Resumo de Direito Penal para OAB Professor Lúcio Valente Aula: 3 (2ª parte) 1 EXCLUDENTES DE ILICITUDE 1. Relação entre tipicidade e ilicitude Matar alguém é crime ou indica ser crime? Matar alguém indica ser crime. Matar alguém só será crime se não ocorrer qualquer causa que justifique essa conduta (legítima defesa, estado de necessidade etc.). Onde há fumaça não necessariamente há fogo. Onde há fumaça, provavelmente há fogo, podendo ser gelo seco! Onde há fato típico, provavelmente há ilicitude, podendo ocorrer uma causa justificante (ou excludente) de ilicitude. fato típico Conduta. resultado nexo causal tipicidade ilicitude estado de necessidade legítima defesa estrito cumprimento do dever legal exercício regular do direito consentimento do ofendido culpabilidade imputabilidade potencial consciência da ilicitude exigibilidade de conduta diversa
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Resumo de Direito Penal para OAB Professor Lúcio … · 2 O Código Criminal do Império (1830) adotou a teoria diferenciadora, que foi mantida pelo Código Penal de 1890. Já o
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Professor Lúcio Valente
Aula: 3 (2ª parte)
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EXCLUDENTES DE ILICITUDE
1. Relação entre tipicidade e ilicitude
Matar alguém é crime ou indica ser crime?
Matar alguém indica ser crime. Matar alguém só será crime se não ocorrer
qualquer causa que justifique essa conduta (legítima defesa, estado de necessidade
etc.). Onde há fumaça não necessariamente há fogo. Onde há fumaça,
provavelmente há fogo, podendo ser gelo seco! Onde há fato típico, provavelmente
há ilicitude, podendo ocorrer uma causa justificante (ou excludente) de ilicitude.
fato típico
Conduta.
resultado
nexo causal
tipicidade
ilicitude
estado de
necessidade
legítima
defesa
estrito
cumprimento
do dever legal
exercício
regular do
direito
consentimento
do ofendido
culpabilidade
imputabilidade
potencial
consciência
da ilicitude
exigibilidade
de conduta
diversa
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A teoria que adotamos para representar isso que acabei de falar é a TEORIA
INDICIÁRIA DO TIPO PENAL (Ratio Cognoscendi).
Anote: a doutrina finalista de Welzel defende que a tipicidade é mero indício
da antijuridicidade. Teoria da Ratio Cognoscendi.
Conceito de ilicitude (ou antijuridicidade)
Ilicitude é a relação de antagonismo que se estabelece entre a conduta
humana voluntária e o ordenamento jurídico, de modo a causar lesão ou
perigo de lesão a um bem jurídico tutelado (Toledo).
O raciocínio, como se vê, é feito por exclusão. Tudo que não for ilícito, será lícito.
Injusto Penal
RELAÇÃO ENTRE TIPICIDADE E ILICITUDE
Teoria Indiciária da ilicitude (Ratio Cognoscendi)
O fato típico indica ser ilícito.
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Injusto Penal (fato típico + antijurídico): uma conduta típica e antijurídica é um
INJUSTO PENAL, sendo a antijuridicidade um JUÍZO NEGATIVO DE VALOR, na
expressão de Zaffaroni, que incide sobre a conduta humana, sendo o injusto a
“CONDUTA HUMANA DESVALORADA”.
Anote: para Damásio, Capez, Delmanto, entre outros, o injusto Penal já é
considerado crime (Teoria Bipartida).
Não obstante, a doutrina majoritária, nacional e estrangeira considera o crime em
seus três elementos FATO TÍPICO + ANTIJURÍDICO + CULPÁVEL.
OBSERVAÇÃO:
CUIDADO COM OS TERMOS!
justificantes ou descriminantes → afastam a ilicitude
Dirimentes, eximentes → afastam a culpabilidade
CAUSAS DE JUSTIFICAÇÃO EM ESPÉCIE (EXCLUDENTES DE ILICITUDE OU
ANTIJURIDICIDADE)
FATO TÍPICO ILÍCITO INJUSTO PENAL
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ESTADO DE NECESSIDADE
1. Conceito Legal
Art. 241 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para
salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de
outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas
circunstâncias, não era razoável exigir-se.
O Estado de Necessidade configura-se pela existência de uma situação de PERIGO,
ATUAL (ou iminente), INVOLUNTÁRIO (que o agente não tenha provocado
por sua vontade) e INEVITÁVEL, que exige ação de proteção necessária para
garantir um bem jurídico próprio ou de terceiro, evitando-se mal próprio ou de
outrem, que viola um dever, tornando a conduta ILÍCITA.
( FCC - 2009 - TJ-PI - Analista Judiciário) São elementos do estado de
necessidade:
a) perigo atual; defesa de direito próprio ou de outrem; reação moderada.
b) que ocorra um perigo; que o agente use dos meios moderados e
necessários.
c) perigo iminente; que o agente defenda um direito legítimo e seu; que use
moderadamente dos meios necessários.
d) perigo atual ou iminente; que o agente não o tenha provocado; que não
poderia ser evitado.
e) reação a injusta agressão; atual ou iminente; uso dos meios necessários
moderadamente.
1 O artigo 24 somente estabelece as regras gerais do Estado de Necessidade; de modo específico, ele é estabelecido nos arts. 128, I (aborto necessário);
146, § 3º, I (constrangimento ilegal).
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Resposta: letra D.
No exemplo da tábua de Carneades (luta dos náufragos por uma taboa), existe
um conflito entre a vida de duas pessoas que tentam preservá-las em situação de
perigo.
O raciocínio é que o Estado não pode estar presente em todas as situações de conflito.
Quando a ocorrência do perigo surge, o Direito permite que haja a destruição de um
bem jurídico para a preservação de outro. Contudo, o Estado de Necessidade exige
alguns requisitos que agora passo a apresentar.
Requisitos do Estado de Necessidade
a. Perigo atual
O ponto nodal do Estado de Necessidade, que o diferencia da Legítima Defesa, é que
nesta existe uma agressão humana, enquanto no primeiro (estado de necessidade)
há uma situação de PERIGO em que existem dois bens jurídicos em conflito, sendo
que um deve perecer para a salvaguarda do outro.
(FUNDEP - 2005 - TJ-MG) Considerando-se as determinações legais,
é INCORRETO afirmar que a legítima defesa pode ser alegada quando a
agressão for praticada por
a) indivíduos com mais de 70 anos.
BEM JURÍDICO
BEM JURÍDICO
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b) loucos de todo gênero
c) quaisquer animais.
d) sujeitos considerados imputáveis.
Resposta: Letra C.
b. Perigo Involuntário
(POLICIA CIVIL_MG_2007) São requisitos para configuração do estado de
necessidade a existência de situação de perigo atual que ameace direito
próprio ou alheio, causado ou não voluntariamente pelo agente que não tem
dever legal de afastá-lo.
Resposta: Falso
Só poderá alegar Estado de Necessidade aquele que se salve de um perigo não
causado por sua própria vontade (dolosamente).
Estado de Necessidade
Situação de Perigo
atual
Legítima Defesa
Reação à agressão
humana injusta,
atual ou iminente
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O perigo não pode ter sido provocado DOLOSAMENTE pela pessoa que invoca
o Estado de Necessidade (segundo maioria da doutrina). Caso provoque o
perigo culposamente, poderá fazê-lo. Interessante que, caso o sujeito cria
intencionalmente a situação de perigo, coloca-se ele em uma situação de
garante (art. 13, § 2º, a), devendo agir para evitar o resultado.
b. Inevitável
O perigo não pode ser daqueles evitáveis. O Direito, no Estado de Necessidade, só
aceita a exclusão da ilicitude se outro caminho não houver para o autor.
Em uma situação de perigo, caso o agente tenha a opção de fugir do perigo a destruir
bem jurídico alheio, deve fazê-lo. Caso o agente tenha a alternativa de sair, deve
escolher a “covardia” a destruir um bem de inocente.
c. Proporcionalidade
Só pode haver alegação de estado de necessidade quando houver proporcionalidade
entre o bem protegido e aquele sacrificado. Não há proporcionalidade da conduta de
quem sacrifica uma vida para salvar sua coleção dos Beatles durante um incêndio.
Caso o agente destrua desproporcionalmente um bem jurídico para salvar outro irá
responder pelo excesso.
i. Excesso no Estado de Necessidade Justificante: Pode ocorrer quando o
autor, na conduta de preservar interesse legítimo de outrem, para salvar o seu, atua
excessivamente a título de dolo ou culpa.
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Natureza jurídica
O Estado de Necessidade no Código Penal Brasileiro é sempre justificante, ou seja,
afasta sempre a ilicitude.
TEORIA UNITÁRIA OU MONISTA OBJETIVA (adotada pelo CPB2): todo estado
de necessidade é justificante.
CESPE_Juiz Federal Substituto_TRF_5ª Região_2007-adaptada) Para a
teoria unitária, diferentemente do que ocorre com a teoria diferenciadora,
todo estado de necessidade é justificante, inexistindo estado de necessidade
exculpante.
Resposta: correto.
As situações que levam ao estado de necessidade afastam sempre a ilicitude
(justificante). Não existe outro estado de necessidade a não ser aquele que tenha por
natureza justificar a conduta típica.
2 O Código Criminal do Império (1830) adotou a teoria diferenciadora, que foi mantida pelo Código Penal de 1890. Já o projeto Alcântara Machado (que
deu origem ao Código Penal de 1940) adotou a teoria unitária. O anteprojeto Hungria retornou à adoção da teoria diferenciadora, que foi adotada pelo natimorto Código de 1969.
Requisitos do Estado de Necessidade
Perigo Atual
Perigo não causado dolosamente pelo
agente
Inevitabilidade
Proporcionalidade
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Dever legal de enfrentar o perigo
Quem tem o dever legal de enfrentar o perigo (ex. capitão do navio, Bombeiro Militar,
policial etc.), em princípio, não pode alegar a justificante. Contudo, deve-se observar
que o direito não exige atos heróicos.
Não se deve confundir, portanto, a OBRIGAÇÃO DE CORRER O PERIGO como
DEVER DE SACRIFICAR-SE.
( PGT - 2008 - PGT - Procurador do Trabalho) O estado de necessidade pode
ser alegado por quem não tinha o dever legal de enfrentar.
Resposta: correto.
( CESPE - 2010 - TRE-MT ) Pode alegar estado de necessidade quem tem o
dever legal de enfrentar o perigo, desde que demonstre que praticou o fato
para salvar de perigo atual direito próprio cujo sacrifício, nas circunstâncias,
não era razoável exigir-se.
Resposta: errado.
Espécies de Estado de Necessidade
Estado de necessidade defensivo e agressivo
AGRESSIVO – ocorre quando a conduta do agente sacrifica bens de um inocente, não
provocador da situação de perigo (ex.: motorista que, para evitar sua morte quase
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certa pelo choque de seu veículo com uma jamanta que invadira sua meia pista,
desvia-o para o acostamento, atropelando um ciclista.)
DEFENSIVO – ocorre quando a conduta do agente dirige-se diretamente contra o
produtor da situação de perigo, a fim de eliminá-la (ex.: destruir as janelas de um
veículo para salvar criança que foi esquecida pelo pai dentro do automóvel). Neste
caso, o pai da criança causou o perigo. O salvador da criança destruiu um bem
jurídico do próprio causador (o pai).
A importância desta diferenciação é que, no primeiro caso (estado de
Estado de Necessidade Próprio e de Terceiros
PRÓPRIO: A ação se dá para salvar-se a si mesmo.
TERCEIROS: A ação corre para salvamento de outrem.
Ambas as situações são legítimas, desde que preenchidos os requisitos do estado de
necessidade.
Estado de Necessidade Real e Putativo
REAL: O perigo corresponde à realidade.
ESTADO DE NECESSIDADE
Agressivosacrifica bens de um
inocente, não provocador da situação de perigo
Defensivovolta-se ao causador do
perigo
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PUTATIVO (imaginário): O agente supõe erroneamente estar em situação de
perigo. Aplica-se, aqui, a regra do art. 20, § 1º, do Código Penal.
Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o
dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei.
Descriminantes putativas
§ 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas
circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação
legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é