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https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-44782013000400002&lng=pt&tlng=pt.
Acesso em: 21 ago. 2020. REFERÊNCIA SILVA, Rafael Silveira e;
ARAÚJO, Suely Mara Vaz Guimarães de. Ainda vale a pena legislar: a
atuação dos agenda holders no Congresso brasileiro. Revista de
Sociologia e Política, Curitiba, v. 21, n. 48, p. 19-50, dez. 2013.
DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S0104-44782013000400002. Disponível
em:
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Acesso em: 21 ago. 2020.
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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 21, Nº 48: 19-50 DEZ.
2013
RESUMO
AINDA VALE A PENA LEGISLAR:A ATUAÇÃO DOS AGENDA HOLDERS
NO CONGRESSO BRASILEIRO
Rafael Silveira e Silva Suely Mara Vaz Guimarães de Araújo
ARTIGOS
Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 21, n. 48, p. 19-50, dez.
2013Recebido em 12 de julho de 2012.Aprovado em 15 de outubro de
2012.
O artigo analisa a estratégia de atuação de parlamentares que se
dedicam e se destacam na articulação política naarena de produção
de leis, denominados agenda holders. O objetivo é apresentar os
marcos analíticos e o delinea-mento desse conceito no âmbito dos
Estudos Legislativos e propor estratégias metodológicas para a
observação eanálise desses agentes políticos no Congresso Nacional.
Foram empregadas três abordagens diferenciadas, cadaqual formulada
no sentido de selecionar casos em que os parlamentares foram
protagonistas nos processos legislativos.Analisaram-se vários
exemplos, entre os anos 2007 e 2011, que envolveram o fenômeno da
apropriação da agenda dopoder Legislativo, os processos
legislativos realizados por meio das comissões especiais na Câmara
dos Deputadose a participação dos relatores na tramitação das
medidas provisórias. Tais abordagens metodológicas foram
bemsucedidas, resultando em interessantes observações acerca dos
requisitos compartilhados para a atuação do parla-mentar como
agenda holder, tais como sua experiência pregressa e possíveis
especializações, a seniority no Congres-so e sua capacidade de
negociação. As análises também permitiram observar uma ligação
consistente entre assumira condição de agenda holder e
sobrevivência política, bem como as diferenças de atuação entre
deputados e senado-res. Ademais, foi possível verificar a
existência de parlamentares que podem assumir, de acordo com
algumas circuns-tâncias, o papel de anti-agenda holders.
Compreende-se que estudos sobre o comportamento dos agenda
holderspodem enriquecer as análises que abordam as ações do poder
Legislativo, enfatizando, ainda, a necessidade de umavisão mais
apurada sobre a dinâmica da relação entre o Congresso e o poder
Executivo. Além disso, explora-se poroutro prisma a construção de
carreiras políticas, inserindo grau de relevância nas ações dos
parlamentares noprocesso legislativo, a despeito de todas as
dificuldades e limitações. Desse modo, também se resgata o lugar
dosparlamentares na moldagem da agenda legislativa em senso estrito
e na atividade primária de formulação das leis.
PALAVRAS-CHAVE: agenda holder; parlamentares; carreira política;
Congresso; metodologia.
I. INTRODUÇÃO1
Da forma que foi desenhado, o sistema políticobrasileiro
assegura um controle da produção legal deforma quase imperial ao
poder Executivo. Verifica-seque pelo menos 80% das leis federais
são oriundas deproposições legislativas de autoria formal do
Presidenteda República, considerando projetos de lei comple-mentar,
projetos de lei ordinária e medidas provisórias(PEREIRA &
MUELLER, 2000, p. 65; FIGUEIREDO& LIMONGI, 2001, p. 50-51;
AMORIM NETO &SANTOS, 2003, p. 664; PEREIRA, POWER &RENNÓ,
2005, p. 403; AMORIM NETO, 2006, p.
130). Em contraposição, apenas 1,9% das iniciativasdos
parlamentares brasileiros foram convertidas emlei durante o período
de 1990 a 2006 (GARCÍAMONTERO, 2009).
Talvez o país que mais se assemelhe ao Brasil sejaa Argentina,
onde as taxas de aprovação dos projetosde iniciativa dos
parlamentares alcançou pouco maisde 4,2%, entre 1984 e 2007. No
entanto, ao contráriodo que se pode esperar, os legislativos da
maioria dospaíses latino-americanos conseguem converter
seuspróprios projetos em lei, na média, a taxas superioresa 20%,
mesmo contando com poderes executivosfortes na área legislativa
(idem)2.
1 Versão preliminar deste trabalho foi apresentada no I
Seminá-rio Internacional Instituições, Comportamento Político e
Geo-grafia do Voto (Geovoto), realizado em Brasília, em maio
de2012, e no VI Congreso Latinoamericano de Ciencia Política
deAlacip, realizado em Quito, em junho de 2012. Os autores
agra-decem os comentários feitos pelos professores Marcelo
Leiras,Lucio Rennó, Denilson Coêlho e Alejandro Bonvecchi, bem
comoaos pareceristas anônimos da Revista de Sociologia e
Política.
2 De certa forma, quase todos esses países possuem presiden-tes
fortes, mas a configuração institucional entre os poderes decada
república determinam resultados legislativos variados.
Bastacomparar o exemplo do Chile, cuja presidência é tão forte
comoa brasileira em termos de capacidade legislativa, porém
apresen-ta perfil bem diferenciado quanto à participação dos
projetos delei dos parlamentares nos respectivos arcabouços
legais.
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
No Brasil, esse quadro de preponderância doExecutivo sobre o
Legislativo na esfera legiferante temsido explicado,
principalmente, pelas regras presentesna própria Constituição
Federal, que asseguram aoPresidente da República (i) a iniciativa
exclusiva naapresentação das proposições legislativas quedisponham
sobre a administração pública federal emsenso estrito ou sobre a
questão orçamentária; (ii) aprerrogativa da adoção das medidas
provisórias e (iii)o poder de solicitar urgência da tramitação dos
projetosde lei complementar ou ordinária de sua autoria3, assimcomo
pela capacidade de centralização do processodecisório no Congresso
Nacional nos líderes dospartidos políticos que integram a base
política dogoverno. O poder Executivo, na prática, em
açãoarticulada com os líderes, seria o responsável peladefinição da
agenda legislativa.
A leitura mais frequente é a de um CongressoNacional integrado
por parlamentares passivos, que“carimbariam” as propostas
encaminhadas peloPresidente da República e chanceladas pelos
líderesda base aliada. Os deputados federais e senadores, emgrande
medida, delegariam a tarefa de legislar. Essanoção ainda é
reforçada quando se considera que oExecutivo “detém a prerrogativa
de iniciar a legislaçãode maior interesse e, dessa forma, pode
explorarestrategicamente esse direito” (LIMONGI &FIGUEIREDO,
2009, p. 77), indicando que o raio deatuação do parlamentar é
limitado por apenas agir apóso governo ter apresentado sua
proposta. O elevadoíndice de sucesso das proposições
legislativasapresentadas pelo Executivo costuma ser colocadocomo
respaldo empírico dessa leitura.
Nesse quadro, a atuação dos parlamentares na arenalegislativa,
entendida aqui como a arena da produçãode leis4, tende a ser
considerada pouco proveitosapoliticamente, dada a difícil obtenção
de frutos geradosdiretamente no campo eleitoral. Para alguns,
importariamais que os parlamentares mantivessem relações
decordialidade com um Executivo que tem autoridadefinal sobre a
alocação de verbas para o atendimentodas demandas das bases
eleitorais, do que propriamentelegislar (AMES, 2003)5. Para outros,
o que realmente
conta é assegurar a coordenação necessária para aaprovação da
“agenda da maioria”. Esta seria espelhadapor meio das propostas do
Executivo e representaria avontade dos partidos membros da
coalizãogovernamental (LIMONGI & FIGUEIREDO, 2009).
Mesmo que a atividade parlamentar na arenalegislativa enfrente
constrangimentos institucionais,defendemos que a análise mais
detida sobre os trabalhosdo Parlamento pode lançar novas luzes
sobre a interaçãoLegislativo-Executivo no que concerne à
estruturaçãoda agenda governamental e à formulação das baseslegais
das políticas públicas. Não se pode negligenciarque há
parlamentares, de diferentes vínculospartidários, que assumem papel
relevante em váriosprocessos que tramitam no Congresso
Nacional,destacando-se na articulação sobre as matérias emdebate,
bem como na tradução dessa articulação emtextos que garantem
consistência política e técnica àsleis produzidas. Esses
parlamentares seriam os agendaholders (SILVA & ARAÚJO, 2010;
ARAÚJO & SILVA,2012).
Neste artigo, buscaremos delinear o conceito e asestratégias
metodológicas para mapear a atuação dessesparlamentares. As
questões principais são (i) estudarcomo e em que condições um
parlamentar se tornaum agenda holder, proporcionando uma visão
maisdetalhada da relação entre os Poderes Legislativo eExecutivo; e
(ii) identificar o que necessita ser analisadono processo
legislativo movido pelos parlamentarespara a construção das
próprias carreiras políticas, adespeito de todas as dificuldades e
limitações. Dessemodo, também se resgata o lugar dos
parlamentaresna construção da agenda legislativa e na
atividadeprimária de formulação das leis.
Consideramos que a realidade do CongressoNacional é complexa e
que as variáveis geralmenteutilizadas nos estudos legislativos
sobre o caso brasileironão conseguem captar todas as diferentes
facetas doprocesso que perpassa a elaboração de leis (ARAÚJO&
SILVA, 2012). Para que se alcance maior robusteznas análises sobre
o Parlamento, exige-se umaprofundamento sobre o grau de repercussão
daatuação do próprio parlamentar, que ultrapasse a leiturade atores
agindo somente segundo o esquemadicotômico de apoio ou combate às
propostas doExecutivo. Nesse esforço, parece indicada acombinação
de estratégias metodológicas qualitativas
3 A fundamentação desses mecanismos institucionais está nosarts.
61, § 1º, 62, 63, 64, § 1º, 165 e 166 da Constituição Federal.4
Consideramos como “arena orçamentária” toda atividade queenvolve a
aprovação e a execução orçamentária.5 O poder de emenda aos
projetos das leis orçamentárias res-tringe-se às verbas alocadas
para investimento e não podemenvolver gastos destinados a pessoal e
serviço da dívida (art.166 da Constituição Federal). Há limitações
adicionais quantoao número e ao valor das emendas parlamentares
impostas porregras internas do Congresso Nacional. De forma geral,
são regi-
mental e politicamente priorizadas as emendas coletivas(LIMONGI
& FIGUEIREDO, 2009, p. 81). Se individualmen-te considerados,
os membros do Legislativo estão sujeitos naarena orçamentária a
limitações ainda mais fortes do que na arenalegislativa.
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e quantitativas. Desse modo, além de aprofundarmoso conceito,
pretendemos indicar abordagens distintaspara a observação da
atuação dos agenda holders, asquais devem ser lidas como
complementares e nãoexaustivas.
II. CAMINHOS PARA A ATUAÇÃO PARLAMENTAR
Para avaliar-se a capacidade legislativa dosparlamentares,
deve-se adotar como universo decomparação o conjunto de matérias
cujo poder deiniciativa é compartilhado entre o Executivo
eLegislativo6, bem como se faz necessário levar emconta as
alterações realizadas pelos parlamentares nasproposições
legislativas apresentadas pelo Presidenteda República, no curso do
processo legislativo. Aindanão há banco de dados amplo disponível
sobre essasalterações. No entanto, impõe-se compreender que
ainiciativa das proposições legislativas não assegura, porsi só,
que o produto final dos processos reflita aspreferências do
Executivo. Não se podem gerarconclusões sobre a arena legislativa
apenas em facedas restrições institucionais que moldam
seufuncionamento, sem estudar também a sua dinâmicainterna na
prática e respectivos outputs.
No trâmite de projetos de lei, em grande parte dosprocessos
gera-se substitutivo7, ou mesmo váriossubstitutivos. No caso das
medidas provisórias,qualquer alteração, de pequena ou grande monta,
impõea formulação de projeto de lei de conversão8. Sementrar no
mérito das alterações, tomando-se paraanálise, por exemplo, as leis
sancionadas no ano de2010, originadas de medidas provisórias,
verificam-secasos concretos de ampla participação do Congressona
configuração final da lei, especialmente nas matériasnão inclusas
na esfera da iniciativa privativa doPresidente da República. Ao
mesmo tempo, constata-se que, nas propostas relativas à gestão da
máquinagovernamental, os parlamentares tendem a não fazeracréscimos
ou mudanças significativas nas propostasdo Executivo (idem, p.
65-66). Há, também, muitoscasos em que as proposições encaminhadas
peloPresidente da República são apensadas a propostassimilares de
autoria de deputados ou senadores,
previamente em trâmite no Congresso Nacional, assimcomo o
fenômeno da apropriação, no qual projetos delei ou medidas
provisórias do governo são inspiradosem propostas dos parlamentares
previamenteapresentadas (SILVA & ARAÚJO, 2010; ARAÚJO
&SILVA, 2012).
Em face disso, no que tange à atuação parlamentar,deve-se ter
cautela ao julgar resultados pelo quantitativode leis e sua autoria
formal. É necessária maior atençãopara os processos legislativos e
suas diferenças, bemcomo para os resultados de cada uma de suas
etapas.
Como destacado de início, mesmo havendodiferentes leituras sobre
os mecanismos que norteiama atuação parlamentar em nosso
presidencialismo decoalizão, predomina o entendimento de que o
fortepoder legiferante do Presidente da República e acentralização
do processo decisório nas mãos doslíderes partidários no Congresso
Nacional tendem atornar inócua a ação independente e individual
dosdeputados e senadores na produção de leis (ARAÚJO& SILVA,
2013). O curso de ação racional seria aatuação por intermédio dos
partidos políticos, vistoscomo veículos praticamente obrigatórios
para que ospolíticos tenham influência sobre as políticas
públicase, dessa forma, pleiteiem mandatos junto ao
eleitorado(FIGUEIREDO & LIMONGI, 2002).
Embora coloque em evidência que o aumento dasprerrogativas do
Executivo retira do Legislativocapacidade de efetivamente gerar
contribuções para aformulação das políticas públicas, Santos (1997)
admiteque os parlamentares possuem uma gama variada deestratégias
para obter e defender seus mandatos. Dessaforma, mesmo que grande
parte das matérias queganham destaque na pauta política sejam
mediadas porum Presidente da República poderoso e por
partidosfortes na arena legislativa, o referido autor não negaque
pode haver oportunidades para ações parlamentaresindependentes e
individuais.
Entendemos que não pode ser desprezada arelevância do
investimento dos parlamentares naapresentação de projetos de lei, a
despeito das inúmerasbarreiras estabelecidas por nosso sistema
político paraa aprovação dessas propostas. Devemos buscar
talrelevância justamente na premissa de que o político,por razões
individuais ou ideológicas, tem interesseem manter-se no poder,
visando a reeleição ou aincrementar sua carreira política por
diversos meios,entre os quais formular e aprimorar textos
legais.
Podemos traduzir essa atuação como uminvestimento em termos de
capital político,especialmente quando há um reconhecimento
dalegitimidade de determinado indivíduo para agir napolítica
(MIGUEL, 2003). A lógica é simples: quanto
6 Cerca de 40% das leis federais produzidas referem-se a
atosnormativos pontuais, de iniciativa exclusiva do Presidente
daRepública por força de previsão da Constituição Federal,
refe-rentes a créditos orçamentários específicos. Cf. Silva e
Araújo(2013).7 Formulam-se substitutivos quando as propostas de
modifica-ção demandam muitas emendas pontuais e nas situações em
quese intenta unificar em um único texto diferentes propostas.8 Ver
art. 62, § 12, da Constituição Federal.
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
maior o capital político, maior legitimidade e maiordesenvoltura
para atuar politicamente, permitindo aformação de redes partidárias
e extrapartidáriasnecessárias à busca e manutenção do mandato
eleitoral.
Os atores procuram manter a capacidade detransitarem entre
situações políticas distintas ou entreos partidos políticos, sem
perderem suas posições dedestaque. Nessa perspectiva, ganha
relevância oreconhecimento do significado de sua participação
emprocessos que têm potencial para gerarem lei,atendendo à demanda
de seus eleitores. Do ponto devista do parlamentar, o
reconhecimento de sua atuaçãona aprovação de uma proposição
legislativa, seja comoautor, seja como relator, coloca-o
potencialmente emuma posição de destaque diante não somente
doseleitores, mas também de seu partido político, dacoalizão de que
faz parte (governista ou ou oposição)e de seu grupo temático, assim
considerados as frentesparlamentares suprapartidárias organizadas
em prol detemas específicos ou os grupos de pressão que
tenhamvínculos com o parlamentar (ARAÚJO & SILVA,2013).
Quando um parlamentar dedica-se a um ou maisprojetos de lei,
seja como autor, seja como relator, elerealiza um investimento em
seu capital político, quepoderá ter, direta ou indiretamente,
repercussões noâmbito da conexão eleitoral. Com uma atuação
eficaznessa linha, ele poderá ter ganhos políticos, tais comopassar
a ser visto como interlocutor importante emdeterminado tema ou como
um parlamentar“especialista”, ganhar expressão dentro do seu
partidoou grupo partidário e, em decorrência, ser nomeadopara
cargos no Legislativo, como a presidência decomissões ou postos nas
mesas diretoras. Dependendoda questão em tela, também poderá chamar
a atençãodo Executivo, obtendo acesso a importantes recursosna
esfera daquele poder. Mesmo que se entenda que oque realmente conta
é a agenda da maioria (LIMONGI& FIGUEIREDO, 2009), deve ser
percebido que essedestaque poderá implicar a possibilidade de
oparlamentar ser chamado a participar concretamentedo processo que
delineia tal agenda.
Dessa forma, torna-se relevante fazer parte dosprocessos de
discussão e tomada de decisão sobre osprojetos de lei e outras
proposições legislativas, nãoapenas no âmbito dos plenários das
casas legislativas,mas também nas comissões permanentes e
temporárias,especialmente quando o parlamentar está à frente
dedeterminado processo, centralizando as negociaçõesem torno do
futuro texto legal e servindo de ponto dereferência para o governo
e os grupos organizados.Ou seja, aquele que está cuidando e
orientando asdiscussões das matérias em tramitação, enfim,
queconsegue atuar como agenda holder.
III. AGENDA HOLDER: MARCOS ANALÍTICOS
A primeira questão de pesquisa que se coloca ésaber diferenciar
quem são os agenda holders e comoeles atuam, evitando distinções
maniqueístas econsiderando a valorização do papel do Legislativo
emsua função primária de formulação dos textos legais.Não se
objetiva colocar em dúvida a relevância doExecutivo na produção das
leis no país, mas sim trazerà tona elementos para que se
compreendam ascontribuições dos parlamentares, que não se resumema
aprovar propostas acordadas entre o governo e oslíderes
partidários. Outra importante aspecto a serenfrentado é como
estudar a atuação dos agendaholders.
Essas questões configuram verdadeiros desafios,na medida em que
a literatura não trata desse tema, anão ser quando, em estudos de
casos, realizam-serastreamentos de processos que permitem
observarcom detalhes as ações de alguns parlamentares. Aindaassim,
nem sempre, nesses estudos de caso, consegue-se realmente aferir o
grau de participação dos atorespolíticos na esfera legislativa.
Abordaremos essas duas questões de formaintegrada neste
trabalho, esperando despertar interessede outros pesquisadores para
o conceito e a atuaçãodos agenda holders, para que se possam
ampliar aspesquisas sobre o assunto.
Considera-se que um parlamentar atua comoagenda holder quando,
em determinadas matérias, “[...]centraliza articulações políticas
entre os demaisparlamentares, o Poder Executivo e representantes
doempresariado e da sociedade civil organizada, ematuação que tende
a ter repercussões relevantes nostextos legais produzidos” (ARAÚJO
& SILVA, 2013,p. 292).
Um parlamentar que atua como agenda holder nãoo faz apenas
quando é relator. Pode ser o próprio autorque acompanha a
tramitação de sua proposição,participando ativamente das discussões
e negociações,servindo de ponte ao(s) relator(es) ao longo
doprocesso. Pode ser, também, o parlamentar noexercício de função
similar à relatoria, como acoordenação de um grupo de trabalho ou
mesmo opresidente de uma comissão, seja quando avoca a si
arelatoria de uma matéria, seja quando contribuiativamente na
condução das discussões.
Fazendo algumas pontes com a literatura, julgamosque a figura do
agenda holder supera a perspectiva dafunção de advisor ad hoc dos
parlamentares,relacionada aos relatores por Santos e Almeida
(2005),uma vez que o agenda holder não apenas especializa-se sobre
determinada questão, contribuindo com
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elementos informacionais, mas atrai para si parteimportante das
negociações políticas. Ele pode,também, exercer a função de policy
broker junto aoseleitorado e aos grupos interessados, reduzindo o
graude conflito entre eles e contribuindo para que sealcancem
outputs mais consensuais nos processos detomada de decisão
relativos às bases legais das políticaspúblicas (SABATIER &
JENKINS-SMITH, 1993;1999).
Além disso, quando falamos de agenda holdersestamos vinculando a
atuação do parlamentar ao méritodas propostas legislativas, bem
como à viabilização daproposta para ser discutida e votada nas
váriasinstâncias de cada casa legislativa. Isso pode remeter-nos,
eventualmente, à figura do agenda setter. Noentanto, aqui temos de
diferenciá-lo do agenda holder,na medida em que o primeiro exerce
uma função formale específica que o capacita a inserir propostas
nas
pautas de discussão e votação de determinada arenadecisória.
Isso, por si só, não garante que ele seja umagenda holder, a não
ser que também tenha influêncianas discussões e nas articulações
que favoreçam otrâmite legislativo.
Deve ser dito que a condição de agenda holder nãodetermina que o
parlamentar seja neutro, embora doponto de vista democrático e da
qualidade legislativa,agir dialogando e interagindo com as partes
interessadasem um projeto de lei, buscando solução de
equilíbrio,pareça ser a atitude mais desejável para um
parlamentarcom essa condição. O que se quer dizer é que,
conduziruma agenda, ainda que com viés, atraindo a atençãodas
partes envolvidas, entre elas o governo, e,principalmente, gerando
produtos que podem envolverdesde a produção de um parecer até a
construção deum texto que venha a se tornar lei, já torna o
parlamentarum forte candidato a agenda holder.
FIGURA 1 – NÍVEIS DE ATUAÇÃO DOS AGENDA HOLDERS
FONTE: Os autores.
De acordo com a Figura 1, o agenda holder queocupa a posição
“AH1” é o que se vale da vantagem deser agenda setter para atuar
ativamente sobre certamatéria e, concomitantemente, promove
umaaproximação entre as partes interessadas, de maneiraa conduzir a
matéria da maneira consensual possível.Desse modo, podemos
visualizar alguns graus deatuação como agenda holder conforme a
posiçãoinstitucional (agenda setter) e a forma de atuação entreuma
posição mais conciliadora (policy broker) e umaposição mais
favorável a algumas partes envolvidas(viés). Dada a quantidade
restrita de posições deagenda setting, deveremos encontrar atuações
mais
frequentes nos níveis “AH2” e “AH4”.
Cabe então verificar quais estratégias metodológicassão
adequadas para mapear os agenda holders.Primeiramente, poderíamos
observar o conteúdoveiculado pelos meios de comunicação como a
formamais rápida para verificar a que os parlamentares sededicam. É
fácil compreender essa abordagem, tendoem vista que, no fundo,
todos os políticos querematrair a cobertura da mídia para si, além
de a maiorparte deles construírem estratégicas específicas
paraisso. Miguel (2003) é um dos autores que procuraobservar a
mídia como fonte de obtenção de capital
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
político, assumindo que a visibilidade oferecida pelosmeios de
comunicação é condição importante para oreconhecimento público.
Desse modo, a mídiainterferiria na estrutura da carreira política
por meioda produção de capital político, conformando “atalhos”que
permitiriam a postulação de cargos mais elevadose acesso mais
efetivo às estruturas de poder.
A título de exemplo, tomamos dois parlamentaresde partidos com
linhas ideológicas e de atuação bemdiferenciadas e que podemos
considerar, pelo conceitopor nós adotado, como agenda holders
consolidados.Esses dois casos evidenciaram-se nas
primeirasinvestidas de cunho exploratório sobre o tema (SILVA&
ARAÚJO, 2010), mesmo antes de o conceito deagenda holder avançar
com contornos mais nítidos.
Constitui fato público e notório que o Senador PauloPaim (PT-RS)
é um parlamentar que atrai demandaspolíticas em torno dos temas
afetos à questãotrabalhista e previdenciária. Sindicatos,
associaçõespatronais e a imprensa tratam-no como um dosresponsáveis
pelo assunto no Congresso Nacional. “OExecutivo sabe que esse
parlamentar estará envolvidonas negociações em relação a esses
temas, composicionamento crítico mesmo no período em que seupartido
esteja no poder” (ARAÚJO & SILVA, 2013, p.296). Outro exemplo
ilustrativo é o da Senadora KátiaAbreu (PSD-TO). A parlamentar, que
possui grandeinfluência no âmbito da Confederação Nacional
daAgricultura e Pecuária (CNA), tem atuação de destaquenas
negociações sobre a pauta política relacionada, diretaou
indiretamente, à agropecuária. A chamada bancadaruralista é
historicamente numerosa e poderosa, masseus membros não têm o papel
de articulação dasenadora. O Executivo e a imprensa têm
consciênciadisso.
Embora a importância da mídia seja inquestionável,sabemos que a
seleção por parte de quem cobre asatividades parlamentares recai
sobre o que mais chamaa atenção do grande público. Esse aspecto é
maisvalorizado do que o cerne dos debates das centenas deassuntos
que são debatidos no dia-a-dia do CongressoNacional. A imprensa
sabe, seja pela história, seja pelaposição estratégica do
congressista, a quem procurar.No entanto, não se pode desprezar que
há um forteviés nessa seleção, especialmente nos temas abordados.Na
maioria dos casos, o parlamentar que aparece namídia,
posicionando-se sobre determinada matéria, éum ator relevante do
Congresso. Isso não quer dizerque esse parlamentar seja um agenda
holder.
É importante entender que há parlamentares queatuam como agenda
holder que não têm aespecialização temática, nem a força de
articulação,tão em evidência quanto nos exemplos do Senador
Paulo Paim e da Senadora Kátia Abreu. Por isso,percebemos a
necessidade de adotar estratégiasmetodológicas alternativas e
também complementarespara estruturar as análises nesse âmbito,
qualificando-as em termos de maior precisão acerca do
processolegislativo e do papel exercido pelo parlamentar.
Julgamos que as abordagens para a observação daatuação dos
agenda holders podem ser concretizadaspor meio da análise temática,
que se aprofunda noconteúdo dos debates que ocorrem no Legislativo,
oupor meio dos mecanismos de centralização geralmenteadotados para
a tramitação de algumas proposições.
A análise temática exige um conhecimento detalhadodos assuntos
tratados no Congresso Nacional, o querequer familiaridade com os
atores envolvidos e coma forma que geralmente o Legislativo
funciona. Umdos recortes metodológicos que podemos adotar
paraverificar a atuação dos agenda holders pelo tratamentotemático
é observar seus papéis nos processos deapropriação da agenda do
Legislativo, nos quaistambém se pode observar a atuação do
Presidente daRepública. Os casos aqui abordados relacionados aesse
primeiro recorte já haviam sido trabalhadosanteriormente, com olhar
mais voltado para os detalhesda apropriação (SILVA & ARAÚJO,
2010; ARAÚJO& SILVA, 2013).
Pelos mecanismos de centralização, propomos,neste trabalho, dois
caminhos adicionais que podemevidenciar os agenda holders: (i) o
processo legislativorealizado por meio das comissões especiais na
Câmarados Deputados e (ii) a participação dos relatores
natramitação das medidas provisórias. O recorte temporaldo estudo
empírico das comissões especiais e dasmedidas provisórias foi a 53ª
Legislatura (2007-2011).
Na sequência, desenvolveremos cada uma dessastrês trilhas
metodológicas. Como já referido, as trêsalternativas são
complementares, e não exaurem aspossibilidades de outros caminhos
para o estudo dosagenda holders.
IV. AGENDA HOLDERS E A APROPRIAÇÃO DAAGENDA DO LEGISLATIVO9
O fenômeno da apropriação da agenda é verificadoquando projetos
de lei ou medidas provisórias dogoverno são inspirados em propostas
que tramitam noParlamento. A apropriação pode assumir
diferentesfeições e graus, variando da simples abordagem
nasproposições do Executivo de políticas que estavamanteriormente
sendo tratadas pelo Congresso até a
9 Para uma visão sistematizada desta seção, recomendamos vero
Anexo I.
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adoção de cópias literais de dispositivos ou deproposições
legislativas em trâmite. Com isso, tambémse contrapõe a noção de
que as matérias de interessedo Executivo têm origem exclusivamente
dos órgãosda administração pública (SILVA & ARAÚJO,
2010).Excetuando-se as proposições caracterizadas como deiniciativa
exclusiva do Presidente da República,constata-se que, no período de
1995 a 2010, 18,5%das medidas provisórias e 40% dos projetos de lei
doExecutivo surgiram por meio da apropriação da agendado
Legislativo (ARAÚJO & SILVA, 2012).
A condição de agenda holder pode alçar oparlamentar a um
relacionamento especial com o poderExecutivo, quando a matéria da
qual está cuidando, oua própria atuação do parlamentar, chama a
atençãodesse ator político poderoso. É nesse ponto que podeocorrer
a relação entre a figura do agenda holder e ofenômeno da
apropriação da agenda: quanto mais bemarticulada e desenvolvida a
ideia (e o texto) daproposição dentro do Parlamento, maiores as
chancesde haver interesse direto e, consequentemente, de
aproposição ser apropriada pelo Executivo.
As situações que envolvem apropriação da agenda,o agenda holder
pode estar na condição de autor daproposição legislativa ou de
relator que tenha produzidosubstitutivo que sofreu apropriação. Se
esse atorpolítico conseguir tirar proveito desse processo, ouseja,
se conseguiu participar antes ou durante atramitação das propostas
do Executivo que resultaramda apropriação, ele poderá impulsionar
sua carreira esuas chances de continuar compartilhando poder.Assim,
há de se considerar que o fenômeno daapropriação pode trazer,
também, uma oportunidadede aquisição de maiores recursos políticos
para oparlamentar, ampliando as possibilidades de ele pleitearou
indicar cargos no Executivo, ou de ter mais acessoà aprovação e
liberação de emendas orçamentárias(LEONI, PEREIRA & RENNÓ,
2003; PEREIRA &RENNÓ, 2007). Nessa leitura, o estudo do
fenômenoda apropriação pode relacionar as proposiçõeslegislativas
iniciadas pelos congressistas e carreiraspolíticas, com
possibilidade de mútuo benefício paraatores do Parlamento e do
Executivo quando háaproximação de suas preferências (ARAÚJO &
SILVA,2013).
Neste primeiro foco do estudo sobre os agendaholders foram
selecionadas situações de apropriaçãoque já se encontravam
descritas por Silva e Araújo(2010), cujo trabalho abrangeu várias
legislaturas,desde 1995. Essa opção deu-se em razão tanto de
aapropriação tender a evidenciar a efetividade dosparlamentares na
produção das leis, quanto do fato deos respectivos processos
legislativos estarem com seurastreamento previamente realizado.
Trata-se apenas
de uma amostra. Há um conjunto extenso de outroscasos de
apropriação que poderão ser estudados como intuito de identificar e
analisar a atuação de agendaholders.
Após releitura e análise cuidadosa de toda adocumentação dos 20
casos de apropriação levantadospor Silva e Araújo (idem),
concluiu-se que, em setedeles, estavam presentes indicações de
parlamentarescom características de agenda holders.
Cabe explicar que, nos casos de apropriação, exige-se que o
pesquisador realize a análise de cada etapa doprocesso, de modo a
visualizar, em primeiro lugar, qualproposição legislativa resultou
da apropriação. Dessaforma, é importante distinguir qual foi o
“produto”, equal foi o “objeto” da apropriação, especialmente emque
estágio encontrava-se no momento da formalizaçãoda proposição pelo
Executivo.
IV.1. Casos de apropriação
No primeiro desses casos, o produto da apropriaçãofoi parte da
medida provisória que originou as regrasdo programa Minha Casa
Minha Vida (PMCMV). Essamedida provisória (MP 459/2009) teve o seu
capítulosobre regularização fundiária totalmente baseado emum texto
produzido na Câmara dos Deputados, noâmbito do processo em que se
discute, há anos, a futuraLei de Responsabilidade Territorial
Urbana (LRTU) (PL3 057/2000 e apensos). O objeto da apropriação foi
osubstitutivo produzido pelo último relator, o DeputadoRenato Amary
(PMDB-SP), que estava pronto para avotação em plenário.
Amary era deputado federal de primeiro mandato,mas também era um
político experiente, com passagempela Assembleia Legislativa do
estado de São Paulo edois mandatos como prefeito de Sorocaba, uma
dasmaiores cidades do estado de São Paulo. Além disso,como é
empresário do setor imobiliário, era especialistanos assuntos
debatidos no âmbito da LRTU.
Esse parlamentar mostrou sua capacidade dearticulação política
com a aprovação, em 2007, de seusubstitutivo pela comissão especial
criada na Câmarapara tratar da matéria. O processo já havia
passadopor três relatores sem sucesso. Trata-se de debate
queenvolve conflitos entre loteadores e incorporadoresimobiliários,
entidades que integram o movimento dareforma urbana, o Ministério
das Cidades, o Ministériodo Meio Ambiente e organizações não
governamentaisambientalistas, órgãos de defesa do
consumidor,registradores imobiliários e outros atores
(ARAÚJO,2008).
Mesmo com a aprovação na comissão especial,Amary não teve força
para assegurar a colocação deseu texto em pauta para votação final
no plenário da
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Câmara, situação que, provavelmente, decorreu doesfriamento da
demanda política pela LRTU após aocorrência da apropriação e a
consequente inclusãodas normas sobre regularização fundiária na Lei
doPMCMV. Assim, apesar de ter atuado como um agendaholder nos
debates sobre a LRTU, Amary não obtevesucesso na fase final do
processo na Câmara. Como oparlamentar era, à época, filiado ao
PSDB, a condiçãode oposicionista na coordenação de tema com
relevanterepercussão social pode ter levado o Executivo aincorporar
o assunto na referida medida provisória,auferindo os dividendos
eleitorais potencialmentegerados pela autoria das normas nacionais
sobreregularização. Em face do gigantesco número defavelas e outras
ocupações irregulares nas cidadesbrasileiras, cabe considerar que a
votação final daLRTU, que não ocorreu até hoje, poderia ter
contribuídopositivamente para a reeleição do parlamentar. O
seupouco tempo de Câmara é outro aspecto que necessitaser
ponderado. Ele pode não ter tido oportunidade deconsolidar a rede
de relacionamentos necessária parafazer avançar uma matéria
complexa como essa(ARAÚJO & SILVA, 2013).
No segundo caso em que foi identificada a presençade um agenda
holder, o produto da apropriação foi amedida provisória que gerou
as normas nacionais sobreo acesso a medicamentos a baixo custo (MP
154/2003).O objeto da apropriação foi um projeto de lei de
autoriado Deputado Eduardo Jorge (PV-SP), que se propunhaa
disciplinar as farmácias populares (PL 4 702/1994).
Eduardo Jorge era um parlamentar especializadoem saúde e
seguridade social, tendo posteriormenteestendido sua atuação para a
questão ambiental. É umpolítico experiente, que reunia, à época, um
mandatocomo deputado estadual e quatro como deputadofederal, então
pelo Partido dos Trabalhadores (idem).
Na documentação relativa a esse processolegislativo, não há
indicativos de que Eduardo Jorgetenha sido chamado pelo governo
para negociar aapropriação. Considera-se, contudo, que sua
condiçãode agenda holder permitiu que ele auferisse
proveitospolíticos da lei do Executivo que foi aprovada. A ideiada
“farmácia popular” permaneceu ligada a ele.Registre-se que, no
decreto que viria a regulamentar alei, a própria denominação
“farmácia popular” foitextualmente aproveitada.
No terceiro caso que apresenta interesse para aanálise sobre os
agenda holders, o produto daapropriação foi parte do conteúdo da
medida provisóriaque gerou a Lei do Fundo de Manutenção
eDesenvolvimento da Educação Básica e de Valorizaçãodos
Profissionais de Educação – (Fundeb) (MP 339/2006). O objeto da
apropriação foi o estabelecimento
de regras sobre controle social constantes emsubstitutivo de
autoria da Deputada Fátima Bezerra (PT-RN), relativo a um projeto
de lei que dispunha sobre oassunto (PL 241/1999).
Bezerra é pedagoga, com dois mandatos comodeputada estadual e
três como deputada federal.Considera-se que essa parlamentar é uma
agendaholder especializada em educação e cultura,permanecendo hoje
com essa qualificação (idem). Noprocesso de apropriação estudado,
evidencia-se anegociação do Executivo com a parlamentar, uma vezque
ela foi a relatora da medida provisória da Lei doFundeb.
No quarto caso, tem-se como produto daapropriação o projeto de
lei complementar de autoriado Executivo, apresentado em 2008, que
dispunhasobre a cooperação entre os entes federados em termosde
política ambiental (PLP 388/2007). O objeto daapropriação foi um
projeto exatamente com o mesmoobjetivo, o PLP 12/2003, de autoria
do DeputadoSarney Filho (PV-MA). A proposta do governo foiapensada
ao processo previamente em curso, quegerou a lei complementar três
anos depois. Não sepode dizer que o parlamentar obteve proveito
políticocom a apropriação ocorrida. Ele participou diretamentedo
processo de negociação do diploma legal aprovado,em atuação típica
de agenda holder, mas sofreu derrotana votação final em relação a
parte do texto. Essa leicomplementar tem recebido críticas de
algumasentidades ambientalistas.
Sarney Filho tem histórico familiar forte deenvolvimento na
política, tem oito mandatosconsecutivos como deputado federal, com
atuaçãoespecializada na questão ambiental. Foi Ministro
doMeio-Ambiente entre 1999 e 2002 e coordena a FrenteParlamentar
Ambientalista (idem).
No quinto caso, o produto da apropriação foi amedida provisória
que gerou lei concedendo pensãoespecial às pessoas atingidas pela
hanseníase,submetidas a isolamento e internação compulsórios
(MP373/2007). Trata-se de um caso de cópia literal deuma proposição
pelo Executivo. O objeto daapropriação foi projeto de lei de
autoria do SenadorTião Viana (PT-AC), o PLS 206/2006. O
parlamentarparticipou do processo de apropriação, tendo assumidoa
relatoria da referida medida provisória.
Viana tem formação profissional em medicinatropical e foi
governador do Acre. No banco de dadosdo Senado, constam duas
centenas de processos porele relatados, o que indica a consolidação
comoarticulador político, elemento básico da qualificaçãocomo
agenda holder, independentemente daespecialização temática.
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No sexto caso, o produto da apropriação foi oprojeto de lei de
autoria do Executivo que gerou a Leida Política Nacional sobre
Mudança do Clima (PL 3535/2008). O objeto de apropriação foram
doisprojetos de lei, o PL 18/2007 e o PL 261/2007, deautoria
respectivamente do Deputado Sarney Filho edo Deputado Antônio
Carlos Mendes Thame (PSDB-SP).
Assim como Sarney Filho, Thame é umparlamentar especializado em
meio ambiente, tendo seismandatos como deputado federal.
Professoruniversitário na área de agronomia, ele foca com
atençãoespecial as interfaces da questão ambiental com ostemas
agricultura e energia. Coordena o grupo detrabalho sobre energias
renováveis da FrenteParlamentar Ambientalista (idem).
Thame foi relator do projeto de lei que foi produtoda
apropriação. Note-se que a especialização doparlamentar e o fato de
ele ser autor de proposta sobreo assunto contribuíram para que ele
assumisse arelatoria de um processo de interesse direto
doExecutivo, mesmo sendo um deputado da oposição.
Por fim, no sétimo caso, coloca-se como produtoda apropriação a
medida provisória que alterou a Leide Licitações, dispondo sobre o
limite da área ruralque pode ser transferida sem licitação na
Amazônia(MP 422/2008). Trata-se de outro caso de cópia literalde
uma proposição pelo Executivo. O objeto daapropriação foi projeto
de lei de autoria do DeputadoAsdrúbal Bentes (PMDB-PA), o PL 2
278/2007.
Bentes é advogado com histórico de atuação emquestões
fundiárias. Deputado Federal com seismandatos, um número relevante
de relatorias estãoregistradas em seu nome. No caso em tela, ele
atuoucomo relator do produto da apropriação, o que indicarelações
diretas de coordenação com o Executivo. Háindicativos de que os
benefícios auferidos por ele apartir do processo de apropriação
foram significativos.Ele foi escolhido para relatar,
posteriormente, umamedida provisória bem mais ampla sobre
aregularização das ocupações em terras da União naAmazônia (MP
458/2009).
IV.2. Comentário dos casos
Os achados da análise dos agenda holdersidentificados nos
processos em que ocorreuapropriação da agenda do Legislativo
apontam que “[...]para ser e se estabelecer ao longo do tempo
comoagenda holder, são relevantes (i) o passado doindivíduo, sua
biografia, suas possíveis especializações(que aqui também tratamos
como o tema focalizadopelo parlamentar); (ii) a seniority no
Congresso; e (iii)sua capacidade de negociação” (ARAÚJO &
SILVA,
2013, p. 306).
Entende-se que, para que sejam auferidos benefíciospara a
carreira política, a condição de agenda holderexige um esforço
inicial do parlamentar no sentido deconstrução de uma rede de
relacionamentos noCongresso Nacional, que pode ser alcançada
pelaespecialização temática e pela habilidade de negociaçãocom seus
pares. Dos sete parlamentares citados acima,seis deles, em maior ou
menor grau, podem serconsiderados como especialistas, com atuação
políticadirecionada a assuntos determinados. Em certosmomentos,
essa especialização impulsiona até mesmoa diluição da barreira
entre partidos da base e daoposição, como no caso de Thame.
Apenas Viana surge como um parlamentar que, maisdo que
especialização, buscou-se consolidar na funçãode relator. Contudo,
a importância desse perfil para aqualificação como agenda holder
não pode serdesconsiderada, em face do reduzido número de
casosanalisados neste tópico. Além disso, os
parlamentares“especialistas” estudados também acumulavamhistórico
com número relevante de relatorias.
Praticamente todos os agenda holders identificadostinham
bastante tempo de Congresso Nacional. Amaryé exceção, mas seu pouco
tempo no Legislativo federalpode ter sido exatamente um dos fatores
que dificultouque ele fosse bem sucedido tendo em vista a
votaçãofinal da LRTU.
V. AGENDA HOLDERS E AS COMISSÕESESPECIAIS DA CÂMARA10
De acordo com o art. 34 do Regimento Interno daCâmara dos
Deputados, as comissões especiais sãoconstituídas para dar parecer
sobre: (i) proposta deemenda à Constituição; (ii) projeto de código
e (iii)proposições que versarem matéria de competência demais de
três comissões que devam pronunciar-sequanto ao mérito, por
iniciativa do presidente daCâmara, ou a requerimento de líder ou de
presidentede comissão interessada. Nesse último caso, pelomenos
metade dos membros titulares da referidacomissão deve ser formada
por membros titulares dascomissões permanentes que deveriam ser
chamados aopinar sobre a proposição em causa. Como regra
geral,passa a ser atribuição da comissão especial o examede
admissibilidade e do mérito da proposição em tela edas emendas que
lhe forem apresentadas, podendoainda ter poder conclusivo para
alguns casos, se nãohouver recursos para deliberação pelo
plenário.
10 Para uma síntese dos casos aqui tratados, recomendamos
aleitura da tabela constante no Anexo II.
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
Há impactos potenciais sobre a alternativa pelascomissões
especiais, em substituição às de comissõespermanentes. Comandadas
apenas por um presidentee um relator, elas constituem um mecanismo
decentralização das decisões. É justamente por isso queesse
expediente tem sido sistematicamente usado peloExecutivo como forma
de garantir rapidez e reduzir aspossibilidades de mudança em suas
proposiçõesencaminhadas na forma de projetos de lei. O controledos
líderes governistas na indicação dos nomes para acoordenação dessas
comissões e no resultado final dostrabalhos, não resta dúvida, é
maior do que no trâmitenormal nas comissões permanentes. Desse
modo,ganha relevo a questão da disciplina partidária e
doposicionamento do partido político frente à matéria
emanálise.
Nos últimos anos, essa ferramenta tem sido usadacom bastante
frequência, notadamente em temas deimpacto na sociedade, tendo
levado ao esvaziamentoda pauta de determinadas comissões
permanentes. Esseuso estratégico das comissões especiais na
Câmara,constituídas nos processos que envolvem matéria domérito de
mais de três comissões, ainda não mereceuatenção da Ciência
Política. Registre-se que esseinstrumento não existe no Senado.
Entende-se que essas comissões especiais sãoarenas privilegiadas
para a análise de agenda holders.Como um relator apenas, que se
manifestará tantosobre o mérito quanto sobre a admissibilidade
jurídicae, se for o caso, orçamentária, elas potencializarão
aatuação parlamentar no sentido da articulação política,de
negociação com os diferentes gruposgovernamentais e não
governamentais envolvidos nodebate de cada assunto. Basta observar
que a realizaçãode audiências públicas é atividade sistemática
nessascomissões11. Na análise realizada sobre as 33comissões
especiais constituídas na 53ª Legislatura naCâmara dos Deputados,
verificou-se que apenas trêsdelas não realizaram audiências
públicas.
Com variações naturais em razão dasespecificidades do objeto de
cada comissão, em geralforam ouvidos nessas reuniões tanto
representantesdos diferentes poderes da república, com
destaquenatural para o Executivo federal, quanto representantesdo
empresariado, da sociedade civil e da academia12.
Mesmo considerando os limites da 53ª Legislatura,constam três
casos de deputados que trabalharam narelatoria de duas comissões
especiais, o que configuraforte indício de atuação como agenda
holders. Vejamosesses casos.
O Deputado João Maia (PR-RN) é deputado desegundo mandato13, mas
vem de cargos importantesno Executivo em diferentes níveis de
governo. Nosistema de controle da Câmara, constam dez projetosde
lei ordinária de sua autoria e 59 processos relatados,o que parece
indicar uma opção pela atividade derelatoria. O parlamentar foi
relator da comissão especialque se debruçou sobre a Lei do Gás (PL
334/2007 eapensos) e da comissão especial que analisou um
dosprojetos de lei relacionados à exploração do Pré-Sal, aproposta
relativa ao exercício das atividades de pesquisae lavra de
petróleo, de gás natural e de outroshidrocarbonetos fluidos pela
Petrobrás (PL 5 941/2009).Em ambos os casos, houve seis audiências
públicas eformulação de substitutivo às proposições originais
pelorelator. Esses processos contribuíram na publicaçãoda Lei 11
909/2009 e da Lei 12 276/2010. Sem prejuízoda necessidade de
análise de outros fatores envolvidos,o sucesso na aprovação do
texto em lei evidencia opapel de um relator que atua como agenda
holder compapel de relevo nas negociações políticas e,
também,ameniza o grau de conflito entre os atores envolvidos,também
funcionando como policy broker (SABATIER& JENKINS-SMITH, 1993;
1999) A confirmaçãoefetiva dessa atuação demandaria estudo
detalhado dosdois processos legislativos.
Outro caso é do Deputado Carlos Zarattini (PT-SP). No seu
segundo mandato14, com mandatoanterior no legislativo estadual,
possui registrados comode sua autoria 22 projetos de lei ordinária
e 29 processosrelatados. O parlamentar foi relator da
comissãoespecial referente à tarifa social de energia elétrica (PL1
921/1999 e apensos) e da comissão especial quetratou da desoneração
tributária do transporte (PL 1927/2003 e apensos). Em ambos os
casos, houve seteaudiências públicas e formulação de substitutivo
às
11 É preciso destacar que não resta dúvida acerca da atuação
deagenda holders nas comissões permanentes. Ocorre que a
cen-tralização provocada pela criação de comissão especial
tornamais perceptível o trabalho desses atores. As atividades
dosagenda holders nas comissões permanentes devem ser estuda-das
caso a caso, demandando uma análise dos atores na tramitaçãode cada
matéria, que frequentemente passa por mais de umacomissão e,
portanto, pelas mãos de mais de um relator. Issoexige do
pesquisador um esforço de investigação mais detalhadoainda para
distinguir as ações dos parlamentares e verificar ograu de
influência de cada um no processo. A estratégia de estu-dar casos
de apropriação é uma das formas de analisar a atuaçãodos agenda
holders também no âmbito dos processos que tra-mitam pelas
comissões permanentes.
12 Para a lista dos nomes ouvidos nas audiências públicas,
cf.Brasil (2013).13 Legislaturas de 2007-2011 e 2011-2015.14
Legislaturas de 2007-2011 e 2011-2015.
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proposições originais pelo relator. O primeiro
processorepercutiu na publicação da Lei 12 212/2010 e osegundo
ainda tramita, tendo sido o texto do relatoraprovado na comissão
especial e remetido diretamenteao Senado. Nos dois processos,
manteve-se o poderconclusivo da comissão que o analisou, ou seja,
nãohouve aprovação de recurso para análise pelo plenário,o que
indica consenso sobre os textos produzidos.
O Deputado Jorginho Maluly (DEM-SP) surgecomo relator na
comissão especial sobre contratos deseguro privado (PL 3 555/2004 e
apensos) e dacomissão especial da reforma universitária (PL 4
212/2004 e apensos). Esse caso é interessante, pois mostraque a
repetição de atuações na relatoria, isoladamente,não pode ser
adotada como caracterização do agendaholder. Se na comissão da
reforma universitária foramouvidos atores relevantes em seis
audiências públicas,bem como produzido parecer pelo parlamentar,
quenão chegou a ser votado, na comissão sobre contratosde seguro
privado foram realizadas três audiências,mas sequer foi apresentado
parecer. Registre-se queMaluly não foi reeleito.
Na lista de comissões especiais da 53ª Legislatura,surge o
Deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que foi relator na
comissão especial de uma daspropostas legislativas relacionadas ao
Pré-Sal (PL 2502/2007 e apensos). Alves relatou, também, a
medidaprovisória que gerou a Lei do PMCMV, citada nos casosde
apropriação por envolver parte do conteúdo dafutura LRTU.
Esse parlamentar, certamente um dos maisexperientes do Congresso
Nacional, com 11 mandatosde deputado federal15, tem assumido
relatorias deprocessos com maior relevância nos últimos
anos,firmando-se como articulador político independente-mente de
tema. Note-se que nem todos os líderespartidários buscam relatorias
de relevo, o que parecereforçar a qualificação de Alves, pelo menos
atualmente,como um agenda holder.
Como mencionado anteriormente, há alguns casosde parlamentares
que, no decorrer dos anos, firmamatuação em torno de temáticas
específicas,consolidando-se como agenda holders especializados.Os
principais atores envolvidos nesses temas depolíticas públicas
sabem, de antemão, que asnegociações sobre as propostas
legislativas, comoregra, passarão por determinado
parlamentarespecializado. Na lista de relatores das comissões
especiais da 53ª Legislatura, podemos citar a DeputadaRita
Camata (PSDB-ES). Especialista nas causasrelativas a mulheres,
crianças e adolescentes, aparlamentar foi relatora na comissão
especial doatendimento socioeducativo (PL 1 627/2007), emprocesso
no qual ficou caracterizada a atuação comoagenda holder e que gerou
a Lei 12 594/2012. Apesarde não ter sido reeleita para a atual
legislatura, Camatavinha de vários mandatos como deputada
federal16.
Na relatoria da comissão especial do Estatuto daJuventude (PL 4
529/2004 e apensos), tem-separlamentar que também parece estar
seguindo ocaminho da especialização, a Deputada ManuelaD’Ávila
(PCdoB-ES). No referido processo legislativo,parece caracterizada a
atuação como agenda holder,com concentração das negociações nos
entesgovernamentais, que estiveram presentes empraticamente todas
as oitivas públicas.
Merece ser analisado em particular o polêmicoprocesso da nova
lei florestal, também objeto decomissão especial da Câmara na 53ª
Legislatura (PL1.876/1999 e apensos). Foram realizadas 14
audiênciaspúblicas para o debate do projeto, além de um bomnúmero
de reuniões públicas nos estados. Não se podecolocar em dúvida que
o relator, Deputado Aldo Rebelo(PCdoB-SP) envolveu-se com vigor nas
negociaçõescom um conjunto grande de atores governamentais enão
governamentais. No entanto, a atuação comoagenda holder
circunscreveu-se pela evidenciadapostura a favor das demandas das
entidadesrepresentativas dos produtores rurais, o que pareceter
contribuído para o acirramento dos conflitos entreos atores
partícipes dos debates, não para sua redução.Dessa forma, foi um
agenda holder que se distancioudo papel de policy broker.
Avalia-se que, em determinados processos, o fortecontrole do
Executivo não favorece a atuação do relatorcomo agenda holder,
mesmo que tenham ocorridoalgumas audiências públicas e votação.
Esse é o casodas comissões do PL 3 960/2008 (cargos no Bacen
epesca), do PL 5 939/2009 (Pré-Sal/Petrosal) e doProjeto de Lei
Complementar (PLP) 001/2007 (limitesde despesa com pessoal).
Fator fundamental para a ausência de caracterizaçãodo agenda
holder, evidentemente, é a não apresentaçãode parecer pelo relator,
em processos nos quais houvetempo hábil para isso ocorrer. Ademais,
deve-se atentarpara o fato de que nem sempre o relator é o
único
15 Legislaturas de 1971-1975, 1975-1979, 1979-1983, 1983-1987,
1987-1991, 1991-1995, 1995-1999, 1999-2003, 2003-2007, 2007-2011 e
2011-2015.
16 Legislaturas de 1987-1991, 1991-1995, 1995-1999 e 2007-2011.
Mencione-se que, em 2009, a parlamentar saiu do PMDBapós mais de 25
anos de militância no partido.
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
agenda holder no processo. Nas comissões especiaisanalisadas, há
casos em que há indicativos de que opresidente do órgão colegiado
atuou como articuladordas negociações e viabilizou a votação. Para
aconstatação do que coube exatamente ao relator e aopresidente,
todavia, faz-se necessário rastreardetalhadamente cada processo
legislativo17.
VI. AGENDA HOLDERS E AS MEDIDAS PROVI-SÓRIAS18
Sabe-se que, por diversos motivos, até além dosautorizados
legalmente, o governo recorre aoinstrumento das medidas provisórias
(MPs), queconstituem uma maneira imediata para efetivar-se
umainovação jurídica e, ao mesmo tempo, obter umadecisão do
Legislativo em um prazo extremamentecurto. Nesse quadro, há de se
lidar com asconsequências imediatas da norma para
estabeleceremendas ao texto. Isso impõe um grande custo e umamplo
desafio para os parlamentares que estiveremrelatando a proposta em
cada uma das casas doCongresso Nacional.
Nos processos das MPs, o governo age no sentidode diminuir ao
máximo os riscos de alteração indesejadano texto, atuando, assim,
de maneira importante naescolha dos relatores. No entanto, como já
foi dito, aalteração no texto é bastante comum, o que leva a
umquestionamento: será que existe um problema de seleçãoadversa dos
relatores ou o processo legislativo é de talforma controlado pelo
Executivo, que todas asalterações são autorizadas? Na verdade,
esses doisaspectos representam extremos de um espectro
depossibilidades que acontecem no dia-a-dia dasdiscussões das MPs.
E, certamente, entendemos quehaverá espaço para encontramos os
agenda holdersnesse espectro.
Primeiramente, deve-se levar em consideração quea tramitação das
MPs envolve processos bastanteconcentrados (assim como nas
comissões especiaisabordadas na seção anterior), o que, tendo em
vista os
curtíssimos prazos de discussão, impõe umacapacidade de
responsabilização extra aos relatores.Isso ocorre tanto pela
característica do processo dasMPs em si como pelo interesse e
pressão do Executivo,em situações que podem direcionar
encaminhamentosdo tipo “aprovar sem acatar mudanças”, “em
algumaspartes, podem-se abrir negociações” ou até mesmo”preciso de
você para articular esses temas polêmicose conciliar os interesses
do Congresso e os nossos”.Cada um desses exemplos reflete um tipo
de posturae, principalmente, depende do perfil do
parlamentaratuando na relatoria, do que se depreende a relevânciada
seleção desses parlamentares. Serão escolhidos,nessa perspectiva,
os bons delegados ou os bonsarticulares.
Em segundo lugar, quando se observa a atuaçãodos parlamentares,
é fundamental as idiossincrasiasda Câmara e do Senado, não apenas
pelas diferençasconhecidas sobre perfil, funções, tipo de eleição e
regraspróprias, entre outros pontos, mas também pelasdiferenças nos
padrões de condução da tramitação dasMPs. Por exemplo, sabe-se que
o Senado pode atéfazer alterações no texto aprovado pela Câmara,
masestá limitado a ver se suas propostas são aceitas ounão pela
câmara baixa19. No entanto, a questão quemais vem impondo condições
mais ou menos adversasao Senado (e, ao respectivo relator) são os
prazos detramitação distorcidos entre as duas casas doCongresso.
Como está estabelecido na Constituição, oCongresso Nacional tem 120
dias de prazo para votara MP20, prazo esse que não conta durante o
recessoparlamentar. Ocorre que a Câmara dos Deputadosutiliza muito
mais desse tempo para as suas discussões,como até era de se
esperar, tendo em vista a quantidadede parlamentares e a
complexidade que isso implica.Não obstante, o tempo utilizado pelas
casas vem sendocada vez menos favorável ao Senado, conformepodemos
verificar no Gráfico 1.
Observe-se que os prazos menores estabelecemcondicionamentos
relevantes aos relatores do Senado,especialmente no ano de 2010,
onde houve umrecrudescimento da diferença entre as casas
e,naturalmente, uma menor frequência observada nasmudanças
realizadas pelos senadores relatores. Issomostra que, na Câmara, os
relatores tinham muito mais
17 Recomendamos a leitura do Anexo II, onde estão
sistemati-zadas todas as informações coletadas acerca das comissões
es-peciais durante a 53ª Legislatura.18 Ver Anexo III. Entre
setembro de 2001 e março de 2012, oCongresso Nacional não
formalizou, na prática, as comissõesmistas previstas na
Constituição Federal para análise das MPs.A primeira data refere-se
à Emenda Constitucional 32/2001, quemudou o prazo de validade
desses atos. A segunda data dizrespeito à decisão do Supremo
Tribunal Federal (STF) que obri-gou o Legislativo a observar a
regra das comissões mistas. Asanálises inclusas nessa seção tomam
como material empírico asMPs da 53ª Legislatura. Assim, consideram
as regras de tramitaçãoque valeram até março de 2012.
19 Cabe lembrar que todas as proposições apresentadas peloPoder
Executivo passam primeiramente pela Câmara dos Depu-tados, por
previsão da Constituição Federal.20 Após a Emenda Constitucional
32/2001, a MP vale porsessenta dias, prazo que pode ser prorrogado
uma vez por maissessenta dias. Na prática, essa prorrogação tem
sido realizada deforma automática.
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2013
espaço de ação que no Senado, casa na qual tal açãodepende não
só da capacidade técnica ou de
articulação, mas de lidar com tempo hábil para realizaro
trabalho.
GRÁFICO 1 – PRAZOS DE TRAMITAÇÃO DAS MPS EM CADA CASA
LEGISLATIVA (2007-2010)
FONTE: Os autores, com base em dados da Câmara dos Deputados e
do Senado Federal.
NOTAS:
1. As curvas de tendências foram obtidas por meio de média móvel
para os prazos de cada MP coletados em cadacasa legislativa.
2. Os pontos de dados significam os prazos de tramitação,
ocorridos no Senado, de textos que sofreram alteraçãoe retornaram à
Câmara.
Outro aspecto que deve ser levado em conta é queos senadores já
têm acesso a todas as informaçõessobre o processo decisório
ocorrido na Câmara e, nãoraro, também participam indiretamente
dele, implicandoum conhecimento prévio sobre os detalhes da
matériae incluindo a avaliação relativa à necessidade real
defazerem-se mudanças no texto. Tais consideraçõesfazem-nos crer
que, a princípio, poderia haver maiorocorrência de atuação de
parlamentares com perfil deagenda holders na Câmara que no Senado.
Por fim, éimportante ressaltar que, por serem MPs, haveráclaramente
uma predominância de relatores dos partidosque constituem a base do
governo.
Espera-se que o relator seja um agenda holderquando forem
observados elementos de que ele exerceucapacidade de articular as
demandas dos parlamentares(e, indiretamente, nos setores
interessados) e osinteresses do governo.
Dado esse panorama, apresentaremos algumasmaneiras de estudar a
atuação dos agenda holders nas
MPs. Para esse exercício, adotaremos o corte da 53ªLegislatura
(2007-2010), como foi feito em relação àscomissões especiais. Além
disso, realizamos umaseleção na base de dados, eliminando situações
ondenão faria muito sentido buscar atuação de agendaholders, tais
como (i) MPs rejeitadas, revogadas ouque foram consideradas sem
eficácia e (ii) proposiçõesde créditos extraordinários (em relação
às quais oCongresso nunca realizou nenhuma mudança).Retirados esses
processos, para o período proposto,foram analisadas 115 medidas
provisórias21.
Na Câmara, os relatores são escolhidos após aapresentação das
emendas à MP, apresentadas tanto
21 É importante destacar que as análises levaram em
considera-ção a ordem e as circunstâncias impostas pelo processo
legislativodas MPs, o que incorpora abordagens específicas para
cada umadas casas legislativas. Para obter o levantamento completo
dasmedidas provisórias e os agenda holders durante o período
de2007-2010, cf. Silva e Araújo (2013).
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
por deputados quanto por senadores. Entendemos que,para
verificar a situação de agenda holder, é precisoconjugar a
complexidade do trabalho e o nível de sensi-bilidade política
perante as demandas demonstradaspelo Congresso. Dessa forma, dois
fatores serãoimportantes para determinar o curso da ação do
relator:(i) a quantidade de dispositivos do texto, que indica
acomplexidade da matéria e (ii) o número de emendasapresentadas,
que representa o interesse do Congresso.Com esses dados, criaremos
dois parâmetros deavaliação: a atratividade e a aceitação.
A atratividade corresponde à simples razão entre aquantidade de
emendas apresentadas e a quantidadede artigos do texto da MP22. Seu
resultado retorna umnível aproximado do interesse despertado pela
MP etambém mostra o grau de desafio do relator para lidarcom as
demandas existentes. A aceitação é o resultadodo trabalho do
relator, pois é a razão entre a quantidadede emendas aceitas e o
total de emendas. Ela representao grau de atendimento das demandas
dos parlamentares.Assim, estabelecemos critérios para verificar se
o rela-tor pode ter exercido ou não o papel de agenda
holder,expostos no Quadro 1.
QUADRO 1 – MPS E AGENDA HOLDERS: CRITÉRIOS DE ANÁLISE NA
CÂMARA
Atratividade (At) Aceitação (Ac) Papel do relator Descrição
(grande) (grande) Agenda holder Demonstrou capacidade
dearticular as demandas em questões.
(grande) (pequena) Anti-agenda holder Não foi sensível às
demandas.
(pequena) (grande) Neutro, de acordo comA característica do
processo não
(pequena) (pequena) o esperado pelo governo
revelou nenhuma necessidadede articulação demandas
vis-à-vis complexidade do tema.
FONTE: Os autores.
A distinção dos critérios entre “grande” ou“pequena” dependerá
da amostra analisada. No nossocaso, para diferenciar a
atratividade, levamos emconsideração o resultado que representou o
primeiroquartil de nossa amostra, que foi a razão de atratividadede
1,4 (At = 1,4). Essa escolha justifica-se pelo fatode que
poderíamos ter excluídas MPs de grandecomplexidade e que tiveram
demanda em proporçãosemelhante ao número de artigos. Relativamente
àaceitação, levamos em consideração que deveríamosescolher um
parâmetro que refletisse minimamente aatuação ativa de um
parlamentar em aceitar alteraçõesno texto baseadas nas emendas. De
acordo com ascaracterísticas de nossa amostra, julgamos que a
adoçãoda mediana seria interessante, apresentando uma razãode
aceitação de 0,08 ou 8% (Ac = 8%).
De acordo com essas informações, tivemos apresença de
aproximadamente 43% de agenda holders,33% de anti-agenda holders e
de 24% de parlamentarescom perfil neutro. O que chamou a atenção
foi apresença de anti-agenda holders de partidos daoposição, o que
reflete, nesses casos, uma aproximaçãode preferências entre governo
e esses parlamentares.Observamos uma grande correlação entre as
matériase os interesses dos parlamentares (pelo tema em si,por
ligações regionais etc.) e também verificamosrepetições de alguns
parlamentares nas relatorias. Tal
aspecto, no entanto, não implicou repetição dos
mesmospapéis.
A título de exemplificação, notamos doisparlamentares da Câmara
bastante presentes nasrelatorias, os deputados André Vargas (PT-PR)
e Rosede Freitas (PMDB-ES). Segundo nossos parâmetros,nos três
casos em que atuou como relator de MP na53ª Legislatura, o Deputado
André Vargas foi, em todos,um agenda holder, enquanto a Deputada
Rose deFreitas apresentou variação nas três oportunidades,servindo
de agenda holder, anti-agenda holder e neutra.Essa questão é
interessante, na medida em que oparlamentar pode assumir missões
diferentes,obedecendo ou não a um padrão de comportamento.Implica
dizer, conforme defendemos desde o começo,que é relevante a
complementaridade dos métodos parajulgar se tal ou qual parlamentar
é um “legítimo” agendaholder. Por enquanto, baseamo-nos nos
processoslegislativos.
Outro destaque nos relatores mais frequentes é odo Deputado
Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN),
22 Neste trabalho, não foi possível realizar o cálculo por
meiodo número de dispositivos (artigos, incisos, alíneas e
parágra-fos). Entendemos que avanços nessa linha refletirão melhor
acomplexidade do texto das MPs.
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pois além de ter sido agenda holder em duas MPs, eletambém
apresentou esse perfil no que tange aosexemplos estudados na seção
sobre as comissõesespeciais. Nesse caso, confirmou-se, mediante
maisde uma metodologia, o perfil de agenda holder, pelomenos nos
anos mais recentes da carreira desseparlamentar.
Para os senadores a situação altera-se um pouco.Quando se trata
de MPs, qualquer alteração do Senadoimplica o retorno do texto para
a avaliação da Câmara,especificamente naquilo que foi alterado na
câmara alta.Isso impõe um custo de transação mais alto aogoverno, o
que implica uma pressão maior sobre osenador relator. Outro aspecto
interessante, decorrentedesse primeiro, é que o relator tem de
conciliarinteresses da Câmara, do próprio Senado e do governo.Dessa
forma, embora tenda a ter uma “cargainformacional” maior que o
relator da Câmara, aconciliação de interesses torna-se mais
complexa. Aisso se adiciona o fator tempo, que acaba também
condicionando a ação do relator senador.
Nessa perspectiva, continuaremos a adotar a razãode atratividade
(Ac) como parâmetro de determinaçãodo nível de interesse do
Congresso, conciliado com acomplexidade do tema, para observar a
atuação dorelator senador. Ao outro parâmetro
chamaremosreceptividade (Rc), que representa o número deemendas
aprovadas pelo Senado que foram acatadasao retornar à Câmara dos
Deputados. A receptividademostra a capacidade do senador relator em
terarticulado mudanças que representassem a vontade dasua casa de
origem e que não ferissem os interessesda Câmara. Daí pode-se
também inferir que houve umaarticulação bem sucedida com as partes
interessadasexternas ao Congresso ao longo da etapa final
dediscussão do texto.
Estabelecemos critérios para verificar se o senadorrelator pode
ter exercido ou não o papel de agendaholder, expostos no Quadro
2.
QUADRO 2 – MPS E AGENDA HOLDERS: CRITÉRIOS DE ANÁLISE NO
SENADO
Atratividade (At) Receptividade (Rc) Papel do relator
Descrição
(grande) (grande) Agenda holderDemonstrou capacidade de
articular
as demandas das duas casaslegislativas, do possível público
externo e do governo.
(grande) (pequena) Anti-agenda holder
Não foi bem sucedido naavaliação das demandas, pois
não conseguiu conciliar diferentesinteresses entre as casas
legislativas ou foi totalmenteinsensível às novas demandas.
(pequena) (grande) Agenda holder
Levando-se em conta que qualquermudança do Senado não pode
serdesprezada, pois provoca o retornoà Câmara, a elevada
receptividade
demonstra um trabalho de articulaçãoque também não pode ser
desprezado.
(pequena) (pequena) Neutro, de acordo comA característica do
processo não
o esperado pelo governorevelou nenhuma necessidade de aptidão em
articular demandasvia-à-vis complexidade do tema
FONTE: Os autores.
Manteremos a mesma razão de atratividade (At =1,4). Com relação
à receptividade, levamos emconsideração que deveríamos escolher um
parâmetroque refletisse minimamente o esforço de articulaçãodo
senador relator em vista da dificuldade de exercero papel de agenda
holder na câmara alta. Dessa forma,optamos por adotar o primeiro
quartil da amostra,apresentando uma razão de receptividade de 0,46
ou
46% (Rc = 46%).
Os dados do Senado revelam a presença de 20%de agenda holders,
58% de anti-agenda holders e deaproximadamente 22% de parlamentares
com perfilneutro, o que correspondeu às nossas expectativastendo em
vista o contexto da relação entre as duascasas legislativas na
tramitação das MPs.
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
Muito mais do que na Câmara, a repetição derelatores é comum no
Senado, embora a variação deposição do relator tenha sido
igualmente encontrada.Deve-se destacar o papel da liderança do
governo noSenado na ocupação dessas relatorias. O então líder,
oSenador Romero Jucá (PMDB-RR), esteve comorelator em 18
oportunidades, das quais sete comoagenda holder e sete como
anti-agenda holder. Pode-se inferir que o líder que faz papel de
agenda holdertambém atua fortemente em função das necessidadesdo
governo, uma vez que sempre é possível haverajustes (que igualmente
podem ser demandas externas)não devidamente atendidos durante a
tramitação daCâmara.
Outro caso interessante chama a atenção para anecessidade de
verificarmos mais de um método paraconstatarmos categoricamente a
condição de agendaholder. O Senador Tião Viana (PT-AC) foi
umimportante agenda holder na formulação da Lei 11 520/2007, que
dispõe sobre a concessão de pensão especialàs pessoas atingidas
pela hanseníase que foramsubmetidas a isolamento e internação
compulsórios.Esse senador não foi apenas o autor da
propostapraticamente copiada pelo Executivo, como tambémfoi o
relator, no Senado, da MP 373/2007 que resultouna lei. Na
oportunidade da tramitação, houve umapequena alteração na Câmara,
provocando aformulação de um projeto de lei de conversão
(PLV).Quando chegou à câmara alta, o Senador Tião Vianausou de um
recurso estratégico, preferindo que avotação da MP precedesse à do
PLV. Assim, de acordocom os critérios para as MPs, o Senador foi um
anti-agenda holder, pois a questão suscitou procura doParlamento,
mas ele, conciliando seus interesses comos do governo, usou da
estratégia da não aprovaçãode qualquer alteração. Em nossa opinião,
esse resultadonão invalida nossos parâmetros, mas,
novamente,desperta atenção para a necessidade de conciliação
entreas diferentes metodologias de apuração da função deagenda
holder.
VII. CONCLUSÕES
No campo dos estudos legislativos, muitas vezesas variáveis
utilizadas para descrever as atividades doParlamento não conseguem
alcançar toda acomplexidade do jogo político e da arena de
produçãode leis. Os atores mais importantes de cada processo,as
proposições de autoria dos próprios parlamentares,as emendas
apresentadas aos textos em trâmite e osrelatórios, entre outros
aspectos que descrevem eexplicam o processo legislativo, são
raramenteanalisados. Entendemos que esse quadro colabora deforma
relevante para que se alcance uma compreensãoapenas parcial da
atividade legislativa e de seusprodutos, da relação entre os
poderes e das carreiras
políticas. Dessa forma, a dinâmica do exercício práticoda
representação política permanece com muitospontos ainda a serem
desvendados.
Assumimos aqui o desafio de trabalhar um temapouco explorado,
qual seja, estudar os parlamentaresque assumem destaque na
articulação política na arenada produção de leis, os quais tem sido
denominamosagenda holders. Os casos estudados neste
trabalhoevidenciam o papel-chave desses atores políticos emvárias
propostas, viabilizando-as a se tornarem leis, ecomo sua atuação
fortaleceu suas carreiras políticas,seja para alçar patamares
superiores nas hierarquiasdo poder, seja para manter-se nessa
esfera.
Foi possível perceber que o trabalho de mérito sobremudanças de
legislação realizado pelos agenda holdersapresenta diferentes
características, de acordo com aposição institucional que ocupa
(agenda setting) e dadisposição para ouvir e conciliar as partes
interessadasem cada matéria (policy brokering). Ademais, segundouma
lógica de “agente/principal”, podemos verificarque os agenda
holders podem ser agentes de atoresespecíficos, tais como grupos de
interesse e até opróprio governo. Isso também levanta a questão
deque a neutralidade não deve ser vista como condiçãopara ser um
agenda holder, ainda que seja algo desejávelquando observada a
ótica da representação e dademocracia.
Ninguém “nasce” dentro do parlamento agendaholder. Para tanto,
exige-se um esforço na arenalegislativa que vai desde a atuação
especializada, aseniority no Congresso e um bom trânsito intra e
inter-partidos políticos. Os dados e as observações
coletadaslevam-nos a inferir que há uma relação deretroalimentação
entre o status de agenda holder e ascarreiras políticas. Por um
lado, ser agenda holder éum fator que agrega capital político e
fortalececarreiras. Por outro, quanto mais consolidada é acarreira
política, maiores possibilidades tem o ator deassumir a condição de
agenda holder. Nesse sentido,ser agenda holder pode ser visto como
uma identidadepolítica, um reconhecimento por parte de outros
atorespolíticos.
Na pesquisa, foi relevante destacar algumas ponde-rações
vinculadas à figura das lideranças e das relato-rias. Mesmo um
parlamentar que exerça função formalde liderança partidária não
necessariamente tem atuaçãoativa nas negociações internas ao
Congresso Nacionale com o Executivo. Nem todos os líderes são
negocia-dores de destaque nas matérias. O mesmo raciocínioaplica-se
aos relatores. Há um número extenso de parla-mentares que atuam nos
milhares de processos legis-lativos em curso no Congresso Nacional.
Apenas umaparte deles efetivamente realiza trabalho de
articulação
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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 21, Nº 48: 19-50 DEZ.
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política com os demais parlamentares, o governo e asociedade em
escala que implique contribuições efetivaspara a produção
legislativa.
A atividade legislativa representa um jogo de múlti-plas etapas,
idiossincrasias, atores diferenciados e pre-ferências heterogêneas,
que demandam a associaçãode diferentes metodologias para poderem
ser compreen-didas. Por isso houve a preocupação de
levantarmosalgumas alternativas objetivas para se estudarem
osagenda holders ou, no mínimo, criar condições deseleção de casos
para aprofundamento subsequente.
Empregamos, neste trabalho, três abordagens dife-renciadas, que
incluem estudos de caso e também es-forços de cunho quantitativo.
Foram abordados osexemplos que envolveram apropriação da agenda
doLegislativo, o processo legislativo realizado por meiodas
comissões especiais na Câmara dos Deputados ea participação dos
relatores na tramitação das medidasprovisórias.
Na análise dos exemplos de apropriação, ainvestigação envolveu
detalhamento de casosespecíficos. Mesmo assim, puderam ser
identificadosalguns padrões sobre a atuação dos agenda holders eas
implicações em termos de carreira. Verifica-se que,para o
estabelecimento ao longo do tempo comoagenda holder, são
importantes o passado do indivíduoe suas possíveis especializações,
a seniority noCongresso e sua capacidade de negociação.
Essesachados necessitam agora ser testados por outrospesquisadores
em outros casos. Considera-se que osprocessos legislativos em que
ficou caracterizada aapropriação são especialmente promissores para
aanálise da existência e atuação de agenda holders. Assituações de
apropriação referem-se a proposiçõeslegislativas cuja relevância
pode ser depreendida dopróprio fato de terem atraído o
interessegovernamental. Elas tenderão, também, a estarassociadas a
quadros de relação entre os poderesExecutivo e Legislativo, e de
negociação política, quemerecem ser descritos e compreendidos.
Nas comissões especiais da Câmara, ficou evidenteque a
negociação política não se limita ao Legislativo eao Executivo. Ela
envolve os diferentes representantesda sociedade, que participam
formalmente do processonas audiências públicas e informalmente nos
esforçosde convencimento dos tomadores de decisão. O grandenúmero
de audiências públicas que ocorrem nessascomissões especiais,
incluindo um conjunto bastantecomplexo de atores, aponta para a
necessidade deestudos específicos tanto sobre as comissões
especiais,quanto para as audiências públicas que acontecem
nascomissões permanentes. Em nosso estudo, essasreuniões
evidenciaram o trabalho concreto de agenda
holders e, também, de atores que fazem o papel inverso,os
anti-agenda holders.
Nos processos das medidas provisórias, optou-sepor um recorte
mais geral, com a proposta de adotaropções metodológicas para a
seleção de parlamentaresagenda holders. Avalia-se que os critérios
de análisedesenhados para a Câmara dos Deputados e o SenadoFederal
geraram achados próximos à realidade. Aquestão que se coloca é que
esses critérios não devemser aplicados isoladamente de esforços
complementaresem perspectiva mais qualitativa. Eles funcionam
comouma primeira etapa na identificação dos agenda holderse de seu
papel. Se e como podem ser aplicados emfóruns diferentes dos
processos atinentes às medidasprovisórias, são perguntas em aberto.
Note-se, nesseponto, que a recente determinação do Supremo
TribunalFederal para o funcionamento da comissão mista paraa
apreciação das medidas provisórias pode estabelecerum novo
equilíbrio entre deputados e senadores noque tange à possibilidade
de atuação como agendaholder. Há fortes possibilidades de que tal
comissãoretire do relator da Câmara e do plenário daquela Casaas
vantagens gozadas até então. Trata-se de uma boaagenda para a
continuidade desta pesquisa.
A conjugação de ferramentas metodológicas é umesforço necessário
para garantir a robustez dos achadosde pesquisa. Apresentamos
algumas propostas quedialogam entre si, mas não esgotam os esforços
parao estudo dos agenda holders, atores políticos para osquais
julgamos que a Ciência Política brasileira poderiadar mais atenção
dada sua importância para o desenrolarde matérias relevantes dentro
do Congresso Nacionale para uma compreensão mais precisa do nosso
sistemapolítico.
Relativamente aos estudos comparados, verifica-se que há uma
promissora agenda de estudo sobre ocomportamento dos parlamentares
no campolegislativo23, pesquisas as quais compartilham domesmo
objetivo deste trabalho, qual seja, o de descobrircomo, quando e o
quanto atua um congressista nalegislação de seu país, e que tipo de
parlamentar assumeposição de relevo nesse sentido. Deve-se observar
queas características da relação entre os poderes, bemcomo a
estrutura e funcionamento das instituiçõeslegislativas será
determinante no desenvolvimento demetodologias adequadas na
detecção de prováveisagenda holders argentinos, chilenos, mexicanos
eoutros. Este trabalho buscou dar um passo nessadireção.
23 Recentes trabalhos da professora Algazi (2012) e dos
pro-fessores Ana Maria Mustapic, Alejandro Bonvecchi e
JavierZelasnik (2012) apontam essa tendência.
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AINDA VALE A PENA LEGISLAR
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