Oct 15, 2015
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O SILNCIOROMPENDOROMPENDOO SILNCIO
Distribuio Gratuita
Publicao de combate Tortura
Famosos rompem o silncio contra essaterrvel violao aos direitos humanosWagner Moura, Daniela Mercury, Jean Wyllys, Mv Bill,
Tico Santa Cruz, Zez Motta, Clodoaldo Silva,Zilda Arns, Joo Moreira Salles e mais...
Ano 1. Edio 01. ISSN 1983-2761
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Expediente
um projeto que visa promover o
combate tortura por meio da produoe publicao de revista com depoimentose testemunhos de personalidadesbrasileiras.
ISSN 1983-2761
Executor do projeto:
IDDEHA Instituto de Defesa dos DireitosHumanosPresidente: Paulo Pedron
Financiador:
Secretaria Especial dos Direitos Humanos -
SEDH. Convnio 188/2006
Jornalista Responsvel:
To Travagin MTB - 5531
Diagramao e Layout:
Leandro Lauer
Reviso:
Sinttica Comunicao
Fotos de capa (personalidades):Rogrio Ehrlich, Desire do Valle, Marcelo
Rudini, Gaspar Nbrega, Michel Ray,David Prichard, Guto Costa e fotos dedivulgao.
Impresso:
Artes Grcas Renascer Ltda
Tiragem:
6.700 exemplares
Os artigos e entrevistas so de responsabi-lidade de seus autores.
Contato:
IDDEHA Instituto de Defesa dosDireitos HumanosRua Reinaldino de Quadros, n. 89,Alto da XV.CEP: 80050-030. Curitiba-PRTel: (41) 3363 3103
Rompendo o Silncio
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TORTURAR NO INVESTIGAR
AQUI O PAPO RETO
TORTURA RACIAL, UM CRIME AINDA COMUM
JUVENTUDE, VIOLNCIA E TORTURA
O FIM DA VIOLNCIA E A VIOLNCIA SEM FIM
POR MAIS RESPEITO AO SER HUMANO
JUVENTUDE EM XEQUE E MATE!
DITADURA, TORTURA E CINEMA
A TORTURA QUE EXISTE DENTRO DE CASA
COMO COMBATER A TORTURA?
O ESPECIALISTA FALA
DIRETOR E PROTAGONISTASDE TROPA DE ELITE ENTRAM NADISCUSSO SOBRE TORTURA
CONTRA A DESIGUALDADE, AFAVOR DAS OPORTUNIDADES
SUCESSO NAS PISCINAS,E PREOCUPAO COMO FUTURO DO BRASIL
TORTURA: NEM MESMO CRIANASE ADOLESCENTES SO POUPADOSDESSE CRIME
A opinio de Jos Padilha, Wagner Mourae Andr Ramiro sobre as prticas de abusode autoridade, em relatos que analisam olme Tropa de Elite.
O papel da sociedade em cobrar seusdireitos e a omisso que existe com relao violncia e tortura. Esses so algunsassuntos da entrevista com o msico TicoSanta Cruz.
O atleta paraolmpico Clodoaldo Silva
conta em sua entrevista como venceusuas limitaes e analisa como o Brasilpode vencer a violncia.
Daniela Mercury traz uma mensagem muitoclara da importncia de lutar pelos direitosda infncia e da adolescncia.
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Explicaes e conceitos sobre esse crime hediondo,embasados pela opinio de mdica psiquiatra espe-cializada no tema Tortura.
O rapper Mv Bill conta como j sofreu um tipo deabuso nas mos de agentes pblicos e manda seurecado.
Entrevista com atriz Zez Motta, que h tempos militano movimento negro. Ela fala sobre violncia, racismoe sobre como a mdia tem se comportado com relao tortura e ao preconceito.
Artigo de reexo sobre juventude dos dias atuais,embasado por processos histricos que levaram auma realidade de violncia e discriminao.
Joo Moreira Salles apresenta um forte artigo sobre aviolncia que envolve o trco de drogas, mostrandocomo a situao do Brasil to grave quanto de umpas em guerra.
O vencedor da quinta edio do reality show BigBrother, Jean Wyllys, fala sobre violaes de direitosno Brasil e mostra sua indignao pelo desrespeito
diversidade.
O preconceito com relao aos jovens e a mudanasocial que esse pblico pode construir, em artigoescrito pelo cantor Netinho de Paula.
O lme Batismo de Sangue traz cenas da torturana ditadura militar no Brasil. Acompanhe a entrevis-ta com o diretor do lme, que faz uma comparao
da tortura naquela poca e nos dias atuais.
A paz s pode ser construda em um esforo dasociedade pela vida e pela fraternidade. Veja o que amdica pediatra Zilda Arns diz sobre isso.
Entrevista com o Ministro da Secretaria Especial dosDireitos Humanos, Paulo Vanuchi.
Acompanhe as opinies de prossionais envolvidoscom o combate tortura no Brasil.
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Romper o silncio. Expressar. Falar. Gritar. Assumir posio. Ter opinio. O objetivo dessa publicao
concebida pela nossa instituio e pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, trazer pessoaspblicas brasileiras a se posicionarem sobre uma das mais hediondas e covardes formas de vio-lncia: a tortura. Essa prtica ainda comum no s em nosso Pas, mas praticamente no mundointeiro. Relatrios de organizaes internacionais de direitos humanos comprovam isso. Pesquisasde opinio revelam que parte considervel da nossa sociedade tolera, aceita a justicativa da tor-tura como prtica investigativa policial. Envolver personalidades pblicas no sentido de mostrar oquanto terrvel tal crime, com certeza ajuda na consolidao de valores. Principalmente daquelesque desejamos para a estrutura democrtica do Brasil. Estrutura essa fundamentada no respeitono s a pessoa, ao cidado, mas tambm ao ambiente, ao planeta. Ns, do IDDEHA, nos sentimosorgulhosos por estarmos nesse projeto junto com a Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Prin-cipalmente porque tal ao vem a somar com as aes j desenvolvidas por nossa organizao nosentido de armao de direitos. Espero que a leitura seja to prazerosa para voc leitor-cidado,como foi para ns projet-la e escrev-la.
Paulo PedronPresidente do IDDEHA
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Torturar no investigar
A tortura, apesar de ir contra inmeras leis nacionais e internacionais, ainda acontece no Brasil. considerada um crimehediondo, ou seja, to grave quanto estupro, sequestro ou latrocnio. A lei 9.455/97 dene os tipos de tortura:
1- Tortura-prova:emprega-se a violn-cia fsica ou psquica para extrair provas da vtima;
A mdica psiquiatra Guanara Amaral, do Hospital de Custdia e TratamentoPsiquitrico de So Paulo, conceitua esse crime como um ato de um serhumano contra o outro com o objetivo de causar dor e sofrimento e obteralguns ganhos como informao ou apenas o exerccio do poder sobre o ou-tro. Ela explica que o agente torturador um ser humano normal, com ca-pacidade de amar e ser amado, mas ao praticar a tortura no est vendo nasua vtima um ser igual a ele. visto como um ser que no pertence ao seu
grupo arma.
A mdica comenta que atualmente essa ainda uma prtica muito comum,mas que infelizmente no combatida porque a sociedade no tem se impor-tado com as vtimas, que geralmente so pobres. Quando utilizada para ex-trair consses ou provas, a tortura faz com que a investigao da polcia noapenas perca credibilidade, como tambm manche a imagem da polcia dian-te da populao, pois coloca todos, polcia e bandido, no mesmo patamar.
Guanara comenta a gravidade desse crime: quando a pessoa torturada,geralmente ca com muitas seqelas, que podem ser fsicas, mas tambm
psicolgicas, pois pode provocar distrbio cognitivo, ou seja, a pessoa tor-turada pode criar diculdades de aprendizado, de concentrao, de mem-ria ou passar a ter distrbios emocionais. Se uma tortura coletiva, comoquando h uma ao policial ostensiva dentro de uma favela, em que toda apopulao sofre com isso, essa populao ca marcada para sempre.
A tortura acontece em plenaluz do dia, mas ningumsabe nada
O artigo 1 (2) da lei sobre a torturadetermina que aquele que se omiteem face dessas condutas, quando ti-
nha o dever de evit-las ou apur-las,incorre na pena de deteno de um aquatro anos
Para denunciar a tortura, a pessoa quetomar conhecimento desse crime deveprocurar uma Ouvidoria da Polcia. AOuvidoria de Polcia tem como atribui-es ouvir, encaminhar e acompanharas manifestaes da sociedade civil:denncias, reclamaes e representa-
es da populao referente a omis-ses e atos arbitrrios, desonestos,indecorosos ou que violem os direitosindividuais ou coletivos praticados porautoridades e agentes policiais.
2- Tortura-pena outortura-castigo: a tortura utilizada
como forma de punio;
3- Tortura do Encarcerado:Violncia contra a pessoa presa, no importando a natureza ou
motivo do encarceramento;
4- Tortura Racialou discriminatria:o
agente emprega a violncia em razo da
discriminao racial ou religiosa;
5- Tortura como cri-me-meio:o torturador obriga atravs
da violncia a vtima a cometer crimes.
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DavidPrichard/Be
lemcom
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Diretor e protagonistas de
Filme levanta debate sobre a ao dos policiais
na favela, tortura, violncia e trco de drogas
O Filme: Passa-se no Rio deJaneiro, no ano de 1997. Narra a hist-ria de um capito do Batalho de Ope-raes Policiais Especiais da Policia
Militar. O Capito Nascimento (Wag-ner Moura) da Tropa de Elite da Polciado Rio precisa encontrar um sucessor aquem deixar o Batalho e, assim, mu-dar de vida ao lado da mulher, pres-tes a dar a luz ao seu primeiro lho.Junta histrias de outros personagens:dois jovens aspirantes a ocial da PM,uma jovem idealista, um garoto daZona Sul que vende maconha na facul-dade e o dono do morro que divide a
cocana com jovens de uma ONG. Sorepresentantes dos vrios extratos so-ciais que compem o enredo do lme.Cada um desses grupos tem diferentes
interesses: o tracante, a polcia, oBatalho, o consumidor de drogas. OFilme debate a tortura na medida emque apresenta cenas em que os poli-
ciais se utilizam de mtodos violentoscontra os moradores dos morros paraobter informaes sobre o trco.
O lme Tropa de Elite obteve sucessode pblico e de crtica, levou o Ursode Ouro em Berlim e gerou uma fe-bre nacional em cima das frases deimpacto dos personagens. Ele levan-ta um debate sobre a ao dos poli-ciais e sobre esse assunto comentam
o diretor Jos Padilha e os atoresWagner Moura (Capito Nascimen-to) e Andr Ramiro (Andr Mathias).
Tropade Eliteentram
na discusso sobre tortura
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O que pode a linguagemNO CINEMA?Entre a linguagem e a sua interpretao
Jos Padilha e Luiz Eduardo Soares*
* Jos Padilha diretor
do lme Tropa de Elite e
co-roteirista com Bru-
lio Mantovani e Rodrigo
Pimentel.
Luiz Eduardo Soares
co-autor do livro Elite da
Tropa (Ed.Objetiva), com
Andr Batista e Rodrigo
Pimentel.
Um capito do Bope, Batalho de Ope-raes Policiais Especiais da PM do Riode Janeiro, depois de torturar por horasum adolescente pobre e negro, numafavela carioca, ante a resistncia de suavtima em delatar o parceiro do tr-co, apanha uma vassoura e determina
a seu subordinado: Zero-Seis, arreia ascalas dele.
***Foi ento que me ocorreu estrear osGolnhos de Miami. Fomos at umacaixa dgua. Retiramos dois os darede de iluminao pblica. Manda-mos o Juninho entrar na caixa e mer-gulhamos as pontas dos os, uma emcada lado. Que beleza! Voc precisavaver aquilo. Ele saltava com leveza egraa. S faltava trilha sonora e umjogo de luzes.
***Qual o horror maior, o maior assom-bro? As cenas descritas de um pontode vista distante e crtico, interpre-
tando suas condies de possibilidadehistrico-culturais, ou na voz e pelaperspectiva de quem incorporou taiscondies, inconsciente de sua ec-cia subliminar e ubqua, inteiramentedistante de qualquer sensibilidade cr-tica?
Optamos pelo horror maior. Torturaprescinde de adjetivos e meta-lingua-gem. Tortura sinnimo de barbrie;seria absurdo explicar as razes pelasquais ela o inverso de toda razo. Aprimeira cena est no lme Tropa deElite; a segunda no livro, Elite da Tro-pa, que nasceram e cresceram obrasdistintas e autnomas, mas atraves-sadas por fontes, referncias, inten-es e estrutura narrativa comuns. Euma indagao compartilhada: comoa sociedade constitui policiais capazesde torturar e de atribuir selvageriaum sentido, convertendo-a em perfor-mance funcional e em instrumento detrabalho passvel de clculo e distri-buio metdica?
Seria extremamente simplicador re-duzir a magnitude desse problema esua complexidade a explicaes denatureza individual, moral ou psico-lgica. Ainda que essas dimenses se-jam relevantes, patologias e idiossin-crasias, desequilbrios e desvios de
carter no dariam conta da escalado fenmeno, nem de sua incessantereproduo. Sob 4.329 mortes provo-cadas por aes policiais nos ltimosquatro anos, no estado do Rio, muitasdas quais ocultando execues, estem curso a armao repetida de umpadro institucionalizado, de umacultura corporativa, de uma poltica.A maioria desses atos praticada porindivduos to normais quanto podemser, em mdia, cidados de nosso pas:pais de famlia, estudantes universit-rios, religiosos, dotados do juzo me-diano que caracteriza o senso comum.Aqueles que perpetram essa barbriejusticam seus atos recorrendo ao es-toque de valores disponvel em nossacultura, adaptando o inominvel s
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Divulgao
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expectativas ticas que organizam osdiscursos correntes. Essa estranha eoblqua operao naturaliza o abomi-nvel. O corpo do outro, desprovido desubjetividade e valor intrnseco, reduz-se a meio e objeto sobre o qual o poderse exerce.
Mas essa experincia tem de ser acei-tvel para seu protagonista, no spara a sociedade. indispensveladapt-la a uma viso de mundo quea justique. Livro e lme buscam des-velar essa operao adaptativa e essaviso de mundo, focalizando-as a par-tir de seu interior e de seus mecanis-mos cotidianos, conduzindo leitor eespectador ao fundo mais sombrio desuas possibilidades emocionais e sim-
blicas.
Um personagem verossmil e capaz deser o antrio nesse universo de tre-vas, vinganas e estratgias, tem decrer nesse mundo que criou (ou ao qualaderiu) para apaziguar suas angstias,no esforo desesperado e impotentede compatibilizar valores e prticas in-
conciliveis. Esforo vo, mas, por issomesmo, sempre reiniciado, de raciona-lizar, processar, elaborar o excessivo, oresduo que escapa, o vestgio que nose encaixa. Algum poderia acreditarque o personagem que cr em sua ilu-so perversa seria poderoso a pontode seduzir sua platia, a despeito dacrueza de seus atos mais violentos?
Desconstruir essa viso de mundo e osmecanismos micro-polticos que a tor-
nam social e subjetivamente sustent-
O que o ator Wagner Mourapensa sobre tortura:
A tortura, assim como o trabalho escravo, parece uma
prtica medieval enterrada,mas no . Infelizmente, ain-
da utilizada em larga escala por rgos pblicos de
diversos pases, inclusive dos ditos desenvolvidos (vide os
horrores de Abu Grab). O Brasil tambm no sepultou o
horror sofrido nos pores da ditadura militar e ainda
um pas tolerante com a tortura (sabidamente pratica-
da pela polcia). A denncia e o debate so instrumentos
fundamentais para ajudar na erradicao de prticas
perversas como explorao sexual infantil, trabalho es-cravo e tortura, que em pleno sculo XXI nos remetem `as
fogueiras da Idade Mdia.
Algum poderia acreditar
que o personagem que cr em
sua iluso perversa seria po-
deroso a ponto de seduzir sua
platia, a despeito da crueza
de seus atos mais violentos?
vel exige mais do que palavras crticase conscientes. Requer a dramatizaode seus impasses pelo atrito entre, deum lado, a opacidade impermevel dosvalores que justicam a barbrie emnome da civilizao, e, de outro, as ima-gens descentradas, incompletas, sujas,resistentes unidade clssica que tudo
integra, pacica e harmoniza.
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avidPrichard/Belemcom
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Andr Ramiro, ator queinterpreta o aspirante Matias, fala
para a Rompendo o Silncio:
Acredito que, mais importante que osucesso de bilheteria e de crtica do l-me TROPA DE ELITE , so as questespolmicas que o lme gera em nossasociedade, principalmente para os ci-dados que acham que o Capito Nas-cimento est certo por torturar e ma-tar e que represso a soluo parao problema da segurana pblica emnosso pas.
Seria o Capito Nascimento um gran-de heri ?
Vamos analisar da seguinte maneira:nosso heri uma pessoa beira dainsanidade, cansado daquela guerrasem m na qual, para cada tracantemorto, surgem dois novos no dia se-guinte.A violncia do seu dia a dia de policialse estende aos limites de sua prpriacasa destruindo sua famlia. Para eleo BOPE to brutal que tudo em queele consegue pensar na sua aposen-tadoria.Como espectador, sinto muita penado meu personagem, o Matias, que aolongo da histria, tornou-se herdeirodeste universo de violncia.
Considero inadmissvel qualquer tipode tortura , mas a pior tortura mesmo aquela imposta por nossos gover-nantes quando se omitem e tratamcom descaso a educao como fatorpreponderante alm de forte aliada naluta pela diminuio da violncia emnosso pas.
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DesiredoValle
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Eu j fui vtima da tortura de policial dentro da Cidade deDeus. Eu estava passeando de shorts e sem camisa e um po-licial quis me levar para a delegacia. Quando eu respondi queele poderia me levar, ele comeou a proferir palavras racistas,a questionar minhas tatuagens e quando viu que eu estavacom uma passagem de avio dentro da carteira j questio-nou como um sujeito como eu, dentro da favela, poderia es-tar com uma passagem de avio. Quando eu respondi que a
passagem era minha, para eu viajar, ele achou que eu estavadebochando dele. Colocou uma pistola nas minhas costas e fezeu atravessar a Cidade de Deus com a pistola nas costas, com
Aqui o
papoe retoMv Bill um cantor de rap que alcanou o su-cesso na msica e ultrapassou barreiras sociais
ao se tornar conhecido tambm por seu traba-lho no documentrio Falco Meninos do Tr-co. Nasceu e ainda reside na Cidade de Deus,comunidade da periferia do Rio de Janeiro, ondefoi um dos fundadores da Cufa Central nicadas Favelas, uma organizao voltada para apromoo de aes de formao para a juventu-de. Seu trabalho mais recente a co-autoria dolivro Falco Mulheres e o Trco. Acostumadoa falar em seus trabalhos sobre a realidade dasperiferias, principalmente sobre violncia, dis-criminao e cidadania, Mv Bill d tambm sua
opinio sobre a tortura:
todas as pessoas me olhando. Na viatura osargento me reconheceu e me livrou. Cha-mei a imprensa e eu z questo de falar docaso, mas pedi para no expulsarem aque-le policial, para ele no servir como bodeexpiatrio, porque o problema continuariana corporao. E z questo tambm de fa-lar que tive a vantagem de ser reconhecido,
mas no o Bill que no pode ser importu-nado, mas nenhum favelado pode ser tra-tado daquela maneira.
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BrunoVeiga
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A banda existe desde 1997, mas prin-cipalmente depois da morte do amigoe colega de banda Rodrigo Netto v-tima da violncia urbana o vocalis-ta Tico Santa Cruz tem participado demanifestaes contra a violncia e ainjustia. Em entrevista feita RevistaRompendo o Silncio, ele fala sobreesses assuntos e deixa claro que pa-pel de cada um construir a paz no seu
cotidiano. Acompanhe a entrevista:
Como voc caracterizaria hojea violncia envolvendo jovensno Brasil?
Os mais afetados com a violncia sosem dvida os jovens, no vou usar es-tatsticas pois no acredito totalmentenelas. Falo o que vejo, o que vivo, o que
acompanho. Dentre todos os bitosem conseqncia da violncia re-gistrados no pas, vericaremos
que se concentram numa fai-xa etria de 16 a 25 anos.Na minha opinio, a maiorviolncia antes de tudo afalta de oportunidades, deeducao, de um horizon-te que lhes permita sonhare acreditar num futuro.
Vocalista da banda
de rock Detonautas
comenta sobre os temas
tortura, violncia ejuventude.
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Divulg
ao
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Como voc entende que ecomo deveria ser a participa-
o da sociedade na busca peladiminuio da violncia?
Minhas respostas so clichs antigos,que muito apontam como discursode esquerdista. Antes de me identi-car com qualquer posio ideolgica,
sou um cidado que acredita que osnossos direitos devem ser respeitados,de modo que o estado deve oferecer oque est garantido pela constituio.Mas ele no oferece e a populao secoloca mediante seus servios comose estivesse recebendo um favor. No favor para ningum matricular o -lho numa escola pblica de qualidade,com prossionais bem remuneradosou ser atendido num hospital pblico
decente, acesso a cultura, entreteni-mento, mas tambm qualidade de vidadigna no lugar onde mora. A sociedadevive num crculo vicioso, que soa atpatolgico, me arrisco a deduzir umaesquizofrenia coletiva. Coloca a culpanos polticos por tudo, mas se esqueceque quem os colocam no poder somosns. Poucos se lembram em que votounas ltimas eleies, poucos acompa-nham poltica. A violncia o reexode um estado falido que no d assis-tncia para seus cidados e por outrolado sustentado por uma omissocoletiva que no quer se comprometercom as mudanas. No h soluo en-quanto no entendermos que ela parteprimeiro de nossa atitude no dia-a-dia.Como podemos cobrar honestidade docongresso se ns somos os primeirosa oferecer propinas, comprar produtosfalsicados, jogar papel, guimba de ci-
garro nas ruas, desrespeitar as leis m-nimas de convvio? Na minha opinio,furar la uma violncia. Pequenosatos em grandes quantidades formamgrandes problemas.
Como voc percebe que a socie-dade reage tortura?
A prtica da tortura comum com jo-vens em favelas, morros e periferias,provinda de agentes pblicos com nsde obteno de informao. A socie-dade reage com omisso e indiferen-a. No sendo com eles, que se danemos outros. No tem gente achandoque o Capito Nascimento salvaodo pas?
Qual nosso papel (enquantosociedade) no combate vio-lncia?
Nosso papel nos organizar, acompa-nhar e cobrar dos nosso polticos pos-turas coerentes com o cargo que estoocupando. Praticar o que falamos,buscar uma coerncia com a realidade,
entendendo que a mudana s serpossvel com unio e determinao.Sem educao, sem oportunidades,sem justia nunca teremos a paz quealguns sonham, mas que nunca existiupara uma boa parcela da populao.
A paz que
alguns sonhamnunca existiu
para uma boa
parcela da
populao
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Zez Motta comenta as conquistas que asociedade alcanou ultimamente comrelao diminuio do preconceito racial
Zez Motta, quais so seus projetosatuais?
Eu acabei de fazer uma participaonum lme chamado Brothers, grava-do na comunidade de Capo Redondoem So Paulo. um lme com Cassia
Kiss, Caio Blat, e eu fao a me de umdos meninos um dos brothers. Estoutambm na expectativa de lanar meunovo CD, que vai se chamar O SambaMandou me Chamar. Acabei de fazerum musical no Rio de Janeiro, chama-do Sete, o Musical. E estou estudan-do o roteiro de um lme chamado Pi-xinguinha, um Homem Carinhoso.
E o seu trabalho de educao e arte?
No pra. O trabalho no CIDAN - Cen-
tro de Informao e Documentaodo Artista Negro - comeou quandoas coisas comearam a dar certo paramim, mas no momento em que deu
A atriz e cantora Zez Motta, nacionalmente e internacionalmente co-nhecida desde seu trabalho como protagonista no lme Xica da Silva(1976), j participou de diversos lmes, atuou em telenovelas e seguesua carreira de cantora desde 1971, mas tambm conhecida por suamilitncia a favor dos direitos humanos e contra a discriminao racial.Sobre esse ltimo tema, a artista muito segura em dizer que h muitasevolues, principalmente quando compara a televiso de hoje com a te-leviso da poca em que comeou a trabalhar. Parte dos avanos contraa discriminao racial reexo de trabalhos de artistas que comearamcom ela a batalhar por igualdade. Zez fundadora do CIDAN- Centro
de Informao e Documentao do Artista Negro, uma organizao nogovernamental que desde 1984 atua na insero de atores negros namdia e atualmente realiza atividades de formao para a cidadania epara as artes com jovens de baixa renda no Rio de Janeiro-RJ.
TorturaRacial,um crime ainda comum
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RogrioEhrlich
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certo olhei para o lado e vi que qua-se no havia outros atores negros. Aminha virada foi com Xica da Silva,foi um sucesso, viajei o mundo inteiropara lanar o lme, mas me dei contade que ramos muito poucos atoresnegros e mesmo com o sucesso do l-me as coisas demoraram a mudar. En-to a proposta inicial era a insero donegro na mdia. Eu comecei a cobrardos produtores e diretores o porqudessa quase invisibilidade do negro namdia. Arranjavam desculpas esfarra-padas, como a gente s convida vocs
(eu, o Pitanga, o Zzimo, a Leia Garcia)porque vocs so bons, mas os atoresnegros de modo geral so muito ten-sos, inseguros.
Como est a relao da mdia de hojecom os artistas negros?
Esse assunto - preconceito - deixou deser tabu. A gente, quarenta anos atrs,tinha uma luta muito solitria no mo-vimento negro. Mas hoje j deixou de
ser tabu, tendo negros j no horrio no-bre. Inclusive j z uma novela em quea gente discutia o preconceito - Corpoa Corpo, de Gilberto Braga - em queeu namorava um rapaz branco (inter-pretado por Marcos Paulo) e o pai noaceitava a relao porque eu era negrae pobre. A partir do momento que dei-xou de ser tabu, j meio caminho an-dado. Assim que a gente comeou comesse movimento negro, fomos taxadosde racistas, pois diziam que a gente
imitava o movimento americano, tra-zendo para o Brasil um problema queno existia, porque na poca e at hojese prega que existe no Brasil a demo-
cracia racial. Ento acredito que o fatode a televiso ter passado a discutiro assunto j um avano. Outro diafui contar quantos negros tm nessanovela das oito (Duas Caras) e chegouuma hora em que desisti, de tantosque so. E, alm disso, o papel dosnegros no est restrito ao bandido, empregada. J h uma diversicaodos papis. Acredito que meu trabalhotem uma parcela de contribuio a eco muito orgulhosa.
A tortura racial existe tambm?
Essa perseguio dos policiais aosnegros na rua uma violncia e umatortura. A discriminao uma vio-lncia. Uma vez, em reunio do mo-vimento negro, ns zemos questode convidar um policial para discutir aquesto da perseguio dos negros narua e me lembro do depoimento deledizendo que, segundo as ordens queeles tinham, se encontrassem com umnegro na rua, dependendo do lugar e
horrio, ele era sempre um suspeito.Tenho amigos que se queixam de quenegro com carro do ano ou moto novasempre so parados pela polcia. E isso recorrente nos dias de hoje.
J aconteceu algum caso de discrimi-
nao contigo?
Hoje em dia acho que acabou aquelahistria de entrar pela porta dos fun-dos, ou ao menos imagino que acabou.Mas eu j passei por isso: fui visitar um
empresrio e o porteiro me apontou aporta dos fundos e eu argumentei queera amiga dos donos da casa, mas oporteiro insistia que estava apenas
cumprindo ordens. Ele no admitiaque era por causa de minha cor que eudeveria entrar pelos fundos. Eu dei umempurro nele e entrei no elevador, eele simplesmente desligou o elevador.Fiquei l parada, foi uma experinciamuito desagradvel. Eu quei muitoaita porque sofro de claustrofobia.Chorei muito. O elevador desceu e eusubi pelos fundos, aos prantos. Outrasituao foi quando eu tirei umas fo-tos de anncio para uma loja de teci-dos. O cliente me pagou mas no usouas fotos, que caram belssimas, mas
ele disse que no ia usar minhas fotosporque a classe mdia era preconcei-tuosa e no ia assimilar as fotos deuma mulher negra.
Como deve se posicionar o jovem ne-gro perante a discriminao?
importante a mudana que est ten-do na mdia, porque o negro passa aser retratado no apenas como ban-dido ou escravo. Isso fundamental
para a auto-estima do jovem negro,que pode crescer com melhores refe-rncias. fundamental a questo daeducao para que a pessoa estudede igual para igual. Acho interessan-te a questo das cotas, como medidaprovisria, porque levanta o debate. Agente tem que mudar esse mundo e acota um dos meios da sociedade seretratar perante as injustias que jaconteceram. Acho que a juventudetem que ter conscincia de que existe
a discriminao e nem por isso podeabaixar a cabea, tem que brigar peloseu espao.
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Juventude, violncia e torturaPor Marcilene Lena Garcia de Souza
Pensar a juventude pensar no futuro,e o futuro do Brasil est em jogo. Quem
sero e como sero os pais e mes, osprofessores ou empresrios? Quem ocu-par cargos no sistema judicirio? Quemsero os cidados? Quem sero os poe-tas? Quem sero os policiais? Quem seronossos amores? Quem cuidar do Plane-ta, das pessoas mais velhas, das crian-as, quem sero os polticos? Quem vaiocupar os espaos de poder? Quem seroos talentos aproveitados pela sociedade?Quem sero os talentos desperdiados?Qual ser a viso de poder e de solidarie-
dade que teremos? Qual ser o nvel desatisfao com a vida e com as pessoas?Qual a democracia que nos espera? Quetipo de tijolos estamos construindo? Qualcasa? O futuro incerto e nos d medo.Tantas fraudes e corrupes em todos ossetores e lugares. Sonegar, omitir infor-mao, silenciar indignao, silenciar-seacerca de opresses, torturas, etc.
No possvel reetirmos sobre juventu-de e tortura sem pensar no futuro e semlembrar do passado. Qual passado? Pas-
sado da escravido? Passado da ditadura?Passado estampado no jornal de ontem?Para tanto, relevante, ao problematizar-mos o tema, lembrarmos do verdadeirosentido da escravido negra no pas, quefoi construda, regulamentada, legitima-da e consolidada pelo Estado Brasileiro epelas formas de tortura, violncia, maustratos e humilhao destinados aos nos-sos antepassados. E em que medida aforma de tratamento dispensada a estapopulao por mais de 350 anos, conti-
nua presente no imaginrio das relaessociais atuais. Quantos jovens africanoschegaram ao Brasil para serem escraviza-
dos? Como foi a sua formade captura em solo afri-
cano? Qual forma de pri-ses e sofrimentos queesta juventude vivenciounos navios negreiros?Quantos conseguiramchegar vivos? Quantos
foram assassinados?De que forma fo-
ram assassi-nados? A que
tipo de escravido foram submetidos emtodos os Estados deste pas? A juventude
negra, com seu esforo braal e intelectu-al, durante a escravido, construiu as ba-ses econmicas deste pas de graa e semser trabalho voluntrio. Quantos lderesnegros jovens travaram grandes lutas emorreram pela liberdade? Quem foram osfujes que chearam Quilombos, redu-tos de convivncia, muitas vezes, harmo-niosa entre brancos pobres, ndios e ne-gros? Quem foram estes jovens lderes?
A cultura e o folclore so meus/Mas os livros
foi voc quem escreveuQuem garante que Palmares se entregou/Quem garante que Zumbi voc matouPerseguidos sem direitos nem escolas/Comopodiam registrar as suas glrias
Nossa memria foi contada por vocs/E jul-gada verdadeira como a prpria lei./Por isso
temos registrados em toda histria/Uma m-sera parte de nossas vitrias. por isso queno temos sopa na colher/ E sim anjinhospra dizer que o lado mal o candombl(NATIRUTS. Msica: Palmares 1999).
pertinente salientar que esta juven-tude, ainda hoje, depois de 120 anos daAbolio da Escravido(1888) continuasendo a vtima preferencial de todas asformas de violncia, tortura e humilha-es da sociedade brasileira.
De acordo com os indicadores sociais doIBGE (2000, 2006), PNUD (2005), IPEA(2001, 2007) a juventude negra encontra-se numa situao de desvantagem social,econmica, poltica e de acesso s polti-
cas pblicas como educao, mercado detrabalho, emprego, segurana, expectati-va de vida, etc., quando comparada a ou-tros pers de juventude. Chama ateno,sobretudo, a situao de vulnerabilida-de desta juventude em ser assassinada.Ou seja, a taxa de homicdio de jovensnegros 74% superior dos brancos. Aprobabilidade de ser assassinado quaseo dobro para os pardos e 2,5 vezes maiorpara os pretos. Salientamos ainda que osnegros so as maiores vtimas no s doscriminosos, mas tambm da instituioque deveria proteger os cidados que apolcia.
O IPEA, 2007, analisando a mdia de esco-laridade das pessoas no Brasil entre 15 e
24 anos, arma que levaria 67 anos paraque brancos e negros tivessem alcanadoos mesmos nveis de igualdade educacio-nal. A probabilidade de um branco chegar universidade de 19% para 6,6% de umnegro; um negro recebe 53% de um sal-rio de um branco. Ainda segundo o IPEA,analisando os dados de 1995 a 2005 le-varia 65 anos para o Brasil eliminar a po-breza entre os negros e 52 anos para osnegros alcanarem o mesmo nvel de po-breza que tm os brancos no Brasil hoje.
Vejamos que a juventude negra, do sexomasculino o principal grupo vulnervel violncia urbana e policial represen-tando a maioria das vtimas de tortura ede homicdio. No obstante, as do sexo fe-minino (jovens negras), esto mais vulne-rveis impunidade da violncia sexista,traduzida na forma de regulamentar aspolticas pblicas, que em muitos casos, omissa na defesa das mulheres negras queso vtimas de violncia domstica, trcode seres humanos, assim como na omis-
so quanto ao perl de sade pblica querecebem (ausncia de polticas de direitossexuais e reprodutivos, na preveno dagravidez na adolescncia, etc.). E do pontode vista geral, tambm de outras doenassocialmente predestinadas como toxico-mania, alcoolismo, DSTS/HIV, etc. Ento,
Voc tem de aprender a se defenderTem de saber, que no h nada erradoCom seu tom de pele, seu cabelo enroladoFica ligado que eles querem te arrastar
(...)Querem fazer uma lavagem em sua menteQuerem que voc seja um cara inconscienteTipo um demente, uma marionete isso que o sistema quer do negro quando cresceA escravido no acabou apenas um sonho
(Rappin Hood Msica Us Guerreiro)
Destacamos que apesar da realidade ne-fasta para a juventude em geral, e espe-cialmente para a negra, a juventude ten-ta dar o seu recado preferindo espaos devalorizao da cultura, da arte, da cida-dania e da cobrana de seus direitos quetm se traduzido, muitas vezes, atravsdo Movimento Hip-Hop no Brasil.
Marcilene Lena Garcia de Souza sociloga,diretora licenciada do IPAD BRASIL Instituto de
Pesquisa da Afrodescendncia.
A data ocial da Abolio da Escravatura no Brasil foi dia 13 demaio de 1888.
IBGE Instituto Brasileiro de Geograa e Estatstica; PNUD-Programa Nacional das Naes Unidas para o Desenvolvimento;IPEA Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada.
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Divulgao
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Sucessonas piscinas,e preocupao com o
futuro do Brasil
Clodoaldo Silva, apontadocomo melhor atleta
paraolmpico brasileiro detodos os tempos, fala sobre
suas preocupaes com ajuventude de hoje
Voc poderia descrever quem era o Clo-doaldo Silva antes e depois de alcanar
tanto sucesso no esporte?
Fui um garoto da periferia de Natal, e svenci no esporte depois de muita luta.Nasci com paralisia cerebral e passei pordiversas cirurgias at chegar na siote-
rapia, onde me reabilitei com a prticade natao. A minha famlia me apoioumuito e s venci na natao porque abrimo de muitas coisas.
Hoje, que j viajou para diversos luga-res, como voc v o mundo no que dizrespeito violncia e qualidade devida dos jovens?Fico impressionado quando chego emoutros lugares do mundo, muitos deles
me do inveja, pela educao do povo,por terem mais oportunidades eacesso cultura. Nunca es-
tive em lugares muito vio-lentos. Estive na frica doSul no ano passado que
um pas que tem uma taxade violncia sexual absurda.Mas em relao qualidade
de vida, meio complicado,no d para saber direito
quais so os pases
que se destacam.
E como v o Brasil com relao vio-lncia?Fico triste quando vejo nossos jovensenvolvidos na violncia ou sofrendopor causa dela. Precisamos de maisinvestimento na segurana pblica ede mais programas que dem opor-
tunidades para as crianas e adoles-centes. Sem oportunidades eles seroos bandidos do futuro, pois no terooutra chance que no seja se envol-ver no trco de drogas, em roubos ena violncia em si.
A tortura um crime hediondo queainda acontece muito no Brasil.
Como voc encara esse tema?Acho que ningum deveria passar
por nenhum tipo de tortura, mas seique muitas pessoas tambm achamisso. No sei o que pode ser feito emrelao a esse tema, o que sei queviolncia gera violncia e o ser hu-mano no foi criado paraser massacrado. oque disse, faltampolticas pbli-cas ecazesem quasetodas as
reas.
Pessoas com decincia so vtimasde discriminao? Qual sua opiniosobre isso?
Acho que a situao j foi pior. Acre-dito que discriminao no seja s otipo de tratamento que voc recebede alguma pessoa, discriminao
est aliada com vrios assuntos: fal-ta de adaptao nos lugares, faltade capacitao para as pessoas comdecincia e falta de empregos nomercado do trabalho. Acredito queos decientes j mostraram que socapazes, para ns tambm esto fal-tando oportunidades.
Qual o recado para o jovem para aconstruo de uma cultura de paz?
Cada um precisa fazer a sua parte.As pessoas tm esquecido e exercero amor ao prximo e enquanto issoocorrer a paz no ir reinar. O amor a soluo para esse problema, masno basta s algumas pessoas que-
rerem, o mundo dever se unirmais ainda em prol da paz,
caso contrrio a violncias tende a piorar cadavez mais.
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GasparNbrega/HesseComunicao
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ArtigoO cineasta Joo Moreira Salles fala sobre:
Em dezembro do ano passado fuiconvidado para dar um curso em Sa-rajevo. Passei pouco tempo na cida-de, trs dias apenas, mas o que vi me
fez pensar no Brasil e, especicamen-te, na minha cidade, o Rio de Janeiro.Este um relato na primeira pessoa.Seu nico sentido reside na vontadede transmitir o espanto de um mo-rador de uma cidade violenta dianteda paisagem destruda de uma ou-tra cidade. No sou especialista emguerra dos Blcs nem em violnciado Rio de Janeiro. Mas, dessas duasviolncias, testemunhei os efeitos
da primeira e vivo diariamente asmisrias da segunda. So processosdiferentes, com etiologias distintas,mas, vendo-me diante de Sarajevo,
percebi que, se situaes li-mites encarnam quase
todos os vcios, aomenos guardam
uma virtude, a daclareza. Como onervo est ex-posto, no hcomo nem porque ludibriar,ngir ou man-ter as aparn-cias. As coisasso o que so.
H uma inte-gridade nessatransparn-cia, uma in-
capac idadede mentir,traduzida nasinceridade
de uma cidade sem rvores de p ouprdios intactos, incapaz portanto deesconder que o que houve por l foiuma guerra, durante a qual a vida foi
outra, trgica, cruel, anormal. Sara-jevo funciona um pouco como essasdestilaes literrias que, por conse-guirem reduzir determinadas paixeshumanas sua mais pura essncia,nos fazem ver melhor as paixes maismodestas que nos cercam. Nenhumpoltico Ricardo III, ningum to vilquanto Iago, mas conhecer Ricardo IIIe Iago torna mais fcil compreender aessncia da corrupo moral e do res-
sentimento. Assim tambm Sarajevo.Nessas ltimas dcadas, nenhumacidade foi como ela, mas com ela seaprende muito sobre as diferentes na-turezas da violncia.
Cheguei tarde, junto com Branca, mi-nha mulher. No mesmo vo havia umoutro documentarista, o israelense AviMograbi, autor de lmes extremamen-te crticos quanto posio de seu pasdiante da questo palestina. Tomamosum carro e fomos levados at nossohotel. O trajeto durou pelo menos vin-te minutos, e nos fez atravessar pra-ticamente toda a cidade. Do primeiroprdio que vimos, logo sada do ae-roporto, at o edifcio que abrigava ohotel, no passamos em frente a umanica edicao intacta. Simplesmen-te no existem construes livres demarcas de tiros, rombos de obuses, es-tilhaos de granadas. Numa boa parte
dos edifcios, os andares intermedi-rios, aqueles diretamente na linhadescendente dos projteis o sexto, ostimo e o oitavo andar, digamos es-
to carbonizados, deixando mostra,como pobres bocas abertas, os ves-tgios de residncias modestas: umacama, uma cadeira, o corpo negro de
uma geladeira. As pessoas continuammorando acima e abaixo desses anda-res fantasmas. De suas janelas, quasesempre vem terrenos convertidos emcemitrio: o estdio de futebol, o es-tacionamento do estdio olmpico, osparques que cercavam a cidade. Quemanda por Sarajevo inevitavelmentepassa ao lado de um desses campos demortos. As datas nas pedras tumula-res terminam sempre com os nmeros
92, 93, 94, 95. As datas de nascimentodizem: 68, 72, 74, 81.
O cerco cidade comeou no dia 6 deabril de 92, quando um estudante bs-nio foi morto por um franco-atiradorsrvio durante um protesto contra aRepblica Iugoslava, que se recusa-va a conceder autonomia Bsnia-Herzegovina (cuja capital Sarajevo).Neste dia, teve incio a guerra dosBlcs. Imaginando Sarajevo como alagoa Rodrigo de Freitas, em poucosdias o exrcito da antiga Iugoslviaocupou com tanques e canhes toda aextenso das duas avenidas que mar-geiam a Lagoa, a Epitcio Pessoa e aBorges de Medeiros. No s isso, comoposicionou unidades de artilharia emtodos os morros que circundam a La-goa Dois Irmos, Pedra da Gvea,Corcovado, macio da Floresta da Tiju-ca. Cada unidade de fogo no distava
mais de 50 metros da unidade seguin-te, formando assim um garrote letalem torno de Sarajevo.
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Durante quatro anos, at novembro de95, as linhas srvias despejaram suamunio na cidade. Como os tiros vi-nham de todas as direes, casas, apar-tamentos ou escritrios no tinhamlado mais ou menos exposto. Pessoaseram atingidas na sala, nos quartos,na cozinha e nos banheiros, no saguode entrada dos prdios e nos esta-cionamentos dos fundos. Apenas umhotel permaneceu aberto durante osanos de guerra, um velho Holliday Innque hospedou quase toda a imprensainternacional. As dirias dos quartos
eram cotadas em funo do tamanhodas janelas quanto maiores, menoro preo da diria -, e a habitao maiscara era um pequeno cubculo de pa-redes cegas. Sarajevo passou os anosde guerra sem luz e sem gua, pois ossrvios controlavam os reservatriosde gua e as usinas eltricas. Comduas excees apenas (um bosque emtorno do centro de operaes da resis-tncia e uma alameda rente s posi-
es dos franco-atiradores srvios), acidade no tem mais rvores. Foramtodas abatidas para fazer frente aosquatro invernos da guerra.
Pergunte a qualquer croata, bsnioou srvio como reconhecer de prontoo inimigo e ele dir: no h como. Osrostos so iguais, as roupas so iguais,o tom da pele o mesmo. Nesse sen-tido, o cerco a Sarajevo foi uma guerracivil na acepo mais profunda da pa-
lavra iguais matando iguais. Muitasvezes, o fato de algum se saber srvioou bsnio no denia de imediato onome do inimigo. Srvios que h ge-raes habitavam Sarajevo decidirampermanecer na cidade e participar desua defesa. O general que comandoua resistncia um cristo ortodoxode origem srvia. Ainda mora em Sa-rajevo e considerado pela maioriamuulmana como um dos heris da
guerra. Num dos documentrios pro-duzidos pelos estudantes, assisti aodepoimento de um jovem soldado sr-vio que lutou ao lado das foras iugos-
lavas. Aps receber ordens de seu su-perior para bombardear determinadoprdio durante um dia inteiro, cumpriua ordem. Passou doze horas alternan-do disparos de canho com ligaes decelular para o terceiro andar do prdio:queria saber se sua me havia sobrevi-vido. Ela se recusara a sair da cidade emorava ali.
difcil imaginar guerra mais fratrici-da. Ou mais feroz: como me ensinaram,a boa estratgia blica prescreve que,toda vez que o objetivo de um cerco
a tomada de uma cidade, deixa-se umanco aberto para que a populaocivil possa fugir, facilitando assim aentrada do exrcito invasor na cidadeagora abandonada. Em Sarajevo, nose ofereceu passagem a ningum. Acidade foi cercada por todos os lados.Em termos estratgicos, h uma nicarazo para esse procedimento: exter-minar a populao. Em plena dcadade 90, a uma hora de vo de Viena ou
noventa minutos de Zurique, uma ci-dade europia foi sitiada durante qua-tro anos sem que ningum pudesseescapar do cerco.
Na sua comunicao aos alunos, AviMograbi, o documentarista israelense,disse que ali, ao se ver diante de Sara-jevo, sentiu pela primeira vez um cer-to alento por morar em Israel. Talveznossa situao no seja to desespe-radora como eu pensava. Nosso dio
no parece tamanho, e nossas cidadesainda esto de p. Pensei o contrrio.Como Mugrabi, sei que nosso dio no tamanho e que nossas cidades con-tinuam de p, mas num aparente pa-radoxo exatamente isso que me fezsentir o tamanho da nossa tragdia.Posso resumi-la numa frase: apesar detudo, em Sarajevo a guerra terminou. isso que impressiona e isso que conta:um processo violento to concentrado
e to feroz encontrou uma soluo decompromisso, no importa se momen-tnea ou duradoura. Neste momento,no se mata mais em Sarajevo.
Branca andou sozinha por toda a cida-
de, a p, de manh, tarde e principal-mente noite, sem nenhuma sensaode insegurana ou temor. Numa cida-de at ontem conagrada, a presenada polcia e do exrcito innitamentemenos ostensiva do que no Rio de Ja-neiro. Policiais tomam caf e conver-sam nas esquinas sem metralhadorana mo. No ano passado, dez pessoasforam assassinadas na cidade. No Rio,delegacias que cobrem reas onde o
nmero de habitantes igual popu-lao de Sarajevo contabilizam essesmesmos dez homicdios em menos decinco dias.
No seu novo livro, Lendo imagens, Al-berto Manguel ensina que cada trag-dia seu prprio paradigma. Qualquerinstncia do mal o Holocausto, atortura, o estupro s equivalentea si mesma e existe apenas em seusprprios termos. Seria um profundo
desrespeito armar que um horror es-pecco equivale a qualquer outro. Emoutras palavras, no permitido com-parar pesadelos. No mximo, pode-sedescrev-los, identicando os elemen-tos comuns e, sobretudo, os traosdessemelhantes. Fundamentalmente,o que muda entre o horror de Saraje-vo e o horror do Rio de janeiro (e porextenso, de todo o Brasil) a natu-reza da violncia. A deles, tem fundo
tnico e religioso, e est impregnadana histria da regio h pelo menosmil anos. A nossa... a nossa uma in-cgnita.
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Joo Moreira Salles
cineasta e documentarista,
diretor de Entreatos (2004),Nelson Freire (2003) e
Notcias de uma Guerra
Particular (1999)
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Essa a outra lio de Sarajevo. Quan-do se sabe o que deseja a violncia,existe a possibilidade de um compro-misso. Sei que alguns amigos no gos-taro do que escrevo aqui, mas depoisde Sarajevo passei a lamentar o fatode nossa violncia no ter se tornadoideolgica, no ter produzido lideran-as polticas com agendas denidas.Assim, poderamos pelo menos traarestratgias, prever, agir de antemo eno apenas reagir, como fazemos cadavez mais e pior. Eventualmente, se fs-semos hbeis e inteligentes, chegara-mos concluso de que talvez fossetil conversar, sentando mesa como adversrio.
Cheguei de volta ao Rio num domin-
go e repassei os jornais da semana. Noprimeiro deles, vi um homem com umestilete na mo ameaando de morteo prprio lho de dois anos. No se-guinte, li sobre uma chacina na Vila daPenha. Adiante, soube de um passa-geiro de nibus atingido por uma bala.Mais alm, li sobre uma menina dedezesseis anos arrancada de casa porum grupo de seqestradores. Soube deescolas que fraudavam os boletins dosprprios alunos para melhorar seusrespectivos rankings. Aprendi comoRicardo Teixeira faz suas contas.
Creio que no h muita diferena entreesses fatos, j que na origem de todoseles est a degradao moral do pas.Mas se a origem uma, o propsito decada uma dessas aes irredutvels demais transgresses. So aesautnomas que no conversam entresi, violncias solitrias, fechadas em si
mesmas. Isso nos faz muito diferentesde Israel, da Bsnia ou da Irlanda. So-fremos uma fratura, mas ao contrriode Sarajevo no sabemos de nenhumprocedimento cannico indicado pararestabelecer nossa integridade. L, os
objetivos podem at ser inalcan-veis, mas tm nome prprio, identi-dade e CPF: a construo de um pasautnomo, uma terra sua, sem o ou-tro. Quando um palestino entra numapizzaria e explode uma bomba, podeestar agindo insanamente, mas, comodiria Polonius, h mtodo em sua de-mncia. Ele sabe por que faz. E aqui?O que quer a violncia? Descono queessa inconscincia seja parte do nossodrama.
Outro dia, pela primeira vez, sofri umatentativa de assalto num sinal de trn-sito. Eram dois meninos. O mais velhono tinha mais de treze anos, o maisnovo, no mximo onze. Bateram no vi-dro do carro mas no abri. Ensaiaram
com as mos embaixo da camiseta apresena de uma arma, que evidente-mente no tinham. Quando percebe-ram que o sinal abriria, espetaram odedo no vidro, rente a meu rosto, e dis-seram que estavam de olho em mim.Nas suas expresses, era difcil sabero que mais queriam: assaltar-me oume machucar. O assalto no dizia res-peito apenas a dinheiro, mas a outracoisa pior, ainda sem nome, na qual semisturava desespero, vilania e ressen-timento.
Existem muitas explicaes para a vio-lncia daqui, a nossa, mas nenhumame convence inteiramente. eviden-te que a feroz desigualdade social doBrasil uma das razes, mas o abismoentre ricos e pobres no pode expli-car, por si s, seja a intensidade, sejaa patologia dos nossos crimes. Pasescomo a ndia, nos quais a renda dis-
tribuda de forma ainda mais injusta,no convivem com nveis cotidianosde violncia sequer parecidos com osnossos. Vizinha razo social, h aexplicao ontolgica, que parte doprincpio de que a opo pelo crime
uma armao de existncia. O meni-no que escolhe pegar em armas expe-rimentaria, pela primeira vez na vida,a sensao de ser visto, percebido, oque no ocorreria se decidisse entre-gar remdios para uma farmcia oupedir esmola no sinal. O fato de o bemno conferir existncia a quem o pra-
tica um dos sintomas mais tristes donosso drama social. No documentrioNotcias de uma guerra particular, quedirigi com Ktia Lund, um menino ar-ma que o dia mais feliz de sua vida foiquando o chefe do morro lhe deu umapistola: Me senti o dono do mundo.Trata-se da armao ontolgica pelomal o crime conferindo existncia aquem at ento era invisvel e inexis-tente. (Algo semelhante ocorre com
as favelas, de cuja existncia s nosdamos conta quando nos chega umabala perdida.) O jovem transgressorno s passa a existir pela sua trans-gresso, como tambm a pertencer:a um bando, a uma quadrilha, a umafaco. Torna-se parte de algo. Deixade ser rfo.
Essas duas razes so ingredientes im-portantes do nosso drama, mas aindaassim no esgotam o fenmeno. Re-gies brasileiras ainda mais pobres emais relegadas ao limbo ontolgicono so to violentas quanto o Rio eSo Paulo. Nem mesmo a violncia deBogot ou de Medelln pode servir demodelo para o caso brasileiro. L, ocrime organizado segundo os inte-resses estratgicos do grande narco-trco, o que evidentemente no ocaso das guerras de tracantes do Rio,que opem, nas favelas, o maltrapilho
contra o indigente. A natureza lmpendo nosso crime , alis, o que explicao fato dele jamais ter conseguido seorganizar em torno de objetivos e pro-gramas.
O documentrio Notcias de uma Guerra Particular ganhou,entre outros, o prmio de Melhor Documentrio Brasileiro e oPrmio Quanta, ambos no festival Tudo Verdade.
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Por todas essas razes, suspeito que oBrasil esteja diante de um fenmenonovo, ainda em busca de explicao.Compreende-se a violncia de Saraje-vo, de Israel, da Colmbia. A violnciabrasileira, cuja manifestao exem-plar ocorre nas ruas do Rio, permaneceuma incgnita. No acredito que haja
um aparato terico adequado para en-tender o fenmeno.
Descono de que nossa violncia temalgo de essencialmente moderno, nosentido de ser uma violncia individu-al, descentralizada, sem utopias. Arris-co dizer que sua gnese vem dos anos80, e sua maioridade, dos anos 90. Nose pode imputar a responsabilidadedo fenmeno a nenhum governo es-
pecco, visto que atravessa diversosmandatos. No caso especco do atualgoverno, julgo difcil negar as contri-buies positivas que fez ao pas: esta-bilizou a moeda, indicou homens no-tveis para ministrios-chave sade,educao, economia -, teve um presi-dente que governou para o pas e nopara si mesmo. Falhou, porm, numaspecto essencial (alis, falhamostodos ns, pois a tarefa tambm eranossa, da sociedade civil): no deu aoBrasil um sonho, uma utopia, um de-sejo de ser alguma coisa. tristementecompreensvel, pois na dcada da he-gemonia do mercado a dimenso no
mensurvel dos sonhos perdeu suaimportncia. Curiosamente, nessesanos de prevalncia da lgica liberal,as polticas de desenvolvimento foramconduzidas segundo princpios de ummarxismo vulgar, segundo o qual asforas econmicas so hegemnicas, etodo o resto os sonhos, os desejos
apenas epifenmeno. O que se v nasfavelas do Rio no tanto a misriamaterial, mas a misria de projetos, dedesejos, de futuros sonhados. Nisso,Sarajevo o nosso avesso. Vi no rostodos meus alunos a vontade de cons-truir um pas.
Assim como o mercado rico na pro-duo de bens e pobre na produo depadres ticos, assim como incapaz
de oferecer solues solidrias queconsigam tomar de assalto a imagi-nao de um pas, assim como no sepode escapar do fato de que todo im-pulso de mercado sempre individual cada um sonha s, mesmo que os so-nhos sejam iguais -, tambm a violn-cia, quem sabe impregnada dessadescentralizao da utopia, pulve-rizou-se e tornou-se anrquica,reinventando-se como violnciainvertebrada, sem centro, mo-lecular. Ela no protesta, noprope nada alm do ganhoimediato, to vazia de conte-do social quanto o ato isolado
de um agente econmico militandoem causa prpria. Como ela no temobjetivos, no tem hora para parar. Aocontrrio de Sarajevo, a nossa violn-cia no tem por que ter m.
No nal do curso, projetei Notcias deuma guerra particular para os dezoito
alunos de Sarajevo. Uma menina dedezoito anos que passara grande par-te dos quatro anos de guerra no porode sua casa, sem luz e sem gua, medisse: Pela primeira vez na vida dougraas a Deus por ter nascido aqui.Tenho certeza de que ela no me diriaisso durante os anos de guerra, quandovizinho atirava em vizinho, e parenteem parente, mas entendo que me digaisso hoje. De abril de 92 a novembro de
95, em pouco menos de quatro anosde guerra, morreram 11.600 pessoasna cidade de Sarajevo. Nesse mesmoespao de tempo, so assassinadas noRio de Janeiro 13 mil pessoas.
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Jean Wyllys solta o verbo contra a discriminao e a homofobia
Que contribuio a exposio de
imagem teve para a sociedadebrasileira?
Ainda no d para avaliar todo impac-to de minha imagem pblica. A parti-cipao num reality show de grandeaudincia fez com que milhes de pes-soas conhecessem e aprovassem meutalento, meus valores morais e minharelao comigo e com os outros, que,antes do reality show, eram conheci-dos apenas por parte signicativa da
populao de Salvador, onde eu j eraconhecido por conta de meu trabalho
escritor e professor universitrio com
honestidade e graas ao seu talento eesforo - serviu de inspirao num pasonde comum o apadrinhamento e acorrupo. O restante do impacto s otempo - senhor de todo destino, tam-bor de todos os ritmos - dir.
Em que medida falar de direitoshumanos falar dos direitos daschamadas minorias?
Falar de direitos humanos no fcil.
Apesar do sentido de universalidade pre-sente na expresso aquele que apontapara a existncia de direitos que devemser observados, respeitados e promovi-dos independentemente de qual nao,religio, etnia, classe social, gnero,orientao sexual e faixa etria perten-a a pessoa - os direitos humanos noexistem para todos os humanos. E, emmuitas situaes, contraditoriamente,violncias e crimes so praticados em
nome da defesa e preservao dedireitos humanos. Mas as chamadasminorias - negros, mulheres, povosindgenas, imigrantes e homossexuais- quando tm voz, reivindicam direitosalegando sua humanidade; reivindi-cam direitos humanos. A lembranade que as minorias so humanas fazparte tambm das estratgias das or-ganizaes no-governamentais e atgovernamentais que apiam as lutasde tais minorias. Nesse sentido, falar dedireitos humanos , em termos prticos,falar do direito das minorias.
como jornalista, escritor e professor
universitrio. E tambm pelo fato de euser gay, um gay assumido e inteligente.Agora, o impacto maior de minha ex-posio ainda no d para avaliar. Sei,por meio de cartas e do contato com aspessoas em lanamentos do meu livroe em eventos, que minha participaono reality show ajudou muitos gays aassumirem sua identidade sexual, aenxergarem positivamente a homos-sexualidade e serem respeitados porsuas famlias. Tambm certo que,
na histria da TV, at ento, ningumhavia dito eu sou gay com todas asletras e to tranqilamente. provvelque eu tenha inaugurado uma novarepresentao de gay assumido na
mdia: aquele cujo fator de exposi-o no est apenas na identidadesexual, mas, principalmente, emtudo mais que forja uma perso-na pblica: inteligncia, talento,
valores morais e tica. E eu sei
que muitos gays, mas muitosmesmo, estavam espera dis-so; por isso que eles me res-
peitam e admiram. Aos gaysque entendem de moda,falam da vida de celebri-dades e desmunhecam
em humorsticos, veiose somar a minha gu-ra. Mas, de um modogeral, a minha histriade vida - o garoto po-bre e nordestino quese tornou jornalista,
O jornalista, escritor e professor universitrio baiano Jean Wyllys um intelectual que cou conhecido nacionalmente aoparticipar do reality show Big Brother Brasil. Ele assumiu, sem hesitar, sua homossexualidade e por ter conquistado o respeitoe o carinho de milhes de espectadores do programa, Jean conquistou no apenas a vitria no jogo, mas alcanou diversasvitrias em favor do respeito aos homossexuais.
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Como voc v hoje o movimentopelos direitos dos homossexuais?
Engraado, eu vivo me perguntandoquais so os direitos dos homossexu-ais... Os homossexuais so um grupoheterogneo e at divergente. Eles noconstituem uma classe social, no senti-do marxista do termo. O que no quer
dizer que ser homossexual no incluaa percepo de se pertencer a um gru-po social determinado (estando claroque essa conscincia coletiva variasegundo o tempo e o espao). Logo, possvel falar de modos de vida gay ouhomossexual. Entretanto, h homosse-xuais organizados que vivem tentandodespertar a conscincia de classe entreos gays, mas sem muito sucesso. Nessecontexto, quais seriam os direitos dos
homossexuais que j no seriam direi-tos de qualquer cidado? Poder adotaruma criana com o parceiro ou deixaro patrimnio que construram juntospara um dos pares em caso de morte?Caso a resposta seja sim, quantos soos homossexuais que desejam se unir aoutro e construir uma famlia? Em minhaopinio, os homossexuais - organizadosou no - em se tratando de objetivospolticos, deveriam defender a liberdadede escolha sexual; o que no quer dizerliberdade de atos sexuais, pois, comobem lembrou Michel Foucault, h atossexuais, como o estupro, que no devemser permitidos. E essa liberdade de es-colha sexual deve incluir a liberdade deexpresso dessa escolha, ou seja, de tor-n-la pblica ou no. Ns, os gays, nodevemos nos comportar como desvia-dos que cobramos tolerncia legal paranossos desvios; antes, devemos des-montar ou desmascarar os esquemas
conceituais e de representao que nosconstroem como desviados, como, porexemplo, certas descobertas cient-cas, a indstria da pornograa e quasetoda teledramaturgia.
Em sua opinio, quais as pioresformas de violao e quais os prin-cipais direitos conquistados?
Assassinatos, tortura, leses corporais,estupros, extorses e humilhaes p-blicas so crimes dos quais os homos-sexuais so vtimas, mas j esto pre-vistos no Cdigo Penal porque qualquer
cidado heterossexual tambm podemser vtimas deles... Inadmissvel quejuzes variem a sentena dos algozes- quando estes vo a julgamento - se-gundo a orientao sexual de suas v-timas, ou seja, dem uma pena maisbranda a um assassino s porque suavtima era um homossexual e o ad-vogado ou defensor pblico desse as-sassino argumentou que a vtima erapromscua - logo, culpada de seu m
trgico - ou assediou o algoz. por issoque devemos lutar por uma liberdadede escolha sexual e por uma livre ex-presso pblica dessa escolha. Achoque as paradas do orgulho gay so umprimeiro e importante passo nessa di-reo. Poder realiz-las at mesmo emcidades como Feira de Santana umagrande conquista.
De que maneira a mdia se posicio-na diante de todas estas questes,
principalmente sobre a tortura?
A mdia heterognea em todas asacepes da palavra mdia. Ela acabasendo uma arena, um espao onde di-ferentes foras e interesses se opemou colaboram uns com os outros. Amdia so pessoas. E h pessoas commais fora e material blico que ou-tras (por exemplo, os donos das redesde tv e transmissoras tendem a impor
suas vises de mundo em produtosde artistas e jornalistas que para elestrabalham). possvel que, entre essaspessoas que fazem e so a mdia, exis-tam poucos homossexuais dispostos a
desenhar novas estratgias de combateou de fazer novas alianas em nome dobem-estar da coletividade e da co-exis-tncia da diversidade.
A riqueza de uma sociedade estna sua diversidade. Como vocavalia a sociedade brasileira naquesto da diversidade no que se
refere aos gays?
um pergunta difcil de responder, atporque os gays tambm so a socie-dade brasileira ou fazem parte dela...H gays em todos os setores da so-ciedade: somos muitos e estamos emtoda parte, inclusive fazendo os pro-gramas de TV a que toda a sociedadeassiste e os jornais que toda a socieda-de letrada l. Nesse sentido, a socie-
dade brasileira convive em harmoniacom os gays porque estes fazem partedela, muitas vezes reforando seuspreconceitos e sua estupidez. H doisanos, no dia da Parada de So Paulo,a coluna de Mnica Bergamo, na Fo-lha de So Paulo, trouxe umas quatrobichas ricas e celebradas pela intelli-gentsia paulistana falando mal doevento. Ora, possvel dizer que essasquatro bichas esto em perfeita har-monia com a mentalidade reacionria
e moralista de parte da (alta) socieda-de. Sou gay assumido publicamente eas pessoas me respeitam e me admi-ram; logo, estou em harmonia com asociedade. Mas ser que as famliase amigos dos travestis assassinadose humilhados diariamente por seumodo de vida podem dizer o mesmo?Ser que os gays agredidos em praiaspor lutadores de jiu-jitsu podem dizero mesmo? Ser que as bichasafetadas,
sobretudo as mais pobres, que soofendidas verbalmente em suas casase escolas e rejeitadas pelos postos detrabalho podem dizer o mesmo?Respondam-me, por favor.
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JUVENTUDEEM XEQUE E MATE!Por Netinho de Paula*
Muitos estudiosos, autoridades, fruns,
rgos governamentais e at no-gover-namentais, nos ltimos anos tratam dostemas juventude, tortura e violncia comosendo apenas crescentes ndices - meros da-dos estatsticos. Estes, fornecidos por rele-
vantes institutos de pesquisas.
Sendo assim, mais uma vez algum rgoou algum que no nosso, dizendo o queestamos fazendo e como estamos morren-do. Ento mais uma vez, muito obrigado,digo eu, em nome da periferia e digo, comautoridade, pois sou fruto dela. Acho que a
classe mdia est fazendo a parte dela: acu-sar e cobrar mudanas. Quanto a ns queno acreditamos nela, continuamos comnossos pagodes romnticos, nosso rap, fa-lando da polcia e para ajudar tem ainda ofunkcarioca dizendo: MOLECADA, RELAXEME GOZEM, APROVEITE ENQUANTO ESTOVIVOS!!! Estas manifestaes de periferiaprecisam ser consideradas como elementosimportantes em nossa sociedade.
... h mais ou menos 15 anos eu fazia partede um movimento que sonhava com a nossa
msica tendo espao na mdia para mostrar
o nosso outro lado. Mostrar nossas tias etios que do m duro honestamente e quepagam os carns em dia, alguns que at fa-culdade fazem, mesmo ganhando pouco.
Seria importante mostrar tambm as reli-gies que seguram a onda da comunidade,como os Centros de Umbanda que amenizamas dores e que do comida, para molecada...sempre tem uma Me Maria na comunidade.Temos ainda as vrias igrejas de inmerasdenominaes que interferem diretamentenos barracos fazendo da Bblia a melhor das
leis, limitando os desnimos e surtosque emnome de Deus so amenizados.
Pois, saibam senhores que nossa juventude teleguiada. Sem atitude, sem chance e
vive em xeque-mate, ou seja, encurraladae no tendo mais para onde correr. Aqui nose cria nada, s se recebe. Uma das poucasoportunidades que teramos de nos ma-nifestar, de nos organizarmos, de fazer a
verdadeira revoluo pacca na periferia, hoje atravs das malquistas rdios comu-nitrias que nos foram tiradas, e que ironia,em pleno governo de esquerda? Ou melhor
de direita? Quer dizer... sei l!
S sei que no podemos nos comunicara no ser por meio de veculos que j sode posse constituda por famlias tradicio-nais em cada canto do Pas. Televiso? Peloamor de Deus nem pensem nisso! J pensouuma televiso comunitria em cada perife-
ria do Brasil? Este bando de gente fazendo
seus programas, apresentando, criandosuas Xuxas, fazendo concurso de belezasem serem chamadas de miss favelas?Peloamor de Deus! Deixem-nos l descendoat o cho mexendo a bundinha, tocandocavaquinho... Ah! Eles devem pensar: ain-da bem que at as escolas de samba, queeram administradas por eles(da periferia),agora para preservar a cultura popular,so administradas por ns (a elite). Assim,
vai se mostrando tudo de ruim atravs depesquisas e de prmios para iniciativas quemostram alternativas, porm que causam
pouco impacto.
Escrevendo este texto, pensei na importn-cia de se ter atitude para uma juventude queno tem grandes lderes, que despreza a res-ponsabilidade de ser jovem. No apenas os
jovens de periferia, mas, tambm, aquelesque mesmo tendo uma educao diferen-ciada e oportunidades diferenciadas, devemprocurar pensar a quem esto servindo. Porexemplo, o lho do poltico ladro est ser-
vindo a quem? O lho do tracante-ladroest servindo a quem? Qual a responsabi-lidade de ambos?
Que reitam se puderem, ainda que pelaInternet. Comuniquem-se, troquem idias ese encontrem, no s para a balada, bailesou sei l o nome que tem agora, mas simpara a construir a grande mudana que sum movimento jovem pode causar. Tortura no pensar!
* Netinho de Paula (Jos de Paula Neto)
cantor, compositor, apresentador deTV, presidente de honra doINSTITUTO CASA DA GENTEe Presidente da
TV DA GENTE.
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Qualquer forma de tortura, fsica ou psicolgica,deve ser combatida. O Brasil precisa erradicar essaprtica de violncia, que submete pessoas a humi-lhaes e sofrimentos intensos. Nem mesmocrianas e adolescentes so poupados dessecrime. Meninas e meninos continuam sendovtimas de maus tratos em campos de tra-balho perigosos e penosos, onde so ex-plorados por gente que desrespeita suacondio especial de desenvolvimento,lhes negando oportunidades e alimen-tando o ciclo de pobreza no pas.
O Brasil aprovou o Estatuto da Crianae do Adolescente (ECA) em 1990, criouuma lei especca contra a tortura em1997, e tornou-se signatrio da Con-veno Internacional contra a Torturaem 2001. Apesar desses avanos nocampo do direito, os maus tratos aindafazem parte da rotina institucional demuitos abrigos e centros de internao.
So instrumentos disciplinares paracrianas e adolescentes. Uma situaoainda mais grave do que a explorao damo-de-obra infantil, pois signica dizerque os agressores so pessoas e entidadesque deveriam apoiar e proteger meninas emeninos em situao de risco. Trata-se, muitasvezes, do prprio Estado violando os direitos da in-fncia e da adolescncia.
Em 2008 comemoramos 18 anos do ECA e 60 anos
da Declarao Universal dos Direitos Humanos. preciso chamar ateno e enfrentar os efeitos da-nosos que a tortura provoca nas novas geraes,promovendo a violncia ao invs de convivnciaspaccas.
Tortura:nem mesmocrianas e adolescentes sopoupados desse crime.Daniela Mercury,personalidade consagrada por seustrabalhos na msica, tem tambm grande reconhecimentona rea de Direitos Humanos. Embaixadora do Unicef noBrasil, ela comenta sobre a tortura:
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MichelRay
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Ditadura,tortura e cinemaO cineasta Helvcio Ratton fala sobre seu ltimo longa-metragem, Batismo de Sangue,sobre a tortura que o lme mostra e sobre a tortura nos dias de hojeBaseado em fatos reais, o lme Batis-mo de Sangue (2007) conta a partici-pao de frades dominicanos na lutaclandestina contra a ditadura militar,
no nal dos anos 60. Movidos por ide-ais cristos, eles decidem apoiar a lutaarmada, e so presos e torturados. Umdeles, Frei Tito, mandado para o ex-lio na Frana, onde, atormentado pe-las imagens de seus carrascos, cometesuicdio. O roteiro uma adaptao dolivro de Frei Betto, vencedor do prmioJabuti. Veja o que o diretor HelvcioRatton fala sobre o lme e sobre otema tortura:
Por que escolheu esse tema e esse livropara seu lme?
Eu acho que o cinema brasileiro vemcumprindo um papel muito interes-sante de iluminar certos campos escu-ros de nossa histria. A melhor formade a gente entender nosso presente conhecendo nosso passado. A histriado Frei Tito uma histria ainda pou-co conhecida que eu acho interessante
que os jovens tomem conhecimento.
O tema ditadura recorrente hoje?
A questo do abuso e da tortura noBrasil muito antiga. Mesmo quandoela aconteceu na ditadura, ela con-tou com a experincia que j havia na
prtica de tortura dos presos comuns.Inclusive o delegado Fleury foi levadopara a represso poltica devido a famaque ele tinha de torturador na repres-
so ao crime comum. Na poca da di-tadura, os militares utilizaram muitoa tortura para conseguir informaesseguindo prticas que exrcitos comoo da Frana e do Vietn j aplicavam.Essa questo, quando chegou ao Bra-sil, somou com a experincia que havianas delegacias brasileiras. algo quej tinha h muito tempo e que perma-nece at hoje.
A tortura permanece nos dias de hoje.Existe diferena da prtica da tortura
na ditadura para os dias de hoje?
A ditadura se utilizou da experinciade torturar presos comuns na delega-cia e trouxe isso para os presos pol-ticos. Sempre houve no Brasil umapoltica de maltrato ao preso, como sevoc pudesse arrancar informao deuma pessoa a qualquer custo. A tor-tura se fundamenta no seguinte: ns
temos o direito de fazer mal a essapessoa na medida em que a informa-o que a gente vai arrancar dela vaifazer bem. Agora quem julga isso apessoa que est praticando a tortura.Na verdade no h nada que justiqueque voc possa se apropriar do corpode uma pessoa e infringir algum mal
a ela para extrair uma informao.No h nada que justique isso. Masessa pratica utilizada h tempos noBrasil e na poca da ditadura era pra-
ticada contra um pblico especco os inimigos (estudantes, militantes,polticos, intelectuais, etc.) - e hoje sooutros os torturados.
Voc acredita que Batismo de San-gue cumpre uma funo de sensibili-zao para combater a tortura?
Na medida em que o lme mostra atortura que aconteceu com aquelesjovens, sim. O lme mostra a histriade quatro padres dominicanos que sobrutalmente torturados sendo que umdeles, o Frei Tito, nunca mais conse-guiu se reequilibrar psicologicamentee se suicidou num convento na Fran-a. Na medida em que essa histria exposta com todo o realismo, toda averdade dela, acho que o lme em sipassa a ser um instrumento interes-sante de sensibilizao e conscientiza-o da pessoa a respeito dessa prtica
no Brasil.
O cinema tem a obrigao de ser umaferramenta de mobilizao social?
Cinema principalmente um entrete-nimento. Nasceu nas feiras e parques,com a funo principal de entreter.
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Com a passagem do tempo,quando o cinema foi alcanan-do uma linguagem capaz de al-canar as pessoas, emocionar as
pessoas, ele passou a ter, almda funo de entreter, a funode provocar, gerar discusso, re-exes. Acredito que ns, do Brasil,que fazemos cinema principalmentecom dinheiro pblico e vivemos numpas to desigual, temos que encararo cinema tambm com a funo deajudar a pensar e discutir questesda realidade brasileira.
O pblico priorizado para essas dis-cusses o pblico jovem?
Eu me preocupo muito em fazer umcinema aberto aos jovens. Fiz ques-to que o lme tivesse uma censu-ra baixa, a partir de 14 anos, assimcomo no lme Uma Onda no Artambm. Porque eu acho que a gentetem que cuidar muito das geraesfuturas, que vo estar daqui a poucogovernando o Pas, dirigindo as insti-
tuies. importante essa formaocidad, e o cinema pode compor umpapel muito legal nisso. O cinematraz a cultura junto com a educaoe nesse sentido temos, sim, o cinemacomo instrumento de formao.
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fotos:divulg
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As aes que violam os direitos hu-manos causam sofrimento a todos eno caso das vtimas serem crianas ouadolescentes, os seus efeitos vo almdo presente. Espancamentos, agresses
psicolgicas, abandono, abuso sexu-al so as formas mais comuns deviolncia domstica contra crian-
as e adolescentes e elas deixammarcas para toda a vida. Muitosadultos sofrem uma verdadeiratortura ao longo da vida motivada
por circunstncias de violnciana infncia. Uma Pesquisa
da OMS - OrganizaoMundial da Sade, inti-tulada Salud mentaly desarrollo psicos-social de la niez:lineamentos bsi-cos y propuesta deun plan de accininteragencial a ni-vel regional, cujosresultados foramdiscutidos em de-zembro de 1994,em Montevidu,Uruguai, compro-va, entre outrascoisas, que crian-as maltratadasantes de comple-
tarem o seu primei-ro ano de vida tm
signicativa tendn-
A mdica pediatra e sanitarista Zilda Arns fundadora e coordenadora
nacional da Pastoral da Criana. A ONG tem um reconhecido trabalho peladiminuio da mortalidade infantil no Brasil. Alm dos diversos prmiosque ela e a Pastoral j conquistaram, Zilda Arns foi indicada em 2006 parao Prmio Nobel da Paz. E sobre a paz que ela fala agora neste artigo:
cia violncia e at criminalidade.Outros estudos comprovam a necessi-dade da educao infantil, que comeaquando a criana ainda est na barrigada me, como fator que afeta o seu de-senvolvimento. Por isso, devemos tomaratitudes para que todas as formas deviolncia sejam evitadas.
Para reduzir a violncia nas famlias,nas comunidades e no pas precisa-mos de Polticas Pblicas que tenhamcomo eixo principal a reduo das de-sigualdades sociais e o respeito ao meioambiente. Devemos garantir, de formaprioritria, o acesso de todos sade, segurana alimentar e nutricional, educao de boa qualidade e humani-zada, que inclui a educao para a con-vivncia fraterna por meio dos esportes,msica, artes e valores culturais.
Nada d mais resultado do que come-armos a cuidar da criana desde a ges-tao at sua adolescncia, no contextofamiliar e comunitrio, priorizando seudesenvolvimento integral: fsico, social,mental, espiritual e cognitivo. neces-srio promover a justia social e a co-responsabilidade entre pases ricos e po-bres para que haja solidariedade entreeles.
Mas na famlia e na comunidade quea pessoa pode ser educada tanto para aviolncia quanto para a paz.
O Ser Pacficopor Zilda Arns Se quisermos construir a paz, temos que concentrar es-
foros na construo de uma sociedade justa e fraternaa servio da vida e da esperana
A torturaque existe
dentro decasa
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MarceloRudin
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Ministro Paulo Vanuchi, o que vem sen-do feito para ampliar o combate tor-
tura no mbito nacional?
Ns temos um plano de aes integra-das para a preveno e combate tortu-ra que estamos assinando gradualmen-te com todos os estados brasileiros. Esse
plano de aes integradas incorporabasicamente as recomendaes do sis-tema de direitos humanos das NaesUnidas e da OEA, sendo que o Brasil signatrio desde 1989 da convenocontra a tortura que existe nas NaesUnidas desde 84. Avanamos com araticao do protocolo facultativoque foi adotado em 2002. O protocoloestabeleceu basicamente: a criao deum subcomit nacional e o decreto dopresidente Lula do Dia 26 de junho, Dia
Nacional do Combate Tortura. E tam-bm estabelece um mecanismo muitoimportante para o combate torturaque o sistema permanente de visitassem aviso prvio aos possveis locais deprtica deste delito.
Existe uma certa tolerncia da socieda-
de para esse tipo de crime?
Na questo da tortura existe um sensocomum que de uma certa tolernciaem segmentos populares: olha, se noespancar, ele no confessa ou entose ele matou, ele tem de ser torturado
ou ele tem de ser executado sumaria-mente, que revelam o desconhecimen-to sobre os principais tijolos que for-mam a democracia de um Pas. A idiade que numa democracia todos somosescravos da lei, temos de seguir a lei, ochamado primado da lei do estado de-mocrtico de direito. Isso quer dizer oseguinte: os criminosos, eles tm de serpunidos, eles tm de ser perseguidos, secometerem homicdios, latrocnios, es-tupros, agresses violentas, tm de ser
presos. Agora, a priso no direito mo-derno e sobretudo no direito brasileiro,ela sempre entendida no como umlugar onde a pessoa estar submetidaa um sistema de castigos permanentes,mas sim, a pessoa ter oferecida umachance de reparao do dano, de reco-nhecimento de sua culpa e responsabi-lidade para uma reinsero social.
Ministro, a tortura atualmente um
dos crimes mais graves contra os direi-
tos humanos cometidos no Brasil?
Ainda persiste o mito que muitos tmde que a tortura um instrumento e-ciente de consso, de condenao. Opolicial muitas vezes argumenta se eu
no bater, se eu no torturar o crimino-so, ele no confessa e eu no consigodestruir o crime. Isso uma falsa com-preenso da lei e todos os currculos re-centes introduzidos nas polcias civis emilitares dos estados, na polcia federal,cada vez mais sob a tica dos direitoshumanos, desmentem esses mitos emostram primeiro que a consso no necessria, que h mecanismos deinvestigao cientcos, tecnolgicos,exames de balstica, institutos de crimi-
nalstica. A tortura se congura na maisgrave desconsiderao para os direitosinerentes pessoa humana. Porquesubmeter uma pessoa a choques el-tricos, espancamentos, afogamentos, oque seja, caracteriza em primeiro lugarum crime do ponto de vista da autorida-de policial que pratica isso.
Comocombater a
Tortura?
A Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidnciada Repblica vem realizando esforos junto a vrios outros
rgos federais, estaduais e municipais para combater a
tortura no Brasil. Esse esforo conta com o apoio de vrias
instituies da sociedade civil organizada e at da comu-
nidade internacional. Um esforo que, segundo o ministroPaulo de Tarso Vanuchi, secretrio especial de direitos
humanos, vem sendo ampliado cada vez mais.
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Jos Franciscoda Silva,ex-coordenador doFrum Nacional dosOuvidores de Polcia
A violncia praticada pelos agentes pblicos da rea de segurana s vai cessar ouchegar prximo a zero na medida em que o cidado exercer a sua cidadania, o seu di-reito e trazer s ouvidorias essa notcia, trazer essa denncia de tortura em especial
e tambm outro abusos cometidos. Ento essa populao, ela pode procurar e deve
procurar as ouvidorias que so responsveis juntamente com o ministrio pblicopara levar essas denncias e fundamental que ela participe e a ouvidoria a casado cidado. Ele pode vir a qualquer ouvidoria no Brasil porque essa sua casa para
fazer a sua defesa e fazer a sua relao com o estado.
Ceclia Coimbra,uma das fundadoras
do grupo TorturaNunca Mais
A denncia, o tornar pblico, fortalece as pessoas porque as pessoascomeam a perceber que o seu caso no um caso isolado, que h muitasoutras pessoas que passaram por violncias to grandes quanto aque-la pessoa passou, ento, no momento em que voc coletiviza isso, vocproduz vnculo e solidariedade, voc se sente no como um estranho, mascomo pertencendo a grupos que tambm passaram por isso.
AntonioFunare Filho,ouvidor de polcia doestado So Paulo (etambm vtima datortura na DitaduraMilitar)
Trata-se de um ato de agresso covarde. Uma violncia covarde em todos os seustermos porque ofende a dignidade humana tanto do torturado como do tortura-
dor. Grande parte (...) dos exames apenas o exame fsico e se constata um tipo deleso considerada leve, se esquece de que possvel torturar sem causar nenhumferimento fsico (...) Uma luta minha para que os integrantes, os peritos sejam
preparados especicamente para essa questo das denncias de tortura.
OlympioSotto Maior,
procurador geral dejustia do Estado
do Paran
A lei prev um caso especial de aumento de pena, de aumento de 1/6 at1/3, quando o crime cometido contra a criana e o adolescente. Entoquando o legislador, ao tratar do crime de tortura, prev uma pena agra-vada exatamente porque precisam elas, por se tratarem de pessoas empeculiar fase de desenvolvimento, de uma proteo especial.
Oespecialistafala
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RicardoBalestreri,Secretrio Nacionalde Segurana Pblica
Dentre todas as formas de desumanidade, talvez seja a tortura a mais emblem-tica da incivilidade. Degrada o corpo e a mente de quem torturado, destri a almado torturador e corrompe moralmente o estado. A vigilncia e o combate contra ela
so imperativos da democracia e do processo civilizatrio.
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Brasil: Nunca Mais
Esse , provavelmente, o mais conhecido relato sobre a tortura no Brasildurante a Ditadura Militar.Conta as torturas que ocorriam no Brasil napoca, atravs dos depoimentos das pessoas que sofreram essas tortu-ras. O livro somente pde ser publicado pela Arquidiocese de So Pauloquando chegou ao m a ditadura no Brasil, no ano de 1985. J teve 34edies.
Direito Memria e Verdade
Um livro que relata as informaes levantadas pela Comisso Especialsobre Mortos e Desaparecidos Polticos (1995) sobre violaes de DireitosHumanos ocorridas no ltimo ciclo ditatorial no Brasil. O material, pro-duzido pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, est disponvel paradownload em www.sedh.gov.br
Armazem Memria
Documentos sobre sobre a Tortura no apenas no perodo da Ditadura Mi-litar podem ser acessados no site Armazm Memria - www.armazemme-moria.com.br . O site rene em uma biblioteca virtual centenas de obras
no apenas sobre temas como Tortura, Luta pela Terra, Movimento Sindical,Direitos das Crianas e Educao Popular.
Direitos Humanos na Net
No site do Dhnet (www.dhnet.org.br) h uma srie de documentos e re-ferncias sobre questes relacionadas a direitos humanos. Artigos atuaissobre tortura podem ser encontrados nesse site, no atalho: www.dhnet.org.br/denuncir/tortura/textos/index.html .
Vale a pena conferir tambm os sites do grupo Tortura Nunca Mais:
www.torturanuncamais.org.br e www.torturanuncamais-rj.org.br
Algumas outras referncias sobre o assunto:
A Democracia em Pedaos: direitos humanos no Brasil.DIMENSTEIN,Gilberto e PINHEIRO, P. So Paulo, Companhia das Letras, 1996. Baro de Mesquita, 425 - a fbrica do medo.COSTA, Alcir Henrique da.So Paulo, Brasil Debates, 1981. Dossi Herzog: priso, tortura e morte no Brasil.JORDO, Fernando.So Paulo , Global, 1984. O que Cidadania? COVRE, M. So Paulo, Brasiliense, 1991. O que Tortura? MATTOSO, Glauco. So Paulo, Brasiliense, Coleo Pri-
meiros Passos, 1984. O que so Direitos da Pessoa.DALLARI, Dalmo de Abreu. So Paulo,Brasiliense, Coleo Primeiros Passos, 1982. O que so Direitos Humanos? DORNELLES, Joo Ricardo W. So Paulo,Brasiliense, Coleo Primeiros Passos, 1989.
Para
saber mais...Algumas referncias sobre Tortura
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