1. Do ritual ao drama: o nascimento do teatro ocidental As manifestações de caráter teatral e dramático acompanham a história da humanidade e sua evolução. Mesmo os homens pré-históricos já usavam máscaras e fantasias de animais, imitando-os, para atrair uma caça farta. O teatro surge a partir dos rituais sagrados, nos quais os homens tentavam, através de canto, dança e representações, dominar e entender a natureza, além de agradar e homenagear os deuses sagrados. O drama ocidental, assim como o conhecemos e entendemos contemporaneamente, teve seus primórdios junto à civilização grega, no final do século VII a.C. Suas raízes podem ser relacionadas ao ditirambo, uma evolução proveniente dos rituais realizados pelos seguidores de Dioniso, o deus da embriaguez, da luxúria, do prazer. O mito de Dioniso, por ter-se fixado tardiamente na Península do Peloponeso (por volta do século VI a.C, quando as poesias épicas e seus heróis já circulavam), por contar com muitas versões e uma imensa variabilidade de fatos e ações, possibilitou que dos rituais em sua honra surgissem as primeiras formas dramáticas ocidentais que evoluiriam a ponto de chegarmos a toda complexidade da dramaturgia e das encenações realizadas na Grécia Antiga. O ditirambo era uma canção em forma circular, dançada e coreografada, acompanhada pelo som de flautas, que narrava fatos da vida de Dioniso. Os participantes integravam o coro do ditirambo em estado de êxtase, prevendo que assim as pessoas sairiam de seus estados cotidianos de sentido para atingir uma personificação ou o contato com o deus. Essa forma teatral semi-religiosa e semi- Material para fins didáticos Autora: Taís Ferreira ENFOQUE 1: HISTÓRIA DO TEATRO
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1. Do ritual ao drama: o nascimento do teatro ocidental
As manifestações de caráter teatral e dramático acompanham a história da
humanidade e sua evolução. Mesmo os homens pré-históricos já usavam
máscaras e fantasias de animais, imitando-os, para atrair uma caça farta. O teatro
surge a partir dos rituais sagrados, nos quais os homens tentavam, através de
canto, dança e representações, dominar e entender a natureza, além de agradar e
homenagear os deuses sagrados.
O drama ocidental, assim como o conhecemos e entendemos
contemporaneamente, teve seus primórdios junto à civilização grega, no final do
século VII a.C.
Suas raízes podem ser relacionadas ao ditirambo, uma evolução
proveniente dos rituais realizados pelos seguidores de Dioniso, o deus da
embriaguez, da luxúria, do prazer. O mito de Dioniso, por ter-se fixado
tardiamente na Península do Peloponeso (por volta do século VI a.C, quando as
poesias épicas e seus heróis já circulavam), por contar com muitas versões e uma
imensa variabilidade de fatos e ações, possibilitou que dos rituais em sua honra
surgissem as primeiras formas dramáticas ocidentais que evoluiriam a ponto de
chegarmos a toda complexidade da dramaturgia e das encenações realizadas na
Grécia Antiga.
O ditirambo era uma canção em forma circular, dançada e coreografada,
acompanhada pelo som de flautas, que narrava fatos da vida de Dioniso. Os
participantes integravam o coro do ditirambo em estado de êxtase, prevendo que
assim as pessoas sairiam de seus estados cotidianos de sentido para atingir uma
personificação ou o contato com o deus. Essa forma teatral semi-religiosa e semi-
Material para finsdidáticosAutora: Taís Ferreira
ENFOQUE 1:HISTÓRIA DO TEATRO
literária foi introduzida na Ática em 550 a.C, porém já desenvolvia-se nas regiões
de Corinto e nas regiões dóricas desde o séc. VII a.C. As máscaras, ou rostos
pintados, já faziam parte dos ditirambos, bem como a existência de público, fator
fundamental ao fenômeno teatral. O ditirambo evolui de uma forma ritual em que
todos seguidores participam igualitariamente para a existência de um Corifeu(líder do coro), que dialoga e comanda os coreutas (participantes do ditirambo).
Árion, poeta de Lesbos e líder de ditirambos, introduziu algumas
modificações, tais como escrever e formalizar versos presentes no ritual
dionisíaco, fixar o número de coreutas em 50 e vestí-los com peles de animais, a
maneira dos sátiros; impôs alguma ordem e disciplina à informalidade do ritual,
alterou a forma que anteriormente era a procissão para a forma circular pela qual
os ditirambos são reconhecidos, além de intercalar breves colóquios entre os
coreutas e o Corifeu, composições cantadas e faladas ao som da lira.
Téspis pode ser considerado o primeiro ator da história do teatro ocidental
e também um dos responsáveis pela criação do drama grego. Poeta e líder do
ditirambo, nasceu na Icária e no início do séc. VI a.C. transferiu-se para Atenas,
onde possivelmente tenha começado a exibir suas peças. Ao destacar-se do coro
e travar um diálogo com o Corifeu, estabelecendo a contracenação, ao
transformar a narrativa em diálogo acerca de acontecimentos vividos no
momento, cria o primeiro ator: o hypocrites (aquele que responde). Assim, além
deste feito de grande importância à evolução do teatro, Téspis também introduz o
uso de máscaras de linho, possibilitando a existência de diferentes personagens
em cena. Empregou o diálogo de forma mais ampla que qualquer de seus
predecessores ou contemporâneos, desenvolvendo uma trama dramática de
razoável extensão. De engenhoso líder de ditirambos tornou-se dramaturgo,
recebendo em 534 a.C. o primeiro prêmio concedido à representação de tragédias
em Atenas. Em 538 a.C. Téspis foi patrocinado pelo tirano ateniense Psístrato,
que tinha o intuito de divertir o povo, advindo daí os primeiros festivais e
competições teatrais, que mais tarde seriam institucionalizados e fariam parte do
calendário cívico oficial da Grécia.
Com sua evolução, o teatro sai das ruas e passa a ocupar espaço junto ao
templo de Dioniso. O ditirambo não se extingue com o surgimento do drama e
ambas manifestações acontecem paralelamente na Grécia, inclusive nas
Grandes Dionisíacas, festivais de caráter religioso acerca dos quais
discorreremos posteriormente.
Espaço ocupado
pelo público
Espaço ocupado
Pelo coro ditirâmbico
Figura 1. O espaço circular do ditirambo
2. TEATRO GREGO
2.1 A estrutura e as formas da tragédia grega clássica
Com a evolução do drama e dos festivais de teatro na Grécia Antiga,
acompanhamos também a formalização daquele que seria o primeiro gênero
dramático levantado por Aristóteles: a tragédia. Esta, após seus anos de formação
e consolidação, apresentava uma estrutura de composição rígida e praticamente
imutável. Na maior parte da tragédia que conhecemos há um herói (que
geralmente nomeia a peça também), um número restrito de personagens
secundários que circula ao seu redor, bem como um antagonista. Deuses por
vezes aparecem como personagens, contracenando com os heróis humanos, que
sempre são descendentes de dinastias reais da Grécia. O coro é parte integrante
das tragédias, bem como o Corifeu e seus comentários sobre o destino do herói
ou heroína. Nos primórdios do drama o coro era primordial à tragédia, no entanto
sua importância vai diminuindo na medida em que sua participação é reduzida.
A estrutura formal da tragédia grega clássica apresenta-se da seguinte
forma:
Prólogo – Antecede os acontecimentos da trama de forma falada.
Párodos – Canto coral que estabelece o ‘clima’ da peça ao entrar
em cena, representando a coletividade e os preceitos éticos e morais
desta. Ao narrar os acontecimentos posicionam-se em relação a
eles.
Episódios - São a ação da peça, onde a trama ou enredo
desenvolve-se de fato.
Estásimos – São cantos que intercalam os episódios, nos quais o
coro comenta a ação, antecipa as próximas, critica-as, porém não
interfere no episódio.
Êxodo – Última participação do coro.
Em relação aos figurinos e máscaras, pode-se levantar a importância
destes elementos na evolução da tragédia grega. O figurino base dos atores era o
‘chiton’ ou ‘quíton’, a longa túnica jônica ou dórica usada na Grécia Antiga e
altos coturnos com saltos de até 15 centímetros. A platéia também se vestia com
túnicas brancas, lembrando o caráter ritual e religioso das celebrações dos
festivais. Sobre o chíton utilizava-se um manto drapeado e longo chamado
‘himation’. Somente os estrangeiros usavam o manto curto, denominado
‘clamyde’. Reis e rainhas vestiam mantos de cor púrpura, os adivinhos batas
longas e cinza sem cintura, os guerreiros mantos e chitons curtos e os demais
personagens, que tinham caráter secundário, usavam trajes simples. O exílio era
simbolizado por roupas brancas, a morte e o luto pela cor preta e os farrapos
significavam a miséria e o sofrimento de determinados personagens.
Com o passar dos tempos e a evolução das encenações, enriquecem-se os
cenários e mecanismos cênicos, engrandece-se a figura dos atores em cena, que
auxiliados por enchimentos horizontais, barrigas e ombros postiços, grandes
perucas (‘óncos’), os altos coturnos e as máscaras tornam-se visíveis e audíveis
mesmo com as longas distâncias que separavam espectadores de atores.
O uso de máscaras remonta aos rituais primitivos, às danças sagradas e à
personificação dos homens pré-históricos com intuito de uma boa caça. Em
diversos cultos a diferentes deuses as máscaras são parte integrante das
celebrações. Téspis foi quem primeiro utilizou-se das máscaras no teatro,
diferenciando-se assim dos coreutas dos ditirambos. Ésquilo aperfeiçoa-as
aplicando policromia a elas. A evolução das máscaras determina sua
expressividade, denotando também sentimentos dos personagens. Além da
identificação dos personagens das tragédias e comédias, as máscaras tinham a
funcionalidade primordial de amplificadores das vozes dos atores, que precisavam
ser ouvidos e entendidos em todo o espaço do theatron, já que a importância da
tragédia residia fundamentalmente nas palavras. Há registros de que as vozes
dos atores em cena eram graves e profundas, sem grande variabilidade de
entonações.
As máscaras eram feitas de algodão socado forrado de porcelana e
contavam com mecanismos internos de amplificação sonora. Eram grandes e
chamativas, ao todo havia 28 tipos de máscaras nas tragédias gregas, cada um
representando uma classe de personagens: homens, mulheres, jovens, servos,
feridos, guerreiros, etc.
2.2 Os três grandes tragediógrafos
Ésquilo (525-456 a.C.) estreou em 490 a.C como dramaturgo, depois de
ser um consagrado guerreiro na polis ateniense, tendo participado das batalhas
de Salamina (gregos x persas) e de Maratona. Nascido em Elêusis, é proclamado
herói nacional por seus feitos de guerra. É considerado o ‘pai da tragédia’, pois foi
o primeiro dramaturgo grego a introduzir a ação em cena, desenvolvendo assim
uma trama. Aumentou as partes da tragédia na qual havia representação e
introduziu a figura do segundo ator, sendo que o primeiro ator era quem dialogava
com o Corifeu e praticava as ações. Desta forma, surge a contracenação. Diminui
o número de coreutas para 12, no entanto esforçou-se para que o coro fosse
parte ativa do espetáculo, interferisse no conflito, etc. Ésquilo foi próspero
ensaiador de suas peças e não era ator, utilizava ‘pausas de efeito’ e fez progredir
a ‘dança trágica’ do coro através de uma variedade de posturas e movimentos.
Utilizou em suas encenações máscaras enormes, expressivas e extremamente
pintadas. Os atores usavam coturnos de salto alto.
As peças de Ésquilo têm enfoque ético, moral e severo. Ele escreveu em
torno de 90 tragédias e recebeu 13 prêmios, sendo o primeiro em 484. a. C. Com
o tempo seus textos vão adquirindo profundidade, seus temas eram polêmicos e o
próprio Péricles seguiu algumas de suas colocações. Utilizou-se de princípios
conflitantes na construção de suas tragédias.
Escreveu trilogias, que foram o formato dominante das tragédias nas
Grandes Dionisíacas. Suas obras que chegaram até nós são a trilogia conhecida
como Orestea (458 a.C.), composta pelas tragédias “Agamênon”, “As Coéforas” e
“As Eumênides” e as peças “As Suplicantes”, “Os Persas”, “Prometeu
Acorrentado” e “Os Sete contra Tebas”.
Sófocles nasceu em Colona, trinta anos depois de Ésquilo, filho de um rico
mercador. Foi ator, dramaturgo e encenador, o segundo de maior destaque no
séc. V. Recebeu treinamento em música quando criança. Em relação a seu
predecessor, Ésquilo, Sófocles destaca-se por não trabalhar seus textos
dramáticos em trilogias, por acelerar a ação nas cenas e conseqüentemente o
ritmo das peças. A ação, bem como todo enredo, passa a centrar-se na figura do
herói trágico (Antígona, Édipo, Electra...). Foi muito menos místico que Ésquilo e
acreditava que as ações humanas não provêm de uma decisão divina, ainda que
condicionadas por esta; o homem pode lidar com seu destino. Um elemento muito
presente em suas tragédias foi a ‘ironia trágica’ ou ‘contraste patético’, recurso
utilizado pelo dramaturgo a fim de demonstrar a passagem da ignorância ao
conhecimento na trajetória dos heróis. Há também o uso de certo ‘suspense
trágico’ como recurso cênico-literário, assim como alguns detalhes cômicos que
permeavam alguns de seus textos trágicos.
Como encenador, introduz a figura do terceiro ator. Estes três
representavam todos os personagens da peça. Utilizou-se de prismas giratórios
pintados como cenário de suas montagens e aumentou o número de coreutas
para 15. Sófocles obteve 18 prêmios nas Dionisíacas e tem-se registro de ter
recebido outros 6 nas Lenéias (competição de comédias). Escreveu em torno de
123 peças e destas somente 7 chegaram integralmente até nós: “As
Eurípides (480 a.C.-406 a.C.) foi o mais ‘moderno’ dos tragediógrafos
gregos, o menos religioso e o que imprimia a suas peças uma caráter mais
sensacionalista. Foi um cidadão que, ao contrário de seu contemporâneo
Sófocles, que levava uma vida serena, mostrava-se melancólico e reservado. O
‘pessimismo’ de sua obra pode estar associado a seu caráter e aos infortúnios
sofridos em vida.
Nascido em uma aldeia repleta de templos denominada Fila, Eurípides foi
treinado para ser atleta, contudo, acabou interessando-se pela música e pela
pintura. Ele próprio compunha as partituras de suas peças. Em sua juventude
entra em contato com os ‘sofistas’, escola filosófica que prega o racionalismo e o
humanismo, questionando doutrinas e ensinando a arte do raciocínio. Seu apreço
pela arte racional é proveniente deste contato e do mestre jônio Anaxágoras, de
quem foi discípulo. Ainda na tenra idade foi introduzido nos mistérios das
cerimônias em honra ao deus Apolo (que se opõe a Dioniso justamente pelo culto
às formas racionais, belas e perfeitas), sendo que posteriormente viria a criticar
com severidade a religião, tornando-se um iconoclasta em sua maturidade.
Lutou em diversaS frentes de batalha da Guerra do Peloponeso. Péricles
exila os sofistas Protágoras, Fidias e Anaxágoras culpando-os por derrotas
sofridas na citada guerra, já que sua crença na responsabilidade dos homens por
seus atos abalaria a possibilidade das derrotas serem vontades divinas. Eurípides
também foi exilado no final de sua vida, morrendo na Macedônia. Foi acusado de
impiedoso e muito criticado, tendo reconhecimento póstumo por parte de Atenas.
O próprio Sócrates apreciava muito suas peças, apesar de terem travado durante
suas vidas certa inimizade. Sófocles, já aclamado dramaturgo, não gostava da
forma ‘realista’ como Eurípides tratava os temas desenvolvidos em suas obras.
Eurípides escreveu 92 tragédias, sendo que somente 5 foram premiadas.
Algumas características de sua obra o diferenciam de outros dramaturgos da
época: ele retrata e critica a sociedade grega e a decadência de Péricles, expôs
os males do imperialismo e da agressão militar, há certo ‘realismo’ na
aproximação com temas e problemas contemporâneos. Os deuses, no entanto,
são representados como seres por vezes perigosos e desprezíveis, outras como
respeitáveis; refletem a mentalidade primitiva dos homens, que são tiranos. Há
um ‘quase’ psicologismo na construção dos personagens de Eurípides, o caráter
heróico dos personagens é amenizado, o que, por conseqüência, humaniza-os.
Dramaturgicamente pode-se listar algumas especificidades nas tragédias
deste autor, tais como a ‘epifania’, ou seja, o aparecimento dos deuses em cenas
cruciais à trama, bem como a trama não ser solucionada diretamente através das
ações e sim por recursos cênicos mágicos, como o ‘Deus ex-machina’, aparição
divina que finaliza determinadas peças de sua autoria. Na prática, um deus ou
deusa surge em um carro alado, sem ter relação direta com o enredo, e salva o
herói de suas mazelas. Essa ‘máquina voadora’ era um dispositivo mecânico
formado por um cesto suspenso por um guindaste que descia do teto do theatron(espaço que compreendia as arquibancadas nas quais ficava a numerosa platéia,
que chegava a milhares de pessoas). Outro mecanismo cênico utilizado por
Eurípides em suas tragédias foi o ‘eciclema’, uma espécie de plataforma rolante
que atravessava o palco trazendo á vista do espectador as atrocidades narradas
que anteriormente aconteciam fora de cena: assassinatos, suicídios, sangue e
terror. O teto da própria skene (nome dado à estrutura que compunha o palco e
seus mecanismos cênicos).
É do dramaturgo Eurípides o maior número de tragédias gregas que
chegou até os nossos dias (17), sendo algumas delas “Medéia” (431 a.C.), “As
Troianas” (415 a.C.), “Hipólito” (428 a.c.), entre outras.
2.3 Os dramas satíricos
Os dramas satíricos não ultrapassam as tragédias clássicas na Grécia
Antiga em importância, no entanto antecedem a tragédia cronologicamente, que
se apresenta enquanto uma evolução e transformação deste. A própria etimologia
da palavra tragédia demonstra esta descendência direta: tragos (bode) e ode
(canto). O canto dos bodes refere-se diretamente ao coro dos dramas satíricos,
composto pelos sátiros vestidos de bode, com patas de pele e rabos, além de
falos de couro. Os sátiros eram conduzidos por Sileno (pai de criação de Dioniso),
que caracterizava o Corifeu dos dramas satíricos, usando andrajos de pele e uma
longa barba. Os personagens usam os mesmos figurinos das tragédias. As
máscaras dos sátiros têm a testa larga com uma ou duas rugas, além de barbas
eriçadas.
Pratinas foi o autor pioneiro de dramas satíricos. Frinico também os
escreveu, assim como os grandes tragediógrafos do período clássico. Depois da
apresentação das três tragédias que compunham uma tetralogia nas Grandes
Dionisíacas, apresentava-se um drama satírico que ridicularizada a solenidade
das primeiras, zombando dos sentimentos sublimes. Assim, a função do drama
satírico era quase a de um ‘epílogo de distensão’ para a trilogia trágica.
“O Cíclope”, de Eurípides, é o único drama satírico da Antiguidade Clássica
que conhecemos nos dias atuais, trama baseada em um episódio da “Odisséia”
de Homero. Há alguns fragmentos de “Os Perseguidos”, de Sófocles.
2.4 Os festivais
As Grandes Dionisíacas ou Dionisíacas Urbanas aconteciam am Atenas,
anualmente, no final de março, início da primavera, com duração de 6 dias. Pela
hegemonia ateniense na Grécia Antiga, pessoas de todas regiões da Ática vinham
a Atenas a fim de prestigiar as representações e as festividades religiosas. O
caráter religioso e ritual deste festivais era de suam importância social às polis
gregas.
O local no qual aconteciam era a encosta da colina do santuário de
Dioniso, ao sul da Acrópole.
Era o mais importante festival do mundo grego e dava-se da seguinte
forma: no primeiro dia acontecia a grande procissão na qual retirava-se a estátua
do deus Dioniso do templo e instalava-se o mesmo no teatro, no centro da
‘orchestra’. O teatro sai de dentro do templo e ocupa um espaço próprio com o
passar dos anos, como se pode ver nas figuras que seguem. No segundo dia
dava-se o concurso de ditirambos e nos próximos os concursos de tragédias,
dramas satíricos e comédias. Pela manhã apresentavam-se 3 tragédias e um
drama satírico no final. À tarde apresentavam-se as comédias. A maior parte das
tragédias de Ésquilo, Sófocles e Eurípides foi apresentada nas Grandes
Dionisíacas.
O Arconte era o responsável pela organização artística do festival, pela
escolha do Corego e também dos poetas que seriam admitidos no concurso. O
Corego era a pessoa escolhida para patrocinar financeiramente os festivais.
Devia também instruir e equipar o coro, alugar espaços para ensaios, fornecer
bebidas aos executantes, encarregar-se do salário dos artistas. Após a Guerra do
Peloponeso, com a crise financeira que sofre Atenas, associam-se dois Coregos.
Posteriormente formaria-se a Agonotesia, grupo de cidadãos responsáveis pela
organização dos festivais. A redução do número de coreutas de 50 para 12
também se deveu, em certa medida, à decadência econômica.
As Lenéias ou Dionisíacas de Lenéias aconteciam em janeiro, durante 3 a
4 dias, eram de menor porte em relação às Grandes Dionisíacas, somente
atenienses participavam e nelas não havia o concurso de ditirambos, pois o foco
centrava-se nas comédias.
As Dionisíacas Rurais realizavam-se em dezembro, nos ‘demos’ da Ática.
Os demos pobres não contavam com os concursos de peças teatrais, somente a
parte religiosa do culto era levada a cabo, o cortejo em honra ao deus. Já nos
demos abastados, além de suntuosos cortejos, podiam-se apreciar concursos nos
quais participavam diversos dramaturgos atenienses.
2.5 A comédia grega
As origens da comédia, segundo Aristóteles, residem nas cerimônias
fálicas, orgias e canções em honra a Dioniso que eram famosas em muitas das
cidades da Ática. As Leneías em seus primórdios caracterizavam-se como
ruidosos carnavais, em que a palhaçada grosseira e o humor licencioso
coexistiam. Ao Komos (orgias noturnas em honra a Dioniso, com caráter ritual e
religioso) realizado na Ática, juntaram-se os comediantes dóricos (mimodóricos),
com falos e imensas barrigas, cenas bonachonas e cômicas que satirizavam
homens, deuses e heróis. O mimodórico desenvolveu-se em Esparta, na Sicília e
em Corinto. É na Sicília que atinge sua forma mais literária com Epicarmo (330-
440 a.C) que desenvolveu nas cenas o ágon, ou seja, o conflito entre dois pólos
distintos. Eram conhecidos como phlyakes nas colônias dóricas sicilianas. Sua
temática é cotidiana e os personagens farsescos sobreviveram até a Commedia
dell’Arte. Nos Komos gregos as pessoas embriagavam-se, vestiam-se de animais,
dançavam com movimentos pélvicos e cantavam.
O mimodórico foi importado por Megara, cidade da península Ática, e lá
ocorreu a junção com o komos, construindo uma estrutura dramática plenamente
realizada: a comédia. É levada a Atenas e reconhecida oficialmente em 486 a.C.,
quando têm-se os registros do primeiro concurso de comédias nas Grandes
Dionisíacas.
Assim, a comédia grega desenvolveu-se e recebeu importante papel social
de crítica e sátira a todos os cidadãos, homens públicos ou não, em acirrados
combates, brigas e competições entre os comediógrafos. Através da comédia, o
teatro torna-se o fórum onde foram travadas as mais veementes controvérsias da
pólis ateniense.
2.5 Estrutura da comédia
Prólogo – mais demorado e completo que na tragédia, na comédia
divide-se me dois momentos, o primeiro expositivo e o segundo (que
se assemelha ao primeiro episódio da tragédia) no qual se introduz a
ação que desencadeará todo enredo.
Párodos – entrado do coro, momento solene de canto e dança.
Ágon – conflito é exposto, o coreuta expressa a idéia do poeta, esta
é contestada, porém sempre vence. O ágon se dá entre 2 coreutas,
ou 2 coros, ou entre coreutas e atores.
Parábase – compreende vários momentos, como um canto muito
curto, somado aos anapestos (discursos do corifeu dirigidos ao
público) e ao pnigo (longa fala dita sem respirar).
Êxodo – saída do coro.
Mais do que na tragédia clássica, na comédia a participação do coro é
ativa. Ele é parte essencial da estrutura, contracena com os atores, interage e
posiciona-se.
Os momentos em que atores, ou o próprio coro, dirigem-se diretamente ao
público fazendo comentários sobre as ações ou evocando-as, é nomeado por
alguns autores de parabasis. Este recurso cômico foi amplamente utilizado pos
Aristófanes e encontra-se presente nas farsas, melodramas e comédias até os
dias atuais.
Quanto às máscaras e figurinos da comédia, podem-se encontrar
características que se percebem ainda no teatro cômico contemporâneo: o uso de
postiços como barrigas, narizes, ancas e ventres com a função de deformar
fisicamente os personagens; a caricatura, ou seja, o exagero de determinadas
características, presente nas máscaras, que são fantásticas, grosseiras, feitas
para provocar o riso. Há máscaras de animais e caricaturas de seres humanos,
Um chiton curto e um falo de couro com a ponta vermelha, além de sandálias de
solado baixo, eram o figurino base de atores e do coro. Os personagens que
representam deuses ou heróis nas comédias são caricaturais, bem como os
personagens do coro, que podem ser animais como rãs, pássaros, vespas ou
insólitas nuvens. Estes animais eram devidamente caracterizados por penachos,
plumas, etc. Somente as máscaras dos jovens não assumem caráter tão
fantasioso e caricatural nas comédias.
A Comédia Antiga foi o período áureo da comédia política, que satirizava a
sociedade e os homens públicos e seus feitos, as tradições e a religião. Os
espetáculos da comédia Antiga aconteciam no edifício teatral, com suas paredes
de madeira pintadas e painéis de tecido, enquanto o coro, como na tragédia,
ficava na orchestra. Havia cenas de transporte aéreo, em que os personagens
eram erguidos por guindastes, cordas e complexas maquinarias da skene. As
danças da Comédia Antiga também tinham origem ritual e caráter sexual. O
kordax era a dança barulhenta e fálica, obscena e licenciosa, dançada nas
comédias. Efeitos de travestimento, completa falta de reservas no tocante a
gestos, figurinos e imitação e , por fim, a exposição do falo, são traços
característicos do estilo de atuação da Comédia Antiga.
Os escritores de tragédia não escreviam comédias e vice-versa, isso era
praticamente uma regra entre os dramaturgos gregos. Os dramas satíricos eram
escritos pelos tragediógrafos, já que parte integrante da tetralogia trágica a ser
apresentada nas Grandes Dionisíacas.
Os autores de comédias dos quais temos notícia, ainda que nenhum texto
de sua autoria tenha chegado integralmente até nós, e que entre si travaram
intensas disputas, richas e brigas, são Quiônides (ganhador da primeira
competição de comédias), Cratino (atacou a política de Péricles e os sofistas),
Crates (do qual restam fragmentos de 8 comédias de sua autoria) e Eupólis(446-412 a.C.). Todos ganharam prêmios em festivais e conviveram entre si.
Crates foi ator nas peças de Cratino. Eupólis foi contemporâneo e amigo de
Aristófanes (até os dois romperem por acusação de plágio), destacou-se pela
linguagem refinada e pelo humor efetivo. Venceu Aristófanes em alguns
concursos.
Aristófanes (445-388 a.C.) foi o grande e polêmico comediógrafo da
Grécia Clássica. Escreveu por volta de 40 comédias e 11 chegaram até os nossos
dias. Nascido na Ilha de Egina, migrou cedo para Atenas, cidade-estado na qual
morreria. Viveu o período da Guerra do Peloponeso, engajou-se política e
socialmente nas questões de sua, época, que aparecem como temas de suas
comédias. Criticou demagogos e a escola sofista, confrontou publicamente líderes
políticos como os tiranos sucessores de Péricles Cleon e Hiperbolo, atacou
Sócrates, defendeu a pacificação, foi julgado reacionário, aristocrático e
conservador. “Os Banqueteiros” (427 a.C.) e “Os Babilônios” (426 a.C.) são as
duas primeiras peças sobre as quais temos registros. Dentre as que podem ter
seus textos encontrados contemporaneamente, temos, cronologicamente situadas
entre os anos de 425 a.C. e 388 a.C: “Os Arcanianos”, “Os Cavaleiros”, “As