Direito Administrativo
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DIREITO
ADMINISTRATIVO
Série Objetiva
Gustavo da Silva Santanna
Porto Alegre
2013
4
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
S232d SANTANNA, Gustavo da Silva Direito administrativo : série objetiva /
Gustavo Santanna. – 3. ed. - Porto Alegre : Verbo Jurídico, 2013. 416 p. ; 21 cm.
ISBN: 978-85-7699-415-2
1. Direito Administrativo - Brasil. 2. Administração Pública. 3. Regime Jurídico Administrativo. 4. Atos Administrativos. 5. Licitações – Brasil. 6. Contratos
Administrativos. 7. Serviços Públicos. 8. Responsabilidade Civil do Estado. I. Título.
CDD 341.3
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Direito Administrativo
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SSuummáárriioo
Capítulo I - O ESTADO, A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, O DIREITO ADMINISTRATIVO E O REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO
1. Estado: conceito, evolução e transformações .....................................15
2. Administração Pública ........................................................................22
3. Direito Administrativo ........................................................................24
3.1. Fontes do Direito Administrativo ....................................................25
3.1.1. Lei .................................................................................................25
3.1.2. Costume ........................................................................................25
3.1.3. Jurisprudência ...............................................................................25
3.1.4. Doutrina ........................................................................................26
4. Regime jurídico-administrativo ..........................................................26
Capítulo II - PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS
1. Introdução ...........................................................................................27
2. Princípios explícitos (expressos) ........................................................28
2.1. Princípio da legalidade.....................................................................28
2.2. Princípio da impessoalidade ............................................................29
2.3. Princípio da moralidade ...................................................................33
2.4. Princípio da publicidade ..................................................................35
2.5. Princípio da eficiência .....................................................................36
3. Princípios implícitos ...........................................................................38
3.1. Princípio da supremacia do interesse público sobre o
interesse particular ..................................................................................38
3.2. Princípio da indisponibilidade do interesse público.........................40
3.3. Princípio da continuidade do serviço público ..................................40
3.4. Princípio da autotutela e tutela .........................................................41
3.5. Princípio da segurança jurídica ........................................................42
3.6. Princípios da razoabilidade e proporcionalidade .............................46
Capítulo III – PODERES E DEVERES ADMINISTRATIVOS
1. Introdução ...........................................................................................49
2. Poder Vinculado .................................................................................50
3. Poder Discricionário ...........................................................................51
4. Poder Hierárquico ...............................................................................52
6
5. Poder Disciplinar ................................................................................54
6. Poder Normativo (Regulamentar) .......................................................55
7. Poder de Polícia ..................................................................................59
7.1. Ciclo de Polícia ...............................................................................62
7.2. Delegação de atos do poder de polícia ............................................63
7.3. Polícia administrativa e polícia judiciária ........................................67
7.4. Atributos do poder de polícia ...........................................................68
7.5. Meios de atuação .............................................................................69
7.6. Limites ............................................................................................70
7.7. Prescrição .........................................................................................70
8. Deveres administrativos ......................................................................71
8.1. Dever de agir ...................................................................................71
8.2. Dever de eficiência .........................................................................72
8.3. Dever de probidade .........................................................................72
8.4. Dever de prestar contas ...................................................................73
Capítulo IV - ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO
1. Introdução ...........................................................................................75
2. Administração Direta ..........................................................................76
2.1. Classificação dos órgãos ..................................................................78
2.1.1. Quanto à posição estatal ...............................................................78
2.1.2. Quanto à estrutura .........................................................................78
2.1.3. Quanto à atuação funcional ou composição ..................................79
3. Administração Indireta .......................................................................79
3.1. Autarquias ........................................................................................81
3.2. Agências Reguladoras......................................................................88
3.3. Fundações ........................................................................................91
3.4. Agências Executivas ........................................................................94
3.5. Consórcios Públicos .........................................................................95
3.6. Empresas públicas e sociedades de economia mista ........................97
3.6.1. Semelhanças. ................................................................................97
3.6.2. Diferenças .....................................................................................99
3.6.3. Subsidiárias ...................................................................................105
4. Entidades paraestatais, entes de cooperação ou terceiro setor ............107
4.1. Serviços sociais autônomos .............................................................107
4.2. Organizações Sociais .......................................................................109
4.3. Organização da sociedade civil de interesse público (OSCIP) .......110
4.4. Entidades de apoio ...........................................................................111
Direito Administrativo
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Capítulo V - ATOS ADMINISTRATIVOS
1. Introdução ..........................................................................................113
2. Atributos dos atos administrativos .....................................................115
3. Requisitos (elementos) dos atos administrativos ...............................116
3.1. Competência ...................................................................................116
3.2. Forma ..............................................................................................117
3.3. Finalidade .......................................................................................118
3.4. Objeto .............................................................................................118
3.5. Motivo ............................................................................................119
3.5.1. Teoria dos motivos determinantes ...............................................119
4. Perfeição, validade e eficácia .............................................................121
5. Classificação dos atos administrativos ................................................122
5.1. Quanto ao grau de liberdade conferido à Administração .................122
5.2. Quanto aos destinatários ..................................................................122
5.3. Quanto à abrangência dos efeitos ....................................................123
5.4. Quanto às prerrogativas (ao objeto) .................................................123
5.5. Quanto à estrutura ............................................................................123
5.6. Quanto à formação (composição) da vontade ..................................124
5.7. Quanto à exequibilidade ..................................................................127
5.8. Quanto aos efeitos ............................................................................127
5.9. Quanto a sua validade ......................................................................127
6. Espécies de atos administrativos .........................................................128
7. Atos administrativos em espécie .........................................................129
7.1. Quanto ao conteúdo .........................................................................129
7.2. Quanto à forma de exteriorização ....................................................130
8. Extinção dos atos administrativos .......................................................132
8.1. Extinção de ato ineficaz ...................................................................132
8.2. Extinção de ato eficaz ......................................................................133
8.2.1. Cumprimento de seus efeitos ........................................................133
8.2.2. Pela retirada ..................................................................................133
9. Convalidação dos atos administrativos ...............................................137
Capítulo VI - LICITAÇÃO
1. Conceito, destinatários e objeto ..........................................................139
2. Princípios ............................................................................................140
2.1. Princípio da legalidade.....................................................................140
2.2. Princípio da impessoalidade ............................................................140
2.3. Princípio da publicidade ..................................................................142
2.4. Princípio da moralidade e probidade ...............................................143
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2.5. Princípio da vinculação ao instrumento convocatório .....................143
2.6. Princípio do julgamento objetivo .....................................................143
2.7. Princípio da adjudicação compulsória .............................................143
2.8. Princípio da padronização ...............................................................144
3. Obrigatoriedade da licitação ...............................................................147
4. Inexigibilidade de licitação .................................................................147
5. Dispensa de licitação ..........................................................................148
5.1. Licitação dispensada ........................................................................149
5.2. Licitação dispensável .......................................................................151
6. Modalidades de licitação ....................................................................152
6.1. Concorrência ....................................................................................153
6.2. Tomada de preços ............................................................................154
6.3. Convite.............................................................................................154
6.4. Concurso ..........................................................................................156
6.5. Leilão ...............................................................................................157
6.6. Pregão ..............................................................................................157
6.7. Consulta ...........................................................................................158
7. Procedimento adotado pela Lei nº 8.666/93 .......................................159
7.1. Ato convocatório - edital ou carta-convite .......................................159
7.1.1. Comissão responsável ...................................................................161
7.2. Habilitação .......................................................................................161
7.2.1. Na concorrência ............................................................................161
7.2.2. Na tomada de preços e convite .....................................................163
7.2.3. Recurso .........................................................................................163
7.3. Classificação e julgamento ..............................................................163
7.3.1. Tipos de licitação ..........................................................................164
7.3.2. Recurso .........................................................................................165
7.4. Homologação ...................................................................................165
7.5. Adjudicação .....................................................................................166
8. Procedimento adotado pela Lei nº 10.520/02 .....................................166
8.1. Prazos...............................................................................................166
8.2. Inversão de fases ..............................................................................167
8.3. Inclusão de uma nova fase ...............................................................167
9. Anulação e revogação da licitação ......................................................168
Capítulo VII - CONTRATOS ADMINISTRATIVOS
1. Noções gerais ......................................................................................171
2. Características .....................................................................................172
3. Cláusulas exorbitantes ........................................................................173
Direito Administrativo
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3.1. Exigência de garantia .......................................................................173
3.2. Execução e fiscalização da execução ...............................................174
3.3. Aplicação de sanções .......................................................................177
3.4. Alteração unilateral ..........................................................................178
3.5. Rescisão unilateral ...........................................................................179
3.6. Anulação ..........................................................................................181
3.7. Restrição ao uso da cláusula de exceção de contrato não
cumprido (exceptio non adimpleti contractus) .......................................181
3.8. Retomada do objeto .........................................................................182
4. Formalização do contrato....................................................................182
5. Duração e prorrogação contratual .......................................................183
6. Extinção contratual .............................................................................185
6.1. Forma ordinária ...............................................................................185
6.2. Forma extraordinária .......................................................................185
6.2.1. Culposa .........................................................................................185
6.2.2. Sem Culpa .....................................................................................186
6.2.2.1. Teoria da Imprevisão .................................................................186
6.2.2.2. Caso fortuito ou força maior ......................................................186
6.2.2.3. Fato do príncipe .........................................................................187
6.2.2.4. Fato da administração ................................................................187
7. Espécies de contratos administrativos ................................................188
8. Consórcio Público ...............................................................................190
9. Convênio .............................................................................................190
Capítulo VIII - SERVIÇOS PÚBLICOS
1. Introdução ...........................................................................................193
2. Classificação .......................................................................................193
3. Princípios ............................................................................................197
3.1. Princípio da eficiência .....................................................................197
3.2. Princípio da continuidade do serviço público ..................................197
3.3. Princípio da modicidade das tarifas .................................................202
3.4. Princípio da generalidade .................................................................202
3.5. Princípio da regularidade .................................................................203
3.6. Princípio da atualidade ....................................................................203
3.7. Princípio da segurança .....................................................................203
4. Formas de prestação do serviço público ............................................203
4.1. Prestação direta ................................................................................203
4.2. Prestação indireta .............................................................................204
5. Concessão de serviços públicos ..........................................................205
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5.1. Regras atinentes à licitação ..............................................................207
5.2. Regras atinentes ao contrato administrativo de concessão ..............208
5.3. Intervenção ......................................................................................209
5.4. Formas de extinção das concessões .................................................210
5.4.1. Advento do termo contratual ........................................................210
5.4.2. Anulação .......................................................................................210
5.4.3. Rescisão ........................................................................................211
5.4.4. Encampação ..................................................................................211
5.4.5. Caducidade ...................................................................................211
5.4.6. Falência ou extinção da empresa concessionária ..........................212
6. Permissão de serviços públicos ...........................................................213
7. Autorização de serviços públicos........................................................215
Capítulo IX - AGENTES PÚBLICOS
1. Introdução ...........................................................................................219
2. Agentes públicos .................................................................................219
3. Classificação de agentes públicos .......................................................220
3.1. Agentes políticos .............................................................................221
3.2. Agentes administrativos ...................................................................221
3.3. Agentes (ou particulares) em colaboração com o Estado ................223
4. Cargo, emprego e função ....................................................................224
4.1. Organização dos cargos públicos .....................................................225
4.2. Classificação dos cargos públicos quanto ao provimento ................225
4.3. Formas de provimento de cargos públicos .......................................229
4.3.1. Originário ......................................................................................229
4.3.2. Derivado .......................................................................................229
4.3.2.1. Provimento derivado vertical .....................................................230
4.3.2.2. Provimento derivado horizontal .................................................230
4.3.2.3. Provimento derivado por reingresso .........................................232
4.4. Posse e exercício ..............................................................................233
4.5. Acessibilidade a cargos, empregos e funções ..................................233
4.5.1. Cargos privativos de brasileiros natos ..........................................235
4.5.2. Exigência de concurso público .....................................................235
4.6. Formas de vacância de cargos públicos ...........................................243
4.7. Sistema remuneratório .....................................................................250
4.7.1. Remuneração ................................................................................250
4.7.2. Subsídio ........................................................................................252
4.7.3. Salário ...........................................................................................253
4.7.4. Limite máximo para a remuneração, subsídio e salário ................253
Direito Administrativo
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4.7.5. Limite mínimo para a remuneração, subsídio e salário .................255
4.8. Acumulação de cargos, empregos e funções ...................................256
4.9. Licenças e afastamentos ..................................................................258
4.10. Disponibilidade e aproveitamento .................................................259
4.11. Direitos, deveres e responsabilidade dos agentes públicos ............261
4.12. A Lei Complementar nº 10.098/94 (Estatuto e regime jurídico único
dos servidores públicos civis do Estado do Rio Grande do Sul) ...........268
Capítulo X - BENS PÚBLICOS
1. Considerações iniciais ........................................................................279
2. Classificação dos bens públicos ..........................................................280
2.1. Quanto à titularidade ........................................................................280
2.2. Quanto à destinação .........................................................................280
2.3. Quanto à disponibilidade .................................................................281
3. Afetação e Desafetação .......................................................................282
4. Regime jurídico ..................................................................................282
5. Uso dos bens públicos ........................................................................283
6. Aquisição dos bens públicos ...............................................................286
7. Alienação dos bens públicos ...............................................................287
8. Espécies de bens públicos ...................................................................288
Capítulo XI - INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE
1. Introdução ...........................................................................................291
2. Modalidades ........................................................................................292
2.1. Servidão Administrativa ..................................................................293
2.2. Requisição Administrativa ...............................................................295
2.3. Ocupação temporária ou provisória .................................................297
2.4. Limitação Administrativa ................................................................299
2.5. Tombamento ....................................................................................302
2.6. Desapropriação ................................................................................306
2.6.1. Espécies de desapropriação ..........................................................308
2.6.1.1. Desapropriação ordinária ou clássica .........................................308
2.6.1.2. Desapropriação extraordinária ...................................................309
2.6.2. Procedimento da desapropriação ..................................................310
2.6.2.1. Fase declaratória ........................................................................310
2.6.2.2. Fase executória ..........................................................................311
2.6.3. Da destinação dos bens desapropriados ........................................316
2.6.4. Desapropriação indireta ................................................................317
2.6.5. Direito de extensão .......................................................................319
12
2.6.6. Tredestinação ................................................................................320
2.6.7. Retrocessão ...................................................................................322
Capítulo XII - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
1. Introdução ...........................................................................................325
2. Breve histórico ....................................................................................326
2.1. Teoria da irresponsabilidade do Estado ...........................................326
2.2. Teoria da culpa civil ou subjetiva do Estado ...................................326
2.3. Teoria da Culpa Administrativa .......................................................327
2.4. Teoria da responsabilidade objetiva .................................................327
3. Elementos constitucionais da responsabilidade civil do Estado .........328
3.1. Pessoas responsáveis .......................................................................328
3.2. Danos ...............................................................................................330
3.3. Qualidade de agente .........................................................................330
3.4. Causa ...............................................................................................330
3.6. Direito de regresso ...........................................................................334
4. Dano decorrente de obra pública ........................................................336
5. Dano decorrente de atos legislativos e jurisdicionais .........................336
6. Dano decorrente de atos de multidões e por atos terroristas ...............338
7. Dano decorrente de serviço notarial, cartório extrajudicial e
tabelionato ..............................................................................................339
8. Dano decorrente de medida provisória não convertida em lei.............340
9. Excludentes de responsabilidade ........................................................341
10. Prescrição ..........................................................................................342
Capítulo XIII - PROCESSO ADMINISTRATIVO
1. Introdução ...........................................................................................349
2. Princípios ............................................................................................349
2.1. Princípio do contraditório e da ampla defesa ...................................350
2.2. Princípio da legalidade objetiva .......................................................351
2.3. Princípio da oficialidade ..................................................................351
2.4. Princípio do formalismo moderado .................................................352
2.5. Princípio da verdade material ..........................................................352
3. Fases do processo administrativo .......................................................353
4. Espécies de processo administrativo ...................................................354
4.1. Da sindicância ..................................................................................355
4.2. Do processo administrativo disciplinar – PAD ................................356
4.3. Da revisão .......................................................................................359
Direito Administrativo
13
Capítulo XIV - IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
1. Introdução ...........................................................................................361
2. Sujeito Passivo ....................................................................................362
3. Sujeito Ativo .......................................................................................363
4. Modalidades ........................................................................................364
5. Cominações ........................................................................................366
6. Procedimentos ....................................................................................370
6.1. Procedimento administrativo ...........................................................370
6.2. Procedimento judicial ......................................................................372
Capítulo XV - CONTROLE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 1. Introdução ...........................................................................................377
2. Classificação das formas de controle ..................................................379 2.1. Quanto aos órgãos incumbidos do controle .....................................379
2.2. Quanto ao âmbito .............................................................................379 2.3. Quanto à amplitude ..........................................................................380
2.4. Quanto ao momento de exercício ....................................................381 2.5. Quanto à iniciativa ...........................................................................381
2.6. Quanto à natureza do controle .........................................................381
3. Controle Administrativo .....................................................................382 3.1. Direito de petição .............................................................................382
3.2. Representação ..................................................................................383 3.3. Reclamação Administrativa .............................................................383
3.4. Pedido de reconsideração .................................................................383
3.5. Recurso hierárquico .........................................................................384 3.6. Pedido de revisão .............................................................................385
4. Controle Legislativo ...........................................................................385 4.1. Controle político ..............................................................................386
4.2. Controle financeiro ..........................................................................387 5. Controle judicial .................................................................................389
5.1. Sistema de jurisdição .......................................................................391
5.2. Meios de controle ............................................................................391 5.2.1. Habeas corpus ..............................................................................392
5.2.2. Habeas data ..................................................................................393 5.2.3. Mandado de segurança individual ................................................394
5.2.4. Mandado de segurança coletivo ....................................................401 5.2.5. Mandado de injunção ....................................................................403
5.2.6. Ação civil pública .........................................................................404
5.2.7. Ação popular .................................................................................406 Referências Bibliográficas ......................................................................409
Direito Administrativo
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Capítulo I
OO EESSTTAADDOO,, AA AADDMMIINNIISSTTRRAAÇÇÃÃOO PPÚÚBBLLIICCAA,, OO
DDIIRREEIITTOO AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVOO EE OO RREEGGIIMMEE
JJUURRÍÍDDIICCOO--AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVOO
1. Estado: conceito, evolução e transformações
Até alcançar a sua formatação atual, o Estado, já passou e
ainda passa por inúmeras transformações. Em uma primeira
concepção seria constituído por três elementos indissociáveis:
povo, território e governo soberano. Neste sentido, o Estado
poderia tradicionalmente ser conceituado como o núcleo
politicamente organizado e ordenado, com um poder soberano
exercido nos limites do seu território e finalidades específicas
respeitadas por um povo. Jacques Chevallier (2009, p. 24-5)
formata o Estado (em sua ideia inicial) em cinco elementos
essenciais devidamente conjugados: 1. Nação: a existência de um
grupo humano; 2. Estado: figura abstrata depositária da identidade
social e fonte de toda a autoridade; 3. Monopólio da coerção: o
Estado como única fonte legítima de coerção; 4. Interesse geral: o
Estado é concebido como o princípio de integração, unificação e de
coesão social, e; 5. Burocracias funcionais: existência de um
aparelho estruturado e coerente de dominação encarregado de
colocar em funcionamento esse poderio. Entretanto, esse mesmo
autor (CHEVALLIER, 2009, p. 21) observa que: o Estado se
caracteriza, enquanto forma de organização política, por um certo
número de elementos comuns e específicos que se extraem de sua
essência, constituem as balizas mestres de sua edificação e estão
no princípio de sua instituição. Ora, esses elementos não se
extraem mais, na sociedade contemporânea, como evidentes em
si sós (...) – (grifei). O Estado que estaríamos vivenciando hoje
seria o que se tem denominado de pós-moderno. Um Estado
passando por profundas crises (ainda que se prefira dar o nome de
transformações) estruturais e valorativas, que nas palavras de José
16
Luis Bolzan de Morais (2002) seriam crises: conceitual, estrutural,
institucional e política. Todas na tentativa de acompanhar a
sociedade contemporânea, altamente informatizada e dinâmica.
Ainda assim, é ele (o Estado) que guia, distribui,
planifica a vida não só individual, mas também organizada em
sociedade (social). Contudo, as obrigações não se limitam aos
membros da sociedade entre si, envolvem, inclusive, o próprio
Estado.
Da Revolução Francesa (tomando-a como marco
histórico) emergiram e permaneceram duas ideias centrais que
ainda dão forma a esta feição (pós)moderna de Estado (MAFFINI,
2008, p. 22). A primeira delas seria o conceito de Estado de Direito
sustentado por quatro elementos:
A segunda foi a retomada do pensamento Aristotélico,
aprofundado por Montesquieu (na obra O Espírito das Leis),
defendendo a necessidade de divisão do Estado em funções
(tradicionalmente denominado: Poderes - Legislativo, Judiciário e
Executivo).
A separação dos Poderes vem prevista na Constituição
Federal de 1988 em seu art. 2º, estabelecendo que são
independentes e harmônicos entre si o Legislativo, o Judiciário e o
A regulação e
submissão do
próprio
Estado a tal
ordenamento
jurídico.
A imposição
isonômica a
todos que
fossem
submetidos a
esta ordem
jurídica.
A existência de
um
ordenamento
jurídico para a
regulação da
vida em
sociedade.
A existência de
uma jurisdição
imparcial a
quem se
submeteria à
sociedade e ao
próprio Estado.
Estado de Direito
Direito Administrativo
17
Executivo: sistema de freios e contrapesos – mecanismo por força
do qual atribui-se a uns funções que seriam exercidas atipicamente
por outros, com o intuito de promover um equilíbrio melhor e
articulado entre os Poderes (MELLO, 2002, p. 30).
Como fora bem demonstrado por Danilo Zolo (2010),
ainda que o Estado de Direito seja apresentado pela doutrina como
sinônimo de rule of law (Estado de Direito Inglês – assim como
sua variante norte-americana) em verdade tanto o Rechtsstaat
(Estado de Direito Alemão), quanto o État de Droit (Estado de
Direito Francês) e o Stato di Diritto (Estado de Direito Italiano)
tiveram suas peculiaridades, o que não seria de todo correto
abordar como pacífico a coincidência conceitual. Como não é o
objetivo aprofundar a discussão sobre o assunto, o que se
direcionaria o leitor ao estudo do próprio autor mencionado, é,
entretanto, necessária a abordagem dos principais pontos
sustentados no que nesta obra simplesmente se denominará de
Estado de Direito.
O primeiro ponto a ser destacado é, sem sombra de
dúvidas, o seu paradigma individualista. A Revolução Francesa foi
pautada na figura do Homem enquanto indivíduo, uma filosofia
política individualista (ZOLO, 2010, p. 5), sem qualquer
preocupação com o grupo ou com o coletivo, e neste sentido afirma
o autor: uma filosofia que não só abandonou definitivamente o
organicismo social, o utilitarismo coletivista e o estatismo, mas
que subordina a dimensão pública e o interesse geral ao primado
absoluto dos valores e das expectativas individuais.
Sob uma perspectiva política, o individualismo dá início
à construção do pensamento liberal – de intervenção mínima do
Estado – (BRAGATO, 2006, p. 468), pois sendo o indivíduo o
detentor primário de direitos, as atividades do Estado estariam
confiadas unicamente à proteção desses direitos. A lei positiva
(direito positivo), assim, poder-se-ia afirmar, é a manifestação da
própria liberdade do indivíduo. Deste ponto de vista, a Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) tem como fim a
conservação dos direitos naturais e imprescritíveis como a
liberdade e propriedade, garantindo assim o triunfo do indivíduo
(DUMONT, 1992, p. 99-100).
18
Assim sendo, a lei positiva (fundamentalmente baseada
no individualismo) teve seu império no início do Estado de Direito
o que, por via reflexa, tornou o Poder Legislativo o principal poder
no Estado Liberal, uma vez que a Lei vinha no sentido de proteção
da liberdade da vontade individual frente às intromissões estatais.
Ainda que houvesse uma regulação por parte do Estado, esta se
dava de forma mínima, de maneira a garantir a liberdade do
indivíduo. É bom destacar que a Revolução Francesa veio
exatamente para combater o Absolutismo Estatal, o que é de todo
compreensível, a prevalência das vontades individuais, como
forma de romper o anterior paradigma.
Tendo por base os direitos fundamentais o Estado Liberal
daria ensejo aos direitos de primeira dimensão/geração
correspondendo aos direitos de liberdade (os direitos civis e
políticos) de proteção do cidadão frente ao Estado: oponíveis ao
Estado, situações em que a intromissão do Estado não se
mostra(va) lícita, dirigidos a uma abstenção do Poder Público. O
que se pretende com os direitos fundamentais de primeira
geração/dimensão é a limitação dos poderes estatais.
É também sob este paradigma liberal, que surge para
limitar a atuação do Administrador Público (do Poder Executivo) o
princípio da legalidade, ou seja, a primazia da lei, por força da
qual as normas estatuídas pelo Poder Legislativo devem(riam) ser
rigorosamente respeitadas pelo Executivo (e também pelo
Judiciário) como condição de legitimidade dos atos (ZOLO, 2010,
p. 13), è attività sub lege (RASELLI, 1975, p. 10). Mas a limitação
ao Executivo vai além, uma vez que tudo o que não estiver
estabelecido em lei, ao invés de constituir uma liberdade, assim
como é aos particulares, traduz-se em uma não ação (uma
proibição). Sob este enfoque como bem observa o saudoso mestre
Seabra Fagundes (1979, p.4-5): administrar é aplicar a lei de
ofício.
A legitimidade do Poder Legislativo justificava-se na
democracia. Uma vez que, os que ali estavam, estavam por força
do poder do voto, e desta forma, eram a própria voz
(representantes) dos cidadãos, outorgavam ao legislador o poder
de proteção frente às interferências estatais. O Estado Liberal
Direito Administrativo
19
bastava-se com a igualdade formal, ou a igualdade perante a lei
(afinal, a sociedade girava em torno desta). Sob esta perspectiva
bastava-se o Direito na figura da Lei.
É fato que o homem evolui, e, consequentemente, a
sociedade. E com relação à transformação do Estado Liberal para o
Estado Social não foi diferente. Aliás, como bem denota Danilo
Zolo (2010, p. 76): No decorrer desse acontecimento secular, o
“Estado de Direito” abriu-se progressivamente ao reconhecimento
formal de uma serie de sucessivas “gerações” de direitos, até
assumir as faces daquilo que foi chamado de “Estado
constitucional” e, depois, de “Estado social” ou “Estado do bem-
estar” (Welfare State).
A sociedade percebeu que a igualdade perante a lei era
uma falácia, pois de fato entre os indivíduos havia muitas
diferenças (desigualdades), e a lei não os igualou. O Poder
Legislativo fora efetivo na sua proposta, entretanto, os objetivos da
sociedade que o legitimava mudaram. Agora, a sociedade
reivindicava uma igualdade material: de fato. Então é que surge a
figura do Poder Executivo como ator principal, como um
garantidor da igualdade de fato, e não somente formal como se
propusera o Estado Liberal.
Talvez como marco histórico (ainda que se saiba que toda
a evolução de uma sociedade dá-se de forma gradativa) possa-se
destacar a Segunda Guerra Mundial juntamente com a
promulgação da Constituição Mexicana de 1917 e a Constituição
Alemã de Weimar de 1919, como idealizadoras deste Estado
Social. Nesta seara expõe Manoel Gonçalves Ferreira Filho (2007,
p. 42): A consagração do chamado Estado-Social, ou Estado de
Bem-Estar, depois da Segunda Guerra Mundial, leva muito
adiante a tendência desempenhada pelo intervencionismo. Faz
predominar a concepção de que o Estado é como que uma
divindade benevolente, onisciente, quase onipotente (recorde-se a
profecia de Toqueville), apta a transformar a sociedade e o
homem, tornando aquela mais justa, este mais feliz.
O liberalismo na sua formulação inicial não resolveu o
problema das camadas proletárias, e, portanto, não encontrou
20
solução para as contradições sociais (BONAVIDES, 2009, p. 188).
Bonavides assim expõe: Quando o Estado, coagido pela pressão
das massas, pelas reivindicações que a impaciência do quarto
estado faz ao poder político, confere, no Estado constitucional ou
fora deste, os direitos do trabalho, da previdência, da educação,
intervém na economia como distribuidor, dita o salário, manipula
a moeda, regula os preços, combate o desemprego, protege os
enfermos, dá ao trabalhador e ao burocrata a casa própria,
controla as profissões, compra a produção, financia as
exportações, concede crédito, institui comissões de abastecimento,
provê necessidades individuais, enfrenta crises econômicas, coloca
na sociedade todas as classes na mais estreita dependência de seu
poderio econômico, político e social, em suma, estende sua
influência a quase todos os domínios que dantes pertenciam, em
grande parte, à área de iniciativa individual, nesse instante o
Estado pode, com justiça, receber a denominação de Estado social
(BONAVIDES, 2009, p. 186). Para garantir ao que o Estado agora
se propunha, necessitava de um Poder Executivo forte, e que,
também, devidamente legitimado pelo voto, passou a ter a sua
prevalência frente aos demais Poderes (Legislativo e Judiciário).
Tendo em conta os direitos fundamentais, o Estado Social
dava ensejo aos direitos de segunda geração/dimensão, ou seja, os
direitos sociais, culturais e econômicos, resultantes deste processo
evolutivo histórico de formação e consolidação do Estado, agora,
Social. Estes direitos (sociais) exigem um comportamento ativo do
Poder Público, mais especificamente do Poder Executivo,
possuindo uma dimensão positiva: a atuação do Estado. Aqui a
ação do Executivo propicia ao indivíduo que este goze a sua
liberdade (garantida no Estado Liberal). Os direitos são exercidos
através do Estado.
Os direitos de segunda dimensão, como regra, exigem
uma não-abstenção do Estado, ou seja, uma ação, que lhes dá a
característica de positivos. O Poder Público assume uma função
prestacional.
Andreas J. Krell (2002, p. 19) afirma que os direitos
sociais não são direitos contra o Estado, mas sim direitos através
do Estado, impondo ao Poder Público certas prestações materiais,
Direito Administrativo
21
as chamadas: políticas sociais, de educação, saúde, assistência,
trabalho, habitação, etc. O que diferenciaria basicamente os
direitos fundamentais de primeira para os de segunda dimensão é
que no primeiro caso, por tratar-se de direitos de defesa, exigiria
uma abstenção do Estado (um nom facere), enquanto os últimos
uma atuação (um facere) estatal, uma prestação positiva de
natureza material ou fática (CUNHA JUNIOR, 2008, p. 291).
Teriam os países de modernidade tardia, especificamente
o caso do Brasil, ultrapassado o Estado Social? A resposta é não.
Em verdade o Brasil sequer, efetivamente, experimentou o Estado
(puramente) Liberal. Então de fato, estamos em meio a maior
demanda por serviços públicos, devidamente garantidos pela
Constituição e pela Lei, mas que de fato, não conseguem ser
prestados pelo Poder Executivo. E como agora (ontem o
Legislativo), quem se mostra ineficiente é a Administração Pública
(Poder Executivo), quais as consequências? Quem se apresentaria
capaz que dar efetividade ao que foi prometido pela Constituição e
normas infraconstitucionais? Eis é que surge a intervenção e a
importância do Poder Judiciário no que se convencionou
denominar de Estado Democrático de Direito.
A Constituição Federal de 1988 incorporando não só
ideais liberais, mas principalmente sociais, apresentou inúmeras
promessas que ao longo dos 22 anos de sua promulgação não
foram concretizados pelo Poder Executivo. Isso fez com que o
período – curto e ilusório – de hegemonia Executiva desse lugar ao
novo papel do Poder Judiciário. Para alguns, ativismo judicial, para
outros, invasão nas competências do Poder Executivo, para outros,
ainda, nada mais que o cumprimento do seu papel constitucional. O
que de fato vê-se, atualmente, é, sem sombra de dúvidas, uma
crescente importância das decisões judiciais, e via de
consequência, um aumento da responsabilidade do papel do Poder
Judiciário frente à sociedade (no caso específico, a brasileira). É a
partir destas ideias que se iniciará o estudo da Administração
Pública.
22
2. Administração Pública
Primeiramente é de bom alvitre destacar que quem
estabelece os fins da Administração Pública, não é a lei
(infraconstitucional), mas sim a Constituição Federal. É árdua a
conceituação do que seja Administração Pública, podendo ser
concebida em dois sentidos, os quais não são excludentes, mas sim
complementares um ao outro.
Como visto (Administração Pública no sentido objetivo,
material), o Poder Executivo possui por função precípua a
administração pública, art. 84 da CRFB/88. O Poder Legislativo
executa a função de criação de normas jurídicas primárias (leis) e
fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial do
Executivo, art. 48 da CRFB/88. O Poder Judiciário, por sua vez, é
a quem cabe tipicamente a função de processar e julgar, ou seja, de
solução de conflitos, dizendo/criando o direito no caso concreto e
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Sentido objetivo, material ou funcional
Sentido subjetivo, formal ou orgânico
Designa a natureza da atividade desempenhada pelo Estado para alcançar os objetivos
traçados na Constituição. É a função ou atividade
administrativa desempenhada pelo Estado, que incumbe precipuamente ao Poder Executivo. Inclui não só a
Administração Pública Direta e Indireta, mas também, todas as pessoas que com ele colaboram
como concessionárias, permissionárias e paraestatais.
É o conjunto de pessoas jurídicas, órgãos e agentes
públicos que têm a incumbência de executar as atividades administrativas.
Seguindo orientação doutrinária (MEIRELLES, 2009,
p. 65), neste sentido, a palavra Administração Pública
deve estar sempre com as iniciais maiúsculas. É a soma
da Administração Pública Direta e Indireta.
Direito Administrativo
23
dirimindo conflitos que lhe são alcançados, art. 5º, XXXV, da
CRFB/88.
Entretanto, não há exclusividade no exercício de cada
função; há sim uma preponderância, uma prevalência. Isso porque
o Poder Legislativo, que possui função típica de legislar, ao
realizar a nomeação de um servidor está cumprindo atipicamente
papel típico do Poder Executivo. Da mesma forma, quando o Poder
Judiciário realiza uma licitação para compra de material de
escritório está exercendo de maneira atípica a função
administrativa (típica para o Poder Executivo). Apresentando de
forma sintética:
Parte da doutrina (MEDAUAR, 2008, p. 46; CARVALHO FILHO, 2008, p. 3) não aceita a função de processar e julgar (jurisdicional) como atípica do Poder Executivo, ou porque os julgamentos dos processos disciplinares, por exemplo, seriam em verdade atos administrativos, e não propriamente decisões, ou porque a Constituição Federal não teria dado margem, assim como fez ao Poder Legislativo, no art. 52, I e II, para que o Poder Executivo pudesse exercer a função jurisdicional, ainda que
Função de administrar
Atípico
Arts. 59, IV, 62 da
CRFB/88
Típico
Art. 48 da CRFB/88
Atípico
Arts. 96, I a e 61 da
CRFB/88
Típico
Art. 84 da CRFB/88
Atípico
Arts. 51, IV e 52, III da CRFB/88
Atípico
Art. 96, I b, e e f da
CRFB/88
Função de legislar
Atípico
Art. 143 da Lei 8.112/90
Atípico
Art. 52, I, II, da CRFB/88
Típico
Arts. 102, I, 109, da
CRFB/88
Função de processar e julgar
Executivo Judiciário Legislativo
24
atipicamente. Mesmo assim, pondera Celso Antonio Bandeira de Mello (2002, p. 31): se o Legislativo fundar-se na ocorrência de algo que não existiu para dar como incursa em crime de responsabilidade a autoridade por ele processada e “julgada”, cabe recurso ao Poder Judiciário para anular decisão que, dessarte, lhe haja provocado lesão de direito.
3. Direito Administrativo
O Direito Administrativo como disciplina jurídica teve sua origem na França. Por tal motivo, até hoje sofre grande influência daquele país. É ramo do Direito Público (LIMA, 1964, p. 18) e seu conceito pode variar de acordo com o critério adotado, ou até mesmo, o que é mais comum, do autor consultado. São vários os critérios que servem para a conceituação do que seja Direito Administrativo. A doutrina costuma classificar o Direito Administrativo de acordo com cada critério como:
Critério negativista Ramo do Direito que regula toda a atividade estatal que não seja legislativa e jurisdicional.
Critério legalista Conjunto de leis administrativas que regulam a Administração Pública.
Critério do poder executivo
Critério das relações jurídicas
Critério teleológico ou finalístico
Conjunto de regras que disciplinam os atos do Poder Executivo.
Conjunto de regras que disciplinam
o relacionamento da Administração
Pública com os administrados.
Sistema de princípios que regulam a atividade do Estado para o cumprimento de seus fins.
Critério do serviço público
Disciplina jurídica que regula a instituição, a organização, o funcionamento e a prestação dos serviços públicos.
Direito Administrativo
25
Não obstante os critérios expostos acima, aos quais os
próprios autores fazem duras críticas, podemos conceituar Direito
Administrativo como ramo do Direito Público, consistente num
conjunto ordenado de normas (princípios e regras), que além de
disciplinar o exercício da função administrativa também regula as
pessoas jurídicas, órgãos e agentes que a desempenham, sempre
visando ao interesse público.
3.1. Fontes do Direito Administrativo
O Direito Administrativo possui, basicamente, quatro
fontes principais: a lei, o costume, a jurisprudência e a doutrina.
3.1.1. Lei
É a principal fonte do Direito Administrativo. É fonte
primária porque inaugura um novo direito, inova no ordenamento
jurídico (todas as demais fontes são derivadas). A expressão lei
possui uma concepção ampla, abrangendo todos os atos normativos
resultantes do Poder Legislativo como as leis ordinárias,
complementares, leis delegadas, decretos legislativos, e até a
própria Constituição Federal.
3.1.2. Costume
É prática reiterada e uniforme de um comportamento
social. Pode ser utilizada desde que não contrarie a lei e a moral.
Não pode ser confundido com a praxe administrativa, prevista no
art. 100, III, do CTN, como sendo as práticas reiteradamente
observadas pelas autoridades administrativas, ou seja, a prática
reiterada de atos administrativos exercidos dentro dos limites
legais.
3.1.3. Jurisprudência
São decisões judiciais num mesmo sentido que acabam
por influenciar o Direito Administrativo. São exemplos as decisões
proferidas em ADI (Ações Direta de Inconstitucionalidade), em
ADC (Ações Diretas de Constitucionalidade), em RE (Recursos
Extraordinários), em REsp (Recursos Especiais), decisões estas
que podem até virar Súmulas e Súmulas Vinculantes – art. 103-A,
da CRFB/88 (estas últimas regulamentadas pela Lei nº 11.417/06).
26
3.1.4. Doutrina
A doutrina é um conjunto teórico de princípios aplicáveis
ao Direito. É o elemento constitutivo da Ciência Jurídica, resultado
do trabalho de estudiosos, autores, juristas e cientistas, com função
de construir e consolidar entendimentos (paradigmas) de matérias
que envolvem o Direito Administrativo.
4. Regime jurídico-administrativo
Para poder se falar em Direito Administrativo é
necessário que existam princípios próprios, que lhe sejam
peculiares. Como bem explicita Celso Antonio Bandeira de Mello
(2002, p. 36), pode-se dizer que há uma disciplina jurídica
autônoma quando existe um conjunto sistematizado de princípios e
normas que lhe dão identidade, diferenciando-a das demais
ramificações do Direito. E assim o é com o Direito Administrativo,
onde o seu regime jurídico existe quando há princípios que lhe são
peculiares e que guardam entre si uma relação lógica de coerência
e unidade, compondo um sistema (MELLO, 2002, p. 36).
Para Maria Sylvia Di Pietro (2009, p. 60), o regime
jurídico-administrativo se resume em duas palavras: prerrogativas
(privilégios) e sujeições (restrições). Neste sentido o regime
jurídico-administrativo possui como princípios basilares a
supremacia do interesse público sobre o interesse privado
(funcionando como prerrogativa, como poder administrativo) e a
indisponibilidade do interesse público (funcionando como
sujeição, como dever administrativo).
Regime Jurídico-Administrativo
Supremacia do interesse público
sobre o particular.
Indisponibilidade do interesse
público.
Direito Administrativo
27
Capítulo II
PPRRIINNCCÍÍPPIIOOSS AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVOOSS
1. Introdução
É de fundamental importância o estudo dos princípios. Estes são postulados fundamentais, são a base, a estrutura de todo um (macro ou micro) sistema jurídico. Por tal motivo, em tese, seria mais gravoso infringir um princípio que somente uma regra (lei), pois ao burlar-se o princípio estaria se contrariando todo o sistema.
Não obstante tenham um alto grau de abstração em comparação às leis, os princípios, especialmente os administrativos, adquirem grande importância, haja vista que por não haver uma codificação estruturada de direito administrativo, existindo apenas leis esparsas, são eles que suprem eventuais lacunas, servem de parâmetro, que dão coerência e uniformidade na interpretação das normas administrativas (ALEXY, 2007).
Hoje se vive em um Estado de Direito, que mais que um Estado de leis é também um Estado de princípios (MAFFINI, 2008, p. 34). Não existe uma classificação rígida de princípios. Serão expostos os mais sustentados pela doutrina e jurisprudência, e classificados em dois grupos: os princípios explícitos (ou expressos) e os implícitos.
2. Princípios explícitos (expressos)
Adota-se esta nomenclatura porque vêm expressamente
previstos no caput do art. 37 da CRFB/88, sendo eles os princípios da:
Legalidade
Impessoalidade
Moralidade
Publicidade
Eficiência
28
2.1. Princípio da legalidade
Tem-se este princípio como um dos basilares da
Administração Pública, pois, segundo ele, toda e qualquer
atividade administrativa deve ter por fundamento a lei. É uma
sujeição, um limite ao qual o administrador público está
submetido, pois todos os seus atos deverão ser pautados na lei, não
bastando a não contrariedade à lei. Com relação à legalidade estrita
julgou o Superior Tribunal de Justiça:
CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO ANTERIORMENTE
DEMITIDO DO SERVIÇO PÚBLICO FEDERAL. NEGATIVA DE
NOMEAÇÃO EM OUTRO CARGO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA
LEGALIDADE.
O cerne da controvérsia cinge-se à interpretação e aplicação dos
princípios da moralidade e da legalidade insculpidos no art. 37, caput,
da CF. No caso, o impetrante foi aprovado em concurso público para
os cargos de analista fiscal de contas públicas e de analista
administrativo do TC estadual, mas teve sua nomeação recusada em
virtude de anterior demissão dos quadros da PRF por ato de
improbidade administrativa. A Min. Relatora observou que, estando
ambos os princípios ladeados entre os regentes da Administração
Pública, a discussão ganha relevância na hipótese em que o
administrador edita ato em obséquio ao imperativo constitucional da
moralidade, mas sem previsão legal específica. A Turma entendeu
que, por força do disposto nos arts. 5º, II, 37,caput, e 84, IV, da CF, a
legalidade na Administração Pública é estrita, não podendo o gestor
atuar senão em virtude de lei, extraindo dela o fundamento jurídico de
validade dos seus atos. Assim, incorre em abuso de poder a negativa
de nomeação de candidato aprovado em concurso para o exercício de
cargo no serviço público estadual em virtude de anterior demissão no
âmbito do Poder Público Federal se inexistente qualquer previsão em
lei ou no edital de regência do certame. (RMS 30.518-RR, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 19/6/2012).
De acordo com o art. 5º, II, da CRFB/88: ninguém será
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude
de lei. Isso quer dizer que ao particular tudo o que não estiver
vedado por lei, lhe é permitido.
Atenção! Para a Administração, tudo o que não estiver autorizado em lei, lhe é vedado. Se mesmo sem funda-mento legal tomar alguma atitude, restará esta ilícita.
Direito Administrativo
29
É também o princípio da legalidade uma garantia para o
administrado, pois sabe que toda a atividade administrativa deve
estar respaldada na legislação, não podendo, desta forma, sofrer
investidas arbitrárias por parte do administrador público. Celso
Antonio Bandeira de Mello (2002, p. 50) afirma que o princípio da
legalidade encarna o princípio da finalidade pública, uma vez
que não se compreenderia uma lei, uma norma, sem entender o seu
objetivo, ou seja, só se cumpriria a legalidade quando se atendesse
a sua finalidade. Assim, a atividade administrativa, desvirtuada do
seu fim legal, seria uma ação invalida.
Pelo princípio da legalidade, para a legitimidade de um
ato administrativo é insuficiente o fato de não ser ofensivo à lei.
Cumpre que seja praticado com embasamento em alguma norma
permissiva que irá lhe servir de fundamento. Não basta a não-
contradição, deve haver quase que uma submissão.
Atualmente, este princípio vem sofrendo um alarga-
mento. Em verdade, não propriamente o princípio, mas sim o
conceito de legalidade. Isso porque deve o administrador público
respeitar não somente a lei propriamente dita (sentido formal), mas
também os princípios, e, de uma forma geral, o Direito, o
Ordenamento Jurídico como um todo. Por isso, não é incomum
ver-se ações ingressadas contra administradores que não
infringiram a lei em seu sentido formal, mas sim algum princípio
(neste sentido STF no RMS nº 24.699 e no RE nº 76.729).
Em alguns momentos, entretanto, a legalidade é posta
num segundo plano pela própria Constituição Federal, permitindo
ao administrador agir sem autorização legal, como na adoção das
medidas provisórias (art. 62), na instituição do Estado de Defesa
(art. 136) e do Estado de Sítio (arts. 137 a 139), além do caso do
art. 84, VI, da CRFB/88 (decretos autônomos), aprofundado no
capítulo referente aos poderes administrativos.
2.2. Princípio da impessoalidade
Para Celso Antonio Bandeira de Mello (2002, p.55) nada
mais é que o princípio da isonomia ou igualdade. Hely Lopes
Meirelles (2009, p. 93) já entende ser o clássico princípio da
finalidade.
30
A atividade administrativa não pode ter por fim pessoa
específica, determinada, com o objetivo de lhe garantir privilégios
que não sejam estendidos de forma isonômica aos demais. Deve
ser destinada a todos os cidadãos de forma geral, sem
discriminação (FREITAS, 2009, p. 49), por força inclusive do art.
5º, I, da CRFB/88 que afirma: todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza (...), ou seja, a finalidade da lei é
que todos sejam tratados de forma impessoal.
Exemplo clássico que se tem do princípio da
impessoalidade é a regra contida no art. 37, II, da CRFB/88
exigindo para a investidura em cargo ou emprego público
aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e
títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou
emprego (STF no MS nº 22.509/SP; STJ no REsp nº 205.870/PI,
no RMS nº 11.336/PE).
A impessoalidade objetiva o tratamento igualitário que a
Administração Pública deve dispensar a todos os administrados
(STF no MI nº 58-1/DF).
Com razão, neste sentido, Juarez Freitas (2009, p. 83-4):
é tempo de, doutrinária e jurisprudencialmente, o princípio da
imparcialidade ou da impessoalidade ser assimilado como justa e
equalizadora vedação à prática de discriminações negativas em
Atenção! Em alguns momentos a Lei ou a Constituição permitem alguma hipótese de favorecimento, mas não a pessoas determinadas e sim a certas categorias de pessoas, como ocorre nos concursos em que se exige um limite de idade justificado pela natureza do cargo (Súmula do STF nº 683). O mesmo ocorre quanto aos privilégios concedidos às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte com o fim de estimular emprego e riqueza ao país (arts. 170, IX, e 179 da CRFB/88 c/c LC nº 123/06), ou mesmo na reserva de percentual de vagas para pessoas portadoras de deficiência (art. 37, VIII, da CRFB/88). Mesmo nestas hipóteses é temerária a afirmativa que a Administração Pública está sendo parcial ou pessoal.
Direito Administrativo
31
todas as relações de administração, assim como dever de redução
das desigualdades nefastas à promoção do “bem de todos”, nos
termos no art. 3º da CF. Não implica jamais cercear a prática
salutar das diferenciações positivas, (...). Impessoalidade não quer
dizer, nessa linha, falta de estímulo à criatividade ou ao
comprometimento pessoal dos agentes públicos com as metas
pactuadas, por exemplo, nas áreas da saúde, educação e
segurança.
José Afonso da Silva (2002, p. 648) traz importante
observação. A impessoalidade pode ser tanto em relação aos
administrados como à própria Administração. A primeira forma de
impessoalidade foi a que até aqui se trabalhou (em relação aos
administrados). Já a segunda forma, a qual será aprofundada no
Capítulo III, quer dizer que a responsabilidade pelos atos
praticados não é imputada ao agente que os praticou, mas sim à
pessoa jurídica, por força da Teoria do Órgão.
É através, também, deste princípio que se veda a promoção
pessoal dos administradores, forte no art. 37, § 1º, da CRFB/88.
Outro exemplo é a edição da Súmula Vinculante nº 13 (incluindo o
respeito a outros princípios) que estabeleceu a vedação do
nepotismo: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em
linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau,
inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma
pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou
assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de
confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração
Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o
ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição
Federal. Ainda os arts. 2º, parágrafo único, III, e 18 a 21, da Lei nº
9.784/99 e art. 149, § 2º, da Lei nº 8.112/90.
ADMINISTRADO
ADMINISTRAÇÃO
IMPESSOALIDADE
ADMINISTRAÇÃO
ADMINISTRADO
32
Porém, o próprio Supremo Tribunal Federal de encontro
ao que se imaginava julgou os seguintes casos:
AGRAVO REGIMENTAL EM MEDIDA CAUTELAR EM
RECLAMAÇÃO. NOMEAÇÃO DE IRMÃO DE GOVERNADOR
DE ESTADO. CARGO DE SECRETÁRIO DE ESTADO.
NEPOTISMO. SÚMULA VINCULANTE Nº 13.
INAPLICABILIDADE AO CASO. CARGO DE NATUREZA
POLÍTICA. AGENTE POLÍTICO. ENTENDIMENTO FIRMADO
NO JULGAMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
579.951/RN. OCORRÊNCIA DA FUMAÇA DO BOM DIREITO. 1.
Impossibilidade de submissão do reclamante, Secretário Estadual
de Transporte, agente político, às hipóteses expressamente
elencadas na Súmula Vinculante nº 13, por se tratar de cargo de
natureza política. 2. Existência de precedente do Plenário do Tribunal:
RE 579.951/RN, rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJE 12.9.2008. 3.
Ocorrência da fumaça do bom direito. 4. Ausência de sentido em relação
às alegações externadas pelo agravante quanto à conduta do prolator da
decisão ora agravada. 5. Existência de equívoco lamentável, ante a
impossibilidade lógica de uma decisão devidamente assinada por
Ministro desta Casa ter sido enviada, por fac-símile, ao advogado do
reclamante, em data anterior à sua própria assinatura. 6. Agravo
regimental improvido. (Rcl nº 6650 MC-AgR / PR, Min. ELLEN
GRACIE, 16/10/2008).
O Supremo Tribunal Federal possui decisões que fixam o entendimento
segundo o qual os cargos de natureza política, como o de Secretário de
Estado ou Secretário Municipal, não se submetem às hipóteses da
Súmula Vinculante n. 13 do STF (RE 579.951/RN,rel. Min. Ricardo
Lewandowski, DJE 12.9.2008; Rcl 6650 MC-AgR, Rel. Min. Ellen
Gracie, DJ 21.11.2008). Ocorre que, no caso concreto apresentado
nos autos, tem-se cargo que, à primeira vista, parece ser de
duvidosa natureza política: o de Procurador-Geral da Câmara
Municipal. O fato alegado de que lei municipal teria atribuído
natureza eminentemente política a tal cargo não parece elidir a
plausível hipótese de incidência no caso da Súmula Vinculante n. 13 do
Supremo Tribunal Federal, tal como atestado em análise preliminar pelo
Juízo de Direito da Comarca de Silva Jardim-RJ. Portanto, neste
primeiro contato com os autos, não vislumbro no caso concreto qualquer
violação aos termos da Súmula Vinculante n. 13 do STF por parte da
autoridade reclamada. Ausente o requisito da plausibilidade jurídica do
pedido, entendo que não há motivo para a concessão de medida liminar.
(Rcl nº 12.742/RJ, Min. Rel. Gilmar Ferreira Mendes, julgado em
14/12/2011).
Direito Administrativo
33
Por tudo, conclui-se que a Súmula Vinculante nº 13 só se
aplica a cargos eminentemente administrativos, excluídos de índole
política.
AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO
CONSTITUCIONAL. DENEGAÇÃO DE LIMINAR. ATO
DECISÓRIO CONTRÁRIO À SÚMULA VINCULANTE 13 DO
STF. NEPOTISMO. NOMEAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DO
CARGO DE CONSELHEIRO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO
ESTADO DO PARANÁ. NATUREZA ADMINISTRATIVA DO CARGO. VÍCIOS NO PROCESSO DE ESCOLHA. VOTAÇÃO
ABERTA. APARENTE INCOMPATIBILIDADE COM A
SISTEMÁTICA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRESENÇA DO
FUMUS BONI IURIS E DO PERICULUM IN MORA. LIMINAR
DEFERIDA EM PLENÁRIO. AGRAVO PROVIDO. I - A vedação do
nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática, uma
vez que decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da
Constituição Federal. II - O cargo de Conselheiro do Tribunal de
Contas do Estado do Paraná reveste-se, à primeira vista, de
natureza administrativa, uma vez que exerce a função de auxiliar do
Legislativo no controle da Administração Pública. III - Aparente
ocorrência de vícios que maculam o processo de escolha por parte da
Assembleia Legislativa paranaense. IV - À luz do princípio da simetria,
o processo de escolha de membros do Tribunal de Contas pela
Assembleia Legislativa por votação aberta, ofende, a princípio, o art. 52,
III, b, da Constituição. V - Presença, na espécie, dos requisitos
indispensáveis para o deferimento do pedido liminarmente pleiteado. VI
- Agravo regimental provido
(Rcl nº 6.702/PR, Min. Rel. Ricardo Lewandowski, julgado em
04/03/2009).
2.3. Princípio da moralidade
Ainda que de difícil definição, o princípio da moralidade
está ligado ao conceito de honestidade, de conduta ilibada, ética,
decente, leal: de bom administrador. Aparece na Constituição
Federal de 1988 em três artigos distintos: no art. 5º, LXXIII
(quando trata da Ação Popular), no art. 14 (quando aborda os casos
de inelegibilidade) e caput do art. 37 (que trabalha os princípios da
Administração Pública). De fato um dos maiores pensadores
positivistas, Hans Kelsen (2009, p. 71), ao formular uma ciência
(Teoria pura do direito) de cunho puramente jurídica, tenta excluir
todos os elementos morais: o Direito só pode ser distinguido
essencialmente da Moral quando – como já mostramos – se
34
concebe como uma ordem de coação, isto é, como uma ordem
normativa que procura obter uma determinada conduta humana
ligando à conduta oposta um ato de coerção socialmente
organizado, enquanto a Moral é uma ordem social que não estatui
quaisquer sanções desse tipo (...). Mas como bem aponta Juarez
Freitas (2009, p. 88) assim considerado – isto é como princípio
jurídico autônomo –, colabora, ao mesmo tempo, para o reforço
dos demais e para a ultrapassagem da dicotomia rígida entre
Direito e Moral; rigidez tão enganosa como aquela que pretende
separar Direito e Sociedade (...).
No Direito Público, afirma Têmis Limberger (1998, p.
124): a entrada da moral na área do direito público vai ocorrer
com a figura do desvio de poder, que dará ensejo a que se
desenvolva, através da criação jurisprudencial, a moralidade
administrativa. Assim, segue a autora, não bastaria que o ato fosse
praticado em conformidade com a lei, sendo necessário que o
mesmo também fosse revestido de moralidade (LIMBERGER,
1998, p. 125).
De acordo com a doutrina moderna e a jurisprudência, a
imoralidade é vista como uma forma de ilegalidade, e, portanto,
sujeita ao controle do Poder Judiciário. Neste sentido afirma a
autora citada: tal se constitui evidentemente em um grande avanço,
visto que o controle jurisdicional pode adentrar na esfera moral de
forma mais intensa (LIMBERGER, 1998, p. 122).
Um conceito próximo do que seja moralidade
administrativa talvez possa ser encontrado na Lei nº 9.784/99, art.
2º, parágrafo único, inciso IV: atuação segundo padrões éticos de
probidade, decoro e boa-fé.
A não observância deste princípio pode gerar inúmeras
consequências legalmente previstas como: propositura de Ação
Popular (art. 5º, LXXIII, da CRFB/88 e Lei nº 4.717/65), de Ação
Civil Pública (Lei nº 7.347/85, art. 1º, IV) e de Ação de
Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92).
Para a doutrinadora Maria Sylvia Zanella Di Pietro
(2009, p. 77), em se tratando de matéria administrativa, sempre que
se verificar que o comportamento da Administração ou do
Direito Administrativo
35
administrado que com ela se relaciona juridicamente, ainda que em
consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as
regras de boa administração, a ideia comum de honestidade,
estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa.
A moralidade administrativa refere-se a uma moralidade jurídica
que se chega pela observância de princípios como os da
supremacia do interesse público, legalidade, impessoalidade,
igualdade, ao qual se aciona mais um elemento: o dever de
lealdade às instituições (ARAÚJO, 2009, p. 56-7).
2.4. Princípio da publicidade
Princípio que torna obrigatória a divulgação dos atos
praticados pela Administração Pública. É inerente ao próprio
conceito de democracia, ou seja, atribui dever de transparência, de
visibilidade do Poder Público.
O princípio da publicidade assoma como o mais importante princípio
instrumental e condição indispensável para a sindicabilidade da
legalidade, da legitimidade, e da moralidade da ação do Poder Público,
pois será pela transparência dos seus atos, ou, como mais
adequadamente expressado, por sua visibilidade, que se tornará possível
constatar a sua conformidade ou desconformidade com a ordem jurídica
e, em consequencia, poderem ser exercidas as várias modalidades de
controle nela previstos. (MOREIRA NETO, 2006, p. 278).
Com previsão Constitucional no art. 37, § 1º, a
publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos
órgãos públicos deverão ter caráter educativo, informativo ou de
orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou
imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou
servidores públicos.
A publicidade gera a eficácia dos atos administrativos e
também alguns efeitos como: a presunção do conhecimento, o
desencadeamento do decurso do prazo para interposição de
recursos, o início da contagem dos prazos de prescrição e
decadência, entre outros (por exemplo, os efeitos da declaração de
utilidade pública estão previstos no art. 7º do Decreto-Lei nº
3.365/41).
36
Aparece previsto em inúmeras normas: art. 5º, XXXIII,
primeira parte, e inciso XXXIV; art. 93, IX e X, todos da
CRFB/88, na Lei nº 8.666/93 art. 3º, § 3º, primeira parte, artigos 21
e 61, parágrafo único, art. 14, da Lei nº 9.784/99, entre outros.
O princípio da publicidade constitui, também, uma
garantia para o administrado, pois facilita o controle sobre as ações
do administrador, sendo requisito para a eficácia dos atos
administrativos. Os instrumentos utilizados para a garantia deste
princípio são, via de regra, o habeas data (Lei nº 9.507/97) e o
mandado de segurança (Lei nº 12.016/09).
2.5. Princípio da eficiência
Ainda que sem um conceito unívoco para expressão, haja
vista que a eficiência é matéria de estudos em inúmeras ciências
como a Administração, Economia, Sociologia, entre outras, está
presente no caput do art. 37 da CRFB/88, desde a Emenda
Constitucional nº 19 de 1998, consubstanciando-se na busca pela
qualidade do serviço público prestado. Busca a otimização, rapidez
e aperfeiçoamento dos resultados com o menor desperdício de
recursos possíveis. Ou seja, melhor desempenho, com menor custo,
referindo-se a um ideal de racionalização da ação (GABARDO,
2002, p. 26).
Atenção! Escapam à regra da publicidade: art. 5º, XXXIII, (com relação às informações imprescindíveis à segurança da sociedade e do Estado, regulado pela Lei nº 11.111/05) e inciso LX, o art. 14, § 11, o art. 37, § 3º, II, todos da CRFB/88, os arts. 20 e 201, § 6º do CPP, art. 3º, § 3º, segunda parte, da Lei nº 8.666/93, o art. 155 do CPC, a lei que trata da interceptação telefônica (9.296/96) e das operações financeiras (Lei Complementar nº 105/2001), o art. 21 da Lei nº 9.472/97, quando determina que os registros poderão ser mantidos em sigilo quando a publicidade puder colocar em risco a segurança do País, ou violar segredo protegido ou a intimidade de alguém, entre outros.
Direito Administrativo
37
Ainda que somente em 1998 tenha integrado o caput do
art. 37 da CRFB/88, já vinha previsto na Constituição Federal
desde 1988 no artigo 74, II, e art. 144, § 7º, até mesmo na
legislação esparsa como no Decreto-Lei nº 200/67, art. 26, III, e na
Lei nº 8.987/95, art. 6º, § 1º.
A avaliação especial de desempenho como condição para
a aquisição da estabilidade, prevista no art. 41, § 4º, da CRFB/88, a
avaliação periódica de desempenho, exposta no art. 41, § 1º, III, da
CRFB/88, a implantação de pagamento através de subsídios, as
escolas de governo (art. 41, § 2º), são exemplos da aplicação do
princípio da eficiência. A edição de súmulas vinculantes (art. 103-
A, da CRFB/88) e a duração razoável do processo (art. 5º,
LXXVIII, da CRFB/88) configuram-se, também, como busca pelo
dever de eficiência.
Está, também, expressamente previsto na Lei
Complementar Estadual/RS nº 10.098/94 (que disciplina o Regime
Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio
Grande do Sul) no art. 28, II, como um dos requisitos a ser
observado durante o estágio probatório.
É a relação custo-benefício (GASPARINI, 2006, p. 22)
que deve presidir todas as ações públicas. A palavra liga à ideia de
serviço rápido e preciso. Exige que a atividade administrativa seja
exercida com presteza, rendimento e busca da perfeição.
Importante, no entanto, traçar distinção entre eficiência, eficácia e
efetividade, que mesmo não se apresentando de forma imutável e
rígida, a não abordagem de tais conceitos como sinônimos já
demonstra o mínimo de esclarecimento. Para Dirley da Cunha
Junior (2009, p. 46) o primeiro conceito preocupa-se com os
meios, os métodos, os procedimentos de trabalhos adotados. O
segundo preocupar-se-ia com o sucesso dos resultados obtidos,
com os fins, com os resultados. O último (efetividade) seria a
composição da eficiência com a eficácia, ou seja, quando o sucesso
do resultado alcançado deu-se através do emprego dos meios
adequados. Emerson Gabardo (2002, p. 24), citando Egon
Bockmann Moreira, expõe que a eficácia administrativa diz
respeito à potencialidade de concreção dos fins preestabelecidos
em lei, enquanto a eficiência administrativa imporia esse
38
cumprimento da lei concretizado com um mínimo de ônus social,
sempre beneficiando o cidadão. José dos Santos Carvalho Filho
(2008, p. 27) traça a distinção de forma diversa. A eficiência
relacionar-se-ia com o modo pelo qual se processa a atividade
(diria respeito à conduta dos agentes). A eficácia teria relação com
os meios e instrumentos empregados no exercício da função estatal
(um sentido instrumental) enquanto a efetividade estaria voltada
para os resultados.
Note-se que longe está a doutrina jurídica pátria (mesmo
apresentando um estudo superficial da matéria) de colher um
conceito unânime ou até mesmo convergente deste
conceito/princípio/dever chamado eficiência. Isso faz com que
provas e concursos resumam seus questionamentos ao que se
encontra nos manuais, ou seja, uma forma facilitada/simplificada
de lidar com a matéria.
3. Princípios implícitos
Como dito anteriormente, além dos princípios expressos
no art. 37, caput, da CRFB/88, há princípios que também são
reconhecidos, mas estão presentes somente de forma implícita na
Constituição Federal.
3.1. Princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse particular
Como já foi mencionado, os atos administrativos devem
possuir respaldo em lei (princípio da legalidade). Somando-se a
isso, as atividades desenvolvidas pela Administração Pública
devem buscar sempre o beneficio da coletividade (caso contrário,
eivadas de ilegalidade).
Em alguns momentos a Administração Pública deve se
colocar num patamar de superioridade frente ao particular para
buscar/alcançar este interesse coletivo (público). Quando o Poder
Público coloca-se nesta posição vertical (de superioridade) utiliza-
se do princípio da supremacia do interesse público sobre o
interesse particular. Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p.
64) e Hely Lopes Meirelles (2009, p. 105) é o próprio princípio da
finalidade pública.
Direito Administrativo
39
Ainda que o particular se oponha a determinado ato
administrativo (por exemplo, uma desapropriação), este
prevalecerá, porque busca o bem estar coletivo. São as
prerrogativas, os poderes instrumentais da Administração Pública.
São exemplos: as cláusulas exorbitantes constantes na
Lei 8.666/93, no art. 58, a encampação prevista no art. 37, da Lei
nº 8.987/95, as restrições ao direito de greve do art. 37, VII, da
CRFB/88, etc. É por força deste princípio, também, que se justifica
a coercibilidade (ou imperatividade) dos atos administrativos.
Se o objetivo buscado pela Administração é sempre o
público, nada mais natural que a sua vontade prevaleça sobre a do
particular. Inclusive, no momento em que a finalidade é
desvirtuada, para outra que não a pública, o ato restará ilegal pelo
desvio de poder, também chamado de desvio de finalidade.
Costumamos distinguir interesse público primário, que
são os interesses da coletividade como um todo, de interesse
público secundário que são os interesses do Estado como sujeito
de direitos (independente de sua qualidade como servidor do
interesse de terceiros). O primeiro é o único interesse concebido
como verdadeiro interesse público, ou como afirma Celso Antonio
Bandeira de Mello (2002, p. 69-75) interesse do todo, do próprio
conjunto social, o interesse público propriamente dito. Para o autor,
o interesse secundário na verdade trata-se de interesse (individuais)
do Estado, e não interesses públicos.
Logo, as prerrogativas (poderes) alcançadas ao Estado
somente se justificam se manejadas para o alcance dos interesses
públicos primários, e não para satisfazer unicamente interesses ou
conveniências do aparelho estatal: interesses secundários (CUNHA
JUNIOR, 2009, p. 40).
Mas o que seria o interesse público? Mais uma vez
socorremo-nos de Celso Antonio para responder a este
questionamento. De fato o primeiro pensamento, e não está errado,
é o interesse do todo, do conjunto social, que não se subsume ao
somatório de interesses individuais. Se limitássemos a isso,
teríamos que aceitar os interesses ilícitos de particulares, o que é
inconcebível no interesse público. Em verdade é o interesse
público existente por si mesmo, dotado de consciência autônoma,
40
independentemente e estranho a qualquer interesse das partes.
Individualmente ninguém se consideraria interessado em sofrer
uma desapropriação, ou sanções no caso de descumprimento de
regras. Porém, admite estes enquanto membro de um corpo social.
O interesse público, o interesse do todo, do conjunto social, nada
mais é que a ‘dimensão pública dos interesses individuais’. Mas
também é inconcebível um interesse público dissociado do
interesse das partes, uma vez que este só se justifica na medida em
que se constitui um meio de realização dos interesses das partes
que o integram (MELLO, 2002, p. 69-71).
3.2. Princípio da indisponibilidade do interesse público
O administrador não possui livre disposição do interesse
público, pois como visto este interesse é próprio da coletividade.
Ao contrário, cabe a ele tão somente gerir, conservar, zelar por este
interesse. Por isso, inclusive, que o interesse público deve
prevalecer, porque o interesse público não é o interesse do gestor, é
o interesse de toda a coletividade. Moreira Neto (2006, p. 288-289)
bem aponta a indisponibilidade do interesse público dizendo que a
norma legal, ao enunciar o interesse público específico, impõe ao
Estado o encargo finalístico de satisfazê-lo, ou seja, uma vez
cometida uma competência a uma entidade, órgão ou agente, não
mais lhes cabe senão exercê-la, tornando-se o interesse público
específico indisponível para a Administração Pública.
São as sujeições (deveres) impostas à Administração
Pública. O administrador público é somente um gestor dos bens,
direitos, interesses e serviços da Administração, não estando estes
à sua livre disposição (neste sentido STF no RE nº 253.885/MG).
Exemplo clássico da indisponibilidade do interesse
público é a atividade vinculada tributária, prevista no art. 3º do
CTN, na qual ocorrendo o fato gerador à Administração Pública
resta, unicamente, efetuar o lançamento do tributário, além de
outros, é claro, como a demissão do agente transgressor, etc.
3.3. Princípio da continuidade do serviço público
Os anseios da sociedade são ininterruptos (contínuos).
Ademais, o Estado ao ser criado assumiu a prestação de
Direito Administrativo
41
determinados serviços essenciais, que por possuírem esta qualidade
devem ser prestados também de forma contínua.
A exemplo cite-se o art. 37, VII, da CRFB/88, o art. 37
da Lei nº 8.987/95, o art. 80, I e II, da Lei nº 8.666/93, a invocação
restrita ou vedada da exceptio non adimpleti contractus, arts. 78
XV, da Lei nº 8.666/93 e art. 39, parágrafo único, da Lei nº
8.987/95, respectivamente.
3.4. Princípio da autotutela e tutela
Por força deste princípio, possui a Administração a
faculdade de rever os seus atos, independentemente de
manifestação do Poder Judiciário, declarando-os nulos quando
eivados de ilegalidade ou revogando-os quando inoportunos e
inconvenientes (Súmulas do STF nºs 346 e 473).
Para muitos autores não se trata de um poder, mas sim de
um dever de correção dos erros, pois inadmissível que frente a atos
irregulares a Administração permaneça inerte.
Uma importante diferenciação deve ser feita entre
autotutela e tutela. A primeira é o controle exercido sobre os
próprios atos (controle endógeno), ligado à ideia de subordinação;
a segunda é o controle exercido pela Administração Pública Direta
sobre a atuação da Administração Pública Indireta, ligado à ideia
de vinculação. A regra é a independência, a autonomia, entre a
Administração Pública Direta e a Administração Pública Indireta,
mas a lei impõe que aquela exerça o controle finalístico
(cumprimento das finalidades) desta.
AUTOTUTELA SUBORDINAÇÃO
TUTELA VINCULAÇÃO
Cumpre expor que a Lei nº 9.784/99, em seu art. 54,
consignou que o direito da Administração Pública de anular os atos
de que decorram efeitos favoráveis decai em 5 anos, salvo
comprovada a má-fé.
Além disso, a Administração Pública, mesmo possuindo
o dever (ou poder) de rever os seus atos, deve respeitar o devido
42
processo legal, bem como o contraditório e a ampla defesa (art. 5º,
LV, da CRFB/88), isso porque também está pautada por outro
princípio: o da segurança jurídica.
3.5. Princípio da segurança jurídica
Conhecido também como princípio da proteção à
confiança (CARVALHO FILHO, 2008, p. 30), é através dele que
se evita uma instabilidade eterna, uma incerteza perpétua das
situações jurídicas. É consagrado pelo direito adquirido, ato
jurídico perfeito, coisa julgada, convalidação de atos ampliativos
de direitos, entre outros.
O princípio da segurança jurídica impede a mudança
abrupta na interpretação de textos jurídicos prejudiciais aos
administrados bem como a aplicação retroativa destas decisões
(STF no MS nº 20.280/DF, no MS nº 22.357/DF, no RE nº
466.546/RJ, no RE nº 442.683/RS). Pode ser encontrado no art. 2º,
caput, e parágrafo único, XIII, da Lei nº 9.784/99.
Rafael Valim (2010, p. 91-112) traça uma distinção entre
certeza jurídica e estabilidade, sendo a primeira o seguro
conhecimento das normas jurídicas, condição indispensável para
que o homem tenha previsibilidade, podendo projetar sua vida e,
assim, realizar plenamente seus desígnios pessoais. A estabilidade
consubstanciar-se-ia com a consagração do Estado Social de
Direito, no bojo do qual se introduz a ideia de atos ampliativos,
concedentes de vantagens em favor dos administrados de cuja
singularidade de regime jurídico derivaria a criação de novos
mecanismos de defesa, em face da confiança legítima, ou seja, a
confiança que o indivíduo de boa-fé deposita na ação do Estado.
Nesta mesma seara afirma Giovani Bingolin (2007, p. 79):
Partindo-se da noção do princípio da segurança jurídica como um
subprincípio maior do Estado de Direito (ao lado e do mesmo nível
hierárquico de outro subprincípio do Estado de Direito, que é o da
legalidade), pode-se, como visto alhures, demarcar o princípio em dois
aspectos: 1) natureza objetiva, que envolve os limites à retroatividade
dos atos do Estado, à proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico
perfeito e à coisa julgada. 2) natureza subjetiva, concernente à proteção
à confiança das pessoas diante dos procedimentos e das condutas do
Estado, nos mais diferentes aspectos de sua atuação. Essa última
Direito Administrativo
43
categoria impõe ao Estado limitações na liberdade de alterar sua conduta
e de modificar atos que produziriam vantagens para os destinatários,
mesmo quando ilegais, ou atribui a ele consequências patrimoniais por
essas alterações, em virtude da crença gerada nos beneficiários, ou na
sociedade em geral, de que aqueles atos eram legítimos.
Irretocável a manifestação do Superior Tribunal de
Justiça no RMS nº 24.339/TO, julgado em 30/10/2008, tendo como
Min. Rel. Napoleão Nunes Maia Filho, no sentido de manter
aposentadoria concedida de forma inconstitucional, cuja ementa
segue em sua integralidade:
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
ADMINISTRATIVO. ENQUADRAMENTO DE PROFESSORA
DO ESTADO DE TOCANTINS, COM BASE EM ASCENSÃO
FUNCIONAL. LEI ESTADUAL DE TOCANTINS 351/92,
POSTERIORMENTE REVOGADA. NORMA
INCONSTITUCIONAL. ATO PRATICADO SOB OS AUSPÍCIOS
DO ENTÃO VIGENTE ESTATUTO DO MAGISTÉRIO DO
ESTADO DE TOCANTINS. PREPONDERÂNCIA DO
PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA
RAZOABILIDADE. CONVALIDAÇÃO DOS EFEITOS
JURÍDICOS. SERVIDORA QUE JÁ SE ENCONTRA
APOSENTADA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.
1. O poder-dever da Administração de invalidar seus próprios atos
encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, pela
evidente razão de que os administrados não podem ficar
indefinidamente sujeitos à instabilidade originada do poder de autotutela
do Estado, e na convalidação dos efeitos produzidos, quando, em razão
de suas consequências jurídicas, a manutenção do ato atenderá mais ao
interesse público do que sua invalidação.
2. A infringência à legalidade por um ato administrativo, sob o ponto
de vista abstrato, sempre será prejudicial ao interesse público; por outro
lado, quando analisada em face das circunstâncias do caso concreto,
nem sempre sua anulação será a melhor solução. Em face da dinâmica
das relações jurídicas sociais, haverá casos em que o próprio interesse
da coletividade será melhor atendido com a subsistência do ato nascido
de forma irregular.
3. O poder da Administração, destarte, não é absoluto, de forma que a
recomposição da ordem jurídica violada está condicionada
primordialmente ao interesse público. O decurso do tempo ou a
convalidação dos efeitos jurídicos, em certos casos, é capaz de tornar a
anulação de um ato ilegal claramente prejudicial ao interesse público,
finalidade precípua da atividade exercida pela Administração.
4. O art. 54 da Lei 9.784/99 funda-se na importância da segurança
jurídica no domínio do Direito Público, estipulando o prazo decadencial
44
de 5 anos para a revisão dos atos administrativos viciosos (sejam eles
nulos ou anuláveis) e permitindo, a contrario sensu, a manutenção da
eficácia dos mesmos, após o transcurso do interregno quinquenal,
mediante a convalidação ex ope temporis, que tem aplicação
excepcional a situações típicas e extremas, assim consideradas aquelas
em que avulta grave lesão a direito subjetivo, sendo o seu titular isento
de responsabilidade pelo ato eivado de vício.
5. Cumprir a lei nem que o mundo pereça é uma atitude que não tem
mais o abono da Ciência Jurídica, neste tempo em que o espírito da
justiça se apoia nos direitos fundamentais da pessoa humana, apontando
que a razoabilidade é a medida sempre preferível para se mensurar o
acerto ou desacerto de uma solução jurídica.
6. O ato que investiu a recorrente no cargo de Professora Nível IV, em
06.01.93, sem a prévia aprovação em concurso público e após a vigência
da norma prevista no art. 37, II da Constituição Federal, é
induvidosamente ilegal, no entanto, a sua efetivação sob os auspícios de
legislação vigente à época, (em que pese sua inconstitucionalidade), a
aprovação de sua aposentadoria pelo Tribunal de Contas, e o transcurso
de mais de 5 anos, consolidou uma situação fática para a qual não se
pode fechar os olhos, vez que produziu consequências jurídicas
inarredáveis. Precedente do Pretório Excelso.
7. A singularidade deste caso o extrema de quaisquer outros e impõe a
prevalência do princípio da segurança jurídica na ponderação dos
valores em questão (legalidade vs segurança), não se podendo ignorar a
realidade e aplicar a norma jurídica como se incidisse em ambiente de
absoluta abstratividade.
8. Recurso Ordinário provido, para assegurar o direito de a recorrente
preservar sua aposentadoria no cargo de Professor, nível IV, referência
23, do Estado do Tocantins.
Há, contudo, que se precisar terminologicamente o
significado de boa-fé, segurança jurídica e proteção à confiança, o
que se faz com base em artigo de autoria do professor Almiro do
Couto e Silva (O princípio da segurança jurídica (proteção à
confiança) no direito público brasileiro e o direito da administração
pública de anular seus próprios atos administrativos: o prazo
decadencial do art. 54 da lei do processo administrativo da União),
publicado na Revista Eletrônica de Direito do Estado. A boa-fé
firmada predominantemente no direito privado, quer no sentido
objetivo, quer no subjetivo, diz respeito à lealdade, correção e
lisura do comportamento das partes reciprocamente, com inserção
destacada nos contratos administrativos. A segurança jurídica,
por sua vez, ramifica-se em duas partes: uma de natureza objetiva,
que envolve a questão dos limites à retroatividade dos atos do
Direito Administrativo
45
Estado, dizendo respeito à proteção ao direito adquirido, ao ato
jurídico perfeito, e à coisa julgada (artigo 5º, XXXVI, da
CRFB/88) e de natureza subjetiva, concernente à proteção à
confiança das pessoas no pertinente aos atos, procedimentos e
condutas do Estado. Este último, diz o ilustre professor, impõe ao
Estado limitações na liberdade de alterar sua conduta e de
modificar atos que produzam vantagens para os destinatários,
mesmo quando ilegais, ou, atribui-lhe consequências patrimoniais
por essas alterações, sempre em virtude da crença gerada nos
beneficiários, nos administrados ou na sociedade em geral de que
aqueles atos eram legítimos, tudo fazendo razoavelmente supor
que seriam mantidos (COUTO E SILVA, 2005, p. 5).
Com relação à boa-fé, decidiu do Superior Tribunal de
Justiça no REsp nº 1.244.182/PB, assim ementado:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR
PÚBLICO. ART. 46, CAPUT, DA LEI N. 8.112/90 VALORES
RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR INTERPRETAÇÃO
ERRÔNEA DE LEI. IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO.
BOA-FÉ DO ADMINISTRADO. RECURSO SUBMETIDO AO
REGIME PREVISTO NO ARTIGO 543-C DO CPC.
1. A discussão dos autos visa definir a possibilidade de devolução ao
erário dos valores recebidos de boa-fé pelo servidor público, quando
pagos indevidamente pela Administração Pública, em função de
interpretação equivocada de lei.
2. O art. 46, caput, da Lei n. 8.112/90 deve ser interpretado com alguns
temperamentos, mormente em decorrência de princípios gerais do
direito, como a boa-fé.
3. Com base nisso, quando a Administração Pública interpreta
erroneamente uma lei, resultando em pagamento indevido ao
servidor, cria-se uma falsa expectativa de que os valores recebidos
são legais e definitivos, impedindo, assim, que ocorra desconto dos
mesmos, ante a boa-fé do servidor público.
(...)
VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. SERVIDOR
PÚBLICO. BOA-FÉ.
É incabível a restituição ao erário dos valores recebidos de boa-fé
pelo servidor público em decorrência de errônea ou inadequada
interpretação da lei por parte da Administração Pública. Em virtude
do princípio da legítima confiança, o servidor público, em regra, tem a
justa expectativa de que são legais os valores pagos pela Administração
Pública, porque jungida à legalidade estrita. Assim, diante da ausência
da comprovação da má-fé no recebimento dos valores pagos
46
indevidamente por erro de direito da Administração, a Turma deu
provimento ao recurso para afastar qualquer desconto na remuneração
da recorrente, a título de reposição ao erário. Precedente citado do STJ:
EREsp 711.995-RS, DJe 7/8/2008. (RMS 18.780-RS, Rel. Min.
Sebastião Reis Júnior, julgado em 12/4/2012).
Por fim cabe trazer à baila as palavras de J.J. Gomes
Canotilho (2003, p. 257):
Em geral, considera-se que a segurança jurídica está conexionada com
elementos objectivos da ordem jurídica – garantia de estabilidade
jurídica, segurança de orientação e realização do direito – enquanto a
protecção da confiança se prende mais com as componentes subjetctivas
da segurança, designadamente a calculabilidade e previsibilidade dos
indivíduos em relação aos efeitos jurídicos dos actos dos poderes
públicos.
3.6. Princípios da razoabilidade e proporcionalidade
Muitos autores pátrios (MELLO, 2002, p. 91-4;
CARVALHO FILHO, 2008, p. 32; BARROS, 2006) separam a
razoabilidade e a proporcionalidade. De fato nem o Supremo
Tribunal Federal nem o Superior Tribunal de Justiça se
pronunciaram a respeito diferenciando um do outro.
Há uma controvérsia muito grande a respeito do que
realmente seja ou queira dizer cada um destes princípios. A autora
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p. 79), por exemplo, afirma
que o princípio da razoabilidade exige proporcionalidade. Já a
autora Odete Medauar (2008, p. 129) afirma que a
proporcionalidade engloba a razoabilidade.
O que podemos afirmar com garantia é que ambos estão
ligados à ideia de limitação à discricionariedade administrativa, ou
seja, uma decisão administrativa que não seja proporcional ou
razoável estará em desacordo com a lei (ferindo a legalidade) e por
consequência pode ser objeto de anulação pelo Poder Judiciário ou
pela própria Administração. Na realidade os princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade se completam.
Não se está afirmando que são sinônimos: muito pelo
contrário. Sabe-se que não possuem o mesmo significado, mas face
aos objetivos do presente trabalho, não aprofundaremos o tema
Direito Administrativo
47
tentando diferenciar a proporcionalidade da razoabilidade (prova
máxima de distinção entre ambos já começa por suas origens, pois
enquanto a razoabilidade tem origem no direito norte-americano, a
proporcionalidade tem origem no direito alemão [BARROS, 2006,
p. 31/44]).
Ainda que não aprofundemos, algumas noções básicas
serão expostas.
O princípio da proporcionalidade é subdividido em 3
subprincípios: adequação, necessidade e proporcionalidade em
sentido estrito. A adequação serve para determinar se a medida
adotada pelo ente estatal é o meio certo para levar a cabo o fim
determinado. Na necessidade questiona-se se a medida restritiva é
indispensável ou se há outra menos gravosa que possa ser adotada
pelo Estado. Por fim, na proporcionalidade em sentido estrito,
faz-se um sopesamento para averiguar se o resultado obtido com a
restrição é proporcional à coação imposta, faz-se uma ponderação,
as vantagens devem superar as desvantagens (BARROS, 2006, p. 60-67).
Expoe José Roberto Pimenta Oliveira (2006, p. 50),
citando Hartmut Maurer que:
1) A medida em causa somente é apropriada quando ela é apta,
certamente, à obtenção do resultado perseguido; 2) a medida apropriada
somente é necessária quando outras medidas apropriadas menos
prejudiciais à pessoa afetada e à coletividade não estão à disposição da
autoridade no caso em apreço; 3) a medida necessária somente apresenta
um caráter de proporcionalidade no sentido estrito quando ela não esta
em desproporção com o resultado perseguido.
A razoabilidade, diz Carvalho Filho (2008, p. 33) é
aquilo que se situa dentro de limites aceitáveis, critérios aceitáveis
do ponto de vista racional.
Ambos os princípios objetivam evitar condutas absurdas,
desmedidas, incoerentes. Deve o administrador público buscar o
equilíbrio, a prudência das decisões, uma ponderação de valores e
interesses jurídicos.
É como afirma Hely Lopes Meirelles (2009, p. 94-5), a
proibição do excesso, em última análise, objetiva aferir a
48
compatibilidade entre os meios e os fins, com o fim de evitar
restrições abusivas ou desnecessárias.
Aparecem explicitamente no art. 2º, da Lei nº 9.784/99,
tendo, talvez, como conceitos aproximados no inciso VI o da
razoabilidade como sendo a adequação entre os meios e fins, e o da
proporcionalidade a vedação à imposição de obrigações, restrições
e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao
atendimento do interesse público.
Direito Administrativo
49
Capítulo III
PPOODDEERREESS EE DDEEVVEERREESS AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVOOSS
1. Introdução
Para o Estado por em prática a busca pelo interesse
público (interesse coletivo), o ordenamento jurídico atribuiu-lhe
certas prerrogativas, peculiaridades denominadas poderes
administrativos. São em verdade formas que o Estado tem de fazer
sobrepor a sua vontade frente à individual.
Em que pese a palavra poder dar a impressão de se tratar
de uma faculdade, trata-se na realidade de uma obrigação, um
dever imposto à Administração Pública, e por isso poder-dever ou
dever-poder, na busca do bem estar da coletividade.
Os poderes administrativos aqui tratados serão os poderes
instrumentais (instrumentos que servem para a atuação Estatal) e
não os poderes políticos, estruturais ou orgânicos que compõem a
estrutura do Estado (Poder Judiciário, Poder Legislativo, Poder
Executivo).
A utilização ilegal, inadequada, imoral dos poderes
administrativos leva ao abuso de poder. Esta, por sua vez, pode
ocorrer de duas maneiras: quando o agente administrativo atua fora
dos limites de sua competência, além de suas atribuições, ou
quando o fim buscado é outro que não o interesse público. No
primeiro caso temos o excesso de poder, no segundo desvio de
poder.
Excesso de poder competência
Abuso de Poder
Desvio de poder finalidade
50
Os poderes administrativos são classificados da seguinte
forma: poder vinculado, poder discricionário, poder hierárquico,
poder normativo, poder disciplinar e poder de polícia. Essa
classificação, porém, não é unânime. A autora Maria Sylvia
Zanella Di Pietro (2009, p. 89) entende que o poder discricionário
e o poder vinculado não existem como poderes autônomos, são,
quando muito, atributos dos demais poderes. Celso Antonio
Bandeira de Mello (2008) afirma não se tratar de poderes, mas sim
regras de atribuição de competência. Já Rafael Maffini (2008, p.
55) expõe que o poder discricionário e o poder vinculado são
poderes em sentido impróprio, sendo os demais em sentido
próprio.
2. Poder Vinculado
Também denominado de regrado, é aquele ao qual a lei
confere uma única solução jurídica válida para a prática de um ato.
A execução de um ato administrativo está inteiramente definida na
lei, sendo validamente possível somente uma forma de proceder.
Não é disponibilizada ao administrador público qualquer
margem de opção, por exemplo: o art. 40, § 1º, II, da CRFB/88 que
trata da aposentadoria compulsória; o art. 207 da Lei nº 8.112/90
ao qual estabelece 120 de licença à gestante; o art. 48 da Lei nº
9.784/99 que estabelece o dever da Administração de
explicitamente emitir decisões nos processos administrativos,
dentre outros. O STJ no REsp nº 871.762/RS, julgado em
16/11/2010, entendeu que: que o pedido de concessão de licença
formulado na ação possui natureza distinta da atinente ao instituto
da remoção, previsto no art. 36, parágrafo único, III, a, da Lei n.
8.112/1990. O pedido está embasado no art. 84 da mencionada lei
e, uma vez preenchidos pelo servidor os requisitos ali previstos,
não há espaço para juízo discricionário da Administração,
devendo a licença ser concedida, pois se trata de um direito do
servidor, em que a Administração não realiza juízo de
conveniência e oportunidade.
No poder vinculado não há faculdade de opção do
administrador: não há que se falar em mérito, pois toda atuação do
administrador se resume no atendimento das imposições legais.
Direito Administrativo
51
Pela falta de possibilidade de escolha, se diz que, diante
do poder vinculado, o particular tem um direito subjetivo de exigir
da autoridade a adoção de determinado ato, sob pena de não o
fazendo sujeitar-se à correção judicial.
3. Poder Discricionário
O poder discricionário existe em decorrência da riqueza
das situações cotidianas, haja vista que à lei é impossível prever
todas as condutas que o agente administrador deva tomar. A
Administração Pública, por sua posição mais favorável, em
determinadas ocasiões, possui certa liberdade para decidir no caso
concreto, diante da multiplicidade dos fatos administrativos, a
melhor maneira de satisfazer a finalidade da lei.
No poder discricionário, contrariamente ao poder
vinculado, a lei outorga certa liberdade de escolha ao
administrador. Diante de uma hipótese legal (e não ausência legal),
ao administrador é permitido eleger uma dentre as várias condutas
possíveis, segundo critérios de oportunidade e conveniência
(equivalem à noção de mérito administrativo). Cita-se apenas
exemplificativamente os arts. 83 e 91 da Lei nº 8.112/90.
O poder da Administração é discricionário, porque a
adoção de uma ou de outra solução é feita segundo critérios de
oportunidade e conveniência, próprios da autoridade.
Temos de ressaltar que discricionariedade não quer dizer
arbitrariedade. Esta se dá à margem da lei, contrária à lei, de forma
abusiva. Logo, um ato arbitrário será sempre ilegítimo/ilegal.
Contudo, o poder discricionário não é absoluto, pois
encontra limites na razoabilidade, proporcionalidade, na
moralidade, que não se encontram na noção de mérito
administrativo, mas sim no conceito de legalidade. Assim, um ato
desproporcional ou desarrazoado será considerado ilegal (neste
sentido o STJ no RMS nº 24.339/TO, no RMS nº 25.652/PB e no
MS nº 12.957/DF). Além desses limites, a discricionariedade
administrativa também esbarra na competência, na forma e na
finalidade do ato, uma vez que estes sempre são impostos pela lei.
52
Daí surge a razão de se dizer que a discricionariedade
implica liberdade de atuação nos limites traçados pela lei, e se a
Administração ultrapassa esses limites sua decisão passa a ser
arbitrária, ou seja, contrária à lei.
4. Poder Hierárquico
É o poder que possui a Administração Pública de
organizar-se, estruturar-se, distribuir funções entre os diversos
órgãos que a compõem. Segundo a autora Maria Sylvia Zanella Di
Pietro (2009, p. 94), o estabelecimento da hierarquia é instituído
por uma relação de coordenação e subordinação entre os órgãos.
São decorrências do poder hierárquico (MEDAUAR,
2008, p.116):
Poder de dar ordens ou instruções (poder de chefia e dever
de obediência);
Poder de fiscalização e coordenação;
Poder de revisão (controle) dos atos dos subordinados,
anulando os atos ilegais e revogando os inconvenientes ou
inoportunos;
Poder de delegação e avocação de competência.
Já para Maria Sylvia Di Pietro (2009, p. 95) as
decorrências são:
De editar atos normativos (com efeito interno) com o
objetivo de ordenar a atuação dos órgãos;
De dar ordens aos subordinados, o que implica no dever de
obediência;
De controlar a atividade dos órgãos inferiores, podendo
anular ou revogar os atos;
O de aplicar sanções em caso de infrações disciplinares
(Poder Disciplinar);
O de avocar e delegar atribuições/competências.
MANDADO DE SEGURANÇA. ESCOLHA DE VAGAS PARA O
CNAS. NÃO APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTOS EXIGIDOS
NO ATO DE HABILITAÇÃO PELA ENTIDADE SOCIAL.
RECURSO HIERÁRQUICO. PARTICIPAÇÃO NO CERTAME
ELEITORAL DEFERIDA. OCORRÊNCIA DE EVENTO DE
Direito Administrativo
53
FORÇA MAIOR. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
ATENDIMENTO AO INTERESSE SOCIAL E À FINALIDADE
DA LEI PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SEGURANÇA
DENEGADA.
1. É inerente ao poder hierárquico da Administração a prerrogativa
de rever os atos praticados por seus subordinados, consoante
enuncia a nova ordem constitucional.
2. (...).
3. A Autoridade Coatora, ao prover o recurso hierárquico, agiu de forma
razoável e sensata ao sopesar a justificativa da CUT, que naquela
oportunidade apresentou os documentos faltantes.
4. Segurança denegada.
(MS 8358/DF; Relator(a) Ministra LAURITA VAZ; Data do
Julgamento 13/11/2002)
Quanto ao poder de delegação e avocação, faz-se
necessário tecer algumas observações.
Delegar é transferir a outrem parte de atribuições
(competências) que originariamente lhe são próprias e não
privativas. Deve ser por tempo determinado, publicado no meio
oficial e é revogável a qualquer momento (a exemplo podemos
citar os artigos 12 ao 14 da Lei nº 9.784/99, o art. 84, parágrafo
único e 93, XIV, da CRFB/88 e o art. 12 do Decreto-Lei nº
200/67). Algumas atribuições são indelegáveis como as elencadas
no artigo 13 da Lei nº 9.784/99, na Lei nº 11.079/04, artigo 4º, III,
e no artigo 84 da CRFB/88, dentre outras.
Avocar é chamar para si, temporariamente, atribuição
originariamente de um subordinado seu. Para a avocação, portanto,
a subordinação hierárquica é obrigatória (art. 15 da Lei nº 9.784/99
e art. 103-B, § 4º, III, da CRFB/88).
Para facilitar a compreensão destes conceitos imagine,
por exemplo, duas Secretarias Municipais: a Secretaria do Meio
Ambiente e a Procuradoria Geral do Município. Entre um
Procurador e o Procurador-Geral há subordinação hierárquica.
Atenção! Para a delegação não é necessária haver subordinação hierárquica.
54
Logo, entre esses poderá haver tanto delegação do Procurador-
Geral para o Procurador, quanto avocação por parte do Procurador-
Geral de atribuição do Procurador. No entanto, entre o Secretário
do Meio Ambiente e o Procurador-Geral, por não haver
subordinação hierárquica, o máximo que poderá ocorrer é
delegação de alguma competência, mas nunca a avocação.
Por estarmos trabalhando com o termo subordinação,
uma diferenciação é fundamental. A subordinação existe entre
órgãos de uma mesma pessoa jurídica (caráter interno), por
exemplo, órgãos de uma prefeitura, ou até mesmo órgãos de uma
autarquia, diferentemente de vinculação que existe entre pessoas
jurídicas (caráter externo, ligado à ideia de Administração Pública
Indireta), por exemplo, há vinculação entre uma Autarquia (o
IBAMA) e o órgão a ele vinculado (Ministério do Meio
Ambiente).
Inexiste também uma hierarquia no sentido de
coordenação e subordinação entre os órgãos do Poder Judiciário
(há uma divisão de competências entre instâncias) e entre os órgãos
do Poder Legislativo (Senado e Câmara): há uma partilha de
competências constitucionais (DI PIETRO, 2009, p. 97).
5. Poder Disciplinar
É aquele conferido à Administração Pública de apurar
infrações e impor penalidades aos seus agentes e demais pessoas
sujeitas à disciplina administrativa, em razão de prática de
infrações funcionais (disciplinares).
Não deve ser confundido com o poder punitivo do Estado
(jus puniendi). Este é exercido através do Poder Judiciário tendo
em vista o cometimento de infração penal (crimes e contravenções)
regido pelo direito penal e processual penal. Já o poder disciplinar
é realizado para a punição de infrações administrativas, possuindo
trâmite interno, regido pelo direito administrativo. Para o autor
Rafael Maffini (2008. p. 67-8), o poder disciplinar decorre da
subordinação específica ou especial, já o poder punitivo (ligado ao
poder de polícia) decorre da subordinação geral.
No que diz respeito aos servidores públicos, o poder
disciplinar é uma decorrência da hierarquia; mesmo no Poder
Direito Administrativo
55
Judiciário e no Ministério Público, onde não há hierarquia quanto
ao exercício de suas funções institucionais (DI PIETRO, 2009, p. 94)
O exercício do poder disciplinar apresenta-se como um
dever da autoridade, por força do art. 143 da Lei nº 8.112/90.
Norma semelhante existe no Rio Grande do Sul na Lei
Complementar nº 10.098/94, art. 198.
Há forte divergência doutrinária questionando se o poder
disciplinar seria discricionário ou vinculado. Em verdade, ele é
uma conjugação, ora se apresentado vinculado ora discricionário.
Vinculado porque assim que a autoridade tem ciência da
irregularidade funcional é obrigada a promover a sua apuração.
Vinculado, também, porque o processo administrativo para a
apuração da falta deve respeitar o devido processo legal, o
contraditório, a ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CRFB/88).
Discricionário porque a Administração Pública pode, em face das
peculiaridades do caso, converter a suspensão em multa, por
exemplo, pode graduar a pena de suspensão em até 90 dias. No
caso da sindicância, há uma liberdade maior no procedimento que
no PAD, visto que a lei é omissa quanto a este.
São instrumentos (tradicionais) para a verificação das
sanções cometidas: a sindicância, procedimento célere de forma
simplificada, e o processo administrativo disciplinar, mais formal,
rígido, estudados de forma mais aprofundada no Capítulo XIII.
6. Poder Normativo (Regulamentar)
Paira controvérsia acerca da nomenclatura, se poder
normativo ou poder regulamentar.
Maria Sylvia Di Pietro (2009, p. 89) prefere a
nomenclatura poder normativo, entendendo que o poder
regulamentar não esgota a competência normativa da
Administração Pública, coexistindo outras (como resoluções,
portarias, instruções normativas, etc.).
Odete Medauar (2008, 114-116) distingue o poder
regulamentar do normativo, aquele configurando os modos de
exercício no âmbito do Poder Executivo, vinculados à edição de
uma lei, de competência privativa do Chefe do Poder Executivo. O
56
poder normativo seria a faculdade de a Administração emitir
normas para disciplinar matérias não privativas de lei, como por
exemplo uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito
disciplinando o tacógrafo, resolução de um diretor de uma
faculdade sobre a revisão das provas, etc. O poder regulamentar,
expõe a autora, é uma das formas de exercício do poder normativo.
Poderíamos afirmar que há um gênero, denominado poder
normativo e a (especial) espécie denominada de poder
regulamentar, esta exclusiva dos chefes do poder executivo.
Aquele, podendo ser exercida por outras autoridades como
ministros, secretários, agências reguladoras, etc. No poder
regulamentar encontraríamos o decreto como ato emitido. No
normativo, portarias, instruções normativas, resoluções, etc.
Existe, ainda, a discussão acerca da natureza jurídica do
poder regulamentar, dividindo-se em primária ou originária
(independente ou autônoma): quando emanada diretamente da
Constituição e secundária ou derivada (execução): externalizadas à
luz de uma lei (em sentido formal) (pré)existente.
Assim é que o poder regulamentar é o poder conferido
aos chefes do Poder Executivo (Presidente da República,
Governadores e Prefeitos) para expedirem decretos e/ou
regulamentos destinados a oferecer fiel execução à lei, tradução,
explicação à lei (art. 84, IV, da CRFB/88). Logo não podem ser
emitidos contra ou extra legem, mas tão somente secundum legem
(CUNHA JUNIOR, 2009, p. 79).
Os regulamentos, expõe Maria Sylvia Di Pietro (2009,
p. 90), podem ser jurídicos ou normativos, estabelecendo normas
sobre relações de supremacia geral, ou seja, aquelas relações que
ligam todos os cidadãos ao Estado (voltam-se para fora da
Administração – exemplo: normas inseridas no poder de polícia).
Mas também podem ser administrativos ou de organização: que
contêm, normas sobre a organização ou sobre as relações entre os
particulares que estejam em situação de submissão especial ao
Estado (concessão, outorga, nomeação, convocação, internação em
hospital público, etc.).
Direito Administrativo
57
Para Diógenes Gasparini (2006, p. 122), os fundamentos
do poder regulamentar são políticos porque residem na
conveniência e oportunidade que se reconhece ao Poder Executivo
para dotar a lei de certos pormenores, haja vista que o Legislativo
não pode tudo prever, e jurídicos porque a atribuição de expedir
decretos e regulamentos nasceria e seria exercida segundo
disposições da lei ou da Constituição.
Em que pese as suas semelhanças, decretos e
regulamentos não possuem o mesmo significado. O decreto é ato
emanado do Chefe do Poder Executivo, de caráter geral ou
individual, resultante de sua competência privativa. Pode ser
independente ou autônomo (quando dispõe de matéria não regulada
em lei, art. 84, VI, da CRFB/88), regulamentar ou de execução
(quando expedido para complementar, explicar, detalhar a
execução da lei, art. 84, IV, da CRFB/88). O regulamento por sua
vez aparece, via de regra, como um apêndice do decreto; é pelo
decreto que o regulamento se exterioriza. Por exemplo: o
Regulamento do Imposto de Renda – RIR – foi exteriorizado pelo
Decreto nº 3.000/99. A doutrina aponta como diferenças entre o
decreto e o regulamento: a) enquanto os decretos têm força
jurígena própria, ou seja, vigoram por si mesmos como atos
independentes, os regulamentos são atos dependentes (via de regra
do decreto) por não ter força própria que os levem a vigência, e b)
os decretos podem ser de execução (normativos) ou autônomos,
enquanto os regulamentos só parecem como de execução
(normativos), não havendo espaço no ordenamento jurídico para o
regulamento autônomo ou independente. Carvalho Filho (2008, p.
129) afirma sobre os regulamentos: a despeito de serem
exteriorizados através de forma própria, constituem apêndices de
outros atos, mais comumente de decretos (embora nem sempre).
Esses atos é que os colocam em vigência.
O poder regulamentar tem, inicialmente, por finalidade
editar normas complementares, explicativas às leis, devendo total
respeito a estas. São os chamados decretos executivos. Pode-se
citar, exemplificativamente, o Decreto nº 7.559/2011, expedido
pelo Presidente da República que dispôs sobre o Plano Nacional do
Livro e Leitura, regulamentando a Lei nº 10.753/2003.
58
Entretanto, com a Emenda Constitucional nº 32, de 2001,
a Constituição Federal passou a prever, também, em seu art. 84,
VI, a possibilidade de edição de outra forma de decreto: o decreto
independente ou autônomo. A partir desta emenda, existem
decretos que podem ser expedidos não de forma complementar à
lei, para explicá-la ou executá-la, mas sim decretos expedidos
tendo como fonte originária a Constituição. São os casos de:
Organização e funcionamento da administração federal,
quando não implicar aumento de despesa nem a criação ou
extinção de órgãos públicos;
Extinção de funções ou cargos públicos quando vagos.
Ainda que com tal permissão constitucional (agora
justificando o art. 102, I, a da CRFB/88) José dos Santos Carvalho
Filho (2008, p. 55) ainda não visualiza a inserção do
decreto/regulamento autônomo, pelo fato de que estes não criam ou
extinguem efetivamente direitos e obrigações, mas tão somente
regulam, organizam o funcionamento da administração. Entende o
autor que no artigo 62 da Constituição da República (no caso das
medidas provisórias) sim encontraríamos um poder legiferante
primário da Administração Pública. O autor ainda destaca que os
artigos 36, § 1º, 136, § 1º, 138, todos da CRFB/88, cuidam de atos
administrativos de cunho político, assim como ocorre nos arts.
103-B, § 4º, I, 130-A, § 2º, I, 51, IV, 52, XIII, 96, I, que não
cuidariam de poder regulamentar autônomo propriamente dito.
Ultrapassada esta posição, importante ainda expor que os
decretos autônomos são passíveis de delegação, por força do artigo
84, parágrafo único, da CRFB/88 não podendo prosperar mais o
pensamento de que o exercício do poder regulamentar ou
normativo seja indelegável.
A exemplo de poder normativo temos as portarias
expedidas pelos Ministros de Estado, artigo 87, parágrafo único, II
CRFB/88 (Portaria normativa nº 618 de 18 de novembro de 2010,
expedida pelo Secretário de fomento e incentivo à cultura ou
Portaria normativa nº 24 de 03 de dezembro de 2010, emitida pelo
Ministro de Estado da Educação dispondo sobre o procedimento
Direito Administrativo
59
para adesão ao processo seletivo de instituições ao programa
PROUNI). A Resolução da ANVISA nº 43/2009, suspendendo
temporariamente as publicidades de medicamentos destinados ao
alívio dos sintomas da gripe face ao vírus H1N1; a Resolução nº
12/2011 emitida pelo Conselho Federal de Psicologia
regulamentando a atuação do psicólogo no âmbito do sistema
prisional; Instrução Normativa nº 22/2012 emitida pelo Instituto
Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade estabelecendo os
procedimentos para os programas de cativeiro e espécies
ameaçadas.
É possível extrair do poder normativo/regulamentar que o
seu exercício interfere, reflete diretamente na discricionariedade. A
sua manifestação gera uniformidade, padrão na conduta dos demais
agentes cessando, assim, eventuais liberdades que a lei pudesse ter
deixado para ser exercida.
Por fim, a Constituição Federal em seu artigo 49, V
possibilita ao Congresso Nacional sustar os atos normativos do
Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos
limites de delegação legislativa.
7. Poder de Polícia
Decorre da necessidade de se impor limites, freios,
restrições ao exercício de direitos individuais, condicionando-os,
em prol do bem estar da coletividade e do próprio Estado. Destaca-
se que o poder de polícia incide sobre o exercício e não sobre o
direito propriamente dito. Possui por fundamento o princípio da
predominância do interesse público sobre o interesse particular,
logo é um dos institutos onde mais predomina a superioridade do
Estado frente ao particular.
Ressalva importante teceu o Ministro Napoleão Nunes
Maia Filho no HC nº 45.462/PI ao explicitar que: o poder de
polícia, decorrente da supremacia do interesse público sobre o
privado, traduz-se em uma necessidade imposta em nome do equilíbrio social, mas que, sob pena de sujeitar a própria coletividade
a arbitrariedades da Administração, não pode se exercer de forma
ilimitada. A aplicação de sanções administrativas, como elemento de
coerção e intimidação, somente será legítima quando o ato praticado
60
pelo administrado estiver previamente previsto como infração
administrativa, além de que a punição imposta também terá de ser
exatamente aquela cominada para o caso.
Marcelo Caetano (2003, p. 267) aborda inicialmente o
poder de polícia com um olhar que poucos doutrinadores alcançam.
Expõe o renomado doutrinador português que a polícia (no caso a
administrativa, como veremos) não é inimiga da liberdade: é uma
garantia das liberdades individuais. Ora, numa sociedade em que
cada um pode, sustentando suas liberdades, fazer tudo que lhe
convém, sem pensar nos interesses, nas necessidades, nos direitos
dos outros não há liberdade. A Ordem Jurídica, segundo a
concepção democrática, consiste justamente em proclamar e
garantir a igualdade de todos perante a lei. Assim, o poder de
polícia é uma forma de intervenção no exercício de atividades
(liberdades) individuais, pressupondo a existência de normas de
conduta e a possibilidade de sua violação.
Para conceituar poder de polícia, a exemplo de diversos
doutrinadores, indica-se a leitura do artigo 78 do Código Tributário
Nacional: atividade da administração pública que, limitando ou
disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de
ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público,
concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à
disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder
Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e
aos direitos individuais ou coletivos.
Do artigo citado e com base constitucional no artigo 145,
II, da CRFB/88 a taxa é o tributo remunerador do exercício do
poder de polícia. Seguindo posicionamento que utiliza como
critério diferenciador a subjetividade a diferença entre taxa e tarifa
se daria através de quem presta o serviço. Se o serviço for prestado
pela própria Administração dar-se-á a cobrança de taxa. Entretanto,
se os serviços públicos forem prestados por particulares
delegatários deverão ser remunerados por tarifa ou preço público
(MAFFINI, 2008, p. 177). Não obstante a existência deste
posicionamento, ainda impera na doutrina administrativa como
critério diferenciador a compulsoriedade, sendo que os serviços
Direito Administrativo
61
utilizados de forma compulsória deveriam ser remunerados pela
taxa, enquanto os facultativos através da tarifa (GASPARINI,
2006, p. 357; CARVALHO FILHO, 2008, p. 319; STJ nos REsp’s
nº 840.864/SP e 690.609/RS). A Súmula do STF nº 545 estabelece
que preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque
estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm a sua
cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária, em
relação à lei que as instituiu. As tarifas são fixadas
contratualmente, podendo ser majoradas por decreto, enquanto as
taxas decorrem de lei, estando sujeitas ao regime tributário, e,
portanto, seus aumentos só podendo advir de lei. À tarifa se aplica
as normas do Código de Defesa do Consumidor o qual, no que diz
respeito à taxa, possui aplicação mais limitada
Para a cobrança da taxa em decorrência de fiscalização,
já assentou entendimento o Superior Tribunal de Justiça que é
dispensável a comprovação do exercício efetivo de fiscalização,
bastando a existência do aparato administrativo para tal atividade
(REsp nº 936.487/ES).
CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. TAXA DE LOCALIZAÇÃO E
FUNCIONAMENTO. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA. EFETIVO
EXERCÍCIO DE PODER DE POLÍCIA. AUSÊNCIA EVENTUAL DE
FISCALIZAÇÃO PRESENCIAL. IRRELEVÂNCIA. PROCESSUAL
CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. 1. A incidência de taxa pelo exercício
de poder de polícia pressupõe ao menos (1) competência para fiscalizar
a atividade e (2) a existência de órgão ou aparato aptos a exercer a
fiscalização. 2. O exercício do poder de polícia não é necessariamente
presencial, pois pode ocorrer a partir de local remoto, com o auxílio de
instrumentos e técnicas que permitam à administração examinar a
conduta do agente fiscalizado (cf., por semelhança, o RE 416.601, rel.
min. Carlos Velloso, Pleno, DJ de 30.09.2005). Matéria debatida no RE
588.332-RG (rel. min. Gilmar Mendes, Pleno, julgado em 16.06.2010.
Cf. Informativo STF 591/STF). 3. Dizer que a incidência do tributo
prescinde de “fiscalização porta a porta” (in loco) não implica
reconhecer que o Estado pode permanecer inerte no seu dever de
adequar a atividade pública e a privada às balizas estabelecidas pelo
sistema jurídico. Pelo contrário, apenas reforça sua responsabilidade e a
de seus agentes. 4. Peculiaridades do caso. Necessidade de abertura de
instrução probatória. Súmula 279/STF. Agravo regimental ao qual se
nega provimento. (RE nº 361.009 AgR/RJ - Relator: Min. Joaquim
Barbosa, julgado em 31/08/2010)
62
A proibição de se construir a determinada altura, o recuo
nas calçadas, o condicionamento para se ter porte de arma, os
requisitos para possuir a Carteira Nacional de Habilitação, a
apreensão e destruição de alimentos impróprios para o consumo, o
embargo e/ou a demolição de uma obra irregular, a multa aplicada
em decorrência de um descumprimento de uma ordem, etc. são
exemplo de condutas materiais do poder de polícia.
Em sentido amplo o poder de polícia é toda atividade
estatal limitadora/condicionadora de liberdade individual em
benefício da coletividade. Nesta concepção, o poder de polícia
abrangeria tanto os atos do Poder Legislativo (leis) quanto pelo
Poder Executivo (decretos, portarias, fiscalização, autuações, etc.).
Já em um sentido estrito, o poder de polícia aparece somente
como a atuação administrativa (Poder Executivo), sendo exclusivo
de órgão e Entidades com personalidade de direito público
integrantes da Administração Pública (direta ou indireta).
Não são exemplos de exercício do poder de polícia (ao
qual decorre de vínculo geral) ato que impõe funcionário público a
utilizar uniforme ou farda, a obrigatoriedade de concessionária de
ônibus a colocar determinados dizeres, a suspensão aplicada a um
servidor, porque decorrentes de vínculo especial (um contrato, um
estatuto, um convênio), ainda que também restrinjam a liberdade
individual, decorrem ora do poder hierárquico, ora do poder
disciplinar.
7.1. Ciclo de polícia
Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2009, p. 444-447)
expõe que a função de polícia pode ser dividida em quatro fases,
correspondendo a um verdadeiro ciclo de polícia: a ordem de
polícia, o consentimento de polícia, a fiscalização de polícia e a
sanção de polícia.
A ordem de polícia corresponde aos preceitos legais
limitadores de atuação. São as leis (art. 5º, II, da CRFB/88 - ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei), decretos, instruções normativas, etc. O
consentimento de policia é o ato de anuência que possibilita o
desempenho de certa atividade ou utilização de bem, sem o qual não
Direito Administrativo
63
seria licitamente permitido. Engrada-se como espécie de controle
preventivo exercido pelo Estado. Esta anuência é formalizada
através de um alvará de licença ou de autorização (os dois atos
emitidos a partir do exercício do poder de polícia). Na fiscalização
de polícia verifica-se o cumprimento das ordens e das condições pré
estabelecidas no consentimento de polícia. Possui dupla utilidade:
preventiva e preparatória (para a possível repressão contra os
infratores). A sanção de polícia, por fim, é a aplicação das
penalidades àqueles que descumprirem as normas estabelecidas (seja
na ordem, seja no consentimento de polícia). É a submissão
coercitiva do infrator a medidas inibidoras (compulsivas) ou
dissuasoras (suasivas) impostas pela Administração; é ato
unilateral, extroverso e interventivo, que visa a assegurar, por sua
aplicação, a ‘repressão da infração’ e a restabelecer o atendimento
do interesse público, compelindo o infrator à prática de ato
corretivo, dissuadindo-o ou de iniciar ou de continuar a cometer
uma transgressão administrativa (MOREIRA NETO, 2009, p. 447).
7.2. Delegação de atos do poder de polícia
O poder de polícia pode ser classificado como originário
(ALEXANDRINO, 2008, p. 194) aquele exercido pelas próprias
Pessoas Políticas do Estado (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios). O outorgado é o exercido pelas pessoas jurídicas
com personalidade de direito público como as Autarquias e as
Agências Reguladoras, por exemplo, (STJ AgRg no Ag nº
1.233.775/MG, no REsp nº 1.118.302/SCL), e o derivado ou
delegado é aquele desempenhado por particulares, possibilidade
inadmitida pela jurisprudência (STF na ADI nº 1.717/DF, no MS nº
21.797/RJ; STJ no REsp nº 880.549/DF), pela lei (Lei nº 11.079/04,
art. 4º, III, que impede a delegação do poder de polícia) e pela
doutrina (MAFFINI, 2008, p. 71; GASPARINI, 2006, p. 136,
CUNHA JUNIOR, p. 85).
Pode-se extrair que a premissa é a de que o poder de
polícia é indelegável para pessoas jurídicas de direito privado.
Contudo, em 10 de novembro de 2009 o Superior Tribunal de
Justiça se manifestou sobre o assunto no REsp nº 817.534/MG
relativamente a trânsito e entendeu que:
64
ADMINISTRATIVO. PODER DE POLÍCIA. TRÂNSITO.
SANÇÃO PECUNIÁRIA APLICADA POR SOCIEDADE DE
ECONOMIA MISTA. IMPOSSIBILIDADE.
1. (...)
2. No que tange ao mérito, convém assinalar que, em sentido amplo,
poder de polícia pode ser conceituado como o dever estatal de limitar-se
o exercício da propriedade e da liberdade em favor do interesse público.
A controvérsia em debate é a possibilidade de exercício do poder de
polícia por particulares (no caso, aplicação de multas de trânsito por
sociedade de economia mista).
3. As atividades que envolvem a consecução do poder de polícia
podem ser sumariamente divididas em quatro grupos, a saber: (I)
legislação, (II) consentimento, (III) fiscalização e (IV) sanção.
4. No âmbito da limitação do exercício da propriedade e da liberdade no
trânsito, esses grupos ficam bem definidos: o CTB estabelece normas
genéricas e abstratas para a obtenção da Carteira Nacional de
Habilitação (legislação); a emissão da carteira corporifica a vontade o
Poder Público (consentimento); a Administração instala equipamentos
eletrônicos para verificar se há respeito à velocidade estabelecida em lei
(fiscalização); e também a Administração sanciona aquele que não
guarda observância ao CTB (sanção).
5. Somente os atos relativos ao consentimento e à fiscalização são
delegáveis, pois aqueles referentes à legislação e à sanção derivam
do poder de coerção do Poder Público.
6. No que tange aos atos de sanção, o bom desenvolvimento por
particulares estaria, inclusive, comprometido pela busca do lucro -
aplicação de multas para aumentar a arrecadação.
7. Recurso especial provido.
Assim é que de acordo com esta posição o consentimento
e a fiscalização de polícia poderiam ser exercidos por pessoas
jurídicas de direito privado, no que tange ao trânsito. Ainda que o
exercício do poder de polícia seja, como regra indelegável a
pessoas jurídicas de natureza privada (ou exercido por quem seja
ocupante de emprego público – como se verá adiante) podem estas
pessoas, entretanto, emitirem atos preparatórios e praticar atos
materiais sucessivos ao ato de polícia (MELLO, 2002, p. 715)
para o futuro exercício por parte do Estado, senão vejamos:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. MULTA DE
TRÂNSITO. NECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DO
AGENTE. AUTO DE INFRAÇÃO.
1. Nos termos do artigo 280, § 4º, do Código de Trânsito, o agente da
autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de infração poderá
Direito Administrativo
65
ser servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial militar
designado pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no
âmbito de sua competência. O aresto consignou que toda e qualquer
notificação é lavrada por autoridade administrativa.
2. Certos atos materiais que precedem atos jurídicos de polícia
podem ser praticados por particulares, mediante delegação,
propriamente dita, ou em decorrência de um simples contrato de
prestação. Em ambos os casos (isto é, com ou sem delegação), às vezes,
tal figura aparecerá sob o rótulo de "credenciamento".
3. É descabido exigir-se a presença do agente para lavrar o auto de
infração no local e momento em que ocorreu a infração, pois o § 2º do
CTB admite como meio para comprovar a ocorrência "aparelho
eletrônico ou por equipamento audiovisual (...) previamente
regulamentado pelo CONTRAN."
4. Recurso especial a que se nega provimento. (Grifei)
(STJ no REsp nº 880.549/DF, julgado em 21/10/08, Min. Rel. Eliana
Calmon).
Pode-se citar, ainda, exemplificativamente, o
guinchamento de veículos, a contratação de uma empresa de
demolição ou implosão de obras efetuadas irregularmente, atos
estes exercidos posteriormente ao ato de polícia que é a ordem de
execução para estes atos.
Na ADI nº 2.310/DF, ainda que extinta sem julgamento
de mérito, tendo em vista a perda de objeto da ação (pela
publicação da Lei nº 10.871/04), o Ministro Relator Marco Aurélio
havia se manifestado monocraticamente (em 19/12/2000) sobre a
possibilidade de contratação de agentes públicos pela CLT
(empregados públicos) pelas Agências Reguladoras (hoje forma
inviabilizada) uma vez que a definição da possibilidade de ter-se a
Consolidação das Leis do Trabalho como regedora das relações
jurídicas entre as agências reguladoras e os respectivos
prestadores de serviços surge como matéria prejudicial, tendo em
conta o exame dos demais dispositivos da Lei nº 9.986/2000 a ela
ligados. Inegavelmente as Agências Reguladoras atuam com poder
de polícia, fiscalizando, cada qual em sua área, atividades
reveladoras de serviço público, a serem desenvolvidas pela
iniciativa privada. Continua o Ministro: Os servidores das
agências reguladoras hão de estar, necessariamente, submetidos
ao regime de cargo público, ou podem, como previsto na lei em
exame ser contratados para empregos públicos? Prescindir, no
66
caso, da ocupação de cargos públicos, com os direitos e garantias
a eles inerentes, é adotar flexibilidade incompatível com a
natureza dos serviços a serem prestados, igualizando os servidores
das agências a prestadores de serviços subalternos, dos quais não
se exige, até mesmo, escolaridade maior, como são serventes,
artífices, mecanógrafos, entre outros. Atente-se para a espécie.
Está-se diante de atividade na qual o poder de fiscalização, o
poder de polícia fazem-se com envergadura ímpar, exigindo, por
isso mesmo, que aquele que a desempenhe sinta-se seguro, atue
sem receios outros, e isso pressupõe a ocupação de cargo público,
a estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição Federal.
Aliás, o artigo 247 da Lei Maior sinaliza a conclusão sobre a
necessária adoção do regime de cargo público relativamente aos
servidores das agências reguladoras. Refere-se o preceito àqueles
que desenvolvam atividades exclusivas de Estado, e a de
fiscalização o é. Em suma, não se coaduna com os objetivos
precípuos das agências reguladoras, verdadeiras autarquias,
embora de caráter especial, a flexibilidade inerente aos empregos
públicos, impondo-se a adoção da regra que é a revelada pelo
regime de cargo público, tal como ocorre em relação a outras
atividades fiscalizadoras - fiscais do trabalho, de renda, servidores
do Banco Central, dos Tribunais de Conta, etc. (...). O emprego
público é incompatível com a atividade a ser desenvolvida (...).
De tais afirmativas é de se destacar que: 1) a atividade
fiscalizatória é típico exercício de poder de polícia (mesmo que
exercida por Agência Reguladora); 2) o poder de polícia é
atividade típica de Estado, e, portanto, exercida só por quem detém
natureza jurídica de direito público; e, 3) este tipo de atividade
(poder de polícia) deve ser exercida por quem possui cargo público
uma vez que atividade exclusiva de Estado. Logo, mesmo que
dentro de uma entidade com natureza de direito público (como uma
Agência Reguladora, por exemplo) haja empregados públicos
(agentes ocupantes de emprego, regidos pela CLT) estes não
poderão exercer o poder de polícia, por ser atividade esta típica de
Estado, e, portanto, devendo incidir norma de direito público
(cargo) com os direitos e garantias a eles inerentes.
Direito Administrativo
67
Odete Medauar (2008, p. 336) aponta como regime
jurídico geral do poder de polícia:
Atuação administrativa sujeita ao direito público;
Regido por princípios constitucionais que norteiam a
Administração;
Não pode significar uma proibição geral e absoluta, pois
impediria o exercício efetivo do direito;
Limitado à proporcionalidade e razoabilidade;
Decorrente do exercício do poder discricionário, podendo, às
vezes, apresentar-se de forma vinculada, quando fiscaliza o
cumprimento e impõe as respectivas sanções;
Deve apresentar-se devidamente motivado;
Observando o processo legal.
7.3. Polícia administrativa e polícia judiciária
O poder de polícia pode incidir em duas áreas de atuação:
administrativa e judiciária. Hely Lopes Meirelles (2009, p. 133)
ainda acrescenta uma terceira categoria, a polícia para
manutenção da ordem pública, com caráter eminentemente
preventivo exercido pelas corporações militares através do
policiamento ostensivo.
Administrativa: notadamente preventiva (podendo em alguns
casos se dar de forma repressiva, como por exemplo, a
apreensão de alimentos impróprios para o consumo), incide
sobre bens, serviços ou atividades (restringindo o exercício de
atividades lícitas), tem por objetivo impedir ações antissociais
(ocorre antes do delito), e possui como âmbito de atuação a
função administrativa. É aqui que se manifesta o poder de
polícia.
Judiciária: repressiva, incide sobre a pessoa (impede o
exercício de atividades ilícitas), tem por objetivo punir
infratores da lei penal (ocorre após o delito praticado) e possui
como âmbito de atuação a função jurisdicional. O exemplo
clássico trazido são as polícias civis (artigo 144, § 4º da
CRFB/88: às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia
de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União,
68
as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações
penais, exceto as militares).
É possível encontrarmos órgãos que exerçam as duas
polícias simultaneamente. É o caso da polícia federal, por exemplo.
Ao emitir passaportes e portes de arma, atua como polícia
administrativa. Ao investigar crimes envolvendo a União, entidade
autárquica ou fundação federal, age como polícia judiciária. No
Rio Grande do Sul, por exemplo, a Brigada Militar age como
polícia para manutenção da ordem pública (atividade típica).
Porém quando fiscaliza as rodovias estaduais age como polícia
administrativa.
7.4. Atributos do poder de polícia
Costuma-se apontar como atributos do poder de polícia:
Autoexecutoriedade ou executoriedade: é a possibilidade de a
própria Administração, por seus próprios meios, executar
(materialmente) as suas decisões, sem recorrer
necessariamente ao Judiciário. Não precisa de outro Poder
para tornar a decisão efetiva. É o caso da dissolução de uma
reunião, a apreensão de mercadorias, a interdição de uma
fábrica (DI PIETRO, 2009, p. 120). Não está presente em
todos os atos decorrentes do poder de polícia como é o caso
das multas não pagas pelo particular, as quais precisam ser
executadas por via judicial (execução fiscal).
Imperatividade ou coercibilidade: as medidas impostas
independem (ou até mesmo podem ser contrárias) da vontade
do administrado. A aceitação ou não da medida adotada pelo
particular é irrelevante, podendo inclusive a Administração
utilizar-se de força pública para o seu cumprimento.
Discricionariedade: a regra é que o poder de polícia
manifeste-se de forma discricionária, ou seja, a Administração
possuiria certa margem de liberdade (juízo de conveniência e
oportunidade) na sua atuação. Cretella Junior (2005, p. 263) já
afirmava que: o poder de polícia é uma ‘facultas’, uma
faculdade, uma possibilidade, um direito que o Estado tem de,
através da polícia, que é a força organizada, limitar as
Direito Administrativo
69
atividades nefastas dos cidadãos. A administração pode
escolher a área, o conteúdo e as dimensões das limitações da
atividade que vai impor a restrição em favor do interesse
público, momento este eminentemente discricionário
(CARVALH FILHO, 2008, p. 80). Uma vez efetuadas tais
limitações, a atuação por parte da Administração passa a ser
vinculada (fiscalização e sanção).
Exigibilidade: por este atributo o Estado pode exigir do
particular o cumprimento, observância, das obrigações que
impôs em razão do exercício do poder de polícia. Não se
confunde com a imperatividade porque esta apenas impõe a
obrigação. Na exigibilidade se impele a obediência à
obrigação imposta (MELLO, 2002, p. 370), correspondendo
aos meios indiretos de coerção. É o caso, por exemplo, da
impossibilidade de licenciamento do veículo enquanto não
paga as multas (DI PIETRO, 2009, p. 120).
O instrumento formal (documento) de
materialização/exteriorização do poder de polícia é o alvará, nada
impedindo, entretanto, que outros também cumpram o mesmo
papel como carteiras, certificados, declarações, etc.
7.5. Meios de atuação
A atuação da polícia administrativa (atividades materiais)
pela Administração Pública se dá através de ordens, proibições,
fiscalização, inspeções, vistorias (meios preventivos de atuação),
bem como através da imposição de sanções (meios repressivos de
atuação) como multas, interdição/fechamento de estabelecimentos,
Atenção! Há momentos, também, que manifestação do poder de polícia é vinculado. Quando a norma legal acaba por reger o modo e a forma de sua realização, como na concessão das licenças, em que cumpridas as regras pré-determinadas pela lei ao particular passa a ser reconhecido o direito de tê-la. Na autorização o exercício do poder de polícia apresenta-se de forma discricionária.
70
embargo/demolição de obras, inutilização de alimentos, apreensão
de mercadorias, guinchamento de veículos, etc.
Além disso, o campo de atuação, que inicialmente era
limitado à segurança das pessoas e bens, saúde, salubridade e
tranquilidade públicas, hoje está deveras ampliado, incluindo-se o
meio ambiente, o abuso econômico, a viação, as profissões, a
comunicação, a sanitária, etc.
7.6. Limites
O poder de polícia, exatamente por interferir nas
liberdades individuais, deve ser exercido dentro de certos limites.
O primeiro deles pode ser detectado nas leis e nas liberdades
públicas garantidas pela Constituição Federal. Ademais, pode-se
encontrar limites nos princípios, especialmente, da
proporcionalidade e razoabilidade, aquele, inclusive, nascido no
direito alemão em razão desta limitação. O não respeito às
limitações impõe o dever de anulação, seja pela própria
Administração (exercício da autotutela), seja pelo Poder Judiciário
(controle externo).
7.7. Prescrição
De acordo com a Lei nº 9.873/99, as ações punitivas no
âmbito, somente, da Administração Pública Federal, decorrentes do
exercício do poder de polícia, prescrevem em 5 anos contados da
data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou
continuada, do dia em que tiver cessado (em prestígio ao princípio
da segurança jurídica).
Também incide a prescrição (intercorrente) no
procedimento administrativo paralisado por mais de três anos,
pendente de julgamento ou despacho, cujos autos serão arquivados
de ofício ou mediante requerimento da parte interessada, sem
prejuízo da apuração da responsabilidade funcional decorrente da
paralisação, se for o caso. As formas de interrupção estão previstas
em seu art. 2º, e as de suspensão no art. 3º.
Direito Administrativo
71
8. Deveres administrativos
São as sujeições à que os agentes públicos estão
condicionados. Podemos citar como principais deveres os de agir,
de eficiência, probidade e de prestar contas. Dos deveres impostos
à Administração (seja pela Constituição, sejam pelos princípios,
sejam pelas normas), ex-surge ao particular/sociedade um direito,
que nas palavras do ilustre professor Juarez Freitas (2009, p. 455)
corresponderia ao direito fundamental à boa administração
pública compreendido como: o direito à administração pública
eficiente e eficaz, proporcional cumpridora de seus deveres, com
transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade,
à participação social e à plena responsabilidade por suas
condutas omissivas e comissivas.
8.1. Dever de agir
Ao administrador cabe desempenhar as funções
(atribuições) do cargo, emprego ou função de que é titular. Sobre o
tema afirma Diógenes Gasparini (2006, p. 150): as competências
do cargo, emprego ou função devem ser exercidas na sua plenitude
e no momento legal. Não se satisfaz o Direito com o desempenho
incompleto ou a destempo da competência, e pior ainda, com a
omissão da autoridade. Percebe-se que o dever de agir está ligado
à obrigatoriedade do exercício de sua competência.
Ensina Hely Lopes Meirelles (2009, p. 107) que se para
o particular o poder de agir é uma faculdade, para o
administrador é uma obrigação de atuar, desde que se apresente o
ensejo de exercitá-lo em benefício da comunidade.
Atenção! Quando o fato também constituir crime, a prescrição deste seguirá as regras da lei penal (Código Penal, art. 109), o mesmo se aplicando às infrações de natureza funcional (art. 142 da Lei nº 8.112/90) e aos processos de natureza tributária (art. 173 do CTN); é o que determina o art. 1º, § 2º, e art. 5º da Lei nº 9.873/99.
72
8.2. Dever de eficiência
Reside na necessidade de tornar cada vez mais
qualitativa a atividade administrativa. Perfeição, celeridade,
coordenação, técnica, todos esses são fatores que qualificam a
atividade pública e produzem maior eficiência no seu desempenho
(CARVALHO FILHO, 2008, p. 60). Confunde-se com o próprio
princípio da eficiência que nas palavras de Hely Lopes Meirelles
(2009, p. 108) o dever de eficiência, fora erigido à categoria de
princípio norteador da atividade administrativa (...), que para não
se tornar repetitivo remete-se o leitor ao Capítulo II, item 2.5.
8.3. Dever de probidade
Pelo dever de probidade o agente público, no exercício de
suas atribuições, deve guiar-se por condutas justas, honestas, leais,
íntegras, ligado à ideia de moralidade administrativa. O dever de
probidade, expõe Hely Lopes Meirelles (2009, p. 110), está
constitucionalmente integrado na conduta do administrador
público como elemento necessário à legitimidade de seus atos.
As condutas dos agentes públicos que deixarem de
atender o dever de probidade importarão a suspensão dos direitos
políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e
o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei,
sem prejuízo da ação penal cabível (art. 37, § 4º, da CRFB/88). A
lei que regulamentou o referido parágrafo do art. 37 da
Constituição Federal foi a Lei nº 8.429/92, conhecida como Lei de
Improbidade Administrativa, que em seu art. 12 expôs as
penalidades aplicáveis aos agentes públicos nos casos de
improbidade administrativa.
Ao administrador, pelo dever de probidade, incumbe
escolher o particular com melhores condições para o exercício da
função pública, a escolha da proposta mais vantajosa, etc. O art.
85, V, da CRFB/88 considera crime de responsabilidade o ato
praticado pelo Presidente da República que atente contra a
Constituição Federal e, especialmente, contra a probidade na
administração.
Direito Administrativo
73
8.4. Dever de prestar contas
Quem administra coisas de terceiros tem a obrigação de
prestar contas. O agente público é um gestor, um administrador da
coisa pública. Logo, é decorrência natural do administrador público
o encargo da prestação de contas. Discorre José dos Santos
Carvalho Filho (2008, p. 58) como o encargo dos administradores
públicos a gestão de bens e interesses da coletividade, decorre daí
o natural dever, a eles cometido, de prestar contas de sua
atividade. Essa prestação de contas é efetuada com muito mais
razão na administração pública, pois os interesses geridos pelo
agente público pertencem a toda a sociedade (coletividade).
A regra é que o controle seja feito pelo Poder Legislativo
(órgão de representação popular, art. 49, IX, e 70 da CRFB/88),
mas nada impede que o controle seja feito também internamente
(art. 74, II, da CRFB/88). O controle feito pelo Poder Legislativo é
efetuado com auxílio do Tribunal de Contas (art. 71 da CRFB/88),
órgão deste Poder.
Frise-se, ainda, que a prestação de contas não envolve
somente verba, dinheiro público (gestão financeira), mas a todos os
atos dos administradores, uma vez que compete, por exemplo, ao
Congresso Nacional (art. 49 da CRFB/88) autorizar o Presidente da
República a declarar guerra e celebrar a paz, apreciar os atos de
concessão e renovação de concessão de emissoras de rádio e
televisão, aprovar, previamente, a alienação ou concessão de terras
públicas com área superior a dois mil e quinhentos hectares, etc.
Direito Administrativo
75
Capítulo IV
EESSTTRRUUTTUURRAA EE OORRGGAANNIIZZAAÇÇÃÃOO
1. Introdução
O presente capítulo tratará da descentralização
administrativa do estado, ou seja, quando este entrega parcela de
suas competências a empresas estatais. Não se deve confundir com
a denominada descentralização política do Estado, onde os estados-
membros (os municípios) exercem suas competências não
decorrentes de um ente central, mas sim da própria Constituição
Federal (é o caso do Estado brasileiro). Diferencia-se esta hipótese
do Estado Unitário onde as competências dos estados são
“delegadas” do ente central (no caso do Brasil seria da União). Este
tipo de Estado é o adotado na França.
Os entes políticos, União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, para exercerem os poderes/deveres que lhe são
conferidos pela Constituição Federal (expressa ou implicitamente),
podem se organizar de forma centralizada/direta, desconcentrada
ou descentralizada:
Centralizada ou direta: situação em que o Estado (Entes
políticos) executa as tarefas atribuídas diretamente por
intermédio de órgãos e agentes da Administração Direta.
Desconcentrada: quando a execução das funções é dividida
em órgãos (conceito legal encontrado no art. 1º, § 2º, I, da Lei
nº 9.784/99). A distribuição das atribuições pela
desconcentração se dá internamente, ou seja, dentro da mesma
pessoa jurídica, sendo técnica de simplificação e aceleração do
serviço.
Descentralizada: é a distribuição de tarefas que serão
executadas por outra pessoa jurídica. Nas palavras de Ruy
Cirne Lima (1954, p. 147): descentralizar é pluralizar a
autoridade. Cumpre, entretanto, tecer uma distinção. A
descentralização pode ser política ou administrativa. Na
76
primeira hipótese (política) uma Constituição distribui
competências entre os diversos Entes Políticos (União,
Estados, Municípios – forma federada de Estado), que acabam
por exercer suas atribuições independentemente de um ente
central, contrapondo-se ao Estado Unitário, em que somente
um Ente possui competências (de forma monopolizada),
podendo, entretanto, delegá-las aos demais Entes. Na
descentralização administrativa, a função administrativa pode
ser exercida por outras pessoas físicas ou jurídicas, públicas
ou privadas, apresentando como modalidades a
descentralização territorial ou geográfica, na qual uma
entidade local, geograficamente delimitada, é dotada de
personalidade jurídica (própria) de direito público, mas com
capacidade administrativa genérica (sujeita a controle pelo
poder central), no Brasil seria o caso dos Territórios Federais
(art. 18, § 2º, da CRFB/88); por serviços, técnica ou
funcional verificada quando o poder público cria uma pessoa
jurídica de direito público ou privado ou, ainda, por
colaboração quando, por acordo de vontades ou ato
unilateral, se transfere a execução de certo serviço público a
uma pessoa de direito privado (previamente existente)
conservando o poder público a titularidade do serviço (DI
PIETRO, 2009, p. 42-6).
De acordo com o art. 41 do Código Civil: são pessoas
jurídicas de direito público interno: I - a União; II - os Estados, o
Distrito Federal e os Territórios; III - os Municípios; IV - as
autarquias, inclusive as associações públicas; V - as demais
entidades de caráter público criadas por lei. Parágrafo único.
Salvo disposição em contrário, as pessoas jurídicas de direito
público, a que se tenha dado estrutura de direito privado, regem-
se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas
deste Código.
2. Administração Direta
É o conjunto de órgãos que integram as pessoas políticas
do Estado, confundindo-se com os próprios entes federados
(União, Estados, Distrito Federal e Municípios).
Direito Administrativo
77
Os órgãos são centros de competências, fontes abstratas,
simples repartição de atribuições, como, por exemplo, o Conselho
Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), Conselho Nacional de
Política Energética (CNPE), o Conselho de República (art. 89 da
CRFB/88), o Conselho de Defesa Nacional (art. 91 da CRFB/88),
entre outros. Não possuem patrimônio, nem personalidade jurídica
própria. De regra, também não possuem capacidade processual.
Exatamente por serem unidades abstratas necessitam de pessoas
físicas para concretizar as atribuições que lhe são confiadas: os
agentes públicos. São criados por lei, mas podem ser extintos por
decreto, quando vagos (art. 61, § 1º, II, a, e 84, VI, da CRFB/88).
Desta forma, o ato praticado por um agente público é
considerado um ato do órgão, e, portanto, imputável à Entidade a
que ele pertence, conhecido por Teoria do Órgão. Isso porque o
Estado, como visto, se manifesta por meio de seus órgãos, que, por
sua vez, concretizam suas funções através dos agentes públicos.
Atenção! Quanto à possibilidade de se conferir capacidade processual aos órgãos públicos, os tribunais vêm decidindo pela sua viabilidade, desde que estes possuam natureza constitucional e estejam defendendo interesses institucionais próprios e vinculados à sua independência e funcionamento, como por exemplo, uma Assembleia Legislativa Estadual (órgão) impetrar mandado de segurança para defender sua autonomia financeira frente ao Poder Executivo (neste sentido STF na ADI nº 1.557-5/DF, no SS 668/RS; STJ no ROMS nº 8.967/SP). Outro caso específico vem disposto no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90, art. 82, III) quando legitima órgãos da administração pública direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código. São os casos específicos dos Procons.
78
O vínculo que há entre o agente e o Estado é o de
imputação, ou seja, não é de mandato nem de representação. O ato
do agente é imputado diretamente ao órgão ao qual está vinculado.
2.1. Classificação dos órgãos
2.1.1. Quanto à posição estatal
Independentes: São os órgãos originários da Constituição e
representam os Poderes do Estado (Executivo, Legislativo e
Judiciário). São exemplos: Câmara de Vereadores, Congresso
Nacional, Supremo Tribunal Federal, Tribunais de Justiça,
Presidência da República, Governo do Estado e Prefeitura
Municipal. Também se incluem os Tribunais de Contas,
Ministério Público e Defensoria Pública.
Autônomos: São os órgãos localizados na cúpula, mas
imediatamente abaixo dos órgãos independentes, participando
das decisões governamentais. Possuem autonomia
administrativa e financeira (a exemplo dos órgãos
independentes): são os Ministérios, Secretarias, Procuradorias,
Advocacia Geral da União, etc.
Superiores: São os órgãos de direção, controle e comando,
mas sujeitos à subordinação e controle hierárquico de uma
chefia. Não possuem autonomia administrativa e financeira,
sendo responsáveis pela execução de planejamento e soluções
técnicas. São Departamentos, Coordenadorias, Divisões,
Gabinetes, etc.
Subalternos: São os órgãos subordinados aos órgãos
superiores e têm funções eminentemente de execução.
Destinam-se à realização de serviços de rotina. São as
portarias, zeladorias, seções de expediente, de pessoal e
material, dentre outros.
2.1.2. Quanto à estrutura
Simples: Também chamado de Unitário, porque constituído
por um único centro de competência. Não existe nenhum
outro órgão na sua estrutura. Não há divisões internas, como,
por exemplo, em uma portaria.
Direito Administrativo
79
Compostos: São constituídos por vários outros órgãos
menores. Uma Secretaria pode compreender diversas
coordenadorias, seção de pessoal, material, etc.
2.1.3. Quanto à atuação funcional ou composição
Singulares ou unipessoais: São os órgãos que atuam e
decidem através de um único agente: Presidente da República,
Prefeito, Governador, etc.
Colegiados ou pluripessoais: São aqueles integrados por
vários agentes, que atuam e decidem pela manifestação
conjunta de seus membros. A exemplo, temos o Congresso
Nacional, Conselho da República, Tribunais, Câmaras de
Vereadores, etc.
3. Administração Indireta
Seguindo os ensinamentos do autor José dos Santos
Carvalho Filho (2008, p. 430), a Administração Indireta do Estado
é o conjunto de pessoas administrativas que, vinculadas à
respectiva Administração Direta, têm o objetivo de desempenhar
as atividades administrativas.
Deve-se salientar, das afirmações feitas, que por serem
pessoas jurídicas autônomas, possuem certa independência
gerencial e administrativa, não obstante sejam controladas e/ou
fiscalizadas pela Administração Pública Direta que criou/autorizou
a criação (art. 37, XIX, da CRFB/88).
Segundo dispõe o art. 4º, II, do Decreto-Lei nº 200/67, a
Administração Indireta compreende as seguintes entidades dotadas
de personalidade jurídica própria: Autarquias, Empresas Públicas,
Sociedades de Economia Mista e as Fundações Públicas. Hoje este
rol de Entidades da Administração Indireta serve apenas
exemplificativamente, haja vista o maior número de Entidades da
administração Indireta que podem ser criadas pela Administração
Direta.
Algumas características podemos apontar como comuns a
todas as entidades da Administração Pública Indireta. Assim é que
desde já citamos, sendo elas:
80
Adquirem personalidade jurídica própria;
São originadas a partir de uma lei específica (artigo 37, XIX,
da CRFB/88), podendo ser organizadas pela própria lei ou por
decretos, regulamentos, estatutos;
Possuem autonomia administrativa, financeira e às vezes
orçamentária (criadoras de suas próprias receitas);
Não possuem autonomia política (possibilidade de criar o
próprio direito. Somente quem possui são a União, Estados,
Distrito Federal e os Municípios, pois são estes – Entes
Políticos – que têm Poder Legislativo);
Permanecem vinculadas a um Ministério (ou Secretaria no
caso dos Estados e Municípios) da Administração Pública
Direta (por exemplo: o BNDES, o INMETRO e o INPI são
vinculados ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior, a ANATEL, a TELEBRÁS e a ECT são
vinculadas ao Ministério das Comunicações; o CADE e a
FUNAI ao Ministério da Justiça; a ANEEL, a ANP, a
ELETROBRÁS, o DNPM, a PETROBRÁS ao Ministério de
Minas e Energia; o TRENSURB ao Ministério das Cidades; o
CNPq, o CEITEC e a AEB são vinculados ao Ministério da
Ciência e Tecnologia; a ANCINE, a FUNARTE, o IPHAN e o
IBRAM vinculados ao Ministério da Cultura, etc.);
Ficam sujeitas à tutela, ou controle finalístico (dos fins) ou
supervisão ministerial (arts. 19 a 29 do Decreto-Lei nº
200/67);
Ficam, também, sujeitas ao controle feito pelo Tribunal de
Contas, art. 71, II, da CRFB/88 julgar as contas dos
administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e
valores públicos da administração direta e indireta (...);
Possuem patrimônio/bens próprios transferido do Ente
Político originador da Entidade;
Possuem dirigentes próprios, podendo haver a participação do
Legislativo na escolha, art. 52, III, d e f, da CRFB/88 (nesse
sentido STF na ADI nº 1.281/PA e na ADI-MC nº 1.949/RS);
São responsáveis não somente pela execução do serviço, mas
também, pela própria titularidade;
Devem respeitar as normas pertinentes às licitações.
Direito Administrativo
81
3.1. Autarquias
Numa tentativa de expor de forma mais didática as
características das Autarquias, seguem as mesmas como forma de
tópicos:
Adquirem personalidade jurídica de direito público;
São criadas por lei específica e extintas, também, somente
por lei (princípio da simetria das formas);
Executam atividades típicas da Administração Pública;
Os atos e contratos são administrativos, sujeitos a Lei de
Licitações nº 8.666/93 e demais normas licitatórias;
Possuem todas as prerrogativas e sujeições que formam o
regime jurídico de direito público, aparecendo perante os
administrados como se fosse a própria administração;
Seus bens são considerados bens públicos, usufruindo dos
mesmos privilégios conferidos à administração direta, como
impenhorabilidade, imprescritibilidade, não-onerabilidade e
inalienabilidade;
Seus atos podem ser questionados via Mandado de Segurança,
Ação Popular ou Ação Civil Pública;
Seus agentes são servidores públicos (estatutários);
A responsabilidade civil é delineada pelo art. 37, § 6º, da
CRFB/88;
Possuem os mesmos privilégios processuais conferidos à
Fazenda Pública como os constantes nos arts. 27, 188 e 730
do CPC, art. 100 da CRFB/88, execução fiscal de seus
créditos pela Lei nº 6.830/80, Súmula 483: O INSS não está
obrigado a efetuar depósito prévio do preparo por gozar das
prerrogativas e privilégios da Fazenda Pública, dentre outros;
Gozam de imunidade tributária referente ao seu patrimônio,
renda ou serviços vinculados à sua finalidade (art. 150, § 2º,
da CRFB/88).
São exemplos de autarquias federais: Banco Central do
Brasil (BACEN); Instituto Brasileiro do Meio Ambiente
(IBAMA); Instituto Chico Mendes de Conservação da
82
Biodiversidade (ICMBio); Instituto Nacional de Seguro Social
(INSS); Comissão de Valores Mobiliários (CVM);
Superintendência de Seguros Privados (SUSEP); Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária (INCRA); Instituto Nacional da
Propriedade Industrial (INPI); Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes (DNIT); Instituto Brasileiro de
Turismo (EMBRATUR); Departamento Nacional de Produção
Mineral (DNPM); Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (IPHAN); Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), entre
outros. De autarquias estaduais toma-se como exemplo o Estado do
Rio Grande do Sul: Instituto de Previdência do Estado (IPERGS);
Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN); Instituto Rio
Grandense do Arroz (IRGA); Departamento Autônomo de Estradas
de Rodagem (DAER); Superintendência de Portos e Hidrovias
(SPH); e de autarquias no Município de Porto Alegre, cita-se o
Departamento Municipal de Água e Esgoto de Porto Alegre
(DMAE) e o Departamento Municipal de Limpeza Urbana
(DMLU).
Os Conselhos fiscalizadores de profissões como
Conselho Federal de Medicina (CFM), Conselho Federal de
Farmácia (CFF), Conselho Regional de Contabilidade (CRC),
Conselho Regional de Nutrição (CRN), entre outros, possuem
status, foram equiparados às autarquias (Autarquias
Corporativas). Esta equiparação deu-se, também, com o intuito de
obrigar tais instituições a prestarem contas perante o Tribunal de
Contas da União (art. 71, II, da CRFB/88).
Mandado de segurança. - Os Conselhos Regionais de Medicina, como
sucede com o Conselho Federal, são autarquias federais sujeitas à
prestação de contas ao Tribunal de Contas da União por força do
disposto no inciso II do artigo 71 da atual Constituição. - Improcedência
das alegações de ilegalidade quanto à imposição, pelo TCU, de multa e
de afastamento temporário do exercício da Presidência ao Presidente do
Conselho Regional de Medicina em causa. Mandado de segurança
indeferido. (STF no MS nº 22643/SC, julgado em 06/08/1998, Min.
Relator Moreira Alves). No mesmo sentido STF no MS nº 21.797/RJ.
LEGITIMIDADE - AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE - CONSELHOS - AUTARQUIAS
CORPORATIVISTAS. O rol do artigo 103 da Constituição Federal e
exaustivo quanto à legitimação para a propositura da ação direta de
Direito Administrativo
83
inconstitucionalidade. Os denominados Conselhos, compreendidos no
gênero "autarquia" e tidos como a consubstanciar a espécie
corporativista não se enquadram na previsão constitucional relativa às
entidades de classe de âmbito nacional. Da Lei Básica Federal exsurge a
legitimação de Conselho único, ou seja, o Federal da Ordem dos
Advogados do Brasil. Dai a ilegitimidade "ad causam" do Conselho
Federal de Farmácia e de todos os demais que tenham idêntica
personalidade jurídica - de direito público. (STF na ADI nº 641/DF,
julgado em 11/12/1991, Min. Relator Marco Aurélio).
Ademais, ao estabelecerem normas (como, por exemplo,
a Resolução nº 542, do Conselho Federal de Farmácia, que obrigou
a apresentação e retenção de uma via do receituário médico para a
venda de medicamentos antimicrobianos), ao realizarem
fiscalização e imporem eventuais sanções tais autarquias exercem
poder de polícia, cujo desempenho somente pode ser feito sob o
manto de normas de direito público (indelegável para pessoas com
natureza de direito privado) o que obriga inclusive que seus
agentes sejam estatutários (regidos pela Lei nº 8.112/90 – ver ACP
nº 2009.51.01.017964-2/RJ). Foi neste sentido a decisão da ADI nº
1.717/DF, julgada pelo STF em 07/11/2002, assim ementada:
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS
PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE
TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE
PROFISSÕES REGULAMENTADAS. 1. Estando prejudicada a
Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como já
decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a
Ação Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a
inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º do
mesmo art. 58. 2. Isso porque a interpretação conjugada dos artigos 5°,
XIII, 22, XVI, 21, XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da
Constituição Federal, leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade,
a uma entidade privada, de atividade típica de Estado, que abrange
até poder de polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao
exercício de atividades profissionais regulamentadas, como ocorre
com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime. Grifei.
Noutro sentido não tem sido as decisões proferidas pelo
Superior Tribunal de Justiça:
84
PROCESSUAL CIVIL – CONFLITO DE COMPETÊNCIA –
CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL – PESSOA
JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO – MANDADO DE
SEGURANÇA – PENALIDADE IMPOSTA NO EXERCÍCIO DA
FISCALIZAÇÃO DO CONSELHO AUTÁRQUICO –
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1. O Supremo Tribunal Federal, na ADIn 1.717/DF, declarou a
inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei 9.649/98, que alteraram a
natureza jurídica dos conselhos profissionais por ser indelegável a
entidade privada atividade típica de Estado, que abrange até poder de
polícia, de tributar e de punir, no que concerne ao exercício das
atividades profissionais regulamentadas.
2. Mantida a natureza autárquica dos conselhos profissionais
permanece competente a Justiça Federal para julgar mandado de
segurança. 3. Ademais, a relação existente entre o profissional e o respectivo
conselho não se constitui relação de emprego, a justificar a
competência da Justiça Obreira, prevista no art. art. 114 da
Constituição Federal, com a redação dada pela EC 45/2004.
(STJ no CC 70.051/SP, Julgado em 13/12/2006, Min Relatora Eliana
Calmon). No mesmo sentido o STJ no CC nº 59.879/MS, AgRg nº CC
80665/MG e no REsp nº 889720/RJ.
Considerando a sua natureza autárquica, foi a decisão
proferida pela Superior Tribunal de Justiça no REsp nº
1.338.247/RS, julgada em 10/10/2012:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREPARO. CONSELHO DE
FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ISENÇÃO. RECURSO
REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. N. 8/2008-STJ).
Os Conselhos de Fiscalização Profissional, embora ostentem
natureza jurídica de entidades autárquicas, não estão isentos do
recolhimento de custas e do porte de remessa e retorno. A previsão
contida no art. 4º, parágrafo único, da Lei n. 9.289/1996, prevalece
sobre as demais (v.g. arts. 27 e 511 do CPC e art. 39 da Lei n.
6.830/1980). Precedentes citados: AgRg no AREsp 144.914-RJ, DJe
4/6/2012; AgRg no AREsp 146.616-RJ, DJe 24/5/2012; AgRg no
AREsp 43.763-RS, DJe 23/11/2011; AgRg no AREsp 2.795-RJ, DJe
19/12/2011; AgRg no AREsp 2.589-RJ, DJe 16/6/2011; AgRg no Ag
1.181.938-RS, DJe 25/3/2010, e EDcl no AREsp 148.693-RS, DJe
4/6/2012. (REsp 1.338.247-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado
em 10/10/2012).
A natureza autárquica dos Conselhos Fiscalizadores de
profissão é de tamanha importância que impõe, inclusive, o regime
estatutário aos seus agentes, senão vejamos:
Direito Administrativo
85
CONSELHO. FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. REGIME
JURÍDICO.
A controvérsia está em saber a natureza do vínculo jurídico da
recorrente com o conselho de fiscalização profissional, a fim de ser
apreciada a legalidade do ato de sua demissão. A Min. Relatora
ressaltou que o regime jurídico dos funcionários dos conselhos de
fiscalização profissional, por força do art. 1º do DL n. 968/1969, era o
celetista até o advento da CF/1988, que, em conjunto com a Lei n.
8.112/1990, art. 243, instituiu o regime jurídico único. Essa situação
perdurou até a edição do art. 58, § 3º, da Lei n. 9.469/1998, que instituiu
novamente o regime celetista para os servidores daqueles conselhos, em
razão da promulgação da EC n. 19/1998, que aboliu o regime jurídico
único dos servidores públicos. Entretanto, destacou que, no julgamento
da ADI 1.171-DF, o STF declarou a inconstitucionalidade dos §§ 1º, 2º,
4º, 5º, 6º, 7º, 8º e do caputdo art. 58 da Lei n. 9.649/1998, reafirmando a
natureza de autarquia especial dos conselhos de fiscalização
profissional, cujos funcionários continuaram celetistas, pois permaneceu
incólume o § 3º da norma em comento, que submetia os empregados
desses conselhos à legislação trabalhista. Porém, frisou que essa
situação subsistiu até 2/8/2007, quando o Pretório Excelso, no
julgamento da ADI 2.135-DF, suspendeu, liminarmente, com efeitos ex
nunc, a vigência do art. 39, caput, do texto constitucional, com a
redação dada pela EC n. 19/1998. Com essa decisão, subsiste, para os
servidores da administração pública direta, autarquias e fundações
públicas, a obrigatoriedade de adoção do regime jurídico único,
ressalvadas as situações consolidadas na vigência da legislação editada
nos termos da norma suspensa. In casu, a recorrente manteve vínculo
trabalhista com o conselho de fiscalização de 7/11/1975 até 2/1/2007, ou
seja, antes do retorno ao regime estatutário por força da decisão do STF
(na ADI 2.135-DF). Assim, visto que à época a recorrente não estava
submetida ao regime estatutário, sendo, portanto, de natureza celetista a
relação de trabalho existente, não cabe invocar normas estatutárias para
infirmar o ato de dispensa imotivada. Dessarte, a Turma, prosseguindo o
julgamento, negou provimento ao recurso. Precedente citado: REsp
820.696-RJ, DJe 17/11/2008. (REsp 1.145.265-RJ, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, julgado em 14/2/2012).
DIREITO ADMINISTRATIVO. CONSELHOS DE
FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA.
AUTARQUIAS CORPORATIVAS. REGIME DE
CONTRATAÇÃO DE SEUS EMPREGADOS. INCIDÊNCIA DA
LEI N. 8.112/90.
1. A atividade de fiscalização do exercício profissional é estatal, nos
termos dos arts. 5º, XIII, 21, XXIV, e 22, XIV, da Constituição Federal,
motivo pelo qual as entidades que exercem esse controle têm função
tipicamente pública e, por isso, possuem natureza jurídica de autarquia,
86
sujeitando-se ao regime jurídico de direito público. Precedentes do STJ
e do STF.
2. Até a promulgação da Constituição Federal de 1988, era possível, nos
termos do Decreto-Lei 968/69, a contratação de servidores, pelos
conselhos de fiscalização profissional, tanto pelo regime estatutário
quanto pelo celetista, situação alterada pelo art. 39, caput, em sua
redação original.
3. O § 1º do art. 253 da Lei n. 8.112/90 regulamentou o disposto na
Constituição, fazendo com que os funcionários celetistas das autarquias
federais passassem a servidores estatutários, afastando a possibilidade
de contratação em regime privado.
4. Com a Lei n. 9.649/98, o legislador buscou afastar a sujeição das
autarquias corporativas ao regime jurídico de direito público. Entretanto,
o Supremo Tribunal Federal, na ADI n. 1.717/DF, julgou
inconstitucional o dispositivo que tratava da matéria. O exame do § 3º
do art. 58 ficou prejudicado, na medida em que a superveniente Emenda
Constitucional n. 19/98 extinguiu a obrigatoriedade do Regime Jurídico
Único.
5. Posteriormente, no julgamento da medida liminar na ADI n.
2.135/DF, foi suspensa a vigência do caput do art. 39 da Constituição
Federal, com a redação atribuída pela EC n. 19/98. Dessa forma, após
todas as mudanças sofridas, subsiste, para a administração pública
direta, autárquica e fundacional, a obrigatoriedade de adoção do regime
jurídico único, ressalvadas as situações consolidadas na vigência da
legislação editada nos termos da emenda declarada suspensa.
6. As autarquias corporativas devem adotar o regime jurídico único,
ressalvadas as situações consolidadas na vigência da legislação editada
nos termos da Emenda Constitucional n. 19/97.
7. Esse entendimento não se aplica a OAB, pois no julgamento da ADI
n. 3.026/DF, ao examinar a constitucionalidade do art. 79, § 1º, da Lei n.
8.906/96, o Excelso Pretório afastou a natureza autárquica dessa
entidade, para afirmar que seus contratos de trabalho são regidos pela
CLT.
8. Recurso especial provido para conceder a segurança e determinar que
os impetrados, com exceção da OAB, tomem as providências cabíveis
para a implantação do regime jurídico único no âmbito dos conselhos de
fiscalização profissional, incidindo no caso a ressalva contida no
julgamento da ADI n. 2.135 MC/DF.
(STJ, REsp nº 507.536/DF, Ministro relator Jorge Mussi, julgado
em 18/11/2010).
Atenção! O STF, na ADI nº 3.026/DF, entendeu que a OAB é um serviço público independente, uma entidade sui generis, e por isso, não se enquadraria nas regras dos Conselhos fiscalizadores de profissões.
Direito Administrativo
87
O BRDE – Banco Regional do Extremo Sul, pertencente
aos Estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul,
entretanto, não possui as feições de uma autarquia como já se
manifestou o STF:
TRABALHISTA. BANCARIO. EMPREGADO DO BANCO
REGIONAL DE DESENVOLVIMENTO DO EXTREMO SUL
- BRDE. JORNADA DE TRABALHO. ALEGADA
CONTRARIEDADE AO ART. 173, PAR. 1., DA
CONSTITUIÇÃO. PRELIMINAR DE
INCONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA DO
DEPOSITO RECURSAL. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. O Supremo Tribunal Federal, no
julgamento do RE 115.891 (RTJ 128/422), firmou entendimento no
sentido de que a simples adoção do nomen juris de autarquia
interestadual destinada a financiar o desenvolvimento de regiões e de
projetos econômicos específicos não isenta o BRDE de submeter-se as
regras do direito comum, como ordena o art. 173, § 1º, da Carta Federal.
Para chegar-se a conclusão diversa da adotada pelo julgado em relação
ao enquadramento de seus empregados como bancários seria necessário
o exame da legislação de constituição da entidade, exsurgindo, de forma
indireta, a violação constitucional (AI nº 148.917 AgR/PR, julgado em
24/05/1994, Min. Relator Ilmar Galvão).
Execução fiscal: débito representado por Cédula de Crédito Industrial
em favor do BRDE - Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo
Sul: inidoneidade da via processual, resultante da solução negativa a
questão constitucional da suposta natureza autárquica interestadual, que
se arroga o credor exequente: RE provido. I. Atividade econômica do
Estado: intervenção suplementar no domínio econômico ou exploração
de serviço público. 1. Ainda que se devesse reduzir a participação
suplementar do Estado na atividade econômica "stricto sensu" - objeto
do art. 170 CF/69 - aquela que se faça mediante o apelo a técnica
privatística das empresas estatais de forma mercantil não basta a
descaracterização, em tese, da natureza autárquica de um banco de
desenvolvimento criado pelo Poder Público. 2. Em tese, a assunção
estatal, como serviço público, da atividade dos bancos de
desenvolvimento e tanto mais viável quanto e certo que, desde a
Constituição de 1967, a elaboração e a execução de planos regionais de
desenvolvimento foram explicitamente incluídos no rol da competência
da União: dispensa demonstração que, nosso regime de liberdade de
iniciativa, a atividade de fomento dela, desenvolvida pelos bancos de
desenvolvimento mediante empréstimos com prazo ou condições
favorecidas, prestação de garantias, intermediação de empréstimos
externos ou tomada de participações acionarias, são um dos
88
instrumentos primaciais da tarefa estatal de execução do planejamento
econômico. II. Autarquia interestadual de desenvolvimento: sua
inviabilidade constitucional. 3. O dado diferencial da autarquia e a
personalidade de direito público (Celso Antonio), de que a podem dotar
não só a União, mas também as demais entidades políticas do Estado
Federal, como técnicas de realização de sua função administrativa, em
setor especifico subtraído a administração direta. 4. Por isso mesmo, a
validade da criação de uma autarquia pressupõe que a sua destinação
institucional se compreenda toda na função administrativa da entidade
matriz: 5. O objetivo de fomento do desenvolvimento de região
composta pelos territórios de três Estados Federados ultrapassa o raio da
esfera administrativa de qualquer um deles, isoladamente considerado;
só uma norma da Constituição Federal poderia emprestar a manifestação
conjunta, mediante convenio, de vontades estatais incompetentes um
poder que, individualmente, a todos eles falece. 6. As sucessivas
Constituições da Republica além de não abrirem explicitamente às
unidades federadas a criação de entidades publicas de administração
interestadual, tem reservado a União, expressa e privativamente, as
atividades de planejamento e promoção do desenvolvimento regional:
analise da temática regional no constitucionalismo federal brasileiro.
(RE 120.932/RS, julgado em 24/03/1992, Min. Relator Sepúlveda
Pertence).
Existem ainda as autarquias territoriais que seriam os
extintos territórios, previstos no artigo 18, § 2º, da CRFB/88
(Diogo de Figueiredo Moreira Neto, 2009, p. 288).
3.2. Agências Reguladoras
As Agências Reguladoras são Autarquias sob regime
especial. Logo parte-se do pressuposto que possuem todas as
características atribuídas às Autarquias, agregando-se, no entanto,
outras. Com forte influência neoliberal norte-americana
(independent agencies) com a criação das Agências Reguladoras
almeja-se espécie de administrações independentes, busca-se uma
administração pública neutralizada politicamente, na qual a
legitimidade é técnica (LIMBERGER, 2007, p.138). Segue a
doutrinadora: a independência do governo é uma característica
estrutural, e a neutralidade política de sua gestão é de índole
funcional. No contexto das administrações independentes, a
neutralidade tem o significado de favorecimento da tomada de
decisões, a chamada neutralidade dos técnicos (LIMBERGER,
2007, p. 147). A expansão deste tipo de administração estaria
Direito Administrativo
89
ligada ao conflito gerado entre o modelo econômico adotado
(capitalista) e o Estado, enquanto, Social. Com a implantação do
Programa Nacional de Desestatização (PND - Lei nº 9.491/97),
surgiu ao Estado o dever de regular a prestação dos serviços
públicos, que agora não seriam mais prestados diretamente pelo
Estado, mas sim por empresas privadas (por meio de permissões,
concessões ou autorização) ou privatizadas, como, por exemplo, a
Embraer, que nasceu estatal, mas foi privatizada em 1994, ainda
sob a égide da Lei nº 8.031/90, antigo PND.
No Brasil muitos doutrinadores afirmam que o próprio
Banco Central do Brasil, criado em 1964, ainda que sem a
nomenclatura de Agência Reguladora (terminologia implantada na
Constituição Federal de 1988, no art. 174, caput, e reforçada com
as Emendas Constitucionais nº 8 e 9/95), já possuía algumas das
características atribuídas a estas entidades.
Os Conselheiros e Diretores possuem mandato fixo, o
que impede a demissão ad nutum, uma vez que somente perderão o
mandato em caso de renúncia, de condenação judicial transitada
em julgado ou de processo administrativo disciplinar, sendo que a
lei de criação da Agência poderá prever outras condições para a
perda do mandato, fato este que garante maior autonomia
administrativa perante o Poder Executivo. Além de maior
autonomia administrativa, as Agências Reguladoras possuem
também maior autonomia financeira em comparação às Autarquias,
pois além das dotações orçamentárias gerais, possuem arrecadação
de receitas provenientes de outras fontes, tais como taxas de
fiscalização e regulamentação, ou ainda participações em
contratos e convênios, como ocorre, por exemplo, nos setores de
petróleo e energia elétrica, art. 15, III, da Lei nº 9.478/97 e art. 11,
V, da Lei nº 9.427/96, respectivamente, (BARROSO, 2002, p. 8).
Além de maior autonomia administrativa e financeira, as
Agências possuem amplo poder normativo expedindo resoluções,
com o objetivo de regular/regulamentar a sua área de atuação, além
de possuir, também, amplo poder decisório (entre os agentes
econômicos que atuam no setor e entre eles e os consumidores) e
fiscalizador (incluindo-se aí a aplicação de sanções
90
administrativas): funções quase legislativas e quase judiciais
(LIMA, 1975, p. 101).
A autonomia das Agências Reguladoras pode ser dividida
em duas espécies: orgânica e administrativa. A primeira está
relacionada com o exercício das atividades-fim da agência, no que
diz respeito à autonomia para manejar os instrumentos
regulatórios, limitadas as finalidades expostas na lei instituidora da
entidade aos princípios que regem a administração pública e às
políticas públicas estabelecidas para o setor. Está ligada à
estabilidade dos agentes e à ausência de controle hierárquico das
decisões das agências. A autonomia administrativa direciona-se aos
meios para a agência efetivar suas competências. Encontra-se aqui
a autonomia financeira, na liberdade para organizar seus próprios
serviços, etc. (FGV, 2008, p. 109-110).
O ex-dirigente de uma Agência Reguladora fica impedido
para o exercício de atividades ou de prestar qualquer serviço no
setor regulado pela respectiva agência, por um período de quatro
meses (quarentena), contados da exoneração ou término de seu
mandato. Entretanto, durante o impedimento, o ex-dirigente ficará
vinculado à agência, fazendo jus a remuneração compensatória
equivalente à do cargo de direção que exerceu e aos benefícios a
ele inerentes. Este período pode mudar de Agência Reguladora
para Agência Reguladora. Na ANEEL, por exemplo, Lei nº
9.427/96, art. 9º, o ex-dirigente continua vinculado à autarquia nos
doze meses seguintes ao exercício do cargo, durante os quais estará
impedido de prestar, direta ou indiretamente, independentemente
da forma ou natureza do contrato, qualquer tipo de serviço às
empresas sob sua regulamentação ou fiscalização, inclusive
controladas, coligadas ou subsidiárias.
São exemplos: Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (CADE), Agência Nacional de Telecomunicações
(ANATEL, art. 21, XI, da CRFB/88), Agência Nacional de
Transportes Terrestres (ANTT), Agência Nacional de Águas
(ANA), Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Agência
Direito Administrativo
91
Nacional de Aviação Civil (ANAC), Agência Nacional do
Petróleo, Gás Natural e Bicombustíveis (ANP, art. 177, § 2º, III da
CRFB/88), Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS),
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), entre outras.
De Agência Reguladora Estadual cita-se a Agência Estadual de
Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul
(AGERGS).
3.3. Fundações
Antes de se expor as características das fundações,
algumas observações relevantes fazem-se necessárias. A primeira
delas é informar a existência de fundações não governamentais
(criadas e mantidas pela iniciativa privada) e fundações
governamentais/estatais (criadas e mantidas pelas pessoas
políticas). Contudo, em ambas, a finalidade é sempre social
(pesquisa, educação, cultura, ensino, médica, etc.), não lucrativa.
Costuma-se afirmar, também, que as fundações não são dotadas de
patrimônio, mas sim a incorporação ao patrimônio de suas
finalidades (a personificação do patrimônio para determinado fim
ou a universalidade de bens personalizada, em atenção ao fim, que
lhe dá unidade [MEIRELLES, 2009, p. 359]). A segunda
observação refere-se à natureza jurídica de uma fundação instituída
pelo Estado. Este pode instituir fundação com natureza jurídica de
direito público ou privado.
Atenção! As fundações que ostentam a personalidade jurídica pública são verdadeiras autarquias denominadas inclusive de fundações autárquicas ou autarquias fundacionais (instituídas diretamente por lei específica). Seriam uma espécie do gênero autarquias (STF na ADI 191/RS, nos RE’s nº 101.126/RJ, nº 215.741/SE e nº 219.900/RS).
92
As Fundações com personalidade jurídica de direito
público possuem as mesmas características que as Autarquias,
(como a criação por lei, sujeição às normas de direito público,
privilégios processuais, etc.) motivo pelo qual torna-se
desnecessária a exposição pormenorizada das características,
bastando para compreendê-las reportar-se às das Autarquias.
São exemplos destas Fundações: Fundação Nacional do
Índio (FUNAI), Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), Fundação Universidade Federal do Rio Grande
(Furg); Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), dentre outras.
No Município de Porto Alegre podemos citar a FASC (Fundação
de Assistência Social e Cidadania), responsável pela gestão no
Fundo Municipal de Assistência Social, segundo as deliberações
Personalidade jurídica de direito
privado
Possui caráter híbrido, incidindo normas de direito privado e público.
Fundações
Entes com patrimônio destinado a
um fim.
Personalidade jurídica de direito
público
Verdadeira espécie de autarquia. Governamentais ou
Estatais
Criadas e mantidas pela Administração.
Não governamentais
Criadas e mantidas pela iniciativa privada. Regidas pelas normas
de direito civil.
Direito Administrativo
93
do Conselho Municipal de Assistência Social. No Estado do Rio
Grande do Sul: Fundação Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore
(FIGTF), Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde
(FEPPS), Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária
(FEPAGRO) e a Fundação Orquestra Sinfônica de Porto Alegre
(FOSPA).
Já as que ostentam a personalidade jurídica de direito
privado ficam submetidas a um regime híbrido (ora incidindo
normas de direito público ora incidindo normas de direito privado),
como por exemplo: sua instituição é autorizada por lei específica
(norma de direito público), mas a personalidade jurídica somente é
adquirida com a inscrição da escritura pública no Registro Civil de
Pessoas Jurídicas (norma de direito privado). Por isso, somente
serão destacadas as particularidades que as distinguem das
fundações autárquicas, aplicando, de resto, as características
destas.
Pessoa Jurídica de direito privado;
Autorizada por lei específica, mas sua constituição depende do
registro no Registro Civil de Pessoas Jurídicas;
A definição das áreas de atuação se dá por Lei Complementar;
Seus bens são considerados privados, contudo por força do
artigo 150, § 2º, da CRFB/88, a impossibilidade de se instituir
imposto é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e
mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à
renda e aos serviços, vinculados a suas finalidades essenciais ou
às delas decorrentes;
Não possui as prerrogativas processuais;
Agentes públicos celetistas (ainda que prestem concurso
público, não adquirem a estabilidade do artigo 41 da CRFB/88).
No Rio Grande do Sul citamos: Universidade Estadual do
Rio Grande do Sul (UERGS), Fundação de Desenvolvimento e
Recursos Humanos (FDRH), Fundação de Economia e Estatística
(FEE), Fundação de Atendimento Socioeducativo (FASE);
Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM), Fundação
Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional
(METROPLAN), Fundação Theatro São Pedro (FTSP), Fundação
94
de Ciência e Tecnologia (CIENTEC), Fundação de Esporte e Lazer
do Rio Grande do Sul (FUNDERGS), Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), entre
outras.
3.4. Agências Executivas
As Agências Executivas, com previsão na Constituição
Federal no art. 37, § 8º, são instituídas sob a forma de autarquias,
fundações ou órgãos e correspondem em verdade a uma
qualificação, um título, uma nova roupagem, conferida à autarquia
ou fundação que celebre contrato de gestão (Lei nº 9.649/98, arts.
51 e 52 e Decretos nº 2.487/98 e nº 2.488/98), concedendo maior
autonomia de gestão, e que tenha cumprido os seguintes requisitos:
Ter plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento
institucional, voltado para a melhoria da qualidade da gestão e
para a redução de custos, já concluído ou em andamento;
Ter celebrado um contrato de gestão com o respectivo
Ministério superior.
O ato de qualificação como Agência Executiva dar-se-á
mediante decreto O contrato de gestão definirá relações e
compromissos entre os signatários, constituindo-se em instrumento
de acompanhamento e avaliação do desempenho institucional da
entidade, para efeito de supervisão ministerial e de manutenção da
qualificação como Agência Executiva.
Cumpre ressaltar que o fato de celebrar este contrato de
gestão não altera a natureza jurídica da entidade. Não é uma nova
pessoa jurídica. Distingue-se das Agências Reguladoras pelo fato
de não possuir função precípua de exercer controle sobre os
particulares prestadores de serviço público. Como exemplo de
agência executiva podemos citar a Autarquia Instituto Nacional de
Metrologia, de Qualidade e Tecnologia (INMETRO) e o órgão
Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Art. 51. O Poder Executivo poderá qualificar como Agência Executiva a
autarquia ou fundação que tenha cumprido os seguintes requisitos:
I - ter um plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento
institucional em andamento;
Direito Administrativo
95
II - ter celebrado Contrato de Gestão com o respectivo Ministério
supervisor.
§ 1º A qualificação como Agência Executiva será feita em ato do
Presidente da República.
§ 2º O Poder Executivo editará medidas de organização administrativa
específicas para as Agências Executivas, visando assegurar a sua
autonomia de gestão, bem como a disponibilidade de recursos
orçamentários e financeiros para o cumprimento dos objetivos e metas
definidos nos Contratos de Gestão.
Art. 52. Os planos estratégicos de reestruturação e de desenvolvimento
institucional definirão diretrizes, políticas e medidas voltadas para a
racionalização de estruturas e do quadro de servidores, a revisão dos
processos de trabalho, o desenvolvimento dos recursos humanos e o
fortalecimento da identidade institucional da Agência Executiva.
§ 1º Os Contratos de Gestão das Agências Executivas serão celebrados
com periodicidade mínima de um ano e estabelecerão os objetivos,
metas e respectivos indicadores de desempenho da entidade, bem como
os recursos necessários e os critérios e instrumentos para a avaliação do
seu cumprimento.
§ 2º O Poder Executivo definirá os critérios e procedimentos para a
elaboração e o acompanhamento dos Contratos de Gestão e dos
programas estratégicos de reestruturação e de desenvolvimento
institucional das Agências Executivas
3.5. Consórcios Públicos
A Lei nº 11.107/05 (regulamentando o art. 241 da
CRFB/88) introduziu no ordenamento jurídico pátrio os
denominados consórcios públicos, revestindo-se de personalidade
jurídica de direito público (associação pública) ou personalidade
jurídica de direito privado.
O consórcio público é a união de Entes federados para a
realização de objetivos e interesses comuns (vários municípios se
unem, por exemplo, em forma de um consórcio para a limpeza e
conservação de um rio que os banhem), integrando a
Administração Indireta destes entes.
Para o cumprimento de seus objetivos, o consórcio
público pode firmar convênios, contratos, acordos de qualquer
natureza, receber auxílios, contribuições e subvenções sociais ou
econômicas de outras entidades e órgãos do governo; nos termos
do contrato de consórcio de direito público, promover
desapropriações e instituir servidões nos termos de declaração de
utilidade ou necessidade pública, ou interesse social, realizada pelo
96
Poder Público; e ser contratado pela Administração Direta ou
Indireta dos entes da Federação consorciados, dispensada a
licitação.
A União somente participará de consórcios públicos em
que também façam parte todos os Estados em cujos territórios
estejam situados os Municípios consorciados, ou seja, para que a
União integre um consórcio de Municípios, o Estado ou Estados
(se forem Municípios de mais de um Estado) devem integrar,
também, este consórcio. Os consórcios públicos, na área de saúde,
deverão obedecer aos princípios, diretrizes e normas que regulam o
Sistema Único de Saúde – SUS.
A lei expõe que o consórcio público com personalidade
jurídica de direito público integra a Administração Indireta dos
entes reunidos em consórcio, sendo, entretanto, silente quanto à de
natureza privada. Neste último caso há autores (GASPARINI,
2006, p. 345; CARVALHO FILHO, 2008, p. 216) com os quais se
concorda que entendem que mesmo sendo silente a Lei nº
11.107/05 quanto aos consórcios de natureza privada, também
pertenceriam à Administração Pública Indireta dos entes reunidos.
O certo é que o consórcio público com personalidade
pública (associação pública) adquire as mesmas características das
autarquias (passa a ser uma espécie de Autarquia), inclusive por
força do art. 41, IV, do Código Civil. Contudo se adquirir
personalidade jurídica de direito privado, além das normas de
direito privado deverá observar, também, normas de direito público
(regime híbrido) concernentes à realização de licitação, celebração
de contratos, prestação de contas e admissão de pessoal (por
Atenção! Os consórcios públicos serão constituídos por contrato cuja celebração dependerá da prévia subscrição de protocolo de intenções. O contrato de consórcio público será celebrado com a ratificação, mediante lei, do protocolo de intenções.
Direito Administrativo
97
concurso), mas regido pelas leis trabalhistas (CLT), art. 6º, § 2º, da
Lei nº 11.107/05.
Poderá ser excluído do consórcio público, após prévia
suspensão, o ente consorciado que não consignar, em sua lei
orçamentária ou em créditos adicionais, as dotações suficientes
para suportar as despesas assumidas por meio de contrato de rateio.
Este contrato é formalizado a cada exercício financeiro e seu prazo
de vigência não será superior ao das dotações que o suportam, com
exceção dos contratos que tenham por objeto exclusivamente
projetos consistentes em programas e ações contemplados em
plano plurianual ou a gestão associada de serviços públicos
custeados por tarifas ou outros preços públicos (art. 8º da Lei dos
Consórcios Públicos).
A retirada do ente da Federação do consórcio dependerá
de ato formal de seu representante em assembleia geral. Os bens
destinados ao consórcio público pelo consorciado que se retira
somente serão revertidos ou retrocedidos no caso de expressa
previsão no contrato de consórcio público ou no instrumento de
transferência ou de alienação (art. 11 da Lei nº 11.105/07).
3.6. Empresas públicas e sociedades de economia mista
3.6.1. Semelhanças
Assumem personalidade jurídica de direito privado;
Sua criação é autorizada por lei específica;
São criadas com a inscrição do ato constitutivo no respectivo
registro, precedida, quando necessário, de autorização ou
aprovação do Poder Executivo (art. 45 do Código Civil);
Seguindo o princípio da simetria das formas, somente a lei
poderia extinguir estas entidades. A Lei de Falências
(11.101/05, art. 2º, I) inclusive veda a sua aplicação às
empresas públicas e às sociedades de economia mista
(independentemente da atividade desempenhada). Entretanto,
não podemos olvidar que o art. 173, § 1º, II, da CRFB/88,
determina que se apliquem às empresas públicas e sociedades
de economia mista que explorarem atividade econômica as
normas de direito privado, o que demonstra, no mínimo,
parcial inconstitucionalidade da norma falimentar
98
(CARVALHO FILHO, 2008, p. 481-3). Paira ainda
controvérsia na Suprema Corte (MS nº 25.888/DF) da
(im)possibilidade do Decreto nº 2.745/98, emitido com base
na Lei nº 9.478/97, artigo 67, regulamentar procedimento
licitatório simplificado (no caso para a PETROBRAS). No
mesmo sentido é a discussão no RE nº 441.280/RS;
Podem prestar serviço público, e neste caso prevalecerão
normas de direito público como imunidade tributária,
demissão de seus agentes condicionada à motivação,
responsabilidade civil objetiva do art. 37, § 6º, da CRFB/88, etc;
Podem, também, contudo, explorar atividade econômica.
Nesta hipótese devem prevalecer normas de direito privado,
sejam elas civis, comerciais, trabalhistas ou tributárias (art.
173, § 1º, II, da CRFB/88). O artigo 173 da Constituição
Federal consagra o princípio da subsidiariedade da
participação direta do Estado na atividade econômica, ou seja,
a regra que se tem é que o Estado se abstenha de exercer
atividade econômica, salvo nos casos de imperativo de
segurança nacional e relevante interesse coletivo. Ainda há
que se destacar importante observação feita por Maria Sylvia
Zanella Di Pietro (2008, p. 44) que expõe:
Quando o Estado exerce uma atividade que não é definida legalmente
como serviço público, não se cogita de descentralização propriamente
dita. É o que ocorre quando ele assume uma atividade econômica com
base no art. 173 da Constituição Federal; ao criar uma empresa estatal
para desempenhar essa atividade, o Estado não está transferindo uma
atividade sua (pois ninguém transfere mais poderes do que tem) mas
saindo de sua órbita própria de ação para atuar no âmbito da atividade
privada, a título de intervenção no domínio econômico. (Grifos no
original).
Os bens são submetidos ao regime jurídico de direito privado,
salvo aqueles direcionados à prestação de serviço público,
caso em que carregarão consigo as características de bens
públicos;
Estão sujeitas ao controle Estatal, inclusive pelo Tribunal de
Contas:
Direito Administrativo
99
MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL.
COMPETÊNCIA. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. ART. 71, III,
DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. FISCALIZAÇÃO DE EMPRESAS
PÚBLICAS E SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA.
POSSIBILIDADE. IRRELEVÂNCIA DO FATO DE TEREM OU NÃO
SIDO CRIADAS POR LEI. ART. 37, XIX, DA CONSTITUIÇÃO DO
BRASIL. ASCENSÃO FUNCIONAL ANULADA PELO TCU APÓS
DEZ ANOS. ATO COMPLEXO. INEXISTÊNCIA. DECADÊNCIA
ADMINISTRATIVA. ART. 54 DA LEI N. 9.784/99. OFENSA AO
PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA E DA BOA-FÉ.
SEGURANÇA CONCEDIDA. 1. As empresas públicas e as sociedades de
economia mista, entidades integrantes da administração indireta, estão
sujeitas à fiscalização do Tribunal de Contas, não obstante a aplicação do
regime jurídico celetista aos seus funcionários. Precedente [MS n. 25.092,
Relator o Ministro CARLOS VELLOSO, DJ de 17.3.06]. (...). (STF no MS
26.117/DF, julgado em 20/05/2009, Min. Rel. Eros Grau).
Realizam concurso público, mas seus agentes são empregados
públicos (celetistas);
Realizam licitação para as atividades “meio” (Súmula nº 333
do STJ: cabe mandado de segurança contra ato praticado em
licitação promovida por sociedade de economia mista ou
empresa pública);
Inaplicabilidade das regras diferenciadas de prescrição
(Decreto nº 20.910/32);
Não possuem privilégios processuais.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PRAZOS PROCESSUAIS
DIFERENCIADOS. EMPRESA PÚBLICA. INTERPRETAÇÃO
RESTRITIVA. Não é possível a concessão às empresas públicas de
prazo em dobro para recorrer e em quádruplo para contestar. As normas
que criam privilégios ou prerrogativas especiais devem ser interpretadas
restritivamente, não se encontrando as empresas públicas inseridas no
conceito de Fazenda Pública previsto no art. 188 do CPC. Precedente
citado: REsp 429.087-RS, DJe 25/10/2004. (AgRg no REsp 1.266.098-
RS, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 23/10/2012).
3.6.2. Diferenças
Em que pese as semelhanças serem em grande número,
não podemos dizer o mesmo quanto às diferenças entre as
empresas públicas e as sociedades de economia mista.
São três as diferenças básicas entre estes entes no que diz
respeito ao capital que os integra, à sua forma societária e à
100
competência processual, ficando em um quadro comparativo
exposto da seguinte maneira:
O fato de o capital integrante de uma empresa pública ser
público não impede que outros entes federativos participem da
constituição do capital de tal entidade. Neste particular, destaca-se
o art. 5º do Decreto-Lei nº 900/69 que estabelece: desde que a
maioria do capital volante permaneça de propriedade da União,
será admitida, no capital da Empresa Pública (art. 5º, inciso II, do
Decreto-lei 200, de 25 de fevereiro de 1967), a participação de
outras pessoas jurídicas de direito público interno, bem como de
EMPRESA PÚBLICA
Aparece sob qualquer forma
societária: S/A, Caixa Econômica,
Ltda, etc.
Aparece somente como Sociedade
Anônima S/A.
Possui capital exclusivamente
público.
Possui capital público, contudo admite a participação de capital
privado.
SOCIEDADE DE ECONOMIA
MISTA
Banco do Brasil, Instituto de
Resseguros do Brasil, Petrobras,
Eletrobrás, Empresa de Trens
Urbanos de Porto Alegre
(Trensurb), Companhia Brasileira
de Trens Urbanos (CBTU).
Casa da Moeda, Empresa
Brasileira de Correios e Telégrafos
(ECT), Caixa Econômica Federal,
SERPRO, Empresa Brasileira de
Infraestrutura Aeroportuária
(Infraero), BNDES, Embrapa,
Hospital de Clínicas de Porto
Alegre.
Foro competente sempre da
justiça estadual. Súmulas nº 42
STJ e 517 e 556 do STF.
Se for uma Empresa Pública Federal o foro competente é a justiça federal (art. 109, I, da CRFB/88).
Direito Administrativo
101
entidades da Administração Indireta da União, dos Estados,
Distrito Federal e Municípios.
Com relação aos litígios envolvendo empresas públicas e
sociedades de economia mista uma atenção deve ser redobrada. Os
conflitos trabalhistas são dirimidos pela justiça obreira, conforme
determina o artigo 114 da Constituição Federal.
Ainda com relação ao Correios, ou melhor, às franquias
concedidas pelos Correios, importante destacar quanto à
competência que: nos crimes praticados contra agências da ECT a
fixação da competência depende da natureza econômica do serviço
prestado. Quando é explorado diretamente pela empresa pública,
a competência é da Justiça Federal. Se a exploração for feita por
particular, mediante franquia, a Justiça estadual será a
competente. No caso, trata-se de uma Agência de Correios
Comunitária operada mediante convênio, em que há interesse
recíproco dos agentes na atividade desempenhada, inclusive da
empresa pública. Assim, a Seção entendeu que prevalece o
interesse público ou social no funcionamento do serviço postal por
parte da empresa pública federal e por isso há maior similitude
com as agências próprias. Dessa forma, a competência será da
Atenção! No que tange à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, o STF no RE nº 230.072/RS e no RE nº 407.099/RS entendeu que os bens destinados aos serviços públicos são bens públicos, e por isso possuem imunidade tributária. No mesmo sentido, o STF no RE nº 220.906/DF entendeu incidir normas de direito público nas relações jurídicas da EBCT equiparando-a à Fazenda Pública, inclusive no que tange à impenhorabilidade de seus bens e à sua submissão ao regime geral de precatórios previsto no art. 100 da Constituição Federal. Após esta manifestação a Casa da Moeda da Brasil ingressou com uma Ação Cível Originária (ACO) nº 1.342/RJ (informativos nº 556 e 591), postulando imunidade tributária (art. 150, VI, da CRFB/88) na condição de Empresa Pública da União prestadora de serviço público. O STF não concedeu a antecipação de tutela, o que demonstra, ainda, não ser o posicionamento tomado frente aos Correios matéria pacífica.
102
Justiça Federal. CC 122.596-SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior,
julgado em 8/8/2012.
Questão semelhante à da Casa da Moeda, foi o Recurso
Extraordinário nº 580.264/RS envolvendo o Grupo Hospitalar
Conceição (Hospital Nossa Senhora da Conceição S/A, Hospital
Cristo Redentor S/A e Hospital Fêmina S/A – tratados como
Sociedades de Economia Mista –, isto porque o seu ingresso ao
Estado [União] deu-se por desapropriação de 51% das ações do
antigo Grupo Hospital Conceição, e após pela aquisição por parte
da União do restante da participação acionária do Grupo) na qual
postulou imunidade tributária com base no art. 150, IV, a, da
CRFB/88, alegando ausência de exploração de atividade
econômica e prestação de serviços de saúde (como entidade de
interesse público). Em decisão apertadíssima (vencidos os
Ministros Joaquim Barbosa, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski
e Marco Aurélio) fora concedida a imunidade tributária ao Grupo
Hospitalar decisão assim ementada:
CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. IMUNIDADE
TRIBUTÁRIA RECÍPROCA. SOCIEDADE DE ECONOMIA
MISTA. SERVIÇOS DE SAÚDE. 1. A saúde é direito fundamental de
todos e dever do Estado (arts. 6º e 196 da Constituição Federal). Dever
que é cumprido por meio de ações e serviços que, em face de sua
prestação pelo Estado mesmo, se definem como de natureza pública (art.
197 da Lei das leis). 2 . A prestação de ações e serviços de saúde por
sociedades de economia mista corresponde à própria atuação do Estado,
desde que a empresa estatal não tenha por finalidade a obtenção de
lucro. 3. As sociedades de economia mista prestadoras de ações e
serviços de saúde, cujo capital social seja majoritariamente estatal,
gozam da imunidade tributária prevista na alínea “a” do inciso VI do art.
150 da Constituição Federal. 3. Recurso extraordinário a que se dá
provimento, com repercussão geral (RE nº 580.264/RS, Relator Min.
Joaquim Barboas, julgado em 16/12/2010).
Controvérsia semelhante perante o Plenário da Corte
Constitucional foi julgada no Recurso Extraordinário nº
599.628/DF, em que se discutiu se o regime de precatórios se
aplicava, ou não, a sociedades de economia mista, no caso
específico das Centrais Elétricas do Norte do Brasil S/A -
ELETRONORTE. O Recurso Extraordinário fora interposto pela
Direito Administrativo
103
ELETRONORTE contra acórdão que reputara não se aplicar o
regime de execução dos precatórios às sociedades de economia
mista, por possuírem elas personalidade jurídica de direito privado
e por não se confundir o regime de execução com a
impossibilidade de penhora de bens que comprometam o
fornecimento do serviço público (forneceria energia elétrica para
nove Estados da região Norte). O Min. Ayres Britto, relator,
(acompanhado pelos Ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes) deu
provimento ao recurso: entendeu que, se as atividades
genuinamente estatais são protegidas com o regime especial do
precatório, este deveria ser estendido às empresas que prestam
serviços públicos essenciais, não importando a natureza jurídica
delas, mas atividade estatal em si, titularizada pelo Estado, ponto
avançado do constitucionalismo social. (...). Frisou que, ao propor
a extensão da expressão Fazenda Pública para as empresas
públicas e sociedades de economia mista que prestam serviço
público, isto é, que não exploram atividade econômica, nada mais
estaria fazendo que dizer que tal expressão seria sinônima de setor
público. Em voto-vista, o Min. Joaquim Barbosa inaugurou
divergência (acompanhado pela Ministra Cármen Lúcia) e
desproveu o recurso. Inicialmente, realçou que seria preponderante
para a resolução da controvérsia a circunstância de o modelo de
geração e fornecimento de energia admitir a livre iniciativa e a
concorrência. Em passo seguinte, aduziu que o atual modelo do
setor elétrico permitiria o financiamento tanto por recursos
públicos quanto privados e que nesse setor conviveriam os
mercados livre e regulado, bem como consumidores livres e
cativos (Informativo nº 611 do STF). Salientou que a competição
entre geradores de energia elétrica no Ambiente de
Comercialização Livre (ACL) seria percebida com mais facilidade,
pois os consumidores que teriam acesso a tal mercado possuiriam
margem maior para escolha e negociação. Enfatizou, por outro
lado, que, apesar de existir concorrência no Ambiente de
Comercialização Regulado (ACR), esta seria em menor grau; que
objetivando alcançar modicidade tarifária, a energia elétrica
excedente seria comercializada às distribuidoras por meio de
leilões e que o acesso ao ACR ocorreria por licitação. Lembrou,
ainda, que as indústrias detentoras de unidades próprias de
104
geração de energia poderiam comercializar a produção excedente,
ainda que este tipo de operação não fizesse parte de seu objetivo
social preponderante (auto geradoras). (...). Asseverou ser
incontroverso que o objetivo principal da recorrente, sociedade de
economia mista, seria a exploração lucrativa em benefício de seus
acionistas — de entidades públicas ou privadas. Expôs, nesse
sentido, que o Estado, ao perseguir o lucro como fim primordial,
deveria despir-se das garantias soberanas necessárias à proteção
do regime democrático, do sistema republicano e do pacto
federativo, pois tais salvaguardas seriam incompatíveis com a
livre iniciativa e com o equilíbrio concorrencial. Assinalou que a
ELETRONORTE não exploraria o potencial energético das fontes
nacionais independentemente de qualquer contraprestação, mas o
faria, licitamente, para obter lucro, não ocupando, portanto, o
lugar do Estado. Por fim, teve a decisão a seguinte ementa:
FINANCEIRO. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA.
PAGAMENTO DE VALORES POR FORÇA DE DECISÃO
JUDICIAL. INAPLICABILIDADE DO REGIME DE
PRECATÓRIO. ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO.
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA
CONSTITUCIONAL CUJA REPERCUSSÃO GERAL FOI
RECONHECIDA. Os privilégios da Fazenda Pública são inextensíveis
às sociedades de economia mista que executam atividades em regime de
concorrência ou que tenham como objetivo distribuir lucros aos seus
acionistas. Portanto, a empresa Centrais Elétricas do Norte do Brasil
S.A. - Eletronorte não pode se beneficiar do sistema de pagamento por
precatório de dívidas decorrentes de decisões judiciais (art. 100 da
Constituição). Recurso extraordinário ao qual se nega provimento. (RE
nº 599.628/DF, Relator Ministro Ayres Brito, julgado em
25/05/2011).
Em 2005, o mesmo Supremo Tribunal Federal, no RE nº
356.711/PR, entendeu que Administração dos Portos de Paranaguá
e Antonina – APPA, por tratar-se de autarquia que presta serviço
público e recebe recursos estaduais, conforme previsto no
Regulamento da APPA (Decreto Estadual 7.447/90) não estaria
submetida ao art. 173, § 1º, da CRFB/88. Entretanto, à época
salientou: não incidir a norma do § 1º do art. 173 nas sociedades
de economia mista ou empresas públicas que, apesar de exercerem
atividade econômica, gozam de exclusividade, e salientando o
Direito Administrativo
105
julgamento do RE 220.906/RS (DJU de 14.11.2002), no qual se
afirmou que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT
está submetida ao regime de precatório (Informativos nº 410, 412
e 420 do STF).
Se o capital de uma empresa pública for de apenas um
ente federativo, ou seja, o ente for sócio ou acionista detentor de
todas as ações, dir-se-á que se trata uma empresa pública
unipessoal. É o caso da Empresa Brasileira de Serviços
Hospitalares - EBSERH (Lei nº 12.550/2011), por exemplo, onde
em seu artigo 2º afirma que terá seu capital social integralmente
sob a propriedade da União. A Empresa Gaúcha de Rodovias
(EGR), criada em 2012 no Rio Grande do Sul, já é uma entidade
onde 90% do seu capital pertence ao Estado, enquanto o restante
(10%) é aberto a autarquias, empresas públicas e municípios. Logo,
não é uma empresa unipessoal.
No tocante às sociedades de economia mista, as ações
com direito a voto devem pertencer em sua maioria ao ente estatal
criador, como determina de forma exemplificativa o art. 62 da Lei
nº 9.478/97: A União manterá o controle acionário da
PETROBRÁS com a propriedade e posse de, no mínimo, cinquenta
por cento das ações, mais uma ação, do capital votante. Podemos
citar como exemplos de sociedade de economia mista estadual
(RS): Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE),
Companhia Riograndense de Artes Gráficas (CORAG),
Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN), Banco do
Estado do Rio Grande do Sul (BANRISUL), Companhia de Gás do
Rio Grande do Sul (SULGÁS), Companhia Riograndense de
Mineração (CRM), Companhia Estadual de Silos e Armazéns
(CESA), Companhia de Processamento de Dados do Rio Grande
do Sul (PROCERGS), entre outros.
3.6.3. Subsidiárias
Segundo dispõe o art. 37, XX, da CRFB/88, a criação de
subsidiárias e a participação de qualquer delas em empresa privada
depende de autorização legislativa, não necessitando, no entanto,
uma lei específica autorizando a criação de cada subsidiária (Lei nº
106
9.478/97, art. 64 e Lei nº 11.908/09, art. 1º). Sobre o tema
manifestou-se o STF na ADI nº 1.649/DF no seguinte sentido:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 9478/97.
AUTORIZAÇÃO À PETROBRÁS PARA CONSTITUIR
SUBSIDIÁRIAS. OFENSA AOS ARTIGOS 2º E 37, XIX E XX, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INEXISTÊNCIA. ALEGAÇÃO
IMPROCEDENTE. 1. A Lei 9478/97 não autorizou a instituição de
empresa de economia mista, mas sim a criação de subsidiárias distintas
da sociedade-matriz, em consonância com o inciso XX, e não com o
XIX do artigo 37 da Constituição Federal. 2. É dispensável a
autorização legislativa para a criação de empresas subsidiárias, desde
que haja previsão para esse fim na própria lei que instituiu a empresa de
economia mista matriz, tendo em vista que a lei criadora é a própria
medida autorizadora.
A exemplo, pode-se citar a Lei nº 11.908/09 que
autorizou o Banco do Brasil S/A e a Caixa Econômica Federal a
constituírem subsidiárias integrais ou controladas, com vistas a dar
cumprimento nas atividades de seu objeto social, bem como
adquirirem participação em instituições financeiras públicas ou
privadas sediadas no Brasil, incluindo empresas dos ramos
securitários, previdenciários, de capitalização, bem como de outros
ramos descritos na Lei nº 4.595/64, arts. 17 e 18.
São aquelas cujo controle e gestão das atividades estão
atribuídas à empresa pública ou à sociedade de economia mista
(CARVALHO FILHO, 2008, p. 467), tendo por objetivo a
dedicação em um dos segmentos específicos da entidade criadora,
integrando a administração pública indireta da administração
(MOREIRA NETO, 2009, p. 274). Podemos citar como exemplo a
Eletrobrás (Centrais Elétricas Brasileiras S/A) e suas 12
subsidiárias: Furnas, Chesf, Eletronorte, Eletrosul, Eletronuclear,
CGTEE, Amazonas Energia, Boa Vista Energia, Ceal, Cepisa,
Ceron e Eletroacre; e a Petrobras (Petróleo Brasileiro S/A) com
suas 5 subsidiárias: Transpetro, Petrobras Distribuidora,
Petroquisa, Gaspetro e a Petrobras Biocombustível.
Direito Administrativo
107
4. Entidades paraestatais, entes de cooperação ou terceiro setor
São pessoas jurídicas de direito privado, sem fins
lucrativos, que não integram a Administração Indireta, mas que
cooperam (colaboram), que caminham paralelamente ao Estado,
executando alguma atividade social de utilidade pública. Não
integram a estrutura da Administração Pública. São também
conhecidas como terceiro setor (o primeiro setor é o Estado, o
segundo é o mercado e o terceiro é a sociedade).
4.1. Serviços sociais autônomos
Conhecidos como Sistema “S” (SESC, SENAI, SESI,
SENAC, SENAT, etc.) são pessoas jurídicas instituídas por lei,
vinculadas a certas categorias profissionais com o fim de fomentar
a assistência ou o ensino, sendo mantidas por dotações
orçamentárias do Poder Público (por isso submetido ao controle do
Tribunal de Contas) e contribuições parafiscais. Seus empregados
estão sujeitos às leis trabalhistas (são empregados celetistas), não
gozam de qualquer privilégio processual ou tributário e ainda que
não estejam necessariamente subordinadas à lei de licitações, na
maioria dos Estados, estas entidades têm se valido das normas
licitatórias. Afirma Hely Lopes Meirelles (2009, p. 385): São todos
aqueles instituídos por lei, com personalidade de Direito Privado,
para ministrar assistência ou ensino a certas categorias sociais ou
grupos profissionais, sem fins lucrativos, sendo mantidos por
dotações orçamentárias ou por contribuições parafiscais.
Os recursos carreados às pessoas de cooperação governamental são
oriundos de contribuições parafiscais, recolhidas compulsoriamente
pelos contribuintes que as diversas leis estabelecem, para enfrentarem os
custos decorrentes de seu desempenho, sendo vinculadas aos objetivos
da entidade. (CARVALHO FILHO, 2008, p. 501).
Tais contribuições estão previstas no artigo 240 da
CRFB/88: ficam ressalvadas do disposto no art. 195 as atuais
contribuições compulsórias dos empregadores sobre a folha de
salários, destinadas às entidades privadas de serviço social e de
formação profissional vinculadas ao sistema sindical. Os recursos
não são provenientes diretamente do erário, mas não deixam, por
108
isso, de ser dinheiro público dada a sua compulsoriedade no
recolhimento.
Afirma Maria Sylvia Di Pietro (DI PIETRO, 2009, p. 492).
Essas entidades não prestam serviço público delegado pelo Estado,
mas atividade privada de interesse público (serviços não exclusivos do
Estado); exatamente por isso, são incentivadas pelo Poder Público. A
atuação estatal, no caso é de fomento e não de prestação de serviço
público. Por outras palavras, a participação do Estado, no ato de
criação, se deu para incentivar a iniciativa privada, mediante
subvenção garantida por meio da instituição compulsória de
contribuições parafiscais destinadas especificamente a essa finalidade.
Não se trata de atividade que incumbisse ao Estado, como serviço
público, e que ele transferisse para outra pessoa jurídica, por meio de
instrumento da descentralização. Trata-se, sim, de atividade privada
de interesse público que o Estado resolveu incentivar e subvencionar.
Seu controle tem previsão no Decreto-Lei nº 200/67,
artigo 183: As entidades e organizações em geral, dotadas de
personalidade jurídica de direito privado, que recebem
contribuições para fiscais e prestam serviços de interesse público
ou social, estão sujeitas à fiscalização do Estado nos termos e
condições estabelecidas na legislação pertinente a cada uma e no
artigo 71, II, da Constituição Federal onde compete ao Tribunal de
Contas julgar as contas dos administradores e de responsáveis por
dinheiro, bens e valores públicos da administração direta e indireta,
incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo
Poder Público Federal.
Competência: Justiça comum: ação popular contra o SEBRAE: L.
4717/65 (LAP), art. 20, f; CF, art. 109, IV; Súmula 516. 1.O SEBRAE
não corresponde à noção constitucional de autarquia, que, para começar,
há de ser criada por lei específica (CF, art. 37, XIX) e não na forma de
sociedade civil, com personalidade de direito privado, como é o caso do
recorrido. Por isso, o disposto no art. 20, -f-, da L. 4717/65 (LAP), para
não se chocar com a Constituição, há de ter o seu alcance reduzido: não
transforma em autarquia as entidades de direito privado que recebam e
apliquem contribuições parafiscais, mas, simplesmente, as inclui no rol
daquelas - como todas as enumeradas no art. 1º da LAP - à proteção de
cujo patrimônio se predispõe a ação popular. 2. Dada a patente
similitude da natureza jurídica do SESI e congêneres à do SEBRAE,
seja no tocante à arrecadação e aplicação de contribuições parafiscais,
seja, em consequência, quanto à sujeição à fiscalização do Tribunal de
Contas, aplica-se ao caso a fundamentação subjacente à Súmula
Direito Administrativo
109
516/STF: "O Serviço Social da Indústria - SESI - está sujeito à
jurisdição da Justiça estadual". (STF, RE nº 366.168/SC Relator: Min.
Sepúlveda Pertence; julgado em 03/02/2004)
4.2. Organizações sociais
Reguladas pela Lei nº 9.637/98, são pessoas jurídicas
criadas por particulares, sem fins lucrativos, que se habilitam
perante a Administração Pública para obter a qualificação de
Organização Social para desempenhar atividades nas áreas de
ensino, pesquisa cientifica, desenvolvimento tecnológico, proteção
e preservação do meio ambiente, cultura e saúde. O Poder Público
abre mão da atividade e a transfere à Organização Social através de
um contrato de gestão.
As entidades qualificadas como organizações sociais são
declaradas como entidades de interesse social ou utilidade publica,
para todos os efeitos legais. Podem ser destinados, inclusive,
recursos orçamentários e bens públicos. É dispensável a licitação
para a contratação destas entidades como se extrai do artigo 24,
XXIV, da Lei nº 8.666/93. É facultada ao Poder Executivo a cessão
especial de servidor para as Organizações Sociais, com ônus para a
origem. O servidor cedido perceberá as vantagens do cargo a que
fizer jus no órgão de origem, quando o ocupante de cargo de
primeiro ou de segundo escalão na organização social.
Atenção! O contrato de gestão disposto no artigo 37, § 8º da Constituição Federal (Agências Executivas), não é o mesmo contrato de gestão disposto na Lei n. 9.637/98. A denominação é a mesma, mas as situações são diferentes. O contrato de gestão é definido como instrumento de vinculação firmado pelo Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à viabilização de cooperação entre as partes para fomento e execução de atividades específicas. É neste contrato que se discriminará as atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da organização social.
110
A qualificação como Organização Social é ato
discricionário, depende a sua qualificação de aprovação quanto à
conveniência e oportunidade do Ministro ou titular de órgão
supervisor ou regulador da área de atividade correspondente ao seu
objeto social, órgão ou entidade estas responsáveis, também, pela
fiscalização da execução do contrato.
4.3. Organização da sociedade civil de interesse público (OSCIP)
Regulamentada pela Lei nº 9.790/99, igualmente às
Organizações Sociais, as OSCIP’s também são pessoas jurídicas
instituídas por particulares que se qualificam perante o Estado para
desempenhar serviços sociais não exclusivos deste. Entretanto,
aqui, o Estado não abre mão do serviço, realizando a Entidade a
atividade mediante termo de parceria.
O termo de parceria é o instrumento passível de ser
firmado entre o Poder Público e as entidades qualificadas como
Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público destinado à
formação de vínculo de cooperação entre as partes, para o fomento
e a execução das atividades de interesse público como assistência
social, cultura, defesa, preservação e conservação do meio
ambiente, promoção do voluntariado, defesa e conservação do
patrimônio histórico e artístico, dentre outras elencadas no artigo 3º
da Lei.
A outorga da qualificação como OSCIP é ato vinculado,
não sendo passível de qualificação:
As sociedades comerciais;
Os sindicatos, as associações de classe ou de representação de
categoria profissional;
As instituições religiosas ou voltadas para a disseminação de
credos, cultos, práticas e visões devocionais e
confessionais;
As organizações partidárias e assemelhadas, inclusive suas
fundações;
As entidades de benefício mútuo destinadas a proporcionar
bens ou serviços a um círculo restrito de associados ou sócios;
Direito Administrativo
111
As entidades e empresas que comercializam planos de saúde e
assemelhados;
As instituições hospitalares privadas não gratuitas e suas
mantenedoras;
As escolas privadas dedicadas ao ensino formal não gratuito e
suas mantenedoras;
As organizações sociais;
As cooperativas;
As fundações públicas;
As fundações, sociedades civis ou associações de direito
privado criadas por órgão público ou por fundações públicas;
As organizações creditícias que tenham qualquer tipo de
vinculação com o sistema financeiro nacional a que se refere o
art. 192 da Constituição Federal
Nas OSCIP’s é permitida a participação de servidores
públicos na composição do conselho, vedada, porém, a percepção
de remuneração ou subsídio, a qualquer título. Uma vez atendidos
os requisitos legais, a entidade interessada em se qualificar como
OSCIP deverá formular requerimento escrito ao Ministério da
Justiça.
4.4. Entidades de apoio
Pessoas Jurídicas instituídas por servidores públicos em
nome próprio, sob forma de fundação, associação ou cooperativa,
que prestam serviços sociais não exclusivos do Estado, vinculando-
se a este por meio de convênio.
Seguindo ensinamento de Maria Sylvia Di Pietro (2009,
p. 492): por entidades de apoio podem-se entender as pessoas
jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, instituídas por
servidores públicos, porém em nome próprio, sob a forma de
fundação, associação ou cooperativa, para a prestação, em
caráter privado, de serviços sociais não exclusivos do Estado,
mantendo vínculo jurídico com entidades da administração direta
e indireta, em regra por meio de convênio. Odete Medauar (2008,
p. 96) denomina tais entidades de fundações de apoio.
Normalmente, inclusive, há a utilização de bens públicos,
bem como de servidores.
112
Não há disciplina legal regulando, o que vem sofrendo
grande crítica por parte da doutrina pátria. A única norma que
estabelece alguma norma próxima ao que seja as Entidades de
Apoio é a Lei nº 8.958/94: fundações de apoio às instituições
federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica.
Direito Administrativo
113
Capítulo V
AATTOOSS AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVOOSS
1. Introdução
Ato Administrativo é toda manifestação unilateral de
vontade da Administração Pública, ou de quem lhe faça as vezes,
que produz efeitos jurídicos, no exercício de suas prerrogativas,
com o fim de atender ao interesse público. Obrigar, extinguir,
proibir, certificar, opinar, declarar ou alterar são alguns dos efeitos
que um ato administrativo pode gerar.
Cumpre destacar que não há consenso na doutrina a
respeito do conceito de atos administrativos, principalmente no
tocante aos seus efeitos. Isso porque para parte da doutrina (DI
PIETRO, 2009, p. 196; MEIRELLES, 2009, p. 196) somente
seriam atos administrativos aqueles que produzissem efeitos
jurídicos imediatos excluindo-se, assim, do conceito de atos
administrativo os pareceres e laudos. Celso Antônio Bandeira de
Mello, por exemplo, (2002, p. 389) refere o parecer como meio de
a Administração exteriorizar sua vontade, não sendo em si mesmo
ato. Por outro lado, há entendimento (CARVALHO FILHO, 2008,
p. 96) que para ser ato administrativo bastaria a produção de efeitos
jurídicos (ainda que mediatos) originados unilateralmente pela
administração e assim, os pareceres e laudos ingressariam no
conceito de ato administrativo propriamente dito, e não somente na
definição de ato da administração.
Importante, além da conceituação, no que tange aos atos
administrativos é diferenciá-los de fato administrativo.
Fato administrativo: são situações fáticas
(acontecimentos) que independem da manifestação de vontade,
mas que acabam por produzir efeitos jurídicos no direito
administrativo, como, por exemplo a morte de um servidor, ou a
greve de funcionários (DI PIETRO, 2009, p. 190). Para Hely Lopes
Meirelles (2009, p. 153) fato administrativo é toda realização
114
material da Administração em cumprimento de alguma decisão
administrativa, tal como a construção de uma ponte, a instalação
de um serviço público, etc. Equivaleria à materialização da
vontade administrativa, o que se entende nesta obra como atos
materiais ou de mera execução.
Dentro, ainda, das hipóteses de fato administrativo,
poderíamos colocar as situações de silêncio administrativo, que
nada mais é que a não manifestação por parte da Administração
Pública, quando esta deveria pronunciar-se. Seguindo
posicionamento de Celso Antônio Bandeira de Mello (2002, p.
365-7) o silêncio não é ato jurídico. Por isto, evidentemente, não
pode ser ato administrativo. (...). Tal omissão é um “fato jurídico”
e, in casu, um “fato jurídico administrativo”. O agente que silencia
comporta-se com negligência e viola dever funcional previsto no
art. 116, I e III, da Lei 8.112/90. Ao administrado, nos casos em
que a lei atribui algum efeito ao silêncio administrativo, sequer há
problema a ser resolvido, pois a solução já se encontra na lei.
Entretanto se a lei nada dispõe: nos casos de ato vinculado poderá
o juiz suprir a ausência de manifestação. Em sendo o ato
discricionário, o juiz deverá assinar prazo para que a
Administração se manifeste.
Ato da Administração possui sentido amplo, ou seja, é
todo o ato praticado no exercício da função administrativa. Desta
forma, todo ato administrativo é ato da administração, mas nem
todo ato da administração é um ato administrativo, pois este é
espécie daquele que é gênero. Um ato administrativo é ato da
administração, assim como também são os atos materiais (não
contém qualquer manifestação de vontade, envolvendo apenas a
execução como a demolição de uma casa ou a varrição de uma
rua), os atos de direito privado (atos de gestão), atos políticos, atos
normativos, entre outros (DI PIETRO, 2009, p. 191).
Existem, ainda, situações que a Administração Pública
manifesta suas vontades sem utilizar-se de suas prerrogativas (de
sua supremacia) colocando-se numa situação de igualdade frente
ao administrado, como numa locação, são os chamados atos de
gestão ou atos jurídicos de direito privado.
Direito Administrativo
115
E por último, há casos em que a Administração Pública
necessita da conjugação de outra vontade, além da sua, para a
produção de efeitos. É o que denominamos de negócio jurídico da
Administração.
2. Atributos dos atos administrativos
São as características ostentadas pelos atos
administrativos e que os diferencia dos demais atos jurídicos. Não
há unanimidade entre os autores quanto às duas últimas
características prevalecendo, entretanto, o consenso nas três
primeiras:
Presunção de legitimidade ou legalidade: Todos os atos
administrativos presumem-se legais, verdadeiros (presunção
de veracidade quanto aos fatos alegados, como ocorre nas
certidões, atestados, declarações), até prova em contrário. Isso
porque, por força do princípio da legalidade, todos os atos da
administração devem ter fundamento legal.
Imperatividade ou coercibilidade: Significa que os atos
administrativos se impõem a terceiros, independentemente da
concordância destes. Não está presente em todos os atos
(pareceres, relatórios, laudos), mas tão somente naqueles que
impõem obrigações ou restrição ao administrado. É na
imperatividade onde se identifica o poder extroverso do
Estado.
Autoexecutoriedade ou executoriedade: A Administração
Pública não precisa socorrer-se do Poder Judiciário para por
em execução o ato expedido: ela própria executa
materialmente o ato. Equivale aos meios diretos de coerção.
Para estar presente em um ato deve ser prevista expressamente
em lei, ou ainda, quando se trate de situações de urgência.
Expõe Rafael Maffini (2008, p. 88): Tal atributo também tem
exceções, quais sejam, aqueles atos cuja execução importa
invasão direta no patrimônio jurídico dos administrados (ex.:
penas administrativas pecuniárias, transferência de domínio
de bem declarado de utilidade pública, para fins de
desapropriação etc.). São exemplos trazidos pela doutrina: a
dissolução de uma passeata, e interdição de um
116
estabelecimento, a apreensão de medicamentos com prazo de
validade vencidos, o fechamento de casas noturnas, cassação
de licença para dirigir, etc. A autoexecutoriedade também
interfere no contraditório e ampla defesa, não por afastá-los
definitivamente, mas por postergá-los para um momento
posterior (ao da execução do ato).
Exigibilidade: atributo do ato administrativo do qual o Estado,
no exercício da função pública, pode exigir do particular o
cumprimento, observância, das obrigações que impôs. Não se
confunde com a imperatividade porque esta apenas impõe a
obrigação. Na exigibilidade se impele a obediência à
obrigação imposta (MELLO, 2002, p. 370), correspondendo
aos meios indiretos de coerção.
Tipicidade: atributo pelo qual os atos devem corresponder a
figuras típicas definidas previamente em lei. Para cada
finalidade que a Administração pretende alcançar, existe um
ato definido em lei (DI PIETRO, 2009, p. 201).
3. Requisitos (elementos) dos atos administrativos
Para que um ato administrativo seja formado é necessário
a existência conjugada de cinco elementos, a saber: competência,
forma, finalidade, objeto e motivo (requisitos mencionados na Lei
nº 4.717/65, art. 2º). Celso Antonio Bandeira de Mello, porém, não
adota esta ideia. Para este autor os elementos do ato resumem-se a
dois: o conteúdo e a forma. Contudo, o renomado autor separa os
elementos do ato de seus pressupostos, estes divididos em
pressupostos de existência e validade. Os de existência são: o
objeto e a pertinência do ato. Os de validade: pressuposto subjetivo
o sujeito; objetivo o motivo e o requisito procedimental; o
pressuposto teleológico a finalidade; pressuposto lógico a causa e o
formalístisco a formalização. Porém, esta linha de pensamento não
é a adotada nem em concursos e nem pela jurisprudência, razão
pela qual citamos somente a título de conhecimento.
3.1. Competência
De exercício obrigatório, é o requisito atribuído pela lei
aos órgãos ou agentes públicos para a prática do ato administrativo.
Para parte da doutrina (MEDAUAR, 2009, p. 135; DI PIETRO,
Direito Administrativo
117
2009, p. 203) apresenta-se como agente competente ou sujeito
competente, ou seja, quem de fato concretiza o ato.
Sua distribuição pode se dar em decorrência da matéria,
território, tempo e hierarquia (atribuições mais complexas aos
órgãos hierarquicamente superiores).
É intransferível: pode ser objeto, entretanto,
de delegação e avocação;
É irrenunciável: o seu titular não pode dela
se desfazer, visto que decorrente de lei;
É imodificável: não tem como tornar a
competência mais ampla ou mais restrita,
porque decorrente de lei;
É imprescritível: o seu não exercício não a
extingue.
3.2. Forma
É o meio pelo qual o ato é exteriorizado – concepção
restrita (DI PIETRO, 2009, p. 207). É o que corporifica o ato, meio
pelo qual se exterioriza a vontade (FIGUEIREDO, 2008, p. 199). É
o revestimento externo do ato (MELLO, 2002, p. 345). As formas
dizem respeito à própria declaração de vontade, enquanto as
formalidades referir-se-iam às solenidades, aos procedimentos ou
pressupostos intermediários indispensáveis para a formação da
declaração – concepção ampla (ARAÚJO, 2009, p. 471). Pode ser
Para relembrar: o vício de competência leva ao excesso de poder, espécie de abuso de poder. Na lei da ação popular, art. 2º, parágrafo único, a: a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais do agente que o praticou.
Características
da competência
118
escrito, por gestos, símbolos ou palavras. Na mesma linha afirma
Carvalho Filho (2008, p. 108): embora se distinga forma e
procedimento, no sentido de que aquela indica apenas a
exteriorização da vontade e este uma sequência ordenada de atos e
atividades, costuma-se os defeitos em ambos como vícios de forma.
O vício de forma consiste na omissão ou na observância
incompleta ou irregular de formalidades indispensáveis à
existência ou seriedade do ato (art. 2º, parágrafo único, da Lei
4.717/65). No Código Civil (art. 166) a forma invalida um negócio
jurídico quando esta não revestir a forma prescrita em lei ou
quando for preterida alguma solenidade que a lei considere
essencial para a sua validade.
3.3. Finalidade
O fim buscado por todo ato administrativo é o interesse
público, o interesse da coletividade. Tem-se também como efeito
jurídico mediato de todo ato administrativo.
O interesse público primário é o interesse da
coletividade, da sociedade, na qual deve pautar-se toda a atividade
Administrativa. Já o interesse público secundário apresenta-se
como interesse da Administração enquanto Pessoa Jurídica, e como
tal, com responsabilidades e obrigações inerentes a toda a qualquer
Pessoa. Este somente terá validade se buscar e/ou alcançar aquele,
ou seja, o interesse público secundário só se justifica em razão do
interesse público primário (a finalidade pública propriamente dita).
3.4. Objeto
Confunde-se com o próprio conteúdo do ato
administrativo. É a alteração que o ato produz no mundo jurídico.
Para que o ato seja válido, seu objeto deve ser lícito, possível
(passível de ser realizado) determinado ou determinável. É no
objeto que a Administração manifesta a sua vontade, ou
simplesmente atesta uma situação já existente (MEIRELLES,
Para relembrar: o vício de finalidade leva ao desvio de poder, espécie de abuso de poder.
Direito Administrativo
119
2009, p. 157). É o efeito jurídico imediato provocado pelo ato: a
concessão de alvará, a exoneração de um funcionário, a
autorização para construção, etc.
3.5. Motivo
É o pressuposto (causa) fático e jurídico que serve de
fundamento para o ato. São as razões de fato e direito que
embasam a prática do ato administrativo. Por exemplo, na
concessão de licença maternidade, o motivo é a gravidez da
mulher.
3.5.1. Teoria dos motivos determinantes
Para esta teoria os motivos alegados devem guardar
compatibilidade com a situação fática que o gerou. Quando a
Administração declara (ainda que não fosse necessário) o motivo
para a prática de um ato, este motivo fica vinculado ao ato,
devendo ser congruente com a realidade. Assim, uma vez exposto
o motivo ele passa a ser determinante para a validade do ato. Caso
Atenção! Não confunda motivo com motivação. Motivação é a exposição de motivos, diz respeito às formalidades do ato. É o modo pelo qual o ato é exteriorizado. Na Lei nº 9.784/99 art. 50, § 1º, está prevista que a motivação deve ser explícita, clara e congruente. Para Rafael Maffini (2008, p. 94) a motivação é, inclusive, subelemento da forma. Para o autor Hely Lopes Meirelles (2009, p. 104) a motivação pode consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso serão parte integrante do ato, é a denominada motivação aliunde (de outro lugar), com previsão no próprio art. 50, § 1º, da Lei nº 9.784/99.
120
os motivos expostos sejam falsos ou até mesmo inexistentes, o ato
administrativo restará nulo, ainda que deles prescindisse.
Assim, quando a Administração Pública motiva um ato,
mesmo que a lei não exija tal motivação, ele só será válido se os
motivos forem verdadeiros, reais. Por óbvio, se a lei exigir a
motivação, esta deverá ser exarada em conformidade com a
realidade.
Por exemplo, de acordo com o art. 37, II, última parte da
CRFB/88, a exoneração de um agente público que exerce cargo em
comissão é livre, logo não necessita de motivação. Entretanto, se
mesmo assim, o ato for motivado (justificando que o agente era
alcoólatra, por exemplo), esta justificativa deve ser real, existente,
sob pena de o ato ser anulado (inclusive pelo Poder Judiciário).
Se inexistir o motivo (ou o motivo for falso), ou se dele o
administrador extrair consequências incompatíveis com o direito
aplicado, o ato será nulo por violação da legalidade. Não é somente
o erro de direito que autoriza a anulação do ato pelo Poder
Judiciário, o erro de fato também.
Atenção! Dos requisitos expostos os três primeiros são sempre vinculados, fixados em lei (MEIRELLES, 2009, p. 155; CARVALHO FILHO, 2008, p. 125; MOREIRA NETO, 2009, p. 166). Já com relação aos dois últimos não necessariamente, e acaba por serem os elementos que tornam o ato vinculado (se também previstos em lei) ou discricionário (quando deixam margem de escolha para o administrador – avaliação da conveniência e oportunidade –, o que equivale ao mérito administrativo).
Direito Administrativo
121
Com relação à forma há de se ter um cuidado especial. O
artigo 22 da Lei nº 9.784/99 afirma que os atos do processo
administrativo não dependem de forma determinada senão quando
a lei expressamente a exigir. Na mesma linha afirma Maria Sylvia
Di Pietro (2009, p. 214): com relação à forma, os atos são em
geral vinculados porque a lei previamente a define (...).
Eventualmente, a lei prevê mais de uma forma possível para
praticar o mesmo ato: a ciência de determinado ato pode, quando
a lei permite, ser dada por meio de publicação ou notificação
direta. Nesses casos, existe discricionariedade com relação à
forma. Porém, onde mais comumente se localiza a
discricionariedade é no motivo e no conteúdo do ato.
4. Perfeição, validade e eficácia
A doutrina pátria costuma, também, distinguir os atos
administrativos nos planos da perfeição, validade e eficácia.
Perfeito seria o ato que exauriu as fases necessárias (completou o
ciclo) para a sua formação: é a situação do ato cujo processo de
Forma
Finalidade
Competência
Motivo
Objeto
Vinculado
Ato vinculado
Vinculado
Vinculado
Vinculado
Vinculado
Discricionário
Discricionário
Ato discricionário
Vinculado
Vinculado
Vinculado
Mérito
Administrativo
122
elaboração está concluído (CUNHA JUNIOR, 2009, p. 105). A
validade estaria relacionada com a conformidade à lei, aos
princípios (ao ordenamento jurídico como um todo). E por último,
a eficácia, teria vínculo com a produção de efeitos do ato. Logo,
ato eficaz, seria o ato administrativo que estaria produzindo seus
efeitos. Expõe José dos Santos Carvalho Filho (2008, p. 122-3):
significa que o ato está pronto para atingir o fim a que foi
destinado.
Resumidamente pode-se concluir que: o ato, em regra, é
perfeito, válido e eficaz. Entretanto poderá ser perfeito, válido e
ineficaz; perfeito, inválido e eficaz ou perfeito, inválido e ineficaz.
5. Classificação dos atos administrativos
Tema de muita divergência na doutrina. Por tal motivo
serão adotados conceitos e critérios aceitos pela maioria dos
autores.
5.1. Quanto ao grau de liberdade conferido à Administração
Atos Vinculados: também chamado de regrados, são aqueles
que os agentes praticam sem qualquer margem de escolha
para decisão. A lei estabelece todos os requisitos do ato.
Atos Discricionários: a Administração pratica o ato com certa
margem de liberdade, segundo critérios de conveniência e
oportunidade. Não é uma liberdade total, absoluta, ilimitada.
Aparecem ligados sempre à ideia de valoração subjetiva do
administrador, aspectos estes que são frequentemente
resumidos no binômio oportunidade e conveniência
consubstanciando-se no mérito administrativo (LIMBERGER,
1998, p. 115-6).
5.2. Quanto aos destinatários
Gerais: regulam uma quantidade indeterminada de pessoas.
Não há um destinatário determinado. Regulamentos,
instruções, portarias, etc.
Direito Administrativo
123
Individuais: possuem destinatários específicos como uma
concessão de férias ou licença para construção, por exemplo.
5.3. Quanto à abrangência dos efeitos
Internos: produz efeitos no âmbito da própria Administração
Pública: são as portarias, ordens de serviço, etc.
Externos: produzem efeitos perante os terceiros: são os
decretos, regulamentos, etc.
5.4. Quanto às prerrogativas (ao objeto)
De império: são os atos impostos coercivamente pela
Administração Pública lançando mão da sua supremacia sobre
o interesse particular. Utiliza-se das prerrogativas e privilégios
que a lei lhe atribuiu. São exemplos: a desapropriação, a
interdição de uma atividade, etc.
De gestão: são os atos praticados em situação de igualdade
com os particulares sem qualquer imposição coercitiva. Por
exemplo: a locação de um imóvel, a assinatura de um
contrato, a alienação de um bem, etc.
De expediente: são os atos de rotina interna (burocráticos)
praticados pela Administração, que se destinam a dar
andamento a processos que tramitam na administração. O
cadastramento de um processo no sistema informatizado ou o
encaminhamento de um processo são alguns exemplos de atos
de mero expediente.
5.5. Quanto à estrutura
Abstratos ou normativos: prevê reiteradas aplicações, sem o
seu esgotamento: é o caso de um regulamento, por exemplo.
Concretos: esgotam-se em uma única aplicação. Exemplo: a
exoneração de um funcionário, a declaração de utilidade
pública, etc.
124
5.6. Quanto à formação (composição) da vontade
Simples: resulta da manifestação de vontade de um único
órgão (unipessoal ou colegiado).
Complexo: é o ato que se forma da conjugação de dois ou
mais órgãos, ou seja, mais de uma vontade para a formação de
um único ato. O ato não se tornaria existente com a
manifestação isolada de um só órgão. Por exemplo, a
aposentadoria de um servidor, a investidura de um Magistrado
pelo quinto constitucional (art. 94 da CRFB/88 – STF no MS
nº 26.438 QO/DF), ou de um Ministro do STF, pelo
Presidente da República, somente se consubstanciam após
aprovação do nome pelo Senado (art. 101, parágrafo único da
CRFB/88. Neste sentido o STJ no REsp nº 223.670).
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
TRIBUNAL DE CONTAS. ATO PROVISÓRIO DE
APOSENTADORIA. REVISÃO. DECADÊNCIA.
INOCORRÊNCIA. ATO COMPLEXO. PRECEDENTES.
I - "O ato de aposentadoria consubstancia ato administrativo complexo,
aperfeiçoando-se somente com o registro perante o Tribunal de Contas.
Submetido a condição resolutiva, não se operam os efeitos da
decadência antes da vontade final da Administração" (STF, MS
25.072/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em
7/2/2007). II - Confirmando-se o ato praticado pelo Poder Executivo, a
homologação pela Corte de Contas reveste-se de natureza
eminentemente declaratória, e o prazo prescricional para eventual
revisão, previsto no art. 1º do Decreto 20.910/32, inicia-se da publicação
do ato da aposentação. Precedente: REsp 759.731/RS, 5ª Turma, Rel.
Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ de 11/6/2007.
III - Havendo, porém, rejeição ou recomendação por parte do Tribunal
de Contas, que resulte em determinação à Administração para fazer
cessar os efeitos de ato tido por ilegal, tal como no caso dos autos, o
prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei n.º 9.784/99 inicia-se a
partir da homologação pelo Tribunal de Contas, e não a partir do
deferimento provisório da aposentadoria pelo Poder Executivo.
Precedentes: STF, MS 25.552/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen
Lúcia, DJe de 30/5/2008, e AgRg no REsp 777.562/DF, 6ª Turma, Rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 13/10/2008.
IV - In casu, conforme delineado no v. aresto recorrido, as decisões do
TCU direcionadas aos demandantes datam de novembro de 2004, e a
Notificação Administrativa data de dezembro de 2004. Logo, não há
falar em decadência.
Direito Administrativo
125
Agravo regimental desprovido.
(STJ, AgRg no AgRg no REsp nº 1.156.093/SC, julgado em
02/09/2010, Min. Rel. Felix Fischer.) No mesmo sentido o STJ no
AgRg no REsp nº 1.145.613/RS e STF no MS nº 25.697/DF.
Composto: o ato resulta da manifestação de dois ou mais
órgãos, onde a vontade de um órgão é ato acessório
(pressuposto ou instrumento) em relação à vontade do outro
que edita o ato principal. Os atos que necessitam de
ratificação, visto, autorização ou aprovação são típicos
exemplos de atos compostos, ou seja, de modo geral, uma
manifestação de aquiescência por parte de outra autoridade,
para que sejam postos em execução. Como pode se observar
antes de ganhar exequibilidade, o ato composto ainda não é
um ato perfeito (...) (MOREIRA NETO, 2009, p. 167). A
permuta de magistrados que depende de aprovação pelo
Tribunal de Justiça (STJ no RMS nº 5.964/BA). A nomeação
(ato principal) do Procurador-Geral da República dependente
de prévia autorização (ato acessório) do Senado (art. 128, § 1º,
da CRFB/88), bem como a dispensa de licitação, em
determinadas situações, dependentes de homologação por
autoridade superior (DI PIETRO, 2009, p. 222). Critica
Alexandre Mazza (2011, p. 204) estes exemplos trazidos pela
doutrinadora Maria Sylvia, afirmando ele que estes dois casos
são, na verdade, exemplos de atos complexos, e não de atos
compostos. Assim, seriam somente exemplos de atos
compostos aqueles praticados por um órgão mas que
dependem da verificação, visto, aprovação, anuência,
homologação ou “de acordo” por parte de outro como
condição de exequibilidade. A manifestação do segundo
órgão é condição de eficácia do ato (MAZZA, 2011, p. 204).
Atenção! No ato complexo há duas ou mais vontades que formam um único ato, enquanto no composto praticam-se dois atos, um principal e outro acessório.
126
Acerca da distinção entre atos complexos e compostos
trazemos à baila ementa do REsp nº 711.812/SP, julgado em
04/08/2005, pelo Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO
ESPECIAL. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 125, 130, 165 E 535, DO
CPC. INOCORRÊNCIA. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESCISÃO
UNILATERAL DE ADITIVO DE CONTRATO
ADMINISTRATIVO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICO-
HOSPITALARES. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. REEXAME
PROBATÓRIO. TERMO INICIAL. REEXAME PROBATÓRIO.
SÚMULA 07/STJ. ATO ADMINISTRATIVO COMPOSTO.
HOMOLOGAÇÃO.
(...).
4. O prazo prescricional quinquenal para propositura de ação
indenizatória em face de autarquia federal, pela suposta existência de
prejuízos resultantes de rescisão unilateral de contrato administrativo,
tem como termo a quo a data da efetiva desconstituição contratual, e não
a da homologação desta por autoridade superior da mesma entidade
autárquica, porquanto configuram ato administrativo composto, passível
de impugnação pela prática do ato principal (rescisão) que por meio de
ato acessório (homologação) veio a ser ratificado.
5. A doutrina do tema é assente no sentido de que: "Ato composto: é
o que resulta da vontade única de um órgão, mas depende da
verificação por parte de outro, para se tornar exequível. Exemplo:
uma autorização que dependa do visto de uma autoridade superior.
Em tal caso a autorização é o ato principal e o visto é o
complementar que lhe dá exequibilidade. O ato composto distingue-
se do ato complexo por que este só se forma com a conjugação das
vontades de órgãos diversos, ao passo que aquele é formado pela
vontade única de um órgão, sendo apenas ratificado por outra
autoridade. Essa distinção é essencial para se fixar o momento da
formação do ato e saber-se quando se torna operante e
impugnável.(Hely Lopes Meirelles in Direito Administrativo Brasileiro,
28.ª ed., Malheiros Editores, São Paulo, 2003, p. 168) Homologação - é
o ato vinculado pelo qual a Administração concorda com ato jurídico já
praticado, uma vez verificada a consonância dele com os requisitos
legais condicionadores de sua válida emissão." (Celso Antônio Bandeira
de Mello in Curso de Direito Administrativo, 13.ª ed., Malheiros
Editores, São Paulo, 2000, p. 391)
(...).
Direito Administrativo
127
5.7. Quanto à exequibilidade
Perfeito: é o ato que já percorreu todo seu ciclo de formação e
está apto a produzir seus efeitos (ato eficaz). Diz respeito ao
processo de sua elaboração.
Imperfeito: é aquele que ainda não completou seu ciclo de
formação. Falta a publicação, a homologação, a assinatura,
etc. A Prescrição administrativa ou judicial não começa a
correr enquanto o ato não se tornar perfeito.
Pendente: embora perfeito em sua formação, está sujeito à
condição (evento futuro e incerto) ou termo (evento futuro e
certo), o que impede a produção de seus efeitos, logo o ato
pendente pressupõe que o ato esteja perfeito. É sinônimo de
ato ineficaz.
Consumado: é o ato que exauriu seus efeitos, o que o torna
irretratável, definitivo e imodificável. A autorização para
realizar uma passeata que, por sua vez, já ocorreu.
5.8. Quanto aos efeitos
Constitutivo: implanta uma nova situação jurídica, que cria,
extingue ou modifica a situação já existente. São as
permissões, as concessões, as nomeações, etc.
Declaratório: afirma a (pré)existência de uma situação fática
ou jurídica. Não cria, extingue ou altera direitos e obrigações.
A expedição de uma certidão ou de um atestado, por exemplo.
5.9. Quanto a sua validade
Válidos: são os atos que não apresentam qualquer
contrariedade às normas superiores. Estão em conformidade
com todas as exigências legais. Se sobre eles pender condição
ou termo (ato pendente) não serão eficazes. Serão atos
válidos, mas ineficazes.
Nulos: nascem com vício substancial de ilegalidade.
Necessitam de algum pronunciamento para a sua anulação,
uma vez que presumem-se válidos/legítimos.
128
Inexistentes: possuem apenas uma aparência de manifestação
que sequer chega a se aperfeiçoar como ato administrativo.
Por exemplo, um ato (expedição de uma certidão) praticado
por alguém se passando por funcionário público (usurpação da
função pública).
6. Espécies de atos administrativos
São espécies de atos administrativos (MEIRELLES,
2009, p. 180-200):
Atos normativos: contêm comandos gerais, abstratos,
impessoais análogos às leis (em sentido material, e não
formal), aplicáveis a todos os administrados. São os decretos,
portarias, regimentos, regulamentos, resoluções e instruções
normativas.
Atos ordinatórios: são atos internos, que regulam o
funcionamento, disciplinam a conduta interna da
administração. Tem base no poder hierárquico. São as
instruções, circulares, avisos, ordens de serviço, provimentos
e ofícios.
Atos negociais: são manifestações de vontade da
Administração coincidentes com a pretensão do particular,
buscando a realização de um negócio jurídico. Não há uso da
imperatividade (coercibilidade). Os principais atos negociais
são as licenças, as autorizações e as permissões.
Atos enunciativos: não possuem uma manifestação material da
Administração, mas tão somente enunciam situação já
existente. São exemplos: as certidões, os atestados, as
apostilas e os pareceres.
Atos punitivos: são os atos que contêm uma sanção imposta
aos infratores de normas administrativas, servidores ou
administrados. É a aplicação conjunta do poder de polícia
Atenção! Atos negociais não são contratos. São manifestações unilaterais da Administração que coincidem com a vontade do particular.
Direito Administrativo
129
(sanção aos administrados) e do poder disciplinar (punição aos
seus próprios agentes ou pessoas sujeitas à disciplina
administrativa). São as multas administrativas, a interdição de
atividades, a destruição de coisas, a suspensão, embargos de
obras, etc.
7. Atos administrativos em espécie
Tendo em vista a proposta do presente trabalho,
estudaremos as espécies mais relevantes de atos administrativos.
7.1. Quanto ao conteúdo
Licença: ato vinculado por meio do qual a Administração
Pública concede, àquele que preencher os requisitos
determinados em lei, a realização de certa atividade. Logo, é
ato declaratório de direito preexistente.
Permissão: ato discricionário e precário pelo qual a
Administração faculta ao particular executar serviço público
ou a utilizar privativamente bem público.
Concessão: é ato vinculado ou discricionário pelo qual a
Administração Pública outorga uma honraria ou status ao
administrado. Por exemplo, a concessão de cidadania, ou de
uma comenda.
Autorização: ato discricionário e precário pelo qual a
Administração Pública outorga a alguém o direito de realizar
certa atividade ou utilizar determinado bem público, no seu
próprio interesse, que sem este consentimento lhe seria
vedado. Baseado no poder de polícia do Estado, é ato
constitutivo de direito. A Lei Geral de Telecomunicações (Lei
nº 9.472/97), em seu art. 131, § 1º, define erroneamente
autorização como ato vinculado.
Atenção! A concessão ato unilateral não pode ser confundida com a concessão contratual de serviço, obra ou uso de bem público.
130
Aprovação: ato discricionário emitido de forma prévia
(equivale à autorização para a prática de ato) ou posterior
(equivale a um referendo) no qual a Administração Pública
exerce controle sobre outro ato. Analisa os aspectos de
conveniência e oportunidade. Exemplificamente cita-se o art.
49, IV, XIV e XVII, bem como o art. 52, III, IV e XI, da
CRFB/88.
Homologação: ato vinculado pelo qual a Administração
Pública, sempre a posteriori, verifica a legalidade de um ato
(exemplos: art. 43, VI, da Lei nº 8.666/93 e art. 71, III, da
CRFB/88).
7.2. Quanto à forma de exteriorização
Decreto: ato emanado do Chefe do Poder Executivo, de
caráter geral ou individual, resultante de sua competência
privativa. Pode ser independente ou autônomo (quando dispõe
matéria não regulada em lei, art. 84, VI, da CRFB/88),
regulamentar ou de execução (quando expedido para
complementar, explicar, detalhar a execução da lei, art. 84, IV,
da CRFB/88).
Oficio: meio que as autoridades comunicam-se entre si ou
com terceiros.
Despacho: é forma de expressar decisões (finais ou não)
proferidas por autoridades administrativas em processos
administrativos.
Resolução: forma que os órgãos colegiados manifestam suas
deliberações para disciplinar matéria de sua competência ou
para dispor de seu funcionamento.
Portaria: é a forma que as autoridades de nível inferior ao
Chefe do Poder Executivo dirigem-se aos seus subordinados
(não atinge particulares).
Certidão: é a exteriorização feita pela Administração Pública
de ato ou fato que tenha conhecimento, que por qualquer
razão esteja em seus arquivos. É a expressão do princípio da
publicidade: art. 5º, XXIV, b, da CRFB/88.
Direito Administrativo
131
Atestado: é o meio pelo qual a Administração Pública
comprova um ato ou fato (passageiro, sujeito a alteração) que
não esteja em seus arquivos, mas que tenha conhecimento.
Apostila: é anotar à margem, emendar, equivalente a uma
averbação. Não cria nem extingue direito, apenas reconhece
um direito criado por uma norma. Expressamente previsto no
art. 65, § 8º, da Lei nº 8.666/93. Para Hely Lopes Meirelles
(2009, p. 197) são meros atos enunciativos ou declaratórios de
uma situação anterior já criada por lei. Equivale a uma
averbação.
Alvará: é o instrumento utilizado pela Administração Pública
para expedir licença ou autorização.
Ordem de serviço: é o ato que transmite determinações aos
respectivos subordinados, acerca da condução de determinado
serviço.
Parecer: é a manifestação (opinião) técnica ou jurídica de
matéria submetida à apreciação de determinado órgão
consultivo. Nem toda a doutrina aceita o parecer como um ato
administrativo. Seguindo os ensinamentos de Carvalho Filho
(2008, p. 132-3), os pareceres podem adquirir as
características de :
Parecer normativo: casos em que o parecer esgota de
forma tão profunda o tratamento a ser dispensado a determinada
questão, que se determinada autoridade concorda com tal
posicionamento estendendo a todas hipóteses idênticas, representa
verdadeira orientação geral para os demais órgãos. Note-se que não
é propriamente o parecer que carrega a normatividade, mas sim o
ato da autoridade.
Parecer vinculante: aqueles que impedem a autoridade
de tomar posicionamento diverso a do ato opinativo, admitido,
somente quando a lei assim previamente estipular.
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CONTROLE
EXTERNO. AUDITORIA PELO TCU. RESPONSABILIDADE DE
PROCURADOR DE AUTARQUIA POR EMISSÃO DE
PARECER TÉCNICO-JURÍDICO DE NATUREZA OPINATIVA.
SEGURANÇA DEFERIDA. I. Repercussões da natureza jurídico-
administrativa do parecer jurídico: (i) quando a consulta é facultativa,
a autoridade não se vincula ao parecer proferido, sendo que seu
132
poder de decisão não se altera pela manifestação do órgão
consultivo; (ii) quando a consulta é obrigatória, a autoridade
administrativa se vincula a emitir o ato tal como submetido à
consultoria, com parecer favorável ou contrário, e se pretender
praticar ato de forma diversa da apresentada à consultoria, deverá
submetê-lo a novo parecer; (iii) quando a lei estabelece a obrigação
de decidir à luz de parecer vinculante, essa manifestação de teor
jurídica deixa de ser meramente opinativa e o administrador não
poderá decidir senão nos termos da conclusão do parecer ou, então,
não decidir. II. No caso de que cuidam os autos, o parecer emitido pelo
impetrante não tinha caráter vinculante. Sua aprovação pelo superior
hierárquico não desvirtua sua natureza opinativa, nem o torna
parte de ato administrativo posterior do qual possa eventualmente
decorrer dano ao erário, mas apenas incorpora sua fundamentação
ao ato. III. Controle externo: É lícito concluir que é abusiva a
responsabilização do parecerista à luz de uma alargada relação de
causalidade entre seu parecer e o ato administrativo do qual tenha
resultado dano ao erário. Salvo demonstração de culpa ou erro
grosseiro, submetida às instâncias administrativo-disciplinares ou
jurisdicionais próprias, não cabe a responsabilização do advogado
público pelo conteúdo de seu parecer de natureza meramente
opinativa. Mandado de segurança deferido. (STF, MS nº 24.631/DF,
Min. Joaquim Barbosa, Julgamento: 09/08/2007).
8. Extinção dos atos administrativos
Utilizaremos a classificação adotada por Celso Antônio
Bandeira de Mello (2002, p. 393-427), como segue:
8.1. Extinção de ato ineficaz
A extinção de ato ineficaz (que aguarda ocorrência de
termo ou condição) pode ser por:
Mera retirada: extinção de ato ineficaz por motivo de mérito
(conveniência e oportunidade) ou por motivo de ilegalidade.
Recusa: é a falta de aceitação do beneficiário de ato cujo
consentimento era necessário para a produção de seus efeitos.
Direito Administrativo
133
8.2. Extinção de ato eficaz
Ato eficaz é aquele que está apto a produzir seus efeitos,
e a sua extinção pode transcorrer pelo cumprimento de seus efeitos
ou pela sua retirada.
8.2.1. Cumprimento de seus efeitos
Esgotamento do prazo: por exemplo, término das férias.
Execução material do ato: quando a ordem é cumprida:
interditar um estabelecimento.
Desaparecimento do sujeito da relação jurídica: por exemplo,
a morte do beneficiário.
Desaparecimento do objeto da relação jurídica: tomada de
um terreno da marinha pelo mar.
Renúncia: quando o próprio beneficiário abre mão, rejeita
determinada situação favorável que desfrutava. Por exemplo,
a renúncia de um Secretário ou de um título honorífico.
8.2.2. Pela retirada
Caducidade: se dá quando nova legislação impede ou
inadmite situação que norma anterior consentia. Exemplo: a
permissão de uso de bem público, que passa a ter seu uso
proibido por lei posterior. Desaparece o fundamento legal.
Opera efeito ex nunc.
Cassação: a retirada do ato pela cassação se dá quando o
destinatário descumpre condições ou requisitos que lhe
cabiam, para continuar desfrutando do benefício concedido.
Opera efeito ex nunc.
Atenção! A extinção de ato eficaz por caducidade não tem qualquer ligação com a caducidade de contrato constante nos arts. 27 e 38 da Lei nº 8.987/95.
134
Contraposição: extinção do ato por outro com efeitos
contrapostos: a exoneração frente à nomeação. Possui efeito
ex nunc.
Revogação: ocorre quando o ato é extinto por razões de
conveniência e oportunidade (mérito administrativo). É a
retirada de ato válido e eficaz (sem vícios), mas que acabou
por se tornar inoportuno ou inconveniente, operando efeitos
somente a partir da sua revogação (efeitos ex nunc). Somente
a autoridade que produziu o ato pode revogá-lo. Assim, o
Poder Judiciário pode revogar os atos inconvenientes ou
inoportunos, desde que tenha sido o emissor deste ato (no
exercício atípico da função administrativa). Não pode,
entretanto, revogar atos do Poder Executivo ou do Poder
Legislativo.
A revogação é ato discricionário, logo não se pode
revogar ato vinculado porque prescinde dos elementos
conveniência e oportunidade. Também não podem ser revogados
os atos declarados por lei como irrevogáveis, os atos que já
exauriram seus efeitos, quando já se exauriu a competência da
autoridade que o editou, os que geram direitos adquiridos (art. 5º,
XXXVI, da CRFB/88), os que integram um procedimento (pois a
cada novo ato ocorre preclusão do ato anterior) e os atos
enunciativos (ou meros atos administrativos ou declaratórios),
porque seus efeitos são estabelecidos em lei.
Anulação: ocorre quando o ato é praticado em
desconformidade com a lei, ou seja, há vício de legalidade. O
ato é inválido porque fere a ordem jurídica.
A anulação pode ser feita tanto pela própria
administração pública, como pelo Poder Judiciário (art. 5º, XXXV,
da CRFB/88). Inclusive é matéria sumulada pelo Supremo
Atenção! Em determinados momentos a lei poderá exigir que a revogação fique condicionada a alguma circunstância superveniente como é o caso do art. 49 da Lei nº 8.666/93 ou art. 123 da Lei nº 9.472/97.
Direito Administrativo
135
Tribunal Federal nos enunciados números 346 e 473, que assim
expõem, respectivamente: A administração pública pode declarar
a nulidade dos seus próprios atos; e A administração pode anular
seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornam ilegais,
porque deles não se originam direitos; ou revogá-lo por motivo de
conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos,
e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
Para parte da doutrina anulação é sinônimo de
invalidação (MELLO, 2002, p. 409; CARVALHO FILHO, 2008,
p. 148). Para outra parte (MEIRELLES, 2009, p. 201) invalidação
é gênero, dos quais são espécies revogação e anulação.
Por ser um ato ilegal, os efeitos da anulação retroagem ao
momento da prática do ato (efeito ex tunc). Logo, a regra é que
atos nulos não possam gerar direitos ou obrigações, até mesmo
porque todos os efeitos gerados acabam sendo desfeitos pela
anulação. Há, porém, entendimento no sentido de atribuir-se efeito
ex nunc à anulação. Neste sentido o STJ no REsp nº 488.905/RS e
no REsp nº 663.831/DF.
O dever de a própria Administração Pública anular os
atos ilegais (decorrente do princípio da autotutela) deve ser
ponderado com outros deveres da Administração Pública como o
respeito à boa-fé do administrado, a segurança jurídica das
relações, razoabilidade, proporcionalidade, o contraditório e a
ampla defesa, entre outros. Neste sentido o STJ no RMS nº
24.339/TO e STF no AI-AgR nº 662.912/GO, no AgRg nº
210.916/RS, no MS nº 26.405/DF. A Lei nº 9.784/99, em seu
artigo 54, inclusive estipula o prazo decadencial de 5 anos para a
anulação dos atos de que decorrem efeitos favoráveis a terceiros, e
estes estejam de boa-fé. Perceba-se, que aqui, por uma opção
legislativa, após 5 anos o princípio prevalecente não é o da
legalidade, mas sim, o da segurança jurídica. Porém, quanto a este
prazo, interessante decisão emitiu o Supremo Tribunal Federal nos
Embargos Declaratórios em Mandado de Segurança nº 27.746/DF,
tendo por Relator o Ministro Dias Tofolli:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE
SEGURANÇA. DECISÃO MONOCRÁTICA. CONVERSÃO EM
AGRAVO REGIMENTAL. NEGATIVA DE REGISTRO DE
136
APOSENTADORIA JULGADA ILEGAL PELO TRIBUNAL DE
CONTAS DA UNIÃO. INAPLICABILIDADE AO CASO DA
DECADÊNCIA PREVISTA NO ART. 54 DA LEI 9.784/99.
ASSEGURADO O DIREITO AO CONTRADITÓRIO E À
AMPLA DEFESA.
1. Esta Suprema Corte possui jurisprudência pacífica no sentido de que
o Tribunal de Contas da União, no exercício da competência de controle
externo da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadorias,
reformas e pensões (art. 71, inciso III, CF/88), não se submete ao prazo
decadencial da Lei nº 9.784/99, iniciando-se o prazo quinquenal
somente após a publicação do registro na imprensa oficial.
2. O TCU, em 2008, negou o registro da aposentadoria do ora
recorrente, concedida em 1998, por considerar ilegal “a incorporação de
vantagem de natureza trabalhista que não pode subsistir após a
passagem do servidor para o regime estatutário”. Como o ato de
aposentação do recorrente ainda não havia sido registrado pelo Tribunal
de Contas da União, não há que se falar em decadência administrativa,
tendo em vista a inexistência do registro do ato de aposentação em
questão.
3. Sequer há que se falar em ofensa aos princípios da segurança jurídica,
da boa-fé e da confiança, pois foi assegurado o ao recorrente o direito ao
contraditório e à ampla defesa, fato apresentado na própria inicial, uma
vez que ele apresentou embargos de declaração e também pedido de
reexame da decisão do TCU.
4. Agravo regimental não provido
No mesmo sentido manifestou o Superior Tribunal de
Justiça em 07/11/2012, no EREsp nº 1.240.168/SC:
DIREITO ADMINISTRATIVO. PRAZO DECADENCIAL PARA
A ANULAÇÃO DE ATO DE APOSENTADORIA. TERMO A
QUO.
O termo inicial do prazo decadencial de cinco anos para que a
Administração Pública anule ato administrativo referente à
concessão de aposentadoria, previsto no art. 54 da Lei n. 9.784/1999,
é a data da homologação da concessão pelo Tribunal de Contas. A
concessão de aposentadoria tem natureza jurídica de ato administrativo
complexo que somente se perfaz com a manifestação do Tribunal de
Contas acerca da legalidade do ato. Precedentes citados: AgRg no REsp
1.284.915-SC, DJe 10/4/2012; REsp 1.264.053-RS, DJe 16/3/2012;
AgRg no REsp 1.259.775-SC, DJe 16/2/2012, e AgRg no REsp
1.257.666-PR, DJe 5/9/2011
Direito Administrativo
137
Um quadro comparativo entre as características
preponderantes da revogação e anulação poderia ser assim
elaborado:
9. Convalidação dos atos administrativos
Pela teoria monista o ato é nulo ou válido, não havendo
possibilidade de convalidação. Pela dualista, os atos além de nulos
ou válidos, podem também ser anuláveis (convalidáveis). É esta
teoria que ganhou espaço no sistema administrativo brasileiro,
como veremos (CARVALHO FILHO, 2008, p. 147).
Existem determinados vícios que podem gerar nulidades
absolutas (atos nulos) e vícios que levam a nulidades relativas (atos
anuláveis), que somente a riqueza dos casos concretos irá permitir
Atenção! Até mesmo os atos discricionários podem ser objeto de anulação por parte do Poder Judiciário. Isso se deve porque mesmo nestes atos, três dos cinco elementos são sempre definidos em lei: a competência, a forma e a finalidade, além da possibilidade de anulação por força da Teoria dos motivos determinantes.
Anulação Revogação
Legitimidade
Motivo
Efeitos
O próprio Poder emissor do ato a ser anulado ou o Poder Judiciário.
Conveniência e oportunidade.
Ilegalidade.
Somente o próprio poder
emissor do ato a ser revogado.
Ex tunc. Ex nunc.
138
a análise de quando o vício é nulo ou anulável. Segundo os
ensinamentos de Weida Zancaner, os vícios de finalidade, objeto e
motivo seriam sempre inválidos, enquanto a competência (quando
não exclusiva) e a forma (quando não essencial) apresentar-se-iam
convalidáveis (ZANCANER, 2008, p. 85-97). Neste mesmo
sentido afirma Giovani Bigolin (2007, p. 124): em sede
doutrinária, por sua vez, a melhor posição é a colhida no
magistério de Weida Zancaner, segundo a qual podem ser
convalidados os atos que possuam os vícios de competência,
formalidade e procedimento. Cumpre destacar, no entanto, que a
autora, seguindo os ensinamentos de Celso Antônio Bandeira de
Mello, divide o requisito forma em formalidade e procedimento,
linha que não se seguiu nesta obra.
Também denominado saneamento (DI PIETRO, 2009, p.
245), convalidação é o ato pela qual a Administração Pública
aproveita um ato administrativo exarado com vício sanável,
suprindo o seu defeito. É a correção do ato exarado com defeito, o
suprimento de uma invalidade operando efeitos retroativos
(ZANCANER, 2008, p. 65).
O ato de convalidação possui efeitos ex tunc, ou seja,
seus efeitos retroagem ao momento da prática do ato viciado.
O art. 55 da Lei nº 9.784/99 contemplou a convalidação
estabelecendo que a Administração poderá convalidar seus atos
desde que contenham vícios sanáveis, não acarretem lesão ao
interesse público e nem prejuízos a terceiros.
Existem quatro formas de convalidação:
Ratificação: é forma de convalidação efetuada pela própria
autoridade que praticou o ato anterior.
Confirmação: quando a convalidação é efetuada por
autoridade superior a que emitiu o ato viciado.
Reforma: é ato de convalidação que suprime apenas a parte
inválida do ato originário.
Conversão: quando a administração substitui a parte inválida
do ato viciado por outra válida.
Direito Administrativo
139
Capítulo VI
LLIICCIITTAAÇÇÃÃOO
1. Conceito, destinatários e objeto
É um procedimento administrativo vinculado, de
observância obrigatória, salvo exceções legalmente previstas, por
meio do qual a Administração Pública seleciona a proposta mais
vantajosa dentre as apresentadas pelos interessados para a provável
celebração de um contrato que atenda aos interesses públicos.
Possui também um caráter instrumental, pois serve como meio para
o alcance de um fim: a realização de um contrato.
A licitação aparece prevista constitucionalmente nos arts.
22, XXVII; 37, XXI; 173, § 1º, III, e 175. A lei geral disciplinadora
das licitações é a Lei nº 8.666/93 (Estatuto Geral das Licitações) e
a Lei nº 10.520/02 (que regulou a licitação na modalidade de
pregão).
São obrigados a licitar, além dos órgãos da administração
direta (União, Estados, Distrito Federal, Municípios), os
integrantes da administração indireta (autarquias, fundações,
empresas públicas, sociedades de economia mista, consórcios
públicos), os fundos especiais e demais entidades controladas
direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e
Municípios. As obras, serviços, compras e alienações realizadas
pelos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Tribunal de
Contas, também, serão regidos pelas normas da Lei nº 8.666/93, no
que couber, nas três esferas administrativas.
A licitação tem por objeto, além da seleção da melhor
proposta para a Administração, a contratação de obras, serviços
(inclusive de publicidade), compra, alienação, concessões,
permissões e locações quando realizada com terceiros.
Quanto às licitações envolvendo serviços de publicidade, na
qual o legislador desde a publicação da Lei nº 8.666/93 entendeu ser
140
de realização obrigatória (arts. 1º e 2º, caput, e art. 25, II), em 2010 foi
publicada a Lei nº 12.232, que estabeleceu as normas gerais sobre as
licitações e contratações deste tipo de serviços.
2. Princípios
Os destinatários da lei de licitações devem seguir alguns
princípios específicos, expostos de forma exemplificativa no art. 3º
da Lei nº 8.666/93, além daqueles já trabalhados no segundo
capítulo desta obra, sempre na busca do princípio constitucional da
isonomia, abordados agora de forma objetiva.
2.1. Princípio da legalidade
A licitação é procedimento formal e vinculado. Isso quer
dizer que o seu rito deve ser fielmente seguido (para alguns,
princípio da formalidade ou formalismo) com observância à lei.
Neste sentido explicita o art. 4º da Lei nº 8.666/93: todos quantos
participem da licitação promovida pelos órgãos ou entidades a
que se refere o art. 1º têm direito público subjetivo à sua fiel
observância do pertinente procedimento estabelecido nesta lei (...).
2.2. Princípio da impessoalidade
É vedado ao órgão ou entidade que esteja realizando o
certame licitatório estabelecer qualquer discriminação ou
favoritismo que não esteja previsto em lei. Desta forma, o
tratamento dispensado a todos os licitantes deve ser de forma
igualitária, ou seja, ofertada aos interessados igual oportunidade de
condições para disputar a licitação. Oferecendo igual oportunidade
aos interessados, estará a Administração dispensando tratamento
impessoal aos administrados.
O art. 3º, § 1º, I, da Lei nº 8.666/93 é bastante elucidativo
ao vedar que os agentes públicos restrinjam ou frustrem o caráter
competitivo do certame, estabelecendo preferências ou distinções
em razão da naturalidade, sede ou domicílio dos licitantes. Da
mesma forma o inciso II veda o tratamento diferenciado de
natureza comercial, legal, trabalhista, previdenciária ou qualquer
outro entre empresas nacionais e estrangeiras.
Todavia, em alguns momentos a lei pode estabelecer
tratamento diferenciado entre os licitantes. A exemplo, temos o art.
Direito Administrativo
141
3º, § 2º, da Lei Geral de Licitações, que como critério de
desempate assegura em igualdade de condições, preferência,
sucessiva, aos bens ou serviços:
Produzidos no país;
Produzidos ou prestados por empresas brasileiras;
Produzidos ou prestados por empresas que invistam em
pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no País.
Caso ainda persista o empate, o art. 45, § 2º, determina
que se proceda o sorteio. No caso da licitação do tipo menor preço,
entre os licitantes considerados qualificados a classificação se dará
pela ordem crescente dos preços propostos, prevalecendo, no caso
de empate, exclusivamente o critério do sorteio.
Após a publicação da Lei nº 12.349/10 que alterou alguns
artigos da Lei de licitações, passou-se a adotar margem de
preferência para produtos manufaturados e serviços nacionais que
atendam a normas técnicas brasileiras. Esta margem de preferência,
é definida pelo Poder Executivo Federal, limitada a até 25% acima
do preço dos produtos manufaturados e serviços estrangeiros,
sendo que esta preferência será estabelecida com base em estudos
que devem levar em consideração: I – geração de emprego e renda;
II – efeito na arrecadação de tributos federais, estaduais e
municipais; III – desenvolvimento e inovação tecnológica
realizados no País; IV – custo adicional dos produtos e serviços; e
V – em suas revisões, análise retrospectiva de resultados.
Sem confrontar com o princípio da igualdade (princípio
constitucional que a Lei de Licitações tratou por resguardar) e
obedecendo aos ditames constitucionais insculpidos nos artigos
Atenção! Com a publicação da Lei Complementar nº 123/06 (Estatuto da micro e pequena empresa), as micro e pequenas empresas passaram a dispor de alguns privilégios específicos como prazo diferenciado para a apresentação de regularidade fiscal, criação de um empate ficto que as beneficia, licitação com participação exclusiva de micro e pequenas empresas, dentre outros privilégios.
142
170, IX, e 179 a Lei Complementar estabeleceu as seguintes
vantagens às micro e pequenas empresas (arts. 42 a 49):
A comprovação de regularidade fiscal das microempresas
e empresas de pequeno porte somente será exigida para efeito de
assinatura do contrato, ou seja, elas não estão livres de apresentar
toda a documentação exigida para efeito de comprovação de
regularidade fiscal, o único porém é que não será inabilitada por
apresentar eventual irregularidade fiscal. Declarada vencedora do
certame, à micro ou pequena empresa será assegurado o prazo de 2
(dois) dias úteis, prorrogáveis por igual período, a critério da
Administração Pública, para a regularização da documentação,
pagamento ou parcelamento do débito, e emissão de eventuais
certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa.
A Lei Complementar também uma espécie de empate
ficto, entendendo-se por empate aquelas situações em que as
propostas apresentadas pelas microempresas e empresas de
pequeno porte sejam iguais ou até 10% superiores à proposta mais
bem classificada (na modalidade de pregão, o intervalo percentual
estabelecido será de até 5% superior ao melhor preço).
2.3. Princípio da publicidade
Disposto no art. 3º, § 3º, primeira parte, da Lei nº
8.666/93, a licitação não poderá ser sigilosa. Isto quer dizer que os
atos de seu procedimento devem ser públicos ou acessíveis ao
público.
Ademais, quanto maior a quantidade de pessoas
informadas da realização da licitação, mais fácil será obter a
proposta mais vantajosa para a Administração. Da mesma forma,
com maior publicidade, mais fácil de manter um controle dos atos
da Administração.
Vários são os artigos da Lei nº 8.666/93 que estabelecem
esta publicidade, como os artigos 15, § 2º, 16, 21, 39, 43, § 1º, 53,
§ 4º, dentre outros.
Direito Administrativo
143
2.4. Princípio da moralidade e probidade
Estudados conjuntamente de forma mais aprofundada no
capítulo segundo, por estes princípios a licitação deve ser
conduzida com padrões éticos, zelosos, honestos, respeitando a
boa-fé, que deve guiar todo administrador da coisa pública.
2.5. Princípio da vinculação ao instrumento convocatório
De acordo com o art. 41 da Lei nº 8.666/93, a
Administração Pública não pode descumprir as normas e condições
estabelecidas no edital (ou carta convite) ao qual se acha
estritamente vinculada. Assim o instrumento convocatório (edital
ou carta convite) vincula não só os administrados, mas também a
própria administração, aos quais devem cumprir fielmente as
regras traçadas.
2.6. Princípio do julgamento objetivo
O julgamento das propostas deve ser objetivo, ou seja,
deve ocorrer em conformidade com o tipo de licitação (art. 45 da
Lei nº 8.666/93) previsto no ato convocatório. Este princípio visa
afastar critérios subjetivos no julgamento das propostas. Ainda que
na modalidade do concurso, e nos tipos melhor técnica ou técnica
e preço a subjetividade possa parecer marcante, o julgamento deve
seguir este princípio, ou seja, deve ser objetivo. Assim a comissão
ao julgar deverá emitir as razões da escolha pelo vencedor e a não
aceitação dos demais participantes.
2.7. Princípio da adjudicação compulsória
Não vem explícito no art. 3º da Lei nº 8.666/93, mas
tratamos por abordá-lo principalmente para evitar eventual
equívoco de interpretação que a sua denominação pode levar.
Atenção! Até a respectiva abertura da proposta, seu conteúdo tem caráter sigiloso, sendo considerado crime devassar ou proporcionar que terceiro devasse o sigilo da proposta (art. 94 da Lei nº 8.666/93).
144
Por este princípio a Administração não pode, após
concluído o certame licitatório, atribuir a outrem o objeto da
licitação que não ao seu vencedor. O direito do vencedor, expõe
Hely Lopes Meirelles (2010, p. 54), limita-se à adjudicação, e não
ao contrato imediato, visto que, após a licitação é licito à
Administração Pública revogar ou anular a licitação. O que não
pode é a Administração contratar com outro que não seja o
adjudicatário enquanto válida sua adjudicação.
2.8. Princípio da padronização
O princípio da padronização estipula que a
Administração deve, nos bens que tenham uma vida útil mais
prolongada, dar preferência a produtos semelhantes aos que já
integram o patrimônio público, com objetivo de redução de custos
de manutenção, simplificação na mão de obra, etc. (JUSTEN
FILHO, 2010, p. 194), atentando-se para os riscos de inadequação,
de ofensa à isonomia e de elevação de custos. Existem tais riscos
especialmente quando os objetos a serem adquiridos envolverem
preferenciais regionais ou adaptação a condições ambientais
(JUSTEN FILHO, 2010, p. 185).
Não se deve, contudo, confundir padronização com
preferência por marca. A padronização pode resultar na seleção de
um produto identificável por meio de uma marca. Isso não se
traduz em qualquer tipo de atuação reprovável, não infringe a
Constituição nem viola a Lei nº 8.666. Não há infringência quando
se elege um produto (serviço etc.) em virtude de qualidades
específicas, utilizando-se sua marca apenas como instrumento de
identificação. No caso, não há preferência pela marca, mas pelo
objeto (JUSTEN FILHO, 2010, p.187).
Atenção! O princípio da adjudicação compulsória não significa que o vencedor da licitação tenha direito subjetivo à celebração do contrato. Apenas expõe que se a administração for firmar contrato relativo ao objeto licitado, o fará com o vencedor do certame.
Direito Administrativo
145
Para atender a este princípio a Lei nº 8.666/93 em seu
artigo 15 estabeleceu o sistema de registro de preços que será
precedido de ampla pesquisa de mercado, e, exigindo a
concorrência como modalidade de licitação. Contudo, o artigo 3º
do decreto que regulamentou este Sistema (3.931/01) expõe que a
licitação para registro de preços será realizada na modalidade de
concorrência ou de pregão, do tipo menor preço.
O prazo de validade da ata do registro de preços é de um
ano, de acordo com o artigo 15 da Lei de Licitações. Porém, no
decreto regulamentador, o artigo 4º admite, excepcionalmente a
prorrogação por mais um ano, quando a proposta continuar se
mostrando mais vantajosa, satisfeitos os demais requisitos desta
norma.
O sistema de registro de preços regulado pelo Decreto nº
3.931/01 assim conceituou em seu artigo 1º: Sistema de Registro de
Preços - SRP - conjunto de procedimentos para registro formal de
preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para
contratações futuras.
O artigo 2º do referido decreto estipula,
preferencialmente, o SRP nas seguintes hipóteses:
Quando, pelas características do bem ou serviço, houver
necessidade de contratações frequentes;
Quando for mais conveniente a aquisição de bens com
previsão de entregas parceladas ou contratação de serviços
necessários à Administração para o desempenho de suas
atribuições;
Quando for conveniente a aquisição de bens ou a contratação
de serviços para atendimento a mais de um órgão ou entidade,
ou a programas de governo; e
Quando pela natureza do objeto não for possível definir
previamente o quantitativo a ser demandado pela
Administração
O artigo 8º do Decreto comentado estabelece um
procedimento conhecido tradicionalmente como carona, isto é, a
Ata de Registro de Preços, durante sua vigência, poderá ser
utilizada por qualquer órgão ou entidade da Administração que não
146
tenha participado do certame licitatório, mediante prévia consulta
ao órgão gerenciador, desde que devidamente comprovada a
vantagem. Ainda que não haja concordância nesta possibilidade de
contratação, a devida comprovação da vantagem parece somente
ser possível se, realizada uma licitação, a Ata de Registro da outra
entidade ainda se mostrar mais vantajosa.
O pedido de carona, porém possui alguns requisitos. Os
órgãos e entidades que não participaram do registro de preços,
quando desejarem fazer uso da Ata de Registro de Preços, deverão
manifestar seu interesse junto ao órgão gerenciador da Ata, para
que este indique os possíveis fornecedores e respectivos preços a
serem praticados, obedecida a ordem de classificação.
Caberá ao fornecedor beneficiário da Ata de Registro de
Preços, observadas as condições nela estabelecidas, optar pela
aceitação ou não do fornecimento, independentemente dos
quantitativos registrados em Ata, desde que este fornecimento não
prejudique as obrigações anteriormente assumidas.
As aquisições ou contratações adicionais a que se refere
este artigo não poderão exceder, por órgão ou entidade, a cem por
cento dos quantitativos registrados na Ata de Registro de Preços.
Os valores estabelecidos na Ata, entretanto, não têm um
caráter absoluto, pois poderão sofrer alterações (revisão) em
decorrência de eventual redução daqueles praticados no mercado,
ou de fato que eleve o custo dos serviços ou bens registrados,
cabendo ao órgão gerenciador da Ata promover as necessárias
negociações junto aos fornecedores (art. 12 do Decreto nº
3.931/01).
Quando o preço inicialmente registrado, por motivo
superveniente, tornar-se superior ao preço praticado no mercado o
órgão gerenciador deverá:
Convocar o fornecedor visando a negociação para redução de
preços e sua adequação ao praticado pelo mercado;
Frustrada a negociação, o fornecedor será liberado do
compromisso assumido; e
Convocar os demais fornecedores visando igual oportunidade
de negociação.
Direito Administrativo
147
Quando o preço de mercado tornar-se superior aos
preços registrados e o fornecedor, mediante requerimento
devidamente comprovado, não puder cumprir o compromisso, o
órgão gerenciador poderá:
Liberar o fornecedor do compromisso assumido, sem
aplicação da penalidade, confirmando a veracidade dos
motivos e comprovantes apresentados, e se a comunicação
ocorrer antes do pedido de fornecimento; e
Convocar os demais fornecedores visando igual oportunidade
de negociação
3. Obrigatoriedade da licitação
Já se afirmou anteriormente que a regra é a realização da
licitação, sendo obrigatória a observância de seu procedimento.
Entretanto, em alguns casos o legislador autorizou a
contratação direta pela Administração sem respeitar todo o
procedimento licitatório. São os casos de inexigibilidade e dispensa
de licitação.
4. Inexigibilidade de licitação
Exposta de forma exemplificativa no art. 25 da Lei nº
8.666/93, a inexigibilidade se verifica sempre que há uma
impossibilidade jurídica de competição.
Deve, para tanto, ser observada a exigência do art. 26 que
expõe ser necessária a justificativa e comunicada a autoridade
superior em 3 dias, cabendo a esta ratificar e publicar na imprensa
oficial a justificativa no prazo de 5 dias, com o objetivo de obter a
eficácia dos atos.
A inexigibilidade se verifica:
Para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só
possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante
comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo
a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado
fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que
se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato,
148
Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas
entidades equivalentes;
Para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13
da Lei 8.666/93, de natureza singular, com profissionais ou
empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade
para serviços de publicidade e divulgação (regulamentado
pela Lei nº 12.232/10);
Para contratação de profissional de qualquer setor artístico,
diretamente ou através de empresário exclusivo, desde que
consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública.
5. Dispensa de licitação
A dispensa, assim como a inexigibilidade, é uma exceção
à obrigatoriedade de licitar, mas que, diversamente da
inexigibilidade, existe a possibilidade jurídica de ocorrer a
competição, que por alguma razão deixa de ser realizada por
prevalência de algum outro interesse público.
Desta forma, a dispensa de licitação consiste na
possibilidade legal de a Administração Pública deixar de realizar a
licitação, por alguma hipótese taxativamente prevista, contratando
diretamente com o terceiro.
A doutrina normalmente costuma diferenciar a licitação
dispensada da dispensável. A licitação dispensada seria a dispensa
autorizada pelo art. 17, I e II, da Lei nº 8.666/93. Já a licitação
dispensável seriam aqueles casos previstos no art. 24 do Estatuto.
A mesma observação feita em relação à inexigibilidade
deve ser aplicada às hipóteses de dispensa de licitação, no que se
refere à necessidade de justificativa (art. 26 da Lei nº 8.666/93), e
comunicação da autoridade superior em 3 dias, cabendo a esta
ratificar e publicar na imprensa oficial a justificativa no prazo de 5
Atenção! A Lei nº 11.107/05 em seu art. 2º, § 1º, III, acrescentou outra possibilidade de dispensa de licitação, quando o consórcio público for contratado pela Administração Pública Direta ou Indireta dos entes consorciados.
Direito Administrativo
149
dias, com o objetivo de obter a eficácia dos atos, nas hipóteses dos
§§ 2º e 4º, do art. 17 e a partir do inciso III do art. 24.
5.1. Licitação dispensada
O artigo17 da Lei nº 8.666/93 refere-se à alienação dos
bens imóveis no inciso I e dos bens móveis no inciso II. Com
relação a esta espécie de dispensa expõe Dirley da Cunha Junior
(2009, p. 435): é aquela que a própria lei declarou-a como tal, de
modo que não há discricionariedade administrativa de decidir se
realiza ou não a licitação (art. 17, I e II). Aqui, configurada a
hipótese legal, a Administração está obrigada a dispensar a
licitação, por determinação da própria lei.
Quando a alienação for de bem imóvel, art. 17, I, da Lei nº
8.666/93 é exigida a autorização legislativa, comprovação de interesse
público devidamente justificado, bem como a avaliação prévia e a
licitação na modalidade de concorrência, dispensada nos seguintes casos:
a) dação em pagamento;
b) doação, permitida exclusivamente para outro órgão ou
entidade da administração pública, de qualquer esfera de governo,
ressalvado o disposto nas alíneas “f”, “h” e “i”; (Redação dada pela
Lei nº 11.952/09)
c) permuta, por outro imóvel que atenda aos requisitos
constantes do inciso X do art. 24 desta Lei;
d) investidura;
e) venda a outro órgão ou entidade da administração
pública, de qualquer esfera de governo;
f) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão
de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis
residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no
âmbito de programas habitacionais ou de regularização fundiária
de interesse social desenvolvidos por órgãos ou entidades da
administração pública;
g) procedimentos de regularização fundiária de que trata
o art. 29 da Lei no 6.383, de 7 de dezembro de 1976; (Redação
dada pela Lei nº 11.952/09)
150
h) alienação gratuita ou onerosa, aforamento, concessão
de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens imóveis
de uso comercial de âmbito local com área de até 250 m² (duzentos
e cinquenta metros quadrados) e inseridos no âmbito de programas
de regularização fundiária de interesse social desenvolvidos por
órgãos ou entidades da administração pública;
i) alienação e concessão de direito real de uso, gratuita ou
onerosa, de terras públicas rurais da União na Amazônia Legal
onde incidam ocupações até o limite de quinze módulos fiscais ou
mil e quinhentos hectares, para fins de regularização fundiária,
atendidos os requisitos legais; (Incluído pela Medida Provisória nº
458, de 2009)
Se o bem imóvel tiver sido derivado de procedimento
judicial ou de dação em pagamento, será exigida prévia
avaliação e comprovação da necessidade ou utilidade pública da
alienação, aceitando-se nestes casos a modalidade não só de
concorrência, mas também de leilão (art. 19 da Lei nº 8.666/93).
Dispensa-se neste caso a autorização legislativa (desafetação).
Quando a alienação for de bem móvel, art. 17, II, da Lei
nº 8.666/93, exige-se a avaliação prévia e licitação, dispensada nos
seguintes casos:
a) doação, permitida exclusivamente para fins e uso de
interesse social, após avaliação de sua oportunidade e conveniência
socioeconômica, relativamente à escolha de outra forma de
alienação;
b) permuta, permitida exclusivamente entre órgãos ou
entidades da Administração Pública;
c) venda de ações, que poderão ser negociadas em bolsa,
observada a legislação específica;
d) venda de títulos, na forma da legislação pertinente;
e) venda de bens produzidos ou comercializados por
órgãos ou entidades da Administração Pública, em virtude de suas
finalidades;
Direito Administrativo
151
f) venda de materiais e equipamentos para outros órgãos
ou entidades da Administração Pública, sem utilização previsível
por quem deles dispõe.
O art. 17, § 2º, da Lei comentada também tratou do tema
de licitação dispensada, nos casos de concessão de título de
propriedade ou de direito real de uso de imóveis, quando o uso
destinar-se a alguma das hipóteses previstas nas alíneas do referido
parágrafo.
5.2. Licitação dispensável
As hipóteses de licitação dispensável, também com rol
taxativo, encontram-se disciplinadas no art. 24 da Lei nº 8.666/93,
e podem ser divididas em 4 categorias (DI PIETRO, 2009, p. 367):
Em razão do valor: incisos I e II que podem assim ser
expostos: I – para obras e serviços de engenharia de valor de
até R$ 15.000,00; II – para outros serviços e compras de valor
até R$ 8.000,00.
Atenção! Com relação ao art. 17, I, b e c; II, b e § 1º o STF na ADI nº 927-3/SP suspendeu em relação aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a eficácia da expressão permitida exclusivamente para outro órgão ou entidade da Administração Pública.
Atenção! O artigo 24, § 1º da Lei nº 8.666/93 dobrou o valor da dispensa quando contratados por consórcios públicos, sociedades de economia mista, empresas públicas e por autarquias e fundações qualificadas como agências executivas, ficando então os valores de dispensa para obras e serviços de engenharia no valor de até R$ 30.000,00 e para outros serviços e compras no valor de até R$ 16.000,00. Atente ainda que para os incisos I e II, do art. 24 da Lei 8.666/93, não é necessária a justificativa exigida pelo art. 26.
152
Em razão de situações excepcionais: incisos III, IV, V, VI,
VII, IX, XI, XIV, XVIII, XXVII e XXVIII.
Em razão do objeto: incisos X, XII, XV, XVII, XIX, XXI,
XXV, XXIX, XXXI e XXXII.
Em razão da pessoa: incisos VIII, XIII, XVI, XX, XXII,
XXIII, XXIV, XXVI e XXX.
Em razão da proposta dada à presente obra, a análise
detalhada de cada alínea torna-se desaconselhável, o que não
dispensa, entretanto, uma leitura atenta pelo leitor.
Com relação à dispensa de licitação e o crime previsto no
artigo 89 da Lei de Licitações, manifestou o STJ:
DISPENSA DE LICITAÇÃO. AUSÊNCIA DE DOLO
ESPECÍFICO E DANO AO ERÁRIO.
A Corte Especial, por maioria, entendeu que o crime previsto no
art. 89 da Lei n. 8.666/1993 exige dolo específico e efetivo dano ao
erário. No caso concreto a prefeitura fracionou a contratação de
serviços referentes à festa de carnaval na cidade, de forma que em cada
um dos contratos realizados fosse dispensável a licitação. O Ministério
Público não demonstrou a intenção da prefeita de violar as regras de
licitação, tampouco foi constatado prejuízo à Fazenda Pública, motivos
pelos quais a denúncia foi julgada improcedente. (APn 480-MG, Rel.
originária Min. Maria Thereza de Assis Moura, Rel. para acórdão
Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 29/3/2012)
6. Modalidades de licitação
A Lei nº 8.666/93, em seu art. 22, prevê 5 modalidades
de licitação, sendo que as três primeiras possuem o mesmo objeto:
a contratação de obras, serviços e compras, enquanto as outras duas
possuem objetivos próprios, sendo elas respectivamente:
Concorrência
Tomada de preços
Convite
Concurso
Leilão
Cumpre anotar que o § 8º do art. 22 veda a criação de
outras modalidades de licitação ou a combinação das referidas, o
Direito Administrativo
153
que não impediu, porém, a publicação da Lei nº 10.520/02 que
criou mais uma modalidade de licitação: o pregão. Em verdade,
como cabe à União fazer as normas gerais de licitação (art. 22,
XXVII, da CRFB/88) e tratando-se o pregão de modalidade (norma
geral) aplicável a todos os entes, a sua criação é constitucional,
ainda que em sua origem, por via de sucessivas medidas
provisórias aplicadas exclusivamente à União, não o fosse.
6.1. Concorrência
É a modalidade de licitação entre quaisquer interessados
que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir
os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para
execução de seu objeto. É a modalidade mais complexa e, por isso,
adequada para as contratações de grande vulto, que exigem maior
rigor em sua formalidade e ampla divulgação (art. 22, § 1º, do
Estatuto Geral das Licitações).
A regra pela escolha ou não da modalidade de
concorrência é o valor estimado da contratação compreendido nos
limites constantes no art. 23, I, c, e II, c, da Lei nº 8.666/93.
Contudo, em alguns momentos a lei entendeu melhor exigir esta
modalidade de licitação independentemente do valor, por sua
natureza, como nos casos:
Na compra ou alienação de bens imóveis, ressalvado o
disposto no art. 19, que admite também o leilão (art. 23, § 3º,
da Lei de Licitações);
Nas concessões de direito real de uso (art. 23, § 3º, da Lei de
Licitações);
Nas licitações internacionais, admitindo-se neste último caso,
observados os limites deste artigo, a tomada de preços,
quando o órgão ou entidade dispuser de cadastro internacional
de fornecedores ou o convite, quando não houver fornecedor
do bem ou serviço no País (art. 23, § 3º, da Lei de Licitações);
Nas alienações de bens móveis quando o valor for superior a
R$ 650.000,00 (art. 17, § 6º, da Lei de Licitações);
Para o registro de preços (Dec. nº 3.931/01) com a
possibilidade de utilizar-se também o pregão (art. 3º, do Dec.
nº 3.931/01);
154
Para a concessão de serviços públicos (art. 2º, II e III, da Lei
nº 8.987/95);
Para a contratação de parceria público-privada (art. 10 da Lei
nº 11.079/04);
Para a concessão florestal (Lei nº 11.284/06, art. 13, § 1º).
6.2. Tomada de preços
É a modalidade de licitação entre interessados
devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições
exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do
recebimento das propostas, observada a necessária qualificação
(art. 22, § 2º, do Estatuto).
Os documentos exigidos do licitante que não estiver
cadastrado serão aqueles constantes nos artigos 27 a 31, desde que
compatíveis com o objeto da licitação.
Destinada às contratações de vulto médio possui suas
faixas de valores estabelecidas no art. 23, I, b e II, b.
Os interessados cadastrados recebem um certificado (art.
36, § 1º) e seus registros para efeito de habilitação são válidos no
máximo por um ano (art. 34).
6.3. Convite
Com conceito previsto no art. 22, § 3º, da Lei nº 8.666/93, o
convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo
pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados
em número mínimo de 3 pela unidade administrativa, a qual afixará,
em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá
aos demais cadastrados na correspondente especialidade que
manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 horas da
apresentação das propostas.
É a modalidade menos complexa, e as faixas de valores
estão previstas no art. 23, I, a, e II, a, da Lei nº 8.666/93. O que chama
atenção nesta modalidade de licitação é que não há edital, assim como na concorrência e tomada de preços, mas sim carta-convite.
Existindo na praça mais de 3 possíveis interessados, a
cada novo convite, realizado para objeto idêntico ou assemelhado,
é obrigatório o convite a, no mínimo, mais um interessado,
Direito Administrativo
155
enquanto existirem cadastrados não convidados nas últimas
licitações.
Quando, por limitações do mercado ou manifesto
desinteresse dos convidados, for impossível a obtenção do número
mínimo de licitantes exigidos no § 3º do artigo, essas
circunstâncias deverão ser devidamente justificadas no processo,
sob pena de repetição do convite.
É vedada a utilização da modalidade convite ou tomada
de preços, conforme o caso, para parcelas de uma mesma obra ou
serviço, ou ainda para obras e serviços da mesma natureza e no
mesmo local que possam ser realizadas conjunta e
concomitantemente, sempre que o somatório de seus valores
caracterizar o caso de tomada de preços ou concorrência,
respectivamente, exceto para as parcelas de natureza específica que
possam ser executadas por pessoas ou empresas de especialidade
diversa daquela do executor da obra ou serviço.
Como fora afirmado anteriormente, a regra pela escolha
entre uma modalidade ou outra de licitação é em decorrência do
valor, salvo quando a lei exigir modalidade específica. Um quadro
comparativo envolvendo os valores da concorrência, tomada de
preços e convite, poderia ser assim elaborado:
Concorrência
Tomada
de preços
Convite
Outros serviços e
compras
Obras e serviços
de engenharia
Até R$
150.000,00
A partir de R$
1.500.000,01
De R$ 80.000,01
até R$
650.000,00
A partir de R$
650.000,01
De R$
150.000,01 até
R$ 1.500.000,00
Até R$
80.000,00
156
6.4. Concurso
Segundo o art. 22, § 4º, da Lei nº 8.666/93 o concurso é a
modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha
de trabalho técnico, científico ou artístico (art. 13, § 1º, da Lei nº
8.666/93) mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos
vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na
imprensa oficial com antecedência mínima de 45 dias.
Com natureza diversa das demais modalidades até agora
estudadas, o concurso visa à escolha de trabalho técnico, científico
ou artístico, como, por exemplo, a escolha de um hino para uma
cidade, a escolha de um projeto, o que demonstra o seu inevitável
subjetivismo como já apontado.
A Lei de licitações não prevê nenhum procedimento para
o concurso, fixando apenas o prazo mínimo para recebimento das
propostas que é de 45 dias. O art. 52, por sua vez, salienta que deva
ter regulamento próprio que indicará:
A qualificação exigida dos participantes;
As diretrizes e a forma de apresentação do trabalho;
As condições de realização do concurso e os prêmios a serem
concedidos.
Outra característica do concurso é que o seu julgamento
será feito por uma comissão especial com conhecimento da matéria
objeto do certame, servidores públicos ou não.
Note-se também que ao concurso não se aplica nenhum
tipo de licitação estipulado no art. 45 do Estatuto licitatório, pois
aqui o vencedor receberá um prêmio ou remuneração.
Atenção! Os valores expostos, nos casos de consórcios públicos, dobrarão quando formados por até 3 Entes da Federação e triplicarão quando formados por maior número (art. 23, § 8º, da Lei nº 8.666/93).
Direito Administrativo
157
6.5. Leilão
É a modalidade de licitação, prevista no art. 22, § 5º,
entre quaisquer interessados que tem por objetivo:
A venda de bens móveis inservíveis para a administração, ou
A venda de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou
A alienação de bens imóveis, prevista no art. 19, a quem
oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da
avaliação.
Por força do art. 17, § 6º, da Lei comentada, o leilão só é
cabível quando o valor dos bens móveis for não superior a R$
650.000,00.
Assim, como o concurso, a Lei nº 8.666/93 não
estabelece um procedimento específico, prevendo somente que o
leilão possa ser cometido a leiloeiro oficial ou a servidor designado
pela Administração, procedendo-se na forma da legislação
pertinente.
Todo bem a ser leiloado será previamente avaliado pela
Administração para fixação do preço mínimo de arrematação.
Os bens arrematados serão pagos à vista ou no percentual
estabelecido no edital, não inferior a 5% e, após a assinatura da
respectiva ata lavrada no local do leilão, imediatamente entregues
ao arrematante, o qual se obrigará ao pagamento do restante no
prazo estipulado no edital de convocação, sob pena de perder em
favor da Administração o valor já recolhido.
Nos leilões internacionais, o pagamento da parcela à vista
poderá ser feito em até vinte e quatro horas.
O edital de leilão deve ser amplamente divulgado,
principalmente no município em que este se realizará.
6.6. Pregão
Modalidade prevista na Lei nº 10.520/02 para qualquer
ente da Federação, o pregão é utilizado qualquer que seja o valor
da contratação para a aquisição de bens e serviços comuns (aqueles
cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser
objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações
158
usuais no mercado) tendo como tipo de licitação que será sempre o
menor preço.
Visa acelerar o processo licitatório, ou seja, a busca pela
eficiência, tendo por características a adoção parcial do princípio
da oralidade e do (in)formalismo.
O Dec. nº 3.555/00 teve por finalidade regulamentar o
pregão na forma presencial. Isso porque o art. 2º, § 1º, da Lei nº
10.520/02 possibilitou a realização do pregão na forma eletrônica
(utilizando recursos de tecnologia da informação), que foi objeto
de regulamentação novamente no âmbito da União, pelo Dec. nº
5.450/05, onde inclusive em seu art. 4º determinou como
obrigatória a modalidade de pregão para a aquisição de bens e
serviços comuns, sendo preferencial a utilização na forma
eletrônica (no mesmo sentido expôs o art. 1º, § 1º, do Dec. nº
5.504/05).
Para os demais entes Federados o pregão não é
modalidade obrigatória por força do poderá (art. 1º da Lei nº
10.520/02), a não ser, é claro, que dessa forma estabeleçam em
seus regulamentos.
A modalidade pregão poderá ser utilizada para a licitação
de registro de preços (art. 3º do Dec. nº 3.931/01).
6.7. Consulta
A modalidade de licitação consulta, de
constitucionalidade questionável (pois cabe à União estabelecer
normas gerais de licitação, art. 22, XXVII, da CRFB/88), surgiu
em nossa legislação por advento da Lei nº 9.472/97, arts. 55 e 58,
aplicável somente à ANATEL, sendo posteriormente ampliada
para todas as Agências Reguladoras na Lei nº 9.986/00, pelo artigo
37.
Atenção! O pregão na forma eletrônica (Dec. nº 5.450/05) não se aplica às contratações de obras de engenharia, às locações imobiliárias e alienações em geral.
Direito Administrativo
159
A ANATEL, na resolução nº 5/98, definiu consulta como
modalidade de licitação em que ao menos cinco pessoas, físicas ou
jurídicas, de elevada qualificação, serão chamadas a apresentar
propostas para o fornecimento de bens ou serviços não comuns.
7. Procedimento adotado pela Lei nº 8.666/93
Já foi afirmado que a licitação é um procedimento
formal. A doutrina costuma dividir o procedimento licitatório em 5
fases distintas:
Ato convocatório
Habilitação
Classificação e julgamento
Homologação
Adjudicação
Cumpre esclarecer que na verdade estas fases
correspondem à fase externa (executória). Isso porque o
procedimento de licitação inicia-se com a abertura do processo
administrativo (fase interna ou preparatória), conforme mostram o
art. 38 da Lei nº 8.666/93, o art. 3º da Lei nº 10.520/02, o art. 8º do
Dec. nº 3.555/00 e o art. 9º do Dec. nº 5.450/05.
Quanto às modalidades de licitação concurso e leilão a
Lei nº 8.666/93, como já foi exposto, não estabeleceu nenhum
procedimento específico. Por tal motivo, as disposições referentes
aos seus procedimentos foram objeto de observação quando do
estudo da própria modalidade.
7.1. Ato convocatório - edital ou carta-convite
A publicação resumida do edital (art. 21 da Lei nº 8.666/93) é o ato deflagrador da fase externa de algumas modalidades de licitação. É para alguns a lei interna da licitação, por força do princípio da vinculação ao instrumento convocatório.
Um dos efeitos da publicação resumida do edital é a abertura do prazo para sua impugnação feita por qualquer cidadão em até 5 dias úteis antes da abertura dos envelopes de habilitação, e por qualquer licitante até o segundo dia útil que anteceder a abertura do envelope de habilitação (art. 41, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.666/93).
160
É por meio do edital ou carta convite que se fixam os requisitos mínimos para participar do certame, se define o objeto e as condições básicas do contrato. O artigo 40 da Lei nº 8.666/93 expõe quais são os requisitos que deve observar o edital, sendo um deles o prazo mínimo para o recebimento das propostas que será de:
Atenção! Na modalidade de convite, a convocação dos interessados é feita por carta-convite e não edital.
15 dias Tomada de preços, licitação que não for do tipo
melhor técnica ou técnica e preço.
5 dias úteis
Convite
8 dias
úteis Pregão
15 dias Leilão
45 dias
Concurso
Concorrência, com contrato em regime de
empreitada integral ou quando a licitação for do
tipo melhor técnica ou técnica e preço.
30 dias
Concorrência, nos casos não especificados nos
casos anteriores.
Tomada de preços, quando a licitação for do tipo melhor técnica ou técnica e preço.
Direito Administrativo
161
7.1.1. Comissão responsável
A licitação é conduzida por uma Comissão permanente
ou especial de, no mínimo, 3 membros, sendo pelo menos 2 deles
servidores qualificados pertencentes aos quadros permanentes dos
órgãos da Administração responsáveis pela licitação, que processa
e julga o certame.
No caso de convite, a Comissão de licitação,
excepcionalmente, nas pequenas unidades administrativas e em
face da exiguidade de pessoal disponível, poderá ser substituída
por servidor (um) formalmente designado pela autoridade
competente.
Os membros das Comissões de licitação responderão
solidariamente por todos os atos praticados pela Comissão, salvo se
posição individual divergente estiver devidamente fundamentada e
registrada em ata lavrada na reunião em que tiver sido tomada a
decisão.
A investidura dos membros das Comissões permanentes
não excederá a 1 ano, vedada a recondução da totalidade de seus
membros para a mesma comissão no período subsequente.
7.2. Habilitação
7.2.1. Na concorrência
Após a entrega dos envelopes com a documentação e as
propostas, é verificada a aptidão dos interessados.
Procede-se então a abertura dos envelopes contendo a
documentação exigida no edital e a análise destes documentos.
Ressalta-se que a Administração não deve fazer exigências
impertinentes ao objeto licitado, sendo que deve unicamente exigir
qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do
cumprimento das obrigações, conforme dispõe o art. 37, XXI, da
CRFB/88 (neste sentido o STJ no MS nº 5.624/DF).
De acordo com o art. 27 da Lei nº 8.666/93, para a
habilitação nas licitações exigir-se-á dos interessados,
exclusivamente, documentação relativa a:
162
Habilitação jurídica (art. 28 da Lei nº 8.666/93);
Qualificação técnica (art. 30 da Lei nº 8.666/93);
Qualificação econômico-financeira (art. 31 da Lei nº
8.666/93);
Regularidade fiscal (art. 29 da Lei nº 8.666/93);
Cumprimento do disposto no inciso XXXIII do art. 7º da
CRFB/88 (proíbe o trabalho noturno, perigoso ou insalubre a
menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de
dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir dos
quatorze anos).
Quando algum licitante porventura não entregar
documentação exigida ou entregar documentação em
desconformidade, será considerado inabilitado (ato administrativo
vinculado), e o envelope contendo a proposta devolvido ainda
lacrado ao licitante inabilitado.
Ultrapassada a fase de habilitação e abertas as propostas,
não cabe mais desclassificação por motivo relacionado à
habilitação, salvo em razão de fatos supervenientes ou só
conhecidos após o julgamento (art. 43, § 6º, da Lei nº 8.666/93).
Igualmente, ultrapassada esta fase, não cabe mais ao
licitante habilitado desistir da proposta apresentada, salvo por
Atenção! Quando nenhum licitante for habilitado (ou todas as propostas forem desclassificadas) a licitação será considerada fracassada ou frustrada, podendo-se (ato administrativo discricionário) abrir prazo de 8 dias úteis para apresentação de nova documentação (para o convite poderá ser de 3 dias úteis). Diferente é o conceito de licitação deserta, aquela em que não comparece nenhum interessado à licitação. Em ambos os casos, na falta de tempo para se proceder a nova licitação ou disponibilizar prazo para a apresentação de nova documentação, apresenta-se a hipótese de dispensa constante no art. 24, V e VII, da Lei 8.666/93.
Direito Administrativo
163
motivo justo decorrente se fato superveniente e aceito pela
comissão (art. 43, §6º, da Lei nº 8.666/93).
7.2.2. Na tomada de preços e convite
Tanto na modalidade de licitação tomada de preços
quanto na modalidade de convite, esta fase fica prejudicada, pois
na primeira a licitação ocorre entre cadastrados que entregam tão
somente na habilitação um certificado de cadastramento, enquanto
que na segunda a licitação envolve convidados ou interessados já
cadastrados.
7.2.3. Recurso
Da habilitação ou inabilitação do licitante cabe recurso
hierárquico, dirigido à autoridade superior, com efeito suspensivo
no prazo de 5 dias úteis contados da intimação do ato ou lavratura
da ata (art. 109, I, a, da Lei nº 8.666/93).
7.3. Classificação e julgamento
Após a abertura dos envelopes contendo os documentos
de habilitação, procede-se a abertura dos envelopes contendo a
proposta dos habilitados.
É nesta fase que a comissão de licitação realiza o
julgamento das propostas e as classifica, observando o tipo de
licitação estabelecido no edital.
Atenção! A LC nº 123/06, no art. 43, permite que sempre que uma microempresa ou empresa de pequeno porte for declarada vencedora do certame, ainda que exista alguma restrição na comprovação da regularidade fiscal, ser-lhe-á concedido prazo de 2 dias úteis (a partir desta declaração), prorrogáveis por igual período, para a regularização da documentação.
164
Serão desclassificadas as propostas:
Que não atendam às exigências do ato convocatório da
licitação;
Com valor global superior ao limite estabelecido ou com
preços manifestamente inexequíveis, assim considerados
aqueles que não venham a ter demonstrada sua viabilidade
através de documentação que comprove que os custos dos
insumos são coerentes com os de mercado e que os
coeficientes de produtividade são compatíveis com a execução
do objeto do contrato, condições estas necessariamente
especificadas no ato convocatório da licitação.
No julgamento das propostas, a comissão levará em
consideração os critérios objetivos definidos no edital ou carta-
convite, os quais não devem contrariar as regras e princípios
previamente estabelecidos (art. 44 da Lei nº 8.666/93).
A classificação é ato vinculado, o que a impede de
celebrar contrato com preterição da ordem de classificação das
propostas referente ao objeto da licitação (art. 50 da Lei de
Licitações).
O licitante fica obrigado a manter o compromisso
assumido na proposta até 60 dias da entrega da mesma, ficando
após este período, sem a convocação para a assinatura do contrato,
liberado do compromisso (art. 64, § 3º, da Lei nº 8.666/93).
7.3.1. Tipos de licitação
Os tipos de licitação, exceto na modalidade de
concurso, são (art. 45 do Estatuto licitatório):
Menor preço;
Melhor técnica;
Técnica e preço;
Maior lance ou oferta – nos casos de alienação de bens ou
concessão de direito real de uso.
Acresce-se a estes tipos, ainda que o art. 45, § 5º, da Lei
nº 8.666/93 vede a utilização de outros tipos de licitação não
previstos neste artigo, os critérios estabelecidos no art. 15 da Lei nº
Direito Administrativo
165
8.987/95 abordados com mais profundidade no capítulo referente
aos serviços públicos.
O tipo de licitação para a modalidade de pregão é sempre
de menor preço.
No caso de utilização dos tipos melhor técnica e técnica e
preço, serão apresentados 3 envelopes aos invés de 2. O que
diferencia estes dois tipos de licitação é que no tipo técnica e preço
o resultado do certame provém de uma média ponderada entre a
técnica e o preço, de acordo com os valores atribuídos a cada um
no instrumento convocatório.
Já no tipo melhor técnica há um só critério analisado que
é a técnica, enquanto o preço serve como instrumento de
negociação entre o licitante que ofereceu a melhor técnica
(preferencial) e o licitante que ofereceu o menor valor. Caso o
licitante de melhor classificação técnica não aceite a contratação
pelo menor valor ofertado, passa-se a proposta de negociação ao
segundo classificado técnico, até encontrar o vencedor que aceite a
execução de sua técnica pelo menor preço ofertado.
Os tipos de licitação melhor técnica ou técnica e preço
serão utilizados exclusivamente para serviços de natureza
predominantemente intelectual, em especial na elaboração de
projetos, cálculos, fiscalização, supervisão e gerenciamento e de
engenharia consultiva em geral e, em particular, para a elaboração
de estudos técnicos preliminares e projetos básicos e executivos.
7.3.2. Recurso
Do julgamento das propostas cabe recurso hierárquico,
dirigido à autoridade superior, com efeito suspensivo no prazo de 5
dias úteis, contados da intimação do ato ou da lavratura da ata (art.
109, I, b, da Lei nº 8.666/93).
7.4. Homologação
Prevista no art. 43, VI, primeira parte, da Lei Geral de
Licitações é a fase na qual a autoridade superior à comissão aprova
ou não o procedimento, verificando os requisitos de validade da
licitação. Com isso, concluímos que o trabalho da comissão
166
encerra-se com a divulgação do resultado do julgamento e
classificação das propostas.
Assim, a autoridade poderá homologar o resultado, anular
o certame por ilegalidade, revogar ou, ainda, sanar eventuais vícios
ou irregularidades que não afetem o resultado nem a legalidade do
certame, homologando o mesmo.
7.5. Adjudicação
Praticamente uma consequência jurídica da
homologação, é ato (também vinculado) pelo qual a autoridade
superior atribui ao licitante vencedor o objeto da licitação. Está
exposto no art. 43, VI, segunda parte, da Lei nº 8.666/93.
Não pode ser confundida com a obrigatoriedade de
celebração do contrato. É tão somente a intenção de firmar contrato
referente àquele objeto com o licitante vencedor (art. 50 da Lei nº
8.666/93).
8. Procedimento adotado pela Lei nº 10.520/02
O procedimento do pregão aparece regulado nos arts. 3º
(fase preparatória ou interna) e 4º (fase externa ou de execução) da
Lei nº 10.520/02.
Na União, como já dito, o pregão presencial foi
regulamentado pelo Dec. nº 3.555/00 e o pregão na forma
eletrônica pelo Dec. nº 5.450/05. Como muitas semelhanças há
com o procedimento adotado pela Lei nº 8.666/93, aplicando-se,
inclusive, este de forma subsidiária (art. 9º da Lei nº 10.520/02),
serão somente ressaltados os pontos incomuns entre os dois
procedimentos, incluindo as particularidades que tangem ao pregão
na forma eletrônica.
8.1. Prazos
Além do prazo fixado para apresentação das propostas,
não inferior a 8 dias úteis a partir da publicação do aviso do edital,
a Lei nº 10.520/02 estabelece prazo diferenciado para
apresentações das razões e contrarrazões de recurso da decisão que
declara o vencedor do certame.
Direito Administrativo
167
Declarado o vencedor do certame, qualquer licitante
poderá manifestar imediata e motivadamente a intenção de
recorrer, quando lhe será concedido o prazo de 3 dias úteis para a
apresentação das razões do recurso (art. 4º, XVIII, da Lei nº
10.520/02).
8.2. Inversão de fases
Uma das mais marcantes alterações trazidas pela lei que
disciplinou o pregão foi a inversão das fases de habilitação e
julgamento, vindo esta antes daquela. Isso proporcionou maior
celeridade ao trâmite licitatório.
Assim, de acordo com o art. 4º, VII, XI e XII, da Lei nº
10.520/02, o pregoeiro (e não a comissão de licitação como é no
procedimento da Lei nº 8.666/93) primeiro procede a abertura dos
envelopes contendo as propostas, e somente depois de definir quem
é o licitante classificado em primeiro lugar abrirá o envelope
contendo os documentos de habilitação.
Ainda que contestado doutrinariamente, as fases de
adjudicação e homologação também aparecem invertidas (art. 4º,
XX, XXI e XXII, da Lei nº 10.520/02), porém nesta modalidade
com uma justificativa. Em não havendo a manifestação na
interposição de recurso, a adjudicação é feita pelo próprio
pregoeiro, cabendo à autoridade somente a homologação do
certame. Já no caso de interposição (manifestação) de recurso,
caberá à autoridade a decisão do recurso, e daí a adjudicação e
homologação do procedimento. Logo, pode-se constatar que a
homologação é sempre realizada pela autoridade, enquanto a
adjudicação dependerá da interposição ou não do recurso.
8.3. Inclusão de uma nova fase
A modalidade de licitação pregão não se satisfaz com as
propostas apresentas nos envelopes. Vai além. Isso porque após a
abertura dos envelopes contendo as propostas e uma
(pré)classificação surge uma nova fase que é a de lances verbais ou
via sistema de tecnologia de informação (internet) e sucessivos.
De acordo com o art. 4º, VIII, da Lei nº 10.520/02, após a
abertura dos envelopes contendo as propostas, no curso da mesma
168
sessão, o autor da oferta de valor mais baixo e os das ofertas com
preços até 10% superiores àquela poderão fazer novos lances
verbais e sucessivos, até a proclamação do vencedor.
Não havendo pelo menos 3 ofertas com preços até 10%
da oferta de valor mais baixo, os licitantes das melhores propostas,
até o máximo de 3, quaisquer que tenham sido os valores por eles
oferecidos (ou seja, ainda que acima dos 10%) poderão oferecer
novos lances verbais e sucessivos (art. 4º, IX, da Lei nº 10.520/02).
Alerta-se ainda ao leitor que as Leis nº 8.987/95, art. 18-
A, e 11.079/04, art. 13, admitem a mesma inversão da ordem das
fases de habilitação e julgamento, desde que expressamente
previsto no edital.
9. Anulação e revogação da licitação
Já foi objeto de afirmação que à autoridade superior cabe
homologar a licitação. Entretanto, caso seja verificada alguma
ilegalidade no certame, deverá ela anulá-lo, de ofício ou por
provocação de terceiro, com parecer escrito e devidamente
fundamentado (art. 49, primeira parte, da Lei nº 8.666/93). A
anulação produz efeito ex tunc.
A anulação do procedimento licitatório não gera dever de
indenizar (art. 49, § 1º, do Estatuto licitatório), mas induz a
nulidade do contrato, se porventura este já tiver sido firmado (art.
59 da mesma lei).
A revogação, por sua vez, se dá por razões de interesse
público, decorrente de fato superveniente devidamente
comprovado, pertinente e suficiente para justificar tal conduta,
conforme preceitua o art. 49, segunda parte, da Lei nº 8.666/93.
Trata-se em verdade de uma revogação condicionada, com efeito
ex nunc.
Atenção! O pregão na forma eletrônica, os lances verbais são substituídos por lances oferecidos via sistema eletrônico. A sessão pública é efetuada via internet.
Direito Administrativo
169
O artigo 38, IX, da Lei nº 8.666/93 prevê a necessidade
de fundamentar circunstanciadamente tanto a anulação quanto a
revogação.
Estas ações que pode tomar a autoridade superior
demonstram que o licitante vencedor tem mera expectativa de
direito na celebração do contrato.
Tanto a anulação quanto a revogação geram aos
interessados o direito de contraditório e ampla defesa (art. 49, § 3º,
do Estatuto), mesmo que somente após praticado o ato de anulação
ou revogação (STF no ROMS nº 24.188/DF). Da decisão que anula
ou revoga a licitação cabe recurso hierárquico no prazo de 5 dias
úteis, conforme prevê o art. 109, I, c, da Lei nº 8.666/93.
Direito Administrativo
171
Capítulo VII
CCOONNTTRRAATTOOSS AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVOOSS
1. Noções gerais
A Administração Pública, na busca de seu maior
objetivo, o bem estar da coletividade, pode celebrar compromissos
recíprocos com terceiros (pessoa física ou jurídica, de direito
público ou privado). Paulo Nader (2010, p. 9) conceitua contrato
como acordo de vontades que visa a produção de efeitos jurídicos
de conteúdo patrimonial. Diogo de Figueiredo Moreira Neto
(2009, p. 182) é mais preciso ao expor que: no contrato há uma
manifestação recíproca de vontades entre dois entes conformando
uma relação jurídica bilateral, em que os respectivos interesses
das partes se compõem e instituem uma vontade comum nascida do
consenso autônoma e diferenciada das vontades individuais
originais, que, a ambas subordinando, passará a reger a relação
assim formada.
A primeira distinção que se há de fazer é a de que a
característica marcante dos contratos é a bilateralidade (acordos),
diferentemente dos atos, cuja particularidade é distinta: a
unilateralidade.
A segunda observação que deve ser feita é a distinção
entre contratos administrativos, contratos celebrados pela
Administração com regras predominantes de direito privado e
contratos da Administração, sendo este gênero e aqueles espécies,
podendo, assim, dividir-se em:
172
Logo, somente a presença da Administração Pública, ou
até mesmo o interesse público, não tornam necessariamente o
contrato em contrato administrativo.
Trabalharemos neste capítulo com o contrato tipicamente
administrativo, podendo desde já ser conceituado como sendo o
acordo firmado entre a Administração Pública e um particular sob
a prevalência de regras de direito público, fixadas pela própria
Administração e buscando a concretização do interesse público.
Compete privativamente à União legislar sobre as normas
gerais de contratação (art. 22, XXVII, da CRFB/88), que assim
procedeu com a edição da Lei nº 8.666/93.
2. Características
Algumas características são comuns a todo e qualquer
contrato, celebrado ou não pela Administração Pública:
Consensual – acordo de vontades;
Oneroso – remunerados;
Comutativo – equivalência entre as obrigações;
Formal – expressado de forma escrita, solene;
Intuito personae – executado pelo próprio contratado.
Contratos da Administração Pública
Caracterizados pela presença da Administração Pública em um dos polos da relação contratual
Contratos privados (administrativo atípico ou semipúblico) da
Administração
São contratos celebrados pela Administração Pública, com a predominância de normas de direito
privado como a compra e venda, doação, permuta, locação.
Contratos administrativos
(tipicamente administrativo ou públicos ou propriamente ditos)
São os contratos celebrados pela
Administração que prevalecem as normas de direito público como concessão de serviço público, de uso
de bem público, entre outros.
Direito Administrativo
173
Envolvendo a Administração Pública o contrato deve ser
celebrado com aquele que comprovou ter a melhor proposta para
Administração na licitação realizada, ou seja, leva em consideração
as condições pessoais do contratado. Por exemplo, o art. 78, VI, da
Lei nº 8.666/93 veda a subcontratação total ou parcial, sendo
aceita, entretanto, sempre que a Administração assim permitir, de
acordo com o art. 72, da lei mencionada. Já o art. 13, § 3º, da Lei
de Licitações veda absolutamente a subcontratação.
Outras características, porém, devem aparecer quando a
Administração Pública está sob as prerrogativas de direito público,
caracterizando, portanto, o contrato como tipicamente
administrativo. Soma-se às características já mencionadas:
A finalidade pública – a Administração deve ter por fim,
sempre, o interesse público.
Natureza de contrato de adesão – as cláusulas estabelecidas
nos contratos administrativos são unilateralmente
estabelecidas pela Administração (art. 55 da Lei nº 8.666/93).
Obediência à forma prescrita em lei – a Lei nº 8.666/93
estabelece inúmeras formalidades que devem ser seguidas,
como, por exemplo, a publicação resumida do contrato na
imprensa oficial como condição de sua eficácia.
As prerrogativas públicas – a presença das cláusulas
exorbitantes ou cláusulas de privilégio que colocam a
Administração Pública num patamar de supremacia frente o
contratado.
3. Cláusulas exorbitantes
Previstas no art. 58 e outras regras esparsas da Lei nº
8.666/93, são as cláusulas que conferem vantagens à
Administração Pública.
3.1. Exigência de garantia
Reza o art. 56 da Lei nº 8.666/93 que a autoridade
competente, e desde que prevista no instrumento convocatório,
poderá exigir a prestação de garantias do contratado podendo optar
pelas seguintes modalidades:
174
Caução em dinheiro ou em títulos da dívida pública, devendo
ter sido emitidos sob a forma escritural, mediante registro em
sistema centralizado de liquidação e de custódia autorizado
pelo Banco Central do Brasil e avaliados pelos seus valores
econômicos, conforme definido pelo Ministério da Fazenda;
Seguro-garantia;
Fiança bancária.
3.2. Execução e fiscalização da execução
Uma vez o contrato assinado pelas partes, está apto para
ser executado. De acordo com Hely Lopes Meirelles (2010, p.
295), executar o contrato é cumprir as suas cláusulas segundo a
comum intenção das partes no momento de sua celebração. De
acordo com o autor, a execução do contrato refere-se não só à
realização de seu objeto, mas também aos prazos estipulados, a
adequação técnica dos trabalhos, condições de pagamento, etc.
A entrega e recebimento do objeto do contrato constituem
a etapa final da execução, de modo a liberar o contratado dos
encargos assumidos. Pode ser provisório ou definitivo. Provisório
quando é recebido em caráter experimental, para averiguação da
perfeição do objeto. Uma vez transcorrido o prazo do recebimento
provisório sem apontamentos por parte da Administração,
entendem-se que o objeto do contrato foi recebido definitivamente.
O definitivo é o recebimento que feito em caráter definitivo,
incorporando o objeto do contrato ao seu patrimônio, exonerando o
contratado dos demais encargos contratuais (MEIRELLES, 2010, p.
305-7).
Marçal Justen Filho (2010, p. 827) explica que o
recebimento provisório (que deve ser documentado via termo
circunstanciado) do objeto do contrato não acarreta liberação do
particular nem significa que a Administração reconheça que o
objeto é bom ou que a prestação foi executada corretamente. Mas
também não significa que não possua algum efeito, pois produz a
liberação do particular dos riscos a partir da transferência da posse.
Ao receber definitivamente o objeto deve-se preencher o
respectivo termo circunstanciado de recebimento, definindo a
posição da Administração e a do contratado face a realização do
Direito Administrativo
175
objeto do contrato (realização de obra, serviço ou fornecimento).
Quanto ao recebimento de obras e serviços, compras ou locação de
equipamentos remete-se o leitor ao art. 73 da Lei de Licitações,
podendo, no entanto, ser dispensado o recebimento provisório
(sendo feito mediante recibo) quando:
Gêneros perecíveis e alimentação preparada;
Serviços profissionais;
Obras e serviços de valor até R$ 80.000,00, desde que não se
componham de aparelhos, equipamentos e instalações sujeitos
à verificação de funcionamento e produtividade.
A fiscalização da execução do contrato está prevista nos
arts. 58, III, 67 e 70 da Lei nº 8.666/93, a Administração deve
acompanhar e fiscalizar a execução do contrato por um
representante da Administração especialmente designado, sendo
permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de
informações pertinentes a essa atribuição. Este representante
anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com
a execução do contrato, determinando o que for necessário à
regularização das faltas ou defeitos observados.
O contratado, por sua vez, deverá manter preposto, aceito
pela Administração, no local da obra ou serviço, para representá-lo
na execução do contrato.
A obrigação de reparar, corrigir, remover, reconstruir ou
substituir, no todo ou em parte, o objeto do contrato em que se
verificarem vícios, defeitos ou incorreções resultantes da execução
ou de materiais empregados é do contratado, correndo os custos daí
decorrentes às suas expensas.
O contratado é responsável pelos danos causados
diretamente à Administração ou a terceiros, decorrentes de sua
culpa ou dolo (responsabilidade subjetiva) na execução do
contrato, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a
fiscalização ou o acompanhamento pelo órgão interessado.
É do contratado, também, a responsabilidade dos
encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais
resultantes da execução do contrato. Entretanto, a inadimplência do
contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e
176
comerciais não transfere à Administração Pública a
responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto
do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e
edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis – art. 71, §º 1º
da Lei de Licitações. O STF na ADC nº 16/DF, julgada em
24/11/2010, declarou constitucional tal dispositivo: entendeu-se
que a mera inadimplência do contratado não poderia transferir à
Administração Pública a responsabilidade pelo pagamento dos
encargos, mas reconheceu-se que isso não significaria que
eventual omissão da Administração Pública, na obrigação de
fiscalizar as obrigações do contratado, não viesse a gerar essa
responsabilidade.
A Administração Pública responde, entretanto,
solidariamente com o contratado pelos encargos previdenciários
resultantes da execução do contrato (artigo 71, § 2º, da Lei de
Licitações).
Atenção! O Tribunal Superior do Trabalho possui enunciado de nº 331 (alterado em 31 de maio de 2011) expondo que: IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. VI - A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral
Direito Administrativo
177
3.3. Aplicação de sanções
O artigo 58, IV, da Lei de Licitações permite à
Administração Pública aplicar sanções diretamente
(autoexecutáveis), desde que devidamente motivada, sempre que o
contratado descumprir total ou parcialmente o pactuado.
O artigo 87 do Estatuto prevê as sanções aplicáveis ao
contratado, garantida a defesa prévia, sendo elas:
Advertência;
Multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no
contrato, podendo ser aplicada juntamente com as demais
sanções;
Suspensão temporária de participação em licitação e
impedimento de contratar com a Administração, por prazo não
superior a 2 anos;
Declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a
Administração Pública enquanto perdurarem os motivos
determinantes da punição ou até que seja promovida a
reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a
penalidade, que será concedida sempre que o contratado
ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após
decorrido o prazo da sanção aplicada com base no item
anterior. De competência exclusiva do Ministro de Estado, do
Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, é
facultada a defesa do interessado no respectivo processo,
podendo a reabilitação ser requerida após 2 anos de sua
aplicação.
Na modalidade pregão, o licitante ficará impedido de
licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal ou
Municípios e será descredenciado no SICAF (Sistema de
Cadastramento Unificado de Fornecedores), ou nos sistemas de
cadastramento de fornecedores, pelo prazo de até cinco anos,
quando:
Não celebrar o contrato ao ser convocado;
Deixar de entregar a documentação ou apresentar
documentação falsa exigida para o certame;
178
Ensejar o retardamento da execução do objeto do contrato;
Não mantiver a proposta;
Falhar ou fraudar na execução do contrato;
Comportar-se de modo inidôneo ou cometer fraude fiscal.
3.4. Alteração unilateral
Esta prerrogativa confere à Administração (art. 58, I, da
Lei nº 8.666/93) a possibilidade de alterar unilateralmente o
contrato, para melhor adequá-lo às finalidades de interesse público,
respeitando, contudo, os direitos do contratado.
O art. 65 da Lei de Licitações expõe que os contratos
podem ser alterados unilateralmente (devidamente justificado):
Quando houver modificação no projeto ou das especificações,
para melhor adequação técnica aos seus objetivos (alteração
qualitativa);
Quando necessária a modificação do valor contratual em
decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu
objeto (alteração quantitativa).
Não é possível que a Administração Pública altere
unilateralmente o contrato de forma a importar aumento dos
encargos do contratado, devendo, sempre que isso ocorrer,
restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato (art. 65,
§ 6º, do Estatuto).
As cláusulas econômico-financeiras são um dos
sustentáculos dos contratos administrativos e são tão importantes
Atenção! O contratado fica obrigado a aceitar, porém, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% para os seus acréscimos. Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder estes limites, salvo quando resultar de acordo celebrado entre os contratantes, nos casos das supressões.
Direito Administrativo
179
que não podem ser alteradas diretamente sem a prévia
concordância do contratado, devendo ser revistas, entretanto,
sempre que as alterações unilaterais lhe atinjam, mantendo, assim,
o equilíbrio contratual (art. 58, §§ 1º e 2º do Estatuto).
A revisão tem lugar sempre que a Administração Pública
altera unilateralmente o contrato, afetando a equação econômico-
financeira deste ou na existência de evento extraordinário, estranho
ao contrato, que altera substancialmente os seus custos. Diferente é
o caso do reajuste, que ocorre periodicamente, relacionado à perda
ordinária do valor aquisitivo da moeda.
Marçal Justen Filho (2010, p. 158 e 792), ao comentar o
art. 7º, § 7º da Lei de Licitações coloca que a correção monetária
de inflação não caracteriza elevação nem modificação do valor do
contrato. E mais a frente ao comentar o art. 65, continua:
atualização monetária e reajuste de preços eram figuras distintas.
Previa-se que o reajuste incidiria até a data da execução da
prestação devida pelo particular. A partir dessa data, passaria a
correr a atualização monetária. O reajuste teria por fundamento
índices setoriais específicos, destinados a avaliar a variação dos
custos necessários à execução da prestação. Já a atualização
monetária seria uma compensação genérica pela perda do valor
monetário. (...) Em tese essa distinção permanece existindo. Mas a
figura da atualização monetária deixou de ser praticada, passando
a aludir-se apenas a reajuste de preço. (...). Neste sentido já
decidiu o STJ no REsp nº 846.367/RS e REsp nº 837.790/SP.
3.5. Rescisão unilateral
Outra importante cláusula exorbitante refere-se à
possibilidade de a Administração rescindir o contrato
unilateralmente, previsão constante no art. 58, II, nos arts. 79, I, e
78, I a XII e XVII.
O art. 78, supramencionado, possibilita a rescisão
unilateral do contrato pela Administração nos seguintes casos:
O não cumprimento de cláusulas contratuais, especificações,
projetos ou prazos;
180
O cumprimento irregular de cláusulas contratuais,
especificações, projetos e prazos;
A lentidão do seu cumprimento, levando a Administração a
comprovar a impossibilidade da conclusão da obra, do serviço
ou do fornecimento, nos prazos estipulados;
O atraso injustificado no início da obra, serviço ou
fornecimento;
A paralisação da obra, do serviço ou do fornecimento, sem
justa causa e prévia comunicação à Administração;
A subcontratação total ou parcial do seu objeto, a associação
do contratado com outrem, a cessão ou transferência, total ou
parcial, bem como a fusão, cisão ou incorporação, não
admitidas no edital e no contrato;
O desatendimento das determinações regulares da autoridade
designada para acompanhar e fiscalizar a sua execução, assim
como as de seus superiores;
O cometimento reiterado de faltas na sua execução, anotadas
na forma do § 1º do art. 67 da Lei de Licitações;
A decretação de falência ou a instauração de insolvência civil;
A dissolução da sociedade ou o falecimento do contratado;
A alteração social ou a modificação da finalidade ou da
estrutura da empresa, que prejudique a execução do contrato;
Razões de interesse público, de alta relevância e amplo
conhecimento, justificadas e determinadas pela máxima
autoridade da esfera administrativa a que está subordinado o
contratante e exaradas no processo administrativo a que se
refere o contrato;
A ocorrência de caso fortuito ou de força maior, regularmente
comprovada, impeditiva da execução do contrato.
Nas duas últimas hipóteses citadas (razões de interesse
público e caso fortuito ou força maior), o contratado tem direito de
ser ressarcido dos prejuízos que comprovadamente houver sofrido,
tendo ainda direito à devolução de garantia, aos pagamentos
devidos pela execução do contrato até a data da rescisão e ao
pagamento do custo da desmobilização (art. 79, § 2º, da Lei
8.666/93).
Direito Administrativo
181
É de causar estranheza, porém, que a Administração
Pública tenha que ressarcir o contratado nas hipóteses de caso
fortuito ou força maior, pois nem mesmo a Administração deu
causa a estes eventos. Deveria, nestas hipóteses, o contrato se
extinguir de pleno direito (sem indenização), não sendo, porém, o
que determina o § 2º do art. 79, que expõe: sem que haja culpa do
contratado, será este ressarcido dos prejuízos (...).
3.6. Anulação
A Administração Pública deve (é a regra) anular seus atos
cometidos com vício de legalidade, no exercício da autotutela.
Matéria já consagrada pelas Súmulas nºs 346 e 473 do STF que
assim dispõem respectivamente: a administração pública pode
declarar a nulidade de seus próprios atos; a administração pode
anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam
ilegais, porque deles não originam direitos; (...).
Contudo, a anulação, por força do art. 59, parágrafo
único, da Lei nº 8.666/93, não exonera a Administração de
indenizar o contratado pelo que este tiver executado até a data da
declaração, e pelos prejuízos comprovados, contanto que a
anulação não lhe seja (ao contratado) imputável.
Entretanto, é válido ressaltar, a anulação do procedimento
licitatório não gera direito a indenização (art. 49, § 1º, do Estatuto
Geral das Licitações).
3.7. Restrição ao uso da cláusula de exceção de contrato não cumprido (exceptio non adimpleti contractus)
No direito privado, caso uma das partes não cumpra a sua
obrigação no contrato, a outra também não está obrigada a cumprir
Atenção! Os casos de rescisão contratual devem ser formalmente motivados, assegurado o contraditório e a ampla defesa.
182
a sua (art. 476 do Código Civil Brasileiro). Porém, nos contratos
tipicamente administrativos, e em decorrência do princípio da
continuidade do serviço público, esta cláusula tem seu uso
restringido. Isso quer dizer que, caso a Administração Pública não
cumpra o que o contrato lhe obriga, ao contratado impõe-se o dever
de continuar executando o contrato, não podendo fazer assim uso
da cláusula exceptio non adimpleti contractus.
Esta restrição imposta ao contratado está atenuada
conforme se verifica no art. 78, XV, da Lei nº 8.666/93, pois exige
que sejam ultrapassados mais de 90 dias sem que haja pagamento
por parte da Administração para que o contratado possa suspender
ou rescindir o contrato.
A restrição ao uso da cláusula exceptio non adimpleti
contractus é plena, por exemplo, nos contratos de concessão de
serviço público, art. 39, parágrafo único, da Lei nº 8.987/95.
3.8. Retomada do objeto
A última cláusula exorbitante que será objeto de estudo
diz respeito à possibilidade de a Administração Pública, de forma a
assegurar a continuidade do serviço público, assumir
imediatamente, ocupar e utilizar o local, instalações, equipamentos,
material e pessoal necessários à continuidade do serviço. Além
disso, a Administração também pode executar a garantia
contratual, os valores das multas e indenizações a ela devidos e
reter os créditos decorrentes do contrato até o limite dos prejuízos
causados (arts. 58, V, e 80 da Lei nº 8.666/93).
4. Formalização do contrato
Já se falou que a regra dos contratos é o seu formalismo,
ou seja, um instrumento escrito, sendo inclusive considerado nulo e
de nenhum efeito o contrato feito de forma verbal, salvo o de
pequenas compras de pronto pagamento, ou seja, até R$ 4.000,00
(art. 60, parágrafo único, da Lei 8.666/93). Neste sentido já se
manifestou o STJ no AgRg no REsp nº 915.697/PR.
Aliás, o contrato é instrumento obrigatório nos casos de
concorrência, tomada de preços, bem como nos casos de dispensa e
Direito Administrativo
183
inexigibilidade, cujos preços estejam compreendidos nos limites
das duas modalidades citadas. Nas demais modalidades a
Administração pode optar pelo contrato ou ainda substituir por
carta-contrato, nota de empenho, autorização de compra ou ordem
de execução de serviço (art. 62 da Lei nº 8.666/93).
Também é dispensável o termo de contrato
independentemente de seu valor e facultada a substituição, nos
casos de compra com entrega imediata e integral dos bens
adquiridos, dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive
assistência técnica.
Precedidos geralmente de licitação, os contratos e seus
aditamentos serão lavrados nas repartições interessadas, as quais
manterão arquivo cronológico e registro sistemático do seu extrato,
salvo os relativos a direitos reais sobre imóveis, que se formalizam
por instrumento lavrado em cartório de notas, de tudo juntando-se
cópia no processo que lhe deu origem.
Para passar a ter eficácia é necessária a publicação resumida
na Imprensa Oficial do instrumento de contrato e de seus aditamentos,
até o quinto dia útil do mês seguinte ao de sua assinatura.
5. Duração e prorrogação contratual
É vedado contrato por prazo indeterminado (art. 57, § 3º,
da Lei nº 8.666/93), ficando inclusive sua duração adstrita à
vigência dos respectivos créditos orçamentários, salvo nos
seguintes casos (art. 57 da Lei nº 8.666/93):
Aos projetos cujos produtos estejam contemplados nas metas
estabelecidas no Plano Plurianual, os quais poderão ser
prorrogados se houver interesse da Administração e desde que
isso tenha sido previsto no ato convocatório;
À prestação de serviços a serem executados de forma
contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais
e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e
condições mais vantajosas para a administração, limitada a 60
meses;
184
Ao aluguel de equipamentos e à utilização de programas de
informática, podendo a duração estender-se pelo prazo de
48 meses após o início da vigência do contrato.
Às hipóteses previstas nos incisos IX, XIX, XXVIII e XXXI
do artigo 24, cujos contratos poderão ter vigência por até 120
meses, caso haja interesse da administração.
Os prazos de início de etapas de execução, de conclusão e
de entrega admitem prorrogação (justificada por escrito e
previamente autorizada pela autoridade competente), mantidas as
demais cláusulas do contrato e assegurada a manutenção de seu
equilíbrio econômico-financeiro, desde que ocorra algum dos
seguintes motivos, devidamente autuados em processo:
Alteração do projeto ou especificações, pela Administração;
Superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho
à vontade das partes, que altere fundamentalmente as
condições de execução do contrato;
Interrupção da execução do contrato ou diminuição do ritmo
de trabalho por ordem e no interesse da Administração;
Aumento das quantidades inicialmente previstas no contrato,
nos limites permitidos por esta Lei;
Impedimento de execução do contrato por fato ou ato de
terceiro reconhecido pela Administração em documento
contemporâneo à sua ocorrência;
Omissão ou atraso de providências a cargo da Administração,
inclusive quanto aos pagamentos previstos de que resulte,
diretamente, impedimento ou retardamento na execução do
contrato, sem prejuízo das sanções legais aplicáveis aos
responsáveis.
Em caráter excepcional, devidamente justificado e
mediante autorização da autoridade superior, o prazo de 60 meses
para a prestação de serviços a serem executados de forma contínua,
poderá ser prorrogado por até doze meses, totalizando 72 meses.
Direito Administrativo
185
6. Extinção contratual
6.1. Forma ordinária
Os contratos podem ser extintos de forma normal ou
ordinária, ou seja, após as partes terem cumprido seu objeto
(extinção de pleno direito) ou após o término do prazo de vigência.
6.2. Forma extraordinária
A extinção do contrato pode se dar antes do prazo
estipulado ou antes da entrega da coisa, de forma anormal ou
extraordinária pela anulação (vício quanto a legalidade) ou pela
rescisão.
De acordo com o art. 79 do Estatuto Geral das Licitações,
existem 3 formas de rescisão contratual:
1. Unilateral ou Administrativa: abordada no item 3.5,
trata de rescisão por iniciativa da Administração nas hipóteses do
art. 78, I a XII e XVII.
2. Amigável ou distrato: decorrente de um acordo entre
as partes, podendo ocorrer desde que haja conveniência para a
Administração. Deve ser formalizado por termo no processo de
licitação e precedida de autorização escrita e fundamentada da
autoridade competente.
3. Judicial: é a rescisão determinada judicialmente. A
única modalidade de rescisão que o contratado pode adotar
unilateralmente contra a Administração, quando esta descumpre
alguma obrigação, mas nada impede que a Administração também
faça uso dela.
6.2.1. Culposa
A extinção do contrato pode decorrer pela culpa (ou dolo)
de alguma das partes (inexecução culposa), impondo-se ao infrator
responsabilidade administrativa, civil e penal, mas também pode
ocorrer sem que qualquer contratante tenha incorrido em culpa
(negligência, imprudência ou imperícia – inexecução sem culpa).
186
6.2.2. Sem Culpa
A inexecução sem culpa existe quando uma das partes
não cumpre sua parte pactuada, não por sua vontade, mas sim por
fatos estranhos, supervenientes à celebração do contrato. Estes
acontecimentos podem gerar tanto o retardamento quanto a
inexecução do contrato.
6.2.2.1. Teoria da Imprevisão
Sempre que o retardo ou não cumprimento do contrato
vier a ocorrer por fatos supervenientes à sua celebração, de eventos
extraordinários, imprevistos ou imprevisíveis (ou até mesmo
previsíveis, porém de consequências incalculáveis), causando
desequilíbrio econômico-financeiro muito grande, libera-se o
inadimplente das sanções legais e contratuais em razão da
denominada: Teoria da Imprevisão (prevista nos artigos 478 e 479
do CCB): os contratos de execução continuada ou diferida, se a
prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa,
com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos
extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a
resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar
retroagirão à data da citação. A resolução poderá ser evitada,
oferecendo-se o réu a modificar equitativamente as condições do
contrato. Nada mais é que a aplicação da cláusula rebus sic
standibus.
A Teoria da Imprevisão pode ensejar a revisão do
contrato assim como a sua rescisão, estando implícita em todos os
contratos de execução prolongada (artigo 65, II, d, da Lei nº
8.666/93).
6.2.2.2. Caso fortuito ou força maior
O retardamento ou inexecução do contrato pode ainda se
dar por eventos decorrentes da natureza, como ciclones, tufões,
terremotos, ou por alguma atividade humana estranha ao contrato,
como greve ou paralisações, denominados de caso fortuito e força
maior. Tanto um quando o outro autorizam a aplicação da Teoria
da Imprevisão.
Direito Administrativo
187
Não há consenso na doutrina do que seja caso fortuito ou
força maior, ora atribuindo-se ao primeiro eventos da natureza e ao
segundo eventos humanos, ora exatamente o oposto. O que de fato
interessa é que o Código Civil Brasileiro, no art. 393, parágrafo
único, deu-lhes tratamento igual como fatos imprevisíveis (o ideal
seria o termo inevitáveis).
Há ainda hipóteses em que o retardo ou não execução
contratual decorra de ato do próprio Estado. E nestes casos há que
se fazer uma distinção.
6.2.2.3. Fato do príncipe
Todo ato geral do Estado, positivo ou negativo,
imprevisto ou imprevisível, que incida indireta ou reflexamente
nos contratos onerando-os substancialmente denomina-se fato do
príncipe. Constitui álea administrativa extraordinária e
extracontratual. A exemplo tem-se a elevação substancial de um
tributo de importação (pode gerar uma revisão contratual) ou a
proibição de importação deste (pode ensejar a rescisão do
contrato). Interessante notar que o artigo 65, § 5º, da Lei de
Licitações ao expor que quando um tributo ou encargo legal criado,
extinto ou alterado, após a apresentação das propostas, repercutir
nos preços, implicarão a revisão destes para mais ou para menos,
conforme o caso. É interessante, porque estamos diante da
aplicação do fato do príncipe antes mesmo da assinatura do
contrato, ainda na fase licitatória.
São manifestações que o Poder Público emite como
autoridade pública, e não como parte no contrato.
Ato geral do Estado fato do príncipe
6.2.2.4. Fato da administração
Há, porém, atos da Administração que incidem específica
e diretamente sobre um determinado contrato, retardando ou
impedindo a sua execução. Nestes casos temos o chamado fato da
administração. Incide nos casos, por exemplo, em que a
188
Administração não consegue promover a liberação de uma área
onde deveria ocorrer a construção de um hospital público.
Ato específico da Administração fato da administração
7. Espécies de contratos administrativos
São algumas modalidades de contratos administrativos:
Contrato de obra pública: é o ajuste que tem por objeto a
construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação de
um imóvel. O Poder Público quer a realização de uma obra.
Contrato de serviço: ajuste feito pela Administração para a
execução de uma atividade realizada em seu favor. O Poder
Público quer a realização de uma atividade.
Contrato de fornecimento: utilizado pela Administração para
aquisição de coisas móveis.
Contrato de concessão: é o ajuste no qual a Administração
delega ao particular a execução remunerada de serviço, de
obra ou de uso de bem público, para que explore por sua conta
e risco, por determinado prazo, condições legais e contratuais
previamente estabelecidas. Pode ser subdividido em:
1. Concessão de serviço público: previsto no art. 2º, II, da
Lei nº 8.987/95, é a delegação da prestação do serviço público,
feita pelo poder concedente (União, Estado, Distrito Federal ou
Município), mediante licitação, na modalidade de concorrência, à
pessoa jurídica ou consórcio de empresas (concessionário) que
demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco
e por prazo determinado.
2. Concessão de serviço público precedida de obra
pública: prevista, no art. 2º, III, da Lei nº 8.987/95 é a construção
total ou parcial conservação, reforma, ampliação ou melhoramento
de quaisquer obras de interesse público, delegada pelo poder
concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à
pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstra
Direito Administrativo
189
capacidade para a sua realização, por sua conta e risco, de forma
que o investimento da concessionária seja remunerado e
amortizado mediante a exploração do serviço ou da obra por prazo
determinado.
3. Concessão patrocinada: modalidade de contrato na
forma de parceria público-privada, previsto no art. 2º, § 1º, da Lei
nº 11.079/04 como sendo a concessão de serviço público ou de
obras públicas de que trata a Lei nº 8.987/95 quando envolver,
adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários, contraprestação
pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.
4. Concessão administrativa: também modalidade de
contrato na forma de parceria público-privada, previsto no art. 2º,
§2º, da Lei nº 11.079/04 como sendo o contrato de prestação de
serviço, de que a Administração Pública seja usuária direta ou
indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e
instalação de bens.
5. Concessão de uso de bem público: é o ajuste pelo qual
a Administração faculta ao particular a utilização exclusiva de um
bem público, para que este o explore segundo sua destinação.
6. Concessão de obra pública: é o ajuste realizado entre
Administração e o particular que tem por objeto a delegação da
execução e exploração de certa obra pública, para uso da
coletividade, remunerado por tarifa.
Permissão de serviço público: é um ajuste formalizado por
contrato de adesão no qual a Administração Pública delega
serviço público, a título precário, precedido de licitação, à
pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu
desempenho, por sua conta e risco.
Atenção! No contrato de concessão de obra pública o administrado é o usuário da obra que pagará pela sua utilização, enquanto no contrato de obra pública quem remunera o executor da obra é a Administração Pública.
190
Contrato de gestão: não se trata propriamente de um contrato
porque não há interesses contraditórios. É o acordo realizado
entre a Administração Pública Direta e a Administração
Pública Indireta (Autarquia ou Fundação) qualificando-as
como Agência Executiva estabelecendo objetivos, metas e
indicadores de desempenho da atividade, reduzindo custos,
otimizando e aperfeiçoando a prestação dos serviços.
O art. 37, § 8º, da CRFB/88, ampliou a possibilidade de
se firmar contrato de gestão também com órgãos públicos, preceito
de difícil aplicação prática, pois os órgãos públicos não possuem
personalidade jurídica, nem vontade própria.
Pode também ser firmado com entidade privada,
qualificando-a como Organização Social, para fomentar a execução
de atividades nas áreas de ensino, pesquisa científica,
desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio
ambiente, cultura e saúde. Em que pese possuírem a mesma
nomenclatura (contrato de gestão), não existe qualquer semelhança
entre contratos.
8. Consórcio Público
O consórcio público é uma união de Entes Federados,
que criam uma outra Pessoa Jurídica, para a realização de objetivos
e interesses comuns, integrando a Administração Indireta destes
entes. É um acordo de vontades, com objetivos e interesses
comuns, mas difícil de caracterizar como contrato.
Regulado pela Lei nº 11.107/05 (com previsão
constitucional no art. 241), o consórcio público é constituído por
um contrato, cuja celebração dependerá de prévia subscrição de
protocolo de intenções, devendo ainda ser ratificado por lei. Foi
objeto de estudo mais aprofundado no Capítulo V.
9. Convênio
Não constitui modalidade de contrato, porque neste os
interesses são opostos, enquanto no convênio os interesses são
comuns, paralelos.
Direito Administrativo
191
É um ajuste entre o Poder Público e entidade privada ou
pública para a realização de interesses comuns, mediante mútua
colaboração, termo de cooperação. Não há a criação de uma Pessoa
Jurídica, como no Consórcio Público. Possui previsão no art. 116
da Lei nº 8.666.93 que dispõe: aplicam-se as disposições desta Lei,
no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros
instrumentos congêneres celebrados por órgãos e entidades da
Administração.
A celebração de convênio, acordo ou ajuste pelos órgãos
ou entidades da Administração Pública depende de prévia
aprovação de competente plano de trabalho proposto pela
organização interessada, o qual deverá conter, no mínimo, as
seguintes informações:
Identificação do objeto a ser executado;
Metas a serem atingidas;
Etapas ou fases de execução;
Plano de aplicação dos recursos financeiros;
Cronograma de desembolso;
Previsão de início e fim da execução do objeto, bem assim da
conclusão das etapas ou fases programadas;
Se o ajuste compreender obra ou serviço de engenharia,
comprovação de que os recursos próprios para complementar
a execução do objeto estão devidamente assegurados, salvo se
o custo total do empreendimento recair sobre a entidade ou
órgão descentralizador.
Direito Administrativo
193
Capítulo VIII
SSEERRVVIIÇÇOOSS PPÚÚBBLLIICCOOSS
1. Introdução
Tomando-se por base o conceito de administração
pública, desenvolvido no primeiro capítulo, os serviços públicos
estariam inseridos no critério objetivo, material ou funcional, ou
seja, é a atividade desempenhada não só pelo Estado, órgãos e seus
agentes, mas também por concessionárias e permissionárias, por
exemplo.
Existem três correntes distintas que tentam conceituar o
que seja serviço público. A primeira delas tem por base o critério
orgânico ou subjetivo, pelo qual serviço público seria a atividade
prestada diretamente pelo Estado; pelo critério formal todo o
serviço que fosse prestado sob o regime de direito público, e pelo
critério material a atividade que atendesse às necessidades da
coletividade seria serviço público. Agregando todos os critérios,
Lúcia Valle Figueiredo (2008, p. 81) conceitua serviço público
como: toda atividade material fornecida pelo Estado, ou por quem
esteja a agir no exercício da função administrativa, se houver
permissão constitucional e legal para isso, com o fim de
implementação de deveres consagrados constitucionalmente
relacionados à utilidade pública, que deve ser concretizada, sob
regime prevalecente do Direito Público.
Já, para a autora Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p.
102), serviço público é toda atividade material que a lei atribui ao
Estado para que a exerça diretamente ou por meio de seus
delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às
necessidades coletivas, sob o regime jurídico total ou parcialmente
público.
2. Classificação
Em linhas gerais, utiliza-se a seguinte classificação para
os serviços públicos:
194
Propriamente dito: são os serviços públicos prestados pelo
Estado e que não aceitam sua delegação ou concessão a
particulares, como segurança pública, defesa nacional,
fiscalização de atividades (exercício do Poder de Polícia) e
atividade postal (Lei nº 6.538/78 - STF na ADPF nº 46/DF
entendeu como regime de monopólio pela ECT – Correios – a
atividade postal).
Próprio: aqueles prestados diretamente pelo Estado ou por
particulares colaboradores (concessionárias ou
permissionárias). Por exemplo: energia elétrica, transporte
coletivo, distribuição de água, etc.
Impróprio: mesmo atendendo às necessidades públicas, não
são assumidos (privativamente) pelo Estado. O Poder Público
aparece muito mais como um fomentador, do que um
executor. São serviços prestados por particulares, mas que
atendem a necessidades coletivas, sendo pelo Estado apenas
autorizado, regulado e fiscalizado. Exemplo: serviço de táxi,
despachante, previdência privada, ensino, saúde, etc. Em
verdade a denominação como sendo serviços públicos é
imprópria, porque são serviços de utilidade pública.
Administrativo – comercial – industrial – social: o primeiro
atende às necessidades internas da própria administração. Por
exemplo, a imprensa oficial. O segundo e o terceiro atendem
às necessidades coletivas de ordem econômica, produzindo
renda aos seus prestadores (encontrado nos arts. 170, 173,
175, 176 e 177, todos da CRFB/88). Já os sociais são aqueles
que atendem às necessidades coletivas em que a atuação do
Estado é essencial, como segurança, saúde e previdência,
muito embora conviva com a iniciativa privada.
Individuais ou ut singuli: são os serviços públicos prestados
para um número determinado de usuários. Pode-se especificar,
Atenção! As atividades de serviço público desta categoria, quando prestadas pelo Poder Público, são consideradas serviços públicos. Entretanto, quando desempenhadas por particulares são consideradas de interesse público (utilidade pública).
Direito Administrativo
195
individualizar as pessoas atendidas. É remunerado por taxa ou
tarifa (preço público). São exemplos: coleta de lixo
domiciliar, serviço telefônico, energia domiciliar, gás, etc.
Não há unanimidade na doutrina acerca da diferenciação entre
taxa e tarifa. Seguindo posicionamento que utiliza como
critério diferenciador a subjetividade, a diferença entre taxa e
tarifa se daria através de quem presta o serviço. Se o serviço
for prestado pela própria Administração dar-se-á a cobrança
de taxa. Entretanto, se os serviços públicos forem prestados
por particulares delegatários deverão ser remunerados por
tarifa ou preço público (MAFFINI, 2008, p. 177). Não
obstante a existência deste posicionamento, ainda impera na
doutrina administrativa como critério diferenciador a
compulsoriedade, sendo que os serviços utilizados de forma
compulsória deveriam ser remunerados pela taxa, enquanto os
facultativos através da tarifa (GASPARINI, 2010, p. 357;
CARVALHO FILHO, 2008, p. 319; e STJ nos REsp’s nº
840.864/SP e nº 690.609/RS). A Súmula do STF nº 545
estabelece que preços de serviços públicos e taxas não se
confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são
compulsórias e têm a sua cobrança condicionada à prévia
autorização orçamentária, em relação à lei que as instituiu.
As tarifas são fixadas contratualmente, podendo ser majoradas
por decreto, enquanto as taxas decorrem de lei, estando
sujeitas ao regime tributário, e, portanto, seus aumentos só
podendo advir de lei. À tarifa se aplica as normas do Código
de Defesa do Consumidor, ao qual no que diz respeito à taxa,
possui aplicação mais limitada.
Gerais ou ut universi: são os serviços prestados a toda
coletividade indistintamente. Abrangem um número
indeterminado ou indeterminável de pessoas. Não há como
parcelar, mensurar a quantidade de serviço prestado a cada
usuário individualmente. São remunerados por imposto ou
contribuição, porque não há vinculação entre o pagamento e
os fins a que se destinam (Súmula nº 670 do STF). São
exemplos a limpeza urbana, a iluminação pública, a segurança
pública, etc.
196
É de bom alvitre, destacar algumas decisões judiciais que
trazem à baila a questão envolvendo a classificação dos serviços,
como é o caso do REsp nº 690.609/RS e 1.062.975/RS,
respectivamente:
TRIBUTÁRIO. SERVIÇO DE FORNECIMENTO DE ÁGUA.
NATUREZA JURÍDICA. TAXA. RECURSO ESPECIAL
PROVIDO.
(...)
2. O serviço de fornecimento de água e esgoto é cobrado do usuário pela
entidade fornecedora como sendo taxa, quando tem compulsoriedade.
Trata-se, no caso em exame, de serviço público concedido, de natureza
compulsória, visando atender necessidades coletivas ou públicas.
3. Não tem amparo jurídico a tese de que a diferença entre taxa e preço
público decorre da natureza da relação estabelecida entre o consumidor
ou usuário e a entidade prestadora ou fornecedora do bem ou do serviço.
4. (...)
5. “A remuneração dos serviços de água e esgoto normalmente é feita
por taxa, em face da obrigatoriedade da ligação domiciliar à rede
pública” (Hely Lopes Meirelles, in “Direito Municipal Brasileiro”, 3a
ed., RT – 1977, p.492).
6. “Se a ordem jurídica obriga a utilização de determinado serviço, não
permitindo o atendimento da respectiva necessidade por outro meio,
então é justo que a remuneração correspondente, cobrada pelo Poder
Público, sofra as limitações próprias de tributo”. (Hugo de Brito
Machado, "in" Regime Tributário da Venda de Água, Rev. Juríd. da
Procuradoria-Geral da Fazenda Estadual/Minas Gerais, nº 05, pg. 11).
(Min. Rel. José Delgado, julgado em 28/06/05).
ADMINISTRATIVO – SERVIÇO PÚBLICO CONCEDIDO –
ENERGIA ELÉTRICA – INADIMPLÊNCIA – ALEGAÇÃO DE
OFENSA AO ART. 535, I e II, DO CPC – INEXISTÊNCIA –
DISSÍDIO NÃO CONFIGURADO – INOBSERVÂNCIA DOS
REQUISITOS DOS ARTS. 255 DO RISTJ E 541, PARÁGRAFO
ÚNICO, DO CPC.
(...)
3. Os serviços públicos podem ser próprios e gerais, sem possibilidade
de identificação dos destinatários. São financiados pelos tributos e
prestados pelo próprio Estado, tais como segurança pública, saúde,
educação, etc. Podem ser também impróprios e individuais, com
destinatários determinados ou determináveis. Neste caso, têm uso
específico e mensurável, tais como os serviços de telefone, água e
energia elétrica.
4. Os serviços públicos impróprios podem ser prestados por órgãos da
administração pública indireta ou, modernamente, por delegação, como
Direito Administrativo
197
previsto na CF (art. 175). São regulados pela Lei 8.987/95, que dispõe
sobre a concessão e permissão dos serviços públicos.
5. Os serviços prestados por concessionárias são remunerados por tarifa,
sendo facultativa a sua utilização, que é regida pelo CDC, o que a
diferencia da taxa, esta, remuneração do serviço público próprio.
6. Os serviços públicos essenciais, remunerados por tarifa, porque
prestados por concessionárias do serviço, podem sofrer interrupção
quando há inadimplência, como previsto no art. 6º, § 3º, II, da Lei
8.987/95. Exige-se, entretanto, que a interrupção seja antecedida por
aviso, existindo na Lei 9.427/97, que criou a ANEEL, idêntica previsão.
7. A continuidade do serviço, sem o efetivo pagamento, quebra o
princípio da igualdade das partes e ocasiona o enriquecimento sem
causa, repudiado pelo Direito (arts. 42 e 71 do CDC, em interpretação
conjunta).
8. (...). (Min. Rel. Eliana Calmon, julgado em 23/09/08).
3. Princípios
3.1. Princípio da eficiência
Para não se tornar repetitivo, remetemos o leitor ao que já
foi exposto no Capítulo II. O princípio da eficiência está ligado à
noção de custo-benefício, ou seja, a busca pela melhor qualidade
no serviço público, com o menor custo. Ou seja, melhor
desempenho, com menor custo, referindo-se a um ideal de
racionalização da ação (GABARDO, 2002, p. 26).
3.2. Princípio da continuidade do serviço público
Os serviços públicos não devem ser interrompidos ou
paralisados, devendo ser prestados de forma contínua. Cita-se
exemplificativamente os arts. 6º, § 1º, 35, § 3º e 39, parágrafo
único, da Lei nº 8.987/95 e arts. 58, V, e 80, I e II, da Lei nº
8.666/93.
O princípio da continuidade não impede que em
determinados momentos o serviço público não possa ser interrompido
ou suspenso, como ocorre no caso do art. 6º, § 3º, da Lei nº 8.987/95;
art. 78, XV, da Lei nº 8.666/93; art. 3º, VII e VIII da Lei º 9.472/97;
art. 40, V, da Lei nº 11.445/07, desde que atendidos determinados
requisitos, como, por exemplo, o aviso prévio do consumidor (neste
sentido o STF no RE nº 201.630/DF, no ERE nº 54.491; o STJ no
198
REsp nº 510.478/PB, no REsp nº 337.965/MG, no REsp nº
914.828/RS).
O art. 22 do Código de Defesa do Consumidor quando
determina que os órgãos públicos, por si ou suas empresas,
concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de
empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados,
eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos deve ser lido
conjuntamente com o art. 6º, § 3º, da Lei 8.987/95 (neste sentido STJ
nos REsp’s nº 858.752/RS e nº 847.878/RS e no AgRg no Ag nº
742.398/RJ).
No EREsp nº 845.982/RJ, julgado em 24/06/2009, tendo
como Min. Rel. Luiz Fux, Primeira Seção do STJ, restou pacificado
tal entendimento como assim se extrai da ementa:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE
DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. ENERGIA
ELÉTRICA. UNIDADES PÚBLICAS ESSENCIAIS, COMO
SOEM SER HOSPITAIS; PRONTO-SOCORROS; ESCOLAS;
CRECHES; FONTES DE ABASTECIMENTO D'ÁGUA E
ILUMINAÇÃO PÚBLICA; E SERVIÇOS DE SEGURANÇA
PÚBLICA. INADIMPLÊNCIA. SUSPENSÃO DO
FORNECIMENTO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL.
1. A suspensão do serviço de energia elétrica, por empresa
concessionária, em razão de inadimplemento de unidades públicas
essenciais - hospitais; pronto-socorros; escolas; creches; fontes de
abastecimento d'água e iluminação pública; e serviços de segurança
pública -, como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou
multa, despreza o interesse da coletividade.
2. É que resta assente nesta Corte que: "O princípio da continuidade do
serviço público assegurado pelo art. 22 do Código de Defesa do
Consumidor deve ser obtemperado, ante a exegese do art. 6º, § 3º, II da
Lei nº 8.987/95 que prevê a possibilidade de interrupção do
fornecimento de energia elétrica quando, após aviso, permanecer
Atenção! Existem casos, entretanto, que nem mesmo por falta de pagamento os serviços públicos podem ser interrompidos, quando se tratem de serviços essenciais e inadiáveis como saúde, segurança, educação (neste sentido STJ no REsp nº 721.119/RJ, no REsp nº 460.271/SP, no REsp nº 853.392/RS, no REsp nº 848.784/RJ).
Direito Administrativo
199
inadimplente o usuário, considerado o interesse da coletividade.
Precedentes de ambas as Turmas de Direito Público (...) " RESP
845.982/RJ.
3. Deveras, não se concebe a aplicação da legislação infraconstitucional,
in casu, art. 6.º, § 3.º, II, da Lei 8.987/95, sem o crivo dos princípios
constitucionais, dentre os quais sobressai o da dignidade da pessoa
humana, que é um dos fundamentos da República como previsto na
Constituição Federal.
4. In casu, o acórdão recorrido (RESP 845.982/RJ), de relatoria do
Ministro Castro Meira, Segunda Turma, decidiu pela impossibilidade de
interrupção no fornecimento de energia elétrica das unidades de ensino
do Colégio Pedro II, autarquia federal que presta serviço educacional,
situado na Cidade do Rio de Janeiro, consoante se infere do voto-
condutor: "(...) Entretanto, in casu, a concessionária pretende
interromper o fornecimento de energia elétrica das unidades de ensino
do Colégio Pedro II, autarquia federal que presta serviço educacional a
"aproximadamente quinze mil alunos". Ainda que a falta de pagamento
por pelos entes públicos deva ser repudiada, neste caso, a Corte regional
que, ao tempo em que proibiu o corte da energia, também determinou
que a verba seja afetada para o pagamento do valor devido, se for o
caso, pela requisição de complementação orçamentária. Nas hipóteses
em que o consumidor seja pessoa jurídica de direito público, prevalece
nesta Turma a tese de que o corte de energia é possível, desde que não
aconteça de forma indiscriminada, preservando-se as unidades públicas
essenciais (...) Ressalto que a interrupção de fornecimento de energia
elétrica de ente público somente é considerada ilegítima quando atinge
necessidades inadiáveis da comunidade, entendidas essas - por analogia
à Lei de Greve - como "aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo
iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população" (art. 11,
parágrafo único, da Lei n.º 7.783/89), aí incluídos, hospitais, prontos-
socorros, centros de saúde, escolas e creches (...)". O acórdão paradigma
(RESP 619.610/RS), de relatoria do Ministro Francisco Falcão, Primeira
Turma, examinando hipótese análoga, decidiu pela possibilidade de
corte no fornecimento de energia elétrica, em razão de inadimplência,
em se tratando de Estado-consumidor, mesmo no caso de prestação de
serviços públicos essenciais, como a educação, verbis: "(...) Com efeito,
ainda que se trate o consumidor de ente público, é cabível realizar-se o
corte no fornecimento de energia elétrica, mesmo no caso de prestação
de serviços públicos essenciais, como a educação, desde que antecedido
de comunicação prévia por parte da empresa concessionária, a teor do
art. 17 da Lei nº 9.427/96. Tal entendimento se justifica em atendimento
aos interesses da coletividade, na medida em que outros usuários
sofrerão os efeitos da inadimplência do Poder Público, podendo gerar
uma mora continuada, assim como um mau funcionamento do sistema
de fornecimento de energia (...)".
5. Embargos de Divergência rejeitados.
200
ADMINISTRATIVO. ENERGIA ELÉTRICA. INTERRUPÇÃO
DO FORNECIMENTO. PESSOA JURÍDICA DE DIREITO
PÚBLICO. INTERESSE DA COLETIVIDADE. PRESERVAÇÃO
DE SERVIÇOS ESSENCIAIS.
1. O Superior Tribunal de Justiça entende que, nos casos de
inadimplência de pessoa jurídica de direito público, é inviável a
interrupção indiscriminada do fornecimento de energia elétrica.
2. Não há que se proceder à suspensão da energia elétrica em locais
como hospitais, escolas, mercados municipais, bem como em outras
unidades públicas cuja paralisação seja inadmissível, porquanto existem
outros meios jurídicos legais para buscar a tutela jurisdicional, como a
ação de cobrança.
3. In casu, o Tribunal a quo salientou que na Municipalidade, "dada a
precariedade de suas instalações, em um único prédio, funcionam várias
Secretarias e até mesmo escolas", a suspensão do fornecimento de
energia iria de encontro ao interesse da coletividade.Agravo regimental
improvido. (STJ AgRg no REsp nº 1.142.903/AL, Min. Rel.
Humberto Martins, julgado em 13/12/10). Na mesma linha: AgRg no
AREsp 211.514/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em
18/10/2012 (informativo nº 508 STJ).
Porém ao se manifestar acerca da interrupção de energia
elétrica em hospital particular, foi noutro sentido a decisão da Corte da
Cidadania:
ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA
ELÉTRICA. HOSPITAL PARTICULAR INADIMPLENTE. CORTE NO
FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. POSSIBILIDADE. DANO
MORAL INEXISTENTE.
1. De acordo com a jurisprudência da Primeira Seção não se admite a
suspensão do fornecimento de energia elétrica em hospitais
inadimplentes, diante da supremacia do interesse da coletividade
(EREsp 845.982/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 24/06/2009,
DJe 03/08/2009).
2. Hipótese diversa nestes autos em que se cuida de inadimplência de
hospital particular, o qual funciona como empresa, com a finalidade de
auferir lucros, embutindo nos preços cobrados o valor de seus custos,
inclusive de energia elétrica.
3. Indenização por dano moral indevida porque o corte no fornecimento
do serviço foi precedido de todas as cautelas legais, restabelecendo-se o
fornecimento após, mesmo com a inadimplência de elevado valor.
4. Recurso especial conhecido e provido
(STJ, REsp nº 771.853/MT, Ministra Relatora Eliana Calmon,
julgado em 10/02/2010)
Há entendimento, ainda, do STJ no EDcl no AgRg no Ag
466.122/MS (ou REsp nº 684.442/RS, REsp nº 615.705/PR), que nos
Direito Administrativo
201
casos de miserabilidade, os serviços públicos não poderiam ser
interrompidos, uma vez que feririam a dignidade da pessoa humana,
um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, art. 1º, III, da
CRFB/88.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO
ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. CORTE DO FORNECIMENTO DE
ENERGIA ELÉTRICA. INADIMPLÊNCIA DO CONSUMIDOR.
LEGALIDADE.
(...)
3. Não obstante, ressalvo o entendimento de que o corte do
fornecimento de serviços essenciais - água e energia elétrica – como
forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa, extrapola
os limites da legalidade e afronta a cláusula pétrea de respeito à
dignidade humana, porquanto o cidadão se utiliza dos serviços públicos
posto essenciais para a sua vida, curvo-me ao posicionamento
majoritário da Seção.
4. Hodiernamente, inviabiliza-se a aplicação da legislação
infraconstitucional impermeável aos princípios constitucionais, dentre
os quais sobressai o da dignidade da pessoa humana, que é um dos
fundamentos da República, por isso que inaugura o texto constitucional,
que revela o nosso ideário como nação.
5. Em segundo lugar, a Lei de Concessões estabelece que é possível o
corte considerado o interesse da coletividade, que significa interditar o
corte de energia de um hospital ou de uma universidade, bem como o de
uma pessoa que não possui condições financeiras para pagar conta de
luz de valor módico, máxime quando a concessionária tem os meios
jurídicos legais da ação de cobrança. A responsabilidade patrimonial no
direito brasileiro incide sobre o patrimônio do devedor e, neste caso,
está incidindo sobre a própria pessoa.
6. Outrossim, é voz corrente que o 'interesse da coletividade' refere-se
aos municípios, às universidades, hospitais, onde se atingem interesses
plurissubjetivos.
7. Destarte, mister analisar que as empresas concessionárias ressalvam
evidentemente um percentual de inadimplemento na sua avaliação de
perdas, e os fatos notórios não dependem de prova (notoria nom egent
probationem), por isso que a empresa recebe mais do que experimenta
inadimplementos.
8. Esses fatos conduzem a conclusão contrária à possibilidade de corte
do fornecimento de serviços essenciais de pessoa física em situação de
miserabilidade, em contrapartida ao corte de pessoa jurídica portentosa,
que pode pagar e protela a prestação da sua obrigação, aproveitando-se
dos meios judiciais cabíveis.
9. Embargos de declaração providos, com efeitos infringentes.
202
Importante, ainda, observar que:
DIREITO ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE ÁGUA E
SERVIÇO DE ESGOTO. DÉBITOS DE CONSUMO.
RESPONSABILIDADE DO EFETIVO CONSUMIDOR.
A responsabilidade por débito relativo ao consumo de água e
serviço de esgoto é de quem efetivamente obteve a prestação do
serviço. Trata-se de obrigação de natureza pessoal, não se
caracterizando como obrigação propter rem. Assim, o inadimplemento é
do usuário que obteve a prestação do serviço, razão por que não cabe
responsabilizar o atual usuário por débito pretérito relativo ao consumo
de água de usuário anterior. Precedentes citados: REsp 1.267.302-SP,
DJe 17/11/2011 e AgRg no REsp 1.256.305-SP, DJe 19/9/2011. (AgRg
no REsp 1.313.235-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho,
julgado em 20/9/2012).
3.3. Princípio da modicidade das tarifas
Por este princípio, os serviços públicos devem ser
remunerados a preços módicos, suficientes para retribuir pelo
serviço prestado. A remuneração pelo serviço deve ser compatível
com o poder aquisitivo de seus usuários.
Expressamente previsto no art. 6º, § 1º, da Lei nº
8.987/95, é por força deste princípio que deve a prestadora do
serviço público criar fontes de receita alternativas, complementares
ou acessórias, tudo visando o barateamento dos valores cobrados
(arts. 9º a 13 da Lei nº 8.987/95).
É por esse princípio, também, que se utiliza dos
mecanismos de reajuste (decorrente de circunstâncias ordinárias,
previsíveis, como a atualização monetária) e revisão (decorrente de
situações imprevistas, extraordinárias), ambos com a finalidade de
manter o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
3.4. Princípio da generalidade
Os serviços públicos devem ser prestados tendo a maior
amplitude possível, ou seja, abrangendo o maior número de
usuários possível. Da mesma forma que devem ser prestados de
forma isonômica, igualitária: sem discriminação entre os usuários.
Direito Administrativo
203
3.5. Princípio da regularidade
Os serviços públicos devem ser prestados em quantidade
e periodicidade suficientes para atender as demandas de seus
usuários.
3.6. Princípio da atualidade
Pelo princípio da atualidade é possível que a
Administração exija a modernidade de técnicas e equipamentos,
bem como a melhoria e expansão dos serviços. É claro que não se
pode esquecer que em se tratando a concessão (ou permissão) de
contratos, qualquer exigência mais específica quanto à atualidade
poderá refletir na cláusula econômico-financeira gerando ônus para
o Estado ao fim do contrato ao para o usuário no valor da tarifa.
3.7. Princípio da segurança
Por este princípio a prestação de serviços não pode
colocar em risco a vida ou a integridade física dos usuários.
4. Formas de prestação do serviço público
A titularidade do serviço público pertence ao Estado, não
obstante, em alguns momentos ao invés de executá-los
diretamente, o faz por meio de terceiros, pertencentes
(Administração Pública Indireta) ou não (concessionárias,
permissionários ou autorizadas) ao próprio Estado.
4.1. Prestação direta
Quando a realização do serviço é efetuada diretamente
pela própria Administração Direta, através de seus órgãos ou
agentes. Acumula as funções de titular e prestador do serviço.
Ainda que a realização do serviço seja prestada diretamente pela
Administração, esta pode ser de forma desconcentrada, quando
dividida nos mais diversos órgãos que compõem a Administração
Direta, como Ministérios, Secretarias, Departamentos,
Coordenadorias (CARVALHO FILHO, 2008, p. 322; GASPARINI,
204
2006, p. 309-11). Pelo artigo 6º, VII, da Lei nº 8.666/93 é a feita pelos
órgãos e entidades da Administração, pelos próprios meios.
4.2. Prestação indireta
O Estado também pode decidir, por conveniência,
transferir a execução do serviço público para determinada pessoa
integrante ou não da Administração.
Quando a prestação do serviço é efetuada por pessoa
integrante da própria Administração (Administração Pública
Indireta) diz-se que há descentralização por outorga (por lei), em
que o Poder Público transfere a titularidade do serviço, possuindo,
portanto, caráter definitivo. São exemplos a ECT, o TRENSURB,
o IBAMA, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, etc.
Quando a prestação é feita por particular, não integrante
da Administração, diz-se que há descentralização por delegação
(por contrato ou ato administrativo), em que o Poder Público
transfere tão somente a execução do serviço, possuindo, assim,
caráter temporário.
Atenção! Existe pensamento doutrinário entendendo que tanto a Administração Direta quanto a Indireta executam de forma direta a prestação do serviço público, enquanto que se esta atividade é desempenhada por concessionárias ou permissionárias a prestação do serviço seria de forma indireta.
OUTORGA
TITULARIDADE
DEFINITIVO
LEI
Direito Administrativo
205
No que tange à prestação indireta do serviço público por
delegação, atenção mais aprofundada merecem suas espécies neste
capítulo, haja vista que a descentralização por outorga já foi objeto
de estudo no Capítulo IV.
5. Concessão de serviços públicos
Utilizando-se a conceituação trazida por Diógenes Gasparini
(2006, p. 360), concessão de serviço público é o contrato administrativo pelo qual a Administração Pública transfere, sob
condições, a execução e exploração de certo serviço público, que lhe
é privativo a um particular que para isso manifeste interesse e que
será remunerado adequadamente mediante a cobrança, dos usuários,
de tarifa previamente por ela aprovada.
É, com certeza, a concessão de serviços públicos a mais
importante forma de delegação. Aparece disciplinada pela Lei nº
8.987/95, Lei nº 9.074/95 e Lei nº 11.079/04. São normas gerais (na
Lei nº 11.079/04, pelo menos até o art. 14) editadas pela União (art.
22, XXVII da CRFB/88) que não impedem aos demais entes políticos
editarem leis específicas direcionando-as à realidade local, não
podendo, é claro, desrespeitar o estabelecido pelas normas nacionais.
Atualmente, convivem no ordenamento pátrio quatro
espécies de concessões de serviços públicos, divididas em dois
grandes grupos, quais sejam:
EXECUÇÃO
CONTRATO/ATO
TEMPORÁRIO DELEGAÇÃO
Atenção! É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios executarem obras e serviços públicos por meio de concessão ou permissão de serviço público, sem lei que lhes autorize e fixe os termos, dispensada nos casos de saneamento básico e limpeza urbana e nos casos referidos na Constituição Federal, nas Constituições Estaduais e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e Municípios, observado, em qualquer caso, os termos da Lei nº 8.987/95.
206
CONCESSÃO NA MODALIDADE PÚBLICO-PRIVADA (Lei nº 11.079/04)
Concessão administrativa
Concessão patrocinada
Definida no art. 2º, § 1º, da Lei nº 11.079/04 (que disciplinou as parcerias público-privadas), como sendo a concessão de serviço público ou de obras públicas de que trata a Lei nº 8.987/95 quando envolver, adicionalmente à tarifa cobrada dos usuários, contraprestação pecuniária do parceiro público ao parceiro privado.
Também definida na Lei nº 11.079/04, no art. 2º, § 2º, é o contrato de prestação de serviço, de que a Administração Pública seja usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens.
CONCESSÃO COMUM (Lei nº 8.987/95)
Concessão de serviço público
Concessão de serviço público precedida da execução de obra pública
Definida no art. 2º, II, da Lei nº 8.987/95, é a delegação da prestação do serviço público, feita pelo poder concedente (União, Estado, Distrito Federal ou Município), mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas (concessionário) que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado.
Definida no art. 2º, III, da Lei nº 8.987/95, é a construção, conservação, reforma, ampliação ou melhoramento de quaisquer obras de interesse público, delegada pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para a sua realização, por sua conta e risco, de forma que o investimento da concessionária seja remunerado e amortizado mediante a exploração do serviço ou da obra por prazo determinado.
Direito Administrativo
207
Mas afinal, qual a diferença da concessão patrocinada
para a concessão administrativa? Simples, na concessão
patrocinada, a tarifa cobrada do usuário é em parte subsidiada
(contraprestação pecuniária do parceiro público) pelo Poder
Público, enquanto na concessão administrativa não há esta
cobrança de tarifa do usuário.
Na concessão patrocinada uma importante observação há
de se fazer: quando mais de 70% do valor final da tarifa for
remunerado pela Administração Pública, dependerá de autorização
legislativa específica, artigo 10, § 3º, da Lei das PPP’s (espécie de
controle político realizado pelo Poder Legislativo sobre ato do
Poder Executivo).
Como observado por Aloísio Zimmer (2008, p. 287) a
Lei das Parcerias Público-Privada (PPP) ampliou o conceito de
poder concedente, estabelecido na Lei nº 8.987/95, art. 2º, I. Isso
porque a Lei implantada aplica-se não só aos órgãos da
Administração Direta, mas também aos fundos especiais, às
autarquias, às fundações públicas, às empresas públicas, às
sociedades de economia mista e às demais entidades controladas
direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e
Municípios.
5.1. Regras atinentes à licitação
A obrigatoriedade de adotar o procedimento licitatório
para a contratação de concessionárias já foi objeto de estudo
anteriormente. Três observações, ainda, são de fundamental
importância destacar.
A primeira delas diz respeito ao art. 15 da Lei nº
8.987/95, que, muito embora, tenha denominado de critérios os
requisitos ali constantes, não passam de verdadeiros tipos de
licitação. Provavelmente a lei tenha dado esse nome porque o art.
Atenção! Tanto na concessão patrocinada, quanto na administrativa, a licitação deverá ser na modalidade de concorrência (art. 10 da Lei nº 11.079/04).
208
45, § 5º, da Lei nº 8.666/93 veda a utilização de outros tipos de
licitação que não aqueles previstos (menor preço, melhor técnica,
técnica e preço e maior lance ou oferta). Da mesma forma
procedeu o art. 12, II, da Lei Nº 11.079/04, que além de adotar os
critérios previstos no art. 15 da Lei nº 8.987/95, acrescentou ainda
mais dois: menor valor da contraprestação a ser paga pela
Administração Pública e menor proposta em razão da combinação
do critério citado com o de melhor técnica.
A segunda observação refere-se à possibilidade de
inversão das fases de habilitação e classificação/julgamento, vindo
primeiro esta e depois aquela, conforme preceituam o art. 18-A da
Lei nº 8.987/95 e o art. 13 da Lei nº 11.079/04, similar ao
procedimento adotado na modalidade de licitação pregão (Lei nº
10.520/02).
E por último, nos casos de licitação que adote a
concessão na modalidade público-privada, a minuta do edital e do
contrato devem ser submetidas à consulta pública, por força do
art. 10, VI, da Lei nº 11.079/04.
A Lei nº 9.074/95, nos arts. 27, I, e 29, adotou a
modalidade de leilão nos casos de serviços públicos prestados por
pessoas jurídicas sob o controle direto ou indireto da União, para
promover a privatização simultaneamente com a outorga de nova
concessão ou com a prorrogação das concessões existentes (exceto
quanto aos serviços públicos de telecomunicações, e desde que a
necessidade da venda garantam a transferência do controle
acionário) bem como nas licitações relativas à outorga de nova
concessão com a finalidade de transferência de serviço público
prestado por pessoas jurídicas incluídas no Programa Nacional de
Desestatização (Lei nº 9.491/97).
5.2. Regras atinentes ao contrato administrativo de concessão
Em todas as espécies de concessão, a ligação com o
Poder Público (concedente) será formalizada por contrato
administrativo (art. 4º da Lei nº 8.987/95 e art. 5º da Lei nº
11.079/04). As cláusulas essenciais relativas ao contrato de
concessão estão mencionadas no art. 23 da Lei nº 8.987/95.
Direito Administrativo
209
Admite-se a subconcessão desde que prevista no
contrato, expressamente autorizada pelo poder concedente e
precedida de concorrência (arts. 25 e 26 da Lei nº 8.987/95).
Importante mencionar que a subconcessão sem prévia autorização
do poder concedente leva à decretação de caducidade da concessão
(ato administrativo vinculado).
Ressalta-se, também, que tanto na Lei nº 8.987/95, art.
23-A, quanto na Lei nº 11.079/04, art. 11, III, existe a possibilidade
de ser empregado o mecanismo de arbitragem (Lei nº 9.307/96)
para dirimir conflitos decorrentes ou relacionados ao contrato.
A Lei das Parcerias Público-Privada no art. 2º, § 4º, III,
veda a celebração de contrato que tenha por objetivo único o
fornecimento de mão de obra, o fornecimento e instalação de
equipamentos ou a execução de obra pública. Quanto a esta última
vedação, lida conjuntamente com o art. 2º, § 2º, da mesma lei,
conclui-se que a realização de obra pública deve vir sempre
acompanhada da prestação de serviço. Assim, o contrato que tenha
por objeto unicamente a construção de um hospital ou uma rodovia
deverá ser regido pela Lei nº 8.666/93. Porém, se depois da
construção, o hospital for administrado ou a rodovia for explorada
(mediante pedágio, por exemplo) pela empresa que os construiu,
então poderemos falar em contrato de concessão.
Todas as contratações devem ter prazo determinado, e no
caso específico da contratação na modalidade público-privada este
prazo não pode ser inferior a 5 nem superior a 35 anos, incluindo
eventual prorrogação (art. 5º, I, da Lei nº 11.079/04). Ademais, o
valor do contrato não poderá ser inferior a R$ 20.000.000,00 (vinte
milhões).
5.3. Intervenção
É uma medida investigatória em que o poder concedente
objetiva assegurar a adequação na prestação do serviço bem como
o fiel cumprimento das normas contratuais, regulamentares e legais
pertinentes (arts. 32 a 34 da Lei nº 8.987/95). O ato deflagrador da
intervenção é o decreto, que designa o interventor, o prazo e os
objetivos da intervenção.
210
Após declarada a intervenção, deverá ser instaurado
procedimento administrativo em até 30 dias, para comprovar as
causas determinantes da medida, bem como apurar as
responsabilidades, assegurada a ampla defesa, que deverá ser
concluído em até 180 dias, sob pena de se considerar inválida a
intervenção.
Encerrado o procedimento dois resultados podem ser
encontrados:
Nenhuma culpa contra o concessionário é apurada, caso em
que o serviço é devolvido a este, precedido de prestação de
contas pelo interventor; ou
A extinção da concessão uma vez verificada a
responsabilidade do concessionário.
A não observação da intervenção aos pressupostos legais
e regulamentares leva à declaração de nulidade da intervenção,
retornando, imediatamente, o serviço à concessionária, sem
prejuízo à indenização a que tenha direito.
5.4. Formas de extinção das concessões
Várias são as formas de extinção das concessões expostas
no art. 35 da Lei nº 8.987/95, que serão objeto de estudo
separadamente.
5.4.1. Advento do termo contratual
É a forma natural de extinção: o esgotamento do prazo da
concessão, com o retorno ao poder concedente dos bens
reversíveis, direitos e privilégios, bem como com a assunção
imediata do serviço pelo poder concedente (art. 35, I e §§ 1º, 2º e
3º da Lei nº 8.987/95). As demais formas apresentadas de extinção
da concessão dar-se-ão durante o prazo contratual da mesma.
5.4.2. Anulação
Prevista no art. 35, V, da Lei nº 8.987/95, é declarada
sempre que há vício de legalidade na licitação ou contrato da
concessão, produzindo efeito ex tunc, possuindo o mesmo sentido da
anulação estudada no capítulo referente aos atos administrativos.
Direito Administrativo
211
5.4.3. Rescisão
Única forma que a concessionária tem de extinguir uma
concessão por sua iniciativa. Vem exposta nos arts. 35, IV, e 39 da
Lei nº 8.987/95. Nada impede, porém, aparentemente, que a
Administração também se utilize deste instrumento para a extinção
contratual, ainda que o art. 39 mencione expressamente: por
iniciativa da concessionária.
Deve ter por fundamento o descumprimento das normas
contratuais pelo poder concedente (ou concessionária) e necessita
de ação judicial. Contudo, os serviços não poderão deixar de ser
prestados (interrompidos ou paralisados) pela concessionária até o
trânsito em julgado da decisão. É a aplicação do princípio da
continuidade do serviço público, e vedação da alegação da exceptio
non adimpleti contractus (art. 39 da Lei nº 8.987/95).
Não há empecilho, ao que tudo indica, que a concessão
também possa ser rescindida amigavelmente (rescisão bilateral),
por força do art. 79, II, da nº Lei 8.666/93.
5.4.4. Encampação
Também chamada de resgate (MELLO, 2002, p. 670;
MEIRELLES, 2009, p. 401) é a forma de extinção unilateral da
concessão em que prevalece o interesse público, retomando o
poder concedente, mediante lei autorizativa e após prévio
pagamento de indenização (correspondente aos investimentos
vinculados e bens reversíveis ainda não amortizados), o objeto da
concessão. Está prevista nos arts. 35, II, e 37 da Lei nº 8.987/95.
5.4.5. Caducidade
Com previsão nos artigos 35, III, e 38 da Lei nº 8.987/95,
a caducidade pode (a critério do poder concedente – ato
administrativo discricionário) ser declarada unilateralmente pelo
poder concedente sempre que haja um descumprimento das
Atenção! Não há qualquer inadimplência por parte da concessionária. Há sim um interesse da Administração em retomar o serviço concedido.
212
cláusulas contratuais ou normas legais, seja por inadimplemento,
seja por adimplemento defeituoso por parte da concessionária.
Contudo, até chegar à declaração de caducidade, o poder
concedente deve inicialmente notificar a concessionária para que,
de acordo como prazo estabelecido, corrija as falhas e/ou
transgressões apontadas. Superada esta fase, instaura-se um
processo administrativo, assegurando o direito à ampla defesa, com
o intuito de comprovar a inadimplência do concessionário. A
declaração da caducidade se dá por decreto do poder concedente, e
independentemente de prévia indenização. A indenização da
caducidade é devida, nos mesmos moldes da encampação, com a
ressalva de que não é prévia.
Há ainda a caducidade exposta no art. 27 da Lei nº
8.987/95, decretada obrigatoriamente (implicará – ato
administrativo vinculado) sempre que houver a transferência de
concessão ou do controle societário da concessionária sem prévia
anuência do poder concedente. A Lei nº 9.074/95, no art. 26,
parágrafo único, também se refere ao tema caducidade.
5.4.6. Falência ou extinção da empresa concessionária
Assim como o falecimento ou incapacidade do titular no
caso de empresa individual, a falência e extinção da empresa
concessionária (Lei nº 11.101/05, art. 195) provocam a extinção de
pleno direito do contrato de concessão, porque inviabiliza, por
óbvio, a execução do serviço púbico concedido (art. 35, VI, da Lei
nº 8.987/95). A impossibilidade de execução da atividade também
Atenção! Antes mesmo da instauração do processo administrativo de caducidade que verificará a inadimplência ou não da concessionária, o poder concedente deve comunicar detalhadamente a concessionária dos descumprimentos contratuais, concedendo-lhe prazo para corrigir as falhas e transgressões apontadas. Somente no caso de não correção é que o processo será instaurado.
Direito Administrativo
213
está consignada no art. 75 da Lei 11.101/05, porquanto a falência
implica o afastamento do devedor de suas atividades.
6. Permissão de serviços públicos
Ainda que de natureza diferente da concessão
(contratual), a permissão (ato administrativo) acabou recebendo o
mesmo tratamento pela Constituição Federal e pela legislação
infraconstitucional, ainda que pela doutrina não se confundam. A
Constituição Federal no art. 175 e a Lei nº 8.987/95, art. 2º, IV e
art. 40 atribuíram um caráter contratual às permissões de serviço
público, precedida, inclusive, de licitação.
Afirma o art. 2º, IV, da Lei nº 8.987/95 que a permissão
de serviço público é um ato precário. O art. 40 da mesma lei expõe
que pode inclusive ser revogada unilateralmente.
Entretanto é difícil imaginar esta revogação unilateral nas
permissões de serviço público, porque as revogações
(inconveniência ou inoportunidade) ocorrem em atos unilaterais e
não em contratos (os quais são objeto de rescisão). Nem imagine
que por interesse público pudesse tal revogação unilateral ocorrer,
pois a hipótese de rescisão por interesse público já vem
estabelecida no art. 35, II, da Lei nº 8.987/95, que por força do art.
40, parágrafo único, aplica-se às permissões de serviço público.
Ademais, dizer que a permissão de serviço público é ato
precário e depois afirmar que a mesma é formalizada mediante
contrato (ato bilateral) é no mínimo contraditório. Para aumentar as
confusões trazidas referentes à permissão, o parágrafo único do art.
40 da Lei 8.987/95 estende às permissões todos os dispositivos da
lei, que trabalha, detalhadamente, somente o instituto da concessão.
Atenção! As permissões de serviços públicos, ao contrário das concessões, admitem a delegação à pessoa física, não aceitando, porém, consórcio de empresas.
214
A doutrina acabou por diferenciar, então, as permissões
de serviço público, com as características trazidas tanto pela
Constituição Federal, quanto pela Lei nº 8.987/95, das permissões
de uso de bem público, que aí sim permaneceriam com as
características originais do ato administrativo permissão
(GASPARINI, 2006, p. 405).
De qualquer forma, o art. 2º, IV, da Lei nº 8.987/95
conceituou permissão de serviço público como sendo uma
delegação a título precário, mediante licitação, da prestação de
serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou
jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua
conta e risco.
Como na permissão os contratos são precários, é natural
que possam ser revogados sem direito a indenização. Porém, esta
regra possui, pontualmente, exceções:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO
ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC.
INEXISTÊNCIA. AÇÃO INDENIZATÓRIA. SERVIÇOS
LOTÉRICOS. PERMISSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO.
NATUREZA JURÍDICA. RESCISÃO UNILATERAL. DIREITO À
INDENIZAÇÃO PELOS GASTOS DE INSTALAÇÃO DA CASA
LOTÉRICA. EXISTÊNCIA DE INVESTIMENTO VULTOSO
PARA CONCRETIZAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE.
DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA DO STJ. DANOS
MATERIAIS. RECONHECIMENTO PELO TRIBUNAL DE
ORIGEM EM RAZÃO DE LAUDO PERICIAL. REEXAME DE
MATÉRIA FÁTICO PROBATÓRIA. INADEQUAÇÃO. SÚMULA
7/STJ. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO ESPECIAL
PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, NÃO
PROVIDO
(...)
3. A análise do acórdão recorrido permite asseverar que o Tribunal de
origem firmou as seguintes conclusões: a) a permissão de serviço
público é dotada de caráter discricionário e precário, o que permite a
revogação em razão de interesse público, sem ensejar indenização; b)
em casos específicos, nas hipóteses que o permissionário realizar
investimento de vulto para a exploração do serviço delegado, é possível
o reconhecimento do direito à indenização pelos referidos gastos; c) a
Caixa Econômica Federal realizou a rescisão unilateral da permissão
sem oportunizar defesa ao permissionário, tampouco indicou motivos
relevantes para justificar a medida ou atos ensejadores de
descumprimento dos termos do contrato formado entre as partes; d) o
Direito Administrativo
215
laudo pericial produzido nos autos concluiu pela existência de valores
expressivos gastos para a instalação e manutenção da casa lotérica na
qual seriam prestados os serviços objeto da permissão; e) não há falar
em indenização de dano moral da pessoa jurídica, por se tratar a rescisão
da permissão em mero dissabor da vida cotidiana; f) a indenização deve
se restringir "tão somente, aos gastos com a instalação e manutenção
pela Autora da casa lotérica destinada à prestação do serviço objeto da
permissão", cujo exatos valores serão apurados em liquidação de
sentença. 4. Efetivamente, a permissão de serviços lotéricos é caracterizada pela discricionariedade, unilateralidade e precariedade, o que autorizaria a rescisão unilateral pelo poder permissionário. Nesse sentido: REsp 705.088/SC, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 11.12.2006; REsp 821.039/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 31.8.2006. 5. Entretanto, em hipóteses específicas, como o caso dos autos, é lícito o reconhecimento ao direito à indenização por danos materiais. É incontroverso nos autos que o permissionário realizou significativo investimento para a instalação do próprio empreendimento destinado à execução do serviço público delegado, inclusive mediante atesto de padronização do poder concedente. Todavia, após poucos meses do início da atividade delegada, a Caixa Econômica Federal rescindiu unilateralmente a permissão, sem qualquer justificativa ou indicação de descumprimento contratual pelo permissionário. Assim, no caso concreto, a rescisão por ato unilateral da Administração Pública impõe ao contratante a obrigação de indenizar pelos danos materiais relacionados à instalação da casa lotérica. (...)
(REsp nº 1.021.113/RJ, Ministro Mauro Campebell, Julgado em
11/10/2011).
Há também inúmeras decisões do Superior Tribunal de
Justiça que expõem não ser devida indenização a permissionário de
serviço público de transporte coletivo por prejuízos suportados em
face de déficit nas tarifas quando ausente procedimento licitatório
prévio (EDcl no AgRg no REsp nº 1.108.628/PE, Ministro Relator
Humberto Martins, julgado em 23/03/2010). Assim é indispensável
a licitação para que se possa cogitar de indenização aos
permissionários de serviço público (de transporte coletivo) face a
tarifas deficitárias (AgRg nos EDcl no REsp 799.250/MG,
Ministro Mauro Campebell, julgado em 17/12/2009).
7. Autorização de serviços públicos
É ato administrativo discricionário (ainda que a Lei nº
9.472/97, em seu art. 131, § 1º, tenha afirmado que a autorização
seja ato administrativo vinculado), precário, pelo qual o Poder
216
Público delega a alguém (interesse privado) o exercício de certa
atividade, como exercício profissional de taxista, despachantes,
vigilância privada, funcionamento de rádio comunitária, etc. É
modalidade de serviço adequada às atividades que não exigem
execução direta pela Administração, nem mesmo grande
especialização.
Não é precedido de licitação e independe da celebração
de contrato, pois é ato administrativo (unilateral). Logo, pode ser
revogado ou modificado sumariamente, sem direito à indenização
(regra geral). Possui previsão na Carta Magna nos artigos 21, XI,
XII, e 223. Exemplificativamente, cita-se o REsp nº 958.641/PI:
RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE
SEGURANÇA. RÁDIO COMUNITÁRIA. INTERDIÇÃO.
AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO PARA FUNCIONAMENTO.
RECURSO PROVIDO.
1. Nos termos do art. 223 da CF/88, cabe ao Poder Executivo outorgar e
renovar concessão, permissão e autorização, bem como fiscalizar o
serviço de radiodifusão sonora e de sons e imagens. (...)
2. O funcionamento de rádio comunitária, ainda que de baixa
potência e sem fins lucrativos, depende de prévia autorização do
Poder Público. Outro não é o entendimento desta Corte de Justiça:
AgRg no REsp 1.074.432/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Francisco Falcão,
DJe de 17.11.2008; REsp 944.430/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana
Calmon, DJe de 15.12.2008; REsp 440.674/RN, 1ª Turma, Rel. Min.
Teori Albino Zavascki, DJ de 23.8.2004; REsp 845.751/CE, 5ª Turma,
Rel. Min. Felix Fischer, DJ de 10.9.2007; REsp 584.392/PE, 2ª Turma,
Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 25.4.2007; REsp 363.281/RN,
2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 10.3.2003.
3. (...)
4. Considerando que a legislação em vigor estabelece a competência do
Poder Executivo para autorizar, conceder e fiscalizar o serviço de
radiodifusão sonora e de sons e imagens, não pode o Poder Judiciário
imiscuir-se no âmbito da discricionariedade da Administração Pública,
deferindo pedido de funcionamento, ainda que a título precário, de rádio
comunitária. Ao Judiciário apenas é permitido, em caso de demora na
análise de requerimento administrativo de autorização para seu
funcionamento, o reconhecimento de omissão por parte da autoridade
competente, estipulando prazo razoável para que se pronuncie sobre o
respectivo requerimento. "Assim, se houve atraso na apreciação do
pedido de fundação, quanto à autorização da sua rádio, seria certo a
impetração de segurança para forçar o poder público a cumprir o seu
mister. Não pode, porém, o Judiciário, pela demora na apreciação do
Direito Administrativo
217
procedimento administrativo, chancelar a instalação de uma rádio, sem a
aferição sequer dos aspectos técnicos de funcionamento" (REsp
363.281/RN, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 10.3.2003). E
ainda: MS 7.148/DF, 1ª Seção, Rel. Min. José Delgado, DJ de
20.8.2001; REsp 983.077/SC, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe
de 27.11.2008; REsp 1.006.191/PI, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon,
Rel. p/ acórdão Min. Castro Meira, DJe de 18.12.2008. (...).
(...)
De acordo com Hely Lopes Meirelles (2009, p. 410)
serviços autorizados são aqueles que o Poder Público, por ato
unilateral, precário e discricionário, consente na sua execução por
particular para atender a interesses coletivos instáveis ou
emergência transitória. São serviços delegados e controlados pela
Administração autorizante, normalmente sem regulamentação
específica, e sujeitos, por índole, a constantes modificações. Sua
remuneração é tarifada pela Administração, dentro das
possibilidades de medida para oferecimento aos usuários. Contudo
José dos Santos Carvalho Filho tece verdadeira crítica quanto a
este conceito. Para ele a autorização é ato administrativo
discricionário e precário pelo qual a Administração consente que
o indivíduo desempenhe atividade de seu exclusivo ou
predominante interesse, não se caracterizando a atividade como
serviço público (CARVALHO FILHO, 2008, p. 414). Tratar-se-
iam de atividades de interesse privado, que necessitariam de
consentimento estatal pela necessidade de ser exercido, como, por
exemplo, o porte de arma e a retirada de águas de um rio para
plantação.
Para demonstrar que o assunto envolvendo concessão,
permissão e autorização de serviços públicos é ainda
controvertido, pega-se como exemplo o transporte autônomo de
passageiros (táxi), que podem ser explorados por concessão,
permissão ou autorização. A Lei nº 8.989/95 que dispõe sobre a
isenção de IPI para a aquisição de automóveis e utilização neste
tipo de prestação de serviço bem demonstra a confusão. Em seu
art. 1º, I, aponta que os motoristas profissionais que prestem este
tipo de serviço na condição de titular de autorização, permissão ou
concessão (...). As cooperativas de trabalho (pessoas jurídicas),
entretanto, diz o art. 1º, III, da mesma Lei, só podem prestar tal
218
serviço por permissão ou concessão (aí sim de acordo com o art.
2º, II e IV, da Lei nº 8.987/95).
No município de Porto Alegre a Lei nº 10.559/08
estabelece a classificação dos motoristas profissionais do sistema
de táxi estipulando que Taxista condutor autônomo: é a pessoa
física, proprietária de um veículo, que possui ‘permissão’ dos
órgãos municipais; Taxista empregado: é a pessoa física que
trabalha em veículo de propriedade de empresa que possui
‘permissão’ dos órgãos municipais; e, Taxista auxiliar de condutor
autônomo: pessoa física que possui ‘autorização’ para exercer a
atividade profissional. Frente à Constituição Federal de 1988 os
serviços de transporte autônomo de passageiros (táxis) parecem se
incluir naqueles constantes no artigo 30, I, na qual compete aos
Municípios legislar sobre assuntos de interesse
(preponderantemente) local.
Direito Administrativo
219
Capítulo IX
AAGGEENNTTEESS PPÚÚBBLLIICCOOSS
1. Introdução
Como pudemos ver anteriormente, o Estado, para a
execução de suas funções, pode se organizar de forma centralizada,
descentralizada ou desconcentrada. A desconcentração é a divisão
de funções em órgãos.
Órgão é a menor unidade de atuação integrante da
estrutura da Administração Pública Direta e Indireta. São fontes
abstratas, sem personalidade jurídica, que necessitam de pessoas
físicas para concretizar as atribuições que lhe são distribuídas.
2. Agentes públicos
Agentes públicos são todas as pessoas físicas, legalmente
investidas, que de algum modo exercem a função estatal (pública),
de maneira definitiva ou transitória, independentemente do vínculo
que possuem com o Estado. Assim, a expressão agentes públicos é
usada de forma genérica a todos que exercem a função pública.
Podemos encontrar algumas normas que conceituam o que seja
agentes públicos, como o art. 2º da Lei nº 8.429/92 e o art. 327 do
Código Penal, dentre outras.
Agentes de fato são pessoas que desempenham alguma
função pública (no interesse público) sem estar regularmente
investidas, levadas por erro (jamais por dolo ou malícia). No
desempenho (ainda que ilícito) desta função os agentes de fato
poderiam ser divididos em mais duas categorias: agente putativo,
pessoa que, embora investida na função pública, o foi com violação
do ordenamento jurídico desempenhando-a, no entanto, como se
regularmente tivesse sido sua investidura; e agente necessário o
qual assume o encargo público diante de um estado de necessidade
pública (MOREIRA NETO, 2009, p. 323).
220
Distinta é a figura do usurpador que se apodera da
função pública por fraude ou violência para satisfação de interesses
privados, sendo inclusive caracterizado como crime: usurpar o
exercício de função pública: pena de detenção de 3 (três) meses a
2 (dois) anos, e multa (art. 328 do Código Penal).
Ainda seguindo os ensinamentos de ilustre professor
Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2009, p. 323):
Se um servidor, embora investido em funções públicas, o foi
com violação de normas legais, desempenhando-as, entretanto,
reputadamente como agente de direito, tem-se a figura do
agente putativo, hipótese em que se privilegia a boa-fé do
administrado, respeitando a aparência de validade da
investidura.
Da falta ou deficiência da competência poderão resultar duas
linhas de consequências, tendo em vista os atos praticados
pelo servidor de fato: as introversas, nas relações do agente
com o Estado, e as extroversas, nas relações entre o Estado e
os administrados.
Na hipótese de estado de necessidade pública, e enquanto este
persistir, serão tidos como válidos os atos praticados pelo
agente necessário, se satisfizerem os requisitos legais
relativamente aos demais elementos do ato, de modo que a
emergência convalidará a competência, tanto para efeitos
externos como efeitos internos.
O problema suscitado pelo agente putativo é mais complexo,
pois, internamente, os atos padecem de vício de competência,
e assim, não produzirão efeitos enquanto não vierem a ser
objeto de sanatória. Fica ressalvada, porém, a percepção da
remuneração pelo agente, que não será devolvida, se houver
ocorrido o efetivo exercício da função, pois o Estado não pode
locupletar-se do trabalho alheio prestado de boa-fé.
Externamente, porém, em atenção à presumida boa-fé dos
administrados, como se expôs, produzir-se-ão todos os efeitos
regulares.
3. Classificação de agentes públicos
Podemos classificar os agentes públicos como:
Agentes políticos;
Agentes administrativos;
Agentes (ou particulares) em colaboração com o Estado.
Direito Administrativo
221
3.1. Agentes políticos
São as pessoas que exercem as funções políticas do
Estado, titulares de cargos que fazem parte da organização política
do País, gozando de ampla liberdade funcional, representando os
poderes do Estado. Ocupam cargos públicos que permitem escolha
de políticas públicas. São agentes políticos o Presidente da
República, Governadores, Prefeitos, e seus respectivos vices,
Vereadores, Senadores, Deputados, Ministros, Secretários.
Podemos incluir também como agentes políticos os
membros do Poder Judiciário, como Juízes e Desembargadores,
membros do Ministério Público, como Promotores e Procuradores
de Justiça, Membros dos Tribunais de Contas, como Auditores e
Conselheiros, membros dos Conselhos Nacional de Justiça e
Ministério Público e Defensores Públicos (MEIRELLES, 2009,
p.418 e o STF no RE nº 228.977/SP, no RE AgR nº 579.799/SP).
Outra parte da doutrina (CARVALHO FILHO, 2008, p. 557;
GASPARINI, 2006, p. 156) não inclui os juízes e promotores
como agentes políticos, mas sim como servidores especiais dentro
da categoria de servidores públicos.
3.2. Agentes administrativos
Servidor público (funcionário público): são agentes sujeitos
ao regime estatuário, ocupantes de cargo público. Toda pessoa
legalmente investida em cargo público. Na União são regidos
pela Lei nº 8.112/90. No Estado do Rio Grande do Sul pela
Lei Complementar nº 10.098/94. Bom destacar que não há
direito adquirido a regime jurídico (AI nº 307.918 AgR/PE).
Temporário: contratado por tempo determinado, em caráter
excepcional, com a função de atender necessidades
temporárias (art. 37, IX, da CRFB/88). É ocupante de função
pública. De acordo com a decisão do STF proferida na ADI nº
3.068/DF, a contratação de servidor temporário pode ser sem
concurso público, mas, salienta-se, como forma de exceção. A
Lei nº 8.745/93, por exemplo, em seu art. 3º, exige processo
seletivo simplificado. As ações judiciais envolvendo
servidores temporários contratados após a promulgação da
222
Constituição Federal de 1988, devem tramitar perante a
Justiça Comum, e não na Justiça do Trabalho (STF nas Rcl nº
4.489/PA, nº 5.264/DF e nº 5.171/DF).
Servidor militar: possuem vínculo estatutário próprio especial
(art. 42, caput e § 1º; art. 142, caput, e § 3º, X, da CRFB/88).
São os membros das Forças Armadas, Polícias Militares,
Corpo de Bombeiros Militares, etc.
Empregado público: são as pessoas físicas que prestam
concurso público, mas são contratadas pelo regime celetista
(trabalhista); são ocupantes de emprego público. A
contratação de pessoal nas entidades da Administração
Indireta de natureza privada (Banco do Brasil e Petrobrás, por
exemplo) se dá por este regime. As ações judiciais envolvendo
empregados públicos são julgadas na Justiça do Trabalho, e
segundo entendimento do TST para a demissão de
empregados públicos não é necessária nem motivação nem
processo administrativo, ainda que contratado mediante
concurso público (TST – Súmula nº 390, RR nº 632.808 e RR
nº 672.575).
Entretanto, se a Empresa Pública (a Empresa Brasileira
de Correios e Telégrafos – EBCT) ou Sociedade de Economia
Mista prestar serviço público (não forem exploradoras de atividade
econômica), a dispensa do empregado público deve estar
condicionada à motivação (TST na Resolução nº 143/07, que altera
a Orientação Jurisprudencial nº 247 da SDI-1). Indo além,
inclusive, o TST já anulou processo administrativo disciplinar que
culminou com a demissão do trabalhador da EBCT, por julgar que
a empresa não lhe garantiu o direito à ampla defesa (TST no
AIRR-68940-02.2008.5.11.0003, no E-RR-106/2003-042-15-00).
Tal mudança de posicionamento deu-se em virtude da decisão
proferida pelo STF no RE nº 220.906/DF que entendeu incidir
normas de direito público nas relações jurídicas da EBCT
equiparando-a a Fazenda Pública, inclusive no que tange à
impenhorabilidade dos seus bens e à sua submissão ao regime geral
de precatórios previsto no artigo 100 da Constituição. O TRT da 4ª
região, por exemplo, no Recurso Ordinário nº 00010-2008-333-04-
00-4 entendeu que os Correios só podem despedir mediante ato
Direito Administrativo
223
motivado, amparado na OJ nº 247. Em situação semelhante no
Recurso Ordinário nº 013282-2007-008-04-00-2, este mesmo
Tribunal Trabalhista considerou inválida demissão sem motivação
de empregado da Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE
(sociedade de economia mista prestadora de serviço público) por
ser ilógico ter-se uma admissão diferenciada (o concurso) e uma
despedida injustificada, o que feriria os princípios da moralidade e
da legalidade.
3.3. Agentes (ou particulares) em colaboração com o Estado
São pessoas que prestam algum serviço para o Estado,
gratuito ou oneroso, mas com ele não possuem vínculo
empregatício. Pode ser:
Por delegação: é o caso das concessionárias e
permissionárias, dos serviços notariais e de registro, leiloeiros,
tradutores e intérpretes, peritos, depositário judicial (STJ no
REsp nº 276.817/SP), etc. Também conhecidos como agentes
delegados ou agentes colaboradores por concordância. O
Atenção! A EC 19/98 alterou o art. 39 da CRFB/88 extinguindo o regime jurídico único, autorizando o Estado a contratar agentes pela CLT (empregado público). A Lei Federal nº 9.962/00, inclusive, instituiu o regime de emprego público de pessoal da Administração Federal Direta, autárquica e fundacional. Entretanto, na ADI nº 2.135/DF concedeu-se medida cautelar para suspender (com eficácia ex nunc) a redação dada pela EC 19/98 ao caput do art. 39 da CRFB/88, restabelecendo a redação anterior. Atualmente, portanto, retornou no sistema brasileiro o regime jurídico único no âmbito da União, Estados, Distrito Federal, Municípios, suas autarquias e fundações.
224
pagamento pelos serviços prestados por estes agentes é feito
pelos usuários dos mesmos.
Por requisição, compulsão ou designação: também
conhecidos com agentes honoríficos, são os jurados, os
mesários eleitorais, os recrutados para serviço militar
obrigatório, etc. Como regra não há contraprestação, razão
pela qual, inclusive, o soldo pode ser inferior a um salário
mínimo. É nesse sentido inclusive a Súmula Vinculante nº 6
do STF: não viola a Constituição da República o
estabelecimento de remuneração inferior ao salário mínimo
para os praças prestadores de serviço militar inicial.
Por animus próprio: também denominados de gestores de
negócio, ou colaboradores por vontade própria (GASPARINI,
2006, p. 166), são as pessoas que espontaneamente assumem
uma função pública em momentos de emergência,
calamidade, epidemias, catástrofes, etc.
4. Cargo, emprego e função
Tendo em vista as diversas vezes em que a Carta Magna
utiliza tais expressões é de fundamental importância saber
diferenciá-las.
Função são as atribuições, podendo ser atreladas aos
órgãos, cargos, empregos ou ainda ser autônoma (no caso da
função temporária, art. 37, IX, da CRFB/88 e função de confiança,
art. 37, V, da CRFB/88). Assim, conclui-se que pode existir função
sem cargo.
Os cargos e empregos são unidades específicas de
atribuições, criados por lei (ou resolução, no caso da Câmara e do
Senado, artigos 51, IV, e 52, XIII, da CRFB/88), localizadas no
interior dos órgãos públicos, com denominação, função e
responsabilidades próprias, previstas na estrutura organizacional,
distinguindo-se unicamente pelo regime jurídico e tipo de vínculo
que liga o agente ao Estado. Logo, não existe cargo sem função. A
Lei nº 8.112/90, em seu art. 3º, conceituou cargo como conjunto de
atribuições e responsabilidades previstas na estrutura
organizacional que devem ser cometidas a um servidor.
Direito Administrativo
225
Enquanto o funcionário público possui vínculo estatutário
(regido por estatuto funcional próprio, na União a Lei nº 8.112/90),
é titular de cargo público, o agente que possui vínculo trabalhista
contratual (regido pela CLT) é denominado empregado público e
detentor de emprego.
4.1. Organização dos cargos públicos
Os cargos públicos podem ser organizados da seguinte
forma:
Cargos de carreira: são distribuídos e escalonados em classes
(ou graus). Existe a possibilidade de ascensão profissional.
Classe: é a reunião de cargos da mesma profissão, com
idênticas atribuições, responsabilidades e vencimentos.
Constituem verdadeiros degraus de carreira.
Carreira: é o agrupamento de classes de mesma atividade
escalonada em consequência do grau de responsabilidade e
nível de complexidade das atribuições, ou seja, é o
escalonamento segundo critério de hierarquia de serviço.
Quadro: é o conjunto de carreiras ou cargos isolados de um
mesmo serviço, órgão ou Poder.
Cargos isolados: aqueles que não são escalonados em classes.
São únicos em sua categoria.
4.2. Classificação dos cargos públicos quanto ao provimento
Provimento é o ato administrativo que investe o agente
público no cargo, emprego ou função. É o preenchimento do cargo
público. A investidura em cargo público ocorre na posse (art. 7º da
Atenção! É de bom alvitre recordar que os cargos, ainda que sejam criados por lei, podem ser extintos quando vagos por decreto autônomo por força do art. 84, VI, b da CRFB/88. Quando não vagos, dependem de lei para sua extinção (art. 84, XXV da CRFB/88).
226
Lei nº 8.112/90) e é considerada ato complexo, constituída de atos
do Estado e do particular. Os cargos podem ser providos:
De forma comissionada (cargo de provimento em comissão): de
livre nomeação e exoneração. Admitem provimento sem
concurso público e têm caráter provisório (art. 37, II, segunda
parte da CRFB/88). Destinados apenas às atribuições de direção,
chefia ou assessoramento (nesse sentido o STF na ADI nº
3.706/MS), não devendo desempenhar funções técnicas,
burocráticas e de caráter permanente (fundantes dos cargos de
provimento efetivo), Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul na
ADI nº 70030248918.
De forma efetiva (cargo de provimento efetivo): são os cargos
dependentes de concurso público, adequados aos funcionários
públicos, que possuem estabilidade após o período de 3 anos
de efetivo exercício (art. 41 da CRFB/88).
De forma vitalícia (cargo de provimento vitalício): são os
cargos que asseguram vitaliciedade aos seus ocupantes.
Conferido aos integrantes do Poder Judiciário (cargo de juiz,
desembargador ou ministro, art. 95, I da CRFB/88), Ministério
Público (cargo de promotor ou procurador, art. 128, §5º, I, a,
da CRFB/88) e Tribunais de Contas (cargo de ministro ou
conselheiro).
No MS nº 9.373/DF o STJ (em 2004) entendeu que os
institutos estabilidade e estágio probatório eram distintos, pois no
estágio probatório o servidor é avaliado para apurar sua aptidão
para o exercício de um cargo determinado, mediante a verificação
de específicos requisitos legais, e deve cumprir o período
Atenção! Não confunda os termos efetividade, estabilidade e vitaliciedade. Efetividade é uma qualificação jurídica que se dá aos ocupantes de cargo efetivo, usada para distinguir dos ocupantes de cargo em comissão. Estabilidade é o direito outorgado ao servidor público de permanecer no serviço público após 3 anos de efetivo exercício e desde que tenha transposto o estágio probatório. Vitaliciedade é a garantia assegurada ao agente no cargo público após dois anos de exercício.
Direito Administrativo
227
estipulado em cada estatuto (no estatuto dos servidores públicos da
União, Lei nº 8.112/90, art. 20 é de 24 meses), não se confundindo
com a estabilidade que é o direito de permanência no serviço
público outorgado ao servidor que tenha transposto o estágio
probatório, e, portanto, o prazo de aquisição de estabilidade no
serviço público não restaria vinculado ao prazo de estágio
probatório. Nesta mesma direção foi a decisão emitida pela mesma
Corte no MS nº 12.418/DF (ano de 2008). Porém em decisão
publicada no dia 22 de abril de 2009 a Terceira Seção do STJ, no
MS nº 12.523/DF, voltou a adotar seu antigo posicionamento, qual
seja: que o estágio probatório é o período compreendido entre o
início do exercício do cargo e a aquisição da estabilidade no
serviço público. Assim sendo, o prazo do estágio probatório deve
observar a alteração promovida pela EC nº 19/98, que aumentou
para 3 anos o prazo para a aquisição da estabilidade. Assim, ainda
que institutos jurídicos distintos entre si, não há como dissociá-los,
pois estão pragmaticamente ligados.
O estágio probatório é o período em que se avalia a
aptidão do servidor para o exercício do cargo. Logo, a cada novo
concurso público realizado, o servidor é cometido a um novo
período de estágio. Durante este período o servidor é avaliado,
sendo observados os seguintes fatores:
Assiduidade;
Disciplina;
Capacidade de iniciativa; na LC/RS 10.098/94 - Eficiência
Produtividade;
Responsabilidade.
Durante o estágio, o servidor pode exercer quaisquer
cargos de provimento em comissão ou funções de direção, chefia
ou assessoramento no órgão ou entidade de lotação, e somente
poderá ser cedido a outro órgão ou entidade para ocupar cargos
de Natureza Especial, cargos de provimento em comissão do
Grupo-Direção e Assessoramento Superiores - DAS, de níveis 6, 5
e 4, ou equivalentes (art. 20, § 3º, da Lei nº 8.112/90)
Caso não seja aprovado no estágio probatório de novo
cargo, e tendo optado pela posse em outro cargo inacumulável (art.
228
33, VIII), o servidor estável no cargo anteriormente ocupado, será
para ele reconduzido (art. 29, I, da Lei 8.112/90). O STF,
entretanto, admite, também, a recondução nos casos em que o
servidor estável, durante o período de estágio probatório, opte pelo
retorno ao cargo originário (MS nº 24.543/DF, MS nº 24.271/DF e
MS nº 23.577/DF), isso por que enquanto não confirmado no
estágio do novo cargo, não estará extinta a situação anterior.
Ao servidor em estágio podem ser concedidas as
seguintes licenças e afastamentos que não suspendem o período
de estágio, segundo a Lei nº 8.112/90:
Licença para o serviço militar;
Afastamento para o exercício de mandato eletivo;
Afastamento para estudo ou missão no exterior;
Afastamento para participar de curso de formação decorrente
de aprovação em concurso para outro cargo na Administração
Pública Federal;
Licença para tratamento da própria saúde (art. 185, I, d);
Licença gestante, adotante, e paternidade (art. 185, I, e);
Licença por acidente em serviço (art. 185, I, f).
O estágio probatório fica suspenso, nos casos de:
Licença por motivo de doença em pessoa da família;
Licença por motivo de afastamento de cônjuge ou
companheiro;
Licença para atividade política;
Afastamento para servir em organismo internacional;
Participação em curso de formação.
Não podem ser concedidas ao servidor em estágio:
Licença para capacitação;
Licença para tratar de interesses particulares;
Licença para mandato classista;
Afastamento para participar de curso de pós-graduação stricto
sensu no país.
Direito Administrativo
229
4.3. Formas de provimento de cargos públicos
O provimento pode ser originário ou derivado:
4.3.1. Originário
Dá início à relação jurídica entre pessoa e Estado. Pode
ocorrer tanto pela nomeação (nos casos de cargo efetivo ou
vitalício ou cargo em comissão) quanto pela contratação (nos
casos de empregos públicos).
CONCURSO PÚBLICO. EDITAL. CONVOCAÇÃO.
In casu, trata-se de candidato aprovado em cadastro de reserva na 170ª
colocação em certame que previu apenas dez vagas no edital de
abertura. Ocorre que, embora fosse informado da necessidade de manter
seu endereço atualizado, porquanto haveria comunicação pessoal da
nomeação, somente após seu contato telefônico com o órgão é que foi
comunicado de que haviam ocorrido as nomeações, com o chamamento
realizado pelo diário oficial estadual (DOE). Sustenta que o edital do
concurso continha previsão implícita de comunicação pessoal, uma vez
que obrigava a atualização do endereço e número telefônico dos
candidatos no trecho referente à sistemática de provimento. Além disso,
alega a existência de legislação expressa (art. 51 do Decreto estadual n.
43.911/2005) no sentido de prescrever a publicação no DOE e nos
demais meios destinados a esse fim. Nesse contexto, a Turma entendeu
que, na hipótese em questão, o edital permitia antever que haveria
comunicação por carta ou outro meio, além da publicação no DOE.
Ademais, como o candidato foi aprovado na condição de compor o
cadastro de reserva, não havia como prever se haveria a real
condição de surgir vaga, bem como se seria convocado para a posse,
motivo pelo qual seria ainda mais necessário o envio de
comunicação pessoal para que pudesse exercer o seu direito à
nomeação e posse. Assim, dada a colocação do impetrante, justifica-se,
na espécie, a analogia com situações nas quais havia longo transcurso
temporal, pois foram previstas poucas vagas, não sendo possível
construir uma expectativa evidente de nomeação em curto prazo.
Precedentes citados: RMS 34.304-ES, DJe 14/9/2011, e AgRg no Ag
1.369.564-PE, DJe 10/3/2011. (AgRg no RMS 35.494-RS, Rel. Min.
Humberto Martins, julgado em 20/3/2012).
4.3.2. Derivado
Pressupõe o provimento originário. Decorre de um
vínculo anterior do agente com o Estado. Pode ocorrer por
provimento vertical, horizontal ou por reingresso.
230
4.3.2.1 Provimento derivado vertical
Há elevação funcional do servidor.
Promoção: é a elevação de um servidor de uma classe para
outra dentro da mesma carreira. Não se confunde com
progressão que é a elevação do padrão de vencimento dentro
da mesma classe. Pela Lei nº 8.112/90, art. 33, III, também é
forma de vacância do cargo público. A promoção não
interrompe o tempo de exercício (art. 17 da Lei 8.112/90). Na
Lei nº 11.416/06 que trata da carreira dos servidores do poder
judiciário da União, artigo 9º, a progressão funcional é a
movimentação do servidor de um padrão para o seguinte
dentro de uma mesma classe, observado o interstício de um
ano, sob os critérios fixados em regulamento e de acordo com
o resultado de avaliação formal de desempenho; promoção é
a movimentação do servidor do último padrão de uma classe
para o primeiro padrão da classe seguinte, observado o
interstício de um ano em relação à progressão funcional
imediatamente anterior, dependendo, cumulativamente, do
resultado de avaliação formal de desempenho e da
participação em curso de aperfeiçoamento oferecido,
preferencialmente, pelo órgão, na forma prevista em
regulamento.
Transposição ou ascensão funcional: era a passagem de uma
carreira para outra sem concurso público (ou por concurso
público interno). Não foi recepcionada pela Constituição
Federal de 1988. É matéria sumulada pelo STF no verbete
685: é inconstitucional toda a modalidade de provimento que
propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em
concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que
não integra a carreira na qual anteriormente investido.
4.3.2.2. Provimento derivado horizontal
Não implica uma elevação funcional.
Transferência: também não recepcionada pela Constituição
Federal de 1988 (STF na ADI nº 231/RJ), era a passagem de
servidor estável de cargo efetivo para outro de igual
Direito Administrativo
231
denominação pertencente a quadro de pessoal diverso, de
órgão ou instituição do mesmo Poder.
Quanto à remoção de servidores e a nomeação de novos
concursados manifestou-se o STF no MS nº 29.350/PB, julgado em
20/06/2012:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONSELHO NACIONAL DE
JUSTIÇA. DECISÃO QUE DETERMINA AO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA QUE PROCEDA À
REMOÇÃO DE SERVIDORES PREVIAMENTE À NOMEAÇÃO DE
CANDIDATOS APROVADOS EM CONCURSO PÚBLICO E
INTEGRANTES DE CADASTRO DE RESERVA. NÃO SE DECLARA
A NULIDADE PROCESSUAL DECORRENTE DA AUSÊNCIA DE
CITAÇÃO DE TODOS OS SERVIDORES INTERESSADOS,
QUANDO O MÉRITO FOR FAVORÁVEL, TAL COMO IN CASU, À
PARTE A QUEM A NULIDADE APROVEITAR (ART. 249, § 2º, DO
CPC). MODIFICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESTATUTÁRIA DOS
SERVIDORES DA JUSTIÇA PARAIBANA QUE NÃO ALTERA A
SISTEMÁTICA ADOTADA PARA A REMOÇÃO E NOMEAÇÃO DE
SERVIDORES. OBRIGATORIEDADE DA PRECEDÊNCIA DA
REMOÇÃO SOBRE A INVESTIDURA DE CONCURSADOS.
DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA
PARAIBANA NA ALOCAÇÃO DOS RESPECTIVOS RECURSOS
HUMANOS NÃO É IRRESTRITA E FICA ENTRINCHEIRADA
PELA LEI E PELO PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA
QUE ASSEGURA AOS SERVIDORES O DIREITO DE
PRECEDÊNCIA SOBRE OS CANDIDATOS APROVADOS. 1. (...) 2.
A precedência da remoção sobre a investidura de candidatos inseridos
em cadastro de reserva – e, portanto, excedentes ao número de vagas
disponibilizadas no edital do concurso em que lograram aprovação – é
obrigatória, máxime à luz do regime jurídico atualmente vigente e em
decorrência do princípio da proteção da confiança. 3. O juízo
discricionário da Administração da Justiça paraibana, sob o enfoque da
sua avaliação de conveniência e oportunidade, encarta o poder de
Atenção! Não confunda transferência (inconstitucional) com remoção ou redistribuição (constitucionais). Na remoção (art. 36 da Lei nº 8.112/90) há o deslocamento do servidor a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede. Na redistribuição (art. 37 da Lei 8.112/90) o deslocamento é do cargo (de provimento efetivo) ocupado ou vago para outro órgão ou entidade do mesmo Poder.
232
decidir quanto à alocação de seus quadros funcionais dentro dos limites
da legalidade e dos princípios constitucionais, sob pena de incidir em
arbitrariedade. 4. (...). 5. Segurança denegada, para manter o acórdão
proferido pelo Conselho Nacional de Justiça em Pedido de Providências
e consignar a existência de obrigatoriedade da precedência da remoção
de servidores públicos sobre a investidura dos Impetrantes, ficando
cassada a liminar e prejudicados os agravos regimentais.
Readaptação: é a investidura do servidor em cargo de
atribuições e responsabilidades compatíveis com a limitação
que tenha sofrido em sua capacidade física ou mental
verificada em inspeção médica (art. 24 da Lei nº 8.112/90), e
por força do art. 33, VI, também é forma de vacância do cargo
público.
4.3.2.3. Provimento derivado por reingresso
Ocorre quando o servidor que estava desligado do serviço
público ativo retorna por:
Reversão: é o retorno à atividade de servidor aposentado por
invalidez, quando junta médica oficial declarar insubsistentes
os motivos da aposentadoria ou no interesse da administração,
desde que: tenha solicitado a reversão; a aposentadoria tenha
sido voluntária; estável quando na atividade; a aposentadoria
tenha ocorrido nos cinco anos anteriores à solicitação e haja
cargo vago (art. 25 da Lei nº 8.112/90).
Aproveitamento: é o reingresso de servidor estável, que se
encontrava em disponibilidade, em cargo de atribuições e
vencimentos compatíveis com o anteriormente ocupado (art.
30 da Lei nº 8.112/90).
Reintegração: é a reinvestidura do servidor estável no cargo
anteriormente ocupado, ou no cargo resultante de sua
transformação, quando invalidada a sua demissão por decisão
(art. 28 da Lei nº 8.112/90 e 41, § 2º, da CRFB/88)
Recondução: é o retorno do servidor estável ao cargo
anteriormente ocupado por motivo de inabilitação em estágio
probatório relativo a outro cargo ou reintegração do anterior
ocupante. No caso de encontrar-se provido o cargo de origem,
o servidor será aproveitado em outro ou posto em
Direito Administrativo
233
disponibilidade (art. 29 da Lei nº 8.112/90 e 41, § 2º, da
CRFB/88).
4.4. Posse e exercício
A posse dar-se-á pela assinatura do respectivo termo de
provimento. É o ato que investe o agente de suas atribuições,
prerrogativas e responsabilidades. Também é o ato que completa a
investidura. A posse deve ocorrer até 30 dias da publicação do ato
de provimento (art. 13 da Lei nº 8.112/90).
Já o exercício é o efetivo desempenho das funções
atribuídas ao cargo ou função, e no âmbito federal, deverá ocorrer
até 15 dias da data da posse (art. 15, § 1º, da Lei nº 8.112/90). O
servidor que não entrar em exercício no prazo estabelecido será
exonerado do cargo, ou no caso de designação para o exercício de
função de confiança será tornado sem efeito o ato de sua
designação (art. 15, § 2º). No caso do exercício da função de
confiança este coincidirá com a data da publicação do ato de
designação, salvo quando o servidor estiver em licença ou afastado
por qualquer motivo legal, hipótese em que o exercício deverá
recair no primeiro dia útil após o término do impedimento, que não
poderá exceder a 30 dias da publicação.
O servidor que deva ter exercício em outro município em
razão de ter sido removido, redistribuído, requisitado, cedido ou
posto em exercício provisório (art. 37, § 4º, e 84, § 2º, da Lei nº
8.112/90) terá, no mínimo, dez e, no máximo, trinta dias de prazo,
contados da publicação do ato, para a retomada do efetivo
desempenho das atribuições do cargo, incluído nesse prazo o
tempo necessário para o deslocamento para a nova sede.
4.5. Acessibilidade a cargos, empregos e funções
De acordo com o art. 37, I, da CRFB/88, os cargos,
empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros (natos
ou naturalizados, art. 13, § 2º, da CRFB/88) que preencham os
requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na
forma da lei.
234
Está consagrado pela regra constitucional o acesso
universal, cabendo tão somente à lei estabelecer os requisitos de
acesso, não podendo, porém, restringir a determinados grupos ou
categorias. Prova desta afirmação encontra-se na própria
Constituição Federal que em seu art. 207, § 1º faculta às
universidades admitir professores, técnicos e cientistas
estrangeiros, na forma da lei, bem como o artigo 5º, § 3º, da Lei
8.112/90.
A Súmula nº 14 do STF proíbe a restrição em razão da
idade de inscrição em concurso público, por ato administrativo.
Facilmente se percebe que a restrição ao ingresso na
carreira pública somente pode ser feita mediante lei, e não
simplesmente por editais. Não foi diferente o STF ao editar as
Súmulas nº 683 e 686 que dispõem, respectivamente: o limite de
idade para a inscrição em concurso público só se legitima em face
do art. 7º XXX, da Constituição, quando possa ser justificado pela
natureza das atribuições do cargo a ser preenchido; só a lei pode
sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato em cargo
público (ainda STF no RE nº 182.432/RS e no RE nº 188.234/DF).
O Estatuto do Idoso (artigo 27 da Lei nº 10.741/03) estabelece no
mesmo sentido que: na admissão do idoso em qualquer trabalho
ou emprego, é vedada a discriminação e a fixação de limite
máximo de idade, inclusive para concursos, ressalvados os casos
em que a natureza do cargo o exigir.
O Decreto nº 3.298/99 que dispôs sobre Política Nacional
para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência trouxe
normas para a União referente ao conjunto de orientações
normativas que objetivam assegurar o pleno exercício dos direitos
individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiência.
Atenção! A lei deve reservar percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definir os critérios de sua admissão (art. 37, VIII, da CRFB/88 e STF no MS nº 26.310/DF). Na Lei nº 8.112/90 está previsto no art. 5º, § 2º.
Direito Administrativo
235
4.5.1. Cargos privativos de brasileiros natos
Ainda que a regra seja o acesso universal aos cargos,
empregos e funções públicas existem, contudo, cargos que,
segundo a Constituição Federal, são acessíveis privativamente aos
brasileiros natos (artigo 12, § 3º):
Presidente e Vice-Presidente da República;
Presidente da Câmara dos Deputados;
Presidente do Senado Federal;
Ministro do Supremo Tribunal Federal;
Carreira diplomática;
Oficial das Forças Armadas;
Ministro de Estado da Defesa.
Todas as hipóteses apresentadas possuem uma
justificativa relevante, pois envolvem a administração política do
País, sua representação no exterior ou a segurança nacional.
Além dos cargos citados, o Conselho da República, em
sua composição, deve ter a participação de seis cidadãos brasileiros
natos, com mais de trinta e cinco anos de idade (art. 89, VII, da
CRFB/88).
4.5.2. Exigência de concurso público
Como afirmando anteriormente, a lei poderá estabelecer
requisitos de acesso aos cargos públicos, desde que não incorra de
modo desarrazoado, desproporcional ou discriminatório.
A exigência de concurso público é a concretização dos
princípios da impessoalidade, moralidade, eficiência e igualdade
(STF na ADI nº 3.522/RS, no RE nº 365.368/SC; STJ no REsp nº
772.241/MG).
Conforme preceitua o art. 37, II, da CRFB/88, o ingresso
em cargo ou emprego público depende de prévia aprovação em
concurso público de provas ou de provas e títulos, conforme
previsão legal. Excluem-se desta ordem os agentes que ingressam
na Administração para cargos eletivos (como Senador, Deputados,
Presidente da República, Governador, Prefeito e seus vices, dentre
outros).
236
A própria Constituição, em alguns casos, não esperou a
edição de lei exigindo concurso público e estabelecendo seus
requisitos. Assim, a Constituição Federal passou a exigir concurso
público para o ingresso nas carreiras constantes nos arts. 93, I
(cargo de Juiz); 129, § 3º (cargo de Promotor); 131, §2º (carreira da
Advocacia Geral da União); 132 (Procurador do Estado); 134, § 1º
(Defensor Público da União, Estados e Distrito Federal) e 236, § 3º
(ingresso na atividade notarial e de registro). Para o ingresso no
cargo de Juiz e Promotor, a Constituição exigiu também, como
requisito, no mínimo 3 anos de atividade jurídica. Este requisito,
de acordo com a Resolução nº 75 do CNJ deve estar consolidado
até a data da inscrição definitiva, e não no momento da posse,
sendo vedada, para efeito de comprovação de atividade jurídica, a
contagem do estágio acadêmico ou qualquer outra atividade
anterior à obtenção do grau de bacharel em Direito.
CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 7º, CAPUT E
PARÁGRAFO ÚNICO, DA RESOLUÇÃO Nº 35/2002, COM A
REDAÇÃO DADA PELO ART. 1º DA RESOLUÇÃO Nº 55/2004,
DO CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO
DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. A norma impugnada veio
atender ao objetivo da Emenda Constitucional 45/2004 de recrutar, com
mais rígidos critérios de seletividade técnico-profissional, os
pretendentes às carreira ministerial pública. Os três anos de atividade
jurídica contam-se da data da conclusão do curso de Direito e o fraseado
"atividade jurídica" é significante de atividade para cujo desempenho se
faz imprescindível a conclusão de curso de bacharelado em Direito. O
momento da comprovação desses requisitos deve ocorrer na data da
inscrição no concurso, de molde a promover maior segurança jurídica
tanto da sociedade quanto dos candidatos. Ação improcedente. (STF –
ADI nº 3.460/DF, julgada em 31/08/2006, Min. Rel. Carlos Britto.) No mesmo sentido o próprio STF se manifestou no MS nº 27.608/DF e
o STJ no AgRg no RMS nº 25.948/CE.
Em sentido oposto, a Carta Magna possibilitou em
algumas hipóteses excepcionais a contratação independentemente
de concurso, como nos cargos em comissão de livre nomeação e
exoneração (art. 37, II, última parte da CRFB/88), para o exercício
de funções de confiança, art. 37, V, ou temporária, art. 37, IX, da
CRFB/88.
Direito Administrativo
237
Há ainda o caso de admissão, pelo Sistema Único de
Saúde, de agentes comunitários de saúde e agentes de combate
às endemias por meio de processo seletivo público (e não
concurso público), de acordo com a natureza e complexidade das
atribuições e requisitos específicos para a atuação, art. 198, § 4º,
(regulado pela Lei 11.350/06, que, por sua vez, acabou submetendo
a contratação desses agentes à CLT, e processo seletivo de provas
ou de provas e títulos).
DIREITO ADMINISTRATIVO. PRORROGAÇÃO DO PRAZO
DE VALIDADE DE CONCURSO PÚBLICO. ATO
DISCRICIONÁRIO. A prorrogação do prazo de validade de concurso
público é ato discricionário da administração, sendo vedado ao Poder
Judiciário o reexame dos critérios de conveniência e oportunidade
adotados. Precedentes citados: RMS 25.501-RS, DJe 14⁄9⁄2009; MS
9909-DF, DJ 30⁄3⁄2005. (AgRg no AREsp 128.916-SP, Rel. Min.
Benedito Gonçalves, julgado em 23/10/2012)
O prazo de validade do concurso público é de até 2 anos
(contados da sua homologação) prorrogável uma vez, por igual
período, devendo as nomeações seguir a ordem de classificação.
Não obstante o que determinada a Constituição (artigo 37, IV)
durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação,
aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e
títulos será convocado com prioridade sobre os novos concursados
para assumir cargo ou emprego, na carreira, a Lei nº 8.112/90, em
seu artigo 12, § 2º, estabelece, diferentemente, que: não se abrirá
novo concurso enquanto houver candidato aprovado em concurso
anterior com prazo de validade não expirado.
Atenção! A aprovação em concurso público, dentro do limite de vagas estabelecido no edital, gera ao aprovado direito subjetivo à nomeação (o entendimento anterior era de mera expectativa de direito) porque o edital obriga não só o candidato, mas também a própria Administração – ato vinculado (STJ no RMS nº 15.034/RS, no RMS nº 10.817/MG, no RMS nº 19.478/SP).
238
Com relação a este direito subjetivo à nomeação dos
aprovados dentro do número de vagas estabelecidas no edital
firmou posição a Suprema Corte no RE nº 598.099/MS, de
relatoria do Ministro Gilmar Mendes, julgado em 10/08/2011,
senão vejamos:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL.
CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL.
DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS. I.
DIREITO À NOMEAÇÃO. CANDIDATO APROVADO DENTRO
DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. Dentro do
prazo de validade do concurso, a Administração poderá escolher o
momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre
a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir
um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto
ao poder público. Uma vez publicado o edital do concurso com número
específico de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos
aprovados no certame cria um dever de nomeação para a própria
Administração e, portanto, um direito à nomeação titularizado pelo
candidato aprovado dentro desse número de vagas. II.
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA
JURÍDICA. BOA-FÉ. PROTEÇÃO À CONFIANÇA. O dever de
boa-fé da Administração Pública exige o respeito incondicional às
regras do edital, inclusive quanto à previsão das vagas do concurso
público. Isso igualmente decorre de um necessário e incondicional
respeito à segurança jurídica como princípio do Estado de Direito. Tem-
se, aqui, o princípio da segurança jurídica como princípio de proteção à
confiança. Quando a Administração torna público um edital de
concurso, convocando todos os cidadãos a participarem de seleção para
o preenchimento de determinadas vagas no serviço público, ela
impreterivelmente gera uma expectativa quanto ao seu comportamento
segundo as regras previstas nesse edital. Aqueles cidadãos que decidem
se inscrever e participar do certame público depositam sua confiança no
Estado administrador, que deve atuar de forma responsável quanto às
normas do edital e observar o princípio da segurança jurídica como guia
de comportamento. Isso quer dizer, em outros termos, que o
comportamento da Administração Pública no decorrer do concurso
público deve se pautar pela boa-fé, tanto no sentido objetivo quanto no
aspecto subjetivo de respeito à confiança nela depositada por todos os
cidadãos. III. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. NECESSIDADE DE
MOTIVAÇÃO. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO.
Quando se afirma que a Administração Pública tem a obrigação de
nomear os aprovados dentro do número de vagas previsto no edital,
deve-se levar em consideração a possibilidade de situações
excepcionalíssimas que justifiquem soluções diferenciadas, devidamente
motivadas de acordo com o interesse público. Não se pode ignorar que
Direito Administrativo
239
determinadas situações excepcionais podem exigir a recusa da
Administração Pública de nomear novos servidores. Para justificar o
excepcionalíssimo não cumprimento do dever de nomeação por parte da
Administração Pública, é necessário que a situação justificadora seja
dotada das seguintes características: a) Superveniência: os eventuais
fatos ensejadores de uma situação excepcional devem ser
necessariamente posteriores à publicação do edital do certame público;
b) Imprevisibilidade: a situação deve ser determinada por circunstâncias
extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação do edital; c)
Gravidade: os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis devem ser
extremamente graves, implicando onerosidade excessiva, dificuldade ou
mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das regras do edital; d)
Necessidade: a solução drástica e excepcional de não cumprimento do
dever de nomeação deve ser extremamente necessária, de forma que a
Administração somente pode adotar tal medida quando absolutamente
não existirem outros meios menos gravosos para lidar com a situação
excepcional e imprevisível. De toda forma, a recusa de nomear
candidato aprovado dentro do número de vagas deve ser devidamente
motivada e, dessa forma, passível de controle pelo Poder Judiciário. IV.
FORÇA NORMATIVA DO PRINCÍPIO DO CONCURSO
PÚBLICO. Esse entendimento, na medida em que atesta a existência de
um direito subjetivo à nomeação, reconhece e preserva da melhor forma
a força normativa do princípio do concurso público, que vincula
diretamente a Administração. É preciso reconhecer que a efetividade da
exigência constitucional do concurso público, como uma
incomensurável conquista da cidadania no Brasil, permanece
condicionada à observância, pelo Poder Público, de normas de
organização e procedimento e, principalmente, de garantias
fundamentais que possibilitem o seu pleno exercício pelos cidadãos. O
reconhecimento de um direito subjetivo à nomeação deve passar a impor
limites à atuação da Administração Pública e dela exigir o estrito
cumprimento das normas que regem os certames, com especial
observância dos deveres de boa-fé e incondicional respeito à confiança
dos cidadãos. O princípio constitucional do concurso público é
fortalecido quando o Poder Público assegura e observa as garantias
fundamentais que viabilizam a efetividade desse princípio. Ao lado das
garantias de publicidade, isonomia, transparência, impessoalidade, entre
outras, o direito à nomeação representa também uma garantia
fundamental da plena efetividade do princípio do concurso público. V.
NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO
DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO FORA
DAS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. SURGIMENTO DE
NOVAS VAGAS NO DECORRER DO PRAZO DE VALIDADE
DO CERTAME. CARGOSOCUPADOS EM CARÁTER
PRECÁRIO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO CONFIGURADO
240
NO CASO CONCRETO. PRECEDENTES DO STF E STJ.
PROVIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO.
(...)
3. A orientação jurisprudencial desta Corte Superior reconhece a
existência de direito líquido e certo à nomeação de candidatos
aprovados dentro do número de vagas previsto no edital. Por outro
lado, eventuais vagas criadas/surgidas no decorrer da vigência do
concurso público, por si só, geram apenas mera expectativa de
direito ao candidato aprovado em concurso público, pois o
preenchimento das referidas vagas está submetido à
discricionariedade da Administração Pública.
4. Entretanto, tal expectativa de direito é transformada em direito
subjetivo à nomeação do candidato aprovado se, no decorrer do prazo de
validade do edital, houver a contratação precária de terceiros para o
exercício dos cargos vagos, salvo situações excepcionais plenamente
justificadas pela Administração, de acordo com o interesse público.
5. Na hipótese examinada, a recorrente foi aprovada para o cargo de
Escrivão, fora do número de vagas previsto no edital, em regular
concurso público realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul. Além disso, é incontroverso o surgimento de novas
vagas para o referido cargo, no período de vigência do certame, as quais
foram ocupadas, em caráter precário, por meio de designação de
servidores do quadro funcional do Poder Judiciário Estadual.
6. Portanto, no caso concreto, é manifesto que a designação de
servidores públicos de seus quadros, ocupantes de cargos diversos, para
exercer a mesma função de candidatos aprovados em certame dentro do
prazo de validade, transforma a mera expectativa em direito líquido e
certo, em flagrante preterição a ordem de classificação dos candidatos
aprovados em concurso público. (STJ, RMS nº 31.847/RS, Ministro
Mauro Campbell, julgado em 22/11/2011).
Porém, quanto à nomeação tardia e decorrente de decisão
judicial, se manifestou o Superior Tribunal de Justiça:
CONCURSO PÚBLICO. INDENIZAÇÃO. SERVIDOR
NOMEADO POR DECISÃO JUDICIAL. A nomeação tardia a
cargo público em decorrência de decisão judicial não gera direito à
indenização. Com esse entendimento, a Turma, por maioria, negou
provimento ao especial em que promotora de justiça pleiteava reparação
no valor do somatório dos vencimentos que teria recebido caso sua
posse se tivesse dado em bom tempo. Asseverou o Min. Relator que o
direito à remuneração é consequência do exercício de fato do cargo.
Dessa forma, inexistindo o efetivo exercício na pendência do processo
judicial, a recorrente não faz jus à percepção de qualquer importância, a
título de ressarcimento material. Precedentes citados: EREsp 1.117.974-
RS, DJe 19/12/2011; AgRg no AgRg no RMS 34.792-SP, DJe
Direito Administrativo
241
23/11/2011. (REsp 949.072-RS, Rel. Min. Castro Meira, julgado em
27/3/2012).
Na mesma linha manifestou-se o Supremo Tribunal
Federal, no Recurso Extraordinário nº 676.774/DF, de relatoria do
Ministro Celso de Melo, julgado em 08/06/2012:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCESSÃO. EFEITOS
PATRIMONIAIS DEVIDOS SOMENTE A PARTIR DA DATA DA
IMPETRAÇÃO MANDAMENTAL. CONSEQUENTE EXCLUSÃO DE
PARCELAS PRETÉRITAS. SÚMULA 271/STF. DISCUSSÃO EM TORNO
DA EXIGIBILIDADE DE VALORES PECUNIÁRIOS ANTERIORES AO
AJUIZAMENTO DA AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA.
NECESSIDADE DE EXAME DE NORMAS DE CARÁTER
INFRACONSTITUCIONAL. INADMISSIBILIDADE. REC.
EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO. Os efeitos patrimoniais
resultantes da concessão de mandado de segurança somente abrangem
os valores devidos a partir da data da impetração mandamental,
excluídas, em consequência, as parcelas anteriores ao ajuizamento da
ação de mandado de segurança, que poderão, no entanto, ser vindicadas
em sede administrativa ou demandadas em via judicial própria.
Precedentes. Súmula 271/STF. Lei nº 12.016/2009 (art. 14, § 4º).
O debate em torno da exigibilidade de efeitos patrimoniais produzidos
em data anterior à da impetração do mandado de segurança, por implicar
exame e análise de normas de índole infraconstitucional, refoge ao
estrito domínio temático abrangido pelo recurso extraordinário.
Precedente.
Quanto à possibilidade de apreciação pelo Poder
Judiciário do conteúdo das questões do concurso, a regra é que este
entenda incabível a verificação, por tratar-se de mérito
administrativo os critérios adotados (STF no RE nº 315.007/CE).
Entretanto, o Judiciário também já entendeu que deve haver
compatibilidade entre o conteúdo das questões e os programas das
disciplinas constantes no edital (STF no RE nº 434.708/RS).
Conforme as jurisprudências abaixo citadas percebe-se que é certo
que excepcionalmente existe a possibilidade de apreciação das
questões pelo judiciário,
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. ANULAÇÃO DE
QUESTÕES DA PROVA OBJETIVA. DEMONSTRAÇÃO DA
INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO À ORDEM DE CLASSIFICAÇÃO E AOS
DEMAIS CANDIDATOS. PRINCÍPIO DA ISONOMIA OBSERVADO.
LIQUIDEZ E CERTEZA DO DIREITO COMPROVADOS. PRETENSÃO
242
DE ANULAÇÃO DAS QUESTÕES EM DECORRÊNCIA DE ERRO
GROSSEIRO DE CONTEÚDO NO GABARITO OFICIAL.
POSSIBILIDADE. CONCESSÃO PARCIAL DA SEGURANÇA. 1. A
anulação, por via judicial, de questões de prova objetiva de concurso
público, com vistas à habilitação para participação em fase posterior do
certame, pressupõe a demonstração de que o Impetrante estaria
habilitado à etapa seguinte caso essa anulação fosse estendida à
totalidade dos candidatos, mercê dos princípios constitucionais da
isonomia, da impessoalidade e da eficiência. 2. O Poder Judiciário é
incompetente para, substituindo-se à banca examinadora de concurso
público, reexaminar o conteúdo das questões formuladas e os critérios
de correção das provas, consoante pacificado na jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal. Precedentes (v.g., MS 30433 AgR/DF, Rel.
Min. GILMAR MENDES; AI 827001 AgR/RJ, Rel. Min. JOAQUIM
BARBOSA; MS 27260/DF, Rel. Min. CARLOS BRITTO, Red. para o
acórdão Min. CÁRMEN LÚCIA), ressalvadas as hipóteses em que
restar configurado, tal como in casu, o erro grosseiro no gabarito
apresentado, porquanto caracterizada a ilegalidade do ato praticado pela
Administração Pública. 3. Sucede que o Impetrante comprovou que, na
hipótese de anulação das questões impugnadas para todos os candidatos,
alcançaria classificação, nos termos do edital, habilitando-o a prestar a
fase seguinte do concurso, mediante a apresentação de prova
documental obtida junto à Comissão Organizadora no exercício do
direito de requerer certidões previsto no art. 5º, XXXIV, “b”, da
Constituição Federal, prova que foi juntada em razão de certidão
fornecida pela instituição realizadora do concurso público. 4. Segurança
concedida, em parte, tornando-se definitivos os efeitos das liminares
deferidas. (STF, MS nº 30.859/DF, Ministro Relator: Luiz Fux,
julgado em 28/08/2012).
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO.
ANULAÇÃO DE QUESTÕES DA PROVA OBJETIVA.
COMPATIBILIDADE ENTRE AS QUESTÕES E OS CRITÉRIOS
DA RESPECTIVA CORREÇÃO E O CONTEÚDO
PROGRAMÁTICO PREVISTO NO EDITAL. INEXISTÊNCIA.
IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA BANCA
EXAMINADORA PELO PODER JUDICIÁRIO. PRECEDENTES
DO STF. DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA. 1. O Poder Judiciário é
incompetente para, substituindo-se à banca examinadora de concurso
público, reexaminar o conteúdo das questões formuladas e os critérios
de correção das provas, consoante pacificado na jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal. Precedentes (v.g., MS 30433 AgR/DF, Rel.
Min. GILMAR MENDES; AI 827001 AgR/RJ, Rel. Min. JOAQUIM
BARBOSA; MS 27260/DF, Rel. Min. CARLOS BRITTO, Red. para o
acórdão Min. CÁRMEN LÚCIA). No entanto, admite-se,
excepcionalmente, a sindicabilidade em juízo da incompatibilidade entre
o conteúdo programático previsto no edital do certame e as questões
Direito Administrativo
243
formuladas ou, ainda, os critérios da respectiva correção adotados pela
banca examinadora (v.g., RE 440.335 AgR, Rel. Min. EROS GRAU, j.
17.06.2008; RE 434.708, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, j.
21.06.2005). 2. Havendo previsão de um determinado tema, cumpre ao
candidato estudar e procurar conhecer, de forma global, todos os
elementos que possam eventualmente ser exigidos nas provas, o que
decerto envolverá o conhecimento dos atos normativos e casos julgados
paradigmáticos que sejam pertinentes, mas a isto não se resumirá.
Portanto, não é necessária a previsão exaustiva, no edital, das normas e
dos casos julgados que poderão ser referidos nas questões do certame. 3.
In casu, restou demonstrado nos autos que cada uma das questões
impugnadas se ajustava ao conteúdo programático previsto no edital do
concurso e que os conhecimentos necessários para que se assinalassem
as respostas corretas eram acessíveis em ampla bibliografia, afastando-
se a possibilidade de anulação em juízo. 4. Segurança denegada,
cassando-se a liminar anteriormente concedida. (STF, MS nº
30.860/DF, Ministro Relator: Luiz Fux, julgado em 28/08/2012).
4.6. Formas de vacância de cargos públicos
É o ato ou fato administrativo que rompe a ligação entre
o Estado e o servidor público, desaparecendo o vínculo
anteriormente existente. Para os servidores públicos civis federais
vêm previstos no art. 33 da Lei nº 8.112/90.
Além do falecimento, da posse em outro cargo
inacumulável, da promoção e da readaptação, temos como forma
de vacância:
Exoneração: é o simples desligamento, sem caráter punitivo,
do servidor do quadro da Administração Pública. Pode dar-se
a pedido do servidor (em qualquer caso) ou de ofício. Quando
tratar-se de cargo efetivo a exoneração de ofício dar-se-á
quando não satisfeitas as condições do estágio probatório ou
quando, tendo tomado posse, o servidor não entrar em
exercício no prazo estabelecido – atos vinculados. Porém,
quando tratar-se de cargo em comissão ou função de
confiança a exoneração/destituição de ofício dar-se-á a juízo
da autoridade competente – ato discricionário (arts. 34 e 35 da
Lei nº 8.112/90).
Demissão: é uma penalidade imposta ao servidor decorrente
de processo administrativo disciplinar (arts. 127, III, e 132 da
Lei nº 8.112/90). É de bom alvitre destacar que a lei citada
prevê três espécies de demissão: as demissões que
244
incompatibilizam o ex-servidor para nova investidura em
cargo público federal pelo prazo de 5 anos, nas hipóteses de o
agente valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de
outrem, em detrimento da dignidade da função pública e
quando o agente atuar, como procurador ou intermediário,
junto a repartições públicas, salvo quando se tratar de
benefícios previdenciários ou assistenciais de parentes até o
segundo grau, e de cônjuge ou companheiro (art. 117, IX e XI,
c/c 137 caput), as demissões que impedem o ex-servidor de
retornar aos serviço publico federal (de constitucionalidade
questionável frente ao art. 5º, XLVII, b, da CRFB/88), nas
hipóteses de demissão por crime contra a administração
pública; improbidade administrativa; aplicação irregular de
dinheiros públicos; lesão aos cofres públicos e dilapidação do
patrimônio nacional e corrupção (art. 132, I, IV, VIII, X e XI,
c/c 137, parágrafo único) e as demissões simples, nas demais
hipóteses.
Aposentadoria: é a transferência para a inatividade
remunerada, assegurada ao servidor nos casos de invalidez,
idade ou a pedido (voluntariamente).
Foram inúmeras as mudanças nas regras de cunho
previdenciário que ocorreram na Constituição Federal de 1988 nos
últimos anos, principalmente em 1998 e 2003 (EC 19/98 e EC
41/03).
Há dois regimes previdenciários previstos na
Constituição Federal de 1988:
Regime Geral de Previdência Social (RGPS): aplicável
a todos os trabalhadores da iniciativa privada de caráter
contributivo e filiação obrigatória (art. 201 da CRFB/88).
Regime Próprio de Previdência Social (RPPS): aplicável aos servidores públicos titulares de cargos efetivos e
cargos vitalícios de caráter contributivo e solidário (arts. 40; 93,
VI; 129, § 4º, e 73, § 3º, da CRFB/88). Solidário porque tem como
fonte de custeio contribuições do ente público, servidores ativos e
inativos (julgado constitucional pelo STF a contribuição pelos
Direito Administrativo
245
inativos nas ADIs nº 3.105/DF e 3.128/DF). Aos demais agentes
ocupantes de cargo em comissão, temporário e emprego público
aplica-se o RGPS.
Existem na Constituição Federal (EC nº 41/03) três
modalidades de aposentadoria:
Compulsória;
Por invalidez permanente;
Voluntária.
A aposentadoria compulsória se impõe (ato vinculado)
aos setenta anos de idade, com proventos proporcionais ao tempo
de contribuição. Na ADI nº 2.602/MG, o STF entendeu que os
notários e registradores por não serem titulares de cargo público
efetivo, nem tampouco ocuparem cargos públicos, não estariam
alcançados pela compulsoriedade imposta pelo artigo 40, § 1º, II,
da CRFB/88:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
PROVIMENTO N. 055/2001 DO CORREGEDOR-GERAL DE
JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. NOTÁRIOS E
REGISTRADORES. REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES
PÚBLICOS. INAPLICABILIDADE. EMENDA
CONSTITUCIONAL N. 20/98. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE EM
CARÁTER PRIVADO POR DELEGAÇÃO DO PODER
PÚBLICO. INAPLICABILIDADE DA APOSENTADORIA
COMPULSÓRIA AOS SETENTA ANOS.
INCONSTITUCIONALIDADE. 1. O artigo 40, § 1º, inciso II, da
Constituição do Brasil, na redação que lhe foi conferida pela EC 20/98,
está restrito aos cargos efetivos da União, dos Estados-membros do
Distrito Federal e dos Municípios --- incluídas as autarquias e
fundações. 2. Os serviços de registros públicos, cartorários e notariais
são exercidos em caráter privado por delegação do Poder Público ---
serviço público não privativo. 3. Os notários e os registradores exercem
atividade estatal, entretanto não são titulares de cargo público efetivo,
tampouco ocupam cargo público. Não são servidores públicos, não lhes
alcançando a compulsoriedade imposta pelo mencionado artigo 40 da
CB/88 - aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade. 4. Ação
direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
Quanto à aposentadoria compulsória dos ocupantes de
cargo em comissão, não há uma posição firme e consolidada a
respeito. Nos EDcl no RMS nº 11.722/DF, julgado em 12/11/2002
246
o STJ entendeu que se aplicaria a disposição do artigo 40, §1º, II
aos ocupantes de cargo em comissão, mas difícil de afirmar que
que seja um posicionamento sólida sobre a matéria.
A aposentadoria por invalidez permanente é imposta
quando há impossibilidade absoluta de o agente continuar
exercendo suas atribuições, e inviável também a readaptação,
sendo com proventos proporcionais ao tempo de contribuição,
exceto se decorrente de acidente em serviço, moléstia profissional
ou doença grave, contagiosa ou incurável, na forma da lei.
A aposentadoria voluntária deve ser requerida pelo
servidor público que deverá ter além de 10 anos de efetivo
exercício no serviço público e 5 anos no cargo em que se dará a
aposentadoria:
Se homem: mínimo de 60 anos de idade e 35 anos de
contribuição com proventos integrais.
Se mulher: mínimo de 55 anos de idade e 30 anos de
contribuição com proventos integrais.
Se homem: 65 anos de idade com proventos proporcionais ao
tempo de contribuição.
Se mulher: 60 anos de idade com proventos proporcionais ao
tempo de contribuição.
Proventos integrais significa que no cálculo dos
proventos de aposentadoria dos servidores de cargo efetivo será
considerada a média aritmética simples das maiores remunerações,
utilizadas como base para as contribuições do servidor ao regime
de previdência correspondendo a 80% de todo o período
contributivo (art. 1º da Lei nº 10.887/04), não podendo os
proventos de aposentadoria e as pensões por ocasião da concessão
exceder a remuneração do respectivo servidor, no cargo efetivo em
que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a
concessão da pensão (art. 40, § 2º, da CRFB/88).
Direito Administrativo
247
O art. 40, § 5º, da CRFB/88 reduz em 5 anos os requisitos
de tempo de contribuição e idade para o professor que comprove
exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de
magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
Sobre a matéria o STF editou Súmula de nº 726 em que para efeito
de aposentadoria especial de professores não se computa o tempo
de serviço prestado fora da sala de aula, sendo que, entretanto, no
julgamento da ADI nº 3.772/DF a própria Corte decidiu que as
funções de direção, coordenação e assessoramento pedagógico
integram a carreira do magistério, desde que exercidos, em
estabelecimentos de ensino básico, por professores de carreira,
excluídos os especialistas em educação, fazendo jus aqueles que as
desempenham ao regime especial de aposentadoria estabelecido
nos arts. 40, § 4º, e 201, § 1º, da Constituição Federal. No mesmo
sentido STF no AI nº 802.732 AgR/SC e RE nº 552.172 AgR/SC.
É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados
para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo RPPS
ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os
casos de servidores:
Portadores de deficiência;
Que exerçam atividades de risco;
Cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que
prejudiquem a saúde ou a integridade física.
Indo no mesmo sentido das decisões dos Mandados de
Injunção acima citados, está o STF no julgamento do MI nº
833/DF (ainda não inteiramente julgado, Informativo do STF nº
594) com relação à aposentadoria especial dos Oficiais de Justiça
Atenção! No dia 15 de abril de 2009, julgando os MIs nºs 795, 797, 815 e 825, o STF permitiu que os pedidos de aposentadoria de servidores públicos que trabalham em situação de insalubridade e de periculosidade fossem concedidos de acordo com as regras do art. 57 da Lei nº 8.213/91, que regulamenta a aposentadoria especial de celetistas, isso porque a regra disposta no parágrafo 4º, do artigo 40 da Constituição Federal depende de regulamentação, que ainda não ocorreu.
248
Avaliador Federal em decorrência da omissão legislativa com
relação ao art. 40, § 4º, II, da CRFB/88. A Relatora Min. Cármen
Lúcia reconheceu a mora legislativa e a necessidade de se dar
eficácia às normas constitucionais e efetividade ao direito
alegado. Concedeu em parte a ordem para integrar a norma
constitucional e garantir a viabilidade do direito assegurado aos
substituídos do impetrante, que estejam no desempenho efetivo da
função de Oficial Avaliador, o que disposto no art. 40, § 4º, II, da
CF. Assegurou-lhes a aplicação do inciso I do art. 1º da LC 51/85,
no que couber, a partir da comprovação dos dados, em cada caso
concreto, perante a autoridade administrativa competente.
Ao encontro foi a decisão do Superior Tribunal de Justiça
no Recurso em Mandado de Segurança nº 36.806/PE, senão
vejamos:
DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO.
APOSENTADORIA ESPECIAL.
A concessão de aposentadoria especial a servidor público depende
de comprovação da efetiva nocividade da atividade realizada de
forma permanente, nos termos do art. 57 da Lei n. 8.213/1991,
enquanto não editada lei complementar que discipline o assunto. A
EC n. 20/1998 garantiu o direito à concessão de aposentadoria especial
aos servidores públicos que exerçam atividades em condições que
prejudiquem a saúde ou a integridade física. O art. 40, § 4º, da CF, com
redação dada pela EC n. 47/2005, estendeu o benefício aos servidores
com deficiência física e aos que exerçam atividades de risco, nos termos
definidos em lei complementar, ainda não editada. Assim, diante da
omissão legislativa, o STF tem reconhecido a adoção do disposto no art.
57 da Lei n. 8.213/1991 para a concessão de aposentadoria especial aos
servidores públicos. Precedente citado do STF: MI 1.683-DF, DJ
1°/10/2012. RMS 36.806-PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho,
julgado em 4/10/2012
A paridade do tratamento remuneratório dada aos
servidores públicos da ativa e os aposentados foi mitigada. Isso
porque o § 3º, do art. 40 da CRFB/88 determinou que para o
cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua
concessão, fossem consideradas as remunerações utilizadas como
base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência a
que esteve vinculado. O § 8º do mesmo artigo, inclusive,
modificou a forma de revisão dos valores dos proventos de
aposentadoria, assegurando o reajustamento dos benefícios para
Direito Administrativo
249
preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme
critérios estabelecidos em lei. A norma que disciplinou estas
alterações (introduzidas pela EC 41/03) foi a Lei nº 10.887/04.
Sentença judicial transitada em julgado: são os casos de
condenações em processos, por exemplo, de natureza penal
(art. 92 do CP) ou civil (Lei nº 8.429/92, art. 12). Previsto na
Constituição Federal no art. 41, § 1º, I, da CRFB/88.
Mediante processo administrativo assegurada ampla defesa:
aplicada como pena apurada em processo administrativo
disciplinar, como visto anteriormente (art. 41, § 1º, II da
CRFB/88).
Por procedimento de avaliação periódica de desempenho:
inspirada no princípio da eficiência, a Constituição Federal
passou a prever a perda do cargo de servidor estável
considerado ineficiente, assegurada ampla defesa e
contraditório (art. 41, III da CRFB/88). Carecedora ainda de
lei complementar regulamentando.
Em virtude do excesso de despesa com pessoal: prevista na
CRFB/88 em seu art. 169, §§ 3º e 4º, esta extinção do vínculo
ocorre quando não cumpridos os limites com despesa de
pessoal ativo e inativo. Os entes políticos devem, além de
outras medidas, exonerar os servidores não estáveis, ou, se
mesmo assim a medida for insuficiente, exonerar os
servidores estáveis.
De acordo com o art. 33 da EC nº 19/98, considera-se
servidor não estável para fins deste artigo (art. 169, § 3º, II da
CRFB/88) os agentes admitidos na administração direta, autárquica
e fundacional sem concurso público de provas e de provas e títulos
após 5 de outubro de 1983. Esta afirmação é de fundamental
importância porque de acordo com o art. 19 do ADCT os servidores
Atenção! Os ocupantes de cargos vitalícios somente perdem a vitaliciedade em decorrência de sentença judicial transitada em julgado.
250
públicos admitidos há pelo menos cinco anos continuados, sem a
prestação de concurso público previsto na forma do art. 37 da
CRFB/88, e em exercício na data da promulgação da Constituição
Federal (05/10/1988) são considerados estáveis no serviço público,
logo se enquadram na possibilidade do art. 169, § 4º, da CRFB para
fins de perda de vínculo em virtude de excesso de despesa com
pessoal.
4.7. Sistema remuneratório
Pela norma Constitucional existem três sistemas
remuneratórios dos agentes públicos: remuneração, subsídio e
salário.
A fixação dos padrões de vencimento e dos demais
componentes do sistema remuneratório observará: a natureza, o
grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos
componentes de cada carreira, os requisitos para a investidura e as
peculiaridades dos cargos.
4.7.1. Remuneração
Remuneração é o vencimento acrescido de todas as
vantagens pecuniárias (fixas ou não) percebidas pelo agente. É
bom destacar que para o autor Luiz Gustavo Bezerra de Menezes
(2009, p. 65), seguindo fielmente o que determina a Lei 8.112/90,
remuneração é a soma do vencimento mais as vantagens
pecuniárias de caráter permanente (art. 41).
Vencimento, por sua vez, é a retribuição pecuniária
básica percebida pelo exercício de cargo público, com valor fixado
em lei (art. 40 da Lei nº 8.112/90). É o que se costuma chamar de
vencimento básico ou padrão.
A fixação de vencimentos dos servidores públicos não
pode ser objeto de convenção coletiva (Súmula do STF nº 679),
afinal, sua fixação se dá através de lei. Salvo por imposição legal,
ou mandado judicial, nenhum desconto incidirá sobre a
remuneração ou provento, porém, diante de autorização do
servidor, poderá haver consignação em folha de pagamento a favor
Direito Administrativo
251
de terceiros, a critério da administração e com reposição de custos,
na forma definida em regulamento.
Vantagens pecuniárias são parcelas acrescidas ao
vencimento definidas por lei como indenizações, gratificações e
adicionais. Na Lei Complementar Estadual/RS 10.098/94, art. 85,
por exemplo, além das vantagens citadas ainda existem os avanços
(triênios), honorários e jetons. Isto prova que as vantagens
pecuniárias variam de acordo com o ente e a lei a que o servidor
está submetido.
As indenizações não têm natureza jurídica remuneratória
e não se incorporam ao vencimento. São as ajudas de custo, diárias,
transporte e auxílio moradia e destinam-se a indenizar o servidor
por gastos em razão da função. Gratificações são acréscimos
pecuniários que podem ser incorporadas, desde que prevista esta
incorporação. São retribuições por exercício de cargo em comissão
ou função de confiança e natalina (décimo terceiro). Em 2006 foi
incluída na Lei nº 8.112/90 a gratificação por encargo de curso ou
concurso e trata-se de gratificação devida ao servidor que, em
caráter eventual, atue como instrutor em curso de formação ou
treinamento, participe de banca examinadora ou comissões de
exames orais ou da logística de preparação e de realização de
concurso público, bem como da ampliação, fiscalização e avaliação
de provas de exame de vestibular ou concurso público. Os
adicionais são vantagens pecuniárias concedidas em decorrência
do tempo do serviço, do exercício de determinada função ou e de
condições peculiares de trabalho.
Hely Lopes Meirelles (2009, p. 495) aponta como
característica diferenciadora do adicional para a gratificação o fato
de aquele ser uma recompensa ao tempo de serviço do servidor, ou
uma retribuição pelo desempenho de funções especiais, e que a
gratificação é uma compensação por serviços comuns executados
em condições anormais para o servidor, ou uma ajuda pessoal em
face de certas situações que agravam o orçamento do servidor. O
adicional relaciona-se com o tempo ou com a função, a gratificação
com o serviço ou com o servidor.
252
O servidor perderá a remuneração do dia em que faltar ao
serviço, sem motivo justificado e a parcela de remuneração diária,
proporcional aos atrasos, ausências justificadas, ressalvadas as
concessões de que trata o art. 97 da Lei 8.112/90 (por 1 dia, para
doação de sangue; por 2 dias, para se alistar como eleitor; por 8
dias consecutivos em razão de: casamento, falecimento do cônjuge,
companheiro, pais, madrasta ou padrasto, filhos, enteados, menor
sob guarda ou tutela e irmãos), e saídas antecipadas, salvo na
hipótese de compensação de horário, até o mês subsequente ao da
ocorrência, a ser estabelecida pela chefia imediata.
As faltas justificadas decorrentes de caso fortuito ou de
força maior poderão ser compensadas a critério da chefia imediata,
sendo assim consideradas como efetivo exercício (artigo 44,
parágrafo único, da Lei nº 8.112/90).
4.7.2. Subsídio
Subsídio é a modalidade de retribuição pecuniária,
acrescida à CRFB/88 pela EC 19/98, fixada (e alterada) por lei
específica, em parcela única, sendo vedado o acréscimo de
qualquer vantagem pecuniária como gratificação, adicional, abono,
prêmio, anuênios, verba de representação ou qualquer outra espécie
remuneratória, salvo algumas permitidas de cunho indenizatório
como diárias, ajudas de custo e algumas gratificações, como a
natalina, por exemplo (art. 39, § 4º, da CRFB/88). A remuneração
por subsídio é exclusiva para os seguintes agentes públicos:
Chefes do Executivo, vices e auxiliares diretos (ministros e
secretários);
Parlamentares em geral (vereadores, deputados, senadores);
Membros do Poder Judiciário (juízes, desembargadores e
ministros);
Membros do Ministério Público (promotores e procuradores
de justiça);
Membros da Advocacia Geral da União, Procuradores dos
Estados e do Distrito Federal e Defensores Públicos;
Membros dos Tribunais de Contas;
Direito Administrativo
253
Servidores policiais das polícias civis e militares, das polícias
ferroviária, rodoviária e federal.
Aos demais servidores públicos organizados em carreira,
a forma de retribuição pecuniária por subsídio é facultativa,
conforme preceitua o art. 39, § 8º, da CRFB/88.
4.7.3. Salário
Além dos dois sistemas remuneratórios citados, ainda
existe o salário pago aos ocupantes de emprego público,
submetidos à CLT.
4.7.4. Limite máximo para a remuneração, subsídio e salário
A remuneração, subsídio e salário dos ocupantes de
cargos, funções e empregos públicos da administração direta,
autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos
detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os
proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos
cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de
qualquer outra natureza, não poderão exceder (teto e subtetos
nacional) o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do
Supremo Tribunal Federal.
Aplica-se como limite, nos Municípios, o subsídio do
Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal o subsídio mensal do
Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos
Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e
o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a
90,25% do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo
Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este
limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos
Defensores Públicos (art. 37, XI, da CRFB/88).
254
Além do limite estabelecido no art. 37, XI, da CRFB/88,
fica facultado aos Estados e ao Distrito Federal fixar, em seu
âmbito (subteto estadual ou distrital), mediante emenda às
respectivas Constituições e Lei Orgânica, como limite único, o
subsídio mensal dos Desembargadores do respectivo Tribunal de
Justiça, limitado a 90,25% do subsídio mensal dos Ministros do
Supremo Tribunal Federal, não se aplicando este limite aos
subsídios dos Deputados Estaduais e Distritais e dos Vereadores
(art. 37, § 12, da CRFB/88). Na Constituição Estadual do Rio
Grande do Sul, o subteto foi previsto no art. 33, § 7º.
Convém ressaltar também que o art. 17 do ADCT
determina que os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os
adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam
sendo percebidos em desacordo com a Constituição deverão ser
imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se
admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção
de excesso a qualquer título.
DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO
APOSENTADO. PROFISSIONAIS DA ÁREA DA SAÚDE.
CUMULAÇÃO DE CARGOS. TETO REMUNERATÓRIO.
A acumulação de proventos de servidor aposentado em decorrência
do exercício cumulado de dois cargos de profissionais da área de
saúde legalmente exercidos, nos termos autorizados pela CF, não se
submete ao teto constitucional, devendo os cargos ser considerados
isoladamente para esse fim. A partir da vigência da EC n. 41/2003,
todos os vencimentos percebidos por servidores públicos, inclusive os
proventos e pensões, estão sujeitos aos limites estatuídos no art. 37, XI,
da CF. Entretanto, a EC n. 41/2003 restabeleceu a vigência do art. 17 do
ADCT, que, embora em seu caput afaste a invocação do direito
adquirido ao recebimento de verbas remuneratórias contrárias à CF, em
Atenção! O art. 37, XI, da CRFB/88 não inclui as empresas públicas nem as sociedades de economia mista. Entretanto o mesmo artigo em seu § 9º estabeleceu que o inciso XI aplicar-se-ia às empresas públicas e sociedades de economia mista e suas subsidiárias que recebam recursos da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para pagamento de despesas de pessoal ou de custeio em geral.
Direito Administrativo
255
seus §§ 1º e 2º, traz exceção ao assegurar expressamente o exercício
cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de
saúde. Assim, a referida norma excepciona a incidência do teto
constitucional aos casos de acumulação de cargos dos profissionais de
saúde, devendo tais cargos ser considerados isoladamente para esse fim.
Precedente citado: RMS 33.170-DF, DJe 7/8/2012. RMS 38.682-ES,
Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18/10/2012
Por força do art. 37, § 11, da CRFB/88, não são
computadas, para efeito dos limites remuneratórios, as parcelas de
caráter indenizatório previstas em lei.
Por último, cabe destacar que os vencimentos dos cargos
do Poder Legislativo e do Poder Judiciário não poderão ser
superiores aos pagos pelo Poder Executivo.
4.7.5. Limite mínimo para a remuneração, subsídio e salário
Assim, como um limite máximo, há também um limite
mínimo para o subsídio, remuneração (e não vencimento-básico) e
salário dos agentes públicos a ser respeitado, que em nenhum
momento pode ser inferior a um salário mínimo (art. 39, § 3º, que
remete ao art. 7º, IV, da CRFB/88). Assim, nada impede que o
vencimento seja inferior a um salário mínimo. O vencimento do
cargo efetivo, acrescido das vantagens de caráter permanente, é
irredutível, art. 41, § 3º, da Lei 8.112/90. Norma semelhante há no
art. 37, XV, da CRFB/88 onde determina que o subsídio e os
vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são
irredutíveis, ressalvados o disposto nos incisos XI e XIV deste
artigo.
É entendimento do STF no RE nº 299.075/SP que a
garantia de salário mínino a que se refere o art. 7º, IV da CRFB/88
refere-se à remuneração total percebida pelo servidor, e não o
vencimento básico (art. 41, § 5º, da Lei nº 8.112/90).
Na há mais referência no artigo 39, § 3º, da CRFB/88 ao
art. 7º, VI, que garante a irredutibilidade de salários, talvez por esta
regra já estar prevista no art. 37, XV, da CRFB/88.
256
4.8. Acumulação de cargos, empregos e funções
A Constituição Federal, em seu art. 37, XVI e XVII,
proíbe a acumulação remunerada de cargos, empregos e funções
públicas, abrangendo tal vedação às autarquias, fundações,
empresas públicas, sociedades de economia mista, suas
subsidiárias e sociedades controladas, direta ou indiretamente, pelo
poder público, exceto quando houver compatibilidade de horários:
De dois cargos de professor;
De um cargo de professor com outro técnico ou científico (que
exija conhecimentos profissionais especializados para o seu
desempenho, neste sentido STF no AI-AgR nº 192.918/DF);
De dois cargos ou empregos privativos de profissionais de
saúde, com profissões regulamentadas.
DIREITO ADMINISTRATIVO. NOTÁRIO. ACUMULAÇÃO INDEVIDA
DE CARGO, EMPREGO OU FUNÇÃO PÚBLICA.
A atividade de notário é inacumulável com qualquer cargo,
emprego ou função pública, ainda que em comissão, mesmo que o
servidor esteja no gozo de férias ou licença remunerada. O status de
servidor público, que não é desconfigurado pelo fato de o servidor estar
no gozo de férias ou licenças, é incompatível com a atividade de notário
nos termos do art. 25 da Lei n. 8.935/1994. (RMS 38.867-AC, Rel.
Min. Humberto Martins, julgado em 18/10/2012).
RECURSO DE REVISTA. ACUMULAÇÃO DE CARGOS
PÚBLICOS. PROFISSIONAL DE SAÚDE. COMPATIBILIDADE
DE HORÁRIOS.
1. A Constituição da República, em seu artigo 37, XVI, -c-, dispõe que é
possível a acumulação de dois cargos públicos pelo profissional de
saúde, desde que a profissão seja regulamentada e exista
compatibilidade de horários.
2. No entanto, na hipótese dos autos, verifica-se que o acúmulo de
cargos exigiria da Reclamante trabalho com carga horária de setenta e
duas horas semanais. Significa que a Autora teria que trabalhar de
segunda-feira a sábado, seis vezes por semana, cumprindo jornada de
doze horas. Portanto, verifica-se que a Reclamante pleiteia o acúmulo de
cargos com carga horária de trabalho muito superior ao limite
constitucional e legal estabelecido. Tal situação caracterizaria jornada de
trabalho exaustiva, em ofensa à legislação trabalhista vigente.
3. O Tribunal de Contas da União, em razão da competência do art.
71, III, da Constituição da República, tem se manifestado no sentido
de que o limite máximo de jornada de trabalho em casos de
Direito Administrativo
257
acumulação de cargos ou empregos públicos é de 60 (sessenta) horas
semanais. Precedentes da Corte de Contas.
4. Por todo o exposto, pode-se concluir que o requisito da
compatibilidade de que trata o texto constitucional para acumulação de
dois cargos públicos não deve ser interpretado meramente com base na
colisão de horários. Deve considerar, também, a possibilidade efetiva de
cumprimento de jornada, sem prejuízo ao desempenho do cargo ou à
saúde do trabalhador.
Recurso de Revista não conhecido.
(TST, RR - 76300-34.2009.5.04.0007, Julgamento: 23/11/2011,
Relator: Sebastião Geraldo de Oliveira).
Ainda, conforme preceitua o art. 17, §§ 1º e 2º, do
ADCT, é assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou
empregos privativos de médico que estivessem sendo exercidos por
médico militar na administração pública direta ou indireta e o
exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de
profissionais de saúde que estivessem sendo exercidos na
administração pública direta ou indireta quando da promulgação da
Constituição. Em qualquer dos casos citados deve-se observar o
limite máximo de remuneração do art. 37, XI, da CRFB/88.
Os magistrados e promotores não podem exercer
qualquer outra função pública, salvo uma função de magistério
(arts. 95, parágrafo único, I, e 128, § 5º, II, d, da CRFB/88).
Quanto à possibilidade ou não de o servidor público da
administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de
mandato eletivo, acumular cargo, emprego ou função, aplicam-se
as seguintes disposições (art. 38 da CRFB/88):
Atenção! Por força do art. 37, § 10, da CRFB/88, é vedada, também, a percepção simultânea de proventos de aposentadoria decorrentes de regime jurídico próprio com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis possíveis na ativa (art. 37, XVI, da CRFB/88), os cargos eletivos e os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração.
258
Tratando-se de mandato eletivo federal, estadual ou distrital,
ficará afastado do seu cargo, emprego ou função;
Investido no mandato de prefeito, será afastado do cargo,
emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela sua
remuneração (sobre a impossibilidade de o vice-prefeito
utilizar-se deste benefício, STF no RE nº 140.269/RJ);
Investido no mandato de vereador, havendo compatibilidade
de horários, perceberá as vantagens do seu cargo, emprego ou
função, sem prejuízo da remuneração do cargo eletivo, e, não
havendo compatibilidade, será aplicada a regra do item anterior.
Em qualquer caso que exija o afastamento para o
exercício de mandato eletivo, seu tempo de serviço será contado
para todos os efeitos legais, exceto para promoção por
merecimento e para efeito de benefício previdenciário: no caso de
afastamento, os valores serão determinados como se no exercício
estivesse.
Na Lei nº 8.112/90 as regras relativas à acumulação de
cargos estão nos arts. 119 e 120. No primeiro caso o servidor não
pode exercer mais de um cargo em comissão, exceto na hipótese de
interinidade, hipótese em que deverá optar pela remuneração de um
dos cargos (art. 9º, parágrafo único, da Lei 8.112/90). No segundo,
o servidor que cumular licitamente dois cargos efetivos, quando
investido em cargo de provimento em comissão, ficará afastado de
ambos os cargos, salvo na hipótese em que houver compatibilidade
de horário e local com o exercício de um deles.
4.9. Licenças e afastamentos
As licenças são períodos autorizados de afastamento do
agente público com ou sem perda da remuneração, contando como
de efetivo exercício ou não. Algumas são concedidas ex officio. Já
outras, somente a pedido, podendo inclusive ser negado este
requerimento. Licença é a permissão para se ausentar do serviço
durante determinado espaço de tempo.
Estão previstas na Lei nº 8.112/90 em dois locais
distintos. Primeiro no Capítulo IV do Título III, capítulo este que
trata especificamente das licenças e no Título VI quando refere-se
Direito Administrativo
259
à seguridade social do servidor. Assim, podemos concluir que as
licenças podem ser concedidas decorrentes do Plano de Seguridade
Social do servidor como a licença para tratamento de interesse de
saúde, da licença-gestante, adotante e paternidade e a licença por
acidente de serviço, sendo as demais, não decorrentes de tal Plano
de Seguridade.
4.10. Disponibilidade e aproveitamento
Segundo determina a Constituição Federal de 1988,
extinto o cargo ou declarada a sua desnecessidade, o servidor
estável ficará em disponibilidade, com remuneração
proporcional ao tempo de serviço, até seu adequado
aproveitamento em outro cargo. Ficará, também, em
disponibilidade com remuneração proporcional ao tempo de
serviço, o servidor estável, que ocupe cargo de servidor que tenha
sido reintegrado, quando não possa ser reconduzido ao cargo de
origem ou aproveitado em outro cargo.
O art. 28, § 1º, da Lei nº 8.112/90 estabelece que sendo
reintegrado o servidor estável (com ressarcimento de todas as
vantagens), e na hipótese de o cargo ter sido extinto, o servidor
ficará em disponibilidade.
A remuneração do servidor em disponibilidade será
proporcional ao seu tempo de serviço, considerando-se, para o
respectivo cálculo, um trinta e cinco avos da respectiva
remuneração mensal, por ano de serviço, se homem, e um trinta
avos, se mulher.
O Decreto nº 3.151/99 disciplinou a prática dos atos de
extinção e de declaração de desnecessidade de cargos públicos,
bem assim a dos atos de colocação em disponibilidade remunerada
e de aproveitamento de servidores públicos em decorrência da
extinção ou da reorganização de órgãos ou entidades da
Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional.
Autorizada por lei, a extinção de cargo público far-se-á
mediante ato privativo do Presidente da República (decreto), que
deverá verificar a existência de cargos sujeitos à declaração de
desnecessidade (em decorrência da extinção ou da reorganização
260
de órgão ou de entidade), devendo adotar, separada ou
cumulativamente, os seguintes critérios de análise, pertinentes à
situação pessoal dos respectivos ocupantes, para fins de
disponibilidade:
Menor tempo de serviço;
Maior remuneração;
Idade menor;
Menor número de dependentes.
Na Lei Complementar/RS 10.098/94, artigo 65, o
servidor em disponibilidade tem o período contado para efeito de
aposentadoria ou nova disponibilidade. O Superior Tribunal de
Justiça nunca enfrentou propriamente o tema, se o tempo em que o
servidor permaneceu em disponibilidade conta ou não como tempo
de efetivo exercício. Duas decisões são encontradas, porém, com
posições diversas:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO
FEDERAL. HORAS EXTRAS. LIMITE MÁXIMO DE 2 (DUAS)
HORAS. ART. 74 DA LEI 8.112/90. ANUÊNIOS. INDEVIDOS.
PERÍODO EM QUE O SERVIDOR ESTEVE EM DISPONIBILIDADE.
RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Consoante
inteligência do art. 74 da Lei 8.112/90, a prestação de serviço
extraordinário limita-se ao máximo de 2 (horas) diárias. 2. O período
em que o servidor público esteve em disponibilidade não deve ser
computado para fins de pagamento de anuênios, uma vez que, nos
termos do art. 102 da Lei 8.112/90, não se enquadra nas hipóteses
de afastamento consideradas como efetivo exercício. 3. Recurso
especial conhecido e improvido. (REsp nº 425.787/RN, Relator
Ministro Arnaldo Esteves Lima, Julgado em 17/08/2006).
PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - RECURSO
ESPECIAL - NORMA LEGAL APONTADA COMO VIOLADA
NÃO DEBATIDA NA INSTÂNCIA DE ORIGEM - FALTA DE
Atenção! O art. 10 do Decreto nº 3.151/99 delegou a competência aos Ministros de Estado e ao Advogado-Geral da União para a prática dos atos de declaração de desnecessidade de cargos públicos e de colocação dos respectivos ocupantes em disponibilidade remunerada, não admitindo a sua subdelegação.
Direito Administrativo
261
PREQUESTIONAMENTO - NÃO CONHECIMENTO -
SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL - DISPONIBILIDADE -
TEMPO COMPUTADO PARA FINS DE LICENÇA-PRÊMIO -
POSSIBILIDADE. 1 - Não enseja interposição de Recurso Especial
matéria que não foi ventilada no julgado atacado e sobre a qual a parte
não opôs os embargos declaratórios competentes, restando, portanto,
sem o devido prequestionamento (art. 15 da Lei nº 8.112/90). Aplica-
se, à espécie, a Súmula 356 do Pretório Excelso. 2 - O tempo do
servidor público federal em disponibilidade deve ser contado para
todos os fins. O instituto deve proporcionar ao servidor,
compulsória e temporariamente afastado de suas funções, todos os
direitos e garantias que teria se estivesse em pleno exercício. In
casu, o recorrido esteve em disponibilidade, porque o cargo que
exercia foi extinto, o que decorreu de ato unilateral da
Administração Pública, não podendo o mesmo sofrer qualquer
prejuízo. Ademais, a disponibilidade não está prevista dentre as
hipóteses do art. 88 da Lei nº 8.112/90, que, se ocorridas no
período aquisitivo da licença-prêmio, impedem a concessão desta.
3 - Precedente (REsp nº 173.092/AL). 4 - Recurso conhecido, nos
termos acima expostos, porém, desprovido (REsp. nº 584.214/RN,
Relator Ministro Jorge Scartezzini, julgado em 01/06/2004).
Presente a necessidade da Administração, o
aproveitamento (retorno) do servidor em disponibilidade, far-se-á
em cargo de atribuições, vencimentos, nível de escolaridade,
especialidade ou habilitação profissional compatíveis com o cargo
anteriormente ocupado. Será tornado sem efeito, porém, o
aproveitamento e cassada a disponibilidade se o servidor não entrar
em exercício no prazo legal, salvo doença comprovada por junta
médica oficial.
4.11. Direitos, deveres e responsabilidade dos agentes públicos
O art. 39, § 3º da CRFB/88, estendeu aos servidores
públicos alguns direitos atribuídos aos trabalhadores da iniciativa
privada, tais como:
Salário mínimo;
Garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que
percebem remuneração variável;
Décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou
no valor da aposentadoria;
262
Remuneração do trabalho noturno superior a do diurno;
Salário-família pago em razão do dependente do trabalhador
de baixa renda nos termos da lei;
Duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e
quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de
horários e a redução da jornada, mediante acordo ou
convenção coletiva de trabalho;
Repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos;
Remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo,
em cinquenta por cento a do normal;
Gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço
a mais do que o salário normal. Com relação a férias não
gozadas, já se manifestou o STF no RE nº 570.908/RN, no
seguinte sentido:
DIREITOS CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR
PÚBLICO ESTADUAL. CARGO COMISSIONADO. EXONERAÇÃO.
FÉRIAS NÃO GOZADAS: PAGAMENTO ACRESCIDO DO TERÇO
CONSTITUCIONAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL DO BENEFÍCIO.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO EM LEI. JURISPRUDÊNCIA DESTE
SUPREMO TRIBUNAL. RECURSO AO QUAL SE NEGA
PROVIMENTO. 1. O direito individual às férias é adquirido após o
período de doze meses trabalhados, sendo devido o pagamento do terço
constitucional independente do exercício desse direito. 2. A ausência de
previsão legal não pode restringir o direito ao pagamento do terço
constitucional aos servidores exonerados de cargos comissionados que
não usufruíram férias. 3. O não pagamento do terço constitucional
àquele que não usufruiu o direito de férias é penalizá-lo duas vezes:
primeiro por não ter se valido de seu direito ao descanso, cuja finalidade
é preservar a saúde física e psíquica do trabalhador; segundo por vedar-
lhe o direito ao acréscimo financeiro que teria recebido se tivesse
usufruído das férias no momento correto. 4. Recurso extraordinário não
provido.
Licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com
a duração de cento e vinte dias;
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. RECURSO
ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDORA
PÚBLICA. DISPENSA DE FUNÇÃO COMISSIONADA NO
GOZO DE LICENÇA-MATERNIDADE. ESTABILIDADE
PROVISÓRIA. PROTEÇÃO À MATERNIDADE. OFENSA.
RECURSO PROVIDO.
Direito Administrativo
263
1. (...).
2. O Supremo Tribunal Federal tem aplicado a garantia constitucional à
estabilidade provisória da gestante não apenas às celetistas, mas também
às militares e servidoras públicas civis.
3. Na hipótese, muito embora não se afaste o caráter precário do
exercício de função comissionada, não há dúvida de que a ora
recorrente, servidora pública estadual, foi dispensada porque se
encontrava no gozo de licença maternidade. Nesse cenário, tem-se que a
dispensa deu-se com ofensa ao princípio de proteção à maternidade.
Inteligência dos arts. 6º e 7º, inc. XVIII, da Constituição Federal e 10,
inc. II, letra "b", do ADCT.
4. Recurso ordinário provido.
(STJ no RMS nº 22,361/RJ, julgado em 08/11/2007, Min. Rel.
Arnaldo Esteves Lima).
Licença-paternidade, nos termos fixados em lei;
Proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante
incentivos específicos, nos termos da lei;
Redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas
de saúde, higiene e segurança;
Proibição de diferença de salários, de exercício de funções e
de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou
estado civil.
Além dos direitos enumerados, o art. 37 da CRFB/88,
conferiu, também, aos servidores públicos civis o direito à livre
associação sindical e o direito de greve (vedados aos servidores
militares na forma do art. 142, § 3º, IV, da CRFB/88).
No caso do direito de greve, a Constituição Federal
condicionou seu exercício aos termos e limites definidos em lei
específica. Esta lei específica não foi editada, até hoje, o que
acabou por gerar inúmeras ações perante o STF, que mudando
entendimento anterior pronunciou-se nos Mandados de Injunção
números 670/ES, 708/DF e 712/PA, de forma a garantir o direito
de greve aos servidores, aplicando, no que coubesse, a Lei nº
7.783/89 (dispõe sobre o direito de greve na iniciativa privada).
1. Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Parágrafo único do art. 1º
do Decreto estadual n.° 1.807, publicado no Diário Oficial do Estado
de Alagoas de 26 de março de 2004. 3. Determinação de imediata
264
exoneração de servidor público em estágio probatório, caso seja
confirmada sua participação em paralisação do serviço a título de
greve. 4. Alegada ofensa do direito de greve dos servidores públicos
(art. 37, VII) e das garantias do contraditório e da ampla defesa (art.
5º, LV). 5. Inconstitucionalidade. 6. O Supremo Tribunal Federal, nos
termos dos Mandados de Injunção n.ºs 670/ES, 708/DF e 712/PA, já
manifestou o entendimento no sentido da eficácia imediata do direito
constitucional de greve dos servidores públicos, a ser exercício por
meio da aplicação da Lei n.º 7.783/89, até que sobrevenha lei
específica para regulamentar a questão. 7. Decreto estadual que viola a
Constituição Federal, por (a) considerar o exercício não abusivo do
direito constitucional de greve como fato desabonador da conduta do
servidor público e por (b) criar distinção de tratamento a servidores
públicos estáveis e não estáveis em razão do exercício do direito de
greve. 8. Ação julgada procedente. (STF, ADI nº 3.235/AL, julgada
em 04/02/2010, Min. Rel. Carlos Velloso).
Não obstante este posicionamento, na Rcl nº 6.568/SP,
julgada em 21/09/09, o Min. Eros Roberto Grau, estabeleceu uma
exceção para os casos de servidores públicos que exerçam
atividades relacionadas à manutenção da ordem pública e à
segurança pública, à administração da Justiça - aí os integrados
nas chamadas carreiras de Estado, que exercem atividades
indelegáveis, inclusive as de exação tributária - e à saúde pública.
Nestes casos a prestação dos serviços se imporia em sua plenitude,
em sua totalidade.
RECLAMAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. POLICIAIS CIVIS.
DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. SERVIÇOS OU
ATIVIDADES PÚBLICAS ESSENCIAIS. COMPETÊNCIA
PARA CONHECER E JULGAR O DISSÍDIO. ARTIGO 114,
INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIREITO DE
GREVE. ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO
BRASIL. LEI N. 7.783/89. INAPLICABILIDADE AOS
SERVIDORES PÚBLICOS. DIREITO NÃO ABSOLUTO.
RELATIVIZAÇÃO DO DIREITO DE GREVE EM RAZÃO DA
ÍNDOLE DE DETERMINADAS ATIVIDADES PÚBLICAS.
AMPLITUDE DA DECISÃO PROFERIDA NO JULGAMENTO
DO MANDADO DE INJUNÇÃO N. 712. ART. 142, § 3º, INCISO
IV, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INTERPRETAÇÃO DA
CONSTITUIÇÃO. AFRONTA AO DECIDIDO NA ADI 3.395.
INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA
DIRIMIR CONFLITOS ENTRE SERVIDORES PÚBLICOS E
ENTES DA ADMINISTRAÇÃO ÀS QUAIS ESTÃO
VINCULADOS. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE. 1.
Direito Administrativo
265
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MI n. 712, afirmou
entendimento no sentido de que a Lei n. 7.783/89, que dispõe sobre o
exercício do direito de greve dos trabalhadores em geral, é ato
normativo de início inaplicável aos servidores públicos civis, mas ao
Poder Judiciário dar concreção ao artigo 37, inciso VII, da
Constituição do Brasil, suprindo omissões do Poder Legislativo. 2.
Servidores públicos que exercem atividades relacionadas à
manutenção da ordem pública e à segurança pública, à administração
da Justiça --- aí os integrados nas chamadas carreiras de Estado, que
exercem atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária --- e
à saúde pública. A conservação do bem comum exige que certas
categorias de servidores públicos sejam privadas do exercício do
direito de greve. Defesa dessa conservação e efetiva proteção de
outros direitos igualmente salvaguardados pela Constituição do Brasil.
3. Doutrina do duplo efeito, segundo Tomás de Aquino, na Suma
Teológica (II Seção da II Parte, Questão 64, Artigo 7). Não há dúvida
quanto a serem, os servidores públicos, titulares do direito de greve.
Porém, tal e qual é lícito matar a outrem em vista do bem comum, não
será ilícita a recusa do direito de greve a tais e quais servidores
públicos em benefício do bem comum. Não há mesmo dúvida quanto
a serem eles titulares do direito de greve. A Constituição é, contudo,
uma totalidade. Não um conjunto de enunciados que se possa ler
palavra por palavra, em experiência de leitura bem comportada ou
esteticamente ordenada. Dela são extraídos, pelo intérprete, sentidos
normativos, outras coisas que não somente textos. A força normativa
da Constituição é desprendida da totalidade, totalidade normativa, que
a Constituição é. Os servidores públicos são, seguramente, titulares do
direito de greve. Essa é a regra. Ocorre, contudo, que entre os serviços
públicos há alguns que a coesão social impõe sejam prestados
plenamente, em sua totalidade. Atividades das quais dependam a
manutenção da ordem pública e a segurança pública, a administração
da Justiça --- onde as carreiras de Estado, cujos membros exercem
atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária --- e a saúde
pública não estão inseridos no elenco dos servidores alcançados por
esse direito. Serviços públicos desenvolvidos por grupos armados: as
atividades desenvolvidas pela polícia civil são análogas, para esse
efeito, às dos militares, em relação aos quais a Constituição
expressamente proíbe a greve [art. 142, § 3º, IV]. 4. No julgamento da
ADI 3.395, o Supremo Tribunal Federal, dando interpretação
conforme ao artigo 114, inciso I, da Constituição do Brasil, na redação
a ele conferida pela EC 45/04, afastou a competência da Justiça do
Trabalho para dirimir os conflitos decorrentes das relações travadas
entre servidores públicos e entes da Administração à qual estão
vinculados. Pedido julgado procedente.
266
Ainda que garantido o direito de greve seguindo a Lei
geral nº 7.783/89, é plenamente possível o descontos dos dias
parados:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR
PÚBLICO. GREVE. DESCONTO DOS DIAS PARADOS.
POSSIBILIDADE.
1. O direito de greve, nos termos do art. 37, VII, da Constituição
Federal, é assegurado aos servidores públicos, não sendo ilegítimos,
porém, os descontos efetuados em razão dos dias não trabalhados.
Precedentes.
2. Agravo regimental a que se nega provimento
(AgRg no RMS nº30.188/RS, Ministro ADILSON VIEIRA
MACABU, 17/04/2012)
ADMINISTRATIVO. DIREITO DE GREVE DE SERVIDORES
PÚBLICOS. DESCONTO DE VENCIMENTOS PELOS DIAS
PARADOS. POSSIBILIDADE. DECISÃO MONOCRÁTICA DO
RELATOR. ARTIGO 557, § 1º-A, DO CPC.
1. (...).
2. Esta Corte assentou a compreensão de que, embora o direito de greve
seja constitucionalmente assegurado, é legítimo o desconto relativo aos
dias não trabalhados.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp nº 1.145.471/SC, Ministro HAROLDO
RODRIGUES, 09/08/2011)
Cumpre esclarecer que o direito de greve constante no
art. 37, VII, da CRFB/88 não se estende aos empregados públicos,
que exercem este direito com base no art. 9º da CRFB/88.
Além dos direitos constitucionalmente garantidos, cada
estatuto prevê direitos e vantagens aos seus servidores. No caso
dos servidores civis da União, na Lei nº 8.112/90, no Título III, no
caso dos servidores do Estado do Rio Grande do Sul, na Lei
Complementar nº 10.098/94, também no Título III.
Quanto aos deveres e proibições, da mesma forma, cada
estatuto possui a sua previsão (na Lei nº 8.112/90, nos arts. 116 e
117). Entretanto, alguns destes deveres são previstos pela própria
Constituição, como a responsabilidade pelos atos de improbidade,
a obrigação de ressarcir o erário nos casos de dolo ou culpa em
Direito Administrativo
267
ação regressiva quando o agente causar danos a terceiros, dentre
outros.
Os agentes públicos estão sujeitos às responsabilidades
civis, penais e administrativas pelo exercício irregular de suas
atribuições, podendo cumularem-se, sendo independentes entre si.
(arts. 121 e 125 da Lei nº 8.112/90), desta forma, inclusive, se
manifestou o STF no MS nº 21.708/DF. Contudo, a
responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso
de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua
autoria (art. 126 da Lei nº 8.112/90), em cumprimento, inclusive, à
segurança jurídica, como pode se extrair da decisão ora citada:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
POLICIAL MILITAR DO ESTADO DE PERNAMBUCO.
ACUSAÇÃO DE HOMICÍDIO. EXCLUSÃO DA CORPORAÇÃO.
SUPERVENIENTE SENTENÇA CRIMINAL ABSOLUTÓRIA
COM BASE NO MESMO FATO. NEGATIVA DE AUTORIA.
INEGÁVEL REPERCUSSÃO NA SEARA ADMINISTRATIVA.
RECURSO PROVIDO.
1. O Poder Judiciário pode e deve sindicar amplamente, em mandado
de segurança, o ato administrativo que aplica a sanção de demissão a
Servidor Público, para verificar (a) a ocorrência dos ilícitos imputados
ao Servidor e, (b) mensurar a adequação da reprimenda à gravidade da
infração disciplinar, não ficando a análise jurisdicional limitada aos seus
aspectos formais.
2. (...)
3. O Processo Administrativo Disciplinar não é dependente da
instância penal, porém, quando o Juízo Penal já se pronunciou sobre os
fatos que constituem, ao mesmo tempo, o objeto do PAD, exarando
sentença absolutória por negativa de autoria, não há como se negar a sua
inevitável repercussão no âmbito administrativo sancionador.
4. A teor do art. 126 da Lei 8.112/90, aplicável ao caso por analogia, a
responsabilidade do Servidor deverá ser afastada no caso de absolvição
criminal que negue a existência do fato ou sua autoria, exceto se houver
falta disciplinar residual, não englobada na sentença penal absolutória
(Súmula 18/STF).
5. Refoge ao senso de justiça que se tenha o mesmo fato por não
provado no crime e provado na esfera administrativa punitiva, como se
esta pudesse se satisfazer com prova incompleta, deficiente ou
inconclusiva; a necessária independência entre as instâncias
administrativa e penal, não exclui o imperioso equilíbrio entre elas,
capaz de impingir coerência às decisões sancionatórias emanadas do
Poder Público, sejam proferidas pelo Executivo ou pelo Judiciário.
268
6. A materialização do dever-poder estatal de punir deve estar
compatibilizada com os preceitos fundamentais que tutelam a dignidade
da pessoa humana, de sorte que o julgamento do Processo
Administrativo Disciplinar não pode consubstanciar ato arbitrário
pautado em presunções, mas deve sempre estar calcado em liquidez e
certeza, assegurando a aplicação do princípio da segurança jurídica entre
as partes. (STJ, RMS 30.511/PE, julgado em 09/11/2010, Min. Rel.
Napoleão Nunes Maia Filho).
4.12. A Lei Complementar nº 10.098/94 (Estatuto e regime jurídico único dos servidores públicos civis do Estado do Rio Grande do Sul)
A Lei Complementar ora comentada costuma ser conteúdo
cobrado em diversos concursos realizados no Estado do Rio
Grande do Sul. De outra banda, na maioria dos casos, grande parte
dos estudantes está acostumada a estudar de forma mais
aprofundada a Lei Federal nº 8.112/90 (Regime jurídico dos
servidores públicos civis da União, das Autarquias e das Fundações
Federais), provavelmente pelo maior número de vagas e concursos
abertos de âmbito federal. Ainda que semelhantes, ambas as leis
possuem peculiaridades, características próprias que devem ser
cuidadas pelos candidatos-estudantes. Com este objetivo, este item
abordará algumas destas distinções, tendo por base a Lei Federal
em comparação à Lei Estadual.
O artigo 10 da Lei Complementar Estadual traz as formas
de provimento de cargo público, não constando a promoção como
no artigo 8º da Lei Federal. Aliás, nesta lei a promoção é tanto
forma de provimento como de vacância em cargo público,
enquanto naquela, é simplesmente forma de progressão na carreira,
mediante critérios alternados de merecimento e antiguidade (ver
ainda art. 35 da LC nº 10.098/94).
A posse na lei federal dá-se no prazo máximo de 30 dias
contados da publicação do ato de nomeação, enquanto na lei
estadual este prazo é de 15 dias prorrogáveis por igual período a
pedido do interessado (art. 18). Tanto em uma, quanto na outra lei
não se realizando a posse neste prazo, o ato de nomeação perde
seus efeitos. A partir da posse, o prazo para entrar em exercício é
de 15 dias na lei federal, enquanto na estadual são de 30 dias, e
Direito Administrativo
269
com consequências bem distintas se este não ocorrer. Na Lei nº
8.112/90 a consequência é a exoneração do servidor, enquanto na
Lei nº 10.098/94 é a perda dos efeitos da nomeação (art. 22). Bom
destacar que nesta, o prazo para entrar em exercício nos casos de
reintegração, reversão e aproveitamento é contado a partir da
publicação do ato no Diário Oficial do Estado (art. 22, § 4º).
Ainda com relação às formas de provimento enquanto na
Lei nº 8.112/90 a readaptação e a promoção são simultaneamente
formas de provimento e vacância, na Lei Estadual são a
readaptação e a recondução que possuem esta característica.
O período de estágio probatório em ambas as leis
apresentam o mesmo prazo de 24 meses (o tema já foi abordado
com maior profundidade ainda neste capítulo no item 4.2), porém
modifica um requisito avaliado, na lei federal consta a capacidade
de iniciativa (art. 20), enquanto na estadual eficiência (art. 28).
A readaptação da lei estadual destina-se somente a
servidores estáveis (art. 39), exigência esta não feita na lei federal
(art. 24). Ademais, enquanto nesta a readaptação só se efetiva em
cargo com atribuições afins, respeitadas a habilitação exigida, o
nível de escolaridade e a equivalência de vencimentos (art. 24, §
2º), na Lei Complementar Estadual realizando-se a readaptação em
cargo de padrão de vencimento inferior, ficará assegurada ao
servidor a remuneração correspondente à do cargo que ocupava
anteriormente (art. 41, parágrafo único).
Admite-se a reversão na Lei nº 8.112/90, artigo 25, em
duas hipóteses: por invalidez, quando junta médica oficial declarar
insubsistentes os motivos da aposentadoria, ou no interesse da
administração, desde que preenchido certos requisitos. Na Lei
Estadual nº 10.098/94 (art. 44) o retorno à atividade do servidor
aposentado só é admissível no caso de aposentadoria por invalidez.
Na lei federal não poderá reverter o aposentado que já tiver
completado 70 anos de idade (art. 27), enquanto na lei estadual a
idade é de 60 anos (art. 46), pois após a reversão o servidor deverá
exercer mais 5 anos de efetivo exercício (art. 47).
A reintegração na Lei Complementar nº 10.098/94 (art.
43) não faz exigência da estabilidade. Neste particular tem-se que
270
cuidar que não é somente a lei federal que faz esta exigência (art.
28), mas a própria Constituição Federal no artigo 41, § 2º.
O servidor que estiver em disponibilidade, de acordo coma lei estadual receberá provento igual ao vencimento do cargo, acrescido das vantagens de caráter permanente (art. 50), enquanto pela Constituição Federal (art. 41, § 3º) a remuneração é proporcional ao tempo de serviço.
Na substituição estabelecida pela lei estadual (art. 61) o servidor substituto fará jus ao vencimento do cargo ou função na proporção dos dias de efetiva substituição iguais ou superiores a 10 dias consecutivos, enquanto na lei federal (art. 38), o substituto fará jus à retribuição pelo exercício do cargo ou função de direção ou chefia superiores a 30 dias consecutivos, pagas na proporção dos dias de efetiva substituição que excederem o referido período.
O vencimento nas duas leis possuem conceitos idênticos, porém destoam quanto à remuneração. Enquanto na lei federal é o vencimento acrescido de vantagens pecuniárias permanentes (art. 41), na lei estadual é o vencimento do cargo acrescido de vantagens (permanentes ou não), artigo 79. Enquanto na primeira nenhum servidor receberá remuneração inferior a salário mínimo (art. 41, §5 º), na segunda nenhum servidor receberá, a título de vencimento básico, importância inferior ao salário mínimo (art. 78, parágrafo único).
Três são as espécies de vantagens trazidas pela Lei nº 8.112/90 (art. 49): indenizações, gratificações e adicionais. Quatro são as apresentadas pela Lei nº 10.098/94 (art. 85): indenizações, avanços, gratificações e adicionais e os honorários ou jetons. A lei federal entre suas indenizações traz o auxílio-moradia, que não consta no rol da lei complementar estadual (art. 89), resumindo-se a apenas três: ajuda de custo, diárias e a indenização de transporte.
Os avanços (art. 99), conhecido por triênios, é o percentual de 3% que o servidor recebe a cada três anos de efetivo exercício. Os honorários (art. 121) são devidos sempre que o servidor for designado para exercer, fora do horário de expediente a que estiver sujeito, as funções de: membro de banca de concurso; gerência, planejamento, execução ou atividade auxiliar de concurso; treinamento de pessoal ou professor, em cursos legalmente constituídos. Os jetons, por sua vez, são devidos ao servidor que desempenhar o encargo de membro de órgão de deliberação coletiva legalmente instituído, a título de
Direito Administrativo
271
representação. Neste último caso, podemos citar, por exemplo, o Secretário da Fazenda recebendo jetons por participar do Conselho Administrativo do Banrisul.
A Lei Complementar nº 10.098/94 apresenta um lista de licenças em seu artigo 128. Desta listagem destaca-se que somente poderão ter prazo superior a 24 meses as seguintes licenças:
Para acompanhar cônjuge;
Para o desempenho de mandato classista;
Para o exercício de mandato eletivo.
Ademais, somente as seguintes licenças podem ser
concedidas ao servidor ocupante de cargo em comissão:
Para tratamento de saúde;
Por acidente em serviço;
Por motivo de doença em pessoa da família;
Gestante, adotante ou paternidade;
Prêmio por assiduidade;
Especial, para fins de aposentadoria.
A licença por motivo em pessoa da família pode ser
concedida pelo prazo máximo de 730 dias, porém podendo ou não
ser remunerada, seguindo o seguinte esquema:
Até 90 dias Com remuneração total
De 90 a 180 dias 2/3 da remuneração
De 180 a 365 dias 1/3 da remuneração
365 a 730 dias Sem remuneração
A licença gestante na lei estadual possui 180 dias, sem
prejuízo da remuneração. Neste particular é bom destacar que na
Constituição Federal (art. 7º, XVIII) e na Constituição Estadual
(art. 29, X) ainda constam como prazo de licença gestante 120 dias.
A licença paternidade tem prazo de 15 dias consecutivos (art.
272
144) enquanto a licença concedida à servidora adotante, também
pode esquematizada da seguinte forma:
Criança de 0 a 2 anos 180 dias
Criança de 2 a 4 anos 150 dias
Criança de 4 a 6 aos 120 dias
Criança com mais 6
anos desde que menor 90 dias
A licença para tratar de interesses particulares (art.
146 da lei estadual) é concedida pelo prazo de até 2 anos
consecutivos, ao servidor de cargo de provimento efetivo estável.
Na lei federal o prazo da concessão é de 3 anos (art. 91).
A licença para desempenho de mandato classista na lei
10.098/94 é remunerada (art. 149), enquanto na lei federal é sem
remuneração (art. 92).
Consta, ainda, na Lei Complementar estadual 10.098/94 a
licença-prêmio por assiduidade, concedida automaticamente por
3 meses ao servidor que a cada 5 anos ininterruptos não se houver
afastado do exercício de suas funções, com todas as vantagens do
cargo, como se nele estivesse em exercício (art. 150). Esta licença
consta na Constituição Estadual no artigo 33, § 4º. Mesmo que no
artigo 151 ainda conste a possibilidade de contagem em dobro para
efeitos de aposentadoria caso o servidor não goze do benefício, a
Constituição Federal veda tal possibilidade forte no artigo 40 §10.
Há licença especial para fins de aposentadoria
(remunerada e considerada como tempo de efetivo exercício para
todos os efeitos legais) sempre que decorridos 30 dias da data que
houver sido protocolado o requerimento a administração não
decidir sobre o pedido. Esta licença consta na Constituição
Estadual no artigo 40.
Direito Administrativo
273
No capítulo referente às penalidades (art. 187 e
seguintes) algumas diferenças são bem perceptíveis, a começar
pelas penalidades propriamente ditas. Não há advertência (art. 127,
I, da Lei nº 8.112/90) como penalidade na lei estadual. A
penalidade correspondente é a repreensão (art. 188). Na lei federal
constam ainda a destituição de cargo em comissão e a destituição
de função comissionada, que não possuem semelhante na lei
estadual. Na Lei 8.112/90 a multa não é uma penalidade, enquanto
na lei estadual consta no artigo 187, VI. O caso de aplicação da
multa no Estatuto Federal limita-se a conversão da suspensão (art.
130, § 2º). Já no Estatuto Estadual duas penalidades podem ser
convertidas em multa, além da suspensão (art. 189, § 2º), a pena de
cassação de aposentadoria (art. 195, parágrafo único).
Na Lei nº 8.112/90, artigo 131, as penalidades de
advertência e suspensão terão seus registros cancelados após o
decurso de 3 e 5 anos respectivamente. Na Lei Complementar nº
10.098/94 (art. 190) os registros de advertência, repreensão,
suspensão e multa são automaticamente cancelados em 10 anos.
Critica-se neste artigo a menção à pena de advertência, pois esta
não consta no rol de penalidades do artigo 187.
Os prazos para a aplicação das penas também são
distintos. No Estatuto Federal prescrevem (art. 142):
180 dias Advertência
2 anos Suspensão
5 anos
Demissão, cassação de aposentadoria
ou disponibilidade e destituição de
cargo em comissão.
274
No Estatuto Estadual os prazos são (art. 197):
6 meses Repreensão
12 meses Suspensão e de multa
18 meses
Abandono de cargo ou ausências não
justificadas ao serviço em número
superior a 60 dias intercalados
durante 1 ano.
24 meses Demissão, cassação de aposentadoria
e de disponibilidade.
Ambas as leis determinam que se o ato praticado pelo
servidor também configurar crime, o prazo prescricional será o da
lei penal, e não o estipulado pelos estatutos. Porém, há que se fazer
uma ressalva. Só se aplicará o prazo penal, caso o fato também
esteja sendo investigado na seara penal, vejamos:
INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA E CRIMINAL. PRAZO
PRESCRICIONAL.
A Turma reiterou que a pretensão punitiva da Administração
Pública em relação à infração administrativa que também
configura crime em tese somente se sujeita ao prazo prescricional
criminal quando instaurada a respectiva ação penal. Ademais,
destacou-se que a regra constante do art. 4º da Lei n. 9.873/1999 não
se aplica às hipóteses em que a prescrição já se haja consumado antes
da entrada em vigor do referido diploma legal. In casu, o tribunal a
quo consignou que não houve sequer a abertura de inquérito policial e
que os fatos questionados são anteriores à edição da Lei n.
9.873/1999, motivos pelos quais, na hipótese, torna-se inaplicável a
aplicação da equiparação da prescrição administrativa penal.
Precedentes citados: MS 14.446-DF, DJe 15/2/2011; MS 15.462-DF,
DJe 22/3/2011; EDcl no REsp 1.099.647-RS, DJe 15/12/2010, e REsp
1.088.405-RS, DJe 1º/4/2009. (REsp 1.116.477-DF, Rel. Min. Teori
Albino Zavascki, julgado em 16/8/2012)
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO.
PRAZO PRESCRICIONAL. INEXISTÊNCIA DE APURAÇÃO
CRIMINAL. APLICAÇÃO DO PRAZO ADMINISTRATIVO.
Direito Administrativo
275
PARECER DO MPF PELA CONCESSÃO DA ORDEM.
PRECEDENTES.
1. A regra geral do prazo prescricional para a punição administrativa
de demissão é de cinco anos, nos termos do art. 142, I, da Lei n.
8.112/90, entre o conhecimento do fato e a instauração do processo
administrativo disciplinar.
2. Quando o servidor público comete infração disciplinar também
tipificada como crime, somente se aplicará o prazo prescricional
da legislação penal se os fatos também forem apurados em ação
penal. 3. Precedentes: RMS 19.087/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta
Turma, julgado em 19.6.2008, DJe 4.8.2008; MS 12.884/DF, Rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, julgado em
9.4.2008, DJe 22.4.2008; RMS 18.688/RJ, Rel. Min. Gilson Dipp,
Quinta Turma, DJ 9.2.2005.
4. No presente caso não há notícia de apuração criminal, razão pela
qual deve ser aplicado o prazo prescricional de 5 (cinco) anos,
previsto no art. 142, I, da Lei n. 8.112/90.
5. É incontroverso nos autos que os fatos desabonadores foram
conhecidos pela Administração em 7.4.2000, e que o prazo
prescricional foi interrompido em 7.3.2008, com a instauração do
Processo Administrativo Disciplinar (PAD), caracterizando a
prescrição quinquenal para a punição dos servidores públicos.
Segurança concedida. (STJ, MS 15.462/DF, Ministro Relator
Humberto Martins, julgado em 14/03/2011).
O título referente ao processo administrativo disciplinar
possui peculiaridades bem marcantes. O Estatuto do Estado
estipula prazo para que a autoridade que tenha conhecimento de
irregularidade no serviço público estadual apure a suposta
irregularidade: 10 dias. Na lei federal não determina prazo algum.
A sindicância (art. 201 e seguintes) tem o prazo máximo
para ser concluída de 30 dias úteis, prorrogável por igual período.
No seu procedimento, o sindicante efetua todas as diligências
necessárias para o esclarecimento da ocorrência, traduzindo no
relatório suas conclusões. Somente após é que se poderá abrir o
prazo para a defesa que é de 3 dias úteis.
O processo administrativo disciplinar em espécie (art.
205 e seguintes) é conduzido por uma comissão composta por 3
servidores estáveis, com formação superior, sendo pelo menos um
com formação em ciências jurídicas e sociais (art. 206). O
276
presidente da comissão deve designar um servidor para secretariar,
que não poderá ser um dos componentes da mesma. No Estatuto
Federal (art. 149) a exigência é de que os três servidores sejam
estáveis e somente o seu presidente deve possuir cargo de mesmo
nível ou superior, ou ter nível de escolaridade igual ou superior ao
do indiciado. Para secretariar a comissão o servidor escolhido pode
ser um dos componentes da mesma.
De acordo com o artigo 211 o processo administrativo
disciplinar (PAD) se desenvolve nas seguintes fases:
Instauração;
Processo administrativo-disciplinar, propriamente dito,
subdividido em:
Instrução
Defesa
Relatório
Julgamento.
Em comparação à lei federal, somente a segunda fase
muda de nome, pois nesta denomina-se: inquérito administrativo
(art. 151).
No que tange ao inquérito administrativo da lei
10.098/94, andou mal o legislador. Isso porque em diversos artigos
não deixou claro se o inquérito tratava-se de outro instrumento
além da sindicância e do processo administrativo disciplinar (PAD)
ou se de uma fase deste último. Essa confusão terminológica é bem
visível no artigo 200 onde consta que as irregularidades e as
infrações funcionais são apuradas por meio de: I) sindicância; II)
inquérito administrativo. Na mesma linha é o artigo 202 § 2º ao
determinar que da sindicância poderá ser sugerida a instauração de
inquérito administrativo.
Ao estudar-se detalhadamente o inquérito administrativo
(arts. 224 a 246) percebe-se que este trata na verdade de uma fase
do PAD, assim como na lei federal. Esta conclusão pode se extrair
dos seguintes trechos de artigos: 226: na fase do inquérito...; 228: o
presidente da comissão, ao instalar os trabalhos...; 244: ultimada a
instrução do processo, intimar-se-á o indiciado, ou seu defensor
Direito Administrativo
277
legalmente constituído, para, no prazo de 10 dias, apresentar
defesa... ; 245: esgotado o prazo de defesa, a comissão apresentará,
dentro de 10 dias, minucioso relatório...
Assim é que ao se estudar o inquérito administrativo da
Lei Complementar 10.098/94 está se estudando o que o artigo 211
denominou de processo administrativo disciplinar propriamente
dito. Não é um terceiro instrumento. Trata-se na realidade de uma
fase do PAD.
Por fim, cumpre trazer pequena observação quanto à
revisão do processo. Em ambas as leis o processo administrativo
disciplinar pode ser revisto a qualquer momento, porém na lei
estadual só pode uma única vez (art. 249). Em ambas o prazo da
revisão é de 60 dias, o de julgamento de 20, não podendo resultar
no agravamento da pena aplicada.
Direito Administrativo
279
Capítulo X
BBEENNSS PPÚÚBBLLIICCOOSS
1. Considerações iniciais
O conceito legal de bem público é encontrado no Código
Civil, art. 98: são bens públicos do domínio nacional, pertencentes
às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são
particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem. Entretanto,
o conceito doutrinário do que seja bem público não é uniforme.
Alguns administrativistas consideram bens públicos os
bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público (União,
Estados, Distrito Federal, Municípios suas autarquias e fundações).
Outros entendem que são todos os bens da administração direta e
indireta (incluindo, então, empresas públicas, sociedades de
economia mista, etc.). Há ainda uma terceira corrente, que
considera bem público, além dos bens pertencentes às pessoas
jurídicas de direito público, os bens, que mesmo não pertencentes a
estas pessoas, estejam afetados para a prestação de serviços
públicos (por exemplo, bens de empresas públicas e sociedades de
economia mista que prestem serviços públicos).
Há ainda outra conceituação que merece destaque: o
conceito de domínio público. O termo domínio público tem
conceituação mais ampla que bem público, ainda que muitas vezes
sejam utilizados como sinônimos. Domínio público é o conjunto
de bens sujeitos ou pertencentes ao Estado. Logo, bem é a coisa
propriamente dita, enquanto domínio é o direito que se exerce
sobre esta coisa (MEIRELLES, 2009, p. 521-2).
A expressão domínio público possui os seguintes
desdobramentos: domínio público eminente é o poder político que
o Estado exerce sobre todas as coisas de seu território, uma
manifestação de Soberania Nacional, o que justificaria as
limitações ao uso da propriedade privada como as servidões, a
280
desapropriação, etc.; domínio patrimonial é o poder exercido pelo
Estado sobre os seus próprios bens. Expõe Hely Lopes Meirelles
(2009, p. 522-523):
O domínio público exterioriza-se, assim, o domínio público em
poderes de soberania e em direitos de propriedade. Aqueles se
exercem sobre todas as coisas de interesse público, sob a forma de
domínio eminente; estes só incidem sobre os bens pertencentes às
entidades públicas, sob a forma de domínio patrimonial. O domínio
eminente é o poder político pelo qual o estado submete à sua vontade
todas as coisas de seu território. É uma das manifestações da soberania
interna; não é direito de propriedade. Como expressão da soberania
nacional, não encontra limites senão no ordenamento jurídico-
constitucional estabelecido pelo próprio Estado. Esse domínio alcança
não só os bens pertencentes às entidades públicas como a propriedade
privada e as coisas inapropriaveis, de interesse público. O domínio
patrimonial do Estado sobre seus bens é direito de propriedade, mas
direito de propriedade pública, sujeito a um regime administrativo
especial. A esse regime subordinam-se todos os bens das pessoas
administrativas, assim considerados bens públicos e, como tais,
regidos pelo direito público, embora supletivamente se lhes aplicarem
algumas regras da propriedade privada. Mas advirta-se que as normas
civis não regem o domínio público; suprem, apenas, as omissões das
leis administrativas.
2. Classificação dos bens públicos
2.1. Quanto à titularidade
Federais: constantes de forma não taxativa no art. 20 da
CRFB/88, que assim afirma: os que atualmente lhe pertencem
e os que lhe vierem a ser atribuídos.
Estaduais: constantes no art. 26 da CRFB/88.
Distritais: previstos no art. 16, § 3º, do ADCT.
Municipais: sem previsão constitucional.
2.2. Quanto à destinação (art. 99 do Código Civil)
Bens de uso comum do povo: aqueles destinados ao uso da
coletividade em igualdade de condições. São os bens
destinados à utilização geral pelos indivíduos, normalmente
Direito Administrativo
281
gratuita (art. 103 do Código Civil) tidas como mar, praias,
ruas, praças, rios, estradas e o meio ambiente.
Bens de uso especial: visam à execução dos serviços públicos.
São os prédios onde funcionam as repartições públicas,
teatros, escolas, museus, quartéis, cemitérios, aeroportos, etc.
Bens dominicais ou dominiais: diferentemente dos demais,
não possuem destinação pública específica, e por isso podem
ser utilizados de qualquer forma, ou até alienados pela
Administração (art. 101 do CCB). Recebem também a
denominação de bens do patrimônio disponível (LIMA, 1964,
p. 74). São os prédios desativados, bens móveis inservíveis e
as terras devolutas (com ressalva do art. 225, § 5º, da
CRFB/88, que dispõe sobre terras devolutas indisponíveis).
Pertencem à União as terras devolutas indispensáveis à defesa
das fronteiras, das fortificações e construções militares, das
vias federais de comunicação e à preservação ambiental (art.
20, II, da CRFB/88). As demais pertencem aos Estados-
Membros (art. 26, IV, da CRFB/88). Ainda, de acordo com o
artigo 99, parágrafo único, do Código Civil: não dispondo a
lei em contrário, consideram-se dominicais os bens
pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se
tenha dado estrutura de direito privado.
2.3. Quanto à disponibilidade
Bens indisponíveis por natureza: são aqueles que, por não
possuírem caráter patrimonial, a Administração não pode
deles dispor. Os bens de uso comum do povo são, em regra,
absolutamente indisponíveis.
Bens patrimoniais indisponíveis: ainda que sejam bens com
natureza patrimonial, a Administração Pública não pode deles
dispor por estarem afetados a uma destinação pública
específica. São os bens móveis ou imóveis de uso especial e
os bens de uso comum do povo suscetíveis de avaliação
patrimonial (art. 100 do CCB).
Bens patrimoniais disponíveis: contrariamente aos bens
patrimoniais indisponíveis, a Administração pode aliená-los
(na forma e nas condições constantes em lei) por não estarem
282
afetados, ou seja, não possuírem destinação pública específica.
São os bens dominicais em geral.
3. Afetação e Desafetação
Diz respeito ao destino dado aos bens públicos. Afetação
é a atribuição explícita (por lei, ato administrativo, etc.) ou
implícita (o Poder Público simplesmente passa a utilizar um bem
sem manifestação formal) de uma destinação específica de um bem
público.
Se um bem público estiver sendo utilizado para
determinado fim público, o bem estará afetado. A retirada desta
destinação pública corresponde à desafetação. Portanto, desafetado
é o bem que não possui qualquer fim público. O processo de
desafetação dá-se pela via legislativa, através de uma lei.
A desafetação é a mudança da destinação do bem. De regra, a
desafetação visa a incluir bens de uso comum do povo ou bens de uso
especial na categoria de bens dominicais para possibilitar a alienação.
A desafetação pode advir de manifestação explicita, como no caso de
autorização legislativa para venda de bem de uso especial, na qual esta
contida a desafetação para bem dominical; ou decorrer de conduta da
administração como na hipótese de operação urbanística que torna
inviável o uso de uma rua próxima como via de circulação
(MEDAUAR, 2008, p. 241)
Tanto a afetação como a desafetação podem se dar por
ato administrativo (lei ou decreto) como por fato administrativo (o
poder público simplesmente constrói um cemitério em um terreno,
ou quando há um incêndio que destrua inteiramente um prédio
escolar). Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p. 673) não admite
a desafetação por não uso.
4. Regime jurídico
Os bens públicos possuem as seguintes características:
Inalienabilidade: o administrador público não dispõe
livremente dos bens públicos. Muito pelo contrário, ao
administrador cabe o dever de guardá-los e conservá-los (art.
23, I, da CRFB/88). A regra é que os bens públicos não
possam ser vendidos, doados ou permutados. Entretanto, esta
Direito Administrativo
283
inalienabilidade não é absoluta, pois poderão ser objeto de
alienação os bens que sejam suscetíveis de valorização
econômica (excluem-se o mar e os rios, por exemplo), desde
que desafetados e ainda obedeçam aos devidos trâmites legais
como prévia avaliação e interesse público (arts. 17 e 19 da Lei
nº 8.666/93 e arts. 100 e 101 do CCB).
Impenhorabilidade: sobre os bens públicos não pode recair
nenhuma penhora. Isso acontece porque segundo dispõe o art.
100 da CRFB/88, a forma com que a Fazenda Pública satisfaz
seus débitos em virtude de sentença judicial é através do
sistema de pagamento de precatórios. No mesmo sentido o art.
649 do Código de Processo Civil afirma que os bens
inalienáveis são impenhoráveis.
Não onerabilidade: os bens públicos não podem ser gravados,
ou seja, não podem ser oferecidos como garantia (penhor,
hipoteca) para eventual credor. Ora, se os administradores
públicos não são donos dos bens não podem onerá-los. Da
mesma forma como acontece com a impenhorabilidade o,
Código Civil, no art. 1.420, diz que só podem ser objeto de
penhor, hipoteca ou anticrese os bens passíveis de alienação,
característica que os bens públicos não possuem.
Imprescritibilidade: com esta característica os bens públicos
são insuscetíveis de aquisição por usucapião (o transcurso de
tempo não transfere a propriedade – prescrição aquisitiva da
propriedade). Neste sentido a CRFB/88 nos arts. 183, § 3º e
191, parágrafo único e o CCB, no art. 102, e ainda a Súmula
nº 340 do STF.
5. Uso dos bens públicos
Existem determinadas formas que particulares podem
fazer uso privativo de um bem público. Salienta-se que não é o
Atenção! O Código Civil Brasileiro, em seu artigo 1.437, traz a possibilidade de hipoteca do direito de uso especial para fins de moradia e o direito real de uso, mas neste caso o gravame recai sobre o direito de uso, e não sobre o bem propriamente dito.
284
caso do pagamento do pedágio, pois o uso livre de qualquer bem
público, além de ser gratuito, também pode ser remunerado. O uso
livre, neste caso, quer dizer que independe de outro ato
administrativo que permita a utilização do bem, o que não exclui a
remuneração para ou pelo uso.
Uso especial – uso especial é todo aquele que, por um titulo individual,
a administração atribui a determinada pessoa para fruir de um bem
público com exclusividade, nas condições convencionadas. É também
uso especial aquele a que a administração impõe restrições ou para o
qual exige pagamento, bem como o que ela mesma faz de seus bens para
a execução dos serviços públicos, como é o caso dos edifícios, veículos
e equipamentos utilizados por suas repartições, mas aqui só nos
interessa a utilização do domínio público por particulares com
privacidade. Todos os bens públicos, qualquer que seja sua natureza, são
passiveis de uso especial por particulares, desde que a utilização
concedida pela administração não os leve a inutilização ou destruição,
caso em que se converteria em alienação. O Dec. - lei 1.561, de 13.7.77,
dispõe sobre a ocupação de terrenos da União e a Lei 9.636, de 15.5.98,
dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de
bens imóveis de domínio da União, altera dispositivos dos Decs. -leis
9.760, de 5.9.46, e 2.398, de 21.12.87, e regulamenta o § 2º do art. 49 do
ADCT. (MEIRELLES, 2009, p. 530-531).
Autorização de uso: ato unilateral, discricionário e precário,
independentemente de licitação ou autorização legislativa,
pelo qual a Administração Pública no interesse do
particular, transfere o uso de bem público por um período de
curta duração. São exemplos: o uso de área municipal para
instalação de um circo, o fechamento de uma rua para efetuar
uma feira livre, etc.
Permissão de uso: ato unilateral, discricionário, precário,
gratuito ou oneroso, por prazo determinado ou não, pelo qual
a Administração Pública, no interesse da coletividade,
transfere o uso de bem público, mediante certas condições ou
não. Independe de autorização legislativa, mas deve ocorrer
procedimento licitatório quando houver mais de um
interessado, para assegurar o tratamento isonômico entre os
interessados. São exemplos: a permissão para instalação de
bancas de jornal, mesas e cadeiras em frente aos restaurantes,
etc.
Direito Administrativo
285
Concessão de uso: é contrato administrativo no qual o Poder
Público transfere a particular o uso exclusivo de um bem para
que este explore segundo sua destinação, nos termos e
condições previamente estabelecidas. É dependente, em regra,
de autorização legislativa e de procedimento licitatório,
podendo ser de forma gratuita ou onerosa. É o caso dos boxes
de um mercado municipal, restaurantes em aeroportos,
lanchonetes em rodoviárias e escolas, etc.
Concessão de direito real de uso: criada pelo Decreto-Lei nº
271/67, se aplica a bens imóveis não construídos ou sobre o
espaço aéreo que se ergue acima da superfície. É contrato
administrativo, remunerado ou gratuito, precedido por
licitação (com a ressalva do art. 17, I, f, e § 2º da Lei nº
8.666/93), mediante lei autorizadora, pela qual a
Administração Pública concede ao particular o uso de terrenos
públicos para que os utilize com o fim de regularização
fundiária de interesse social, urbanização, industrialização,
edificação, cultivo de terra, aproveitamento sustentável das
várzeas, bem como outras modalidades de interesse social em
áreas urbanas.
Atenção! Não confunda a permissão de uso de bem público com a permissão de prestação de serviço público da Lei nº 8.987/95, formalizada mediante contrato de concessão.
Atenção! A concessão de uso gratuito não é sinônimo de comodato, assim como a concessão de uso onerosa não o é de locação. Tanto o comodato como a locação, embora de aplicação não vedada pela legislação à Administração Pública, são institutos de natureza de direito privado. Existe, ainda, de natureza privada a enfiteuse prevista no art. 49, § 3º, do ADCT e o aforamento mencionado na Lei nº 9.760/46 arts. 64, § 1º e 96.
286
Concessão de uso especial para fins de moradia: figura criada
pela MP nº 2.220/01 com o objetivo de regularizar a ocupação
ilegal de terrenos públicos, em atenção ao disposto no art. 183
da CRFB/88. Provadas as condições exigidas na medida
provisória (art. 1º), o possuidor passa a ter direito à concessão
(ato administrativo vinculado). A Lei nº 11.481/07, arts. 2º e
25, estendeu este benefício às áreas de propriedade da União,
inclusive aos terrenos de Marinha, bem como a imóvel
público remanescente de desapropriação cuja propriedade
tenha sido transferida a empresa pública ou sociedade de
economia mista.
Concessão florestal: trazida pela Lei nº 11.284/06 é a
delegação onerosa do direito de praticar manejo florestal
sustentável para exploração de produtos ou serviços em
unidade de manejo, formalizada por contrato e mediante
prévia licitação. Quanto à obrigatoriedade de autorização pelo
poder legislativo constante no art. 49, XVII, da CRFB/88,
entendeu o STF na STA nº 235/RO pela sua desnecessidade.
Cessão de uso: é a transferência gratuita do uso de certo bem
público de um órgão para outro, mediante termo de cessão,
por prazo determinado ou não. É em verdade uma colaboração
entre órgãos. É, por exemplo, o caso do Poder Judiciário
Estadual ceder uma sala para funcionamento da Defensoria
Pública; ou ainda o Estado ceder um imóvel para um
Município ali instalar um órgão municipal, etc.
6. Aquisição dos bens públicos
São várias as formas pelas quais os bens públicos passam
a integrar o acervo patrimonial público. Além das formas previstas
no Direito Privado como compra e venda, adjudicação, usucapião,
testamento, doação, dação em pagamento, dentre outros, há formas
específicas de aquisição de propriedade pelo Poder Público, como
é o caso da desapropriação (o qual merecerá atenção especial no
próximo capítulo); o confisco ou perdimento de bens, previsto nos
arts. 5º, XLVI, e 243, parágrafo único, da CRFB/88; no art. 91, I e
II do Código Penal; no art. 24 da Lei nº 9.605/98; na Lei nº
8.429/92, art. 12; o registro de parcelamento de solo, no qual a Lei
Direito Administrativo
287
nº 6.766/79 (que regula o parcelamento do solo urbano), em seu
art. 22, estabelece que desde a data de registro do loteamento
passam a integrar o domínio do Município as vias e praças, os
espaços, livre e as áreas destinadas a edifícios públicos e outros
equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial
descritivo.
7. Alienação dos bens públicos
Alienação é a transferência da propriedade podendo ser
remunerada ou gratuita. Pode ocorrer por institutos de natureza
privada como dação em pagamento, doação, permuta, bem como
por institutos de natureza pública como a investidura (é a alienação
aos proprietários lindeiros de área remanescente ou resultante de
obra pública inapropriável isoladamente, por preço nunca inferior
ao da avaliação, art. 17, § 3º, da Lei nº 8.666/93), retrocessão,
legitimação de posse, etc.
Para que seja procedida a alienação de bens públicos o
primeiro requisito que deve haver é o interesse público (sempre).
Como já foi objeto de comentário anteriormente, os bens
públicos são inalienáveis, enquanto conservarem a sua afetação
(destinação pública). Logo, para que seja procedida a alienação,
outro requisito que se faz necessário é a desafetação dos bens,
especificamente, de uso comum do povo e dos bens de uso
especial. Os bens dominicais já são desafetados, e os bens imóveis
da Administração derivados de procedimentos judiciais ou de
dação em pagamento (art. 19 da Lei nº 8.666/93), jamais
adquiriram uma destinação pública, tendo somente passado pela
Administração, motivo pelo qual não há de se falar em desafetação.
Além destes requisitos, devem obedecer ao que preceitua
o art. 17 da Lei nº 8.666/93. Este artigo exige, dentre os diversos
requisitos, o interesse público devidamente motivado, a prévia
avaliação, e quando se tratar de bens imóveis, autorização
legislativa e a modalidade de concorrência.
Tratando-se de bens móveis (art. 17, II, da Lei nº
8.666/93) a alienação independe de autorização legislativa, mas
288
depende de avaliação prévia e licitação (sem indicação da
modalidade), sendo, porém dispensada nos casos das alíneas a a f.
Para a venda de bens móveis inservíveis para a
Administração, ou de produtos que foram legalmente apreendidos
ou penhorados (o termo correto deveria ser empenhados), bem
como aqueles avaliados isolada ou globalmente em quantia que
não supere o limite de R$ 650.000,00, indica-se a modalidade de
leilão, arts. 22, § 5º, e 17, § 6º, da Lei nº 8.666/93.
8. Espécies de bens públicos
Impossível, frente ao objetivo do presente trabalho, que se faça
um estudo detalhado de todas as espécies de bens públicos. Por tais
motivos, segue abaixo algumas espécies que merecem destaque:
Terras devolutas: não são destinadas a qualquer uso pelo
Poder Público nem incorporadas ao domínio privado. Seu
conceito legal pode ser encontrado na Lei nº 9.760/46, art. 5º
(terras devolutas federais). Pertencem à União as
indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e
construções militares, das vias federais de comunicação e à
preservação ambiental (art. 20, II, da CRFB/88). As demais
pertencem aos Estados-Membros (art. 26, IV da CRFB/88).
Mar territorial: é a faixa de 12 milhas marítimas medidas a
partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular,
onde o Estado exerce plenos poderes de soberania (art. 20, VI,
da CRFB/88 e Lei nº 8.617/93, art. 1º).
Zona contígua: é a faixa entre 12 e 24 milhas marítimas em
que o Estado exerce fiscalização (art. 5º da Lei nº 8.617/93).
Zona econômica exclusiva: é a faixa entre as 12 e as 200
milhas marítimas onde o Estado exerce direito exclusivo de
Atenção! As terras devolutas necessárias para a proteção dos ecossistemas naturais e as arrecadadas pelos Estados por ações discriminatórias são indisponíveis (art. 225, § 5º, da CRFB/88), bem como as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios (art. 231, § 4º, da CRFB/88), e por isso são absolutamente inalienáveis.
Direito Administrativo
289
exploração de recursos minerais (art. 20, V, da CRFB/88 e Lei
nº 8.617/93, arts. 6º a 8º).
Plataforma continental: é o prolongamento natural das áreas
continentais sob o mar até a profundidade de cerca de 200
metros (art. 11 da Lei nº 8.617/93). O Brasil exerce soberania
para efeitos de exploração de recursos naturais. Deve ser
entendido como bem da União por força do art. 20, I, primeira
parte, da CRFB/88, haja vista que a Constituição de 1967, em
seu art. 4º, III, considerava a plataforma continental como
bem federal.
Terrenos da marinha: pertencem à União, por força do art. 20,
VII, da CRFB/88. São as áreas que, banhadas pelas águas do
mar ou dos rios navegáveis, em sua foz, se estendem à
distância de 33 metros para a área terrestre, contados do
preamar médio, medido em 1831 (Aviso Imperial de 1833 e
art. 20, VII da CRFB/88).
Faixa de fronteira: é a área de até 150 Km de largura que
corre paralelamente à linha terrestre demarcatória da divisa
entre o território nacional e os países estrangeiros, sendo
considerada fundamental para a defesa nacional (art. 20, § 2º,
da CRFB/88).
Atenção! A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira integram o patrimônio nacional (art. 225, § 4º, da CRFB/88), mas isso não os tornam bens da União (neste sentido o STJ no AgRg-CC nº 93.083/PE).
Direito Administrativo
291
Capítulo XI
IINNTTEERRVVEENNÇÇÃÃOO DDOO EESSTTAADDOO NNAA PPRROOPPRRIIEEDDAADDEE
1. Introdução
O direito à propriedade é reconhecido constitucionalmente
(art. 5º, XXII, e 170, II), porém não possui mais caráter absoluto.
Realmente, em alguns momentos históricos, o direito à propriedade
foi visto como intangível, pelo menos até o final do século XIX e
primeiras décadas do século XX: a doutrina do laissez faire, do
Estado puramente liberal.
Essa forma de Estado liberal cedeu lugar hoje para o que
chamamos de Estado do bem-estar social (ponto com estudo mais
aprofundado no primeiro capítulo). Um Estado com uma feição
marcadamente social, voltado para a prestação dos serviços
fundamentais sociais (ALEXANDRINO, 2008, p. 645).
Assim, o Estado, para garantir esse bem-estar social,
necessita em alguns momentos intervir na propriedade, para
garantir o bem da coletividade, de forma que a propriedade hoje só
se justifica quando atenda a sua função social (art. 5º, XXIII, 170,
III, 182, § 2º, 186, todos da CRFB/88 e art. 1.228, § 1º, do CCB).
A intervenção estatal, verdadeiro poder de império que
restringe o caráter absoluto ao direito de propriedade (supremacia
do interesse público sobre o interesse particular), só se justifica
quando tem por objetivo o interesse da sociedade, em adequar o
uso da propriedade particular a este interesse coletivo.
A vigente constituição é peremptória no que se refere ao
reconhecimento do direito: “É garantido o direito de propriedade”
(art.5º, XXII). O mandamento indica que o legislador não pode erradicar
esse direito do ordenamento jurídico positivo. Pode, sim, definir-lhe os
contornos e fixar-lhe limitações, mas nunca deixará o direito de figurar
como objeto da tutela jurídica.
A propriedade não mais se caracteriza como direito absoluto, como
ocorria na época medieval. Hoje, o direito de propriedade só se justifica
292
diante do pressuposto que a constituição estabelece para que a torne
suscetível de tutela: a função social. Se a propriedade não esta
entendendo a sua função social, deve o Estado intervir para amoldá-la a
essa qualificação. E essa função autoriza não só a determinação de
obrigações de fazer, como de deixar de fazer, sempre para impedir o uso
egoístico e anti-social da propriedade. Por isso, o direito de é relativo e
condicionado.
O novo Código Civil, depois de repetir a norma que confere ao
proprietário e a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa (art. 1.228),
fez a seguinte ressalva, em conformidade com a disciplina
constitucional, e para consolidar o caráter social da propriedade: “O
direito de propriedade deve ser exercido em consonância com suas
finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as
belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e
artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas” (art.1.228, §
1°). Ficou, portanto, reforçado o sentido social da propriedade. Se o
proprietário não respeita essa função, nasce para o Estado o poder
jurídico de nela intervir e até de suprimi-la, se esta providencia se
afigurar indispensável para ajustá-la aos fins constitucionalmente
assegurados. (CARVALHO FILHO, 2008, p. 718).
É competência privativa da União legislar sobre o direito
de propriedade, desapropriação e requisições civis e militares (art.
22, I, II e III, da CRFB/88), o que não impede que os demais entes
políticos não possam legislar sobre eventuais restrições e
condicionamentos ao uso da propriedade, com fulcro no art. 24, I,
VI, VII e VIII, art. 30 I, II e VIII da CRFB/88.
Não podemos confundir a mencionada competência
legislativa (exclusiva nas hipóteses do art. 25, §§ 1º, 2º, e 3º,
privativa no art. 22, concorrente no art. 24 ou suplementar no art.
24, § 2º todos da CRFB/88) com a competência administrativa,
material ou executiva, que pode ser exclusiva (art. 21 da
CRFB/88) ou comum, cumulativa ou paralela (art. 23 da
CRFB/88) a qual se consubstancia na prática de atos
administrativos relacionados à restrição e condicionamento do uso
da propriedade (SILVA, 2002, p.478).
2. Modalidades
Tecidas essas breves considerações iniciais, passamos ao
estudo um pouco mais detalhado de cada modalidade de
Direito Administrativo
293
intervenção na propriedade, a saber: servidão administrativa,
requisição administrativa, ocupação temporária, limitação
administrativa, tombamento (estas restritivas) e desapropriação
(esta supressiva).
2.1. Servidão Administrativa
É direito real público que autoriza o Poder Público a usar
a propriedade imóvel de forma a permitir a execução de obras e
serviços de interesse coletivo. Suporta-se a presença física do
Estado.
O primeiro cuidado que se deve ter com relação à
servidão administrativa é não confundi-la com a servidão de direito
privado, regulada pelos arts. 1.378 a 1.389 do CCB. Esta servidão
privada se dá entre particulares, enquanto aquela constitui direito
real público, instituída em favor do Estado.
Toda a servidão limita a propriedade, mas nem toda limitação
da propriedade implica a existência de servidão. Assim, se a
restrição que incide sobre um imóvel for em benefício do
interesse público genérico e abstrato, como a estética, a
proteção do meio ambiente, a tutela do patrimônio histórico e
artístico, existe limitação à propriedade, mas não servidão;
esta se caracteriza quando, no outro extremo da relação (o
dominante) existe um interesse público corporificado, ou seja,
uma coisa palpável, concreta, a usufruir a vantagem prestada
pelo prédio serviente. (DI PIETRO, 2009, p. 150)
Não existe norma específica regulando a servidão
administrativa, sendo encontrada referência no art. 40 do Decreto-
Lei nº 3.365/41. A sua promoção pode ser transferida a terceiros,
como preconiza o art. 31, VI, da Lei nº 8.987/95, mas a declaração
de necessidade ou utilidade pública cabe ao Poder Público (art. 29,
IX, da Lei nº 8.987/95). A exemplo, cita-se o Decreto 12.935/10
que: declara de utilidade pública, para fins de desapropriação,
total ou parcial, ou de instituição de servidão administrativa, em
favor da Petróleo Brasileiro S.A. - PETROBRAS, os imóveis que
menciona, situados no Estado do Rio Grande do Norte,
necessários à construção do Trecho Terrestre do Projeto do
Aqueduto UTPF/PUB-3, bem como de suas instalações
complementares, e dá outras providências (Processo MME no
48000.002447/2009-96) tendo por fundamento o art. 8º, VIII, da
294
Lei nº 9.478/97 (norma semelhante ao que estipula o art. 29, IX da
Lei nº 8.987/95).
Sua extinção pode se dar por desaparecimento do bem
gravado, perda do interesse público ou pela incorporação do
imóvel ao domínio público.
A base legal para a servidão administrativa está no art. 40 do Dec. Lei
3.365/41 (lei geral de desapropriação), que possibilita, aos mesmos
entes que podem expropriar, a constituição deste ônus. Como na
desapropriação, edita-se declaração de necessidade pública, utilidade
pública, ou interesse social de parte do imóvel para fins de servidão
administrativa, o que não parece pertinente em servidões simples, não
gravosas, genéricas, por exemplo, para a fixação de placas de nome de
ruas. Nos termos da Lei 8.987/95 (concessão de serviço público), art.
29,VIII, entre os encargos do concedente figura a declaração de
necessidade ou utilidade pública, para fins de servidão, dos bens
necessários à execução de serviço ou obra pública promovendo-a
diretamente ou mediante outorga de poderes à concessionária, caso em
que será desta o ônus indenizatório; por outro lado, dentre os encargos
da concessionária inclui-se instituir servidões autorizadas pelo
concedente, conforme previsto no edital e no contrato (art.31,VI).
Após editado o ato declaratório da servidão, esta poderá concretizar-se
por acordo ou mediante sentença do judiciário em ação movida pelo
poder público ou seu delegado. Caso servidão seja instituída de fato, o
proprietário poderá pleitear ressarcimento na via administrativa; não
obtendo êxito ou não pretendendo usar esta via, moverá ação de
reparação de dano. Algumas servidões advêm diretamente da lei:
servidão para transporte e distribuição de energia elétrica, servidão nas
margens dos rios (Código de Águas). (MEDAUAR, 2008, p. 348).
Ressalta-se suas principais características:
Possui natureza jurídica de direito real de uso;
Pode ser instituída por acordo administrativo (precedido de
declaração de necessidade pública) ou sentença judicial (não é
autoexecutável);
ADMINISTRATIVO – SERVIDÃO ADMINISTRATIVA –
LINHAS DE TRANSMISSÃO DE ENERGIA ELÉTRICA –
DECRETO DO PODER EXECUTIVO DE DECLARAÇÃO DE
CONSTITUIÇÃO DA SERVIDÃO – AUSÊNCIA.
1. Segundo a doutrina, as servidões administrativas, em regra, decorrem
diretamente da lei (independente de qualquer ato jurídico, unilateral ou
bilateral) ou constituem-se por acordo (precedido de ato declaratório de
utilidade pública) ou por sentença judicial (quando não haja acordo ou
quando adquiridas por usucapião).
Direito Administrativo
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2. Não observadas as formalidades necessárias à implementação da
servidão administrativa (decreto de declaração de utilidade pública), em
atenção ao princípio da eficiência e da continuidade do serviço público,
deve ser mantida a servidão, com a indenização correspondente à justa
reparação dos prejuízos e das restrições ao uso do imóvel, como ocorre
com a desapropriação indireta.
(STJ, REsp nº 857.596/RN, Relatora Ministra Eliana Calmon,
Julgado em 06/05/2008).
Deve ser levada a registro no Registro de Imóveis;
Possui caráter de permanência (definitividade);
Dá-se sobre bens imóveis;
Indenização prévia e condicionada (se houver prejuízo).
Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2009, p. 150), pode
decorrer ainda diretamente de lei como, por exemplo, sobre as
margens dos rios navegáveis e servidão ao redor de aeroportos.
Nesta hipótese não caberia direito à indenização, porque imposta a
toda a coletividade de imóveis que se encontram na mesma
situação. Quando decorrer de acordo ou sentença judicial,
incidindo sobre imóveis determinados, a regra é a indenização,
porque seus proprietários estão sofrendo prejuízo em benefício da
coletividade, devendo ser calculada a cada caso concreto, devendo
demonstrar o prejuízo.
São exemplos: a implantação de gasodutos e oleodutos, a
passagem de redes elétricas, telefônicas e cabos ópticos, a
colocação dos nomes de ruas em prédios e casas e de ganchos para
sustentar fios da rede elétrica, etc.
2.2. Requisição Administrativa
É o meio de intervenção estatal no qual o Estado, nas
situações de perigo iminente, utiliza bens móveis, imóveis ou,
ainda, serviços particulares. A requisição pode ser tanto civil, como
em inundações, incêndio, comoção social, catástrofes e sonegação
de gêneros de primeira necessidade, quanto militar, como nos
casos de manutenção da segurança interna, da soberania nacional,
conflito armado, etc.
O vigente código civil, confirmando o instituto na parte em que
disciplina a propriedade, deixou expresso que o proprietário pode ser
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privado da coisa não só em caso de desapropriação, como também “no
de requisição, em caso de perigo público iminente” (arte. 1.228, § 3°),
o que reforça o caráter social da propriedade. De outro lado, a lei n°
8.080, de 19.09.90, que regula os serviços de saúde, contempla a
requisição de bens e serviços de pessoas naturais ou jurídicas, para
atendimento de “necessidades coletivas, urgentes e transitórias,
oriundas de perigo iminente, calamidade pública ou irrupção de
epidemias”, assegurada justa indenização. Assim como ocorre com a
servidão administrativa, consuma-se em cinco anos a prescrição da
pretensão do proprietário para postular indenização (se for o caso) em
face da pessoa responsável pela requisição, contado o prazo a partir do
momento em que se inicia o efetivo uso do bem pelo poder público. A
requisição, tal como sucede com a servidão, reflete restrição
decorrente de ato do poder público, e é exatamente ela que rende
ensejo ao pedido indenizatório, em havendo a ocorrência de prejuízos.
(CARVALHO FILHO, 2008, p. 731-732)
Possui fundamento constitucional no art. 5º, XXV e
legislativo no art. 1.228, § 3º, do Código Civil e legislativo no
Decreto-Lei nº 4.812/42 e Lei nº 8.080/90, art. 15, XII.
Por tratar-se de intervenção administrativa presente em
situações de iminente perigo, é autoexecutória (não necessita de
prévia intervenção judicial).
Possui por características:
Possui natureza jurídica de direito pessoal;
Incide sobre bens móveis, imóveis e serviços;
Necessita como pressuposto o perigo público iminente;
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE
SEGURANÇA. MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. UNIÃO
FEDERAL. DECRETAÇÃO DE ESTADO DE CALAMIDADE
PÚBLICA NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE NO MUNICÍPIO
DO RIO DE JANEIRO. REQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS
MUNICIPAIS. DECRETO 5.392/2005 DO PRESIDENTE DA
REPÚBLICA. MANDADO DE SEGURANÇA DEFERIDO. Mandado de segurança, impetrado pelo município, em que se impugna o
art. 2º, V e VI (requisição dos hospitais municipais Souza Aguiar e
Miguel Couto) e § 1º e § 2º (delegação ao ministro de Estado da Saúde
da competência para requisição de outros serviços de saúde e recursos
financeiros afetos à gestão de serviços e ações relacionados aos
hospitais requisitados) do Decreto 5.392/2005, do presidente da
República. Ordem deferida, por unanimidade. Fundamentos
predominantes: (i) a requisição de bens e serviços do município do Rio
de Janeiro, já afetados à prestação de serviços de saúde, não tem amparo
Direito Administrativo
297
no inciso XIII do art. 15 da Lei 8.080/1990, a despeito da invocação
desse dispositivo no ato atacado; (ii) nesse sentido, as determinações
impugnadas do decreto presidencial configuram-se efetiva intervenção
da União no município, vedada pela Constituição; (iii) inadmissibilidade
da requisição de bens municipais pela União em situação de
normalidade institucional, sem a decretação de Estado de Defesa ou
Estado de Sítio. Suscitada também a ofensa à autonomia municipal e ao
pacto federativo. Ressalva do ministro presidente e do relator quanto à
admissibilidade, em tese, da requisição, pela União, de bens e serviços
municipais para o atendimento a situações de comprovada calamidade e
perigo públicos. Ressalvas do relator quanto ao fundamento do
deferimento da ordem: (i) ato sem expressa motivação e fixação de
prazo para as medidas adotadas pelo governo federal; (ii) reajuste, nesse
último ponto, do voto do relator, que inicialmente indicava a
possibilidade de saneamento excepcional do vício, em consideração à
gravidade dos fatos demonstrados relativos ao estado da prestação de
serviços de saúde no município do Rio de Janeiro e das controvérsias
entre União e município sobre o cumprimento de convênios de
municipalização de hospitais federais; (iii) nulidade do § 1º do art. 2º do
decreto atacado, por inconstitucionalidade da delegação, pelo presidente
da República ao ministro da Saúde, das atribuições ali fixadas; (iv)
nulidade do § 2º do art. 2º do decreto impugnado, por ofensa à
autonomia municipal e em virtude da impossibilidade de delegação.
(STF, MS nº 25.295/DF, Min. Rel. Joaquim Barbosa, julgado em
20/04/2005)
Possui caráter transitório (enquanto perdurar o perigo
público). Diógenes Gasparini (2006, p.749) entende que sobre
vestuário e gêneros alimentícios possui caráter definitivo;
Indeniza só se houver dano (posteriormente).
2.3. Ocupação temporária ou provisória
É a utilização transitória, remunerada ou gratuita, de
imóveis particulares, não edificados, como apoio à execução de
obras, serviços ou atividades públicas ou de interesse público,
mesmo que não haja a situação de perigo público iminente. Há,
contudo, uma observação a ser feita. Nem sempre a ocupação
temporária ou provisória incide sobre terrenos não edificados. O
caso de utilização para a colocação de urnas eleitorais e campanhas
de vacinação utilizam-se imóveis edificados. Por esta razão, talvez,
a sua utilização atualmente não se limite a imóveis não edificados
como posto pela norma de 1941. Neste sentido afirma Carvalho
Filho (2008, p. 735): a outra é a ocupação é temporária para as
298
demais obras e para os serviços públicos em geral, sem qualquer
vínculo com o processo de desapropriação executado pelo Estado.
Possui fundamento constitucional no art. 5º, XXV, bem
como no art. 36 do Decreto-Lei nº 3.365/41.
Mediante a ocupação temporária o poder público, por seus próprios
agentes ou por empreiteiros, utiliza provisoriamente terrenos não
edificados, visinhos a obras públicas – essa utilização provisória é
necessária a realização da obra. A base legal dessa figura encontra-se
no art. 36 do Dec.-lei 3.365/41 (lei de desapropriações), que prevê,
também, indenização a final, mediante ação própria. O mesmo
dispositivo determina que o poder público preste caução, se exigida
pelo proprietário. A ocupação temporária deve ser precedida de
declaração de utilidade pública, conforme orientação jurisprudencial.
(MEDAUAR, 2008, p. 346)
Quanto a sua autoexecutoriedade ou não, bem como a
necessidade de ato formal instituidor, a doutrina é bastante
divergente. Diógenes Gasparini (2006, p. 740) não admite a
autoexecutoriedade do ato de instituição da ocupação temporária.
Marcelo Alexandrino (2008, p. 653) entende necessitar do ato
instituidor, mas diversamente entende ser este autoexecutório. José
dos Santos Carvalho Filho (2008, p. 735-6) entende que quando se
tratar de ocupação vinculada à desapropriação o ato instituidor é
necessário, se desvinculada o ato é dispensável, mas em ambos os
casos a ocupação é autoexecutória.
As características da ocupação temporária poderiam ficar
assim sintetizadas:
Cuida-se de direito pessoal;
Incide sobre bens imóveis;
Possui caráter transitório (enquanto perdurar a realização da
obra, serviço ou atividade pública);
Indeniza só se houver dano (posteriormente).
Atenção! Ainda existem as ocupações provisórias previstas na Lei nº 8.666/93, arts. 58, V, 80, II e na Lei nº 8.987/95, art. 35, § 3º.
Direito Administrativo
299
O dever do Estado de indenizar o proprietário pelo uso do imóvel. O
referido dispositivo da lei expropriatória estabelece que a ocupação
“será indenizada, afinal”. Nota-se aqui que a utilização estatal se
consuma por período de tempo mais extenso, gerando, em
consequência, o dever indenizatório.
Na ocupação desvinculada da desapropriação, a regra é a mesma que
vale para servidão administrativa, ou seja, em principio não haverá
indenização, mas esta será devida se o uso acarretar comprovado
prejuízo ao proprietário. Por isso é que os casos que citamos, de obras
em estradas e de serviços eleitorais, não rendem, como regra, ensejo a
qualquer indenização.
Em qualquer caso, contudo, ocorre em cinco anos a prescrição da
pretensão para que o proprietário postule indenização pelos prejuízos
decorrentes da ocupação temporária, que, tanto como a servidão
administrativa e a requisição, se caracteriza como restrição a
propriedade. É o fato em si da ocupação que constitui o termo inicial da
contagem do referido prazo prescricional. (CARVALO FILHO, 2008, p.
735).
São exemplos os depósitos de equipamentos e materiais
para a realização de obra pública, instalação de barracas de
vacinação em clubes ou escolas, de urnas eleitorais, etc.
2.4. Limitação Administrativa
São determinações genéricas, gerais, unilaterais e
gratuitas por meio das quais o Poder Público condiciona o
exercício de direitos dos proprietários de bens imóveis a
obrigações positivas, negativas ou permissivas objetivando o
atendimento da função social. Condiciona o uso da propriedade em
prol da coletividade para que atenda sua função social – deriva do
poder de polícia. Expõe Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2009,
p. 419) que a limitação é intervenção ordinária, abstrata e geral
do Estado na propriedade e na atividade privadas, limitativa do
exercício de liberdades e de direitos, gratuita, permanente e
indelegável.
Sua imposição pode ser decorrente de lei ou decreto,
alcançando uma quantidade indeterminada de propriedades.
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RECURSO
ESPECIAL. DECRETO 750/93. PROIBIÇÃO DO CORTE, DA
EXPLORAÇÃO E DA SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO
300
PRIMÁRIA OU NOS ESTÁGIOS AVANÇADO E MÉDIO DE
REGENERAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA. SIMPLES
LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. AÇÃO DE NATUREZA
PESSOAL. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. DECRETO
20.910/32. RECURSO PROVIDO.
1. Para que fique caracterizada a desapropriação indireta, exige-se que
o Estado assuma a posse efetiva de determinando bem, destinando-o à
utilização pública, o que não ocorreu na hipótese dos autos, visto que
a posse dos autores permaneceu íntegra, mesmo após a edição do
Decreto 750/93, que apenas proibiu o corte, a exploração e a
supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de
regeneração da Mata Atlântica.
2. Trata-se, como se vê, de simples limitação administrativa, que,
segundo a definição de Hely Lopes Meirelles, "é toda imposição geral,
gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de
direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar
social" ("Direito Administrativo Brasileiro", 32ª edição, atualizada por
Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José
Emmanuel Burle Filho - São Paulo: Malheiros, 2006, pág. 630).
3. (...)
4. Não se tratando, todavia, de ação real, incide, na hipótese, a
norma contida no art. 1º do Decreto 20.910/32, o qual dispõe que
"todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou
Municipal, seja qual for a sua natureza, prescreve em cinco anos
contados da data do ato ou fato do qual se originarem".
(...)
(STJ no REsp nº 901.319/SC, julgado em 17/05/2007, Min. Rel.
Denise Arruda). Grifei. No mesmo sentido STJ no REsp nº
1.120.228/SC, REsp nº 1.110.048 e REsp 1.100.563/RS.
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE
INDENIZAÇÃO. CRIAÇÃO DO "PARQUE ESTADUAL DA
SERRA DO MAR". ESVAZIAMENTO DO CONTEÚDO
ECONÔMICO DA PROPRIEDADE. ALEGADA VIOLAÇÃO
DOS ARTS. 44 E 674 DO CÓDIGO CIVIL. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. LIMITAÇÕES
ADMINISTRATIVAS. DECRETO ESTADUAL 10.251/77.
INDENIZAÇÃO INDEVIDA. LIMITAÇÕES PRÉ-
EXISTENTES EM DECORRÊNCIA DE OUTRAS NORMAS.
(...)
3. Ao criar o Parque Estadual da Serra do Mar, o Decreto 10.251/77
previu, em seu art. 6º, a ulterior expedição de ato declaratório de
utilidade pública, para fins de desapropriação, das terras particulares
abrangidas pelo Parque. Todavia, o Estado de São Paulo não procedeu
às transferências de todas as terras para o seu patrimônio mediante a
competente ação de desapropriação. Assim, a criação do parque pelo
Decreto 10.251/77 não resultou na perda da posse, mas sim em
Direito Administrativo
301
limitação ao uso de propriedade, realizada de forma geral, carente de
natureza subjetiva ou individualizada, mas vinculativo a todos os
proprietários de imóveis localizados na área abrangida pelo Parque
Estadual em referência. Certo é que, tendo ocorrido mera limitação
administrativa que afeta, em caráter não substancial, o direito de
propriedade, não se justifica a imposição de indenização
correspondente ao valor da terra quando o que lhe atinge é apenas
limitação de uso, visto que não se concretizou a transferência do
imóvel pela desapropriação. Precedentes da Primeira Seção: EAg
407817 / SP, rel. Ministra Denise Arruda, Dje 3/6/2009; EREsp
610158 / SP, rel. Ministro Castro Meira, DJe 22/9/2008.
4. No caso dos autos, o acórdão recorrido deixou assentado que o
particular não perdeu a exclusividade dos poderes sobre o imóvel em
discussão, não obstante possuir o dever de respeitar as limitações
estabelecidas por lei, fato que afasta o cabimento da indenização pela
desapropriação indireta. Nada impede, todavia, que se postule
indenização em ação própria acaso comprovada a ocorrência de
prejuízos ao proprietário decorrente de limitação administrativa mais
extensa do que aquelas já existentes à época da edição do Decreto
10.251/77.
5. (...)
(STJ no REsp nº 703.591/SP, julgado em 23/03/2010, Min. Rel.
Mauro Campbell Marques). Grifos meus.
Caracteriza-se por (CARVALHO FILHO, 2008, p. 740):
Decorrer de ato legislativo ou administrativo (ato de caráter
geral);
Possuir caráter de definitividade;
Ser motivada por interesses públicos abstratos;
Indenizável somente se perpetrando dano.
DIREITO ADMINISTRATIVO. LIMITAÇÃO
ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DE
RESSARCIMENTO.
A pretensão reparatória do esvaziamento do conteúdo econômico da
propriedade decorrente de limitações administrativas prescreve em
cinco anos, nos termos do art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei
n. 3.365/1941. Os danos eventualmente causados pela limitação
administrativa devem ser objeto de ação de direito pessoal, cujo prazo
prescricional é de cinco anos, e não de direito real, que seria o caso da
desapropriação indireta. A limitação administrativa distingue-se da
desapropriação: nesta, há transferência da propriedade individual para o
domínio do expropriante, com integral indenização; naquela, há apenas
restrição ao uso da propriedade imposta genericamente a todos os
proprietários, sem qualquer indenização. Dessa forma, as restrições ao
302
direito de propriedade impostas por normas ambientais, ainda que
esvaziem o conteúdo econômico, não constituem desapropriação
indireta. Precedentes citados: AgRg no REsp 1.235.798-RS, DJe
13/4/2011; AgRg no REsp 1.192.971-SP, DJe 3/9/2010, e EREsp
901.319-SC, DJe 3/8/2009. (AgRg no REsp 1.317.806-MG, Rel. Min.
Humberto Martins, julgado em 6/11/2012). Grifos meus.
São exemplos: a imposição de limpeza de terrenos,
parcelamento ou edificação compulsória de terrenos (art. 182, § 4º,
da CRFB/88), proibição de construir além de determinada altura, a
proibição de desmatamento florestal em área de preservação
permanente, o recuo de calçada nas construções, a permissão de
vistoria em elevadores, etc.
2.5. Tombamento
O tombamento (Decreto-Lei nº 25/37) é modalidade de
intervenção no uso da propriedade, utilizado (também) como
instrumento de preservação do patrimônio cultural brasileiro, com
fundamento Constitucional no art. 216, § 1º. São exemplos desta
espécie de proteção (do Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil):
a feira nordestina de São Cristóvão, a feira de Caruaru, o Carimbó
Paraense, a roda de capoeira, o samba carioca, o ofício das baianas
de acarajé, o frevo, a festa do bumba meu boi, entre outros. O
instrumento legal que assegura a preservação do patrimônio
cultural imaterial do Brasil é o registro, instituído pelo IPHAN.
A competência para legislar sobre a proteção do
patrimônio histórico, cultural e artístico é concorrente entre a
União, Estados e Distrito Federal (art. 24, VII, da CRFB/88) e
suplementar dos municípios 30, II, da CRFB/88. A competência
material (administrativa ou executiva – para efetivar o
tombamento) vem prevista nos arts. 23, III, IV, e 30, IX da
CRFB/88.
A finalidade primordial do tombamento é a proteção do
meio ambiente cultural (o valor cultural pertencente ao bem é
anterior ao próprio tombamento - REsp nº 753.534/MT) nele
compreendidos os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico,
paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e
científico. Pode incidir sobre bens materiais móveis ou imóveis. O
Direito Administrativo
303
tombamento de coisa pertencente à pessoa natural ou à pessoa
jurídica de direito privado se fará de forma voluntária ou
compulsória. Voluntário, quando o proprietário consente no
tombamento do bem, seja a pedido ou por aceitação. Compulsório,
quando o proprietário se recusar a anuir à inscrição da coisa.
Quando o poder executivo não toma as medidas necessárias para o
tombamento de um bem que reconhecidamente deva ser protegido, em
face de seu valor histórico ou paisagístico, a jurisprudência tem
entendido que, mediante provocação do ministério público (ação civil
pública) ou de cidadão (ação popular), o judiciário pode determinar ao
executivo faça a proteção. (MEIRELLES, 2009, p. 587).
Há decisão do Superior Tribuna de Justiça (REsp nº
41.993/SP) no sentido de que quando o Poder Público protela
indefinidamente o processo de tombamento afetando o direito de
propriedade, pode o poder judiciário anular o referido processo,
afastando as limitações impostas.
Será provisório o tombamento enquanto estiver em curso
o processo de tombamento e definitivo com a respectiva inscrição
do tombamento no registro de imóveis. O tombamento provisório
se equipara em seus efeitos ao tombamento definitivo uma vez que
o instituto do tombamento provisório não é fase procedimental
precedente do tombamento definitivo. Caracteriza-se como medida
assecuratória da eficácia que este poderá, ao final, produzir (STJ,
RMS nº 8.252/SP).
Traz como consequência a imodificabilidade, a proibição
de alterar, destruir, transformar ou modificar o bem, cabendo tão
Atenção! O tombamento dos bens pertencentes à União, aos Estados e aos Municípios se fará de ofício, devendo ser notificada a entidade a quem pertencer a coisa, ou sob cuja guarda estiver a coisa tombada, a fim de produzir os necessários efeitos (art. 5º do DL 25/37). As coisas tombadas que pertençam à União, aos Estados ou aos Municípios, inalienáveis por natureza, só poderão ser transferidas de uma para a outra das referidas entidades (art. 11 do Decreto-Lei).
304
somente ao proprietário a sua manutenção e conservação, ficando,
ademais, submetida a coisa tombada à vigilância permanente do
IPHAN, que poderá inspecioná-lo sempre que for julgado
conveniente, não podendo o respectivo proprietário ou responsável
criar obstáculos à inspeção. Uma vez tombada a coisa, não poderá
esta sair do país, senão por curto prazo, sem transferência de
domínio e para fim de intercâmbio cultural.
O ato de tombamento não transfere a propriedade do bem
ao Poder Público, permanecendo com o respectivo dono a sua
posse e propriedade, devendo, entretanto, o ato ser averbado junto
à matrícula do imóvel. Não impede também de alienar (o Poder
Público neste caso tem direito de preferência) ou gravar o bem por
meio de penhor, anticrese ou hipoteca. Os imóveis vizinhos
acabam também por sofrer restrição por via reflexa, pois não
poderão realizar construção que impeça ou reduza a visibilidade,
nem nela colocar cartazes ou anúncios.
Em princípio é cabível indenização quando o
tombamento é individual (isolado) como um prédio, por exemplo,
e desde que o proprietário comprove que o ato de tombamento lhe
causou prejuízo. Não o será, se tiver alcance geral, como uma
cidade (Ouro Preto ou Olinda), por exemplo.
Não há consenso na doutrina em saber qual a natureza
jurídica do tombamento. Devido ao objetivo da presente obra,
cabe unicamente expor as teorias conflitantes. Alguns autores
entendem a natureza do tombamento como de servidão
(GASPARINI, 2006, p. 744-5). Outros como instrumento especial
de intervenção restritiva do Estado na propriedade privada (DI
PIETRO, 2009, p. 147). José dos Santos Carvalho Filho (2008, p.
744) entende também ser uma intervenção especial na propriedade,
entretanto, aceita como natureza de servidão ou desapropriação
quando o tombamento interdita o uso do bem pelo proprietário.
Atenção! O tombamento é sempre uma restrição parcial ao direito de propriedade do imóvel. Se esta restrição for integral, estaremos diante de uma desapropriação indireta.
Direito Administrativo
305
É ato discricionário, e por consequência pode ser objeto
de revogação (quando o ato torna-se inconveniente ou inoportuno)
ou anulação, por ilegalidade. Deve ser precedido de processo
administrativo, em que se apurará a necessidade de intervenção do
Estado na propriedade, devendo respeitar-se o contraditório e a
ampla defesa (o devido processo legal).
São obrigações geradas pelo tombamento ao proprietário
do imóvel para Di Pietro (2009, p. 143-144).
Positivas: fazer as obras de conservação necessárias à preservação do
bem ou, se não tiver meios, comunicar a sua necessidade ao órgão
competente (...); em caso de alienação onerosa do bem, deverá assegurar
o direito de preferência da União, Estados e Municípios, nessa ordem,
sob pena de nulidade do ato, sequestro do bem por qualquer dos titulares
do direito de preferência e multa de 20% do valor do bom (...). Se o bem
tombado for público, será inalienável, ressalvada a possibilidade de
transferência entre União, Estados e Municípios;
Negativas: o proprietário não pode destruir, demolir ou mutilar as
coisas tombadas nem, sem prévia autorização do IPHAN, repará-las,
pintá-las ou restaurá-las, sob pena de multa de 50% do dano causado;
também não pode em se tratando de bens móveis não pode retira-los do
país, se não por curto espaço de tempo, para fins de intercâmbio cultural
(...).
Obrigação de suportar: o proprietário fica sujeito à fiscalização do
bem pelo órgão técnico competente, sob pena de multa em caso de opor
obstáculos indevidos à vigilância.
O desfazimento, embora não seja comum, é possível.
Depois do tombamento, o poder público, de oficio ou em razão de
solicitação do proprietário ou de outro interessado, pode entender
que tenha desaparecido o fundamento que deu suporte ao ato de
tombamento. Havendo este reconhecimento, desaparece o motivo
para a restrição ao uso da propriedade, promovendo-se o
cancelamento do ato de inscrição, fato também denominado por
alguns de destombamento (CARVALHO FILHO, 2008, p. 747).
Porém um cuidado há de ser tomado: o cancelamento não resulta
de avaliação discricionária da administração; ao revés, está ela
vinculada ás razões que fizeram desaparecer o fundamento
anterior. Assim, se o bem tombado continua a merecer proteção,
não pode a administração agir a seu exclusivo arbítrio e proceder
ao destombamento, porque, assim agindo, sua conduta seria
306
ofensiva aos mandamentos constitucionais que impõe (e não
facultam) a tutela dos órgãos públicos. (CARVALHO FILHO,
2008, p. 748)
2.6. Desapropriação
É procedimento administrativo pelo qual o Poder Público
transfere para si compulsoriamente a propriedade de terceiro, por
razões de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social,
geralmente, mediante justa e prévia indenização em dinheiro.
Bem da verdade, não é uma transferência propriamente
dita, é meio de aquisição originário de propriedade. Isso porque a
propriedade transferida para o Poder Público não provém de
nenhum título anterior (logo, livre de quaisquer ônus), ficando
eventuais credores sub-rogados no preço pago a título de
indenização.
É a modalidade de intervenção na propriedade mais
gravosa, pois o antigo proprietário é despojado do seu bem pelo
Poder Público, não se limitando a condicionar o seu uso como nas
modalidades anteriores.
Algumas observações a autora Maria Sylvia Zanella Di
Pietro (2009, p. 177-8) faz quanto ao fato de a desapropriação ser
forma originária de aquisição da propriedade:
A ação judicial de desapropriação pode prosseguir
independentemente de saber a Administração quem seja o
proprietário ou onde possa ser encontrado (decorrência do art.
20 do Decreto-Lei nº 3.365/41).
Se a indenização fora paga a terceiro, que não o proprietário,
não se invalidará a desapropriação (por força do art. 35 do
referido Decreto). Qualquer ação posterior resolver-se-á em
perdas e danos.
Todos os ônus que recaiam sobre o bem expropriado
extinguem-se e ficam sub-rogados no preço.
A transcrição da desapropriação no registro de imóveis
independe da verificação de continuidade em relação às
transcrições anteriores, não cabendo qualquer apontamento
por parte do Oficial do Registro de Imóveis.
Direito Administrativo
307
A desapropriação está prevista no art. 5º, XXIV, da
CRFB/88, sendo que a competência para legislar sobre
desapropriação é privativa da União conforme o art. 22, II, da
CRFB/88, que assim procedeu no Decreto-Lei nº 3.365/41, na Lei
nº 4.132/62, na Lei nº 8.629/93 e na Lei Complementar nº 73/93.
Há ainda outras normas constitucionais que contemplam
matéria envolvendo desapropriação, como o art. 182, § 4º, III, o
art. 184 e o art. 243.
Não são somente os entes políticos que podem
realizar/promover as desapropriações. Concessionárias e
permissionárias de serviço público (que exercem funções
delegadas de poder público), entidades da Administração Pública
Indireta prestadora de serviço público ou exploradora de atividade
econômica também podem, desde que expressamente autorizadas
por lei ou contrato (arts. 3º do DL nº 3.365/41, 31, VI, da Lei
8.987/95 e Lei nº 9.478/97, art. 8º, VIII). Entretanto, é de bom
alvitre destacar que: incumbe ao poder concedente declarar de
utilidade pública os bens necessários à execução ou de obra
promovendo as desapropriações, diretamente ou mediante outorga
de poderes à concessionária, caso em que será desta a
responsabilidade pelas indenizações cabíveis (art. 29, VIII da Lei
nº 8.987/95). Exemplificativamente pode-se citar o Decreto nº
12.930/10 que: declara de utilidade pública, para fins de
desapropriação, em favor da concessionária Autopista Litoral Sul
S.A., os imóveis que menciona, localizados no Município de São
José dos Pinhais, no Estado do Paraná, necessários à execução
das obras de melhoria da interseção de acesso ao Distrito
Industrial de Campo Largo da Roseira, localizada no km
628+100m da Rodovia BR-376/PR (Processo ANTT no
50500.017159/2010-81).
O bem desapropriável pode ser móvel ou imóvel,
corpóreo ou incorpóreo, não sendo passível de desapropriação a
moeda corrente e os chamados direitos personalíssimos, como a
honra, a moral, a vida, a liberdade, etc. O artigo 185 da Carta
Magna também aponta como insuscetíveis de desapropriação para
fins de reforma agrária: a) pequena e média propriedade rural,
308
assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra,
e; b) a propriedade produtiva.
Bens públicos também podem ser objeto de
desapropriação, desde que haja autorização legislativa e
observada a hierarquia política entre as entidades, como a União
desapropriando bens dos Estados, ou Municípios, os Estados bens
dos Municípios integrantes do seu território, (art. 2º, § 2º do DL nº
3.365/41. Neste sentido o STF no RE nº 172.816/RJ. Ainda as
Súmulas 157 e 479 do STF).
DESAPROPRIAÇÃO. MUNICÍPIO. BENS. UNIÃO.
A Turma reiterou o entendimento de que é vedado ao município
desapropriar bens de propriedade da União ou de suas autarquias e
fundações, assim como das empresas públicas e sociedades de
economia mista submetidas à sua fiscalização, sem prévia autorização,
por decreto, do presidente da República. Precedentes citados: REsp
214.878-SP, DJ 17/12/1998, e REsp 71.266-SP, DJ 9/10/1995. (REsp
1.188.700-MG, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 18/5/2010).
ADMINISTRATIVO - DESAPROPRIAÇÃO - BEM DE
EMPRESA PÚBLICA FEDERAL - MUNICÍPIO - AUSÊNCIA
DE AUTORIZAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA -
IMPOSSIBILIDADE.
A ECT é uma empresa pública federal, com capital total da União, e
não pode ter os seus bens desapropriados por um Município, sem
prévia autorização, por decreto, do Presidente da República. Recursos
providos. (REsp nº 214.878/SP, Ministro Garcia Vieira, julgado em
05/10/1999).
2.6.1. Espécies de desapropriação
2.6.1.1. Desapropriação ordinária ou clássica
Realizada mediante justa e prévia indenização paga em
dinheiro (art. 5º, XXIV, da CRFB/88), pode recair sobre qualquer
imóvel e ser efetivada por qualquer ente da federação. Possui esta
denominação porque não tem caráter punitivo.
Desapropriação por necessidade pública: dá-se quando o
bem é indispensável, quando a Administração está diante de
uma situação anormal, inadiável, de emergência e cuja
solução exija a desapropriação do bem. São os casos
Direito Administrativo
309
constantes no art. 5º do DL nº 3.365/41, alíneas a a d, ainda
que o decreto lhe tenha dado o nome de utilidade pública.
Desapropriação por utilidade pública: são situações normais
nas quais mesmo não havendo a indispensabilidade do bem
sua desapropriação é conveniente, traz algum benefício para a
Administração. São os demais casos presentes no art. 5º do
DL nº 3.365/41.
Desapropriação por interesse social: regulada pela Lei nº
4.132/62, são as hipóteses que se impõe a desapropriação para
melhor aproveitamento da propriedade, para justa distribuição
em prol da coletividade. Os casos desta espécie de
desapropriação estão previstos no art. 2º da referida lei, como
para a construção de casas populares, proteção do solo e a
preservação de cursos e mananciais de água e de reservas
florestais, aproveitamento de bem improdutivo, entre outros.
2.6.1.2. Desapropriação extraordinária
Realizada mediante justa indenização, mas paga com
títulos da dívida pública ou agrária (art. 182, § 4º, III, e 184 a 186
da CRFB/88), deve recair sobre bens que não estejam cumprindo
sua função social e somente realizada pela União para fins de
reforma agrária, e pelos Municípios ou Distrito Federal para fins de
urbanização. Tem esta nomenclatura porque possui nítido caráter
punitivo.
Desapropriação para fins de reforma agrária: desapropriação
privativa da União, realizada pelo INCRA, com fundamento
constitucional nos arts. 184 a 186, incidindo sobre imóveis
Atenção! Há discussão acerca da possibilidade de os Estados utilizarem a Lei nº 4.132/62 para desapropriação por interesse social. Para tanto, não poderiam utilizá-la para reforma agrária (de competência privativa da União) e a indenização deveria ser em dinheiro (neste sentido o STJ no REsp nº 20.896/SP, no RMS nº 16.627/RS e no RMS nº 13.959/RS).
310
que não estejam cumprindo sua função social. É regulada pela
Lei Complementar nº 76/93 e Lei nº 8.629/93.
Desapropriação para fins de reforma urbana: desapropriação
privativa dos Municípios e do Distrito Federal, com
fundamento constitucional no art. 182, § 4º, III, incidindo
sobre imóveis urbanos que não estejam cumprindo sua função
social de acordo com o Plano Diretor da cidade. Está
disciplinada na Lei nº 10.257/01 (Estatuto da Cidade).
Uma última espécie que poderia se mencionar de
desapropriação é a desapropriação confisco, que na verdade não
se trata de uma desapropriação, mas sim de verdadeiro confisco, ou
expropriação, porque não é realizada qualquer indenização. De
competência privativa da União (art. 243 da CRFB/88), esta
expropriação ocorre em propriedades onde forem encontradas
culturas ilegais de plantas psicotrópicas, disciplinada pela Lei nº
8.257/91. Uma vez realizada a expropriação o imóvel é destinado
ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos
alimentícios e medicamentosos. Possui acentuado grau punitivo.
O art. 243 da Constituição Federal, ao utilizar o termo gleba,
pretendeu que a totalidade do imóvel fosse confiscada, ainda que
somente sobre parte dele tenha se dado os cultivos ilegais (STF no
RE nº 543.974/MG).
2.6.2. Procedimento da desapropriação
O procedimento administrativo de desapropriação pelo
DL nº 3.365/51 resume-se basicamente em duas fases: fase
declaratória e fase executória.
2.6.2.1. Fase declaratória
Consubstancia-se na declaração da finalidade –
necessidade, utilidade pública ou interesse social –, bem como na
descrição detalhada do bem e a indicação do dispositivo legal
autorizador da desapropriação. É a fase em que o Poder Público
manifesta sua vontade de desapropriar aquele bem.
Direito Administrativo
311
Pode ser realizada tanto pelo Poder Executivo via
decreto, art. 6º do DL nº 3.365/41, quanto pelo Poder Legislativo
por meio de lei (DI PIETRO, 2009, p. 164; GASPARINI, 2006, p.
790) ou por meio de decreto legislativo (pois neste caso não estaria
sujeito a sanção ou veto do Poder Executivo [CARVALHO
FILHO, 2008, p. 777]), art. 8º do DL nº 3.365/41.
Quando recair sobre bens públicos, a autorização
legislativa é obrigatória por força do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei
referido. São efeitos do ato declaratório:
Permite que as autoridades penetrem no bem (art. 7º do DL nº
3.365/41);
Fixa o estado do bem para efeito da futura indenização;
Inicia a contagem do prazo de caducidade do ato (5 anos nos
casos de utilidade pública – art. 10 do DL nº 3.365/41 – e 2
anos nos casos de desapropriação por interesse social – art. 3º
da Lei nº 4.132/62).
2.6.2.2. Fase executória É nesta fase que o Poder Público passa a adotar as
medidas necessárias, a agir efetivamente para concretizar a
desapropriação.
Pode ser processada tanto por via administrativa quanto
por via judicial.
Administrativa ou extrajudicial ou amigável: ocorre quando
há acordo entre o Poder Público e o proprietário do bem.
Trata-se, neste caso, de um pseudo negócio bilateral, um
contrato de compra e venda que anteriormente à manifestação
do proprietário concordando com o valor ofertado, há a
declaração da intenção em desapropriar aquele bem.
Judicial: quando não há acordo na via administrativa, a via
judicial é a única legalmente possível para viabilizar a
desapropriação (não autoexecutável). Entretanto, a discussão
na via judicial somente pode cingir-se sobre vício do processo
judicial ou impugnação do preço (art. 20 do Decreto-Lei nº
3.365/41), sendo vedado ao Judiciário decidir sobre o mérito
da desapropriação, ou seja, os motivos que levaram a
312
Administração a desapropriar aquele bem por necessidade,
utilidade pública ou interesse social (art. 9º do Decreto
citado).
O sujeito ativo do polo processual é sempre o Poder
Público, ou pessoa privada que exerça função delegada. O sujeito
passivo, por sua vez, deve ser o proprietário ou proprietários do
bem. O Ministério Público deve intervir obrigatoriamente no
processo de desapropriação (neste sentido o STF no RE nº
87.168/PB, no RE nº 86.502/RS e ainda o art. 18, § 2º, da LC nº
76/93).
A petição inicial deverá conter, além dos requisitos
previstos no Código de Processo Civil, a oferta do preço, cópia do
contrato e do diário oficial em que foi publicado o decreto
desapropriatório, juntamente com a planta ou descrição dos bens e
suas confrontações.
O processo de desapropriação é um processo moroso, e
muitas vezes o Poder Público necessita com determinada urgência
dar a finalidade planejada ao bem, não podendo esperar a
conclusão do mesmo. Para isso, o art. 15 do DL nº 3.365/41
disponibiliza ao Poder Público a possibilidade de se imitir
provisoriamente na posse alegando urgência, no próprio decreto
expropriatório ou no curso da ação (STJ no REsp nº 24.104/SP e
no REsp nº 33.477/SP), e depositando a quantia arbitrada pelo juiz
(depósito prévio). A imissão provisória na posse deve ser requerida
em até 120 dias da alegação de urgência.
Pelo disposto no art. 33, § 2º, do DL nº 3.365/41 o
expropriado pode levantar até 80% do valor depósito, se não
concordar com o preço oferecido, desde que atendidos os requisitos
do art. 34, quais sejam: I) prova da propriedade, II) quitação das
dívidas fiscais do imóvel e III) publicação de editais, com prazo de
10 dias, para conhecimento de terceiros.
A sentença no processo judicial de desapropriação possui
por efeitos a imissão definitiva na posse do bem, e também
constitui título hábil para a transferência do bem perante o Registro
de Imóveis (art. 29 do DL nº 3.365/41). Entretanto, a
desapropriação somente se conclui com o respectivo pagamento da
Direito Administrativo
313
indenização arbitrada. Até este momento, o Poder Público pode
desistir da desapropriação, pagando por todos os prejuízos
causados ao expropriante, incluindo as despesas processuais (neste
sentido o STJ no REsp nº 402.482/RJ e no REsp nº 187.825/SP).
A indenização, para que seja justa, deve abranger, além
do valor atual da coisa, os danos emergentes, despesas judiciais,
honorários (Súmulas do STJ nºs 131 e 141 e do STF nº 617) e,
correção monetária (Súmula nº 561 do STF), juros compensatórios
(não cumuláveis com os lucros cessantes, STJ no REsp nº
1.094.950/MG, no REsp nº 509.854/RS e no REsp nº 662.859/SP)
e moratórios (Súmulas nº 618 do STF e nºs 12 e 113 do STJ).
DESAPROPRIAÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. DATA DA
AVALIAÇÃO.
A Turma, por maioria, reafirmou o entendimento de que, nas ações de
desapropriação - a teor do disposto no artigo 26 do DL n. 3.365/1941 -
o valor da indenização será contemporâneo à data da avaliação
judicial, não sendo relevante a data em que ocorreu a imissão na
posse, tampouco a data em que se deu a vistoria do expropriante.
Precedentes citados: REsp 1.195.011-PR, DJe 14/2/2011, e REsp
1.035.057-GO, DJe 8/9/2009. (REsp 1.274.005-MA, Rel. originário
Min. Mauro Campbell Marques, Rel. para acórdão Min. Castro
Meira, julgado em 27/3/2012).
Sobre a matéria envolvendo os juros compensatórios e
moratórios tem se manifestado o Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO
PELO INCRA. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE
SOCIAL. REFORMA AGRÁRIA. INDENIZAÇÃO JUSTA.
COBERTURA VEGETAL NATIVA. JAZIDA INEXPLORADA.
PRETENSÃO DE NÃO INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
JUROS COMPENSATÓRIOS. TAXA. SÚMULA 618/STF. MP
1.577/97. ORIENTAÇÃO SEDIMENTADA PELA CORTE EM
RAZÃO DO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL
1.111.829/SP, NOS TERMOS DO ARTIGO 543-C. JUROS
MORATÓRIOS. ART. 15-B DO DECRETO-LEI Nº 3.365/41.
TERMO A QUO.
Atenção! Quando o bem sofre alterações substanciais, o pedido de desistência da desapropriação fica prejudicado (STJ no REsp nº 132.398/SP e no REsp nº 450.383/RS ).
314
1. (...)
2. Segundo a jurisprudência assentada no STJ, a Medida
Provisória 1.577/97, que reduziu a taxa dos juros compensatórios
em desapropriação de 12% para 6% ao ano, é aplicável no
período compreendido entre 11.6.1997, quando foi editada, até
13.9.2001, quando foi publicada a decisão liminar do STF na
ADIn 2.332/DF, suspendendo a eficácia da expressão "de até seis
por cento ao ano", do caput do art. 15-A do Decreto-lei 3.365/41,
introduzida pela referida MP. Nos demais períodos, a taxa dos
juros compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano, como
prevê a súmula 618/STF.
3. O Superior Tribunal de Justiça fixou entendimento segundo o qual
o disposto no art. 15-B do Decreto-Lei n.º 3.365/41, introduzido
originalmente pela MP 1.901-30/99, deve ser aplicado às ações de
desapropriação que já tramitavam em 27/09/1999, por isso os
juros moratórios incidem a partir de 1º de janeiro do exercício
seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos exatos
termos do referido dispositivo.
4. Recurso especial não conhecido.
(REsp nº 569.629/CE, julgado em 1/09/09, Min. Rel. Mauro
Campbell Marques). Grifos meus.
ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO. JUROS
MORATÓRIOS E COMPENSATÓRIOS. INCIDÊNCIA.
PERÍODO. TAXA. REGIME ATUAL. DECRETO-LEI 3.365/41,
ART. 15-B. ART. 100, § 12 DA CF (REDAÇÃO DA EC 62/09).
SÚMULA VINCULANTE 17/STF. SÚMULA 408/STJ.
1. Conforme prescreve o art. 15-B do Decreto-lei 3.365/41,
introduzido pela Medida Provisória 1.997-34, de 13.01.2000, o termo
inicial dos juros moratórios em desapropriações é o dia "1º de janeiro
do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito,
nos termos do art. 100 da Constituição". É o que está assentado na
jurisprudência da 1ª Seção do STJ, em orientação compatível com a
firmada pelo STF, inclusive por súmula vinculante (Enunciado 17).
2. Ao julgar o REsp 1.111.829/SP, DJe de 25/05/2009, sob o regime
do art. 543-C do CPC, a 1ª Seção do STJ considerou que os juros
compensatórios, em desapropriação, são devidos no percentual de
12% ao ano, nos termos da Súmula 618/STF, exceto no período
compreendido entre 11.06.1997 (início da vigência da Medida
Provisória 1.577, que reduziu essa taxa para 6% ao ano), até
13.09.2001 (data em que foi publicada decisão liminar do STF na
ADIn 2.332/DF, suspendendo a eficácia da expressão "de até seis
por cento ao ano", do caput do art. 15-A do Decreto-lei 3.365/41,
introduzido pela mesma MP). Considerada a especial eficácia
vinculativa desse julgado (CPC, art. 543-C, § 7º), impõe-se sua
aplicação, nos mesmos termos, aos casos análogos. A matéria está,
ademais, sumulada pelo STJ (Súmula 408).
Direito Administrativo
315
3. Segundo jurisprudência assentada por ambas as Turmas da 1ª
Seção, os juros compensatórios, em desapropriação, somente incidem
até a data da expedição do precatório original. Tal entendimento está
agora também confirmado pelo § 12 do art. 100 da CF, com a redação
dada pela EC 62/09. Sendo assim, não ocorre, no atual quadro
normativo, hipótese de cumulação de juros moratórios e juros
compensatórios, eis que se tratam de encargos que incidem em
períodos diferentes: os juros compensatórios têm incidência até a data
da expedição de precatório, enquanto que os moratórios somente
incidirão se o precatório expedido não for pago no prazo
constitucional.
4. Recurso especial parcialmente provido. Recurso sujeito ao regime
do art. 543-C do CPC.
(REsp nº 1.118.103/SP, julgado em 24/02/10, Min. Rel. Teori
Albino Zavaski). No mesmo sentido o STJ no REsp nº 1.007.301/PB
e no REsp nº 1.111.829/SP. Grifos meus.
Sobre a questão o STJ editou Súmula de nº 408 onde: nas
ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após
a Medida Provisória nº 1.577/97, devem ser fixados em 6% ao ano
até 13/09/2001 e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da
Súmula nº 618 do Supremo Tribunal Federal.
Com relação ao valor da indenização, manifestou-se o STJ:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO
ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.
SÚMULA 211/STJ. DESAPROPRIAÇÃO. IMÓVEL
COMERCIAL. FUNDO DE COMÉRCIO.
INDENIZABILIDADE. MATÉRIA PACIFICADA.
1. No pertinente à alegada violação dos arts. 19 e 33 do Código de
Processo Civil, a irresignação recursal não merece acolhida. É que a
leitura atenta do acórdão combatido, integrado pelo pronunciamento
da origem em embargos de declaração, revela que tais dispositivos
legais não foram objeto de debate pela instância ordinária, o que atrai
a aplicação da Súmula n. 211 desta Corte Superior, inviabilizando o
conhecimento do especial no ponto por ausência de
prequestionamento. Por outro lado, as alegações que fundamentaram a
pretensa ofensa aos referidos dispositivos são genéricas, sem
discriminação precisa de como tais dispositivos foram violados.
Incide, no caso, a Súmula n. 284 do Supremo Tribunal Federal, por
analogia.
2. O entendimento firmado pelo Tribunal estadual encontra amparo na
jurisprudência consolidada no âmbito da Primeira Seção desta Corte
Superior no sentido de que é devida indenização ao expropriado
316
correspondente aos danos ocasionados aos elementos que compõem o
fundo de comércio pela desapropriação do imóvel. Precedentes: REsp
1076124 / RJ, rel. Ministra Eliana Calmon, DJe 03/09/2009; AgRg no
REsp 647660 / SP, rel. Ministra Denise Arruda, DJ 05/10/2006; REsp
696929 / SP, rel. Ministro Castro Meira, DJ 03/10/2005.
3. Cumpre destacar que, na hipótese em análise, o detentor do fundo
do comércio é o próprio proprietário do imóvel expropriado. Assim, a
identidade de titularidade torna possível a indenização simultânea na
desapropriação. Ademais, o processo ainda se encontra na fase inicial,
o que permite seja apurado o valor de bens intangíveis, representados
pelo fundo de comércio, na própria perícia a ser realizada para fixação
do valor do imóvel, dispensando posterior liquidação de sentença.
4. Agravo regimental não provido
(STJ, AgRg no REsp 1.199.990/SP, Ministro Relator Mauro
Campbell Marques, julgado em 19/04/2012).
É de bom alvitre ressaltar que o valor depositado a título
de imissão provisória pode ser levantado por simples expedição de
alvará. Já o valor final da condenação deve respeitar o sistema de
precatórios judiciais previstos no art. 100 da CRFB/88.
2.6.3. Da destinação dos bens desapropriados
Os bens desapropriados não necessitam ser incorporados
definitivamente à Fazenda Pública. Podem acontecer casos que os
bens desapropriados somente provisoriamente passem ao Poder
Público, e este, em momento posterior, repassa a terceiros.
O repasse dos bens desapropriados a terceiros acontece
na desapropriação por zona ou extensiva (art. 4º do DL nº
3.365/41), ou seja, aquelas que abrangem áreas contíguas
necessárias para o desenvolvimento da obra realizada pelo Poder
Público e as zonas que vierem a sofrer valorização extraordinária
em decorrência da mesma obra (STF no AI nº 42.240). A
Atenção! As desapropriações para fins de reforma agrária (art. 184 da CRFB/88) e urbana (182, § 4º, III, da CRFB/88) são indenizadas com títulos da dívida agrária (resgatáveis no prazo de até 20 anos) e títulos da dívida pública (com prazo de resgate de até 10 anos), respectivamente, devendo respeitar ainda o que expõe o art. 78 do ADCT.
Direito Administrativo
317
declaração de utilidade pública deverá indicar os bens que serão
objeto deste tipo de desapropriação, além de identificar quais serão
para o desenvolvimento da obra, bem como quais sofrerão a
valoração extraordinária.
Outra hipótese em que os bens somente de forma
transitória permanecem com o Poder Público ocorre na
desapropriação para industrialização ou urbanização, prevista no
art. 5º, i do DL nº 3.365/41 (neste sentido o STJ no REsp nº
55.723/MG). Os requisitos para a efetivação deste tipo de
desapropriação estão delimitados nos respectivos §§ 1º, 2º e 3º do
mesmo artigo.
A possibilidade de transferir os bens desapropriados a
terceiros também ocorre na desapropriação para fins de reforma
agrária (Lei nº 4.132/62, art. 4º) e na desapropriação confisco (art.
243 da CRFB/88).
2.6.4. Desapropriação indireta
Equivale ao esbulho possessório. É o fato administrativo
por meio do qual o Poder Público se apropria de bem particular,
sem observar os requisitos da declaração e de indenização prévia.
Vem capitulado no artigo 35 do DL nº 3.365/41
denominado de fato consumado, isso porque uma vez incorporado
ao patrimônio público, resta ao proprietário exigir indenização por
perdas e danos, pelo valor real e atualizado do imóvel (STJ no
REsp nº 827.613/SC) ainda que nulo o processo de desapropriação.
A ação visando o pagamento da indenização deverá ser
ajuizada pelo ex-proprietário do bem, no foro do local da situação
do imóvel. Possui natureza de direito real (STJ no REsp nº
64.177/SP e REsp nº 30.674/SP) porque fundada na perda da
propriedade e enquanto não se configurar o prazo para a
consumação da usucapião extraordinária (STJ na Súmula nº 119 e
no REsp nº 7.459/SP, hoje de 15 anos por força do art. 1.238 do
CCB) o proprietário pode pleitear a indenização. Na ADI-MC nº
2.260/DF o STF manifestou no sentido de que a ação de
desapropriação indireta tem caráter real e não pessoal, traduzindo
uma verdadeira expropriação às avessas.
318
DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. ESBULHO. PROMESSA DE
COMPRA E VENDA NÃO REGISTRADA. INDENIZAÇÃO.
A Turma negou provimento ao recurso ao reafirmar que, em se
tratando de desapropriação indireta, a promessa de compra e
venda, ainda que não registrada no cartório de imóveis, habilita os
promissários compradores a receber a indenização pelo esbulho
praticado pelo ente público. Consignou-se que a promessa de
compra e venda constitui negócio jurídico, sendo imanentes a ele
direitos, deveres, obrigações, exceções e demais categorias eficaciais.
Portanto, o registro não interfere na relação de direito obrigacional,
apenas produz eficácia perante terceiros que não participaram do
contrato. Ademais, possuem direito à indenização o titular do
domínio, o titular do direito real limitado e o detentor da posse.
Precedente citado: REsp 769.731-PR, DJ 31/5/2007.(REsp 1.204.923-
RJ, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/3/2012).
Além da indenização, o ex-proprietário tem direito às
custas processuais, honorários advocatícios, honorários de perito,
juros moratórios de até 6% ao ano, contados a partir de 1º de
janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria
ter sido feito (art. 15-B do Decreto-Lei objeto de estudo). O STF,
na ADI nº 2.332/DF, suspendeu a eficácia da expressão até seis por
cento ao ano dos juros compensatórios previstos no art. 15-A do
Decreto-Lei nº 3.365/41. Foi neste sentido a manifestação da
Suprema Corte na concessão da liminar na ADI mencionada:
Deferiu-se em parte o pedido de liminar, para suspender, no "caput"
do artigo 15-A do Decreto-Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941,
introduzido pelo artigo 1º da Medida Provisória nº 2.027-43, de 27 de
setembro de 2000, e suas sucessivas reedições, a eficácia da expressão
"de até seis por cento ao ano"; para dar ao final desse "caput"
interpretação conforme a Constituição no sentido de que a base de
cálculo dos juros compensatórios será a diferença eventualmente
apurada entre 80% do preço ofertado em juízo e o valor do bem fixado
na sentença; e para suspender os parágrafos 1º e 2º e 4º do mesmo
artigo 15-A e a expressão "não podendo os honorários ultrapassar
R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais)" do parágrafo 1º
do artigo 27 em sua nova redação. (Grifos meus).
DIREITO ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO
INDIRETA. VALORIZAÇÃO DA ÁREA REMANESCENTE.
REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO.
IMPOSSIBILIDADE.
Direito Administrativo
319
Na desapropriação indireta, quando há valorização geral e ordinária da
área remanescente ao bem esbulhado em decorrência de obra ou
serviço público, não é possível o abatimento no valor da indenização
devida ao antigo proprietário. Cabe ao Poder Público, em tese, a
utilização da contribuição de melhoria como instrumento legal capaz
de fazer face ao custo da obra, devida proporcionalmente pelos
proprietários de imóveis beneficiados com a valorização do bem.
Precedentes citados: REsp 795.580/SC, DJ 1º/2/2007; REsp
1.074.994-SC, DJe 29/10/2008. REsp 1.230.687-SC, Rel. Min.
Eliana Calmon, julgado em 18/10/2012
AVENIDA PAULISTA. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA.
TOMBAMENTO. SÚMULA 279. Na desapropriação indireta,
destaca-se a dimensão individual do prejuízo sofrido com o
tombamento. Demonstração, no acórdão recorrido, do dano especial
sofrido pelo proprietário, o qual resultou no esvaziamento do direito
de propriedade. Inviabilidade da pretensão recursal de reexame das
premissas fáticas do acórdão (súmula 279 desta Corte). Agravo
regimental a que se nega provimento. (STF, RE nº 361.127/SP, Min.
Rel Joaquim Barbosa, julgado em 15/05/2012.
2.6.5. Direito de extensão
O direito de extensão consiste no direito de o expropriado
exigir que a desapropriação (inicialmente parcial) alcance a
totalidade do bem, com o pagamento da respectiva indenização,
quando o remanescente resultar esvaziado de seu conteúdo
econômico (art. 19, § 1º, da Lei nº 4.504/64 e art. 4º da LC nº
76/93): para evitar a situação de permanecer com a propriedade
apenas dessa parte inócua, o expropriado deve requerer que a
desapropriação, e, por conseguinte, a indenização a ela se
Atenção! Vem se consolidando o entendimento que caracteriza desapropriação indireta os casos em que a Administração Pública, ainda que por conduta lícita, praticamente esgota o valor econômico do bem, como em casos extremos de tombamento ou instituição de Unidades de Conservação (neste sentido o STJ no REsp nº 141.192/SP, no REsp nº 52.905/SP e no REsp nº 123.080/SP.
320
estenda, transformando-se então a desapropriação de parcial para
total (CARVALHO FILHO, 2008, p. 816). Uma vez negado o
pedido por parte da Administração Pública, ou seja, admitir que o
ex-proprietário permaneça com esse remanescente inócuo, logo
comprovado o esvaziamento do valor econômico do restante imóvel,
cabe, em última hipótese ao proprietário, também, alegar/proceder a
desapropriação indireta.
2.6.6. Tredestinação
É a destinação com finalidade diversa da inicialmente
estabelecida para o bem, em desconformidade com o plano
inicialmente previsto. O bem é empregado para outro fim, que não
o estabelecido no ato expropriatório.
A tredestinação pode ser ilícita quando o Poder Público
transfere a terceiro o bem desapropriado, ou o pratica em desvio de
finalidade permitindo que terceiro beneficie-se de sua utilização. É
o exemplo de uma desapropriação de um imóvel que objetivava a
construção de uma escola, mas que acaba sendo doado para que
uma empresa ali se instale, STJ no RMS nº 18.703/BA, julgado em
28/11/06, Min. Rel. Denise Arruda:
PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA.
RECURSO ORDINÁRIO. DECRETO EXPROPRIATÓRIO. ART.
5º, ALÍNEA I, DO DECRETO-LEI 3.365/41. IMPLANTAÇÃO DE
"UNIDADE" INDUSTRIAL. NULIDADE DO ATO VICIADO
POR DESVIO DE FINALIDADE, POIS BENEFICIA UMA
ÚNICA EMPRESA PRIVADA. AUTORIDADE COATORA
INCOMPETENTE PARA A EXPEDIÇÃO DO ATO.
(...)
4. Por distritos industriais deve-se entender "a área de concentração de
indústrias e atividades complementares delas, ordenada pelo Poder
Público mediante plano urbanístico especial de urbanificação do solo,
com possibilidade de desapropriação da gleba e revenda ou locação dos
lotes aos estabelecimentos industriais interessados" (SILVA, José
Afonso da. "Direito Urbanístico Brasileiro", 4ª ed., rev. e atual., São
Paulo: Malheiros, 2006, pág. 377).
5. O decreto expropriatório editado com fundamento no art. 5º, i, do
Decreto-Lei 3.365/41, beneficiando uma única empresa privada, contém
vício de finalidade que o torna nulo, na medida em que se desvia do
interesse público, contrariando, ainda, os princípios da impessoalidade e
da moralidade administrativa, consagrados no art. 37 da Constituição
Federal.
Direito Administrativo
321
6. Ademais, a construção ou ampliação de distritos industriais pressupõe
"o loteamento das áreas necessárias à instalação de indústrias e
atividades correlatas, bem como a revenda ou locação dos respectivos
lotes a empresas previamente qualificadas", dependendo, ainda, "de
aprovação, prévia e expressa, pelo Poder Público competente, do
respectivo projeto de implantação", tal como definido nos §§ 1º e 2º do
art. 5º do Decreto-Lei 3.365/41, atraindo, desse modo, a competência
exclusiva dos Municípios, a teor do disposto no art. 30, VIII, da CF/88.
7. O Governador do Estado da Bahia não detém competência, tanto para
a expedição do decreto expropriatório atacado pela via do presente
mandamus como para a efetiva desapropriação, visto ser do Município o
interesse público capaz de ensejar a desapropriação para a construção ou
ampliação de distritos industriais.
8. A Primeira Turma desta Corte já se manifestou no sentido de que "é
lícito ao Poder Judiciário declarar nulo decreto expropriatório onde se
verifica desvio de poder" (REsp 36.611/SC, Rel. Min. Humberto Gomes
de Barros, DJ de 22.8.1994).
9. (...)
Mas a tredestinação também pode ser lícita, quando a
finalidade dada ao bem, ainda que diferente da inicialmente
planejada, continua sendo de interesse público (STJ no REsp nº
968.414/SP e no REsp nº 772.676/SP). É o caso de uma
desapropriação que visava a construção de uma escola, mas que
acaba sendo utilizada para a construção de um posto médico. É,
exemplo, também de tredestinação lícita:
DIREITO ADMINISTRATIVO - RECURSO ESPECIAL -
RETROCESSÃO - DESVIO DE FINALIDADE PÚBLICA DE BEM
DESAPROPRIADO - DECRETO EXPROPRIATÓRIO. CRIAÇÃO DE
PARQUE ECOLÓGICO. NÃO EFETIVAÇÃO. BENS DESTINADOS
AO ATENDIMENTO DE FINALIDADE PÚBLICA DIVERSA.
TREDESTINAÇÃO LÍCITA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO À
RETROCESSÃO OU À PERDAS E DANOS.
1. A retrocessão é o instituto por meio do qual ao expropriado é lícito
pleitear as consequências pelo fato de o imóvel não ter sido utilizado
para os fins declarados no decreto expropriatório. Nessas hipóteses, a
lei permite que a parte, que foi despojada do seu direito de
propriedade, possa reivindicá-lo e, diante da impossibilidade de fazê-
lo (ad impossibilia nemo tenetur), venha postular em juízo a reparação
pelas perdas e danos sofridos.
2. A retrocessão constitui-se direito real do ex-proprietário de
reaver o bem expropriado, mas não preposto a finalidade pública
(Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo,
17ª edição, pg. 784).
322
3. Precedentes: RESP n.º 623.511/RJ, Primeira Turma, deste relator,
DJ de 06.06.2005) RESP nº 570.483/MG, Segunda Turma, Rel. Min.
Franciulli Netto, DJ de 30.06.2004).
(...).
10. Consectariamente, em não tendo havido o desvio de finalidade,
uma vez que, muito embora não efetivada a criação de Parque
Ecológico, conforme constante do decreto expropriatório, a área
desapropriada for utilizada para o atingimento de outra finalidade
pública, não há vício algum que enseje ao particular ação de
retrocessão, ou, sequer, o direito a perdas e danos.
11. Precedentes que trataram de matéria idêntica à versada nos
presentes autos: RESP n.º 800.108/SP, Rel. Min. Teori Albino
Zavascki, DJ de 20.03.2006; RESP n.º 710.065/SP, Rel. Min. José
Delgado, DJ de 06.06.2005; RESP n. 847092/SP, Rel. Min. Denise
Arruda, DJ. 18.09.2006.
12. Inexistente o direito à retrocessão uma vez que inocorreu desvio
de finalidade do ato, o expropriados não fazem jus, da mesma forma, à
percepção de indenização por perdas e danos.
13. Não há falar em retrocessão se ao bem expropriado for dada
destinação que atende ao interesse público, ainda que diversa da
inicialmente prevista no decreto expropriatório.
(STJ no REsp nº 868.120/SP, julgado em 27/11/2007, Min. Rel.
Luiz Fux).
2.6.7. Retrocessão
Com previsão legal no art. 519 do Código Civil
Brasileiro, a retrocessão tem espaço quando a coisa expropriada
não é utilizada para o fim originariamente previsto, nem para
qualquer obra ou serviço público. É um direito de preferência que o
antigo proprietário tem em readquirir (de recompra) o bem pelo
preço atual, sendo que somente a tredestinação ilícita enseja direito
à retrocessão. Na impossibilidade de recompra subjaz-lhe a ação de
indenização (perdas e danos).
Atenção! Se a desapropriação se der de forma amigável (pseudo contrato de compra e venda) não terá o particular direito de reclamar a destinação dada ao imóvel, ainda que se dê finalidade diversa da inicialmente pretendida (CARVALHO FILHO, 2008, p. 824 e STJ no REsp nº 46.336/RS. Em sentido contrário o STJ no AgRg no Ag nº 12.955/RS).
Direito Administrativo
323
Paira grande controvérsia se a retrocessão seria um
direito pessoal (CARVALHO FILHO, 2008, p. 821), possuiria
natureza mista: real e pessoal (DI PIETRO, 2009, p. 187) ou seria
um direito real, prevalecendo este entendimento nos tribunais
superiores: STJ no REsp nº 868.655/MG, no REsp nº 868.120/SP;
STF no ERE 104.591/RS, no RE nº109.853/SP, aplicando-lhe o
prazo previsto no antigo Código Civil de 1916, art. 177 (20 anos),
hoje no art. 205, de 10 anos.
CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO. DESAPROPRIAÇÃO.
RETROCESSÃO. DESTINAÇÃO DIVERSA. AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DE QUE O DESVIO TENHA FAVORECIDO
AO PARTICULAR. FINALIDADE PÚBLICA ATINGIDA.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. (...)
2. Acerca da natureza jurídica da retrocessão temos três correntes
principais: aquela que entende ser a retrocessão um direito real
em face do direito constitucional de propriedade (CF, artigo 5º,
XXII) que só poderá ser contestado para fins de desapropriação
por utilidade pública CF, artigo 5º, XXIV. Uma outra, entende
que o referido instituto é um direito pessoal de devolver o bem ao
expropriado, em face do disposto no artigo 35 da Lei 3.365/41, que
diz que “os bens incorporados ao patrimônio público não são
objeto de reivindicação, devendo qualquer suposto direito do
expropriado ser resolvido por perdas e danos.”. Por derradeiro,
temos os defensores da natureza mista da retrocessão (real e
pessoal) em que o expropriado poderá requerer a preempção ou,
caso isso seja inviável, a resolução em perdas e danos. 3. (...)
4. Os autos revelam que a desapropriação foi realizada mediante
escritura pública para o fim de implantação de um Parque Ecológico,
o que traria diversos benefícios de natureza ambiental em face dos já
tão conhecidos problemas relativos à poluição sofridos pela população
daquela região. O imóvel objeto da expropriação foi afetado para
instalação de um polo industrial metal-mecânico, terminal intermodal
de cargas rodoviário, um centro de pesquisas ambientais, um posto de
abastecimento de combustíveis, um centro comercial com 32 módulos
de 32 m cada, um estacionamento, restaurante/lanchonete.
5. Não demonstrado favorecimento a pessoas de direito privado:
Finalidade Pública atingida.
6. Recurso improvido.
(REsp nº 710.065/SP, Julgado em 12/04/2005, Min. Rel. José
Delgado). Grifei.
324
PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO – RETROCESSÃO –
DESVIO DE FINALIDADE DE BEM DESAPROPRIADO –
PRAZO PRESCRICIONAL.
1. A jurisprudência desta Corte e do STF adotou corrente no sentido
de que a ação de retrocessão é de natureza real e, portanto, aplica-se o
art. 177 do CC/16 e não o prazo quinquenal de que trata o Decreto
20.910/32.
2. Recurso especial provido
(STJ, REsp. nº 868.655/MG, Ministro Relator Eliana Calmon, julgado
em 06/03/2007).
Direito Administrativo
325
Capítulo XII
RREESSPPOONNSSAABBIILLIIDDAADDEE CCIIVVIILL DDOO EESSTTAADDOO
1. Introdução
A responsabilidade civil do Estado traduz na obrigação
atribuída ao Poder Público de compor os danos patrimoniais e
morais causados a terceiros. Assim é que determinadas condutas do
Estado, omissivas ou comissivas, materiais ou jurídicas, lícitas
(como na requisição administrativa ou na ocupação temporária) ou
ilícitas podem ser causadoras de dano à pessoa ou ao seu
patrimônio. Nestes casos, será o Estado obrigado a reparar o dano
causado material (patrimonial) ou moralmente. Afirma com
precisão Rafael Maffini (2008, p. 208):
Em relação às condutas ilícitas (ações ou omissões), o fundamento da
responsabilidade do Estado consiste no próprio princípio da
legalidade, que, uma vez infringido, enseja a devida reparação. (...).
No que tange às condutas lícitas (...), bem como naquelas em que o
dano resulta de situações criadas pelo Poder Público, o fundamento da
responsabilidade consiste no princípio da repartição (distribuição) do
ônus (dos encargos) provenientes de atos ou efeitos lesivos. Tal
princípio nada mais é do que um consectário do princípio da
solidariedade social. O raciocínio é mais ou menos o seguinte: a
existência do Estado, que é fruída por todos, traz consigo um “custo”
que lhe é inerente. (...).
A responsabilidade aqui tratada cingir-se-á à
responsabilidade civil extracontratual, isso porque não decorrente
de um contrato (responsabilidade contratual).
Aconselha-se a utilização da expressão responsabilidade
civil do Estado e não da Administração Pública, e isso se deve
porque quem possui personalidade jurídica é o Estado (União,
Estados, Distrito Federal, Municípios). A Administração Pública
não é titular de direitos e obrigações por não possuir personalidade
jurídica e, portanto, não pode figurar como sujeito responsável por
eventual dano ocasionado (DI PIETRO, 2009, p. 638).
326
A norma que regula a responsabilidade civil do Estado
vem prevista na Constituição Federal de 1988, no art. 37, § 6º,
enquanto a norma geral que trata a responsabilidade civil está
insculpida nos arts. 186 e 927 do CCB.
2. Breve histórico
Até a responsabilidade civil estatal assumir a forma com
que hoje é tratada (responsabilidade objetiva – desde a
Constituição de 1946), perpassou por inúmeras teorias que serão,
brevemente, expostas.
2.1. Teoria da irresponsabilidade do Estado
Vigorou no período absolutista, ligada à ideia de
soberania. Neste período, o Estado não era responsável pelos atos
que seus agentes praticavam, porque o Estado não errava: Le roi ne
peaut mal faire e The King can do no wrong (o rei não pode fazer
mal, o rei não erra). Perceba que durante este período não havia
uma cisão sólida do que fosse Estado e o que fosse Igreja. Os
poderes do Rei (Imperador) eram legitimados pela Igreja, que via
naquele um representante do Poder Divino. Logo, se Deus não
errava, por consequência o Rei também não o fazia.
2.2. Teoria da culpa civil ou subjetiva do Estado
A irresponsabilidade do Estado foi combatida fortemente
por sua evidente injustiça e acabou sendo superada ainda mesmo
no século XIX. Cumpre esclarecer que no século XVII a união
Estado/Igreja rompeu-se, cabendo à Igreja assuntos de cunho
religioso e ao Estado assuntos Políticos.
Inicialmente, entretanto, deveriam se distinguir os atos de
império dos atos de gestão. Estes admitiam a responsabilização
civil do Estado, porque se aproximavam dos atos de direito
privado, ou seja, atos praticados em situação de igualdade com os
particulares. Eram baseados na ideia da culpa lato sensu (dolo ou
culpa stricto sensu – negligência, imprudência e imperícia).
Já os atos de império, por serem praticados
soberanamente (com todos os privilégios e prerrogativas) pelo
Estado, não o responsabilizavam civilmente pelos prejuízos
causados. Aplicavam-se, nesses casos, as normas de direito
Direito Administrativo
327
público, protetivas da figura estatal, prevalecendo então a teoria da
irresponsabilidade, dispensando a análise do elemento psicológico,
subjetivo (MORAES, 2002, p. 897).
2.3. Teoria da Culpa Administrativa
Nesta fase, não era mais necessária a distinção entre atos
de império e atos de gestão. O que realmente levava-se em
consideração era a atuação correta ou incorreta do serviço público
prestado, tendo como marco o famoso caso Blanco (1873).
Também denominada de Teoria da culpa anônima ou
da culpa do serviço aqui se desvinculava a culpa individual do
funcionário da culpa do Estado propriamente dita. Assim, se fosse
possível atribuir a responsabilidade pelo dano ao funcionário,
deveria este responder. Caso contrário, responderia o Estado pela
culpa anônima ou falta do serviço público.
A culpa ou falta do serviço (faute du service) poderia
consumar-se quando o serviço não funcionava quando deveria
(culpa in ommitendo), funcionava mal (culpa in commitendo) ou
atrasado, incidindo, nestas três hipóteses, a responsabilidade ao
Estado, independentemente de qualquer apreciação de culpa do
agente.
Assim, sempre que o administrado comprovasse que o
ato danoso originara-se de qualquer uma das três hipóteses,
atribuída estaria a responsabilidade ao Estado.
2.4. Teoria da responsabilidade objetiva
Nesta teoria, a culpa é substituída pela noção de nexo de
causalidade (DI PIETRO, 2009, p. 642). Para o Estado indenizar o
dano é suficiente a prova do ato, do dano e do nexo de causalidade,
prescindido a apreciação da culpa.
No Brasil, esta teoria está consagrada, como já
mencionado, no art. 37, § 6º, da CRFB/88 que assim dispõe: As
pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que
seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando
o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo e
328
culpa, e nos acompanha nesta formatação desde a Constituição de
1946.
3. Elementos constitucionais da responsabilidade civil do Estado
Estudaremos separadamente cada elemento
constitucional caracterizador da responsabilidade civil do Estado,
nunca esquecendo que para a responsabilização do ente todos os
elementos devem estar presentes. O Supremo Tribunal Federal já
decidiu que os elementos que compõe a estrutura e delineiam o
perfil da responsabilidade civil do Poder Público compreendem: a
alteridade do dano, a causalidade material entre o ‘eventusdamni’
e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do
agente público, a oficialidade da atividade lesiva, imputável ao
agente do Poder Público e a ausência de causa excludente da
responsabilidade estatal (AI nº 299.125/SP; RE nº 495.740
AgR/DF; RE nº 481.110 AgR-ED/PE).
3.1. Pessoas responsáveis
Responderão objetivamente pelos danos (prejuízos) as
pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado
prestadoras de serviço público. Como pessoas jurídicas de direito
público interno (como determina o art. 41 do Código Civil)
podemos apontar a União, os Estados, o Distrito Federal, os
Municípios, os Territórios (que Diogo de Figueiredo Moreira Neto,
2009, p. 288, denomina como Autarquias territoriais), as
autarquias, as associações públicas as demais entidades de caráter
público criadas por lei (como por exemplo as Agências
Reguladoras).
Atenção! A teoria da responsabilidade objetiva compreende duas modalidades: a do risco administrativo e a do risco integral. O traço distintivo entre as duas modalidades é a aceitação (risco administrativo) ou não (risco integral) de excludentes de responsabilidade (caso fortuito, força maior, culpa exclusiva da vítima ou culpa de terceiro).
Direito Administrativo
329
Não é aconselhável que se faça a ligação que empresa
pública ou sociedade de economia mista, por serem pessoas
jurídicas de direito privado, respondam subjetivamente, conforme
as normas gerais de responsabilidade civil previstas no Código
Civil (art. 173, § 1º, II, da CRFB/88). Nada impede, por exemplo,
que uma empresa pública (a Empresa Brasileira de Correios e
Telégrafos, por exemplo) preste serviço público, e desta forma sua
responsabilidade será objetiva.
Incluem-se também no conceito de pessoas jurídicas de
direito privado as concessionárias (neste sentido o STJ no Resp nº
647.710/RJ e no REsp nº 467.218/RJ) e permissionárias (STF no
RE nº 206.711/RJ). É o caso de empresas de transporte coletivo, de
fornecimento de energia, água e outros desta natureza, pois na
verdade executam funções que em princípio caberiam ao Estado,
respondendo objetivamente, por eventuais danos. Com relação às
concessionárias e permissionárias importante lembrar do artigo 31,
parágrafo único, da Lei nº 8.987/95 que assim dispõe: As
contratações, inclusive de mão de obra, feitas pela concessionária
serão regidas pelas disposições de direito privado e pela
legislação trabalhista, não se estabelecendo qualquer relação
entre os terceiros contratados pela concessionária e o poder
concedente. Isso porque a concessionária pode contratar com
terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou
complementares ao serviço concedido, bem como a implementação
de projetos associados (art. 25, § 1º). Incumbe à concessionária a
execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos
os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a
terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente
exclua ou atenue essa responsabilidade.
Logo, o que determina a responsabilidade civil como
sendo objetiva é a sua finalidade como prestadora de serviço
público, excluindo as exploradoras de atividade econômica, que
responderão nos moldes gerais da responsabilidade civil (que, via
de regra, é subjetiva, podendo, não obstante, mostrar-se de forma
objetiva como ocorre nos casos do Código de Defesa do
Consumidor, por exemplo).
330
3.2. Danos
Não é qualquer dano que deve ou pode ser indenizado. O
dano para gerar a responsabilidade deve ser (GASPARINI, 2006.
p. 974):
Certo: real, efetivo, existente. Não eventual ou possível. O
dano já deve ter sido experimentado.
Anormal: extraordinário, aquele que ultrapassa as dificuldades
do cotidiano, da vida comum. Que supera as dificuldades do
convívio social.
Especial: pode ser particularizado, individualizado, não
atingindo a coletividade de uma forma abstrata, geral. Deve
ser possível a identificação da pessoa atingida.
3.3. Qualidade de agente
A expressão nessa qualidade quer dizer que o prejuízo
sofrido deve ter sido cometido por pessoa que esteja no exercício
de suas funções ou, pelo menos, a pretexto de exercê-la (art. 124 da
Lei 8.112/90).
Assim o que importa é a qualidade de agente público.
Irrelevante que tenha atuado dentro, fora ou além de suas
atribuições (competências), mas sim que tenha cometido o dano
como se Estado fosse naquele momento (neste sentido o STF no RE
nº 363.423/SP, no RE nº 160.401/SP; o STJ no REsp nº
782.834/MA).
Outro conceito que não pode ser deixado em segundo
plano é o de agente, que não pode ser confundido com o de
servidor. Isso porque o conceito de agente público apresentado no
art. 37, § 6º, da CRFB/88 é amplo, incluindo-se empregados
públicos, servidores, agentes políticos, contratados em caráter
temporário, colaboradores, ainda que sem remuneração,
empregados de concessionárias, entre outros.
3.4. Causa
É de salutar importância ressaltar que a causa nada mais é
que o nexo de causalidade, entre o ato (omissivo ou comissivo,
Direito Administrativo
331
licitou ou ilícito, jurídico ou material) e o dano (certo, anormal e
especial).
No Direito Brasileiro vigora, nos casos de
responsabilidade civil extracontratual do Estado, a teoria da
causalidade adequada, ou seja, o dano deve ser efeito direto e
imediato do ato (art. 403 do CCB). Segundo esta teoria ninguém
pode ser responsabilizado por aquilo que não tiver dado causa e
somente se considera causa o evento que produziu direta e
imediatamente o resultado danoso (neste sentido o STJ no REsp nº
325.622/RJ). No Direito Ambiental, por exemplo, a teoria adotada
é outra, a conditio sine qua non (da equivalência das condições)
que por força do art. 14, § 1º da Lei 6.938/81, adotou a
responsabilidade objetiva na modalidade do risco integral (não
aceitação de nenhuma excludente de responsabilidade).
Nos casos de danos ambientais a indenização é devida,
independentemente da culpa, e pela simples razão de existir a
atividade da qual adveio o prejuízo. O titular da atividade
assumiria todos os riscos dela oriundos. Elucidativo são os
ensinamentos de Annelise Monteiro Steigleder ao expor que:
A fim de resolver estas perplexidades, a teoria do risco integral supõe
que a mera existência do risco gerado pela atividade, intrínseco ou não
a ela, deverá conduzir à responsabilização. Havendo mais de uma
causa provável do dano todas serão reputadas eficientes para produzi-
lo, não se distinguindo entre causa principal e causas secundárias, pelo
que a própria existência da atividade é reputada causa do evento lesivo
danoso. Cuida-se aqui da aplicação, em matéria de nexo de
causalidade, da teoria da conditio sine qua non, cujo mérito é a
potencialidade de atenuar o rigorismo do nexo de causalidade,
substituindo-se o liame entre uma atividade adequada e o seu
resultado lesivo pelo liame entre a existência de riscos inerentes a
determinada atividade e o dano ambiental, fundado em juízos de
probabilidade.
Portanto, diferentemente do que ocorre na teoria do risco criado, que
resolve os problemas causais a partir da teoria da causalidade
adequada, em que se seleciona ‘entre as diversas causas que podem ter
condicionado a verificação daquele dano, aquela que, numa
perspectiva de normalidade e adequação sociais, apresente serias
probabilidades de ter criado um risco socialmente inaceitável, risco
esse, concretizado no resultado danoso’, na teoria da equivalência das
condições basta que o dano possa estar vinculado à existência do fator
risco, o qual é reputado ‘causa’ do dano, pelo que qualquer evento
332
condicionante é equiparado à causa do prejuízo, sem a exigência de
que este seja uma consequência necessária, direta e imediata do
evento. Fundamentam a adoção do mero fator risco, em substituição
ao requisito de uma causa adequada perfeitamente identificada,
vinculada a uma atividade perigosa, a percepção de que a atividade é
realizada no interesse da pessoa ou empresa e o princípio da alterum
neminem laedere.
Quanto à responsabilidade civil da Administração
Pública nos atos comissivos (decorrentes de ação) não restam
maiores dúvidas, haja vista que nestes casos a responsabilidade
será objetiva, pois a ação será imputável diretamente ao Estado.
Logo, a causa (nexo de causalidade) do dano será a ação do agente
estatal.
A mesma facilidade de compreensão não se encontra
quando o ato (ou não ato) é decorrente de uma omissão. Aqui está,
talvez, uma das maiores divergências doutrinárias.
Para a primeira teoria, tanto nos atos comissivos quanto
nos omissivos, a responsabilidade do Estado seria objetiva
(MEIRELLES, 2009, p. 662; MEDAUAR, 2008, p. 366). Para os
defensores desta tese, tanto a ação quanto a omissão seriam causa
do dano, e por isso a responsabilidade objetiva do Estado estaria
configurada.
A segunda teoria, entretanto, distingue os atos comissivos
dos atos omissivos do Estado. Para a primeira hipótese não restaria
dúvida, como visto anteriormente, pois a ação seria causa do dano
(responsabilidade objetiva). Entretanto, nos casos de omissão do
Estado, esta seria tão somente uma condição do dano, e não
necessariamente a sua causa, motivo pelo qual, nestes casos, seria
necessário comprovar a culpa (lato sensu) do Estado, retornando a
responsabilidade nos casos de omissão a ser subjetiva (MELLO,
2001, p. 856-8; CARVALHO FILHO, 2008, p. 532; STF no RE nº
382.054/RJ, no RE nº 512.698/AC, no RE nº 369.820/RS; STJ no
REsp nº 721.439/RJ).
Mas afinal por que subjetiva nos casos de omissão?
Porque a responsabilidade do Estado se daria, nestes casos, por
culpa anônima (faute du service), e como vimos anteriormente,
Direito Administrativo
333
nestes casos, de falta (culpa) do serviço, a responsabilidade do
Estado é subjetiva.
3.5. Terceiros
A 2ª Turma do STF no RE nº 262.651/SP entendeu, por
maioria de votos, que os terceiros, referidos no art. 37, § 6º, da
CRFB/88, seriam somente os usuários do serviço público,
excluindo os não usuários. Para ficar mais fácil a compreensão
desta afirmativa imagine um acidente de trânsito envolvendo um
ônibus de transporte urbano e um automóvel, em que restassem
feridas pessoas tanto dentro do coletivo, quanto no automóvel
colidido. Segundo o entendimento da 2ª Turma do STF, os usuários
do transporte coletivo poderiam valer-se da norma constitucional,
configurando a responsabilidade objetiva do Estado. Já com
relação aos passageiros do automóvel, por não serem usuários do
transporte coletivo, teriam que comprovar além dos requisitos
exigidos para a responsabilização objetiva, também a culpa
(negligência, imprudência ou imperícia), isso porque a
responsabilidade do Estado frente a eles seria subjetiva.
Muitas vozes doutrinárias levantaram-se contra esse
entendimento, principalmente por não poder ser a condição da
vítima requisito para a caracterização da responsabilidade civil
objetiva do Estado, mas sim a do autor do ato. Ademais, não
poderia o Estado ao delegar uma função tipicamente sua, ter
diminuída sua responsabilidade.
Atenção! Nos casos em que o Estado cria a situação de dano, como a criação de um presídio ou um paiol de armas, ou ainda quando o Estado descumpre ordem (dever) legal específica (contrário às ordens legais genéricas como segurança, saúde, habitação, emprego, entre outros) ou judicial, sua omissão equivaleria (equiparar-se-ia) a uma ação, e por isso, sua responsabilidade transmutaria de subjetiva para objetiva (JUSTEN FILHO, 2006, p. 814; o STJ no REsp nº 105.102-3/RJ, no REsp nº 719.738/RS, no REsp nº 1.142.245/DF).
334
Entretanto (como afirmado na primeira edição) a
Suprema Corte, em julgamento feito pelo plenário em 26 de agosto
de 2009, do RE nº 591.874/MS, reviu sua posição e inclui no
conceito de terceiros tanto os usuários quanto os não usuários do
serviço.
CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE DO ESTADO.
ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. PESSOAS JURÍDICAS DE
DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO
PÚBLICO. CONCESSIONÁRIO OU PERMISSIONÁRIO DO
SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA EM RELAÇÃO A
TERCEIROS NÃO USUÁRIOS DO SERVIÇO. RECURSO
DESPROVIDO. I - A responsabilidade civil das pessoas
jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público é
objetiva relativamente a terceiros usuários e não-usuários do
serviço, segundo decorre do art. 37, § 6º, da Constituição
Federal. II - A inequívoca presença do nexo de causalidade
entre o ato administrativo e o dano causado ao terceiro não
usuário do serviço público, é condição suficiente para
estabelecer a responsabilidade objetiva da pessoa jurídica de
direito privado. III - Recurso extraordinário desprovido
3.6. Direito de regresso
Há duas relações em se tratando de responsabilidade civil
do estado. A primeira relação terceiro – Estado e outro Estado –
agente, e esta última relação é que será tratada agora.
A primeira relação pode se dar com base na
responsabilidade objetiva (nos casos de ação) ou subjetiva (nos
casos de omissão). Já a segunda sempre se dará com base na
responsabilidade subjetiva, pois como afirma a parte final do art.
37, § 6º, da CRFB/88, (...) assegurado o direito de regresso contra
o responsável nos casos de dolo ou culpa. Quis o parágrafo
comentado que contra o servidor, sempre, fosse perquirida sua
culpa (lato sensu).
O direito de regresso é gênero do qual são espécies a
denunciação da lide e a ação regressiva:
Direito Administrativo
335
Denunciação da lide
Direito de regresso
Ação regressiva
A denunciação da lide dar-se-ia por força do art. 70, III,
do Código de Processo Civil, sendo obrigatória àquele que
estivesse obrigado, por lei ou contrato, a indenizar em ação
regressiva ao que tivesse perdido a ação (no caso o Estado).
A dúvida entre ambos os institutos restou superada, pelo
menos com relação aos servidores públicos civis da União (Lei nº
8.112/90) e com relação aos servidores públicos civis do Estado do
Rio Grande do Sul (Lei Complementar nº 10.098/94) ao afirmarem
em seus arts. 122, § 2º e 184, § 2º, respectivamente, que o servidor
responderá perante a Fazenda Pública em ação regressiva.
Logo, em se tratando do ente estatal União e Estado do
Rio Grande do Sul, em relação aos seus servidores públicos civis, a
opção do legislador foi abandonar totalmente a ideia de
denunciação da lide e adotar a ação regressiva. No mesmo sentido
foi a decisão do STF no RE nº 327.904/SP senão vejamos:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO: § 6º DO ART.
37 DA MAGNA CARTA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD
CAUSAM. AGENTE PÚBLICO (EX-PREFEITO). PRÁTICA
DE ATO PRÓPRIO DA FUNÇÃO. DECRETO DE
INTERVENÇÃO. O § 6º do artigo 37 da Magna Carta autoriza a
proposição de que somente as pessoas jurídicas de direito público, ou
as pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos,
é que poderão responder, objetivamente, pela reparação de danos a
terceiros. Isto por ato ou omissão dos respectivos agentes, agindo estes
na qualidade de agentes públicos, e não como pessoas comuns. Esse
mesmo dispositivo constitucional consagra, ainda, dupla garantia:
uma, em favor do particular, possibilitando-lhe ação indenizatória
contra a pessoa jurídica de direito público, ou de direito privado que
preste serviço público, dado que bem maior, praticamente certa, a
possibilidade de pagamento do dano objetivamente sofrido. Outra
garantia, no entanto, em prol do servidor estatal, que somente
336
responde administrativa e civilmente perante a pessoa jurídica a cujo
quadro funcional se vincular. Recurso extraordinário a que se nega
provimento.
Na ação regressiva (judicial ou administrativa), é
imprescindível a comprovação do dolo ou da culpa e comprovação
do trânsito em julgado da decisão condenatória do Estado.
Entende-se, porém, que o ressarcimento do agente ao Estado
deveria ocorrer somente após o pagamento efetivo à vítima (que
por força do art. 100 da CRFB/88 dá-se por precatório), pois é aí
que se concretiza o prejuízo da Administração Pública (neste
sentido, também, GASPARINI, 2006, p. 979).
Na esfera federal, esta ação regressiva deve ser proposta
pelo funcionário responsável em 60 dias, por força da Lei nº
4.619/65, art. 1º. Não sendo, porém, proposta neste prazo, poderá
implicar ao funcionário responsável pela cobrança o ajuizamento
de processo disciplinar, e nunca a perda do direito do Estado,
porque por força do art. 37, § 5º, da CRFB/88, as ações de
ressarcimento de prejuízos sofridos pela Administração Pública são
imprescritíveis.
4. Dano decorrente de obra pública
Se o dano experimentado for única e exclusivamente pelo
simples fato da existência da obra, pela sua extensão ou duração, a
responsabilidade será objetiva do Estado, independentemente de
quem quer que esteja executando.
Se, entretanto, o dano decorrer da execução da obra, será
necessário saber quem a está realizando. Se for a própria
Administração Pública, através de seu órgão responsável, por
exemplo, a Secretaria Municipal de Obras e Viação (SMOV), a
responsabilidade será objetiva. Mas se a obra estiver sendo
realizada por uma empresa contratada a responsabilidade será
subjetiva, por força do art. 70 da Lei nº 8.666/93.
5. Dano decorrente de atos legislativos e jurisdicionais
A regra é que o Estado não responda por danos que
porventura venham a ocorrer por atos legislativos (leis) e atos
jurisdicionais (sentenças, acórdãos, despachos, etc.).
Direito Administrativo
337
A regra é a irresponsabilidade porque os magistrados
agem com independência e imparcialidade, e os legisladores
editam normas gerais, abstratas e impessoais, e por isso,
inicialmente, não poderiam causar danos.
Contudo há exceções. O Estado (por ato do Poder
Judiciário) poderá responder por perdas e danos sempre que seu
agente proceder conforme previsão do art. 133, II, do Código de
Processo Civil (com fraude ou dolo, recusar, omitir ou retardar,
sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício, ou a
requerimento da parte) bem como nas ações penais, se proceder
conforme o exposto no art. 5º, LXXV, da CRFB/88 (condenado
por erro do judiciário, ou se permanecer preso por prazo maior que
o fixado na sentença). Neste sentido o STF no RE nº 228.977/SP e
no RE nº 429.518/SC.
No caso do Poder Legislativo, a sua responsabilidade
poderá decorrer de leis inconstitucionais, desde que devidamente
declaradas pelo Poder Judiciário, bem como por leis de efeitos
concretos, como uma desapropriação originada da Câmara de
Vereadores ou de uma Assembleia Legislativa (que na verdade são
leis em sentido formal, mas que não passam materialmente de atos
administrativos).
Enquanto no exercício típico de suas funções a regra seja
a irresponsabilidade destes órgãos, ambos (Legislativo e
Judiciário), porém, responderão nos casos em que praticarem de
forma atípica atos de administração pública, como nomeações,
exonerações, concursos públicos, licitações, entre outros. O
ingresso da ação é direcionado contra o Estado (União, Rio Grande
do Sul, São Paulo, Prefeitura de Porto Alegre, etc.), e não
diretamente contra o agente, e muito menos contra o órgão (Poder
Judiciário ou Poder Legislativo).
Não é demais lembrar que mesmo sendo possível a
responsabilização por atos legislativos e jurisdicionais, os demais
elementos (ato, dano e nexo) deverão estar presentes, juntamente
com suas peculiaridades.
338
6. Dano decorrente de atos de multidões e por atos terroristas
Os danos decorrentes de atos praticados por multidão
remontam aos movimentos multitudinários da Revolução Francesa,
que deram origem à teoria autônoma da responsabilidade
administrativa e do próprio direito administrativo (STERMAN,
1997, P. 28).
Esse fato foi originário da multidão enfurecida que, durante a
Revolução Francesa, passou a danificar inúmeras propriedades dos
nobres e da alta burguesia, os quais, posteriormente, procuraram
acionar o Estado para obter o ressarcimento dos prejuízos havidos em
suas propriedades. Porém, com a finalidade de proteger o Estado
Francês, que nessa época já era concebido como uma unidade
jurídico-política passível de imputação de responsabilidade, das
inúmeras ações promovidas pelos particulares, criou-se uma distinção
entre os atos de império e de gestão, atribuindo-se a estes últimos a
possibilidade de se obter o ressarcimento dos danos causados pela
multidão, desonerando-se, desse modo, em muitos casos o Estado
Francês (STERMAN, 1997, p. 328).
Atualmente, a regra é que os danos decorrentes de atos de
multidões não sejam indenizáveis pelo Estado, uma vez que
praticados por terceiros, logo sem nexo de causalidade com a
conduta Estatal. Entretanto, também existem hipóteses que os
danos decorrentes de tal conduta (omissiva) do Estado podem gerar
a sua responsabilidade. É o caso, por exemplo, quando os órgãos
de segurança são comunicados de que possivelmente determinado
agrupamento de pessoas com certa hostilidade (sem fins pacíficos)
irá se reunir em determinado local. Nesta hipótese a comunicação
prévia faz originar ao Estado o dever específico de agir, e sua
eventual omissão equiparar-se-ia a uma ação, ensejadora de
responsabilizá-lo civilmente (de forma objetiva). Nesta mesma
linha é o posicionamento de José dos Santos Carvalho Filho (2008,
p. 529-30) que assim expõe: Ocorre, porém, que, em certas
situações se torna notória a omissão do Poder Público, porque
teria ele a possibilidade de garantir o patrimônio das pessoas e
evitar os danos provocados pela multidão. Nesse caso, é claro que
existe uma conduta omissiva do Estado, assim como é indiscutível
o reconhecimento do nexo de causalidade entre a conduta e o
dano, configurando-se, então, a responsabilidade civil do Estado.
Direito Administrativo
339
Com relação aos atos terroristas, a Lei nº 10.744/03
estabelece que a União responderá objetivamente por atos
terroristas, atos de guerra ou eventos correlatos ocorridos no Brasil
ou no exterior, contra aeronaves de matrícula brasileira operadas
por empresas brasileiras de transporte aéreo público, excluídas as
empresas de táxi aéreo.
7. Dano decorrente de serviço notarial, cartório extrajudicial e tabelionato
Os serviços notariais, cartórios extrajudiciais, de
protestos de títulos e tabelionatos, não possuem personalidade
jurídica própria, e, por consequência, são desprovidos de
patrimônio próprio, não se caracterizando como entidade ou
empresa. O exercício de atividade notarial delegada (art. 236, § 1º,
da CRFB/88) deve se dar por conta e risco do delegatário, nos
moldes do regime das concessões e permissões de serviço público.
O art. 22 da Lei nº 8.935/94 é claro ao estabelecer a
responsabilidade dos notários e oficiais de registro por danos
causados a terceiros, não permitindo a interpretação de que deve
responder solidariamente o ente estatal. Por se tratar de serviço
público delegado do Estado, apenas a pessoa titular do cartório
responde por eventuais atos danosos, cabendo ao Estado somente
responder de forma subsidiária ao delegatário. Cabe trazer à baila
Recurso Especial nº REsp 1.163.652/PE, julgado em junho de
2010, pelo Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO
ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. CARTÓRIO NÃO
OFICIALIZADO. ATIVIDADE DELEGADA. ART. 22 DA LEI
8.935/1994. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TABELIÃO
E SUBSIDIÁRIA DO ESTADO. DESNECESSIDADE DE
DENUNCIAÇÃO À LIDE. DANO MORAL. SÚMULA 7/STJ.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. SÚMULA 83/STJ.
1. Hipótese em que a instância ordinária condenou o ora recorrente ao
pagamento de indenização em razão de transferência de imóvel
mediante procuração falsa lavrada no cartório de sua titularidade.
Foram fixados os valores dos danos morais e materiais,
respectivamente, em R$ 10.000,00 e R$ 12.000,00 – estes últimos
correspondentes aos gastos com advogado para reverter judicialmente
a situação.
340
2. (...)
3. O exercício de atividade notarial delegada (art. 236, § 1º, da
Constituição) deve se dar por conta e risco do delegatário, nos moldes
do regime das concessões e permissões de serviço público.
4. Conforme decidido pela Segunda Turma no julgamento do
Recurso Especial 1.087.862/AM, em caso de danos resultantes de
atividade estatal delegada pelo Poder Público, há responsabilidade
objetiva do notário, nos termos do art. 22 da Lei 8.935/1994, e
apenas subsidiária do ente estatal. Precedentes do STJ.
5. O Código de Defesa do Consumidor aplica-se à atividade
notarial.
6. Em se tratando de atividade notarial e de registro exercida por
delegação, tal como in casu, a responsabilidade objetiva por danos é
do notário, diferentemente do que ocorre quando se tratar de cartório
ainda oficializado. Precedente do STF.
7. Não está configurada violação do art. 70 do CPC, na linha do
raciocínio que solidificou a jurisprudência na Primeira Seção do STJ,
no sentido de que é desnecessária a denunciação à lide em relação à
responsabilidade objetiva do Estado, sem prejuízo do direito de
regresso em ação própria.
(...)
No mesmo sentido são as decisões proferidas pela mesma
corte no REsp nº 911.151/DF, REsp nº 1.163.652/PE, REsp nº
1.087.862/AM, REsp nº 1.044.841/RJ, AgRg no REsp nº
1.005.878/GO.
8. Dano decorrente de medida provisória não convertida em lei
Neste particular, a professora Lucia Valle Figueiredo
(2008, p. 300-301) com maestria escreve que a medida provisória
pode ter sido expedida dentro dos pressupostos constitucionais,
mas não convertida em lei em tempo hábil pelo Congresso
Nacional, perdendo assim sua eficácia. Neste caso afigurar-se-ia a
responsabilidade objetiva do Estado, por ato (omissivo) do Poder
Legislativo. Se, contudo, a medida provisória não é editada com os
pressupostos constitucionais, seja porque a matéria não seria
daquelas que possibilitariam este tipo de medida (processual,
penal, cível, etc.), seja porque não carecer de relevância ou
urgência. A responsabilidade objetiva permaneceria com o Estado,
agora por ato do Poder Executivo, com ação regressiva ao Chefe
do Executivo.
Direito Administrativo
341
9. Excludentes de responsabilidade
A responsabilidade objetiva do Estado adota a teoria do
risco administrativo ou criado (STJ no REsp nº 866.450/RS). A
adoção desta teoria significa dizer que o nexo de causalidade pode
ser rompido por motivo de caso fortuito, força maior, culpa de
terceiro ou culpa exclusiva da vítima.
Existem autores (DI PIETRO, 2009, p. 648; MEDAUAR,
2008, p. 372) que atribuem o caso fortuito à obra do acaso, como a
quebra de uma peça, ou o fechamento de uma fronteira
internacional por manifestantes, e atrelam à força maior a ideia de
eventos da natureza, superior às forças humanas, como terremoto,
tufão, raio, etc. Há, no entanto, autores (GASPARINI, 2006, p.
973) que defendem o conceito exatamente inverso.
DIREITO CIVIL. TRANSPORTE DE CARGA PELA ECT.
ROUBO. FORÇA MAIOR.
A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), ao prestar
serviço de coleta, transporte e entrega domiciliar de fitas de vídeo
mediante Sedex, não responde pelos danos decorrentes do roubo
da carga, salvo se demonstrado que a transportadora não adotou
as cautelas necessárias. O STF, ao julgar a ADPF 46-DF, restringiu à
categoria de serviço público stricto sensu (regime de privilégio) as
atividades postais descritas no art. 9º da Lei n. 6.538/1978, excluindo
do regime especial a distribuição de outros tipos de encomendas ou
impressos. O serviço de coleta, transporte e entrega domiciliar de fitas
de vídeo, ainda que exercido pelos Correios, caracteriza atividade
econômica típica, devendo ser observado o regime de direito privado
aplicável a empresas de transporte de carga, com as quais a ECT
concorre no mercado. O art. 17, I, da Lei n. 6.538/1978 exclui a
responsabilidade objetiva da empresa exploradora de serviço postal
pela perda ou danificação de objeto postal em caso de força maior,
cuja extensão conceitual abarca a ocorrência de roubo das mercadorias
transportadas. Atualmente, a força maior deve ser entendida como
espécie do gênero fortuito externo, do qual faz parte também a
culpa exclusiva de terceiros, os quais se contrapõem ao chamado
fortuito interno. O roubo mediante uso de arma de fogo é fato de
terceiro equiparável à força maior, que deve excluir o dever de
indenizar, mesmo no sistema de responsabilidade civil objetiva,
por se tratar de fato inevitável e irresistível que gera uma
impossibilidade absoluta de não ocorrência do dano. Não é
razoável exigir que os prestadores de serviço de transporte de cargas
alcancem absoluta segurança contra roubos, uma vez que a segurança
pública é dever do Estado, também não havendo imposição legal
342
obrigando as empresas transportadoras a contratar escoltas ou
rastreamento de caminhão e, sem parecer técnico especializado, nem
sequer é possível presumir se, por exemplo, a escolta armada seria
eficaz para afastar o risco ou se o agravaria pelo caráter ostensivo do
aparato. O exame quanto à falta de cuidado da transportadora,
evidentemente, depende das circunstâncias peculiares de cada caso
concreto, não bastando as afirmações de que outros assaltos
semelhantes já haviam ocorrido e de que a ocorrência de um assalto
não representa circunstância imprevisível em uma metrópole. Mesmo
que a relação jurídica se sujeitasse ao regime público de
responsabilidade civil do Estado, previsto no art. 37, § 6º, da
Constituição Federal, como entendeu o acórdão recorrido, a solução
seria a mesma, com a exclusão da responsabilidade dos Correios pelo
roubo de mercadorias. Precedentes citados do STF: RE 109.615-RJ,
DJ 2/8/2006; do STJ: REsp 435.865-RJ, DJ 12/5/2003; REsp 927.148-
SP, DJe 4/11/2011; REsp 721.439-RJ, DJ 31/8/2007, e REsp 135.259-
SP, DJ 2/3/1998. (REsp 976.564-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,
julgado em 20/9/2012). Grifos meus.
O ideal é que se pense em ambos como fatos inevitáveis e
de efeitos idênticos: o rompimento do nexo causal. Prevê o Código
Civil no art. 393: O devedor não responde pelos prejuízos
resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não
se houver por eles responsabilizado. Parágrafo único. O caso
fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos
efeitos não era possível evitar ou impedir.
Com relação à culpa da vítima, reforça-se o pensamento
de que esta deva ser exclusiva e não concorrente, visto que se desta
forma ocorrer, haverá culpa recíproca (ambas as partes concorrem
para a concretização do resultado danoso), o que não excluirá a
responsabilidade do Estado, simplesmente atenuando-a.
10. Prescrição
Tendo por base o princípio da segurança jurídica, o
direito de exigir indenização por atos do Estado não é eterno. Por
força do Decreto nº 20.910/32 e da Lei nº 9.494/97, art. 1º-C, o
direito do lesado de exigir indenização do Estado (incluindo-se aí o
direito de obtenção de indenização das pessoas jurídicas de direito
privado prestadoras de serviços públicos) é de 5 anos (prazo
quinquenal).
Direito Administrativo
343
José dos Santos Carvalho Filho (2008, p. 541-2) traz
importante reflexão que merece destaque acerca da permanência do
prazo quinquenal:
O vigente Código Civil, no entanto, introduziu várias alterações na
disciplina da prescrição, algumas de inegável importância. (...). Outra
é a que fixa o prazo de três anos para a prescrição da pretensão de
reparação civil (art. 206, § 3º, inc. V). (...).
(...)
Cumpre nessa matéria recorrer à interpretação normativa-sistemática.
Se a ordem jurídica sempre privilegiou a Fazenda Pública,
estabelecendo prazo menor de prescrição da pretensão de terceiros
contra ela, prazo esse fixado em cinco anos pelo Decr. 20.910/32, raia
ao absurdo admitir a manutenção desse mesmo prazo quando a lei
civil, que outrora apontava prazo bem superior àquele, reduz
significativamente o período prescricional, no caso para três anos
(pretensão à reparação civil). Desse modo, se é verdade, de um lado,
que não se pode admitir prazo inferior a três anos para a prescrição da
pretensão à reparação civil contra a Fazenda, em virtude de
inexistência de lei especial pena total inversão do sistema lógico-
normativo; no mínimo é de aplicar-se o novo prazo fixado agora pelo
Código Civil.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, porém,
ao julgar o EREsp 1.081.885/RR, consolidou entendimento no
sentido de que o prazo prescricional aplicável às ações de
indenização contra a Fazenda Pública é de cinco anos, previsto no
Decreto 20.910/32, e não de três anos, por se tratar de norma
especial que prevalece sobre a geral:
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL.
DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO
POR RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO.
PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL.
1. É de cinco anos o prazo para a pretensão de reparação civil do
Estado.
2. Precedente da Primeira Seção (AgRgREsp nº 1.149.621/PR, Relator
Ministro Benedito Gonçalves, in DJe 18/5/2010).
3. Embargos de divergência rejeitados.
(STJ, Primeira Seção, EREsp nº 1081885/RR, Ministro Relator
Hamilton Carvalhido, julgado em 13/12/2010). Na mesma linha:
STJ, AgRg nos EREsp nº 1.200.764/AC, julgado em 06/06/2012;
REsp nº 1.236.599/RR, julgado em 08/05/2012).
344
DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO
CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. PRAZO PRESCRICIONAL
QUINQUENAL.
As ações de indenização contra a Fazenda Pública prescrevem em
cinco anos. Por se tratar de norma especial, que prevalece sobre a
geral, aplica-se o prazo do art. 1º do Dec. n. 20.910/1932, e não o de
três anos previsto no CC. Precedentes citados: EREsp 1.081.885-RR,
DJe 1º/2/2011 e AgRg no Ag 1.364.269-PR, DJe 24/9/2012. (AgRg
noAREsp 14.062-RS, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em
20/9/2012).
Há de se observar, também, o início do prazo
prescricional que segundo posicionamento consolidado do Superior
Tribunal de Justiça há de ser contado a partir do momento do
evento danoso, independentemente da ciência dos efeitos das
lesões, por observância do princípio da actio nata, ou seja, seu
termo inicial é a data a partir da qual a ação poderia ter sido
ajuizada.
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO
ESTADO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. MOMENTO DA
CONSTATAÇÃO DAS CONSEQUÊNCIAS LESIVAS
DECORRENTES DO EVENTO DANOSO. PRINCÍPIO DA
ACTIO NATA. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL
NÃO PROVIDO.
1. Na hipótese dos autos, o recorrente sustenta a prescrição desta ação
ao asseverar que o prazo prescricional deve ser contado a partir do
momento do evento danoso, independentemente da ciência dos
efeitos das lesões.
2. Segundo a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de
Justiça, o termo inicial do prazo prescricional das ações
indenizatórias, em observância ao princípio da actio nata, é a data
em que a lesão e os seus efeitos são constatados. Incidente,portanto,
o óbice da Súmula 83/STJ.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp nº 1.248.981/RN, Ministro Mauro Campbell
Marques, julgado em 14/09/2012)
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. CONCURSO
PÚBLICO. SERVIDOR PÚBLICO IMPEDIDO DE TOMAR
POSSE POR ATO DA ADMINISTRAÇÃO. RESPONSABI
LIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR
DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRESCRIÇÃO
QUINQUENAL. DECRETO 20.910/32. TERMO INICIAL.
TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA QUE
Direito Administrativo
345
RECONHECEU A EXISTÊNCIA DE ATO ADMINISTRATIVO
ILEGAL. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. No ordenamento jurídico brasileiro, o prazo prescricional está
submetido ao princípio da actio nata, ou seja, seu termo inicial é a
data a partir da qual a ação poderia ter sido ajuizada. Da mesma
forma, deve ocorrer em relação às dívidas da Fazenda Pública, cujas
ações "prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do
qual se originarem" (art. 1º do Decreto 20.910/32).
2. O termo inicial do prazo prescricional para o ajuizamento de
ação de indenização contra ato do Estado, por dano moral e
material, conta-se da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do
ato lesivo.
3. No presente caso, a lesão ao direito, que fez nascer a pretensão à
indenização, foi reconhecida em sede de decisão judicial que
determinou a nomeação dos autores aos cargos pleiteados, cujo
trânsito em julgado ocorreu em 1999. Tendo sido a presente ação de
indenização proposta em 2000, não há falar em prescrição.
4. Recurso especial provido.
(REsp 909.990/PE, Ministro Realtor Arnaldo Esteves Lima,
julgado em 05/06/2012).
Vale lembrar, novamente, que o direito ao qual tem o
Estado de cobrar do agente causador do dano é imprescritível, por
força do art. 37, § 5º, da CRFB/88 (STJ no REsp nº 106.756-
1/AM). Ao fim, é bom destacar que as ações de ressarcimento
intentadas em decorrência dos atos de tortura ocorridos durante o
Regime Militar são imprescritíveis, bem como as ações de
reparação civil por danos ao meio ambiente:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA.
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS CAUSADOS
DURANTE REGIME MILITAR. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA.
IMPRESCRITIBILIDADE.
1. Na hipótese dos autos, o recorrido propôs ação ordinária visando à
condenação da União ao pagamento de indenização dos danos morais
que suportou com as diversas sessões de tortura e com seu banimento
para o Chile durante o regime da ditadura militar, porém o Tribunal de
origem extinguiu com julgamento de mérito ao reconhecer a
ocorrência de prescrição.
2. Ocorre que segundo a jurisprudência do STJ, em face do
caráter imprescritível das pretensões indenizatórias dos danos a
direitos da personalidade ocorridos durante o regime militar, não
há que se falar em aplicação de prazos prescricionais. Precedentes:
AgRg no Ag 1.337.260/PR, 1ª Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
346
DJe 13.9.2011; AgRg no Ag 1392493/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, DJe 1.7.2011; AgRg no REsp 893.725/PR, 2ª Turma, Rel. Min.
Humberto Martins, DJe 8.5.2009.
3. Logo, com razão a decisão agravada, que afastou a ocorrência da
prescrição declarada pela Corte a quo.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1.280.101/RJ, Ministro Relator Mauro Campbell
Marques, julgado em 02/08/2012).
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO
REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE
REPARAÇÃO DE DANOS. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA E
TORTURA DURANTE O REGIME MILITAR.
IMPRESCRITIBILIDADE DE PRETENSÃO INDENIZATÓRIA
DECORRENTE DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS
FUNDAMENTAIS DURANTE O PERÍODO DE EXCEÇÃO.
INAPLICABILIDADE DO ART. 1.º DO DECRETO N.º
20.910/32.
1. O STJ pacificou entendimento no sentido de que são
imprescritíveis as ações de reparação de danos ajuizadas em
decorrência de perseguição, tortura e prisão, por motivos
políticos, durante o Regime Militar, afastando-se, por conseguinte,
a prescrição quinquenal prevista no art. 1º do Decreto 20.910/32.
Isso, porque as referidas ações referem-se a período em que a
ordem jurídica foi desconsiderada, com legislação de exceção,
havendo, sem dúvida, incontáveis abusos e violações dos direitos
fundamentais, mormente do direito à dignidade da pessoa
humana. Precedentes: REsp 959.904/PR, Rel. Ministro Luiz Fux,
Primeira Turma, julgado em 23/04/2009, DJe 29/09/2009; AgRg no
Ag 970.753/MG, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma,
julgado em 21/10/2008, DJe 12/11/2008; REsp 449.000/PE, Rel.
Ministro Franciulli Netto, Segunda Tturma, julgado em 05/06/2003,
DJ 30/06/2003 p. 195.
2. Agravo regimental não provido
(AgRg no REsp 1.251.529/PR, Ministro Relator Benedito
Gonçalves, julgado em 28/06/2011.)
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL - DIREITO AMBIENTAL -
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL –
IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL
– PEDIDO GENÉRICO – ARBITRAMENTO DO QUANTUM
DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE –
SÚMULAS 284/STF E 7/STJ.
1.(...).
2. Segundo a jurisprudência do STJ e STF trata-se de competência
territorial e funcional, eis que o dano ambiental não integra apenas o
foro estadual da Comarca local, sendo bem mais abrangente
Direito Administrativo
347
espraiando-se por todo o território do Estado, dentro da esfera de
competência do Juiz Federal.
3. Reparação pelos danos materiais e morais, consubstanciados na
extração ilegal de madeira da área indígena.
4. O dano ambiental além de atingir de imediato o bem jurídico que
lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os
integrantes do Estado, espraiando-se para toda a comunidade local,
não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal
ocasionado.
5. Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande
amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade
do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples
fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente
causador do dano.
6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro
da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da
imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida,
fundamental e essencial à afirmação dos povos,
independentemente de não estar expresso em texto legal.
7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem
jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos
normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível,
fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele
não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer , considera-se
imprescritível o direito à reparação.
8. O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e
como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da
imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.
9. Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde
já, o montante da reparação, havendo elementos suficientes nos autos.
Precedentes do STJ.
10. (...).
11. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido
(REsp 1.120.117/AC, Ministra Relatora Eliana Calmon, julgado
em 10/11/2009)
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO
AMBIENTAL. EMPRESAS MINERADORAS. CARVÃO MINERAL.
ESTADO DE SANTA CATARINA. REPARAÇÃO.
RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR OMISSÃO.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RESPONSABILIDADE
SUBSIDIÁRIA.
1. A responsabilidade civil do Estado por omissão é subjetiva,
mesmo em se tratando de responsabilidade por dano ao meio
ambiente, uma vez que a ilicitude no comportamento omissivo é
aferida sob a perspectiva de que deveria o Estado ter agido
conforme estabelece a lei.
2. (...).
348
3. Condenada a União a reparação de danos ambientais, é certo que a
sociedade mediatamente estará arcando com os custos de tal
reparação, como se fora auto-indenização. Esse desiderato apresenta-
se consentâneo com o princípio da equidade, uma vez que a atividade
industrial responsável pela degradação ambiental – por gerar divisas
para o país e contribuir com percentual significativo de geração de
energia, como ocorre com a atividade extrativa mineral – a toda a
sociedade beneficia.
4. Havendo mais de um causador de um mesmo dano ambiental, todos
respondem solidariamente pela reparação, na forma do art. 942 do
Código Civil. De outro lado, se diversos forem os causadores da
degradação ocorrida em diferentes locais, ainda que contíguos, não há
como atribuir-se a responsabilidade solidária adotando-se apenas o
critério geográfico, por falta de nexo causal entre o dano ocorrido em
um determinado lugar por atividade poluidora realizada em outro
local.
5. (...).
6. Segundo o que dispõe o art. 3º, IV, c/c o art. 14, § 1º, da Lei n.
6.938/81, os sócios/administradores respondem pelo cumprimento da
obrigação de reparação ambiental na qualidade de responsáveis em
nome próprio. A responsabilidade será solidária com os entes
administrados, na modalidade subsidiária.
7. A ação de reparação/recuperação ambiental é imprescritível.
8. (...).
(REsp nº 647.943/SC, Ministro Relator João Otávio de Noronha,
julgado em 22/05/2007)
Direito Administrativo
349
Capítulo XIII
PPRROOCCEESSSSOO AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVOO
1. Introdução
O processo no âmbito da Administração Pública revela-se
de fundamental importância para que o Estado concretize a
realização dos seus fins cumprindo o que determinam a lei e os
princípios.
No âmbito da Administração Pública Federal, o processo
administrativo foi regulado pela Lei nº 9.784/99 (que será objeto de
estudo neste capítulo). Esta lei aplica-se de forma subsidiária (art.
69 da Lei) aos processos administrativos específicos tal como o
Processo Administrativo Disciplinar (PAD), por exemplo. Trata-se
da aplicação do art. 2º, § 2º, da Lei de Introdução às normas do
Direito Brasileiro.
Podemos conceituar processo administrativo como o
conjunto de atos cronologicamente ordenados, no qual a
Administração Pública se utiliza para a concretização de seus fins,
seja a produção de um ato, seja a emissão de uma decisão.
2. Princípios
Além dos princípios gerais aplicáveis no âmbito da
Administração Pública, o processo administrativo possui alguns
princípios específicos que lhe dão estrutura. O art. 2º, caput, da Lei
do Processo Administrativo Federal expõe alguns princípios, ainda
que de forma exemplificativa, tais como legalidade, motivação,
Atenção! Não confunda processo e procedimento. Este equivale ao rito, é o conjunto de formalidades, a forma de proceder, desenvolvendo-se dentro do processo. Processo, por sua vez, é a sucessão ordenada de atos administrativos praticados visando determinado objetivo.
350
razoabilidade, proporcionalidade, segurança jurídica, contraditório,
ampla defesa, interesse público e eficiência.
2.1. Princípio do contraditório e da ampla defesa
O contraditório e a ampla defesa devem ser respeitados
em todos os processos judiciais ou administrativos por força do art.
5º, LV, da CRFB/88 (aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela
inerentes). Refere-se ao due process of law (devido processo
legal).
O contraditório (manifesta-se contrariamente, em sentido
oposto) é o direito de a parte se manifestar sobre documentos
juntados, bem como de qualquer manifestação pela parte contrária,
oportunizando-lhe, desta forma, um direito de resposta. Decorre do
princípio do contraditório a notificação dos atos processuais (arts.
3º, II, 26, 28, 41, 62 da Lei nº 9.784/99), a motivação das decisões
(art. 55 da lei comentada), o direito de participar da inquirição de
testemunhas, dentre outros.
A ampla defesa tem profunda ligação com o princípio do
contraditório, mas com certeza possui interpretação muito mais
ampla. Assim, utilizando-se das palavras de Marcelo Alexandrino
(2008, p. 614): ampla defesa refere-se à possibilidade de utilização
de todos os meios lícitos, pelo acusado, para provar sua inocência
e à necessidade de que ao acusado sejam apresentados todos os
fatos a ele imputados e provas contra ele produzidas, além de
possibilitar-se a ele o acompanhamento da instrução do processo.
Decorre do princípio da ampla defesa o direito de
interpor recurso sem depósito prévio, art. 5º, XXIV, da CRFB/88
(neste sentido STF no RE nº 388.359, na ADI nº 1.922/DF, na ADI
nº 1.976/DF), o direito de ser comunicado dos atos do processo e
de solicitar e acompanhar a produção de provas. O STJ editou a
Súmula nº 373, publicada em março de 2009, expondo ser
ilegítima a exigência de depósito prévio para a admissibilidade de
recurso administrativo. Da mesma forma o STF editou a Súmula
Vinculante de nº 21 estabelecendo ser inconstitucional a exigência
de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para
Direito Administrativo
351
admissibilidade de recurso administrativo (para alguns autores,
este mandamento corresponde ao princípio da gratuidade).
2.2. Princípio da legalidade objetiva
Por tal princípio, a instauração e condução do processo
administrativo deve ser com base em lei. Além do respeito à lei,
acrescenta Rafael Maffini (2008, p. 118), as relações jurídico-
processuais que emergem do processo administrativo devem ser
conduzidas de modo a se preservar a lealdade, o decoro, a boa-fé
objetiva, tanto em relação aos interessados, quanto, especialmente,
em relação à Administração Pública.
2.3. Princípio da oficialidade
O processo administrativo, ainda que envolva direito dos
administrados, se desenvolve no interesse da Administração
Pública, pois é dela a intenção de solucionar as questões levantadas
(prevalência do interesse público). Aparece expressamente previsto
no art. 2º, XII da Lei nº 9.784/99.
A movimentação do processo administrativo cabe à
Administração Pública, independentemente da provocação de
terceiros (contrário ao processo judicial, por exemplo). Cabe a ela
adoção das medidas que forem necessárias para a instrução e
desfecho do processo.
É aplicação deste princípio o início de ofício por parte da
Administração (art. 5º da Lei nº 9.784/99), a obtenção de provas
não restritas às requeridas pelas partes (art. 29 da lei comentada), a
inércia ou desistência dos particulares não acarretando a
paralisação do processo (art. 51, § 2º da lei), o poder de revisão de
suas decisões (arts. 64 e 65). É a Administração agindo ex officio.
Atenção! Por força da Súmula Vinculante nº 5 publicada em 16 de maio de 2008: a falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição, prejudicando, assim, a Súmula nº 343 do STJ (neste sentido STJ no RMS nº 21.719/DF).
352
2.4. Princípio do formalismo moderado
Também citado pela doutrina, erroneamente, como
princípio do informalismo, em razão deste princípio dispensam-se
ritos complexos, rigorosos ou solenes, principalmente com relação
aos atos praticados pelos particulares, desde que não prejudique
direitos do administrado.
O formalismo deve ser seguido justamente para propiciar
adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos
administrados, devendo ser observadas certas formas essenciais
como garantia destes direitos (art. 2º, VIII e IX, da Lei nº
9.784/99). Assim o princípio do formalismo moderado não quer
dizer ausência de forma, mas sim a não rigidez destas formas.
2.5. Princípio da verdade material
O que se busca no processo administrativo é a reprodução
dos fatos da forma mais próxima possível da realidade, de como
realmente aconteceram, não se satisfazendo apenas com as versões
oferecidas pelas partes. O que importa é saber como o fato
efetivamente ocorreu. Por conta disso no processo administrativo é
possível (o que no judicial não o é) alegar em instância de recurso,
o que não foi alegado anteriormente, produzir novas provas, etc.
Atenção! O princípio do formalismo moderado não quer dizer que não existam quaisquer formalidades no processo administrativo. A lei, em determinados casos, impõe certas formas (art. 22 da Lei nº 9.784/99) e exige um procedimento mais rígido, como ocorre nos prazos de recurso, no processo licitatório, no processo disciplinar, por exemplo.
Atenção! Por força deste princípio no processo administrativo é possível a reformatio in pejus, ou seja, a parte recorrente pode ter sua situação agravada em consequência do próprio recurso interposto (art. 64, parágrafo único, da Lei 9.784/99). Este agravamento, entretanto, não é possível nos casos de revisão (art. 65, parágrafo único).
Direito Administrativo
353
3. Fases do processo administrativo
A sucessão de atos ordenados e cronologicamente
praticados para dar andamento a um processo são as suas fases. O
processo administrativo possui as seguintes fases:
Atenção! Caso o administrado entenda que a decisão administrativa violou enunciado de súmula vinculante, poderá ajuizar reclamação perante o STF (art. 64-B da Lei nº 9.784/99).
Recursal: permite à parte prejudicada recorrer da decisão (art. 56 da Lei nº 9.784/99). A regra é que o recurso não tenha efeito suspensivo (art. 61, decorrência da presunção de legitimidade dos atos administrativos), podendo tramitar no máximo por três instâncias administrativas (art. 58 da Lei nº 9.784/99).
Instauração: onde são oferecidos os elementos para dar início ao processo. Pode
iniciar-se por iniciativa de interessados ou de ofício pela Administração Pública (art. 5º da
Lei nº 9.784/99) através de portaria, representação, auto de infração, etc.
Instrução ou preparatória: momento em que são colhidas
as provas, realizadas diligências, ouvidos os interessados, formulados
pareceres e laudos, realizadas audiências públicas, para a elucidação dos fatos
apresentados na fase anterior.
Relatório: peça opinativa
(não vincula a decisão final da autoridade competente)
que sintetiza todo o
apurado no processo e propõe uma decisão à
autoridade competente.
Decisória: a autoridade ou órgão
colegiado competente emite a
decisão final devidamente
fundamentada sobre o objeto do
processo. É ato vinculado como
expõe o art. 48 da Lei nº 9.784/99,
pois a Administração tem o dever de
emitir decisão. Nos casos em que a
decisão final acolher a sugestão
oferecida na fase do relatório, este
servirá de motivação para a decisão.
354
Importante ainda destacar que
4. Espécies de processo administrativo
Seguindo as lições de Hely Lopes Meirelles (2009, p.
699), são quatro as espécies (modalidades) de processos
administrativos:
Processo administrativo de expediente: tramita internamente
na administração, não possui um rito rígido, não modifica nem
extingue direitos. Exemplos: a desapropriação antes da
publicação do interesse público, licitação antes de ato
convocatório, abertura de concurso público, etc.
Processo administrativo de outorga: o particular pleiteia
algum direito ou situação individual frente à Administração
Pública. Geralmente possui rito especial. Caracteriza-se pela
falta de direito subjetivo do interessado ao que pleiteia. As
decisões finais emitidas neste tipo de processo possuem efeito
vinculante, gerando, aí sim, direito subjetivo ao interessado.
Exemplos: licenciamentos, concessões, permissões, pesquisa e
lavra de jazida, dentre outros.
Processo administrativo de controle: possui, normalmente,
rito especial e destina-se a verificar e declarar situação de
regularidade ou irregularidade de administrado ou servidor
perante a Administração. Sua decisão final vincula a
Administração. Exemplos: prestação de contas, lançamento
tributário e consulta fiscal.
Processo administrativo punitivo: é promovido pela
Administração com o fim de apurar infração à lei,
regulamento ou contrato. Possui necessariamente contraditório
e ampla defesa, em respeito ao devido processo legal, sob
pena de nulidade do processo. É instaurado por auto de
infração, representação ou peça equivalente. Pode ser interno
(quando aplicável aos próprios agentes) ou externo (quando
aplicável aos administrados). Dentre os processos
administrativos punitivos merecem destaque a sindicância e o
processo administrativo disciplinar. Exemplos: imposição de
sanções disciplinares, estudante que infringe regulamento
Direito Administrativo
355
escolar, apuração de infração por desobedecer a certa
determinação decorrente do poder de polícia, etc.
4.1. Da sindicância
É processo administrativo punitivo de rito sumário, sem
rito formal, que visa investigar fatos ou irregularidades no serviço
público, praticados por servidores para subsequente punição do
infrator ou instauração do processo administrativo.
Corresponde ao inquérito administrativo (caráter
inquisitivo) que precede (peça preliminar e informativa) o processo
administrativo disciplinar, podendo, entretanto, imputar sanções
menos severas ao servidor, caso em que deverá respeitar o
contraditório e a ampla defesa.
De acordo com a Lei nº 8.112/90, art. 145, da sindicância
poderá resultar o arquivamento do processo; aplicação de
penalidade de advertência ou suspensão de até 30 dias e a
instauração do processo administrativo disciplinar.
Caso o órgão competente já tenha elementos probatórios
suficientes que lhe sirvam de suporte para a acusação poderá
instaurar diretamente o processo administrativo disciplinar, neste
sentido o STJ nº MS 8.030/DF.
Existiriam ainda duas outras formas de processo
administrativo punitivo de natureza sumária, mas que por
afrontarem os princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º,
LV, da CRFB/88) não possuem mais espaço legal no atual sistema
pátrio: a verdade sabida, quando a infração cometida por servidor
era testemunhada por autoridade superior competente, que
Atenção! A sindicância, quando possui caráter de simples expediente de apuração ou verificação de irregularidade, dispensa publicidade do seu procedimento. Se servir de base para punição, no entanto, seu procedimento não poderá ter esse caráter sigiloso, devendo, inclusive, neste caso ser oportunizado o contraditório e a ampla defesa.
356
imediatamente lhe aplicava a pena ou também nos casos de
infração pública notória e o termo de declaração, quando o
próprio servidor confessava a prática da infração, sendo-lhe desde
já imputada a sanção.
4.2. Do processo administrativo disciplinar - PAD
O processo administrativo disciplinar é o meio hábil,
formal, para a apuração de faltas disciplinares e punição dos
agentes públicos (art. 41, § 1º, II, da CRFB/88), e por tal motivo
deve respeitar obrigatoriamente o princípio do contraditório e da
ampla defesa.
É processo punitivo e na Lei nº 8.112/90 vem regulado
nos arts. 143 a 152. Na Lei Complementar/RS nº 10.098/94
aparece nos arts. 205 a 223 (podendo acrescentar ao PAD Estadual
o Inquérito Administrativo, como uma fase deste, arts. 224 a 246).
A autoridade que tiver ciência de irregularidade é
obrigada (ato vinculado) a promover a apuração do ato faltoso.
Instaura-se o processo disciplinar mediante portaria que é
conduzido por uma comissão (permanente ou especial) composta
de três servidores estáveis, designados pela autoridade competente,
sendo o seu presidente ocupante de cargo efetivo superior ou de
mesmo nível hierárquico, ou tendo nível de escolaridade igual ou
superior ao do indiciado, emitindo (a comissão), ao final, relatório
conclusivo e minucioso, porém, de caráter meramente opinativo.
Estabilidade exigida para a condução do processo disciplinar é no
serviço público, e não necessariamente no cargo que ocupam (STJ,
MS nº 17.583/DF, julgado em julgado em 12/9/2012, Rel. Min.
Napoleão Nunes Maia Filho). Contudo em direção totalmente
oposta, no Agravo Regimental no REsp nº 1.317.278-PE, Relator
Min. Humberto Martins, julgado em 28/8/2012 (um mês antes)
Atenção! A Lei nº 8.112/90, nos artigos 133 e 140, estabelece mais um processo administrativo de rito sumário para a acumulação ilegal de cargo, emprego ou função e para apuração de abandono de empregou ou inassiduidade habitual.
Direito Administrativo
357
tinha entendido que sim, os membros da comissão que conduzem o
processo administrativo disciplinar devem ser estáveis no atual
cargo que ocupam. Nesta decisão a turma, por maioria, entendeu
que essa exigência é uma garantia ao investigado, pois tem por
escopo assegurar a independência total desses servidores, sem
ingerência da chefia. Dessa forma, a estabilidade deve ser no
cargo, e não apenas no serviço público, pois este não oferece ao
servidor essa independência. Não parece restar pacificado nenhum
dos posicionamentos, o que obriga o acompanhamento por parte do
leitor.
Sempre que a infração cometida puder resultar em
punição de suspensão por mais de 30 dias, demissão, cassação de
aposentadoria ou disponibilidade, destituição de cargo em
comissão, o processo disciplinar terá instauração obrigatória (ato
administrativo vinculado).
O processo administrativo disciplinar deve ser concluído
em no máximo 60 dias, admitida sua prorrogação por igual prazo
(totalizando 120 dias – art. 152 da Lei nº 8.112/90). Porém, tanto o
STF quanto o STJ têm posicionamento consolidado no sentido de
que uma vez instaurado o processo disciplinar e interrompido o
prazo prescricional (arts. 110, parágrafo único, 111 e 142 da Lei
8.112/90), este retoma sua contagem por inteiro após 140 dias:
PRESCRIÇÃO - PROCESSO ADMINISTRATIVO -
INTERRUPÇÃO. A interrupção prevista no § 3º do artigo 142 da Lei
nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, cessa uma vez ultrapassado o
período de 140 dias alusivo à conclusão do processo disciplinar e à
imposição de pena - artigos 152 e 167 da referida Lei - voltando a ter
curso, na integralidade, o prazo prescricional. Precedente: Mandado de
Segurança nº 22.728-1/PR, Pleno, Relator Ministro Moreira Alves,
acórdão publicado no Diário da Justiça de 13 de novembro de 1998.
Atenção! As reuniões e as audiências das comissões terão caráter reservado (exceção ao princípio da publicidade), art. 150, parágrafo único da Lei nº 8.112/90.
358
(STF no RMS nº 23.436/DF, julgado em 24/08/99, Min. Rel. Marco
Aurélio). Na mesma linha: STF no MS 23.299/SP, julgado em
06/03/02, Min. Rel. Sepúlveda Pertence
MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO.
SERVIDORA PÚBLICO FEDERAL. ATO IMPUGNADO.
PORTARIA. LEGITIMIDADE DO MINISTRO DE ESTADO
RESPONSÁVEL PELA SUA EDIÇÃO. PENALIDADE DE
SUSPENSÃO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
ESTATAL. NÃO OCORRÊNCIA. PROCESSO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. OBSERVÂNCIA DO
PRAZO DE 140 DIAS PARA CONCLUSÃO. INTERRUPÇÃO DO
PRAZO PRESCRICIONAL. SINDICÂNCIA. INTERRUPÇÃO DO
PRAZO PRESCRICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO DE
INDICIAMENTO. VÍCIO. AUSÊNCIA.
1. (...)
2. É cabível a interrupção da prescrição, em face da instauração de
sindicância, somente quando este procedimento sumário tiver caráter
punitivo e não meramente investigatório ou preparatório de um processo
disciplinar, pois, neste caso, dar-se-á a interrupção somente com a
instauração do processo administrativo disciplinar, apto a culminar na
aplicação de uma penalidade ao servidor.
3. De acordo com jurisprudência consolidada deste Superior Tribunal de
Justiça, o prazo legal para término do processo administrativo
disciplinar é de 140 (cento e quarenta) dias.
4. A contagem do prazo prescricional, após a interrupção prevista no art.
142, § 3º, da Lei nº 8.112/90, deve ser retomada, por inteiro, a partir do
término do prazo de interrupção.
5. Afasta-se a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva
estatal se, no momento da aplicação da pena de suspensão, ainda não
tiverem transcorridos dois anos, contados a partir do fim do prazo de
interrupção previsto no 142, § 3º, da Lei nº 8.112/90.
6. (...)
7. Segurança denegada. (STJ no MS nº 11.644/DF, julgado em
27/10/2010, Min. Rel. Maria Thereza de Assis Moura). No mesmo
sentido: STJ no REsp nº 1.191.346/CE, no MS nº 12.735/DF
No informativo nº 505 o Superior Tribunal de Justiça
consolidou entendimento de ser possível a utilização de provas
penais no âmbito do processo administrativo disciplinar, senão
vejamos:
DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (PAD). UTILIZAÇÃO DE
INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA.
É possível utilizar, em processo administrativo disciplinar, na
qualidade de “prova emprestada”, a interceptação telefônica
Direito Administrativo
359
produzida em ação penal, desde que devidamente autorizada pelo
juízo criminal e com observância às diretrizes da Lei n.
9.296/1996. Precedentes citados: MS 13.099-DF, DJe 22/3/2012; MS
15.823-DF, DJe 18/8/2011; MS 14.598-DF, DJe 11/10/2011; MS
15.786-DF, DJe 11/5/2011, e AgRg na APn 536-BA, DJ
9/10/2007. MS 14.140-DF, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em
26/9/2012.
Para não ferir o princípio da impessoalidade, é nulo o
processo administrativo disciplinar quando o servidor que realizou
a sindicância determina posteriormente a abertura do processo
disciplinar, designando os membros da comissão, isso porque a
instauração do PAD, ainda que superficialmente, envolve juízo de
admissibilidade em que é verificada a existência ou não de indícios
suficientes a demonstrar que ocorreu transgressão às regras de
conduta funcional. Por isso, não se pode admitir que o servidor que
realizou as investigações e exarou um juízo preliminar acerca da
possível responsabilidade disciplinar do sindicado, determine a
instauração do processo administrativo e, em seguida, aprove o
relatório final produzido. Este foi o entendimento da Corte da
Cidadania no Mandado de Segurança nº 15.107/DF, julgado em
26/09/2012, tendo como Relator o Ministro Jorge Mussi.
4.3. Da revisão
O processo disciplinar pode ser revisto a qualquer
tempo, a pedido ou de ofício, quando se aduzirem fatos novos ou
circunstâncias suscetíveis de justificar a inocência do punido ou
inadequação da penalidade aplicada, nunca, porém, podendo
resultar agravamento da sanção (só admite reformatio in mellius).
Neste sentido se manifestou o Tribunal da Cidadania:
PAD. NOVO JULGAMENTO. BIS IN IDEM. REFORMATIO IN
PEJUS.
A Seção reconheceu que é impossível o agravamento da penalidade
imposta a servidor público após o encerramento do respectivo
processo disciplinar, ainda que a sanção anteriormente aplicada
não esteja em conformidade com a lei ou orientação normativa
interna. O PAD somente pode ser anulado quando constatada a
ocorrência de vício insanável (art. 169, caput, da Lei n. 8.112/1990),
ou revisto quando apresentados fatos novos ou circunstâncias
suscetíveis de justificar a inocência do servidor punido ou a
inadequação da penalidade aplicada (art. 174, caput, da Lei n.
360
8.112/1990). Nos termos do enunciado da Súm. n. 19/STF, o
rejulgamento do processo administrativo disciplinar para a aplicação
de nova punição ao servidor caracteriza bis in idem, situação vedada
na seara administrativa. Assim, in casu, a anulação parcial do processo
administrativo disciplinar para adequar a penalidade aplicada ao
servidor, consoante pareceres do órgão correspondente, ensejando
aplicação de sanção mais grave ofende o devido processo legal e a
proibição da reformatio in pejus. Com base nesse entendimento, a
Seção concedeu a ordem para determinar a reintegração do impetrante
no cargo de analista ambiental do Ibama. Precedentes citados: MS
13.341-DF, DJe 4/8/2011; MS 13.523-DF, DJe 4/6/2009. (MS 10.950-
DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 23/5/2012).
Direito Administrativo
361
Capítulo XIV
IIMMPPRROOBBIIDDAADDEE AADDMMIINNIISSTTRRAATTIIVVAA
1. Introdução
Já foi objeto de estudo o conceito de moralidade
administrativa. Verificou-se, naquele momento (Capítulo II), que a
distinção entre moralidade e probidade não é tarefa fácil, pois
possuem significados/conteúdos semânticos semelhantes, ligados à
ideia de honestidade, boa-fé, lealdade e ética. Poder-se-ia, talvez,
sustentar que a probidade seria uma espécie de moralidade, mas
ainda assim seria uma afirmativa incompleta. Isso porque
moralidade e improbidade podem ser estudadas ora como
princípio, ora como norma. Este capítulo destina-se ao estudo da
(im)probidade enquanto norma.
Atualmente, a improbidade vem prevista no art. 37, § 4º
da CRFB/88, tendo sido regulada pela Lei nº 8.429/92 (Lei de
Improbidade Administrativa – LIA). É uma norma de natureza
eminentemente civil quando acarreta a indisponibilidade de bens, o
ressarcimento ao erário, a multa civil, e política quando implica a
suspensão de direitos políticos ou a perda da função pública.
Improbidade administrativa, para a Lei nº 8.429/92, é
todo ato que importa em enriquecimento ilícito, causa prejuízo ao
erário ou que atenta contra os princípios da Administração Pública.
A Lei de Improbidade é, também, considerada uma lei
híbrida, no sentido de que apresenta artigos aplicáveis ora de
ordem nacional, ora de ordem federal. Os arts. 13 e 14, § 3º, da Lei
Atenção! A Lei de Improbidade Administrativa, por ter natureza civil, não impede o ajuizamento da ação penal cabível, ou até mesmo processo administrativo.
362
nº 8.429/92 aplicam-se (ou deveriam aplicar-se) somente aos
servidores públicos federais, o que a torna uma norma de âmbito
federal, pelo menos quanto a estes artigos. Os demais artigos
expressos na Lei aplicam-se a todos os entes da federação, o que os
tornam de ordem nacional.
2. Sujeito Passivo
Os sujeitos passivos indicados pela Lei de Improbidade
(art. 1º) são as pessoas jurídicas atingidas do ato de improbidade, a
indicar:
Pessoas da administração direta (União, Estados, Distrito
Federal e Municípios);
Pessoas da administração indireta (autarquias, fundações,
sociedades de economia mista, empresas públicas, consórcios
públicos);
Empresa incorporada ao patrimônio público ou entidade para
cuja criação ou custeio o erário tenha concorrido ou concorra
com mais de 50% do patrimônio ou da receita anual;
Entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo fiscal
ou creditício de órgão público. Neste caso a sanção
patrimonial deve limitar-se exclusivamente à repercussão do
ilícito sobre a parcela oriunda dos cofres públicos; e
Entidades para cuja criação ou custeio o erário tenha
concorrido ou concorra com menos de 50% do patrimônio ou
receita anual. Neste caso, igualmente, a sanção patrimonial
deve limitar-se exclusivamente à repercussão do ilícito sobre a
parcela oriunda dos cofres públicos.
As Organizações Sociais (OS), Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), Serviços Sociais
Autônomos, Entidades de Apoio e qualquer outro tipo de entidade
criada ou mantida com recursos do Poder Público, enquadram-se
na modalidade prevista no parágrafo único do art. 1º da Lei de
Improbidade (DI PIETRO, 2009, p. 814-5). Em sentido contrário é
o posicionamento de José dos Santos Carvalho Filho (2008, p. 991)
e Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (2008, p. 198), haja
vista que no caso dos Serviços Sociais Autônomos, para estes
Direito Administrativo
363
autores, praticamente todo o custeio destas entidades provém das
contribuições (parafiscais) instituídas por lei, o que as
enquadrariam a responder pelo caput do art. 1º e não pelo seu
parágrafo único. Já com relação às demais entidades paraestatais, o
enquadramento entre o caput do art. 1º e seu parágrafo único
dependeria dos valores repassados pelos cofres públicos e o
percentual equivalente agregado a cada entidade (se maior ou
menor de 50%).
3. Sujeito Ativo
O sujeito ativo da improbidade administrativa é o agente
público (art. 2º), que pratica o ato de improbidade, bem como
aquele (terceiro) que induz, concorre ou se beneficia de qualquer
forma direta ou indireta (art. 3º).
Agente público, para a Lei de Improbidade, é:
Aquele que exerce cargo, emprego, mandato ou função;
Com vínculo permanente ou temporário;
Com ou sem remuneração;
Por nomeação, contratação, designação, eleição ou qualquer
outra forma de investidura ou vínculo;
Em qualquer das entidades mencionadas no art. 1º.
Tendo em conta a decisão do Supremo Tribunal Federal
(Rcl nº 2.138/DF) com relação aos agentes políticos salienta-se que
tal restrição à aplicação da Lei de Improbidade não alcança os
agentes parlamentares. Isso pelo fato de que ao julgar a
mencionada reclamação, os agentes políticos ali mencionados para
que não sofressem bis in idem (incidência de duas normas de
Atenção! Em decisão publicada no dia 18 de abril de 2008 (julgada em 2007) o STF, na Rcl nº 2.138/DF, entendeu que a Lei nº 8.429/92 não se aplicaria aos agentes políticos que já possuíssem normas específicas para sanções nesta modalidade (improbidade): crimes de responsabilidade como a Lei nº 1.079/50.
364
mesma natureza – bis – pelo mesmo fato – in idem) deveriam
responder pelas normas específicas (que lhes imputavam crime de
responsabilidade) e não pela Lei de Improbidade. Como não há lei
prevendo crime de responsabilidade para parlamentares, (como
senadores, deputados e vereadores) ainda que agentes políticos
continuem a responder perante a Lei 8.429/92. Neste sentido
indica-se a leitura das manifestações da Corte Constitucional na
Pet-QO 3.923/SP e na Rcl 7.339 MC/ES.
A questão ainda não resta pacífica, contudo, quanto aos
atos de improbidade praticados por Prefeitos. Isso porque se pode
encontrar diversas decisões do Superior Tribunal de Justiça
aplicando a mesma linha decidida na Rcl nº 2.138/DF, fazendo,
assim, com que incida sobre os prefeitos o DL nº 201/67 como no
REsp nº 456.649/MG, REsp nº 769.811/SP. Porém, no AgRg no
AREsp 6.693/RS, Ministro Castro Meira, julgado em 15/09/2011, a
mesma Corte entendeu que os Prefeitos deveriam continuar
respondendo frente a Lei de Improbidade, visto que o Supremo
Tribunal Federal jamais decidira nada a respeito dos chefes do
executivo municipal.
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PUBLICIDADE.
PROMOÇÃO PESSOAL. LEI DE IMPROBIDADE. PREFEITO.
APLICABILIDADE. DECRETO-LEI Nº 201/67. INCIDÊNCIA
CONCOMITANTE COM A LEI Nº 8.429/92. REVISÃO DO
JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) aplica-se a
prefeito, máxime porque a Lei de Crimes de Responsabilidade
(1.070/50) somente abrange as autoridades elencadas no seu art. 2º,
quais sejam: o Presidente da República, os Ministros de Estado, os
Ministros do Supremo Tribunal Federal e o Procurador Geral da
República. Precedentes.
2. O Tribunal de origem, com fundamento nas provas colhidas, concluiu
que as campanhas publicitárias realizadas pelo agravante foram
"destinadas à promoção pessoal" (fl. 587). Alterar esse entendimento
esbarra na Súmula 7/STJ.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 6693 / RS, Ministro CASTRO MEIRA,
15/09/2011)
4. Modalidades
A Lei nº 8.429/92 dividiu os atos de improbidade em três
modalidades, como sendo aqueles que:
Direito Administrativo
365
Importam enriquecimento ilícito (art. 9º);
Causam prejuízo ao erário (art. 10);
Atentam contra os princípios da Administração Pública (art. 11).
Outro ponto relevante é que das três modalidades que definem as
condutas ímprobas somente no art. 10 da Lei de Improbidade é que
aparece o elemento subjetivo dolo ou culpa. No mesmo sentido o
art. 5º da Lei refere-se ao elemento culpa somente nos casos em
que ocorra lesão ao patrimônio público. Nos demais, somente se
processa mediante dolo. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp
nº 797.671/MG e REsp nº 875.163/RS, entendeu que para
caracterizar o ato como ímprobo, como atentador aos princípios
constitucionais, (todos com status de improbidade), deve ao menos
ter sido cometido com má-fé pelo administrador. No Resp nº
1.023.904/RJ (julgado em 01/06/2010) o STJ expôs: A exegese das
regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a
gravidade das sanções e restrições impostas ao agente público,
deve se realizada cum granu salis, máxime porque uma
interpretação ampliativa poderá acoimar de ímprobas condutas
meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa,
posto ausente a má-fé do administrador público, preservada a
moralidade administrativa e, a fortiori, ir além de que o legislador
pretendeu. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e
ímprobo e a ilegalidade só adquire o status de improbidade
quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da
Administração Pública coadjuvados pela má-intenção do
administrador.
Atenção! A Lei de Improbidade Administrativa apresenta um rol exemplificativo das condutas que possam importar atos de improbidade, haja vista que as normas (arts. 9º, 10 e 11) possuem ao final de cada caput a expressão: notadamente.
366
5. Cominações
Primeiramente cumpre observar que a Constituição
Federal, no art. 37, § 4º, não se refere às medidas aplicáveis aos
responsáveis pelos atos de improbidade como sanção,
simplesmente afirmando importarão. E nem poderia mesmo, pois
nesta norma há medidas de natureza cautelar, como a
indisponibilidade de bens e também obrigação natural, como
ressarcimento ao erário (aquele que causar dano a outrem deve
ressarci-lo, art. 186 c/c art. 927, do Código Civil). Da mesma
forma o art. 12 da Lei nº 8.429/92 reporta-se às medidas como
cominações. Previu o art. 37, § 4º, da CRFB/88 como cominações
aos responsáveis pelos atos de improbidade:
Suspensão dos direitos políticos;
Perda da função pública;
Indisponibilidade dos bens;
Ressarcimento ao erário.
O art. 12 da Lei nº 8.429/92 ampliou o rol de cominações
estabelecido na Constituição além de especificar para cada
modalidade de improbidade a gradação das medidas ali impostas,
sendo aplicadas de forma isolada ou cumulativa, de acordo com a
gravidade do fato (Lei nº 12.120, publicada em 15/12/2009, que
alterou o caput do referido artigo).
A ampliação no rol de cominações do art. 12 da Lei nº
8.429/92 em comparação às do art. 37, § 4º, da CRFB/88 é
constitucional, pois a Constituição Federal apontou apenas o
Atenção! Por força do art. 21 da Lei de Improbidade é totalmente dispensável para a aplicação das sanções que tenha efetivamente ocorrido dano ao patrimônio público (salvo quanto à pena de ressarcimento, STJ no REsp nº 917.437/MG), o enriquecimento ilícito ou até mesmo a aprovação ou rejeição das contas por órgão do controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas (neste sentido o STJ no REsp nº 711.732/SP).
Direito Administrativo
367
mínimo de medidas, possibilitando ao legislador
infraconstitucional aumentar aquela relação.
Entretanto é bom salientar ainda que o art. 37, § 4º da
CRFB/88 ao indicar as penas indicou a indisponibilidade dos
bens, enquanto o art. 12 da Lei de Improbidade apontou para a
perda dos bens e valores. A indisponibilidade de bens para os
casos de atos de improbidade que causem prejuízo ao patrimônio
público ou ensejem enriquecimento ilícito foi trabalhada no art. 7º
da Lei de Improbidade, sobre o tema já se manifestou o Tribunal
da Cidadania:
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS.
PERICULUM IN MORA. O periculum in mora para decretar a
indisponibilidade de bens decorrente do ato de improbidade
administrativa (art. 37, § 4º, da CF) é presumido, nos termos do art. 7º
da Lei n. 8.429/1992. Precedentes citados: REsp 1.315.092-RJ, DJe
14/6/2012; REsp 1.203.133-MT, DJe 28/10/2010; REsp 1.135.548-PR,
DJe 22/6/2010; REsp 1.115.452-MA, DJe 20/4/2010, e REsp 1.319.515-
ES. AgRg no AREsp 188.986-MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,
julgado em 28/8/2012 (Informativo 503 do STJ)
ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. INDISPONIBILIDADE DE BENS. LIMINAR.
VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC. OMISSÃO. NÃO
CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 1º DA LEI N. 8.009/90.
NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO. TRIBUNAL DE
ORIGEM ASSENTOU NÃO ESTAR CARACTERIZADO BEM DE
FAMÍLIA. ANÁLISE DOS PRESSUPOSTOS DO 'FUMUS BONI IURIS'.
SÚMULA 07/STJ. ART. 7º DA LEI N. 8.492/92. POSSIBILIDADE DE
CONSTRIÇÃO DOS BENS ADQUIRIDOS ANTERIORMENTE AO
FATO ALEGADO. PRECEDENTES. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL.
NÃO DEMONSTRAÇÃO
(...)
5. A jurisprudência do STJ conclui pela possibilidade de a indisponibilidade recair sobre bens adquiridos antes do fato descrito na inicial, pois o sequestro ou
a indisponibilidade dá-se como garantia de futura execução em caso de
constatação do ato ímprobo; assim, irrelevante se a indisponibilidade recaiu sobre bens anteriores ou posteriores ao ato acoimado de ímprobo. Precedentes: AgRg
no Ag 1.423.420/BA, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe
28.10.2011; e REsp 1.078.640/ES, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 23.3.2010. (STJ, AgRg no REsp 937085/PR, Ministro Relator Humberto
Martins, julgado em 04/09/2012). No mesmo sentido ver REsp nº
1.319.515/ES; AgRg no AREsp nº 20.853/SP).
Ainda com relação às penas o art. 23 da Lei nº 8.429/92
estabeleceu como prazo de prescrição 5 anos para a aplicação das
368
sanções previstas após o término do exercício do mandato, de
cargo em comissão ou função de confiança.
No caso de reeleição já se manifestou o Superior Tribunal de
Justiça no REsp nº 1.107.833/SP, julgado em setembro de 2009, que o
prazo prescricional de 5 anos começa a partir do término do segundo
mandato pois: A LIA, promulgada antes da Emenda Constitucional n. 16,
de 4 de junho de 1997, que deu nova redação ao § 5º do art. 14, da
Constituição Federal, considerou como termo inicial da prescrição
exatamente o final de mandato. No entanto, a EC n. 16/97 possibilitou a
reeleição dos Chefes do Poder Executivo em todas as esferas
administrativas, com o expresso objetivo de constituir corpos
administrativos estáveis e cumprir metas governamentais de médio prazo,
para o amadurecimento do processo democrático. A Lei de Improbidade
associa, no art. 23, I, o início da contagem do prazo prescricional ao
término de vínculo temporário, entre os quais, o exercício de mandato
eletivo. De acordo com a justificativa da PEC de que resultou a Emenda
n. 16/97, a reeleição, embora não prorrogue simplesmente o mandato,
importa em fator de continuidade da gestão administrativa. Portanto, o
vínculo com a Administração, sob ponto de vista material, em caso de
reeleição, não se desfaz no dia 31 de dezembro do último ano do primeiro
mandato para se refazer no dia 1º de janeiro do ano inicial do segundo
mandato. Em razão disso, o prazo prescricional deve ser contado a
partir do fim do segundo mandato. A estabilidade da estrutura
administrativa e a previsão de programas de execução duradoura
possibilitam, com a reeleição, a satisfação, de forma mais concisa e
eficiente, do interesse público. No entanto, o bem público é de
titularidade do povo, a quem o administrador deve prestar contas. E se,
por dois mandatos seguidos, pôde usufruir de uma estrutura mais bem
planejada e de programas de governo mais consistentes, colhendo frutos
ao longo dos dois mandatos – principalmente, no decorrer do segundo,
quando os resultados concretos realmente aparecem – deve responder
inexoravelmente perante o titular da res publica por todos os atos
praticados durante os oito anos de administração, independente da data
de sua realização. No que concerne à ação civil pública em que se busca
a condenação por dano ao erário e o respectivo ressarcimento, esta
Corte considera que tal pretensão é imprescritível, com base no que
dispõe o artigo 37, §5º, da Constituição da República. Precedentes de
ambas as Turmas da Primeira Seção
É de suma importância lembrar que esse prazo
prescricional de 5 anos não abrange todas as cominações, mas tão
somente a perda da função pública, a suspensão dos direitos
Direito Administrativo
369
políticos, o pagamento de multa civil, a perda de bens ou valores
acrescidos ilicitamente e a proibição de contratar com o Poder
Público ou dele receber benefícios, pois as ações de ressarcimento
ao erário são imprescritíveis, como enuncia o art. 37, § 5º, da
CRFB/88 (STF no MS nº 26.210/DF; STJ no REsp 1.056.256/SP,
no REsp nº 764.278/SP, no REsp nº 730.264/RS, no REsp nº
1.067.561/AM).
Perda de bens ou valores acrescidos ilicitamente
Ressarcimento integral
Suspensão dos direitos políticos
Pagamento de multa civil
Perda da função
pública
Sim Sim
Sim
Sim
Sim, acrescido
do art. 6º Sim
Sim Sim
Não há previsão específica no art.
12, só a de suspensão do art.
7º
Atos de improbidade que
importam
enriquecimento ilícito
Atos de improbidade que causem
prejuízo ao erário
Atos de improbidade que atentam
contra os princípios
Proibição de contratar com o
Poder Público ou receber benefícios ou incentivos
fiscais ou creditícios
8 a 10 anos 5 a 8 anos 3 a 5 anos
Prazo de 3
anos Prazo de 5
anos Prazo de 10
anos
Até 3 vezes o valor do
acréscimo
patrimonial
Até 2 vezes o valor do
acréscimo patrimonial
Até 100 vezes
o valor da remuneração
370
6. Procedimentos
6.1. Procedimento administrativo
Estabelecido nos arts. 14 a 16 da Lei de Improbidade, não
apresenta particularidades inovadoras. O art. 14 da Lei nº 8.429/92
repete o já estabelecido no art. 5º, XXXIV, a, da CRFB/88, que por
sua vez expõe o direito de petição, nele incluído o direito de
representação.
A representação deverá ser escrita ou reduzida a termo e
assinada, contendo inclusive a assinatura do representante. Estes
requisitos têm o objetivo de coibir acusações levianas, sem
qualquer indício de prova. Até mesmo porque como o exercício do
Poder Disciplinar é, inicialmente, obrigatório (a exemplo do art.
143 da Lei 8.112/90) caso se aceitasse qualquer hipótese de
representação anônima, inviável e impraticável se tornaria a
função da autoridade encarregada pela sua investigação. Por isso, a
regra é a não aceitação de representações anônimas. O art. 19 da
Lei expõe ser crime, passível de detenção de 6 a 10 meses e multa,
a representação por ato de improbidade contra agente público ou
terceiro beneficiário, quando o autor da denúncia o sabe inocente.
Porém se estas representações anônimas apresentarem fortes
indícios de veracidade e seriedade a autoridade administrativa pode
instaurar a investigação e apurar a prática do suposto ato de
improbidade (STF no MS nº 24.369 e STJ no MS nº 7.069/DF).
Havendo fortes indícios da prática de ato de improbidade,
que tenha causado dano ao patrimônio público ou enriquecimento
ilícito, estabelece o art. 16 da Lei de Improbidade que o agente ou
terceiro poderá ver decretado contra si o sequestro de bens
(processado de acordo com os arts. 822 e 825 do CPC).
Equivocou-se, entretanto, o legislador, pois o instituto do
sequestro direciona-se a bens previamente determinados, o que não
Atenção! A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com o trânsito em julgado da sentença condenatória (art. 20 da Lei de Improbidade).
Direito Administrativo
371
é o caso, uma vez que sempre que há confusão patrimonial, não se
consegue, num primeiro momento, determinar o que fora acrescido
lícita ou ilicitamente. Em verdade, a medida cautelar corretamente
aplicada deveria ser o arresto (arts. 813 a 821 do CPC), pois se
destina a quaisquer bens. Para aplicar a norma cautelar correta
utiliza-se a norma geral do art. 7º da própria Lei de Improbidade,
que dispõe sobre a indisponibilidade dos bens, aplicando-se, aí sim,
à integralidade do patrimônio. O Superior Tribunal de Justiça, no
AgRg no AREsp nº 188.986/MG, Relator Min. Teori Albino
Zavascki, julgado em 28/08/2012, entendeu que o periculum in
mora para decretar a indisponibilidade de bens decorrente de ato de
improbidade administrativa é presumido, nos termos do artigo 7º
da Lei nº 8.429/92 (Informativo 503 do STJ).
No Informativo nº 505, o Superior Tribunal de Justiça
entendeu ser plenamente possível a demissão de servidor em razão
da prática de ato de improbidade, mesmo que o fato não tenha sido
apurado na esfera cível:
DIREITO ADMINISTRATIVO. PROCESSO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (PAD). DEMISSÃO POR
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
É possível a demissão de servidor por improbidade administrativa
em processo administrativo disciplinar. A pena de demissão não é
exclusividade do Judiciário, sendo dever indeclinável da
Administração apurar e, eventualmente, punir os servidores que
vierem a cometer ilícitos de natureza disciplinar, conforme o art. 143
da Lei n. 8.112/1990. Conforme o entendimento da Terceira Seção do
STJ, em face da independência entre as esferas administrativas e
penais, o fato de o ato demissório não defluir de condenação do
servidor exarada em processo judicial não implica ofensa aos ditames
da Lei n. 8.492/1992, nos casos em que a citada sanção disciplinar é
aplicada como punição a ato que pode ser classificado como de
improbidade administrativa, mas não está expressamente tipificado no
citado diploma legal, devendo, nesses casos, preponderar a regra
prevista na Lei n. 8.112/1990. Precedentes citados: MS 15.054-DF,
DJe 12/19/2011, e MS 12.536-DF, DJe 26/9/2008. MS 14.140-DF,
Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 26/9/2012.
372
6.2. Procedimento judicial
A ação de improbidade poderá ser promovida pelo
Ministério Público (STJ no REsp nº 1.069.723/SP) ou pela pessoa
jurídica interessada (a União, um Município, uma Autarquia, por
exemplo), tendo natureza de ação civil pública, sendo aplicável
subsidiariamente as normas constantes da Lei nº 7.347/85 (lei que
disciplina a ação civil pública), no que não contrariar os
dispositivos da Lei de Improbidade.
É de difícil aceitação que a Defensoria Pública possa
ingressar com uma ação civil pública de improbidade
administrativa. Assim, também, afirmam Emerson Garcia e
Rogério Pacheco Aves (2008, p. 630). Entretanto o Tribunal
Gaúcho (ainda que em decisão isolada) no Agravo de Instrumento
Nº 70034602201, julgado em 19/05/2010, entendeu ser a
Defensoria Pública legitimada para a propositura de ação civil
pública não apenas na defesa dos necessitados, em atenção às suas
finalidades institucionais, mas também na tutela de todo e
qualquer direito difuso, coletivo ou individual homogêneo, na
forma da lei.
As ações de improbidade deverão ser processadas na sede
da pessoa jurídica lesada. Se houver interesse ou for parte,
assistente ou oponente a União, Entidade autárquica ou empresa
pública federal, a ação deverá ser proposta na Justiça Federal (art.
109 da CRFB/88).
O art. 84, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Penal
(alterado pela Lei nº 10.628/06) instituiu o foro especial por
prerrogativa de função. Para exemplificar, caso o acusado fosse um
Comandante da Marinha, a ação de improbidade deveria ser
Atenção! A ação judicial possui rito ordinário, sendo expressamente vedada transação, acordo ou conciliação (princípio da indisponibilidade do interesse público), e se o Ministério Público não intervier no processo como parte, deverá atuar, obrigatoriamente, como custos legis (fiscal da lei).
Direito Administrativo
373
proposta perante o STF (art. 102, I, b, da CRFB/88). No entanto,
esta alteração foi declarada inconstitucional pelo STF na ADI nº
2.797/DF, sob o argumento que somente a Constituição Federal
poderia instituir foro privilegiado por prerrogativa de função.
Logo, a ação de improbidade administrativa deve ser proposta no
juízo de primeiro grau de jurisdição (juiz de primeira instância).
Uma vez instaurado o processo, o requerido será
notificado para oferecer manifestação por escrito, no prazo de 15
dias (art. 17, §7º, da Lei de Improbidade). Esta manifestação por
escrito funciona como uma defesa prévia, preliminar, haja vista
que a notificação do requerido não equivale à citação, que somente
ocorrerá caso sua manifestação não seja convincente e a petição
inicial seja recebida (art. 17, §9º). Se convencido da inexistência do
ato de improbidade, o juiz deve extinguir o processo.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DEFESA PRÉVIA.
NULIDADE.
A falta de notificação do acusado para apresentar defesa prévia nas
ações submetidas ao rito da Lei de Improbidade Administrativa (art.
17, § 7º, da Lei n. 8.429/1992) é causa de nulidade relativa do feito,
devendo ser alegada em momento oportuno e devidamente
comprovado o prejuízo à parte. Com esse entendimento, a Turma
negou provimento ao recurso, mantida a condenação do recorrente.
Precedentes citados: REsp 1116932-SP, DJe 14/10/2009, e REsp
1.034.511-CE, DJe 22/9/2009. (EDcl no REsp 1.194.009-SP, Rel.
Min. Arnaldo Esteves Lima, julgados em 17/5/2012).
Recebida a petição inicial, proceder-se-á a citação do
(agora sim) réu, para apresentar contestação, seguindo, então, o rito
da ação civil pública. Da decisão que recebe a petição inicial cabe
recurso de agravo de instrumento.
Tanto a autoridade judicial quanto a autoridade
administrativa podem (medida excepcional) determinar o
afastamento (cautelar) do agente público do cargo, emprego ou
função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer
necessária à instrução processual (art. 20, parágrafo único), ou seja,
quando for manifesta a sua indispensabilidade (STJ no
929.483/BA, no AgRg na SLS 955/CE e AgRg na SLS 867/CE).
Inadmite-se nas penas impostas pelas condutas ímprobas,
aplicação do princípio da insignificância. Desta forma já se
374
manifestou o Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 892.818/RS,
julgado em 11/11/2008, tendo como Ministro Relator Herman
Benjamin, assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRINCÍPIO
DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. MERA IRREGULARIDADE
ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
DISTINÇÃO ENTRE JUÍZO DE IMPROBIDADE DA
CONDUTA E JUÍZO DE DOSIMETRIA DA SANÇÃO.
1. Hipótese em que o Ministério Público do Estado do Rio Grande do
Sul ajuizou Ação Civil Pública contra o Chefe de Gabinete do
Município de Vacaria/RS, por ter utilizado veículo de propriedade
municipal e força de trabalho de três membros da Guarda Municipal
para transportar utensílios e bens particulares.
2. (...)
3. A implementação judicial da Lei da Improbidade Administrativa
segue uma espécie de silogismo – concretizado em dois momentos,
distintos e consecutivos, da sentença ou acórdão – que deságua no
dispositivo final de condenação: o juízo de improbidade da conduta (=
premissa maior) e o juízo de dosimetria da sanção (= premissa menor).
4. Para que o defeito de uma conduta seja considerado mera
irregularidade administrativa, exige-se valoração nos planos
quantitativo e qualitativo, com atenção especial para os bens jurídicos
tutelados pela Constituição, pela Lei da Improbidade Administrativa,
pela Lei das Licitações, pela Lei da Responsabilidade Fiscal e por
outras normas aplicáveis à espécie. Trata-se de exame que deve ser
minucioso, sob pena de transmudar-se a irregularidade administrativa
banal ou trivial, noção que legitimamente suaviza a severidade da Lei
da Improbidade Administrativa, em senha para a impunidade, business
as usual.
5. (...)
6. Iniquidade é tanto punir como improbidade, quando desnecessário
(por atipicidade, p. ex.) ou além do necessário (= iniquidade
individual), como absolver comportamento social e legalmente
reprovado (= iniquidade coletiva), incompatível com o marco
constitucional e a legislação que consagram e garantem os princípios
estruturantes da boa administração.
7. O juiz, na medida da reprimenda (= juízo de dosimetria da
sanção), deve levar em conta a gravidade, ou não, da conduta do
agente, sob manto dos princípios da razoabilidade e da
proporcionalidade, que têm necessária e ampla incidência no campo
da Lei da Improbidade Administrativa.
8. Como o seu próprio nomen iuris indica, a Lei 8.429/92 tem na
moralidade administrativa o bem jurídico protegido por
excelência, valor abstrato e intangível, nem sempre reduzido ou
reduzível à moeda corrente.
Direito Administrativo
375
9. A conduta ímproba não é apenas aquela que causa dano financeiro
ao Erário. Se assim fosse, a Lei da Improbidade Administrativa se
resumiria ao art. 10, emparedados e esvaziados de sentido, por essa
ótica, os arts. 9 e 11. Logo, sobretudo no campo dos princípios
administrativos, não há como aplicar a lei com calculadora na mão,
tudo expressando, ou querendo expressar, na forma de reais e
centavos.
10. (...)
11. A Quinta Turma do STJ, em relação a crime de responsabilidade,
já se pronunciou no sentido de que "deve ser afastada a aplicação do
princípio da insignificância, não obstante a pequena quantia
desviada, diante da própria condição de Prefeito do réu, de quem
se exige um comportamento adequado, isto é, dentro do que a
sociedade considera correto, do ponto de vista ético e moral."
(REsp 769317/AL, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ
27/3/2006). Ora, se é assim no campo penal, com maior razão no
universo da Lei de Improbidade Administrativa, que tem caráter
civil.
12. (...)
Há de se destacar por fim que por ordem do artigo 17,
§12 da LIA o Presidente e o Vice-Presidente da República, os
senadores e deputados federais, os ministros de Estado, os
governadores de Estados e Territórios, os secretários de Estado, os
prefeitos do Distrito Federal e dos Municípios, os deputados das
Assembleias Legislativas Estaduais, os membros do Poder
Judiciário, os ministros e juízes dos Tribunais de Contas da União,
dos Estados, do Distrito Federal, bem como os do Tribunal
Marítimo serão inquiridos em local, dia e hora previamente
ajustados entre eles e o juiz. O Presidente e o Vice-Presidente da
República, os presidentes do Senado Federal, da Câmara dos
Deputados e do Supremo Tribunal Federal poderão optar pela
prestação de depoimento por escrito, caso em que as perguntas,
formuladas pelas partes e deferidas pelo juiz, lhes serão
transmitidas por ofício.
Direito Administrativo
377
Capítulo XV
CCOONNTTRROOLLEE DDAA AADDMMIINNIISSTTRRAAÇÇÃÃOO PPÚÚBBLLIICCAA
1. Introdução
A Administração Pública no Brasil historicamente passou
por três modelos clássicos de gestão: o patrimonialista, o
burocrático e o gerencial.
A Administração Pública patrimonialista (típico regime
autoritário) era marcada pelo poder nas mãos de poucos. Os cargos,
os bens, o dinheiro pertencente ao Poder Público, eram utilizados
como patrimônio particular dos governantes, não havendo
diferenciação entre a coisa pública e os bens e direitos particulares,
originando a corrupção, o nepotismo, o abuso de poder, e outras
formas de ilegalidade (ou imoralidade).
A Administração Pública burocrática, surgida na
primeira metade do século XX, se baseava na racionalidade, por
meio da criação e cumprimento das leis, como forma de combater a
corrupção e o nepotismo patrimonialista.
Webber identifica como características fundamentais do Estado
burocrático justamente o somatório entre a prévia definição de
competências e o exercício contínuo de uma atividade vinculada a
regras oficiais. O quadro mais puro de dominação legal é o que se
exerce por meio do quadro administrativo burocrático, porque
somente este modelo pressupõe: 1. hierarquia oficial (instâncias fixas
de controle e supervisão com a garantia do direito de apelação das
subordinadas às superiores; 2. regramento das condutas (cuja
aplicação depende de qualificação profissional e de regras
especificamente técnicas); 3. separação entre o quadro administrativo
e os meios de administração e produção; e 4. documentação formal
dos processos administrativos. (GABARDO, 2002, p. 33).
Contudo, para se alcançar esta racionalidade este modelo
de administração criou excessivas formalidades na máquina estatal,
voltando-se apenas para a otimização dos meios, esquecendo-se
378
dos resultados, de sua missão principal: servir ao interesse público,
o interesse da coletividade.
A Administração Pública gerencial (public management),
com início na segunda metade do século XX, surgiu como resposta
à evolução econômica e social do Estado, diante da globalização e
do desenvolvimento tecnológico. Este modelo de Administração
Pública constituiu uma resposta à evolução da sociedade
objetivando aspectos de eficiência e eficácia, da necessidade de
redução dos custos da estrutura pública e aumento da qualidade dos
serviços públicos.
Nesta perspectiva histórica de Administração Pública, o
seu controle assumiu um papel importante, impondo limites à
atuação dos governantes e orientando a melhor utilização dos
recursos disponíveis de forma organizada e ponderada.
Já foi dito que a Administração Pública atua por meio de
seus órgãos e seus agentes, os quais são incumbidos do exercício
das funções públicas, ou seja, da atividade administrativa.
Afirmou-se, também, que a função administrativa é exercida nos
três Poderes, sendo tipicamente pelo Poder Executivo e
atipicamente pelos Poderes Legislativo e Judiciário.
O Estado de Direito corresponde a um conceito de Estado
que cria uma ordem jurídica, que submete o Estado a esta ordem e
cria um órgão imparcial ao qual se submetem a sociedade e o
próprio Estado em caso de conflito. De nada adiantaria, entretanto,
a submissão da função administrativa ao ordenamento jurídico e a
este órgão imparcial, se não houvesse instrumentos de efetivo
controle da Administração Pública.
Desta forma, a Constituição Federal de 1988
institucionalizou um sistema de controle externo (além do interno)
relativamente aos atos do executivo reservando competências ao
Legislativo e ao Judiciário, além de outras específicas dos
Tribunais de Contas e Ministério Público.
Podemos então sintetizar o controle da Administração
Pública como sendo um conjunto de mecanismos disponíveis tanto
para a sociedade quanto para a própria Administração, objetivando
a correção e fiscalização da atividade administrativa.
Direito Administrativo
379
Tomando-se por base os princípios da Administração
Pública, o seu controle está inserido no princípio da autotutela, ou
seja, o dever que a Administração tem de rever a sua própria
atuação (controle interno) e tutela, o controle que a Administração
Pública Direta exerce sobre a Administração Pública Indireta (na
Administração Pública Federal denominado de supervisão
ministerial).
2. Classificação das formas de controle
2.1. Quanto aos órgãos incumbidos do controle
Controle Legislativo: feito diretamente pelo Poder Legislativo
sobre os atos do Executivo (arts. 49, 50, 51, 52 e 58, § 3º da
CRFB/88), ou com o auxílio do Tribunal de Contas (art. 71 da
CRFB/88). Verificado somente nas hipóteses previstas na
Constituição, envolvendo o controle das regularidades
políticas e financeiras dos atos.
Controle Administrativo: feito no próprio âmbito
administrativo podendo ser hierárquico ou tutelar. É o
exercício da autotutela. Decorrente também do poder
hierárquico, é o poder (ou dever) que a Administração tem de
rever seus próprios atos.
Controle Judicial: controle exercido pelo Poder Judiciário o
qual deve ser necessariamente invocado (princípio da inércia,
art. 2º, do Código de Processo Civil). Com base no art. 5º,
XXXV, da CRFB/88, nenhum ato poderá escapar de seu
controle, desde que sua fiscalização fique adstrita à legalidade.
2.2. Quanto ao âmbito
Controle interno: é o controle efetuado pelos órgãos
integrantes do próprio Poder, pelas condutas administrativas
produzidas na sua esfera. Pode ser hierárquico ou tutelar
(ministerial). No Poder Judiciário este controle é exercido,
também, pelo Conselho Nacional de Justiça (artigo 103-B,
§ 4º da CRFB/88): compete ao Conselho o controle da
atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do
cumprimento dos deveres funcionais dos juízes; zelar pela
observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante
provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados
380
por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo
desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem
as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem
prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;
receber e conhecer das reclamações contra membros ou
órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços
auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços
notariais e de registro que atuem por delegação do poder
público ou oficializados, sem prejuízo da competência
disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar
processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a
disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou
proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras
sanções administrativas, assegurada ampla defesa.
Controle externo: existe quando o Poder que realiza o
controle é diverso daquele que se originou o ato, como, por
exemplo, o Poder Judiciário realizando controle legal de ato
do Poder Executivo (forma de atenuar a independência dos
Poderes). Tem a máxima previsão no art. 2º da CRFB/88.
2.3. Quanto à amplitude
Controle hierárquico é feito dentro da própria estrutura
administrativa hierarquizada, pressupondo, via de regra, a
desconcentração administrativa. É o controle subordinação.
Aparece na CRFB/88 nos arts. 31, 70 e 74.
Controle tutelar (ministerial) também denominado de
finalístico é, igualmente ao controle hierárquico, exercido no
âmbito administrativo, todavia, por uma pessoa jurídica
distinta daquela que emitiu o ato, mas a ela vinculada. Não é
um controle hierárquico propriamente dito, porque não há
relação hierárquica de subordinação entre as pessoas jurídicas,
mas sim uma relação de vinculação. É um controle finalístico
(do cumprimento de suas finalidades). Quando há previsão de
recurso cabível da pessoa controlada para a controladora, o
mesmo é chamado de recurso hierárquico impróprio, tendo de
ser obrigatoriamente previsto em lei. É o controle exercido
pela Administração Pública Direta sobre a Indireta. Parte da
doutrina entende que este controle decorrente da tutela é
Direito Administrativo
381
controle externo e não interno (CARVALHO FILHO, 2008, p.
885; DI PIETRO, 2009, p. 727).
2.4. Quanto ao momento de exercício
Prévio ou preventivo ou a priori: é aquele que ocorre antes da
consumação da conduta. Exemplo dos arts. 49, II, XVII, e 52,
III, da CRFB/88.
Concomitante: controle que ocorre no momento em que a
atividade é desenvolvida, como o acompanhamento de um
concurso por um órgão (art. 93, I, da CRFB/88), uma auditoria
enquanto está sendo realizada, etc.
Posterior ou a posteriori: ocorre após a conclusão do ato.
Pode extingui-lo (art. 49 da Lei nº 8.666/93), corrigi-lo ou
confirmá-lo (art. 43, VI, da Lei nº 8.666/93). Serve como uma
forma de revisão dos atos praticados.
2.5. Quanto à iniciativa
De ofício: é uma prerrogativa conferida à Administração de
reparar seus próprios erros, equívocos. Baseia-se no princípio
da legalidade e no princípio da autotutela, princípio este
inclusive reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal nas
Súmulas nºs 346 e 473.
Provocado: quando um terceiro se dirige à Administração
para deflagrar a correção de um ato. Pode ser feito por
diversas formas de impugnação.
2.6. Quanto à natureza do controle
Controle de legalidade ou validade: é o controle que se
verifica se a conduta do agente público se deu de acordo com
a lei (ordem jurídica). Esta espécie de controle pode ser
interna (quando o próprio emissor do ato o revisa) ou externa
(quando é outro Poder que realiza este controle de legalidade).
Tanto em uma quanto na outra ocasionará a anulação do ato
(neste sentido as Súmulas do STF nºs 346 e 473).
382
É bom ressaltar que não é todo e qualquer ato com
defeito (vício) que poderá acarretar a sua declaração de nulidade.
De acordo com o art. 55 da Lei nº 9.784/99, os atos com vícios
sanáveis que não acarretem lesão ao interesse público, nem
prejuízo a terceiros, poderão ser convalidados pela própria
Administração. Além disso, salvo má-fé, o direito da
Administração de anular os atos que decorram efeitos favoráveis
para os destinatários decai em 5 anos (art. 54 da Lei nº 9.784/99).
Controle de mérito: examina os aspectos da conduta da
Administração Pública sob os prismas da conveniência e
oportunidade. Neste contexto, somente haverá controle de
mérito nos atos administrativos discricionários (quanto ao
objeto e motivo), visto que, nos atos vinculados, a
oportunidade e conveniência (assim como todos os demais
requisitos do ato) estão prescritas em lei. Logo, o controle de
mérito (conveniência e oportunidade) só pode ser exercido
pelo próprio Poder que, atuando na função administrativa,
editou o ato, o que não impede o Poder Judiciário (ou o
próprio Poder) de anular o ato por ilegalidade.
3. Controle Administrativo
É o controle exercido pelo Executivo e pelos demais
Poderes na função administrativa, com o objetivo de averiguar a
legalidade e conveniência do ato.
O controle interno pode ser exercido de ofício ou por
provocação. Neste último caso são os instrumentos mais utilizados:
3.1. Direito de petição
Previsto no art. 5º, XXXIV, a, da CRFB/88, possui uma
acepção ampla, pois é assegurado o direito de petição em defesa de
Atenção! Atualmente, após a publicação da EC 45/04, que acrescentou o art. 103-A, § 3º, à CRFB/88, a Administração Pública não pode, também, contrariar Súmula Vinculante (além da lei), sob pena de ver seu ato declarado nulo.
Direito Administrativo
383
direitos individuais ou coletivos. Atua contra a ilegalidade (abuso
de poder é um tipo de ilegalidade) do ato e decorre do próprio
exercício da cidadania (CARVALHO FILHO, 2008, p. 886).
É dotado de eficácia, ou seja, exige uma resposta por
parte da autoridade (administrativa). No Regime Jurídico dos
Servidores Públicos Civis da União está previsto nos artigos 104 a
115.
3.2. Representação
É a denúncia solene (escrita, datada, assinada) de
irregularidade ou ilegalidade, efetuada perante a própria
Administração ou junto a órgãos de controle como Ministério
Público ou Tribunal de Contas (DI PIETRO, 2009, p. 730). Não se
presta para defender interesse próprio (signatário) ou difuso. Na
CRFB/88 está prevista no art. 37, § 3º, III, e no art. 74, § 2º, mas
também surge na Lei nº 4.898/65 e no Código de Processo Civil,
art. 198.
3.3. Reclamação Administrativa
É o meio, também solene, pelo qual o interessado
(particular ou agente público) postula a revisão de um ato que lhe
cause lesão ou ameaça de lesão, ou, ainda, para obter o
reconhecimento de um direito (DI PIETRO, 2009, p. 731). Aparece
no Dec. nº 20.910/32, art. 6º, e no art. 103-A, § 3º, da CRFB/88.
A reclamação administrativa não é recurso, não é ação,
não é incidente processual: é um instrumento de provocação das
esferas administrativas no âmbito do seu sistema de controle
interno (neste sentido o STF na ADI nº 2.212/CE). É instrumento
do direito de petição na esfera administrativa e indica o desejo de
se opor a ato ou atividade pública que ofendeu interesse legítimo
do reclamante.
3.4. Pedido de reconsideração
É a solicitação de reexame do ato ou decisão pela própria
autoridade que o praticou. Não suspende nem interrompe o prazo
para a impetração de mandado de segurança (STF Súmula nº 430).
Vem previsto, por exemplo, no art. 109, III, da Lei nº 8.666/93, e
384
no art. 106 da Lei nº 8.112/90. Inclusive, neste último caso, é do
indeferimento do pedido de reconsideração que se torna possível a
interposição do recurso (art. 107, I).
3.5. Recurso hierárquico
É o pedido de reexame da decisão ou ato à autoridade
superior àquela que editou o ato ou proferiu a decisão. Possui
sempre efeito devolutivo, e pode ter efeito suspensivo (a exemplo o
art. 61, parágrafo único, da Lei nº 9.784/99 e art. 109, § 2º, da Lei
nº 8.666/93).
É importante destacar que a interposição de recursos
administrativos não impede o acesso às vias judiciais. Entretanto,
no caso do mandado de segurança (Lei nº 12.016/09, art. 5º, I)
quando for possível o cabimento de recurso administrativo com
efeito suspensivo e independente de caução, a sua impetração
ficará prejudicada, desde que o recurso tenha efetivamente sido
interposto.
O recurso hierárquico pode ser:
Recurso hierárquico próprio: dirigido à autoridade superior
dentro do mesmo órgão em que o ato ou decisão foram
emitidos. Independe de previsão legal, ou seja, mesmo que
não previsto é lícita a sua interposição, e é decorrente da
subordinação hierárquica. Por força da autotutela, a autoridade
superior tem amplo poder revisional, indo até mesmo além do
postulado no recurso.
Recurso hierárquico impróprio: dirigido à autoridade de outro
órgão que não compõe a mesma estrutura hierárquica daquele
que proferiu o ato anterior, mas a ele é vinculado. Depende de
expressa previsão de lei que propicie a utilização deste recurso.
Por exemplo, é o caso da interposição de um recurso de um ato
Atenção! Se for recurso interposto com base na Lei nº 9.784/99 poderá resultar em agravamento na situação do recorrente (art. 64, parágrafo único): reformatio in pejus.
Direito Administrativo
385
de uma Autarquia para a Administração Pública Direta. Caso
entenda-se que seja possível também na via inversa, ou seja, da
Administração Direta para uma entidade da Administração
Indireta, pode-se citar o art. 7º, IV e VII, da Lei nº 8.884/94, em
que compete ao Plenário do CADE (Conselho Administrativo
de Defesa Econômica – Agência Reguladora) decidir recursos
de ofício do Secretário da SDE (Secretaria de Direito
Econômico – órgão integrante da Administração Pública
Direta da União) e apreciar em grau de recurso as medidas
preventivas adotadas pela SDE ou pelo Conselheiro-Relator.
No mesmo sentido é a determinação do art. 14, VII, da mesma
norma.
3.6. Pedido de revisão
O pedido de revisão é também pedido de reexame, assim
como a reconsideração, é utilizado por servidor público para
reapreciação de uma decisão final proferida em processo
administrativo.
Da revisão não poderá ocorrer agravamento da situação
anterior (art. 65, parágrafo único da Lei nº 9.784/99 e arts. 174 a
182 da Lei nº 8.112/90). A decisão poderá ser revista, a qualquer
tempo, a pedido ou de ofício, quando se aduzirem fatos novos ou
circunstâncias suscetíveis de justificar a inocência do punido ou a
inadequação da penalidade aplicada, cabendo o ônus da prova cabe
ao requerente.
A simples alegação de injustiça da penalidade não
constitui fundamento para a revisão, que requer elementos novos,
ainda não apreciados no processo originário. Julgada procedente a
revisão, será declarada sem efeito a penalidade aplicada,
restabelecendo-se todos os direitos do servidor, exceto em relação
à destituição do cargo em comissão, que será convertida em
exoneração.
4. Controle Legislativo
É o controle da Administração Pública realizado pelas
casas parlamentares (Senado e Câmara dos Deputados,
Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores) nas hipóteses
386
constitucionalmente previstas, envolvendo basicamente o controle
político e o controle financeiro. Não fere a separação dos poderes
porque é instrumento construído pelo Poder Constituinte
Originário.
Os meios normalmente utilizados para o exercício deste
controle são: convocação de Autoridades, pedidos escritos de
informação, Comissões Parlamentares de Inquérito, entre outros.
4.1. Controle político
Tem por base a possibilidade de controlar os aspectos de
legalidade e de mérito dos atos da Administração no que tangem à
função administrativa e a sua organização.
São hipóteses as competências do Congresso Nacional e
Senado para apreciar os atos do Poder Executivo previstos nos arts.
49, I, II, III, IV, XII, XIV, XVI, XVII, 52, I, II, III, V e XI, o art.
50 (convocação de ministros ou de outras autoridades para prestar
pessoalmente informações sobre assuntos determinados), o art. 58,
§ 3º (trata das Comissões Parlamentares de Inquérito), todos da
CRFB/88, entre outros.
O STF na ADI-MC nº 2.225/SC entendeu serem válidas
normas locais que subordinam a nomeação dos dirigentes de
autarquias ou fundações à prévia aprovação pela Assembleia
Legislativa (no mesmo sentido o STF na ADI nº 1.642/MG).
Estamos aqui, igualmente, frente ao controle do Executivo pelo
Legislativo.
Atenção! A lei autorizativa para encampação prevista no art. 37 da Lei nº 8.987/95, a autorização legal para a execução de obras e serviços públicos por meio de concessão e permissão prevista no art. 2º da Lei nº 9.074/95, a autorização legislativa para a concessão patrocinada com mais de 70% da remuneração paga pela Administração, hipótese exposta no art. 10, § 3º, da Lei nº 11.079/04, nada mais são que formas de controle que o Poder Legislativo exerce sobre o Poder Executivo.
Direito Administrativo
387
4.2. Controle financeiro
Consiste no controle exercido pelo Poder Legislativo,
com auxílio do Tribunal de Contas, sobre o Poder Executivo no
que tange à fiscalização, consulta e julgamento contábil,
financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial, quanto à
legalidade, legitimidade e economicidade (arts. 70 e 71 da
CRFB/88).
Os Tribunais (Conselhos) de Contas são órgãos públicos
especializados, sem personalidade jurídica, com decisões de caráter
administrativo, com competências constitucionais exclusivas (art.
71 da CRFB/88), que exercem o Controle Externo de forma
auxiliar ao Poder Legislativo. Não ficam, por exemplo, vinculados
às decisões de caráter administrativo, senão vejamos:
AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA.
TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. VIOLAÇÃO DOS
PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
NÃO OCORRÊNCIA. INDEPENDÊNCIA ENTRE A ATUAÇÃO
DO TCU E A APURAÇÃO EM PROCESSO ADMINISTRATIVO
DISCIPLINAR. RESPONSABILIZAÇÃO DO ADVOGADO
PÚBLICO POR PARECER OPINATIVO. PRESENÇA DE
CULPA OU ERRO GROSSEIRO. MATÉRIA
CONTROVERTIDA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO
PROBATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1.
Ausência de violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa.
A Corte de Contas providenciou a notificação do impetrante assim que
tomou conhecimento de seu envolvimento nas irregularidades
apontadas, concedendo-lhe tempo hábil para defesa e deferindo-lhe,
inclusive, o pedido de dilação de prazo. O TCU, no acórdão impugnado,
analisou os fundamentos apresentados pela defesa, não restando
demonstrada a falta de fundamentação. 2. O Tribunal de Contas da
União, em sede de tomada de contas especial, não se vincula ao
resultado de processo administrativo disciplinar. Independência
entre as instâncias e os objetos sobre os quais se debruçam as
respectivas acusações nos âmbitos disciplinar e de apuração de
responsabilidade por dano ao erário. Precedente. Apenas um detalha
do exame dos dois processos poderia confirmar a similitude entre os
fatos que são imputados ao impetrante. 3. Esta Suprema Corte firmou
o entendimento de que “salvo demonstração de culpa ou erro
grosseiro, submetida às instâncias administrativo-disciplinares ou
jurisdicionais próprias, não cabe a responsabilização do advogado
público pelo conteúdo de seu parecer de natureza meramente
opinativa” (MS 24.631/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 1º/2/08).
388
Divergências entre as alegações do agravante e as da autoridade coatora.
Enquanto o impetrante alega que a sua condenação decorreu
exclusivamente de manifestação como Chefe da Procuradoria Distrital
do DNER em processo administrativo que veiculava proposta de acordo
extrajudicial, a autoridade coatora informa que sua condenação não se
fundou apenas na emissão do dito parecer, mas em diversas condutas,
comissivas e omissivas, que contribuíram para o pagamento de acordos
extrajudiciais prejudiciais à União e sem respaldo legal. Divergências
que demandariam profunda análise fático-probatória. 4. Agravo
regimental não provido. (STF, MS nº 27.867 AgR/DF, rel. Min. Dias
Toffoli, 18/9/2012).
O Tribunal de Contas também fiscaliza o Poder
Judiciário (competência exercida concorrentemente com o
Conselho Nacional de Justiça), o próprio Poder Legislativo e
pessoas físicas ou jurídicas que lidam com recursos públicos.
Podem, também, os Tribunais de Contas examinarem no
exercício de suas atribuições a compatibilidade de uma norma de
caráter infraconstitucional (lei ou ato administrativo) com a
Constituição Federal ou Estadual (Súmula nº 347 do STF). Porém,
com razão tece crítica o então Ministro Eros Grau: A referida regra
sumular foi aprovada na sessão Plenária de 13.12.1963, num
contexto constitucional totalmente diferente do atual. Até o
advento da Emenda Constitucional n° 16, de 1965, que introduziu
em nosso sistema o controle abstrato de normas, admitia-se como
legítima a recusa, por parte de órgãos não jurisdicionais, à
aplicação da lei considerada inconstitucional. No entanto, é
preciso levar em conta que o texto constitucional de 1988
introduziu uma mudança radical no nosso sistema de controle de
constitucionalidade. Parece quase intuitivo que, ao ampliar, de
forma significativa, o círculo de entes e órgãos legitimados a
provocar o Supremo Tribunal Federal, no processo de controle
abstrato de normas, acabou o constituinte por restringir, de
maneira radical, a amplitude do controle difuso de
Atenção! O auxílio prestado pelo Tribunal de Contas em regime de colaboração não o torna subordinado ao Congresso Nacional.
Direito Administrativo
389
constitucionalidade. (...). Assim, a própria evolução do sistema de
controle de constitucionalidade no Brasil, verificada desde então,
está a demonstrar a necessidade de se reavaliar a subsistência da
Súmula 347 em face da ordem constitucional instaurada com a
Constituição de 1988 (STF, MS nº 25.888 MC/DF, julgado em
22/03/2006).
O julgamento das contas do Presidente da República é
exclusividade do Congresso Nacional (art. 49, IX, da CRFB/88). Já
com relação aos demais administradores públicos é o Tribunal de
Contas quem julga (art. 71, II, da CRFB/88).
O Supremo Tribunal Federal (MS nº 23.875/DF e MS nº
23.627/DF) tinha entendimento de que o Tribunal de Contas não
poderia julgar as contas dos administradores de entidades de direito
privado, pois a participação majoritária do estado não tornava seus
bens em públicos. Entretanto, esse entendimento restou superado
com o julgamento em 2005 do MS nº 25.181/DF, entendendo,
agora, que ao Tribunal de Contas incumbe atuar inclusive com
relação à gestão de sociedades de economia mista (no mesmo
sentido STF nº MS nº 25.092/DF).
A condenação imposta pelo Tribunal de Contas tem
eficácia de título executivo (art. 71, § 3º, da CRFB/88), devendo o
órgão do Poder Executivo efetuar o lançamento como dívida ativa,
para cobrar via execução fiscal. Caso o órgão não efetue esta
inscrição em dívida ativa, a cobrança não poderá ser via execução
fiscal, mas sim execução comum.
5. Controle judicial
É o controle que o Poder Judiciário exerce sobre a
Administração Pública, mediante provocação. Possui matriz
constitucional no art. 5º, XXXV, que expõe: a lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito.
O controle jurisdicional constitui, juntamente com o
princípio da legalidade, um dos fundamentos em que repousa o
Estado de Direito, porque de nada adiantaria sujeitar a
Administração Pública à lei se seus atos não pudessem ser
390
controlados por um órgão dotado de garantias e imparcialidade que
permitam apreciar e invalidar os atos ilícitos por ela praticados.
Assim, em princípio, todo o ato administrativo pode ser
questionado frente ao Poder Judiciário, desde que este controle
exercido limite-se a examinar a legalidade (legitimidade),
incluindo-se aí a razoabilidade, proporcionalidade e moralidade
dos atos do Poder Executivo, sejam eles unilaterais ou bilaterais,
gerais ou individuais, vinculados ou discricionários. O que é
vedado ao Poder Judiciário é exercer o controle do mérito
(conveniência e oportunidade) administrativo.
Não existe um círculo de imunidade de poder que não
possa ser apreciado pelo Judiciário, assim, mesmo os atos interna
corporis e os atos políticos podem ser controlados pelo judiciário,
não podendo se manifestar, unicamente, quanto aos critérios
utilizados (mérito administrativo).
Outro fator importante também a ser considerado é que o
controle judicial é necessariamente provocado, sendo, pois um
órgão inicialmente inerte, até a sua provocação (art. 2º do CPC –
princípio da demanda).
Atenção! A regra é que todo ato praticado pelo Poder Executivo possa ser levado a questionamento ao Poder Judiciário independentemente do esgotamento das instâncias administrativas. Excepcionam-se, entretanto, as questões relativas à disciplina e às competições esportivas (art. 217, § 1º da CRFB/88) e os crimes materiais contra a ordem tributária e contribuições previdenciárias (STF no HC nº 88.894/SP, no RHC nº 90.532/CE; STJ no HC nº 96.348/BA), pois nestes casos o exaurimento das vias administrativas é uma imposição. Neste sentido veio a edição da Súmula Vinculante nº 24: não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.
Direito Administrativo
391
Como o inciso XXXV do art. 5º da CRFB/88 permite a
apreciação judicial de ameaça de lesão a direito, seu controle pode
ser efetuado de forma preventiva, e não somente repressiva.
5.1. Sistema de jurisdição
A inafastabilidade do Poder Judiciário de toda lesão ou
ameaça de lesão a direito dá-se porque o Brasil adotou o sistema de
jurisdição única ou sistema inglês, cabendo exclusivamente ao
Judiciário decidir toda e qualquer demanda sobre aplicação do
Direito ao caso concreto. Por este sistema a função de julgar e
administrar é desempenhada por órgãos distintos, pertencentes a
Poderes diversos: Poder Judiciário e Poder Executivo,
respectivamente.
Nesse sistema de jurisdição o Poder Judiciário é o único
órgão competente para dizer do direito aplicável em determinada
situação com caráter de coisa imodificável e definitiva, fazendo
coisa julgada.
Adotando este sistema (jurisdição única) o Brasil relegou
o chamado sistema de jurisdição dupla ou dual, sistema do
contencioso administrativo ou sistema francês. Tal sistema
consagra duas ordens jurisdicionais. Uma dessas ordens cabe ao
Poder Judiciário, a outra a um organismo próprio do Executivo,
denominado contencioso administrativo, a este incumbindo de
julgar em caráter definitivo as lides que Administração Pública é
parte, cabendo a solução das demais pendências ao Poder
Judiciário. A Administração Pública, assim, tem uma justiça
própria e fora do Judiciário.
5.2. Meios de controle
A Constituição Federal prevê alguns meios específicos
para a efetivação do controle judicial conhecidos como remédios
constitucionais, dos quais destacamos: o Habeas Corpus, o Habeas
Data, o Mandado de Segurança Individual e Coletivo, o Mandado
de Injunção, a Ação Civil Pública e a Ação Popular.
As demandas enumeradas, no entanto, não excluem
outras espécies de demandas. Por exemplo, pode-se em um
embargos à execução questionar-se a validade do título executivo
392
(MAFFINI, 2008, p. 219), ou ainda, a matéria levantada em um
mandado de segurança (direito líquido e certo) não impede que seja
sustentada via ação ordinária.
5.2.1. Habeas corpus
O habeas corpus é um remédio constitucional destinado a
proteger o direito de locomoção (ir e vir). É uma das garantias mais
antigas do indivíduo tendo seu primeiro aparecimento na Carta
Magna de 1215.
Possui fonte constitucional no art. 5º, LXVIII e é
regulado pelo CPP nos arts. 647 a 667.
É uma ação gratuita, proposta sempre que alguém estiver
sofrendo ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação
em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder
(sendo que abuso de poder é uma forma de ilegalidade).
Ainda que a liberdade de locomoção seja comumente
advinda de atos emanados do Poder Público, nada impossibilita a
impetração de habeas corpus contra atos de particular (MENDES,
2008, p. 522 e STJ no HC nº 35.301/RJ). Em sentido contrário,
afirma Luis Roberto Barroso (2009, p. 182) que o CPP refere-se à
autoridade coatora, e que o particular por não ser autoridade não
poderia cometer abuso de poder. Além disso, a ilegalidade do
particular em tolher o direito de locomoção configuraria crime de
cárcere privado (art. 148 do CP).
Por possuir rito sumaríssimo, exige prova pré-constituída,
ou seja, impede a dilação probatória. Pode ser utilizado de forma
repressiva ou preventiva (salvo conduto), e seu cabimento só é
possível nos casos em que a ação possa resultar, ainda que em
decorrência de conversão, em prisão do paciente (Súmula nº 695
do STF), excluindo-se assim, as infrações que somente cominem
pena de multa (Súmula nº 693 do STF) bem como as penas
criminais impostas às Pessoas Jurídicas (STJ no RHC nº
24.933/RJ, HC nº 93.867/GO, no RHC nº 16.762/MT). É incabível
também em relação a punições disciplinares militares (art. 142,
§ 2º da CRFB/88, porém, os pressupostos de legalidade [e não
Direito Administrativo
393
mérito] destas punições podem ser analisados por este remédio
constitucional, STF no RE nº 338.840/RS e no HC nº 70.648/RJ).
Por ser ação com previsão constitucional e voltada à
defesa da liberdade pode ser impetrado por qualquer pessoa (física
ou jurídica, advogado ou não), pelo Ministério Público e inclusive
expedida (e não impetrada) de ofício por juiz ou tribunal (art. 654,
§ 2º, do CPP).
O art. 102, I, d e i, II, a; o art. 105, I, c e II a; o art. 108, I,
d e o art. 109, VII, todos da CRFB/88, trazem normas referentes à
competência para processamento e julgamento de habeas corpus.
5.2.2. Habeas data
Previsto no art. 5º, LXXII, da CRFB/88 o habeas data é
o meio constitucional posto à disposição de pessoa física ou
jurídica para assegurar o conhecimento de informações relativas à
pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados
de entidades governamentais ou de caráter público, bem como para
a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo
sigiloso, judicial ou administrativo. Serve, também, para proceder à
anotação nos assentamentos do interessado, contestando ou
explicando possível pendência sobre o fato objeto do dado. Esta
garantia constitucional foi regulamentada pela Lei nº 9.507/97.
São sujeitos passivos da impetração as pessoas públicas
ou privadas, estas somente se mantiverem registros ou banco de
dados de natureza pública (o Serviço de Proteção ao Crédito
[SPC], por exemplo).
Só tem cabimento a impetração quando a informação,
retificação ou anotação for negada ou pelo decurso do período
constante no art. 8º, parágrafo único, da Lei nº 9.507/97. Logo,
deve haver a provocação da instância administrativa, mas não
necessariamente o seu esgotamento.
Não cabe habeas data se não houver recusa quanto às
informações por parte da autoridade administrativa. Esta recusa
deve surgir como prova na forma do art. 8º da Lei nº 9.507/97.
O rito processual é o mesmo do mandado de segurança,
com aplicação subsidiária do Código de Processo Civil,
394
culminando a ação com uma decisão de natureza mandamental. É
um processo isento de custas, não há condenação em honorários e
o Ministério Público atua como fiscal da lei (custus legis).
O habeas data tem prioridade de tramitação sobre todos
os atos judiciais, exceto sobre o habeas corpus e mandado de
segurança.
Não pode ser confundido com o direito de obter certidões
(art. 5º, XXXIV, b da CRFB/88) ou informações de interesse
particular, coletivo ou geral (art. 5º, XXXIII da CRFB/88), pois
havendo recusa no fornecimento da certidão ou informações de
terceiros, o remédio constitucional disponibilizado é o mandado de
segurança, e não o habeas data. Se o pedido efetuado for no
sentido de assegurar o conhecimento de informações relativas à
pessoa do impetrante, como visto, o remédio, aí sim, será o habeas
data (LENZA, 2009, p. 743).
As regras de competência estão previstas na Constituição
Federal no art. 102, I, d e II a, no art. 105, I, b, no art. 108, I, c, art.
109, VIII e no art. 121, § 4º.
5.2.3. Mandado de segurança individual
É ação de natureza civil em que se protege próprio direito
subjetivo e não a reparação do direito supostamente lesado. Por
isso, o mandado de segurança não é substitutivo da ação de
cobrança e não produz qualquer efeito patrimonial (Súmulas nºs
269 e 271 do STF).
O mandado de segurança individual é o remédio
constitucional (art. 5º, LXIX, da CRFB/88) de que se pode socorrer
toda pessoa física ou jurídica, órgão com capacidade processual
(exemplo: PROCON) para proteger direito individual, próprio,
líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data,
lesado ou ameaçado de lesão, por ilegalidade ou abuso de poder
(que é sempre uma ilegalidade) tendo como agente coator
autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de
atribuições do Poder Público. Está regulado pela Lei nº 12.016/09
(que revogou as Leis 1.533/51 e 4.348/64).
Direito Administrativo
395
O mandado de segurança pode ser tanto repressivo como
preventivo, sendo que neste último caso a prevenção deve atender
a três aspectos: o da realidade, na qual o impetrante deve
demonstrar que o ato realmente vai ser produzido, o da
objetividade, na qual a ameaça de lesão deve ser séria, e não
fundada em meras suposições e o da atualidade na qual a ameaça é
iminente, presente no momento da ação, e não ameaças passadas
(CARVALHO FILHO, 2008, p. 962). A título exemplificativo
podemos citar o mandado de segurança preventivo
questionando/impedindo o lançamento de um tributo em
determinada alíquota, que como já visto é ato vinculado.
Ocorrendo o fato gerador, o tributo deve ser lançado pela
autoridade competente.
Direito líquido e certo é aquele direito que pode ser
provado de plano, através de prova pré-constituída, existente e
definido em seu conteúdo. Independe de comprovação posterior,
logo, não necessita de dilação probatória. Pode ser direito
reconhecido mediante interpretação de normas jurídicas,
escolhendo-se entre duas ou mais teses, portanto, nada impede que
esse direito possa ser suscetível de controvérsia. A complexidade
da matéria ou a as controvérsias de direito não são impeditivos
para se impetrar um mandado de segurança (Súmula nº 625 do
STF).
São legitimados a ingressar com a ação (impetrante)
pessoa física (brasileira ou não, agente político, etc.) ou jurídica,
inclusive órgãos públicos (mesa do Legislativo, procuradoria, etc.),
universalidades reconhecidas por lei (espólio, massa falida,
condomínio, etc.).
Trata-se de ação civil de rito sumário especial, sujeito a
normas procedimentais próprias, pelo que somente
subsidiariamente lhe são aplicáveis as disposições do Código de
Processo Civil.
O titular de direito líquido e certo, pode depender,
contudo, da iniciativa de um terceiro, também titular do direito
atingido. Neste caso, o titular de direito líquido e certo decorrente
de direito, em condições idênticas, de terceiro poderá impetrar
396
mandado de segurança a favor de terceiro originário, se o titular
não o fizer, no prazo de 30 dias, quando notificado judicialmente
(art. 3º da Lei nº 12.016/09). Sob o assunto expõe André Ramos
Tavares (2009, p. 52-3): deve haver notificação do titular do
direito originário, sua inércia pelos trinta dias seguintes e a
propositura do mandamus pelo titular do direito decorrente de
direito de terceiro, tudo dentro do prazo total de cento e vinte dias
(art. 23). Isso significa que, para o impetrante de direito
decorrente de direito de terceiro, a contagem não se inicia com a
ciência, por parte deste terceiro, do ato/fato a ser impugnado, mas
sim pela data da notificação que o futuro impetrante fizer quanto
ao terceiro. O impetrante, neste caso, deverá aguardar os trinta
dias e, apenas em seguida, e no prazo de noventa dias, é que
poderá impetrar o mandado de segurança.
O mandado de segurança tem caráter personalíssimo,
assim com a morte do impetrante não há de se falar em sucessão
processual, restando tão somente a possibilidade de extinguir a
ação sem julgamento do mérito (neste sentido o STJ no REsp nº
89.882/MG e no RMS nº 2.415/ES).
É considerado autoridade coatora (impetrado, sujeito
passivo) o agente público (pessoa física), equiparando-se para os
efeitos da lei à autoridade, os representantes ou órgãos de partidos
políticos e os administradores de entidades autárquicas, bem como
pessoa investida da função pública que editou ou executou o ato
administrativo que ofendeu direito líquido e certo, como Presidente
da OAB, do CREA, Prefeito, Secretários, Ministros,
Superintendentes, etc. (art. 1º, § 3º da Lei nº 12.016/09).
São também considerados autoridades coatoras agentes
de uma empresa concessionária (STJ no REsp 457.716/MT) ou
outras entidades privadas, como escolas ou universidades, quando
seus atos se relacionem com funções delegadas pela
Administração. Neste sentido o Tribunal Regional Federal da 4ª
Região, e decisão proferida em 14/04/2010, tendo como Relatora a
Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, no AI nº
0000503-23.2010.404.0000, movido contra a Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande Sul – PUC-RS – entidade
Direito Administrativo
397
privada de ensino, quanto ao impedimento de colação de grau em
decorrência da não realização do ENADE:
ADMINISTRATIVO. NÃO REALIZAÇÃO DO EXAME
NACIONAL DE CURSOS. COLAÇÃO DE GRAU.
IMPEDIMENTO. ILEGALIDADE.
A não realização do Exame Nacional de Desempenho de Estudante -
ENADE não impede a colação de grau, por não compor a formação do
aluno do curso superior.
Na Súmula nº 333 do STJ, por exemplo, as licitações
promovidas por empresas públicas ou sociedades de economia
mista, por tratar-se de ato tipicamente de direito público, são
passíveis de mandado de segurança. Indo ao encontro deste
posicionamento, o art. 1º, § 2º da Lei comentada trata não caber
mandado de segurança contra os atos de gestão comercial
praticados pelos administradores de empresas públicas, de
sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço
público.
Considerar-se-á federal a autoridade coatora se as
consequências de ordem patrimonial do ato contra o qual se requer
o mandado houverem de ser suportadas pela União ou entidade por
ela controlada.
No caso de órgãos colegiados, por exemplo, o impetrado
é o presidente, chefe ou administrador do órgão, por exemplo, o
presidente de uma comissão de licitação é a autoridade coatora
para o caso de mandado de segurança. Se, porém, o procedimento
licitatório já tiver sido homologado pela autoridade superior, a
legitimidade será deste.
Esta ação tem prazo decadencial de 120 dias (art. 23 da
Lei nº 12.016/09) contados do dia da ciência, pelo interessado, do
ato impugnado. O STF já se posicionou no sentido que mesmo se
operando somente a extinção do prazo para ingressar com a ação
de mandado de segurança, e não a extinção do próprio direito
subjetivo, a natureza do prazo de 120 dias é decadencial (STF no
RMS nº 21.362/DF e Súmula nº 632). Com esta afirmação, já
podemos concluir que, ainda que se perca o prazo decadencial de
120 dias impostos pela Lei para se ingressar com o mandado de
398
segurança, o direito do impetrante pode ser salvaguardado via ação
ordinária (comum). Assim, o que decai não é o direito
propriamente dito, mas sim os benefícios que o rito especial do
mandado de segurança oferece.
Por força da Súmula nº 430 do STF o pedido de
reconsideração na via administrativa não interrompe o prazo para o
mandado de segurança.
A competência para processar e julgar o mandado de
segurança vem prevista na Constituição no art. 102, I, d, no art.
105, I, b, no art. 108, I, c, e no art. 109, VIII. Ainda com relação à
competência existem as Súmulas nºs 624 do STF, 41 e 177 do STJ,
bem como a título elucidativo as decisões do STF no MS nº
24.691/MG entendendo que a competência originária para
conhecer de mandado de segurança contra coação imputada a
Turma Recursal dos Juizados Especiais é da própria Turma
Recursal e não do Supremo Tribunal Federal, e do STJ no CC nº
5.248/MT posicionado-se no sentido de que se uma autarquia
federal impetra mandado de segurança, mesmo que a autoridade
coatora seja estadual ou municipal, a competência para processar e
julgar é da Justiça Federal (art. 109, I, da CRFB/88).
Desta forma, podemos concluir que a competência
jurisdicional para o mandado de segurança não é definida apenas pela
titularidade da autoridade coatora, levando-se em consideração os
atributos pessoais do cargo que podem influenciar na competência
(neste sentido Súmula nº 511 do STF), mas também se a pessoa (física
ou jurídica) lesada possui competência perante a Justiça Federal.
Não é cabível mandado de segurança contra lei em tese
(Súmula nº 266 do STF). Nada impede, também, que o juiz defira a
Atenção! No caso de ser declarada a incompetência absoluta, os autos devem ser remetidos ao juiz competente, aproveitando todos os atos não decisórios, admitindo-se a aplicação do art. 113, § 2º do CPC (STF no MS nº 26.006/DF, no MS nº 25.087/SP e no MS nº 26.244/DF).
Direito Administrativo
399
segurança sob o fundamento de inconstitucionalidade de uma lei,
mas o fará para o efeito de tutelar um direito subjetivo específico.
Da mesma forma é incabível mandado de segurança
quando (art. 5º da Lei nº 12.016/09) se tratar de:
Ato de que caiba recurso administrativo com efeito
suspensivo, independente de caução (e o interessado
efetivamente o tenha interposto, neste sentido o STF decidiu
no MS nº 24.511/DF). Entretanto a existência de recurso
administrativo com efeito suspensivo não impede o mandado
de segurança contra omissão da autoridade (Súmula nº 429 do
STF), é o caso de postular-se um efeito ativo ao recurso, pois
se a autoridade está omissa, e o impetrante está postulando
uma ação, de nada adianta um recurso com efeito suspensivo.
De decisão judicial transitada em julgado (Súmula 268 do
STF).
De decisão judicial da qual caiba recurso com efeito
suspensivo.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. MS IMPETRADO CONTRA
ATO JUDICIAL. EXISTÊNCIA DE TERATOLOGIA OU
PREJUÍZO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO.
Admite-se a impetração de mandado de segurança contra ato
judicial em situações teratológicas, abusivas que possam gerar dano
irreparável ou nos casos em que o recurso previsto não tenha obtido
ou não possa obter efeito suspensivo. Precedentes citados: AgRg no
MS 10.252-DF, DJ 26/9/2005; AgRg no MS 10.029-DF, DJ 28/2/2005;
AgRg no MS 15.777-SP, DJe 18/4/2011, e MS 15.941-DF, DJe
1º/7/2011. AgRg no MS 17.857-DF, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima,
julgado em 7/11/2012
A sentença do mandado de segurança possui natureza
preponderantemente mandamental, de ordem, de determinação,
cabendo apelação se concedida ou denegada a segurança (art. 14 da
Lei nº 12.016/09). A sentença que concede o mandado está sujeita
obrigatoriamente ao duplo grau de jurisdição, podendo, entretanto,
ser executada provisoriamente (art. 12, § 3º da Lei estudada).
Não se admite condenação em honorários advocatícios
em ação de mandado de segurança (Súmulas nºs 105 do STJ e 512
400
do STF), nem a interposição de embargos infringentes (art. 25 da
Lei). Ao despachar a inicial, o juiz ordenará (art. 7º):
Que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial,
enviando-lhe a segunda via apresentada com as cópias dos
documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias, preste as
informações;
Que se dê ciência do feito ao órgão de representação judicial
da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial
sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito
(inovação trazida pela nova Lei);
Que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido, quando
houver fundamento relevante e do ato impugnado puder
resultar a ineficácia da medida, caso seja finalmente deferida,
sendo facultado exigir do impetrante caução, fiança ou
depósito, com o objetivo de assegurar o ressarcimento à
pessoa jurídica.
Da última afirmativa extrai-se ser admissível a concessão
de medida liminar (Lei nº 12.016/09, art. 7º, III, e Súmula nº 626
do STF) e uma vez concedida, este processo passa a ter prioridade
de julgamento, sendo que seus recursos, inclusive terão prioridade
de julgamento sobre todos os atos judiciais, salvo habeas corpus
(arts. 7º, § 4º c/c 20 da Lei nº 12.016/09). Neste sentido o art. 26 da
Lei estipula constituir crime de desobediência, nos termos do
Código Penal, o não cumprimento das decisões proferidas em
mandado de segurança, sem prejuízo das sanções administrativas e
da aplicação da Lei nº 1.079/50, quando cabíveis. O STF na
Súmula nº 735 definiu não caber recurso extraordinário contra
acórdão que defere medida liminar.
Atenção! A concessão de liminar é vedada quando tiver por objeto a compensação de créditos tributários, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza (art. 7º, § 2º).
Direito Administrativo
401
Quando, a requerimento de pessoa jurídica de direito
público interessada ou do Ministério Público e para evitar grave
lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas, o
presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do
respectivo recurso suspender, em decisão fundamentada, a
execução da liminar e da sentença, dessa decisão caberá agravo,
sem efeito suspensivo, no prazo de 5 (cinco) dias, que será levado a
julgamento na sessão seguinte à sua interposição (art. 15 da Lei nº
12.016/09). Entretanto, o art. 7º, § 1º diz ser cabível agravo de
instrumento (seguindo as regras do Código de Processo Civil) da
concessão ou denegação de pedido liminar. Assim, constata-se que
da concessão da medida liminar ou sendo julgado procedente o
mandamus cabe tanto agravo de instrumento ou apelação,
respectivamente, quanto pedido de suspensão ao presidente do
tribunal.
5.2.4. Mandado de segurança coletivo
Inovação da Carta Federal de 1988 (art. 5º, LXX), o
mandado de segurança coletivo é um remédio posto à disposição
de partido político com representação no Congresso Nacional e
organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente
constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa
dos interesses de seus membros ou associados. Hoje está incluída
na Lei do Mandado de Segurança nº 12.016/09, que, portanto, não
se limitou a dispor sobre o mandado de segurança individual.
Possui os mesmos pressupostos do mandado de
segurança individual (direito líquido e certo, ilegalidade ou abuso
de poder, por exemplo), porém sua diferença encontra-se no objeto
e na legitimação.
O mandado de segurança coletivo tutela (tem por objeto)
interesse, direitos de natureza coletiva, transindividuais, quais
sejam: coletivos ou individuais homogêneos. Neste sentido, agora,
afirma o art. 21, parágrafo único, da Lei do Mandado de
Segurança:
Os direitos protegidos pelo mandado de segurança
coletivo podem ser:
402
Coletivos, assim entendidos, para efeito desta Lei, os
transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular
grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte
contrária por uma relação jurídica básica;
Individuais homogêneos, assim entendidos, para efeito da Lei
do Mandado de Segurança, os decorrentes de origem comum e
da atividade ou situação específica da totalidade ou de parte
dos associados ou membros do impetrante.
Os legitimados são somente (art. 21, caput, da Lei nº
12.016/09):
Partido político com representação no Congresso Nacional, na
defesa de seus interesses legítimos relativos a seus integrantes
ou à finalidade partidária, e;
Organização sindical, entidade de classe ou associação
legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um
ano, em defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou
de parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus
estatutos e desde que pertinentes às suas finalidades,
dispensada para tanto, autorização especial.
Quanto aos partidos políticos, a legitimação corresponde
ao direito de defender seus integrantes em questões políticas ou à
finalidade partidária, e não para defender qualquer direito inerente
à sociedade (STJ no MS nº 197/DF e STF no RE nº 196.184/AM e
no MS nº 20.653/DF).
A legitimidade das organizações sindicais, entidades de
classe ou associação é por substituição processual: legitimação
extraordinária.
A impetração do mandado de segurança coletivo pelos
sindicatos, em favor de seus associados, independe de autorização
específica destes (Súmula nº 629 do STF), porquanto, como
substitutos processuais, defendem os interesses coletivos ou
individuais dos associados: pleiteiam em nome próprio direito
alheio (neste sentido STF no RE nº 193.503/SP, no RE
210/029/RS, no RE 213.111/SP).
Direito Administrativo
403
Pela Súmula nº 630 do STF, a entidade de classe também
possui legitimação para o mandado de segurança ainda que para
defender interesses que beneficiem apenas uma parte da categoria
(neste sentido STJ no RMS nº 20.762/RJ).
Importante destacar que o art. 5º, XXI, da CRFB/88
exige expressa autorização quando for o caso de representação, ou
seja, a associação como mandatária de seus associados, e não nos
casos de substituição processual, como é o caso do mandado de
segurança coletivo.
No mandado de segurança coletivo, a sentença fará coisa
julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria
substituídos pelo impetrante, não induzindo litispendência para as
ações individuais. No entanto, os efeitos da coisa julgada não
beneficiarão o impetrante a título individual se não requerer a
desistência de seu mandado de segurança no prazo de 30 (trinta)
dias a contar da ciência comprovada da impetração da segurança
coletiva.
Ainda, no mandado de segurança coletivo, a liminar só
poderá ser concedida após a audiência do representante judicial da
pessoa jurídica de direito público, que deverá se pronunciar no
prazo de 72 (setenta e duas) horas.
5.2.5. Mandado de injunção
O mandado de injunção, previsto no art. 5º, LXXI, da
CRFB/88 tem espaço sempre que alguém se considerar prejudicado
pela falta de norma reguladora que torne inviável o exercício dos
direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania. Trata-se de uma ação que
afeta direito subjetivo em face de uma omissão legislativa.
Estão legitimados todos aqueles que têm o seu direito
negado pela ausência da norma regulamentadora. Admite-se
inclusive a legitimidade para sindicatos (por substituição
processual, STF no MI nº 595) e não só para os particulares,
pessoas físicas ou jurídicas. Possui o mesmo rito do mandado de
segurança.
404
No julgamento do MI nº 107/DF, o STF entendeu que a
decisão deve declarar a omissão do órgão regulamentador (corrente
não concretista). Logo, resumir-se-ia o mandado de injunção tão
somente à comunicação da mora legislativa, ao reconhecer
formalmente a omissão legislativa, porque não se admitiria ao
Poder Judiciário o papel de legislador positivo (neste sentido o STF
no MI nº 168/RS e no MI nº 219/DF)
Nestes casos, entende Luis Roberto Barroso (2009, p.
266) que a ação teria natureza constitutiva e não meramente
mandamental. Mas o STF afirma que, ainda assim, a natureza do
mandado de injunção seria mandamental (MI nº 721/DF).
Quando a falta da norma regulamentadora for atribuída
ao Presidente da República, ao Congresso Nacional, à Câmara de
Deputados, ao Senado, ao Tribunal de Contas da União, aos
Tribunais Superiores ou ao próprio STF, a competência para
decidir o mandado de injunção é do Supremo Tribunal Federal (art.
102, I, q, da CRFB/88). Já a competência do Superior Tribunal de
Justiça está prevista no art. 105, I, h, da CRFB/88.
5.2.6. Ação civil pública
Prevista constitucionalmente no art. 129, III, e
disciplinada pela Lei nº 7.347/85, a ação civil pública é o
Atenção! O STF mudou seu posicionamento no MI nº 670/ES, no MI nº 708/ DF e no MI nº 712/PA (tratam do direito de greve dos servidores públicos civis), dando mais eficácia ao mandado de injunção, entendendo que, não obstante o caráter mandamental do instituto, é possível a cominação de prazo para o órgão competente editar a norma demandada, suprindo, assim, a mora legislativa, sob pena de vencido esse prazo assegurar, concretamente, o exercício do direito inviabilizado pela falta da norma: corrente concretista geral (aplicando-se a todo funcionalismo, não se restringindo somente aos impetrantes).
Direito Administrativo
405
instrumento processual aplicável para tutelar interesses coletivos e
difusos.
É uma ação de rito especial, aplicando-se subsidiariamente
o rito ordinário (comum), que protege o meio ambiente, o
consumidor, bens e direitos de valor artístico, estético, histórico,
turístico e paisagístico e a qualquer outro interesse difuso ou
coletivo (a lista constante no art. 1º da Lei 7.347/85 é meramente
exemplificativa), não se prestando ao amparo de direitos
individuais, nem tampouco à reparação de prejuízos causados a
particulares.
Pode ser proposta para defesa do patrimônio público (STJ
no REsp nº 107.384/RS), do direito à saúde de um grupo de
indivíduos (STJ no REsp nº 854.557/RS). Neste mesmo sentido
são as Súmulas nº 643 do STF e nº 329 do STJ.
O conceito do que seja interesses difusos e coletivos é
encontrado no art. 81 da Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do
Consumidor). É oportuno lembrar que a ação popular também
tutela alguns interesses difusos e coletivos, o que não impede que
ambas as ações possam ser propostas, por força do art. 1º da Lei da
Ação Civil Pública: sem prejuízo da ação popular.
A Constituição Federal conferiu ao Ministério Público a
função institucional de promover o inquérito civil (art. 8º, § 1º, da
Lei 7.347/85) e a ação civil pública, não se impedindo a
propositura por terceiros, segundo o que dispõe o § 1º do art. 129
da CRFB/88. Neste sentido, o art. 5º da Lei 7.347/85 expõe ter
legitimidade para propor a ação civil pública:
O Ministério Público;
A Defensoria Pública (STJ no REsp nº 912.849/RS);
A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
Autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de
economia mista;
Associação que concomitantemente esteja constituída há pelo
menos 1 ano nos termos da lei civil e inclua, entre suas
finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao
406
consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao
patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.
No Informativo nº 677 o Supremo Tribunal Federal
entendeu que o Ministério Público tem legitimidade para propor
ação civil pública em torno de certame para diversas categorias
profissionais de determinada prefeitura, em que asseverara que a
pontuação adotada privilegiaria candidatos os quais já integrariam
o quadro da Administração Pública Municipal (RE nº 216.443).
O Ministério Público, se não intervier no processo como
parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei (custus legis).
Deve ser proposta no foro do local do dano (material ou moral)
conforme dispõe o art. 2º da Lei 7.347/85, podendo ter caráter
preventivo (via ação cautelar, art. 4º, ou via mandado liminar, art.
12) ou repressivo.
A sentença pode ter natureza condenatória ou
mandamental (art. 3º da Lei 7.347/85). A regra é a produção de
coisa julgada erga omnes, mas será inter partes quando for julgada
improcedente por falta de provas, e ainda ultra partes nos casos de
direitos coletivos em sentido estrito, como o meio ambiente do
trabalho (ZIMMER JUNIOR, 2008, p. 557).
5.2.7. Ação popular
Contemplada na Constituição Federal no art. 5º, LXXIII,
e regulada pela Lei nº 4.717/65, a ação popular é a ação
constitucional à disposição de qualquer cidadão (portador de título
de eleitor e em pleno gozo dos direitos políticos) que vise anular
ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado
participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao
patrimônio histórico e cultural.
É forma de controle da Administração Pública, de
soberania popular (ZIMMER JUNIOR, 2008, p. 549) na qual o
autor da ação popular protege interesse da coletividade (e porque
não, direito seu também). Por defender direito da comunidade, não
está sujeita a custas processuais nem a honorários de sucumbência,
salvo má-fé.
O cidadão atua como substituto processual (da
coletividade). Se desistir da ação, por exemplo, outro cidadão ou
Direito Administrativo
407
até mesmo o Ministério Público podem assumir a ação (art. 9º da
Lei nº 4.717/65). Logo, o Ministério Público não pode ajuizar a
ação, mas isso nada impede que em determinado momento apareça
como parte autora. O Ministério Público acompanhará a ação
necessariamente como custus legis (art. 6º, § 4º, da Lei da Ação
Popular).
No polo passivo estarão as pessoas públicas ou privadas e
as outras entidades referidas no art. 1º da Lei da Ação Popular, as
autoridades, funcionários ou administradores que houverem
autorizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou
que, por omissas, tiverem dado oportunidade à lesão, e contra os
beneficiários diretos do mesmo. Em princípio, é caso de
litisconsórcio passivo necessário.
A pessoa jurídica de direito público ou de direito privado
pode abster-se de contestar a ação e atuar ao lado do cidadão autor
(art. 6º, § 3º, da Lei 4.717/65).
Admite-se, também, a concessão de liminares (art. 5º,
§ 4º Lei da Ação Popular).
O art. 5º, LXXIII, da CRFB/88 exige que o ato seja lesivo e
ilegal (um ato imoral é considerado ilegal). Esta lesividade pode ser
concreta ou presumida, material ou moral. Neste sentido o STJ decidiu no
EREsp nº 260.821/SP (CARVALHO FILHO, 2008, p. 970).
A regra é que a ação popular seja ajuizada no juízo de
primeiro grau. O foro competente é o do ato ou do contrato que
originou a ação. Nas hipóteses do art. 102, I, f e n, da CRFB/88,
entretanto, poderia o julgamento da ação popular ser de
competência originária do Supremo Tribunal Federal (LENZA,
2009, p. 748. Neste sentido STF na AO-QO nº 859/AP e na Pet nº
3.674/DF).
O efeito preponderante da sentença é desconstitutivo
(anulação do ato) e subsidiariamente condenatório (perdas e
danos). Possui também efeito erga omnes, salvo quando a ação for
julgada improcedente por falta de provas (a sentença neste caso
terá efeito inter partes). Prescreve em 5 anos (art. 21 da Lei
4.717/65) a partir da data do evento ou do primeiro ato que lhe der
publicidade.
Direito Administrativo
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