VII ESOCITE.BR tecsoc - ISSN ∕ 1808-8716 Toledo, Carlotto. Anais VII Esocite.br/tecsoc 2017; 1(gt19):1-20 Tecnologia, independência nacional e relações internacionais GT19 – Ciência, tecnologia e sociedade e relações internacionais: um diálogo possível? Demétrio Gaspari Cirne de Toledo Maria Caramez Carlotto Resumo: As relações entre tecnologia, independência nacional e relações internacionais, outrora elementos centrais das análises de escolas como o estruturalismo cepalino e as teorias da dependência, em tempos recentes têm recebido pouca atenção de pesquisadores dos campos de estudo da ciência e tecnologia e relações internacionais. As transformações da tecnologia e do sistema internacional nas últimas décadas explicam em parte esse desinteresse passado, e mais ainda seu renovado interesse atual. O dilema tecnológico clássico entre make or buy pareceu a alguns, no auge da euforia da globalização neoliberal e na sequência da derrocada das tentativas de desenvolvimento autônomo nacional nas décadas de 1980 e 1990, haver encontrado resolução definitiva no polo do segundo termo, buy, tornando dispensáveis os esforços nacionais pela autonomia tecnológica como forma de reduzir a dependência dos países periféricos em relação ao monopólio tecnológico dos países centrais. A história das últimas quatro décadas, no entanto, não só não assistiu à ampliação do acesso às tecnologias proprietárias dos países centrais por meio de transações de mercado – buy –, como viu o aprofundamento do monopólio tecnológico daqueles países, recolocando a necessidade de desenvolvimento tecnológico autônomo – make – para os países periféricos, tarefa tão ou mais urgente agora quanto antes. Com vistas a retomar o diálogo entre estudos da ciência, tecnologia e sociedade e RI, não apenas possível, mas necessário e urgente, este artigo mobiliza formulações clássicas sobre desenvolvimento e dependência e estabelece um quadro conceitual para analisar as relações entre tecnologia, independência nacional e relações internacionais. Em seguida, apresenta uma breve análise das tentativas brasileiras de desenvolvimento tecnológico autônomo nos governos de Costa e Silva (1967-1969), Médici (1969-1974) e Geisel 1974-1979), investigando as relações entre política tecnológica e política externa. Por fim, elencamos problemas de pesquisa relativos às relações entre tecnologia, independência nacional e relações internacionais que combina as análises da família das teorias da dependência e do desenvolvimento tardio ao ferramental da sociologia e da economia da tecnologia e à história da política externa brasileira, temática com potencial de abrir nova fronteira de pesquisa sobre as conexões entre CTI e RI.
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Tecnologia, independência nacional e relaçõesinternacionais
GT19 – Ciência, tecnologia e sociedade e relações internacionais: umdiálogo possível?
Demétrio Gaspari Cirne de ToledoMaria Caramez Carlotto
Resumo: As relações entre tecnologia, independência nacional e relações internacionais, outroraelementos centrais das análises de escolas como o estruturalismo cepalino e as teorias dadependência, em tempos recentes têm recebido pouca atenção de pesquisadores dos campos deestudo da ciência e tecnologia e relações internacionais. As transformações da tecnologia e do sistemainternacional nas últimas décadas explicam em parte esse desinteresse passado, e mais ainda seurenovado interesse atual. O dilema tecnológico clássico entre make or buy pareceu a alguns, no augeda euforia da globalização neoliberal e na sequência da derrocada das tentativas de desenvolvimentoautônomo nacional nas décadas de 1980 e 1990, haver encontrado resolução definitiva no polo dosegundo termo, buy, tornando dispensáveis os esforços nacionais pela autonomia tecnológica comoforma de reduzir a dependência dos países periféricos em relação ao monopólio tecnológico dospaíses centrais. A história das últimas quatro décadas, no entanto, não só não assistiu à ampliação doacesso às tecnologias proprietárias dos países centrais por meio de transações de mercado – buy –,como viu o aprofundamento do monopólio tecnológico daqueles países, recolocando a necessidade dedesenvolvimento tecnológico autônomo – make – para os países periféricos, tarefa tão ou mais urgenteagora quanto antes. Com vistas a retomar o diálogo entre estudos da ciência, tecnologia e sociedade eRI, não apenas possível, mas necessário e urgente, este artigo mobiliza formulações clássicas sobredesenvolvimento e dependência e estabelece um quadro conceitual para analisar as relações entretecnologia, independência nacional e relações internacionais. Em seguida, apresenta uma breve análisedas tentativas brasileiras de desenvolvimento tecnológico autônomo nos governos de Costa e Silva(1967-1969), Médici (1969-1974) e Geisel 1974-1979), investigando as relações entre política tecnológicae política externa. Por fim, elencamos problemas de pesquisa relativos às relações entre tecnologia,independência nacional e relações internacionais que combina as análises da família das teorias dadependência e do desenvolvimento tardio ao ferramental da sociologia e da economia da tecnologia eà história da política externa brasileira, temática com potencial de abrir nova fronteira de pesquisasobre as conexões entre CTI e RI.
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1. Independência e tecnologia nacional
A construção da independência política e econômica nacional passa
necessariamente pela afirmação da independência tecnológica nacional. Sem
independência tecnológica, todo ensaio de independência é forçosamente parcial e
efêmero, resultando, ao fim, na recolocação do país em sua condição de
dependência, não raro em posição quase idêntica à que se encontrava no começo
da tentativa de se tornar independente tecnologicamente. Não há independência
política e econômica sem independência tecnológica, e vice-versa.
Quando falamos em tecnologia, não nos referimos a qualquer forma de
conhecimento, tampouco a qualquer forma de tecnologia, mas ao conhecimento e à
tecnologia na forma que assumiram no capitalismo mundial, a partir da virada do
século XVIII para o século XIX, época da grande divergência que colocou primeiro
algumas partes da Europa ocidental e depois os EUA, na posição de nações
hegemônicas do capitalismo histórico. Em seu sentido antropológico, o
conhecimento é incomensurável entre culturas, sociedades e civilizações. Não se
trata, portanto, de estabelecer hierarquias, transformando diferenças – ou seja,
diferentes formas de conhecimento – em desigualdades – isto é, conhecimentos
superiores e inferiores. Estamos interessados nas formas historicamente definidas
que o conhecimento assumiu no capitalismo, e sobretudo a partir da primeira
revolução industrial e em seus desdobramentos nas sucessivas ondas de progresso
técnico, e no papel absolutamente central na transformação das diferenças gerais
entre culturas, sociedades e civilizações em desigualdades específicas no sistema
capitalista mundial desempenhada por uma forma particular de conhecimento: o
conhecimento produtivamente aplicável. Nesse sentido, a noção de conhecimento
produtivamente aplicável especifica o sentido em que empregamos o termo
tecnologia – como dimensão central dos processos de produção e reprodução do
capital – e o contexto – o capitalismo histórico como estrutura mundial de
diferenciação entre centro e periferia.
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A definição de conhecimento produtivamente aplicável pressupõe sua aplicabilidade
nos processos de produção e reprodução ampliada do capital e sua inserção em
mercados crescentemente globais, logo, uma concorrência cujo espaço é o
capitalismo mundial. Não basta que o conhecimento seja útil e confiável (useful and
reliable), é preciso que ele seja capaz de participar com proveito dos processos de
acumulação capitalista. Logo, nem todo conhecimento útil e confiável é
produtivamente aplicável no sentido que aqui utilizamos essa noção. A aplicabilidade
do conhecimento aos processos de produção, portanto, demanda uma especificação
adicional de nossa definição: é preciso que o conhecimento esteja próximo à
fronteira tecnológica em dado momento da história dos processos de produção
capitalista. Conhecimentos obsoletos, ainda que úteis e confiáveis, não se prestam a
romper com o monopólio e a dependência tecnológica da periferia em relação ao
centro do capitalismo, antes reforçam esses traços, por exemplo, no modo como
empresas multinacionais transferem integralmente, por meio de transações
intrafirma, parques produtivos obsoletos do centro para a periferia, estendendo,
assim, o ciclo de vida daquelas formas de conhecimento produtivamente aplicável e
sua capacidade de gerar lucros, tudo isso sem jamais ameaçar seu monopólio do
conhecimento produtivamente aplicável.
A estrutura centro-periferia do capitalismo mundial é consequência direta da
desigualdade de acesso ao conhecimento produtivamente aplicável: a posição e o
papel de uma nação na divisão internacional do trabalho estão diretamente
relacionadas às distâncias relativas de cada país em relação à fronteira tecnológica
de determinado período. Um dos aspectos fundamentais da divisão internacional do
trabalho em sua dimensão tecnológica, que definirá todas as outras dimensões, é
que o avanço de uma nação em direção à fronteira tecnológica não se dá de modo
linear e contínuo, mas de modo descontínuo: os subparadigmas tecnoeconômicos
(Perez 2009) estão separados um dos outros por descontinuidades não-triviais. Não
é possível transitar do domínio de um subparadigma tecnoeconômico para outro de
modo incremental e cumulativo. Além disso, a descontinuidade entre subparadigmas
tecnoeconômicos cresce em direção à fronteira tecnológica: quanto mais próximo da
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fronteira tecnológica estiver um subparadigma, maior a descontinuidade em relação
aos demais. Essas descontinuidades não são intrínsecas ao conhecimento; elas são
politicamente construídas.
A dependência tecnológica é politicamente construída a partir de fora e a partir de
dentro do país. De fora, pelas nações mais poderosas e tecnologicamente
avançadas do capitalismo histórico por meio de suas instituições de poder e
acumulação de capital (empresas multinacionais, setor financeiro, instituições de
ciência e tecnologia, acordos internacionais de regulação da propriedade
intelectual). As nações centrais do capitalismo detêm o monopólio do conhecimento
produtivamente aplicável; é por meio da produção e reprodução no tempo e no
espaço desse monopólio que as nações centrais consolidam suas posições na
divisão internacional do trabalho no capitalismo mundial. De dentro, pela submissão
dos interesses mais amplos do povo brasileiro aos interesses particulares de uma
classe dominante (que também é uma raça dominante) material e ideologicamente
vinculada ao capital estrangeiro cujo traço fundamental é o recurso à
superexploração do trabalho. Também no âmbito interno, a dominação de classe e
de raça envolve o monopólio do conhecimento de modo geral e do conhecimento
produtivamente aplicável especificamente; é pela exclusão de uma classe/raça do
acesso ao conhecimento, que a divisão nacional do trabalho se produz e reproduz
ao longo do tempo.
Encontramos os fundamentos da superexploração do trabalho no país na estrutura
de longa duração que é a forma de inserção do Brasil no capitalismo mundial a partir
do século XVI: vasta natureza a ser conquistada e explorada por meio do trabalho
de seres humanos escravizados. Desde então, e ainda hoje, a superexploração do
trabalho no Brasil é de base racial e racista, uma vez que classe e raça no Brasil,
andam de mãos dadas.
O papel desempenhado pelas colônias americanas no processo de acumulação de
capital em escala mundial a partir do século XVI tornou não apenas desnecessário o
emprego intensivo de tecnologia na transformação da natureza pelo ser humano,
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mas também, e sobretudo, perigoso aos interesses da classe/raça dominante, cujo
poder político e material se baseava integralmente na exploração de mão de obra
escravizada e no comércio escravagista.
A escravidão como forma de superexploração do trabalho prolonga seus efeitos no
Brasil por meio do racismo estrutural, que coloca à disposição de uma classe, que
também é raça, os corpos de outra classe, que também é raça, para serem
superexplorados. Nesse contexto de superexploração do trabalho de uma
classe/raça por outra classe/raça, a dependência tecnológica representa a
convergência dos interesses internos – a superexploração de uma classe/raça por
outra – com os interesses externos – a perpetuação do papel periférico do Brasil no
sistema capitalista mundial – não muito mais do que um arrabalde de onde se pode
extrair recursos naturais e despejar produtos próximos da obsolescência, mas que
ainda podem gerar lucros em terras que nada produzem de sequer parecido.
A centralidade da raça nas relações de classe no Brasil, cujas formas gerais de
relacionamento se constituíram pela escravidão, colocaram o país em uma trajetória
de desenvolvimento baseado no uso intensivo da mão de obra. Isso não faz da
experiência brasileira um caso excepcional, pelo contrário: as nações da América
Latina e Caribe, África e Ásia compartilham o mesmo traço, comum a toda a periferia
do capitalismo. A persistência dessa trajetória ao longo de dois séculos por toda a
periferia do capitalismo foi, é e será viabilizada pela dependência tecnológica desta
em relação aos países do capitalismo central tecnologicamente dependentes.
Escapar a essa situação – feito raro, mas já empreendido com sucesso por algumas
poucas nações, entre elas Japão e União Soviética – passa necessariamente pela
busca da independência tecnológica
A independência tecnológica traz, em si, o potencial de reduzir a dependência
externa e abalar fortemente a estrutura de dominação classe-racial que vigora no
Brasil caso sua trajetória de desenvolvimento estiver voltada a solucionar os
problemas de superexploração do trabalho no país. Essa é uma façanha que não se
logra por acidente ou de modo não intencional; ela só se realiza por meio da decisão
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consciente de buscar a independência tecnológica com esse sentido social
específico.
A reversão de dependência tecnológica, portanto, é uma etapa central e inescapável
do processo maior de independência política e econômica, e de afirmação do país,
de fato, como uma “nação”. Independência tecnológica não significa desconexão
dos sistemas globais de tecnologia, mas não-subordinação aos países que detêm o
monopólio do conhecimento produtivamente aplicável no sistema capitalista mundial.
2. Tentativas (breves e incompletas, mas não vãs) de independência
tecnológica no Brasil
Em seus breves e incompletos ensaios de independência tecnológica (portanto, de
independência política e econômica), o Brasil se defrontou com a tecnologia
enquanto fator de poder e riqueza - de um país sobre outro, de uma classe/raça
sobre outra. Os momentos em que o país buscou colocar em prática uma política
tecnológica soberana (PTS) quase sempre foram momentos em que se procurou
formular e executar uma política externa soberana (PES). Não se trata de
coincidência: independência tecnológica nacional e independência política e
econômica nacional são faces da mesma moeda. Vou mais longe: sem política
externa independente, não há política tecnológica independente e vice-versa.
Identificar, sem mais, as tentativas de independência tecnológica à história da
construção das instituições e políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação nos
levaria a falsas conclusões, ou seja, a atribuição de intenções independentistas onde
só há reforço da dependência e a indistinção dos impulsos fundamentais que
orientaram umas e outras iniciativas. De fato, uma dimensão central da nossa
análise consiste em reconhecer que nem toda iniciativa de desenvolvimento
tecnológico e científico equivale a uma tentativa de independência tecnológica, o
que implica diferenciar as hoje chamadas Políticas de Ciência, Tecnologia e
Inovação da Política Tecnológica Soberana.
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O país tem oscilado entre dois vetores cujos efeitos um sobre o outro têm variado
imensamente ao longo do tempo. Esses vetores são o desenvolvimento tecnológico
com vistas a reforçar o status quo e, portanto, a inserção dependente do Brasil
enquanto nação periférica no sistema capitalista mundial. Incluem-se entre estas as
instituições e políticas públicas de tecnologia e ciência voltadas a aprofundar a
extroversão da produção agrária e de recursos minerais do país: a modernização
(conservadora) da produção agrária e da extração mineral que reproduz, em escala
industrial e segundo as técnicas mais modernas do capitalismo, a inserção
dependente do Brasil.
A avaliação dessas iniciativas está longe de ser fácil: o desenvolvimento tecnológico
e científico, ainda quando resultem em um primeiro momento no reforço da inserção
subordinada da nação na economia capitalista mundial, nem por isso deixam de
incorporar um potencial de desdobramentos futuros que podem contribuir
efetivamente para a independência tecnológica: consequência imprevista, mas em
algum grau desejável. Tudo dependerá do modo como a nação irá mobilizar os
elementos gerados por essa modernização conservadora, se de modo a
potencializar seus vetores que nos levam em direção à independência tecnológica
ou a reforçar o estado das coisas.
2.1. A Política Externa Independente de Jânio/Jango (1961-1964)
O problema do desenvolvimento tecnológico começa a se fazer presente na
dimensão discursiva da Política Externa Brasileira (PEB) durante a chamada Política
Externa Independente (PEI), de Jânio/Jango, mas não chega a alçar voos mais
ambiciosos como os que se veriam nos anos 1970 e na primeira década dos anos
2000. A preocupação com a tecnologia aparece na PEI como fator subordinado ao
tema mais geral do desenvolvimento econômico, em que as questões comerciais, o
papel das multinacionais nas economias internas dos países subdesenvolvidos e os
entraves colocados ao desenvolvimento pelos países ricos tinham maior
proeminência. No tocante às relações entre política externa e desenvolvimento
econômico e tecnológico, também se aplica a avaliação de Vizentini sobre a PEI:
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“seu fracasso deve ser relativizado (...) [a PEI] revelou-se muito mais precoce do que
equivocada, pois muitos de seus postulados foram retomados pela própria
diplomacia dos militares ao final da primeira metade dos anos 1970 com o chamado
‘pragmatismo responsável’” (Vizentini, 2008: 31).
Os anos de 1961-1964, portanto, são, pelo menos no que diz respeito à política
externa e à política de desenvolvimento econômico e tecnológico, um período de
maturação dos esforços por autonomia que vinham sendo desenvolvidos desde o
princípio da década de 1950 no segundo governo Vargas, esforços aos quais o
governo Kubitschek viria a dar impulso adicional. As continuidades e traços em
comum da PEB ao longo do período, conforme apontou Vizentini (2008: 14), e como
se pode depreender do processo de construção institucional e das políticas públicas
de desenvolvimento tecnológico apresentados acima, preponderaram. O projeto de
soberania na política externa e na política tecnológica foi colocado em compasso de
espera entre 1964, mas seria retomado com força pelos governos militares a partir
de 1967.
2.2. A Diplomacia da Prosperidade de Costa e Silva (1967-1969)
A diplomacia da prosperidade (1967-1969), portanto, no governo Costa e Silva,
representou, segundo Vizentini, “uma ruptura profunda com o governo anterior (...)
como política externa voltada para a autonomia e o desenvolvimento, assemelhava-
se muito à PEI” (2008: 45). A importância atribuída ao desenvolvimento tecnológico
na dimensão discursiva foi acompanhada por um importante conjunto de ações
diplomáticas voltadas a dar materialidade à política externa autonomista. A
diplomacia da prosperidade configurou o que seria o projeto de desenvolvimento
tecnológico mais ambicioso e sensível nos governos seguintes: o avanço do
programa nuclear brasileiro e sua dualização para a energia nuclear de uso civil,
sempre sob a liderança da Marinha do Brasil. Foram celebrados cinco acordos de
cooperação na área nuclear, com Israel e Argentina em 1967, com Espanha e Índia
em 1969 e o mais relevante de todos, a assinatura com a República Federal da
Alemanha do Acordo de Cooperação em ciência e tecnologia em 1969, que abriria
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caminho para a cooperação na área nuclear. Ainda no campo da diplomacia nuclear,
a recusa do Brasil em assinar o Tratado de Não-Proliferação Nuclear em 1968 – por
“injusto e discriminatório” - dá a exata medida das pretensões de autonomia e da
ambição de autonomia tecnológica que começavam a se desenhar naqueles anos e
que seria aprofundado na década seguinte pelos governos Médici e Geisel – note-se
que, um ano antes, o Brasil foi signatário do Tratado de Tlatelolco para a Proscrição
de Armas Nucleares na América Latina e Caribe.
No plano doméstico, a política tecnológica é igualmente ambiciosa e efetiva. Quinze
dias antes de Costa e Silva assumir o poder, foi aprovado o decreto-lei de criação da
Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA). Nesse ano o CNPq
elaboraria o primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e
daria início ao Plano Quinquenal 1968-1972. O Plano Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico havia sido proposto no Plano Estratégico de
Desenvolvimento 1968-1970 e representou a primeira política sistemática para a
área de CTI no Brasil. O Plano Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico tinha como prioridades a formação de recursos humanos em nível de
graduação e pós-graduação e a ampliação da infraestrutura de pesquisa do país.
Além disso, elegeu as áreas prioritárias para investimentos em CTI no Brasil: