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Uma análise regional das estratégias pluriativas dos agricultores
familiares de Mato Grosso em 2006
Grupo de Pesquisa: Agricultura familiar e ruralidade
RESUMO
Este trabalho tem por finalidade identificar as estratégias de reprodução econômica da
agricultura familiar no Estado de Mato Grosso, de acordo com os tipos de atividades
desempenhadas pelo estabelecimento. Foram consideradas as atividades: Agricultura,
Criação de Animais, Produção de Fertilizantes, Prestação de Serviços, Extração de
Minerais e Agroindústria. Foi utilizado o conceito de Pluriatividade para analisar o
comportamento das famílias agrícolas e dados do Censo Agropecuário do IBGE referentes
às receitas das atividades em questão. A metodologia adotada foi o cálculo do Índice de
Concentração Normalizada que resultou na localização dos municípios especializados. Foi
verificado que a Agricultura é a atividade mais difundida entre os municípios
especializados, além de ser a que mais se relaciona com as demais atividades. A Criação de
animais também está difundida no estado. Por fim, a atividade que se mostrou menos
relevante foi a Produção de Fertilizantes, pois nenhum município se apresentou
especializado exclusivamente nesta atividade, estando essa atrelada a outras atividades,
como a Agricultura.
Palavras-chaves: Pluriatividade, Mato Grosso, Agricultura Familiar.
A regional analysis of the strategies pluriactivity family farmers in Mato
Grosso in 2006
ABSTRACT
This study aims at identifying strategies for economic reproduction of family farming in
the State of Mato Grosso, according to the types of activities performed by the
establishment. We considered all activities: Agriculture, Animal Husbandry, Fertilizer
Production, Service Delivery, Mineral Extraction and Agribusiness. We used the concept
of Pluriactivity to analyze the behavior of agricultural households and Census data from
IBGE regarding revenue activities in question. The methodology adopted was to calculate
the Normalized Concentration Index which resulted in the location of specialized
municipalities. It was found that Agriculture is the most widespread activity among
municipalities specialist, and is the one most associated with the other activities. The
Livestock is also widespread in the state. Finally, the activity that was less relevant was the
Fertilizer Production, since no municipality is presented solely specialized in this activity,
this being linked to other activities, such as agriculture.
Key Words: Pluriactivity, Mato Grosso, Family farm.
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1. INTRODUÇÃO
A agricultura familiar no Brasil, bem como no estado de Mato Grosso vem
sofrendo grandes transformações, cujas discussões tem grande peso nas áreas social,
política e acadêmica. Recentemente o governo federal lançou o programa “Brasil sem
Miséria”, que visa a tender as necessidades do homem do campo, aumentar a autoestima
deles para produzir para consumo e venda, obter renda, gerar emprego e garantir a
qualidade de vida a fim de evitar o êxodo rural. As circunstâncias vividas no meio rural em
relação a incentivos aos financiamentos, principais atividades realizadas dentro ou fora da
propriedade e questões voltadas ao fortalecimento da agricultura familiar visam contribuir
para dinamizar o crescimento econômico e desenvolvimento desse setor.
Dentro dessa realidade Schneider (2009) busca entender o fenômeno da
pluriatividade na agricultura como uma nova estratégia da reprodução social das unidades
familiares agrícolas. Uma combinação permanente de atividades agrícolas e não agrícolas,
em uma mesma família, caracteriza e define a pluriatividade, que tanto pode ser um
recurso ao qual a família faz uso como representar uma estratégia individual dos membros
que consistem a unidade doméstica.
O uso da força de trabalho familiar em diversas atividades pode minimizar os riscos
inerentes ao ambiente rural ao qual a agricultura familiar está inserida. Os indivíduos
buscam não somente diversificar as atividades econômicas dentro da propriedade rural,
mas também buscam executar tarefas fora de âmbito. Acredita-se que a pluriatividade seria
uma forma de se especializar em diversas outras atividades da agricultura e que as decisões
são baseadas de acordo com estratégias adotadas entre os membros das famílias.
O objetivo desse trabalho é identificar em quais regiões do Estado de Mato Grosso
a agricultura familiar adota estratégias pluriativas considerando a sua especialização nas
atividades de Agricultura, Criação de Animais, Produção de Fertilizantes, Prestação de
Serviços, Extração de Minerais e Agroindústria. Para isso, será utilizado o método do
Índice de Concentração Normalizada.
Serão apresentados neste trabalho os aspectos da agricultura familiar no estado, os
aspectos metodológicos calculados a partir do ICN, a discussão dos resultados e em
seguida as considerações finais.
2. METODOLOGIA
Os dados considerados neste trabalho são do Censo Agropecuário do IBGE de
2006, correspondente ao valor das receitas obtidas nas atividades desempenhadas pela
Agricultura Familiar durante o ano de 2006. As atividades consideradas são: Agricultura,
Criação de Animais, Produção de Fertilizantes, Prestação de Serviços, Extração de
Minerais e Agroindústria.
A especialização em uma atividade é compreendida como monoatividade, porém,
neste pesquisa quando a especialização ocorre em várias atividades, a unidade agrícola será
considerada pluriativa. Pelo fato dos dados serem municipais, a análise deste trabalho se
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dará no âmbito municipal e não na unidade agrícola. Dessa forma, busca-se evidenciar os
municípios que possuem agricultores familiares especializados em diversas atividades, que
poderiam ser considerados pluriativos.
Será utilizado o método estatístico denominado Índice de Concentração
Normalizado (ICN) para se estimar a especialização. Este método tem como referência os
autores Croco (2011) e Simões (2004), e consiste num indicador composto por outros três:
o Quociente Locacional (QL); o Hirschman-Herfindahl (IHH); e a Participação Relativa
(PR).
O primeiro indicador QL serve para determinar se um município em particular
possui especialização em dada atividade ou setor específico e é calculado com base na
razão entre duas estruturas econômicas, sendo a “economia local” apresentada no
numerador e a “economia de referência”, no denominador.
(1)
Onde:
= Receita da atividade i no município j (economia local);
= Receita da atividade i em Mato Grosso (economia de referência);
= Receita Total Municipal;
= Receita Total de Mato Grosso.
Os valores obtidos pelo QL permitem a interpretação da seguinte maneira, quando
QL = 1 a especialização da economia local no setor i é idêntica a da economia de
referência, quando QL < 1 a especialização da economia local no setor i é inferior a da
economia de referência, e, por fim, quando QL > 1 a especialização da economia local no
setor i é superior a da economia de referência.
Além do QL, os autores propõem ainda o cálculo de dois outros índices que são o
Hirschman-Herfindahl (IHH), que busca captar o real peso do setor i na economia local na
estrutura produtiva da economia de referência. Este é obtido da seguinte forma (Crocco et
al, 2003):
(2)
O IHH permite comparar o peso da atividade ou setor i do município j no setor i do
Estado em relação ao peso da estrutura produtiva do município j na estrutura do Estado
como um todo. Um valor positivo indica que a atividade ou setor i do município j no Mato
Grosso está, ali, mais concentrado e, portanto, com maior poder de atração econômica,
dada sua especialização em tal atividade ou setor.
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O terceiro indicador foi utilizado para captar a importância da atividade ou setor i
do município j diante do total de emprego na referida atividade para a agricultura familiar
em Mato Grosso, isto é, a participação relativa da atividade ou setor no PIB total da
respectiva atividade ou setor no estado. A fórmula é dada por:
(3)
O indicador varia entre zero e um. Quanto mais próximo de um maior a
importância da atividade ou setor i do município j no estado.
3.1 Índice de Concentração Normalizada
Os três indicadores descritos fornecem os insumos básicos para a construção de um
indicador mais geral e consistente de concentração empresarial ligado a uma atividade ou
setor econômico em um município, denominado de Índice de Concentração Normalizado
(ICN). A constituição do ICN seguiu parte do procedimento de Crocco et al. (2003),
mediante a combinação linear dos três indicadores especificados na equação 4.
(4)
3. REFERENCIAL TEÓRICO
3.2 Atividades econômicas
Os setores da economia podem ser classificados em três categorias distintas, setor
primário, secundário e terciário. O setor primário compreende as atividades que extraem ou
produzem matéria-prima, como por exemplo, a agricultura, a pesca, a pecuária e o
extrativismo. Já o setor secundário transforma a matéria-prima extraída ou produzida pelo
setor primário em bens de consumo ou de capital. E por fim, o setor terciário compreende a
comercialização, seja atacadista ou varejista, e a prestação de serviços de forma geral.
Com isso, as atividades econômicas geram riqueza mediantes os processos de
extração, transformação e comercialização que tem como finalidade a satisfação das
necessidades humanas. Essas necessidades podem ser familiares ou individuais, sendo que
esta em conjunto pode constituir aquela. Dessa forma, a agricultura familiar pode empregar
sua força de trabalho em atividades que atinjam a satisfação das necessidades familiares.
As atividades consideradas nesta pesquisa são a agricultura, criação de animal,
produção de fertilizantes, extração mineral, prestação de serviço e agroindústria. A escolha
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dessas atividades deve-se ao fato de resultarem em rendas para a família e que, portanto,
podem garantir a reprodução economia familiar.
A agricultura pertence ao setor primário e se dedica a produção vegetal que pode
ser destinada tanto para a alimentação familiar ou para o mercado. A criação de animal se
refere principalmente à pecuária, que se divide em animais de grande porte e de pequeno
porte. A produção de fertilizantes entende-se como um processo orgânico de produção de
húmus e esterco. A extração mineral engloba todo tipo de exploração de areia, ouro, argila
e a agroindústria compreende pequenas atividades de processamento ocorridas na
agricultura familiar, como a produção de doces, polpas de frutas, entre outras. Essas
atividades podem estar conectadas sendo interdependetes, como por exemplo, a pecuária e
a produção de fertilizantes, ou então, a agricultura e a agroindústria.
3.2 Estratégia e Pluriatividade na agricultura familiar
A reprodução social familiar está inserida dentro de um contexto em que se tem de
um lado as necessidades de consumo familiar e de outro a força de trabalho ou a
capacidade de produção dessa unidade. O equilíbrio ocorre de forma subjetiva, ou seja,
cada família irá satisfazer as suas necessidades de acordo com as suas limitações e
ambições (ABRAMOVAY, 1992). Diversos modelos foram elaborados para compreender
esses mecanismos, tais como, o modelo de Chayanov (1975), Tepich (1973), Lamarche
(1999) e Gasson e Errington (1993, apud SCHNEIDER, 2009).
Segundo Costa (1994), ao contrário da análise marxista que parte do sistema
econômico para compreender a relação campesinato/capitalismo, a abordagem neoclássica
inicia sua perspectiva no âmbito microeconômico da unidade camponesa. Para Chayanov
(1999), a unidade camponesa difere por não apresentar grandezas socialmente
estabelecidas, como o lucro, o salário e a renda da terra.
Com isso, a variável mensurável é a produção, que é determinada pelo tamanho da
família, que também possui influencia da composição e disposição dos membros
(CHAYANOV, 1999). Segundo Faria (2001), no modelo chayanoviano existem dois
limites estabelecidos na produção, sendo primeiro o volume máximo que é obtido pela
utilização total do trabalho, e o segundo é o volume mínimo que é estabelecido de acordo
com o consumo familiar, ou seja, é o mínimo necessário que deve ser produzido para
manter a reprodução social da família.
Com isso, o equilíbrio chayanoviano é obtido quando é igualada a satisfação da
demanda familiar com a penosidade do trabalho (FARIA, 2001). Este equilíbrio possui
caráter subjetivo e é determinado pela força de trabalho (penosidade), pelos meios de
produção e pela situação do mercado (preço). Com isso, a família irá minimizar a
penosidade e maximizar a satisfação com o consumo. Pelo fato de não possuir a mesma
racionalidade do sistema capitalista, o aumento do preço das mercadorias proporciona a
oportunidade de acumulação de capital, porém surge a possibilidade de diminuir a sua
penosidade com o trabalho (FARIA, 2001).
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A produção camponesa sem a geração de excedente não irá lhe proporcionar um
relativo grau de liberdade, fazendo com que a família dependa cada vez mais de
institucionalidades como os preços mínimos, os créditos e os subsídios ofertados pelo
Estado (CHAYANOV, 1999).
Jerzy Tepicht (apud FARIA, 2001) considerou um modo de produção camponês
articulado com outros modos de produção, adaptando-o às leis econômicas destes e ao
mesmo tempo imprimindo neles suas marcas. Segundo Faria (2001), o objetivo de Tepicht
era explicar a sobrevivência do camponês, abordando o seu relacionamento com diversos
modos de produção cuja lógica de funcionamento se diferem.
Segundo Campos (1994), os traços principais do campesinato segundo a visão de
Tepicht são:
1. Caráter familiar, que provoca a simbiose entre a produção e o consumo;
2. Relação entre os fatores de produção trabalho, capital e terra, sendo que ocorre um
aumento na substituição do trabalho pelo capital;
3. Relação entre a economia camponesa e a de mercado;
4. Trabalho e renda camponesa diferentes da lógica de funcionamento capitalista.
Outra questão abordada por Tepicht é a interação entre camponês, mercado e
Estado, que se baseia num jogo dialético de pressão-resposta, na busca de soluções que
geram problemas contínuos (FARIA, 2001). Nesse sentido surgem duas formas de
adaptação do camponês em relação às pressões do “mundo externo”. É a Intensificação do
Tipo I e a do Tipo II. A primeira consiste no camponês se adaptar utilizando técnicas e
recursos que eles conhecem, evitando recorrer ao mercado. Na segunda, há uma adaptação
radical onde buscam as soluções de reposta no mercado, com o objetivo de adquirir novas
técnicas e recursos externos (FARIA, 2001).
As conclusões de Tepicht foram que os sistemas produtivos intensivos em mão-de-
obra deveriam ser realizados pelos camponeses, pois tornaria a produção mais barata e a
produção intensiva em capital deveria ser feita pelas empresas capitalistas. Além disso, a
formação dos oligopólios deriva das trocas desiguais entre camponeses e empresas
capitalistas (FARIA, 2001).
Segundo Schneider (2009), na economia existem as Formas Familiares de
Produção, que consiste na combinação de três fatores: a propriedade jurídica, a atividade
econômica e a unidade familiar. O que caracteriza a agricultura familiar, é que esta pratica
a atividade econômica agrícola, residindo numa propriedade rural. Dessa forma, para
Schneider (2009), a agricultura familiar é aquela que combina a propriedade rural, com
uma atividade agrícola e cuja administração é realizada por uma unidade familiar.
Esta família pode produzir tanto para o autoconsumo quanto para o mercado, ou
para as duas finalidades, sendo que quanto mais aberta ao mercado for, maiores serão as
características capitalistas da produção (SCHNEIDER, 2009). Dentro da agricultura
familiar, existem diversas categorias diferenciadas, como o colono, o ribeirinho, o morador
ou sitiante e o assentado.
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Apesar dessa definição simples de agricultura familiar, surgiram diversos modelos
de análise dessa forma de produção. Um desses é o modelo de Lamarche (1999), que
compreende o funcionamento agrícola evidenciando as diferenças lógicas em função das
quais o agricultor determina suas escolhas. Com isso, ele adotou duas extremidades de
análise, a primeira é o modelo original e a segunda é o modelo ideal. O primeiro seria
aquele tipo de unidade familiar que caracterizava a família no passado, e o segundo é o
tipo de unidade familiar que a família possui a intenção de ser. Dessa forma, as decisões
são tomadas visando atingir o modelo ideal de agricultura familiar.
Outro modelo de agricultura familiar foi elaborado por Gasson e Errington (1993
apud SCHNEIDER, 2003, p. 71), tendo como pressuposto de que as unidades produtivas
agrícolas modernas possuem tanto características familiares quanto empresariais. Com
isso, segundo Schneider (2003) os autores buscam evidenciar a relação entre a propriedade
e o grupo doméstico, considerando seis características essenciais:
1. O chefe da família realiza o controle gerencial da propriedade do empreendimento;
2. Existem as relações de parentesco ou matrimoniais com o chefe.
3. Os membros familiares alocam capital para a produção;
4. O trabalho incorporado na produção da propriedade é familiar;
5. A propriedade e o controle gerencial são transferidos pelas gerações;
6. A família vive na unidade produtiva.
Em meio às discussões de agricultura familiar, surgiram no debate dois conceitos
que inicialmente se confundiam, mas que com a evolução dos estudos acabaram sendo
diferenciados. São os conceitos de part-time farming (agricultura em tempo parcial) e
pluriactivité (pluriatividade). Segundo Schneider (2009), na década de 1980 esses termos
se confundiam, sendo que a única diferença era que os ingleses utilizam mais a primeira
conotação e os franceses utilizam a segunda.
Esses conceitos surgiram a partir de um fenômeno já detectado na década 1970, que
era as diversas origens das rendas nas famílias agrícolas (SCHNEIDER, 2009). A
agricultura em tempo parcial se refere ao tempo utilizado pelo trabalhador no campo, e a
pluriatividade é entendida como as combinações de uma ou mais formas de rendas
auferidas pelas famílias que possibilitam a reprodução social dessas (SCHNEIDER, 2009).
Existem termos antônimos a estes, que são o full-time farming (agricultura em
tempo integral) e a monoactivité (monoatividade), que possuem certa semelhança, tendo
em vista que uma unidade familiar que trabalha com apenas uma atividade ocupa todo o
seu tempo de trabalho nesta mesma atividade (SCHNEIDER, 2009). Entretanto, os seus
opostos possuem diferenças relevantes.
Segundo Fuller (apud SCHNEIDER, 2009,p. 81), o termo “agricultura em tempo
parcial” foi desenvolvido por Rozman para diferenciar os agricultores que produzem para
subsistência dos que produzem para a venda. Além disso, foi com as contribuições desde
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autor junto com Brun (1988, apud SCHENEIDER, 2009, p.82) que as definições entre
part-time farming e pluriatividade foram exaltadas.
O primeiro termo se refere a situação em que a unidade produtiva opera com o
tempo de trabalho menor do que um ano, devido ao tamanho da propriedade ou por opção
da gestão (FULLER e BRUN, 1988 apud SCHNEIDER, 2009, p. 83). E o segundo focaliza
as diversas atividades e interesses dos indivíduos e das famílias que vivem na unidade
produtiva, além de preocupar-se com a reprodução social, com a participação no mercado
de trabalho rural, com a terra e com as questões agrícolas (FULLER e BRUN, 1988 apud
SCHNEIDER, 2009, p. 83).
Nesse contexto a atividade agrícola pode ser menos relevante na composição da
renda familiar e a pluriatividade pode assumir um caráter permanente nas estratégias de
reprodução social das famílias.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
A agricultura familiar, em tese, tem como principal atividade econômica a
agricultura, pois é dela que se produz o alimento e também produtos para serem
comercializados no mercado, para obtenção de recurso financeiro para satisfação das
demais necessidades familiares. Porém, nem sempre a agricultura é a atividade exclusiva
na agricultura familiar, pois cada família se adapta ao ambiente em que se está inserida, e
por isso, pode flexibilizar o uso de sua força de trabalho alocando-a em outras atividades.
Dependendo das condições sócio-econômicas e ambientais de cada região, as famílias
adotam estratégias de reprodução econômica, podendo se dedicar a mais de uma atividade,
além da agricultura.
O Censo Agropecuário do IBGE de 2006 considerou seis atividades principais na
qual a agricultura familiar obtém as suas rendas monetárias. Para esta análise foram
utilizadas as seis atividades econômicas consideradas pelo IBGE nessa pesquisa. São elas:
agricultura, criação de animal, produção de fertilizantes, extração mineral, prestação de
serviço e agroindústria. Essas atividades foram analisadas separadamente e de forma
conjunta no intuito de verificar as estratégias de reprodução econômica da agricultura
familiar no Mato Grosso.
A média do ICN é indicada para verificar os municípios especializados, ou seja, os
municípios com indicador superior à média do Estado de Mato Grosso são considerados
especializados. Entretanto, há municípios com diferentes graus de especialização, por isso
o grupo dos especializados pode ser subdividido em: especializados e altamente
especializados. Porém, o conceito de altamente especializados não é possível de se
determinar de forma universal para todos os casos. Cada conjunto de dados possui suas
especificidades para que seja determinado um limite de separação entre os grupos
especializados e altamente especializados. Para simplificar a análise deste trabalho, serão
considerados municípios altamente especializados aqueles que apresentarem ICN superior
a 5.
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O menor índice médio foi da Prestação de Serviços de 0,65 ICN, enquanto que a
maior média está na atividade da Agroindustria de 1,10 ICN.
Tabela 1. Média do ICN entre os municípios do Mato Grosso na agricultura familiar em
2006.
Atividades Média do ICN no Mato Grosso
Agricultura 0,70
Criação de animais 0,97
Produção de Fertilizantes 0,86
Prestação de Serviços 0,65
Extração Mineral 0,94
Agroindustria 1,10 Fonte: Elaborado no SPSS 17.0 e Excel (2007), com base em dados do IBGE (2011).
Os municípios que se mostraram especializados na Agroindustria estão localizados
nas regiões Sul e Nordeste do estado, enquanto que na Agricultura, os municípios
especializados se concentram nas regiões Sul, Centro e Noroeste. Na Agroindústria
destaca-se o município de Acorizal (5,43 ICN), Jangada (46,04 ICN), Itanhangá (16,22
ICN), Barão de Melgaço (12,07 ICN), Carlina (6,64 ICN) e na Agricultura destacam-se os
municípios Lambari d’Oeste (22,69 ICN), Itanhangá (8,61 ICN) e Ipiranga do Norte (5,92
ICN).
Fonte: Elaborado no SPSS 17.0, Tabwin e Excel (2007), com base em dados do IBGE (2011).
Figura 1. Municípios de Mato Grosso especializados na Agroindustria e na Agricultura da
agricultura familiar em 2006.
A Criação de Animais está difundida no estado, ou seja, não se concentra em
apenas uma região. Já a Produção de Fertilizantes está concentrada em alguns municípios
do Centro-sul e do Norte. Destacam-se na Criação de Animais os municípios de Vale de
São Domingos (11,54 ICN), Reserva do Cabaçal (6,43 ICN) e São José do Povo (5,11
ICN). Na atividade de Produção de Fertilizantes, os municípios com maior grau de
especialização foram Nova Bandeirantes (81,00 ICN) e Nova Marilândia (21,70 ICN).
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Fonte: Elaborado no SPSS 17.0, Tabwin e Excel (2007), com base em dados do IBGE (2011).
Figura 2. Municípios de Mato Grosso especializados na Criação de Animais e na Produção
de Fertilizantes da agricultura familiar em 2006.
A Extração Mineral não apresenta concentração especifica no território estadual de
Mato Grosso, já a atividade de Prestação de Serviços se distribui numa faixa que vai desde
o Sudoeste até o Nordeste do estado. Destacam-se na Extração Mineral os municípios de
Alto Paraguai (68,77 ICN), Matupá (33,77 ICN) e Serra Nova Dourada (7,68 ICN). Na
Prestação de Serviço os principais municípios especializados foram Reserva do Cabaçal
(21,81 ICN), Nova Marilândia (8,17 ICN) e Glória d’Oeste (7,67 ICN).
Fonte: Elaborado no SPSS 17.0, Tabwin e Excel (2007), com base em dados do IBGE (2011).
Figura 3. Municípios de Mato Grosso especializados na Extração de Minerais e na
Prestação de Serviços da agricultura familiar em 2006.
Considerando a distribuição dos municípios do Estado de Mato Grosso em relação
à quantidade de atividades especializadas, verificou-se que nenhum município se
especializou em todas as atividades, nem em cinco nem em seis delas. O máximo de
especialização foi de quatro atividades em nove municípios, que estão localizados na
região Sul do estado. Isso indica um grau elevado de pluriatividade na região Sul enquanto
que na região Norte grande parcela dos municípios se mostraram especializados em duas
atividades.
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Fonte: Elaborado no SPSS 17.0, Tabwin e Excel (2007), com base em dados do IBGE (2011).
Figura 4. Municípios de Mato Grosso especializados segundo o número de atividades
especializadas na agricultura familiar em 2006.
Os dados demonstraram que os municípios estão especializados principalmente na
Agricultura, na Criação de animais e na Prestação de Serviços, e altamente especializados
na Agroindustria.
Tabela 2. Divisão dos municípios do Mato Grosso em Não-especializados, Especializados
e Altamente Especializados, segundo as atividades na agricultura familiar em 2006.
Atividades Não-especializados Especializados Altamente
Especializados
Agricultura 112 26 3
Criação de animais 96 42 3
Produção de Fertilizantes 132 7 2
Prestação de Serviços 113 25 3
Extração Mineral 130 8 3
Agroindustria 117 19 5
Fonte: Elaborado no SPSS 17.0 e Excel (2007), com base em dados do IBGE (2011).
Analisando as atividades de forma separada, verifica-se um elevado número de
municípios não-especializados, porém se analisar de forma generalizada esse número é
reduzido. Muitos municípios se especializam em várias atividades ao mesmo tempo,
indicando que as famílias possam estar adotando estratégias pluriativas de reprodução
econômica. Dos 141 municípios em Mato Grosso, cerca de 24 municípios não
apresentaram especialização em nenhuma das atividades, e 55 municípios apresentaram
especialização em um tipo de atividade revelando o caráter monoativo da agricultura
familiar nesses municípios. Entretanto, 62 municípios apresentaram especialização em
mais de uma atividade, sendo 36 em duas, 17 em três e 9 em quatro.
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Tabela 3. Número de municípios de Mato Grosso segundo quantidade de atividades
especializadas na agricultura familiar em 2006.
N° de atividades especializadas N° de municípios
0 24
1 55
2 36
3 17
4 9
Total 141
Fonte: Elaborado no SPSS 17.0 e Excel (2007), com base em dados do IBGE (2011).
É possível notar a partir do quadro 1, que a agricultura é a atividade mais
especializada entre os agricultores familiares presente em 48 municípios do estado . E em
18 municípios a atividade é realizada em conjunto com a criação de animais. São
realizados em 16 municípios a atividade agrícola em conjunto com mais duas outras
atividades e em 8 municípios ligada a mais 3 atividades. Sendo que a criação de animais é
especializada em mais municípios quando relacionada com mais atividades. Já a produção
de fertilizantes sozinha não está presente em nenhum município, tal atividade só apresenta
certo nível de especialização quando relacionada a duas ou mais atividades.
Atividades
2 atividades 3
atividades
4
Atividades Agricultura Criação de
Animais
Produção de
Fertilizantes
Prestação de
Serviços
Extração
Mineral Agroindústria
Agricultura 43 18 2 2 3 5 16 8
Criação de Animais
18 6 0 2 1 2 8 8
Produção de
Fertilizantes 2 0 0 1 0 0 3 3
Prestação de serviços
2 2 1 2 0 0 12 9
Extração
Mineral 3 1 0 0 2 0 3 2
Agroindústria 5 2 0 0 0 2 9 6
Fonte: Elaborado pelos autores no SPSS 17.0 e Excel (2007), com base nos dados do IBGE (2011).
*Dados da diagonal indicam a quantidade dos municípios especializados em uma atividade.
Quadro 1. Relação entre as atividades especializadas na agricultura familiar dos municípios
de Mato Grosso em 2006.
A especialização de prestação de serviços está fortemente relacionada a duas ou
mais atividades, representando a grande inteiração do setor com as demais atividades. A
extração mineral como atividade especializada está presente em apenas dois municípios,
tem relação com a agricultura em três municípios. A especialização da agroindústria
apresenta uma relação com mais duas atividades em nove municípios e relação com três
atividades em seis municípios.
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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A agricultura familiar é um sistema onde a economia está sujeita às necessidades
familiares. Com isso, as decisões tomadas internamente podem alocar a força de trabalho
em atividades agrícolas ou não-agrícolas. Isso irá depender dos interesses familiares e das
condições sócio-econômicas e ambientais em que estão inseridos. Nesse sentido, as
atividades estudadas podem estar de alguma forma relacionada, pois no ambiente familiar
as atividades nem sempre estão isoladas, mas sim compartilham de um mesmo espaço, e às
vezes, da mesma força de trabalho. No caso da Agricultura e da Criação de Animais, estas
atividades podem estar correlacionadas no sentido de fornecimento de insumos. Ou então,
entre Agricultura e a Produção de Fertilizante, onde os fertilizantes podem ser produzidos
com resíduos da agricultura, seguindo uma racionalidade agroecológica.
6. BIBLIOGRAFIA
ABRAMOVAY, Ricardo. Paradigmas do capitalismo agrário em questão. São Paulo:
HUCITEC, 1992.
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