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Por: RENATO PIMENTA DE AZEVEDO Geólogo/Petrobras No Brasil, constitui monopólio da União a pesquisa, a lavra, a refinação, a importação e exportação, bem como o transporte marí- timo e dutoviário de petróleo, gás natural e derivados, de qualquer origem. O actual regi- me de concessões petrolíferas brasileiro foi viabilizado por uma emenda constitucional - Emenda Constitucional n.o 9/95 - e pela Lei do Petróleo - Lei n.o 9478/97. Ficou defi- nido que as actividades no sector seriam exer- cidas por empresas estatais ou privadas, inde- pendente da origem do capital. Essas mudanças objectivaram a atracção de inves- timentos na produção de energia e a ampliação da competitividade do país no mercado internacional. Entre 1954, data de criação da Petrobras – Petróleo Brasileiro S.A., a empresa estatal brasileira do petróleo, e 1995, o monopó- lio da União era exercido integralmente pela sua empresa estatal. A primeira experiência com atracção de investimentos privados no sector começou ain- da durante a vigência do regime de mono- pólio sob exercício da Petrobras, com os cha- mados “Contratos de Serviço com Cláusula de Risco”, que estiveram em vigor entre 1976 e 1989. A Petrobras contratav a serviços de exploração e produção mediante contratos onde a remuneração do investidor, em caso de sucesso, seria realizada através do pagamento em moeda corrente e não em produto. Durante esse período de 13 anos, foram assinados 243 contratos, investidos cer- ca de US$ 1,7 bilhão por 35 empresas estrangeiras e nacionais, e perfurados 222 poços exploratórios em áreas reservadas pela Petrobras. Os resultados desse imenso esforço foram pífios. No final desse período, apenas dois contratos forneciam alguma pro- dução de petróleo e gás natural em quanti- dades mínimas e a apropriação de reservas foi insignificante. Hoje, o regime de concessões em vigor no Brasil é ainda muito jovem e acumula expe- riência no processo de contratação, entregue à responsabilidade da Agência Nacional do Petróleo - ANP, órgão regulador da indústria petrolífera, instituído formalmente em Janei- ro de 1998, e que exerce, de maneira rela- tivamente independente do Poder Executivo, a regulação e fiscalização das actividades do sector. A ANP está vinculada ao Minis- tério de Minas e Energia. Desde à instituição da ANP , todos os pro- cessos de outorga de concessões petrolífe- ras no Brasil são conduzidos de forma sis- têmica, pública e aberta, através de licitações internacionais, conforme os procedimentos estabelecidos pela Lei do Petróleo. Por essas característic as, e pelo facto de ser per- mitido o acompanhamento da apuração do resultado pela internet em tempo real, os cer- tames licitatórios da ANP já são considera- dos como uma referência mundial. As licitações são realizadas uma vez por petróleo 10 • Revista ENERGIA• N.º 67 • Abril 2 004 U ma análise comparativa expedita entre características dos regi- mes de concessão petrolífe ra, angolano e brasileiro, pode reve- lar atributos que justificam a dinâmica e a atractividade expe- rimentada nesses dois importantes mercados e indicar possíveis cami- nhos para avanços na sua regulação. Esta análise não é exaustiva e é focada nos regimes contratuais pre- dominantes nos dois países nos últimos 10 a 15 anos, e que experi- mentam actividade febril na pesquisa e produção de hidrocarbonetos em regiões marítimas de águas profundas a ultra - profundas.* Regimes Petrolíferos do Brasil e Angola ____________ ____________ __________ * As ideias emitidas em relação ao regime angolano bene- ficiaram-se de uma revisão preliminar efectuada pelo Dr. Pes- soa Vaz, a quem endereço o meu agradecimento. As even- tuais incorrecções devem, entretanto, ser atribuídas exclusi- vamente ao autor.
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Regimes Petroliferos de Brasil e Angola

Feb 18, 2018

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Renato Azevedo
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Por: RENATO PIMENTA DE AZEVEDOGeólogo/Petrobras

No Brasil, constitui monopólio da União apesquisa, a lavra, a refinação, a importaçãoe exportação, bem como o transporte marí-timo e dutoviário de petróleo, gás natural ederivados, de qualquer origem. O actual regi-me de concessões petrolíferas brasileiro foiviabilizado por uma emenda constitucional- Emenda Constitucional n.o 9/95 - e pelaLei do Petróleo - Lei n.o 9478/97. Ficou defi-nido que as actividades no sector seriam exer-cidas por empresas estatais ou privadas, inde-pendente da origem do capital. Essas

mudanças objectivaram a atracção de inves-timentos na produção de energia e aampliação da competitividade do país nomercado internacional.

Entre 1954, data de criação da Petrobras– Petróleo Brasileiro S.A., a empresa estatalbrasileira do petróleo, e 1995, o monopó-lio da União era exercido integralmente pelasua empresa estatal.

A primeira experiência com atracção deinvestimentos privados no sector começou ain-da durante a vigência do regime de mono-pólio sob exercício da Petrobras, com os cha-

mados “Contratos de Serviço com Cláusulade Risco”, que estiveram em vigor entre 1976e 1989. A Petrobras contratava serviços deexploração e produção mediante contratos

onde a remuneração do investidor, em casode sucesso, seria realizada através dopagamento em moeda corrente e não emproduto. Durante esse período de 13 anos,

foram assinados 243 contratos, investidos cer-ca de US$ 1,7 bilhão por 35 empresasestrangeiras e nacionais, e perfurados 222poços exploratórios em áreas reservadaspela Petrobras. Os resultados desse imensoesforço foram pífios. No final desse período,apenas dois contratos forneciam alguma pro-dução de petróleo e gás natural em quanti-dades mínimas e a apropriação de reservasfoi insignificante.

Hoje, o regime de concessões em vigor noBrasil é ainda muito jovem e acumula expe-riência no processo de contratação, entregue

à responsabilidade da Agência Nacional doPetróleo - ANP, órgão regulador da indústriapetrolífera, instituído formalmente em Janei-ro de 1998, e que exerce, de maneira rela-

tivamente independente do Poder Executivo,a regulação e fiscalização das actividadesdo sector. A ANP está vinculada ao Minis-tério de Minas e Energia.

Desde à instituição da ANP, todos os pro-cessos de outorga de concessões petrolífe-ras no Brasil são conduzidos de forma sis-têmica, pública e aberta, através de licitaçõesinternacionais, conforme os procedimentosestabelecidos pela Lei do Petróleo. Poressas características, e pelo facto de ser per-mitido o acompanhamento da apuração doresultado pela internet em tempo real, os cer-tames licitatórios da ANP já são considera-dos como uma referência mundial.

As licitações são realizadas uma vez por

petróleo

10 • Revista ENERGIA • N.º 67 • Abril 2004

U

ma análise comparativa expedita entre características dos regi-mes de concessão petrolífera, angolano e brasileiro, pode reve-

lar atributos que justificam a dinâmica e a atractividade expe-rimentada nesses dois importantes mercados e indicar possíveis cami-nhos para avanços na sua regulação.

Esta análise não é exaustiva e é focada nos regimes contratuais pre-dominantes nos dois países nos últimos 10 a 15 anos, e que experi-mentam actividade febril na pesquisa e produção de hidrocarbonetosem regiões marítimas de águas profundas a ultra - profundas.*

Regimes Petrolíferos

do Brasil e Angola

__________________________________

* As ideias emitidas em relação ao regime angolano bene-ficiaram-se de uma revisão preliminar efectuada pelo Dr. Pes-soa Vaz, a quem endereço o meu agradecimento. As even-tuais incorrecções devem, entretanto, ser atribuídas exclusi-vamente ao autor.

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petróleo

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ano, totalizando cinco rodadas já realizadasentre 1999 e 2003, sendo que actualmen-te os três critérios principais de competiçãosão: (i) bônus de assinatura (peso 30), (ii)compromisso mínimo com aquisição de

bens e serviços locais (peso 30) e (iii) pro-grama exploratório mínimo (peso 40).

As empresas vencedoras do leilão oficialassinam contratos de concessão com a ANP,que podem ser posteriormente cedidos a ter-ceiros, após aprovação da agência.

Os modelos de contratos de concessão emvigor são bastante detalhados, tendo em vis-ta o pequeno número de dispositivos legaisexistentes sobre essa actividade, embora aANP já tenha iniciado um exaustivo trabalhoregulador e desenvolvido muitos regula-mentos técnicos específicos para o sector.

A experiência brasileira com esses con-tratos de concessão na indústria do petróleoé ainda muito pequena, porém já forneceindícios de estabilidade contratual que incluigarantia de equilíbrio económico-financeiro,caso o Poder Público promova alteração uni-lateral das condições pactuadas.

O REGIME DE PARTILHADE PRODUÇÃO ANGOLANO

Em Angola, de acordo com a Lei Geral dasActividades Petrolíferas - Lei n.o 13/78, de

26 de Agosto - os direitos mineiros sobre apesquisa e produção de petróleo e gás natu-ral são outorgados à empresa estatalSONANGOL E.P., que é autorizada a seassociar a companhias nacionais ou estran-geiras para a execução das operações petro-líferas.

A associação da SONANGOL com asempresas petrolíferas através de Contratos dePartilha de Produção (CPP) tem sido a fórmulaadoptada em Angola para o desenvolvi-mento das actividades do sector a partir daentrada em vigor da citada lei, particular-

mente nas áreas de exploração e produçãoem águas profundas.

Os CPP’s em Angola são negociados pelaSONANGOL e submetidos à aprovação doConselho de Ministros através do Ministériodos Petróleos. A atribuição dos direitos minei-ros à SONANGOL e a aprovação do CPPpor aquele órgão governativo processa-seatravés de um Decreto–Lei de Concessão queincide sobre uma área geográfica precisa.

O processo de associação da SONAN-GOL com investidores privados para exe-cução de CPP’s não é sistemático e pode

incluir negociação directa ou concurso inter-nacional. Um dos factores determinantes daforma de contratação é a atractividade eco-nómica das áreas onde os trabalhos são exe-

cutados. Embora o princípio estabelecidopela prática seja a do concurso público, exis-tiram casos de negociação directa, os quaisincidiram em áreas de menor atractividade.

Quando a associação ocorre através de

concurso, os critérios de selecção têm sido:• Programa de trabalho obrigatório pro-

posto• Partilha do petróleo lucro• Limite do petróleo para recuperação dos

custos• Bônus de assinaturaRecentemente, o governo angolano vem

intensificando as suas acções no sentido detransferir parte da riqueza gerada pelo sec-tor petrolífero para outros sectores da eco-nomia. Talvez, uma boa ideia fosse a inclu-são nos processos de contratação de novos

CPP’s, seja via negociação directa ou con-curso, do compromisso de aquisição de bense serviços no país, conferindo a este critérioum peso elevado no contexto dos factoresde licitação, à semelhança do que ocorre noregime brasileiro.

A relativa simplicidade do arcabouço legalespecífico do sector petrolífero em Angolademanda que os modelos de contratos departilha de produção sejam bastante deta-lhados em alguns aspectos, procurando supe-rar as lacunas regulatórias.

A experiência angolana com a contrata-

ção de empresas privadas para execução deactividades na indústria do petróleo é rica,particularmente no segmento de pesquisa eprodução, sendo referência mundial deestabilidade contratual. Essa característica éainda mais notável quando se observa a tur-bulência do cenário nacional durante o perío-do em que essa experiência foi adquirida.

A NOVA LEI DOS PETRÓLEOSDE ANGOLA

O projecto da nova lei dos petróleos de

Angola, em fase de tramitação pelo Conse-lho de Ministros da República e pela Assem-bleia Nacional, reveste-se de capital impor-tância, uma vez que irá abranger toda a acti-vidade de exploração e produção, substi-tuindo a actual Lei Geral das ActividadesPetrolíferas - Lei n.o 13/78. O projecto delei não contempla mudanças radicais no sis-tema em vigor, mas observa-se, que a legis-lação proposta é mais ampla que a vigen-te, o que provavelmente resultará em con-tratos mais simples que os actualmenteempregados.

O projecto de lei reforça princípios ante-riormente adoptados, tais como: (i) a pro-priedade do Estado sobre petróleo, gás edemais recursos minerais; (ii) o papel da

SONANGOL como companhia petrolíferaestatal e única concessionária dos direitos deexploração e produção; (iii) a obrigatorie-dade associativa para as companhias depetróleo interessadas em actuar em Angola;

e (iv) o regime contratual de partilha de pro-dução. O projecto de lei afasta assim, demaneira definitiva, a possibilidade de umórgão regulador autárquico, com dotaçãoorçamentária própria, cuja missão principal,em uma economia de mercado moderna,constitui-se na defesa da concorrência e pro-tecção ao consumidor.

O projecto em discussão, que reproduzmatérias já cobertas pela lei e pelos contratosem vigor, também introduz temas novos,como a responsabilidade objectiva e con-dições mais rígidas sobre a obrigatoriedade

de aquisição de bens e a contratação de ser-viços no mercado nacional.

Determina o Projecto de Lei que as ope-rações petrolíferas só podem ser exercidasatravés de licença de prospecção ou de umaconcessão petrolífera. A empresa que obtémuma concessão petrolífera, já tem, automa-ticamente, direito à licença de prospecção,podendo, em caso de sucesso, alcançardirectamente o período de produção. Nocaso da licença de prospecção ser obtidasem que se obtenha simultaneamente umaconcessão petrolífera, tal facto acarretará

para a licenciada o risco de não lograr êxi-to em associar-se com a SONANGOL paraobtenção da concessão, uma vez que talassociação depende de concurso público,sem qualquer direito de preferência.

Em relação às operações petrolíferas, oprojecto de lei prevê uma mudança signifi-cativa no que se refere ao gás natural. Eleestabelece que é obrigatório, com poucasexcepções, o aproveitamento do gás naturalproduzido em qualquer jazida de petróleo,sendo expressamente proibida a sua queima.Em caso de campos marginais ou de peque-

na dimensão, o Ministério da tutela poderáautorizar a queima de gás. O projecto de leiainda prevê que sempre que a queima degás for autorizada, o Ministério poderá deter-

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minar a aplicação de uma taxa em funçãoda quantidade e qualidade do gás queimadoe da localização da queima.

O projecto de lei introduz ainda o conceitode “conteúdo local mínimo”, no que concerne

à aquisição de bens e serviços. Estabeleceque é obrigatória a consulta às empresasnacionais, para aquisição de bens e serviçospara execução das actividades do sectorpetrolífero, nas mesmas condições da con-sulta ao mercado internacional, determinandolimites de tolerância para acréscimos nos pre-ços internos em relação aos corresponden-tes preços internacionais. A introdução des-te dispositivo reflecte uma tendência mundial,mas o seu resultado prático é questionável.

A DINÂMICA DOS REGIMES

Embora a área geográfica sujeita à pes-quisa petrolífera no Brasil - 6,4 milhões dequilômetros quadrados - seja maior que aque-la disponível em Angola - 0,6 milhão de qui-lômetros quadrados -, permitindo maioracesso e uma dinâmica mais acelerada nacontratação de novas concessões, algumascaracterísticas dos contratos de concessãobrasileiros e de partilha de produção ango-lano ainda podem ser analisadas em con-junto e contribuir para uma melhor com-preensão da dinâmica das actividades nes-

ses dois mercados.Os blocos que correspondem às conces-

sões no offshore profundo angolano são degrandes dimensões, possuindo em média,uma área de 5.000 km2. Esse tamanho médiode blocos, quando comparado com aqueledas concessões brasileiras - vide gráfico abai-xo -, em uma área geográfica muito maior,parece sugerir que o tamanho das conces-sões em Angola não favorece a dinâmica domercado, limitando o espaço para a entra-da de novos agentes.

Nas concessões brasileiras, assim comonos contratos de partilha em Angola, existemdois períodos contratuais, um de pesquisa eoutro de produção. No Brasil, o período deexploração é normalmente dividido em três

fases, sendo que a decisão de ingresso emuma fase subsequente é de competência daempresa concessionária. O primeiro perío-do pode ter a duração de 3 ou 4 anos, com

compromisso mínimo de sísmica 2D. Ossegundo e terceiro períodos são de dois atrês anos e o compromisso de trabalho, emgeral, contém dois a três poços exploratórios.Actualmente o compromisso mínimo explo-

ratório passou a ser ofertado pelas compa-nhias e se constitui em critério para escolhado vencedor da licitação.

 Já em Angola, um CPP típico contempla noseu período de pesquisa uma fase inicial dequatro anos e uma fase adicional de trêsanos, podendo haver prorrogações desseperíodo. O compromisso mínimo de traba-lho é estabelecido por concurso e em geral,estabelece a sísmica 2D e 3D além de poçosexploratórios. Na prática, o período de pes-quisa de um CPP pode se estender além doinicialmente estabelecido, por decisão do

Ministro dos Petróleos, a pedido da Con-cessionária e das suas associadas. A possi-bilidade de prorrogação da fase explorató-ria, usualmente exercida, também não con-tribui para acelerar a dinâmica do mercado.

ATRACTIVIDADE SOB A ÓPTICADO INVESTIDOR ESTRANGEIRO

De uma maneira geral, podemos dizer quea atractividade de uma determinada áreapetrolífera é dependente da combinaçãofavorável de três factores básicos: (i) poten-

cial petrolífero; (ii) regime fiscal do país e (iii)disponibilidade de acesso a dados e a áreasde concessão.

O potencial petrolífero tanto de Angolacomo do Brasil é inquestionável. Os resulta-dos obtidos nos dois lados do Oceano Atlân-tico, ao longo da última década, não deixammargem a dúvidas. Em conjunto, cerca de 20biliões de barris de reservas recuperáveis deóleo foram adicionadas ao portfólio global,apenas nas águas profundas dessas duasregiões.

Como consequência de modelos regula-

tórios diferenciados, o regime fiscal aplica-do às actividades da indústria petrolífera, emambos os países, são bastante distintos. NoBrasil, a questão é complexa, pois além doregime fiscal específico para empresaspetrolíferas - Decreto 2705 de 03/08/1998-, todas elas são também enquadradas pordispositivos tributários nas esferas federal,estadual e municipal. A carga fiscal total inci-dente sobre as empresas do sector, segun-do estimativas recentes, deve estar com-preendida entre 50 e 60%. A participaçãogovernamental específica do sector petróleo

é constituída pelos (i) royalties, (ii) bônus deassinatura, (iii) participação especial e (iv)aluguel por retenção de área.

O regime fiscal das concessões brasileiras

contempla ainda uma participação aos pro-prietários de terras nas áreas das concessões.Essa participação é contratualmente defini-da pela ANP e pode variar entre 0,5 a 1%da produção fiscalizada. Essa pequena car-

ga fiscal possui o interessante efeito de esti-mular a permissão de acesso às áreas dasconcessões terrestres, além de capilarizar adistribuição de renda nas comunidadesafectadas pela actividade petrolífera. Suge-re-se que essa experiência possa ser adap-tada e replicada nas concessões localizadasnas bacias terrestres angolanas, incluindoCabinda, como forma de mitigar resistênciasdas comunidades, ao tempo em que promovea redistribuição de riqueza.

Em Angola, as empresas petrolíferas sobo regime do CPP são isentas de outros tributos

além do Imposto de Rendimento do Petróleo(IRP). O regime fiscal é, portanto, simples nasua concepção, mas exerce um impactoimportante na actividade, pois a carga fiscal,correspondente à participação governa-mental, seja em moeda corrente via IRP, sejana partilha do petróleo bruto com a con-cessionária, pode chegar a 80% do resultadolíquido da actividade.

Um outro elemento que exerce grandeinfluência na atractividade que o sector ofe-rece a investimentos estrangeiros é a possi-bilidade presente em Angola, mas ausente

no Brasil, de liberdade para exportação semobrigação de reingresso de divisas prove-nientes das exportações de petróleo bruto.Essa importância se reflecte, de maneira agu-da, nas cotações de risco divulgadas poragências internacionais e que são determi-nantes na obtenção de créditos no mercadofinanceiro internacional.

AUMENTO DO CONTEÚDOLOCAL

Nos países onde investimentos estrangei-

ros são admitidos na indústria petrolífera,observa-se uma tendência generalizada dosgovernos e agentes reguladores em estimu-larem fortemente o aumento da participaçãode empresas indígenas no quadro de enco-mendas de equipamentos e serviços. Essa éuma questão que preocupa autoridades eexecutivos tanto no Brasil como em Angola,embora os mecanismos aplicados sejam dife-renciados.

Em Angola, as acções no sentido deaumentar a participação de empresas nacio-nais se fazem via regulação do Ministério dos

Petróleos e gestões da Concessionária. OMinistério dos Petróleos tem desempenhadoum papel relevante ao provocar debatessobre o tema, incluindo-o na sua agenda per-

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Campos Marginais

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Por: RENATO PIMENTA DE AZEVEDO

Geólogo/Petrobras

O negócio de Campos Marginais permi-te o incremento nas reservas e na produçãode óleo e gás através da aplicação de novastécnicas de recuperação secundária, perfu-rações adicionais nos campos, reentrada empoços inactivos e recompletação de poçosem produção. Qualquer que seja a tecno-logia empregue, o maior responsável pelosganhos da actividade é a agilidade opera-cional de pequenas organizações dedicadase vocacionadas para esse negócio.

HISTÓRICO NO BRASIL

Na sequência da promulgação da NovaLei do Petróleo de 1997, em 1998, a Petro-bras abdicou dos direitos de produção sobre62 campos de petróleo ou gás natural, ten-do ainda retornado 10 outras áreas à con-cessionária, a Agência Nacional do Petró-leo – ANP.

Em 2000, após concurso público, a Petro-bras celebrou contrato de operação deCampos Marginais com uma empresa

independente. O contrato abrange a ope-ração de 12 campos na Bacia do Recôn-cavo e o operador é remunerado, princi-palmente, com base na produção incre-mental (1). O sucesso do empreendimentotem sido notável. Dois anos após o início davigência do contrato, aquele conjunto decampos produzia 50% a mais em termos debarris de óleo equivalente diários e 100%acima do que seria obtido caso a operaçãonão tivesse sido adjudicada.

Em Janeiro de 2001 a Petrobras condu-ziu a sua primeira licitação para venda de73 campos maduros, divididos em 11 gru-pos, nas bacias do Espírito Santo (11), Recôn-cavo (33), Sergipe-Alagoas (15) e Potiguar(14), localizados tanto em terra como emzonas marinhas de águas rasas. Mais de 50companhias, nacionais e estrangeiras, qua-lificaram-se para o concurso público inter-nacional. A despeito do interesse inicialmentedespertado, apenas 13 campos pertencen-tes a dois grupos receberam propostas. Asrazões para o insucesso foram atribuídas a:(a) preços mínimos considerados elevados;(b) obrigações mínimas de investimento porparte da concessionária - ANP; (c) indispo-

nibilidade de equipamentos e serviços nasáreas licitadas e (d) ausência de incentivosaos pequenos empreendedores.

Em Outubro de 2003, a ANP regula-mentou a cessão de direitos de CamposMarginais e introduziu um incentivo à pro-dução incremental obtida pelos concessio-nários, que se baseia na redução para até5% dos royalties devidos sobre a produçãoincremental. Actualmente, a taxa média deroyalties para todas as concessões petrolí-feras no Brasil situa-se em torno de 9,8%,próximo ao limite legal que é de 10%, índi-ce largamente praticado nas concessõesoutorgadas durante a fase exploratória.

SITUAÇÃO ACTUAL

A Petrobras anunciou em 2001 a reali-zação de uma nova rodada de licitaçãopara cessão de direitos em 31 campos mar-ginais nas Bacias do Recôncavo (26), Ser-

gipe-Alagoas (4) e Paraná (1), que foi sen-do sucessivamente adiada até à aprovaçãoda Portaria ANP n.º 279 de 31/10/2003,

que regulamentou a cessão total de direi-tos de contratos de concessão de camposmarginais, quando o certame foi então defi-nitivamente cancelado.

A ANP ainda não promoveu nenhum cer-tame oficial para outorga de concessões ine-rentes aos Campos Marginais libertadosdesde 1997.

A actividade de pequenas e médiasempresas na operação de Campos Margi-nais ou maduros possui um grande poten-cial para abertura de postos de trabalhodirectos, sendo que no caso brasileiro, essepotencial poderá ser melhor aproveitado namedida em que se desenvolva a oferta deserviços e equipamentos no segmento de ser-viços da indústria.__________________________________

(1) Produção Incremental – Aquela que venha a ser obti-

da em decorrência de projectos destinados à revitalizaçãodo campo. É a diferença entre a produção efectiva e aque-la que seria obtida caso não ocorresse nenhum investimentoadicional (curva base).

No Brasil, entende-se como Campos Marginais, aqueles camposde petróleo e/ou gás natural, desenvolvidos ou não, que pos-suem capacidade de produção inferior a 500 barris por dia

de óleo ou 70.000 metros cúbicos diários de gás natural. Podem serenquadrados como Campos Marginais tanto campos em avançado está-gio de produção, campos maduros, como pequenos campos em está-gio de desenvolvimento. No conceito de Campos Marginais ainda inclui-se a noção de resultado económico, portanto possui uma dimensãotemporal, isto é, um Campo Marginal pode deixar de ser visto comotal em caso de alteração significativa do cenário económico, seja por

via do regime fiscal, seja por via do preço do produto. É geralmenteum empreendimento de pequena rentabilidade, insuficiente para atrairo interesse da maioria das grandes empresas petrolíferas. Por essascaracterísticas, os Campos Marginais são objecto de actuação de peque-nos empreendedores, que actuam com baixos custos fixos, grande fle-xibilidade operacional e são altamente focados no negócio.

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petróleo

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manente. Essas acções, entretanto, têm “der-rapado” no estágio ainda insipiente de desen-volvimento do empresariado nacional e doseu pequeno conhecimento sobre as neces-sidades da indústria petrolífera. Por outro

lado, as regras as quais os operadores estãosubmetidos ainda não são suficientemente cla-ras e não há um sistema de consequênciaspara correcção dos desvios.

No Brasil, um dos mecanismos em utiliza-ção mais efectivo no estímulo a contribuição

nacional ao desenvolvimento da indústriapetrolífera é a obrigatoriedade contratual des-sa participação. Sem dúvida, um grandeincentivo ao aumento do conteúdo local foia introdução do percentual de compromisso

local, nas fases de exploração e desenvol-vimento da produção, como critérios de selec-ção nas licitações oficiais. Por ser um itemimportante do contrato de concessão, osdetentores de direitos estão sujeitos a perdadas concessões, com encerramento do con-

trato, caso as metas de conteúdo local, pro-postas pelos mesmos investidores, não sejamatendidas.

A figura abaixo apresenta a evoluçãoquantitativa desse critério nas cinco rodadas

de licitação já realizadas pela ANP. Obser-var que a oferta de conteúdo local pelasempresas licitantes é significativamente cres-cente, a despeito da localização e das carac-terísticas fisiográficas das áreas das con-cessões.

COMENTÁRIOS FINAIS

Uma breve análise da diversidade dos regi-mes petrolíferos praticados no segmento depesquisa e produção (E&P) no Brasil e Ango-la permite sugerir que ambos os modelospodem beneficiar-se da experiência acumu-lada em cada país.

A dinâmica do mercado e sua atractivi-

dade podem ser positivamente impactadaspor medidas tais como:

(i) Inclusão do compromisso de aquisiçãode bens e serviços no mercado local comocritério significativo de selecção de parcei-ros no processo de licitação (concurso) inter-nacional para novas concessões;

(ii) Redução do tamanho das áreas de con-cessão (blocos) como forma de aumentar oacesso às oportunidades de negócio e atrairmaior número de possíveis investidoresestrangeiros;

(iii) Introdução de uma “Participação aos

proprietários de Terras” em concessões ter-restres, como fórmula mitigadora de preo-cupações comunitárias e incentivo à redis-tribuição da riqueza gerada pelo petróleo;

(iv) Garantia de liberdade para exportarpetróleo bruto, sem obrigação de reingres-so das receitas obtidas.

As indústrias petrolíferas do Brasil e Ango-la, pela sua pujança, importância geopolíti-ca de seus mercados, afinidades culturais eexperiências regulatórias diversificadas, pos-suem um imenso potencial sinérgico, que serápossível apropriar em sua plenitude através

do fortalecimento dos laços comerciais e decooperação entre os dois países, represen-tados pelos seus principais agentes de mer-cado e regulação.