Revista Científica Gamaliel - ISSN 2674-9149– FATEJ / FADISA | Vol.1 | Nº. 3 | julho /dezembro – Ano 2020 | g ACADEMIA BRASILEIRA DE PENSADORES CRISTÃOS FACULDADE DE TEOLOGIA – FATEJ / WWW.FATEJ.EDU.BR l EDIÇÃO CRISTOLÓGICA O CONTRATO COM DEUS E JUSTIÇA RESTAURATIVA EM TEMPOS DE PANDEMIA A TERCEIRIZAÇÃO DA FÉ NOS TEMPOS DE PANDEMIA E ISOLAMENTO SOCIAL O SACERDÓCIO UNIVERSAL DE JESUS NO APOCALIPSE REVELAÇÃO MESSIÂNICA NO LIVRO DE LEVÍTICO AMALIE REVISTA CIENTÍFICA
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REVISTA CIENTÍFICA AMALIE · 2020. 7. 6. · REVELAÇÃO MESSIÂNICA NO LIVRO DE LEVÍTICO AMALIE REVISTA CIENTÍFICA . ... Idiomas: Aceitos artigos escritos em português, espanhol
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Revista Cientiacutefica Gamaliel - ISSN 2674-9149ndash FATEJ FADISA | Vol1 | Nordm 3 | julho dezembro ndash Ano 2020 |
g ACADEMIA BRASILEIRA DE PENSADORES CRISTAtildeOS
FACULDADE DE TEOLOGIA ndash FATEJ WWWFATEJEDUBR
l
EDICcedilAtildeO CRISTOLOacuteGICA
O CONTRATO COM DEUS E JUSTICcedilA RESTAURATIVA EM TEMPOS DE PANDEMIA
A TERCEIRIZACcedilAtildeO DA FEacute NOS TEMPOS DE PANDEMIA E ISOLAMENTO SOCIAL
O SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS NO APOCALIPSE
REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NO LIVRO DE LEVIacuteTICO
AMALIE REVISTA CIENTIacuteFICA
Revista Cientiacutefica Gamaliel - ISSN 2674-9149ndash FATEJ FADISA | Vol1 | Nordm 3 | julho dezembro ndash Ano 2020 |
copyFATEJ FADISA
Faculdade de Tecnologia Jardim
Faculdade de Direito Santo Andreacute
REVISTA
CIENTIacuteFICA
GAMALIEL
Vol1 | Nordm 3 | julhodezembro - Ano 2020
SANTO ANDREacute ndash SAtildeO PAULO BRASIL
Os direitos de publicaccedilatildeo desta revista satildeo da FATEJ FADISA
Os textos publicados na revista satildeo de inteira responsabilidade de seus autores
Permite-se a reproduccedilatildeo desde que citada a fonte
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CORPO EDITORIAL
Direccedilatildeo Cientifica Intelectual Reitora Dra Arleide Braga Poacutes-Doutora em Direito Constitucional pela Universitaacute degli Studi di Messina ndash Itaacutelia
Doutora em Ciecircncias Juriacutedicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino ndash UMSA ndash Bs
As | ARG
Doutora em Ciecircncias Sociais pela PUC | SP
Mestre em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos | SP ndash UNIMES
Poacutes-Graduada em Direito Previdenciaacuterio e Direito do Trabalho pela Universidade Gama Filho | RJ
Graduada em Letras (Licenciatura) pelo Centro Universitaacuterio de Santo Andreacute | SP
Presidente da Comissatildeo de Direito Previdenciaacuterio da OAB ndash Santo Andreacute | SP ndash Triecircnio 20162018
Diretora Estrateacutegica Dra Karina Costa Braga
Mestre em Direito - PUC | SP
Diretora Institucional da Faculdade de Tecnologia Jardim ndash FATEJ e da Faculdade de Direito Santo
Andreacute ndash FADISA em Santo Andreacute | SP
Diretora e Procuradora Dra Karen Costa Braga
Mestre em Direito - PUC | SP
Procuradora Institucional Coordenadora Administrativa do Departamento de Poacutes-Graduaccedilatildeo da
Faculdade de Tecnologia Jardim e da Faculdade de Direito Santo Andreacute ndash FADISA em Santo Andreacute |
SP
Diretor Acadecircmico Institucional Dr Mauriacutecio Tintori Piqueira
Doutor em Ciecircncias Sociais Mestre em Histoacuteria PUC-SP
Editor
Me Marcelo Alves Dantas
Periodicidade da Publicaccedilatildeo
Semestral
CAPA
Marcos Camilo Santana
Idiomas Aceitos artigos escritos em portuguecircs espanhol e inglecircs
AUTOR CORPORATIVO
Faculdade de Tecnologia Jardim - FATEJ
Faculdade de Direito Santo Andreacute - FADISA
Campus I - R Almirante Protoacutegenes 44 - B Jardim - Santo Andreacute - SP CEP 09090-760
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SUMAacuteRIO
O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 6
1 UM LIVRO ATEMPORAL 7 2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO 8
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 12 4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH 14
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 17 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 18
A CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA EXEGESE DO
APOCALIPSE DE JOAtildeO 20 APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO
JUDAICO - UMA EXEGESE CONTEMPORAcircNEA 20 INTRODUCcedilAtildeO 22
1INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS FUNDANTESrdquo 23 11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 23
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 25 13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 27
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 28 2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea 30
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14) 34 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 44
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 46
A TERCEIRIZACcedilAtildeO DA FEacute NOS TEMPOS DE PANDEMIA E ISOLAMENTO SOCIAL O SURGIMENTO DO ldquoPERSONAL PROFECTrdquo ndash E AS CRISES DE
ESPIRITUALIDADE 53 INTRODUCcedilAtildeO 54 1OUTROS PROBLEMAS INFLUENCIANDO A ESPIRITUALIDADE NO TEMPO DE
ISOLAMENTO SOCIAL DO ATEIacuteSMO CETICISMO OU UMA BUSCA MAL DIRECIONADA DA ESPIRITUALIDADE PODERAtildeO INFLUENCIAR AS RELACcedilOtildeES
DE FEacute 55 2VIVEMOS - ldquoUMA NOVA FEacute PARA UM NOVO TEMPOrdquo ONDE VERIFICAMOS COMO COMPREENDER A FEacute E SUAS APLICACcedilOtildeES COMO VIVENCIAR A FEacute NA
ATUALIDADE 56 3HOJE Eacute PRECISO RESSIGNIFICAR ALGUNS CONCEITOS SOBRE A FEacute 57
4QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS E PANDEMIAS 59
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 62 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 63
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O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO 67 INTRODUCcedilAtildeO 68
1 EM BUSCA DO CENAacuteRIO HISTOacuteRICO68 2 A EXPANSAtildeO DA FEacute CRISTAtilde69
3 DE PEDRO A PAULO (EXPANSAtildeO DA OBRA DE MISSOtildeES)69 4 O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO72 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 73
REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NO LIVRO DE LEVIacuteTICO 74 INTRODUCcedilAtildeO 75 1 TIPOLOGIA 76
11 - Definiccedilatildeo de tipologia77 12 - A tipologia como ferramenta da hermenecircutica 77
13 - As Escrituras e a tipologia77 14 - A tipologia e as correntes teoloacutegicas78 141- ldquotiposrdquo natildeo ratificados pelo Novo Testamento 79
142 - Siacutembolos ratificados pelo Novo Testamento 80 142 - Corrente intermediaacuteria ldquotiposrdquo expliacutecitos e impliacutecitos 81
2 ESTABELECIMENTO DA CORRENTE INTERPRETATIVA81 3 REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NA OFERTAS VOLITIVAS E COMPULSOacuteRIAS 82
31 - As ofertas volitivas 82 311 - Os Holocaustos 82
312 - Exigecircncias para o Holocausto 83 313 - As ofertas de manjares 85 314 - As ofertas de comunhatildeo ou ofertas pacificas 86
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS86 41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia87
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo 87 43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo 88 44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas 88
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE89 51 - A mediaccedilatildeo 89
52 - A unccedilatildeo e a pureza 90 53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo 90 54 - O Yom Kippur92
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 93 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 94
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O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA
RESTAURATIVA1
RESUMO
O presente artigo escrito durante a pandemia da COVID-19 tem o intuito de relembrar a
histoacuteria de Joacute Partindo de uma perspectiva interdisciplinar entre Teologia e Direito
analisam-se as diferentes visotildees de Justiccedila contidas no Livro de Joacute Pretende-se
demonstrar a prevalecircncia da ideia de justiccedila restaurativa em detrimento das concepccedilotildees de
justiccedila retributiva (ligada ao tema do castigo divino) e contratualista (ligada ao tema da
teologia da prosperidade)
Palavras-chave Livro de Joacute Justiccedila retributiva Contrato Justiccedila restaurativa
ABSTRACT
This article written during the pandemic of COVID-19 is intended to recall Jobs story
Starting from an interdisciplinary perspective between theology and law the different
views of justice contained in the Book of Job are analyzed It is intended to demonstrate
the prevalence of the idea of restorative justice instead of the concepts of retributive
justice (linked to the theme of divine punishment) and contractualist (linked to the theme
of prosperity theology)
Key words Book of Job Retributive justice Contract Restorative justice
1 Doutor em Direito Penal pela Universidade de Satildeo Paulo Juiz Federal e Professor de Direito Penal da
FADISA
autor
Excelentissiacutemo Juiz Federal
Dr Paulo Bueno de Azevedo
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1 UM LIVRO ATEMPORAL
O presente artigo eacute escrito durante um periacuteodo turbulento certamente ineacutedito para
muitos de noacutes embora natildeo seja o primeiro evento da espeacutecie em nosso planeta A
pandemia da COVID (Corona virus Disease) -19 tal como outras doenccedilas no passado
(peste negra gripe espanhola etc) ainda estaacute causando milhares de mortes no mundo
todo forccedilando medidas eneacutergicas de isolamento social levando muitos ao desemprego agrave
falecircncia e agrave desesperanccedila
Neste cenaacuterio alguns ousam perguntar onde estaacute Deus Por que Deus esconde sua
face nesse momento Jaacute outros enxergam o sinal do fim dos tempos a puniccedilatildeo divina
decorrente dos pecados humanos E haacute ainda quem reforce a sua descrenccedila se Deus
existisse mesmo nada disso poderia ocorrer Enfim num momento tatildeo difiacutecil a
desesperanccedila a raiva e a incerteza encontram terreno feacutertil para disseminaccedilatildeo As
muacuteltiplas vozes se chocam e a feacute arrefece
Na verdade tais anguacutestias vecircm de certas concepccedilotildees que as pessoas tecircm de Deus
as quais por sinal estatildeo profundamente entrelaccediladas com pensamentos juriacutedicos A ideia
do castigo vem do tirociacutenio que invoca a justiccedila retributiva divina Jaacute o pensar que Deus
natildeo poderia permitir tais cataacutestrofes parece traduzir uma espeacutecie de obrigaccedilatildeo do Senhor
para com a humanidade E se existisse mesmo tal obrigaccedilatildeo quem poderia levar Deus ao
tribunal para que fosse compelido a cumprir esse contrato
O problema parece insoluacutevel pois quer se trate da puniccedilatildeo quer de um contrato
descumprido ningueacutem poderia confrontar o Criador em juiacutezo Ou poderia O desespero eacute
atual no entanto a histoacuteria eacute antiga Haacute milhares de anos foi retratada no Livro de Joacute A
autoria desse livro que compotildee o Antigo Testamento da Biacuteblia eacute desconhecida e existem
muitas duacutevidas sobre possiacuteveis trechos inseridos ou modificados a posteriori Imaginaria o
seu autor (ou sua autora2) que sua obra continuaria atual e sendo objeto de estudos e
reflexotildees mais de dois mil anos depois
Natildeo natildeo eacute por acaso que Jorge Luis Borges (BORGES 2009 p 156) considerava
o Livro de Joacute um dos mais impressionantes da Biacuteblia nem que Freud o tenha situado
como a mais alta das literaturas humanas (apud BORGES 1965) Natildeo eacute coincidecircncia que
o Livro de Joacute seja considerado ldquoo mais saacutebio da Biacuteblia Hebraicardquo (BLOOM 2005 p 15)
e tenha sido recontado tantas vezes como nas versotildees de HG Wells (apud BORGES
1965) e Fabrice Hadjadj bem como objeto de longos estudos a exemplo daqueles de Carl
2 A hipoacutetese de que o texto javista da Biacuteblia Hebraica poderia ter sido escrito por uma mulher hitita eacute
aventada por Harold Bloom (BLOOM 2005 p 27)
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
AZEVEDO Paulo Bueno de Ensaio sobre a irracionalidade do sistema criminal agrave
luz da obra religiosa de Lev Tolstoacutei Rio de Janeiro Lumen Juris 2019
BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
2011
BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
Revisatildeo de Marta Miranda OrsquoShea Rio de Janeiro Objetiva 2005
BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
de 2020
BORGES Jorge Luis Sete conversas com Fernando Sorrentino Organizador
Fernando Sorrentino Traduccedilatildeo de Ana Flores Rio de Janeiro Beco do Azougue
2009
CARBAJOSA Ignacio Joacute potildee Deus no banco dos reacuteus Sobre o sofrimento inocente
In httparquivorevistapassoscombrdefaultaspid=344ampid_n=5530amppagina=1
acesso em 14052020
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
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Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
JUNG CJ Resposta a Joacute Traduccedilatildeo do Pe Dom Mateus Ramalho Rocha 10 ediccedilatildeo
Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
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Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
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A oferta paciacutefica ou de comunhatildeo traz a ideia de comunhatildeo existente entre Deus
e os homens Na ocasiatildeo dessa oferenda o peito e a coxa deveriam ser dados para o
sustento dos sacerdotes e levitas Enquanto que na oferta de holocausto quase tudo era
queimado na oferta paciacutefica somente as gorduras eram oferecidas sobre o altar e o
restante das partes do animal era divido entre os sacerdotes e o ofertante Nessas refeiccedilotildees
comunais o ofertante juntamente com os sacerdotes fazia um banquete jubiloso porque
criam que Deus tambeacutem estava presente Nessa oferta de comunhatildeo estava selada a paz
entre Deus e o ofertante
Basta uma anaacutelise das figuras que estavam envolvidas nessa oferta para
verificarmos claramente a tipologia nela impliacutecita A paz era selada pois havia a presenccedila
de Deus do sacerdote (mediador) e do ofertante Isso nos remete a mediaccedilatildeo do sumo
sacerdote celestial que atraveacutes de sua oferta sacrificial derrubou a parede de inimizades
existente entre Deus e os homens proporcionando-nos a paz
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS
As ofertas compulsoacuterias eram ofertadas para expiar o pecado e a culpa do
transgressor e oferececirc-las natildeo dependia da sua vontade Caso natildeo quisesse sofrer as
consequecircncias do juiacutezo divino por suas transgressotildees ofertas pelo pecado deveriam ser
oferecidas pelo transgressor Essas ofertas estatildeo regulamentadas nos capiacutetulos 4 a 7 de
Leviacutetico onde as encontramos divididas basicamente em trecircs grupos oferta por
ignoracircncia oferta pelo pecado e oferta pela culpa
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Certa complexidade haacute em diferenciar de forma simples uma oferta da outra mas
de uma forma sintetizada podemos diferenciaacute-las conforme a proacutepria classificaccedilatildeo
mosaica Os textos biacuteblicos natildeo nos fornecem de forma satisfatoacuteria elementos para que
possamos fazer uma diferenciaccedilatildeo precisa de uma oferta para outra
41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia
O termo ignoracircncia (hb segaga) natildeo pode ser confundido com desconhecimento
da lei mosaica Os pecados a serem expiados por esse tipo de oferta eram aqueles que o
transgressor cometia de forma natildeo intencional (Lv 42) A ldquointenccedilatildeordquo aqui deve ser
entendida como ldquode forma natildeo desafiadorardquo isto eacute contrariando as leis divinas de modo a
desprezar a Deus e sua palavra Para esses natildeo havia expiaccedilatildeo
Os pecados cometidos por ignoracircncia estavam classificados no rol daqueles que o
transgressor cometia inadvertidamente ou inconscientemente como por exemplo tocar em
restos mortais sem que disso tivesse conhecimento Tambeacutem se enquadra aqueles
cometidos por conta da natureza caiacuteda do homem e sua consequente inclinaccedilatildeo para o
pecado Independente se o pecado havia sido cometido inconscientemente ou por conta da
inclinaccedilatildeo pecaminosa o homem tornar-se-ia culpado diante do Deus Santo necessitando
assim da expiaccedilatildeo do seu pecado
A expiaccedilatildeo para essa classe de pecados deveria obedecer a alguns criteacuterios
estabelecidos Sacerdotes priacutencipes a comunidade em geral e o indiviacuteduo em particular
deveriam oferecer sacrifiacutecios Para cada um desses grupos um animal especifico deveria
ser ofertado
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo
Esse tipo de oferta pela culpa (hb asham) era realizada nas ocasiotildees em que a
transgressatildeo fosse cometida em relaccedilatildeo ao proacuteximo Nesse caso deveria haver entatildeo uma
restituiccedilatildeo do ofensor para o ofendido Por envolver questotildees monetaacuterias como forma de
reparaccedilatildeo essa oferta tambeacutem era conhecida como oferta de restituiccedilatildeo
Logicamente por ser o homem a imagem e semelhanccedila de Deus qualquer
transgressatildeo cometida contra aquele ofendia Este Assim antes mesmo de tentar reatar o
seu relacionamento com Deus o pecador deveria estabelecer a comunhatildeo perdida com o
ofendido Se natildeo houvesse expiaccedilatildeo a culpa permaneceria e o juiacutezo divino certamente
recairia sobre o ofensor
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43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo
Haacute entre os eruditos certa dificuldade para entender a que tipo de pecado essa
oferta faz referecircncia A ligaccedilatildeo dos dois substantivos (ldquooferta pelo pecadordquo) sugerem eles
parece indicar que os pecadores deveriam lidar com seus pecados mediante a oferta de
sacrifiacutecios Ao pecar necessariamente o transgressor deveria associar a ideia dual de
ldquopecado necessita de ofertardquo
Outra ideia impliacutecita na oferta pelo pecado (hb hattarsquot) eacute a de purificaccedilatildeo O
pecado -atraveacutes do pecador - contaminava o ambiente sagrado tornando-o improacuteprio para
a presenccedila de Deus Por esse motivo o sangue dessa oferta era aspergido sobre os altares
o propiciatoacuterio e dentro do Santo dos Santos A purificaccedilatildeo mediante o sangue era
necessaacuteria para a manifestaccedilatildeo da presenccedila divina Esse ato de purgar deu tambeacutem a essa
oferta o nome de ldquooferta de purificaccedilatildeordquo
Temos dois fatores de suma importacircncia no processo de salvaccedilatildeo expiaccedilatildeo e
purificaccedilatildeo Sem a expiaccedilatildeo o homem permanece separado de Deus e sem a purificaccedilatildeo eacute
impedido de receber sua presenccedila Esse duplo processo soacute poderia ser realizado mediante o
derramamento de sangue inocente e com a indispensaacutevel presenccedila do sacerdote mediador
44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas
Para todas essas ofertas volitivas e compulsoacuterias a qualidade era imprescindiacutevel
A expiaccedilatildeo pelo sangue era o elemento comum que as unificava Desde um touro oferecido
pelo sacerdote em favor de seus proacuteprios pecados ateacute um pombo ofertado pelos mais
pobres eram recebidos por Deus como sacrifiacutecio substitutivo com o poder de expiar e
purificar ainda que de forma provisoacuteria
O estudo da lei mosaica nos leva a concluir que havia a possibilidade de oferendas
e sacrifiacutecios expiatoacuterios para todos os pecados com exceccedilatildeo daqueles cometidos de forma
que desafiassem a Deus e a sua palavra Esse tipo de pecado era fruto de um coraccedilatildeo
impenitente que desobedecia propositalmente aos mandamentos divinos O Novo
Testamento demonstra de forma inequiacutevoca que o sacrifiacutecio de Cristo tem suficiecircncia para
perdatildeo de todos os pecados no tempo e no espaccedilo A uacutenica exceccedilatildeo feita a essa regra eacute a
blasfecircmia contra o Santo Espiacuterito (Mt 1232 Lc 1210)
Todas essas variedades de ofertas e as mais diversas classes de animais bem
como os rituais diaacuterios tinham a intenccedilatildeo de revelar a necessidade do Messias que com
um uacutenico sacrifiacutecio expiatoacuterio anularia os efeitos do pecado sobre os homens que nele
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cressem Jesus na cruz fez a oferta de si mesmo a Deus uma uacutenica vez e com a eficaacutecia
eterna para perdatildeo de todas as variedades de pecados que a lei classificava mas natildeo dava a
soluccedilatildeo definitiva
O sangue de bovinos caprinos ovinos e aves eram apenas uma paacutelida sombra que
apenas cobria os pecados conscientes ou inconscientes voluntaacuterios ou involuntaacuterios Por
sua ineficaacutecia a expiaccedilatildeo limitava-se a indiviacuteduos ou grupos de indiviacuteduos e seu alcance
era temporal pois tinha eficaacutecia somente em um periacuteodo especifico O sangue de Cristo
entretanto como nos atesta o Novo Testamento atua de forma ilimitada sendo tambeacutem
atemporal (Hb 913-15 104)
A nossa limitaccedilatildeo nos permite apenas olhar o sacrifiacutecio vicaacuterio do Cristo de forma
progressiva na revelaccedilatildeo biacuteblica mas com o Eterno tal natildeo se sucede visto ter Ele os
atributos incomunicaacuteveis da onisciecircncia e presciecircncia (At 223 1Pe 12) Portanto ao
perdoar as transgressotildees com base no sangue de animais na verdade Ele via
antecipadamente o sacrifiacutecio de Cristo sendo realizado
O homem olha a revelaccedilatildeo progressiva da salvaccedilatildeo poreacutem o Deus Eterno a vecirc na
totalidade A cruz na perspectiva divina sempre esteve no Velho Testamento pois ela
considerando uma progressatildeo histoacuterica eacute antes dele O Messias ainda que de forma
velada sempre esteve laacute como nos atestam as seguintes passagens biblicas 2Tmt 11 2T
19 Ap 178 Pv 823-31 Mt 2534 Jo 1724 At 1518 Rm 1625 1Pe 120-23 Ap 138
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE
51 - A mediaccedilatildeo
As ofertas cuja funccedilatildeo era expiar o pecado conforme jaacute vimos tipificavam o
sacrifiacutecio perfeito e final do Messias Eram apenas sombras indicativas de algo superior
que foi revelado atraveacutes de Jesus e sistematizado nos vinte e nove livros que compotildee o
Novo Testamento (Hb 85 99 23-24 101 Cl 217)
Essas ofertas soacute poderiam ser aceitas por Deus caso houvesse um mediador que as
oferecesse Nesse cenaacuterio entra a figura do sacerdote e do sumo sacerdote que tipificavam
o sacerdoacutecio eterno do Messias Muitos satildeo os detalhes que vinculam o sacerdoacutecio terreno
com a obra mediadora do Messias Visto que nosso espaccedilo eacute limitado pela natureza desse
artigo faremos apenas algumas correspondecircncias entre o sacerdoacutecio humano e o
sacerdoacutecio celestial de Cristo
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52 - A unccedilatildeo e a pureza
O capiacutetulo oito de Leviacutetico descreve a consagraccedilatildeo de Aratildeo como sumo sacerdote
e de seus filhos como sacerdotes O oacuteleo da unccedilatildeo - siacutembolo do Espiacuterito Santo - foi
derramado sobre ele - tipo de Jesus - para exercer sua funccedilatildeo em favor dos fracos e
ignorantes (Hb 51-10) O Velho e o Novo Testamento apresentam Jesus como o ungido de
Deus sobre o qual foi derramado o Espiacuterito Santo para libertar os cativos do pecado
Somente eles poderiam fazer mediaccedilatildeo pelo povo da mesma forma que natildeo haacute
outro mediador entre Deus e os homens a natildeo ser Jesus (At 412 1 Tm 25 Hb 725 86
915 1224) Conforme nos atestam alguns versos biacuteblicos qualquer pessoa que tentasse
usurpar a funccedilatildeo sacerdotal receberia a pena capital (Nm 310 38 1640 185-7) Assim
tipologicamente falando excluindo-se a pessoa de Jesus qualquer outro mediador diante
de Deus estaacute morto
O sacerdote deveria antes de oferecer qualquer sacrifiacutecio banhar-se na bacia de
bronze localizada no aacutetrio do tabernaacuteculo (Lv 86) Esse ritual continha a ideia de
purificaccedilatildeo pois o sacerdote que oferecesse o sacrifiacutecio deveria estar puro diante de Deus
Qualquer oficiante do tabernaacuteculo que natildeo se lavasse ou natildeo fizesse os cerimoniais
prescritos na lei deveria seria morto (Ecircx 3018-21)
Esse simbolismo eacute perfeito quando comparado a situaccedilatildeo do pecador diante do
Deus Santo Qualquer transgressor que Dele se aproximar sem estar puro receberaacute o
salaacuterio do pecado isto eacute a morte eterna
53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo
Associada com a ideia de santidade havia uma lacircmina de ouro posta no turbante
do sumo sacerdote com a inscriccedilatildeo ldquoSantidade ao Senhorrdquo (Ecircx 2836 Lv 89) Essa lacircmina
representava o elevado grau de santidade que o sumo sacerdote deveria ter por se
apresentar diante de Deus para expiar os pecados do povo Outra peccedila que compunha o
vestuaacuterio da classe sacerdotal era a estola feita de linho fino branco indicativo na Biacuteblia de
pureza e santidade (Ecircx 2839 87)
Toda o ritual de purificaccedilatildeo e as vestimentas apontavam para a santidade do
sacerdote que por sua vez tipificava a santidade do sumo sacerdote celestial que em tudo
foi tentado poreacutem sem pecado (Hb 726 Is 539 Jo 846 2Co 521 1Pe 222 1 Jo 35)
No ritual de purificaccedilatildeo dos contaminados por lepra e liacutequidos corporais descrito
nos capiacutetulos 11 a 15 de Leviacutetico o sacerdote figurava como a personagem principal pois
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sem ele o processo de purificaccedilatildeo natildeo poderia ser finalizado Vemos entatildeo uma dupla
funccedilatildeo sacerdotal o que mediava e o que purificava Na pessoa de Jesus cumpriu-se esse
duplo tipo sacerdotal pois o Novo Testamento atribui a ele a funccedilatildeo de mediador e
purificador
Qualquer judeu por mais simples que fosse entenderia a mensagem espiritual
profunda que havia no ritual de purificaccedilatildeo e nas roupas sacerdotais E qual seria essa
mensagem A resposta simples eacute antes mesmo de se aproximar de um Deus Santo com
sacrifiacutecio havia a necessidade imperiosa de purificar-se Primeiro se purifica Depois a
Ele oferece-se sacrifiacutecios de adoraccedilatildeo Purificaccedilatildeo e sacrifiacutecios estatildeo intimamente
interligados conforme jaacute vimos nas ofertas compulsoacuterias E tudo isso soacute seria possiacutevel com
a figura do mediador
Todo o vestuaacuterio do sumo sacerdote tipificava o Messias e seu oficio sacerdotal
Natildeo sendo possiacutevel nesse artigo analisar as minuacutecias de cada uma das peccedilas falaremos
delas de forma geneacuterica Basicamente o eacutefode e o cinto do sumo sacerdote possuiacuteam
quatro cores que apareciam tambeacutem na primeira cortina que cobria o tabernaacuteculo no veacuteu
que separava o lugar santo do santiacutessimo e na cortina de entrada do aacutetrio do tabernaacuteculo O
azul carmesim puacuterpura e branco tipificavam alguns atributos do Messias O azul sua
origem celestial a puacuterpura apontava para sua realeza o branco fala de sua absoluta
pureza e o vermelho do seu sacrifiacutecio expiatoacuterio Somente o Messias Jesus Cristo
apresentou as quatro caracteriacutesticas aceitaacuteveis a Deus Rei que veio do ceacuteu cujo sangue foi
derramado e sobre Ele natildeo pode ser imputado pecado algum
Sobre o eacutefode ficava o peitoral do juiacutezo contendo doze pedras preciosas e em
cada uma delas estava gravada o nome das doze tribos de Israel Essas pedras conforme
determinaccedilatildeo biacuteblica deveriam estar sobre o coraccedilatildeo do sumo sacerdote quando este
oficiasse no tabernaacuteculo Ele tambeacutem carregava sobre os ombros uma pedra preciosa de
cada lado Na primeira eram gravados os nomes de seis tribos de Israel na outra mais seis
tribos Assim o representante dos homens carregava simbolicamente no coraccedilatildeo e nos
ombros toda a naccedilatildeo dos filhos de Israel diante de Deus estando assim toda ela
representada pelas quatorze pedras Assim o sumo sacerdote intercedia por toda a naccedilatildeo
continuamente
Poucos discordariam que a igreja de Cristo assumiu o papel de Israel ainda que
saibamos que esse fato natildeo invalida as promessas de Deus feitas a esse povo Apaziguada
essa questatildeo podemos entatildeo verificar a tipicidade desse peitoral no tocante a figura do
Messias O sumo sacerdote humano carregava sobre o coraccedilatildeo e ombros a naccedilatildeo de
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Israel ao passo que o Messias carrega sobre o coraccedilatildeo e ombros a igreja composta de
pessoas de todas as naccedilotildees (Jo 315 Mt 913 1Tt 115-16 Ap 59 Ap 1211 Hb 1312
1Pe 119)
Esse peitoral dobrado formava uma bolsa que continha duas pedras conhecidas
como Urim e Tumim com as quais se consultavam a vontade de Deus Sacerdotes
profetas Urim e Tumim eram necessaacuterios enquanto o Messias natildeo havia sido revelado
Poreacutem o Messias jaacute veio como a revelaccedilatildeo final de Deus para o homem (Hb 11-
2) Ele eacute a uacutenica verdade e portanto nosso uacutenico guia espiritual (Jo 146) Tal qual o sumo
sacerdote guiava o povo mediante o Urim e Tumim Ele sem fazer uso de qualquer pedra
nos guia mediante o Espirito Santo e as Escrituras sagradas rumo ao ceacuteu (Jo 1426 1613
1Co 210-13 Ef 47-15 1 Jo 220 1 Jo 227)
Mediante essas duas pedras consultava-se a Deus e por elas vinha a resposta
Hoje eacute por intermeacutedio do Cristo revelado nas Escrituras que obtemos a maioria das
respostas para nossas indagaccedilotildees
54 - O Yom Kippur
Ao falarmos das ofertas volitivas e compulsoacuterias alguns paraacutegrafos devem ser
dedicados ao ritual do Yom Kippur cujo cerimonial representava o perdatildeo anual dos
pecados dos filhos de Israel
O Yom Kippur ou Dia do perdatildeo eacute considerado um dos dias mais sagrados do
calendaacuterio judaico Era nesse dia que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para
purificar o tabernaacuteculo e oferecer o sacrifiacutecio anual por toda a naccedilatildeo (Lv 166 16 18-19
24) Era um dia de jejum e nenhum trabalho servil deveria ser realizado Era nesse
grandioso dia que o bode expiatoacuterio Azazel tinha de ser enviado ao deserto para longe do
arraial ou das portas de Jerusaleacutem Ele carregava sobre si os pecados de toda a naccedilatildeo e
acabava simbolicamente morrendo por ela Isso por si soacute jaacute configura uma bela
tipologia o cordeiro de Deus sofreu e morreu fora das portas de Jerusaleacutem carregando
sobre si os pecados da humanidade (Mt 1520-24 Jo 1917-18 At 758 Hb 1312)
Ao entrar no Santiacutessimo o sumo sacerdote enchia-o de fumaccedila de incenso para
que a nuvem perfumada ocultasse de seus olhos o propiciatoacuterio local esse considerado
como sendo ldquoo trono de Deusrdquo Ao entrar nesse recinto sagrado o sumo sacerdote deveria
ter em matildeos o sangue para expiar os pecados de toda a naccedilatildeo Fontes extrabiacuteblicas nos
informam sobre o alto grau de relevacircncia desse dia pois era nele que se promulgava certo
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decreto divino sobre quem iraacute viver e quem iraacute morrer quem estaraacute sereno e quem seraacute
perturbado quem seraacute pobre e quem seraacute rico quem seraacute exaltado e quem seraacute humilhado
(KOLATCH p239)
Para estabelecer a rica tipologia encontrada nos ritos desse tatildeo importante dia
basta-nos consultar alguns versos do livro de hebreus que revelam o ofiacutecio sacerdotal de
Cristo (Hb 91-26 217 31 415 55-6 71 11-27 81)
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
A tipologia por ser essencialmente biacuteblica natildeo pode ser desprezada sendo que os
extremos na sua utilizaccedilatildeo devem ser evitados atraveacutes de esforccedilos para encontrar-se uma
posiccedilatildeo moderada Ao nos apossarmos dessa ideia perceberemos o quatildeo proveitoso seraacute o
nosso conhecimento dos ldquotiposrdquo biacuteblicos para a robustez da nossa teologia
A anaacutelise das ofertas volitivas e compulsoacuterias demostram essa verdade na medida
em que as conhecemos de forma mais profunda A partir disso vemos natildeo mais um
emaranhado de ordenanccedilas cerimoniais destituiacutedas de sentido mas profundas liccedilotildees
espirituais acerca da figura central da Biacuteblia Jesus Cristo
Ainda que geraccedilatildeo apoacutes geraccedilatildeo os filhos de Israel matavam os inocentes animais
atraveacutes de sacrifiacutecios e natildeo tinham a plena consciecircncia da magnitude do seu simbolismo
todavia pela feacute sabiam que seus pecados haviam sido expiados As ofertas o sofrimento e
morte dos animais o sangue derramado e a mediaccedilatildeo dos sacerdotes propiciavam um
cenaacuterio pedagoacutegico riquiacutessimo mediante a qual todos aprendiam acerca do plano divino da
redenccedilatildeo Negar isso eacute negar a proacutepria Escritura
Os escritores do Novo Testamento empreenderam grandes esforccedilos para elaborar
suas doutrinas com base no entendimento que tinham do Velho Testamento pois era esse
que testificava acerca do Messias Ele mesmo nos seus ensinamentos citou por diversas
vezes as Escrituras veterotestamentaacuterias Era o antiacutetipo em carne e osso explicando aos
disciacutepulos toda a tipologia que Nele encontrava a plena realizaccedilatildeo Assim quando os
escritores neotestamentaacuterios analisavam as ofertas volitivas e compulsoacuterias encontravam
nelas revelado o Messias de Israel
As ldquosombrasrdquo tiveram o seu valor ateacute a chegada da realidade isto eacute Cristo Ele eacute
a revelaccedilatildeo final de Deus pois posteriormente ao brado ldquoestaacute consumadordquo o veacuteu foi
rasgado e o acesso pleno a Deus liberado As ofertas volitivas e compulsoacuterias natildeo satildeo mais
necessaacuterias pois aquele para quem elas apontavam as substituiu satisfez a justiccedila divina e
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reconciliou o homem com Deus Cabe-nos empreendermos esforccedilos com a finalidade uacutenica
de conhecer mais detalhadamente as ofertas volitivas e compulsoacuterias E assim ter uma
percepccedilatildeo mais niacutetida de que o mesmo Deus que instituiu os ldquotiposrdquo eacute o mesmo que os
tornou realidade na pessoa do Messias Jesus Cristo
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CPAD 2002
HABERSHON Ada R Manual de tipologia biacuteblica como reconhecer e interpretar
siacutembolos ldquotiposrdquo e alegorias das Escrituras Sagradas Satildeo Paulo Vida 2003
HAMILTON Victor P O Manual do Pentateuco 1ordf ed Rio de Janeiro CPAD
1982
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Testamento 1ordf ed Satildeo Paulo Vida Nova 1988
HARRISON Roland K Leviacutetico Introduccedilatildeo e Comentaacuterio 1ordf ed Satildeo Paulo
Cultura Cristatilde 1983
HOFF Paul O Pentateuco 1ordf ed Satildeo Paulo Vida 1994
95
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SCHULTZ Samuel J A Histoacuteria de Israel no Antigo Testamento 1ordf ed Satildeo
Paulo Vida Nova 1977
JEREMIAS Joachim Jerusaleacutem no tempo de Jesus Satildeo Paulo Paulus 1983
JOSEFO Flaacutevio Histoacuteria dos Hebreus 8ordf ed Rio de Janeiro CPAD 2004
KOLATCH Alfred J Livro Judaico dos porquecircs Satildeo Paulo Sefer 2007
KOLUTCH Alfred J 2ordm Livro Judaico dos Porquecircs 2ordf ed Satildeo Paulo Secircfer 2003
MOREIRA Odilon S Comentaacuterio de Leviacutetico Versiacuteculo por Versiacuteculo 2ordf ed Satildeo
Paulo Querigma 2020
ZUCK Roy B A interpretaccedilatildeo biacuteblica meios de descobrir a Verdade da Biacuteblia
Satildeo Paulo Vida Nova 1994
Autor ndash Bacharel em Teologia
Prof Odilon Soares Moreira
Bacharel em Teologia pela Faculdade
Beth Shalom e licenciado em Filosofia
pela Universidade Metodista de Satildeo
Paulo
E-mail odilonmoreira13hotmailcom
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copyFATEJ FADISA
Faculdade de Tecnologia Jardim
Faculdade de Direito Santo Andreacute
REVISTA
CIENTIacuteFICA
GAMALIEL
Vol1 | Nordm 3 | julhodezembro - Ano 2020
SANTO ANDREacute ndash SAtildeO PAULO BRASIL
Os direitos de publicaccedilatildeo desta revista satildeo da FATEJ FADISA
Os textos publicados na revista satildeo de inteira responsabilidade de seus autores
Permite-se a reproduccedilatildeo desde que citada a fonte
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CORPO EDITORIAL
Direccedilatildeo Cientifica Intelectual Reitora Dra Arleide Braga Poacutes-Doutora em Direito Constitucional pela Universitaacute degli Studi di Messina ndash Itaacutelia
Doutora em Ciecircncias Juriacutedicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino ndash UMSA ndash Bs
As | ARG
Doutora em Ciecircncias Sociais pela PUC | SP
Mestre em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos | SP ndash UNIMES
Poacutes-Graduada em Direito Previdenciaacuterio e Direito do Trabalho pela Universidade Gama Filho | RJ
Graduada em Letras (Licenciatura) pelo Centro Universitaacuterio de Santo Andreacute | SP
Presidente da Comissatildeo de Direito Previdenciaacuterio da OAB ndash Santo Andreacute | SP ndash Triecircnio 20162018
Diretora Estrateacutegica Dra Karina Costa Braga
Mestre em Direito - PUC | SP
Diretora Institucional da Faculdade de Tecnologia Jardim ndash FATEJ e da Faculdade de Direito Santo
Andreacute ndash FADISA em Santo Andreacute | SP
Diretora e Procuradora Dra Karen Costa Braga
Mestre em Direito - PUC | SP
Procuradora Institucional Coordenadora Administrativa do Departamento de Poacutes-Graduaccedilatildeo da
Faculdade de Tecnologia Jardim e da Faculdade de Direito Santo Andreacute ndash FADISA em Santo Andreacute |
SP
Diretor Acadecircmico Institucional Dr Mauriacutecio Tintori Piqueira
Doutor em Ciecircncias Sociais Mestre em Histoacuteria PUC-SP
Editor
Me Marcelo Alves Dantas
Periodicidade da Publicaccedilatildeo
Semestral
CAPA
Marcos Camilo Santana
Idiomas Aceitos artigos escritos em portuguecircs espanhol e inglecircs
AUTOR CORPORATIVO
Faculdade de Tecnologia Jardim - FATEJ
Faculdade de Direito Santo Andreacute - FADISA
Campus I - R Almirante Protoacutegenes 44 - B Jardim - Santo Andreacute - SP CEP 09090-760
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SUMAacuteRIO
O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 6
1 UM LIVRO ATEMPORAL 7 2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO 8
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 12 4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH 14
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 17 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 18
A CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA EXEGESE DO
APOCALIPSE DE JOAtildeO 20 APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO
JUDAICO - UMA EXEGESE CONTEMPORAcircNEA 20 INTRODUCcedilAtildeO 22
1INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS FUNDANTESrdquo 23 11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 23
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 25 13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 27
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 28 2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea 30
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14) 34 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 44
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 46
A TERCEIRIZACcedilAtildeO DA FEacute NOS TEMPOS DE PANDEMIA E ISOLAMENTO SOCIAL O SURGIMENTO DO ldquoPERSONAL PROFECTrdquo ndash E AS CRISES DE
ESPIRITUALIDADE 53 INTRODUCcedilAtildeO 54 1OUTROS PROBLEMAS INFLUENCIANDO A ESPIRITUALIDADE NO TEMPO DE
ISOLAMENTO SOCIAL DO ATEIacuteSMO CETICISMO OU UMA BUSCA MAL DIRECIONADA DA ESPIRITUALIDADE PODERAtildeO INFLUENCIAR AS RELACcedilOtildeES
DE FEacute 55 2VIVEMOS - ldquoUMA NOVA FEacute PARA UM NOVO TEMPOrdquo ONDE VERIFICAMOS COMO COMPREENDER A FEacute E SUAS APLICACcedilOtildeES COMO VIVENCIAR A FEacute NA
ATUALIDADE 56 3HOJE Eacute PRECISO RESSIGNIFICAR ALGUNS CONCEITOS SOBRE A FEacute 57
4QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS E PANDEMIAS 59
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 62 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 63
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O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO 67 INTRODUCcedilAtildeO 68
1 EM BUSCA DO CENAacuteRIO HISTOacuteRICO68 2 A EXPANSAtildeO DA FEacute CRISTAtilde69
3 DE PEDRO A PAULO (EXPANSAtildeO DA OBRA DE MISSOtildeES)69 4 O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO72 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 73
REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NO LIVRO DE LEVIacuteTICO 74 INTRODUCcedilAtildeO 75 1 TIPOLOGIA 76
11 - Definiccedilatildeo de tipologia77 12 - A tipologia como ferramenta da hermenecircutica 77
13 - As Escrituras e a tipologia77 14 - A tipologia e as correntes teoloacutegicas78 141- ldquotiposrdquo natildeo ratificados pelo Novo Testamento 79
142 - Siacutembolos ratificados pelo Novo Testamento 80 142 - Corrente intermediaacuteria ldquotiposrdquo expliacutecitos e impliacutecitos 81
2 ESTABELECIMENTO DA CORRENTE INTERPRETATIVA81 3 REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NA OFERTAS VOLITIVAS E COMPULSOacuteRIAS 82
31 - As ofertas volitivas 82 311 - Os Holocaustos 82
312 - Exigecircncias para o Holocausto 83 313 - As ofertas de manjares 85 314 - As ofertas de comunhatildeo ou ofertas pacificas 86
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS86 41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia87
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo 87 43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo 88 44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas 88
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE89 51 - A mediaccedilatildeo 89
52 - A unccedilatildeo e a pureza 90 53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo 90 54 - O Yom Kippur92
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 93 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 94
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O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA
RESTAURATIVA1
RESUMO
O presente artigo escrito durante a pandemia da COVID-19 tem o intuito de relembrar a
histoacuteria de Joacute Partindo de uma perspectiva interdisciplinar entre Teologia e Direito
analisam-se as diferentes visotildees de Justiccedila contidas no Livro de Joacute Pretende-se
demonstrar a prevalecircncia da ideia de justiccedila restaurativa em detrimento das concepccedilotildees de
justiccedila retributiva (ligada ao tema do castigo divino) e contratualista (ligada ao tema da
teologia da prosperidade)
Palavras-chave Livro de Joacute Justiccedila retributiva Contrato Justiccedila restaurativa
ABSTRACT
This article written during the pandemic of COVID-19 is intended to recall Jobs story
Starting from an interdisciplinary perspective between theology and law the different
views of justice contained in the Book of Job are analyzed It is intended to demonstrate
the prevalence of the idea of restorative justice instead of the concepts of retributive
justice (linked to the theme of divine punishment) and contractualist (linked to the theme
of prosperity theology)
Key words Book of Job Retributive justice Contract Restorative justice
1 Doutor em Direito Penal pela Universidade de Satildeo Paulo Juiz Federal e Professor de Direito Penal da
FADISA
autor
Excelentissiacutemo Juiz Federal
Dr Paulo Bueno de Azevedo
7
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1 UM LIVRO ATEMPORAL
O presente artigo eacute escrito durante um periacuteodo turbulento certamente ineacutedito para
muitos de noacutes embora natildeo seja o primeiro evento da espeacutecie em nosso planeta A
pandemia da COVID (Corona virus Disease) -19 tal como outras doenccedilas no passado
(peste negra gripe espanhola etc) ainda estaacute causando milhares de mortes no mundo
todo forccedilando medidas eneacutergicas de isolamento social levando muitos ao desemprego agrave
falecircncia e agrave desesperanccedila
Neste cenaacuterio alguns ousam perguntar onde estaacute Deus Por que Deus esconde sua
face nesse momento Jaacute outros enxergam o sinal do fim dos tempos a puniccedilatildeo divina
decorrente dos pecados humanos E haacute ainda quem reforce a sua descrenccedila se Deus
existisse mesmo nada disso poderia ocorrer Enfim num momento tatildeo difiacutecil a
desesperanccedila a raiva e a incerteza encontram terreno feacutertil para disseminaccedilatildeo As
muacuteltiplas vozes se chocam e a feacute arrefece
Na verdade tais anguacutestias vecircm de certas concepccedilotildees que as pessoas tecircm de Deus
as quais por sinal estatildeo profundamente entrelaccediladas com pensamentos juriacutedicos A ideia
do castigo vem do tirociacutenio que invoca a justiccedila retributiva divina Jaacute o pensar que Deus
natildeo poderia permitir tais cataacutestrofes parece traduzir uma espeacutecie de obrigaccedilatildeo do Senhor
para com a humanidade E se existisse mesmo tal obrigaccedilatildeo quem poderia levar Deus ao
tribunal para que fosse compelido a cumprir esse contrato
O problema parece insoluacutevel pois quer se trate da puniccedilatildeo quer de um contrato
descumprido ningueacutem poderia confrontar o Criador em juiacutezo Ou poderia O desespero eacute
atual no entanto a histoacuteria eacute antiga Haacute milhares de anos foi retratada no Livro de Joacute A
autoria desse livro que compotildee o Antigo Testamento da Biacuteblia eacute desconhecida e existem
muitas duacutevidas sobre possiacuteveis trechos inseridos ou modificados a posteriori Imaginaria o
seu autor (ou sua autora2) que sua obra continuaria atual e sendo objeto de estudos e
reflexotildees mais de dois mil anos depois
Natildeo natildeo eacute por acaso que Jorge Luis Borges (BORGES 2009 p 156) considerava
o Livro de Joacute um dos mais impressionantes da Biacuteblia nem que Freud o tenha situado
como a mais alta das literaturas humanas (apud BORGES 1965) Natildeo eacute coincidecircncia que
o Livro de Joacute seja considerado ldquoo mais saacutebio da Biacuteblia Hebraicardquo (BLOOM 2005 p 15)
e tenha sido recontado tantas vezes como nas versotildees de HG Wells (apud BORGES
1965) e Fabrice Hadjadj bem como objeto de longos estudos a exemplo daqueles de Carl
2 A hipoacutetese de que o texto javista da Biacuteblia Hebraica poderia ter sido escrito por uma mulher hitita eacute
aventada por Harold Bloom (BLOOM 2005 p 27)
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
AZEVEDO Paulo Bueno de Ensaio sobre a irracionalidade do sistema criminal agrave
luz da obra religiosa de Lev Tolstoacutei Rio de Janeiro Lumen Juris 2019
BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
2011
BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
Revisatildeo de Marta Miranda OrsquoShea Rio de Janeiro Objetiva 2005
BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
de 2020
BORGES Jorge Luis Sete conversas com Fernando Sorrentino Organizador
Fernando Sorrentino Traduccedilatildeo de Ana Flores Rio de Janeiro Beco do Azougue
2009
CARBAJOSA Ignacio Joacute potildee Deus no banco dos reacuteus Sobre o sofrimento inocente
In httparquivorevistapassoscombrdefaultaspid=344ampid_n=5530amppagina=1
acesso em 14052020
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
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Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
JUNG CJ Resposta a Joacute Traduccedilatildeo do Pe Dom Mateus Ramalho Rocha 10 ediccedilatildeo
Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
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Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
31
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
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A oferta paciacutefica ou de comunhatildeo traz a ideia de comunhatildeo existente entre Deus
e os homens Na ocasiatildeo dessa oferenda o peito e a coxa deveriam ser dados para o
sustento dos sacerdotes e levitas Enquanto que na oferta de holocausto quase tudo era
queimado na oferta paciacutefica somente as gorduras eram oferecidas sobre o altar e o
restante das partes do animal era divido entre os sacerdotes e o ofertante Nessas refeiccedilotildees
comunais o ofertante juntamente com os sacerdotes fazia um banquete jubiloso porque
criam que Deus tambeacutem estava presente Nessa oferta de comunhatildeo estava selada a paz
entre Deus e o ofertante
Basta uma anaacutelise das figuras que estavam envolvidas nessa oferta para
verificarmos claramente a tipologia nela impliacutecita A paz era selada pois havia a presenccedila
de Deus do sacerdote (mediador) e do ofertante Isso nos remete a mediaccedilatildeo do sumo
sacerdote celestial que atraveacutes de sua oferta sacrificial derrubou a parede de inimizades
existente entre Deus e os homens proporcionando-nos a paz
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS
As ofertas compulsoacuterias eram ofertadas para expiar o pecado e a culpa do
transgressor e oferececirc-las natildeo dependia da sua vontade Caso natildeo quisesse sofrer as
consequecircncias do juiacutezo divino por suas transgressotildees ofertas pelo pecado deveriam ser
oferecidas pelo transgressor Essas ofertas estatildeo regulamentadas nos capiacutetulos 4 a 7 de
Leviacutetico onde as encontramos divididas basicamente em trecircs grupos oferta por
ignoracircncia oferta pelo pecado e oferta pela culpa
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Certa complexidade haacute em diferenciar de forma simples uma oferta da outra mas
de uma forma sintetizada podemos diferenciaacute-las conforme a proacutepria classificaccedilatildeo
mosaica Os textos biacuteblicos natildeo nos fornecem de forma satisfatoacuteria elementos para que
possamos fazer uma diferenciaccedilatildeo precisa de uma oferta para outra
41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia
O termo ignoracircncia (hb segaga) natildeo pode ser confundido com desconhecimento
da lei mosaica Os pecados a serem expiados por esse tipo de oferta eram aqueles que o
transgressor cometia de forma natildeo intencional (Lv 42) A ldquointenccedilatildeordquo aqui deve ser
entendida como ldquode forma natildeo desafiadorardquo isto eacute contrariando as leis divinas de modo a
desprezar a Deus e sua palavra Para esses natildeo havia expiaccedilatildeo
Os pecados cometidos por ignoracircncia estavam classificados no rol daqueles que o
transgressor cometia inadvertidamente ou inconscientemente como por exemplo tocar em
restos mortais sem que disso tivesse conhecimento Tambeacutem se enquadra aqueles
cometidos por conta da natureza caiacuteda do homem e sua consequente inclinaccedilatildeo para o
pecado Independente se o pecado havia sido cometido inconscientemente ou por conta da
inclinaccedilatildeo pecaminosa o homem tornar-se-ia culpado diante do Deus Santo necessitando
assim da expiaccedilatildeo do seu pecado
A expiaccedilatildeo para essa classe de pecados deveria obedecer a alguns criteacuterios
estabelecidos Sacerdotes priacutencipes a comunidade em geral e o indiviacuteduo em particular
deveriam oferecer sacrifiacutecios Para cada um desses grupos um animal especifico deveria
ser ofertado
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo
Esse tipo de oferta pela culpa (hb asham) era realizada nas ocasiotildees em que a
transgressatildeo fosse cometida em relaccedilatildeo ao proacuteximo Nesse caso deveria haver entatildeo uma
restituiccedilatildeo do ofensor para o ofendido Por envolver questotildees monetaacuterias como forma de
reparaccedilatildeo essa oferta tambeacutem era conhecida como oferta de restituiccedilatildeo
Logicamente por ser o homem a imagem e semelhanccedila de Deus qualquer
transgressatildeo cometida contra aquele ofendia Este Assim antes mesmo de tentar reatar o
seu relacionamento com Deus o pecador deveria estabelecer a comunhatildeo perdida com o
ofendido Se natildeo houvesse expiaccedilatildeo a culpa permaneceria e o juiacutezo divino certamente
recairia sobre o ofensor
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43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo
Haacute entre os eruditos certa dificuldade para entender a que tipo de pecado essa
oferta faz referecircncia A ligaccedilatildeo dos dois substantivos (ldquooferta pelo pecadordquo) sugerem eles
parece indicar que os pecadores deveriam lidar com seus pecados mediante a oferta de
sacrifiacutecios Ao pecar necessariamente o transgressor deveria associar a ideia dual de
ldquopecado necessita de ofertardquo
Outra ideia impliacutecita na oferta pelo pecado (hb hattarsquot) eacute a de purificaccedilatildeo O
pecado -atraveacutes do pecador - contaminava o ambiente sagrado tornando-o improacuteprio para
a presenccedila de Deus Por esse motivo o sangue dessa oferta era aspergido sobre os altares
o propiciatoacuterio e dentro do Santo dos Santos A purificaccedilatildeo mediante o sangue era
necessaacuteria para a manifestaccedilatildeo da presenccedila divina Esse ato de purgar deu tambeacutem a essa
oferta o nome de ldquooferta de purificaccedilatildeordquo
Temos dois fatores de suma importacircncia no processo de salvaccedilatildeo expiaccedilatildeo e
purificaccedilatildeo Sem a expiaccedilatildeo o homem permanece separado de Deus e sem a purificaccedilatildeo eacute
impedido de receber sua presenccedila Esse duplo processo soacute poderia ser realizado mediante o
derramamento de sangue inocente e com a indispensaacutevel presenccedila do sacerdote mediador
44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas
Para todas essas ofertas volitivas e compulsoacuterias a qualidade era imprescindiacutevel
A expiaccedilatildeo pelo sangue era o elemento comum que as unificava Desde um touro oferecido
pelo sacerdote em favor de seus proacuteprios pecados ateacute um pombo ofertado pelos mais
pobres eram recebidos por Deus como sacrifiacutecio substitutivo com o poder de expiar e
purificar ainda que de forma provisoacuteria
O estudo da lei mosaica nos leva a concluir que havia a possibilidade de oferendas
e sacrifiacutecios expiatoacuterios para todos os pecados com exceccedilatildeo daqueles cometidos de forma
que desafiassem a Deus e a sua palavra Esse tipo de pecado era fruto de um coraccedilatildeo
impenitente que desobedecia propositalmente aos mandamentos divinos O Novo
Testamento demonstra de forma inequiacutevoca que o sacrifiacutecio de Cristo tem suficiecircncia para
perdatildeo de todos os pecados no tempo e no espaccedilo A uacutenica exceccedilatildeo feita a essa regra eacute a
blasfecircmia contra o Santo Espiacuterito (Mt 1232 Lc 1210)
Todas essas variedades de ofertas e as mais diversas classes de animais bem
como os rituais diaacuterios tinham a intenccedilatildeo de revelar a necessidade do Messias que com
um uacutenico sacrifiacutecio expiatoacuterio anularia os efeitos do pecado sobre os homens que nele
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cressem Jesus na cruz fez a oferta de si mesmo a Deus uma uacutenica vez e com a eficaacutecia
eterna para perdatildeo de todas as variedades de pecados que a lei classificava mas natildeo dava a
soluccedilatildeo definitiva
O sangue de bovinos caprinos ovinos e aves eram apenas uma paacutelida sombra que
apenas cobria os pecados conscientes ou inconscientes voluntaacuterios ou involuntaacuterios Por
sua ineficaacutecia a expiaccedilatildeo limitava-se a indiviacuteduos ou grupos de indiviacuteduos e seu alcance
era temporal pois tinha eficaacutecia somente em um periacuteodo especifico O sangue de Cristo
entretanto como nos atesta o Novo Testamento atua de forma ilimitada sendo tambeacutem
atemporal (Hb 913-15 104)
A nossa limitaccedilatildeo nos permite apenas olhar o sacrifiacutecio vicaacuterio do Cristo de forma
progressiva na revelaccedilatildeo biacuteblica mas com o Eterno tal natildeo se sucede visto ter Ele os
atributos incomunicaacuteveis da onisciecircncia e presciecircncia (At 223 1Pe 12) Portanto ao
perdoar as transgressotildees com base no sangue de animais na verdade Ele via
antecipadamente o sacrifiacutecio de Cristo sendo realizado
O homem olha a revelaccedilatildeo progressiva da salvaccedilatildeo poreacutem o Deus Eterno a vecirc na
totalidade A cruz na perspectiva divina sempre esteve no Velho Testamento pois ela
considerando uma progressatildeo histoacuterica eacute antes dele O Messias ainda que de forma
velada sempre esteve laacute como nos atestam as seguintes passagens biblicas 2Tmt 11 2T
19 Ap 178 Pv 823-31 Mt 2534 Jo 1724 At 1518 Rm 1625 1Pe 120-23 Ap 138
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE
51 - A mediaccedilatildeo
As ofertas cuja funccedilatildeo era expiar o pecado conforme jaacute vimos tipificavam o
sacrifiacutecio perfeito e final do Messias Eram apenas sombras indicativas de algo superior
que foi revelado atraveacutes de Jesus e sistematizado nos vinte e nove livros que compotildee o
Novo Testamento (Hb 85 99 23-24 101 Cl 217)
Essas ofertas soacute poderiam ser aceitas por Deus caso houvesse um mediador que as
oferecesse Nesse cenaacuterio entra a figura do sacerdote e do sumo sacerdote que tipificavam
o sacerdoacutecio eterno do Messias Muitos satildeo os detalhes que vinculam o sacerdoacutecio terreno
com a obra mediadora do Messias Visto que nosso espaccedilo eacute limitado pela natureza desse
artigo faremos apenas algumas correspondecircncias entre o sacerdoacutecio humano e o
sacerdoacutecio celestial de Cristo
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52 - A unccedilatildeo e a pureza
O capiacutetulo oito de Leviacutetico descreve a consagraccedilatildeo de Aratildeo como sumo sacerdote
e de seus filhos como sacerdotes O oacuteleo da unccedilatildeo - siacutembolo do Espiacuterito Santo - foi
derramado sobre ele - tipo de Jesus - para exercer sua funccedilatildeo em favor dos fracos e
ignorantes (Hb 51-10) O Velho e o Novo Testamento apresentam Jesus como o ungido de
Deus sobre o qual foi derramado o Espiacuterito Santo para libertar os cativos do pecado
Somente eles poderiam fazer mediaccedilatildeo pelo povo da mesma forma que natildeo haacute
outro mediador entre Deus e os homens a natildeo ser Jesus (At 412 1 Tm 25 Hb 725 86
915 1224) Conforme nos atestam alguns versos biacuteblicos qualquer pessoa que tentasse
usurpar a funccedilatildeo sacerdotal receberia a pena capital (Nm 310 38 1640 185-7) Assim
tipologicamente falando excluindo-se a pessoa de Jesus qualquer outro mediador diante
de Deus estaacute morto
O sacerdote deveria antes de oferecer qualquer sacrifiacutecio banhar-se na bacia de
bronze localizada no aacutetrio do tabernaacuteculo (Lv 86) Esse ritual continha a ideia de
purificaccedilatildeo pois o sacerdote que oferecesse o sacrifiacutecio deveria estar puro diante de Deus
Qualquer oficiante do tabernaacuteculo que natildeo se lavasse ou natildeo fizesse os cerimoniais
prescritos na lei deveria seria morto (Ecircx 3018-21)
Esse simbolismo eacute perfeito quando comparado a situaccedilatildeo do pecador diante do
Deus Santo Qualquer transgressor que Dele se aproximar sem estar puro receberaacute o
salaacuterio do pecado isto eacute a morte eterna
53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo
Associada com a ideia de santidade havia uma lacircmina de ouro posta no turbante
do sumo sacerdote com a inscriccedilatildeo ldquoSantidade ao Senhorrdquo (Ecircx 2836 Lv 89) Essa lacircmina
representava o elevado grau de santidade que o sumo sacerdote deveria ter por se
apresentar diante de Deus para expiar os pecados do povo Outra peccedila que compunha o
vestuaacuterio da classe sacerdotal era a estola feita de linho fino branco indicativo na Biacuteblia de
pureza e santidade (Ecircx 2839 87)
Toda o ritual de purificaccedilatildeo e as vestimentas apontavam para a santidade do
sacerdote que por sua vez tipificava a santidade do sumo sacerdote celestial que em tudo
foi tentado poreacutem sem pecado (Hb 726 Is 539 Jo 846 2Co 521 1Pe 222 1 Jo 35)
No ritual de purificaccedilatildeo dos contaminados por lepra e liacutequidos corporais descrito
nos capiacutetulos 11 a 15 de Leviacutetico o sacerdote figurava como a personagem principal pois
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sem ele o processo de purificaccedilatildeo natildeo poderia ser finalizado Vemos entatildeo uma dupla
funccedilatildeo sacerdotal o que mediava e o que purificava Na pessoa de Jesus cumpriu-se esse
duplo tipo sacerdotal pois o Novo Testamento atribui a ele a funccedilatildeo de mediador e
purificador
Qualquer judeu por mais simples que fosse entenderia a mensagem espiritual
profunda que havia no ritual de purificaccedilatildeo e nas roupas sacerdotais E qual seria essa
mensagem A resposta simples eacute antes mesmo de se aproximar de um Deus Santo com
sacrifiacutecio havia a necessidade imperiosa de purificar-se Primeiro se purifica Depois a
Ele oferece-se sacrifiacutecios de adoraccedilatildeo Purificaccedilatildeo e sacrifiacutecios estatildeo intimamente
interligados conforme jaacute vimos nas ofertas compulsoacuterias E tudo isso soacute seria possiacutevel com
a figura do mediador
Todo o vestuaacuterio do sumo sacerdote tipificava o Messias e seu oficio sacerdotal
Natildeo sendo possiacutevel nesse artigo analisar as minuacutecias de cada uma das peccedilas falaremos
delas de forma geneacuterica Basicamente o eacutefode e o cinto do sumo sacerdote possuiacuteam
quatro cores que apareciam tambeacutem na primeira cortina que cobria o tabernaacuteculo no veacuteu
que separava o lugar santo do santiacutessimo e na cortina de entrada do aacutetrio do tabernaacuteculo O
azul carmesim puacuterpura e branco tipificavam alguns atributos do Messias O azul sua
origem celestial a puacuterpura apontava para sua realeza o branco fala de sua absoluta
pureza e o vermelho do seu sacrifiacutecio expiatoacuterio Somente o Messias Jesus Cristo
apresentou as quatro caracteriacutesticas aceitaacuteveis a Deus Rei que veio do ceacuteu cujo sangue foi
derramado e sobre Ele natildeo pode ser imputado pecado algum
Sobre o eacutefode ficava o peitoral do juiacutezo contendo doze pedras preciosas e em
cada uma delas estava gravada o nome das doze tribos de Israel Essas pedras conforme
determinaccedilatildeo biacuteblica deveriam estar sobre o coraccedilatildeo do sumo sacerdote quando este
oficiasse no tabernaacuteculo Ele tambeacutem carregava sobre os ombros uma pedra preciosa de
cada lado Na primeira eram gravados os nomes de seis tribos de Israel na outra mais seis
tribos Assim o representante dos homens carregava simbolicamente no coraccedilatildeo e nos
ombros toda a naccedilatildeo dos filhos de Israel diante de Deus estando assim toda ela
representada pelas quatorze pedras Assim o sumo sacerdote intercedia por toda a naccedilatildeo
continuamente
Poucos discordariam que a igreja de Cristo assumiu o papel de Israel ainda que
saibamos que esse fato natildeo invalida as promessas de Deus feitas a esse povo Apaziguada
essa questatildeo podemos entatildeo verificar a tipicidade desse peitoral no tocante a figura do
Messias O sumo sacerdote humano carregava sobre o coraccedilatildeo e ombros a naccedilatildeo de
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Israel ao passo que o Messias carrega sobre o coraccedilatildeo e ombros a igreja composta de
pessoas de todas as naccedilotildees (Jo 315 Mt 913 1Tt 115-16 Ap 59 Ap 1211 Hb 1312
1Pe 119)
Esse peitoral dobrado formava uma bolsa que continha duas pedras conhecidas
como Urim e Tumim com as quais se consultavam a vontade de Deus Sacerdotes
profetas Urim e Tumim eram necessaacuterios enquanto o Messias natildeo havia sido revelado
Poreacutem o Messias jaacute veio como a revelaccedilatildeo final de Deus para o homem (Hb 11-
2) Ele eacute a uacutenica verdade e portanto nosso uacutenico guia espiritual (Jo 146) Tal qual o sumo
sacerdote guiava o povo mediante o Urim e Tumim Ele sem fazer uso de qualquer pedra
nos guia mediante o Espirito Santo e as Escrituras sagradas rumo ao ceacuteu (Jo 1426 1613
1Co 210-13 Ef 47-15 1 Jo 220 1 Jo 227)
Mediante essas duas pedras consultava-se a Deus e por elas vinha a resposta
Hoje eacute por intermeacutedio do Cristo revelado nas Escrituras que obtemos a maioria das
respostas para nossas indagaccedilotildees
54 - O Yom Kippur
Ao falarmos das ofertas volitivas e compulsoacuterias alguns paraacutegrafos devem ser
dedicados ao ritual do Yom Kippur cujo cerimonial representava o perdatildeo anual dos
pecados dos filhos de Israel
O Yom Kippur ou Dia do perdatildeo eacute considerado um dos dias mais sagrados do
calendaacuterio judaico Era nesse dia que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para
purificar o tabernaacuteculo e oferecer o sacrifiacutecio anual por toda a naccedilatildeo (Lv 166 16 18-19
24) Era um dia de jejum e nenhum trabalho servil deveria ser realizado Era nesse
grandioso dia que o bode expiatoacuterio Azazel tinha de ser enviado ao deserto para longe do
arraial ou das portas de Jerusaleacutem Ele carregava sobre si os pecados de toda a naccedilatildeo e
acabava simbolicamente morrendo por ela Isso por si soacute jaacute configura uma bela
tipologia o cordeiro de Deus sofreu e morreu fora das portas de Jerusaleacutem carregando
sobre si os pecados da humanidade (Mt 1520-24 Jo 1917-18 At 758 Hb 1312)
Ao entrar no Santiacutessimo o sumo sacerdote enchia-o de fumaccedila de incenso para
que a nuvem perfumada ocultasse de seus olhos o propiciatoacuterio local esse considerado
como sendo ldquoo trono de Deusrdquo Ao entrar nesse recinto sagrado o sumo sacerdote deveria
ter em matildeos o sangue para expiar os pecados de toda a naccedilatildeo Fontes extrabiacuteblicas nos
informam sobre o alto grau de relevacircncia desse dia pois era nele que se promulgava certo
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decreto divino sobre quem iraacute viver e quem iraacute morrer quem estaraacute sereno e quem seraacute
perturbado quem seraacute pobre e quem seraacute rico quem seraacute exaltado e quem seraacute humilhado
(KOLATCH p239)
Para estabelecer a rica tipologia encontrada nos ritos desse tatildeo importante dia
basta-nos consultar alguns versos do livro de hebreus que revelam o ofiacutecio sacerdotal de
Cristo (Hb 91-26 217 31 415 55-6 71 11-27 81)
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
A tipologia por ser essencialmente biacuteblica natildeo pode ser desprezada sendo que os
extremos na sua utilizaccedilatildeo devem ser evitados atraveacutes de esforccedilos para encontrar-se uma
posiccedilatildeo moderada Ao nos apossarmos dessa ideia perceberemos o quatildeo proveitoso seraacute o
nosso conhecimento dos ldquotiposrdquo biacuteblicos para a robustez da nossa teologia
A anaacutelise das ofertas volitivas e compulsoacuterias demostram essa verdade na medida
em que as conhecemos de forma mais profunda A partir disso vemos natildeo mais um
emaranhado de ordenanccedilas cerimoniais destituiacutedas de sentido mas profundas liccedilotildees
espirituais acerca da figura central da Biacuteblia Jesus Cristo
Ainda que geraccedilatildeo apoacutes geraccedilatildeo os filhos de Israel matavam os inocentes animais
atraveacutes de sacrifiacutecios e natildeo tinham a plena consciecircncia da magnitude do seu simbolismo
todavia pela feacute sabiam que seus pecados haviam sido expiados As ofertas o sofrimento e
morte dos animais o sangue derramado e a mediaccedilatildeo dos sacerdotes propiciavam um
cenaacuterio pedagoacutegico riquiacutessimo mediante a qual todos aprendiam acerca do plano divino da
redenccedilatildeo Negar isso eacute negar a proacutepria Escritura
Os escritores do Novo Testamento empreenderam grandes esforccedilos para elaborar
suas doutrinas com base no entendimento que tinham do Velho Testamento pois era esse
que testificava acerca do Messias Ele mesmo nos seus ensinamentos citou por diversas
vezes as Escrituras veterotestamentaacuterias Era o antiacutetipo em carne e osso explicando aos
disciacutepulos toda a tipologia que Nele encontrava a plena realizaccedilatildeo Assim quando os
escritores neotestamentaacuterios analisavam as ofertas volitivas e compulsoacuterias encontravam
nelas revelado o Messias de Israel
As ldquosombrasrdquo tiveram o seu valor ateacute a chegada da realidade isto eacute Cristo Ele eacute
a revelaccedilatildeo final de Deus pois posteriormente ao brado ldquoestaacute consumadordquo o veacuteu foi
rasgado e o acesso pleno a Deus liberado As ofertas volitivas e compulsoacuterias natildeo satildeo mais
necessaacuterias pois aquele para quem elas apontavam as substituiu satisfez a justiccedila divina e
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reconciliou o homem com Deus Cabe-nos empreendermos esforccedilos com a finalidade uacutenica
de conhecer mais detalhadamente as ofertas volitivas e compulsoacuterias E assim ter uma
percepccedilatildeo mais niacutetida de que o mesmo Deus que instituiu os ldquotiposrdquo eacute o mesmo que os
tornou realidade na pessoa do Messias Jesus Cristo
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EDERSHEIM Alfredo Festas de Israel Satildeo Paulo Uniatildeo Cultural
ELWELL Walter A Enciclopeacutedia Histoacuterico-teoloacutegica da Igreja Cristatilde 1ordf ed
Satildeo Paulo Vida Nova 2009
FILLION Louis Claude Enciclopeacutedia da Vida de Jesus 2ordf ed Rio de Janeiro
Vida 2008
GOWER Ralph Usos e Costumes dos tempos biacuteblicos 1ordf ed Rio de janeiro
CPAD 2002
HABERSHON Ada R Manual de tipologia biacuteblica como reconhecer e interpretar
siacutembolos ldquotiposrdquo e alegorias das Escrituras Sagradas Satildeo Paulo Vida 2003
HAMILTON Victor P O Manual do Pentateuco 1ordf ed Rio de Janeiro CPAD
1982
HARRIS R Laird et al Dicionaacuterio Internacional de Teologia do Antigo
Testamento 1ordf ed Satildeo Paulo Vida Nova 1988
HARRISON Roland K Leviacutetico Introduccedilatildeo e Comentaacuterio 1ordf ed Satildeo Paulo
Cultura Cristatilde 1983
HOFF Paul O Pentateuco 1ordf ed Satildeo Paulo Vida 1994
95
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SCHULTZ Samuel J A Histoacuteria de Israel no Antigo Testamento 1ordf ed Satildeo
Paulo Vida Nova 1977
JEREMIAS Joachim Jerusaleacutem no tempo de Jesus Satildeo Paulo Paulus 1983
JOSEFO Flaacutevio Histoacuteria dos Hebreus 8ordf ed Rio de Janeiro CPAD 2004
KOLATCH Alfred J Livro Judaico dos porquecircs Satildeo Paulo Sefer 2007
KOLUTCH Alfred J 2ordm Livro Judaico dos Porquecircs 2ordf ed Satildeo Paulo Secircfer 2003
MOREIRA Odilon S Comentaacuterio de Leviacutetico Versiacuteculo por Versiacuteculo 2ordf ed Satildeo
Paulo Querigma 2020
ZUCK Roy B A interpretaccedilatildeo biacuteblica meios de descobrir a Verdade da Biacuteblia
Satildeo Paulo Vida Nova 1994
Autor ndash Bacharel em Teologia
Prof Odilon Soares Moreira
Bacharel em Teologia pela Faculdade
Beth Shalom e licenciado em Filosofia
pela Universidade Metodista de Satildeo
Paulo
E-mail odilonmoreira13hotmailcom
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CORPO EDITORIAL
Direccedilatildeo Cientifica Intelectual Reitora Dra Arleide Braga Poacutes-Doutora em Direito Constitucional pela Universitaacute degli Studi di Messina ndash Itaacutelia
Doutora em Ciecircncias Juriacutedicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino ndash UMSA ndash Bs
As | ARG
Doutora em Ciecircncias Sociais pela PUC | SP
Mestre em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos | SP ndash UNIMES
Poacutes-Graduada em Direito Previdenciaacuterio e Direito do Trabalho pela Universidade Gama Filho | RJ
Graduada em Letras (Licenciatura) pelo Centro Universitaacuterio de Santo Andreacute | SP
Presidente da Comissatildeo de Direito Previdenciaacuterio da OAB ndash Santo Andreacute | SP ndash Triecircnio 20162018
Diretora Estrateacutegica Dra Karina Costa Braga
Mestre em Direito - PUC | SP
Diretora Institucional da Faculdade de Tecnologia Jardim ndash FATEJ e da Faculdade de Direito Santo
Andreacute ndash FADISA em Santo Andreacute | SP
Diretora e Procuradora Dra Karen Costa Braga
Mestre em Direito - PUC | SP
Procuradora Institucional Coordenadora Administrativa do Departamento de Poacutes-Graduaccedilatildeo da
Faculdade de Tecnologia Jardim e da Faculdade de Direito Santo Andreacute ndash FADISA em Santo Andreacute |
SP
Diretor Acadecircmico Institucional Dr Mauriacutecio Tintori Piqueira
Doutor em Ciecircncias Sociais Mestre em Histoacuteria PUC-SP
Editor
Me Marcelo Alves Dantas
Periodicidade da Publicaccedilatildeo
Semestral
CAPA
Marcos Camilo Santana
Idiomas Aceitos artigos escritos em portuguecircs espanhol e inglecircs
AUTOR CORPORATIVO
Faculdade de Tecnologia Jardim - FATEJ
Faculdade de Direito Santo Andreacute - FADISA
Campus I - R Almirante Protoacutegenes 44 - B Jardim - Santo Andreacute - SP CEP 09090-760
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SUMAacuteRIO
O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 6
1 UM LIVRO ATEMPORAL 7 2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO 8
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 12 4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH 14
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 17 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 18
A CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA EXEGESE DO
APOCALIPSE DE JOAtildeO 20 APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO
JUDAICO - UMA EXEGESE CONTEMPORAcircNEA 20 INTRODUCcedilAtildeO 22
1INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS FUNDANTESrdquo 23 11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 23
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 25 13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 27
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 28 2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea 30
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14) 34 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 44
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 46
A TERCEIRIZACcedilAtildeO DA FEacute NOS TEMPOS DE PANDEMIA E ISOLAMENTO SOCIAL O SURGIMENTO DO ldquoPERSONAL PROFECTrdquo ndash E AS CRISES DE
ESPIRITUALIDADE 53 INTRODUCcedilAtildeO 54 1OUTROS PROBLEMAS INFLUENCIANDO A ESPIRITUALIDADE NO TEMPO DE
ISOLAMENTO SOCIAL DO ATEIacuteSMO CETICISMO OU UMA BUSCA MAL DIRECIONADA DA ESPIRITUALIDADE PODERAtildeO INFLUENCIAR AS RELACcedilOtildeES
DE FEacute 55 2VIVEMOS - ldquoUMA NOVA FEacute PARA UM NOVO TEMPOrdquo ONDE VERIFICAMOS COMO COMPREENDER A FEacute E SUAS APLICACcedilOtildeES COMO VIVENCIAR A FEacute NA
ATUALIDADE 56 3HOJE Eacute PRECISO RESSIGNIFICAR ALGUNS CONCEITOS SOBRE A FEacute 57
4QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS E PANDEMIAS 59
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 62 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 63
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O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO 67 INTRODUCcedilAtildeO 68
1 EM BUSCA DO CENAacuteRIO HISTOacuteRICO68 2 A EXPANSAtildeO DA FEacute CRISTAtilde69
3 DE PEDRO A PAULO (EXPANSAtildeO DA OBRA DE MISSOtildeES)69 4 O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO72 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 73
REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NO LIVRO DE LEVIacuteTICO 74 INTRODUCcedilAtildeO 75 1 TIPOLOGIA 76
11 - Definiccedilatildeo de tipologia77 12 - A tipologia como ferramenta da hermenecircutica 77
13 - As Escrituras e a tipologia77 14 - A tipologia e as correntes teoloacutegicas78 141- ldquotiposrdquo natildeo ratificados pelo Novo Testamento 79
142 - Siacutembolos ratificados pelo Novo Testamento 80 142 - Corrente intermediaacuteria ldquotiposrdquo expliacutecitos e impliacutecitos 81
2 ESTABELECIMENTO DA CORRENTE INTERPRETATIVA81 3 REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NA OFERTAS VOLITIVAS E COMPULSOacuteRIAS 82
31 - As ofertas volitivas 82 311 - Os Holocaustos 82
312 - Exigecircncias para o Holocausto 83 313 - As ofertas de manjares 85 314 - As ofertas de comunhatildeo ou ofertas pacificas 86
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS86 41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia87
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo 87 43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo 88 44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas 88
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE89 51 - A mediaccedilatildeo 89
52 - A unccedilatildeo e a pureza 90 53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo 90 54 - O Yom Kippur92
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 93 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 94
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O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA
RESTAURATIVA1
RESUMO
O presente artigo escrito durante a pandemia da COVID-19 tem o intuito de relembrar a
histoacuteria de Joacute Partindo de uma perspectiva interdisciplinar entre Teologia e Direito
analisam-se as diferentes visotildees de Justiccedila contidas no Livro de Joacute Pretende-se
demonstrar a prevalecircncia da ideia de justiccedila restaurativa em detrimento das concepccedilotildees de
justiccedila retributiva (ligada ao tema do castigo divino) e contratualista (ligada ao tema da
teologia da prosperidade)
Palavras-chave Livro de Joacute Justiccedila retributiva Contrato Justiccedila restaurativa
ABSTRACT
This article written during the pandemic of COVID-19 is intended to recall Jobs story
Starting from an interdisciplinary perspective between theology and law the different
views of justice contained in the Book of Job are analyzed It is intended to demonstrate
the prevalence of the idea of restorative justice instead of the concepts of retributive
justice (linked to the theme of divine punishment) and contractualist (linked to the theme
of prosperity theology)
Key words Book of Job Retributive justice Contract Restorative justice
1 Doutor em Direito Penal pela Universidade de Satildeo Paulo Juiz Federal e Professor de Direito Penal da
FADISA
autor
Excelentissiacutemo Juiz Federal
Dr Paulo Bueno de Azevedo
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1 UM LIVRO ATEMPORAL
O presente artigo eacute escrito durante um periacuteodo turbulento certamente ineacutedito para
muitos de noacutes embora natildeo seja o primeiro evento da espeacutecie em nosso planeta A
pandemia da COVID (Corona virus Disease) -19 tal como outras doenccedilas no passado
(peste negra gripe espanhola etc) ainda estaacute causando milhares de mortes no mundo
todo forccedilando medidas eneacutergicas de isolamento social levando muitos ao desemprego agrave
falecircncia e agrave desesperanccedila
Neste cenaacuterio alguns ousam perguntar onde estaacute Deus Por que Deus esconde sua
face nesse momento Jaacute outros enxergam o sinal do fim dos tempos a puniccedilatildeo divina
decorrente dos pecados humanos E haacute ainda quem reforce a sua descrenccedila se Deus
existisse mesmo nada disso poderia ocorrer Enfim num momento tatildeo difiacutecil a
desesperanccedila a raiva e a incerteza encontram terreno feacutertil para disseminaccedilatildeo As
muacuteltiplas vozes se chocam e a feacute arrefece
Na verdade tais anguacutestias vecircm de certas concepccedilotildees que as pessoas tecircm de Deus
as quais por sinal estatildeo profundamente entrelaccediladas com pensamentos juriacutedicos A ideia
do castigo vem do tirociacutenio que invoca a justiccedila retributiva divina Jaacute o pensar que Deus
natildeo poderia permitir tais cataacutestrofes parece traduzir uma espeacutecie de obrigaccedilatildeo do Senhor
para com a humanidade E se existisse mesmo tal obrigaccedilatildeo quem poderia levar Deus ao
tribunal para que fosse compelido a cumprir esse contrato
O problema parece insoluacutevel pois quer se trate da puniccedilatildeo quer de um contrato
descumprido ningueacutem poderia confrontar o Criador em juiacutezo Ou poderia O desespero eacute
atual no entanto a histoacuteria eacute antiga Haacute milhares de anos foi retratada no Livro de Joacute A
autoria desse livro que compotildee o Antigo Testamento da Biacuteblia eacute desconhecida e existem
muitas duacutevidas sobre possiacuteveis trechos inseridos ou modificados a posteriori Imaginaria o
seu autor (ou sua autora2) que sua obra continuaria atual e sendo objeto de estudos e
reflexotildees mais de dois mil anos depois
Natildeo natildeo eacute por acaso que Jorge Luis Borges (BORGES 2009 p 156) considerava
o Livro de Joacute um dos mais impressionantes da Biacuteblia nem que Freud o tenha situado
como a mais alta das literaturas humanas (apud BORGES 1965) Natildeo eacute coincidecircncia que
o Livro de Joacute seja considerado ldquoo mais saacutebio da Biacuteblia Hebraicardquo (BLOOM 2005 p 15)
e tenha sido recontado tantas vezes como nas versotildees de HG Wells (apud BORGES
1965) e Fabrice Hadjadj bem como objeto de longos estudos a exemplo daqueles de Carl
2 A hipoacutetese de que o texto javista da Biacuteblia Hebraica poderia ter sido escrito por uma mulher hitita eacute
aventada por Harold Bloom (BLOOM 2005 p 27)
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
AZEVEDO Paulo Bueno de Ensaio sobre a irracionalidade do sistema criminal agrave
luz da obra religiosa de Lev Tolstoacutei Rio de Janeiro Lumen Juris 2019
BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
2011
BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
Revisatildeo de Marta Miranda OrsquoShea Rio de Janeiro Objetiva 2005
BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
de 2020
BORGES Jorge Luis Sete conversas com Fernando Sorrentino Organizador
Fernando Sorrentino Traduccedilatildeo de Ana Flores Rio de Janeiro Beco do Azougue
2009
CARBAJOSA Ignacio Joacute potildee Deus no banco dos reacuteus Sobre o sofrimento inocente
In httparquivorevistapassoscombrdefaultaspid=344ampid_n=5530amppagina=1
acesso em 14052020
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
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Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
JUNG CJ Resposta a Joacute Traduccedilatildeo do Pe Dom Mateus Ramalho Rocha 10 ediccedilatildeo
Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
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Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
31
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
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A oferta paciacutefica ou de comunhatildeo traz a ideia de comunhatildeo existente entre Deus
e os homens Na ocasiatildeo dessa oferenda o peito e a coxa deveriam ser dados para o
sustento dos sacerdotes e levitas Enquanto que na oferta de holocausto quase tudo era
queimado na oferta paciacutefica somente as gorduras eram oferecidas sobre o altar e o
restante das partes do animal era divido entre os sacerdotes e o ofertante Nessas refeiccedilotildees
comunais o ofertante juntamente com os sacerdotes fazia um banquete jubiloso porque
criam que Deus tambeacutem estava presente Nessa oferta de comunhatildeo estava selada a paz
entre Deus e o ofertante
Basta uma anaacutelise das figuras que estavam envolvidas nessa oferta para
verificarmos claramente a tipologia nela impliacutecita A paz era selada pois havia a presenccedila
de Deus do sacerdote (mediador) e do ofertante Isso nos remete a mediaccedilatildeo do sumo
sacerdote celestial que atraveacutes de sua oferta sacrificial derrubou a parede de inimizades
existente entre Deus e os homens proporcionando-nos a paz
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS
As ofertas compulsoacuterias eram ofertadas para expiar o pecado e a culpa do
transgressor e oferececirc-las natildeo dependia da sua vontade Caso natildeo quisesse sofrer as
consequecircncias do juiacutezo divino por suas transgressotildees ofertas pelo pecado deveriam ser
oferecidas pelo transgressor Essas ofertas estatildeo regulamentadas nos capiacutetulos 4 a 7 de
Leviacutetico onde as encontramos divididas basicamente em trecircs grupos oferta por
ignoracircncia oferta pelo pecado e oferta pela culpa
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Certa complexidade haacute em diferenciar de forma simples uma oferta da outra mas
de uma forma sintetizada podemos diferenciaacute-las conforme a proacutepria classificaccedilatildeo
mosaica Os textos biacuteblicos natildeo nos fornecem de forma satisfatoacuteria elementos para que
possamos fazer uma diferenciaccedilatildeo precisa de uma oferta para outra
41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia
O termo ignoracircncia (hb segaga) natildeo pode ser confundido com desconhecimento
da lei mosaica Os pecados a serem expiados por esse tipo de oferta eram aqueles que o
transgressor cometia de forma natildeo intencional (Lv 42) A ldquointenccedilatildeordquo aqui deve ser
entendida como ldquode forma natildeo desafiadorardquo isto eacute contrariando as leis divinas de modo a
desprezar a Deus e sua palavra Para esses natildeo havia expiaccedilatildeo
Os pecados cometidos por ignoracircncia estavam classificados no rol daqueles que o
transgressor cometia inadvertidamente ou inconscientemente como por exemplo tocar em
restos mortais sem que disso tivesse conhecimento Tambeacutem se enquadra aqueles
cometidos por conta da natureza caiacuteda do homem e sua consequente inclinaccedilatildeo para o
pecado Independente se o pecado havia sido cometido inconscientemente ou por conta da
inclinaccedilatildeo pecaminosa o homem tornar-se-ia culpado diante do Deus Santo necessitando
assim da expiaccedilatildeo do seu pecado
A expiaccedilatildeo para essa classe de pecados deveria obedecer a alguns criteacuterios
estabelecidos Sacerdotes priacutencipes a comunidade em geral e o indiviacuteduo em particular
deveriam oferecer sacrifiacutecios Para cada um desses grupos um animal especifico deveria
ser ofertado
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo
Esse tipo de oferta pela culpa (hb asham) era realizada nas ocasiotildees em que a
transgressatildeo fosse cometida em relaccedilatildeo ao proacuteximo Nesse caso deveria haver entatildeo uma
restituiccedilatildeo do ofensor para o ofendido Por envolver questotildees monetaacuterias como forma de
reparaccedilatildeo essa oferta tambeacutem era conhecida como oferta de restituiccedilatildeo
Logicamente por ser o homem a imagem e semelhanccedila de Deus qualquer
transgressatildeo cometida contra aquele ofendia Este Assim antes mesmo de tentar reatar o
seu relacionamento com Deus o pecador deveria estabelecer a comunhatildeo perdida com o
ofendido Se natildeo houvesse expiaccedilatildeo a culpa permaneceria e o juiacutezo divino certamente
recairia sobre o ofensor
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43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo
Haacute entre os eruditos certa dificuldade para entender a que tipo de pecado essa
oferta faz referecircncia A ligaccedilatildeo dos dois substantivos (ldquooferta pelo pecadordquo) sugerem eles
parece indicar que os pecadores deveriam lidar com seus pecados mediante a oferta de
sacrifiacutecios Ao pecar necessariamente o transgressor deveria associar a ideia dual de
ldquopecado necessita de ofertardquo
Outra ideia impliacutecita na oferta pelo pecado (hb hattarsquot) eacute a de purificaccedilatildeo O
pecado -atraveacutes do pecador - contaminava o ambiente sagrado tornando-o improacuteprio para
a presenccedila de Deus Por esse motivo o sangue dessa oferta era aspergido sobre os altares
o propiciatoacuterio e dentro do Santo dos Santos A purificaccedilatildeo mediante o sangue era
necessaacuteria para a manifestaccedilatildeo da presenccedila divina Esse ato de purgar deu tambeacutem a essa
oferta o nome de ldquooferta de purificaccedilatildeordquo
Temos dois fatores de suma importacircncia no processo de salvaccedilatildeo expiaccedilatildeo e
purificaccedilatildeo Sem a expiaccedilatildeo o homem permanece separado de Deus e sem a purificaccedilatildeo eacute
impedido de receber sua presenccedila Esse duplo processo soacute poderia ser realizado mediante o
derramamento de sangue inocente e com a indispensaacutevel presenccedila do sacerdote mediador
44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas
Para todas essas ofertas volitivas e compulsoacuterias a qualidade era imprescindiacutevel
A expiaccedilatildeo pelo sangue era o elemento comum que as unificava Desde um touro oferecido
pelo sacerdote em favor de seus proacuteprios pecados ateacute um pombo ofertado pelos mais
pobres eram recebidos por Deus como sacrifiacutecio substitutivo com o poder de expiar e
purificar ainda que de forma provisoacuteria
O estudo da lei mosaica nos leva a concluir que havia a possibilidade de oferendas
e sacrifiacutecios expiatoacuterios para todos os pecados com exceccedilatildeo daqueles cometidos de forma
que desafiassem a Deus e a sua palavra Esse tipo de pecado era fruto de um coraccedilatildeo
impenitente que desobedecia propositalmente aos mandamentos divinos O Novo
Testamento demonstra de forma inequiacutevoca que o sacrifiacutecio de Cristo tem suficiecircncia para
perdatildeo de todos os pecados no tempo e no espaccedilo A uacutenica exceccedilatildeo feita a essa regra eacute a
blasfecircmia contra o Santo Espiacuterito (Mt 1232 Lc 1210)
Todas essas variedades de ofertas e as mais diversas classes de animais bem
como os rituais diaacuterios tinham a intenccedilatildeo de revelar a necessidade do Messias que com
um uacutenico sacrifiacutecio expiatoacuterio anularia os efeitos do pecado sobre os homens que nele
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cressem Jesus na cruz fez a oferta de si mesmo a Deus uma uacutenica vez e com a eficaacutecia
eterna para perdatildeo de todas as variedades de pecados que a lei classificava mas natildeo dava a
soluccedilatildeo definitiva
O sangue de bovinos caprinos ovinos e aves eram apenas uma paacutelida sombra que
apenas cobria os pecados conscientes ou inconscientes voluntaacuterios ou involuntaacuterios Por
sua ineficaacutecia a expiaccedilatildeo limitava-se a indiviacuteduos ou grupos de indiviacuteduos e seu alcance
era temporal pois tinha eficaacutecia somente em um periacuteodo especifico O sangue de Cristo
entretanto como nos atesta o Novo Testamento atua de forma ilimitada sendo tambeacutem
atemporal (Hb 913-15 104)
A nossa limitaccedilatildeo nos permite apenas olhar o sacrifiacutecio vicaacuterio do Cristo de forma
progressiva na revelaccedilatildeo biacuteblica mas com o Eterno tal natildeo se sucede visto ter Ele os
atributos incomunicaacuteveis da onisciecircncia e presciecircncia (At 223 1Pe 12) Portanto ao
perdoar as transgressotildees com base no sangue de animais na verdade Ele via
antecipadamente o sacrifiacutecio de Cristo sendo realizado
O homem olha a revelaccedilatildeo progressiva da salvaccedilatildeo poreacutem o Deus Eterno a vecirc na
totalidade A cruz na perspectiva divina sempre esteve no Velho Testamento pois ela
considerando uma progressatildeo histoacuterica eacute antes dele O Messias ainda que de forma
velada sempre esteve laacute como nos atestam as seguintes passagens biblicas 2Tmt 11 2T
19 Ap 178 Pv 823-31 Mt 2534 Jo 1724 At 1518 Rm 1625 1Pe 120-23 Ap 138
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE
51 - A mediaccedilatildeo
As ofertas cuja funccedilatildeo era expiar o pecado conforme jaacute vimos tipificavam o
sacrifiacutecio perfeito e final do Messias Eram apenas sombras indicativas de algo superior
que foi revelado atraveacutes de Jesus e sistematizado nos vinte e nove livros que compotildee o
Novo Testamento (Hb 85 99 23-24 101 Cl 217)
Essas ofertas soacute poderiam ser aceitas por Deus caso houvesse um mediador que as
oferecesse Nesse cenaacuterio entra a figura do sacerdote e do sumo sacerdote que tipificavam
o sacerdoacutecio eterno do Messias Muitos satildeo os detalhes que vinculam o sacerdoacutecio terreno
com a obra mediadora do Messias Visto que nosso espaccedilo eacute limitado pela natureza desse
artigo faremos apenas algumas correspondecircncias entre o sacerdoacutecio humano e o
sacerdoacutecio celestial de Cristo
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52 - A unccedilatildeo e a pureza
O capiacutetulo oito de Leviacutetico descreve a consagraccedilatildeo de Aratildeo como sumo sacerdote
e de seus filhos como sacerdotes O oacuteleo da unccedilatildeo - siacutembolo do Espiacuterito Santo - foi
derramado sobre ele - tipo de Jesus - para exercer sua funccedilatildeo em favor dos fracos e
ignorantes (Hb 51-10) O Velho e o Novo Testamento apresentam Jesus como o ungido de
Deus sobre o qual foi derramado o Espiacuterito Santo para libertar os cativos do pecado
Somente eles poderiam fazer mediaccedilatildeo pelo povo da mesma forma que natildeo haacute
outro mediador entre Deus e os homens a natildeo ser Jesus (At 412 1 Tm 25 Hb 725 86
915 1224) Conforme nos atestam alguns versos biacuteblicos qualquer pessoa que tentasse
usurpar a funccedilatildeo sacerdotal receberia a pena capital (Nm 310 38 1640 185-7) Assim
tipologicamente falando excluindo-se a pessoa de Jesus qualquer outro mediador diante
de Deus estaacute morto
O sacerdote deveria antes de oferecer qualquer sacrifiacutecio banhar-se na bacia de
bronze localizada no aacutetrio do tabernaacuteculo (Lv 86) Esse ritual continha a ideia de
purificaccedilatildeo pois o sacerdote que oferecesse o sacrifiacutecio deveria estar puro diante de Deus
Qualquer oficiante do tabernaacuteculo que natildeo se lavasse ou natildeo fizesse os cerimoniais
prescritos na lei deveria seria morto (Ecircx 3018-21)
Esse simbolismo eacute perfeito quando comparado a situaccedilatildeo do pecador diante do
Deus Santo Qualquer transgressor que Dele se aproximar sem estar puro receberaacute o
salaacuterio do pecado isto eacute a morte eterna
53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo
Associada com a ideia de santidade havia uma lacircmina de ouro posta no turbante
do sumo sacerdote com a inscriccedilatildeo ldquoSantidade ao Senhorrdquo (Ecircx 2836 Lv 89) Essa lacircmina
representava o elevado grau de santidade que o sumo sacerdote deveria ter por se
apresentar diante de Deus para expiar os pecados do povo Outra peccedila que compunha o
vestuaacuterio da classe sacerdotal era a estola feita de linho fino branco indicativo na Biacuteblia de
pureza e santidade (Ecircx 2839 87)
Toda o ritual de purificaccedilatildeo e as vestimentas apontavam para a santidade do
sacerdote que por sua vez tipificava a santidade do sumo sacerdote celestial que em tudo
foi tentado poreacutem sem pecado (Hb 726 Is 539 Jo 846 2Co 521 1Pe 222 1 Jo 35)
No ritual de purificaccedilatildeo dos contaminados por lepra e liacutequidos corporais descrito
nos capiacutetulos 11 a 15 de Leviacutetico o sacerdote figurava como a personagem principal pois
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sem ele o processo de purificaccedilatildeo natildeo poderia ser finalizado Vemos entatildeo uma dupla
funccedilatildeo sacerdotal o que mediava e o que purificava Na pessoa de Jesus cumpriu-se esse
duplo tipo sacerdotal pois o Novo Testamento atribui a ele a funccedilatildeo de mediador e
purificador
Qualquer judeu por mais simples que fosse entenderia a mensagem espiritual
profunda que havia no ritual de purificaccedilatildeo e nas roupas sacerdotais E qual seria essa
mensagem A resposta simples eacute antes mesmo de se aproximar de um Deus Santo com
sacrifiacutecio havia a necessidade imperiosa de purificar-se Primeiro se purifica Depois a
Ele oferece-se sacrifiacutecios de adoraccedilatildeo Purificaccedilatildeo e sacrifiacutecios estatildeo intimamente
interligados conforme jaacute vimos nas ofertas compulsoacuterias E tudo isso soacute seria possiacutevel com
a figura do mediador
Todo o vestuaacuterio do sumo sacerdote tipificava o Messias e seu oficio sacerdotal
Natildeo sendo possiacutevel nesse artigo analisar as minuacutecias de cada uma das peccedilas falaremos
delas de forma geneacuterica Basicamente o eacutefode e o cinto do sumo sacerdote possuiacuteam
quatro cores que apareciam tambeacutem na primeira cortina que cobria o tabernaacuteculo no veacuteu
que separava o lugar santo do santiacutessimo e na cortina de entrada do aacutetrio do tabernaacuteculo O
azul carmesim puacuterpura e branco tipificavam alguns atributos do Messias O azul sua
origem celestial a puacuterpura apontava para sua realeza o branco fala de sua absoluta
pureza e o vermelho do seu sacrifiacutecio expiatoacuterio Somente o Messias Jesus Cristo
apresentou as quatro caracteriacutesticas aceitaacuteveis a Deus Rei que veio do ceacuteu cujo sangue foi
derramado e sobre Ele natildeo pode ser imputado pecado algum
Sobre o eacutefode ficava o peitoral do juiacutezo contendo doze pedras preciosas e em
cada uma delas estava gravada o nome das doze tribos de Israel Essas pedras conforme
determinaccedilatildeo biacuteblica deveriam estar sobre o coraccedilatildeo do sumo sacerdote quando este
oficiasse no tabernaacuteculo Ele tambeacutem carregava sobre os ombros uma pedra preciosa de
cada lado Na primeira eram gravados os nomes de seis tribos de Israel na outra mais seis
tribos Assim o representante dos homens carregava simbolicamente no coraccedilatildeo e nos
ombros toda a naccedilatildeo dos filhos de Israel diante de Deus estando assim toda ela
representada pelas quatorze pedras Assim o sumo sacerdote intercedia por toda a naccedilatildeo
continuamente
Poucos discordariam que a igreja de Cristo assumiu o papel de Israel ainda que
saibamos que esse fato natildeo invalida as promessas de Deus feitas a esse povo Apaziguada
essa questatildeo podemos entatildeo verificar a tipicidade desse peitoral no tocante a figura do
Messias O sumo sacerdote humano carregava sobre o coraccedilatildeo e ombros a naccedilatildeo de
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Israel ao passo que o Messias carrega sobre o coraccedilatildeo e ombros a igreja composta de
pessoas de todas as naccedilotildees (Jo 315 Mt 913 1Tt 115-16 Ap 59 Ap 1211 Hb 1312
1Pe 119)
Esse peitoral dobrado formava uma bolsa que continha duas pedras conhecidas
como Urim e Tumim com as quais se consultavam a vontade de Deus Sacerdotes
profetas Urim e Tumim eram necessaacuterios enquanto o Messias natildeo havia sido revelado
Poreacutem o Messias jaacute veio como a revelaccedilatildeo final de Deus para o homem (Hb 11-
2) Ele eacute a uacutenica verdade e portanto nosso uacutenico guia espiritual (Jo 146) Tal qual o sumo
sacerdote guiava o povo mediante o Urim e Tumim Ele sem fazer uso de qualquer pedra
nos guia mediante o Espirito Santo e as Escrituras sagradas rumo ao ceacuteu (Jo 1426 1613
1Co 210-13 Ef 47-15 1 Jo 220 1 Jo 227)
Mediante essas duas pedras consultava-se a Deus e por elas vinha a resposta
Hoje eacute por intermeacutedio do Cristo revelado nas Escrituras que obtemos a maioria das
respostas para nossas indagaccedilotildees
54 - O Yom Kippur
Ao falarmos das ofertas volitivas e compulsoacuterias alguns paraacutegrafos devem ser
dedicados ao ritual do Yom Kippur cujo cerimonial representava o perdatildeo anual dos
pecados dos filhos de Israel
O Yom Kippur ou Dia do perdatildeo eacute considerado um dos dias mais sagrados do
calendaacuterio judaico Era nesse dia que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para
purificar o tabernaacuteculo e oferecer o sacrifiacutecio anual por toda a naccedilatildeo (Lv 166 16 18-19
24) Era um dia de jejum e nenhum trabalho servil deveria ser realizado Era nesse
grandioso dia que o bode expiatoacuterio Azazel tinha de ser enviado ao deserto para longe do
arraial ou das portas de Jerusaleacutem Ele carregava sobre si os pecados de toda a naccedilatildeo e
acabava simbolicamente morrendo por ela Isso por si soacute jaacute configura uma bela
tipologia o cordeiro de Deus sofreu e morreu fora das portas de Jerusaleacutem carregando
sobre si os pecados da humanidade (Mt 1520-24 Jo 1917-18 At 758 Hb 1312)
Ao entrar no Santiacutessimo o sumo sacerdote enchia-o de fumaccedila de incenso para
que a nuvem perfumada ocultasse de seus olhos o propiciatoacuterio local esse considerado
como sendo ldquoo trono de Deusrdquo Ao entrar nesse recinto sagrado o sumo sacerdote deveria
ter em matildeos o sangue para expiar os pecados de toda a naccedilatildeo Fontes extrabiacuteblicas nos
informam sobre o alto grau de relevacircncia desse dia pois era nele que se promulgava certo
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decreto divino sobre quem iraacute viver e quem iraacute morrer quem estaraacute sereno e quem seraacute
perturbado quem seraacute pobre e quem seraacute rico quem seraacute exaltado e quem seraacute humilhado
(KOLATCH p239)
Para estabelecer a rica tipologia encontrada nos ritos desse tatildeo importante dia
basta-nos consultar alguns versos do livro de hebreus que revelam o ofiacutecio sacerdotal de
Cristo (Hb 91-26 217 31 415 55-6 71 11-27 81)
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
A tipologia por ser essencialmente biacuteblica natildeo pode ser desprezada sendo que os
extremos na sua utilizaccedilatildeo devem ser evitados atraveacutes de esforccedilos para encontrar-se uma
posiccedilatildeo moderada Ao nos apossarmos dessa ideia perceberemos o quatildeo proveitoso seraacute o
nosso conhecimento dos ldquotiposrdquo biacuteblicos para a robustez da nossa teologia
A anaacutelise das ofertas volitivas e compulsoacuterias demostram essa verdade na medida
em que as conhecemos de forma mais profunda A partir disso vemos natildeo mais um
emaranhado de ordenanccedilas cerimoniais destituiacutedas de sentido mas profundas liccedilotildees
espirituais acerca da figura central da Biacuteblia Jesus Cristo
Ainda que geraccedilatildeo apoacutes geraccedilatildeo os filhos de Israel matavam os inocentes animais
atraveacutes de sacrifiacutecios e natildeo tinham a plena consciecircncia da magnitude do seu simbolismo
todavia pela feacute sabiam que seus pecados haviam sido expiados As ofertas o sofrimento e
morte dos animais o sangue derramado e a mediaccedilatildeo dos sacerdotes propiciavam um
cenaacuterio pedagoacutegico riquiacutessimo mediante a qual todos aprendiam acerca do plano divino da
redenccedilatildeo Negar isso eacute negar a proacutepria Escritura
Os escritores do Novo Testamento empreenderam grandes esforccedilos para elaborar
suas doutrinas com base no entendimento que tinham do Velho Testamento pois era esse
que testificava acerca do Messias Ele mesmo nos seus ensinamentos citou por diversas
vezes as Escrituras veterotestamentaacuterias Era o antiacutetipo em carne e osso explicando aos
disciacutepulos toda a tipologia que Nele encontrava a plena realizaccedilatildeo Assim quando os
escritores neotestamentaacuterios analisavam as ofertas volitivas e compulsoacuterias encontravam
nelas revelado o Messias de Israel
As ldquosombrasrdquo tiveram o seu valor ateacute a chegada da realidade isto eacute Cristo Ele eacute
a revelaccedilatildeo final de Deus pois posteriormente ao brado ldquoestaacute consumadordquo o veacuteu foi
rasgado e o acesso pleno a Deus liberado As ofertas volitivas e compulsoacuterias natildeo satildeo mais
necessaacuterias pois aquele para quem elas apontavam as substituiu satisfez a justiccedila divina e
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reconciliou o homem com Deus Cabe-nos empreendermos esforccedilos com a finalidade uacutenica
de conhecer mais detalhadamente as ofertas volitivas e compulsoacuterias E assim ter uma
percepccedilatildeo mais niacutetida de que o mesmo Deus que instituiu os ldquotiposrdquo eacute o mesmo que os
tornou realidade na pessoa do Messias Jesus Cristo
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95
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Satildeo Paulo Vida Nova 1994
Autor ndash Bacharel em Teologia
Prof Odilon Soares Moreira
Bacharel em Teologia pela Faculdade
Beth Shalom e licenciado em Filosofia
pela Universidade Metodista de Satildeo
Paulo
E-mail odilonmoreira13hotmailcom
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SUMAacuteRIO
O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 6
1 UM LIVRO ATEMPORAL 7 2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO 8
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA 12 4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH 14
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 17 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 18
A CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA EXEGESE DO
APOCALIPSE DE JOAtildeO 20 APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO
JUDAICO - UMA EXEGESE CONTEMPORAcircNEA 20 INTRODUCcedilAtildeO 22
1INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS FUNDANTESrdquo 23 11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 23
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 25 13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 27
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico 28 2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea 30
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14) 34 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 44
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 46
A TERCEIRIZACcedilAtildeO DA FEacute NOS TEMPOS DE PANDEMIA E ISOLAMENTO SOCIAL O SURGIMENTO DO ldquoPERSONAL PROFECTrdquo ndash E AS CRISES DE
ESPIRITUALIDADE 53 INTRODUCcedilAtildeO 54 1OUTROS PROBLEMAS INFLUENCIANDO A ESPIRITUALIDADE NO TEMPO DE
ISOLAMENTO SOCIAL DO ATEIacuteSMO CETICISMO OU UMA BUSCA MAL DIRECIONADA DA ESPIRITUALIDADE PODERAtildeO INFLUENCIAR AS RELACcedilOtildeES
DE FEacute 55 2VIVEMOS - ldquoUMA NOVA FEacute PARA UM NOVO TEMPOrdquo ONDE VERIFICAMOS COMO COMPREENDER A FEacute E SUAS APLICACcedilOtildeES COMO VIVENCIAR A FEacute NA
ATUALIDADE 56 3HOJE Eacute PRECISO RESSIGNIFICAR ALGUNS CONCEITOS SOBRE A FEacute 57
4QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS E PANDEMIAS 59
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 62 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 63
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O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO 67 INTRODUCcedilAtildeO 68
1 EM BUSCA DO CENAacuteRIO HISTOacuteRICO68 2 A EXPANSAtildeO DA FEacute CRISTAtilde69
3 DE PEDRO A PAULO (EXPANSAtildeO DA OBRA DE MISSOtildeES)69 4 O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO72 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 73
REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NO LIVRO DE LEVIacuteTICO 74 INTRODUCcedilAtildeO 75 1 TIPOLOGIA 76
11 - Definiccedilatildeo de tipologia77 12 - A tipologia como ferramenta da hermenecircutica 77
13 - As Escrituras e a tipologia77 14 - A tipologia e as correntes teoloacutegicas78 141- ldquotiposrdquo natildeo ratificados pelo Novo Testamento 79
142 - Siacutembolos ratificados pelo Novo Testamento 80 142 - Corrente intermediaacuteria ldquotiposrdquo expliacutecitos e impliacutecitos 81
2 ESTABELECIMENTO DA CORRENTE INTERPRETATIVA81 3 REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NA OFERTAS VOLITIVAS E COMPULSOacuteRIAS 82
31 - As ofertas volitivas 82 311 - Os Holocaustos 82
312 - Exigecircncias para o Holocausto 83 313 - As ofertas de manjares 85 314 - As ofertas de comunhatildeo ou ofertas pacificas 86
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS86 41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia87
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo 87 43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo 88 44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas 88
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE89 51 - A mediaccedilatildeo 89
52 - A unccedilatildeo e a pureza 90 53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo 90 54 - O Yom Kippur92
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 93 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 94
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O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA
RESTAURATIVA1
RESUMO
O presente artigo escrito durante a pandemia da COVID-19 tem o intuito de relembrar a
histoacuteria de Joacute Partindo de uma perspectiva interdisciplinar entre Teologia e Direito
analisam-se as diferentes visotildees de Justiccedila contidas no Livro de Joacute Pretende-se
demonstrar a prevalecircncia da ideia de justiccedila restaurativa em detrimento das concepccedilotildees de
justiccedila retributiva (ligada ao tema do castigo divino) e contratualista (ligada ao tema da
teologia da prosperidade)
Palavras-chave Livro de Joacute Justiccedila retributiva Contrato Justiccedila restaurativa
ABSTRACT
This article written during the pandemic of COVID-19 is intended to recall Jobs story
Starting from an interdisciplinary perspective between theology and law the different
views of justice contained in the Book of Job are analyzed It is intended to demonstrate
the prevalence of the idea of restorative justice instead of the concepts of retributive
justice (linked to the theme of divine punishment) and contractualist (linked to the theme
of prosperity theology)
Key words Book of Job Retributive justice Contract Restorative justice
1 Doutor em Direito Penal pela Universidade de Satildeo Paulo Juiz Federal e Professor de Direito Penal da
FADISA
autor
Excelentissiacutemo Juiz Federal
Dr Paulo Bueno de Azevedo
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1 UM LIVRO ATEMPORAL
O presente artigo eacute escrito durante um periacuteodo turbulento certamente ineacutedito para
muitos de noacutes embora natildeo seja o primeiro evento da espeacutecie em nosso planeta A
pandemia da COVID (Corona virus Disease) -19 tal como outras doenccedilas no passado
(peste negra gripe espanhola etc) ainda estaacute causando milhares de mortes no mundo
todo forccedilando medidas eneacutergicas de isolamento social levando muitos ao desemprego agrave
falecircncia e agrave desesperanccedila
Neste cenaacuterio alguns ousam perguntar onde estaacute Deus Por que Deus esconde sua
face nesse momento Jaacute outros enxergam o sinal do fim dos tempos a puniccedilatildeo divina
decorrente dos pecados humanos E haacute ainda quem reforce a sua descrenccedila se Deus
existisse mesmo nada disso poderia ocorrer Enfim num momento tatildeo difiacutecil a
desesperanccedila a raiva e a incerteza encontram terreno feacutertil para disseminaccedilatildeo As
muacuteltiplas vozes se chocam e a feacute arrefece
Na verdade tais anguacutestias vecircm de certas concepccedilotildees que as pessoas tecircm de Deus
as quais por sinal estatildeo profundamente entrelaccediladas com pensamentos juriacutedicos A ideia
do castigo vem do tirociacutenio que invoca a justiccedila retributiva divina Jaacute o pensar que Deus
natildeo poderia permitir tais cataacutestrofes parece traduzir uma espeacutecie de obrigaccedilatildeo do Senhor
para com a humanidade E se existisse mesmo tal obrigaccedilatildeo quem poderia levar Deus ao
tribunal para que fosse compelido a cumprir esse contrato
O problema parece insoluacutevel pois quer se trate da puniccedilatildeo quer de um contrato
descumprido ningueacutem poderia confrontar o Criador em juiacutezo Ou poderia O desespero eacute
atual no entanto a histoacuteria eacute antiga Haacute milhares de anos foi retratada no Livro de Joacute A
autoria desse livro que compotildee o Antigo Testamento da Biacuteblia eacute desconhecida e existem
muitas duacutevidas sobre possiacuteveis trechos inseridos ou modificados a posteriori Imaginaria o
seu autor (ou sua autora2) que sua obra continuaria atual e sendo objeto de estudos e
reflexotildees mais de dois mil anos depois
Natildeo natildeo eacute por acaso que Jorge Luis Borges (BORGES 2009 p 156) considerava
o Livro de Joacute um dos mais impressionantes da Biacuteblia nem que Freud o tenha situado
como a mais alta das literaturas humanas (apud BORGES 1965) Natildeo eacute coincidecircncia que
o Livro de Joacute seja considerado ldquoo mais saacutebio da Biacuteblia Hebraicardquo (BLOOM 2005 p 15)
e tenha sido recontado tantas vezes como nas versotildees de HG Wells (apud BORGES
1965) e Fabrice Hadjadj bem como objeto de longos estudos a exemplo daqueles de Carl
2 A hipoacutetese de que o texto javista da Biacuteblia Hebraica poderia ter sido escrito por uma mulher hitita eacute
aventada por Harold Bloom (BLOOM 2005 p 27)
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
AZEVEDO Paulo Bueno de Ensaio sobre a irracionalidade do sistema criminal agrave
luz da obra religiosa de Lev Tolstoacutei Rio de Janeiro Lumen Juris 2019
BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
2011
BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
Revisatildeo de Marta Miranda OrsquoShea Rio de Janeiro Objetiva 2005
BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
de 2020
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2009
CARBAJOSA Ignacio Joacute potildee Deus no banco dos reacuteus Sobre o sofrimento inocente
In httparquivorevistapassoscombrdefaultaspid=344ampid_n=5530amppagina=1
acesso em 14052020
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
HADJADJ Fabrice Joacute ou a tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo
Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
JUNG CJ Resposta a Joacute Traduccedilatildeo do Pe Dom Mateus Ramalho Rocha 10 ediccedilatildeo
Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
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Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
31
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRIA Clemente de Stromata de notas Gnoacutesticas segundo a Verdadeira
Filo Editorial Ciudad Nueva Madrid 1996
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A oferta paciacutefica ou de comunhatildeo traz a ideia de comunhatildeo existente entre Deus
e os homens Na ocasiatildeo dessa oferenda o peito e a coxa deveriam ser dados para o
sustento dos sacerdotes e levitas Enquanto que na oferta de holocausto quase tudo era
queimado na oferta paciacutefica somente as gorduras eram oferecidas sobre o altar e o
restante das partes do animal era divido entre os sacerdotes e o ofertante Nessas refeiccedilotildees
comunais o ofertante juntamente com os sacerdotes fazia um banquete jubiloso porque
criam que Deus tambeacutem estava presente Nessa oferta de comunhatildeo estava selada a paz
entre Deus e o ofertante
Basta uma anaacutelise das figuras que estavam envolvidas nessa oferta para
verificarmos claramente a tipologia nela impliacutecita A paz era selada pois havia a presenccedila
de Deus do sacerdote (mediador) e do ofertante Isso nos remete a mediaccedilatildeo do sumo
sacerdote celestial que atraveacutes de sua oferta sacrificial derrubou a parede de inimizades
existente entre Deus e os homens proporcionando-nos a paz
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS
As ofertas compulsoacuterias eram ofertadas para expiar o pecado e a culpa do
transgressor e oferececirc-las natildeo dependia da sua vontade Caso natildeo quisesse sofrer as
consequecircncias do juiacutezo divino por suas transgressotildees ofertas pelo pecado deveriam ser
oferecidas pelo transgressor Essas ofertas estatildeo regulamentadas nos capiacutetulos 4 a 7 de
Leviacutetico onde as encontramos divididas basicamente em trecircs grupos oferta por
ignoracircncia oferta pelo pecado e oferta pela culpa
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Certa complexidade haacute em diferenciar de forma simples uma oferta da outra mas
de uma forma sintetizada podemos diferenciaacute-las conforme a proacutepria classificaccedilatildeo
mosaica Os textos biacuteblicos natildeo nos fornecem de forma satisfatoacuteria elementos para que
possamos fazer uma diferenciaccedilatildeo precisa de uma oferta para outra
41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia
O termo ignoracircncia (hb segaga) natildeo pode ser confundido com desconhecimento
da lei mosaica Os pecados a serem expiados por esse tipo de oferta eram aqueles que o
transgressor cometia de forma natildeo intencional (Lv 42) A ldquointenccedilatildeordquo aqui deve ser
entendida como ldquode forma natildeo desafiadorardquo isto eacute contrariando as leis divinas de modo a
desprezar a Deus e sua palavra Para esses natildeo havia expiaccedilatildeo
Os pecados cometidos por ignoracircncia estavam classificados no rol daqueles que o
transgressor cometia inadvertidamente ou inconscientemente como por exemplo tocar em
restos mortais sem que disso tivesse conhecimento Tambeacutem se enquadra aqueles
cometidos por conta da natureza caiacuteda do homem e sua consequente inclinaccedilatildeo para o
pecado Independente se o pecado havia sido cometido inconscientemente ou por conta da
inclinaccedilatildeo pecaminosa o homem tornar-se-ia culpado diante do Deus Santo necessitando
assim da expiaccedilatildeo do seu pecado
A expiaccedilatildeo para essa classe de pecados deveria obedecer a alguns criteacuterios
estabelecidos Sacerdotes priacutencipes a comunidade em geral e o indiviacuteduo em particular
deveriam oferecer sacrifiacutecios Para cada um desses grupos um animal especifico deveria
ser ofertado
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo
Esse tipo de oferta pela culpa (hb asham) era realizada nas ocasiotildees em que a
transgressatildeo fosse cometida em relaccedilatildeo ao proacuteximo Nesse caso deveria haver entatildeo uma
restituiccedilatildeo do ofensor para o ofendido Por envolver questotildees monetaacuterias como forma de
reparaccedilatildeo essa oferta tambeacutem era conhecida como oferta de restituiccedilatildeo
Logicamente por ser o homem a imagem e semelhanccedila de Deus qualquer
transgressatildeo cometida contra aquele ofendia Este Assim antes mesmo de tentar reatar o
seu relacionamento com Deus o pecador deveria estabelecer a comunhatildeo perdida com o
ofendido Se natildeo houvesse expiaccedilatildeo a culpa permaneceria e o juiacutezo divino certamente
recairia sobre o ofensor
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43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo
Haacute entre os eruditos certa dificuldade para entender a que tipo de pecado essa
oferta faz referecircncia A ligaccedilatildeo dos dois substantivos (ldquooferta pelo pecadordquo) sugerem eles
parece indicar que os pecadores deveriam lidar com seus pecados mediante a oferta de
sacrifiacutecios Ao pecar necessariamente o transgressor deveria associar a ideia dual de
ldquopecado necessita de ofertardquo
Outra ideia impliacutecita na oferta pelo pecado (hb hattarsquot) eacute a de purificaccedilatildeo O
pecado -atraveacutes do pecador - contaminava o ambiente sagrado tornando-o improacuteprio para
a presenccedila de Deus Por esse motivo o sangue dessa oferta era aspergido sobre os altares
o propiciatoacuterio e dentro do Santo dos Santos A purificaccedilatildeo mediante o sangue era
necessaacuteria para a manifestaccedilatildeo da presenccedila divina Esse ato de purgar deu tambeacutem a essa
oferta o nome de ldquooferta de purificaccedilatildeordquo
Temos dois fatores de suma importacircncia no processo de salvaccedilatildeo expiaccedilatildeo e
purificaccedilatildeo Sem a expiaccedilatildeo o homem permanece separado de Deus e sem a purificaccedilatildeo eacute
impedido de receber sua presenccedila Esse duplo processo soacute poderia ser realizado mediante o
derramamento de sangue inocente e com a indispensaacutevel presenccedila do sacerdote mediador
44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas
Para todas essas ofertas volitivas e compulsoacuterias a qualidade era imprescindiacutevel
A expiaccedilatildeo pelo sangue era o elemento comum que as unificava Desde um touro oferecido
pelo sacerdote em favor de seus proacuteprios pecados ateacute um pombo ofertado pelos mais
pobres eram recebidos por Deus como sacrifiacutecio substitutivo com o poder de expiar e
purificar ainda que de forma provisoacuteria
O estudo da lei mosaica nos leva a concluir que havia a possibilidade de oferendas
e sacrifiacutecios expiatoacuterios para todos os pecados com exceccedilatildeo daqueles cometidos de forma
que desafiassem a Deus e a sua palavra Esse tipo de pecado era fruto de um coraccedilatildeo
impenitente que desobedecia propositalmente aos mandamentos divinos O Novo
Testamento demonstra de forma inequiacutevoca que o sacrifiacutecio de Cristo tem suficiecircncia para
perdatildeo de todos os pecados no tempo e no espaccedilo A uacutenica exceccedilatildeo feita a essa regra eacute a
blasfecircmia contra o Santo Espiacuterito (Mt 1232 Lc 1210)
Todas essas variedades de ofertas e as mais diversas classes de animais bem
como os rituais diaacuterios tinham a intenccedilatildeo de revelar a necessidade do Messias que com
um uacutenico sacrifiacutecio expiatoacuterio anularia os efeitos do pecado sobre os homens que nele
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cressem Jesus na cruz fez a oferta de si mesmo a Deus uma uacutenica vez e com a eficaacutecia
eterna para perdatildeo de todas as variedades de pecados que a lei classificava mas natildeo dava a
soluccedilatildeo definitiva
O sangue de bovinos caprinos ovinos e aves eram apenas uma paacutelida sombra que
apenas cobria os pecados conscientes ou inconscientes voluntaacuterios ou involuntaacuterios Por
sua ineficaacutecia a expiaccedilatildeo limitava-se a indiviacuteduos ou grupos de indiviacuteduos e seu alcance
era temporal pois tinha eficaacutecia somente em um periacuteodo especifico O sangue de Cristo
entretanto como nos atesta o Novo Testamento atua de forma ilimitada sendo tambeacutem
atemporal (Hb 913-15 104)
A nossa limitaccedilatildeo nos permite apenas olhar o sacrifiacutecio vicaacuterio do Cristo de forma
progressiva na revelaccedilatildeo biacuteblica mas com o Eterno tal natildeo se sucede visto ter Ele os
atributos incomunicaacuteveis da onisciecircncia e presciecircncia (At 223 1Pe 12) Portanto ao
perdoar as transgressotildees com base no sangue de animais na verdade Ele via
antecipadamente o sacrifiacutecio de Cristo sendo realizado
O homem olha a revelaccedilatildeo progressiva da salvaccedilatildeo poreacutem o Deus Eterno a vecirc na
totalidade A cruz na perspectiva divina sempre esteve no Velho Testamento pois ela
considerando uma progressatildeo histoacuterica eacute antes dele O Messias ainda que de forma
velada sempre esteve laacute como nos atestam as seguintes passagens biblicas 2Tmt 11 2T
19 Ap 178 Pv 823-31 Mt 2534 Jo 1724 At 1518 Rm 1625 1Pe 120-23 Ap 138
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE
51 - A mediaccedilatildeo
As ofertas cuja funccedilatildeo era expiar o pecado conforme jaacute vimos tipificavam o
sacrifiacutecio perfeito e final do Messias Eram apenas sombras indicativas de algo superior
que foi revelado atraveacutes de Jesus e sistematizado nos vinte e nove livros que compotildee o
Novo Testamento (Hb 85 99 23-24 101 Cl 217)
Essas ofertas soacute poderiam ser aceitas por Deus caso houvesse um mediador que as
oferecesse Nesse cenaacuterio entra a figura do sacerdote e do sumo sacerdote que tipificavam
o sacerdoacutecio eterno do Messias Muitos satildeo os detalhes que vinculam o sacerdoacutecio terreno
com a obra mediadora do Messias Visto que nosso espaccedilo eacute limitado pela natureza desse
artigo faremos apenas algumas correspondecircncias entre o sacerdoacutecio humano e o
sacerdoacutecio celestial de Cristo
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52 - A unccedilatildeo e a pureza
O capiacutetulo oito de Leviacutetico descreve a consagraccedilatildeo de Aratildeo como sumo sacerdote
e de seus filhos como sacerdotes O oacuteleo da unccedilatildeo - siacutembolo do Espiacuterito Santo - foi
derramado sobre ele - tipo de Jesus - para exercer sua funccedilatildeo em favor dos fracos e
ignorantes (Hb 51-10) O Velho e o Novo Testamento apresentam Jesus como o ungido de
Deus sobre o qual foi derramado o Espiacuterito Santo para libertar os cativos do pecado
Somente eles poderiam fazer mediaccedilatildeo pelo povo da mesma forma que natildeo haacute
outro mediador entre Deus e os homens a natildeo ser Jesus (At 412 1 Tm 25 Hb 725 86
915 1224) Conforme nos atestam alguns versos biacuteblicos qualquer pessoa que tentasse
usurpar a funccedilatildeo sacerdotal receberia a pena capital (Nm 310 38 1640 185-7) Assim
tipologicamente falando excluindo-se a pessoa de Jesus qualquer outro mediador diante
de Deus estaacute morto
O sacerdote deveria antes de oferecer qualquer sacrifiacutecio banhar-se na bacia de
bronze localizada no aacutetrio do tabernaacuteculo (Lv 86) Esse ritual continha a ideia de
purificaccedilatildeo pois o sacerdote que oferecesse o sacrifiacutecio deveria estar puro diante de Deus
Qualquer oficiante do tabernaacuteculo que natildeo se lavasse ou natildeo fizesse os cerimoniais
prescritos na lei deveria seria morto (Ecircx 3018-21)
Esse simbolismo eacute perfeito quando comparado a situaccedilatildeo do pecador diante do
Deus Santo Qualquer transgressor que Dele se aproximar sem estar puro receberaacute o
salaacuterio do pecado isto eacute a morte eterna
53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo
Associada com a ideia de santidade havia uma lacircmina de ouro posta no turbante
do sumo sacerdote com a inscriccedilatildeo ldquoSantidade ao Senhorrdquo (Ecircx 2836 Lv 89) Essa lacircmina
representava o elevado grau de santidade que o sumo sacerdote deveria ter por se
apresentar diante de Deus para expiar os pecados do povo Outra peccedila que compunha o
vestuaacuterio da classe sacerdotal era a estola feita de linho fino branco indicativo na Biacuteblia de
pureza e santidade (Ecircx 2839 87)
Toda o ritual de purificaccedilatildeo e as vestimentas apontavam para a santidade do
sacerdote que por sua vez tipificava a santidade do sumo sacerdote celestial que em tudo
foi tentado poreacutem sem pecado (Hb 726 Is 539 Jo 846 2Co 521 1Pe 222 1 Jo 35)
No ritual de purificaccedilatildeo dos contaminados por lepra e liacutequidos corporais descrito
nos capiacutetulos 11 a 15 de Leviacutetico o sacerdote figurava como a personagem principal pois
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sem ele o processo de purificaccedilatildeo natildeo poderia ser finalizado Vemos entatildeo uma dupla
funccedilatildeo sacerdotal o que mediava e o que purificava Na pessoa de Jesus cumpriu-se esse
duplo tipo sacerdotal pois o Novo Testamento atribui a ele a funccedilatildeo de mediador e
purificador
Qualquer judeu por mais simples que fosse entenderia a mensagem espiritual
profunda que havia no ritual de purificaccedilatildeo e nas roupas sacerdotais E qual seria essa
mensagem A resposta simples eacute antes mesmo de se aproximar de um Deus Santo com
sacrifiacutecio havia a necessidade imperiosa de purificar-se Primeiro se purifica Depois a
Ele oferece-se sacrifiacutecios de adoraccedilatildeo Purificaccedilatildeo e sacrifiacutecios estatildeo intimamente
interligados conforme jaacute vimos nas ofertas compulsoacuterias E tudo isso soacute seria possiacutevel com
a figura do mediador
Todo o vestuaacuterio do sumo sacerdote tipificava o Messias e seu oficio sacerdotal
Natildeo sendo possiacutevel nesse artigo analisar as minuacutecias de cada uma das peccedilas falaremos
delas de forma geneacuterica Basicamente o eacutefode e o cinto do sumo sacerdote possuiacuteam
quatro cores que apareciam tambeacutem na primeira cortina que cobria o tabernaacuteculo no veacuteu
que separava o lugar santo do santiacutessimo e na cortina de entrada do aacutetrio do tabernaacuteculo O
azul carmesim puacuterpura e branco tipificavam alguns atributos do Messias O azul sua
origem celestial a puacuterpura apontava para sua realeza o branco fala de sua absoluta
pureza e o vermelho do seu sacrifiacutecio expiatoacuterio Somente o Messias Jesus Cristo
apresentou as quatro caracteriacutesticas aceitaacuteveis a Deus Rei que veio do ceacuteu cujo sangue foi
derramado e sobre Ele natildeo pode ser imputado pecado algum
Sobre o eacutefode ficava o peitoral do juiacutezo contendo doze pedras preciosas e em
cada uma delas estava gravada o nome das doze tribos de Israel Essas pedras conforme
determinaccedilatildeo biacuteblica deveriam estar sobre o coraccedilatildeo do sumo sacerdote quando este
oficiasse no tabernaacuteculo Ele tambeacutem carregava sobre os ombros uma pedra preciosa de
cada lado Na primeira eram gravados os nomes de seis tribos de Israel na outra mais seis
tribos Assim o representante dos homens carregava simbolicamente no coraccedilatildeo e nos
ombros toda a naccedilatildeo dos filhos de Israel diante de Deus estando assim toda ela
representada pelas quatorze pedras Assim o sumo sacerdote intercedia por toda a naccedilatildeo
continuamente
Poucos discordariam que a igreja de Cristo assumiu o papel de Israel ainda que
saibamos que esse fato natildeo invalida as promessas de Deus feitas a esse povo Apaziguada
essa questatildeo podemos entatildeo verificar a tipicidade desse peitoral no tocante a figura do
Messias O sumo sacerdote humano carregava sobre o coraccedilatildeo e ombros a naccedilatildeo de
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Israel ao passo que o Messias carrega sobre o coraccedilatildeo e ombros a igreja composta de
pessoas de todas as naccedilotildees (Jo 315 Mt 913 1Tt 115-16 Ap 59 Ap 1211 Hb 1312
1Pe 119)
Esse peitoral dobrado formava uma bolsa que continha duas pedras conhecidas
como Urim e Tumim com as quais se consultavam a vontade de Deus Sacerdotes
profetas Urim e Tumim eram necessaacuterios enquanto o Messias natildeo havia sido revelado
Poreacutem o Messias jaacute veio como a revelaccedilatildeo final de Deus para o homem (Hb 11-
2) Ele eacute a uacutenica verdade e portanto nosso uacutenico guia espiritual (Jo 146) Tal qual o sumo
sacerdote guiava o povo mediante o Urim e Tumim Ele sem fazer uso de qualquer pedra
nos guia mediante o Espirito Santo e as Escrituras sagradas rumo ao ceacuteu (Jo 1426 1613
1Co 210-13 Ef 47-15 1 Jo 220 1 Jo 227)
Mediante essas duas pedras consultava-se a Deus e por elas vinha a resposta
Hoje eacute por intermeacutedio do Cristo revelado nas Escrituras que obtemos a maioria das
respostas para nossas indagaccedilotildees
54 - O Yom Kippur
Ao falarmos das ofertas volitivas e compulsoacuterias alguns paraacutegrafos devem ser
dedicados ao ritual do Yom Kippur cujo cerimonial representava o perdatildeo anual dos
pecados dos filhos de Israel
O Yom Kippur ou Dia do perdatildeo eacute considerado um dos dias mais sagrados do
calendaacuterio judaico Era nesse dia que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para
purificar o tabernaacuteculo e oferecer o sacrifiacutecio anual por toda a naccedilatildeo (Lv 166 16 18-19
24) Era um dia de jejum e nenhum trabalho servil deveria ser realizado Era nesse
grandioso dia que o bode expiatoacuterio Azazel tinha de ser enviado ao deserto para longe do
arraial ou das portas de Jerusaleacutem Ele carregava sobre si os pecados de toda a naccedilatildeo e
acabava simbolicamente morrendo por ela Isso por si soacute jaacute configura uma bela
tipologia o cordeiro de Deus sofreu e morreu fora das portas de Jerusaleacutem carregando
sobre si os pecados da humanidade (Mt 1520-24 Jo 1917-18 At 758 Hb 1312)
Ao entrar no Santiacutessimo o sumo sacerdote enchia-o de fumaccedila de incenso para
que a nuvem perfumada ocultasse de seus olhos o propiciatoacuterio local esse considerado
como sendo ldquoo trono de Deusrdquo Ao entrar nesse recinto sagrado o sumo sacerdote deveria
ter em matildeos o sangue para expiar os pecados de toda a naccedilatildeo Fontes extrabiacuteblicas nos
informam sobre o alto grau de relevacircncia desse dia pois era nele que se promulgava certo
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decreto divino sobre quem iraacute viver e quem iraacute morrer quem estaraacute sereno e quem seraacute
perturbado quem seraacute pobre e quem seraacute rico quem seraacute exaltado e quem seraacute humilhado
(KOLATCH p239)
Para estabelecer a rica tipologia encontrada nos ritos desse tatildeo importante dia
basta-nos consultar alguns versos do livro de hebreus que revelam o ofiacutecio sacerdotal de
Cristo (Hb 91-26 217 31 415 55-6 71 11-27 81)
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
A tipologia por ser essencialmente biacuteblica natildeo pode ser desprezada sendo que os
extremos na sua utilizaccedilatildeo devem ser evitados atraveacutes de esforccedilos para encontrar-se uma
posiccedilatildeo moderada Ao nos apossarmos dessa ideia perceberemos o quatildeo proveitoso seraacute o
nosso conhecimento dos ldquotiposrdquo biacuteblicos para a robustez da nossa teologia
A anaacutelise das ofertas volitivas e compulsoacuterias demostram essa verdade na medida
em que as conhecemos de forma mais profunda A partir disso vemos natildeo mais um
emaranhado de ordenanccedilas cerimoniais destituiacutedas de sentido mas profundas liccedilotildees
espirituais acerca da figura central da Biacuteblia Jesus Cristo
Ainda que geraccedilatildeo apoacutes geraccedilatildeo os filhos de Israel matavam os inocentes animais
atraveacutes de sacrifiacutecios e natildeo tinham a plena consciecircncia da magnitude do seu simbolismo
todavia pela feacute sabiam que seus pecados haviam sido expiados As ofertas o sofrimento e
morte dos animais o sangue derramado e a mediaccedilatildeo dos sacerdotes propiciavam um
cenaacuterio pedagoacutegico riquiacutessimo mediante a qual todos aprendiam acerca do plano divino da
redenccedilatildeo Negar isso eacute negar a proacutepria Escritura
Os escritores do Novo Testamento empreenderam grandes esforccedilos para elaborar
suas doutrinas com base no entendimento que tinham do Velho Testamento pois era esse
que testificava acerca do Messias Ele mesmo nos seus ensinamentos citou por diversas
vezes as Escrituras veterotestamentaacuterias Era o antiacutetipo em carne e osso explicando aos
disciacutepulos toda a tipologia que Nele encontrava a plena realizaccedilatildeo Assim quando os
escritores neotestamentaacuterios analisavam as ofertas volitivas e compulsoacuterias encontravam
nelas revelado o Messias de Israel
As ldquosombrasrdquo tiveram o seu valor ateacute a chegada da realidade isto eacute Cristo Ele eacute
a revelaccedilatildeo final de Deus pois posteriormente ao brado ldquoestaacute consumadordquo o veacuteu foi
rasgado e o acesso pleno a Deus liberado As ofertas volitivas e compulsoacuterias natildeo satildeo mais
necessaacuterias pois aquele para quem elas apontavam as substituiu satisfez a justiccedila divina e
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reconciliou o homem com Deus Cabe-nos empreendermos esforccedilos com a finalidade uacutenica
de conhecer mais detalhadamente as ofertas volitivas e compulsoacuterias E assim ter uma
percepccedilatildeo mais niacutetida de que o mesmo Deus que instituiu os ldquotiposrdquo eacute o mesmo que os
tornou realidade na pessoa do Messias Jesus Cristo
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Autor ndash Bacharel em Teologia
Prof Odilon Soares Moreira
Bacharel em Teologia pela Faculdade
Beth Shalom e licenciado em Filosofia
pela Universidade Metodista de Satildeo
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E-mail odilonmoreira13hotmailcom
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O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO 67 INTRODUCcedilAtildeO 68
1 EM BUSCA DO CENAacuteRIO HISTOacuteRICO68 2 A EXPANSAtildeO DA FEacute CRISTAtilde69
3 DE PEDRO A PAULO (EXPANSAtildeO DA OBRA DE MISSOtildeES)69 4 O APOacuteSTOLO PAULO NO AREOacutePAGO72 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 73
REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NO LIVRO DE LEVIacuteTICO 74 INTRODUCcedilAtildeO 75 1 TIPOLOGIA 76
11 - Definiccedilatildeo de tipologia77 12 - A tipologia como ferramenta da hermenecircutica 77
13 - As Escrituras e a tipologia77 14 - A tipologia e as correntes teoloacutegicas78 141- ldquotiposrdquo natildeo ratificados pelo Novo Testamento 79
142 - Siacutembolos ratificados pelo Novo Testamento 80 142 - Corrente intermediaacuteria ldquotiposrdquo expliacutecitos e impliacutecitos 81
2 ESTABELECIMENTO DA CORRENTE INTERPRETATIVA81 3 REVELACcedilAtildeO MESSIAcircNICA NA OFERTAS VOLITIVAS E COMPULSOacuteRIAS 82
31 - As ofertas volitivas 82 311 - Os Holocaustos 82
312 - Exigecircncias para o Holocausto 83 313 - As ofertas de manjares 85 314 - As ofertas de comunhatildeo ou ofertas pacificas 86
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS86 41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia87
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo 87 43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo 88 44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas 88
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE89 51 - A mediaccedilatildeo 89
52 - A unccedilatildeo e a pureza 90 53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo 90 54 - O Yom Kippur92
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS 93 REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 94
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O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA
RESTAURATIVA1
RESUMO
O presente artigo escrito durante a pandemia da COVID-19 tem o intuito de relembrar a
histoacuteria de Joacute Partindo de uma perspectiva interdisciplinar entre Teologia e Direito
analisam-se as diferentes visotildees de Justiccedila contidas no Livro de Joacute Pretende-se
demonstrar a prevalecircncia da ideia de justiccedila restaurativa em detrimento das concepccedilotildees de
justiccedila retributiva (ligada ao tema do castigo divino) e contratualista (ligada ao tema da
teologia da prosperidade)
Palavras-chave Livro de Joacute Justiccedila retributiva Contrato Justiccedila restaurativa
ABSTRACT
This article written during the pandemic of COVID-19 is intended to recall Jobs story
Starting from an interdisciplinary perspective between theology and law the different
views of justice contained in the Book of Job are analyzed It is intended to demonstrate
the prevalence of the idea of restorative justice instead of the concepts of retributive
justice (linked to the theme of divine punishment) and contractualist (linked to the theme
of prosperity theology)
Key words Book of Job Retributive justice Contract Restorative justice
1 Doutor em Direito Penal pela Universidade de Satildeo Paulo Juiz Federal e Professor de Direito Penal da
FADISA
autor
Excelentissiacutemo Juiz Federal
Dr Paulo Bueno de Azevedo
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1 UM LIVRO ATEMPORAL
O presente artigo eacute escrito durante um periacuteodo turbulento certamente ineacutedito para
muitos de noacutes embora natildeo seja o primeiro evento da espeacutecie em nosso planeta A
pandemia da COVID (Corona virus Disease) -19 tal como outras doenccedilas no passado
(peste negra gripe espanhola etc) ainda estaacute causando milhares de mortes no mundo
todo forccedilando medidas eneacutergicas de isolamento social levando muitos ao desemprego agrave
falecircncia e agrave desesperanccedila
Neste cenaacuterio alguns ousam perguntar onde estaacute Deus Por que Deus esconde sua
face nesse momento Jaacute outros enxergam o sinal do fim dos tempos a puniccedilatildeo divina
decorrente dos pecados humanos E haacute ainda quem reforce a sua descrenccedila se Deus
existisse mesmo nada disso poderia ocorrer Enfim num momento tatildeo difiacutecil a
desesperanccedila a raiva e a incerteza encontram terreno feacutertil para disseminaccedilatildeo As
muacuteltiplas vozes se chocam e a feacute arrefece
Na verdade tais anguacutestias vecircm de certas concepccedilotildees que as pessoas tecircm de Deus
as quais por sinal estatildeo profundamente entrelaccediladas com pensamentos juriacutedicos A ideia
do castigo vem do tirociacutenio que invoca a justiccedila retributiva divina Jaacute o pensar que Deus
natildeo poderia permitir tais cataacutestrofes parece traduzir uma espeacutecie de obrigaccedilatildeo do Senhor
para com a humanidade E se existisse mesmo tal obrigaccedilatildeo quem poderia levar Deus ao
tribunal para que fosse compelido a cumprir esse contrato
O problema parece insoluacutevel pois quer se trate da puniccedilatildeo quer de um contrato
descumprido ningueacutem poderia confrontar o Criador em juiacutezo Ou poderia O desespero eacute
atual no entanto a histoacuteria eacute antiga Haacute milhares de anos foi retratada no Livro de Joacute A
autoria desse livro que compotildee o Antigo Testamento da Biacuteblia eacute desconhecida e existem
muitas duacutevidas sobre possiacuteveis trechos inseridos ou modificados a posteriori Imaginaria o
seu autor (ou sua autora2) que sua obra continuaria atual e sendo objeto de estudos e
reflexotildees mais de dois mil anos depois
Natildeo natildeo eacute por acaso que Jorge Luis Borges (BORGES 2009 p 156) considerava
o Livro de Joacute um dos mais impressionantes da Biacuteblia nem que Freud o tenha situado
como a mais alta das literaturas humanas (apud BORGES 1965) Natildeo eacute coincidecircncia que
o Livro de Joacute seja considerado ldquoo mais saacutebio da Biacuteblia Hebraicardquo (BLOOM 2005 p 15)
e tenha sido recontado tantas vezes como nas versotildees de HG Wells (apud BORGES
1965) e Fabrice Hadjadj bem como objeto de longos estudos a exemplo daqueles de Carl
2 A hipoacutetese de que o texto javista da Biacuteblia Hebraica poderia ter sido escrito por uma mulher hitita eacute
aventada por Harold Bloom (BLOOM 2005 p 27)
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
AZEVEDO Paulo Bueno de Ensaio sobre a irracionalidade do sistema criminal agrave
luz da obra religiosa de Lev Tolstoacutei Rio de Janeiro Lumen Juris 2019
BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
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BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
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BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
HADJADJ Fabrice Joacute ou a tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo
Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
JUNG CJ Resposta a Joacute Traduccedilatildeo do Pe Dom Mateus Ramalho Rocha 10 ediccedilatildeo
Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
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Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
29
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
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A oferta paciacutefica ou de comunhatildeo traz a ideia de comunhatildeo existente entre Deus
e os homens Na ocasiatildeo dessa oferenda o peito e a coxa deveriam ser dados para o
sustento dos sacerdotes e levitas Enquanto que na oferta de holocausto quase tudo era
queimado na oferta paciacutefica somente as gorduras eram oferecidas sobre o altar e o
restante das partes do animal era divido entre os sacerdotes e o ofertante Nessas refeiccedilotildees
comunais o ofertante juntamente com os sacerdotes fazia um banquete jubiloso porque
criam que Deus tambeacutem estava presente Nessa oferta de comunhatildeo estava selada a paz
entre Deus e o ofertante
Basta uma anaacutelise das figuras que estavam envolvidas nessa oferta para
verificarmos claramente a tipologia nela impliacutecita A paz era selada pois havia a presenccedila
de Deus do sacerdote (mediador) e do ofertante Isso nos remete a mediaccedilatildeo do sumo
sacerdote celestial que atraveacutes de sua oferta sacrificial derrubou a parede de inimizades
existente entre Deus e os homens proporcionando-nos a paz
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS
As ofertas compulsoacuterias eram ofertadas para expiar o pecado e a culpa do
transgressor e oferececirc-las natildeo dependia da sua vontade Caso natildeo quisesse sofrer as
consequecircncias do juiacutezo divino por suas transgressotildees ofertas pelo pecado deveriam ser
oferecidas pelo transgressor Essas ofertas estatildeo regulamentadas nos capiacutetulos 4 a 7 de
Leviacutetico onde as encontramos divididas basicamente em trecircs grupos oferta por
ignoracircncia oferta pelo pecado e oferta pela culpa
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Certa complexidade haacute em diferenciar de forma simples uma oferta da outra mas
de uma forma sintetizada podemos diferenciaacute-las conforme a proacutepria classificaccedilatildeo
mosaica Os textos biacuteblicos natildeo nos fornecem de forma satisfatoacuteria elementos para que
possamos fazer uma diferenciaccedilatildeo precisa de uma oferta para outra
41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia
O termo ignoracircncia (hb segaga) natildeo pode ser confundido com desconhecimento
da lei mosaica Os pecados a serem expiados por esse tipo de oferta eram aqueles que o
transgressor cometia de forma natildeo intencional (Lv 42) A ldquointenccedilatildeordquo aqui deve ser
entendida como ldquode forma natildeo desafiadorardquo isto eacute contrariando as leis divinas de modo a
desprezar a Deus e sua palavra Para esses natildeo havia expiaccedilatildeo
Os pecados cometidos por ignoracircncia estavam classificados no rol daqueles que o
transgressor cometia inadvertidamente ou inconscientemente como por exemplo tocar em
restos mortais sem que disso tivesse conhecimento Tambeacutem se enquadra aqueles
cometidos por conta da natureza caiacuteda do homem e sua consequente inclinaccedilatildeo para o
pecado Independente se o pecado havia sido cometido inconscientemente ou por conta da
inclinaccedilatildeo pecaminosa o homem tornar-se-ia culpado diante do Deus Santo necessitando
assim da expiaccedilatildeo do seu pecado
A expiaccedilatildeo para essa classe de pecados deveria obedecer a alguns criteacuterios
estabelecidos Sacerdotes priacutencipes a comunidade em geral e o indiviacuteduo em particular
deveriam oferecer sacrifiacutecios Para cada um desses grupos um animal especifico deveria
ser ofertado
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo
Esse tipo de oferta pela culpa (hb asham) era realizada nas ocasiotildees em que a
transgressatildeo fosse cometida em relaccedilatildeo ao proacuteximo Nesse caso deveria haver entatildeo uma
restituiccedilatildeo do ofensor para o ofendido Por envolver questotildees monetaacuterias como forma de
reparaccedilatildeo essa oferta tambeacutem era conhecida como oferta de restituiccedilatildeo
Logicamente por ser o homem a imagem e semelhanccedila de Deus qualquer
transgressatildeo cometida contra aquele ofendia Este Assim antes mesmo de tentar reatar o
seu relacionamento com Deus o pecador deveria estabelecer a comunhatildeo perdida com o
ofendido Se natildeo houvesse expiaccedilatildeo a culpa permaneceria e o juiacutezo divino certamente
recairia sobre o ofensor
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43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo
Haacute entre os eruditos certa dificuldade para entender a que tipo de pecado essa
oferta faz referecircncia A ligaccedilatildeo dos dois substantivos (ldquooferta pelo pecadordquo) sugerem eles
parece indicar que os pecadores deveriam lidar com seus pecados mediante a oferta de
sacrifiacutecios Ao pecar necessariamente o transgressor deveria associar a ideia dual de
ldquopecado necessita de ofertardquo
Outra ideia impliacutecita na oferta pelo pecado (hb hattarsquot) eacute a de purificaccedilatildeo O
pecado -atraveacutes do pecador - contaminava o ambiente sagrado tornando-o improacuteprio para
a presenccedila de Deus Por esse motivo o sangue dessa oferta era aspergido sobre os altares
o propiciatoacuterio e dentro do Santo dos Santos A purificaccedilatildeo mediante o sangue era
necessaacuteria para a manifestaccedilatildeo da presenccedila divina Esse ato de purgar deu tambeacutem a essa
oferta o nome de ldquooferta de purificaccedilatildeordquo
Temos dois fatores de suma importacircncia no processo de salvaccedilatildeo expiaccedilatildeo e
purificaccedilatildeo Sem a expiaccedilatildeo o homem permanece separado de Deus e sem a purificaccedilatildeo eacute
impedido de receber sua presenccedila Esse duplo processo soacute poderia ser realizado mediante o
derramamento de sangue inocente e com a indispensaacutevel presenccedila do sacerdote mediador
44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas
Para todas essas ofertas volitivas e compulsoacuterias a qualidade era imprescindiacutevel
A expiaccedilatildeo pelo sangue era o elemento comum que as unificava Desde um touro oferecido
pelo sacerdote em favor de seus proacuteprios pecados ateacute um pombo ofertado pelos mais
pobres eram recebidos por Deus como sacrifiacutecio substitutivo com o poder de expiar e
purificar ainda que de forma provisoacuteria
O estudo da lei mosaica nos leva a concluir que havia a possibilidade de oferendas
e sacrifiacutecios expiatoacuterios para todos os pecados com exceccedilatildeo daqueles cometidos de forma
que desafiassem a Deus e a sua palavra Esse tipo de pecado era fruto de um coraccedilatildeo
impenitente que desobedecia propositalmente aos mandamentos divinos O Novo
Testamento demonstra de forma inequiacutevoca que o sacrifiacutecio de Cristo tem suficiecircncia para
perdatildeo de todos os pecados no tempo e no espaccedilo A uacutenica exceccedilatildeo feita a essa regra eacute a
blasfecircmia contra o Santo Espiacuterito (Mt 1232 Lc 1210)
Todas essas variedades de ofertas e as mais diversas classes de animais bem
como os rituais diaacuterios tinham a intenccedilatildeo de revelar a necessidade do Messias que com
um uacutenico sacrifiacutecio expiatoacuterio anularia os efeitos do pecado sobre os homens que nele
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cressem Jesus na cruz fez a oferta de si mesmo a Deus uma uacutenica vez e com a eficaacutecia
eterna para perdatildeo de todas as variedades de pecados que a lei classificava mas natildeo dava a
soluccedilatildeo definitiva
O sangue de bovinos caprinos ovinos e aves eram apenas uma paacutelida sombra que
apenas cobria os pecados conscientes ou inconscientes voluntaacuterios ou involuntaacuterios Por
sua ineficaacutecia a expiaccedilatildeo limitava-se a indiviacuteduos ou grupos de indiviacuteduos e seu alcance
era temporal pois tinha eficaacutecia somente em um periacuteodo especifico O sangue de Cristo
entretanto como nos atesta o Novo Testamento atua de forma ilimitada sendo tambeacutem
atemporal (Hb 913-15 104)
A nossa limitaccedilatildeo nos permite apenas olhar o sacrifiacutecio vicaacuterio do Cristo de forma
progressiva na revelaccedilatildeo biacuteblica mas com o Eterno tal natildeo se sucede visto ter Ele os
atributos incomunicaacuteveis da onisciecircncia e presciecircncia (At 223 1Pe 12) Portanto ao
perdoar as transgressotildees com base no sangue de animais na verdade Ele via
antecipadamente o sacrifiacutecio de Cristo sendo realizado
O homem olha a revelaccedilatildeo progressiva da salvaccedilatildeo poreacutem o Deus Eterno a vecirc na
totalidade A cruz na perspectiva divina sempre esteve no Velho Testamento pois ela
considerando uma progressatildeo histoacuterica eacute antes dele O Messias ainda que de forma
velada sempre esteve laacute como nos atestam as seguintes passagens biblicas 2Tmt 11 2T
19 Ap 178 Pv 823-31 Mt 2534 Jo 1724 At 1518 Rm 1625 1Pe 120-23 Ap 138
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE
51 - A mediaccedilatildeo
As ofertas cuja funccedilatildeo era expiar o pecado conforme jaacute vimos tipificavam o
sacrifiacutecio perfeito e final do Messias Eram apenas sombras indicativas de algo superior
que foi revelado atraveacutes de Jesus e sistematizado nos vinte e nove livros que compotildee o
Novo Testamento (Hb 85 99 23-24 101 Cl 217)
Essas ofertas soacute poderiam ser aceitas por Deus caso houvesse um mediador que as
oferecesse Nesse cenaacuterio entra a figura do sacerdote e do sumo sacerdote que tipificavam
o sacerdoacutecio eterno do Messias Muitos satildeo os detalhes que vinculam o sacerdoacutecio terreno
com a obra mediadora do Messias Visto que nosso espaccedilo eacute limitado pela natureza desse
artigo faremos apenas algumas correspondecircncias entre o sacerdoacutecio humano e o
sacerdoacutecio celestial de Cristo
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52 - A unccedilatildeo e a pureza
O capiacutetulo oito de Leviacutetico descreve a consagraccedilatildeo de Aratildeo como sumo sacerdote
e de seus filhos como sacerdotes O oacuteleo da unccedilatildeo - siacutembolo do Espiacuterito Santo - foi
derramado sobre ele - tipo de Jesus - para exercer sua funccedilatildeo em favor dos fracos e
ignorantes (Hb 51-10) O Velho e o Novo Testamento apresentam Jesus como o ungido de
Deus sobre o qual foi derramado o Espiacuterito Santo para libertar os cativos do pecado
Somente eles poderiam fazer mediaccedilatildeo pelo povo da mesma forma que natildeo haacute
outro mediador entre Deus e os homens a natildeo ser Jesus (At 412 1 Tm 25 Hb 725 86
915 1224) Conforme nos atestam alguns versos biacuteblicos qualquer pessoa que tentasse
usurpar a funccedilatildeo sacerdotal receberia a pena capital (Nm 310 38 1640 185-7) Assim
tipologicamente falando excluindo-se a pessoa de Jesus qualquer outro mediador diante
de Deus estaacute morto
O sacerdote deveria antes de oferecer qualquer sacrifiacutecio banhar-se na bacia de
bronze localizada no aacutetrio do tabernaacuteculo (Lv 86) Esse ritual continha a ideia de
purificaccedilatildeo pois o sacerdote que oferecesse o sacrifiacutecio deveria estar puro diante de Deus
Qualquer oficiante do tabernaacuteculo que natildeo se lavasse ou natildeo fizesse os cerimoniais
prescritos na lei deveria seria morto (Ecircx 3018-21)
Esse simbolismo eacute perfeito quando comparado a situaccedilatildeo do pecador diante do
Deus Santo Qualquer transgressor que Dele se aproximar sem estar puro receberaacute o
salaacuterio do pecado isto eacute a morte eterna
53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo
Associada com a ideia de santidade havia uma lacircmina de ouro posta no turbante
do sumo sacerdote com a inscriccedilatildeo ldquoSantidade ao Senhorrdquo (Ecircx 2836 Lv 89) Essa lacircmina
representava o elevado grau de santidade que o sumo sacerdote deveria ter por se
apresentar diante de Deus para expiar os pecados do povo Outra peccedila que compunha o
vestuaacuterio da classe sacerdotal era a estola feita de linho fino branco indicativo na Biacuteblia de
pureza e santidade (Ecircx 2839 87)
Toda o ritual de purificaccedilatildeo e as vestimentas apontavam para a santidade do
sacerdote que por sua vez tipificava a santidade do sumo sacerdote celestial que em tudo
foi tentado poreacutem sem pecado (Hb 726 Is 539 Jo 846 2Co 521 1Pe 222 1 Jo 35)
No ritual de purificaccedilatildeo dos contaminados por lepra e liacutequidos corporais descrito
nos capiacutetulos 11 a 15 de Leviacutetico o sacerdote figurava como a personagem principal pois
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sem ele o processo de purificaccedilatildeo natildeo poderia ser finalizado Vemos entatildeo uma dupla
funccedilatildeo sacerdotal o que mediava e o que purificava Na pessoa de Jesus cumpriu-se esse
duplo tipo sacerdotal pois o Novo Testamento atribui a ele a funccedilatildeo de mediador e
purificador
Qualquer judeu por mais simples que fosse entenderia a mensagem espiritual
profunda que havia no ritual de purificaccedilatildeo e nas roupas sacerdotais E qual seria essa
mensagem A resposta simples eacute antes mesmo de se aproximar de um Deus Santo com
sacrifiacutecio havia a necessidade imperiosa de purificar-se Primeiro se purifica Depois a
Ele oferece-se sacrifiacutecios de adoraccedilatildeo Purificaccedilatildeo e sacrifiacutecios estatildeo intimamente
interligados conforme jaacute vimos nas ofertas compulsoacuterias E tudo isso soacute seria possiacutevel com
a figura do mediador
Todo o vestuaacuterio do sumo sacerdote tipificava o Messias e seu oficio sacerdotal
Natildeo sendo possiacutevel nesse artigo analisar as minuacutecias de cada uma das peccedilas falaremos
delas de forma geneacuterica Basicamente o eacutefode e o cinto do sumo sacerdote possuiacuteam
quatro cores que apareciam tambeacutem na primeira cortina que cobria o tabernaacuteculo no veacuteu
que separava o lugar santo do santiacutessimo e na cortina de entrada do aacutetrio do tabernaacuteculo O
azul carmesim puacuterpura e branco tipificavam alguns atributos do Messias O azul sua
origem celestial a puacuterpura apontava para sua realeza o branco fala de sua absoluta
pureza e o vermelho do seu sacrifiacutecio expiatoacuterio Somente o Messias Jesus Cristo
apresentou as quatro caracteriacutesticas aceitaacuteveis a Deus Rei que veio do ceacuteu cujo sangue foi
derramado e sobre Ele natildeo pode ser imputado pecado algum
Sobre o eacutefode ficava o peitoral do juiacutezo contendo doze pedras preciosas e em
cada uma delas estava gravada o nome das doze tribos de Israel Essas pedras conforme
determinaccedilatildeo biacuteblica deveriam estar sobre o coraccedilatildeo do sumo sacerdote quando este
oficiasse no tabernaacuteculo Ele tambeacutem carregava sobre os ombros uma pedra preciosa de
cada lado Na primeira eram gravados os nomes de seis tribos de Israel na outra mais seis
tribos Assim o representante dos homens carregava simbolicamente no coraccedilatildeo e nos
ombros toda a naccedilatildeo dos filhos de Israel diante de Deus estando assim toda ela
representada pelas quatorze pedras Assim o sumo sacerdote intercedia por toda a naccedilatildeo
continuamente
Poucos discordariam que a igreja de Cristo assumiu o papel de Israel ainda que
saibamos que esse fato natildeo invalida as promessas de Deus feitas a esse povo Apaziguada
essa questatildeo podemos entatildeo verificar a tipicidade desse peitoral no tocante a figura do
Messias O sumo sacerdote humano carregava sobre o coraccedilatildeo e ombros a naccedilatildeo de
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Israel ao passo que o Messias carrega sobre o coraccedilatildeo e ombros a igreja composta de
pessoas de todas as naccedilotildees (Jo 315 Mt 913 1Tt 115-16 Ap 59 Ap 1211 Hb 1312
1Pe 119)
Esse peitoral dobrado formava uma bolsa que continha duas pedras conhecidas
como Urim e Tumim com as quais se consultavam a vontade de Deus Sacerdotes
profetas Urim e Tumim eram necessaacuterios enquanto o Messias natildeo havia sido revelado
Poreacutem o Messias jaacute veio como a revelaccedilatildeo final de Deus para o homem (Hb 11-
2) Ele eacute a uacutenica verdade e portanto nosso uacutenico guia espiritual (Jo 146) Tal qual o sumo
sacerdote guiava o povo mediante o Urim e Tumim Ele sem fazer uso de qualquer pedra
nos guia mediante o Espirito Santo e as Escrituras sagradas rumo ao ceacuteu (Jo 1426 1613
1Co 210-13 Ef 47-15 1 Jo 220 1 Jo 227)
Mediante essas duas pedras consultava-se a Deus e por elas vinha a resposta
Hoje eacute por intermeacutedio do Cristo revelado nas Escrituras que obtemos a maioria das
respostas para nossas indagaccedilotildees
54 - O Yom Kippur
Ao falarmos das ofertas volitivas e compulsoacuterias alguns paraacutegrafos devem ser
dedicados ao ritual do Yom Kippur cujo cerimonial representava o perdatildeo anual dos
pecados dos filhos de Israel
O Yom Kippur ou Dia do perdatildeo eacute considerado um dos dias mais sagrados do
calendaacuterio judaico Era nesse dia que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para
purificar o tabernaacuteculo e oferecer o sacrifiacutecio anual por toda a naccedilatildeo (Lv 166 16 18-19
24) Era um dia de jejum e nenhum trabalho servil deveria ser realizado Era nesse
grandioso dia que o bode expiatoacuterio Azazel tinha de ser enviado ao deserto para longe do
arraial ou das portas de Jerusaleacutem Ele carregava sobre si os pecados de toda a naccedilatildeo e
acabava simbolicamente morrendo por ela Isso por si soacute jaacute configura uma bela
tipologia o cordeiro de Deus sofreu e morreu fora das portas de Jerusaleacutem carregando
sobre si os pecados da humanidade (Mt 1520-24 Jo 1917-18 At 758 Hb 1312)
Ao entrar no Santiacutessimo o sumo sacerdote enchia-o de fumaccedila de incenso para
que a nuvem perfumada ocultasse de seus olhos o propiciatoacuterio local esse considerado
como sendo ldquoo trono de Deusrdquo Ao entrar nesse recinto sagrado o sumo sacerdote deveria
ter em matildeos o sangue para expiar os pecados de toda a naccedilatildeo Fontes extrabiacuteblicas nos
informam sobre o alto grau de relevacircncia desse dia pois era nele que se promulgava certo
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decreto divino sobre quem iraacute viver e quem iraacute morrer quem estaraacute sereno e quem seraacute
perturbado quem seraacute pobre e quem seraacute rico quem seraacute exaltado e quem seraacute humilhado
(KOLATCH p239)
Para estabelecer a rica tipologia encontrada nos ritos desse tatildeo importante dia
basta-nos consultar alguns versos do livro de hebreus que revelam o ofiacutecio sacerdotal de
Cristo (Hb 91-26 217 31 415 55-6 71 11-27 81)
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
A tipologia por ser essencialmente biacuteblica natildeo pode ser desprezada sendo que os
extremos na sua utilizaccedilatildeo devem ser evitados atraveacutes de esforccedilos para encontrar-se uma
posiccedilatildeo moderada Ao nos apossarmos dessa ideia perceberemos o quatildeo proveitoso seraacute o
nosso conhecimento dos ldquotiposrdquo biacuteblicos para a robustez da nossa teologia
A anaacutelise das ofertas volitivas e compulsoacuterias demostram essa verdade na medida
em que as conhecemos de forma mais profunda A partir disso vemos natildeo mais um
emaranhado de ordenanccedilas cerimoniais destituiacutedas de sentido mas profundas liccedilotildees
espirituais acerca da figura central da Biacuteblia Jesus Cristo
Ainda que geraccedilatildeo apoacutes geraccedilatildeo os filhos de Israel matavam os inocentes animais
atraveacutes de sacrifiacutecios e natildeo tinham a plena consciecircncia da magnitude do seu simbolismo
todavia pela feacute sabiam que seus pecados haviam sido expiados As ofertas o sofrimento e
morte dos animais o sangue derramado e a mediaccedilatildeo dos sacerdotes propiciavam um
cenaacuterio pedagoacutegico riquiacutessimo mediante a qual todos aprendiam acerca do plano divino da
redenccedilatildeo Negar isso eacute negar a proacutepria Escritura
Os escritores do Novo Testamento empreenderam grandes esforccedilos para elaborar
suas doutrinas com base no entendimento que tinham do Velho Testamento pois era esse
que testificava acerca do Messias Ele mesmo nos seus ensinamentos citou por diversas
vezes as Escrituras veterotestamentaacuterias Era o antiacutetipo em carne e osso explicando aos
disciacutepulos toda a tipologia que Nele encontrava a plena realizaccedilatildeo Assim quando os
escritores neotestamentaacuterios analisavam as ofertas volitivas e compulsoacuterias encontravam
nelas revelado o Messias de Israel
As ldquosombrasrdquo tiveram o seu valor ateacute a chegada da realidade isto eacute Cristo Ele eacute
a revelaccedilatildeo final de Deus pois posteriormente ao brado ldquoestaacute consumadordquo o veacuteu foi
rasgado e o acesso pleno a Deus liberado As ofertas volitivas e compulsoacuterias natildeo satildeo mais
necessaacuterias pois aquele para quem elas apontavam as substituiu satisfez a justiccedila divina e
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reconciliou o homem com Deus Cabe-nos empreendermos esforccedilos com a finalidade uacutenica
de conhecer mais detalhadamente as ofertas volitivas e compulsoacuterias E assim ter uma
percepccedilatildeo mais niacutetida de que o mesmo Deus que instituiu os ldquotiposrdquo eacute o mesmo que os
tornou realidade na pessoa do Messias Jesus Cristo
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Satildeo Paulo Vida Nova 1994
Autor ndash Bacharel em Teologia
Prof Odilon Soares Moreira
Bacharel em Teologia pela Faculdade
Beth Shalom e licenciado em Filosofia
pela Universidade Metodista de Satildeo
Paulo
E-mail odilonmoreira13hotmailcom
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O LIVRO DE JOacute O CONTRATO COM DEUS E A JUSTICcedilA
RESTAURATIVA1
RESUMO
O presente artigo escrito durante a pandemia da COVID-19 tem o intuito de relembrar a
histoacuteria de Joacute Partindo de uma perspectiva interdisciplinar entre Teologia e Direito
analisam-se as diferentes visotildees de Justiccedila contidas no Livro de Joacute Pretende-se
demonstrar a prevalecircncia da ideia de justiccedila restaurativa em detrimento das concepccedilotildees de
justiccedila retributiva (ligada ao tema do castigo divino) e contratualista (ligada ao tema da
teologia da prosperidade)
Palavras-chave Livro de Joacute Justiccedila retributiva Contrato Justiccedila restaurativa
ABSTRACT
This article written during the pandemic of COVID-19 is intended to recall Jobs story
Starting from an interdisciplinary perspective between theology and law the different
views of justice contained in the Book of Job are analyzed It is intended to demonstrate
the prevalence of the idea of restorative justice instead of the concepts of retributive
justice (linked to the theme of divine punishment) and contractualist (linked to the theme
of prosperity theology)
Key words Book of Job Retributive justice Contract Restorative justice
1 Doutor em Direito Penal pela Universidade de Satildeo Paulo Juiz Federal e Professor de Direito Penal da
FADISA
autor
Excelentissiacutemo Juiz Federal
Dr Paulo Bueno de Azevedo
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1 UM LIVRO ATEMPORAL
O presente artigo eacute escrito durante um periacuteodo turbulento certamente ineacutedito para
muitos de noacutes embora natildeo seja o primeiro evento da espeacutecie em nosso planeta A
pandemia da COVID (Corona virus Disease) -19 tal como outras doenccedilas no passado
(peste negra gripe espanhola etc) ainda estaacute causando milhares de mortes no mundo
todo forccedilando medidas eneacutergicas de isolamento social levando muitos ao desemprego agrave
falecircncia e agrave desesperanccedila
Neste cenaacuterio alguns ousam perguntar onde estaacute Deus Por que Deus esconde sua
face nesse momento Jaacute outros enxergam o sinal do fim dos tempos a puniccedilatildeo divina
decorrente dos pecados humanos E haacute ainda quem reforce a sua descrenccedila se Deus
existisse mesmo nada disso poderia ocorrer Enfim num momento tatildeo difiacutecil a
desesperanccedila a raiva e a incerteza encontram terreno feacutertil para disseminaccedilatildeo As
muacuteltiplas vozes se chocam e a feacute arrefece
Na verdade tais anguacutestias vecircm de certas concepccedilotildees que as pessoas tecircm de Deus
as quais por sinal estatildeo profundamente entrelaccediladas com pensamentos juriacutedicos A ideia
do castigo vem do tirociacutenio que invoca a justiccedila retributiva divina Jaacute o pensar que Deus
natildeo poderia permitir tais cataacutestrofes parece traduzir uma espeacutecie de obrigaccedilatildeo do Senhor
para com a humanidade E se existisse mesmo tal obrigaccedilatildeo quem poderia levar Deus ao
tribunal para que fosse compelido a cumprir esse contrato
O problema parece insoluacutevel pois quer se trate da puniccedilatildeo quer de um contrato
descumprido ningueacutem poderia confrontar o Criador em juiacutezo Ou poderia O desespero eacute
atual no entanto a histoacuteria eacute antiga Haacute milhares de anos foi retratada no Livro de Joacute A
autoria desse livro que compotildee o Antigo Testamento da Biacuteblia eacute desconhecida e existem
muitas duacutevidas sobre possiacuteveis trechos inseridos ou modificados a posteriori Imaginaria o
seu autor (ou sua autora2) que sua obra continuaria atual e sendo objeto de estudos e
reflexotildees mais de dois mil anos depois
Natildeo natildeo eacute por acaso que Jorge Luis Borges (BORGES 2009 p 156) considerava
o Livro de Joacute um dos mais impressionantes da Biacuteblia nem que Freud o tenha situado
como a mais alta das literaturas humanas (apud BORGES 1965) Natildeo eacute coincidecircncia que
o Livro de Joacute seja considerado ldquoo mais saacutebio da Biacuteblia Hebraicardquo (BLOOM 2005 p 15)
e tenha sido recontado tantas vezes como nas versotildees de HG Wells (apud BORGES
1965) e Fabrice Hadjadj bem como objeto de longos estudos a exemplo daqueles de Carl
2 A hipoacutetese de que o texto javista da Biacuteblia Hebraica poderia ter sido escrito por uma mulher hitita eacute
aventada por Harold Bloom (BLOOM 2005 p 27)
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
AZEVEDO Paulo Bueno de Ensaio sobre a irracionalidade do sistema criminal agrave
luz da obra religiosa de Lev Tolstoacutei Rio de Janeiro Lumen Juris 2019
BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
2011
BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
Revisatildeo de Marta Miranda OrsquoShea Rio de Janeiro Objetiva 2005
BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
de 2020
BORGES Jorge Luis Sete conversas com Fernando Sorrentino Organizador
Fernando Sorrentino Traduccedilatildeo de Ana Flores Rio de Janeiro Beco do Azougue
2009
CARBAJOSA Ignacio Joacute potildee Deus no banco dos reacuteus Sobre o sofrimento inocente
In httparquivorevistapassoscombrdefaultaspid=344ampid_n=5530amppagina=1
acesso em 14052020
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
HADJADJ Fabrice Joacute ou a tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo
Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
JUNG CJ Resposta a Joacute Traduccedilatildeo do Pe Dom Mateus Ramalho Rocha 10 ediccedilatildeo
Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
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Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
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A oferta paciacutefica ou de comunhatildeo traz a ideia de comunhatildeo existente entre Deus
e os homens Na ocasiatildeo dessa oferenda o peito e a coxa deveriam ser dados para o
sustento dos sacerdotes e levitas Enquanto que na oferta de holocausto quase tudo era
queimado na oferta paciacutefica somente as gorduras eram oferecidas sobre o altar e o
restante das partes do animal era divido entre os sacerdotes e o ofertante Nessas refeiccedilotildees
comunais o ofertante juntamente com os sacerdotes fazia um banquete jubiloso porque
criam que Deus tambeacutem estava presente Nessa oferta de comunhatildeo estava selada a paz
entre Deus e o ofertante
Basta uma anaacutelise das figuras que estavam envolvidas nessa oferta para
verificarmos claramente a tipologia nela impliacutecita A paz era selada pois havia a presenccedila
de Deus do sacerdote (mediador) e do ofertante Isso nos remete a mediaccedilatildeo do sumo
sacerdote celestial que atraveacutes de sua oferta sacrificial derrubou a parede de inimizades
existente entre Deus e os homens proporcionando-nos a paz
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS
As ofertas compulsoacuterias eram ofertadas para expiar o pecado e a culpa do
transgressor e oferececirc-las natildeo dependia da sua vontade Caso natildeo quisesse sofrer as
consequecircncias do juiacutezo divino por suas transgressotildees ofertas pelo pecado deveriam ser
oferecidas pelo transgressor Essas ofertas estatildeo regulamentadas nos capiacutetulos 4 a 7 de
Leviacutetico onde as encontramos divididas basicamente em trecircs grupos oferta por
ignoracircncia oferta pelo pecado e oferta pela culpa
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Certa complexidade haacute em diferenciar de forma simples uma oferta da outra mas
de uma forma sintetizada podemos diferenciaacute-las conforme a proacutepria classificaccedilatildeo
mosaica Os textos biacuteblicos natildeo nos fornecem de forma satisfatoacuteria elementos para que
possamos fazer uma diferenciaccedilatildeo precisa de uma oferta para outra
41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia
O termo ignoracircncia (hb segaga) natildeo pode ser confundido com desconhecimento
da lei mosaica Os pecados a serem expiados por esse tipo de oferta eram aqueles que o
transgressor cometia de forma natildeo intencional (Lv 42) A ldquointenccedilatildeordquo aqui deve ser
entendida como ldquode forma natildeo desafiadorardquo isto eacute contrariando as leis divinas de modo a
desprezar a Deus e sua palavra Para esses natildeo havia expiaccedilatildeo
Os pecados cometidos por ignoracircncia estavam classificados no rol daqueles que o
transgressor cometia inadvertidamente ou inconscientemente como por exemplo tocar em
restos mortais sem que disso tivesse conhecimento Tambeacutem se enquadra aqueles
cometidos por conta da natureza caiacuteda do homem e sua consequente inclinaccedilatildeo para o
pecado Independente se o pecado havia sido cometido inconscientemente ou por conta da
inclinaccedilatildeo pecaminosa o homem tornar-se-ia culpado diante do Deus Santo necessitando
assim da expiaccedilatildeo do seu pecado
A expiaccedilatildeo para essa classe de pecados deveria obedecer a alguns criteacuterios
estabelecidos Sacerdotes priacutencipes a comunidade em geral e o indiviacuteduo em particular
deveriam oferecer sacrifiacutecios Para cada um desses grupos um animal especifico deveria
ser ofertado
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo
Esse tipo de oferta pela culpa (hb asham) era realizada nas ocasiotildees em que a
transgressatildeo fosse cometida em relaccedilatildeo ao proacuteximo Nesse caso deveria haver entatildeo uma
restituiccedilatildeo do ofensor para o ofendido Por envolver questotildees monetaacuterias como forma de
reparaccedilatildeo essa oferta tambeacutem era conhecida como oferta de restituiccedilatildeo
Logicamente por ser o homem a imagem e semelhanccedila de Deus qualquer
transgressatildeo cometida contra aquele ofendia Este Assim antes mesmo de tentar reatar o
seu relacionamento com Deus o pecador deveria estabelecer a comunhatildeo perdida com o
ofendido Se natildeo houvesse expiaccedilatildeo a culpa permaneceria e o juiacutezo divino certamente
recairia sobre o ofensor
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43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo
Haacute entre os eruditos certa dificuldade para entender a que tipo de pecado essa
oferta faz referecircncia A ligaccedilatildeo dos dois substantivos (ldquooferta pelo pecadordquo) sugerem eles
parece indicar que os pecadores deveriam lidar com seus pecados mediante a oferta de
sacrifiacutecios Ao pecar necessariamente o transgressor deveria associar a ideia dual de
ldquopecado necessita de ofertardquo
Outra ideia impliacutecita na oferta pelo pecado (hb hattarsquot) eacute a de purificaccedilatildeo O
pecado -atraveacutes do pecador - contaminava o ambiente sagrado tornando-o improacuteprio para
a presenccedila de Deus Por esse motivo o sangue dessa oferta era aspergido sobre os altares
o propiciatoacuterio e dentro do Santo dos Santos A purificaccedilatildeo mediante o sangue era
necessaacuteria para a manifestaccedilatildeo da presenccedila divina Esse ato de purgar deu tambeacutem a essa
oferta o nome de ldquooferta de purificaccedilatildeordquo
Temos dois fatores de suma importacircncia no processo de salvaccedilatildeo expiaccedilatildeo e
purificaccedilatildeo Sem a expiaccedilatildeo o homem permanece separado de Deus e sem a purificaccedilatildeo eacute
impedido de receber sua presenccedila Esse duplo processo soacute poderia ser realizado mediante o
derramamento de sangue inocente e com a indispensaacutevel presenccedila do sacerdote mediador
44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas
Para todas essas ofertas volitivas e compulsoacuterias a qualidade era imprescindiacutevel
A expiaccedilatildeo pelo sangue era o elemento comum que as unificava Desde um touro oferecido
pelo sacerdote em favor de seus proacuteprios pecados ateacute um pombo ofertado pelos mais
pobres eram recebidos por Deus como sacrifiacutecio substitutivo com o poder de expiar e
purificar ainda que de forma provisoacuteria
O estudo da lei mosaica nos leva a concluir que havia a possibilidade de oferendas
e sacrifiacutecios expiatoacuterios para todos os pecados com exceccedilatildeo daqueles cometidos de forma
que desafiassem a Deus e a sua palavra Esse tipo de pecado era fruto de um coraccedilatildeo
impenitente que desobedecia propositalmente aos mandamentos divinos O Novo
Testamento demonstra de forma inequiacutevoca que o sacrifiacutecio de Cristo tem suficiecircncia para
perdatildeo de todos os pecados no tempo e no espaccedilo A uacutenica exceccedilatildeo feita a essa regra eacute a
blasfecircmia contra o Santo Espiacuterito (Mt 1232 Lc 1210)
Todas essas variedades de ofertas e as mais diversas classes de animais bem
como os rituais diaacuterios tinham a intenccedilatildeo de revelar a necessidade do Messias que com
um uacutenico sacrifiacutecio expiatoacuterio anularia os efeitos do pecado sobre os homens que nele
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cressem Jesus na cruz fez a oferta de si mesmo a Deus uma uacutenica vez e com a eficaacutecia
eterna para perdatildeo de todas as variedades de pecados que a lei classificava mas natildeo dava a
soluccedilatildeo definitiva
O sangue de bovinos caprinos ovinos e aves eram apenas uma paacutelida sombra que
apenas cobria os pecados conscientes ou inconscientes voluntaacuterios ou involuntaacuterios Por
sua ineficaacutecia a expiaccedilatildeo limitava-se a indiviacuteduos ou grupos de indiviacuteduos e seu alcance
era temporal pois tinha eficaacutecia somente em um periacuteodo especifico O sangue de Cristo
entretanto como nos atesta o Novo Testamento atua de forma ilimitada sendo tambeacutem
atemporal (Hb 913-15 104)
A nossa limitaccedilatildeo nos permite apenas olhar o sacrifiacutecio vicaacuterio do Cristo de forma
progressiva na revelaccedilatildeo biacuteblica mas com o Eterno tal natildeo se sucede visto ter Ele os
atributos incomunicaacuteveis da onisciecircncia e presciecircncia (At 223 1Pe 12) Portanto ao
perdoar as transgressotildees com base no sangue de animais na verdade Ele via
antecipadamente o sacrifiacutecio de Cristo sendo realizado
O homem olha a revelaccedilatildeo progressiva da salvaccedilatildeo poreacutem o Deus Eterno a vecirc na
totalidade A cruz na perspectiva divina sempre esteve no Velho Testamento pois ela
considerando uma progressatildeo histoacuterica eacute antes dele O Messias ainda que de forma
velada sempre esteve laacute como nos atestam as seguintes passagens biblicas 2Tmt 11 2T
19 Ap 178 Pv 823-31 Mt 2534 Jo 1724 At 1518 Rm 1625 1Pe 120-23 Ap 138
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE
51 - A mediaccedilatildeo
As ofertas cuja funccedilatildeo era expiar o pecado conforme jaacute vimos tipificavam o
sacrifiacutecio perfeito e final do Messias Eram apenas sombras indicativas de algo superior
que foi revelado atraveacutes de Jesus e sistematizado nos vinte e nove livros que compotildee o
Novo Testamento (Hb 85 99 23-24 101 Cl 217)
Essas ofertas soacute poderiam ser aceitas por Deus caso houvesse um mediador que as
oferecesse Nesse cenaacuterio entra a figura do sacerdote e do sumo sacerdote que tipificavam
o sacerdoacutecio eterno do Messias Muitos satildeo os detalhes que vinculam o sacerdoacutecio terreno
com a obra mediadora do Messias Visto que nosso espaccedilo eacute limitado pela natureza desse
artigo faremos apenas algumas correspondecircncias entre o sacerdoacutecio humano e o
sacerdoacutecio celestial de Cristo
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52 - A unccedilatildeo e a pureza
O capiacutetulo oito de Leviacutetico descreve a consagraccedilatildeo de Aratildeo como sumo sacerdote
e de seus filhos como sacerdotes O oacuteleo da unccedilatildeo - siacutembolo do Espiacuterito Santo - foi
derramado sobre ele - tipo de Jesus - para exercer sua funccedilatildeo em favor dos fracos e
ignorantes (Hb 51-10) O Velho e o Novo Testamento apresentam Jesus como o ungido de
Deus sobre o qual foi derramado o Espiacuterito Santo para libertar os cativos do pecado
Somente eles poderiam fazer mediaccedilatildeo pelo povo da mesma forma que natildeo haacute
outro mediador entre Deus e os homens a natildeo ser Jesus (At 412 1 Tm 25 Hb 725 86
915 1224) Conforme nos atestam alguns versos biacuteblicos qualquer pessoa que tentasse
usurpar a funccedilatildeo sacerdotal receberia a pena capital (Nm 310 38 1640 185-7) Assim
tipologicamente falando excluindo-se a pessoa de Jesus qualquer outro mediador diante
de Deus estaacute morto
O sacerdote deveria antes de oferecer qualquer sacrifiacutecio banhar-se na bacia de
bronze localizada no aacutetrio do tabernaacuteculo (Lv 86) Esse ritual continha a ideia de
purificaccedilatildeo pois o sacerdote que oferecesse o sacrifiacutecio deveria estar puro diante de Deus
Qualquer oficiante do tabernaacuteculo que natildeo se lavasse ou natildeo fizesse os cerimoniais
prescritos na lei deveria seria morto (Ecircx 3018-21)
Esse simbolismo eacute perfeito quando comparado a situaccedilatildeo do pecador diante do
Deus Santo Qualquer transgressor que Dele se aproximar sem estar puro receberaacute o
salaacuterio do pecado isto eacute a morte eterna
53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo
Associada com a ideia de santidade havia uma lacircmina de ouro posta no turbante
do sumo sacerdote com a inscriccedilatildeo ldquoSantidade ao Senhorrdquo (Ecircx 2836 Lv 89) Essa lacircmina
representava o elevado grau de santidade que o sumo sacerdote deveria ter por se
apresentar diante de Deus para expiar os pecados do povo Outra peccedila que compunha o
vestuaacuterio da classe sacerdotal era a estola feita de linho fino branco indicativo na Biacuteblia de
pureza e santidade (Ecircx 2839 87)
Toda o ritual de purificaccedilatildeo e as vestimentas apontavam para a santidade do
sacerdote que por sua vez tipificava a santidade do sumo sacerdote celestial que em tudo
foi tentado poreacutem sem pecado (Hb 726 Is 539 Jo 846 2Co 521 1Pe 222 1 Jo 35)
No ritual de purificaccedilatildeo dos contaminados por lepra e liacutequidos corporais descrito
nos capiacutetulos 11 a 15 de Leviacutetico o sacerdote figurava como a personagem principal pois
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sem ele o processo de purificaccedilatildeo natildeo poderia ser finalizado Vemos entatildeo uma dupla
funccedilatildeo sacerdotal o que mediava e o que purificava Na pessoa de Jesus cumpriu-se esse
duplo tipo sacerdotal pois o Novo Testamento atribui a ele a funccedilatildeo de mediador e
purificador
Qualquer judeu por mais simples que fosse entenderia a mensagem espiritual
profunda que havia no ritual de purificaccedilatildeo e nas roupas sacerdotais E qual seria essa
mensagem A resposta simples eacute antes mesmo de se aproximar de um Deus Santo com
sacrifiacutecio havia a necessidade imperiosa de purificar-se Primeiro se purifica Depois a
Ele oferece-se sacrifiacutecios de adoraccedilatildeo Purificaccedilatildeo e sacrifiacutecios estatildeo intimamente
interligados conforme jaacute vimos nas ofertas compulsoacuterias E tudo isso soacute seria possiacutevel com
a figura do mediador
Todo o vestuaacuterio do sumo sacerdote tipificava o Messias e seu oficio sacerdotal
Natildeo sendo possiacutevel nesse artigo analisar as minuacutecias de cada uma das peccedilas falaremos
delas de forma geneacuterica Basicamente o eacutefode e o cinto do sumo sacerdote possuiacuteam
quatro cores que apareciam tambeacutem na primeira cortina que cobria o tabernaacuteculo no veacuteu
que separava o lugar santo do santiacutessimo e na cortina de entrada do aacutetrio do tabernaacuteculo O
azul carmesim puacuterpura e branco tipificavam alguns atributos do Messias O azul sua
origem celestial a puacuterpura apontava para sua realeza o branco fala de sua absoluta
pureza e o vermelho do seu sacrifiacutecio expiatoacuterio Somente o Messias Jesus Cristo
apresentou as quatro caracteriacutesticas aceitaacuteveis a Deus Rei que veio do ceacuteu cujo sangue foi
derramado e sobre Ele natildeo pode ser imputado pecado algum
Sobre o eacutefode ficava o peitoral do juiacutezo contendo doze pedras preciosas e em
cada uma delas estava gravada o nome das doze tribos de Israel Essas pedras conforme
determinaccedilatildeo biacuteblica deveriam estar sobre o coraccedilatildeo do sumo sacerdote quando este
oficiasse no tabernaacuteculo Ele tambeacutem carregava sobre os ombros uma pedra preciosa de
cada lado Na primeira eram gravados os nomes de seis tribos de Israel na outra mais seis
tribos Assim o representante dos homens carregava simbolicamente no coraccedilatildeo e nos
ombros toda a naccedilatildeo dos filhos de Israel diante de Deus estando assim toda ela
representada pelas quatorze pedras Assim o sumo sacerdote intercedia por toda a naccedilatildeo
continuamente
Poucos discordariam que a igreja de Cristo assumiu o papel de Israel ainda que
saibamos que esse fato natildeo invalida as promessas de Deus feitas a esse povo Apaziguada
essa questatildeo podemos entatildeo verificar a tipicidade desse peitoral no tocante a figura do
Messias O sumo sacerdote humano carregava sobre o coraccedilatildeo e ombros a naccedilatildeo de
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Israel ao passo que o Messias carrega sobre o coraccedilatildeo e ombros a igreja composta de
pessoas de todas as naccedilotildees (Jo 315 Mt 913 1Tt 115-16 Ap 59 Ap 1211 Hb 1312
1Pe 119)
Esse peitoral dobrado formava uma bolsa que continha duas pedras conhecidas
como Urim e Tumim com as quais se consultavam a vontade de Deus Sacerdotes
profetas Urim e Tumim eram necessaacuterios enquanto o Messias natildeo havia sido revelado
Poreacutem o Messias jaacute veio como a revelaccedilatildeo final de Deus para o homem (Hb 11-
2) Ele eacute a uacutenica verdade e portanto nosso uacutenico guia espiritual (Jo 146) Tal qual o sumo
sacerdote guiava o povo mediante o Urim e Tumim Ele sem fazer uso de qualquer pedra
nos guia mediante o Espirito Santo e as Escrituras sagradas rumo ao ceacuteu (Jo 1426 1613
1Co 210-13 Ef 47-15 1 Jo 220 1 Jo 227)
Mediante essas duas pedras consultava-se a Deus e por elas vinha a resposta
Hoje eacute por intermeacutedio do Cristo revelado nas Escrituras que obtemos a maioria das
respostas para nossas indagaccedilotildees
54 - O Yom Kippur
Ao falarmos das ofertas volitivas e compulsoacuterias alguns paraacutegrafos devem ser
dedicados ao ritual do Yom Kippur cujo cerimonial representava o perdatildeo anual dos
pecados dos filhos de Israel
O Yom Kippur ou Dia do perdatildeo eacute considerado um dos dias mais sagrados do
calendaacuterio judaico Era nesse dia que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para
purificar o tabernaacuteculo e oferecer o sacrifiacutecio anual por toda a naccedilatildeo (Lv 166 16 18-19
24) Era um dia de jejum e nenhum trabalho servil deveria ser realizado Era nesse
grandioso dia que o bode expiatoacuterio Azazel tinha de ser enviado ao deserto para longe do
arraial ou das portas de Jerusaleacutem Ele carregava sobre si os pecados de toda a naccedilatildeo e
acabava simbolicamente morrendo por ela Isso por si soacute jaacute configura uma bela
tipologia o cordeiro de Deus sofreu e morreu fora das portas de Jerusaleacutem carregando
sobre si os pecados da humanidade (Mt 1520-24 Jo 1917-18 At 758 Hb 1312)
Ao entrar no Santiacutessimo o sumo sacerdote enchia-o de fumaccedila de incenso para
que a nuvem perfumada ocultasse de seus olhos o propiciatoacuterio local esse considerado
como sendo ldquoo trono de Deusrdquo Ao entrar nesse recinto sagrado o sumo sacerdote deveria
ter em matildeos o sangue para expiar os pecados de toda a naccedilatildeo Fontes extrabiacuteblicas nos
informam sobre o alto grau de relevacircncia desse dia pois era nele que se promulgava certo
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decreto divino sobre quem iraacute viver e quem iraacute morrer quem estaraacute sereno e quem seraacute
perturbado quem seraacute pobre e quem seraacute rico quem seraacute exaltado e quem seraacute humilhado
(KOLATCH p239)
Para estabelecer a rica tipologia encontrada nos ritos desse tatildeo importante dia
basta-nos consultar alguns versos do livro de hebreus que revelam o ofiacutecio sacerdotal de
Cristo (Hb 91-26 217 31 415 55-6 71 11-27 81)
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
A tipologia por ser essencialmente biacuteblica natildeo pode ser desprezada sendo que os
extremos na sua utilizaccedilatildeo devem ser evitados atraveacutes de esforccedilos para encontrar-se uma
posiccedilatildeo moderada Ao nos apossarmos dessa ideia perceberemos o quatildeo proveitoso seraacute o
nosso conhecimento dos ldquotiposrdquo biacuteblicos para a robustez da nossa teologia
A anaacutelise das ofertas volitivas e compulsoacuterias demostram essa verdade na medida
em que as conhecemos de forma mais profunda A partir disso vemos natildeo mais um
emaranhado de ordenanccedilas cerimoniais destituiacutedas de sentido mas profundas liccedilotildees
espirituais acerca da figura central da Biacuteblia Jesus Cristo
Ainda que geraccedilatildeo apoacutes geraccedilatildeo os filhos de Israel matavam os inocentes animais
atraveacutes de sacrifiacutecios e natildeo tinham a plena consciecircncia da magnitude do seu simbolismo
todavia pela feacute sabiam que seus pecados haviam sido expiados As ofertas o sofrimento e
morte dos animais o sangue derramado e a mediaccedilatildeo dos sacerdotes propiciavam um
cenaacuterio pedagoacutegico riquiacutessimo mediante a qual todos aprendiam acerca do plano divino da
redenccedilatildeo Negar isso eacute negar a proacutepria Escritura
Os escritores do Novo Testamento empreenderam grandes esforccedilos para elaborar
suas doutrinas com base no entendimento que tinham do Velho Testamento pois era esse
que testificava acerca do Messias Ele mesmo nos seus ensinamentos citou por diversas
vezes as Escrituras veterotestamentaacuterias Era o antiacutetipo em carne e osso explicando aos
disciacutepulos toda a tipologia que Nele encontrava a plena realizaccedilatildeo Assim quando os
escritores neotestamentaacuterios analisavam as ofertas volitivas e compulsoacuterias encontravam
nelas revelado o Messias de Israel
As ldquosombrasrdquo tiveram o seu valor ateacute a chegada da realidade isto eacute Cristo Ele eacute
a revelaccedilatildeo final de Deus pois posteriormente ao brado ldquoestaacute consumadordquo o veacuteu foi
rasgado e o acesso pleno a Deus liberado As ofertas volitivas e compulsoacuterias natildeo satildeo mais
necessaacuterias pois aquele para quem elas apontavam as substituiu satisfez a justiccedila divina e
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reconciliou o homem com Deus Cabe-nos empreendermos esforccedilos com a finalidade uacutenica
de conhecer mais detalhadamente as ofertas volitivas e compulsoacuterias E assim ter uma
percepccedilatildeo mais niacutetida de que o mesmo Deus que instituiu os ldquotiposrdquo eacute o mesmo que os
tornou realidade na pessoa do Messias Jesus Cristo
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
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Paulo Querigma 2020
ZUCK Roy B A interpretaccedilatildeo biacuteblica meios de descobrir a Verdade da Biacuteblia
Satildeo Paulo Vida Nova 1994
Autor ndash Bacharel em Teologia
Prof Odilon Soares Moreira
Bacharel em Teologia pela Faculdade
Beth Shalom e licenciado em Filosofia
pela Universidade Metodista de Satildeo
Paulo
E-mail odilonmoreira13hotmailcom
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1 UM LIVRO ATEMPORAL
O presente artigo eacute escrito durante um periacuteodo turbulento certamente ineacutedito para
muitos de noacutes embora natildeo seja o primeiro evento da espeacutecie em nosso planeta A
pandemia da COVID (Corona virus Disease) -19 tal como outras doenccedilas no passado
(peste negra gripe espanhola etc) ainda estaacute causando milhares de mortes no mundo
todo forccedilando medidas eneacutergicas de isolamento social levando muitos ao desemprego agrave
falecircncia e agrave desesperanccedila
Neste cenaacuterio alguns ousam perguntar onde estaacute Deus Por que Deus esconde sua
face nesse momento Jaacute outros enxergam o sinal do fim dos tempos a puniccedilatildeo divina
decorrente dos pecados humanos E haacute ainda quem reforce a sua descrenccedila se Deus
existisse mesmo nada disso poderia ocorrer Enfim num momento tatildeo difiacutecil a
desesperanccedila a raiva e a incerteza encontram terreno feacutertil para disseminaccedilatildeo As
muacuteltiplas vozes se chocam e a feacute arrefece
Na verdade tais anguacutestias vecircm de certas concepccedilotildees que as pessoas tecircm de Deus
as quais por sinal estatildeo profundamente entrelaccediladas com pensamentos juriacutedicos A ideia
do castigo vem do tirociacutenio que invoca a justiccedila retributiva divina Jaacute o pensar que Deus
natildeo poderia permitir tais cataacutestrofes parece traduzir uma espeacutecie de obrigaccedilatildeo do Senhor
para com a humanidade E se existisse mesmo tal obrigaccedilatildeo quem poderia levar Deus ao
tribunal para que fosse compelido a cumprir esse contrato
O problema parece insoluacutevel pois quer se trate da puniccedilatildeo quer de um contrato
descumprido ningueacutem poderia confrontar o Criador em juiacutezo Ou poderia O desespero eacute
atual no entanto a histoacuteria eacute antiga Haacute milhares de anos foi retratada no Livro de Joacute A
autoria desse livro que compotildee o Antigo Testamento da Biacuteblia eacute desconhecida e existem
muitas duacutevidas sobre possiacuteveis trechos inseridos ou modificados a posteriori Imaginaria o
seu autor (ou sua autora2) que sua obra continuaria atual e sendo objeto de estudos e
reflexotildees mais de dois mil anos depois
Natildeo natildeo eacute por acaso que Jorge Luis Borges (BORGES 2009 p 156) considerava
o Livro de Joacute um dos mais impressionantes da Biacuteblia nem que Freud o tenha situado
como a mais alta das literaturas humanas (apud BORGES 1965) Natildeo eacute coincidecircncia que
o Livro de Joacute seja considerado ldquoo mais saacutebio da Biacuteblia Hebraicardquo (BLOOM 2005 p 15)
e tenha sido recontado tantas vezes como nas versotildees de HG Wells (apud BORGES
1965) e Fabrice Hadjadj bem como objeto de longos estudos a exemplo daqueles de Carl
2 A hipoacutetese de que o texto javista da Biacuteblia Hebraica poderia ter sido escrito por uma mulher hitita eacute
aventada por Harold Bloom (BLOOM 2005 p 27)
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
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BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
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BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
Revisatildeo de Marta Miranda OrsquoShea Rio de Janeiro Objetiva 2005
BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
de 2020
BORGES Jorge Luis Sete conversas com Fernando Sorrentino Organizador
Fernando Sorrentino Traduccedilatildeo de Ana Flores Rio de Janeiro Beco do Azougue
2009
CARBAJOSA Ignacio Joacute potildee Deus no banco dos reacuteus Sobre o sofrimento inocente
In httparquivorevistapassoscombrdefaultaspid=344ampid_n=5530amppagina=1
acesso em 14052020
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
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Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
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Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
21
Revista Cientiacutefica Gamaliel - ISSN 2674-9149ndash FATEJ FADISA | Vol1 | Nordm 3 | julho dezembro ndash Ano 2020 |
Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
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A oferta paciacutefica ou de comunhatildeo traz a ideia de comunhatildeo existente entre Deus
e os homens Na ocasiatildeo dessa oferenda o peito e a coxa deveriam ser dados para o
sustento dos sacerdotes e levitas Enquanto que na oferta de holocausto quase tudo era
queimado na oferta paciacutefica somente as gorduras eram oferecidas sobre o altar e o
restante das partes do animal era divido entre os sacerdotes e o ofertante Nessas refeiccedilotildees
comunais o ofertante juntamente com os sacerdotes fazia um banquete jubiloso porque
criam que Deus tambeacutem estava presente Nessa oferta de comunhatildeo estava selada a paz
entre Deus e o ofertante
Basta uma anaacutelise das figuras que estavam envolvidas nessa oferta para
verificarmos claramente a tipologia nela impliacutecita A paz era selada pois havia a presenccedila
de Deus do sacerdote (mediador) e do ofertante Isso nos remete a mediaccedilatildeo do sumo
sacerdote celestial que atraveacutes de sua oferta sacrificial derrubou a parede de inimizades
existente entre Deus e os homens proporcionando-nos a paz
4 AS OFERTAS COMPULSOacuteRIAS
As ofertas compulsoacuterias eram ofertadas para expiar o pecado e a culpa do
transgressor e oferececirc-las natildeo dependia da sua vontade Caso natildeo quisesse sofrer as
consequecircncias do juiacutezo divino por suas transgressotildees ofertas pelo pecado deveriam ser
oferecidas pelo transgressor Essas ofertas estatildeo regulamentadas nos capiacutetulos 4 a 7 de
Leviacutetico onde as encontramos divididas basicamente em trecircs grupos oferta por
ignoracircncia oferta pelo pecado e oferta pela culpa
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Certa complexidade haacute em diferenciar de forma simples uma oferta da outra mas
de uma forma sintetizada podemos diferenciaacute-las conforme a proacutepria classificaccedilatildeo
mosaica Os textos biacuteblicos natildeo nos fornecem de forma satisfatoacuteria elementos para que
possamos fazer uma diferenciaccedilatildeo precisa de uma oferta para outra
41 - Ofertas pelos pecados cometidos por ignoracircncia
O termo ignoracircncia (hb segaga) natildeo pode ser confundido com desconhecimento
da lei mosaica Os pecados a serem expiados por esse tipo de oferta eram aqueles que o
transgressor cometia de forma natildeo intencional (Lv 42) A ldquointenccedilatildeordquo aqui deve ser
entendida como ldquode forma natildeo desafiadorardquo isto eacute contrariando as leis divinas de modo a
desprezar a Deus e sua palavra Para esses natildeo havia expiaccedilatildeo
Os pecados cometidos por ignoracircncia estavam classificados no rol daqueles que o
transgressor cometia inadvertidamente ou inconscientemente como por exemplo tocar em
restos mortais sem que disso tivesse conhecimento Tambeacutem se enquadra aqueles
cometidos por conta da natureza caiacuteda do homem e sua consequente inclinaccedilatildeo para o
pecado Independente se o pecado havia sido cometido inconscientemente ou por conta da
inclinaccedilatildeo pecaminosa o homem tornar-se-ia culpado diante do Deus Santo necessitando
assim da expiaccedilatildeo do seu pecado
A expiaccedilatildeo para essa classe de pecados deveria obedecer a alguns criteacuterios
estabelecidos Sacerdotes priacutencipes a comunidade em geral e o indiviacuteduo em particular
deveriam oferecer sacrifiacutecios Para cada um desses grupos um animal especifico deveria
ser ofertado
42 - Oferta pela culpa ou restituiccedilatildeo
Esse tipo de oferta pela culpa (hb asham) era realizada nas ocasiotildees em que a
transgressatildeo fosse cometida em relaccedilatildeo ao proacuteximo Nesse caso deveria haver entatildeo uma
restituiccedilatildeo do ofensor para o ofendido Por envolver questotildees monetaacuterias como forma de
reparaccedilatildeo essa oferta tambeacutem era conhecida como oferta de restituiccedilatildeo
Logicamente por ser o homem a imagem e semelhanccedila de Deus qualquer
transgressatildeo cometida contra aquele ofendia Este Assim antes mesmo de tentar reatar o
seu relacionamento com Deus o pecador deveria estabelecer a comunhatildeo perdida com o
ofendido Se natildeo houvesse expiaccedilatildeo a culpa permaneceria e o juiacutezo divino certamente
recairia sobre o ofensor
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43 - Oferta pelo pecado ou de purificaccedilatildeo
Haacute entre os eruditos certa dificuldade para entender a que tipo de pecado essa
oferta faz referecircncia A ligaccedilatildeo dos dois substantivos (ldquooferta pelo pecadordquo) sugerem eles
parece indicar que os pecadores deveriam lidar com seus pecados mediante a oferta de
sacrifiacutecios Ao pecar necessariamente o transgressor deveria associar a ideia dual de
ldquopecado necessita de ofertardquo
Outra ideia impliacutecita na oferta pelo pecado (hb hattarsquot) eacute a de purificaccedilatildeo O
pecado -atraveacutes do pecador - contaminava o ambiente sagrado tornando-o improacuteprio para
a presenccedila de Deus Por esse motivo o sangue dessa oferta era aspergido sobre os altares
o propiciatoacuterio e dentro do Santo dos Santos A purificaccedilatildeo mediante o sangue era
necessaacuteria para a manifestaccedilatildeo da presenccedila divina Esse ato de purgar deu tambeacutem a essa
oferta o nome de ldquooferta de purificaccedilatildeordquo
Temos dois fatores de suma importacircncia no processo de salvaccedilatildeo expiaccedilatildeo e
purificaccedilatildeo Sem a expiaccedilatildeo o homem permanece separado de Deus e sem a purificaccedilatildeo eacute
impedido de receber sua presenccedila Esse duplo processo soacute poderia ser realizado mediante o
derramamento de sangue inocente e com a indispensaacutevel presenccedila do sacerdote mediador
44 - Aplicaccedilatildeo tipoloacutegica das ofertas
Para todas essas ofertas volitivas e compulsoacuterias a qualidade era imprescindiacutevel
A expiaccedilatildeo pelo sangue era o elemento comum que as unificava Desde um touro oferecido
pelo sacerdote em favor de seus proacuteprios pecados ateacute um pombo ofertado pelos mais
pobres eram recebidos por Deus como sacrifiacutecio substitutivo com o poder de expiar e
purificar ainda que de forma provisoacuteria
O estudo da lei mosaica nos leva a concluir que havia a possibilidade de oferendas
e sacrifiacutecios expiatoacuterios para todos os pecados com exceccedilatildeo daqueles cometidos de forma
que desafiassem a Deus e a sua palavra Esse tipo de pecado era fruto de um coraccedilatildeo
impenitente que desobedecia propositalmente aos mandamentos divinos O Novo
Testamento demonstra de forma inequiacutevoca que o sacrifiacutecio de Cristo tem suficiecircncia para
perdatildeo de todos os pecados no tempo e no espaccedilo A uacutenica exceccedilatildeo feita a essa regra eacute a
blasfecircmia contra o Santo Espiacuterito (Mt 1232 Lc 1210)
Todas essas variedades de ofertas e as mais diversas classes de animais bem
como os rituais diaacuterios tinham a intenccedilatildeo de revelar a necessidade do Messias que com
um uacutenico sacrifiacutecio expiatoacuterio anularia os efeitos do pecado sobre os homens que nele
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cressem Jesus na cruz fez a oferta de si mesmo a Deus uma uacutenica vez e com a eficaacutecia
eterna para perdatildeo de todas as variedades de pecados que a lei classificava mas natildeo dava a
soluccedilatildeo definitiva
O sangue de bovinos caprinos ovinos e aves eram apenas uma paacutelida sombra que
apenas cobria os pecados conscientes ou inconscientes voluntaacuterios ou involuntaacuterios Por
sua ineficaacutecia a expiaccedilatildeo limitava-se a indiviacuteduos ou grupos de indiviacuteduos e seu alcance
era temporal pois tinha eficaacutecia somente em um periacuteodo especifico O sangue de Cristo
entretanto como nos atesta o Novo Testamento atua de forma ilimitada sendo tambeacutem
atemporal (Hb 913-15 104)
A nossa limitaccedilatildeo nos permite apenas olhar o sacrifiacutecio vicaacuterio do Cristo de forma
progressiva na revelaccedilatildeo biacuteblica mas com o Eterno tal natildeo se sucede visto ter Ele os
atributos incomunicaacuteveis da onisciecircncia e presciecircncia (At 223 1Pe 12) Portanto ao
perdoar as transgressotildees com base no sangue de animais na verdade Ele via
antecipadamente o sacrifiacutecio de Cristo sendo realizado
O homem olha a revelaccedilatildeo progressiva da salvaccedilatildeo poreacutem o Deus Eterno a vecirc na
totalidade A cruz na perspectiva divina sempre esteve no Velho Testamento pois ela
considerando uma progressatildeo histoacuterica eacute antes dele O Messias ainda que de forma
velada sempre esteve laacute como nos atestam as seguintes passagens biblicas 2Tmt 11 2T
19 Ap 178 Pv 823-31 Mt 2534 Jo 1724 At 1518 Rm 1625 1Pe 120-23 Ap 138
5 OS SACERDOTES E O SUMO SACERDOTE
51 - A mediaccedilatildeo
As ofertas cuja funccedilatildeo era expiar o pecado conforme jaacute vimos tipificavam o
sacrifiacutecio perfeito e final do Messias Eram apenas sombras indicativas de algo superior
que foi revelado atraveacutes de Jesus e sistematizado nos vinte e nove livros que compotildee o
Novo Testamento (Hb 85 99 23-24 101 Cl 217)
Essas ofertas soacute poderiam ser aceitas por Deus caso houvesse um mediador que as
oferecesse Nesse cenaacuterio entra a figura do sacerdote e do sumo sacerdote que tipificavam
o sacerdoacutecio eterno do Messias Muitos satildeo os detalhes que vinculam o sacerdoacutecio terreno
com a obra mediadora do Messias Visto que nosso espaccedilo eacute limitado pela natureza desse
artigo faremos apenas algumas correspondecircncias entre o sacerdoacutecio humano e o
sacerdoacutecio celestial de Cristo
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52 - A unccedilatildeo e a pureza
O capiacutetulo oito de Leviacutetico descreve a consagraccedilatildeo de Aratildeo como sumo sacerdote
e de seus filhos como sacerdotes O oacuteleo da unccedilatildeo - siacutembolo do Espiacuterito Santo - foi
derramado sobre ele - tipo de Jesus - para exercer sua funccedilatildeo em favor dos fracos e
ignorantes (Hb 51-10) O Velho e o Novo Testamento apresentam Jesus como o ungido de
Deus sobre o qual foi derramado o Espiacuterito Santo para libertar os cativos do pecado
Somente eles poderiam fazer mediaccedilatildeo pelo povo da mesma forma que natildeo haacute
outro mediador entre Deus e os homens a natildeo ser Jesus (At 412 1 Tm 25 Hb 725 86
915 1224) Conforme nos atestam alguns versos biacuteblicos qualquer pessoa que tentasse
usurpar a funccedilatildeo sacerdotal receberia a pena capital (Nm 310 38 1640 185-7) Assim
tipologicamente falando excluindo-se a pessoa de Jesus qualquer outro mediador diante
de Deus estaacute morto
O sacerdote deveria antes de oferecer qualquer sacrifiacutecio banhar-se na bacia de
bronze localizada no aacutetrio do tabernaacuteculo (Lv 86) Esse ritual continha a ideia de
purificaccedilatildeo pois o sacerdote que oferecesse o sacrifiacutecio deveria estar puro diante de Deus
Qualquer oficiante do tabernaacuteculo que natildeo se lavasse ou natildeo fizesse os cerimoniais
prescritos na lei deveria seria morto (Ecircx 3018-21)
Esse simbolismo eacute perfeito quando comparado a situaccedilatildeo do pecador diante do
Deus Santo Qualquer transgressor que Dele se aproximar sem estar puro receberaacute o
salaacuterio do pecado isto eacute a morte eterna
53 - As vestimentas sacerdotais e os rituais de purificaccedilatildeo
Associada com a ideia de santidade havia uma lacircmina de ouro posta no turbante
do sumo sacerdote com a inscriccedilatildeo ldquoSantidade ao Senhorrdquo (Ecircx 2836 Lv 89) Essa lacircmina
representava o elevado grau de santidade que o sumo sacerdote deveria ter por se
apresentar diante de Deus para expiar os pecados do povo Outra peccedila que compunha o
vestuaacuterio da classe sacerdotal era a estola feita de linho fino branco indicativo na Biacuteblia de
pureza e santidade (Ecircx 2839 87)
Toda o ritual de purificaccedilatildeo e as vestimentas apontavam para a santidade do
sacerdote que por sua vez tipificava a santidade do sumo sacerdote celestial que em tudo
foi tentado poreacutem sem pecado (Hb 726 Is 539 Jo 846 2Co 521 1Pe 222 1 Jo 35)
No ritual de purificaccedilatildeo dos contaminados por lepra e liacutequidos corporais descrito
nos capiacutetulos 11 a 15 de Leviacutetico o sacerdote figurava como a personagem principal pois
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sem ele o processo de purificaccedilatildeo natildeo poderia ser finalizado Vemos entatildeo uma dupla
funccedilatildeo sacerdotal o que mediava e o que purificava Na pessoa de Jesus cumpriu-se esse
duplo tipo sacerdotal pois o Novo Testamento atribui a ele a funccedilatildeo de mediador e
purificador
Qualquer judeu por mais simples que fosse entenderia a mensagem espiritual
profunda que havia no ritual de purificaccedilatildeo e nas roupas sacerdotais E qual seria essa
mensagem A resposta simples eacute antes mesmo de se aproximar de um Deus Santo com
sacrifiacutecio havia a necessidade imperiosa de purificar-se Primeiro se purifica Depois a
Ele oferece-se sacrifiacutecios de adoraccedilatildeo Purificaccedilatildeo e sacrifiacutecios estatildeo intimamente
interligados conforme jaacute vimos nas ofertas compulsoacuterias E tudo isso soacute seria possiacutevel com
a figura do mediador
Todo o vestuaacuterio do sumo sacerdote tipificava o Messias e seu oficio sacerdotal
Natildeo sendo possiacutevel nesse artigo analisar as minuacutecias de cada uma das peccedilas falaremos
delas de forma geneacuterica Basicamente o eacutefode e o cinto do sumo sacerdote possuiacuteam
quatro cores que apareciam tambeacutem na primeira cortina que cobria o tabernaacuteculo no veacuteu
que separava o lugar santo do santiacutessimo e na cortina de entrada do aacutetrio do tabernaacuteculo O
azul carmesim puacuterpura e branco tipificavam alguns atributos do Messias O azul sua
origem celestial a puacuterpura apontava para sua realeza o branco fala de sua absoluta
pureza e o vermelho do seu sacrifiacutecio expiatoacuterio Somente o Messias Jesus Cristo
apresentou as quatro caracteriacutesticas aceitaacuteveis a Deus Rei que veio do ceacuteu cujo sangue foi
derramado e sobre Ele natildeo pode ser imputado pecado algum
Sobre o eacutefode ficava o peitoral do juiacutezo contendo doze pedras preciosas e em
cada uma delas estava gravada o nome das doze tribos de Israel Essas pedras conforme
determinaccedilatildeo biacuteblica deveriam estar sobre o coraccedilatildeo do sumo sacerdote quando este
oficiasse no tabernaacuteculo Ele tambeacutem carregava sobre os ombros uma pedra preciosa de
cada lado Na primeira eram gravados os nomes de seis tribos de Israel na outra mais seis
tribos Assim o representante dos homens carregava simbolicamente no coraccedilatildeo e nos
ombros toda a naccedilatildeo dos filhos de Israel diante de Deus estando assim toda ela
representada pelas quatorze pedras Assim o sumo sacerdote intercedia por toda a naccedilatildeo
continuamente
Poucos discordariam que a igreja de Cristo assumiu o papel de Israel ainda que
saibamos que esse fato natildeo invalida as promessas de Deus feitas a esse povo Apaziguada
essa questatildeo podemos entatildeo verificar a tipicidade desse peitoral no tocante a figura do
Messias O sumo sacerdote humano carregava sobre o coraccedilatildeo e ombros a naccedilatildeo de
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Israel ao passo que o Messias carrega sobre o coraccedilatildeo e ombros a igreja composta de
pessoas de todas as naccedilotildees (Jo 315 Mt 913 1Tt 115-16 Ap 59 Ap 1211 Hb 1312
1Pe 119)
Esse peitoral dobrado formava uma bolsa que continha duas pedras conhecidas
como Urim e Tumim com as quais se consultavam a vontade de Deus Sacerdotes
profetas Urim e Tumim eram necessaacuterios enquanto o Messias natildeo havia sido revelado
Poreacutem o Messias jaacute veio como a revelaccedilatildeo final de Deus para o homem (Hb 11-
2) Ele eacute a uacutenica verdade e portanto nosso uacutenico guia espiritual (Jo 146) Tal qual o sumo
sacerdote guiava o povo mediante o Urim e Tumim Ele sem fazer uso de qualquer pedra
nos guia mediante o Espirito Santo e as Escrituras sagradas rumo ao ceacuteu (Jo 1426 1613
1Co 210-13 Ef 47-15 1 Jo 220 1 Jo 227)
Mediante essas duas pedras consultava-se a Deus e por elas vinha a resposta
Hoje eacute por intermeacutedio do Cristo revelado nas Escrituras que obtemos a maioria das
respostas para nossas indagaccedilotildees
54 - O Yom Kippur
Ao falarmos das ofertas volitivas e compulsoacuterias alguns paraacutegrafos devem ser
dedicados ao ritual do Yom Kippur cujo cerimonial representava o perdatildeo anual dos
pecados dos filhos de Israel
O Yom Kippur ou Dia do perdatildeo eacute considerado um dos dias mais sagrados do
calendaacuterio judaico Era nesse dia que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para
purificar o tabernaacuteculo e oferecer o sacrifiacutecio anual por toda a naccedilatildeo (Lv 166 16 18-19
24) Era um dia de jejum e nenhum trabalho servil deveria ser realizado Era nesse
grandioso dia que o bode expiatoacuterio Azazel tinha de ser enviado ao deserto para longe do
arraial ou das portas de Jerusaleacutem Ele carregava sobre si os pecados de toda a naccedilatildeo e
acabava simbolicamente morrendo por ela Isso por si soacute jaacute configura uma bela
tipologia o cordeiro de Deus sofreu e morreu fora das portas de Jerusaleacutem carregando
sobre si os pecados da humanidade (Mt 1520-24 Jo 1917-18 At 758 Hb 1312)
Ao entrar no Santiacutessimo o sumo sacerdote enchia-o de fumaccedila de incenso para
que a nuvem perfumada ocultasse de seus olhos o propiciatoacuterio local esse considerado
como sendo ldquoo trono de Deusrdquo Ao entrar nesse recinto sagrado o sumo sacerdote deveria
ter em matildeos o sangue para expiar os pecados de toda a naccedilatildeo Fontes extrabiacuteblicas nos
informam sobre o alto grau de relevacircncia desse dia pois era nele que se promulgava certo
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decreto divino sobre quem iraacute viver e quem iraacute morrer quem estaraacute sereno e quem seraacute
perturbado quem seraacute pobre e quem seraacute rico quem seraacute exaltado e quem seraacute humilhado
(KOLATCH p239)
Para estabelecer a rica tipologia encontrada nos ritos desse tatildeo importante dia
basta-nos consultar alguns versos do livro de hebreus que revelam o ofiacutecio sacerdotal de
Cristo (Hb 91-26 217 31 415 55-6 71 11-27 81)
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
A tipologia por ser essencialmente biacuteblica natildeo pode ser desprezada sendo que os
extremos na sua utilizaccedilatildeo devem ser evitados atraveacutes de esforccedilos para encontrar-se uma
posiccedilatildeo moderada Ao nos apossarmos dessa ideia perceberemos o quatildeo proveitoso seraacute o
nosso conhecimento dos ldquotiposrdquo biacuteblicos para a robustez da nossa teologia
A anaacutelise das ofertas volitivas e compulsoacuterias demostram essa verdade na medida
em que as conhecemos de forma mais profunda A partir disso vemos natildeo mais um
emaranhado de ordenanccedilas cerimoniais destituiacutedas de sentido mas profundas liccedilotildees
espirituais acerca da figura central da Biacuteblia Jesus Cristo
Ainda que geraccedilatildeo apoacutes geraccedilatildeo os filhos de Israel matavam os inocentes animais
atraveacutes de sacrifiacutecios e natildeo tinham a plena consciecircncia da magnitude do seu simbolismo
todavia pela feacute sabiam que seus pecados haviam sido expiados As ofertas o sofrimento e
morte dos animais o sangue derramado e a mediaccedilatildeo dos sacerdotes propiciavam um
cenaacuterio pedagoacutegico riquiacutessimo mediante a qual todos aprendiam acerca do plano divino da
redenccedilatildeo Negar isso eacute negar a proacutepria Escritura
Os escritores do Novo Testamento empreenderam grandes esforccedilos para elaborar
suas doutrinas com base no entendimento que tinham do Velho Testamento pois era esse
que testificava acerca do Messias Ele mesmo nos seus ensinamentos citou por diversas
vezes as Escrituras veterotestamentaacuterias Era o antiacutetipo em carne e osso explicando aos
disciacutepulos toda a tipologia que Nele encontrava a plena realizaccedilatildeo Assim quando os
escritores neotestamentaacuterios analisavam as ofertas volitivas e compulsoacuterias encontravam
nelas revelado o Messias de Israel
As ldquosombrasrdquo tiveram o seu valor ateacute a chegada da realidade isto eacute Cristo Ele eacute
a revelaccedilatildeo final de Deus pois posteriormente ao brado ldquoestaacute consumadordquo o veacuteu foi
rasgado e o acesso pleno a Deus liberado As ofertas volitivas e compulsoacuterias natildeo satildeo mais
necessaacuterias pois aquele para quem elas apontavam as substituiu satisfez a justiccedila divina e
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reconciliou o homem com Deus Cabe-nos empreendermos esforccedilos com a finalidade uacutenica
de conhecer mais detalhadamente as ofertas volitivas e compulsoacuterias E assim ter uma
percepccedilatildeo mais niacutetida de que o mesmo Deus que instituiu os ldquotiposrdquo eacute o mesmo que os
tornou realidade na pessoa do Messias Jesus Cristo
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
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1ordf ed Satildeo Paulo Imago 1983
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KOLATCH Alfred J Livro Judaico dos porquecircs Satildeo Paulo Sefer 2007
KOLUTCH Alfred J 2ordm Livro Judaico dos Porquecircs 2ordf ed Satildeo Paulo Secircfer 2003
MOREIRA Odilon S Comentaacuterio de Leviacutetico Versiacuteculo por Versiacuteculo 2ordf ed Satildeo
Paulo Querigma 2020
ZUCK Roy B A interpretaccedilatildeo biacuteblica meios de descobrir a Verdade da Biacuteblia
Satildeo Paulo Vida Nova 1994
Autor ndash Bacharel em Teologia
Prof Odilon Soares Moreira
Bacharel em Teologia pela Faculdade
Beth Shalom e licenciado em Filosofia
pela Universidade Metodista de Satildeo
Paulo
E-mail odilonmoreira13hotmailcom
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Gustav Jung e de Reneacute Girard A histoacuteria de Joacute tambeacutem ecoa na seacutetima arte como em A
aacutervore da vida de Terrence Malick (apud CARBAJOSA 2017) e tambeacutem na chamada
nona arte como na graphic novel ldquoO contrato com Deusrdquo de Will Eisner (EISNER 2019
p 21-79)
Enfim ateacute por abordar o eterno problema do sofrimento humano trata-se de obra
atemporal cujo reexame no momento atual eacute mais do que propiacutecio inclusive com um
olhar detalhado sobre suas possiacuteveis liccedilotildees especialmente acerca de um valor tatildeo caro
tanto para a Teologia quanto para o Direito qual seja a Justiccedila O grito de Joacute ainda se
prolonga eacute o grito de Jesus na cruz eacute o grito dos pobres e desamparados e eacute o grito de
todos noacutes em nossos momentos de maior fragilidade Eacute dele que vem o nosso clamor por
justiccedila e restauraccedilatildeo
2 O PROMOTOR ACUSADOR DE JOacute E O ENTRELACcedilAMENTO DAS IDEIAS
DE RETRIBUICcedilAtildeO E CONTRATO
A histoacuteria de Joacute pode ser vista por muacuteltiplos olhares desde o seu enigmaacutetico
comeccedilo De fato o proacutelogo conteacutem amplo material para se discutir a teodiceia ou mais
exatamente como se justificar que um Deus infinitamente bom permita o mal E tudo
parece se complicar quando num determinado dia em que os Filhos de Deus se apresentam
a Iaweh entre eles veio tambeacutem Satatilde (Joacute 16)
De acordo com o senso comum Satanaacutes eacute o anjo caiacutedo inimigo da humanidade
Todavia conforme observa Ari Marcelo Solon ldquono Livro de Joacute Satanaacutes deve ser
entendido no sentido hebraico de lsquoacusadorrsquo um servo obediente de Deus e natildeo
necessariamente maurdquo (SOLON 2009 p 2)
Neste diapasatildeo podemos olhar o Livro de Joacute sob uma perspectiva de um drama de
tribunal sendo que o iniacutecio da acusaccedilatildeo eacute feito por Satanaacutes uma espeacutecie de promotor que
atua perante o Juiacutezo de Deus Mas qual seria o teor desta accedilatildeo penal satacircnica Eacute a
falsidade da feacute de Joacute Satatilde potildee em duacutevida a feacute de Joacute dizendo num primeiro momento que
ele apenas se comporta como um servo obediente em razatildeo de seus muitos bens Se
perdesse seus bens de acordo com o acusador Joacute lanccedilaria maldiccedilotildees contra Deus (Joacute 1 9-
11)
E o que faz Iahweh Recebe a acusaccedilatildeo e deixa tudo o que pertence a Joacute em poder
de Satanaacutes (Joacute 1 12) Inicia-se pois a celeuma Um mal seraacute praticado contra Joacute e nem se
poderaacute aqui falar-se ldquoapesar de Deusrdquo Natildeo o texto biacuteblico eacute categoacuterico ao estabelecer que
todo o mal seraacute praticado por autorizaccedilatildeo expressa de Iahweh Como Por quecirc Como
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pode um Deus bom autorizar expressamente que o mal seja praticado contra um homem
justo Seria uma aplicaccedilatildeo do ditado popular ldquoaqui se faz aqui se pagardquo Mas o que Joacute
fez
Natildeo obstante natildeo haja respostas a tais perguntas no Livro importa por ora observar
que a feacute de Joacute natildeo falhou embora trageacutedias o tenham tirado seus bens e tambeacutem os seus
filhos Eis a resposta de Joacute
ldquoNu saiacute do ventre de minha matildee
e nu voltarei para laacute
Iaweh o deu Iaweh o tirou
bendito seja o nome de Iawehrdquo3
Joacute perseverou em sua feacute Eacute evidente que se abalou ateacute pela informaccedilatildeo de que
rapou a cabeccedila e caiu por terra inclinando-se no chatildeo (Joacute 1 20)4 poreacutem sua feacute se
mostrou verdadeira Ou natildeo O promotor Satanaacutes ainda duvida e adita a acusaccedilatildeo se a
carne fosse ferida se a sua vida e sauacutede estivessem em jogo Joacute revelaria a sua verdadeira
face e amaldiccediloaria Deus (Joacute 2 4-5) E Deus uma vez mais autoriza o acusador
proibindo-lhe apenas de tirar a vida de Joacute (Joacute 2 6)
Esta eacute a autorizaccedilatildeo final a Satanaacutes que jaacute sai de cena no segundo capiacutetulo do
Livro de Joacute Contudo ao contraacuterio do que alguns possam pensar o Acusador falhou
novamente em seu intento De fato Joacute manteve sua feacute apesar das chagas em seu corpo
quando responde ao comentaacuterio de sua esposa que deveria amaldiccediloar Iaweh ldquose
recebemos de Deus os bens natildeo deveriacuteamos receber tambeacutem os malesrdquo (Joacute 2 10)
Mas como A histoacuteria natildeo termina aiacute Se o acusador saiu de cena o que fez Joacute
comeccedilar a expressar a sua anguacutestia ou em outras palavras o que fez Joacute comeccedilar a perder
a sua paciecircncia
Eacute certo que na Biacuteblia o acusador fez sua uacuteltima apariccedilatildeo apoacutes lanccedilar a Joacute o
sofrimento em sua pele Contudo na versatildeo irreverente contada pelo filoacutesofo Fabrice
Hadjadj o Acusador depois disso ainda lanccedila matildeo de sua uacuteltima arma contra Joacute ldquoa uacutenica
matilha capaz de devorar seu coraccedilatildeordquo (HADJADJ 2017 p 20) Hadjadj estaacute se
referindo com uma boa dose de razatildeo aos amigos de Joacute
E com efeito na versatildeo biacuteblica Joacute somente comeccedila os seus lamentos apoacutes a
chegada de seus trecircs amigos Elifaz Baldad e Sofar
3 Joacute 1 21 4 De acordo com nota da Biacuteblia de Jerusaleacutem tais gestos significam expressatildeo de dor ou de lu to (Biacuteblia de
Jerusaleacutem 2011 p 804)
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Os diaacutelogos de Joacute com seus amigos constituem beliacutessimos exemplos de disputas
retoacutericas e reforccedilam a perspectiva desse livro biacuteblico como um drama de tribunal Em
grande esforccedilo de siacutentese os amigos que tambeacutem podem ser comparados pela mesma
oacutetica a assistentes da acusaccedilatildeo culpam Joacute por todos os males por ele sofridos De fato se
Joacute sofre eacute porque pecou contra Deus E Deus em sua infinita bondade e justiccedila estaacute
apenas castigando Joacute por seus pecados Em suma Elifaz Baldad e Sofar sustentam a
justiccedila retributiva
Eacute mais do que relevante notar que essa concepccedilatildeo de retribuiccedilatildeo complementa
perfeitamente a acusaccedilatildeo de Satanaacutes segundo a qual Joacute soacute tinha feacute porque tudo corria bem
com ele natildeo passava por dificuldades nem provaccedilotildees E a acusaccedilatildeo de Satanaacutes em
verdade seria totalmente procedente em relaccedilatildeo aos amigos de Joacute pois eles demonstram
acreditar nessa visatildeo contratualista da relaccedilatildeo com Deus Se Joacute natildeo tivesse realmente
pecado Deus nunca faria nada de mal com ele Ou dito de outro modo se a pessoa natildeo
peca Deus tem a obrigaccedilatildeo de natildeo deixar nada de mal ocorrer com ela Porque o mal sem
pecado tornaria Deus injusto e isto seria uma verdadeira blasfecircmia Nas palavras de
Baldad ldquoacaso Deus torce o direito ou Shaddai perverte a justiccedilardquo (Joacute 8 4)
Se natildeo pecarmos nada de mal nos aconteceraacute Desde quando foi elaborado esse
contrato com Deus O contrato foi celebrado por um representante da humanidade em
nome de todos ou cada um de noacutes o celebra individualmente
O renomado quadrinista William Erwin Eisner mais conhecido como Will Eisner
brindou-nos com uma das mais belas histoacuterias da nona arte intitulada ldquoUm contrato com
Deusrdquo (EISNER 2019) Neste conto moderno que ecoa o Livro de Joacute acompanhamos o
judeu Frimme Hersh que desde crianccedila embora oacuterfatildeo soacute praticava boas accedilotildees Numa
conversa com um rabino o menino lhe pergunta sobre a justiccedila de Deus e se Ele saberia se
Frimme se comportaria bem O rabino fala sobre a onisciecircncia de Deus e surge aiacute a ideia
do contrato entatildeo redigido numa pequena pedra (EISNER 2019 p 35-36) Fugindo da
perseguiccedilatildeo aos judeus de seu paiacutes Frimme Hersh vai para os Estados Unidos e ali cresce
tornando-se um respeitado membro da sinagoga Talvez por sua reconhecida bondade e
generosidade com todos uma menina receacutem-nascida foi abandonada na porta de Hersh E
Frimme Hersh a adotou e a criou com todo o seu amor batizando-a com o nome de sua
falecida matildee Rachele Hersh considerou sua filha uma daacutediva de Deus
Contudo passados os anos na flor da idade Rachele adoece e vem a falecer Neste
momento depois de enterrar sua filha numa noite tempestuosa Hersh explode em fuacuteria
ldquoNAtildeO Vocecirc natildeo pode fazer isso comigo noacutes temos um contrato VOCEcirc QUEBROU
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NOSSO CONTRATOrdquo () ldquoSe Deus exige que homens honrem seus acordos entatildeo
Deus tambeacutem natildeo tem essa obrigaccedilatildeordquo (EISNER 2019 pp 41-43)5
Seraacute mesmo que existe esse contrato Um contrato que garante que nada de ruim
aconteceraacute com pessoas boas Aparentemente a resposta era positiva para os amigos de Joacute
Tanto que buscavam imputar a Joacute a culpa pelas desgraccedilas que se abateram sobre ele
Portanto a loacutegica da justiccedila retributiva (castigo para quem peca) e contratual (Deus tem
obrigaccedilatildeo de proteger quem natildeo peca) estatildeo intrinsecamente ligadas E tal pensamento
perdura ateacute hoje como observa Luiz Alexandre Solano Rossi ldquoMais angustiante ainda eacute
reconhecer que mesmo hoje fazemos teologia com a mesma loacutegica dos amigos de Joacute
Trata-se portanto de uma loacutegica que temos muita dificuldade para quebrarrdquo (ROSSI
2017 p 31) Mesmo Carl Gustav Jung ao falar de ldquoquebra de juramentordquo aduzindo que
ldquonatildeo se pode contrapor um Deus arcaico agraves exigecircncias da eacutetica modernardquo parece sucumbir
agrave oacutetica contratualista (JUNG 2018 p 22)
Especificamente Rossi critica a chamada teologia da prosperidade tratando-a
como uma teologia da retribuiccedilatildeo poacutes-moderna (2017 p 65)
ldquoUma das possiacuteveis expressotildees da teologia da retribuiccedilatildeo em ambiente
eclesiaacutestico poacutes-moderno eacute a lsquoteologia da prosperidadersquo Essa teologia declara
que o plano de Deus para o ser humano eacute fazecirc-lo feliz abenccediloado saudaacutevel
proacutespero enfim uma pessoa de sucesso Mas onde estaria a complexidade dessa
afirmaccedilatildeo Sua complexidade reside justamente no fato de que para essa
teologia soacute natildeo eacute proacutespero financeiramente soacute natildeo eacute saudaacutevel e feliz nesta vida
quem carece de feacute natildeo cumpre o que a Biacuteblia diz a respeito das promessas
divinas e estaacute envolvido com o diabo ou seja quem estaacute em pecadordquo
Janaina Conceiccedilatildeo Paschoal (2018 p 183) comentando sobre crimes cometidos
por alguns liacutederes religiosos observa que ldquoos interesses econocircmicos tambeacutem passam mais
claramente a motivar os fieacuteisrdquo Nesse diapasatildeo Rossi observa que muitas teologias estatildeo
tratando os fieacuteis como clientes (2017 p 129)
Como se vecirc portanto embora a histoacuteria de Joacute sempre seja lida com criacuteticas aos
seus amigos podemos ver que a teologia deles retributiva e contratualista permanece
sendo praticada por muitos homens de feacute ateacute os dias de hoje
5 As belas e tristes cenas da fuacuteria de Frimme Hersh satildeo retratadas como um diaacutelogo entremeando -se os gritos
furiosos do enlutado pai com os terriacuteveis relacircmpagos da tempestade que assola a cidade neste momento Este
eacute apenas o comeccedilo da histoacuteria de Frimme Hersch que merece ser lida Natildeo diremos mais sobre ela anotando
apenas que esse diaacutelogo pode ser comparado com o de Joacute e Iaweh que aparece no seio de uma tempestade
(Joacute 38 1) De qualquer forma a dor eacute semelhan te agrave da matildee que perde um filho no filme ldquoA aacutervore da vidardquo
o qual conteacutem referecircncias expressas ao Livro de Joacute
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Mas Joacute natildeo se calou perante seus amigos Discutiu com eles agrave exaustatildeo Ele queria
mais do que provar o seu ponto natildeo desejava simplesmente amaldiccediloar a Deus O que
afinal queria Joacute Joacute ansiava sim algo profundamente encontrar Deus no tribunal
3 O DESEJO DE JOacute E A JUSTICcedilA RESTAURATIVA
A ideia de levar Deus ao tribunal parece absurda e fadada agrave derrota e Joacute sabe muito
bem disso Afinal ele se pergunta quem citaraacute Deus (Joacute 9 19) e sabe que entre mil
razotildees natildeo haveraacute uma para rebatecirc-lo (Joacute 9 3) Mas Joacute ainda assim insiste Por quecirc
Dentre as inuacutemeras respostas possiacuteveis falaremos sobre aquela que mais nos
parece proacutexima da verdade do livro E para isso faremos uma pequena digressatildeo
aproveitando-nos de um pouco de nossa experiecircncia com os tribunais Muitos pensam e
falam como se tratasse de um dogma que os juiacutezes sempre tecircm o dom de desagradar uma
das partes do processo aquela que perde De acordo com essa visatildeo na praacutetica o processo
eacute um jogo em que as partes soacute tecircm uma finalidade vencer Nem sempre isso eacute verdade eis
que natildeo raramente mesmo os vencedores se desagradam com os magistrados que lhe
deram ganho de causa ao passo que os perdedores podem se conformar e ateacute aderir agrave
pretensatildeo adversa Para muitos isso pode parecer um desatino poreacutem ainda que desafie a
loacutegica e o senso comum trata-se uma conclusatildeo vaacutelida que tem a ver com um conceito
diverso de justiccedila qual seja o de justiccedila restaurativa Talvez essa seja a melhor forma de
justiccedila superando ateacute mesmo a justiccedila distributiva pois essa tambeacutem natildeo perde seu
caraacuteter impositivo A justiccedila restaurativa eacute a mais simples e paradoxalmente a mais
complexa A mais faacutecil e a mais difiacutecil A mais simples de se entender e a mais impossiacutevel
de se acreditar Essa eacute a justiccedila do diaacutelogo em que todos falam e ouvem-se uns aos
outros
Joacute natildeo quer vencer Deus no tribunal Joacute quer simplesmente falar ldquoEntatildeo lhe falaria
e natildeo teria medo pois eu natildeo sou assim a meus olhosrdquo (Joacute 9 35) Joacute tambeacutem quer ouvir
ldquoDirei a Deus Natildeo me condenes explica-me o que tens contra mimrdquo (Joacute 10 2)
Joacute sabe que nenhuma razatildeo poderaacute derrotar o Criador Mesmo assim quer ser
ouvido por Ele e tambeacutem quer escutaacute-lo
O processo judicial pode ser encarado como um jogo poreacutem nem sempre eacute assim
Muitos reacuteus mesmo de processos criminais conformam-se com sua condenaccedilatildeo quando
percebem que foram efetivamente ouvidos e compreendidos no julgamento A pena entatildeo
eacute aceita pois o proacuteprio acusado compreendeu e aceitou a sua proacutepria responsabilidade O
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processo penal com sua estrutura adversarial eacute um ambiente pouco propiacutecio para a justiccedila
restaurativa embora talvez ateacute por obra do acaso algumas vezes ela ocorra nele E talvez
esse acaso possa ser provocado justamente quando o juiz natildeo condena o reacuteu mas sim lhe
explica o que tem contra ele6 Poder-se-ia objetar que isso seria mera questatildeo de
semacircntica todavia seraacute que em tantas situaccedilotildees o problema natildeo estaacute exatamente no que
se diz mas no como se diz
O encontro entre o autor da infraccedilatildeo e a viacutetima eacute uma das possiacuteveis formas pelas
quais se pratica a justiccedila restaurativa Este diaacutelogo para dar certo deve ser preparado
pelos facilitadores restaurativos7 No processo penal autor da infraccedilatildeo e viacutetima raramente
se encontram Ateacute porque o ofendido frequentemente pede para natildeo depor na frente do
reacuteu por fundado temor Eacute certo que amiuacutede o medo eacute justificaacutevel contudo o que se vecirc
no cotidiano forense eacute que ele eacute praticamente presumido automaticamente aprofundando
o trauma do crime de modo que natildeo se vislumbre mais qualquer possibilidade de perdatildeo
ou reconciliaccedilatildeo
Joacute disse que Shaddai8 lhe encheu de terror (Joacute 23 16) todavia deseja
ardorosamente o encontro
ldquoOxalaacute soubesse como encontraacute-lo
como chegar agrave sua morada
Exporia diante dela a minha causa
com minha boca cheia de argumentos
Gostaria de saber com que palavras iria responder-me
e ouvir o que teria para me dizer
Usaria ele de violecircncia ao pleitear comigo
Natildeo bastaria que me desse atenccedilatildeo
Ele reconheceria em seu adversaacuterio um homem reto
e eu triunfaria sobre meu juizrdquo (Joacute 23 3-7)
Joacute pretende expor seus argumentos diante de Deus ouvir o que Ele tem a dizer e
bastaria que Ele reconhecesse a sua retidatildeo para que Joacute se considerasse vitorioso Ora o
desejo de Joacute se coaduna com os preceitos da justiccedila restaurativa De fato como observa
Helena Zani Morgado ldquocomunicaccedilatildeo assertiva e escuta compassiva portanto satildeo verso e
anverso da moeda restaurativardquo (2018 p 158)
6 Eacute inusitado que um reacuteu parabenize o juiz que o condenou As vezes em que isso nos ocorreu podem ser
contadas nos dedos Poreacutem olhando agora para traacutes percebemos um lugar comum nesses casos Os acusados
se sentiram efetivamente ouvidos no processo Embora o julgamento lhes tenha sido adverso natildeo foram mal
compreendidos Sentiram eles que foram efetivamente ouvidos E souberam eles aceitar a su a
responsabilidade Uma rara poreacutem feliz combinaccedilatildeo que resultou de um processo penal 7 Entenda-se bem natildeo para se instigar um discurso artificial de arrependimento e perdatildeo mas sim para que
os envolvidos compreendam o processo especialmente no tocante agrave igualdade entre as partes e falem com
honestidade sobre seus sentimentos em relaccedilatildeo ao conflito Os facilitadores em regra satildeo voluntaacuterios que se
especializam em determinadas teacutecnicas restaurativas visando garantir um efetivo diaacutelogo entre as partes 8 Outro nome de Deus no Livro de Joacute
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Eacute preciso enfatizar que Joacute mais do que a reversatildeo dos seus infortuacutenios deseja o
reconhecimento de Deus exatamente como a viacutetima deseja ser reconhecida como pessoa
por seu ofensor Na justiccedila retributiva dos amigos de Joacute e do processo penal em geral
ofendidos e acusados satildeo instrumentalizados vale dizer satildeo apenas peccedilas de um jogo que
determinaraacute ou natildeo a aplicaccedilatildeo da pena A viacutetima eacute um instrumento para a condenaccedilatildeo
pois o Estado-Juiz natildeo se importa com o seu trauma Jaacute o acusado tambeacutem eacute um
instrumento na medida em que serve de exemplo para a prevenccedilatildeo geral de delitos
reforccedilando a crenccedila na vigecircncia da norma ou como diz expressamente Guumlnther Jakobs ldquoa
finalidade da culpabilidade eacute a estabilizaccedilatildeo da norma deacutebilrdquo (JAKOBS 2003 p 31)
Elifaz Baldad Sofar natildeo soacute instrumentalizam Joacute como o pecador que certamente
estaacute recebendo o merecido castigo como tambeacutem o proacuteprio Deus que passa a ter funccedilotildees
claras de puniccedilatildeo ou recompensa (ou ateacute pagamento na perspectiva contratualista)
independentemente de sua vontade Enfim Deus passa a ser uma ideia que justifica o
sofrimento do pobre (pecador) e o bem-estar do rico (justo) Posteriormente em reforccedilo a
essa concepccedilatildeo ainda surge Eliuacute que censura Joacute simplesmente por falar9 e se coloca em
posiccedilatildeo de superioridade pretendendo instrui- lo10
Eliuacute assim humilha Joacute colocando-o num patamar inferior em que sua liberdade
de expressatildeo e de sentimentos por si soacute jaacute eacute tida como uma ofensa Enfim mais uma
personagem que tenta desviar Joacute de seu encontro restaurativo com Deus tratando-o como
um insensato que multiplica palavras
Joacute natildeo responde a Eliuacute talvez ateacute porque demais humilhado por ele11 Ou entatildeo Joacute
simplesmente natildeo tenha tido tempo de responder a Eliuacute pois eacute nesse momento que surge a
tempestade e finalmente o desejo de Joacute eacute atendido
4 O ENCONTRO RESTAURATIVO DE JOacute E IAWEH
No seio da tempestade estaacute Iaweh que passa a responder a Joacute (Joacute 38 1) O que
seria o cliacutemax do livro de Joacute torna-se o anticliacutemax Se por um acaso se esperava o retorno
do Acusador e sua eventual derrota ou qualquer esclarecimento ou justificativa divina para
o ocorrido o que se tem eacute que o livro terminaraacute sem qualquer explicaccedilatildeo para os atos de
Satanaacutes ou de Deus nem qualquer alusatildeo agrave inocecircncia ou eventual culpabilidade de Joacute
9 ldquoJoacute abre a boca para o vazio e insensatamente multiplica palavrasrdquo (Joacute 35 16) 10 ldquoEspera um pouco que eu te instruireirdquo (Joacute 36 2) 11 Uma liccedilatildeo que serve para os encontros restaurativos com autores de crimes pois a justiccedila restaurativa deve
empoderar as pessoas contribuindo para o desenvolvimento comunitaacuterio e natildeo para censuraacute -los ou colocaacute-
los em posiccedilatildeo de inferioridade o que apenas contribui para o ressentimento
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Iahweh pergunta e desafia ldquoOnde estavas quando lancei os fundamentos da terra
Dize-mo se eacute que sabes tantordquo (Joacute 38 4) A ironia utilizada por Deus em seu desafio a
Joacute por um lado poderia chocar como de fato tem chocado inuacutemeros autores e inteacuterpretes
da Biacuteblia Contudo temos aqui de fato um encontro restaurativo em que Joacute e Iahweh
puderam de fato dizer tudo o que pensavam Com efeito um diaacutelogo restaurativo natildeo pode
ser mal-entendido como uma conversa artificial uma espeacutecie de teatro em que cada um
procura dizer exatamente aquilo que o outro quer ouvir mostrando um (falso)
arrependimento em busca de uma (falsa) reconciliaccedilatildeo ou (falso) perdatildeo Apenas quando
duas pessoas falam a verdade ainda que dolorosa eacute possiacutevel a construccedilatildeo da justiccedila
restaurativa Neste sentido a observaccedilatildeo de Elizabeth M Elliot citando Hal Pepinsky e a
sabedoria do povo navajo para o processo de conceituaccedilatildeo da justiccedila ldquoCompareccedila Preste
atenccedilatildeo Fale a verdade Natildeo fique preso a resultadosrdquo (2018 p 103)
Assim veja-se a formaccedilatildeo da justiccedila restaurativa no livro de Joacute 1) Deus
compareceu diante de Joacute 2) Apesar de Deus natildeo ter surgido antes o livro aponta
claramente que Ele prestou atenccedilatildeo em tudo o que Joacute dizia (Joacute 38 1-4) 3) Tanto Joacute
quanto Deus falam francamente e por fim 4) Natildeo existe um resultado certo que devemos
esperar vale dizer natildeo estamos diante de um contrato em que cada uma das partes tecircm
obrigaccedilotildees previamente estipuladas a serem cumpridas
Um diaacutelogo fluido e natural e natildeo riacutegido e artificial eacute o que propiciaraacute a justiccedila
restaurativa A rigidez e a artificialidade somente poderatildeo produzir uma ilusatildeo de justiccedila
O discurso de Iahweh eacute duro e nisso reside a Sua verdade ou pelo menos
franqueza A restauraccedilatildeo natildeo pode ser alcanccedilada sem que se diga aquilo que se sente
Deus assim quebra expectativas com o que alguns inteacuterpretes chegam ao ponto
de lhe acusar de ausecircncia de compaixatildeo (HABEL 2004 p 37) De fato quando
expectativas comportamentais satildeo quebradas a proacutepria acusaccedilatildeo tambeacutem se mostra
implacaacutevel e sem misericoacuterdia assemelhando-se ao que ocorre no julgamento criminal12
Contudo a restauraccedilatildeo natildeo ocorreraacute tentando-se mudar aquilo que a pessoa eacute para se
atender a determinados preacute-conceitos
12 Embora a moderna dogmaacutetica penal seja unacircnime na rejeiccedilatildeo do ldquodolo pela conduccedilatildeo de vidardquo concepccedilatildeo
de Mezger com repercussotildees no direito penal nazista (cf SOUZA 2019 p 285) estudos da criminologia
criacutetica demonstram que o direito penal amiuacutede as sume caraacuteter altamente seletivo o que explicaria um
encarceramento massivo de negros pobres pessoas com baixa instruccedilatildeo etc Natildeo eacute funccedilatildeo deste trabalho
investigar os fatores que levam a isso mas fica aqui rapidamente consignado que desde a lei penal eacute
possiacutevel constatar irracionalidades no sistema de justiccedila criminal Como jaacute tivemos oportunidade de
mencionar alhures basta ver a pena destinada ao crime de fraude em licitaccedilatildeo (art 90 da Lei 86661993)
ainda que milionaacuteria e a pena do crime de moeda falsa ainda que envolvendo uma uacutenica ceacutedula de cinquenta
reais (art 289 do Coacutedigo Penal) e fazer um breve exerciacutecio de imaginaccedilatildeo tentando traccedilar um perfil de quem
costumeiramente costuma praticar o primeiro e o segundo delito (AZEVEDO 2019 p 210)
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E Joacute compreendeu isso dizendo que havia chegado o seu momento de escutar (Joacute
40 4-5) Ao final Joacute menciona ldquoQuem eacute aquele que vela teus planos com propoacutesitos sem
sentidordquo (Joacute 42 3)
Interpretamos esse trecho da seguinte forma Joacute reconheceu o seu erro e
finalmente entendeu que natildeo existe contrato aliaacutes nunca existiu um contrato Mas
tambeacutem natildeo houve retribuiccedilatildeo E isso ficou subentendido nos discursos de Iahweh nos
quais em momento algum existe alusatildeo a alguma acusaccedilatildeo contra Joacute Joacute estava certo ao
se considerar inocente poreacutem equivocado ao se considerar imune a quaisquer mazelas
como se protegido por uma obrigaccedilatildeo de Deus
Natildeo foi outra a conclusatildeo de Luiz Felipe Pondeacute (2017 p 7)
ldquoO lsquoerrorsquo de Joacute (como o de todos noacutes) foi achar-se justo e portanto merecedor
de uma vida feliz Quando ele finalmente se entrega a Deus e a tudo que existe
agrave sua volta sem se perguntar por que ele sofre Joacute entende seu pecado a
idolatria de sua proacutepria virtuderdquo
Depois do reconhecimento do proacuteprio erro por Joacute abre-se entatildeo o caminho para a
restauraccedilatildeo E espancando quaisquer duacutevidas Deus se dirige aos amigos de Joacute e fala algo
surpreendente ldquoEstou indignado contra ti e teus dois companheiros porque natildeo falastes
corretamente de mim como o fez meu servo Joacuterdquo (Joacute 42 7) Eacute curioso porque ao longo
dos diaacutelogos aparentemente os amigos de Joacute colocavam-se como os advogados de Iahweh
contra as blasfecircmias de Joacute Contudo como visto na verdade isto era apenas a ilusatildeo de
uma suposta justiccedila retributiva que puniria somente os pecadores de modo que quanto
aos natildeo pecadores evidentemente nada de mal ocorreria o que traduzia a ideia de
contrato com Deus A instrumentalizaccedilatildeo de Deus para permitir tais concepccedilotildees
definitivamente natildeo agradou Iahweh que natildeo soacute os desautorizou como ainda por cima
elogiou a fala sincera de Joacute Mesmo errado Joacute acertou mais que seus amigos ao afastar a
retribuiccedilatildeo divina como causa de suas mazelas O comparecimento e o reconhecimento de
Deus representaram o triunfo de Joacute ldquoEu te conhecia soacute de ouvir mas agora meus olhos te
veemrdquo (Joacute 42 5)
Tudo isso contudo natildeo resolveu o misteacuterio Muito tempo depois a duacutevida
novamente surgiu na boca dos disciacutepulos de Jesus e ele novamente a afastou embora
tenha aprofundado o misteacuterio
ldquoAo passar ele viu um homem cego de nascenccedila Seus disciacutepulos lhe
perguntaram lsquoRabi quem pecou ele ou seus pais para que nascesse cego
Jesus respondeu lsquoNem ele nem seus pais pecaram mas eacute para que nele sejam
manifestadas as obras de Deusrdquo
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A melhor soluccedilatildeo para o misteacuterio parece vir de Tolstoacutei que nos lembra que desde
o iniacutecio de nossas vidas a sombra da morte nos espreita A morte eacute inexoraacutevel para todos
noacutes e todos os nossos bens desejos e interesses desapareceratildeo depois dela Por isso
Tolstoacutei natildeo vecirc sentido numa ldquovida vivida soacute para sirdquo A uacutenica vida racional com
verdadeiro significado seria a vida vivida para os outros Apenas essa vida natildeo pode ser
destruiacuteda pela morte (TOLSTOacuteI 2011 p 148) Essa uma liccedilatildeo ainda a ser aprendida
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
Como dito no iniacutecio o presente artigo estaacute sendo escrito durante uma pandemia
num momento de fragilidade de muitas pessoas tempo em que o choque de vozes
favorece o temor e a desesperanccedila Poreacutem aqui recordamos a histoacuteria de Joacute todos os seus
infortuacutenios e sofrimentos e ao final sua restauraccedilatildeo
A propoacutesito do final alguns autores o consideram escrito posteriormente por outro
autor um ldquoepiacutelogo ineptordquo (BLOOM 2005 p 27) ou proacuteprio de ldquoum grande sucesso de
bilheteria hollywoodianordquo (GIRARD 2014 p 163)13 Natildeo cremos nessa hipoacutetese14
poreacutem ainda que verdadeira natildeo eacute muito relevante Na verdade o final com a devida
vecircnia natildeo recebeu a devida interpretaccedilatildeo dos ilustres autores citados
De fato esse fim de Hollywood parece resultar do enfoque na restauraccedilatildeo15 dos
bens e de novos filhos para Joacute como se fosse isso o que realmente importasse Ou seja
novamente uma interpretaccedilatildeo que se apega ao contratualismo como o pagamento de uma
diacutevida em atraso por Deus Natildeo eacute este o melhor entendimento
A restauraccedilatildeo ocorre com o reconhecimento por Deus da retidatildeo de Joacute natildeo
obstante todos os males que se abateram sobre ele a respeito dos quais Iahweh tambeacutem
natildeo fornece qualquer explicaccedilatildeo Isso aliado ao comparecimento de Deus eacute o bastante
para o triunfo e reparaccedilatildeo de Joacute Enfim tudo isso eacute suficiente para a restauraccedilatildeo do seu
conflito com Deus Novos bens e novos filhos bem como provaacuteveis novos revezes
embora natildeo citados satildeo apenas meras consequecircncias da continuidade da vida
13 Natildeo obstante Reneacute Girard mesmo considerando que o epiacutelogo tenha sido adicionado reconhece nele uma
frase marcante na qual Deus falando aos amigos acrescenta que natildeo os castigaraacute ldquopor natildeo terdes falado
corretamente de mim como o fez meu servo Joacute (Joacute 48 8) rdquo (GIRARD 2014 P 163) 14 O fim do livro eacute perfeitamente compatiacutevel com o seu conteuacutedo afastando a ideia de justiccedila retributiva 15 A propoacutesito desta restauraccedilatildeo Norman C Habel sugere que o uso do verbo restaurar pode ser fortuito
poreacutem sugere uma justiccedila restaurativa em vez de uma retributiva (HABEL 2004 p 35)
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A oportunidade do diaacutelogo com Deus foi a verdadeira restauraccedilatildeo de Joacute pois ele
compreendeu dois fatos fundamentais 1ordf) mesmo sendo justo natildeo estava imune ao mal e
ao sofrimento 2ordf) apesar de ter chegado a amaldiccediloar o dia em que nasceu (Joacute 3 1) Joacute
percebeu que sua vida teve um verdadeiro significado como no sentido proposto por
Tolstoacutei Foi uma vida vivida para os outros como demonstra a lembranccedila de Joacute em um
dos diaacutelogos
ldquoA justiccedila eu vivia como tuacutenica
o direito era meu manto e meu turbante
Eu era olhos para o cego
era peacutes para o coxo
Era o pai dos pobres
e examinava a causa de um desconhecidordquo (Joacute 29 14-16)
Nestes tempos de pandemia temos uma escolha reclamar da sorte e maldizer a
Deus ou continuar dando um verdadeiro significado agraves nossas vidas ajudando-nos uns aos
outros da melhor forma que pudermos Sem lamentar um contrato natildeo cumprido e sem nos
desesperarmos pela crenccedila de que estamos sofrendo um castigo divino A vida vivida para
os outros com espaccedilo para o perdatildeo e para a reconciliaccedilatildeo levaraacute agrave restauraccedilatildeo e ao
desenvolvimento de nosso senso de comunidade Esta a liccedilatildeo que extraiacutemos do Livro de
Joacute
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
AZEVEDO Paulo Bueno de Ensaio sobre a irracionalidade do sistema criminal agrave
luz da obra religiosa de Lev Tolstoacutei Rio de Janeiro Lumen Juris 2019
BIacuteBLIA DE JERUSALEacuteM Traduccedilatildeo de Luiz Inaacutecio Stadelmann 7ordf impressatildeo
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BLOOM Harold Onde encontrar a sabedoria Traduccedilatildeo de Joseacute Roberto OrsquoShea
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BORGES Jorge Luiacutes El libro de Job [Conferecircncia en el Instituto Cultural
Argentino-Israeliacute de Buenos Aires 1965] In
httpsborgestodoelanioblogspotcomsearchq=libro+de+job acesso em 08 de maio
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ELLIOTT Elizabeth M Seguranccedila e cuidado justiccedila restaurativa e sociedades
saudaacuteveis Traduccedilatildeo de Cristina Telles Assumpccedilatildeo com revisatildeo teacutecnica de Tonia
Van Acker Satildeo Paulo Palas Athena 2018
EISNER Will Biblioteca Will Eisner um contrato com Deus Will Eisner [histoacuteria e
arte] Traduccedilatildeo Marquito Maia Satildeo Paulo Devir 2019
GIRARD Reneacute A rota antiga dos homens perversos Traduccedilatildeo de Tiago Joseacute Risi
Leme Satildeo Paulo Paulus 2014
JAKOBS Guumlnther Fundamentos do direito penal Traduccedilatildeo Andreacute Luiacutes Callegari
Satildeo Paulo Revista dos Tribunais 2003
HABEL Norman C The verdict onof Goda at the end of Job In Jobrsquos God
London SCM Press 2004
HADJADJ Fabrice Joacute ou a tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo
Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
JUNG CJ Resposta a Joacute Traduccedilatildeo do Pe Dom Mateus Ramalho Rocha 10 ediccedilatildeo
Petroacutepolis Vozes 2018
MORGADO Helena Zani Direito penal restaurativo em busca de um modelo
adequado de justiccedila criminal Rio de Janeiro Revan 2018
PASCHOAL Janaina Conceiccedilatildeo Religiatildeo e direito penal interfaces sobre temas
aparentemente distantes Satildeo Paulo LiberArs 2018
PONDEacute Luiz Felipe Joacute e a alegria (prefaacutecio) In HADJADJ Fabrice Joacute ou a
tortura pelos amigos Traduccedilatildeo de Clara Carvalho Satildeo Paulo Eacute Realizaccedilotildees 2017
ROSSI Luiz Alexandre Solano A origem do sofrimento do pobre teologia e
antiteologia no livro de Joacute Satildeo Paulo Paulus 2017
SOLON Ari Marcelo Direito e tradiccedilatildeo o legado grego romano e biacuteblico Rio de
Janeiro Elsevier 2009
SOUZA Luciano Anderson de Direito penal parte geral Satildeo Paulo Revista dos
Tribunais 2019
TOLSTOacuteI Liev Minha religiatildeo Traduccedilatildeo Dinah de Abreu Azevedo Satildeo Paulo A
Girafa 2011
Autor ndash Excelentiacutessimo Juiz Federal Dr Paulo Bueno de Azevedo
Docente FATEJ FADISA
JUIZ FEDERAL e Professor de Direito Penal da
FADISA
DOUTOR em Direito Penal pela Universidade
de Satildeo Paulo
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ldquoA CONTRIBUICcedilAtildeO DOS MANUSCRITOS DE QUMRAN PARA
EXEGESE DO APOCALIPSE DE JOAtildeOrdquo
APOCALIPSE 51-14 ndash O CAcircNTICO CERIMONIAL DA
CELEBRACcedilAtildeO DO SACERDOacuteCIO UNIVERSAL DE JESUS Agrave LUZ DAS TRADICcedilOtildeES DO MISTICISMO JUDAICO - UMA EXEGESE
CONTEMPORAcircNEA
RESUMO
Nos uacuteltimos anos as descobertas dos manuscritos de Qumran intensificaram as propostas
de exegese da literatura apocaliacuteptica dando novas ecircnfases dentre elas estatildeo as hipoacuteteses de
Rowland16 de que os textos do Apocalipse 4 e 5 possuem em sua narrativa uma
semelhanccedila baacutesica com a liturgia descrita nas tradiccedilotildees do misticismo apocaliacuteptico do
judaiacutesmo no I seacuteculo bem como em textos de Qumran principalmente no fragmento
4Q405 Nogueira17 seguindo esta linha de pesquisas cita que Ezequiel capiacutetulo 1 eacute
considerado chave de uma tradiccedilatildeo miacutestica do judaiacutesmo enoquita sendo tambeacutem um
elemento central do Apocalipse de Joatildeo o principal visionaacuterio do cristianismo Sebastiana
Nogueira18 lembra que foi Scholem quem realmente usou este misticismo para produzir a
chave das histoacuterias de ascensatildeo celestial presentes nos apocalipses dos uacuteltimos dois seacuteculos
aC e dos primeiros dois seacuteculos dC de forma que Scholem na verdade foi quem
iniciou a discussatildeo acadecircmica dos miacutesticos judaicos em seu livro Major Trends in Jewish
Myticism - Principais Tendecircncias no Misticismo Judaico em 1941 Destarte esta linha de
pesquisa ecoa nos estudos do misticismo apocaliacuteptico e do ecircxtase visionaacuterio relativo ao
contexto do judaiacutesmo e cristianismo primitivos sendo fundamentada em autores tais
como Christopher Rowland Alan Segal C R A Morray-Jones e John Ashton John
Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo A S Nogueira Carol Newsom David E
Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez dentre
outros sendo que estes autores se alinham aos resultados das pesquisas iniciais de
Gershom Scholem sobre o Misticismo Judaico e aos desenvolvimentos mais recentes neste
acircmbito Corroborando com a tradiccedilatildeo destes estudos se encontram as descobertas dos
manuscritos de Qumran como a dos Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico uma composiccedilatildeo de
treze cacircnticos tambeacutem chamada de liturgia angeacutelica e que tem contribuiacutedo para o
desenvolvimento das pesquisas bem como sustentado os argumentos de Scholem
16 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 20097273 17 NOGUEIRA Paulo Augusto de S (org) Religiatildeo de Visionaacuterios ndash Apocaliacuteptica e Misticismo no
Cristianismo Primitivo Satildeo Paulo Ed Loyola ndash 200543 18 NOGUEIRA Sebastiana M Silva 2 Coriacutentios 12 e o Misticismo Judaico (Os Quatro que Entraram no
Pardes) Oracula 201204
autor
Me Marcelo Alves Dantas
E-mail marcelodantasteologiagmailcom
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Portanto este artigo faz uma breve exposiccedilatildeo das tradiccedilotildees da miacutestica judaica e suas
contribuiccedilotildees para exegese do capiacutetulo 5 do Apocalipse de Joatildeo
In recent years the discoveries of the Qumran manuscripts have intensified the proposals
for the exegesis of apocalyptic literature with new emphases among them are Rowlands
hypotheses that the texts of Revelation 4 and 5 have in their narrative a basic similarity
with the liturgy described in the traditions of Judaisms apocalyptic mysticism in the first
century as well as in Qumran texts mainly in fragment 4Q405 Nogueira following this
line of research and based on other scholars mentions that Ezekiel chapter 1 is considered
key to a mystical tradition of enochite Judaism being also a central element of the
Apocalypse of John the main visionary of Christianity Sebastiana Nogueira recalls that it
was Scholem who really used this mysticism to produce the key to the stories of celestial
ascension present in the apocalypses of the last two centuries BC and the first two
centuries AD So Scholem in fact who started the academic discussion of mystics Jews in
his book Major Trends in Jewish Myticism - Main Trends in Jewish Mysticism in 1941
Thus this line of research echoes in the studies of apocalyptic mysticism and visionary
ecstasy concerning the context of primitive Judaism and Christianity with some of the best
known authors Christopher Rowland Alan Segal CRA Morray-Jones and John Ashton
John Collins Adella Collins Jonas Machado Paulo AS Nogueira Carol Newsom David
E Aune Philip Alexander Crispin HT Fletcher-Louis Florentino Garciacutea Martiacutenez among
others these authors are aligned with the results of Gershom Scholems initial research on
Jewish Mysticism and with the most recent developments in this area Corroborating the
tradition of these studies are the findings of the Qumran manuscripts such as the Song of
Sacrifice Saacutebatico a composition of thirteen songs also called angelic liturgy which has
contributed to the development of research as well as supporting the arguments of
Scholem Therefore this article briefly exposes the traditions of Jewish mysticism and
their contributions to the exegesis of chapter 5 of the Apocalypse of John
Keywords Judaism Mysticism Apocalyptic Throne Song
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INTRODUCcedilAtildeO
Segundo Nogueira19 o cristianismo primitivo nasceu como religiatildeo extaacutetica e que
para se compreender a literatura antiga eacute importante levar-se em consideraccedilatildeo a pergunta
sobre a situaccedilatildeo cultural da eacutepoca e a produccedilatildeo dos textos Diante do reconhecimento de
que visotildees audiccedilotildees e revelaccedilotildees natildeo acontecem sem um quadro cultural de referecircncia
assim o exegeta deve partir da busca de possiacuteveis contribuiccedilotildees para o estudo deste quadro
cultural tendo como finalidade contribuir para a compressatildeo das experiecircncias visionaacuterias e
apocaliacutepticas tanto quanto da experiecircncia religiosa dos primeiros cristatildeos
Assim procurando situar o quadro cultural de referecircncia elencamos no trabalho
comparativo os dados apresentados por Sacchi20 permitindo a distinccedilatildeo de quatro periacuteodos
da Apocaliacuteptica
a) A primeira fase apocaliacuteptica com seu iniacutecio antes de 200 aC
b) A segunda fase apocaliacuteptica desde 200 aC a 100 aC
c) A terceira fase apocaliacuteptica desde 100 aC a 50 dC
d) A quarta fase apocaliacuteptica desde 50 dC a 120 dC
Sob a mesma linha de hipoacuteteses temos a contribuiccedilatildeo de Collins21 que por meio de
um levantamento exaustivo dos textos que puderam ser classificados como Apocalipses e
datados com qualquer plausibilidade no periacuteodo de 250 aC ndash 250 dC procurou ver ateacute
onde podiam ser considerados como membros de um mesmo gecircnero Para ele haacute uma
distinccedilatildeo entre ldquoApocalipses Histoacutericosrdquo e os ldquoApocalipses de Viagensrdquo de sorte que
considera necessaacuterio a elucidaccedilatildeo de que um apocalipse eacute ldquouma estrutura geralrdquo que
incorpora outros gecircneros literaacuterios (carta testamento paraacutebola hino oraccedilatildeo etc)
De sorte que sendo a dimensatildeo das fases da Apocaliacuteptica de grande extensatildeo e com
muitos textos produzidos se impotildee a necessidade de delimitaccedilatildeo da pesquisa e nesse
quesito contribui Machado22 ao citar um importante aspecto que deve ser levado em
consideraccedilatildeo a distinccedilatildeosimilaridade em relaccedilatildeo aos gecircneros literaacuterios que envolvem a
19 NOGUEIRA Paulo Augusto de Souza Experiecircncia Religiosa e Criacutetica Social no Cristianismo Primitivo
Satildeo Paulo ndash Paulinas 200417 20 SACCHI P Jewish Apocalyptic and its History Sheffield Academic Press England 1990110 21 Artigo Intitulado Apocalipses Judaicos - p 1-8 COLLINS John J SEMEIA 14 Apocalypse The
Morphology of a Genre The Society of Biblical Literature 1979 22 Apud SEGAL Alan F Paul The Convert The Apostolate and Apostasy of Saul The Pharisee New
HavenLondon Yale University Press 1990 p 38 ndash Life After Death A History of the Afterlife in the
Religions of the West New York Doubledy 2004410
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apocaliacuteptica e a miacutestica judaica uma vez diferentes e facilmente distinguiacuteveis mas que
relatam experiecircncias religiosas semelhantes
Os apocalipses combinam tambeacutem uma seacuterie de formas menores sendo as mais
importantes 1) Panoramas da histoacuteria em forma de futuro - o interesse dos
apocaliacutepticos volta-se em primeiro lugar para os iminentes acontecimentos
escatoloacutegicos para os horrores do tempo final e a gloacuteria do novo mundo 2)
Descriccedilatildeo do aleacutem - outro interesse consiste em dar ao leitor uma visatildeo do
mundo do aleacutem Para isso se recorre a descriccedilotildees de arrebatamentos visionaacuterios
Em um ecircxtase o visionaacuterio passa por mudanccedila de lugar e perambula por regiotildees
estranhas e misteriosas na terra e no ceacuteu (Ez 83ss) Elas oferecem a
oportunidade de transmitir conhecimentos sobre a topografia do ceacuteu e do inferno
sobre hierarquia dos anjos etc 3) Visotildees da sala do trono - ponto alto dessas
viagens seu alvo mas agraves vezes tambeacutem seu desenlace eacute a visatildeo da sala do trono
de Deus Sua descriccedilatildeo tem por objetivo mostrar sua inacessibilidade de Deus e
documentar simultaneamente a competecircncia do visionaacuterio que remonta
diretamente a Deus o qual recebe nessas audiecircncias uma missatildeo especial e ao
qual se confere um status especial (Atos 9 1011 101011 2619) As visotildees da
sala do trono formam um elo intermediaacuterio entre visatildeo de convocaccedilatildeo dos
profetas (cf Is 6 Ez 1ss) e da posterior miacutestica merkaba (carruagem divina)
judaica23
Reforccedilando as hipoacuteteses da exegese apocaliacuteptica com base nas tradiccedilotildees do
misticismo judaico Vielhauer a semelhanccedila de Collins fala da abrangecircncia e relevacircncia da
literatura apocaliacuteptica identificando que nas visotildees da sala do trono se encontram a
formaccedilatildeo de um elo intermediaacuterio entre a visatildeo de convocaccedilatildeo dos profetas e das tradiccedilotildees
do misticismo da Mercavaacuteh o que tambeacutem eacute atestado por Collins sendo fontes das quais
participam os apocaliacutepticos
1 INTRODUCcedilAtildeO AO MISTICISMO JUDAICO - ldquoANAacuteLISE DOS TEXTOS
FUNDANTESrdquo
11 ndash Isaiacuteas Cap 6 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Machado24 em sua tese de doutorado elucida que o texto de (Isaiacuteas 61-13) pode ser
visto como pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na corte celestial de anjos
ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute situado na base do
judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a Deus colocando
assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
23 VIELHAUER Philipp Literatura Cristatilde Primitiva - Introduccedilatildeo ao Novo Testamento aos Apoacutecrifos e aos
Pais Apostoacutelicos Ed Academia Cristatilde Satildeo Paulo 2005517 24 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107
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O texto de Isaiacuteas em sua narrativa apresenta uma visatildeo da sala do trono de Deus a
partir do santuaacuterio terrestre local geograacutefico onde Isaiacuteas se encontra Um estudo dos
termos hebraicos utilizados no texto permitem entender claramente a visatildeo que o profeta
viu
Com base no verso 1 a experiecircncia do profeta se concentra numa visatildeo (האראו -
varingereumleh) o termo hebraico aqui utilizado traz o sentido natildeo apenas de ver mas de temer
honrar respeitar diante do impacto e da grandeza da visatildeo
O termo hebraico (שי yoshev ldquosentadordquo) tem o significado de sentar morar habitar ndash ב
viver residir permanecer ficar
Trono alto e elevado
Temos aqui o termo (סא para (al ndash לע) kise) usado para a palavra Trono e ndash א
elevado
margem borda referindo-se a borda do manto (veumlshularingyv ndash השלעבה)
במ) meumlleym) encher completar ndash םעא
Evidenciamos que Isaiacuteas no verso 1 usa o termo (וובהע - haheykharingl) para o
Templo e que este tambeacutem pode ser traduzido por ldquoPalaacutecio ou Assembleiardquo com efeito
seu uso aqui levantou a hipoacutetese da concepccedilatildeo de que Isaiacuteas era um integrante da ldquocorte
celestialrdquo ou ldquoassembleia dos deusesrdquo O fato de o Trono estar no ldquoalto ou elevadordquo junto
ao termo (וובהע - haheykharingl - Palaacutecio) nos permite entender que a visatildeo de Isaiacuteas parece
se referir a uma visatildeo da sala do Trono no Templo ldquoPalaacuteciordquo Celestial Assim temos a
visatildeo do Templo Celestial a partir do Templo Terrestre sendo portanto uma visatildeo do
Templo Celestial isenta de uma ascensatildeo ao mesmo
Essa hipoacutetese eacute corroborada quando tambeacutem notamos que no verso 4 ao se
mencionar que o Templo se encheu de fumaccedila se usa outro termo ou seja (ו ndash הובב
veumlhabayt ldquoe a casardquo) para se referir ao mesmo
Deste modo o texto do profeta Isaiacuteas nas tradiccedilotildees do judaiacutesmo antigo tem sua
leitura no hebraico justaposta as experiecircncias da sala do trono de Deus sendo um
documento preservado e achado plenamente conservado em Qumran a preservaccedilatildeo do
רמraringm
סא אkise
לעal
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documento tem levado muitos pesquisadores a considerar a tradiccedilatildeo do profeta Isaiacuteas como
uma importante hipoacutetese dos elos das tradiccedilotildees do judaiacutesmo enoquita
12 ndash Ezequiel Cap 1 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
Apoacutes uma breve introduccedilatildeo em busca das origens da Apocaliacuteptica e seus possiacuteveis
elos histoacutericos enquanto tradiccedilotildees de judaiacutesmos e suas praacuteticas lituacutergicas literatura e
movimento social demonstrando a existecircncia de contextos e ambiente histoacuterico nos quais
podemos inserir a pesquisa e a produccedilatildeo exegeacutetica a proposta agora eacute a de apresentar
meacutetodos que auxiliem no processo da exegese
Como porta de entrada citamos a tese de doutorado de Machado25 que indica o
texto de (Isaiacuteas 61-13) como podendo pertencente agrave tradiccedilatildeo de participaccedilatildeo profeacutetica na
corte celestial de anjos ainda que a visatildeo esteja restrita ao Templo terrestre todavia estaacute
situado na base do judaiacutesmo poacutes-exiacutelico que vecirc Isaiacuteas como uacutenico ser humano que viu a
Deus colocando assim a passagem no centro da apocaliacuteptica e miacutestica judaica
Portanto a proposta de antematildeo preacute-estabelecida para exegese eacute a de um olhar dos
aspectos literaacuterios com base naquilo que haacute ldquocomumsimilardiferente26rdquo nos textos A isso
somamos levamos as noccedilotildees do meacutetodo exegeacutetico de W Egger27 que abrange forma e
gecircnero respectivamente como ldquoa configuraccedilatildeo individual de um texto particular e por
classe de textogecircnero o que vaacuterios textos possuem em comumrdquo
Assim temos como pressuposto que um texto pertencente a um mesmo gecircnero
quando assinalado pelos seguintes aspectos
a) Revelam uma estrutura linguiacutestico-sintaacutetica semelhante
b) Possuem uma estrutura semacircntica e narrativa anaacuteloga
c) Tem uma intenccedilatildeo parecida em relaccedilatildeo ao efeito que pretendem produzir
d) Mostram uma situaccedilatildeo vital semelhante o entorno social e comunicativo eacute
semelhante
Portanto para conduccedilatildeo de uma exegese estes olhares analiacuteticos satildeo singulares
procurando manter um processo da que evidencie a participaccedilatildeo ou proximidade de
25 MACHADO Jonas Transformaccedilatildeo Miacutestica na Religiatildeo do Apoacutestolo Paulo Recepccedilatildeo do Moiseacutes
Glorificado em 2 Coriacutentios na Perspectiva da Experiecircncia Religiosa Satildeo Bernardo do Campo (Tese de
Doutorado) - UMESP 2007107 26 MARGUERAT Daniel amp BOURQUIN Yvan Para Ler as Narrativas Biacuteblicas Iniciaccedilatildeo agrave Anaacutelise
Narrativa 200913-16 27 EGGER Wilhelm Lecturas Del Nuevo Testamento Verbo Divino Navarra 1990304
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tradiccedilotildees apocaliacutepticas permitindo acessar os aspectos que possam ligar as tradiccedilotildees a
viabilizar a interpretaccedilatildeo do texto
Assim temos a contribuiccedilatildeo de Evans28 que resume o comentaacuterio em concordacircncia
com os autores ateacute aqui mencionados justapondo que os elementos baacutesicos do misticismo
judaico ldquoTrono-Carruagemrdquo encontrados na visatildeo biacuteblica do Trono em Ezequiel corrobora
com os paradigmas formando os elos das tradiccedilotildees apocaliacutepticas sendo a visatildeo do
chamado profeacutetico de Ezequiel junto ao rio Quebar um modelo de judaiacutesmo miacutestico uma
vez que o sacerdote Ezequiel traz a identidade de um sacerdote que natildeo aceita e natildeo
convive amigavelmente com o templo uma vez que o templo estaacute profanado pela idolatria
e poliacutetica religiosas (Ezequiel 11-28)
O texto nos daacute uma extensa e enigmaacutetica imagem do que ficou conhecido como
Mercavaacuteh orraC) ם ר ה י ו-Trono) aparentemente uma espeacutecie de Trono real sobre rodas
(cf Dn 79) com vento tempestuoso e uma nuvem de fogo que se aproxima a partir do
norte (v 4)
Ezequiel comeccedila a visatildeo que se desdobra com uma descriccedilatildeo de quatro imagens
enigmaacuteticas (והבח - as hayot - seres viventes) cada um com quatro faces (homem leatildeo boi
e aacuteguia) quatro asas e quatro rodas (5-21) acima de suas cabeccedilas se encontra uma
plataforma como o cristal (vv 22-25) e por cima da plataforma esta assentado um
pesonagem uma manifestaccedilatildeo antropomoacuterfica de Deus em um Trono de pedra como
safira descrito com ldquoo aspecto da semelhanccedila da gloacuteria do Senhorrdquo (vv 26-28)
Ezequiel aparece como um dos parametros miacutesticos de sonsideravel relevacircncia
para a comunidade de Qumran e seus pergaminhos fornecerem algumas das primeiras
evidecircncias de que o Trono na sua visatildeo foi chamado de Merkavaacuteh Segundo o fragmento
(4Q38529) o que os estudiosos tecircm apelidado ldquoSegundo Ezequielrdquo a visatildeo que
Ezequiel viu foi agrave divina Mercavaacuteh ( ו י ה ר ם ) juntamente com os ldquoquatro seres
viventesrdquo (4 5-6)
Os Manuscritos do Mar Morto tecircm muito a dizer sobre o Trono da divina
carruagem com efeito um dos maiores objetivos da Comunidade de Qumran parece ter
sido a participaccedilatildeo na liturgia celeste angelical e ver o grande Trono-Carruagem de Deus
entrar no Templo celeste
28 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co1997102-103 29 Conhecido como 4QPseudo-Ezequiel eacute citado em fontes mais antigas como 4QSecond Ezequiel Pseudo-
Ezequiel Trata-se de um texto hebraico fragmentaacuterio e pseudopigraacutefico encontrado na Caverna 4 em
Qumran e portanto pertence ao conjunto de manuscritos popularmente conhecidos como Manuscritos do
Mar Morto
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Para Evans o texto achado na Caverna 4 de Qumran eacute uma composiccedilatildeo lituacutergica
preacute-cristatilde conhecida como Cacircnticos do Sacrifiacutecio Saacutebatico ou Liturgia Angeacutelica
composta por treze partes separadas uma para cada um dos treze saacutebados Os Cacircnticos
invocam o louvor angelical descrevem o sacerdoacutecio angelical e o Templo celestial e datildeo
conta do culto realizado no saacutebado no santuaacuterio celestial O 13ordm Cacircntico do saacutebado comeccedila
com uma longa descriccedilatildeo da aparecircncia e movimento do divino trono-carruagem
Considerando que a 7ordf e a 11ordf Canccedilotildees do Sabbath referem-se a uma pluralidade da
o 13ordm Cacircntico descreve a divina Merkavaacuteh o trono carruagem de gloacuteria ( ו ה י ה ר ם )
tomando emprestado enfaticamente os termos de Ezequiel 1 e 10 Estes Cacircnticos
receberam a identificaccedilatildeo (4Q400 a 4Q407) devido agrave localizaccedilatildeo da Caverna em Qumran
onde foram encontrados
13 ndash I Enoque Cap 14 e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O texto de I Enoque 148-21 apresenta vaacuterios elementos associados miacutestica da sala
do Trono A descriccedilatildeo da sala celestial do Trono (Hehaloth - Palaacutecio) o tema do rio do
fogo que procede do trono a face e o Trono de Deus em si elementos estes que satildeo
reproduzidos mais tarde em outros textos apocaliacutepticos judaicos e cristatildeos satildeo os
elementos que permancem sempre reproduzidos em outros textos da tradiccedilatildeo
(I Enoque 14 8-21) na traduccedilatildeo proposta por Alejandro Diez Macho30 que
concorda com outras traduccedilotildees que avaliamos como a de Rowland31
Entrei ateacute chegar-me ao muro construiacutedo com pedras de granizo que eacute rodeado
por uma liacutengua de fogo e comecei assustar-me Entrei na liacutengua de fogo e me
aproximei ateacute a casa construiacuteda com pedras de granizo cujo muro e pavimento
satildeo laacutepidas pedras de granizo Seu solo eacute tambeacutem de granizo Seus tetos claros
como estrelas e relacircmpagos onde estatildeo os iacutegneos querubins e seus ceacuteus satildeo
como aacutegua Havia fogo ardente ao redor das paredes e tambeacutem a porta se
abrasava em fogo Entrei nesta casa que ardia como fogo e fria como granizo
onde natildeo havia nenhum prazer ou vida e o medo tomou-me e o terror oprimiu-
me Caiacute com a face no chatildeo e tive uma visatildeo eis que havia outra casa maior
que esta a qual as portas estavam abertas diante de mim construiacutedas de liacutenguas
de fogo ndash era tudo tatildeo esplendido ilustre e grande que natildeo posso contar o
tamanho da gloacuteria e grandeza Seu solo era de fogo por cima tinham
relacircmpagos e orbitas astrais seu teto de fogo abrasador Mirei e vi em um alto
trono com um esplendor aspecto e (tinha ao seu redor) um ciacuterculo com sol
brilhante e voz de querubins Debaixo do trono saiam rios de fogo abrasador de
modo que era impossiacutevel mirar A grande Majestade estava sentada sobre o
30 Fonte DIEZ MACHO Alejandro Apoacutecrifos del Antigo Testamento Vol IV Madri Ed Cristiandad
198751 31 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 200976 77
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trono com uma tuacutenica mais brilhante que o sol e mais resplandecente que o
granizo de modo que nenhum dos anjos poderia entrar na casa
Como jaacute podemos obsevar eacute perfeitamente claro que o texto Enoquita possui seu
campo imaginaacuterio moldado pela estrutura semacircntica e imageacutetica dos textos de Isaiacuteas e
Ezequiel
Boccaccini32 argumenta que esses textos de I Enoque provavelmente foram escritos
por membros do sacerdoacutecio de Jerusaleacutem poreacutem tem procedecircncia por parte de um grupo
antizadoquita Um movimento sacerdotal dissidente ativo em Israel no fim do periacuteodo
persa e iniacutecio do helecircnico no IV seacuteculo aC Para Boccaccini esse movimento enoquita era
um grupo de oposiccedilatildeo entre a elite do Templo e natildeo um simples grupo de separatistas No
entanto o centro do judaiacutesmo enoquita natildeo era a Toragraveh nem o Templo Os dois grupos
(zadoquita e enoquita) interpretavam Ezequiel diferentemente e tinham ideias
completamente contrastantes Ateacute cerca de 200 aC enoquismo e zadoquismo eram duas
distintas e paralelas linhas de pensamentos no judaiacutesmo
14 - Daniel (79-14) e as Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico
O livro do profeta Daniel tambeacutem marca sua presenccedila em Qumran atualmente se
entende que sua composiccedilatildeo aconteceu alguns anos depois de I Enoque e as conclusotildees de
muitos pesquisadores como Collins33 Rowland34 Martiacutenez35 entre outros eacute de que Daniel
possui relaccedilotildees intimas e demonstra ter recebido influecircncia da literatura enoquita
9 Eu continuava olhando uns tronos foram instalados e um Anciatildeo se assentou
vestido de veste branca como a neve cabelos claros como a latilde O seu trono era
como labaredas de fogo com rodas de fogo em brasa 10 Um rio de fogo brotava
da frente dele Milhares e milhares o serviam e milhotildees estavam agraves suas ordens
Comeccedilou a sessatildeo e os livros foram abertos 11 Eu continuava olhando atraiacutedo
pelos insultos que aquele chifre gritava vi que mataram a fera fazendo-a em
pedaccedilos e jogando-a no fogo 12 Quanto agraves outras feras o poder delas foi tirado
mas foi-lhes dado um prolongamento de vida ateacute um tempo determinado 13 Em
imagens noturnas tive esta visatildeo entre as nuvens do ceacuteu vinha algueacutem como um
filho de homem Chegou ateacute perto do Anciatildeo e foi levado agrave sua presenccedila 14 Foi-
lhe dado poder gloacuteria e reino e todos os povos naccedilotildees e liacutenguas o serviram O
32 BOCCACCINI Gabriele Beyond the Essene Hypothesis The Parting of the Ways between Qumran and
Enochic Judaism Grand Rapids W B Eerdmans 199848 76 78 33 COLLINS John J A Imaginaccedilatildeo Apocaliacuteptica ndash Uma Introduccedilatildeo Literaacuteria a Apocaliacuteptica Judaica Satildeo
Paulo ndash Paulus 2010 34 ROWLAND C MORRAY JONES Christopher R A The Mystery of God Early Jewish Mysticism and
the New Testament (Compendia Rerum Iudaicarum ad Novum Testamentum Volume 12) Leiden Brill
Academic 2009 35 MARTIacuteNEZ Florentino Gaacutercia Qumran and Apocalyptic Studies on the Aramaic Texts from Qumran
New York EJ Brill 1994
29
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seu poder eacute um poder eterno que nunca lhe seraacute tirado E o seu reino eacute tal que
jamais seraacute destruiacutedo
Segundo Evans36 um total de oito manuscritos do livro de Daniel foi descoberto em
Qumran nenhum veio agrave luz ateacute agora em outros locais no deserto da Judeacuteia
Dois dos manuscritos de Daniel foram descobertos na Gruta 1 cinco na Gruta 4 e
um (Escrito em papiro) em Gruta 6 Com base na anaacutelise Paleacuteografica noacutes podemos saber
que quatro foram copiados no periacuteodo dos Hasmoneus (lQDanᵇ 4QDanordf 4QDan
4QDan e quatro no periacuteodo de Herodes (lQDanordf 4QDanᵇ 4QDan pap6QDan) Por causa
dos estragos do tempo dos elementos nenhum desses achados preserva uma coacutepia
completa do livro de Daniel No entanto entre eles pocircde-se preservar uma quantidade
substancial destes
Evans considera que os graacuteficos fazem a indicaccedilatildeo da autoridade da tradiccedilatildeo de
Daniel em Qumran e deixa claro o manuseio dos textos por parte da comunidade isto
fundamenta a forccedila da tradiccedilatildeo e do pensamento apocaliacuteptico em Qumran ainda que o
Livro de Daniel natildeo seja considerado um apocalipse em si mesmo mas caracterizado pelo
seu sentido profeacutetico
Assim as pesquisas apontam com precisatildeo que os textos de Isaiacuteas Ezequiel Daniel
e I Enoque perpassaram a comunidade de Qumran e a presenccedila de os seus conteuacutedos
linguiacutesticos e imageacuteticos aparecem nos cacircnticos do Sacrifiacutecio Sabaacutetico sendo que as
liturgias em Qumran fazem declaraccedilotildees das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do
segundo templo e nestes cacircnticos os sacerdotes se sentiam participantes do culto junto aos
anjos na sala do trono de Deus esta liturgia reflete um afastamento do templo terreno e a
busca do templo celestial gerando a hipoacutetese que inuacutemeros pesquisadores acreditam
validar o tipo de experiecircncia religiosa de um judaiacutesmo dissidente cuja origens estaacute no
periacuteodo do segundo templo Portanto ateacute aqui podemos apreciar um relato histoacuterico das
fontes literaacuterias e seus conteuacutedos imageacuteticos o que permite ver o Apocalipse de Joatildeo como
um texto que traz consigo conteuacutedos narrativos e imagens das tradiccedilotildees do misticismo da
Mercavaacuteh
36 EVANS Craig A and FLINT Peter W Eschatology Messianism and the Dead Sea Scrolls Edited by
Wm Β Eerdmans Publishing Co 199741-43
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2 Apocalipse 51-14 ndash O Cacircntico Cerimonial da Celebraccedilatildeo do Sacerdoacutecio Universal
de Jesus agrave Luz das Tradiccedilotildees do Misticismo Judaico - Uma Exegese Contemporacircnea
A pesquisa das tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
apoacutes as descoberta dos manuscritos de Qumran em 1947 revolucionaram portanto a
exegese do Novo Testamento acerca disto concordam os argumentos de Rowland37
aferindo que havia uma lacuna importante nos estudos da cristologia do Novo Testamento
e que as pesquisas da exegese avanccedilaram na busca tanto do cenaacuterio e ambiente das
experiecircncias religiosas nos tempos de Jesus bem como das crenccedilas em uma figura
angelical exaltada no judaiacutesmo apocaliacuteptico
Seus apontamentos em primeiro lugar nos permitiram ver certos desenvolvimentos
no pensamento rabiacutenico sob uma nova luz e em segundo lugar do ponto de vista da
Exegese do Novo Testamento se ilustra um aspecto negligenciado sobre o
desenvolvimento doutrinaacuterio judaico e que natildeo tinha recebido suficiente atenccedilatildeo no estudo
da Cristologia do Novo Testamento
A anaacutelise do material sobre o mundo celestial produz consideraccedilotildees que nos
permitem ver as perspectivas distintivas da apocaliacuteptica como tambeacutem o modo pelo qual
o visionaacuterio justo entrava em contato com Deus Desta forma percebemos a infiltraccedilatildeo dos
padrotildees de pensamento da comunidade de Qumran na cristologia do Novo Testamento
A partir das consideraccedilotildees preliminares desta pesquisa e suas indicaccedilotildees a anaacutelise
da cerimocircnia da entronizaccedilatildeo de Jesus se estabelece sob os criteacuterios da oacutetica propiciada nos
termos das tradiccedilotildees do misticismo judaico com suas raiacutezes no periacuteodo do segundo templo
Como visto os textos considerados fundantes junto a cacircnticos e documentos da nos remete
a antiguidade da tradiccedilatildeo miacutescitca de modo que a hipoacutetese sustentanda nesta linha de
peesquisa eacute a de que Joatildeo participou ativamente de uma corrente literaacuteria com antecedentes
expressivos nos documentos de Qumran presente nas tradiccedilotildees do misticismo judaico e
apocaliacuteptico no periacuteodo do Segundo Templo e tambeacutem encontradas em Qumran
Assim de antematildeo podemos considerar em Apocalipse 5 evidencia aspectos das tradiccedilotildees
miacutesticas da sala do trono
Contudo os criteacuterios morfoloacutegicos adotados por Deutsch38 proposcinaram melhor
clareza para discernir as tradiccedilotildees do misticismo judaico do periacuteodo do segundo templo
onde os atributos angelomoacuterficos e posteriormente a elaboraccedilatildeo de uma ldquocristologia-
37 ROWLAND Christopher The Open Heaven - A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity
First published 198277 e 113 38 DEUTSCH Nathaniel The Guardians of the gates Angeuc Vice Regency In Late Antiquity Brill Leiden -
Boston - Koln 1999 ndash (Introduccedilatildeo)
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angelomoacuterficardquo se estabeleceu e apresentou as imagens de forma sitematizada produzindo
compreensatildeo acerca das funccedilotildees sacerdotais junto ao trono de Deus a saber (1) Funccedilatildeo
Demiuacutergica satildeo atribuiacutedas funccedilotildees na Criaccedilatildeo ao vice-regente angelomoacuterfico neste caso
se levarmos em conta (Ap 314) como parte contextual correspondente ao texto de (411)
Jesus eacute claramente interpretado por Joatildeo nesta linha de raciociacutenio Portanto participa como
agente de Deus na confecccedilatildeo do universo (2) Guardiatildeo do Portal Cabe ao vice-regente
permitir ou natildeo a entrada de seres humanos e ou celestiais agrave presenccedila imediata de Deus o
que pode ser tambeacutem acolhido em nossa leitura de Ap 5 porquanto neste Jesus por assim
dizer funciona como uma porta de acesso tanto a abertura dos selos como pelo seu
sacrificio pascoal abre o caminho para que todos tenham livre acesso ao Trono Deus uma
vez que por meio do seu sangue ldquoos fizeste reis e sacerdotesrdquo (3) O vice-regente
angelomoacuterfico exerce governo sobre os seres humanos e ou seres angeacutelicos todos
reconhecem sua dignidade e se submentem a seu comando o que eacute perfeitamente tambeacutem
concebiacutevel no texto em questatildeo
Embora natildeo possa ser dito que seja um traccedilo tiacutepico de todos os apocalipses em
estudo contudo parece haver evidecircncias de que uma angelologia tenha
produzido uma figura de status consideraacutevel cuja posiccedilatildeo na hierarquia celestial
colocou-o aparte do resto dos anjos () Embora poucos detalhes existam acerca
dessas angelofanias parece que havia um ser angeacutelico que em algum sentido era
considerado comunicando a aparecircncia de Deus mesmo e que agraves vezes aparecia
em forma humana (Gecircnesis 182) () O que a maioria das discussotildees modernas
da cristologia primitiva falha eacute em natildeo incluir a extensatildeo da influecircncia de uma
cristologia angeacutelica sobre a doutrina cristatilde primitiva Natildeo eacute apenas uma questatildeo
aiacute da rejeiccedilatildeo de uma cristologia angeacutelica como um fator no desenvolvimento
cristoloacutegico haacute quase total ausecircncia de tal toacutepico39
Sob esta oacutetica encontramos no proacuteprio Apocalipse uma alusatildeo pela qual podemos
concluir que tanto a imagem como os atributos angelomoacuterficos natildeo estavam restritos a um
uacutenico personagem poreacutem percebemos distinccedilotildees no uso dos termos gregos para descrevecirc-
los No texto de (Ap 115 16) Jesus eacute representado com ldquoκαὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὅμοιοι
χαλκολιβάνῳ ὡς ἐν καμίνῳ - os peacutes dele semelhantes a bronze (polido) como em fornalha
ardente ἡ ὄψις αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος φαίνει ἐν τῇ δυνάμει αὐτοῦ - e a aparecircncia do rosto dele
como o sol brilha em o poder delerdquo
No entanto em (Ap 101) encontramos a descriccedilatildeo feita para o anjo forte que
descia do ceacuteu ldquoκαὶ τὸ πρόσωπον αὐτοῦ ὡς ὁ ἥλιος καὶ οἱ πόδες αὐτοῦ ὡς στῦλοι πυρός ndash e
o rosto dele como o sol e os peacutes dele como colunas de fogordquo
39 Apud CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca Cristologia Angelomoacuterfica de Hebreus Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10 Satildeo Paulo Tese de Doutorado ndash
UMESP 200515
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O que podemos aferir eacute que se trata de niacuteveis de ldquoangelomorfiardquo com intensidades
diversificadas sendo as de Jesus norteadas por aspectos mais intensos de brilho
Gieshen40 apresentou uma excelente contribuiccedilatildeo em sua anaacutelise da Angelologia
judaica para a Cristologia do cristianismo das origens segundo ele o ponto de partida natildeo
deveria ser primariamente as paacuteginas do Novo Testamento e do Judaiacutesmo mas as tradiccedilotildees
angelomoacuterficas presente na miacutestica judaica preacute-cristatildes sendo provenientes da angelologia
judaica As hipoacuteteses assim levaram a compreensatildeo de ldquoAntecedentsrdquo trazendo a luz um
estudo abrangente das figuras hipostaacuteticas do Antigo Testamento e do Judaiacutesmo do
Segundo Templo buscando compreender a angelologia e os seres humanos
angelomoacuterficos presentes na literatura miacutestica do judaiacutesmo do segundo templo
Assim ficou perceptiacutevel a inter-relaccedilatildeo das vaacuterias tradiccedilotildees judaicas a respeito dos
mediadores celestes
Outro estudioso do tema Hannah41difere Gieshen na terminologia Enquanto este
utilizou o termo ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo de modo abrangente Hannah se utiliza de
quatro termos objetivando uma maior especificidade ldquoAngelo-Cristologiardquo para delimitar
as Cristologias influenciadas por ideias angeloloacutegicas ldquoCristologia-Angeacutelicardquo para definir
Cristo como ser angeacutelico ldquoCristologia-Angelomoacuterficardquo para se referir apenas as imagens
visuais de Cristo e ldquoCristologia Angeacutelico-Teofacircnicardquo aplicado agrave identificaccedilatildeo patriacutestica de
Cristo com o Anjo do Senhor no Antigo Testamento
Podemos retornar agraves consideraccedilotildees de Himmelfarb42 que fala dos apocalipses
com transformaccedilotildees de homens em anjos pertencentes a uma vertente de
um corpo grande e diversificado de literatura Especialmente porque trata os patriarcas
biacuteblicos e que Moiseacutes em certo sentido tambeacutem eacute visto como divino
A literatura proveacutem tanto do Egito como da Palestina e inclui obras que vatildeo desde
Philo e Ezequiel o Tragedista ao Testamento de Moiseacutes e passagens rabiacutenicas As
semelhanccedilas estruturais da literatura os papeacuteis de mediaccedilatildeo satildeo claros e demonstram
diferentes tipos de seres
40 GIESCHEN Charles A Angelomorphic Cristology Antecedents and Early Evidence Leiden E J Brill
199805 41 HANNAH Darrel D Of Cherubin and the Divine Throne Rev 56 in Context New Testament Studies 49
2003528-542 42 HIMMELFARB Martha Ascent to Heaven in Jewish and Christian Apocalypses New York Oxford
University Press 199347 48
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Encontramos nos textos que aferimos em nossa leitura a menccedilatildeo ldquoAngelomoacuterfica-
Antropomoacuterfica43rdquo da ldquoGloacuteria de Javeacuterdquo no livro de Ezequiel Por meio deste termo
podemos compreender a dimensatildeo e fusatildeo entre o humano e o divino no Trono de Deus
Unindo esta perspectiva agrave imagem da entronizaccedilatildeo e exaltaccedilatildeo e vice-regecircncia do
ldquoFilho do Homemrdquo em (Dn 713) junto a outras tradiccedilotildees como a de Enoque temos o
campo imageacutetico que nos permite entender como a figura de Jesus no Apocalipse 5 chega
ao Trono de Deus
Apoacutes esta breve consideraccedilatildeo do desenvovimento das tradiccedilotildees do misticismo
judaico e as origens do que se intitula ldquocristologia-angelomoacuterficardquo chegamos a um
complexo das tradiccedilotildees do misticismo judaico e apocaliacuteptico assim este artigo permite a
elaboraccedilatildeo do cenaacuterio exegeacutetico do cerimonial da entronizaccedilatildeo do sacerdoacutecio universal de
Jesus junto ao Trono de Deus
O texto faz alusatildeo agrave continuidade narrativa do capiacutetulo 4 Trata-se natildeo somente do
Trono de Deus e de uma liturgia mas a composiccedilatildeo dos 24 anciatildeos permanece na hipoacutetese
de uma corte celestial reunida na ldquosala do Trono de Deusrdquo
A funccedilatildeo na narrativa do (capiacutetulo 5) eacute ampliada Enquanto no (capiacutetulo 4) os
anciatildeos apenas se prostram e adoram logo notamos que no cap 5 um dos anciatildeos eacute
destacado por um pronunciamento no qual apresenta o Cordeiro como ldquoleatildeo da tribo de
Judaacute raiz de Davi e como aquele que venceurdquo
O texto segue o padratildeo narrativo que encontramos em (Dn 7 9-14) onde um como
ldquofilho do homemrdquo eacute entronizado e recebe autoridade para exercer o papel de um vice-
regente As imagens em Daniel tambeacutem nos permitem visualizar uma ldquoSala onde Tronos
satildeo colocadosrdquo ou um tipo de cenaacuterio preparado como um local apropriado para um rito
cerimonial de transferecircncia de poder
Portanto as configuraccedilotildees temaacuteticas satildeo proacuteximas embora tenhamos que respeitar
o desfecho de cada cenaacuterio e seu contexto histoacuterico- literaacuterio
Assim tambeacutem percebemos o tema da ldquodignidaderdquo do filho do homem em (Dn 7
9-14) Lembrando que (Apocalipse 411) exalta a Deus e sua diginidade por meio dos
anciatildeos e o capiacutetulo 5 do Apocalipse retoma o tema da ldquodignidaderdquo do Cordeiro Assim
prosseguimos com a divisatildeo proposta e interpretaccedilatildeo do texto
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
43 Natildeo localizei o termo ldquoAngelomoacuterfica-Antropomoacuterficardquo em minhas leituras mas o estabeleci aqui como
meio para interpretar a passagem biacuteblica supracitada
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b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
c) v4 e 5 ndash Desespero do Vidente A Proclamaccedilatildeo do Anciatildeo ndash ldquoO Reconhecimento
da Dignidade do Cordeirordquo
d) v6 e 7 ndash O Cordeiro recebe o livro ndash A Vitoacuteria do Cordeiro
e) v8-14 ndash Celebraccedilatildeo ao Cordeiro ldquoSacerdoacutecio e Realeza do Cordeirordquo - por parte
dos seres Viventes e dos Anciatildeos por parte de ldquouma voz de anjosrdquo toda a Criaccedilatildeo
21 - O Misticismo Judaico e Apocaliacuteptico em (Apocalipse 51-14)
a) v1 ndash Abertura da Cena (e vi) - Visatildeo do Trono e do Livro
Natildeo podemos deixar de considerarmos aqui os apontamentos de Holtz44 que
encontra em Apocalipse 5 uma referecircncia a um antigo ritual egiacutepcio de entronizaccedilatildeo com
trecircs estaacutegios o qual alega ter as formas e a estrutura baacutesica para a narrativa
Com base nestes rituais de entronizaccedilatildeo propotildees a divisatildeo baacutesica de trecircs etapas
1) Elevaccedilatildeo
2) Apresentaccedilatildeo
3) Entronizaccedilatildeo
Aune apresenta uma contra argumentaccedilatildeo de Roloff que concorda que haacute uma
entronizaccedilatildeo com ritual de trecircs estaacutegios dos reis orientais refletidos em Apocalipse 5
poreacutem julga que ele natildeo revela as fontes das quais eacute dependente Sua leitura revecirc as
categorias de uma forma surpreendentemente arbitraacuteria (invertendo a segunda e terceira
etapas e redefinindo-as) aparentemente sua intenccedilatildeo foi ldquoencaixarrdquo melhor os trecircs estaacutegios
para ver os eventos narrados em Apocalipse 5 Assim propondo a seguinte divisatildeo
1) Exaltaccedilatildeo a descriccedilatildeo dos eventos de exaltaccedilatildeo do discurso do anciatildeo (v5)
2) Atribuiccedilatildeo de poder dominante ao receber o ldquorololivrordquo (vv6 e 7) e
3) Apresentaccedilatildeo do governante Homenagem ao sacrifiacutecio pago pelo Cordeiro em
favor dos habitantes do mundo celestial (vv8-14)
44 Apud AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978333
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Contudo Aune menciona que esta proposta com diferentes formas na entronizaccedilatildeo
do Cordeiro apresentado por Jeremias Holtz e Roloff eacute extremamente vulneraacutevel a criacuteticas
em vaacuterias frentes
Em primeiro lugar tanto Jeremias e Holtz afirmam que esse padratildeo de trecircs estaacutegios
eacute encontrado em outros textos cristatildeos que refletem a entronizaccedilatildeo de Cristo (Mt 28 18-
20 Fl 2 9-11 I Tm 316 Hb 1 5-14) no entanto natildeo eacute nem uacutetil nem convincente pois
haacute grandes diferenccedilas entre estes textos e os hinos (particularmente Fl 2 5-11 I Tm 3 16)
e Ap 51-14 Ainda sim estudiosos que analisaram os hinos compreendem que natildeo se
encontra nestes o esquema ldquoExaltaccedilatildeo-Apresentaccedilatildeo-Entronizaccedilatildeordquo considerado uacutetil e
esclarecedor
Outras eruditos sugestionam outras possibilidades e propostas sobre a possiacutevel
relaccedilatildeo da estrutura do Apocalipse 5 com contextos e ambientes diversos dentre eles estaacute
a relaccedilatildeo com as duas cerimocircnias de entronizaccedilatildeo no Antigo Testamento configuradas do
Antigo Israel citadas por R de Vaux (I Rs 1 32-48 e II Rs 11 12-20) que se utilizando
das duas sintetiza uma estrutura de 5 partes (1) Investidura da insiacutegnia real (2) a unccedilatildeo
(3) a aclamaccedilatildeo (4) a entronizaccedilatildeo (5) a homenagem Contudo o ritual de unccedilatildeo natildeo eacute
encontrado em Apocalipse 5 o que distacircncia o texto deste paradigma A discussatildeo
permanece no campo das hipoacuteteses em meio haacute uma divesidade de opiniotildees sobre a
estrutura da narrativa e suas origens
Assim fundamentados pela pesquisa permanecemos com a seguinte divisatildeo e
interpretaccedilatildeo concluiacutemos aacute luz da pesquisa de que Joatildeo possui relaccedilotildees em sua literatura
com as tradiccedilotildees de Isaiacuteas e I Enoque que descreve a ldquoSala ndash Palaacuteciordquo onde se encontra o
Trono de Deus Sendo que suas narrativas tambeacutem agregam aspectos dos ldquoseres viventesrdquo
que estatildeo tanto no Trono quando imoacutevel quanto na ocasiatildeo em que se move por meio da
Carruagem
Assim nossa compreensatildeo eacute a de que Joatildeo entende ser a ldquoSalado Tronordquo o
ambiente legiacutetimo onde as cemimocircnias lituacutergicas devem acontecer sendo ambos os textos
tanto Apocalipse capiacutetulo 4 quanto o capiacutetulo 5 cenaacuterios narrativos de cerimocircniais
realizados na ldquoSala do Tronordquo
b) v2 e 3 ndash A Dignidade do Cordeiro
Portanto a ecircnfase da narrativa em (Ap 5) eacute a ldquoDignidade (ἄξιος ndash digno) do
Cordeirordquo que ganha intensidade diante do contraste com a declaraccedilatildeo que apresenta o
ldquoanjordquo na configuraccedilatildeo de ldquoum anjo forterdquo
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1 καὶ εἶδον ἄγγελον ἰσχυρὸν ndash e vi em anjo forte
Do verso 1 ao 5 podemos contemplar um primeiro movimento do texto e da
experiecircncia visionaacuteria
Todo cenaacuterio eacute no Trono e ao redor do livro escrito e selado
8 E quando recebeu o livro os quatro viventes os vinte e quatro anciatildeos prostraram-se diante o cordeiro tendo cada um harpa e taccedilas de ouro cheias de incenso
as quais satildeo as oraccedilotildees dos santos
Pringent47 menciona que o termo hebraico ldquokinnorrdquo eacute inspirado na Septuaginta que
quase sempre o traduz por ldquoκιθάραν ndash harpasrdquo e que o uso de ldquoφιάλας - taccedilasrdquo eacute
empregado unicamente no Apocalipse dentro no Novo Testamento tendo seu uso
47 PRIGENT Pierre O Apocalipse Traduccedilatildeo Luiz Joatildeo Barauacutena Satildeo Paulo ndash Loyola 2002119
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designado no Antigo Testamento junto a libaccedilatildeo de uso cultual e lituacutergico (cf Ex 27 3
38 3 Nm 4 14 I Rs 7 40ss)
Josefo48 menciona a presenccedila de duas taccedilas de ouro cheias de incenso sobre os patildees
da preposiccedilatildeo O Antigo Testamento faz menccedilatildeo constante de taccedilas de ouro e seu uso no
Templo um dos textos paradigmaacuteticos para essa questatildeo eacute o texto no qual Davi apresenta
todos os materiais para construccedilatildeo do Templo em (I Cr 28) com destaque para o (verso
17) ndash ldquoE ouro puro para os garfos e para as bacias e para os jarros e para as taccedilas de
ouro para cada taccedila seu peso como tambeacutem para as taccedilas de prata para cada taccedila seu
pesordquo
Natildeo haacute duacutevidas de que se trata de um ato lituacutergico Inicia-se a grande celebraccedilatildeo
pela qual o Cordeiro eacute em absoluto reconhecido como detentor do direito conquistado por
meacuteritos proacuteprios e assim pode abrir o livro A celebraccedilatildeo tem sua iniciativa pelos ldquoseres
viventes ndash hayotrdquo seguido pelos anciatildeos
O fato de os seres viventes iniciarem a celebraccedilatildeo nos remete a forccedila e ao
significado das tradiccedilotildees miacutesticas do Trono uma vez que jaacute podemos aferir durante a
pesquisa que a divindade que se assenta no Trono eacute sempre caracterizada por aclamaccedilotildees
que procedem das ldquohayotrdquo (como em Ezequiel)
Conveacutem ressaltar que o fato de os ldquoseres viventesrdquo prestarem culto ao Cordeiro as
insere num movimento narrativo pelo qual a ldquodignidade do Cordeirordquo alcanccedila o seu
cliacutemax uma vez que estes ldquoseres viventesrdquo aparecem na tradiccedilatildeo do misticismo judaico
apenas se dirigindo objetivamente com aclamaccedilotildees ao Trono e ao que se assenta sobre ele
Parece ser uma indicaccedilatildeo contundente de que o Cordeiro eacute reconhecido como Deus49
Os anciatildeos aparecem em segundo plano o que mantecircm os ldquoseres viventesrdquo da
tradiccedilatildeo miacutestica da Mercavaacuteh no primeiro plano Isto pode estabelecer algum tipo de
relaccedilatildeo de autoridade entre os ldquoseres viventesrdquo e os ldquoanciatildeosrdquo como tambeacutem uma espeacutecie
de ordem e de hierarquia estabelecida no tocante agrave liturgia uma vez que no capiacutetulo 4
tambeacutem aparecem sob a mesma oacutetica (cf Ap 4 89)
Incenso e oraccedilotildees satildeo elementos encontrados no AT no periacuteodo do Segundo
Templo em Qumran como em outros contextos lituacutergicos num mundo complexo e
diversificados de ritos cerimoniais ainda assim se destaca o uso por parte dos ritos
sacerdotais portanto natildeo eacute incomum neste cenaacuterio de modo que a cerimocircnia conta com
48 Ibid Apud Pringent p 119 - Antiguidades Judaicas 3143 49 Se assim o eacute as indagaccedilotildees sobre questotildees ligadas ao monoteiacutesmo judaico e a divindade de Jesus entram
em tensatildeo e novamente acende a fogueira das discussotildees em torno do assunto
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elementos que fazem parte das ofertas e sacrifiacutecios que apontam para a consolaccedilatildeo dos
51 AUNE David E Word Biblical Comentary vl 52 ndash Revelation 1-5 Ed Thomas Nelson 1978335 52 CARDOSO Joseacute Roberto Correcirca ldquoCristologia Angelomoacuterfica de Hebreus - Estudo Soacutecio-Retoacuterico e
Histoacuteria das Religiotildees Comparadas em Hebreus 11-14 25-18 71-10rdquo Satildeo Paulo UMESP 2005
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Deus eterno estaacute trabalhando ateacute agora Por isso a adoraccedilatildeo ao que sempre estaacute no
meio do povo
4 QUAL A MENSAGEM OU CONSELHO SOBRE O VIVER UM
CRISTIANISMO COERENTE QUE SOBREVIVA A ISOLAMENTOS SOCIAIS
E PANDEMIAS
Precisamos amar a criatividade e o processo construtivo do reino e comunidade
Vejo Cristo caminhando de forma livre abenccediloadora e plural dialogando com todos
quantos cruzarem seu caminho
Natildeo haacute propriamente conselho ou mensagem mas a oraccedilatildeo eacute para que o povo
esteja livre para esse Deus trino que nos enviou seu Espiacuterito Santo para sermos livres
Oro para natildeo precisarmos de intermediadores Natildeo deleguem o grande desejo do
Senhor Diz sua palavra ldquo[] agrada-te do Senhor e espera nEle e ele satisfaraacute o desejo do
coraccedilatildeo (Salmo 37) ndash Que este desejo seja sua presenccedila sua doce voz seus ensinos seu
confronto Natildeo outras coisas quaisquer
Agravequele que estaacute buscando ser o orientador o ldquopersonal profectrdquo o mentor ndash
lembre-se da recomendaccedilatildeo do Cristo [] Pode porventura o cego guiar o cego Natildeo
cairatildeo ambos na cova (Lucas 639)
Que os poderes deste tempo natildeo corrompam nossos costumes Servos Somos
Servos Chamados para Caminhar juntos lavando os peacutes uns dos outros
Se delegarem a vocecirc a autoridade de conduzir ndash e a exemplo de Corneacutelio com
Pedro (Atos 10) ndash fuja e apresente-se como homem que tambeacutem estaacute na caminhada da feacute
Joatildeo Calvino reformador protestante entende que a feacute e a espiritualidade natildeo eacute
uma expectativa ou confianccedila mas uma convicccedilatildeo No seu comentaacuterio do Salmo 42 ele
apresenta a certeza que o salmista tinha do livramento divino natildeo como ldquouma expectativa
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imaginaacuteria produzida por uma mente fantasiosa mas confiado nas promessas de Deus ele
natildeo soacute se anima a nutrir soacutelida esperanccedila mas tambeacutem se assegura de que receberia
infaliacutevel livramentordquo
Tal afirmaccedilatildeo mostra como o reformador se identificava com a perspectiva teiacutesta
cristatilde ao mostrar a feacute como uma convicccedilatildeo sustentada por um objeto definido e real isto eacute
Deus Aleacutem disso Calvino em um de seus sermotildees diz que ldquonossa feacute natildeo tem que estar
fundamentada no que tenhamos pensado por noacutes mesmos mas no que nos foi prometido
por Deusrdquo
Com esta ideia o Pastor de Genebra mostra seu compromisso com a cosmovisatildeo
cristatilde de que a feacute tem como objeto de sustentaccedilatildeo natildeo apenas o ser divino mas a revelaccedilatildeo
que ele faz de sua vontade
Ao comeccedilar a discorrer sobre a feacute Calvino condena o pensamento de que feacute eacute
apenas consentimento ou especulaccedilatildeo
ldquoCom efeito a maioria dos homens ao ouvir falar de feacute nada mais profundo
concebe do que certo assentimento comum agrave histoacuteria do Evangelho De fato
quando nas escolas discutem a respeito da feacute afirmando simplesmente que Deus
lhe eacute objeto mercecirc de efecircmera especulaccedilatildeo Transviam as miacuteseras almas em
vez de as dirigirem ao seu destinordquo60
Nestas palavras ele deixa clara sua distacircncia da percepccedilatildeo de que feacute eacute tatildeo somente
uma concordacircncia com algo que foi dito Calvino agrave semelhanccedila dos demais reformadores
cristatildeos tambeacutem pensava a feacute como convicccedilatildeo em Deus e em sua revelaccedilatildeo Contudo
ainda fazendo parte da cosmovisatildeo teiacutesta cristatilde em seus escritos mostra algumas
divergecircncias de outros cristatildeos quando discorre sobre este assunto
Calvino entende que Deus natildeo eacute somente o objeto da nossa feacute mas igualmente o
autor da mesma
ldquoA feacute convicta natildeo depende do endosso humano mas ao contraacuterio eacute nosso
dever repousar na verdade nua de Deus de modo que nem os homens nem todos
os anjos juntos tenham como despojar-nosrdquo (CALVINO p 49)
Nas Institutas Calvino afirma que ldquonoacutes soacute somos levados a Cristo e seu reino em
genuiacutena e verdadeira feacute em virtude do Espiacuterito do Senhorrdquo Isto significa que aleacutem de
objeto da feacute Deus eacute tambeacutem aquele que nos conduz agrave mesma Eacute impossiacutevel de acordo
com o pensamento de Calvino que algueacutem tenha genuiacutena feacute em Deus sem que tenha sido
conduzido ao mesmo por Deus mediante seu Espiacuterito Calvino valoriza a oraccedilatildeo para ele
60 12 Calvino Joatildeo Instituicioacuten de la religioacuten Cristiana Livro III cap 2 seccedilatildeo 1
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o principal exerciacutecio da feacute eacute a oraccedilatildeo ldquoA oraccedilatildeo eacute fruto da feacute verdadeira eacute a manifestaccedilatildeo
da graccedila na almardquo (STROHL 2004 p 49)
Vemos em Calvino uma feacute disposta Segundo ele a feacute opera grande virtude de se
manter a confianccedila em Deus mesmo quando ele nos envia a morte o oproacutebrio a
enfermidade e a indigecircncia Calvino diz que a praacutetica da oraccedilatildeo eacute uma ordenanccedila eacute a
preparaccedilatildeo a fim de entrarmos em coloacutequio com Deus
Ele defende que a feacute eacute dada por Deus a quem ele deseja Isto eacute ela tem origem natildeo
no homem mas no Criador A feacute na perspectiva calvinista natildeo eacute fruto do esforccedilo humano
natildeo deriva das capacidades inatas do homem em crer piamente em algo tampouco decorre
de alguma habilidade adquirida e desenvolvida ao longo da vida de quem quer que seja
Para Calvino a verdadeira feacute soacute existe quando decorre de Deus que aleacutem de ser seu
autor eacute o seu objeto maior Esta perspectiva da feacute novamente levanta homens e mulheres
para uma resposta ao dom de Deus E para ele eacute impossiacutevel que a verdadeira feacute caminhe
dissociada da Palavra de Deus Retirada a Palavra a feacute fica impossibilitada de resistir a
algo Isto pelo fato de que acima de qualquer outra coisa eacute mediante a feacute que vecircm o
conhecimento da verdade de Deus e a elucidaccedilatildeo da revelaccedilatildeo feita na natureza que
aponta para a existecircncia do Criador mas que sem a Palavra permanece obscurecidamente
compreendida
A feacute ganha perspectiva de engajamento social e em seu texto Humanismo Social
temos evidecircncias de que os ldquoeleitosrdquo pela feacute satildeo atuantes e envolvidos com seu meio
social
Movimentos posteriores eacute a maior prova de como a feacute tomou projeccedilotildees conquistou
e mobilizou vaacuterias geraccedilotildees Portanto caminhamos para a compreensatildeo de que o seacuteculo
XVI era um novo tempo e a feacute vivenciada estava totalmente desfocada de protestante
vemos que a feacute eacute fustigada a prestar conta em seu tempo e o produto desta soacute eacute evidenciado
com o viver intensamente desta feacute Assim nos tempos de isolamento social eacute importante
ver na histoacuteria da cristandade q necessidade de um povo que avanccedila apesar das lutas e
desafios
Para o tempo presente eacute importante que tiremos de Deus a maacutescara da
onipotecircncia Nosso Deus sempre se relacionou e se relaciona Ele natildeo eacute cristatildeo Muito
antes de qualquer crenccedila Ele jaacute existia O que vem posteriormente eacute apenas religiatildeo que
passaram a avocar para si a propriedade do Todo-poderoso como se o Criador fosse
patrimocircnio exclusivo do homem e natildeo o contraacuterio
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Daiacute o fruto desta inversatildeo na relaccedilatildeo de feacute foi de intoleracircncias e conflitos com a feacute
que Deus nos daacute Evidentemente natildeo poderiacuteamos tirar essa ldquomaacutescara de Deusrdquo
imaginando-nos independentes do mundo que vivemos
Pelo contraacuterio demos muita atenccedilatildeo a este mundo agrave pouca credibilidade que ele
reserva agrave Igreja e agrave Feacute quando trata de seus negoacutecios ao crescimento impressionante do
poder da humanidade em inuacutemeros setores e agraves consequecircncias perversas desse poder A feacute
em muito contribuiu para este crescimento mas verificamos tambeacutem como realidade cada
vez mais inegaacutevel que este poder em plena expansatildeo contra a feacute e pela feacute natildeo gera vida
Muitos vivem esquecidos e excluiacutedos enquanto outros em atitude de autodefesa
preventiva refugiam-se nos corporativismos e nos ciacuterculos fechados Hoje todo esse poder
humano cava um vazio enorme insuportaacutevel explorado por seitas de todo tipo que
mediante promessas e exigecircncias aberrantes recrutam seguidores com a maior facilidade
nessa multidatildeo de pessoas amarguradas e desprovidas do essencial da feacute dada por Deus
que sofrem Segundo os evangelhos eacute diante de gente assim que Jesus se sentia ldquotomado
de compaixatildeordquo
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
No cenaacuterio atual da feacute prosseguir na proclamaccedilatildeo da onipotecircncia de Deus seja
associando-a a tudo que eacute extraordinaacuterio ou sem explicaccedilatildeo seja repetindo ingenuamente o
credo tradicional sem explicaccedilatildeo e reflexatildeo sem perceber as interpelaccedilotildees que essa
proclamaccedilatildeo hoje levanta seraacute continuar contribuindo para a rejeiccedilatildeo do Evangelho e da
real dimensatildeo da feacute que estaacute tatildeo deplorada pelas igrejas O Deus de Jesus Cristo instiga os
seus a exaltar seu poder Ou pede que reconheccedilam seu amor A ldquogeraccedilatildeo maacute e aduacuteltera
que reclama um sinalrdquo (Mateus 1239 e 164) ldquogeraccedilatildeo increacutedulardquo (Marcos 919) seriacuteamos
nos hoje confessando a feacute e impondo teimosamente a maacutescara da onipotecircncia ao Deus que
se revela pela face de Cristo crucificado
Apoacutes tantas ilusotildees de um progresso sem fim da humanidade apoacutes tantas
promessas de vida abundante e justa para todos apoacutes a monstruosidade da Shoah e a
sucessatildeo de guerras muitas provocadas pela diferenccedila de compreensatildeo da feacute e em torno da
feacute ou pela feacute obriga-nos a reconhecer a verdade que a velha Biacuteblia obstinadamente nos
passa Deus natildeo desarma o mal nem transforma os seus numa casta protegida e
privilegiada O Deus de Israel e de Jesus decididamente natildeo alardeia poder irresistiacutevel
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Ele se daacute a conhecer ao mundo por um projeto propositadamente alheio agrave
dominaccedilatildeo e sobretudo agrave onipotecircncia porque contesta as relaccedilotildees de forccedila na organizaccedilatildeo
da vida Ele eacute alvo da nossa feacute e isso eacute o que o agrada O reino que ele propotildee eacute diferente
de outros essa eacute a beleza louca da nossa feacute ou deveria ser A palavra ldquoonipotecircnciardquo natildeo
aproxima o amor de Deus libertador da vida parece estar longe do bom pastor que Jesus
apresentou
ldquoEu sou o Bom Pastor que daacute a sua vida pelas ovelhas Eu sou a porta quem entra
por mim seraacute salva entraraacute e sairaacute e encontraraacute pastagemrdquo (Joatildeo 9) Jesus eacute o cuidador da
alma que fundamentalmente nos liberta de tudo o que nos aprisiona adoece e mata Isso
eacute sua salvaccedilatildeo Natildeo haacute aprisionamentos em Jesus e no seu Evangelho de tal modo que os
seus entram e saem livremente de forma espontacircnea natildeo satildeo cerceados Para seguirem
Jesus precisam ouvir e reconhecer sua Voz no coraccedilatildeo porque natildeo haacute condicionamentos
manipulaccedilatildeo regras de contenccedilatildeo Os que estatildeo em Jesus entram e saem
Quem lecirc as escrituras com a feacute simples de nela encontrar Palavra de Vida jamais
seraacute manipulado de qualquer ordem e jamais se sentiraacute coagido pelo medo a permanecer
em qualquer sistema A Religiatildeo aprisiona trabalha com o medo de que se algueacutem deixar
de seguir ou fazer o que mandam seraacute castigado ou que se resolver deixar aquele
ambiente religioso seraacute castigado por seres espirituais que se vingaratildeo da decisatildeo de
romper com tal realidade
A feacute nos mobiliza a agradar a Deus vem dele para que ningueacutem se glorie e toda
vez que estamos em movimento favoraacutevel ou contraacuterio estamos sendo guiado pela feacute E
isso agrada a Deus ldquoConheccedilo as tuas obras que nem eacutes frio nem quente quem dera foras
frio ou quente Assim porque eacutes morno e natildeo eacutes frio nem quente vomitar-te-ei da minha
bocardquo
(Apocalipse 31516) A feacute nos impele nos move nos conduz Simples assim para
o alto e avante
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