1 TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA TECNOLOGIA E FUNCIONAMENTO DOS EQUIPAMENTOS Denise Yanikian Nersissian 1 1 HISTÓRIA DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA O desenvolvimento da tomografia computadorizada foi uma revolução para a medicina, permitindo que órgãos e tecidos fossem visualizados sem sobreposição de imagens, podendo-se ainda escolher a vista anatômica (axial, coronal ou sagital) mais favorável para o correto diagnóstico. “Tomos” é uma palavra grega que significa “corte” ou “seção”. As primeiras imagens deste tipo foram obtidas por meio da superposição de várias aquisições mantendo- se um objeto de interesse em foco e todos os outros apareciam desfocados (Figura 1). Esta técnica ficou conhecida por: estratigrafia, planigrafia, planeografia, laminografia ou ainda tomografia convencional 1 . 1 Física Médica do Instituto de Física da Universidade de São Paulo. Doutora em Tecnologia Nuclear - Aplicações (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - SP), Especialista em Radiologia Diagnóstica (Associação Brasileira de Física Médica)
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TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
TECNOLOGIA E FUNCIONAMENTO DOS EQUIPAMENTOS
Denise Yanikian Nersissian1
1 HISTÓRIA DA TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
O desenvolvimento da tomografia computadorizada foi uma revolução para a
medicina, permitindo que órgãos e tecidos fossem visualizados sem sobreposição
de imagens, podendo-se ainda escolher a vista anatômica (axial, coronal ou sagital)
mais favorável para o correto diagnóstico.
“Tomos” é uma palavra grega que significa “corte” ou “seção”. As primeiras imagens
deste tipo foram obtidas por meio da superposição de várias aquisições mantendo-
se um objeto de interesse em foco e todos os outros apareciam desfocados (Figura
1). Esta técnica ficou conhecida por: estratigrafia, planigrafia, planeografia,
laminografia ou ainda tomografia convencional1.
1 Física Médica do Instituto de Física da Universidade de São Paulo. Doutora em Tecnologia Nuclear - Aplicações (Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - SP), Especialista em Radiologia Diagnóstica (Associação Brasileira de Física Médica)
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Figura 1 Representação do princípio de funcionamento de um planígrafo. (a) Raios X e filme
produzem as imagens A1 e B1 dos objetos A e B, (b) raios X e filmes se movem
simultaneamente, de forme que a imagem A2 se sobrepõe a imagem de A1, o mesmo
não acontece com B2, assim gera-se uma imagem desfocada de B
O que eu preciso saber da história dos desenvolvimentos da tomografia?
É importante destacar os pesquisadores e experimentos que contribuíram para o
desenvolvimento da tomografia computadorizada:
Johann Radon2: um matemático austríaco que publicou em 30 de abril de
1917 uma teoria que possibilitou a resolução de um sistema matemático
que foi utilizado posteriormente no tratamento das imagens em tomografia
computadorizada; esta teoria ficou conhecida como “Transformada de
Radon”.
David E. Kuhl e Roy Q. Edwards1: apresentaram a ideia da tomografia
por seção transversal utilizando um radioisótopo emissor de radiação
gama e dois filmes que eram simultaneamente expostos em linhas finas;
isto se tornaria a origem do funcionamento do que hoje é utilizado nos
equipamentos de tomografia por emissão.
⇒ Princípio de funcionamento do planígrafo: Digamos que o ponto A na
Figura 1 seja uma estrutura que se deseja visualizar na imagem. Ao se angular o
feixe, obtêm-se várias projeções, que nada mais são do que um perfil de
intensidade ou de atenuação em cada ângulo de incidência do feixe de raios X.
Neste caso, o ponto A está no plano de interesse e o ponto B não está. Assim, nas
exposições seguintes, haverá uma sobreposição das imagens do ponto A sem
distorções perceptíveis, enquanto que as imagens do ponto B se deslocarão
causando um borramento deste.
⇒ Sistema matemático ou Sistema: conjunto de equações cujo objetivo é
buscar a solução para cada uma das incógnitas ou variáveis.
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William H. Oldendorf1: utilizando uma fonte radioativa, este médico
neurologista americano, verificou que uma estrutura interna dentro de
estruturas densas pode ser visualizada por meio de medições de
transmissão em várias projeções ou ângulos. A Figura 2 apresenta, de
forma simplificada, o experimento de Oldendorf, que continha uma fonte
de 131I colimado e um detector composto por um material cintilador
acoplado a uma fotomultiplicadora. O objeto simulador era composto por
vários anéis de fios de ferro montados em um bloco de material plástico; este simulava parte superior do crânio. Um anel de alumínio era colocado
no meio dos anéis de ferro e todo este conjunto andava sobre um trilho
em uma plataforma, que por sua vez girava:
Figura 2 Experimento de Oldendorf utilizando uma fonte de 131I colimado e um detector
composto por um material cintilador acoplado a uma fotomultiplicadora
⇒ Radioisótopo: é um material radioativo que possui um núcleo instável que
emite energia transformando-se em um átomo mais estável. É aplicado na
medicina tanto para tratamento em radioterapia quanto no diagnóstico em exames
de medicina nuclear.Error! Bookmark not defined.
⇒ Radiação gama: é um tipo de radiação ionizante que é produzida no interior
do núcleo atômico. Error! Bookmark not defined.
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Godfrey Newbold Hounsfield1: nasceu no ano de 1919 (Nottinghmshire,
Inglaterra) e estudou engenharia eletrônica e mecânica. Ele fazia parte do
grupo de desenvolvimento da empresa EMI, a mesma que produzia os
discos dos “The Beatles”. Nos experimentos laboratoriais, Hounsfiled
utilizou um conjunto fonte-detector composto por uma fonte de raios gama
que executava um movimento de varredura através de uma plataforma,
onde era posicionado o objeto de interesse. Esta plataforma girava em
intervalos de um grau e cada corte registrava 28 mil medições
armazenadas em uma fita de papel. Todo o processo de aquisição e
processamento das imagens da peça anatômica sob estudo levava nove
dias. Posteriormente, ele conseguiu otimizar este tempo para 9 horas,
substituindo a fonte gama por uma tubo de raios X.
O primeiro protótipo de equipamento aplicado clinicamente foi
apresentado em 1971, era dedicado a exames do crânio e o tempo total
de aquisição e geração das imagens era de 20 minutos. Com os avanços
dos microcomputadores este tempo foi reduzido para 5 minutos. O
primeiro estudo clínico foi realizado no Atkinson-Morley Hospital em uma
paciente com suspeita de lesão cerebral e a imagem obtida pelo exame
mostrava um grande cisto circular de aparência escura6.
Allan MacLeod Cormack1: nasceu em 1924 (Johannesburg, África do
Sul), estudou física nuclear na Cambridge University, trabalhou como
professor de física na University of Cape Town. Como único físico nuclear
desta cidade, ele trabalhou no Groote Schuur Hospital e observando
exames de radioterapia, percebeu a importância de conhecer a atenuação
da radiação nos vários tecidos do corpo humano. Isto poderia ser avaliado
conhecendo-se os coeficientes de atenuação dos raios X e melhorariam a
precisão dos tratamentos na radioterapia. Depois, juntou-se ao grupo de
pesquisadores na Tufts University onde se aplicou nos estudos da teoria
matemática que era necessária para a reconstrução de imagens obtidas
em várias projeções.
A Figura 3 resume os principais pontos de desenvolvimento ao longo da história que
contribuíram para o que hoje conhecemos por tomografia computadorizada:
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Figura 3 H
istórico das descobertas que precederam a tom
ografia
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1.1 GERAÇÕES DOS EQUIPAMENTOS DE TOMOGRAFIA
A subdivisão das diferentes tecnologias de equipamentos de tomografia
computadorizada introduzidas no mercado costuma ser numerada através de
gerações de equipamentos. Estas gerações estão basicamente relacionadas à
geometria de detecção e à forma como os componentes do sistema (tubo de raios X,
detectores e a maca onde é posicionado o paciente) se movimentam durante a
coleta de dados para a produção das imagens. A evolução dessas gerações busca,
em geral, a redução dos tempos de exames e a coleta de dados para a formação
das imagens, com o objetivo de viabilizar a reconstrução de imagens de boa
qualidade mesmo com a presença de movimentos involuntários dos órgãos em
estudo.
Contudo, não há um consenso sobre a definição dessas gerações dos
equipamentos. A maioria dos autores1,3,4 assume que existem quatro ou cinco
gerações de tomógrafos até os dias atuais, sendo algumas delas variações da
terceira geração.
⇒ Movimento de translação: quando o objeto se movimenta em uma direção, com a mesa de exames andando continuamente ou incrementando passo a passo durante a aquisição das imagens nos exames de tomografia.
⇒ Movimento de rotação: quando o objeto gira ao redor de seu próprio eixo, como o conjunto formado pelo tubo de raios X e o detector girando ao redor do paciente nos exames de tomografia.
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A. PRIMEIRA GERAÇÃO
Movimento do conjunto fonte-detector: Translação e rotação (1o de cada vez)
Geometria do feixe: Muito colimado (feixe “lápis”)
Detector: Um ou dois detectores
Tempo de aquisição: 5 minutos (em média)
A geometria de aquisição de dados dos primeiros equipamentos era baseada em um
princípio de rotação-translação1,3, 4 , 5 , 6 , no qual um feixe de raios X altamente
colimado atravessava o paciente e era coletado por um ou dois detectores. Este
feixe de raios paralelos gerava um perfil de projeção a cada varredura (translação).
Após uma translação, o tubo e o detector giravam um grau e transladavam
novamente para coletar informações de uma direção diferente. Este processo era
repetido até circunscrever 180º ao redor do paciente e esses equipamentos
gastavam seis minutos, em média, para executar todo este processo (Figura 4).
Figura 4 Equipamento de tomografia de 1ª geração
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B. SEGUNDA GERAÇÃO
Movimento do conjunto fonte-detector: Translação e rotação (6o de cada vez)
Geometria do feixe: Divergente (formato de leque)
Detector: 30 unidades
Tempo de aquisição: 20 segundos (em média)
Nesta geração de tomógrafos, o número de detectores aumentou resultando em
uma geometria de feixe em forma de um pequeno leque com origem no tubo de
raios X1,5,6. Após uma varredura, o tubo e o conjunto de detectores realizavam um
movimento de rotação (6o a cada giro), completando um ciclo. Este processo era
repetido até circunscrever 180º em torno do paciente. Isto acarretou em mudanças
significativas no processo de reconstrução das imagens, que agora deveria ser
capaz de manipular as informações obtidas a partir de uma projeção de um feixe em
forma de leque. Foi elaborado um arranjo composto por 30 detectores, que eram
capazes de coletar todas as projeções em torno de 20 segundos (Figura 5).
Figura 5 Equipamento de tomografia de 2ª geração
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C. TERCEIRA GERAÇÃO
Movimento do conjunto fonte-
detector: Rotação-rotação (giro completo - 360o)
Geometria do feixe: Divergente (formato de leque)
Detector: Formato de arco de 30o a 40o
Tempo de aquisição: Menor que 1 segundo (em média)
Limitações: Cabos de alta tensão (slip ring)
Artefatos: Formato de anel (detector descalibrado ou com defeito)
Equipamentos desta geração (Figura 6) realizavam uma coleta completa dos perfis
das projeções em rotação de 360o do conjunto fonte-detector. A geometria do feixe
ainda possui formato de leque e atingia o conjunto de detectores posicionados em
arcos de 30º a 40º1,5,6. As limitações de aquisição estavam no sistema gerador, pois
o tubo de raios X era alimentado por cabos de alta tensão, que ficavam torcidos ao
final de cada giro do gantry, era necessário então rotacionar no sentido contrário
para “desenrolar” os cabos e assim possibilitar uma nova aquisição. Assim,
sequências axiais, com incremento da mesa eram realizadas em diversos exames.
Esses equipamentos realizavam a varredura em tempos menores que 1 segundo, o
que resultou na diminuição da quantidade de artefatos gerados devido aos
movimentos do paciente.
⇒ Cabos de alta tensão: cabos de alimentação que levam tensão do gerador
ao tubo de raios X.
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Figura 6 Equipamento de tomografia de 3ª geração
D. QUARTA GERAÇÃO
Movimento do conjunto fonte-detector: Rotação-estacionário (giro completo - 360o)
Geometria do feixe: Divergente (formato de leque)
Detector: Arco de 360o, composto por 4000 unidades detectoras
Tempo de aquisição: Menor que 1 segundo (em média)
O projeto dos tomógrafos de 4a geração (Figura 7) consistia de um conjunto detector
composto por um arco de 360o (contendo 4000 unidades, em média) que se
mantinha estacionário, enquanto o tubo de raios X rotacionava ao redor do
paciente1,5,6. Uma vantagem dos equipamentos desta geração foi o fato de obter-se
uma alta amostragem das projeções, pois a mesma área do detector era atingida por
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uma grande quantidade de fótons de raios X (isto devido à geometria do feixe e à
maneira como os fótons chegavam ao detector), o que minimizou os artefatos de
descontinuidade. Era possível também, calibrar e normalizar (equalizar) o sinal em
cada detector, isto evitou artefatos do tipo anel, nesta geração de equipamentos.
Porém, como cada detector era atingido por fótons provenientes de feixes muito
largos, isto produzia muita radiação espalhada. Outra desvantagem estava
associada ao custo de um equipamento deste tipo, pois eram necessários cerca de
4000 elementos detectores distribuídos em uma grande circunferência ao redor do
paciente. Tal número era devido a uma abertura de suficiente do gantry para caber
um paciente e também para manter o tubo de raios X a uma distância aceitável até o
paciente.
Figura 7 Equipamento de tomografia de 4ª geração
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E. QUINTA GERAÇÃO – EBCT
Movimento do conjunto fonte-
detector: Estacionário-estacionário
Geometria do feixe: Feixe de elétrons – fótons em leque
Detector: Anéis de tungstênio
Tempo de aquisição: 50 milissegundos
Aplicação Exames cardíacos
Os tomógrafos desta geração foram construídos entre 1980 e 1984 com a finalidade
de aplicação em exames cardíacos. Os tomógrafos por feixe de elétrons (do inglês:
electron beam computer tomography – EBCT) eram capazes de obter imagens do
coração praticamente sem movimento, pois conseguiam adquirir imagens em 50
milissegundos minimizando assim artefatos de movimento, inerentes às imagens
cardíacas. Nestes equipamentos, a rotação da fonte era obtida por meio de campos
magnéticos, atingindo anéis de tungstênio, gerando radiação X. Os fótons de raios X
atravessavam o paciente e eram capturados por detectores que estavam
posicionados em oposição aos anéis de tungstênio. Neste sistema, tanto a fonte
(anéis-alvo) quanto os detectores eram estacionários (Figura 8).
Figura 8 Equipamento de tomografia de 5ª geração
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F. HELICOIDAL
Movimento do conjunto fonte-detector: Rotação-rotação
Geometria do feixe: Feixe cônico
Detector: Fileira única
Tempo de aquisição: Menor que 1 segundo (em média)
Aplicação Diversas regiões anatômicas
Pode-se dizer que esta é uma variação da 3a geração de equipamentos de
tomografia. O que tornou a tomografia helicoidal ou espiral (Figura 9) possível foi o
desenvolvimento de uma nova tecnologia conhecida por slip ring (anéis deslizantes),
que eliminou o problema dos cabos de alta tensão que limitavam as aquisições na 3a
geração1,5,6. Tal sistema permitia que o contato elétrico entre o gerador e o tubo de
raios X fosse feito por meio de “escovas” que deslizavam em um anel metálico.
Assim, tornou-se viável a aquisição das projeções enquanto a mesa se
movimentava, obtendo-se imagens volumétricas. Como resultado do movimento
combinado entre a rotação do sistema tubo-detectores e do movimento da mesa, a
fonte de raios X se movia como se formasse um padrão helicoidal ao redor do
paciente. Outro conceito importante criado neste período foi o fator de passo (pitch),
definido pelo movimento da mesa do paciente a cada 360o de rotação do tubo de
raios X e pela largura do feixe de raios X.
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Figura 9 Equipamento de tomografia helicoidal
MULTIDETECTORES (MULTISLICE)
Movimento do conjunto fonte-detector: Rotação-rotação
Geometria do feixe: Feixe cônico
Detector: Múltiplos–aquisição simultânea
Tempo de aquisição: Frações de segundos
Aplicação Diversas regiões anatômicas e específicas
Apesar dos grandes avanços obtidos com a tomografia helicoidal, algumas
aplicações clínicas, como a angiografia por tomografia exigia cobertura de volumes
maiores, porém os equipamentos helicoidais contendo uma fileira para aquisição
não eram rápidos o suficiente para obterem imagens de boa qualidade no pico de
concentração do material de contraste nas veias e artérias do paciente. Diante de
necessidades como esta, os fabricantes desenvolveram os equipamentos de
múltiplos detectores (Figura 10). O primeiro equipamento com esta tecnologia é de
1998 com a configuração de quatro fileiras detectoras que faziam aquisições
simultâneas, agilizando o processo de obtenção das imagens1,3,5,6.
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Figura 10 Equipamento de tomografia de múltiplos detectores (multislice)
Na tomografia de uma única fileira detectora (single slice), a espessura de corte era
determinada pela abertura do colimador, o que era bom para aumentar a quantidade
de fótons de raios X que atingia o paciente (Figura 11a)1,3,5,6. Porém, a resolução
espacial piorava, pois a quantidade de radiação espalhada aumentava no paciente
e, consequentemente, esta atingia os detectores elevando o ruído, o que
comprometia a visualização de estruturas importantes em um exame. Nos
equipamentos de múltiplos detectores, a colimação (n x d) passou a ser determinada
pela combinação, entre o tamanho do elemento detector (d) associado à quantidade
de fileiras de detectores selecionadas (n); a espessura de corte pode ser escolhida
entre as possibilidades de cada colimação (Figura 11b).
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Figura 11 Diferença da colimação selecionada em um equipamento com uma fileira detectora
(a) e em um equipamento de múltiplos detectores (b)
Por serem detectores do tipo estado sólido, já não seria mais possível mudar
fisicamente a largura do detector para atender a um protocolo de exame. Era
necessário agrupá-los entre si, por meio de controle computacional, para se
ajustarem à espessura selecionada para a representação da imagem. Os fabricantes
escolheram construir as fileiras detectoras de duas maneiras: homogêneas (todas as
fileiras com o mesmo tamanho de detector - Figura 12a) e híbridas (fileiras com
tamanhos diferenciados - Figura 12b)7. Atualmente, encontram-se equipamentos
com 4, 8, 16, 32, 40, 64, 128 e 320 fileiras detectoras. Apenas como um exemplo:
um equipamento de 16 fileiras possui, em média, 750 detectores por fileira,
chegando a um total de 12 mil detectores individuais. Os arranjos entre as fileiras
detectoras podem ser exemplificados para um equipamento de 16 fileiras com
espessura de detector de 0,625 mm (colimação = 16 x 0,625 mm), é possível
selecionar espessuras de corte de 0,625, 1,25, 2,5 e 5,0 mm, gerando 16, 8, 4 e 2
imagens, respectivamente (Figura 13).
(a) (b)
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Figura 12 Diferença entre os detectores homogêneos (a) e híbridos (b)
Figura 13 Exemplo de arranjo de detecores para um tomógrafo de 16 fileiras: (a) 0,625 mm – 16
imagens, (b) 1,25 mm – 8 imagens, (c) 2,5 mm – 4 imagens e (d) 5,0 mm – 2
imagens
(a)
(b)
(a) (b) (c) (d)
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2 COMPONENTES DO EQUIPAMENTO DE TOMOGRAFIA
Os vários componentes dos equipamentos de tomografia computadorizada são
apresentados a seguir:
A. GANTRY
Trata-se da estrutura principal do equipamento de tomografia, pois em seu interior
(Figura 14) encontram-se: tubo de raios X, sistemas elétricos que possibilitam a
geração da radiação e o conjunto de detectores (Figura 15). Na parte externa,
localizam-se os comandos (Figura 16) para movimentar a mesa e inclinar o próprio
gantry em aplicações específicas, além do sistema laser para alinhamento do
paciente, que permite o correto posicionamento em relação ao isocentro do
equipamento no plano x-y (axial ou transversal), o plano x-z (coronal) e o plano y-z
(sagital)3,8.
Figura 14 Interior do gantry de um equipamento Philips, modelo Brilliance
Conjunto de detectores Cúpula com
tubo de raios X
Colimador pré-paciente
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Figura 15 Ilustração que representa o gantry e seus componentes internos e externos com a
identificação dos planos considerando o sistema de alinhamento laser
Figura 16 Painel de comando do Philips, modelo Brilliance 64 (a) e do Philips modelo Brilliance
iCT (b) para movimentar a mesa e o gantry
B. GERADOR: BAIXA E ALTA FREQUÊNCIA
Os primeiros equipamentos de tomografia operavam com geradores trifásicos de
baixa frequência (60 Hz) que se conectavam ao tubo de raios X por meio de longos
cabos de alta tensão, pois ficavam localizados fora do gantry (Figura 17a). Esses
cabos impediam que o tubo girasse continuamente sem antes retroceder e então
executar a próxima aquisição axial, que era realizada fatia por fatia (sistemas não
helicoidais).
(a) (b)
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Os circuitos atuais são de alta frequência (3000 Hz) e funcionam transformando a
baixa tensão de entrada da rede elétrica em alta tensão que alimenta o tubo de raios
X para produção da radiação. Por serem pequenos, todos os circuitos que compõem
o gerador ficam dentro do gantry e giram ao redor do paciente (Figura 17b). Nestes
geradores, aplica-se a tecnologia dos anéis deslizantes (slip rings) que permitem a
rotação contínua do conjunto fonte-detector enquanto a mesa com o paciente de
desloca pelo gantry.
Figura 17 Equipamento de 3ª geração, utilizando cabos de alta tensão entre tubo de raios X e
gerador, o que obrigava o conjunto a retroceder a cada rotação do gantry (a) e
Equipamento helicoidal com a tecnologia dos anéis deslizantes (b)
C. TUBO DE RAIOS X
O funcionamento de um tubo de raios X utilizado na tomografia computadorizada
segue os mesmos princípios de um tubo da radiologia convencional. Ele é composto
pelo catodo e anodo inseridos em um invólucro de vidro a vácuo. Devido às
necessidades da tomografia helicoidal e de multidectetores, que permitem a
aquisição de imagem de grandes extensões do corpo de forma contínua por tempos
de até 60 s de irradiação com altas correntes, estes tubos necessitam de uma
capacidade térmica maior, tanto no armazenamento, quanto na dispersão do calor
produzido no processo de geração dos raios X6,8.
(a) (b)
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Os tubos convencionais de vidro (borosilicato) que garantiam o bom isolamento
térmico e elétrico deram lugar a tubos com revestimento metálicos e isolantes
cerâmicos entre o anodo e catodo. Com isso, anodos mais espessos e maiores -
diâmetro de 200 mm comparados aos 120 mm dos anodos convencionais - foram
construídos melhorando a relação de troca de calor. Outra inovação foi a utilização
de novos materiais para o anodo, a antiga composição possuía um base de titânio,
zircônio e molibdênio, com uma pista de ponto focal contendo 10% de rênio e 90%
de tungstênio. Porém, todo este conjunto era muito pesado e foi substituído por uma
base de grafite, que tem uma capacidade dez vezes maior que o tungstênio para
dissipar o calor e por ser mais leve, pode ser utilizado na tomografia helicoidal, a
pista do ponto focal permaneceu a mesma. A capacidade térmica de um tubo de
raios X para tomografia é da ordem de 8 MHU e a taxa de dissipação é de
1 MHU/min. A vida útil de um tubo com essa tecnologia pode variar de 10 mil a 40
mil horas, dependendo dos cuidados com sua utilização, enquanto os tubos
convencionais duram aproximadamente mil horas4,6,8. 9
D. FILTROS
Assim como em radiologia convencional, o feixe de raios X na tomografia é
policromático ou polienergético, isto é, a radiação emitida pelo tubo é composta por
fótons (pacotes de energias) de várias energias, conhecido como espectro (Figura
18). O significado disto é o seguinte: considere um sistema que tenha sido acionado
com 120 kV de tensão, isto produzirá fótons com energias entre 0 e 120 keV em
uma distribuição contínua da radiação (radiação de freamento - bremsstralung). Para
garantir que as imagens sejam reconstruídas de forma adequada, é necessário
“uniformizar” os feixes provenientes do feixe e que interceptarão o paciente e depois
atingirão os detectores para formação da imagem.
⇒ HU (heat unit): é a quantidade de calor que pode ser produzida em tubo de
raios X com gerador operando em 1 kVp, com uma corrente média de 1 mA
durante 1 s.9
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Figura 18 Espectro de radiação X gerado para 120 kV
Assim, os fabricantes utilizam um filtro com formato geométrico semelhante a uma
gravata borboleta (bow tie filter) posicionado entre o tubo e o paciente (Figura 19). A
geometria deste filtro consiste em ser mais espesso nas extremidades que na região
central para poder compensar o formato elíptico o corpo humano. Com isso, as
regiões centrais do corpo, que são mais espessas, recebem uma quantidade maior
de radiação que as regiões periféricas (mais finas) e o fluxo de radiação que atingirá
os detectores será mais uniforme.
Quando um feixe de radiação é interceptado por um filtro, o feixe é atenuado,
acontecendo alguns fenômenos; vamos considerar três situações:
1. Fótons de baixa energia são absorvidos pelo filtro, e, portanto, não
contribuirão com a dose no paciente
2. Fótons de energia intermediária interagem com o filtro e são reemitidos
com energias diferentes; depois atingirão o paciente e sofrerão interações
com ele, e atingindo os detectores para formar a imagem deste paciente.
3. Fótons mais energéticos atravessam o filtro e podem interagir com o
paciente da mesma maneira explicada no item 2.
Como os filtros alteram os fótons que compõem o feixe de radiação X, um dos
resultados observados é tornar este feixe mais penetrante, isto é, capaz de
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atravessar espessuras maiores ou com de maior densidade do corpo do paciente
(Figura 19). O termo adotado para este efeito é endurecimento do feixe. Novamente,
cabe lembrar que isto favorece o paciente, pois reduz a dose de radiação eliminando
os fótons de baixa energia que seriam absorvidos por ele antes de atingir com os
detectores. Porém, verificou-se nas primeiras gerações de equipamentos, que estes
filtros causavam artefatos provenientes do endurecimento do feixe, ou seja, o
sistema detector não conseguia responder adequadamente a esse efeito na
varredura de objetos circulares. Atualmente, os equipamentos de tomografia
possuem recursos em seus softwares de reconstrução das imagens que minimizam
tal artefato.
Figura 19 Princípio de funcionamento para dois modelos do filtro tipo gravata borboleta
E. COLIMADORES
Nos equipamentos de tomografia existem dois tipos de colimadores:
Pré-paciente: fica posicionado entre o tubo de raios X e o paciente,
interceptando o feixe de raios X; tem a mesma função do colimador da
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radiologia convencional, reduzir a dose no paciente e melhorar a
qualidade da imagem. Nos equipamentos com uma fileira detectora têm,
ainda, a função de definir a espessura do corte tomográfico.
Pós-paciente (pré-detector): tem a finalidade de minimizar a radiação
espalhada pelo paciente.
F. TIPOS DE DETECTORES
Após interagir com o paciente, os fótons de radiação sensibilizarão os detectores no
equipamento de tomografia e serão quantificados e processados por um sistema
eletrônico associado a estes detectores. Queremos apresentar algumas
características importantes dos detectores e descrever alguns tipos utilizados em
tomografia computadorizada. Para isso, começaremos falando algumas destas
características intrínsecas10:
Estabilidade: é a constância ou consistência com a qual um detector
responde. Nos processos de interação da radiação com os detectores,
serão necessárias calibrações frequentemente se não houver estabilidade
do sistema;
Eficiência: é a capacidade que um sistema detector tem para capturar,
absorver e converter os fótons de raios X em sinais elétricos;
Faixa dinâmica: descreve a razão entre o maior e o menor sinal capaz de
ser medido pelo sistema detector, por exemplo, em tomografia esta razão
é de 1 milhão para 1, o que significa que estes detectores são capazes de
diferenciar sinais de 1 mA e de 1 nA.
Tempo de resposta: refere-se à rapidez com a qual o detector consegue
diferenciar dois eventos (duas interações) da radiação de forma distinta,
isto é perceber uma interação, quantificá-la e se recuperar para um novo
processo. Esses tempos são necessariamente muito curtos
(milissegundos) para evitar problemas de emissão pós-luminescência e
empilhamento
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São dois os tipos de detectores associados aos equipamentos de tomografia
computadorizada: detectores à gás e detectores cintiladores. O primeiro tipo foi
utilizado na terceira geração dos equipamentos de tomografia, mas atualmente não
são mais encontrados. Resumidamente, os detectores a gás convertem a radiação
incidente diretamente em sinais elétricos, enquanto que os cintiladores convertem a
radiação em luz e depois esta luz é convertida em sinal elétrico (Figura 20)10.
Figura 20 Dois tipos de detectores: (a) detector cintilador que converte a radiação em luz e depois
em sinal elétrico e (b) câmara de ionização (gás) que convertem a radiação diretamente
em sinal elétrico
Conhecendo um pouco mais sobre os tipos de detectores10:
Detectores a gás: utilizados na 3a geração de equipamentos de
tomografia, compostos por câmaras individuais, preenchidas com gás
xenônio, altamente pressurizado (30 atmosferas). Sua configuração
básica pode ser observada na Figura 21, consistindo de câmaras de
ionização separadas por finas placas de tungstênio, que funcionavam
com placas coletoras dos íons gerados no processo de interação da
radiação com os átomo de xenônio da cavidade1,10. Uma tensão de
polarização (bias) correta precisava ser aplicada ao conjunto detector
para garantir que as placas coletassem os elétrons (e-) e íons positivos de
(a) (b)
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xenônio (Xe+) - Figura 21. Geralmente, esta tensão era mantida em 500 V,
de forma que se minimiza a possibilidade de recombinação destes pares
de íons, garantido que a quantidade de ionização fosse linearmente
proporcional à quantidade de energia absorvida pelos fótons de raios X.
Uma das maneiras de se avaliar o desempenho de um detector é a
verificação de quantos fótons de raios X incidentes são atenuados ou
detectados pelo conjunto de detectores; este parâmetro é chamado de
Eficiência Quântica Detectável (do inglês: Detective Quantum Efficiency).
Sob este aspecto, os detectores a gás apresentavam uma baixa eficiência
devido à baixa densidade do gás xenônio - alguns fótons de raios X
passavam pelo detector sem interagir com ele e, portanto, não eram
contados. Assim, constatou-se que uma eficiência de apenas 50 % a
60 % neste tipo de detector, isto é, apenas metade dos fótons que
atingiam o conjunto detector interagia por meio da ionização do gás no
interior da cavidade.
Figura 21 Funcionamento de um detector a gás ilustrando antes e depois da irradiação
Detectores cintiladores: a configuração de um sistema deste tipo consiste
em um material cintilador como o tungstato de cádmio (CdWO4) coberto
por um material refletor e acoplado a fotodiodos (Figura 22). Ao atingirem
o material cintilador os fótons de raios X são convertidos em fótons de luz
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por meio de interações fotoelétricas, podem ocorrer dois fenômenos que
precisam ser entendidos: emissão primária (devido ao decaimento
intrínseco do emissor) e a emissão pós-luminescência; o segundo
processo compete com a cintilação e diminui a eficiência de detecção.
Assim, ao longo do desenvolvimento dos equipamentos de tomografia,
vários materiais foram estudados com a finalidade de encontrar-se um
tipo de cintilador onde tais efeitos não fossem significativos e atendessem
propriedades relacionadas à qualidade de imagem que serão explicadas
posteriormente. Outro item importante no processo de detecção deste
sistema é o material refletor. Seu papel é o de direcionar os fótons de luz,
que foram gerados em todas as direções na interação da radiação com o
material cintilador, para o fotodiodo; porém, como ocorrerão várias
reflexões e absorções no cintilador, apenas uma parte destes fótons de
luz será utilizada na produção dos sinais elétricos10. Analisando a
Eficiência Quântica Detectável (do inglês: detective quantum efficiency -
DQE) dos detectores cintiladores encontram-se níveis entre 98 % e
99,5 %.
Figura 22 Funcionamento de um detector cintilador
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Para facilitar a compreensão relativa à eficiência destes tipos de detectores, veja a
Figura 23 que ilustra a diferença de Eficiência Quântica Detectável entre ambos.
Vamos dizer que temos 10 fótons de radiação incidindo sobre ambos os tipos de
detectores. Na Figura 23a, o detector tipo cintilador será capaz de detectar, pelo
menos, 90 % dos fótons incidentes e na Figura 23b, o detector a gás apresentará
uma eficiência de detecção de apenas 50 %.
Figura 23 Comparação da eficiência quântica de detecção entre detectores cintiladores e
detectores a gás
G. CONTROLE AUTOMÁTICO DE EXPOSIÇÃO
Pensando em prover maneiras de diminuir a dose de radiação nos exames de
tomografia, os fabricantes desenvolveram um sistema capaz de ajustar o valor da
corrente (mA) dependendo do11:
Tamanho do paciente;
Tipo de material (tecido); e
Ângulo de irradiação, porém garantido que a qualidade da imagem fosse
preservada.
Para se garantir uma boa qualidade de imagem, é esperado que uma quantidade
suficiente de fótons, chegue ao sistema detector, e tal quantidade depende das
interações dos fótons com o paciente. Portanto, espessuras maiores atenuam mais
fótons que espessuras menores e assim, uma menor quantidade de fótons chegam
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ao detector. Com este conceito podemos concluir que um paciente pequeno pode
ser irradiado com uma corrente menor que um paciente grande consequentemente;
reduzindo a dose nestes pacientes (Figura 24).
Figura 24 Modos de operação do controle automático de exposição nos equipamentos de
tomografia computadorizada: tamanho de paciente
Outro conceito diz respeito à densidade do material (tecido) que está sendo
irradiado. Sabemos que o ar dentro dos pulmões é menos denso que os ossos,
produzindo as imagens escuras (pouco atenuadas pelo ar) e as imagens claras
(muito atenuadas nos ossos), respectivamente. Por meio do topograma (scout), o
equipamento de tomografia registra a posição de cada região anatômica sob estudo
associada à posição da mesa (eixo z), considerando os níveis de atenuação em
cada uma delas, durante a realização da aquisição das imagens para o exame, o
equipamento diminui o valor da corrente de irradiação quando passa por regiões de
menor atenuação e, consequentemente, aumenta a corrente quando se trata de
tecidos mais densos (Figura 25).
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Figura 25 Modos de operação do controle automático de exposição nos equipamentos de
tomografia computadorizada: posição no eixo z
Há ainda uma terceira maneira de se controlar as alterações da corrente de
irradiação. Também utilizando o topograma, agora com duas direções de aquisição,
uma anteroposterior (AP) e outra lateral (LAT), verifica-se a espessura do paciente
em cada ângulo de irradiação (Figura 26). Quando o conjunto fonte-detector está na
posição 0o, o equipamento irradia com menor corrente, pois os fótons precisam
atravessar uma espessura menor daquele paciente, já quando está na posição 90o
irradia com uma corrente maior, devido a maior espessura do paciente (Figura 27)
Figura 26 Diagrama do topograma para varredura do paciente com o tubo de raios X em 0o para
vista AP do paciente (a) e com o tubo de raios X em 90o para vista LAT (b)
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Figura 27 Modos de operação do controle automático de exposição nos equipamentos de
tomografia computadorizada: variação angular
Na prática, os fabricantes disponibilizam estes recursos de forma combinada, por
exemplo: pode-se corrigir o valor da corrente considerando a posição da mesa no
eixo z e os ângulos de irradiação. Vejamos na Tabela 1 como estes recursos estão
disponíveis nos equipamentos de quatro principais fabricantes:
Tabela 1 Controle automático de exposição dos quatro principais fabricantes de tomografia