Fronteiras fluidas, religiosidades e os desafios contemporâneos Geórgia Pereira Lima Resumo: O foco deste artigo é apresentar a religiosidade na interamazônia latina, no contexto fronteiriço da tríplice fronteira: Brasil–Peru–Bolívia, especificamente, a fronteira entre Brasil e Bolívia, onde os elementos complexos de religiosidades permitem analisar, nos silêncios e silenciamentos advindo a colonização europeia, as recriações do universo social, cultural, religioso e plural, daquele espaço de fronteiras bi–nacional. Assim, a experiência de famílias brasileiras em território boliviano, a chamada comunidade “brasiviana”, particularmente, a partir das reflexões acerca da fé católica e protestante/evangélica. Na igreja, elementos culturais e religiosos em além–fronteiras, extrapola limites geopolíticos de países latino-amazônicos. De tal modo, a bíblia e harpas em espanhol, os cânticos como manifestação da fé, bem como, a devoção popular a “Virgem de Santa Rosa” e seus elementos de representações (CHARTIER, 1990) produzidos durante esse festejo popular, analisados através da interpretação das imagens como “mapa mentais” (KOZEL, 2007). Portanto, o universo religioso e das fronteiras fluidas apresentadas individual e socialmente permitem analisar que o continuo e descontinuo colonial fazem parte de sentidos de vidas através da fé, possibilitando uma (re)construções de fronteiras simbólicas e perceber os desafios e as complexidades do vivido nos contextos contemporâneos. Palavras chave: Brasivianos, Fronteira simbólica e Religiosidades. Professora e pesquisadora do Centro de Filosofia e Ciências Humanas – Área de História (UFAC). Mestre em História do Brasil pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, 2002. Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo – USP, 2014. Coordenadora do PIBID/UFAC e membro do Laboratório Interdisciplinar de Formação de Educadores (CAPES); Coordenadora do Curso de História Bacharelado, professora dos cursos de História graduação em Bacharelado e Licenciatura e do curso de pós-graduação em Ciências da Religião. [email protected]Revista Tempo Amazônico
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Fronteiras fluidas, religiosidades e os desafios contemporâneos
Geórgia Pereira Lima
Resumo: O foco deste artigo é apresentar a religiosidade na
interamazônia latina, no contexto fronteiriço da tríplice fronteira:
Brasil–Peru–Bolívia, especificamente, a fronteira entre Brasil e
Bolívia, onde os elementos complexos de religiosidades
permitem analisar, nos silêncios e silenciamentos advindo a
colonização europeia, as recriações do universo social, cultural,
religioso e plural, daquele espaço de fronteiras bi–nacional.
Assim, a experiência de famílias brasileiras em território
boliviano, a chamada comunidade “brasiviana”, particularmente,
a partir das reflexões acerca da fé católica e
protestante/evangélica. Na igreja, elementos culturais e
religiosos em além–fronteiras, extrapola limites geopolíticos de
países latino-amazônicos. De tal modo, a bíblia e harpas em
espanhol, os cânticos como manifestação da fé, bem como, a
devoção popular a “Virgem de Santa Rosa” e seus elementos de
representações (CHARTIER, 1990) produzidos durante esse
festejo popular, analisados através da interpretação das imagens
como “mapa mentais” (KOZEL, 2007). Portanto, o universo
religioso e das fronteiras fluidas apresentadas individual e
socialmente permitem analisar que o continuo e descontinuo
colonial fazem parte de sentidos de vidas através da fé,
possibilitando uma (re)construções de fronteiras simbólicas e
perceber os desafios e as complexidades do vivido nos contextos
contemporâneos.
Palavras chave: Brasivianos, Fronteira simbólica e
Religiosidades.
Professora e pesquisadora do Centro de Filosofia e Ciências Humanas – Área de História (UFAC). Mestre em
História do Brasil pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE, 2002. Doutora em História Social pela
Universidade de São Paulo – USP, 2014. Coordenadora do PIBID/UFAC e membro do Laboratório Interdisciplinar
de Formação de Educadores (CAPES); Coordenadora do Curso de História Bacharelado, professora dos cursos de
História graduação em Bacharelado e Licenciatura e do curso de pós-graduação em Ciências da Religião.
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Abstract: The focus of this article is to present religiosity in the
Latin interamazonia, in the border context of the triple border:
Brazil – Peru – Bolivia, specifically, the border between Brazil
and Bolivia, where the complex elements of religiosity allow to
analyze, in the silences and silences resulting from colonization
European, the recreations of the social, cultural, religious and
plural universe, of that bi-national frontier space. Thus, the
experience of Brazilian families in Bolivian territory, the so-
called “Brasivian” community, particularly, based on reflections
on the Catholic and Protestant / evangelical faith. In the church,
cultural and religious elements across borders, go beyond the
geopolitical limits of Latin Amazon countries. In such a way, the
bible and harps in Spanish, the songs as a manifestation of the
faith, as well as the popular devotion to the “Virgin of Santa
Rosa” and its elements of representations (CHARTIER, 1990)
produced during this popular celebration, analyzed through the
interpretation of images as a “mind map” (KOZEL, 2007).
Therefore, the religious universe and the fluid borders presented
individually and socially allow us to analyze that the continuous
and discontinuous colonial are part of the meanings of lives
through faith, enabling a (re) construction of symbolic borders
and perceiving the challenges and complexities of what we have
lived in. contemporary contexts.
Keywords: Brasivianos, Symbolic frontier and Religiosities.
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INTRODUÇÃO
A região acreana representa no arco norte das fronteiras brasileiras amazônicas um
significativo processo de exposição de uma tríplice fronteira Brasil–Bolívia e Peru que
representa um desafio contemporâneo a nível regional, nacional e internacional no contexto
latino americano seja como processo de integração para o desenvolvimento político–econômico
ou ainda nos aspectos socioculturais em razão da diversidade regional que envolve os espaços
interamericanos e amazônicos desses países. Expondo nesse contexto pensar as Amazônias e
seus múltiplos espaços. Se referindo ao espaço amazônico Almeida (2003, p. 71):
[..] além de ser produto das atividades humanas, tem múltiplas valorizações e
caracteriza-se por atributos funcionais, estruturais e afetivos. Esse espaço pode ser,
então, considerado como o lugar onde homens e mulheres, ideologicamente diferentes,
procuram impor suas representações, suas práticas e seus interesses. Cada espaço,
tornando se social, está possuído de símbolos e afetividades atribuídos pelas pessoas.
Nesses contextos, a religiosidade expõem um campo de análise acerca da
reorganização político social do pluralismo cultural, particularmente do território boliviano,
uma vez em que experiências envolvendo famílias brasileiras em seringais bolivianos
evidenciando a fé católica e protestante1. Entre outros mostrou que a igreja se constituiu em um
dos marcos, sobretudo, culturais e religiosos de além–fronteiras extrapolando os limites
geopolíticos de países latino-amazônicos.
Nesse sentido, o mundo religioso e das fronteiras simbólicas/fluidas apresentadas
pelas memórias constituídas individual e, ou, socialmente daqueles sujeitos que permitem
analisar as representações2 as perspectivas da interpretação de “falas” e “imagens” a partir dos
chamados “mapas mentais3”, entrevendo as temporalidades de conflitos, onde continuo e
descontinuo fazem parte de sentidos de vidas através da fé e permite entender como o
pluriculturalismo expõem a religiosidade boliviana.
1 Geórgia P. Lima, ao expor as experiência de famílias brasileiras em seringais bolivianos afirma que “A atividade
religiosa permite a recolocação continua dos processos de descontínuos da fronteira limite. [...]Desta forma, o
mundo religioso apresentado pelos “brasivianos” se compõe de histórias e linguagens do sujeito que ao narras
apresentam a diversidade dos sentidos de estar presente numa fronteira limite e, ao expor o protagonismo social
de vivências e relações, demonstra a dimensão simbólica que o espaço-lugar representa no viver entre-fronteiras
internacionais e amazônicas” In: “Brasivianos”: Culturas, Fronteiras e Identidades. Tese. Pós-graduação em
História Social da Universidade de São Paulo (USP), p. 110, 2014. 2 [...] a representação é instrumento de um conhecimento mediato (cic) que faz ver um objecto ausente através da
sua substituição por uma «imagem» capaz de o reconstituir em memória e de o figurar tal como ele é. (CHARTIER,
1990, p.20) 3 1 Interpretação quanto à forma de representação dos elementos na imagem; 2. Interpretação quanto à distribuição
dos elementos na imagem; 3. Interpretação quanto à especificidade dos ícones: a) Representação dos elementos
da paisagem natural, b) Representação dos elementos da paisagem construída, c) Representação dos elementos
móveis, d) Representação dos elementos humanos; 4. Apresentação de outros aspectos ou particularidades.
(KOZEL, p133)
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Portanto, ao pensar as fronteiras simbólicas das religiosidades que expõe os desafios
para entender e (re) interpretá-las em razão das complexidades do vivido e das perspectivas dos
sujeitos nos contextos contemporâneos da América Latina, particularmente, o estado boliviano.
FRONTEIRAS SIMBÓLICAS DE RELIGIOSIDADES LATINAS
A fronteira amazônica entre Brasil - Bolívia no contexto das experiências dos
brasivianos se evidencia os interstícios dos rios Abunã e Acre, se convertem em espaços de
representações contraditórias onde as fronteiras políticas entre os Estados Nacionais estão
consolidadas a partir de elementos culturais significativos que sinalizam a constituição de uma
fronteira simbólica4.
Nesse sentido, é importante destacar mudanças políticas a partir do final do século XX
e início do XXI com a republica boliviana sob as presidências de Victor Hugo Cárdenas, vice-
presidente de 1993 a 1997; Juan Evo Morales Ayma, 2006/2019 representantes dos chamados
pueblos originários. Contudo, vale ressaltar que a questão da representatividade política das
comunidades indígenas de todo pais, mostrando que haviam valores culturais divergências
internas entre o Altiplano e as “terras baixas”, expõem as chamadas “minorias étnicas”.
Esse aspecto é importante para expor as fronteiras simbólicas das religiosidades a
partir de um mosaico sociocultural acerca da diversidade étnica e pluricultural que se
constituíram em aspectos reconhecidos pela constituição boliviana indicando um país
multiétnico e pluricultural a partir de 2009.
Assim, como em território brasileiro, a Bolívia também apresenta diferentes grupos
étnicos indígenas que historicamente5 interagiram com os outros grupos étnicos europeus,
asiáticos e africanos. Esses grupos representam diferentes formas de pensar os valores sociais
e culturais, particularmente, religiosos e as religiosidades. Sob a perspectiva da secularização
da religião constituída pelo Estado para a Nação. Ao comparar as constituições bolivianas de
1967 e 2009, assevera RIBEIRO (2014. P. 113/14):
A questão religiosa na Constituição boliviana de 1967 era bastante problemática, sendo
que o Estado boliviano se declarava católico apostólico romano no artigo 3º. Em um
4 Estamos compreendendo fronteira simbólica como sendo espaços constituídos a partir da lógica de pensar a
experiência cultural dos sujeitos e nesse sentido é uma fronteira imprecisa e indefinida antagônica a constituição
do território de soberania nacional, por ser permeável, elástica, flexível, fluída, líquida, como pensa Zygmunt
BAUMAN, na obra Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001, p. 7. 5 Segundo Charupá, expondo o contexto histórico boliviano afirma que “La llegada de las tradiciones religiosas y
culturales españolas supuso un cambio radical en la concepción de vida de los antiguos pobladores del oriente
boliviano, tanto por la radical novedad de contenidos como por la imposición forzosa y la conquista sociopolítica
de los espacios indígenas (Tomichá Charupá, 2005, p. 05).
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país pluricultural, a religiosidade varia muito, e mesmo com a ampla catequização
imposta no período colonial pelos espanhóis, houve um processo de aculturação
enorme, com a adequação e adaptação de elementos litúrgicos. Assim, a pretensão de
um cristianismo uníssono é incoerente com a variedade de costumes religiosos, quanto
mais um catolicismo captado pelo Estado. Ao institucionalizar uma religião o Estado
exerce um constrangimento velado, pois põem à sua margem as demais religiões
professadas na sociedade, como se fossem ilegítimas ou menos legítimas. Assim, a
liberdade de culto concedida no artigo 3º da Constituição de 1967 era limitada. A
Constituição de 2009, por outro lado, declara em seu artigo 4º o Estado independente
de religião, o que amplia o campo de manifestação de outras religiões, sem o
constrangimento de estar desconforme com a religião oficial do Estado, fazendo com
que as diversas celebrações de cultos, credos e seitas, além de permitidas, sejam
também legítimas.
Nesse sentido, respeitadas as diversidades étnicas e pluriculturais das fronteiras
religiosas6 que expressão os grupos sociais, no caso da Bolívia os Aymará, os Quéchua e os
Guaranis e, ainda. um expressivo contingente de “minorias étnicas” entre outros: Chiquitano,
os Chiriguano e os Ayoreo para entender as interações religiosas nesse espaço, não como uma
simplificação representada pela superioridade do colonizador sobre o colonizado, mas perceber
a tênue fronteira simbólica entre o preconceito e (in)tolerância religiosa como enfrentamentos
num estado plurinacional7.
Assim, as culturas nativas da Bolívia podem ser agrupadas em três regiões geográficas
habitadas pelos respectivos povos nativos: a) habitantes localizados ao oeste, o altiplano e nas
montanhas da Cordilheira dos Andes; b) habitantes, leste e nordeste, na Amazônia boliviana e,
c) habitantes sudeste do país, na região seca do Chaco. Essa distribuição geoespacial de
localidades possibilita entrever aspectos contínuos e descontínuos do domínio colonial na
Amazônia latina.
O processo colonizador no campo das religiosidades impôs crenças e rituais do mundo
católico desconhecidas dos povos originários, em razão do processo de cristianização
realizadas pelos jesuítas tanto no Brasil quanto na Bolívia. Somado a esse cenário as imigrações
6 Roberto Balza expõem: “En efecto, la presencia de los jesuitas en lo que hoy es el departamento de Santa Cruz
– en Bolivia, representó para las diferentes parcialidades chiquitas y otros pueblos indígenas vecinos, la
oportunidad de sobrevivir al régimen colonial, que dominado por españoles y portugueses, condenaba el destino
de los indígenas del lugar al exterminio físico o a la esclavitud. Alarcón, (2008, p. 271) 7 Vívian Lara Cáceres Dan, ao refletir sobre o plurinacional do estado boliviano: “A constituição política da Bolívia
elaborada por uma assembleia constituinte foi aprovada por referendu em 2009, a qual teve a participação de
diferentes setores sociais e políticos desse país incluindo representantes de dezesseis nacionalidades indígenas, ou
seja, participação popular e indígena ampla. Houve ainda, o reconhecimento dos primeiros direitos políticos de
terras e territórios e sua livre-determinação de acordo com os preceitos internacionais dos direitos humanos. O
atual governo na Bolívia, tendo como objetivo a descolonização tem implantado uma série de reformas estruturais
a partir do próprio estado tendo como elemento central dessa nova política a definição da Bolívia como um estado
plurinacional. O preâmbulo da constituição enfatiza que esse novo estado seria uma unidade social de direito
plurinacional comunitário e intercultural para fazer avançar uma Bolívia democrática (Constituição política da
Bolívia, 2009, p. 3)” Civitas, Rev. Ciênc. Soc. vol.15 no.3 Porto Alegre jul./Sept. 2015.
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forçadas de grupos europeus, africanos e de asiáticos expõem diversos contextos e
temporalidades históricos dos contatos, as interações e as rupturas8 de religiosidades latinas.
A conjuntura geocultural boliviana do altiplano e das “terras baixas” constituem uma
história com significados colonial e decolonial9 destacando o Art. 4º da constituição boliviana
de 2009, em razão da visão ideológica e cultural dos representantes dos “Andes e que remetem
ao passado incaico, estruturados sob a forma de ayllus [...] legítimas comunidades indígenas na
Bolívia, [...] e outros grupos seriam categorizados como comunidades campesinas
agrupadas10”.
Considerando os aspectos históricos que envolvem a expressão religiosa boliviana,
afirma Tomichá Charupa (2005, p 05):
La llegada de las tradiciones religiosas y culturales españolas supuso un cambio radical
en la concepción de vida de los antiguos pobladores del oriente boliviano, tanto por la
radical novedad de contenidos como por la imposición forzosa y la conquista
sociopolítica de los espacios indígenas.
Considerar o art. 4º da Constituição boliviana: “O Estado respeita e garante a liberdade
de religião e de crenças espirituais, em concordância com sua visão de mundo. O Estado é
independente da religião”, isso reflete no mosaico que o censo de 2001 (Instituto Nacional de
Estatística da Bolívia) mostrou: a) 78% da população boliviana seguia o catolicismo romano;
b) 19% o protestantismo, c) 3% são representantes de diferentes crenças cristãs e, d) Cerca de
3% da população do país se identifica como agnóstico ou ateu.
Nesse sentido, é importante expor a diversidade sociocultural, principalmente da
Amazônia boliviana e atentar para a região de Pando-BO, uma vez que esta compõem o cenário
das fronteiras interamazônicas envolvendo Acre-Brasil e Cobija-Pando/BO. A Tabela 1 a
seguir, expõem a complexidade e impactos da colonização desse espaço e nos recoloca a
questão das religiosidades.
8 A exemplo do que afirma a antropóloga Stearman acerca de Camba y Colla: “Los bolivianos de las tierras bajas
rechazarán en lo posible cualquier influencia andina sustantiva en la formación de su cultura y tradición. La
filosofía separatista de los cambas comenzó y se cultivó durante los tempos coloniales y continúa hasta el día de
hoy“ (Stearman, 1987, p. 41). 9 Vívian Lara Cáceres Dan, ao refletir sobre o plurinacional do estado boliviano: “Partindo de um movimento
denominado “descolonização” e “neoconstitucionalismo latino-americano” [...] uma reflexão sobre os avanços,
limites e possibilidades do estado boliviano rumo ao estado plurinacional desde que foi implantado em 2009. [...]
perspectiva da descolonização e restituição de direitos indígenas. Civitas, Rev. Ciênc. Soc. vol.15 no.3 Porto
Alegre jul./Sept. 2015. 10 SILVA, Giovani José da. A Bolívia, a Chiquitania e as populações indígenas em um mosaico étnico e
cultural. Revista de Estudos e Pesquisas sobre as Américas, vol.6, No 2/ 2012
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Tabela 1: Amazônia boliviana: território e territorialidades culturais
Denominação População Principais
regiões habitada Língua Obs.
Afro-
bolivianos Cerca de 20 mil
Floresta tropical
de Yungas, ao
norte de La Paz
Espanh
ol ou
Aimará
Propriamente não são
considerados um povo
nativo, mas
descendentes de
escravos africanos que
perderam os vínculos
com suas tradições
africanas há séculos
Ayoreos
Inferior a 1.800
Região dos
Chiquitos no
Departamento de
Santa Cruz de la
Sierra
Língua
Ayoreo
-
Baures
Estima-se que
sua população,
na época das
missões
jesuíticas, era de
mais de 16 mil
indivíduos,
entretanto, sua
população atual é
inferior a mil
Proximidades do
Rio Iténez, -
Departamento de
Beni
Língua
Arauqu
e
-
Cavineños Cerca de 1.700
Departamentos de
Beni e de Pando,
nas proximidades
dos rios Madre de
Dios e Manuripi
Língua
Tacana
Agricultura de
subsistência, pecuária e
coleta
Chiquitos
Superior a 180
mil
3º maior povo
nativo.
Região de
chiquitos no
Departamento de
Santa Cruz
Língua
Chiquit
ana
Agrupados pelos
jesuítas em diversas
reduções que
atualmente tem sua
importância histórica
reconhecida pela
Unesco
Esse-ejjas Inferior a 500
Proximidades do
Rio Madre de
Dios, no
Departamento de
Pando
Língua
Tacana
Caça, pesca e coleta de
ovos de tartaruga, mel e
frutas
Machineris Menos de 200
Cidade de San
Miguel no
Departamento de
Pando
Língua
Arauqu
e
Nahuas Pequena Proximidades do
Rio Manuripi-
Língua
Nahua
Caça e coleta
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Departamento de
Pando
Pacahuaras Inferior a 30
Aldeias de
"Tujuré" e "Santa
Ana" nas
proximidades de
Riberalta, na
fronteira entre os
departamentos
de Beni e de
Pando.
Língua
Pano
Coleta de castanhas do
Pará [...] - Estima-se
foram numerosos, mas
resistiram ferozmente
às tentativas de
evangelização e sua
população foi dizimada
pelos espanhóis que os
escravizaram para
trabalhar em fazendas
produzindo borracha.
Yaminahuas Inferior a 150
Província de
Nicolás Suárez -
Departamento de
Pando
Língua
Pano
Caça, pesca e coleta
Fonte: Quadro constituída das informações https://pt.wikipedia.org/wiki/Povos_nativos_da_Bolivia
O quadro (1) Amazônia boliviana: território e territorialidades culturais criado a partir
das 30 comunidades indígenas da Amazônia boliviana aqui o destaque aos grupos Cavineños,
Esse-ejjas, Machineris, Nahuas, Pacahuaras, Yaminahuas que contextualizam a região pandina
sob a perspectiva da análise das fronteiras das religiosidades nas interamazonias.
Contudo, esse mesmo quadro possibilita entrever na Amazônia boliviana a presença
de diversos grupos indígenas e, somados a esses tem-se os descendentes africanos e europeus,
de acordo com o censo de 2001, entre os elementos culturais predominante no campo da
religião, a expressão cristã europeia, se apresenta como principais impactos da colonização
latina americana.
Nesse contexto, o departamento de Pando-Bolívia região limítrofe do Estado do Acre
é, também representante das comunidades campesinas agrupadas, traz à tona as implicações
sócio históricas do duplo cenário boliviano da diversidade cultural e social que refletiram nos
conflitos político-ideológicos entre o altiplano e a zona tropical boliviana (LIMA, 2014, p. 122)
internos e além-fronteiras amazônica. No mapa da Bolívia a seguir (Figura 1), é possível
localizar e identificar os espaços socioculturais:
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os cânticos o de nº 33 - “Grande gozo em minha alma”, demonstra que os sentidos bíblicos por
serem auto–explicativos extrapolam a leitura e a escrita para evidenciar a dimensão prática
modo particular como a religiosidade assume caráter integrador.
Assim, a presença da Igreja Evangélica Assembleia Deus silencia a experiência do
xamã da cultura indígena, enquanto induz ao indivíduo brasileiro o sentido de pertencimento à
comunidade boliviana de São Luiz. Índios e não índios, convertidos pelo ato do batismo
“aceitar Jesus” denota continuidades de padrões ideológicos do colonizador e implica na
condição de sujeito naquela sociedade.
Estamos diante de um campo estritamente religioso “sentir na presença de Deus”,
preservando uma continuidade de ações sociais já cristalizadas, tanto no Brasil quanto na
Bolívia que mesmo identificando o outro “indígena” é pensado pelo não índio como destituído
de caracteres de valores culturais, pronto para absorver os ensinamentos morais de “Jesus
Cristo”, através da igreja.
Porquanto, sob o influxo da fé Protestante/Evangélica nacionais brasileiros e
bolivianos índios e não índios, não se apresentam divergentes, mas, o conecta sem aflitíssimo
o enredo de saber se “estar na presença de Deus” se manifesta sob substratos culturais que
aceitos desde o processo de colonização não ignora o silencio cultural que continua
promovendo na sociedade contemporânea.
Antes de continuar é importante visibilizar as mudanças na orientação da Igreja
Católica a partir de 1960 uma vez que a próxima área fronteiriça Santa Rosa do Abunã se
constituirá na análise da expressão da fé católica nessa região de fronteira. Bem como, entender
as implicações da visão católica sobre diversos processos históricos da instituição convergiram,
principalmente a partir da década de 1970, desvinculando e vinculando aspectos políticos e,
entre esses, as questões envolvendo compreensões das comunidades indígenas e demandaram
aceitação das culturas e o modo de vida.
No Brasil, tem-se a criação do Conselho Indigenista Missionário (CIMI) em 1972,
articulou atitudes quanto ao trabalho com os indígenas, no que tange a cultural e a defesa da
terra. Nessa perspectiva, na Amazônia e em vários locais foram criadas organizações em defesa
aos povos indígenas, as chamadas Comissões Pró-Índio12.
12 CPI Acre, [...] Desde a fundação da Comissão Pró-Índio do Acre em 1979, os povos indígenas no Acre vêm
conquistando espaços nas cidades, no país e no mundo [...]No início de 1983, a CPI-Acre realizou, na cidade de
Rio Branco, o “I Curso de Formação de Monitores Indígenas”. Este primeiro curso contou com a participação de
25 representantes de 6 povos – Huni Kuĩ (Kaxinawá), Katukina, Manchineri, Apurinã, Yawanawá e Yaminawa
[...] Em fevereiro de 2014, a CPI-Acre completou 35 anos de existência” (http://cpiacre.org.br/conteudo/cpi-
acre/historia)
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A província del Abunã, com cerca de 4.049 de habitantes, distribuídos entre as Cidades
de Ingavi - 1.654 habitantes e Santa Rosa del Abuná - 2.395 habitantes (INE - Censo 2012).
Considerando, o quadro (1) nesse espaço há ausência de comunidades indígenas13. Nessa
região, a fé cristã será representada pela religiosidade católica e aplicamos a ideia “mapas
mentais” (KOZEL, 2007) na leitura interpretativa das imagens.
A província Santa Rosa do Abunã integra a paisagem de fronteiras, entre margens do
rio Abunã fronteira da região do rio Abunã com a cidade acreana de Plácido de Castro (Ac/BR),
antes, o acesso era através do rio, com a construção da ponte em madeira e na entrada da cidade
encontramos a guarnição (segurança) armada com a presença da Comando da Marinha
boliviana e, na sequência de cerca de 100metros, há um corredor de casas de comercio a partir
daí a configuração de um núcleo urbano.
Nesse sentido, a festa religiosa a Virgem de Santa Rosa é um procissão de dois dias
que acontece na cidade de Santa Rosa do Abunã (Pando-BO) se constitui entre as diversas
representações do cultos bolivianos a divindades, a exemplo, à Pachamama ou "Mãe Terra", a
adoração à Virgem de Copacabana, Virgem de Urkupiña e Virgem de Socavon, são notáveis
no território boliviano, somados a outras formas de devoções com a Santiago Maior que entre
as divindades cultuadas na Bolívia incluem Ekeko, o deus aimará da abundância e prosperidade,
cujo dia é comemorado todo 24 de janeiro, bem como, Tupã, o deus do povo guarani.
Descrevendo as territorialidades latinas, elucida Almeida (2009, p 127):
La organización de las fiestas religiosas es obra de los fieles laicos, quienes para tal
efecto se encuentran organizados en mayordomías, o bien en comissiones para los
distintos aspectos relacionados con los festejos: recaudación de dinero; alquiler de
templete y lonas; contratación de las bandas de música y equipo de sonido; otra para
los cuetes y castillos, etcétera. La jerarquía católica tiene ya muy poca participación en
la preparación de estas fiestas que, aunque nacieron con un propósito evangelizador, la
comunidad se las ha apropriado. (LANDÁZURI; LÓPEZ; SÁNCHEZ, 2006).
O significado aos festejos a Virgem de Santa Rosa (29 e 30 de agosto) reelabora a
ideia de devoção aos santos da igreja católica por sua especificidade envolvendo a trânsito da
fé entre os devotos, brasileiros e bolivianos, na romaria que expressou a imagem da “Virgem”,
antes, durante e depois da cerimônia religiosa. Desde a organização dos espaços do culto e da
procissão, bem como, do próprio cortejo e dos sentidos que expõem o ofertório aos mortos, as
bênçãos recebidas e o lugar do batismo como parte de expressões litúrgicas desse momento.
13 Brian, ao apresentar no relatório “Expedição Fawcwtt” faz uma descrição sobre os índios “selvagens” que
habitavam a região do rio Abunã. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira S/A, 1954, p. 58.
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O espaço urbanizado de Santa Rosa do Abunã (BO) se configura no entorno de uma
praça central (Foto 1) a partir da qual as instituições administrativas, comerciais e religiosas
são visibilizadas e interagem. Nessa praça acontecem as comemorações da comunidade e
representou a forma de marco divisor entre os festejos do profano e sagrado à Virgem de Santa
Rosa.
Foto 1: Praça central de Santa Rosa do Abunã (BO). Fonte:
http://www.conservacionamazonica.org.bo
A primeira representação de religiosidade é a edificação da capela da Virgem de Santa
Rosa, uma pequena construção na areal central do vilarejo. A localização está disposta numa
meia lua de formação de organização da ordem social do espaço em razão dos elementos que
adornam o acesso principal ao a administração pública centrada no poder executivo e setores
de atendimento público.
A localização da capela se torna um ícone para reconhecer as projeções da instituição:
a) a visão dos fieis quanto a importância da religião na comunidade de Santa Rosa; b) a
organização da festa religiosa pelos fies laicos; c) relações do corteja com a liturgia na
experiência social da comunidade. Esses três aspectos permitem entrever o processo de devoção
e os signos que advém do cortejo a Virgem de Santa Rosa.
O espaço físico da capela à “Virgem” na comunidade de Santa Rosa foi o primeiro
aspecto que nos chamou atenção, durante a participação nos dois dias do evento religioso, a
capela estava fechada e permaneceu até a noite do dia 29 de agosto. E nos diálogos
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estabelecidos com devotas, pessoas “católicas”, “ex-católicas”, de outra religião e, ainda,
aquelas que se declarou sem vínculo com as religiosidades presentes no lugarejo.
Foram possíveis de serem agrupadas como frases: a) temos a chave e abrimos quando
necessário; b) o padre vem nos festejos e faz a missa, batismo e, casamentos e cumpri todos os
rituais litúrgicos da fé católica; c) o cortejo da “Virgem de Santa Rosa” faz parte dos festejos
da cidade, uma espécie de folclore cultural; d) a capela não tem objetividade evangelizadora e,
só nesse cortejo ela revive a romagem de uma “Santa” e, e) a festa faz o lugarejo explodir em
festas por dois dias.
Isso implica pensar o antes e o depois da noite do dia 29 de agosto mostrou que a
relação social da capela e da devoção a “Virgem de Santa Rosa” expõem os elementos
significativos entre presença na comunidade e a saída da “virgem” da capela e sua aparição
social tem uma relação uma forma de permanência e as implicações da idolatria religiosa
Contudo, enquanto calendário festivo, manifesta socialmente como tríade
representação sendo concebido como um evento religioso - cívico - cultural. A explicação
possível está na sua forma de ocupação e formação sócio espacial da Santa Rosa do Abunã14 é
uma comunidade que essa manifestação cultural de origem local, mas, que se articula com
experiências sociais de devoção brasileira e boliviana. Assumiu em diferentes temporalidades
e dinâmicas social, do seringal e organização urbana uma forma de manifesta a fronteira
simbólica pelas interações sociais entre nacionais15 nessa parte da interamazônia latina.
Durante os preparativos para o festejo religiosa destacamos importância das mulheres
devotas da “Virgem” que organizam e constituem a essência da religiosidade católica naquela
comunidade. As redes estruturas pelo relações familiares, de compadrio e amizades mantem o
cortejo e a expressão da fé. São as devotas que cuidam do espaço e tem sobre sua posse a
“chave” da capela é, essa chave que representa a autoridade sobre os sujeitos que entram no
salão da capela.
Nesse sentido, a ideia acerca da descontinuidade da fé católica entre as pessoas do
lugarejo, ainda precisa ser entendida, uma vez em que a capela “fechada” representa domínio
do sagrado sob um profano se institui até o momento em que o cortejo da Virgem de Santa Rosa
o silencia até a meia noite do dia 29 de agosto. O profundo silencio e escuridão imposto no
14 Historicamente é um espaço fronteiriço compartilhado por nacionais brasileiros e bolivianos, tem no
extrativismo vegetal, borracha e castanha, sendo que constituído de seringais e colocações habitados por
trabalhadores brasileiros (Lima, 2014, p 223). Indicamos a leitura do nosso trabalho de pesquisa para elaboração
da tese: “Brasivianos”: Culturas, Fronteiras e Identidades, Universidade de São Paulo – USP, 2014. 15 Ibidem, p 98 a 167.
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princípio da noite desse dia é extraordinário. Este é rompido pelo cortejo em que a “Virgem”
se apresenta iluminando a sombra do profano humana pelas velas acesas nas mãos de homens
e mulheres: crianças, jovens, adultos, velhos e velhas que acompanham em cânticos e,
expressando em alguns rosto reflexivos por vezes envolto de choro ou de jubilo.
Consideradas as proporções que as machas de pés descalços ou não, impõem sob o
tempo do percurso da caminhada ao início da manifestação imagética do uso da indumentária
para celebrar a missa, constituindo a visão do sacerdote frente a comunidade cristã, os vasos
sagrados, o espaço constituído para esse fim, mostrando que a “virgem” estará entre os fieis
durante à passagem da escuridão da noite e o movimento litúrgico para realizações do culto.
Assim, a liturgia16 dos louvores aos mortos, o jubilo da vida em razão das bênçãos
recebidas e creditadas a Virgem de Santa Rosa, ao momento dos batismos de crianças de
nacionais brasileiros e bolivianos é, ainda, sem esquecer a eucaristia como parte da sequência
do velório que em seu conjunto representou uma viagem ao ritual da liturgia católica difundida
no Brasil e no restante da Bolívia católica se apresentando a mais rica experiência de ritos e
crenças próprias para pensar o sagrado e o profano.
O velório longe de representar encenações das peças teatrais das Igrejas Católicas
muito comum desde meados do século XVI na Europa e no Brasil, particularmente, a partir do
século XIX. O velório não trazia encenações de passagens bíblicas ou mesmo a temática do
ciclo da borracha circunstância do aparecimento fenomênico da “Virgem”. Entre os signos do
advento do catolicismo popular amazônico o velório correspondia ao momento da eucaristia da
igreja católica. O momento da Comunhão17 entre irmãos e irmãs que dividiam o “pão” o
alimento do corpo e suas experiências de devoção com a “Virgem” como alimento da alma.
Portanto, há ainda muitas nuanças a serem (re)interpretada acerca da religiosidade
interamazônica seja no campo da liturgia ou das simbologia das fronteira nacionais que
parafraseando Kozel, os elementos na imagem permitem a compreensão e formação ícones,
onde a representação dos elementos da paisagem natural ou da paisagem construída do lugar
dialogam com a “representação dos elementos móveis” e “humanos”. Permitindo entrever a
“apresentação de outros aspectos ou particularidades”. (KOZEL, 2007).
16 A liturgia da Igreja pressupõe, integra e santifica elementos da criação e da cultura humana, conferindo-lhes a
dignidade de sinais da graça, da nova criação em Cristo Jesus.” (CIC, n. 1149). 17 Como ser social, o homem precisa de sinais e de símbolos para se comunicar com os outros através de linguagem,
de gestos e de ações. O mesmo vale para o seu relacionamento com Deus.” (CIC, n. 1146)
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CONCLUSÃO
A título da conclusão desse artigo podemos afirmar inicialmente que os estudos
mostram os mosaicos de religiosidades e os desafios contemporâneos latinos. Nesse sentido,
iremos apresenta alguns pontos considerados importante para tecer algumas considerações as
que foram possíveis interpretações acerca do tema em análise.
Primeiro, os espaços físicos da interamazônia latina mesmo sendo uma fronteira e
parte do jogo que representam dois discursos nacionalistas se configuram também, em razão da
experiência social de homens e mulheres, no âmbito do vivido os dinâmicos conceitos de “zona
de contato”, de espaço “hibrido” e, “porosidade”, “trânsito” e ainda, de “alteridade”.
Mostrando que a religiosidade na interamazônia latina permite recolocar o continuo e
descontinuo processo de manifestação colonial em razão dos silêncios das crenças indígenas.
Mostrando que o espaço da igreja se torna o lugar onde o sujeito socializa os múltiplos percursos
e dinâmicas de vidas entrecortadas pela sua própria história, mas, recompõe a legitimidade do
lugar socialmente constituído.
Nessa compreensão as diversas histórias de homens e mulheres, indígenas e não
indígenas conduziria a uma possível cultura hibrida onde seus elementos seriam ressignificados
e não mais negados. Acerca dessa hibridização revela Bauman, (2007, p. 45/46):
[...] Numa avaliação final, a "hibridização" significa um movimento em direção a uma identidade
eternamente "indeterminada", de fato "indeterminável" [...] A ausência de um alvo pré-selecionado só pode ser
compensada por um excesso de marcadores culturais e um esforço contínuo de cercar todas as apostas e manter
abertas todas as opções.
Segundo, os espaços de igrejas e festas religiosas manifestam a religiosidade popular
nas cidades e lugarejos pandinos-BO e, tem-se a possibilidade de perceber como a alteridade
entre homens e mulheres nacionais, brasileiros e bolivianos, convertem de modo simbólico a
fronteira em espaço que ao mesmo tempo é geográfico é também, étnico racial, espiritual,
psicológico e dinâmico, tendo entre outros elementos à religiosidade como uma forma de
interação entre culturas.
Terceiro, o protagonismo social da dimensão do vivido podem servir para explicar sob
o universo de fronteiras simbólicas, como homens e mulheres organizam, negociam e trocam
elementos culturais e, ainda, permite identificar a fronteira entre o Estado do Acre–Brasil e o
Departamento de Pando–Bolívia, para além-limites territoriais geopolíticos para perceber nos
interstícios a porosidade e flexibilidade que permitem observar que esta fronteira também é
simbólica e fluida.
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Portanto, o mundo religioso exposto pelos “brasivianos” no interior do território
boliviano se compõe de histórias e linguagens de sujeitos, em seu conjunto apresenta uma
diversidade cultural, indígena e não-indígena. Constituindo sentidos de que, estar presente
numa fronteira limite em que ao mesmo tempo é, simbólica de um viver entre–fronteiras
interamericanas e amazônicas e sob, a perspectiva do desafio, sobretudo cultural e religioso,
que permita perceber os indícios de vidas além–fronteiras de continuidades e descontinuidades
geradores de respeito as identidades indígenas e não indígenas presentes.
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