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PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL:
O GRUPO COMO DISPOSITIVO1
Moises Romanini
Adriane Roso
Resumo: A psicanlise tem encarado um desafio marcante nos dias
atuais:
seu estabelecimento nas instituies de sade pblica no Brasil.
Esse ensaio objetiva estabele-
cer um dilogo entre psicanlise e instituio, propondo um exame
terico sobre algumas pos-
sibilidades de trabalho em grupo apoiados nesta perspectiva
terica. Nossa inteno no
levantar questes de mtodo da clnica psicanaltica, mas promover
novas reflexes que pos-
sam contribuir para a mudana desse campo de conhecimento.
Tomando os Centros Ateno
Psicossocial lcool/ Drogas (CAPSad) como ponto de partida, ns
desenvolvemos nossos argu-
mentos. Primeiro, ns apresentamos alguns dos
significados/valores da palavra instituio, as-
sociando-os ao texto Mal-estar na civilizao (Freud) e abordagem
psicanaltica toxicoma-
nia (adico a drogas). Aps, ns introduzimos a noo de clnica
ampliada com a inteno de
articular a clnica psicanaltica demanda institucional para o
tratamento toxicomania.
Palavras-chave: Psicanlise. Instituies de sade. Grupos. lcool.
Drogas.
1 Agradecimentos: CAPES, pelo apoio financeiro relativo Bolsa de
Mestrado CAPES/REUNI.
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344 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
2 Aqui se torna necessrio enfatizar de que fazer estamos
falando. Embora este artigo tome como refern-
cia autores que falam do saber e do fazer da psicanlise, e use
os termos psicanlise e psicanalistas, ele foi
construdo a partir das experincias do primeiro autor no estgio
curricular em um Centro de Ateno
Psicossocial lcool e Drogas, na disciplina de Mestrado
Psicanlise e Instituio, bem como das refle-
xes produzidas no Grupo de Pesquisa Sade, Minorias Sociais e
Comunicao e nas supervises acad-
micas de estgio curricular do curso de graduao em Psicologia,
cuja proposta era Estgio em Psicolo-
gia Clnica (Ampliada). Portanto, falamos de um fazer dos
psiclogos que trabalham com uma orientao
psicanaltica.
Introduo
A Psicanlise, enquanto um campo terico e clnico, tem enfrenta-do
um grande desafio na atualidade: a sua insero em instituies
p-blicas de sade, enquanto modalidade de tratamento a contribuir
com ateraputica de organizaes subjetivas, com evidente prejuzo
adaptativo,tais como as adices, compulses alimentares e psicoses.
Consideran-do que cada instituio produz o seu prprio saber, de
acordo com seusprotagonistas, com a realidade scio-histrica das
pessoas que atendee do objetivo institucional, o trabalho
desenvolvido se torna ainda maiscomplexo.
Nesse sentido, o fazer2 deve ser uma construo singular que
possi-bilite a emergncia dos sujeitos envolvidos na instituio e de
uma lgi-ca discursiva que aponte para a alteridade, constituda a
partir da lingua-gem, da famlia, da sociedade, enfim, todos os
elementos do que Lacandenominou o Outro (Elia, 2006). Sustentar
essa lgica, segundo Oliveira eTerzis (2010), tarefa primordial da
interveno psicanaltica dentro dasinstituies.
Kas (2002) nos mostra que a relao entre a psicanlise e a
institui-o foi, historicamente, determinada pelas transformaes da
instituiopsiquitrica, pela conceitualizao de doena mental e pela
emergnciadas psicoterapias, particularmente, a modalidade grupal. A
corrente psi-canaltica inspirou as prticas e pensamentos a propsito
da instituiono contexto de duas correntes: da psicoterapia
institucional e das apli-caes da psicanlise s instituies
assistenciais psiquitricas. A partirde 1968, as pesquisas
psicanalticas se estenderam a outros tipos de ins-tituies, porm
atuando de maneira a trazer uma presena consultivaou no contexto de
uma superviso e anlise das relaes de equipe.
Dentre as preocupaes tericas da psicanlise em instituies
en-contram-se, em especial, as de cunho grupal, sendo importante
ressaltarque essas no esto circunscritas aos aspectos metodolgicos,
como bemsalientou Hur (2007): a psicanlise de grupos e instituies
no mera-mente uma psicanlise aplicada aos grupos ou ao social, pois
ao refletir e
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intervir nessas realidades, acaba por gerar novas reflexes que
contribueme alteram esse campo do conhecimento.
Nesse artigo, temos como objetivo estabelecer uma articulaoentre
psicanlise e instituio, propondo uma reflexo terica sobre
aspossibilidades de trabalho com grupos nas instituies a partir de
algunsprincpios psicanalticos. Ou seja, acreditamos que continuar
as pesqui-sas sobre instituies e dispositivos grupais uma
necessidade no mbi-to pblico. Como afirmou Sigal (1989), a atuao
fora do setting tradicio-nal do consultrio, a insero institucional
e o vnculo com os trabalhosem grupo so algumas das dificuldades
encontradas pela Psicanlise, e,consequentemente, so questes que
precisam ser investidas e pesqui-sadas.
A instituio, no mbito da sade mental, a partir do Movimento
daReforma Psiquitrica, converteu-se em um espao coletivo aberto e
inte-rativo, investindo no fortalecimento do lao social dos usurios
(Dassoler& Silva, 2011). Tradicionalmente, uma das objees
feitas participaoda psicanlise nesse cenrio institucional a sua
dificuldade em compar-tilhar com outros profissionais as qualidades
dos fenmenos psquicos.Nessa direo, urge como desafio clnica
psicanaltica a sua inseronesses contextos, preservando, por um
lado, os princpios da ateno psi-cossocial (o acolhimento, a
convivncia, o cuidado, por exemplo) e inda-gando, por outro, a
pertinncia de distinguir o indivduo portador dedireitos civis da
noo de sujeito formulada pela psicanlise (Dassoler& Silva,
2011, p. 23).
O presente artigo foi estruturado em trs partes distintas, mas
com-plementares. No primeiro momento, apresenta-se alguns
significados dapalavra instituio e do valor social atribudo a ela
no decorrer da hist-ria. Articulamos ento esses significados com o
texto O mal-estar na civi-lizao de Freud, tendo em vista a
problematizao da relao entre in-divduo e civilizao, e entre
psicanlise e instituio. No segundomomento, ento, direcionamos a
discusso para uma instituio espec-fica: o Centro de Ateno
Psicossocial para usurios de lcool e outrasDrogas (CAPSad).
Associado ao papel do CAPSad, apresenta-se uma aproximao te-rica
da psicanlise toxicomania para, num terceiro momento, propor
otrabalho em grupo com toxicmanos como um dispositivo possvel
detrabalho nas instituies, salvaguardando os princpios fundamentais
e origor tico da psicanlise. Com isso, pretendeu-se evidenciar que
psica-nlise e instituio podem estabelecer uma articulao profcua a
partirdas diferenas, de modo a no se pretender a diluio das
especificida-des de cada campo.
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MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
Instituio e Psicanlise: notas sobre diferenas
O conceito de instituio discutido em diferentes correntes
teri-cas, no somente no campo da sociologia, mas na antropologia,
cinciaspolticas e filosofia. Dentro das prprias correntes esse
conceito tem sidoempregado de maneiras distintas. No pretendendo
aqui esgotar essadiscusso, tomamos como ponto de partida a concepo
de GregrioBaremblitt, que de forma concisa define que
as instituies so lgicas, so rvores de composies lgicas que,
segundoa forma e o grau de formalizao que adotem, podem ser leis,
podem ser nor-mas e, quando no esto enunciadas de maneira
manifesta, podem ser pau-
tas, regularidades de comportamentos. (Baremblitt, 1992, p.
27)
As instituies enquanto composies lgicas so instncias desaber que
buscam o tempo todo recompor as relaes sociais e organi-zar/ordenar
espaos (Pereira, 2007). Com os objetivos de recompor, orga-nizar e
ordenar, as instituies e seus respectivos estabelecimentos
cap-turam os processos de subjetivao singulares, impondo-lhes seu
prpriomodelo atravs da centralidade do poder, do saber, do
dinheiro, do pres-tgio, da disseminao da culpa (Pereira, 2007, pp.
7-8).
Os significados atribudos ao conceito de instituio deixam
claro,portanto, o seu papel de agente regulador e normativo de
aspectos relati-vos vida social. Ela institui normas, regras e
cdigos de conduta, estabele-cendo os limites entre o que normal (a
mdia) e o que desviante, pato-lgico. As instituies, enquanto
institutos ou organizaes (seja qual for oseu carter social,
educacional, religioso, etc.), foram historicamente esta-belecidas
para corrigir e isolar os indivduos considerados anormais:
osleprosrios, que por muito tempo serviram no somente para proteger
asociedade dos leprosos, mas dos loucos, criminosos e um amplo
espec-tro de pessoas no enquadradas s normas sociais; os hospcios,
para osloucos; os presdios, para os criminosos (Foucault, 2004;
Goffman, 1974).
Enfim, poderamos aqui citar uma infinidade de instituies
criadasna histria da humanidade que preservam a lgica
classificatria comfins de excluso. Entretanto, as instituies tambm
foram constitudasna tentativa de diminuir o estado de desamparo,
inerente condiohumana. Nesse sentido, espera-se que as instituies
criem estruturasrazoveis de apoio para apaziguar as sensaes de caos
absoluto e des-trutividade das relaes (Pereira, 2007, p. 8). Tambm
no se pode redu-zir a instituio a algo conservador, desprovida de
movimentos contrri-os, j que se encontra em seu bojo movimentos
instituintes, seu germetransformador, o desejo (Pereira, 2007).
s instituies, ento, como podemos ver, atribudo um valor so-cial
fundamental, visto que so elas que se encarregam das pessoas e
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grupos sociais que produzem mal-estar sociedade. Pode-se dizer,
dessaforma, que as instituies representam o conflito da civilizao3
com osdiversos mal-estares que surgiram no decorrer da histria. Na
verdade,elas se propem a acabar com esse conflito, criando
dispositivos de con-trole (as regras, as normas, entre outros) e
tratamento (isolamento, cho-que-eltrico, etc.) que visam em seu
horizonte a dissoluo/cura para omal-estar ou a excluso dos
intratveis. Em relao ordem preconizadapela sociedade e por suas
instituies, Freud (1930/1974) destaca que osbenefcios da ordem so
incontestveis. Ela capacita os homens a utiliza-rem o espao e o
tempo para seu melhor proveito, conservando ao mes-mo tempo as
foras psquicas deles (p. 100).
Nesse sentido, as ideias de Freud apresentadas no texto O
mal-es-tar na civilizao so de grande valia para pensarmos sobre o
tema. Almdisso, esse texto nos fornece elementos para iniciar uma
reflexo sobreas relaes entre Psicanlise e Instituio, considerando
que a Psicanlisefoi inicialmente proposta como um arcabouo
terico-clnico que tam-bm pretendia a cura para o mal-estar, ainda
que no sob os auspcios dosilenciamento do mal-estar, mas, ao
contrrio, um tratamento que se es-tabelece ao dar voz e lugar ao
estranho, ao caos que desconcerta as nor-mas de convivncia
social.
Em O mal-estar na civilizao (1930/1974), Freud aponta que o
ter-mo civilizao descreve a soma integral das realizaes e
regulamentosque distinguem nossas vidas das de nossos antepassados
e que servema dois intuitos: o de proteger os seres humanos contra
a natureza e o deajustar seus relacionamentos mtuos. Todavia, ele
tambm constata oequilbrio precrio que mantm o ser humano em uma
civilizao desti-nada a proteg-lo. Ou seja, pelo fato de restringir
as pulses sexuais eagressivas dos indivduos com o objetivo de
manter a coeso da socieda-de, a civilizao entra em conflito com
seus membros tomados indivi-dualmente que, caso se revoltem, podem
destru-la.
Os discursos forjados por Freud sobre a subjetividade no campo
dacivilizao foram, portanto, comentrios crticos sobre a inscrio do
su-jeito na modernidade (Birman, 2005, p. 123). No incio do seu
percursoterico, Freud acreditou na harmonia possvel entre os
registros do sujei-to e do social e que a Psicanlise poderia
oferecer uma resposta resolutivaao mal-estar na civilizao.
Entretanto, em 1932, ele coloca a harmoniaem questo, evidenciando a
problemtica do desamparo e a desarmonia
3 Freud entende civilizao como tudo aquilo em que a vida humana
se elevou acima de sua condio
animal e difere da vida dos animais... Inclui todo o
conhecimento e a capacidade que o homem adquiriu
com o fim de controlar as foras da natureza e extrair a riqueza
desta para a satisfao das necessidades
humanas; ... inclui todos os regulamentos necessrios para
ajustar as relaes dos homens uns com os
outros e, especialmente, a distribuio da riqueza disponvel
(Freud, 1930/1974, p. 16).
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MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
inerente aos laos sociais do sujeito, considerando a incidncia
da pulsode morte. Como o conflito no poderia mais ser curvel pela
clnica psi-canaltica, entendendo a cura como silncio/ausncia da
pulso de mor-te, nesse segundo momento Freud sugere que seria
necessria
uma espcie de gesto interminvel e infinita do conflito pelo
sujeito, de for-
ma tal que este no poderia jamais se deslocar de sua posio
originria dedesamparo. Nesse deslocamento crucial, dos registros da
teraputica possvelpara o da gesto, pode-se vislumbrar que o
discurso freudiano assume uma
perspectiva tica e poltica sobre o conflito. (Birman, 2005, p.
129)
Com o conceito de pulso de morte, na 2 teoria das pulses
deFreud, torna-se impossvel uma harmonia entre os registros
conflitivosda pulso e da civilizao. Isso porque a vida seria algo a
ser conquistadoe no mais um valor originrio do indivduo. A partir
de uma concepomortalista e antivitalista de Freud, o conflito
interminvel entre pulsode vida e a pulso de morte torna a
homeostasia uma ideia impossvel.Com esse deslocamento terico,
pode-se dizer que a Psicanlise foi colo-cada prova do social
(Birman, 2005). Mais do que isso, fala-se numa criseda Psicanlise,
caracterizada por alguns aspectos: restrio a uma pers-pectiva
individualista, j que perdeu suas dimenses tica e poltica
apon-tadas por Freud; assuno de uma perspectiva normativa,
considerandoque as novas condies do mal-estar na modernidade
levaram a psica-nlise a adotar tal perspectiva; ela perde a posio
estratgica que ocu-pava no campo dos saberes sobre o psquico, sendo
paulatinamente subs-tituda pela psiquiatria biolgica, pelas
neurocincias e modelos advindosdo cognitivismo que fascinam pela
promessa de cura do mal-estar, ideiaessa considerada invivel pela
Psicanlise (Birman, 2005).
Atualmente, as instituies de sade mental e de tratamento para
adependncia qumica, por exemplo, trabalham a partir de uma normaque
estabelea o que a sade/doena mental e o que a dependnciaqumica,
propondo tratamentos que trazem consigo a promessa de curade tais
patologias (encontramos exemplos disso nos manuais diagnsti-cos e
nos livros que propem modelos de tratamento para a dependn-cia
qumica). Essas instituies, pensadas a partir do movimento da
refor-ma psiquitrica, trabalham com uma noo de sujeito geralmente
atreladaao discurso da cidadania (o sujeito, na maioria das vezes,
entendidocomo uma pessoa nica, cuja individualidade deve ser
resgatada e res-peitada), acentuando o objetivo central de
possibilitar a reinsero des-ses sujeitos, como cidados, na
sociedade (Rinaldi, 2006).
Os profissionais de sade, ento, respondem a uma lgica de
sadepautada por preceitos universais de qualidade de vida e de
reinserosocial. A concepo de sujeito na instituio , portanto, uma
concepouniversalista que, com objetivo de organizar, ordenar e
extrair o sintoma
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349PSICOLOGIA USP, So Paulo, 2012, 23(2), 343-365
que gera mal-estar, acaba por capturar modos de subjetivao
singula-res (Pereira, 2007). nesse contexto, caracterizado de um
lado pela estru-tura estvel da instituio cujo objetivo apaziguar e
mesmo excluir assensaes de caos e destrutividade, pautada na
concepo (universal)do sujeito como cidado, e de outro lado pela
prpria crise da Psicanli-se (Birman, 2005) que a Psicanlise,
entendida ao mesmo tempo comouma metapsicologia e uma prtica de
interveno psquica, ingressa nasinstituies de sade mental.
Dentro dessas instituies, contudo, os psicanalistas so
convoca-dos a formalizar, de alguma maneira, os efeitos dessa
experincia com apsicanlise. Porm, como formalizar essas intervenes
que so pauta-das na concepo de sujeito do inconsciente e que no
recoberto pelasnoes de indivduo ou de cidado propostos pela
instituio? Que su-jeito esse?
O sujeito do inconsciente, circunscrito categoria do Outro na
teo-ria psicanaltica, conforme Elia (2006), no , em si mesmo, pobre
ou rico,branco ou negro, tampouco e a que se situa talvez o ponto
mais escan-daloso da descoberta freudiana , homem ou mulher. em sua
relaocom a alteridade que o sujeito vai sexuar-se, definir-se homem
ou mu-lher, e definir tambm seus demais atributos.
Alm da noo distinta da categoria de sujeito, o psicanalista
en-contra nessas instituies a demanda pela necessidade ou a
promessade cura, baseados num cuidado e, at mesmo, numa educao a
respeitodo transtorno, visando sempre restabelecer um estado de
sade e debem-estar. Nessa perspectiva, destacam-se os significantes
cuidar, tratare curar que esto associados ao significado Therapeia,
terapia, psicotera-pia. Sabe-se, porm, que Freud criticou a ambio
de educar, curar e dequerer o bem do paciente revelia do que o
terapeuta entende porbem, pois isso impossibilita a emergncia do
desejo inconsciente e,portanto, do sujeito na sua diferena
(Rinaldi, 2006, p. 145), condio es-sencial assuno de um estar
bem.
Nessa direo, a promessa de cura das psicoterapias em consonn-cia
com a demanda das instituies de sade exige uma tcnica que devaguiar
o indivduo no tratamento. A tcnica, por sua vez, pressupe queseus
mtodos e regras sejam aplicados a todos, o que no ocorre na
pro-posta de um tratamento psicanaltico. Distintamente, com a
psicanliseno h tratamento standard, no h um protocolo geral que
reja o indiv-duo num tratamento psicanaltico (Barros, 2003). Longe
de poder ser re-duzida a um protocolo tcnico, a experincia com a
psicanlise tem ape-nas uma regularidade: a da originalidade do
cenrio individual atravsdo qual se manifesta a singularidade
subjetiva. Portanto, a psicanlise no uma tcnica (tais quais as
demais cincias), mas sim um discurso regidopor princpios que
encorajam cada um a produzir sua singularidade, suaexceo.
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350 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
Dessa forma, a interveno analtica difere claramente da
interven-o mdica, social, psicolgica e de qualquer outra devido
especificida-de de sua direo ao sujeito do inconsciente. Para tal,
necessrio man-ter o rigor tico da psicanlise, no sentido do lugar
ocupado pelo analista,lugar que se dirige ordenao do circuito
pulsional e suas vicissitudes.
Entendemos, portanto, que a tica da psicanlise, cujo motor
odesejo, que possibilita indicar a direo do tratamento (Delgado,
2008).Essa relao entre a tica da psicanlise e o desejo delineada
atravsdas afirmaes de Freud e Lacan, nas quais o sujeito do
inconsciente caracterizado por um atravessamento de uma falta
estruturante, a cas-trao. Tal falta o que articula o desejo e
suporta o movimento dese-jante.
Nessa direo, conforme nos indica Delgado (2008),
Ao sustentarmos a efetividade do discurso analtico numa
instituio como o
CAPS, indicamos que a verdade, que a castrao, s pode ser a do
sujeito, e
sempre no-toda, est referida ao saber do inconsciente. Desta
forma, o dese-
jo do analista, enquanto desejo de saber diferente de desejo de
curar faz
com que o analista se recuse em ocupar o lugar do Outro, do
discurso do mes-
tre, e possibilite o encontro do sujeito com seu desejo. (p.
60)
As diferentes concepes de sujeito implicam, dessa maneira,
emposies distintas de desejo: o desejo de curar e o desejo de
saber. Essesdesejos evidenciam, respectivamente, o discurso do
mestre e o discursodo analista. A instituio, portadora do discurso
do mestre e do desejo decurar, equivale a busca pela felicidade
(Freud, 1930/1974) evitao dosofrimento: a ordem preconizada por ela
tem como objetivo curar o so-frimento, agindo sobre os
comportamentos inadequados, ou patolgi-cos. A psicanlise, por sua
vez, portadora do discurso do analista e dodesejo de saber, opera
com as demandas pulsionais. Ao propor uma clni-ca que inclua o
circuito pulsional, a psicanlise equivale a felicidade satisfao das
pulses.
E, nesse sentido, a lgica da cidadania, atravs da qual se
pretendedar voz queles que foram excludos do convvio social,
reafirma-se pormeio do discurso do mestre (Lacan, 1969-190/1992),
na medida em quese parte de um modelo preestabelecido a partir de
um saber apriorsticoe universal sobre o que bom para o sujeito
(Rinaldi, 2006, p. 145). Por-tanto, o discurso do mestre encarnado
nas intervenes dos demais pro-fissionais de uma instituio, baseado
em um saber prvio de carternormatizador a ordem (o que no deve ser
concebido de maneiranegativa, trata-se apenas de uma outra forma de
discurso e de prtica, deparadigmas distintos), impe ao analista o
desafio de sustentar uma cl-nica baseada no discurso do analista
(Lacan, 1969-190/1992), no preo-cupado com a ordenao do caos e do
mal-estar, a partir de ndices pre-
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351PSICOLOGIA USP, So Paulo, 2012, 23(2), 343-365
viamente estabelecidos, mas abrindo espao e sustentando o
tratamen-to na singularidade de cada sujeito, em que a ele cabe
inventar os ele-mentos que podem oferecer algum destino uma ordem
ao caos.
Assim, vemos que num primeiro momento a instituio,
represen-tante da ordem simblica e, por isso, caracterizada pela
positividade deinstituir algo atravs de normas e regras, mostra-se
avessa Psicanlise,que tem na associao livre sustentada na
transferncia um convite operao com o inusitado, o inesperado do
mal-estar como um elemen-to necessrio composio da vida de um
sujeito.
A Psicanlise no CAPSad: possveis pontos de encontro en-
tre psicanlise e instituio?
Destacados alguns elementos importantes (como as diferentes
con-cepes de sujeito, posies discursivas e de desejo) reflexo da
norelao entre psicanlise e instituio, poderamos pensar que elas
soexcludentes. Ou seja, haveria uma impossibilidade da Psicanlise
se inse-rir nas instituies de sade, visto que elas concebem e
propem o trata-mento aos sujeitos em sofrimento psquico de maneiras
muito distintas.Entretanto, constata-se a crescente presena de
psicanalistas nesses ser-vios (Delgado, 2008; Abreu, 2008), o que
evidencia a necessidade de es-tabelecer uma relao entre psicanlise
e instituio. E, mais especifica-mente, a psicanlise na
instituio.
Com o intuito de refletir sobre essa insero, tomamos como
refe-rncia de instituio os Centros de Ateno Psicossocial lcool e
Dro-gas (CAPS). Trata-se de um servio substitutivo da Reforma
PsiquitricaBrasileira e representa, hoje, uma das instituies s
quais so endereadasas pessoas que sofrem com a toxicomania, segundo
ponto desta refle-xo. Dentro dos CAPSad observa-se a preponderncia
de atividades tera-puticas grupais. Nesse sentido, faz-se mister
analisar o grupo como dis-positivo de tratamento pautado nos
saberes da psicanlise, podendo seconfigurar num ponto de encontro
entre psicanlise e instituio. Come-cemos pelos Centros de Ateno
Psicossocial.
As primeiras intervenes do governo brasileiro com relao aten-o
ao usurio de drogas datam no incio do sculo XX e foram constitu-das
pela criao de um aparato jurdico-institucional (Machado &
Miranda,2007). Esse aparato estabelecia, atravs de uma srie de leis
e decretos, ocontrole do uso e do comrcio de drogas e a preservao
da segurana eda sade pblica no pas, prevendo penas que determinavam
a exclusodos usurios do convvio social. Em 2003, o Ministrio da
Sade estabele-ceu a Poltica de Ateno Integral aos Usurios de lcool
e outras Drogase reconheceu que houve um atraso histrico do Sistema
nico de Sadeno enfrentamento de problemas associados ao consumo de
lcool e ou-
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352 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
tras drogas. A atual poltica adota uma abordagem no mais
comprome-tida com o controle e a represso, mas sim com a reduo dos
danos edos prejuzos.
Atravs de sua Poltica de Ateno Integral, o Ministrio da
Sadeassume de modo integral e articulado o desafio de prevenir,
tratar e rea-bilitar os usurios de lcool e outras drogas como um
problema de sadepblica (Brasil, 2004, p. 9). O projeto props a
criao de uma rede deateno integral do Sistema nico de Sade (SUS),
que envolve aes depreveno, promoo e proteo sade; a construo de
malhas assis-tenciais formadas por dispositivos especializados (os
Centros de Aten-o Psicossocial lcool/drogas CAPSad) e no
especializados (unidadesbsicas, programas de sade familiar e
hospitais em geral), bem como oestabelecimento de aes
intersetoriais (Machado & Miranda, 2007).
O dispositivo do CAPS, fazendo um uso deliberado e eficaz
dosconceitos de territrio e rede, oferece atividades teraputicas e
preven-tivas comunidade, buscando: prestar atendimento dirio aos
usuriosdos servios, dentro da lgica de reduo de danos; oferecer
cuidadospersonalizados; oferecer atendimento em diversas
modalidades (inten-sivo, semi-intensivo e no intensivo); oferecer
condies para o repousoe desintoxicao ambulatorial para os usurios
que necessitem de taiscuidados; oferecer cuidados aos familiares
dos usurios dos servios; pro-mover, mediante diversas aes, a
reinsero social dos usurios, utilizan-do recursos intersetoriais;
entre outros (Brasil, 2004).
Percebe-se, portanto, que o CAPS trabalha com uma concepo
desujeito enquanto cidado, portador de direitos e, por isso,
aposta-se numaperspectiva de humanizao do servio prestado. O Centro
de AtenoPsicossocial apresenta, no mnimo, trs discursos: o
psicolgico, o social eo mdico que, apesar das diferenas,
unificam-se na direo clnica dacura pela via da adaptao ao social,
da sade fsica como distanciamen-to pleno dos fatores intoxicantes,
em que sobressaem os elementos vin-culados a uma adeso ao
universal. So discursos que se distinguem dodiscurso e do paradigma
psicanaltico. Neles, a toxicomania concebidaa partir do vis
biomdico-curativo, sendo denominada de dependnciaqumica (Associao
Americana de Psiquiatria, 2000) o foco na subs-tncia, na droga que
deve ser retirada da cena do sujeito, diferente domodus operandi da
psicanlise que faz, justamente, a incluso da drogana tecitura
subjetiva do sujeito.
O uso de drogas, seguindo o pensamento freudiano em O mal-es-tar
na civilizao, seria uma das possveis sadas para o alvio da
angstia,provocadas pelas renncias a serem realizadas pelos sujeitos
em benef-cio da vida na civilizao.
O servio prestado pelos veculos intoxicantes na luta pela
felicida-de e no afastamento da desgraa to altamente apreciado como
umbenefcio que tanto indivduos quanto povos lhes concederam um
lugar
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permanente na economia de sua libido. Devemos a tais veculos no
s aproduo imediata de prazer, mas tambm um grau altamente
desejadode independncia do mundo externo, pois sabe-se que, com o
auxliodesse amortecedor de preocupaes, possvel, em qualquer
ocasio,afastar-se da presso da realidade e encontrar refgio num
mundo pr-prio, com melhores condies de sensibilidade (Freud,
1930/1974, p. 86).
Ao pensar que, com a ajuda dessas substncias, possvel
subtrair-se a qualquer momento da presso da realidade e refugiar-se
em ummundo prprio, Freud reconhece possveis benefcios no uso de
drogasdesde que seu uso seja socialmente controlado, e no como uma
prticaque se ope ao social. Nessa perspectiva, o uso de drogas
ocupava umaposio fixa na economia libidinal nas cerimnias rituais
de diversos po-vos primitivos e, atualmente, em certas formas de
consumo de lcool con-sideradas sociais, tais como festas e
comemoraes em geral, o que cons-titui um cenrio distinto do que
ocorre nas adices.
Com efeito, justamente essa propriedade dos intoxicantes
quedetermina seu perigo e sua capacidade de causar danos (Freud,
1930/1974, p. 86). quando a relao com as drogas passa a ser vivida
comtotal independncia, opondo-se ao social de uma forma radical. Na
ver-dade, o que impulsiona a passagem do uso para o abuso de drogas
acondio subjetiva do sujeito, indicativa, tambm, de um
rompimentocom o lao social.
Segundo Freud (1930/1974), a intoxicao via drogas um mto-do
interessante, grosseiro e eficaz de evitar a dor, usado contra o
sofri-mento que pode advir dos relacionamentos humanos. Como uma
defe-sa, a droga serve para manter-se distncia de outras pessoas.
Com oauxlio da droga, ou de um amortecedor de preocupaes,
possvel,em qualquer ocasio, afastar-se da realidade e encontrar
refgio nummundo prprio.
Aqui se torna necessrio ressaltar que o simples fato de
consumirdrogas no constitui uma toxicomania. O txico no a droga,
diz LePoulichet (1990, p. 80). O que pode fazer da droga um txico o
lugarque ela (a droga) assume na relao com o Outro. O que marca,
ento, atoxicomania a tentativa de constituio de uma relao dual com
a dro-ga, eliminando qualquer terceiro da mesma.
A toxicomania, como uma relao intensa e exclusiva com a droga,
proposta por Le Poulichet (1990) como uma condio em que a
drogasobrepe-se ao prprio sujeito. Como consequncia, na
toxicomania, ha excluso do Outro4 e de seus recortes pulsionais.
Sendo assim, a toxico-
4 Encontramos uma referncia sobre o Outro, no Seminrio XI de
Jacques Lacan. A noo de um Outro est
intimamente ligada s duas outras operaes de constituio do
sujeito: a alienao e a separao. Con-
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354 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
mania pode ser entendida como uma tentativa de realizar um
idealnarcsico de autossuficincia, excluindo o outro como parceiro
possvelpara a satisfao pulsional.
Na perspectiva psicanaltica lacaniana, a toxicomania
contempla
sujeitos que sofrem por no conseguirem assumir sua dependncia em
rela-
o, nem aos significantes que determinam suas histrias (sua relao
com o
Outro), nem a seus semelhantes (os outros), com quem poderiam
construir
relaes capazes de sustentar uma posio subjetiva. (Ribeiro, 2003,
p. 16)
Dessa forma, a conduo ideal do tratamento seria o do
desloca-mento da fixidez da relao com a droga para um lugar onde o
exercciodo seu desejo no se encontre fixado em um nico objeto
degradante.Ou seja, um outro saber fazer com o corpo, que no
substitui necessa-riamente essa relao inicial, mas que implica o
sujeito a estabelecer ou-tras formas de relao e a constituir-se
enquanto um sujeito desejante,podendo fazer outras coisas com o seu
corpo.
Assim, podemos pensar que a ameaa est em apostar todas asfichas
(economia libidinal) em um nico objeto (as drogas). Como disseFreud
(1930/1974)
Qualquer escolha levada a um extremo condena o indivduo a ser
exposto a
perigos, que surgem caso uma tcnica de viver, escolhida como
exclusiva, se
mostre inadequada. Assim como o negociante cauteloso evita
empregar todo
seu capital num s negcio, assim tambm, talvez, a sabedoria
popular nos
aconselhe a no buscar a totalidade de nossa satisfao numa s
aspirao.
(p. 103)
Conte (2003), ao abordar o tratamento das toxicomanias, abstm-se
de falar do ideal de cura (abstinncia total), buscando a
plasticidadesubjetiva como direcionamento teraputico, no sentido de
achar umasada na relao de extrema dependncia e alienao em que o
sujeitose encontra em relao droga. Entretanto, o que fazer se a
instituio(CAPad) na qual o psicanalista est inserido toma a
abstinncia ou a pro-blematizao do uso como indicadores de cura?
Como operar com osprincpios psicanalticos para o tratamento (pulso,
transferncia, incons-ciente, repetio) no tratamento de toxicmanos
nos CAPSad?
forme Mller-Granzotto (2008), em ambas operaes trata-se de
descrever o advento do sujeito en-
quanto duplo efeito de falta gerado pela sobreposio de dois
campos distintos: o campo do ser (ou das
pulses parciais) e o campo do significante (em que propriamente
encontramos a teoria lacaniana do
grande Outro) (p. 7). Ver Lacan (1979) e Mller-Granzotto
(2008).
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355PSICOLOGIA USP, So Paulo, 2012, 23(2), 343-365
Costa (2006) sugere a criao de dispositivos de tratamento
basea-dos em uma noo de clnica ampliada, sem perder de vista a
posioterica e clnica do psicanalista. Por clnica ampliada
entende-se
um instrumento para que os trabalhadores e gestores de sade
possam en-
xergar e atuar na clnica para alm dos pedaos fragmentados, sem
deixar de
reconhecer e utilizar o potencial desses saberes. Este desafio
de lidar com os
usurios enquanto Sujeitos buscando sua participao e autonomia no
proje-
to teraputico tanto mais importante quanto mais longo for o
seguimento
do tratamento e maior for a necessidade de participao e adeso do
Sujeito
no seu projeto teraputico. (Brasil, 2007, p. 3)
Nesse sentido, a construo do conceito e da prtica de uma
clnicaampliada nasce tambm das dificuldades que os profissionais de
sadetm em propor teraputicas s chamadas patologias do real, como
ocaso da toxicomania, que so configuraes marcadas pela
desinserosocial. Essa desinsero social evidencia uma condio de no
resposta ordem civilizatria, representada pelo ordenamento das
instituies, e/ou aos prescritores universais que devem regular a
sade, pautadas naconcepo de sujeito cidado. A psicanlise, ento,
tanto beneficiadacomo pode beneficiar a construo dessa clnica
ampliada dentro dasinstituies, propondo um resgate da singularidade
dos sujeitos numcontexto em que a primazia dada ao social, social
aqui entendido comouniversal.
Na tentativa de resgatar a noo singular de sujeito, no
necessa-riamente excludente noo de sujeito cidado, significativos
trabalhosj vm sendo realizados discutindo a viabilidade da
psicanlise em con-textos institucionais, diferentes da criao
original do mtodo. Esses es-tudos apontam diversos dispositivos
clnicos que so pertinentes atua-o da psicanlise nas instituies: o
manejo das sesses por semana ehorrios (Figueiredo, 1997); a
construo do caso clnico junto s equipesde sade mental (Figueiredo,
2004); a clnica da recepo e a direo dotratamento pautada na clnica
do sujeito (Fernandes & Freitas, 2009); aincluso dos conceitos
sintoma e tica na escuta do sujeito na clnica psi-cossocial
(Dassoler & Silva, 2011); ou ainda entrevistas de passagem,
in-tervindo no tempo de tratamento (Bueno & Pereira, 2002).
Contudo, outro dispositivo nos interessa neste artigo: o grupo.
Ogrupo, via teraputica privilegiada em instituies de sade como
osCAPSad, representa avanos nessa interlocuo traada entre
psicanlisee instituio. Nessa via, a prxima seo apresentar o
trabalho com gru-po como um dos dispositivos da clnica ampliada em
uma instituio, vi-sando uma articulao entre a clnica psicanaltica e
as demandas insti-tucionais para o tratamento de toxicmanos.
-
356 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
Criando Dispositivos Clnicos: apontamentos tericos iniciais
O trabalho em grupos, coordenado por psicanalistas e
psiclogosque sustentam suas prticas em uma leitura a partir da
psicanlise, asso-ciado interveno individual, tem sido considerado
um dispositivo im-portante para se intervir nas especificidades
relativas constituio sub-jetiva dos toxicmanos e sua relao com o
lao social. Ao considerar atoxicomania em relao ao lao social,
Melman (1992) apresenta as toxi-comanias como uma das respostas
possveis aos imperativos de consu-mo vigentes na busca de gozo,
propondo-as como sintoma social, inscri-tas no discurso
dominante.
Partindo das especificidades do lao social contemporneo
asso-ciado a algumas das questes apontadas anteriormente sobre a
toxico-mania, a interveno grupal surge como um dispositivo eficaz
de trata-mento e como uma possibilidade de insero da psicanlise
nessasinstituies.
O Grupo de Trabalho e Estudo das Manifestaes Sociais
Contem-porneo Vindicas , problematizando os dispositivos grupais,
destacadois tipos de trabalho em grupo: um, no qual a reflexo sobre
o uso dedrogas tem como objetivo configurar uma demanda a um
tratamentopsquico; outro, como um dos dispositivos de tratamento
propriamentedito (Grupo de Trabalho e Estudo das Manifestaes
Sociais Contempo-rneo, 2002, 2003). Ambas as modalidades so
interessantes, seja por seconstiturem como ingresso para o trabalho
analtico, seja como recurso promoo de novas inseres do sujeito em
relaes de sociabilidade,perspectiva que se aproxima da do sujeito
cidado e do objetivo insti-tucional da reinsero social.
Sabemos que nos grupos se entrecruzam laos transferenciais
en-tre os participantes e entre eles e os coordenadores. Nessa
perspectiva, ogrupo fornece inmeras possibilidades identificatrias
necessrias aolongo de um tratamento, confluindo numa escuta que
auxilia o sujeito ase reorientar frente aos significantes que o
representam no mundo (Gru-po de Trabalho e Estudo das Manifestaes
Sociais Contemporneo, 2003,p. 28). H, com isso, o convite ao
restabelecimento de um circuito libidinalde trocas no dispositivo
de pertena a um grupo, favorecido por relaesde sociabilidade
mediadas pelo simblico.
Por outro lado, nos grupos em que o trao que os identifica
estligado substncia droga, h sempre o risco de uma equivalncia
entreaquilo que so e o que consomem, fazendo com que o sujeito se
protejana identidade calcada numa relao dual com a droga. Porm, a
psican-lise destaca a oportunidade da passagem de momentos de
identifica-es homogneas onde o ser drogado e saber sobre a droga
tomamconta da fala dos participantes, para, aos poucos, se
depararem com as
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357PSICOLOGIA USP, So Paulo, 2012, 23(2), 343-365
singularidades da histria de cada um, suas insuficincias, vazios
e signi-ficaes (Grupo de Trabalho e Estudo das Manifestaes Sociais
Contem-porneo, 2003). Ou seja, busca-se o estabelecimento de laos
simblicosna atividade grupal.
Precisamos lembrar que tais intervenes e direo do tratamentoesto
inseridas no campo da ateno psicossocial, no qual a dimensosocial
e/ou territorial so consideradas, ao mesmo tempo, pontos de
par-tida e pano de fundo para toda e qualquer interveno clnica
(Delgado,2008). A noo de territrio, na qual se busca articular os
laos simbli-cos, amplia-se para alm de uma definio de rea geogrfica
e se sus-tenta como suporte de referncias de toda ordem (culturais,
histricas,etc.) na vida do sujeito (p. 64). O dispositivo clnico do
grupo constitudoa partir de uma interlocuo entre os campos
psicossocial e psicanalticopode, ento, proporcionar um
engendramento entre aspectos de natu-reza scio-econmica-sanitria,
relativos aos territrios existenciais dossujeitos, e da lgica de
uma clnica do desejo, abrindo caminhos nos ter-ritrios
subjetivos.
A prtica da psicanlise nos CAPSad, e em outras instituies,
no-meada como uma prtica entre vrios (Abreu, 2008). Uma clnica
entrevrios uma aposta no sujeito, na capacidade de produo de
discurso,atrelada posio da equipe que pode colaborar nesta direo
(p. 76).Para pensar a prtica entre vrios, Stevens (2003) nos indica
quatro eixosnorteadores: a desespecializao, a inveno, a formao e a
transmisso.Com o intuito de contemplarmos os objetivos deste
trabalho, nosso focose restringe apenas aos dois primeiros
eixos.
A desespecializao ou no especializao tomada sobre dois pla-nos:
o plano do sintoma e o plano do trabalho tcnico. Uma clnica
nainstituio pautada pela psicanlise no pode ser monossintomtica,
iden-tificando o sujeito ao significante de seu sofrimento. A
identificao nomeao advinda do discurso cientfico (visto como uma
especializa-o, na qual o especialista nomeia o sofrimento do
sujeito), como o casodas classificaes diagnsticas do Manual
Diagnstico e Estatstico dosTranstornos Mentais DSM (Associao
Americana de Psiquiatria, 2000),conduz alienao e promove no sujeito
uma tendncia repetio, poisele pode atrelar-se aos ganhos secundrios
e no produzir um corte emsua cadeia para o surgimento de um novo
significante. Por exemplo, umsujeito que frequenta o CAPSad e
recebe o diagnstico de dependnciaqumica pode identificar-se em
absoluto com o significante dependentequmico e, ao mesmo tempo,
desresponsabilizar-se por seus desejos, vis-to que portador de uma
doena crnica e incurvel.
Quanto ao plano do trabalho tcnico, temos o afrouxamento
doslugares preestabelecidos nos diplomas universitrios, pois o ato
de cadaum dos membros da equipe produz efeitos teraputicos
(Stevens, 2003).Nesse sentido,
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358 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
muito mais que uma clnica multidisciplinar, interdisciplinar e
at transdisci-plinar, o funcionamento das relaes entre os tcnicos
no se d pelo diplo-
ma ou pelo saber que cada profisso carrega. Mas sim pelo saber
construdo apartir de cada sujeito que ali se trata. (Abreu, 2008,
p. 77)
O segundo eixo, o da inveno, tambm tomado sobre dois pla-nos: o
da inveno do sujeito sobre si mesmo e o da inveno na inter-veno do
analista. A inveno do sujeito sobre si mesmo diz respeito aocorte,
ou aos possveis cortes, que o sujeito pode efetuar com a interven-o
do analista em sua cadeia significante, produzindo novos
significa-dos para sua existncia. Um exemplo simples dessa inveno
quando,em um grupo, os sujeitos comeam a se apresentar no mais como
de-pendentes qumicos, mas como o Joo, que gosta de futebol e que
de-seja conversar sobre o que o leu ontem no jornal. A inveno
justamen-te essa produo de novos significados, de novas maneiras
que sujeitoencontra para falar de si e de sua histria (Abreu,
2008). Ao acolher asinvenes dos sujeitos, continua o autor, estamos
ao mesmo tempo bus-cando constituir uma instituio diferente para
cada sujeito, pois a ins-tituio que deve caber ao paciente e no
este caber na instituio. Porisso, precisamos inventar uma nova
instituio e novas intervenes queacolham as invenes dos
sujeitos.
Portanto, as contribuies da psicanlise para o tratamento das
to-xicomanias nos parecem ser fundamentais dentro de um CAPSad,
poisambos esto preocupados com a reinsero dos sujeitos, ou seja,
pro-pondo um tratamento que possibilite aos sujeitos novas maneiras
de seinserirem no lao social e, por mais que tenhamos concepes
distintasde sujeito, de desejo e de lugares discursivos, vemos a
possibilidade dearticular psicanlise e instituio, embora
inicialmente paream ser ex-cludentes. Contudo, se as estratgias de
reinsero social propostas nes-ses servios no forem articuladas a
partir da direo apontada pelo su-jeito, podem tornar-se mecanismos
adaptadores e empobrecedores dosujeito e de seus enigmas (Delgado,
2008, p. 64).
O psicanalista no trata a dependncia qumica, mas de um
sujeitoque sofre com a toxicomania, entendendo que este se
subjetiva numasociedade que tem no consumo um de seus mximos
valores (Mance,1998). Por isso, ao tratar de um sujeito que sofre
com a toxicomania, con-voca-se o paciente fala, a verbalizar suas
fissuras, seus medos, fragilida-des, necessidades e sonhos,
abrindo.
Privilegia-se, assim, a palavra, pontuam-se atos falhos,
recoloca-seo que o paciente diz desejar, auxilia-se no
estabelecimento de limites ena sustentao dos projetos pessoais, sem
descuidar os actings outs que,s vezes, insurgem-se como puro ato de
violncia (Conte, 2003, p. 51). Asdificuldades enfrentadas na clnica
da toxicomania convocam o psicana-lista a pensar os movimentos
teraputicos necessrios nessa clnica e no
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359PSICOLOGIA USP, So Paulo, 2012, 23(2), 343-365
trabalho em instituies de maneira geral, a partir de um lugar de
angs-tia e de no saber, a fim de ofertar outra experincia com o
Outro, queconvide ao investimento em outras formas de relao, em que
o desejopredomine sobre o gozo mudo da droga.
Consideraes Finais
Enquanto as instituies so criadas para curar ou excluir os
sinto-mas provenientes do desamparo fundamental, como, por exemplo,
o sin-toma da toxicomania, a psicanlise concebe o sintoma como a
formapossvel ao sujeito de se inserir na realidade, isto , operar
com seu mal-estar estrutural, ainda que essa operao se constitua de
modo precrioou mesmo autodestrutivo. Ou seja, a psicanlise
considera o uso e/ouabuso da droga a partir da relao que o sujeito
estabeleceu com esseobjeto (droga), como uma via de subjetivao, e
no apenas como umdesvio s normativas sociais e biolgicas. Contudo,
a clnica psicanalticaassociada noo de clnica ampliada, atravs da
criao de dispositivosde tratamento, vista como um desafio e como
uma possibilidade paraos psicanalistas que trabalham em instituies
de sade, o que requerdesses profissionais um rigor tico e uma
postura clnico-poltica condi-zente com os princpios fundamentais da
psicanlise.
Rinaldi (2006), nesse sentido, enfatiza que
Tal posio deriva de uma tica que se orienta no pelo bem, mas
pelo desejo,
e que se funda na aposta de que ali h um sujeito que poder
emergir comoresultado de um trabalho clnico. Este trabalho deve ser
sustentado dentro dainstituio, no contra ela, nem apesar dela, mas
procurando transmitir algodessa dimenso do sujeito, sem a qual o
discurso da cidadania corre o risco de
reproduzir o modelo tutelar e excludente nesse caso, do sujeito
que pre-tende combater. (p. 146)
Observa-se, em nossa experincia, atravs de conversas cotidia-nas
e de encontros com profissionais da sade, que em grande partedos
servios pblicos de sade existe a ideia recorrente de que o
trata-mento psicanaltico no aconselhado em casos de toxicomania, j
queesses pacientes precisam de tratamento breve e urgente e no
conse-guem estabelecer uma relao transferencial. A ideia de
tratamentobreve basicamente se associa, nesses casos, concepo de
cura asso-ciada abstinncia.
Apesar das posies distintas quanto direo do tratamento e,por
vezes, contraditrias no que tange abstinncia, observa-se a pre-sena
crescente de psicanalistas nas instituies pblicas de assistncia
sade mental (Rinaldi, 2006), indicando no somente uma ampliaono
campo de trabalho, mas, tambm, um aumento crescente no interes-
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360 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
se dos psicanalistas em trabalhar em instituies de sade. Esse
movi-mento produz um deslocamento do psicanalista do seu consultrio
pri-vado para um espao onde ele est entre muitos, tanto em uma
equipemultidisciplinar quanto entre as diversas pessoas a quem se
dirige otratamento. A entrada de um novo olhar e de uma escuta
diferenciadanas instituies provoca, no mnimo, a necessidade de
rearranjo institu-cional.
O que se pretendeu evidenciar neste trabalho, portanto, que
deuma relao inicial mutuamente excludente entre psicanlise e
institui-o, podemos, atravs do uso do grupo como um dispositivo de
trata-mento pautado nos saberes da psicanlise, pensar numa relao na
quala psicanlise enriquece o trabalho nas instituies e estas, por
sua vez, aomesmo tempo em que questionam o saber da psicanlise,
desafiam eestimulam os psicanalistas a criar novos dispositivos.
Afinal, tanto a psi-canlise quanto a instituio (como o caso do
CAPSad), preconizam a(re)insero no lao social, ainda que por meios
e princpios distintos.
Psychoanalyse, institution and social tie: the group as a
device
Abstract: Psychoanalysis has been facing a remarkable challenge
nowadays: its
establishment in public health institutions in Brazil. This
essay aims to establish a
dialog between on psychoanalysis and institution, proposing a
theoretical
examination about some possibilities of group work supported by
this theoretical
perspective. Our intention is not to raises questions to the
psychoanalytic clinic
method, but to promote new reflections that may contribute to
the change of this
field of knowledge. Taking the Psychosocial Care Centers for
alcohol and other drugs
users (CAPSad) as point of departure we developed our reasons.
First, we presented
some of the meaning/value of the word institution, associating
them to the text
Civilization and Its Discontents (Freud) and to the
psychoanalytic approach to the
toxicomania (drug addiction). After, we introduced the notion of
amplified clinic (cl-
nica ampliada) with the intention to articulate the
psychoanalytic clinic and the
institutional demand for the toxicomania treatment.
Keywords: Psychoanalysis. Residential care institutions. Groups.
Alcohol. Drugs.
-
361PSICOLOGIA USP, So Paulo, 2012, 23(2), 343-365
Psychanalyse, institution et lien sociale: le groupe comme
dispositif
Rsum: La psychanalyse a vu un remarquable dfi daujourdhui: sa
cration dans
les institutions de sant publique au Brsil. Cet essai vise
tablir un dialogue entre
la psychanalyse et linstitution, en proposant une observation
thorique sur certaines
possibilits de travaille en groupe appuys sur cette perspective
thorique. Notre
intention nest pas de soulever des questions de mthode de la
clinique psychanaly-
tique, mais de promouvoir des nouvelles rflexions qui puissent
contribuer au
changement dans ce domaine de connaissance. Prenant les Centres
de Soins Psycho-
social Alcool / Drogues (CAPSad) comme point de dpart, nous
dveloppons nos
arguments. Tout dabord, nous prsentons quelques-unes des
significations / valeurs
du mot institution, en liaison avec le texte Malaise dans la
civilisation (Freud) et
lapproche psychanalytique la toxicomanie (addiction aux
drogues). Aprs, nous
avons introduit la notion de clinique largie avec lintention
darticuler la clinique
psychanalytique la demande institutionnelle pour le traitement
la toxicomanie.
Mots-cls: Psychanalyse. Institutions. Groupes. Alcool.
Drogues.
Psicoanlisis, institucin y vnculo social: el grupo como
dispositivo
Resumen: El psicoanlisis se ha enfrentado a un desafo notable
hoy en da: su
establecimiento en las instituciones de salud pblica en Brasil.
Este ensayo tiene por
objeto establecer un dilogo entre el psicoanlisis y la
institucin, proponiendo un
examen terico acerca de algunas posibilidades de trabajo en
grupo con el apoyo
de esta perspectiva terica. Nuestra intencin no es plantear
preguntas al mtodo
clnico psicoanaltico, sino promover nuevas reflexiones que
pueden contribuir al
cambio de este campo del conocimiento. Tomando los Centros de
Atencin
Psicosocial para usuarios de alcohol y otras drogas (CAPSad)
como punto de partida
hemos desarrollado nuestras razones. En primer lugar,
presentamos algunos de los
efectos/valor de la palabra institucin, asocindolos con el texto
El malestar en la
cultura (Freud) y el enfoque psicoanaltico del consumo de drogas
(drogadiccin).
Despus, hemos introducido el concepto de clnica ampliada (Clnica
Ampliada) con
la intencin de articular la clnica psicoanaltica con la demanda
institucional para el
tratamiento de toxicomana.
Palabras clave: Psicoanlisis. Instituciones de salud. Grupos.
Alcohol. Drogas.
-
362 PSICANLISE, INSTITUIO E LAO SOCIAL: O GRUPO COMO DISPOSITIVO
MOISES ROMANINI E ADRIANE ROSO
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Moises Romanini, psiclogo, mestre em Psicologia
(PPGP-UFSM/Bolsista CAPES-REU-
NI). Doutorando em Psicologia Social e Institucional
(PPGPSI-UFRGS), integrante do
Grupo de Pesquisa Sade, Minorias Sociais e Comunicao. Endereo
para corres-
pondncia: Rua Mal. Floriano Peixoto, 1750, 3 Andar, Sala 317,
CEP 97015-372, Santa
Maria, RS, Brasil. Endereo eletrnico:
[email protected]
Adriane Roso, psicloga, doutora em Psicologia (PUC-RS), docente
do Programa de
Ps-Graduao em Psicologia da Universidade Federal de Santa Maria
(PPGP-UFSM),
lder do Grupo de Pesquisa Sade, Minorias Sociais e Comunicao.
Endereo para
correspondncia: Rua Mal. Floriano Peixoto, 1750, 3 Andar, Sala
317, CEP 97015-372,
Santa Maria, RS, Brasil. Endereo eletrnico:
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Recebido: 23/05/2011
Aceito: 25/01/2012