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Rev. Dilogo Educ., Curitiba, v. 12, n. 37, p. 997-1026,
set./dez. 2012
ISSN 1518-3483Licenciado sob uma Licena Creative Commons
[T]
doi: 10.7213/dialogo.educ.7214
Formao inicial de professores da educao
bsica no Brasil: trajetria e perspectivas[I]
Initial training of basic education teachers in Brazil:
trajectory and perspectives
[A]
Rosa Oliveira Marins Azevedo[a], Evandro Ghedin[b], Maria Clara
Silva-Forsberg[c], Amarildo Menezes Gonzaga[d]
[a] Doutoranda do Programa de Ps-Graduao em Educao em Cincias e
Matemtica da Rede
Amaznica de Educao em Cincias e Matemtica (REAMEC) na
Universidade do Estado do
Amazonas (UEA), Manaus, AM - Brasil, e-mail:
[email protected] [b] Doutor em Educao, professor da
Universidade do Estado do Amazonas (UEA), Manaus, AM -
Brasil, e-mail: [email protected] [c] Doutora em Cincias
Ambientais, professora da Universidade do Estado do Amazonas
(UEA),
Manaus, AM- Brasil, e-mail: [email protected][d]
Doutor em Educao, professor da Universidade do Estado do Amazonas
(UEA), Manaus, AM -
Brasil, e-mail: [email protected]
[R]
Resumo
Discute-se a formao inicial de professores da educao bsica,
procurando evidenciar
as exigncias dessa formao, bem como a formao oferecida e,
consequentemente, o
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papel do professor no contexto da escola. um estudo, numa
perspectiva histrico-crtica,
que compe o referencial terico de uma pesquisa de doutorado, no
qual se partiu dos
modelos de formao oferecidos aos professores no Brasil, fazendo
uma breve trajetria
dessa formao desde as primeiras iniciativas institucionalizadas
at os dias atuais, pro-
curando apontar algumas perspectivas. Para tanto, desenvolveu-se
uma pesquisa docu-
mental, a partir da produo cientfica publicada em livros,
trabalhos apresentados em
anais de evento e revistas da rea educacional, alm de dissertaes
e teses. A partir das
leituras, foram elaborados fichamentos e resenhas que
possibilitaram direcionar as discus-
ses, assumindo-se a hermenutica crtica como horizonte
metodolgico. Com isso, pode-
-se afirmar que nos ltimos 40 anos a formao de professores
tornou-se uma temtica
central nas discusses no cenrio acadmico brasileiro, com mudanas
significativas nas
exigncias da formao e no papel do professor, no entanto, a
formao oferecida perma-
nece sem alteraes significativas. Como perspectiva, o cenrio
atual aponta a necessida-
de urgente de alm de pensar a formao de dentro da profisso,
organiz-la a partir de
programas de desenvolvimento profissional docente e reconstruo
do espao acadmico
de formao, articulando-a ao debate sociopoltico da
educao.[P]
Palavras-chave: Formao inicial de professores. Papel do
professor. Fundamentos da for-mao. Histria da formao docente.
[B]
Abstract
We discuss here the initial training of basic education
teachers, trying to highlight not only
the requirements of this training in the classroom context, but
also the instruction system of-fered, and consequently the role of
the teacher in that context. It is a theoretical study in the
historical-critical perspective as part of a literature review
of an ongoing research of a Ph.D.
project, where we start from the current models of teacher
training in Brazil, making a brief his-torical trajectory of this
formation since the first institutionalized initiatives until
current days,
seeking to point out some perspectives. For that matter, a
thematic bibliographical survey was
done using several sources such as books, conference proceedings
and journals of the educa-tional area, in addition to theses and
dissertations. Critical hermeneutics is used in this work as
methodological approach. From the readings, we concluded that in
the last forty years, teacher
training became a central theme in the quarrels in the Brazilian
scientific academy and there
were significant changes in the requirements of the training and
in the teachers work. However,
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the model of training remains without significant changes. Thus,
it is necessary and urgent to
think of the training from the inside of the profession itself
and also, to organize it from profes-sional teaching development
programs and reconstruction of the academic space of training,
articulating it to the social and political discussion of
education.[K]
Keywords: Initial training of teachers. Teacher Role.
Foundations of training. History of teacher training.
Introduo
A formao de professores tornou-se, nos ltimos 40 anos,
particularmente pela criao das faculdades ou centros de educao nas
universidades, em 1968, um tema presente nas discusses no cenrio
aca-dmico brasileiro. Embora isso, os cursos de licenciatura que
oferecem formao para o professor atuar na educao bsica permanecem,
desde sua origem, sem alteraes significativas em seu modelo. Para o
desenvol-vimento dessa argumentao, partimos dos modelos de formao
ofereci-dos aos professores no Brasil, fazendo uma breve trajetria
dessa forma-o desde as primeiras iniciativas institucionalizadas at
os dias atuais, procurando apontar algumas perspectivas. Com isso,
nossa inteno demonstrar as exigncias da formao, a formao oferecida,
bem como o papel do professor resultante dessa formao.
Trata-se, desse modo, de um estudo terico numa perspectiva
histrico-crtica, em que desenvolvemos uma pesquisa documental,
cen-trada na produo cientfica publicada em livros, trabalhos
apresentados em anais de evento e revistas da rea educacional, alm
de dissertaes e teses. A partir das leituras, elaboramos resenhas e
fichamentos que per-mitiram direcionar as discusses para a
organizao do texto, no qual ini-cialmente fazemos consideraes
gerais sobre a formao de professores e, em seguida, traamos uma
breve trajetria dessa formao no Brasil at os dias atuais, apontando
algumas perspectivas.
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Nessa direo, o mtodo de anlise seguiu o desenho da herme-nutica
crtica, e a anlise apresentada se deu pela considerao
terico--metodolgica das categorias assumidas no horizonte
histrico-crtico. Do ponto de vista terico-epistemolgico operamos
pelos mecanismos da sntese histrica como instrumento que
possibilita novas interven-es na realidade, esperando que os
resultados possam incidir na refor-mulao de novos processos de
formao de professores que substituam antigas prticas institudas e
assumidas como verdades absolutizadas pela tradio.
As consideraes que desenvolvemos, centradas no conceito de
formao de professores, procurando evidenciar as exigncias des-sa
formao, a formao oferecida e, consequentemente, o papel do
professor no contexto da escola, no do conta da complexidade que
envolve tal conceito. Apenas representam uma tentativa de situar as
questes apontadas e possivelmente sugerir caminhos para o
aprofun-damento de estudos, tendo como foco a formao de professores
para a educao bsica.
Contextualizao do estudo
Quando a questo tratar da formao de professores, verifica-mos o
quanto intensa e diversificada a literatura a respeito, tanto no
que diz respeito s temticas tratadas quanto s suas fontes. Isso, ao
mesmo tempo em que contribui para o estudo da temtica, exige do
estudante/pesquisador um cuidadoso senso de anlise, seja para no
perder seu foco de abordagem, seja para selecionar a literatura
mais apropriada para dis-cutir seu objeto de estudo.
No que diz respeito formao inicial de professores, conside-rando
os graves problemas que afetam o processo ensino-aprendizagem dos
estudantes, vemos que se intensificam a preocupao com os cursos de
licenciatura, que pela legislao brasileira visa formao de
profes-sores para a educao bsica.
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Embora isso, sabemos que no possvel concentrar apenas no
trabalho docente1 a responsabilidade pelos problemas enfrentados no
processo ensino-aprendizagem dos estudantes da educao bsica, pois
inmeros so os fatores que concorrem para isso, desde as polticas
edu-cacionais, o financiamento da educao bsica, os aspectos da
cultura, seja nacional, regional ou local, as formas de estrutura e
gesto das esco-las, bem como a formao dos gestores, entre outros
(GATTI, 2010).
Nesse aspecto, oportuna a observao de Severino (2011) quanto ao
fato de sentir-se impressionado ao ver que grande parte das anlises
que mostra a situao problemtica da educao brasileira atribui os
motivos inadequada formao dos professores. Salienta, o autor, a
necessidade de se condicionar os problemas dessa educao e suas
solues ao modo como a gesto poltica, econmica e administrativa tm
conduzido a questo.
Tais reflexes levam-nos a concordar com Ldke e Boing (2007)
quando afirmam que o trabalho docente no pode ser pensado
isolada-mente, fora das transformaes que esto ocorrendo tambm em
outros setores socioeconmicos, pois o problema da educao bsica
pblica no um fato isolado, algo parecido vem ocorrendo com outras
instituies e servios pblicos. A questo precisa ser considerada no
bojo das mudan-as no mundo do trabalho e emprego, centradas em um
tipo de gesto inspirada na lgica de mercado.
No ignorando esses fatores, e tendo como foco de discusso a
formao de professores da educao bsica, situamos as deficincias
dessa formao como uma das questes cruciais para os problemas que
afetam a educao brasileira, tendo em vista ser o professor, o
profissio-nal da formao humana, como afirma Severino (2004, p.
17).
O cenrio dessas deficincias pode ser considerado a partir de trs
aspectos: o institucional, no que diz respeito s ms condies do
1 De acordo com BRZEZINSKI, I.; GARRIDO, E. Trabalho docente:
mapeando a pesquisa em teses
e dissertaes brasileiras. Educao & Linguagem, ano 10, n. 15,
p. 60-81, 2007, a expresso trabalho docente, mais abrangente, surge
para substituir prtica pedaggica, utilizada no
perodo de 1990 a 1996.
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trabalho docente, insuficincia dos recursos disponveis e s
condies das polticas de gesto; o pedaggico, considerando a
fragilidade epist-mica, a carncia de postura investigativa na
formao docente e na insu-ficincia da prtica no processo formativo,
alm da formao disciplinar, levando a viso de um mundo fragmentado,
incapaz de dar conta da com-plexidade do trabalho docente; o
tico-poltico, pois a formao no d conta de desencadear no futuro
professor a deciso tica de assumir o compromisso com a construo da
cidadania (SEVERINO, 2004).
A despeito de outras questes, vemos que esses trs aspectos so
centrais quando se discute a formao de professores. Muitos estudos
vm contribuindo para aprofundar as discusses e anlises desses
aspectos, fo-cando mais para um ou outro aspecto. Dentre eles,
podemos citar Krasilchik (1987), que analisa o contexto educacional
e a sua influncia no currculo de Cincias, considerando o perodo de
1950 a 1985; Pereira (2007) iden-tifica as principais discusses
acadmicas sobre a formao de professores no Brasil no perodo entre
1980 e 1995; Andr (2002) investiga o conhe-cimento sobre a temtica
no perodo compreendido entre 1990 a 1998; Brzezinki e Garrido
(2001) analisam a formao para a docncia na edu-cao bsica, no perodo
compreendido em 1992 e 1998; ainda Brzezinki e Garrido (2006)
apresentam resultados da segunda fase da pesquisa que compreende o
perodo de 1997 a 2002; Gatti (2010) traz questes relevan-tes s
discusses sobre a formao de professores na atualidade, a partir de
pesquisas recentes publicadas em 2008 e 2009, dentre outros.
No que diz respeito ao estudo de Krasilchik (1987), h mais de
trs dcadas, ao anunciar vrias percepes sobre o ensino2, em
diferentes nveis do sistema escolar brasileiro, elencou alguns
fatores que o influen-ciavam negativamente, e no obstante
relacionar outros fatores, a exem-plo das prprias condies de
trabalho docente, a formao precria do professor foi o que se
destacou na pesquisa.
2 Embora o foco de estudo da autora fosse o Ensino de Cincias, a
literatura da rea de educao
permite-nos generalizar aos demais processos de ensino da educao
escolar brasileira.
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Se tomarmos por base estudo feito recentemente por Gatti (2010)
que trata das caractersticas e problemas da formao de professo-res
no Brasil, notamos que a situao no demonstra avanos significativos.
A autora, ao analisar projetos pedaggicos de cursos de licenciatura
de instituies pblicas e privadas das cinco regies do pas, revela um
pa-norama desolador quanto s condies dos cursos de formao de
profes-sores para a educao bsica, mostrando a necessidade urgente
de uma reviso profunda nas estruturas dos cursos. Uma das causas
apontadas pela autora para essa situao, que sofre implicaes da
pulverizao na formao e indica uma formao frgil, distante das
necessidades forma-tivas de professores para atender s exigncias da
educao bsica, a ausncia de um eixo formativo para a docncia.
Diante do exposto, para o desenvolvimento dessa abordagem,
partimos dos modelos de formao oferecidos aos professores no Brasil
e fazemos uma breve trajetria desde as primeiras iniciativas
institucio-nalizadas at os dias atuais, procurando evidenciar as
exigncias dessa formao, bem como os modelos de formao oferecidos e,
consequente-mente, o papel do professor no contexto da escola.
Anos 1960: o transmissor de conhecimentos
Antes de nos referirmos propriamente aos anos 1960, recuamos um
pouco mais no tempo e vimos que o aparecimento manifesto da
preo-cupao com a formao de professores para o ensino secundrio
(atuais anos finais do ensino fundamental e ensino mdio), em cursos
regulares e especficos, surgiu no incio do sculo XX, nos anos 1930,
nas faculda-des de Filosofia, constituindo-se na frmula 3+1, em que
se acrescenta-va formao de bacharis um ano com disciplinas da rea
de educao (GATTI, 2010).
Esse modelo, que permaneceu oficialmente at os anos 1960 foi, de
acordo com Silva (1999), fortemente criticado, pois fazia a ntida
sepa-rao entre saberes cientficos e pedaggicos, principalmente
porque os
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cursos oferecidos eram compostos por trs anos de disciplinas
especficas das reas de conhecimento da formao e um ano de
disciplinas pedag-gicas. Isso reflete ainda hoje na fragmentao
entre conhecimentos da te-oria e conhecimentos da prtica,
culminando naquilo que Pimenta (1995)
chama de a expresso mais radical dessa viso que a de que na
prtica a teoria outra.
A esse respeito, pesquisa feita por Brzezinski (1992),
corres-pondente ao perodo 1980-1992, mostrou que a formao nos
cursos de licenciatura, particularmente no que se refere formao
pedaggica e formao especfica, nitidamente fragmentada. Para a
autora, a fragili-dade dessa formao, constitui-se mais em deformao
do que em forma-o para a docncia.
Essa fragmentao, na forma de conceber a formao de
professores,
[...] revela-se consoante com o que denominado, na literatura
educa-cional, de modelo da racionalidade tcnica. Nesse modelo, o
professor visto como um tcnico, um especialista que aplica com
rigor, na sua prtica cotidiana, as regras que derivam do
conhecimento cientfico e do conhecimento pedaggico. Portanto, para
formar esse profissional, necessrio um conjunto de disciplinas
cientficas e um outro de disci-plinas pedaggicas, que vo fornecer
as bases para sua ao (PEREIRA, 1999, p. 111-112).
Quanto a isso, quase consenso na literatura educacional que a
formao de professores, centrada no modelo da racionalidade tcnica,
mostra-se inadequada realidade do trabalho docente. Inmeras crticas
so atribudas a esse modelo (SILVA, 1999), basicamente pela
prioridade dada teoria em detrimento da prtica, sendo esta vista
simplesmente como espao de aplicao daquela, desvinculada de
estatuto epistemol-gico prprio. Nesse ponto, concordamos com
Pereira (1999) que um dos maiores equvocos na formao de professores
advindos desse modelo acreditar que, para ser bom professor, basta
o domnio da rea do conhe-cimento especfico que se vai ensinar.
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A esse equvoco, ainda presente na atualidade (MALDANER, 2008),
foram se somando outras questes. Todavia, para atender as
ne-cessidades de escolarizao impostas pelo processo de modernizao
da sociedade brasileira, o Estado assume o controle da escola, fato
esse deter-minante para a estruturao da funo docente no Brasil
(WEBER, 2003).
Com isso, as mudanas sociais e polticas ocorridas no pas, a
partir da dcada de 1950 provocaram a promulgao das Diretrizes e
Bases da Educao Nacional, Lei 4.024/61 (BRASIL, 1961), que, no seu
captulo IV, ao tratar do Processo de Formao do Magistrio,
apresenta, entre outros, as finalidades do ensino normal; o
processo de formao docente nos graus ginasial e colegial; a
realizao de cursos de especiali-zao e aperfeioamento; a formao de
docentes para o grau mdio em faculdades de Filosofia; cursos de
formao para docentes do grau mdio em institutos de Educao.
Tendo por base o art. 59 da lei mencionada, o Conselho Federal
de Educao, por meio do Parecer 262/62 (BRASIL, 1962a),
regulamen-tou os currculos mnimos e a durao dos cursos superiores.
Esse Parecer estabelecia, entre outros, que os currculos mnimos das
licenciaturas compreendiam as matrias fixadas para o bacharelado,
alm de incluir estudos sobre os alunos e o processo de
ensino-aprendizagem, ou seja, mantinha a frmula 3+13.
Ainda nos anos de 1960, houve um avano nas discusses nas
universidades brasileiras, com a finalidade de traar os rumos a
serem seguidos pela educao superior. No entanto, a Lei n. 5.540/68,
que trata da Reforma Universitria Brasileira (BRASIL, 1968), foi
promulgada sem considerar essas discusses, mantendo, por exemplo,
os cursos de forma-o de professores de curta durao. Por outro lado,
define em seu art. 30,
3 Em 1962 o Parecer do Conselho Nacional de Educao n. 292
(BRASIL. Conselho Federal de Educao. Parecer n. 292, de 14 de
novembro de 1962. Fixa a carga horria das matrias de formao
pedaggica. Braslia, DF, 14 nov. 1962b. Disponvel em: . Acesso em:
11 ago. 2011) extinguiu o modelo de formao de professores
conhecido como 3+1, de modo que tanto os cursos de bacharelado
quanto os de licenciatura
passaram a ter o mesmo tempo de formao.
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que a formao de professores para o ensino de segundo grau seria
feito em nvel superior, em faculdade de educao.
De modo geral, pode-se dizer que essa Reforma no atendeu s
expectativas da formao de professores. Inmeras crticas foram
feitas, principalmente pela fragmentao que houve entre as
disciplinas de con-tedo e disciplinas didtico-pedaggicas,
transformadas em unidades de ensino diferentes (PEREIRA, 2000),
provocando cada vez mais o distan-ciamento entre objetivos e
adequao de currculos.
Essa crtica tambm feita por Candau (1987), ao afirmar que
problemas, tais como falta de integrao entre a formao pedaggica e a
especfica e o carter eminentemente terico dos cursos de formao de
professores, mantinham-se inalterados, apesar da Reforma. Essa
situao se agrava na dcada seguinte, considerando, entre outros, o
disposto pela Lei n. 5.692/71 que visava a basicamente atender ao
momento poltico--econmico do pas.
Anos 1970: o tcnico de educao
No incio dos anos de 1970, a Lei n. 5.692/71 (BRASIL, 1971)
permitiu a formao de quadros profissionais para o ensino geral,
sem, to-davia, desconsiderar a possibilidade de continuidade dos
estudos em n-vel superior. No entanto, a referida lei apontava
caminhos na contramo da realidade socioeconmica e poltica do pas, o
que provocou, no fim da dcada de 70, amplas discusses sobre a
educao no Brasil, em que a formao de professores passou a ser tema
de referncia, o que culminou na reformulao dos cursos de
licenciaturas em geral (GUEDES, 2002).
Discute-se nesse perodo, a necessidade de formar um professor
tecnicamente competente (MARTINS, 2008). Portanto, sua formao
de-veria estar centrada na instrumentao tcnica, sendo
[...] o professor concebido como um organizador dos componentes
do processo de ensino-aprendizagem (objetivos, seleo de
contedo,
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estratgia de ensino, avaliao, etc.) que deveriam ser
rigorosamente planejados para garantir resultados instrucionais
altamente eficazes e eficientes (PEREIRA, 2007, p. 16).
Nesse caso, a formao visava ao treinamento tcnico em educa-o, e
ocorria por meio da transmisso dos instrumentos tcnicos para a
aplicao do conhecimento cientfico produzido por outros. Por esse
mo-delo de formao, o professor competente corresponde a um bom
exe-cutor de tarefas, observando sua posio no interior da organizao
do trabalho na escola (MARTINS, 2008, p. 18).
De acordo com Brzezinski (2007), as discusses para reverter esse
panorama tomavam por base, no fim dos anos 1970, propostas
alternativas de formao de professores que viessem a corresponder s
exigncias da sociedade em mudana e s necessidades da educao bsica
que requeria profissionais crticos e conscientes do papel da educao
na sociedade.
Por outro lado, essas discusses, j no fim da dcada de 1970, por
vezes caminhavam na contramo, medida em que geravam entendimen-tos,
que, de acordo com Pereira (2007), atrelavam as dificuldades gerais
en-frentadas pela educao do pas aos problemas da formao do
professor.
Essa uma questo ainda bastante presente nas discusses atuais.
Nesse aspecto, compartilhamos da preocupao de Severino (2011, p. 4)
que, quela poca como agora, grande parte das anlises relacionadas
situao problemtica da educao brasileira atribua suas causas
centrais a questes internas vida escolar e a deficincias na formao
dos pro-fessores, esquecendo-se de que esses problemas e suas
solues requerem o compromisso de todos os segmentos da sociedade.
Nesse sentido, vale considerar o alerta de Balzan e Paoli (1988)
que ignorar esse compromis-so recair no pedagogismo ingnuo e
admitir a possibilidade de melhores condies na educao escolar
desvinculadas da situao de vida e condi-es de trabalho do
professor.
Essas discusses, todavia, foram cada vez mais mostrando a
es-cola como uma instncia social que dissemina o conhecimento
produzido
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ao longo da histria da humanidade, tendo uma importante
finalidade na formao das novas geraes. Nesse contexto,
[...] o docente da educao bsica [...] tem, de uma parte, a sua
atuao sob suspeio, transformando-se em mero agente da preservao e
ex-panso da sociedade capitalista, e, de outra, tem o seu papel
superva-lorizado ao ser percebido como elemento importante na
organizao de alunos e comunidade, em prol de um projeto de
sociedade em favor das camadas populares (WEBER, 2003, p.
1133-1334).
Essa contradio, de certa forma, leva a uma nova maneira de
situar o exerccio da docncia que passa a ser visto no mais como uma
atividade neutra, mas como uma atividade educativa transformado-ra
(PEREIRA, 2007). Ainda de acordo com o autor, no fim da dcada de
1970, a questo central que girava em torno da formao de professores
era o carter poltico de sua formao. No entanto, h um consenso na
literatura educacional, a exemplo do que revela Candau (1987), que,
at os ltimos anos da dcada de 1970, a formao de professores estava
cen-trada nas dimenses funcionais e operacionais.
As discusses sobre o exerccio da docncia como uma atividade
educativa transformadora ganham corpo a partir dos anos 1980.
Anos 1980: o educador
Na dcada de 1980, marcada como um importante momento his-trico
de abertura poltica no pas, a formao de professores buscava
dis-tanciar-se daquilo que vinha sendo referncia at ento nos
estudos publi-cados at 1981, ou seja, a formao centrada nos mtodos
e treinamento de professores (FELDENS, 1984). Isso, para Candau
(1984, p. 19), significou um despertar para a importncia da dimenso
poltica at ento silenciada pela perspectiva instrumental fundada na
neutralidade tcnica.
Martins (2008, p. 19), de certo modo, contribuiu para o
enten-dimento dos motivos desse distanciamento, fortemente
vinculado ao
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momento histrico do pas nos anos 1980, ao referir-se necessidade
de formar educadores crticos e conscientes do papel da educao na
so-ciedade e mais comprometidos com as demandas das camadas
populares cada vez mais presentes na escola e cedo dela excludos.
Essa questo, ainda de acordo com a autora, faz surgir novas
discusses na formao de professores e fomentar outras j conhecidas,
tais como valorizao da prtica dos professores; compromisso poltico
com as camadas populares; transformao social; busca de unidade
teoria-prtica.
Essas discusses, conforme Pereira (2007), incidem na
necessi-dade de os cursos de formao possibilitar aos professores,
em seu pro-cesso formativo, tomar conscincia da importncia da
escola na transfor-mao da sociedade e, ao mesmo tempo de que sua ao
docente precisa estar associada a uma atividade social mais
global.
Nesse cenrio, ainda de acordo com o autor, surge, no incio dos
anos 1980, permanecendo at o fim, a figura do educador em
substitui-o do professor. Tal substituio, alm de mostrar o
descontentamento com a formao docente e demarcar um novo tempo em
que ficasse carac-terizado o rompimento com o perodo anterior,
representava oposio ao tcnico de educao.
Pereira (2007) ainda salienta que o movimento de rejeio viso de
educao e formao de professores se fortalece ao ser questionada pela
crtica de cunho marxista. Isso foi a alavanca para que as discusses
sobre a formao de professores, nos primeiros anos da dcada de 1980,
girassem em torno da dimenso poltica do ato pedaggico (MARTINS,
2008).
Nessa perspectiva, ganha relevo as pesquisas sobre prtica
pe-daggica, destacando-se o trabalho de Mello (1982) sobre a
necessidade de formar professores com competncia tcnica e
compromisso poltico, dois aspectos, embora distintos,
indissociveis. No dizer dessa autora, o sentido poltico da prtica
docente se realizava pela mediao da compe-tncia tcnica. Candau
(1982) vai alm, ao defender a formao de educa-dores em trs
dimenses: humana, tcnico e poltico-social. Embora isso, notrio que
a nfase foi dada nas duas dimenses referidas, conforme Mello
(1982), pois, nesse perodo,
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[...] o professor foi identificado com o educador, ganhando
relevncia a dimenso poltica da atividade educativa,
transformando-se sua prin-cipal tarefa a formao da conscincia
crtica das classes subalternas, concepo que no debate acadmico
recebeu contornos de confronto entre o necessrio desenvolvimento de
competncia tcnica e o com-promisso poltico para o magistrio (WEBER,
2003, p. 1134).
Todavia, para a formao desse educador, responsvel pela for-mao
da conscincia crtica nos alunos, como vimos, a necessidade
for-mativa de desenvolver compromisso poltico e competncia tcnica
estava, intrinsecamente, vinculada necessidade de relacionar teoria
e prtica.
No que diz respeito a essa relao, Candau e Lelis (1983), que
pes-quisaram amplamente essa questo, identificaram duas vises: uma,
dicot-mica, que destaca a autonomia da teoria em relao prtica e
vice-versa, porm admitindo teoria e prtica como polos diferentes,
mas no basicamen-te opostos; outra, defendida pelas autoras, que
enfatiza a viso de unidade entre teoria e prtica, salientando que
essa unidade diferente de identidade, uma relao simultnea e
recproca de autonomia e dependncia.
Ainda nos anos 1980, mas com nfase nos anos 1990, as ati-vidades
que articulassem teoria e prtica tiveram lugar de destaque na
formao de professores, como aponta Brzezinski e Garrido (2001). A
formao inicial teria, assim, que superar a dicotomia teoria-prtica.
Para tanto, era necessrio um esforo de valorizar essa formao.
Nesse aspecto, na obra organizada por Catani (1986), ela e os
demais autores fazem uma crtica severa ao descaso com que a
univer-sidade trata a formao de professores, relegando-a a segundo
plano. Exemplo disso o que diz Menezes (1986, p. 120) quando afirma
que a formao de professores na universidade ocorre [...] como uma
espcie de tarifa que ela paga para poder fazer cincia em paz. Esse
argumento reforado por Ldke (1994) quando, a partir de uma anlise
da situao dos cursos de licenciatura no Brasil, afirma que, nas
universidades brasi-leiras, a formao de professores ocupa lugar
diminuto. Para a autora, as prioridades esto centradas na pesquisa
e elaborao do conhecimento
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cientfico. De modo que as atividades fora desse foco so
consideradas, em geral, como coisa inferior, a exemplo das
atividades de ensino e for-mao de professores.
As discusses vinculadas s questes que articulam ensino e
pesquisa s vo ganhar algum destaque na formao de professores no
Brasil, a partir dos anos 1990.
Anos 1990: o professor-pesquisador
De acordo com Carvalho e Simes (2002, p. 163), que fizeram um
estudo destinado ao levantamento do estado do conhecimento
rela-tivo formao inicial e prxis do professor no Brasil de 1990 a
1997, a relao entre a teoria e a prtica aparece como questo central
a ser trabalhada no mbito da formao docente, especialmente quando a
uni-versidade vem sendo permanentemente desafiada pelas mazelas
sociais e econmicas da sociedade brasileira.
Essa questo aparece como dispositivo de lei, quando, na segun-da
metade da dcada 1990, a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educao
Nacional, Lei n. 9.394/96 (BRASIL, 1996), provoca a necessidade de
re-pensar a formao de professores no Brasil, causando mudanas nos
cur-rculos dessa formao, inclusive quando indica a incluso da
associao entre teoria e prtica [...] (art. 61, I) e a prtica de
ensino de, no mnimo, trezentas horas nos cursos de formao docente
(art. 65).
Essa indicao da lei impeliu a reviso dos currculos dos cursos de
formao de professores, particularmente no que se refere separao
entre disciplinas de contedo e pedaggicas, no sentido de rever a
desar-ticulao entre formao acadmica e realidade prtica, que tanto
contri-buem para a fragmentao daqueles cursos (PEREIRA, 2007).
Nesse contexto, duas perspectivas apontam como principais na
formao de professores: a relao ensino-pesquisa; saber
escolar/docen-te e formao prtica do professor. Esta ltima, para
Pereira (2007, p. 45), ao distinguir
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[...] as especificidades dos saberes cientficos e dos saberes
escolares, parecem contribuir para a desmistificao da ideia de que
compete ao pesquisador produzir o conhecimento, resultados de suas
pesquisas, e ao professor cabe a simples tarefa de ensinar, ou
seja, reproduzir e transmitir esses saberes j produzidos.
Ainda a respeito dessa perspectiva, Nunes (2001, p. 28), ao
fa-zer uma anlise de como e quando a questo dos saberes docentes
apare-ce nas pesquisas sobre formao de professores na literatura
educacional brasileira, constata que:
[...] embora ainda de uma forma um tanto tmida, a partir da
dca-da de 1990 que se buscam novos enfoques e paradigmas para
compre-ender a prtica pedaggica e os saberes pedaggicos e
epistemolgicos relativos ao contedo escolar a ser
ensinado/aprendido. Nesse perodo, inicia-se o desenvolvimento de
pesquisas que, considerando a comple-xidade da prtica pedaggica e
dos saberes docentes, buscam resgatar o papel do professor,
destacando a importncia de se pensar a formao numa abordagem que v
alm da acadmica, envolvendo o desenvolvi-mento pessoal,
profissional e organizacional da profisso docente.
Dentre essas pesquisas, podemos citar a de Fiorentini, Souza e
Mello (1998). O autor partiu da relao entre teoria e prtica para
conhecer e caracterizar os saberes docentes e identificar como
estes po-deriam ser de domnio e produo pelos professores, por meio
da ativi-dade pedaggica reflexiva e investigativa. Mostra que a
relao que os professores mantm com os saberes determinante em sua
formao, relao essa que, na maioria das vezes, [...] marcada pela
racionali-dade tcnica [...] ou pelo pragmatismo praticista ou
atividade que ex-clui a formao e a reflexo terica e filosfica
(FIORENTINI; SOUZA; MELLO, 1998, p. 311). Conclui que a articulao
entre teoria e prtica poder contribuir na formao do
professor-pesquisador, sendo a ati-vidade pedaggica espao
privilegiado para problematizar, significar e explorar os contedos
tericos.
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Quanto primeira perspectiva, ou seja, a relao entre ensino e
pesquisa,
[...] os estudos sobre a formao do professor voltam-se
crescentemen-te para a compreenso dos aspectos microssociais [sic],
destacando e focalizando, sob novos prismas, o papel do
agente-sujeito. Nesse ce-nrio, privilegia-se hoje, a formao do
professor-pesquisador, ou seja, ressalta-se a importncia da formao
do profissional reflexivo, aquele que pensa-na-ao, cuja atividade
profissional se alia atividade de pesquisa (PEREIRA, 2007, p.
41).
Com isso, notamos que depois de a nfase recair sobre os
con-tedos a serem ensinados, as questes de sistema e de organizao
curri-cular, e sobre os processos de ensino-aprendizagem,
convive-se com uma mudana de foco em que se tem colocado no centro
das discusses o de-bate sobre os desafios da articulao teoria e
prtica para decidir questes entre ensinar e aprender mediado pela
pesquisa, ou seja, a
[...] anlise da literatura educacional aponta para importantes
mudan-as na forma de conceber a formao de professores. Do
treinamento do tcnico em educao, na dcada de 1970, observa-se a
nfase na formao do educador na primeira metade dos anos 1980 e, nos
anos 1990, um redirecionamento para a formao do
professor-pesquisador (PEREIRA, 2007, p. 51, grifo do autor).
Essas mudanas, na concepo da formao docente, indicam as
distintas formas como o trabalho do professor visto na escola em
sua trajetria como espao educativo. Da condio de grande conhecedor
da matria e transmissor de conhecimentos; exmio planejador e
executor de tarefas; competente tecnicamente e com compromisso
poltico que lhe possibilite a transformao social das camadas
populares, o professor nos anos 1990 passa a ser visto como
profissional reflexivo, que deve aliar, em seu trabalho docente, as
atividades de ensino pesquisa.
Com essas questes, surgem com fora as discusses de que a formao
do professor no pode ser pensada, desvinculada do espao
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real em que se efetiva o seu campo prioritrio de atuao
profissional, ou seja, a escola. Isso pressupe um repensar a formao
inicial, no mais centrada na dimenso terica ou cultural do
conhecimento ou na ideia de que o trabalho docente comprometido
procede do domnio da cincia e de tcnicas e mtodos para sua aplicao
(BELLOCHIO; TERRAZAN; TOMAZETTI, 2004).
Nesse sentido, concordamos com Pereira (2007, p. 47) que esse
modo de pensar exige do professor, ainda durante a sua formao, a
com-preenso do prprio processo de construo e produo do
conhecimen-to escolar, entender as diferenas e semelhanas dos
processos de produ-o do saber cientfico e do saber escolar.
No entanto, a efetivao dessas mudanas demonstra ser um processo
lento e seguir caminhos complexos. De qualquer forma, as
con-tribuies dos anos 1990 so importantes, particularmente no que
diz respeito s discusses sobre os saberes da docncia; defesa da
formao de professores que articule teoria e prtica, pesquisa e
ensino, reflexo e ao; formao do professor que pesquisa o seu prprio
trabalho docen-te, entre outros, que so ressaltadas nos anos
seguintes.
Anos 2000: o professor pesquisador-reflexivo
Como vimos, no fim dos anos 1990, a atual Lei de Diretrizes e
Bases da Educao Nacional (BRASIL, 1996) prope alteraes para os
cursos de formao de professores, sendo definido um perodo para
efe-tivao dessas alteraes. Em decorrncia disso, em 2002, as
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formao de Professores so
estabelecidas e, nos anos subsequentes, as Diretrizes Curriculares
para cada curso de licenciatura. Essas diretrizes, de acordo com
Freitas (2007, p. 1211),
[...] provocaram movimentos diferenciados, contraditrios, no
desen-volvimento e materializao da organizao curricular em cada
IES, dependendo das concepes norteadoras dos currculos e da
histria
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e trajetria das relaes entre as reas especficas da licenciatura
e as faculdades/centros e departamentos de educao.
Embora as Diretrizes estejam assentadas nos princpios que
atre-lam a formao do professor s necessidades atuais do
capitalismo, e ao mesmo tempo permitem um controle sobre essa
formao por meio de pro-cessos de avaliao e certificao, podemos
visualizar maior flexibilidade na organizao curricular dos cursos
de licenciatura (CHAPANI, 2010).
Essa flexibilidade ocorre por fora da situao que caracteriza a
sociedade atual, em que a formao de professores se desenvolve em um
contexto marcado por:
- Um incremento acelerado e uma mudana vertiginosa nas formas
adotadas pela comunidade social, no co-nhecimento cientfico e nos
produtos do pensamento, a cultura e arte.
- Uma evoluo acelerada da sociedade em suas estruturas
materiais, institucionais e formas de organizao da con-vivncia,
modelos de famlia, de produo e de distribui-o, que tm reflexos na
mudana inevitvel das atuais formas de pensar, sentir e agir das
novas geraes.
- Contextos sociais que condicionaro a educao e refleti-ro uma
srie de foras em conflito. As enormes mudanas dos meios de
comunicao e da tecnologia foram acompa-nhadas por profundas
transformaes na vida institucio-nal de muitas organizaes e abalaram
a transmisso do conhecimento e, portanto, tambm suas instituies
[...].
- Uma anlise da educao que j no a considera pa-trimnio exclusivo
dos docentes e sim de toda a co-munidade e dos meios que esta
dispe, estabelecendo novos modelos relacionais e participativos na
prtica da educao (IMBERNN, 2006, p. 9).
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Todo esse contexto leva a uma nova maneira de conceber a
ins-tituio formativa e, consequentemente, a formao do professor e
seu papel no contexto da escola, que, em seu bojo, mostra de forma
inques-tionvel que
[...] a situao da instituio escolar se torna mais complexa,
amplian-do a complexidade para a esfera da profisso docente, que no
pode mais ser vista como reduzida ao domnio dos contedos das
discipli-nas e tcnica para transmiti-los. agora exigido do
professor que lide com um conhecimento em construo e no mais
imutvel e que analise a educao como um compromisso poltico,
carregado de valores ticos e morais, que considere o
desenvolvimento da pessoa e a colaborao entre iguais e que seja
capaz de conviver com a mudana e a incerteza (LIMA, 2004, p.
118).
Para tanto, concordamos com a autora que a formao de
pro-fessores precisa contemplar outro modelo que no o da
racionalidade tcnica, sendo preciso considerar na atualidade um
modelo alternativo sustentado na racionalidade prtica.
Nesse modelo, da racionalidade prtica, o professor con-siderado
um profissional autnomo, que reflete, toma decises e cria durante
sua ao pedaggica, a qual entendida como um fenmeno complexo,
singular, instvel e carregado de incertezas e conflitos de va-lores
(PEREIRA, 1999, p. 113). A prtica, nesse caso, ainda de acordo com
o autor, no considerada apenas como espao de transmisso de
conhecimentos, mas de reflexo e de construo de novos
conhecimen-tos, o que condiz com a formao de um professor
pesquisador-reflexivo (NVOA, 2011).
Nesse modo de conceber a formao, o professor ao refletir sobre
sua prtica, converte-se em um pesquisador que produz conheci-mentos
e colabora para que outros conhecimentos sejam produzidos (AZEVEDO,
2008, p. 45).
Para uma formao nessa perspectiva, assim como Pereira (1999, p.
177), entendemos que
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[...] a familiaridade com os processos e os produtos da pesquisa
cient-fica torna-se imprescindvel na formao docente. A imerso dos
futu-ros educadores em ambientes de produo cientfica do
conhecimento possibilita-lhes o exame crtico de suas atividades
docentes, contribuin-do para aumentar sua capacidade de inovao e
para fundamentar suas aes. o mergulho em tal atividade que permite
a mudana de olhar do futuro docente em relao aos processos
pedaggicos em que se envolve na escola, maneira de perceber os
educandos e suas aprendizagens, ao modo de conceber e desenvolver o
seu trabalho em sala de aula.
Para essa familiaridade dos professores em formao com os
pro-cessos e produtos da pesquisa cientfica, visando a um trabalho
docente mais intencional, crtico e autnomo, necessrio investir na
educao cientfica do professor. Nesse sentido, estudos como os de
Chassot (2006), Cachapuz, Praia e Jorge (2004), Gil-Prez (2003),
Zancan (2000), Roitman (2007), den-tre outros, discutem a educao
cientfica como condio desejvel para um agir responsvel e autnomo no
mundo, uma vez que colabora para
[...] desenvolver o esprito crtico e o pensamento lgico,
desenvolver a capacidade de resoluo de problemas e a tomada de
deciso com base em dados e informaes. Alm disso, [a Educao
Cientfica] fundamental para [...] compreender a importncia da
cincia no cotidiano. Ela tambm representa o primeiro degrau da
formao de recursos humanos para as atividades de pesquisa cientfica
e tecnolgica (ROITMAN, 2007, p. 121).
Vista desse modo, a educao cientfica poder contribuir para
facilitar a leitura da realidade e o entendimento da necessidade de
transfor-m-la para melhor (CHASSOT, 2006), com domnio das condies
para essa transformao. Uma formao, nesse horizonte, dever basear-se
no en-volvimento dos professores na construo do conhecimento,
aproximando sua atividade do tratamento cientfico dos problemas
(CACHAPUZ, 2005).
Para uma estratgia de ensino nessa perspectiva, desde o ponto de
vista da formao de professores, podemos inferir, com base em
Azevedo (2008) que se tem buscado caminhos para a efetivao da
articulao teo-ria e prtica como fundamento necessrio para oferecer
elementos para o
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fazer do professor, a partir de uma prtica pautada na pesquisa.
Essa pr-tica, vista como espao privilegiado de construo de
conhecimento nos processos formativos de professores, tem sido foco
nas discusses atuais sobre formao de professores, conforme mostra o
estudo realizado por Reis Jnior e Castro (2011), que analisaram a
produo de pesquisas em formao de professores no Brasil, no perodo
de 2005 a 2009.
No entanto, embora os esforos e as conquistas no campo das
pesquisas ao longo desses anos, a proposio de uma formao que
aten-da as necessidades do trabalho docente4 foram muito mais
discutidas do que verdadeiramente incorporadas nos espaos de formao
de profes-sores. Isso nos leva a concordar com Nvoa (2011): houve
revoluo nos discursos, no nas prticas.
Essa situao evidenciada em um estudo em que Gatti (2010) analisa
a formao de professores no Brasil, considerando quatro aspec-tos: o
da legislao relativa a essa formao; as caractersticas
socioeduca-cionais dos licenciandos; as caractersticas dos cursos
formadores de pro-fessores; os currculos e ementas de licenciaturas
em Pedagogia, Lngua Portuguesa, Matemtica e Cincias Biolgicas. As
concluses da autora, centradas na interao dos quatro aspectos
mencionados, apontam um cenrio de grande tenso e preocupao sobre as
condies formativas do professor para exercer o trabalho
docente:
No que concerne formao de professores, necessria uma verda-deira
revoluo nas estruturas institucionais formativas e nos currcu-los
da formao. As emendas j so muitas. A fragmentao formativa clara.
preciso integrar essa formao em currculos articulados e voltados a
esse objetivo precpuo. A formao de professores no pode ser pensada
a partir das cincias e seus diversos campos disciplinares, como
adendo destas reas, mas a partir da funo social prpria es-colarizao
ensinar s novas geraes o conhecimento acumulado e
4 Sobre necessidades formativas do professor para o trabalho
docente, particularmente o ensino,
consultar AZEVEDO, R. O. M. Ensino de cincias e formao de
professores: diagnstico, anlise e proposta. Manaus: Universidade do
Estado do Amazonas, 2008.
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consolidar valores e prticas coerentes com nossa vida civil. A
forte tradio disciplinar que marca entre ns a identidade docente e
orien-ta os futuros professores em sua formao a se afinarem mais
com as demandas provenientes da sua rea especfica de conhecimento
do que com as demandas gerais da escola bsica, leva no s as
entidades profissionais como at as cientficas a oporem resistncias
s solues de carter interdisciplinar para o currculo [...] (GATTI,
2010, p. 1375).
Isso evidencia que, enquanto no conseguirmos avanar nessas
questes, que se enquadram em uma matriz de pensamento dicotmico
(ALARCO, 2004), pouco poder ser feito. No entanto as recentes
abordagens na formao de professores, a respeito do trabalho docente
como articulador da interface ensino, pesquisa e reflexo, podero
contribuir nesse avano.
Essas abordagens apontam para a necessidade de se compreen-der,
no cenrio atual da educao brasileira, que o processo formativo de
professores precisa estar fundado na reflexo na ao e sobre a ao, de
modo que o trabalho docente possa ser visto como fonte de pesquisa
do professor. Isso tem impulsionado as discusses sobre a relevncia
da pes-quisa-reflexo na formao inicial de professores, como
princpio forma-tivo e cientfico capaz de promover a coerncia entre
a formao oferecida e a prtica desejada que os professores exeram em
seu trabalho docente.
Consideraes finais
No texto, procuramos argumentar que a formao de profes-sores,
embora tenha se tornado uma temtica central nas discusses no cenrio
acadmico brasileiro, os cursos que oferecem essa formao para atuao
na educao bsica permanecem sem alteraes significativas em seu
modelo formativo. Nessa tentativa, tomamos caminhos que nos
leva-ram a evidenciar as exigncias dessa formao, a formao oferecida
e o papel do professor no contexto da escola.
Para a sustentao terica desses argumentos, desenvolvemos
discusses, considerando a trajetria da formao de professores para
a
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educao bsica no Brasil, que nos permitem afirmar que, da formao
fo-cada no professor transmissor de conhecimentos, indo em direo ao
tc-nico em educao, ao educador e ao pesquisador, chegando ao
professor pesquisador-reflexivo, as exigncias da formao e o papel
do professor mudaram radicalmente. No entanto, a formao oferecida
no acompa-nhou efetivamente essas mudanas, que se mantm mais
presentes no plano dos discursos do que no campo formativo, a
exemplo da questo de articulao teoria e prtica que, apesar de to
anunciada, enfatizada e desejada pelos acadmicos, por documentos e
normas, no se concretiza nos cursos de licenciatura, ou seja, na
formao de professores.
Na trajetria exposta, vimos que, nos anos 1960, havia o
en-tendimento da docncia como transmisso de conhecimento; nos anos
1970, como um fazer tcnico; nos anos 1980, como mudana social, a
constituio de estudantes crticos e responsveis pela mudana social;
nos anos 1990, a atividade pedaggica como espao privilegiado para
pro-blematizar, significar e explorar os contedos tericos; nos anos
2000, a educao cientfica para uma atividade pedaggica como espao de
pes-quisa, reflexo, construo e produo de conhecimento, na busca por
uma racionalidade prtica.
Considerando o exposto, por um olhar prospectivo, deve-mos tomar
como alerta o que diz Tardif (2000) quando discute que as pesquisas
em educao correm o risco de esvaziar a dimenso eman-cipadora e
crtica do conhecimento, graas centralidade de pensar a formao de
professores a partir da nfase nos saberes profissionais utilizveis
no contexto do trabalho docente, especificamente no coti-diano da
sala de aula. Tendo nesse olhar uma referncia, apoiamo-nos em Nvoa
(2011) para indicar que o cenrio atual aponta, como neces-srio e
urgente, para alm de pensar a formao de dentro da profisso,
organiz-la a partir de programas de desenvolvimento profissional
do-cente e reconstruo do espao acadmico de formao, articulando-a ao
debate sociopoltico da educao.
Promover uma formao docente, diante desse horizonte, ter coragem
de romper com prticas assumidas como verdade, mas, acima
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de tudo, romper consigo mesmo para contribuir na instaurao de
uma nova compreenso dessa formao, por meio de um processo crtico.
Esse processo, conforme aponta Ghedin (2010), no ocorre de modo
distenso, mas, ao contrrio, resulta de arrojo e transgresses e,
medida que rompe com modelos vistos como verdade absoluta, pode
impulsionar mudanas, provocando um processo formativo em que o
professor assuma-se como sujeito de sua histria, em direo a um agir
responsvel e autnomo pe-rante si mesmo e o mundo. Essa perspectiva
nos conduz a uma formao de professores que precisa considerar o
compromisso histrico com a edu-cao e com a profisso docente.
Por fim, ressaltamos que as discusses estabelecidas refletem um
esforo de colaborao para (re)pensar o processo formativo de
pro-fessores da educao bsica, que resulte na formao de um professor
que, consciente e autonomamente, reconhea e assuma-se como
profissional da educao, tendo condies para um enfrentamento crtico
perante os desafios do trabalho docente.
Referncias
ALARCO, I. Prefcio. In: MACIEL, L. S.; SHIGUNOV NETO, A. Formao
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Braslia: MEC; INEP; COMPED, 2002. (Srie Estado do conhecimento, n.
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BELLOCHIO, C. R.; TERRAZAN, E.; TOMAZETTI, E. Profisso docente:
algumas dimenses e tendncias. Educao, v. 29, n. 2, p. 17-32,
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Recebido: 24/10/2011 Received: 10/24/2011
Aprovado: 07/12/2011Approved: 12/07/2011