Um modelo de classificação e de periodização dos estudos científicos em Geografia Dante F. C. Reis Jr. Prof. Adjunto, Departamento de Geografia, Universidade de Brasília LAGIM, Laboratório de Geo-Iconografia e Multimídias [email protected]Resumo Design de um modelo “tripartido”, pelo qual propomos o tratamento de temas de história e filosofia da ciência geográfica mediante (i) rearticulação lógica entre termos correntes mas de uso descuidado (Sistema de Pensamento, Vertente, Corrente), (ii) rearranjo simples de grandes marcos temporais e (iii) configuração de um campo particular para os estudos de “geografia da ciência” (caso exclusivo em que o termo “Escola” estaria habilitado). Os dois primeiros aspectos do modelo dizem respeito a uma “Epistemologia da Geografia”; enquanto o terceiro, a uma “Epistemologia Geográfica”. O protótipo, portanto, pode ter serventia no ensino universitário, a fim de propiciar exercícios interpretativos da dimensão tanto científica, quanto metacientífica da Geografia. Palavras-chave: sistemas de pensamento filosófico; correntes de prática científica; geografia da ciência Abstract Design of a “three-way” model for which we propose an approach of history and philosophy of geographical science topics by (i) logic re-articulation between current terminology although of careless use (Thought System, Strand, Current), (ii) simple rearrangement of large turning points and (iii) setting up a particular field for studies in “geography of science” (the single case in which “School” term would be enabled). The first two aspects of the model relate to an “Epistemology of Geography”; the third, to an “Geographical Epistemology”. The prototype therefore may have usefulness in higher education, in order to provide interpretative exercises about scientific and meta- scientific dimensions of Geography. Keywords: systems of philosophical thought; currents of scientific practice; geography of science Introdução: o problema e algumas táticas de abordagem
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Um modelo de classificação e de periodização dos estudos ... · Manuais correntes que tratam de “pensamento geográfico” (geographical thought, pensée géographique, pensamiento
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Um modelo de classificação e de periodização dos estudos científicos em Geografia
Dante F. C. Reis Jr.
Prof. Adjunto, Departamento de Geografia, Universidade de Brasília
LAGIM, Laboratório de Geo-Iconografia e Multimídias
Pensamos que a sistematização aqui proposta apresenta uma vantagem funcional no âmbito do
ensino de história e filosofia da ciência geográfica.
Figura 2 – As Três Trilhas Discursivas da Geografia
(sent. horário: “postura política”, “prática científica” e “postura estética”)
1. Quadrante primeiro (Q1): modelo de “timbres”, a partir de uma imagem de fluência
Descreveremos o esquema seguindo aquela linha de descendência acima referida (SP>V>C>M>E).
Em nossa proposição os “Sistemas de Pensamento” (SP’s) são os timbres formados pelas grandes
orientações filosóficas do entendimento humano. Grandes visões de mundo que, muito
naturalmente, tenderão a estar infiltradas (“mais adiante”, na cadeia das constituições explanatórias)
nos esquemas científicos de descrição/interpretação. Três pares de SP’s são particularmente
motrizes, sendo que há uma certa predisposição de um dos constituintes do par inserir-se no plano
do concreto e dos sentidos (enquanto o outro parece enraizado mais no plano do abstrato, da razão ...
com alguma migração possível à sensibilidade emocional). Os três pares seriam: Empirismo e
Racionalismo, Realismo e Idealismo, Materialismo e Humanismo. A História da Filosofia
demonstra quão vasta pode ser se tomarmos cada um destes seis SP’s como uma “família” ou
“ordem” de pensamento. Fato verificado já pela heterogeneidade de autores possíveis de vincular,
por dado motivo, a uma dessas famílias.
Podemos enxergar os Sistemas como que canais encravados num altiplano. Quando, porém, escoam
em declive assumem a condição as Vertentes.
“Vertente” viria a ser, portanto, uma derivação a partir de um ou vários SP’s; sendo que detentora já
de uma característica muito peculiar: tem intenção concentrada (ou, ação centrada) a um fim.
Descola-se das moções meramente especulativas e/ou essencialistas, rumando a um plano que logo
poderá redundar em argumentações propriamente resolutivas, ou pelo menos dirigidas a contextos
mais aplicados. Isso significa, então, que uma Vertente, de certo modo, intermedeia ou conecta um
planalto de reflexões filosóficas a uma planície de práticas científicas. E, como se presume, também
pode ser entendida como uma ordem mais especial de SP’s “antecedentes”. O Positivismo Lógico,
assim como as várias modalidades de Pragmatismo, seriam bons exemplos de Vertentes – chamando
a atenção para o fato de que o primeiro verteria uma mescla ou confluência dos sistemas empirista e
racionalista.
[Em pesquisas anteriores já nos referimos a essa transição PhiSci como uma “introjeção” de
“preceitos filosóficos” em “premissas científicas” (Reis Jr., 2014), ou como uma “correspondência”
relativa entre “cláusulas” do sistema filosófico e “atributos” do discurso científico (Reis Jr. et al.
2016).].
Realizada a “derivação” encontramo-nos, por fim, no baixo terreno do pensamento e da prática
científicos. Por esta planície mundana escoam todos aqueles canais que serão, em última análise,
“rebatimentos” (no plano agora das investigações normatizadas) de SP’s e V’s ascendentes. É nesta
planície ou campo aberto que localizaremos a atuação de uma ciência. E chamaremos “Corrente”
cada possível manifestação (já, é claro, embebida em projetos aplicados e/ou resolutivos) de
pensamentos filosóficos redivivos. Ela consiste, então, de uma “tendência” verificada dentro de um
campo científico.
Seguindo na analogia fluvial, é conveniente incorporarmos também a imagem dos canais que se
ramificam em avulsão. Estes ramos instituiriam o timbre “Matizes”.
“Matiz” representaria uma “variante” alternativa de certa tendência. Sendo assim, considerando o
caso da ciência geográfica, enquanto tendências que aqui denominaríamos Geografia “Descritivo-
Classificatória”2, Geo. “Matemático-Mensurativa”3, Geo. “Modelística” e Geo. “Irracionalista”
configurariam Correntes, variantes de tendência tais como (digamos) Geografia “I.-Humanística”,
G.“M.-Quantitativa” e G.“M.-Representacional” configurariam Matizes. (Ressaltando que estas
2 Sugestão de timbre particular para a prática (das mais antigas na história de nossa disciplina) dos inventários
“catalográficos” a campo, descarregados de qualquer grade teórica sofisticada. 3 Sugestão de timbre particular para a prática (tão ou mais datada que a catalográfica) das representações geométricas e
estabelecimento de sistemas de localização. Timbre que aproximou, por largo tempo, geógrafos e astrônomos.
duas últimas seriam, particularmente, as variantes da Corrente “Modelística” de Geografia; enquanto
a primeira, uma ramificação de sua Corrente Irracionalista).
Quadro 2 – Exemplo de Proposta de Reclassificação
Um modelo de classificação que interponha esses específicos dois timbres (da Corrente e do Matiz)
é particularmente oportuno para o caso do ensino de Epistemologia da Ciência Geográfica (E:cg).
Isso porque os manuais correntes também costumam difundir (talvez mesmo a despeito das boas
intenções de seus autores) a imagem de “paradigmas” da investigação geográfica que seriam quase
que perfeitamente homogêneos, identitários, em suas (aparentes) estritas manifestações –