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Trabalho Nbr 15165

Feb 22, 2018

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  • 7/24/2019 Trabalho Nbr 15165

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    Universidade de So Paulo

    Faculdade de Sade Pblica

    A discricionariedade tcnica nos atos

    administrativos sanitrios

    ALEXANDRE NEMER ELIAS

    Dissertao apresentada ao Programade Ps-Graduao em Sade Pblicapara obteno do ttulo de Mestre emSade Pblica

    rea de Concentrao: Servios deSade Pblica

    Orientador: Prof. Dr. Laurindo DiasMinhoto

    So Paulo2008

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    A discricionariedade tcnica nos atos

    administrativos sanitrios

    ALEXANDRE NEMER ELIAS

    Dissertao apresentada ao Programade Ps-Graduao em Sade Pblica da

    Faculdade de Sade Pblica daUniversidade de So Paulo paraobteno do ttulo de Mestre em SadePblica

    rea de Concentrao: Servios deSade Pblica

    Orientador: Prof. Dr. Laurindo Dias

    Minhoto

    So Paulo2008

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    expressamente proibida a comercializao deste documento tanto na

    sua forma impressa como eletrnica. Sua reproduo total ou parcial

    permitida exclusivamente para fins acadmicos e cientficos, desde que

    na reproduo figure a identificao do autor, ttulo, instituio e ano da

    dissertao.

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    Aos meus pais, Jorge Nemer Elias,

    Lia Santa Terra Elias, e minha

    esposa Sandra Regina M. Campos

    Nemer Elias.

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    AGRADECIMENTOS

    Ao meu orientador professor Laurindo Dias Minhoto, pela confiana e

    pacincia durante o processo de orientao.

    professora Sueli Gandolfi Dallari, pelo apoio depositado no trabalho

    proposto.

    A meus colegas da Nemer e Dacorso Advogados Associados e em especial

    a meu scio, pelo apoio cotidiano.

    Eliane Arajo e Adelaide do CEPEDISA e a todos aqueles que

    participaram direta ou indiretamente da realizao deste importante sonho.

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    RESUMO

    Por meio de uma intensa explorao doutrinria, vem se discutindo as

    mutaes do direito frente exploso tecnolgica no mundo e, em especial,

    tecnificao das atividades de atuao do Estado. Diante dessa situao,

    exploramos na doutrina internacional e nacional o conceito de um instituto

    intimamente ligado tecnificao da atividade Estatal chamado de

    discricionariedade tcnica. Com esta explorao, temos o intuito de

    demonstrar que, alm de esta doutrina ser plenamente aplicvel no direito

    ptrio, a situao de fato correspondente tecnificao pela aplicao ao

    direito dos conhecimentos cientficos de engenharia, biologia, medicina,

    sade pblica, entre outros, impulsionado pelas agncias reguladoras,

    demanda o seu reconhecimento como forma de controle e proteo dos

    direitos contra eventuais abusos e ilegalidades da Administrao Pblica e,

    especialmente, da Administrao Pblica Sanitria. Por isso, iniciamos com

    os conceitos da discricionariedade tcnica em suas duas modalidades e,

    aps isto, buscamos, nas mais recentes doutrinas, os conceitos e limites

    identificados para a atividade discricionria tcnico-administrativa, alm de

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    exemplificar ao leitor, circunstncias em que tal discricionariedade se impe.

    Paralelamente conceituao, demonstramos a correlao e a relevncia

    do reconhecimento deste instituto para o direito sanitrio, buscando

    exemplos existentes neste ramo jurdico para melhor ilustrar a pesquisa.

    Aps conceituar e exemplificar, passamos, finalmente, a justificar a real

    relevncia deste estudo levantando na doutrina os limites formais e materiais

    deste instituto, como maneira de fornecer ferramentas para a proteo dos

    direitos coletivos e individuais contra atos ilegais.

    Descritores: Direito Administrativo Sanitrio Discricionariedade

    Discricionariedade Tcnica Discricionariedade Tcnico-Administrativa

    Ato Administrativo Sanitrio Ato Normativo Regulatrio Tecnificao do

    Estado.

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    ABSTRACT

    By means of an intense doctrinaire exploration, people have discussed the

    mutations of law before the technological explosion in the world and,

    especially, to the technological development of the activities which the State

    acts. Because of that situation, we have explored in the international and

    national doctrine the concept of an institute connected to the technological

    development of the State activity which is called technical discretionarity.

    With this exploration, we wish to demonstrate that, not only is this doctrine

    fully applicable in Paternal Law, actually the situation corresponding to the

    technical development by means of the application to the right of the

    scientific knowledge of engineering, biology, medicine, public health, among

    others, impelled by Regulatory Authorities, demands its recognition as a way

    to control and protect the rights against eventual abuses and illegalities of

    Public Administration and, especially, of Health Administration. Therefore, we

    began with the concepts of the technical discritionarity in its two modalities

    and, after that, we searched, in more recent doctrines, the concepts and

    identified limits for the technical-administrative discretionary activity, besides

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    exemplifying the reader, circumstances in which such discritionarity is

    imposed. Parallel to the conception, we demonstrated the correlation and the

    relevance of the recognition of this institute for Health Law, looking for

    existing examples in this juridical branch in order to better illustrate the

    research. After classifying and exemplifying it, we finally started to justify the

    real relevance of this study raising in the doctrine the formal and material

    limits of this institute, as a way to supply tools for the protection of collective

    and individual rights against illegal actions.

    Keywords: Administrative Health Law Discretionarity - Technical

    Discritionarity Technical - Administrative Discretionarity - Administrative

    Health Act Normative Act of a Regulatory Authority Technical

    Development of the State.

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    NDICE

    Pgina

    I Introduo 12

    II Conceito e as modalidades da discricionariedadetcnica 19

    2.1 O conceito clssico da discricionariedade administrativa e a

    sua incapacidade de prover solues diante da atividadetcnico-administrativa do Estado na atualidade.......................................

    2.2 A discricionariedade tcnica, suas modalidades e diferenas......

    2.3 H discricionariedade na realizao de aes tcnicas pelaAdministrao? O estgio atual da Administrao Pblica.............

    2.4 O termo tcnica e a discricionariedade.......................................................

    2.5 A discricionariedade tcnica e a atividade tcnico-interpretativa da administrao a discricionariedade

    instrumental jurdico-tcnica...................................................................................

    2.5.1 A discricionariedade instrumental e a teoria dosconceitos jurdicos indeterminados......................................................

    2.5.2 A discricionariedade instrumental jurdico-tcnica....................

    2.6 A discricionariedade tcnico-administrativa................................................

    19

    22

    23

    26

    34

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    46

    III A discricionariedade tcnico-administrativa nossistemas jurdicos estrangeiros 59

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    3.1 A discricionariedade tcnica nos pases adotantes do direitoanglo-saxo.........................................................................................................................

    3.1.1 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoestadunidense......................................................................................................

    3.1.2 A discricionariedade tcnica no sistema jurdico ingls........

    3.2 A discricionariedade tcnica nos pases adotantes do direitoromanstico...........................................................................................................................

    3.2.1 A discricionariedade tcnica no sistema jurdico italiano.....

    3.2.1.1 Incio do debate do conceito da discricionariedade

    tcnica.......................................................................................................

    3.2.1.2 A posio da doutrina da segunda metade do sculoXX o crescimento da tecnificao e esta influnciana atividade do Estado......................................................................

    3.2.1.3 O entendimento atual da doutrina italiana e atecnificao da administrao pblica. Adiscricionariedade tcnico-administrativa nascida dainterferncia da tcnica no direito administrativo................

    3.2.2 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoportugus.................................................................................................................

    3.2.3 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoargentino..................................................................................................................

    3.2.4 A discricionariedade tcnica no sistema jurdicoespanhol...................................................................................................................

    3.2.4.1 As teorias sobre a discricionariedade tcnico-administrativa da autora EVA DESDENTADO DAROCA.........

    59

    61

    69

    71

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    93

    97

    103

    IV A relevncia da discricionariedade tcnico-administrativa para o direito sanitrio brasileiro 107

    4.1 A relevncia do reconhecimento da discricionariedade tcnico-administrativa no sistema jurdico sanitrio brasileiro.........................

    4.1.1 A identidade da discricionariedade tcnico-administrativa........................................................................................................

    4.1.2 O carter tcnico e interdisciplinar do direito sanitrio

    107

    110

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    brasileiro como justificativa para o reconhecimento dadiscricionariedade tcnico-administrativa........................................

    4.1.3 A importncia da discricionariedade tcnico-administrativa como instrumento do direito sanitrio..............

    4.2 As hipteses em que surge a discricionariedade tcnico-administrativa no direito sanitrio........................................................................

    4.2.1 A hiptese de discricionariedade tcnico-administrativano ato administrativo sanitrio em abstrato o estudo docaso da marcao de pequenos implantes parafusos......

    4.2.2 A influncia da norma tcnica no caso da marcao dosparafusos biocompatveis............................................................................

    4.2.3 A hiptese de discricionariedade tcnico-administrativano ato administrativo sanitrio em concreto o estudo docaso do cumprimento das Boas Prticas de Fabricao(BPF) de Medicamentos...............................................................................

    4.3 Os limites formais e materiais na atuao discricionriatcnico-administrativa o papel e a importncia do controle doato...............................................................................................................................................

    4.3.1 Os limites formais para a atuao discricionria tcnico-administrativa os elementos da discricionariedade.............

    4.3.2 Os limites materiais..........................................................................................

    4.3.2.1 O critrio da discricionariedade tcnico-administrativa a eficincia............................................................................................

    4.3.2.2 O critrio da discricionariedade tcnico-administrativa a razoabilidade...................................................................................

    4.3.2.3 A norma tcnica como critrio.......................................................

    115

    119

    123

    123

    127

    130

    132

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    140

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    V Concluses 151

    Bibliografia 155

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    SIGLAS UTILIZADAS

    ABNT - Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    ANS - Agncia Nacional de Sade Suplementar

    ANVISA - Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    APA - Administrative Procedure Act

    BPF - Boas Prticas de Fabricao

    EPA - Environmental Protection Agency

    EUA - Estados Unidos da Amrica

    FDA - Food and Drug Administration

    ISO - International Standards Organization

    NBR - Norma Brasileira

    PL - Projeto de Lei

    RDC - Resoluo da Diretoria Colegiada

    RN - Resoluo Normativa

    SNVS - Sistema Nacional de Vigilncia Sanitria

    SUS - Sistema nico de Sade

    TV - Technische berwachungs Vereine

    UE - Unio Europia

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    CAPTULO I

    INTRODUO

    A discricionariedade, uma das mais instigantes matrias do direito

    pblico, sempre desafiou e ainda desafia a doutrina e a jurisprudncia

    quanto sua identificao e limites.

    Seu estudo, que se intensificou durante o sculo XX, ensejou, a partir

    do incio daquele sculo, a identificao de outra modalidade de

    discricionariedade que parte da doutrina passou a denominar

    discricionariedade tcnica.

    Termo que vem criando grande polmica no direito est muito longe,

    como est tambm a prpria discricionariedade administrativa clssica1, de

    constituir unanimidade e consenso, principalmente quanto sua efetiva

    existncia e diferenciao relativa ao prprio instituto da discricionariedade

    administrativa clssica, sendo tratado, at mesmo, como questo obscura,

    1- Segundo a lio de MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, a discricionariedade administrativa a faculdade que a lei confere Administrao para apreciar o caso concreto, segundocritrios de oportunidade e convenincia, e escolher uma dentre duas ou mais

    solues, todas vlidas perante o direito. (Discricionariedade administrativa naConstituio de 1988.2. ed., So Paulo: Atlas, 2001, p. 67).

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    dada a sua variedade de conceitos2.

    Tal instituto, concebido na obra de EDMUND BERNAZIK3, baseou-se nas

    apreciaes (chamadas por ele de ein technisches Ermessen) em que a

    Administrao Pblica age como um tcnico (administrativo) do interesse

    pblico, no abrindo a possibilidade de controle judicial para esses atos4.

    Assim, por este conceito pretendia-se englobar todos os atos administrativos

    que, apesar de eventualmente no serem discricionrios, por sua alta

    complexidade tcnica administrativa do dia-a-dia da Administrao Pblica,

    deveriam ser retirados do controle jurisdicional5.

    Aps isto, o conceito deste instituto foi debatido e desenvolvido

    principalmente na Itlia e na Espanha, onde se encontra a maioria das bases

    doutrinrias para a discusso do tema. Porm, apesar da intensa discusso

    sobre o instituto da discricionariedade tcnica e apesar de passado mais de

    um sculo de discusso, no existe, ainda, consenso na doutrina quanto

    sua existncia.

    No entanto, houve sem dvida alguma uma ampliao tanto da

    atividade estatal quanto da regulao estatal que, em vrios casos, se

    utilizam das normas e conhecimentos tcnicos que se tornaram por sua vez

    fontes das decises administrativas sanitrias, principalmente nos casos das

    2- SOUSA, Antnio Francisco de. A discricionariedade administrativa: origem e evoluohistrica no sistema continental europeu. Estado actual dos reconhecimentoscientficos. Consideraes para o estreitamento e a clarificao do conceito dediscricionariedade administrativa.Lisboa: Danbio, 1987, p. 307.

    3- Rechtsprechung und materielle Rechtskraft, de 1886 apud QUEIR, Afonso Rodrigues.O poder discricionrio da administrao.2. ed., Coimbra: Coimbra Editora, 1948, p.123.

    4- QUEIR. O poder discricionrio..., p. 122.5- SOUSA. A discricionariedade..., p. 307-308.

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    agncias reguladoras, o que imprime ao direito, a necessidade de

    reestruturar formas de controles especficos para a sua atividade.

    Por isso, tratamos neste trabalho de demonstrar as duas vertentes

    doutrinrias que estudam este assunto na doutrina estrangeira, comparando

    as razes da doutrina que no aceita a tese de que a tcnica capaz de

    alterar a discricionariedade administrativa ao ponto de criar uma nova

    modalidade de discricionariedade chamada de discricionariedade tcnico-

    administrativa6, com a doutrina que acredita nesta nova modalidade de

    discricionariedade7apontando, ainda, suas peculiaridades.

    Assim, independente da falta de consenso quanto sua existncia,

    verificamos que cada vez mais ela objeto de estudo na doutrina

    estrangeira, principalmente na atualidade e com a intensificao da atividade

    de regulao do Estado moderno nas reas de alta complexidade

    tecnolgica.

    Aliada esta atividade estatal ao surgimento de decises e atos dos

    rgos da administrao sanitria brasileira: Resolues da Diretoria

    Colegiada (RDC) da ANVISA ou as Resolues Normativas (RN) da ANS,

    alm de normas ISO, ABNT, entre outras, teve inicio aqui uma crescente

    6- Un secondo fattore strettamente connexxo allespansione dei poteri discrezionali statuil convincimento che mopti compiti di carattere regolamentare dovessero essereaffrontati alla stregua di questioni di natura tecnica o scientifica e, quindi, dovesseroessere risolti da autorit specializzate. Tuttavia, non vi una netta linea didemarcazione tra le questioni che possono essere risolte aplicando abilit tecniche equelle che, invece, richiedono decisioni che comportano scelte politiche e di valore.(GALLIGAN, Denis J. La discrezionalit amministrativa. Trad. de Marco Mazzoni eVincenzo Varano. Milo: Giuffr, 1999, p. 85).

    7- PELAGATTI, Giuseppe. Valutazione techiche dellamministrazione pubblica e sindicato

    giudiziario. Un analisi critici dei recenti sviluppi della dottrina iuspubblicista. RevistaTrimestale di Diritto Pubblico.Nmero VI, Milano: Giuffr, 1992, p. 159.

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    discusso sobre a existncia da discricionariedade tcnica no Brasil e, da,

    comeou-se a verificar a possibilidade do seu controle social e judicial.

    Apesar de tudo isso, no houve no Brasil, muitos estudos dedicados a

    este instituto8, embora estejam contidos nas obras que abordam temas

    como agncias reguladoras e discricionariedade administrativa.

    Em toda a coleta e anlise da doutrina nacional, encontramos uma

    obra, resultante de uma dissertao de mestrado9, que trata exclusivamente

    da discricionariedade tcnica, concluindo pela sua inexistncia e, assim,

    dando mais nfase s questes relativas discricionariedade administrativa

    clssica e a seu controle.

    Por esta razo e pela importncia que vem sendo dada matria na

    Europa, trazemos discusso a evoluo doutrinria e jurisprudencial sobre

    este tema, identificando, tambm no Brasil, o que a doutrina tem discutido

    sobre a discricionariedade tcnica.

    A justificativa desta abordagem est na necessidade de adequarmos

    a doutrina e as decises administrativas e judiciais situao de fato quanto

    atividade do Estado que mudou significativamente aps a metade do

    sculo XX.

    E, com o surgimento das leis e normas que disciplinaram a atividade

    8- Como bem ressalta SRGIO GUERRA,...entre ns, o tema da discricionariedade tcnicano foi objeto de um amplo aprofundamento doutrinrio (Controle judicial dos atosregulatrios. Rio de Janeiro: Lmen Jris, 2005, p. 200).

    9- FARIAS, Daniela Cordeiro de. Discricionariedade e apreciaes tcnicas da

    administrao pblica. Dissertao (Mestrado em Direito do Estado). 2005. 203 p.Faculdade de Direito, PUC/SP, So Paulo.

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    de vigilncia sanitria a partir da dcada de 7010, a disciplina

    discricionariedade tcnica ganhou mais fora com a tecnificao11 das

    atividades do Estado na busca de regulao de setores de alto

    conhecimento cientfico e na sua prpria atividade estatal, especificamente,

    para nosso caso, as reas de sade.

    E, como explica MIGUEL SNCHEZ MORN:

    ...la doctrina jurdico-pblica necesita actualizar peridicamente su bagaje

    de ideas y conceptos, so pena de quedar desconectada del devenir social y,en consecuencia, ver reducida la capacidad explicativa (de fenmenosnuevos que no encajan en los moldes preestablecidos), ordenadora y deresolucin de conflictos que le es propia12.

    Sensibilizados com esta idia, dedicamos esta obra coleta e estudo

    da doutrina nacional e internacional como base para o entendimento da

    discricionariedade tcnica, seus novos critrios de eleio e sua definio

    como ponto inicial para a discusso do tema.

    Iniciaremos, no Captulo II, a identificao do conceito da

    discricionariedade administrativa clssica, a discricionariedade tcnica e sua

    subdiviso conforme entendimento baseado na mais recente doutrina

    espanhola em discricionariedade instrumental tcnico-jurdica (atividade

    10- BRASIL. Lei n. 6.360, de 23 de setembro de 1976. Dispe sobre a vigilncia sanitria aque ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacuticos e correlatos,cosmticos, saneantes e outros produtos, e d outras providncias. Dirio Oficial daUnio, Braslia, DF, 24 de setembro de 1976. BRASIL. Lei n. 5.991, de 17 dedezembro de 1973. Dispe sobre o controle sanitrio do comrcio de drogas,medicamentos, insumos farmacuticos e correlatos, e d outras providncias. DirioOficial da Unio, Braslia, DF, 19 de dezembro de 1973, entre outras.

    11- Tal conceito empregado pela doutrina para identificar a incluso das atividadesprofissionais de alta complexidade tcnico-cientficas extrajurdicas na atividade doEstado.

    12

    - Discricionalidad administrativa y control judicial. 2. Reimpresso, Madrid: Tecnos,1995, p. 94-95.

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    interpretativa) e discricionariedade tcnico-administrativa(atividade volitiva),

    com a finalidade de colocar o leitor, desde j, em contato com a discusso

    do tema e com o entendimento da linha conceitual deste instituto.

    Tais conceitos sero colocados dentro da perspectiva do direito

    brasileiro, sem nos afastarmos da essncia trazida principalmente pela

    doutrina espanhola e italiana que mais se desenvolveram neste campo.

    A partir da, comearemos a justificativa deste conceito com a coleta

    da doutrina internacional sobre o tema.

    Esta coleta, realizada no Captulo III, ser dividida entre os pases

    adotantes do direito anglo-saxo common law e o direito romanstico.

    A subdiviso realizada tem como justificativa a diferena de

    abordagem entre os conceitos e a evoluo encontrada em cada um desses

    sistemas jurdicos para melhor esclarecer o leitor.

    Aps a demonstrao das doutrinas hoje existentes no direito

    aliengena, passaremos a analisar o direito brasileiro em comparao com

    toda a doutrina demonstrada nos captulos anteriores, mostrando a

    relevncia do tema para nosso direito sanitrio, identificando casos prticos

    de discricionariedade tcnico-administrativa, objeto do nosso estudo,

    aplicada na atividade da ANVISA na regulao de produtos para a sade.

    Como forma de deixar clara a sua diferena com o instituto da

    discricionariedade administrativa, sintetizando e sem a pretenso de esgotar

    o tema, abordaremos algumas consideraes sobre os limites deste instituto

    quanto aos elementos da discricionariedade tcnico-administrativa, quanto

    aos seus critrios de eleio das alternativas e sob a influncia eventual da

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    norma tcnica, como critrio.

    Por ser extensa a matria de discusso neste ltimo captulo, faremos

    uma sntese superficial com a explanao de pontos especficos e

    essenciais para a constituio e aclaramento do instituto, deixando para

    outro momento a complementao subsidiria dos limites da

    discricionariedade tcnico-administrativa, bem como a explanao de seus

    critrios.

    Ressaltamos que por no haver unanimidade em toda a doutrina, seja

    nacional ou internacional, o enfrentamento deste tema no assunto fcil de

    desenvolver.

    Porm, alm de necessria, a urgncia nesta discusso se faz pelas

    circunstncias de fatos ligados atividade do Estado e interferncia deste

    na sociedade, j existente e proliferados em nosso pas.

    Neste sentido, esperamos que este trabalho abra a discusso sobre

    este instituto, e que tambm, o presente debate seja absorvido pela

    atividade estatal, principalmente na busca de delimitar a atividade

    desenfreada de regulao, realizada sob o manto e em nome da

    complexidade tcnica sem controles jurdicos efetivos.

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    CAPTULO II

    CONCEITO E AS MODALIDADES DA DISCRICIONARIEDADE

    TCNICA

    SUMRIO: 2.1 O conceito clssico da discricionariedadeadministrativa e a sua incapacidade de prover soluesdiante da atividade tcnico-administrativa do Estado naatualidade 2.2 A discricionariedade tcnica, suasmodalidades e diferenas 2.3 H discricionariedade na

    realizao de aes tcnicas pela Administrao? Oestgio atual da Administrao Pblica 2.4 O termotcnica e a discricionariedade. 2.5 A discricionariedadetcnica e a atividade tcnico-interpretativa daadministrao a discricionariedade instrumental jurdico-tcnica 2.5.1 A discricionariedade instrumental e a teoriados conceitos jurdicos indeterminados 2.5.2 Adiscricionariedade instrumental jurdico-tcnica 2.6 Adiscricionariedade tcnico-administrativa

    2.1 O conceito clssico da discricionariedade administrativa e asua incapacidade de prover solues diante da atividade

    tcnico-administrativa do estado na atualidade

    A discricionariedade administrativa conceitua-se classicamente como

    a faculdade que a lei confere Administrao Pblica de escolher entre

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    duas ou mais alternativas vlidas perante o direito, a que mais se aproxima

    do interesse pblico segundo os critrios de oportunidade e convenincia13.

    No entanto, quando estamos diante de certos conhecimentos tcnicos

    sanitrios extrajurdicos, tais critrios de oportunidade e convenincia

    estabelecidos pela doutrina clssica do direito administrativo no so

    capazes de resolver o caso em concreto, como j observou a recente

    doutrina administrativista14.

    Assim, os critrios de soluo e os elementos do ato administrativo se

    alteram nestes casos para que o Estado possa atender ao interesse pblico

    da melhor forma, buscando a soluo mais justa quando enfrentados os

    casos em que o administrador se depara com a alta complexidade tcnica

    extrajurdica.

    Esta soluo tem como base conhecimentos complexos e

    especializados, prprios das cincias extrajurdicas e tem como

    caracterstica, ainda, a interdisciplinaridade cientfica.

    Neste sentido, j advertia AFONSO RODRIGUES QUEIR:

    O conceito de poder discricionrio..., resume-se nisto: trata-se de umafaculdade de escolher uma entre vrias significaes contidas num conceitonormativo prtico, relativo s condies-de-fato do agir administrativo escolha feita sempre dentro dos limites da lei.(...)Ora bem: o conceito de fim do ato, na nossa concepo, no forosamente um conceito de valor: pode ser um conceito de valor; comoquando a atividade competente age para reprimir atos contrrios moral e decncia pblica (art. 351. do Cdigo Administrativo) mas pode

    13- DI PIETRO. Discricionariedade administrativa..., p. 67.14- DAROCA, Eva Desdentado. Discrecionalidad administrativa y planeamiento urbanstico

    construccin terica y anlisis jurisprudencial. 2. ed., Editorial Aranzadi: Elcano,1999, p. 133-134.

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    tambm ser um conceito teortico, porque derivado das cincias do ser ouartes correspondentes: como quando a autoridade pode praticar certos atosde polcia sanitriaquere dizer, com o fim higinico-sanitrio15.

    Os conceitos derivados das cincias que, no caso, so extrajurdicas

    e ligadas atividade estatal sanitria, no comportam a prtica do ato diante

    da liberdade conferida pela norma, como vem verificando a doutrina

    administrativista, dentro dos limites estabelecidos pelos critrios da doutrina

    clssica de discricionariedade.

    Este problema da alterao de critrios nos casos de

    discricionariedade baseada em critrios tcnicos tambm j foi levantado por

    THEMSTOCLES BRANDO CAVALCANTI, que advertiu quanto apreciao de

    critrios tcnicos:

    Quem pode determinar o sentido? O tcnico? O perito? O prprio juiz?

    O controle judicial do ato discricionrio delicado, no s pela naturezaespecfica da funo judicial, fundada em pressupostos estranhos, emgrande parte, atividade administrativa, mas tambm porque o critrio deapreciao muitas vzes diferente16.

    Por isto, a doutrina nacional e estrangeira vem buscando vrias

    formas de se adequar o conceito clssico de discricionariedade atividade

    estatal que hoje totalmente diversa daquela que existia quando do

    estabelecimento do conceito clssico.

    E mais. O conceito clssico no tem a capacidade de resolver as

    questes sanitrias enfrentadas atualmente pelo Estado, mesmo porque

    15- A teoria do desvio de poder em Direito Administrativo. Revista de DireitoAdministrativo. Rio de Janeiro, n. 06, 1968, pp. 77-78.

    16

    - Do poder discricionrio. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, vol. 101,jul.-set. 1970, p. 11.

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    atualmente a lei no tem delimitada a atuao estatal e sim tem fixados os

    standards de atuao, ou seja, existe uma limitao mais genrica,

    relegando a soluo do caso concreto aplicao de conceitos da tcnica

    ou da cincia sanitria onde muitas vezes tais solues so encontradas nas

    normas tcnicas.

    Por isto, este trabalho buscou encontrar na evoluo doutrinria e na

    posio mais recente da doutrina da discricionariedade, instrumento capaz

    de responder e de solucionar tais casos concretos encontrados hoje pelo

    Estado na sua atividade sanitria e na atividade de regulao,

    correspondente chamada discricionariedade tcnica.

    2.2 A discricionariedade tcnica, suas modalidades e

    diferenas

    Antes de adentrarmos na explanao conceitual da discricionariedade

    tcnica com base na doutrina existente, preciso tecer algumas

    consideraes quanto aos termos utilizados por esta mesma doutrina que

    subdividiu a denominada discricionariedade tcnica em duas modalidades:

    a discricionariedade instrumental jurdico-tcnica e a discricionariedade

    tcnico-administrativa, sendo esta ltima o objeto de estudo de nossa

    monografia.

    Assim, a doutrina espanhola, com fundamento na doutrina italiana,

    identificou duas subespcies da discricionariedade tcnica como forma de

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    distinguir aquela que tem como base a atividade meramente interpretativa do

    administrador discricionariedade instrumental jurdico-tcnica -, daquela

    em que h liberdade de escolha discricionariedade tcnico-administrativa.

    Aps a atividade interpretativa do agente administrativo sanitrio, em

    que ele interpretar os termos tcnicos extrajurdicos, necessrios para a

    aplicao do direito e do interesse pblico j definido pela norma, seguir ele

    para a aplicao direta deste direito, concluindo pela inexistncia de

    liberdade conferida pela tcnica, ou, em havendo esta liberdade, ter este

    que percorrer o caminho da eleio at culminar na concreo do ato

    administrativo sanitrio com a finalidade exigida pela norma.

    Neste estudo centraremos nossa pesquisa na chamada

    discricionariedade tcnico-administrativa.

    Porm, apenas neste captulo discorreremos sobre a sua modalidade

    interpretativa - discricionariedade instrumental tcnico-jurdica, para dar ao

    leitor noo mais ampla sobre o assunto, e que ser de grande importncia

    para a identificao dos institutos, mas sem aprofundamento do tema.

    2.3 H discricionariedade na realizao de aes tcnicas pela

    Administrao? O estgio atual da Administrao Pblica

    A crescente tecnificao e remisses a conceitos, regras e aes que

    se desenvolvem por meio de conhecimentos especializados no direito,

    uma preocupao dos juristas da atualidade.

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    Neste sentido, explica DAROCAque:

    Como consecuencia de ello, las reglas y criterios tcnicos inciden de formacada vez ms relevantes y penetrante sobre la actividad de laAdministracin, hasta el punto que se ha afirmado que la tcnica sobre laactuacin administrativa es una de las tendencias que caracterizan laactividad del poder pblico en la poca contempornea.17

    Razo pela qual, estando a tecnificao permeando a atividade

    administrativa do Estado, esta influncia atinge tambm o poder

    discricionrio.

    E para DAROCA, a discricionariedade no mudou. O que mudou foram

    os critrios de juzos e valorao necessrios para a eleio da soluo mais

    adequada quando se est diante das chamadas apreciaes tcnicas, o

    que alterou o instituto da discricionariedade, admitindo o surgimento de uma

    nova espcie18

    : a discricionariedade tcnica.

    Alm disso, desta mudana criou-se uma preocupao quanto

    interferncia das aes tcnicas da Administrao que atingem os

    particulares, afetando-os neste novo conceito de atividade discricionria.

    Porm, a doutrina, ao tratar da discricionariedade tcnica, deparava-

    se com o questionamento consistente na existncia de liberdade nas

    escolhas de alternativas tcnicas. Hoje este entendimento foi ultrapassado

    admitindo a existncia da pluralidade de opes mesmo quando esto

    presentes as questes tcnicas, fazendo com que a discricionariedade

    tcnica seja analisada como instituto do direito administrativo.

    17- Discrecionalidad, p. 133.18- Discrecionalidad, p. 133-134.

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    Mesmo assim, a discusso ainda est longe de chegar a um

    consenso. H parte da doutrina que no admite a criao de uma nova

    modalidade de discricionariedade e, assim, para no restringir a aceitao

    de sua tese, adverte DAROCA que, para no se aprofundar no debate do

    termo discricionariedade tcnica, condenado pela doutrina italiana, utiliza

    ela a expresso apreciao tcnica, fazendo referncia a toda a atividade

    de respostas a problemas prticos mediante a utilizao de critrios tcnicos

    que, adverte, no se reduz cincia aplicada, e sim a todos os

    conhecimentos cientficos e tcnicos.

    So estas as apreciaes heternomas19.

    E assim conclui que:

    En las apreciaciones tcnicas los criterios o reglas tcnicas no sonsusceptibles de una aplicacin y utilizacin mecnicas, sino que exigen que

    el operador tcnico ejercite su discernimiento, es decir, que realice ciertaselecciones conforme a criterios que no vienen determinados ni por elordenamiento jurdico ni por la tcnica.20

    A utilizao do termo apreciaes tcnicas no afasta o

    reconhecimento da discricionariedade tcnica nas teses levantadas por

    DAROCA. Mas para evitar confuso, j que parte da doutrina no aceita este

    reconhecimento, deixamos bem claro que ele expresso em sua obra bem

    como na de muitos autores que se aprofundaram no tema.

    Com este reconhecimento, passaremos a analisar as duas

    modalidades de discricionariedade tcnica identificadas pela doutrina

    19- Discrecionalidad, p. 136-137.20- Discrecionalidad, p. 138-139.

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    espanhola e italiana, diante das atividades de regulao e atuao tcnicas

    da Administrao Pblica, dentro dos conceitos de discricionariedade forte

    (poltica) e fraca (jurdica)21, passamos a descrever.

    2.4 O termo tcnica e a discricionariedade

    A doutrina que vem estudando a discricionariedade tcnica tem boas

    razes para defender a continuidade do termo tcnica quando se fala na

    possibilidade de eleio com base na liberdade e em conhecimentos de alta

    complexidade tecnolgica ou cientfica extrajurdica22.

    O direito assim segue uma alterao imposta pelo prprio homem, ouseja, a evoluo tecnolgica e a sua interferncia nas atividades estatais23.

    Conforme j identificaram a doutrina nacional e internacional, a atual

    atividade da Administrao Pblica na produo dos seus atos

    administrativos regulatrios (de poder de polcia), de fomento ou de

    prestao de servios pblicos, impe, muitas vezes, conhecimento tcnico

    21- DWORKIN criou um sistema de identificao do grau de liberdade na atividadediscricionria quantificando este ele como forte e fraca, sendo a fraca de menoramplitude e a forte de maior amplitude, ou seja, onde se tem mais liberdade de ao(Levando os direitos a srio. Traduo e notas Nelson Boeira. So Paulo: MartinsFontes, 2002, p. 51-54).

    22- Discrecionalidad, p. 134.23- PELAGATTI. Valutazione techiche..., p. 159.

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    extrajurdico para as diversas situaes encontradas na busca das solues

    para o exerccio destas atividades perante cada caso concreto24.

    As normas e conhecimentos tcnicos extrajurdicos esto hoje

    presentes tambm nas normas legais, nas administrativas em abstrato, alm

    dos atos administrativos em concreto, principalmente naqueles emanados

    pelas agncias reguladoras em matria de sade: ANVISA e ANS25, que

    tm, at por exigncia legal26, atribuio tcnica27.

    Atualmente faz necessrio que o conhecimento tcnico-extrajurdico

    de certos agentes administrativos seja utilizado na interpretao e aplicao

    dos conhecimentos tcnicos existentes, tanto para a criao de normas,

    necessrios na definio das regras sanitrias prprias de regulao,

    24- A produo de regras tcnicas acerca do desempenho de atividades econmicasrelevantes passa titularidade de rgos tcnicos. As agncias so entidades

    hierarquicamente no subordinadas ao poder Legislativo, dotadas de competncia paradisciplinar os meios tcnicos adequados realizao dos fins impostos(legislativamente) aos sujeitos que desempenham atividades integrantes de certosegmento econmico. (JUSTEN FILHO. Maral. O direito das agncias reguladorasindependentes.So Paulo: Dialtica, 2002, p. 364).

    25- Tal finalidade tcnica faz MARAL JUSTEN FILHO afirmar que as agncias: ...recebemcompetncias de diversas ordens para fiscalizar a formulao de decises polticas,verificar o cumprimento dos deveres institucionais por parte das autoridades pblicas,promover a implementao de valores fundamentais consagrados constitucionalmente,concentrar conhecimento tcnico e a produo dele derivadas e assim por diante. (Odireito das agncias..., p. 358.)

    26 - Artigo 5. - O Presidente ou o Diretor-Geral ou o Diretor-Presidente (CD I) e os demais

    membros do Conselho Diretor ou da Diretoria (CD II) sero brasileiros, de reputaoilibada, formao universitria e elevado conceito no campo de especialidade doscargos para os quais sero nomeados, devendo ser escolhidos pelo Presidente daRepblica e por ele nomeados, aps aprovao pelo Senado Federal, nos termos daalnea f do inciso III do art. 52 da Constituio Federal. (grifo nosso) (BRASIL. Lei n.9.986, de 18 de julho de 2000. Dispe sobre a gesto de recursos humanos dasAgncias Reguladoras e d outras providncias. Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF,19 de julho de 2000).

    27- Aduz ALEXANDRE SANTOS DE ARAGOque: O carter tcnico da atuao das agnciasreguladoras se revela atravs dos requisitos de formao tcnica que a lei impe aosseus dirigentes e, principalmente, pelo fato dos seus atos e normas demandaremconhecimento tcnico e cientfico especializado para que possam ser emanados,

    aplicados e fiscalizados.(Agncias reguladoras. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004,p. 323)

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    quanto na concreo dos atos administrativos discricionrios, definindo as

    regras para a atividadesanitria de fomento ou prestao de servios.

    Negar a existncia da tcnica (extrajurdica) e da sua influncia na

    discricionariedade como conhecemos, vem em desencontro a uma atual

    situao de fato e de direito hoje encontrada no direito ptrio.

    Por isso, com todo respeito queles que defendem posio contrria,

    baseada na doutrina de ALESSI28, o qual afirmou que los dos trminos

    discrecionalidad y tcnica son esencialmente inconciliables, no podemos

    mais imaginar que no houve uma readaptao do direito situao de fato

    baseada na evoluo tecnolgica, lembrando sempre que a base da

    negativa desta doutrina anterior dcada de 1970, situao diversa da

    que encontramos hoje no direito, principalmente diante da interferncia da

    tcnica no direito administrativo sanitrio.

    Conclumos estar mais acertada a doutrina de DAROCA, neste caso.

    Vejamos por que.

    DAROCA, iniciando num extenso estudo da parte filosfica para o apoio

    da sua teoria, passando pelas teses de KELSEN, HART, MACCORMICK e

    DWORKIN29, fazendo uma anlise do conceito da discricionariedade

    administrativa, define como sendo esta uma espcie do gnero

    supraconcepto de discrecionalidad, que para ela uma definio de um

    mnimo denominador comum entre todas as espcies de

    discricionariedades.

    28- Instituciones de derecho administrativo.Vol. I, Barcelona: Bosch, 1970, p. 199.29- Discrecionalidad, p. 35-52.

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    Tais espcies de discricionariedade, apesar de terem caractersticas

    particulares que as diferenciam entre si, na essncia, remetem a uma viso

    unitria de um fenmeno complexo e heterogneo, dentro do qual a

    discricionariedade administrativa, por exemplo, no mais do que uma

    parte30.

    Portanto, neste supraconceito estaria um fator comum a todas as

    modalidades de discricionariedade consistente em um determinado modo de

    operar, de atuar, de realizar algo. Por fora deste entendimento, o ato

    demandaria a adoo de decises dentro de uma margem de apreciao

    desejada pelo ordenamento mediante a realizao de uma eleio entre

    diferentes alternativas sobre a base de determinados critrios31.

    Assim:

    Se trata, pues, de la adopcin de decisiones de forma desvinculada delordenamiento jurdico, realizando una eleccin entre diferentes alternativas,utilizando para ello criterios valorativos extrajurdicos. La discrecionalidad esun . Con el supraconcepto de discrecionalidad no se esthaciendo, pues, referencia ms que a una determinada forma de operar; nose describe la actividad que realiza el sujeto ms que desde una perspectivapuramente formal. Desde esta perspectiva formal, todas las manifestacionesde fenmenos discrecionales son esencialmente iguales; su nica diferenciaes de grado.32

    A partir desse entendimento, passa DAROCA33

    a dividir a

    discricionariedade com base no instituto da separao de poderes e nos

    limites das atividades a eles conferidos pelo sistema jurdico:

    30- Discrecionalidad, p. 70.31- Discrecionalidad, p. 70-71.32- Discrecionalidad, p. 71.33- Discrecionalidad, p. 71-81.

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    discricionariedade poltica Poder Legislativo discricionariedade

    fortssima;

    discricionariedade jurdica Poder Judicirio discricionariedade

    fraca;

    discricionariedade administrativa Poder Executivo

    discricionariedade forte ou fraca, dependente da outorga de liberdade

    do ordenamento jurdico.

    No primeiro caso (discricionariedade poltica), afirma DAROCAque, de

    todas as formas de discricionariedade analisadas:

    la ms amplia es, por tanto, la caracterstica del legislador (que Bell llama) en la medida en que implica la creacin de normasjurdicas generales y la eleccin para ello de los fines y medios pertinentesdentro de un amplio marco de opciones polticas, con las nicas limitacionesque se establezcan en la Constituicin. Es decir, el legislador goza de unamplio margen de discrecionalidad para el establecimiento de opcionespolticas, para lo cual se halla plenamente legitimado por su carcterrepresentativo. De ah, que se haya calificado esta discrecionalidad de y de .34

    J no segundo caso (discricionariedade jurdica), os Tribunais operam

    na soluo de casos que exijam critrios extrajurdicos de moralidade

    poltica, de justia ou econmicos, onde devem eleger, entre um espao de

    liberdade bem restrito conferido pela lei, uma soluo proporcionada pelo

    ordenamento jurdico.

    34- Discrecionalidad.. ., p. 76.

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    Neste sentido, afirma DAROCAque:

    ...los tribunales operan discrecionalmente aunque su discrecionalidad seanormalmente de escasas dimensiones en la medida en que exige ms juicioque voluntad, se encuentra guiada por los materiales jurdicos existentes ycualquier decisin que se adopte ha de estar justificada mediante unargumento jurdico, aunque para ello sea precisa una integracin valorativadel ordenamiento jurdico. La discrecionalidad propia de los tribunales sera,as, una o que aparece en la concreciny aplicacin del ordenamiento jurdico al caso concreto.35

    Entre esta modalidade de discricionariedade e a primeira aqui

    demonstrada, existe uma intermediaria, denominada por DAROCA, como

    sendo discricionariedade administrativa36.

    Nela, afirma a doutrina que pode haver tanto uma maior como uma

    menor liberdade de atuao, podendo-se, assim, dizer que h uma

    discricionariedade administrativa forte e fraca.

    No caso da fraca, a administrao pode ter seu campo de liberdadeto reduzido que se assemelhar muito discricionariedade jurdica37.

    J na discricionariedade administrativa forte, a liberdade maior, mas

    nada comparvel discricionariedade poltica, que bastante ampla.

    Dentro deste entendimento podemos realizar uma nova diviso das

    liberdades discricionrias, agora fundada nas imperfeies da norma ou na

    real finalidade de a norma atribuir a liberdade ao operador. A primeira, define

    35- Discrecionalidad..., p. 77.36- Discrecionalidad.. ., p. 77.37- Discrecionalidad.. ., p. 81-82.

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    DAROCA como discricionariedade instrumental, ou fraca, e a segunda,

    discricionariedade forte38:

    Es importante tener presente la distincin entre aquellos casos en los que elordenamiento jurdico pretende realmente atribuir a un sujetodiscrecionalidad con la finalidad de que sea titular de un poder de decisinconsistente en la eleccin entre diferentes alternativas vlidas y aquellosotros supuestos en los que la posibilidad de elegir o decidir dentro de unmargen de maniobra surge como consecuencia de indeterminaciones,vaguedades u otro tipo de imperfecciones de la regulacin jurdica.39

    E, conclui:

    El tratamiento de ambos tipos de discrecionalidad no puede ser equivalente:el hecho de que el ordenamiento jurdico quiera o no que un determinadorgano tenga un poder de decisin es un factor que ha de jugar un papelrelevante a la hora de determinar tanto la actitud de otros rganos quepudieran interferir en esa decisin como la actitud del mismo rgano queacta discrecionalmente.40

    Teramos, assim, duas modalidades partidas do denominado

    supraconceito de discricionariedade: uma discricionariedade instrumental, ou

    fraca, voltada a elementos adjetivos do instituto e uma discricionariedade

    forte, voltada ao elemento de deciso de caracterstica volitiva, ou seja,

    parte substantiva do instituto.

    Para ela, a discricionariedade jurdica ser sempre instrumental por setratar de uma atividade com liberdade reduzida41.

    38- Discrecionalidad.. ., p. 81.39- Ibidem idem.40- Ibidem idem.41- Los tribunales cuentan con un margen de maniobra para la bsqueda de la solucin

    ms adecuada al caso difcil, es decir, con una discrecionalidad instrumental, pero nocon una discrecionalidad fuerte.(Ibidem idem)

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    No entanto, nos casos em que h discricionariedade poltica ou, em

    alguns casos em que h a discricionariedade administrativa, existe uma

    atribuio intencional pelo ordenamento jurdico de um poder de deciso de

    natureza eletiva42. Portanto:

    Tanto la discrecionalidad poltica del legislador como la discrecionalidadadministrativa tienen en comn que ambas implican que el sistema jurdicoha reconocido al legislador o a la Administracin un poder de decisin, quese traduce en un poder de elegir, sobre la base de una valoracin poltica,entre diferentes alternativas, todas igualmente vlidas dentro del marco del

    Derecho.43

    A partir desta construo terica, conceitua EVA DESDENTADO DAROCA

    a discricionariedade administrativa forte como:

    ...un poder de decisin atribuido por el ordenamiento jurdico a laAdministracin que se traduce en un poder de eleccin entre diferentesalternativas dentro del marco del ordenamiento jurdico, de tal forma que la

    Administracin viene legitimada para la adopcin y desarrollo de unadeterminada poltica de actuacin.44

    Nestes termos, inexiste, em parte, a apreciao do Poder Judicirio

    sobre a deciso tomada pela Administrao.

    Por ser uma discricionariedade provisional, j a discricionariedade

    instrumental perfeitamente suscetvel reviso judicial at mesmo pela

    falta de liberdade conferida nesta atividade discricionria45.

    Ser luz destas definies, alm das modificaes e mutaes do

    direito administrativo, que iremos abordar a matria demonstrando os

    42- Discrecionalidad.. ., p. 82.43- Ibidem idem.44- Discrecionalidad...,p. 83.45- Ibidem idem.

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    aspectos jurdicos da influncia ftica da tcnica extrajurdica na atividade da

    Administrao Pblica, especificamente no campo da atividade discricionria

    do Estado.

    2.5 A discricionariedade tcnica e a atividade tcnico-

    interpretativa da administrao a discricionariedade

    instrumental jurdico-tcnica

    Segundo DAROCA46, a discricionariedade instrumental jurdico-

    tcnica a margem que a Administrao tem em eleger, mediante

    apreciaes tcnicas interpretativas com a integrao de conceitos

    jurdicos indeterminados, uma resposta mais adequada ao caso, jque, estes termos tcnicos extrajurdicos, levam conseqente

    dificuldade de identificar de maneira certa uma nica resposta

    verdadeira para o caso concreto.

    Este conceito desenvolvido pela doutrina nasceu, segundo ela, da

    teoria geral dos conceitos jurdicos indeterminados47, denominao

    46- Discrecionalidad...,p. 139-140.47- Nos casos de aplicao da norma tcnica ou suas bases para a interpretao de tais

    termos tcnicos afirma JOS ESTEVE PARDOque: ...como es propio de la frmula de losconceptos jurdicos indeterminados, su concrecin puede variar en cada caso ymomento. De esta forma no se opera una remisin a una solucin tcnica concreta, auna norma tcnica singular, sino al orden tcnico en su conjunto, con su componentedinmico, de progresso. El operador jurdico y el juez en su caso tendrn una margende valoracin sobre cul sea, en ese momento del desarrollo cientfico y tecnolgico, la

    solucin adecuada. (Tcnica, riesgo y Derecho: tratamiento del riesgo tecnolgico en elDerecho ambiental. Barcelona: Ariel Derecho, 1999, p. 176).

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    empregada para designar vocbulos ou expresses que no tm um sentido

    preciso, objetivo ou determinado, e que so encontrados com grande

    freqncia nas normas jurdicas dos vrios ramos do direito48.

    2.5.1 A discricionariedade instrumental e a teoria dos conceitosjurdicos indeterminados

    Vimos que nos termos da construo doutrinria de DAROCA, a

    discricionariedade administrativa pode tanto ser instrumentalou fraca quanto

    forte.

    Na primeira modalidade, ela sempre existir quando da necessidade

    de interpretao de termos qualificados como conceitos jurdicos

    indeterminados49.

    Assim:

    cuando la actuacin viene condicionada por conceptos jurdicosindeterminados, la autoridad competente debe, al igual que cuando laconducta no viene condicionada en modo alguno, establecer determinadoscriterios de actuacin, aunque el marco que tenga para hacerlo sea ms

    reducido. Tanto en el primer caso como en el segundo la autoridad .50

    48- DI PIETRO. Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade administrativa..., p. 97.49- Discrecionalidad, p. 124.50- Discrecionalidad, p. 123-124.

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    Podemos entender, portanto, que para DAROCAh discricionariedade

    instrumental na definio dos conceitos jurdicos indeterminados

    encontrados nas normas jurdicas.

    Porm, a discricionariedade ali encontrada no a mesma da

    administrativa clssica, e sim uma modalidade fraca, voltada aos meios de

    interpretao e procedimento que tendem ao fim do interesse pblico ditado

    pela norma legal.

    Neste sentido:

    ...en los conceptos jurdicos indeterminados no hay una nica solucincorrecta, sino un margen de discrecionalidad instrumental, lo que nosignifica que la Administracin tenga una discrecionalidad fuerte para suaplicacin que excluya el control judicial pleno porque precisamente es a lostribunales a los que el sistema confiere la funcin de interpretar el Derecho yde resolver los casos litigiosos conforme al mismo.51

    No entanto, deve-se frisar que essa discricionariedade deve ser

    exercida dentro de critrios de poltica-jurdica-administrativa com o

    estabelecimento de determinados objetivos para a sua deciso com a

    adequada relao de meios e fins52.

    2.5.2 A discricionariedade instrumental jurdico-tcnica

    51- Discrecionalidad, p. 126.52- Discrecionalidad, p. 133.

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    Iniciando sua explicao, afirma DAROCA que em alguns casos, a

    Administrao Pblica se depara com conceitos que necessitam de

    conhecimentos tcnicos extrajurdicos para sua aplicao ao caso concreto.

    Quando a norma faz referncia a edifcio em runa etc. estaria ela

    determinando Administrao que busque dentro desses conhecimentos

    tcnicos, a forma mais adequada de aplic-los.

    Assim, en la utilizacin y aplicacin de conocimientos tcnicos el

    tcnico acta, por tanto, ejerciendo una cierta discrecionalidad, una

    discrecionalidad instrumental53.

    E, estabelecendo a valorao dos fatores e critrios tcnicos

    cientficos extrajurdicos, o Estado concluiria que, continuando o exemplo

    dado, uma casa est em runa, mediante a obteno de parecer tcnico

    qualificado, especialmente proporcionado pelos conhecimentos

    especializados e tcnicos de um agente administrativo, de forma automtica

    e nica54.

    Portanto, como la norma no ha atribuido a la Administracin la

    posibilidad de elegir con carcter concluyente conforme a su juicio y

    voluntad, sino que la eleccin es necesaria como consecuencia de la propia

    naturaleza de las normas tcnicas55, estaramos neste caso, diante da

    modalidade de discricionariedade fraca ou instrumental.

    53- Discrecionalidad, p. 139.54- Discrecionalidad, p. 140.55- Discrecionalidad, p. 140-141.

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    Esta atividade , segundo DAROCA, plenamente sindicvel pelo Poder

    Judicirio, com a ajuda da prova tcnica, dado ser ela fundada em uma

    discricionariedade instrumental56de atividade meramente interpretativa que

    pode ser substituda pelo Poder Judicirio.

    Conforme preceitua ainda, devem ser observadas algumas

    peculiaridades neste modelo de discricionariedade que difere da

    discricionariedade administrativa clssica que conhecemos:

    a) No se pode falar que h, na discricionariedade instrumental jurdico-

    tcnica, a busca do interesse pblico. Em todos os casos em que existe

    discricionariedade instrumental jurdico-tcnica, no h um poder

    conferido Administrao para a atividade de juzo de valor em busca do

    interesse pblico. Esse interesse pblico j ficou fixado pelo

    ordenamento jurdico, seja qual for o resultado da discricionariedade

    instrumental.

    b) No existe valorao que justifique ser esta discricionariedade uma

    discricionariedade forte. As apreciaes tcnicas necessrias para a

    aplicao de um conceito jurdico indeterminado que remete a um critrio

    tcnico no so mais do que operaes jurdicas consistente na

    56- Assim ensina DAROCA que: el que la determinacin de la concurrencia de lascualidades previstas en la norma no sea fcil, no siquiera mediante la utilizacin decriterios y conocimientos tcnicos, no permite concluir que la Administracin tiene unadiscrecionalidad fuerte, pues el ordenamiento ha pretendido regular su actividad y queen el desarrollo de su actividad se someta a las pautas establecida sin la norma, cuya

    interpretacin y aplicacin final no le corresponde a ella, sino a otros rganos (losrganos judiciales)(Ibidem idem).

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    aplicao de uma norma57. Por isso se deve denominar de

    discricionariedade instrumental jurdico-tcnica.

    c) No se pode, tambm, afirmar que tem a Administrao poder conferido

    pela norma como inteno de possibilitar o poder de valorao que

    afastaria o controle jurisdicional. Em sendo uma operao jurdica,

    absolutamente possvel ser sindicvel pelo Judicirio.

    d) Por ltimo, a valorao tcnica realizada pela Administrao pode ser

    perfeitamente confrontada com uma prova tcnica judiciria.

    Conclui DAROCA, portanto, que nas hipteses de integrao de

    conceitos jurdicos indeterminados de carter tcnico estamos diante da

    discricionariedade instrumental jurdico-tcnica58.

    Voltando conceituao e qualificao desta atividade de

    interpretao como sendo uma atividade discricionria, o entendimento de

    DAROCA diverge, em parte, do significado atribudo pela doutrina dos

    conceitos jurdicos indeterminadosque entende que estes tm apenas uma

    nica soluo justa59.

    No entanto, DAROCAensina que, como parte da doutrina baseada no

    conceito de discricionariedade aceita a circunstncia de que h certa

    discricionariedade nos conceitos jurdicos indeterminados face relativa

    multiplicidade efetiva de opes finais da Administrao frente a esta forma

    57- Discrecionalidad, p. 142.58- Discrecionalidad, p. 143.59

    - GARCIA DE ENTERRA, Eduardo e TOMS-RAMN Fernndez. Curso de derechoadministrativo. Vol. I, 12. ed., Madri: Civitas Ediciones, 2005, p. 467.

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    de indeterminao, o emprego do termo discricionariedade neste caso

    plenamente admissvel60.

    A corrente que entende uma nica soluo para os casos em que h

    conceitos jurdicos indeterminados tem o apoio de SAINZ MORENO61, que

    explica:

    ...la tesis segn la cual la utilizacin de tales conceptos por una norma nosignifica, por si sola, la atribucin de la facultad de elegir discrecionalmenteentre varias soluciones aquella que en cada caso se considera

    conveniente e oportuna; esta tesis, por el contrario, mantiene que lainterpretacin y aplicacin de todo concepto jurdico, cualquiera que sea elgrado de su indeterminacin, no admite, si la norma no dispone otra cosa,ms que una sola solucin correcta y que, por tanto, la correccin de ladecisin que se tome puede ser controlada judicialmente sin que tal controlimplique una mera substitucin de criterios, sino el resultado de la bsquedade la solucin justa. As, pues, la teora de los conceptos jurdicosindeterminados reduce la discrecionalidad administrativa eliminando laarbitrariedad mediante el sometimiento a control judicial de todo aquello quedebe ser juzgado en trminos de legalidad o de justicia.

    Isto porque, diferentemente do que entende EVA DESDENTADO

    DAROCA, SAINZ MORENO afirma que os conceitos jurdicos indeterminados

    resultam apenas numa soluo correta justamente pela simples inexistncia

    de critrios de opo da atividade interpretativa. Assim sendo, esta no

    poderia resultar em duas ou mais escolhas.

    Este entendimento tambm confirmado por COSTA62

    :

    60- Hemos llegado a la siguiente conclusin general: en los conceptos jurdicosindeterminados no hay una nica solucin correcta, sino un margen de discrecionalidadinstrumental, lo que no significa que la Administracin tenga una discrecionalidad fuertepara su aplicacin que excluya el control judicial pleno porque precisamente es a lostribunales a los que el sistema confiere la funcin de interpretar el Derecho y deresolver los casos litigiosos conforme al mismo.(Discrecionalidad,p. 126)

    61- Conceptos jurdicos, interpretacin y discrecionalidad administrativa. Editora Civitas:Madri, 1976, p. 192.

    62

    - Conceitos jurdicos indeterminados e discricionariedade administrativa. Revista daProcuradoria Geral do Estado de So Paulo, So Paulo, v. 29, p. 93, jun. 1988.

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    A distino mais simples e didtica entre conceitos jurdicos indeterminadose discricionariedade , a nosso ver, a formulada por Sainz Moreno: existediscricionariedade quando a autoridade administrativa pode escolher entre

    vrias decises, de modo que, na vontade do legislador, qualquer delas juridicamente admissvel e tem o mesmo valor: existe um conceito jurdicoindeterminado, por sua vez, quando s uma deciso juridicamenteadmissvel.

    Com isto, criou-se uma forma de diferenciao entre os chamados

    conceitos jurdicos indeterminados e a denominada discricionariedade

    administrativa clssica que se funda no ponto principal da inexistncia, no

    entendimento da doutrina, de verdadeira liberdade na aplicao do direito ao

    caso concreto63.

    Porm, no obstante esta diferenciao, a doutrina foi mais longe e

    comeou a analisar no s a multiplicidade ou no das opes, mas

    tambm, o exerccio de aplicao da norma ao caso concreto. Com isto,

    firmou DAROCA64

    o entendimento de ser esta modalidade verdadeira

    discricionariedade, que qualifica como instrumental:

    La distincin entre los conceptos jurdicos indeterminados y ladiscrecionalidad administrativa no puede basarse, por tanto, como hapropugnado la teora de los conceptos jurdicos indeterminados, en la ideade que la aplicacin de stos requiere una operacin de mero juicio odescubrimiento de la nica solucin justa que proporciona el ordenamientojurdico, mientras que la discrecionalidad administrativa supondra unaoperacin de volicin que consiste en la eleccin entre una pluralidad dealternativas igualmente posibles. El anlisis del problema a la luz de laTeora General del Derecho impide aceptar este criterio de distincin ypermite, por el contrario, poner de manifiesto que tambin en la aplicacinde los conceptos jurdicos indeterminados aparecen diferentesinterpretaciones posibles entre las que es preciso elegir conforme a criteriosque estn fuera del mundo jurdico.

    63- DAROCA. Discrecionalidad,p. 116.64- Discrecionalidad, p. 124.

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    Entendemos a corrente defendida por DAROCA a mais adequada, j

    que a liberdade da atividade interpretativa que d verdadeiro significado ao

    conceito jurdico indeterminado, independente da pluralidade ou no das

    opes de resultados finais.

    A atividade interpretativa faz com que haja uma diferena concreta

    entre o que podemos denominar discricionariedade administrativa clssica e

    o conceito jurdico indeterminado, sendo que, no primeiro, a lei no precisou

    exaustivamente todo ocaminhoa ser percorrido pelo administrador no seu

    dever de satisfazer o interesse pblico por ela indicado65. No segundo, a

    preciso existe, mas de forma fraca e, por isso, qualifica-se a

    discricionariedade em instrumental.

    No direito administrativo brasileiro, apesar de parte de a doutrina

    entender que os conceitos jurdicos indeterminadosno surgem da atividade

    discricionria da Administrao Pblica, reputamos ser mais acertada a

    posio de BANDEIRA DE MELLO:

    Deveras, a apreenso do significado dos conceitos imprecisos, semdvida, um ato de inteleco e ao Judicirio assiste pratic-lo parainterpretar a lei. As decises de mrito so, induvidosamente, atos volitivos,decididos segundo critrios de convenincia e oportunidade, que traduzemopo por um dentre dois ou mais comportamentos comportados pela

    norma a ser aplicada. Da no se segue entretanto que s nesta segundahiptese esteja a Administrao a exercer atividade discricionria.Com efeito, a circunstncia de que um ato de inteleco e um ato de voliosejam realidades logicamente distintas como, deveras, o so no implicaque necessariamente tenham, em face do Direito, ressonncias diversas.(...)

    65- COSTA. Conceitos jurdicos indeterminados..., p. 90-91.

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    Vale dizer, tais operaes mentais, intelectivas ou volitivas, repercutemindiferentemente para a composio dos mesmos efeitos jurdicos queintegram o que se entende por discricionariedade.66

    Sendo assim, reconhecida na doutrina ser a aplicao de conceitos

    jurdicos indeterminados atividade discricionria e ultrapassada a questo

    relativa posio doutrinria sobre a teoria dos conceitos jurdicos

    indeterminados e a sua localizao dentro da discricionariedade

    administrativa, restou pacificado que a atividade resultante da aplicao

    deste instituto cognitivo-interpretativa, como esclarecem GARCA DE

    ENTERRA E FERNNDEZ67:

    Esto es lo esencial del concepto jurdico indeterminado: la indeterminacindel enunciado no se traduce en una indeterminacin de las aplicaciones delmismo, las cuales slo permiten una en cadacaso, a la que se llega mediante una actividad de cognicin, objetivable portanto, y no de volicin.

    Neste diapaso, levando em considerao as afirmaes de EVA

    DESDENTADO DAROCA, quando a tcnica est presente na forma de conceitos

    jurdicos indeterminados, a atividade de aplicao da norma ao caso

    concreto resultar no exerccio do dever-poder discricionrio instrumental

    jurdico-tcnica68.

    Instrumental, porque, como afirmamos, a discrio aqui usada

    como processo interpretativo e cognitivo sem grande liberdade de

    66- Discricionariedade e controle jurisdicional. 2. ed., 6. tir., So Paulo: Malheiros, 2003,p. 24-25.

    67- Curso de derecho, p. 465.68

    - Los problemas del control judicial de la discrecionalidad tcnica (un estudio crtico de lajurisprudencia).Madri: Civitas, 1997, p. 61-62

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    atuao discricionria (fraca), diferente de um poder prprio de

    deciso atribudo pela lei Administrao69, e diverge quanto falta

    de interferncia da vontade dos aplicadores do conceito70e, por isto,

    considerada uma discricionariedade fraca71.

    Tal tarefa consiste na apreciao tcnica, denominao j

    conhecida pela doutrina brasileira, estudada em artigo doutrinrio

    escrito por CSAR AUGUSTO GUIMARES PEREIRA72 e, em dissertao de

    mestrado de DANIELA CORDEIRO DE FARIAS73. Ressaltamos ainda que as

    hipteses de fato estudadas por esses dois autores no analisaram as

    questes relativas ao exerccio de opes tcnicas e, com isto, a

    concluso de ambos os trabalhos deixa de incorporar que entendemos

    ser discricionariedade tcnico-administrativa, sendo restritas apenas

    s hipteses que definimos como discricionariedade instrumental

    jurdico-tcnica.

    Isto porque a grande discusso jurdica sobre a apreciao

    tcnica nasceu logo aps a criao das agncias reguladoras na

    busca da doutrina de respostas aos problemas relativos aos termos

    69- DAROCA.Discrecionalidad,p. 140.70- COSTA.Conceitos jurdicos indeterminados..., p. 94.71- DAROCA.Discrecionalidad,p. 81-84.72- Discricionariedade e apreciaes tcnicas da Administrao. Revista de Direito

    Administrativo. Rio de Janeiro, n. 231: p. 217-267. jan./mar. 2003.73 - Discricionariedade e apreciaes tcnicas da administrao pblica. Dissertao

    (Mestrado em Direito do Estado). 2005. 203 p. Faculdade de Direito, PUC/SP, SoPaulo.

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    tcnicos encontrados nas resolues normativas das agncias,

    problema este apenas resolvido mediante a utilizao dos critrios

    tcnicos e de conhecimento especializado74.

    Nesses casos, abordados pela doutrina, no h deciso entre

    escolhas e sim, pura interpretao.

    E, por ser atividade interpretativa com a aplicao de conceitos

    jurdicos e extrajurdicos, podemos conceitu-la como atividade

    interpretativa jurdico-tcnica. Jurdico-tcnica por fora da forma de

    discricionariedade (mesmo que fraca) ali realizada75 que acrescentada

    apreciao tcnica interpretativa. Neste caso, os elementos do Direito e da

    cincia tcnica extrajurdica especfica devero ser conjugados para a

    atividade jurdico-cognitiva e isto nos traz mais uma razo para diferenciar

    esta modalidade a teoria dos conceitos jurdicos indeterminados.

    Somando essas qualidades diferenciadoras dentro da teoria geral dos

    conceitos jurdicos indeterminados, podemos concluir que, alm de essa

    modalidade poder ser conceituada como uma atividade discricionria que

    DWORKIN chama de discricionariedade em sentido fraco76, ela tambm

    possui elementos prprios distintivos e relativamente autnomos da regra

    geral.

    74- Discrecionalidad, p. 137.75- DAROCA.Discrecionalidad,p. 71.76- Segundo DWORKIN, discricionariedade em sentido fraco ocorre quando o contexto no

    por si s esclarecedor, quando os pressupostos de nosso publico no incluem essefragmento de informao. (Levando os direitos..., p. 52)

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    Os conceitos tcnico-jurdicos nem sempre so indeterminados. O

    grau de indeterminao depender sempre da necessria interpretao. O

    mero auxlio de um perito ao juiz, no caso de lide judicial, no exclusivo

    para a verificao da determinao ou indeterminao do termo. Na

    verdade, a indeterminao sempre ser verificada dentro da capacidade de

    cognio do homem comum.

    Portanto, nos casos em que o termo tcnico-jurdico tiver bem claro,

    com base no conhecimento cientfico-tcnico do homem mdio, estaremos

    diante do conceito jurdico determinado, enquanto que, aquele que depender

    de uma interpretao tcnico-cientfica mais profunda, ser um conceito

    jurdico indeterminado.

    Conclumos, assim, que a discricionariedade instrumental jurdico-

    tcnica a atividade tcnico-interpretativa que a AdministraoPblica desenvolve quando da aplicao de suas normas ou

    conhecimentos tcnicos extrajurdicos ao caso concreto e que

    resultam, necessariamente, numa alternativa efetiva, correta,

    razovel e proporcional que, por fora do processo de

    interpretao, ter resultados que podero ser plenamentesindicveis pelo Poder Judicirio.

    2.6 A discricionariedade tcnico-administrativa

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    Os conhecimentos e normas tcnicas podero, tambm, ser usados

    em certas situaes em que a Administrao Pblica chamada para

    eleger, dentre duas ou mais alternativas, a deciso mais razovel e eficiente

    ao caso concreto, decises estas eventualmente orientadas por normas

    tcnicas77.

    Para isto, os conhecimentos e normas tcnicas so imprescindveis

    hoje na atividade administrativa78 de escolha e deciso, bastando a

    existncia desta remisso expressa pela norma, tcnica extrajurdica, para

    que essa modalidade de discricionariedade ocorra79.

    Assim, da mesma forma que sem a norma jurdica a Administrao

    Pblica no poderia atuar nos casos em que h discricionariedade tcnico-

    administrativa, sem o conhecimento tcnico-cientfico ou a norma tcnica, a

    soluo para o caso seria inalcanvel.

    A discricionariedade aparece aqui ento com um elemento

    imprescindvel e responsvel pela tarefa cognitiva e volitiva da administrao

    na aplicao das normas: os conhecimentos tcnicos extrajurdicos.

    Os conhecimentos tcnicos definem a escolha que, sem ele, no seria

    acertada e no alcanaria o fim objetivado pelo direito.

    77- HAWKINS, Keith org. The uses of discretion. Claredon Press: Oxford, 1991, p. 99.78- Como afirma GIORGIO PELAGATTI, ...difatti, la progressiva accentuazione dellimportanza

    delle regole tecniche nellagire di tali poteri connessa strettamente allo sviluppo dellefuncioni che connotano sprecificamente la forma dello Stato. (Valutazioni tecniche..., p.159)

    79- Discrecionalidad..., p. 143-144.

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    J quanto s normas tcnicas, estas j so entendidas pelo direito

    brasileiro como normas de aplicao obrigatrias e vinculativas a certas

    atividades tcnico-administrativas80.

    As normas e os conhecimentos tcnico-cientficos unem-se, nestes

    termos, ao conhecimento jurdico e, com esta operao interdisciplinar, o

    direito aplicado ao caso concreto em relao s questes tcnicas

    sanitrias81.

    No se trata, portanto, de exclusiva apreciao tcnica interpretativa.

    claro que para o objetivo da atividade discricionria tcnico-

    administrativa, a Administrao, no raras vezes, ter de executar

    inicialmente, uma apreciao instrumental tcnico-jurdica. Por isso,

    afirma DESDENTADO DAROCA82que:

    ...la discrecionalidad tcnico-administrativa se caracteriza por la existencia,en primer lugar, de un momento de discrecionalidad instrumental en larealizacin de apreciaciones tcnicas y, en segundo lugar, de un momentode verdadera discrecionalidad o discrecionalidad fuerte.

    Porm, alm disso, as normas e conhecimentos tcnicos,

    nesses casos e por fornecer elementos de deciso e mltiplas

    80- Artigo 39 (...) Inciso VIII vedado ao fornecedor de produtos ou servios, dentreoutras prticas abusivas:colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou servioem desacordo com as normas expedidas pelos rgos oficiais competentes ou, senormas especficas no existirem, pela Associao Brasileira de Normas Tcnicas ououtra entidade credenciada pelo Conselho Nacional de Metrologia, Normalizao eQualidade Industrial (Conmetro). (BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1980.Cdigo de Defesa do Consumidor. Dispe sobre a proteo do consumidor e d outrasprovidncias.Dirio Oficial da Unio, Braslia, DF, 12 de setembro de 1980).

    81- VASCONCELOS, Fernando Donato. Normalidade: entre a norma jurdica e a normatcnica. Trabalho & Doutrina, So Paulo, v. 15, dez. 1997, p. 39.

    82- Discrecionalidad, p. 145-146.

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    escolhas, pem-se na qualidade de fonte fundamental para a atividade

    discricionria (forte) do Estado83. Temos assim, diante da

    interdisciplinaridade, a conjugao de normas e conhecimentos

    tcnicos e jurdicos como fonte da discricionariedade tcnico-

    administrativa84.

    Entender de outra forma seria navegar por um campo perigoso

    da inexistncia de regras de criao e aplicao do direito pelas

    normas e conhecimentos tcnicos85, presentes no direito sanitrio.

    Isto porque a atividade discricionria tcnico-administrativa hoje

    aceita pela doutrina brasileira qualificada como apreciao tcnica,

    no sendo reconhecida como parte da atividade volitiva86, e sem o

    reconhecimento tambm de que a interferncia da norma tcnica no

    direito alcana outra dimenso, ultrapassando o campo da

    interpretao ou mera apreciao, impondo um controle social e

    jurisdicional mais rigoroso e inexistente ainda hoje, j que ela acaba

    por limitar os resultados nascidos da atividade discricionria tcnico-

    administrativa.

    83- Em favor da aplicao das normas tcnicas no direito: PELAGATTI. Valutazionetecniche..., p. 159; SESIN, Domingo Juan. Administracin pblica, actividad reglada,discrecional y tcnica. 2. ed., Buenos Aires: Depalma, 2004, p. 201; MOREIRA NETO,Diogo de Figueiredo. Mutaes do direito pblico. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p.394-395; entre outros.

    84- AMARAL. Diogo Freitas do. Curso de direito administrativo.Vol. 2. Lisboa: Almedina,2004, p. 115-116.

    85- Ibidem idem.86- PEREIRA, Discricionariedade..., p. 265.

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    Neste sentido, relata o professor TRCIO SAMPAIO FERRAZ JUNIOR ao

    descrever a situao originria das agncias reguladoras estadunidenses

    que:

    ...a idia de especializao em reas de atuao demarcadas, nas quais oconhecimento tcnico exige uma formao especial, fez com que aindependncia de grande parte delas [agncias] tornou-se corolrio do altograu de discricionariedade tcnica de seus atos regulamentares que,destarte, se supunham politicamente neutros, se comparados com aatividade legislativa do Congresso87.

    Compartilhando do mesmo entendimento, explica DIOGO DE

    FIGUEIREDO MOREIRA NETO:

    Com efeito, no Direito Pblico, as normas reguladoras surgem comoespcies normativas muito distintas das normas legais tradicionais.Desde logo assim o porque as normas legais resultam de opes polticas

    abstratas, definitrias de interesse pblico especfico, que dever prevalecerem cada tipo de relao administrativa considerada, de modo a que possamser aplicadas direta e concretamente pelo mtodo de subsuno.(...)Diferentemente, as normas reguladoras resultam de opes administrativas,tambm abstratas, formuladas, porm, com um maior nvel de densidadetcnica, como resultado da ponderao de vrios interesses concorrentesem certas relaes interprivadas crticas deslegalizadas, de modo a que, emsua aplicao direta e concreta, promovam o mximo de equilbrio social eeconmico nessas relaes crticas88.

    Assim, inegvel que hoje estamos diante da interferncia cada vez

    mais atuante das normas e conhecimentos tcnicos, especialmente no

    campo do direito sanitrio, direito de grande atividade regulatria que

    87- Agncias reguladoras: legalidade e constitucionalidade, Revista Tributria e deFinanas Pblicas.So Paulo, v. 8, n. 35, nov./dez. 2000, p. 144.

    88- Mutaes..., p. 394-395.

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    culminou na reviso do conceito da discricionariedade administrativa

    clssica.

    At as ltimas dcadas, o direito sanitrio nunca sofreu tanta

    influncia externa ao direito como vem sendo praticado atualmente.

    Isto porque em vrios casos as normas e conhecimentos tcnicos

    tornam-se muitas vezes fonte desse direito nas decises administrativas

    sanitrias da ANVISA e da ANS, o que imprime ao direito, a necessidade de

    reestruturar formas de controles especficos para a sua atividade.

    Por isso, nos Estados Unidos, o controle dos atos normativos das

    agncias, rgos da administrao pblica daquele pas, teve grande

    importncia na reestruturao regulatria na dcada de 1970.

    L, o controle das normas tcnicas e tcnico-administrativas regido

    tanto pelo Poder Legislativo quanto pelo Poder Judicirio.

    Explica ORLANDO CELSO DA SILVA NETO89, que o Poder Legislativo nos

    Estados Unidos exerce tanto um controle formal, criando legislao que

    restrinja ou revogue o ato normativo da agncia, quanto o informal com o

    veto, exercido por fora da disciplina do Administrative Procedural Act, dos

    atos das agncias reguladoras90.

    89- SILVA NETO, Orlando Celso da. Noes gerais sobre o controle das agnciasregulatrias no direito Norte-Americano. inDI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direitoregulatrio: temas polmicos. 2. ed., rev. e ampl., Belo Horizonte: Frum, 2004, p.404-416.

    90- No campo do direito sanitrio, exemplifica ORLANDO CELSO DA SILVA NETOque, a Food

    and Drug Administrationfoi impedida pelo Legislativo de banir a sacarina quando esteera o nico adoante artificial do mercado (Ibidem idem).

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    Quanto ao controle judicial, podemos citar alguns mecanismos que

    permitem ao Judicirio daquele pas realizar o controle dos atos editados

    pelas agncias.

    Dentre eles, nos casos dos atos administrativos em concreto:

    substancial evidence test91 consistente no controle da razoabilidade

    com base nas informaes de fato do procedimento contencioso das

    agncias (Administrative Procedure Act (APA), United States Code,

    Title 5, Chapter 5 Administrative Procedure, 706, (2));

    controle judicial do abuso ou arbitrariedade na emanao de atos

    administrativos discricionrios pelas agncias92

    o controle judicial quando o ato exarado v contra outro ato da

    prpria agncia, ainda que respeite os atos normativos

    vigentes (United States v. Nixon, 418 U.S. 683 (1974));

    o no adote em seus atos precedentes da prpria agncia e no

    d razes para esta no adoo (Atchison, Y & S.F. Ry v.

    Wichita Board of Trade, 412 U.S. 800 (1973));

    o no aplique os princpios de direito (United States v. Stauffer

    Chemical Co., 464 U.S. 165 (1984)); e,

    o abuse da imposio de sanes ao setor regulado (Jacob

    Siegel Co. v. FTC, 327 U.S. 608 (1946)).

    J nos casos dos atos administrativos normativos93:

    91- SILVA NETO. Noes gerais... in DI PIETRO.Direito regulatrio..., p. 413.92- Ibidem idem.93- Ibidem, p. 415.

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    hard look94e hard look review controle democrtico e, no segundo,

    judicial, sobre os aspectos das polticas pblicas afetadas pela norma

    dentro dos standards legais (Automotive Parts & Accessories

    Association v. Boyd, 407, F. 2ns 330 (D.C. Circuit, 1968));

    incerteza cientifica controle judicial para as regulamentaes

    tcnicas mesmo quando caso de incerteza cientfica. (Ethyl Corp. v.

    EPA, 541 F 2nd Circuit (D.C. Circuit, 1976));

    reexame das provas;

    controle por omisso da agnciacontrole judicial vlido tanto quando

    h inrcia da agncia na prtica de um ato, como no caso de demora

    no registro de medicamento, ou quando ela tem o dever de baixar o

    ato normativo (Telecommunications Research & Action Center v.

    FCC, 750 F. 2d 70 (D.C. Circuit, 1984)).Tudo isto demonstra claramente a necessria e importante evoluo

    para o reconhecimento da discricionariedade tcnico-administrativa pelo

    direito sanitrio que possui, hoje, a influncia evidente dos conhecimentos e

    normas tcnicas extrajurdicas.

    Ao verificar esta situao, iniciou-se, nos Estados Unidos, elaborao

    de regras para a interao do direito aos atos de contedo tcnico e

    cientfico, como veremos no prximo captulo com mais detalhes.

    E esta atividade discricionria, sendo um poder atribudo pelo direito

    Administrao Pblica, faz com que estes conhecimentos sejam utilizados,

    no mais s para interpretar os termos legais, como ocorre nos casos da

    94- ARAGO, p. 440.

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    discricionariedade instrumental jurdico-tcnica, mas tambm para buscar a

    configurao das alternativas e, concretizando a eleio, dentre duas ou

    mais alternativas razoveis e eficientes, como afirma DESDENTADO DAROCA95.

    Difere, assim, a discricionariedade instrumental jurdico-tcnica da

    discricionariedade tcnico-administrativa quanto ao alcance da influncia da

    tcnica, como conhecimento, ou da norma tcnica na deciso por escolha

    discricionria do Estado.

    Portanto, se o conhecimento tcnico ou a norma tcnica atingem

    apenas a interpretao, estaremos diante do primeiro caso

    discricionariedade instrumental tcnico-jurdica.

    Enquanto, nos casos em que o conhecimento tcnico ou a norma

    tcnica atingem tambm ou exclusivamente a escolha da alternativa,

    estamos perante a discricionariedade tcnico-administrativa.

    Podemos dizer, assim, que ao invs de defender a delegao

    normativa nestes casos, que inexiste enquanto agncias reguladoras, a

    discricionariedade tcnico-administrativa abre um espao para a delegao

    discricionria tcnico, emergida da necessidade de lidar com a

    complexidade tcnico-cientfica extrajurdica, social e econmica, com a

    produo de atos administrativos apropriados com o emprego de meios

    corretos, razoveis e eficientes96.

    95- Discrecionalidad, p. 143.96- FERRAZ JNIOR, p. 151-154.

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    Neste sentido assevera TRCIO SAMPAIO FERRAZ JNIOR, ao explicar

    os limites impostos pelo critrio da eficincia, exigida pelo direito s

    Agncias Reguladoras:

    A delegao instrumental tem a ver com os casos de em que preponderamas funes programticas e de resguardo. Trata-se de situaes em que,por razes de complexidade setorial e de correspondente exigncia deespecializao tcnica, a lei que atribui a delegao autoriza decises demrito, responsabilizando-se o rgo competente pela alocao de finstecnicamente apropriados e pelo encontro do meio correto. Estaresponsabilidade avaliada pela eficincia da medida97. (grifo nosso)

    Porm, contrariando este entendimento, nasceu uma corrente no

    Brasil que defende a tese da inexistncia da discricionariedade tcnica, mas

    de uma discricionariedade administrativa com apreciao tcnica, fundada

    na inexistncia de peculiaridades ou diferenas entre esta e aquela

    discricionariedade98.

    No entanto, verifica-se que esta doutrina deixa de analisar os casos

    em que realmente h escolha do Estado, entre duas ou mais alternativas,

    aquela que seja mais razovel99 e eficiente para o caso concreto, ou que

    defina o caminho para a escolha atravs de atos administrativos normativos

    tcnicos como veremos adiante100.

    97- Ibidem,p. 155-156.98- PEREIRA, Discricionariedade... , p. 265.99- Em favor do critrio da razoabilidade, apesar de subsistir para este autor os critrios de

    oportunidade e convenincia na atividade discricionria das Agncias Reguladoras, alio de um captulo inteiro da obra de SRGIO VARELLA BRUNA: ...a razoabilidade olimite ltimo para o exerccio de quaisquer poderes discricionrios. (Agnciasreguladoras: poder normativo; consulta pblica; reviso judicial. So Paulo: RT, 2003,p. 142)

    100- Captulo IV, itens 4.2.1 a 4.2.3.

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    Independente desta discusso, o surgimento do debate da

    discricionariedade tcnico-administrativa est provocando significativas

    alteraes no procedimento normativo da agncia, como forma de

    implementar as regras democrticas e os instrumentos de controles sociais

    j estabelecidos nos Estados Unidos. No Brasil, estas alteraes esto

    representadas no Projeto de Lei n. 3.337/04, que dispe sobre a gesto, a

    organizao e o controle social das Agncias Reguladoras, em trmite pela

    Cmara dos Deputados101.

    Este projeto, importando alguns institutos prprios do Administrative

    Procedural Act estadunidense, determina e vincula a produo de atos

    normativos s consultas pblicas, dando oportunidade sociedade

    organizada, especialmente por meio das associaes, de participar da

    discusso de tais atos e, dentre outras garantia