ZECA CAMARGO: VIAJANTE GLOBAL NEVE QUENTE: VALLE NEVADO Itália BELA, ALEGRE, DELICIOSA, DERRAMADA... Ano 7 N 0 32 R$3,50
ZECA
CAMARGO:
VIAJANTE
GLOBAL
NEVE
QUENTE:
VALLE
NEVADO
ItáliaBELA, ALEGRE, DELICIOSA, DERRAMADA...
Ano 7 N0
32 R$3,50
82882 capa.p65 4/29/05, 10:51 AM2
Milene Leal
EDITORA E DIRETORA DE REDAÇÃO
REDAÇÃO Beatriz Guimarães, Cris Berger, Gustavo Mini Bittencourt,
Irene Marcondes, Paula Taitelbaum
REVISÃO Flávio Dotti Cesa
PROJETO GRÁFICO Odyr Bernardi
DIREÇÃO E EDIÇÃO DE ARTE Luciane Trindade [email protected]
ILUSTRAÇÕES Nik
FOTOGRAFIA Angela Farias, Cris Berger, Cristiano Sant’Anna, Daniel Martins,
Eduardo Iglesias, Letícia Remião
PRODUÇÃO DE ALIMENTOS Jorge Nascimento
COLUNISTAS Fernando Lokschin, Luís Augusto Fischer, Martha Medeiros,
Malu Coelho, Ruza Amon, Tetê Pacheco
EDITORA RESPONSÁVEL Milene Leal (7036/30/42 RS)
COLABORADORES Cook Store, Livraria Cultura, Mariangela Badalotti
Izabella Boaz
DIRETORA DE ATENDIMENTO
DEPTO. DE ATENÇÃO AO LEITOR Renata Xavier Soares
A revista Estilo Zaffari é uma publicação bimestral da Contexto Marketing Editorial Ltda., sob licença
da Companhia Zaffari Comércio e Indústria. Distribuição exclusiva nas lojas da rede Zaffari e Bour-
bon. Estilo Zaffari não publica matéria editorial paga e não é responsável por opiniões ou conceitos
emitidos em entrevistas, artigos e colunas assinadas. É vedada a reprodução total ou parcial do
conteúdo desta revista sem prévia autorização e sem citação da fonte.
TIRAGEM 25.000 exemplares
PRÉ-IMPRESSÃO Maredi
IMPRESSÃO Pallotti
ENDEREÇO DA REDAÇÃO
Rua Padre Chagas, 185/801– Porto Alegre/RS – Brasil – 90570-080
(51) 3395.2515 (51) 3395.2404 (51) 3395.1781
CAPA: POLENTA COM GORGONZOLA
FOTOGRAFADA POR LETÍCIA REMIÃO
82882 expediente.p65 4/28/05, 6:07 PM2
N O T A D O E D I T O R
Que delícia fazer esta edição da Estilo Zaffari! Quando resolvemos prestar uma homenagem aos 130
anos da imigração italiana no Rio Grande do Sul, não imaginávamos que trabalho maravilhoso teríamos
pela frente. Começamos por aquilo que é indiscutivelmente uma delícia: a culinária italiana. Escolher quais
receitas iríamos publicar e quais pratos seriam fotografados foi uma tarefa dificílima. Todo mundo tem um
prato predileto na gastronomia italiana. Ou vários... Não foi à toa que sofremos para fazer essa escolha.
Quando a gente começa a pensar (e salivar...), parece que tudo que os italianos fazem é absolutamente
saboroso e irresistível. Mas, enfim, chegamos a um consenso, procurando levar até nossos leitores um mix
de receitas que resume o talento culinário da colônia italiana. Depois disso, a fotógrafa Letícia Remião fez
jus ao seu sobrenome toscano e produziu imagens lindíssimas. Não deixe de conferir as fotos, as receitas
e, é claro, experimente esses sabores.
Se você é ou não descendente de italianos não importa: qualquer um se emociona com a matéria de
Paula Taitelbaum sobre as Mammas. Paula literalmente se meteu no dia-a-dia de três famílias, com o
objetivo de delinear o perfil dessas matriarcas italianas. Resultado: ela descobriu e publica aqui na Estilo
Zaffari a “Receita de Mamma”. Não perca.
Emoção também tem de sobra na reportagem de Irene Marcondes sobre as relíquias do passado
colonial italiano. Visitando três antiquários, Irene garimpou objetos e móveis que contam lindas histórias.
As antigüidades italianas – móveis simples e rústicos que hoje são usados como peças de decoração
altamente valorizadas – expõem um modo de vida e uma cultura que tiveram um papel importantíssimo na
construção da identidade do nosso Estado.
Já que o tema é Itália, os colunistas da Estilo Zaffari aderiram, entusiasmados. Martha Medeiros
confessou que ama a Itália, a qualquer hora, em qualquer lugar. Fernando Lokschin dissecou as origens
etimológicas e históricas da “pasta”. Luís Augusto Fischer diz por que a saga dos nossos “gringos” é um
verdadeiro romance. E Malu Coelho conta como surgiu o mito do nhoque da sorte.
Afora as saborosas italianices, esta edição da sua revista tem outras matérias supergostosas. Tem
um perfil do viajante, contador de histórias e global Zeca Camargo; tem uma reportagem sobre o templo
budista de Três Coroas, escrita por um publicitário que é também praticante dos ensinamentos de Buda; e
tem a já tradicional viagem da incansável Cris Berger: desta vez ela foi ao Valle Nevado e fez imagens
lindíssimas do lugar. Olhando essas fotos, você vai se encher de vontade de planejar férias aqui pelas
montanhas da América Latina. É um programa e tanto! A Estilo Zaffari recomenda!
Itália
deliciosaBela e
82882 nota do editor.p65 4/29/05, 11:34 AM2
Correio
6 Estilo Zaffari
ESTILO COM ESTILO
Acredito com certeza que toda a equipe des-
sa importante publicação tenha estilo apurado.
Acompanho a revista ao longo do tempo e obser-
vei, ao ler o exemplar de nº 31, que os “estilos” se
fundiram em um belo presente aos leitores apre-
ciadores de textos, fotos, com excelente resulta-
do final. É uma edição saborosa, light, perfuma-
da: a caminhada por Paris, os aromas dos tempe-
ros, as cores, bom gosto das casas, as delícias de
Punta, vida mais saudável, organicamente falan-
do. Enfim, gostaria de fazer um pedido: não per-
mitam que nada possa alterar o ESTILO desse
grupo ao produzir uma edição maravilhosa, nos
apresentando tudo com exclusividade aqui no eixo
meridional deste nosso paralelo 30. Sigam com
estilo. Abraços a toda a equipe editorial.
ARQUITETO WILLIAM PUPE
Diante dessas palavras, a equipe só pode
agradecer efusivamente a tantos elogios e
prometer que nunca abandonaremos nos-
so ESTILO! Um grande abraço!
VONTADE DE MORDER!
Oi, Milene.
Mais uma vez fico muito feliz em participar
da Estilo Zaffari. Os textos da Irene estão óti-
mos, e as fotos do Cláudio também. Participar ao
lado da Susi e da Anne contribuiu ainda mais
para a qualidade da matéria. Acho a revista sen-
sacional e fico na expectativa para ver os artigos
todo mês quando minha mulher chega com ela
em mãos. As receitas da edição nº 31 estão im-
batíveis. A matéria de Punta nem se fala, dá von-
tade de comer as páginas! Florianópolis! Paris!
A minha paixão. A cidade ideal para se viver!
Obrigado mais uma vez a ti e a toda tua equipe.
ZECA AMARAL – ARQUITETO
Zeca, pra nós também é sempre um prazer
ter o teu trabalho nas páginas da revista.
Ficamos felizes que tenhas gostado da maté-
ria, pois também achamos o resultado óti-
mo. Concordamos contigo sobre as fotos de
Punta: dá vontade de morder a revista! Um
grande abraço e obrigada pelo carinho. Es-
peramos contar sempre contigo como leitor,
além de te ter como uma das nossas fontes
preferidas para as matérias de decoração.
AINDA OS AZEITES
Adoro a revista Estilo Zaffari e compro sempre
que vou ao Bourbon. Porém, como moro no inte-
rior (Lajeado), não consigo adquirir todas as edi-
ções. Lendo a nº 30, nas cartas, observei que uma
leitora referia-se a uma edição anterior onde havia
uma reportagem sobre azeites. O assunto me inte-
ressa muito, especialmente a questão da degusta-
ção. Procuro experimentar azeites de diferentes ti-
pos, porém, sem método. Gostaria de conhecer o
conteúdo dessa reportagem ou, melhor, toda a re-
vista onde consta tal matéria. Como devo proce-
der para consegui-la? Aguardo retorno. Abraço.
RICARDO ANTONIAZZI
Olá! De fato, publicamos na edição 29 uma
linda matéria sobre degustação de azeites.
A redatora Rejane Wilke conta nesse texto
uma experiência de degustação que realizou
em Lisboa. Se a edição ainda estiver disponí-
vel em estoque, providenciaremos o envio para
seu endereço, ok? E boa leitura!
CRIANÇAS NA COZINHA
Lendo a revista Estilo Zaffari nº 28 deparei-
me com a excelente reportagem de Tetê Pache-
co, “Os Novos Gourmets”, que relata as curiosas
incursões de crianças na cozinha. Tomei também
conhecimento da existência do Clubinho do Es-
quilo, que leva a garotada às oficinas gastronô-
micas como uma formação ao mesmo tempo sé-
ria e lúdica. Sou cliente do Zaffari há muitos anos
(desde a inauguração do Ipirangão) e assídua lei-
tora e colecionadora dessa grande revista, bem
ao gosto gaúcho. Como professora aprecio a boa
leitura, e como consumidora opto sempre pela
qualidade e variedade existentes no Zaffari.
LISETE JOHNSON – PORTO ALEGRE
Que legal, Lisete. Este projeto do
Clubinho do Esquilo é realmente muito in-
teressante, uma iniciativa maravilhosa que
contribui de forma diferente para a forma-
ção da criançada. Continue nos prestigian-
do, tanto na revista como em nossas lo-
jas, ok?
82882 cartas.p65 29/04/05, 09:262
Í N D I C E
Cartas
Coluna: Cotidiano
Cesta Básica
O Sabor e o Saber
Viagem: Valle Nevado
Lugar: Templo Budista
Perfil: Zeca Camargo
6
10
11
34
58
72
84
38
Irene Marcondes visitou
três antiquários e
descobriu verdadeiros
tesouros em mobiliário e
objetos coloniais italianos
italianas
Relíquias
82882 indice.p65 4/29/05, 8:52 AM2
Italianosno
RSA saga dos imigrantes italianos
no Rio Grande do Sul, sua
história e sua herança cultural 20
PAULA TAITELBAUM
APRESENTA TRÊS
MAMMAS ITALIANAS
E SEUS SEGREDOS PARA
MANTER A FAMÍLIA
SEMPRE UNIDA 48
82882 indice.p65 29/04/05, 17:213
Cotidiano
Pra mim, a bota sempre está na moda
ITALIANADAS
Quando a Milene, diretora de redação aqui da revista,
me disse que esta edição traria um sapore di Italia, fiquei com
água na boca, e não apenas pela mentalização que fiz de
macarronadas bem calóricas, pizzas com queijo escorrendo pe-
las bordas e vinhos de embriagar a alma. Salivei, na verdade,
por tudo. A Itália é tudo.
Tem tanto lugar no mundo que não conheço – nada do
Oriente, pra começar – e, no entanto, quando pinta grana e
tempo para uma viagem, me vejo rondando a Itália ou definitiva-
mente enfiada nela. A moda agora não é bota? Para mim, sempre
foi. Por dentro das calças, por baixo das saias, dentro da mala e
carimbando o passaporte. Bota, sempre.
Moda, então. Poderíamos falar de Dolce e Gabbana,
Versace, Valentino, mas dispenso esta turma toda e fico só com o
que interessa: Giorgio Armani. Claro que estou falando metafo-
ricamente, porque de grifes internacionais meu armário não tem
visto nem a cor – tudo o que tive do Armani até hoje foi um
perfume, mas tudo bem, ele me inspira a ponto de eu me
“armanizar” com grifes nativas mesmo, fazer o quê. Armani tem
o dom de unir o chique ao simples, e ele próprio é o melhor retrato
disso: cabelo grisalho, olhos azuis, camiseta branca (ou preta) e
jeans. Nada pode ser mais digno. E atual. Atual hoje e daqui a 200
anos. Um homem pronto tanto para a balada quanto para o dolce
far niente. Acessório? Relógio de pulso e pele bronzeada os 12
meses do ano.
Avanti.
Conheci a Itália pelas mãos de Visconti, Marco Ferreri,
Bertolucci, Fellini, Ettore Scola. Eu matava aula na faculdade
para assistir a Esposamante, A Comilança, Sacco e Vanzzetti,
Feios, Sujos e Malvados. Ainda hoje gosto de filmes italianos,
e também de filmecos americanos que me remetem à Itália,
como aquele com Robert Downey Jr. e Marisa Tomei que se
passa em boa parte do tempo em Positano!!! E quando vi Sob o
Sol da Toscana, desejei acordar no dia seguinte sendo o perso-
nagem de Diane Lane: uma escritora que compra e reforma
uma vila italiana no meio do nada mas cercada de afeto, de
cenários bucólicos, de vinhedos e de homens lindos. Eu falei
homens lindos? Vou ter que pular esta parte, pois tenho que
concluir a crônica nesta única página – se entrar no assunto
“homens lindos”, precisarei de no mínimo umas 12.
A Itália nos deu Veneza, a cidade mais inusitada e espeta-
cular do mundo. Marcello Mastroianni e Sophia Loren. O pôr-do-
sol em Florença. A falta de pontaria do Roberto Baggio. A cor do
mar em Capri. A lambreta. A Ferrari. A via Condotti. A Sicilia.
Michelangelo. Leonardo da Vinci. Dino Buzzati. Italo Calvino.
Roberto Begnini. Pavarotti. Eros Ramazzoti. Escuse, acho que es-
tou começando a apelar.
Itália e seu trânsito esquizofrênico, sua gente franca e
gritona, suas ruas estreitas e igrejas enormes, e pessoas que se
chamam Paola, Francesco, Giuseppe, Itália – sim, no livro Não se
Mexa, de Margarete Mazzantini (que já virou filme), há uma
personagem caótica chamada... Itália.
A Itália dos papas e da nossa gente aqui da serra. Que
grande país. Que alegria que provoca. Um lugar que, mesmo
longe, a gente sente muito perto, tão perto que... Dá licença, vou
dar um pulinho em Milão e já volto.
M A R T H A M E D E I R O S
MARTHA MEDEIROS É ESCRITORA
10 Estilo Zaffari
82882 cotidiano.p65 4/29/05, 11:09 AM12
Cesta básica
Os pratos vão passando diante dos seus olhos e tudo oque você precisa fazer é esticar o braço para o seusushi preferido. O Kaiten, como é chamada essaesteira giratória no Japão, surgiu muito mais pornecessidade do que por maneirismo. Os japonesestinham pouco tempo para suas refeições, mas nãoqueriam abrir mão de comer bem. Aqui em PortoAlegre, a novidade chegou através do Sakura, que emjaneiro inaugurou seu segundo restaurante na capital,no Bourbon Shopping Country. Os pratos têm bordasde diferentes cores para sinalizar o preço do que vocêescolhe. Niguiris, makis e outras maravilhas daculinária japonesa no melhor estilo self service.Muita gente anda fazendo uma boquinha antes docinema e voltando depois do filme para comer mais.
DANIEL MARTINS, PUBLICITÁRIO
NESTA SEÇÃO VOCÊ ENCONTRA
DICAS E SUGESTÕES PARA CURTIR
O DIA-A-DIA E SE DIVERTIR DE
VERDADE: MÚSICA, CINEMA, LUGARES,
OBJETOS ESPECIAIS, COMIDINHAS,
PASSEIOS, COMPRAS. BOM PROVEITO!
Sakura Kaiten
FOTOS: CRISTIANO SANT’ANNA
Estilo Zaffari 11
82882 cestabasica2.p65 4/29/05, 6:07 PM1
Cesta básica
A pizza é deliciosa, o ambiente aconchegante, de bomgosto, e o atendimento é atencioso, supercorreto.Precisa de mais alguma coisa? A Villa Rústicainaugurou em janeiro e já conquistou clientela assíduaem Porto Alegre. Não é pra menos. Raros são osrestaurantes que conseguem se sair tão bem neste“tripé”. Feita artesanalmente e assada em forno a lenha,a pizza da Villa Rústica pode vir com sabores diferentese criativos, além dos tradicionais já consagrados.A variedade é imensa, você se diverte pedindo umanovidade cada vez que vai lá. A massa é fina e crocante,como convém. E pode ter bordas recheadas, coisa que ospuristas odeiam e os junkie-food lovers, como eu,não conseguem dispensar... Experimente: Fabrício Pillar, 27– Moinhos de Vento.
MILENE LEAL, JORNALISTA
VILLA RÚSTICA
A ESTILO ZAFFARI 32 ESTÁ APRESENTANDO O VALLE NEVA-
DO, COM FOTOS E REPORTAGEM DE CRIS BERGER. A REVIS-
TA E A TEMPORADA DE ESQUI 2005 DA OPERADORA POINT
DA NEVE/S7 VIAGENS TERÃO LANÇAMENTO ESPECIAL NO DIA
12 DE MAIO, ÀS 20H30MIN, NA DADO BIER, QUANDO TAM-
BÉM INAUGURA A EXPOSIÇÃO COM OS MELHORES CLIQUES
DA MATÉRIA. DEPOIS, AS IMAGENS PODERÃO SER VISTAS
NA MOSTRA FOTOGRÁFICA “UM VALLE NEVADO”, QUE PER-
MANECE DE 13 A 23 DE MAIO NO SEGUNDO ANDAR DO
BOURBON COUNTRY, EM FRENTE À LIVRARIA CULTURA.
LANÇAMENTO TRIPLO
FOTOS: CRISTIANO SANT’ANNA
82882 cestabasica1.p65 29/04/05, 16:222
É fácil se apaixonar pela Itália. Um país verdadeiramen-te fascinante. Berço da civilização, conhecida por suahistória e cultura milenares, a Itália até hoje guarda amaior coleção de arte do mundo, e 60% do patrimôniocultural da humanidade está lá. Para os italianos, apaixão está em todo lugar, principalmente quando oassunto é gastronomia. A diversidade, qualidade e aconsciência da tradição italiana nos trazem à mesaiguarias que aguçam todos os sentidos. Mas tudo isso sótem valor quando reconhecemos a atitude típica dositalianos perante a comida e a bebida. O livro “Culiná-ria Itália”, com suas imponentes 496 páginas e mais de1.200 fotografias, apresenta não somente receitas evinhos, mas também a paisagem e a história deste povoque nos é tão familiar. Saiba no livro como aparecem osbolores azuis do queijo gorgonzola. Por que o Prosecco étão apreciado, quais pratos eram servidos na Romaantiga. Do café aos queijos, das ervas aromáticas aotradicional panettone, do carnaval veneziano à hospita-lidade na Toscana. Está tudo ali. O maior e maiscompleto registro da arte da cozinha e da arte de viverbem. Buon appetito! (Culinária Itália, 496 páginas,Editora Konemann). Mais literatura sobre o tema:Mais literatura sobre o tema:Mais literatura sobre o tema:Mais literatura sobre o tema:Mais literatura sobre o tema:La Cucina, 598 páginas, Editora Cia. das Letras;La Cucina, 598 páginas, Editora Cia. das Letras;La Cucina, 598 páginas, Editora Cia. das Letras;La Cucina, 598 páginas, Editora Cia. das Letras;La Cucina, 598 páginas, Editora Cia. das Letras;Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica, 698Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica, 698Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica, 698Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica, 698Fundamentos da Cozinha Italiana Clássica, 698páginas, Editora Martins Fontes.páginas, Editora Martins Fontes.páginas, Editora Martins Fontes.páginas, Editora Martins Fontes.páginas, Editora Martins Fontes.
EDUARDO BORGES, ESPECIALISTA EM GASTRONOMIA
Livros italianos
Já que místico é o que está além do real – envolto em mistérioe espiritualidade –, eu ousaria dizer que a trilha do baléO Grande Circo Místico é para você escutar não apenas como ouvido, mas também com a alma. As músicas são umaparceria de Chico Buarque e Edu Lobo e foram criadas noinício dos anos 80 para o Ballet Guaíra, a partir do poemahomônimo de Jorge de Lima. A trilha completa foi editadana época, mas o disco não chegou a ser lançadocomercialmente. Talvez por isso, o CD O Grande CircoMístico, relançado pela Dubas, tenha chegado como umcoelho tirado da cartola: feito surpresa. Em versão completa,traz clássicos como “Beatriz”, na voz de Milton Nascimento,“Sobre Todas as Coisas”, por Gilberto Gil, e “A Bela e aFera”, com Tim Maia, além da versão original de “Cirandada Bailarina”, com um coro que inclui todas as filhas do Chicoquando elas ainda eram crianças. Ao escutar, você vaidescobrir que circo é mais do que alegria. É pura alegoria.
PAULA TAITELBAUM, ESCRITORA
Hoje tem Circo Místico?
Tem, sim, senhor!
82882 cestabasica1.p65 29/04/05, 10:333
Cesta básica
Gel New Wave no cabelo e muita purpurina. Carteiraemborrachada com velcro. Os Goonies na Sessão daTarde. MacGyver consertando um radiador com clara deovo. Lembrar de tudo isso dá uma vontade danada devoltar no tempo e àquela época gostosa em que éramosrealmente felizes e não nos dávamos conta. Esse tipo denostalgia é o que deve ter servido de estímulo aosjornalistas Mariana Claudino e Luiz André Alzer. Elescriaram o “Almanaque dos Anos 80”, um livro divididoem oito capítulos, sobre temas como televisão, música,cinema e os modismos que transformaram a década emum clássico. O almanaque demonstra a profundidade deseu mergulho no tempo ao revelar detalhes até entãoconsiderados verdadeiros tabus, como a quantidadeexata de chicletinhos que vinha naquele saquinho rosae vermelho dos Minichicletes Adams. É uma viagem notempo capaz de sensibilizar toda uma geração! Os maisnovos, que infelizmente não viveram os anos 80, podemmatar sua curiosidade sobre a década que hoje écultuada com louvor. Também merece destaque otrabalho do designer gráfico Marcelo Martinez, respon-sável por dar ao almanaque um visual que remete àestética dos anos 80. Pode ser que eu nunca mais volte aser criança. Mas com o Almanaque dos Anos 80 dá pramatar a saudade.
RAFAEL TRINDADE, JORNALISTA
PRA VIAJAR NO TEMPO É
PRECISO UM ALMANAQUE
Se você, assim como eu, é uma daquelas pessoas quetêm medo de cozinha, prepare-se para perdercompletamente a fobia. Carla Civile, idealizadora doCírculo de Babete, é apaixonada por culinária. Desdecriança, rodeada de panelas, ela ajudava suas nonas napreparação das pastas e dos doces típicos italianos.Aprimorou seu prazer pela gastronomia quando morouna França. Um dos objetivos de Carla é justamente tirarda cabeça das pessoas a idéia do “eu não sei cozinhar” e,mais ainda, divulgar sabores e paladares de diferentespartes do mundo para o maior número de“simpatizantes”. O Círculo promove cursos mensais quesão uma verdadeira Festa de Babete. Os participantesaprendem com Carla a preparar um menu completo e,depois de tudo pronto, sentam juntos para saborear ospratos. Então, prepare seu avental e reserve um espaçopra você no próximo evento. Vai ser uma grandediversão! Os cursos acontecem na Confraria Blue Ville,Av. Cristóvão Colombo, 3309. Fone: 3326-7000.
LUCIANE TRINDADE, DESIGNER GRÁFICA
CÍRCULO DE BABETE
14 Estilo Zaffari
FO
TO
S: C
RIS
TIA
NO
S
AN
T’A
NN
A
82882 cestabasica1.p65 29/04/05, 10:334
Consumo
A existência masculina parece estar condenada à performance
SOBRE HOMENS E SACOLAS
Tenho amigas que até hoje acreditam que os ma-
ridos ou os namorados não são tão legais quanto de-
veriam porque não saem com elas pra fazer compras.
Confesso que eu mesma, embora prefira um milhão de
vezes a companhia feminina para esses fins, já me pe-
guei chateada com a falta de paciência e vontade mas-
culina para o maravilhoso mundo das sacolas.
Outro dia vi um documentário da BBC onde um
homem era colocado na seguinte situação: numa rua
lotadíssima, com um medidor de batimentos cardía-
cos colado ao corpo e carregando um carrinho de bebê,
o cara recebia a tarefa de, em alguns minutos, com-
prar um caminhãozinho de brinquedo para a criança
e uma camiseta branca para ele.
A tarefa que qualquer uma de nós executaria rin-
do quase infartou o pobre coitado. Foi impressionan-
te acompanhar o nervosismo dele diante do que cos-
tumamos fazer para dar uma relaxadinha.
O que nos coloca em mundos tão opostos é a
velha questão da performance.
Segundo esse documentário, os nossos queridos
do sexo oposto vivem num desafio interno perma-
nente. A simples idéia de “ter” que ir às compras libe-
ra neles uma adrenalina semelhante à de uma caçada,
de uma perseguição.
Imagine-se no meio de uma selva sabendo que a
qualquer momento vai pintar um tigre de 300 quilos para
você matar antes que ele mate você. É o que eles sentem
ao sair pra comprar a tal camiseta branca sob encomenda.
Não conseguir “executar a tarefa” os transforma em der-
rotados, e para os derrotados não há perdão, ou qualquer
outra conclusão dramática assim.
A existência masculina parece estar mesmo con-
denada à performance.
Mas veja pelo lado bom: não é que ele não te ama
porque prefere qualquer outra coisa a sair com você
para ir ao shopping.
Lembre-se disso antes de pedir que ele vá ao súper
com aquela listinha.
T E T Ê P A C H E C O
TETÊ PACHECO É PUBLICITÁRIA
18 Estilo Zaffari
82882 consumo.p65 4/28/05, 10:57 AM1
Sabor
82882 culinaria italianos.p65 29/04/05, 16:262
P O R B E A T R I Z G U I M A R Ã E S
F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O
I L U S T R A Ç Õ E S N I K
RS
Italianosno
AO COMEMORAR OS 130 ANOS DE IMIGRAÇÃO ITALIANA NO RS, PER-
CEBEMOS QUE AQUELA GENTE SIMPLES QUE VEIO DE TÃO LONGE
PRODUZIU UMA GRANDE REVOLUÇÃO POR AQUI. JUNTO COM SUA
VONTADE DE TRABALHAR E DE VENCER, OS IMIGRANTES ITALIANOS
ACABARAM INTRODUZINDO UM MODELO DE DESENVOLVIMENTO
CENTRADO NA FAMÍLIA E NA PEQUENA PROPRIEDADE. ELES INSTA-
LARAM EM TERRAS GAÚCHAS, COM GRANDE SUCESSO, UMA SOCIE-
DADE DE HOMENS LIVRES, PRODUZINDO MUITAS RIQUEZAS, ORGA-
NIZANDO AS COMUNIDADES EM TERMOS IGUALITÁRIOS, COM BASE
NO TRABALHO COOPERATIVO. UM EXEMPLO PARA TODO O PAÍS.
Estilo Zaffari 21
82882 culinaria italianos.p65 29/04/05, 16:263
Sabor
TRABALHO,
RELIGIÃO, FAMÍLIA E
ALEGRIA DE VIVER:
OS ÍCONES DA
COLÔNIA ITALIANA
Quando os colonos chegaram ao Brasil, encontraram
um país de escravos, com a economia baseada na
monocultura – o café no Sudeste e as charqueadas e a pecu-
ária no Sul –, um modelo perverso e ineficiente. Os imi-
grantes mostraram, então, que era possível plantar, colher,
gerar riquezas, promover a educação e ter uma vida digna.
Hoje, 130 anos depois da chegada dos primeiros
colonos ao Estado, fica evidente o acerto desse modelo.
Nenhuma região do Estado tem se desenvolvido tão ple-
namente quanto esta.
Atualmente, a zona italiana da Serra gaúcha en-
volve mais de 50 municípios e possui, ao todo, mais de 1
milhão de habitantes, tornando-se o pólo econômico,
cultural e turístico de maior expressão no sul do Brasil.
Além das vinícolas de qualidade, também há a pro-
dução de móveis – e uma das maiores fábricas de equipa-
mentos de cozinha do país –, calçados, vestuário, fábri-
cas de tratores e equipamentos agrícolas, carrocerias de
ônibus, caminhões, cutelaria, além da tradicional indús-
tria alimentícia.
O Vale do Rio das Antas
Foi ao longo do Rio das Antas que surgiram as pri-
meiras comunidades de colonos italianos. O rio, que
chega a percorrer quase 400 km com este nome, e que
forma um dos mais belos vales do Rio Grande do Sul, foi
o berço de uma comunidade nova e empreendedora.
Vindos de uma Itália dilacerada pela miséria causa-
da pela modernização capitalista que atingiu diretamente
a estrutura agrária tradicional, os imigrantes tinham
muito pouco a perder. A grande maioria dos italianos
que vieram para o RS – quase 90 % – eram originários do
Vêneto e da Lombardia, daí a presença de uma certa
unidade cultural e religiosa, tão importantes para a for-
mação de uma comunidade sólida como esta.
Há inúmeros relatos sobre as dificuldades que os imi-
grantes tiveram ao sair do seu país. Geralmente eram casais
jovens que deixavam os pais, a família, enfrentavam uma
longa viagem, durante meses, passando por privações, do-
enças, mortes de parentes, rumo a uma terra estranha e, no
seu imaginário, cheia de mistérios. Talvez até selvagem.
Muitos deles, quando chegaram aqui, querendo ir
logo para os seus lotes, acomodavam-se embaixo de ár-
vores, ou de alguma gruta, até que pudessem derrubar a
mata e construir suas casas. Ficavam ali isolados, com
medo do ataque de animais, dos índios, dos bichos
peçonhentos e das doenças.
82882 culinaria italianos.p65 29/04/05, 16:274
Para quem se interessar, há o romance Nanetto Pipetta,
de Aquiles Bernardi, que relata as aventuras e desventuras
de um colono no RS, narradas com muita imaginação e
humor, para o divertimento da comunidade italiana.
Vinho, elixir da alegria
As primeiras culturas foram as de milho e abóbora,
para garantir o alimento das famílias e da criação, além
da uva, para assegurar o elixir da vida e da alegria que é o
vinho. Mas até que pudessem fazer a colheita, os pinhões
serviram de base para a alimentação de muitos.
Como a polenta é um prato típico da região do norte
da Itália, os colonos mantiveram essa tradição. Sempre
presente, ela era servida de muitas maneiras: grelhada
com salame, com queijo, com radici e toucinho, com
molho de galinha. Consumida até no café da manhã, era
feita em grande quantidade nos caldeirões de ferro, onde
se devia mexer até borbulhar, para atingir uma consis-
tência bem firme.
Apreciadores da caça, os colonos costumavam cap-
turar passarinhos e aves como pombos, sabiás, tico-tico
e, dizem, até papagaios. A passarinhada e as aves eram
preparadas geralmente com toucinho e sálvia e acompa-
nhadas de polenta.
O risoto também era muito comum nas refeições e
era feito quase sempre com os miúdos da galinha, e ser-
vido como acompanhamento para outros pratos.
A religiosidade e as festas
Diferentemente dos alemães, que construíram seus
núcleos a partir da escola, os italianos buscaram a unidade
pela religião, e é a partir das capelinhas que muitas comuni-
dades surgiram e iniciaram o seu convívio social.
Segundo Rovílio Costa e De Boni*, em algumas
construções, para umedecer o barro ao erguer capelas e
igrejas, foi usado o vinho, em vez de água. Este foi o caso
da capela Nossa Senhora das Dores, no interior de Ben-
to Gonçalves, e de muitas outras construções.
Portanto, as festas estavam muito ligadas à Igreja,
com festejos dos santos padroeiros, chamadas de “sagras”,
além dos casamentos, batizados, festas da vindima, etc.
Geralmente, depois da missa, os almoços eram prepara-
dos e compartilhados por todos, com muita fartura, com
sopa de capeletti, galeto, polenta, massas e muito vinho
e canções, ao som das sanfonas, para alegrar a vida dessa
gente que trabalhava duro desde cedo.
Enquanto as mulheres bordavam e conversavam, os
homens jogavam bocha, ou a mora, que consistia em fazer
um cálculo rápido da soma dos dedos dos participantes co-
locados sobre a mesa, além dos jogos de cartas, como o
quatrilho, a escova, bisca – e tantas outras brincadeiras.
O basalto e a poesia das pedras
Os colonos usaram o basalto para construir a base
de suas casas, mas a parte de cima era quase sempre de
madeira. Era ali, no porão de pedra, e ainda hoje é assim,
que abrigavam os queijos, os vinhos, os salames, as copas
e, quase sempre, a marcenaria. Essa combinação de pe-
dra e madeira trouxe graça e beleza, além de utilidade e
conforto num clima tão frio.
Ao longo da Serra se vêem os muros feitos de pe-
dras de basalto serpenteando os morros e dividindo as
propriedades entre parreiras e pinheiros.
O escultor João Bez Batti recolhe o basalto que en-
contra na beira do rio, e continua o trabalho das águas
esculpindo e arredondando, completando a forma que a
própria natureza deu. O escultor e poeta nos leva de volta
pelos Caminhos das Pedras, onde ele vive e trabalha.
O colono, assim como o escultor, molda a terra,
trata e cuida, e, complementando o trabalho da nature-
za, colhe seus frutos e celebra a vida. Como deve ser.
*Os Italianos do Rio Grande do Sul – Costa, Rovílio e De Boni, L., 1979, Vozes
82882 culinaria italianos.p65 29/04/05, 16:275
Sabor
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Polenta com
Gorgonzola
Coelho ao
Vinho Tinto
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Siga as instruções para cozimento da polenta, acrescente ostemperos, e a manteiga no final. Quando estiver pronta,despeje parte da polenta numa fôrma refratária e cubra comgorgonzola. Repita a operação para formar camadas. Leveao forno até dourar. Sirva em seguida. Serve como entradaou como acompanhamento para carnes. Caso você queirausar o fubá de milho, a polenta deverá ser cozida durante 45minutos, mexendo sempre, como nas receitas tradicionais.
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Faça um refogado com a cebola, cenoura e salsão. Junte ocoelho e deixe pegar cor nos dois lados, e então acrescenteo vinho, a canela e o sal. Abaixe o fogo, tampe e cozinhelentamente até ficar macio. Antes de desligar, adicione oMarsala.
A CARNE DE COELHO É MUITO APRECIADA POR TODA A ITÁLIA.
AQUI SUGERIMOS UMA RECEITA TRADICIONAL COM VINHO TINTO,
ERVAS E UM TOQUE DE CANELA.
1 CEBOLA PICADA / 1 CENOURA PICADA
1 PEDAÇO PEQUENO DE SALSÃO PICADO
2 COLHERES DE AZEITE
1 COELHO EM PEDAÇOS
1 TOMATE SEM PELE E SEM SEMENTES PICADO
½ GARRAFA DE VINHO TINTO SECO
1 PITADA DE CANELA
SAL / 3 COLHERES DE MARSALA (OPCIONAL)
A POLENTA TORNOU-SE UM DOS ALIMENTOS BÁSICOS DAS POPU-
LAÇÕES RURAIS DO NORTE DA ITÁLIA, QUE TROUXERAM PARA O
RIO GRANDE DO SUL A TRADIÇÃO DESTE PRATO. ERA MUITO CO-
MUM PREPARAR A POLENTA COMO ACOMPANHAMENTO PARA AVES,
ESPECIALMENTE PASSARINHOS, MAS AQUI SUGERIMOS UMA RE-
CEITA COM O FAMOSO QUEIJO ITALIANO.
250 G DE POLENTA PRÉ-COZIDA
(OU FUBÁ DE MILHO)
ÁGUA / SAL
1 PITADA DE NOZ-MOSCADA
25 G DE MANTEIGA
300 G DE QUEIJO GORGONZOLA EM PEDAÇOS
Estilo Zaffari 25
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Sabor
Spaghetti
com Mexilhões
Ragu, ou Molho
à Bolonhesa
2 KG DE MEXILHÕES LIMPOS
2 COLHERES DE AZEITE
4 DENTES DE ALHO PICADOS
½ COPO DE VINHO BRANCO SECO
3 TOMATES SEM PELE E SEM SEMENTES
SAL / SALSINHA PICADA
1 PIMENTA VERMELHA PICADA SEM SEMENTES
400 G DE SPAGHETTI / 2,5 A 3 LITROS DE ÁGUA
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Numa panela, aqueça o azeite, acrescente o alho e deixepegar uma cor. Ponha os mexilhões e a pimenta, tampe ecozinhe em fogo alto por uns 2 minutos. Retire os mexi-lhões e descarte aqueles que estiverem fechados. Retire orecheio da metade dos mexilhões, e mantenha a outra me-tade nas conchas. Reserve-o. Aqueça a panela em que fo-ram cozidos os mexilhões e acrescente o vinho, reduzindo-o por uns 3 minutos. Ponha um pouco de sal, a salsinha, ostomates e os mexilhões. Enquanto isso, ponha água numapanela e depois que ferver junte o sal e a pasta. Deixe cozi-nhar conforme as instruções, e um pouco antes de ficarpronta escorra a pasta e leve-a à panela com os mexilhões.Finalize o cozimento da pasta no próprio molho. Sirva emseguida. Não se esqueça de que na cozinha italiana não sedeve usar queijo nos pratos de frutos do mar e de peixes.
É UM PRATO TÍPICO DAS REGIÕES COSTEIRAS, PRINCIPALMENTE
DE NÁPOLES, ONDE O VONGOLE É MAIS POPULAR. MAS CASO VOCÊ
NÃO ENCONTRE O VONGOLE, PODE SUBSTITUIR POR MEXILHÕES.
O RAGU, OU MOLHO À BOLONHESA, É ENCONTRADO EM DIVER-
SAS REGIÕES DA ITÁLIA, APRESENTANDO VARIAÇÕES. O SEGRE-
DO É COZINHAR POR LONGO TEMPO EM FOGO BAIXO. SERVE PARA
LASANHAS, SPAGHETTI E VÁRIOS TIPOS DE PASTA. FAÇA COM AN-
TECEDÊNCIA E GUARDE NA GELADEIRA.
400 G DE CARNE MOÍDA (PODE SER DE BOI,
VITELA, PORCO, OU TUDO MISTURADO)
1 CEBOLA PICADA / 1 CENOURA PICADA
50 G DE BACON PICADO
½ GARRAFA DE VINHO TINTO SECO
1 LATA DE TOMATE PELADO
1 COPO DE ÁGUA QUENTE OU CALDO DE CARNE
SAL / 1 PITADA DE NOZ-MOSCADA
1 PITADA DE CANELA / 2 COLHERES DE AZEITE
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Numa panela bem grande, ponha o azeite, a cebola e obacon. Deixe pegar uma cor, acrescente a cenoura e a car-ne. Mexa bem até a carne ficar marrom, junte então ovinho, e deixe reduzir. Acrescente o tomate, a água quen-te e deixe cozinhar em fogo baixo por bastante tempo.Ponha a canela e a noz-moscada. Continue mexendo devez em quando, e mais para o fim adicione o sal. Estecozimento pode levar em torno de 1 a 2 horas.
26 Estilo Zaffari
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Sabor
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Risoto Milanês Pepperonata
Alla Treviso
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Salgue a berinjela e reserve por 1 hora ao menos. Depoislave bem os cubinhos de berinjela e seque tudo com pa-pel-toalha. Enquanto isso, aqueça o azeite numa panela,ponha o alho, deixe tostar e então retire-o da panela.Acrescente a cebola picada, deixando ficar dourada, adi-cione a berinjela até secar bem e junte os pimentões e otomilho. Ponha o vinho, tampe a panela e deixe cozinharpor uns 15 a 20 minutos, cuidando para não queimar. Junteos tomates e finalize o cozimento por uns 5 a 10 minutosmais. Ao final, ponha as azeitonas. Serve-se frio ou quente.
2 BERINJELAS CORTADAS EM CUBINHOS
2 COLHERES DE AZEITE
3 CEBOLAS
2 DENTES DE ALHO MACHUCADOS
2 PIMENTÕES VERMELHOS PICADOS
EM QUADRADINHOS
150 ML DE VINHO BRANCO
50 G DE AZEITONAS PRETAS PICADAS
5 TOMATES SEM PELE E SEM SEMENTES
TOMILHO FRESCO / SAL
EMBORA A PEPPERONATA SEJA UM PRATO MUITO POPULAR EM
NÁPOLES, E NO SUL DA ITÁLIA, TAMBÉM HÁ UMA VERSÃO VINDA
DA CIDADE DE TREVISO, AO NORTE. LOCALIZADA NA REGIÃO DO
VÊNETO E CERCADA POR BELOS CANAIS, TREVISO É A CIDADE
DE ORIGEM DE MUITOS DOS NOSSOS IMIGRANTES.
O RISOTO É UM PRATO MUITO POPULAR NO NORTE DA ITÁLIA, ES-
PECIALMENTE NA LOMBARDIA E NO VÊNETO. É FEITO COM UM AR-
ROZ ESPECIAL, ARREDONDADO, E OS TIPOS MAIS CONHECIDOS
SÃO O CARNAROLI, O VIALONE E O ARBÓRIO. SEU PREPARO EXIGE
ATENÇÃO, POIS O MAIS IMPORTANTE, ALÉM DO SABOR, É MAN-
TER A CONSISTÊNCIA CREMOSA E OS GRÃOS FIRMES.
300 G DE ARROZ ARBÓRIO, OU OUTRO
PRÓPRIO PARA “RISOTTO”
1 CEBOLA PICADA / 1 COLHER DE AZEITE
1 LITRO DE CALDO DE GALINHA OU ÁGUA
MINERAL QUENTE
½ COPO DE VINHO TINTO OU BRANCO
2 A 3 COLHERES (SOPA) DE MANTEIGA
1 ENVELOPE DE AÇAFRÃO / SAL
QUEIJO PARMESÃO RALADO NA HORA
TUTANO DE BOI (OPCIONAL)
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Numa panela, aqueça o caldo de galinha, ou a água, man-tendo-a em fogo baixo. Em outra panela, ponha o azeite, acebola e o tutano, caso for usá-lo. Coloque o vinho e deixereduzir bem. Ponha o arroz e misture bem na panela. Acres-cente o caldo ou a água quente sobre o arroz, aos poucos.Adicione sal e mexa delicadamente com um garfo. Vá acres-centando mais líquido conforme o arroz vai sendo cozido,sem deixar secar. O risotto deve ser sempre bem molhado.Mexa de vez em quando, mas sempre atento ao cozimento.Quando estiver quase pronto, adicione a manteiga e o aça-frão, que deve ser desmanchado com um pouco de água.Mexa mais uma vez e sirva com parmesão e um fio de azeitepor cima. A consistência deve ser sempre cremosa. Pode serservido como entrada ou como acompanhamento.
Estilo Zaffari 29
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Sabor
Galeto com Ervas Ossobuco
Alla Milanesa
O OSSOBUCO, EM ESPECIAL O DE VITELA, É MUITO APRECIADO EM
TODA A ITÁLIA. É A COMBINAÇÃO DE UM PRATO SUBSTANCIOSO, DE
COZIMENTO LENTO, E SABOROSÍSSIMO. AQUI, UMA RECEITA TRADI-
CIONAL DE MILÃO.
4 FATIAS DE OSSOBUCO
FARINHA DE TRIGO / AZEITE / SAL
½ XÍCARA DE VINHO BRANCO SECO
3 TOMATES SEM PELE E SEM SEMENTES
1 XÍCARA DE CALDO DE CARNE OU ÁGUA QUENTE
GREMOLATA
1 DENTE DE ALHO BEM PICADO
SALSINHA PICADA / RASPA DE 1 LIMÃO
Modo de fazer Gremolata:Modo de fazer Gremolata:Modo de fazer Gremolata:Modo de fazer Gremolata:Modo de fazer Gremolata:Misture os ingredientes da gremolata e coloque sobre oosso buco antes de desligar o fogo.
Modo de fazer o Ossobuco:Modo de fazer o Ossobuco:Modo de fazer o Ossobuco:Modo de fazer o Ossobuco:Modo de fazer o Ossobuco:Passe o ossobuco na farinha e frite-o dos dois lados. Acres-cente o vinho e deixe cozinhar por uns 10 minutos. Junteentão os tomates, o caldo até cobrir, e o sal. Abaixe o fogo,tampe e cozinhe por cerca de 2 horas, mexendo às vezespara não pegar. A carne deve ficar bem macia e o molho,espesso. Acrescente a gremolata, deixe cozinhar mais umpouco e sirva em seguida.
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Deixe os galetos marinando de véspera com todos osingredientes, menos o limão. Vire às vezes para tempe-rar bem a carne. Aqueça a churrasqueira, raspe o limãosobre o galeto e esprema o sumo também. Ponha o gale-to para assar em grelha própria ou em espetos. Deixedourar. Sirva em seguida com salada de radite.
TALVEZ O MAIS TÍPICO DOS PRATOS ITALIANOS DO RIO GRANDE
DO SUL, O GALETO, NA VERDADE, TEM ORIGENS NA ITÁLIA.
O GALETO TEMPERADO COM ERVAS DO CANTEIRO E ASSADO NAS
BRASAS É IMBATÍVEL.
2 GALETOS CORTADOS AO MEIO (VERTICAL)
4 DENTES DE ALHO AMASSADOS
SÁLVIA FRESCA PICADA
TOMILHO FRESCO PICADO
ALECRIM FRESCO PICADO
1 COPO DE VINHO BRANCO SECO
SAL GROSSO
1 COLHER DE AZEITE
RASPA DE 1 LIMÃO
30 Estilo Zaffari
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Sabor
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Tiramisu Torta de
Amêndoas
Lombardia
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Misture o café, o conhaque e o vinho. Arranje os biscoi-tos numa travessa de vidro ou louça retangular e umede-ça-os com o café. Bata as claras em neve e reserve. Bata asgemas com o açúcar, acrescente a nata e misture tudo comas claras em neve. Caso tenha sobrado um pouco do cafécom conhaque, adicione à mistura. Espalhe sobre os bis-coitos cobrindo bem, ponha o chocolate picado por cima,cubra com filme e leve para a geladeira. Sirva depois dealgumas horas ou no dia seguinte.
Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Para pelar as amêndoas, afervente-as em um pouco de água,em seguida tire as cascas e seque bem as amêndoas. Passe noprocessador e reserve as amêndoas. Bata as gemas e o açúcarmuito bem até ficar com uma cor pálida. Acrescente a fari-nha, a manteiga, a amêndoa, a raspa de limão, a canela e ospedaços de laranja. Bata as claras em neve e misture tudodelicadamente. Unte uma fôrma com manteiga e farinha,leve ao forno moderado por uns 30 minutos. Pode ser servi-da com nata fresca ou creme de baunilha.
½ XÍCARA DE CAFÉ FORTE
¼ DE XÍCARA DE CONHAQUE, OU WHISKY
2 OU 3 COLHERES DE VINHO BRANCO
OU ESPUMANTE
20 BISCOITOS TIPO CHAMPANHE
400 G DE NATA FRESCA (OU MASCARPONE)
2 OVOS SEPARADOS
5 COLHERES DE AÇÚCAR CONFEITEIRO
100 G DE CHOCOLATE MEIO-AMARGO PICADO
EMBORA TENHA SE TORNADO MUITO POPULAR A PARTIR DOS
ANOS 90, O TIRAMISU TEM DIVERSAS VERSÕES E É BASTANTE
TRADICIONAL DENTRE OS DOCES ITALIANOS. O MASCARPONE É
UM QUEIJO CREMOSO ITALIANO MUITO LEVE, FEITO COM ÁCI-
DOS CÍTRICOS DA REGIÃO DE LODI. É QUASE UMA NATA BATI-
DA, E PODE MUITO BEM SER SUBSTITUÍDO POR ELA.
100 G DE AMÊNDOAS DESCASCADAS
E TRITURADAS
3 OVOS SEPARADOS / 180 G DE AÇÚCAR
120 G DE MANTEIGA
100 G DE FARINHA DE SEMOLINA
RASPA DE UM LIMÃO / 1 PITADA DE CANELA
PEDACINHOS DE LARANJA GLACEADA OU
CRISTALIZADA (OPCIONAL)
AQUI SUGERIMOS UMA RECEITA ANTIGA, MUITO SIMPLES MAS DELICIOSA,
VINDA DA LOMBARDIA. A AMÊNDOA É MUITO UTILIZADA NA
CULINÁRIA ITALIANA, ESPECIALMENTE NOS DOCES E BISCOITOS.
Estilo Zaffari 33
82882 saborreceitas.p65 4/29/05, 9:33 AM11
O sabor e o saber
F E R N A N D O L O K S C H I N
Um paraíso a contrastar com a Peste que assolava a
Itália, Bocage imaginou a ‘doce terra’ de Bengodi. Lá cres-
cia uma montanha de queijo gratinado: bastava deixar o
macarrão rolar encosta abaixo para se gozar a mais delici-
osa das refeições.
Ícones italianos, Frederico Felini definia o mundo
como a mistura da massa com magia e Sofia Loren se
considerava mero subproduto do espaguete. A massa é a
metáfora pela qual a Itália expressa o universo; se a co-
mida é uma linguagem, a massa é seu vocabulário íntimo,
seu poema. Não há caso igual de identificação entre ali-
mento e povo. Para Garibaldi, “o herói de dois mundos”,
seu aliado mais poderoso, o verdadeiro unificador da Itá-
lia foi o macarrão.
Nascidos e criados na massa, os italianos passaram
séculos engolindo a lenda de que seu prato nacional era
uma invenção chinesa importada por Marco Polo (séc.
XIII). Na verdade, o que contou o viajante é que na Chi-
na também descobrira a massa; numa cultura diferente
esta semelhança, embora feita de um “trigo que crescia
em árvores” (a fruta pão).
A história da massa é tão enovelada como um prato
de espaguete. Ela se confunde com a dos cereais, histori-
camente comidos ou cozidos como pirão num caldo (o
puls latino, a polenta) ou assados em pão. Mistura sim-
ples de farinha e água, a massa descende destes dois ali-
mentos básicos: pão e polenta. Tanto o It. pasta como o P.
massa nasceram no grego: paste e maza, sinônimos que
descrevem uma mistura uniforme e maleável.
É possível que o cozinhar em vez de assar a massa
de pão, mescla do preparo do pão e polenta, tenha surgi-
do ao leste de Roma. A literatura persa fala de um ali-
MASSA, A VOLÚPIA
“LA PASTA DI PIETRO MASSA”
FERVER ÁGUA MINERAL COM UM POUCO DE ÓLEO DE OLIVA. COZINHAR AL DENTE A MASSA
CARACOL (“CONCHIGLIONI”). RETIRAR. REFOGAR CEBOLA, ALHO, TOMATES PELADOS E CA-
MARÕES. RETIRAR. MISTURAR QUEIJO COTTAGE E TEMPERO VERDE. ENGROSSAR COM FARI-
NHA DOURADA OU MAISENA. RECHEAR O INTERIOR DOS CARACÓIS COM O REFOGADO. CO-
LOCAR UM A UM OS CARACÓIS NA TRAVESSA UNTADA. DESPEJAR O RESTO DO MOLHO COA-
DO E LEVAR AO FORNO. SERVIR JUNTO A ERVILHAS TORTAS E ASPARGOS NA MANTEIGA.
34 Estilo Zaffari
82882 sabor e o saber.p65 4/28/05, 11:07 AM2
HONESTAmento, o lakshah (‘escorregadio’), termo que passou a di-
versos idiomas com o sentido de ‘massa’: Rus. laksha, Ucr.
lokschina, Iídiche, lokschin.
Antes sempre fresca, a massa passou a ser seca ao
sol, a pastaciutta (‘pasta enxuta’) do sul da Itália, na épo-
ca colônia moura (sécs. IX a XI). Tanto as caravanas ára-
bes como os navegadores italianos precisavam de um ali-
mento assim: versátil, nutritivo, leve de transportar, sim-
ples de preparar e que se conserva por mais de ano, quan-
do, na tradição napolitana, preparado na lua cheia...
A palavra árabe para ‘massa’, ainda presente nos
dialetos do sul da Itália, itriyya passou ao português e es-
panhol: aletria.
Uma das massas pioneiras foi a que os gregos cha-
mavam de laganon, uma lâmina de massa, a lasanha; pra-
to predileto de Cícero, era definida por Horacio como a
comida simples e saudável do homem simples e saudável.
É bem possível que laganon derive de lazanon, o pote em
que os gregos urinavam: assar lasanha seria uma nova
utilidade dos urinóis...
Roma só dizia dois nomes para massa, laganun e
tracta, todos os outros trezentos surgiram no italiano me-
dieval. O mais antigo é vermicelli (vermezinho), e o mais
popular é espaguete (cordãozinho), mas a lista é curiosa:
linguini (lingüinha), orechietti (orelhinha), capeletti
(chapeuzinho), agnolli (ovelhinha). Os diminutivos falam
do carinho, e o leque de nomes se estende desde a Ave
Maria, que imita contas de rosário, até o penne, na forma
do próprio.
Convivendo com o epicentro do catolicismo, a massa
recebeu o condimento da religião: ravioli e torlelli, antes
recheados com as sobras da véspera, receberam abóbora,
O mundo é a mistura da massa com a magia
82882 sabor e o saber.p65 4/28/05, 11:07 AM3
O sabor e o saber
F E R N A N D O L O K S C H I N
nozes e creme para os dias de abstinência à carne, eram la
pasta di quaresma.
A estada do papado em Avignon deixou como lega-
dos gastronômicos o divino tinto Chateauneuf du pape
(‘castelo novo do Papa’) e a escatológica lasanha crouzet,
que, recheada de queijo, nozes e amêndoas, é um prato
natalino a imitar as fraldas do menino Jesus.
No livro de culinária com o mais saboroso dos títu-
los, ‘A Volúpia Honesta’, Bartolomeu de Platina (1475)
dava receitas de massa e o tempo de cozinhá-las, a reza de
‘tres pai-nossos’ – é antigo o gosto pela pasta al dente...
A origem da palavra macarrão é uma verdadeira sa-
lada, há até quem identifique um comentário ao provar o
prato: bon, ma caroni (‘bom, mas caro’) – não é à toa que
a expressão si no è vero è bene trovato é italiana. Macarrônico
descrevia os poemas cômicos do séc. XVI, onde o latim
parodia os dialetos populares. Pilhéria da Itália do norte
em relação ao sul é que, ao fazer macarrão, o furo do
meio é o último e mais difícil passo. Spaghetti Western foi o
estilo criado pelos filmes de faroeste italianos dos anos 70
que revitalizou o cinema e que se traduz na luz do Medi-
terrâneo, câmara de Sergio Leone e ação de Clint
Eastwood embalados pela música de Enio Morricone.
O queijo da região de Parma tem sido o fiel escudei-
ro da massa por 800 anos. Vizinhos de nascimento, pasta
e parmezzano compõem uma dupla de amigos que se en-
chem de alegria toda vez que se encontram. Tempos sem
molho, o queijo era misturado a pimenta, canela, ervas e
até açúcar. No olhar poético de Goethe, o queijo ralado
“espraia-se sobre o espaguete como o orvalho na relva”;
ao visitar a Itália em 1787, o gênio alemão conheceu a
massa e esqueceu o chucrute.
Já o tomate se uniu com a massa e o queijo no triân-
gulo do macarrão. Trazido da América do Sul, o tomate
chegou primeiro na Sicília e Nápoles, então colônias es-
panholas: o pommarolla era antes o pomodoro alla spagnuola.
O sabor e cor do tomate deram o contraste para a
neutralidade da massa. Nascidos em mundos à parte, to-
mate e massa formaram o par perfeito, desde sempre pre-
destinados um para o outro. Após o tomate, nem a massa
nem a mesa seriam as mesmas. A massa era comida pura e
com as mãos, o molho de tomate motivou o uso do garfo,
costume que da Itália migrou à França e daí se alastrou.
A globalização da massa, favorecida pela emigração
italiana e consolidada no pós-guerra, deu-se pelo Espa-
guete com Molho de Tomate (enlatado!), ainda hoje o
prato de massa mais consumido.
O gosto romano por aves, principalmente passarinhos,
ganhou expressão na galinha recoberta com massa, um dos
pratos mais tradicionais na Itália do séc. XIX. Hoje a gali-
nha com massa rivaliza com o feijão com arroz como o
prato do domingo brasileiro, e no galeto al primo canto do
imigrante estão presentes a massa, a pequena ave e a
polenta, os três principais pratos do país de origem.
Este texto, indigesta maçaroca macarrônica, á assi-
nado por um nome materno italiano – Massa – e um
paterno iídiche – Lokschin, um ‘Massa Massa’, a invocar
dose dupla de euforia na mesa e de agonia na balança.
Qualquer que seja o nome, somos subprodutos da
massa e, Volúpia Honesta, junto à mesa a presença ema-
nante de Sofia Loren, afinal o mundo não é a mistura da
massa com magia? Mangia que te fa biene.
E a massa é até mesmo o segredo energético de
Arnold Schwarzenegger, Mr. Músculo eleito Governador
que se despediu do Exterminador do Futuro com a famo-
sa frase: “Pasta la vista, baby!”.
FERNANDO MASSA LOKSCHIN É MÉDICO E GOURMET
36 Estilo Zaffari
82882 sabor e o saber.p65 4/29/05, 11:08 AM4
Bom conselho
P O R M A L U C O E L H O
NHOQUES DA SORTE
56 Estilo Zaffari
A origem do costume é explicada com a lenda de um frade
andarilho que chegou a uma pequena localidade italiana e bateu à
porta de um casal de velhinhos, num dia 29. Pediu um prato de comida
e recebeu o único alimento que havia: nhoque. Tempos depois, voltou
ao local e contou aos velhinhos que, após comer aquele prato, sua vida
mudara para melhor.
NOS PERGUNTAMOS: MAGIA OU SUPERSTIÇÃO?
Magia ou superstição, a lenda virou costume entre os italianos e
se espalhou pelo mundo. No Brasil, ganhou a simpatia das pessoas, que
procuram o nhoque nos restaurantes sempre no dia 29 do mês ou o
preparam em casa, cultivando o ritual.
Alguns comem apenas sete nhoques, mastigando sete vezes cada
um. Outros comem tudo, pois consideram importante não haver so-
bras. Outros ainda colocam dinheiro embaixo do prato, almejando
alcançar a fortuna.
VARIEDADES
Diferenciando-se conforme o ingrediente da massa e do molho,
o nhoque começou a ser elaborado com várias farinhas: trigo, arroz,
miolo de pão e até de milho. Mas foi a chegada da batata que mudou a
história do prato. Tornou-se seu ingrediente supremo. O modo de
cozimento varia conforme o país – uns cozinham na água, outros no
leite, colocam recheios de queijo, uva passa, temperam das mais varia-
das formas, com manjericão fresco, castanhas e frutos secos.
RAZÃO DO SUCESSO
O que explica o sucesso do prato de todos os dias 29, além da
relação mística com este alimento, são suas variadas elaborações e o
seu delicioso sabor, que independe de magia ou superstição.
O NHONQUE É SEMPRE UMA DELÍCIA! ESTA É A VERDADEIRA FORTUNA!
82882 bom conselho.p65 4/29/05, 11:14 AM1
Casa
Relíquias
82882 casa antiquarios.p65 4/27/05, 5:36 PM2
italianasP O R I R E N E M A R C O N D E S
F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O
Estilo Zaffari 39
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Casa
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Restaurar um móvel colonial antigo garimpado no interior
do Rio Grande do Sul e depois devolvê-lo em plena for-
ma à sociedade é certamente uma das maneiras mais
nobres de se preservar e honrar a cultura dos imigran-
tes italianos. Produzidos em madeira maciça, como ce-
dro, araucária e louro, os móveis concebidos por esses
aprendizes de marceneiro priorizavam os aspectos fun-
cionais. A agradável surpresa é que essas formas, mui-
tas vezes sem proporção e com acabamentos rústicos,
conferem uma identidade única ao mobiliário colonial.
A personalidade marcante e alegre desses imigrantes
italianos se reflete nas cores vibrantes que eram pince-
ladas nas peças: azul anil, vermelho, verde-claro e azul
celeste. Especialistas revelam que ao longo de quase um
século existiu uma seqüência igual no uso dessas cores
mesmo entre as colônias distantes. Mais do que imprimir
uma nova roupagem, essas pinceladas de tinta a óleo
tinham como objetivo estabelecer um código social, um
elo entre as famílias estrangeiras que se adaptavam ao
novo país. Hoje, a decoração contemporânea reserva
um espaço privilegiado para essas peças. No entanto,
não se trata de mero modismo. Trata-se de humanizar a
decoração, de resgatar a história de uma cultura e de
trazê-la para a intimidade de nossas casas.
CORES VIBRANTES
DESTACAM A
CULTURA ITALIANA
Estilo Zaffari 41
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Casa
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A cultura dos imigrantes italianos e alemães sempre
despertou um interesse especial no advogado gaúcho Pau-
lo Roberto Maia. Nas temporadas que passava em sua casa
na Praia do Rosa, Santa Catarina, ele levava consigo anti-
gos móveis coloniais para serem restaurados cuidadosamen-
te. Como nunca tinha coragem de desfazer-se deles, a resi-
dência litorânea foi ficando intransitável. Paulo começou
a vender alguns exemplares para os amigos, até que, em
1990, abriu a loja Via Appia, em Porto Alegre. “Cheguei a
dormir no carro quando viajava pelo interior do Estado à
procura de raridades que conservam a história destes imi-
grantes”, revela Maia. Um de seus achados prediletos é o
roupeiro de cedro verde-azulado, do começo do século XX,
a síntese mais fiel do legítimo móvel italiano. “Esta peça
não foi produzida numa marcenaria, mas sim no quintal
de uma casa, com poucas ferramentas. As dobradiças apa-
rentes e a tramela no lugar da fechadura expõem a simpli-
cidade e a robustez da peça.” O curioso é que ao contrário
dos móveis, que não recebiam muitos acabamentos, os brin-
quedos mostravam-se ricos em entalhes e encaixes. “Os
avós faziam carrinhos e cavalinhos de madeira para seus
netos, e a dedicação a estes projetos era grande”, conta.
Exibindo um pouco mais de elaboração, a cadeira de cedro
pincelada de azul ainda não passou por restauros. Veio jun-
to com mais cinco exemplares de um conjunto de doze
cadeiras. “As demais foram terminando com o tempo e
podem até ter virado lenha. Isto era muito comum”, conta
Maia. Ele ressalta que esse modelo tipicamente italiano de
cadeira é um dos mais copiados até hoje. “Uma peça rara.”
Já a imaculada mesa de louro nunca recebeu uma demão
de tinta e foi encontrada em ótimo estado de conservação.
“Certamente a família era mais abastada e tinha consciên-
cia de que se tratava de uma madeira nobre”, explica.
Detalhes como esse reforçam a teoria de Maia: cada peça
tem uma boa história para contar, sobre tempos em que as
famílias se reuniam em torno do fogão a lenha e as crian-
ças se distraíam com os brinquedos, que eram, na verdade,
pequeninas obras de arte.
Via Appia: resgate de raridades
Estilo Zaffari 43
MÓVEIS DE
MADEIRA NOBRE
CONTAM
HISTÓRIAS DA
COLÔNIA
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Você pode se perguntar o que este paulista e descen-
dente de ucraniano tem a ver com os móveis coloniais ita-
lianos. A resposta é simples: paixão. Quando Carlos
Sautchuck veio morar em Porto Alegre, no início dos anos
80, passou a dedicar-se a um hobby bem peculiar nos finais
de semana. Viajava pelo interior do Estado em busca de
móveis antigos para depois restaurá-los e colocá-los em uso
na sua residência. Aos poucos, os amigos começaram a
encomendar essas peças antigas e a brincadeira acabou vi-
rando um negócio. Em 1991 Sautchuck abriu as portas da
loja Naftalina e hoje dedica uma área de 400 metros qua-
drados exclusivamente para os modelos coloniais, exibin-
do um acervo invejável de centenas de móveis e objetos.
Da cidade de Bento Gonçalves vieram, por exemplo, os
tamancos de madeira e de couro, da década de 40, que
eram utilizados pelos italianos no parreiral. Outro design
curioso é o do baú de araucária, que hoje apresenta um
desgaste natural da pintura avermelhada. Repare que a
robusta caixa de madeira fica suspensa por quatro delica-
Naftalina: reinventando a História
dos pés. “O italiano fazia o móvel de acordo com a sua
vontade, sem se preocupar com tendências, estilos e estética”,
conta o especialista. Segundo ele, muitas vezes a fron-
teira que separa a cultura italiana da cultura alemã se con-
funde. “O bule de ferro esmaltado é a prova disso. Apesar de
ser produzido pelos alemães, foi amplamente utilizado nas
residências italianas”, comenta. Cidades coloniais como
Brochier, Maratá, Serafina Corrêa e Carlos Barbosa são mi-
nas de ouro para garimpeiros de peças antigas como ele. As
garrafas de vidro, que antes conservavam vinho e graspa,
vieram de Carlos Barbosa e hoje assumem um papel decora-
tivo na casa de seus clientes. “Essa mudança de status é fas-
cinante. Transformar algo que foi meramente utilitário em
uma peça a ser admirada é como reinventar a História”, diz.
O mesmo acontece com as gamelas “de orelhas”, utilizadas
para salgar a carne. Hoje, as peças de madeira maciça ainda
estão em perfeito estado e poderiam ser usadas, mas as pes-
soas preferem empregá-las na decoração, como se fossem ob-
jetos valiosos demais para voltarem para a cozinha.
Casa
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ANTIGOS UTILITÁRIOS
VIRAM CHARMOSAS
PEÇAS DECORATIVAS
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Casa
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Na casa deste artesão, em São Sebastião do Caí, que
também abriga o ateliê de restauro de móveis, todos os
cantos remetem à cultura colonial. A começar pela pró-
pria estrutura da moradia: janelas e portas trazidas de an-
tigas residências do interior e paredes erguidas com madei-
ras de costaneira e tijolos de demolição. Na cozinha, des-
tacam-se o robusto armário colonial azul, que abriga as lou-
ças e as schmier, e um porta-utensílio por onde desfilam as
colheres de pau usadas nas colônias. Normélio Brill, filho
de um carpinteiro alemão, herdou não só o talento do pai
como também boas lições de marcenaria. “Ele me ensinou
a fazer encaixes, a conhecer a madeira e a afiar as ferra-
mentas. Uma arte que é fundamental neste ofício”, conta.
A paixão pelo garimpo e restauro de móveis coloniais co-
meçou na década de 80. “Certo dia eu entrei numa tenda
de móveis antigos na beira de uma estrada e vi uma cadei-
ra de balanço bastante danificada. Foi paixão à primeira
vista. Restaurei e vendi para um amigo. A peça continua
Normélio: garimpo de relíquiasperfeita e em uso quase 25 anos após o conserto”, comen-
ta. A possibilidade de dar nova vida ao móvel é que fascina
este artista. “Só de olhar para uma peça eu consigo identi-
ficar a espécie de madeira empregada. Sou movido por um
forte sentimento de que não se pode deixar uma boa ma-
deira sem restauro”, afirma Brill. Ele não mede esforços e
viaja para cidades no interior em busca dessas relíquias,
muitas vezes esquecidas em porões. Segundo Brill, o méri-
to da resistência deste mobiliário deve ser atribuído aos co-
lonos, que respeitavam a época certa do corte das árvores.
“Os meses que não tinham a letra ‘r’ eram os liberados ao
corte. Desse modo, a seiva estava baixa e a madeira ficava
mais durável e resistente ao ataque de cupins”, explica.
A longevidade dessas madeiras é comprovada no armário
italiano transformado em cristaleira e escolhido para aco-
modar a coleção de imagens sacras, figuras de ex-votos e
de cerâmicas holandesas. “É um bom exemplo de como uma
peça centenária pode integrar a decoração atual”, diz.
ARTESÃO
REVELA SUA
COLEÇÃO
DE OBJETOS
RAROS
Estilo Zaffari 47
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Tradição
Eu, que nunca fui de preparar receitas italianas,
aprendi. É assim: junte força de vontade com alegria
de viver, acrescente carinho e superproteção, mis-
ture com o amor pela cozinha, coloque no meio de
uma grande família e pronto. Você terá aí uma legíti-
ma mamma. Independentemente da época em que
nasceram e dos gostos pessoais que possuem, a
impressão é a de que a vida dessas mulheres é sem-
pre em ritmo de tarantela. E isso, eu juro, não é fol-
clore. Leia esta matéria e você terá certeza do que
eu estou dizendo. Porque ao conhecer de perto as
matriarcas italianas, a gente percebe que elas car-
regam muito mais do que sobrenomes vindos da
Itália. Carregam, todas, muita energia e a certeza
de que nada é mais importante do que ter a família
unida. De preferência, é claro, em volta da mesa.
P O R P A U L A T A I T E L B A U M F O T O S E D U A R D O I G L E S I A S
Receita de
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Mangia che te fa bene!
Antigamente, na colônia italiana, era comum que
os noivos recém-casados fossem morar com os pais do
rapaz. Quer saber o que a sogra fazia quando a nora
chegava? Mandava a jovem desposada ir fazer a polenta.
Só pra ver se a moça era forte o bastante pra ficar me-
xendo mais de uma hora o fubá fervilhante no caldeirão
enorme. Mamma mia! Não quero nem pensar o que
acontecia se a sogra encontrasse uma bolinha de fari-
nha perdida lá no meio. Felizmente, isso já era. Hoje, as
mammas italianas, pelo menos as que moram em Porto
Alegre, são modernas, flexíveis e... lights. Se bem que
light é uma palavra que definitivamente não combina
com elas. Ao menos não no que se refere a comida. Onde
tem mamma tem que ter muita massa.
Quando eu sentei pra conversar com Dona Inês
Franciosi La Porta, uma doce mamma de quase 86 anos,
a primeira coisa que ela fez foi me mostrar um cartão
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onde estava escrito de próprio punho que, nesses anos
da sua vida, ela teve a oportunidade de saborear massas
feitas por cinco gerações da família, da sua avó até sua
neta. Ou seja, a massa é uma coisa que passa de mamma
para filha. Não é à toa que Paula, uma das netas de Dona
Inês, é sócia do Puppi Baggio, um restaurante italiano
com clima de casa da nona. Paula e as irmãs lembram
que passaram muitos finais de semana esticando massa
de lasanha na casa da avó. O que era uma festa.
“É massa dia e noite”, diz toda faceira Jandira
Broilo, uma moderna mamma que se veste com cami-
sa Forum e calça capri pra cozinhar. Janda, como é
chamada pelos amigos, me diz que o supermercado é
o seu shopping, tamanho é o seu prazer em escolher
ingredientes. Para ela, a mamma é aquela que preser-
va o culto pela comida. “Pra gente, comer não é só se
nutrir, tem todo um ritual, ficar junto na mesa, deci-
dir as coisas...” Janda morou onze anos na Itália com
o marido e os dois filhos. De volta ao Brasil, trouxe
maravilhosas receitas da cozinha toscana que hoje
prepara para a família diariamente. Observo ela cozi-
nhando e, ao mandar o marido sair de perto, descu-
bro outro segredo de mamma: homens não devem se
meter (a não ser para provar). Janda é outra que her-
dou da mãe o amor pelas receitas.
Já Dona Ignez Varnier Spolidoro, quando casou,
aos 17 anos, nunca tinha cozinhado nada na vida.
Como há 63 anos não existia comida congelada, muito
menos telepizza, ela nem pestanejou. Antes das bodas,
encheu um caderno inteiro com receitas da mãe. Pra
você ver como toda mamma é um poço de decisão (mes-
mo quando nem é mamma ainda). Eu conheci o ca-
derno, que hoje é uma relíquia com direito a manchas
de molho e tudo. E Dona Ignez, aos 80 anos, continua
cozinhando pra família. Entre suas especialidades, tam-
bém está a organização de festas, assistência social, ar-
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recadação de fundos, bordado e costura, jogo de cartas
e por aí vai. É... mammas italianas parecem estar sem-
pre ligadas na tomada.
Boas conselheiras
Uma pesquisa realizada na Itália mostrou que
sete, em cada dez homens entrevistados, pedem a
opinião de suas mães para tomar as decisões corretas
em sua vida profissional e pessoal. A razão para esse
hábito é o fato de considerarem a mãe a pessoa mais
próxima, que melhor os entende e que, em muitos
casos, é a “musa” de seu sucesso. Para 31% dos entre-
vistados, a mãe transmite segurança, para 26%, tran-
qüiliza na hora de tomar decisões difíceis e para o
restante é aquela que dá força para que sigam em fren-
te. Ou seja, mamma nunca deixa a peteca das suas
crias cair. Elas são orgulhosas, elas são protetoras, elas
são as primeiras a tentar encontrar uma boa saída.
Questionando os filhos e netos das mammas sobre isso,
ouvi coisas como “ela sempre quer saber com quem
eu saio, o sobrenome” ou “quando tenho um proble-
ma, não recorro às amigas, mas sim a ela”. Talvez seja
por isso que casa de mamma nunca fica vazia. “Eu
moro sozinha, mas nunca estou sozinha”, diz, feliz,
Dona Ignez. “Meu filho vem três vezes por dia me
ver”, conta Dona Inês La Porta. “Qui no beve in
compania é un ladro o un spia”, fala Dona Jandira,
citando um provérbio italiano que diz que quem não
bebe vinho acompanhado é um ladrão ou um espião.
Ou seja, toda mamma quer bastante gente pra dividir
a bebida, a comida e tudo o que ela tem a oferecer.
Todas vinhos da mesma pipa
Mammas, como boas italianas que são, adoram
vinho. Tomam diariamente, sempre pouquinho. O que
talvez seja o segredo da longevidade. Peço para Dona
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Ignez contar uma história de quando era criança, e ela
acessa os arquivos. Lembra de quando tinha seis anos
e conta que o pai ia encontrar os amigos depois do
trabalho na bodega perto de casa. Depois de jantar, a
menina Ignez ia então buscá-lo. Chegando lá, ganha-
va um pouquinho de vinho. “Não sou viciada! Vicia
quem quer”, ela me diz com toda sua sapiência de
mamma. No almoço dominical na casa de Dona Janda
também é assim. “Deus me livre colocar Coca-Cola
na mesa”, diz ela, enquanto serve um bom vinho para
todos. Seus netos de olhinhos puxados (o genro é de
descendência oriental) estão na mesa, e o menor, de
seis anos, molha o dedinho na taça do pai para depois
provar. Ele faz uma careta e todos riem. E na mesa de
Dona Inês também não faltam vinho e muita alegria.
Risada, aliás, é outra característica da mesa de
mamma. Todo mundo alegre, rindo e falando alto e
ao mesmo tempo.
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Elas aquecem os pés e a alma
No almoço que reuniu a família de Dona Inês para
a matéria, suas netas se empolgam e começam a contar
outras histórias da mamma e avó. De repente, uma de-
las diz “tem o sapatinho de lã”. Sapatinho de lã?, Per-
gunto eu. E fico sabendo que Dona Inês adora presen-
tear as pessoas com o tal mimo. “A gente mal apresenta
um namorado e ela já vem com um sapatinho de lã para
ele”, diz uma delas. No final da entrevista, Dona Inês
pede meu endereço, diz que vai mandar um presente.
Tomara que seja um sapatinho de lã, penso eu.
Com essa do sapatinho, não consigo deixar de pen-
sar que mammas são uma fonte inesgotável de calor
humano. Sempre com um sorriso enorme e o braços
abertos, não apenas para a família, mas também para os
amigos. “Quando a gente morava na Itália, tinha sem-
pre um monte de gente em casa, Sócrates e Zico viviam
por lá.” Sim, caro leitor, Sócrates e Zico, os jogadores,
que como todos que vivem longe de casa também preci-
savam de um colinho de mãe de vez em quando. Ou de
mamma, pra ser mais exata.
E já que o assunto é futebol, vale dizer que em casa
de mamma até jogo na televisão é motivo pra reunir a
família e começar a gritaria. Na casa de Dona Ignez
Varnier Spolidoro é assim. Só que o engraçado é que
entre os Spolidoro só tem colorado, enquanto os Varnier
são todos gremistas. Dá pra imaginar a confusão quan-
do se reúnem, não?
Os dez mandamentos da boa mamma
Depois desta matéria, conhecendo as mammas de
perto, poderia dizer que essas matriarcas de descendên-
cia italiana têm mais do que receitas: têm seus pró-
prios mandamentos. Que nem sempre são seguidos à
risca, mas que existem para caracterizá-las. Vou me
atrever a listá-los.
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OFERECERÁS SEMPRE BOA COMIDA E BEBIDA À FAMÍLIA E AOS AMIGOS.
TERÁS O COLO MAIS MACIO E OS BRAÇOS MAIS ACOLHEDORES QUE PODEM EXISTIR.
COMEÇARÁS A PREPARAR O ENXOVAL DAS FILHAS ASSIM QUE ELAS NASCEREM.
SABERÁS SEMPRE COM QUEM ANDAM FILHOS E NETOS.
CULTIVARÁS O GOSTO PELO JOGUINHO DE CARTA, PRINCIPALMENTE OS DE ORIGEM ITALIANA.
ESQUENTARÁS A CABEÇA QUANDO NECESSÁRIO, MAS OS IMPROPÉRIOS SERÃO SEMPRE EM ITALIANO.
TERÁS UM ORGULHO ENORME DE TODOS OS TEUS DESCENDENTES.
TERÁS FIBRA E FORÇA PARA ENFRENTAR QUALQUER PROBLEMA.
FREQÜENTARÁS A IGREJA – A NÃO SER QUE SEJAS UMA ANARQUISTA.
FARÁS DAS FILHAS MULHERES AS MAMMAS DA NOVA GERAÇÃO.
DEZ MANDAMENTOS DA BOA MAMMA
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Viagem
Um vale
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nevadoT E X T O S E F O T O S C R I S B E R G E R
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Viagem
Antes de começar a escrever esta matéria vou lhes
confidenciar um antigo e superado preconceito. Para isto,
preciso voltar no tempo uns cinco anos, quando eu ti-
nha a convicção de que férias deveriam ser aproveitadas
sob um sol de quarenta graus em alguma ilha paradisíaca
do Caribe. Eu detestava inverno. Mas um dia, por iro-
nia do destino, acabei aterrissando em uma estação de
esqui da América do Norte. Resultado? Passei a amar a
neve, o frio e todas aquelas coisas maravilhosas que
acompanham as baixas temperaturas: vinho tinto,
fondue, roupas elegantes e ambientes acolhedores.
Assim, ao ser convidada a escrever sobre Valle
Nevado eu estava predestinada a adorar a viagem. E ado-
rei! Não há como discordar que o principal motivo que
leva as pessoas ao Valle Nevado seja a prática do esqui,
mas ouso afirmar que há muito mais do que neve por lá.
No decorrer das linhas que se formam vou lhes mostrar
as delícias que este Valle chileno reserva para todos que
o visitam.
Acima das nuvens sempre raia o sol
Me despedi de Santiago do Chile rumo às monta-
nhas de Valle Nevado com o céu nublado, em uma ma-
nhã mais fria do que o habitual. Estava ansiosa para su-
bir a 3.025 m de altura. Deixar para trás a agitação ur-
bana. Uma verdadeira sucessão de “esses” se revelou
pelos 42 quilômetros de estrada asfaltada. À medida que
eu ganhava altura, o azul substituía o branco do céu.
O VISUAL É
DESLUMBRANTE.
MESMO QUE VOCÊ
NÃO ESQUIE, VAI
AMAR ESTE LUGAR
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“Bom sinal”, pensei. Sempre é melhor chegar em um
lugar novo com o colorido do sol. Ao olhar para baixo
pude ver um grande cobertor de nuvens me separando
da elétrica capital chilena. A natureza mostrava sua for-
ça, e meus olhos foram contemplados com a imagem de
montanhas salpicadas de neve e cercadas de brumas. De
repente, avisto o hotel; mais uma curva e ele foge dos
meus olhos; volta a aparecer e não me restam dúvidas:
eu estava chegando à estação de esqui de Valle Nevado.
Antes de prosseguir quero deixar uma dica útil para
quem enjoa facilmente: tome um remedinho dez minu-
tos antes de entrar na van e evite ficar sentado de costas.
Caso contrário, você provavelmente não terá as melho-
res recordações do trajeto até a estação...
Mapa do Valle
Valle Nevado é a maior estação de esqui da Amé-
rica do Sul, tem 37 quilômetros de pistas e 9 mil hecta-
res. São 34 pistas que se dividem conforme o grau de
dificuldade que impõem aos esportistas, com opções para
principiantes, intermediários e profissionais.
Para quem está começando, aulas de esqui ou
snowboard são fundamentais. Fatalmente os primeiros
dias serão de quedas, mas com um pouco de determi-
nação a brincadeira começa a valer a pena. Faz toda
diferença ter aulas. Elas não são baratas, mas se tor-
nam absolutamente necessárias. Lembre-se: um bom
professor fará você amar o esporte de neve. Garanto
que depois desta temporada esquiar estará sempre den-
tro de seus planos.
Valle oferece uma equipe de 70 instrutores bilín-
gües de diversas nacionalidades. Nós, brasileiros, somos
grandes freqüentadores da estação, o que torna garanti-
das as aulas em português. Como sua concentração de-
verá estar totalmente direcionada para aprender a se
equilibrar na neve, a aula de esqui não será o melhor
momento para aprimorar o espanhol. Portunhol não
vale. Opte por aulas no nosso idioma. A equipe de ins-
trutores de esqui conta com o talento de Isabel Clark.
Ela foi classificada para os Jogos Olímpicos de 2006 em
Torino, na Itália. Ostenta com orgulho o título de ser a
primeira sul-americana classificada para as Olimpíadas.
A 3.670 metros de altura está o cerro Três Puntas,
onde se encontra o desnível mais alto da estação, com
810 metros. Para subir as montanhas, o Valle oferece 11
meios de elevação. O Andes Express leva 5 minutos e
quarenta segundos para percorrer 1.700 m. Caso a neve
não seja generosa com os esportistas, o Valle tem 19 ca-
nhões que a fabricam e garantem a diversão de quem não
pode ficar sem descer uma montanha.
Para quem pratica snowboard, as pistas Half Pipe e
Border Cross são um verdadeiro deleite. A Half Pipe
tem o formato de meia-lua e é perfeita para manobras
radicais. É em Valle Nevado que acontecem, desde 2001,
os campeonatos mundiais de snowboard. Detalhe im-
portante: Valle é a única estação latino-americana a
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sediar o Mundial. Cinco curvas, seis saltos e uma “triple
ola” compõem a pista de Boarder Cross. E para a tem-
porada de 2005 Valle Nevado promete um novo
snowpark, mesclando a modalidade de half pipe, saltos
e obstáculos. Para os mais experientes, a estação oferece
o heliskiing, e um helicóptero leva os esquiadores para
os topos mais altos e exclusivos da montanha, onde a
neve é virgem e de excelente qualidade.
Um momento só seu
Muitas pessoas acham que uma estação de esqui é
um local perfeito apenas para quem pratica esportes de
neve. Eu ouso discordar. Uma estação é um lugar ideal
para um momento só seu. Coloque sua leitura em dia,
deixe as horas correrem soltas enquanto você relaxa ao
sol ouvindo seu CD preferido. Reorganize seus pensa-
mentos, estipule novas metas de vida, olhe para dentro,
se conheça. É exatamente a idéia de não fazer nada que
provoca um momento de introspecção maravilhoso.
Como inspiração, você tem os Andes.
Gosto de pensar que uma estação de esqui é como
uma praia. No lugar da areia, a neve. As cadeiras de praia
O ESQUI É
SENSACIONAL. MAS
VALLE NEVADO TEM
MUITAS OUTRAS
DELÍCIAS
62 Estilo Zaffari
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são trocadas pelas diversas mesinhas espalhadas pelo deck.
Foi assim, sentada em uma delas, que as horas da minha
primeira tarde no Valle passaram. O sol deixava a tempe-
ratura deliciosamente agradável. O colorido das roupas
dos esquiadores emprestava ao ambiente um clima ainda
mais alegre. No alto das montanhas, manobras arrojadas.
No pé dela, os iniciantes buscavam o equilíbrio para pro-
var a sensação de liberdade que só entende quem esquia.
Inspiração das montanhas
Se nas pistas a grande atração são os esquiadores e
snowboarders, fora delas a gastronomia ganha brilho es-
pecial. No Valle há cinco opções para agradar a seu pa-
ladar. Você pode escolher entre as cozinhas francesa, me-
diterrânea, italiana, americana, chilena e suíça. Todas
elas sob o olhar atento do chef chileno Axel Manrriquez,
que ostenta no seu currículo quatro temporadas na se-
mana gastronômica de Milão e Roma. Axel gosta de le-
var para dentro de sua cozinha sabores naturais com
influência latino-americana. Ele cria os pratos sem re-
petir ingredientes. Admira a textura dos alimentos, apos-
ta na alquimia dos sabores e cozinha como se todos os
dias fossem domingos. Para o cardápio da temporada de
esqui de 2005, que se inicia em junho e estende-se até o
fim de setembro, Axel garante que todos os pratos já
estão elaborados na cabeça. Quando conversamos ele
estava prestes a colocar suas criações em prática.
Desconfio que haja um ingrediente especial que
faz os pratos alcançarem tanto sabor e sofisticação.
Arrisco dizer que é o ar montanhês. Uma nova geração
de chefs de primeira classe toma conta da gastronomia
do Valle. O Fourchete D’or é comandado pelo talentoso
Damian Sanches, da região de Chillán. Com apenas 22
anos, Damian já passou pela cozinha do Hotel Ritz
Carlton. Formado pelo Instituto de Gastronomia de
Santiago, ele me contou o segredo para deixar os pratos
saborosos: prepará-los com amor e carinho. Há que se
levar em conta que a rotina do jovem chef se dá entre
comandar a cozinha e descer as montanhas esquiando.
O máximo de trânsito que ele pega é no ski lift (meios
de acesso ao alto da montanha).
No clima do Valle
Viajei ao Valle sozinha e descobri que, como eu,
Estilo Zaffari 63
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FORA DAS PISTAS,
A GASTRON0MIA
É A GRANDE
ATRAÇÃO
Viagem
muitas pessoas chegam à estação desacompanhadas. Tudo
bem que eu estava ali a trabalho e o restante do pessoal
de férias. Mesmo assim me dei conta de que se “enturmar”
por lá não leva mais do que meio turno. Portanto, se você
não tem companhia para fazer esta viagem ou quer mes-
mo viajar sozinho para ter a oportunidade de conhecer
novos amigos, vá sem medo de ser feliz. No final do pri-
meiro dia eu já tinha feito minha turma.
Não apenas como repórter, mas também na posi-
ção de quem gosta de aproveitar as coisas boas da vida,
vou logo dando uma dica: é obrigatório acabar o dia
mergulhado na piscina climatizada, ao ar livre. Você só
precisa de um pouquinho de coragem para vencer o frio,
tirar a roupa e pular na piscina. Uma vez dentro dela, é
observar o sol deixando o horizonte avermelhado e cur-
tir a incrível sensação que a água quente provoca em
contraste com a baixa temporada do ar.
Fim do dia. Boas lembranças das manobras na mon-
tanha. Hora de relaxar e pedir um pisco sauer, bebida típi-
ca chilena. A 3 mil metros de altura, uma única dose é
suficiente para deixar as pernas bambas, por isso, vá com
calma. Aviso às mulheres: a predominância do sexo mas-
64 Estilo Zaffari
82882 viagem vale nevado.p65 4/27/05, 7:14 PM8
culino em Valle Nevado é e-vi-den-te. Se você chegar na
piscina e perceber que é a única mulher presente, deixe
de besteira e siga em frente. Posso afirmar que o clima
descontraído da estação é um ótimo ambiente para co-
nhecer pessoas diferentes. Afinal, não há pressa para nada.
A vida passa tranqüila em meio à Cordilheira. E o ro-
mance está no ar.
Montanha acima
Há horas eu estou tentando disfarçar, mas terei que
contar. Eu não esquiei. Quero dizer, não foi desta vez.
Prometi às montanhas que na próxima passagem pelo
Valle Nevado eu não direi adeus sem antes deslizar em
seus cerros. Porém não foi só da base da montanha que
as observei. Por dois caminhos bem distintos fui até o
topo. A história é a seguinte: todos os dias, à noite, uma
espécie de caminhão alisa a neve da pista para o dia
seguinte. Fui de carona com um deles. Rádio ligado, fa-
rol acesso, eu e o motorista montanha acima. Um tra-
balho solitário que é feito durante a madrugada. Na des-
cida paramos para uma fotografia. Um daqueles momen-
tos mágicos. Montei meu tripé e arrumei minha câmera.
Lá embaixo o hotel iluminado. O silêncio era quebrado
apenas pelas vozes suaves do vento. Me senti feliz. Fui
abraçada pelas montanhas. Guardei este momento para
sempre dentro do meu coração.
No dia seguinte, empolgada com a experiência
da noite anterior, fui levada de snowmobile (moto da
neve) até o restaurante Bajo Zero, que fica estrategi-
camente bem localizado no meio das montanhas. Que
sensação deliciosa estar imersa como em um mergu-
lho entre aquelas montanhas branquinhas. Fiz umas
fotos aqui, outras ali e resolvi me dar de presente al-
gumas horas de relaxamento. Folga para minha
câmera fotográfica, hora de rabiscar idéias. Fiquei sa-
boreando a vida entre um gole e outro da cerveja
Austral, produzida na Patagônia.
Sempre é bom termos um motivo para voltar. Eu
já tenho um, na verdade, dois: descer esquiando as mon-
tanhas de Valle Nevado e provar as invenções do novo
chef da estação, Axel Marrintez. Mas volto a repetir:
mesmo que você não seja um esportista nato, saiba que
no meio dos Andes muitas emoções e sabores incríveis
esperam por você.
Estilo Zaffari 65
82882 viagem vale nevado.p65 4/29/05, 10:11 AM9
QUEM ESQUIA UMA VEZ
FICA VICIADO, QUER
VOLTAR TODOS OS ANOS
SE VOCÊ VAI ESQUIAR NO VALE PRECISA TER EM MENTE ALGUMAS
DICAS QUE PODEM CONTRIBUIR PARA QUE SUA TEMPORADA SEJA AINDA
MELHOR. AS DICAS A SEGUIR FORAM DADAS POR CARLOS GIANOTTI NETO, O
TUCA, EX-SURFISTA PROFISSIONAL E ATUAL AMANTE DA NEVE. O TUCA JÁ
COMPLETOU SEIS TEMPORADAS DE SNOW, SENDO DUAS DELAS EM VALLE
NEVADO. HOJE ELE É PROFESSOR E TÉCNICO DE SURF, CINEGRAFISTA E
EDITOR DA PRODUTORA STORM.
AO SUBIR A MONTANHA, VISTA-SE CONFORTAVELMENTE E EM CA-
MADAS. SENTIR FRIO NÃO É NADA AGRADÁVEL, POR ISSO, ESCOLHA AS
ROUPAS CERTAS QUE PROTEJAM DO VENTO. NÃO ESQUEÇA QUE NO TOPO
DA MONTANHA A TEMPERATURA CAI ALGUNS GRAUS EM RELAÇÃO À SUA
BASE E QUE NA SUBIDA DE “SKI LIFT” O VENTO PODE SER CRUEL. MAS
DEPOIS QUE VOCÊ ESTIVER EM MOVIMENTO, SEU CORPO VAI AQUECER.
TENHA CERTEZA DE QUE A BOTA DE ESQUI OU “SNOW” NÃO ESTÁ
MUITO APERTADA, E EXPERIMENTE QUANTAS FOREM NECESSÁRIAS.
SE VOCÊ NÃO POSSUI ÓCULOS PARA ESQUIAR E VAI OPTAR POR
USAR ÓCULOS DE SOL, NÃO ESQUEÇA DE PRENDÊ-LOS COM UMA
“SICUREZA”, MAIS CONHECIDA COMO “CORDINHA”, PARA GARANTIR QUE
VOCÊ NÃO OS PERCA.
ESQUIE SEMPRE NA COMPANHIA DE AMIGOS. ALÉM DE SER MAIS
DIVERTIDO, É MAIS SEGURO. MESMO QUE VOCÊ TENHA EXPERIÊNCIA NO
SURF OU NO SKATE, SAIBA QUE NO SNOW A BRINCADEIRA É UM POUCO
Dicas de esqui do Tuca Gianotti
DIFERENTE. ENTÃO VÁ COM CALMA E SEM VÍCIOS. O TRUQUE DO SNOW
ESTÁ EM SABER GIRAR O QUADRIL. HUMILDADE É FUNDAMENTAL NA EVO-
LUÇÃO DO ESPORTE. UMA HORA DE AULA É ACONSELHÁVEL PARA ADQUI-
RIR TÉCNICA.
ALONGAMENTO NÃO É FRESCURA. FAÇA COM CALMA, NUM LUGAR
EM QUE VOCÊ SE SINTA À VONTADE. UMA BOA OPÇÃO É NA SUA PRÓPRIA
HABITAÇÃO, OUVINDO MÚSICA E CURTINDO A PAISAGEM. OS ESQUIADORES
DEVEM CAPRICHAR NO ALONGAMENTO DAS PERNAS E DA VIRILHA, E OS
“SNOWBOARDERS”, DO TORNOZELO. CASO CONTRÁRIO, NO TERCEIRO DIA
DE ESPORTE VOCÊ CORRERÁ O RISCO DE ESTAR COM AS ARTICULAÇÕES
DOLORIDAS. ISSO SEM FALAR NO QUANTO OS ALONGAMENTOS PREVINEM
POSSÍVEIS LESÕES. PARA OS INICIANTES: CAIR FAZ PARTE DO JOGO, TENHA
PERSISTÊNCIA E VÁ ADIANTE.
OBRIGATÓRIO: PROTETOR LABIAL E SOLAR, CACHECOL OU PROTE-
TOR DE PESCOÇO, TOUCA DE LÃ COMPRIDA QUE TAPE AS ORELHAS E LUVAS
IMPERMEÁVEIS.
PARA OS ESQUIADORES MAIS EXPERIENTES, VALLE NEVADO OFE-
RECE UMA ATRAÇÃO ESPECIAL: OS “FORA DE PISTA”. A VANTAGEM É QUE
NELES A NEVE É VIRGEM E FOFA. ALGUNS CUIDADOS SÃO EXTREMAMENTE
IMPORTANTES: NUNCA VÁ SOZINHO E NÃO ULTRAPASSE OS LIMITES PERMI-
TIDOS PELA ESTAÇÃO. RESPEITE A MONTANHA. PISCO SAUER E ESQUI NÃO
COMBINAM. PISCO SAUER E PISCINA AO AR LIVRE, SIM.
66 Estilo Zaffari
82882 viagem vale nevado.p65 4/29/05, 10:11 AM10
Viagem
82882 viagem vale nevado.p65 4/27/05, 7:15 PM12
VALLE NEVADO TAMBÉM
É UM LUGAR PERFEITO
PARA RELAXAR
QUEM LEVA
AEROLINEAS ARGENTINAS WWW.AEROLINEASARGENTINAS.COM
0800.7073313
ONDE FICAR
SANTIAGO - MARRIOTT WWW.MARRIOTT.COM
VALLE NEVADO - CENTRO DE ESQUI DE VALLE NEVADO
WWW.VALLENEVADO.COM
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POINT DA NEVE WWW.POINTDANEVE.COM.BR
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CRIS BERGER VIAJOU A CONVITE DA POINT DA NEVE E HOTEL MARRIOTT.
Dicas da Cris Berger
O CENTRO DE ESQUI DE VALLE NEVADO OFERECE MEIA PENSÃO
(CAFÉ E JANTAR) E PENSÃO COMPLETA (CAFÉ, ALMOÇO, CHÁ DA TARDE E
JANTAR) PARA SEUS HÓSPEDES. MINHA DICA É: OPTE POR PENSÃO COM-
PLETA. A DIFERENÇA DE VALORES NÃO É GRANDE E NINGUÉM CONSEGUE
FICAR O DIA INTEIRO ESQUIANDO. UMA PARADA NO MEIO DO DIA PARA
RECARREGAR AS BATERIAS É ESSENCIAL. SEUS PÉS VÃO AGRADECER. DE-
POIS SUBA A MONTANHA COM ENERGIA TOTAL. NO FINAL DA TARDE, O CHÁ
É SEMPRE BEM-VINDO.
VALLE OFERECE QUATRO COZINHAS DIFERENTES. FORA ISSO NÃO
HÁ OUTRAS OPÇÕES POR PERTO. VOCÊ ESTARÁ NO MEIO DOS ANDES E
TERÁ AO SEU DISPOR APENAS A ESTRUTURA DO HOTEL, QUE, DIGA-SE DE
PASSAGEM, É ÓTIMA. PORTANTO, NADA COM QUE SE PREOCUPAR.
PARA QUEM NÃO VAI ESQUIAR, HÁ ALGUMAS COISINHAS QUE NÃO
PODEM FALTAR NA BAGAGEM. LEVE UM BOM LIVRO, SE POSSÍVEL DOIS.
COLOQUE SUA LEITURA EM DIA. VALLE É MAIS DO QUE PROPÍCIO PARA LER.
UMA BOA SELEÇÃO DE CDS TAMBÉM É IMPRESCINDÍVEL.
LEMBRA QUE EU CONTEI QUE OUVIR MÚSICA NO DEQUE DA ESTA-
ÇÃO TOMANDO UM SOLZINHO É UM PROGRAMA BÁRBARO? LEVE UM LAPTOP,
BLOCO OU CADERNO E RABISQUE IDÉIAS, PROJETOS, PLANOS E METAS.
GARANTO QUE OS ANDES TRAZEM INSPIRAÇÃO.
FIM DE TARDE É NA PISCINA, PORTANTO, ROUPA DE BANHO NA
MALA. ÓCULOS DE SOL PARA CONSEGUIR MANTER OS OLHOS ABERTOS,
POIS O REFLEXO DA NEVE É MUITO FORTE.
DEPOIS É SÓ BEBER MUITO VINHO CHILENO, SABOREAR A
GASTRONOMIA DO VALLE, ASSISTIR AO COLORIDO PÔR-DO-SOL, CONHECER
NOVOS AMIGOS E, QUEM SABE, SE APAIXONAR. NÃO ESQUEÇA: TUDO NA VIDA
É UMA QUESTÃO DE ESTADO DE ESPÍRITO, PREPARE O SEU E BOA VIAGEM!
Estilo Zaffari 69
82882 viagem vale nevado.p65 4/27/05, 7:15 PM13
(con)vivências
Cuidado! Tudo que é romântico pode ser usado contra você
A BOLSA DE DOIS GUMES
Eu já tinha decidido que não escreveria sobre homens
que carregam a bolsa de suas esposas ou namoradas porque
eu achei que vocês não iriam compreender meu sentimento.
Mas hoje, hoje mesmo, há algumas poucas horas, eu estava
saindo do shopping e justamente vi um casal caminhando
abraçado, a mulher de mãos vazias e o homem carregando a
bolsa dela. Recebi como um sinal para escrever a respeito.
É sempre assim: um homem com cara de apaixonado e
com o braço sobre os ombros da mulher, por nenhuma razão
aparente carrega a bolsa de sua amada. Acho particularmen-
te linda a cena porque ali está um ato de desprendimento
masculino. É visível que ele não se importa com o que as pes-
soas possam estar pensando. Tampouco está preocupado se o
modelo tem a ver com o estilo dele, ou se a bolsa combina
com seu cinto e seus sapatos. Aquela é uma bolsa sagrada. É a
bolsa da mulher que ele ama. Já vi homens altos com baguetes
ínfimas em couro de cobra; homens atarracados com amplas
tiracolos em camurça escovada; rapazes malhados com mo-
chilas em forma de panda... todos seguros de si, levando o
acessório com desenvoltura, como se fizesse parte do seu pró-
prio guarda-roupa. E vendo sempre suas mulheres de mãos
vazias, sem nenhum impedimento para que carreguem seus
pertences, me botei a pensar sobre o motivo daquele ato re-
corrente. Vocês já adivinharam? É isso! Eles vão abraçá-las
para que caminhem juntinhos e chegam pelo lado em que
está a bolsa. Sentem o volume do objeto que os impede de
estar próximos como gostariam, e simplesmente o retiram. Por
distração, por cavalheirismo ou para mostrar que amam tudo
nela – e tudo que é dela – não o devolvem como seria o óbvio.
Eu acho bem romântico. Vocês não acham? Romântico e con-
veniente, pois traz suporte lógico para uma das mais clássicas
práticas femininas, que é de chamar o marido, enquanto está
se arrumando, para perguntar:
– Meu bem, qual das bolsas tu preferes, a branca ou a
verde? (Ele não estará em condições de dizer o frustrante
“tanto faz”.)
Mas tem o outro lado, para azar dos homens que gos-
tam de carregar bolsas. Como tudo que eles fazem – e princi-
palmente o que eles deixam de fazer –, este ato romântico
pode se transformar em medidor de temperatura do relacio-
namento, visto que as mulheres são craques em arrolar todo e
qualquer detalhe como massa de manobra. Ela bem que pode
argumentar:
– Faz muito tempo que tu não carregas a minha bolsa.
Tenho notado isso... Nem me lembro quando foi a última vez.
Acho que precisamos discutir a relação... – e lá vai uma “DR”,
na cabeça!
Mas o desfecho dramático seria se eles tomassem gosto
em andar com as bolsas porém sem as donas!
– Acostumei. E daí? Vai emprestar ou não vai?
Já pensou? Não bastassem as filhas adolescentes baten-
do no closet da gente, ter mais um sócio nos acessórios? Uma
tragédia! Pensando melhor, essa história de homens carregando
bolsas por aí nem é uma idéia tão boa assim.
R U Z A A M O N
RUZA AMON É JORNALISTA
70 Estilo Zaffari
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Lugar
P O R G U S T A V O M I N I B I T T E N C O U R T F O T O S D A N I E L M A R T I N S
sagradoCotidiano
72 Estilo Zaffari
82882 templobudista.p65 4/27/05, 6:28 PM2
82882 templobudista.p65 4/27/05, 6:28 PM3
Lugar
No século VI a.C., o príncipe indiano Sidarta Gau-
tama olhou ao seu redor, percebeu o quão limitada era a
imensa riqueza da sua família para lhe proporcionar sa-
tisfação duradoura, viu que todos os outros seres do uni-
verso estavam imersos em ilusões e deixou tudo para trás,
embrenhando-se em uma jornada espiritual por seis anos.
Durante esse tempo, o ex-membro do clã dos Shakyas ex-
perimentou o outro extremo, levando uma vida absoluta-
mente austera até notar que a simples renúncia ao mundo
material também não proporcionava contentamento per-
manente, justamente por depender da renúncia. Então,
abandonando os extremos e buscando o caminho do meio,
o rapaz sentou-se sob uma figueira e meditou por 49 dias,
até encontrar respostas definitivas para suas dúvidas, as
dúvidas de qualquer ser humano: como alcançar uma feli-
cidade estável e eliminar para sempre o sofrimento?
Hoje, 2.600 anos depois, uma comunidade incrusta-
da no topo de uma montanha que contempla a cidade
gaúcha de Três Coroas vive inspirada nas descobertas mais
KHADRO LING, EM TRÊS COROAS: UM LOCAL
PARA APRENDER QUE TODO LUGAR É SAGRADO
profundas do ex-príncipe, depois chamado de Buda, ou “o
desperto”. O grupo teve início em 1994, quando o mestre
budista tibetano S. Ema. Chagdud Tulku Rinpoche (1930-
2002) trocou os Estados Unidos, onde vivia desde os anos
70, pela serra gaúcha, devido ao forte comprometimento
de alunos brasileiros com a prática e a disseminação dos
ensinamentos do Buda no país. Parte das terras foi doada,
outro tanto foi comprado e logo Rinpoche manifestou o
desejo de construir um tradicional templo tibetano para
abrigar as práticas, os ensinamentos e as cerimônias.
Construção coletiva
Em cerca de dois anos o Lha Kang foi erguido, com a
incansável determinação de Rinpoche e a ajuda espontâ-
nea de muitos voluntários. Alunos do mestre vieram de
diversas partes do mundo para contribuir, fosse com idéias,
com dinheiro ou com os próprios braços. Artistas nepale-
ses, butaneses e tibetanos foram “importados” para execu-
tar as minuciosas pinturas que recobrem o templo contan-
74 Estilo Zaffari
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Lugar
76 Estilo Zaffari
82882 templobudista.p65 4/27/05, 6:28 PM6
do histórias e espalhando sabedoria de forma colorida e
instigante. Muitos dos adereços foram confeccionados por
Lamas habilidosos e imunes à fadiga do trabalho duro no
canteiro de obras ou na marcenaria. Foi uma época mági-
ca, quando tarefas geralmente tomadas por comuns fize-
ram brotar um lugar sagrado pela mente compassiva de
seres humanos decididos a produzir benefícios incomensu-
ráveis e atemporais.
Esse, aliás, é o ponto principal da vida na comunida-
de do Khadro Ling. Toda e qualquer tarefa serve como su-
porte para a prática espiritual e tem como objetivo trazer
benefícios para todos os seres. Na parede em frente à pia
onde se lavam os pratos, vê-se um cartazete sugerindo que
o ato de limpar a louça seja utilizado para treinar a mente,
direcionando-a para um tipo de compaixão infinitamente
expansiva. O texto diz ao lavador para imaginar o prato
como o universo inteiro e os restos de comida como os
obscurecimentos mentais dos seres. Visualizações como essa
parecem corriqueiras mas são extremamente poderosas e
purificadoras do egoísmo, o principal obstáculo ao cresci-
mento espiritual.
Rotina de dedicação
Depois da morte do generoso e diligente professor, a
direção espiritual e administrativa do centro ficou a cargo
da Lama americana Chagdud Khadro. Esposa de Rinpo-
che desde meados dos anos 70, ela mantém as atividades
do Khadro Ling com a ajuda de praticantes e Lamas resi-
dentes previamente treinados pelo mestre tibetano. Ape-
sar de a principal atribuição dos Lamas estar na orientação
espiritual, todos também têm algum grau de envolvimento
nos afazeres diários, seja cuidando de assuntos administra-
tivos, seja colocando a mão na massa na hora de construir
um novo monumento.
No Khadro Ling, o dia começa cedo. Muito antes
do sol nascer, já há alunos acordados fazendo suas práti-
cas individuais nos quartos ou residências desde as 4h30.
Às 6h todos se encontram no templo para a primeira prá-
tica coletiva do dia, que envolve meditação por meio de
visualizações, gestos e mantras. A partir daí, a maior par-
te das pessoas, incluindo Lamas, toma conta de funções
gerais, cuidando da loja, das traduções e publicações de
MAIS IMPORTANTE DO QUE
VIVER NO TEMPLO É VIVER
O BUDA A CADA MOMENTO
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Lugar
82882 templobudista.p65 4/27/05, 6:29 PM8
texto, manutenção física das instalações, entre todas as
necessidades que uma comunidade do tamanho do Kha-
dro Ling apresenta. Às 19h, novamente os moradores se
reúnem no templo para a prática do final de tarde. Os
engajados em outras práticas específicas continuam noite
adentro refinando sua mente por meio dos sofisticados
métodos do budismo tibetano vajraiana da linhagem
nyingma. São observados atentamente por lamparinas,
pinturas, textos sagrados e centenas de estátuas das di-
versas emanações do Buda.
Moradores e visitantes
Quem quer morar no Khadro Ling deve antes con-
versar com um dos Lamas residentes. Se o professor achar
benéfico para a pessoa, vai autorizar sua mudança. Em al-
guns casos, os Lamas convidam praticantes para residir lá,
caso isso venha a contribuir para a prática do futuro mora-
dor. A partir daí, de acordo com as possibilidades e condi-
ções, o praticante vai construir sua casa num pedaço de
terra cedido por comodato ou instalar-se em um quarto
alugado. Há moradores que sobrevivem de suas aposenta-
dorias, poupanças, aluguéis de imóveis em outras cidades e
há os que pagam suas despesas no Khadro Ling com traba-
lho. Ainda há uma curiosa situação para os ocidentais:
benfeitores que patrocinam os retiros de praticantes mais
dedicados, pagando todas as suas despesas para que eles
possam praticar formalmente em tempo integral.
Além do grupo de residentes, há uma imensa popu-
lação flutuante que vem buscar ensinamentos com o intui-
to de levá-los para seu dia-a-dia. Ao longo do ano, diversos
eventos são realizados, muitos dos quais com a presença de
grandes Lamas que vêm de longe para ensinar. O Khadro
Ling, então, ganha outros ares, com uma movimentação
constante e uma mistura de línguas. O inglês é quase o
idioma oficial para a comunicação entre os alunos que tro-
cam sua rotina comum por alguns dias ou semanas de trei-
namento da mente dentro de um contexto mais litúrgico.
Essa é uma atitude muito estimulada pelos Lamas:
TODA TAREFA PODE SER USADA COMO PRÁTICA
ESPIRITUAL. BASTA A MOTIVAÇÃO CORRETA
Estilo Zaffari 79
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texto, manutenção física das instalações, entre todas as
necessidades que uma comunidade do tamanho do Kha-
dro Ling apresenta. Às 19h, novamente os moradores se
reúnem no templo para a prática do final de tarde. Os
engajados em outras práticas específicas continuam noite
adentro refinando sua mente por meio dos sofisticados
métodos do budismo tibetano vajraiana da linhagem
nyingma. São observados atentamente por lamparinas,
pinturas, textos sagrados e centenas de estátuas das di-
versas emanações do Buda.
Moradores e visitantes
Quem quer morar no Khadro Ling deve antes con-
versar com um dos Lamas residentes. Se o professor achar
benéfico para a pessoa, vai autorizar sua mudança. Em al-
guns casos, os Lamas convidam praticantes para residir lá,
caso isso venha a contribuir para a prática do futuro mora-
dor. A partir daí, de acordo com as possibilidades e condi-
ções, o praticante vai construir sua casa num pedaço de
terra cedido por comodato ou instalar-se em um quarto
alugado. Há moradores que sobrevivem de suas aposenta-
dorias, poupanças, aluguéis de imóveis em outras cidades e
há os que pagam suas despesas no Khadro Ling com traba-
lho. Ainda há uma curiosa situação para os ocidentais:
benfeitores que patrocinam os retiros de praticantes mais
dedicados, pagando todas as suas despesas para que eles
possam praticar formalmente em tempo integral.
Além do grupo de residentes, há uma imensa popu-
lação flutuante que vem buscar ensinamentos com o intui-
to de levá-los para seu dia-a-dia. Ao longo do ano, diversos
eventos são realizados, muitos dos quais com a presença de
grandes Lamas que vêm de longe para ensinar. O Khadro
Ling, então, ganha outros ares, com uma movimentação
constante e uma mistura de línguas. O inglês é quase o
idioma oficial para a comunicação entre os alunos que tro-
cam sua rotina comum por alguns dias ou semanas de trei-
namento da mente dentro de um contexto mais litúrgico.
Essa é uma atitude muito estimulada pelos Lamas:
TODA TAREFA PODE SER USADA COMO PRÁTICA
ESPIRITUAL. BASTA A MOTIVAÇÃO CORRETA
Estilo Zaffari 79
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em vez de a pessoa abandonar sua vida cotidiana, renunci-
ando aos bens materiais por motivos supostamente mais
elevados, como reza o clichê, retirar-se durante um tempo
e depois voltar para casa utilizando fatos mundanos como
combustível para a reflexão e a prática espiritual. Isso por-
que o simples impulso de largar tudo e ir em busca de um
suposto paraíso místico pode ser, na verdade, uma fuga e
terminar como mais uma fonte de frustração. Não são pou-
cos os que chegam ao centro budista cheios de delírios de
bem-aventurança. Esses, ao se depararem com a disciplina
que uma prática espiritual genuína exige, em pouco tempo
mostram que tudo o que queriam era tirar umas férias dife-
rentes. Quando a decepção é maior que a ligação espiri-
tual, eles vão embora e nunca mais retornam. Quando a
motivação autocentrada é percebida e abandonada, eles se
conectam à essência dos ensinamentos, que é praticar para
trazer a iluminação para todos os seres e não apenas para
conquistar algum tipo de paz e conforto.
MUITOS VÃO
EMBORA LEVANDO
UM POUCO DO
TEMPLO NO
CORAÇÃO. E VEM
BUSCAR MAIS
80 Estilo Zaffari
82882 templobudista.p65 4/29/05, 9:40 AM10
A verdade é que não há uma regra. Nem todos de-
vem ir morar no templo e nem todos devem continuar a
focar-se na carreira profissional e nas relações familiares.
Cada caso é um caso e tem seu remédio específico. A prá-
tica espiritual autêntica está em confrontar as próprias ca-
rências e inseguranças em vez de projetá-las nos outros, o
que pode ser feito em qualquer situação e em qualquer lu-
gar. Ao transferir-se para uma comunidade espiritual, não
é raro a pessoa começar a ver seus antigos obstáculos se
manifestando no convívio diário do centro. Isso não é uma
dificuldade em si, desde que se tenha a maturidade de en-
xergar os empecilhos como parte do processo de cresci-
mento e não como uma barreira.
Se você quer só fugir dos seus problemas, um centro
budista não é o lugar mais recomendado. Agora, se você
quer observá-los com profundidade e aprender com eles a
libertar outros seres das mesmas armadilhas, apareça no
Khadro Ling.
VISITAÇÃO & HOSPEDAGEM
O KHADRO LING ESTÁ ABERTO AO PÚBLICO DIARIAMENTE DAS 9H
ÀS 12H E DAS 13H ÀS 17H. NO ENTANTO, LIGUE SEMPRE ANTES DE
IR, POIS DURANTE QUALQUER EVENTO OS HORÁRIOS SÃO ALTERA-
DOS E HÁ MOMENTOS EM QUE VOCÊ NÃO PODERÁ CONHECER O IN-
TERIOR DO TEMPLO.
NENHUMA TAXA É COBRADA PARA A VISITA. O TEMPLO SOBREVIVE
DE DOAÇÕES. CONTRIBUIÇÕES ESPONTÂNEAS SÃO BEM-VINDAS.
PEÇA INFORMAÇÕES ATRAVÉS DO E-MAIL [email protected]
OU PELOS TELEFONES (51) 546.8200 E (51) 546.8261
A HOSPEDAGEM É RESTRITA A PARTICIPANTES DE RETIROS E
EVENTOS.
NO MOMENTO, O KHADRO LING NÃO ESTÁ ACEITANDO NOVOS
MORADORES FIXOS.
SE VOCÊ DESEJA CONHECER UM POUCO MAIS SOBRE AS PRÁTICAS
ANTES DE IR A TRÊS COROAS, VISITE UM DOS CENTROS DO CHAGDUD
GONPA. HÁ SEDES OU GRUPOS DE PRÁTICA EM VÁRIAS CIDADES DO
ESTADO. VEJA OS ENDEREÇOS E TELEFONES EM WWW.CHAGDUD.ORG/
PT/CENTROS/BRASIL/SUL.HTM
Estilo Zaffari 81
82882 templobudista.p65 4/29/05, 9:41 AM11
Bem Viver
O congelamento de óvulos já é viável
PRESERVANDO A FERTILIDADE
Algumas situações da vida moderna podem fazer com
que a mulher se depare com a infertilidade por perda de fun-
ção dos ovários (órgãos que produzem os óvulos). Uma des-
sas situações é a mudança do papel social e profissional da
mulher, que nos últimos tempos tem levado ao adiamento
da gravidez. O incremento de atividades laborais pode retar-
dar o casamento ou levar à demora em encontrar o parceiro
ideal. Também não é incomum os casais esperarem mais tem-
po para ter filhos, até que as condições financeiras e psicoló-
gicas o permitam. Entretanto, sabe-se que quanto mais tar-
de, mais difícil pode ser engravidar. A biologia dos óvulos
femininos permanece inalterada, não acompanhando o de-
sejo de iniciar a constituição da família tardiamente. A ferti-
lidade das mulheres, que nascem já com um número estabe-
lecido de óvulos, começa a diminuir aos 35 anos, sendo esta
queda mais marcante a partir dos 40 anos.
Até recentemente não era possível armazenar óvulos como
os homens fazem com os espermatozóides há várias décadas. O
congelamento esbarrava em dificuldades técnicas, decorrentes
das características celulares dos óvulos: por serem células gran-
des e complexas, acabavam sendo danificados durante o pro-
cesso. Com algumas modificações técnicas introduzidas nos úl-
timos cinco anos, este procedimento tornou-se viável.
O congelamento de óvulos pode deter o “relógio bioló-
gico” e possibilitar filhos nas situações em que há necessidade
de postergar a gravidez. Esta técnica também representa uma
esperança para aquelas mulheres que necessitam combater
doenças malignas com a quimioterapia, que pode levar à des-
truição dos óvulos. Visto que atualmente a maioria das
neoplasias já tem cura, preservar a fertilidade dessas pacientes
significa diminuir ainda mais as seqüelas e proporcionar
restabelecimento físico, mental e social. Congelamento de frag-
mentos de ovário também pode ser utilizado nessas situações.
Outra utilidade do congelamento de óvulos é ser uma
alternativa para os casais que se submetem à fertilização in
vitro e não se sentem confortáveis com o congelamento de
embriões por razões éticas, morais e religiosas.
A coleta dos óvulos é feita da mesma forma que para a
fertilização in vitro: a mulher recebe hormônios para produzir
vários óvulos naquele ciclo, durante um período de 10 a 20
dias; os óvulos são aspirados através do ultra-som e são anali-
sados no laboratório. Os que forem considerados adequados
são congelados. Quando a mulher ou o casal decidirem que
chegou a hora dos filhos, os óvulos são descongelados e in-
seminados com os espermatozóides do futuro pai.
Este avanço da ciência é um procedimento novo, mes-
mo na área da reprodução assistida. Estima-se que existam
pouco mais de 100 crianças nascidas em todo o mundo a
partir de óvulos congelados. No Brasil, a técnica foi intro-
duzida pioneiramente pelo Rio Grande do Sul, e a primeira
criança nasceu em 2002. Antes de optarem pelo congela-
mento de óvulos, as mulheres ou casais devem ser ampla-
mente esclarecidos sobre esta nova tecnologia.
M A R I A N G E L A B A D A L O T T I
MARIANGELA BADALOTTI É CHEFE DO SERVIÇO DE GINECOLOGIA
DO HSL/PUCRS, DIRETORA DO FERTILITAT – CENTRO DE MEDICINA
REPRODUTIVA E COORDENADORA DO DEPARTAMENTO
DE GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA DA FAMED/PUCRS
82 Estilo Zaffari
82882 bem Viver mariangela.p65 4/28/05, 11:15 AM1
Perfil
Zeca
O mundo de
P O R P A U L A T A I T E L B A U M F O T O S A N G E L A F A R I A S
O mundo dá muitas voltas. Numa dessas, Zeca
Camargo trocou a MTV pela Globo e virou um dos ân-
coras do Fantástico. E foi no programa de maior audi-
ência da TV brasileira que ele e um cinegrafista percor-
reram 103.792 quilômetros em diferentes continentes.
Uma distância que corresponde a duas voltas em torno
da Terra. Com a participação do público, que escolhia
entre dois roteiros, e sob o olhar atento de milhões de
brasileiros, eles andaram por 17 países em quatro me-
ses. México, Havaí, Nova Zelândia, Tasmânia,
Cingapura, Camboja, Filipinas, Rajastão, Sri Lanka,
Uzbequistão, Romênia, Turquia, Grécia, Quênia, País
Basco, Escócia e Ilha da Madeira foram os destinos. Pra
ser honesta, não acompanhei essas viagens fantásticas
do Zeca. Pouco ligo a televisão no domingo. Foi por isso
que só tomei conhecimento da coisa toda quando li
A Fantástica Volta ao Mundo, onde o jornalista mostra os
bastidores de sua aventura. É nesse livro que ele conta,
por exemplo, que as piores experiências gastronômicas
foram – prepare-se para dizer “blergs” – estômago de boi,
no México, ovo de pato fecundado, nas Filipinas, folha
enrolada com especiarias, na Índia, e jantar de congela-
dos, em Honolulu. Pra compensar, ele cita os melhores
manjares, que incluem delícias indianas, e também enu-
84 Estilo Zaffari
82882 perfil zecacamargo.p65 4/29/05, 10:35 AM2
82882 perfil zecacamargo.p65 4/27/05, 7:45 PM3
O ASSÉDIO É MAIS BRANDO. SOU UM JORNALISTA, É
mera as paisagens mais exuberantes da viagem – agora é
a vez de dizer “uau” –, que foram o Vulcão Diamond
Head, em Honolulu, o Pico do Areeiro, na Ilha da Ma-
deira, em Portugal, as Rochas de Meteora, na Grécia, o
Lago Wakatipu, em Queenstown, na Nova Zelândia, e
a Península da Tasmânia, na Austrália. Só que essas não
são as únicas listas que você vai encontrar no livro.
Amante confesso de listagem do tipo “dez mais”, Zeca
espalhou pelas suas mais de 400 páginas coisas como os
cinco lugares mais estranhos de que aprendeu a gostar,
as cinco melhores primeiras impressões, os três lugares
mais assustadores, as quatro piores “roubadas” em ho-
téis, os cinco meios de transporte mais bizarros, os qua-
tro lugares mais perfumados, as cinco línguas mais curi-
osas e os quatro encontros memoráveis com animais.
Pra descobrir o que há nessas listas, você terá que ler
A Fantástica Volta ao Mundo. Mas se o que você quer é
só descobrir um pouquinho mais sobre o Zeca Camargo,
então ler esta entrevista já basta. Pra começar, vale dizer
o óbvio: Zeca é inteligente e bem informado e, além da
MTV e da Globo, seu currículo traz passagem pela TV
Cultura, Folha de S.Paulo e revista Capricho. Quer sa-
ber mais? Ele nasceu em 1963 em Uberaba, Minas Ge-
rais. É do signo de Áries, já foi mochileiro, aos 17 anos,
adora a Índia e quer ir para a China, gosta de cozinhar
e é do tipo que não viaja sem sair do lugar. Ah, e é ultra-
exigente consigo mesmo, fica brabo se alguma coisa
não sai exatamente como ele imaginava (essa conclu-
são foi minha). Conversei com Zeca em março, quando
ele esteve em Porto Alegre para lançar e autografar o
livro. Entre outras coisas, ele falou que não se conside-
ra uma celebridade. Acho que ele deve ter esquecido
que, no Brasil, só quem vive longe da civilização e da
luz elétrica não o conhece. Além do mais, pesquisando
na Internet, descobri que existe o Fã-Clube Oficial do
Zeca Camargo, com direito às últimas notícias e fotos.
Depois ele vem dizer que não é uma cele -
bridade... Então tá...
86 Estilo Zaffari
82882 perfil zecacamargo.p65 4/29/05, 10:36 AM4
DIFERENTE DE SER ATOR, QUE TEM UMA TIETAGEM
“FOI NESSE DIA QUE COMI A COISA MAIS ESTRANHA
DE TODA A VIAGEM. AGORA JÁ POSSO FALAR: NADA SUPE-
ROU O BALOT! PARA OS NÃO INICIADOS (MEU CASO), A
IGUARIA ME FOI APRESENTADA DA MANEIRA MAIS CRUA:
OVO DE PATO FECUNDADO. NÃO SEI BEM COMO CHAMAR
ISSO. A PRONÚNCIA É ALGO COMO “BALÚTH”. TENTANDO
DESCREVER: É UM OVO COZIDO, DE PATO; SÓ QUE A GEMA,
BEM, NÃO É MAIS GEMA, É UM EMBRIÃO; ENTENDO POU-
QUÍSSIMO DO DESENVOLVIMENTO DOS BICHOS ANTES DE
ELES NASCEREM (ALIÁS, ENTENDO POUCO TAMBÉM DO DE-
SENVOLVIMENTO DEPOIS DE ELES NASCEREM...), MAS ACHO
QUE O QUE É COZIDO ALI NO BALOT JÁ É UM FETO. QUER
CONFERIR? PENAS? TEM. OSSINHOS? TEM. BICO? TEM. PES-
COÇO? TEM. TEM TUDO! E FICA LÁ, ENROLADINHO. E NÃO
SERIA EXAGERO CONTAR QUE A SENSAÇÃO É DE QUE O
BICHO ESTÁ TE OLHANDO...”
“A COMEÇAR PELO CAFÉ DA MANHÃ DE BEIRA DE
ESTRADA (MAIS PRECISAMENTE, DE BEIRA DE ESTRADA
NO UZBEQUISTÃO), QUE INCLUÍA CHÁ, PÃO E KEBAB!
KEBAB? KEBAB! ESPETINHO – ÀS 8H30 DA MANHÃ! NADA
COMO UM BOLINHO DE CARNE MOÍDA AMASSADA E ENFIA-
DA NO ESPETO QUE VAI DIRETO PRA UMA CHURRASQUEI-
RA – AQUI, GERALMENTE IMPROVISADA COM TIJOLOS –
PARA ABRIR SEU DIA.
O FAVORITO DOS UZBEQUES (E QUE NÓS, DEDICA-
DOS TURISTAS, NÃO RECUSAMOS) É O DE CARNE DE CAR-
NEIRO. ESPECIALMENTE RECOMENDADO PARA AS 8H30
DA MANHÃ! A SORTE É QUE, MAIS ADIANTE, DEZENAS DE
MULHERES VENDIAM LINDOS BALDES REPLETOS DE MA-
ÇÃS – BEM PEQUENAS, QUASE DO TAMANHO DE UMA
AMEIXINHA, MAS EXTREMAMENTE DOCES –, E ISSO DEU
UMA BALANCEADA NA NOSSA DIETA.”
DOIS TRECHOS DE “A FANTÁSTICA VOLTA AO MUNDO”
Estilo Zaffari 87
82882 perfil zecacamargo.p65 4/29/05, 10:36 AM5
Perfil
NUNCA FUI PRECONCEITUOSO. AGORA EU POSSO
ESCREVER PORQUE SENTI: TODO MUNDO É IGUAL
O QUE MUDA DEPOIS DE UMA VOLTA AO MUNDO?
Essas diferenças que eu considero ultra-superficiais,
como de cultura, se você vencê-las, vai encontrar pessoas
muito interessantes que poderiam ser seus amigos, seus na-
morados, qualquer coisa assim, entende? Mas você precisa
vencer um preconceito.
OU SEJA: VOCÊ VOLTOU DA VIAGEM COM MENOS PRECONCEITO.
Eu consolidei isso, nunca fui preconceituoso. Só que
agora eu posso escrever porque senti: todo mundo é igual.
Eu tenho a prova empírica do que eu já achava intuitiva-
mente. Isso vale pra mim.
QUAL O SOUVENIR ESPECIAL QUE VEIO NA SUA BAGAGEM?
A coisa mais linda que eu trouxe foi da Índia, é um
teatrinho, uma pecinha de madeira. Tem de vários tama-
nhos, mas eu trouxe uma bem pequenininha. É um brin-
quedo de criança, como um altarzinho, e conta a passagem
de uma lenda hindu. E é tão bonitinho... Eu já gosto de
coisa indiana, sempre gostei.
VOCÊ ACREDITA QUE TEM ALGUMA LIGAÇÃO ESPIRITUAL COM O
ORIENTE?
Eu não sou espiritualizado, porém eu tive momentos
muito reveladores na viagem, um deles foi no Sri Lanka,
saindo de um templo na montanha. Lá tem um santuário
onde fica uma suposta relíquia, que é um dente de Buda,
mas você nem vê, porque só o imperador tem direito de ver
aquilo. Saindo desse templo, tem uma árvore que nasceu
de um ramo da árvore original onde Buda sentou e chegou
ao Nirvana, e aí posso acreditar nessa história ou não, mas
era uma árvore tão bonita, larga, cheia de bandeirinhas
coloridas, e no pé dela centenas de Budas de todos os tipos.
Um lugar muito sereno, mesmo com um monte de gente
em volta eu resolvi ficar sentado ali olhando. Foi um mo-
mento muito especial da viagem.
QUAIS FORAM AS MELHORES EXPERIÊNCIAS GASTRONÔMICAS?
Na Índia... cada banquete maravilhoso. Eu tive a sor-
te de ficar na casa de um amigo meu, e a mãe dele cozi-
nhava pra gente. No primeiro dia, tinha um café da ma-
nhã maravilhoso, muito estranho na verdade, um
macarrãozinho que parecia um arroz doce, uma sopa de
tomate, aquele pão frito que é uma delícia. Em Odaipura,
no final da viagem, nós fizemos uma extravagância, fica-
mos em um palácio e pedimos uma dieta digna de um
marajá, era um prato enorme com uns doze pratinhos em
volta, cada um deles com uma coisinha ultradeliciosa.
VOCÊS COMIAM MUITO?
Muito, sim, muito. Como a rotina era muito maluca, a
gente comia a toda hora. Churrasquinho de carneiro com
pão na beira de estrada como café da manhã, por exemplo...
VOCÊ COZINHA, É UM GOURMET?
Cozinho, cozinho bastante.
TROUXE RECEITAS?
Trouxe, mas é difícil conseguir todos os ingredientes.
QUAL A SUA ESPECIALIDADE?
O cuscuz que eu faço, muito bom! Com camarão e
rúcula, fica muito gostoso. Mas cuscuz é fácil, né?
DEPENDE...
É, tem que ter um toque pessoal.
VOCÊ É PERFECCIONISTA?
Um pouco... Na verdade eu sou CDF, se eu me pro-
pus a fazer alguma coisa, tem que sair direitinho. E tem
uma coisa de desafio. Eu sou meu chefe, eu não gosto de
ser cobrado. Se alguém me pede pra fazer alguma coisa,
eu quero entregar do jeito que me pediram pra fazer, essa
é minha meta. Caso eu não consiga, fico bravo comigo
mesmo.
PUXA, QUAL O TEU SIGNO?
Sou ariano.
88 Estilo Zaffari
82882 perfil zecacamargo.p65 4/29/05, 10:36 AM6
DE TODOS OS LUGARES EM QUE VOCÊ ESTEVE, QUAL VOCÊ
DIRIA QUE AS PESSOAS NÃO PODERIAM DEIXAR DE CONHECER?
A Índia, eu sou doido pela Índia, já fui quatro vezes e não
conheço tudo.
POR QUE A ÍNDIA?
Porque é muito diferente do nosso referencial. Você ali é
forçado a pensar em outros referenciais. E não é só pelo esoterismo.
A Índia tem uma cultura pop violenta, uma indústria cinemato-
gráfica maior do que Hollywood, a música é louca, tem todos os
gêneros, tudo misturado e intenso, muito intenso. Não gostaria
de morar lá, pra trabalhar é muito difícil. Um dia eu fui tentar
trocar dinheiro num banco da Índia, e uma operação que leva
minutos em qualquer lugar do mundo lá levou duas horas e
quarenta. É infernal.
SE PUDESSE ESCOLHER, ONDE VOCÊ QUERIA TER NASCIDO?
Ah, com certeza no Brasil. Não é nem ufanismo, mas é que
ser brasileiro te obriga a ser curioso, ávido de informação, te obri-
ga a ter uma personalidade muito forte. E quando você viaja
descobre que é brasileiro pelas negativas. Tipo: olha, eu não sou
esse cara, eu não sou turco, eu não sou grego, eu não sou
cambojano, e aí você vai se reafirmando mais ainda. Essa não-
identidade, que acaba sendo a própria identidade, é a coisa mais
positiva. Eu não queria ter nascido em outro lugar do mundo e
hoje em dia não queria morar em nenhum outro lugar do mun-
do. Eu quero viajar pra tudo quanto é lugar, mas eu quero morar
no Brasil.
ALGUM PROJETO A CURTO PRAZO?
Tenho um projeto pessoal: eu queria ir pro Butão e pra Chi-
na.
E ALGUMA COISA QUE VOCÊ QUERIA FAZER MAS NÃO TEM TEM-
PO?
Escrever meu segundo livro, de entrevista sobre música. Por
enquanto, só escrevi o título... “De A-ha a U2”...
VOCÊ ASSISTE A MUITA TV?
Assisto a bastante TV, sim, mas sempre menos do que
SER BRASILEIRO TE OBRIGA A SER CURIOSO, ÁVIDO
90 Estilo Zaffari
82882 perfil zecacamargo.p65 4/29/05, 6:50 PM8
eu gostaria... é tanta coisa pra ver... contando os programas a
cabo, então...
QUAL O SEU PROGRAMA FAVORITO?
Adoro comédias, e a minha favorita é uma que se cha-
ma “Curb Your Enthusiasm”, criada e protagonizada por um
dos criadores de “Seinfield”, Larry David – e é sensacional!
VOCÊ ESTRANHA CHEGAR EM OUTRO PAÍS E NÃO SER RECO-
NHECIDO NA RUA?
Não tem o menor problema, porque eu não fui pra te-
levisão procurando assédio. Fora do Brasil, pra trabalhar, é
muito mais fácil. Porque o assédio atrapalha o trabalho,
você tá se deslocando pra outro lugar, você precisa chegar,
e demora porque pára pra falar com as pessoas. Mas, no
meu caso, o assédio é muito mais brando. Eu sou um jorna-
lista, é diferente de ser um ator, que tem uma tietagem.
Tem sempre uma reverência, só que a pessoa não chega a
falar “ai, você é lindo”, ela diz “gosto do seu trabalho”, e
isso é bacana. Pra falar a verdade, no meu dia-a-dia, isso
não atrapalha nem um pouco.
QUEM GOSTARIA DE CONVIDAR PRA DAR A VOLTA AO MUNDO
COM VOCÊ?
Quando saio de férias, gosto de ir sozinho... é sério!
Ninguém acredita muito nisso, mas eu prefiro viajar só por-
que é a melhor maneira de conhecer pessoas, absorver os
lugares por onde eu passo e refletir sobre as coisas. Sem
contar que é inspirador: foi durante férias no Vietnã que
eu tive a idéia da Fantástica Volta ao Mundo. Mas se você
me forçar a ter uma companhia... Ernest Schkleton, o gran-
de aventureiro que tentou, em várias expedições, chegar
ao Pólo Sul (sem sucesso, mas cheio de obstinação!!).
O QUE NUNCA FALTA NA SUA MALA, INDEPENDENTEMENTE DO
SEU DESTINO?
Meu iPod.
VOCÊ ACREDITA EM DESTINO?
Não, acredito em acaso!
DE INFORMAÇÃO, A TER PERSONALIDADE FORTE
Estilo Zaffari 91
82882 perfil zecacamargo.p65 29/04/05, 17:069
Assim, ó...
A saga dos nossos “gringos” rende muito romance
Palavras migram, ao longo do tempo. E não apenas viajam na
geografia, acompanhando os deslocamentos humanos; elas passam
de um significado a outro. Dessas viagens resulta a língua nossa de
cada dia, essa espécie de coleção de sabedorias e espantos, que se
revela quando observada de perto.
Tome lá o prezado leitor a palavra romance. Bem no começo
de sua vida ela foi uma forma da então nascente língua francesa, que
veio principalmente do latim, como o espanhol, o português e o ita-
liano. Grafava-se romanz e guardava em sua forma algo de romano,
quer dizer, de coisa relativa a Roma, a sede do império que viveu em
latim por séculos. Nos anos 1100 e 1200, começou-se a observar
que em certos lugares do Império Romano não se falava latim, pro-
priamente, mas uma língua diferente, apenas aparentada, uma lín-
gua romance, parecida com a língua de Roma mas já distinta.
Em seguida, passou-se a dizer que as histórias relatadas nessa
nova língua eram histórias romances. Que peripécias se contavam
então? Histórias de valentia e de amor. Nasceram os romances de
cavalaria, que juntavam guerra e sentimento, naqueles extraordiná-
rios feitos dos cavaleiros de Carlos Magno e do rei Arthur. Mais adi-
ante, a palavra romance concentrou-se na significação genérica de
relato da história de uma vida, em geral marcada por grandes e in-
tensos lances de amor e desamor. Daí que hoje em dia, na linguagem
geral, a mesma palavra romance signifique, essencialmente, um
envolvimento amoroso, uma paixão, um amor. Toda aquela história
multicentenária veio parar nesse inesperado lugar.
Outras voltas semânticas aconteceram com a palavra gringo.
Há hipóteses fantasiosas variadas para sua origem, como aquela que
afirma ter a palavra nascido da contração de Green, go!, do inglês (Ver-
des, vão embora!), palavras que teriam sido usadas por mexicanos con-
tra o exército norte-americano, em certa época. Em todo caso, parece
mesmo que a origem vem de uma deformação de griego, isto é, grego, em
espanhol: conta-se que alguns conterrâneos de Cervantes chama-
vam de grigo ou de gringo tudo o que não entendiam, tudo o que
parecia grego, língua remota e ininteligível para eles.
No Brasil, a palavra designa os estrangeiros, quaisquer que
sejam; mas aqui no Rio Grande do Sul, gringo ficou como nomea-
ção exclusiva para os descendentes dos italianos. Por quê? Difícil
encontrar resposta direta e definitiva para a questão. Como expli-
car que, na linguagem cotidiana gaúcha, a gente denomine de
alemães os descendentes de imigrantes alemães e chame de gringos
os ítalo-descendentes, sem jamais misturar as duas etnias de ori-
gem européia sob a mesma palavra?
O certo é que os gringos gaúchos começaram a chegar aqui
nos anos 1870 e foram designados para ocupar terras ruins de traba-
lho – terras nas encostas, terras pedregulhentas, terras que não se
entregaram facilmente. Tanto fizeram, que prosperaram e consegui-
ram criar até um pólo metalmecânico fortíssimo, que exporta cami-
nhões e ônibus para meio mundo, sem que haja uma mina de ferro
num raio de centenas de quilômetros, e isso tudo num lugar que não
fica em beira de mar ou rio, de tal forma que pudessem embarcar seu
produto facilmente. Parece que as adversidades mais aguçaram o
senso de trabalho e dedicação dos colonos, seus filhos e netos.
A mesma natureza que dificultou sua vida no começo foi em
parte responsável pela manutenção das pequenas propriedades, com
agricultura familiar e cooperativas de produção – bem diferente de
regiões em que a antiga vida comunitária foi desalojada para dar
lugar à monocultura da soja. Mantido o núcleo familiar de trabalho,
preservou-se também muito do estilo de vida austero, a ética do tra-
balho duro que recompensa, até mesmo a língua dos pioneiros.
Língua familiar e dialetal, forma popular do italiano culto (onde
por sinal não há a palavra gringo), este por sua vez uma língua deri-
vada do mesmo latim que viu nascer o romance e que viu aparecer a
esquisita palavra gringo. E quanto romance vai ainda ser escrito para
contar a saga dos nossos gringos...
L U Í S A U G U S T O F I S C H E R
LUÍS AUGUSTO FISCHER É PROFESSOR DE LITERATURA E ESCRITOR
MIGRAÇÃO DE PALAVRAS E GENTES
92 Estilo Zaffari
82882 gauchismos.p65 4/28/05, 10:43 AM1