Roteiro Pico 2 GUIA/ROTEIRO ILHA DO PICO FICHA TÉCNICA Edição ADELIAÇOR – Associação para o Desenvolvimento Local de Ilhas dos Açores Textos ADELIAÇOR – Associação para o Desenvolvimento Local de Ilhas dos Açores Arlene Goulart e Sónia Borges Fotografias Museu dos Baleeiros, Manuel Inácio Goulart, Sónia Borges, Ricardo Medeiros, Sérgio Azevedo Paginação Carlos Mota AID Impressão Nova Gráfica, Lda Tiragem 250 exemplares Depósito Legal 00000000/09 ISBN 00000000 TURISMO CULTURAL O projecto de Turismo Cultural denominado Itinerários Turísticos Temáticos, surge no terri- tório da ADELIAÇOR pela necessidade de enaltecer todo o património e história associados a temas que, quer pela importância económica quer pela importância cultural, marcaram a história destas ilhas. É desta forma que, a ADELIAÇOR, enquanto associação de desenvolvimen- to local, propõe a realização de um trabalho de concepção e programação, que permitirá a criação de condições para a organização e promoção de um novo produto turístico, na sua Zona de Intervenção, cuja designação internacional corresponde ao que em Portugal se convencionou chamar “Rotas”. Assim, neste contexto, entende-se por Rota, um conjunto de entidades e instituições públicas, associadas a empresas locais, nas áreas da restaura- ção, artesanato, património (natural, cultural e edificado) e animação, or- ganizados num itinerário, devidamente sinalizado e aprovado para o efeito, aumentando assim o leque de oferta turística na área em que se insere. 3 Roteiro Pico
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Roteiro Pico 2
GUIA/ROTEIRO ILHA DO PICO
FICHA TÉCNICA
EdiçãoADELIAÇOR – Associação para o Desenvolvimento Local de Ilhas dos Açores
TextosADELIAÇOR – Associação para o Desenvolvimento Local de Ilhas dos AçoresArlene Goulart e Sónia Borges
Fotografi as Museu dos Baleeiros, Manuel Inácio Goulart, Sónia Borges, Ricardo Medeiros, Sérgio AzevedoPaginação Carlos Mota AIDImpressão Nova Gráfi ca, LdaTiragem 250 exemplaresDepósito Legal 00000000/09ISBN 00000000
TURISMO CULTURAL O projecto de Turismo
Cultural denominado Itinerários Turísticos Temáticos, surge no terri-
tório da ADELIAÇOR pela necessidade de enaltecer todo o património
e história associados a temas que, quer pela importância económica quer
pela importância cultural, marcaram a história destas ilhas.
É desta forma que, a ADELIAÇOR, enquanto associação de desenvolvimen-
to local, propõe a realização de um trabalho de concepção e programação,
que permitirá a criação de condições para a organização e promoção de
um novo produto turístico, na sua Zona de Intervenção, cuja designação
internacional corresponde ao que em Portugal se convencionou chamar
“Rotas”.
Assim, neste contexto, entende-se por Rota, um conjunto de entidades e
instituições públicas, associadas a empresas locais, nas áreas da restaura-
ção, artesanato, património (natural, cultural e edifi cado) e animação, or-
ganizados num itinerário, devidamente sinalizado e aprovado para o efeito,
aumentando assim o leque de oferta turística na área em que se insere.
3 Roteiro Pico
Roteiro Pico 4
Com estes itinerários culturais, adiante designados por Rotas, a ADELIA-
ÇOR pretende proporcionar ao visitante, um percurso pela cultura que,
no caso da Ilha do Pico, está associado aos temas da Faina Baleeira e do
Vinho do Pico, através da organização de toda a oferta turística e cultural
relacionada com as temáticas propostas.
A Zona de Intervenção da ADELIAÇOR, constituída pelas Ilhas de São
Jorge, Pico, Faial, Flores e Corvo, oferece ao visitante um vasto e diverso
conjunto de elementos associados a uma cultura rica em manifestações.
A Rota da Faina Baleeira e a Rota do Vinho do Pico, propostas
para a Ilha do Pico, podem ser percorridas durante todos os meses do
ano recomendando-se um percurso de carro, para que seja realizada com
maior comodidade.
Este guia encontra-se organizado em duas partes: uma primeira dedicada à
caracterização histórica e geográfi ca da Ilha, e uma segunda parte aborda,
os conteúdos relativos à Rota da Faina Baleeira e Rota do Vinho. Por
sua vez, e para que o visitante possa planear o seu percurso pelas Rotas,
de forma segura e esclarecida, a segunda parte está organizada de forma a
5 Roteiro Pico
que o visitante tenha uma percepção das freguesias contempladas em cada
itinerário, relevando os eventos que possam ocorrer na localidade, asso-
ciados à respectiva temática, para além de curiosidades históricas, sempre
que estas se justifi cam e uma identifi cação dos Aderentes.
O roteiro é complementado com um mapa desdobrável, onde está iden-
tifi cado, através de pictogramas, o itinerário da Rota, os respectivos Ade-
rentes e outras informações turísticas gerais. No verso do mapa existe um
resumo da respectiva rota.
Sugerimos que organize a sua visita, pelos itinerários propostos, com base
neste Roteiro, concebido com o intuito de guiar o visitante pelo percurso
escolhido, para que não deixe passar a oportunidade de sentir a emoção
da baleação vivida em terra de baleeiros, provar o vinho nascido do basalto
e apreciar a gastronomia local.
Seja bem-vindo à Ilha do Pico!
ENTIDADE GESTORA DA ROTA
ADELIAÇOR – Associação para o Desenvolvimento Local de Ilhas dos
(Uva-da-serra), Juniperus brevifolia (Cedro-do-mato). À
medida que diminui a altitude, surgem as espécies intro-
duzidas, como o Pittosporum Undulatum (Incenso) e a He-
dychium Gardneniaum (Roca da Velha).
Nas ilhas dos Açores não existem animais de grande
porte. No Pico, encontra-se apenas uma espécie endé-
mica – o Morcego-dos-Açores (Nyctalus azoreum).
Louro-da-Terra
Roteiro Pico 8 9 Roteiro Pico
Os passeios pedestres percorridos através de caminhos ver-
dejantes, oferecem ao visitante da ilha paisagens de extraor-
dinária beleza onde se podem surpreender com a diversida-
de de fauna e fl ora e pela geografi a resultado dos sucessivos
vulcões que deram origem à ilha.
A CULTURA DE UM POVO A Pai-
sagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, classifi cada como
Património da Humanidade pela UNESCO, em 2004, surge
como um reconhecimento pela obra hercúlea deste povo.
A zona classifi cada, que engloba os lajidos das freguesias da
Criação Velha e de Santa Luzia, abrange uma área de 987
hectares de muros lineares paralelos e perpendiculares à li-
nha de costa rochosa, construídos com pedras soltas, para
protecção da vinha, contra a água do mar e do vento. São
os denominados currais. Aqui continua a ser produzido o
famoso “Verdelho do Pico”. A necessidade de trabalhar a
terra, em paralelo com a vinha, para sustento das famílias
obrigou a que os terrenos fossem limpos de pedras, levando
à construção de amontoados de pedras, em forma piramidal,
designados por “maroiços”, localizados em terrenos adja-
centes aos currais das vinhas. Hoje ainda são visíveis estes
“monumentos de basalto”.
Paisagem da Cultura da Vinha do Pico
Poço de Maré Rola-Pipas
Mas a zona classifi cada abrange também todo o
património civil e religioso associado a esta activi-
dade, cujas origens datam do século XV. São disso
exemplo, os Solares do Verdelho, do início do sé-
culo XIX, as adegas, os poços de maré, as igrejas
e ermidas e até os portos com os “rola-pipas”,
porta de saída do vinho para a exportação.
A introdução da vinha na ilha, atribuída à ordem
religiosa Jesuíta, remonta ao tempo do povoamen-
to, quando foi inserida a casta Verdelho. Apenas no
século XIX, são introduzidas novas castas que dão
origem a vinhos de mesa brancos e tintos.
Para além do Ciclo do Vinho, a ilha conheceu aquilo
que poderá denominar-se o Ciclo da Baleação, pelo
que a caça à baleia também faz parte das vivências
deste povo insular. No século XIX, as armações ba-
leeiras que se instalaram na ilha, proporcionaram à
população uma nova forma de sustento, comple-
mentar à actividade agrícola muito débil. Como
testemunho desta actividade, subsiste todo um
património arquitectónico e cultural, singular nos
Açores.
Roteiro Pico 10
Estes pratos podem e devem ser precedidos
pelo Verdelho e pelo Queijo do Pico. A refei-
ção propriamente dita, deve ser acompanhada
pelo “Vinho de Cheiro” artesanal ou por um
dos Vinhos Regionais, brancos ou tintos pro-
duzidos na Ilha. Para terminar, a doçaria está
representada pelo Arroz Doce, a Massa Sova-
da ou até as Rosquilhas e as Vésperas. E como
pelos sabores se identifi ca um território, a
refeição pode ainda ser terminada com uma
Aguardente de Bagaço do Pico, um Licor de
Amora ou Nêspera ou com uma “Angelica”.
No artesanato, destacam-se as rendas e os
bordados produzidas pelas mãos habéis das
senhoras da ilha que, através de técnicas de
“Gancho”, ou “Crochet de Arte”, criam be-
las e diversas peças de utilidade doméstica
decorativa, como toalhas e centros de mesa,
cortinas e uma série de entremeios e outras
aplicações em tecido de linho e de algodão,
tendo sido no passado um complemento fun-
damental ao sustento das famílias.
Com o contributo da actividade baleeira, sur-
ge a forma de arte popular conhecida por
“Scrimshaw”, cuja origem remonta às frotas
baleeiras nos fi nais do século XVIII, como
forma de ocupar o tempo durante as longas
horas de lazer a bordo. Nas ilhas do Faial e do
Pico, esta forma de artesanato consiste num
processo de gravura e escultura em dente e
osso de cachalote, aplicado em objectos tanto
de uso diário como ornamental.
11 Roteiro Pico
A museologia da ilha, enaltece a cultura associada aos
dois ciclos económicos referenciados: o Museu dos
Baleeiros, na Vila das Lajes, o Museu da Industria Ba-
leeira, na Vila de São Roque e o Museu do Vinho, na
Vila da Madalena.
Museu do Vinho
Comemorações do Divino Espírito Santo
Linguiça
Rendas do Pico
Scrimshaw
O calendário festivo da ilha tem início com as festividades em honra do
Divino Espírito Santo, comuns a todas as ilhas do Arquipélago. Para além
destas, as festividades que mais se destacam na Ilha são: a Festa de Santa
Maria Madalena; Cais Agosto, em São Roque; a Festa e Procissão do Senhor
Bom Jesus, na freguesia de São Mateus e a Semana dos Baleeiros, em honra
de Nossa Senhora de Lourdes; realizada na Vila das Lajes.
Mas, da cultura de um povo faz também parte a gastronomia e nenhum
roteiro fi caria completo sem esta referência. No caso da Ilha do Pico, esta
caracteriza-se pela abundância e riqueza de sabores. A partir dos produtos
oferecidos pelo mar, onde se destacam, os crustáceos (lagosta, cavaco e
caranguejo) e o peixe de todos os tamanhos e sabores, é possível confec-
cionar pratos como o “Caldo de Peixe” ou a “Caldeirada”. A terra também
é generosa e presenteia a gastronomia com carnes de bovino e suíno, a
partir das quais são confeccionados pratos como a “Molha de Carne à
Moda do Pico”, “Sopas do Espírito Santo”, “Torresmos de Vinha-d’alhos”,
a “Linguiça” e a “Morcela”.
12 Rota da Rota da 13
Esta – a vida para que nasceram. Cavar a terra que lhes pertence; ir à pesca
em noites bonançosas; ir à baleia, por esses mares sem fi m, quando o foguete
rebenta na vigia; e, no intervalo de duas canseiras, ter tempo, muito tempo, para
descansar, na casa dos botes. Terra de baleeiros – vida de baleeiros.
Dias de Melo
12 Rota da
A Rota da Faina Baleeira, na Ilha do Pico, surge com a principal fi nalidade
de promover localidades, estruturas e actividades desportivo-culturais es-
treitamente associadas à história da baleação. Para além deste objectivo,
procura dinamizar o património industrial e artesanal, com a divulgação
do vasto legado vernacular e o rico espólio de artesanato - “Scrimshaw”,
testemunhos vivos da epopeia da baleia.
A caça à baleia surge como designação genérica para a caça de várias es-
pécies, de grandes cetáceos, que passam ao largo das ilhas dos Açores, nas
quais se incluem as baleias de bossa e os cachalotes.
Em 28 de Abril de 1876 foi estabelecida a primeira armação baleeira, na
Ilha do Pico, na freguesia da Calheta de Nesquim, através de um contrato
escrito entre a família Dabney, residente no Faial, e o Capitão Anselmo
Silveira. Logo de seguida, surgiram diversas armações pelo Sul do Pico. Pri-
meiro na freguesia de São João, pertencente à família Lemos da freguesia
de São Mateus e aos “Macieis” da freguesia de São João, cujas instalações
terrestres viriam a ser destruídas pelo ciclone de 28 de Agosto de 1893,
tendo as canoas sido depois vendidas às armações da Vila das Lajes.
Em 1897 existiam, na Vila das Lajes, seis companhias baleeiras, sociedades
irregulares que funcionavam em nome dos respectivos gerentes. No início
do século XX é publicada legislação para regulamentação da actividade
baleeira que dará origem à legalização das sociedades existentes.
14 Rota da Rota da 15 14 Rota da
Assim, estava iniciada uma “epopeia” que duraria pouco mais do que um
século na ilha, mas que deixou marcas indeléveis. A faina baleeira encer-
ra-se defi nitivamente nos anos oitenta do séc. XX, por causa das mora-
tórias ambientalistas internacionais. O último cachalote a ser arpoado no
Grupo Ocidental ocorreu em 1981, enquanto nas ilhas do Grupo Central
a caça continuou, de forma extemporânea, por mais meia dúzia de anos.
Hoje em dia, a caça à baleia é recordada e perpetuada pelos açorianos na
chamada “Regata de Botes Baleeiros”.
Os homens da ilha, “baleeiros”, eram sobretudo agricultores durante todo
o ano, dedicando-se, nos meses de Verão, à caça à baleia.
Embarcação destinada à caça ao cachalote, tem cerca de 10 a 12 metros
de comprimento por 1,90m de largura de boca, considerada uma das em-
barcações mais elegantes do mundo. O mastro mede cerca de 8,80 m de
altura suportando duas velas, a grande e a giba (burrajona). Da palamenta
fazem ainda parte: seis remos, duas selhas, cinco arpões, cinco lanças, um
espeide, um croque, um machado, um balde, um pequeno barrilete com
água doce, uma faca, uma bússola, uma caixa de víveres e uma lanterna.
No mar, a experiência dita as regras. Assim, e depois de ultrapassarem as
ondas da costa, os botes, com os sete homens a bordo, que compõem
uma “Companha”, começavam a deslizar. A sua velocidade era sinal de que
seria uma boa jornada na faina. Por vezes, as baleias mudavam de rumo e
então o “Vigia” retirava a bandeira. Os botes começavam a deslocar-se
em círculo, até que o “Vigia” voltasse a hastear a bandeira, indicando que
estavam no rumo certo e podiam avançar.
VIGIA DAS RELVAS
BOTE OU CANOA BALEEIRA
As vigias eram os locais onde homens, com binóculos, se instalavam em
busca de baleias no horizonte. Estes espaços, normalmente construídos
num formato quadrado ou hexagonal, localizavam-se em zonas onde se
vislumbrava o mar numa grande amplitude.
Não há dúvida que a baleação muito contribuiu, durante século e meio,
para um certo desafogo económico da população picarota. Nos meses de
passagem dos cachalotes, estes homens aguardavam, pelo sinal do “Vigia”,
normalmente dado com o soprar de um búzio ou com o lançamento de
um foguete.
Ouvido o sinal, os homens corriam para o calhau, deixando os seus afa-
zeres do campo e, com os olhos fi xos no mar, alguns conseguiam ainda
receber o farnel entregue pelas esposas ou fi lhos que também corriam
até ao cais ao encontro do marido ou pai. Arreados os “botes”, também
designados “canoas baleeiras”, seguiam os homens para a faina do mar, em
busca de uma vida melhor, sem saber quando e se voltavam.
Rota da 17 16 Rota da
Acaba na vigia de rebentar o foguete, o alarme de baleia à vista. O seu fumo
esbranquiçado, que se recortou e diluiu na limpidez do céu azul, impregnou a
luz do sol e a pureza do ar que respiramos de um fl uido misterioso que nos
penetra no corpo, entra no sangue e nos transmite qualquer coisa de diferente.
(…) Entretanto, não demoram os que, dispersos pela freguesia, trabalhavam nas
suas terras, muitos nas suas ofi cinas. Descem em corrida vertiginosa pelos velhos
e empinados caminhos. (…) Os que andavam à pesca, recolhem rapidamente os
aparelhos, gorazeiras e agulheiras, vogam para o porto. Embatem barcos contra
barcos. Quebram-se remos. Arrombam-se embarcações. (…) Nem as mulheres
fi cam indiferentes ao acontecimento movimentado, espectacular, emocionante.
As que não têm ninguém que parta – poucas – debruçam-se pelas janelas,
empinam-se pelos balcões, a ver. As outras – as mães, as esposas, as irmãs,
as fi lhas dos baleeiros – chegam ao portão, à cancela, a alcançar, nervosas, a
comida e a roupa aos seus homens, que passam, como rajadas de vento, sem
as olharem – ou, se eles trabalhavam arredados do caminho de casa, também
correm, esbraseadas, esbaforidas, xailes pelas cabeças, até à beira do cais. Vêm
trazer-lhes as suas coisinhas.
No mar, não há pão. O sol, durante o dia todo, queima, com seu fogo de frigir
demónios, as carnes dos baleeiros: porém, depois que se esconde à ilharga do
Faial, a noite chega e o frio aperta.
In, “Mar Rubro”, Dias de Melo
Nome pelo qual a tripulação de um bote era conhecida.
A técnica consistia em aproximarem-se da baleia, sem ruído, sendo a tarefa
mais difícil aquela desempenhada pelo “trancador” ou “arpoador” o qual,
de pé, com os pés bem fi rmes, vai à proa de arpão em punho, aguardando
a ordem do mestre que lhe dará a indicação para atingir a baleia num
sítio crucial. Depois de arpoado, o animal sangra até à morte. Esta acti-
vidade torna-se perigosa, sobretudo nesta fase em que, o animal ferido,
pode reagir violentamente e abafar os botes com a cauda, provocando um
redemoinho nas ondas ou até mesmo arrastando os botes para o fundo,
quando mergulha entre as vagas, uma vez que o bote continua seguro à
baleia, através da linha, que se encontra dentro de duas celhas, muito bem
enrolada. Muitas vezes, a linha acabava e a baleia submergia a muita profun-
didade, resolvendo-se apenas quando estava outro barco por perto e era
possível fornecer mais linha, senão a baleia perdia-se….mas na maior parte
das vezes o animal emergia, para respirar, antes de acabar a linha, a qual
passando de mão em mão, era segurada por todos os tripulantes do barco.
Uma baleia dava muito óleo e o óleo dava sustento às famílias.
COMPANHA
18 Rota da Rota da 19
O Capitão vai contando:
- Um embrulho de linha. Passou aqui no cepo, eu gritei prá proa: Lá vai embrulho!
Safa se podes, senão corta! – O rapaz estendeu-se por riba do leito, já o bote
afocinhava, deu uma pancada no embrulho, por baixo, com a mão esquerda,
e disse: Safei! – Nisto, a linha começa a correr, dá-lhe uma chicotada e atira-o
borda fora. O Azevedo mergulhou, agarrou-o pelos cabelos, estava ele já sem sen-
tidos. Metemo-lo dentro, vimos que tinha um inchaço na cabeça, a mão esquerda
esmigalhada e com falta de dedos.
In, Mar Rubro, Dias de Melo
Depois da captura, a baleia era rebocada até uma das fábricas onde era
esquartejada, para produção de óleos.
Inicialmente, todo este processo era feito de forma artesanal, pelos pró-
prios baleeiros através de um método designado de “fogo directo”, em
típicos “traiols”. Só mais tarde, a partir de 1930, com as fábricas de derreti-
mento, é que esta árdua tarefa passa a ser menos artesanal. O aparecimen-
to destas fábricas e a industrialização permitiu também o desenvolvimento
económico da Ilha do Pico. Foi nesta fase que se constituiu a Sociedade
de Indústria Baleeira Insular, Lda, - SIBIL, a partir da fusão de dez socieda-
des baleeiras, três sediadas em Santa Cruz das Ribeiras e sete da Vila das
Lajes.
Os trancadores, meios nus, de pé em cima das baleias, com as espés muito afi a-
das, separavam-lhes dos corpos as enormes cabeças, descascavam-lhes da carne
o toicinho. (…) Á borda d’ água, abriam-se as cabeças. Esvaziam-se do líquido
precioso, o esparmacete que enchia baldes, celhas, latas.
Trabalho nauseabundo. Só por se não perder substância tão procurada, tão cara,
rica em virtudes medicinais, havia homens que se sujeitavam àquele banho pe-
gajoso, repugnante, em que, enfi ados até à cintura, tinham de permanecer horas
e horas. Retalhava-se a parte sólida das cabeças e, no cais, o toicinho.
(…)
Trabalho de escravos. Dois a dois, pendia-lhes a carga, numa corrente, do meio
do pau de adreço, que aguentavam, pelas pontas, nos ombros. E as verrugas do
pau de adreço dilaceravam-lhes, retalhavam-lhes as carnes, os ossos; retesavam-
se-lhes os músculos, vergavam-se-lhes as costas, cansavam-se-lhes as pernas, o
lume do chão, a ferver ao fogo do sol, queimava-lhes os pés nus, o dia todo e a
noite toda para cima, para baixo, naquela vida dolorosa.
In, Mar Rubro, Dias de Melo
20 Rota da Rota da 21 Roteiro Pico
TRAIOL
A fábrica pertencente à SIBIL, iniciou a sua laboração em Junho de 1955,
com a exportação de óleos, farinha e o valioso âmbar, um pouco por todo
o mundo. Conhecida ainda hoje como “Fábrica da Baleia”, encerrou a acti-
vidade no início dos anos 80, tendo sido, no fi m da década, adquirida pela
Câmara Municipal das Lajes do Pico, onde instalou o “Centro de Artes e
Ciências do Mar”.
Fábrica SIBIL
Fábrica das Armações Baleeiras Reunidas
Vila das Lajes
Na Vila de São Roque foi fundada, em 1942, a Fabrica das Armações Baleei-
ras Reunidas, que resultou da união entre a Companhia Velha Baleeira, Lda.,
a Armação Baleeira do Livramento, Lda. e a Armação Baleeira Atlântica,
Lda. Actualmente, neste espaço, funciona o Museu da Indústria Baleeira,
onde é possível ver as máquinas de guinchos e todos os elementos utiliza-
dos no reboque, esquartejamento e desmanche do cachalote.
Local onde se derrete o toucinho do cacha-
lote para produzir óleo, antes de existirem
as Fábricas da Baleia. Poderão ser observadas
junto ao Museu dos Baleeiros.
Ao percorrer o itinerário aqui sugerido, são
notórias as marcas que esta actividade econó-
mica imprimiu na sociedade local. Destacam-
se como atracções mais relevantes, os dois
núcleos museológicos do Museu da Ilha do
Pico e todo o vasto património ligado à bale-
ação, incluindo ambientes portuários onde se
imagina a faina da caça à baleia e as tradições e
festividades evocativas.
Trata-se de uma homenagem à história e à
identidade desta ilha. Nas Lajes do Pico, os
últimos baleeiros encabeçam o corpo de jo-
vens provenientes de várias localidades da
ilha, havendo entre eles os Mestres de outros
tempos. As regatas, que percorrem as ilhas do
triângulo, especialmente o Faial e o Pico, são a
memória de um legado cultural que não de-
sapareceu com o fi m das capturas em 1987.
Recentemente, têm sido recuperados edifícios
ligados à história da baleação, para neles insta-
lar estruturas museológicas.
Estes museus são pólos de atracção a não
perder, por todos os que visitam a Ilha do
Pico. Tanto as Regatas de Botes Baleeiros, tal
como os espaços museológicos, mostram o
22 Rota da Rota da 23
quão “heróica” foi a epopeia baleeira açoriana, sobretudo quando vista
aos olhos de hoje, habituados que estamos a um mundo facilitado pela
tecnologia. Hoje, os Açores procuram tirar partido da tradição da baleia
de outra forma, através da Observação de Cetáceos.
Regatas de Botes Baleeiros
Observação de Cetáceos
Conscientes da importância de contribuir para o equilíbrio ecológico do
planeta e para a defesa dos ecossistemas, os açorianos deram o seu exem-
plo ao mundo, ao aceitarem subscrever o tratado internacional em prol
da vida das baleias. Viraram-se, entretanto, para a observação de baleias e
escolheram um destino mais “eco” – e essa é a história de um novo rela-
cionamento com o mar, que também merece ser contada.
Para além de todo o espólio baleeiro, que pode ser apreciado nos museus
da ilha, a memória dos baleeiros tem sido enaltecida pela construção de
monumentos, em dois concelhos. Monumento à Memória Baleeira, locali-
zado no cais da Vila das Lajes e o Monumento ao Homem Baleeiro, locali-
zado junto ao cais de São Roque, em frente à antiga fábrica da Baleia.
O potencial da ilha, para o avistamento de baleias e todo o património
baleeiro, são aproveitados para o lazer, quer em termos da actividade de
Observação de Cetáceos, que possui um papel importante na animação
turística da Ilha, utilizando os conhecimentos do povo e as infra-estruturas
como as vigias para o avistamento dos cetáceos, quer através do aprovei-
tamento dos botes baleeiros, das gasolinas ou lanchas baleeiras e das casas
dos botes para a realização das Regatas, organizadas durante o Verão, entre
os meses de Junho e Setembro.
GASOLINA OU LANCHA BALEEIRA
É um rebocador dos botes e dos cachalotes capturados, movidas a gasolina que pode medir entre os 10 e os 18 metros de comprimento e 2, 50 me-tros a 4,10 metros de boca e 1,15 a 2,15 metros de pontal. Actualmente, é também usada nas regatas de Botes Baleeiros, nos meses de Verão.
24 Rota do Rota da 25 24 Rota da 25
O ITINERÁRIO DA FAINA BALEEIRA NA ILHA DO PICOInstruções Breves
Itinerário São Mateus – São Caetano – São João -
Lajes – Ribeiras – Calheta de Nesquim –
Piedade - Santo Amaro - São Roque
Duração média 2 dias
Distância aproximada 63km
Trajectos
Chegada por via aérea
Chegadas por via
marítima ao Porto
da Madalena
Chegadas por via
marítima ao Porto
de São Roque
À saída do ramal do aeroporto voltar à
direita e seguir pela ER, em direcção à
Madalena e a partir daqui em direcção às
Lajes do Pico. Continuar até à freguesia de
São Mateus onde a Rota tem o seu início.
Na Vila da Madalena seguir pela ER, em di-
recção às Lajes do Pico. Continuar até à
freguesia de São Mateus onde a Rota tem
o seu início.
Seguir pela ER, em direcção à Madalena e
depois em direcção às Lajes do Pico. Con-
tinuar até à freguesia de São Mateus onde
a Rota tem o seu início.
Terminamos com uma curiosidade. Aquando da visita régia, à Cidade da
Horta, em 28 de Junho de 1901, os reis D. Carlos e D. Amélia foram rece-
bidos por uma esquadrilha de canoas baleeiras, a remos, que contornaram
o navio onde estes se encontravam e o acompanharam ao ancoradouro.
No dia seguinte houve regatas, à vela e a remos, de canoas baleeiras e em-
barcações de recreio. Sabe-se que participaram duas canoas das Lajes do
Pico, pertencentes às companhias das “Senhoras” e “Judeus”. O rei, muito
satisfeito com a homenagem dos baleeiros, veio a oferecer, às armações
proprietárias das duas canoas vencedoras, uma canoa baleeira.
Lancha “Medina” Século XX Lancha “Medina” Século XXI
26 Rota da Rota da 27 27
Locais a Visitar
Partindo do centro da Madalena, seguir pela Estrada Regional (ER), em di-
recção a São Mateus. Depois de passar o lugar do Guindaste, junto à placa
de identifi cação da Rota da Faina Baleeira, localizada no lugar do Areeiro,
deve virar à esquerda para o lugar das Relvas. Seguindo pela direita, o ca-
minho passa a ser de terra batida, mas o esforço da subida é compensado
por existir aqui um ponto fulcral da actividade baleeira – a Vigia – tendo
o exemplar em causa - Vigia das Relvas - um raro formato octogonal, que
merece uma visita atenta. Tal como as restantes vigias, esta guarita é hoje
utilizada como local de observação de baleias para a actividade marítimo-
turística de Observação de Cetáceos.
Voltando à ER, em direcção às Lajes do
Pico, seguir pelo acesso, do lado direito, ao
Porto de São Mateus para uma paragem
na Casa dos Botes, actualmente usada
para guardar o bote baleeiro, propriedade
da freguesia, que participa nas regatas que
animam as ilhas do Triângulo nos meses de
Verão.
Junto à Casa dos Botes deve subir, optan-
do pela direita na primeira bifurcação e
depois sempre em frente até encontrar
a ER. Neste cruzamento deve virar nova-
mente à direita, em direcção à freguesia de
São Caetano.
Vigia das Relvas
Casa dos Botes de São Mateus
Porto de S. Mateus actualmente
Sr. Silvino
SÃO MATEUS
O itinerário da Faina Baleeira, na Ilha do Pico tem início na freguesia de São
Mateus, do Concelho da Madalena.
Porto de São Mateus
- década de 70 do Século XX
Eventos
Festa do Senhor Bom Jesus Milagroso, festa religiosa que se realiza
no seu Santuário, no dia 6 de Agosto.
Participação na Regata de Botes Baleeiros.
Histórias e Lendas
A Freguesia de São Mateus foi um importante baluarte da epopeia baleeira,
havendo muitas histórias para contar, de entre as quais destaca-se aquela
em que, numa perseguição a uma baleia mais agressiva, esta terá virado o
bote, atirando toda a companha ao mar… um dos baleeiros foi literalmen-
te apanhado na boca da baleia, que lhe terá dado uma valente dentada…O
Sr. Silvino sobreviveu a tal trincadela e está vivo para contar a história.
28 Rota da Rota da 29 29
SÃO CAETANO
Locais a Visitar
O itinerário continua pela ER, em direcção à
freguesia de São Caetano, com a descida ao
porto local mais conhecido por Porto da Prai-
nha. Aqui, a Casa dos Botes, construída em
alvenaria de basalto está relativamente bem
conservada. Este edifício servia como local de
abrigo das embarcações e das palamentas uti-
lizadas na faina baleeira, o que demonstra que,
tanto São Mateus como São Caetano eram
freguesias muito comprometidas com a caça
à baleia.
Ao saír do Porto de São Caetano deve subir
pelo lado direito, até junto da escola primária,
para regressar à ER, em direcção às Lajes do
Pico.
Casa dos Botes
de São Caetano
SÃO JOÃO
Locais a Visitar
Depois de passar pela placa toponímica da freguesia de São João, vai en-
contrar um acesso do lado direito com a placa da Rota da Faina Baleeira.
Ao descer, encontra um entroncamento onde deve virar à esquerda para
uma paragem no Porto de São João, do lado direito depois de passar pela
Igreja. Este porto merece uma referência uma vez que, também aqui se
caçou à baleia. Uma das primeiras armações baleeiras da Ilha do Pico foi
a Armação dos “Macieís”, que possuíam dois botes e caldeiras de derreti-
mento. As instalações terrestres viriam a ser destruídas pelo ciclone de 28
de Agosto de 1893, tendo os proprietários desistido da actividade. Os des-
troços terão depois sido vendidos às armações baleeiras da Vila das Lajes.
Retomando o itinerário, à saída do porto deve voltar à direita para a Rua
do Porto, onde no nº 18, poderá visitar a Exposição das Lulas e dos
Cachalotes. Continuando a subir vai desembocar na ER, onde deve virar
à direita, em direcção às Lajes do Pico. Pelo caminho, pode avistar um Moi-
nho de Vento em bom estado de conservação, localizado junto ao campo