volumes da Revista Long Playing, periódico que publicou com regularidade semestral, entre 1956 e 1970, catálogos dos discos lançados no mercado, organizados por segmentos – p. ex. “Música Clássica e Erudita”, “Música Orquestral”, “Piano”, “Órgão”, “Corais”, “Obras Poéticas”, “Vocais”, “Música de Filmes”, “Infantil”, “Popular”, etc. -, por ordem
84
Em uma matéria publicada pelo crítico Maurício Quádrio, encontra-se uma
breve análise das condições de atuação do segmento de música erudita, na qual o autor
aponta dificuldades encontradas no segmento, assim como as restrições estruturais nas
próprias gravadoras:
Há cerca de dois anos percorremos a “Via Crucis” das fábricas para conseguir que gravassem a “Missa Pastoral” [Missa Pastoril] do Aleijadinho da música [referência ao compositor Pe. José Maurício Nunes Garcia (1767 – 1830)] antes que a “Odeon” aceitasse as nossas sugestões. As respostas, sempre negativas, foram das mais estranhas e, às vezes, pitorescas. A maioria das fábricas possui um departamento internacional que tem a função de encomendar as matrizes estrangeiras, clássicas e populares (a competência, para ambas, é a mesma...) e a uma direção artística nacional dirigida, apenas, em um setor: o popular. Não há direção artística nacional para os clássicos. Parece até que desde Cabral o Brasil só produziu sambas e baiões! (cf. QUÁDRIO, 1958b) 30
A questão era tida como um problema não apenas por críticos, agentes culturais,
comprometidos com a difusão da cultura da música “de classe” no país, como Maurício
Quádrio (Jornal do Brasil), Renzo Massarani (idem), Claribalte Passos (Correio da
Manhã), Zito Batista Filho (O Globo), mas também por personalidades influentes que
ocupavam cargos de direção em instituições culturais públicas, como o compositor
Camargo Guarnieri – consultor técnico do Ministério da Educação -; o compositor
Cláudio Santoro – diretor musical e regente da Orquestra da Rádio MEC (Rádio
Ministério da Educação); o musicólogo Mozart de Araújo – diretor da Rádio MEC,
entre outros. Estes grupos de agentes do setor privado e do Estado promoviam reuniões
para discutir temas e problemas envolvidos na área, entre eles, a divulgação da música
erudita nacional e folclórica no país e no exterior.
A título de exemplo, participaram de um debate realizado em uma mesa redonda
realizada na Rádio MEC, em 1956, além dos músicos citados acima, o compositor
Arnaldo Estrela, o crítico Maurício Quádrio e Celso Brant, chefe do gabinete do
Ministro da Educação e diretor da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro. Conforme
destaca matéria de jornal do período, na ocasião os Ministérios da Educação e de
Relações Exteriores entraram em entendimentos para gravar uma série de discos -
inicialmente de música de câmara de autores contemporâneos, como Villa-Lobos,
alfabética dos compositores. Apresentava também informações sobre os intérpretes, bem como as gravadoras responsáveis. 30 Colchetes nossos.
85
Guarnieri, Santoro, Mignone, Gnattali, etc. - que o próprio Itamaraty, por intermédio
das Missões Diplomáticas, entregaria às emissoras de rádio estrangeiras (cf.
QUÁDRIO, 1956). Um aspecto notável é que, um ano após a ocorrência desta mesa,
Irineu Garcia iniciou a produção de discos de música erudita, dedicados exatamente ao
repertório comentado e também envolvendo especificamente os participantes da mesa
nas produções, seja como regentes, como redatores de texto de contracapa, ou como
autores do repertório gravado. Deste modo, assumimos como uma hipótese muito
provável que a orientação de Irineu Garcia ao segmento de música erudita nacional
tenha se dado pela intervenção de compositores e agentes políticos em seus projetos
culturais nacionalistas.
Apesar das condições de atuação pouco atraentes dispostas no segmento de
música erudita nacional, durante os dez anos seguintes Irineu Garcia realizou
intensamente investimentos na produção de uma série de discos neste setor pela
gravadora Festa. Entre os aproximadamente 30 títulos de compositores brasileiros
lançados, destaca-se a Missa de Réquiem (Festa /1958) do Padre José Maurício Nunes
Garcia, interpretada pela Orquestra Sinfônica Brasileira e coro misto da Associação de
Canto Coral do Rio de Janeiro; a Antologia da Música Brasileira (Festa/1958), com
diversas obras de piano gravadas por Arnaldo Estrela; Sinfonia, Op. 43 (Festa/1959) de
Henrique Oswald também interpretada pela Orquestra Sinfônica Brasileira com
regência de Edoardo de Guarnieri; as coletâneas Mestres do Barroco Mineiro Vol. I e
Vol. II (Festa/1958) com obras de José Joaquim Emérico Lobo de Mesquita, Marcos
Coelho Netto, Francisco Gomes da Rocha, gravadas pela Associação do Canto Coral do
Rio de Janeiro e Orquestra Sinfônica Brasileira; a Suíte Brasileira / Lendas Brasileiras,
respectivamente, de Alexandre Levy e Souza Lima, também interpretadas pela
Orquestra Sinfônica Brasileira; Sinfonia N°6 de Cláudio Santoro, interpretada pela
mesma orquestra e com regência do próprio compositor.
86
Fig. 10 – Foto de Irineu Garcia (esq.) ao lado do compositor Francisco Mignone (dir.) publicada
na contracapa do LP 1ª e 2ª Fantasias Brasileiras de Francisco Mignone (Festa/1958). Fonte: Instituto Moreira Salles, Coleção José Ramos Tinhorão.
Através da produção do selo, Irineu Garcia contribuiu para promover a
conscientização acerca do registro da produção de música erudita nacional, em
performances de obras fundamentais de compositores brasileiros conceituados,
realizadas por intérpretes e grupos de relevância nacional no período, como os listados
acima. Pode-se afirmar que a opção de Irineu Garcia por gravar obras significativas do
repertório erudito brasileiro, fez da gravadora Festa uma das pioneiras no registro da
memória cultural brasileira31.
Contudo, conforme já apontamos anteriormente, a atividade de Irineu Garcia não
estava completamente isolada e compartilhava interesses com compositores, agentes
públicos em determinados projetos culturais nacionalistas de políticos. Com o intuito de
registrar e arquivar fenômenos culturais representativos da cultura brasileira, muitas
vezes considerados ameaçados pelos avanços dos meios de comunicação de massa e
pela urbanização, musicólogos de formação consistente, como Mário de Andrade, o
teuto-uruguaio Francisco Curt Lange, o norte-americano Carleton Sprague Smith, o
folclorista Luiz Heitor Correia de Azevedo, entre outros, eram comissionados por
entidades públicas desde as décadas de 1930 e 1940 para realizar pesquisas, coletar
31 Eventualmente surgiram outras iniciativas pontuais similares, como o lançamento da versão integral da ópera O Guarani (1959) de Carlos Gomes pela gravadora Chantecler, em uma edição de álbum de três discos (cf. VICENTE, 2010: 83) e também o lançamento do LP Concerto Carioca (1965) de Radamés Gnattali pela gravadora Continental.
87
registros de músicas folclóricas e criar discotecas públicas para a preservação do
patrimônio cultural de manifestações populares (cf. TONI; CAROZZE, 2013).
Em uma das pesquisas conduzidas pelo musicólogo Curt Lange em meados da
década de 1940 foram descobertas partituras do final do século XVIII em igrejas da
cidade de Ouro Preto, Minas Gerais. A autoria de parte das obras foi atribuída a quatro
compositores atuantes no período do ciclo do ouro - José Joaquim Emérico Lobo de
Mesquita, Marcos Coelho Netto, Francisco da Rocha e Ignácio Parreira Neves (cf.
QUER, 1958), músicos até então desconhecidos; na maioria mulatos que atuaram nas
atividades musicais das igrejas como instrumentistas, cantores, regentes ou
compositores no período colonial.
Passados dez anos da descoberta das partituras, a Orquestra Sinfônica Brasileira,
uma das orquestras subvencionadas pelo Estado de grande relevância no período,
recebeu instruções para trabalhar mais assiduamente o repertório nacional, por parte de
Mozart de Araújo, diretor da Rádio Ministério da Educação e Cultura (Rádio MEC) na
gestão do Ministro da Educação Clóvis Salgado (cf. FILHO, 1962). Neste momento as
obras descobertas por Curt Lange foram selecionadas para serem executadas e passaram
a integrar o programa de uma série de concertos com repertório de música religiosa do
período colonial, apresentados na Europa e na Argentina, bem como no “Festival de
Música Religiosa de Minas Gerais” pela orquestra e a Associação de Canto Coral do
Rio de Janeiro sob regência de Edoardo de Guarnieri (cf. FILHO, 1958a).
Deste modo, as descobertas provenientes das pesquisas de Curt Lange
comissionadas pelo governo e as intenções de Mozart de Araújo, vice-presidente da
Orquestra Sinfônica Brasileira, encontram afinidade de interesses na atuação de Irineu
Garcia junto à sua gravadora. Após a realização dos concertos, o produtor executa a
gravação das performances no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, material que dá
origem ao lançamento da coletânea de dois volumes, intitulada Mestres do Barroco
Mineiro (Festa/1958) 32.
32
Pouco tempo depois do lançamento do LP Mestres do Barroco Mineiro (1958), uma matéria publicada pelo periódico O Globo relatava que o musicólogo Curt Lange havia entrado com um processo na justiça contra Irineu Garcia para cobrar direitos autorais pelas obras gravadas, como se fosse ele o próprio autor (cf. QUER, 1958). No entanto, conforme aponta Cotta (2009: 191), a ação do advogado de Curt Lange solicitava, na verdade, a inclusão de seu nome como restaurador das obras nas etiquetas fixadas nos discos, uma vez que não lhe parecia suficiente a menção no texto publicado na contracapa do LP. Para maiores detalhes sobre o processo, conferir a tese: COTTA, André Henrique Guerra. História da coleção Francisco Curt Lange. Rio de Janeiro, Tese (Doutorado em Música) - Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2009.
Fig. 11 – Capa do LP Mestres do Barroco Mineiro Vol. ISalles, Coleção
Deste modo, podemos perceber que Garcia
com compositores, agentes públicos
usufruiu dos resultados de pesquisas musicológicas e da atividade de grupos financiados
por instâncias públicas, para assim poder contribuir com o registro fonográfico e a
difusão do repertório nacional.
de produção adotada pelo produtor torna
erudita, motivo pelo qual a maior parte das obras e discos gravados neste segmento está
associada ao repertório nacion
Associação de Canto Coral do Rio de Janeiro
Como resultado, integram o catálogo deixado pela gravadora Festa
predominantemente coletâneas e/ou obras
Francisco Mignone, Heitor Villa
Nepomuceno, Henrique Oswald, Alexandre Levy, Lorenzo Fernandez, Barroso Neto,
Cláudio Santoro, Brasílio Itiberê, André da Silva Gomes, José Maurício Nunes Garcia,
Radamés Gnatalli, Maurício Ohana, Luís Cosme, Mario de Andrade; mas também de
alguns compositores de outras nacionalidades, como o austríaco Sigismund von
Neukomm; os russos Sergei
Igor Stravinsky.
Mestres do Barroco Mineiro Vol. I (Festa/1958). Fonte: Instituto Moreira
Salles, Coleção Aloysio de Alencar Pinto.
, podemos perceber que Garcia manteve uma relação de
agentes públicos e políticos, pautada em interesses nacionalistas
dos resultados de pesquisas musicológicas e da atividade de grupos financiados
por instâncias públicas, para assim poder contribuir com o registro fonográfico e a
difusão do repertório nacional. Nos anos seguintes esta relação se mantém e a logística
de produção adotada pelo produtor torna-se padrão nos lançamentos da série de música
erudita, motivo pelo qual a maior parte das obras e discos gravados neste segmento está
associada ao repertório nacional trabalhado pela Orquestra Sinfônica Brasileira e pela
Associação de Canto Coral do Rio de Janeiro.
Como resultado, integram o catálogo deixado pela gravadora Festa
predominantemente coletâneas e/ou obras específicas dos compositores brasileiros
co Mignone, Heitor Villa-Lobos, Souza Lima, Camargo Guarnieri, Alberto
Nepomuceno, Henrique Oswald, Alexandre Levy, Lorenzo Fernandez, Barroso Neto,
Cláudio Santoro, Brasílio Itiberê, André da Silva Gomes, José Maurício Nunes Garcia,
ício Ohana, Luís Cosme, Mario de Andrade; mas também de
alguns compositores de outras nacionalidades, como o austríaco Sigismund von
Neukomm; os russos Sergei Rachmaninov, Alexander Glazunov, Alexander Scriabin
88
Fonte: Instituto Moreira
manteve uma relação de cooperação
interesses nacionalistas e
dos resultados de pesquisas musicológicas e da atividade de grupos financiados
por instâncias públicas, para assim poder contribuir com o registro fonográfico e a
a relação se mantém e a logística
os lançamentos da série de música
erudita, motivo pelo qual a maior parte das obras e discos gravados neste segmento está
al trabalhado pela Orquestra Sinfônica Brasileira e pela
Como resultado, integram o catálogo deixado pela gravadora Festa
dos compositores brasileiros
Lobos, Souza Lima, Camargo Guarnieri, Alberto
Nepomuceno, Henrique Oswald, Alexandre Levy, Lorenzo Fernandez, Barroso Neto,
Cláudio Santoro, Brasílio Itiberê, André da Silva Gomes, José Maurício Nunes Garcia,
ício Ohana, Luís Cosme, Mario de Andrade; mas também de
alguns compositores de outras nacionalidades, como o austríaco Sigismund von
Rachmaninov, Alexander Glazunov, Alexander Scriabin e
89
Os lançamentos da gravadora Festa no segmento de música erudita iam ao
encontro do interesse de críticos especialistas do setor e conquistaram rapidamente
respaldo em periódicos do Rio de Janeiro, como o Jornal do Brasil, Correio da Manhã,
O Globo e Diário Carioca. Na visão de um grupo de agentes culturais, comprometidos
com a difusão da cultura da música “de classe” no país, como os críticos Maurício
Quádrio (Jornal do Brasil), Renzo Massarani (idem), Claribalte Passos (Correio da
Manhã), Zito Batista Filho (O Globo), a falta de gravações de compositores brasileiros
consistia em uma das grandes deficiências do mercado fonográfico e da cultura
nacional. Para estes agentes, por dedicar lançamentos para o segmento de música
erudita e dar prioridade às gravações do repertório nacional Irineu Garcia
desempenhava um papel central desprezado pelas grandes gravadoras e contribuía
diretamente para a documentação da produção cultural brasileira. Vejamos algumas das
resenhas:
O horizonte tão limitado da música clássica brasileira em discos, está começando a se ampliar com aquela que consideramos a primeira, séria e funcional iniciativa por parte da nossa indústria, para dar ao Brasil o que há longos anos outros países possuem: uma discografia própria. Queremos nos referir à “Antologia da Música Erudita Brasileira”, que a gravadora “Festa” está editando e cujo primeiro volume, “Sinopse”, acaba de ser lançado. Não podemos deixar de elogiar, nesta coluna, Irineu Garcia pela coragem que demonstrou neste seu segundo vultuoso empreendimento. O primeiro, como se sabe, talvez mais arrojado do que êste, é o de dar ao Brasil uma discografia poética. (QUÁDRIO, 1958b) Irineu Garcia descobriu para o discófilo brasileiro e internacional a música erudita do Brasil. Teve plena confiança nos intelectuais e no público a que êsses intelectuais se dirigem. Congregou em tôrno de sua editôra “Festa” um movimento em tudo e por tudo semelhante ao do simpático Carlos Ribeiro no mundo dos livros. Soube dar ao disco, no Brasil, a função educativa e cultural ignorada por muitos velhos profissionais que militam no ramo há algumas décadas. [...] Fundou a primeira editôra fonográfica de literatura em nosso país e agora envereda a passos seguros, firmemente apoiado pela crítica e pelo público, pelos caminhos da música, destacando sempre em primeiro lugar a nossa música, a música dos nossos grandes compositores. (FILHO, 1958e) Embora sem fábrica própria, enfrentando todas essas dificuldades com recursos modestos, a etiqueta “Festa” angariara prestígio em nosso ambiente cultural literário, notadamente com a gravação do “Pequeno Príncipe” de Saint Exupéry, logo esgotada. [...] Irineu Garcia à frente desse empreendimento fonográfico, pelo ano de 1956 norteou-o especialmente para o terreno da música, lançando uma coleção autênticamente nacional, em que uma gravação com música de
90
Nepomuceno recebeu o I Prêmio Nacional do Disco, instituído pelo Ministério da Educação. (DANTAS, 1962: 1) Irineu Garcia me procurou, falando-me dos planos futuros da Festa Discos e dando-me um exemplar dos dois primeiros LPs da nova série, de iminente lançamento. O lamentável esquecimento em que se encontra a música erudita brasileira nas nossas gravadoras voltará a ser superado graças ao retorno da Festa, que no passado realizaram, neste campo, vários empreendimentos de real interesse. Irineu continuará preocupando-se exclusivamente com a nossa música, e está desenvolvendo um plano que (com a cooperação de Cleofe Person de Matos, da Associação de Canto Coral e das nossas orquestras) promete gravações bem selecionadas e bem apresentadas. (MASSARANI, 1963)
Ao considerar o volume de matérias e resenhas publicadas sobre a gravadora
Festa e o seu aspecto enfaticamente positivo, pode-se inferir que o nível de
reconhecimento conquistado por Irineu Garcia a seu tempo foi notável. Em 1958,
apenas três anos após o início das atividades da gravadora, Garcia foi eleito como a
“Maior Personalidade do Disco” pelo Clube dos Críticos de Discos, agremiação
composta pelos principais jornalistas e críticos especialistas em música de periódicos do
Rio de Janeiro. Vejamos o argumento do crítico Zito Baptista Filho a favor da
premiação de Garcia, que constitui um indício do reconhecimento recebido:
Os discos Festa, que podem ser considerados o sêlo da intelectualidade brasileira, dividem [...] a fonografia nacional em dois períodos: antes, o desdém e a apatia pelas criações sérias da nossa arte; depois, a crença, a confiança e o entusiasmo, unindo artistas e público. Não sabemos que outro melhor título poderia ter o nosso candidato à maior personalidade do disco em 1958. (FILHO, 1958e)
A prioridade dada ao repertório de música erudita nacional por Irineu Garcia na
direção da gravadora Festa, somada à união de interesses com determinados
políticos/servidores públicos na difusão do patrimônio cultural do país e aos discursos
de distinção simbólica de jornalistas e críticos especialistas, figuram um conjunto de
elementos que integravam um projeto nacionalista compartilhado entre setores públicos
e particulares. Em análise sobre o tema, José Miguel Wisnik destaca que o nacionalismo
“representou um projeto sistemático de cultura musical erudita, empenhado na criação
de um público, uma tradição instrumental, uma compreensão histórica, além de uma
poética, baseados no pressuposto da autenticidade pura da música popular” (WISNIK,
2007: 68).
91
No que se refere ao percurso histórico da produção de música erudita no Brasil,
verifica-se o predomínio de uma corrente nacionalista que se estende até a década de
1940. Desde o início do século XX, compositores identificados com referenciais do
romantismo europeu e influenciados por obras de intelectuais que defendiam a busca da
identidade étnica e cultural começaram a pesquisar em manifestações folclóricas
materiais composicionais para realizar suas obras. Na primeira fase do Modernismo de
22, a tendência nacionalista ganha maiores proporções, uma vez que artistas de diversas
áreas articularam-se pela recusa da transposição de modelos artísticos europeus e pela
busca de signos e temáticas representativos da cultura brasileira em manifestações
populares, que passam a serem reconhecidas como fontes de “autenticidade” e de
“brasilidade” (cf. ZAN, 1997).
Com a publicação do Ensaio sobre a música brasileira (1928), ocorre um novo
impulso nacionalista por influência determinante das teses do escritor Mario de
Andrade. No ensaio, Andrade defende que o compositor brasileiro deve se basear em
um estudo sistemático da música popular nacional e, a partir da estilização dos seus
materiais, realizada por meio de regras “universais” de estruturação musical oriundas da
música erudita, produzir uma linguagem artística genuína, conformada à realidade
nacional. Na década de 1930, tais princípios constituíram uma referência central para
compositores como Villa-Lobos, Francisco Mignone e Camargo Guarnieri, os quais
passam a incorporar de maneira intensa os referenciais nacionalistas em suas atuações.
Segundo Zan (ibidem), esses músicos procuraram estabelecer vínculos com o governo
de Vargas para implementar políticas culturais compatíveis com os seus ideais, que
valorizassem a música erudita nacional e que contribuíssem na consolidação da
nacionalidade.
Tomavam parte nas tarefas de difusão da música erudita e da cultura nacional
uma série de órgãos relacionados aos meios de comunicação, jornalistas, críticos
especializados, arquivistas, músicos do conservatório, e, durante o período Vargas, os
departamentos de censura, os quais contribuíam para assegurar a legitimação das
diretrizes e interesses do Estado. Dentro do aparato estatal e sob direção do musicólogo
Mozart de Araújo, especialmente a Rádio Ministério da Educação (MEC)
desempenhava um papel significativo na execução de um projeto nacionalista desde sua
fundação, seguindo a diretriz de funcionar como “uma emissora cuja programação
constitua um roteiro de aprimoramento na formação e orientação do gosto musical e
92
artístico, e do nível cultural dos seus ouvintes” (ARAÚJO, Mozart apud MASSARANI,
1958).
Durante o seu período de atividade, o perfil de atuação da gravadora Festa se
manteve em sintonia com um projeto modernista-nacionalista de cultura erudita, e
realizou diversos lançamentos de obras representativas de compositores brasileiros
nacionalistas ainda atuantes daquele período, como Villa-Lobos, Francisco Mignone e
Camargo Guarnieri. Além disso, lançou também obras antigas importantes de
compositores recém-descobertos ou considerados pioneiros no emprego de materiais
oriundos do folclore e na formação de uma “linguagem musical nacional”, como
Alberto Nepomuceno, Henrique Oswald, Alexandre Levy, Lorenzo Fernandez e
Barroso Neto. Na contracapa do LP Suíte Vila Rica e Três Poemas Afro-brasileiros
(Festa/1958) de Camargo Guarnieri, encontra-se um texto escrito pelo então diretor da
Rádio Ministério da Educação e Cultura, Mozart de Araújo, no qual fica evidente a
adoção do referencial modernista-nacionalista:
O que há de mais historicamente significativo na formação e na evolução musical de Camargo Guarnieri é o fato de êle ser um compositor nacional brasileiro. [...] Ser um compositor nacional, como o foram Bach, Beethoven, Schubert, Chopin ou Debussy - eis a linha de conduta que CAMARGO GUARNIERI se traçou, ajudado desde o primeiro momento, pelo mestre que lhe guiou os passos, pelo amigo solícito que lhe mostrou os rumos a seguir - MÁRIO DE ANDRADE. Vem dessa convivência e dessa amizade fecunda com o mestre, a segurança das convicções estéticas adquiridas pelo discípulo, segurança a que se deve essa unidade, essa homogeneidade, essa fusão de forma e de fundo que são, por assim dizer, a mais forte característica de sua obra. (cf. SUÍTE, 1958)
O predomínio do repertório nacional no catálogo da gravadora e a convergência
de interesses com compositores, agentes públicos e críticos são simbólicos e
demonstram os valores que orientaram as decisões de Irineu Garcia na produção da
série de música erudita e na direção de sua empresa, a Festa Discos. Nesse sentido,
pode-se dizer que a iniciativa de Garcia tomou parte em um projeto modernista-
nacionalista amplo das classes dirigentes, contribuindo para a documentação e difusão
do patrimônio cultural nacional, a formação de público e para a compreensão histórica
da música erudita do país.
Uma vez que o país não possuía um passado clássico, rigorosamente
formalizado nas artes e institucionalizado pelo Estado - que constituísse uma fonte de
93
tradição artística e referência obrigatória para os críticos do academicismo oficial
(ORTIZ, 1994: 104-5)-, e que não havia no mercado um público consumidor
suficientemente engajado que pudesse dar subsistência à produção nacional, torna-se
problemático reconhecer nesse período um campo artístico autônomo de cultura erudita.
A inexistência de um circuito de produção e consumo de música erudita nacional
consistia um impasse para o investimento de gravadoras no setor privado e impunha ao
Estado e à algumas isoladas agremiações de elite as diversas tarefas de fomento à
produção de música erudita nacional, manutenção de orquestras e grupos
especializados, formação de público e formação de instâncias de consagração com
vistas à consolidação de uma “identidade nacional” 33.
Nesse contexto, a produção de discos de música erudita nacional da gravadora
Festa somente conquistou viabilidade, longevidade e alguma legitimidade no momento
em que recebeu apoio de agentes e órgãos públicos, seja na forma de subsídio feito
através da compra de discos da gravadora pelo Itamaraty, seja na concessão do uso de
espaços para ensaio/gravação ou pela participação de orquestras e grupos de artistas
subvencionados. Por sua vez, as condições de produção dispostas por Irineu Garcia
explicam o predomínio da participação de orquestras, grupos de câmara financiados
pelo Estado, a participação de diversos compositores com cargos públicos na elaboração
dos discos e a razão pela qual foi possível manter a produção direcionada a um
segmento de baixa circularidade no mercado por um período de tempo considerável de
aproximadamente dez anos.
2. 4. Atuação do Estado como instância de consagração: prêmios, certames e a
repercussão dos Discos Festa
Dentre os cargos especializados em instituições públicas ocupados durante o
período populista do país, parte deles se alocavam em áreas que ainda não dispunham
de um mercado de trabalho, como os economistas, estatísticos, geólogos, cientistas
sociais e formavam uma hierarquia interna segundo suas qualificações. Outra parte
consistia de vagas que se abriram no quadro dos ministérios recém-criados, como os
inspetores de ensino, ministério da imigração, do trabalho, entre outros. Nesta última,
33 No que se refere à questão nacional, convém aqui citar as colocações de Ortiz sobre o papel desempenhado pelo Estado em relação a esse ponto: “Como a indústria cultural é incipiente, toda discussão sobre a integração nacional se concentra no Estado, que em princípio deteria o poder e a vontade política para a transformação da sociedade brasileira. Os intelectuais, ao se voltarem para o Estado, seja para fortalecê-lo como o fizeram durante Vargas, seja para criticá-lo, como os isebianos, o reconhecem como o espaço privilegiado por onde passa a questão cultural” (ORTIZ, 1994: 51).
94
uma quantidade considerável de intelectuais escritores e artistas prestavam colaboração
na política cultural do governo atendendo a encomendas oficiais de projetos de prédios,
livros, concertos, manuais escolares, guias turísticos e obras de arte; assumindo o papel
de representantes do Estado em conferências, congressos e reuniões internacionais e
prestando consultoria em assuntos que integravam suas áreas de atuação profissional
(cf. MICELI, 2001).
De um lado, havia intelectuais que prestavam serviços burocráticos específicos
que não se alinhavam em nenhum sentido à atividade artística e compatibilizavam suas
atividades profissionais institucionais e artísticas em suas agendas. Por outro lado havia
um grupo de intelectuais cujas atribuições institucionais demandavam os saberes e
competências específicos relacionados ao campo artístico e ao trabalho intelectual, e
que manteve uma relação de dependência material e institucional com o poder público.
Os rendimentos recebidos garantiam os subsídios necessários para a manutenção das
suas iniciativas na área de produção cultural e, ao mesmo tempo, os resguardavam das
oscilações de prestígio e dos imperativos do mercado.
No entanto, conforme aponta Miceli (2001: 216), a condição de servidor público
por sua vez não constituiu exatamente um fator neutro na produção escritores e artistas
subvencionados, posto que contrapunham como moeda de troca aos favores da
cooptação uma produção intelectual de orientação nacionalista. De modo semelhante às
carreiras dos modernistas, os intelectuais cooptados se auto-definiam como porta-vozes
do coletivo da sociedade e dispuseram a assumir o trabalho de conservação, difusão e
manipulação da herança cultural nacional, se incumbindo de celebrar autores e obras
que tivessem potencial de exprimir um coletivo compartilhado. Para Miceli (idem), foi
nesse contexto que a concepção de “cultura brasileira” ganhou corpo e constituiu uma
espécie de chancela sob a qual se formou uma rede de instâncias de produção,
distribuição e consagração de bens simbólicos, aos cuidados e subsídios das instâncias
oficiais.
Na posição de servidores e representantes do Estado, os intelectuais puderam
esquivar-se dos testes do mercado amplo e dispor dos meios necessários para
monopolizar as instâncias de financiamento através do controle das concessões públicas
de serviços e recursos da área e a autoridade intelectual para emitir juízos em assuntos
culturais. Atuaram, deste modo, como administradores de um mercado paralelo de bens
culturais que se constituía relevante ao campo artístico no mesmo grau em que interferia
na substituição dos juízos dos agentes do setor privado (idem) e que intercedia na
95
omissão dos agentes deste. Uma vez que o poder público não poderia rejeitar os
empreendimentos particulares no campo cultural, as ações de legitimação e
deslegitimação realizadas por intelectuais no setor público funcionavam como instância
de validação e reconhecimento da produção cultural. Como consequência, destaca
Miceli (2001: 217-8)
Mesmo que não tenha chegado a monopolizar o controle do mercado e a contratação de serviços culturais, o poder público impôs-se não obstante como concessionário-mor dos padrões da legitimidade intelectual. As encomendas, os prêmios, as viagens de representação, as prebendas, tudo que ostentasse o timbre do oficialismo passou a constituir a caução daqueles que aspiravam ingressar no panteão da “cultura brasileira”. Nas palavras de Raymundo Faoro, ‘o brasileiro que se distingue há de ter prestado sua colaboração no aparelhamento estatal, não na empresa particular, no êxito dos negócios, nas contribuições à cultura, mas numa ética confuciana do bom servidor, com carreira administrativa [...]
A criação de concursos e prêmios por meio de decretos do Ministério da
Educação e outros órgãos públicos servia o intuito de fomentar a produção de obras
artísticas e produtos de orientação nacionalista cuja temática contemplasse uma
determinada deficiência preterida pelo setor privado e funcionava como instâncias de
legitimação da produção cultural. Em diversos concursos como o Prêmio Confederação
Nacional da Indústria, Prêmio Machado de Assis, Prêmio Jabuti, Prêmio Nacional do
Disco, Prêmio Nacional de Romance, Prêmio Carmem Dolores Barbosa, Prêmio Juca
Pato, integravam as comissões julgadoras usualmente intelectuais, jornalistas e críticos
de referência de cada área respectiva que exerciam funções do serviço público ou de
magistério e dispunham de autoridade intelectual reconhecida no meio. Entre outros
exemplos, podemos citar a comissão julgadora do Prêmio Confederação Nacional da
Indústria de 1959, que teve a tarefa de eleger o melhor ensaio sobre “O Rio de Janeiro
na obra literária de Machado de Assis” e admitiu como integrantes o escritor modernista
Augusto Meyer, o filólogo e crítico literário Aurélio Buarque de Holanda, além de
Maciel Pinheiro e Magalhães Junior.
No intuito de combater as dificuldades envolvidas no setor de música erudita
nacional do mercado fonográfico e incentivar iniciativas de gravadoras do setor privado,
foram instituídos, em 1959, o “Prêmio Brasília” e o “Prêmio Nacional do Disco” através
de portaria assinada pelo Ministro da Educação e Cultura, Clóvis Salgado. Com
periodicidade anual, o Prêmio Nacional do Disco concedeu um valor de cem mil
cruzeiros, considerável a seu tempo, à gravadora responsável pela melhor gravação em
96
disco do ano escolhida por uma comissão julgadora integrada por críticos especializados
na área de música erudita, na incumbência do diretor da Rádio MEC, Mozart de Araújo
(cf. PRÊMIO, 1959). A gravação deveria conter repertório composto por autor
brasileiro e executado por intérpretes brasileiros e, além do prêmio em dinheiro,
adquiria-se também duzentas cópias do disco como forma de apoio. Os membros da
comissão julgadora, convocados em 1959, foram Maurício Quádrio e Zito Baptista
Filho, ambos jornalistas, críticos especializados em música erudita e responsáveis por
programas deste segmento na Rádio Globo.
Pela edição do LP Série Brasileira de Alberto Nepomuceno, gravado pela
Orquestra Sinfônica Brasileira, a gravadora Festa venceu o “Prêmio Nacional do Disco”
do ano de 1962, eleita por uma comissão composta exatamente pelos mesmos críticos
que publicavam regularmente resenhas de teor enfaticamente positivo nos periódicos
que atuavam. Por sua vez, ao que tudo indica os membros da comissão foram
selecionados por Mozart de Araújo, que durante certo período assumiu o posto de vice-
presidente da Orquestra Sinfônica Brasileira, orquestra que gravou a grande maioria dos
discos produzidos por Garcia. Vale destacar também que Mozart de Araújo, Maurício
Quádrio e Zito Baptista colaboravam também diretamente na elaboração dos discos da
gravadora Festa escrevendo os textos informativos que compunham a contracapa dos
discos antes da premiação.
Deste modo, a evidente proximidade entre os agentes envolvidos na premiação
pode ser compreendida como um dos meios pelo qual se manifestava o projeto
nacionalista compartilhado entre setores públicos e particulares de difusão da cultura da
música erudita no país. Frente à inexistência de um circuito de produção e consumo de
música erudita nacional no setor privado, a criação e manutenção de prêmios artísticos
constituíram uma das formas de executar políticas culturais nacionalistas e de garantir o
fomento à produção do segmento no setor privado e ao “cultivo da identidade nacional”.
Ao mesmo tempo, as premiações funcionavam como instâncias de validação e
reconhecimento da produção cultural administradas e subsidiadas pelas instâncias
oficiais, que impunham ao setor privado o timbre do oficialismo como índice de
distinção simbólica e assumiam, como destacou Miceli, o papel de “concessionário-mor
dos padrões da legitimidade intelectual”.
Além da premiação do Ministério da Educação e da Cultura e da eleição de
Irineu Garcia como “Maior Personalidade do Disco” pelo Clube dos Críticos de Discos
em 1958, a gravadora Festa recebeu também os prêmios de “Melhor LP Literário” e de
97
“Melhor LP de Música Erudita Brasileira”, concedidos pela Confederação Nacional da
Indústria em 1959; pelo disco Jograis de São Paulo (1956), recebeu o prêmio de melhor
capa de disco, entre outras 295 capas analisadas de 13 gravadoras diferentes no 1° Salão
Nacional de Capas de LP, promovido pela revista Radiolândia em 1958; recebeu o
prêmio de “Melhor LP de Música Erudita Brasileira”, concedido pelo Jornal Correio da
Manhã em colaboração com a Biblioteca Municipal do Rio de Janeiro em 1959, e o
prêmio de “Melhor Repertório Clássico Nacional” concedido pelo Jornal do Brasil em
1969.
Os prêmios concedidos à gravadora e as publicações de jornalistas e
musicólogos atuaram no sentido de conferir distinção simbólica à atuação de Garcia
através da negação do aspecto comercial. Constituíam, assim, instâncias de consagração
que atuavam diretamente para a formação de hierarquias em um campo artístico ainda
em formação daquele período, em que determinados critérios específicos da área
passavam a orientar valores nas trocas simbólicas e, assim conferindo certo grau de
autonomia das práticas artísticas em relação aos imperativos do mercado. No entanto,
conforme pudemos indicar neste capítulo, em função da escassa socialização da cultura
de música erudita no país e da consequente demanda reduzida no mercado, tal
autonomia não se manifestava de uma maneira plena aos agentes produtores. Era
minada no mesmo grau em que a viabilidade da produção esteve condicionada ao apoio
de órgãos públicos do Estado em suas diferentes etapas de produção, seja na
arregimentação de músicos especializados ou grupos subvencionados pelo Estado, na
aquisição de parte dos discos como forma de subsídio, na concessão de prêmios pelo
repertório nacional gravado, na cessão de partituras recém-descobertas por musicólogos,
espaços para gravação e ensaio, etc. Apesar de haver certa liberdade administrativa
sobre a gravadora e de escolha sobre os grupos de músicos atuantes, tal liberdade era,
em certa medida, condicionada pelas possibilidades da obtenção de retorno financeiro,
pela agenda e pelo repertório dos grupos subvencionados, e, em sentido amplo, por
ideais estéticos que entrassem em convergência com as políticas culturais nacionalistas.
Vale observar também a incidência de uma dupla função contraditória
desempenhada pelo Estado. Ao mesmo tempo em que criou aparatos culturais, como o
Departamento de Imprensa e Propaganda em 1934, e atuou no sentido de cooptar o
samba e difundi-lo enquanto símbolo da identidade nacional e de uma cultura popular
“oficial” através dos meios de comunicação de massa fomentou também o pólo de
circulação restrita da música erudita como projeto educativo para “aprimorar o gosto e a
98
cultura”. Ainda que os dois tipos de intervenção estivessem orientados para um único
fim de assegurar um sentimento compartilhado de nação, isto não quer dizer que não
tenha levado a consequências díspares na dinâmica de produção e consumo dos dois
segmentos no mercado. Enquanto o projeto de cooptar e civilizar a cultura popular
massiva transformou o samba em um dos símbolos da cultura nacional e atingiu uma
sociabilidade e disseminação expressiva no país, o projeto pedagógico das classes
dirigentes de difundir a cultura erudita falhou em conquistar uma difusão ampla e
encontrou regularmente dificuldades na formação de público e consolidação de um
mercado de música erudita nacional.
Uma vez que o mercado de bens simbólicos daquele período ainda não havia se
desenvolvido plenamente uma racionalidade e que, até então, a sociedade brasileira era
fortemente marcada pelo localismo (ORTIZ, 1994: 49), a iniciativa de Irineu Garcia foi
tributária das condições de atuação dispostas na configuração do mercado. A fraca
divisão do trabalho intelectual (imprensa/literatura) e a confusão de fronteiras entre as
diversas áreas culturais parecem ter constituído fatores favoráveis tanto para a
articulação das diferentes etapas de produção dos discos junto aos escritores
modernistas, jornalistas, músicos e agentes públicos influentes, como também para a
obtenção de subsídios e apoio estrutural de órgãos públicos. Na mesma medida que
atendia aos interesses de críticos especializados e que cumpria as premissas da política
cultural nacionalista de políticos e agentes públicos, a gravadora Festa tornava-se
beneficiária das instâncias de legitimação administradas e subsidiadas pelo Estado
através de prêmios e também do setor privado, no qual a imprensa desempenhava um
papel determinante.
2.5. Aloísio de Oliveira e a gravadora Elenco: Bossa Nova e o projeto de uma
“moderna música popular brasileira”
No que se refere ao caso da gravadora Elenco, em sua atuação desempenhou um
papel central no surgimento e consolidação da Bossa Nova34 e contribuiu para a
consolidação de um segmento musical reconhecido como portador de “qualidade
artística”. Reuniu em seu cast um grupo com artistas centrais da Bossa Nova, como
34 Além de ter lançado os LP’s de estréia e ter produzido diversos artistas do segmento posteriormente designado como Bossa Nova, Aloísio de Oliveira foi um dos personagens-chave que incentivaram e quebraram a resistência de executivos da Odeon para lançarem o LP Chega de saudade (1959) de João Gilberto, reconhecido por muitos como o marco inicial da Bossa Nova e um divisor de águas na trajetória da música popular brasileira.
99
Tom Jobim, Dick Farney, Sílvia Telles, João Donato, Lúcio Alves, Sérgio Ricardo,
Baden Powell, Edu Lobo, Roberto Menescal, Quarteto em Cy, Nara Leão, MPB-4, entre
outros, além de ter lançado álbuns importantes da música popular brasileira, como
Vinícius e Odette Lara (1963), Nara (1964), Caymmi Visita Tom (1965), Bossa Nova
York (1967), e Vinícius e Caymmi no Zum Zum (1965).
A empresa foi fundada por Aloísio de Oliveira, produtor carioca e ex-integrante
do grupo Bando da Lua, conjunto vocal e instrumental que acompanhou a cantora
Carmem Miranda durante sua carreira de sucesso nos Estados Unidos desde o final da
década de 1930 até os anos 1950. A experiência de liderar o grupo Bando da Lua e
acompanhar uma cantora de enorme repercussão comercial, em um mercado de um alto
nível de desenvolvimento como o dos Estados Unidos, permitiu a Aloísio de Oliveira
vivenciar intensamente o profissionalismo do show business de Nova York e
compreender melhor o papel desempenhado pelas funções de direção artística e de
produção na gravação de discos, na preparação de musicais de grandes empresas de
entretenimento, como os teatros profissionais da Broadway da década de 1940 e em
números de musicais gravados por grandes estúdios da indústria do cinema norte-
americano.
Depois da morte da cantora e da dissolução do grupo Bando da Lua, em meados
de 1950, Oliveira regressou ao Brasil e começou a trabalhar na gravadora Odeon como
diretor artístico. Nesse posto, passou a coordenar o trabalho dos arranjadores e
produtores Tom Jobim e Lindolfo Gaia, e conceituou discos que se distanciavam de
tendências comerciais consolidadas no mercado fonográfico do período, como o
clássico LP Caymmi e o mar (1957), que estreou a suíte de canções de pescadores;
assim como Ary Caymmi/ Dorival Barroso (1958), que reuniu um repertório
representativo dos dois intérpretes-compositores. Depois de atuar alguns anos, decidiu
pedir demissão na empresa, devido à decisão do diretor geral da gravadora, Mr. Morris,
de dispensar um grupo promissor de intérpretes e compositores como Lúcio Alves,
Roberto Menescal, Carlos Lyra, Sérgio Ricardo e Sylvia Telles. Em uma entrevista
posterior, realizada pelo jornalista Aramis Millarch, o produtor relatou suas motivações
para criar uma gravadora:
AO - Por ocasião de certos modismos que entravam no mercado brasileiro, que iniciou a fase Roberto Carlos e aquela coisa toda da Jovem Guarda, a Bossa Nova começou a decair comercialmente. E eu achava que isso devia ser preservado, de uma maneira ou de outra.
100
Tanto que, na Odeon, quando eles fizeram uma lista pra mim dos artistas que deveriam ser excluídos porque não estavam vendendo mais; que incluía João Gilberto, Silvia Telles, Lúcio Alves, Sérgio Ricardo, enfim, os artistas em que eu acreditava; eu acrescentei nessa lista o meu nome. Eu então senti necessidade de formar uma etiqueta pra preservar esses artistas. [...] Essa foi a intenção da Elenco. E não só isso.. lançar nova gente que aparecia nessa nova fase, dentro dessa evolução da música que não parava. Continuava, mas que não tinha veículo de comunicação nenhum. A não ser que se criasse uma Elenco. Foi isso que eu fiz, a intenção foi essa. 35
Depois de sua demissão na Odeon, trabalhou por oito meses na gravadora
Philips e, após sentir-se insatisfeito pela limitação que tinha em suas decisões na
empresa, resolveu criar o seu próprio selo e seguir seu próprio conceito artístico. A
princípio, a ideia era de fundar o selo Elenco como subsidiário de alguma grande
gravadora interessada em trabalhar com um selo temático, como os norte-americanos
Prestige ou Verve, porém não encontrou apoio de nenhuma grande empresa, o que o
levou a decidir administrar a gravadora sozinho. Ao prezar pela autonomia
administrativa e por agir em reação às mudanças de estratégias de atuação no mercado e
às medidas de contenção de orçamento implementadas por executivos da gravadora
Odeon no país, Aloísio de Oliveira optava por realizar um tipo de produção que não se
enquadrava nas tendências comerciais prezadas por grandes gravadoras.
Em 1963, depois de ter suspenso contrato com a TV-Rio, para a qual trabalhou
como produtor por um breve período de tempo (cf. ALBERTO, 1963), Aloísio de
Oliveira fundou a gravadora Elenco, em associação com o empresário Flávio Ramos,
então proprietário da boate Au Bon Gourmet situada no bairro de Copacabana. No mês
de outubro do mesmo ano foi realizado um evento de inauguração da nova gravadora no
Copacabana Palace36, luxuoso hotel localizado na praia de Copacabana, o qual se
destinou a apresentar o seu cast de artistas e uma mostra das primeiras gravações
35 Entrevista consultada através de visita ao link http://www.millarch.org/audio/aloysio-de-oliveira realizada no dia 13/03/2017. 36 Publicações do período indicam que a ideia inicial de Aloísio de Oliveira era realizar o evento de inauguração no dia 30 de setembro de 1963 na boate Au Bon Gourmet (cf. CARVALHO, 1963). Entretanto devido o rompimento precoce da sociedade com Flávio Ramos, o evento foi re-agendado para o dia 7 de outubro e transferido para o Copacabana Palace. Segundo o jornalista Carlos Alberto (1963: 9), havia dois motivos para o conflito: o fato de Aloísio de Oliveira ter registrado a gravadora Elenco apenas em seu nome e no do seu cunhado, em represália ao não pagamento das temporadas de espetáculos que produziu para a boate Au Bon Gourmet; além disso, havia a suspeita de que uma parte do empréstimo feito para fundá-la fora supostamente desviada por Flávio Ramos com a afinidade de pagar dívidas acumuladas pela sua boate.
101
realizadas. Vejamos a seguir a repercussão causada pelo evento em publicações de
matérias de periódicos:
Perto de trezentas pessoas compareceram à boate Meia-Noite do Copacabana Palace para assistir ao lançamento da nova etiquêta de discos “Elenco”, que tem Aloísio de Oliveira no seu comando geral. Festa informal coroada por um pequeno “show” [...], ao qual se destacaram o pianista e maestro Antônio Carlos Jobim cantando, o excelente Baden Powell fazendo alarde de virtuosismo ao violão e Dorival Caymmi, que foi a chave de ouro da reunião, obrigando a que todos os presentes cantassem com êle o samba “Eu Não Tenho Onde Morar”. Pelo que foi mostrado das gravações já feitas, a “Elenco” vem com fôrça total revolucionar o mercado de discos, môrmente no que tange ao bom-gôsto de suas realizações. (ECO, 1963: 8) Aloísio de Oliveira, com muitos anos de observação e estudos nos Estados Unidos, a par dos bons “shows” que tem apresentado no Bon Gourmet, muito colaborou para a melhoria técnica e artística da fabricação dos discos, brasileiros, produzindo, em algumas gravadoras, pequenas obras de arte do gênero. [...] A “Elenco”, que será lançada na primeira semana de outubro, contará [...], com o seu elenco. Não só para as gravações, para produção de discos de alta classe, mas também para o trabalho de divulgação porque do interesse geral37. (CARVALHO, 1963)
Nas duas matérias nota-se o emprego de termos como “bom gosto”, “obras de
arte” e “alta classe”, códigos utilizados por agentes da crítica especializada do período
com o intuito de atribuir valores positivos e assim legitimar a nova gravadora. Pode-se
dizer que as produções de Oliveira, sejam os discos ou as temporadas de espetáculos
musicais em boates, atingiram um padrão de conteúdo e formato compatível com o tipo
de fruição estética e os ideais de “bom gosto” cultivados pela classe média e alta e
expressavam um ideal de civilização específico associado aos ambientes de
entretenimento da Zona Sul. Sua experiência obtida no mainstream do meio artístico
dos Estados Unidos certamente incidiu neste processo, conferindo-o respaldo em sua
atuação nas gravadoras e levando-o a ser reconhecido como um dos produtores mais
notáveis da música popular brasileira nos meios de comunicação. Além disso, as
matérias publicadas em jornais conferiam ênfase positiva também aos artistas que
compunham o elenco da gravadora, que integrou artistas centrais da Bossa Nova e
outros intérpretes consagrados da música popular brasileira: Vinicius de Morais, Tom
Jobim, Silvia Telles, Lúcio Alves, Sérgio Ricardo, Dorival Caymmi, Baden Powell,
37 Grifos e colchetes nossos.
Maysa, Mário Reis, Tereza Souza Campos, Nara Leão, Odete Lara, Robert
Chris Connor e Lennie Dale.
Fig. 12 – Um dos logos impressos nos discos da gravadora Elenco.
Além do evento de inauguração, a estréia da gravadora incluiu também o
lançamento do primeiro suplemento de seis LP’s:
de Lúcio Alves, A Bossa Nova
Balada de Silvia Telles, Chris Connor at the Village Gate
Jimmy Pratt. Os primeiros lançamentos causaram certa repercussão comercial,
midiática e tornaram-se tema de publicação não apenas em matérias de periódicos, mas
também em programas de rádio, como o “Música Também é Notícia”, transmitido pela
Rádio Jornal do Brasil de segunda à sexta
em horário nobre.
A gravadora Elenco atuava de maneira autônoma e dispunha de uma estrutura
consideravelmente simples: Aloísio de Oliveira acumulava as funções de proprietário,
diretor artístico, produtor musical, redigia textos para as contracapas dos LP’s,
preparava dos materiais de divulgação e os enviava para a imprensa. Trabalhavam como
colaboradores os técnico
arregimentador de músicos José Delphino Filho, o diretor de relações públicas
Guilherme Araújo, o programador visual e diretor de arte das capas César Villela e o
fotógrafo Francisco Pereira. Eventualmente recebia também contribuições intermitentes
de outros profissionais, como Durval Ferreira (produção), Roberto Menescal (
João Mello (idem), Paulo
outros.
Segundo Castro (1989: 341), a empresa não firmava contrato com nenhum
funcionário ou artista e realizava os seus pagamentos através do repasse de
uma determinada porcentagem de
baixas tiragens dos lançamentos, a remuneração gerada não atingia valores muito altos.
sa, Mário Reis, Tereza Souza Campos, Nara Leão, Odete Lara, Robert
Chris Connor e Lennie Dale.
Um dos logos impressos nos discos da gravadora Elenco.
Além do evento de inauguração, a estréia da gravadora incluiu também o
lançamento do primeiro suplemento de seis LP’s: Vinicius & Odette Lara
A Bossa Nova de Roberto Menescal e seu Conjunto,
Chris Connor at the Village Gate e Baden Powell swings with
. Os primeiros lançamentos causaram certa repercussão comercial,
se tema de publicação não apenas em matérias de periódicos, mas
também em programas de rádio, como o “Música Também é Notícia”, transmitido pela
Rádio Jornal do Brasil de segunda à sexta-feira em intervalos intermitentes de uma hora
A gravadora Elenco atuava de maneira autônoma e dispunha de uma estrutura
consideravelmente simples: Aloísio de Oliveira acumulava as funções de proprietário,
diretor artístico, produtor musical, redigia textos para as contracapas dos LP’s,
reparava dos materiais de divulgação e os enviava para a imprensa. Trabalhavam como
técnicos de som Umberto Contardi e Norman Sternberg,
arregimentador de músicos José Delphino Filho, o diretor de relações públicas
ogramador visual e diretor de arte das capas César Villela e o
fotógrafo Francisco Pereira. Eventualmente recebia também contribuições intermitentes
de outros profissionais, como Durval Ferreira (produção), Roberto Menescal (
Lorgus (fotografia), Oswaldo Vidal (técnico de som), entre
Segundo Castro (1989: 341), a empresa não firmava contrato com nenhum
funcionário ou artista e realizava os seus pagamentos através do repasse de
uma determinada porcentagem deduzida das vendas dos discos. Contudo, devido às
baixas tiragens dos lançamentos, a remuneração gerada não atingia valores muito altos.
102
sa, Mário Reis, Tereza Souza Campos, Nara Leão, Odete Lara, Roberto Menescal,
Um dos logos impressos nos discos da gravadora Elenco.
Além do evento de inauguração, a estréia da gravadora incluiu também o
Vinicius & Odette Lara, Balançamba
de Roberto Menescal e seu Conjunto, Bossa, Balanço,
Baden Powell swings with
. Os primeiros lançamentos causaram certa repercussão comercial,
se tema de publicação não apenas em matérias de periódicos, mas
também em programas de rádio, como o “Música Também é Notícia”, transmitido pela
feira em intervalos intermitentes de uma hora
A gravadora Elenco atuava de maneira autônoma e dispunha de uma estrutura
consideravelmente simples: Aloísio de Oliveira acumulava as funções de proprietário,
diretor artístico, produtor musical, redigia textos para as contracapas dos LP’s,
reparava dos materiais de divulgação e os enviava para a imprensa. Trabalhavam como
Contardi e Norman Sternberg, o
arregimentador de músicos José Delphino Filho, o diretor de relações públicas
ogramador visual e diretor de arte das capas César Villela e o
fotógrafo Francisco Pereira. Eventualmente recebia também contribuições intermitentes
de outros profissionais, como Durval Ferreira (produção), Roberto Menescal (idem),
Lorgus (fotografia), Oswaldo Vidal (técnico de som), entre
Segundo Castro (1989: 341), a empresa não firmava contrato com nenhum
funcionário ou artista e realizava os seus pagamentos através do repasse de royalties,
duzida das vendas dos discos. Contudo, devido às
baixas tiragens dos lançamentos, a remuneração gerada não atingia valores muito altos.
103
Dado que não dispunha de fábrica própria, a Elenco dependeu de contratos com a RCA,
entre 1963 e 1967, e com a Companhia Brasileira de Discos (CBD), entre 1967 e 1970,
para realizar as etapas de fabricação das remessas usuais de duas mil cópias e de
distribuição. As sessões de gravação eram realizadas na maioria das vezes no Estúdio
Rio Som entre 1963 e 1967 e no estúdio da CBD entre 1967 e 1970. Contudo, houve
algumas gravações realizadas em outros estúdios, inclusive em Hollywood, como os
LP’s Antônio Carlos Jobim (1964), Bud Shank / Donato / Rosinha de Valença (1965); e
aquelas realizadas ao vivo, em locais que faziam parte do cotidiano da boemia da Zona
Sul, como as boates Au Bon Gourmet e Zum Zum e o Teatro Santa Rosa.
A concepção da arte gráfica realizada por César Villela também contribuiu
consideravelmente para associar a identidade visual dos produtos da gravadora Elenco
aos valores de “modernidade” e “sofisticação” pertencentes ao universo simbólico da
Bossa Nova. A partir da sua experiência prévia com as capas produzidas no mercado e
de reflexão oriunda de leituras dos livros do teórico pioneiro da área de comunicação, o
canadense Marshall Mc Luhan, César Villela concluiu que era necessário simplificar o
conteúdo das capas produzidas pelas gravadoras no período, as quais considerava
confusas. Especialmente a ideia de Mc Luhan, de que “o excesso de detalhes em uma
composição visual consistia em ruídos visuais”, incentivou-o a optar pela simplificação
e redução do número dos elementos presentes em suas composições (VIDAL, 2008: 97-
99).
As capas da Elenco se distinguiram no mercado através de um padrão: fotos
solarizadas em preto e branco, processada em alto contraste pelo fotógrafo Chico
Pereira e, na grande maioria delas, eram incluídas quatro bolinhas vermelhas38, sendo
uma delas para o logo e outras três distribuídas estrategicamente em outros elementos.
Se para Aloísio de Oliveira, César Villela e Chico Pereira, o motivo em preto e branco
foi uma solução encontrada para a falta de dinheiro, para muitos críticos do período as
capas da Elenco foram consideradas extremamente modernas. Segundo Castro (1989:
340), o sucesso gerado pelos discos fez com que outras gravadoras, como a Philips,
RGE e RCA começassem a imitar o padrão. Vejamos alguns casos:
38 Segundo depoimento do próprio César Villela, consultado em um trecho de entrevista no dia 14/05/2017, disponível no link <http://canalbrasil.globo.com/programas/arte-na-capa/videos/3609916.htm>, o artista decidiu que o número de bolinhas deveria ser preferencialmente quatro devido à sua crença na simbologia da cabala judaica, que associa ao número a representação da harmonia.
104
Fig. 13 – Capa do disco Vinicius & Odete Lara (1963), o primeiro lançado pela Elenco.
Fig. 14 – Capa do LP Os Cariocas de quatrocentas bossas (1965), editado pela Philips.
105
Fig. 15 – Capa do disco Avanço (1963) do grupo Tamba Trio, lançado pela Philips.
Fig. 16 – Capa do LP Bossa no Paramount (1965), coletânea editada pela RGE.
Como parte da logística de produção dos LP’s da gravadora, Aloísio de Oliveira
organizava também pequenos espetáculos musicais, também conhecidos como pocket-
shows, para as boates Au Bon Gourmet e Zum Zum no bairro de Copacabana. Com base
na experiência obtida durante a década de 1940 em sua atuação no show business e no
106
cotidiano profissional da indústria cultural consolidada e bem desenvolvida dos Estados
Unidos, Aloísio de Oliveira produziu e dirigiu 32 shows de maneira a formatar um
produto: seguindo um roteiro organizado, um conceito no aspecto visual (coreografia,
iluminação, figurino e cenário), equilíbrio do tempo de cada cena mensurado, repertório
previamente definido e ensaiado, etc. Além disso, os espetáculos serviram também
como uma espécie de termômetro para testar a recepção do público sobre o trabalho e
avaliar a possibilidade de gravá-lo e lançá-lo em LP pela gravadora Elenco. Tal
procedimento resultou no lançamento de alguns discos representativos da gravadora,
como, por exemplo: Vinicius e Caymmi no Zum-Zum (1965), Maysa (1964), Um Show
de Bossa... Lennie Dale (1964), Lennie Dale e o Sambalanço Trio (1965), entre outros.
Conforme aponta Zan (1998: 67), as produções de Aloísio de Oliveira eram
características por combinar a espontaneidade dos artistas em suas performances com a
tecnologia disponível de gravação e artesanalidade. O produtor acreditava que o
produtor musical deveria pensar em um disco como se tivesse pensando em um show39
e, por esta razão, muitos espetáculos musicais e discos traziam a marca do intimismo
que caracterizou a Bossa Nova, como o LP Vinicius e Caymmi no Zum-Zum (1965), no
qual foram mantidas risadas das cantoras do Quarteto em Cy e as piadas de Vinicius de
Moraes. Ainda segundo Zan (1998: 67), havia casos em que se dava prioridade à
“emoção” de um momento em detrimento da perfeição técnica da execução de uma
música. Um depoimento conferido por Cynara do grupo Quarteto em Cy é revelador
nesse sentido: “A gente chorava no estúdio. Tinha aqueles momentos emocionantes...
Era aí que às vezes a gente errava ou o Trio Tamba errava e Aloísio dizia: não vamos
manter isso porque está lindo. Existia essa preocupação com a sensibilidade, com a
emoção do momento” (idem). Em algumas etapas da gravação muitas vezes os técnicos
da gravação recorriam à soluções artesanais, conforme aponta outro depoimento de
Cynara: “Era coisa de amigos. Gravávamos tudo direto nos estúdios da Rio Som e da
RCA. O corte era feito na gilete mesmo. Isso não impedia que os discos tivessem
qualidade musical e sonora” (idem).
39 Conforme depoimento do próprio Aloísio de Oliveira em entrevista concedida ao pesquisador José Roberto Zan, realizada no dia 22 de agosto de 1994.
107
Fig. 17 – Publicação de anúncio do espetáculo “Sonho de Môça” produzido por Aloísio
de Oliveira.
Com base em seus contatos estabelecidos nos Estados Unidos e através da sua
produção de artistas da Bossa Nova pela gravadora Elenco, Aloísio de Oliveira
contribuiu também na internacionalização da música popular brasileira ao assinar
contratos com gravadoras estrangeiras e atender encomendas de discos do exterior.
Além de ter se envolvido na organização do histórico concerto de artistas da Bossa
Nova no prestigioso Carnegie Hall - realizado em Nova York no ano de 1962-, o
produtor realizava viagens ao exterior para firmar contratos de distribuição dos discos
Elenco através de gravadoras representantes nos Estados Unidos e México, como a
Warner e a Kapp Records de Nova York. Algumas encomendas feitas por estas
gravadoras resultaram na produção de discos como The music of Mr. Jobim (1966) e It
might as well be spring (1967) de Sylvia Teles; The Astrud Gilberto álbum (1965),
homônimo da cantora; Antônio Carlos Jobim (1964), Antônio Carlos Jobim com Nelson
Riddle e Sua Orquestra (1964) de Tom Jobim; Bud Shank / Donato / Rosinha de
Valença (1965), os quais foram gravados no exterior e incluíram versões em inglês das
canções de Bossa Nova.
Os lançamentos também despertaram o interesse do mercado europeu e,
conforme relato presente em publicação do jornal Tribuna da Imprensa (cf. MÚSICA,
1966), Oliveira teria recebido até mesmo uma proposta do célebre empresário e
108
produtor francês Eddie Barclay (fundador da gravadora Barclay), de compra de direitos
exclusivos do lançamento dos discos da Elenco em território europeu. Deste modo, o
interesse de gravadoras estrangeiras somado à publicações positivas de outras matérias
de periódicos, constituem indícios da repercussão favorável que os lançamentos da
gravadora causaram e da dimensão da demanda por discos de Bossa Nova no mercado
fonográfico nacional e internacional.
No que se refere ao catálogo deixado pela gravadora Elenco, foi possível
identificar cerca de 87 discos lançados, que se distribuem entre os seguintes segmentos:
58 discos de artistas centrais da Bossa Nova, seja interpretando canções ou arranjos
instrumentais; 9 discos de intérpretes de canções de protesto; 4 discos de intérpretes de
samba; 7 discos de música instrumental com repertório de gêneros como jazz, funk
norte-americano e canções brasileiras; 7 coletâneas de músicas lançadas pela própria
gravadora; 1 disco de trilha sonora e 1 disco de literatura recitada. Nesse sentido, fica
evidente que o perfil de produção da gravadora Elenco ficou marcado não apenas
simbolicamente como a marca da Bossa Nova, mas também quantitativamente, pela
prioridade dada aos artistas deste segmento.
Dada a grande quantidade de lançamentos nesse segmento não é factível tecer
aqui comentários sobre uma quantidade minimamente representativa do total de discos,
porém selecionamos alguns títulos que tiveram maior relevância na trajetória da
empresa e que conquistaram grande relevância na história da música popular brasileira,
como Caymmi Visita Tom (1964) e Vinicius & Odette Lara (1963), Vinicius & Caymmi
no Zum Zum (1966), Nara (1964), o primeiro LP de Nara Leão, e Bossa Nova York
(1967), o primeiro disco de Sergio Mendes nos Estados Unidos. O primeiro disco citado
marcou o encontro de dois compositores consagrados da música brasileira Dorival
Caymmi e Tom Jobim. No repertório, figuraram canções que se tornaram
representativas na história da música brasileira, como “Inútil Paisagem”, de Jobim e
Aloísio de Oliveira, “Das Rosas” e “Saudade da Bahia”. Já comentamos sobre o disco
Vinicius & Caymmi no Zum Zum (1966), que combinou a espontaneidade dos artistas
em suas performances com a tecnologia disponível de gravação e artesanalidade. Ao
optar por reproduzir o ambiente informal das boates no estúdio e manter as risadas das
cantoras do Quarteto em Cy e as piadas de Vinicius de Moraes nas gravações, tais
produções de Oliveira traziam a marca do intimismo que caracterizou a Bossa Nova.
Nos discos prevaleceram arranjos enxutos e econômicos típicos do estilo
bossanovista baseados em acompanhamento de notas longas executadas por
109
instrumentos de sopro ou cordas, a batida de violão desenvolvida por João Gilberto,
tratamento harmônico com extensões (sexta, nona, décima primeira, etc.) e acordes de
empréstimos modais, diminutos de passagem e o emprego recorrente de inversões de
acordes. Os arranjos gravados tinham normalmente formação instrumental pequena de
combos ou grupos de câmara, com condução rítmica discreta de bateria ou percussão e
eram escritos principalmente por Lindolfo Gaia, contudo atuaram também Claus
Ogerman, Eumir Deodato, Carlos Monteiro de Souza, Luiz Eça e Oscar Castro Neves.
O repertório gravado constituiu de canções dos compositores mais destacados do
segmento, como Tom Jobim, Newton Mendonça, Vinicius de Moraes, João Gilberto,
Carlos Lyra, Baden Powell, Luis Bonfá, Roberto Menescal, Ronaldo Bôscoli, Billy
Blanco, Sérgio Ricardo, Luiz Eça, Marcos Valle, entre outros.
Tiveram destaque também os discos Antônio Carlos Jobim (1964), The Astrud
Gilberto Album (1965) e Antônio Carlos Jobim com Nelson Riddle e Sua Orquestra
(1964), que trazem no repertório canções de grande representatividade da Bossa Nova
interpretadas por Tom Jobim. Uma audição comparativa dos seus arranjos permite
perceber as diferenças estilísticas na concepção de arranjos do segmento, que incluíram
as práticas usuais bossanovistas nos arranjos de Lindolfo Gaia e de Nelson Riddle, e
menos familiar no disco de Astrud Gilberto, que teve arranjos experimentais elaborados
pelo compositor norte-americano Marty Paich e incluiu procedimentos incomuns como
trinados, arpejos rápidos e frases atípicas de acompanhamento.
Entre os discos lançados no segmento de canção de protesto, destacam-se Um
Sr. Talento (1964) de Sérgio Ricardo, A música de Edu Lobo (1964) de Edu Lobo, Edu
e Bethânia (1967), Edu Canta Zumbi (1968), Manifesto musical (1967) e Grupo
Manifesto N°2 (1967) do grupo Manifesto, Sidney Miller (1967) e Brasil, do Guarani
ao guaraná (1968) do cantor Sidney Miller. Apesar dos temas das canções girarem em
torno dos problemas e contradições sociais do país nos discos, provavelmente devido à
perspectiva de censura e opressão de parte do regime militar, as resenhas publicadas
sobre os seus lançamentos não abordaram tais questões. Ao invés de tratarem do tema
central do disco, alguns jornalistas se limitaram a apresentar comentários
descritivos/técnicos. Vejamos a seguir uma das críticas:
Esse disco da Elenco [Edu canta Zumbi], lançado pela Companhia Brasileira de Discos, é uma das grandes produções de Aloísio de Oliveira. Nele estão doze músicas da peça Arena conta Zumbi de Gianfrancesco Guarnieri e Augusto Boal, com músicas de Edu Lôbo e
110
letras de Guarnieri, Boal e Vinicius de Moraes. Essa peça em que os negros da República dos Palmares cantam a liberdade, manteve-se em cartaz, no Rio e em São Paulo durante todo o ano de 1965, sendo que boa parte do sucesso é devido ao jovem cantor-compositor Edu Lôbo, que praticamente rouba a peça. (BRACONNOT, 1968) 40
Conforme aponta o crítico, o título e o repertório do disco se remete ao musical
Arena conta Zumbi, cujas canções foram compostas pelo próprio Edu Lobo e roteiro
escrito por Guarnieri e Boal, intelectuais envolvidos na fundação do Centro Popular de
Cultura e comprometidos com a causa política e a difusão da arte de orientação
nacional-popular no país. Apesar de não ter se dedicado definidamente ao engajamento
político como Boal e Guarnieri o fizeram, percebemos que Aloísio de Oliveira manteve
contato com artistas dissidentes da Bossa Nova, que continuaram seguindo os princípios
estéticos postulados pelos extintos CPC’s41 de compor canções engajadas baseadas nos
gêneros folclórico-populares, porém ao mesmo tempo sem abandonar as “conquistas
estéticas da Bossa Nova” (cf. CONTIER, 1998).
Nesse sentido, todo o repertório dos discos citados constitui de canções de
protesto compostas pelos próprios artistas que privilegiam temas políticos como o
problema da seca na região do nordeste e consequente fenômeno de imigração para o
sudeste, o racismo, as mazelas da desigualdade social na favela e nos subúrbios, entre
outros. Seguiam a diretriz nacional-popular do CPC de levar até o povo a
conscientização política para que superassem o seu estado de alienação, partindo de
elementos da própria cultura do povo. Conforme aponta Contier (idem), os
compositores destas canções aproximaram-se de arranjadores (maestros), de intérpretes,
de intelectuais (ligados aos CPC’s, ISEB ou Departamentos de Sociologia das
Universidades), de instrumentistas, almejando induzir, implícita ou explicitamente -
através de formas, instrumentos ou ritmos sacralizados como representações de uma
memória genuinamente brasileira ou nacional -, algumas ideias revolucionárias. Por esta
razão, nos arranjos elaborados e no aspecto composicional das canções predominam
40 Colchetes nossos. 41 O Centro Popular de Cultura (CPC) foi uma organização vinculada à União Nacional dos Estudantes (UNE) e fundado em dezembro de 1961 por jovens intelectuais como Oduvaldo Vianna Filho, Carlos Estevam Martins e Leon Hirzman. Teve como intuito inicial ampliar o público atingido pelo teatro politizado e permaneceu na ativa por um pouco mais de dois anos. Na redação do anteprojeto do Manifesto do CPC realizada em 1962, procurou-se definir as linhas de atuação política e cultural de seus membros, defendendo-se uma arte revolucionária destinada à conscientização política das massas. Segundo Zan (1997: 134), “caberia ao intelectual cepecista a missão de aproximar-se das massas com o objetivo de levar até elas a consciência política capaz de superar seu estado de alienação, e de produzir, a partir dos elementos da própria cultura do povo, a verdadeira arte popular revolucionária”.
111
perfis melódicos e linhas de condução rítmica de gêneros folclóricos, como moda-de-
viola, embolada, bumba-meu-boi, e/ou populares urbanos, como samba, marcha rancho,
frevo, baião, tratamento harmônico com extensões (nonas, décimas primeiras, etc.) – o
qual não é normalmente empregado nas práticas musicais comunitárias dos gêneros
folclóricos- e seções com acompanhamento flauta ou cordas executando notas longas,
típicas de discos de Bossa Nova.
No segmento de samba, os títulos lançados pela Elenco foram Ao meu Rio
(1965) de Mario Reis, De Vinicius e Baden especialmente para Cyro Monteiro (1965),
Samba é Aracy Almeida (1966) e As músicas de Baden Powell e Paulo César Pinheiro
(1970). O repertório gravado nos discos de Mario Reis e Aracy de Almeida reuniu
sambas e marchas de compositores da Época de Ouro do samba, como Noel Rosa,
Sinhô, Ismael Silva, Ernesto dos Santos (Donga), Ary Barroso, Assis Valente,
Lamartine Babo, João de Barros, entre outros. Enquanto que no disco de Mario Reis,
prevalecem arranjos convencionais de samba escritos por Lindolfo Gaya, no disco de
Aracy de Almeida, os arranjos de Roberto Menescal conferiram uma sonoridade de
samba-jazz ao disco devido à inclusão de seções e fraseados típicos de jazz e ao
emprego do acompanhamento de órgão.
Por sua vez, os discos de Baden Powell neste gênero apresentam exclusivamente
composições originais suas realizadas em parceria com Vinicius de Moraes e Paulo
César Pinheiro, que colaboraram enquanto letristas. Apesar de Vinicius de Moraes e
Baden Powell terem sido artistas historicamente reconhecidos como representantes da
Bossa Nova, também se envolveram com as práticas da religião e da cultura negra. Esta
característica fica evidente nos arranjos e na sonoridade nesse disco da dupla (e também
em outros de outras gravadoras), nos quais prevalece a forma, a instrumentação, os
toques e as linhas de condução rítmica características do samba e de batuques de
candomblé ou umbanda.
Em se tratando dos lançamentos de música instrumental, a presença de discos de
artistas norte-americanos com títulos em inglês, como Chris Connor at the Village Gate
(1963), Cannonball Adderley e Gil Evans (1964), Jazz Series – Dizzy Gillespie, Gil
Fuller and the Monterey Jazz Festival Orchestra (1965), reflete a rede de contatos e os
vínculos que Aloísio de Oliveira manteve desde sua carreira nos Estados Unidos, que
certamente favoreceu o direcionamento de uma pequena parte da produção da gravadora
ao exterior. O repertório destes discos se limitou exclusivamente a temas e canções de
jazz norte-americano com arranjos típicos do gênero. Dentre os títulos de artistas
112
brasileiros, se destacaram Bud Shank / Donato / Rosinha de Valença (1966) e Luiz Eça,
Piano e Cordas – Vol. II (1970). Os dois discos apresentam principalmente canções
consagradas de compositores de Bossa Nova em arranjos instrumentais com formação
de quinteto com saxofone, violão, contrabaixo, bateria e piano, no caso do disco de Bud
Shank e do disco de Luiz Eça, destacam-se os arranjos de cordas escritos pelo próprio
artista e acompanhamento de banda.
Apenas quatro lançamentos apresentaram características distintas em relação aos
demais lançamentos presentes no catálogo da gravadora. Além da trilha sonora do show
Rio de 400 Janeiros de Carlos Machado, que apresenta uma espécie de retrospectiva
histórica dos gêneros musicais que marcaram os diversos séculos no Brasil, os LP’s
Samba-Tropi – Até aí morreu Neves (1970) de Wilson das Neves, Terra à vista (1969)
do grupo Terra Trio, Briamonte Orchestra (1970) e Big Parada – Formiga e sua
Orquestra (1970) incluem composições, arranjos instrumentais de canções de grandes
sucessos de filmes estrangeiros em ritmos diversos, como funk e rock, opção estética
que destoa completamente do perfil da gravadora. No entanto, vale observar que estes
foram lançados no período em que a gravadora Elenco já operava enquanto selo
subsidiário da Philips-Phonogram, e, portanto, sem a supervisão de Aloísio de Oliveira,
fato que explica o caráter distinto e a inclusão de músicas de gêneros de maior
circulação no mercado. Outra gravação que se distingue sensivelmente no catálogo é o
disco com trechos da obra Júlio Cesar de William Shakespeare traduzidos e recitados
pelo jornalista e político Carlos Lacerda por constituir o único disco de literatura
recitada.
Pudemos perceber neste tópico que o perfil de produção da gravadora Elenco, a
construção do aspecto visual de seus produtos e o repertório gravado associaram-se
principalmente com o segmento de prestígio de Bossa Nova e formaram um padrão de
conteúdo e formato compatível com o tipo de fruição estética e os ideais de “bom
gosto” cultivados pela classe média e alta e expressavam um ideal de civilização, de
“modernidade” específico associado aos ambientes de entretenimento da Zona Sul. Ao
contrário de Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira não dependeu de investimentos estatais
para realizar sua produção durante os cinco anos de atividade e manter um ritmo de
produção intenso de, em média, dez discos por ano. Se considerarmos o relato de Castro
(1989: 340), que a gravadora Elenco era a única gravadora que o público procurava nas
lojas pelo selo, e a quantidade de críticas positivas sobre os discos, pode-se inferir que
Oliveira teve condições de manter sua produção de maneira autônoma através da
113
vendagem dos discos por um período curto de cinco anos, possivelmente devido à
popularidade e ao grau de consagração dos artistas do seu cast e à sua atuação enquanto
diretor/produtor artístico. Evidentemente a produção de Oliveira à frente da Elenco, da
maneira como foi realizada (sem a assinatura de contratos, sem remuneração), foi
possível em uma configuração de mercado pouco especializada, em que as relações
formais de trabalho ainda não pautavam de modo amplo o métier artístico e davam
margem para que a iniciativa de Oliveira pudesse diminuir custos e manter sua
produção, ainda que trabalhasse com artistas de prestígio da música popular brasileira.
2.6. Aspiração ao avanço da “moderna música popular” e a ideia de etiqueta de
autor na gravadora Forma de Roberto Quartin
No que se refere ao caso da gravadora Forma, sua atuação ficou marcada por um
perfil de lançamentos também direcionado aos artistas e repertório da Bossa Nova,
porém se distinguiu por ter realizado uma produção mais diferenciada, com um maior
número de álbuns de música instrumental e três álbuns com trilhas sonoras de filmes
nacionais. O fundador e principal articulador da gravadora, Roberto Quartin, havia
estudado com os célebres compositores Moacir Santos e César Guerra Peixe, porém não
quis seguir a carreira artística e, ao invés disso, optou por trabalhar na área de música
enquanto produtor musical. Nesta posição, Quartin desempenhou um papel central no
lançamento de discos importantes da música popular brasileira, como, por exemplo, Os
Afro-sambas (1966) de Baden Powell e Vinicius de Moraes; Liberdade, Liberdade
(1966) de Flávio Rangel, Millôr Fernandes e Nara Leão; Coisas (1965) de Moacir
Santos, Dulce (1966) da cantora Dulce Nunes com arranjos de Guerra Peixe, entre
outros.
Em 1964, a gravadora Forma é fundada através de parceria de Roberto Quartin
com o seu amigo arquiteto Wadi Gebara e, para realizar a estréia da gravadora, foi
organizado um coquetel de lançamento, no dia 4 de dezembro do mesmo ano, no Leme
Palace Hotel (um luxuoso hotel localizado na praia de Leme) que reuniu a imprensa e
artistas envolvidos no primeiro suplemento de discos. Vale observar que, de maneira
similar à fundação da gravadora Elenco, a escolha da inauguração da gravadora ser
realizada em um luxuoso hotel diretamente ao lado da praia de Copacabana, é simbólica
e destaca tanto o lugar social ocupado pelos produtos da gravadora, como também a
afinidade do perfil de produção de Roberto Quartin com certas demandas de consumo e
predileções de classes altas e médias em ascensão do período.
114
Ao longo do seu período de atividade, a Forma colocou no mercado discos em
formato LP e desempenhou um papel relevante no cenário da produção fonográfica do
país como uma empresa nacional de menor porte, fornecendo espaço para novos
artistas. Pela iniciativa de Quartin, grupos e artistas que se tornariam posteriormente
conhecidos pelo público em geral puderam lançar os primeiros LP’s de suas carreiras:
Eumir Deodato (Inútil Paisagem/1964), Quarteto em Cy (Quarteto em Cy/1964), Victor
Assis Brasil (Desenhos/1966), Moacir Santos (Coisas/1965), Dulce Nunes (Dulce/1966)
Ivan Lins (Agora/1970) e O Terço (Terço/1970).
Fig. 18 – Fotografia de Roberto Quartin e Dulce Nunes publicada na contracapa do LP Dulce
(Forma/1966).
A primeira série de discos da gravadora integrou uma edição de luxo, com capas
duplas ilustradas com pinturas a óleo, algo que já aponta a intenção de Quartin em
associar sua produção com o tipo de ilustração modernista e com a ideia de sofisticação
artística e despojamento, tanto na elaboração das capas dos seus LP’s, como na escolha
do elenco ou nos discursos de autopromoção.
115
Fig. 19 – Capa do disco de trilha sonora Esse mundo é meu (Forma/1964), elaborada a partir de
pintura a óleo.
Fig. 20 – Capa do disco Coisas (Forma/1965) de Moacir Santos.
Uma matéria promocional publicada um ano depois da criação do selo dá pistas
para compreendermos o seu perfil de atuação:
116
Já no fim de 1964, uma nova gravadora surgiu no Brasil com o objetivo de acelerar o avanço técnico que a música brasileira vem registrando nos últimos tempos. Seu nome é Forma, sua sede é o Rio de Janeiro e seu proprietário, Roberto Quartin. Para atuar dentro do programa mencionado, a etiqueta procurou constituir um elenco de ases, tanto assim que adotou o “slogan”: os expoentes da música brasileira estão em Forma! Mas esses ases podem ser nomes consagrados e gente nova, gente que, antes, nunca gravou. Assim, os primeiros lançamentos da Forma são discos que salientam os já bem conhecidos Eumir Deodato e Luís Carlos Vinhas, mas focalizam também uma excelente novidade: o Quarteto em Cy. (...) A qualidade do quarteto pode ser avaliada, inicialmente, com base no próprio fato de começar a gravar em uma empresa que demonstra possuir rígido critério para a escolha de seus artistas. 42 (VALENTINI, 1965: 4)
Através das ideias de “avanço técnico” e da ênfase na exigência da escolha do
seu elenco, observamos alguns critérios pelos quais o jornalista tenta distinguir a
produção do selo. Assim como nos casos das gravadoras Festa e Elenco, aqui a
associação com a ideia de “qualidade artística” também parece ter sido recorrente em
sua atuação no mercado, orientando sua produção por critérios artísticos, procedimentos
e padrões estéticos considerados “avançados”, “modernos” e “sofisticados” como meio
de distinguir seus produtos e formatar a ideia de pertencimento a um segmento de “bom
gosto”. Não por acaso, acabou especializando seu catálogo no segmento de Bossa Nova
e de música instrumental brasileira, gêneros bastante identificados com tais
representações, lançando ao longo do seu período de atividade LP’s de Vinicius de
Moraes, Quarteto em Cy, Bossa Três, Tamba Trio, Nara Leão, Roberto Menescal,
Eumir Deodato, entre outros.
A gravadora Forma também manteve um modo de produção autônomo e um
esquema simples de funcionamento: Quartin e Gebara eram os proprietários, realizavam
a produção artística e cuidavam da divulgação na imprensa, a direção artística era
assumida pelo músico principal de cada lançamento e os textos de capa ou contracapa
eram redigidos por Quartin, pelo compositor do repertório do disco ou por algum
intelectual relacionado. Colaboraram na parte de engenharia técnica do som diversos
profissionais - Alberto Soluri, Célio Martins, Norman Sternberg, Umberto Contardi,
Ademar Rocha e Ary Perdigão-, fato que indica que nenhum permaneceu por um longo
período e que a gravadora não tinha técnicos de som contratados permanentemente.
Devido ao alto custo envolvido, as capas realizadas a partir de pinturas a óleo foram
feitas apenas nos primeiros lançamentos pela artista Patrícia Tatersfeld, nos posteriores
42 Grifos nossos.
117
predominaram projetos gráficos com fotos dos artistas ou ilustrações relacionadas ao
tema do disco. Na parte fotográfica das capas colaboraram diversos profissionais, a
saber, a Agência Image, Paulo Lorgus, Pedro Moraes, Rubens Ritcher, entre outros. No
que se refere ao local de gravação, uma análise das fichas técnicas dos discos indica que
a cada ano era utilizado um estúdio diferente - RCA Victor (1964), Philips (1964), Rio
Som (1965), Musidisc (1966) e estúdios da CBD (1968). A empresa que ficou
encarregada das partes de fabricação das remessas de discos e de distribuição durante
todo o período de atividade da gravadora foi a Companhia Brasileira de Discos (CBD),
que no período estava subordinada à Philips-Phonogram.
O catálogo de discos produzidos pela gravadora Forma apresentou um número
consideravelmente menor de títulos em relação aos da Elenco e Festa, em torno de 36
discos. Em comparação com os outros produtores, Roberto Quartin manteve um ritmo
de produção mais lento e lançou uma média de 5 discos a cada ano, enquanto que
Aloísio de Oliveira lançava em média 10 discos. Além disso, nota-se também uma
diversidade maior em relação às outras gravadoras, uma vez que os discos tiveram uma
distribuição mais equilibrada entre os segmentos: 12 títulos de artistas de Bossa Nova;
10 discos de música instrumental brasileira; 5 discos de artistas brasileiros de gêneros
musicais diversos (rock, rock progressivo, funk); 4 coletâneas de músicas lançadas pelo
próprio selo ao longo de um ano específico; 3 discos com trilhas sonoras, 1 disco de
canções engajadas; 1 disco de literatura recitada.
Observamos que a maior parte dos lançamentos se concentrou no segmento de
Bossa Nova e alguns deles adquiriram grande destaque na história da música popular,
como o LP Os Afro-sambas de Baden & Vinicius (1966). Um dos modos de proceder
empregados por Quartin em diversas produções foi contratar arranjadores experientes e
consagrados para trabalhar com os artistas produzidos, visando obter um resultado
sonoro que se distinguisse por evitar práticas musicais consideradas como padronizadas
ou como “lugar comum”. Assim, no catálogo da gravadora destacaram-se os arranjos
elaborados por Guerra Peixe em Afro-sambas de Baden & Vinicius (1966), Dulce
(1966) e Samba do escritor (1968) de Dulce Nunes e Quinteto Villa-Lobos (1966); por
Luiz Eça em Som Definitivo (1966) do Quarteto em Cy e por Oscar Castro Neves em
Chico fim de noite apresenta Chico Feitosa (1965).
Entre os lançamentos do segmento de Bossa Nova, destacam-se Vinicius: Poesia
e canção Vol. I e II (1966) de Vinicius de Moraes, Dulce (1966) e Samba do escritor
(1968) da cantora Dulce Nunes, Inútil paisagem (1964) de Eumir Deodato, Quarteto em
118
Cy (1964) do grupo homônimo, Som definitivo (1966) do Tamba trio com Quarteto em
Cy, Chico fim-de-noite apresenta Chico Feitosa (1965) do cantor Chico Feitosa e Ana
Margarida (1965) da cantora homônima. Escreveram os arranjos dos discos os músicos
Luiz Eça, Oscar Castro Neves, Eumir Deodato, J. T. Meirelles, Paulo Moura e Carlos
Castilho, os quais conferiram uma sonoridade típica do estilo bossanovista, com
procedimentos e abordagens musicais similares aos empregados nos discos da
gravadora Elenco. Com exceção das composições próprias dos discos de Chico Feitosa
e do segundo LP de Dulce Nunes, o repertório gravado também constituiu de canções
dos compositores mais representativos do segmento, como Tom Jobim, Newton
Mendonça, Vinicius de Moraes, Carlos Lyra, Baden Powell, Roberto Menescal,
Ronaldo Bôscoli, Luiz Eça, Marcos Valle, entre outros.
No segmento de canção de protesto, o único lançamento foi o LP Liberdade,
Liberdade (1966) que registra o musical de autoria de Flávio Rangel e Millôr
Fernandes, apresentado no Teatro de Arena de Copacabana pelo do grupo de teatro
Opinião, em 1965, com participação de Nara Leão, Paulo Autran, Tereza Rachel e
Oduvaldo Viana Filho. Estabelecendo como eixo temático do musical os direitos
humanos e a liberdade do indivíduo em diferentes contextos (deslocamento, moradia,
etc.), os textos do roteiro são intercalados por inserções de trechos ou pot-pourris de
canções brasileiras consagradas e de algumas canções estrangeiras, estabelecendo um
contraponto entre a carga simbólica das canções e os problemas sociais abordados.
Deste modo, em arranjos simples de violão, flauta e percussão a canção “Marcha da
Quarta-feira de Cinzas” de Carlos Lyra e Vinicius de Moraes remete à necessidade da
luta e da resistência pelos direitos humanos através do fazer artístico; “Eu não tenho
onde morar” de Dorival Caymmi faz referência ao direito à moradia e o problema da
habitação; “Aruanda” de Carlos Lyra e Geraldo Vandré faz alusão ao período de
escravidão do país, à liberdade física e o direito de ir e vir; “Com que roupa” de Noel
Rosa comenta a exploração das riquezas do país por empresas estrangeiras, “If You
Miss Me At The Back Of The Bus” de Pete Seeger faz referência à campanha pelos
direitos civis dos negros nos Estados Unidos.
Dentre os discos de música instrumental, causou repercussão enfaticamente
positiva nos meios de comunicação o LP Coisas (1965) de Moacir Santos, o qual
apresenta 10 composições originais intituladas como “coisas” e arranjadas em duas
formações não tão usuais: uma big band ampliada, com trompete, 3 saxofones, 2
trombones, trompa, flauta transversal, vibrafone, piano, violão, contrabaixo, bateria e
119
percussão, e outra formação de combo menor com cordas, que reuniu 3 violoncelos,
trompete, 2 saxofones, piano/órgão, guitarra elétrica, contrabaixo, bateria e percussão. O
caráter inovador do disco residia na combinação incomum para o período do emprego
de atabaque, toques de candomblé e umbanda no acompanhamento rítmico, associado
às técnicas de escrita para big band e de estruturação musical de música erudita, e
material composicional original.
Vale apontar também neste segmento o LP Tempo feliz (1966) de Baden Powell,
que apresenta arranjos sofisticados de violão, com a participação especial do gaitista
Maurício Einhorn em algumas faixas. O repertório traz cinco composições do próprio
Baden Powell realizadas em parceria com Aloísio de Oliveira e Vinicius de Moraes, e
três músicas de outros autores, pertencentes aos gêneros samba e valsa, e executadas na
formação simples de violão, gaita, contrabaixo e bateria. Os discos Novas estruturas
(1964) do pianista Luiz Carlos Vinhas e Bossa Três em Forma! (1965) do trio Bossa
Três apresentam um repertório eclético de canções de Bossa Nova, composições
próprias, temas de samba-jazz em arranjos instrumentais que revelam uma evidente
afinidade com estilos de jazz (hardbop e jazz modal) devido ao emprego de riffs no
acompanhamento do piano, voicings característicos e arranjo para combos (incluindo
instrumentos de sopro, como flauta, saxofones, trompete e trombone) em algumas
faixas. O mesmo caráter jazzístico pode ser identificado nos discos Desenhos (1966) de
Victor Assis Brasil e A viagem (1966) do pianista norte-americano Dwike Mitchell e do
trompista Willie Ruff, que reúnem no repertório composições próprias, canções de
Bossa Nova e de samba, com arranjos e perfil interpretativo alinhados às práticas de
cool jazz e jazz modal e formação instrumental de piano/violão, contrabaixo, bateria e
saxofone/trompa.
O disco Quinteto Villa-Lobos (1966) do grupo de sopros homônimo se destaca
pelos arranjos criativos e bem estruturados, elaborados pelo próprio grupo e 3 arranjos
do maestro e compositor Guerra Peixe executados na formação pouco usual de flauta,
clarinete, oboé, trompa e fagote. Apesar de incluir no repertório uma série de canções de
música popular no repertório, como “Arrastão” de Edu Lobo e Vinicius de Moraes,
“Consolação” de Baden Powell e Vinicius de Moraes, “Jam Session” de Robert
McBride, “Berimbau” de João Mello e Clodoaldo Brito, prevalece no disco uma
sonoridade de música de câmara erudita, resultante do estilo composicional dos
arranjos, do cuidado com o timbre aveludado, articulações unificadas e coerentes,
dinâmicas executadas coletivamente e do emprego de linhas de acompanhamento
120
escritas com diferentes vozes em contraponto. Além dos discos apontados, destacam-se
ainda no segmento de música instrumental os discos de recitais de violão solo de
Sebastião Tapajós e Rosinha de Valença.
No que se refere aos discos de artistas de gêneros diversos, pode-se citar os três
discos do início de carreira de Ivan Lins, Agora (1970), Som livre exportação (1971) e
Deixa o trem seguir (1971), o LP O Conjunto de Roberto Menescal (1969), que
apresenta temas de Bossa Nova em arranjos híbridos de funk, rock e Bossa Nova; o LP
Terço (1970) da banda de rock progressivo O Terço; dois discos de música instrumental
em ritmos como rock e funk para dançar, Big Parada – Orquestra Tropical (1969),
Sebastião Tapajós e sua guitarra cósmica (1969) e o disco com repertório de samba e
funk Muita Zorra! ou São Coisas Que Glorificam a Sensibilidade Atual (1971) do Trio
Mocotó, que ganhou reconhecimento pela sua produção de discos de samba-rock e pela
participação posterior do cantor Jorge Ben no grupo. Vale apontar aqui que estes discos
foram lançados no período em que a gravadora já operava enquanto selo subsidiário da
gravadora Philips-Phonogram e foram produzidos sem a direção de Roberto Quartin.
Nos demais segmentos, se incluem as trilhas sonoras dos filmes Deus e o diabo
na terra do sol (1964), Esse mundo é meu (1965) compostas por Sérgio Ricardo; Brasil
ano 2000 (1969), composta pelo compositor e maestro Rogério Duprat, assim como o
disco com a peça de teatro O Avarento de Jean-Baptiste Poquelin (Molière), recitado
por Procópio Ferreira. A decisão de lançar em disco trilhas sonoras de filmes nacionais
parece ter constituído uma tentativa de Quartin de distinguir os produtos da gravadora
no mercado por oferecer um tipo de produto incomum no mercado e de aproveitar a
repercussão gerada pelos filmes. Fica evidente também a simpatia de Quartin com o
movimento do Cinema Novo de Glauber Rocha.
Uma análise da sonoridade dos discos lançados pela gravadora Forma, no
entanto, permite notar que ela difere ligeiramente dos LP’s da gravadora Elenco,
especialmente se considerarmos a grande quantidade de discos de música instrumental e
o seu perfil estético. Enquanto que, na Elenco, os lançamentos de destaque se
concentraram no segmento da Bossa Nova, seus artistas centrais e privilegiou arranjos
musicais típicos consolidados desse gênero e dos demais gêneros gravados, na
gravadora Forma parece haver uma maior recorrência elaborações não usuais nos
arranjos dos discos, especialmente no que se refere à forma musical, aos arranjos e ao
material composicional gravado. Não por acaso, apontava-se em uma matéria publicada
no periódico O Estado de São Paulo:
121
“Outro acontecimento importante no campo da discografia popular contemporânea foi o surgimento da “Forma”. Dirigida por Roberto Quartin e Wadi Gebara, esta etiqueta caracterizou-se pelo alto teor artístico-experimental de suas produções e pelo cuidado dispensado a todos os detalhes técnicos dos seus discos”. (DISCOGRAFIA, 1965)
Considerando o catálogo da gravadora, destacam-se as composições e os
arranjos do disco Coisas de Moacir Santos, os quais se tornaram referência e foram
regravados por diversos artistas no percurso da história da música popular; os arranjos
criativos de sopros do Quinteto Villa-Lobos, os arranjos de Guerra Peixe, os cantos
afro-brasileiros e composições modais de Baden Powell em Os Afrosambas43, o
repertório de violão solo gravado por Sebastião Tapajós e Rosinha de Valença, são
marcados por incursões experimentais, procedimentos musicais não usuais e repertório
bastante distinto do perfil de discos de Bossa Nova.
Tal diferença de caráter se deve provavelmente ao caráter distinto da orientação
adotada por cada produtor enquanto proprietários e diretores artísticos das gravadoras.
Os discursos presentes nas matérias de periódicos publicadas sobre os produtores
deixam claro que ambos compartilhavam da mesma decisão de produzir artistas da
música popular considerada “moderna” e obras que foram preteridas pelas grandes
gravadoras, que priorizavam o aspecto artístico e que se pautavam pela ideia de “bom
gosto”. No entanto, se compararmos os discursos dos produtores do período,
observamos certa diferença de orientação.
Ao que indicam os discursos de Aloísio de Oliveira, a ideia de inovação
constituiu um valor importante e parece ter permanecido sempre vinculada aos
procedimentos musicais e perfil estético da Bossa Nova. Em entrevistas publicadas, no
qual se explica o seu modo de compreender as transformações pelas quais passavam a
música brasileira, destaca-se a recorrência do entusiasmo de Oliveira em relação às
transformações trazidas pela Bossa Nova e seus protagonistas. Vejamos alguns casos:
“Entrei no estúdio ignorando a música, o arranjo e a intérprete. [...] O impacto que tive é até hoje indescritível. A construção melódica era uma coisa inteiramente nova dentro dos padrões brasileiros. O arranjo
43 Para obter mais informações a respeito, consultar CAMPOS, Miller Augusto de Souza. Os afro-sambas de Vinicius de Moraes e Baden Powell: modernismo nacionalista na música popular brasileira. Dissertação (Mestrado em História) - Universidade Federal de São João del-Rei, Minas Gerais, 2015.
122
simples, impecável, fornecia uma sequência harmônica que enaltecia a melodia de um modo incomum. A interpretação era genial. Sílvia Teles conseguia com sua voz rouca e suave penetrar dentro da gente e mexer com todas as nossas emoções. Bem, eu estava definitivamente diante de uma coisa que não esperava encontrar. Era a bossa nova na sua maior expressão.” (OLIVEIRA apud SEVERIANO, 1997) Agora, o Tom [Jobim] já deu uma concepção completamente diferente, porque ele venceu a barreira do primitivismo e saiu para harmonizações contemporâneas, saiu para fraseamentos diferentes, sem perder a continuidade de samba, vamos dizer. [...] De modo que com essa música do Tom eu comecei a sentir alguma coisa de novo e quando eu fui buscar e querer conhecer o Tom para saber outras coisas, foi então que eu vi que dentro das coisas dele também existiam os sambas que ele fazia e que também era influenciados por essa nova concepção harmônica e melódica. (IVAN; PORTELLA, 1965) 44
No caso dos produtores Roberto Quartin e Wadi Gebara, em contraposição, seus
discursos proferidos e o modo de compreenderem o cenário indicam que a ideia de
inovação não se vinculava necessariamente aos artistas da Bossa Nova, nem às suas
práticas musicais e adotaram outra orientação para suas atividades junto à gravadora
Forma. Vejamos uma matéria, publicada no ano de fundação da gravadora, que torna
essa diferença de compreensão evidente:
[...] Os dois tiveram então a ideia de lançar uma etiqueta de discos selecionados, de alto nível artístico e industrial, tendo como principal palavra de ordem a valorização do intérprete, orientado em suas concepções, mas com condições para que o disco seja totalmente seu. A maior preocupação dos dois é se interessar pelo que há de mais avançado na moderna música popular. [...] Para os jovens Quartin e Gebara, bossa nova e bossa velha nada significam sozinhas pois o que lhes interessa é a boa música brasileira. Tanto é que, ao lado da clássica Araci de Almeida, a nova etiqueta contará também com o moderno Luiz Carlos Vinhas, Tom Jobim, Zé Keti, Lyra e Cartola. O importante para os dois é que todos tenham alguma coisa para dizer, de verdadeiro e enraizado através da música. [Roberto Quartin] - Estamos fazendo aquilo que se poderia chamar, a grosso modo, de disco nôvo - prossegue-, ou seja, exatamente aquilo que o cinema nôvo vem fazendo no Brasil e no mundo: dizer a verdade e nada mais. Estamos fazendo uma etiqueta de autor, onde a direção artística imprimida por nós a nossos discos dará a eles a necessária unidade, uma posição filosófica definida e a nossa forma definitiva. Quero realçar a importância que Aloísio de Oliveira teve em nossa música popular dando o primeiro passo para que o disco tivesse uma personalidade própria. Só resta agora ampliar e dar maior conteúdo a isto. (JOANOU, 1964) 45
44 Colchetes e grifos nossos. 45 Colchetes e grifos nossos.
123
Percebemos que a ideia de inovação de Roberto Quartin e Wadi Gebara se
pautou mais pelo desenvolvimento do aspecto autoral, da singularidade criativa do
artista, aproximando-se da concepção de individualidade criativa associada ao
compositor erudito, privilegiando aqueles procedimentos musicais que consideravam
como “avançados” e de “alto nível artístico”. Esta diferença na orientação adotada pelos
dois produtores parecem ter conferido características sutilmente distintas aos seus
catálogos, que se observam na diferença da sonoridade, da escolha do repertório
gravado, dos arranjos elaborados e do projeto musical seguido em alguns discos.
Enquanto Aloísio de Oliveira aplicava seus conhecimentos obtidos enquanto produtor
do Bando da Lua e de Carmem Miranda nos Estados Unidos, realizando a direção
artística de maneira a formatar um produto com arranjos e forma bem alinhados aos
padrões estilísticos de arranjo de Bossa Nova e dos demais gêneros brasileiros, Roberto
Quartin, por sua vez, parece ter privilegiado trabalhos musicais nos quais se
desenvolviam arranjos e concepções formais que se distinguiam das práticas usuais,
nem sempre associados ao segmento de Bossa Nova, o que contribuiu para que o
catálogo da gravadora Forma apresentasse uma maior diversidade de gêneros musicais
lançados e um perfil de produção sutilmente distinto.
A partir do próximo capítulo pretendemos colocar em questão de que maneira as
três gravadoras Festa, Elenco e Forma se inscreveram nos conflitos simbólicos
suscitados nos diferentes segmentos do mercado fonográfico das décadas de 1950 e
1960 e as suas relações com a configuração do mercado e os debates políticos/estéticos
em vigência. Neste sentido, convém identificar e problematizar as representações sob os
quais os discursos dos agentes se apoiaram e de que maneira estas noções e os
posicionamentos “políticos” orientaram escolhas estéticas. Em outras palavras, com o
intuito de avançar no estudo das gravadoras e dos perfis de atuação de cada uma,
buscamos verificar a relação entre os discursos simbólicos, as escolhas estéticas e as
práticas musicais propriamente ditas.
124
CAPÍTULO 3 – O “BOM GOSTO” EM DISPUTA:
CONFLITOS SIMBÓLICOS E REPRESENTAÇÕES DE “BOM GOSTO” NAS
TRAJETÓRIAS DAS GRAVADORAS FESTA, FORMA E ELENCO E NA
CRÍTICA ESPECIALIZADA
3.1. Especificidades na formação do campo artístico no Brasil e suas implicações
na formação de representações de “bom gosto” e hierarquias
Para se compreender em perspectiva uma série de práticas e representações que
marcaram o campo da produção cultural das décadas de 1940 e 1950 e a atividade das
gravadoras Festa, Elenco e Forma no mercado fonográfico, consiste em uma etapa
fundamental de reflexão neste trabalho, colocar em questão algumas especificidades da
formação do mercado de bens culturais e do campo artístico no Brasil. Em seguida,
pretendemos problematizar as posições dos agentes nas disputas, suas condições de
atuação dentro dos setores envolvidos (Estado, imprensa, editoras, rádio, indústria
fonográfica, televisão), e, principalmente, os valores que constituíram os elementos de
tensão e de baliza nos discursos proferidos no campo. Em sentido amplo, interessa-nos
neste capítulo refletir sobre as relações entre as lutas de classificação e o
recrudescimento da segmentação do mercado nas décadas de 1950 e 1960, processo este
que culmina posteriormente na consolidação de um segmento que passa a ser
reconhecido como de “bom gosto”, “legítimo”, e designado como “moderna música
popular brasileira” (cf. NAPOLITANO, 2001).
Estudos da área já demonstraram que entre as características marcantes que
diferenciaram a situação do mercado de bens culturais brasileiro dos países
desenvolvidos despontam os entraves e dificuldades presentes no nosso estágio de
desenvolvimento capitalista e as respectivas implicações no funcionamento da indústria
nacional. Segundo Ortiz (1994: 49), naquele período ainda não havia se desenvolvido
plenamente no país uma racionalidade de mercado, a especialização de funções e a
divisão de setores de produção eram pouco incidentes, condições estas que contribuíam
para se dar uma fraca divisão do trabalho intelectual e uma confusão de fronteiras entre
as diversas áreas culturais.
Nesse contexto, a ausência de um passado clássico, rigorosamente formalizado
nas artes e institucionalizado pelo Estado - que constituísse uma fonte de tradição
artística e referência obrigatória para os críticos do academicismo oficial (idem: 104-5)
e de uma classe burguesa sólida, que fosse capaz de “desempenhar o papel civilizador”
125
segundo os moldes dos países desenvolvidos (idem: 17), levou não apenas a uma
interpenetração entre as áreas da música erudita e música popular e à incidência de um
“livre-trânsito” entre seus agentes, mas interferiu também nos critérios de legitimidade
que orientavam as disputas simbólicas. De maneira distinta ao que ocorreu nos países
desenvolvidos, cujo gosto legítimo se associava a referenciais cultivados em instituições
sólidas vinculadas à classe hegemônica - como a tradição da música erudita, as artes
plásticas e a literatura (cf. BORDIEU, 2006)-, no Brasil a música erudita não passou por
uma socialização dos seus parâmetros internos e não se constituiu plenamente enquanto
instituição legítima. Deste modo, a própria precariedade da ideia de hegemonia cultural
no país contribuiu, conforme aponta Ortiz (1994: 64-5), para que determinados setores
da indústria da cultura popular de massa fossem vistos como sinal de status e marcados
por uma aura que a princípio deveria pertencer à esfera da cultura erudita. Assim,
devido a tais peculiaridades na formação do campo artístico do país, pode-se afirmar
que a cultura erudita constituiu sim um dos parâmetros das lutas simbólicas em torno da
noção de “bom gosto” e de “valor artístico”, porém não enquanto critério de
legitimidade no campo.
Também devido à fraca autonomização das diferentes áreas culturais, torna-se
problemático reconhecer nesse período uma segmentação plena do mercado em nichos
de produção e de consumo. No entanto, estudos relativamente recentes da área
(POLETTO, 2004; SARAIVA, 2007; VICENTE, 2015) apontam que concomitante à
expansão e consolidação de uma classe média no país, surgiram indícios de um
processo de segmentação corrente nas esferas da produção, do público consumidor e,
consequentemente, das classificações no mercado desde a década de 1940. Assim, uma
série de códigos, parâmetros, juízos e valores nem sempre homogêneos - atribuídos a
certas temáticas e noções comuns, como “tradição”, “modernidade”, “nacional”,
“estrangeiro”, “artístico”, “comercial”-, eram empregados por intelectuais, artistas, pela
crítica especializada e constituíam os valores nos quais se concentravam as disputas
simbólicas. Tais disputas, que se manifestavam através de discursos de legitimação e
deslegitimação nos meios de comunicação, balizavam determinadas práticas e condutas
dos agentes no campo e traduzem o vínculo intrínseco e indissociável existente entre as
representações simbólicas formadas e as práticas musicais; o imaginário e a praxis dos
agentes atuantes no campo.
A eleição de critérios de “qualidade artística”, “refinamento estético” e de
determinados elementos poéticos e musicais em detrimento de outros por determinados
126
agentes no período, se vinculam estreitamente com importantes transformações sociais e
infra-estruturais correntes no país desde a década de 1940. Em um momento em que a
indústria nacional se modernizava e se expandia num ritmo acelerado e que se
intensificava o processo de urbanização e consequente re-estruturação da sociedade de
classes, dado que o movimento migratório para os centros urbanos se acentua em espaço
de tempo relativamente curto com uma maior parte do contingente oriunda de classes
menos favorecidas, o acesso ao mercado de trabalho e ao consumo se dava de forma
gradual e parcial entre as classes subalternas (MELLO & NOVAIS, 1998: 560-586).
Considerando tais diferenças de acesso entre as classes, a eleição critérios de distinção
na produção do mercado fonográfico traduz um estabelecimento de coordenadas no
campo das lutas simbólicas, uma vez que objetifica demandas de consumo e
expectativas das diferentes classes sociais nos planos material e simbólico.
Conforme já indicamos no primeiro capítulo, de um lado formava-se no âmbito
da música popular um segmento que desenvolveu um tipo de tratamento musical
distinto do samba exaltação e do samba-canção, pautado por sofisticações poéticas,
harmônicas e orquestrais oriundas do jazz e da música erudita, que guardavam afinidade
com o cotidiano da boemia dos bairros da Zona Sul do Rio de Janeiro, o intimismo das
boates e um público de classe média. Do outro lado, definia-se uma linha reconhecida
como massiva de música popular, que se sintonizava com o caráter dos programas de
auditório das rádios, o teatro de revista e as chanchadas do cinema brasileiro. Tal
segmento reuniu desde gêneros musicais regionais como o baião, o xote e a moda-de-
viola, até gêneros estrangeiros, como o bolero, a rumba, o calipso, o chá-chá-chá, o
tango, a guarânia, entre outros (cf. ZAN, 1997).
Para jornalistas, críticos e agentes representantes de uma vertente tradicionalista,
como Lúcio Rangel, José Ramos Tinhorão, Almirante, Ary Barroso, Jota Efegê,
Maurício Quádrio, a popularidade de gêneros estrangeiros - tanto em suas manifestações
originais como em formas “híbridas” com os ritmos brasileiros (p. ex. sambolero,
sambajazz, samba-canção)-, em programas de rádio, boates, restaurantes e dancings,
representava um momento de “decadência” ou período “nefasto” pelo qual passava a
música brasileira. Deste modo, a defesa das tradições e do legado da música brasileira
era considerada necessária e posta em prática, dada a ameaça associada ao avanço da
modernização e dos meios de comunicação de massa, que imprimiam, na visão destes
agentes, um processo de “aculturação” ou “descaracterização” das tradições do país.
127
Em contraposição, publicações de artigos de críticos especialistas em jazz em
periódicos, e a atuação de músicos como Tom Jobim, Luiz Bonfá, Billy Blanco, Dick
Farney, Johnny Alf, bem como a presença recorrente de gêneros estrangeiros na
programação do rádio, no repertório dos discos e dos conjuntos de boate contribuíam na
formação de narrativas e representações que defendiam a modernização da música
brasileira e buscavam justificar as transformações correntes. Deste modo, verificava-se
na década de 1950, um aprofundamento da segmentação do mercado fonográfico, tanto
no que se refere à esfera de produção, como também às de recepção e consumo.
Além da querela entre nacionalistas e entusiastas da música estrangeira, outras
questões relativas ao lugar social das práticas musicais incidiam nos embates. Mesmo
dentre aqueles agentes defensores das “tradições” e do patrimônio cultural nacional, não
havia um consenso sobre que tipo de música popular era considerada “autêntica”. Para
intelectuais ligados aos estudos folclóricos, como Mário de Andrade, Renato de
Almeida, Oneyda Avarenga e Mariza Lira, de uma maneira geral, a música folclórica
constituía a expressão máxima da “inconsciência do povo”, de uma “identidade
brasileira”, uma vez que a música urbana (p. ex. samba, marchas) estaria mais propensa
a receber diversos tipos de influências que eram transmitidas pelos meios de
comunicação de massa (imprensa, fonografia ou radiodifusão). No entanto, para
Almirante, Lúcio Rangel e outros colaboradores da Revista da Música Popular, a
música urbana também traduzia as singularidades do imaginário coletivo nacional, e,
em seus discursos emprestavam conceitos e a legitimidade dos estudos folclóricos para
elevar um determinado repertório da música popular urbana ao status de música
popular, reclamando sua preservação (cf. GARCIA, 2010).
Outro fator que desempenhou um papel importante nas lutas de classificação
sobre os critérios do que seria um “bom gosto” e na formação de uma influente corrente
de pensamento sobre a história da música popular foi a atividade de uma geração
pioneira de radialistas, cronistas e jornalistas, como Vagalume, Jota Efegê, Almirante,
Lúcio Rangel, Alexandre Gonçalves Pinto, Edigar de Alencar, Orestes Barbosa nas
décadas de 1940-50. Ao reunir material, coletar, organizar e arquivar documentos e
construir narrativas sobre a música popular, tais agentes inventaram uma ideia de
tradição46 que permanece presente no imaginário, discursos identitários e certas práticas
de música popular.
46 Ver HOBSBAWM, E. e RANGER, T. A invenção das tradições. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
128
Por terem participado ativamente da cena cultural do Rio de Janeiro nas
primeiras décadas do século XX, observando de perto as particularidades de seus
eventos em diversos ramos como a indústria fonográfica, a imprensa escrita, as rodas
musicais informais e os espetáculos, esses autores puderam ter uma proximidade das
fontes orais, sonoras e escritas, o que possibilitou a formação de coleções pessoais de
documentos em um período em que nem mesmo havia formação acadêmica de
historiadores no país47. Este material constituiu posteriormente em acervos importantes
de órgãos públicos voltados para a conservação de patrimônio histórico (cf. MORAES,
2013). Conforme aponta Moraes (2007: 278), tal proximidade com os eventos,
associada à produção das crônicas, de programas de rádio de considerável
alcance/repercussão, do registro memorialístico, parece ter conferido a esses autores
certa confiabilidade para selecionar os acontecimentos mais relevantes, sua veracidade e
a sequência cronológica dos fatos. Condição esta que possibilitou a organização de uma
narrativa sobre a história da música popular do início do século XX, suas origens, seus
personagens marcantes, datas importantes, e certos referenciais estéticos característicos,
o que contribuiu para a construção de uma ideia de “tradição”, “autenticidade” e de uma
identidade brasileira.
É nesta complexa trama de disputas simbólicas, de tensão entre agentes e
respectivos debates sobre determinados valores e noções comuns que se situaram as
atividades das gravadoras Festa, Elenco e Forma ao longo das décadas de 1950 e 1960.
Convém aos propósitos deste trabalho avaliar de que maneira as lutas simbólicas em
torno da noção de “bom gosto” tangenciaram a produção das três gravadoras e
problematizar as decisões de seus diretores, realizadas a favor de um determinado
gênero/segmento musical e em detrimento de outros. Pretende-se também problematizar
o papel desempenhado por cada iniciativa no processo de segmentação do mercado e na
definição de critérios de distinção e classificação.
47 Segundo a pesquisadora Giuliana Souza de Lima, “o primeiro curso regular de História foi criado em 1934 na Universidade de São Paulo e no ano seguinte, na Universidade do Distrito Federal (RJ). Eram considerados historiadores os intelectuais que produziam na área dos estudos históricos. De modo geral, o historiador era o erudito, “homem de letras” que frequentemente era poeta, jornalista militante, romancista ou jurista” (LIMA, 2012: 109).
129
3.2. Pares de oposição que balizam as disputas dos agentes no campo
3.2.1. Massivo X Circulação restrita (“Artístico”)
Ao se debruçar sobre os problemas envolvidos na análise dos fenômenos
relacionados aos conceitos de cultura de massa e indústria cultural em um estudo sobre
uma determinada produção cultural, constata-se que a compreensão própria dos
conceitos constituiu, ela mesma, fruto de questionamento e debate por parte de diversos
dos seus autores na historiografia da área de Sociologia. Deste estado das coisas decorre
a impropriedade do simples emprego ou aplicação direta de tais conceitos a fenômenos
ou produções culturais, sem que seja devidamente contextualizada a historicidade dos
termos, assim como o vínculo com linhas de pensamento que tendem a conferir sentido
e base científica à análise.
Comentando sobre o tema, Morelli (1991) manifesta sua concordância com o
sociólogo Gabriel Cohn (1973), que sustenta que o simples uso da noção de cultura de
massa com base em indícios e deduções, com as quais se pretenda alcançar alguma
legitimidade científica, deveria ser evitado em qualquer trabalho acadêmico. Ao acusar
a insuficiência explicativa da noção, o autor desenvolve seu argumento sustentando que
ela não traduz qualquer princípio estruturador da sociedade real à qual se aplica
justamente por pressupor a massa no lugar no lugar das classes sociais e, assim,
demonstra com propriedade as indissociáveis conotações ideológicas e conservadoras
da noção básica de massa e das concepções de sociedade e cultura dela derivadas.
Segundo o autor, esta compreensão estava associada ao discurso de reação às
transformações trazidas pela revolução burguesa e industrial, assim como à intenção da
própria burguesia e de seus pares teóricos de se distinguirem e assim designar a nova
classe emergente de trabalhadores das fábricas, o proletariado.
Ainda segundo o autor, o emprego do termo “massa” no setor de bens culturais
ocorreu historicamente de maneira análoga à sua utilização no campo político, cuja
conotação incidia no estabelecimento de uma distinção/oposição qualitativa entre “elite”
e “público”, que traduzia os interesses de distinção das classes aristocráticas e
burguesas. Cohn destaca ainda um paralelismo entre a exclusão das classes
trabalhadoras do universo político e do universo cultural, dado que as demandas pela
garantia dos meios para a própria sobrevivência privavam-lhes do tempo livre e das
condições necessárias para o exercício da razão. Condição esta considerada por
membros da elite como o motivo pelo qual quem dependia do trabalho corporal para
130
garantir sua subsistência era consequentemente incapaz de desenvolver gosto (idem: 33-
59).
Ainda dissertando sobre o tema, Rita Morelli (1991: 21) comenta sobre a
presença recorrente de uma ideia de incompatibilidade irreconciliável entre o trabalho
corporal e a cultura e a sua permanência em muitas das formulações recentes feitas
sobre a noção de cultura de massa. Tomando como referência as elaborações de Hannah
Arendt (1972: 248-81), comenta que a autora compreende a sociedade e a sociedade de
massa como fenômenos históricos concretos, sem que uma seja considerada uma das
expressões mais abstrata que a outra. A primeira caracteriza uma situação social
anterior, caracterizada pela persistência de certa hegemonia aristocrática por um lado e
por outro pela luta dos segmentos burgueses enriquecidos em busca de prestígio social.
Para Arendt, o primeiro momento de deturpação do aspecto cultural pela sociedade
ocorreu quando alguns segmentos passaram a utilizar a ostentação de um falso interesse
por atividades culturais e objetos artísticos como forma de demonstrar superioridade
social, sem que necessariamente nutrissem de fato qualquer interesse real pelas questões
intrínsecas do campo cultural. Como consequência, Arendt aponta que isso representou
a perda de uma característica essencial dos objetos e atividades culturais, a de terem
como finalidade o seu puro aparecimento, assumindo nesta condição uma função de
simples meio para a obtenção de distinção social e perdendo-se a atitude desinteressada
nas práticas do campo cultural.
Sendo assim, Morelli (1991: 23-8) sustenta que a base do pensamento de Arendt
está justamente na ideia fundamental de uma incompatibilidade irreconciliável entre os
universos da cultura e da produção material, na qual a cultura, deturpada por segmentos
da sociedade, terminou por desintegrar-se completamente quando incorporada pela
sociedade de massa não mais como meio de obtenção de prestígio, mas como artigo de
entretenimento. Tal incorporação estaria associada às demandas daquilo que designa
como processo vital das massas, no qual estas estariam presas às demandas de
subsistência e impossibilitadas de acender à cultura devido às necessidades de recuperar
as energias aplicadas no trabalho com vistas a garantir o retorno e manutenção de sua
continuidade. A autora aponta também que, esta acepção do trabalho como processo
vital mantém uma relação em suma indireta com as noções de trabalho como esforço de
dominação ou como adequação dos meios aos fins, esta última associada por Arendt
também à deturpação da cultura pela burguesia citada anteriormente, e, além disso,
quando passa a atribuir essa racionalidade abstrata a condição de característica essencial
131
do similar caráter abstrato do universo da produção material. Respectivamente, a autora
compreende as transformações políticas e culturais ocorridas no Ocidente a partir da
Revolução Industrial como consequências da expansão dessa racionalidade da produção
material para os domínios outrora independentes da política e da cultura (cf. ARENDT,
1972).
A partir de um referencial teórico diferente, porém com determinados conceitos
em comum e uma perspectiva analítica similar em relação à Hannah Arendt, os filósofos
integrantes da designada Escola de Frankfurt, Adorno e Horkheimer, introduziram a
noção de indústria cultural para problematizar a questão e também com o intuito de
evitar conotações conservadoras em suas abordagens. Ao invés de trabalhar com a
noção abstrata de sociedade de massa e de se referenciar no conceito de cultura na
tradição histórica clássica dos gregos e romanos, como fez Arendt, Adorno alinha seu
raciocínio com premissas teóricas marxistas, utilizando-se da noção historicamente
concreta de sociedade capitalista monopolista. Seguindo esta linha conceitual, analisa a
incursão dos bens culturais no campo das mercadorias, quando estas são resultado de
um processo industrial e capitalista de produção. A partir de uma série de investigações
sistemáticas das músicas que tocavam nas rádios dos Estados Unidos na primeira
metade do século XX, Adorno chega à tese de que com o avanço da razão técnica no
capitalismo tardio a produção cultural cada vez mais perde seu traço artesanal e seu
potencial crítico para assumir feições padronizadas de mercadoria e funções de
consumo per si, criando demandas de consumo e condicionando gostos.
Em especial nos trabalhos “Sobre Música Popular” e “A indústria cultural: o
iluminismo como mistificação das massas”, as formulações de Adorno e Horkheimer
abordam de maneira semelhante as relações estabelecidas entre a disponibilidade de
energia e tempo livre para reflexão, as demandas do cotidiano pela subsistência e a
consequente incompatibilidade irreconciliável entre o trabalho corporal e a cultura. Tal
semelhança fica clara, por exemplo, no desenvolvimento de suas análises e as
categorizações realizadas sobre música séria (E-Musik) e música de entretenimento (U-
Musik), bem como as relações entre suas estruturas internas e as condições de produção.
Além disso, a opção pela conceituação da noção de indústria cultural ao invés do uso da
expressão cultura de massa traduz a intenção dos teóricos de Frankfurt em evitar a ideia
de que a cultura brotava espontaneamente das massas, sem que se fossem colocadas em
questão as conotações elitistas do termo e não considerando a interpretação de tal
132
fenômeno enquanto um produto de planejamento e racionalização do sistema de
produção capitalista.
Os fenômenos relacionados à produção de bens culturais constituíram também
objeto de estudo na análise da produção cultural no contexto do Brasil realizada por
sociólogos como Renato Ortiz. Com base nos conceitos desenvolvidos e noções
formuladas por Bourdieu em Economia das trocas simbólicas, Ortiz (1994: 25)
compreende na produção cultural uma distinção entre uma esfera de produção restrita -
vinculada à literatura, música e às artes-, e uma esfera de circulação ampliada, na qual
prevalece os imperativos do mercado e das tendências e demandas do consumo. As duas
esferas coexistem em um campo artístico, o qual necessita da integração de diferentes
partes constituintes para se configurar plenamente, a saber: um público consumidor que
possa garantir a manutenção do segmento no mercado, agentes participantes (escritores,
músicos, artistas, produtores, técnicos especializados, administradores, etc.), instâncias
de consagração (críticos especializados, imprensa, o Estado, instituições sólidas de
referência), e o processo de autonomização do campo através do predomínio das regras
internas relativas ao próprio fazer artístico sobre as demandas do mercado e do grande
público. Deste modo, segundo Bourdieu com o funcionamento concreto de cada um
destes elementos do campo pode-se reconhecer a presença de um campo artístico
autônomo, com suas regras próprias de funcionamento, critérios de legitimidade e
conflitos simbólicos pela acumulação de capital cultural e pela consagração no campo.
Em sua análise, Ortiz compreende esta cisão entre duas esferas distintas de
produção como fruto de um processo histórico, iniciado pela vultosa expansão do
mercado consumidor no setor editorial na Europa, possibilitada pelo desenvolvimento
tecnológico trazido pela Revolução Industrial no século XIX. Tal cisão fez
correspondência também com a divisão entre dois tipos de público, de um lado uma
minoria de especialistas e, por outro, uma massa de consumidores, configuração que
contribuiu para gerar conflitos entre os agentes das duas esferas e respectivos discursos
de distinção simbólica. Uma vez que o universo artístico encontra a sua existência na
medida em que garante a autonomia dos seus parâmetros internos, ele se vê condenado
a impor seus critérios estéticos e fazer frente à concorrência de uma produção de
mercado de maior alcance quantitativo. Assim, o posicionamento dos especialistas de
cada área artística se alinharam não raro a uma ideologia de conotação elitista,
orientando seus discursos à favor do “belo”, da “superioridade da arte”, em oposição à
valores como “comercial” ou “medíocre”, associados à produção de circuito massivo.
133
Vale observar que sua abordagem se diferencia sutilmente dos autores da escola de
Frankfurt e de Arendt, uma vez que a ideia de processo vital e o papel desempenhado
pela disposição de tempo livre e as demandas do trabalho no cotidiano, não integram
explicitamente sua formulação sobre o funcionamento do campo. Bourdieu baseia sua
conceitualização antes na compreensão dos sistemas simbólicos enquanto estruturas
estruturantes e as produções simbólicas como instrumentos de dominação e meios de
garantir a manutenção das diferenças entre classes e da ideologia das classes dominantes
(cf. BOURDIEU, 2011).
O emprego de tais conceitos e formulações por pesquisadores de diferentes áreas
acadêmicas que se debruçaram sobre o tema, como Paiano (1994), Zan (1997),
Napolitano (2001) e Vicente (2002), por sua vez também não ocorreu sem as devidas
precauções frente aos riscos e dificuldades de aplicar um referencial teórico
originalmente formulado para a compreensão do campo artístico europeu em um país de
configuração social, política e econômica substancialmente distinta. Assim,
resguardando as devidas diferenças e especificidades de cada contexto, seus trabalhos
apontaram a possibilidade de empregar tais referenciais teóricos que auxiliam na
compreensão do contexto brasileiro, sem que fossem deturpadas as características de
cada objeto de estudo e dos agentes envolvidos nos fenômenos culturais.
Já mencionamos no capítulo anterior que a constituição do massivo no Brasil
ocorreu simultaneamente à configuração de um modelo populista do governo de Getúlio
Vargas, processo em que o rádio desempenhou um papel central de difusão enquanto
um meio de comunicação de grande alcance. Além disso, a constituição do massivo no
país se difere também pela ausência de uma indústria cultural nos moldes da estrutura
produtiva de bens simbólicos já existentes nos países desenvolvidos, especialmente se
compararmos com países como os Estados Unidos. Comentamos também que outra das
diferenças marcantes manifestadas ao confrontarmos com o europeu/norte-americano se
evidencia na ausência de uma diferenciação clara entre pólo de produção restrita e de
produção ampliada nas décadas de 1950 e 1960. Segundo Ortiz (idem), devido ao
estágio precário de desenvolvimento do capitalismo no país e às complicações daí
decorrentes no período - como a fraca divisão do trabalho intelectual e a confusão de
fronteiras entre as diversas áreas culturais-, tornava-se difícil formar-se uma
diferenciação nítida entre o pólo de produção restrita e outro de produção ampliada.
Tais condições levaram não apenas a uma interpenetração entre as áreas da música
134
erudita e música popular; entre a imprensa e a literatura, mas também à incidência de
um “livre-trânsito” dos seus agentes48.
No entanto, na medida em que o processo de industrialização, o acréscimo do
número de cargos públicos e de profissões liberais acelerou a expansão da classe média
e sua consolidação enquanto estrato social, surgiam também indícios de um processo de
segmentação corrente nas esferas da produção, do público consumidor e,
consequentemente, das classificações da produção cultural desde a década de 1940.
Ainda que não houvesse uma distinção clara entre as esferas de produção restrita e
ampliada no mercado brasileiro, a atuação das gravadoras Festa, Elenco e Forma, entre
outras gravadoras atuantes no mercado, não deixaram de desempenhar os seus
respectivos papéis na formação de representações alinhadas a categorizações
polarizadas entre “artístico/cultural” e “massivo/comercial” por parte da crítica
especializada e de outros agentes do mercado.
No caso específico da gravadora Festa, pode-se dizer que sua atuação ficou
associada a discursos pautados em servir o propósito de “valorizar e divulgar a cultura”.
Deste modo, buscava-se legitimar a atividade do selo pela sua importância enquanto
difusora cultural, atribuindo à sua produção o status da arte, em uma suposta oposição
aos interesses comerciais, como estratégia para distinguir simbolicamente seus produtos
no mercado. Na matéria “Festa Discos – Divulgar oralmente a cultura no Brasil”,
publicada no Jornal do Brasil, ficam evidentes tais características do discurso: “[...]
Após termos tomado conhecimento das atividades quase que completas da nova Editora
Festa Discos, ficou-nos uma impressão segura: seu propósito é divulgar e ampliar o
gosto artístico do nosso povo. Comercialmente, tem interesses muito limitados, não
desejando fugir ao gênero puramente artístico e inédito” 49 (SILVER, 1957).
Entre outras matérias elogiosas dedicadas à etiqueta Festa, publicadas pelo
poeta, crítico musical e colunista Claribalte Passos no jornal Correio da Manhã, uma
resenha de lançamento do LP Canto de amor à Bahia (Festa/1958) de Jorge Amado e
Dorival Caymmi, também revela enfaticamente tais características:
48
A título de exemplo, podemos citar a atuação dos compositores/regentes na Rádio Nacional durante a década de 1950, que compunham e orquestravam materiais para a programação da rádio e trilhas sonoras para filmes nacionais, além de, ao mesmo tempo, escrever também obras extensas de música erudita, como Radamés Gnattali, Lyrio Panicalli e Leo Peracchi. Pode-se citar também o emprego de voicings e idiomatismos da música erudita em arranjos dos discos de Bossa Nova, entre outros numerosos casos. 49 Grifos nossos.
135
O disco, de modo geral, constitui um acontecimento fonográfico e de indiscutível valor cultural. Nele encontramos tudo que seja possível exigir no tocante aos méritos da verdadeira criação artística. A gravadora esmerou-se na apresentação gráfica, no nível de perfeição técnica das gravações em alta fidelidade, no acêrto da escolha do intérprete [Jorge Amado] e do ilustrador musical [Dorival Caymmi]. Mantém, assim, o alto conceito que conquistou junto à crítica especializada e o público não relaxando num mínimo possível a dignidade de um repertório. “CANTO DE AMOR À BAHIA” justifica aplausos irrestritos, longe de qualquer exagêro ou cômoda simpatia, uma vez que define a obra de um homem inteligente e dinâmico - Irineu Garcia. [...] Realizações de uma tal categoria honram a nossa indústria fonográfica, a cultura, contribuindo para difundir a obra e tornar ainda mais admirado o talento de um grande autor brasileiro [referência a Jorge Amado]50. (PASSOS, 1958)
Através do emprego de termos como “valor cultural”, “verdadeira criação
artística”, “nível de perfeição técnica das gravações”, “alto conceito” e “realização que
honra a cultura”, percebemos alguns códigos pelos quais agentes da crítica especializada
do período intencionavam atribuir valores positivos e assim legitimar a produção da
gravadora, com ênfase não apenas no aspecto técnico das capas e do fonograma, mas
principalmente na relevância do “papel cultural” de seus lançamentos. Deste modo, a
iniciativa autônoma de Irineu Garcia era estimada pela crítica especializada, à qual
dedicava regularmente matérias que enalteciam sua contribuição em promover aquilo
que era entendido como a “legítima” arte e cultura do país, em oposição aos interesses
comerciais de grandes gravadoras.
Em uma matéria publicada em 1956 no Jornal do Brasil, se distingue novamente
o empreendimento de Irineu Garcia e Carlos Ribeiro através da negação do aspecto
comercial, desta vez estabelecendo um paralelo com o setor radiofônico:
Não é possível pensar na iniciativa de Carlos Ribeiro e Irineu Garcia em termos de rádio comercial. [...] Com isso quero dizer: em termos de vulgaridade, banalidade, superficialidade, emoção fácil, ausência completa de qualquer sentido estético. [...] Já faz parte dos planos dêsses dois pioneiros o lançamento comercial de poemas gravados por quem os diga com maiores recursos vocais. Certamente para êsse trabalho não serão chamados animadores de auditório nem gente viciada em rádio teatro. Mas mesmo nessa segunda fase já programada há muito, a intenção não é ganhar dinheiro. Ganha dinheiro quem grava Emilinha [Borba], não quem grava Drummond. (JAIR, 1956)
50 Colchetes e grifos nossos.
136
A polarização presente no discurso do crítico, notável pela distinção da iniciativa
de Irineu Garcia frente aos programas de auditório – caracterizados aqui
pejorativamente através de termos como “vulgaridade”, “banalidade”,
“superficialidade”-, constitui um indício da segmentação que ocorria no âmbito prático
e simbólico entre um tipo de produção designada como “comercial” ou “massiva”,
direcionada ao grande público, e uma produção “culta” ou “sofisticada”, que respondia
aos interesses e às expectativas de segmentos sociais médios e altos. No setor do rádio,
a primeira era representada pelos programas de auditório e novelas de rádio teatro,
produções que possuíam os maiores índices de audiência.
Os auditórios das transmissoras de rádio constituíam o espaço preferencial das
relações entre os ídolos do rádio e o público desde a década de 1940, em especial
aqueles que buscavam contato pessoal e ingresso naquele universo. Constituíam em
teatros-auditórios normalmente sem separação ou isolamento acústico entre o público e
o locutor, nos quais o locutor interagia com a platéia e as reações decorrentes eram
integradas às transmissões. O programa “Caixa de perguntas”, idealizado pelo radialista
Almirante em 1938 e transmitido pela Rádio Nacional foi um dos primeiros. Na
transmissão eram oferecidos prêmios em dinheiro àqueles que acertassem as perguntas
do locutor (AGUIAR, 2007: 29-30; TINHORÃO, 1981: 65). Diversos outros programas
seguiram o mesmo formato e eram frequentados predominantemente por uma população
de baixa renda dos subúrbios, cujo comportamento exacerbado de gritarias, aplausos e
vaias – incentivado muitas vezes pelos próprios animadores de auditório-, acabaram
provocando “reações elitistas” por parte de uma classe média ascendente. Este tipo de
comportamento exagerado não se adequava aos padrões de hábitos, civilidade e valores
morais cultivados por segmentos sociais de elite, que por sua vez recorriam a termos
pejorativos para se referir ao ambiente dos programas de auditório, chegando até mesmo
a casos extremos, em que chegaram a descrever o publico feminino de subúrbio como
“macacas de auditório” (PEREIRA, 1967: 108).
Ao mesmo tempo, havia também uma parcela da programação radiofônica
dedicada à transmissão de poesia, literatura e música erudita – esta última por vezes
designada pela crítica como “música de classe” ou “música séria”-, na qual se incluem
os programas Música das nações, Concêrto antigo e Concerto da meia noite da Rádio
MEC, Os clássicos da semana da Rádio Globo. Estas atrações tinham conteúdo e
formato compatíveis com o tipo de fruição estética e os ideais de “bom gosto”
cultivados pela classe média e alta, e foram fomentados, desde a década de 1920, pelos
137
pioneiros da experiência radiofônica no Brasil – os cientistas Roquette-Pinto e Henrique
Moritze, membros destacados da elite carioca da época. Aliado a discursos valorativos
de jornalistas e críticos especializados publicados em periódicos, estes programas
orientavam as práticas consideradas como de “bom gosto” e atuavam no sentido de
realizar uma distinção simbólica de determinada produção no mercado.
Podemos perceber, assim, que a atuação da gravadora Festa estava associada ao
pólo de produção restrita, considerada como “culta”, “de classe” e figurava como
símbolo de “bom gosto” em matérias de jornais, contribuindo para a eleição de
referenciais de distinção social e estética compatíveis com setores sociais médios e
altos. Não por acaso alguns dos seus discos foram incluídos no repertório de programas
de rádio de música erudita, como o Romance do Piano do crítico Ayres Andrade,
transmitido às 21 horas na Rádio Ministério da Educação e Cultura (MEC), Os
Clássicos da Semana, transmitido às 21:30 na Rádio Globo, e o Programa Primeira
Classe, transmitido às 13h00 na Rádio Jornal do Brasil (cf. ANTOLOGIA, 1958;
FILHO, 1958a). Em uma publicação do Jornal do Brasil, um dos discos da gravadora
Festa figurava entre as recomendações de artigos para consumo e atrações turísticas às
classes altas do Rio de Janeiro:
MODA - Conjuntos de mohair em tons de café e roxo, vestidos de malha pied de cocq para serem usados com suéter por baixo, mantôs, de tweed, tailleurs, de zibelina fúcsia ou turquesa para os compromissos mais formais, calça Lee, de veludo cotelé, bijuteria do gênero italiano como os modernos brincos e pulseiras dourados, perucas: trança, meia ou um quarto de peruca, blusas de ban-lon cotelé, guarda-chuva com padrão de cobra combinando com a capa e conjuntos de blusão e meias iguais com estranhos estampados. DISCOS - Sinfonia Fantástica de Berlioz, Mestres do Barroco Mineiro [Festa/1958], com a missa em mi bemol, de José Joaquim Lôbo de Mesquita, Sinfonia n°6, Pastoral de Beethoven, Heróica de Chopin, Noites no Monte Calvo, de Mussorgsky, Deep Purple, de Nino Tempo e April Stevens. O Canto Livre de Nara [Philips/1965], com Nara Leão, Gioventu de diversos cantores, People, de Ella Fitzgerald e Nova Dimensão do Samba [Odeon/1964] com Wilson Simonal. (CARNET, 1965) 51
Vale observar também que a atividade de Irineu Garcia na direção do selo Festa
parece se alinhar ao ideário nacionalista cultivado por intelectuais do setor radiofônico
das décadas de 1920 e 1930, período em que intencionavam converter o rádio em um
51 Grifos originais do autor. Colchetes nossos.
138
meio de comunicação voltado para a educação e “civilização” do povo (TINHORÃO,
1981: 34-6). Defendiam uma radiofonia educativa capaz de “assumir a dianteira num
grande movimento civilizador no país” e, seguindo esse ideário, Gallet chegou a
encaminhar um projeto ao governo com a definição de uma programação oficial
destinada a veicular uma “cultura geral”, que deveria incluir concertos de música
erudita visando a “educação nacional” (CONTIER, 1988: 313-4). Em outras palavras, a
atuação de Irineu Garcia na direção do selo Festa parece representar o ideário que
pautou diferentes grupos sociais ligados às classes dominantes, o desejo de “civilizar” o
elemento popular.
No que se refere à gravadora Elenco, a atuação de Aloísio de Oliveira e a sua
produção de discos e espetáculos também foram associadas com representações afins e
termos positivos como “artística”, de “bom gosto” nos meios de comunicação. Vejamos
alguns discursos de distinção simbólica em duas matérias publicadas pelos periódicos O
Jornal e Correio da Manhã, sobre os shows de Norma Benguel e de Sylvia Telles e
Roberto Menescal:
Nunca se sabe, nunca se pode afirmar qual o melhor espetáculo de Aloísio de Oliveira porque o melhor é sempre o último que o produtor está apresentando. Como “Contraponto”, recentemente estreado. Introdutor do “pocket-show” na noite carioca, de logo Aloísio Oliveira encontrou seguidores, que o bom deve ser imitado, fêz uma escola nem sempre bem compreendida e, por isso mesmo, algumas vêzes deturpada. Caladão, infenso a qualquer crítica ao trabalho alheio, com êsse “Contraponto” Aloísio parece querer chamar a atenção dos seus alunos: “Meninos, o negócio é assim. Nem mais, nem menos”. Dir-se-ia que Aloísio Oliveira aplica nos seus espetáculos, com notável maestria, quatro dos “five right of Merchandise”: a mercadoria certa, no lugar certo, no tempo certo, na quantidade certa. “Contra ponto” é o “show” exato. Se exagêro há é no bom-gôsto que deixa saudades quando as luzes se apagam no instante final. (ECO, 1965: 8) O novo espetáculo do “Zum Zum”, lançado quarta-feira, reflete o bom-gôsto de uma produção eficiente e inteligente. [...] O espetáculo tem, inclusive, uma noção de tempo pouco comum aos shows de boates. É dinâmico, objetivo, visual. Deve-se respeitar, também, a excelente iluminação. [...] O show de Silvinha Telles & Roberto Menescal é um espetáculo obrigatório nas agendas noturnas. (SILVINHA, 1964: 10)
Fica evidente nas duas matérias o status conquistado por Aloísio de Oliveira no
meio artístico, notável aqui através da atribuição de termos como “eficiente”,
“inteligente”, “dinâmico”, “objetivo”, “visual”, de “equilíbrio ideal”, etc., para
descrever seus pocket-shows. Tais publicações em jornais e revistas contribuíram para
139
distinguir sua produção e, além disso, atuavam diretamente para a formação de
hierarquias no campo artístico em formação daquele período. Durante a década de 1960,
em grande parte devido à sua empreitada a frente da Elenco e à mediação que realizou
junto aos artistas e ao cotidiano da Bossa Nova com as demandas técnicas e
administrativas do mercado fonográfico, Oliveira tornou-se uma grande referência na
produção de obras de artistas célebres da música brasileira e de artistas estreantes de
Bossa Nova. Ao longo do tempo, alguns dos discos se tornaram uma espécie de reserva
de procedimentos musicais e padrões estéticos reconhecidos como de “bom gosto”,
qualidade artística, sofisticação e modernidade musical em narrativas realizadas sobre a
música popular brasileira (cf. ZAN, 1997).
Além disso, vale apontar também que a escolha da inauguração da gravadora
Elenco ser realizada em um dos mais distintos e luxuosos hotéis do Rio de Janeiro, o
Copacabana Palace Hotel, é simbólica e destaca tanto o lugar social ocupado pelos
produtos da gravadora, como também a afinidade do perfil de produção de Aloísio de
Oliveira com certas demandas consumo e predileções de classes altas e médias em
ascensão daquele período. Em publicações de periódicos do período, representações de
“bom gosto” e de música “moderna” associadas à produção da gravadora por vezes
constituíam referência até mesmo para estratégias de publicidade em anúncios, como
podemos ver a seguir:
140
Fig. 21 – Anúncio da gravadora Elenco, publicado pelo jornal O Globo em janeiro de 1967.
No que se refere à gravadora Forma, a negação do aspecto comercial não
ocorreu de maneira distinta em relação às gravadoras Elenco e Festa, e constituiu
também em um fator de diferenciação recorrente em matérias de periódicos publicadas
pela crítica especializada. Vejamos a seguir um trecho de matéria sobre o lançamento do
disco Afrosambas (1965):
Com faixas “mais longas do que gostam os homens do rádio”, buscando uma forma simples de transmitir as mensagens de seus sambas inspirados no folclore baiano, o poeta Vinícius de Morais e o violonista Baden Powell lançarão dia 6 de setembro, no Museu da Imagem e do Som, um disco não comercial com sete “afro-sambas” inéditos. Preferindo gravar, cantando as próprias músicas, buscando “matriz que não deturpasse a letra e o ritmo”, Vinícius de Morais afirmou que o desejo expresso no nôvo disco, de fugir às convenções e exigências
141
comuns do mercado musical, não significa que êle, anteriormente, se tenha comercializado52. (VINICIUS, 1965)
Observamos no discurso do jornalista uma oposição clara entre um circuito
entendido como comercial - associado à programação de rádio e ao mercado musical e
suas convenções e demandas estéticas-, e a produção “livre”, “artística” e
“desinteressada”. A tentativa de atestar uma ideia de “pureza artística”, dissociada de
qualquer vínculo com o mercado se destaca na última sentença, na qual se intui isentar
até mesmo as produções anteriores de Vinicius de Moraes. Deste modo, nesta e em
diversas outras matérias publicadas de teor similar, a negação do aspecto comercial
parece ocultar na verdade um interesse na legitimação simbólica no campo. Ao ressaltar
a produção da gravadora pelo valor artístico em detrimento do comercial, e investir em
produções culturais pouco conhecidas pelo grande público, os produtores Roberto
Quartin, Aloísio de Oliveira e Irineu Garcia parecem agir de maneira adequada em um
campo em que a postura desinteressada é valorizada. Nas palavras de Bourdieu (2008:
150-3), “se o desinteresse é sociologicamente possível, isso só ocorre por meio do
encontro entre habitus predispostos ao desinteresse e universos nos quais o desinteresse
é recompensado”.
Fig. 22 – Foto publicada em matéria pelo periódico Correio da Manhã em 1965.
52 Grifos nossos.
142
Nesse sentido, a constante manifestação e exaltação pública do desinteresse
comercial parecem constituir uma estratégia dos produtores na tentativa de legitimar as
suas produções e associá-las a valores como “sofisticação”, “artístico”, “diferenciado”,
e um tipo de produto compatível aos padrões de fruição estética das classes altas e
médias ascendentes. Conforme bem aponta Zan (1997: 126-7), muitas das gravadoras
que produziam discos ligados ao repertório da Bossa Nova eram dirigidas por
aficionados pelo gênero. Uma vez que os agentes da indústria fonográfica brasileira e da
indústria do entretenimento não haviam adquirido habilidade para tratar com os músicos
da Bossa Nova, fez-se necessário a atuação de empresários e produtores ligados ao
movimento com formação musical, conhecimento do público, liderança e uma
concepção estética compatível com esse segmento da música popular. Produtores estes,
capazes de estabelecer a intermediação entre a racionalidade empresarial, o cotidiano da
Bossa Nova e o seu público. Para Zan (idem), o surgimento de produtores com este
perfil somente foi possível em um momento em que a organização racional da indústria
e do mercado fonográfico caracterizavam-se por certa incipiência. Tais condições
contribuíram para a manutenção de projetos autônomos de gravadoras com interesse
personalista, menor escala de produção e destinado a segmentos cuja demanda no
mercado não correspondiam às tendências mais populares. De certa maneira, os
produtores Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e Roberto Quartin parecem se encaixar
nesse perfil, pois além de terem sido conhecedores e apreciadores do tipo de arte que
produziam, estavam a par do seu público consumidor e tinham uma concepção estética
compatível com a Bossa Nova e com a música instrumental brasileira.
Entre outras análises de agentes atuantes do período e discursos apoiados na
cisão entre as duas categorias, uma específica publicada pelo crítico Sylvio Tullio
Cardoso constitui um indício da segmentação corrente do mercado e aponta uma cisão
de perfis de produção no mercado fonográfico entre grandes gravadoras e gravadoras
menores. Vejamos os seus argumentos:
A atual situação da fonografia brasileira chega a ser engraçada, com tanta injustiça, tanta omissão, tanta falta de orientação, de equilíbrio. O panorama é mais ou menos êste: as gravadoras financeiramente estáveis, que são, como é de conhecimento geral, as representantes dos grandes consórcios internacionais - Odeon, Philips, RCA e CBS - só lançam praticamente os chamados discos “comerciais”. Só editam LP's ou compactos cujo sucesso comercial esteja assegurado de antemão. Tudo que represente evolução artística, contribuição para a cultura do nosso público é liminarmente vetado. Os grandes consórcios - que têm
143
milhões e milhões a perder - não arriscam um centavo. LP’s e compactos de rock, twist, hully-gully, surf, sambolero, guarânia, versão de tango argentino, são lançados aos borbotões na praça. [...] Pois ora muito bem: enquanto os que podem não lançam, os que não podem o fazem. E estes são os chamados “independentes”, etiquetas como a “Elenco”, a “Festa” e agora a “Forma”, cujos dirigentes felizmente ainda acreditam que disco, antes de ser mercadoria, é também arte, cultura, talento e sensibilidade. (CARDOSO, 1965)
Observamos na argumentação de Cardoso sua intenção de atribuir um sentido
positivo aos lançamentos das gravadoras Elenco, Festa e Forma, conferindo mérito pela
suas contribuições prestadas à arte e cultura do país em oposição à operação de um
circuito comercial dominado pelas grandes gravadoras associadas a empresas
multinacionais. Antes de consistir fruto de uma análise abrangente do mercado53, a
parcialidade na posição de Cardoso indica a tensão estabelecida no campo, no qual
noções como “artístico”, “bom gosto”, “moderno” constituíam os elementos de conflito
simbólico na disputa pela legitimação no campo e pela classificação positiva de
determinados produtos em detrimento de outros em um campo em vias de consolidação.
Identificamos neste tópico alguns casos em que as lutas de classificação
envolveram a produção das gravadoras Festa, Elenco e Forma ao longo das décadas de
1950 e 1960; mais especificamente as representações vinculadas ao par de oposição
categórico manifestado em discursos valorativos de jornalistas e da crítica especializada
como comercial/massivo e artístico/circulação restrita. Resguardadas as diferenças entre
suas produções, pudemos perceber que as três gravadoras foram constantemente
associadas à valores como “artístico”, “de sofisticação”, “diferenciado”, e a um tipo de
produção compatível aos padrões de fruição estética das classes altas e médias em
expansão. Conforme pudemos observar na crítica de Cardoso, o modo de produção
autônomo empregado pelos seus produtores também figurou como um dos parâmetros
de distinção, destacado positivamente pela crítica por consistir uma condição favorável
para o investimento em segmentos de mercado em geral desprezados pelas grandes
gravadoras, como a música erudita nacional, música instrumental, trilhas de filmes e
53
No restante do conteúdo da publicação, Sylvio Tullio Cardoso não apresenta nenhum tipo de dado estatístico e, além disso, não considera alguns discos de artistas de Bossa Nova, lançados pelas grandes gravadoras citadas. Pela Philips, por exemplo, foram editados os discos Opinião (1964), O Canto livre de Nara (1965) de Nara Leão; Dois na Bossa (1965) de Elis Regina e Jair Rodrigues; O fino do fino (1965), Zimbo Trio (1965) do grupo Zimbo Trio; Tamba Trio (1962), Avanço (1963), Tempo (1964) do grupo Tamba Trio; Pela RCA, foi lançado os discos Maria Bethânia (1965), homônimo da cantora, Bossa Nova (1963) do Sexteto de Jazz Moderno; Pela Odeon, foram lançado discos como: Milton Banana Trio (1965), Recado nôvo de Luiz Bonfá (1963), a coletânea Festival da Bossa Nova (1963), entre outros lançamentos que não se enquadram nos gêneros musicais associados às grandes gravadoras pelo crítico.
144
alguns artistas de Bossa Nova menos familiares ao grande público. Por seguirem tal
modo de proceder, eram prezadas pela crítica por um suposto desinteresse em relação
aos objetivos financeiros e pela contraposição aos lançamentos de grandes gravadoras,
considerados comerciais e frutos de estratégias de mercado prezadas pelos grandes
consórcios internacionais.
3.2.2. Popular X Erudito
Na perspectiva de análise proposta neste trabalho sobre os pares de oposição os
quais balizaram as disputas simbólicas ocorridas em torno das três gravadoras Festa,
Elenco e Forma, optamos por desenvolver as análises seguindo uma divisão em
diferentes tópicos com o intuito de organizar a problematização das representações e
visando formatar uma linha de raciocínio coerente. Apesar de adotarmos esta estratégia
de organização, isto não quer dizer que as categorias Popular e Erudito não deixam de
compartilhar um nicho de significados em comum ao par de oposição
Comercial/Massivo X Artístico/Circulação restrita. Conforme Ortiz aponta (1994: 23-
5), no contexto dos países desenvolvidos, por consequência da expansão expressiva do
mercado consumidor da indústria editorial e, posteriormente também da fonográfica, se
dá a emergência de duas esferas distintas de recepção e produção. De um lado um
circuito restrito, que inclui uma produção de bens culturais destinada a um público
seleto de especialistas e historicamente associada à literatura, música erudita e às artes
cultas; de outro, uma produção de caráter comercial destinado a uma massa de
consumidores não necessariamente especializados.
Já apontamos anteriormente que no quadro cultural brasileiro, devido ao precário
desenvolvimento do capitalismo, à fraca divisão do trabalho intelectual e a confusão de
fronteiras entre as diversas áreas culturais, não se observa uma diferenciação nítida
entre o pólo de produção restrita e outro de produção ampliada (ORTIZ 1994: 23-5). Tal
estado das coisas fez com que as fronteiras entre as esferas da cultura popular e erudita
permanecessem imbricadas, tanto no que se refere ao funcionamento do mercado
cultural, como também nas representações. Assim, na análise de fenômenos culturais
deste período faz-se necessário levar em consideração suas especificidades para se obter
uma compreensão mais fiel e abrangente sobre as categorizações feitas pela crítica
especializada e o funcionamento do mercado daquele período.
As relações entre as esferas da cultura popular e erudita no contexto brasileiro
começam a ganhar proximidade no final do Império e no início da República, momento
145
em que surge a atuação de um grupo de intelectuais e artistas imbuídos de referenciais
românticos e nacionalistas interessados em manifestações populares. Considerado-as
como expressões legítimas da cultura brasileira, compositores como Alexandre Levy e
Alberto Nepomuceno, começaram a introduzir temas da cultura popular em suas obras.
Ao mesmo tempo, começava a se interpretar a sociedade brasileira e a identidade
nacional a partir da ideia de mestiçagem em obras de autores como Sílvio Romero,
Euclides da Cunha, Afonso Celso, Alberto Torres e Nina Rodrigues (ORTIZ, 1985: 37-
8). Nesta perspectiva ideológica, determinados segmentos sociais populares recorriam à
táticas de ocupação de espaços para introduzir suas manifestações culturais e conquistar
reconhecimento por parte das elites, assim como intelectuais e artistas das classes
sociais dominantes passam a buscar na cultura popular elementos para fundamentar a
construção da identidade nacional.
O caso dos estudos folclóricos de diversos musicólogos do período é
representativo desta busca, uma vez que buscavam nas manifestações folclóricas
elementos para levar ao “despertar um sentimento de identidade, mesmo que tênue”
(VILHENA, 1997: 81). Se até os anos 1930 este campo mantém suas atividades em
repercussão local, com a criação da Comissão Nacional do Folclore (CNFL), em 1947,
se amplia a repercussão de suas intervenções, uma vez que mediavam uma vasta rede de
membros centralizada no Rio de Janeiro, mas que se estendia pela maioria dos estados
brasileiros” e organizavam a realização de congressos, criação de museus, execução de
exposições (GARCIA, 2010: 10), com o objetivo de preservar a cultura popular e
fomentar o cultivo da identidade nacional. Com o intuito de conferir credibilidade às
suas análises e conferir certo status científico ao que escreviam, autores folcloristas
como Silvio Romero e Mariza Lira embasavam-se em estudos sociológicos e
etnográficos para defender, entre outras teses, a ideia de que as manifestações
folclóricas sejam compreendidas enquanto portadoras de uma cultura mestiça,
deslocando assim o sentido negativo vingou em fins do século XIX em relação às
diferenças biológicas das três raças, para uma compreensão positiva sobre o resultado
desta mistura. Alinhados a um pensamento romântico oitocentista remanescente,
consideravam a música folclórica menos passível de tais influências, e reconhecida
como expressão do inconsciente imaginário do povo e fonte principal de materiais
autênticos da identidade brasileira.
Por sua vez, iniciativas no campo popular, como o refinamento dos enredos dos
ranchos carnavalescos, intuíam também conquistar legitimidade se aproximando de
146
valores prezados pela classe hegemônica. Conforme aponta Zan (1997: 17), a iniciativa
de Coelho Neto, membro do rancho Ameno Resedá, de introduzir enredos cívicos nas
sociedades carnavalescas na época constitui um indício representativo. Na esfera da
música erudita, a repercussão do movimento modernista de 22, da publicação do Ensaio
sobre música brasileira (1928) e da atuação de uma série de compositores ligados ao
modernismo, como Villa-Lobos, Francisco Mignone e Camargo Guarnieri, também
contribuíram para estreitar as relações com a cultura popular. Além de produzir suas
obras com base em temas regionais e incorporar de maneira intensa os referenciais
nacionalistas em suas atuações, estes músicos procuraram também estabelecer vínculos
com o governo de Vargas para implementar políticas culturais compatíveis com os seus
ideais, que valorizassem a música erudita nacional e que contribuíssem na consolidação
de um sentimento compartilhado de nação.
A música popular urbana, que conquistava um público crescente no rádio e no
mercado fonográfico, não era vista da mesma maneira que o folclore por intelectuais
tradicionalistas, uma vez que era considerada mais suscetível às influências da
modernidade e também devido à sua relação estreita com tendências musicais
estrangeiras que aportavam no país. No entanto, havia segmentos da música popular que
ocupavam uma posição intermediária na hierarquia de legitimidades do período, como o
choro e a seresta. Devido à erudição e sofisticação de suas regras internas de
estruturação musical, ao emprego de polifonia entre o acompanhamento dos
instrumentos e a melodia, seu rigor composicional em formas rondó, o gênero choro
agregava músicos de boa formação, ainda que por vezes intuitiva, e era amplamente
aceito pelas camadas médias urbanas desde a década de 1930 (cf. ZAN, 1997). Um caso
indicativo de sua representatividade e da relação estreita com a cultura erudita, foi a
experiência formativa do compositor Villa-Lobos nas rodas de choro e a posterior
adoção do choro como material composicional na série “Choros”, realizada na década
de 1920. Nesta, combinou as regras de estruturação e orquestração da técnica de escrita
da música erudita a partir de materiais e padrões de contorno melódico típicos de
composições e acompanhamentos do choro.
A tendência ao emprego de técnicas de orquestração e estruturação musical da
música erudita e à sofisticação dos arranjos se manifestava na medida em que incidiam
as condições deficientes da organização do mercado e a fraca divisão do trabalho
intelectual. Alguns compositores, arranjadores e regentes de formação erudita por vezes
eram levados a realizar trabalhos no mercado de música popular devido à inexistência
147
de um campo artístico autônomo de música erudita no país, que dependia não raro de
incentivos financeiros estatais para subsistência. Arranjadores em atividade na Rádio
Nacional desde a década de 1940, como Radamés Gnattali, Leo Peracchi, Lyrio Panicali
e Romeu Ghipsman, além do próprio jovem arranjador Tom Jobim, aplicavam seus
conhecimentos da técnica de escrita erudita combinados com as técnicas de escrita para
big bands apropriadas com referência em obras de jazz na elaboração dos arranjos que
escreviam semanalmente (ZAN, 1997: 93).
Além disso, em um contexto em que as políticas culturais do governo de Vargas
procuravam instrumentalizar o samba com o objetivo de reforçar um sentimento
nacionalista, as novas técnicas empregadas por estes arranjadores conferiam um
tratamento musical mais “digno”, “elegante” ao samba, condizente com as aspirações
nacionalistas, ufanistas, modernizadoras e civilizadoras da época (VICENTE, 2010: 28-
45). Processos como estes contribuíram para o refinamento das técnicas de escrita de
arranjos e consequentemente para a formação de um conjunto de procedimentos
musicais associados à ideia de sofisticação na década de 1950. Ao longo do tempo,
esquemas de estruturação/orquestração da música erudita e técnicas de escrita em bloco
tipicamente empregadas em big bands serviriam como critério de legitimação frente à
crítica especializada e contribuiriam para a legitimação de artistas através do
aprimoramento técnico e pelo culto à “qualidade” estética, contrapondo-se ao
comercialismo.
Situa-se nesse contexto a atuação das gravadoras no mercado fonográfico e,
entre elas as empresas Festa, Elenco e Forma, que gravavam a produção realizada nesse
segmento e desempenhavam o seu próprio papel no mesmo processo através da
iniciativa na produção dos discos, das oportunidades conferidas aos músicos e aos
profissionais envolvidos e da repercussão gerada pelos seus lançamentos no cenário
artístico. Como já foi exposto no capítulo anterior, o catálogo da gravadora Festa de
Irineu Garcia constituiu predominantemente de lançamentos de cultura erudita, em parte
discos de literatura recitada e outra grande parte obras de música erudita nacional. Neste
último segmento, realizou uma contribuição expressiva uma vez que as grandes
gravadoras não direcionavam investimentos representativos para o setor.
Como evidência clara da orientação de Irineu Garcia à cultura erudita e
principalmente do seu comprometimento musical nacionalista com a gravação das obras
representativas da música erudita brasileira figuram não apenas o predomínio das obras
de compositores brasileiros no catálogo da gravadora, mas também a intenção de
148
possibilitar o acesso e melhor avaliação do escopo histórico da música erudita nacional
e preservar o patrimônio cultural do país. A expressão mais sintética da orientação
nacionalista de Garcia se manifestou no lançamento da coletânea Do Barroco a Villa-
Lobos (1962), a qual reuniu oito LP’s de obras representativas desde compositores do
barroco mineiro, passando pelos compositores do período romântico e cobrindo por fim
os compositores modernistas. Através desta coletânea, Garcia concretizava as
aspirações de um grupo de críticos e grupos sociais hegemônicos interessados na
preservação das produções culturais representativas do país e no fomento à
compreensão da música nacional em perspectiva histórica54.
Por outro lado, apesar de constituir menor parte do seu catálogo, no final da
década de 1950 a gravadora Festa produziu também uma pequena série de discos para o
setor de música popular. Conforme já apontamos, havia naquele período um contexto
permeado de conflitos simbólicos e debates estéticos em processo, nos quais noções
como “autenticidade”, “tradição”, “modernização”, “decadência”, “descaracterização”
ganhavam evidência em discursos de legitimação em torno do campo de música
popular. As escolhas realizadas por Irineu Garcia na produção da série de música
popular não ficaram alheias às estas questões ou isentas de contradições, e figuram uma
conduta de caráter notadamente ambíguo se observado o perfil de determinados discos.
Ainda que o perfil da gravadora estivesse associado a um segmento reconhecido
como de “bom gosto” e ao tipo de produção reconhecida como “culta” (p. ex. poesia e
música erudita), isso não constituiu um impasse para que lançassem também discos de
música reconhecida como “comercial”. Vejamos uma resenha publicada pelo crítico
Ary Vasconcelos sobre o LP Prelúdio de Amor do flautista/clarinetista Nicolino Cópia e
o Conjunto Studio:
54
Integravam a coletânea Do Barroco a Villa-Lobos (1962) os seguintes discos: 1) José Joaquim Emérico Lobo de Mesquita (1746 - 1805) - Missa em mi bemol (barroco mineiro) 2) Antologia da Música Brasileira, vol. I - Interpretado por Arnaldo Estrêla. Obras de Sigismundo Neukomm (1778 – 1858, austríaco), Brasílio Itiberê (1846 – 1913), Leopoldo Miguez (1850 – 1902), Henrique Oswald (1852 – 1931), Alexandre Levy (1864 - 1892), Alberto Nepomuceno (1864 - 1920), Barroso Neto (1881 – 1941), Villa-Lobos (1887 – 1959), Fructuoso Vianna (1896 – 1976), Lorenzo Fernandez (1897 – 1948), Francisco Mignone (1897 – 1986), Radamés Gnattali (1906 – 1988), Camargo Guarnieri (1907 – 1993) e Luiz Cosme (1908 – 1965) 3) Henrique Oswald (1852 – 1931) - Sinfonia Opus 43 4) Alberto Nepomuceno (1864 - 1920)- Sinfonia em Sol menor 5) Francisco Mignone (1897 – 1986)- 12 Valsas de Esquina 6) Radamés Gnatalli (1906 – 1988) - Concerto para harpa e orquestra e para violino e orquestra 7) Cláudio Santoro (1919 - 1989) - Sinfonia n°5 8) Villa-Lobos (1887 – 1959) - Prelúdio de Bachianas Brasileiras n°4; Quarteto n°11 e Magnificat-Aleluia
149
Enveredando agora também pelo disco dançante, Irineu Garcia oferece-nos um disco de alta qualidade do gênero. Porque há discos de dança e há discos de dança. Este pertence aos de categoria. Cópia [O flautista copinha], ele mesmo um grande intérprete de sax-alto, clarinete e flauta, à frente de seu ótimo conjunto (Lauro Miranda: piano; Geraldo Miranda: guitarra; Gabriel Bezerra: contrabaixo; Jayme Storino: bateria; e às vezes bongô, maracas, pandeiro e afoché) produz música moderna e suave, que gostam de dançar. (VASCONCELOS, 1959)
Na visão do crítico, o repertório de música popular predominantemente
estrangeira – integram o disco baladas e canções de filmes, como “Cry me a River” de
Arthur Hamilton, “Fiorin Fiorello” de Mascheroni Mendes, “Picolíssima Serenata” de
Gianni Ferrio, “Embraceable You” de Gershwin, “Lover Come Back To Me” de
Sigmond Romberg, entre outras-, bem como o emprego de instrumentos de percussão
típicos de gêneros latino-americanos (bongô e maracas) nos arranjos não constituíram
um empecilho para qualificar o LP como um disco de “categoria”. Deste modo, Ary
Vasconcelos demonstra sua simpatia pela produção afirmando o caráter de “música”
moderna e “suave”, alguns dos códigos que expressavam um ideal de civilização
específico associado aos ambientes de entretenimento da Zona Sul na década de 1950.
Além deste disco de Nicolino Cópia, foram produzidos também alguns outros
discos no mesmo segmento, como o LP Eu te amo (1959) também de Nicolino Cópia,
Eu sei que vou te amar (1959) de Mozart e Seu Pistom, Eu preciso de você (1959) do
guitarrista Geraldo Miranda; bem como de outros segmentos diversos, como o disco
Música chinesa (1958) realizado a partir de gravação de performance do Conjunto de
Instrumentos Tradicionais da República Popular Chinesa e o LP Escola de samba da
Portela (1959), com registro de batucada de samba.
Ao mesmo tempo, a série de música popular da gravadora Festa não deixou de
incluir discos do segmento de música popular brasileira reconhecida como “sofisticada”
ou “tradicional”, e editou lançamentos que se tornaram referência de um suposto “bom
gosto” e que ganharam representatividade no seu percurso histórico. Nos primeiros
meses de produção da série, Irineu Garcia reuniu personagens promissores da cena
musical carioca: o poeta Vinicius de Moraes, que apesar ter amplo reconhecimento pela
sua produção literária, ainda dava seus primeiros passos no meio musical; e o
compositor Antônio Carlos Jobim, que além de músico popular requisitado, era um
estudioso da música erudita e conhecedor da obra de Debussy e Villa-Lobos. Junto da
consagrada cantora Elizete Cardoso e contando com as primeiras incursões da batida de
150
João Gilberto no violão, gravaram, no estúdio da Odeon, o LP Canção do Amor Demais
em 1957. No ano seguinte, o disco foi lançado e, futuramente, passa a ser considerado
como um divisor de águas na história da música brasileira e um dos marcos da Bossa
Nova55.
Em uma resenha publicada sobre o LP, escrita pelo crítico e musicólogo José da
Veiga Oliveira no período, é possível notar indícios de referenciais que guiaram o
julgamento de distinção da obra:
A “Canção do Amor de Demais” obteve grande aceitação por quatro motivos: música admiravelmente comunicativa de Antonio Carlos Jobim, a poesia de Vinicius de Moraes, a voz cálida e flexível de Elizete Cardoso e um registro sonoro dos mais perfeitos já produzidos no país [...]. Primeira indagação: será música popular ou erudita? Daquela possui todos os elementos de ritmo, imagens, colorido, menos o primarismo do conteúdo poético, a harmonia grosseira, defectiva e rudimentar. Música erudita ainda não é, muito embora algumas das melodias estejam próximas aos melhores “Lieder”. [...] O “Lied” acha-se ligado a seu texto. O menor desvio da palavra torna-se sua ferida, seu impudor, sua tolice. Tudo se passa numa concentração de espaço e dos sentidos, onde a sensação nada dissocia, onde nenhuma ficção desvia nem anestesia. [...] Quando ele se comprime num medalhão, aí nenhum artifício é mais possível, nenhuma falta ao pensamento e bom gosto. (OLIVEIRA, 1959: 41 apud BOLLOS, 2010: 86-87)
Como se percebe, para avaliar o LP o musicólogo recorre à aplicação de
referenciais estético-musicais oriundos da esfera erudita à música popular brasileira,
como meio para qualificar artisticamente o produto através de representações
concebidas sobre um presumido “bom gosto”. Provavelmente por atuar como um crítico
e estudioso da música erudita no período, parece ter despertado a atenção de José da
Veiga o emprego de recursos musicais típicos da música erudita no âmbito da canção
popular, como a instrumentação, que reuniu sete violinos, duas violas, dois violoncelos,
flauta, trombones, trompa e piano; o emprego de contraponto entre violinos e
violão/percussão; a inclusão estratégica de uma função harmônica do violoncelo; a
55 Em uma entrevista com Vinicius de Moraes publicada, em 1965, pelo periódico Jornal do Brasil, o episódio que supostamente teria dado origem à ideia de produção do disco é assim relatado: “Em 1957 o compositor Haroldo Barbosa promoveu uma reunião no bar Vilarino, ponto de encontro de intelectuais. Durante o encontro, Irineu convidou Tom para musicar um disco que ia lançar, O Pequeno Príncipe, extraído do original de Saint-Exupéry e apresentado pelo ator Paulo Autran com pequeno elenco. Na mesma ocasião surgiu a ideia de um LP com músicas de Tom e poesia - como gosta o próprio autor de dizer - de Vinicius. Esse disco, segundo palavras de Irineu Garcia, era considerado não comercial pelas grandes gravadoras, mas, ainda assim, resolveu promover o seu lançamento, que ocorreu no ano seguinte.” (IVAN & PORTELLA, 1965a)
151
utilização de recursos de colorido timbrístico, como o staccato e o pizzicato, etc. Deste
modo o musicólogo contribuía para a formação de um segmento musical calcado em
uma ideia construída do “bom gosto”, por meio de critérios de distinção oriundos da
esfera culta. Assim, destacou Vicente (2012: 3), que José da Veiga acabava reforçando
uma prática que se consagraria posteriormente com o fenômeno da Bossa Nova, a saber,
a aplicação de critérios analíticos da esfera culta na música popular, visando legitimá-la
perante as classes intelectualizadas.
Vale observar que constitui um fato simbólico que um dos discos que
prenunciaram os elementos poéticos e musicais que se consagrariam posteriormente
com a Bossa Nova tenha ocorrido em uma gravadora especializada em discos de
literatura recitada e música erudita através da mediação de um produtor com o perfil de
Irineu Garcia. Como se sabe, uma das transformações trazidas na música popular pela
Bossa Nova ocorreu no plano das letras, que passa a apresentar influências da lírica
modernista brasileira. Nesse sentido, a própria atuação de Vinicius de Moraes - que
naquele período já havia lançado discos de poesia pelo selo Festa-, contribuiu
diretamente para aproximar os campos da poesia e música popular.
Pode-se inferir que o esgotamento das duas mil cópias de Canção do amor
demais e de outros discos lançados pelo selo Festa aliado à repercussão enfaticamente
positiva gerada por parte da crítica especializada indica a existência desta demanda de
consumo e o papel que a iniciativa autônoma de Irineu Garcia desempenhava em
realizar um tipo de produção que atendia às expectativas destes segmentos sociais. Uma
vez que o perfil de lançamentos do selo muitas vezes não se alinhava às tendências de
maior público e maior potencial comercial do mercado, o modo de produção autônomo
empregado por Irineu Garcia era necessário para fornecer condições de autonomia
artística aos músicos, usualmente restringidas por medidas de contenção de risco de
grandes gravadoras.
Dentre os demais títulos de música popular lançados pelo selo Festa, destacam-
se também os LP’s Festa dentro da noite Vol. I e Vol. II (1959), uma das poucas
gravações do compositor e pianista Vadico, parceiro de Noel Rosa em parte de seus
sambas mais representativos; Modinhas fora de moda (1958) da cantora Lenita Bruno
com orquestra dirigida por Leo Peracchi, traz uma seleção de modinhas colhidas por
musicólogos, e compostas ou arranjadas por Villa-Lobos, Carlos Gomes e Alberto
Nepomuceno; Nelson Souto interpreta Eduardo Souto (1958) constitui uma coletânea
de obras do regente e compositor Eduardo Souto, que eram referência no repertório de
152
música popular para piano do período, como o tango “O despertar da montanha”, “Tatu
subiu no pau”, “Parati dançante”, entre outras.
No que se refere à gravadora Elenco de Aloísio de Oliveira, sabemos que sua
atuação no mercado fonográfico ficou predominantemente centrada no subgênero Bossa
Nova. Devido ao perfil de produção e ao perfil de direção de Oliveira, tornou-se uma
referência na produção de discos de artistas célebres da música popular brasileira
considerada “moderna” e de artistas estreantes de Bossa Nova. Em uma série de
publicações de uma entrevista com Aloísio de Oliveira, realizadas, em 1965, no
periódico Jornal do Brasil, o produtor relata sua visão sobre o percurso da música
popular no período e apresenta argumentos que fornecem indícios para compreender o
sentido de sua opção pelo segmento de Bossa Nova:
AO – [...] a música brasileira foi melhorando, mas as mudanças não foram tão pronunciadas, nestes 18 anos [1939 - 1957] [...] Não senti grandes transformações, pelo menos nada que me chocasse, até que tive contato com a música de Tom Jobim - completou. A primeira vez que eu de fato senti esta transformação, mesmo, foi com o Tom em 1956, quando eu voltei para o Brasil, que ouvi uma música que não era nem samba ritmado nem samba-canção [“Foi a Noite” de Tom Jobim] [...]. O que me chamou atenção foi, em primeiro lugar, a harmonia, em segundo o fraseamento, que era completamente diferente de tudo que eu já tinha ouvido no Brasil. Eu senti que quem estava fazendo música no Brasil, de fato sabia música - afirmou Aluísio de Oliveira. JB – Aluísio de Oliveira toma como exemplo, então, o que ele chama de “samba moderno” e “samba primitivo”. AO – Para ilustrar o que estou dizendo, o samba primitivo, quando eu digo o samba de morro, o samba carioca, o samba de Ataulfo Alves são considerados primitivos pelo seguinte: os autores são indivíduos que não conhecem música e tocam um instrumento chamado violão, conhecendo apenas três ou quatro acordes. JB – Concluiu seu pensamento, dizendo que a música destes compositores não pode caminhar por terrenos extensos, tendo que se limitar ao campo dos acordes conhecidos, “apesar de ser inspirada e bem carioca”. AO – Elas se prendem a certas coisas, porque o compositor não tem condições de sair daquilo. A isso eu chamo de música primitiva. Samba primitivo carioca. Agora, o Tom já deu uma concepção completamente diferente, porque ele venceu a barreira do primitivismo e saiu para harmonizações contemporâneas, saiu para fraseamentos diferentes, sem perder a continuidade de samba, vamos dizer. [...] De modo que com essa música do Tom eu comecei a sentir alguma coisa de novo e quando eu fui buscar e querer conhecer o Tom para saber outras coisas, foi então que eu vi que dentro das coisas dele também existiam os sambas
153
que ele fazia e que também era influenciados por essa nova concepção harmônica e melódica56. (IVAN; PORTELLA, 1965)
Através de referenciais oriundos da esfera erudita, calcados no domínio do
tratamento musical da harmonia, de progressões harmônicas e da melodia no ato da
composição, percebemos que Aloísio de Oliveira distingue claramente o samba
“moderno” do samba de compositores do morro, em função de um suposto
“primitivismo”, um presumido limite de seus autores em empregar de acordes e
progressões harmônicas. Na visão do produtor, principalmente Tom Jobim e aqueles
compositores com formação musical seriam capazes de superar a “barreira do
primitivismo” e compor um novo tipo de música, com uma “nova concepção harmônica
e melódica”. Por meio desta visão sobre a música popular e de suas ações e discursos
orientados por tais valores, Aloísio de Oliveira contribuiu para a segmentação de
gêneros ou estilos de música popular, atuando no sentido da consolidação de um
segmento considerado “culto” ou de “bom gosto” e procurando se legitimar no campo
artístico através do aprimoramento técnico do ofício musical e do culto à “qualidade”
estética.
Tal concepção de Oliveira sobre a produção de música popular certamente
orientou sua atividade enquanto produtor, diretor e proprietário da gravadora Elenco,
desde a seleção do cast, passando pela direção artística, seleção do repertório e
chegando até as etapas mais pontuais, como a supervisão das seções de gravação. Já
apontamos no capítulo anterior que predominou com grande folga na gravadora os 58
lançamentos de Bossa Nova contrapostos a apenas quatro discos de intérpretes
sambistas lançados (ainda assim incluindo participação de artistas da Bossa Nova): Ao
meu Rio (1965) de Mario Reis, De Vinicius e Baden especialmente para Cyro Monteiro
(1965), Samba é Aracy Almeida (1966) e As músicas de Baden Powell e Paulo César
Pinheiro (1970).
A crítica especializada também desempenhou um papel relevante na vigência de
referenciais de distinção no campo artístico. Matérias publicadas sobre os lançamentos
da gravadora Elenco e os espetáculos de boate produzidos por Aloísio de Oliveira
associavam representações de “bom gosto”, “modernidade” e “sofisticação”, em
contraposição àquela produção considerada como comercial ou de qualidade estética
56
Colchetes e grifos nossos.
154
“questionável”. Vejamos os argumentos em uma matéria publicada pelo jornal Correio
da Manhã em 1963:
Qualquer noite dessas reencontramos Aloysio de Oliveira, poucas palavras, olha longe, pensando na estréia de terça-feira no Bon Gourmet (Maysa). [...] Aloysio, homem de cinema, “show” e disco, dezoito anos profissionais nos Estados Unidos, acha que rádio não existe, é arte superada. É uma opinião respeitável diante da experiência de barbas brancas do produtor, especialmente se a sua atual audiência radiofônica se resume a alguns programinhas menos razoáveis como as novelinhas da Nacional ou dos “disc-jockeys” subdesenvolvidos. (HUNGRIA, 1963a)
A intenção valorativa do crítico Julio Hungria se evidencia aqui no
estabelecimento de uma oposição entre a produção de Aloísio de Oliveira – destacada
positivamente pela sua experiência no mercado cultural dos Estados Unidos-, e os
programas de rádio-novela da Rádio Nacional e programas de radialistas focados no
repertório de samba-canção e gêneros estrangeiros latinos. Matérias como esta e com
esta maneira de interpretar a configuração do mercado cultural do período não
consistiram exceção e eram publicadas regularmente em colunas culturais e seções de
entretenimento de periódicos da década de 1960. Como consequência, tais discursos
contribuíam para legitimar determinados artistas e procedimentos ligados à Bossa Nova
e a um segmento considerado como sofisticado técnica e artisticamente em narrativas
sobre a história da música brasileira.
No que se refere à gravadora Forma de Roberto Quartin, já sabemos que o seu
catálogo também se especializou principalmente em lançamentos de artistas de Bossa
Nova e música instrumental. As resenhas publicadas sobre os seus lançamentos
destacam de maneira positivamente similar qualidades como a escolha do repertório, a
competência musical e originalidade dos artistas gravados, o design das capas, os
arranjos elaborados, entre outros aspectos. Vejamos um trecho de uma resenha
publicada sobre o disco Coisas (1965) editada pela gravadora:
O grande musicista brasileiro [Moacir Santos] perpetuou realmente uma obra definitiva, não apenas no que se refere à concepção, mas também à realização. Tanto no plano da forma como do conteúdo, ela é extraordinária. Gastaríamos ainda algumas outras laudas se nos dispuséssemos a falar sobre a felicidade com que Moacir empregou nestas suas dez “Coisas” - que são realmente umas “COISAS” - os compassos não convencionais, sobre a fascinante tessitura de seus “voicings” e especialmente o admirável rendimento que obteve dos
155
solistas. Neste particular, aliás, podemos dizer que nunca ouvimos o músico popular brasileiro se expressar com tanta convicção e personalidade. [...] Ouçam o disco e orgulhem-se, como nós, da música moderna brasileira, podemos contar com um talento da dimensão de Moacir Santos (CARDOSO, 1965) 57
Podemos observar que a repercussão gerada pelos lançamentos de Quartin em
periódicos também contribuía para a formação de um segmento musical calcado em
uma noção construída de um “bom gosto”, através da eleição de critérios de distinção
oriundos da esfera culta. Na argumentação de Cardoso, a distinção acontece pelo
destaque da qualidade autoral da obra e pela referência a aspectos musicais
composicionais/técnicos, como o emprego de “compassos não convencionais”, voicings
específicos e a qualidade do improviso dos músicos. Reforçava-se também aqui, a
aplicação de critérios analíticos da esfera culta na música popular, visando legitimar
determinada produção no mercado.
Outro lançamento da gravadora, o disco Dulce (1966) da cantora Dulce Nunes,
colocou em questão até mesmo sua própria categorização, se se tratava de um disco de
música popular ou propriamente de música erudita. Vejamos a resenha publicada pelo
crítico Sylvio Tullio Cardoso:
Êste LP não é a rigor “um disco de música popular”. Não é uma gravação que se enquadre exata e perfeitamente no escopo desta coluna. Quem deveria comentá-lo é o nosso colega Zito Batista Filho, titular da coluna de gravações de música erudita. [...] Por que não é um disco de música popular? Basicamente porque nêle não há ritmo e a nosso ver não há o que conhecemos por “música popular” sem marcação rítmica. O que se houve nas doze faixas são baladas modernas tratadas eruditamente pelo arranjador e regente Guerra Peixe. Na verdade, o gênero do LP se aproxima mais da “música erudita vocal” do que da chamada “canção popular”. Excluindo-se porém o problema da situação do disco em relação a gêneros musicais, concordamos plenamente com os que já o ouviram e o acharam um dos mais belos discos vocais já gravados no Brasil. O disco é realmente qualquer coisa de tocante, de belo, de comovente, de enternecedor, de poético. [...] Dulce canta com o “charm” e a “finesse” de Lenita Bruno, a sutileza e a vaporosidade de Alaíde Costa e ainda acrescenta a estas uma meiguice, uma brandura que nos envolvem integral e irremediavelmente. [...] O disco é realmente maravilhoso. Não é “O fino da Fossa” - como já o apelidaram os que choram montes de lenços quando o ouvem - mas sim o fino da sensibilidade, da poesia e da musicalidade. (CARDOSO, 1966b)
57 Colchetes nossos.
156
Apesar do repertório do disco trazer apenas canções de compositores de música
popular (Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Baden Powell, Oscar Castro Neves, Ruy
Guerra, entre outros), na visão de Cardoso a ausência de acompanhamento percussivo e
o caráter formal e estrutural dos arranjos do maestro Guerra Peixe bastaram para
categorizar o disco como de música erudita. A comparação com a cantora Lenita Bruno
não constitui um acaso, uma vez que o perfil dos arranjos do LP e o estilo interpretativo
do canto se assemelham consideravelmente com os empregados no disco Por toda a
minha vida (Festa/1959) de Lenita Bruno. Apesar de haver mais canções acompanhadas
por violão no disco de Dulce Nunes, ambos os discos apresentam longas seções escritas
com acompanhamentos de cordas, oboé e flauta, e tratamento arrojado no que se refere
à elaboração contrapontística e à escrita idiomática das diferentes vozes do
acompanhamento. A referência a tais características estruturais constituiu muitas vezes
um parâmetro central pelo qual a crítica especializada distinguia produções desse
segmento de maneira positiva, destacando o rigor estrutural e atribuindo a qualidade de
“artístico” ou de “bom gosto” pelo emprego de procedimentos da esfera erudita.
Neste tópico apresentamos algumas maneiras pelas quais discursos e
representações associadas às esferas da cultura erudita e popular envolveram as
gravadoras Festa, Elenco e Forma em lutas simbólicas do mercado cultural pela
atribuição da noção do “bom gosto” nas décadas de 1950 e 1960. À exceção de um
número pequeno de discos de música popular de estilos considerados “comerciais”,
lançados pela gravadora Festa, constatamos que a produção realizada pelas três
gravadoras se destinou predominantemente a contemplar a música erudita nacional, a
Bossa Nova e a música instrumental nacional, segmentos do mercado e gêneros de
música popular associados à valores de distinção simbólica. Observamos nos discursos
proferidos pela crítica especializada que determinados critérios oriundos de
competências no domínio das técnicas da esfera erudita eram eleitos e empregados em
discursos de legitimação no campo artístico.
3.2.3. Nacional X Estrangeiro
Na perspectiva de consolidação de uma identidade nacional, desde os anos de
1920 artistas e intelectuais modernistas assumiram para si as demandas da convergência
harmônica de esforços entre artistas, líderes políticos, educadores e as classes populares.
O problema central da primeira geração modernista consistia em realizar um tipo de arte
ao mesmo tempo “universal” – enquanto parte pertencente da cultural ocidental
157
moderna-, e tipicamente “brasileira”. Para tal era determinantemente necessário romper
com a reprodução de formatos e padrões importados das formas artísticas européias e
buscar assegurar um paradigma de criação nacional através do emprego de símbolos
culturais locais e temas regionais. No plano político, assumiam o papel de mediadores,
reorganizando as relações entre as esferas da cultura e do poder público, formatando
conceitos, representações e tipos de discursos para que a busca da modernização não os
desviassem a sociedade para uma importação cultural mimética e desagregadora.
Em um período em que a linha de pensamento modernista-nacionalista orientava
posicionamentos políticos e estéticos não apenas de intelectuais, artistas, mas também
de segmentos sociais de elite interessados na construção da nação, a popularização de
gêneros musicais estrangeiros nos mercados fonográfico e editorial, ocorrida após a 1ª
Guerra Mundial, representava uma ameaça ao esquecimento ou descaracterização dos
gêneros musicais típicos e reconhecidos como tradicionais e representativos da
brasilidade. Em reação à presença de compactos simples de fox-trots, one-steps,
ragtimes, charlestones e blues nas lojas, bem como de apresentações de diversos
pequenas orquestras e conjuntos musicais com instrumentos típicos do jazz no cenário
cultural - as quais instigavam o interesse de um público considerável (ZAN 1997: 31)-,
políticos e intelectuais tradicionalistas, defensores das tradições, adotavam estratégias
combate e resistência aos impulsos de mundialização da cultura. Considerando que o
projeto de construção de uma identidade nacional moderna tornou-se um projeto
permanente e nunca “concluído”, por assim dizer, debates estéticos polarizados sobre
valores como nacional x estrangeiro, modernidade x tradição, autêntico x imitação,
permaneceram uma constante no percurso histórico do cenário cultural do país.
A partir do final da Segunda Guerra Mundial, com a intensificação do processo
de urbanização e a expansão do alcance e popularidade dos meios massivos de
comunicação – como o cinema as transmissoras de rádio-, bem como as consequências
da política de Boa Vizinhança dos Estados Unidos em relação à América Latina, a
difusão de gêneros caribenhos (rumba, calipso, chá-chá-chá, tango, guarânia, entre
outros) e norte-americanos (jazz, rock, twist, hully-gully) ocorreu de maneira mais
intensa no país e incutiu novos padrões de consumo, valores e produtos no mercado
(SEVERIANO, 1997: 242). Tanto em seus formatos originais como em combinações
“híbridas” com os ritmos brasileiros (p. ex. sambolero, sambajazz, samba-canção)-, tal
produção representava, para determinados jornalistas, críticos e agentes representantes
158
de uma vertente tradicionalista, um momento de “decadência” ou período “nefasto” pelo
qual passava a música brasileira.
Nesse contexto surgiam iniciativas para fazer frente a este processo e uma delas,
levada a cabo pelo crítico musical e jornalista Lúcio Rangel e um círculo de intelectuais
simpatizantes, como Rubem Braga, Carlos Lacerda, Murilo Miranda, consistiu na
edição da Revista da Música Popular. Conforme já apontamos no primeiro capítulo, o
periódico tinha como um dos principais propósitos estabelecer os cânones e os critérios
para se diferenciar a música popular de “bom gosto”, “artística” ou “de qualidade” em
relação àquela considerada massiva, veiculada nos canais mais popularizados dos meios
de comunicação. Durante os dois anos de circulação, nas diversas seções seus autores e
colaboradores procuravam orientar os leitores e direcionar os consumidores de discos
para a valorização daquilo que consideravam ser a “autêntica música popular brasileira”
(cf. GARCIA, 2010). Através de resenhas, artigos e crônicas com informações
biográficas de músicos representativos do samba e de gêneros folclóricos, atuavam de
maneira tributária a uma linha narrativa sobre a memória da música popular brasileira
cultivada, desde os anos 1930, por memorialistas e jornalistas não acadêmicos, como
Vagalume, Orestes Barbosa, Jota Efegê e Alexandre Gonçalves Pinto. Tais autores se
dedicaram a selecionar determinados artistas, lugares, instrumentos e ritmos que
consideraram relevantes na música popular carioca, inventando assim uma tradição que
elegia o samba carioca do início do século XX como autêntico representante da música
popular nacional.
Na acepção dos editores do periódico, a maior parte da música urbana veiculada
pelo rádio e pelo disco, na década de 1950, não se comparava ao samba tradicional,
representado por compositores da década de 1930, designada “época de ouro”, a saber,
Sinhô, Donga, João da Baiana, Pixinguinha, Noel Rosa, Mario Reis, Francisco Alves,
Aracy de Almeida, entre outros. Além do samba, outros gêneros contemporâneos
urbanos e folclóricos também foram valorizados em seus artigos, como o baião e a larga
difusão do coco. Por sua vez, inovações resultantes das misturas destes gêneros com
procedimentos musicais oriundos de gêneros estrangeiros constituíam frequentemente
objeto de críticas incisivas.
Em contraposição a estas iniciativas, havia segmentos sociais e artistas que
simpatizavam com os avanços da modernização e se identificavam com as novidades
trazidas pelo rádio e pela indústria fonográfica. Diante do impasse, representado pelo
assumido quadro de decadência e baixa qualidade da produção musical da década de
159
1950, o valor de modernidade que simbolizava a Bossa Nova despontava como uma
possível solução para preservar a canção brasileira frente às reminiscências de
romantismo figuradas em arranjos exagerados inspirados em gêneros latino-americanos
(bolero, mambo, rumba, entre outros) e à invasão de modelos estrangeiros. Nessa linha
de pensamento, a modernidade assumia um valor positivo enquanto possibilidade de
superação do impasse no campo artístico, representado pela estagnação criativa da
produção nacional e pelo caráter comercial e massivo dos gêneros estrangeiros
difundidos nos meios de comunicação e no mercado fonográfico. Assim, como releitura
da tradição, a modernidade ansiada previa a incorporação de alguns códigos
considerados em sua positividade (tratamento harmônico do jazz e
estruturação/orquestração da música erudita) e a supressão de outros identificados com
a “latinidade” subdesenvolvida e o atraso cultural, identificadas nas produções musicais
consideradas massificadas.
Vale apontar que a polarização formada entre “tradicionalistas” e “modernos”,
no entanto, não era estanque e as condutas dos agentes envolvidos nos conflitos
simbólicos assumiam muitas vezes um caráter ambíguo/contraditório. Pode-se inferir
que a segmentação não se apresentava de uma maneira evidente aos profissionais
envolvidos no meio artístico e que as alternâncias de posicionamentos faziam parte da
dinâmica de tensividade das lutas simbólicas. Estudos apontam que, mesmo entre os
defensores mais assíduos dos valores da tradição da música popular brasileira, como
Nestor de Holanda, Lúcio Rangel, e Sérgio Porto, e contrários à influência da música
dita “comercial” ou “estrangeira”, publicavam textos aprovando, com devidas
considerações em relação ao contexto, a produção do pianista Waldir Calmon, músico
reconhecido como um dos principais representantes do circuito de boates na Zona Sul
do Rio de Janeiro (LIMA REZENDE, 2014: 132). Deste modo, percebemos que a
dicotomia entre a produção cultural “culta” e a “comercial” ou ”massiva” muitas vezes
não era percebida como um problema nas atividades dos agentes daquele período, que
agiam não raro a favor de determinados interesses de ocasião.
Para se ter uma ideia mais clara das posições cambiantes ou “maleáveis” de
determinados agentes, vejamos alguns discursos proferidos em dois momentos distintos.
Primeiramente, seguem argumentos de defesa das tradições no texto inaugural da
primeira edição da Revista da Música Popular, assinado por Lúcio Rangel e Pérsio de
Moraes.
160
Ao estamparmos na capa do nosso primeiro número a foto de Pixinguinha, saudamos nêle, como símbolo, ao autêntico músico brasileiro, o criador verdadeiro que nunca se deixou influenciar pelas modas efêmeras ou pelos ritmos estranhos ao nosso populário. (RANGEL, 2006: 25)
Em seguida, vejamos os textos da contracapa do LP Uma noite no Arpege
(Rádio/1956) de Waldir Calmon, que traz em seu repertório “In The Still Of The Night”
de Cole Porter, “Love Is A Many Splendored Thing” de Paul Francis Webster e Sammy
Fain, “Silbando Mambo” de Perez Prado e “Um Poquito de Tu Amor” de Xavier Cugat,
R. Soler e F. L. Aguirre, “Auf Wiedersehe’n” de S. Storch, entre outras:
[Lúcio Rangel] O grande segredo de Waldir Calmon é a escolha de seu repertório. Firmou-se no rádio, na televisão e em “boites” após os lançamentos desta fábrica. [...] Waldir Calmon é um executante de bom gosto. Sabe escolher o que interpreta e interpreta com felicidade tudo o que escolhe. A seleção de melodias que ele subordinou no título de “Uma Noite no Arpege”, merece a atenção dos apreciadores da boa música popular. Waldir é considerado um homem da noite e como tal a madrugada. Um disco de rara felicidade êste que aqui está. (UMA NOITE, 1956) [Sérgio Porto] Em Waldir Calmon, a par de sua impressionante técnica e do seu inegável virtuosismo, o que mais me impressiona é a versatilidade, a capacidade que tem de se adaptar a todos os ritmos dançantes, quer aos nacionais - baião, samba, etc. - como aos estrangeiros. Waldir Calmon é tão verdadeiro num mambo ou numa guaracha, num tango ou num fox-trot. É portanto, o pianista ideal para conjuntos dançantes de boite, onde é preciso contentar o gôsto variado de centenas de dançarinos. (UMA NOITE, 1956) 58
Nesta ocasião, a presença de ritmos estrangeiros e de músicas de filmes
estrangeiros em voga daquele período não constituiu um empecilho para que Lúcio
Rangel, Sérgio Porto e Nestor de Holanda escrevessem críticas positivas ao disco. A
postura adotada pelos críticos nesta ocasião atesta o interesse que compartilhavam pela
promoção do disco “dançante” de Waldir Calmon, ainda que em seus aspectos estéticos
contrariasse a atitude de defesa que empreendiam em relação aos segmentos de música
brasileira considerados “tradicionais” no mercado.
A demanda crescente por uma produção cultural notadamente “moderna” e a
crescente adesão aos ideais de modernização constituem fenômenos que guardam nexo
com o momento político pelo qual o país passava. Na década de 1950, a indústria
58 Colchetes nossos.
161
nacional se modernizava e se expandia num ritmo acelerado e se intensificava também o
processo de urbanização e de re-estruturação da sociedade de classes. Segundo Mota
(1998: 156), foi uma época de montagem e potencialização de tendências nacionalistas
que vinham se plasmando em ressonância a processos políticos e sociais marcados pelo
desenvolvimento econômico e pela busca pela superação do subdesenvolvimento
mediante a proposição de uma revolução burguesa. Um indício concreto dessa tendência
constituiu na fundação do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) em 1955,
órgão destinado principalmente a analisar e buscar alternativas para o desenvolvimento
nacional e a construção de uma ideologia do desenvolvimento. Através da planificação
da economia, acreditava-se, conforme a formulação da ideologia nacional-
desenvolvimentista, se criar condições para superar os entraves estruturais presentes e
assim poder ocupar uma posição central no capitalismo mundial. Durante o governo de
Juscelino Kubitschek (1956-61), o planejamento econômico representava uma
necessidade e o modelo de governo embasava-se na ideia de que a industrialização
somente teria condições de ser fortemente impulsionada em um contexto de
interdependência e associação com o capital estrangeiro. Distinguia-se assim da
orientação defendida por Getúlio Vargas, que considerava a industrialização e a
substituição de importações pelo viés do fortalecimento da produção nacional como o
caminho mais curto para a emancipação econômica e política (IANNI, 1996: 190).
Segundo Castro (2000), no período a crença no desenvolvimentismo tornou-se
especialmente forte e a industrialização, urbanização e tecnologia tornam-se palavras de
ordem de um projeto político cuja ênfase residiria na conciliação entre o velho e o novo,
entre elite e massas. Para o autor, o ISEB atua enquanto mentor do pensamento que
orienta as políticas do governo Kubitschek, ao procurar saídas para o
subdesenvolvimento, integrar as camadas populares e criar uma arte de acordo com a
nova realidade (CASTRO, 2000: 10). Esta busca de um “perfil moderno” nos campos
político, econômico e social iria refletir-se, no entender de Castro, no campo das
expressões artísticas e culturais.
As gravadoras Festa, Elenco e Forma se inserem nesse contexto e naturalmente
não ficaram alheias às debates e divisões de posicionamentos relacionados à
modernização do país e tampouco aos discursos e debates específicos que tangiam a
produção musical nacional e os gêneros musicais estrangeiros difundidos no mercado.
Interessa-nos neste trabalho avaliar de que maneira representações foram associadas à
162
produção de cada empresa e como seus diretores/produtores se posicionaram no
período.
Em dois discursos, presentes primeiramente no texto do editor de livros Ênio
Silveira, publicado na contracapa do LP Valsas de esquina (Festa/1958), e, em segundo,
em uma matéria publicada pelo crítico musical Maurício Quádrio, pode-se observar
alguns posicionamentos sobre o desempenho da gravadora Festa no período:
[...] As doze VALSAS DE ESQUINA, sobretudo, se prestam muito bem para êsse merecido e algo tardio proselitismo. Caracteristicamente brasileiras na essência e no sentimento, assim como na forma, (“Hoje em dia bom número das modinhas populares são em três-por-quatro e valsas legítimas” - Mário de Andrade, in Pequena História da Música), essas composições nos dão expressivo retrato musical dêsse dôce-amargo que constitui o modo de ser do nosso povo. Com a industrialização crescente do país e a modificação rápida de usos e costumes, foram-se em primeiro lugar as serestas apaixonadas, os Romeus com violão e as Julietas sonhadoras, mas sem balcão; foram-se depois os pianos das mocinhas casadouras, substituídos pelo rádio, pela eletrola, pela televisão. A edição em disco destas valsas de Mignone não reviverá o tempo passado ou perdido, mas reafirmará certas e fundamentais características de nossa cultura popular, que não podem e não devem ser esquecidas na violenta e às vezes grosseira aculturação do brasileiro no Brasil que hoje ocorre graças ao cinema americano e à consequente americanização de nossos hábitos. (SILVEIRA apud VALSAS, 1957) [...] O quadro oferecido pela nossa indústria fonográfica, do ponto de vista artístico é desolador. Os pianistas (com respectivos “ritmos”) degladiam-se nos sulcos de seus “12 polegadas”, pois só eles dominam hoje o campo. O Brasil deixou de dançar ao ar livre, nos morros, nas gafieiras, o Rio pendurou num prego a proletária frigideira e o humilde cavaquinho para viver o ambiente das “boites” (desculpem: boátes) concentrado em faixas de discos. Procure, o leitor, nas lojas especializadas, os últimos lançamentos de música popular brasileira. E só encontrará 99 por cento de baiões e sambas na execução de .. piano e ritmo. Até discos comemorativos de Herivelto Martins seguiram o mesmo melancólico destino. (cf. QUÁDRIO, 1957)
Como podemos perceber, os dois autores compartilham de uma perspectiva
crítica semelhante em relação à presença de gêneros estrangeiros e à transformação de
costumes na capital carioca. No discurso de Ênio Silveira fica evidente a linha de
pensamento modernista-nacionalista de Andrade e a tentativa de atribuir importância ao
lançamento do disco de Francisco Mignone por contribuir para a preservação do
patrimônio cultural do país, frente a um suposto processo de americanização corrente.
Maurício Quádrio por sua vez critica a predominância que o formato dos conjuntos de
163
boate e o seu repertório estava conquistando no cenário musical brasileiro, inspirado nos
pequenos conjuntos de jazz então em voga nos Estados Unidos, caracterizados pela
formação de bateria, contrabaixo, piano e/ou violão elétrico, às vezes substituído pela
guitarra elétrica. Ao caracterizar a presença do samba no repertório como um
“melancólico destino”, Quádrio faz alusão ao samba-canção, estilo de samba executado
muitas vezes com elementos inspirados do bolero, como o emprego de maracas e bongô
na percussão e temáticas das letras que abordavam de maneira exagerada amores
platônicos ou relações amorosas mal sucedidas.
Deste modo, observamos que eram associadas representações de conotação
positiva à gravadora de Irineu Garcia em grande parte devido à sua predileção pelo
investimento na produção nacional, seja ela destinada ao segmento de poesia recitada,
música erudita ou música popular. A atuação de Garcia representava, para um
determinado grupo de intelectuais e tradicionalistas, uma iniciativa relevante e
necessária por registrar e/ou preservar uma produção cultural historicamente
representativa do país, diante da “ameaça” representada pela popularidade de gêneros
estrangeiros no mercado. Seus discos eram reconhecidos como uma produção de “bom
gosto”, na medida em que contribuíam para a preservação da cultura nacional e que
eram compatíveis com o projeto de consolidação da identidade nacional prezados por
intelectuais e segmentos sociais vinculados à classe hegemônica.
Apesar de também terem suas produções reconhecidas pela crítica musical como
“artísticas”, de “bom gosto”, as gravadoras Elenco e Forma foram associadas a
representações de viés distinto. Por priorizarem seus lançamentos a artistas de Bossa
Nova, música instrumental e trilhas sonoras, Aloísio de Oliveira e Roberto Quartin
atendiam às demandas de consumo e expectativas de segmentos sociais simpatizantes
com o caráter de “novidade”, “sofisticação” e “modernidade” que tais segmentos
simbolizavam, e com os ideais de modernização e emancipação do país. Na visão destes
segmentos e de uma parcela da crítica musical, a combinação de procedimentos
musicais do jazz ou de música de concerto européia com gêneros musicais brasileiros
não representava um problema, mas sim um fator de sofisticação musical e de domínio
do ofício artístico. Assim, na medida em que tais critérios passaram a orientar lutas
simbólicas no campo artístico, as iniciativas de Oliveira e Quartin conquistaram
legitimidade pelo aprimoramento técnico e pelo culto à “qualidade” estética,
contrapondo-se ao comercialismo.
164
Na resenha publicada sobre o disco Desenhos (Forma/1966), do saxofonista
Victor Assis Brasil, fica evidente que o tratamento jazzístico conferido a temas
brasileiros de Bossa Nova e de samba não consistiu um impasse para que o crítico o
avaliasse positivamente. Vejamos abaixo em que termos:
[...] O disco não é propriamente um recital de samba-“jazz”. É mais do que isto. O termo não exprime com perfeição o tipo de música executada no micro por Victor (alto), Tenório Junior (piano), Edison Lôbo (baixo) e Chico Batera (bateria). Talvez “free samba” fôsse mais apropriado. Porque a música do disco é na verdade uma combinação aparentemente impossível de elementos do samba moderno com o “free form jazz”, o “jazz” de Coltrane de Eric Dolphy e Jackie Mc Lean. Em matéria de música popular, trata-se inegavelmente da experiência mais avançada, mais “avant-garde” já levada a efeito no nosso país. [...] Esta é que é a verdadeira música-jovem do Brasil, e não o yê-yê-yê alienado (desculpe, Tinhorão) de Roberto Carlos e outros promotores das “Festas do Bolinha”. Música séria, consistente, com conteúdo e mensagem artística. [...] São discos como êste que nos fazem acreditar novamente na nossa fonografia, nos nossos músicos e compositores. Que nos dão forças e entusiasmo para continuar. (CARDOSO, 1966a)
Percebemos que, no entender de críticos como Cardoso, a incorporação de
elementos formais e interpretativos do jazz norte-americano à música brasileira, não
configuraria um caso de descaracterização ou de alienação, julgamento que intelectuais
de esquerda e integrantes dos extintos CPC’s faziam às versões brasileiras de rock
criadas por artistas da Jovem Guarda. Ao invés disso representa uma música “jovem”
com conteúdo, de alto valor artístico e de caráter “moderno”, de “vanguarda” por
incorporarem desenvolvimentos das práticas interpretativas mais recentes do jazz norte-
americano. Assim, a incorporação do elemento musical estrangeiro poderia constituir
tanto um critério para a desqualificação como para a legitimação, o que indica constituir
mais um caso de condutas ambíguas/maleáveis dos agentes nos conflitos simbólicos.
Para termos uma noção mais detalhada sobre os tipos de discursos e as
representações associadas às gravadoras enquanto um segmento de novas empresas
fonográficas apresentamos a seguir uma das edições da coluna “Discos na Revista do
Rádio” escrita pelo jornalista Fernando Luiz:
Realmente, no ano findo, as novas etiquetas tiveram a sua importância acentuada no cenário da música popular. Primeiro porque, entregues à direção de homens que conhecem o que é a verdadeira música, sem falso comercialismo, ou de qualidade artística duvidosa, seus lançamentos alcançaram um bom nível artístico e musical. As três mais
165
recentes gravadoras no Rio são a “Elenco”, “Equipe” e “Forma”, cujos produtores nos deram grandes momentos. Daí, a têrmos LPs expressivos, alguns revelando novos músicos, outros trazendo repertórios inéditos, ou então artistas já famosos, mas com discos de boa qualidade. Por serem estas companhias, de relativo poder econômico, é necessário a elas discos mais sérios musicalmente mais objetivos, para que possam sobreviver. Ora, a êstes problemas, Aluísio de Oliveira (da Elenco), Oswaldo Colares (da Equipe) e Roberto Quartin (da Forma) têm sabido vencer e têm dado boas produções para a música moderna popular, como foi o caso do LP de Dick Farney, Rosinha de Valença (na Elenco), a série de LPs dos “Catedráticos” de Eumir Deodato (pela Equipe) e “Inútil Paisagem” com Eumir e orquestra (pela Forma), além de “Novas Estruturas” com Luís Carlos Vinhas e Maurício Eihorn. São devido a produções arrojadas, e feitas com o máximo de entusiasmo, que a nossa música, tanto moderna como tradicional progridem e melhoram consideravelmente com a ajuda das novas etiquetas. (LUIZ, 1965) 59
Observamos que, na visão do colunista da Revista do Rádio, a presença
marcante do repertório de Bossa Nova no disco de Dick Farney e de temas de Jazz nos
discos de Eumir Deodato e de Luiz Carlos Vinhas não constituiu qualquer impeditivo
para o autor distinguir positivamente os discos citados e os reconhecer como referência
na produção de boa “música moderna”. A ideia de “progressão” e “melhora” nos
argumentos finais denota uma compreensão evolutiva da música brasileira por parte do
jornalista, a qual estaria acontecendo tanto na música dita “tradicional” como na
“moderna” pela atuação dos três produtores.
Esse tipo de compreensão histórica da música popular e de discurso associado
aos segmentos da Bossa Nova e da música instrumental desempenha nos anos seguintes
um papel importante na legitimação de uma construção narrativa específica sobre a
história da música popular. Tal narrativa se baseava na ideia da perpetuação de uma
linha evolutiva, iniciada com os chorões e sambistas da Era de Ouro do rádio
(Pixinguinha, Noel Rosa, Ismael Silva, etc.), representantes estes das tradições do país,
e continuada por João Gilberto através da incorporação de elementos estruturais e
interpretativos do cool jazz e da música erudita européia (MACHADO, 2016: 205-8).
Conforme destacou Machado (idem), em ocasiões de debates estéticos ocorridos mesmo
após décadas, uma série de jornalistas, críticos e intelectuais, como Caetano Veloso
(apud NAPOLITANO, 2007: 102), o poeta concretista Augusto de Campos (1968: 52),
a jornalista Ana Maria Bahiana (2005: 41) na década de 1970, músicos integrantes da
assim designada Vanguarda Paulista na década de 1980, reproduziram em seus
59 Grifos nossos.
166
discursos o mesmo tipo de compreensão evolutiva sobre a história da música popular.
Nesse sentido, esse tipo de narrativa, que fora compartilhada por diferentes agentes em
momentos e contextos históricos distintos, aponta para a configuração de um projeto
historiográfico da MPB, conforme os termos de Napolitano (2007: 103), no qual se
seleciona um conjunto de produções no passado musical (necessariamente excluindo
outras no processo) e se conceitua a organização de um conjunto de eventos históricos
de modo que faça sentido enquanto lógica sucessiva linear de fases evolutivas (cf.
MACHADO, 2016).
Em outra matéria, publicada pelo crítico Sylvio Túlio Cardoso em coluna do
jornal O Globo, é possível constatar a mesma linha de pensamento inspirada pela ideia
de progresso, porém com um viés argumentativo um pouco distinto:
[...] Sobre os “independentes” as “big shots” dos consórcios [gravadoras Odeon, Philips, RCA e CBS] comentam: “O que adianta lançar discos artísticos e ir à falência em um ou dois anos?” Perguntamos nós: o que é melhor, ir à falência depois de deixar um legado artístico inestimável ou faturar tantos milhões a mais mensalmente e contribuir decisivamente para que continuemos eternamente subdesenvolvidos no plano cultural? A atitude certa, no entanto, é como sabemos o meio-têrmo. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Se para cada cinco discos “comerciais” a Odeon, Philips, RCA e CBS fizessem pelo menos um lançamento artístico - UMZINHO só - já estariam às portas do purgatório, passíveis de uma absolvição pelo crime de haver despejado na praça coisas abomináveis que se perpetram em nome da arte musical. A verdade, amigos, é que se não fôssem produtores como Aloísio de Oliveira, Armando Pittigliani, Irineu Garcia e agora Roberto Quartin, estaríamos até hoje nos samboleros, das guarânias, nos baiões e nos sambaladas. Estaríamos ainda na fase 1946-1959, que foi sem dúvida a mais nefasta para a música popular brasileira. (CARDOSO, 1965) 60
Fica evidente que, na visão de Cardoso, a condição de autonomia disposta por
alguns produtores na direção de suas gravadoras consistia um fator positivo e necessário
na medida em possibilitava o investimento em produções musicais que supostamente
destoavam das tendências prezadas pelas grandes gravadoras e contribuíam para o
desenvolvimento da esfera cultural do país. Em um momento em que os critérios de
legitimação, associados às categorias problematizadas neste capítulo (massivo X
artístico, popular x erudito, nacional x estrangeiro, tradicional x moderno), consistiam
os elementos de tensão e de baliza das lutas simbólicas pela consagração no campo
artístico, posicionamentos contundentemente parciais como os de Cardoso e de outros
60 Grifos e colchetes nossos.
167
agentes refletem a dinâmica de tensividade das lutas de classificação e de formação das
hierarquias de legitimidade nas décadas de 1950 e 1960.
Deste modo, em um cenário marcado por um mercado de bens culturais ainda
pouco especializado, os produtores Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e Roberto Quartin
souberam trabalhar e compatibilizar de modo eficaz, perante os consumidores das
classes médias e altas, suas demandas e as concepções estéticas adequadas com as
condições materiais de produção dispostas. A manutenção de um modo de produção
praticamente artesanal - com um contingente reduzido de colaboradores, sem divisão de
departamentos, atuação pessoal do proprietário em quase todas as etapas
(arregimentação, produção, fabricação, divulgação, vendas), muitas vezes sem assinar
contrato com os artistas e limitações consideráveis de orçamento- somente foi possível
em uma configuração de mercado pouco especializada, no qual ainda havia espaço para
iniciativas locais personalistas (não corporacionais), de agentes apreciadores e
entusiastas do tipo de arte que produziam. Ao que tudo indica, a boa receptividade
conquistada pela crítica e pelo público indica a satisfação de uma demanda de classes
média e alta por um perfil de produtos compatíveis com os seus valores e preferências
estéticas, nos quais critérios como o refinamento do tratamento musical pelo domínio de
técnicas de composição, estruturação, contraponto e orquestração da música erudita e de
escrita em bloco típica de grupos de jazz, desempenhavam um papel decisivo e
contribuíam no processo de recrudescimento da segmentação do mercado.
168
CAPÍTULO 4 – DECLÍNIO E ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES DAS
GRAVADORAS FESTA, ELENCO E FORMA NO CONTEXTO DE
RECONFIGURAÇÃO DO MERCADO CULTURAL EM FINS DE 1960
4.1. Regime militar, tecnocracia e o campo da produção cultural
A última etapa a ser desenvolvida na reflexão sobre as atividades das gravadoras
Festa, Elenco e Forma e as condições materiais sócio-históricas de produção no
contexto das décadas de 1950 e 1960 se concentra na análise das transformações
engendradas pelas medidas político-econômicas implementadas no modelo de governo
de Juscelino Kubitschek e de João Goulart, assim como no projeto tecnocrático da
ditadura militar. Pretendemos investigar, notadamente, de que maneira a expansão,
reorganização e modernização dos diferentes setores do mercado de bens simbólicos
ocorridas na década de 1960 interferiram nas atividades das três gravadoras. Mais
precisamente, buscamos avaliar em que medida as mudanças, ocorridas na
intensificação do processo da industrialização e de consolidação da indústria cultural,
atuaram no sentido de minar as bases de manutenção de suas produções e levar ao
encerramento de suas atividades, assim como à subsequente aquisição dos seus
catálogos por parte de uma empresa multinacional.
Dentre as medidas políticas e econômicas implementadas pelo governo Vargas
(1930-1954), a expansão do estamento burocrático consistiu em uma ação necessária
para impulsionar o processo de industrialização por meio da organização e planificação
das atividades dos diversos setores econômicos, assim como para superar a condição de
dependência em relação ao capital e ao mercado estrangeiro e assegurar a soberania da
nação sobre os centros de decisão econômica do país. Contudo, conforme aponta Ianni
(1996: 147), na medida em que a progressiva internacionalização do capitalismo
forçara, de diversas maneiras, as fronteiras ideológicas e práticas do modelo de
capitalismo autônomo e nacional defendido no governo de Vargas – como as medidas
de controle das empresas internacionais no interior da economia brasileira, a proibição
do agrupamento ou associação de um grupo de empresas comerciais nas mãos de uma
pessoa ou grupo de pessoas, entre outras- cresciam os pontos de tensão com as forças
políticas de oposição internas e externas e minavam-se as bases de sustentação do
governo, processo que culminou no suicídio do presidente em 1954.
Após um período de dezesseis meses de crise sob o governo do vice-presidente
João Café Filho, inicia-se com o governo de Juscelino Kubitschek uma nova fase de
169
ampla e profunda transformação do sistema econômico do país. As medidas
sistematizadas para implementação no Programa de Metas, na Superintendência do
Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), na Operação Pan-Americana (OPA) e na
construção de Brasília, se destinaram a impulsionar a industrialização pelo setor privado
nacional e estrangeiro, por meio de um novo processo de planificação em que deixava
de ser induzido pelo estrangulamento do setor externo e o fechamento ao capital
estrangeiro. As possibilidades abertas pela estrutura econômica e pelo desenvolvimento
das forças produtivas internas nos anos anteriores direcionaram os investimentos e
induziram uma transformação qualitativa da estrutura econômica do país, a qual se
objetivava consolidar pela criação da indústria de base e pela reformulação das
condições de interdependência e complementaridade com o capitalismo mundial
(IANNI, 1996: 152-192).
No percurso da nova orientação do governo de Kubitschek, as medidas que
causaram o fortalecimento do setor privado e dos segmentos de mercado ligados ao
setor externo levaram também ao crescimento da importância do papel desempenhado
pelas empresas ligadas a grupos e conglomerados internacionais na economia nacional.
O sentido e o caráter da concentração do capital assumiam uma nova conformação, uma
vez que ocorria um surto de internacionalização da economia, manifestado pelos novos
empreendimentos surgidos, pela associação de capitais e empresas e pela importação de
tecnologias e know-how para o parque industrial brasileiro. No entanto, ao contrário do
que se poderia supor, as contradições entre a ideologia nacionalista difundida pelo
governo e a internacionalização da economia não chegaram a se manifestar de maneira
efetiva. Em parte devido a um surto notável de desenvolvimento econômico gerado pela
nova política econômica e também porque diversos setores da burguesia industrial
brasileira, além da classe média e do próprio proletariado se beneficiavam com a
expansão econômica propiciada pela execução do Programa de Metas.
Entretanto, as contradições do modelo político-econômico de J. Kubitschek
acabaram se postergando e tornando-se mais agudas aos governos seguintes de Jânio
Quadros e João Goulart (1961-64). Com a manifestação de uma crise gerada por
diferentes fatores, como a diminuição da entrada de capital externo, aumento da inflação
e queda do índice de investimentos, o governo teve de optar entre as duas estratégias
políticas de desenvolvimento: favorecer a expansão do capitalismo nacional ou acelerar
a internacionalização, como meio de promover os investimentos indispensáveis a uma
nova expansão econômica. Contudo, ao contrário do período anterior as condições
170
políticas da época, em relação aos poderes Executivo e Legislativo, não permitiam a
definição de uma posição clara ou ambígua frente às duas opções. Diante desta
problemática os dois governos tiveram dificuldades para propor e resolver os termos da
contradição entre as duas orientações possíveis e adotaram uma sucessão de medidas
político-econômicas ambíguas e intermitentes, que apontavam uma descaracterização
do modelo de planejamento até então adotado no Plano de Metas de Kubitschek e
denotavam um caráter transitório e instável.
Em virtude da contradição entre duas orientações políticas essencialmente
distintas se intensificou a divergência entre os segmentos sociais favoráveis à expansão
do capitalismo interdependente e aqueles favoráveis à formação de um sistema
capitalista de tipo nacional ou mesmo à transição pacífica para o socialismo. O
agravamento da divergência ocorria também pelo conflito de interesses entre o poder
Legislativo, o qual defendia os interesses do setor agricultor latifundiário e da economia
primária exportadora, e o Executivo, comprometido com setores da burguesia industrial
e financeira, assim como pela politização crescente das populações urbanas e das
massas camponesas, impulsionada pela situação de crise e pelo agravamento da
desigualdade entre as classes. À medida que os pronunciamentos e as campanhas do
governo de Goulart se manifestaram em prol das reformas de base (agrária, cambial,
universitária, entre outras) como medida necessária para superação dos impasses da
estrutura produtiva e da economia, agravara-se a crise interna do poder político do
Estado frente às forças políticas e militares conservadoras contrárias (idem). Foi neste
contexto de antagonismo entre duas orientações políticas que ganhou força o
movimento civil-militar que depôs o presidente João Goulart, instaurando um regime de
exceção no país em abril de 1964.
A partir do início do período de sucessivos mandatos de Castello Branco, Costa
e Silva, Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Figueiredo, todos presidentes não-
eleitos por voto popular (1964-1985), o Estado passou a adotar medidas políticas
repressivas, suspendendo os direitos políticos e civis aos considerados subversivos,
aprimorando assim sua instrumentalização para o recrudescimento da repressão e da
censura e a manutenção da ordem social. Por meio da adoção dos atos institucionais
(AI-1 a AI-17) e da Constituição de 1969, foi assegurada a hegemonia absoluta do
Poder Executivo sobre o Poder Legislativo, condição esta que beneficiou as políticas
governamentais ao conferir possibilidades extraordinárias para a formulação e execução
das diretrizes econômicas. Dentro destas condições, as medidas econômicas adotadas ao
171
longo do regime militar, por um lado, corresponderam ao aperfeiçoamento e
aprofundamento das tendências e ações efetivadas nas décadas anteriores, mas por outro
lado, adotaram uma nova sistemática e orientação que se distinguiram essencialmente
de todos os governos anteriores.
Diante da problemática representada pelos desequilíbrios econômicos, sociais e
políticos gerados na década de 1950 e acentuados no governo de João Goulart (elevada
taxa de inflação, enfraquecimento do setor privado, desníveis econômicos setoriais e
regionais, baixa taxa de crescimento, entre outros), o regime militar orientou a política
econômica para a adoção de medidas que visavam promover a estabilização financeira,
a racionalização do mercado produtivo - desde o mercado de capitais até as relações de
produção-; e a reintegração da economia brasileira ao sistema capitalista internacional.
A re-estruturação da economia brasileira tinha como intuito tornar o sistema mais eficaz
através do controle sobre determinados desequilíbrios e pontos problemáticos de
estrangulamento internos e externos, os quais eram avaliados segundo as premissas da
interdependência e modernização, orientação considerada essencial para o
funcionamento e progresso da economia nacional (idem). Com o tempo a reorganização
da economia inseriu o país cada vez mais no processo de internacionalização do capital
e atuou em função da consolidação do “capitalismo tardio” (ORTIZ, 1994: 114).
A política anti-inflacionária adotada pelo governo de Castello Branco, por
exemplo, destinou-se a conter os déficits governamentais, aprimorar o sistema
tributário, manter os níveis dos salários e estabelecer uma nova política de crédito, com
novas regras e condições para obtenção de financiamentos. As novas normas acabaram
causando um crescimento agudo do índice de falências de empresas, uma vez que não
beneficiavam a pequena e a média burguesia industrial e parte do empresariado não
estava bem preparada para compatibilizar a administração os seus negócios às novas
normais creditarias, tributárias e fiscais estabelecidas. Permaneceram no mercado
aqueles que tiveram condições de “modernizar” ou “racionalizar” a empresa, desde os
sistemas de informação e processos decisórios até a própria divisão do trabalho social,
na esfera da produção. Outra reação adotada foi a associação com empresas maiores ou
grupos econômicos de grande poder, ou mesmo com empresas de posição superior no
mercado, que dispunham de melhor funcionamento técnico, organizatório e funcional
(cf. IANNI, 1996).
Submetidas às mesmas imprevisibilidades e às novas normas do mercado, as
empresas associadas ao capital estrangeiro tiveram maior facilidade e acesso ao crédito
172
para a expansão de suas atividades e, portanto, condições mais favoráveis, em
comparação com as empresas nacionais, para garantir a manutenção de suas atividades.
Devido à vigência das normas contidas na Instrução n° 289 da SUMOC editada em
1965, as empresas que dispunham de acesso ao capital estrangeiro passaram a desfrutar
de condições especiais ao acesso de crédito. Com a medida pretendia-se evitar que as
empresas estrangeiras tivessem acesso aos recursos creditícios internos e
destinar/priorizar estes às empresas nacionais, contudo, sua aplicação acabou colocando
as empresas associadas a capitais internacionais em uma posição privilegiada.
Conforme aponta Ianni (1996: 259-276), além do crédito interno não ter sido reservado
exclusivamente à empresa nacional, este era limitado e selecionado segundo as metas da
política anti-inflacionária e, por sua vez, o crédito externo reservado às empresas
estrangeiras não estava sujeito às limitações quantitativas impostas na política de
combate à inflação.
Como consequência das medidas aplicadas, foi acentuado o processo de
acumulação de capital pela associação e fusão de empresas do mesmo setor ou de
setores distintos. Em poucos anos a estrutura do sistema empresarial do Brasil foi
transformada, acentuando-se decisivamente a preponderância do papel desempenhado
pelas grandes empresas e pelas empresas filiais ou associadas às multinacionais no
funcionamento da economia do país. Desenvolvia-se um novo tipo de relação
estabelecida entre o Estado e a empresa privada, tornando o sistema econômico cada
vez mais integrado à dinâmica do capitalismo mundial61.
Em análise realizada sobre esse contexto, Ortiz (1994: 113-148) destaca que
todas estas transformações trouxeram consequências diretas na esfera cultural, pois em
paralelo ao crescimento do parque industrial e do mercado interno de bens materiais,
foram fortalecidos também os setores ligados ao mercado de bens culturais. Se
considerarmos que nos anos 1950 as produções eram restritas, marcadas pelo aspecto
local e atingiam um número reduzido de pessoas, nos anos 1960 e 1970 elas passam a
ser cada vez mais diferenciadas e a atingir uma massa consumidora. Nesse período o
volume e a dimensão do setor de bens culturais crescem exponencialmente, tanto no que
se refere à esfera de produção, mas também à de distribuição e de consumo de cultura.
Fomentados por investimentos volumosos do Estado em melhorias na infraestrutura, os
61 Vale atentar aqui que nos próximos tópicos deste capítulo nos ocuparemos em avaliar como a implantação do regime militar e estas mudanças ocorridas na configuração do sistema econômico incidiram nas trajetórias das gravadoras Festa, Elenco e Forma.
173
meios de comunicação se desenvolvem, se expandem e se consolidam os
conglomerados de empresas hegemônicos do setor de comunicação e publicidade.
Favorecido por investimentos do governo na importação e modernização da
indústria gráfica do país, entre 1965 e 1980 o setor editorial teve um acréscimo
expressivo em seu volume de circulação. Além do aprimoramento da capacidade
produtiva gerado pela aquisição do novo maquinário industrial, o setor de publicação
também passou a diversificar mais sua produção, adaptando-se ao surgimento de
públicos especializados, cujo consumo correspondia a interesses específicos de
determinados segmentos sociais. A imprensa muda a formatação dos seus periódicos,
passando a incluir a publicidade de automóveis e eletrodomésticos, produtos
alimentícios e agrícolas em lugar dos anúncios de casas comerciais. O aspecto formal é
aprimorado: diferentes meios de concepção gráfica, diagramação e paginação conferiam
um novo aspecto às publicações e o discurso empregado nas matérias tornava-se mais
objetivo e informativo (cf. O MODERNO, 2008).
Por sua vez, o mercado fonográfico não se desvinculou dos outros setores, como
o cinematográfico e também foi marcado pela superação do crescimento vegetativo
mantido até 1970 e por uma vultosa expansão no período, propiciada em grande parte
pelas facilidades concedidas no comércio a varejo para a aquisição de eletrodomésticos.
O expressivo crescimento da venda de toca-discos, estimado em 1375% entre 1967 e
1980 (cf. ORTIZ, 1994), contribuiu assim para o acréscimo do faturamento das
empresas fonográficas e do crescimento expressivo do número de discos vendidos.
Conforme apontam Morelli (1991) e Paiano (1994: 191-221), o percentual do
crescimento avaliado, entre 1967 e 1975, foi de, em média, 400% e, após um período de
recesso devido às consequências da crise mundial do petróleo de 1973 e à subsequente
escassez de matéria prima para fabricação dos discos (PAIANO, 1994: 196), se
estabelece um crescimento estável de, em média, 20%. No ano de 1979, o volume do
mercado no Brasil passa a ocupar a quinta posição no mercado fonográfico mundial.
174
Ano Unidades
1968 14.818
1970 17.102
1972 25.591
1974 31.098
1976 48.926
1978 59.106
1979 64.104
1980 57.066
Tab. 9 – Estatística de vendas de compacto simples, duplos e LP’s em milhões de unidades. Fonte: ABPD, RJ 03-95 apud DIAS, 2000
Outro fator que contribuiu para a expansão do setor fonográfico foi a
consolidação do formato LP no mercado no início dos anos 1970 e os benefícios
econômicos e estratégicos que as suas possibilidades técnicas de reprodução trouxeram.
Dado que os formatos compacto simples e duplo eram predominantes na circulação do
mercado, os quais somavam 57% da totalidade dos discos vendidos em 1969 e 36% em
1976, com a adoção do LP as gravadoras puderam restringir custos de produção e
otimizar os investimentos, uma vez que em termos de custos podia equivaler a seis
compactos simples ou três duplos. Por consequência de suas vantagens e da paulatina
queda do seu preço no mercado, ao longo da década de 1970 os compactos passam a
cair em desuso progressivamente até deixarem de ser fabricados na década de 1990 (cf.
DIAS, 2000).
Deste modo, a partir desse período os modos de atuação e o os mecanismos de
funcionamento do mercado brasileiro assumiram cada vez mais feições de uma
sociedade administrada, noção empregada por Adorno para destacar o fenômeno da
absorção da cultura pela assim denominada racionalidade administrativa. A
modernização da sociedade brasileira trouxe em si uma mudança essencial na
mentalidade empresarial, seja no setor industrial ou nos setores administrativos do
Estado. A indústria cultural, por sua vez, não se dissociou deste processo de
transformação e cada vez mais as estratégias de atuação orientavam-se pela garantia do
retorno financeiro e por medidas de controle de custos e de riscos, baseadas em
mudanças estruturais internas, adoção de novas estratégias produtivas e pesquisas
175
fundamentadas sobre os padrões de sucesso e perfis dos consumidores (tendências de
gostos, poder de compra, faixas econômicas, etc.). Com a progressiva consolidação da
racionalidade administrativa no mercado, iniciativas de caráter empreendedor ou
personalista baseadas no empirismo, caracterizadas por procedimentos aventureiros, e
orientadas por um projeto particular/aspirações pessoais tornaram-se inadequadas ao
novo contexto de desenvolvimento do capitalismo do Brasil. Em outras palavras,
conforme aponta Ortiz (1994: 134-41), os capitães da indústria dos anos anteriores
cedem lugar ao manager, tipo ideal do empresário que administra conglomerados de
diversos setores empresariais e que submete sua vontade individual às necessidades da
empresa. Sua atuação se volta para a metodização do trabalho, a especialização da base
tecnológica e a assimilação do espírito de concorrência. Nas décadas de 1960 e 1970, os
grandes empreendedores do setor de bens culturais são homens que administram
conglomerados, que englobam desde empresas ligadas à indústria cultural quanto à
indústria de bens materiais62. O sentido de “missão” é substituído pelo cálculo exato,
buscando com isso evitar os elementos “político” e “romântico/passionais” que
costumavam se interpor à lógica da produção industrializada no capitalismo
corporativo.
Portanto, dentro do quadro de expansão, modernização e integração entre os
diferentes setores observado na passagem dos anos 1960 para os 1970 o mercado
cultural perdia os seus últimos traços de incipiência e amadorismo que a
caracterizavam, efetuando um vertiginoso aprimoramento do controle e da
racionalização dos mecanismos de atuação no mercado. No contexto brasileiro,
pesquisadores da área apontam que o processo de consolidação de um mercado de bens
culturais acontece no Brasil ao longo da década de 197063. Mudanças como a
acentuação da divisão de trabalho em diferentes setores, a formalização das relações
entre empregador e empregado, a maior especialização de funções, o controle rígido do
tempo da programação, o aprimoramento técnico das fábricas e a consolidação do
departamento de marketing, refletiram a especialização estrutural das grandes empresas
nos diferentes setores.
62 A título de exemplo, Ortiz cita os empresários Roberto Civita, responsável pelas empresas: Editora Abril, Distribuidora Nacional de Publicações, Centrais de Estocagem Frigorificada, Quatro Rodas Hotéis, Quatro Rodas Empreendimentos Turísticos; Roberto Marinho, à frente da TV Globo, Sistema Globo de Rádio, Rio Gráfica, VASGLO, Telcom, Galeria Arte Global, Fundação Roberto Marinho; os sócios Octávio Frias e Carlos Caldeira, que administravam a Folha da Manhã S.A., Impress, Cia. Litográfica Ypiranga, Última Hora, Notícias Populares e a Fundação Casper Líbero (ORTIZ, 1994: 134). 63 Ver ORTIZ, 1994: 113-148; PAIANO, 1994; ZAN, 1997; DIAS, 2000: 51-89; VICENTE, 2002: 49-59.
176
Em um novo contexto de um mercado expandido, unificado e um modo de
operar agora alinhado às tendências do capitalismo internacional, não faltava mais o
caráter integrador entre os diferentes setores, característico das indústrias da cultura. A
esfera da cultura e a peculiaridade de suas práticas se submetiam cada vez mais à
racionalidade administrativa e à lógica do investimento comercial. Em uma perspectiva
frankfurtiana, pode-se afirmar que nesse contexto os espaços individualizados são
invadidos pela racionalidade empresarial e submetidos a um mesmo sistema de
produção, cuja consequência incide na padronização dos produtos. A sociedade
industrial se constitui então como espaço integrador das partes diferenciadas, que se
constituem agora enquanto uma massa de consumidores. Por sua vez, as massas se
relacionam de maneira mais estreita com os centros de produção do que em seu estágio
anterior de sociedade comunitária (cf. ADORNO, 1978).
A relação próxima, pouco diferenciada e interdependente que havia entre a
esfera de produção restrita e a ampliada nas décadas anteriores se desfaz com a
expansão e consolidação do mercado de bens simbólicos e de uma hierarquia de
legitimidades e de gostos no interior do campo. As marcas de distinção simbólica dos
produtos adquirem coordenadas mais bem definidas e um status cada vez mais
difundido pelos diferentes tipos de agentes participantes. A segmentação do mercado se
faz presente não mais apenas em publicações da crítica especializada e de anúncios
publicitários, mas passa a se expressar também nas estratégias de atuação e na própria
estrutura produtiva interna das empresas. O caso das gravadoras Festa, Elenco e Forma
nesse contexto de transição de uma configuração incipiente para uma indústria cultural
consolidada é sugestivo. Ele indica que os espaços disponíveis para iniciativas baseadas
em um empreendedorismo de aspirações pessoais e dedicadas a uma determinada
manifestação artística passam a ter limites bem determinados na vigência do sistema
produtivo industrial corporativo. Isto não quer dizer que as condições das gravadoras
autônomas se tornaram absolutamente inviáveis, pois basta considerar os diversos casos
de gravadoras autônomas existentes na década de 1980 para refutar esta ideia, mas
queremos apenas destacar aqui que a atuação destas no mercado vai estar, mais ainda
que outrora, condicionada à competitividade e à lógica comercial dos conglomerados e
multinacionais. Vejamos mais detalhes a respeito nos tópicos seguintes.
177
4.2. Segmentação e especialização do mercado musical
Apesar de alguns autores terem apontado os riscos e dificuldades de aplicar o
conceito de campo de Pierre Bourdieu à realidade brasileira, os trabalhos de
pesquisadores da área como Ortiz (1994), Paiano (1994), Zan (1997), Napolitano (2001)
e Vicente (2002) apontaram a possibilidade de identificação de sinais da constituição de
um campo da música popular brasileira, resguardadas as devidas diferenças e
especificidades de cada contexto cultural. Para Ortiz (1994: 113-48), a consolidação do
mercado de bens simbólicos ocorre ao longo das décadas de 1960 e 1970, juntamente à
consolidação de hierarquias no campo artístico, processo este que representaria o
advento de uma sociedade moderna reestruturada e de um moderno mercado de música
popular no Brasil, no qual a segmentação do mercado desempenha um papel
determinante na distinção das esferas de bens restritos e de bens ampliados.
Nos capítulos anteriores pudemos apresentar indícios, na atividade da crítica
especializada e nas esferas de produção e recepção, de um processo de segmentação em
curso nas décadas de 1950 e 1960, assunto sobre o qual vêm se formando consenso
entre os pesquisadores da área. No entanto, no que se refere à consolidação de tal
processo de segmentação, se dividem as opiniões e os modos de interpretar os fatos.
Para Enor Paiano (1994: 205-209), tal processo vinha se delineando desde a formação
de hierarquias na música popular das décadas anteriores, se consagrou com o advento da
televisão e dos festivais universitários de canção e consolidou-se nos anos 1970 através
da consolidação dos departamentos de criação das grandes gravadoras (p. ex. Philips-
Phonogram), os quais passaram a interferir de maneira mais incisiva nos trabalhos dos
artistas “populares” de vendagem massiva e conferir maior autonomia àqueles artistas
pertencentes ao segmento de prestígio. A partir dessa segmentação na própria estrutura
interna das gravadoras enquanto estratégia de atuação no mercado, ficaria posta de
maneira mais clara no mercado as diferenças entre os produtos “populares” e o
segmento de distinção da MPB. Para o pesquisador Eduardo Vicente (2002: 63-77), se
verifica uma segmentação do mercado musical antes mesmo desta mudança estrutural,
já no final dos anos 1950, com o advento da Bossa Nova, o desenvolvimento da
televisão e a fundação da gravadora Chantecler, empresa se propõe adotar uma
orientação única de explorar o mercado de música sertaneja, segmento considerado
como “popular”.
Em um contexto de consolidação de uma estrutura de produção integrada e
marcada por uma relação de complementaridade entre os setores da indústria cultural, as
178
empresas da indústria fonográfica também aprimoraram suas estratégias de atuação no
mercado, definindo de maneira mais precisa os conteúdos e as faixas de mercado que
deveriam ser exploradas. Nesse sentido é ilustrativa a reorganização interna dos
departamentos envolvidos na produção e a distinção entre artistas de catálogo e artistas
de marketing apontadas por Márcia Dias (2000: 57-77), bem como a consolidação do
departamento de marketing nas gravadoras, que muitas vezes orientava suas estratégias
de atuação no mercado com base em pesquisas de opinião pública e de tendências do
mercado (idem: 78-80). Tais pesquisas de mercado começaram a ser encomendadas e
realizadas através de métodos especializados por institutos como o IBOPE e o NOPEM,
este último fundado em 1965 com o objetivo de atender justamente às empresas
fonográficas e cujas pesquisas de vendas de discos eram baseadas em levantamentos
junto a lojistas das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.
A chegada de uma quantidade de grandes gravadoras multinacionais nesse
período também incidiu como um fator determinante na organização do mercado da
forma como se conhece atualmente. A chegada da empresa holandesa Philips em 1958 é
marcada pela aquisição das gravadoras CBD (Companhia Brasileira de Discos) e Sinter;
a CBS, subsidiária da empresa multinacional Columbia, amplia sua participação no
mercado a partir de 1963 com a repercussão gerada pelos seus artistas do segmento da
Jovem Guarda; a empresa de origem britânica EMI se instala em 1969 através da
aquisição da pioneira e igualmente internacional Odeon; a WEA, que atua enquanto
braço fonográfico do grupo Warner, é fundada em 1976; de menor porte, a gravadora
Ariola é fundada em 1979, vinculada ao conglomerado alemão Bertellsman. Pode-se
citar também a empresa RCA, que operava no país desde 1925 e posteriormente é
adquirida pelo grupo Bertellsman e torna-se núcleo da BMG em 1987, completando
assim o quadro de consórcios internacionais mais participantes no mercado brasileiro
(cf. VICENTE, 2002). Conforme aponta pesquisa de mercado realizada pelo
Departamento de Informação e Documentação Artística (IDART, 1980), entre 1974 e
1975 prevaleciam no mercado as seguintes empresas fonográficas: Philips-Phonogram,
EMI-Odeon, CBS, RCA, Continental, Sigla e Copacabana, sendo as três últimas
empresas nacionais.
Além da entrada das multinacionais, outro fator relevante que incidiu na
organização do mercado foi a articulação entre os representantes da indústria
fonográfica para mobilizar o setor no intuito de defender os seus interesses frente ao
governo. A atuação da Associação Brasileira dos Produtores de Disco (ABPD), fundada
179
em 1958, promoveu a conquista de concessões importantes para as empresas que
interferiram diretamente nas condições de produção e consequentemente no panorama
geral do mercado. Como exemplo, podemos citar o veto que tornou sem efeito o artigo
83 da lei de direitos autorais de 1973, o qual obrigava a numeração dos discos
fabricados e o estabelecimento, em 31 de dezembro de 1968, de incentivo fiscal
fornecido através de abatimento do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias (ICM),
benefício que engendrou transformações consideráveis e tendências de mercado
particularmente influentes (cf. IDART, 1980; MORELLI, 1991: 137-8).
Como consequência da chegada empresas internacionais do mercado, Rita
Morelli (1991: 62) aponta um suposto predomínio de músicas estrangeiras na
programação das emissoras rádio e nos lançamentos das gravadoras. Tal fenômeno teria
sido propiciado pelas condições favoráveis que as gravadoras subsidiárias e
representantes das multinacionais gozavam, dado que utilizavam matrizes produzidas
em suas sedes no exterior e assim conseguiam amortizar os custos de gravação, pois já
haviam sido financiados através das vendas do disco ocorridas nos mercados de origem.
Incidia neste cenário aparente de predomínio também o lançamento de discos de artistas
brasileiros que compunham e interpretavam em inglês com pseudônimos estrangeiros64
eram classificados como produtos internacionais, algo que contribuía para causar
confusão nas estimativas (idem: 65). Para a autora, o público consumidor de principal
de tais produções consistia de jovens que dispunham de poder de compra relativamente
baixo, mas que formavam uma faixa de mercado em crescimento no país.
Por sua vez, a vantagem concedida pela isenção do Imposto sobre a Circulação
de Mercadorias (ICM) consistia um fator que favorecia as gravadoras internacionais. Se
por um lado, a nova lei promoveu um incentivo ao setor fonográfico como um todo,
melhorando a relação entre custo-benefício e contribuindo consideravelmente para a sua
expansão; por outro lado, criou condições de mercado desfavoráveis para as empresas
nacionais, uma vez que as produções estrangeiras que vinham com os custos
amortizados possibilitaram às empresas multinacionais reinvestir o montante recebido
pela isenção na contratação daqueles artistas nacionais de maior popularidade e
64 A pesquisadora Rita Morelli (1991: 65) cita como exemplo o grupo Light Refletions, lançado pela gravadora Copacabana da Copacabana, que foi classificado em 7° lugar no levantamento do periódico Jornal do Brasil relativo ao segundo semestre de 1972, com o compacto Tell me once again; e também Terry Winter, da gravadora Beverly, que foi posicionado em 8° lugar no mesmo levantamento, com o compacto Summer Holiday.
180
prestígio que ainda mantinham contratos com gravadoras brasileiras (VICENTE, 2000:
58).
No primeiro capítulo deste trabalho, pudemos observar que antes mesmo da
instalação das gravadoras internacionais no país, os catálogos de várias delas já eram
editados e/ou distribuídos no país através de empresas brasileiras. A título de exemplo,
podemos citar as gravadoras estrangeiras Decca, Mercury, Verve, Motown, Dot, Seeco,
Barclay, Vox, MGM, Young, Kapp, Telefunken, United Artists, Montilla, entre outras,
cujos sucessos internacionais eram capitaneados pelas empresas brasileiras (ver Tab. 6).
Com a instalação dos conglomerados no país, as gravadoras nacionais não tinham mais
como editar os catálogos estrangeiros, dado que eles passaram a ser trabalhados pelas
filiais das próprias gravadoras. Como consequência, pioraram as condições de atuação
das empresas nacionais no setor (idem: 55-56).
Outra questão apontada por Vicente diz respeito ao suposto predomínio da
música estrangeira. Baseando-se em estatísticas da ABPD publicadas em matéria do
periódico O Estado de São Paulo e nas listagens dos 50 LP’s mais vendidos anualmente
levantadas em pesquisas de mercado realizadas a partir de 1965 pelo NOPEM, destaca
que embora o número de lançamentos de música internacional tivesse superado o de
música brasileira em alguns anos do período compreendido entre 1972 e 1975, os
melhores índices de vendagem recaíram sempre no repertório nacional.
Ano
N° de títulos
nacionais
N° de títulos
estrangeiros
N° de discos
nacionais
vendidos
N° de discos
estrangeiros
vendidos
1972 7.572 10.032 58.019.900 34.523.900
1973 8.378 7.743 86.161.000 34.623.100
1974 9.834 10.229 88.676.700 42.134.100
1975 12.221 10.768 92.491.800 53.086.000
Tab. 10 – Estimativa da Associação Brasileira de Produtores de Disco (ABPD) sobre o mercado fonográfico publicados pelo periódico O Estado de São Paulo.
Apesar de constatar que os dados demonstram de fato um expressivo
crescimento da participação do repertório internacional durante toda a década de 1970,
no entender de Vicente, nunca se configurou plenamente um predomínio de música
181
estrangeira no mercado. Sobre a ideia de uma possível dominação cultural estrangeira, o
autor argumenta que os números de unidades vendidas de discos de música
estrangeira/nacional mostram que uma internacionalização profunda do mercado nunca
chegou ao menos perto de se estabelecer e que, apesar dos lançamentos internacionais
consistirem uma via de investimentos realmente lucrativa, a exploração do repertório
doméstico foi a estratégia principal adotada para a atuação e consolidação no mercado
brasileiro. Nesse sentido, o pesquisador não reconhece como plausível o
estabelecimento de uma relação direta entre a internacionalização da produção
fonográfica brasileira e a predominância do consumo de um repertório importado (idem:
58).
A expansão do mercado fonográfico ocorrida no período foi impulsionada por
diversos fatores que merecem ser problematizadas na linha de reflexão aqui proposta.
Além das vantagens fiscais promovidas pela isenção do ICM já citadas, desde a segunda
metade da década de 1960 a indústria beneficiava-se com um momento de grande
efervescência e criatividade na produção de música popular nacional. Ao longo da
década de 1970, grandes gravadoras como a RCA e principalmente a Philips-
Phonogram constituíram seus elencos estáveis e transformaram determinados
intérpretes em verdadeiros astros, como Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil,
Gal Costa, Maria Bethânia, Elis Regina, entre outros, os quais tiveram seus nomes
consolidados nas narrativas sobre a história da música popular brasileira e reuniram uma
produção agora em diante reconhecida sob o rótulo MPB65. Este segmento figurava
ainda como símbolo de qualidade técnica e artística, porém agora em diante se tornou
vinculada predominantemente às gravadoras hegemônicas do mercado. Ao mesmo
tempo, a partir da produção dos artistas da Jovem Guarda e da produção anteriormente
considerada como de “mau gosto” (p. ex. bolero, tango, guarânia, samba-canção), se
consolida outro segmento de grande potencial lucrativo, que vai revelar intérpretes
como Roberto Carlos, Odair José, Reginaldo Rossi, Amado Batista, Fernando Mendes,
Evaldo Braga, Almir Rogério, Sidney Magal como grandes vendedores discos na
indústria brasileira. Este segmento, designado como “romântico” nas listagens do
instituto NOPEM, vai reunir a produção de canções popularescas cuja temática se
vinculava às relações amorosas e no qual se executava uma diversidade de estilos, como
65 Um estudo extenso sobre um processo de institucionalização da produção que ficou conhecida pelo rótulo de MPB pode ser consultado em NAPOLITANO, Marcos. Seguindo a canção: engajamento político e indústria cultural na MPB (1959-1969). São Paulo: Annablume/Fapesp, 2001.
182
a lambada, o sertanejo, o axé, o rock, e posteriormente recebe a denominação genérica
de “brega”.
A adoção do formato do LP desde 1951, também desempenhou um papel
relevante, não apenas devido às vantagens recebidas na economia de material do seu
emprego, mas também pelo aprimoramento de estratégias de atuação pelas gravadoras.
Conforme aponta Paiano (1994: 210), o emprego do formato do LP traz uma mudança
profunda nos modos de produção, uma vez que torna o artista mais importante do que o
disco. As possibilidades técnicas de reprodução (aprox. 23 minutos em cada lado de um
LP de 12’) possibilitaram aos artistas desenvolver tipos de trabalho temáticos que não
poderiam ser feitos em compactos simples ou duplos. As gravadoras, por sua vez,
trabalharam com o formato e os seus componentes (capa, contracapa, ordem das faixas,
etc.) de modo a reforçar as marcas de singularidade de cada lançamento e de cada
artista, buscando alcançar o equilíbrio entre a manifestação do projeto autoral de cada
intérprete e os perfis de consumo/as demandas do mercado.
Deste modo, a formação de elencos estáveis nas grandes gravadoras refletia o
quadro de aprimoramento das estratégias de atuação e da mentalidade empresarial, uma
vez que consistia um proceder mais seguro e rentável ter um quadro de artistas que
vendesse com regularidade, do que atuar no mercado de sucessos temporários, os quais
exigem investimentos constantes em publicidade e se baseiam no emprego de fórmulas
consagradas, as quais não garantem o retorno financeiro. Além de aprimorar o controle
sobre os riscos envolvidos nos investimentos, o monopólio sobre um conjunto de
artistas consagrados conferia também às gravadoras internacionais certo prestígio, dado
que associava a sofisticação/legitimidade das obras e da imagem dos artistas de sucesso
com a marca da empresa. Considerando que tal estratégia começava a se tornar
predominante no contexto internacional da indústria (VICENTE, 2002: 62), podemos
afirmar que tais transformações colocavam os modos de operação do mercado brasileiro
a páreo em relação a determinados padrões de administração internacionais.
Conforme apontam Paiano (1994: 197) e Morelli (1991: 90), outro fator que
contribuiu significativamente na expansão do setor fonográfico consistiu no surgimento
e consolidação da circulação de discos de trilhas de novelas, fenômeno que foi
evidenciado pelo crescimento exponencial obtido pela etiqueta Som Livre, associada à
empresa Rede Globo. Beneficiada por um esquema promocional em escala nacional na
programação da Rede Globo e de outras empresas do grupo, a gravadora Som Livre
iniciou suas atividades em 1971 e três anos depois, as vendas da empresa já
183
representavam 38% do mercado de discos mais vendidos; em 1975, tal cifra alcançou o
patamar de 56% e, em 1977, conquistou a liderança. Diferenciava-se das outras
gravadoras por lançar apenas trilhas sonoras, ou seja, não gravava ou produzia novas
obras e limitava sua ação à escolha dos títulos e à subsequente negociação dos royalties
e direitos autorais, empregando os serviços de fábrica e distribuição de grandes
gravadoras. Segundo Rita Morelli (idem: 91), a verba aplicada em publicidade pela
gravadora chegava a superar muito àquelas de grandes anunciantes, como do grupo
Souza Cruz e da Coca-cola, um montante de investimento que nenhuma outra empresa
do setor fonográfico teria condições de realizar, devido ao alto custo dos espaços
publicitários televisivos.
Com o avanço da especialização dos setores e da racionalização administrativa
nas empresas fonográficas e a incidência da meta do retorno dos investimentos em cada
empresa, a área comercial das gravadoras tornou a exercer uma maior influência sobre
as atividades de produção. Apesar da adoção de uma divisão interna de setores
especializados, as exigências do mercado levaram as empresas a integrar as atividades
das diferentes áreas internas (produtor, diretor, técnicos de som, comercial, marketing,
etc.). Nesse contexto, o posto de produtor artístico na empresa passa a adquirir uma
importância cada vez mais central no campo da produção (DIAS, 2000: 91-101).
Se na configuração da indústria de bens culturais dos anos 1950 e 1960 o
acúmulo de funções pelos funcionários consistia em uma necessidade constante e a
coordenação geral das gravações era realizada pelo diretor artístico da gravadora, na
década de 1970 o crescimento do mercado engendrou a necessidade da criação de novos
cargos, como o de assistente de produção. Sua função consistia em selecionar
repertório, reunir maestros e músicos, designar arranjadores, apanhar a autorização dos
compositores para a gravação das músicas escolhidas e marcar horários de estúdio. Com
o avanço tecnológico dos softwares e do equipamento envolvido nas gravações, o cargo
de assistente de produção passa a ser designado produtor artístico e sua função seria
administrar todas as demandas envolvidas na gravação – além de coordenar as sessões
de gravação, escolhe os músicos, arranjadores, estúdio e ferramentas técnicas a serem
utilizadas (tipos de filtro, equalização, mixagem, masterização, etc.), delibera sobre a
ordem das músicas no disco, supervisiona os custos em relação ao orçamento previsto e
faz mediação com o setor de marketing. A expansão do mercado e a profissionalização
levou, por sua vez, a especialização dos produtores, que passaram a acumular
experiência e a atuarem em determinados segmentos - seja ele MPB, samba, música
184
regional, samba-rock, sertanejo, etc.-, assumindo a responsabilidade de coordenar a
produção dos discos e mediar as demandas operacionais, artísticas e mercadológicas (cf.
VICENTE, 2002).
Durante a década de 1970, alguns produtores se destacaram no campo artístico
por tutelarem as carreiras de artistas que consolidavam seus nomes entre os intérpretes
consagrados da MPB ou que geravam uma extensa repercussão comercial e
conquistavam o apreço de grandes gravadoras. Um dos casos a que convém destacar é o
de Guilherme Araújo, cuja atuação no setor da música se iniciou como assistente do já
respeitado produtor Aloísio de Oliveira junto à atividade da gravadora Elenco e também
nos musicais organizados em boates de Copacabana. Em 1965, Araújo foi contratado
pela major Philips-Phonogram e passou a investir nas carreiras do grupo de intérpretes
baiano - Caetano Veloso, Gal Costa, Gilberto Gil-, e fez trabalhos avulsos com Luiz
Melodia, Jards Macalé. Nesse período, se destacou pela concepção visual futurista dos
figurinos nas performances e happenings realizados no Tropicalismo (roupas
extravagantes, cabelos longos e arrepiados, roupas de plástico, miçangas e colares
exóticos, gestos e rebolados exagerados), com a qual intencionava criar uma imagem
assimilável pelo público consumidor jovem ansioso por modernidade e alheio às
questões da ideologia nacional-popular. Adotava, assim, a estratégia de tornar seus
artistas em ídolos jovens e explorar a faixa de mercado até então associada à Jovem
Guarda. Junto à gravadora Philips-Phonogram produziu alguns discos aclamados66 e
manteve considerável influência no cenário musical até se desentender e romper com
boa parte dos artistas consagrados em meados da década de 1970.
Dependendo do interesse da empresa em relação ao artista, o cargo do produtor
poderia chegar até mesmo a deter um poder de decisão maior do que o próprio artista
sobre aspectos artísticos do disco. Um caso representativo é o do produtor Marco
Mazzola, cuja atuação conquistou destaque pela produção de trabalhos de Rita Lee, Elis
Regina, Milton Nascimento, Chico Buarque, Frenéticas, RPM, Belchior, Gilberto Gil,
Ney Matogrosso, entre outros. Conforme aponta Morelli (1991: 104), as mudanças de
perfil estético e adaptações aos modismos do estilo discotheque introduzidas nos discos
de Belchior, Ney Matogrosso e das Frenéticas constituíram decisão estratégica do
66 Entre os discos nos quais Guilherme Araújo atuou enquanto produtor, destacam-se o aclamado Expresso 2222 (Philips/1972) de Gilberto Gil; o bem recebido Bandido (Continental/1976), segundo disco de Ney Matogrosso; os LP’s India (Philips/1973), Gal Tropical (Philips/1979) e Aquarela do Brasil (Philips/1980) de Gal Costa – estes dois últimos alcançaram a cifra de um milhão de cópias vendidas e iniciaram uma fase de grande sucesso comercial da cantora; Pérola Negra (Philips/1973) de Luiz Melodia, Jards Macalé (Philips-Phonogram/1972) do artista homônimo, entre outros.
185
produtor tendo em vista as tendências do mercado. Vejamos o seu depoimento, colhido
por Morelli (idem):
Eu transformei toda a música para que virasse uma coisa com apelo de fazer sucesso. E fazer com que aquela letra fosse tão... porque eu achava também que o Belchior ficava falando também toda hora que o negócio tava ruim... então, pudesse infiltrar nas discotecas, através do ritmo. Então eu fiz esse negócio, quer dizer, eu bolei, eu mudei toda a música dele, toda a música mudei e com essa finalidade de fazer isso. E ele foi sucesso. Na mesma época estavam surgindo as danceterias, então eu fiz As Frenéticas, com Dancing days, e fiz o Belchior, e fiz o Ney, com Não existe pecado ao sul do equador. Fiz três. Os três nos Estados Unidos. Eu cheguei lá, peguei os melhores músicos de danceteria. Digo: “olha, eu quero fazer isso para discoteca” 67.
Em outros casos, o produtor poderia chegar até mesmo a construir ídolos e criar
personagens com biografias não necessariamente verídicas, ou empregar fórmulas de
sucesso já testadas anteriormente no mercado. A jornalista Ana Maria Bahiana cita a
experiência dos cantores Peninha e Sidney Magal em 1977, os quais constituíram
“expoentes verdadeiros do que se chama pop music - música industrial, de massa,
pronta para o consumo em larga escala - venderam discos aos milhares e nisso se
concentra, como eles próprios afirmam, seu maior quiçá único mérito. São produtos da
linha de montagem bem sucedidos e lucrativos. E gostam disso.” (BAHIANA, 1980:
239). Segundo Márcia Dias (2000: 92-3), constituíram em uma estratégia de mercado
empreitada pelo selo Polydor, especializado em música romântica e subsidiado pela
gravadora Phonogram, sob orientação do produtor musical argentino Roberto Livi.
Deste modo, as consequências do crescimento do mercado, como a segmentação
e a especialização dos setores internos, levaram a adoção de estratégias cada vez mais
racionalizadas e à necessidade do emprego de modos operacionais que pudessem ser
capazes de avaliar a dinâmica do mercado, conceituar produtos adequados às tendências
vigentes e assim aprimorar o controle sobre os riscos dos investimentos realizados.
Nesse contexto, Paiano (1994: 217) destaca a transformação a organização interna das
gravadoras, como a multinacional Philips-Phonogram que, se em 1968 dispunha de 170
empregados e 150 artistas, em 1974, passou a contar com 500 empregados para realizar
uma produção de apenas 28 artistas. Além da re-estruturação interna das gravadoras, o
crescimento do mercado e a chegada das multinacionais ocasionaram outra mudança 67 Grifos originais da autora.
186
determinante relacionada à concentração de mercado e à terceirização das atividades de
produção musical no que tange as relações entre as grandes gravadoras e as gravadoras
autônomas. Dentro dos propósitos deste trabalho, cabe aqui abordar as implicações
deste fenômeno no mercado e nos casos específicos das gravadoras Festa, Elenco e
Forma e suas atividades.
4.3. Expansão/internacionalização do mercado e encerramento das atividades das
gravadoras Festa, Elenco e Forma
Mesmo contando com algumas condições favoráveis de atuação já citadas, os
conglomerados que ingressaram no mercado fonográfico na década de 1960 tiveram de
adotar estratégias para conquistarem fatias do mercado e lidar com as empresas de
grande porte que já concentravam a demanda de determinados segmentos, seja ela
vinculada ao capital nacional ou internacional. Conforme aponta pesquisa do IDART
(1980: 22), as gravadoras Continental e Copacabana eram as maiores empresas
nacionais atuantes e dispunham inclusive de fábrica, gráfica e estúdio próprios para
realizarem todas as etapas de suas produções. Atuavam principalmente no segmento de
música brasileira sertaneja e regional, porém realizavam também investimentos em
novos artistas na busca de novas tendências, e atingiram um nível alto no que se refere à
organização e infra-estrutura.
Algumas das novas empresas que ingressaram no mercado optaram por não
arcar com os custos do estabelecimento de estrutura física completa e decidiram, ao
invés disso, terceirizar algumas etapas de produção. Dentre as 21 empresas fonográficas
de médio e grande porte atuantes no mercado da década de 1970, estimava-se que sete
delas dispunham de estúdio próprio (RCA, CBS, Phonogram, Odeon, Continental,
Copacabana e Chantecler) e oito delas possuíam fábrica (RCA, Continental, Crazy,
Copacabana, Phonogram, Tapecar, Odeon e CBS) (cf. IDART, 1980). Vale apontar que
desse total de 21 não foram considerados os selos e empresas de pequeno porte. Citando
exemplos, Vicente (2002: 68) indica que a empresa nacional Som Livre contava com a
estrutura administrativa e produtiva da RCA; a WEA, que iniciou suas atividades
fabricando seus discos fechando contratos com a Continental e após adquirir fábrica
própria, prensou discos para a gravadora Ariola.
Nesse contexto de crescimento de mercado e aumento da competitividade entre
as empresas no mercado fonográfico na década de 1960, ao que tudo indica as
condições de atuação das gravadoras nacionais e multinacionais não foram similares e
187
atuaram de maneira a beneficiar uma das partes, especialmente após as transformações
impulsionadas pelas medidas econômicas do governo militar. Já apontamos
anteriormente que, além de empregarem matrizes produzidas em suas sedes no exterior
e evitarem os custos envolvidos na gravação dos discos e na confecção das capas, as
empresas multinacionais também foram beneficiadas pela pelo incentivo fiscal
concedido através de abatimento do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias (ICM),
o qual possibilitou às gravadoras internacionais reinvestir o montante recebido pela
isenção na contratação daqueles artistas nacionais de maior popularidade e prestígio que
ainda mantinham contratos com gravadoras brasileiras. Além disso destacamos também
que, os conglomerados internacionais desfrutavam de condições especiais ao acesso ao
crédito, devido às novas normas contidas na Instrução n° 289 da SUMOC editada em
1965. Como uma das medidas implementadas com o intuito de combater à inflação, o
volume de crédito interno concedido foi limitado e selecionado segundo as metas da
política anti-inflacionária. Por sua vez, o crédito externo reservado às empresas
estrangeiras não ficou sujeito às limitações quantitativas impostas na medida. Como
consequência, as empresas que tinham acesso ao capital no exterior dispunham de
maiores facilidades de acesso a crédito/capital de giro para realizar suas produções e
operações (IANNI, 1996: 259-276).
Tais vantagens certamente incidiram no panorama de competitividade crescente
do mercado fonográfico e favoreceram as empresas multinacionais ao longo do
processo que levou à concentração e segmentação do mercado e à consolidação da
indústria cultural. Duas pesquisas, realizadas nas décadas de 1960 e 1970, confirmaram
o predomínio dos conglomerados internacionais no mercado fonográfico. Uma das
pesquisas, realizada com base em dados coletados pela ABPD (Associação Brasileira de
Produtores de Disco), estimou que, em 1979, as empresas dividiam o faturamento do
mercado segundo as seguintes proporções: Internacionais - CBS, 16%; Polygram, 13%;
RCA, 12%; WEA, 5%; EMI-Odeon, 2%; K-Tel, 2%; Nacionais - Som Livre, 25%;
Copacabana, 4,5%; Continental, 4,5%; Fermata, 3%; Top Tape, 1%; Tapecar, 1%;
outras - 11% (MAKALÉ, 1982 apud DIAS, 2000). Tendo parte que a empresa Som
Livre dispunha de condições privilegiadas de atuação68, podemos constatar que a maior
parte da receita levantada era concentrada por poucas empresas internacionais. Outra
estimativa foi realizada por Eduardo Vicente (2002: 70-4) a partir das listagens dos 50
68 Consultar sobre tais condições no tópico anterior.
188
discos mais vendidos no eixo Rio/São Paulo produzidas pelo NOPEM no período entre
1965 e 1999. Ao analisar a participação das gravadoras nacionais nas listagens a cada
ano, o pesquisador conclui que ela tende a tende a diminuir:
Ano Participação de empresas nacionais
(de um total de 50 títulos)
1965 17
1966 19
1967 20
1968 12
1969 18
1970 9
1971 9
Tab. 11 – Participação dos LP’s de gravadoras nacionais nas listagens dos 50 discos mais vendidos no eixo Rio/São Paulo entre 1965 e 1971. Fonte: NOPEM apud VICENTE, 2002: 71
A partir de 1972, com o ingresso da gravadora Som Livre no mercado, Vicente
(idem) identifica um aumento da participação das gravadoras nacionais nas listagens,
porém tal crescimento se vincula diretamente à participação da empresa, beneficiada
pelo seu esquema de divulgação privilegiado.
189
Ano Participação de empresas nacionais
/ Lançamentos da Som Livre
1972 16 / 5
1973 17 / 3
1974 18 / 8
1975 17 / 8
1976 17 / 8
1977 10 / 5
1978 9 / 4
1979 10 / 2
1980 18 / 9
Tab. 12 – Participação dos LP’s de gravadoras nacionais nas listagens dos 50 discos mais vendidos no eixo Rio/São Paulo entre 1972 e 1980. Fonte: NOPEM apud VICENTE, 2002: 72
Considerando tais indícios em pesquisas, pode-se inferir que apesar do mercado
estar em crescimento e teoricamente poder oferecer maior demanda/absorção dos
produtos lançados no mercado e maior viabilidade de produção para as gravadoras em
geral, as estatísticas apontam que, ao longo das décadas de 1960 e 1970, se verificou na
verdade uma concentração das vendas do mercado fonográfico nas mãos de um pequeno
grupo de conglomerados multinacionais e grandes consórcios nacionais. Nesse contexto
as empresas nacionais passaram a ter de lidar com uma concorrência cada vez mais
acirrada com as transnacionais, as quais atuaram no sentido de expandir cada vez mais
sua hegemonia no mercado e tomar os espaços das empresas concorrentes até que se
chegasse ao ponto de fundir com estas ou adquirirem os seus catálogos, fenômeno este
que se agravou ainda mais na década de 1980 (DIAS, 2000: 74-5).
É evidente que tal processo de concentração do mercado não ocorreu isento de
conflitos e contradições e motivou a reação de produtores interessados em melhores
condições de participação no mercado e/ou receosos frente à condição enfraquecida da
indústria nacional; entre outras diversas razões que indicavam a dinâmica tensa da
competitividade. Publicações em periódicos, como a seguir, assinada pelo jornalista
Cícero Sandroni apontam a competitividade no mercado já em 1968:
190
O processo de desnacionalização da indústria brasileira envolveu, agora, o mercado de discos, que está sob domínio de grandes gravadoras anglo-americanas e holandesas. Em média, o preço do disco, quer de música erudita, quer de música popular, é de dez cruzeiros novos. Um grupo brasileiro resolveu forçar a barra: entrou no mercado, produzindo e vendendo gravações, de igual qualidade às dos concorrentes estrangeiros, por pouco menos da metade do preço: quatro cruzeiros novos e 50 centavos. Os grupos estrangeiros revidaram: só em um mês lançaram vinte e três gravações novas a quatro cruzeiros o disco. Mas não ficaram contentes: querem, agora, assumir o controle acionário da produtora brasileira. (SANDRONI, 1968)
Ainda sobre a crescente competitividade no mercado, Vicente (2002: 68) aponta
as manifestações de Enrique Lebemdiger em 1981, no período presidente da gravadora
Fermata, contra as multinacionais que teriam desregulado o mercado brasileiro,
passando a vender discos aos lojistas em consignação e conceder prazos de até 180 dias
para o pagamento. Segundo Lebemdiger, tal manobra fez com que as gravadoras
nacionais tivessem de oferecer iguais condições para poderem competir e
consequentemente perderem o lucro, dado que os juros consumiam 40% do valor
recebido pela venda. Além disso, o empresário acusava também as gravadoras de
exercerem dumping por venderem discos de grande sucesso abaixo do preço de
mercado e Alberto Byington protestava contra evasão de divisas através do pagamento
irregular de royalties e do pagamento de propinas (jabaculê) aos disc-jóqueis das rádios.
Notadamente, a crescente competitividade do mercado e a racionalização das
estratégias não deixou de interferir nas condições de atuação e produtividade das
gravadoras de menor porte, como as autônomas Festa, de Irineu Garcia; Elenco, de
Aloísio de Oliveira; e Forma, de Roberto Quartin. Além de operarem com sérias
limitações de falta de pessoal, orçamento reduzido, falta de estrutura física e de
esquemas de distribuição próprios, as três empresas tiveram de lidar ainda com a
concorrência das grandes gravadoras multinacionais ingressantes, competindo com suas
estratégias de atuação direcionadas aos segmentos de prestígio, de produção
considerada como “artística”, “sofisticada” e com as vantagens destas de acesso ao
crédito já citadas.
Além dos fatores citados relacionados ao mercado, outras complicações de
cunho político também contribuíram para minar as bases que mantinham a produção das
gravadoras. A partir do ano de 1964, como parte das transformações ocorridas no
cenário político trazidas pelo golpe militar, o apoio financeiro concedido até então pela
Divisão Cultural do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty) à gravadora Festa na
191
forma de compra de discos foi cessado. Parte dos contatos próximos de Irineu Garcia,
como Vinicius de Moraes, Pablo Neruda, Nicolás Guillén, entre outros, eram membros
ou simpatizantes de partidos de esquerda e passaram a sofrer perseguição do governo69.
Apesar de Irineu Garcia não fazer parte de nenhum partido e aparentemente não ter
sofrido perseguição pessoal, tudo indica que o benefício foi suspenso por intervenção do
governo militar. Vejamos um dos seus discursos publicados posteriormente:
Não recebíamos subvenções, apenas apoio, uma forma simpática de atenuar custos. Mas a nova orientação política, a partir de 1964, privou a etiqueta dessas fontes. Fui caminhando até onde pude. Depois tranquei a casa, não deixei as chaves debaixo do tapete porque eram minhas, coloquei-as no bolso e fui embora. (cf. ANDRADE, 1997)
Após três anos de dificuldades, Garcia resolveu deixar a gravadora, conceder o
catálogo em consignação para a Phillips e mudar-se para Portugal em auto-exílio em
1967. Durante os próximos três anos, o selo Festa continuou ainda em atividade sob
administração da Philips-Phonogram, re-editando os títulos mais representativos como
selo subsidiário. Irineu Garcia, por sua vez, residiu em Portugal e atuou como jornalista
do Jornal de Letras e também como correspondente do Jornal do Brasil até 1984, ano
em que faleceu. O catálogo deixado pelo selo Festa acabou reunindo uma produção
significativa de aproximadamente 103 títulos, com recitais de autores consagrados da
literatura brasileira e latino-americana; um acervo expressivo de gravações do repertório
de música erudita nacional; e uma série de discos de música popular característica de
uma fase de re-formatação da canção corrente da década de 1950.
Deste modo, percebemos que entre outras diversas iniciativas, sindicatos,
instituições, empresas privadas e grupos de intelectuais afetados pela ocorrência do
golpe militar e subsequente perseguição, a gravadora Festa também teve suas condições
de manutenção comprometidas e sofreu influência determinante que contribuiu para o
encerramento de suas atividades. O corte do benefício realizado nesse caso
69 Segundo o jornalista Marcelo Bortoloti, com o governo Costa e Silva, o decreto do AI-5 e o consequente acirramento do regime, foi criada a Comissão de Investigação Sumária, medida saneadora proposta pelos militares, que instituíram comissões semelhantes em outros ministérios. No Itamaraty, o objetivo era expurgar funcionários (p. ex. homossexuais e alcoólatras) com conduta considerada incompatível com o que se entendiam ser as responsabilidades e o decoro da diplomacia brasileira. A título de exemplo, pode-se citar o caso de Vinicius de Moraes, que junto de outros 9 diplomatas e cerca de 30 funcionários subalternos atuantes no Itamaraty, foi afastado de suas funções, em 1969, sob a justificativa de ter “condutas pessoais questionáveis”. Outro caso foi o do poeta João Cabral de Melo Neto, que fora investigado por ser visto como comunista, porém não chegou a ser exonerado. Informações retiradas de artigo consultado no link https://blogdoims.com.br/o-poeta-e-a-revolucao-por-marcelo-bortoloti/ no dia 04/01/2019.
192
representava, porém, uma das duas vertentes não excludentes que caracterizavam a
atuação contraditória do governo militar frente à esfera cultural: por um lado se definia
pela repressão ideológica e política aos grupos de oposição; por outro lado, foi um dos
períodos da história do país em que o mercado de bens simbólicos mais se desenvolveu
e foram produzidos e difundidos bens culturais. Por reconhecerem a importância do
controle e do fomento aos meios de comunicação e à produção cultural, os militares
incentivaram a criação de diversos órgãos de fomento ao setor e o início de um processo
de institucionalização das políticas culturais. A título de exemplo, com a elaboração do
Plano Nacional de Cultura, foram fundados nesse período o Conselho Federal de
Cultura, Instituto Nacional do Cinema, EMBRAFILME, FUNARTE, Centro Nacional
de Referência Cultural (CNRC) 70, etc. (cf. ORTIZ, 1994).
Estudos apontam que até então os grandes desenvolvimentos realizados no setor
cultural eram impulsionados pela iniciativa privada e o Estado não promovia ações
institucionais de grande dimensão no setor (CALABRE, 2009). No período, algumas
instituições privadas como o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, o Museu de
Arte de São Paulo, a Fundação Bienal, por exemplo, foram declaradas de utilidade
pública e passaram a receber subvenções do governo federal. Porém a concessão de
fomentos acontecia sempre de maneira descontinuada, sem que se constituísse uma
política planejada e administrada de financiamento ou de manutenção de instituições
culturais (idem). Nesse sentido, considero que seria forçado afirmar que no período da
ditadura militar as políticas culturais foram abolidas ou negligenciadas pelos agentes do
Estado, como se poderia supor. Ao invés disso, desempenhou o papel contraditório de
atuar como instância repressora das manifestações contrárias à sua ideologia e ao
mesmo tempo incentivadora das atividades culturais.
Apesar de não ter recebido fomento de órgãos públicos, a gravadora Elenco
também não ficou alheia às transformações trazidas no panorama econômico e político
pelo governo militar. Parte da sua produção de artistas de Bossa Nova– p. ex. Nara
Leão, Edu Lobo, Odette Lara, entre outros-, reuniu canções de protesto orientadas pelo
referencial ideológico cepecista do nacional-popular e, como qualquer outra produção
lançada no mercado, era obrigatoriamente submetida aos órgãos de censura do governo
militar. Em 1966, Aloísio de Oliveira editou um compacto com a canção “Tamandaré”,
a qual integrava o espetáculo “Meu Refrão” de Chico Buarque estreado na boate Arpege
70 Órgão este que vai dar origem posteriormente, em 1979, à Fundação Nacional Pró-Memória.
193
e que deveria integrar o repertório de um long-play previsto para o ano seguinte da
atriz-cantora Odette Lara. No entanto, devido ao alegado “caráter ofensivo” das
referências ao almirante Tamandaré da Marinha Brasileira na letra da canção, o órgão
de censura proibiu a sua circulação e apreendeu as seis mil cópias produzidas do
compacto, o que acarretou prejuízos significativos à gravadora Elenco de Oliveira (cf.
CENSURA, 1966)71.
Outro fator que dificultou sensivelmente a permanência das gravadoras Elenco e
Forma no mercado foi a disputa acirrada por parcelas de público em comum e espaços
comerciais de divulgação entre a Bossa Nova e artistas da Jovem Guarda. Depois da
grande repercussão comercial gerada pelos lançamentos de Roberto Carlos e pelo
fenômeno comercial da Jovem Guarda em meados da década de 60, começou a se
configurar certa polarização no campo artístico entre artistas e intelectuais associados à
Bossa Nova ou à canção de orientação nacional-popular e os entusiastas das versões
brasileiras de rock’n roll. Assim, além de ter perdido popularidade com a produção de
canções de protesto por artistas dissidentes da Bossa Nova, o segmento passava a ter de
lidar com uma tendência de consumo crescente dos discos da Jovem Guarda e a disputa
por uma parcela de público comum de jovens. Um indicador representativo deste
cenário pode ser observado na disputa de audiência entre os programas musicais “O
Fino da Bossa” e “Jovem Guarda”, ambos transmitidos pela TV Record. Se no início de
1966, os índices de audiência dos dois programas se mantiveram em um patamar
próximo, a partir de abril o programa associado à Jovem Guarda apresentou um
acréscimo de audiência, contando com um percentual entre 30 e 35%; enquanto isso, o
percentual do programa “O Fino da Bossa” se manteve estável (entre 23 e 26%) nos
meses restantes do ano72. Nesse sentido, o acirramento da competitividade com outras
gravadoras e a vigência de novas tendências de consumo no mercado diminuíam ainda
mais o espaço de participação para gravadoras pequenas de orientação única,
especialmente aquelas especializadas em segmentos de menor volume de circulação.
Para o pesquisador José Roberto Zan (1998: 68-69), os problemas financeiros da
gravadora Elenco eram decorrentes do “comportamento empresarial pouco eficiente” de
71 Após a proibição da canção, os produtores do espetáculo (“Meu Refrão”), Hugo Carvana e Antônio Carlos Fontoura, tentaram mover recursos contra a proibição; porém a canção permaneceu proibida durante a vigência do regime militar. A primeira versão gravada foi lançada apenas em 1991, pelo selo CID, enquanto faixa do disco Chico em Cy do grupo Quarteto em Cy. 72 Fonte: Boletim de Assistência de TV, São Paulo, 1966, Vol.1 (Acervo do Arquivo Edgar Leuenroth, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas).
194
Aloísio de Oliveira, o qual se concentrava muito mais no aspecto artístico dos
lançamentos do que na esfera de negócios da empresa, a saber, as demandas das etapas
de distribuição, divulgação e vendas. Segundo o autor, a distribuição dos discos deixada
à cargo da RCA e a demora em lançar os discos em São Paulo, onde se encontrava o
maior mercado consumidor do segmento e onde já atuavam as diversas gravadoras
concorrentes (p. ex. RCA, Odeon, Philips, RGE, Audio Fidelity, Forma), constituíram
falhas na administração de Oliveira e marcaram o seu perfil enquanto produtor:
dedicado especialmente ao aspecto artístico e musical e menos compromissado com as
demandas logísticas comerciais.
A combinação de dificuldades incidentes na atuação das gravadoras Elenco e
Forma no mercado, decorrentes do clima repressor, da censura e do acirramento da
concorrência no mercado com outras tendências musicais e outras empresas
multinacionais e locais, certamente contribuiu para a redução da cota de participação
destas no mercado e tornou a manutenção de suas atividades cada vez mais
impraticável. Diante da crescente problemática e após um período curto de cinco anos
de atividades, os produtores acabaram cessando suas produções e vendendo os catálogos
para a gravadora Philips-Phonogram em fins da década de 1960, assim como Irineu
Garcia havia feito. Vejamos matérias em que se apresentam as justificativas feitas pelos
próprios produtores:
[Aloísio de Oliveira] Eu estava achando que a música brasileira estava indo para um caminho muito ruim, e não errei, não. Ela começou com esse negócio de imitação de rock, guitarras elétricas, e não gostei. Comecei a achar que estava tudo muito chato... os bons compositores parando. Fiquei sem animação de fazer qualquer coisa, fechei a Elenco e, em abril de 1968 eu viajei. E acho que fiz muito bem. (cf. OLIVEIRA, 1973) Em 1969, Quartin fechou o selo. “Os grandes nomes da bossa nova estavam no Exterior, a repressão havia piorado, o Cinema Novo tinha morrido.”, conta, lembrando que o início dos anos 70 foi de total marasmo musical. Antes de acabar com o selo, Quartin produziu nos Estados Unidos o Francis Albert Sinatra e Antônio Carlos Jobim. De volta ao Brasil, constatou que não havia realmente mercado para trabalhar no país e decidiu se mudar para os EUA. “Vendi todas as gravações para a Polygram [em 1969, ainda Philips-Phonogram] para ter dinheiro para a mudança”. (cf. JANSEN, 1995) 73
73 Colchetes nossos. Grifos originais do autor.
195
A aquisição dos catálogos de três gravadoras pequenas - cujos perfis de
produção ficaram predominantemente associados ao pólo de produção restrita e gêneros
destacados como símbolo de “bom gosto” no campo artístico-, pela mesma gravadora
multinacional não parece constituir um acaso e pode ser reconhecido como mais um
indício do processo de concentração do mercado fonográfico no domínio de grandes
conglomerados multinacionais. Como se sabe, mesmo antes da aquisição das três
empresas, a Philips-Phonogram já havia adquirido, em 1959, a CBD (Companhia
Brasileira de Discos) e o catálogo da gravadora associada Sinter. Como consequência
desse processo, os grandes conglomerados concentraram em seus elencos artistas e
produções associadas a segmentos de prestígio e, de outro, as gravadoras menores
brasileiras foram forçadas a atuar na exploração de segmentos marginais menos
rentáveis do mercado e na sondagem de novos artistas e tendências ainda não
identificadas e/ou preteridas pelas majors. Assim, com a crescente segmentação do
mercado, as empresas brasileiras passariam a desempenhar um papel similar ao
destinado às indies nos países de industrialização avançada.
Deste modo, podemos compreender a compra das três gravadoras pela Philips-
Phonogram em fins da década de 1960 como o marco tanto do início da expansão dos
investimentos e da monopolização dos conglomerados multinacionais sobre os
segmentos de prestígio do mercado fonográfico associados ao rótulo MPB, como
também da aquisição de gravadoras autônomas pequenas por empresas de maior porte.
A adoção de tal estratégia constitui um indício da vigência da lógica dominante de um
mercado em um estágio mais avançado de especialização, em que os riscos envolvidos
na realização de investimentos para a descoberta de novos artistas passam a ser
terceirizados/assumidos por gravadoras menores nacionais e, no momento em que uma
produção se mostra financeiramente rentável, é captada por um consórcio internacional.
O caso das três gravadoras representa talvez o momento inicial desta re-configuração de
mercado, a qual chega a se consolidar de fato na segunda metade da década de 1970.
Uma consequência direta desse processo foi apontada por Enrique Lebemdiger
em uma matéria publicada em 1981, na qual afirmava que as gravadoras nacionais
foram obrigadas a atuar no mercado com “o disco econômico, classe C” e, assim,
trabalhar o repertório sertanejo, cujos discos são vendidos pela metade dos demais.
Como os aumentos de matéria-prima e produção são iguais tanto para a MPB classe A
como para sertanejos, comprimiu-se a faixa de rentabilidade das gravadoras nacionais”
(DÚVIDAS, 1981 apud VICENTE, 2002). Seja por estratégia de atuação mercado ou
196
devido ao menor potencial lucrativo, o segmento de música sertaneja e gêneros
regionais foram desprezados pelas gravadoras internacionais durante a década de 1970 e
se tornaram um nicho de mercado de gravadoras nacionais. Caso estas tentassem
investir na produção direcionada ao segmento de prestígio da MPB, todo o investimento
feito neste setor poderia se perder frente à uma oferta mais vantajosa de uma das
gravadoras multinacionais.
Observando as listagens de discos mais vendidos produzidas pelo NOPEM, no
que se refere ao segmento da MPB, todos os artistas consagrados de projeção nacional
estavam vinculados a gravadoras multinacionais que lideravam o mercado (Philips-
Phonogram, CBS, RCA Victor, EMI-Odeon e WEA). Devido à sua orientação dos seus
investimentos a esse setor, a gravadora Philips-Phonogram concentrou a maioria dos
artistas mais expressivos, como Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal
Costa, Maria Bethânia, Jorge Ben, Elis Regina, entre outros; pela RCA gravavam João
Bosco, Beth Carvalho e Martinho da Vila; na WEA, Tim Maia e Ney Matogrosso; na
EMI-Odeon, Milton Nascimento. Por outro lado, a presença das gravadoras nacionais
nas listagens apontam sua atuação com artistas de grande apelo popular e menor
reconhecimento junto à crítica especializada, como Wando, Moacyr Franco, Nelson
Ned e Wanderley Cardoso, associados à Copacabana; e Waldick Soriano, Amado
Batista e Adriana, vinculados à Continental.
Apesar da aparente polarização, vale lembrar que as gravadoras internacionais
também mantinham em sua estrutura interna um conjunto de artistas de marketing, o
qual se destinava a atuar na faixa discos de artistas populares de sucesso comercial, com
o intuito de cobrir possíveis prejuízos oriundos das produções dos artistas de
prestígio/catálogo. Nesse sentido, a CBS lançou a grande maioria dos discos da carreira
de grande sucesso comercial de Roberto Carlos e de Waldir Ramos; pela EMI-Odeon,
lançaram José Augusto e Agnaldo Timóteo; Nelson Gonçalves, Jane & Herondy, Perla,
Sérgio Reis e Lilian pela RCA (cf. TEIXEIRA, 1978), e pela Polydor, subdivisão
comercial da Philips-Phonogram, foram lançados diversos discos de Odair José e de
Evaldo Braga.
Como outro fator decorrente da estratégia das grandes gravadoras de eliminar os
riscos dos investimentos no mercado, pode-se apontar o fechamento dos espaços para
experimentalismos e novas tendências na grande indústria. Uma vez que já havia uma
hierarquia artística bem definida e um conjunto de artistas consagrados, as grandes
gravadoras puderam prover a realização dos lucros através do trabalho com as matrizes
197
trazidas do exterior, os artistas de catálogo ligados aos segmentos de prestígio e artistas
de marketing que proviam retorno financeiro de maior volume, perdendo-se assim a
preocupação com a busca de novas tendências e novos talentos. Esta função e os riscos
envolvidos em investimentos nessa área acabaram sendo assumidos pelas gravadoras
nacionais e de menor porte. Em uma entrevista realizada em 1974, argumentos do então
executivo da Philips/Phonogram, André Midani, confirmam a consciência sobre essa
configuração do mercado e a estratégia de atuação da empresa:
[...] Agora, o terceiro aspecto: cabe às pequenas companhias esse trabalho de pesquisa, de buscar, porque inegavelmente a grande companhia é um trator e não deixa campo para a pequena companhia. Então, o que ela pode fazer? Disputar conosco a Gal? Disputar conosco o Vinicius? Não, ela não pode fazer isso porque nós temos uma máquina preparada para enfrentar esses problemas. Nossa máquina é preparada para esse tipo de talento mais maduro. Então o que acontece é que hoje a companhia Continental [empresa nacional], uma companhia pequena, abriu as portas como a nossa companhia fez quando era pequena, há alguns anos atrás. [...] Eu acho que se a companhia tem que continuar investindo e evoluindo, ela tem que assegurar cada vez mais seus fórmula um e sempre, cada vez mais, dar serviço a eles. Eu não acho que é um bom serviço que a gente presta em contratar, por exemplo, o Walter Franco. Porque é mais um momento em que a gente vai desviar a atenção, desviar dinheiro, desviar pessoas e investir, que eu acho leviano, mas leviano mesmo, contratar mais dessa área em que, com certeza, não chegamos nem ao bêabá de prestar o serviço com eles, para a carreira deles. (JAGUARIBE, 1974: 12)74
Deste modo, pudemos perceber neste capítulo que, ao longo do processo de
crescimento constante e de larga escala do mercado fonográfico ocorrido nas décadas de
1960 e 1970, as vantagens desfrutadas pelas grandes empresas multinacionais devido ao
acesso ao crédito no exterior e à lucratividade proveniente do incentivo fiscal pelo
abatimento no ICM possibilitaram aos grandes conglomerados internacionais
estabilizarem suas posições na liderança no mercado, assegurarem o domínio das
produções de prestígio associadas à MPB e abrir mão dos riscos envolvidos no
investimento na exploração de novas tendências e novos mercados. No percurso de
formação desta configuração de um mercado moderno, especializado e segmentado, as
condições de atuação de gravadoras nacionais e autônomas, como foram as gravadoras
Festa, Elenco e Forma, se tornaram cada vez mais limitadas pelas condições desiguais
74 Colchetes nossos.
198
da crescente competitividade e pela lógica comercial incutida pelos consórcios
nacionais e empresas multinacionais.
Nesse sentido, Vicente (2002: 89) destaca que, na década de 1980, o quadro de
concorrência e concentração do mercado seria ainda mais acirrado em virtude da
ocorrência da crise econômica ocorrida e suas consequências no setor fonográfico, cujas
condições problemáticas levaram cerca de vinte selos de menor expressão a encerrarem
suas atividades, a gravadora Copacabana adquirir os catálogos de 15 deles e ter de
encerrar ela própria suas atividades em 1983. Outro relato representativo foram as
tentativas de ingresso no mercado da gravadora Ariola, que também não resiste às
dificuldades incidentes no mercado período e acabam sendo adquirida pela Polygram; e
da gravadora WEA, que também é obrigada a demitir 400 funcionários e fazer uma
união estratégica com a EMI-Odeon e deixar para ela as etapas de fabricação, produção
e cobrança (idem).
Se na configuração do mercado de bens simbólicos das décadas de 1950 e 1960
ainda havia condições de competição e manutenção razoáveis para iniciativas nacionais
autônomas de capital reduzido manterem uma produção de pequeno volume, a expansão
do mercado, sua modernização e as transformações trazidas pelas medidas
implementadas no governo militar tornariam tais condições cada vez menos praticáveis
e os espaços cada vez mais reduzidos. Considerando que, segundo Ortiz (1994: 144), “a
implantação de uma indústria cultural modifica o padrão de relacionamento com a
cultura, uma vez que definitivamente ela passa a ser concebida como um investimento
comercial”, a partir da década de 1970, iniciativas dedicadas a segmentos não muito
rentáveis e a produções culturais que não se enquadravam nas tendências comerciais
vigentes, como as de Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e Roberto Quartin, atuariam
cada vez mais às margens do mercado e dispunham de condições de competitividade
menos vantajosas nas disputas por legitimidade no campo artístico.
Em síntese, as trajetórias das três gravadoras parecem se situar em uma fase de
transição entre duas configurações e dois modos de funcionamento distintos do mercado
de bens simbólicos. Se as condições favoráveis de atuação dos três produtores,
engendradas pela conjuntura do mercado e pela política nacional-desenvolvimentista de
perfil intervencionista e emancipacionista praticada no governo Vargas, contribuíram
para viabilizar a realização de uma produção cultural destinada a segmentos
desprezados pelas grandes gravadoras; ao mesmo tempo a atividade das três gravadoras
com processos de produção autônomos não teria sido possível sem as competências
199
específicas dos três produtores. O conhecimento das regras do métier artístico e o senso
do investimento, dispostos pelos três agentes se mostraram elementos essenciais no
momento da tomada de posição, figurada na busca pela autonomia artística e a
realização de suas produções prezadas pela distinção, pela liberdade criativa e destinada
ao estabelecimento de um novo patamar no mercado sedimentado pela sofisticação
interpretativa e domínio técnico estrutural da escrita, ainda que estivessem envolvidos
sérios riscos econômicos.
Não apenas por parte da iniciativa das gravadoras Festa, Elenco e Forma e de
outras com produção similar, mas principalmente também a oposição de disposições -
entre os agentes favoráveis ao fomento de uma produção cultural essencialmente
marcada pela sofisticação artística e aqueles inclinados aos gêneros estrangeiros, sua
popularidade e potencial comercial-, incidiram na formação de um sistema de
oposições, mantido e tornado efetivo pela crítica especializada e os demais participantes
envolvidos nas disputas simbólicas. Tal dinâmica de tensividade constituiu um fator
essencial para a formação das representações e a eleição dos parâmetros de legitimação,
processo que culminaria na formação de uma hierarquia de legitimidade ao longo do
processo de consolidação do campo artístico e decantação do formato de canção ao
longo das décadas de 1950 e 1960.
No cenário do mercado de meados da década 1970, em meio a um processo de
expansão do mercado de bens materiais e simbólicos, a concretização das hierarquias e
consolidação das empresas multinacionais que tornariam a dominar maior parte do
mercado fonográfico, aquelas produções de “vanguarda artística” antes representadas
pelos lançamentos das gravadoras Festa, Elenco e Forma, tornaram-se elas próprias a
matéria de distinção simbólica e segmento de prestígio mantido pelos conglomerados
hegemônicos. Em outras palavras, aquela produção que se primava pelo seu aspecto
negativo, de oposição às tendências comerciais de grandes gravadoras são assimiladas
por estas. Após consagradas pela crítica e demais agentes participantes das disputas,
tornam a incidir no campo enquanto positividade/critério de legitimidade. As novas
posições de vanguarda definidas enquanto oposição às posições dominantes
representadas principalmente pelas multinacionais e pelos preceitos estéticos da sigla
MPB, acabaram sendo ocupadas principalmente por gravadoras nacionais, em um
território cada vez mais marginalizado, difuso e minado pela especialização e
competitividade do mercado. Assim, com a mudança estrutural do mercado e de
posições no campo artístico, as iniciativas de vanguarda opostas às tendências
200
comerciais hegemônicas e compromissadas com a garantia da liberdade artística vão se
posicionar cada vez mais à margem no mercado e se contrapor aos padrões estéticos
consolidados durante a decantação da forma da canção da MPB promovida durante as
décadas de 1950 e 1960.
201
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A evolução da indústria brasileira, dos sistemas de comunicação e do mercado
de bens simbólicos ocorrida entre as décadas de 1950 e 1960 revelou transformações
fundamentais na configuração do mercado fonográfico brasileiro e no padrão de
tratamento dado à produção cultural. O estudo realizado sobre as trajetórias das
gravadoras Festa, Elenco e Forma e seus três produtores nesse contexto e a reflexão
sobre suas condições de produção constituiu uma circunstância oportuna para reaver o
debate sobre cultura brasileira, identidade nacional, segmentação do mercado
fonográfico, formação de hierarquias e a consolidação do campo artístico. Se
considerarmos a relativa escassez de estudos acadêmicos realizados sobre o mercado
cultural da década de 1950, podemos afirmar que a abordagem analítica realizada sobre
tais objetos de estudo contribuiu por colocar em questão em quais parâmetros o
tratamento dado à produção fonográfica foi alterado e por avaliar o período em seu
regime de historicidade específico, apreciando as disputas simbólicas e as manifestações
formadas sobre as produções culturais de maneira a apontar a historicidade dos
discursos e evitar a mera reprodução da parcialidade de suas posições.
A problematização das mudanças ocorridas na conjuntura política econômica do
país associadas à transição do modelo de governo de Vargas e de Kubitschek para o
projeto tecnocrático do regime militar constituiu uma etapa fundamental na avaliação do
nível de desenvolvimento e integração do mercado cultural, as condições de produção
dispostas e as implicações destas mudanças estruturais na dinâmica de produção,
recepção e segmentação do mercado. A implementação de uma política nacional-
desenvolvimentista de perfil intervencionista e emancipacionista ocorrida durante a
vigência do modelo de governo populista (1930-1954) e a expressiva ampliação do
aparato burocrático, contribuíram enquanto fatores relevantes na constituição de uma
classe de servidores públicos de classe média nos grandes centros industriais e
administrativos do país e um mercado de bens culturais dotado de maior autonomia. Por
sua vez, observamos que a condição incipiente do mercado, expressa pela fraca divisão
do trabalho intelectual (imprensa/literatura) e pela confusão de fronteiras entre as
diversas áreas culturais, parece ter constituído um fator favorável para aqueles agentes
que habitavam determinados círculos sociais de intelectuais e servidores públicos
influentes. O caso de Irineu Garcia é representativo nesse ponto, uma vez que teve
condições de articular as diferentes etapas de produção dos discos junto a intelectuais
202
modernistas, jornalistas, músicos e agentes públicos, além de captar subsídios e apoio
institucional do Estado. Assim, a configuração incipiente e a precariedade tecnológica,
financeira e empresarial, que caracterizava o mercado cultural na década de 1950,
liberavam espaço para a criatividade e a um tratamento peculiar conferido à produção
cultural, na qual as iniciativas individuais/locais desempenharam um papel fundamental
na articulação de determinadas produções frente ao insuficiente corporativismo e à
ausente especialização/racionalização empresarial (ORTIZ, 1994: 96-8).
Empreendimentos personalistas, como os de Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e
Roberto Quartin, constituem casos emblemáticos de uma dinâmica de produção
marcada pela estima e entusiasmo pessoal pelo tipo de arte que produziam, em uma
atividade fascinada e compromissada com a sujeição às regras e com as demandas
próprias do ofício artístico-musical. Dentro das condições praticamente artesanais de
produção, em que se dispunha um contingente reduzido de colaboradores, sem divisão
de departamentos, atuação pessoal do proprietário em quase todas as etapas
(arregimentação, produção, fabricação, divulgação, vendas) e limitações consideráveis
de orçamento, os três produtores souberam trabalhar e compatibilizar de modo eficaz,
perante os consumidores de classes média e alta em expansão, as demandas e as
concepções estéticas adequadas com as condições materiais de produção dispostas. Em
um período em que as grandes gravadoras ainda não adotavam a estratégia de
monopolizar os segmentos de prestígio, os três produtores tiveram condições de
trabalhar com um grupo de artistas deste setor, escoando uma produção significativa de
poetas/literatos consagrados, intérpretes de Bossa Nova, instrumentistas proeminentes e,
deste modo, dando visibilidade a projetos musicais que não se alinhavam às tendências
de maior circulação comercial; que não tinham espaço nas grandes empresas do
mercado fonográfico.
Dentre as diversas instâncias que co-atuavam no processo de formação e
consolidação de critérios de legitimação e hierarquias de legitimidade no campo
artístico durante as décadas de 1950 e 1960, apontamos o papel desempenhado pelas
gravadoras Festa, Elenco e Forma na definição mais clara de posições no campo e no
estabelecimento de um “sistema de oposições” na cena cultural. Fatores como a tomada
de posição dada pelos três produtores a favor da autonomia artístico-administrativa e do
investimento em uma produção de discos que se opunha às tendências comerciais do
mercado, somada aos discursos de distinção proferidos pelos demais críticos e agentes
participantes nas disputas simbólicas, atuaram no estabelecimento de coordenadas, de
203
posições possíveis no campo. Produções específicas designadas como de “bom gosto” e
pertencentes a um segmento “culto” ou “erudito-popular” puderam ser alocadas em uma
determinada posição de distinção na mesma medida em que se contrapunham àquela
posição representada pela produção associada a termos de conotação negativa, como
“comercial”, “estrangeira” ou “massiva”. Deste modo, delineava-se um processo de
autonomização do campo artístico e subsequente polarização de posicionamentos
motivada pela disputa pela legitimação neste, a qual se tornava evidente nos discursos e
representações formadas pelos agentes participantes. No entanto, em um contexto em
que o mercado cultural e o campo artístico não haviam se erigido plenamente,
observamos também a existência de posicionamentos “cambiáveis” ou “maleáveis”
frente às duas posições - mesmo na produção da gravadora Festa-, fatos que indicam
que a segmentação do mercado não se manifestava de uma maneira plena ao longo das
décadas de 1950 e 1960.
Nesse ponto reside uma característica singular do processo histórico do campo
cultural brasileiro, dado que no país ocorreu uma correspondência histórica entre o
desenvolvimento de uma cultura de mercado incipiente e a autonomização de uma
esfera cultural universal, conforme apontou Ortiz (1994: 104-5). A interpenetração entre
os universos erudito e popular associada à fraca divisão do trabalho intelectual e à
fragilidade do capitalismo no país marcou evidentemente também as trajetórias dos
produtores e as produções das três gravadoras Elenco, Festa e Forma. Constitui um fato
bastante representativo que uma das primeiras experiências que precederam a Bossa
Nova - a parceria firmada entre o jovem compositor Antônio Carlos Jobim e o poeta
Vinicius de Moraes na produção do LP Canção do amor demais (Festa/1958)-, tenha
encontrado respaldo justamente no investimento arriscado do jornalista Irineu Garcia,
junto à uma gravadora autônoma especializada em literatura recitada e música erudita75.
Ao mesmo tempo, também por meio das iniciativas de Aloísio de Oliveira e Roberto
Quartin não apenas intérpretes de Bossa Nova, samba e artistas novatos da música
instrumental tiveram espaço, mas também alguns trabalhos de música popular
interpretada em arranjos de música erudita integraram seus catálogos76. Assim, pode-se
75 A inserção recorrente de seções orquestradas, as diferenças interpretativas no canto e as peculiaridades da estruturação musical observadas no tratamento dos arranjos do disco de Elizete Cardoso citado e Por toda minha vida (Festa/1959) da cantora lírica Lenita Bruno permitem vislumbrar na própria esfera da prática musical tal proximidade entre os dois universos. 76 A título de exemplo, pode-se citar os discos Quinteto Villa-Lobos (Forma/1966) e Re-encontro (Elenco/1966) de Silvinha Telles, Edu Lobo, Tamba Trio e Quinteto Villa-Lobos.
204
dizer que a manutenção do investimento em projetos musicais “desinteressados” e a
liberdade artística concedida aos músicos e artistas gravados em suas produções
contribuíam para elevar o grau de autonomia do campo artístico e consolidar as lógicas
de distinção que pautavam o processo de autonomização vigente no cenário artístico em
meio a uma configuração de mercado específica, no qual a precariedade e a falta de
especialização do mercado parecem ter constituído fatores favoráveis à manutenção
desta dinâmica.
Com as transformações engendradas pelas medidas político-econômicas
implementadas no modelo de governo populista de Juscelino Kubitschek, de João
Goulart e principalmente no projeto tecnocrático da ditadura militar, a dinâmica de
funcionamento do mercado de bens simbólicos se modifica fundamentalmente. Em fins
da década de 1960 se consolida uma indústria cultural no país, em uma relação
indissociável com a intensificação do processo de industrialização, o crescimento do
parque industrial e do mercado interno de bens materiais e a expansão/modernização
dos diferentes setores de comunicação. Uma vez que o conjunto de medidas aplicadas
nestes governos atuou na inserção do país no processo de internacionalização do capital
e no alinhamento com os centros produtivos e modos de operação capitalista
internacionais, tal processo não se efetivou sem que fossem criados desajustes ou pontos
de tensão com os modos de operação e as estruturas produtivas remanescentes dos
governos populistas.
Na medida em que as empresas buscaram aprimorar o controle sobre os riscos e,
consequentemente, sobre as diversas variáveis que pudessem interferir na repercussão
comercial de seus produtos, restringia-se o espaço para o improviso, o experimento e a
criatividade nos diversos setores do mercado cultural (ORTIZ, 1994: 97-101). A
profissionalização dos quadros de funcionários, a especialização dos setores internos, a
adoção de estratégias baseadas em princípios mercadológicos passaram a se sobrepor
aos acordos verbais tradicionais e à própria noção de cultura, que passou a ser vista
prioritariamente enquanto investimento comercial (idem: 144). Com o advento de uma
sociedade moderna e o ingresso do país em um estágio avançado do capitalismo se
transfigurou a relação entre a esfera de circulação restrita e ampliada de modo que a
lógica comercial se impôs enquanto dominante e delimitou os espaços concedidos às
formas de manifestação cultural.
A partir das vantagens competitivas garantidas aos conglomerados
multinacionais por consequência dos planos econômicos do regime militar, aquelas
205
gravadoras vinculadas ao capital exterior passam a conquistar maiores fatias no
mercado e a adotar estratégias de atuação racionalizadas, como a de monopolizar os
segmentos de prestígio e, em paralelo, trabalhar com artistas de marketing. Nesse
sentido, a aquisição dos catálogos das três gravadoras autônomas Festa, Elenco e Forma
- cujos perfis de produção ficaram predominantemente associados ao pólo de produção
restrita e gêneros reconhecidos como símbolo de “bom gosto” no campo artístico-, pela
mesma gravadora multinacional, em 1968, não parece ter constituído um acaso, mas sim
um indício claro da consolidação do processo de segmentação e do início da
concentração do mercado fonográfico no domínio de grandes conglomerados
multinacionais. Na década de 1970, além de concentrar em seu elenco a maioria dos
artistas mais prestigiosos do período (Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Gal
Costa, Maria Bethânia, Jorge Ben, Elis Regina, entre outros), a gravadora Philips-
Phonogram manteve em sua disposição três catálogos com discos de grande relevância
da maioria dos artistas que vieram a integrar a gênese da sigla MPB e se consolidar
entre os grandes nomes nas narrativas históricas sobre a música popular brasileira (Tom
Jobim, Dorival Caymmi, Vinicius de Moraes, Baden Powell, Roberto Menescal, Nara
Leão, Edu Lobo, Quarteto em Cy, etc.).
Por fim, nesse contexto de um mercado desenvolvido, segmentado e
especializado, os espaços disponíveis para pequenas gravadoras nacionais e
empreendimentos personalistas como os de Irineu Garcia, Aloísio de Oliveira e Roberto
Quartin – orientados por aspirações marcadamente pessoais e dedicados a projetos
musicais não necessariamente rentáveis-, passaram a ter limites bem determinados.
Conforme bem coloca Ortiz (idem: 147), isto não quer dizer que se extinguiu espaço
para a criatividade ou que a marca pessoal dos intérpretes e músicos fosse subtraída nos
novos modos de produção, mas sim que as condições para sua manifestação se tornaram
cada vez mais difíceis e mais subordinadas aos imperativos do mercado.
206
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Compactos simples, duplos, long-plays e CD’s POESIAS Vol. I. Carlos Drummond de Andrade e Manoel Bandeira (Autores e intérpretes). Rio de Janeiro: Festa, 1955. LP. SUÍTE Vila Rica e Três Poemas Afro-brasileiros. Orquestra Sinfônica Brasileira (Intérprete), Camargo Guarnieri (Compositor e regente). Rio de Janeiro: Festa, 1958. LP. UMA NOITE no Arpege. Waldir Calmon (Intérprete). Rio de Janeiro: Rádio, 1956. LP. VALSAS de esquina. Francisco Mignone (Compositor e intérprete). Rio de Janeiro: Festa, 1957. LP.
217
APÊNDICES
Estimativa de catálogo – Gravadora Festa Long Plays de sete e dez polegadas
N° de série Título Intérprete Ano
LPP 001 Poesias – Vol. I – Manoel Bandeira / Carlos Drummond de Andrade
Manuel Bandeira / Drummond
1955
LPP 002 Poesias – Vol. II – Vinicius de Moraes / Paulo Mendes Campos
Vinicius / Paulo Mendes Campos
1956
LPP 003 Poesias – Vol. III – Augusto Frederico Schmidt / Abgar Renault
Abgar Renault / Augusto Frederico Schmidt
1956
LPP 004 Poesias – Vol. IV – Guilherme de Almeida / Onestaldo de Pennafort
Onestaldo de Pennafort /
Guilherme de Almeida
1956
LPP 005 Poesias – Vol. V – Olegário Mariano / Álvaro Moreira
Álvaro Moreira / Olegário Mariano
1956
LPP 006 Poesias – Vol. VI – Ascenso Ferreira / Vargas Neto
Vargas Neto / Ascenso Ferreira
1956
LPP 007 Poesias – Vol. VII – Menotti Del Picchia / Emílio Moura
Menotti Del Picchia / Emílio
Moura
1956
LPP 008 Poesias – Vol. VIII – Cassiano Ricardo / Adalgisa Nery
Cassiano Ricardo /
Adalgisa Nery
1956
LPP 009 Poesias – Vol. IX – Cecília Meireles / Guilherme de Almeida
Cecília Meireles / Guilherme de
Almeida
1956
LPP 010 Poesias – Vol. X – Murilo Mendes / João Cabral de Melo Neto
Murilo Mendes / João Cabral de
Melo Neto
1956
LPP 011 Poesias – Vol. XI – Augusto Meyer / Geir Campos
Augusto Meyer / Geir Campos
1956
LPP 012 Poesias – Vol. XII – Rosalina Coelho Lisboa / Gilberto Amado
Rosalina Coelho Lisboa /
Gilberto Amado
1956
LPP 013 Poesias – Vol. XIII – Sergio Milliet / Manoel Bandeira
Sergio Milliet / Manoel
Bandeira
1958
LPI 1.001 Moderna Poesia Brasileira – Jograis de São Paulo
Diversos 1956
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LPI 1.002 Poesia de Sempre (Antologia) Paulo Autran 1956 LPI 1.003 Poemas de Natal – Jograis de São Paulo Diversos 1956 LPI 1.004 Recital de Margarida Lopes de Almeida Margarida
Lopes de Almeida
1956
LPI 1.005 O pequeno príncipe Paulo Autran / Glória Cometh /
Tom Jobim
1958
LPI 1.006 Recital – João Vilaret – Poesia Brasileira – Antologia
João Villaret 1958
LPI 1.007 Canto de Amor à Bahia e Quatro Acalantos de “Gabriela, Cravo e Canela”
Jorge Amado / Dorival Caymmi
1958
LDA 4.001
Poemas de Amor – Pablo Neruda Pablo Neruda S/D
Número total de LP’s de 7’ e 10’ catalogados: 22
Long Plays de quatorze polegadas (14’) Poesia, Teatro
N° de série Título Intérprete Ano
LPT 2.001
As Mãos de Eurídice de Pedro Bloch Rodolfo Mayer S/D
LPT 2.002
Do Tamanho de Um Defunto (Millôr Fernandes) por Ludy Veloso, Armando Couto, Renato Consorte e Edson Silva
Ludy Veloso, Armando Couto
e outros
S/D
LPA 3.001
Antologia Falada do Conto Brasileiro Vol. 1 Paulo Autran / Luis Jatobá
S/D
LPA 3.002
Machado de Assis (Poesia e Prosa) por Tânia Carrero, Margarida Ruy, Cesar Ladeira e Paulo Autran
Tânia Carrero, Margarida Ruy e
outros
S/D
LDR 5.030
IG 49.004
Fernando Pessoa por João Villaret João Villaret 1968
IG 49.008 Fernando Pessoa – In Memoriam / Antologia da Poesia Portuguesa
João Villaret 1968
IG 79.029 João Cabral de Melo Neto Por Ele Mesmo João Cabral de Melo Neto
1969
IG 79.030 Moderna Poesia Brasileira – Antologia (10 poetas)
João Villaret 1969
IG 79.034 Vinicius em Portugal Vinicius de Moraes
1969
IG 79.035 Poemas de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa) por Sinde Filipe
Sinde Filipe 1971
IG 79.502 Mário de Andrade “In Memoriam” – Poesia e Som
Mário de Andrade
1971
219
FP 7.002 Carlos Drummond de Andrade Carlos Drummond de
Andrade
1963?
FP 7.003 Vinicius de Moraes Vinicius de Moraes
S/D
FP 7.005 Manuel Bandeira Manuel Bandeira
S/D
FP 7.006 Cecília Meireles Cecília Meireles S/D FP 7.007 Mário Quintana Mário Quintana S/D FP 7.008 Érico Veríssimo – Fragmentos de “O Tempo
e o Vento” Érico Veríssimo S/D
FP 7.009 Paulo Mendes Campos Paulo Mendes Campos
S/D
FP 7.010 Thiago de Mello Thiago de Mello S/D FP 7.012 Federico Garcia Lorca por Rafael Alberti Rafael Alberti S/D FP 7.013 Gabriela Mistral por Alicia Quiróga Alícia Quiróga S/D FP 7.014 Rubem Braga Rubem Braga S/D FP 7.015 Geir Campos Geir Campos S/D
Música Erudita
N° de série Título Intérprete Ano
LDR 5.001
Valsas de Esquina para piano, de Francisco Mignone
Francisco Mignone
1957
LDR 5.002
12 Valsas-chôros para piano, de Francisco Mignone dedicadas à Manuel Bandeira
Francisco Mignone
1958
LDR 5.003
IG 79.006
1ª e 2ª Fantasias Brasileiras de Francisco Mignone pela O.S.B.
Mignone/ Orquestra Sinfônica Brasileira
1958
LDR 5.004
Antologia da Música Erudita Brasileira Vol. I – Sinopse
Arnaldo Estrela (piano)
1958
LDR 5.005
Mestres do Barroco Mineiro (Séc. XVIII) – Vol. I José Joaquim Emérico Lobo de Mesquita - Missa em Mi Bemol
Associação de Canto Coral do
RJ
1958
LDR 5.006
Mestres do Barroco Mineiro (Séc. XVIII) – Vol. II José Joaquim Emérico, Marcos Coelho Netto, Francisco Gomes da Rocha
Associação de Canto Coral do
RJ
1958
LDR 5.007
Mestres da Música Soviética – Sergei Prokofieff, Dimitri Shostakovich, Nadiejda Simonian e Abram Lobscovskii
Pavel Serebriakov
(Piano)
1958
LDR 5.008
IG 79.018
Antologia da Música Brasileira – Vol. II Valsas ao Piano
Arnaldo Estrela 1958
LDR Mestres da Música Russa – Rachmaninov, Pavel 1958
220
5.009 Glazunoff, Scriabin e Stravinsky Serebriakow LDR 5.010
Camargo Guarnieri – Suíte Vila Rica e Três poema afro-brasileiros O.S.B.; Regente: Camargo Guarnieri
Orquestra Sinfônica Brasileira
1958
LDR 5.011
Cláudio Santoro – Sinfonia N° 5 O.S.B.; Regente: Cláudio Santoro
Orquestra Sinfônica Brasileira
1958
LDR 5.012
IG 79.003
Pe. José Maurício Nunes Garcia – Missa de Réquiem (1816)
Associação de Canto Coral do
RJ 1958
LDR 5.014
Alberto Nepomuceno – Série Brasileira O.S.B.; Regente: Souza Lima
Orquestra Sinfônica Brasileira
1959
LDR 5.015
Brasiliana N° 3 – Concerto Para Harmônica de Boca e Orquestra – Orquestra Sinfônica Brasileira / Regência: Radamés Gnattali
Edu da Gaita / Radamés Gnattali
1959
LDR 5.016
Henrique Oswald – Sinfonia, Op. 43 O.S.B.; Regente: Edoardo de Guarnieri
Orquestra Sinfônica Brasileira
1959
LDR 5.017
Alexandre Levy – Suíte Brasileira / Souza Lima – Lendas Brasileiras O.S.B.; Regente: Souza Lima
Orquestra Sinfônica Brasileira
1959
LDR 5.018
Alberto Nepomuceno – Sinfonia em Sol Menor O.S.B.; Regente: Edoardo de Guarnieri
Orquestra Sinfônica Brasileira
1959
LDR 5.019
Radamés Gnatalli – Concerto Para Harpa e Orquestra de Cordas / Concerto para Violino e Orquestra (Regente: Radamés Gnatalli)
Orquestra Sinfônica Brasileira
1959
LDR 5.021
Cláudio Santoro – Sinfonia N° 6 / Radamés Gnattali – Sinfonia Popular O.S.B.; Regente: Cláudio Santoro
Orquestra Sinfônica Brasileira
1963
LDR 5.022
Francisco Mignone – Concerto para Piano / Sinfonia Tropical
Orquestra Sinfônica Brasileira
1963
LDR 5.023
Villa-Lobos – Missa São Sebastião Regência: Cleofe Person de Matos
Associação de Canto Coral
1963
LDR 5.024 IGC
79.004
Do Tempo do Império Regência: Cleofe Person de Matos
Collegium Musicum da Rádio MEC
S/D
LDR 5.025
Francisco Mignone – Missa em si bemol / Villa-Lobos – Bendita Sabedoria Regência: Cleofe Person de Matos
Associação de Canto Coral
1964
LDR 5.026
LLanto por Ignácio Sanchez Mejias Compositor: Maurício Ohana
Rafael Alberti Orquestra e
Coro feminino de Montevideo
1965
LDR 5.027
Camargo Guarnieri – Sonata N° 3 para Violino e Piano / Cláudio Santoro – Sonata
Oscar Borgeth e Ilara Gomes
1966
221
N° 4 LDR 5.028
Heitor Villa-Lobos – Sonata N° 2 / Radamés Gnatalli – Sonata N° 1
Iberê Gomes Grosso / Radamés Gnattali
1966
LDR 5.029
Pedro Marinho - Missa em aboio por Coral Ars Nova (UFMG)
Coral Ars Nova 1967
IG 79.015 Recital de Música Brasileira Regente: Carlos Alberto Pinto Fonseca
Coral Ars Nova (UFMG)
1969
IG 79.018 Antologia da Música Brasileira Vol. II (Valsas) – Mignone, Sousa Lima, Villa-Lôbos, Henrique Oswald, Nepomuceno
? S/D
IG 79.020 Alberto Nepomuceno – Série Brasileira; Abul; O Guaratujá por O. S. Brasileira, Reg. Souza Lima
Orquestra Sinfônica Brasileira
1969
IG 79.021 Henrique Oswald – Sinfonia Op. 43 por O. S. Brasileira, Reg. Edoardo de Guarnieri
Orquestra Sinfônica Brasileira
S/D
IG 79.022 Suíte Brasileira e Lendas Brasileiras de Alexandre Levy por O. S. Brasileira
Orquestra Sinfônica Brasileira
1969
IG 79.026 Pablo Neruda – XX poemas de amor y una canción desesperada
Pablo Neruda 1968
IG 79.028 Sinfonia em Sol Menor de Alberto Nepomuceno por O. S. Brasileira, Reg. Edoardo de Guarnieri
Orquestra Sinfônica Brasileira
1968
IG 79.032 Federico Garcia Lorca – Poemas & Canções
Diversos intérpretes
1969
IG 79.501 André da Silva Gomes (1752 - 1844) – Missa a oito vozes e instrumentos Regente: Júlio Medaglia
Orquestra de Cordas de São
Paulo
1970
Música Popular
N° de série Título Intérprete Ano
LDV 6.001
Nelson Souto interpreta Eduardo Souto Nelson Souto 1958
LDV 6.002
Canção do Amor Demais Elizeth Cardoso 1958
LDV 6.003
IG 79.010
Modinhas Fora de Moda Lenita Bruno 1958
LDV 6.004
Música Chinesa pelo Conjunto de Instrumentos Tradicionais da República Popular Chinesa
Conjunto de I. T. da R.P.C.
1958
LDV 6.005
Festa Dentro da Noite N° 1 – Vadico e Seu Conjunto Instrumental
Vadico 1959
222
LDV 6.006
Por Toda a Minha Vida / Música: Antônio Carlos Jobim – Poesia: Vinicius de Moraes
Lenita Bruno 1959
LDV 6.007
Prelúdio de Amor – Cópia e Seu Conjunto Studio
Nicolino Cópia 1959
LDV 6.008
Eu Preciso de Você – Geraldo Miranda, Sua Guitarra e Sua Música
Geraldo Miranda
1959
LDV 6.009
Festa Dentro da Noite N° 2 – Vadico e Sua Orquestra
Vadico 1959
LDV 6.010
Eu Sei Que Vou Te Amar – Mozart e Seu Pistom
Mozart Ituassú 1959
LDV 6.011
Escola de Samba da Portela Escola de Samba Portela
1959
LDV 6.012
Eu Te Amo – Nicolino Cópia e Seu Conjunto Studio
Nicolino Cópia 1959
IG 49.005 Por Toda Minha Vida – Música: Antônio Carlos Jobim / Poesia: Vinicius de Morais
Lenita Bruno 1968
Número total de LP’s identificados: 94 Endereço(s) – Ordem cronológica: (1956) Rua São José, 46 – Sala 405 – 4° andar – Rio de Janeiro, Brasil Av. Franklin Roosevelt, 84 – 5º- Grupo 501 – Rio de Janeiro, Brasil (1968) Av. Franklin Roosevelt, 39 – Grupo 712 – Rio de Janeiro
223
Estimativa de catálogo – Gravadora Elenco Long Plays (LP)
N° de série Título Intérprete Ano
ME-1 Vinicius & Odette Lara Vinicius de Moraes / Odette
Lara
1963
ME-2 Balançamba Lúcio Alves 1963 ME-3 A Bossa Nova de Roberto Menescal e seu
Conjunto Roberto
Menescal 1963
ME-4 Baden Powell Swings With Jimmy Pratt Baden Powell / Jimmy Pratt
1963
ME-5 Bossa, Balanço, Balada Sylvia Telles 1963 ME-6 Premiére Diversos 1963 ME-7 Um Sr. Talento Sérgio Ricardo 1964 ME-8 Maysa Maysa 1964 ME-9 Antônio Carlos Jobim Tom Jobim 1964
ME-10 Nara Nara Leão 1964 ME-11 Baden Powell à Vontade Baden Powell 1964 ME-12 Um Show de Bossa... Lennie Dale Lennie Dale 1964 ME-13 Bossa Session – Silvinha Telles, Lúcio Alves
e Roberto Menescal e seu Conjunto Diversos 1964
ME-14 A Nova Bossa de Roberto Menescal e seu Conjunto
Roberto Menescal
1964
ME-15 Dick Farney Dick Farney 1964 ME-16 Apresentando Rosinha de Valença Rosinha de
Valença 1964
ME-17 Caymmi Visita Tom Dorival Caymmi / Tom Jobim
1964
ME-18 Rio Capital de Bossa Nova Diversos 1965 ME-19 A Música de Edu Lobo por Edu Lobo Edu Lobo /
Tamba Trio 1964
ME-20 Rio de 400 Janeiros (Trilha Sonora) Lindolfo Gaya 1965 ME-21 Lennie Dale e o Sambalanço Trio Sambalanço
Trio / Lennie Dale
1965
ME-22 Ao Meu Rio Mário Reis 1965 ME-23 Vinicius e Caymmi no Zum-Zum Dorival Caymmi
/ Vinicius de Moraes
1965
ME-24 De Vinicius e Baden Especialmente Para Cyro Monteiro
Cyro Monteiro 1965
ME-25 Nâna Nana Caymmi 1965 ME-26 Agostinho dos Santos Agostinho dos
Santos 1966
224
ME-27 Dick Farney – Piano / Orquestra Gaya Dick Farney / Lindolfo Gaya
1966
ME-28 Trechos de Júlio Cesar de William Shakespeare – Tradução e Leitura de Carlos Lacerda
Carlos Lacerda 1966
ME-29 Músicas de Billy Blanco na Voz do Próprio Billy Blanco 1966 ME-30 Ao Vivo no Teatro Santa Rosa Baden Powell 1966 ME-31 Re-encontro – Silvinha Telles, Edu Lobo,
Tamba Trio e Quinteto Villa-Lobos Diversos 1966
ME-32 MPB-4 MPB-4 1966 ME-33 Quarteto em Cy Quarteto em Cy 1966 ME-34 Sérgio Porto – Aracy de Almeida – Billy
Blanco no Zum-Zum Diversos 1966
ME-35 Samba é Aracy de Almeida Aracy de Almeida
1966
ME-36 A 3ª Dimensão de Lennie Dale Lennie Dale 1966 ME-37 Edu e Bethânia Edu Lobo /
Maria Bethânia 1967
ME-38 Contrastes Odette Lara 1967 ME-39 Grande Parada da Elenco Vol. 1 Diversos 1967 ME-40 Grande Parada da Elenco N° 2 Diversos 1967 ME-41 De Marré de Cy Quarteto em Cy 1967 ME-42 Série Autógrafo de Sucessos – Tamba Trio Tamba Trio 1970 ME-43 MPB-4 MPB-4 1967 ME-44 Manifesto Musical Grupo
Manifesto 1967
ME-45 Sidney Miller Sidney Miller 1967 ME-46 O Melhor do Samba! (Mario Reis, Aracy de
Almeida, Cyro Monteiro e Billy Blanco) Diversos 1967
ME-47 Em Cy Maior Quarteto em Cy 1968 ME-48 Baden Baden Powell 1968 ME-49 Grupo Manifesto N° 2 Grupo
Manifesto 1968
ME-50 MPB-4 MPB-4 1968 ME-51 Brasil, Do Guarani ao Guaraná Sidney Miller 1968 ME-52 MPB-4 MPB-4 1968 ME-54 Egberto Gismonti Egberto
Gismonti 1969
ME-55 Terra à Vista Terra Trio 1969 ME-56 Cynara Pronta Para Consumo Cynara 1969 ME-57 27 Horas de Estúdio Baden Powell 1969 ME-58 Samba-Tropi – Até aí Morreu Neves Wilson das
Neves 1970
ME-59 Big Parada – Formiga e sua Orquestra Formiga 1970 ME-60 Márcia, Vol. 3 Márcia 1970 ME-61 Deixa Estar MPB-4 1970 ME-62 Briamonte Orchestra José Briamonte 1970 ME-63 As músicas de Baden Powell e Paulo César Baden Powell / 1970
225
Pinheiro – Baden Powell e os Cantores da Lapinha
Cantores da Lapinha
ME-64 De Palavra ... Em Palavra ... MPB-4 1971 MEV-1 Chris Connor at the Village Gate Chris Connor 1963 MEV-2 Bossa Nova York Sergio Mendes 1964 MEV-3 Cannonball Adderley e Gil Evans Cannonball
Adderley e Gil Evans
1964
MEV-4 The Astrud Gilberto Album Astrud Gilberto 1965 MEV-5 The Music of Mr. Jobim by Sylvia Telles Sylvia Telles 1966 MEV-6 Antônio Carlos Jobim com Nelson Riddle e
Sua Orquestra Tom Jobim S/D
MEV-7 Jazz Series – Dizzy Gillespie, Gil Fuller and the Monterey Jazz Festival Orchestra
Dizzy Gillespie / Gil Fuller
1965
MEV-8 Bud Shank / Donato / Rosinha de Valença João Donato / Rosinha de
Valença
1966
MEV-9 Surf Board – Conjunto Roberto Menescal Roberto Menescal
1966
MEV-10 Tom Jobim Apresenta Diversos 1966 MEV-11 It Might As Well Be Spring Sylvia Telles 1967 MEV-12 Antônio Carlos Jobim & Sergio Mendes Tom Jobim /
Sergio Mendes 1967
SE 1001 Kaleidoscópio Elenco Diversos S/D SE 1002 Kaleidoscópio N° 2 Diversos S/D SE 1003 Edu Canta Zumbi Edu Lobo 1968 SE 1004 Em Cy Maior Quarteto em Cy S/D SE 1005 Luis Eça, Piano e Cordas – Vol. II Luis Eça 1970 SE 1006 Cantiga de Longe Edu Lobo 1970 SE 1007 Estudos Baden Powell 1971
SE 1008/9 Maria de Buenos Aires Diversos S/D SE 1010 Portal das Maravilhas Rick Ferreira 1977 SE 1011 Norma Canta Mulheres Norma Bengell 1977
S/n ° Vinicius de Morais – Máximo da Bossa Vinicius de Moraes
1967
SRD-M1 O Que É Bossa Nova Diversos 1967
Número total de LP’s identificados: 87
226
Estimativa de catálogo – Gravadora Forma Long Plays (LP)
N° de série Título Intérprete Ano
FM-1 Inútil Paisagem Eumir Deodato 1964 FM-2 Novas Estruturas Luiz Carlos
Vinhas 1964
FM-3 Deus e o Diabo na Terra do Sol (Trilha Sonora)
Sérgio Ricardo 1964
FM-4 Quarteto em Cy Quarteto em Cy 1964 FM-5 Esse Mundo é Meu (Trilha Sonora) Sérgio Ricardo /
Lindolfo Gaya 1964
FM-6 Bossa Três em Forma! Bossa Três 1965 FM-7 Chico Fim-de-noite apresenta Chico Feitosa Chico Feitosa 1965 FM-8 Coisas Moacir Santos 1965 FM-9 Ana Margarida Ana Margarida 1965
FM-10 Som Definitivo Quarteto em Cy e Tamba Trio
1966
FM-11 Forma ‘65 Diversos 1966 FM-12 Liberdade, Liberdade de Flávio Rangel e
Millôr Fernandes – Com Nara Leão, Paulo Autran, Tereza Rachel e Oduvaldo Viana Filho
Diversos 1966
FM-13 Dulce Dulce Nunes 1966 FM-16 Os Afro-sambas de Baden & Vinicius Baden Powell /
Vinicius de Moraes
1966
FM-17 Desenhos Victor Assis Brasil
1966
100 VDL Tempo Feliz Baden Powell / Maurício Einhorn
1966
101 VDL Quinteto Villa-Lobos Quinteto Villa-Lobos
1966
102 VDL A Viagem – Mitchell & Ruff Mitchell / Ruff 1966 103 VDL Rosinha de Valença Ao Vivo Rosinha de
Valença 1966
104 VDL Forma ‘66 Diversos 1967 105 VDL Vinicius – Poesia e Canção Vol. I Vinicius de
Moraes 1966
106 VDL Vinicius – Poesia e Canção Vol. II Vinicius de Moraes
1966
107 VDL O Violão é ... Tapajós Sebastião Tapajós
1968
108 VDL Músicanossa Diversos 1968 VDL 109 O Conjunto de Roberto Menescal Roberto 1969
227
Menescal VDL 110 Samba do Escritor Dulce Nunes 1968 VDL 112 Brasil Ano 2000 (Trilha Sonora) Rogério Duprat 1969 VDL 113 O Avarento – De Moliére com Procópio
Ferreira Procópio Ferreira
1969
VDL 114 Sebastião Tapajós e sua Guitarra Cósmica SebastiãoTapajós 1969 VDL 115 Big Parada – Orquestra Tropical Orquestra
Tropical 1969
VDL 116 Terço O Terço 1970 VDL 117 Agora Ivan Lins 1970 VDL 118 Som Livre Exportação Ivan Lins 1971 VDL 119 Deixa o Trem Seguir Ivan Lins 1971 FE 1019 Som Livre Exportação N° 2 Diversos 1971 FE 1020 Muita Zorra! ou São Coisas Que Glorificam a
Sensibilidade Atual Trio Mocotó 1971
Número total de LP’s identificados: 36
228
Material de imprensa coletado - Correio da Manhã ANTOLOGIA da música brasileira. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 19 jul. 1958. 1º Caderno, p. 13. DANTAS, Carlos. Música de sempre - do Barrôco a Villa-Lobos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 9 mai. 1962. 2º Caderno, p. 1. DO BARROCO a Villa Lobos em 300 minutos. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20 de abr, 1962. 1º Caderno, p. 10. FESTA na música clássica. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 28 ago. 1957. 2º Caderno, p. 3. HUNGRIA, Julio. Da existência. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 11 mai. 1963a. 2º Caderno, p. 2. ______________. RJB Mostra Elenco hoje. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 10 set. 1963b. 2º Caderno, p. 2. IVAN, Mauro. Mario Reis dá show. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 13 jan. 1968. Segundo Caderno, p. 2. ___________. Tom de Sérgio e Tom. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 18 jan. 1968. Segundo Caderno, p. 2. JAFA, Van. Pela noite carioca tudo é show. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 5 jun. 1964. 4º Caderno, p. 3. MAURÍCIO, João. Som definitivo com Quarteto em Cy e o Tamba Trio. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20 mar. 1966a. 4º Caderno, p. 3. _______________. Discos populares. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 13 fev. 1966b. 4º Caderno, p. 3. _______________. Dick Farney & Gaya. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 3 abr. 1966c. 4º Caderno, p. 3. _______________. Música do Brasil em boa forma. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 10 abr. 1966d. 4º Caderno, p. 2. _______________. Baden Powell ao vivo no Teatro Santa Rosa. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 31 jun. 1966e. 4º Caderno, p. 5. MURILO, Cláudio. Drummond e Bandeira em vinilite. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 27 nov. 1955. 5º Caderno, p. 12.
229
O PEQUENO Príncipe. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 10 dez. 1957. 2º Caderno, p. 3. PASSOS, Claribalte. Vozes harmoniosas falam aos corações. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 22 dez. 1957. 5º Caderno, p. 12. _________________. Música evocativa do Brasil. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 11 mai. 1958a. 5º Caderno, p. 9. _________________. Novidades em primeira mão. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 22 jun. 1958b. 5º Caderno, p. 8. ________________. “Canto de amôr à Bahia;” retrato de um talento! Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 3 ago. 1958c. 5º Caderno, p. 9. ________________. Verdadeira apoteose à modinha brasileira. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 4 jan. 1959. 4º Caderno, p. 1. ________________. Acontecimento artístico em LP. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26 jul. 1959. 5º Caderno, p. 7. ________________. Uma nova estrêla. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 25 out. 1964. Cultura, p. 10. PRÊMIO Nacional do Disco. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 20 dez. 1959. 4º Caderno, p. 4. SANDRONI, Cícero. Irineu na Europa. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 30 jan. 1969. 1º Caderno, p. 7. ________________. Vinicius e Fernando Pessoa. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 3 out. 1969. 1º Caderno, p. 7. SILVINHA Telles – “Show” & Sucesso. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26 abr. 1964. Cultura, p. 10. VALSAS de Eduardo Souto. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 26 fev. 1958. 2º Caderno, p. 3. VINICIUS e Baden fazem disco para fugir ao comércio. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 1 set. 1965.1º Caderno, p. 2. - Jornal do Brasil ALOÍSIO de Oliveira afirma ao chegar dos EUA que desta vez ficará no Brasil. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 29 abri. 1973. 1º Caderno, p. 23. ALUÍSIO de Oliveira vai dirigir em Hollywood obra sobre Carmem Miranda. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 13 jul. 1972. 1º Caderno, p. 4.
230
ANDRADE, Moacyr. Um tesouro recuperado. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20 mar. 1997. Caderno B, p. 1. ANTÔNIO, João. Vozes da África. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 9 set. 1966. Caderno B, p. 3. BANDEIRA, Manuel. Poesia em disco. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 27 nov. 1955. 1º Caderno, p. 5. _________________. Discos. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 5 jan. 1958. 1º Caderno, p. 3. BARROS, André Luiz. O homem que 'inventou' a bossa nova. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 1 jan. 1995. Caderno B, p. 10. __________________. Uma morte silenciosa. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 21 fev. 1995. Caderno B, p. 1. __________________. Das ruas do catete a Hollywood. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 21 fev. 1995. Caderno B, p. 2. __________________. Viúva de Aloísio diz que estava 'abalada'. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 22 fev. 1995. Caderno B, p. 7. BRAGA, Rubem. Discos novos. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 6 nov. 1964. Caderno B, p. 3. _____________. Irineu se expande. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 8 jan. 1965. Caderno B, p. 5. CABALLERO, Mara. Entre amigos famosos, a grande festa de Aloysio de Oliveira. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 12 set. 1983. Caderno B, p. 1. CARNEIRO, Luiz Orlando. Os Desenhos de Vítor Assis Brasil. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 28 abr. 1965. Caderno B, p. 2. CARNET. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 13 jun. 1965. Revista de Domingo, p. 2. CENSURA proíbe “Tamandaré” de entrar no “Meu Refrão” e Chico Buarque adia show. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 9 set. 1966. 1° Caderno, p. 15. GARCIA, Irineu. Em Portugal se ouve o Brasil. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 20 jun. 1972. Caderno B, p. 2. HUNGRIA, Julio. Aloísio chega e pode assumir. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 8 abri. 1973. Caderno B, p. 14. IRINEU Garcia – Um homem cordial, servidor das letras. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 4 abr. 1984. Caderno B, p. 1.
231
IVAN, Mauro; PORTELLA, Juvenal. Panorama da bossa nova – Vinícius de Morais (3). Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 28 abr. 1965a. Caderno B, p. 3. _____________________________. Panorama da bossa nova – Aluísio de Oliveira (1). Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 12 mai. 1965b. Caderno B, p. 5. _____________________________. Panorama da bossa nova – Aluísio de Oliveira (2). Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 19 mai. 1965c. Caderno B, p. 5. _____________________________. Panorama da bossa nova – Aluísio de Oliveira (3). Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26 mai. 1965d. Caderno B, p. 5. _____________________________. Panorama da bossa nova – Aluísio de Oliveira (4). Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 2 jun. 1965e. Caderno B, p. 5. _____________________________. Panorama da bossa nova – Aluísio de Oliveira (5). Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 9 jun. 1965f. Caderno B, p. 5. JAIR Amorim, poesia, L. P. Carlos Ribeiro, Irineu Garcia. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 21 fev. 1956. 1º Caderno, p. 8. LEONAM, Carlos. Sérgio Ricardo: a gente tem que ser humilde. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 8 dez. 1962. LUZ, Celina. A poesia e suas razões. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 16 jan. 1971. Caderno B, p. 4. MARIA, Léa. A nova forma de trocar cultura. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26 abr. 1967. Caderno B, p. 3. MASSARANI, Renzo. Ministério da Educação / Diretrizes da Rádio. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 17 set. 1958. Caderno B, p. 2. _________________. Os novos discos. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 4 jun. 1963. Caderno B, p. 2. _________________. Llanto por Ignacio. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 21 jan. 1965. Caderno B, p. 4. _________________. Cinco sonatas brasileiras. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 25 fev. 1966. Caderno B, p. 2. _________________. Discos. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 14 fev. 1967. Caderno B, p. 2. OLIVEIRA, José Carlos. O canto da volta. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 4 mai. 1973. Caderno B, p. 4.
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___________________. Retrato póstumo de Irineu Garcia. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 8 abr. 1984. Caderno B, p. 9. POESIA em discos. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 22 set. 1969. Caderno B, p. 5. QUÁDRIO, Maurício. Importação. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 7 out. 1956. 4º Caderno, p. 2. _________________. O brasileiro sabe ouvir música. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 23 ago. 1957. 1º Caderno, p. 2. _________________. Música brasileira no Brasil e no mundo. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 2 out. 1957. 4º Caderno, p. 2. _________________. Discos populares. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 22 jun. 1958a. 4º Caderno, p. 2. _________________. Garcia, Estrêla e a música brasileira. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 24 ago. 1958b. 1º Caderno, p. 8. _________________. O “Requiem” do padre José Maurício. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 28 dez. 1958c. 1º Caderno, p. 8. _________________. Valsas brasileiras com Arnaldo Estrêla. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 15 fev. 1959a. 1º Caderno, p. 8. _________________. O primeiro suplemento “Festa” de música popular. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 5 abr. 1959b. 1º Caderno, p. 8. _________________. Alberto Nepomuceno em disco. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26 jul. 1959c. 2º Caderno, p. 9. QUARTIN vai gravar música brasileira para emprêsa de Frank Sinatra. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26 mai. 1967. Caderno B, p. 10. RÁDIO Jornal do Brasil lança hoje como cantora Teresa Campos. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 10 set. 1963. 1º Caderno, p. 10. RANGEL, Maria Lucia. Os 60 anos do poeta, ator, cantor, etc. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26 dez. 1974. Caderno B, p. 4. SABINO, Fernando. O sucesso do homem cordial. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 16 set. 1974. Caderno B, p. 4. SÉRGIO PORTO um cronista em disco. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 11 nov. 1968. Caderno B, p. 5. SILVER, Ruth. Festa-discos - Divulgar oralmente a cultura no Brasil. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 12 mai. 1957. Suplemento Dominical, p. 1.
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235
FILHO, Zito Baptista. Doze Valsas de Esquina em LP. O Globo, Rio de Janeiro, 2 dez. 1957. Geral, p. 16. _________________. O Pequeno Príncipe. O Globo, Rio de Janeiro, 2 dez. 1957. Geral, p. 9. _________________. Poesia e Música em Discos “Festa”. O Globo, Rio de Janeiro, 28 abr. 1958a. Geral, p. 2. _________________. Antologia da Música Erudita Brasileira. O Globo, Rio de Janeiro, 28 jul. 1958b. Geral, p. 19. _________________. Antologia da Música Erudita Brasileira (2). O Globo, Rio de Janeiro, 14 ago. 1958c. Geral, p. 12. _________________. “Mestres do Barroco Mineiro”. O Globo, Rio de Janeiro, 18 set. 1958d. Geral, p. 5. _________________. Irineu Garcia, Candidato. O Globo, Rio de Janeiro, 8 out. 1958e. Geral, p. 11. _________________. Valsas Brasileiras. O Globo, Rio de Janeiro, 29 dez. 1958f. Geral, p. 13. _________________. LP de Nepomuceno de Categoria Internacional. O Globo, Rio de Janeiro, 27 jul. 1959. Geral, p. 18. _________________. Do Barroco a Vila-Lôbos. O Globo, Rio de Janeiro, 30 abr. 1962. Geral, p. 11. _________________. “O principal é fazer”. O Globo, Rio de Janeiro, 13 mai. 1963. Geral, p. 15. _________________. “A Salamanca do Jarau de Luís Cosme”. O Globo, Rio de Janeiro, 15 mai. 1963. Geral, p. 7. _________________. Mignone, concêrto e sinfonia. O Globo, Rio de Janeiro, 22 mai. 1963. Geral, p. 10. _________________. Ars Nova. O Globo, Rio de Janeiro, 3 jan. 1967. Geral, p. 5. _________________. Poesia em discos. O Globo, Rio de Janeiro, 18 nov. 1968. Geral, p. 11. _________________. Manuel Bandeira - In memoriam. O Globo, Rio de Janeiro, 6 fev. 1969. Geral, p. 6.
236
_________________. Arquivo da palavra literária. O Globo, Rio de Janeiro, 16 set. 1969. Geral, p. 6. _________________. A Espanha trágica de Lorca. O Globo, Rio de Janeiro, 6 nov. 1969. Geral, p. 6. _________________. A lira infrene de Vinicius. O Globo, Rio de Janeiro, 22 nov. 1969. Geral, p. 4. _________________. Fernando Pessoa. O Globo, Rio de Janeiro, 27 nov. 1969. Geral, p. 6. _________________. Um Kantor na Paulicéia. O Globo, Rio de Janeiro, 13 jun. 1970. Geral, p. 3. _________________. Em 3ª edição os barrocos mineiros. O Globo, Rio de Janeiro, 10 abr. 1977. Domingo, p. 3. _________________. Villa-Lobos e Nepomuceno marcam a volta da Festa. O Globo, Rio de Janeiro, 27 set. 1981. Domingo, p. 6. _________________. Adeus, Irineu Garcia. O Globo, Rio de Janeiro, 5 abr. 1984. Cultura, p. 31. JOÃO CABRAL de Melo Neto por ele mesmo. O Globo, Rio de Janeiro, 22 out. 1969. Geral, p. 4. LESSA, Elsie. Canção do Amor Demais. O Globo, Rio de Janeiro, 5 ago. 1957. Geral, p. 1. MIGNONE Seresteiro em 12 “Valsas de Esquina”. O Globo, Rio de Janeiro, 24 out. 1957. Geral, p. 7. QUER direito autoral de Obra de Domínio Público. O Globo, Rio de Janeiro, 23 out. 1958. Geral, p. 3. RESENHA sobre Banana da Terra. O Globo. Rio de Janeiro, 17 fev. 1939. Geral, p. 1. - O Jornal ANDRADE, Ayres de. Antologia da música erudita brasileira (resenha). O Jornal, Rio de Janeiro, 5 nov. 1958. p. 5. CABRAL, Sérgio. Lúcio Rangel e outras histórias. O Jornal, Rio de Janeiro, 29 dez. 1964. p. 9. ECO, Mister. Leitura de uma peça. O Jornal, Rio de Janeiro, 30 mar. 1963. p. 8. __________. Elenco & outras. O Jornal, Rio de Janeiro, 15 out. 1963. p. 8.
237
__________. O grande artista é Aloísio. O Jornal, Rio de Janeiro, 28 abr. 1964. p. 7. __________. Quatro discos e uma festa. O Jornal, Rio de Janeiro, 30 out. 1964. p. 6. __________. Rio noite e dia. O Jornal, Rio de Janeiro, 5 out. 1965. p. 8. LAWDOVSKY, Rufus. LP Elenco de Maysa. O Jornal, Rio de Janeiro, 12 abr. 1964. p. 8. VASCONCELOS, Ary. Mestres do barroco mineiro (resenha). O Jornal, Rio de Janeiro, 19 out. 1958. p. 6. __________________. Long-playings em desfile. O Jornal, Rio de Janeiro, 4 abr. 1959. p. 2. __________________. Prelúdio de Amor (resenha). O Jornal, Rio de Janeiro, 7 ago. 1959. p. 2. __________________. Festa dentro da noite (resenha). O Jornal, Rio de Janeiro, 9 ago. 1959. p. 2. __________________. Por toda minha vida (resenha). O Jornal, Rio de Janeiro, 14 jul. 1959. p. 2. - Outros periódicos ACADE tem nova sede. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 28 nov. 1956, p. 5. ALBERTO, Carlos. Preto no Branco. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 27 set. 1963, p. 9. BRACONNOT, L. P. Resenha do disco It Might As Well Be Spring de Silvia Telles. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 16 jan. 1967, Segundo Caderno, p. 2. ________________. Resenha do disco Tom Jobim Apresenta. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 20 jan. 1967, Segundo Caderno, p. 2. ________________. Resenha do disco Edu Canta Zumbi. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 29 abr. 1968, Segundo Caderno, p. 2. CARVALHO, Thor. A etiqueta “Elenco” quem faz é o próprio. Última Hora, Rio de Janeiro, 7 set. 1963, p. 2. ECO, Mister. O melhor ‘Pocket-show’. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 20 ago. 1964, DC, p. 6. IRINEU JOSÉ. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 13 nov. 1956. p. 6.
238
JOANOU, Walcy. Gravadora nasce para lançar uma “nova escola de música”. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 24 nov. 1964, Segundo Caderno, p. 9. LUIZ, Fernando. A importância das novas gravadoras. Revista do Rádio, Rio de Janeiro, n. 804. 1965. _____________. Resenha sobre o LP Quarteto em Cy. Revista do Rádio, Rio de Janeiro, n. 808. 1965. _____________. Resenha sobre o LP Inútil Paisagem. Revista do Rádio, Rio de Janeiro, n. 808. 1965. MÚSICA. Tribuna da Imprensa, Rio de Janeiro, 14 jun. 1966. RÊGO, Alberto. Jorge Amado e Caymmi em LP. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 30 jul. 1958. p. 6. ____________. Música erudita com estrêla. Diário Carioca, Rio de Janeiro, 4 nov. 1958. p. 7. VALENTINI, Rodolpho. Forma apresenta o Quarteto em Cy. Folha de São Paulo, São Paulo, 14 fev. 1965a. Folha Ilustrada, p. 4. ___________________. LP Reúne as maiores composições de Jobim. Folha de São Paulo, São Paulo, 14 fev. 1965b. Folha Ilustrada, p. 4.
239
Lista dos discos de maior sucesso no mercado segundo a Revista do Rádio
A transcrição a seguir foi realizada com o intuito de complementar as bases de
dados disponíveis sobre o mercado fonográfico nas décadas de 1950 e 1960, dando
sequência às listagens apresentadas por Machado (2016: 241-301). As categorias
escolhidas para integrar as tabelas apresentadas apresentam as mesmas informações
indicadas nas publicações da Revista do Rádio. Segundo Machado (idem), as listagens
começaram a ser publicadas na edição número 15, publicada em maio de 1949 e
continuou sendo publicada até os seus últimos números. Conforma aponta o próprio
corpo editorial do periódico, as listagens eram realizadas mediante pesquisa realizada
pela revista junto às lojas de discos e radialistas.
Conforme aponta Machado (idem), em 1949, a revista lançava edições mensais,
de modo que sua sondagem dos discos mais vendidos contemplava o período de um
mês. A partir de 1950, o periódico se tornou semanal, e suas informações de vendagem
de disco passam a se referir a esse intervalo de tempo. Com o intuito de condensar as
informações e garantir a coerência dos dados catalogados por manter o mesmo método
de coleção das informações empregado por Machado, foi selecionado para transcrição
um exemplar de cada mês (em geral, o primeiro; quando não disponível ou ilegível, o
segundo ou terceiro). Apesar de este método não cobrir a totalidade das informações
publicadas pela revista e dos métodos aplicados nas pesquisas não terem sido
pormenorizados pelo corpo editorial, as transcrições viabilizam, no entanto, uma
avaliação dos discos de maior repercussão comercial em um amplo recorte temporal
(incluindo as listas catalogadas por Machado, de 1949 até 1964) e formam uma base de
dados alternativa, oportuna quando se considera a escassez de informações dispostas
sobre o mercado do período.
240
1960
n. 537, 2 jan. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 A noite de meu
bem Dolores Duran Dolores Duran Samba-
canção Copacabana
02 E daí Sônia Dutra Sônia Dutra Samba Victor 03 Oh, Carrol ---- Neil Sedaka Cha cha rock Victor 04 Personality ---- Don Taylor Balada RGE 05 Hino ao amor ---- Wilma
Bentivegna Balada Odeon
São Paulo 01 Oh, Carrol ---- Neil Sedaka Cha cha rock Victor 02 A noite de meu
bem Dolores Duran Dolores Duran Samba-
canção Copacabana
03 Hino ao amor ---- Wilma Bentivegna
Balada Odeon
04 E daí Sônia Dutra Sônia Dutra Samba Victor 05 Cinzas do
passado Cláudio de
Barros Cláudio de
Barros Tango Chantecler
n. 542, 6 fev. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 E daí Sônia Dutra Sônia Dutra Samba Victor 02 Hino ao amor ---- Wilma
Bentivegna Balada Odeon
03 A noite de meu bem
Dolores Duran Dolores Duran Samba-canção
Copacabana
04 Cinzas do passado
Cláudio de Barros Cláudio de Barros
Tango Chantecler
05 O milagre da volta
A. Cavalcanti, Fernando César
João Dias Bolero Colúmbia
São Paulo 01 La violetera José Padilla Ângela Maria Balada(filme) Copacabana 02 Arrependimento Dolores Duran,
Fernando César Ellen de Lima Samba-
canção Colúmbia
03 Lua azul Patrick Welch, Michael Merlo
Léo Romano Rock Odeon
04 Lonely Boy Paul Anka Paul Anka Balada Polydor 05 Quem é? Oldemar
Magalhães, Osmar Navarro
Hebe Camargo Rock-balada Odeon
241
n. 547, 6 mar. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Me dá um
dinheiro aí Ivan Ferrira, Homero
Ferreira Moacyr Franco Marcha Copacabana
02 Ó crides João de Barro Ronald Golias Marcha Continental 03 Arruma a
trouxa ---- Zila Fonseca Samba Colúmbia
04 O samba é bom assim
Norival Reis, Hélio Nascimento
Jamelão Samba Continental
05 Naquela base
João Donato Bill Farr Bossa Nova Continental
São Paulo 01 Me dá um
dinheiro aí ---- Moacyr Franco Marcha Copacabana
02 Ó crides João de Barro Ronald Golias Marcha Continental 03 E daí? Sônia Dutra Isaura Garcia Samba Odeon 04 Oh Carrol Neil Sedaka, Howard
Greenfield Élcio Álvares e
Orquestra Balada Chantecler
05 Quem é? Oldemar Magalhães, Osmar Navarro
Hebe Camargo Rock-balada Odeon
n. 551, 9 abr. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Pagando o pato Luiz Vieira Luis Vanderlei Xote Chantecler 02 Olhos castanhos Alves Coelho
Filho Francisco José Balada Sinter-
Philips 03 Oh, Carrol Neil Sedaka,
Howard Greenfield Neil Sedaka Cha cha rock Victor
04 Se acaso você chegasse
Lupicínio Rodrigues
Elza Soares Samba Odeon
05 Argumento Adelino Moreira Nélson Gonçalves
Samba-canção
Victor
São Paulo 01 Se acaso você
chegasse Lupicínio Rodrigues
Elza Soares Samba Odeon
02 Put your head on my shoulder
Paul Anka Paul Anka Rock-Balada Polydor
03 Tu és o meu castigo
Jacira Costa Agnado Rayol Bolero Copacabana
04 Meditação Tom Jobim, Newton M.
Isaura Garcia Bossa Nova Odeon
05 Menina Moça Luis Antônia Tito Madi Bossa Nova Colúmbia
242
n. 555, 3 mai. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Menina
Moça Luis Antônia Tito Madi Bossa Nova Colúmbia
02 Oração de amor
Lourival Faissal, Arcênio de Carvalho
Luis Cláudio Balada Victor
03 Alguém me disse
Evaldo Gouveia, Jair Amorim
Anísio Silva Bolero Odeon
04 Chore Comigo
Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
05 Marina Rocco Granata Levy Eversong Canção RGE São Paulo
01 Somente tu Luis de Castro José Orlando Tango Chantecler 02 Banho de lua Franco Migliacci, e.o. Celly Campelo Rock Odeon 03 Canção do
desejo Jair Amorim, Georges
Moran Ângela Maria Samba Colúmbia
04 Chiclete com banana
Jackson do Pandeiro Jackson do Pandeiro
Samba Colúmbia
05 Morrer por ti Charles Aznavour Osvaldo Rodrigues
Bolero Continental
n. 559, 4 jun. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Chore
Comigo Adelino Moreira Nelson
Gonçalves Samba-canção
Victor
02 Menina Moça Luis Antônia Tito Madi Bossa Nova Colúmbia 03 Alguém me
disse Evaldo Gouveia, Jair
Amorim Anísio Silva Bolero Odeon
04 Marina Rocco Granata Levy Eversong Canção RGE 05 Oração de
amor Lourival Faissal,
Arcênio de Carvalho Luis Cláudio Balada Victor
São Paulo 01 Somente tu Luis de Castro José Orlando Tango Chantecler 02 Banho de lua Franco Migliacci, e.o. Celly Campelo Rock Odeon 03 Chore
Comigo Adelino Moreira Nelson
Gonçalves Samba-canção
Victor
04 Ironia Adelino Moreira Ângela Maria Samba-canção
Copacabana
05 Um amor igual ao nosso
Emerson Borel, Nelson Novaes
Nélson Novaes ---- Todamérica
n. 563, 2 jul. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Banho de lua Franco Migliacci,
e.o. Celly Campelo Rock Odeon
02 Chore Comigo Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
03 Sua majestade, o neném
Klécius Caldas, Armando Cavalcanti
Trio Nagô Rock Victor
243
04 Alguém me disse
Evaldo Gouveia, Jair Amorim
Anísio Silva Bolero Odeon
05 Que me importa
Diogo Mulero, Leonel Cruz
Orlando Dias Bolero Odeon
São Paulo 01 Banho de lua Franco Migliacci,
e.o. Celly Campelo Rock Odeon
02 Chore Comigo Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
03 Somente tu Luis de Castro José Orlando Tango Chantecler 04 Marina Rocco Granata Cauby Peixoto Canção Colúmbia 05 Romantica Neil Sedaka, Howard
Greenfield Tony Campello Rock Odeon
n. 568, 6 ago. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Serenata
Suburbana Capiba Dalva de
Andrade Valsa Odeon
02 Chore Comigo Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
03 Que me importa Diogo Mulero, Leonel Cruz
Orlando Dias Bolero Odeon
04 Banho de lua Franco Migliacci, e.o.
Celly Campelo Rock Odeon
05 Mineiro sabido Luiz Wanderley, Elias Soares
Luis Wanderley
---- Chantecler
São Paulo 01 Chore Comigo Adelino Moreira Nelson
Gonçalves Samba-canção
Victor
02 Alguém me disse
Evaldo Gouveia, Jair Amorim
Anísio Silva Bolero Odeon
03 Tango triste Osvaldo de Souza, Haroldo José
Haroldo José Tango Chantecler
04 Banho enxuto P. de Filippo, F. Migliacci
Zé Fidelis Rock Odeon
05 Outro amor por toda a vida
Fernando César Ângela Maria Balada-rock Copacabana
n. 573, 10 set. 1960 Rio de Janeiro
No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Serenata
Suburbana Capiba Dalva de
Andrade Valsa Odeon
02 Negue Adelino Moreira, Enzo de Almeida
Passos
Carlos Augusto Samba-canção
Odeon
03 Meu dilema Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
04 Não voltarei a amar
Johny Ray Johny Ray Balada(filme) Colúmbia
05 Conversa ao B. Pipper, I. Jattes Doris Day Balada(filme) Colúmbia
244
telefone São Paulo
01 Noite cheia de estrelas
Cândido das Neves "Índio"
Poly Bolero Chantecler
02 Meu dilema Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
03 Não tenho namorado
Gladys Marie Caballero, Fred
Jorge
Celly Campello
Rock Odeon
04 Veraneio ---- Percy Faith ---- Colúmbia 05 Se aquela noite
não tivesse fim Nelson Ferreira, Ziul
Matos Paulo Molin Balada-Rock Mocambo
n. 577, 8 out. 1960 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Esmeralda Filadelfo Nunes,
Fernando Barreto Carlos José Samba-canção Continental
02 Estou pensando em ti
Raul Sampaio, Benil Santos
Anísio Silva Bolero Odeon
03 Adam and Eve Paul Anka Paul Anka Rock Polydor 04 Negue Adelino Moreira,
Enzo de Almeida Passos
Carlos Augusto
Samba-canção Odeon
05 Serenata Suburbana
Capiba Dalva de Andrade
Valsa Odeon
06 I’ll never fall in Love again
---- Johnnie Ray Balada Colúmbia
07 Mulher de trinta
Luis Antônio Miltinho Samba Drink
08 Minha serás eternamente
Arcênio de Carvalho, Lourival
Faissal
Orlando Dias Valsa-canção Odeon
09 La violetera José Padilla Ângela Maria Balada(filme) Copacabana 10 O amor e a rosa Ayres da Costa
Pessoa, Antônio Maria
Elizete Cardoso
Samba/Bossa Nova
Copacabana
n. 581, 6 nov. 1960 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Negue Adelino Moreira,
Enzo de Almeida Passos
Carlos Augusto Samba-canção
Odeon
02 Esmeralda Filadelfo Nunes, Fernando Barreto
Carlos José Samba-canção
Continental
03 O sole mio Eduardo di Capua Elvis Presley Rock RCA-Victor
04 Mulher de trinta
Luis Antônio Miltinho Samba Drink
05 Serenata Suburbana
Capiba Dalva de Andrade
Valsa Odeon
06 Adam and Eve Paul Anka Paul Anka Rock Polydor
245
07 Conversa ao telefone
B. Pipper, I. Jattes Doris Day Balada(filme) Colúmbia
08 Minha serás eternamente
Arcênio de Carvalho, Lourival Faissal
Orlando Dias Valsa-canção Odeon
09 Devaneio Djalma Ferreira, Luis Antônio
Miltinho Balada Drink
10 Ninguém é de ninguém
Umberto Silva, Toso Gomes, e.o.
Cauby Peixoto Bolero RCA-Victor
n. 585, 3 dez. 1960 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 O sole mio Eduardo di Capua Elvis Presley Rock RCA-
Victor 02 Mulher de
trinta Luis Antônio Miltinho Samba Sideral
03 Broto legal H. Earnhart/Vrs. Renato Corte Real
Sérgio Murilo Rock Colúmbia
04 Esmeralda Filadelfo Nunes, Fernando Barreto
Carlos José Samba-canção
Continental
05 Negue Adelino Moreira, Enzo de Almeida
Passos
Carlos Augusto Samba-canção
Odeon
06 Adam and Eve Paul Anka Paul Anka Rock Polydor 07 Serenata
Suburbana Capiba Dalva de
Andrade Valsa Odeon
08 Devolvi Adelino Moreira Núbia Lafayette
Samba-canção
RCA-Victor
09 Mambo da Cantareira
Barbosa da Silva, Eloide Warthon
Gordurinha Samba-mambo
Copacabana
10 Minha serás eternamente
Arcênio de Carvalho, Lourival Faissal
Orlando Dias Valsa-canção Odeon
246
1961
n. 590, 7 jan. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Ninguém é de
ninguém Umberto Silva, Toso
Gomes, e.o. Cauby Peixoto Bolero RCA-
Victor 02 My home town Paul Anka Paul Anka Rock Polydor 03 Sole mio Eduardo di Capua Elvis Presley Rock RCA-
Victor 04 Doidivana Adelino Moreira Nélson
Gonçalves Samba-canção
RCA-Victor
05 Alma de boêmio
Tião Carreiro, Benedito Seviero
José Orlando Tango Chantecler
06 Mulher de trinta
Luis Antônio Miltinho Samba Sideral
07 Devolvi Adelino Moreira Núbia Lafayette
Samba-canção
RCA-Victor
08 Beija-me depois
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Anísio Silva Bolero Odeon
09 Pelo bem que te quero
Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
10 Zé Bonitinho Fernando César, Britinho
Jorge Lôredo Rock Colúmbia
n. 594, 4 fev. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Pelo bem que
te quero Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
02 Alma de boêmio
Tião Carreiro, Benedito Seviero
José Orlando Tango Chantecler
03 Doidivana Adelino Moreira Nélson Gonçalves
Samba-canção
RCA-Victor
04 O bom menino Altamiro Carrilho, Irany de Oliveira
Carequinha Canção Copacabana
05 Run sanson run
Neil Sedaka, Howard Greenfield
Neil Sedaka Rock RCA-Victor
06 Ninguém é de ninguém
Umberto Silva, Toso Gomes, e.o.
Cauby Peixoto Bolero RCA-Victor
07 Beija-me depois
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Anísio Silva Bolero Odeon
08 O sole mio Eduardo di Capua Elvis Presley Rock RCA-Victor
09 My home town
Paul Anka Paul Anka Rock Polydor
10 Mulher de trinta
Luis Antônio Miltinho Samba Sideral
247
n. 598, 4 mar. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Marcha do
pintinho Hilton Simões,
Alventino Cavalcanti Emilinha
Borba Marcha Colúmbia
02 Quero morrer no carnaval
Luis Antônio, Eurico Campos
Linda Batista Samba RCA-Victor
03 De lanterna na mão
Elzo Augusto, José Saccomani, e.o.
Gilberto Alves Samba Copacabana
04 Não sou de nada
Waldir Finotti, Benedito Reis
Fernando Costa
Marcha Otiger
05 A lua é dos namorado
Armando Cavalcanti, Klécius Caldas
Ângela Maria Marcha Continental
06 A sogra vem aí Haroldo Lobo, Milton de Oliveira
Blecaute Marcha Continental
07 Eu já te vi Aôr Ribeiro, Mariano Nogueira
Rogéria ---- Sideral
08 Não emplaca 61 Monsueto, Ari Monteiro
Miltinho Samba Sideral
09 Marcha da molecagem
Sebastião Nunes, Luiz Wanderley
Luis Vanderlei Marcha Sideral
10 Abaixo de deus Jorge Veiga, Sebastião Mota
Jorge Veiga ---- Copacabana
n. 602, 4 abr. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Pelo bem que
te quero Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
02 Perdão para dois
Alfredo Corleto, Diogo Mulero
Cauby Peixoto Balada RCA-Victor
03 Palhaçada Luis Reis, Haroldo Barbosa
Dóris Monteiro Samba-Jazz Philips
04 Poema do adeus
Luiz Antônio Miltinho Samba-canção
Sideral
05 Boato João Roberto Kelly Elza Soares Samba Odeon 06 My home
town Paul Anka Paul Anka Rock Polydor
07 Queixas Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
RCA-Victor
08 Run sanson run
Neil Sedaka, Howard Greenfield
Neil Sedaka Rock RCA-Victor
09 No domingo não
Manos Hadjidakis, Vrs. Billy Towne
Hebe Camargo Bolero Odeon
10 Chega José Messias Carlos Augusto Bolero Odeon
n. 607, 6 mai. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Palhaçada Luis Reis, Haroldo
Barbosa Dóris Monteiro Samba-Jazz Philips
02 Boato João Roberto Kelly Elza Soares Samba Odeon 03 Solidão Adelino Moreira Núbia Lafayette Samba-
canção RCA
Camden 04 Ser só Fernando César, Ted Dalva de Balada Odeon
248
Moreno Andrade 05 Pepe Daniel Lemaitre, Vrs.
A. Santana Ângela Maria Salsa Continental
06 My home town
Paul Anka Paul Anka Rock Polydor
07 Poema do adeus
Luiz Antônio Miltinho Samba-canção
Sideral
08 No domingo não
Manos Hadjidakis, Vrs. Billy Towne
Hebe Camargo Bolero Odeon
09 Perdão para dois
Alfredo Corleto, Diogo Mulero
Cauby Peixoto Balada Victor
10 Look for a star
---- Garry Miles Rock Liberty
n. 611, 3 jun. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Look for a
star ---- Garry Miles Rock Liberty
02 Palhaçada Luis Reis, Haroldo Barbosa
Dóris Monteiro Samba-Jazz Philips
03 Torna a sorriento
Giambattista, Ernesto de Curtis
Elvis Presley Rock RCA-Victor
04 A noiva Vrs. Fred Jorge, Joaquim Prieto
Ângela Maria Rock-Balada Continental
05 Solidão Adelino Moreira Núbia Lafayette
Samba-canção
RCA Camden
06 Ser só Fernando César, Ted Moreno
Dalva de Andrade
Balada Odeon
07 Boato João Roberto Kelly Elza Soares Samba Odeon 08 Flor do meu
bairro Adelino Moreira Nelson
Gonçalves Samba-canção
RCA-Victor
09 No domingo não
Manos Hadjidakis, Vrs. Billy Towne
Hebe Camargo Bolero Odeon
10 Perdão para dois
Alfredo Corleto, Diogo Mulero
Cauby Peixoto Balada RCA-Victor
n. 616, 8 jul. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Coração de
luto Teixeirinha Teixeirinha Sertanejo Chantecler
02 A noiva Vrs. Fred Jorge, Joaquim Prieto
Ângela Maria Rock-Balada Continental
03 Ave Maria Vicente Paiva, Jaime Redondo
Dalva de Oliveira
Samba-canção
Odeon
04 Flor do meu bairro
Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
05 Solidão Adelino Moreira Núbia Lafayette
Samba-canção
RCA Camden
06 Agora Augusta de Oliveira, Antônio Soares
Alcides Gerardi Bolero Colúmbia
07 Rock do ratinho
Ciro de Souza Carequinha Rock Copacabana
249
08 Ser só Fernando César, Ted Moreno
Dalva de Andrade
Balada Odeon
09 Palhaçada Luis Reis, Haroldo Barbosa
Dóris Monteiro Samba-Jazz Philips
10 Look for a star
---- Garry Miles Rock Liberty
n. 620, 5 ago. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Ansiedad Jose Enrique Sarabia Nat King Cole Guarânia Capitol 02 Blue moon Richard Rodgers,
Lorenz Hart The Marcels Rock Col-Pix
03 Abandonado Roy Orbison, Joe Melson
Sérgio Murilo Rock-Balada Colúmbia
04 Olga Adilson Ramos, Armelindo Leandro
Os Cometas Rock-Balada Sideral
05 My love for you
---- Johny Mathis Rock-Balada Colúmbia
06 Agora Augusta de Oliveira, Antônio Soares
Alcides Gerardi
Bolero Colúmbia
07 Me leva pro céu
Fernando Costa, Rossini Pinto
Emilinha Borba
Samba Colúmbia
08 Nossos momentos
Luis Reis, Haroldo Barbosa
Elizeth Cardoso
Bolero Copacabana
09 Onde estarás Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Anísio Silva Bolero Odeon
10 Coração de luto
Teixeirinha Teixeirinha Sertanejo Chantecler
n. 624, 2 set. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Bat Masterson Bart Corwin, Havens
Wray Waldir
Azevedo Canção Continental
02 Onde estarás Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Anísio Silva Bolero Odeon
03 Olga Adilson Ramos, Armelindo Leandro
Os Cometas Rock-Balada Sideral
04 Blue moon Richard Rodgers, Lorenz Hart
The Marcels Rock Col-Pix
05 Tenho ciúme de tudo
Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
06 Analfabeta em amor
Santos Garcia Éllen de Lima Samba Victor
07 Nossos momentos
Luis Reis, Haroldo Barbosa
Elizeth Cardoso
Bolero Copacabana
08 Per omnia saecula
Miguel Gustavo Carminha Samba Copacabana
09 Agora Augusta de Oliveira, Antônio Soares
Alcides Gerardi
Bolero Colúmbia
10 Ansiedad Jose Enrique Sarabia Nat King Cole Guarânia Capitol
250
n. 629, 7 out. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Tenho ciúme
de tudo Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
02 Bat Masterson Bart Corwin, Havens Wray
Carlos Gonzaga Canção Victor
03 Louco por você
Paul Vance, Lee Pockriss, e.o.
Roberto Carlos Rock-Balada Colúmbia
04 Faz-me rir Francisco Yoni, Edmundo Arias
Edith Veiga Bolero Chantecler
05 Onde estarás Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Anísio Silva Bolero Odeon
06 Aliança Getúlio Macedo Fernando Barreto
Bolero Victor
07 G. I. Blues Sid Tepper, Roy C. Bennett
Elvis Presley Rock Victor
08 Corinna, Corinna
Parish, Chapman, Williams
Demétrius Rock-Balada Continental
09 Borrasca Adelino Moreira Ângela Maria Bolero Continental 10 Blue moon Richard Rodgers,
Lorenz Hart The Marcels Rock Col-Pix
n. 633, 4 nov. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Faz-me rir Francisco Yoni,
Edmundo Arias Edith Veiga Bolero Chantecler
02 Bat Masterson Bart Corwin, Havens Wray
Waldir Azevedo Canção Continental
03 Louco por você
Paul Vance, Lee Pockriss, e.o.
Roberto Carlos Rock-Balada Colúmbia
04 Tenho ciúme de tudo
Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
05 Maria Chiquinha
Geysa Bôscoli, Guilherme Figueiredo
Evaldo Gouveia, Sônia Mamede
Rock-Balada RGE
06 Só vou de mulher
Luis Reis, Haroldo Barbosa
Miltinho Samba RGE
07 Corinna, Corinna
Parish, Chapman, Williams
Demétrius Rock-Balada Continental
08 Greenfields Terry Gilkyson, Richard Dehr, e.o.
Nilo Amaro e os cantores do Ébano
Balada Odeon
09 Não deixe a peteca cair
Billy Blanco Trio Irakitan --- Odeon
10 Serenata Adpt. René Bittencourt,
Schubert
Ângela Maria Rock-Balada Continental
251
n. 637, 2 dez. 1961 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Tu sabes Joaquim Taborda Martha
Mendonça Bolero Chantecler
02 Faz-me rir Francisco Yoni, Edmundo Arias
Edith Veiga Bolero Chantecler
03 Deixa andar Jujuba Elizeth Cardoso
Samba Copacabana
04 Seria tão diferente
Adelino Moreira, Tonio Luna
Núbia Lafayette
Samba-canção Camden
05 Castiguei Jorge Costa, Venâncio
Altamiro Carrilho
Marcha Copacabana
06 Bat Masterson
Bart Corwin, Havens Wray
Carlos Gonzaga
Canção Victor
07 Alô Marilu Vrs. Ramalho Neto, Gene Pitney
Francisco Carlos
Cha cha cha-Rock
Victor
08 Tenho ciúme de tudo
Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
09 Falta de sorte José Messias Leo Vaz Samba Victor 10 Juntinhos é
melhor Fernando Barreto,
Fernando Costa, e.o. Emilinha Borba Bolero Colúmbia
252
1962
n. 642, 6 jan. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Rancho das
flores J. S. Bach - Adpt.
Vinicius de Moraes Banda do Corpo de Bombeiros
Marcha Odeon
02 Fica comigo esta noite
Adelino Moreira, Nelson Gonçalves
Nelson Gonçalves Samba-canção
Victor
03 Tu sabes Joaquim Taborda Martha Mendonça Bolero Chantecler 04 Faz-me rir Francisco Yoni,
Edmundo Arias Edith Veiga Bolero Chantecler
05 Seria tão diferente
Adelino Moreira, Tonio Luna
Núbia Lafayette Samba-canção
Camden
06 Minhas namoradas
Paulo Borges, Otto Borges
Cauby Peixoto ---- Victor
07 Castiguei Jorge Costa, Venâncio
Altamiro Carrilho Marcha Copacabana
08 Deixa andar Jujuba Elizeth Cardoso Samba Copacabana 09 Juntinhos é
melhor Fernando Barreto, Fernando Costa,
e.o.
Emilinha Borba Bolero Colúmbia
10 Bat Masterson
Bart Corwin, Havens Wray
Carlos Gonzaga Canção Victor
n. 646, 3 fev. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Tu sabes Joaquim Taborda Martha
Mendonça Bolero Chantecler
02 De quem estás enamorado?
Rafael Ramirez, Vrs. Alba Prado
Edith Veiga Bolero Chantecler
03 Escândalo Vrs. Teixeira Filho, Rubén
Fuentes
Cauby Peixoto Bolero Victor
04 Domingo de Sol
Rutinaldo, Vicente Amar
Sérgio Murilo Rock Colúmbia
05 Fica comigo esta noite
Adelino Moreira, Nelson Gonçalves
Nelson Gonçalves
Samba-canção Victor
06 Faz-me rir Francisco Yoni, Edmundo Arias
Edith Veiga Bolero Chantecler
07 Rancho das flores
J. S. Bach - Adp. Vinicius de
Moraes
Banda do Corpo de Bombeiros
Marcha Odeon
08 Menino legal Rutinaldo, Vicente Amar
Carequinha Jazz New Orleans
Copacabana
09 Borrasca Adelino Moreira Ângela Maria Bolero Continental 10 Juntinhos é
melhor Fernando Barreto, Fernando Costa,
e.o.
Emilinha Borba Bolero Colúmbia
253
n. 650, 3 mar. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Fica comigo
esta noite Adelino Moreira, Nelson Gonçalves
Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
02 Palavras de amor
Paulo Borges Alcides Gerardi
Bolero Colúmbia
03 Quem eu quero não me quer
Raul Sampaio, Ivo Santos
Raul Sampaio Bolero RGE
04 Tu sabes Joaquim Taborda Martha Mendonça
Bolero Chantecler
05 Eu já fiz tudo Romeo Nunes, Almeida Serra
Anísio Silva Bolero Odeon
06 Escândalo Vrs. Teixeira Filho, Rubén Fuentes
Cauby Peixoto Bolero Victor
07 Castiguei Jorge Costa, Venâncio
Altamiro Carrilho
Marcha Copacabana
08 Juntinhos é melhor
Fernando Barreto, Fernando Costa, e.o.
Emilinha Borba
Bolero Colúmbia
09 Não me perguntes
Adelino Moreira Ângela Maria Samba-canção
Victor
10 Faz-me rir Francisco Yoni, Edmundo Arias
Edith Veiga Bolero Chantecler
n. 655, 7 abr. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Poema Fernando Dias Renato
Guimarães Bolero Chantecler
02 Quem eu quero não me quer
Raul Sampaio, Ivo Santos
Raul Sampaio Bolero RGE
03 Palavras de amor Paulo Borges Alcides Gerardi Bolero Colúmbia 04 Meu nome é
ninguém Haroldo Barbosa,
Luis Reis Miltinho Samba-
canção RGE
05 Eu já fiz tudo Romeo Nunes, Almeida Serra
Anísio Silva Bolero Odeon
06 Não me perguntes
Adelino Moreira Ângela Maria Samba-canção
Victor
07 Lembranças C. Martinez, Vrs. Serafim Costa
Carlos José Bolero Continental
08 Las secretarias Pepe Luis Ruy Rey --- Continental 09 Escândalo Vrs. Teixeira Filho,
Rubén Fuentes Cauby Peixoto Bolero Victor
10 Fica comigo esta noite
Adelino Moreira, Nelson Gonçalves
Nelson Gonçalves
Samba-canção
Victor
n. 659, 5 mai. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Amor Antenógenes
Silva, Ernâni Campos
Rinaldo Calheiros e
Silvana
Tango Copacabana
02 Ele é engraxate Luis Antônio José Leão Samba Continental 03 Poema Fernando Dias Renato
Guimarães Bolero Chantecler
254
04 Dois amores Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção Victor
05 Garota solitária Adelino Moreira Ângela Maria Bolero Victor 06 Lembranças C. Martinez, Vrs.
Serafim Costa Carlos José Bolero Continental
07 Ninguém gostou ...
Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
08 Palavras de amor
Paulo Borges Alcides Gerardi Bolero Colúmbia
09 Quem eu quero não me quer
Raul Sampaio, Ivo Santos
Raul Sampaio Bolero RGE
10 Amor em Cha-cha-cha
Fernando Costa, Rossini Pinto
Fernando Costa Cha-cha-cha Rock
Continental
n. 663, 2 jun. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Garota
solitária Adelino Moreira Ângela Maria Bolero Victor
02 Poema Fernando Dias Renato Guimarães
Bolero Chantecler
03 Lembranças C. Martinez, Vrs. Serafim Costa
Carlos José Bolero Continental
04 Amor Antenógenes Silva, Ernâni
Campos
Rinaldo Calheiros e Silvana
Tango Copacabana
05 Filho bom Adelino Moreira Luiz de Carvalho Baião RCA-Victor
06 Dois amores Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Samba-canção RCA-Victor
07 Serenata do assobiador
Martin Böttcher, Miguel Gustavo
Ângela Maria Canção RCA-Victor
08 Amor em Cha-cha-cha
Fernando Costa, Rossini Pinto
Fernando Costa Cha-cha-cha Rock
Continental
09 Amor em serenata
Raul Sampaio, Ivo Santos
Carlos Nobre Samba-canção RCA-Victor
10 Ninguém gostou ...
Waldir Machado Orlando Dias Bolero Odeon
n. 668, 7 jul. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Malena Rossini Pinto,
Fernando Costa Roberto Carlos Rock-Balada Colúmbia
02 Poema Fernando Dias Renato Guimarães Bolero Chantecler 03 Amor Antenógenes Silva,
Ernâni Campos Rinaldo Calheiros
e Silvana Tango Copacabana
04 Sonho de amor
--- Sarita Montiel Balada(filme) RCA-Victor
05 Lembranças C. Martinez, Vrs. Serafim Costa
Carlos José Bolero Continental
06 Esta noite ou nunca
Adelino Moreira Carlos Augusto Samba-canção
Odeon
07 Confidência Raul Sampaio, Miltinho Samba- RGE
255
Benil Santos canção 08 Let’s twist
again Kal Mann, Dave
Appell Chubby Checker Rock’n Roll Fermata
09 Garota solitária
Adelino Moreira Ângela Maria Bolero Victor
10 Se a vida parasse
Romeo Nunes, Milton Gomes
Anísio Silva Bolero Odeon
n. 672, 2 ago. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Meu querido
lindo Canarinho,
Moacyr Franco Moacir Franco Bolero Copacabana
02 Esta noite ou nunca
Adelino Moreira Carlos Augusto Samba-canção Odeon
03 Quem é? Silvio Lima, Maurílio Lopes
Silvinho Bolero Philips
04 Ya ya --- Joey Dee, Starlights
Rock Fermata
05 Rock A-Hula Baby
--- Elvis Presley Rock RCA-Victor
06 Let’s twist again
Kal Mann, Dave Appell
Chubby Checker Rock’n Roll Fermata
07 Protesto Adelino Moreira Nelson Gonçalves Samba-canção RCA-Victor
08 Onde estás coração?
Luis M. Serrano, Augusto Berto
Rinaldo Calheiros e Silvana
Tango RCA-Victor
09 Malena Rossini Pinto, Fernando Costa
Roberto Carlos Rock-Balada Colúmbia
10 Amor em Cha-cha-cha
Fernando Costa, Rossini Pinto
Fernando Costa Cha-cha-cha Rock
Continental
n. 676, 1 set. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Amargura Antônio Correia,
Hilton Simões, e.o. Éllen de Lima Bolero RCA-
Victor 02 Quem é? Silvio Lima,
Maurílio Lopes Silvinho Bolero Philips
03 Duas taças Antônio Cyrino Mário Alves --- RCA-Victor
04 Suave é a noite
Paul F. Webster, Sammy Fain
Moacir Franco Bolero Copacabana
05 Confidência Raul Sampaio, Benil Santos
Miltinho Samba-canção
RGE
06 Serenata moderna
Adelino Moreira Nelson Gonçalves Samba RCA-Victor
07 Se a vida parasse
Romeo Nunes, Milton Gomes
Anísio Silva Bolero Odeon
08 Onde estás coração
Luis M. Serrano, Augusto Berto
Rinaldo Calheiros e Silvana
Tango RCA-Victor
09 Meu querido lindo
Canarinho, Moacyr Franco
Moacir Franco Bolero Copacabana
10 Let’s twist Kal Mann, Dave Chubby Checker Rock’n Roll Fermata
256
again Appell
n. 681, 6 out. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Multiplication --- Bobby Darin Rock Fermata 02 Speedy Gonzalez --- Pat Boone Rock Philips 03 Stella by
Starlight Victor Young Ray Charles Jazz Philips
04 Toureiro suburbano
Haroldo Barbosa, Luis Reis
Moacyr Franco
Bolero Copacabana
05 Quem é? Silvio Lima, Maurílio Lopes
Silvinho Bolero Philips
06 O Arlequim de Toledo
Hubert Giraud, Jean Drejac
Ângela Maria Valsa RCA-Victor
07 E a vida continua Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Agnaldo Rayol
Bolero Copacabana
08 Quando setembro vier
--- Billy Vaughn Rock RGE
09 Suave é a noite Paul F. Webster, Sammy Fain
Moacir Franco Bolero Copacabana
10 O que é que eu faço
Ribamar, Dolores Duran
Leila Silva Samba Chantecler
n. 685, 3 nov. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 O trovador de
Toledo Hubert Giraud,
Jean Drejac Gilda Lopes Valsa Odeon
02 Multiplication --- Bobby Darin Rock Fermata 03 Porteiro suba e
diga Luis C. Amadori, Eduardo de Labar
João Dias Tango Odeon
04 E a vida continua
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Agnaldo Rayol Bolero Copacabana
05 O que é que eu faço
Ribamar, Dolores Duran
Leila Silva Samba Chantecler
06 Beijo roubado Adelino Moreira Ângela Maria Bolero RCA-Victor
07 Speedy Gonzalez
--- Pat Boone Rock Philips
08 Poema do olhar Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Miltinho Samba-canção
RGE
09 Quando setembro vier
--- Billy Vaughn Rock RGE
10 Onde estás coração?
Luis M. Serrano, Augusto Berto
Rinaldo Calheiros e
Silvana
Tango RCA-Victor
n. 691, 15 dez. 1962 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Na cadência do
samba Ataulfo Alves,
Paulo Gesta Elizete e Jorge
Veiga Samba RCA-
Victor 02 Tu és o maior Silvio Lima, De Silvinho Bolero Philips
257
amor da minha vida
Carvalho
03 Pergunte ao coração
Silvino Neto Jorge Goulart --- Mocambo
04 E a vida continua Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Agnaldo Rayol Bolero Copacabana
05 O trovador de Toledo
Hubert Giraud, Jean Drejac
Gilda Lopes Valsa Odeon
06 Multiplication --- Bobby Darin Rock Fermata 07 Vida Adelino Moreira Núbia Lafayette Tango RCA-
Victor 08 Porteiro suba e
diga Luis C. Amadori, Eduardo de Labar
João Dias Tango Odeon
09 Beijo roubado Adelino Moreira Ângela Maria Bolero RCA-Victor
10 No more --- Elvis Presley Rock-Balada RCA-Victor
258
1963
n. 694, jan. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Na cadência do
samba Ataulfo Alves,
Paulo Gesta Elizete e Jorge
Veiga Samba RCA-
Victor 02 I can’t stop
loving you --- Ray Charles Balada Polydor
03 Canção do fim Ulpio Minucci, Roy Jordan
Moacir Franco Samba-canção
Copacabana
04 Samba da madrugada
Dora Lopes, Carminha M.,
e.o.
Dora Lopes Samba Copacabana
05 Caixinha de segredo
J. P. Cruz, Miguel Orlando
Rômulo de Alencar Bolero RCA-Victor
06 Tu és o maior amor da minha
vida
Silvio Lima, De Carvalho
Silvinho Bolero Philips
07 O trovador de Toledo
Hubert Giraud, Jean Drejac
Gilda Lopes Valsa Odeon
08 O passo do elefantinho
Henry Mancini, Vrs. RUth
Blanco
Os rouxinóis, Pachequinho e
Orquestra
Rock Copacabana
09 Se a vida fosse um sonho
Waldir Machado Orlando Dias Samba-canção
Odeon
10 Pergunte ao coração
Silvino Neto Jorge Goulart --- Mocambo
n. 698, 2 fev. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 I can’t stop
loving you --- Ray Charles Balada Polydor
02 Filme triste John D. Loudermilk, Vrs.
Romeo Nunes
Trio Esperança Rock Odeon
03 Ave Maria dos namorados
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Cauby Peixoto Balada-canção
RCA-Victor
04 Volta por cima Paulo Vanzolini Noite Ilustrada Samba Philips 05 The guns of
navarone --- Joe Reisman Marcha(filme) Colúmbia
06 Pra sempre te adorar
Don Gibson, Vrs. Hamilton Di
Giorgio
Paulo Marques --- Chantecler
07 Tu és o maior amor da minha
vida
Silvio Lima, De Carvalho
Silvinho Bolero Philips
08 Caixinha de segredo
J. P. Cruz, Miguel Orlando
Rômulo de Alencar
Bolero RCA-Victor
09 Samba da madrugada
Dora Lopes, Carminha M., e.o.
Dora Lopes Samba Copacabana
10 Canção do fim Ulpio Minucci, Roy Jordan
Moacir Franco Samba-canção Copacabana
259
n. 702, 2 mar. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Pó de mico Nilo Viana, Dora
Lopes, e.o. Emilinha Borba Marcha CBS
02 Aprendiz de feiticeiro
--- Ângela Maria Marcha RCA-Victor
03 Tô com a macaca
Arnô Provenzano, Otolindo Lopes
Jackson do Pandeiro e Almira
Marcha Philips
04 Samba do saci Oswaldo Nunes, Lino Roberto
Bloco C. Bafo da Onça
Samba Mocambo
05 Metade homem e metade mulher
Haroldo Lobo, Milton de Oliveira
Walter Levita Marcha Continental
06 Twist no carnaval
João de Barro, Jota Junior
Marlene Rock Continental
07 O último a saber
Klécius Caldas, Brasinha
Dircinha Batista Marcha Mocambo
08 Briguei Jujuba, Paulo Valdez
Elizeth Cardoso Samba Copacabana
09 Marcha da condução
José Messias José Messias Marcha Polydor
10 E o bicho não deu
Klécius Caldas, Rutinaldo
Emilinha Borba Marcha CBS
n. 707, 6 abr. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Amor ingrato Neco, Herique de
Almeida Silvinho Bolero Philips
02 Volta por cima Paulo Vanzolini Noite Ilustrada Samba Philips 03 Filme triste John D. Loudermilk,
Vrs. Romeo Nunes Trio Esperança Rock Odeon
04 Eu te amo Adelino Moreira, Nelson Gonçalves
Ângela Maria Bolero RCA-Victor
05 Piedosa mentira
Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Tango RCA-Victor
06 Ave Maria dos namorados
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Anísio Silva Balada-canção
RCA-Victor
07 Tem bobo pra tudo
João C. da Silva, Manoel Brigadeiro
Alcides Gerardi
Samba CBS
08 Razão Adelino Moreira Núbia Lafayette
--- RCA-Victor
09 Hava Nagila --- Chubby Checker
Rock Fermata
10 Cuando calienta El sol
--- Antônio Prieto Rock-Balada RCA-Victor
260
n. 711, 4 mai. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Esta noite eu
queria que o mundo acabasse
Silvio Lima Silvinho Samba-canção
Philips
02 Abraça-me Almeida Rego, Antônio Correa
Anísio Silva Bolero Odeon
03 Tem bobo pra tudo
João C. da Silva, Manoel
Brigadeiro
Alcides Gerardi
Samba CBS
04 Piedosa mentira Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Tango RCA-Victor
05 Prisioneiro Elmer Bernstein, Mack David
Jorge Goulart Marcha Copacabana
06 Amor ingrato Neco, Herique de Almeida
Silvinho Bolero Philips
07 Volta por cima Paulo Vanzolini Noite Ilustrada Samba Philips 08 E você... não dizia
nada Hélio Sindô, José Saccomani, e.o.
Gilberto Alves Samba Copacabana
09 Hava Nagila --- Chubby Checker
Rock Fermata
10 Eu te amo Adelino Moreira, Nelson Gonçalves
Ângela Maria Bolero RCA-Victor
n. 715, 1 jun. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Tem bobo pra
tudo João C. da Silva,
Manoel Brigadeiro
Alcides Gerardi
Samba CBS
02 Hava Nagila --- Chubby Checker
Rock Fermata
03 Boogie do Bebê Ralf Bendix Tony Campello
Rock Odeon
04 Esta noite eu queria que o
mundo acabasse
Silvio Lima Silvinho Samba-canção
Philips
05 Volte pra casa Sérgio Malta Noite Ilustrada Samba Philips 06 Piedosa mentira Adelino Moreira Nelson
Gonçalves Tango RCA-
Victor 07 Afrikaan beat --- Bert
Kaempfert Canção Polydor
08 Abraça-me Almeida Rego, Antônio Correa
Anísio Silva Bolero Odeon
09 Prisioneiro Elmer Bernstein, Mack David
Jorge Goulart Marcha Copacabana
10 Foi deus Alberto Janes Gilda Valença Marcha-rancho
Musidisc
n. 720, 6 jul. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Boogie do Bebê Ralf Bendix Tony Campello Rock Odeon 02 Tem bobo pra João C. da Silva, Alcides Samba CBS
261
tudo Manoel Brigadeiro Gerardi 03 Afrikaan beat --- Bert Kaempfert Canção Polydor 04 Esta noite eu
queria que o mundo acabasse
Silvio Lima Silvinho Samba-canção
Philips
05 Volte pra casa Sérgio Malta Noite Ilustrada Samba Philips 06 Amor sincero Silvio Lima,
Roberto Muniz Miltinho Samba Philips
07 Piedosa mentira Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Tango RCA-Victor
08 Hava Nagila --- Chubby Checker
Rock Fermata
09 O último dos moicanos
Miguel Gustavo Moreira da Silva
Samba Odeon
10 Abraça-me Almeida Rego, Antônio Correa
Anísio Silva Bolero Odeon
n. 723, 27 jul. 196377 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Sonhar
contigo Adilson Ramos,
Armelindo Leandro Adilson Ramos Bolero RCA-
Victor 02 Tudo de mim Jair Amorim, Evaldo
Gouveia Altemar Dutra Samba-
canção Odeon
03 Amor sincero Silvio Lima, Roberto Muniz
Miltinho Samba Philips
04 Uirapuru Murillo Latini, Jacobina
Cantores de Ébano
Balada-Rock Odeon
05 Boogie do Bebê
Ralf Bendix Tony Campello Rock Odeon
06 Abraça-me Almeida Rego, Antônio Correa
Anísio Silva Bolero Odeon
07 Piedosa mentira
Adelino Moreira Nelson Gonçalves
Tango RCA-Victor
08 Não diga a ninguém
José Messias Leila Silva Samba Chantecler
09 Tem bobo pra tudo
João C. da Silva, Manoel Brigadeiro
Alcides Gerardi Samba CBS
10 Afrikaan beat --- Bert Kaempfert Canção Polydor
n. 729, 7 set. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Tudo de mim Jair Amorim,
Evaldo Gouveia Altemar Dutra Samba-canção Odeon
02 Sonhar contigo
Adilson Ramos, Armelindo Leandro
Adilson Ramos Bolero RCA-Victor
03 Enigma Adelino Moreira Nelson Samba-bolero RCA-
77 Os exemplares do início do mês de agosto de 1963 não estão disponíveis para consulta no banco de dados da Hemeroteca Digital, Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Consulta realizada no dia 05/11/2018.
262
Gonçalves Victor 04 A hora do
amor Vrs. Fernando
César, Leo Delibes Gilda Lopes Habanera(filme) Odeon
05 Amor sincero Silvio Lima, Roberto Muniz
Miltinho Samba Philips
06 Beleza de cores
Jota Santos, Carlos Santana Lima
Silvinho Bolero Odeon
07 Uirapuru Murillo Latini, Jacobina
Cantores de Ébano
Balada-Rock Odeon
08 Blame it on the Bossa
Nova
--- Eydie Gormé Rock ---
09 Abraça-me Almeida Rego, Antônio Correa
Anísio Silva Bolero Odeon
10 Foi assim Lupicínio Rodrigues
Jamelão Samba Continental
n. 733, 5 out. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Tudo de mim Jair Amorim,
Evaldo Gouveia Altemar Dutra Samba-
canção Odeon
02 Papa oon mow mow
--- The Rivingstons
Rock RCA-Victor
03 Sonhar contigo Adilson Ramos, Armelindo Leandro
Adilson Ramos Bolero RCA-Victor
04 Chariot J. W. Stole, Jacques Plante, e.o.
Lana Bittencourt
--- CBS
05 Al di La --- Emilio Pericoli Balada(filme) --- 06 Enigma Adelino Moreira Nelson
Gonçalves Samba-bolero RCA-
Victor 07 Samba da
madrugada Dora Lopes,
Carminha M., e.o. --- Samba ---
08 Splish splash Bobby Darin, Jean Murray
Roberto Carlos Rock CBS
09 Blame it on the Bossa Nova
--- Eydie Gormé Rock ---
10 Amor sincero Silvio Lima, Roberto Muniz
Miltinho Samba Philips
n. 737, 2 nov. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Al di La --- Emilio Pericoli Balada(filme) --- 02 Tudo de mim Jair Amorim,
Evaldo Gouveia Altemar Dutra Samba-
canção Odeon
03 Sonhar contigo
Adilson Ramos, Armelindo Leandro
Adilson Ramos Bolero RCA-Victor
04 El relicario José Padilla João Dias e Dalva de Andrade
Habanera Odeon
05 Mulher governanta
Getúlio Macedo Silvinho Samba-canção
Philips
06 Splish splash Bobby Darin, Jean Murray
Roberto Carlos Rock CBS
263
07 Mas que nada Jorge Ben Jor Jorge Ben Samba-rock Philips 08 Papa oon
mow mow --- The Rivingstons Rock RCA-
Victor 09 Enigma Adelino Moreira Nelson Gonçalves Samba-bolero RCA-
Victor 10 Roberta --- Pepino di Capri Rock Odeon
n. 742, 7 dez. 1963 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Mulher
governanta Getúlio Macedo Silvinho Samba-
canção Philips
02 Tudo de mim Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Altemar Dutra Samba-canção
Odeon
03 Sabe deus Álvaro Carrillo, Vrs. Nely B. Pinto
Carlos Alberto Bolero CBS
04 El relicário José Padilla João Dias e Dalva de Andrade
Habanera Odeon
05 Quem tudo quer nada tem
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Anísio Silva Bolero Odeon
06 Doce amargura
Nino Oliviero, Riz Ortolani, e.o.
Moacyr Franco Balada-Jazz Copacabana
07 Mas que nada Jorge Ben Jor Jorge Ben Samba-rock Philips 08 Por onde
andarás Irmãos Orlando, Adauto Michilis
Orlando Dias Bolero Odeon
09 Enigma Adelino Moreira Nelson Gonçalves Samba-bolero RCA-Victor
10 Al di La --- Emilio Pericoli Balada(filme) ---
264
1964
n. 746, 4 jan. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Sabe deus Álvaro Carrillo,
Vrs. Nely B. Pinto Carlos Alberto Bolero CBS
02 El relicario José Padilla João Dias e Dalva de Andrade
Habanera Odeon
03 Mulher governanta
Getúlio Macedo Silvinho Samba-canção
Philips
04 Al di La --- Emilio Pericoli Balada(filme) --- 05 Tudo de mim Jair Amorim,
Evaldo Gouveia Altemar Dutra Samba-
canção Odeon
06 Se eu morresse amanhã
Waldick Soriano Waldick Soriano Bolero Chantecler
07 Mas que nada Jorge Ben Jor Jorge Ben Samba-rock Philips 08 Doce
amargura Nino Oliviero, Riz
Ortolani, e.o. Moacyr Franco Balada-Jazz Copacabana
09 Sonhar contigo
Adilson Ramos, Armelindo
Leandro
Adilson Ramos Bolero RCA-Victor
10 Enigma Adelino Moreira Nelson Gonçalves Samba-bolero RCA-Victor
n. 750, 1 fev. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Sabe deus Álvaro Carrillo,
Vrs. Nely B. Pinto Carlos Alberto Bolero CBS
02 Doce amargura Nino Oliviero, Riz Ortolani, e.o.
Moacyr Franco Balada-Jazz Copacabana
03 El relicario José Padilla João Dias e Dalva de Andrade
Habanera Odeon
04 Mulher governanta
Getúlio Macedo Silvinho Samba-canção
Philips
05 Acorrentados Carlos Arturo Briz, Vrs. J.
Miranda
Agnaldo Rayol Bolero Copacabana
06 Enigma Adelino Moreira Nelson Gonçalves Samba-bolero RCA-Victor
07 Tudo de mim Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Altemar Dutra Samba-canção
Odeon
08 Al di La --- Emilio Pericoli Balada(filme) --- 09 Se eu morresse
amanhã Waldick Soriano Waldick Soriano Bolero Chantecler
10 Sonhar contigo Adilson Ramos, Armelindo
Leandro
Adilson Ramos Bolero RCA-Victor
265
n. 754, 29 fev. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Marcha do
remador Antônio Almeida,
Oldemar Magalhães Emilinha Borba Marcha CBS
02 Cabeleira do Zezé
Roberto Faissal, João R. Kelly
Jorge Goulart Marcha Mocambo
03 Bigorrilho Sebastião Gomes, Paquito, e.o.
Jorge Veiga Samba RCA-Victor
04 Marcha da Cegonha
José Messias Clério Morais Marcha Continental
05 João ou Maria Waldir Machado, José Roy
Orlando Dias Marcha Odeon
06 Deixa o meu pranto rolar
Francisco Neto, Ivo Santos
Risadinha Samba CBS
07 Garota tentação
César de Alencar, B. Toledo
Francisco Carlos
--- Chantecler
08 Pistoleira Haroldo Lobo, Milton de Oliveira
Ari Cordovil Marcha CBS
09 Meu patuá Carvalhinho, Zilda do Zé, e.o.
Roberto Audi e Zilda
Samba Copacabana
10 Baile do pierrot
Haroldo Lobo, Milton de Oliveira
Dalva de Oliveira
Marcha Odeon
n. 760, 11 abr. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Dominique Souer Sourire, Vrs.
Paulo Queiroz Giane Canção Chantecler
02 Acorrentados Carlos Arturo Briz, Vrs. J. Miranda
Agnaldo Rayol Bolero Copacabana
03 Andorinha preta
Breno Ferreira Hebe Camargo Toada Polydor
04 Pombinha branca
Carlo Concina, Bruno Cherubini
Silvana Bolero Copacabana
05 Sabe deus Álvaro Carrillo, Vrs. Nely B. Pinto
Carlos Alberto Bolero CBS
06 Doce amargura
Nino Oliviero, Riz Ortolani, e.o.
Moacyr Franco Balada-Jazz Copacabana
07 The hully gully
--- Chubby Checker Rock Fermata
08 Olhando para o céu
Hachidai Nakamura,
Rokusuke Ei, e.o.
Trio Esperança Rock Odeon
09 Tudo de mim Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Altemar Dutra Samba-canção
Odeon
10 El relicario José Padilla João Dias e Dalva de Andrade
Habanera Odeon
266
n. 764, 9 mai. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Estão voltando
as flores Paulo Soledade Helena de Lima Marcha RGE
02 Dominique Souer Sourire, Vrs. Paulo Queiroz
Giane Canção Chantecler
03 Pombinha branca
Carlo Concina, Bruno Cherubini
Silvana Bolero Copacabana
04 Andorinha preta Breno Ferreira Hebe Camargo Toada Polydor 05 Acorrentados Carlos Arturo Briz,
Vrs. J. Miranda Agnaldo Rayol Bolero Copacabana
06 O ritmo da chuva
John Gummoe, Vrs. Demétrius
Demétrius Rock-Balada Continental
07 Doce amargura Nino Oliviero, Riz Ortolani, e.o.
Moacyr Franco Balada-Jazz Copacabana
08 Sabe deus Álvaro Carrillo, Vrs. Nely B. Pinto
Carlos Alberto Bolero CBS
09 Parei na contra-mão
--- Roberto Carlos Rock CBS
10 Canto o fado --- Olivinha Carvalho
Fado ---
n. 767, 30 mai. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Rua Augusta Hervé Cordovil Ronnie Cord Rock RCA-
Victor 02 Parei na contra-
mão --- Roberto
Carlos Rock CBS
03 I want to hold your hand
--- The Beatles Rock Odeon
04 Dominique Souer Sourire, Vrs. Paulo Queiroz
Giane Canção Chantecler
05 Lêda Adilson Ramos, Gentil Ramos
Adilson Ramos
Rock RCA-Victor
06 Cansei de pedir Nuno Soares Carlos Alberto Bolero CBS 07 Acorrentados Carlos Arturo Briz,
Vrs. J. Miranda Agnaldo
Rayol Bolero Copacabana
08 America Leonard Bernstein, Stephen Sondheim
Prini Lorez Rock RGE
09 Andorinha preta Breno Ferreira Hebe Camargo
Toada Polydor
10 Vou morrer de rir
Silvio Lima, De Carvalho
Silvinho --- Philips
267
n. 781, 5 set. 196478 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Datemi um
martelo --- Rita Pavone Rock RCA-
Victor 02 Que queres tu
de mim Jair Amorim, Evaldo
Gouveia Altemar Dutra Bolero Odeon
03 Obsessão Vrs. Fred Jorge, Pedro Flores
Sérgio Odilon Bolero RCA-Victor
04 Una lacrima sul viso
-- Bobby Solo Rock Chantecler
05 Abraza-me --- Bienvenido Granda
Bolero ---
06 La bamba Prini Lorez Prini Lorez Rock RGE 07 Beijo gelado Rubens Machado José Augusto Bolero Chantecler 08 Somente uma
saudade Hélio Justo, Dayse
Justo José Ricardo Rock RCA-
Victor 09 O relógio Roberto Cantoral,
Vrs. Nely B. Pinto Adilson Ramos Balada RCA-
Victor 10 Minha história
de amor --- Roberto Carlos Rock CBS
n. 785, 3 out. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Una lacrima sul
viso -- Bobby Solo Rock Chantecler
02 Datemi um martelo
--- Rita Pavone Rock RCA-Victor
03 Bicho do mato Jorge Ben Jor Jorge Bem Samba-rock Philips 04 Scrivimi --- Rita Pavone Rock RCA-
Victor 05 O Calhambeque John D. Loudermilk,
Gwen Loudermilk Roberto Carlos
Rock CBS
06 Que queres tu de mim
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Altemar Dutra Bolero Odeon
07 Beijo gelado Rubens Machado José Augusto Bolero Chantecler 08 Viva Las vegas --- Elvis Presley Rock RCA-
Victor 09 O relógio Roberto Cantoral,
Vrs. Nely B. Pinto Adilson Ramos
Balada RCA-Victor
10 Obsessão Vrs. Fred Jorge, Pedro Flores
Sérgio Odilon Bolero RCA-Victor
n. 790, 7 nov. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Scrivimi --- Rita Pavone Rock RCA-
Victor 02 Deixa pra
mim a culpa José Angel Espinosa, Vrs. Nilza Miranda
Agnaldo Rayol
Bolero Copacabana
78 As imagens digitalizadas das listas publicadas nos meses de julho agosto de 1964 presentes no banco de dados da Hemeroteca Digital, Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro estão ilegíveis. Consulta realizada no dia 05/11/2018.
268
03 Una lacrima sul viso
-- Bobby Solo Rock Chantecler
04 Datemi um martelo
--- Rita Pavone Rock RCA-Victor
05 Somente uma saudade
Hélio Justo, Dayse Justo
José Ricardo Rock RCA-Victor
06 Que queres tu de mim
Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Altemar Dutra Bolero Odeon
07 Diz que fui por aí
Zé Keti, Hortêncio Rocha
Paulo Marques
Samba Albatroz
08 O divórcio Vrs. Benil Santos, Pepe Avila
Oslain Galvão Bolero RGE
09 É proibido fumar
Roberto Carlos, Erasmo Carlos
Roberto Carlos
Rock CBS
10 La raspa --- Prini Lorez Rock RGE
n. 794, 5 dez. 1964 No. Título Composição Interpretação Classificação Gravadora 01 Deixa isso pra
lá Alberto Paz, Edson
Menezes Jair Rodrigues Samba-rock Philips
02 My boy Lollipop
--- Millie Small Rock Copacabana
03 Sul cucuzzolo --- Rita Pavone Rock RCA-Victor
04 O divórcio Vrs. Benil Santos, Pepe Avila
Oslain Galvão Bolero RGE
05 Deixa pra mim a culpa
José Angel Espinosa, Vrs. Nilza Miranda
Agnaldo Rayol
Bolero Copacabana
06 Una lacrima sul viso
-- Bobby Solo Rock Chantecler
07 Somos iguais Jair Amorim, Evaldo Gouveia
Altemar Dutra Bolero Odeon
08 Scrivimi --- Rita Pavone Rock RCA-Victor
09 O Calhambeque John D. Loudermilk, Gwen Loudermilk
Roberto Carlos
Rock CBS
10 Lado a lado Nóbrega e Souza, Jerônimo Bragança
Carlos Alberto Bolero CBS