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RIO DE JANEIRO, CARTÃO POSTAL: O PODER POLÍTICO NA ESTÉTICA URBANA PELA DEFESA DE UMA IDENTIDADE INTERNACIONAL

Mar 27, 2023

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Luis Cruz
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RIO DE JANEIRO, CARTÃO POSTAL: O PODER POLÍTICO NA

ESTÉTICA URBANA PELA DEFESA DE UMA IDENTIDADE

INTERNACIONAL

Leonardo Mercher1

Resumo

Após o fim do Regime Militar, em 1985, e a ampliação na participação da sociedade civil nas

decisões sobre o espaço urbano da cidade do Rio de Janeiro, pôde-se ver um crescimento nas

iniciativas à preservação e construção de uma identidade local, bem como uma nova dinâmica

de atores envolvidos na consolidação de uma imagem internacional positiva. Grandes eventos

de visibilidade internacional, de 1990 até a década de 2010, bem como o surgimento legal de

iniciativas publico-privadas, através da Lei nº11.079 de 30 de dezembro de 2004, redirecionam

a relação entre o poder político, o espaço urbano e a identidade local. Este artigo aborda a

relação entre a construção de uma identidade local e projeção de uma identidade internacional

através da revisão de literatura e de análises sobre iniciativas público-privadas na região central

da cidade do Rio de Janeiro, durante os anos de 1990 até 2010. A dinâmica entre o poder

político e a estética urbana, bem como a identidade gerida, é interpretada como um processo que

se torna amplo e envolve, não somente as decisões de gabinetes, mas também as novas agendas

internacionais e os novos processos nas dinâmicas participativas da sociedade civil e do capital

privado.

Palavras-chave: Rio de Janeiro. Políticas Públicas. Estética Urbana.

Abstract

After the end of Military Regime in 1985 and the increase of civil society participation in urban

decisions at Rio de Janeiro city it can be seen a growth of initiatives to preserve and to build a

local identity and also a new debate about the dynamics of different actors involved in the

consolidation of a positive international image. Major events of international visibility, from

1990 until the 2010s, as well as the emergence of legal public-private initiatives, through Law

11.079 of December 30, 2004, redirected the relationship between political power and urban

space local identity. This article studies the relationship between the build of a local identity and

the projection of a international identity through a literature review and analysis of public-

private initiatives downtown area of Rio de Janeiro, during the years 1990 to 2010. The

dynamics among political power and urban aesthetics, as well as managed identity, is

interpreted as a process that becomes wider and involves not only the decisions of governments

firms but also the new international agenda and the new participatory processes in the dynamics

of civil society and private capital.

Key-words: Rio de Janeiro. Public Policies. Urban Aesthetic.

1 Mestrando em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná. É graduado e pós-graduado em

Relações Internacionais pela PUC-Rio e especialista em Comunicação, Cultura e Arte pela PUC-PR.

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INTRODUÇÂO

Ao deixar de ser capital nacional, em 1960, a cidade do Rio de Janeiro entrou em

uma fase de degradação de sua região central devido, dentre outros fatores; a problemas

financeiros; choques de interesses ideológicos; instabilidade política; intervenções

unilaterais do governo central; e burocracias espaciais que dificultavam a cooperação

entre as três esferas do poder executivo – municipal, estadual e federal. Com a

redemocratização, nos anos 1980, bem como a concepção de atuação subnacional nas

relações internacionais, a diplomacia cultural passa a ser incluída nas ferramentas ao

desenvolvimento da cidade. É nesse cenário que a região central da cidade voltou a ser

foco das políticas públicas e, em especial a região portuária, defendida atualmente como

um importante portão de entrada da visibilidade internacional. Tem-se, então na região

central, um palco povoado por atores, como o tradicional Estado, e também por atores

sociais, atuando e moldando essa nova dinâmica de interesses.

Assim, define-se neste artigo que; como ator ativo será analisado o poder

político, ressaltando a esfera executiva local que direcionou o rumo dessa nova imagem

e, como ator reativo, a sociedade – seja a população da cidade do Rio de Janeiro, seja o

capital privado ou o capital privado. Ao ter o poder de decisão sobre o espaço urbano e

ao institucionalizar meios de produção artística – como na criação de escolas de belas

artes, leis de proteção ao patrimônio histórico, e financiamentos de projetos culturais –,

o Estado reforçaria seu caráter ativo como ator nesta dinâmica sob a estética urbana

pública2, como vista na recuperação e criação de museus e monumentos à visibilidade

internacional. Ainda que a sociedade também seja de extrema importância para a

consolidação de uma identidade, por método de análise empregado, ela será colocada

como ator reativo à ação política do Estado e de seus interesses internacionais.

O palco onde se dá o diálogo entre esses atores é a malha urbana na região

central da cidade do Rio de Janeiro, em especial nos anos 2000, em sua relação entre a

estética e o indivíduo. A importância de se construir uma identidade internacional, a

partir dos anos 1990, se sustenta segundo as premissas teóricas da atuação subnacional

internacional, como por ganhos de investimentos, cooperação ao desenvolvimento,

fortalecimento da identidade política e do estabelecimento de uma identidade pública

internacional que sustentaria uma maior eficiência da diplomacia cultural. Sendo assim,

2 Prédios, monumentos, aparelhos e urbanidades de caráter público e não particular ou com esta função.

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ao longo deste artigo o foco maior estará sobre as iniciativas do poder político e em sua

tentativa de positivar uma imagem da cidade do Rio de Janeiro diante da comunidade

internacional nos últimos anos.

Estética urbana como instrumento de poder

Ao atrelar a produção artística de sua sociedade; como em concursos públicos de

projetos arquitetônicos; subsídios financeiros; leis de incentivos específicos à cultura;

institutos de fiscalização do patrimônio; agendas culturais sob coordenação de

secretarias; seus secretários e órgãos ligados ao poder executivo têm-se resguardada a

parcela participativa do poder na chance de ampliar a orientação da estética a vigorar,

bem como das ideologias que nela serão defendidas. A estética urbana cria laços

afetivos com a população que, por sua vez, constroem um imaginário coletivo da cidade

e de si mesmos que pode alterar seu comportamento e sua identidade local.

Como a identidade local pode ser percebida por outros grupos sociais, como

internacionais, há a formação de uma identidade internacional diretamente relacionada

com a concepção artística e monumental de um determinado espaço público. Cidades

são reconhecidas por seus monumentos, e a relação do poder político com sua sociedade

também pode ser levada em consideração. Sociedades democráticas tendem a cooperar

externamente com outros regimes democráticos. Através de uma relação triangular; o

governo institui seu regime e seus projetos urbanos que irão moldar a identidade interna

e, consequentemente a externa que retorna ao cenário interno interferindo nas novas

tomadas de decisões dos demais atores envolvidos.

Utilizando-se a definição de poder como “a habilidade de influenciar os outros a

fazer o que se quer” (NYE, 2004, p.31), o governo teria três formas de fazer valer seus

interesses; pela ameaça física; pela subornação; e pela sedução cooperativa. O Estado-

Nação contemporâneo percebeu que, ao conseguir atender aos anseios de sua sociedade

e levá-la a querer o mesmo que seus governantes, minimiza-se os custos da

implementação de políticas públicas e de diplomacias culturais. Utilizando-se do

conceito de “poder suave como a habilidade de se obter o que se deseja através da

atração e da cooperação” (NYE, 2004, p.31), pode-se dizer que a sedução, inerente à

estética, torna a arte um dos vetores mais práticos para promover, legitimar e conquistar

o apoio de demais atores – internos e internacionais – dispostos a se envolverem ou

ampliarem sua participação em uma dinâmica local. A sedução cooperativa de um poder

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suave seria muito mais eficiente e lucrativo para o Estado do que o uso da força.

A relação entre a dinâmica por detrás da construção do espaço público faz com

que a estética e o imaginário urbano busquem um resultado final onde haja um

consentimento entre todos os atores envolvidos, caso contrário, a sociedade não gozaria

de um regime democrático participativo e cairia nos velhos regimes impositivos. Pode-

se dizer que em regimes democráticos há sempre a possibilidade de mobilização dentro

da própria arte contra o seu uso indevido. O Estado teria competência para criar e

legislar sobre o espaço comum, enquanto que a sociedade teria a capacidade de redefini-

lo de acordo com seus valores, costumes e necessidades. Assim, é possível ver nas

atuais reformas urbanas na cidade do Rio de Janeiro ao menos uma tentativa crescente

de diálogo contínuo entre os atores envolvidos, as estéticas propostas e as novas

identidades locais e internacionais em constante formação.

Um processo político de degradação urbana

Desde que deixou de ser capital federal, em 1960, a cidade do Rio de Janeiro

teve que buscar sua nova identidade política. Se a cidade gozava de uma imagem

cultural forte no país e reconhecida no mundo, o seu espaço urbano ainda precisava ser

apropriado por um poder local, agora autônomo e distante do nacional. Em menos de

vinte anos a cidade havia deixado de ser Distrito Federal, em 1960, tornando-se Estado

da Guanabara e, posteriormente, anexado ao antigo Estado do Rio de Janeiro, em 1975,

como sendo a nova capital fluminense. Essas mudanças precisaram de tempo até ser

absorvidas pela consciência coletiva em sua reorganização política.

No que diz respeito à organização do poder local, pode-se dizer que houve

dificuldade em trabalhar com seu espaço urbano, tanto por este ter sido herdado das

projeções políticas nacionais anteriores – e esvaziado com Brasília –, como pela

necessidade de se adaptar aos tantos propósitos políticos em um curto período de tempo

(1960-1975). O quadro a seguir (VAZ, 2006, p.69-70) permite uma análise pontual

desse desenvolvimento histórico da atuação do poder político no espaço urbano central

da cidade;

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Quadro I: Cidade do Rio de Janeiro – Síntese histórica das transformações

espaciais nas áreas Centrais:

PERÍOD

O

INTERVENÇÃO /

PROJETO

OBJETIVO

ENUNCIADO

CONSEQUENCIA

(Área Central)

Séculos

XVII/XIX

Desmonte de morros; aterros;

Aqueduto da Carioca.

Ocupação do território; criação

de solo urbanizável; construção de

infraestrutura urbana.

Alteração do meio ambiente;

expansão da área urbana; adensamento

populacional.

Déc. 1900 Reforma urbana Pereira Passos:

abertura de vias; criação do porto.

Saneamento; embelezamento;

modernização; ordem urbana.

Expulsão da moradia; formação de

favelas; destruição do patrimônio; área

central como área de lazer e cultura.

Déc. 1920 Arrasamento do Morro do Castelo. Saneamento, aeração e higiene;

abertura de vias, modernização.

Destruição de marcos e do tecido

urbano; formação de vazios e favelas.

Déc.

1920/1930

Renovação da área da Cinelândia;

mudança de uso da Lapa.

Modernização; área de lazer das

classes altas; criação de lugares da

boemia; sede de jornais.

Início da verticalização; área central

como área de lazer e cultura de elite.

Déc. 1940

Estado Novo: abertura da Av.

Presidente Vargas; controle de

atividades urbanas.

Rodoviarismo, transporte

individual; embelezamento e

ordem urbana; "limpeza de usos

sujos".

Expulsão da moradia; formação de

vazios; destruição do patrimônio.

Déc. 1950 Arrasamento do Morro de Santo

Antônio; degradação da Lapa.

Saneamento; abertura da Av.

Norte-Sul (não concretizada).

Destruição da primeira favela da

cidade; formação de vazios.

Déc.

1950/1960

Construção da Av. Perimetral;

extensão da Av. Perimetral. Obra viária.

Rompimento da relação do centro

com o mar.

Déc. 1960

Renovação do Estácio e do

Catumbi; destruição do casario da

Lapa.

Obras viárias - acessos ao túnel

S. Bárbara.

Arrasamento dos bairros do Estácio e

Catumbi; expulsão da moradia.

Déc. 1970

Construção do metrô. Dec. N.

322/76 proíbe uso residencial na

ACN; destruição do casario da Lapa.

Transporte de massa; ordenação

do espaço urbano.

Destruição do tecido urbano

histórico; formação de vazios; expulsão

da moradia.

Déc. 1980 Expansão do metrô. Transporte de massa.

Destruição do tecido urbano

histórico; formação de vazios; expulsão

da moradia (Dec. N. 322/76).

Projeto Corredor Cultural; reforma

de equipamentos culturais.

Preservação da arquitetura e do

ambiente cultural; incentivo à

atividade comercial/cultural.

Manutenção do patrimônio edificado;

expulsão da moradia (Dec. N. 322/76).

Déc. 1990

Projetos: Rio Cidade; de habitação e

cultura; Quadra da Cultura da Lapa;

Lei de Uso Residencial/1994.

Requalificação e revitalização;

retomada da centralidade; retorno

da moradia.

Ocupação de vazios; retomada da

relação do centro com o mar e de

atividades culturais.

Déc. 2000

Projetos: Distrito Cultural da Lapa;

Revitalização da Praça Tiradentes,

Área Portuária. Intervenções: Rua do

Lavradio; Programa Novas

Alternativas.

Retomada da centralidade;

revitalização da área central.

Retomada de atividades culturais;

retorno pontual da moradia.

O deslocamento da máquina estatal, após a criação de Brasília, deixou o centro

da cidade do Rio de Janeiro com vazios espaciais cercados por conflitos burocráticos

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entre as esferas do poder local e da União. Por ter em Brasília novas construções

federais que concorriam na captação de verbas da União, o número de prédios e terrenos

subutilizados ou abandonados na região central traziam consigo barreiras burocráticas

para iniciativas do poder local. O recorte da região central, entre a Guanabara e a União,

já mantinha conflitos que só aumentaram com a divisão do espaço junto ao novo Estado

do Rio de Janeiro, na década de 1970. Medidas de intervenções acabavam por esbarrar

nas burocracias das três esferas que, muito provavelmente, passaram a engavetar seus

projetos por falta de cooperação entre o Município, o Estado e a União, bem como

interesses partidários.

Na segunda metade do século XX, com a malha urbana já refém da “glorificação

do automóvel” (JAGUARIBE, 1998, p.139), ampliou-se a rejeição ao centro desprovido

dessa nova necessidade moderna. Os planejamentos modernistas, financiados pelo

Estado, valorizavam uma estética que não encontrava espaço no Rio antigo, demolindo

ou se dirigindo para as demais áreas da cidade. Ainda que com bons referenciais do

período, como o Edifício Capanema, as intervenções modernistas privilegiaram a malha

viária para os carros particulares, como a construção da Avenida Perimetral. A perda

política da capital e a imagem midiática da Zona Sul, representada nos filmes e nas

novelas de alcance nacional, trouxe uma alteração, nos anos 1970 e 1980, ao se pensar o

Rio;

Os cartões-postais cariocas raramente enfocam edificações arquitetônicas. As

retratações turísticas do Rio de Janeiro reproduzem, sobretudo, os clichês de praias

repletas de corpos tostando-se ao sol, a baía da Guanabara ao amanhecer ou ao pôr-

do-sol, os morros verdejantes e, finalmente, as mulatas exuberantes em fantasia de

carnaval. Mesmo os postais da escultura do Cristo fincado no topo do Corcovado

amenizam sua simbologia sagrada e cultural através do espetáculo da vista

panorâmica. Entretanto, nos inícios do século XX, os cartões-postais que os turistas

nacionais buscavam do Rio de Janeiro eram, segundo Gilberto Freyre, aqueles que

ilustravam os progressos da capital. Bondes, monumentos, instalações técnicas,

eram prenhes da simbologia de modernização de um Brasil pouco explorado. Como

ex-capital, o Rio de Janeiro já não simbolizava as urgências do progresso que o

caracterizaram aos olhos provincianos do início do século (JAGUARIBE, 1998,

p.119).

.

Com a nova imagem que se tentava construir sobre o ser carioca, ligado à Bossa

Nova, e a cidade praiana, junto ao turismo da Zona Sul, restou ao centro o descaso de

sua importância no registro histórico. É da história que se reforçam os laços afetivos que

faz com que o indivíduo se sinta parte daquele lugar e compartilhe, com um numero

maior de cidadãos, um imaginário coletivo que possibilitará a construção de uma

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identidade local condizente não apenas com os interesses políticos de um governo, mas

com a vivência dos demais atores sociais e suas projeções. Nos anos 1960, 1970 e 1980

uma série de obras que cortaram a região, como a Perimetral, passou por cima de

construções urbanas que serviam como registro da identidade local rotineira, como o

caso do extinto Mercado Municipal, inaugurado em 1907, e que hoje só lhe resta uma

de suas quatro torres originais – atualmente o Restaurante Albamar, na Praça XV.

A cidade, ainda que visse investimentos em redes de transporte público, como a

inauguração, em 1979, do primeiro trecho da linha 1 do metrô, teve o planejamento de

seu espaço voltado para o uso do transporte individual. O crescimento do automóvel era

tanto um resultado como também mantinha o incentivo ao afastamento da moradia da

região central para as Zona Sul e Oeste. Portanto, pode-se dizer que o modernismo

trouxe consigo a corrente racionalista que;

Agia como se a cidade atual não correspondesse às necessidades do mundo

moderno. Era necessário pensar uma cidade absolutamente nova, que

atendesse a imagem que se formava da cidade contemporânea, aliás, nome

dado pelo expoente dessa Corrente, Le Corbusier [...] A ideia de sociedade,

aqui, acompanhava a ideia do homem-tipo com as mesmas necessidades, seja

na Europa, na Índia ou no Brasil. Le Corbusier afirma que o caminho dos

homens é a linha reta; quem anda em curvas são os asnos (SOUZA, 1997,

p.115).

Avenidas e elevados destinavam-se apenas aos carros; à mobilidade sobre o

passado, sobre o espaço compartilhado. Para suprir o espaço público das regiões

centrais, vieram os shoppings centers e seus estacionamentos. “Não seria essa uma das

explicações do porquê, também no imaginário coletivo, a rua se identifica cada vez mais

com a população marginal? [...] Relacionadas com áreas da cidade por uma

acessibilidade boa, esses locais representam os focos na estrutura de eixos viários”

(SOUZA. 1997, p.119). A segunda metade do século XX testemunha a expansão dessa

estética moderna que, deturpada ou não, se materializou atropelando a região pelas

iniciativas do poder público. O processo de degradação da região central da cidade do

Rio de Janeiro, retratado no quadro anterior, permite a interpretação de que, na segunda

metade do século XX, a atuação do poder político acaba por incentivar o esvaziamento

que já havia sido iniciado com a saída da máquina estatal para Brasília.

As intervenções destinavam-se em atender às demandas viárias, deslocando a

estrutura histórica urbana para segundo plano. Essa atuação do poder público central

acabou por esvaziar e, consequentemente, degradar a região. Provavelmente um dos

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fatores que contribuíram a essa situação de abandono, além da saída da maquina estatal,

fora a burocracia em que a região se encontrava, dividida por tantas esferas do poder

político que exigia uma cooperação de difícil concretização. A estética do modernismo

acabou por fomentar mais esse processo. Ainda que possa não ser inerente à sua

estética, o uso de suas intenções, por parte do poder político nacional, trouxe “a

destruição do tecido urbano histórico” (VAZ, 2006, p.69) da cidade do Rio de Janeiro.

A dinâmica da recuperação por uma imagem internacional

Se por um lado a cidade do Rio de Janeiro nunca deixou de ser referência à

identidade nacional, foi buscando também na atuação internacional que sua relação com

a imagem local, construída em seu espaço urbano, ganharia maior incentivo às

iniciativas do poder político. A partir da conscientização crescente de seu espaço

internacional é que a cidade do Rio – e, consequentemente, o novo Estado do Rio de

Janeiro – passou a identificar oportunidades ao construir uma identidade positivada de

si mesma que, inevitavelmente passa por sua estética urbana. Ao recepcionar grandes

eventos internacionais, como a ECO92, ganhava-se maior visibilidade e aumentava,

ainda mais, a preocupação dos governantes com sua imagem.

A importância da cidade, internacionalmente reconhecida como global (em 22º

lugar no ranking de centros culturais e em 47º no ranking geral do The World According

to GaWC 2008) consolidou a preocupação com a manutenção de uma identidade

internacional que trouxesse para seu espaço um conjunto constante de novos eventos de

grande visibilidade. Eventos como os encontros internacionais de mídias, promovidos

pela empresa municipal MultiRio (Empresa Municipal de Multimeios), o Pan-

Americano em 2007, os Jogos Mundiais Militares em 2011, e as futuras Copa do

Mundo de Futebol, em 2014, e os Jogos Olímpicos de Verão, em 2016, consolidam uma

identidade externa e também se baseiam em fluxos de captação de investimentos e

empreendimentos financeiros e culturais que, sob novas propostas do poder político

local, possibilitam e exigem a recuperação da região central.

Ao conseguir sediar eventos com visibilidade internacional, que coloca em jogo,

não só a imagem da cidade, mas também a do país, as três esferas do poder se veem em

uma situação onde a cooperação se faz necessária para que se mantenha uma imagem

positiva não só da cidade, mas do país que também se utiliza de sua identidade

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internacional. Ainda que as intenções de recuperação não possam ser interpretadas

apenas como resultados desse novo interesse internacionais, a atuação subnacional, em

uma diplomacia cultural feita pela cidade do Rio de Janeiro, certamente alavanca os

investimentos e a cooperação necessária entre as esferas do poder executivo para

superar dificuldades já vistas, como a da burocracia espacial. Essa cooperação, dentre

outros objetivos, busca também recuperar as identidades nacionais na história da cidade,

bem como construir novos laços afetivos com a estética urbana que possibilitarão uma

avaliação externa positiva por diversos atores internacionais, como da Comissão

Olímpica Internacional ou da já citada World According to GaWC.

Através de investimentos e intervenções na recuperação urbana, a partir da

segunda metade da década de 1980, o poder político adere às iniciativas em conjunto

com outros atores sociais, como ONGs e Fundações, que contribuem para a construção

dessas novas agendas de necessidades urbanas e assim otimizar sua identidade de cidade

global. Nos anos 2000, através da Lei nº11.079 de 30 de dezembro de 2004, as

iniciativas sociais se rendem às parcerias publico privadas que dão novo folego às

reformas urbanas. Ao não depender apenas dos recursos federais para grandes projetos,

o governo local pode definir sua própria agenda de reformas. Se a comunicação entre os

atores deste trabalho, o Estado como ativo e a sociedade como reativo, dá-se através da

estética urbana, essa mudança legal traz uma nova dinâmica para a cidade do Rio de

Janeiro. Iniciativas mistas, como o Museu do Amanhã – parceria pública com a

Fundação Roberto Marinho – e a Concessionária Porto Novo – de capital privado –

estão sendo postas em pratica, não só como uma ferramenta urbana, mas como marcos

de identificação dessa nova fase das políticas públicas.

Deve-se ressaltar, mais uma vez, que essas iniciativas ainda são orientadas pelo

poder político, através de leis e instituições normativas, visto que este ainda detém a

soberania administrativa sobre o uso do espaço público. O poder local passou então a ter

que estabelecer caminhos próprios que dessem conta de representar os interesses e as

identidades local e internacional de acordo com sua população. É então que os marcos

urbanos passam a ser resgatados ou construídos, atingindo tanto a percepção dos atores

sociais locais, como os internacionais que podem assimilar esses novos símbolos como

manifestação de uma saúde social e política que lhes oferece maior segurança em

possíveis acordos.

Ao trazer algumas dessas iniciativas que ilustram o novo caminho das políticas

públicas, traçado na estética urbana da cidade do Rio de Janeiro percebe-se, nessas duas

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primeiras décadas do século XXI, uma recuperação do valor histórico na identidade

local. A busca pela recuperação de sua própria história, ainda que entrelaçada com a

nacional, se torna fruto de uma reestruturação do poder local e da nova imagem que a

cidade almeja consolidar, tanto para si como externamente. Ainda que críticas sejam

feitas, por ser o poder público a escolher o que deveríamos recordar, não se pode

esquecer que a recuperação desses espaços já possibilitam a oportunidade, em uma

sociedade democrática, de redescobrir simbologias e fatos que podem contribuir para a

consolidação de novos laços afetivos, como a recuperação dos Cais do Valongo e da

Imperatriz.

Mudanças no espaço público, que se preocupam com a recepção da imagem

local para além de sua sociedade também pode ter um efeito negativo, como ocorrera

em manifestações internacionais e locais sobre a Pirâmide do Louvre, em Paris. Para

muitos, essa intervenção surtiu um efeito negativo quando descaracterizou a obra

original – em seu sentido real, imaginário ou ainda em sua função prática. Paris, por um

apelo de agenda internacional de passar uma imagem de cidade contemporânea, onde o

passado e o presente se comunicariam, teve que lidar com várias concepções negativas

sobre a desfiguração junto ao imaginário local sobre o Museu do Louvre. Além de um

possível choque estético, que pode provocar uma recepção negativa pela população

local, ainda existem os riscos de uma alienação – temporária ou permanente – sobre as

dinâmicas afetivas com a região.

O apelo do internacional não deve cometer o mesmo erro de regimes passados

ao defender conceitos de desenvolvimento que atropelem a relação da sociedade com

seu espaço público. No Rio, o maior projeto atual de revitalização da cidade encontra-se

na Zona Portuária, denominado Projeto Porto Maravilha. Após décadas de abandono e

esvaziamento, o poder público voltou-se para a região seguindo uma corrente de

capitalização indireta do espaço, cada vez mais comum na administração das cidades. A

atuação, que antes teria sido apenas pela cooperação entre as esferas do poder público,

conta agora com as iniciativas privadas. Essa mudança, que se tornou legal

nacionalmente em 2004, ampliou as possibilidades de intervenções urbanas por

parcerias mistas.

A atuação dos governos em parcerias com ONGs, OSCIPs (Organizações da

Sociedade Civil de Interesse Público), fundações e empresas, permitiu também um

debate maior por envolver uma diversidade de atores interessados em bons resultados.

Ancorado no Museu de Arte do Rio (MAR) e no Museu do Amanhã (do arquiteto

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espanhol Santiago Calatrava), o projeto Porto Maravilha expõe não só a cooperação de

interesses público e privado, como também demonstra preocupações sobre o impacto na

dinâmica interna e externa da cidade. No caso do MAR, as intervenções pós-

modernistas ganham destaque na junção de três prédios distintos (Palacete Dom João VI

de 1916, o Hospital da Polícia Civil – de caráter modernista – e a antiga Rodoviária

Mariano Procópio) para a construção de um único complexo. A construção ainda tentará

se integrar a outras comunidades com a construção de teleféricos no terraço do museu

ligando-se ao Morro da Conceição.

Entretanto, para que a iniciativa do MAR seja positiva, deve-se cuidar para que

as identidades originais não sejam perdidas, ainda que suas funções sejam modificadas.

É preciso pensar na coexistência e manutenção dessas novas funções e seus impactos no

entorno que ainda contará com mais um museu; o Museu do Amanhã, no Píer Mauá. O

Museu do Amanhã surge como uma construção nova que irá contrastar com a

centenária Praça Mauá, o edifício A Noite – também em reformas – e o novo complexo

do MAR. De seu posicionamento, ao lado do desembarque dos turistas navais, suas

dimensões – cobrindo todo o píer –, e a escolha do arquiteto Santiago Calatrava

colocam essa intervenção mais próxima de objetivos relacionados a uma reformulação

de imagem, principalmente à percepção internacional da cidade.

A tentativa de construir um possível cartão postal para a região, como feito com

o Museu de Arte Contemporânea em Niterói (1996), também pode ser levantada como

uma identificação monumental de contemporaneidade e saúde social da cidade. Essa

intervenção, sobretudo, objetiva marcar o espaço com um novo símbolo da atuação

política atual, que guardará em si um momento do poder político vigente. A construção

de uma imagem para o meio nacional e internacional não pode ser menos importante do

que a dinâmica da população com o seu espaço e a cultura pública. Mais uma vez, deve-

se pensar se a intervenção não irá descaracterizar todo um bairro ou trazer uma mudança

cuja população local não terá tempo e nem estrutura suficientes para absorver. Ainda

que a modernização seja almejada, tanto no exemplo de Paris como no do Rio, os

esforços para programar essa abertura à produção cultural pública podem ser recebidos

negativamente pela sociedade que passa a enxergar a obra não mais como uma solução,

mas sim como um gasto indevido e desnecessário.

Assim, tanto fatores como altos custos às contas públicas e a descaracterização

da região podem levá-la à uma dinâmica de rejeição e desvalorização que, por muitas

vezes, acaba iniciando alterações em cadeia que cada vez mais acabam por encobrir ou

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afastar os vínculos afetivos dos indivíduos. No caso do Porto Maravilha, a preocupação

estende-se das obras e engloba todo o bairro, presumindo-se que essas intervenções

terão seus impactos positivados ou, ao menos, neutralizados. A manutenção de parte da

região encontra-se nas mãos do capital privado da Concessionária Porto Novo. A

operação da Concessionária Porto Novo assumiu, em quinze de junho de 2011, a

maioria dos serviços públicos municipais referentes à região portuária, como cuidados

com a iluminação, limpeza urbana, pavimentação, implantação de 700 quilômetros de

redes de água, esgoto, energia elétrica, telefonia e drenagem de águas pluviais,

sinalização, poda de árvores e a conservação do mobiliário urbano.

Pelo contrato com o consórcio Porto Novo, além de prestar serviços públicos, a

empresa terá que realizar obras de infraestrutura, dentre elas a derrubada de parte do

Elevado da Perimetral. Suas funções podem ser remanejadas pelo governo respeitando a

base de orçamento e gastos firmados previamente pelo acordo de sua

institucionalização. Um exemplo é a sua desobrigação, ocorrida em outubro de 2011, de

implementar as estruturas para o futuro veículo leve sobre trilhos, transferindo a verba

privada para a atual construção do Museu do Amanhã. Com o início dos leilões dos

Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepacs) – títulos emitidos pela

prefeitura para financiar a revitalização do Porto, utilizando-se o mínimo possível da

verba pública – o poder executivo municipal delega aos interesses privados maior

responsabilidades nas dinâmicas de atuação do novo espaço e a sociedade.

O intuito da iniciativa é construir um memorial, encontrado nas escavações em

março de 2011, próximo à Avenida Barão de Tefé que exponha os pisos originais, em

dois níveis de camada – por um ter sido construído sobre o outro – e construir, ao longo

de uma das paredes, uma linha do tempo com informações sobre a evolução histórica

dos dois cais. Tenta-se resgatar a história da identidade negra na cidade, por ter sido o

Cais do Valongo um dos atracadores que mais recebeu africanos escravizados. Já o Cais

da Imperatriz, inaugurado para receber a consorte de Dom Pedro II, a Imperatriz D.

Teresa Cristina, traz a engenharia neoclássica à época do Império, elaborado pelo

arquiteto francês Grandjean de Montigny. Essa recuperação fara com que uma obra,

antes soterrada pelos interesses políticos anteriores, volte a fazer parte da estética

urbana da cidade – com 1350 m² – e possa servir como instrumento comunicador de um

passado que havia sido esquecido intencionalmente.

Como defendido anteriormente, as iniciativas de recuperação mostram-se

positivas, pois ao menos absorve os interesses da sociedade local em seus debates,

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mostrando que os poderes local, estadual e federal estão interessados novamente em

promover a ocupação da região central do Rio de Janeiro, bem como no reflexo que o

desenvolvimento urbano da cidade exerce sobre a positivação de sua identidade no

âmbito internacional. Ao trazer cuidado às áreas degradadas, investir na manutenção e

aceitar a cooperação com o capital privado, o poder político está conseguindo valorizar

a região que passa a atrair, cada vez mais, um numero maior de moradores. Iniciativas

de resgates cultural e histórico também influenciam no perfil dos novos moradores que,

quase sempre, buscam se estabelecer em áreas que possam se identificar com a

identidade produzida no local. Essas novas dinâmicas certamente vem positivar a

imagem do Rio como uma cidade que, a nível global, tenta ampliar sua diplomacia

cultural subnacional.

Considerações Finais

A cidade do Rio de Janeiro serviu aqui para uma análise da relação entre o poder

político e alguns atores sociais – como o capital privado – que interferem na estética

urbana de sua região central e contribuem na percepção de iniciativas a uma identidade

internacional positivada. A dinâmica produzida nessa relação permite à sociedade

entender os novos caminhos de sua cidade e suas identidades, local e externa, que ainda

hoje são guiadas pela atuação do poder político. O poder local, ao ter que representar

democraticamente os interesses de sua população traçou um novo caminho, nos anos

1990 e 2000, incorporado preocupações de uma agenda local de resgate e de uma

agenda internacional pela positivação. Ainda que tantos outros assuntos permeiem as

mudanças e reformas urbanas na cidade, a atuação subnacional desse novo ator global

exigiu e continuará exigindo reformas na estética urbana tendo que equilibrar suas

intervenções com os laços afetivos dos cidadãos.

Através da chamada de atenção para a cidade, ao sediar diversos eventos

internacionais nessas duas décadas, o poder político ampliou não só a visibilidade do

Rio de Janeiro como também do país, forçando uma cooperação entre três esferas do

executivo – municipal, estadual e federal – para que tanto a imagem local como a

nacional se mantivessem positivadas. A atuação subnacional da cidade permitiu a

cooperação política que tenta ultrapassar décadas de descaso e de burocracias territoriais

que tanto alimentaram a degradação da região central. Mesmo enfrentando problemas

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diversos, como financeiros e burocráticos, após a longa fase de descaso, de 1960 até a

redemocratização participativa, conseguiu reestruturar nos últimos anos uma imagem

sustentada por velhos e novos laços afetivos com a identidade urbana.

A cooperação das esferas do poder, priorizando tanto a imagem, como a

recuperação social de áreas degradadas pode ser resultado, mas também resulta, nesse

repensar da identidade local e internacional. As simbologias políticas espaciais também

passam pelo clive afetivo da população que, conhecendo melhor seu passado, poderá

entender sua atual realidade. Novos monumentos também ampliam e poderão ampliar a

autoestima do cidadão que passa a reafirmar seus vínculos com o espaço e a fortalecer

uma identidade mais concisa que permite, a médio e longo prazo, uma estabilidade no

reconhecimento internacional.

A pluralidade de simbolismos existentes no espaço histórico e afetivo da cidade

é somada às complexidades em analisar o presente e os resultados futuros do caminho

traçado. Todavia, tomando a afirmação de que as imagens ambientais seriam o resultado

de um processo bilateral entre o observador e seu ambiente, a imagem de uma

determinada realidade pode variar significativamente entre observadores diferentes. No

final do século XX e início do século XXI, a absorção da ideia de cooperação com o

capital privado também teve impactos na relação entre o poder e a estética. Foi posto na

agenda política uma necessidade de normatizar essa relação que, em 2004, tomou forma

pela lei que possibilitou as iniciativas mistas.

Projetos, como Porto Maravilha, ilustram essa passagem parcial das obrigações

públicas para a esfera privada, indo muito além da recuperação do patrimônio, e

cuidando de funções administrativas e serviços sociais. O Estado, ainda que transfira

parte de seus custos para outros atores sociais, não é substituído em sua noção de

obrigação e de vistoria do espaço púbico. Assim, através de novos objetivos de inserção

internacional, a possibilidade de cooperação entre o público e o capital privado e a

ampliação da participação da sociedade democrática nos debates e decisões do poder

político, a região central da cidade do Rio de Janeiro voltou a ser apropriada pela

população, impressionando pelo crescimento de moradores em tão curto espaço de

tempo.

Referências Bibliográficas

JAGUARIBE, Beatriz. Fins de Século: Cidade e Cultura no Rio de Janeiro. Rio de

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