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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE VETERINÁRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA DOUTORADO EM HIGIENE VETERINÁRIA E PROCESSAMENTO TECNOLÓGICO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL DISCIPLINA: BIOQUÍMICA DOS ALIMENTOS PROFESSOR: ELIANE MÁRSICO TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS DANUZA PINHEIRO BASTOS GARCIA DE MATTOS JORGE LUIZ FORTUNA Niterói – RJ 2009
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TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

Jul 03, 2015

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Transformações enzimáticas em tecnologia dos alimentos.
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Page 1: TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE VETERINÁRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MEDICINA VETERINÁRIA DOUTORADO EM HIGIENE VETERINÁRIA E PROCESSAMENTO TECNOLÓGICO DE PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL DISCIPLINA: BIOQUÍMICA DOS ALIMENTOS PROFESSOR: ELIANE MÁRSICO

TRANSFORMAÇÕES

ENZIMÁTICAS EM

TECNOLOGIA DOS

ALIMENTOS

DANUZA PINHEIRO BASTOS GARCIA DE MATTOS

JORGE LUIZ FORTUNA

Niterói – RJ

2009

Page 2: TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO, p. 4

2 HISTÓRICO, p. 4

3 ATIVIDADE ENZIMÁTICA, p. 5

4 CLASSIFICAÇÃO, p. 5

5 ESPECIFICIDADE, p. 6

6 ENZIMAS NA TECNOLOGIA DE ALIMENTOS, p. 7

6.1 ENZIMAS AMILOLÍTICAS, p. 9

6.2 ENZIMAS HIDROLISANTES DE DISSACARÍDEOS, p. 10

6.2.1 Invertases ou sacarases, p. 10

6.2.2 Lactases, p. 11

6.3 ENZIMAS HIDROLISANTES DE TECIDO VEGETAL, p. 11

6.3.1 Celulases, p. 11

6.3.2 Hemicelulases, p. 12

6.4 ENZIMAS PROTEOLÍTICAS (PROTEASES), p. 12

6.4.1 Papaína, p. 13

6.4.2 Bromelina, p. 13

6.4.3 Ficina, p. 13

6.4.4 Pepsina, p. 13

6.4.5 Tripsina, p. 13

6.4.6 Quimosina (quimotripsina ou coalho ou renina animal), p. 14

6.4.7 Renina, p. 14

6.5 ENZIMAS PÉCTICAS, p. 14

6.5.1 Pectinesterase, p. 14

6.5.2 Poligalacturonase, p. 15

6.5.3 Pectina-transeliminase, p. 15

6.6 ENZIMAS LIPOLÍTICAS, p. 16

6.6.1 Lipase, p. 16

6.7 ENZIMAS OXIDATIVAS (OXIDORREDUTASES), p. 17

6.7.1 Catalase, p. 17

6.7.2 Peroxidase, p. 17

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6.7.3 Polifenol oxidase, p. 18

6.7.4 Ácido ascórbico oxidase, p. 18

6.7.5 Glicose oxidase, p. 18

6.7.6 Lipoxidase (lipoxigenase), p. 19

6.8 ENZIMAS FLAVORISANTES, p. 19

7 APLICAÇÕES DAS ENZIMAS NA INDÚSTRIA DE ALIMENTOS, p. 19

7.1 FABRICAÇÃO DE PÃO, p. 19

7.2 ELABORAÇÃO DE CERVEJA, p. 20

7.3 AMACIAMENTO DE CARNE, p. 21

7.4 PRODUÇÃO DE VINHO E SUCOS DE FRUTAS, p. 22

7.5 HIDRÓLISE DA LACTOSE, p. 23

7.6 FABRICAÇÃO DE QUEIJOS, p. 24

8 CONCLUSÕES, p. 25

9 REFERÊNCIAS, p. 26

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1 INTRODUÇÃO

As enzimas, também chamadas de diástases, são proteínas (complexo

protéico) de alto peso molecular, que apresentam capacidade de catalisar reações

químicas e biológicas (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

Quimicamente as enzimas são proteínas com uma estrutura química especial,

contendo um centro ativo, denominado apoenzima e algumas vezes um grupo não

protéico, denominado coenzima. À molécula toda (apoenzima e coenzima) é dado o

nome de haloenzima. Dependendo do tipo de ligação, o grupo prostético pode ser

separado da proteína por métodos brandos, como por exemplo diálise. Em alguns

casos as enzimas podem estar ligadas a moléculas orgânicas de baixo peso

molecular, ou íons metálicos cuja função é ativar as enzimas a eles ligados e que são

denominados cofatores (BOBBIO; BOBBIO, 1989).

2 HISTÓRICO

A descoberta das enzimas data do século XVIII, quando se iniciavam os

estudos sobre digestão dos alimentos. No século XIX, Louis Pasteur afirmou que a

fermentação era inseparável da célula viva e estabeleceu o conceito de que as

enzimas fossem células vivas. Na mesma época, Liebig, dizia que a fermentação era

provocada por substâncias químicas. Em 1897, Kuhne propôs o nome de enzimas

para evitar o uso dos chamados “fermentos organizados” e “fermentos não

organizados”. Buchner, em 1897, acabou com a controvérsia entre Liebig e Pasteur,

ao mostrar a possibilidade de fermentação na ausência de células vivas (GAVA,

1979).

Bobbio e Bobbio (1989), descrevem que a denominação enzima (palavra

grega que significa “em leveduras”) foi dada por Khune em 1878, quando se

acreditava que as enzimas só eram ativas nas células vivas, permanecendo até 1897,

quando Buchner observou que o extrato obtido por prensagem de células de

leveduras ainda possuía a propriedade de fermentar sacarose.

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5

3 ATIVIDADE ENZIMÁTICA

As enzimas apresentam a capacidade de reagir com determinados

constituintes das células, denominados substratos, formando complexos, ou mesmo

compostos com ligações covalentes. Essa atividade enzimática vai depender da

estrutura da proteína, ou seja, do número de cadeias peptídicas e arranjo dessas

cadeias na molécula, da natureza do substrato e da estrutura do grupo prostético. A

atividade enzimática pode ser medida com a enzima pura em condições tais que

permita que a velocidade da reação seja máxima, significando que o substrato deve

estar em concentração elevada, permitindo que toda a enzima esteja transformada

num complexo ativado. Neste caso, a velocidade da reação é proporcional à

concentração enzimática e também proporcional ao complexo enzima+substrato.

Além disso, a velocidade das reações enzimáticas também varia com diversos

fatores, tais como a concentração de enzima ou de substrato, temperatura e pH

(BOBBIO; BOBBIO, 1989).

E + S ES E + P

Onde:

E = Enzima;

S = Substrato;

ES = Complexo Enzima+Substrato;

P = Produto.

4 CLASSIFICAÇÃO

Observa-se o sufixo ASE para indicar uma enzima. Entretanto, restaram ainda

algumas enzimas cujos nomes, consagrados pelo uso, nem mesmo esta regra se

observa, sendo o caso da papaína, tripsina, pepsina, renina e outras (GAVA, 1979).

Em 1955, uma Comissão de Nomenclatura e Classificação de Enzimas,

nomeada pela União Internacional de Bioquímica, estabeleceu normas para a

nomenclatura e classificação de enzimas, que foram implantadas em 1964 (TABELA

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6

1). Essas normas conferem para cada enzima um código de quatro algarismos

separados por um ponto, sendo que o primeiro algarismo, que vai de 1 a 6,

determina as seis principais classes de enzimas, que são: Oxidorredutases;

Transferases; Hidrolases; Liases; Isomerases; Ligases (ou Sintetases) (EVANGELISTA,

1992; BOBBIO; BOBBIO, 1989; GAVA, 1979).

TABELA 1 Principais grupos, mecanismos de ações e exemplos de enzimas. GRUPOS MECANISMOS DE AÇÕES EXEMPLOS

Oxidorredutases Envolvem reações de óxido-redução, através de enzimas receptoras de coenzimas (NAD+

e NADP+).

Oxidases; redutases; desidrogenases; oxigenases; hidrolases; catalases.

Transferases Envolvem transferências de radicais. Aminotransferases (transaminases).

Hidrolases Envolvem reações de hidrólise. Produzem a

catalização de reações de ruptura de ligações químicas (C=O; C-N; C-C).

Amilases; maltase; peptidase; lipase; fosfatase; pectinoesterase; urease; pepsina; quimiotripsina; tripsina.

Liases Envolvem remoção de grupos dos seus substratos, deixando duplas ligações.

Descarboxilases; aldolases; citrato-liases; desidratases.

Isomerases Envolvem reações de isomerização. Racemiases; mutases; epimerases.

Ligases Ocasionam reações de síntese. Catalisam a ligação entre C e O, S, N e outros átomos.

Sintetases; carboxilases.

Fonte: GAVA (1979); EVANGELISTA (1992).

5 ESPECIFICIDADE

Existe uma correlação estreita entre a estrutura das proteínas ou peptídeos

que fazem parte da molécula enzimática e suas propriedades biológicas, constituindo

uma especificidade extraordinariamente alta. Apenas uma fração da molécula,

denominada lugar ativo ou centro ativo, é responsável pela ligação da enzima ao

substrato ou substratos, determinando a especificidade enzimática (BOBBIO;

BOBBIO, 1989).

Segundo Gava (1979), toda enzima possui um centro ativo, local onde se

processam as reações químicas. O centro ativo é constituído de alguns resíduos de

aminoácidos da cadeia da proteína que se encontram em íntima e mútua

proximidade espacial. Acredita-se que os aminoácidos que constituem o centro ativo

formam na superfície da enzima uma espécie de “orifício”, ao qual o substrato pode

ajustar-se. O orifício, por sua vez, deve possuir um formato definitivo, que acomode

algumas moléculas, como os substratos e os inibidores, mas rejeite outras espécies

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de moléculas e impeça-as de entrar em contato ativo com a enzima. Esta é a

explicação para a especificidade enzimática e a principal razão porque as estruturas

secundárias e terciárias são tão importantes para a atividade da enzima; elas

determinam a forma global da molécula enzimática e, em particular, criam o centro

ativo, que, de outra maneira, seria uma fileira uniforme de resíduos de aminoácidos.

Bobbio e Bobbio (1989), descrevem que Emil Fischer, em 1894, desenvolveu o

conceito de especificidade enzimática, estabelecendo uma relação estérica entre

enzima e substrato. Esta especificidade enzimática é comparada a um conjunto de

chave e fechadura (key and lock) onde a chave (substrato) deve se ajustar à

fechadura (enzima).

A especificidade é uma característica importante das enzimas, onde

determinada enzima só aceita como substrato, determinada(s) substância(s). Como

exemplo, a maltase ataca a ligação α-1,4 maltose, mas não afeta a ligação β-1,4

celobiose. A maioria das enzimas proteolíticas rompe ligações de L-aminoácidos mas

não de D-aminoácidos (GAVA, 1979).

6 ENZIMAS NA TECNOLOGIA DE ALIMENTOS

As enzimas empregadas em tecnologia de alimentos são limitadas, em relação

ao número de espécies, em comparação com as milhares de enzimas atuantes em

outros setores. A maior parte das enzimas utilizadas pela tecnologia de alimentos

pertence às classes das hidrolases, proteases, lipases e esterases (EVANGELISTA,

1992).

As reações enzimáticas são muito importantes em alimentos, delas

dependendo não só a formação de compostos altamente desejáveis como podem ter

consequências indesejáveis. As reações enzimáticas ocorrem não só no alimento

natural, mas também durante o seu processamento e armazenamento (BOBBIO;

BOBBIO, 1989).

Segundo Evangelista (1992), a atuação enzimática na elaboração de alimentos

representa uma das maiores conquistas da indústria de produtos alimentícios,

oferecendo as seguintes vantagens:

� Aumento da qualidade e estabilidade de produtos alimentícios;

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� Obtenção de produtos derivados e sintéticos;

� Estabelece e exalta o sabor de alimentos;

� Catalisa reações sem produzir efeitos secundários;

� Constituinte natural, desprovido de toxicidade;

� Exerce atividade em temperaturas e pH moderados;

� Exerce o controle de velocidade das reações, com adequado pH,

temperatura e número de enzimas;

� Pode ser inativada, quando a reação atinge o ponto requerido;

� Permite maior velocidade dos processos de extração.

Gava (1979), descreve que a obtenção de enzimas para diversas finalidades

na tecnologia de alimentos pode ser feita a partir de microrganismos, vegetais

superiores ou animais (TABELA 2).

TABELA 2 Principais fontes de enzimas comerciais. FONTES ENZIMAS

ANIMAL

PÂNCREAS BOVINO E SUÍNO Pancreatina; tripsina; crimotripsina;

lípase; α-amilase

MUCOSA GÁSTRICA SUÍNA Pepsina

MUCOSA GÁSTRICA BOVINA Renina

FÍGADO BOVINO Catalase

VEGETAL

MALTE DE CEVADA α e β-amilases

BATATA DOCE β-amilase

MAMÃO PAPAYA Papaína

ABACAXI Bromelaína

FIGO Ficina

BOLORES

Aspergillus eryzae α-amilase; protease

Aspergillus niger α-amilase; glucoamilase; celulase; pectinase; glucose-oxidase; catalase

Rhizopus spp. α e β-amilases; glucoamilase;

pectinase; lipase

LEVEDURAS

Saccharomyces cerevisae Invertase

Saccharomyces carlsbergensis Invertase

Saccharomyces fragilis Lactase

BACTÉRIAS Bacillus subtilis α-amilase; protease

Micrococcus lysodeikticus Catalase

Fonte: ESKIN (1971).

Para que os alimentos processados se conservem por mais tempo, é

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necessário não somente que os microrganismos sejam destruídos, mas também que

a atividade enzimática seja inibida ou bloqueada. Poucos são os métodos que podem

ser empregados para a inibição enzimática em alimentos, devido a problemas de

toxidez, desenvolvimento de aromas estranhos, ou mesmo devido a problemas

econômicos. Os principais métodos empregados neste caso são calor; mudanças de

pH até valores extremos; adição de sulfito ou dióxido de enxofre. O congelamento

também é muito empregado (BOBBIO; BOBBIO, 1989).

Muitas enzimas são indesejáveis no alimento e, por isso, devem ser inativadas.

Como outras proteínas, as enzimas podem ser facilmente desnaturadas de várias

maneiras, principalmente pelo calor. A maioria das enzimas são inativadas quando se

aplica temperaturas na ordem de 70-80°C durante 2-5 minutos. Essa inativação pelo

calor é muito utilizada na indústria alimentícia, sendo este processo conhecido pelo

nome de blanching. A continuidade da atividade enzimática pode ocasionar uma

mudança de cor, escurecimento em alguns alimentos, rancidez em óleos, variações

no aroma, alterações no valor nutritivo das proteínas e vitaminas ou presença de

enzimas pécticas ocasionando mudanças na textura dos alimentos (GAVA, 1979).

6.1 ENZIMAS AMILOLÍTICAS

Enzimas que atuam, através de hidrólise, sobre os polímeros da glicose como

o amido e o glicogênio, transformando-os em moléculas com menor peso molecular.

Frequentemente são utilizados em panificação; cervejaria; fermentação alcoólica, etc

(GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

As enzimas amilolíticas responsáveis pelo processo hidrolítico são as α-

amilase, β-amilase e glicoamilase (amiloglicosidase), que ao hidrolisarem o amido

dão origem aos seguintes produtos, dextrina; maltose e glicose, respectivamente

(EVANGELISTA, 1992).

Amido Dextrina + Maltose

Amido Maltose + Dextrina

Amido Glicose

α-amilase

β-amilase

Glicoamilase

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As principais utilizações das amilases são:

� Produzir dextrose;

� Elaborar xaropes açucarados;

� Converter o amido em dextrina, na elaboração de xaropes de chocolate e

milho, impedindo seu exagerado espessamento;

� Sacarificar o amido, empregado para a fermentação alcoólica;

� Fabricar pectina a partir do bagaço de maçã, para clarificar sucos de frutas,

cerveja e vinho;

� Substituir o malte na purificação, visando à melhoria da qualidade da

massa.

6.2 ENZIMAS HIDROLISANTES DE DISSACARÍDEOS

São enzimas que catalizam a hidrólise de dissacarídeos, formando dois

monossacarídeos:

Sacarose Glicose + Frutose

Lactose Glicose + Galactose

Maltose Glicose + Glicose

6.2.1 Invertases ou sacarases

Produzem a hidrólise da sacarose, transformando-a em glicose e frutose. São

constituídas de dois tipos de enzimas: a β-frutofuranosidase e a α-glicosidase, que

hidrolisam as ligações glicosídicas da sacarose, em posições distintas. A α-glicosidase

hidrolisa a união entre o oxigênio e o carbono 1 da glicose e a β-frutofuranosidase a

ligação entre o carbono 2 do extremo da glicose (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

As principais ações e utilizações das invertases são:

� Fabricação de açúcar invertido;

� Elaboração de biscoitos, caramelos e chocolates;

� Produção de mel de sacarose;

Invertase

Lactase

Maltase

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� Obtenção de xarope de sacarose (evitando a caramelização);

� Recheio de bombons;

� Elaboração de produtos de confeitaria;

� Impedir a cristalização de açúcar em sorvetes;

� Produção de sobremesas geladas;

� Fabricação de licores.

6.2.2 Lactases

Provocam a hidrólise de lactose, transformando-a em glicose e galactose, que

são açúcares com maior valor edulcorante e mais rápida assimilação. Suas principais

ações são (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992):

� Elaboração de produtos lácteos;

� Produção de cremes, visando a não formação de cristais de lactose;

� Hidrólise da lactose do soro, resultando açúcares de maior valor

edulcorante e de solubilidade.

6.3 ENZIMAS HIDROLISANTES DE TECIDO VEGETAL

Neste grupo incluem-se as enzimas que degradam tecidos vegetais fibrosos,

as celulases e as hemicelulases (EVANGELISTA, 1992).

6.3.1 Celulases

Enzimas que atuam em pH ótimo de 2,7, sendo constituídas por um complexo

representado por dois tipos principais (C e Cx), que desdobram a celulose em

dextrina e glicose. A celulase tipo C age sobre a celulose natural, resultando cadeias

insolúveis de glicose. A celulose tipo Cx age sobre a celulose hidratada ou moída;

sobre a carboximetil celulose, produzindo substâncias de baixo peso molecular e

solúveis (EVANGELISTA, 1992).

Principais ações e utilizações:

� Digestão de material fibroso de vegetais;

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� Agem em vegetais desidratados e de rápido cozimento;

� Produção de sucos cítricos;

� Extração de aromatizantes;

� Tratamento de cítricos, antes da concentração do suco;

� Manutenção da capacidade de reidratação de vegetais;

� Bebida de café concentrada;

� Abrandamento de ervilhas secas;

� Produção de glicose, através de resíduos celulósicos inaproveitados.

6.3.2 Hemicelulases

Enzimas que hidrolisam a hemicelulose que é abrandada pela ação do calor e

dos sucos digestivos. As principais enzimas hemicelulases são a gumase e a

pentosanase (EVANGELISTA, 1992).

Ações e utilizações:

� Elaboração de sucos de frutas;

� Impede a geleificação de concentrados de café;

� Melhora o rendimento do amido de trigo;

� Melhora a textura do pão, agindo sobre o endosperma do trigo.

6.4 ENZIMAS PROTEOLÍTICAS (PROTEASES)

Degrada proteínas, produzindo polipeptídeos, peptídeos e aminoácidos,

desdobrando ainda amidas e ésteres de aminoácidos. As proteases são de origem

vegetal, animal e microrgânica (microrganismos). As proteases vegetais são a

papaína (extraída do mamoeiro); a bromelina (extraída de plantas da família

Bromeliaceae) e a ficina (extraída da seiva das figueiras). As proteases animais são a

pepsina, tripsina e coalho (renina animal ou quimosina). As proteases microrgânicas

têm ação similar à da quimosina (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

Principais ações e utilizações:

� Amaciamento de carnes de segunda;

� Maturação do glúten;

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� Melhora no sabor, volume, textura e forma dos pães;

� Maior expansão e elasticidade da massa;

� Menor período de amassamento da massa;

� Maior capacidade de conservação;

� Clareamento da cerveja e estabilidade da espuma.

6.4.1 Papaína

Enzima vegetal mais utilizada, atuando sobre o colágeno e a elastina, tendo

pequena ação sobre as fibras musculares. Utilizada no amolecimento de carnes; no

tratamento de cerveja para evitar formação de precipitados e como auxiliar de

digestão. É extraída do látex do mamoeiro (Carica papaya) (GAVA, 1979;

EVANGELISTA, 1992).

6.4.2 Bromelina

Proveniente do Ananas consomus e Ananas bracteatus, tendo função análoga

à da papaína (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

6.4.3 Ficina

Enzima proveniente do látex do Ficus spp. (figueiras), apresentando as

mesmas indicações da papaína e bromelina (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

6.4.4 Pepsina

Extraída de células do estômago. Hidrolisa polipeptídeos, sendo importante na

digestão dos alimentos (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

6.4.5 Tripsina

Isolada de extratos purificados do pâncreas de boi ou de porco. Hidrolisa os

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polipeptídeos, amidas e ésteres resultando peptídeos de menor peso molecular

(GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

6.4.6 Quimosina (quimotripsina ou coalho ou renina animal)

Produzida a partir do coagulador de vitela, cordeiro ou cabrito. Utilizado na

coagulação do leite e elaboração de queijos (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

6.4.7 Renina

Enzima de origem microrgânica (microrganismos) de ação proteolítica, com

atividade similar à da quimosina. Atua na coagulação do leite e elaboração de queijos

(GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

6.5 ENZIMAS PÉCTICAS

Originadas principalmente de microrganismos e substâncias vegetais, as

enzimas pécticas podem ser divididas em três tipos principais de enzimas:

pectinesterase, poligalacturonase e pectina-transeliminase. Estas têm grande

utilização industrial nos processos de filtração e clarificação de sucos de frutas e na

produção de pectinas de baixa metoxilação ou de ácidos galacturônicos (GAVA, 1979;

EVANGELISTA, 1992).

Assim como ocorre com muitos microrganismos e outras enzimas, as enzimas

pécticas podem também atuar de forma indesejável ao produzirem o abrandamento

excessivo de vegetais, na formação de precipitados nos sucos de laranja e tomate, e

na diminuição da consistência das massas de tomate (GAVA, 1979; EVANGELISTA,

1992).

6.5.1 Pectinesterase

É proveniente de vegetais (como frutas cítricas, cebola e tomate) e de alguns

microrganismos (como os fungos Aspergillus niger e Fusarium oxisporum, bactérias

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e leveduras). Age catalisando a remoção de grupos metoxílicos da molécula de

pectina e de ácido pectínico para produzir ácido péctico (GAVA, 1979; EVANGELISTA,

1992).

Principais ações e utilizações:

� Obtenção de sucos claros;

� Aumenta a quantidade de suco obtida;

� Filtração mais veloz e assim a ausência de fenômenos oxidativos;

� Evita a obstrução dos poros dos filtros;

� Maior extração de pigmentos e aroma.

Em alguns casos onde a turvação (cloud) ou espessamento confere ao

produto mais prestígio comercial, como no suco de tomate e algumas frutas, a

pectinesterase deve ser inativada por tratamento térmico (GAVA, 1979;

EVANGELISTA, 1992).

6.5.2 Poligalacturonase

Também conhecida como pectino despolimerase ou pectinase. Pode ser

originada por vegetais superiores ou microrganismos como bactérias do gênero

Bacillus ou fungos como Aspergillus sp e Penicillium sp. De acordo com sua origem

pode haver diferença em seu pH ideal de ação, sendo este 5,8 quando originada em

bactérias e 3,6 em fungos (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

A poligalacturonase ocasiona a quebra das ligações glicosídicas das

substâncias pécticas produzindo ácido galacturônico (GAVA, 1979; EVANGELISTA,

1992).

Ação e utilização:

� Emprego na indústria de sucos vegetais, como o de frutas;

� Reduz o tempo de fermentação do grão de café para desprendimento do

seu pericarpo;

� Obtenção de aromas extraídos de vegetais triturados.

6.5.3 Pectina-transeliminase

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É uma enzima péctica de pouca relevância sob o ponto de vista de aplicação

na indústria alimentícia. Age sobre a pectina estabelecendo a clivagem não hidrolítica

da ligação a-1,4 com resultantes insaturados do ácido galacturônico. Desta maneira

reduz a viscosidade da pectina formando uma molécula de açúcar redutor por cada

ligação a-1,4 (EVANGELISTA, 1992).

6.6 ENZIMAS LIPOLÍTICAS

Dentre as enzimas que promovem a quebra de lipídeos encontram-se as

lipases e as fosfolipases.

6.6.1 Lipase

As lipases são encontradas de forma abundante entre os vegetais, os animais

e os microrganismos. Apresentam a função de hidrolisar glicérides liberando ácidos

graxos e glicerol (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

De acordo com sua origem a lipase apresenta diferenças em seu pH ideal de

atuação. A lipase animal pode ser obtida do tecido pancreático e do cárdia

comestível de vitela, de cordeiro e de cabrito, sendo o seu pH ideal 8,9. A lipase

vegetal pode ser obtida da semente de algodão, de cereais (milho e trigo), de rícino

e soja, e seu pH ideal é 4,5. As lipases de origem microrgânica são produzidas pelos

Rhyzopus sp, Sacharomyces fragillis, Candida lypolitica, algumas espécies de

Aspergillus e Mucor (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

Ação e utilização:

� Produção de queijos (lipases animais);

� Tratamento de ovos para hidrolisar partículas graxas da gema;

� Controle do saboroma (flavor) em queijos;

� Aromatizar produtos contendo manteiga;

� Colaboração no sabor do chocolate com leite;

� Produção do sabor do queijo azul (associado a esporos de mofo);

� Preparo de produtos de panificação.

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6.7 ENZIMAS OXIDATIVAS (OXIDORREDUTASES)

Estas enzimas constituem verdadeiros sistemas dos quais fazem partes as

seguintes enzimas: catalase, peroxidase, pseudoperoxidase, polifenol-oxidase, Ácido

ascórbico-oxidase, glicose-oxidase, amina-oxidase e citocromo-oxidase (GAVA, 1979;

EVANGELISTA, 1992).

6.7.1 Catalase

Também conhecidas como hidróxido-peróxido-óxido redutase, são capazes de

catalisar a separação do peróxido de hidrogênio em água e oxigênio. Apresentam um

núcleo ferro porfirina assim como a peroxidase e podem ser obtidas de fontes

animais (hemácias e fígado bovino e suíno) e de microrganismos (Aspergillus niger e

Micrococcus sp). Ação e utilização:

� Usada em alimentos com alto teor de água oxigenada evitando alterações

organoléticas em relação a sabor e cor;

� Geralmente empregada em associação com glicose-oxidase;

� Evitar o desenvolvimento de microrganismos aeróbios e a grande

produção de ácidos voláteis em vinhos;

� Ação antioxidante em alimentos líquidos ou viscosos (maionese, manteiga

e outras gorduras animais).

6.7.2 Peroxidase

Apresentam grupo prostético hemo e estão presentes em leucócitos, em

vegetais superiores e no leite. Possui ação catalisadora na degradação peroxidativa

dos ácidos graxos insaturados, com a formação de complexos que favorecem o

aparecimento do sabor de ranço (GAVA, 1979; EVANGELISTA, 1992).

De forma indesejável a peroxidase pode destruir por oxidação o ácido

ascórbico em alimentos e provocar transformações inoportunas de cor e sabor.

Ação e utilização:

� Indicador para tratamentos calóricos (possui resistência térmica maior que

Page 18: TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

18

outras enzimas);

� Determinar se alimentos foram submetidos ao processo de “blanching”.

6.7.3 Polifenol oxidase

Também chamada de fenolase e oxigênio-oxirredutase. Com a compressão ou

esmagamento dos tecidos vegetais há o rompimento celular e junção ao oxigênio

(sob ação da polifenol-oxidase). Ocorre então a oxidação de fenóis em ortoquinona

com a transformação rapidamente em pigmentos de melanoidinas. O Browning

enzimático apresenta alterações de cor, sobor, aroma e valor nutritivo dos alimentos

(EVANGELISTA, 1992).

Para deter o empardecimento:

� Inativação enzimática (alterações de temperatura ou adicionando elementos

como dióxido de enxofre; sulfitos; acidulantes);

� Eliminação do oxigênio (vácuo; imersão dos tecidos em salmoura ou calda

açucarada);

� Tratamento do substrato com antifenolases.

A polifenol oxidase pode ter uma ação favorável em determinados

processamentos, tais como: elaboração de batatas para fritar; fermentação do chá;

eliminação da película que envolve o grão de café (EVANGELISTA, 1992).

6.7.4 Ácido ascórbico oxidase

É uma enzima que catalisa oxigenação do ácido ascórbico dando como

produto final água e não peróxido como as demais enzimas oxidativas. Sua ação leva

a perda do poder da vitamina C (especialmente em sucos vegetais). Para evitar seu

efeito de forma negativa busca-se a inibição enzimática utilizando: baixas

temperaturas; redução do conteúdo de oxigênio; pasteurização (EVANGELISTA,

1992).

6.7.5 Glicose oxidase

Page 19: TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

19

Catalisa a oxidação da glicose em ácido glicônico com a formação de peróxido

de hidrogênio. A origem da glicose oxidase é microbiana, envolvendo principalmente

fungos como Aspergillus sp e Penicillium sp. Comumente, a glicose oxidase atua

junto a catalase sendo o produto final da reação ácido glicônico, água e oxigênio

(EVANGELISTA, 1992).

6.7.6 Lipoxidase (lipoxigenase)

Catalisa oxidação de ácidos graxos polinsaturados, seus ésteres e glicérides.

Pode levar a alterações de sabor, aroma e coloração. Seus ácidos graxos alvos são:

linoléico, linolênico, araquidônico, e ac. graxos dos óleos de pescado. Algumas fontes

de lipoxidase: leguminosas (soja), cereais (aveia, cevada, milho e trigo) e certos

legumes, frutas e folhas (EVANGELISTA, 1992).

6.8 ENZIMAS FLAVORISANTES

Algumas enzimas podem ser utilizadas individualmente ou associadas para

contribuir com a formação do sabor e do aroma de alguns alimentos vegetais

(principalmente frutas). São chamadas enzimas flavorisantes. Tais sabores são

liberados por ação térmica ou enzimática (EVANGELISTA, 1992).

Ação e utilização:

� Compensar perdas de sabor causadas pelo aquecimento do alimento;

� Exaltar as qualidades de aroma e sabor característicos de determinado

alimento;

� Corrigir aromas impróprios em certos alimentos.

7 APLICAÇÕES DAS ENZIMAS NA INDÚSTRIA DE ALIMENTOS

Muitas podem ser as aplicações industriais das enzimas, sendo estas de

grande importância na indústria alimentícia.

7.1 FABRICAÇÃO DE PÃO

Page 20: TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

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A indústria de panificação suplementa na massa de trigo ou cevada, aditivos

de atividades enzimáticas (amilases e proteinases), em forma de xarope ou

desidratados. Estes aditivos contribuem à conversão do amido em dextrina e

produzem ligeira hidrólise do glúten (principal proteína da farinha). Estas

transformações da massa são convenientes, pois possibilitam uma fermentação mais

vigorosa, aumentando as propriedades elásticas da massa (BRAVERMAN, 1980).

As enzimas amilolíticas, α e β-amilases, originadas principalmente de

Aspergillus spp. e Bacillus spp., melhoram o valor funcional das farinhas de trigo ou

cevada (EVANGELISTA, 1992; BRAVERMAN, 1980).

As enzimas proteolíticas (proteases) atuam na maturação do glúten,

interferindo na qualidade do trigo, melhorando o sabor, volume, textura e forma;

auxiliando na elaboração do pão, fazendo com que a massa seja mais elástica e

tenha maior expansão, menor período de amassamento com maior eficiência no

amassamento mecânico, além de maior capacidade de conservação (EVANGELISTA,

1992; BRAVERMAN, 1980).

A invertase, originada a partir de Saccharomyces spp., em produtos

açucarados de confeitaria, transforma vagarosamente a sacarose em açúcar

invertido, que apresenta melhor condição umectante e de solubilidade, diminuindo a

possibilidade de cristalização e de endurecimento e, além disso, tem maior

capacidade adoçante. Assim, os produtos de confeitaria adquirem consistência macia

e cremosa mesmo depois da armazenagem. Isto ocorre porque o açúcar invertido

supera em qualidade o que é obtido por hidrólise ácida, proporcionando um xarope

(calda) mais concentrado e de melhor cor e sabor e sem substâncias residuais

(furfural) (EVANGELISTA, 1992; BRAVERMAN, 1980; ESKIN et al, 1971).

Certos produtos de panificação, que necessitam amoldamento, exigem que a

massa tenha condições de maciez e elasticidade. Para que isso ocorra, mistura-se

papaína a massa, que atua sobre o glúten, possibilitando a formação de massa de

textura macia e elástica (BRAVERMAN, 1980).

7.2 ELABORAÇÃO DE CERVEJA

Page 21: TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

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O turvamento de cerveja refrigerada ocorre devido a coagulação das proteínas

procedentes dos cereais ou da autólise das leveduras. Podendo também ser

produzido pelos taninos ou as leucoantocianinas do lúpulo utilizado na elaboração da

cerveja (ESKIN et al, 1971).

As proteases vegetais e microrgânicas são aplicadas em cervejaria, quando a

bebida se apresenta turva, devido a ação de fatores ambientais (oxigênio, luz, alta

temperatura), de proteínas de grande peso molecular (procedentes da cevada ou de

leveduras) e de metais. Para se evitar este turvamento aplica-se a papaína, que

possibilita a degradação dessas proteínas responsáveis pela turvação da cerveja

refrigerada, além de provocar a estabilidade da espuma. Também a enzima

bromelina é utilizada no tratamento da cerveja, com objetivo de não aparecimento

do halo no resfriamento do produto (EVANGELISTA, 1992).

Recomenda-se o uso de preparados com glicose-oxidase e catalase, para que

não ocorra, pela ação do oxigênio, aparecimento de alterações de cor e aroma, além

de perdas de ácido ascórbico. A presença de oxigênio pode ainda favorecer o

crescimento de microrganismos aeróbios, produtores de precipitados e floculações

(EVANGELISTA, 1992).

A hidrólise preliminar das proteínas impede a formação de suspensões

coloidais durante o aquecimento. As enzimas papaína, pepsina, ficina, bromelina e

proteases bacterianas têm sido muito utilizadas, mas a papaína juntamente com

outras proteases é a mais usada na elaboração de cervejas (BRAVERMAN, 1980;

ESKIN et al, 1971).

7.3 AMACIAMENTO DE CARNE

As carnes passíveis de amaciamento de sua textura são geralmente aquelas

denominadas de segunda, por sua apresentação muscular e maior riqueza de tecido

conjuntivo (EVANGELISTA, 1992).

O processo natural de maturação da carne ocorre vagarosamente (cerca de 12

horas), por ação de catepsinas, tornando a textura da carne mais macia. Mas para

que não se espere por ele, utilizam-se enzimas proteolíticas para a sua ativação

(EVANGELISTA, 1992).

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O amaciamento da carne pode ser feito antes e depois da matança do animal.

As enzimas utilizadas são geralmente de origem vegetal (papaína, bromelina, ficina)

e microrgânica, isoladamente ou associadas (EVANGELISTA, 1992; BRAVERMAN,

1980). A aplicação enzimática pode ser realizada por imersão ou dispersão e

pulverização. Por imersão ou dispersão, as carnes são tratadas por enzimas em

solução aquosa ou misturada com álcool, sendo que a aplicação dura de 30 minutos

a três horas. Por pulverização a aplicação enzimática se faz por veículos secos

geralmente em associação com coadjuvantes (amido, glutamato de sódio, sal, citrato

de sódio) e substâncias estabilizantes (ácido ascórbico, polifosfato) (EVANGELISTA,

1992).

O amaciamento da carne inicia-se com a dissolução do sarcolema, seguido

pelo desaparecimento dos núcleos e degradação das fibras musculares, ocorrendo

assim a perda das estrias musculares. A maior diferença do amaciamento da carne a

partir das mudanças produzidas pelo envelhecimento e aquelas pelas enzimas

adicionadas, é que na anterior não há mudança visível na membrana externa da fibra

muscular. Enzimas de vegetais são caracterizadas por suas ações no tecido

conjuntivo (colágeno) e esta degradação pode ser aumentada pelo aquecimento

durante a cocção. A elastina e outros componentes do tecido conjuntivo, não são

alterados pelo cozimento ou envelhecimento e está presente em grande quantidade

no tecido muscular, requerendo amaciamento (ESKIN et al, 1971).

A carne de peixe, justamente por conter menor presença de tecido conjuntivo,

geralmente não necessita de amaciamento enzimático, sendo suficiente a ação de

suas catepsinas durante a maturação. Além disso, a proteólise é intensificada pelas

enzimas gastrintestinais, quando os peixes não são eviscerados (EVANGELISTA,

1992).

7.4 PRODUÇÃO DE VINHO E SUCOS DE FRUTAS

Durante o processo de prensagem de frutas como a maçã e a uva há liberação

de pectina (elemento com propriedades coloidais que dificultam a sedimentação de

partículas). Desta maneira, a adição de pectinases promove uma sedimentação mais

rápida e obtenção de sucos mais claros (ESKIN et al, 1971; UENOJO; PASTORE,

Page 23: TRANSFORMAÇÕES ENZIMÁTICAS EM TECNOLOGIA DOS ALIMENTOS

23

2007).

As pectinases podem ainda ser utilizadas no tratamento das uvas e na

clarificação de mostos e vinhos. Neste processo elas beneficiam a produção por

acelerar a prensagem, a clarificação e a filtração do mosto. As pectinases diminuem

a viscosidade e a dimensão das moléculas pécticas (ESKIN et al, 1971; UENOJO;

PASTORE, 2007).

Outro benefício ocorre pelo aumento da velocidade de sedimentação de

substâncias pécticas degradadas e da sedimentação de outras partículas em

suspensão (ESKIN et al., 1971).

Apesar do amplo emprego, em determinados alimentos as pectinases devem

ter sua ação bloqueada para obtenção de um produto de melhor qualidade. Isso

ocorre principalmente quando a turvação (ou cloud) é desejada e apreciada, como

no caso dos sucos de tomate e dos concentrados de frutas. Para um produto mais

valorizado deve-se pré-aquecer o material para inativar pectinases presentes (ESKIN

et al, 1971).

Nas indústrias geralmente são utilizados preparados enzimáticos contendo

poligalacturonases e pectinesterases obtidas de fungos para obter a degradação

completa da molécula de pectina (ESKIN et al, 1971).

7.5 HIDRÓLISE DA LACTOSE

A lactose, presente em diversos lacticínios, pode ser quebrada em moléculas

de glicose e galactose. Tal quebra pode representar algumas vantagens na indústria

(BRAVERMAN, 1980), tais como:

� Poder edulcorante 2 a 3 vezes maior quando comparada a lactose;

� Alta digestibilidade;

� Maior solubilidade em água (à 25ºC = lactose 13%; glicose 50% e

galactose 25%);

� Baixa viscosidade (maior concentração de sólidos sem cristalização);

� Sabor mais acentuado com a liberação de galactose;

� Menor tempo de fermentação de iogurtes com hidrólise parcial de 30 a

40% da lactose (produção mais rápida de ácido, sabor mais doce e com

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baixa pós-acidificação);

� Importante para evitar a cristalização da lactose indesejada em certos

produtos (leite condensado, concentrado de leite, soro de leite);

� Produção de alimentos para pessoas com intolerância a lactose;

A hidrólise pode ocorrer por processo ácido (catalítico, em altas temperaturas)

ou enzimático. As vantagens do processo enzimático são:

� Condições mais amenas de pH e temperatura;

� Não causa desnaturação de proteínas nem escurecimento;

� Maior rendimento.

7.6 FABRICAÇÃO DE QUEIJOS

Vários tipos de queijos requerem a utilização de enzimas para a sua

coagulação. A enzima coagulante atua sobre a caseína em presença de íons de cálcio

para produzir um coágulo insolúvel que engloba os outros componentes do leite

(água, gordura, sais, proteínas e etc). Os coalhos podem ter diferentes origens

(BRAVERMAN, 1980).

� Origem animal: extrato obtido do estômago de ruminantes. Bezerros

lactentes (maior quantidade de quimosina); Bovinos adultos (maior

quantidade de pepsina).

� Origem microbiana: coalho de Mucor miehei (com uma protease que

degrada rapidamente a caseína). Muito usado na fabricação de vários tipos

de queijo;

� Origem vegetal: látex da figueira (Ficus carica), a papaína da Carica papaya

e a bromelina da Ananas sativa (entretanto são excessivamente

proteolíticos).

As lipases também são importantes na produção de queijos. Sua atividade

hidrolítica é complexa e determinada pela microflora do queijo. Durante o

processamento, diferentes microrganismos predominam por sua atividade

enzimática. Inicialmente Streptococcus cremoris e S. thermophilus atuam em

conjunto com lactobacilos, depois os processos e microrganismos envolvidos variam

de acordo com o queijo (ESKIN et al, 1971).

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8 CONCLUSÕES

• As enzimas apresentam papel importante na industria alimentícia;

• Podem melhorar o valor nutritivo de um alimento, torná-lo mais saboroso,

digestivo, ou atraente;

• Podem aumentar a segurança e preservação de alimentos (maior durabilidade

e redução da necessidade de outros aditivos);

• Em certos casos, a ação das enzimas deve ser bloqueada para que não altere

negativamente o produto.

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9 REFERÊNCIAS

BOBBIO, F. O.; BOBBIO, P. A. Introdução à Química de Alimentos. 2ª ed. São Paulo:

Varela. 1989, 223 p.

BRAVERMAN, J. B. S. Introducción a La Bioquímica de los Alimentos. 3ª ed.

Barcelona: Omega. 1980, 355 p.

ESKIN, N. A. M.; HENDERSON, H. M.; TOWNSEND, R. J. Biochemistry of Foods. New

York: Academic Press. 1971, 240 p.

EVANGELISTA, J. Tecnologia de Alimentos. 2ª ed. São Paulo: Atheneu. 1992, 652 p.

FELLOWS, P. Tecnología del Processado de los Alimentos: Princípios y Prácticas.

Zaragoza: Acribia. 1994, 549 p.

GAVA, J. A. Princípios de Tecnologia de Alimentos. 2ª ed. São Paulo: Nobel. 1979,

284 p.

UENOJO, M.; PASTORE, G. M. Pectinases: aplicações industriais e perspectivas. Quim

Nova, 2007; 30, 2, 388-394.

WEINLING, H. Tecnología Práctica de La Carne. Zaragoza: Acribia. 1973, 392 p.