PRISÃO CAUTELAR EM PERSPECTIVA COM O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Cassiano D’Cristian da Silva Juliani 1 Fábio Marques 2 RESUMO O presente trabalho tem por objetivo verificar na legislação, jurisprudência e doutrina o entendimento prevalente a respeito do prazo máximo tolerável para o término da ação penal, estando o réu preso, acerca do conflito com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Fazer breves comentários sobre as espécies de prisão cautelar: prisão em flagrante, à prisão preventiva e a prisão temporária, bem como o afrontamento dos princípios constitucionais pertinentes: do estado de inocência, da razoabilidade, da proporcionalidade, da legalidade/reserva legal, com a decretação da prisão cautelar e da fundamentação das decisões judiciais. Fazer uma abordagem do tema sob a ótica do Código de Processo Penal. Por fim, compilar o melhor entendimento sobre a ocorrência de constrangimento ilegal em face do tempo de permanência nas prisões cautelares. Palavras-chave: Processo Penal. Prisão Cautelar. Princípios Constitucionais. Jurisprudência. Dignidade da Pessoa Humana. 1. INTRODUÇÃO Neste dedicado artigo científico serão apresentadas argumentos e arrazoados pertinentes à constitucionalidade da prisão cautelar sob a perspectiva do princípio da dignidade da pessoa humana. Para tanto, serão expostos também uma relação com demais princípios constitucionais pertinentes: do estado de inocência, da razoabilidade, da proporcionalidade, da legalidade/reserva legal, e da fundamentação das decisões judiciais, os tipos de prisão cautelar: em flagrante, preventiva, temporária, breve análise destas prisões à luz do princípio da presunção de inocência. O método adotado para o presente artigo será dedutivo, advento com dissecação das regras da prisão cautelar, bem como dos princípios constitucionais associados a ela, com a premissa finalidade de verificar se a adoção da prisão cautelar acata ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. 1 Artigo confeccionado por Cassiano D’Cristian da Silva Juliani acadêmico de Direito no Centro Universitário de Várzea Grande – UNIVAG; Estagiário da 5ª Promotoria de Justiça Criminal de Várzea Grande/MT. 2 Professor Orientador Especialista em Direito Criminal; Mestre pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; Professor Mestre do Curso de Direito no Centro Universitário de Várzea Grande – UNIVAG; Coordenador do Curso de Direito no Centro Universitário de Várzea Grande – UNIVAG
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PRISÃO CAUTELAR EM PERSPECTIVA COM O PRINCÍPIO … · 2013-10-21 · requisitos do fummus commissi delicti e o periculum libertatis converter a prisão em flagrante em preventiva,
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PRISÃO CAUTELAR EM PERSPECTIVA COM O PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Cassiano D’Cristian da Silva Juliani1
Fábio Marques2
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo verificar na legislação, jurisprudência e doutrina o
entendimento prevalente a respeito do prazo máximo tolerável para o término da ação penal,
estando o réu preso, acerca do conflito com o princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana. Fazer breves comentários sobre as espécies de prisão cautelar: prisão em flagrante, à
prisão preventiva e a prisão temporária, bem como o afrontamento dos princípios
constitucionais pertinentes: do estado de inocência, da razoabilidade, da proporcionalidade, da
legalidade/reserva legal, com a decretação da prisão cautelar e da fundamentação das decisões
judiciais. Fazer uma abordagem do tema sob a ótica do Código de Processo Penal. Por fim,
compilar o melhor entendimento sobre a ocorrência de constrangimento ilegal em face do
tempo de permanência nas prisões cautelares.
Palavras-chave: Processo Penal. Prisão Cautelar. Princípios Constitucionais. Jurisprudência.
Dignidade da Pessoa Humana.
1. INTRODUÇÃO
Neste dedicado artigo científico serão apresentadas argumentos e arrazoados
pertinentes à constitucionalidade da prisão cautelar sob a perspectiva do princípio da
dignidade da pessoa humana. Para tanto, serão expostos também uma relação com demais
princípios constitucionais pertinentes: do estado de inocência, da razoabilidade, da
proporcionalidade, da legalidade/reserva legal, e da fundamentação das decisões judiciais, os
tipos de prisão cautelar: em flagrante, preventiva, temporária, breve análise destas prisões à
luz do princípio da presunção de inocência.
O método adotado para o presente artigo será dedutivo, advento com dissecação das
regras da prisão cautelar, bem como dos princípios constitucionais associados a ela, com a
premissa finalidade de verificar se a adoção da prisão cautelar acata ao princípio
constitucional da dignidade da pessoa humana.
1Artigo confeccionado por Cassiano D’Cristian da Silva Juliani acadêmico de Direito no Centro Universitário de Várzea
Grande – UNIVAG; Estagiário da 5ª Promotoria de Justiça Criminal de Várzea Grande/MT.
2 Professor Orientador Especialista em Direito Criminal; Mestre pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; Professor
Mestre do Curso de Direito no Centro Universitário de Várzea Grande – UNIVAG; Coordenador do Curso de Direito no
Centro Universitário de Várzea Grande – UNIVAG
Quanto ao tipo de pesquisa e a sua sistemática, será bibliográfico, através de estudo
em doutrinas, leis, jurisprudência e demais fontes bibliográficas, propiciando que se alcance
esclarecer a importância da utilização das prisões como medida cautelar penal.
O referido tema foi escolhido devido ao interesse e sua relevância na órbita jurídica e
social, vista que existem demasiadas discussões e diversos entendimentos doutrinários pela
aplicabilidade da prisão cautelar, com o fim de considerar a imprescindibilidade de ser
respeitado o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Sendo assim, este artigo tem por objetivo responder questões pertinentes quanto à
aplicação da prisão cautelar, tendo em vista que, feri a presunção de inocência do agente,
principalmente sua dignidade quando é decretada sua prisão cautelar, pois está privando de
sua liberdade de locomoção, sem antes de uma sentença penal já transitada em julgado.
2. DA PRISÃO CAUTELAR
As prisões efetuadas antes de a sentença transitar em julgado, não tem natureza de
pena, haja vista que são dotadas de natureza cautelar.
As prisões cautelares têm por objetivo defender o meio social de um indivíduo
perigoso, bem como garantir o trâmite regular do processo, com a prisão do indivíduo,
conforme determina a legislação. Visa, ainda, o cumprimento da eventual sanção penal.
Para a realização da prisão cautelar é necessário ainda à presença de indícios
suficientes de autoria ou participação, bem como o fumus boni juris e o periculum libertatis.
A prisão cautelar deve-se fundar em um dos requisitos supramencionados, sob pena
de ser considerada inconstitucional por desrespeitar ao princípio da presunção de não
culpabilidade, que está previsto no art. 5º, LVII, da CF.
Em um Estado que ratifica o princípio de presunção de não culpabilidade, seria ideal
que, o imputado somente fosse privado de sua liberdade de locomoção por força de uma
prisão penal, após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
O penalista Mougenot3 afirma que:
“Fora dessas hipóteses, à prisão de qualquer indivíduo será inconstitucional. Nesse
caso, qualquer pessoa poderá impetrar habeas corpus em favor do ilegalmente preso,
sendo de rigor que se determine sua imediata soltura. Uma vez ciente de prisão
ilegal, diga-se, a autoridade judiciária terá o dever de determinar seu relaxamento
(art. 5°, LXV, da CF). A recusa do juiz em fazê-lo, desde que evidente a ilegalidade
3 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de Processo Penal – 4. ed. São Paulo. Saraiva: 2009, página 399
da prisão, pode ensejar responsabilização da autoridade judiciária por crime de
abuso de autoridade (art. 4°, d, da Lei n. 4.898/65).”
O mestre penalista Rangel4 define prisão cautelar como: “uma espécie de medida
cautelar, ou seja, é aquele que recai sobre o indivíduo, privando-o de sua liberdade de
locomoção, mesmo sem sentença definitiva”.
Seguindo essa ideia, medida cautelar é algo presente no processo cautelar,
consequentemente, a medida cautelar conta como instrumento para se alcançar o que se
pretende no processo de conhecimento, ou seja, a solução do caso penal.
Assim sendo, a prisão cautelar em primeiro momento não solucionará o problema do
caso penal, haja vista, a precariedade das penitenciárias brasileiras que estão longe de atingir
seus objetivos, qual seja: a ressocialização, educação e a referente punição ao seu delito.
Em segundo momento, a prisão cautelar afronta com o princípio da dignidade da
pessoa humana, com o princípio da presunção de inocência e principalmente com o direito de
liberdade, princípios protegidos pela Carta Magna de 1988.
A prisão cautelar tem natureza de medida excepcional e não é utilizada como
cumprimento antecipado da pena, ou seja, a qual não tem o intuito de garantir a instrução
processual.
Pois bem, cumpre ainda, salientar que, a prisão somente poderá resultar de flagrante
delito ou de decisão escrita e fundamentada do Juiz competente, e será cumprida mediante
mandado de prisão. A prisão cautelar deve estar obrigatoriamente comprometida com a
instrumentalização do processo criminal.
Dentro da órbita da prisão cautelar existem três tipos de prisões, são elas: a prisão em
flagrante, à prisão preventiva e a prisão temporária, cujo que, será cada uma brevemente
analisadas.
2.1 DOS TIPOS DE PRISÃO CAUTELAR
2.1.1 Da Prisão Em Flagrante
Como medida restritiva de liberdade e a única prisão em que não exigem ordem
escrita por juiz, deve esta, ser verificada pelo aplicador se esta restrição à liberdade de
locomoção está devidamente prescrita na lei, caso estando, sempre aplicando aquilo que dela
emana, sem estender seu alcance ou restringi-la.
4 RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. – 16. ed. Rio de Janeiro. Lumen Juris: 2009, página 677.
Pois bem, a prisão em flagrante delito decorre do momento em que o agente é
surpreendido durante a execução do delito penal, ou seja, pode ser concretizada tanto na
tentativa ou consumação (respeitando as normas após a consumação) do crime.
Paulo Rangel delimita dois elementos imprescindíveis para configuração da prisão
em flagrante: a atualidade e visibilidades, definindo-as da seguinte forma:
“A atualidade é expressa pela própria situação flagrancial, ou seja, algo que está
acontecendo naquele momento ou acabou de acontecer. A visibilidade é a ocorrência
externa ao ato. É a situação de alguém atestar a ocorrência do fato ligando-o ao
sujeito que o pratica. Portanto, somadas a atualidade e a visibilidade tem-se o
flagrante delito.”.
Assim sendo, conforme enunciado do artigo 302 do Código de Processo Penal:
Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem:
I – está cometendo a infração penal;
II – acaba de cometê-lo;
III – é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa,
em situação que faça presumir ser autor da infração;
IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que
façam presumir ser ele autor da infração.
Nesse sentido, (Demercian, 2005, pg. 169),5 o estado de flagrância é a mais
eloquente manifestação de presença de suficientes indícios de autoria e prova da existência do
crime, permitindo-se aferir facilmente o primeiro requisito, a fumaça do bom direito.
Com relação ao sujeito em flagrante, temos a figura do sujeito passivo e do sujeito
passivo. Sujeito ativo é qualquer pessoa que efetua a prisão do agente encontrado nas
situações de flagrância prevista no artigo acima. Já no que diz respeito ao sujeito passivo,
temos como o agente, o infrator, o autor do delito cometido, a pessoa que está em situação de
flagrância.
Pois bem, muito se fala na prisão em flagrante como uma medida para anteceder a
Prisão Preventiva, outra espécie de prisão cautelar que tem caráter de medida cautelar.
Deste modo, a prisão em flagrante não é algum requisito para aplicação da prisão
preventiva, vista que, ao receber o auto de prisão em flagrante, cabe ao juiz, utilizando-se
fundamentação legal, conceder o relaxamento de prisão, ou então, quando houver os
5 DERMERCIAN, Pedro Henrique. Curso de processo penal / Pedro Henrique Demercian, Jorge Assaf Maluly. – 3° ed. – Rio
de Janeiro: Forense, 2005.
requisitos do fummus commissi delicti e o periculum libertatis converter a prisão em flagrante
em preventiva, podendo ainda conceder liberdade provisória com ou sem fiança, conforme
previsão do artigo 310 do Código de Processo Penal.
Alguns doutrinadores entendem que a natureza jurídica da prisão em flagrante é de
ato administrativo, isto posto que, não possui qualquer natureza jurisdicional, não sendo
coerente considerar como medida processual acautelatória. Entretanto, outra parte da doutrina,
entende que a prisão em flagrante tem natureza jurídica de prisão cautelar, enquanto ainda,
alguns outros defendem a prisão cautelar como uma pedida precautelar.
Guilherme de Souza Nucci dispõe que:
“Tem, inicialmente, natureza administrativa, pois o auto de prisão em flagrante,
formalizador da detenção, é realizado pela polícia judiciária, mas se torna
jurisdicional, quando o juiz, tomando conhecimento dela, ao invés de relaxá-la,
prefere mantê-la, pois considerada legal, convertendo-a em preventiva.” 6
Renato Brasileiro de Lima expõe que:
“pensamos que a prisão em flagrante tem caráter precautelar. Não se trata de uma
medida cautelar de natureza pessoal, mas sim precautelar, porquanto não se dirige a
garantir o resultado final do processo, mas apenas objetiva colocar o capturado à
disposição do juiz para que adote uma verdadeira medida cautelar.” 7
Pois bem, inicialmente pode-se dizer que a prisão em flagrante tem caráter de medida
precautelar, podendo torna-se empós medida cautelar após o juiz de direito convertê-lo em
prisão preventiva.
Com isto, passemos a estudar sobre prisão preventiva.
2.1.2 Da Prisão Preventiva
A prisão preventiva é uma medida cautelar, que priva a liberdade do agente e é
decretada pelo juiz competente durante o inquérito ou instrução criminal, ante a presença dos
pressupostos legais, que visam assegurar os interesses da sociedade, ressaltando, que é
compatível com o principio da presunção de não culpabilidade, previsto na Carta Magna.
O doutrinador Capez define prisão preventiva como:
˝prisão cautelar de natureza processual decretada pelo juiz durante o inquérito
policial ou processo criminal, antes do transito em julgado, sempre que estiverem
preenchidos os requisitos legais e ocorrerem os motivos autorizadores˝. 8
6 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 11 ed. rev. atual e ampl. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2012, página 631. 7 LIMA, Renato Brasileiro de. Nova prisão cautelar: doutrina, jurisprudência e prática. Niterói: Impetrus, 2011, página 182. 8 CAPEZ. Fernando. Curso de processo penal. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, página. 241.
A prisão preventiva será decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério
Público, ou do querelante, ou mediante representação da autoridade policial em qualquer fase
do inquérito policial ou da instrução criminal, a fim de garantir da ordem pública, a ordem
econômica, a conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal.
A prisão preventiva, por trazer como consequência restrição a liberdade do
indivíduo, antes do transito em julgado, somente se justifica enquanto puder realizar a
proteção da persecução penal, e se mostrar a única maneira de satisfazer tal necessidade.
O doutrinador Pacelli afirma que a prisão preventiva somente será decretada por
decisão judicial escrita e fundamentada, conforme dispõe o artigo 5º, inciso LXI, da
Constituição Federal, haja vista a sua gravidade e decorrência do sistema de garantias
individuais constitucionais9.
Além disso, Pacelli ressalta que se faz necessário que a decretação da prisão
provisória esteja expressamente prevista em lei, não podendo a autoridade judicial afastar-se
do principio da legalidade, nem mesmo se entender presentes circunstâncias e/ou situações
que coloquem em risco o regular andamento processual, ou seja, visa preservar o adequado
funcionamento de um processo 10
.
Portanto, a decisão judicial que denegar ou decretar a prisão preventiva deverá ser
sempre fundamentado, diante do princípio constitucional da motivação das decisões judiciais,
ou melhor, incumbe ao juiz realçar as provas de existência ou inexistência da infração penal,
bem como os indícios suficientes ou insuficientes de autoria, e demonstrando, ainda, os
elementos do processo ou do inquérito policial a sua necessidade para garantia da ordem
publica, da ordem econômica, como conveniência para instrução criminal ou para assegurar a
aplicação da lei penal.
Cumpre ainda registrar, que a mera repetição dos termos legais, sem qualquer
referência as circunstâncias do caso concreto, não satisfaz a exigência legal prevista nos
dispositivos legais: artigo 315, do Código de Processo Penal e artigo 93, inciso IX, da
Constituição Federal, pois deve o juiz apreciar os fundamentos de fato e de direito do pedido,
ou seja, motivar a sua decisão.
Quando o juiz verificar pelo conjunto probatório constante dos autos terem o agente
praticado o crime em legítima defesa, ou estado de necessidade ou qualquer outra excludente 9 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 11 ed. – Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009, página 415.
10 Idem, página 415.
de ilicitude (artigo 23, do Código Penal), não será decretada a prisão preventiva, nos termos
do artigo 314, do Código de Processo Penal.
A prisão preventiva também tem o seu tempo de duração e submete-se à cláusula da
imprevisão – rebus sic stantibus, podendo ser revogada quando não mais presentes os
motivos/requisitos que ensejaram a sua decretação, bem como renovada quando sobrevieram
razões para que subsista (artigo 316, do Código Processo Penal).
2.1.2.1 Pressupostos que autorizam a prisão preventiva
Para o juiz decretar a prisão preventiva, um dos pressupostos estabelecidos no art.
312 do CPP, devem estar presentes, bem como a prova da existência de crime e indícios
suficientes da autoria.
O doutrinador Mougeno11
aduz que apenas a presença do fumus boni yuris
(existência de prova da materialidade e indícios de autoria), não é suficiente para que seja
decretada a medida cautelar, como já dito acima, faz-se necessário a presença de um dos
requisitos previstos no art. 312 do CPP, quais sejam:
a) garantia da ordem pública: entende-se por ordem pública, a paz, tranquilidade
no meio social. Tal medida visa proteger a coletividade, em face de periculosidade de o agente
vir a cometer novos crimes, se este estiver praticando reiteradamente crimes, haverá
perturbação da ordem pública.
Sobre a matéria, segue o posicionamento do Supremo Tribunal Federal12
, in verbis:
“O Estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela
repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação
da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de
completa grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade. O clamor
público – precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão
processual (CPP, art. 312) – não se qualifica como fator de legitimação da privação
cautelar da liberdade do indiciado ou do réu, não sendo lícito pretender-se, nessa
matéria, por incabível, aplicação analógica do que se contém no art. 323, V, do CPP,
que concerne, exclusivamente, ao tema da fiança criminal. Precedente. A acusação
penal por crime hediondo não justifica, só por si, a privação cautelar da liberdade do
indiciado ou réu”.
O Superior Tribunal de Justiça, em seu informativo de nº 413, ao expor fundamentos
sobre a conversão de uma prisão temporária em preventiva, explicitou que: “a gravidade e a
11 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de Processo Penal – 4ed. São Paulo. Saraiva: 2009, página 405.
12 STF, HC 80.719/SP, Rel. Min. Celso Mello, DJU, 28-9-2001.
crueldade, por si sós, não são suficientes a embasar a preventiva, porém a agressão e a ameaça
às testemunhas o são”.
Verifica-se que, a gravidade do crime, por si só, é insuficiente para decretar a prisão
preventiva, porém se aferida a partir das circunstâncias em que o crime foi cometido, é
suficiente para fundamentar a decretação da aludida prisão. Nesse mesmo sentido entende o
Supremo Tribunal Federal.
b) garantia da ordem econômica: este pressuposto visa guardar a credibilidade da
justiça, afastando a sensação de impunidade, buscando impedir que o indiciado ou réu
continue sua atividade prejudicial à ordem econômica e financeira.
c) conveniência da instrução criminal: este requisito visa resguardar o persecutio
criminis que pode vir a ser perturbado pelo acusado, impedindo sua atuação com vistas a
influenciar a colheita das provas, ameaçando as vítimas, testemunhas, peritos, enfim,
prejudicando a investigação ou a instrução criminal.
d) assegurar a aplicação da lei penal: tem por objetivo assegurar a efetividade do
processo penal, para que o acusado esteja presente em todos os atos processuais e cumpra a
pena que lhe for imposta.
2.1.2.2 Crimes passíveis de decretação da prisão preventiva
O princípio da proporcionalidade impõe algumas restrições em matéria de prisão
cautelar, de modo a impedir que a medida deferida seja mais grave e mais intensa que a pena
a ser aplicada ao agente na ação penal, ao final do processo.
Dispõe o art. 313 do CPP que a regra geral é a permissão da prisão preventiva para
os delitos dolosos punidos com reclusão, e desde que presentes alguns dos pressupostos
estabelecidos no art. 312 do CPP.
Uma vez decretada à prisão preventiva, preenchido os requisitos legais, será
admissível nos seguintes casos: se a pena é de reclusão, se o crime for punido com pena de
detenção e apurar-se que o agente é vadio ou não indicar elementos para esclarecer sua
identidade, quando houver dúvida quanto a esta, se o imputado for reincidente em crime
doloso, conforme ressalva o disposto no art. 64, I, do CP e se o crime envolver violência
doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, a fim de garantir a
execução das medidas protetivas de urgência.
Em sua obra doutrinária Mougenout explana que não se admite a prisão preventiva
em crimes culposos e em contravenções penais e se houver prova de que o acusado agiu por
alguma causa de excludente de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito
cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito) - art. 314 do CPP, ou se, ainda, o
juiz verificar pelas provas dos autos, que o agente cometeu o crime sob coação moral
irresistível ou erro de proibição também não deve decretar a sua prisão.
2.1.3 Da Prisão Temporária
A prisão temporária é uma espécie de prisão cautelar, com prazo preestabelecido de
duração, cabível exclusivamente na fase do inquérito policial, onde que, visa auxiliar nas
investigações do inquérito policial, sendo assim, jamais será decretada na ação penal, mas
então somente no ciclo da investigação policial, cujo qual, está devidamente disciplinado na
Lei n. 7.960 de 1989.
Capez entende que prisão cautelar possui natureza processual destinada a possibilitar
as investigações a respeito de crimes. Em conformidade com o dispositivo do artigo 2º, da Lei
n° 7.960/89, somente pode ser decretada pela autoridade judiciária, mediante requerimento do
Ministério Público ou representação de autoridade policial e terá seu prazo de duração de 05
(cinco) dias, prorrogáveis pelo mesmo período em casos de extrema e comprovada
necessidade.
Tourinho Filho delimita em sua obra que:
“Somente o Juiz, mediante representação de Autoridade Policial ou requerimento
do Ministério Público, poderá decretá-la. Seu prazo máximo de duração é de 5 dias,
prorrogável por igual período, em caso de extrema e comprovada necessidade. Em
se tratando de crimes hediondos, de prática de tortura, de tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas e afins, e de terrorismo, o prazo de prisão temporária é de 30
dias, prorrogável por igual período e caso de extrema e comprovada necessidade,
conforme alteração procedida pela Lei n. 11.464/2007”.13
Para o Távora (2010, p. 546) “Se o inquérito chegou ao fim, à necessidade da
temporária desaparece, e a liberdade é obrigatória.”.
A falta de prévia instauração do inquérito não impede a decretação da medida
cautelar, pois os elementos de convicção podem ter sido extraídos de investigação realizada
pelo Ministério Público.
13 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 10. ed., rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. Página
535/536.
A prisão temporária não poderá ser decretada de ofício. Depende de requerimento do
Ministério Público ou de representação da autoridade policial (artigo 2º, caput), caso em que
deverá ser ouvido o Ministério Público (art. 2º, §1º). O Juiz terá, após o requerimento ou
representação, 24 horas para determinar fundamentadamente, se for o caso, a prisão
temporária (art. 2º, §2º).
As hipóteses em que caberá a prisão provisória estão descritas no artigo 1º da Lei n.
7.960/89, in versus:
“Art. 1° - Caberá prisão temporária:
I) quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;
II) quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos
necessários ao esclarecimento de sua identidade;
III) quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na
legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:
a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2°); b) sequestro ou cárcere privado
(art. 148, caput, e seus §§ 1° e 2°); c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°);
d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1° e 2°); e) extorsão mediante sequestro (art.
159, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°); f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com
o art. 223, caput, e parágrafo único); g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e
sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único); h) rapto violento (art.
219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único); i) epidemia com
resultado de morte (art. 267, § 1°); j) envenenamento de água potável ou substância
alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art.
285); l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal; m) genocídio (arts. 1°
2° e 3° da Lei n° 2.889, de 1° de outubro de 1956), em qualquer de sua formas
típicas; n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei n° 6.368, de 21 de outubro de 1976); o)
crimes contra o sistema financeiro (Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986)”.14
A decretação da prisão temporária depende da existência concomitante da hipótese
do fumus commissi delicti, em conjunto com uma das hipóteses dos incisos I ou II do supra
dispositivo legal, reveladoras do periculum libertatis.
Sobre a referida prisão provisória, cabe destacar uma jurisprudência do STJ:
PROCESSO PENAL PRISÃO TEMPORÁRIA. ATENTADO VIOLENTO AO
PUDOR COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA. AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO. CONFIGURAÇÃO. 1. A decisão que decreta a prisão
temporária lastreando-se apenas na gravidade do delito encontra-se sem a devida
fundamentação. Tal medida é de natureza excepcional e deve conter elementos
14 BRASIL. Planalto. Brasília, DF, 21 de dezembro de 1989. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em:
01/06/2013.
concretos que ensejem sua adoção. 2. Ordem concedida para que seja revogada a
prisão temporária decretada 15
.
Porém, para o doutrinador Guilherme de Souza Nucci:
“não se pode decretar a temporária somente porque o inciso I foi preenchido, pois
isso implicaria viabilizar a prisão para qualquer delito, inclusive os de menor
potencial ofensivo, desde que fosse imprescindível para a investigação policial, o
que soa despropositado. Não parece lógico, ainda, decretar a temporária unicamente
porque o agente não tem residência fixa ou não é corretamente identificado, em
qualquer delito. Logo, o mais acertado é combinar essas duas situações com os
crimes enumerados no inciso III, e outras leis especiais, de natureza grave, o que
justifica a segregação cautelar do indiciado”.
Nesse sentido, é possível o quão importante é a fundamentação da prisão temporária,
haja vista que a motivação da decisão é uma condição protegida pelo artigo 93, inciso IX da
Constituição Federal logo após a implantação da EC 45/2004. Sendo assim, não é admitida a
autorização da prisão somente pela gravidade do delito.
Esse tipo de prisão cautelar é alvo de imensas críticas doutrinárias, visto que, no
Estado Democrático de Direito como assevera a Carta Magna, não é admissível prender um
indivíduo para depois apreciar se esse é culpado ou não.
Os doutrinadores como Tourinho e Paulo Rangel partem da premissa de que mesmo
nos processos penais deve-se respeito aos direitos e garantias fundamentais previstas na
Constituição Federal, do contrário o estado se transforma em um violador da norma
constitucional.
3. A LIMITAÇÃO DOS PRAZOS DA PRISÃO CAUTELAR COMO MEIO DE
PROTEÇÃO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
É sabido que o Código de Processo Penal não prevê prazo para a duração da prisão
cautelar, contudo, estabelece prazos para a prática de atos durante a persecução penal, tais
como: prazos para a conclusão do inquérito policial, oferecimento da denúncia, designação de
data para audiência de instrução e julgamento, quando o réu estiver preso.
Mougenot afirma que:
A decretação da prisão preventiva não se faz por prazo determinado, isto é, possui
caráter rebus sic stantibus, ou seja, enquanto as cosias continuarem como estão.
Entretanto, é certo que não pode o réu permanecer preso preventivamente por prazo
indeterminado, sob pena de se caracterizar constrangimento ilegal. Nesse caso, a
15 BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n.º 13669 – 2ª Turma Criminal do Supremo Tribunal de Justiça.
Brasília, DF, 20 de agosto 2001. Disponível em: HTTP://www.stj.gov.br. Acesso em 07/10/2010.
jurisprudência tem criado mecanismo para a aferição da existência do chamado
excesso de prazo16
Parte da doutrina entende que o prazo de 81 (oitenta e um) dias, para réu preso e 120
dias, para réu solto, estabelecido no art. 8º da Lei 9.034/95, cuja redação foi alterada pela Lei
9.303/96, que dispõe das ações praticadas por organizações criminosas, aplica-se a todos os
casos de prisão cautelar em que não há prazo determinado.
O doutrinador Eugênio Pacelli17
pondera que o prazo de 81 (oitenta e um) dias teve
sua origem em construção jurisprudencial, firmada ao longo dos anos, em consideração aos
prazos legais fixados para a prática de atos processuais no processo penal.
Pacelli18
ressalta ainda que, a ausência de fixação de prazo certo para a duração da
prisão preventiva deixava o acusado inteiramente à mercê do Estado, nossa jurisprudência
elaborou entendimento de que se tratando de réu preso provisoriamente no curso da instrução
criminal, esta deveria ser concluída nos prazos previstos em lei, sob pena de caracterizar o
constrangimento ilegal.
Assim, o prazo legal para o encerramento da ação penal, alcançou-se o total de 81
(oitenta e um) dias, levando-se em consideração desde os prazos para conclusão do inquérito
policial até o prazo para a prolação da sentença, nos termos do art. 800, I, §, 3º, do CPP.
Os nossos tribunais superiores também têm adotado esse posicionamento, pois é o
entendimento que prevalece na jurisprudência.
Cumpre registrar que, o Supremo Tribunal de Justiça já sumulou a questão por meio
da Súmula n.º 52: “Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de
constrangimento por excesso de prazo”.
A Súmula n.º 21 da mesma Corte é no mesmo sentido, porém se refere à decisão de
pronuncia nos procedimentos do Tribunal de Júri, para o fim de superar a alegação de excesso
de prazo.
Pacelli, menciona ainda, um novo prazo no rito ordinário chegando ao total de 86
(oitenta e seis) dias, conforme sua contagem:
A nova contagem no rito ordinário chegará a 86 dias, como regra, ressalvada
circunstancia especificas de cada caso concreto, veja:
16 BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de Processo Penal – 4ed. São Paulo. Saraiva: 2009. página: 420. 17 OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 11 ed. – Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009, página 456. 18 Idem, página 456.
a) 10 dias ou 15 na Justiça Federal, para a conclusão das investigações;
b) 05 (cinco) dias para o oferecimento da denúncia;
c) 10 (dez) dias para a resposta escrita (art. 396, do CPP);
d) até 60 (sessenta) dias para a audiência de instrução (art. 400 do CPP), a serem
acrescidos do prazo de 24 (vinte e quatro) horas para a decisão do recebimento da
peça acusatória, e, eventualmente, do prazo de prisão temporária (Lei 7.690/89)19
.
Eventuais atrasos na conclusão da instrução criminal, se não imputáveis à defesa, não
deverão ter o condão de ampliar o aludido prazo.
Pacelli afirma que, quando se tratar de instrução complexa ou de pluralidade
excessiva de réus, o rito ordinário poderá ser ampliado em mais 20 (vinte) dias, sendo 05
(cinco) para cada parte e 10 (dez) para o juiz sentenciar.
A jurisprudência ressalva a relatividade desse prazo, que poderá ser excedido por
justo motivo, admitindo-se em homenagem ao principio da razoabilidade, que o acusado
permaneça preso por mais tempo, procurando compatibilizar a duração desse prazo com o
tempo necessário à prática dos atos de instrução do processo em análise no caso concreto, não
ficando perplexo diante da inexistência de uma previsão legislativa específica e, tampouco,
diante do já consagrado prazo de 86 dias fixado pela jurisprudência pátria.
Da mesma forma ocorre quando a demora excessiva for provocada pela própria
defesa, que visa apenas e tão somente beneficiar-se da própria torpeza.
Sobre o tema segue a Súmula n.º 64 do STJ: “Não constitui constrangimento ilegal o
excesso de prazo na instrução, provocado pela defesa”.
Se exceder o prazo da prisão cautelar sem justificativa, o magistrado da causa poderá
revogar a prisão, determinando a soltura do agente. Nos casos em que isso não ocorra, a
defesa poderá requerer a revogação da prisão por meio de habeas corpus, independentemente
da natureza do crime em apuração, de acordo com a Súmula n.º 697 do STF: “A proibição de
liberdade provisória nos processos por crimes hediondos não veda o relaxamento da prisão
processual por excesso de prazo”.20
19
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de processo penal. 11 ed. – Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009, página 457/458. 20 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Brasília, DF, 24 de setembro de 2003. Disponível em: HTTP://www.stf.gov.br.
Acesso em 07/10/2010.
Sobre o estabelecimento do prazo de duração da prisão cautelar e de sua
compatibilidade com o prazo necessário à conclusão da instrução processual as Cortes
PLURALIDADE DE RÉUS. AUSÊNCIA DE DESÍDIA DA AUTORIDADE
JUDICIÁRIA. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. DEMORA JUSTIFICADA.
1. Os prazos para a conclusão da instrução criminal não são peremptórios, podendo
ser flexibilizados diante das peculiaridades do caso concreto, em atenção e dentro
dos limites da razoabilidade. 2. A pluralidade de réus que integram o processo - 6
(seis) -, bem como as conseqüências advindas de tal fato, como a não localização de
testemunhas e sua substituição, demandam um maior intervalo para a conclusão do
sumário de culpa, não se podendo atribuir eventual atraso a suposta negligência da
autoridade judiciária, que, ao contrário, tem procurado dar diligente andamento ao
feito. 3. Ordem denegada 23
.
Sendo assim, configurando excesso de prazo, por mais que trate de crime hediondo
ou não, deve ser rebatido pelo Poder Judiciário, vista que, que não é tolerável admitir que
persista, no tempo, sem qualquer razão, a duração da prisão cautelar do imputado, em cujo
benefício castiga a presunção constitucional de inocência.
Não há que se olvidar que a prisão cautelar não pode converter-se em forma
antecipada de punição penal, uma vez que a privação cautelar da liberdade é a exceção e não
retira do réu o direito de responder o processo em liberdade e principalmente a um julgamento
em prazo compatível com a complexidade da causa, como decorrência da garantia
constitucional do due process of law, conforme preceitua a Constituição Federal Brasileira em
seu art. 5º, incisos LV e LXXVIII.
21 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 84201 – 2ª Turma Criminal do Supremo Tribunal Federal.
Brasília, DF, 01 de outubro de 2004. Disponível em: HTTP://www.stf.gov.br. Acesso em 07/10/2010. 22 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 82138 – 6ª Turma Criminal do Supremo Tribunal Federal.
Brasília, DF, 14 de novembro de 2002. Disponível em: HTTP://www.stf.gov.br. Acesso em 07/10/2010. 23 BRASIL. Supremo Tribunal de Justiça. Habeas Corpus n.º 2008/0142374-5 – 5ª Turma Criminal do Supremo Tribunal de
Justiça. Brasília, DF, 14 de outubro de 2008. Disponível em: HTTP://www.stj.gov.br. Acesso em 07/10/2010.
A dignidade humana é um atributo da pessoa, não podendo ser medida por um único
fator, pois nela intervém a combinação de aspectos morais, econômicos, sociais e políticos,
entre outros. Como princípio fundamental do Estado Democrático brasileiro, a dignidade da
pessoa humana, juntamente com o direito à vida e à liberdade, são garantias individuais
asseguradas pela Constituição Federal de 1988.
Sobre o tema preleciona Sílvia Mota:
O princípio da salvaguarda da dignidade da pessoa humana é base da própria
existência do Estado brasileiro e, ao mesmo tempo, fim permanente de todas as suas
atividades. É a criação e manutenção das condições para que as pessoas sejam
respeitadas, resguardadas e tuteladas, em sua integridade física e moral, asseguradas
o desenvolvimento e a possibilidade da plena concretização de suas potencialidades
e aptidões24
.
Sílvia Mota defende, ainda, que, cabe ao Estado propiciar as condições para que as
pessoas se tornem dignas. Todavia, a dignidade humana pode ser por diversas maneiras
violadas, entre estas, através da qualidade de vida desumana, de medidas como a tortura que,
sob todas as modalidades, são inibidoras do desenvolvimento humano. Portanto, é relevante
que o homem dê sentido à sua própria vida, e quanto ao Estado cabe este facilitar-lhe o
exercício da liberdade25
.
Desta forma, verifica-se que é de extrema relevância e de grande necessidade a
fixação do prazo razoável para a prisão cautelar, que, por ser limitadora de uma das
primordiais garantias do indivíduo, qual seja sua liberdade, pode acarretar constrangimentos
ilegais se não fixada de forma excepcional, proporcional e coerente com sua função
acautelatória, não podendo ser utilizada como antecipação de pena, eis que fere o princípio de
estado de inocência.
A Constituição Federal de 1988 consagra o estado de inocência, prevendo que o
cidadão somente será considerado culpado após o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória (art. 5º, LVII), do que se extrai que a execução da pena em desfavor do agente
somente é possível se calcada em condenação definitiva.
O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que a execução provisória da
pena, ausente à justificativa da segregação cautelar, fere o princípio da presunção de
inocência, senão vejamos:
24 MOTA, Sílvia. Princípio da dignidade da pessoa humana. Enciclopédia Virtual. Rio de Janeiro, RJ. 16 de julho de 2008.
Disponível em: http://www.silviamota.com.br. Acesso em 28 de outubro de 2010.
25 Idem.
“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de reconhecer
que a prisão decorrente de sentença condenatória meramente recorrível não
transgride a presunção constitucional de inocência, desde que a privação da
liberdade do sentenciado - satisfeitos os requisitos de cautelaridade que lhe são
inerentes - encontre fundamento em situação evidenciadora da real necessidade de
sua adoção. Precedentes. - A Convenção Americana sobre Direitos Humanos não
assegura, de modo irrestrito, ao condenado, o direito de (sempre) recorrer em
liberdade, pois o Pacto de São José da Costa Rica, em tema de proteção ao "status
libertatis" do réu, estabelece, em seu Artigo 7º, nº 2, que "Ninguém pode ser privado
de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas
Constituições políticas dos Estados-Partes ou pelas leis de acordo com elas
promulgadas", admitindo, desse modo, a possibilidade de cada sistema jurídico
nacional instituir os casos em que se legitimará, ou não, a privação cautelar da
liberdade de locomoção física do réu ou do condenado. Precedentes. PRISÃO
CAUTELAR - CARÁTER EXCEPCIONAL. - A privação cautelar da liberdade
individual reveste-se de caráter excepcional, somente devendo ser decretada em
situações de absoluta necessidade. A prisão processual, para legitimar-se em face de
nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos pressupostos a que se refere o
art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e indício suficiente de
autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões
justificadoras da imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de
privação da liberdade do indiciado ou do réu. - A questão da decretabilidade da
prisão cautelar. Possibilidade excepcional, desde que satisfeitos os requisitos
mencionados no art. 312 do CPP. Necessidade da verificação concreta, em cada
caso, da imprescindibilidade da adoção dessa medida extraordinária. Doutrina.
Precedentes. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA E O POSTULADO DA
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. - O Supremo Tribunal Federal não reconhece a
possibilidade constitucional de execução provisória da pena, por entender que
orientação em sentido diverso transgride, de modo frontal, a presunção
constitucional de inocência26
.”
Para evitar que a prisão provisória cause danos irreparáveis a pessoa, é primordial
que tal medida possua um prazo definido legalmente, em caso de omissão no ordenamento
jurídico, cabe ao juiz competente, ponderar os requisitos da prisão cautelar, frente ao princípio
da razoabilidade, verificando se a prisão é legal e se possui o condão de alcançar os objetivos
a que se propõe.
Assim, quando ocorre o excesso de prazo, na prisão cautelar, resta evidente que o
Estado está desprezando o a liberdade de locomoção do cidadão, bem como ainda, contraria a
direito básico de toda e qualquer pessoa, qual seja, o direito à resolução do litígio, sem
dilações indevidas (Constituição Federal, artigo 5º, LXXVIII) e demais garantias
reconhecidas pela Lei Maior.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende que quando a duração é
prolongada, abusiva e não razoável à prisão cautelar do agente, está ofendendo frontalmente o
princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, presente em nossa Carta Magna,
artigo 5º, incisos LIV e LXXVIII.
26 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus n.º 99914 – 2ª Turma Criminal do Supremo Tribunal Federal.
Brasília, DF, 23 de março de 2010. Disponível em: HTTP://www.stf.gov.br. Acesso em 07/10/2010.
Logo que configurado o excesso na extensão da prisão cautelar do agente, este não
pode permanecer exposto a tal situação abusiva, mesmo que este tenha praticado crime
considerado hediondo (Súmula 697/STF), haja vista, configurado nestes casos a
inconstitucional antecipação executória da sanção penal.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante das considerações acima mencionadas, pode-se concluir que toda prisão de
natureza processual ou provisória, ou seja, aquela que não decorre de condenação transitada
em julgado, tem natureza cautelar, devendo atender aos requisitos e às formalidades legais.
Ressalta-se, ainda, que a aludida medida cautelar não pode converter-se em forma
antecipada de punição penal, uma vez que a privação cautelar da liberdade é a exceção e não
retira do réu o direito de responder o processo em liberdade.
A Carta Magna de 1988 elege o princípio do estado de inocência, prevendo que o
agente é considerado culpado com o trânsito em julgado da sentença penal que o condenou,
conforme artigo 5º, LVII, vista que para a execução da pena em desfavor do réu ocorre apenas
com o apenar definitivo.
O artigo 5º, LXI, do mesmo ordenamento jurídico preceitua que “ninguém será preso
em senão em flagrante delito ou por ondem escrita e fundamentada de autoridade judiciária
competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos
em lei.”.
Além dessas garantias individuais (direito à liberdade), a Constituição Federal
assegura outra garantia, como por exemplo, a dignidade humana, que é um atributo da pessoa,
não podendo ser medida por um único fator, pois nela intervém a combinação de aspectos
morais, econômicos, sociais e políticos, entre outros. Cabe ao Estado propiciar as condições
para que as pessoas se tornem dignas.
Assim, em regra, sempre que uma prisão for decretada, está deve ter como base a
decisão do juiz, com a devida motivação e reduzida a escrito, porém, pode ocorrer da
flagrância do crime, onde qualquer cidadão pode concretizá-la.
O objetivo das prisões cautelares é defender o meio social de um indivíduo perigoso,
bem como garantir o trâmite regular do processo, conforme determina a legislação.
Quanto ao prazo máximo de duração da prisão provisória, não há nenhuma previsão
na legislação penal, contudo, nossos tribunais superiores têm fixado o prazo de 81 (oitenta e
um) dias, já que parte da doutrina entende que o referido prazo, estabelecido no art. 8º da Lei
9.034/9, aplica-se a todos os casos de prisão cautelar em que não há prazo determinado.
Com a vigência da nova Lei 11.719/2008, que alterou os ritos procedimentais,
passou-se o entendimento de que o prazo de 81 (oitenta e um) dias deveria ser observado até o
final da instrução, pois tal prazo não é absoluto e sofre flexibilidade diante do caso concreto,
devendo obedecer aos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, conforme as
peculiaridades e especificidades dos fatos delituosos e a complexidade do processo.
Todavia, é primordial que tal medida possua um prazo definido legalmente. Em caso
de omissão no ordenamento jurídico, cabe ao juiz competente, ponderar os requisitos da
prisão cautelar, frente ao princípio da razoabilidade, verificando se a prisão é legal e se possui
o condão de alcançar os objetivos a que se propõe, para impedir que a prisão provisória cause
danos irreparáveis a pessoa, e observar, ainda, o seu tempo de duração, a fim de evitar o
constrangimento ilegal por excesso de prazo da prisão.
Não obstante a omissão do legislador em relação à fixação do prazo da prisão
provisória, o Código de Processo Penal, visa suprimir falha existente antes da reforma do
referido código, fixando um período máximo de duração da prisão preventiva, que é de 180
(cento e oitenta) dias e será contado do início da execução da medida.
E no que tange a prisão temporária, o seu prazo continua o mesmo da atual
legislação, ou seja, esta não excederá a 05 (cinco) dias, admitindo-se uma única prorrogação
por igual período, em caso de extrema e comprovada necessidade.
Após o início da execução, o custodiado fugir, os prazos interrompem-se e, após ser
recapturado, serão contados em dobro, porém em nenhuma hipótese a prisão preventiva
ultrapassará o limite máximo de 03 (três) anos, ainda que a contagem seja feita de forma
descontínua.
Exaurido o prazo legal supracitado, o réu será posto em liberdade.
Portanto, diante de todas estas colações conclui-se que a prisão provisória só terá
cabimento quando estiverem presentes os requisitos ou pressupostos legais e a decisão que a
decretá-la deverá ser fundamentada pelo juiz competente.
Além disso, verifica-se que é relevante a fixação do prazo máximo de duração da
medida cautelar na legislação penal, e que ao ser aplicado deverá observar as referidas
garantias individuais previstas na Constituição Federal, evitando que o imputado cumpra um
regime de pena mais severo do que aquele a ser imposto por sentença condenatória.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 11 ed. rev. atual e
ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2009.
RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosamar Antonni Rodrigues Cavalcanti de. Curso de direito