Top Banner
0 SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES INTEGRADAS SÃO PEDRO UNIDADE DE CONHECIMENTO DE CIÊNCIAS MÉDICAS E SAÚDE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA REGIANE KIEPER DO NASCIMENTO EDUCAÇÃO: INSTRUMENTO DE REINSERÇÃO SOCIAL PARA OS PRIVADOS DE LIBERDADE VITÓRIA, 2011
52

SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

Dec 09, 2018

Download

Documents

truongcong
Welcome message from author
This document is posted to help you gain knowledge. Please leave a comment to let me know what you think about it! Share it to your friends and learn new things together.
Transcript
Page 1: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

0

SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES INTEGRADAS SÃO PEDRO

UNIDADE DE CONHECIMENTO DE CIÊNCIAS MÉDICAS E SAÚDE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

REGIANE KIEPER DO NASCIMENTO

EDUCAÇÃO: INSTRUMENTO DE REINSERÇÃO SOCIAL

PARA OS PRIVADOS DE LIBERDADE

VITÓRIA, 2011

Page 2: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

1

REGIANE KIEPER DO NASCIMENTO

EDUCAÇÃO: INSTRUMENTO DE REINSERÇÃO SOCIAL PARA OS PRIVADOS DE LIBERDADE

Trabalho de Conclusão de Curso

de Graduação em Psicologia

apresentado às Faculdades

Integradas São Pedro, como

requisito parcial para obtenção do

título de Psicólogo, sob orientação

da professora: MS. Andréia da

Silva Ferreira.

VITÓRIA, 2011

Page 3: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

2

REGIANE KIEPER DO NASCIMENTO

EDUCAÇÃO: INSTRUMENTOS DE REINSERÇÃO SOCIAL PARA OS PRIVADOS DE LIBERDADE.

BANCA EXAMINADORA MS. Andréia da Silva Ferreira Orientadora MS. Mônica Trindade – AEV/FAESA MS. Maria do Rosário Camacho– AEV/FAESA

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado

em ____ / ____/ ____.

Page 4: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

3

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, pelo amor incondicional e pelo sustento, me possibilitou traçar

objetivos e me fortaleceu para alcança-los;

Aos sujeitos da intervenção, alunos privados de liberdade, que compartilharam sua

experiências, emoções e informações importantíssima para produção e conclusão

desse trabalho, possibilitando meu crescimento profissional;

A Dr. Ângelo Roncalli de Ramos Barros e Quésia da Cunha com os quais aprendi

tudo sobre tratamento penal humanizado e ampliar minha crença na mudança do ser

humano;

À minha orientadora, mestre Andréia da Silva Ferreira, que sempre esteve me

inspirando com seu amor à Educação, a você todo meu carinho e respeito;

À minha banca: Maria do Rosário e Monica Trindade, professoras que foram

importantes para o meu processo de aprendizagem profissional;

Às minhas grandes amigas e futura psicólogas: Josinês Loiola e Lorena Gomes,

com quem dividi alegrias e tristezas, frustrações e vitórias durante o estágio.

Por fim, agradeço à minha família, pela paciência e compreensão com minha

ausência durante o período de graduação e elaboração deste: minha filha amada

Amanda e meu esposo Adair, pelo apoio e escuta permanente; a minha mãe e irmã

que completam minha vida.

Page 5: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

4

“ A EDUCAÇÃO SOZINHA NÃO TRANSFORMA

A SOCIEDADE, SEM ELA TÃO POUCO A

SOCIEDADE MUDA”.

Paulo Freire.

Page 6: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

5

RESUMO

O presente trabalho relata a experiência no ambiente escolar do sistema prisional capixaba, no período de agosto/2010 a maio/2011, como experiência prática desenvolvida no Estágio supervisionado da Ênfase em Educação do Curso de Psicologia da FAESA. O trabalho tem por objetivo delinear o cenário da educação dentro do ambiente carcerário capixaba, tratado como instrumento de reinserção social que a educação desempenha na política da Execução Penal. A partir da coleta de dados em fontes oficiais e bibliográficas, foi proposta uma intervenção em Psicologia com um grupo de 20 alunos matriculados na modalidade de Educação para Jovens e Adultos (EJA), participantes de cursos de qualificação profissional; e em três grupos de mulheres selecionadas para serem matriculadas no programa educacional da unidade. O trabalho teve como instrumento de intervenção entrevistas e questionários, seguidas de trabalho em grupo, projeção e discussão de filmes. Em análise de dados estatísticos foi possível constatar que a grau de escolaridade da população privada de liberdade no Brasil é baixa, assinalada pela interrupção ainda no ensino fundamental e incipiente profissionalização.Essa realidade não é diferente no Espírito Santo. Os sujeitos desse trabalho, em sua maioria, são jovens e tiveram pouco mais de cinco anos de estudos e permanecem em média seis anos presos. As intervenções, em grupo, objetivaram oportunizar aos presos/alunos momentos de discussões e reflexões sobre o papel da educação em sua vida e na sociedade, educação e profissionalização como instrumento de reinserção social após o cumprimento da pena, sempre na perspectiva de que o sujeito encarcerado são agentes efetivos no processo de reintegração. O trabalho aponta para a necessidade de implementar uma política educacional na prisão que possa ampliar a capacidade critica do apenado e servir como instrumento que irá auxiliar na reconstrução de um futuro longe do crime após o cumprimento da pena. Neste contexto, a Psicologia tem papel fundamental e um grande desafio ao trabalhar com sentimentos, sonhos, miséria social, abandono, dentre outras especificidades do ambiente carcerário. Os resultados do trabalho indicam que é possível promover reinserção social através da educação formal e qualificação profissional em sujeitos privados de liberdade, embora saibamos que é um assunto que precisa ser muito discutido e melhorado não apenas pelos profissionais que estão dentro das penitenciárias, mas pelo mundo acadêmico e pelos operadores do direito. Palavras chaves: Sistema Prisional – Educação – Intervenção em Psicologia

Page 7: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

6

LISTA DE SIGLAS CFP - Conselho Federal de Psicologia.

CNJ – Conselho Nacional de Justiça.

CTC - Comissão Técnica de Classificação.

DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional.

DIRESP – Diretoria de Ressocialização do Sistema Penal.

DPJ – Departamento de Policia Judiciária.

EJA – Educação de Jovens e Adultos.

FIC – Formação Inicial Continuada.

INFOPEN – Informações Penitenciárias.

LEP – Lei de Execução Penal.

MEC – Ministério da Educação e Cultura.

ONU - Organização das Nações Unidas.

PROEJA – programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a

Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos.

PNE – Plano Nacional de Educação.

SEDU – Secretaria de Educação.

SEJUS - Secretaria de Estado da Justiça.

UNECO – Organização das Nações Unidas para Educação e ciência e a Cultura.

IFES – Instituto Federal do Espirito Santo.

SENAC – Serviço Nacional do Comércio.

SENAI – Serviço Nacional da Industria.

SESI - Serviço Social da Industria.

SETEC - Secretaria de Educação Profissional e tecnologia.

FEBEM – Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor.

Page 8: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

7

LISTA DE GRAFICOS.

GRÁFICO 1 - CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO PRISIONAL DO ES ...........................20

GRÁFICO 2 - FAIXA ETÁRIA DA POPULAÇÃO ENCARCERADA DO ES.....................22

GRÁFICO 3 - CRIMES COMETIDOS PELOS HOMENS ...............................................22

GRÁFICO 4 - CRIMES COMETIDOS PELAS MULHERES............................................23

GRÁFICO 5 - TEMPO DE PENA A CUMPRIR DOS SENTENCIADOS DO ES................23

GRÁFICO 6 – GRAU DE ESCOLARIDADE DA POPULAÇÃO ENCARCERADA DO ES..24

GRÁFICO 7 - EVOLUÇÃO DO Nº DE MATRICULA DO PROGRAMA EDUCACIONAL...36

Page 9: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

8

LISTA DE TABELAS.

TABELA 1 – ATIVIDADES DESENVOLVIDAS NA PRIMEIRA ESTAPA DO TRABALHO..32

TABELA 2 – ATIVIDADES DESENVOLVIDAS NA SEGUNDA ESTAPA DO TRABALHO..32

TABELA 3 – ATIVIDADES NO PRESIDIO MASCULINO.....................................................33

TABELA 4 – QUANTITATIVO DE ALUNO DO PROGRAMA EDUCACIONAL..................35

TABELA 5 – NUMERO DE MULHERES ESTUDANDO NOS ANOS DE 2010 E 2011......39

Page 10: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

9

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.....................................................................................10

1.1 EDUCAÇÃO NAS PRISÕES................................................................................14

1.1.1 Um direito Negado por Décadas...................................................................... 14

1.1.2 Educação Profissionalizante nos Presídios..................................................... 18

1.2 DADOS DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA CAPIXABA...................................... 21

1.3 O PAPEL DA PSICOLOGIA E A INTERVENÇÃO DO PSICOLOGO NAS

PRISÕES................................................................................................................. 26

2. OBJETIVOS...........................................................................................................29

2.1 OBJETIVO GERAL .............................................................................................29

2.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS............................................................................... 29

3. METODOLOGIA................................................................................................... 30

3.1 CONTEXTO........................................................................................................ 31

3.2 SUJEITOS.......................................................................................................... 32

3.3 PROCEDIMENTOS............................................................................................ 32

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO.............................................................................35

4.1 ENTENDENDO A EDUCAÇÃO NOS PRESÍDIOS CAPIXABAS .......................35

4.2 AMPLIAÇÃO DA OFERTA EDUCACIONAL E DA PERSPECTIVA DE FUTURO

PARA AS MULHERES PRIVADAS DE LIBERDADE............................................... 39

4.3 REGIME SEMIABERTO: UM PASSO PARA O RETORNO À SOCIEDADE......42

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 47

6. REFERENCIAS.................................................................................................... 49

ANEXOS................................................................................................................... 51

Page 11: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

10

1. INTRODUÇÃO

Faz parte do processo de graduação de Psicologia a escolha de uma ênfase

curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia da FAESA, a

ênfase em educação traz como ementa, o diagnóstico das necessidades,

planejamento e realização de procedimentos que envolvam o processo de educação

e de ensino-aprendizagem através do desenvolvimento de conhecimento,

habilidades, atitudes e valores de indivíduos e grupos em distintos contextos

institucionais em que tais necessidades sejam detectadas. A partir da escolha desta

ênfase, o presente trabalho tem como foco central de investigação do papel que a

educação/profissionalização cumpre na vida do sujeito preso, buscando delinear,

avaliar e compreender as relações entre educação e inserção social.

Não se pode negar o colapso da segurança pública no país, demonstrado pelos

crescentes índices de violência. A violência trata-se de um fenômeno tão complicado

e preocupante, que vem se infiltrando na vida contemporânea e diante da qual não

pode haver neutralidade.

Minayo (1998) diz que a violência é um termo complexo, controverso e polissêmico.

Não há como escapar da violência, ela se faz presente a qualquer hora e em

qualquer lugar, seja nos espaços públicos ou privados. A violência traz uma relação

desigual, onde um tenta dominar, agredir física ou emocionalmente, ou ainda se

omite de seu papel em relação ao outro. É fácil encontrarmos pessoas que

defendem a teoria de que a favela e a periferia são grandes produtores de violência.

[...] Essa corrente despreza os componentes microestruturais da subjetividade na escolha dos possíveis sociais. A lógica estrutural-funcionalista, que sustenta o modelo, supõe uma sociedade homogênea e estável com normas, padrões e valores dados, eternos, esquecendo a natureza sócio-histórica e a de mudanças exercesse uma força de atração sobre os atores sociais, arrastando-os para condutas criminosas e violentas. Migração interna, favelização, condições precárias de vida, desemprego, acesso reduzido à escolaridade seriam geradores de comportamentos desviantes. Ao reduzir violência a crime e delinqüência, e ao encarar como "criminosa potencial" a população imigrante e pobre das classes trabalhadoras, os seguidores da corrente que enxerga a transição como portadora de violência não levam em conta a violência estrutural, a violência do Estado e a cultural, que quase sempre aparecem naturalizadas. (MINAYO, 1998, p.518)

Page 12: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

11

Nesse contexto vale ressaltar que a violência não pode ser considerada de maneira

simplista e não basta responsabilizar setores exclusivos, nem se basear em critérios

tradicionais que se contentam em criminalizar a pobreza, atribuir a violência ao

usuário de drogas ilícitas, responsabilizando o tráfico de armas e de drogas.

O que não podemos negar que um dos resultados de toda essa violência está

refletido no sistema prisional, onde está grande parte daqueles que de alguma forma

foram causadores de algum tipo de violência contra a sociedade. E é nesse espaço,

de privação de liberdade, que o Estado tem a missão de cumprir a sentença dada

pelo juiz, ou seja, manter o sujeito preso sem que esse fuja e realizar o tratamento

penal garantindo a reinserção social do apenado após cumprimento da pena,

obedecendo assim o que preceitua a Lei de Execução Penal (LEP) nº 7210/84, em

seu artigo 1: “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença

ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do

condenado e do internado”.

Essa missão não é simples de ser executada, até porque, está no senso comum a

idéia de que os homens e mulheres encarcerados estão pagando pelo mal que

cometeram à sociedade, por isso, precisam passar por períodos de sofrimentos.

Impera neste contexto o sentimento de vingança e para isso os presídios precisam

parecer com um inferno. É necessário anular o sujeito temporariamente, forçando-o

a refletir sobre o ato praticado, reconhecendo-o como errado, para então voltar à

“sociedade”.

Assim o sistema prisional apresenta um paradoxo. Espera-se que os presídios

transformem os corpos transgressores em corpos dóceis em meio a um grande

sofrimento. Sobre o assunto Foucault diz:

O momento histórico das disciplinas é o momento em que nasce uma arte do corpo humano, que visa não unicamente o aumento das suas habilidades, mas a formação de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais obediente quanto mais útil é. Forma-se então, uma política de coerções que consiste num trabalho sobre o corpo, numa manipulação calculada dos seus elementos, dos seus gestos, dos seus comportamentos. O corpo humano entra numa maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe. A disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, os chamados "corpos dóceis". A disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui essas mesmas forças ela dissocia o poder do corpo faz dele por um lado uma "aptidão",

Page 13: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

12

uma "capacidade" que ela procura aumentar; e inverte por outro lado a energia, a potencia que poderia resultar disso, e faz dela uma relação de

sujeição estrita. (FOUCAULT, 2008, p. 119)

Com essa visão de aprisionamento, nos deparamos com unidades prisionais com

pouca ou sem nenhuma estrutura para realização de um tratamento penal digno,

conforme prescreve a lei, que proporcione efetivas condições ao preso para o não

retorno ao crime. De acordo com Foucault (2008), a prisão não dispõe de meios

para recuperar o sujeito não havendo nenhuma garantia de alcance dos objetivos:

[ ]...a idéia de uma reclusão penal é explicitamente criticada por muitos reformadores. Porque é incapaz de responder à especificidade dos crimes. Porque é desprovida de efeitos sobre o público. Porque é inútil à sociedade, até nociva e cara. Mantém os condenados na ociosidade, multiplica-lhe os vícios... [ ] (FOUCAULT, 2008, p. 95).

Essa problemática nos traz o desafio de encarar e repensar nossa atual situação

com a população carcerária brasileira, hoje ultrapassando mais 470.000

(quatrocentos e setenta mil) indivíduos privados de liberdade, segundo dados do

INFOPEN1, em quadro de superlotação e carentes de mecanismos que promovam a

reinserção na sociedade. O Conselho Nacional de Justiça- CNJ- (set/2010) divulgou

que o Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, o pais só fica atrás

dos Estados Unidos, que têm mais de 2 milhões e da China, com mais de 1 milhão e

meio de encarcerados

Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional - DEPEN – a população

privada de liberdade brasileira, em sua maioria são jovens entre 18 a 30 anos,

sujeitos economicamente produtivos, 94% são do sexo masculino e com uma baixa

escolaridade. Os presos estão distribuídos em 1857 estabelecimentos penais

Brasileiros. O déficit atual é de 164.185 vagas nas penitenciárias brasileiras. A

superlotação dificulta um tratamento penal digno e as atividades educacionais e

laborativas ficam comprometidas. O processo de marginalização é agravado

gradativamente no período da execução da pena, quando apresenta uma relação de

exclusão entre a prisão e a sociedade.

1 O INFOPEN é um programa de computador (software) de coleta de Dados do Sistema Penitenciário no Brasil,

para a integração dos órgãos de administração penitenciária de todo Brasil, possibilitando a criação dos bancos de dados federal e estaduais sobre os estabelecimentos penais e populações penitenciárias. É um mecanismo de comunicação entre os órgãos de administração penitenciária, criando “pontes estratégicas” para os órgãos da execução penal, possibilitando a execução de ações articuladas dos agentes na proposição de políticas públicas. (DEPEN, 2011)

Page 14: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

13

A Lei de Execução Penal (LEP) em seu artigo 10 e 11 garante que:

“A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso. A assistência será: I - material; II - à saúde; III -jurídica; IV - educacional; V - social; VI - religiosa.”

De acordo com o artigo, podemos perceber uma dupla intenção da execução penal:

responsabilizar o Estado por efetivar a decisão judicial, além de dar ao preso,

condições reais para que ao retornar à sociedade, possa ter uma vida digna e não

volte a cometer crimes.

Sozinha, a pena não consegue reintegrar o indivíduo preso. É necessária a inserção

de outros meios, como a participação da própria família para que se consiga

caminhar para resultados mais favoráveis a essa reintegração do preso à sociedade.

É preciso ainda, ações que auxiliem em suas escolhas após o cumprimento da

pena, em sua educação e em sua capacitação profissional.

Acreditamos que entre tantas ações, com educação e qualificação profissional,

podemos resgatar a auto-estima, o respeito à lei, a promoção do desenvolvimento

humano, o valor da cidadania; o respeito mútuo e os fortalecimentos dos vínculos

familiares, proporcionando aos privados de liberdade uma estrutura sólida para o

momento da volta ao convívio familiar, após o cumprimento da sentença judicial.

Sendo assim, a educação em suas variadas formas possibilita maiores chances de

inclusão no mundo do trabalho, uma auto-referência para resignificar a vida do

sujeito privado de liberdade e ampliar suas escolhas.

Page 15: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

14

1.1. EDUCAÇÃO NAS PRISÕES

1.1.1. Um Direito Negado por Décadas

Após ser condenado, o preso perde direitos fundamentais: o direito de liberdade e os

direitos políticos. Todos os demais direitos da vida civil permanecem garantidos aos

sentenciados: direito à vida, integridade física e moral, liberdade de consciência e de

convicção religiosa, instrução e à cultura, dentre outros. A Lei de Execução Penal Nº

7210/84 (LEP) ainda destaca vários direitos do preso em seu art. 41.

Art. 41 - Constituem direitos do preso: I - alimentação suficiente e vestuário; II - atribuição de trabalho e sua remuneração; III - previdência social; IV - constituição de pecúlio; V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado; X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI - chamamento nominal; XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes.

A LEP ainda garante em sua seção V, do art. 17 aos 21, a assistência educacional:

Art. 17. A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado. Art. 18. O ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da Unidade Federativa. Art. 19. O ensino profissional será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico. Parágrafo único. A mulher condenada terá ensino profissional adequado à sua condição. Art. 20. As atividades educacionais podem ser objeto de convênio com entidades públicas ou particulares, que instalem escolas ou ofereçam cursos especializados. Art. 21. Em atendimento às condições locais, dotar-se-á cada estabelecimento de uma biblioteca, para uso de todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e didáticos

Page 16: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

15

A Constituição Federal anuncia em seu art. 205 que a “educação, direito de todos e

dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da

sociedade, visando pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício

da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. As pessoas privadas de liberdade,

assim como qualquer outro ser humano, têm o direito à educação.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos reconhece o direito humano à

educação em seu art. 26, e estabelece que o objetivo da educação é o pleno

desenvolvimento da pessoa humana.

Toda pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, ao menos no concernente à instrução elementar e fundamental. A instrução fundamental será obrigatória. A instrução técnica e profissional deverá ser generalizada; o acesso ao Ensino Superior será igual para todos (as), em função dos méritos respectivos. A educação terá por objeto o pleno desenvolvimento da personalidade humana e o fortalecimento do respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais; favorecerá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos étnicos ou religiosos; e promoverá o desenvolvimento. (Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948)

Em esfera internacional, foram estabelecidas, no 1º Congresso das Nações Unidas

sobre Prevenção do Crime e Tratamento de Delinqüentes, realizado em Genebra,

em 1955, as regras mínimas para o tratamento dos presos:

Regra n.º 77.1: Serão tomadas medidas para melhorar a educação de todos os presos em condições de aproveitá-la, incluindo instrução religiosa nos países em que isso for possível. A educação de analfabetos e presos jovens será obrigatória, prestando-lhe a administração especial atenção.

O Conselho Econômico e Social das Organizações das Nações Unidas (ONU)

aprovou em maio de 1990 a resolução 1990/24 que trata da educação em espaços

de privação de liberdade. Em meio às indicações mais importantes dos documentos

para os Estados Membros, destacam-se: oferta de variados tipos de educação que

colaborem para a prevenção do crime, a reintegração social dos reclusos e a

diminuição da reincidência; que as políticas de educação em espaços de privação

de liberdade norteiem-se no desenvolvimento de toda a pessoa, levando em

consideração a história de vida do sujeito; que todos os privados de liberdade

tenham o direito à educação, sendo incluídos em programas de alfabetização,

educação básica, formação profissional, atividades recreativas, religiosas, culturais,

Page 17: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

16

educação física e desporto, educação social, ensino superior e serviços de

biblioteca. A partir daí, a educação deve atuar como um elemento fundamental do

sistema penitenciário, não devendo existir empecilhos aos internos para que

participem de programas educacionais.

A educação de pessoas presas integra a chamada educação de jovens e adultos

(EJA), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN, 1996), que define

a educação de jovens e adultos voltada para as pessoas “que não tiveram acesso

ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na própria idade” (art.

37).

O Plano Nacional de Educação (PNE), lei aprovada pelo congresso em 2001,

estabelece que até 2011, o Brasil deve implantar em todas as unidades prisionais e

nos estabelecimento que atendem adolescentes e jovens infratores, programas de

educação de jovens e adultos, de nível fundamental e médio, assim como formação

profissional, contemplando para esta clientela, as metas nº 4, nº 5 e nº 14.

Meta 4. Estabelecer programa nacional, para assegurar que as escolas públicas de ensino fundamental e médio localizadas em áreas caracterizadas por analfabetismo e baixa escolaridade ofereçam programas de alfabetização e de ensino e exames para jovens e adultos, de acordo com as diretrizes curriculares nacionais.

Meta 5: Estabelecer programa nacional de fornecimento, pelo Ministério da Educação, de material didático-pedagógico, adequado à clientela, para os cursos em nível de ensino fundamental para jovens e adultos de forma a incentivar a generalização das iniciativas mencionadas na meta anterior. Meta 14. Expandir a oferta de programas de educação a distância na modalidade de educação de jovens e adultos, incentivando seu aproveitamento nos cursos presenciais. (Brasil, 2001, p.14)

Em setembro de 2005, foi assinado entre o Ministério da Educação e Ministério da

Justiça, o protocolo de intenções onde ambos os Ministérios se comprometeram em

promover e acompanhar as ações educativas realizadas no sistema penitenciário

em regime de colaboração com as Secretarias de Educação e de Justiça e/ou

Administração Penitenciária dos Estados. A partir dessa iniciativa, vários estados

começaram a discutir a educação prisional para fornecer subsídios para a atuação

da União, dos Estados e da Sociedade Civil, com vistas à formulação, execução e

monitoramento de políticas públicas para a Educação nas Prisões.

Page 18: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

17

Após vários debates regionais, em julho de 2006, em Brasília, foi realizado o “I

Seminário Nacional pela Educação nas Prisões” como singular demonstração dos

esforços que os Ministérios da Educação e da Justiça, e a Representação das

Organizações das Nações Unidas para Educação e Ciência e a Cultura (UNESCO),

têm empenhado no sentido de criar condições e possibilidades para o enfrentamento

dos graves problemas que perpassam a inclusão social de apenados e egressos do

sistema penitenciário. O Seminário Nacional propôs três grandes “eixos” para

nortear os trabalhos educacionais nas prisões: 1) Gestão, Articulação e Mobilização,

2) Formação e Valorização dos Profissionais Envolvidos na Oferta; 3) Aspectos

Pedagógicos.

Em 11 de março de 2009, o Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e

Penitenciária, no uso de suas atribuições legais, previstas no Art. 64, I, Lei nº

7.210/84, bem como no art. 39, I e II, do Anexo I do Decreto nº 6.061, de 15 de

março de 2007, Decreta a Resolução nº 3, a qual dispõe sobre as Diretrizes

Nacionais para a oferta de Educação nos estabelecimentos penais.

O mais novo documento que trata de educação nas prisões é a resolução nº 2, de

19 de maio de 2010, do Conselho Nacional de Educação, a qual “dispõe sobre as

diretrizes nacionais para a oferta de educação para jovens e adultos em situação de

privação de liberdade nos estabelecimentos penais” (publicada no D.O.U em 19 de

maio de 2010 - RESOLUÇÃO CNE/CEB 2/2010). Este documento simboliza um

avanço para o tema educação nas prisões, pois norteia a construção de políticas

estaduais de educação no sistema prisional.

Está comprovado que a garantia do direito à educação nas prisões é condição

indispensável para atingir o objetivo internacionalmente reconhecido, que é a

educação para todos. Em todo o Brasil, são milhares as pessoas que estão

encarceradas nos estabelecimentos penitenciários e entre essa população, uma

importante parcela é formada por analfabetos ou apenas alfabetizados, pessoas que

têm problemas com leitura, escrita e cálculos, cuja formação profissional é nula, e

pouco qualificada.

Page 19: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

18

Embora tenhamos um arcabouço de leis e resoluções que garantem a educação nos

espaços de privação de liberdade, que defende a educação como principal

instrumento para a reinserção social, não podemos deixar de ressaltar certa

restrição às oportunidades educacionais nos presídios. Menos de 20% dos presos

estão inseridos em atividades educacionais nos presídios brasileiros. Muitos estados

avançaram no reconhecimento do direito à educação dos presos, porém possuem

estruturas físicas arcaicas, não havendo espaços para a oferta de educação para

aqueles que abandaram seus estudos antes da prisão. Historicamente, a educação

prisional tem sido desenvolvida a partir de práticas pouco sistematizadas, que em

geral, dependem da iniciativa de cada direção de estabelecimento prisional, embora

sejam várias as leis e resoluções que garantem a educação nos espaços de

privação de liberdade.

1.1.2. Educação Profissionalizante nos Presídios

Como já apresentamos anteriormente, a massa carcerária deriva das camadas mais

pobres da sociedade, com baixa escolaridade e desqualificada para o mercado de

trabalho, cada vez mais exigente. Tais fatores resultam em exclusão do processo

produtivo e para agravar, a grande maioria da população das prisões é usuária de

drogas ilícitas, o que a torna mais vulnerável ao tráfico de drogas e às ações da

polícia. Sendo assim, está posto o desafio de encarcerar esse sujeito por um

determinado período e depois retornar-lo para a sociedade, “transformado” em um

cidadão. O desafio é: como efetivar políticas que dêem conta de tal demanda?

O preso ao sair do sistema prisional, após cumprimento da penas, carrega uma

grande angústia e ansiedade, pois se sente fragilizado frente a esse “novo mundo”,

pois passa a carregar o estigma de “ex-presidiário”. Essa situação é mais agravante

quando o preso já entrou para a prisão, com baixa escolaridade e sem uma

profissão. Ao ser posto em liberdade, toda a dificuldade de “encontrar um lugar no

mundo” dificulta o direito ao exercício da cidadania. São muitas as dificuldades dos

egressos em integrar-se ao convívio social, ao mercado de trabalho e

conseqüentemente, às atividades que contribuem para mantê-lo ajustado à

Page 20: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

19

sociedade, a qual o excluiu anteriormente com seus sistemas selecionadores e

punitivos.

A profissionalização, quando vinculada às atividades educacionais, adquire caráter

estruturante, aumentando as chances de empregabilidade do egresso e sua

conseqüente reintegração social. Sobre qualificação profissional, a LEP diz em seu

Art.17: ” A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação

profissional do preso e do internado; e no Art. 19:”O ensino profissional será

ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico”. A lei preceitua a

qualificação profissional para os presos visando a melhorar as condições para

empregabilidade do sujeito após cumprimento da pena.

Porém, se encontramos dificuldades em garantir a educação formal de um modo

mais amplo, o que dizer das dificuldades para efetivar a qualificação profissional

dentro dos presídios? Para qualificação profissional faz-se necessário maiores

espaços, uma maior segurança, pois os materiais para aulas práticas geralmente

são ferramentas que colocam em risco a segurança; uma seleção dos profissionais

que leve em conta a aptidão do sujeito para aquele curso; estudo das profissões que

o mercado de trabalho está absorvendo; dentre outros diversos obstáculos que

devem ser superados para que a qualificação profissional realmente resignifique o

ser/estar preso.

Atualmente nas prisões capixaba, há duas experiências de qualificação profissional

para os presos. A primeira são cursos de qualificação profissional ministrados por

diversas instituições especializadas no assunto (tais como, IFES, SENAI, SESI e

SENAC), onde os alunos fazem cursos com carga horária de 160 h

aproximadamente e recebem certificados como se estivessem cursado na sede da

instituição, ou seja, não há registro que o aluno tenha se qualificado dentro de uma

unidade prisional. Tal procedimento visa não estigmatizar o sujeito após sua

liberdade, pois ele pode apresentar seu certificado como se estivesse feito nas

dependências das instituições acima citadas. Os cursos ministrados são

basicamente na área da construção civil, uma vez que esta mão de obra no Estado

está escassa. Facilitando assim, a inserção do preso ou egresso no mercado de

trabalho.

Page 21: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

20

A segunda experiência trata-se de uma política do Governo Federal chamada

PROEJA2 FIC APENADO, na qual o Ministério da Educação, por intermédio da

Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC/MEC), acolhe propostas

para implantação de cursos no âmbito do Programa Nacional de Integração da

Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de

Jovens e Adultos, na formação inicial e continuada, integrada com o ensino

fundamental. O projeto teve a parceria da Secretaria de Educação Estadual (SEDU)

e o Instituto Federal do Espírito Santo (IFES). O objetivo do PROEJA-FIC APENADO

era que, em um ano, o aluno concluísse o ensino fundamental e fosse qualificado

em quatro profissões (Pintor, Gesseiro, Bombeiro Hidráulico e Eletricista). O projeto

esteve presente em cinco unidades prisionais no estado do Espírito Santo (duas em

Viana, uma em Colatina, uma em Linhares e outra em Cachoeiro de Itapemirim). Em

cada presídio iniciou-se uma turma com vinte e cinco alunos. O projeto teve duração

de 12 meses e encerrou no mês de maio/2010.

O projeto iniciou com 125 alunos, desses, 90 foram certificados. Os motivos da

evasão foram: alvará de soltura, benefício para o semi aberto obrigando os alunos

serem transferidos para um presídio de regime semi aberto, menos de 5% foi por

motivo de desistência ou por motivo de segurança. Com o final do projeto, a SEJUS

aguarda novo convênio para ampliação do PROEJA.

Na prisão, a educação formal quando vinculada a profissionalização, adquire caráter

estruturante, aumentando as chances de empregabilidade do detento e sua

2 O PROEJA pretende contribuir para a superação do quadro da educação brasileira explicitado pelos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) divulgados em 2003. A pesquisa revelou que 68 milhões de Jovens e Adultos trabalhadores brasileiros com 15 anos e mais não concluíram o ensino fundamental e, apenas 6 milhões (8,8%) estão matriculados em EJA. A partir desses dados e tendo em vista a urgência de ações para ampliação das vagas no sistema público de ensino ao sujeito jovem e adulto, o Governo Federal instituiu em 2005, no âmbito federal, o primeiro Decreto do PROEJA nº 5.478, de 24 de junho de 2005, em seguida substituído pelo Decreto nº 5.840, de 13 de julho de 2006, que introduz novas diretrizes que ampliam a abrangência do primeiro com a inclusão da oferta de cursos PROEJA para o público do ensino fundamental da EJA. A partir deste contexto, o PROEJA tem como perspectiva a proposta de integração da educação profissional à educação básica buscando a superação da dualidade trabalho manual e intelectual, assumindo o trabalho na sua perspectiva criadora e não alienante. Isto impõe a construção de respostas para diversos desafios, tais como: o da formação do profissional, da organização curricular integrada, da utilização de metodologias e mecanismos de assistência que favoreçam a permanência e a aprendizagem do estudante, da falta de infra-estrutura para oferta dos cursos dentre outros. (Fonte: MEC )

Page 22: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

21

conseqüente reintegração social. Foucault, (2008, p.224) diz: “A educação do

detento é, por parte do poder público, ao mesmo tempo uma preocupação

indispensável no interesse da sociedade e uma obrigação por parte do detento”.

Nesse processo, o indivíduo aprende a auto gerenciar-se, refletir e verbalizar de

forma mais intelectualizada e menos alienada, contribuindo para o seu

desenvolvimento integral. Essa aprendizagem possibilita ao individuo perceber

novas relações e novas escolhas de vida, bem como resignificar as experiências

anteriores. O processo educacional resulta em novas atitudes, com impacto positivo

nos campos emocionais, cognitivos e neurológicos, pela nova forma de ver o mundo

como parte dele.

1.2 - DADOS DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA CAPIXABA.

O Brasil, embora tenha demonstrado uma pequena melhora quanto à desigualdade

social e a pobreza, continua sofrendo pressões sociais internas e externas. A

existência de bolsões de pobreza e os altos índices de desigualdades sociais,

chamam a atenção para o agravamento da violência urbana e o aumento de prisões.

Encontramos o reflexo desse contexto no sistema prisional capixaba, o qual abriga

uma população de mais de onze mil presos, conforme dados da SEJUS indicados

no gráfico 1.

Gráfico 1 - CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO PRISIONAL DO ES- Fonte: INFOPEN/SEJUS - MAIO/2011

304 316 389 481 637 752 910 1.126

3778 4182 4706 45875214 5702

745510.255

40824688

5095 50865851 6454

8365

11.381

2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Total

Homem

Mulher

Page 23: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

22

Em conformidade com a realidade nacional, o problema da criminalidade no Estado

do Espírito Santo tem crescido assustadoramente. Em 2003 o Sistema Prisional

Capixaba abrigava pouco mais de quatro mil presos. Em 2007, quatro anos depois,

essa população tinha sido crescido de mais de mil apenados. Nos últimos três anos

a população encarcerada cresceu demasiadamente. Atualmente temos mais de

onze mil presos.

Para analisar o crescimento da população carcerária no Espírito Santo é necessário

estudar vários fatores: o próprio crescimento populacional do estado; o crescimento

econômico que, por vez, aumenta a desigualdade social; aumento do consumo de

drogas; a transferência dos presos, que estavam em Delegacias de Policia Judiciária

(DPJ), consequência da estruturação física do sistema prisional capixaba, que

possibilitou aumento do número de vagas nos presídios. Enfim, vários são os fatores

que podem ter contribuído para o aumento da população carcerária e a análise

desse fenômeno é muito complexa.

Junto ao aumento da população carcerária, cresce também o desafio da garantia

dos direitos dos presos. É preciso a todo o momento, construir e reconstruir formas

de atendimento eficaz, seja na área da Educação, Saúde, familiar, jurídica,

psicossocial, dentre outros. É preciso ainda, capacitação constante para os

profissionais envolvidos no processo de reintegração dos condenados. Outro fator

que precisa ser pensado são ações dêem conta da prevenção, o que fazer para

conter esse aumento gradativo que estamos enfrentando? Quais as alternativas de

prevenção a criminalidade?

Sabemos que esses temas merecem grandes reflexões e atitudes, pois a população

encarcerada capixaba é em sua maioria, uma população jovem. Esses dados podem

ser visualizados no gráfico 2, onde demonstra que 37% dos presos estão entre 18 a

24 anos, 29% estão entre 25 a 29 anos e 14% estão entre 30 a 34 anos, fazendo

um total de 80% de jovens em plena fase produtiva.

Page 24: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

23

Gráfico 2 – Faixa Etária da população encarcerada do ES -Fonte: INFOPEN/DEPEN/2010

Em contato com a população carcerária, percebemos que em sua maioria, a

necessidade de manter o vício do álcool e das drogas, a falta de perspectivas

profissionais, o abandono da escola e a falta de uma referência ou de uma meta de

vida, contribuíram para o inicio da vida de crimes. Podemos confirmar o pressuposto

acima nos dados referentes aos delitos cometidos pelos homens presos que estão

nas prisões capixabas: 35% estavam envolvidos com o tráfico de droga (artigos 12,

18 e 33), em torno de 17% cometeram homicídios (art. 121), 10% praticaram roubo

(art. 155), 13% furtaram (art. 157) e 5% praticaram crime contra os costumes, como

estupro e atentado ao pudor (art. 213 e 214), conforme gráfico 3.

Gráfico 3 - Crimes cometidos pelos homens - Fonte: INFOPEN/DEPEN/2010

Page 25: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

24

Quanto aos delitos praticados pelo público feminino, são basicamente crimes ligados

ao tráfico de drogas em torno de 80% (art. 12 e 18).

Gráfico 4 - Crimes cometidos pelas mulheres - Fonte: INFOPEN/DEPEN/2010

Mesmo quando o delito não é o de tráfico (homicídio, roubo e furto), percebemos

que a motivação para matar ou roubar foi para a grande maioria, a droga. A

sociedade, o Poder Público e a família precisam pensar, em caráter de urgência,

qual papel a droga tem assumido nas vidas dos jovens.

O tempo de prisão da maioria dos presos do Espírito Santo é de 4 até 8 anos (37%),

seguido por aqueles que permanecem de 8 anos até 15 anos (25%).

Gráfico 5 - Tempo de pena a cumprir dos sentenciados do ES - Fonte: INFOPEN/DEPEN/2010

Page 26: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

25

Se agruparmos os grupos que têm pena de até 4 anos aos de 4 a15 anos de prisão,

teremos um total de 84% dos presos capixabas retornando à sociedade nos

próximos 15 anos, conforme dados do DEPEN demonstrado no gráfico 05. Isso nos

faz refletir, que se não houver políticas públicas que garantam o retorno desses

sujeitos de forma que eles possam reconstruir suas vidas sem depender do crime,

eles estarão fadados a retornar para a vida criminosa. Assim, não perde somente o

egresso do sistema prisional, mas perde também o Estado, que foi inoperante em

suas funções e a sociedade que estará propensa a um mundo mais violento a cada

dia.

Vários estudiosos alertam para o fato de que a criminalidade em todo Brasil, está

intimamente ligada à baixa escolaridade e baixa qualificação profissional. Ambas

situações são remetidas à questão econômica e social do país como um todo. Na

realidade, os encarcerados tiveram uma experiência escolar que foi marcada pela

interrupção nos estudos. É relevante o número daqueles que iniciaram as atividades

escolares, mas em função de diversos fatores como necessidade de trabalhar, início

na vida criminosa, dentre outras situações, abandonaram a vida escolar muito cedo.

O gráfico 6 nos mostra que 7% dos que estão presos no Espírito Santo são

analfabetos, 14% são alfabetizados e 51% dos não concluíram o ensino

fundamental, perfazendo um total de 72% de homens e mulheres que não chegaram

ao ensino médio.

Gráfico 6 – Grau de escolaridade da população encarcerada do ES - Fonte: INFOPEN/DEPEN/2010

Page 27: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

26

Na busca da melhoria dos índices acima demonstrados, a Diretoria de

Ressocialização do Sistema Prisional (DIRESP) buscou parcerias para ampliação da

oferta de educação nos presídios capixaba, para assim atender as diversas leis e

acordos nacionais e internacionais que garantem educação para os privados de

liberdade (SEJUS, 2011).

1.3 - O PAPEL DA PSICOLOGIA E A INTERVENÇÃO DO PSICÓLOGO NAS PRISÕES

A história da psicologia brasileira mostra que a função e a atuação do profissional de

psicologia vêm sendo repensada e questionada continuamente, possibilitando a

construção de novos posicionamentos frente ao compromisso social, que se volta

para as necessidades da maioria de nossa população, superando uma tradição de

exclusividade com as elites. Esse repensar, tem motivado os profissionais a

ingressarem em campos ainda poucos explorados pela prática psicológica, como por

exemplo, o sistema prisional.

Após a implantação da Lei de Execução Penal em 1984 (LEP), os psicólogos foram

inseridos nos presídios, tornando-se membros da Comissão Técnica de

Classificação (CTC), ficando com a atribuição de emitir pareceres psicológicos, que

juntamente com o relatório social e o exame psiquiátrico, compõem o Exame

Criminológico, solicitado pelo juiz de execução da pena, com a finalidade de

conceder benefícios como progressão de regime, liberdade condicional, indulto e

visita, aos que tem direito. (BRASIL, DEPEN e CFP, 2007)

A prática do psicólogo na área da execução penal é um tema ainda pouco discutido

nos meios acadêmicos, resultando em uma construção do saber muito mais

empírica do que científica propriamente dita. Cada profissional vai buscando sua

forma de atuar, dependendo das demandas de cada região ou até mesmo de cada

presídio. Os presídios são carentes de idéias inovadoras, de profissionais que

executam projetos e que trabalhem em interdisciplinaridade.

Page 28: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

27

A psicologia dentro dos presídios não tem seu trabalho voltado apenas para

avaliações e pareceres, como tradicionalmente vem sendo colocado e muito

questionado. A atuação do psicólogo vai muito, além disso, têm um papel importante

no resgate de valores, atividades terapêuticas, em grupo de sujeitos que passaram

pela vida do crime e tem dificuldades em deixá-la por diversos fatores como drogas,

álcool, abandono familiar, dentre outros.

O manual de diretrizes e procedimentos da Psicologia no Sistema Penitenciário do

Estado do Espírito Santo traz por missão do psicólogo:

A missão da psicologia no sistema prisional é trabalhar através de uma escuta, a problemática da subjetividade implicada na lógica do aprisionamento, colaborando no âmbito da justiça através da elaboração de relatórios e pareceres na avaliação das condições psicológicas dos presos(as)/internos(as), assim como promover através da observação e do desenvolvimento intelectual, projetos que contemplem efetividade nos contextos individuais e coletivos, visando sempre a reintegração social.(SEJUS, 2010, p. 07)

O manual deixa bem claro que atuação do psicólogo é muito ampla dentro do

sistema prisional, o ele tem participação ativa na CTC, trabalha com os efeitos do

aprisionamento na vida do sujeito, com as angustias provenientes da privação de

liberdade, entre os outros efeitos deletérios que a prisão traz para o indivíduo. O

psicólogo deve atuar em projetos que buscam a reintegração social do sujeito. O

profissional de psicologia precisa fortalecer os laços que une o sujeito privado de

liberdade a seu mundo extramuros, fortalecendo os vínculos familiares e sociais, de

modo a contribuir para que o preso incorpore seus direitos e deveres de cidadão.

Todas essas atribuições da Psicologia nos presídios são discutidas no âmbito da

Psicologia Jurídica. Com os avanços das políticas públicas no que se refere a

educação dentro dos presídios, podemos pensar que o psicólogo que atua no

sistema prisional precisa articular a Psicologia Jurídica com a Psicologia Escolar,

pois segundo o Manual de Psicologia Escolar/educacional, do Conselho Regional

de psicologia do Paraná, 2007, “o psicólogo escolar desenvolve, apóia e promove a

utilização adequada para o melhor aproveitamento acadêmico do aluno a fim que se

torne um cidadão que contribua produtivamente para a sociedade.” (CASSIS, 2007.

p. 17). Sendo assim, o ambiente escolar dentro dos presídios é um campo

Page 29: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

28

inesgotável para atuação do psicólogo, o qual pode contribuir na construção de um

caminho para a efetivação de direitos e reintegração social dos privados de

liberdade.

A partir dessa breve revisão bibliográfica acerca da educação nas prisões e da

exposição de dados quantitativos sobre a população carcerária em âmbito nacional

e estadual, este relatório apresenta a experiência vivida no Estágio Supervisionado

da Ênfase em Educação I e II, nos períodos de 2010/02 e 2011/1. Trata-se de uma

pesquisa ação junto a um grupo de alunos privados de liberdade, no sistema

prisional Capixaba, que estão inseridos no Programa Educacional “Portas Abertas

Para Educação”. O trabalho demonstra que o caminho da pesquisa e intervenção

pode buscar um novo olhar sobre a educação nas prisões

Nesse contexto a Psicologia pode atuar na percepção e escuta atenta das falas dos

alunos que, como cidadãos, reivindicam reconhecimento social e abertura de

oportunidades para se descobrirem, para contribuírem criticamente em relação à

cultura educacional do presídio e, assim, alterarem o modo como a sociedade trata a

realidade do encarceramento, que muitas das vezes é posta como normal e

imutável.

Esperamos que, ao final do trabalho, possamos contribuir para uma reflexão do

tema, Educação como instrumento de reinserção social, e refletir ainda sobre a

necessidade de fazer uma educação a qual busca promover nos sujeitos que ali

estão um sentimento de capacidade de reconstruir sua própria história após o

cumprimento da pena.

Page 30: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

29

2. OBJETIVOS

2.1. Geral

Promover a inserção da psicologia no contexto educacional do sistema prisional

capixaba, possibilitando aos alunos privados de liberdade, a ampliação e

resignificação do conceito de educação.

2.2. Específicos

• Fazer um levantamento dos dados sobre a educação nos presídios capixaba;

• Discutir as experiências de educação formal/qualificação profissional,

desenvolvidas nos presídios capixaba;

• Pesquisar entre os alunos o conceito de educação;

• Realizar intervenções em grupo junto a alunos que estejam inseridos no

processo educacional das unidades prisionais.

Page 31: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

30

3. METODOLOGIA

Inicialmente o presente trabalho baseou-se pelos princípios da pesquisa ação. A

pesquisa-ação enquanto abordagem qualitativa permite uma relação ativa com os

sujeitos pesquisados, que possibilitando construir, investigar e formular ações

coletivas, a fim de encontrar possíveis soluções para os problemas apresentados

(THIOLLENT, 1997).

[...] o procedimento consiste essencialmente em deixar os participantes detectar os problemas e procurar as soluções que lhes são mais apropriadas. Tais soluções e as decorrentes ações são encontradas pelas pessoas e grupos envolvidos no processo de pesquisa-ação e elas são formuladas de acordo com as expressões de sua própria cultura. Se não encontrar soluções, os participantes aceitam reconhecer o fato. Conscientizam-se a cerca da complexidade ou dificuldade dos problemas e, se for possível, planejam novos esforços em matéria de estudo e investigação (THIOLLENT, 1997, p. 29).

Vale ressaltar que, durante o desenvolvimento do trabalho a pesquisa tornou-se de

caráter exploratório, pois pouco material cientifico foi encontrado para discutir o

tema. Sendo assim, houve a necessidade de buscar investigar sobre a educação

nas prisões capixaba para nortear a atuação da Psicologia nesse contexto. Sobre

pesquisa exploratória como recurso metodológico Piovesan e Temporini (1995, p.

29) “Define pesquisa exploratória, na qualidade de parte integrante da pesquisa

principal, como o estudo preliminar realizado com a finalidade de melhor adequar o

instrumento de medida à realidade que se pretende conhecer.”

As informações geradas são baseadas em pesquisa e questionamento, de modo a

produzir novos conhecimentos. Perante isso, é possível firmar novas convicções

entre os sujeitos envolvidos. Aplicando este conhecimento, procedeu-se à

observação, realização de entrevistas e técnicas para grupos com os sujeitos

envolvidos. Todos os dados foram registrados em diário de campo e discutidos em

supervisões semanais, onde foi discutido como a Psicologia pode atuar no campo da

educação prisional.

Page 32: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

31

3.1 Contexto

Pelo fato da estagiária, autora do trabalho, exercer atividades profissionais no

Sistema Prisional Capixaba, houve a oportunidade de coletar dados em diversas

unidades prisionais, possibilitando uma atuação mais ampla, entrando em contato

com vários alunos e projetos desenvolvidos pelo Programa Educacional da

Secretaria de Justiça.

Para preservar a identidade das instituições, foram dados nomes fictícios, em

consonância com o que prescreve o código de ética do psicólogo no Art. 9º “ É dever

do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da

confidencialidade, a intimidade da pessoas, grupos ou organizações, a que tenha

acesso no exercício profissional”. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005)

Sendo assim, foram pesquisados um presídio masculino e dois presídios femininos.

Em alguns só havia a educação na modalidade de Jovens e Adultos (EJA) e outros

havia a inserção de alunos em cursos de qualificação profissional. Para manter em

sigilo a identidade dos presídios usaremos as cores rosa, lilás e azul para

identificação das unidades prisionais

O primeiro presídio, que chamaremos de rosa, é uma unidade feminina que fica na

grande Vitória. Sua capacidade é para 96 internas do regime semi aberto e 224 para

o regime fechado. Possui cinco salas de aulas com capacidade de atender 120

alunas em cada turno, 01 espaço amplo para biblioteca e uma sala para professores

com banheiro.

O presídio Lilás é uma unidade feminina no interior do estado, com capacidade para

aproximadamente 280 mulheres. O presídio é destinado para internas do regime

provisório, fechado e semi-aberto. O espaço educacional é composto por quatro

salas que comporta 100 alunas em cada turno escolar, um espaço para biblioteca e

uma sala professores.

O terceiro presídio, aqui chamado de Azul, foi inaugurado em fevereiro de 2011.

Trata-se de um presídio masculino que abriga apenados que estão cumprindo a fase

Page 33: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

32

final de sua pena. Com 650 vagas, abrigava até o ultimo dia de intervenção, 580

presos. Esta penitenciária possui um espaço para atividades escolares, conforme

Anexo A, contendo seis salas de aula; duas salas amplas, com depósito, para

execução de cursos profissionalizantes; um auditório para duzentas pessoas, para

palestras e atividades extraclasses; um espaço para laboratório de informática, que

ainda não foi equipado; um espaço para biblioteca, que está em fase de organização

do acervo; uma sala para professores com banheiro; seis banheiros para os alunos

e dois bebedouros. O espaço escolar possibilita a inserção de 150 alunos por turno.

3.2 Sujeitos

Nos presídios femininos, rosa e Lilás, procuramos estar presente no momento em

que a equipe do programa educacional esteve fazendo o cadastramento de todas as

internas, para seleção dos nomes que iriam compor as turmas do ensino

fundamental e ensino médio. Na oportunidade obtivemos os dados das 320

mulheres do presídio rosa e das 280 internas do presídio lilás. Intervimos em duas

turmas de vinte cinco alunas do ensino fundamental de cada unidade prisional.

No presídio azul, foi possível intervir em um grupo de vinte alunos que estavam

estudando no Ensino de Jovens e Adultos (EJA) no tuno vespertino e foram

selecionados para participar de um curso de qualificação profissional para Pintor e

Gesseiro. Os sujeitos desse projeto foram alunos envolvidos no programa Portas

abertas para Educação.

3.3 Procedimentos

Foram realizadas atividades em três unidades prisionais do Espírito Santo no

período de setembro de 2010 a maio de 2011. Podemos dividir o estágio em duas

etapas. Em 2010/2 foram realizadas as intervenção nas unidades femininas. Durante

as visitas buscamos conhecer as novas unidades, os espaços educacionais das

mesmas e participamos dos atendimentos às internas para levantamento de dados

educacionais. Ainda em 2010/2, participamos no Presídio Rosa, de uma intervenção

psicológica realizada por outro grupo de estagiárias de psicologia da FAESA. Tal

intervenção consistiu em encontros terapêuticos com grupos de presas.

Page 34: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

33

Abaixo segue quadros especificando as atividades realizadas na primeira etapa,

tabela 1.

ENCONTRO UNIDADE

PRISIONAL

ATIVIDADE OBJETIVO PARTICIPANTES

1º ROSA

Visita à unidade Prisional feminina da grande vitória

Conhecer o Campo de Estágio

Estagiárias e Supervisora de

Estágio 2º

ROSA Levantamento de dados

educacionais das presas do presídio feminino da grande

Vitória

Conhecer a realidade

Educacional das presas.

Estagiárias e Equipe técnica do grupo

educacional (Sejus)

3° ROSA

Levantamento de dados educacionais das presas do presídio feminino da grande

Vitória

Conhecer a realidade

Educacional das presas.

Estagiárias e Equipe técnica do grupo

educacional (Sejus)

4º ROSA

Tabulação de Dados

Conhecer a realidade Educacional das presas

Estagiárias e Equipe técnica do grupo

educacional (Sejus) 5º

ROSA

Tabulação de Dados

Conhecer a realidade Educacional das presas

Estagiárias e Equipe técnica do grupo

educacional (Sejus) 6º

ROSA

Oficina de modelagem com argila

Trabalhar expressão de

conflitos na esfera afetiva

Estagiária Grupo de mulheres

presas

7º ROSA

Oficina de Pintura em tela

Analisar questões

relacionadas a identidade

Estagiária Grupo de mulheres

presas

LILÁS

Levantamento de dados educacionais das presas do presídio feminino do interior

do estado

Conhecer a realidade

Educacional das presas.

Estagiárias e Equipe técnica do grupo

educacional (Sejus)

LILÁS

Tabulação de Dados

Conhecer a realidade Educacional das presas

Estagiárias e Equipe técnica do grupo

educacional (Sejus) Tabela 1 - Demonstrativo das atividades desenvolvidas na primeira etapa do trabalho.

Na segunda etapa em 2011/1, com o inicio das aulas e com a seleção de alunas

feita nas duas unidades femininas, foi possível atuar em quatro turmas expondo o

programa educacional da SEJUS, tirando dúvidas e refletindo sobre a importância

da educação na vida do ser humano, conforme o tabela 2:

ENCONTRO UNIDADE

PRISIONAL ATIVIDADE OBJETIVO PARTICIPANTES

10º

ROSA

Conhecendo e refletindo o projeto

educacional da Sejus

Apresentar o Núcleo Educacional e refletir sobre a importância da educação na

vida do sujeito

Estagiária Turma A

11º

ROSA

Conhecendo e refletindo o projeto

educacional da Sejus

Apresentar o Núcleo Educacional e refletir sobre a importância da educação na

vida do sujeito

Estagiária Turma B

Page 35: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

34

12º

LILÁS

Conhecendo e refletindo o projeto

educacional da Sejus

Apresentar o Núcleo Educacional e refletir sobre a importância da educação na

vida do sujeito

Estagiária Turma A

13º

LILÁS

Conhecendo e refletindo o projeto

educacional da Sejus

Apresentar o Núcleo Educacional e refletir sobre a importância da educação na

vida do sujeito

Estagiária Turma B

Tabela 2 - Demonstrativo das atividades desenvolvidas na segunda etapa do trabalho.

Ainda em 2011/1, tivemos a oportunidade de realizar intervenções no presídio

masculino de regime semi aberto (Azul), com um grupo de 20 alunos que estavam

inseridos em um curso profissionalizante. Os encontros com este grupo seguiu a

seguinte programação:

ENCONTRO UNIDADE

PRISIONAL ATIVIDADE OBJETIVO PARTICIPANTES

14º

AZUL

Conhecendo e refletindo o projeto educacional da

Sejus

Apresentar a curso profissionalizante e o professor. Conhecer a

turma

Estagiária Turma do curso profissionalizante

pintor e gesseiro

15º

AZUL

Levantamento de dados

Pesquisar dados do aluno e sua percepção sobre o

tema Educação

Estagiária Turma do curso profissionalizante

pintor e gesseiro

16º

AZUL

Cine Reflexivo

Exibição do filme; “o Contador de História”

Estagiária Turma do curso profissionalizante

pintor e gesseiro

17º

AZUL

Discussão sobre o

filme

Refletir sobre a importância da educação e escolhas

pessoais

Estagiária Turma do curso profissionalizante

pintor e gesseiro

18º

AZUL

Discussão sobre o

filme

Refletir sobre a importância da educação e escolhas

pessoais

Estagiária Turma do curso profissionalizante

pintor e gesseiro

Tabela 3 - Demonstrativo das atividades no presídio masculino (Azul).

Os encontros com o grupo serão encerrados em junho de 2011, quando se encerra

o estágio. Porém, para efeito deste trabalho de conclusão de curso, estarão

descritos e analisados os resultados alcançados até o mês de maio/11.

Page 36: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

35

4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

A seguir apresentaremos os dados levantados no decorrer das intervenções,

ressaltando que dada à complexidade do campo em questão, as análises são

preliminares e exigem ainda um maior aprofundamento, uma vez que tratamos de

um projeto educacional em construção no Estado do Espírito Santo.

4.1 Entendendo a educação nos presídios capixaba

O Programa Educacional da Secretaria de Justiça/SEJUS, foi criado através da

parceria com a Secretaria de Educação/SEDU. O documento que norteia tal parceria

é a portaria 042.R de 21/06/05 que garante a criação de salas de aula nos presídios

capixabas. O Programa Educacional “Portas Abertas para a Educação” em sua

missão atende o que preceitua a lei de Execução Penal 7210/84 na seção V e nos

seus respectivos artigos. Nesse sentido, foram criadas turmas especiais nos níveis

escolares, fundamental e médio na modalidade de Educação de Jovens e Adultos

(EJA).

O programa “Portas Abertas para Educação” nasceu em 2005 com apenas 80

alunos divididos em dois presídios: Penitenciaria Estadual Feminina em Cariacica e

Penitenciária de Segurança Média II em Viana. Anualmente o projeto foi sendo

ampliado para outras unidades. Segundo os dados da Secretaria de Estado da

Justiça, em 2009 o programa tinha atingindo todas as unidades onde havia estrutura

física que comportasse as ações educacionais, espaços esses que muitas vezes

eram improvisados para que minimamente pudesse ser oferecida a alfabetização, ou

seja, a educação de Jovens e Adultos, primeiro segmento, até quarta série do

ensino fundamental.

Ainda em 2009, segundo a Diretora de Ressocialização da SEJUS (2011), o Estado

iniciou a reestruturação do sistema prisional, entrando na pauta de discussões as

questões de segurança e espaços adequados para o tratamento penal. Em 2010

começaram a ser inaugurados os primeiro presídios que apresentam espaços

Page 37: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

36

voltados para a Educação compostos minimamente de quatro salas de aula, sala

para professores, espaço para biblioteca e laboratório de informática (Anexo A –

planta baixa do espaço educacional do presídio azul).

Na tabela 1, podemos observar o processo de implantação do Programa Portas

Abertas para Educação nas unidades prisionais adaptadas e construídas e o

respectivo aumento de matrículas de alunos/presos.

UNIDADE PRISIONAL 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011

01 PEF - Penitenciaria Estadual Feminina - Cariacica 20 20 36 42 23 27 34

02 PSME II - Penitenciária de Segurança Média II - Viana 60 80 115 220 230 173 176

03 HCTP - Hospital de Custódia e Trat. Psiquiátrico-Cariacica 13 15 16 11 15

04 PRBSF- Penitenciária Regional de Barra de S. Francisco 44 50 38 40 30

05 PRL - Penitenciária Regional de Linhares - Linhares 89 105 115 125 146

06 PSME I - Penitenciária de Segurança Média I - Viana 90 95 108 96

07 PSMA I - Penitenciária de Segurança Máxima I - Viana 155 156 160 171

08 PSMA II - Penitenciária de Segurança Máxima II - Viana 30 30 28 30

09 PSMECOL - Penitenciária de Segurança Média de Colatina 190 200 210 214

10 PAES - Penitenciária Agrícola do ES - Viana 40 45 40 38

11 CPFCI - Centro Prisional Feminino Cachoeiro do Itapemirim 53 130 102

12 PRCI - Penitenciária Regional de Cachoeiro do Itapemirim 53 210 207

13 CDPA - Centro de Detenção Provisória de Aracruz - 40 45 50

14 CDPSDN - Centro de Detenção Provisória de São Domingos do Norte

20 12 40

15 CDPM - Centro de Detenção Provisória de Marataízes 50 38 39

16 PSVV – Penitenciária Semiaberto Vila Velha (até 2010 era IRS)

49 29 197 203 206 167

17 PEVV I – Penitenciária Estadual Vila Velha I 361

18 CPFCOL – Centro Prisional de Cariacica 200

19 CDPCOL – Centro Detenção Provisório de Cariacica 50

20 CDPV II – Centro Detenção Provisório de Viana II 84

21 PFC – Penitenciária Feminina de Cariacica 186

TOTAL 80 149 326 1094 1367 1563 2537

Tabela 4 - Demonstrativo do quantitativo de alunos inseridos no programa educacional da SEJUS -

Fonte: Secretaria de Estado da Justiça do Espírito Santo – SEJUS/2011

Page 38: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

37

A iniciativa possibilitou o aumento de 3.171% de alunos, conforme podemos

observar no gráfico 7. Em 2011, no primeiro semestre havia um número de 2.537 de

alunos matriculados.

Gráfico 7 – evolução de matricula do programa educacional - Fonte: SEJUS/2011

O crescimento no número de alunos e o investimento que se deu nos últimos seis

anos são reflexos de uma discussão tanto a nível estadual como nacional, da

importância de oferecer educação nos sistema prisional. Embora a LEP já instituísse

a garantia dos espaços educacionais desde 1984, poucos estados respeitava tal

direito, inclusive o Espírito Santo.

Após a construção dos espaços educacionais surgiu outro problema para que as

vagas disponibilizadas fossem preenchidas: o interesse do aluno em retomar seus

estudos e a significação da educação na vida do sujeito privado de liberdade, para

que os espaços educacionais não sejam apenas lugares para “fugir da tranca” ou

lugares onde a segurança pode apresentar-se mais vulnerável.

Segundo a Secretaria de Justiça do Espírito Santo, o primeiro passo para adesão

dos alunos foi fazer com os estudos fossem passivos de remição de pena.

0

500

1000

1500

2000

2500

3000

2006 2007 2008 2009 2010 2011

Alunos

Alunos

149

326

1094

1367

1563

2.537

Page 39: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

38

Diferentemente do trabalho, a participação em atividades educacionais, legalmente

não proporciona ao interno o direito à remição da pena. A Lei de execução Penal só

determina que só por meio da ocupação pelo trabalho, o detento terá direito ao

benefício, não o estendendo à educação. Porém, o Espírito Santo instituiu um

acordo entre os órgãos responsáveis pela execução penal, permitindo a remição por

meio da educação, a cada 18h de estudo será remido um dia na pena,

proporcionando assim uma maior adesão aos estudos por parte dos presos.

O segundo passo, talvez o mais difícil, é fazer com que o ensino seja atrativo, para

que o preso veja na educação um instrumento para saída do mundo do crime, que

possa ampliar seus conhecimento e sentir-se sujeito de direitos e deveres. O

parecer do Ministério da Educação/Conselho Nacional de Educação, homologado

em 7/5/2010, diz que:

Para alcançar essa mudança, tornam-se relevante programa de formação para educadores, gestores, técnicos e agentes penitenciários que auxiliem na compreensão das especificidades e da importância das ações de educação nos estabelecimentos penais (p. 07).

Muitos dos alunos quando estavam em liberdade, passaram por sucessivos

fracassos escolares e a escola acabou excluindo-os da escolarização formal.

Educação nos presídios precisa vencer esse paradigma. Os professores precisam

ser criativos, audaciosos e que conhecerem as dinâmicas do sistema prisional e dos

alunos. Ao pensarmos sobre proposição pedagógica e os métodos da escola nas

prisões, não podemos deixar de proporcionar a estes sujeitos uma tomada de

consciência de seus processos não somente cognitivos, mas principalmente de seu

processo social, em uma reflexão de si mesmo e de seu mundo real, proporcionando

assim a construção de um mundo possível. A educação não pode alienadora, ela

tem que ser libertadora.

(...) o que nos parece indiscutível é que, se pretendemos a libertação dos homens, não podemos começar por aliená-los ou mantê-los alienados. A libertação autêntica, que a humanização em processo, não é uma coisa que se deposita nos homens. Não é uma palavra a mais, oca, mitificante. É práxis, que implica na ação e reflexão dos homens sobre o mundo para transformá-lo (FREIRE. 1983, p. 77).

A Educação nas prisões precisa ainda, de recursos metodológicos e didáticos

diferenciados, que atenda a demanda de uma população que está privada de muitas

coisas (família, informações, vontades,...). O Espírito Santo ainda não alcançou essa

Page 40: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

39

meta de forma satisfatória. Urge ampliar a capacitação dos professores, o material

pedagógico precisa está em constante avaliação para que não seja elemento de

vulnerabilidade para a segurança, os alunos precisam internalizar que os espaços

educacionais são ambientes deles e para eles. Todos esses fatores são empecilhos

para que a educação seja atrativa para o aluno e que assim possa buscar através da

educação, novas formas de vida.

4.2 - Ampliação da oferta educacional e da perspectiva de futuro para as

mulheres privadas de liberdade

Segundo a Secretaria de Estado da Justiça do Espírito Santo, a maioria das

mulheres, aproximadamente 80%, foi condenada por envolvimento no tráfico de

drogas e/ou em função de relações afetivas. Há aquelas ainda que, quando seus

companheiros são presos, terminam assumindo a responsabilidade do sustento da

casa e acabam por tomar o lugar de seu companheiro no tráfico. O Espírito Santo é

um dos estados que tem maior índice de encarceramento feminino. (DEPEN, 2010)

Até 2009, o Espírito Santo contava com apenas dois presídios femininos: um no sul

do estado com pouco mais de cento e sessenta mulheres e outro na grande Vitória

com mais setecentas mulheres. Havia ainda nos presídios do norte do estado, alas

para mulheres nos presídios masculinos, com aproximadamente duzentas mulheres

encarceradas. Sendo assim, o estado contava com mais de mil mulheres e o

percentual de mulheres estudando era inferior a 15%, segundo dados da SEJUS/ES.

No primeiro semestre de intervenção (2010/2), o trabalho aconteceu nos presídios

Rosa e Lilás. O objetivo naquele momento era conhecer a realidade educacional das

mulheres privadas de liberdade. Nessa ocasião, o Estado estava inaugurando dois

novos presídios femininos: um na grande Vitória para dividir a população do já

existente, que apresentava superlotação; e outro no norte do Estado, uma vez que a

ala feminina que estava em um presídio masculino foi desativada.

O novo presídio da Grande Vitória comporta trezentas e vinte mulheres e possui 05

salas de aula onde se realiza do ensino fundamental ao médio, tendo a possibilidade

de inserção de aproximadamente 220 alunas. Vale ressaltar que o presídio antigo

Page 41: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

40

contava apenas com espaço para duas turmas com 15 alunas cada, na primeira

etapa do ensino fundamental. No presídio inaugurado no norte do estado, há vagas

para 280 mulheres, possuindo cinco salas com capacidade para inserir 250

mulheres no processo educacional.

Sendo assim, após inauguração dos novos presídios houve um aumento

considerável de vagas escolares para o público feminino, conforme tabela 2 abaixo:

REGIÃO NÚMERO DE ALUNAS

ESTUDANDO EM 2010

NÚMERO DE ALUNAS

ESTUDANDO EM 2011

Grande vitória 30 210

Sul 58 98

Norte 60 208

TOTAL 148 506

Tabela 5 - Fonte: Número de mulheres estudando nos anos 2010 e 2011 - SEJUS/2011

A intervenção possibilitou a pesquisa dos dados educacionais das duas unidades

prisionais femininas. Utilizamos o questionário (Anexo B) para apurarmos os

seguintes dados: a maioria das presas (70%) possui idade inferior a 35 anos, 80%

indicaram ser pardas ou negras, 85% são mães, mas apenas 26% são casadas ou

viviam com os parceiros antes do encarceramento. Quanto à educação formal, 8%

são analfabetas, 45% não completaram o ensino fundamental, 35 % pararam seus

estudos no ensino médio e havia ainda 12% que concluíram o ensino médio ou

estavam com ensino superior incompleto. Um dado que nos chama atenção é que

no número de 600 mulheres, apenas duas tinham ensino superior. Segundo dados

da SEJUS, 85% das presas foram indiciadas por tráfico de drogas e o envolvimento

com o crime, se devia aos relacionamentos amorosos e à facilidade de obtenção de

dinheiro.

Nos encontros que apresentamos o projeto educacional destinado às internas,

tivemos a oportunidade de discutimos com as alunas o tema “o retorno para sala de

aula”. Como técnica, exibimos um vídeo que apresentava sujeitos que eram

desafiados a superar suas dificuldades. Após a exibição do vídeo buscamos refletir

com as alunas quais foram às dificuldades que as levaram a interromper seus

Page 42: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

41

estudos, e suas expectativas ao retorno escolar. Muitas mulheres puderam expor

que abandonaram os estudos na adolescência por causa de gravidez, início do vício

nas drogas e do crime. Apresentaram-se bastante ansiosas para o início das aulas.

Alegavam querer recuperar o tempo perdido ou apenas para sair da cela, onde

ficavam por aproximadamente 22 horas por dia.

As respostas dos presos, em relação à busca pela escola e ao valor que dão a ela, diferem entre si. Em algumas respostas, o significado da escola restringe à ocupação do tempo e da mente com “coisas boas”; em outras, a escola é vista como possibilidade de melhorias de vida quando em liberdade; e há, ainda, aqueles que não acreditam no valor da instituição escolar. Existe entre os aprisionados um sentimento de tempo perdido, destruído ou tirado de suas vidas, e que pode se configurar como motivo que os leva à escola. A volta à sala de aula oferecer a muito deles a possibilidade de poder sair da cela, distrai a mente e ocupar seu tempo com coisas úteis. (ONOFRE, 2007. p.19)

Durante o encontro podemos perceber que a escola para as mulheres em privação

de liberdade é mais do que um espaço de escolarização é um lugar essencial para a

construção do sentido de existência, de novas perspectivas, de esperança de se

tornarem melhores. Espaço onde podem sonhar em ser professora, ser assistente

social, ser advogada, enfim, alguém que possa receber uma nova oportunidade e ter

um futuro melhor.

4.3. Regime semiaberto: um passo para o retorno à sociedade

O Trabalho de intervenção com os alunos do semi aberto aconteceu no presídio

Azul e foi executado em um grupo de 20 alunos que estão matriculados na

Educação para Jovens e Adulto (EJA), os quais estavam inseridos em um curso de

Pintor/Gesseiro, no período de abril/2011 a maio/2011.

O Curso Profissionalizante de Pintor/Gesseiro é ministrado pelo IFES/SENAI graças

ao convênio celebrado entre as instituições de ensino mencionadas com a

Secretaria de Estado de Justiça (SEJUS). O programa previa aulas diariamente no

horário vespertino com duração de 4 horas, perfazendo um total de 120 horas de

curso divididas em aulas de cidadania, aulas de teorias para exercício da profissão e

aulas práticas de pintor/gesseiro.

Page 43: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

42

No primeiro encontro, no dia 05 de abril foi a aula inaugural. Na oportunidade, os

alunos foram orientados quanto a proposta do curso, foi apresentada a instituição

executora, bem como o professor.

No encontro seguinte em 12 de abril, fizemos uma pesquisa através de um

questionário (Anexo C). Os alunos relataram sua idade, profissão, tempo em que

estão presos, tempo estão fora da escola e se tiveram oportunidade de estudar

antes em outros presídios por onde passaram. No final da pesquisa eles relatam

sobre o tema: “o que significa educação para você?”

Ao analisar os dados, constamos que dos vinte alunos, quatorze têm idade entre 19

anos a 25 anos e apenas seis possuem idades superiores aos 26 anos, sendo que o

aluno de maior idade tem 35 anos. Cinco alunos declararam não possuir nenhuma

profissão e sete alunos são auxiliares de serviços gerais. Os outros oito assinalaram

profissões de nível técnico ou ocupações setoriais como: Borracheiro, comerciante,

porteiro e motorista.

Quanto ao grau de escolaridade, treze alunos evadiram da escola quando ainda

estavam fazendo o ensino fundamental e sete, quando cursavam o ensino médio; e

a maioria, dezesseis alunos, parou de estudar antes de completar 18 anos.

Treze alunos estão presos a menos de dois anos. Os outros sete alunos não

ultrapassam os 5 anos de cumprimento de pena.

Ao descrever sobre o que significa educação, grande parte dos alunos trouxe a

educação como representação do relacionamento interpessoal que temos com o

próximo. Abaixo, transcrevemos literalmente algumas respostas dos alunos:

Eu acho que educação é não dá esporro nas outras pessoas e também que trata as pessoas bem. (sic)

Educação para mim é tudo é fundamental é uma forma de respeitar o procimo enfim educação é tudo. (sic)

Educação significa uma pessoa respeita todo mundo por exemplo. Saiba conversar com vários tipo de pessoas sem desvalorizar os outros. Eu sou um cara que respeita todo mundo para ser respeitado. (sic)

Page 44: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

43

Apenas dois alunos apresentaram uma visão mais ampliada sobre educação:

Educação significa formar novas experiências ser valorizado no que se faz, e apezar de tudo ser e se sentir cidadão responsável e reconhecido onde quer que seja que nos estivermos. E muito importante aprender a ler a escrever e assim aprendemos como podemos educar nossos filhos corretamente, e preparalos para novos disafios na vida ou seja ser cidadão e ter educação.(sic)

Educação para mim significa aprendizado esta se aperfeiçoando na quilo que a pessoa deseja alcansa ou seja como se comporta em devidos lugares através de um gesto, no modo de falar demostrando tudo aquilo que você aprendeu e está aprendendo a cada dia.(sic)

O relato dos alunos aponta que a representação social da Educação é uma

demonstração da realidade que os indivíduos estabelecem ao decorrer de sua vida,

é enxergada conforme as vivências e as experiências próprias de cada sujeito.

“As Representações Sociais são “teorias” sobre saberes populares e do senso comum, elaboradas e partilhadas coletivamente, com a finalidade de construir e interpretar o real. Por serem dinâmicas, levam os individuo a produzir comportamento e interações com o meio, ações que, sem dúvidas, modificam os dois.” (OLIVEIRA, 1988, p. 105)

As representações trazidas pelos alunos vêm confirmar os dados de que, a maioria

dos presos teve uma educação que foi significativa para ele, mas que não encontrou

na educação formal uma forma de ser respeitado, de conquistar seus sonhos, de ter

seu sustento de forma digna, dentre outros benefícios que a escolarização traz.

Neste sentido, a educação no sistema prisional não pode repetir os mesmo erros.

Não pode uma educação onde os conteúdos são passados sem ser significado na

vida do sujeito. A escola na prisão, apontada como local de comunicação, de

interações pessoais, onde o aprisionado pode se mostrar sem reservas, na qual

oferece oportunidade de socialização, na medida em que aponta ao aluno outras

probabilidades referenciais de construção da sua identidade e de resgate da

cidadania perdida.

Portanto, é preciso que o educador busque idealizar um tratamento metodológico,

epistemológico e ideológico das suas atividades, isso é um processo primordial para

o desenvolvimento desses alunos, que geralmente são alunos que precisam de uma

atenção diferenciada, pois em sua maioria vivem sem perspectiva de vida. Não dá

Page 45: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

44

para usar as mesmas metodologias educacionais que fracassaram, metodologia que

muita das vezes, não levou em conta o contexto social e familiar desses sujeitos. É

preciso ainda, que o educador busque dar um tratamento epistemológico, ou seja,

questionar como se dará esse conhecimento? Qual o conhecimento necessário para

os privados de liberdade? Quais os meios eficazes de produzi-lo? Enfim, buscar

idealizar uma educação que de fato será diferente e fará diferença na vida do aluno

que está preso. Para alcançar tais objetivos é preciso que o educador e os

envolvidos em educação nas prisões estejam imbuídos do desejo pela busca do

conhecimento sobre o tema, precisa estar em constantes capacitações fornecidas

pelas instituições responsáveis por garantir a educação nas prisões.

No terceiro encontro em 19 abril, exibimos o filme “O Contador de História”, para que

após a exibição do filme, pudéssemos debater sobre perspectiva de futuro e discutir

o tema Educação como Instrumento de Reinserção Social. O filme foi projetado em

um telão no auditório. Era visível o entusiasmo que os alunos apresentavam por

poderem sair da cela para assistir um filme. O filme teve duração de

aproximadamente duas horas e contou a história real de um menino egresso da

antiga Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor - FEBEM, o qual recebeu um

laudo de “irrecuperável”, porém, ele conseguiu através da educação, mudar toda sua

trajetória e se tornar um dos maiores contadores de histórias.

Nos dois encontros seguintes, discutimos os temas centrais do filme, trazidos pelos

próprios alunos. De uma forma geral, eles escolheram cenas que eles tinham

passado por situações parecidas, por exemplo: a cena que o ator principal pede

para entrar para uma turma de meninos que praticavam assaltos. Na visão dos

alunos ele entra “para ser respeitado”, “para suprir suas necessidades, porque na

rua é loucura”, dentre outras colocações.

Discutimos sobre escolhas. O personagem principal teve que escolher em continuar

no crime ou agarrar a oportunidade que a pedagoga no filme estava lhe oferecendo:

ser alfabetizado aos treze anos e buscar um novo caminho através da educação. O

ator principal escolheu ser alfabetizado e hoje é um nome reconhecido no cenário

Educacional.

Page 46: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

45

Correlacionando à realidade dos sujeitos que estavam fazendo um curso

profissionalizante e estavam bem próximo da liberdade, pudemos discutir o que

significava o retorno à sociedade com uma profissão, pintor/gesseiro. O resultado da

discussão foi muito rico. Teve um aluno que declarou estar muito esperançoso, pois

queria reconstruir sua vida, uma vez que tinha família esperando por ele; outros

disseram que o mundo do crime “as vezes não tem volta”, “muitos estão vivos por

que estão aqui dentro, quando chegarem lá fora estão jurados de morte”. Para os

sem esperança tivemos a oportunidade de refletir se não há como mudar essa

sentença, buscar um recomeço. Em outro lugar não seria uma opção?

O trabalho, com essa turma, teve de ser paralisado, pois o professor ao começar a

parte prática do curso, ficou inseguro diante das ferramentas na mão dos

alunos/presos. O curso teve de ser adiado até a contratação de outro profissional.

Realmente não é fácil para o educador se despi do medo e enfrentar uma turma de

presidiário para ministrar um curso no qual será usado várias ferramentas,

principalmente para aqueles que nunca tiveram contato com o tratamento penal, no

primeiro momento é um mundo desconhecido para o educador.

Sobre o assunto Gadotti (1993) diz que, a característica fundamental da pedagogia

do educador em presídios é a contradição, é saber lidar com conflitos, com riscos.

Cabe a ele questionar de que maneira a educação escolar pode contribuir para

modificar a prisão e o preso, tornar a vida melhor e contribuir para o processo de

desprisionalização e de formação do homem preso.

A contratação de um novo professor só aconteceu no final do mês de maio, isso

dificultou nossa volta ao projeto uma vez que o curso já estava muito atrasado e o

professor não poderia nos ceder uma manhã. Mesmo assim, durante as aulas

práticas estivemos visitando a unidade e percebemos o entusiasmo dos alunos nas

atividades.

O contato com os alunos nos possibilitou perceber que a educação

profissionalizante dentro dos presídios precisa ser uma educação que leve o

indivíduo a reconhecer um novo lugar no mundo, proporcionando-lhe o sentimento

de que é capaz de intervir em sua situação de vida. Precisa ser uma educação que

Page 47: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

46

reconheça a possibilidade de mudança do sujeito. Se não acreditarmos que o

homem tem autonomia sobre sua vida, reproduziremos uma visão preconceituosa

de que o preso será eternamente um criminoso. Sendo assim, precisam-se

desenvolver dentro das prisões processos educacionais que trabalhem para a

tomada de consciência dos educandos, fazendo-os perceber a realidade e

conseqüentemente seu lugar na história. Não somente trabalhar conteúdo, mas

refletir com o aluno sua condição de sujeito capaz de mudanças.

Nesse contexto, o psicólogo pode atuar de forma a proporcionar espaços para

discussões e reflexões. Precisam ter um olhar e uma escuta que possa contribuir

tanto para educadores, como para os alunos e servidores a efetividade da

Educação. Buscar refletir sobre sua contribuição para a vida dos encarcerados e da

sociedade em geral, por meio da aprendizagem participativa e da convivência

baseada na valorização e desenvolvimento do outro e de si mesmo.

Page 48: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

47

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A prática educativa deve ser percebida nos espaços de privação de liberdade, como

um resultante do processo histórico-social. Desenvolve-se de forma diferenciada nos

vários contextos que estas abrangem e para que possamos compreender o

processo de construção e produção do conhecimento do indivíduo é preciso

considerá-lo inserido no seu contexto social.

Efetivar a educação básica e profissionalizante dentro das unidades prisionais é

buscar mudar um cenário onde os apenados estão em absoluto ócio e diminuir as

conseqüências causadas pela privação de liberdade. O tempo de permanência nas

prisões deve obrigatoriamente transformar-se em tempo de resgate do processo de

aprendizagem rompido, assim como de reparação social como mecanismo, inclusive

de enfrentamento da reincidência criminal.

O encarceramento além de levar a uma ruptura social, provoca também, inegáveis

malefícios a esses sujeitos. O apenado perde ou vê fragilizados os papéis que

representa no mundo social e sua identidade sofre uma despersonalização por

efeitos do aprisionamento. Por esses e outros motivos é que se faz necessário

pensar em um conceito de reinserção social de detentos, lastreado pela elevação do

nível de escolaridade e pela qualificação profissional com o propósito de se adotar

políticas mais eficientes de combate a estes déficits.

A educação possibilita a reabilitação, que transforma em resgate social e educação

libertadora, numa dimensão de autonomia, sustentabilidade e minimização da

discriminação social.

A importância da intervenção foi possibilitar na prática o exercício dos

conhecimentos adquiridos na faculdade, colaborando com o desenvolvimento e o

crescimento pessoal/profissional dos alunos/presos. Buscamos desenvolver o senso

crítico, autonomia, maturidade e uma reflexão da vida após cumprimento de pena.

As relações estabelecidas permitiram aos sujeitos acreditar ser possível haver

transformações através da educação.

Page 49: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

48

O enfoque da intervenção pretendeu investigar se educação/profissionalização é

preponderante para a reinserção social e pode evitar possíveis reincidências,

segundo os sujeitos. Mas o que ficou claro é que os desafios são imensos. O Estado

vem buscando ampliar e melhorar as condições estruturais das unidades prisionais,

porém, mesmo diante dos esforços ainda não é possível atender mais que 30% da

população prisional estudando.

Pudemos perceber que os privados de liberdade estão em situação de extrema

vulnerabilidade social, não só pelo perfil individual de cada um, mas também pela

estigmatização que a prisão produz. A função social da pena é a de recuperação,

mas isso só será possível mediante um novo modelo de inserção social que

responda aos anseios da sociedade e que também leve em consideração as

necessidades e complexidades do sujeito que cometeu delito.

A importância da educação nas prisões como instrumento de desconstrução/

reconstrução e de ampliação da capacidade crítica dos sujeitos, pode auxiliar estes

a reconstruírem um futuro melhor durante e após o cumprimento da sentença. Os

objetivos da prisão ultrapassam as idéias de punição e de isolamento que a

detenção carrega.

No decorrer do estágio, as intervenções e as supervisões foram muito significativas,

pois foram momentos para discutir teoria, fazer experimentos, trocar experiências,

entrar em contato com uma realidade tão pouco conhecida. Isso tudo contribuiu

bastante também para meu crescimento, pois intervir em grupos e conhecer suas

realidades, me fez senti a responsabilidade que é ser Psicólogo, o cuidado que

temos que ter ao trabalhar com os sentimentos, sonhos, realidades sociais, dentre

outras coisas.

Sinto que o término da graduação não é o fim da formação em Psicologia. Sei que

para cada novo desafio, terei que estar sempre aberta para aprimorar meus

conhecimentos. Cada novo grupo será uma nova construção e uma nova

experiência.

Page 50: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

49

6. REFERÊNCIAS. BRASIL, Diretrizes para atuação e formação dos psicólogos do sistema prisional brasileiro. Brasília: DEPEN e CFP, 2007.

CERVO, Amado Luiz; BERVIAN, Pedro Alcino. Metodologia científica. 4 ed. São Paulo : Makron Books, 1996.

CONSELHO NASCIONAL DE EDUCAÇÃO (Brasil). Resolução nº 2, de 19 de maio de 2010 – Diário Oficial da União, Brasília, 20 de maio de 2010. Seção 1, p.20. CONSELHO NASCIONAL DE POLITICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA (Brasil). Resolução nº 3, de 11 de março de 2009 – Diário Oficial da União, Brasília, 25 de março de 2009. CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA (Brasil). Codigo de ética profissional do Psicólogo. Brasília: CFP, 2005. ESPÍRITO SANTO, Diário Oficial. Portaria 042 R de 21 de junho de 2005. ESPIRITO SANTO, Manual de diretrizes e procedimentos da Psicologia no Sistema Penitenciário do Estado do Espírito Santo. Espírito Santo: SEJUS, 2010. FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Petrópolis: Vozes, 1999. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.1983 GADOTTI, M. Palestra de encerramento. In: MAIDA, M. J. D. (Org.). Presídios e Educação. São Paulo: FUNAP, 1993, p. 121-148. INFOPEN; http://www.infopen.gov.br/ Acesso em: 20/02/2010 MANUAL DE PSICOLOGIA ESCOLAR - Educacional/ Ana Maria Cassis... [ET al.], - Curitiba: Grafica e EditoraUnificado, 2007 MINAYO, M. C. de S. e SOUZA, E. R. de: 'Violência e saúde como um campo interdisciplinar e de ação coletiva'. História, Ciências, Saúde— Manguinhos, IV(3): 513-531, nov. 1997-fev. 1998. OLIVEIRA, Fátima. Representações Sociais. IN: Jacques Maria Corrêa (org.) Psicologia Social contemporânea. Petrópolis, 1998. ONOFRE, E.M.C; Educação escolar entre as grades. 1. ed. São Paulo: Edufscar, 2007.

Page 51: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

50

PIOVESAN, Armando; TEMPORINI, Edméa Rita. Pesquisa exploratória: procedimento metodológico para o estudo de fatores humanos no campo de saúde pública. Revista Saúde Pública, São Paulo, abril, 1995. Departamento de Prática de Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública – Universidade de São Paulo: Disponível em <http://www.scielo.br/pdf/rsp/v29n4/10.pdf>. Acessado em 30 junho de 2011 SECRETARIA DE ESTADO DA JUSTIÇA: Programa Educacional “portas Abertas para Educação”, 2010/2011. THIOLLENT, M. Pesquisa-Ação nas Organizações. Ed. Atlas. São Paulo, 1997. UNESCO. Educando para Liberdade: trajetória, debates e proposições de um projeto para a educação nas prisões brasileiras. – Brasília:,Governo Japonês, Ministério da Educação, Ministério da Justiça, 2006.

Page 52: SISTEMA FAESA DE EDUCAÇÃO FACULDADES …newpsi.bvs-psi.org.br/tcc/2013/regiane_kieper_nascimento_7ed.pdf · curricular para nortear a prática de estágio. No curso de psicologia

51

ANEXOS