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DAS PRAAS GREGAS GORA VIRTUAL: um panorama histrico da
democracia digital
FROM GREEK SQUARES TO VIRTUAL AGORA: a historical overview of
digital democracy
Tiago Novaes Angelo1, Cesar Bonjuani Pagan2, Ricardo Ribeiro
Gudwin3
Artigo recebido em 7 jul. 2014 e aceito em 13 dez. 2014.
Resumo
A Democracia Digital o resultado do uso das novas Tecnologias de
Informao e Comunicao pelos setores democrticos em prol de uma
participao cidad mais ativa e direta nas decises pblicas. Porm, seu
surgimento est relacionado construo histrica do conceito de
democracia e para, que seja possvel compreende-la, faz necessrio
situa-la scio-historicamente. Este artigo apresenta um panorama da
democracia desde seu
1 Mestrando em Engenharia Eltrica pela Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP); Graduado em Engenharia Eltrica pela
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); Graduado em Psicologia
pela Pontifcia Universidade Catlica de Campinas (PUC-CAMPINAS),
Campinas, SP, Brasil, [email protected].
2 Livre-docente em Engenharia Eltrica pela Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP); Doutor em Fsica pela Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP); Mestre em Fsica pela Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP); Graduado em Fsica pela Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP); Professor da Universidade Estadual de
Campinas (UNICAMP), Campinas, SP, Brasil,
[email protected].
3 Livre-docente em Engenharia Eltrica pela Universidade Estadual
de Campinas (UNICAMP); Doutor em Engenharia Eltrica pela
Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); Mestre em Engenharia
Eltrica pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP); Graduado
em Engenharia Eltrica pela Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP); Professor da Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP), Campinas, SP, Brasil, [email protected].
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surgimento at os dias atuais, mostrando como a Democracia
Digital surge como resposta a um contexto de crise das instituies
democrticas apresentando solues tecnolgicas que visam o resgate de
uma sociedade mais justa e igualitria.
Palavras chave Democracia Digital; Democracia; Tecnologia.
Abstract
Digital Democracy is the result of the use of new Information
and Communication Technologies by democratic sectors in favor of
more active and direct citizen participation in public decisions.
However, its emergence is related to the historical construction of
the concept of democracy and, to understand it, is necessary to
situate socio-historically. This article presents an overview of
democracy since its inception to the present day, showing how
Digital Democracy is a response to a crisis context of democratic
institutions introducing technological solutions that aim the
rescue of a more just and equalitarian society.
Keywords Digital Democracy; Democracy; Technology.
1 Introduo
O surgimento das novas Tecnologias de Informao e Comunicao (TIC)
vem transformando significativamente o panorama das modernas
sociedades democrticas principalmente em relao participao popular
no exerccio da cidadania. Antigos anseios da democracia clssica
abandonados ao longo dos anos como a participao direta dos cidados
nos negcios pblicos vem sendo resgatados graas ao desenvolvimento
destas tecnologias, inaugurando um novo marco da democracia: a
democracia digital.
Por ser um conceito relativamente novo, a vasta quantidade de
experincias em democracia digital que surgiram nos ltimos anos
contemplam um amplo espectro de aplicaes empricas ainda pouco
teorizadas e carentes de definies formais, o que torna seu estudo
um desafio uma vez que so pouco conhecidos os impactos a mdio e
longo prazo de tais iniciativas na promoo de uma sociedade de fato
mais democrtica. Neste sentido,
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aproximar tais aplicaes dos estudos acadmicos uma etapa
necessria para seu amadurecimento como uma cincia que gera um
conhecimento em prol da democratizao efetiva da sociedade. Assim,
algumas questes devem ser cuidadosamente observadas ao se pensar no
desenvolvimento da democracia digital, dentre elas compreender o
que democracia, suas diferentes vises e conceitos, e qual o seu
papel ao longo da histria.
O objetivo deste artigo realizar uma leitura da democracia
digital segundo uma perspectiva histrica, apresentando suas
principais influncias filosficas, histricas e sociais e situar seu
papel na sociedade atual. Para isto, o artigo est dividido em 3
partes: na primeira feito um panorama sobre o que democracia e
quais suas principais vertentes filosficas, resgatando sua histria
e analisando seu papel como alicerce de um modelo de sociedade. Em
seguida situado o surgimento da democracia digital como uma
resposta a crise democrtica da Sociedade Moderna. Por fim,
apresenta como o desenvolvimento das tecnologias de informao e
comunicao podem ajudar na superao desta crise, citando algumas
experincias que so o estado da arte em democracia digital.
2 Uma breve histria da Democracia
Definir exatamente quando a democracia surgiu no uma tarefa
simples. Os primeiros vestgios de prticas democrticas datam de
muito antes da Grcia Antiga em Sociedades do Oriente que se
organizavam em assembleias e elegiam representantes numa espcie de
democracia primitiva que parecia antecipar as assembleias populares
gregas. Herdoto, no terceiro livro de suas Histrias, ao descrever
um debate entre conspiradores persas, relata que a democracia no
somente j era conhecida como havia sido inventada pelos persas,
inimigo histrico dos Gregos na Antiguidade (CANFORA, 2006).
Porm, foi na Grcia Antiga durante o sculo V a.C. que a
democracia passou a fazer parte do pensamento poltico e filosfico,
principalmente na cidade-Estado de Atenas onde se estabeleceu o
primeiro governo democrtico conhecido, liderado por Pricles. Neste
perodo, toda vida poltica ateniense acontecia nas Assembleias
Populares e, apesar de ser um regime popular, nome-lo de
democracia' foi uma ao dos opositores ao regime. Cracia, oriunda da
palavra kratos significa, em seu sentido literal, fora violenta,
portanto, dizer que era um regime democrtico era uma crtica ao que
os opositores consideravam um governo popular de carter violento.
Alm disso, demos no era uma representao de toda populao ateniense.
Pelo contrrio, era um termo que se referia as pessoas consideradas
sem posses, a maioria da populao livre que no fazia parte nem
da
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oligarquia e nem dos militares e, ainda assim, eram a minoria da
populao grega, a qual 3/4 dela era formada por escravos que no
gozavam de nenhum direito poltico enquanto apenas era constituda
por homens livres. A democracia comeou de fato a nascer quando a
cidadania (direito de participao poltica), antes direito apenas dos
oligarcas e militares, foi estendida tambm aos sem posses,
incluindo todos os homens livres da sociedade ateniense (CANFORA,
2006).
O regime democrtico ateniense no s foi alvo de crticas de
opositores polticos como tambm dos principais pensadores da poca
como Plato e Aristteles, os quais buscavam uma razo filosfica sobre
as formas ideais de governana. Aristteles (1986 apud CUNNINGHAM,
2002) foi quem mais se aprofundou nesta busca e encabeou uma
pesquisa cujo objetivo era descrever e esboar as histrias de todos
os sistemas polticos conhecidos na poca. Deste trabalho, concluiu
que havia seis possveis formas de governo: realeza, tirania,
aristocracia, oligarquia, politia e a democracia; e que,
independente da forma de governo, o princpio da maioria prevalece,
ou seja, sempre ser a maioria dominante que ter em mos o poder,
seja a maioria dos ricos (na oligarquia) ou a maioria do povo (na
democracia). Alm disso, Aristteles concluiu que a realeza seria a
forma ideal de governo e considerava a democracia uma deturpao do
modo de governar pois com ela no seria possvel governar em vista do
bem comum. Porm, de todas as possveis deturpaes polticas, a
democracia era o desvio de governo mais tolervel j que era possvel
obter benefcios atravs das experincias coletivas e seria mais fcil
governar quando a maioria absoluta no est descontente (CUNNINGHAM,
2002).
Apesar de nascer j sendo alvo de crticas, o modelo democrtico
ateniense manteve-se e se aprimorou durante a Grcia Antiga,
mostrando seu carter coletivo e de respeito s leis e a justia.
Diversos outros pensadores contriburam para o desenvolvimento da
democracia ateniense, cujo legado denominou-se anos mais tarde de
democracia clssica e influenciou o surgimento de modelos polticos
favorveis e contrrios a este (CUNNINGHAM, 2002). Porm, alguns
fundamentos da democracia ateniense, como a participao direta e
ativa da populao nas decises polticas foram sendo deixado de lado
em prol de modelos mais representativos. Atualmente, com o advento
da tecnologia, surge a possibilidade de rediscutir estes
fundamentos e resgatar a cidadania mais ativa e direta.
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2.1 A democracia Ateniense
Na cidade-estado de Atenas, a vida do cidado estava estritamente
ligada vida da polis. O princpio que prevalecia era o da virtude
cvica, o qual estabelecia que todos os cidados deveriam dedicar-se
cidade subordinando a vida privada s questes pblicas e ao bem
comum, gerando uma distino entre cidado e indivduo onde os diretos
coletivos eram superiores aos direitos individuais. Desta forma,
grande parte da vida dos atenienses era dedicada s questes pblicas,
caracterizada por uma cidadania ativa e de um processo de
auto-governo cujo princpio de governana era a participao cidad
direta. Na prtica, o cidado ateniense dedicava-se a encontros para
debater e decidir as leis, os quais se constituam em discusses
livres e irrestritas onde todos tinham direitos iguais para falar
em uma assembleia soberana. Aps estes debates, decises eram tomadas
a partir do poder de convencimento dos argumentos e as leis
decididas tornavam-se leis do estado (HELD, 2006).
O uso das assembleias soberanas foi fortalecido no governo de
Pricles (V a.C) e passaram a constituir o corao do sistema
democrtico onde os cidados se reuniam para discutir os problemas da
polis e criar as leis. Dentre estas assembleias, a principal delas
era a Ekklsia, ou Assembleia do Povo, local onde todos os cidados
tinham direto a palavra e ao voto e deliberavam questes ligadas a
defesa do pas, escolha de magistrados para cargos polticos,
julgavam questes de traio e direitos polticos entre outras. Outra
assembleia era dedicada aos suplcios, onde todos os cidados
poderiam colocar assuntos de carter pblico ou privado para discusso
ou deliberao. Para que as sesses fossem vlidas, as assembleias
exigiam qurum mnimo de 6 mil cidados e as votaes eram decididas de
forma direta, por maioria simples, com cada votante levantando ou
no a mo para o alto (MENEZES, 2010).
Segundo Held (2006) a participao direta dos cidados foi a
principal caracterstica da poltica ateniense e tornou-se o
fundamento bsico da democracia clssica perdurando at a queda de
Atenas quando surgiram os imprios, estados fortes e o poderio
militar. Apesar do aparente sumio, os ideais democrticos foram
profundamente difundidos na poca do Imprio Romano e voltaram tona
no perodo iluminista quando diversos pensadores resgataram os
escritos gregos sobre democracia e descreveram uma vasta gama de
modelos democrticos, uns como crtica democracia direta ateniense,
outros como tentativa de superao das suas dificuldades e outros
ainda como resgate participao popular direta.
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Neste resgate iluminista, uma das modificaes mais significativas
do modelo de democracia clssica e que obteve grande sucesso no
decorrer da histria moderna foi a transferncia da participao direta
dos cidados para um sistema centralizado de representao poltica.
Enquanto na Grcia ateniense a esfera pblica era o espao de tomada
de deciso e deliberaes polticas cujos participantes eram os
cidados, nos Estados Modernos a participao poltica passou a ser
mediada por um corpo independente de polticos profissionais
legitimados pelos cidados, gerando uma ciso que colocou de um lado
a esfera pblica, cujo objetivo escolher os representantes e, de
outro lado, a esfera poltica a qual de fato definir e deliberar os
rumos da sociedade. A este modelo predominante nas democracias
atuais, denomina-se Democracia Representativa.
2.2 A democracia Representativa e a democracia Participativa
A democracia nos Estados Modernos oriunda de um misto do
desenvolvimento da ideia de representao com a de igualdade de
direto e realiza-se na forma de um governo representativo. John
Stuart Mill teria sido o primeiro pensador a associar a ideia de
governo representativo com democracia ao vislumbrar a inviabilidade
tcnica da participao direta de todos no governo, nascendo assim o
modelo de democracia representativa (CASTANHO, 2012).
De acordo com Stuart Mill (apud HELD, 2006) a ideia grega de
polis no sustentvel na sociedade moderna. A noo de autogoverno
seria insensata para qualquer comunidade que exceda o tamanho de
uma cidade pequena j que nem todos conseguiriam participar de todas
as discusses. O trabalho de organizar e coordenar multides seria
muito complexo para que todos participem diretamente das decises e,
h, inclusive, limitaes fsicas j que no possvel um lugar onde todos
os cidados de uma grande cidade ou do prprio pas se renam para
discutir e deliberar leis. Ainda, segundo Mill, em um regime
governado por todos os cidados h um perigo constante das pessoas
mais sbias e capazes serem apagadas pela falta de conhecimento,
habilidade e experincia das maiorias. Desta forma, conclui que as
dificuldades da participao direta em governos democrticos s podem
ser contornadas pela escolha de governantes atravs de eleio
popular, em um regime denominado Democracia Representativa.
Nesta forma de governo, o poder poltico passa do prprio cidado
para a figura de um representante, estabelecendo um vnculo
representante-representado que pode se expressar politicamente de
trs formas: Primeiro como uma tcnica onde a vontade de uma pessoa
atribuda a outra pessoa ou coletividade; a segunda como um
instrumento para exprimir a
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vontade do representado onde o representante uma espcie de
porta-voz do representado; e a terceira como uma substituio, onde o
representante substitui o povo, atribuindo a ele sua vontade
(CASTANHO, 2012).
Segundo Young (2006), nas sociedades modernas a existncia da
representao uma condio necessria, pois muitas vezes a ao poltica do
cidado est vinculada a processos que ocorrem em vrios e diferentes
locais e instituies no sendo possvel estar presente em todos os
organismos deliberativos e debater todas as ideias que iro afetar
suas vidas. Alm disso, ainda que nem sempre tenha suas expectativas
atendidas, o cidado espera que outros pensem em situaes como a dele
e os represente em fruns ou rgos deliberativos.
A democracia representativa permitiu que os fundamentos
democrticos se mantivessem em uma sociedade que se tornava cada vez
mais numerosa e complexa, porm, o papel da representao poltica nem
sempre se estabeleceu de forma que os reais interesses da populao
fossem de fato atendidos, o que gerou inmeras crticas a este
modelo. Alguns autores atribuem a atual crise do sistema democrtico
aos modelos representativos e suas instituies como partidos
polticos (BENNETT;ENTMAN, 2001) (BUCY;GREGSON,2001) (MIGUEL,2006)
cuja consequncia o descrdito poltico e o enfraquecimento da
cidadania.
Barber (2003), defensor da democracia participativa e crtico ao
modelo de democracia representativa, argumenta que a representao
incompatvel com a liberdade, igualdade e justia social pois:
Aliena a vontade poltica em detrimento do genuno auto-governo,
(...) prejudica a capacidade da comunidade de atuar como um
instrumento regulador, (...) e impede a formao de um pblico
participativo (BARBER, 2003, p.145-146).
Neste sentido, defende um modelo que denomina de democracia
forte, um sistema democrtico semelhante s assembleias gregas onde o
cidado atua de forma direta nas decises. J para Gomes (2005), o
modelo representativo est levando a uma crise do sistema democrtico
pois ao separar a esfera poltica da esfera pblica esvazia o
interesse dos cidados na participao poltica e faz com que a poltica
contempornea no seja capaz de satisfazer os requisitos da
democracia em seu sentido mais prprio. Dentre as consequncias desta
ciso est um sentimento de desinteresse no cidado que no percebe os
efeitos de suas aes visto a forma que o Estado age em relao aos
seus anseios. Tal sentimento refora-se pela percepo de que a
indstria da notcia, do lobby e
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da consultoria poltica tem muito mais eficcia sobre a esfera
poltica do que os prprios cidados. Neste sentido h uma marginalizao
do papel do cidado gerando uma sensao de ineficcia da ao poltica
que contribui para arruinar as condies da participao cvica. Alm
destes fatores, o desinteresse tambm reforado pela pssima imagem
pblica da sociedade poltica, percebida como voltada unicamente ao
jogo de interesses prprios, de grupos/partidos ou a interesses
no-pblicos puramente econmicos.
Segundo Coleman e Blumler (2009), apesar de vivermos numa poca
de grandes possibilidades e oportunidades de mudar governos, as
pessoas nunca se sentiram to frustradas e desapontadas com a falta
de capacidade de fazer qualquer diferena na poltica e nas decises
pblicas. Observou em entrevistas, grupos focados e pesquisas que as
pessoas repetitivamente queixam-se da sensao de estarem excludas,
no serem ouvidas e serem desrespeitadas, tornando-se meros
espectadores do processo poltico o qual rapidamente torna-se pouco
confivel. Lavalle, Houtzager e Castello (2006) observam alguns
indcios que tambm podem indicar uma crise do modelo democrtico
representativo, dentre os quais destacam-se a volatilidade do
eleitorado, a queda nos patamares de comparecimento nas urnas e um
descrdito generalizado das instituies pblicas.
Em relao ao modelo de democracia representativa adotado no
Brasil, os problemas se voltam a atuao dos partidos polticos,
excessiva burocratizao e distanciamento dos interesses sociais
(PERISSINOTTO; FUKS, 2002). Segundo Menezes (2010), a grande
quantidade de partidos polticos, os quais deveriam gerar uma
pluralidade de ideias e princpios, acabou estabelecendo uma situao
na qual partidos nanicos se tornaram legendas de aluguel
constituindo negcios privados que no vo de encontro com a
representatividade dos interesses pblicos. Tal fato favoreceu o
surgimento de grupos de presso que atuam nos bastidores sem
qualquer regulamentao ou responsabilidade a partir de trfico de
influncia. Desta forma, pouco ou nada se representa da vontade
pblica e a poltica se torna um mero jogo de interesses onde seus
cidados que, sem poder de atuar, mudar suas realidade ou serem
ouvidos, passam a desacreditar no sistema poltico acarretando duas
consequncias graves: a apatia poltica e a corrupo. A apatia uma
consequncia da falta de confiana nos polticos e nas suas
capacidades de defender os interesses da coletividade uma vez que h
uma percepo que suas aes ficam confinadas aos interesses de seus
partidos e s estratgias pessoais as quais asseguram sua eleio. J a
corrupo, percebida como atuao dos representantes que subordinam os
interesses pblicos aos interesses individuais, uma consequncia
tambm da prpria apatia poltica
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uma vez que esta acarreta na diminuio da fiscalizao e
regulamentao dos processos polticos por parte dos cidados.
Apesar da hiptese de que o modelo representativo esteja levando
a uma crise dos sistemas democrticos, opor a democracia clssica
como um sistema ideal de participao popular e a democracia
representativa como fonte de interesses individuais e tenso entre
governantes e governados no um caminho frutfero para o
fortalecimento e estabelecimento da democracia. Cada modelo foi
pensado em um contexto histrico diferente cujos desafios sociais
eram muitas vezes de outra natureza e reproduzi-los nem sempre a
melhor soluo. Alm disso, os modelos no so prticas puras, eles se
misturam em diversas situaes, por exemplo, na Grcia ateniense havia
certo grau de representao quando magistrados eram eleitos para
tarefas executivas ou mesmo nas democracias representativas
modernas a participao popular direta pode ser vista em prticas como
plebiscitos e referendos (MENEZES, 2010). Desta forma, refletir
sobre as vantagens e desvantagens de cada modelo contextualizando
sua prtica em um perodo scio-histrico, atento s demandas sociais e
s ferramentas tecnolgicas, um possvel caminho para tentativas de
superao da crise do sistema democrtico.
E desta reflexo que surgiram os modelos de democracia
participativa. Dentre seus principais expoentes, destaca-se Barber
(2003) que criou o modelo de democracia forte, um sistema de
democracia participava que une conceito da democracia clssica e
representativa cuja prtica s possvel graas s novas tecnologias de
informao e comunicao.
Os modelos de Democracia Participativa so relativamente novos e
passaram a ganhar fora a partir do inicio deste sculo graas ao
surgimento de ferramentas tecnolgicas que permitiram aproximar
pessoas e dar espao para uma participao popular mais direta nas
decises polticas. Na democracia participativa, garantir a atuao
cidad o objetivo principal e, para isto, duas condies so
necessrias: A acessibilidade do poder pblico participao popular e
um eficiente processo informativo j que o cidado deve ser capaz de
formular suas prprias questes e no apenas responder a questes
prontas como, por exemplo, num processo de plebiscito ou referendo
que acabam por isolar o cidado da possibilidade de atuar
diretamente nas decises polticas. A votao, nesta viso, um tipo
muito pobre de participao poltica direta pelo simples fato de
deliberar questes pr-fabricadas. Num contexto de democracia
participativa, deseja-se o surgimento de uma opinio coletiva a
partir de debates e discusses em um ambiente rico em informaes.
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Para isto, o uso das tecnologias de informao e comunicao um
caminho lgico a seguir (DIJK, 2000).
Enquanto que na histria os ideais de democracia direta foram
sendo vencidos e tidos como inadequados a medida que a sociedade se
tornava uma sociedade de massas e o Estado uma instituio altamente
complexa, o desenvolvimento tecnolgico trouxe tona a possibilidade
de reverter esse processo. O surgimento de uma nova infraestrutura
de comunicao e processamento de dados como por exemplo a internet
est trazendo novas esperanas para o estabelecimento de modelos
alternativos de democracia que resgatem o verdadeiro significado de
cidadania e devolvam ao cidado o poder de deciso poltica (GOMES,
2005). E neste contexto que, principalmente aps o incio da dcada
passada, surgem diversas iniciativas de base tecnolgica cujo
objetivo resgatar a participao cidad ativa. A este conceito que une
as TIC e os modelos de democracia denominou-se democracia digital e
ser o assunto do prximo tpico.
3 Democracia Digital
Apesar de ser um conceito que ganhou fora com o advento
tecnolgico dos ltimos anos, a democracia digital no um tema novo na
literatura cientfica. Segundo Vedel (2006), a histria da democracia
digital pode ser dividida em trs eras. A primeira comeou por volta
de 1950 com o surgimento das tecnologias de computao e automao as
quais geraram uma promessa de criao de uma mquina de governar que
processaria uma grande quantidade de dados e tomaria decises
racionais a respeito da administrao pblica. No entanto, na dcada de
60 essa ideia foi abandonada devido a crticas de que ela estaria
muito mais direcionada tecnocracia do que de fato a um governo
eletrnico pois reduzia a poltica unicamente sua prtica. A segunda
idade comea entre o fim da dcada de 70 e inicio da dcada de 80 com
o aparecimento da TV a cabo e dos computadores pessoais. Neste
perodo, a televiso comeou a ser usada como espao para debates,
discusses e interatividade com os cidados. Porm, a promoo de
democracia nestes espaos ainda era muito primitiva devido a
limitaes prprias da tecnologia, restringindo-se a ambientes mais
informativos e a pouca possibilidade de atuao por parte do cidado.
J a terceira idade a que melhor pode se associar com o conceito
atual de democracia digital. Ela se inicia em meados da dcada de 90
com a emergncia das mdias digitais como a internet e as
possibilidades da comunicao em rede fazendo surgir o ativismo
ciberntico com a criao de espaos de debate virtual, fruns, blogs,
entre outras formas de expresso
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democrtica. Com a popularizao destas mdias e o desenvolvimento
de ferramentas de processamento de dados, a democracia digital
passa de um conceito para uma prxis com reais possibilidades de
transformar a atuao democrtica.
Nos ltimos anos o entusiasmo sobre as possibilidades que as
mdias digitais vm trazendo para o avano do sistema democrtico
generalizado, abrangendo os interesses desde os governos oficiais
at os libertrios antigovernamentais, o que reflete o grande
potencial da democracia digital em promover as mais diferentes
vises de democracia. Dahlberg (2011), em um estudo sobre as
potencialidades da democracia digital que envolveu a anlise de
diversas aplicaes em diferentes pases, concluiu que as iniciativas
podem ser classificadas em quatro esboos tericos: democracia
digital liberal-individualista, democracia digital deliberativa,
democracia digital contra-pblico e Democracia digital
marxista-autonomista. No ser escopo deste estudo definir estes
quatro esboos, porm vale ressaltar que ao desenvolver tecnologia
nesta rea h necessidade de se ter clareza sobre qual sistema
democrtico deseja-se promover uma vez que estudos como o de
Dahlberg mostram que a democracia digital est carregada de
conceitos ideolgicos que tero impacto sobre a prpria sociedade.
Mesmo que haja um grande esforo na criao de aplicaes, teorizar a
democracia digital ainda no uma tarefa perto de ser concluda.
Embora desde meados do sculo passado a tecnologia venha sendo
pensada como suporte dos ideais democrticos, ainda no h um consenso
sobre a definio deste conceito visto que as aplicaes muitas vezes
so de preocupao muito mais pragmtica e os modelos democrticos so
diversos filosoficamente e ideologicamente. Nem mesmo o nome
Democracia Digital unanimidade no meio acadmico. H autores que se
referem ao mesmo fenmeno como e-democracia (LIDN, 2013), democracia
eletrnica (SPIRAKIS; SPIRAKI; NIKOLOPOULOS, 2010), ciberdemocracia
(LVY, 2002), e-gov (ROMAN; MILLER, 2013), entre outras. No entanto,
este estudo focar na definio de dois dos mais influentes autores em
democracia digital: Steven Cliff, pesquisador pioneiro na rea de
democracia digital e criador do portal E-Democracy.org e o filsofo
francs da cultura virtual contempornea Pierre Levy .
Em seu artigo E-democracy, E-Governance and Public Net-Work,
Clift (2003) antes de definir o conceito, alerta que e-democracia,
ou democracia eletrnica, no votao direta via internet e muito menos
campanha publicitria, mas sim:
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E-democracia o uso de tecnologias de informao e comunicao e
estratgias pelos setores democrticos dentro dos processos polticos
de comunidade locais, estados/regies, naes e mesmo num estgio
global. (CLIFT, 2003, p.2).
Os setores democrticos incluem os seguintes atores democrticos:
Governos, representantes eleitos, mdia, partidos polticos e grupos
de interesse, sociedade civil, organizaes governamentais
internacionais e os prprios cidados/votantes.
J Lvy (2002) utiliza-se do conceito de ciberdemocracia para
expressar o uso das tecnologias de informao e comunicao na promoo
da democracia. Segundo o autor, ciberdemocracia uma expresso que
engloba o conceito de ciberespao, local onde ocorre a comunicao e
flui a informao, e o desejo de formas de governo genuinamente
democrticas. O surgimento das tecnologias de rede que permitem a
interligao mundial e ampliam a liberdade de comunicao esto
estabelecendo um novo espao pblico que vir a redefinir radicalmente
as condies de governana. Para o autor este o momento histrico mais
propcio para se repensar a atuao democrtica j que a tecnologia
poder ser usada a favor de uma sociedade mais justa e igualitria.
Dentre as promessas, Lvy (2002) destaca que graas s novas
tecnologias:
A prpria natureza da cidadania democrtica passa por uma profunda
evoluo, uma vez que caminha no sentido de um aprofundamento da
liberdade: desenvolvimento do ciberativismo escala mundiais,
organizao das cidades e regies em comunidadeS inteligentes, em
goras virtuais, governos eletrnicos cada vez mais transparentes ao
servio dos cidados e votos eletrnicos (LVY, 2002, p.30).
A ciberdemocracia seria no apenas uma forma de se pensar a
democracia na Era da Informao, mas tambm uma forma de buscar o
aperfeioamento social atravs do impulso inteligncia coletiva. Uma
vez que a noo de democracia remete aos direitos e liberdade do
cidado, cujas ideias devem ser debatidas e deliberadas em prol de
algo comum a todos, a busca de uma regra ou ideia comum que
expresse genuinamente o pensamento de uma coletividade o que
denomina-se inteligncia coletiva. A democracia, assim, implica numa
inteligncia coletiva a qual pode ser favorecida pelo uso das
tecnologias de comunicao.
Apesar das promessas que a tecnologia trs, muitos dos meios de
comunicao atualmente pouco ajudam os povos a pensar coletivamente e
criar solues para seus problemas. No sistema poltico atual a
informatizao est servindo basicamente para simplificar os processos
de burocratizao e raramente est buscando formas criativas e
inovadoras de tratar a informao de forma descentralizada, flexvel,
interativa e coletiva. Desta forma,
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necessrio conscientizar da necessidade de se explorar o enorme
potencial transformador por parte das tecnologias (LVY, 1999).
A ciberdemocracia no seria uma forma de reforar ou aprimorar o
modelo democrtico representativo, mas sim de incentivar e propiciar
uma maior participao popular na vida da cidade explorando da melhor
forma possvel as ferramentas de comunicao contemporneas, dentre
elas, as tecnologias de rede e informao que compe o ciberespao,
tornando-o o lugar de uma nova forma de democracia direta em grande
escala. Assim, um uso socialmente mais rico da informtica
propiciaria aos grupos humanos os meios de reunir suas foras
mentais e construir coletivos inteligentes que levem a uma
democracia em tempo real (LVY, 1999).
Neste sentido, Lvy (1999) prope a criao da gora virtual, uma
hiptese utpica de uma plataforma virtual de democracia direta, a
qual explora as potencialidades do ciberespao na busca dos
problemas, debates pluralistas, tomada de deciso coletiva e avaliao
dos resultados sempre o mais prximo possvel das comunidades
envolvidas. Para que venha a se tornar realidade, h a necessidade
do desenvolvimento de ferramentas de filtragem inteligente dos
dados, navegao em meio a informao, simulao de sistemas complexos,
comunicao transversal de tal forma que favorea a tomada de deciso
em coletivos heterogneos e dispersos. A gora virtual teria como
objetivo facilitar a navegao no conhecimento permitindo a troca de
saberes e a construo coletiva do sentido. Proporcionaria uma viso
dinmica das questes coletivas e a avaliao em tempo real de uma
enorme quantidade de proposies, informaes e processos em andamento.
Alm disso, como um instrumento de democracia participativa, o
cidado no mais seria um nmero que daria peso a um partido poltico
ou a um representante, mas sim criaria diversidade e ampliaria o
conhecimento contribuindo para o aperfeioamento da inteligncia
coletiva e resoluo dos problemas comuns.
Apesar das particularidades de cada definio, tanto a
ciberdemocracia quanto a e-democracia referem-se ao papel das novas
tecnologias na promoo da democracia, ideia esta corroborada por
Timonen (2013), o qual aponta cinco razes para usar as tecnologias
e estratgias da democracia digital:
1. A democracia digital essencialmente uma mdia social que
permite aos governos e polticos se aproximarem dos cidados.
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2. Permite que cidados com opinies parecidas compartilhem ideais
e organizem aes polticas.
3. A mdia digital prove uma forma eficiente de disseminao de
mensagens.
4. Redes digitais permitem o surgimento de muitas ideias e,
portanto, do poder aos cidados. Elas facilitam o acesso dos
polticos a essas ideias de forma que possam torn-las polticas
concretas.
5. Redes digitais permitem que os cidados se tornem verdadeiros
responsveis pelas decises.
Indo alm da definio, uma questo pertinente avaliar o impacto das
aplicaes existentes nos processos democrticos. Com este objetivo,
Silva (2005) desenvolveu um estudo envolvendo diversos projetos de
democracia digital no Brasil e em outros pases e concluiu que,
baseado na capacidade do sistema em promover a participao popular
nos negcios pblicos, existem cinco possveis graus de participao
democrtica virtual. Segue abaixo uma breve descrio destes
graus:
1. Primeiro grau de democracia digital: caracterizado pela nfase
na disponibilidade de informao na prestao de servios pblicos.
Nestes dispositivos, o governo busca suprir as necessidades de
informao bsica, servios e bens pblicos, enquanto o cidado espera
receber essas informaes de forma rpida e sem transtornos. um fluxo
de informao unidirecional governo-cidado e est intimamente
relacionado com a melhoria de produtividade e otimizao da mquina
estatal.
2. Segundo grau de democracia digital: aqui os dispositivos
tecnolgicos so criados para obter a opinio pblica e utiliz-la para
tomada de deciso poltica. A ideia estabelecer um dialogo efetivo
com a esfera pblica, porm limitado apenas a um canal de sondagem de
opinio sem garantias de que esta ser de fato acatada.
3. Terceiro grau de democracia digital: diz respeito s aplicaes
que atestam o princpio da transparncia e da prestao de contas,
permitindo o acesso da esfera pblica aos dados do governo de forma
que haja algum controle sobre as aes governamentais. Porm, apesar
deste relativo controle, as decises finais ainda sero tomadas
unicamente pela esfera poltica.
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4. Quarto grau de democracia digital: so ferramentas capazes de
propiciar discusses pblicas que levaro a um consenso mtuo e
implicaro em decises concretas por parte da esfera poltica. So
fundamentadas no dilogo aberto e livre dos participantes que devem
propor solues sobre problemas comuns. Dentro de um modelo de
democracia representativa, este seria o grau mais elevado de
participao democrtica que o cidado poderia participar.
5. Quinto grau de democracia digital: este seria o grau mais
intenso no que diz respeito participao popular na tomada de deciso
dos negcios pblicos, aproximando-se dos modelos de democracia
direta. Neste grau, a esfera pblica e a esfera poltica se
coincidiriam e a deciso pblica passa a ter poder deliberativo. As
ferramentas devem ser capazes de processar a informao pblica e
produzir deciso poltica, fazendo com que o cidado de fato
decida.
De acordo com Silva (2005), o desafio a ser enfrentado melhorar
o acesso dos cidados em cada um desses graus, o que envolve
aspectos tecnolgicos, sociais, econmicos e culturais. Para tal, h
necessidade de gerar condies econmicas e polticas e desenvolver
tecnologia, como a criao de sistemas, ferramentas, modelos,
procedimentos e teorias que auxiliem atingir estes objetivos. No
Brasil, os projetos existentes at o ano de 2005 estavam restritas
ao primeiro e segundo grau, no havendo iniciativas que de fato
atribussem um papel deliberativo s decises populares. J em outros
pases, algumas iniciativas se aproximam do terceiro e quarto grau
de participao poltica. O prximo tpico tratar de apresentar o estado
da arte das aplicaes em democracia digital tanto no Brasil quanto
ao redor do mundo.
3.1 O Estado da Arte da Democracia Digital
Muitas so as iniciativas em democracia digital ao redor do mundo
cujo fator comum recai sobre as tentativas de aproximar as esferas
pblica e poltica. Em um estudo publicado em 2013 sobre o uso destas
ferramentas, Timonen (2013) analisou como a Democracia Digital
empregada na Unio Europeia tanto por instituies governamentais como
pelos prprios polticos. Dentre as aplicaes, destaca a campanha de
Jos Manuel Barroso para presidente da Comisso Europeia no ano de
2009 onde foi criado o TellBarroso (www.tellbarroso.eu), uma
plataforma virtual de consulta publica onde os cidados podiam
colocar propostas sobre aes que gostariam que fossem adotadas pela
futura Comisso Europeia. A participao na consulta foi expressiva:
mais de 150 mil pessoas participaram com 12 mil propostas, 500 mil
visualizaes e 130 milhes de impresses em mdias
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sociais. Timonen tambm descreve outros usos das mdias sociais em
campanhas europeias como o caso do Partido Europeu Socialista que
nas eleies para o Parlamento Europeu utilizou as mdias sociais para
defender a criao de uma taxa de transao financeira, ganhando no s
visibilidade como tambm conseguindo aprov-la posteriormente. J em
relao ao uso da tecnologia em sistemas de votao, cita o caso da
Estnia que criou um sistema de votao eletrnica usando cartes
inteligentes que permitem a votao via internet ou telefone
celular.
O estudo de Timonen (2013) foi restrito a algumas aplicaes
recentes na Unio Europia e ressaltou as inmeras possibilidades da
democracia digital. Nchise (2012), publicou um estudo no qual
analisou 158 artigos cientficos que diziam respeito a democracia
digital e traou um panorama sobre o estado da arte, concluindo
que:
1. Os artigos em democracia digital tiveram um boom de publicaes
a partir do ano de 2003, saltando de 1 artigo publicado em 2001
para 23 em 2003.
2. A maioria das aplicaes encontram-se na Europa (64) e nas
Amricas (36). frica, Austrlia, sia e oriente mdio juntos produziram
20 artigos.
3. 59 artigos focam apenas em discusses tericas sobre democracia
digital. 84 relatam alguma aplicao prtica e 15 apresentam opinies e
ponto de vista de acadmico sobre o tema.
4. Sobre as aplicaes, elas englobam 5 reas: sistemas de voto
eletrnico; sistemas de negociao eletrnica; sistemas de deliberao
on-line; peties online e campanha virtual.
Em relao s aplicaes no Brasil, os projetos em democracia digital
vm apresentando um expressivo aumento nos ltimos anos, tanto em
quantidade quanto na qualidade dos sistemas. Em 2005, Silva (2005),
fundamentado em sua pesquisa sobre os graus de participao popular
em democracia digital, analisou os portais em operao na rede de 24
capitais brasileiras e constatou que grande parte oferecia apenas
servios informativos. Desta anlise, verificou que 87 % continham a
presena das legislaes (leis, estatutos, decretos, portarias etc),
possibilidade de insero de dados pelo usurio de forma a obter uma
informao (consulta customizada) e presena de informaes genricas
sobre as cidades (econmicas, culturais, tursticas, histricas, entre
outras). J 91 % dos portais apresentavam notcias sobre a
administrao municipal e informaes institucionais
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genricas (endereo fsico e eletrnico, telefones da administrao,
funo de rgos da administrao publica). Por outro lado, nenhum portal
apresentou a possiblidade de operao completa de servio pblico via
rede e apenas 8% apresentavam algum tipo de atendimento on-line
instantneo como, por exemplo, um chat ou a possibilidade de obteno
de servio pblico em domicilio com pedido inicial atravs do site.
Por fim, concluiu que grande parte das aplicaes encontravam-se nos
graus 1 e 2 e que nenhum portal apresentava alguma possibilidade de
participao cidad em nvel dos graus 4 e 5.
Conforme a pesquisa, os sistemas existentes no ano de 2005 no
propiciavam a participao ativa da populao, seja de forma consultiva
ou deliberativa. Porm, o avano do alcance da internet, a melhoria
do acesso da populao aos recursos de informtica, bem como o
aprimoramento dos aparatos tecnolgicos levaram a um amadurecimento
e surgimento de novas iniciativas. Segundo Wildauer, Inaba e Silva
(2013), enquanto em 2005 apenas 12 % dos domiclios brasileiros
tinha acesso internet, em 2012 esse ndice passou para 40 % e
projeta-se um ndice de 50 % at o final de 2014. Apesar de ainda
estar prximo de atingir a metade dos domiclios brasileiros,
garantir o acesso de todo cidado internet uma condio fundamental
para o desenvolvimento da democracia digital, possibilitando a
comunicao, a rapidez e a busca e disseminao da informao em massa,
sendo, portanto, um importante canal de livre acesso e exerccio da
cidadania.
A popularizao da internet est permitindo o surgimento das
chamadas cidades inteligentes, uma forma de designar as cidades que
fazem uso das inovaes tecnolgicas para facilitar o acesso da
populao aos servios pblicos e solucionar os problemas da sociedade
local. Iniciativas nesta rea j podem ser encontradas em algumas
cidades brasileiras, as quais procuram desenvolver portais de
servios online que permitem o acesso a diversos servios pblicos,
busca de informaes, pagamentos de tributos municipais, alm de
oferecer espao de ouvidoria online para que as comunidades
interajam com suas prefeitura fazendo solicitaes e reivindicaes.
Uma das caractersticas das cidades inteligentes brasileiras a
preocupao com a incluso digital, uma vez que servios online so s
democrticos de fato quando 100% da populao tm acesso a eles.
(PACHECO et al., 2013) (JNIOR; GALIOTTO, 2013).
No entanto, dois projetos se destacam tanto pelo apelo
participao popular quanto pela inovao tecnolgica no que se refere a
um pioneiro tratamento da informao em prol de uma inteligncia
coletiva que corresponda aos anseios da comunidade. O primeiro
destaque o portal e-democracia da cmara dos Deputados e o segundo,
o portal Gabinete do Governo mantido pelo Governo do Estado do Rio
Grande do Sul.
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O portal e-democracia da Cmara de Deputados foi criado em 2009 e
seu objetivo, segundo descrio no prprio site
(http://www2.camara.leg.br/), incentivar a participao da sociedade
no debate de temas importantes para o pas atravs da internet.
classificado como uma sistema scio-tecnolgico pois so solues
tecnolgicas inovadoras que possibilitam a colaborao popular rpida,
eficaz e abrangente. Por este motivo, sua implementao envolve ampla
participao interdisciplinar que leva em considerao a interao dos
seus componentes tecnolgicos e sociais e culmina em um instrumento
antropocentrado e no apenas tecnocentrado (MEZZAROBA et al,
2013).
O portal formado por dois espaos de interao denominados
Comunidades Legislativas e Espao livre. No primeiro, o usurio
participa de debates a respeito de temas especficos relacionados a
projetos de lei que tramitam na cmara. No segundo, o usurio pode
criar e participar de fruns sugerindo temas a serem discutidos. Alm
disso, h um espao para compartilhar informaes com redes sociais
como o Facebook e o twitter, bate-papo, enquetes e uma Wiki da
comunidade virtual.
No entanto, a principal colaborao cidad est no instrumento de
votao de ideias e temas que permite conhecer a opinio, anseios e
propostas da comunidade a respeito de assuntos que esto em pauta na
cmara dos deputados. Esta votao utiliza-se de uma metodologia de
crowdsourcing cuja proposta produzir um sistema de seleo de ideias
em um universo de grande participao colaborativa.
Como exemplo da participao cidad atravs do e-democracia
destaca-se o projeto recentemente aprovado pela cmara dos Deputados
que criou o Marco Civil da internet. Foi o primeiro projeto de lei
de importante impacto social que teve incorporado sugestes dos
quase 12 mil internautas que acessaram a comunidade virtual e
contriburam com ideias. Das 374 manifestaes selecionadas pelo
sistema e colocadas em votao, 6 foram incorporadas pelo relator e
passaram a fazer parte do projeto de lei aprovado.
O outro destaque o portal Gabinete Digital desenvolvido pelo
Governo do Rio Grande do Sul com o propsito de ser um canal de
participao e dilogo entre governo e sociedade. Segundo a descrio
encontrada no site (http://gabinetedigital.rs.gov.br/), o objetivo
incorporar novas ferramentas de participao, oferecendo diferentes
oportunidades ao cidado de influenciar a gesto pblica e exercer
maior controle social sobre o Estado. Inspirado em projetos de
democracia digital tanto no Brasil quanto no exterior, o portal,
criado em 2011, j se
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tornou foco de pesquisas acadmicas e recebeu diversos prmios
nacionais e internacionais pelo incentivo de pesquisas e projetos
em participao popular, cultura digital, propriedade intelectual e
democracia.
Segundo Wu (2013), o sistema est apresentando um novo paradigma
para participao cidad, indo alm das abordagens nicas sobre as
questes sociais para uma abordagem diversa onde uma grande
quantidade de pessoas so ouvidas e atendidas. Wu (2013) descreve o
projeto como uma aposta na renovao da democracia no apenas por
criar um instrumento de participao cidad, mas tambm por ser um
sistema, que, por si s, de apropriao pblica j que a plataforma foi
desenvolvida com tecnologia aberta e licenas livres.
O Gabinete Digital um ambiente digital que processa as ideias de
um debate pblico e constri consenso atravs da metodologia de
crowdsourcing, a mesma utilizada no portal e-democracia da Cmara
dos deputados citado anteriormente. Elaborado com o objetivo de
alcanar a maior participao popular possvel, foi desenvolvido em
cdigo aberto, o que permitiu a interao com outros especialistas
tcnicos de forma colaborativa e, inclusive, a replicao do projeto
tcnico em outros municpios do Brasil. Alm disso, material grfico,
como os vdeos que foram distribudos em formatos que possibilitam a
visualizao sem a necessidade de softwares especficos, como por
exemplo, em HTML5. A interface adaptvel a dispositivos moveis como
tabletes e smartphones.
A proposta do projeto estabelecer uma relao entre a tecnologia
de informao e os usurios de forma que toda informao colaborativa
seja base para debates e deliberaes polticas e no meramente
consultivas, criando um vnculo efetivo entre a esfera pblica e
poltica. Sua principal ferramenta colaborativa denominada
Governador Pergunta onde os usurios devem responder a uma questo
que diz respeito a temas de interesse pblico. As propostas so
recebidas e disponibilizadas para votao e, ao final, os autores das
questes selecionadas so convidados a participar de um encontro
presencial com o Governado do Estado debatendo o encaminhamento das
propostas levantadas. Outras ferramentas tambm esto disponveis como
o Governador Responde onde qualquer cidado pode enviar um
questionamento para o governador, as quais ficam a disposio de
todos e so colocadas em votao. A pergunta mais votada do ms
respondida pelo governador em vdeo. J no Governo Escuta, so
realizadas audincias pblicas transmitidas pela internet com a
participao do pblico e especialistas onde os usurios podem enviar
questes e sugestes ao vivo.
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Um exemplo da participao alcanada e dos resultados obtidos pelo
programa est em uma consulta feita a respeito da Sade no Estado do
Rio Grande do Sul. Ao todo foram recebidas 3,3 mil propostas e 360
mil votos das quais foram selecionadas 50 prioridades para a sade
no Estado. Desta, pelo menos seis propostas saram do papel e se
tornaram lei, mostrando que a parceria entre tecnologia e
democracia um caminho eficiente para promover a participao cidad
direta na soluo dos problemas sociais.
Diversas iniciativas de Governana Digital tm surgido nos ltimos
anos. Recentemente a Presidncia da Repblica instituiu o decreto que
lana o Programa Nacional de Participao Social (PNPS), o qual abre
as portas para consolidao da Democracia Participativa no Brasil ao
regulamentar e incentivar o desenvolvimento de tecnologias de
Participao Popular ativa e Consultas Pblicas, mostrando que a
parceria entre a democracia e a tecnologia pode ser uma soluo para
o descrdito das instituies democrticas e a reaproximao efetiva dos
cidados aos negcios pblicos.
A Democracia Digital, conforme este artigo procurou ilustrar,
fruto de uma prxis construda historicamente que surge como resposta
a uma percepo de crise das instituies democrticas. A tecnologia
emerge neste contexto como possibilidade de transformao social em
prol do resgate dos valores democrticos. Porm, para que esta
transformao seja possvel e a tecnologia se converta em ferramentas
de construo democrtica, faz-se necessrio um empenho
multidisciplinar que envolva as mais diversas cincias desde as
humanas at as engenharias.
4 Concluso
O avano tecnolgico dos ltimos anos est possibilitando uma
reconfigurao da prtica democrtica no s no que diz respeito
virtualizao das ferramentas, como o voto eletrnico, mas tambm da
aproximao da populao tomada de deciso poltica seja por meio da
consulta pblica ou do resgate de mecanismos de democracia direta.
Desta forma, ao aproximar a tecnologia da democracia, faz-se
necessrio ter um amplo conhecimento dos possveis modelos
democrticos e seus impactos.
O presente artigo teve como objetivo contextualizar
historicamente a democracia e apresentar o estado da arte da
Democracia Digital focando as prticas que esto surgindo no cenrio
brasileiro. Conhecer este panorama e os trabalhos pioneiros
possibilita estabelecer alguns pontos de partida para o
desenvolvimento de uma tecnologia voltada de
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fato para as necessidades da sociedade brasileira respondendo
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