Urgências psiquiátricas na Atenção Básica Profa. Sandra de Souza Pereira
Urgências psiquiátricas na Atenção Básica
Profa. Sandra de Souza Pereira
Urgência Psiquiátrica
• Qualquer situação de natureza psiquiátrica em que existe um risco significativo de morte ou dano grave para o paciente ou para terceiros, demandando uma intervenção terapêutica imediata
Comportamento suicida
Agitação psicomotora
Suicídio
• Ato deliberado executado pelo próprio indivíduo, cuja intenção seja a morte, de forma consciente e intencional, mesmo que ambivalente, usando um meio que ele acredita ser letal.
• Comportamento suicida: pensamentos, planos e tentativa de suicídio
Comportamento suicida
O suicídio em números
• Todos os anos são registrados mais de um milhão de suicídios em todo o mundo
• Uma tentativa de suicídio a cada 3 segundos
• Um suicídio a cada 40 segundos
• Brasil: 2016 formam mais de 13 mil suicídios
• Brasil: 8º país em número absoluto de suicídios notificação
Óbitos por ocorrência de lesões autoprovocadas voluntariamente segundo a região, Brasil- 2015 a 2019
REGIÃO 2015 2016 2017 2018 2019
Norte 875 824 896 986 1.054
Nordeste 2.537 2.719 2.980 2.990 3.082
Sudeste 4.323 4.245 4.640 4.675 4.915
Sul 2.494 2.606 2.860 2.896 3.177
Centr-Oeste 949 1.039 1.119 1.186 1.293
Total 11.178 11.433 12.495 12.733 13.520
Métodos utilizados –Sudeste (2019)
70%
7%
7%
4%4%
8%
Enforcamento Medicamentos
Arma de fogo Queda de locais elevados
Pesticidas e correlatos Outros
Mitos e verdades
O suicídio é uma decisão individual, já que cada um tem pleno direito a exercitar o seu
livre arbítrio
FALSO. Os suicidas estão passando quase invariavelmente por uma doença mental
que altera, de forma radical, a sua percepção da realidade e interfere em seu
livre arbítrio. O tratamento eficaz da doença mental é o pilar mais importante da prevenção do suicídio. Após o tratamento
da doença mental o desejo de se matar desaparece
Mitos e verdades
Quando uma pessoa pensa em se suicidar terá risco de suicídio para o resto da vida
FALSO. O risco de suicídio pode ser
eficazmente tratado e, após isso, a pessoa não
estará mais em risco
Mitos e verdades
As pessoas que ameaçam se matar não farão isso, querem
apenas chamar a atenção
FALSO. A maioria dos suicidas fala ou dá sinais sobre suas ideias de
morte. Boa parte dos suicidas expressou, em dias ou semanas anteriores, frequentemente aos
profissionais de saúde, seu desejo de se matar
Mitos e verdades
Se uma pessoa que se sentia deprimida e pensava em suicidar-se, em um
momento seguinte passa a se sentir melhor, normalmente significa que o
problema já passou
FALSO. Se alguém que pensava em suicidar-se e, de repente, parece
tranquilo, aliviado, não significa que o problema já passou. Uma pessoa que
decidiu suicidar-se pode sentir-se “melhor” ou sentir-se aliviado
simplesmente por ter tomado a decisão de se matar
Mitos e verdades
Quando um indivíduo mostra sinais de melhora ou sobrevive à uma tentativa de
suicídio, está fora de perigo
FALSO. Um dos períodos mais perigosos é quando se está melhorando da crise que motivou a tentativa, ou quando a pessoa ainda está no hospital, na sequência de uma tentativa. A semana que se segue à alta do hospital é um período durante o
qual a pessoa está particularmente fragilizada. Como um preditor do
comportamento futuro é o comportamento passado, a pessoa suicida muitas vezes
continua em alto risco
Mitos e verdades
Não devemos falar sobre suicídio, pois isso pode
aumentar o risco
FALSO. Falar sobre suicídio não aumenta o risco. Muito pelo contrário, falar com alguém
sobre o assunto pode aliviar a angústia e a tensão que esses
pensamentos trazem
Mitos e verdades
É proibido que a mídia aborde o tema suicídio
FALSO. A mídia tem obrigação social de tratar desse importante assunto de
saúde pública e abordar esse tema de forma adequada. Isto não aumenta o
risco de uma pessoa se matar; ao contrário, é fundamental dar
informações à população sobre o problema, onde buscar ajuda, etc
Fatores de risco
• Tentativa prévia de suicídio
• Homens
• Idade entre 15 a 30 anos e acima de 65 anos
• Transtorno mental
• História familiar
• Solteiros, separados ou viúvos; sem filhos; isolamento social
• Desempregados ou aposentados
• Moradores de áreas urbanas
• Minorias: indígenas, moradores de rua, população LGBTQIA+
• Perdas recentes• Pouca resiliência
• Impulsividade
• Violência física ou sexual na infância
• Desesperança, desespero e desamparo
• Doenças orgânicas incapacitantes ou progressivas, dor crônica
Suicídio e transtornos mentais
Transtorno mental Prevalência
Transtorno de humor 30,2%
Transtorno por uso de substância (álcool) 17,6%
Esquizofrenia 14,1%
Transtornos de personalidade 13%
Transtornos mentais orgânicos 6,3%
Transtornos de ansiedade/somatoformes 4,8%
Outros transtornos psicóticos 4,1%
Transtornos de ajustamento 2,3%
Todos os demais diagnósticos 5,5%
Sem diagnóstico 2%
OS MAIS IMPORTANTES PARA SEREM LEMBRADOS
Fatores protetores
• Ausência de transtorno mental
• Gravidez
• Senso de responsabilidade para com a família
• Suporte social positivo
• Religiosidade
• Estar empregado
• Satisfação elevada com a vida
• Presença de criança na família
• Capacidade de resolução de problema positiva
• Capacidade de adaptação positiva
• Teste de realidade intacto
• Relação terapêutica positiva
A importância da atenção primária
• Primeiro contato com o profissional de saúde prevenção
• 80% dos suicidas foram ao médico não psiquiatra no mês anterior ao suicídio
• Considerar qualquer tentativa ou intenção, por mais ingênua que se mostre, como fato relevante
• Qualquer tentativa, atual ou pregressa, deve servir de alerta
• Identificação e avaliação do risco suicida
• Evitar reagir ao paciente, maltratá-lo ou negligenciá-lo
IDENTIFICAR AVALIAR MANEJAR ENCAMINHAR
Abordagem ao paciente
• Escuta e acolhimento
• Investigação do risco
• Transtorno mental atual ou prévio
• Abordagem gradual
1. Você tem planos para o futuro?
2. A vida vale a pena ser vivida?
3. Se a morte viesse, ela seria bem-vinda?
4. Você está pensando em se machucar/ se ferir/ fazer mal a você/ em morrer?
5. Você tem algum plano específico para morrer/ se matar/ tirar sua vida?
6. Você fez alguma tentativa de suicídio recentemente?
Abordagem do paciente
• Meios acessíveis
• Letalidade do plano
• Probabilidade de resgate
• Preparação – carta, testamento ou acúmulo de comprimidos
• Tentativa prévia
• Habilidade de controlar os impulsos
• Fatores estressantes recentes
• Fatores protetores
• Motivos para se manter vivo
• Visão sobre o futuro
Condução de acordo com o risco
• RISCO BAIXO: Pensamento suicida sem planejamento
- Escuta acolhedora
- Reforçar vínculos – instituições, família, amigos
- Tratamento de possível transtorno psiquiátrico
- Caso não haja melhora, encaminhe para profissional especializado, esclareça ao paciente os motivos do encaminhamento
- Oriente sobre medidas de proteção
- Continue acompanhando
Condução de acordo com o risco
• RISCO MÉDIO: Pensamentos e planos, mas sem pretensão de cometer suicídio imediatamente
- Cuidado com possíveis meios de cometer suicídio no próprio espaço de atendimento
- Escuta terapêutica
- Contrato terapêutico de não suicídio
- Investimento em fatores protetivos
- Família e amigos: parceiros no acompanhamento
- Encaminhe para equipe de saúde mental para avaliação e conduta o mais breve possível
- Peça autorização para entrar em contato com a família ou amigos e explique a situação sem alarmar ou colocar panos quentes, preservando o sigilo e outras informações
- Oriente sobre medidas de prevenção
Condução de acordo com o risco
• RISCO ALTO: Planejamento definido, meios para fazê-lo e planejando fazê-lo prontamente; tentou recentemente e apresenta rigidez quanto à nova tentativa; tentou várias vezes em um curto espaço de tempo
- Não deixar sozinho
- Cuidado com possíveis meios de cometer suicídio no próprio espaço de atendimento
- Contrato de “não suicídio”
- Informar a família
- Encaminhar para equipe de saúde mental, via ambulância, para avaliação e, se necessário, internação
Posvenção do suicídio
• Período de ajustamento vivenciado por familiares, amigos e outros contatos do falecido – “sobreviventes” de suicídio
• Cada suicídio tem um sério impacto na vida de pelo menos outras seis pessoas
• Suporte aos “sobreviventes de suicídio”
Conclusões
• Possibilidade de prevenção
• Papel da atenção primária
• Escuta e acolhimento
• Identificação e tratamento dos transtornos mentais associados
• Notificação
• Posvenção
• O “problema” das redes sociais
Agitação psicomotora
• Sentimento de tensão interna associado a atividade motora excessiva, podendo ser acompanhada também de desorganização psíquica e ausência de capacidade crítica
• Síndrome (e não etiologia) presente em diversas condições e doenças
Espectro da agitação
HOSTILIDADE
• Irritado, fala alto, sem contato visual, inquieto, aperta as mãos
AGRESSIVIDADE
• Raivoso, pouco colaborativo, grita, xinga, ameaça, anda de um lato para o outro, gesticula, esmurra a parede
VIOLÊNCIA
• Furioso, afirma que vai agredir ou acabou de agredir, quebra objetos, corre, se debate
Fatores de risco
• Sexo masculino
• Jovem
• Uso crônico de álcool ou outras substâncias
• Comportamento violento prévio
• Baixa continência social e familiar
• Baixa escolaridade
• Desemprego
• Impulsividade
• Baixa tolerância às frustrações
• Baixa autoestima
• Automutilação
Manejo da agitação psicomotora
• Garantir a segurança
• Reduzir o sofrimento do paciente
• Ajudá-lo a recuperar o controle das emoções e do comportamento
• Evitar ações que piorem a agitação
• Evitar danos ao paciente
Manejo da agitação psicomotora
• Respeite o espaço
• Não seja provocativo
• Estabeleça contato verbal
• Seja claro e direto
• Identifique sentimentos e desejos
• Escute e se certifique que entendeu
• Estabeleça e deixe claro limites e regras
• Ofereça alternativas
Manejo farmacológico
• Preferência do paciente
• Medicação via oral x via parenteral
• Tranquilização x sedação
• Monoterapia
• Tente estabelecer a etiologia de base e as condições clínicas
1. Intoxicação substâncias evitar benzodiazepínicos
2. SAA Diazepam
3. T. psicótico antipsicótico + benzodiazepínicos
Manejo farmacológico
• Respeitar tempo de início de ação e dosagem
• Reavaliar a cada 30 minutos
• Se necessário, repetir a droga utilizada inicialmente
• Monitorar e manejar efeitos indesejáveis
Contenção mecânica
• Entende-se por contenção mecânica a fixação do paciente ao leito por meio de faixas de couro ou tecido, geralmente nos membros superiores e inferiores
• A contenção mecânica deve ser usada como último recurso, quando todas as outras possibilidades de intervenção forem fracassadas
• A contenção mecânica deve ser usada apenas quando há risco de agitação psicomotora intensa, de auto e heteroagressão e de queda ou ferimentos em pacientes com rebaixamento do nível de consciência
• Deve-se estabelecer um plano específico para a realização do procedimento
• A contenção mecânica deve ser realizada por vários membros da equipe (de preferência, cinco pessoas)
• O médico deve estar presente durante todo o procedimento
• O paciente deve ser continuamente orientado sobre o procedimento que está sendo realizado e os motivos que levaram a ele
• A contenção mecânica deve ser mantida pelo menor tempo possível
Contenção mecânica
• O conforto e a segurança do paciente devem ser rigorosamente checados, verificando-se a qualidade da perfusão e a eventual ocorrência de garroteamento e hiperextensão de membros, compreensão de tórax e de plexo braquial (no caso de uso de contenção de tórax)
• O paciente deve ser mantido sob observação contínua pela equipe de enfermagem durante o período que for mantido sob contenção mecânica
• Sinais vitais devem ser rigorosamente monitorados
• O paciente deve ser reavaliado pelo médico assistente a cada 30 minutos, para averiguação da necessidade de manutenção da contenção mecânica
• A retirada da contenção mecânica deve ser realizada na presença de vários membros da equipe
• As informações relativas à indicação de contenção mecânica, sinais vitais, condições de conforto e segurança e eventuais intercorrências durante o procedimento devem ser detalhadamente registradas em prontuário
Referências bibliográficas
• ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA. Comissão de Estudos e Prevenção de Suicídio. Suicídio: informando para prevenir. Brasília, 2014.
• BOTEGA, N. J. Prática psiquiátrica no hospital geral. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2012.
• KNOX, D. K.; HOLLOMAN JR, G. H. Use and avoidance of seclusion and restraint: consensus statement of the American Associationfor Emergency Psychiatry Projecto BETA Seclusion and Restraint Workgroup. Western Journal of Emergency Medicine. V. XIII, n. 1, 2012.
• MANTOVANI, C. et al. Manejo do paciente agitado ou agressivo. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 32, supl II, 2010.
• QUEVEDO, J et al. Livro: emergências psiquiátricas. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.