UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR Ciências Sociais e Humanas Religiosidade e Espiritualidade como fatores promotores de Coping Resiliente na adultez e na velhice Clara Maria Freire Margaça Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Psicologia Clínica e da Saúde (2º ciclo de estudos) Orientador: Professora Doutora Rosa Marina Afonso Orientador: Professor Doutor Samuel Monteiro Covilhã, junho de 2015
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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR Ciências Sociais e Humanas
Religiosidade e Espiritualidade como fatores
promotores de Coping Resiliente na adultez e na velhice
Clara Maria Freire Margaça
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Psicologia Clínica e da Saúde (2º ciclo de estudos)
Orientador: Professora Doutora Rosa Marina Afonso Orientador: Professor Doutor Samuel Monteiro
Covilhã, junho de 2015
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Dedicatória
Aos meus pais.
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Agradecimentos
Começo por agradecer àqueles que, de forma próxima e direta, assumiram um papel
determinante no desbravar deste caminho. É a eles a quem dirijo palavras de profundo
reconhecimento.
Um agradecimento inicial à Professora Marina Afonso por, mesmo ausente, se saber
fazer presente. Agradeço ainda todo o conhecimento transmitido, ao longo desta caminhada.
Ao Professor Samuel Monteiro, pela sua paciência e confiança, saber, motivação e exigência
partilhados nesta etapa. Agradeço, ainda, a ambos, todas as oportunidades de evolução e
crescimento.
Um agradecimento especial à minha família. Aos meus pais, pelo esforço, confiança e
estímulo diário, em todos os momentos, pelo seu suporte incondicional. À minha irmã Rosário,
pelas horas infindáveis de escuta mútua.
Aos amigos, nem todos de sempre, aos que sabem ser amigos, independentemente das
circunstâncias e da distância. À Carolina, pelas confidências e desabafos. À Susana, por
acreditar em mim, desde que nos conhecemos, desde sempre, pelo nosso lema: Hakuna Matata.
Pelos momentos de compreensão e partilha, carinho e desafio, pelo otimismo e
confiança em mim. Pela tua presença, na minha vida, na nossa vida. Pelo teu amor e inspiração,
Doni. Agradeço-te.
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Sempre chega a hora em que descobrimos que sabíamos muito mais do que antes julgávamos.
José Saramago
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Resumo
A presente investigação de mestrado, na área de Psicologia Clínica e da Saúde, centra-
se no estudo da espiritualidade e religiosidade como potenciais fatores promotores de coping
resiliente, na idade adulta e na velhice. Esta focaliza a problemática da crescente investigação
no âmbito da resiliência, a qual tem vindo a identificar a espiritualidade e a religiosidade como
seus fatores de promoção.
A primeira parte é composta por dois capítulos, com o intuito de mostrar o trabalho
científico desenvolvido. Por um lado, o primeiro é constituído por um artigo de revisão teórica
de estudos realizados sobre o presente tema, por outro, o segundo capítulo, em concordância
com o primeiro, incorpora e sustenta empiricamente os objetivos desenhados e estruturados,
após a revisão da literatura efetuada – ambos foram submetidos para publicação em publicações
periódicas com revisão por pares.
A segunda parte desta dissertação é constituída pelos Anexos. O primeiro, por um lado,
reúne uma extensão da revisão da literatura, onde são delimitadas as temáticas centrais do
estudo; por outro lado, o Anexo 2 carateriza e apresenta a extensão do estudo empírico, onde,
através de testes estatísticos suplementares nos propomos a ir ao encontro dos objetivos
traçados.
Com uma amostra de 1310 sujeitos, com idades compreendidas entre os 25 e os 97 anos
- e a fim de alcançar os objetivos do estudo - foram realizados o teste t-student e Anova, para
comparar as diferenças entre grupos estabelecidos, efetuaram-se correlações e testes de
regressão e, por fim, efetuou-se um modelo de equações estruturais, com o propósito de
confirmar o impacto da espiritualidade, através das suas dimensões verticais e horizontais, ao
nível do coping resiliente.
A partir dos resultados obtidos, podemos concluir que a espiritualidade, na sua
dimensão horizontal - que diz respeito à forma como as pessoas dão sentido à sua vida -
constitui, nesta amostra, um preditor moderado do coping resiliente. Porém, ao nível das
Crenças foi alcançado um resultado disruptivo ao esperado, o que poderá estar associado ao ao
número de itens que compõem o fator. Podemos, igualmente, concluir que tanto a
espiritualidade como os níveis de coping resiliente são influenciados pelas idiossincrasias dos
indivíduos, nomeadamente ao nível da idade e do género, em diferentes fases do ciclo vital.
Tabela 2 – Características dos estilos de Coping Religioso (Pargament et al., 2001).
Tabela 3 – Tabela de Frequências relativa à variável Idade.
Tabela 4 – Comparação das médias de resposta aos itens da Escala de Espiritualidade.
Tabela 5 – Cálculo da confiabilidade da Escala de Espiritualidade em contextos de saúde e
respetiva comparação com a Escala original.
Tabela 6 – Comparação das médias de resposta aos itens da Escala breve de Coping Resiliente.
Tabela 7 – Cálculo da confiabilidade da Escala breve de Coping Resiliente e respetiva
comparação com as escalas original e adaptada à população portuguesa.
Tabela 8 - Análise das diferenças entre o género e as variáveis Coping Resiliente, Crenças e
Esperança/Otimismo, através do teste t-student.
Tabela 9 – Resultados obtidos, através das estatísticas de teste Anova, da diferença entre
grupos etários.
Tabela 10 – Correlação: Valores correlacionais do Coping Resiliente com as dimensões Crenças
e Esperança/Otimismo.
Tabela 11 – Correlação: Valores correlacionais do Coping Resiliente com as variáveis frequência
de locais de culto e frequência de oração.
Tabela 12 – Regressão das variáveis Coping resiliente, Crenças e Esperança/Otimismo.
Tabela 13 - Índices de ajustamento do modelo estrutural base estimado.
Tabela 14 - Estimativas estandardizadas da solução final do modelo base.
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Introdução Geral
A presente dissertação de mestrado, na área de Psicologia Clínica e da Saúde, insere-
se numa linha de investigação que focaliza, diacronicamente, a espiritualidade e a religiosidade
como potenciais fatores de promoção do coping resiliente. Esta tem como objetivo principal
analisar a magnitude do impacto destes dois fatores na resiliência dos indivíduos, em diferentes
fases do ciclo vital.
Esta investigação centra-se na problemática da crescente investigação no âmbito da
resiliência, a qual tem vindo a identificar a espiritualidade e a religiosidade como seus
promotores. Atualmente, apesar de a ciência, ainda, desvincular a espiritualidade das causas
e cura de patologias, para muitos indivíduos sujeitos a situações de doença, a espiritualidade
pode constituir um importante mecanismo de coping.
No âmbito da revisão da literatura efetuada, apesar de se encontrarem estudos sobre
os fatores relacionados com a resiliência na velhice, deparámo-nos com pesquisas pouco
robustas, do ponto de vista metodológico, que nos permitam discutir a dimensão
desenvolvimental da espiritualidade e da religiosidade enquanto promotores da resiliência na
idade adulta. Desta forma, procura-se com este trabalho, analisar e discutir o eventual papel
da espiritualidade como fator promotor face ao coping resiliente na adultez e velhice,
sustentando-se esta abordagem empiricamente.
A dissertação estruturou-se à luz dos objetivos nela incorporados, sendo fracionada em
três componentes fundamentais: dois capítulos e os Anexos ao trabalho desenvolvido.
Os Capítulos I e II são constituídos por dois artigos já submetidos para avaliação por
pares, visando expor o trabalho científico desenvolvido. O primeiro artigo1, referente ao
primeiro capítulo, teve como objetivo apresentar uma revisão teórica de estudos relevantes
realizados sobre o tema da espiritualidade e religiosidade como fatores de resiliência, com o
intuito de identificar aspetos comuns, pontos de discordância entre autores e questões em
aberto na literatura. O segundo artigo2, desdobramento do primeiro e incorporado no segundo
capítulo, analisa e procura sustentar empiricamente os objetivos gizados e estruturados, após
a cuidada revisão da literatura, numa amostra de 1310 sujeitos, com idades compreendidas
entre os 25 e os 97 anos.
Uma componente final da dissertação inclui os Anexos e subdivide-se, também ela, em
duas partes. A primeira, consignada a aspetos teóricos, delimita as temáticas centrais em
estudo, conferindo-lhes um enquadramento teórico-conceptual. A contextualização da
temática é efetuada mediante a seleção e revisão de fontes bibliográficas científicas,
periódicas e não periódicas, a partir das quais se procura enquadrar, justificar e problematizar,
1 Este artigo foi submetido à revista Psicologia USP e encontra-se, nesta dissertação, formatado à luz das normas para autores. 2 Este segundo artigo foi submetido à revista Temas em Psicologia, Revista da Sociedade Brasileira de Psicologia e encontra-se, nesta dissertação, formatado à luz das suas normas de publicação.
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tanto no plano teórico como no plano da prática, a pertinência e valor científicos deste tema
de investigação. Na segunda parte deste anexo é enquadrada, caraterizada e apresentada a
extensão do estudo empírico, anteriormente referido no segundo capítulo. Através deste visa-
se testar e comprovar, de forma incisiva e detalhada, os objetivos propostos à investigação.
No termo desta dissertação são expostas considerações e reflexões integrativas,
limitações e asserções à prossecução futura da investigação realizada, terminando-se com a
apresentação das referências bibliográficas e anexos.
3
Capítulo I – Espiritualidade e Religiosidade
como fatores de coping resiliente na idade
adulta e na velhice: uma revisão
(Artigo de revisão teórica submetido para
publicação)
4
Espiritualidade e Religiosidade como fatores de coping resiliente na
idade adulta e na velhice: uma revisão3
Resumo
Este artigo, através de uma revisão da literatura, discute a questão da espiritualidade e
religiosidade enquanto fatores promotores da resiliência, em dois momentos distintos do
ciclo vital: a idade adulta e a velhice. Atualmente, a investigação psicológica tem vindo
a atribuir maior importância à espiritualidade do indivíduo, sobretudo no que se refere à
compreensão da forma como as crenças interferem ao nível da saúde e da aprendizagem
de estratégias resilientes. A revisão da literatura efetuada revela que a religiosidade e a
espiritualidade podem estar associadas a uma maior resiliência em condições stressantes,
situações de perda e, sobretudo, na velhice. Todavia, não foram encontradas investigações
consistentes, do ponto de vista metodológico, que permitam a discussão sobre a dimensão
desenvolvimental da espiritualidade e religiosidade como promotores da resiliência,
especialmente, na idade adulta. Assim, torna-se sumamente importante analisar e discutir
o seu papel e contribuição para a resiliência psicológica.
This article, methodologically based on a review of the literature, discusses the spirituality
and religiosity as promoting factors of resilience in two different moments of the life
cycle: adulthood and old age. Presently, psychological research has been placing high
importance on the individual's spirituality, especially in regard to the understanding of
3 O Anexo 1, da secção Anexos, desta dissertação está consignado a aspetos teóricos, delimitando as temáticas centrais do estudo, dando continuidade de forma mais incisiva e detalhada a questões teórico-conceptuais.
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how beliefs affect the level of health and the learning of resilient strategies. A review of
the literature demonstrates that religiosity and spirituality could be associated with more
resilience under stressful conditions, loss situations, and especially, in old age. However,
the research did not enable the discussion of the developmental dimension of spirituality
and religiosity as promoters of resilience in adulthood and old age. Thus, it still is
important to review and discuss its contribution in enhancing psychological resilience.
Spirituality and resilient coping: differences in adulthood and old age
Abstract
4O Anexo 2, da secção Anexos, desta dissertação é exposto como desdobramento deste artigo empírico, visando testar e comprovar, de forma incisiva e detalhada, os objetivos e hipóteses propostos à investigação.
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Throughout the aging process, a resilient self, besides to not only adapt to losses, develops
and strengthens new growth opportunities, and the religiosity and spirituality can
constitute a mechanism of strengthening and resistance. This study aims to analyze the
religiosity/spirituality as resilience predictor factors, in a sample of 1310 adults and
elderly, as well as the relationship of these variables with relevant socio-demographic
data. To achieve these objectives Student’s t test were realized to compare the differences
of the averages between groups and the Anova test in order to test differences in the
established groups; correlations and regression testing were made and lastly effectuated
a structural equation model, with the purpose of confirming the proficient impact of
spirituality, in the role of the vertical and horizontal dimensions, at the level of the
resilient coping. Based on the results obtained, we can conclude that spirituality, in the
horizontal dimension – that means how people give meaning to their life - is, in this
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Considerações Finais
A presente componente da dissertação, reservada a considerações finais, é composta
por uma síntese da informação, teórica e prática, que a compõe, procurando-se refletir sobre
os contributos da investigação levada a cabo, respetivos limites e diretrizes para futuros
estudos complementares.
A partir de uma revisão da literatura, apresentada no artigo teórico, delimitámos as
temáticas centrais em estudo, conferindo-lhes um enquadramento teórico-conceptual.
Subsequentemente, o estudo empírico, incluído no segundo capítulo, visou expor, testar e
analisar, os objetivos e hipóteses propostos à investigação. Com base nesta revisão, é sugerido
que a espiritualidade e a religiosidade podem funcionar como mediadores para o indivíduo em
momentos stressantes, onde ser religioso/espiritual passa a ser uma estratégia de adaptação
com ganhos ao nível da estruturação da resiliência. De igual modo, vários autores referem que
é na velhice onde se constata o aumento da perceção da importância da religião. Porém, no
nosso estudo foi o grupo da meia-idade que revelou dar mais importância a este fator. Tal
resultado pode remeter a duas questões: a primeira prende-se com o facto de o número de
indivíduos em cada grupo ser diferente; e, por outro lado, importa dar atenção à dimensão
horizontal da espiritualidade, que diz respeito à forma como as pessoas dão sentido à sua vida.
Assim, tendo em conta que os adultos na chamada “meia-idade” são confrontados com
experiências que exigem reestruturações relacionais, são vários os fatores que influenciam a
perceção de sentido de vida e esperança no futuro, onde se destaca a espiritualidade. De forma
a sustentar esta ideia, como vimos, Erikson e Jung consideram que a espiritualidade está ligada
ao processo maturacional e às experiências associadas à idade adulta (Barros, 2000). Nesta
linha, Polk (1997) identifica um padrão fisiológico que incorpora atributos à resiliência, como
as crenças pessoais, as quais promovem um sentimento de pertença e uma melhor perspetiva
de vida.
Uma outra ideia a destacar desta investigação é a que que a resiliência incorpora as
idiossincrasias de cada indivíduo, as quais lhes permitem ultrapassar, positivamente, as
adversidades (Connor & Davidson, 2003). Estes autores referem que as investigações sobre a
temática, nos últimos 20 anos, têm demonstrado que a resiliência é uma característica
multidimensional, que varia de acordo com contexto, tempo, idade, género e origem cultural.
O nosso estudo revelou ir ao encontro destes dados, uma vez que foram encontradas diferenças
consideradas estatisticamente significativas, relativamente ao género e à idade.
Se por um lado estudos apontam que, à medida que a idade avança, há indicadores de
que as crenças e a fé ocupam um lugar mais central na vida das pessoas, por outro, o aumento
da perceção da religiosidade não está, nesta faixa etária, diretamente relacionado com
elevados níveis de resiliência. Assim, podemos inferior que a espiritualidade e religiosidade
parecem não ter o mesmo peso como fator explicativo da resiliência na adultez e velhice. Tal
pode estar relacionado com os fatores que influenciam a perceção de sentido na vida, na idade
adulta, por um lado: os fatores internos relacionados com a personalidade e sentimento de
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pertença; e, por outro, os fatores externos, que se relacionam com as oportunidades sociais,
trabalho, lazer e segurança. Já para os indivíduos idosos os padrões de resiliência, que levam
a um envelhecimento com êxito, são mantidos através da interação de vários fatores, como
relações pessoais próximas com familiares e amigos e a participação em atividades sociais e de
caráter cultural e religioso, sendo que veem na religião um suporte fundamental no último
período da sua vida e na forma de enfrentar as adversidades nesta fase terminal.
Outro aspeto importante a realçar reside no facto de, apesar de as pessoas mais velhas
poderem frequentar menos os locais de culto e participar menos em rituais religiosos, a
espiritualidade e a religiosidade continuarem a ser uma dimensão relevante. A menor
frequência de locais de culto e em rituais religiosos pode estar relacionada com perdas de
autonomia e funcionalidade, não significando que ocorra uma diminuição do interesse na
religião. Constata-se, inclusivamente, que a atividade não organizacional religiosa – igreja
eletrónica ou mediatizada – tende a aumentar neste grupo de sujeitos, bem como a meditação
e a oração.
No que diz respeito à investigação efetuada surgiram algumas limitações, que podem e
devem ser colmatadas em estudos futuros. Assim sendo, começamos por destacar a escassez
de estudos, em Portugal, acerca da temática em questão, sobretudo, no que diz respeito à
associação entre a espiritualidade e a religiosidade com o coping resiliente. Tal como foi
referido acima, futuramente seria importante reunir uma amostra equitativa nos grupos de
comparação, de forma a ter resultados generalizáveis. Ainda nesta linha de pensamento, outra
limitação a ser apontada pode ser a utilização de uma abordagem transversal. Para a obtenção
de melhores resultados, poderia ser de interesse adotar uma abordagem longitudinal,
permitindo a análise das variações das características de uma mesma amostra. Uma outra
limitação que pode ser apontada reside no fato de as escalas em uso possuírem poucos itens.
Autores como Coelho e Esteves (2007) argumentam que escalas com poucos itens podem não
fornecer uma boa discriminação das respostas (reduzindo a habilidade de encontrar diferenças
significantes entre segmentos), o que limita o método de análise dos dados. Porém, a escolha
deste tipo de escalas fundamenta-se no fato de serem escalas simples e pequenas, sem
redundâncias e de fácil utilização, o que vem facilitar a sua aplicação, sobretudo, a pessoas
idosas. Sendo estas escalas constituídas por poucos itens, invitavelmente, terão fatores com
poucos itens. Idealmente, cada fator deve ser composto por três itens. A literatura refere que
uma escala que engloba, apenas, um fator deve ser constituída, no minímo, por quatro itens;
aquelas que apresentam mais do que um fator devem conter, pelo menos, dois itens por fator
– devendo ser, efetivamente, encaradas como uma exceção (Raubenheimer, 2004).
Como potencialidades desta investigação podemos destacar o número de participantes
da amostra. Uma amostra com estas dimensões permite uma representação honesta da
população, conduzindo-nos à estimação das caraterísticas da população com grande precisão.
Este estudo permitiu, ainda, compreender o papel que a espiritualidade e a religiosidade podem
desempenhar ao nível da resiliência psicológica dos indivíduos, em dois momentos diferentes
do ciclo vital.
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Em suma, este estudo ao avaliar o impacto da espiritualidade e da religiosidade no
coping resiliente, na idade adulta e na velhice, pode representar um contributo fundamental,
para o conhecimento dos fatores relacionados com a resiliência psicológica e,
consequentemente, permitir a compreensão dos possíveis processos inerentes a um
envelhecimento ativo e com êxito. Assim, investigações futuras deverão suplantar as suas
limitações e considerar as singularidades da amostra em estudo, pelo fato de ser integrada uma
população mais idosa, pelas suas idiossincrasias e características na fase do ciclo de vida em
que se encontra.
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ANEXOS
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Anexo 1 - Extensão da Revisão Teórica
Introdução
A resiliência reporta-se à adaptação bem-sucedida, às dificuldades e adversidades da
vida, que implica flexibilidade mental, emocional e comportamental (APA, 2006). Esta pode
ser perspetivada como um processo dinâmico – denominando-se como resiliência - ou como
sendo um traço, usando-se o termo resiliente (Luthar, Cicchetti & Beker, 2000). O constructo
de resiliência é proveniente da física7, sendo considerada, numa perspetiva psicológica, como
um fenómeno ou processo que reflete a adaptação a contextos de risco e adversidades. A
resiliência pode não ser mensurável de forma direta, podendo ser avaliada através de
dimensões que, indiretamente, refletem que a pessoa se adaptou e recuperou o equilíbrio
apesar das ameaças e adversidades a que está ou esteve exposta (Luthar et al., 2000; Masten,
2001).
A resiliência enquanto processo, pode ser conceptualizada como sendo dinâmica, capaz
de influenciar a capacidade de se lidar com as contrariedades, a sobrevivência, a superação, a
aprendizagem e a capacidade de recuperar de experiências de catástrofe, através da
incorporação e da mobilização de características internas como a autoeficácia, e fatores
externos como o suporte social, que promovem a adoção de estratégias de coping (Resnik,
2008). Nesta linha, pode ser, também, conceptualizada como uma estratégia de coping, sendo
inclusivamente adotado o termo de coping resiliente. Encarada a resiliência como uma
capacidade de o sujeito em responder de forma satisfatória a situações adversas, as estratégias
de coping funcionam como um pré-requisito fundamental para uma adaptação com sucesso,
enquanto variáveis mediadoras dos efeitos do stress (Pais Ribeiro & Morais, 2010). O coping é
considerado como um esforço cognitivo e comportamental face a exigências internas e externas
excessivas (Sinclair & Walltson, 2004), promovendo uma adaptação positiva face ao stress
elevado (Lazarus & Folkman, 1984 citado por Pais Ribeiro & Morais, 2010). Apesar de coping e
resiliência não serem sinónimos, o conceito de coping torna-se fundamental para a
compreensão da capacidade de resiliência do indivíduo (Pais Ribeiro & Morais, 2010). Por um
lado, o coping ocorre num momento determinado e, por outro lado, a resiliência prossegue ao
longo do desenvolvimento. Sinclair e Walltson (2004) afirmam que a principal característica
diferenciadora do coping resiliente é a capacidade deste para promover uma adaptação
positiva, apesar do elevado índice de stress. Os indivíduos resilientes tendem a usar mais
estratégias de coping de confronto direto com o problema e menos estratégias de evitamento
(Pesce, Assiss, Santos & Oliveira, 2004).
7Capacidade de um material readquirir, integralmente, as suas propriedades anteriores, depois de um agente externo exercer ação sobre ele.
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A resiliência enquanto traço é definida como uma caraterística de personalidade que
modera os efeitos negativos do stress e promove a adaptação (Jacelon, 1997). Alguns estudos
identificaram as seguintes caraterísticas em indivíduos resilientes: i) equanimidade – perspetiva
equilibrada da experiência de vida; ii) perseverança – persistência, apesar da adversidade; iii)
auto-resiliência – crenças nas próprias capacidades; iv) ‘meaningfulness’ – perceção de que a
vida tem um propósito e valorização das suas contribuições; e v) solidão existencial – perceção
de que a vida de cada pessoa é única (Wagnild & Young, 1993). Assim, a resiliência enquanto
traço é vista como uma característica pessoal que ajuda o indivíduo a lidar com as dificuldades
e a alcançar uma boa adaptação, perante um problema (Ong, Bergeman, Bisconti & Wallace,
2006).
São vários os fatores enunciados para explicar a resiliência dos indivíduos. Ao considera-
la como um constructo multidimensional da personalidade, os indivíduos resilientes possuem
normalmente diversas caraterísticas ou capacidades positivas, como competência, otimismo
(Petterson, 2000), felicidade, autoestima, sentido de coerência, hardiness e estratégias de
coping ativo (Lindström, 2003). Assim, os fatores protetores que promovem comportamentos
resilientes provêm de três possíveis fontes: a) atributos pessoais (inteligência, autoestima,
autonomia, competência emocional e competência social); b) apoios do sistema familiar; e c)
apoio social, proveniente da comunidade (Pesce et al., 2004). Entre os vários fatores surge,
também, a dimensão da religiosidade e espiritualidade (Jimenez Ambriz, 2008).
1. Resiliência na velhice
A resiliência pode ser descrita como uma caraterística individual que, provavelmente, se
desenvolve ao longo do tempo (Stephens, Breheny & Mansvelt, 2014). Enquanto constructo
psicológico, começou por ser estudada em relação à infância e adolescência. Posteriormente,
a resiliência foi analisada e discutida em relação à velhice, onde parece assumir algumas
especificidades.
A ideia de resiliência na velhice abrange, por um lado, a reintegração de uma
adversidade e, por outro lado, o desenvolvimento, conservação e ativação de capacidades
adicionais de resistência face às perdas, desafios e adversidades que são mais frequentes nesta
etapa do ciclo vital do que noutras fases mais jovens (Afonso, 2012). As pessoas idosas
experienciam, frequentemente, mudanças associadas à idade, tais como quedas, declínios na
saúde e no funcionamento, dores crónicas, diminuição de mobilidade, morte do cônjuge,
diminuição da segurança, reforma ou ageism8 (Martin, Distelberg, Palmer & Jeste, 2015).
Apesar de a idade cronológica não indicar diretamente quais as mudanças e perdas existe uma
crescente probabilidade de ocorrerem incapacidades físicas e cognitivas com o envelhecimento
8 Ageism refere-se, essencialmente, segundo Macnicol (2006), às atitudes que os indivíduos e a sociedade apresentam para com um grupo de pessoas em função da idade, em particular os idosos.
63
(Araújo, Ribeiro, Oliveira & Pinto, 2007), o que gera um esforço crescente de flexibilidade e
resistência ao qual a maioria das pessoas idosas consegue responder. Assim, o desenvolvimento
psicológico modifica-se através do tempo e pode variar de cultura para cultura (Masten, 2001),
sendo que as variáveis que o acompanham são processos subjacentes à resiliência (Jimenez-
Ambriz, 2011a).
A resiliência encontra-se estreitamente relacionada com o facto de a pessoa, apesar
das perdas associadas à velhice, conseguir envelhecer de forma ativa e com êxito. As pessoas
idosas resilientes são, assim, as que conseguem manter a sua saúde física, cognitiva e social,
através de adaptações para manter a sua qualidade de vida e bem-estar, ao longo do ciclo vital
(Jimenez-Ambriz, 2011b). As pessoas idosas tendem, por exemplo, a usar estratégias de coping,
que reduzem o impacto negativo das perdas da velhice e, consequentemente, este torna-se o
fator para que o indivíduo possa ser mais resiliente (Afonso, 2012).
Um envelhecimento com êxito traduz, assim, mecanismos de resiliência, sendo
alcançado através da interação de vários fatores, tais como relações pessoais próximas com
familiares e amigos e a participação em atividades sociais e produtivas (Rowe & Kahn, 1998), e
atividades de caráter cultural e religioso. O envelhecimento saudável e ativo pressupõe uma
associação à ideia de que o indivíduo preserva o seu potencial de desenvolvimento durante o
seu curso de vida, através de novas aprendizagens, onde se prevê, também, um equilíbrio entre
limitações e potencialidades (Baltes, 1987). Fernandez-Ballesteros (2008) resume os critérios
para um envelhecimento ativo a: condições de saúde, bom funcionamento físico e cognitivo,
afeto positivo e participação social. A perspetiva do desenvolvimento ao longo da vida - Life-
Span - (Baltes, 1991) ao explicar o envelhecimento bem-sucedido, sugere que: (1) o curso do
desenvolvimento é individual e variável; (2) existem diferenças relevantes entre
envelhecimento, normal, ótimo e patológico; (3) durante o processo de envelhecimento, o
potencial de desenvolvimento é salvaguardado; (4) os prejuízos desta etapa podem ser
minimizados, através da ativação das capacidades de reserva e resistência; (5) as perdas
cognitivas podem ser compensadas por ganhos e (6) com o avançar da idade, os mecanismos de
autorregulação da personalidade mantêm-se intatos. Assim, os mecanismos que permitem à
pessoa idosa ser resiliente situam-se ao longo do ciclo vital, numa dinâmica de regulação,
otimização e compensação de perdas que permitem o envelhecimento com êxito.
Entre os vários fatores que contribuem para a resiliência na velhice, destaca-se a religião,
que constitui, frequentemente, o principal fator de apoio social (Koenig, 2009). Através das
instituições religiosas, os idosos socializam, inserem-se em grupos e participam em atividades
sociais que acontecem com regularidade no contexto das comunidades religiosas. A
espiritualidade e as crenças religiosas foram identificadas como recursos protetores e de
compensação, sobretudo, em casos de perda e trauma (Granqvist & Hagekull, 2000). A pesquisa
de Fry e Debats (2010) revelou que indivíduos com elevado índice de espiritualidade, quando
comparados com indivíduos com baixos níveis de espiritualidade, superam melhor situações de
morte/luto, mostrando-se este recurso como um contributo significativo para o bem-estar
psicológico. A prática religiosa continuada (maior religiosidade) é um fator relevante na
64
promoção de qualidade de vida da população idosa (Koenig, 2009) e para o desenvolvimento de
estados positivos de saúde mental que, consequentemente, contribuem para o sucesso
cognitivo, emocional e envelhecimento ativo no geral (Martin et al., 2015).
2. Religiosidade e Espiritualidade
A religião é conceptualizada de forma diferenciada em cada contexto sociocultural e
histórico, dependendo da perspetiva teórica que a sustenta. A religião é um sistema organizado
de mitos, ritos, crenças e símbolos que produzem um modelo de relação do ser humano com o
transcendente (Rodrigues, 2007), diferentemente da espiritualidade, que teria relação com
uma busca pessoal de sentido (Koenig, Larson & Larson, 2001). Embora haja proximidade
conceitual entre religiosidade e espiritualidade, esta última, segundo Pinto e Pais Ribeiro
(2007), constrói-se nos contextos socioculturais e históricos, estruturando e atribuindo
significado a valores, comportamentos e experiências do ser humano, sendo que, por vezes, se
materializa na prática de um credo religioso específico. A espiritualidade, etimologicamente,
refere-se ao domínio do espírito, à dimensão imaterial, normalmente descrita como algo
invisível e intangível ao indivíduo (Hufford, 2005 citado por Stroppa & Almeida, 2008). Assim,
esta pode ser entendida como uma força capaz de auxiliar o indivíduo a superar as dificuldades,
detendo também um sentido de conexão com algo superior a si, podendo ou não incluir
participação religiosa formal (Gutz & Camargo, 2013; Batista, 2007). Por sua vez, a religiosidade
inclui comportamentos, atitudes, valores e crenças, sentimentos e experiências e refere-se ao
grau de aceitação ou ligação que cada indivíduo tem face à instituição religiosa, nomeadamente
no que diz respeito à frequência da igreja, participação nas atividades religiosas e à forma
como se põe em prática as crenças e os rituais (Rodrigues, 2007). A religiosidade, sendo
derivada e vinculada ao contexto religioso, é definida como a vivência ou apropriação dos
elementos determinados de um conjunto de crenças (Franco, 2013).
As visões mais tradicionais da Psicologia consideravam a religião como um mecanismo
de defesa passivo, uma negação idealizada, ou como uma forma de coping evitante, com vista
a lidar com os problemas da vida (Pargament & Ano, 2004). Freud (1961, citado por Lewis,
1994) sugeria ainda um paralelo entre as práticas religiosas e as ações obsessivas,
acrescentando que tanto as práticas neuróticas como as religiosas serviam de medidas
defensivas e de autoproteção envolvidas na repressão dos impulsos instintivos. Durante o século
XX, seguindo a tese da secularização, pensava-se que a religião teria os dias contados,
considerando-a como uma reminiscência que o Homem guardava de um período primitivo do
seu desenvolvimento. Freud explicava, ainda, que a religião era vista como uma expressão
social da ilusão, mostrando-se o mundo como um molde dos próprios desejos do Homem
(princípio do prazer).
A espiritualidade continua a ser um conceito de difícil entendimento, sendo que esta é
experienciada e expressa, segundo Hill e Hood (1999), através da compreensão religiosa
65
convencional. Porém, a conceção de espiritualidade contemporânea ocidental distingue a
mesma da religião. Beck (1986) e Booth (1984), por seu lado, sugerem que a espiritualidade
intensifica e aprofunda a experiência interna, possuindo a pessoa espiritual valores positivos e
criativos, bem como traços de consciência, uma perspetiva holística, integração, gratidão,
esperança, aceitação e coragem. A espiritualidade, segundo Volcan, Sousa, Mari e Hirta (2003),
está vinculada a uma procura pessoal de sentido, com ênfase no aperfeiçoamento do potencial
humano. Nesta linha de pensamento, Elkins, Hedstrom, Hughes, Leaf e Saunders (1988)
propuseram um modelo constituído por nove componentes, tocando estes, entre outros, os
conceitos de transcendência, missão de vida, consciência da sacralidade, sacralização da vida,
altruísmo, idealismo e consciência do trágico. Mais tarde, Ingersoll (1994) propôs um modelo
de espiritualidade composto por sete dimensões: 1) significado; 2) conceção de divindade; 3)
relação; 4) mistério; 5) jogo; 6) experiência; e uma dimensão 7) integrativa.
No caso da definição de religiosidade, esta inclui crenças, práticas organizacionais
(como as atividades institucionais da igreja) e compromisso com o sistema teológico/teorético
da religião da qual faz parte (Rodrigues, 2007). Neste contexto, do ponto de vista psicológico,
é pertinente realçar que diferenças no estilo cognitivo, na personalidade ou no tipo de
motivação influenciam a forma como a religião é vivida. De acordo com Dong e Eun-kyoung
(2006), há várias dimensões da religiosidade que podem ser analisadas, mas as mais
amplamente investigadas são: a religiosidade subjetiva (visão que o sujeito tem da sua própria
religiosidade, ou seja, o quão religioso se considera), a denominação religiosa (religião
praticada pelo indivíduo) e práticas religiosas quotidianas (número de vezes que uma pessoa
vai à igreja e/ou frequenta atividades ou serviços religiosos). Assim, ao passo que a religião
estaria vinculada às instâncias de organização institucional, a espiritualidade tem em conta as
dimensões afetivas, pessoais e experienciais (Pargament, 1997). Em suma, a religião pode ser
considerada como o sistema que fornece o conteúdo simbólico, moral e ritual das crenças; a
religiosidade é caraterizada pela forma como o indivíduo se apropria desse sistema,
atualizando-o, a partir das suas vivências; e, por fim, a espiritualidade é conceptualizada como
um sistema próprio e independente de potências como a criatividade, liberdade e autenticidade
(Franco, 2013).
A atitude religiosa, além de incluir crenças e práticas religiosas, envolve também
sentimentos positivos e negativos associados a essas crenças (Hill & Hood, 1999). O indivíduo,
através da religiosidade, pode atribuir significados aos fatos, compreendendo-os como parte de
algo mais amplo, mediante a crença de que nada ocorre ao acaso e de que acontecimentos da
vida são determinados por uma força/entidade superior. Tais fatos, segundo os mesmos
autores, associados às crenças pessoais, podem levar a um enriquecimento individual, como
sabedoria, equilíbrio, maturidade e resiliência. A religiosidade, segundo Fetzer (2003, 1999),
envolve sistemas de culto e de doutrina e é compartilhada dentro de um grupo e pode ter,
66
conforme referem Allport e Ross (1967), duas orientações: intrínseca e extrínseca9 e, para
Baker (2003) pode, igualmente, seguir duas vertentes: organizada e não organizada10.
2.1. Religiosidade e Espiritualidade: uma perspetiva psicológica
Num dos artigos de Stroppa e Almeida (2008) é referenciado que, nos séculos XIX e XX,
época em que alguns dos intelectuais eram influenciados por uma visão antirreligiosa, a
religiosidade era considerada como um estado intelectual e social primitivo. Esta perspetiva
não foi fundamentada por investigações, contribuindo as opiniões e teorias pessoais para a
disseminação da ideia de que a religiosidade/espiritualidade teriam um impacto negativo sobre
a saúde mental. Também Charcot e Maudsley, médicos da época, criticaram e consideraram
várias experiências e práticas religiosas como sendo patológicas. Freud, por sua vez, influenciou
médicos e psicólogos, sugerindo que a religiosidade teria uma influência irracional e neurótica
sobre o psiquismo humano, acrescentando que esta era o resultado da desvalorização da vida
e da distorção da visão do mundo real (Stroppa & Almeida, 2008). Ellis, fundador da Terapia
Relacional Emotiva, sugeriu que a religiosidade equivalia a um distúrbio emocional. Assim,
embora dominasse uma visão negativa da religiosidade, também existiram outros autores que
não partilhavam da mesma opinião. Jung, por exemplo, considerava a religião como aspeto a
considerar na vida do sujeito, bem como um fenómeno histórico e sociológico.
Ao longo do tempo, intelectuais e investigadores do século XX, pressupuseram o
desaparecimento ou diminuição da religiosidade. Contrariamente ao esperado, nas últimas
décadas, observou-se a manutenção de elevadas percentagens de pessoas que se consideram
religiosas, levando a um aumento do interesse por parte dos investigadores, na área da
Psicologia, sobre esta temática (Stroppa & Almeida, 2008).
9 Intrínseca - a pessoa internaliza as suas crenças de tal modo que a religião (força major) faz parte integrante da sua vida diária; Extrínseca - a pessoa utiliza a religião como forma de atingir os seus próprios fins (encontrar segurança, status social, consolo e interação social). O compromisso com os valores religiosos é mais superficial. 10 Organizada (práticas religiosas públicas na igreja ou sinagoga) e não organizada (práticas religiosas privadas: oração pessoal, meditação, leitura de textos religiosos e da Bíblia, audição de música religiosa e visualização de programas religiosos na televisão).
67
3. Religiosidade/espiritualidade ao longo do Ciclo Vital: da
adultez à velhice
Durante o ciclo vital, o indivíduo é desafiado a estabelecer novas relações consigo e
com o mundo, bem como a encontrar estratégias de superação das limitações (Ribeiro de Lima
& Coelho, 2011). A perspetiva do desenvolvimento ao longo do ciclo vital (Life-Span)
compreende o desenvolvimento a partir do indivíduo e do que é comum aos membros de
determinada sociedade (Ribeiro de Lima e Coelho, 2011).
A Life-Span é uma abordagem de orientação dialética que tem colaborado
expressivamente para as mudanças de paradigma no que diz respeito à velhice, sobretudo, no
que diz respeito ao desenvolvimento intelectual dos idosos (Baltes & Baltes, 1990). Esta
perspetiva concebe o envelhecimento de três formas, que não são passiveis de uma
interpretação rígida: i) normal, onde são referidas as mudanças esperadas e inevitáveis
inerentes ao processo de envelhecer; ii) patológico, onde se encontram os casos de doença,
disfuncionalidade e descontinuidade do desenvolvimento; e iii) ótimo ou saudável,
caraterizando-se, este último, por um ideal sociocultural de qualidade de vida, funcionalidade
física e mental plenas, baixo risco de doenças e incapacidade, bem como motivação de viver
(Baltes, 1987). Uma vez que o funcionamento mental providencia importante informação
acerca da forma como os indivíduos aprendem a lidar com as diferentes circunstâncias de vida,
Faller, Melo, Versa e Marcon (2010) referem que as práticas religiosas fornecem suporte
emocional, principalmente para o idoso, que com o avançar da idade, conta com a repercussão
da sua religiosidade, nas relações sociais, na saúde física e mental.
As crenças e práticas que caraterizam a vida espiritual flutuam ao longo do ciclo de
vida, consoante as circunstâncias de vida e o desenvolvimento do indivíduo (Miller & Kelley,
2005). As teorias psicodinâmicas, assim como as do desenvolvimento pós formal, veem a
espiritualidade entrelaçada com o processo maturacional e com as experiências associadas à
meia-idade (Wink & Dillon, 2008). Assim, apesar de a idade adulta não ser definida de forma
estanque, Barros (2000) organiza esta etapa em três grupos: o adulto jovem (dos 25 aos 45
anos), o adulto médio (dos 45 aos 65 anos) e o adulto sénior (a partir dos 65 anos). A chamada
“meia-idade” deverá ser vista no contexto do ciclo de vida com caraterísticas únicas que devem
ser integradas em dimensões biológicas e socioculturais complexas (Wink & Dillon, 2002). No
meio da vida, segundo Fagulha (2005), os adultos são confrontados com experiências que
exigem reestruturações relacionais e que apelam para uma tomada de consciência, por
exemplo, em relação à morte (e.g., perda dos progenitores), sinais de envelhecimento e
adaptação à emancipação dos filhos. Autores como Erikson e Jung consideram que a
espiritualidade está ligada ao processo maturacional e às experiências associadas à idade adulta
(Barros, 2000). Wink e Dillon (2002) referem que os padrões de participação religiosa se
estabelecem no início da idade adulta e tendem a permanecer estáveis. Estes autores defendem
que parece existir uma clara ascendência do nível de espiritualidade na meia-idade, podendo
68
esta ser considerada um fenómeno característico desta etapa do ciclo de vida, uma vez que o
seu desenvolvimento requer autonomia pessoal e consciência do relativismo contextual que,
normalmente, se desenvolve nesta altura. Para os indivíduos adultos são vários os fatores que
influenciam a perceção de sentido na vida: os fatores internos, que estão ligados ao
desenvolvimento do indivíduo (personalidade, estratégias de coping, religiosidade,
espiritualidade e sentimento de pertença), e os fatores externos, que pertencem ao meio e
corroboram o significado que as pessoas dão à vida (oportunidades sociais, trabalho, lazer e
segurança) (Sommerhalder, 2010). Assim, é possível apontar alguns fatores explicativos da
religiosidade/espiritualidade adulta: 1) procura de significado para a vida – relacionado com a
origem e desenvolvimento religioso, como resposta a interrogações existenciais; e) desejo de
auto transcendência – o indivíduo acredita que, apenas, a fé pode dar a plena transcendência;
3) globalidade – a religião possui um caráter totalizante, exprime-se na sua complexidade sob
um princípio organizador capaz de dar significado a tudo, procurando integrar e interpretar
aspetos menos claros do passado; 4) autonomia motivacional – uma religiosidade adulta é fonte
motivacional do comportamento; 5) dinamicidade – a religião adulta funciona como tarefa
aberta, como tendência heurística, flexível e não estereotipada; e 6) consequencialidade – a
De acordo com a perspetiva life-span, o desenvolvimento e a manutenção de padrões
efetivos de envelhecimento dependem de fatores de natureza genético-biológica, e, também,
da influência de fatores socioculturais (Baltes, 1987), onde se insere a dimensão religiosa-
espiritual (Ribeiro de Lima & Coelho, 2011). Segundo Koenig (2009), através da religião, os
idosos socializam, inserem-se em grupos, participam em atividades sociais regulares, sendo
que, para muitos, a sua comunidade de fé torna-se a rede principal de apoio social. As pessoas
idosas relatam a importância da religiosidade na vivência das dificuldades que atravessam no
processo de envelhecimento. A espiritualidade é uma fonte importante de suporte emocional,
contribuindo decisivamente para o bem-estar na velhice, sobretudo, pela rede de suporte social
e pelas estratégias para lidar com o stress (Monteiro, 2004).
A plasticidade desenvolvimental é uma das caraterísticas subjacentes a esta perspetiva,
que se refere ao potencial de mudança de um indivíduo e à sua flexibilidade para lidar com
novas situações (Baltes, 1987) e integra fatores relativos à espiritualidade (Lerner, Dowling &
Anderson, 2010). O grau de plasticidade é inerente à capacidade de reserva11 de cada pessoa,
a qual é constituída por recursos internos e externos que mudam de acordo com o tempo e o
meio envolvente (Baltes, Lindenberger & Staudinger, 2006). Apesar de, segundo Neri (2006), a
velhice ser caracterizada pelo declínio de plasticidade e das funções biológicas, é igualmente
uma fase de readaptação constante, que Baltes et al. (2006) descrevem como uma otimização
seletiva com compensação. Nesta compensação, a espiritualidade pode ser reconhecida como
um recurso para o bem-estar na velhice (Sommerhalder & Goldstein, 2006). Desta forma, a
participação em ambientes estimulantes (e.g., locais de culto), e a presença de oportunidades
11 Segundo Staudinger, Marsiske e Baltes (1995), o termo capacidade de reserva refere-se ao potencial de cada indivíduo para a mudança e, especialmente, o seu potencial de crescimento, face às adversidades.
69
de desenvolvimento, coadunadas com os fatores espirituais-religiosos, segundo Scoralick-
Lempke e Barbosa (2012), têm-se mostrado fundamentais para um melhor desenvolvimento ao
longo do ciclo vital. Langer (2008) refere que durante a velhice, os indivíduos estão sujeitos,
frequentemente, a agressões físicas, emocionais, sociais e espirituais. Baltes e Baltes (1990)
ressaltam que, mesmo quando estes sinais de fragilidade são pronunciados, os idosos são
capazes de fazer as modificações, ajustes e compensações necessárias aos seus objetivos e
aspirações, recorrendo, com frequência, às suas crenças religiosas (Scoralick-Lempke &
Barbosa, 2012). O modelo SOC (Seleção, Otimização e Compensação), proposto por Baltes e
Carstensen (1996), procura explicar o modo como decorre a orquestração da vida, sendo, por
isso, visto como um modelo de adaptação, sobretudo, a partir da meia-idade e durante a
velhice. Baltes e Staudinger (2000) referem que os adultos mais velhos tendem a investir mais
tempo em tarefas de compensação do que em tarefas de otimização. Contudo, fatores como a
regulação emocional e espiritual ou a sabedoria são importantes para uma mudança contínua e
positiva (Baltes & Staudinger, 2000; Kunzmann, 2004). As conclusões do estudo de Gall, Malette
e Guirguis-Younger (2011) mostraram que a espiritualidade para os idosos contribui para o
processo de otimização seletiva do modelo proposto por Baltes e Baltes (1990). Em suma, o
modelo SOC defende que os ganhos e as perdas evolutivas do envelhecimento são resultantes
da interação entre recursos individuais e do ambiente, onde se insere o meio religioso,
procurando este modelo realizar uma descrição do ciclo vital e descobrir como os indivíduos se
adaptam às mudanças biológicas, psicológicas, sociais e espirituais (Neri, 2006).
Alguns estudos sugerem a existência de efeitos geracionais, indicando que os
adolescentes e jovens adultos são considerados menos religiosos em relação aos adultos mais
velhos (Hood, Spilka, Hunsberger & Gorsuch, 1996). Assim, dentro desta temática, levanta-se
uma questão: de que forma é que a idade se relaciona com a religiosidade dos indivíduos?
São propostos, por Argyle e Beit-Hallahami (1975), três modelos que procuram
descrever as mudanças comportamentais e as convicções religiosas ao longo do
desenvolvimento: 1) o modelo tradicional, onde é apresentado um decréscimo da atividade
religiosa entre os 18 e os 30 anos, seguindo-se um contínuo aumento, após esta faixa etária; 2)
o modelo da estabilidade, onde se considera não haver alterações relativas à idade; e 3) o
modelo sem compromisso que considera haver um declínio contínuo da atividade religiosa à
medida que a idade avança. Todavia, autores como Bender (1968) e Cameron (1969) defendem
a evidência de que, com o avançar dos anos, aumentam a importância do rezar, da perceção
da importância da religião e do interesse na religião e frequência de locais de culto – o que
corrobora o defendido pelo modelo tradicional.
Fowler (1991), tendo por base os estádios de desenvolvimento cognitivo de Piaget e
moral de Kolberg, sugeriu que a fé religiosa individual obedece a um processo evolutivo,
correspondente a uma sequência de seis estádios: 1) fé primitiva (0 – 2 anos) – definida por
desenvolver a confiança entre a criança e o seu cuidador; 2) fé intuitiva e projetiva (primeira
infância) – caracterizada pelas imagens criadas para representar o bem e o mal, despertadas
pelos padrões morais; 3) fé mítica/literal (idade escolar) – primeiras expressões de fé, através
70
de linguagem simbólica e metafórica; 4) fé convencional (da adolescência à primeira idade
adulta) – caracterizada pela conformidade entre a autoridade religiosa e o desenvolvimento da
identidade pessoal; 5) fé individual e refletiva (da juventude à idade adulta) – definida pela
autoconsciência e compromisso com o sistema religioso; 6) fé conjuntiva (idade adulta) –
caracterizada pelo reconhecimento e compreensão do paradoxo entre a transcendência e a
realidade; e 7) fé universalizada (da idade adulta à velhice) – perspetiva transcendente,
caracterizada por sentimentos de unidade e compaixão (Oser, Scarlett e Bucher, 2006; Fowler,
1991).
A identidade religiosa e espiritual, no final da vida, e a fé religiosa são de extrema
importância. Assim, segundo Bradley, Fried, Kasl e Idler (2000) levantam-se duas questões: a)
até que ponto a fé e a espiritualidade são importantes no período precedente à morte?; e b)
será que as crenças e práticas religiosas permanecem estáveis ao longo desta última etapa da
vida?.
Vários estudos sobre o envelhecimento dão ênfase à importância da religião para
conseguir recursos para enfrentar os desafios que a idade impõe - isolamento social,
enfraquecimento cognitivo e incapacidade física (e.g., Bevins & Cole, 2000). Estes recursos,
encontrados na religião, segundo Koenig (1999) e Pargament (1997), atuam de forma a diminuir
a depressão, a ansiedade, suicídio - situações comuns em populações idosas, pois é na velhice
que surgem momentos que representam maior desafio (Pargament, 1997). Outros estudos (e.g.,
Vecchia, Ruiz, Bocchi & Corrente, 2005; Panzini, Rocha, Bandeira & Fleck, 2007) que se
debruçaram sobre a relação entre religião e qualidade de vida em idosos revelam que os efeitos
da religiosidade no bem-estar são maiores neste grupo etário do que nos mais novos (Ferreira,
2005). Ainda que, segundo Barros (2000), os idosos desinvistam, progressivamente, nos contatos
com o mundo, podem, no entanto, e do ponto de vista religioso, investir na entrega a funções
e atividades na igreja. A frequência destas atividades correlaciona-se com um maior bem-estar,
mais felicidade, utilidade e adaptação, diminuição do medo da morte e, por conseguinte, uma
Foram propostos por Pargament (1997) quatro estilos de coping religioso: 1)
autodirigido; 2) delegação; 3) colaboração; e 4) súplica, como é demonstrado na Tabela 2.
Tendo por base os objetivos da religião, o coping religioso pressupõe: a procura de significado,
o controlo, o conforto espiritual, a procura de intimidade com Deus e outros membros da
sociedade, a transformação/aceitação da vida e o bem-estar físico, psicológico e emocional
(Tarakeshwar & Pargament, 2001).
Estratégias Positivas Descrição
Reavaliação religiosa benevolente Redefinir o stressor através da religião como
potencialmente benéfico.
Coping religioso de colaboração Tentar controlar e resolver os problemas em
parceria com Deus.
Foco religioso Procurar o alívio da situação stressante focando-
se na religião.
Perdão religioso
Apoio Espiritual
Procurar ajuda na religião para mudar os
sentimentos de raiva, mágoa ou medo.
Procurar conforto e renovação de confiança
através do amor e cuidado de Deus.
Estratégias Negativas Descrição
Reavaliação de Deus como punitivo Considerar o stressor como forma de punição
divina para os pecados individuais.
Reavaliação dos poderes de Deus Redefinir os poderes de Deus para influenciar a
situação stressante.
Coping religioso de delegação Esperar passivamente que Deus resolva os
problemas.
Descontentamento religioso
interpessoal
Expressão de confusão e descontentamento com
os membros da instituição religiosa.
Intervenção divina Suplicar por intervenção divina direta.
75
Tabela 2 – Características dos estilos de Coping Religioso (Pargament et al., 2001).
Estilo Descrição
Autodirigido (self-directing) O indivíduo considera-se responsável pela
resolução dos problemas; Deus tem um papel
passivo; Assenta na perspetiva de que Deus dá ao
indivíduo a liberdade e os recursos para dirigir a
sua própria vida.
Delegação (deferring) Atribui-se a Deus a responsabilidade de resolução
dos problemas; indivíduo tem um papel passivo.
Colaboração (collaborative) Corresponsabilidade entre Deus e o indivíduo na
resolução dos problemas; O indivíduo e Deus
“trabalham” em parceria no processo de coping.
Súplica (pleading ou petitionary) Tentativa de influenciar a vontade de Deus,
através de petições por intervenção divina.
76
Anexo 2 - Extensão do Estudo Empírico
1. Formulação do problema
1.1. Objetivos do estudo
A extensão da componente empírica desta dissertação visa expor e descrever, de uma
forma contínua e detalhada, os objetivos e hipóteses do estudo e respetivos dados estatísticos
obtidos, sobretudo, aqueles que não tiveram lugar anteriormente. É apresentada uma
redundância deliberada, integrada com o que foi referido anteriormente, nomeadamente, no
artigo empírico, a fim de melhor complementar todas as componentes aqui implicadas.
A pertinência da temática, que visa o estudo da espiritualidade como potencial fator
de promoção de resiliência, resulta de duas questões: Será que o grau de espiritualidade está
relacionado com o grau de resiliência dos sujeitos? Haverá diferenças, a este nível, entre os
indivíduos em diferentes fases do ciclo vital?
Neste sentido, a resiliência pode ser descrita como uma caraterística idiossincrática
que, segundo Stephens, Breheny e Mansvelt (2014), se desenvolve ao longo do tempo, e é
considerada como uma adaptação bem-sucedida, às adversidades da vida, o que implica
flexibilidade mental, emocional e comportamental (APA, 2006). Enquanto constructo
psicológico, começou por ser estudada em relação à infância e adolescência. Posteriormente,
a resiliência foi analisada e discutida em relação à velhice, onde parece assumir algumas
especificidades. Em contrapartida, na idade adulta, os sujeitos são confrontados com
experiências que exigem reestruturações relacionais, apelando para uma tomada de
consciência, por exemplo, em relação aos sinais de envelhecimento (Fagulha, 2005).
Atualmente, constatamos que a investigação psicológica tem vindo a atribuir maior
importância à espiritualidade do indivíduo, sobretudo no que se refere à compreensão da forma
como as crenças interferem ao nível da aprendizagem de estratégias resilientes. A revisão da
literatura desta temática revela que a religiosidade e a espiritualidade podem estar associadas
a uma maior resiliência em condições stressantes, situações de perda e, sobretudo, na velhice.
Assim, partindo do pressuposto que a espiritualidade/religiosidade influencia a resiliência dos
indivíduos, através desta investigação pretende-se estudar as especificidades existentes entre
diferentes momentos do desenvolvimento, relativamente aos níveis de religiosidade e
resiliência.
77
1.2. Hipóteses
A base de sustentação para a formulação de hipóteses advém da revisão de estudos
anteriores, bem como dos principais objetivos propostos para este estudo. A formulação das
hipóteses do estudo é a que se segue:
H1: Existe diferença estatisticamente significativa no coping resiliente entre homens e
mulheres;
H2: Existe diferença estatisticamente significativa nas crenças entre homens e mulheres;
H3: Existe diferença estatisticamente significativa na Esperança/Otimismo entre homens e
mulheres;
H4: Existe diferença estatisticamente significativa no coping resiliente em função da idade.
H5: Existem diferenças estatisticamente significativas na espiritualidade em função da variável
idade:
H5a: Existem diferenças estatisticamente significativas nas crenças em função da
variável idade;
H5b: Existem diferenças estatisticamente significativas na esperança/otimismo em
função da variável idade;
H6: Existe associação estatisticamente significativa entre coping resiliente e as crenças;
H7: Existe associação estatisticamente significativa entre coping resiliente e
esperança/otimismo;
H8: Existe associação estatisticamente significativa entre coping resiliente e a frequência em
locais de culto;
H9: Existe uma associação estatisticamente significativa entre coping resiliente e a frequência
de oração;
H10: As crenças e a Esperança/Otimismo influenciam o coping resiliente:
H10a: As crenças influenciam o coping resiliente;
H10b: A Esperança/Otimismo influenciam o coping resiliente.
2. Método
Esta investigação tem por base um design cross-sectionl/transversal de natureza
correlacional, recorrendo a uma amostra por conveniência e a um tratamento quantitativo dos
dados. Este tipo de design envolve a abordagem a uma amostra de sujeitos apenas uma vez,
permitindo estabelecer comparações entre grupos e analisar relações entre variáveis. Um
estudo correlacional tem como objetivo avaliar/medir o grau de relação entre duas ou mais
variáveis, num determinado contexto, acabando por quantificar as relações. A principal
vantagem deste tipo de estudo é saber como se comporta uma determinada variável,
78
conhecendo o comportamento de outras variáveis relacionadas. Assim, os estudos quantitativos
tendem à recolha de dados numéricos que permitam testar hipóteses, centralizando as suas
análises em métodos estatísticos (Sampieri, Collado & Lucio, 2006).
2.1. Participantes
A amostra por conveniência é constituída por um total de 1310 indivíduos, com idades
compreendidas entre os 25 e os 97 anos, sendo que 589 dos inquiridos são de nacionalidade
portuguesa e 686 brasileira. No que diz respeito à variável idade, foram estabelecidos três
grupos de comparação, como é demonstrado na tabela 1. Apresentando uma divisão equitativa
quanto ao género, 44.7% dos participantes da amostra são homens e 55.3% mulheres.
Relativamente ao nível de escolaridade, 76.8% apresenta um nível de escolaridade superior,
seguidamente, a segunda maior fatia (9.5%) corresponde apresenta até 12 anos de escolaridade,
3.9% apresenta escolaridade até 9 anos, 1.4% até 6 anos e, por fim, 6% dos inquiridos
apresentam escolaridade até 4 anos. No que diz respeito ao estado civil, a amostra subdivide-
se em 2 grandes grupos, os casados (45.8%) e os solteiros (22.9%); os restantes, e numa
percentagem consideravelmente menor, situam-se os comprometidos afetivamente (6.0%), os
viúvos (6.3%) e os unidos de facto e os divorciados, com percentagens iguais (9.2%).
Por fim, no que concerne à filiação religiosa, 741 (56.6%) dos participantes diz ser
católico, porém, 27.9% da amostra não respondeu a esta questão; a restante amostra apresenta
valores residuais no que toca a outras filiações: 5.1% espíritas, 3.9% evangélicos, 3.2% outra
religião, 2.1% protestantes, .6 agnósticos e, por fim, .2% ateus.
Tabela 3 – Tabela de Frequências relativa à variável Idade.
2.2. Instrumentos
Após uma pesquisa ponderada e uma análise detalhada, foram apurados os
questionários que se revelaram adequados à recolha de informação, tendo em conta a
população alvo, relativa aos objetivos propostos, nomeadamente o questionário
sociodemográfico, a Escala breve de coping resiliente e a escala de espiritualidade em
contextos de saúde. Seguidamente, caraterizamos os referidos instrumentos.
Grupo Média Mediana Moda DP
Idade 1. 25 – 45 anos 34.234 34.000 28.000 5.937
2. 46 -65 anos 53.872 53.000 50.000 5.287
3. 66 – 97 anos 75.439 74.000 67.000 7.709
79
2.2.1. Questionário sociodemográfico
Este questionário foi elaborado com especial incidência na experiência religiosa dos
sujeitos, de modo a fornecer um quadro exaustivo das características da amostra. Composto
por respostas abertas e fechadas, este questionário inclui, maioritariamente, perguntas de cariz
sociodemográfico, tais como idade, escolaridade, nacionalidade, situação professional, etc..
2.2.2. Escala de Espiritualidade em contextos de saúde (Pinto &
Pais-Ribeiro, 2007)
Como medida de Espiritualidade/Religiosidade foi utilizada a Escala de Espiritualidade
em contextos de saúde (cf. Anexo 4) (Pinto & Pais-Ribeiro, 2007). Esta escala contém cinco
itens que quantificam a concordância do indivíduo com questões relacionadas com a dimensão
da espiritualidade, sendo que as respostas podem variar entre o «Não concordo» (1), «Concordo
um pouco» (2), «Concordo bastante» (3) e «Plenamente de acordo» (4). Da análise fatorial
resultaram duas subescalas, uma constituída por dois itens (item 1 – As minhas crenças
espirituais/religiosas dão sentido à minha vida; item 2 – A minha fé e crenças dão-me forças
nos momentos difíceis) que se referem a uma dimensão vertical da espiritualidade, a que os
autores denominam como «Crenças» e outra constituída por três itens (item 3 – Vejo o futuro
com esperança; item 4 – Sinto que a minha vida mudou para melhor; item 5 – Aprendi a dar
valor às pequenas coisas da vida), referentes a uma dimensão horizontal da espiritualidade,
denominada «Esperança/Otimismo». A cotação de cada subescala é efetuada através da média
dos itens da mesma, sendo que quanto maior o valor obtido em cada item, maior a concordância
com a dimensão avaliada.
Tabela 4 – Comparação das médias de resposta aos itens da Escala de Espiritualidade.
Média DP Mediana Min. Máx.
CopR1 3.65 1.095 4.00 1 5
CopR2 3.56 1.068 4.00 1 5
CopR3 3.83 1.060 4.00 1 5
CopR4 3.60 1.120 4.00 1 5
Coping Resiliente 14.65 3.611 15.00 4 20
A consistência interna desta escala é de α= .800, o que é indicador de uma boa
consistência interna, comparativamente à escala original (a consistência interna desta escala
é de α= .74). No que concerne ao fator Crenças, obtivemos consistência de α= .94 e, o segundo
fator Esperança/Otimismo revelou uma consistência de α= .76. Ambos superiores aos valores
da escala original (α= .92 e α= .69, respetivamente) (cf. Tabela 5).
80
Tabela 5 – Cálculo da confiabilidade da Escala de Espiritualidade em contextos de saúde e respetiva
comparação com a Escala original.
2.2.3. Escala Breve de Coping Resiliente (Pais-Ribeiro & Morais,
2010)
A Escala Breve de Coping Resiliente (cf. Anexo 3) (Pais-Ribeiro & Morais, 2010) é um
instrumento que permite avaliar a resiliência como uma estratégia de coping, a qual foi
adaptada e validada para a população portuguesa, a partir da versão original Brief Resilient
Coping Scale (Sinclair & Wallston, 2003). Inicialmente, a escala incluía nove itens, entre os
quais foram selecionados os quatro que, segundo os autores, operacionalizam o construto de
coping resiliente, emergindo-se temáticas como o otimismo, a perseverança, a criatividade e o
crescimento positivo face às adversidades. Esta é uma escala de autorresposta, unidimensional,
composta por quatro itens, que visam descrever o padrão ativo de resolução de problemas, o
que, por sua vez, reflete o padrão de coping resiliente. A resposta aos itens é dada numa escala
ordinal, em formato de Likert, de cinco posições e sem cotação invertida: 5 – quase sempre, 4
– com muita frequência, 3 – muitas vezes, 2 – ocasionalmente, e 1 – quase nunca, cuja nota de
capacidade para lidar com o stress de forma adaptativa varia entre 4 e 20. Segundo os autores
da escala original, consideram-se com baixa resiliência os sujeitos com uma pontuação inferior
a 13 e com uma resiliência elevada os sujeitos cuja pontuação seja superior a 17 (Sinclair &
Wallston, 2003).
Cronbach’s Alpha
Escala original .74
Crenças .92
Esperança/Otimismo .69
Escala no estudo (n=1310) .80
Crenças .94
Esperança/Otimismo .76
81
Tabela 6 – Comparação das médias de resposta aos itens da Escala breve de Coping Resiliente.
Média DP Mediana Min. Máx.
Cren1 2.94 .967 3.00 1 4
Cren2 3.07 .951 3.00 1 4
EspOp1 3.22 .743 3.00 1 4
EspOp2 3.13 .815 3.00 1 4
EspOp3 3.45 .648 4.00 1 4
Crenças 3.01 .931 3.00 1 4
EspOp 3.25 .605 3.33 1 4
A consistência interna desta escala é de α= .85, o que reflete uma boa consistência
interna (Marôco & Garcia-Marques, 2006), comparativamente com a escala original (α= .68) e
com a escala adaptada para a população portuguesa (α= .53) (cf. Tabela 7).
Tabela 7 – Cálculo da confiabilidade da Escala breve de Coping Resiliente e respetiva comparação com as
escalas original e adaptada à população portuguesa.
2.3. Procedimentos
Primeiramente, iniciou-se a exploração do tema, no que diz respeito ao estado da arte,
desenvolvendo de seguida a questão de investigação e gerando hipóteses de investigação, bem
como o delineamento dos respetivos objetivos. A par deste processo, foram realizados dois
artigos, atualmente, submetidos para publicação, um dos quais de revisão da literatura e outro
empírico.
Este estudo insere-se na investigação “Saúde, bem-estar e felicidade, ao longo do ciclo
de vida PT/BR”, a qual tem como objetivo avaliar os níveis de saúde, bem-estar e felicidade
em portugueses e brasileiros, assim como avaliar outras áreas relacionadas. A recolha da
amostra foi efetuada no período de três meses (novembro de 2014 a fevereiro de 2015)
referindo-se a natureza do estudo e assegurando o anonimato e confidencialidade da
apresentação dos dados. As tarefas a realizar envolviam a forma dita “papel e lápis”, para os
indivíduos com mais de 65 anos e houve, igualmente, um questionário online para os restantes
indivíduos. O preenchimento dos questionários foi efetuado num momento único. Importa
ressalvar que a colaboração dos participantes foi voluntária, sendo que ao longo de todo o
Cronbach’s Alpha
Escala original (Sinclair & Wallson, 2003) .68
Escala adaptada à população portuguesa .53
Escala no estudo .85
82
estudo foram cumpridos os princípios éticos e deontológicos preconizados pela ordem dos
Psicólogos Portugueses para a investigação em Psicologia.
2.4. Análise Estatística
Os dados recolhidos foram analisados com recurso ao software SPSS (Statistical Package
for Social Sciences), bem como ao AMOS, ambos versão 22, com a finalidade de suportar a
investigação e os estudos efetuados. Procedeu-se, em primeiro lugar, ao cálculo das
frequências, média, desvio padrão, estatística descritiva para caracterização da amostra, no
que diz respeito aos dados sócio - demográficos, experiência religiosa e coping resiliente. Para
alcançar os objetivos do estudo foram realizados o teste t-student para comparar as diferenças
nas médias entre grupos e o teste Anova, a fim de testar diferenças nos grupos estabelecidos,
com base numa variável dependente, efetuaram-se correlações e testes de regressão e, por
fim, efetuou-se um modelo de equações estruturais, com o propósito de confirmar, na
globalidade, o impacto proficiente da espiritualidade, na papel das suas dimensões verticais e
horizontais ao nível do coping resiliente.
2.5. Resultados
Foi realizado um t-test (Independet Sample Test), de forma a comparar os resultados
na escala de coping resiliente e nas duas dimensões de espiritualidade (crenças e
esperança/otimismo) em relação ao género, tal como é demonstrado na Tabela 2.
Relativamente à variável Coping Resiliente, os homens (M=15.046, DP= 3.527) apresentam
valores médios de coping mais elevados do que as mulheres (M=14.332, DP= 3.638), alcançando-
se valores estatisticamente significativos t(df=1260.549)= 3.584, p≤ .05), sendo assim aceite a
Hipótese 1.
Seguidamente, no que diz respeito à dimensão Crenças, são as mulheres quem pontuam
valores maiores (M=3110, DP= .855), quando comparadas com os homens (M=2.872, DP= 1.002),
revelando-se resultados estatisticamente significativos t(df=1146.797)= -4.624, p≤ .05), sendo
aceite a Hipótese 2. Por fim, no que concerne à dimensão Esperança/Otimismo, são novamente
as mulheres que alcançam melhores médias (M=3.290, DP= .583), comparativamente aos
homens (M=3.229, DP= .630), porém, não se encontram resultados estatisticamente
significativos t(df=1201.005)= -1.818, p= .069), rejeitando-se, deste modo, a Hipótese 3.
83
Tabela 8 - Análise das diferenças entre o género e as variáveis Coping Resiliente, Crenças e
Esperança/Otimismo, através do teste t-student.
Na tabela abaixo, foi efetuada uma one-way betwwen-groups analysus of variance de
forma a analisar o impacto da idade nas escalas de Coping Resiliente e de Espiritualidade. Os
participantes foram divididos em três grupos de acordo com a sua idade (grupo 1: 25-45 anos;
grupo 2: 46-65 anos; grupo 3: 66-97 anos). Desta análise, foram encontradas diferenças
estatisticamente significativas, a um nível de significância de p< .05, entre os grupos, em todas
as variáveis estudadas, respetivas às Hipóteses 4, 5a e 5b; no Coping resiliente (F(2; 1270)=
23.055 , p≤.05), na dimensão de espiritualidade Crenças (F(2; 1270)= 13.869 , p≤ .05) e, por
fim, para a dimensão Esperança/Otimismo (F(2; 1270)= 21.443, p≤ .05).
Tabela 9 – Resultados obtidos, através das estatísticas de teste Anova, da diferença entre grupos etários.
A partir de comparações post-hoc, através do teste Gabriel, pode inferir-se que existem
diferença significativas, na variável coping resiliente, entre todos os grupos (p≤ .05), sendo o
grupo 2 a alcançar pontuações médias mais elevadas (M=15.471; DP= 3.487). Relativamente à
dimensão Crenças, testes post-hoc Gabriel revelaram que existem diferenças estatisticamente
significativas entre o grupo 1 e o grupo 2 (p= .011) e o grupo 1 e o grupo 3 (p≤ .05), sendo aqui
Género Média Desvio Padrão T p
Coping Homem
Mulher
15.046
14.332
3.527
3.638
3.584 .000
Crenças Homem
Mulher
2.872
3.110
1.002
.855
-4.624 .000
Esperança/Otimismo Homem
Mulher
3.229
3.290
.630
.583
-1.818 .069
Idade M DP F p
Coping Resiliente 25 – 45 anos
46 – 65 anos
66 – 97 anos
14.549
15.471
13.445
3.509
3.487
3.693
23.055 .000
Crenças 25 – 45 anos
46 – 65 anos
66 – 97 anos
2.900
3.071
3.256
.570
.609
.657
13.869 .000
Esperança/Otimismo 25 – 45 anos
46 – 65 anos
66 – 97 anos
3.289
3.348
3.031
.580
.609
.657
21.443 .000
84
o grupo 3 a obter melhores pontuações (M= 3.256; DP= .753). Por fim, no que diz respeito à
dimensão Esperança/Otimismo, utilizando o mesmo teste post-hoc, encontramos diferenças
estatisticamente significativas entre o grupo 1 e o grupo 3 (p≤.05) e entre o grupo 2 e o grupo
3 (p≤.05), sendo agora o grupo de idade compreendida entre os 46 – 65 anos a obter melhores
médias (M=3.348; DP= .609).
Foram posteriormente efetuadas quatro correlações entre as duas dimensões de
espiritualidade (crenças e esperança/otimismo) e o coping resiliente e, posteriormente entre
o coping resiliente e a frequência de locais de culto e a frequência de oração. A análise efetuada
com coeficiente de correlação de Pearson, entre o coping resiliente e a dimensão de
Espiritualidade “Crenças” indica uma correlação positiva, estatisticamente significativa e
classificada como fraca (r= .155; p˂ .01), como é indicado na tabela 4. É, desta forma apoiada,
a Hipótese 6.
Tabela 10 – Correlação: Valores correlacionais do Coping Resiliente com as dimensões Crenças e
Esperança/Otimismo.
**p<.01 (2-tailed)
Porém, quando é realizado o mesmo teste entre o coping resiliente e a segunda dimensão da
Espiritualidade “Esperança/Otimismo” é indicada uma correlação positiva, estatisticamente
significativa e classificada como forte12 (r= .435; p˂ .01), corroborando a Hipótese 7.
12 De acordo com os valores propostos por Cohen: tamanho pequeno do efeito: r= .1 – .23; moderado: r= .24 – .36; grande: r= .37 ou superior (1988, citado por Pallant, 2011).
Coping Resiliente Crenças Esperança/Otimismo
Coping Resiliente - .155** .435**
Crenças .155** - .428**
Esperança/Otimismo .435** .428** -
85
Tabela 11 – Correlação: Valores correlacionais do Coping Resiliente com as variáveis frequência de locais
de culto e frequência de oração.
**p< .01 (2-tailed)
A relação entre o coping resiliente e a frequência de locais de culto e a frequência de
oração foi investigada utilizando o coeficiente de Pearson, rejeitando-se assim as Hipóteses 8
e 9.
Tabela 12 – Regressão das variáveis Coping resiliente, Crenças e Esperança/Otimismo.
Avaliando a capacidade de predição da espiritualidade no coping resiliente, a regressão
linear simples demonstra-nos que enquanto variável explicativa do coping, a espiritualidade
apresenta um valor estatisticamente significativo F=154.126 , p˂ .001. Ao nível do seu
coeficiente de regressão verifica-se que a espiritualidade se apresenta como um bom preditor
do coping resiliente, sendo estatisticamente significativo β= -.039 t= -1.412 , p˂ .001 para a
dimensão “Crenças” e β= .452 t= 16.418 , p˂ .001 para a dimensão Esperança/Otimismo,
suportando, deste modo, as Hipóteses H10a e H10b. Apesar de ser verificada significância
estatística ao nível da dimensão “Crenças” podemos, também, destacar um resultado disruptivo
ao esperado. O facto de se obter um resultado negativo nesta dimensão pode dever-se ao
número de itens que compõem este fator.
2.5.1. Análise de um Modelo de Equações Estruturais
A modelação de equações estruturais constitui um exemplo de uma técnica
multivariada complexa, que articula aspetos de regressão múltipla e da análise fatorial para
estimar uma série de relações, diretas e indiretas, de forma interativa e simultânea, sendo que
Coping
Resiliente
Frequência locais de culto Frequência Oração
Coping Resiliente - -.010 -.035
Frequência Locais de
culto
-.010 - .503**
Frequência de oração -.010 .503** -
Variável Critério Preditor B EPB β T
Coping Resiliente Crenças
Esperança/Otimismo
-.151
2.699
.107
.164
-.039
.452
- 1.412
16.418
86
é utilizada para testar a validade de modelos teóricos que definem relações hipotéticas e
padrões de associações, entre variáveis (Marôco, 2010).
As conclusões retiradas das análises de regressão e o referencial teórico desenvolvido,
na primeira parte desta pesquisa, estiveram na base da especificação e estimação de um
modelo de equações estruturais (cf. Figura 1), que assumiu o propósito de confirmar o impacto
da espiritualidade, no papel das suas dimensões verticais e horizontais, ao nível do coping
resiliente. A avaliação de um modelo com este cariz permitiu reforçar a conceção de que a
espiritualidade afeta, de forma direta, o desenvolvimento de estratégias resilientes,
reforçando o modelo anteriormente estudado, testando as variáveis em simultâneo.
A partir da revisão da literatura são (re)formuladas as seguintes hipóteses de relação
entre variáveis:
H10a: Existe uma relação significativa e positiva entre a variável Crenças e a variável
coping resiliente.
H10b: Existe uma relação significativa e positiva entre a variável Esperança/Otimismo e
a variável coping resiliente.
Figura 1 - Diagrama de caminhos (Path Diagram) do modelo estimado.
Após a especificação e estimação do modelo, a sua adequação foi avaliada em função
de diferentes índices de ajustamento13 disponíveis na literatura e calculados a partir do
programa estatístico adotado (Amos Graphics 22), sendo estes: a) ² - indicador que avalia a
qualidade do ajustamento do modelo. Assim, valores iguais a 1 revelam um ajustamento
perfeito, valores inferiores a 2 suportam um bom ajustamento bom, inferiores a 5 o
13 Índices de ajustamento absoluto; Índices de ajustamento relativo; Índices de ajustamento de parcimónia; Índices de ajustamento de discrepância populacional; e Índices de ajustamento baseados na teoria da informação (Marôco, 2010).
87
ajustamento é considerado aceitável e, por fim, valores superiores a 5 revelam ajustamento
inaceitável; b) GFI (Goodness-of-Fit Index), criado como alternativa ao ², explica a proporção
da covariância observada entre as variáveis manifestas, explicada pelo modelo ajustado.
Valores inferiores a .9 indicam um mau ajustamento, valores entre .9 e .95 sustentam um bom
ajustamento e para um ajustamento muito bom teremos de alcançar valores superiores a .95;
c) CFI (Comparative Fit Index) compara o ajustamento do modelo e corrige a subestimação que
ocorre (geralmente, quando se usa o NFI com amostras pequenas); valores inferiores a .9
indicam mau ajustamento, valores entre .9 e .95 são indicadores de um bom ajustamento e
valores superiores ou iguais a .95 suportam um modelo com muito bom ajustamento; d) TLI
(Tucker-Lewis coeficiente) é considerado um indicador global de adequação do modelo; os
valores variam entre 0 e 1, mas não estão limitados a este intervalo, sendo que valores próximos
de 1 indicam um ajustamento muito bom; e e) RMSEA (Root-Mean-Square Error of
Approximation) estima o erro de aproximação ou a discrepância existente no ajustamento do
modelo hipotético à matriz de covariância populacional. Estes residuais ajustados, idealmente,
deverão ser próximos de zero, indiciando um bom ajustamento do modelo aos dados. Um
ajustamento menor do que .05 indica um ajustamento perfeito, quando menor do que .08 um
ajustamento aceitável. No nosso modelo o RMSEA surge com o valor de .050 que não sendo
perfeito entra no intervalo aceitável.
Sumariamente, a partir dos resultados obtidos (cf. Tabela 13) parece plausível um
modelo de associação entre o Coping Resiliente e a espiritualidade, nomeadamente, na sua
dimensão horizontal.
Tabela 13 - Índices de ajustamento do modelo estrutural base estimado.
*p<.001
O modelo base estimado revelou validade e um ajustamento adequado: ²(24 g.l.) =